Anda di halaman 1dari 7

„ Artigo Original

Estados mistos e quadros de ciclagem


rápida no transtorno bipolar
Mixed States and Rapid Cycling in Bipolar Disorder

DORIS HUPFELD MORENO1 Resumo


RICARDO ALBERTO MORENO2
Estados mistos foram esquecidos por quase um século e os modernos critérios
diagnósticos operacionais do DSM-IV e da CID-10 os caracterizam como
episódios simultâneos de síndromes depressiva e maníaca, denominados mania
mista, mania disfórica ou depressão durante a mania. Estudos de validação
têm investigado várias linhas de corte dos estados mistos maníacos, dependendo
do número de sintomas depressivos presentes no episódio maníaco.
Paralelamente, crescem evidências acerca da existência de estados mistos
depressivos, anteriormente descritos por Kraepelin, caracterizados por
episódios depressivos com pelo menos três sintomas maníacos. O conhecimento
sobre a terapêutica é limitado, pois deriva de ensaios clínicos de pacientes em
mania que incluíram sujeitos em estados mistos. A ciclagem rápida é um tipo
de curso do transtorno bipolar, definida pela presença de pelo menos quatro
episódios distintos de mania, hipomania, depressão ou misto durante um ano.
O tratamento é difícil e inclui a identificação de fatores de risco, como hipoti-
reoidismo e transtornos relacionados ao uso de substâncias. Tanto nos estados
mistos como na ciclagem rápida, preconiza-se evitar antidepressivos, quando
possível. Neste trabalho são apresentadas formas clínicas dos estados mistos e
algoritmos para o tratamento seqüencial de estados mistos maníacos e da
ciclagem rápida baseadas nas evidências disponíveis na literatura.

Palavras-chave: Transtorno bipolar, estados mistos, ciclagem rápida,


apresentação clínica, tratamento, algoritmos.

Recebido: 17/11/2004 - Aceito: 07/01/2005

1 Grupo de Estudos de Doenças Afetivas (GRUDA) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das


Clínicas da FMUSP.
2 Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e
Grupo de Estudos de Doenças Afetivas (GRUDA) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das
Clínicas da FMUSP.
Endereço para correspondência: Doris Hupfeld Moreno. Rua Capote Valente, 432, cj. 35 – 05409-
001 – São Paulo – SP. Tel: (11) 3068-0150; fax: (11) 3063-3417; e-mail: rmoreno@sti.com.br

Moreno, D.H.; Moreno, R.A. Rev. Psiq. Clín. 32, supl 1; 56-62, 2005
57

Abstract
Mixed states were almost forgotten during the last century and in modern
diagnostic criteria of DSMIV and ICD 10 they were characterized as episodes
with manic and depressive syndromes simultaneously, described as mixed
mania, dysphoric mania or depression during mania. Validation studies
investigated various cutoff points, depending on the number of depressive
symptoms during manic episodes. There are also growing evidences on the
existence of depressive mixed states, already described by Kraepelin; they are
characterized by depressive episodes with at least 3 manic symptoms. Data on
therapeutics are limited and were derived from clinical studies in manic
episodes, which included patients with mixed states. Rapid cycling is defined
as the presence of at least 4 distinct affective episodes in a one year period,
i.e. manic, hypomanic, depressive or mixed, in the course of the bipolar disorder.
Treatment is difficult and includes identification of risk factors, such as
hypothyroidism and substance related disorders. In mixed states and rapid
cycling antidepressants should be avoided, if possible. In this study we present
different clinical forms of mixed states, as well as guidelines for the sequential
treatment of mixed states and rapid cycling affective disorders, according to
existing evidences in the literature.

Key words: Bipolar disorder, mixed states, rapid cycling, clinical presentation,
treatment, guidelines

nóstico, pela duração mais prolongada e pela tendência


Estados mistos a cronificar, o que vem sendo confirmado em estudos
recentes (Marneros, 2001). As idéias de Kraepelin e
Weygandt sofreram oposição sistemática de Karl
Introdução Jaspers (1979) e de Kurt Schneider (1979), que
influenciaram sobremaneira o ensino da psicopatologia
Existem descrições de estados mistos, como os conhe- no Brasil. Schneider (1979) negou completamente a
cemos hoje, desde a época dos antigos gregos, mas foi existência dos estados mistos, restringindo-os às
Kraepelin (1976), auxiliado por seu aluno Weygandt formas transitórias.
(apud Marneros, 2001), que desenvolveu e detalhou o Somente a partir da década de setenta ressurgiu
conceito. Kraepelin os classificou em seis tipos, três de nos Estados Unidos o interesse pelos estados mistos,
acordo com uma combinação dos três sintomas designados por mania mista, mania disfórica e depres-
fundamentais da mania (fuga de idéias, euforia e são durante a mania, como sinônimos (Akiskal et al.,
hiperatividade) com os depressivos e três baseavam-se 2000). Entretanto, a definição ampla de Kraepelin foi
nos sintomas fundamentais da depressão (inibição do substituída no DSM-IV (APA, 1994) por critérios que
pensamento, humor depressivo e abulia) associados aos requerem a presença simultânea de um episódio de
sintomas maníacos (Marneros, 2001): mania e de depressão maior. Atualmente existem várias
1. Mania depressiva ou ansiosa (depressive oder linhas de corte para definir uma mania mista, mas
ängstliche Manie); faltam estudos prospectivos que investiguem os
2. Depressão agitada ou excitada (erregte Depression); sintomas depressivos discriminatórios. Desde a presença
3. Mania com pobreza de pensamentos (ideenarme de um ou mais, dois ou mais e três ou mais sintomas
Manie); depressivos durante um episódio maníaco foram
4. Estupor maníaco (manischer Stupor); descritos como mania mista (Akiskal et al., 2000).
5. Depressão com fuga de idéias (ideenflüchtige Apesar da relevância clínica e da declaração de
Depression); que “muitos clínicos experientes na avaliação e no
6. Mania inibida (gehemmte Manie). tratamento de toda extensão do transtorno bipolar
Além desses subtipos, Kraepelin descreveu duas sustentariam que todos os episódios de humor alter-
classes gerais, conforme a evolução. A forma transi- nantes em pacientes bipolares raramente são pura-
tória representava uma transição entre mania e mente depressivos ou maníacos, mas mais freqüente-
depressão e vice-versa, e a forma autônoma, um episó- mente mistos” (Cassano et al., 1999), os estados mistos
dio distinto da doença. Este subtipo era o de pior prog- depressivos continuam negligenciados, quando não

Moreno, D.H.; Moreno, R.A. Rev. Psiq. Clín. 32, supl 1; 56-62, 2005
58

ignorados pelos sistemas diagnósticos oficiais. Eles são fenomenologia e também pode associar-se a abuso de
representados por episódios depressivos com alguns estimulantes e substâncias sedativo-hipnóticas com
sintomas hipomaníacos (por exemplo, pensamentos finalidade terapêutica ou à procura de sensações.
rápidos ou grandiosos, aumento da libido, ativação No estudo EPIMAN os principais sintomas
psicomotora) e têm importância clínica fundamental, preditivos de mania mista encontrados foram humor
porque tais deprimidos “unipolares” respondem mal a depressivo e idéias de suicídio (Akiskal et al., 1998).
antidepressivos e necessitam tratamento com estabili- Nesse sentido, os estados mistos depressivos em
zadores do humor, antipsicóticos ou eletroconvul- bipolares tipo I recentemente vêm sendo validados
soterapia (Akiskal et al., 2000; Marneros, 2001). (Perugi et al., 2001). Os principais sintomas encon-
trados foram agitação, depressão psicótica com humor
irritável, pressão de discurso e/ou fuga de idéias.
Quadro clínico Estudando estados mistos depressivos em bipolares
tipo II deprimidos e deprimidos unipolares, ainda não
Segundo Marneros (2001), o único acréscimo concei- incluídos no DSM-IV, Akiskal e Benazzi (2003)
tual desde Weygandt (1899; apud Marneros, 2001) foi relataram uma associação de agitação psicomotora
introduzido por Akiskal et al. (2000) e vem sendo com o transtorno afetivo bipolar (TAB), na tentativa
sistematicamente investigado nos últimos anos, pois de validar o estado misto depressivo por meio de
partiu da observação de que estados mistos surgem características demográficas e clínicas, curso e história
quando um temperamento irrompe no episódio de pólo familiar. Compararam pacientes com depressão maior
oposto (Tabela 1). Resultaria de temperamento hiper- e TAB tipo II pelo DSM-IV e definiram o estado misto
tímico + depressão, temperamento depressivo + mania pela presença de depressão associada a pelo menos
psicótica ou ciclotimia + depressão (Tabela 1). O pri- três sintomas maníacos: o risco de agitação psicomotora
meiro tipo aparece com o tratamento de depressões lenti- foi 30 vezes maior no quadro misto, que esteve mais
ficadas “unipolares” em indivíduos de temperamento associado a TAB tipo II, sexo feminino, sintomas
hipertímico estável, que nunca tiveram episódios de depressivos atípicos e história familiar de TAB. Em
euforia. Freqüentemente são diagnosticados como tendo estudo mais recente observaram que 23% dos
“depressão agitada” e abusam de estimulantes e álcool. deprimidos e 76,9% dos TAB tipo II tinham estados
O segundo grupo foi investigado em mais de 200 mistos caracterizados pela combinação de irritabili-
pacientes e geralmente é psicótico, incongruente com o dade, agitação psicomotora e aceleração de pensa-
humor. O abuso de álcool pode contribuir com o quadro mentos (Benazzi et al., 2004).
clínico ou complicá-lo, e pode superpor-se a transtornos Koukopoulos e Koukopoulos (1999) já haviam
esquizoafetivos e aos buffées delirantes dos franceses descrito a depressão agitada como um estado misto
(Marneros, 2001). A associação de depressão retardada depressivo (Tabela 2) e preferiram a terminologia
a um fundo ciclotímico instável de base modifica sua “depressão ansiosa excitada” ou “depressão excitada”.

Tabela 1. Quadro clínico dos estados mistos em função do temperamento de base.


Temperamento depressivo Temperamento ciclotímico Temperamento hipertímico
+ + +
mania psicótica depressão maior depressão maior
Choro Humor depressivo Disforia implacável, ódio
Idéias de suicídio Hiperfagia Agitação num fundo de lentificação
Irritabilidade e raiva Hipersonia Fadiga extrema
Euforia Fadiga Pânico e insônia intratáveis
Aceleração de pensamentos Baixa auto-estima Obsessões e impulsos suicidas
Grandiosidade Aceleração de pensamentos Excitação sexual temporária
Hipersexualidade Jocosidade Aceleração de pensamentos
Agitação psicomotora Ataques de ira Aparência histriônica
Insônia grave Tensão (mas expressões de puro sofrimento)
Delírios persecutórios Inquietação
Alucinações auditivas Hipersexualidade impulsiva
Confusão Outros comportamentos
desinibidos: jogo, tentativas
de suicídio dramáticas
Abuso de álcool Abuso de estimulantes (inclusive café) Abuso de estimulantes e álcool
e sedativo-hipnóticos (inclusive álcool)
Fonte: Marneros, 2001.

Moreno, D.H.; Moreno, R.A. Rev. Psiq. Clín. 32, supl 1; 56-62, 2005
59

Deve ser diagnosticada se o indivíduo preencher


Tabela 2. Sintomas gerais dos estados mistos,
os seguintes critérios:
maníacos e depressivos.
a) Episódio de depressão maior;
b) Pelo menos dois dos seguintes sintomas: Aceleração/Agitação +
Lentificação/Cansaço Mental e/ou Físico
1. Agitação motora;
2. Agitação psíquica ou acentuada tensão Alternância entre sintomas depressão e (hipo)mania) no
interior; mesmo dia ou superposição de ambos, associados a:
3. Pensamentos acelerados ou muitos ao mesmo Raiva, ódio, hostilidade
tempo. ↑↑ ansiedade = aflição, desassossego
Consideramos que os quadros mistos, nos quais (insatisfação constante)
se superpõem sintomas depressivos e (hipo)maníacos, desespero
representam formas clínicas verdadeiramente tortu-
rantes, seja pela “energização” de um episódio depres- ↑↑↑ impulsos
sivo, seja por “deprimir” uma mania. O resultado
dependendo do paciente predominam:
fenomenológico dessa combinação traduz-se por grave
irritabilidade, tipicamente sentimentos de ira e ódio, ↑↑ fome (comer compulsivo)
com demonstrações de violência e auto ou heteroagres- ↑↑ cigarros
sividade incontroláveis. ↑↑ uso de: álcool/drogas/tranqüilizantes
Quando sintomas acentuados de ambos os pólos ↑↑ sintomas obsessivo-compulsivos
interagem, sentimentos de puro desespero e sofrimento ↑ sexo, para alívio de ansiedade
psíquico inigualável (aumentados pela incompreensão ataques de pânico
do estado clínico pelo próprio paciente, pelos que o cercam
e pelos profissionais de saúde mental) podem levar à Quando mais grave:
vontade de morrer ou matar (Tabela 2). A impulsividade ↑↑ idéias de suicídio
aumentada da mania é potencializada, mas com senti-
↑ vontade de:
mentos depressivos (sofrimento) gerando comporta- morrer
mentos por vezes incontroláveis, diversos em cada quebrar coisas
paciente: tentativas de suicídio repetidas, quebrar objetos, bater/agredir
agredir verbal e fisicamente, aumentar o uso de cigarros, ou até
álcool e outras substâncias, aumentar sintomas obses- idéias de homicídio
sivo-compulsivos, aumentar vontade de comer etc.
Apesar de os pacientes se queixarem de ansiedade Quando mais leve:
intensa e constante, os sentimentos que melhor descre- Trocar o dia pela noite:
vem esta “ansiedade” são agitação, inquietação e demorar a “desligar” à noite e ter dificuldade ou não
conseguir levantar pela manhã
desassossego mental e/ou físico – e não tensão ou
apreensão. Podem alternar-se várias vezes grupa- Agitação / sonolência vespertina
mentos de sintomas depressivos e eufóricos ao longo pensar muito / programar tudo / idéias fantásticas à noite,
de um mesmo dia, de forma que o paciente não saiba mas não conseguir realizar no dia seguinte
como se sentirá nos próximos minutos ou horas,
gerando instabilidade afetiva prolongada.
Quando os sintomas de ambos os pólos se “desgar-
ram” ao longo do dia e o estado misto é mais leve ou Diagnóstico diferencial
está melhorando, o paciente freqüentemente troca o
dia pela noite: não consegue levantar de manhã, sente Foi visto que o quadro clínico dos estados mistos é extre-
um sono letárgico, melhora ao entardecer e não conse- mamente variável, oscilante na intensidade e no predo-
gue dormir à noite porque se sente extremamente revi- mínio de sintomas depressivos ou maníacos ao longo do
gorado, retoma uma série de planos, devaneia, passa tempo, favorecendo a confusão diagnóstica com uma série
as madrugadas vendo TV, em festas ou na Internet, ou de transtornos psiquiátricos. Dependendo do tipo de
realizando outras atividades, mas não consegue comportamento acionado por meio do aumento da energia
“desligar” e freqüentemente abusa de substâncias. Pode e da impulsividade, por exemplo, o paciente com trans-
sentir-se agitado, acelerado e ter ataques de pânico. torno bipolar facilmente pode ser confundido como tendo:
Apesar de ainda não terem sido suficientemente transtornos de personalidade – borderline, se for mulher,
pesquisados, deve-se levar em conta a possibilidade e psicopática, se for homem; bulimia, abuso/dependência
de que, assim como existem quadros depressivos e de álcool e outras substâncias, além de transtornos de
eufóricos de gravidade variável, haja estados mistos ansiedade, como transtorno de ansiedade generalizada e
de intensidade variável, bastando, para seu diag- síndrome do pânico, sem falar no transtorno obsessivo-
nóstico, a presença de sintomas de polaridade oposta compulsivo. A manutenção da sintomatologia e da
ao episódio atual. instabilidade afetivas de base pode causar genuínas

Moreno, D.H.; Moreno, R.A. Rev. Psiq. Clín. 32, supl 1; 56-62, 2005
60

comorbidades com tais transtornos, que eventual- caso não tenha sido prescrito, ou trocar o antipsicótico
mente se instalam a partir da infância e adolescência (Hirschfeld et al., 2004).
(Lewinsohn et al., 1995). Em casos resistentes há duas opções a indicar: a
clozapina ou a eletroconvulsoterapia (ECT), esta parti-
cularmente em estados mistos ou mania grave na
Tratamento gestação (Hirschfeld et al., 2004). Apesar de não exis-
tirem estudos randomizados, controlados com ECT
A terapêutica de pacientes em estados mistos pode ser
especificamente nos estados mistos, no estudo desse
difícil, dadas as características clínicas e de comorbi-
tipo realizado na mania o maior preditor de resposta
dade mencionadas. Sintomas psicóticos e risco de suicí-
à ECT foi a presença de sintomas depressivos no início
dio ou heteroagressividade são mais comuns e
do tratamento (Hirschfeld et al., 2004). Episódios
freqüentemente é necessário internar o paciente.
mistos psicóticos geralmente necessitam tratamento
Estados mistos são preditores de resposta pobre ao
com antipsicóticos.
lítio e, em geral, requerem mais tratamentos combi-
nados que outros tipos de episódios (Montgomery et Anticonvulsivantes
al., 2000; Hirschfeld et al., 2004).
A maioria dos estudos psicofarmacológicos na Análises secundárias de um estudo controlado duplo-
mania engloba episódios maníacos e mistos indistinta- cego, que comparou ácido valpróico, lítio e placebo,
mente, de modo que a literatura a respeito da tera- sugeriram que pacientes com sintomas depressivos
pêutica dos estados mistos se superpõe à do tratamento acentuados durante a mania e múltiplos episódios
antimaníaco. Por conta disso, resultados específicos anteriores respondiam melhor ao valproato que ao lítio.
acerca de estados mistos se originam de análises Dois outros estudos controlados em estados mistos,
secundárias dos dados pesquisados em estudos clínicos um deles randomizado, apontaram para a superiori-
de mania. dade do valproato em relação ao lítio, tanto na melhora
De acordo com a segunda edição do Practice dos sintomas maníacos, como dos depressivos
Guideline for the Treatment of Patients with Bipolar (Montgomery et al. , 2000; Hirschfeld et al., 2004).
Disorder (Hirschfeld et al., 2004), os medicamentos Nos estudos com a carbamazepina seus efeitos
de primeira escolha para estados mistos graves e foram confundidos pela administração concomitante
episódios maníacos graves são combinações de lítio e de outros medicamentos, inclusive antidepressivos
antipsicótico ou valproato e algum antipsicótico, reco- (Hirschfeld et al., 2004). Uma análise posterior de
mendados com “confiança clínica substancial”. Em recente estudo duplo-cego controlado com placebo
pacientes com estados mistos menos graves, pode ser evidenciou eficácia na subamostra de pacientes em
suficiente a monoterapia com o lítio, o valproato ou estados mistos (Weisler et al., 2004). A oxcarbazepina,
algum antipsicótico atípico, como a olanzapina, po- apesar de não ter sido investigada em estados mistos,
dendo-se dar preferência ao valproato em relação ao poderia ser indicada em substituição à CBZ por não
lítio. Antipsicóticos típicos possuem perfil de efeitos induzir o próprio metabolismo, melhor perfil de efeitos
colaterais mais benigno que os atípicos e as evidências colaterais e menor taxa de interações farmacológicas
favorecem a indicação da olanzapina, seguida pela (Hirschfeld et al., 2004).
risperidona. Alternativas incluem a carbamazepina Entre os anticonvulsivantes mais novos, não há
(CBZ) ou a oxcarbazepina (OXC) em substituição a evidências de eficácia da lamotrigina nos estados
lítio ou valproato. Antidepressivos devem ser suspensos mistos e a gabapentina se mostrou inferior ao placebo
na medida do possível. como coadjuvante ao tratamento com lítio ou valproato
Os antidepressivos poderiam ser usados quando (Yatham et al., 2002; Hirschfeld et al., 2004). Entre-
o tratamento com estabilizadores do humor reduziu tanto, ela foi eficaz no tratamento da fobia social e
significativamente os sintomas maníacos, mas não possivelmente do transtorno do pânico, podendo ser
os depressivos, ou quando a gravidade da mania é indicada em combinação com outros estabilizadores
muito menor que a da depressão e o paciente está em do humor na comorbidade de TAB com transtornos
tratamento vigoroso com estabilizadores do humor ansiosos (Yatham et al., 2002). Em estudos abertos o
(Montgomery et al., 2000). topiramato apresentou evidências de melhora em
Nos casos de recaídas, apesar da adesão ao trata- mania, hipomania e estados mistos, mas faltam resul-
mento, a conduta é a mesma descrita na mania: oti- tados a partir de estudos controlados (Yatham et al.,
mizar doses dos tratamentos de primeira escolha e 2002). Seu potencial efeito na redução de peso pode
adicionar ou suspender algum antipsicótico, e nos torná-lo uma opção interessante no uso combinado com
casos de resposta insuficiente recomenda-se acres- alguns estabilizadores do humor (Yatham et al., 2002).
centar outra medicação de primeira escolha. Opções
alternativas, em ordem decrescente de evidências, Antipsicóticos atípicos
incluem adicionar CBZ ou OXC, em vez de outro trata- Em análises secundárias de estudos abertos de conti-
mento de primeira escolha, adicionar um antipsicótico, nuação com amostras suficientes, a olanzapina se

Moreno, D.H.; Moreno, R.A. Rev. Psiq. Clín. 32, supl 1; 56-62, 2005
61

mostrou eficaz nos pacientes com estados mistos A ciclagem rápida ocorre em torno de 20% dos
(Hirschfeld et al., 2004) e, em estudos controlados bipolares, principalmente nos de tipo II, mas as
duplos-cegos, a olanzapina foi superior ao placebo nas maiores prevalências foram encontradas em pacientes
subamostras de estados mistos (Baldessarini et al., com formas resistentes ou provenientes de serviços
2003). Faltam estudos acerca dos outros antipsicóticos especializados. Entre os fatores de risco estão sexo
atípicos nestes quadros clínicos. feminino, temperamento ciclotímico, abuso/depen-
dência de substâncias, hipotireoidismo subclínico e uso
Combinações excessivo de antidepressivos (Akiskal et al., 2000).
Em pacientes que tiveram recaídas maníacas, ou
resposta incompleta ao tratamento, é necessário Tratamento
adicionar outro medicamento e estudos controlados de
lítio com antipsicótico e valproato com antipsicótico Em geral, a ciclagem rápida é de difícil tratamento
sugeriram maior eficácia ou início de ação mais rápido e, em virtude dos fatores de risco, o primeiro passo
com as combinações, comparadas às monoterapias no tratamento é a identificação das condições que
(Hirschfeld et al., 2004). Apesar de não fazerem menção podem contribuir para a ciclagem rápida, como
particular aos estados mistos, em estudos controlados, hipotireoidismo e uso de álcool ou drogas (Hirschfeld
randomizados, duplos-cegos com placebo, foram et al., 2004). Os antidepressivos devem ser retirados,
estudados neurolépticos adicionados a valproato ou na medida do possível, pois podem agravar o curso
placebo, lítio ou valproato a olanzapina ou placebo, lítio do transtorno bipolar.
ou valproato a risperidona ou placebo, e lítio, valproato O tratamento inicial da ciclagem rápida deve
ou carbamazepina a risperidona ou placebo. Nesta incluir lítio ou valproato e a lamotrigina serve de alter-
última combinação, o tratamento foi mais eficaz quando nativa. Muitos pacientes necessitarão de combinação
se excluiu o grupo da CBZ (Hirschfeld et al., 2004). de medicamentos (Hirschfeld et al., 2004). Na fase
aberta de um estudo de estabilização de ciclagem
rápida com lítio e valproato, a maioria dos pacientes
apresentava depressão, não estados mistos ou mania,
sugerindo que a ação do lítio ou dele com o valproato é
mais antimaníaca e que a ciclagem rápida se carac-
Ciclagem rápida terizava principalmente por depressões recorrentes
(Hirschfeld et al., 2004).
A definição de TAB com ciclagem rápida é arbitrária e
se originou da observação de pacientes resistentes à Anticonvulsivantes
litioterapia (Kilzieh e Akiskal, 1999). Representa um Em relatos de casos e estudos abertos com cicladores
diagnóstico realizado a posteriori, o que explicaria a rápidos, o valproato demonstrou ser eficaz, assim como
discrepância da literatura referente aos fatores de risco a carbamazepina (Soares, 2000). Em um estudo aberto
(Akiskal et al., 2000). O TAB cujo episódio inicial é de valproato em monoterapia ou associação, efeitos
depressivo tem risco maior de desenvolver ciclagem benéficos foram observados nos pacientes que entra-
rápida que o que se inicia com estados mistos ou mania/ ram no estudo em mania ou estado misto, não em
hipomania. O tratamento com antidepressivos prova- depressão (Hirschfeld et al., 2004). Não há estudos
velmente favorece a evolução para ciclagem rápida. controlados confirmando a superioridade destes em
De acordo com a CID-10 e o DSM-IV pacientes relação ao lítio. No único estudo duplo-cego rando-
com ciclagem rápida (CR) apresentam pelo menos mizado, controlado com placebo, 100 mg a 300 mg de
quatro episódios afetivos ao ano de depressão, mistos lamotrigina foram administrados a cicladores rápidos
e mania ou hipomania, representando, portanto, um tipo I e II por seis meses. Ela foi superior ao placebo
especificador de curso do TAB. O TAB com ciclagem em TAB tipo II, não em tipo I, provavelmente pela
rápida pode ser definido de acordo com a duração dos eficácia antidepressiva superior à ação antimaníaca
sintomas maníacos e depressivos: ciclagem rápida: (Hirschfeld et al., 2004). Poucos estudos abertos e
≥ 4 episódios ao ano; ciclagem ultra-rápida: ≥ 4 por relatos de casos de topiramato associado a outros
mês; ciclagem ultradiana ≥ 4 durante o dia (Akiskal medicamentos sugerem possível benefício em
et al., 2000). Distingue-se da ciclotimia, cujo curso e cicladores rápidos, mas não há estudos com a gaba-
sintomas não preenchem critérios sindrômicos. pentina (Yatham et al., 2002).
Aparentemente esta condição é transitória durante
a evolução da doença e não representa um novo Antipsicóticos atípicos
subtipo. Depois de dois a quatro anos, a maioria dos Estudos abertos com pequenas amostras apontam para
pacientes retorna a um padrão com ciclos mais longos a utilidade do uso coadjuvante da olanzapina (Gonzalez-
(Akiskal et al., 2000). Pinto et al., 2002) e da quetiapina (Vieta et al., 2002)

Moreno, D.H.; Moreno, R.A. Rev. Psiq. Clín. 32, supl 1; 56-62, 2005
62

em cicladores rápidos, mas não há estudos clínicos personalidade, faltando esclarecer melhor o quadro
controlados ou randomizados. A clozapina também se clínico de estados mistos que não preenchem os
mostrou eficaz em bipolares resistentes a partir de critérios rígidos do DSM-IV. O tratamento, em
relatos de casos e estudos retrospectivos (Soares, 2000). princípio, é o mesmo do da mania, mas podem
necessitar mais de tratamentos combinados de lítio
Conclusões ou anticonvulsivantes (valproato) com antipsicóticos
ou entre si, sendo reservado ECT para casos
Estados mistos e ciclagem rápida são considerados resistentes. Na ciclagem rápida, antes de mais nada,
quadros de difícil tratamento medicamentoso, condição deve-se afastar possíveis fatores associados, como
agravada pelo fato de serem pouco estudados. A diver- hipotireoidismo ou abuso de substâncias, e por
sidade psicopatológica dos estados mistos gera caracterizarem quadros de mais difícil controle, via
problemas no diagnóstico diferencial com transtornos de regra, respondem melhor a tratamentos combi-
ansiosos, associados ao uso de substâncias e de nados e são menos responsivos ao lítio.

Referências bibliográficas

AKISKAL, H.S.; BENAZZI, F. - Family History Validation of the KOUKOPOULOS, A.; KOUKOPOULOS, A. - Agitated Depression as a
Bipolar Nature of Depressive Mixed States. J Affect Mixed State and the Problem of Melancholia. Psychiatr
Disord 73(1-2): 113-122, 2003. Clin North Am 22(3): 547-564, 1999.
AKISKAL, H.S.; BOURGEOIS, M.L.; ANGST, J. et al. - Re-evaluating LEWINSOHN, P.M.; KLEIN, D.; SEELEY, J. - Bipolar Disord in a
the Prevalence of and Diagnostic Composition within community sample of older adolescents: prevalence,
the Broad Clinical Spectrum of Bipolar Disorders. J phenomenology, comorbidity, and course. J American
Affect Disord 59: S5-S30, 2000. Academy of Child & Adolescent Psychiatry, 34: 454-
AKISKAL, H.S.; BOURGEOIS , M.L.; ANGST, J. et al. - Gender, 463, 1995.
Temperament and the Clinical Picture in Dysphoric MARNEROS, A. - Origin and Development of Concepts of Bipolar
Mixed Mania: Findings from a French National Study Mixed States. J Affect Disord 67: 229-240, 2001.
(EPIMAN). J Affect Disord 50: 175-186, 1998. M ONTGOMERY , A.S.; S CHATZBERG , A. F.; GHELFI , J.D. et al. -
BALDESSARINI, R.J.; HENNEN, J.; WILSON, M. et al. - Olanzapine Pharmacotherapy of Depression and Mixed States in
versus Placebo in Acute Mania: Treatment Responses Bipolar Disorder. J Affect Disord 59: S59-S56, 2000.
in Subgroups. J Clin Psychopharmacol 23: 370-376, 2003. P ERUGI , G.; A KISKAL , H.S.; M ICHELI , C. et al. - Clinical
BENAZZI, F.; KOUKOPOULOS, A.; AKISKAL, H.S. - Toward a Validation of New Characterization of Depressive Mixed State in Bipolar I
Definition of Agitated Depression as a Bipolar Mixed State Patients: Pisa-San Diego Collaboration. J Affect Disord
(Mixed Depression). European Psychiatry 19: 85-90, 2004. 67: 105-114, 2001.
CASSANO, G.B.; DELL’OSSO, L.; FRANK, E. et al. - The Bipolar SOARES, J.C. - Recent Advances in the Treatment of Bipolar
Spectrum: a Clinical Reality in Search of Diagnostic Mania, Depression, Mixed States, and Rapid Cycling.
Criteria and an Assessment Methodology. J Affect Int Clin Psychopharmacol 15: 183-196, 2000.
Disord 54: 319-328, 1999. S CHNEIDER , K. - Psicopatologia Clínica . (Trad.: Emanuel
GONZALEZ-PINTO, A.; TOHEN, M.; LALAGUNA, B. et al. - Treatment of Carneiro Leão). 3rd ed. Mestre Jou, São Paulo, 1979.
Bipolar I Rapid Cycling Patients during Dyphoric Mania VIETA, E.; PARRAMON, G.; PADRELL, E. et al. Quetiapine in the
with Olanzapine. J Clin Psychopharmacol 22: 450-454, 2002. Treatment of Rapid Cycling Bipolar Disorder. Bipolar
HIRSCHFELD, R.M.A.; BOWDEN, C.L.; GITLIN, M.J. et al. - Practice Disord 4(5):335-340, 2002.
Guideline for the Treatment of Patients with Bipolar W EISLER, R.H.; KALALI , A.H.; K ETTER, T.A. - A Multicenter,
Disorder. 2.ed. American Psychiatric Press, 2004. Randomized, Double-blind, Placebo-controlled Trial
JASPERS, K. - Psicopatologia Geral. (Trad.: Samuel Penna of Extended-Release Carbamazepine Capsules as
Reis.). 2nd ed. Atheneu, Rio de Janeiro, 1979. Monotherapy for Bipolar Disorder Patients with
KILZIEH, N.; AKISKAL, H.S. - Rapid-Cycling Bipolar Disorder. An Manic or Mixed Episodes. J Clin Psychiatry 65: 478-
Overview of Research and Clinical Experience. The 84, 2004.
Psych Clin North America 22: 585-607, 1999. YATHAM, L.N.; KUSUMAKAR, V.; CALABRESE, J.R. et al. - Third Generation
KRAEPELIN, E. - Manic: Depressive Insanity and Paranoia. of Anticonvulsants in Bipolar Disorder: a Review of
Livingstone, Edinburgh, 1921. Reprinted Arno Press, Efficacy and Summary of Clinical Recommendations. J
New York, 1976. Clin Psychiatry 63: 275-283, 2002.

Moreno, D.H.; Moreno, R.A. Rev. Psiq. Clín. 32, supl 1; 56-62, 2005

Anda mungkin juga menyukai