Não é de hoje que se ouve falar sobre intervenção de tropas federais na segurança do
Rio de Janeiro, este tema vem se tornando cada vez mais freqüente, por ocasião de
eventos internacionais, ou com objetivo de combater a violência. Durante a conferência da
ONU sobre meio ambiente e desenvolvimento Rio-92, realizada de 3 a 14 de junho de
1992, o Rio de Janeiro Teve a segurança reforçada por homens do Exército e seus
tanques, estrategicamente mobilizados, principalmente por onde passariam as
delegações estrangeiras. Coordenado pelo Comando Militar do Leste, o mesmo de
atualmente, o esquema de segurança da conferência começou no fim de maio/1992 e
envolveu mais de 17 mil homens. Um dos principais pontos estratégico dos militares foi a
Rocinha: em frente à passarela de pedestres da estrada Lagoa-Barra. O esquema
também se estendia ao longo da Avenida das Américas, elevados e túnel do Joá. Os
soldados também estavam na favela do Vidigal, na orla de São Conrado até a Barra da
Tijuca. O esquema incluiu a ciclovia da Lagoa e toda orla da Zona Sul.
“Com o esquema especial de segurança, que também mobilizou policiais militares, civis e
fuzileiros navais, os índices de criminalidade caíram em quase todos os pontos da cidade,
segundo estatísticas da Polícia Militar. Na área sob proteção máxima, a média diária de
crimes diminuiu 16,2%. Nas regiões fora do esquema, a queda foi de 12,4%. Durante a
conferência, mendigos também sumiram da orla do Rio. Para escapar do policiamento
ostensivo na orla e das operações diárias de recolhimento compulsório na Rio-92,
mendigos da Zona Sul se espalharam pelas ruas internas de Copacabana, Leblon e
Ipanema.” (Betim, Felipe. 2018)
Em 2007 é proposta uma solução estruturante e de longo prazo para a segurança pública
do Rio de Janeiro. As Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) foram inauguradas no final
de 2008 com uma operação no morro Dona Marta, no bairro Botafogo. A estratégia, que
logo foi replicada em outras comunidades, consistia em expulsar o tráfico e instalar bases
da Polícia Militar com agentes de preferência novos, sem antigos vícios da corporação, e
treinados para manter uma relação de proximidade com os moradores do local. O objetivo
seria, primeiro fazer uma ocupação policial da favela e, paralelamente, levar serviços
públicos e obras de saneamento. Os tiroteios cessaram nas comunidades, atividades
econômicas floresceram e as taxas de homicídio diminuíram em todo o Estado. “Mas o
efeito disso é provisório, porque há um rearranjo da economia criminosa", argumenta a
antropóloga Jaqueline Muniz, especialista de segurança pública da UFF.
Logo ficou evidente que realmente o programa não estava bem estruturado. As ações de
infra-estrutura e serviços, não aconteceram a de forma eficaz. A relação entre moradores
e policiais se manteve tensa e logo alguns abusos se fizeram evidentes. Além disso, as
UPPs se mostraram de fácil implementação em comunidades pequenas como o Vidigal e
Dona Marta, mas de difícil aplicação em outras maiores como a própria Rocinha e o
Complexo do Alemão, ambas com cerca de 100.000 habitantes. Foi nesta última
comunidade que, em 2010, uma ambiciosa mega operação envolvendo a Polícia Militar e
as Forças Armadas tentou expulsar o tráfico e instalar uma UPP.
Uma das críticas recorrentes dos especialistas e da oposição ao programa das UPPs é
que ele focou nas favelas próximas dos principais pontos turísticos do Rio e das áreas
nobres da cidade — que, do asfalto, enxergou uma melhoria na segurança.
Paralelamente, dizia-se que territórios das periferias da Zona Norte e Zona Oeste cidade,
além dos municípios da Baixada Fluminense, foram abandonados à própria sorte. Foi
também nessa época que as milícias entraram em cena. Elas consistem em agentes do
Estado, como policiais e bombeiros, que controlam determinado território e serviços como
o fornecimento de gás. Políticos importantes do Rio chegaram a dizer no passado que
elas eram uma espécie de proteção comunitária, mas logo ficou claro o regime de terror
que era implantado nesses territórios e a relação umbilical com esses políticos. Cabia a
milicianos, por exemplo, autorizar ou não a distribuição de panfletos de campanha ou
comícios em determinados bairros. Muitos deles inclusive eram deputados estaduais ou
vereadores.
Durante ao menos três décadas, às vezes com maior ou menor intensidade, o Rio vem
sendo palco de fracassadas operações policiais em favelas e periferias que, segundo
especialistas da área, mais servem para encher os noticiários de imagens espetaculares
do que para alcançar resultados efetivos. Grandes planos para conter a violência no Rio
foram anunciados, todos incluíam o uso ostensivo da força e todos, seja a curto ou médio
prazo, fracassaram. Com a “inédita” intervenção federal de caráter militar decretada pelo
presidente Michel Temer, abre-se um novo capítulo na história das tentativas de estancar
a violência no Rio de Janeiro e resolver um problema que possui raízes históricas e
estruturais. Inédito porque, apesar do uso das Forças Armadas no Rio em outras
ocasiões, é a primeira vez desde a redemocratização que o Governo federal intervém
diretamente no estadual, retirando deste suas competências na área de segurança
pública e nomeando um interventor federal — neste caso, o general do Exército Walter
Souza Braga Netto, chefe do Comando Militar do Leste e, agora, responsável máximo
pelas polícias Militar e Civil, Corpo de Bombeiros e da Administração Penitenciária
fluminenses. Cabe ao general, e não mais ao governador Luiz Fernando Pezão, tomar
todas as medidas que achar necessárias para conter o crime no Rio, incluindo o domínio
das facções criminosas de alcance nacional.
1. Reformar as polícias, mudando estrutura, governança e cultura das policias militar e civil.
2. Substituir as políticas de confronto por políticas consistentes de inteligência e investigação para
desarticular o crime. Acabar com a rotina de tiroteios e mortes em favelas e áreas populares,
promovendo lógicas de policiamento baseadas no respeito e no diálogo.
3. Alterar radicalmente nossa legislação na área das drogas. Atualmente o país gasta a maior
parte de seus recursos na guerra às drogas. Os resultados são a explosão do número de prisões
de jovens do varejo das drogas, o inadmissível número de presos provisórios acusados de tráfico,
a superlotação do sistema penitenciário e o fortalecimento das facções no interior das unidades
prisionais.
4. Modernizar o Sistema de Justiça Criminal, abarcando não só as polícias, mas as Defensorias, o
Ministério Público e a Justiça.
5. Integrar os governos municipais ao planejamento de ações de segurança pública,
desenvolvendo políticas de prevenção, especialmente as voltadas para jovens.”
Referências:
Jaqueline Muniz - Sobre a Intervenção militar no Rio de Janeiro. 2018 Disponível em: <
<https://www.youtube.com/watch?v=GC_B5ML9Lic>. Acesso em 02 junho 2018.
Betim, Felipe A história das operações e planos de segurança no Rio: três décadas de
fracassos. El Pais. 2018 Disponível em:
<https://brasil.elpais.com/brasil/2018/02/19/politica/1519058632_353673.html>. Acesso
em 03 junho 2018.