PARECER
1- RELATÓRIO
2 - FUNDAMENTAÇÃO
Além das demandas postulando prestações materiais em relação à saúde – em sua maioria
fornecimento gratuito de medicamentos – outra discussão se tornou freqüente nos tribunais, concernente à
legitimidade da União para figurar no pólo passivo destas ações. O caso em apreço configura-se nesta
segunda situação.
A Constituição Federal, no artigo 196, estabelece que “a saúde é direito de todos e dever do
Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de
outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e
recuperação.” Em relação ao SUS, diz a Constituição, no art.198, que as ações e serviços públicos de
saúde integram “uma rede regionalizada e hierarquizada”, constituindo sistema único baseado na
descentralização, na integralidade do atendimento e na participação da comunidade. Sobre a
regulamentação dos serviços de saúde, diz o art. 197 que cabe “ao Poder Público dispor, nos termos da
lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle (...)”.
A norma regulamentadora é a Lei 8.080, de 1990, a qual define o SUS, no art. 4°, como sendo o
“conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e
municipais, da Administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder Público (...)” e prevê,
no art. 7°, inciso IX, a “descentralização político-administrativa, com direção única em cada esfera de
governo: a) ênfase na descentralização dos serviços para os municípios; b) regionalização e
hierarquização da rede de serviços de saúde”.
Os objetivos da organização prevista no art. 198 da Constituição e nos incisos do artigo 7° da Lei
8.080/90 são de evitar a sobreposição de estruturas e de promover a otimização dos serviços de saúde,
prestando-os de forma eficiente e ágil, para que os princípios da universalidade e da integralidade sejam
cumpridos.
Com relação ao princípio da descentralização, a letra “a”, do art. 7°, inciso IX, acima transcrito,
refere o já disposto no art. 30 da Constituição Federal, em seu inciso VII, que também atribui aos
municípios a tarefa precípua de prestar os serviços direitos de saúde:
Art. 30 – Compete aos Municípios: VII - prestar, com cooperação técnica e financeira
da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população;
No que tange às responsabilidades dos entes federativos de prestação dos serviços de saúde,
assim estipula a Lei 8.080/90:
É igualmente neste sentido a orientação do Ministério da Saúde que, através da edição dos atos
normativos NOB-SUS 01/96 – Norma Operacional Básica, NOAS-SUS 01/01 e, posteriormente, NOAS-
SUS 01/02, veio detalhar a participação da União, dos Estados e dos Municípios na prestação dos
serviços de saúde.
Como visto, a Lei Orgânica da Saúde, Lei 8.080/90, a Constituição Federal e as Normas
Operacionais do SUS, atendendo ao princípio da descentralização, atribuem a execução direta dos
serviços de saúde primordialmente aos municípios, com cooperação financeira e técnica da União e dos
Estados. Neste sentido, observa a doutrina o seguinte:
Segundo a Política Nacional de Medicamentos, item “3. Diretrizes”, “Integram o elenco dos
medicamentos essenciais aqueles produtos considerados básicos e indispensáveis para atender a maioria
dos problemas de saúde da população.” A Organização Mundial de Saúde define seu conceito desta
forma:
A respeito dos medicamentos denominados excepcionais, por seu turno, importa consignar que o
Programa de Medicamentos de Dispensação Excepcional iniciou em 1982, sendo responsável por
disponibilizar medicamentos para o tratamento de doenças específicas, que atingem um número limitado
de pacientes, os quais na maioria das vezes utilizam-nos por períodos prolongados. Algumas das
condições de utilização destes medicamentos englobam: Doença de Gaucher, Doença de Parkinson,
Alzheimer, Hepatites B e C, pacientes renais crônicos, transplantados, portadores de asma grave, anemia,
dentre outras. São medicamentos de custo unitário geralmente elevado, cujo fornecimento depende de
aprovação específica das Secretarias Estaduais de Saúde.
Em 2006, foi editado pela Escola Superior do Ministério Público da União o “Manual de Atuação –
Medicamentos Excepcionais PFDC”, elaborado pelo “Grupo de Trabalho – Saúde - PFDC”, integrado pelos
Procuradores da República Alexandre Amaral Gavronski – Procurador da República em São Paulo; Nara
Soares Dantas – Procuradora da República na Bahia; Oswaldo José Barbosa Silva – Procurador Regional
da República da 1a Região e Ramiro Rockenbach da Silva – Procurador da República em Sergipe.
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MINISTÉRIO DA SAÚDE, O SUS de A a Z. Disponível em:
http://dtr2004.saude.gov.br/susdeaz/topicos/topico_det.php?co_topico=436&letr%20a=M
2 http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/texto_excepcionais.pdf
O “Manual” orienta quanto ao seguimento das normativas do Ministério da Saúde sobre
medicamentos excepcionais, em especial o disposto na Política Nacional de Medicamentos (Portaria MS
n. 3.916/1998).
Cumpre consignar, entretanto, que nem todas as patologias podem ser consideradas
raras, porquanto existem aquelas “com prevalência marcante na população”.
Depreende-se, pois, que num primeiro momento o conceito de medicamento
excepcional evoluiu no que se refere a “doenças raras”, predominando a essência de
que são aqueles destinados ao tratamento de moléstias crônicas, de caráter individual
e cujo custo é elevado, seja pela própria cronicidade, seja pelo elevado valor unitário
da substância medicamentosa.
É possível, então, definir a responsabilidade do gestor de acordo com o medicamento que se está
buscando judicialmente. Caso seja possível identificar qual gestor é responsável pela aquisição e
dispensação, de acordo com a respectiva lista, este será o responsável direto pela omissão em fornecer
este medicamento.
No caso concreto, consoante ofício acostado aos autos (fl. 32), o medicamento Iscover
(Clopidogrel) 75mg foi padronizado pela SES/SC, dentro do Programa de Medicamentos Especiais,
através da alteração na Deliberação CIB nº 60/2005, em reunião ocorrida em 22/06/2007. Consta do
referido documento, ademais, que, não obstante tenho o estado de Santa Catarina padronizado a
medicação, está esta ainda em “fase de aquisição”. O documento de fl. 47, além do mais, atesta já haver
fornecedor devidamente licitado ou contratado para disponibilizá-lo.
Em sendo assim, atento às diretrizes do SUS, acima citadas, entendo não ser caso que autorize o
chamamento ao processo da União. Isso porque, em primeiro lugar, já está assente que o medicamento
requerido foi padronizado pelo Estado de Santa Catarina e, em segundo lugar, porque assumir
posicionamento diverso implicaria óbice à celeridade processual – tão cara ao Estado de Direito –, visto
que a ação já foi contestada e a réplica já foi apresentada (além de que, como dito, já há fornecedor
devidamente licitado).
3 – CONCLUSÃO
Ante o exposto, opina o Ministério Público Federal pelo desprovimento do agravo de
instrumento, nos termos acima referidos.