INTRODUÇÃO:
O nosso Deus é “O Deus de toda graça” (1Pe 5.10). Bem-aventurados são todos
aqueles que vivem como súditos do Reino da Graça de Deus.
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“A doçura da graça” de Deus é a tônica da Sua relação com o Seu povo.
Tudo que temos, somos e seremos, é pela graça (1Co 15.10). A riqueza da graça de
Deus se manifesta de modo superabundante em nós (2Co 9.14; Ef 1.7; 2.7); todavia,
ela não foi revelada em toda a sua plenitude; por isso, aguardamos o regresso
triunfante de Jesus Cristo, quando Ele mesmo revelará a graça de forma mais
completa (1Pe 1.13), concluindo a nossa salvação (Fp 1.6/1Pe 1.3-5).
Neste estudo queremos nos deter em uma delas, conforme é usada por Davi no
Salmo 32. iHeisedh, cuja etimologia é obscura, pode ser traduzida por “bondade”,
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1
Cf. João Calvino, O Livro dos Salmos, São Paulo: Paracletos, 1999, Vol. 1, (Sl 6.1), p. 125.
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Packer diz que “graça” é “a palavra-chave do cristianismo” (J.I. Packer, Vocábulos de Deus,
São José dos Campos, SP.: Fiel, 1994, p. 85).
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João Calvino, O Livro dos Salmos, São Paulo: Paracletos, 1999, Vol. 2, (Sl 32.1), p. 39. “A
benevolência divina se estende a todos os homens. E se não há um sequer sem a
experiência de participar da benevolência divina, quanto mais aquela benevolência que os
piedosos experimentarão e que esperam nela!” [João Calvino, As Pastorais, São Paulo:
Paracletos, 1998, (1Tm 4.10), p. 120-121].
H.J. Stoebe, desex: In: Ernst Jenni & Claus Westermann, eds. Diccionario Teologico Manual del
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(1) A Auto-Entrega de Deus a Israel na Relação de um Pacto:
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Vd. W. Zimmerli, et. al. X/arij: In: G. Friedrich & G. Kittel, eds. Theological Dictionary of the New
Testament, Grand Rapids, Michigan: Eerdmans, 1982, Vol. IX, p. 383ss.; Walther Eichrodt, Teologia
del Antiguo Testamento, Madrid: Ediciones Cristiandad, 1975, Vol. I, p. 213ss.
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Van Groningen, comentando o Salmo 111.1, chama a expressão de “fidelidade pactual”; no
Salmo 118.1, designa de “amor pactual” (Gerard Van Groningen, Revelação Messiânica no Velho
Testamento, Campinas, SP.: Luz para o Caminho, 1995, p. 351, 363). Packer, a traduz por “Amor
constante”. (J.I. Packer, Vocábulos de Deus, p. 88); Eichrodt, chama de “amor solícito” (Walther
Eichrodt, Teologia del Antiguo Testamento, Vol. I, p. 213). Harris seguindo a versão King James, crê
que uma boa tradução é “bondade amorosa” (R. Laird Harris, hsd: In: R. Laird Harris, et. al., eds.
Dicionário Internacional de Teologia do Antigo Testamento, São Paulo: Vida Nova, 1998, p. 503).
R. Laird Harris, ihsd: In: R. Laird Harris, et. al., eds. Dicionário Internacional de Teologia do Antigo
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Testamento, p. 501.
Estudos no Salmo 32 (1) - Rev. Hermisten M.P. Costa - 3/4/2008 - 3
a) A Bondade do Senhor está espalhada por toda Terra: “Ele ama a justiça e o
direito; a terra está cheia da bondade (ʣʱʧ) do SENHOR” (Sl 33.5). (Do mesmo
modo: Sl 119.64).
c) Davi pede a Deus que o livre, o salve pela sua misericórdia: “.... salva-me
por tua graça (ʣʱʧ) (hesed)” (Sl 6.4). (Do mesmo modo: Sl 31.16).
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O Salmo 32 é um dos sete salmos penitenciais (6, 32, 38, 51, 102, 130 e 143).
Neles encontramos forte alento para o pecador perdoado. Além de gratidão (3-8),
neste salmo temos também instrução (8), contrastando o comportamento do íntegro
e com o do ímpio (10).
Neste salmo Davi narra a sua experiência tendo como ingrediente fundamental a
misericórdia perdoadora de Deus. Aqui ele compartilha com o seu povo a bênção do
perdão, demonstrando a intensidade e gravidade do seu pecado e a bem-
aventurança de ser fiel a Deus.
Sendo ela casada, estando o seu marido, Urias – arrolado como um dos valentes
de Davi (2Sm 23.39; 1Cr 11.41) – com o exército de Israel na batalha, Davi
arquitetou um plano: mandou chamá-lo, induziu-o a ir para sua casa deitar-se com
sua mulher, enviando-lhe, inclusive presente. No entanto Urias não quis fazê-lo
porque achava injusto que a arca de Israel e Judá estivessem em tendas; seus
companheiros de batalha ficassem ao relento enquanto que ele estivesse em sua
casa comendo e bebendo; assim, dormiu à porta da casa do rei. Davi usa então de
uma outra estratégia; faz com que Urias coma e beba bastante e se embriague a fim
de que fosse para sua mulher... Nada disso adiantou... Não satisfeito, Davi com uma
estratégia cada vez mais pecaminosa, envia pelo próprio Urias uma carta ao
comandante do exército de Israel, Joabe, na qual dizia: “Ponde a Urias na frente da
maior força da peleja; e deixai-o sozinho, para que seja ferido e morra” (2Sm 11.15).
Assim se fez; Urias foi morto e Davi tomou Bate-Seba para si. O texto relata: “Isto
que Davi fizera, foi mal aos olhos do Senhor” (2Sm 11.27).
Esta história – que falava tão de perto a Davi, que fora um dedicado pastor de
ovelha – foi suficiente para deixá-lo irritadíssimo, declarando ao profeta: “Tão certo
como vive o Senhor, o homem que fez isso deve ser morto. E pela cordeirinha
restituirá quatro vezes, porque fez tal cousa e não se compadeceu” (2Sm 12. 5-6).
A surpresa maior estava por vir; Natã numa declaração corajosa e dramática diz a
Davi: “Tu és o homem. Assim diz o Senhor Deus de Israel” (2Sm 12.7). Deus o
acusa de além de ter adulterado, ter matado a Urias pelas mãos dos Amonitas (2Sm
12.9). Davi cai em si, arrependido, e diz: “Pequei contra o Senhor” (2Sm 12.13).
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João Calvino, O Livro dos Salmos, São Paulo: Paracletos, 1999, Vol. 2, p. 421.
Estudos no Salmo 32 (1) - Rev. Hermisten M.P. Costa - 3/4/2008 - 5
Deus o perdoa: “Disse Natã a Davi: Também o Senhor te perdoou o teu pecado; não
morrerás” (2Sm 12.13).
Foi nesse contexto de angústia que Davi escreveu o Salmo 51. O salmo 32
parece ter sido composto depois, quando o salmista recuperou a sua paz com Deus.
Este salmo retrata de forma didática, sensível e intensa a bem-aventurança do
perdão de Deus resultante de Sua misericórdia que nos assiste. Aliás, “Só serão
bem-aventurados aqueles que põem sua confiança na misericórdia de
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Deus”.
Davi, então, escreve: “Muito sofrimento terá de curtir o ímpio, mas o que confia no
SENHOR, a misericórdia (ʣʱʧ) (hesed) o assistirá (ʡʡʱ) (sabab)” (Sl 32.10).
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João Calvino, O Livro dos Salmos, São Paulo: Paracletos, 1999, Vol. 2, (Sl 32.1), p. 40.