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Avances en Psicología Latinoamericana

ISSN: 1794-4724
editorial@urosario.edu.co
Universidad del Rosario
Colombia

MACEDO, JOAO PAULO; DIMENSTEIN, MAGDA


O trabalho dos psicólogos nas políticas sociais no Brasil
Avances en Psicología Latinoamericana, vol. 30, núm. 1, 2012, pp. 182-192
Universidad del Rosario
Bogotá, Colombia

Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=79924085014

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O trabalho dos psicólogos nas políticas sociais no Brasil
The work of psychologists in social policy in Brazil
El trabajo de los psicólogos en las políticas sociales en Brasil

JOAO PAULO MACEDO


Universidade Federal do Piauí, Brasil
MAGDA DIMENSTEIN
Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil

Resumo Abstract

Esse estudo versa sobre encontros entre a psicologia e This study verses on the meeting of psychology with
o campo das políticas sociais. Objetiva discutir como the social policy area. The objective is to discuss how
psicólogos que atuam em Unidades Básicas de Saúde psychologists that work in the Basic Health Units and in
(UBS) e Centros de Referência de Assistência Social the Social Assistance Reference Centers experience their
(CRAS) vivenciam o cotidiano de suas práticas. Para daily practices. Using the interview and participant ob-
tanto, investigamos os modos de atuar de 13 psicólogos servation methods, we investigated the modes of action
ligados aos serviços indicados por meio de entrevistas e of 13 psychologists involved in these service units. The
da observação participante. Os resultados indicam que results indicate that because these contexts are adverse
por se encontrarem em contextos adversos aos modos to the traditional forms of action, many professionals
tradicionais de atuação, muitos técnicos experimentam experience daily strangeness and discomfort, resulting
cotidianamente estranhamento e mal-estar, frutos da from their encounters with limiting situations of diffi-
vivência de situações limites, de difícil manejo. Além cult management. Furthermore, we observed practices
disso, observamos práticas e vivências marcadas por and experiences that were marked by feelings of com-
sentimentos de compaixão, piedade e pelo ressentimen- passion, pity, and resentment. We consider, finally, that
to. Consideramos, por fim, que o encontro da psicologia the encounter between psychology and social policies
com as políticas sociais exige flexibilidade nos modos requires flexibility in traditional acting modes as well as
tradicionais de atuação e busca de estratégias que con- the pursuit of strategies that consider cultural contexts
siderem as características dos contextos culturais, evi- characteristics, avoiding capture, fatigue and saturation
tando assim processos de captura, cansaço e saturação process that stifle the worker.
que sufocam o trabalhador.  Keywords: brazilian psychologist, public health, social
Palavras-chaves: psicólogo brasileiro, saúde pública, protection, subjectivity modes.
proteção social, modos de subjetivação.

Para citar este artículo: Macedo JP, Dimenstein  M. (2012) O trabalho dos psicólogos nas políticas sociais no Brasil. Avances en Psicología
Latinoamericana, 30 (1), 182-192

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Joao Paulo Macedo, Magda Dimenstein

Resumen jamentos de nossa profissão, bem como possibilitou


a efetivação de articulações entre os psicólogos e
Este estudio se centra en los encuentros entre la psico- os setores progressistas da saúde (movimento de
logía y el campo de las políticas sociales. Tiene como reformas psiquiátrica e sanitária) e também junto
objetivo discutir cómo los psicólogos que trabajan en las a grupos de militância voltados para a proteção da
Unidades Básicas de Salud (UBS) y Centros de Refe- criança e do adolescente, da mulher e do idoso, di-
rencia de Asistencia Social (CRAS) viven sus prácticas reitos humanos e movimento sindical (Dimenstein,
cotidianas. Investigamos las formas de actuar de 13 psi- 1998; Vasconcelos, 2009).
cólogos vinculados a los servicios mencionados, a través A aprovação da Constituição de 1988 fez com
de entrevistas y observación participante. Los resultados que os movimentos sociais em conjunto com outros
indican que la vivencia en contextos adversos y de situa- setores da sociedade brasileira exigissem da esfera
ciones extremas, difíciles de manejar, hace que muchos governamental e legislativa a regulamentação dos
técnicos experimenten en lo cotidiano, sentimientos de direitos previstos na constituição recém-aprovada.
malestar y no saber qué hacer. Además, la práctica y la Teve como resultado a efetivação do Estatuto da
experiencia se caracterizan por sentimientos de compa- Criança e do Adolescente e o Sistema Único de
sión, piedad y resentimiento. Consideramos, por último, Saúde em 1990, além da Lei Orgânica da Assistên-
que el encuentro entre la psicología y la política social cia Social/LOAS em 1993 e da regulamentação de
exige flexibilidad en las formas tradicionales de actua- outras políticas, mesmo considerando as dificul-
ción y la búsqueda de estrategias que tengan en cuenta dades econômicas e políticas dado o contexto ne-
las características de los contextos culturales, evitando oliberal que se aprofundava no país naquela época
así los procesos de captura, la fatiga y la saturación que (Vasconcelos, 2009). A institucionalização desses
ahogan a los trabajadores. campos de direitos e a abertura de vários serviços
Palabras clave: psicólogo brasileño, salud pública, pro- e programas de proteção e assistência à população,
tección social, subjetividad especialmente no campo da saúde, saúde mental e
assistência social, acabaram por ampliar significa-
tivamente (e de forma mais sistemática) o ingresso
Nos últimos 20 anos a Psicologia expandiu signi- dos psicólogos no campo das políticas públicas no
ficativamente seu campo de atuação na área das Brasil (Oliveira, 2005).
políticas sociais no Brasil. São ao todo 236,100 Em função disso, a Saúde Pública e a Assis-
psicólogos em exercício profissional no país, sendo tência Social se constituíram nos últimos anos em
que nos últimos quatro anos a proporção de psicó- espaços privilegiados de absorção de psicólogos
logos nos municípios do interior (48 %) superou a brasileiros. Ambos são atravessados pelos mesmos
das capitais (32 %) (Bastos, Gondim & Rodrigues, princípios: universalização, integralidade, descen-
2010). Além disso, estima-se que pelo menos ¼ da tralização e intersetorialidade (Campos, 2003);
profissão esteja institucionalizada nos aparelhos por conseguinte, buscam alcançar objetivos muito
do Estado em todo o país (Macedo & Dimenstein, próximos que, inclusive, se complementam, pois,
2011). muitas vezes, tanto os equipamentos da Saúde
A mudança do perfil do psicólogo brasileiro se quanto da Assistência Social atuam numa mesma
comparado às décadas anteriores, em que éramos base territorial assegurando à população-usuária
uma profissão hegemonicamente urbana e compos- níveis de seguridade social: 1) seja a partir de ações
ta por uma grande maioria de profissionais autô- de promoção e proteção da saúde, prevenção de
nomos (CFP, 1988), está intimamente relacionada agravos, diagnóstico, tratamento, reabilitação e
com a maior participação dos psicólogos, desde manutenção da saúde; 2) seja ainda com ações que
a década de 1980, junto aos movimentos de luta garantam e promovam direitos sociais, a partir da
social, política e demais ações de afirmação de di- prevenção e proteção dos chamados riscos sociais
reitos. Tais participações ampliaram o espectro de (Menicucci, 2002).
preocupações, debates, responsabilizações e enga-

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O trabalho dos psicólogos nas políticas sociais no Brasil

O foco dessas políticas é, no caso da saúde, neira como organizam saberes, práticas e regimes
priorizar ações com base na territorialização do de verdades sobre as formas como adoecem, como
cuidado, tanto em termos da assistência (ação clí- retomam seus estados de saúde, e como enfrentam
nica) à população-usuária, quanto de vigilância sa- suas dificuldades diárias.
nitária, epidemiológica e sobre o ambiente em que Nesse sentido, consideramos que para atuar no
determinado grupo populacional reside (Campos, campo da saúde e da assistência social (ou demais
2003). E no caso da assistência social, que também políticas) no Brasil se faz necessário, cada vez
se refere a uma política que prioriza ações de base mais, uma redefinição dos processos de trabalho e
territorial, garante ações de vigilância, acompanha- de gestão nesse campo (Benevides, 2005; Dimens-
mento e proteção social de indivíduos, famílias e tein, 2006). Mas, para tanto, é preciso ter clareza,
grupos em situação de vulnerabilidade/risco social implicação e disposição afetiva quanto a operar mo-
e pessoal, por não conseguirem prover seu sustento dos de trabalho sob os pressupostos da ação territo-
dado sua condição de exclusão dos processos pro- rial, em rede e intersetorial. Isso exige por parte dos
dutivos, ou pela a exposição: a) frente à condição profissionais o enfrentamento do modo clássico de
de pobreza, preconceito, exploração, violência e organização dos processos de trabalho (e também
abandono/apartação familiar ou social; b) frente às de como os serviços estão organizados), inserir-se
situações de drogadição, alcoolismo, desemprego no trabalho em equipe e transitar por conhecimen-
prolongado e criminalidade; além dos casos em que tos interdisciplinares, além de circular pelas comu-
grupos populacionais são vitimados por situações nidades (Dimenstein, 2006). Na verdade, tais ações
de desastre e/ou acidentes naturais (MDS, 2004). demandam dos psicólogos a desinstitucionalização
O encontro dos psicólogos com esses campos de práticas pouco permeáveis à complexidade da
trouxe uma série de problematizações para a pro- vida das pessoas, das condições de trabalho e dos
fissão, inclusive sobre a necessidade de se operar cenários onde profissionais e usuários interagem.
mudanças na sua base conceitual e técnica para atu- Por isso, propomos com este estudo conhecer e
ação na saúde pública e na assistência social (Lo- discutir as experiências e desafios dos psicólogos
Bianco, Bastos, Nunes & Silva, 1994; Dimenstein, que trabalham na atenção primária à saúde e na
1998, 2006; Lima, 2005; Benevides, 2005; Campos proteção social básica da assistência social, numa
& Guarido, 2007). Isso implica estarmos alerta realidade específica entre umas das capitais do
com a prática de transposição do modelo clínico estado da federação. Nosso interesse é investigar
tradicional para contextos que pedem outros modos sobre os efeitos produzidos no campo das práticas
de ser trabalhador (Dimenstein, 2006; Benevides, profissionais e no campo subjetivo (ou existencial)
2005). Não raro, as equipes profissionais e a pró- dos psicólogos que atuam em Unidades Básicas de
pria rede de serviços encontram-se permeados por Saúde (UBS) e Centros de Referência da Assistên-
modos de trabalho fragmentados, hierarquizados cia Social (CRAS). Foram objetivos desse estudo:
e burocratizados, ou seja, voltados apenas para a a) pensar como esses profissionais atuam e se rela-
afirmação de práticas reducionistas (Campos & cionam com os contextos em que estão inseridos; b)
Guarido, 2007; Vasconcelos, 2009). Tais saberes identificar o que esses campos têm pedido e exigido
e práticas quase sempre não levam em considera- desses profissionais em termos de saberes, práticas
ção as necessidades sociais de saúde e de proteção e disposição afetiva para neles atuar; c) discutir
social, além de não atuarem na defesa de direitos quais pontos críticos esses profissionais têm lidado
que as populações em suas localidades requerem ao se inserirem nesses espaços.
(Benevides, 2005). Além disso, observam-se situa- Acreditamos que o modo como os profissionais
ções em que os saberes especialistas desqualificam problematizam o cotidiano, a forma como articu-
os projetos ou “ideais” de saúde e de vida (Paim, lam/operam seus campos de saberes e práticas,
2006) construídos, normatizados e reiterados, his- têm implicações diretas na maneira como atuam,
tórico-culturalmente, pela própria comunidade (ou inclusive coletivamente e em rede, especialmente
mais singularmente, por cada indivíduo), na ma- na disposição de produzir interferências naquilo

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que está instituído, portanto, cronificado. Assim, é à realização desse estudo, e consentiram por escrito
preciso conhecer as relações de forças que confi- participarem do mesmo.
guram os processos de subjetivação nesses espaços A seguir, organizamos um calendário de visitas
e mais ainda, é preciso mapear aquilo que resiste e para cada serviço, no intuito conhecer e vivenciar
escapa às relações de dominação e sujeição em que o seu funcionamento diário, o cotidiano de trabalho
somos investidos e nos produzimos profissionais. dos técnicos e a realidade social em que atuavam.
Diferentemente de décadas anteriores em que Realizamos observação participante (registro no
o psicólogo brasileiro se concentrava em consul- diário de campo) e entrevistas abertas. Nas en-
tórios/ambulatórios isolados e distantes da realida- trevistas com os psicólogos priorizamos não só a
de e do cotidiano da população, hoje, os serviços descrição da rotina e das atividades desenvolvidas
de base territorial, vinculados à saúde pública e à no serviço, mas principalmente as experiências e/
assistência social, constituem-se como um campo ou situações que marcaram de forma singular suas
consolidado de inserção profissional para nossa atuações nos/entre os serviços e nas comunidades.
profissão. É importante ressaltar que o fato de termos
No Rio Grande do Norte (RN), em especial visitado os espaços de atuação desses técnicos
Natal, nosso campo de pesquisa, a ampliação da e conhecer seu cotidiano profissional, além das
presença da psicologia no campo das políticas experiências advindas do seu encontro com uma
sociais não é diferente. Somente na saúde existem determinada realidade social, isso possibilitou o
371 psicólogos na rede SUS em todo o estado, dos mapeamento não só dos modos de atuar desses
quais 222 estão localizados na capital e, desses, 31 profissionais, mas uma espécie de “sobrevoo” por
atuam em Unidades Básicas/Centros de Saúde.1 Na seus territórios afetivos. Para apresentar os resul-
assistência social, contamos atualmente com 202 tados desse estudo, organizamos como categorias
CRAS em 154 municípios, totalizando 193 psicó- de análise: 1) os modos de atuar e os desafios de ser
logos atuando no nível básico da assistência social trabalhador na atenção básica da saúde e na prote-
em todo o estado. A cidade do Natal conta com 10 ção social básica da assistência social; e 2) os mo-
psicólogos nos cinco CRAS da cidade. dos de se relacionar (e subjetivar) desses psicólogos
em relação aos contextos de trabalho e os pontos
Estratégias metodológicas críticos que têm que lidar ao atuar nesses espaços.

Mapeamos comunidades que contassem tanto com Resultados


serviços tipo USB quanto tipo CRAS numa mes-
ma base territorial. O critério de escolha tomou Modos de atuar e os desafios de ser
como base a perspectiva da intersetorialidade das trabalhador na atenção básica da saúde e na
políticas de saúde e assistência social. Nesse as- proteção social básica da assistência social
pecto, foram identificados 10 serviços (05 UBS
e 05 CRAS) para a realização do estudo. Sobre De maneira geral, os profissionais entrevistados
os participantes da pesquisa, cada CRAS contava têm pouco tempo de formados e de atuação nos ser-
com dois psicólogos (10 profissionais), enquanto viços. Nos CRAS, os profissionais têm pelo menos
que cada UBS contava apenas com um psicólogo. dois anos de formados e atuam no serviço há menos
Entretanto, só foi possível entrevistar três profissio- de um ano, enquanto que nas UBS os profissionais
nais de UBS, pelo fato de que em duas das cinco têm entre cinco e dez anos de formados, contando
unidades visitadas, o profissional estava afastado o mesmo tempo de atuação neste serviço. Quanto
por licença saúde. Dessa forma, tivemos um total de ao vínculo empregatício, os psicólogos dos CRAS
13 psicólogos entrevistados. Todos eles tiveram co- são temporários, com contratos de trabalho de no
nhecimentos dos objetivos e procedimentos quanto máximo um ano, tendo neste serviço sua primeira

1 Disponível em http://w3.datasus.gov.br/datasus/index.php?area=0203

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O trabalho dos psicólogos nas políticas sociais no Brasil

experiência profissional na psicologia. Enquanto e fragilização das relações técnico-profissionais no/


que os psicólogos das UBS são estatutários, apro- entre os serviços.
vados em concurso público. Em relação à saúde, apesar dos psicólogos das
Ao longo das entrevistas, percebeu-se que o UBS serem estatutários, a precarização das condi-
tipo do vínculo empregatício, a remuneração e as ções de trabalho está presente: a) na estrutura insu-
condições de trabalho são fatores que configuram ficiente para a realização de atendimento individual
o trabalho no campo social como atravessado pela e grupal; b) na falta de material para o trabalho
precarização das políticas públicas. No caso dos com o público infantil (reposição de material para
psicólogos dos CRAS, pelo fato de serem tercei- a brinquedoteca); c) na pouca disponibilidade de
rizados, seus contratos de trabalho não asseguram transporte para realização de visitas domiciliares;
garantias/benefícios trabalhistas (férias, 13º salá- d) na própria precarização da rede de serviços que
rio, licença saúde, etc.). Ou seja, ao mesmo tempo não consegue dar o suporte necessário aos encami-
em que os técnicos dos CRAS têm de desenvolver nhamentos, situação que inviabiliza, muitas vezes,
permanentemente ações de seguridade social à po- a efetividade ou resolutividade das ações propostas
pulação, eles próprios encontram-se descobertos de nos serviços. Também insatisfeitos com seus ren-
direitos e garantias. Além disso, são profissionais dimentos (entre três a quatro salários mínimos),
insatisfeitos com os seus salários (de no máximo mesmo trabalhando apenas 30 horas, os psicólo-
dois salários mínimos), especialmente para o re- gos das UBS complementam sua renda com um
gime de trabalho exigido de 40h semanais. Como segundo local de trabalho, com atuação em clínicas
forma de complementar a renda, os mesmos aca- privadas, na rede hospitalar privada e na docência
bam recorrendo à realização de trabalhos no pe- do ensino superior.
ríodo noturno, com a sublocação de consultórios Sobre o tipo de qualificação profissional, os
em clínicas privadas, ou ainda com a realização de psicólogos dos CRAS e UBS contam em geral
atividades de treinamento e seleção de pessoal em com o título de especialização, sendo a maioria na
empresas de consultoria de recursos humanos ou área da psicologia hospitalar ou clínica. Além dis-
escolas de formação de seguranças. so, recorrem aos saberes das abordagens clínicas
Outro fator complicador que tem contribuído (psicanálise ou abordagens de orientação analítica
para a precarização do trabalho nos CRAS é a rota- e abordagens humanistas/existenciais/fenomeno-
tividade de profissionais que compõem as equipes lógica) como orientações teóricas para embasarem
de trabalho. Anualmente toda a equipe técnica é suas práticas. Em termos das atividades desenvolvi-
renovada com o término dos contratos de trabalho, das, grande parte é executada individualmente por
afetando diretamente o rendimento das atividades cada profissional da equipe, prevalecendo pouco o
desenvolvidas no serviço, além de fragilizar a arti- trabalho interdisciplinar. As ações referidas como
culação do trabalho em equipe e da realização das as mais frequentes foram: atendimento individual
ações territoriais e em rede. Fato que se desdobra (psicoterapia e aconselhamento) e encaminhamen-
na fragilização dos vínculos entre os usuários e os tos, no caso dos psicólogos das UBS; e trabalho
profissionais do serviço, especialmente por não ha- com grupos (informativo/orientação, educativo, de
ver profissionais de referência para o acolhimento sensibilização, de convivência/apoio e terapêutico),
das demandas, ou para a realização de ações em triagem e encaminhamento, no caso dos psicólogos
conjunto com outros equipamentos da comunidade dos CRAS. Outras práticas também foram sinali-
(UBS, escola, igreja, grupos de convivência etc.) zadas por ambos, apesar de menos frequentes, co-
no objetivo de intersetorializar as políticas. A con- mo: visitas domiciliares e articulação com outros
sequência de tudo isso é a dificuldade de engajar equipamentos da comunidade (creche, escolas,
os profissionais no desenvolvimento de suas ações associação de moradores, dentre outros).
técnicas e políticas, pelo o fato de os serviços da Em relação à demanda atendida, os entrevis-
Assistência Social conviverem diuturnamente com tados referiram: a) dificuldade de comportamento
a marca da precarização das condições de trabalho de crianças e adolescentes na escola ou em casa/

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comunidade; e b) questões relacionadas à saúde incremento de ações de cuidado primário, do tra-


mental (depressão, ansiedade, pânico, transtorno balho em rede e articulação atenção básica/saúde
obsessivo-compulsivo, transtorno de personali- mental; da realização de ações da vigilância sani-
dade, psicoses, drogadição) e à saúde em geral tária, da clínica ampliada, do acolhimento, do ma-
(gravidez na adolescência, comportamentos/há- triciamento de equipes da saúde da família e ações
bitos pouco saudáveis que agravam o quadro da de promoção e prevenção de agravos em saúde; da
hipertensão, obesidade e outras doenças crônicas). realização de visitas domiciliares, oficinas terapêu-
Acrescente-se a isso problemas outros que também ticas e realização de atividades de planejamento e
permeiam o cenário dessas comunidades, como: gestão do trabalho; além do desenvolvimento de
falta de emprego, pobreza, violência, maus-tratos, ações intersetoriais pautadas pelos os princípios
criminalidade, consumo de álcool e outras drogas de co-responsabilização das ações, produção de
e tráfico de drogas. vínculo e autonomia. Nesse aspecto, atuar de mo-
De uma maneira geral, os entrevistados redu- do territorial requer, sem dúvida, um trabalho mais
zem sua leitura sobre as necessidades sociais e de integrado e articulado, para que assim se aumente
saúde da população usuária apenas ao diagnóstico o grau comunicacional e o poder de intervenção
das queixas ou quadros clínicos, sem problematizar dos serviços juntamente com outros equipamentos
o modo como as demandas por uso de recursos de urbanos e sociais da comunidade.
saúde, medicamentos, serviços, ações profissionais
e benefícios sociais foram produzidos. Tal postura Modos de se relacionar (e subjetivar) desses
muitas vezes reforça, como bem discute Campos psicólogos em relação aos contextos de trabalho
e Guarido (2007, p. 87), a demanda de “outros e os pontos críticos que têm que lidar ao atuar
profissionais (médicos, enfermeiros, assistentes nesses espaços
sociais, professores, etc.) e instituições (conselho
tutelar, escola, asilos, delegacias, judiciário, etc.)” Ao relatarem sobre o modo como atuavam nos
por modelos de atenção que só reforçam o lugar serviços, bem como sobre as experiências, desafios
clássico do setting e do modus operandi tradicional e pontos críticos que surgiram ao terem que lidar
do psicólogo. Ou seja, são ações que consolidam com o trabalho territorial, registramos em nosso
ainda mais atuações centradas apenas nos sujeitos- diário de campo tensões afetivas (e seus efeitos),
-problema sem levar em consideração a necessi- além de alguns vetores de subjetivação expressos
dade de se ampliar o olhar para os diversos outros pelos técnicos ao narrarem o modo como condu-
elementos constitutivos que compõem o complexo ziam e tentavam reorientar (ou não) suas práticas
campo problemático que tal problema aciona. nesses campos.
Dentre os entraves que obstacularizam a criação Nesse sentido, os entrevistados destacaram
de dispositivos de análise/intervenção dos campos que o encontro com o trabalho territorial na saúde
problemáticos que circundam as demandas re- (UBS) e na assistência social (CRAS), aproximou
queridas pela população usuária está o forte peso nossa profissão de uma realidade ainda distante
que nossas teorias essencialistas ainda têm sobre da que comumente conhecemos e discutimos em
a forma como percebemos, compreendemos, nos nossa formação, como também da que lidamos
afetamos e pensamos o mundo (Campos & Guari- nos clássicos lugares de atuação. As marcas desse
do, 2007). Isso recai no quanto ainda embasamos encontro se expressam no mal-estar/desconforto
nossos entendimentos por certos universais do relatado pelos técnicos ao atuarem nesses espaços.
que seja saúde e doença, ou do que seja sofrimen- Além do surgimento de sensações como estranha-
to mental (e sofrimento psicossocial – como diria mento, medo, impotência, frustração, compaixão
Sawaia (1995). Este, portanto, é um dos fatores que e ressentimento pelo fato de os entrevistados não
têm contribuído para o fato de termos avançado conseguirem atuar ancorados em certezas, na afir-
pouco no desenvolvimento de outras práticas no mação de identidades e na estabilidade dos eventos.
campo das políticas sociais, como por exemplo: o Por outro lado, também acompanhamos a partir das

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O trabalho dos psicólogos nas políticas sociais no Brasil

narrativas dos mesmos, momentos de potência e pesquisador) produzindo efeitos que desalinham
produção de movimentos de diferenciação em suas nossas fronteiras identitárias, visto que a intensi-
práticas técnico-profissionais. Inclusive, tendo al- dade do encontro com essas realidades distintas,
gumas vezes, situações em que os entrevistados se com uma pluralidade de forças que geram inúmeras
reconheceram como geradores de ações coletivas e sensações, imagens, pensamentos e ações, indica
problematizadoras do modo como se posicionavam que não há como sair ileso de tais experiências.
em relação aos entraves institucionais e burocráti- Pormenorizando o movimento de alguns afe-
cos dos serviços em que atuavam. tos que conseguimos cartografar na medida em
De uma maneira geral, os relatos referiam sobre que os técnicos produziram suas narrativas sobre
o quanto o encontro com comunidades, em geral as experiências no serviço, identificamos em rela-
de baixa renda, contribuíam para que eles próprios, ção ao mal-estar, que o mesmo derivava tanto dos
os profissionais entrevistados, questionassem suas questionamentos sobre a falta de suporte teórico-
ferramentas de trabalho e o aparato técnico-teórico -técnico e gerencial para melhor desenvolverem
que utilizavam, especialmente por que se tratava de suas funções, quanto em relação à precarização das
contextos que os colocavam em contato direto com condições de trabalho (questões salariais, falta de
pessoas expostas a um cotidiano de miséria, despro- estrutura física, de capacitação e autonomia para o
teção e violência. Ou seja, contextos que expunham desenvolvimento das atividades). Ou seja, condi-
os profissionais a situação de encontrarem-se face ções que acarretavam entre os técnicos frustrações
a face com seus próprios limites. Assim, os relatos visto não realizarem o seu trabalho da forma ide-
dos entrevistados, ora e outra, nos lançava (eles e alizada. Porém, o que mais chamou nossa atenção
a nós próprios que os escutávamos, muitas vezes,) ao longo das entrevistas foram as expressões de
em experiências abismais, que possibilitavam en- inconformação e desconforto dos profissionais em
contrarmos no cotidiano de suas práticas realidades relação à realidade social que atuavam e a clientela
ou posturas tidas como esquisitas ou estranhas, en- que atendiam.
contro com a diferença. Por se tratar , muitas vezes,
de homens e mulheres extraviados/esvaziados de Estava numa atividade grupal e quando vi o público
quaisquer possibilidades (de sobrevivência, eman- o qual estava me dirigindo, me dei conta de como era
cipação, etc.) em suas vidas (Pelbart, 2004), o en- difícil estar ali naquela situação! Como podíamos falar
contro com este universo marcava definitivamente de saúde, se o básico não existia: roupa, casa, comida?
a sensibilidade dos técnicos (e também a nossa ao Nesse dia minha única vontade foi largar tudo e nunca
acompanharmos suas narrativas no momento das mais voltar! (E1-CRAS)
entrevistas).
Nesse aspecto, o cotidiano de trabalho desses Por repetidas vezes, os entrevistados relataram
técnicos, não raro, os impelia a ter que se con- que se sentiam apenas como meros espectadores
frontar com situações de vida dos usuários que os frente ao sofrimento e as demandas sociais de
deixavam profundamente mobilizados e muitas indivíduos e famílias que atendiam. O incômodo
vezes impossibilitados de realizarem intervenções desses técnicos com tal realidade era disparado
eficazes (no sentido de resolutivas). Além disso, por se sentirem impotentes frente a um cenário
deparavam-se constantemente com a falta de reta- que, sem dúvida, os lhes exigia um tipo de atuação
guarda institucional e/ou jurídica em relação aos diferente, ou seja, mais coletiva e política, além de
casos que necessitavam resoluções imediatas. Por problematizadora das condições sociais e das rela-
isso entendemos que atuar no “campo social”, ali ções de forças que se produziam nesses espaços. O
onde a vida se produz, se fabrica e se modula (ou é resultado disso era que muitos desses profissionais
produzida, fabricada e modulada) permanentemen- acabavam resguardando-se apenas em seu saber
te, requer implicação do trabalhador. técnico como forma de manterem-se seguros fren-
Essa experiência incide, sem dúvida, de imedia- te a esse território diverso e problemático que é o
to em nossos territórios subjetivos (inclusive como campo das políticas sociais.

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é horrível, mas se eu sei que não tenho condições e o


Quando eu cheguei ao cras... É... Foi assustador próprio serviço também não tem como ajudar, enca-
(risos). Porque tem essas coisas novas... Aqui, a gente minho direto! [...] Aqui tudo é muito forte! Não dá
tem que aprender fazendo. Coisas que não fazemos para separar o profissional do pessoal não! Tudo aqui
no consultório e não vemos na faculdade... Trabalhar nos envolve de todos os lados. Temo ficar uma pessoa
aqui é conviver com o estranhamento, é estar dentro indiferente com as outras! (E2 - UBS).
da casa do usuário, lidando com suas questões de
maneira aberta. Ele falando de problemas de drogas Em função disso, muitos desses técnicos recor-
com o filho, estando o garoto ali na tua frente! E você riam, algumas vezes, à “amortização” dos próprios
calada, dentro da casa, vendo tudo aquilo e olhando afetos, especialmente frente aos casos que extrapo-
para as verdadeiras condições de vida daquela gente. lavam suas condições de intervenção.
É difícil! E agora? Atento para as questões do pai, do
filho, da casa, da mãe... Não olho! Atento somente para Nas situações de limite como a pobreza, à dependên-
o psicológico? Não olho! E... [..] Não sei, é difícil viu! cia química e situações de pessoas envolvidas com o
Acho que só aos poucos é que percebemos que isso tráfico, eu bloqueio! São situações em que fico im-
não é só uma experiência profissional, um lugar de possibilitado de propor algo, de ir além do que está
passagem: ‘onde chego aqui’, ‘consigo meu primeiro no nosso script profissional. Travo mesmo! Com isso
emprego’, ‘valorizo meu currículo’, e ‘depois parto eu deixo passar situações/experiências em que possa
para uma coisa melhor’. Aqui é uma experiência de escutar mais, questionar a respeito e insistir mais com
vida! Essa, sem dúvida, é uma experiência que tem me esse usuário, no sentido de mobilizar a unidade de al-
marcado profundamente. Penso nela assim que posso guma forma. Meio a isso ainda tem outro limitante que
para ver o que estou aprendendo com esse lugar, com é o próprio serviço, pois a maneira como os técnicos
as pessoas que aqui circulam, os profissionais, etc. conduzem os atendimentos, e por já agirem meio que
Mas as vezes não a retomo, por medo! (E4 - CRAS). ‘naturalizados’ com essas situações; isso tudo me co-
loca ainda mais, num beco sem saída. É nesse sentido
Nesse sentido, a realidade cotidiana dos profis- que vem a travação mesmo! (E1 - UBS).
sionais se configurava como geradora de grandes
incertezas, seja pelo fato de não terem claro (ou A compaixão e a piedade são outro exemplo de
por não conseguirem delimitar) as fronteiras/papel/ reações muito presentes no cotidiano desses pro-
lugar da psicologia nesses campos, seja por não fissionais em relação às condições de vida dos usu-
conseguirem se reconhecer enquanto trabalhado- ários, especialmente quando se trata de situações
res vinculados às políticas sociais. Tais espaços emergenciais: abrigo, roupas, alimentos, remédios,
de trabalho desterritorializam, sem dúvida, não só proteção e atendimento psicossocial nos casos de
os saberes e práticas profissionais hegemônicas da violência e agilidade no atendimento médico es-
psicologia, como também suas próprias verdades pecializado, etc. Nesses casos, os entrevistados
pessoais e a identidade profissional. relataram sentir-se bastante impotentes quando
A impotência também se evidenciava nos casos têm que desenvolver ações coletivas com vistas a
em que os técnicos se deparavam com situações promoção do auto-cuidado, da auto-gestão e da ar-
em que não sabiam o que fazer frente às demandas ticulação política dessa população para reivindicar
apresentadas, pois ora esbarravam na burocracia direitos. Além disso, reconhecem que a dificuldade
dos serviços ou na falta de estrutura, ora ficavam de organização política não é apenas da população
reféns da falta da rede de apoio de cuidado sócio- usuária, mas deles, enquanto técnicos, que não
-institucional (ações, serviços e programas) que conseguem articulação entre os trabalhadores pa-
atendessem as necessidades da população. ra reivindicarem direitos e melhorias, nem mesmo
em relação às suas condições de trabalho (vínculo
Vou ser sincero com você, tem situação aqui que eu empregatício, salários, carga horária, material para
não olho, eu não agüento olhar, sabe?! Para mim, isso

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O trabalho dos psicólogos nas políticas sociais no Brasil

o desenvolvimento das atividades programadas, como esses profissionais são afetados e problemati-
dentre outros). zam tais experiências têm implicação direta, inclu-
Afora o estranhamento, a impotência e a frus- sive coletivamente, na produção de interferências
tração vividos cotidianamente, ainda observamos naquilo que está instituído, cronificado no cotidiano
outro afeto nas narrativas desses profissionais. Fa- desses serviços.
lavam com ressentimento sobre o funcionamento
dos serviços, bem como sobre o modo com que os Considerações finais
usuários lidavam com a sua própria realidade. E
ainda, relataram de maneira queixosa que o ser- O encontro dos psicólogos com o campo das Po-
viço ou a política local estavam estruturados de líticas Sociais exige o reconhecimento dos modos
modo a não permitir a realização das suas ativida- com que nos produzimos nesses espaços, tanto
des, pois faltavam recursos e estrutura necessária quanto a reflexão sobre as estratégias provisórias
para o trabalho com crianças e atividades grupais, que esses espaços demandam da nossa profissão.
por exemplo. Sobre a população, reclamavam que Ou seja, são campos que pedem um profissional
havia pouca consciência em relação às suas con- que circule por entre os espaços da comunidade:
dições de vida e da sua responsabilidade quanto à ruas, becos, esquinas, casas, praças, etc. Portanto,
educação dos filhos e à manutenção da sua saúde e uma profissão que possa se misturar com o cheiro,
de seus familiares (crianças, adolescentes e idosos), o suor e o sol impiedoso da rua; e mais: que possa
ou mesmo em relação à necessidade de reivindica- “abrir seu corpo” (Gil, 2004, p. 13) e captar/car-
ção dos seus direitos e denúncia de ilegalidades. tografar os mais ínfimos e invisíveis movimentos
Assumiam uma posição crítica em relação ao Es- em nossos territórios afetivos e psicossociais, que
tado, mas não problematizavam suas participações seja sensível às variações das formas e fluxos da
quanto ao modo como desenvolviam suas práticas vida, bem como de seus espaços de luta – devir
e contribuíam com a manutenção dessa realidade a clínico-político.
partir da delimitação de modos instituídos de viver Enquanto continuarmos a operar no campo das
e da produção de verdades ancoradas em um dis- políticas sociais no Brasil, especialmente nos ser-
curso técnico atravessado de valores, de uma moral. viços de base territorial, com posturas pouco sen-
Ao longo das entrevistas também identificamos síveis a produzir potenciais de diferença na forma
o movimento de certos afetos/pensamentos gerado- como reconhecemos/intervimos nos “problemas”,
res de campos de potência quanto à transformação apenas reforçaremos a pouca efetividade do nosso
dos modos de agir (ou pelo menos de se posicionar) fazer profissional, mantendo assim nosso clássico
frente à realidade e condição que esses técnicos se modus operandi de atuação, inclusive transferido
encontravam. Inclusive, por que alguns deles ten- para o campo social. Como operadores de uma
taram, em alguma medida, operar movimentos de micropolítica cotidiana, não podemos esquecer que
diferenciação de suas práticas, e também contagiar na medida em que interferimos na forma como as
uns aos outros para se reposicionarem em relação pessoas vivem, pensam, sentem, sofrem, agem e
aos entraves institucionais e burocráticos das po- se relacionam, estamos em nosso trabalho, cons-
líticas sociais. A esse respeito, Baptista (2000) re- tantemente, enredados em algumas encruzilhadas.
fere que o encontro com o inenarrável borra tanto Ora fazemos o jogo da reprodução de modelos de
os nossos limites pessoais quanto os limites em forma a serializar e fixar identidades a partir de
que temos sido “fabricados” como profissionais. modos de vida hegemônicos, ora experimentamos
Agamben citado por Pelbart (2004, p. 139) sinaliza modalidades de ação que favorecem o encontro de
que é preciso mesmo “deixar-nos levar por tais ex- outros possíveis ou novas configurações que agen-
perimentos”, pois por meio deles “arriscamos [...] ciam processos de luta e singularização, mesmo
nossos modos de existência”, bem como abrimos que provisórios. Por isso, precisamos estar atentos
caminhos para uma constituição diferente do que com os movimentos de constituição, reprodução
somos. É por essa via que apostamos que o modo e invenção de territórios existenciais nesses cam-

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requerem com certa urgência definições e posicio- psicólogo brasileiro? São Paulo: Edicon.
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Fecha de recepción: 24 de enero de 2011


Fecha de aceptación: 27 de marzo de 2012

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