ORGANIZADOR
INDEPENDÊNCIA:
HISTÓRIA E HISTORIOGRAFIA
SBD-FFLCH-USP
llllllllllllllllllllllllllllllllllllllll
265927
EDITORA HUCITEC
lt::IAPESP
707 ~ .
ia, teria
onsta de
lia e dos
~ sociabi-
mais do
r período
~isputan
~o Impé- AS BASES INST ITUC IONA IS DA CONSTRUÇÃO
r DA UNIDADE. DOS POD ERE S DO RIO DE
~da pela JANEIRO JOANINO: ADMINISTRAÇÃO E
~s repre- GOVERNABILIDADE NO IMPÉ RIO
~. onde o
LUSO-BRASILEIRO*
~reuni
i igualda-
tevelada,
~endiam/
MAR IA DE F ÁTI MA SILVA Gouv ÊA
I Universidade Federal Flumine nse
.la "esco-
~aret Ja-
"Rio de Janeiro, cidade a mais ditosa do Novo Mun-
~ desses do! Rio de Janeiro, aí tens a tua augusta rainha, e o teu
~ras que excelso príncipe com a sua real família, as primeiras ma-
jestades, que o hemisfério austral viu e conhece u [... ].
"Nesta Corte, e cidade do Rio de Janeiro é que o
Príncipe Regente Nosso Senhor, com descanso, e as-
I
i
~ 2000, pp. sistido dos seus ministros, e conselheiros, consumará, e
I aperfeiçoará a sua grande obra de supressão e total revo-
gação do antigo sistema colonial."
r(h-Cmtury 1
I - Luis GoNçAL VEs oos SANTOS
p~
No dia 7 de março de 1808, as embar cações que traziam o prínci
os acom~
regent e D. João e a família real, bem como toda a comitiva que
fim à lo~g~
panhava, finalm ente adentr aram a baía de Guanabara, pondo
.. _:'',;;•.'l"
olvimento Ciendf"ICO~
• Pesquisa desenvolvida com apoio do Conselho Nacional de Desenv
CNPq e da Univers idade Federal Flumin ense- UFF. AgradeçQ'~
Tecnol ógico-
razão, no processo final de~
do bolsista de iniciação científica, Gabriel Almeida F
· ·'"\.'·" ~·~ <
dados analisados.
1 es dos Santos (Padre Perereca ). Memória para siiTJÍr à.A~~'I!i!r.P
Luís Gonçalv
Plt.ff~~ ,
Brasil. Belo Horizonte-São Paulo: ltatiaia-Edusp, 1981 (reedição), t.ltJP
707 , .t~ q .~.(lFj
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708 MARIA DE FÁTIMA SILVA GOUVÊA
1
A CHEGADA DA FAMÍLIA REAL E O PROCESSO
DE REDEFINIÇÁO DOS PODERES INSTITUÍDOS
4
C f. afirmou o conselheiro Soriano em sua História da guerra civil e do estabelecimetltO do gOVIf'llo
parlammtar em Portugal (t. li, 1• época) a propósito do célebre intendente da policia de
Lisboa setecentista, o desembargador do paço Oiogo Inácio de Pina Manique, apud: J, C.
Pinheiro. Paulo Fernandes e a polícia de seu tempo. Revista do Instituto Histórico tGttJgltl/ko
Brasileiro, Rio de Janeiro, t. 39(1876):65-76, p. 66. · >';:~.; ~
Paulo Fernandes Viana ocupou o posto de intendente-geral da polícia entre maió'é'J-
e 26 de fevereiro de 1821, enquanto O. João VI permaneceu no Brasil entr4•máJfo*....
e 26 de abril de 1821. Interessante notar também que Luís Gonçalves dos~
Perereca, escolheu concluir a sua célebre Memória para servir à lzistói'ÍiriJo;ifJJjl.á. I "A
'Press,
justamente no momento em que O. João VI enfrentava grave crise polftialllfi•W 11 d · IPf
determinar a substituição de todo o seu ministério, e do próprio ·inu:tú~
Paulo Fernandes Viana. Luís Gonçalves dos Santos (Padre Percreca)t;ClpJ.~o
fviARIA DE FÁTIMA SILVA GOUVÊA
6
Sendo o grande marco deste debate o célebre artigo de Maria Odila da Silva Dias, "A
interiorização da Metrópole (1808-1853)", publicado na coletânea organizada por Carlos
Guilherme Mota./822: dimensões. São Paulo: Perspectiva, 1982, pp. 160-84, estudo que deu li
origem a vários outros, destacando-se, especialmente, os de Alcir Lenharo (As tropas da
moderação), Riva Gorestein & Lenira M. Maninho (Negociantes e caixeiros tm sociedade da
Independência), publicados no Rio de Janeiro, pela Secretaria Municipal de Cultura, em
1993. Estes estudos, como o de Júnia Furtado (Homens de negócio. São Paulo: Hucitec, 1999),
puderam incorporar diversas críticas, como, por exemplo, as de João Fragoso (Homms de
grossa aventura. Rio de Janeiro: MEC/Arquivo Nacional, 1992), demonstrando que, na
verdade, o fenômeno de it1terioriz.ação da Metrópole foi um processo desencadeado anterior-
mente à chegada de D. João ao Centro-Sul do Brasil.
7
Oliveira Lima. Dom João VI no Brasil. 3' ed. Rio de Janeiro: Topbooks, 1996. Ver também
Luís Norton. A Corte de Portugal 110 Brasil. 2' ed. São Paulo: Nacional, 1979.
8
Jurandir Malerba. A Corte no exílio. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
9
Kirsten Schultz. Tropical Versnilles. Empire, ll.fonarchy and the Portuguese Royal Courtin Rio de
Janeiro, 1808-1821. Nova York-Londres: Routledge, 2001.
10
Tendência esta fruto, em grande pane, da produção historiográfica, associada ao movimento
da nova história cultural e política de fins da década de 1980 e início da de 1990. Ver, por
exemplo, lstván Jancsó. "A sedução da liberdade: cotidiano e contestação política no final
I
I
do século XVIII", in: Laura de Mello e Souza (org.). História da vida privada no Brasil:
cotidiano e vida privada 11a América portuguesa. São Paulo: Companhia das Letras, 1997, pp.
387-437; François-Xavier Guerra. "La desintegración de la monarquia hispânica: revolución
e independencias", in: A. Annino; L. C. Leira & F.-X. Guerra (org.). De los Imperiosa las
Naciones: Iberoamérica. Zaragoza: IberCaja, 1994, pp. 195-227; e, em relação ao caso inglês,
ver Kathleen Wilson. The Smse of the People. Politics, Culture and Imperialism in England, 17/S-
178$. Cambridge Press, 1998.
11
Ver Maria de Fátima S. Gouvêa. Redes de poder na América portuguesa. Revista Brasileira
de História. São Paulo, vol. 18, no 36, pp. 297-330; Maria de Lourdes V. Lyra. A utopia do
poderoso Império. Portugal e Brasil: bastidores da política, 1798-1822. Rio de Janeiro: Sette
Letras, 1994; Kenneth Maxwell. "The Generation of 1790's and the Idea of the Luso-
Brazilian Empire", in: Dauril Alden (org.). Colonial Roots of Modem Bmzil. Los Angeles:
University of California Press, 1973; Guilherme P. das Neves. "Del Imperio luso-brasi.leiio
ai Imperio dei Brasil (1789-1822)", in: A. Annino, L. C. Leira & F.-X. Guerra (org.). Op. c;it.,
pp. 169-93; e Maria Odila Silva Dias. Aspectos de Ilustração brasileira. RevisttJ tio /IISIÍitllo
Histórico e Geográfico Brasileiro. Rio de Janeiro, 278, 1969. , .
1
z Diogo Ramada Curto tem produzido uma série de estudos a propósito desta telljÚit1~~'Yes,,
em especial, alguns de seus artigos, publicados nos três primeiros volumes ..~ lfH~ tia
expansão portuguesa, organizado por Francisco Bethencourt & Kirti Chaudh~JJ,.,~~~·
cuJo de Leitores, 1998), "A literatura e o Império: entre o espírito ca~~~~~ da
Corte e o humanismo ~ívico" (vol. 1, pp. 434-54); "Cultura escrita e.p~,.#fij:~f~~"
(vol. 2, pp. 458-531) e' As prática,s da escrita" (vol. 3, pp. 421-62). Para~,~~~~~da
do tema, veja a obra clássica de Angel Rama. A cidade das letras. São Paulo: Brast nse, S.
nz MARIA DE FÁTIMA SILVA GOUV~A
espec
ação administrativa, reafirmavam de forma recorrente a necessidade de se
gover
preservarem o modo e a coerência na aplicação das práticas de registro
de ma
escrito, já então consagradas na administração do Brasil colonial. 13
ria se
Outro aspecto fundamental, mas pouco explorado pela historiografia
Lisb<
que analisa a dinâmica de funcionamento da administração portuguesa, é
da de
o que pode ser entendido como o crescente processo de pagamento dos
Lisbt
mais diversos tipos de taxas e selos no trâmite dos papéis e diplomas edi-
Políc
tados pela própria movimentação interna da gestão administrativa. Curio-
refer
so perceber que eram os oficiais da Coroa quem pagava parte boa parte
dos i
destas taxas, gerando uma massa significativa de recursos financeiros, que ·
lhan1
eram entendidos pela Coroa como uma forma de remuneração interna de
de J
seus oficiais, constituindo-se em fonte geradora de recursos para a fazen-
E
da real e demais órgãos governativos. Exemplo interessante disso é o caso
esta
de vereadores do Senado da Câmara do Rio de Janeiro, que, na busca de
um v
isenção da obrigatoriedade de servir ato contínuo no cargo de almotacé,
sub<
encaminhavam petições que incidiam no pagamento de pelo menos três
são
tipos diferentes de taxa - novos direitos, taxa de assinar e de apresentação
do 1
da dita petição. 14 Apesar de se tratar de questão complexa e que escapa
ros,
aos limites do presente estudo, vale destacar o fato de que havia uma
pel<
soma considerável de selos e taxas, que eram pagos pelas demais pessoas
cad:
que procediam à tramitação de papéis e petições nos diversos órgãos da
cta-
administração régia, podendo-se perceber que toda esta movimentação
ban
gerou certamente uma massa importante de recursos financeiros. Isto aju-
aml
da a explicar a permanente preocupação das várias autoridades com o cons-
por
tante pagamento destas imposições, nas mais variadas circunstâncias.
de~
Outro aspecto importante é rememorar o fato de que, tradicionalmen-
cec
te, a cidade-corte do Império português fora posição sempre ocupada pela
tai1
cidade de Lisboa, que era, como afirmara D. João VI, a "antiga Sede e en1
berço original da Monarquia". 15 Isso estabdecia uma configuração toda
13
Paulo Fernandes Viana, primeiro intendente da polícia, atuava de forma sistemática para
lembrar a todos os oficiais com que se correspondia, superiores ou inferiores, a necessidade
de que mantivessem uma correspondência regular. Esta seria a forma como apolícia poderia
alcançar os objetivos a ela delegados pela Coroa. Outro exemplo interessante foi o observa-
do no alvará de 26 de janeiro de 1811 (p. 5), que estabeleceu umaregmgemlna forma como Ib
os diversos tribunais trocariam comunicações, fato que deveria sempre ocorrer "por meio
de Escrivães ou Secretários, escrevendo uns para os outros em nome dos tribunais respec-
tivos, remetendo cópias autênticas" do que houvesse deliberado o príncipe regente.
14
Ver os diversos exemplos encontrados em relação ao período abordado no Códice 39-2-14, 17
Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro. IR
15
Decreto de 7 de março de 1821. Coleção de leis do Brasil. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional,
1891, p. 28, daqui para frente citado comoCLB. Valentim Alexandre chamou atenção para o fato
de que este caráter ancestral da antiga Corte lisboeta era algo de que a Coroa portuguesa não 19
poderia abrir mão tão facilmente. Tratava-se de uma espécie de referência existencial da própria
AS RASES INSTITUCIONAIS DA CONSTRUÇÃO DA llNIDADl~ 713
políticos que informavam a existência de tal oficial, assim como também colo:
implicava a completa redefinição de todo o edifício governativo e políti- estu
co-administrativo até então instituído na América portuguesa. fest
Nesse sentido, a transmigração da Corte portuguesa para o Brasil con- so (
correu para significativa mudança no perfil geral das atividades adminis- do
trativas governativas, desempenhadas pelo mais alto escalão do governo cap
ali existente. Sua substituição por um conjunto de altos órgãos administra- de
tivos possibilitou um contato mais direto e mais intenso da Coroa com as cen
diferentes autoridades régias existentes no Rio de Janeiro, bem como com l
as que se encontravam espalhadas pelas várias capitanias no Brasil duran- Fe1
te o primeiro quartel do século XIX. Percebe-se de antemão que foram Fa:~
essencialmente as autoridades da magistratura as convocadas a atuar mais pos
intensamente na rearticulação da nova engrenagem governativa joanina. est:
Vale não esquecer também que as autoridades militares e as eclesiásticas ção
se mantiveram como elementos cruciais na rotina do trâmite administrati- de
vo,29 passando a conviver com um padrão de comunicação e de integração órg
mais intensa com os órgãos da administração central, então instalados na as
nova Corte. car
.z atr
ÜS PODERES CENTRAIS E O NOVO GOVERNO NO RIO DE JANEIRO cie
óq
Pelo menos cerca de sete órgãos da administração central foram esta- de
belecidos no Rio de Janeiro, entre março e agosto de 1808, sem conside- ati
_rar o estabelecimento da Imprensa Régia e da Fábrica de Pólvora, criadas co
neste mesmo período, e da Provedoria-Mor da Saúde da Corte e do Esta- le<
do do Brasil, estabelecida no ano seguinte. Tratava-se, portanto, de um do
intenso processo de criação de instituições que pudessem, de fato, trans- ro:
vestir o Brasil meridional com uma roupagem metropolitana, capaz de fa- ze
zer, de fato, que o Rio de Janeiro pudesse ascender ao posto de nova Cor-
te da Monarquia portuguesa. ra1
Antes de qualquer outra medida, foram os portos do Brasil franqueados di
ao comércio direto com o estrangeiro, logo após a chegada da família real til
à Bahia, decisão decorrente de uma representação encaminhada pelo con- ÁJ
de da Ponte, em janeiro de 1808, então governador dessa capitania. 30 Bus- G
cava-se minorar a insuficiência de recursos no suprimento das crescentes úl
necessidades materiais advindas da presença da Corte portuguesa no Bra- re
sil. Segundo Luís Gonçalves dos Santos, o Padre Perereca, este fora o
primeiro grande golpe em direção à completa eliminação do antigo sistema 3I
Jl
33
~9 Caio Prado Jr. Formação do Brnsil cot1temporn11eo. 15' ed. São Paulo: Brasiliense, 1977, pp.
313, 326 e 331.
3
° Carta régia de 23 de janeiro de 1808 (CLB, p. 1). 34
AS BASES INSTITUCIONA IS DA CONSTRUÇÃO DA UNIDADE 717
31
Alvará de 11 de março de 1808 (CLB, p. 4).
3
l José Subtil. Op. cit., p. 173.
H Decisão de 23 de março de 1808 (CLB, p. 5). Vale destacar que o alvará de 28 de rnarçó do
mesmo ano reduziu os salários dos ministros e dos secretários de Estado em face do ..ê$~
atual das rendas reais" (p. 6). ' • '"il
34 Alvará de 28 de junho de 1808 (CLB, pp. 74-86). ·" ;:·· ·!,
718 MARIA DE FÁTIMA SILVA GOUVÊA
Pará, Ceará, Piauí, Paraíba, Ilhas de Cabo Verde, Açores, Madeira e África des d(
Ocidental". Uma dada geografia pode ser depreendida dessa forma de vada r
organizar as finanças do conjunto imperial português. No topo, com gran- tratarr
de destaque e importância, a jóia mais preciosa do Império português na- Aqui,
quele momento: a cidade e a capitania do Rio de Janeiro. Era por ali que, em re
naquele momento, tramitavam o grosso da renda real, bem como os gru- como
pos mais importantes, contribuindo materialmente para a Coroa. A seguir, apena
as jóias intermedidrias, as possessões na África oriental, na Ásia e as capita- Ar
nias mais valiosas no Brasil, depois do Rio de Janeiro. Por fim, as demais ção gc
capitanias do Brasil, os territórios das ilhas do Atlântico e da África ociden- tes cc
tal. O Império se apresentava, então, como um grande arranjo luso-brasi- ro qu:
leiro, cenário onde não apenas a gestão dos recursos materiais era opera- Rio d
da, a partir da administração sediada na nova corte americana, mas onde rialmc
também as possessões territoriais se encontravam hierarquicamente orga- trativ
nizadas quanto aos interesses econômicos, que predominavam nos trdficos instit
mais importantes em curso no Atlântico sul português. sões
Vale lembrar que, diferentemente das demais capitanias do Brasil e pos- posta
sessões ultramarinas, o Rio de Janeiro foi colocado em posição que dis- Portu
pensava a existência de uma junta da fazenda, que até então esteve encar- Janei
regada de sua gestão fazendária. No contexto da transmigração da família ce d<
real, foi uma contadoria-geral do próprio Erário Régio que ficou direta- o
mente encarregada desta incumbência, 35 posição deveras singular, quan- ro, d
do comparada às demais regiões, que, no entanto, remonta à situação aná- Orde
loga vivida por Lisboa, ao longo dos vários séculos anteriores, na história meto
da administração reinol. Coro
Dando prosseguimento à criação dos demais principais órgãos da admi- da C
nistração central no Rio de Janeiro, a Coroa editou o alvará de to de abril gaçãc
de 1808, determinando a criação do Conselho Supremo Militar e de Justi- ticos
ça. Determinava tal diploma régio que este órgão ficava encarregado de rá, e
"todas as matérias que pertenciam ao Conselho de Guerra, ao Almiranta- solu1
do e ao do Ultramar na parte militar somente", ou seja, da gestão logística Ir
e jurisdicional de todas as matérias militares, 36 garantindo-se, ainda, a es- corte
tes conselheiros as "honras e regalias" previstas pelos alvarás de 6 e de 30
de agosto de 1795. Ficava ainda estabelecido que as capitanias do Pará e
do Maranhão e os demais domínios ultramarinos manteriam a sua direta
37
A
38
V:
vinculação com a capital Lisboa, haja vista a "grande distância e dificulda- !e
39
A
ra
35 v:
Esta singularidade da administração fazendária do Rio de Janeiro, no âmbito da administra- 40
ção joanina, pode ser observada também no tocante à tributação editada na cidade, no
A
41 [
período, sempre a cargo do Erário Régio, mesmo que mediada pelas informações prestadas
por demais órgãos administrativos, tais como o juiz do crime do bairro.
36 SI
José Subtil. Op. cit., pp. 180-1.
.~ .
4
AS BASES INSTITUCIONAIS DA CONSTRUÇÃO DA UNIDADE 719
des de navegação para esta Capital" .37 Notória era a diferenciação obser-
vada na forma de a Coroa gerir as finanças de seu Império em relação ao
tratamento das matérias sob a guarda do Conselho Militar e de Justiça.
Aqui, Lisboa mantinha quase intacta a sua jurisdição sobre tais assuntos
em relação à maioria dos domínios ultramarinos, ficando o Rio de Janeiro
como cabeça de comando das forças e dos assuntos que diziam respeito
apenas ao Estado do Brasil.
A natureza específica de cada uma destas duas grandes esferas de atua-
ção governativa acabou por gerar formas diferenciadas de vincular as par-
tes constitutivas do conjunto da geografia imperial portuguesa no primei-
ro quartel do século XIX. A vitalidade dos grupos econômicos sediados no
Rio de Janeiro concorria para sua maior inserção na forma de gerir mate-
rialmente o complexo imperial como um todo. Esta ambivalência adminis-
trativa acabou por concorrer enormemente para a eclosão da grave crise
institucional desencadeada em Portugal, em 1820-1821, quando as ten-
sões geradas entre a nova Corte e a capital Lisboa38 foram frontalmente
postas em xeque e questionadas pelos grupos então sediados no Reino de
Portugal. As condições de governabilidade exercitadas a partir do Rio de
Janeiro foram questionadas, contexto que acabaria por incidir no desenla-
ce do vínculo que então unia o Brasil ao complexo Império português.
O alvará de 22 de abril de 1808 determinou a criação, no Rio de Janei-
ro, dos Tribunais da Mesa do Desembargo do Paço e da Consciência e
Ordens. O primeiro era o órgão máximo pelo qual se despachavam por
meio de "provisão" os mais variados pedidos de licença encaminhados à
Coroa, bem como os pedidos de revisão de idade, perdão e revistas. Já o
da Consciência e Ordens tratava das matérias que diziam respeito à obri-
gação da consciência do monarca e à jurisdição sobre os privilégios eclesiás-
ticos e das ordens militares. 39 Tal medida se fazia necessária, dizia o alva-
rá, em face da "interrupção de comunicação com a capital" e visava "[à]
solução dos negócios [... ] e a prosperidade dos vassalos" .40
Importante também destacar a posição singular ocupada tanto pela nova
corte quanto pela províncio4 1 do Rio de Janeiro, no que se referia à ação
37
Alvará de 1• de abril de 1808 (CLB, pp. 7-9).
38
Vale lembrar que esta é a forma mais freqüente como as duas cidades eram referidas na
legislação editada no Rio de Janeiro, no período aqui abordado.
39
Ambos os tribunais criados em Lisboa na década de 1532, sofrendo posteriormente inúme-
ras modificações que, no entanto, não alteraram a essência de suas jurisdições administrati-
vas. José Subtil. Op. cit., pp. 167-9.
40
Alvará de 22 de abril de 1808 (CLB, pp. 17-8).
41
Destaca-se o fato de que a legislação portuguesa, editada no Brasil entre os anos de 1808 e
1821, usou de forma bastante assistemática os termos capitania e provfncin com um mesmo
significado. .
MAR IA DE FÁT IMA SILV A GOU
VÊA
46
Tal medida não surpreende, ao se considerar que, desde o período final da época pombalina,
se verificava em Portugal uma renovação de valores em prol de maior aceitação dos grupos
mercantis na nobreza portuguesa, tendo sido decretado o comércio como profissão nobre
em 1770 e, em 1773, abolida a antiga diferenciação entre cristãos-novos e cristãos-velhos.
47
O alvará de 23 de abril de 1810 determinou a inovação da chapa e a medalha da Ordem da
Torre e Espada (CLB, pp. 99-100); e Luís Gonçalves dos Santos (Padre Perereca). Op. cit.,
t. 11, pp. 181-5.
48
Decreto de 6 de fevereiro de 1818 (CLB, p. 60).
49
Alvará de 10 de maio de 1808 (CLB, p. 35).
722 MARIA DE FÁTIMA SILVA GOUVf:A
rem sobre interesses mercantis, como em outros tribunais, cujas sentenças to, rc
transitam pela Chancelaria Mor". 52 Estabelecia-se um poderoso mecanis- políc
mo de remuneração mais condigna do funcionário encarregado da admi- admi
nistração dos papéis que tramitavam pela Casa da Suplicação do Brasil, do A
mecanismo que promovia a geração interna de recursos para a própria uma
manutenção do sistema. gove
Vale ainda destacar a posição privilegiada da referida Casa da Suplica- dore
ção do Brasil com relação à administração dos assuntos judiciários da co- tani:
marca do Rio de Janeiro, especialmente no que se referia à indicação dos
substitutos de seus vários magistrados. Decretos editados em junho de 54 c
1809 e em setembro de 181253 ordenaram primeiramente que o Regedor e1
da Casa da Suplicação nomeasse um dos juízes do Crime da Corte para dt
substituição, nos impedimentos, do juiz de fora do cível, e, depois, tam- n
55 [
rc
50
A reconsideração dos negócios dos habitantes das ilhas dos Açores, da Madeira e de Porto L
Santo só voltaria a ser feita novamente pelo Tribunal de Lisboa, por determinação do alvará p
de 5 de julho de 1816 (CLB, p. 468). 56 c
51
Alvará de 9 de julho de 1810 (CLB, pp. 121-3). s
5
z Alvará de 27 de agosto de 1810 (CLB, pp. 141-2). s
53
Decreto de 12 de julho de 1809 e decreto de 4 de setembro de 1812 (CLB, 1809, p. 92 e c
1812, p. 53). I
'<
d
AS RASES INSTITlJCIONAIS DA CONSTRUÇÃO DA UNIDADE 723
54
Conforme os alvarás de 25 de julho de 1760 e de 15 de janeiro de 1780. Vale lembrar que,
em 1766, a Coroa jã havia determinado que o ouvidor-geral do crime do Tribunal da Relação
do Rio de Janeiro deveria servir também como intendente da polícia, atribuição que ga-
nhou instância própria apenas em 1808.
55
D. Rodrigo de Souza Coutinho. "Representação a S.A.R. O Príncipe Regente sobre uma
reforma da Câmara do Rio de Janeiro", in: Textos políticos, econômicos efintmceiros (1783-1811).
Lisboa: Banco de Portugal, 1993, t. 11, p. 347. Jurisdição que, segundo D. Rodrigo, acabaria
por gerar inevitavelmente conflitos com o Senado da Câmara do Rio.
16
· O termo polícia, neste contexto, carregava significado muito particular e próprio da época.
Segundo oDiciotldrio da Lf11gua Portuguesa, organizado por Antônio de Morais Silva, tratâva-
se do "governo e administração interna da República, principalmente no que respc:ita às
comodidades, isto é, asseio, fartura de víveres e vestiaria; e à segurança dos Cidadlos".
Lisboa: Typographia Lacerdina, vol. li, p. 464.
7.24 MA RIA DE FÁ TIM A
SILVA GO lfV ÊA
pelo Brasil joanino. Os códices que reúnem boa parte dessa correspon-
dência atestam com clareza a ação do oficial, de recolha de informações
de natureza bastante variada, bem como de envio de determinações go-
vernativas de ordem igualmente diversificada. Alguns bons exemplos dis-
to são constituídos pela grande correspondência que o oficial enviava a.
ministros de Estado, governadores de capitanias, ouvidores de comarca,_
juízes de fora e demais magistrados espalhados pelo Brasil e pela ÁfricaL
ao intendente de Polícia de Lisboa, a juízes do Crime de bairro e a oficiais
do Senado da Câmara da cidade do Rio de Janeiro, dentre outros. Essa
correspondência envolvia o-pedido de remessa de informações de natu-
reza muitíssimo ampla, destacando-se especialmente as sobre: vadios, ci-
ganos e escravos de má conduta, bem como a aplicação de medidas pu-
nitivas em relação a eles; a circulação de estrangeiros e a emissão de
passaportes; os dados que viabilizassem a construção de mapas populacio-
nais sobre as várias regiões; as condições dos caminhos no Centro-Sul do
Brasil; a circulação de tropas de gado; o envio de sementes do capim-de-
angola para o incremento da produção pecuária do Brasil; as condições das
nascentes e dos rios que abasteciam com água a cidade do Rio; a drena-
gem de pântanos e a manutenção das ruas e dos principais caminhos na
periferia da cidade; o recrutamento de homens para os corpos militares no
Rio de Janeiro; o padrão de construção de edifícios na cidade do Rio; a
geração de recursos em favor da ação governativa levada a cabo pela In-
tendência; o fomento de uma política de formação de trabalhadores livres
no Brasil joanino; a coleta de elementos para a constituição de um museu
de História Natural no Rio de Janeiro.
Em 13 de maio, outros dois importantes decretos régios foram edita-:
dos, determinando a criação da Impressão Régia e da Real Fábrica de
Pólvora. 62 Os dois órgãos foram deixados a cargo da administração de D.
Rodrigo de Sousa Coutinho, então ministro e secretário de Estado dos
Negócios Estrangeiros e da Guerra. Foram criados com o intuito de suprir
dois setores carentes de atendimento e de crucial importância para as co-
municações e a defesa territorial, especialmente em face da presença da
família real no Brasil e da interrupção das comunicações com a Europa. A
posição privilegiada de D. Rodrigo, no contexto político da época, se ob-
servava também no caráter progressivamente agigantado de suas jurisdi..
ções governativas, então acrescidas da gestão destes dois importantes ór-.
gãos. 63 Essas medidas apresentavam forte caráter transformador do Rio,.
6
~ Decretos de 13 de maio de 1808 (CLB, pp. 42 e 43).
63
Vale lembrar que, pelo decreto de 17 de fevereiro de 1815, a Impressão Régia, j4 entio de-
ao
nominada Real Oficina Tipográfica e Fábrica das Cartas de Jogar, ficou subordinada presi-
p.
dente do Real Erário, na qualidade de "inspetor geral destes estabelecimentOs" (CLIJ, 4).
726 MARIA DE FÁTIMA SILVA GOUVÊA
da Mesa de Inspeção, passando todos os assuntos, até então sob sua guar-
da, à jurisdição da nova Real Junta de Comércio, medida que foi parcial-
mente alterada, posteriormente, pela decisão de 3 de junho de 1809, que
determ inou que a "administração e arrecadação dos rendim entos consig-
nados às despesa s públicas", outrora a cargo da extinta Mesa de Inspeção
da Cidade do Rio de Janeiro, ficassem sob a jurisdição do Erário Régio,
conform e o que já era praticado em Lisboa, segund o os Decreto s de 12 de
junho de 1779 e de 14 de junho de 1780. Tal medida reforçou a autono-
68
68
Decisão de 3 de junho de 1809 (CLB, pp. 74-5).
1810, que
69
Com o progressivo desenvolvimento de suas atividades, ficou determinado, em
s e os ministros togados da Real Junta de Comércio , Agricultura, Fábricas e
os deputado
ntos e propinas que venciam os
Navegação do Brasil deveriam receber os mesmos emolume
costumes
da Real Junta de Lisboa, pois ela havia sido "criada[... ] com os mesmos estilos,
ntos daquela de Lisboa". Ver a decisão de 1o de junho de 1810 (CLB, p. 13).
e emolume
70
Alvará de 7 de julho de 1810 (CLB, p. 119).
de Janeir~
71
Outro exemplo desta vinculação mais direta da Real Junta com a área do Rio
ser observad a também em relação ao alvará de 3 de junho de 1809 (pp. 69-76), que
pode
sisa (5%)
determinou o pagamento de sisa (10%) sobre todas as compras e as vendas e meia
sendo o recebedo r de tais quantias, no Rio de Janeiro; a Real
sobre os escravos ladinos,
çio ali
Junta de Comércio e, nas demais capitanias, as Juntas da Administração e Arrecada
existentes.
dimtz
72
Manoel Vieira da Silva. Reflexões sobre alguns dos meios propostos por mais pam fll#/jomr#
da cidade[ . .. ]. Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1808.
728 MARIA DE FÁTIJ'viA SILVA GOllVÊA
73 76
"Aviso para o Intendente-Geral da Polícia do Rio de Janeiro [Paulo Fernandes Viana]", in:
77
D. Rodrigo de Sousa Coutinho, op. cit., t. II, p. 354.
74
Estas Julltns eram integradas pelo governador e pelo capitão-general, pelo ouvidor e pelo
juiz de fora, sendo instaladas nas casas dos governadores, onde se procedia à eleiçlio de seus
78
demais membros, oriundos da gente da governança local (CLB, pp. 105-07).
75
Alvará de 10 de maio de 1819 (CLB, pp. 24-6).
AS BASES INSTITUCI ONAIS DA CONSTRUÇ ÃO DA UNIDADE 729
Corte do Rio, ocasião em que uma nova governança passava a ser organi-
zada de forma sistemática do outro lado da baía de Guanabara. Não sur-
preende, portanto, ver José Clement e Pereira, grande comercia nte re-
cém-cheg ado de Portugal, ser nomeado primeiro juiz de fora e president e
da Câmara da Praia Grande, constituin do tal experiênc ia um momento
importan te em sua trajetória política, antecede ndo sua nomeação para a
presidênc ia do Senado da Câmara do Rio de Janeiro, dois anos depois,
momento em que desempen haria atuação preponde rante no desenlace
dos acontecim entos políticos de 1822.
O processo de instalação de uma administração central na nova Corte, a
partir de 1808, se fez acompanhar de um outro conjunto de órgãos e medi-
das administrativos complem entares. Esta roupagem político-adm,jnistra-
tiva envolvia um requintad o número de instrumen tos governativos, que
tanto expressavam o novo estatuto da cidade, quanto procuravam viabili-
zar o exercício de uma governabilidade mais alargada pelas autoridad es
instaladas na cidade. O segundo bloco de medidas pode ser dividido, em
termos gerais, em três principais áreas de atuação governativa: as autori-
dades eclesiásticas, as forças militares e a administração cotidiana da cida-
de mais propriamente dita, entendida , aqui, como ação mais rotineira das
principais autoridades a ela relacion adas- o Senado da Câmara, a Inten-
dência da Polícia e os juízes do crime de bairros da Corte.
No que tange à esfera eclesiástica do governo do Rio de Janeiro, um
dos recursos então acionados foi a maior gradação social destas autorida-
des, especialm ente das que se encontravam diretamen te ligadas à família
real recém-instalada na cidade. Nesse sentido, a carta régia de 3 de junho
de 1808 transformou o bispo diocesano do Rio de Janeiro no capelão-mor
da Casa Reai.76 O alvará de 15 de junho do mesmo ano condecorou a Sé
Catedral da cidade com o título de "Capela Real" .77 O avanço dessa pro-
gressiva diferenciação culminou com a criação de "uma nova Dignidad e
de Arcipreste, imediata ao Deão", incluindo a definição de um número de
monsenho res da Sé, bem como a condecoração dos cônegos da Real Ca-
pela com o "tratame nto de senhoria" . 78 Mais tarde, o alvará de 27 de
setembro de 1810 aprovou e confirmou os estatutos da Capela Real do
Rio de Janeiro, ocasião em que foi editada também uma nova tabela dos
dias e das funções solenes, classificados hierarqui camente em quatro or-
76
Carta régia de 3 de junho de 1808 (CLB, p. 62).
77
Alvará de 15 de junho de 1808 (CLB, p. 55). O alvará de 20 de agosto de 1808 determinou
a imposição de umapmslio arbitrtfria, calculada conforme a lotaçlio das igrejas das Ordens do
Brasil e domínios ultramarinos, visando à construção de uma nova capela real.
78
Carta régia de 25 de agosto de 1808 e alvará de 21 de dezembro de 1808 (CLB, pp. 132 e
176).
750 MARIA DE FÁTIMA SILVA GOlJVÊA
de tropa
dens. 79 Interessant e notar que a data (20 de janeiro) de celebraçã9 do de mão-
santo padroeiro da cidade, São Sebastião, ficou classificada no primeiro abasteci
grupo, categoria bastante restrita e seleta, apenas integrada por outras cument:
nove datas, dentre as mais importantes do calendário católico. Já o dia (13 para o c
de junho) de Santo Antônio de Lisboa ficou incluído no terceiro grupo, em pro1
80
acompanhado de celebrações de menor importância religiosa e política. tesse e:
A data (7 de março) de celebração pela feliz chegada de D. João ao Rio de mais ni
Janeiro foi classificada no segundo grupo, junto, por exemplo, da sexta- no 29 d
feira santa. No quarto e último grupo, o maior de todos eles, encontrava m-
81
se listados os dias dos santos de menor importância. "[..
O setor que provavelme nte mereceu a edição do maior número de di- di fe
plomas régios no âmbito administrat ivo aqui considerado foi por certo o do]
ligado ao setor dos corpos militares, encarregado da defesa e da manuten- da I
ção da ordem social na nova Corte do Rio. Eram medidas que envolviam Tro
uma grande área de atuação governativa, que ia desde os esforços de re- mo:
crutamento da tropa, em face da imensa carência de homens, à obtenção e
à administraç ão de recursos materiais necessários à manutençã o dos cor- Oc
pos militares, o "governo das armas", a definição de procedimen tos de dos n
graduação militar e, até mesmo, a definição da quantidade e da qualidade de p<
dos instrument os musicais imprescindíveis às bandas militares. Vale lem- cialm
brar também o fato de que havia uma gama muito variada de formas orga- à arti
nizacionais dos corpos militares no Brasil colonial, constituind o um com- Ot
plexo emaranhad o que buscava dar conta minimame nte da constituiçã o pas 1
das tropas necessárias, bem como do agrupamen to e do controle hierár- milí<
quico do conjunto da população, espalhada pelos territórios que integra- orga1
vam a América portuguesa . 82 de.s5
Cabe também destacar que, no Rio de Janeiro joanino, o recrutamen to Rio
c na<
79
Alvará de 27 de setembro de 1810 (CLB, pp. 153-210). da I
8
° Curioso perceber que, no trâmite da administração cotidiana da cidade de São Sebastião do lam
Rio de Janeiro do primeiro quartel do século XIX, era Santo Antônio quem de fato mais
atenção recebeu das autoridades encarregadas do governo da cidade. A devoção pelo céle-
ta e
bre santo havia sido declarada oficial na cid~de desde 1711 e o decreto de 14 de julho de
1810 elevou o "glorioso Santo Antônio da devoção do Rio de Janeiro ao posto de major de 83 (
o capítulo "Administração". Ver também Dauril Alden. Royal Govemmmt in Colonial Brazil 87
with Special Refermce to the Administmtio11 of Marquis of Lavradio, Viceroy, 1769-1779. Berkeley
e Los Angeles: University of California Press, 1968; Francisco Bethencourt. "O complexo
Atlântico", in: F. Bethencourt & K. Chaudhuri (org.). Op. cit., vol. 2, pp. 315-42.
AS BASES INSTITUCIONAIS DA CONSTRUÇÃO DA UNIDADE 731
83
CLB, pp. 24-7. Posteriormente, a Decisão n" 40, de 18 de novembro de 1816 (CLB, pp. 34-
5), deu instruções para o recrutamento especificamente de "praças para o Exército", fican-
do encarregado, na capital, de tal tarefa o intendente-geral da polícia e, nos demais distritos,
os coronéis comandantes dos ditos distritos.
84
O alvará de 2 de junho de 1817 determinava que não deveriam ser recrutados os condutores
de víveres para a Corte (CLB, p. 17).
85
Os figurinos de seus uniformes foram aprovados pelo decreto do dia 22 do mesmo mes e
ano (CLB, pp. 107 e 110). ·
1 ...
86
Decreto de 5 de dezembro de 1810 (CLB, p. 256). . . ..
87
De breve existência foi a criação do Corpo de Inválidos da Corte do Rio de J~n~que -
recebeu instruções por meio do decreto de 20 de dezembro de 1811, sendo, cn~~to,
extinto em dezembro de 1815 (CLB, 1811, p. 148 e 1815, p. 60). · · ' · ·
732 MAR IA DE FÁT IMA SILVA
GOU VÊA
!11.
AS BASES INSTITUCIONAIS DA CONSTRUÇÃO DA UNIDADE 733
foi ainda aprovada a concessão dos "uniformes aos Regimentos de Infantaria de Linha e de
Milícias desta Corte e Província do Rio de Janeiro", bem como dos "cinco figurinos do 1o
Regimento de Cavalaria de linha do Exército". Decretos do dia 13 de novembro de 1815
(CLB, pp. 52-3). A Decisão no 13, de 9 de maio de 1816 (CLB, pp. 10-2), determinou
também o envio dos modelos e dos figurinos dos uniformes dos corpos de infantaria de
linha e de mílicias da província do Rio de Janeiro.
96
Decreto de 13 de maio de 1809 (CLB, pp. 54-9).
..-
734 MARIA DE FÁTIMA SILVA GOUVÊA
tranqüilidade pública desta Corte [... ] cuja extensão e população tanto tente~
100
Decreto de 24 de junho de 1808 (CLB, pp. 61-3).
101
Foram concedidos aos seus professores privilégios similares aos dados aos lentes da Uni-
versidade de Coimbra. Carta de lei de 4 de dezembro de 1810 (CLB, pp. 232-46).
102
Decisão no 12, de 3 de maio de 1812 (CLB, pp. 15-6).
103
Decreto de 27 de março de 1810 (CLB, pp. 88-9).
104
Kirsten Schultz desenvolve argumentação bastante instigante acerca da dialética instalada
no Rio de Janeiro a partir de 1808, quando um processo de metropoliz.nçiio da cidade,
decorrente das demandas inerentes à presença física da família real em seu território, batia
de frente com a presença inexorável da escravidão no cotidiano da cidade. Kirsten Schultz.
Op. cit.; ver capítulo 5, especialmente.
?36 MARIA DE FÁTIMA SILVA GOUVÊA
Nesse sentido, não surpreende perceber a grande preocupação que tanto ça", 1
o ministro da Guerra, D. Rodrigo de Sousa Coutinho, quanto o intendente geral'
da polícia, Paulo Fernandes Viana, tinham em relação à necessidade da me- verna
lhor organização das companhias de capitães-do-mato, encarregadas da pri- sária
são de escravos fugitivos e do assalto a quilombos. Em extensa correspon- depoi
dência trocada por ambos, Paulo Fernandes Viana esclarecia, em fevereiro form;
de 1809, 105 que o conflito de jurisdição gerado em torno da nomeação de Cc
capitães-do-mato em Campos dos Goitacases deveria ser esclarecido à luz blica·
da documentação anteriormente editada sobre o assunto pelo vice-rei do mos
Brasil, o conde de Bobadela. Este material formava, segundo ele, "jurispru- h iera
dência certa" sobre a matéria em questão. Nessa documentação, esclarecia comi
o intendente, encontravam-se definidos os procedimentos pelos quais as plexl
câmaras deveriam seguir no ato de criação das companhias dos capitães- ao e!
do-mato. Eram as câmaras que deveriam nomear estes indivíduos, dando-
lhes cerca de "20 soldados dos homens pardos e dos mais capazes que há
nos distritos os quais têm obrigação de ir acompanhar nas entradas dos
Quilombos, definindo ainda as formas de remuneração por tal serviço". 106
Esclarecia, ainda, que a falta de cumprimento de tais determinações era o
em grande parte fruto da prop
dad2
"[ ... ] falta de magistrados nos grandes distritos das Comarcas e algu- Sem
mas que têm maior território do que era o dito do Reino de Portugal os
com um só Magistrado [tendo sido] necessário que para as desordens mai~
criminosas se desse autoridade a cada capitão do distrito e a cada coro- disse
nel miliciano [... ] para prender facínoras." 107 COnJ
vém
Isso fez que tais companhias fossem usadas de forma muito desorgani- do l
zada, promovendo uma quebra da ordem estabelecida. Reafirmou mais da (
uma vez, por fim, a necessidade de se fazerem impor as velhas instruções de<
dadas pelo conde de Bobadela, afirmando que seria apenas por intermédio essa
das câmaras, por meio da ação de seus juízes de fora, seus presidentes, corr
que se poderia melhor organizar e garantir a manutenção dos capitães-do- c
mato, de modo que atendesse de maneira mais conveniente a todo o con- vinl
junto de áreas que integravam o território sob sua jurisdição. À instância pro1
de poder local competia a organização de tal força punitiva, cabendo ape- mta
nas convocar os comandantes das "tropas milicianas e a gente da ordenan- Ne:
105
Códice 318. Registro de Avisos, Portarias, Ordens e Ofícios à Polícia da Corte, vol. 1 - tos I
Arquivo Nacional, pp. 336-47. !09 p
106
Sendo isso de grande importância, por serem "os capitães-do-mato uma gente pobre, e as d
mais das vezes perdida, que nunca têm forças para levar o necessário alimento as entradas 110 <
dos matos" -ibidem. I
107
Ibidem. J
AS BASES INSTITlJCIONAIS DA CONSTRUÇÃO DA UNIDADE 737
4
CONFLITOS JURISDICIONAIS E TRAMA POLÍTICA
108
Decisão n• 18, de 31 de maio de 1809 (CLB, p. 20).
109
As pautas das eleições dos oficiais do Senado da Cimara.de ·1615 fol'lHil as.t1nicas encontra-
das para o período joanino. Códice 16..1-11 -Arquivo Getal.da ·Cidade do' Rio de Janeiro.
110
Quanto às atribuições do Senado do Rio e de seus oficiais no s6C:ulo XVIII, ver Maria
Fernanda B. Bicalho. As câmaras municipais no lmp6rio portugu8s: o caso do Rio de
Janeiro. Revista Brasileira de História, São Paulo, vol. 18, n• 36 (1998), pp. 251-80.
:.::-
•
738 MARIA DE FÁTIMA SILVA GOUVÊA
115
Alvará de 12 de outubro de 1808 e Decisão no 10, de 16 de abril de 1810. · · bL
116
Códice 812, Arquivo Nacional, vol. 1. Ver também Dauril Alden. Op. cit., 196& ''>"!! c1n
117
Códice 812, Arquivo Nacional, voi. 1. Ver também o relatório da bolsista de lfl iiâ"'*'aden•
to científico (CNPq) Maria Lígia Rosa Carvalho, texto apresentado noSimpáiio~
Regional do Rio de Janeiro de 1996, intitulado O Set~ado da Ctlflinm dtJ.RJ...~ os
conflitos decorrmtes dns irregularidades na administração do Cojrr Gmzl tia CidttitiA: :H· é' i.l;:
118
Decisão no 13, de 14 de junho de 1808 (CLB, p. 11). . . '" • ~ ·~ ''· ::, ·
740 MARIA DE FÁTIMA SILVA GOllVÊA
Uma~
tração de lealdade política, observados pelo Senado para com a Coroa no
dade,
período enfocado. Dois planos para a construção de um monumento a ser
termir
edificado na Praça do Pelourinho, em memória da chegada de sua majes-
[••• ] 1
tade à cidade, foram aprovados na vereação de 17 de setembro de 1814,
cidade
os quais foram finalmente apresentados a D. João em 1817. O príncipe
regente acabou por dar a sua real aprovação ao plano da pirâmide, tendo-
"[.
se lisonjeado muito
pw
ser
"[ ... ] com o público e assinalado testemunho que esse Senado e os
[fie
habitantes desta Cidade deixam à posteridade dos honrados sentimen-
no,
tos de vassalagem e amor que professam a sua real pessoa, fazendo a
honra de aceitar este monumento, permitindo que ele se levante na
direit,
Praça do Pelourinho, como se acordou," 119
impo1
nism<
pedindo ao conde da Barca, ministro do Reino, que desse inteligência da
da no
decisão ao dito Senado. Nova demonstração de lealdade política foi obser-
uma1
vada meses depois, quando foi concedido ao Senado da Câmara o direito
nheci
de afixar, à frente da casa de suas sessões, o escudo das armas do Reino
Cc
Unido. 120
Com
A obra aqui já citada várias vezes do célebre Padre Perereca, Luís Gon-
ment
çalves dos Santos, se apresenta como a crônica mais rica de relatos sobre
nalm
as múltiplas celebrações realizadas no Rio de Janeiro joanino em torno
ofici<
dos nascimentos, dos casamentos, dos falecimentos e de outras grandes
belec
datas de comemoração da Coroa portuguesa. Aí se pode facilmente ava-
abra!
liar o papel preponderante do Senado da Câmara, bem como o dos "ho-
marc
mens da governança", na organização de tais festejos e na demonstração
ta bel
de solidariedade e vassalagem política para com a Coroa. 121 O contexto da
no C
aclamação de D. João VI foi talvez um dos momentos mais significativos
se cc
em que o Senado da Câmara se adiantou em dar provas de lealdade em
"der
seu nome e no da população em geral, por ocasião de tal celebração. 122
que
nad<
119
Decisão no 5, de 15 de fevereiro de 1817 (CLB, p. 5). men
IZO Decisão no 13, de 21 de maio de 1817 (CLB, pp. 9-10). ~ mag
121
Também a legislação editada no período joanino encontra-se prenhe de diversos exemplos nist
neste mesmo sentido. Um deles é a Decisão no 10, de 20 de março de 1816, que determi- r I\
nou que se tomasse luto geral por um ano pela morte da rainha D. Maria I, sendo seis meses
rigoroso e seis aliviado, mandando ainda fazer i~so constar às câmaras da comarca do Rio de t
Janeiro e enviando ainda cópia-circular aos governadores e capitães-generais das capitanias, 12J D
no mesmo sentido (CLB, p. 8). 124 o
122
Ver também M. F. S. Gouvêa. "O Senado da Câmara do Rio de Janeiro no contexto das e
cerimônias de aclamação de D. João VI". Anais do Seminário blternacional D. Joiio VI- Um p.
Rei Aclamado na América. Rio de Janeiro: Museu Histórico Nacional, 2000, pp. 246-59; e IZS )\'
Maria Beatriz Nizza da Silva. A vida privada e quotidiana no Brasil colonial na época de D. Maria 126 [
I e D. Joiio VI. Lisboa: Estampa, 1993.
..
AS BASES INSTITU CIONAI S DA CONSTR UÇÃ-O DA UNIDAD
E 741
Uma das várias formas de retribuição acionadas pela Coroa, na oportun i-
dade, foi a estabel ecida pelo decreto de 6 de fevereiro de 1818, que de-
termino u que "quere ndo dar ao povo da cidade do Rio de Janeiro [em]
[... ] benevo lência pela ocasião da [... ] coroação [de D. João VI] nesta
cidade" , sua majesta de decidiu que
"[ ... ] todos os seus habitan tes [ficassem] gozando de ora em diante do
privilégio de aposen tadoria passiva; e aqueles que tiverem servido ou
e os servire m na Câmara e mais cargos da Govern ança na mesma cidade,
en- [ficassem] gozand o dos privilégios conced idos pela Ordena ção do Rei-
oa no, livro zo,
título 58 para os Fidalgos e seus Caseiros e Lavrad ores," 12.3
na
direito este que conced ia a isenção do acompa nhamen to de presos. Mais
importa nte, entreta no, era o fato de que finalme nte se punha fim ao meca-
nismo de confisco das moradias, a tão odiada aposentadoria, muito utiliza-
da nos primeiros anos de presenç a da Corte joanina no Rio. Tratava-se de
uma recomp ensa de monta, causa de grande júbilo da população, em reco-
i no nhecim ento à concessão de tal privilégio, em tão feliz ocasião. 124
Confor me analisado anterio rmente , a Intendê ncia-G eral da Polícia da
r~~~
Corte e do Estado do Brasil, criada em maio de 1808, introdu ziu um ele-
mento radical mente novo na forma como a cidade vinha sendo tradicio
-
brno nalmen te governada. A amplitu'de das compet ências e das atribuiç ões deste
~des oficial régio sinaliza com clareza a busca, pela Coroa portugu esa, de esta-
hva- belecer no Rio de Janeiro mecani smos para uma govern abilida de mais
~ho abrang ente e comple xa. Esta talvez tenha sido, conform e já apontad o,
a
~ção marca mais distinti va do período, demons trada justam ente no próprio es-
~da tabelec imento e no modo de funcion amento desta institui ção governativa
~vos no Centro -Sul do Brasil. Segund o Maria Beatriz N. da Silva, a intendê ncia
.em se constit uía em um "elo necessá rio" entre a "alta admini stração " e as
b.122 "demai s esferas admini strativa s" . 125 Uma das princip ais medida s régias
que se seguira m à criação da intendê ncia foi a determ inação de que gover-
nadore s e capitãe s-gener ais das capitan ias mandas sem execut ar pronta-
I mente todas as ordens expedi das pelo intende nte-ger al de polícia aos
magistrados de suas capitanias, visando o "maior auxílio para a boa admi-
~
s
i- nistraç ão" . 126
es No que tange aos objetiv os específicos da present e análise, três áreas
de
s,
w Decreto de 6 de fevereiro de 1818 (CLB, p. 14).
124
Outro privilégio concedid o por tal ocasião foi o "l''..lmento dos vencime ntos dos
MinistrOli
e Músicos da Capela Real" do Rio de Janeiro. Carta régia de 6 de fevereiro de
p. 16). 1818 (CLB,
.. .
125
Maria Beatriz Nizza da Silva. Op. cit., 1986, p. 188.
126
Decisão no 16, de 23 de junho de 1808 (CLB, pp. 16-7).
742 MARIA DE FÁTIMA SILVA GOUVÊA
131
Para isso, deveria receber e auxiliar as pessoas que o dito intendente 13
lhes enviasse, procurando agregá-las às "grandes fazendas [... ] dando- 13
127
Decretos de 22 de junho e de 25 de novembro de 1808 (CLB, pp. 6 e 198), decreto de 25 de
janeiro de 1809 (CLB, p. 221).
AS BASES INSTITUCIONAIS DA CONSTRUÇÃO DA UNIDADE 743
1 8
" Carta Régia de 22 de dezembro de 1810 (CLB, pp. 263-4).
129
Códice 325- Províncias- Polícia- Correspondência com diversas autoridades, Arquivo
Nacional, vol. 1808-1814, pp. 36-36v.
130
Ibidem. Ver também, por exemplo, as páginas 40v-41v.
131
Decreto de 16 de fevereiro de 1813 (CLB, p. 6). "í
132
Ver as cartas régias de 2 e de 6 de maio e os três decretos de 6 de maio de 18l8(CLB~ pp:39-
42, e CLB, p. 6). Ver também José Carlos Pedro. A Colônia do MoTTO Qutimllli9,~~~~~
São João Batista de Nova Friburgo, 1820-1831. Mestrado. Niterói: UnitéltsldMé;'J'-ral
Fluminense, Departamento de História, 1999. ··~ '·'n' ob LÍtlt!6b
744: MARIA DE FÁTIMA SILVA GOUVi<:A
800 réis por cada escravo que entrasse no Brasil vindo da costa da África, tos
em favor da Intendência-Geral da Polícia, concorrendo para as "despesas se·
da iluminação pública desta Corte e sustento da Guarda Real da Polícia". 135 za
Bastante ampla era, portanto, a autoridade jurisdicional deste órgão ré- dil
gio, fato que concorria para o surgimento de uma gama bastante extensa
de conflitos governativos e administrativos com as demais autoridades exis- qu
tentes no Rio de Janeiro. Um bom exemplo disso foi a ordem de que os in1
presos, feitos por ordem do intendente-geral da polícia, não pudessem ser ta I
soltos por outra autoridade que não ele, ficando determinado que o chan- ut
celer da Casa de Suplicação fizesse cumprir tal determinação. 136 Outro e:x
ponto importante dizia respeito à circulação de estrangeiros pelo Brasil, sendo N
da competência do intendente de polícia fiscalizar a apresentação e a emis- co
são de passaportes para a circulação de estrangeiros, procedimento regu- es
lado com maior rigor pelo decreto de dezembro de 1820. 137
fi I
d~
133
Ver, por exemplo, o ofício expedido pelo intendente, em 8 de dezembro de 1819, ao juiz de
CC
fora de São João del-Rei. Códice 325- Correspondência com diversas províncias, vol.
1819-1828, Arquivo Nacional. In
134
Decisão no 17, de 20 de julho de 1810 (CLB, p. 16). Em sentido diverso, a Decisão n°44, de de
27 de outubro de 1817, determinou que a Intendência da Polícia tivesse a,tenção especial
no incentivo ao casamento de escravos nas comarcas do Rio de Janeiro, Mi.nas Gerais e São
Paulo (CLB, p. 34).
135
Ficando igualmente estabelecida, com os mesmos fins, a imposição de 1$000 réis por cada
pipa de aguardente comercializada e de 4$800 réis pela emissão de passaporte. Decisão no
39, de 4 de dezembro de 1810 (CLB, pp. 32-3).
136
Decreto de 7 de novembro de 1812 (CLB, p. 69).
137
O decreto de 2 de dezembro de 1820 (CLB, pp. 108-12) mandou exigir passaporte das
13
pessoas que entrassem no Reino do Brasil e dele saíssem, ficando responsável disso o
intendente-geral de polícia na Corte e, nas capitais das demais províncias, os governadores
13
e capitães-generais. Nos outros portos, os comandantes ou os magistrados encarregados
dos respectivos distritos assumiam jurisdição sobre este controle. Ver também a correspon-
dência do intendente com autoridades de diferentes capitanias nos anos de 1811, 1812,
AS BASES INSTITUCIONAIS DA CONSTRUÇÃO DA UNIDADE 745
t~~!
das luminárias e de festejos públicos, da inspeção das condições de fun-
cionamento do matadouro e da venda de alimentos, dentre outros. Na
~os consideração das atribuições administrativas da intendência e dos confli-
~ca, tos jurisdicionais verificados entre as duas instâncias de poder, considerar-
~sas se-ão primeiramente alguns exemplos que possam explicitar a sua nature-
r .13S za e, a seguir, determinadas conjunturas observadas que exemplifiquem a
iré- dinâmica governativa característica do período.
~sa Como já apontado pela historiografia que vem estudando o primeiro
~is quartel do século XIX, a documentação produzida cotidianamente pela
~ os intendência encontra-se profundamente marcada pelo grande desconten-
!
rser tamento do intendente Paulo Fernandes Viana em não poder contar com a
lan- utilização das rendas do Senado, bem como do seu apoio institucional mais
~tro explícito à implementação de suas decisões e estratégias governativas.
~do Não se tratava de nenhuma novidade, haja vista o caso de Lisboa, onde tal
~is contexto de conflitualidade jurisdicional fora a grande marca da relação
gu- estabelecida entre estas duas instituições, como aqui já mencionado.
Um dos maiores conflitos entre ambos os órgãos foi o observado na de-
finição dos recursos que seriam utilizados em prol da organização da Guar-
i
r da Real da Polícia, em 1809, ocasião em que o Senado da Câmarq_ do Rio
~de
~oi.
conseguiu isentar-se de participar de tal esforço, mantendo seus recursos
1 intactos, a despeito das críticas contundentes emitidas por Paulo Fernan-
~lda
de des Viana, na ocasião. Reclamava ele, em dois diferentes ofícios, que
~ai
ao
1817 e 1818, reunida no Códice 325, vols. 1808-1814 e 1814-1819, Arquivo Nacional. Tama-
nho era o montante de serviço relacionado à circulação de estrangeiros pelo Brasil que
pn• tramitava pela Intendência-Geral da Polícia, que a Decisão n• 4, de 3 de fevereiro de 1814,
t. criou o posto de Intérprete de Línguas Estrangeiras em sua secretaria, em atenção ao oijcio
do intendente, de 26 de janeiro de 1814, que dizia ser necessário haver alguém"s6 [•.. ]
~as assistindo aos processos e diligências que intervenham estrangeiros" (CLB, pp, 4:-5),__ ·-
38
Ver especialmente o Códice 318- ~egistro de Avisos, Portarias, Ordens e Oficios da Polfeia
rce~
1
da Corte, Editais, Provimentos, etc.- Arquivo Nacional. ··.di...... • ~~
idos 139
J. C. Fernandes Pinheiro. Op. cit.; Kirsten Schultz. Op. cit., cap. 4; e Paulo·Fttiiiilfdo•
>on- Vianna. Abreviada demonstração dos trabalhos da Polícia. Revista tio /tu~~·~
112, Geográfico Brasileiro, 55, parte I (1892), pp. 373-80. . ·· ,..,j·;n;;_;;;ff{)l-.
746 MARIA DE FÁTIMA SILVA GOUVÊA
"[... ] com bastante mágoa muito afirmo [... ] que me vejo sem os pre- sot
cisos meios de conseguir [... ] o auxílio das rendas militares [e que] por COI
14
° Códice 323, vol. 1809- Registro de Correspondência da Polícia aos Ministérios de Estado,
Juízes do Crime, etc.- Arquivo Nacional, pp. 4 e 58v.
141
Editais de 11 de junho de 1808. Códice 318-Arquivo Nacional, vol. 1808-1809, pp. 51-2.
142
Ofício enviado ao juiz do crime do bairro da Sé de 7 de junho de 1809, ibidem, pp. 83-83v.
AS BASES INSTITUCIONAIS DA CONSTRUÇÃO DA UNIDADE 747
soberano e toda a Sua Real Famnia nio pode, nem deve continuar a
conservar bisonhos e antigos costumes que apenas .podiam tolerar-se,
quando era reputada como uma·col&lia·'f:. /;lo .prospecto da cidade a
faz menos decorosa as presentes felizes,àrounsdnciasr:cm:erem as jane-
las das suas Propriedades r6tulas·ou :gdóiiilr dêlmadeinl;Jque nenhuma
comodidade trazem, e que estão mosr~,.;lak~dâJC!Wilização de
seus Moradores: Confiando [... ] [que).arari0t..1Jr0btóat1 dilvthais pro-
vas não equívocas de seu contentamentore.a.-ancdar: :dersiesu:s ó:ste-
munhos da antiga Condição de Conquista e de• :Cof6niat ceaeawendo
para enobrecer a sua corte e fazê-la mais notável aos olho& ·daa,NafJÕCS
Estrangeiras [... ] Por tudo isso se declara, que desde já devem: abolir
as rótulas das janelas de sobrados." 143
14 1
· Edital de 11 de junho de 1809. Ibidem, pp. 88-9.
144
Decisão no 29, de 8 de outubro de 1810 (CLB, pp. 26-27). O alvará de 3 de março de 1810
criou a Mesa de Despacho Marítimo no Rio de Janeiro visando à maior "comodidade e
esplendor [da] Capital e lugar" da residência da família real, devendo ela "promover a
cômoda condução dos materiais que para tal efeito se transportam e que tem subido pelos
altos preços por falta de exportação, causada pelas demoras que sofrem as embarcações".
Neste sentido, ordenou "que as lanchas costeiras que conduzirem os referidos [... ] mate-
riais de construção de edifícios [... ], logo que derem entrada na Alfândega, hajam de ser
visitadas no preciso espaço de tempo de 24 horas".
AS BASES INSTITUCIONAIS DA CONSTRUÇÃO DA UNIDADE 747
soberano e toda a Sua Real Família não pode, nem deve continuar a
conservar bisonhos e antigos costumes que apenas podiam tolerar-se,
quando era reputada como uma colônia [... ] o prospecto da cidade a
faz menos decorosa as presentes felizes circunstâncias, o terem as jane-
las das suas Propriedades rótulas ou gelosias de madeira, que nenhuma
comodidade trazem, e que estão mostrando a falta de civilização de
seus Moradores: Confiando [... ] [que] estarão prontos a dar mais pro-
vas não equívocas de seu contentamento, e a arredar de si estes teste-
munhos da antiga Condição de Conquista e de Colônia, concorrendo
para enobrecer a sua corte e fazê-la mais notável aos olhos das Nações
Estrangeiras [... ] Por tudo isso se declara, que desde já devem abolir
as rótulas das janelas de sobrados." 143
143
Edital de 11 de junho de 1809. Ibidem, pp. 88-9. · . · ,,.
144
Decisão n• 29, de 8 de outubro de 1810 (CLB, pp. 26-27). O alvará de 3 de,ffi&W9 • .l,8JO,
criou a Mesa de Despacho Marítimo no Rio de Janeiro visando à màior "coriwdici'ade e
esplendor [da] Capital e lugar" da residência da família real, d~v~~ela ~e~~! a
cômoda condução dos materiais que para tal efeito se transportam e quo tenuubido ~los
altos preços por falta de exportação, causada pelas demorasqu~IIS'éí6MaWç1Sós".
Neste sentido, ordenou "que as lanchas costeiras que~~:; ~J mate-
riais de construção de edifícios[ ... ], logo que derem·c~ialdtln<top,flajamde ser
visitadas no preciso espaço de tempo de 24 horas''. • ' ;;' ''' ,_ • :• :·~·: ., • · :. ,.
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748 MARIA DE FÁTIMA SILVA GOUVf:A
145
Códice 318- Arquivo Nacional, vol. 1808-1809, p. 270.
146
Ver o exemplo do longo ofício que o intendente de polícia enviou ao ministro dos Estran- 14~
geiros e da Guerra, o célebre conde de Linhares, dando explicações acerca das agressões 15(
impingidas a vendedores de água e seus escravos- ibidem, pp. 310-4.
r
AS BASES INSTITUCIONAIS DA CONSTRUÇÃO. DA UNIDADE 749
o••
e
b,
'a
~s
l "[ ... ] tendo mostrado a experiência e a constante prática de Portugal,
que o imposto de décima nos prédios, tem a vantagem de ser o mais
geral e repartido com mais igualdade, pois que pagando-o por fim os
inquilinos que os alugam, por lho [en]carregarem os donos no aluguel e
os proprietários pelos que habitam, chega a todos os meus fiéis vassalos
~ que tÊm igual obrigação de concorrer para as despesas públicas e por
b ser já de longo tempo conhecido e praticado [em Lisboa], é preferível a
~- qualquer outro que não tenha as conhecidas vantagens." 150
!16
Buscava-se obter maior soma de recursos que pudesse ser teoricamen-
·-l- te disponibilizada em prol da progressiva melhoria das condições de vida
·~ na cidade, especialmente diante do quadro de grande aumento populacio-
nal e das demandas decorrentes deste rápido crescimento. No caso do Rio
t
~a
I
de Janeiro, o imposto foi criado em todas as cidades e vilas, ficando a
cobrança a cargo de uma Junta de Décima, composta por dois superinten-
dentes - os juízes do crime - de um escrivão, de dois "homens bons",
f~- 147
Decretos de 9 e de 17 de agosto de 1818 (CLB, pp. 44 e 135).
148
Ver especialmente os já citados códices 318, 323, 325 -Arquivo Nacional. Consultar
também a Decisão no 1, de 9 de janeiro de 1818, que deu providências para que não
houvesse diminuição no fornecimento de carnes na cidade e em outros lugares, mediante
1- a liberação nos "registros de qualquer direito ou passagem" (CLB, pp. 4-7).
149
:s Alcir Lenharo. Op. cit., pp. 34 e 40.
150
Alvará de 27 de junho de 1808 (CLB, pp. 69-72).
-
750 MARIA DE FÁTIM A SILVA GOUVÊ A
fO·~
um fiscal, que
um nobre e um do povo, dois carpinteiros, um pedreiro e CÍSI
ros seriam
será um advogado. O alvará especificava que todos estes memb dd;
pelo Conse lho de Fazen da. 151
propostos pelo super intend ente e aprovados F'fl
editad a uma
Dificuldades na efetiv a adoção do imposto fizeram que fosse sá1
sua cobran-
seqüência de leis, que tentav am organizar a melhor forma de ria
inada a organ ização de um
ça.152 Poste riorm ente, em 1818, ficou determ Ca
cobra nças da
métod o unifor me para escrituração dos lançam entos e das de
na Cida-
décima da Cidad e, para conformar-se "com a prática estabe lecida Aj
Erário Régio . 153
de de Lisbo a", coisa que facilitaria os proce dimen tos do fi<
s, no mes-
Para a melho r cobrança deste imposto, foram també m criado d~
, consi deran do que
mo mome nto, os céleb res juízes do Crime da Corte nl
a presen ça do
"não só porqu e se muda ram as antigas circunstâncias" com Pt
aume nto da
prínci pe regen te na cidad e, conco rrendo para o acent uado dt
lugar de
população local, mas també m porque, tendo sido criado o o:
!'.
este Magis-
"[... ] Intend ente-G eral de Polícia neste Estado, não pode té
ilidad e
trado fazer execu tar o que cump re ao bem da segurança e tranqü
que há
públic a com os dois único s magis trados de meno r gradu ação [I
CoNCLUINDO
156
Kirsten Schultz. Op. cit.