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Educação e Fronteiras

v. 5 n. 13

Revista quadrimestral da Faculdade de Educação da Universidade


Federal da Grande Dourados - FAED/UFGD – DOURADOS/MS
V. 5 N.13, maio/ago. 2015
UNIVERSIDADE FEDERAL DA GRANDE DOURADOS

UFGD
Reitora: Liane Maria Calarge
Vice-reitor: Marcio Eduardo de Barros

COED
Coordenador Editorial: Rodrigo Garófallo
Técnico Administrativo: Givaldo R. da Silva Filho

FAED
Diretoria: Elisâgenla S. Scaff
Editoria: Alessandra Cristina Furtado

EDITORAÇÃO ELETRÔNICA, PRODUÇÃO GRÁFICA, IMPRESSÃO E


ACABAMENTO
Rita Motta, sob coordenação da Gráfica e Editora Copiart

DISTRIBUIÇÃO
Coordenadoria editorial da UFGD

Ficha catalográfica – Biblioteca/UFGD - LADHEME FAED/UFGD

Educação e Fronteiras: Revista da Faculdade da UFGD/ Universidade Federal

da Grande Dourados, v.5, n.13 (maio/ago. 2015), Dourad0s/MS: UFGD,


2015.

308 p.

Quadrimestral

ISSN 1982-6273 revista impressa

ISSN 2237-258X revista eletrônica

1. Educação-Periódicos. I Universidade Federal da Grande Dourados


EDUCAÇÃO E FRONTEIRAS
v.5 n.13

EDUCAÇÃO E
DOURADOS, MS V.5 N.13 p.1-308 maio/ago. 2015
FRONTEIRAS
Editor
Alessandra Cristina Furtado, [UFGD - Dourados/MS]

Editores Adjuntos
Monica de Carvalho Magalhães Kassar,[UFMS - Campus Pantanal/MS]
Estela Natalina Mantovani Bertoletti, [UEMS – Paranaíba/MS]

Conselho Editorial da Revista


Monica de Carvalho Magalhães Kassar,[UFMS - Campus Pantanal/MS]
Elisangela Alves da Silva Scaff, [UFGD - Dourados/MS]
Marilda Moraes Garcia Bruno, [UFGD - Dourados/MS]
Magda Sarat, [UFGD - Dourados/MS]
Celi Correa Neres, [UEMS – Paranaiba/MS]
Estela Natalina Mantovani Bertoletti, [UEMS – Paranaíba /MS]
Leia Teixeira Lacerda, [UEMS – Paranaíba /MS]

Conselho Consultivo Internacional


Almerindo Afonso Janela, [Universidade do Minho - Pt]
Carina V. Kaplan, [Universidade de Buenos Aires - UBA]
Carlos Miguel de Jesus Manique da Silva, [Instituto de Educação da Universidade de
Lisboa- Pt]]
Guilherme Basilio, [Universidade Pedagógica de Moçambique - UPMZ]
José Antonio Castorina, [Universidade de Buenos Aires - UBA]
José Pacheco, [Escola da Ponte- Pt]]
Licínio C. Lima, [Universidade do Minho - UM]
Peter Burke, [Cambridge University - UC]
Roberto Elias Canese, [Universidad Columbia del Paraguay – UCP]
Rubén Ubierta, [Universidad Columbia del Paraguay – UCP]
Vera Weiler, [UNAL - Colombia]

Conselho Consultivo Nacional


Ademilson Batista Paes, [UEMS – Paranaíba/MS]
Keila Deslandes, [UFOP - Ouro Preto/MG]
Luis Fernandes Dourado, [UFG – Goiânia/GO]
Maria Dilnéia Espíndola Fernandes, [UFMS/MS ]
Maria Evelyna Pompeu do Nascimento, [UNICAMP/SP]
Marisa Bittar, [UFSCAR/SP]
Moysés Kuhlmann Junior, [USF - FCC/Bragança Paulista/SP]
Ney Cristina Monteiro de Oliveira, [UFPA]
Ocimar Munhoz Alavarse, [Faculdade de Educação-USP/SP]
Pedro Ganzeli, [UNICAMP/SP]
Rosa Fátima de Souza, [UNESP - Araraquara/SP]
Sandra Zákia Liam Souza, [USP - São Paulo/SP]
Katia Regina Moreno Caiado, [UFSCAR/SP]
José Roberto Rus Perez, [UNICAMP/SP]
Afranio Mendes Catani, [USP - São Paulo/SP]
Andrea Leão, [UFCE – Ceará/CE]
Antonio Chizzotti, [PUCSP - São Paulo/SP]
Carlos Monarcha, [UNESP - Araraquara/SP]
Cleiton de Oliveira, [UNIMEP- Piracicaba/SP ]
Cynthia Greive Veiga, [UFMG/Minas Ferais/MG]
Dirce Nei Teixeira de Freitas, [ UFGD - Dourados/MS]
Doracina Aparecida de Castro Araujo, [UEMS – Paranaíba /MS]
Eduardo José Manzini, [UNESP - Marilia/SP]
Eliane Greice Davanço Nogueira, [UEMS – Paranaíba/MS]
Helena Bonito Couto Pereira, [ MACKENZIE – São Paulo/SP]
Elizabeth Figueiredo de Sá [UFMT - Mato Grosso/MT]

Conselho Técnico-Científico
Afranio Mendes Catani, [USP - São Paulo/SP]
Doracina Aparecida de Castro Araujo, [UEMS – Paranaíba/MS]
José Vaidergorn, [UNESP - Araraquara/SP]
Monica de Carvalho Magalhães Kassar, [UFMS - Campus Pantanal/MS]
Nelson Cardoso Amaral, [UFG – Goiânia/GO]
Paulo Gomes Lima, [UFGD - Dourados/MS]

Secretariado Editorial
Markley Florentino de Carvalho, [UFGD - Dourados/MS]

Revisão de textos e provas


Idália Pereira da Cruz Schaustz, [UFGD - Dourados/MS]
Ana Karoliny Teixeira da Costa [[UFGD - Dourados/MS]

Editoração Eletrônica
Rita Motta, sob coordenação da Gráfica e Editora Copiart

A Revista Educação e Fronteiras é uma publicação quadrimestral da Faculdade de


Educação da Universidade Federal da Grande Dourados. Destina-se à publicação de
pesquisa da Educação e suas interfaces adotando um caráter multidisciplinar.

Correspondências para:
UFGD/FAED
UFGD - Rua João Rosa Goes Nº 1761, Vila Progresso - Caixa Postal - 322
CEP: 79.825-070 Dourados - MS
Email:educacaoefronteiras@ufgd.edu.br
Sumário

Apresentação
Alessandra Cristina Furtado.............................................................. 13

Editorial
Nesdete Mesquita Corrêa e Celi Corrêa Neres.................................. 15

DOSSIÊ EDUCAÇÃO ESPECIAL E INCLUSÃO ESCOLAR:


DIÁLOGOS SOBRE POLÍTICAS, PROCESSOS E PRÁTICAS

Primeira Parte
Políticas públicas e formação de professores

O que os dados do Censo Escolar revelam sobre as barreiras à


inclusão escolar?
Adriana Lia Friszman de Laplane..................................................... 21

Deficiência e acessibilidade: concepções de gestores estaduais que


atuam na implementação da política pública de Educação Inclusiva
Sinara Pollom Zardo e Soraia Napoleão Freitas.............................. 43

Formação, cotidiano(s) e Educação Especial


Claudio Roberto Baptista e Mayara Costa da Silva......................... 59
Modelos de formação do professor de Educação Especial:
estratégias de consolidação da política educacional
Rosalba Maria Cardoso Garcia e Kamille Vaz................................. 83

A política de formação de professores do Ensino Fundamental


para atender alunos da Educação Especial
Maria Helena Michels e Márcia de Souza Lehmkuhl.................... 107

Formação de professores na perspectiva da Educação Inclusiva e


os planos de educação
Mariza Borges Wall Barbosa de Carvalho e
Andréa de Jesus Lemos Souza.......................................................... 131

A formação dos professores especializados segundo os


pesquisadores do Observatório Nacional de Educação Especial
Enicéia Gonçalves Mendes, Leonardo Santos Amâncio Cabral,
Sabrina Mazo D’Affonseca, David dos Santos Calheiros............... 151

Aspectos da formação de professoras de Salas de Recursos


Multifuncionais no município de Dourados (MS)
Morgana de Fátima Agostini Martins, Aline Maira da Silva,
Hellen Cristiey Batista de Melo........................................................ 169

O professor de língua espanhola em contexto de Educação


Inclusiva: desafios e perspectivas no ensino para deficientes visuais
Caroline Veloso da Silva e Katia Regina Moreno Caiado............. 189

Segunda Parte
Práticas pedagógicas e Atendimento Educacional Especializado

A Educação Especial, a Sala de Recursos e outros serviços


especializados no Brasil (1973-1986)
Andressa Santos Rebelo.................................................................... 215
Atendimento Educacional Especializado: das diretrizes políticas à
escolarização dos alunos com deficiência intelectual
Flávia Faissal de Souza e Márcia Denise Plestch........................... 237

Práticas pedagógicas inclusivas em sala de aula comum em


diálogo com as Salas de Recursos Multifuncionais: atendimento
educacional e aprendizagem com sucesso
Ivanilde Apoluceno de Oliveira e
Kátia do Socorro Carvalho Lima..................................................... 259

Tecnologias Assistivas no processo de escolarização de alunos


com deficiência sensorial
Celi Corrêa Neres e Nesdete Mesquita Corrêa................................ 287
Primeira Parte

Políticas públicas e
formação de professores
ISSN 2237-258X

APRESENTAÇÃO

A revista Educação e Fronteiras On-Line é uma publicação


quadrimestral de caráter interinstitucional, reunindo parceiros dos
Programas de Pós-Graduação em Educação do estado de Mato
Grosso do Sul (MS) e suas respectivas linhas de pesquisa: Uni-
versidade Federal de Mato Grosso do Sul – Campus do Pantanal
(UFMS/CPAN),com as linhas “Políticas, práticas institucionais e
exclusão/inclusão social” e “Formação de educadores e diversida-
de”; Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS),com as
linhas “Linguagem, literatura, educação e sociedade” e “Teorias e
práticas educacionais”; e Universidade Federal da Grande Doura-
dos (UFGD), instituição responsável pela coordenação geral da Re-
vista, com as linhas “História da educação, memória e sociedade”,
Política e gestão da educação” e “Educação e diversidade”.
Em seu décimo terceiro número, a revista Educação e Frontei-
ras On-Line tem a satisfação de publicar o Dossiê Temático intitula-
do “Educação Especial e Inclusão Escolar: diálogos sobre políticas,
processos e práticas”, que foi premiado pelo Concurso nº 001/2014
FUNAPE/UFG/MEC/SECADI. Ele é composto treze artigos, que
versam sobre temáticas ligadas à Educação Especial e à Inclusão
Escolar, e foi organizado por duas instituições parceiras, no caso,
pelos Programas de Pós-Graduação em Educação (Mestrado em

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.13-14, maio/ago. 2015 13


ISSN 2237-258X

Educação) da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul – Cam-


pus do Pantanal e da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul
− Unidade de Paranaíba, mais especificamente pelas Professoras
Doutoras Nesdete Mesquita Corrêa (UFMS) e Celi Corrêa Neres
(UEMS), a quem agradecemos pela escolha da temática, seleção
dos artigos e adequação ao escopo estipulado pela revista.
Cabe registrar, também, os agradecimentos especiais ao Prof.
Dr. Fabiano Antônio dos Santos (UFMS/-CPAN), à técnica admi-
nistrativa da UFGD e responsável pelo secretariado editorial da
revista Educação e Fronteiras On-Line, Markley Florentino de Car-
valho, ao mestrando Silvano Ferreira de Araújo e ao doutorando
Washington Cesar Shoiti Nozudo do Programa de Pós-Graduação
em Educação (Mestrado e Doutorado) da Universidade Federal da
Grande Dourados, os quais não mediram esforços no sentido de
colaborar para a publicação desta edição.
A equipe editorial deste periódico quer aproveitar, ainda,
para convidar todos os pesquisadores da área da Educação para
que continuem encaminhando artigos e resenhas para essa publi-
cação periódica especializada, bem como para uma leitura profícua
desta edição.

Profa. Dra. Alessandra Cristina Furtado


Editora da revista Educação e Fronteiras On-Line

14 Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p. 13-14, maio/ago. 2015


ISSN 2237-258X

EDITORIAL

DOSSIÊ EDUCAÇÃO ESPECIAL E


INCLUSÃO ESCOLAR: DIÁLOGOS SOBRE
POLÍTICAS, PROCESSOS E PRÁTICAS

Os textos que se constituem objeto desta publicação são de-


correntes do esforço empreendido por 27 pesquisadores que há
muito vêm desenvolvendo, de forma aguerrida e rigorosa, estudos
e pesquisas acerca da Educação Especial e da inclusão escolar. Tais
pesquisadores estão vinculados a programas de pós-graduação
stricto sensu de universidades públicas, abrangendo o Distrito Fe-
deral e sete estados brasileiros: Distrito Federal (Universidade de
Brasília/UnB); Maranhão (Universidade Federal do Maranhão/
UFMA); Pará (Universidade do Estado do Pará/UEPA); Rio Grande
do Sul (Universidade Federal do Rio Grande do Sul/UFRGS e Uni-
versidade Federal de Santa Maria/UFSM); Santa Catarina (Univer-
sidade Federal de Santa Catarina/UFSC); São Paulo (Universidade
Federal de São Carlos/UFSCar e Universidade Estadual de Campi-
nas/Unicamp); Rio de Janeiro (Universidade Federal Rural do Rio

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.15-20, maio/ago. 2015 15


ISSN 2237-258X

de Janeiro/UFRRJ) e Mato Grosso do Sul (Universidade Federal da


Grande Dourados/UFGD, Universidade Federal de Mato Grosso
do Sul/ UFMS e Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul/
UEMS).
A abrangência e a diversidade de origem e de temas trata-
dos no conjunto dos trabalhos aqui apresentados representam uma
ampla amostra da produção no campo da Educação Especial no
Brasil e têm a pretensão de contribuir com esse campo de pesquisa
e de produção de conhecimento, bem como com o processo educa-
cional da população a qual se destina, sobretudo das pessoas com
deficiência.
Nesse sentido, no primeiro artigo, “O que os dados do Censo
Escolar revelam sobre as barreiras à inclusão escolar?”, Adriana Lia
Friszman de Laplane analisa dados recentes do Censo Escolar do
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Tei-
xeira (INEP) com o objetivo de dar visibilidade aos aspectos que,
para além do aumento de matrículas, ainda devem ser objeto da
análise da política. A autora chama atenção para o fato de que os
dados de matrícula constituem, também, uma boa fonte de reflexão
quando se trata de identificar as barreiras que ainda permanecem
na escolarização da população-alvo da Educação Especial.
O segundo texto, “Deficiência e acessibilidade: concepções de
gestores estaduais que atuam na implementação da política pública
de Educação Inclusiva”, Sinara Pollom Zardo e Soraia Napoleão Frei-
tas, a partir da análise de entrevistas narrativas com gestores esta-
duais que atuam na implementação da política de inclusão, buscam
identificar as concepções de tais profissionais sobre a deficiência e
sua relação com o processo de implementação de ações para a ga-
rantia da acessibilidade como condição para a efetiva inclusão esco-
lar. Duas tendências foram identificadas nas dimensões conclusivas
da pesquisa: a deficiência compreendida como dimensão humana,
que remete à acessibilidade como um direito fundamental e afirma o

16 Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.15-20, maio/ago. 2015


ISSN 2237-258X

direito à educação; e a deficiência como um atributo do sujeito, que


se refere ao dever da oferta de recursos e serviços específicos, vincu-
lado à priorização da execução burocrática da política pública.
Claudio Roberto Baptista e Mayara Costa da Silva, no artigo
“Formação, cotidiano(s) e Educação Especial”, propõem uma refle-
xão acerca da formação de professores relacionada à inclusão esco-
lar, com foco nos processos que valorizam a experiência docente
como constitutiva de um percurso formativo. Os autores concluem
que foi possível perceber a importância do planejamento de ações
de maneira coletiva, de forma que o grupo passa a representar, para
estes docentes, um apoio contínuo no desenvolvimento do traba-
lho pedagógico na escola.
“Modelos de formação do professor de Educação Especial:
estratégias de consolidação da política educacional” é o texto das
autoras Rosalba Maria Cardoso Garcia e Kamille Vaz, que analisam
os modelos de formação de professores de Educação Especial em
meio às políticas educacionais do início do século XXI, identifican-
do três modelos de professor apreendidos na análise da formação:
o professor generalista, o professor especialista e o professor do
Atendimento Educacional Especializado (AEE).
No artigo “A política de formação de professores do Ensino
Fundamental para atender alunos da Educação Especial”, Maria
Helena Michels e Márcia de Souza Lehmkuhl analisam a política
de formação de professores do Ensino Fundamental que atendem
alunos considerados deficientes, investigando proposições de for-
mação inicial e continuada de professores no Brasil e, especifica-
mente, em Santa Catarina no período entre 2005 e 2009. As autoras
destacam que as proposições de formação continuada de professo-
res nessa área não rompem com as vertentes médico-pedagógica
e psicopedagógica presentes historicamente no ensino para os su-
jeitos da Educação Especial, além de evidenciar que as propostas
analisadas não rompem com o que vem sendo indicado para os
professores de maneira geral.

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.15-20, maio/ago. 2015 17


ISSN 2237-258X

O estudo “Formação de professores na perspectiva da Educa-


ção Inclusiva e os planos de educação” de autoria de Mariza Borges
Wall Barbosa de Carvalho e Andréa de Jesus Lemos Souza aborda os
planos de educação – nacional, do Maranhão (MA) e do município
de São Luís (MA) − e suas implicações para uma educação pública
para todos, inclusive os que apresentam deficiência, transtornos glo-
bais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação.
O artigo “A formação dos professores especializados segundo
os pesquisadores do Observatório Nacional de Educação Especial”,
dos autores Enicéia Gonçalves Mendes, Leonardo Santos Amâncio
Cabral, Sabrina Mazo D’Affonseca e David dos Santos Calheiros,
trata da formação de professores especializados e constata que es-
ses indicaram não somente lacunas, mas possibilidades de cami-
nhos que direcionam para a melhoria na qualidade da formação
inicial e continuada de professores especializados.
Morgana de Fátima Agostini Martins, Aline Maira da Silva
e Hellen Cristiey Batista de Melo, no texto “Aspectos da formação
de professoras de Salas de Recursos Multifuncionais no municí-
pio de Dourados (MS)”, analisam a formação inicial e continuada
de professores das Salas de Recursos Multifuncionais (SRMs) no
município de Dourados, no Mato Grosso do Sul, e apontam as di-
ficuldades, anseios e necessidades dos profissionais em atuação no
atendimento do público-alvo da Educação Especial.
No artigo “O professor de língua espanhola em contexto de
Educação Inclusiva: desafios e perspectivas no ensino para defi-
cientes visuais”, Caroline Veloso da Silva e Katia Regina Moreno
Caiado propõem uma discussão a respeito do ensino de língua es-
panhola em interface com a Educação Inclusiva, especificamente
no que se refere ao processo de ensino e aprendizagem de alunos
com deficiência visual, e destacam as possibilidades pedagógicas
nesse contexto específico, apontando, também, a importância de
uma prática planejada e intencional com os alunos em tela.

18 Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.15-20, maio/ago. 2015


ISSN 2237-258X

A autora Andressa Santos Rebelo, no texto “A Educação Es-


pecial, a Sala de Recursos e outros serviços especializados no Brasil
(1973-1986)”, analisa a Educação Especial, a Sala de Recursos e ou-
tros serviços especializados previstos nos documentos educacio-
nais (normativos e orientadores), no Brasil, no período entre 1973
e 1986, a fim de estabelecer: de que forma se definem as Salas de
Recursos nos documentos do Ministério da Educação e da Cultura
(verificando se há identificação com atendimento especializado);
como se desenvolve o conceito de atendimento especializado ofe-
recido nas Salas de Recursos em cada documento, verificando o
momento em que é introduzido o termo “Atendimento Educacio-
nal Especializado” (AEE); e quais serviços estavam previstos como
atendimento especializado.
Flávia Faissal de Souza e Márcia Denise Plestch, no artigo
“Atendimento Educacional Especializado: das diretrizes políticas à
escolarização dos alunos com deficiência intelectual”, apresentam
uma discussão sobre o lugar do AEE na política de Educação Es-
pecial e o seu papel no processo de escolarização dos alunos com
deficiência intelectual, concluindo que o papel do AEE não é claro
no processo de escolarização de alunos com deficiência intelectual.
Com o estudo “Práticas pedagógicas inclusivas em sala de
aula comum em diálogo com as Salas de Recursos Multifuncionais:
atendimento educacional e aprendizagem com sucesso”, Ivanilde
Apoluceno de Oliveira e Kátia do Socorro Carvalho Lima analisam
a prática pedagógica inclusiva de uma professora do Ensino Fun-
damental da Rede Municipal de Ensino de Ananindeua, no Pará,
buscando verificar a interação entre a prática pedagógica desenvol-
vida pela professora na sala comum com os docentes das Salas de
Recursos Multifuncionais no Atendimento Educacional Especiali-
zado e identificar como as atividades educacionais são planejadas,
executadas e avaliadas, visando a inclusão e o sucesso escolar de
alunos com deficiência e transtorno global do desenvolvimento.

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.15-20, maio/ago. 2015 19


ISSN 2237-258X

O último estudo que compõe este dossiê é de autoria de Celi


Corrêa Neres e Nesdete Mesquita Corrêa, que tratam sobre “Tec-
nologias Assistivas no processo de escolarização de alunos com
deficiência sensorial”. As autoras discutem o uso da Tecnologia As-
sistiva (TA) no atendimento de alunos com deficiência sensorial
em Salas de Recursos Multifuncionais com vistas a contribuir para
a discussão dos processos e práticas de escolarização dos alunos
com deficiência auditiva, com surdez e/ou deficiência visual.
Em face ao exposto, fica o convite à leitura do coletivo de
trabalhos aqui apresentados que, conforme já anunciado, dedica-se
a tornar público textos que retratam estudos e pesquisas no campo
da Educação Especial, com o intento de possibilitar a reflexão e
fazer valer o papel político do pesquisador que, por meio da produ-
ção e da divulgação, pode levar à (re) construção de práticas educa-
cionais que contemplem, de fato, todos, especialmente aqueles que
são público-alvo da Educação Especial. Espera-se que essa, efetiva-
mente, seja a contribuição desta obra.

Profa. Dra. Nesdete Mesquita Corrêa [UFMS]


Profa. Dra. Celi Corrêa Neres [UEMS]
Organizadoras do Dossiê “Educação Especial e inclusão escolar:
diálogos sobre políticas, processos e práticas”

20 Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.15-20, maio/ago. 2015


ISSN 2237-258X

O que os dados do Censo


Escolar revelam sobre as
barreiras à inclusão?1
What does the school census reveal
about barriers to inclusion?
¿ Qué es lo que los datos del censo escolar
revelan sobre las barreras a la inclusion?

Adriana Lia Friszman de Laplane2

Resumo
Os dados de órgãos oficiais sobre a escolaridade de alunos com deficiên-
cia, transtornos do desenvolvimento e altas habilidades ou superdota-
ção apontam para o aumento do número de matrículas em todas as
etapas e modalidades da educação formal, incremento esse que tem
sido comemorado como indicador do sucesso das políticas de inclusão.
Embora essa seja uma dimensão importante da avaliação da política
educacional, os dados de matrícula constituem, também, uma boa fonte
de reflexão quando se trata de identificar as barreiras que ainda perma-
necem no que se refere à escolarização da população-alvo da Educação
Especial. Levando em conta essa dimensão, o presente estudo analisa
dados recentes do Censo Escolar do Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), com o objetivo de dar

1
Trabalho apoiado pelo Observatório da Educação (Obeduc) e pela Coordena-
ção de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).
2
Doutora. Docente do Ensino Superior – professora associada II do Centro de
Estudos e Pesquisas em Reabilitação Prof. Dr. Gabriel Porto da Faculdade de
Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
E-mail: adrifri@fcm.unicamp.br

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.21-41, maio/ago. 2015 21


ISSN 2237-258X

visibilidade aos aspectos que, para além do aumento de matrículas, ain-


da devem ser objeto da política.

Palavras-chave: Políticas públicas. Educação Inclusiva. Educação


Especial.

Abstract
Official data about the schooling of students with disabilities, envelopment
al disorder sandhog habilities/superdotation point to the increasing
number of enrollment in all level sand modalities of formal education.
The increasing numbers have been celebrated as an indicator of success
of inclusive policies. While this dimension is an important one for the
evaluation of educational policy, enrollment data are also a good source
of reflection when one tries to identify the barriers still present for the
permanence of the target- population of special education services.
Taking into account this dimension, the present study analyzes recent
data extracted from the School Census conducted by Instituto Nacional
de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), aiming to
highlight the aspects that, besides the increasing enrollment of students,
must still be the object of specific policies.

Keywords: Public policies. Inclusive Education. Special Education.

Resumen
Los datos de órganos oficiales sobre la escolaridad de alumnos con
deficiencia, trastornos del desarrollo y altas habilidades o superdotación
apuntan hacia el aumento del número de matrículas en todas las etapas
y modalidades de la educación formal. Ese incremento ha sido festejado
como indicador de éxito de las políticas de inclusión. Aunque esa sea
una dimensión importante de la evaluación de la política educativa, los
datos de matrícula constituyen, también, una buena fuente de reflexión
cuando se trata de identificar las barreras que todavía permanecen en lo
que respecta a la escolarización de la población-blanco de la educación
especial. Llevando en cuenta esa dimensión, el presente estudio analiza
datos recientes del Censo Escolar del Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), con el objetivo de dar
visibilidad a los aspectos que, más allá del aumento de matrículas, todavía
deben ser objeto de la política.

Palabras clave: Políticas públicas. Educación Inclusiva. Educación


Especial.

22 Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.21-41, maio/ago. 2015


ISSN 2237-258X

Introdução

Entre os documentos que balizam as políticas educacionais,


o Plano Nacional de Educação (PNE) 2014-2020, cuja versão final
foi aprovada em 2014, após intensas discussões que envolveram di-
versos setores sociais, traz, entre as suas metas, uma relacionada à
educação das pessoas com deficiência, transtornos globais do de-
senvolvimento e altas habilidades ou superdotação. A meta 4 (as-
sim com as demais) foi produto de muitas mudanças de redação
durante os debates que culminaram na sanção do Plano. O Do-
cumento Final da Conferência Nacional de Educação (CONAE),
que sumarizou os debates realizados nos níveis municipal, estadual
e nacional, referia a necessidade de assegurar o acesso, a perma-
nência e o sucesso das pessoas com deficiência e transtornos do
desenvolvimento na Educação Básica e Superior na rede regular de
ensino (CONAE, 2010).
Sucessivas versões da Meta 4 acrescentaram o termo “prefe-
rencialmente” e afirmaram a garantia de Atendimento Educacio-
nal Especializado (AEE), inclusive em classes, escolas ou serviços
especializados. A versão final é um texto ambíguo, que revela a
persistência de embates entre os defensores de uma política in-
clusiva exclusivamente em salas de aula regular e aqueles que, por
diferentes razões, sentem-se contemplados pela atual formulação.
Entre os defensores da redação final da meta, há grupos tão di-
versos como as instituições especializadas (Federação de APAEs)
e os que defendem uma educação em Língua Brasileira de Sinais
(Libras) para surdos e o ensino de Português como segunda lín-
gua. A formulação final é:

Meta 4: universalizar, para a população de 4 (qua-


tro) a 17 (dezessete) anos com deficiência, trans-
tornos globais do desenvolvimento e altas habili-
dades ou superdotação, o acesso à educação básica

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.21-41, maio/ago. 2015 23


ISSN 2237-258X

e ao atendimento educacional especializado, pre-


ferencialmente na rede regular de ensino, com a
garantia de sistema educacional inclusivo, de salas
de recursos multifuncionais, classes, escolas ou
serviços especializados, públicos ou conveniados
(BRASIL, 2014).

A versão final da meta 4 revela a permanência de um esta-


do de coisas que envolve a articulação de interesses e de grupos
diferentes (LAPLANE e PRIETO, 2010). As dezenove estratégias
elencadas para atingi-la reafirmam compromissos que já constam
em leis e documentos anteriores: a viabilização financeira do aten-
dimento através do registro de dupla matrícula para alunos que
frequentem a rede regular pública, o atendimento especializado e
as instituições sem fins lucrativos conveniadas com o poder públi-
co (1); a universalização do atendimento educacional a crianças de
0-3 anos (2) e a continuidade dele ao longo da vida por meio de
atendimento na Educação de Jovens e Adultos (12); a acessibilidade
física às instituições públicas por meio da adequação arquitetônica,
da oferta de transporte acessível, de material didático próprio e de
recursos de Tecnologia Assistiva (6), e ao conhecimento através da
implantação de Salas de Recursos Multifuncionais (3), da garantia
de atendimento nessas salas (4) e do fomento da formação con-
tinuada de professores para o Atendimento Educacional Especia-
lizado, inclusive por meio de parcerias com instituições sem fins
lucrativos conveniadas (3, 18); a oferta de educação bilíngue em
Língua Brasileira de Sinais (Libras) como primeira língua e, como
segunda língua, na modalidade escrita, da Língua Portuguesa aos
alunos surdos e com deficiência auditiva em escolas e classes bi-
língues e em escolas inclusivas, e a adoção do Sistema Braille de
leitura para cegos e surdocegos (7); e a garantia da oferta de Educa-
ção Inclusiva, vedando-se a exclusão sob alegação de deficiência e
promovendo-se a articulação pedagógica entre o ensino regular e o
Atendimento Educacional Especializado (8).

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Para apoiar o trabalho dos professores da Educação Básica,


está prevista a criação de centros multidisciplinares de apoio (5) e
a ampliação das equipes de profissionais da educação, garantindo a
oferta de professores de AEE, profissionais de apoio ou auxiliares,
tradutores e intérpretes de Libras, guias-intérpretes para surdoce-
gos, professores de Libras (prioritariamente surdos) e professores
bilíngues (13). Além disso, existe a previsão do fomento de pesqui-
sas para o desenvolvimento de metodologias, materiais didáticos,
equipamentos e recursos de Tecnologia Assistiva para o ensino e
melhora das condições de acessibilidade (10) e a promoção de pes-
quisas interdisciplinares para subsidiar a formulação de políticas
públicas intersetoriais que atendam às especificidades educacionais
desses alunos (11).
Outras estratégias dizem respeito ao acompanhamento e mo-
nitoramento do acesso à escola e ao Atendimento Educacional Es-
pecializado e à permanência e desenvolvimento escolar dos alunos
beneficiários de programas de transferência de renda e outros (9);
à definição de indicadores de qualidade e de políticas de avaliação
e supervisão para o funcionamento de instituições públicas e pri-
vadas que atendem a essa população (14); e à necessidade de que os
órgãos de pesquisa, demografia e estatística forneçam informação
detalhada sobre o perfil das pessoas com deficiência, transtornos
globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação de
0 a 17 anos (15). A estratégia 16 refere-se à necessidade de incenti-
var a inclusão de referenciais teóricos que abordem essas condições
nos cursos de graduação e pós-graduação. Registra-se aqui o fato
de que três, das 19 estratégias, abordam nominalmente as parcerias
com instituições especializadas comunitárias, filantrópicas e con-
fessionais conveniadas com o poder público, com vistas a ampliar
as condições de apoio ao atendimento escolar integral de alunos
matriculados na rede pública de ensino (17), a ampliar a oferta de
formação continuada, a produção de material didático acessível e

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.21-41, maio/ago. 2015 25


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os serviços de acessibilidade (18) e favorecer a participação das fa-


mílias e da sociedade na construção do sistema educacional inclu-
sivo. Essas instituições são citadas, também, nas estratégias (1) e (4)
(BRASIL, 2014).
A meta 4 e as estratégias que devem levar à sua concretiza-
ção retomam as ações inclusivas destinadas aos alunos do ensino
público com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e
altas habilidades ou superdotação, reafirmando, de modo explícito,
tanto a importância dos diferentes tipos de recursos listados em
termos de serviços para as pessoas com deficiência como a do pa-
pel das instituições especializadas sem fins lucrativos conveniadas
com o poder público.
Quais as implicações do Plano, tendo em vista o atual pa-
norama de matrículas e a distribuição de alunos com deficiência
nas redes de educação pública e privada? Os dados de matrícula
provenientes do Censo da Educação Básica do INEP informam que
grande parte dos alunos com deficiência encontra-se hoje na Rede
Pública de Ensino. A manutenção da formulação da meta que rea-
firma o lugar das instituições especializadas no sistema de provi-
mento de serviços de educação para esse público sugere que, apesar
do aumento de matrículas de alunos com deficiência e necessida-
des especiais nas redes públicas de ensino, um grupo importante
entre esses alunos não participa nem se beneficia desses equipa-
mentos e ainda deve recorrer às instituições. Esse panorama forne-
ce o pano de fundo para a análise das condições de escolarização e
para a identificação das barreiras que, malgrado os programas de
inclusão que envolvem a formação de professores especializados,
o fornecimento de transporte, o apoio pedagógico e os recursos
de Tecnologia Assistiva, persistem, quando se trata de alunos com
deficiência e necessidades especiais. Baseado nisso, questionamos:
quais são as barreiras que ainda permanecem no que se refere à
escolarização desses alunos? O que os dados de matrícula revelam

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sobre essas barreiras? O que acontece com os sujeitos com diferen-


tes deficiências e necessidades especiais na escola?
As discussões sobre a formação de professores (Garcia,
2013; Jesus; Barreto; Gonçalves, 2011; Kassar, 2014;
MICHELS, 2011) e as pesquisas que recolhem depoimentos de pro-
fessores em serviço (Magalhães, 2013; Magalhães; Lima,
2004) apontam para problemas de ordem geral no campo da cul-
tura, do conhecimento escolar e no campo mais específico dos re-
cursos necessários para a escolarização dessa população (Victor;
Souza, 2013). Outros estudos enfatizam os problemas decorren-
tes das condições de trabalho precárias e das próprias formas de
organização do trabalho escolar como empecilhos para uma edu-
cação de qualidade, que contemple as diferenças e necessidades dos
alunos com deficiência (Caiado; Laplane, 2009; PADILHA,
2013; Pletsch, 2014). O problema dos currículos também é
abordado por pesquisadores que refletem sobre pertinência destes
(Garcia, 2007) e sobre as concepções mais promissoras para tor-
nar o conhecimento disponível para todos (Cotonhoto, 2013;
Glat, 2007; Pletsch, 2009).
A precariedade do atendimento oferecido a alunos com de-
ficiência, a falta de acessibilidade física, as dificuldades de acesso
ao conhecimento e o descompasso em relação à turma frequenta-
da são alguns dos problemas apontados por muitos trabalhos de
pesquisadores que vêm acompanhando, desde a sua implantação, a
política de Educação Inclusiva. Estes identificam condições de par-
ticipação pouco satisfatórias para o aluno, sua família e seus pro-
fessores (BEZERRA; ARAÚJO, 2011; BUENO, 2004; FERREIRA;
FERREIRA, 2007; FONTANA; FURGERI; PASSOS, 2007; LACER-
DA; ALBRES; DRAGO, 2013; MENDES, 2005; PLETSCH, 2014;
PRIETO, 2010). É esse, enfim, o foco que conduz nossa análise dos
dados de matrícula, na tentativa de acompanhar o movimento das
políticas e seu entrelaçamento com as práticas nas escolas.

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.21-41, maio/ago. 2015 27


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A matrícula de alunos com deficiência e necessidades especiais


no Estado de São Paulo

Empreenderemos, agora, a análise de alguns dados do Censo


da Educação Básica, tomando os dados do Estado de São Paulo
como base para a discussão. O presente estudo é um recorte dos
resultados de um projeto de pesquisa3 que analisa as matrículas de
Educação Especial na Educação Básica em diferentes municípios
e estados brasileiros. Análises já divulgadas sobre as matrículas na
Educação Especial dão conta do aumento ocorrido nos últimos
anos, principalmente quando se consideram as matrículas na es-
cola pública regular (Laplane, 2014; Meletti, 2014). O acom-
panhamento da evolução das matrículas revela um incremento sis-
temático do alunado com deficiência e necessidades especiais nas
escolas e, paralelamente, permite identificar os obstáculos ainda
presentes no sistema educacional para a efetivação da política in-
clusiva. O foco desse estudo está na distribuição das matrículas por
deficiência e seu objetivo é analisar as condições de escolarização
de alunos com diferentes tipos de deficiência e necessidades espe-
ciais e discutir a sua presença e progressão nas diferentes modali-
dades e etapas do ensino, tendo em vista as necessidades específicas
que se colocam para cada grupo considerado.
Os dados do Censo da Educação Básica do INEP indicam
que as matrículas de alunos com deficiência e necessidades espe-
ciais cresceram, no Brasil, entre 2009 e 2013, 31,83%. O número
de matrículas passou de 639.718, em 2009, para 843.342 em 2013.
O nordeste brasileiro foi a região que mais colaborou para esse au-
mento (50,35%). Embora na região sudeste a variação tenha sido
bem menor (8,46%), no Estado de São Paulo o aumento foi de

3
“A escolarização de alunos com deficiência e rendimento escolar: uma análise
dos indicadores educacionais em municípios brasileiros”, coordenado por Silvia
Meletti. CAPES: Observatório da Educação. 2010-2014.

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15,90%. Vejamos, a seguir, como se distribuem as matrículas por


deficiência no estado:

Tabela 1 − Tipos de Necessidades Educacionais Especiais (NEE)


na Educação Básica no Estado de São Paulo (2009-2013)4
Tipos NEE 2009 % 2013 % Var %
Cegueira 1.962 0,8 1.981 0,7 0,9
Baixa visão 12.524 5,6 12.598 4,8 0,5
Surdez 9.327 4,1 9.385 3,6 0,6
D. auditiva 6.164 2,7 7.774 3 26,1
Surdocegueira 209 0 185 0 -11,4
D. física 17.808 8 36.467 14,1 104,7
D. mental 116.924 52,6 150.884 58,5 29
Autismo4 37.093 16,6 13.805 5,3 -62,7
Asperger 98 0 1.247 0,4 1.172,4
Rett 888 0,3 278 0,1 -68,6
Tdi 1.120 0,5 3.911 1,5 249,1
D. múltiplas 16.768 7,5 15.822 6,1 -5,6
Superdotação 1.347 0,6 3.237 1,2 140,3
Total NE 222.232 100 257.574 100 15,9
Fonte: elaborado pela autora com base nos microdados
do Censo da Educação Básica do INEP (2009- 2013).

A deficiência mais numerosa entre a população escolar do


estado de São Paulo é a deficiência intelectual, nomeada “deficiên-
cia mental” no Censo. Observa-se um incremento de matrículas
de alunos com essa deficiência no período considerado: 52,6%, em
2009, para 58,5% em 2013, o que representa uma variação de 29%.
Considerando-se esses dados de acordo com as diferentes modali-
dades de ensino, observa-se que, entre 2009 e 2013, as matrículas

4
A variação negativa entre os anos considerados parece obedecer à mudança das
categorias que agrupam os transtornos globais do desenvolvimento. Aparente-
mente, parte das matrículas consideradas em 2009 sob a categoria “Autismo”, em
2013, aparecem na categoria “Asperger” e, por isso, as matrículas nessa categoria
aumentam de modo atípico.

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.21-41, maio/ago. 2015 29


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aumentaram 36,2% no ensino regular, passando de 52.868 para


72.013, enquanto permaneceram estáveis no ensino especial e di-
minuíram no Ensino para Jovens e Adultos (EJA).
A deficiência física, a segunda deficiência em termos de fre-
quência, também apresenta uma variação significativa: em 2009,
configurava 8,9% das matrículas e, em 2013, 16%, o que representa
um aumento de 104,7%. O ensino regular concentra o maior nú-
mero de matrículas (21.504 em 2013), seguido da Educação Espe-
cial (7.941) e do EJA (787).
A terceira deficiência, em ordem decrescente de frequência, é
a que agrupa os transtornos globais do desenvolvimento (Autismo,
Asperger, Rett e TDI). A diminuição do número de matrículas de
18% para 7,4% decorre, provavelmente, da mudança de categorias do
Censo e da reclassificação de alunos. Ainda assim, a maioria dessas
matrículas (13.514 em 2013) encontrava-se no ensino regular, en-
quanto 3.917 correspondiam à Educação Especial e 408 ao EJA.
As deficiências visuais (cegueira e baixa visão) representam
7% das matrículas. Novamente, o ensino regular é a modalidade
com maior número de matrículas (9.533 em 2013), seguida da Edu-
cação Especial (1.408) e do EJA (613). O número total dessas ma-
trículas diminuiu no período considerado. A surdez e a deficiência
auditiva também representam 7% do total de matrículas de alunos
com deficiências. Da mesma forma que no caso das demais defi-
ciências, estas se concentram no ensino regular (9.535 em 2013).
De acordo com os dados apresentados, as matrículas de alu-
nos com deficiência e necessidades especiais encontram-se, princi-
palmente, no ensino regular. As tabelas que seguem apresentam os
dados por dependência administrativa. Para efeitos desse estudo,
consideramos apenas a distinção entre público e privado, sendo
que o ensino público incorpora as dependências federal, estadual
e municipal.

30 Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.21-41, maio/ago. 2015


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Tabela 2 − Tipos de Necessidades Educacionais Especiais


(NEE) por dependência administrativa na Educação Básica
no Estado de São Paulo – Ensino Público (2009-2013)5
Ensino Público
Tipos NE
2009 2013 Var%
Cegueira 1.518 1.461 -3,7
Baixa visão 11.721 11.021 -5,9
Surdez 8.445 8.344 -1,1
D. auditiva 5.656 6.847 21
Surdocegueira 185 123 -33,5
D. física 15.369 27.438 78,5
D. mental 83.179 110.731 33,1
TGD5 35.610 14.134 -60,3
D. múltiplas 8.646 8.184 -5,3
Superdotação 1.118 2.912 160,4
Total NE 171.517 200.693 17
Fonte: elaborado pela autora com base nos microdados
do Censo da Educação Básica do INEP (2009-2013).

No ensino público, as matrículas de alunos com deficiência


física foram as que mais aumentaram no período considerado, re-
gistrando um crescimento de 78,5%. A implementação de políticas
de acessibilidade física, como a construção de rampas e a realiza-
ção de adaptações arquitetônicas, e a presença de professores de
Educação Especial, auxiliares e cuidadores são alguns dos fatores
que colaboraram para esse aumento. Quanto à deficiência mental,
as matrículas aumentaram 33,1%; levando-se em consideração que
se trata da deficiência mais presente, em termos absolutos, no sis-
tema educacional, esse grande número chama à reflexão sobre a
importância das políticas que garantam a permanência, com qua-
lidade, desses alunos na educação formal. A deficiência auditiva é
outra categoria que aumentou no período (21%), incremento cre-

5
Agrupa as categorias: Autismo, Asperger, Rett e TDI.

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.21-41, maio/ago. 2015 31


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ditado às políticas de apoio, que têm provido recursos de Tecnolo-


gia Assistiva e apoio educacional aos alunos com essa deficiência.
As matrículas de alunos com altas habilidades ou superdotação
também aumentaram de forma significativa: de 1.118 para 2.912
(160,40%). Em suma, a superdotação e as deficiências mental, física
e auditiva são as categorias responsáveis pelo aumento de matrícu-
las no ensino público.

Tabela 3 − Tipos de Necessidades Educacionais Especiais


(NEE) por dependência administrativa na Educação Básica
no Estado de São Paulo – Ensino Privado (2009-2013)6
Ensino Privado
Tipos NE
2009 2013 Var %
Cegueira 434 520 19,8
Baixa visão 803 1.577 96,3
Surdez 882 1.041 18
D. auditiva 508 927 82,4
Surdocegueira 24 62 158,3
D. física 2.439 9.029 270,1
D. mental 33.745 40.153 18,9
TGD6 3.589 5.107 42,2
D. múltiplas 8.122 7.638 -5,9
Superdotação 159 325 104,4
Total NE 50.705 70.686 39,4
Fonte: elaborado pela autora com base nos microdados do
Censo da Educação Básica do INEP (2009, 2013).

No que se refere ao ensino privado, as deficiências responsá-


veis pelos maiores aumentos foram: a deficiência física (270,1%);
a surdocegueira (158,3%); e a superdotação (104,4%). A baixa vi-
são também teve um aumento significativo (96,3%), assim como
a deficiência auditiva (82,4%). Todas as matrículas apresentaram
uma variação percentual positiva, menos as de alunos com defi-
ciências múltiplas.

6
Agrupa as categorias: Autismo, Asperger, Rett e TDI.

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Tabela 4 − Tipos de Necessidades Educacionais Especiais


(NEE) por etapa de ensino na Educação Básica no Estado
de São Paulo. Variação percentual (2009-2013)
EI EF1 EF2 EM EP EJA
Tipos NE
Var % Var % Var % Var % Var % Var %
Cegueira -29,6 -8,8 5,3 22 -16,7 -30,9
Baixa visão 33,9 -19,6 -13,7 7 -62,4 -40,1
Surdez 32,3 -34,6 25,4 22 97,1 -34,1
D. auditiva 19,0 -21,8 42,1 63,6 227,3 -19,2
Surdocegueira 166,7 -41,1 85,7 -25 - -54,2
D. física 60,3 76,4 124,3 96,6 87,4 68,5
D. mental -21,8 -12,4 115,1 243,7 227,8 -4,1
TGD 25,9 -60,4 -56,1 14,71 53,8 -65,2
D. múltiplas -52,5 -13,8 80,7 71 - 19,5
Superdotação 25,6 79,9 125,2 80,9 361,1 -57,6
Fonte: elaborado pela autora com base nos microdados
do Censo da Educação Básica do INEP (2009, 2013).

No que se refere à variação das matrículas conforme as etapas


do ensino, cada deficiência se comporta de um modo diferente. As
variações percentuais registradas na Tabela 4 permitem observar
que as matrículas de alunos com baixa visão, surdez, surdoceguei-
ra, deficiência auditiva, deficiência física, transtornos globais do
desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação aumentaram,
entre os anos considerados, na Educação Infantil (EI), indicando
que esse nível de ensino tornou-se mais acessível. A maior varia-
ção encontrada corresponde à surdocegueira, deficiência rara e que
pouco aparece nas escolas, mas é preciso ponderar que se trata de
uma variação de apenas seis para dezesseis matrículas.
Nos primeiros anos do Ensino Fundamental (EF1), observa-se
uma diminuição de matrículas na maioria das categorias, com
exceção da deficiência física e das altas habilidades ou superdota-
ção, que registram aumentos superiores a 70%. Nos anos finais do

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.21-41, maio/ago. 2015 33


ISSN 2237-258X

Ensino Fundamental (EF2), inverte-se a relação: apenas a baixa vi-


são e os transtornos globais do desenvolvimento apresentam varia-
ção percentual negativa. O Ensino Médio (EM) apresenta aumento
de matrículas em todas as categorias, menos na surdocegueira. A
Educação Profissional (EP) também registra aumento de matrícu-
las na maioria das categorias de deficiência, com exceção da ce-
gueira e das deficiências múltiplas. Por fim, a Educação de Jovens e
Adultos (EJA) apresenta variação negativa em todas as categorias,
menos na deficiência física, que registra um aumento de 68,5%. Em
suma, observa-se aumento de matrículas na maioria das categorias
na EI, EF2, EM e EP e diminuição no EF1 e na EJA. Além disso,
a deficiência física foi a categoria que apresentou maior aumento
de matrículas em todas as etapas do ensino, registrando variações
percentuais entre 60% (EI) e 124% (EF2).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os documentos norteadores da política educacional garan-


tem o direito à escolaridade das pessoas com deficiência e neces-
sidades especiais. A presença desses alunos em todos os níveis e
etapas do ensino é um fato consumado na Educação Básica no Bra-
sil. Os estudos realizados por pesquisadores da área apontam para
a permanência de problemas que envolvem desde as condições de
trabalho de docentes e de escolarização dos alunos, os currículos, a
formação docente, as formas de organização do trabalho escolar às
condições de acessibilidade física e ao conhecimento. Nesse senti-
do, a análise dos dados provenientes do Censo da Educação Básica
do Estado de São Paulo permite fazer algumas considerações sobre
as barreiras que ainda permanecem no processo de escolarização
de alunos com deficiência e necessidades especiais.
Os dados apresentados permitem algumas conclusões em re-
lação à escolaridade de alunos com deficiência de um modo geral:

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as matrículas na Educação Infantil (EI), no Ensino Fundamental


2 (EF2), no Ensino Médio (EM) e na Educação Profissional, por
exemplo, aumentaram na maioria das categorias de deficiência
consideradas. A diminuição de matrículas ocorreu apenas no Ensi-
no Fundamental 1 (EF1) e na Educação de Jovens e Adultos (EJA).
O acesso de um número maior de alunos à Educação Infantil é um
dado promissor. Esse nível de ensino pode incluir mais alunos, mas
isso depende da própria expansão da Educação Infantil, que ainda
não atende à população até os cinco anos de idade, assim como das
condições existentes nas escolas para garantir a segurança física, a
presença de professores de Educação Especial, cuidadores e intér-
pretes, quando necessário. O aumento verificado nos últimos anos
nos demais níveis indica uma mudança no padrão anterior, de con-
centração de matrículas de alunos com deficiência, principalmente
no Ensino Fundamental.
Embora esse dado precise ainda ser melhor estudado quanto
Às suas implicações para os alunos matriculados e para as escolas, e
ainda que a distribuição de matrículas ainda seja bastante diferente
da que se observa para a população geral do Estado de São Paulo,
essas mudanças sugerem que a difusão dos direitos e a implemen-
tação de políticas inclusivas têm um efeito positivo. Os casos es-
pecíficos da surdez e da deficiência auditiva, que tiveram aumento
significativo de matrículas no Ensino Fundamental 2 (EF2) e no
Ensino Médio (EM), parecem corroborar isso, já que, no período
considerado, aumentou-se a oferta de Língua Brasileira de Sinais
(Libras) e a presença de intérpretes para os surdos nas escolas, as-
sim como o acesso a recursos de amplificação sonora para as pes-
soas com deficiência auditiva.
A matrícula de alunos com deficiência física também pare-
ce enquadrar-se nessa situação. A implementação de políticas de
acessibilidade física, a construção de rampas de acesso e banheiros
adaptados para cadeirantes, assim como a presença de professores

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.21-41, maio/ago. 2015 35


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de Educação Especial nas escolas estão entre os aspectos que favo-


receram o aumento de matrículas desses alunos.
Alguns dados geram bastante preocupação e devem ser objeto
de pesquisas mais detalhadas, de tipo qualitativo. A variação percen-
tual das matrículas de alunos com deficiência mental (DM) mostra
importante crescimento das matrículas no Ensino Fundamental 2
(EF2) e no Ensino Médio (EM). Levando-se em consideração que
um grande número dessas matrículas encontra-se no ensino público
(110. 731 matrículas, em 2013, o que representa um aumento de 33%
em relação ao número de matrículas existente em 2009) e que esses
níveis de ensino requerem que os alunos operem com conhecimen-
tos e formas de pensamentos mais complexos, é preciso pensar na
proposta curricular e nas estratégias de ensino que o sistema edu-
cacional oferece e oferecerá a essa população, de modo que ela não
precise, sempre, enfrentar barreiras que levem à sua exclusão.
O aumento de matrículas pode ser visto com fato promissor,
mas, considerando-se os depoimentos de professores, familiares,
pessoas com deficiência e profissionais da Educação Especial, as-
sim como os estudos e pesquisas que apontam dificuldades na vida
escolar, no cotidiano das atividades e até mesmo na permanência
nas instituições de ensino durante todo o período, é urgente veri-
ficar as condições de participação da população com deficiência
e necessidades especiais em todos os níveis e etapas da Educação
Básica. Em suma, a evolução do número de matrículas de alunos
com deficiência e necessidades especiais evidencia avanços, mas le-
vanta, também, dúvidas quanto à permanência, à participação e ao
desempenho desses alunos no sistema.

REFERÊNCIAS

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vature theory: intellectual disabilities in inclusive school. Educ.

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Recebido: 10/12/2014
Aprovado: 11/12/2014

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.21-41, maio/ago. 2015 41


ISSN 2237-258X

DEFICIÊNCIA E ACESSIBILIDADE:
CONCEPÇÕES DE GESTORES
ESTADUAIS QUE ATUAM NA
IMPLEMENTAÇÃO DA POLÍTICA
PÚBLICA DE EDUCAÇÃO INCLUSIVA
Disability and accessibility: managers conceptions state acting
in the implementation of public policy Inclusive Education
Discapacidad y accesibilidad: gerentes concepciones
interino del estado en la aplicación de la política
pública la Educación Inclusiva

Sinara Pollom Zardo1


Soraia Napoleão Freitas2

Resumo
A Educação Especial, a partir de 2008, destaca-se no cenário das políticas
públicas brasileiras, pois assume função transversal ao sistema de ensino.
Esse movimento ascende apoiado nas normativas recentes que orientam
a organização de sistemas de ensino inclusivos e na ratificação da Con-
venção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (adotada pela Or-
ganização das Nações Unidas em 2006) como emenda constitucional, no
Brasil, convocando para a transição do modelo biomédico de deficiência

1
Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade
Católica de Brasília (UCB). E-mail: sinarazardo@gmail.com
2
Professora titular/associada do Departamento de Educação Especial do Centro
de Educação da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Líder do Grupo
de Pesquisa Educação Especial: Interação e Inclusão Social (GPESP).
E-mail: soraianfreitas@yahoo.com.br

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.43-58, maio/ago. 2015 43


ISSN 2237-258X

para o modelo social no processo de identificação dos beneficiários das


políticas públicas. A partir da análise de entrevistas realizadas com gesto-
res estaduais que atuam na implementação da política de inclusão nos sis-
temas de ensino brasileiros, este artigo pretende identificar as concepções
de tais profissionais sobre a deficiência e sua relação com o processo de
implementação de ações para a garantia da acessibilidade como condição
para a inclusão escolar. Duas tendências são identificadas nas dimensões
conclusivas da pesquisa: a deficiência compreendida como dimensão hu-
mana, que remete à acessibilidade como um direito fundamental e afirma
o direito à educação; e a deficiência como um atributo do sujeito, que se
refere ao dever da oferta de recursos e serviços específicos, vinculado à
priorização da execução burocrática da política pública.

PALAVRAS-CHAVE: Deficiência. Acessibilidade. Inclusão escolar.

Abstract
The Special Education, in the last decade, stands out in the scenario
of Brazilian public policy, since it assumes a transverse function to the
educational system. This movement rises supported in recent regulations
that guide the organization of inclusive educational systems and in the
ratification of the Convention on the Rights of Persons with Disabilities
(UN, 2006) as constitutional amendment in Brazil. This calls for the
transition of the biomedical model of disability to the social model in
the process of beneficiaries of public policy identification. From the
analysis of narrative interviews with state managers who work in the
implementation of inclusion policy in Brazilian educational systems, this
article aims to identify the conceptions of such professionals on disability
and its relation to the process of implementation of actions to accessibility
warranty as a condition for effective school inclusion. The research has
identified two trends in the conclusive dimensions: disability understood
as human dimension, which refers to accessibility as a fundamental right
and affirms the right to education; and disability as a subject attribute,
which refers to the duty of offering specific facilities and services, linked
to the prioritization of bureaucratic implementation of public policy.

KEYWORDS: Disabilities. Accessibility. School inclusion.

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ISSN 2237-258X

Resumen
La Educación Especial, en la última década, se destaca en el escenario de la
política pública brasileña, ya que asume la función transversal al sistema
educativo. Ese movimiento asciende apoyado en las recientes regulaciones
que guían la organización de los sistemas de educación inclusiva y en
la ratificación de la Convención sobre los Derechos de las Personas con
Discapacidad (ONU, 2006) como una enmienda constitucional en Brasil,
que aboga por la transición del modelo biomédico de la discapacidad
al modelo social en el proceso de identificación de los beneficiarios de
las políticas públicas. A partir del análisis de las entrevistas narrativas
con los gestores estatales que trabajan en la implementación de la política
de inclusión en los sistemas educativos de Brasil, este artículo tiene
como objetivo identificar las concepciones de estos profesionales en
materia de discapacidad y su relación con el proceso de implementación
de acciones para la garantía de accesibilidad como condición para la
inclusión escolar eficaz. La investigación identificó dos tendencias en sus
dimensiones concluyentes: la discapacidad entendida como dimensión
humana, que se refiere a la accesibilidad como un derecho fundamental y
afirma el derecho a la educación; y la discapacidad como un atributo del
sujeto, que se refiere a la obligación de ofrecer instalaciones y servicios
específicos, vinculados a la priorización de aplicación burocrática de la
política pública.

PALABRAS CLAVE: Discapacidad. Accesibilidad. Inclusión escolar.

INTRODUÇÃO

Na última década, o Brasil tem se destacado internacional-


mente pela transformação de suas políticas públicas no campo
da educação de pessoas com deficiência, buscando romper com
concepções assistencialistas ou clínicas e investindo em ações de
cunho educacional e de inclusão social (ZARDO, 2012). Um marco
recente relevante é a publicação da Convenção sobre os Direitos
das Pessoas com Deficiência pela ONU, em 2006, ratificada no Bra-
sil como emenda constitucional por meio do Decreto Legislativo

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ISSN 2237-258X

n.º 186, de 9 de julho de 2008, e pelo Decreto n.º 6.949, de 25 de


agosto de 2009.
A Convenção atribui novo significado ao conceito de defi-
ciência, ao apontar, em seu preâmbulo, que a deficiência consiste
em um conceito em evolução e que a limitação está relacionada à
questão da promoção da acessibilidade, ou seja, às barreiras impos-
tas que impedem ou obstruem a participação das pessoas com de-
ficiência nos diferentes espaços sociais. A definição de pessoa com
deficiência está explícita em seu Art. 1º:

Pessoas com deficiência são aquelas que têm im-


pedimentos de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, os quais, em in-
teração com diversas barreiras, podem obstruir
sua participação plena e efetiva na sociedade em
igualdade de condições com as demais pessoas
(ONU, 2006).

Nesse sentido, a deficiência é considerada uma condição hu-


mana, que identifica um determinado grupo social que tem im-
pedimentos físicos, sensoriais ou intelectuais. Essa perspectiva
apresenta uma conceituação que define a condição de deficiência
sob um prisma diferenciado, ou seja, deficiente não seria um cor-
po com lesão, limitado para a participação social, mas deficientes
seriam os contextos sociais segregadores e pouco sensíveis às dife-
renças específicas de cada sujeito.
A questão que se coloca é como descrever a deficiência em
termos políticos e de garantia de direitos, e não mais de forma es-
tritamente diagnóstica. Com isso, a deficiência passou a ser tema
de políticas públicas, exigindo o posicionamento e a intervenção
do Estado, não sendo mais compreendida como lesão (objeto das
ações biomédicas no corpo), mas sim como questão de ordem
dos direitos, da justiça social e das políticas de bem-estar (DINIZ,

46 Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.43-58, maio/ago. 2015


ISSN 2237-258X

2007). Tais elementos configuram a transição do modelo biomédi-


co para o modelo social de deficiência.
Com vistas a considerar a deficiência como uma categoria
política que caracteriza o sujeito e o situa em uma condição huma-
na diferenciada das demais pessoas, a acessibilidade é compreen-
dida como um princípio fundamental para a garantia dos direitos
e da participação social de seus portadores. Segundo a Conven-
ção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, a acessibilidade
deverá possibilitar às pessoas com deficiência viver de forma in-
dependente e participar plenamente de todos os aspectos da vida,
igualmente às demais pessoas, no que se refere às oportunidades,
ao meio físico, ao transporte, à informação e à comunicação, aos
sistemas e tecnologias da informação, bem como a outros serviços
e instalações abertos ao público ou de uso público, tanto na zona
urbana como na rural.
No cenário populacional brasileiro, o Censo 2010 do IBGE
apresenta o quantitativo total de 190.798.670 habitantes. Desses,
45.606.094 declararam-se com algum tipo de deficiência, represen-
tando 23,9% − 35.774.422 declararam possuir deficiência visual;
9.717.355, deficiência auditiva; 13.265.671, deficiência motora; e
2.611.529, deficiência mental ou intelectual. No que tange à faixa
etária, a maior incidência de população com deficiência está con-
centrada na faixa de 60 anos ou mais (13.061.921), seguida das pes-
soas com idade entre 0 a 14 anos (3.459.417).
É importante destacar que o Censo 2010 do IBGE foi cons-
truído por meio da classificação do grau de severidade (“tem algu-
ma dificuldade de realizar”; “tem grande dificuldade de realizar”; e
“não consegue realizar de modo algum”) de acordo com a própria
percepção das pessoas entrevistadas em relação às suas limitações
e funcionalidades. O instrumento de coleta de dados sobre as defi-
ciências considerou quatro tipificações: deficiência visual, auditiva,
motora e mental ou intelectual. As perguntas elaboradas seguiram

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.43-58, maio/ago. 2015 47


ISSN 2237-258X

as propostas do Grupo de Washington sobre Estatísticas das Pes-


soas com Deficiência (cf. OLIVEIRA, 2012).
Já os dados do Censo Escolar MEC/INEP de 2013 – Anexo
II evidenciam o seguinte cenário de matrículas da Educação Espe-
3

cial no sistema de ensino brasileiro: 8.428 matrículas em creches;


29.363 em pré-escola; 342.899 nos anos iniciais do Ensino Funda-
mental; 178.448 nos anos finais do Ensino Fundamental; 43.885
no Ensino Médio; 50.892 na Educação de Jovens e Adultos (EJA)
presencial – Ensino Fundamental; e 5.247 na Educação de Jovens e
Adultos (EJA) presencial – Ensino Médio.
Os indicadores revelam o desafio de garantir o direito à edu-
cação para as pessoas com deficiência no sistema de ensino brasi-
leiro. Nessa perspectiva, o presente artigo apresenta os resultados
de uma pesquisa realizada com gestores estaduais que atuam na
implementação da política de inclusão, a fim de identificar as con-
cepções de tais profissionais sobre a deficiência e a relação dessa
compreensão com a elaboração e a implementação de políticas pú-
blicas para a garantia da acessibilidade nas escolas. Foram realiza-
das entrevistas narrativas com cinco representantes das Secretarias
de Estado da Educação, representando as cinco regiões do país.
Em entrevista realizada com o profissional da Secretaria de
Estado da Educação representante da região Sudeste, buscou-se ve-
rificar como está o processo de organização do sistema de ensino
para a inclusão escolar de estudantes com deficiência e as condi-
ções de acessibilidade. Nas palavras do gestor,

a briga é, às vezes, a família principalmente querer


que o aluno com deficiência intelectual, deficiência

3
Os resultados referem-se à matrícula inicial na creche, na pré-escola, no
Ensino Fundamental, no Ensino Médio (incluindo o médio integrado e normal
magistério) e na Educação de Jovens e Adultos presencial Fundamental e Médio
(incluindo a EJA integrada à educação profissional) da Educação Especial, das
redes estaduais e municipais, urbanas e rurais, em tempo parcial e integral, e o
total de matrículas nessas redes de ensino.

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mental vá progredindo, porque quer que ele faça


faculdade também, né. Então, muitas vezes, [...] o
aluno com deficiência mental, vamos dizer, se for
chegar no Ensino Médio, como é que vai traba-
lhar com trigonometria, como é que vai trabalhar,
por exemplo, Sociologia, História etc. nos níveis
de abstrações? [...] Só que assim, aparece algum,
né, por aí, principalmente por causa da família,
inclusive [...] até por orientação, [alegando] que o
direito à educação tem que ser respeitado [...] O
que tem que ter, de fato, são as adequações curri-
culares (informação verbal).

A partir do recurso da exemplificação, o gestor refere-se às


exigências das famílias dos estudantes com deficiência intelectual
em querer matriculá-los em escolas comuns do sistema de ensino.
Os familiares, segundo o entrevistado, esperam que os filhos com
deficiência intelectual possam progredir de forma a ingressar na
Educação Superior. O questionamento lançado pelo informante re-
vela especificamente sua preocupação com o trabalho relativo aos
conteúdos curriculares para estudantes com deficiência intelectual,
a exemplo da Trigonometria, da Sociologia e da História; ou seja,
o desafio posto tem relação com o ensino das disciplinas relativas
às áreas de exatas e também às ciências humanas, que demandam,
para sua compreensão, o desenvolvimento de aptidões concernen-
tes ao raciocínio lógico e à própria memorização das informações.
A limitação no desenvolvimento das funções cognitivas superiores,
decorrente da própria deficiência intelectual, justificaria a necessi-
dade de adequações curriculares e da oferta de recursos de acessi-
bilidade. O gestor afirma, ainda, o direito à educação dos estudan-
tes com deficiência intelectual e o direito das famílias de exigirem a
matrícula na escolarização comum.
Ao discorrer sobre a efetividade do exercício do direi-
to à educação para estudantes com deficiência, o informante da

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Secretaria de Estado da Educação que representa, nesta pesquisa,


a região Centro-Oeste destaca: “Já é consenso entre todos da rede
que o aluno com deficiência tem que ser atendido, então nós não
temos problemas de acesso, nós temos problema de permanência”
(informação verbal). Ou seja, o sistema de ensino compreende que
os alunos com deficiência têm direito à escolarização e ele é efetivado
por meio da realização da matrícula nas escolas e da oferta do Aten-
dimento Educacional Especializado (AEE). No entanto, o desafio
refere-se à promoção de condições de permanência desses alunos,
ou seja, à criação de condições efetivas de participação e aprendiza-
gem. Em sua explanação, o gestor pontua como desafios o processo
de formação de professores, a falta de acessibilidade, o número ex-
cessivo de alunos nas salas de aula e a expectativa das famílias quanto
à aprendizagem dos alunos com deficiência. Ainda segundo o in-
formante, outra questão a ser ressignificada refere-se à questão da
avaliação no processo de inclusão escolar; na sua perspectiva:

Essa forma de avaliação que privilegia o lógico


matemático e a memorização atende parte das
pessoas que estão sendo avaliadas, né, então
quando você está tratando [com] um aluno com
deficiência, você tem que pensar assim: é possível
avaliar o conhecimento dele de outra forma? [...]
Nós não podemos entender que é pra facilitar,
porque tem muita gente que fala [que] a gente
tem que passar ele de ano. Não, não é passar ele
de ano, é direito dele ter acesso a todo o currícu-
lo, aprender dentro do seu tempo e dentro do seu
estilo todo o currículo. E ser avaliado em todo o
currículo não é avaliar ele dizendo “nós vamos
dar uma avaliação fácil pra que você passe”, não é
isso (informação verbal).

Na sequência de sua argumentação, o entrevistado faz


uma crítica à avaliação pedagógica recorrente, afirmando que tal

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perspectiva, que privilegia o desenvolvimento do pensamento ló-


gico-matemático e da memorização, atende parte das pessoas que
estão sendo avaliadas, atuando, ainda, como mecanismo de demar-
cação entre os que pertencem e os que não pertencem aos padrões
educacionais pré-definidos.
No caso específico da avaliação de estudantes com deficiên-
cia, o eixo central do processo deve ser a definição de estratégias de
avaliação elaboradas a partir do reconhecimento das especificida-
des desses estudantes e dos conhecimentos que eles foram capazes
de adquirir, na perspectiva do gestor. Tal procedimento, conforme
explica, não objetiva facilitar a aprovação desses alunos, mas garan-
tir o direito de acesso ao currículo escolar. O direito à educação de
estudantes com deficiência pressupõe a flexibilização do currículo
e dos processos avaliativos, considerando os tempos e estilos de
aprendizagem dos alunos.
Ao discorrer sobre o processo de Educação Inclusiva, o in-
formante da Secretaria de Estado da Educação representante da re-
gião Sul afirma que o processo de inclusão demanda romper com
práticas excludentes que historicamente vitimaram a população
com deficiência. Nas palavras do entrevistado: “Eu entendo que
diferentes respostas pedagógicas precisam ser dadas respeitando
[...] a maioria, mas também aquele que possui alta especificidade.
Educação de verdade é pra todos, não pra quem cabe nesse “todos”,
que é a maioria” (informação verbal). A concepção de Educação
Inclusiva expressa sinaliza que as estratégias pedagógicas devem
ser pensadas tanto para a maioria dos alunos quanto para aqueles
que possuem alta especificidade, decorrente de algum tipo de de-
ficiência. O termo “educação”, em sua amplitude, remete à questão
do ensino e da aprendizagem; uma “educação de verdade”, como
referencia o informante, é aquela que respeita as Necessidades
Educacionais Específicas (NEE) dos sujeitos da aprendizagem, por
meio da utilização de estratégias diversificadas. Em complemento

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.43-58, maio/ago. 2015 51


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à contextualização da Educação Inclusiva em seu estado, o gestor


aponta um desafio:

Eu diria pra você que aí nós ainda temos um nó,


no seguinte sentido: primeiro, quando se fala
numa deficiência intelectual, se fala, de fato, numa
limitação que existe em várias formas [...] Os alu-
nos aprendem? Aprendem, sem dúvida, aprendem
tudo. Exatamente no mesmo tempo que os outros
aprendem? Não, porque senão não existiria essa
limitação. Então, de fato, existe uma limitação, e
nós vamos precisar ter a coragem (e é isso que a
gente está trabalhando nesse contexto) de falar so-
bre a terminalidade (informação verbal).

O primeiro aspecto a ser considerado no processo de inclu-


são dos alunos com deficiência intelectual, segundo o informante,
é o próprio reconhecimento de que a deficiência intelectual se re-
fere a uma limitação no desenvolvimento cognitivo dos sujeitos.
A necessidade dessa consideração não seria no sentido de atestar
a impossibilidade de aprendizagem, mas, sim, no sentido de com-
preender que os processos de construção do conhecimento se rea-
lizam em tempos e ritmos diferenciados.
Esse aspecto direciona a introdução de um novo elemento
na exposição do informante, relativo ao processo de terminalidade.
Em virtude das especificidades no processo de aprendizagem dos
estudantes com deficiência intelectual e da necessidade de estabe-
lecer um tempo de escolarização, é preciso “ter coragem”, como diz
o entrevistado, e definir princípios e orientações que possibilitem
atestar a terminalidade dos estudos a esses sujeitos. A terminalida-
de é um assunto que está diretamente ligado à garantia dos direitos
das pessoas com deficiência; por esse motivo, desafia e inquieta o
gestor. Em sua opinião, a terminalidade é imprescindível para pro-
mover a igualdade de condições de acesso das pessoas com defi-
ciência ao trabalho e aos demais direitos sociais.

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As informações obtidas sobre a organização do processo de


gestão com o informante representante da região Norte é expressa
na seguinte exposição:

O estado trabalha de forma realmente a desen-


volver todos os projetos, né. Todos os programas
que lhe são, no caso, atribuídos [...] a gente tenta
desenvolver, tenta executar, atualmente, todas as
políticas que são pertinentes. A gente segue real-
mente as orientações do Ministério e a gente bus-
ca, também, recursos para que a gente realize um
trabalho condizente, para que tenha realmente um
trabalho de qualidade, envolvendo todos os alu-
nos com deficiência e fazendo realmente a inclu-
são deles na escola (informação verbal).

Pode-se verificar que o representante da região Norte afirma


que a gestão desenvolve suas ações na área da Educação Especial de
forma a desenvolver os projetos e programas que lhe são atribuí-
dos. A função executiva da gestão é destacada tanto no que se refe-
re ao desenvolvimento de políticas específicas na área da Educação
Especial quanto na função de captar recursos para o desenvolvi-
mento de um trabalho de qualidade. A afirmação de que a gestão
segue as orientações no Ministério da Educação remete para uma
avaliação de que o trabalho desenvolvido está coerente com a po-
lítica proposta em âmbito federal, dando a entender que seu dever
está cumprido em relação à implementação da política de inclusão.
O fato de seguir as orientações do MEC é considerado, pelo infor-
mante, como um fator determinante da qualidade de educação e da
efetividade da inclusão de alunos com deficiência na escola.
Com o objetivo de conhecer o processo de implementação da
Educação Inclusiva no contexto da Secretaria de Estado da Educa-
ção que representa a região Nordeste, destaca-se:

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.43-58, maio/ago. 2015 53


ISSN 2237-258X

Eu volto lá para a base, eu volto pra a Educação In-


fantil. Eu acho que o grande desafio da política de
inclusão é, hoje, a Educação Infantil, eu acho que
o trabalho é preciso iniciar na Educação Infantil,
mas iniciar fortalecido pra que esse aluno che-
gue no Ensino Médio o mais próximo possível do
aluno sem deficiência. Então ele chega em iguais
condições, porque ele já vem com uma boa base,
e a gente continua dando o apoio, e ele, quan-
do chega ao Ensino Médio, já tem maturidade e
já tem uma base sólida pra que [o] conclua bem
(informação verbal).

Como refere o informante, o grande desafio para a imple-


mentação da política de inclusão refere-se à oferta do apoio espe-
cializado desde a Educação Infantil. Nessa perspectiva, pode-se
observar que o gestor afirma a necessidade de que a oferta do apoio
especializado seja organizada e desenvolvida com intencionalidade
pedagógica definida, de forma a acompanhar todo o processo de
escolarização dos alunos com deficiência. A efetivação dessa ação
possibilitaria aos estudantes da Educação Especial avançar pro-
gressivamente em seus estudos, alcançando o Ensino Médio com
habilidades e competências semelhantes ou “mais próximas” às
dos alunos sem deficiência, na perspectiva do gestor. Portanto, a
oferta de apoio especializado, entendido como recursos e serviços
de acessibilidade, é indicada como condição imprescindível para o
acesso à escolarização, e, consequentemente, para a implementação
da política de inclusão no sistema de ensino.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise dos dados possibilitou verificar a predominância


do argumento de que o apoio especializado é condição sine qua non
para o acesso de estudantes com deficiência à escolarização. Nesse

54 Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.43-58, maio/ago. 2015


ISSN 2237-258X

contexto, foram considerados como apoio especializado a oferta de


Atendimento Educacional Especializado, os recursos e os serviços
da Educação Especial, organizados e disponibilizados para a pro-
moção da acessibilidade aos estudantes da Educação Especial.
É importante destacar que o Atendimento Educacional Es-
pecializado tem a função de complementar ou suplementar à esco-
larização dos alunos da Educação Especial. Vale ainda destacar o
art. 5º da Resolução n.º 4/2009, que estabelece que o Atendimento
Educacional Especializado deverá ser realizado prioritariamente
na Sala de Recursos Multifuncionais (SRM) da própria escola ou
em outra escola de ensino regular, podendo ser realizado também
em centro de Atendimento Educacional Especializado da rede pú-
blica ou de instituições comunitárias, confessionais ou filantrópicas
sem fins lucrativos, conveniadas com as Secretarias de Educação.
Os recursos de acessibilidade para estudantes com deficiên-
cia compreendem materiais, equipamentos ou instrumentos que
promovam o acesso ao currículo4. Quanto aos serviços da Educa-
ção Especial, estes incorporam a atuação de profissionais especia-
lizados, a exemplo de intérpretes de Libras, professores de Libras,
instrutores de Libras, transcritores e revisores em Braille, profissio-
nais de apoio, cuidadores, monitores, guia-intérprete, entre outros.

4
Pode-se destacar como exemplos: a escrita no sistema Braille; a produção de
materiais em alto relevo; a utilização de laptops com sintetizadores de voz ou
com softwares acessíveis; o uso de calculadoras sonoras e do sistema de cálculo
soroban para alunos com cegueira; a ampliação de materiais; a produção de ca-
dernos com pauta ampliada e a utilização de lápis e canetas com ponta porosa
para alunos com baixa visão; a comunicação em Libras e a produção de materiais
acessíveis em Libras e em língua portuguesa para alunos com surdez; a aces-
sibilidade arquitetônica; a adaptação de materiais pedagógicos e mobiliários; a
utilização de ponteiras de cabeça, acionadores e mouses adaptados para alunos
com deficiência física; e a elaboração de atividades pedagógicas e produção de
materiais para estímulo das funções cognitivas superiores para alunos com de-
ficiência intelectual.

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.43-58, maio/ago. 2015 55


ISSN 2237-258X

Os informantes das cinco Secretarias de Estado da Educação


participantes da pesquisa partilham da perspectiva de que a oferta
do apoio especializado no sistema de ensino é fundamental para a
inclusão escolar dos alunos com deficiência, compreensão que se
traduz de diferentes formas nos sistemas de ensino pesquisados.
O representante da região Sudeste afirma que o Atendimento Edu-
cacional Especializado oferecido aos estudantes deve ter vincula-
ção com o currículo. O principal desafio consiste na forma como
a Educação Especial se organiza para garantir a acessibilidade aos
conteúdos curriculares, tendo em vista o direito à educação dos
estudantes com deficiência e a exigência do cumprimento desse
direito por parte das famílias. No caso do representante da região
Centro-Oeste, a afirmação de que as condições de permanência e
de aprendizagem constituem o desafio do sistema de ensino reafir-
mam a relevância do apoio especializado. O gestor aponta a neces-
sidade de transformação na perspectiva avaliativa dos processos de
aprendizagem, no sentido de considerar as especificidades dos su-
jeitos com vistas à efetividade do direito à educação. No caso do re-
presentante da região Sul, a preocupação com a organização de um
sistema de ensino que contemple todas as Necessidades Educacio-
nais Específicas dos estudantes com deficiência é assinalada como
desafio. Para além dessa questão, a terminalidade específica e a cer-
tificação também emergem na fala do informante, como processos
que demandam aperfeiçoamento, concebidos, nessa perspectiva,
como instrumentos de cidadania. Na região Norte, foi possível ve-
rificar que a fala do gestor deteve-se sobre os aspectos administra-
tivos da organização da Educação Inclusiva no sistema de ensino.
Há referência aos programas implementados pelo MEC, o que leva
à compreensão de que a estrutura de apoio especializado dispo-
nibilizada pelo estado é prioritariamente organizada por meio do
estabelecimento de parcerias com o governo federal. Por fim, o in-
formante da região Nordeste destaca a importância da organização

56 Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.43-58, maio/ago. 2015


ISSN 2237-258X

de um sistema de ensino que tenha previsto, em sua estrutura, o


apoio especializado desde a Educação Infantil. Na perspectiva do
gestor, quanto mais estímulos tiverem os estudantes da Educação
Especial, melhor será o desenvolvimento desses sujeitos.
O processo de análise das entrevistas dos gestores estaduais
permitiu a identificação de dois tipos de orientação: a Educação
Inclusiva como direito e a Educação Inclusiva como dever. A Edu-
cação Inclusiva como direito remete aos direitos fundamentais da
condição humana, como essência da garantia do direito à educação
às pessoas com deficiência. Nessa perspectiva, a acessibilidade con-
siste em um direito fundamental para a dignidade das pessoas com
deficiência, visto que assegura as condições para a participação dos
diferentes espaços em igualdade de condições. A Educação Inclusi-
va na perspectiva do dever focaliza o cumprimento das normativas,
colocando em segundo plano o sujeito de direitos e suas caracterís-
ticas, e compreende a deficiência como um atributo do ser huma-
no. A gestão, nessa perspectiva, fica restrita à captação de recursos
e à priorização da execução burocrática da política pública.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Decreto Legislativo nº 186, de 9 julho de 2008. Aprova o


texto da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência
e de seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova Iorque, em 30 de
março de 2007. Disponível em: <http://www2.senado.gov.br/bdsf/
item/id/99423>. Acesso em: 10/12/2014.

______. Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da


Educação Inclusiva, 2008. Disponível em: <http://portal.mec.gov.
br/arquivos/pdf/politicaeducespecial.pdf> Acesso em: 10/12/2014.

______. Decreto n° 6.949, de 25 de agosto de 2009. Promulga a Con-


venção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência

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e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de


março de 2007. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/cci-
vil_03/_ato2007-2010/2009/decreto/d6949.html>. Acesso em:
10/12/2014.

______. Resolução CNE/CEB nº 4, de 2 de outubro de 2009. Institui


Diretrizes Operacionais para o Atendimento Educacional Especia-
lizado na Educação Básica, modalidade Educação Especial. Dispo-
nível em: <http://peei.mec.gov.br/arquivos/Resol_4_2009_CNE_
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DINIZ, D. O que é deficiência. São Paulo: Brasiliense, 2007.

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Brasília: INEP, 2014. Disponível em: http://download.inep.gov.br/
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OLIVEIRA, L. M. B. Cartilha do censo 2010. Secretaria de Direi-


tos Humanos da Presidência da República. Secretaria Nacional de
Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência. Coordenação-
-Geral do Sistema de Informações sobre a Pessoa com Deficiência.
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ZARDO, Sinara Pollom. Direito à educação: a inclusão escolar de


alunos com deficiência no ensino médio e a organização dos siste-
mas de ensino. Tese de Doutorado. Universidade de Brasília, 2012.

Recebido: 10/12/2014
Aprovado: 11/12/2014

58 Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.43-58, maio/ago. 2015


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FormaÇÃO, cotidiano(s)
e educação especial
Teacher Education, daily life and Special Education
Formación, cotidiano(s) y Educación Especial

Claudio Roberto Baptista1


Mayara Costa da Silva2

Resumo
O presente estudo objetiva estabelecer uma reflexão acerca da formação
de professores relacionada à inclusão escolar, com foco nos processos que
valorizam a experiência docente como constitutiva de um percurso for-
mativo. O locus de pesquisa envolve um grupo de trabalho específico,
integrado por professores de Educação Básica e demais pesquisadores
envolvidos com a área da Educação Especial e com os processos de in-
clusão escolar. Partindo de uma análise sobre a possibilidade de “ino-
vação”, estabeleceu-se a seguinte questão norteadora: quais os possíveis
desdobramentos formativos decorrentes do desenvolvimento de um pla-
no inovador de ação envolvendo universidade, escola de Educação Básica
e Atendimento Educacional Especializado? A pesquisa contemplou a
análise documental de atas que constituem a trajetória coletiva do grupo,

1
Doutor em Educação pela Università di Bologna. Professor da Faculdade de
Educação e do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e coordenador do Núcleo de Estudos em
Políticas de Inclusão Escolar (NEPIE). E-mail: baptistacaronti@yahoo.com.br
2
Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), na linha de pesquisa “Educação
Especial e Processos Inclusivos”, e integrante do Núcleo de Estudos em Políticas
de Inclusão Escolar (NEPIE). E-mail: mayacsilva@gmail.com

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ISSN 2237-258X

ao longo de um ano, além da observação participante em reuniões se-


manais. A partir das análises, é possível perceber a potência associada ao
planejamento de ações de maneira coletiva, de forma que o grupo passa a
representar, para os docentes, um apoio contínuo no desenvolvimento do
trabalho pedagógico na escola. Por isso, os conceitos inovação, cotidiano
e necessidade assumiram preponderância ao longo do trabalho.

Palavras-chave: Educação Especial. Formação de professores. Ex-


periência.

Abstract
This study presents a reflection about teacher education, related to school
inclusion, focusing on the processes that enrich the teaching experience
as a constitutive part of the formative journey. The research locus
involves a specific working group, composed of basic education teachers
and researchers related to the Special Education area and to the processes
of school inclusion. Starting from an analysis about the possibility of
innovation, the following guiding question was settled: what are the
possible educational developments arising from the development of
an innovative plan of action comprising Universities, basic education
schools and specialized educational services? The research encompassed
the documentary analysis of minutes that consist the collective trajectory
of the group, during the period of a year, and, furthermore, the participant
observation in weekly meetings. From these analyses, it is possible to
perceive the power associated to this planning of action in a collective
manner, in a way that now the group represents a continuous support for
these teachers in what concerns the development of the teaching process
at schools. Some concepts played a preponderant role during this work,
such as innovation, daily life and demands.

Keywords: Special Education. Teacher education. Experience.

Resumen
La presente investigación tiene como objetivo establecer una reflexión
acerca de la formación de profesores relacionados a la inclusión escolar,
con foco en los procesos que valoran la experiencia docente como
constructiva de un recorrido formativo. El locus de la investigación
involucra un grupo de trabajo específico, integrado por profesores de

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ISSN 2237-258X

Educación Básica y demás investigadores involucrados con el área de


Educación Especial y con los procesos de inclusión escolar. Partiendo
de un análisis sobre la posibilidad de “innovación”, se estableció la
siguiente cuestión: ¿Cuáles son los posibles desdoblamientos formativos
decurrentes del desarrollo de un plan innovador de acción involucrando
Universidad, Escuela de Educación Básica y Atención Educacional
Especializada? La investigación contempló el análisis documental
de minutas que constituyen la trayectoria colectiva del grupo, a lo
largo de un año, además de la observación participativa en reuniones
semanales. A partir del análisis es posible percibir la potencia asociada
al planeamiento de acciones de manera colectiva, de forma que el grupo
pasa a representar para estos docentes un apoyo continuo en el desarrollo
del trabajo pedagógico en la escuela. Los conceptos innovación, cotidiano
y necesidad asumieron preponderancia a lo largo del trabajo.

Palabras clave: Educación Especial. Formación de profesores. Ex-


periencia.

INTRODUÇÃO

Ao longo dos últimos 15 anos, temos identificado, no Brasil,


inúmeros avanços no que se refere ao processo de escolarização
oferecido aos alunos com deficiência. Tais avanços são colocados
em evidência pelo expressivo aumento de matrículas de alunos pú-
blico-alvo da Educação Especial em escolas regulares, como indica
a análise dos dados do Censo escolar do INEP3. Assim, torna-se
crescente, também, a necessidade de se pensar em processos de for-
mação contínua que envolva a Educação Especial na perspectiva da
Educação Inclusiva como eixo norteador, com vistas a investir na
formação de professores qualificados para atuar junto a esse alunado.

3
De acordo com esses dados, em 2012, o total de matrículas dos alunos público-
alvo da Educação Especial era de 820.433 na Educação Básica, sendo que 76%
deles estavam matriculados no ensino comum. Para uma análise desse processo e
da emergência da valorização do atendimento educacional em Salas de Recursos,
sugerimos Baptista (2011) e Jesus, Baptista e Caiado (2013).

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ISSN 2237-258X

Por isso, o principal objetivo do presente estudo diz respeito


ao desenvolvimento de uma reflexão acerca da formação de pro-
fessores relacionada à Educação Especial, priorizando os proces-
sos que valorizam a experiência docente como constitutiva de um
percurso formativo, oferecendo destaque para a seguinte questão
norteadora: quais são os possíveis desdobramentos formativos de-
correntes do desenvolvimento de um plano inovador de ação en-
volvendo universidade e escola de Educação Básica, mais especifi-
camente, neste contexto, abrangendo o espaço dedicado ao Atendi-
mento Educacional Especializado (AEE)?
Nesse sentido, elegemos como locus de pesquisa um grupo de
trabalho específico, integrado prioritariamente por professores da
Educação Básica e outros pesquisadores envolvidos com a Educa-
ção Especial, os quais têm como principal função a instituição de
planos inovadores de ação a serem desenvolvidos nos seus contex-
tos escolares de referência e que têm a inclusão escolar como um
dos principais fins. Com o propósito de lançarmos nosso olhar so-
bre a trajetória desse grupo de trabalho, priorizando o processo que
envolveu a constituição do mesmo, a metodologia escolhida para
o desenvolvimento da pesquisa envolveu a análise de atas que do-
cumentam a trajetória coletiva, definindo como espaço temporal
o período de um ano (2013), além de um processo de observação
participante nas reuniões semanais do grupo em questão.

Sobre um grupo de trabalho e as práticas pedagógicas

Como já foi destacado, nosso locus de pesquisa envolve um


grupo de trabalho que se reúne pelo objetivo principal de reinventar
as práticas pedagógicas nas escolas em que atuam os seus integran-
tes. O processo de reinventar as práticas associa-se ao conceito de
inovar por meio da instituição de planos de ação docente, os quais
devem ser desenvolvidos nos contextos escolares de referência

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dos professores participantes e que têm a inclusão escolar como um


dos principais fins.
O grupo, intitulado “grupo de práticas”, passa a se constituir
por efeito da aprovação de um projeto específico no âmbito do Pro-
grama Observatório da Educação (OBEDUC)4, a partir do edital de
2012. Diante dessa aprovação, começa-se a contar com uma nova
modalidade de vínculo, o bolsista professor de Educação Básica.
Para inserir-se nessa modalidade de bolsa, é pré-requisito que o
docente pertença à rede pública da Educação Básica, sendo pro-
fessor em exercício, coordenador ou supervisor pedagógico, e que
participe de grupo de pesquisa inserido no Programa OBEDUC.
A principal função do bolsista professor de Educação Básica, de
acordo com a Portaria n.º 152, de 2012, é a de elaboração de uma
proposta inovadora/plano de ação inovador “na área ou disciplina
em que atua ou em aspectos da vida escolar e, preferencialmente,
na escola em que está lotado ou em escolas que mantenham relação
com o projeto de pesquisa financiado pelo Programa OBEDUC”
(BRASIL, 2012, p. 17). Além disso, ele deve desenvolver estudos e
pesquisas em consonância com o projeto, bem como manter regis-
tros da proposta de ação desenvolvida.
Atualmente, o grupo de práticas constitui-se de um total de
11 pessoas, sendo seis delas professores de Educação Básica, uma
mestranda, dois doutorandos, uma bolsista de iniciação científica
e uma professora da Rede Privada de Ensino de Porto Alegre. A
maior parte dos professores de Educação Básica (quatro deles) atua
na Rede Municipal de Ensino de Porto Alegre. Três integrantes
são professoras de Sala de Recursos: uma atua como orientadora
educacional de uma escola da Rede Municipal de Ensino; uma é

4
O Programa Observatório da Educação (OBEDUC) é resultado de uma parceria
entre a CAPES, o INEP e a SECADI e foi instituído a partir do Decreto n.º 5.803,
de 8 de junho de 2006. Nossa referência é o projeto “Políticas de inclusão escolar:
o atendimento educacional especializado em municípios do Rio Grande do Sul”.

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ISSN 2237-258X

regente de turma na mesma Rede Municipal de Ensino e, por fim,


uma atua na condição de professora de Educação Infantil em uma
instituição federal.
Diante do número de docentes que constituem o grupo e que
atuam especificamente no Atendimento Educacional Especializa-
do e da importância desse serviço para as dinâmicas de inclusão
escolar, decidimos, no âmbito da presente pesquisa, oferecer visibi-
lidade prioritária aos desdobramentos formativos que abrangem o
espaço desse serviço, por meio das práticas das professoras partici-
pantes do grupo de práticas.
Esse grupo se reúne semanalmente com vistas a discutir e
refletir sobre as práticas pedagógicas desenvolvidas no âmbito de
seus contextos escolares. As reuniões são registradas por meio de
documentos descritivos, designados “atas”. Tomaremos esses docu-
mentos como recurso metodológico prioritário com vistas a ana-
lisar o percurso do grupo em questão, levando em consideração
que tais registros explicitam os movimentos traçados pelo grupo
desde sua origem. Consideramos, dessa forma, que esses registros
constituem-se como uma documentação pedagógica. Nossa com-
preensão se associa àquela de Andrea Canevaro (1996), quando o
autor se pergunta: onde estariam os inovadores, sem aqueles que se
ocupam da documentação?
O desenvolvimento das propostas inovadoras é a principal
função sobre a qual se debruça o grupo, instituindo, assim, um pro-
cesso de acompanhamento dos planos de ação, bem como ofere-
cendo a possibilidade de planejar, avaliar e refletir em companhia,
tornando o grupo uma espécie de dispositivo de apoio para os pro-
fessores integrantes. Além disso, as discussões giram em torno de
referenciais que possam auxiliar a pensar os planos de ação, além
dos conceitos que os perpassam.
Ao longo do primeiro ano de constituição do grupo, foram
elencados três conceitos considerados norteadores para a construção

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do plano de ação inovador, que são: inovação, cotidiano e necessi-


dade. A partir de discussões e de reflexões coletivas, percebemos
que o eixo norteador para o desenvolvimento de uma ação ino-
vadora seria considerar as necessidades emergentes percebidas no
âmbito do cotidiano escolar de cada um dos professores de Educa-
ção Básica integrantes do grupo.

A experiência docente formativa

A experiência é o que nos passa, o que nos acontece,


o que nos toca. Não o que se passa, não o que acon-
tece, ou o que toca. A cada dia se passam muitas
coisas, porém, ao mesmo tempo, quase nada nos
acontece (LARROSA, 2002, p. 21).

Em sintonia com as ideias de Jorge Larrosa (2002), acredi-


tamos na experiência como algo que, quando nos passa, provoca
sentidos. Dessa forma, diferentemente de “informar”, aquilo que
nos passa através da experiência vem a “formar”. Gregory Bateson e
Mary Catherine Bateson (1994, p. 58) apresentam-nos um conceito
de aprendizagem, afirmando que esta consiste em mudanças que
se produzem nas características que constituem o sistema, as quais
são provocadas pela experiência. Enfatizamos, portanto, apoiados
nessa definição, a importância da experiência no processo forma-
tivo proposto, o qual decorre do que nos perpassa através do vivi-
do, apoiando-nos, mais uma vez, nas ideias de Bateson e Bateson
(1994, p. 163, tradução nossa), quando estes afirmam:

Todo mundo sabe (ou deveria saber) que ninguém


pode aprender a dançar limitando-se a ler um li-
vro. Esta pessoa deve ter também a experiência
real da dança que o livro naturalmente deixa sem
descrever. É a prática o que nos permite ligar os
diversos elementos das instruções para formar as
configurações.

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Partindo desse pressuposto, destacamos: ninguém pode


aprender a ser professor limitando-se a ler um livro. Consideramos
a importância da teoria, mas aliada à prática, tendo em vista que
cada uma dessas dimensões perpassa a outra, uma não existe e nem
resiste sem a outra, ou seja, ambas constituem-se mutuamente. Po-
demos, assim, reconhecer a importância de compreendermos que
a vivência de cada pessoa é diferente, ou seja, suas experiências do
vivido são singulares e alteram seu modo de aprender, em sintonia
com o contexto e com suas vivências precedentes. Essa reflexão que
valoriza a experiência pode ser um elo que aproxima a aprendiza-
gem do docente no exercício de sua função e o aluno que “aprende”
no universo escolar. Esse estudante aprende inicialmente a ser “alu-
no” e, dependendo da dinâmica estabelecida, aprenderá sempre a se
relacionar e a construir conhecimentos de modo também singular
como nos lembra Philippe Meirieu (1998). Consideramos impor-
tante destacar que a singularidade do aprendizado não se associa
necessariamente ao aluno com deficiência, mas a todos os alunos.
Dessa forma, quando falamos em uma formação que prioriza
a experiência, referimo-nos às iniciativas formativas decorrentes de
experiências e vivências, ou seja, aquelas que decorrem do espaço
no qual se insere esse profissional − nesse caso, a escola. Destaca-
mos, ainda, que uma formação derivada da experiência constitui-
-se também em espaços e momentos que vão para além daqueles
vividos em sala de aula, como nas ocasiões em que o docente se
propõe a (re)planejar, (re)avaliar e (re)refletir sobre suas práticas.
Quando nos propomos a refletir a respeito de um processo
formativo que envolve a constituição de uma trajetória coletiva,
como a do grupo de trabalho em questão, envolvendo-os em uma
discussão que relaciona a priori suas práticas pedagógicas e a in-
clusão escolar, com um objetivo compartilhado (que é o de inovar
no âmbito de seus cotidianos de trabalho a partir das necessida-
des percebidas nos mesmos), observamos o quanto os processos de

66 Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.59-81, maio/ago. 2015


ISSN 2237-258X

formar-se a partir da experiência perpassam o dia a dia de cada um


desses docentes.
Envolvidos em suas ações “inovadoras”, além de formar, for-
mam-se, em um movimento contínuo, caracterizando-se, priorita-
riamente, pelas relações e pelas trocas, tanto no âmbito do contexto
escolar quanto nas reuniões que envolvem os sujeitos que integram
o grupo de práticas. É possível, com isso, afirmar que o proces-
so formativo, que envolve a priori as experiências dos professores,
ocorre concomitantemente na relação entre os dois espaços, escola
e universidade, os quais se compõem na medida em que, no âmbito
do grupo de trabalho em questão, a intenção é discutir as práticas
pedagógicas, bem como a inclusão escolar, tomando como base o
cotidiano de trabalho desses docentes.
A formação continuada em serviço ou pela experiência
torna-se uma alternativa potente ao considerarmos os fundamen-
tos que a própria Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDB), Lei n.º 9.394, de 20 de dezembro de 19965, apresenta em
seu Artigo 61, destacando como prioritariamente constitutivos da
formação de profissionais da Educação: “a associação entre teorias
e práticas, inclusive mediante a capacitação em serviço” (BRASIL,
1996). Percebe-sea importância de termos clara a inseparabilidade
que há entre teoria e prática, ou seja, de reconhecermos que a visão
tradicional e dicotômica que compreende os dois segmentos como
não relacionados entre si insere-se em uma perspectiva frágil e re-
ducionista. Maurice Tardif (2013, p. 235) afirma que, ainda hoje,
esta visão, que reproduz a percepção dos professores como simples
“aplicadores dos conhecimentos produzidos pela pesquisa univer-
sitária”, é a dominante.
Torna-se importante, portanto, perceber que tal visão não se
confirma na realidade, no dia a dia e nas ações do docente, pois,

5
Como seu nome indica, ela estabelece as diretrizes e bases da educação nacional.

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ISSN 2237-258X

ainda de acordo com Tardif (2013), toda prática produz uma teoria e
vice-versa. Segundo o autor, faz-se necessário que tenhamos claro que:

Todo o trabalho humano, mesmo o mais simples


e mais previsível, exige do trabalhador um saber e
um saber-fazer. Noutras palavras, não existe tra-
balho sem um trabalhador que saiba fazê-lo, ou
seja, que saiba pensar, produzir e reproduzir as
condições concretas de seu próprio trabalho. O
trabalho – como toda práxis – exige, por conse-
guinte, um sujeito do trabalho, isto é, um ator que
utiliza, mobiliza e produz os saberes de seu traba-
lho (TARDIF, 2013, p. 236).

Nesse sentido, perceber que as práticas docentes são cons-


tituídas e portadoras de saberes enfatiza a ideia de um saber e um
saber-fazer que se entrelaçam e atuam relacionados na constituição
de um professor e de uma formação decorrente da experiência, o
que coloca o docente na posição de sujeito (re)produtor de seus
conhecimentos, bem como, tomando mais uma vez emprestadas as
palavras de Tardif (2013, p. 228), detentor de “saberes específicos
que são mobilizados, utilizados e produzidos por eles no âmbito de
suas tarefas cotidianas”.
O autor destaca ainda que a constituição da atividade docente
ocorre “em uma rede de interações com outras pessoas, num con-
texto onde o elemento humano é determinante e dominante e onde
estão presentes símbolos, valores, sentimentos, atitudes” (TARDIF,
2013, p. 49). Consideramos esse aspecto um dos pontos determi-
nantes na constituição de um processo formativo: a percepção de
que o conhecimento é construído em rede, sendo esta constituí-
da por uma combinação de elementos que envolvem, necessaria-
mente, dimensões de regularidade e mutabilidade (MATURANA;
VARELA, 2001).

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Cotidiano(s) e Educação Especial: análise do percurso


formativo

Como anunciado previamente, para o desenvolvimento deste


estudo partimos da seguinte questão norteadora: quais são os pos-
síveis desdobramentos formativos decorrentes do desenvolvimento
de um plano inovador de ação envolvendo universidade e escola de
Educação Básica, mais especificamente, neste contexto, abrangendo
o espaço dedicado ao Atendimento Educacional Especializado? Para
tanto, debruçamo-nos sobre a análise documental de atas que cons-
tituem a trajetória analisada, bem como colocamo-nos como obser-
vadores do espaço de reuniões do grupo em questão.
Referentes ao ano de 2013, a partir do qual passa a se cons-
tituir o grupo, existem 27 atas descritivas, nas quais são expostas
as discussões desenvolvidas nas reuniões semanais de forma de-
talhada. Diante disso, ao analisarmos esses documentos, a partir
de leituras sucessivas6, bem como ao tomarmos como referência
as observações realizadas no espaço dedicado às reuniões do gru-
po, decidimos dividir os principais pontos de discussão em eixos
específicos, de forma a articular as pistas da pesquisa. Oferecere-
mos, dessa maneira, destaque para os seguintes eixos: a) apoio e
diálogo na constituição das práticas pedagógicas; b) instituição de
uma rede formativa; c) inseparabilidade entre teoria e prática; e
d) reflexão constante acerca dos conceitos orientadores.
Com isso, o primeiro ponto que destacamos como potencial
formativo decorrente dos encontros do grupo diz respeito a sua
dimensão de apoio na constituição das práticas pedagógicas dos

6
A análise foi realizada com base na leitura e releitura desses documentos, pro-
curando identificar os aspectos recorrentes ou inusitados, considerando os obje-
tivos específicos da investigação. Essa leitura produziu um movimento de identi-
ficação de eixos de análise e permitiu o destaque de excertos que serão inseridos
com o sentido de ilustrar o processo analítico.

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docentes envolvidos. A partir do diálogo que se constitui entre os


professores, as práticas passam a ser pensadas de maneira com-
partilhada pelo coletivo. Além disso, a partir da análise das atas,
percebe-se o grande espaço oferecido no âmbito das reuniões se-
manais para relatos e notícias envolvendo tanto os cotidianos dos
professores quanto os planejamentos que tomam os planos de ação.
Dessa forma, torna-se perceptível que, a partir da organização
estabelecida pelo coletivo de professores, é instituída, no âmbito do
grupo, uma dinâmica que envolve o processo de acompanhamento
dos planos de ação, a partir da qual há a retomada e a atualização
constante acerca do que tem sido desenvolvido com relação a esses
planos. Esse movimento oferece, assim, a possibilidade de planejar,
avaliar e refletir em companhia, tornando o grupo uma espécie de
espaço coletivo de apoio para os professores integrantes.
Diante desses apontamentos, evocamos o conceito de “co-
munidades de práticas” (WENGER, 2001) para refletir acerca da
proposta formativa representada pelo grupo de trabalho analisado.
Segundo o autor, apesar desse conceito ser algo novo, a prática não
é desconhecida. As comunidades de práticas “são grupos de pes-
soas que compartilham uma preocupação, um conjunto de proble-
mas, ou uma paixão a respeito de algum tópico, e que aprofundam
seu conhecimento e expertise nesta área interagindo numa forma
permanente” (WENGER, 2002 apud MOSER, 2010, p. 211). Con-
siderando a organização estabelecida pelo grupo de práticas, bem
como as dinâmicas que têm se instituído ao longo da sua trajetória,
podemos pensar o grupo a partir do conceito de comunidades de
práticas, tendo em vista que, segundo Francisco Imbernón (2010,
p. 86), ao considerar o conceito para refletir acerca da formação
de professores, as comunidades de práticas envolveriam grupos de
professores que se reúnem e se organizam de forma a refletir coleti-
vamente acerca de suas práticas, dialogando e estabelecendo trocas.
Consideramos que o aspecto de destaque nesse conceito,
pensado com relação ao grupo de práticas, diz respeito à apren-

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dizagem coletiva a partir da definição de um interesse comum.


Segundo Humberto Maturana e Francisco Varela (2001, p. 12), “se
a vida é um processo de conhecimento, os seres vivos constroem
esse conhecimento não a partir de uma atitude passiva e sim pela
interação. Aprendem vivendo e vivem aprendendo”. Nesse sentido,
destacamos um processo de aprender que ocorre, necessariamen-
te, de maneira compartilhada, por meio das trocas e das relações,
organizando-se a partir de uma rede que se constitui de idas e vin-
das, regular e irregularmente, entre curvas que se encontram, se
distanciam e se (re)encontram ou não.
O segundo eixo de análise, para o qual oferecemos desta-
que, diz respeito a um dos compromissos do grupo em questão e
refere-se à instituição de uma rede formativa, a qual, como se pode
perceber, se constrói em um movimento pendular da escola de
Educação Básica para a universidade e vice-versa. Esse movimen-
to se intensifica quando tomamos como referência as professoras
de Atendimento Educacional Especializado, integrantes do grupo,
bem como os planos de ação por elas desenvolvidos.
Ao longo dos primeiros encontros do grupo, solicitou-se que
cada integrante pudesse apresentar seu contexto de trabalho, de
forma que todos soubessem de que lugar o docente estava falando.
É perceptível, dessa forma, a partir das narrativas das professoras
do Atendimento Educacional Especializado, o destaque para o des-
conhecimento dos professores de sala de aula comum acerca do
trabalho desenvolvido nas Salas de Recursos. Essa reação pode ser
percebida na apresentação dos contextos destes professores, quan-
do afirmam, por exemplo, que há “confusão no entendimento a
respeito do trabalho ali desenvolvido (muitos pais, e também pro-
fessores, pensam que é reforço escolar)” (Ata nº 21).
Nesse sentido, os professores responsáveis pelo Atendimento
Educacional Especializado evidenciam a necessidade de espaços de
formação que, inicialmente, contextualizem os demais professores

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.59-81, maio/ago. 2015 71


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acerca desse espaço. Em alguns casos, há, ainda, por iniciativa das
próprias escolas, a abertura para espaços de formação que buscam
esclarecer aos professores qual é a função do Atendimento Edu-
cacional Especializado e do trabalho desenvolvido na Sala de Re-
cursos, como destaca um dos integrantes do grupo ao afirmar que
houve um “evento de formação para professores no início de abril
para explicar o significado e funcionamento do espaço da sala de
integração e recursos, que por carência de informação de muitos
profissionais sobre, havia sido levantada a hipótese de se fechar a
sala” (Ata nº 7).
Não por acaso, todas as professoras que compõem o grupo de
trabalho e que atuam no espaço do Atendimento Educacional Es-
pecializado constituíram planos de ação inovadores que envolvem,
prioritariamente, os professores das escolas em que atuam e a for-
mação continuada em seus contextos. Dessa maneira, percebemos
o trabalho desenvolvido a partir da instituição do plano de ação
como uma rede. Além dos professores participantes das reuniões
do grupo de trabalho, a formação se estende para dentro das esco-
las, alcançando e envolvendo muitos outros professores, bem como
abrangendo inúmeros alunos das escolas. De uma parte, a ideia
de rede se amplia, envolvendo outros atores sociais que não par-
ticipam diretamente do contexto analisado; de outra, identifica-se,
por meio dessas escolhas temáticas, um dos nós que caracterizam
o trabalho do docente especializado em Educação Especial: o risco
do isolamento no âmbito do sistema escolar, que não é específico
da realidade brasileira, como bem evidencia Dario Ianes (2014) ao
abordar os desafios associados ao insegnante di sostegno (professor
de apoio) na Itália.
Destacamos ainda que o movimento “contrário” também
ocorreu. Um dos docentes integrantes do grupo, especificamen-
te professor de Educação Física, instituiu um plano de ação que
teve como principal objetivo estabelecer uma articulação entre a

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ISSN 2237-258X

sua disciplina e o trabalho desenvolvido na Sala de Recursos pela


professora responsável pelo Atendimento Educacional Especializa-
do. Identifica-se, assim, a emergência de um diálogo entre profes-
sores da sala de aula comum e da Sala de Recursos com indícios de
corresponsabilidade pelo processo, envolvendo os demais docentes
que fazem parte da trajetória escolar dos alunos com deficiência
que frequentam a escola.
O terceiro eixo, constituinte de uma das discussões recor-
rentes ao longo das reuniões do grupo, diz respeito à percepção
acerca da inseparabilidade entre teoria e prática. Esse aspecto, que
se destaca, inclusive, pela proposta de organização do grupo e que
contraria a concepção tradicional que costuma separar essas duas
dimensões, torna-se um dos pontos de maior ênfase ao longo das
discussões desenvolvidas pelo coletivo de professores.
Segundo Tardif (2013, p. 235), “a concepção tradicional não
é apenas profundamente redutora, ela é também contrária à reali-
dade. Hoje sabemos que aquilo que chamamos de ‘teoria’, de ‘saber’
ou de ‘conhecimentos’ só existe através de um sistema de práticas e
de atores que as produzem e as assumem”. Nesse sentido, o traba-
lho desenvolvido pelo grupo passa a inovar na proposta que busca
desenvolver uma maior interlocução entre escolas de Educação Bá-
sica e universidade, aproximando dois espaços que vêm, historica-
mente, constituindo-se como distantes.
Temos investido nas discussões que colocam a visão reducio-
nista entre teoria e prática em suspenso, buscando refletir acerca
das duas concepções de maneira relacional, percebendo, com isso,
que “ambas são portadoras e produtoras de práticas e de saberes, de
teorias e de ações e ambas comprometem os atores, seus conheci-
mentos e subjetividades” (TARDIF, 2013, p. 237).
Podemos afirmar, por meio da análise das atas e, principal-
mente, com base nas observações realizadas, que as discussões
que envolvem a relação de inseparabilidade entre teoria e prática

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estão presentes desde o início da trajetória do grupo, mesmo que


de maneira indireta. Uma das evidências desse processo pode ser
percebida quando, para articular os planos de ação, os integrantes
buscavam referenciais teóricos que pudessem ampliar a capacida-
de de leitura dos fenômenos em causa e oferecer sustentação aos
planejamentos. O grupo passou a se organizar dividindo-se entre
espaços para relato, discussões envolvendo os planos e momentos
dedicados à reflexão teórica que congregava referenciais específi-
cos, como Maurice Tardif, Philippe Meirieu e Humberto Maturana.
O quarto e último eixo diz respeito à reflexão constante acer-
ca dos conceitos orientadores do trabalho desenvolvido pelo grupo.
Ao longo da leitura das 27 atas, tornou-se perceptível a retomada
constante dos três conceitos eleitos pelo grupo como orientadores
da prática que buscariam realizar, os quais passamos a identificar:
inovação, cotidiano e necessidade.
A retomada constante dos três conceitos, ao longo do pri-
meiro ano de constituição do grupo, foi acompanhada pela busca
de referenciais que pudessem oferecer base aos professores para re-
fletir acerca do eixo que nortearia suas práticas. Dessa forma, o ato
de inovação passou a ser visto pelo grupo vinculado à ressignifica-
ção de práticas ou à reinvenção do cotidiano, não necessariamen-
te no sentido de inserir rotinas completamente novas, mas rotinas
que inovem no sentido de produzir mudanças que façam sentido
no contexto em que se opera, ou seja, algo “não necessariamen-
te inédito, mas que provoque mudanças” (Ata nº 15). Além disso,
houve ênfase na importância de a inovação ser pensada em um
movimento que considere o contexto e não seja imposta a partir de
um âmbito externo: “A inovação deve vir de dentro da escola, e não
de políticas externas” (Ata nº 4), de forma a valorizar as iniciativas
pensadas para e com a instituição.
O segundo conceito que perpassa a trajetória do grupo é

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o de necessidade – do latim necessitare, variação de necessitas,


relacionada ao latim antigo necesse7 –, palavra que evoca aquilo que
é necessário, não levando em consideração apenas o naturalmen-
te necessário, mas também aquilo que se constrói socialmente. O
conceito de necessidade desenvolvido pelo grupo envolve, assim, o
que é percebido no contexto do cotidiano escolar como emergente,
com vistas a pensar o processo de inovar: “a importância de ver
a ‘necessidade’ e como pensar o currículo para o aluno com defi-
ciência. Pensar isso e desenvolver é uma inovação!” (Ata nº 8). Esse
conceito pode ser percebido como uma evidência da conexão com
os interesses despertados nos sujeitos, que são, portanto, constituí-
dos socialmente.
O terceiro e último conceito que perpassa a trajetória do gru-
po é o de cotidiano, para cuja discussão o grupo debruçou-se prio-
ritariamente sobre as ideias de Carlos Eduardo Ferraço. A partir
das ideias apresentadas por Carlos Eduardo Ferraço (2007), identi-
ficamos o cotidiano escolar como redes de saberes/fazeres construí-
das pelos sujeitos envolvidos nesse contexto. É importante ressal-
tar que, de acordo com o autor, torna-se necessário desconstruir a
percepção de uma rede que existe no cotidiano, mas, sim, perceber
que as redes são o próprio cotidiano, ou seja, as redes não existem
ou se constroem a parte do cotidiano escolar. Este é a própria rede
tecida pelos sujeitos que constituem a comunidade escolar, trama
que, consideramos, constitui-se prioritariamente nas relações. O
grupo de práticas, portanto, não analisa o cotidiano das escolas
como fenômenos isolados do próprio grupo em ação, mas como
uma extensão de dinâmicas que implicam aqueles que as vivem e
as descrevem. Torna-se evidente a importância desse conceito para
o grupo, de forma que os cotidianos assumem uma centralidade

7
Segundo o Dicionário etimológico da língua portuguesa, de Antônio Geraldo
da Cunha, e o livro De onde vêm as palavras: origens e curiosidades da língua
portuguesa, de Deonísio da Silva.

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ISSN 2237-258X

que rompe a ideia de dentro e fora para favorecer a participação, na


medida em que há “crescente mobilização dos professores a partir
do momento que há espaço para falar sobre o cotidiano” (Ata nº 8).
O movimento constante do grupo no sentido de retomar os
conceitos que se constituem como eixos norteadores oferece-nos
pistas para refletir acerca de um compromisso assumido concomi-
tantemente com os espaços da escola e da universidade, de forma
que, para tanto, o coletivo de professores indica uma preocupação
em construir bases, tanto teóricas quanto práticas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo do presente estudo, tornou-se possível perceber o


potencial formativo que pode representar um grupo de professores
que se reúne em função do objetivo de reinventar as práticas pe-
dagógicas em seus contextos de trabalho. Esse aspecto se enfatiza
quando voltamos nosso olhar para o espaço dedicado ao Atendi-
mento Educacional Especializado, de forma que o grupo passa a
representar um apoio para esses docentes oferecerem possibilida-
des de formação contínua para outros professores, estabelecendo,
assim, uma rede formativa que propõe maior articulação com os
professores do ensino comum, em sintonia com as diretrizes ex-
postas nos documentos que orientam a Educação Especial na pers-
pectiva da Educação Inclusiva.
As iniciativas são emergentes em um contexto que produz
vínculos, como o compromisso de colocar em diálogo o conhe-
cimento acadêmico associado à pesquisa e a vida cotidiana das
escolas, assim como a busca por tornar os desafios associados ao
“desconhecimento” percebido diante dos fenômenos da inclusão
escolar em oportunidade criadora, que avança por meio do com-
promisso coletivo. Essa dimensão social da aprendizagem pode

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ser, com facilidade, pensada em sintonia com as ideias de Etienne


Wenger (2009), quando esse estudioso apresenta as linhas organi-
zadoras de uma teoria social da aprendizagem, afirmando:

[...] o foco primário dessa teoria está na apren-


dizagem como participação social. Participação,
aqui, se refere não somente a eventos locais de
engajamento em certas atividades com certas pes-
soas, mas a um processo mais abrangente de ser
participante ativo nas práticas de comunidades
sociais e de se construir identidades em relação a
essas comunidades (WENGER, 2009, p. 210, tra-
dução nossa).

Como procuramos descrever, consideramos como pontos


determinantes na constituição de um processo formativo: a cons-
tância e a regularidade dos encontros; a negação de uma hierarquia
que tenderia a supervalorizar os saberes considerados acadêmicos
em detrimento daqueles associados à vida e ao fazer docente; a
percepção de que o conhecimento é construído em rede, sempre
dinâmico e plural. Essa rede é constituída por uma combinação de
elementos que envolvem dimensões de regularidade e mutabilida-
de, ou seja, baseando-se em elementos que são constitutivos dos
sujeitos, mas necessariamente incorporando novos elementos de
forma não linear (MATURANA; VARELA, 2001).
Considerando essa perspectiva, torna-se perceptível um
movimento “pendular” com relação à articulação entre escola de
Educação Básica e universidade, ou seja, a partir dos discursos dos
professores participantes do grupo de trabalho, podemos perceber
que o movimento de articulação das práticas não se desenvolve de
maneira unidimensional, mas constitui-se com base em oscilações
entre os saberes produzidos nas escolas e aqueles produzidos na
universidade. Assim, o processo formativo pode ser identificado
como atinente àquilo que Maturana e Varella (2001) chamam de

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combinação entre solidez e areias movediças, ou seja, uma união


entre o regular e o mutável, e que se caracteriza por considerar to-
dos os sujeitos envolvidos no processo.
A partir dos destaques apresentados, torna-se possível rea-
firmar o potencial formativo do desenvolvimento dos planos de
ação, principalmente quando pensamos na docência relacionada
à Educação Especial, ou seja, especificamente neste estudo, quan-
do lançamos nosso olhar para o espaço dedicado ao Atendimento
Educacional Especializado no âmbito do grupo em questão.
Tomando como base a emergência desse debate, torna-se
cada vez mais necessário o investimento em processos de formação
continuada que promovam o diálogo entre teoria e prática. Denise
M. Jesus e Alexandro B. Vieira (2011) destacam a importância desse
investimento, bem como afirmam que, para que ele se efetive, tam-
bém se faz necessário atentar para a mudança na visão que contem-
pla as práticas pedagógicas docentes, buscando o desenvolvimento
de ações inovadoras e percebendo a formação como “instrumento
motivador de movimentos transformadores na/da escola” (JESUS;
VIEIRA, 2011, p. 147).
Consideramos, então, que o movimento traçado pelo grupo
tem valorizado um processo formativo que decorre da experiên-
cia. Em suma, enfatizamos que o grupo de trabalho em questão
configura-se como uma oportunidade de formação, como um es-
paço de possível qualificação de práticas pedagógicas e de susten-
tação para tensões e desconhecimentos. Ao retomarmos os sen-
tidos de inovação, cotidiano e necessidade, talvez devêssemos re-
conhecer que tais conceitos concentram a essência da Pedagogia:
favorecer a emergência de algo que o outro, com quem interajo,
necessita, conhecendo sua existência a partir do reconhecimento
de que ele é sempre processo do qual eu participo e, por fim, a
produção do novo como uma meta sem a qual nenhum processo
educativo teria sentido.

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MODELOS DE FORMAÇÃO DO
PROFESSOR DE EDUCAÇÃO ESPECIAL:
ESTRATÉGIAS DE CONSOLIDAÇÃO DA
POLÍTICA EDUCACIONAL
Teacher education models of Special Education:
consolidation strategies educational policy
Modelo de formación del maestro de la Educación Especial:
estrategias de consolidación de la política educativa

Kamille Vaz1
Rosalba Maria Cardoso Garcia2

Resumo
Este artigo tem como objetivo o estudo sobre o professor de Educação
Especial, mais especificamente, os modelos de formação em meio às po-
líticas educacionais do início do século XXI. Para tanto, utilizamos como
procedimentos metodológicos a análise de documentos oficiais elabora-
dos no período entre 2001 e 2011 que expressam a política de Educação
Especial na perspectiva inclusiva e da produção acadêmica do campo

1
Doutoranda da linha Trabalho e Educação no Programa de Pós-Graduação em
Educação da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e integrante do
Grupo de Estudos sobre Política Educacional e Trabalho (GEPETO).
E-mail: kamillevaz@gmail.com
2
Professora do Departamento de Estudos Especializados em Educação e do
Programa de Pós-Graduação em Educação do Centro de Ciências da Educação
da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e integrante do Grupo de
Estudos sobre Política Educacional e Trabalho (GEPETO).
E-mail: rosalba.garcia@ufsc.br

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.83-105, maio/ago. 2015 83


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específico. Ressaltamos, a partir disso, três modelos de professor apreen-


didos na análise da formação: o professor generalista, o professor espe-
cialista e o professor do Atendimento Educacional Especializado. Essa
diferenciação é mais um elemento para a discussão sobre a reconversão
docente e a divisão do trabalho dentro das escolas, considerando-se a
Educação Especial como constituinte das políticas educacionais para a
Educação Básica.

PALAVRAS-CHAVE: Professor de Educação Especial. Política educa-


cional. Formação docente.

Abstract
This article aims to study the Special Education teacher, more
specifically, the training models among the educational policies of the
early twenty-first century. Therefore, we use as instruments analysis of
official documents, the period from 2001 to 2011, expressing the special
education policy in the inclusive perspective and academic production
of the specific field. We emphasize three teacher models seized in the
analysis of training: the generalist teacher, teacher specialist and Professor
of specialized educational services. This distinction is one more element
to the discussion on teacher retraining and the division of labor within
schools, considering the special education as a constituent of education
policy for Basic Education.

KEYWORDS: Special Education Teacher. Educational policy. Teacher


education.

Resumen
Este artículo tiene como objetivo estudiar el maestro de Educación
Especial, más concretamente, los modelos de capacitación entre
las políticas educativas de los principios del siglo XXI. Por lo tanto,
utilizamos como instrumentos de análisis de documentos oficiales, el
período de 2001 a 2011, que expresa la política de educación especial
en la perspectiva inclusiva y la producción académica del campo
específico. Destacamos tres modelos docentes incautados en el análisis
de la formación: el maestro generalista, especialista maestro y profesor de
servicios educativos especializados. Esta distinción es un elemento más a
la discusión sobre el reciclaje maestro y la división del trabajo dentro de

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las escuelas, teniendo en cuenta la educación especial como componente


de la política de educación para la Educación Básica.

PALABRAS CLAVE: Maestro de la Educación Especial. Política educa-


tiva. Formación docente.

INTRODUÇÃO

O objetivo da discussão aqui apresentada consiste em refletir


acerca do professor de Educação Especial (EE) no Brasil, tomando
como base a reforma educacional dos anos 1990 e procurando pro-
duzir algum grau de verticalização em relação aos modelos de forma-
ção docente previstos no âmbito da política educacional brasileira.
Consideramos necessário relacionar o objeto deste trabalho
à conjuntura na qual se situa, ainda que guardados os limites de
análise. Para tanto, a discussão pretendida pauta-se na:

concepção dinâmica da realidade, própria de toda


dialética, [na qual] o singular é concebido ao mes-
mo tempo em sua determinação pelo todo, em sua
universalidade; o singular, portanto, não é apenas
o conservado; precisamente porque é concebido
como momento de um todo que se move a si mes-
mo, que põe os momentos contraditórios e os su-
pera (KOFLER, 2010, p. 202).

Com base nesse pressuposto, partimos da consideração


acerca do acirramento do processo de produção e acumulação de
capital identificado como “regime de acumulação flexível” como
estratégia de superação da crise geral do capital em curso nas dé-
cadas de 1970 e 1980 (HARVEY, 2004). O conjunto de mudanças
nos processos produtivos e nas medidas de regulamentação do tra-
balho que foram implementadas, visando a reposição da hegemo-
nia do capital e a ampliação de sua reprodução, necessitavam do
Estado como “nexo fundamental” do sociometabolismo do capital

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(MÉSZÁROS, 2005). Os Estados nacionais que assumem o modelo


neoliberal reduzem suas funções voltadas às políticas sociais, ten-
do em vista a necessidade de redirecionar os investimentos para o
setor produtivo (MONTAÑO; DURIGUETTO, 2011).
No caso do Brasil, os direitos sociais (dentre eles, a educação)
passam a ser compreendidos como serviços que podem ser presta-
dos tanto pelo setor público como pelo setor privado (PEREIRA,
1996). Compreendemos que as políticas sociais, na sua versão fo-
calizada e fragmentária, representam a perda de um horizonte de
universalidade dos direitos sociais, ao estabelecer ações voltadas
a grupos sociais organizadas em função da identificação de dife-
rentes necessidades específicas relacionadas como dados culturais,
consistindo, dessa forma, em obscurecimento da matriz de classe
social constitutiva do público-alvo das políticas públicas.
Particularmente em relação à Educação Básica brasileira, as
reformas abrangeram o financiamento, a gestão, o currículo, a ava-
liação e a formação de professores (SHIROMA; MORAES; EVAN-
GELISTA, 2002). Tais reformas foram consolidadas, no país, anun-
ciando um objetivo de universalização da educação fundamental,
embora implementadas sob a regência da focalização. Portanto,
configurou-se uma universalização focalizada nos grupos que, his-
toricamente, estiveram fora do sistema educacional ou nele não
permaneceram até a conclusão dos estudos (FREITAS, 2002). Ao
mesmo tempo, a educação fundamental foi sendo direcionada para
a formação dos “códigos da modernidade” ou à “satisfação das ne-
cessidades básicas de aprendizagem”, restritas à “apropriação de co-
nhecimentos e habilidades básicas: leitura e escrita, cálculo, solu-
ção de problemas e conhecimento básico para participação social”
(BUENO, 2008, p. 47).3

3
Os programas e projetos educacionais da década de 1990, sob o comando dos
governos de Fernando Collor de Mello, Itamar Franco e o primeiro mandato de
Fernando Henrique Cardoso podem ser apreciados em Neves (2000).

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Tais elementos são aqui arrolados como fundamentais para


compreender o professor de Educação Especial no Brasil e os mo-
delos de formação a ele destinados nas últimas décadas, a partir da
elaboração de três hipóteses: 1) um projeto de escola de massas,
articulado aos propósitos de “Educação para Todos” (UNESCO,
1990), teria contribuído para produzir alterações no trabalho do
professor de Educação Especial ao ampliar a presença de estudantes
dessa modalidade nas classes comuns do ensino regular e gerar, na
política nacional, a proposição do apoio pedagógico especializado
na classe comum (BRASIL, 2001b); 2) considerando que o mesmo
projeto advoga por um conteúdo formativo rebaixado para todos,
no ensino público, baseado no modelo das necessidades básicas de
aprendizagem, teria referendado o foco do trabalho do professor
de Educação Especial como especializado nas suas características
específicas (deficiência, transtornos globais do desenvolvimento,
altas habilidades ou superdotação), apesar de a atuação na classe
comum possibilitar, em tese, que o professor de Educação Especial
operasse de forma mais articulada ao professor regente de turma.
As duas primeiras hipóteses referem-se, portanto, a um elemento
novo da política de Educação Especial, presente a partir do início
dos anos 2000, em relação ao trabalho do professor do campo es-
pecífico (VAZ, 2013), que, para além das escolas especiais, classes
especiais e Salas de Recursos, passou a ter atuação prevista também
na classe comum, em função de sua adequação à reforma educa-
cional; e 3) mais recentemente, ainda que os alunos da Educação
Especial frequentem a classe comum, a Educação Especial foi redu-
zida a Atendimento Educacional Especializado realizado nas Salas
de Recursos Multifuncionais.4
A presença dos alunos da Educação Especial no ensino re-
gular já estava colocada no texto da Lei de Diretrizes e Bases da

4
Salas de atendimento em contraturno localizadas nas escolas públicas de ensino
e nos centros de Atendimento Educacional Especializado ou nas escolas especiais
de caráter privado-assistencial.

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Educação Nacional (LDBEN), Lei n.º 9.394 (BRASIL, 1996), assim


como a previsão de professores capacitados e especializados. A
premissa, em acordo com a Constituição Federal (BRASIL, 1988),
carecia de detalhamento e explicitação, o que ocorreu mediante as
Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica
(BRASIL, 2001b).
Naquele momento, o debate em curso sobre a formação ini-
cial dos professores de Educação Especial (EE) estava relacionado
à distinção entre o professor generalista e o professor especialista
que, para José Geraldo Silveira Bueno (1999), não são opostos, mas
complementares. A formação inicial, por intermédio das extintas
habilitações no curso de Pedagogia, provia o sistema educacional
de um modelo generalista de professor de Educação Especial, pois,
nos primeiros anos de curso, aprofundava discussões acerca das
teorias educacionais e pedagógicas e, mais ao final, direcionava os
estudos para o conhecimento específico. Um segundo modelo de
formação, com o objetivo de estudo das deficiências e de métodos
e técnicas específicos e pouco afeito às questões pedagógicas, pre-
pararia o professor especialista (BUENO, 1999).5 Tais modelos de
formação foram concomitantes no país.
Ao refletir acerca da presença dos alunos da EE nas classes
comuns, visando uma perspectiva de escolarização, questiona-
mos: os professores de EE que atuam na escola regular não de-
veriam auxiliar nos processos de apropriação do conhecimento
escolar dos alunos com deficiência? Para tanto, a formação cons-
tituída por uma sólida base pedagógica não seria imprescindível?

5
Desde 1962, há a oferta do curso de Licenciatura em Educação Especial na
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Esse curso visa a formação de
professores para atuarem especificamente no atendimento aos alunos da Edu-
cação Especial. A partir da década de 1970, temos o ingresso das habilitações
no curso de Pedagogia e os cursos de especialização lato sensu sobre a Educa-
ção Especial.

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Inserindo-se nessa discussão, Maria Teresa Penteado Cartolano


(1998, p. 5) enfatiza:

Uma coisa, porém, é bastante clara para nós: não


deve haver diferenciação na formação do profes-
sor para as classes do ensino regular, das classes
especiais ou das escolas especiais – todos são edu-
cadores e devem ter uma formação comum e con-
tinuada, uma vez que o interesse deve ser a educa-
ção do ser humano.

Se, por um lado, a autora assegura uma base na docência


para todos os professores, por outro lado, a defesa de uma for-
mação continuada tem sido apropriada nas proposições políticas
em curso no país como argumento para desvalorizar a formação
inicial (MAUÉS, 2003). Além disso, essa formação inicial, de base
comum, seria seguida pela continuada, concebida não como apri-
moramento do trabalho do professor, mas como espaço para a
diversificação em áreas específicas da Educação, conforme as ne-
cessidades dos diferentes grupos de estudantes a serem incorpo-
rados ao sistema educacional.
As disputas em torno das exigências de formação do pro-
fessor de EE revelam a compreensão sobre essa modalidade de en-
sino e seus objetivos. Seja na formação inicial ou na continuada,
a discussão remete para o tipo de profissional formado, como o
professor generalista ou o professor especialista. Mais recentemen-
te, um terceiro modelo de formação passou a ser desenvolvido no
país, visando prover com professores o Atendimento Educacional
Especializado (AEE) realizado nas Salas de Recursos Multifuncio-
nais. Kamille Vaz (2013) chama atenção para o uso do termo AEE
na documentação representativa da política nacional de Educação
Especial (BRASIL, 2008, 2009a, 2011) em substituição à denomi-
nação Educação Especial, indicando um novo modelo de professor

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e de formação. Tal formação tem sido desenvolvida em cursos de


aperfeiçoamento à distância, com o cumprimento de, no máximo,
360 horas. Por outro lado, formações diversificadas também con-
tribuiriam para um tratamento diferenciado dos professores, di-
ficultando ainda mais a apreensão da noção de pertencimento à
classe trabalhadora.
Tendo em vista a preocupação com o tipo de professor de
Educação Especial projetado no âmbito da política educacional no
país, consideramos fundamental ampliar a discussão sobre os mo-
delos de formação vigentes, articulando-os, também, à compreen-
são de Educação Especial correspondente.

Modelos de formação do professor de Educação Especial:


proposições políticas no Brasil entre 2001 e 20116

Temos por pressuposto que o conjunto de determinações da


política de Educação Especial brasileira em vigor, particularmente
no que se refere à formação do professor de EE, circunscreve um
modelo de professor projetado para uma dada concepção sobre a
modalidade de Educação Especial.
Na documentação consultada (BRASIL, 1996, 2001a, 2001b,
2008, 2009a, 2011; ROPOLLI et al., 2010),7 constatamos dois mo-
delos de professor: o professor especializado, que pode ter tam-
bém uma vertente generalista, e o professor do AEE. Assim, con-
sideramos necessária a explicitação dessas nomenclaturas para

6
Nesse período, o Brasil foi governado por Fernando Henrique Cardoso (PSDB),
Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Dilma Rousseff (PT).
7
Os documentos são a Lei n.º 9.394, o Parecer CNE/CEB n.º 17/2001, a Resolução
CNE/CEB n.º 2/2001, a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da
Educação Inclusiva, o Decreto n.º 6.571/2008, o Parecer CNE/CEB n.º 13/2009, a
Resolução CNE/CEB n.º 4/2009, A Educação Especial na Perspectiva da Inclusão
Escolar: a escola comum inclusiva e o Decreto n.º 7.611/2011.

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compreendermos as disputas políticas acerca do professor de EE na


atualidade. É importante relembrar que os documentos que com-
põem nosso estudo foram publicados entre 2001 e 2011 e que, nes-
se período, vigoraram diferentes concepções sobre a formação exi-
gida para atuar na Educação Especial, conforme tratado na seção
anterior. Diante dos encaminhamentos para a Educação Especial
na perspectiva inclusiva nas escolas regulares, atualmente, o privi-
legiamento do AEE ganha maior evidência.

O professor especializado

A formação de professores especializados em EE atingiu o


nível de Ensino Superior por meio de um conjunto de reformas
ocorridas entre os anos de 1960 e 19708, que exigiam melhor es-
pecialização para esse tipo de ensino (BUENO, 2011). Ao longo
desses anos, alguns cursos de formação de professores inseriram
habilitações em Educação Especial e surgiram também licenciatu-
ras em EE, focando a formação específica. Entretanto, como obser-
vamos no delineamento e nos objetivos da formação de professores
no Brasil, contemplar um conhecimento específico nos cursos para
professores não garantiu a qualidade em sua formação docente:

O fato de a formação do professor para a educação


especial ter sido incluída como habilitação dentro
de um curso que, regra geral, tratou a formação
docente como subproduto da formação do espe-
cialista, contribuiu, de forma decisiva, para que
se formasse um docente especializado, mas com
muito pouca formação como professor.

8
Bueno (2011, p. 136) utiliza como exemplo dessas reformas o Parecer CFE
n.º 295/69, de autoria do Conselheiro Clóvis Salgado, e afirma: “A própria defi-
ciência dos alunos, dificultando a tarefa, está a indicar a necessidade de profes-
sores altamente preparados, menos para o emprego de técnicas especiais de que
para as tarefas de orientação, supervisão e pesquisas nos campos específicos”.

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[...] Além disso, na medida em que essas habilitações


centraram a formação do professor especializado nas
dificuldades específicas desta ou daquela deficiência,
reiterou mais uma “especificidade docente” que não
levou em conta as perspectivas ampliadas sobre a re-
lação entre fracasso escolar e processos pedagógicos
(BUENO, 2011, p. 137, grifo do autor).

Para Bueno (1999), há uma falsa dicotomia entre o professor


especializado e o professor generalista. O autor entende que se, de
fato, queremos uma educação que atinja com qualidade todos os
alunos, deficientes ou não, a formação e atuação do professor de EE
deve abarcar essas duas dimensões, ou seja, sua formação deverá ter
uma base docente que permita uma ampliação de suas ações para
além das características específicas de alunado e o aprofundamento
da formação específica sobre as deficiências para que estas sejam
levadas em consideração no processo de ensino, além de oferecer
condições para que esse professor possa atuar com alunos da EE
que, por algum motivo, não podem frequentar as escolas regulares.
O professor de EE sugerido em documentos como a LDBEN,
de 1996, o Parecer CNE/CEB n.º 17/2001 e a Resolução CNE/CEB
n.º 2/2001, é diferenciado dos demais profissionais da escola pela
sua formação específica. Por atuar com a EE dentro das escolas re-
gulares e especiais, esse profissional, segundo os documentos cita-
dos, é caracterizado pelo domínio do saber especializado, o qual,
segundo as análises de Maria Helena Michels (2006), Fabíola Bo-
rowsky (2010) e Márcia de Souza Lehmkuhl (2011), com base em
Gilberta de Martino Jannuzzi (2012), e ancora-se no modelo médi-
co-pedagógico e psicopedagógico. Para Michels (2006, p. 417), “em
síntese, podemos apreender que a proposição atual de formação
de professores, tanto capacitados como especializados, não rompe
com o modelo de formação tradicionalmente destinado à área”.
O primeiro ponto a ressaltar é que se distinguem dois tipos
de profissionais e, consequentemente, dois tipos de formação, o que

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pode acarretar na divisão do trabalho docente. Cartolano (1998),


ao relatar sobre o curso de graduação em Pedagogia, no final da dé-
cada de 1990, estabeleceu uma relação que podemos utilizar como
reflexão, nos dias atuais, de tal forma que nos possibilita entender
como os professores que hoje atuam na Educação Especial foram
formados e de que maneira esse modelo de formação repercute no
processo de escolarização dos estudantes da Educação Especial.
Contraditoriamente, se a LDBEN exigiu formação específi-
ca para a atuação dos professores com os alunos da EE, hoje tal
política de formação está no mesmo patamar de discussão sobre
formação de professores da Educação Básica, a qual tem como um
de seus objetivos o aprimoramento do conhecimento prático em
detrimento do conhecimento teórico e da reflexão sobre o processo
de ensino e aprendizagem (EVANGELISTA; TRICHES, 2008).
O propósito da formação de professores de EE é preparar pro-
fissionais aptos para o trabalho com materiais e recursos específicos
para cada tipo de deficiência? Essa seria a base da formação do pro-
fessor especializado? Esses questionamentos encontram-se embasa-
dos na afirmação de que a corrente hegemônica na formação desses
professores é a médico-pedagógica (JANNUZZI, 2012). A vertente
médico-pedagógica dos cursos de formação está centrada na defi-
ciência dos alunos e não no processo de apreensão do conhecimento
escolar, ou seja, todas as medidas tomadas para a permanência desse
aluno na escola estão pautadas no seu diagnóstico e no modelo de
formação; consequentemente, atende-se a essa demanda, formando
professores especialistas nas deficiências e em como trabalhar com
elas. Para Michels (2006, p. 417), na atualidade,

a proposta de formação desses professores tem


como máxima a inclusão. Porém, a manutenção
da formação de professores com base no modelo
médico-pedagógico auxilia nesse processo? Pode-
mos pensar no processo de inclusão dos alunos

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considerados deficientes formando professores,


tanto capacitados como especializados, que cen-
tram o sucesso ou o fracasso dos processos de
aprendizagem nos alunos individualmente?

O ideário de inclusão educacional está respaldado pelo res-


peito às diferenças e pelo direito de todos à educação. Contudo,
o modelo de formação de professores especializados, em grande
medida, está centrado nas deficiências. O referido modelo de for-
mação projeta, conforme evidenciado por meio de documento
oficial recente (BRASIL, 2009a), professores capazes de trabalhar
com todos os tipos de deficiência, de orientar os pais e professores
e ainda serem responsáveis pela boa articulação da política de in-
clusão escolar. A política em vigor indica mudança na concepção
de professor, provocando consequências na concepção de EE. Essa
modificação incorpora o modelo médico-pedagógico, mas supera
a ideia de professor formado por área de deficiência, prevendo um
professor de EE que atue no AEE com todas as categorias de defi-
ciência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidade
ou superdotação. Tais argumentos elucidam as disputas de concep-
ções nas quais a Educação Especial está inserida.
Percebemos que o professor especializado, assim como sua
formação inicial, está sendo gradativamente desconsiderado na
documentação representativa da política de EE atual, o que, de cer-
ta forma, indica a concepção presente sobre esse professor e sobre
os objetivos da Educação Especial na escola regular.

O professor generalista

No final da década de 1990, as discussões sobre a formação


inicial do professor de EE estavam centradas no âmbito das gra-
duações em Pedagogia com habilitação específica no final do curso,

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focadas em um tipo de deficiência, e, ainda, em cursos de Pedago-


gia que, já no ingresso, restringiam toda a formação em determi-
nado tipo de deficiência. Para Cartolano (1998) e Bueno (1999),
esse último modelo formava um profissional especializado em uma
ou mais deficiências, mas não tinha, em sua base formadora, co-
nhecimentos sobre as questões pedagógicas do processo de ensino
e aprendizagem, indicando a esse profissional uma atuação tera-
pêutica sobre as deficiências dos alunos e o demarcando como um
profissional diferente do professor da Educação Básica:

Nesse sentido, a formação diferenciada para pro-


fessores de uns e de outros somente vem refor-
çar o modelo capitalista de produção baseado na
eficiência, na seleção dos melhores e na exclusão
social de muitos e fundado em uma visão “desfo-
cada” da realidade e do indivíduo; estamos, assim,
correndo o risco de estar institucionalizando a
discriminação já no ponto de partida da formação
dos professores e negando, portanto, o princípio
da “integração”, não só do deficiente na rede re-
gular de ensino, como também do profissional da
educação na realidade educacional existente – não
só escolas, mas também classes especiais, institui-
ções especializadas etc. Estamos negando a esses
profissionais o privilégio e o desafio de conviver
com a diferença (CARTOLANO, 1998, p. 2).

Nesse âmbito, as discussões do final da década de 1990 e iní-


cio dos anos 2000 estavam amparadas no modelo de formação pro-
posto pela LDBEN (BRASIL, 1996). Autores como Bueno (1999)
propunham uma formação com base pedagógica, com conheci-
mentos gerais da educação e do processo ensino e aprendizagem,
assim como a formação dos professores que atuavam na Educação
Básica, mas sem descartar o conhecimento específico do campo
da Educação Especial. Esse é o modelo de formação que o autor

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denomina generalista. Para Bueno (1999), esse professor seria


o profissional que articularia, em sua formação, conhecimentos
pedagógicos gerais e conhecimentos específicos da EE. Cartola-
no (1998) critica esse modelo de formação e sugere um curso de
Pedagogia igual para todos os estudantes, sem separá-los por ha-
bilitações, haja visto que, conforme as indicações de “integração”
na escola regular, todos os professores devem dominar os conhe-
cimentos gerais da educação, incluindo aqueles que possibilitem o
trabalho com alunos com deficiências.
Com base nesses argumentos, podemos considerar dois tipos
de formação para o professor generalista: a apontada por Bueno
(1999), que seria uma formação com base comum de conhecimen-
tos gerais da Educação, associada aos conhecimentos específicos
da EE, considerando que tal proposição se contrapõe aos cursos
de formação específica, como o de professor de educação especial
com enfoque em deficiência mental, por exemplo; e a sugerida por
Cartolano (1998), embasada num curso de formação plena. Segun-
do essa proposta, todos os professores poderiam exercer todas as
funções na escola, incluindo as do professor de EE. A autora indica
a formação continuada como uma maneira de aprofundamento em
alguma área específica.
Tal modelo está presente na proposição política aqui em aná-
lise, a qual prevê que o professor de Educação Especial deve, além
de trabalhar com alunos com todos os tipos de deficiências, trans-
tornos globais de desenvolvimento e altas habilidades ou superdo-
tação nas Salas de Recursos Multifuncionais, atuar como gestor da
política de inclusão nas escolas regulares. Tais proposições se com-
patibilizam com as atribuições dirigidas aos professores do AEE
pela Resolução CNE/CEB n.º 4/2009.
O professor generalista, apontado no âmbito de sua forma-
ção, está centrado na apreensão da base comum do curso, com
disciplinas gerais sobre Educação e que auxiliem a compreender a

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relação com a EE. Já o professor generalista, evidenciado no campo


de sua atuação nas escolas regulares, sofre uma reconversão docen-
te (EVANGELISTA, 2010) tendo em vista que se adapta ao modelo
proposto pela política em vigor e incorpora elementos de gestão,
por exemplo.9
Não encontramos a expressão “professor generalista” na do-
cumentação consultada neste estudo. No entanto, nas expectativas
sobre a atuação desse profissional, registradas nos documentos
analisados, deparamo-nos com as características aqui menciona-
das e relacionadas a esse modelo. A análise empreendida foi gera-
dora de novas questões: o professor generalista é o professor deno-
minado professor do AEE? Podemos dizer que professor do AEE
é sinônimo de professor de EE? Diante do exposto, consideramos
necessária a análise sobre o professor que deverá atuar no Atendi-
mento Educacional Especializado, mais especificamente nas Salas
de Recursos Multifuncionais.

O professor do Atendimento Educacional Especializado

Na documentação representativa da política de EE em vigor


no Brasil, encontramos a nomenclatura “professor do Atendimento
Educacional Especializado” em substituição a “professor de Educa-
ção Especial”, fato que consideramos instigante, pois a indefinição
da terminologia ao mencionar esse profissional não é somente uma
mudança nominal, mas sim de aspectos conceituais e de entendi-
mento do que é e qual a função da Educação Especial na perspectiva
inclusiva nas escolas. É nesse sentido que nos dedicamos à análise da
abordagem sobre o professor do AEE nos documentos consultados.

9
O conceito de reconversão docente, elaborado por Olinda Evangelista (2010),
está pautado no fato de os professores serem convencidos pelas atuais reformas
educacionais a serem multiplicadores destas nas escolas.

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Na documentação coligida, não encontramos definição clara


sobre o professor de AEE, mas, no decorrer do texto, percebemos
que o conceito AEE representa a EE na escola regular, em especial
quando menciona o professor e indica sua formação continuada. O
Atendimento Educacional Especializado é a forma de atuação da
Educação Especial nas escolas regulares. Os documentos que suce-
deram àquele intitulado Política Nacional de Educação Especial na
Perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL, 2008) disseminam a
proposta do AEE nas escolas regulares. No documento A Educação
Especial na Perspectiva da Inclusão Escolar: a escola comum inclu-
siva está descrito que “na perspectiva da inclusão escolar, o profes-
sor da Educação Especial não é mais um especialista em uma área
específica, suas atividades desenvolvem-se, preferencialmente, nas
escolas comuns” (ROPOLI et al., 2010, p. 23). Com esse documen-
to, o governo federal demarca a posição sobre a inclusão escolar e a
reafirma como sua principal ação nesse campo:

Para atuar no AEE, os professores devem ter for-


mação específica para este exercício, que atenda
aos objetivos da educação especial na perspectiva
da educação inclusiva. Nos cursos de formação
continuada, de aperfeiçoamento ou de especiali-
zação, indicados para essa formação, os professo-
res atualizarão e ampliarão seus conhecimentos
em conteúdos específicos do AEE, para melhor
atender a seus alunos (ROPOLI et al., 2010, p. 28).

Com base nessas indicações, constatamos que, para atuar nas


escolas regulares, o professor do AEE, segundo documentos recen-
tes, deve ultrapassar sua característica de especialista e sua forma-
ção deve direcionar sua ação para o modelo de Educação Especial
proposto nas escolas regulares, por meio de formação continua-
da (BRASIL, 2009a). A formação continuada em AEE, oferecida
pelo MEC via Universidade Aberta do Brasil (UAB), é o Curso de

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Aperfeiçoamento de Professores para o Atendimento Educacional


Especializado, disponibilizado como capacitação, com duração
de 180 horas. Ao analisar os referenciais teóricos desse curso, Bo-
rowsky (2010, p. 68) observa que:

na perspectiva prática, instrumental e tecnicista


da formação do professor de Educação Especial,
a própria organização dos documentos já nos per-
mite perceber que o grande enfoque é dado aos
métodos, instrumentos e técnicas de trabalho no
AEE, remetendo o trabalho do professor a meras
funções práticas.

Segundo a análise de Borowsky (2010), esse curso de formação


pretende adequar os profissionais para a política de inclusão nas es-
colas por meio de sua atuação no AEE. No entanto, o foco da discus-
são teórica do curso está no modelo médico-pedagógico e psicope-
dagógico da deficiência. Para a autora, “fica evidente que a base deste
curso está na experiência prática. A formação do professor, assim
como a aprendizagem do aluno, é aqui reduzida a uma reflexão sobre
sua prática. A centralidade está nos métodos e nas técnicas de como
ensinar” (BOROWSKY, 2010, p. 92 grifo do autor).
O professor do AEE, com base no exposto, pode ser consi-
derado um professor generalista pelo viés de sua atuação, mas tem
em sua formação as características do professor especializado com
o enfoque nas deficiências. Dessa forma, podemos sugerir que ele
é um profissional reconvertido para atuar no modelo de Educação
Inclusiva promovido pelas políticas educacionais atuais, mas que
guarda aspectos da concepção de EE pautada na deficiência.
Observamos, na documentação coligida, a tendência à pou-
ca atenção à formação inicial que habilitaria os professores de Edu-
cação Especial, em contraste à consolidação da política de forma-
ção continuada e em serviço. Tal tendência sugere maior destaque
ao professor do AEE e menor interesse pelo professor de Educação

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Especial. É importante lembrar que, mesmo que os professores de


EE tenham sua importância secundarizada na documentação, estes
continuam sendo formados nos cursos de licenciatura em Educação
Especial e atuando em classes especiais e instituições especializadas,
bem como nas Salas de Recursos Multifuncionais, o que demonstra o
debate recorrente sobre o conceito e a função da Educação Especial.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Compreender as reformas educacionais dos anos de 1990, no


Brasil, é essencial para evidenciarmos os rumos da educação, atual-
mente, e, no meio dessas determinações, o papel do professor de Edu-
cação Especial, assim como os modelos de formação a eles destinados.
O debate sobre a formação inicial ou continuada dos pro-
fessores de Educação Especial ressalta os modelos de professor re-
queridos pela formação, como os generalistas, que partem da base
docente com uma formação específica, os especialistas, que restrin-
gem a formação no campo específico, e os professores do AEE, que
são formados para atuar com os recursos e materiais adaptados no
interior das escolas regulares. Tais diferenciações contribuem para
a divisão do trabalho, dentro das escolas, e para a inconsistência ao
definir esse professor e sua formação (MICHELS, 2004).
Mediante a análise da documentação representativa da polí-
tica educacional, observamos que o projeto de professor de Educa-
ção Especial e sua formação guardam características comuns com
os propósitos relacionados aos demais professores da Educação
Básica no Brasil. Nesse aspecto, ressaltamos o direcionamento da
formação com base na prática e na desvalorização da teoria e da
reflexão sobre a apreensão do conhecimento escolar, o encaminha-
mento para a formação continuada à distância e, em sua maioria,
na rede privada, e a necessidade de um profissional adaptável às
mudanças, proativo e multifuncional. Por outro lado, pudemos

100 Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.83-105, maio/ago. 2015
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encontrar elementos específicos do professor de Educação Especial


e de sua formação delineados pela concepção médico-pedagógica
(JANNUZZI, 2012).
Por fim, sustentamos que os modelos de formação do pro-
fessor de Educação Especial, no Brasil, estão relacionados a uma
adaptação desse profissional às exigências do modelo de escola
fundamentado no ideal assistencialista (EVANGELISTA; LEHER,
2012) para a manutenção do capital. O professor de EE é, como
os demais professores, foco de políticas educacionais que induzem
sua reconversão docente (EVANGELISTA, 2010) no sentido de sua
formação ser restrita teoricamente e ter sua atuação alargada, como
podemos observar no conceito de professor multifuncional (VAZ,
2013) o qual contempla características técnicas e de gestão da polí-
tica de inclusão na escola regular, não tendo como foco de sua atua-
ção, nos termos postos pela proposição política, a apropriação do
conhecimento escolar por parte dos alunos da Educação Especial
que frequentam o ensino regular.

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Recebido: 10/12/2014
Aprovado: 11/12/2014

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.83-105, maio/ago. 2015 105
ISSN 2237-258X

A POLÍTICA DE FORMAÇÃO
DE PROFESSORES DO ENSINO
FUNDAMENTAL PARA ATENDER ALUNOS
DA EDUCAÇÃO ESPECIAL
The policy of training teachers of elementary school
to meet the students of Special Education
La política de formación de los docentes de la escuela primaria
a educación de estudiantes de la Educación Special

Maria Helena Michels1


Márcia de Souza Lehmkuhl2

Resumo
Objetivando analisar a política de formação de professores do Ensino
Fundamental que atende alunos considerados deficientes, investigamos
proposições de formação inicial e continuada de professores no Brasil
e, especificamente, no Estado de Santa Catarina no período entre 2005
2009. Para tanto, desenvolvemos uma análise documental, buscando
apreender a perspectiva educacional presente nas proposições nacional e
estadual voltadas à formação de professores. Em relação a Santa Catarina,
analisamos, entre outros documentos, 52 propostas de cursos certificados

1
Professora do Centro de Ciências da Educação da Universidade Federal de Santa
Catarina (UFSC). Possui doutorado em Educação pela Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo (PUC-SP). E-mail: mhmichels@uol.com.br
2
Mestre em Educação pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e
doutoranda em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
(PUC-SP). É analista técnica em Educação Especial da Fundação Catarinense de
Educação Especial. E-mail: lehmkuhlms@gmail.com

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.107-129, maio/ago. 2015 107
ISSN 2237-258X

pela Fundação Catarinense de Educação Especial para a rede regular de


ensino. Para isso, Além disso, buscamos os fundamentos do materialismo
histórico como sustentação de nossa investigação, nos possibilitando. Tal
exame possibilitou identificar o predomínio de cursos cujo objetivo foi
a divulgação dos princípios da Educação Inclusiva em uma perspectiva
prática, instrumental e tecnicista. As proposições de formação continua-
da de professores nessa área não rompem com as vertentes médico-pe-
dagógica e psicopedagógica presentes historicamente no ensino para os
sujeitos da Educação Especial. Também evidenciou-se que as propostas
analisadas não rompem com o que vem sendo indicado para os profes-
sores de maneira geral. Esse fato fortalece a tese da desintelectualização,
instrumentalização, certificação e reconversão dos professores.

Palavras-chave: Política educacional. Educação Especial. Forma-


ção de professores. Ensino Fundamental.

Abstract

Aiming at analyzing the elementary school teacher training policy that


serves students considered disabled, investigated propositions of initial
and continuing teacher education in Brazil and specifically in the state of
Santa Catarina, from 2005 to 2009. For both developed document analysis
seeking to understand this educational perspective in national and state
propositions aimed at teacher training. Regarding the state of Santa
Catarina analyze, among other documents, 52 proposals for certificate
courses by the Santa Catarina Foundation of Special Education for the
regular school system. We seek the foundations of historical materialism
as support of our research. This examination enabled to identify the
prevalence of courses aimed to the dissemination of the principles of
inclusive education in a practical perspective, instrumental and technical
activities. The propositions of continuing education of teachers in this
area do not break with the medical-pedagogic and pedagogical present
historically in teaching the subjects of Special Education. Also showed that
the proposals analyzed do not break with what has been indicated for the
general teachers. This fact strengthens the thesis of desintelectualização,
instrumentation, certification and retraining of teachers.

Keywords: Educational policy. Special Education. Teacher training.


Elementary school.

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ISSN 2237-258X

Resumen
Objetivando analizar la política de formación de los docentes de primaria
de la escuela que sirve a estudiantes considerados discapacitados
proposiciones investigados de la educación inicial y docente continúa en
Brasil y, específicamente en el estado de Santa Catarina, de 2005 a 2009.
Por tanto el análisis de documentos desarrollado buscando entender
esta perspectiva educativa en las proposiciones nacionales y estatales
destinados a la formación del profesorado. En cuanto al estado de Santa
Catarina analizar, entre otros documentos, 52 propuestas de cursos
certificados por la Fundación Santa Catarina de Educación Especial
para el sistema escolar regular. Buscamos las bases del materialismo
histórico como el apoyo de nuestra investigación. Este examen ha
permitido identificar la prevalencia de cursos destinados a la difusión
de los principios de la educación inclusiva en una perspectiva práctica,
instrumental y actividades técnicas. Las proposiciones de la educación
continua de los profesores en esta área no se rompen con el médico-
pedagógico y pedagógica presente históricamente en la enseñanza de las
asignaturas de Educación Especial. También mostró que las propuestas
analizadas no rompen con lo que se ha indicado para los profesores
generales. Este hecho refuerza la tesis de desintelectualização, la
instrumentación, la certificación y el reciclaje profesional de los docentes.

Palabras-clave: La política educativa. Educación Especial. La for-


mación del profesorado. La escuela primaria.

Introdução

Buscando analisar, a partir da política educacional das dé-


cadas de 1990 e 2000 no Brasil, os encaminhamentos da forma-
ção inicial e continuada para professores do Ensino Fundamental
para atender alunos da Educação Especial, é que desenvolvemos a
pesquisa aqui apresentada. Em nossas análises, buscamos as con-
tribuições teóricas do materialismo histórico dialético. No que se
refere à apreciação da política educacional, procuramos respaldar
nossos exames nas produções de Evangelista (2001), Moraes (2003)
e Shiroma (2003); quanto à formação de professores, temos Maués

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(2003), Shiroma e Evangelista (2003) e Falleiros, Pronko e Olivei-


ra (2010) como principais interlocutores; e para as apreciações re-
lativas à Educação Especial, autores com Bueno (1993) e Michels
(2006) foram nossas bases teóricas principais. Nossa base empírica
contou com documentos nacionais e estaduais que encaminham a
política educacional no Brasil e em Santa Catarina, respectivamen-
te, principalmente aquelas concernentes à formação de professores
e à Educação Especial.
Buscando contribuir com as reflexões sobre a temática, orga-
nizamos este texto em subitens, nos quais, primeiramente, discu-
tiremos como está sendo proposta a formação da Educação Espe-
cial na atual reforma educacional brasileira (ocorrida entre 1990 e
2000), que tem a política de inclusão como principal encaminha-
mento. Em seguida, desenvolveremos análises referentes à propo-
sição de formação de professores da rede regular de ensino, na área
da Educação Especial, no Estado de Santa Catarina. Para tanto,
analisaremos 52 propostas de cursos certificados pela Fundação
Catarinense de Educação Especial (FCEE) para a rede regular de
ensino, além da análise de outros documentos de nível estadual e
federal que organizam e propõem a formação dos professores. Por
fim, buscamos relacionar as proposições políticas analisadas com
as perspectivas teóricas que, a nosso ver, dão contorno à política
educacional e, especialmente à política de formação de professores.

A formação de professores para a Educação Especial na política


nacional de perspectiva inclusiva

Nas últimas décadas, observamos proposições políticas que


acarretam mudanças na organização do chamado sistema de en-
sino brasileiro, envolvendo a ampliação do tempo dos alunos na
escola, a progressão continuada, a avaliação em larga escala, en-
tre outros. Para dar conta de tais alterações, os professores são

110 Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.107-129, maio/ago. 2015
ISSN 2237-258X

considerados, pela política educacional brasileira, um dos princi-


pais agentes da reforma. Com isso, observa-se a importância atri-
buída à sua formação constante nos documentos nacionais que
sustentam tais propostas.
Buscando melhor explicitar essa relação, faz-se necessário
analisarmos alguns documentos que tratam da temática em âmbito
nacional. Os documentos aqui discutidos assumem caráter propo-
sitivo e normativo e versam sobre a formação de professores para a
Educação Especial, dos quais destacamos: a Lei de Diretrizes e Bases
para a Educação Nacional (BRASIL, 1996); a Resolução CNE/CEB
n.º 02/2001, que institui as Diretrizes Nacionais para a Educação
Especial na Educação Básica (BRASIL, 2001b); a Resolução CNE/
CP n.º 1/2006, que apresenta as Diretrizes Curriculares Nacionais
para o Curso de Pedagogia (BRASIL, 2006); a Política Nacional de
Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL,
2008) e a Resolução CNE/CEB n.º 04/2009, que institui Diretrizes
Operacionais para o Atendimento Educacional Especializado na
Educação Básica, modalidade Educação Especial (BRASIL, 2009).
Na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN),
Lei n.º 9304, de 1996, mais especificamente em seu Capítulo V, in-
dica-se que devem atender os alunos da Educação Especial profes-
sores especializados ou capacitados. Essa mesma lei determina que
o professor especializado é quem deve atuar com educandos com
Necessidades Educacionais Especiais (NEE), e que sua formação
deve ocorrer em nível médio ou superior. Ela também estabelece
que a União, o Distrito Federal, os estados e os municípios, em
colaboração, deverão promover as formações inicial e continuada
e a capacitação dos profissionais do magistério, podendo esta ser
oferecida nas modalidades à distância ou presencial; os professo-
res capacitados são aqueles que comprovarem, na sua formação,
conteúdos ou disciplinas da área da Educação Especial, conforme
consta na LDBEN e na Resolução n.º 2/2001.

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ISSN 2237-258X

A partir de 2001, no Brasil, por intermédio desta resolução,


fica determinado que “os sistemas de ensino deverão matricular a
todos os alunos, e às escolas caberá a responsabilidade de organi-
zar o atendimento aos educandos com necessidades educacionais
especiais, assegurando uma educação de qualidade para todos”
(BRASIL, 2001). Esse mesmo documento trata da formação de
professores para a inclusão dos sujeitos com NEE na Educação Bá-
sica e estabelece que as escolas devem “prever e prover na organiza-
ção de suas classes comuns: [...] professores das classes comuns e da
educação especial capacitados e especializados, para o atendimento
às necessidades educacionais dos alunos” (BRASIL, 2001b).
Nos anos 2000, precisamente em 2006, as habilitações nos
cursos de Pedagogia, que historicamente formou os professores da
Educação Especial nas habilitações específicas (Educação Espe-
cial e/ou por deficiências), foram extintas pela Resolução CNE/CP
n.º 1/2006.3 Essa Resolução apresenta, em seu Artigo 5º, como fun-
ção do curso de Pedagogia, formar profissionais que atendam a di-
versidade, dentre elas, os alunos com NEE. Com essa determinação,
vários cursos de Educação Especial, que formam o educador especial
e não o professor, foram abertos no Brasil. Especificamente em San-
ta Catarina, após essa resolução, surgiram oito cursos de Educação
Especial, todos em universidades privadas do estado. Tais cursos, em
grande parte, estão sendo oferecidos por intermédio do Plano Nacio-
nal de Formação de Professores da Educação Básica (PARFOR) que,
segundo consta no site do programa: “é um Programa emergencial
instituído para atender o disposto no artigo 11, inciso III do Decreto
nº 6.755, de 29 de janeiro de 2009 e implantado em regime de cola-
boração entre a Capes, os estados, municípios o Distrito Federal e
as Instituições de Educação Superior – IES”.

3
Em relação à reformulação do curso de Pedagogia, ver Triches (2010).

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Em relação à formação continuada ou em serviço, que tam-


bém possibilita formação aos professores para atuarem com alunos
da Educação Especial, vale destacar o Programa Educação Inclusi-
va: direito à diversidade (BRASIL, 2006a). Este tem como objetivo
disseminar a política de Educação Inclusiva, apoiando a formação
de professores nessa perspectiva; conforme o Ministério da Edu-
cação (MEC, 2013), o programa é “voltado à formação de gestores
e educadores para transformar os sistemas educacionais em siste-
mas educacionais inclusivos, por meio da organização de cursos
presenciais, realizados [nos] municípios-polo de todas as regiões
brasileiras”. Por intermédio desse Programa, o MEC disseminou
cursos de formação continuada para os professores para divulgar e
implementar a política de Educação Inclusiva.4
Faz-se importante destacar que, em 2008, o MEC publicou o
documento Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da
Educação Inclusiva, indicando como meta principal “o acesso, a par-
ticipação e a aprendizagem dos alunos com deficiência, transtornos
globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação nas es-
colas regulares, orientando os sistemas de ensino para promover res-
postas às necessidades educacionais especiais” (BRASIL, 2008, p. 8).
Para o acesso e a permanência desses sujeitos na escola regu-
lar, o MEC regulamenta o atendimento na área da Educação Espe-
cial por meio do Atendimento Educacional Especializado (AEE),
serviço responsável por “identificar, elaborar e organizar recursos
pedagógicos e de acessibilidade que eliminem barreiras para a ple-
na participação dos alunos, considerando as suas necessidades es-
pecíficas” (BRASIL, 2008, p. 10). Em relação à formação de profes-
sores, ess documento explicita que:

Para atuar na educação especial, o professor deve


ter como base da sua formação, inicial e continuada,

4
Sobre esse programa, ver Borowsky (2010).

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conhecimentos gerais para o exercício da docência


e conhecimentos específicos da área. Essa forma-
ção possibilita a sua atuação no atendimento edu-
cacional especializado e deve aprofundar o caráter
interativo e interdisciplinar da atuação nas salas
comuns do ensino regular, nas salas de recursos,
nos centros de atendimento educacional especia-
lizado, nos núcleos de acessibilidade das institui-
ções de educação superior, nas classes hospitalares
e nos ambientes domiciliares, para a oferta dos
serviços e recursos de educação especial. Esta for-
mação deve contemplar conhecimentos de gestão
de sistema educacional inclusivo, tendo em vista o
desenvolvimento de projetos em parceria com ou-
tras áreas, visando à acessibilidade arquitetônica,
os atendimentos de saúde, a promoção de ações
de assistência social, trabalho e justiça (BRASIL,
2008, p. 17-18, grifo nosso).

Destaca-se que os conceitos de docência e de gestão apare-


cem fortemente marcados, nesse documento, assim como naqueles
referentes à formação de professores de maneira geral. A docência
é apresentada em seu sentido alargado, indicando ampliação, no
que se refere às atividades e ao locus de atuação desse profissional.
Ao Atendimento Educacional Especializado (AEE), é dado centra-
lidade, pois ele é considerado o locus privilegiado de atuação desse
profissional, como é possível observar no Decreto n.º 6.571/2008,
segundo o qual a gestão assume lugar de destaque nessa formação,
pois o profissional deve estar apto a gerir no e para a constituição
de um sistema educacional inclusivo e para “administrar” os recur-
sos específicos do AEE.
No final dos anos 2000, a Resolução CNE/CEB nº 04, de 01
de outubro de 2009 (BRASIL, 2009) que regulamenta o atendi-
mento especializado do AEE, corrobora com o propalado na Po-
lítica Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação

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Inclusiva ao afirmar que, para atuar no AEE, o professor deve ter


formação inicial que o habilite a atuar com essa modalidade de en-
sino e também formação específica na área de Educação Especial.
O documento não esclarece, entretanto, se a formação inicial deve
ser em Pedagogia e qual formação específica o professor deverá ter
para a Educação Especial, se inicial ou continuada.
Observa-se que os documentos concernentes às décadas de
1990 e 2000 assumem a perspectiva inclusiva como carro chefe. A
formação de professores para atuar com sujeitos com NEE, nesse
período, está estritamente relacionada à política de inclusão e, mais
ao final dele, ao AEE, entendido este como modelo central da pers-
pectiva inclusiva.

Educação e a política de inclusão

No interregno 1990-2010, a Educação, no Brasil, passa a


assumir um novo papel, adquirindo a política de inclusão funda-
mental importância nessa proposição. Não estamos considerando
somente a política de inclusão referente aos sujeitos da Educação
Especial, mas também aqueles que, historicamente, ficaram fora da
escola. Segundo Michels (2006, p. 407), uma das tarefas destina-
das à Educação, à escola e aos professores é a “inclusão dos alunos
que historicamente foram excluídos da escola. A inclusão, então,
aparece como propulsora de uma nova visão da escola. Agora sob
a narrativa do respeito às diferenças, oportuniza-se educação di-
ferente para ‘compensar’ as diferenças sociais”. Nesse sentido, há
um deslocamento, nas políticas educacionais, de conceitos centrais
como exploração/expropriação para conceitos periféricos como
exclusão/inclusão (LEHER, 2010).
Segundo Freitas (2002), os custos econômicos, sociais e po-
líticos da Educação são questões cruciais nas políticas neoliberais.
Para diminuí-los, propõe-se, por exemplo, a redução da ocorrência

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de repetência e de evasão escolar que, nessa perspectiva, aumentam


os custos educacionais. Porém, a base meritocrática continua a ser
a que explica o sucesso ou fracasso escolar que leva à exclusão. Em
outras palavras, a exclusão, que poderia ser compreendida como
resultado de relações sociais mais amplas, assume um caráter “sub-
jetivo”, uma vez que incide sobre o sujeito a responsabilidade por
sua própria exclusão.
É no bojo das políticas neoliberais que a perspectiva inclusiva
é gestada. Assumindo caráter fragmentário e focalizado, a inclusão
como política destina-se a grupos específicos (políticas focais) e, se-
gundo Leher (2009), organiza a verba pública que divide as categorias
de excluídos em subgrupos e focaliza a educação como a solução para
a exclusão social. Para o autor, tais políticas visam o atendimento de
determinados grupos excluídos da escola e, consequentemente, da
sociedade. Um dos grupos focais dessa política de inclusão refere-se
aos sujeitos da Educação Especial, para os quais várias ações preten-
samente inclusivas, envolvendo a assistência social e a educação, es-
tão sendo desenvolvidas pelos governos nacional, estaduais e muni-
cipais, como o Programa Educação Inclusiva: Direito à Diversidade,
o Programa Incluir e o Programa Escola Acessível.
A Educação Especial é tratada como se estivesse fora das
relações sociais. Para Bueno (1993), a política inclusiva retira de
pauta as relações sociais mais amplas que perpassam a Educação
e a sociedade brasileira. Para o autor, as políticas de inclusão são
propostas como se estivessem fora das relações de classes sociais,
“como se o processo de marginalização ocorresse somente em fun-
ção de suas dificuldades específicas, sem que se estabelecesse re-
lação entre esse fenômeno e o processo de exclusão-participação
das camadas subalternas inerentes ao desenvolvimento capitalista”
(BUENO, 1993, p. 138).
É tendo a política de inclusão como base que se propõe a
formação de professores para a Educação Especial no Brasil e, em
particular, em Santa Catarina.

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As propostas de formação inicial e continuada de professores


para a Educação Especial em Santa Catarina

Conforme pesquisa desenvolvida em Santa Catarina no pe-


ríodo de 2006 a 2008, os professores que atuam na Educação Es-
pecial têm, assim como em todo o Brasil, sua formação inicial em
diferentes locus, níveis e modalidades. Com a análise dos microda-
dos do INEP referentes ao AEE no município de Florianópolis, por
exemplo, ainda encontramos profissionais atuando sem formação
específica em Pedagogia (habilitação Educação Especial) ou Licen-
ciatura em Educação Especial.
Se observarmos a formação inicial dos professores do ensi-
no regular, no estado catarinense, nos diversos cursos oferecidos
pelas instituições de Ensino Superior, podemos perceber que há
uma pulverização de informações. Essa área, em muitos casos, é
tratada em uma disciplina de caráter geral, na qual identificamos
a influência tanto da área médica como da Psicologia para ex-
plicar questões pedagógicas referentes aos sujeitos da Educação
Especial. Ouvindo alguns professores da rede regular de ensino
(tanto dos municípios como do estado), observa-se que a cen-
tralidade da formação está no discurso da inclusão (“todos têm
direito/ devem estar na escola”, “os que não usufruírem dela en-
sinarão aos demais a conviver com as diferenças”, entre outros).5
Contudo, essa mesma formação secundariza questões como o
“como ensinar” e “o que ensinar” a esses alunos.
Em relação à formação inicial, então, no que concerne à pro-
posição pedagógica, ainda necessitamos de estudos mais aprofunda-
dos. Porém, o que temos analisado até o momento nos permite afir-
mar que há uma centralidade na utilização de recursos, instrumen-
tos e métodos que estão estritamente relacionados ao diagnóstico

5
Esses professores foram ouvidos durante processo de pesquisa e de estágio
curricular.

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dos sujeitos. Isso nos remete à permanência do modelo médico


nas formações iniciais, mesmo quando tratamos da política de in-
clusão. Tal modelo consolida a perspectiva apontada por Freitas
(2002), da “exclusão subjetiva”, uma vez que, ao inserirem os alunos
da Educação Especial nas escolas regulares e nas classes comuns,
tendo o diagnóstico clínico como definidor de suas possibilidades
acadêmicas, responsabilizando tais sujeitos pelo seu próprio fra-
casso. Podemos considerar, então, a formação continuada (ou em
serviço) desses profissionais a estratégia mais adequada para dar
conta da escolarização desses alunos?
Buscando responder tal questão, Lehmkuhl (2011) analisou
um grupo de proposições de formação continuada de professores
na área da Educação Especial no Estado de Santa Catarina, ofere-
cidas pela Fundação Catarinense de Educação Especial (FCEE) no
período entre 2005 e 2009. Foram examinandas 52 propostas de
cursos certificados pela FCEE e oferecidos aos professores da rede
regular de ensino. Lehmkuhl (2011) analisou os cursos que conti-
nham em seus objetivos, justificativas e conteúdos, caráter pedagó-
gico, desconsiderando (para efeito deste texto) aqueles que objeti-
vavam a formação nas áreas de reabilitação (Fisioterapia, Fonoau-
diologia entre outros). Sua finalidade com tal estudo foi discutir os
aspectos pedagógicos e o atendimento especializado, enfatizando a
relação entre ensino e aprendizagem, o planejamento, o currículo,
o desenvolvimento de metodologias específicas e a avaliação.
Das 52 propostas de curso fornecidas pela FCEE, 25 (46%)
estavam relacionadas aos sujeitos com diagnóstico de deficiência
auditiva; outras 22 (ou 44%) se referiram às questões pedagógicas,
utilizando a expressão “prática pedagógica”; seis delas abordaram
a temática de planejamento, e igualmente seis, o processo de ava-
liação. Em relação ao foco dos trabalhos, constatamos que 23 pro-
postas de curso tinham como foco o ensino em Língua Brasileira

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de Sinais (Libras) e somente seis propostas utilizaram termos como


“planejamento”, “avaliação” e “adequação curricular” para tratar
das questões pedagógicas. Com essa pouca referência, nos cursos,
sobre aspectos pedagógicos, podemos afirmar que a formação con-
tinuada tem assumido caráter instrumental e tecnicista. Lehmkuhl
(2011) afirma que mesmo nos cursos que apresentavam caráter pre-
dominantemente pedagógico, com ênfase na “prática pedagógica”
(48% das propostas para a rede regular de ensino), orientavam-se
para o “saber fazer”, para a resolução dos problemas imediatos ou
para o saber atender os alunos (sujeitos da Educação Especial) sem
a preocupação com a crítica do fazer prático, uma forma de “desin-
telectualização do professor” (SHIROMA, 2003, p. 20) em nome
de um novo “modelo técnico” (MORAES, 2007, p. 6), conforme
discutiremos a seguir.
As 52 propostas de formação voltadas para a rede regular de
ensino foram organizadas a partir da deficiência e não por ques-
tões educacionais. A autora observa que a permanência do modelo
médico-pedagógico, no qual as questões biológicas definem as prá-
ticas pedagógicas, influenciam a formação desse profissional, mes-
mo tendo a inclusão como política. Lehmkuhl (2011) verificou esse
fato na significativa concentração de propostas que tiveram como
principal objetivo discutir a deficiência auditiva e as Necessidades
Educacionais Especiais, mesmo referindo-se, nos objetivos e nas
justificativas, à prática pedagógica e ao encaminhamento na pers-
pectiva da Educação Inclusiva.
Em outras palavras, é o diagnóstico dos sujeitos da Edu-
cação Especial que organiza a política de formação continuada
de professores na área da Educação Especial em Santa Catarina,
o que denota contradição, já que os documentos que orientam e
normatizam a política da área no estado assumem a perspectiva
de Educação Inclusiva.

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A formação de professores na reforma educacional: qual é a


base teórica a sustenta?

Com a reforma educacional, iniciada no Brasil na década de


1990, a formação de professores assume centralidade. Tendo como
base políticas emanadas de organismos multilaterais, como o Ban-
co Mundial, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a
Ciência e a Cultura (UNESCO) e o Fundo das Nações Unidas para
a Infância (UNICEF), observamos as interferências desses nos en-
caminhamentos legais e propositivos da educação brasileira (MO-
RAES, 2003). Compreendemos, porém, que as reformas educacio-
nais estão relacionadas às mudanças na estrutura da sociedade e no
processo de trabalho, que passa a exigir outro tipo de trabalhador,
mais “flexível, eficiente e polivalente” (MAUÉS, 2003, p. 91). Faz
parte desse processo reformista a disseminação de “conceitos, ca-
tegorias e termos, de modo a torná-los condizentes com os emer-
gentes paradigmas que referenciaram as reformas almejadas para
a educação brasileira e latino-americana” (MORAES, 2003, p. 9).
Na Educação Especial, passou-se a adotar expressões que
hoje, muitas vezes, são tomadas como própria da área, entre as
quais estão “inclusão”, “Educação Inclusiva”, “competência”, “socie-
dade civil”, “solidariedade”, “equidade” e “sujeito de direitos”, disse-
minando determinadas formas de encaminhamento de política e,
consequentemente, de formação de professores. Esses conceitos se
coadunam com a proposição de uma política inclusiva, atribuin-
do sentidos à política educacional e referendando uma perspec-
tiva que vem se tornando hegemônica ou, como denomina Neves
(2010, p. 15), “uma nova pedagogia da hegemonia”.
Segundo Moraes (2003, p. 8), a reforma educacional dos anos
1990 e 2000 causou um verdadeiro “transformismo” com leis, de-
cretos, pareceres e resoluções. Ações foram insistentemente divul-
gadas como algo novo, inovador. Evangelista (2001, p. 2) analisa que

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a insistência em uma reforma “diferente”, “um marco de uma nova


era”, fez parte da reorganização da sociedade burguesa para manter
a hegemonia de seus interesses, principalmente “tendo em vista con-
vencer o público alvo de suas reformas de que elas são ‘novas’”.
Nesse contexto a requalificação dos professores é dada pelas
proposições políticas e a formação como eixo principal visando à
sua profissionalização. Para Shiroma (2003, p. 74), com a proposta
de “professor-profissional”, exigem-se níveis cada vez maiores de
ensino e de formação continuada do professor, enfatizando-se o
“saber fazer”, a prática docente, e deslegitimando-se a relação dos
conhecimentos teóricos e práticos. Como afirmam Shiroma, Mo-
raes e Evangelista (2007, p. 11), “o discurso é claro: não basta ape-
nas educar, é preciso aprender a empregar convenientemente os
conhecimentos adquiridos”.
Essa formação centrada na prática, observada nas proposi-
ções de formação continuada de professores para a Educação Es-
pecial em Santa Catarina, está relacionada à perspectiva da compe-
tência que segundo, Falleiros, Pronko e Oliveira (2010, p. 92):

extrapolou a educação básica, influenciando pro-


fundamente as áreas voltadas à formação profis-
sional no Brasil do século XXI. Ao mesmo tem-
po em que se moldou no país um novo ‘sistema
nacional’ de formação técnico-profissional, seus
centros formadores e escolas técnicas passaram a
se responsabilizar por emitir certificados de com-
petências aos trabalhadores, ‘flexibilizando’ a for-
mação técnica (leia-se encurtando ou favorecendo
modalidades de educação a distância) e reforçan-
do comportamentos ético-políticos adequados ao
consenso e a coesão social necessários à reprodu-
ção do capitalismo contemporâneo.

Segundo Maués (2003, p. 104) o objetivo maior de promover


a formação continuada, no processo de reforma, é

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a adaptação às exigências postas pelos governos,


que apresentam a necessidade de uma atualização
a esse novo mundo globalizado. [...] também como
uma forma de reparar as lacunas e as deficiências
da formação inicial [...]. Desta maneira a formação
contínua viria a contribuir, em certa medida, para
o aligeiramento da formação inicial, tendo em vista
que ela não atenderia às demandas sociais.

Percebemos, tanto em relação à política de formação inicial


quanto à continuada (ou em serviço), alguns encaminhamentos
constantes na política educacional brasileira. O primeiro deles re-
fere-se à profissionalização docente, que, estudada principalmente
por Shiroma e Evangelista (2003), mostra a estreita relação entre
Estado e gerencialismo. Segundo as autoras, há uma indicação cla-
ra, nas políticas educacionais, de que o Estado deve gerir o conjun-
to do magistério que deve ser por ele controlado. Para tanto, há a
necessidade de um “novo” profissional da Educação, cuja formação
tem papel definidor para torná-lo responsável, competente e com-
petitivo. Para tanto, são-lhes requeridas três habilidades, a técnica,
a gestão e a ação de forma empreendedora (SHIROMA; EVANGE-
LISTA, 2003), as quais fazem parte da racionalidade presente na
profissionalização.
A desintelectualização do professor é o segundo encami-
nhamento presente na política de formação de professores. Para
Shiroma (2003), a formação dos profissionais da educação vem
centrando-se em conceitos como competência, excelência, mérito
e produtividade, que são considerados conceitos capazes de “sedu-
zir” os profissionais da educação. Corrobora com tais conceitos a
centralidade na prática, indicada pelo MEC como oposição dire-
ta à teoria, que disponibiliza ao professor conhecimentos que lhe
possibilite improvisar, intuir e julgar as ações mais pertinentes ou
eficazes para solucionar problemas imediatos. Desses elementos,

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pode-se derivar a tese da desintelectualização do profissional da


educação, o que os torna práticos, dirimindo sua capacidade de in-
tervenção crítica.
Outro ponto que vem tomando centralidade nos encami-
nhamento políticos para a área é a certificação dos professores. É
possível observar, em vários documentos nacionais, o valor dado à
certificação referente tanto à formação inicial quanto à continuada.
Esse encaminhamento pode ser percebido quando o governo atrela
o rendimento escolar dos alunos diretamente à formação dos pro-
fessores. Porém, a política de avaliação de resultados desconsidera
outros fatores como as condições de trabalho desses profissionais
e mesmo qual formação lhe foi destinada (SHIROMA; SCHINEI-
DER, 2008). Essa certificação vem sendo atrelada à remuneração
(também denominada incentivo), que forja a fragmentação entre
os profissionais da educação, impulsionando o individualismo, a
lógica da meritocracia e a competição: “Nessa perspectiva, pode-
mos entender que essa lógica de formação, calcada na certificação,
procura avaliar e identificar os professores eficazes, com perfil e
‘competências’ capazes de melhorar o desempenho dos alunos”
(MICHELS; SHIROMA; EVANGELISTA, 2011, p. 31)
Todos esses fatores estão atrelados também à proposição
de que a formação de professores deve fazer com que esses pro-
fissionais atuem em um espectro cada vez maior de funções. Esse
profissional deve ser o mais flexível possível e o mais aberto às di-
versidades de sua profissão. Segundo Mello (apud EVANGELISTA;
TRICHES, 2008, p. 3), “Há um reconhecimento unânime de que
os desafios colocados à escola atualmente exigem do trabalho edu-
cativo um patamar profissional muito superior ao hoje existente, o
que sugere uma espécie de reinvenção da profissão docente”. Para
formar esse profissional, assistimos a uma proposição de formação
restrita teoricamente e alargada em relação a suas ações. Em sín-
tese, é necessário operar uma reconversão docente na qual o saber
teórico sucumbe ao saber fazer.

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Consideramos que esses sejam alguns dos elementos que


compõem o debate acerca da formação de professores, observan-
do-se, também, as particularidades no modo de apreender cada
um desses encaminhamentos observáveis nos diferentes níveis e
modalidades da educação, especificamente na Educação Especial.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com as análises aqui empreendidas, consideramos que os


“novos” encaminhamentos das políticas de Educação Especial
proferidos nos documentos legais e orientadores, nacionais e es-
taduais, contêm muitos elementos que, historicamente, compõem
a Educação e, especificamente, a Educação Especial. O mesmo
ocorre na política de formação de professores, tanto inicial como
continuada, na área da Educação Especial no Estado de Santa Ca-
tarina. Em ambos os casos, evidenciam-se as vertentes pedagógi-
cas presentes há muito tempo nessa área (a médico-pedagógica e
a médico-psicológica). Também se evidencia que as propostas de
formação continuada e de formação inicial voltada aos professores
que atendem os sujeitos da Educação Especial não rompem com o
que vem sendo indicado para os professores de maneira geral. Esse
fato fortalece as teses referentes à desintelectualização, instrumen-
talização, certificação e reconversão dos professores.
Isso significa que, mais uma vez na história, a formação de
professores está no centro das preocupações políticas, não para que
mudanças estruturais ocorram, mas para garantir mudanças que
possibilitem a manutenção das relações existentes. Formar o pro-
fessor da Educação Especial para assumir a perspectiva inclusiva
como a que possibilitará uma nova visão sobre as relações concre-
tas estabelecidas com os sujeitos da Educação Especial, sem tratar
de suas condições objetivas (que dizem respeito ao diagnóstico,

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mas principalmente às condições sociais e econômicas desses su-


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construção de um consenso em torno da formação de professores.
Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Federal de
Santa Catarina, Florianópolis, 2010.

Recebido: 10/12/2014
Aprovado: 11/12/2014

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.107-129, maio/ago. 2015 129
ISSN 2237-258X

FORMAÇÃO DE PROFESSORES NA
PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA
E OS PLANOS DE EDUCAÇÃO
Teacher training in the perspective of Inclusive
Education and education plans
Formación de profesores en perspectiva da
Educación Inclusiva y planes de educación

Mariza Borges Wall Barbosa de Carvalho1


Andrea de Jesus Lemos Sousa2

Resumo
Este texto consiste numa reflexão sobre políticas educacionais, enfocando
a formação de professores. Nele, discute-se as diretrizes políticas preco-
nizadas pela Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da
Educação Inclusiva, as orientações internacionais, a legislação vigente e a
Conferência Nacional de Educação, destaca-se a formação para a Educa-
ção Especial prescrita nos documentos citados e registra-se um breve his-
tórico da Educação Especial/Inclusiva maranhense e ludovicense. Além

1
Pedagoga, doutora em Educação e professora do Departamento de Educação
II e do Programa de Pós-Graduação em Educação/Mestrado em Educação da
Universidade Federal do Maranhão (UFMA). E-mail: mariwall@uol.com.br
2
Pedagoga. Possui especialização em Planejamento Educacional e em Psi-
copedagogia. É mestranda em Educação na Universidade Federal do Maranhão
(UFMA). E-mail:andrewsjdl@gmail.com

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.131-149, maio/ago. 2015 131
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disso, indicam-se as repercussões das políticas educacionais no atendi-


mento ao público-alvo da Educação Especial no Maranhão e na cidade
de São Luís e caracteriza-se a formação de professores nesses locais, a
partir da análise dos planos de educação – nacional, do estado do Mara-
nhão e do município de São Luís − e suas implicações para uma educação
pública para todos, inclusive os que apresentam deficiência, transtornos
globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação.

PALAVRAS-CHAVE: Políticas educacionais. Formação de professores.


Planos de educação.

Abstract
Reflections on educational policies focusing on the training of teachers.
It discusses political guidelines recommended by the National Policy for
Special Education in the Perspective of Inclusive Education, international
guidelines, the current legislation and the National Conference on
Education. It highlights the training for special education prescribed
in the cited documents. It registers a brief history of maranhense and
ludovicense special education / inclusive. It Indicates the impact of
educational policies in the care of special education target audience
in Maranhão and in São Luís. It features the training of teachers in
Maranhão, in general, and the city of São Luís, in particular. It analyzes
the education plans - national, from the state of Maranhão and from the
city of São Luís-MA and its implications for public education for ALL,
including those with disabilities, global developmental disorders and
high ability / giftedness.

KEYWORDS: Educational policies. Teacher training. Educación Plan.

Resumen
Reflexiones sobre las políticas educativas centradas en la formación de
profesores. Discute orientaciones políticas recomendadas por la Política
Nacional de Educación Especial en la Perspectiva de la Educación
Inclusiva, las directrices internacionales, la legislación vigente y la
Conferencia Nacional de Educación. Destacados capacitación para la
educación especial prescrita en los documentos citados. Únete breve
historia de la educación especial / Maranhão incluyente y ludovicense.
Indica el impacto de las políticas educativas en el cuidado de la educación

132 Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.131-149, maio/ago. 2015
ISSN 2237-258X

especial público objetivo en Maranhão y en St. Louis. Cuenta con la


formación de profesores en Maranhão, en general, y la ciudad de São
Luís, en particular. Analiza los planes educativos nacionales, - el estado
de Maranhão y la ciudad de São Luís-MA y sus implicaciones para la
educación pública para todos, incluidas las personas con discapacidades,
trastornos generalizados del desarrollo y la alta capacidad / superdotación.

PALABRAS CLAVE: Las políticas educativas. Formación del profesora-


do. Plan de Educación.

INTRODUÇÃO

A política educacional brasileira direcionada à Educação Es-


pecial adotou, nos últimos anos, a perspectiva inclusiva, segundo a
qual a escolarização dos alunos com deficiência, transtornos glo-
bais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação deve
ocorrer junto aos demais alunos nas salas de aula comum. Esse di-
recionamento traz mudanças importantes na organização das esco-
las e na formação dos profissionais da Educação.
A formação de professores assume um lugar importante no
debate sobre a inclusão na medida em que, nas escolas, os profes-
sores alegam não terem conhecimento sobre a área. Não podemos
deixar de considerar que, de fato, os cursos de graduação só mais
recentemente incluíram em seus currículos disciplinas ou conteúdos
referentes à Educação Especial, mas, se verificarmos a legislação, as
orientações de documentos internacionais e as diretrizes políticas,
encontraremos a necessidade de formação da comunidade escolar
para a inclusão. Também encontramos ações em âmbito nacional,
estadual e municipal de realização de cursos, como o Programa Edu-
cação Inclusiva: Direito à Diversidade e o curso sobre Atendimen-
to Educacional Especializado, ambos disseminados por todo o país.
Além disso, temos registros de realizações frequentes de formações,
principalmente para os professores da Educação Especial.

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ISSN 2237-258X

Neste trabalho, pretendemos discutir políticas educacionais


brasileiras, tendo como foco a formação de professores. A partir
da reflexão sobre o quadro nacional, nos deteremos no Estado do
Maranhão e no município de São Luís, nele localizado, problema-
tizando as repercussões das políticas brasileiras sobre a realidade
maranhense e ludovicense.

Políticas educacionais brasileiras e a Inclusão Escolar

A década de 2000 é profícua em iniciativas governamentais


para o alcance da almejada educação para todos. Dispositivos legais
foram instituídos visando garantir a implementação da inclusão;
neles, a formação de professores é contemplada de forma a atender
as demandas decorrentes da inclusão escolar dos alunos público-
-alvo da Educação Especial.
Em 2008, o Ministério da Educação (MEC), por intermédio
da Secretaria de Educação Especial (SEESP)3, publicou a Política
Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclu-
siva, documento que apresenta as principais diretrizes para a Edu-
cação Especial. Ela apresenta como objetivo:

assegurar a inclusão escolar de alunos com defi-


ciência, transtornos globais do desenvolvimento
e altas habilidades/superdotação, orientando os
sistemas de ensino para garantir: acesso ao ensino
regular, com participação, aprendizagem e conti-
nuidade nos níveis mais elevados do ensino; trans-
versalidade da modalidade de educação especial
desde a educação infantil até a educação superior;

3
Órgão governamental responsável pela Educação Especial que, em 2011, foi
extinto. A área tornou-se, então, responsabilidade da Diretoria de Políticas de
Educação Especial, setor da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização,
Diversidade e Inclusão (SECADI).

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ISSN 2237-258X

oferta do atendimento educacional especializado;


formação de professores para o atendimento edu-
cacional especializado e demais profissionais da
educação para a inclusão; participação da família
e da comunidade; acessibilidade arquitetônica,
nos transportes, nos mobiliários, nas comunica-
ções e informação; e articulação intersetorial na
implementação das políticas públicas (BRASIL,
2008, p. 14).

Podemos observar que o objetivo a que se propõe a Política


envolve exclusivamente a Educação Especial com caráter comple-
mentar ou suplementar ao ensino comum, omitindo referências
a atendimentos em ambientes segregados. Ela também procura
contemplar todos os níveis de ensino, a formação da comunidade
escolar, a participação da família, aspectos de infraestrutura a arti-
culação com outros setores. Além disso, destacamos as premissas
referentes à formação de professores:

Para atuar na educação especial, o professor deve


ter como base da sua formação, inicial e continua-
da, conhecimentos gerais para o exercício da do-
cência e conhecimentos específicos da área. Essa
formação possibilita a sua atuação no atendimen-
to educacional especializado e deve aprofundar
o caráter interativo e interdisciplinar da atuação
nas salas comuns do ensino regular, nas salas de
recursos, nos centros de atendimento educacio-
nal especializado, nos núcleos de acessibilidade
das instituições de educação superior, nas classes
hospitalares e nos ambientes domiciliares, para a
oferta dos serviços e recursos de educação espe-
cial [...] deve contemplar conhecimentos de gestão
de sistema educacional inclusivo, tendo em vista o
desenvolvimento de projetos em parceria com ou-
tras áreas, visando à acessibilidade arquitetônica,
os atendimentos de saúde, a promoção de ações

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ISSN 2237-258X

de assistência social, trabalho e justiça (BRASIL,


2008 p. 17-18).

Também percebemos, nas condições para atuação do pro-


fessor na Educação Especial, a exclusividade para a inclusão, sem
mencionar classes ou escolas especiais. Por outro lado, ao especifi-
car o professor, vemos a amplitude da formação exigida, o que, em
linhas gerais é um fator positivo. Porém, ao refletir sobre as atri-
buições do professor do Atendimento Educacional Especializado,
baseadas nessa formação, que são estabelecidas na Resolução CNE/
CEB n.º 04/2009, Carvalho (2012, p. 45) questiona:

Preocupa-nos, nesse artigo, o silêncio referente


a um trabalho em equipe. Afinal, terá o professor
condições para realizar todas as tarefas de planeja-
mento, execução, avaliação do funcionamento do
AEE, bem como a de estabelecer parcerias com ou-
tras áreas? Não será sobrecarregar esse profissional?

É importante registrar que o Decreto n.º 7.611/2011, que dis-


põe sobre a Educação Especial e o Atendimento Educacional Espe-
cializado prescreve formação para os profissionais da escola. Deve-
mos destacar que esse Decreto retorna com a referência à Educação
Especial, escolas e classes especiais.
Documentos internacionais também contemplam a forma-
ção de professores, como a Declaração de Salamanca, que conce-
be a formação adequada como um fator chave para a inclusão, e a
Convenção Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (2007,
p. 29), na qual se afirma que:

os Estados Partes tomarão medidas apropriadas


para empregar professores, inclusive professo-
res com deficiência, habilitados para o ensino da
língua de sinais e/ou do Braille, e para capacitar
profissionais e equipes atuantes em todos os níveis

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de ensino. Essa capacitação incor­porará a cons-


cientização da deficiência e a utilização de modos,
meios e formatos apropriados de comunicação
aumentativa e alternativa, e técnicas e materiais
pedagógicos, como apoios para pessoas com de-
ficiência.

Ainda compondo as políticas nacionais, temos a Conferência


Nacional de Educação (CONAE). Laplane e Prieto (2010, p. 929),
em suas análises, comentam:

Reconhece-se, assim, que não haverá inclusão


efetiva sem uma política de formação que inclua
questões de caráter pedagógico stricto sensu e
aborde princípios e valores de acolhimento às di-
ferenças, bem como a mudança de atitudes e es-
tratégias de combate ao preconceito e às manifes-
tações de discriminação.

Podemos verificar que temos um aparato legal que, embora


com ambiguidades e lacunas, favorece a inclusão de alunos com
deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habi-
lidades ou superdotação na escola. Medidas também estão sendo
tomadas para a sua efetivação; sabemos, porém, que elas ainda
não são suficientes e que necessitam de aprimoramento. Portanto,
devemos estar atentos para o monitoramento dessas medidas, de
forma que possamos contribuir para a conquista de uma educação
para todos, inclusive aos que apresentam deficiência.

A Educação Especial/Inclusiva no Maranhão e em São Luís

Os serviços de Educação Especial na Rede Pública Estadual


de Ensino do Maranhão foram oficializados em 1969. Na época,
as diretrizes políticas indicavam a integração como base dos aten-
dimentos e dos serviços predominantes na rede pública, as classes

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ISSN 2237-258X

especiais, e não foram criadas escolas especiais nessa rede. Já na Rede


Pública Municipal de Ensino da capital, São Luís, os serviços foram
instalados em 1993, no contexto da política nacional de “Educação
para Todos”, período em que já se discutia a inclusão, o que ocasio-
nou um atendimento mais relacionado ao ensino comum.
No que se refere à formação de professores, observou-se
a capacitação em nível médio em meados dos anos 1980. Hoje,
essa formação ocorre na pós-graduação latu sensu, presencial e a
distância, bem como em cursos promovidos pelas redes ou ins-
tituições da área. Grande parte dos professores do Atendimento
Educacional Especializado cursou a formação sobre esse aten-
dimento oferecida pelo MEC, nos últimos anos. Por outro lado,
na formação inicial, temos disciplinas de Educação Especial na
Universidade Federal do Maranhão e na Universidade Estadual
do Maranhão e em algumas instituições da Rede Privada de Ensi-
no, principalmente no curso de Pedagogia. Em pesquisa realiza-
da com professores de Atendimento Educacional Especializado,
constatou-se que a formação continuada na escola não foi mui-
to explorada, embora os participantes tenham destacado que as
necessidades das salas devem servir de base para essa formação
(CARVALHO; MELO, 2014).
O Maranhão elaborou o Plano Estadual de Educação (PEE),
bem como o município de São Luís, tendo como referência o Plano
Nacional de Educação (PNE). Como este é um instrumento essen-
cial para a política educacional, analisamos alguns aspectos impor-
tantes sobre a meta referente à Educação Especial, estabelecendo
uma relação entre eles e o PNE e ressaltando as referências à forma-
ção de professores. Inicialmente, observamos que, diferentemente
do PNE, tanto o PEE quanto o Plano Municipal de Educação (PME)
apresentam considerações a respeito da área, porém são insuficien-
tes para uma análise mais aprofundada da situação. A meta sobre
a Educação Especial é a meta 4 no PEE, enquanto o PME tem uma

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ISSN 2237-258X

estrutura diferente, sendo organizado por etapas e modalidades de


ensino, além de conter: diagnóstico socioeconômico e educacional
de São Luís; gestão democrática, participação popular e controle
social; valorização dos profissionais da educação; financiamento da
educação; e acompanhamento e avaliação do PME. Com exceção
dos itens sobre diagnóstico socioeconômico e acompanhamento e
avaliação, os outros estabelecem metas com uma numeração para
cada item, ou seja, o PME seguiu a estrutura do PNE de 2001-2010.
Vejamos as metas nos três planos:

Meta 4: universalizar, para a população de 4 (qua-


tro) a 17 (dezessete) anos com deficiência, trans-
tornos globais do desenvolvimento e altas habili-
dades ou superdotação, o acesso à educação bá-
sica e ao atendimento educacional especializado,
preferencialmente na rede regular de ensino, com
a garantia de sistema educacional inclusivo, de sa-
las de recursos multifuncionais, classes, escolas ou
serviços especializados, públicos ou conveniados
(BRASIL, 2014, p. 3, grifo nosso).

META 4: Garantir, para a população de 4 a 17 anos,


o atendimento escolar aos (às) alunos (as) com de-
ficiência, transtornos globais do desenvolvimento
e altas habilidades ou superdotação, de forma a
atingir, em cinco anos, pelo menos a 50% da de-
manda e até o final da década a sua universalização
nas escolas da rede regular de ensino, garantindo o
atendimento educacional especializado em salas de
recursos multifuncionais, ou em Centros de Aten-
dimento Educacional Especializado, públicos ou
comunitários, confessionais ou filantrópicos sem
fins lucrativos, conveniadas com o poder público
(MARANHÃO, 2013, p. 45, grifo nosso).

Universalizar para a população de 4 a 17 anos, o


atendimento educacional escolar aos estudantes

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.131-149, maio/ago. 2015 139
ISSN 2237-258X

com deficiência, transtornos globais do desenvol-


vimento e altas habilidades/superdotação na rede
regular de ensino (SÃO LUÍS, 2014, p. 56).

A meta de universalização do atendimento escolar ao públi-


co-alvo da Educação Especial é mantida no PME, e o PEE ado-
ta a meta de garantir o atendimento, seguindo o que foi proposto
no PNE de 2001-2010. O público-alvo é o mesmo nos três planos
(PNE, PEE, PME): alunos com deficiência, transtornos globais do
desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação; entretanto,
os serviços citados divergem: o PNE faz referência a classes, escolas
ou serviços especializados, enquanto o PEE e o PME não registram
esses serviços.
Para atingir a meta sobre Educação Especial, o PNE estabelece
19 estratégias, o PEE determina e o PME prevê 11 estratégias. Em li-
nhas gerais, as estratégias apresentadas nesses documentos abordam
serviços, formação de professores, financiamento, pesquisa, acessi-
bilidade arquitetônica, articulação intersetorial, participação da fa-
mília, elaboração de estatísticas, definição de indicadores de quali-
dade e política de avaliação e supervisão para o funcionamento de
instituições públicas e privadas. O PNE refere-se a escolas ou classes
especiais na estratégia sobre financiamento, reproduzindo o contido
no FUNDEB. Esses serviços também constam da estratégia de:

4.4) garantir atendimento educacional especiali-


zado em salas de recursos multifuncionais, clas-
ses, escolas ou serviços especializados, públicos
ou conveniados, nas formas complementar e su-
plementar, a todos (as) alunos (as) com deficiên-
cia, transtornos globais do desenvolvimento e
altas habilidades ou superdotação, matriculados
na rede pública de educação básica, conforme
necessidade identificada por meio de avaliação,
ouvidos a família e o aluno (BRASIL, 2014, p. 3,
grifo nosso).

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ISSN 2237-258X

Podemos observar ambiguidade quanto aos serviços: a Edu-


cação Especial apresenta um caráter complementar ou suplemen-
tar ao ensino comum, ou, em alguns casos, é substitutiva? Esse po-
sicionamento reflete a influência das instituições especializadas na
trajetória da Educação Especial brasileira. Por outro lado, a inser-
ção incondicional do público-alvo da Educação Especial nas salas
de aula junto aos demais alunos não é consenso entre especialistas.
Outra estratégia importante é a de:

apoiar a ampliação das equipes de profissionais


da educação para atender à demanda do processo
de escolarização dos (das) estudantes com defi-
ciência, transtornos globais do desenvolvimento
e altas habilidades ou superdotação, garantindo
a oferta de professores (as) do atendimento edu-
cacional especializado, profissionais de apoio ou
auxiliares, tradutores (as) e intérpretes de Líbras,
guias-intérpretes para surdos-cegos, professores
de Líbras, prioritariamente surdos, e professores
bilíngues (BRASIL, 2014, p. 3 ) .

Ressaltamos essa meta na medida em que não há um número


suficiente de profissionais para atender as necessidades da área de
Educação Especial, o que dificulta a expansão e consolidação da
inclusão escolar.
As estratégias concernentes à formação de professores con-
templam tanto a formação inicial quanto a continuada. Na forma-
ção inicial, propõe-se:

4.16) incentivar a inclusão nos cursos de licen-


ciatura e nos demais cursos de formação para
profissionais da educação, inclusive em nível de
pós-graduação, observado o disposto no caput
do art. 207 da Constituição Federal, dos referen-
ciais teóricos, das teorias de aprendizagem e dos
processos de ensino-aprendizagem relacionados ao

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ISSN 2237-258X

atendimento educacional de alunos com deficiên-


cia, transtornos globais do desenvolvimento e altas
habilidades ou superdotação (BRASIL, 2014, p. 3,
grifo nosso).

Destacamos a omissão sobre conteúdos referentes à política


e à história da Educação Especial no contexto da educação bra-
sileira, visto que, em disciplinas dessa natureza, há possibilidades
desses aspectos, quando abordados, não permitirem o aprofunda-
mento necessário. Quanto à formação continuada, é proposta uma
parceria com instituições conveniadas com o poder público para
a ampliação da oferta, a produção de material didático acessível e
a oferta de serviços de acessibilidade para alunos público-alvo da
Educação Especial da rede pública de ensino. Além disso, destaca-
-se a formação continuada de professores para o AEE.
Vemos, portanto, que o PNE contempla a formação de pro-
fessores, e que o aprimoramento de suas estratégias depende do
monitoramento e da avaliação das ações e programas.
Passaremos a discutir aspectos específicos do PEE e do PME.
No PEE, destacamos: a referência à qualificação profissional; os as-
pectos de infraestrutura, como a manutenção de equipamentos das
Salas de Recursos; a oferta de Educação de Jovens e Adultos (EJA)
diurno; a garantia de AEE em todos os municípios; a instituciona-
lização do AEE nos projetos políticos-pedagógicos das escolas; a
realização de concurso público; a criação de categorias profissio-
nais de cuidador, professor de AEE e professor mediador para AEE
de altas habilidades ou superdotação; o financiamento proveniente
do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica
e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB) para
a manutenção dos centros e núcleos de Atendimento Educacional
Especializado; e a criação de escola bilíngue para surdos.
Equipamentos são disponibilizados para as escolas procede-
rem à implantação de Salas de Recursos. Entretanto, durante o fun-
cionamento dessas salas, muitas vezes, surgem dificuldades quanto

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ISSN 2237-258X

à manutenção dos equipamentos, o que justifica uma estratégia que


possibilite o pleno funcionamento. A realização de concursos e a
criação das categorias profissionais citadas corresponde à estratégia
para apoiar a ampliação de equipes da Educação Especial prevista
no PNE e, possivelmente, possibilitará a ampliação da Educação
Especial/Inclusiva no estado, bem como a implantação de AEE em
todos os municípios. A ausência de informação do número de mu-
nicípios que oferecem esse atendimento demonstra o que foi dito
anteriormente sobre as considerações expostas no PEE não permi-
tirem uma avaliação aprofundada da situação da Educação Espe-
cial maranhense.
O financiamento para os centros e núcleos de Atendimento
Educacional Especializado é pertinente, na medida em que o Cen-
tro de Ensino de Apoio às Pessoas com Surdez “Maria da Glória
Costa Arcangeli” (CAS/MA), o Centro de Apoio Pedagógico ao
Deficiente Visual do Maranhão “Profa. Ana Maria Patello Salda-
nha’ (CAP/MA), o Núcleo de Atividades para Alunos com Altas
Habilidades/Superdotação “Joãozinho Trinta”, o Centro de Ensino
Especial “Helena Antipoff ” e o Centro de Ensino Especial “Pe João
Mohana” são instituições pertencentes à rede estadual que prestam
serviços de apoio à escolarização do público-alvo da Educação Es-
pecial envolvendo formação, avaliação diagnóstica, acompanha-
mento técnico pedagógico, apoio didático pedagógico, intérpretes
e instrutores de LIBRAS, além de oficinas pedagógicas e orientação
e encaminhamento profissional.
Outra estratégia importante é a que se refere ao projeto
político-pedagógico das escolas, pois, ainda que a legislação pres-
creva a institucionalização da oferta do AEE, muitas escolas não
atendem a todas as indicações presentes na Resolução CNE/CEB
n.º 04/2009. Segundo Carvalho (2012, p. 44),

um dos artigos que consideramos mais importan-


tes é o que diz respeito ao projeto pedagógico da

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ISSN 2237-258X

escola, porque materializa o reconhecimento dos


alunos com deficiência, transtornos globais do de-
senvolvimento e altas habilidades/ superdotação
como alunos da escola. Significa o comprometi-
mento da escola com todos os alunos.

A criação de uma escola bilíngue para surdos é específico do


PEE e do PME, pois o PNE menciona classes e escolas bilíngues,
porém não propõe a criação de uma escola.
A formação de professores é registrada explicitamente em
quatro das vinte e sete estratégias. Três delas são pertinentes à for-
mação continuada e uma, à formação inicial. Uma das estratégias
para formação continuada envolve diretamente a formação de pro-
fessores da Educação Especial e duas são dirigidas a professores
de forma geral. A de formação inicial indica parceria com a Uni-
versidade Federal do Maranhão (UFMA) ou com a Universidade
Estadual do Maranhão (UEMA) para a implantação de um curso
de Licenciatura plena em Letras/Libras e Pedagogia Bilíngue. Para
a formação continuada: 1) é previsto acompanhamento das Salas
de Recursos, envolvendo aspectos de infraestrutura, utilização de
recursos e a formação continuada; 2) garantia de financiamento de
cursos sobre braille, Libras, soroban, deficiência intelectual, trans-
tornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdo-
tação; e 3) formação para professores da Educação Básica que têm
alunos público-alvo da Educação Especial em suas salas de aula.
No PEE, é importante comentar a elaboração de estratégias
que foram baseadas em necessidades da Educação Especial mara-
nhense, ainda que não tenha sido feito um diagnóstico.
O PME também prevê a criação de uma escola bilíngue e, em
linhas gerais, propõe: a implementação de AEE na Educação Bá-
sica em todas as escolas da Rede Pública Municipal; a articulação
com a Educação de Jovens e Adultos, visando a inserção no mun-
do do trabalho; a garantia de profissional cuidador; a inclusão da

144 Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.131-149, maio/ago. 2015
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Libras no currículo da Educação Básica e e avaliação institucional


de aprendizagem visando levantar subsídios para a gestão da polí-
tica educacional da área.
Das estratégias propostas, destacamos a avaliação para sub-
sidiar a gestão da política educacional, medida importante no pro-
cesso de formulação e de implementação de políticas. Não encon-
tramos especificamente formação de professores, mas podemos
inferir que está inserida nas estratégias de:

assegurar o acesso, permanência e qualidade do


atendimento dos estudantes público alvo da edu-
cação especial nas escolas da rede pública muni-
cipal em tempo parcial ou integral, conforme es-
tabelecido em lei, e em parceria com a família, a
comunidade, os órgãos públicos de assistência so-
cial, saúde e proteção à infância, adolescência e à
juventude, no redimensionamento e na execução
do projeto político pedagógico das escolas. [...]

implementar o sistema de avaliação institucional


e de aprendizagem junto as instituições públicas e
privadas que prestam atendimento aos estudantes
público alvo da educação especial, aperfeiçoando os
mecanismos de acompanhamento pedagógico, para
torná-lo instrumento efetivo de planejamento, inter-
venção administrativa e pedagógica, acompanha-
mento e gestão da política educacional da educação
especial (SÃO LUÍS, 2014, p. 57, grifo nosso).

Também encontramos na exposição das considerações:

o planejamento e a melhoria consistente e contí-


nua da estrutura e funcionamento do sistema de
ensino, com vistas a uma qualificação crescente do
processo pedagógico para a educação na diversida-
de, implica em ações de diferentes naturezas – nos
âmbitos político, técnico-científico, pedagógico

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e administrativo, já sinalizados nas Diretrizes Na-


cionais da Educação Especial para a Educação Bá-
sica (SÃO LUÍS, 2014, p. 55).

A Superintendência da Área de Educação Especial, setor da


Secretaria de Educação do Município de São Luís, responsável pela
Educação Especial, tem promovido oportunidades de formação,
tanto para professores da área quanto para os demais professores
da rede (CUNHA et al, 2012). Também como uma ação voltada
para formação de profissionais da educação, podemos citar que São
Luís é um dos municípios polo do Programa Educação Inclusiva:
Direito à Diversidade.
A partir disso, verificamos que as estratégias apresentadas no
PME foram muito genéricas, necessitando que suas diversas ações
fossem mais bem detalhadas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O fortalecimento da inclusão dos alunos público-alvo da


Educação Especial nas escolas brasileiras provocou um redirecio-
namento na área educacional. Dentre as medidas a serem planeja-
das e implementadas, destaca-se a formação de professores.
Os dispositivos legais vigentes, embora com lacunas e ambi-
guidades, favorecem a inclusão escolar de alunos com deficiência,
transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou super-
dotação. Entretanto, a legislação é apenas um dos elementos impor-
tantes e necessários; outro aspecto a ser considerado é a formulação,
implementação e avaliação de ações e programas que atendam às de-
mandas provocadas pela perspectiva da Educação Inclusiva.
A Educação Especial conquistou uma projeção relativa na
política educacional brasileira e, principalmente, desde a promul-
gação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN)

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n.º 9.394/1996 tem sido contemplada nas diversas leis, programas e


ações do poder público, porém, não podemos ignorar que os pro-
blemas da educação também atingem a área, em alguns casos, em
maiores proporções, como é o caso da universalização da educa-
ção. Enquanto temos, praticamente, a universalização do Ensino
Fundamental, no que diz respeito à educação do público-alvo da
Educação Especial, ainda não temos dados que representam a taxa
de escolarização.
A Infraestrutura das escolas, as condições de trabalho, o salá-
rio e a formação dos professores, a organização das escolas, a gestão
das políticas educacionais e o financiamento são outros desafios a
serem enfrentados para a conquista da educação pública, gratuita
e de qualidade para todos, inclusive as que apresentam deficiência,
transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou su-
perdotação. Muito já caminhamos para, hoje, estarmos discutindo
avanços para a inclusão; houve melhoria nos indicadores educa-
cionais, contudo, ainda há muito para ser feito, haja visto que a
educação mantém problemas antigos.
Um Plano Nacional de Educação foi aprovado recentemente
e, especificamente no caso do Maranhão, este já possui o Plano Es-
tadual e o Plano Municipal de São Luís. É importante, entretanto,
que haja a participação da população no acompanhamento da im-
plementação do plano, discutindo e problematizando as estratégias
postas para que possamos ter, enfim, uma educação para todos, de
direito e de fato.

REFERÊNCIAS

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ção Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. Disponível em:
<www. mec.gov.br>. Acesso em 07 jan. 2010.

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em: <http://www.cedes.unicamp.br>. Acesso em: 17 dez. 2014

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2013. Disponível em: <http://www.educacao.ma.gov.br/Documen-
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mar. 2014.

SÃO LUÍS. Plano Municipal de Educação de São Luís – 2014/2023:


Versão preliminar.

Disponível em: <http://www.saoluis.ma.gov.br/custom_files/File/


PME%20-%20versao%20preliminar.pdf>. Acesso em 05 mai. 2014.

Recebido: 10/12/2014
Aprovado: 11/12/2014

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A FORMAÇÃO DOS PROFESSORES


ESPECIALIZADOS SEGUNDO OS
PESQUISADORES DO OBSERVATÓRIO
NACIONAL DE EDUCAÇÃO ESPECIAL
Specialized teachers’ training according to national
observatory of special education researchers
La formación de los maestros especializados según los
investigadores del observatorio nacional de educación especial

Enicéia Gonçalves Mendes1


Leonardo Santos Amâncio Cabral2
Sabrina Mazo D’Affonseca3
David dos Santos Calheiros4

Resumo
No Brasil, é imperativo legal que a oferta do Atendimento Educacional Es-
pecializado (AEE) seja realizada preferencialmente nas Salas de Recursos

1
Possui pós-doutorado pela SORBONNE-UNIVERSITE PARIS V - RENE
DESCARTES. É Doutora em Psicologia pela Universidade São Paulo (USP), e
professora adjunta da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).
E-mail: egmendes@ufscar.br
2 Professor da Universidade de Grandes Dourados. Possui pós-doutorado em
Educação Especial pelo Programa de Pós-Graduação em Educação Especial da
Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).
E-mail: leonardo_educa@yahoo.com.br
3
Pós-doutoranda em Educação Especial pelo Programa de Pós-Graduação em
Educação Especial da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).
E-mail: samazo@hotmail.com
4
Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Educação Especial da
Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). E-mail: david_calheiros@yahoo.com

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Multifuncionais (SRM) por um profissional que possua formação inicial


em curso de licenciatura e/ou pós-graduação na área da Educação Espe-
cial. Todavia, evidenciam-se as escassas oportunidades de formação em
Educação Especial, no Brasil, e a complexidade do papel atribuído a esse
profissional no desempenho de múltiplas funções. Frente a isso, questiona-
-se: qual é a formação dos profissionais que estão sendo envolvidos nas ati-
vidades das SRMs no Brasil? Para responder a essa questão, uma pesquisa
foi realizada no âmbito do Observatório Nacional de Educação Especial
(ONEESP), com base em encontros de grupos focais com 466 professores/
gestores da Rede de Ensino de 38 municípios brasileiros. O presente tra-
balho sistematiza e sintetiza os achados de diferentes estados, conforme
relatados pelos pesquisadores do ONEESP, que coletaram esses dados e
os apresentaram durante o III Encontro Nacional do ONEESP, realizado
em 2013. Em síntese, constou-se que os professores indicaram não so-
mente lacunas, mas possibilidades de caminhos que direcionam para a
melhoria na qualidade da formação inicial e continuada de professores
especializados, e recomendaram especial atenção para a motivação desses
profissionais para ingresso na carreira, além da necessidade de melhora
na definição do papel de todos os atores envolvidos na dinâmica escolar
e social para a promoção da inclusão escolar das pessoas que compõem o
público-alvo da Educação Especial.

PALAVRAS-CHAVE: Educação Especial. Formação de professores. Sa-


las de Recursos Multifuncionais.

Abstract
In Brazil, the Specialized Service in Educational (AEE) should rather
be offered in Multifunction Resource Room (SRM) by a graduated
professional with at least one postgraduate course in the field of Special
Education. However, in Brazil there are little training opportunities in
Special Education and the role assigned to this professional is complex
and involves multiple functions. So one question that arises is: What is
the training of professionals working in SRM in Brazil? As part of the
National Observatory of Special Education, the present study had as
main objective, systematize and analyze the results of the focus groups
presented in III ONEESP. These groups involved 466 teachers/managers
educational system of 38 municipalities all over the country. In this paper
the findings of different states of Brazil were systematized and summarized,

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as reported by Oneesp’s researchers who collected data presented at IIIº


National ONEESP Meeting held in 2013. Results showed that teachers
indicated both gaps and possible paths to improve specialized teachers’
initial and continuing training quality, and recommended special
attention to the role of these professionals’ motivation in the beginning
of career and the need to improve the role definition of all actors involved
in the school and social dynamics in order to promote school inclusion of
target public of Special Education.

KEYWORDS: Special education. Teacher training. Multifunction Re-


sources Rooms.

Resumen
En Brasil constituye una normativa legal que la oferta de Atención
Educacional Especializada (AEE) se realice, preferencialmente, en las
Salas de Recursos Multifuncionales (SRM) y por un profesional que
posea formación inicial en un curso de licenciatura, con pos graduación
en Educación Especial. Sin embargo, aún son evidentes las escasas
oportunidades de formación en la Educación Especial en Brasil, así como
la complejidad del rol atribuido a ese profesional en el desempeño de
múltiples funciones. Ante esta situación se formula el cuestionamiento
siguiente: ¿cuál es la formación de los profesionales envueltos en las
actividades de las SRM en Brasil? En el ámbito del Observatorio Nacional
de Educación Especial, la presente pesquisa tuvo, como objetivo principal,
sistematizar y analizar el contenido de los grupos focales presentados
en el III ONEESP. Los referidos grupos incorporaron a 466 profesores/
gestores de la Red de Educación de 38 municipios brasileiros. Como
resultado, los profesores indicaron no solamente lagunas sino posibles
caminos que nos guíen para la mejora en la calidad de la formación inicial
y continuada de nuestros profesores, teniéndose presente la motivación
de esos profesionales y, a su vez, la definición concreta de su papel y el
de los demás actores envueltos en la dinámica escolar y social como un
todo, para la promoción de la inclusión de las personas que componen el
público objeto de la Educación Especial.

PALABRAS CLAVE: Educación especial. Formación del profesorado.


Salas De Recursos Multifuncionales.

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ISSN 2237-258X

INTRODUÇÃO

Muito embora se perceba, em nível nacional, o aumento no


índice de matrículas de estudantes que possuem deficiência, trans-
tornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou super-
dotação nas classes comuns das escolas regulares, a escolarização
desse público da Educação Especial ainda se mantém fragilizada.
No caso do processo de ensino-aprendizagem, fatores como a ino-
perância dos órgãos diretivos, o preconceito, as barreiras arquite-
tônicas e de comunicação e a ausência e/ou precariedade de for-
mação docente, em seus diferentes níveis de ensino, prejudicam
significativamente a participação com sucesso no cenário escolar
(CAPELLINI; RODRIGUES, 2009; CHACON, 2004; MONTEIRO;
MANZINI, 2008; SANTOS, 2011).
No intuito de contribuir para melhorar a qualidade do apoio
necessário para a educação do público-alvo da Educação Especial
(PAEE), foi publicado o Decreto n.º 7.611/2011 , que dispõe sobre a
oferta do Atendimento Educacional Especializado (AEE), definido
“como um conjunto de atividades, recursos de acessibilidade e pe-
dagógicos organizados institucional e continuamente, prestado de
forma complementar ou suplementar à formação dos educandos
(BRASIL, 2011). Esse AEE deve ser oferecido preferencialmente em
Salas de Recursos Multifuncionais, no contra-turno escolar do edu-
cando, sob a responsabilidade de um profissional que possua forma-
ção inicial em um curso de licenciatura e/ou uma pós-graduação na
área da Educação Especial.
São, por exemplo, atribuições do(a) professor(a) do AEE:

Desenvolver atividades do AEE, de acordo com as


necessidades educacionais específicas dos alunos,
tais como: ensino da Língua Brasileira de Sinais
– Libras; ensino da Língua Portuguesa como se-
gunda língua para alunos com deficiência auditiva

154 Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.151-168, maio/ago. 2015
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ou surdez; ensino da Informática acessível; ensino


do sistema Braille; ensino do uso do soroban; en-
sino das técnicas para a orientação e mobilidade;
ensino da Comunicação Aumentativa e Alternati-
va - CAA; ensino do uso dos recursos de Tecno-
logia Assistiva - TA; atividades de vida autônoma
e social; atividades de enriquecimento curricular
para as altas habilidades/superdotação; e ativida-
des para o desenvolvimento das funções mentais
superiores (BRASIL, 2010, p. 5).

Assim, o professor do AEE deve ter conhecimentos muito


amplos e diversificados, o que lhe permite questionar se a formação
acadêmica desse profissional está à altura dessas exigências, pois isso
afeta a efetivação do que é preconizado para o AEE.
De fato, embora se tenha clareza sobre a importância de um
serviço de apoio ao processo de escolarização do PAEE, não se
sabe como o AEE tem funcionado na prática. O presente relato,
desenvolvido no contexto do Observatório Nacional de Educação
Especial (ONEESP), tem por objetivo, portanto, analisar um dos
aspectos desse serviço das SRM, que é a questão da formação de
professores responsáveis por tais serviços.

O Projeto ONEESP

No período de 2005 a 2011, foram distribuídas pelo MEC


recursos para a criação 37.801 Salas de Recursos Multifuncionais
(SECADI, 2012). Considerando a novidade dessa proposta de im-
plantação desses serviços no contexto brasileiro e o crescimento do
número de SRM em todo o país, um grupo de pesquisadores cons-
tituiu o Observatório Nacional de Educação Especial (ONEESP),
uma rede nacional de pesquisadores para produzir estudos integra-
dos sobre políticas e práticas direcionadas para a questão da inclu-
são escolar na realidade brasileira. No estudo inaugural, o ONEESP

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ISSN 2237-258X

se propôs a investigar limites e possibilidades que oferecem a SRM


como serviço de apoio para todos os tipos de alunos do público-al-
vo da Educação Especial. O projeto enfocou três eixos para avaliar
essa política: a) o processo de avaliação do aluno da SRM (identi-
ficação, planejamento e desempenho); b) a formação inicial e con-
tinuada dos professores que atuam nas SRM; e c) a organização e o
funcionamento das SRM.
No âmbito da Federação, foi constituída uma rede nacional
de pesquisa composta por até três pesquisadores por estado. Na es-
fera dos estados, foram propostas redes estaduais de pesquisa com
pesquisadores das universidades interessados em conduzir estudos
em sua localidade. Ao nível dos municípios, a proposta envolveu os
pesquisadores das universidades que integravam a rede estadual, os
professores de SRM e os gestores municipais da Educação Especial.
O estudo foi desenvolvido simultaneamente em municípios
de 19 estados e envolveu entrevistas individuais com 36 gestores e
com grupos focais compostos por cerca de 450 professores de SRM,
além de uma survey nacional com aproximadamente 1200 profes-
sores de SRM. Ao longo do estudo, foram realizados quatro encon-
tros dos pesquisadores da rede nacional, sendo os dois primeiros
para definir e discutir a metodologia e os dois últimos visando a
socialização dos resultados obtidos nos estados e municípios.
O presente relato teve como fonte de coleta de dados os tra-
balhos apresentados pelos pesquisadores sobre a temática da for-
mação de professores no III Encontro do Observatório Nacional
de Educação Especial (EONEESP), realizado no ano de 2013 pela
Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) em parceria com a
Universidade de São Paulo (USP). Ao todo, foram apresentados
pelos pesquisadores 64 trabalhos, que foram publicados nos anais
do evento em um CD-ROM. Para a revisão sistemática dessa li-
teratura, foram adotados como critérios para a identificação dos
trabalhos pertinentes a esta revisão (BARBOSA, 2013): 1) critérios

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de inclusão: todos os artigos que continham a expressão (ou as ex-


pressões) “formação de professor” no título, resumo ou palavra-
-chave, e/ou que abordassem o tema da formação de professores
no corpo do artigo; e 2) Critérios de exclusão: todos os artigos que
não referiram utilizar a pesquisa colaborativa e a técnica de gru-
po focal (adotada pelo Projeto ONEESP) na metodologia e os que
tratavam de populações específicas (tipos de deficiência) ou os que
direcionavam a formação de professores para aspectos específicos,
tais como a utilização de recursos de apoio a escolarização (Tecno-
logia Assistiva e Comunicação Alternativa).
Após a análise dos 64 artigos publicados no III EONEESP,
verificou-se que 26 deles (40,62%) atendiam aos critérios de sele-
ção previamente estabelecidos e, por isso, constituíram o corpus de
análise desta pesquisa. É importante considerar que os resultados
aqui apresentados e analisados se referem aos resultados relatados
por cada equipe de pesquisadores envolvidos no ONEESP, os quais
envolveram, no total, professores e gestores da Rede de Ensino de
38 municípios brasileiros nas seguintes proporções: 56,65% eram
do Sudeste; 15,88%, do Nordeste; 10,51%, do Sul; 8,79%, do Norte;
e 8,15%, do Centro-Oeste.
A seguir, serão apresentados alguns dos principais resultados
relatados pelos pesquisadores sobre a formação de professores das
SRM durante o III Encontro do ONEESP.

Formação inicial de professores das Salas de Recursos


Multifuncionais

No que tange à formação inicial dos professores que atuam


nas SRM dos diferentes municípios pesquisados, pode-se afirmar,
com base nos relatos dos pesquisadores do ONEESP que contem-
plaram essa informação, que a maioria desses profissionais possuía
formação inicial de nível superior completo, com prevalência nos

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ISSN 2237-258X

cursos de Pedagogia (49%), Letras (16%), Educação Especial (14%),


Artes Visuais/Educação Artística (11%) e Outros (10%). Todavia,
identificou-se que grande parte dos professores considera que seus
cursos de formação inicial não tenham oferecido subsídios teóricos
e/ou metodológicos para o trabalho quotidiano junto ao conjunto
dos alunos que compõem o público-alvo da Educação Especial.

Comecei a botar um aluno na escola para depois


formar o professor. Eu não formei o professor para
depois colocar o aluno. Então, a inclusão aconte-
ceu antes da formação. (...) Mas, se não tivesse
sido feita assim, não iria acontecer (AMORIM;
COSTA, 2013).

Há queixas em relação à formação inicial recebida, mesmo


por parte daqueles que fizeram habilitação especifica na área, a res-
peito da complexidade das atribuições do professor de AEE, con-
siderando-se que eles não obtiveram conhecimentos tão amplos e
diversificados que pudessem sustentar com efetividade a prática
profissional do AEE.

A formação inicial dessas professoras é de ensino


superior, divididas entre os cursos de Pedagogia
Licenciatura, Educação Física, e Letras Português/
Espanhol, sendo que a maior parte era em Pedago-
gia (75%). [...] Outra questão apontada unanime-
mente pelos professores foi o fato de não se senti-
rem aptos para oferecer o AEE em sala de recur-
sos para alunos de qualquer nível, como também,
para qualquer tipo de aluno (diversas deficiências)
(ANJOS; CARVALHO, 2013, p. 12).

A formação inicial foi uma questão problematiza-


da pelas professoras, segundo elas as licenciaturas
e mesmo o curso de pedagogia não ofereceram
subsídios teórico-metodológicos para auxiliá-las

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no trabalho dos alunos com necessidades educa-


cionais especiais (SILVA; TARTUCI, 2013, p. 07).

Professores de SRM se queixam, também, da falta de oportu-


nidades de formação para seus colegas professores das classes co-
muns, que, no decorrer dos cursos de graduação, não constroem
saberes relativos ao processo educativo de pessoas com deficiência,
ainda que sua oferta seja prioritária e recomendada pela Portaria
n.º 1793/1994 para os cursos de Pedagogia, Psicologia e em todas
as licenciaturas, segundo Chacon (2004):

É consenso a importância de que os cursos de gra-


duação, sobretudo os de formação de professores,
incluam conteúdos e disciplinas na área das neces-
sidades educacionais especiais em suas matrizes
curriculares, mesmo que isso, por si só, não garan-
ta a qualidade profissional dos futuros professores,
nem a inclusão escolar dos alunos que apresentam
necessidades educacionais especiais. Entretanto, a
inexistência de espaços no currículo para se abor-
dar essa temática é mais um agravante, para não se
concretizar uma reeducação inclusiva a esse alu-
nado (FREITAS; MOREIRA, 2011, p. 70).

Assim, a formação inicial do professor ainda não atende


às demandas da escola e dos sujeitos da Educação Especial, nem
quando se considera professores supostamente “especializados”,
nem na formação de professores regentes do ensino comum.

Formação continuada de professores das Salas de Recursos


Multifuncionais

Em relação à formação continuada, foi constatado que, no


conjunto dos relatos dos pesquisadores que contemplaram essas
informações, a maioria dos professores de SRM (67%) possuía

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cursos de especialização na área de Educação Especial e/ou áreas


afim (como Psicopedagogia, Educação Infantil e Gestão Escolar).
Em todos os 38 municípios explorados pelos pesquisado-
res estaduais do ONEESP autores dos 26 trabalhos relatados, foi
identificada a existência de cursos de formação continuada oferta-
dos aos professores, tanto pelo Ministério de Educação e Cultura
(MEC) quanto pelas Secretarias Municipais de Ensino. Entretanto,
os professores que fizeram tais cursos se declararam, na maioria
das vezes, insatisfeitos com o modelo dos programas de formação
oferecidos, por tenderem a privilegiar atividades teóricas, delegan-
do aos professores a responsabilidade de articular a teoria com sua
prática quotidiana nas SRM.
Adicionalmente, em vários municípios foi questionada a fal-
ta de preocupação dos gestores dos cursos em adequar as ativida-
des de formação ao tempo de experiência dos professores atuantes
nas SRM. Isso retrata, portanto, a falta de planejamento ou de uma
proposta de curso articulada às necessidades e à realidade desses
profissionais e, com isso, vê-se a necessidade da ativa participação
dos professores na elaboração das propostas de formação, na pos-
sibilidade de discussão sobre os casos reais que tais profissionais já
atendem, bem como no envolvimento de atividades de formação
em tecnologias educacionais específicas.
Os estudos indicam que, mesmo quando os professores aten-
dem aos critérios mínimos exigidos para atuar no AEE, estes ainda
não possuem formação adequada para atender a complexidade das
demandas de um professor polivalente, que atue nos diferentes ní-
veis de ensino, que saiba utilizar diferentes recursos de Tecnologia
Assistiva (TA) e que atenda as diferentes necessidades educacionais
dos educandos com deficiência, transtornos globais do desenvolvi-
mento e altas habilidades ou superdotação. Para ratificar essa in-
formação, apresentamos, a seguir, os excertos de um dos trabalhos:

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Aponta-se a dificuldade em garantir a formação de


um professor polivalente, com conhecimentos so-
bre todas as necessidades educacionais especiais e
os diferentes níveis de educação, e a estrutura físi-
ca para o funcionamento dessas salas, o desconhe-
cimento dos recursos de TA e as condições e a va-
lorização do trabalho das professoras (TARTUCI
et al., 2013, p. 1).

Cabe destacar que as Secretarias de Educação e o Ministério


da Educação têm procurado resolver essa problemática da forma-
ção docente; o procedimento utilizado, em maior escala, tem sido
o da formação continuada, oferecida nas modalidades presencial e
à distância (BRASIL, 2011). Porém, os resultados dessas formações
têm causado poucas mudanças na prática pedagógica do professor,
pois se encontram longe e em desarticulação com a real necessida-
de profissional e cotidiana do serviço de Atendimento Educacional
Especializado, como mostram as pesquisas do ONEESP realizadas
com os próprios professores de Salas de Recursos de municípios
dos estados de Sergipe, Alagoas, Rio de Janeiro, São Paulo, Pará,
Goiás, entre outros. (ANJOS; CARVALHO, 2013; BARBOSA,
MERCADO; FUMES, 2013; DAMASCENO; PEREIRA; ANDRA-
DE, 2013; FUMES et al., 2013; MILANESI, 2013; OLIVEIRA et al.,
2013; RABELO; OLIVEIRA, 2013; SANTOS et al., 2013; SILVA;
PEREIRA, 2013; SILVA; SANTOS; FUMES, 2013; SILVA; TARTU-
CI, 2013; TARTUCI et al., 2013).
Na tentativa de melhorar essa condição da formação conti-
nuada, determinados(as) autores(as) sugerem modificações na or-
ganização e na execução desses cursos, conforme se pode observar
nos fragmentos seguintes:

As professoras participantes consideravam que as


ações de formação continuada, oferecidas pelas
Secretarias de Educação (do seu Estado e do seu

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ISSN 2237-258X

Município) deveriam ter um caráter mais práti-


co, com discussões pautadas em estudos de casos,
pesquisa de campo e com a valorização da ativida-
de profissional como momento de (re)construção
(SILVA; SANTOS; FUMES, 2013, p. 8).

Sobre a formação continuada relacionada à prepa-


ração para atender a todos os alunos que são enca-
minhados à SRM, houve uma inquietação diante da
questão e unanimemente concordaram que não es-
tão preparados para lidar com a complexidade das
demandas apresentadas pelos estudantes. A neces-
sidade de uma formação continuada partindo de
estudos de casos com outros colegas que também
fazem AEE, ou seja, a formação continuada perpas-
sando pela auto-formação foi também um ponto
comentado (SANTOS et al., 2013, p. 7).

Além disso, os processos de formação continuada


têm que considerar as diferentes etapas do desenvol-
vimento profissional, pois as necessidades e desafios
do professor, que está iniciando sua carreira docente,
não são iguais às do professor que já está na prática
em sala de aula e também não são iguais às do pro-
fessor que já está se encaminhando para o final de
carreira docente (ANJOS; CARVALHO, 2013, p. 11).

Nota-se, nesses recortes, que a formação continuada deve


estar atenta às diferentes etapas do desenvolvimento profissional,
direcionada para situações práticas e que possibilite um espaço fa-
vorável para o diálogo sobre as práticas e experiências pedagógicas
com outros professores que atuam no AEE, oportunizando, assim,
um ambiente propício para a colaboração entre pares.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os resultados alcançados com as pesquisas apresentadas no


III EONEESP, de modo geral, confirmam os achados de outros

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ISSN 2237-258X

estudos realizados em âmbito nacional, e apontam para a precarie-


dade da formação do docente que atua nas SRM, as incertezas do
próprio professor quanto a se sentir apto para o designo da fun-
ção de professor do AEE, a inexpressiva contribuição dos cursos de
formação continuada, sobretudo aqueles ofertados na modalidade
à distância financiados pelas Secretarias de Educação e pelo Minis-
tério da Educação.
Como exposto, a opção política do Ministério de Educação é
a de priorizar o serviço de Atendimento Educacional Especializado
(AEE) na chamada Sala de Recursos Multifuncionais como uma
espécie de “serviço tamanho único para alunos de todas as idades
e condições”. Tal sistema de apoio traz razoáveis desafios para a
realidade brasileira, porque os professores especializados terão a
responsabilidade de responder, em uma ou duas horas de atendi-
mento, em turno alternado, às necessidades diferenciadas das mais
variadas crianças, que, em geral, chegam à escola só aos seis anos
de idade, sem requisitos mínimos e já com atrasos consideráveis no
desenvolvimento.
A análise da formação de professores de Salas de Recursos
Multifuncionais, a partir das publicações de trabalhos dos pesqui-
sadores por ocasião do III EONEESP, realizado em 2013, propor-
cionou compreender que a literatura científica nacional relata um
cenário de preocupação pelo despreparo dos professores que atuam
no serviço de Atendimento Educacional Especializado, associado à
inexpressiva contribuição que os cursos de formação inicial e con-
tinuada têm aportado para minimizar esta situação.
Os professores que estão assumindo essa sala se dizem des-
preparados para assumir tamanha variedade de alunos em termos
de idade, tipos de impedimento, exigências curriculares, etc. Eles
demandam mais formações especificas da área, para aprender, por
exemplo, sobre Tecnologia Assistiva, Libras, Comunicação Alter-
nativa, Braille, orientações e mobilidade, etc. Os problemas são

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.151-168, maio/ago. 2015 163
ISSN 2237-258X

interpretados como falta de formação em geral, ou seja, os profes-


sores assumem para si a culpa pelas dificuldades em fornecer apoio
à escolarização do público-alvo da Educação Especial e creem que,
um dia, se fizerem muitos cursos, se sentirão aptos a lidar com
qualquer tipo de aluno do público-alvo da Educação Especial. Es-
ses professores, por outro lado, parecem não questionar, a princí-
pio, se é possível e viável formar um professor tão polivalente quan-
to a política recomenda, e, também, não questionam se este tipo de
serviço de apoio “tamanho único” pode satisfazer as necessidades
de todo o público-alvo da Educação Especial.
Os resultados permitem concluir, ainda, que deve haver uma
mudança na Política de Atendimento Educacional Especializado,
que atribui ao professor da Sala de Recursos a função de principal
personagem responsável pela inclusão escolar, o grande articulador
de uma missão que deve ser de toda a escola. Atribuir aos professo-
res do AEE a responsabilidade pela inclusão escolar é como agen-
dar um casamento sem avisar o parceiro.
Assim, os dados apontam para uma urgente necessidade de
reestruturação nos modelos de formação inicial e continuada, de
professores do ensino comum e da Educação Especial, para a cons-
trução de escolas mais inclusivas, já que as pesquisas apontam, na
opinião dos próprios docentes, que os cursos de licenciaturas, de
especialização, extensão ou aperfeiçoamento não estão conseguindo
atender com efetividade as demandas de alunos com ou sem Neces-
sidades Educacionais Especiais. Entretanto, no caso da formação do
professor de Educação Especial, há que se considerar a necessidade
de se repensar como deve ser a organização de diferentes tipos de
serviços de apoio, a fim de se definir o perfil e se pensar em como
deve ser a formação inicial e continuada desses professores.
Concluindo, se pensarmos em mudanças na formação, sem
mudar o modelo de serviço de apoio baseado exclusivamente nas
Salas de Recursos Multifuncionais, os problemas da formação irão

164 Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.151-168, maio/ago. 2015
ISSN 2237-258X

permanecer, uma vez que a inclusão escolar requer reestruturação


da organização escolar, e não apenas a criação de um espaço físico
e social, a Sala de Recursos, para acomodar a diferença, enquanto a
escola permanece inalterada e onde o único elemento multifuncio-
nal é um professor afeito apenas com as supostas diferenças centra-
das em seus alunos.

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EDUCAÇÃO ESPECIAL, 3., 2013, São Paulo. Anais... São Paulo:
UFSCar/USP, 2013.

Recebido: 10/12/2014
Aprovado: 11/12/2014

168 Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.151-168, maio/ago. 2015
ISSN 2237-258X

ASPECTOS DA FORMAÇÃO DE
PROFESSORAS DE SALAS DE RECURSOS
MULTIFUNCIONAIS NO MUNICÍPIO
DE DOURADOS-MS 1

Aspects of Multifunctional Resource Classrooms


teachers training in Dourados-MS
Aspectos de la educación del profesorado de Salas del
Recursos Multifunción en la ciudad de Dourados-MS

Morgana de Fátima Agostini Martins2


Aline Maira da Silva3
Hellen Cristiey Batista de Melo4

1
Apoio financeiro: CAPES.
2
Doutora em Educação Especial pela Universidade Federal de São Carlos
(UFSCar). É professora adjunta do curso de Pedagogia e do Programa de Pós
Graduação em Educação da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD)
e membro do Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação Inclusiva (GEPEI/
UFGD). E-mail: morganamartins@ufgd.edu.br
3
Doutora em Educação Especial pela Universidade Federal de São Carlos
(UFSCar). É professora adjunta do curso de Pedagogia e do Programa de Pós
Graduação em Educação da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD)
e membro do Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação Inclusiva (GEPEI/
UFGD). E-mail: alinesilva@ufgd.edu.br
4
Mestre em Educação pela Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD)
e membro do Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação Inclusiva (GEPEI/
UFGD). E-mail: hellenufgd@gmail.com

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ISSN 2237-258X

Resumo
Este trabalho objetiva conhecer e discutir alguns aspectos quanto à for-
mação inicial e continuada de professores das Salas de Recursos Multi-
funcionais (SRMs) do Município de Dourados, no Mato Grosso do Sul
(MS), investigação esta que integrou o Observatório Nacional de Edu-
cação Especial: Estudo em Rede Nacional (ONEESP) sobre as SRMs
nas escolas comuns. Serão apresentados dados obtidos por meio de um
formulário de caracterização preenchido pelos professores do municí-
pio em questão. Discute-se essa formação ressaltando as dificuldades,
anseios e necessidades dos profissionais em atuação no atendimento do
público-alvo da Educação Especial, considerando-se a Política Nacional
de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva e o Programa
de Implantação de Salas de Recursos Multifuncionais como modelo de
serviço oferecido a toda a demanda da inclusão escolar.

PALAVRAS-CHAVE: Formação de professores. Atendimento Educacio-


nal Especializado. Salas de Recursos Multifuncionais.

Abstract
This study aims to know and discuss some aspects regarding the initial and
continuing training of teachers of Multifunction Resource Classrooms
(MRCs) in the city of Dourados in Mato Grosso do Sul. This research
was part of the National Centre of Special Education: Study on National
Network on MRCs in public schools. Data will be presented obtained
by the characterization form filled out by municipal teachers concerned.
It discusses such training emphasizing the difficulties, concerns and
needs of professionals in action on the target group of the treatment of
Special Education. It is considered a National Special Education Policy
on Inclusive Education Perspective and the Multifunction Resource
Classrooms (MRCs) deployment program, as the service model offered
all the demand of school inclusion.

KEYWORDS: Teachers education. Specialized Educational Services.


Multifunction Resource Classrooms.

Resumen
Este estudio tiene como meta conocer y discutir algunos aspectos relativos
a la formación inicial y continúa de los profesores de Salas de Recursos

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ISSN 2237-258X

Multifunción (SRMs) en la ciudad de Dourados en Mato Grosso do Sul.


Esta investigación forma parte del Observatório Nacional de Educação
Especial: Estudo em Rede Nacional (ONEESP) de los SRMs en las escuelas
regulares. Los datos se presentarán obtenidos mediante un cuestionario
de caracterización llenado por los maestros municipales afectados. Se
argumenta enfatizando las dificultades, preocupaciones y necesidades de
los profesionales en las operaciones en el público objetivo del tratamiento
de la Educación Especial. Se considera la Política Nacional de Educación
Especial en la perspectiva de la educación inclusiva y el Programa de
ejecución de las Salas de Recursos Multifunción, el modelo de servicio
ofrecido a toda la demanda la inclusión escolar.

PALABRAS CLAVE: Educación del profesorado; Educación especialista


en servicio; Salas de recursos multifunción.

INTRODUÇÃO

Desde a promulgação da Política Nacional de Educação Es-


pecial na Perspectiva da Educação Inclusiva, em 2008, muitos tra-
balhos têm discutido formas de implementação desta no atendi-
mento ao público-alvo da Educação Especial (PAEE) (OLIVEIRA,
2010; KASSAR, 2012; CARNEIRO; DALL’ACQUA; ZANIOLO,
2014). Nessas discussões um ponto parece consenso e tem suscita-
do muitas questões: a formação dos professores para a atuação nas
Salas de Recursos Multifuncionais (SRM) e a oferta do Atendimen-
to Educacional Especializado (AEE).
Estudos em rede nacional discutem aspectos relacionados
à formação dos professores e à organização dos serviços com vis-
tas a contribuir com o conhecimento de como esses serviços têm
sido operacionalizados, suas dificuldades e necessidades e em quais
áreas são necessários maiores investimentos (MENDES, 2010).
Este trabalho busca contribuir com reflexões sobre as políticas de
implantação das Salas de Recursos Multifuncionais no Estado do
Mato Grosso do Sul e sobre o papel do professor de AEE nelas.

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ISSN 2237-258X

Especificamente, serão apresentados os dados obtidos no municí-


pio de Dourados, no qual foram realizadas entrevistas com 13 pro-
fessores do AEE. O trabalho teve por objetivos conhecer e discutir
alguns aspectos da formação dos professores da Educação Especial
em atuação no AEE, com vistas a contribuir para a compreensão do
serviço oferecido à PAEE no município.
Todos os alunos com Necessidades Educacionais Especiais
(NEE) têm por direto a matrícula nas escolas regulares desde a
Constituição de 1988, que estabeleceu o direito à escolarização de
toda e qualquer pessoa, a igualdade de condições para o acesso e
para a permanência na escola e a garantia de “atendimento edu-
cacional especializado aos portadores de deficiência, preferencial-
mente na rede regular de ensino” (BRASIL, 1988). O documento
“Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educa-
ção Inclusiva” (PNEE-EI) (BRASIL, 2008a) especificou a necessi-
dade de garantir, entre outras coisas, a “formação de professores
para o atendimento educacional especializado e demais profissio-
nal da educação para a inclusão escolar” (BRASIL, 2008a, p. 08).
O Programa de Implantação das Salas de Recursos Multifun-
cionais tem sido um dos mais importantes programas na Educação
Especial implantado nas redes de ensino. De acordo com o Edital
n.º 1, de 26 de Abril de 2007, ele tem por objetivo

Apoiar os sistemas de ensino na organização e


oferta do Atendimento Educacional especializa-
do, por meio da implantação de salas de recursos
multifuncionais nas escolas de educação básica da
rede pública, fortalecendo o processo de inclusão
nas classes comuns de ensino regular [...] Sele-
cionar projetos de Estados e Municípios para im-
plantação de salas de recursos multifuncionais nas
escolas de educação básica da rede pública de en-
sino; Expandir a oferta do atendimento educacio-
nal especializado aos alunos incluídos nas classes
comuns do ensino regular (BRASIL, 2007, p. 8).

172 Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.169-188, maio/ago. 2015
ISSN 2237-258X

Legalmente, a função do AEE está bem definida. A partir


dessa definição, enfatizamos a importância do trabalho dos profis-
sionais de educação que atuam nas SRM. De acordo com o Decreto
n.º 6.571/2008, o Atendimento Educacional Especializado é defi-
nido como um “conjunto de atividades, recursos de acessibilidade
e pedagógicos organizados institucionalmente, prestado de forma
complementar ou suplementar à formação dos alunos no ensino
regular” (BRASIL, 2008b).
O professor de AEE atende os alunos que são público-alvo da
Educação Especial (PAEE). Analisando a proposta de formação de
professores contida na Política de Educação Especial na Perspecti-
va da Educação Inclusiva, pode-se afirmar que a atuação no AEE
é bastante complexa, pois deve desenvolver habilidades e conheci-
mentos para o trabalho com todos os tipos de alunos com Neces-
sidades Educacionais Especiais (deficiências, transtornos globais
de desenvolvimento e talentos/superdotação), em todos os níveis e
modalidades de ensino (BRASIL, 2008a).
O Atendimento Educacional Especializado é uma forma de
garantir que sejam reconhecidas e atendidas as especificidades do
PAEE, podendo ser realizada na Sala de Recursos Multifuncionais,
ou seja, em um espaço organizado com materiais didáticos, peda-
gógicos, equipamentos e professores com formação específica para
o atendimento às suas necessidades, visando o desenvolvimento do
aluno e proporcionando seu acesso ao conhecimento. De acordo
com a Secretaria de Educação Especial, o Atendimento Educacio-
nal Especializado tem como função:

identificar, elaborar e organizar recursos pedagó-


gicos e de acessibilidade que eliminem as barreiras
para a participação dos alunos, considerando suas
necessidades específicas. As atividades desenvol-
vidas no atendimento educacional especializado
diferenciam-se daquelas realizadas na sala de aula

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.169-188, maio/ago. 2015 173
ISSN 2237-258X

comum, não sendo substitutivas à escolarização.


Esse atendimento complementa e/ou suplementa
a formação dos alunos com vistas à autonomia
e independência na escola e fora dela (BRASIL,
2008a, p. 15).

É possível perceber as inúmeras funções do professor que


atua no AEE, inclusive a de atender a todos os tipos de necessida-
de, em diferentes níveis de comprometimento e de ensino, mesmo,
muitas vezes, não possuindo formação suficiente para atendê-las.
O documento “Política Nacional de Educação Especial na
Perspectiva da Educação Inclusiva” (PNEE-EI) (BRASIL, 2008a)
especificou a necessidade de garantir, entre outras coisas, a “forma-
ção de professores para o atendimento educacional especializado e
demais profissionais da educação para a inclusão escolar” (BRASIL,
2008a, p. 08). Essa necessidade já está presente desde a Lei de Dire-
trizes e Bases da Educação (BRASIL, 1996) quando esta se refere a
dois perfis de professores que deverão ser formados para atuar com
alunos com Necessidades Educacionais Especiais: a) o professor de
classe comum capacitado, que comprove ter tido, em sua formação,
conteúdos ou disciplinas sobre Educação Especial; e b) o professor
especializado em Educação Especial, que tenha formação em cur-
sos de licenciatura em Educação Especial ou complementação de
estudos ou pós-graduação.

O trabalho nas Salas de Recursos Multifuncionais no


município de Dourados

As Salas de Recursos Multifuncionais foram implantadas no


Município de Dourados (MS) a partir de 2006, tendo uma das esco-
las localizadas na área central da cidade como pioneira (piloto) e mo-
delo. A escola ainda possui a SRM, oferecendo o AEE, atualmente.

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A formação do educador é um processo que não deve ter fim,


dando-se no dia-a-dia de sua prática na sala de aula, de forma a
permanentemente desenvolvê-lo como educador, enquanto estiver
atuando e refletindo sobre sua prática docente. Essa formação tem
como objetivo contemporizar os conhecimentos, as técnicas e os
recursos a serem utilizados pelos professores a fim de proporcionar
uma prática de ensino contextualizada com a realidade dos alunos.

A formação de professores caracteriza-se como


um ponto de debate e reflexão intenso para a cons-
tituição de novos espaços escolares, nos quais os
procedimentos escolares se caracterizem como
instrumentos de transformação, porque poderão
permitir o avanço em direção a uma sociedade
mais justa e igualitária, através da ação pedagógica
que exercemos no cotidiano da escola (OLIVEI-
RA, 2010, p. 143).

A formação inicial e continuada do professor da classe comum


também deve ser voltada para a Educação Inclusiva, pois é impres-
cindível que todos os professores participem de debates e discussões
que reflitam sobre a nova concepção de escola e de escola inclusiva.
O sistema escolar precisa buscar estratégias para que o corpo docen-
te da escola seja munido de novos conhecimentos e atitudes que pos-
sibilitarão o avanço escolar de todos os alunos. Sendo assim, as esco-
las que optam por uma orientação inclusiva valorizam as diferenças
dos alunos e toda a diversidade humana como recursos valiosos para
o desenvolvimento de todos na sala, contribuindo, também, para o
aperfeiçoamento docente (DUK, 2005).
A formação continuada deve constituir-se em um espaço de
construção de novos conhecimentos, um intercâmbio de diferen-
tes saberes, de repensar e refazer a prática do professor, da cons-
trução das capacidades desse educador. Segundo Mittler (2003,
p. 35), “[...] a inclusão implica em que todos os professores tenham o
direito de esperar e de receber preparação apropriada na formação

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inicial em educação e desenvolvimento profissional contínuo du-


rante sua vida profissional”. Nunes et al. (1998, p. 69), em estudos
realizados sobre a produção na pós-graduação, apontam que a for-
mação atual e a atuação profissional não tem sido satisfatória e que,
tanto na formação inicial quanto na formação em serviço, há a ne-
cessidade de que sejam discutidas questões sobre as pessoas com
deficiências “para uma atuação mais eficiente e que contribua para
a efetiva inserção social do portador de deficiência”.
Pesquisando a concepção de docentes e diretores acerca da
Educação Inclusiva, Sant’Ana (2005) encontrou aspectos necessá-
rios ao sucesso dessa proposta. A falta de formação específica e de
apoio técnico no trabalho com os alunos inseridos nas classes re-
gulares foram os principais entraves. Dentre as possibilidades su-
geridas, destacaram-se a necessidade de uma equipe multidiscipli-
nar para a orientação, a formação continuada, os recursos físicos e
pedagógicos adequados, a experiência pedagógica com alunos com
necessidades especiais, além de atitudes positivas dos agentes e a
parceria com a família.
Assim, discutir a formação de professores parece necessário
por reconhecer-se que estes ainda demonstram dificuldades na atua-
ção com os alunos PAEE e ainda consideram-se despreparados para
a variedade de características apresentadas. Por isso, o objetivo desse
trabalho foi conhecer aspectos relacionados à formação inicial e con-
tinuada dos professores das Salas de Recursos Multifuncionais do
município de Dourados (MS), com vistas à compreensão de como
este serviço tem sido oferecido no município em questão.

Método

Local da pesquisa
A pesquisa foi realizada no município de Dourados (MS).
Para a coleta de dados, foi utilizada uma Sala de Recursos Multi-
funcionais cedida por uma das escolas participantes da pesquisa.

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ISSN 2237-258X

Participantes:
Participaram da pesquisa 13 professoras das Salas de Recur-
sos Multifuncionais do Município de Dourados (MS).
Materiais:
Papéis, canetas e cópias reprográficas do formulário.
Procedimento de coleta
As entrevistas foram realizadas a partir da utilização de um
formulário composto por 16 questões abertas e fechadas. O formu-
lário utilizado foi elaborado pelo Observatório Nacional de Edu-
cação Especial (ONEESP)5 e os encontros foram agendados pre-
viamente com as participantes, via Secretaria de Educação. Estas
foram esclarecidas quanto aos objetivos do trabalho, bem como as-
sinaram o Termo de Consentimento Livre e esclarecido. O roteiro
do formulário foi elaborado refletindo sobre critérios importantes
que envolvessem o trabalho das professoras, destacando alguns as-
pectos como a questão da formação inicial e continuada e dados
profissionais das mesmas.
Análise de dados
Os dados foram transcritos na íntegra pelos próprios entrevis-
tadores, descritos e analisados. Como resultado, obteve-se a carac-
terização da formação das professoras que atuam nas Salas de Re-
cursos Multifuncionais do município de Dourados (MS), bem como
aspectos de sua formação que favoreçam a atuação neste serviço.

Resultados

Todas as participantes são do sexo feminino, com idade entre


30 e 50 anos, e possuem como formação inicial Magistério e cursos

5
Formulário elaborado pelo ONEESP (UFSCar) para a utilização do estudo
em rede nacional sob a coordenação da Prof. Dra. Enicéia Gonçalves Mendes.
Disponível em: <www.oneesp.ufscar.br>.

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ISSN 2237-258X

superiores de Licenciatura. No quadro 1, apresentamos os cursos


realizados por cada uma delas.

Quadro 1 – Formação das participantes quanto à formação inicial

Fonte: MELO, 2014.

Em consonância com a legislação, todas as professoras pos-


suem formação em nível superior, a maioria delas, em Pedagogia.
O quadro 2 apresenta a experiência das professoras em Edu-
cação Especial e na Sala de Recursos Multifuncional.

Quadro 2 – Experiência profissional das participantes


na Educação Especial e nas SRMs em anos

Fonte: MELO, 2014.

Apenas uma professora (P11) possui oito anos de experiência


em Educação Especial e cinco de experiência na SRM. A maioria

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ISSN 2237-258X

do restante tem de um a três anos de experiência na Educação Es-


pecial e nas SRMs, equivalendo à época em que foi implantada a
Sala de Recursos no município de Dourados, em 2007.
Fonte: MELO, 2014.
Como se vê no quadro 2, quanto ao tempo de experiência das
professoras em Educação Especial, a maioria tem até dois anos de
Apenas uma professora (P11) possui oito anos de experiência em Educação
experiência
Especial e apenas três
e cinco de experiência delasAmais
na SRM. de três
maioria anos. Étem
do restante importante
de um a três res-
anos de
saltarnaque
experiência o primeiro
Educação Seminário
Especial e nas SRMs,deequivalendo
Educação àEspecial
época emrealizado no
que foi implantada
a Sala de Recursos no
município demunicípio
Dourados de ocorreu
Dourados,emem 2005,
2007. e que foi esse seminário
que
Como desencadeou as ações
se vê no quadro de implementação
2, quanto das SRM.
ao tempo de experiência dasComo po- em
professoras
Educação Especial, a maioria tem até dois anos de experiência e apenas três delas mais de
demos observar, ainda que a maioria das professoras fosse formada
três anos. É importante ressaltar que o primeiro Seminário de Educação Especial realizado
em Pedagogia,
no município de Douradosnove delasem
ocorreu não possuíam
2005, e que foiexperiência
esse seminárionenhuma com as
que desencadeou
a Educação
ações de Especial
implementação e nemComo
das SRM. com podemos
o trabalho com crianças
observar, ainda quecom defi- das
a maioria
professoras fosse formada em Pedagogia, nove delas não possuíam
ciências, começando seu trabalho nas SRMs apenas com a forma- experiência nenhuma
com a Educação Especial e nem com o trabalho com crianças com deficiências,
ção inicial
começando e, algumas,
seu trabalho nas SRMscursando a especialização
apenas com eme,AEE.
a formação inicial algumas, cursando a
especializaçãoOem quadro 3 apresenta a experiência das professoras, em anos, na
AEE.
Educação,3 tanto
O quadro na Educação
apresenta Infantil
a experiência quanto noemEnsino
das professoras, Fundamental.
anos, na Educação, tanto na
Educação Infantil quanto no Ensino Fundamental.
Quadro 3 – Tempo de experiência, em anos, na
Quadro 3 – TempoEducação Infantil
de experiência, e na
em anos, noEducação
EnsinoInfantil
Fundamental
e no Ensino Fundamental

Tempo de Experiência na Educação

25

20
Experiência em Anos

15
Educação Infantil
Ensino Fundamental
10

0
P1 P2 P3 P4 P5 P6 P7 P8 P9 P10 P11 P12 P13
Professoras Participantes

Fonte: MELO, 2014. Fonte: MELO, 2014.

Todas as professoras possuem Especialização em nível latu


Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13, p.96-108, maio/ago. 2015 102
sensu e sete, a especialização em AEE promovida pelo MEC via
educação à distância e oferecida como parte das determinações do

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ISSN 2237-258X

AEE, na política de implementação das SRMs. Das sete professo-


ras especialistas, cinco têm especializações voltadas para as práticas
pedagógicas na SRM (Educação Especial, Libras e Educação Inclu-
siva). É importante enfatizar que dez das treze professoras reali-
zaram especializações diretamente relacionadas com a prática do-
cente nas SRM, em áreas como: Deficiência Intelectual, Deficiência
Auditiva, Deficiência Visual, Deficiência Física, Múltiplas Defi-
ciências, Docência e Intérprete de Libras, AEE, Educação Inclusiva
e Altas Habilidades. Quatro das treze realizaram especializações
relacionadas com a prática pedagógica de modo geral, como em
Política e Gestão da Educação, Metodologia do Ensino Superior,
Séries Iniciais e Estudo das Linguagens.
As treze participantes possuíam experiência docente na Edu-
cação Infantil e/ou no Ensino Fundamental por pelo menos dois
anos, tendo duas delas (P4 e P9) mais de 20 anos de experiência.
É importante esclarecer que, em todas as SRM nas quais as
participantes atuam, há crianças com mais de um tipo de Neces-
sidade Educacional Especial. As 13 professoras, nas suas SRMs,
atendem, em média, 160 alunos por ano. No quadro 4, vemos a
quantidade de alunos atendidos por professora.

Quadro 4 – Quantidade de alunos atendidos,


em média, por professora participante

Fonte: MELO, 2014.

180 Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.169-188, maio/ago. 2015
ISSN 2237-258X

Há uma disparidade entre as professoras em relação ao nú-


mero de alunos atendidos: algumas atendem até cinco alunos e
outras atendem quinze ou mais. Isso acontece em função do ta-
manho da sala, dos recursos utilizados, dos tipos de Necessidades
Educacionais Especiais e da demanda do bairro no qual a SRM se
situa. Em relação à forma de atendimento oferecido, ele pode se dar
individualmente, em duplas ou em trios.. As professoras indicaram
atender em duplas ou individualmente e quatro delas sinalizaram
que também atendem a trios de alunos, o que pode explicar o nú-
mero elevado de alunos atendidos apontado no quadro 4.
O quadro 5 apresenta os tipos de diagnósticos e/ou Necessi-
dades Educacionais Especiais atendidos pelas professoras das SRM.

Quadro 5 – Tipos de diagnósticos/ou Necessidades Educacionais


Especiais atendidas pelas professoras das SRMs

Fonte: MELO, 2014.

Vemos que o público atendido pelas professoras da SRMs


vai além do PAEE previsto na legislação para esse serviço. Diante

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.169-188, maio/ago. 2015 181
ISSN 2237-258X

disso, fazemos a pergunta: como deve ser a formação dos profis-


sionais para atender a todos os tipos de necessidades especiais em
todos os níveis de ensino? Deve-se considerar, também, a respon-
sabilidade e a sobrecarga do professor que trabalha na Sala de Re-
cursos Multifuncionais.
Quanto à opinião das professoras em relação ao papel das
professoras das SRM, esta foi mais marcante quanto à adequação e
aos benefícios da SRM. Dez professoras indicaram que a sala é ade-
quada para o atendimento e quatro indicaram que ela é inadequa-
da, ressaltando que o espaço é pequeno e pouco ventilado. Duas
apontaram que a sala está em espaço improvisado, como em parte
da biblioteca. Mais da metade das professoras entrevistadas (nove)
consideram sua sala equipada com os recursos que julgam neces-
sários para a realização de seu trabalho, referindo-se aos equipa-
mentos oferecidos pelo MEC e a outros, cedidos pela escola, além
de materiais que são produzidos por elas. De acordo com as pro-
fessoras das SRM, os recursos disponíveis em suas salas são: com-
putadores, impressoras, notebooks, escâner, mobiliário adaptado,
cadeira de rodas, jogos pedagógicos industrializados, jogos peda-
gógicos confeccionados, máquina de escrever Braille, lupa manual
e eletrônica, apoio de leitura, fone de ouvido, mesa adaptada para
cadeirante, soroban, teclado adaptado, plano inclinado, colméia de
teclado, quadro branco, mouse com acionador de pressão, softwa-
res educativos, televisão e aparelho de DVD.
As professoras também participam das atividades gerais da
escola, como reuniões pedagógicas, atividades culturais e as reu-
niões de pais, ocorridas mensalmente, e contribuem com as dis-
cussões nos conselhos de classe. Contudo, elas ressaltaram que não
possuem direito a voto quanto à aprovação ou retenção dos alunos
atendidos nas SRMs. Durante esses conselhos, somente os profes-
sores regentes votam.

182 Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.169-188, maio/ago. 2015
ISSN 2237-258X

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante das discussões sobre a Educação Inclusiva e sobre a


função do professor que atua no AEE, podemos destacar que há a
necessidade de se pensar em como tem se dado a formação desse
profissional e como esta poderia ser aperfeiçoada. O professor do
AEE não deve substituir a função do professor regente do ensino
regular, bem como dos demais profissionais que podem contribuir
com o atendimento. O professor do AEE deve, antes, estabelecer
parcerias com os demais profissionais da educação e da saúde, co-
laborando com as necessidades e suas particularidades.
De fato, constatamos que a escola torna-se inclusiva quando
há um projeto pedagógico elaborado coletivamente, entre as diver-
sas instituições educativas, a família, os profissionais especializados
e a comunidade, voltado para a inclusão escolar. O maior desafio
encontra-se na habilidade em avaliar as necessidades e, a partir de-
las, derivar práticas efetivas de ensino e de aprendizagem, estabe-
lecendo formas de lidar com a diversidade e com as diferenças de
cada aluno. Isso não deve ser responsabilidade só do professor, mas
de toda a equipe escolar. Com vistas à efetivação da inclusão esco-
lar, Gomes e Barbosa (2006) ressaltam que é necessário um apri-
moramento constante dos professores e dos demais profissionais
da escola, com o domínio de instrumentos e referenciais que façam
evoluir as práticas pedagógicas, seja por meio de cursos abrangen-
tes ou de treinamentos específicos.
Ainda que tenhamos observado avanços na área educacional
voltada para o atendimento dos alunos com Necessidade Educa-
cionais Especiais, há muito que se fazer para proporcionar melhor
atendimento aos alunos PAEE. Sousa (2008), Gomes e Barbosa
(2006), De Vitta (2010) dentre outros autores, ressaltam a necessi-
dade de reformulação na prática pedagógica de forma a atender a
todas as crianças que precisam da escola e, assim, contribuir para a

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ISSN 2237-258X

elaboração de políticas públicas que ofereçam variedade de serviços


e opções de atendimentos diversificados, levando em consideração
as diferentes potencialidades e necessidades dos alunos. É necessário,
também, considerar que o professor precisa de formação constante
para refletir sobre seu trabalho, buscando aperfeiçoar o ensino ofe-
recido em sala de aula, identificando aqueles que apresentam dificul-
dades no processo de aprendizagem e propondo estratégias. Anjos,
Andrade e Pereira (2009), ao identificarem o sentimento dos profes-
sores em relação à produtividade profissional e ao despreparo para
lidar com a inclusão, apresentam que, entre os sentimentos descritos,
destaca-se o choque sentido pelos professores no início do trabalho
com alunos deficientes, quando percebem suas dificuldades e limites
e sua necessidade de aperfeiçoamento e apoio.
Corroborando com os autores, foi ponto comum nas decla-
rações das participantes que a formação para atuar de maneira a
favorecer a inclusão necessita de apoio e suporte, havendo a neces-
sidade de se pensar, já na formação inicial, em estratégias de ava-
liação das Necessidades Educacionais Especiais e em estratégias de
ensino e acesso ao currículo para o PAEE. De Vitta, Silva e Moraes
(2004), Sousa (2008) e De Vitta (2010) apontam que a formação
de professores, as condições físicas e materiais e a organização de
recursos e de apoio são fatores que devem ser considerados priori-
tários na discussão da proposta de inclusão escolar, possibilitando
refletir sobre o papel da parceria com outros profissionais da saúde
e da assistência, além da família e da comunidade.
O AEE oferecido pelas participantes ultrapassa o público es-
tabelecido como PAEE, pois atende crianças com diagnósticos e/ou
características como déficit de atenção, hiperatividade e problemas
de comportamento. Dentre todas as dificuldades que já são presen-
tes nos quadros das deficiências, os profissionais lidam ainda com
outros quadros, para os quais não possuem sequer o conhecimento
mínimo, tendo que buscar respostas no senso comum. Gomes e

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ISSN 2237-258X

Barbosa (2006) e De Vitta (2010) apontam que há, por parte dos
professores, um temor em lidar com todo esse público. Sentimentos
negativos também foram verificados por Ávila, Tachibana e Vais-
berg (2008), que apontaram a angústia despertada pelo processo
de inclusão escolar nos professores, e concluindo que o processo de
inclusão demanda, além de informações técnicas, um espaço para
a oferta de suporte emocional aos profissionais.
Dall’Acqua (2007, p. 116) ressalta que, à medida que a inclu-
são toma espaço nas organizações educacionais, “torna-se cada vez
mais necessário e complexo o processo de formação de professores
da educação especial”, seja na definição de seus papéis educacio-
nais ou na efetivação de práticas pedagógicas para o enfrentamento
dessa realidade ainda em construção. Para atuar com a diversidade,
é necessário um complexo rol de conhecimentos e disponibilidade
para lidar com o novo. Em se tratando da formação de professores
que atuem de forma efetiva na educação de crianças com necessi-
dades especiais, essa capacitação deve incluir conteúdos que per-
mitam compreender os diferentes diagnósticos e os problemas que
levam às dificuldades e necessidades desta população (DE VITTA,
2010) A formação continuada por meio de especializações é uma
modalidade que, na opinião das professoras, poderia auxiliar na
efetivação da Educação Inclusiva, pois esta exige um conjunto de
atitudes que assegure ao aluno com Necessidades Educacionais Es-
peciais o direito de ela beneficiar-se.
Para que o processo de inclusão escolar se efetive com su-
cesso, há, portanto, a necessidade de coerência entre as demandas
dos alunos e as habilidades de ensinar do professor, além de uma
sensibilidade à diversidade da turma e, principalmente, da cren-
ça de que há um potencial a ser explorado. A predisposição dos
professores em relação à inclusão dos alunos PAEE, especialmente
aqueles com dificuldades mais graves e de caráter permanente, é
fator condicionante dos resultados esperados. Por isso, uma atitude

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ISSN 2237-258X

positiva e confiante já constitui um passo importante, que favorece


a educação desses alunos na escola que queremos.

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Recebido: 10/12/2014
Aprovado: 11/12/2014

188 Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.169-188, maio/ago. 2015
ISSN 2237-258X

O PROFESSOR DE LÍNGUA ESPANHOLA


EM CONTEXTO DE EDUCAÇÃO
INCLUSIVA: DESAFIOS E PERSPECTIVAS
NO ENSINO PARA DEFICIENTES VISUAIS
Spanish language teacher in inclusive education context:
challenges and prospects in education for visually impaired
El profesor de lengua española en contexto de educación
inclusiva: desafíos y perspectivas en la educación de los
discapacitados visuales

Caroline Veloso da Silva1


Katia Regina Moreno Caiado2

Resumo
Este artigo propõe uma discussão a respeito do ensino de língua espa-
nhola em interface com a Educação Inclusiva, especificamente no que
se refere ao processo de ensino e aprendizagem de alunos com deficiên-
cia visual. Com base na metodologia da pesquisa-ação, organizou-se um
curso de nível básico iniciante de espanhol para um pequeno grupo de
alunos com deficiência visual, composto por três alunos cegos e um alu-
no com baixa visão. As aulas foram gravadas em vídeo e foi realizada
uma análise microgenética. O referencial teórico que embasou as discus-
sões e análises foram os estudos sócio-históricos de Lev Vigotski sobre

1
Doutoranda em Linguística no Programa de Pós-Graduação em Linguística da
Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). E-mail: veloso.karoll@gmail.com
2
Doutora em Educação pela Universidade de São Paulo (USP). Docente da
Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), no Departamento de Ciências
Humanas e Educação. E-mail: caiado.katia@gmail.com

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.189-215, maio/ago. 2015 189
ISSN 2237-258X

mediação simbólica e zona de desenvolvimento iminente, e de Dermeval


Saviani sobre mediação e trabalho docente intencional. A partir deles,
foram discutidas possibilidades pedagógicas nesse contexto específico e
apontou-se, também, a importância de uma prática planejada e inten-
cional para que os alunos com deficiência visual possam se apropriar da
língua estrangeira e não apenas estarem presentes no espaço educacional.

PALAVRAS-CHAVE: Ensino de espanhol. Deficiência visual. Mediação.

Abstract
This paper proposes a discussion on the teaching of Spanish language
interfaced with inclusive education, specifically as it relates to teaching
and learning of students with visual impairments. Based on action-
research method, we organized a course for beginner level in Spanish
to a small group of students with visual impairments composed by three
blind people and one low vision person. The lessons were videotaped
and a microgenetic analysis was performed. The theoretical framework
were socio-historical studies of Lev Vygotsky (Symbolic Mediation and
Zone of Proximal Development) and Dermeval Saviani (Mediation,
Intentional Teaching Work). It’s been discussed possibilities based on
these pedagogical theories and also pointed up the importance of a
planned and intentional practice for students with visual disabilities in
order to guarantee that they can take ownership of a foreign language and
not only be included in the classroom.

KEYWORDS: Teaching Spanish. Visual impairment. Mediation.

Resumen
Este artículo se propone a la discusión a respeto de la enseñanza de la
lengua española en interfaz con la educación inclusiva a lo que se refiere al
proceso de enseñanza y aprendizaje de los alumnos con discapacidad visual.
Basados en la metodología de la investigación-acción se ha organizado un
curso de español de nivel básico a un pequeño grupo de estudiantes con
discapacidad visual. Participaron tres ciegos y uno con baja visión. Las
clases fueron grabadas en video y analizadas a través de la metodología
de análisis microgenético. Los debates fueron basados en las teorías de
Lev Vigotski (Mediación Simbólica y Zona de Desarrollo Inminente) y
Dermeval Saviani (Mediación y Trabajo Docente Intencional). A partir

190 Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.189-215, maio/ago. 2015
ISSN 2237-258X

de ellos hemos discutido las posibilidades pedagógicas en este contexto


específico y se puso en relieve la importancia de una práctica planeada
e intencional para que los alumnos con discapacidad visual puedan
apropiarse de la lengua extranjera a fin de que no sean apenas incluidos
en las salas de clase.

PALABRAS CLAVE: Enseñanza de español. Discapacidad visual. Me-


diación.

INTRODUÇÃO

Segundo Dermeval Saviani (2008a), a escola é o espaço de


transmissão sistemática dos saberes historicamente acumulados
pela humanidade com a finalidade de capacitar o indivíduo a par-
ticipar como agente de construção e transformação da sociedade.
No entanto, o mesmo autor (2010) problematiza esse objetivo da
escola, uma vez que a Educação Básica permanece precária e a
formação e as condições de trabalho dos professores não contem-
plam todos os aspectos necessários para a elaboração e realização
de um trabalho pedagógico que garanta o acesso ao saber cientí-
fico, assim como aos materiais didático-pedagógicos aos quais as
escolas têm acesso.
Recentemente, Saviani (2014, s/p., grifo nosso) fez a seguinte
afirmação sobre a escola pública:

No contexto atual a luta se tornou mais comple-


xa, pois o enfrentamento se dá diretamente com
os grandes grupos empresariais que além de atuar
no ensino tem ramificações nas forças dominantes
da economia e também na própria esfera pública,
seja junto aos governos, seja penetrando no inte-
rior das próprias redes de educação pública. Por
isso [...] não será fácil seguir o caminho da defesa
da educação pública de qualidade acessível a toda a
população brasileira.

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ISSN 2237-258X

A partir da afirmativa do autor e da realidade que nos é coti-


dianamente apresentada, compreendemos que a educação pública
de qualidade, com acesso ao conhecimento científico elaborado,
não é para todos. No entanto, existe uma parcela desses estudantes
que, além de não terem acesso à educação de qualidade, não têm
assegurado seu direito de acesso sequer ao material didático e às
práticas pedagógicas da sala de aula; trata-se dos alunos público-
-alvo da Educação Especial (BRASIL, 2008).
Essa é uma discussão que ocorre paralelamente à dos pro-
blemas da Educação Básica, pois, apesar de a legislação nacional
vigente sobre o tema garantir aos estudantes com deficiência e/ou
Necessidade Educacionais Especiais (NEE) o acesso à educação
plena e ao conhecimento científico, dentro dos portões da escola,
essa realidade, na maioria das vezes, se configura de outra maneira.
Isso se deve ao fato de que, além de toda a problematização apre-
sentada, temos as especificidades dentro do contexto da Educação
Especial. A presença de alunos com deficiência na escola regular
traz uma dimensão mais complexa às discussões a respeito do pa-
pel da Educação e da escola no Brasil. Esses alunos têm, muitas ve-
zes, cerceados, assim como ocorre a tantos outros da escola públi-
ca, o seu direito de apropriação do conhecimento científico a partir
do trabalho pedagógico. No entanto, aos alunos público-alvo da
Educação Especial, temos um agravante que está diretamente rela-
cionado à questão das práticas pedagógicas que não contemplam as
especificidades de suas deficiências.
De acordo com a Política Nacional de Educação Especial na
Perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL, 2008), ancorada na
Constituição Brasileira (1988) e na Lei de Diretrizes e Bases da Edu-
cação Nacional (LDB), Lei n.º 9.394, de 1996, aos estudantes com
deficiência, transtorno global do desenvolvimento e altas habilida-
des deve ser promovido total acesso à educação, até aos níveis mais
elevados de ensino. Do mesmo modo, o Decreto n.º 6.949/2009,

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que promulga a Convenção Internacional sobre os direitos da pes-


soa com deficiência, garante a educação plena, com igualdade de
comunicação e acesso às informações (BRASIL, 2009).
Quando a legislação menciona “acesso à educação plena”,
não significa apenas a matrícula nos estabelecimentos de ensino
e o acesso à sala de aula, mas, assim como aos demais alunos, o
acesso pleno às informações dos materiais didáticos e ao conheci-
mento científico em sua totalidade, não somente parte dele. Em um
trabalho de análise de dados oficiais de matrícula de alunos com
deficiência em todos os níveis e modalidades de ensino no período
posterior à LDB, Adriana Lia Frizman de Laplane e Katia Regina
Moreno Caiado (2012) constataram que houve um aumento signi-
ficativo de matrículas dos estudantes com deficiência nas escolas.
No entanto, não há a possibilidade de afirmação de que esse acesso
garante a aprendizagem efetiva dos conteúdos escolares.
O acesso à escola não é garantia de plenitude da implementa-
ção das políticas públicas, de que o aluno tenha acesso à informação,
ao conhecimento, à formação plena de sua cidadania crítica e partici-
pação social. Para isso, o trabalho pedagógico deve, como assegura-
do em legislação sobre a Educação Especial, ser adaptado de acordo
com as necessidades dos estudantes, não visando apenas a facilitação
do trabalho do professor ou a mera ocupação do estudante, mas que
essa prática seja intencional, elaborada a partir de objetivos claros,
considerando-se os direitos dos estudantes ao conhecimento cientí-
fico, elemento chave para a formação plena do indivíduo e para sua
inserção na vida em sociedade de forma democrática.

Espanhol para alunos com deficiência visual: práticas


pedagógicas e o papel do professor

Desde o ano de 2010, o ensino de espanhol tornou-se obri-


gatório no Ensino Médio e facultativo no Ensino Fundamental

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ISSN 2237-258X

através da Lei n.º 11.161 (BRASIL, 2005). A língua estrangeira, de


um modo geral, torna-se relevante na medida em que permite ao
estudante o acesso a um novo mundo cultural, diferente do seu,
além da possibilidade que o conhecimento de um novo idioma
proporciona para a inserção no mercado de trabalho na atual so-
ciedade globalizada.
Assim, a inserção do espanhol na grade curricular atinge to-
dos os alunos inseridos em sala de aula. Com o objetivo de pro-
movermos uma reflexão sobre o processo de ensino e de apren-
dizagem dessa língua a alunos com deficiência visual, propomos
uma discussão com base no papel da interação e da mediação do
professor nesse processo. Além disso, discutiremos a importância
da organização do trabalho docente, de modo a proporcionar a esse
aluno o acesso e a apropriação do conhecimento em língua espa-
nhola. Discorreremos, também, sobre as concepções do processo
de aprendizagem do estudante com deficiência visual com base
nos conceitos de “zona de desenvolvimento iminente” e “mediação
simbólica” de Vigotski.
Antes de discutirmos o trabalho docente, é importante que
se tenha definida a concepção de trabalho apresentada neste artigo,
baseada em Saviani (2008b), que parte da definição de trabalho de
Marx e Engels, que compreendem o conceito a partir da relação
entre o homem e a natureza, tensionada por forças praticamente
opostas, já que o homem precisa nela intervir e transformá-la para
produzir seus meios de subsistência. Desse modo, desenvolveram-
-se as habilidades tipicamente humanas, bem como a origem da
sociedade. A isso, Saviani (2008b, p. 12) chama “trabalho material”.
No entanto, o autor traz outra dimensão de trabalho que
ocorre paralelamente ao trabalho material; para ele, o homem pre-
cisa antecipar mentalmente a ação e seus objetivos, o que signifi-
ca que ele já possui conhecimentos que regem o mundo real, tais
como a ciência, a ética e a arte, que estão no nível da simbolização.

194 Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.189-215, maio/ago. 2015
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A essa elaboração mental que antecede a ação do trabalho material,


Saviani chama “trabalho não material”. Desse modo, o homem cria
e transforma o mundo da cultura. A partir dessa concepção, Savia-
ni trata do conceito de trabalho educativo, que segundo ele,

é o ato de produzir direta e intencionalmente,


em cada indivíduo singular, a humanidade que é
produzida histórica e coletivamente pelo conjun-
to dos homens. Assim, o objeto da educação diz
respeito, de um lado, à identificação de elementos
culturais que precisam ser assimilados pelos indi-
víduos da espécie humana para que eles se tornem
humanos e, de outro lado e concomitantemente, à
descoberta das formas mais adequadas para atin-
gir esse objetivo (SAVIANI, 2008b, p. 13).

A concepção de trabalho educativo apresentada por Saviani


diz respeito, diretamente, ao trabalho realizado pelo professor e às
suas práticas em sala de aula. Assim, o autor nos leva a refletir so-
bre o fato de que o trabalho docente não é apenas o de transmissão
de conhecimentos já prontos ao aluno, na expectativa de que ele
os assimile prontamente; antes disso, deve haver o planejamento,
a intencionalidade do professor com aquele conteúdo, com aquela
prática escolhida e os objetivos a atingir com os alunos devem ser
claros e estabelecidos previamente. Isso é trabalho educativo.
Além disso, o que Saviani aponta também é que, nesse pro-
cesso de elaboração do trabalho educativo, o professor é o elemen-
to mediador e não transmissor, somente. Nessa concepção, toda
a construção do mundo e da cultura, por parte do aluno, aconte-
ce por meio de um elemento que faz a mediação entre o sujeito e
o objeto. Assim como o homem, para criar a sua subsistência e o
mundo da cultura, interagia com a natureza e com outros homens,
assim deve ser a concepção do trabalho educativo. Tendo em vista
essa concepção do papel do professor, é importante ter em mente

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ISSN 2237-258X

como se dá o processo da construção da sociedade e da cultura pelo


homem.
Lev Semionovitch Vigotski (1995) considera que o desen-
volvimento da complexidade humana acontece em um processo
de apropriação da experiência histórica e cultural. Portanto, o ho-
mem constitui-se na interação social e é um ser que transforma
e é transformado pelas próprias relações produzidas em uma de-
terminada cultura.

Nessa perspectiva teórica, entende-se que a apren-


dizagem humana só se dá com base na convivên-
cia social, na apropriação das atividades histori-
camente engendradas pelos homens, pela interna-
lização dos significados sociais. Assim, o homem
conhece o mundo pela atividade simbolizada nas
relações sociais (Caiado, 2014, p. 39).

De acordo com autor, toda relação do homem com o mundo


acontece por meio da intervenção de algum elemento intermediá-
rio entre sujeito e objeto, que se estende para a relação homem-na-
tureza e homem-homem por meio do uso de instrumentos ou de
signos. Portanto, a mediação simbólica (signos) é imprescindível
no processo de aprendizagem, sendo a linguagem o principal ele-
mento mediador entre o mundo visual e o aluno com deficiência.

Toda atividade humana é constituída de signifi-


cados que são mediados, de um homem para o
outro, pela linguagem que é o sistema simbólico
básico de comunicação de todos os grupos huma-
nos. Entre as várias linguagens que representam
o real, a palavra é impar (Caiado, 2014, p. 39).

Vigotski (1997, p. 162) afirma que “la palabra vence la ce-


guera [...]” e que “la tarea consiste en familiarizar el niño ciego
al trabajo, mediante el lenguaje, con la experiencia social de los

196 Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.189-215, maio/ago. 2015
ISSN 2237-258X

videntes”. Assim, a mediação simbólica é um elemento inerente ao


desenvolvimento humano e faz parte da construção sociocultural
do homem, que se dá por meio de sua interação com o mundo e
com o outro. Por isso, não é possível pensar em aprendizado e de-
senvolvimento sem mediação.
O autor afirma também que alunos com deficiência visual
aprendem da mesma maneira que os demais, bastando para isso
que o processo de mediação pelo professor por meio da linguagem
lhes garanta o acesso à cultura historicamente construída. Sob a
ótica desse conceito de Vigotski, percebe-se que as condições, tanto
para proporcionar o aprendizado de um aluno como para o seu de-
senvolvimento, depende indireta ou diretamente da mediação do
professor. A esse respeito, Saviani (2008b, p. 75) alerta para a im-
portância do professor, pois ele é o mediador principal no processo
de ensino e aprendizagem cabendo-lhe o papel de proporcionar aos
alunos meios e “elementos relevantes para o seu crescimento inte-
lectual e organizar esses elementos numa forma, numa sequência
tal que possibilite” o seu aprendizado.
No entanto, de acordo com Del Carmen Daher e Vera Lúcia
de Albuquerque Sant’Anna (2010), a formação dos professores de
língua, nos cursos de licenciatura em Letras, tem se baseado em
materiais pensados para cursos livres e descompromissados com
a preparação docente. Assim, a construção desses futuros profes-
sores tem sido orientada pelo que se sabe sobre aprender línguas
e não sobre como ensiná-las. As autoras afirmam que muitos são
os manuais que se debruçam sobre os métodos e abordagens de
ensino de línguas e sobre as discussões em torno do aluno, mas
não tratam dos conhecimentos teóricos que o professor precisa
ter para ensinar língua.
O ensino de línguas, no Brasil, é muito marcado pela com-
preensão de que ensinar língua é empregar fielmente metodologias
pré-estabelecidas (Vargens; Freitas, 2010). No entanto, de

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.189-215, maio/ago. 2015 197
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acordo com Christine Revuz (1998, p. 217), a aprendizagem de língua


estrangeira é marcada por uma taxa de insucesso, pela ideia de que
nenhum “método, por mais arrojado que seja” garante aprendizagem
bem sucedida. Isso porque aprender língua estrangeira não é como se
apropriar de qualquer outro conhecimento, pois a língua traz em seu
cerne uma relação de identidade do aprendiz, que traz consigo “uma
longa história com sua língua”, que interferirá no seu aprendizado. Essa
identidade aparece destacada no confronto com a língua materna,
pois, segundo Revuz (1998, p. 215), a língua estrangeira é “objeto de
saber, objeto de uma aprendizagem raciocinada” e, quando em conta-
to com a língua materna, “faz vir à consciência alguma coisa do laço
muito específico que mantemos com nossa língua”.
De acordo com a autora, a didática do ensino de língua es-
trangeira (LE) não se interessa por esse confronto e, com isso, o
ensino de língua fica no âmbito da aplicação de métodos, no en-
tanto, a língua não é apenas um instrumento de comunicação, é
viva, é cultura, é identidade do indivíduo. Justamente por isso, esse
confronto é tão importante no processo de ensino e aprendizagem
da LE. A autora vai além e afirma que o “eu da língua estrangeira
não é, jamais completamente, o eu da língua materna” e acrescenta:
“aprender uma língua é sempre, um pouco, tornar-se um outro”
(REVUZ, 1998, p. 227).
Nessa realidade sobre o ensino de línguas, tomando-se a
importância do professor no processo de ensino e aprendizagem
de alunos com deficiência visual e na mediação, sendo elemento
chave para a apropriação do conhecimento, inferimos que não há
a possibilidade de um professor de língua estrangeira manter seu
trabalho educativo na mera aplicação de métodos. Nessa perspec-
tiva, haveria prejuízo não apenas ao aluno com deficiência, mas a
toda a sala de aula. O papel do docente é levar o aluno à reflexão e
à apropriação plena do conhecimento, por meio de uma constante
reflexão sobre a sua própria prática, o que vem sendo amplamente
discutido no âmbito do ensino de línguas.

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Pesquisa de Campo

Com o intuito de trazer a discussão sobre o ensino de espa-


nhol para alunos com deficiência visual para a prática educativa,
elaboramos um curso de espanhol de nível básico, de 20 horas, e
convidamos algumas pessoas com deficiência visual que tivessem
interesse em aprender o idioma para dele participarem. Inicialmen-
te, não estabelecemos critérios com relação à idade e ao grau de de-
ficiência, apenas que fossem todos do nível básico ou que nunca ti-
vessem estudado a língua. Iniciaram o curso seis alunos, sendo três
deles cegos, dois portadores de baixa visão e uma vidente. A partir
da terceira aula, alguns alunos não puderam mais frequentar, então
a turma ficou configurada até o final do curso conforme o quadro:

Quadro 1 – Caracterização dos participantes3


Caracterização dos alunos - participantes
Alunos Grau de
Idade Tipo de deficiência
Participantes1 escolaridade
Ensino Médio
Antônio 37 Cegueira Congênita
Completo
Ensino Médio Baixa Visão
Diego 22
Completo Congênita
Ensino Médio
Roberto 21 Cegueira Adquirida
Completo
Cursando o Ensino
Pedro 19 Cegueira Congênita
Médio
Fonte: elaborado pelas autoras.

As aulas, ministradas por uma das autoras, aconteceram em


uma Instituição Municipal de São Carlos, interior de São Paulo, e
foram gravadas em vídeo para posterior análise. Os dados foram
coletados com base na pesquisa-ação, que, de acordo com Khalid
El Andaloussi (2004, p. 88),

3
Por questões éticas, os nomes dos participantes são fictícios

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se desenvolve enquanto paradigma específico, pos-


sibilitando a abordagem dos fenômenos da socie-
dade em sua complexidade. Permite, também, a
intervenção do pesquisador dentro de uma proble-
mática social, analisando suas implicações e anun-
ciando a sua finalidade, para mobilizar os partici-
pantes da pesquisa-ação. Os interessados tornam-
-se atores e, participando do desenvolvimento da
ação, contribuem para produzir novos saberes.

Assim, à medida que os atores interagem e avançam na solu-


ção de problemas, a ação torna-se fonte de conhecimento e meio de
impulso para ampliação desse conhecimento, visando transformar
a situação e contribuir para o enraizamento do pesquisador e dos
atores na realidade da vida. De acordo com o autor, existem três
tipos de pesquisa-ação: 1) operação programada pelos pesquisa-
dores; 2) situação espontânea e natural; e 3) conjunto de operações
planejadas em comum entre pesquisadores e atores. Neste trabalho,
optamos pelo tipo número três, que condizia com a situação da
nossa sala de aula, em que cada um dos atores tinha participação
plena na operação dos processos.
Os dados produzidos nessas aulas foram analisados microge-
neticamente. A análise microgenética é uma forma de construção
de dados que exige atenção aos detalhes das ações e se configura
como uma análise minuciosa de um determinado acontecimento,
situação ou processo, de modo a observar e identificar a sua gênese
social, bem como as transformações que ocorrem durante o evento
analisado. Concordando com Góes (2000, p. 15),

Essa análise não é micro porque se refere à curta


duração dos eventos, mas sim por ser orientada
para minúcias indiciais – daí resulta a necessidade
de recortes num tempo que tende a ser restrito.
É genética no sentido de ser histórica, por focali-
zar o movimento durante processos e relacionar

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condições passadas e presentes, tentando explorar


aquilo que, no presente, está impregnado de pro-
jeção futura.

Desse modo, ela está dirigida para as interações sociocultu-


rais, responsáveis pela constituição e pelo desenvolvimento huma-
no. Por isso, é importante que seja observado em detalhes os pro-
cessos, ações e relações interpessoais que os sujeitos estabelecem.
Além disso, preocupamo-nos em entender e relacionar os eventos
com a prática social, buscando a compreensão do desenvolvimento
das ações do sujeito e a explicação de suas construções e transfor-
mações cognitivas.
De acordo com Maria Cecília Rafael de Góes (2000), a es-
colha dos episódios é subjetiva e está relacionada com o fenô-
meno que se quer observar e analisar. Com base nessa premissa,
selecionaram-se episódios em que os alunos fazem uso da língua
oral e episódios em que existe interação entre eles e a professora.
Assim, observamos, acompanhamos e analisamos a evolução dos
alunos na apropriação do conhecimento relativo à língua, o papel
da mediação nesse processo e também o desenvolvimento do tra-
balho pedagógico.
Durante o curso de espanhol, objetivamos, em cada aula, es-
tabelecer a comunicação com o aluno na língua estrangeira, uma
vez que o espanhol é uma língua próxima ao português e permite
que, já na primeira aula, o aluno consiga falar. Não houve a ne-
cessidade de criação de material específico ou reduzido, mas de
adaptação desse material ao braile, aos cegos, e a fontes amplia-
das e com os contrastes necessários à especificidade de cada aluno
com baixa visão. O importante é que o professor tenha um objetivo
estabelecido em cada conteúdo trabalhado, devendo antecipar as
necessidades específicas dos seus alunos para que eles possam ter
acesso ao conteúdo escolhido.

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Apresentação e discussão dos episódios selecionados4


Episódio 1

Propusemos, nesta aula, que os alunos praticassem o conteúdo


iniciado na aula anterior (“saludos y presentaciones”). Para isso, a
professora trabalhou com um áudio (CD de livro didático) em que
quatro pessoas (uma argentina, uma espanhola, uma venezuelana
e uma nicaraguense) se apresentavam, falando sobre alguns dados
pessoais de sua vida. A proposta era que os alunos, de posse do co-
nhecimento de algumas estruturas de apresentação pessoal, se apre-
sentassem uns aos outros em sala de aula. Nos exemplos do material
didático de compreensão auditiva, os personagens diziam, sequen-
cialmente, nome, lugar de nascimento, lugar onde vive atualmente,
a idade e onde estuda. A partir desses exemplos, os alunos deveriam
fazer a mesma atividade oral, já utilizando o conhecimento do qual
se apropriou em aula anterior. A professora sugere que alguém inicie
a atividade oral, mas todos permanecem em silêncio. Assim, a pró-
pria professora dá o início à atividade, apresentando-se.

Professora: Eu começo então...me llamo Carol...


soy de São Paulo, pero vivo en São Carlos...estu-
dio en ________ y soy profesora... ¿Algo más que
quieran saber?
Fabiana: Que você estudia?
Professora: Estudié Letras y ahora estudio Educa-
ción Especial (…)
Antônio: ((Faz movimento de cabeça para o
lado da professora e fica em silêncio aguardando
auxílio para começar a falar)) Me llamo Antônio...
como fala?((se referindo à fala seguinte))
Professora: Soy de...
Antônio: Soy de São Paulo pero vivo em São Car-
los...que mais
Professora: Estudio...

4
Apresentaremos, neste texto, dois episódios dos sete analisados na pesquisa.

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Antônio: Estudio en cursinho da UFSCar...


Professora: Vai Diego...
Antônio: Isso Diego...fala tudo da sua vida pra nós
Diego: ((risos)) Ahn...buenas tardes...hola...me
llamo Diego…soy de Piauí:::… ((fica em silêncio
olhando para a professora aguardando auxílio
para continuar))
Professora: Agora você fala de onde é
Antônio: Pero vivo ((interferindo para ajudar
Diego a lembrar))
Diego: Pero vivo en São Carlos...
Professora: ¿Y estudias?
Diego: Eu estudo:::…eu estudo:::…
Professora: Estudio en...
Diego: Estudio en cursinho Casa Aberta
((Antonio começa a ler seu material em braille da
aula anterior enquanto Fabiana começa a falar))
Fabiana: Yo me llamo Fabiana...eh…soy de Ara-
raquara ((faz uma pausa e fica olhando para a
professora e sorrindo esperando como se estivesse
esperando auxílio para continuar, mas não fala,
apenas sinaliza titubeando))
Professora: Pero...
Fabiana: Pero vivo en São Carlos:::…((nova pausa,
mas não solicita ajuda da professora, rapidamente
retoma a sua fala)) tengo vinte anos…eh:::…estu-
dio en cursinho Casa Aberta…como fala estudei?
Professora: Estudié
Fabiana: Estudié musica...
(…)
Roberto: Yo me llamo Roberto...soy de São Car-
los…vivo en São Carlos…eh…estudio en Dioce-
sano…eh:::… como é estudei mesmo?
Professora: Estudié
Roberto: Estudié musica...eh:::...toco sax (infor-
mação verbal).

A primeira situação que o episódio revela é a professora ex-


plicando aos alunos os passos da atividade que devem realizar.

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Para isso, ela mesma inicia a tarefa proposta para que os alunos
sigam o modelo. De acordo com Saviani (2008b), a apresentação
de passos para os alunos é um recurso didático, pois o que há “são
momentos que se articulam toda vez que se quer ensinar algo”
(Marsiglia, 2011, p. 107). Além disso, os alunos realizaram
essa atividade utilizando o material didático da primeira aula,
além do áudio, e, em conjunto com a professora, realizaram a
atividade proposta. No entanto, houve a necessidade de constan-
tes intervenções nas falas dos alunos, sempre solicitadas por eles
mesmos, ora com silêncio, aguardando instruções, ora pergun-
tando diretamente. À medida que os primeiros foram falando, os
que ficaram para depois não precisaram de tanta ajuda, pois já
haviam escutado o áudio (modelo), a professora e os demais cole-
gas, como foi o caso do aluno Roberto.
De acordo com Vigotski (1995), a mediação é importante
para que os alunos passem de um nível de conhecimento a outro,
no entanto, à medida que vai se apropriando desse conhecimento,
passa-se a requerer outros para dar continuidade ao desenvolvi-
mento. No episódio analisado, os alunos sentiram a necessidade de
novos vocabulários para as produções orais; logo, novas necessida-
des emergiram. Conforme afirma Saviani (2008b), nesse momento,
o professor precisa ter claro o modo como irá atuar com o aluno,
como irá abordar os temas planejados, mostrando a eles a impor-
tância do conhecimento.
Segundo o autor, o professor que tem o domínio do que está
ensinando consegue lidar com as novas situações que aparecem
em sala de aula. Com relação ao trabalho docente, o conteúdo foi
passado do modo como havia sido planejado, os alunos participa-
ram da aula atuando em todos os planos, participando da atividade
proposta e, nesse caso específico em que não havia a exigência dos
alunos saberem a forma escrita da palavra, o material impresso não
foi o elemento mais importante. Apenas um aluno fez menção de
consultá-lo, conforme exposto no episódio.

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De acordo com Ana Luiza Bustamante Smolka e Maria Cecília


Rafael de Góes (1997), a constituição do conhecimento é resultado
de interações intersubjetivas, sempre mediadas, processo no qual
a linguagem tem função central. Segundo as autoras, a profunda
relação entre o desenvolvimento e a importância da linguagem se
deve ao fato de que a “elaboração cognitiva se funda na relação com
o outro” (SMOLKA E GÓES, 1997, p. 9). Portanto, nesse episódio
particular, o áudio que foi tomado como modelo e a mediação da
professora foram suficientes para que os alunos compreendessem o
que era requerido na atividade e do que se tratava o conteúdo.
Segundo Saviani (2008b), cabe ao professor oferecer subsí-
dios para que os alunos apropriem-se dos instrumentos culturais
produzidos pela humanidade. Essa produção do saber se dá no in-
terior das relações sociais e supõe o domínio dos “instrumentos de
elaboração e sistematização”. O material impresso não foi o fator
mais importante nessa aula, mas o modelo em áudio (nesse caso,
tanto o do material em CD quanto a professora iniciando a ativi-
dade) e a mediação constante da professora, auxiliando com voca-
bulário e estruturas linguísticas, e principalmente, na compreensão
do que estava sendo trabalhado em aula.

Episódio 6

A aula referente a esse episódio teve como conteúdo verbos


pronominais e vocabulário para expressar ações habituais e rotina
diária. Como atividade, a professora sugeriu que os alunos falassem
sobre suas rotinas e as coisas que mais gostam de fazer. Roberto
não tinha o material impresso em braile referente ao conteúdo pro-
posto, portanto, fez uso apenas do áudio. Apenas Diego tinha o
material impresso ampliado. Antes desse momento, os alunos escu-
taram um diálogo, gravado em CD que acompanha o livro didáti-
co, em que as personagens (mãe e filha) falavam sobre rotina.

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Figura 1 – Diálogo representativo de uma rotina diária

Fonte: BRIONES; FLAVIAN; FERNÁNDEZ, 2003.

Diálogo representativo de uma rotina diária.

Professora: Yo puse en el papel algunas expresio-


nes que ayudan a hablar de rutina. Por ejemplo,
voy a contarles mi rutina ((a professora conta sua
rotina diária como exemplo para que os alunos
possam ter base de como deveria ser a atividade
oral)). Ahora ¿cuál de los dos va a hablar de la ru-
tina? Eu ajudo.
Professora: ¿A qué horas te despiertas Diego?
Diego: Onze
Professora: Vamos juntos…me despierto a las
once de la mañana.
Diego: Me despierto a las once de la mañana.
Professora: ¿Y qué haces después?
Diego: Tomo café
Professora: Desayuno ((corrigindo Diego))
Diego: Desayuno

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((O aluno está com o material impresso em mãos,


mas não consulta. A professora pega o material e
mostra a ele a expressão))
Professora: Desayuno...
Diego: Once y dos más o menos
Professora: Que puntual ((O grupo ri))
((A partir desse momento Diego começa a consul-
tar o material para dar continuidade à atividade))
Diego: Estudio...(...)
Professora: ¿Hasta que horas?
Diego: Siete
Professora: Não vale falar só sete ((risos))...
Diego: Estudio hasta las siete de la noche
Professora: Muy bien...Roberto, ahora tú.
Roberto: Me despierto a las seis e cinco, me levan-
to a las seis e trinta e cinco, […] como é mesmo
escovo os dentes?
Professora: cepillo los dientes
Roberto: no, no...antes lavo la cara, desayuno, des-
pués cepillo los dientes […] como é saio de casa?
Professora: Salgo de mi casa
Roberto: Salgo de mi casa a las siete e cinco, llego
a la escuela a las siete e diez.
Roberto: estudio até medio-dia, después […]
como é almoço mesmo?
Professora: almuerzo…
Roberto: Almuerzo, después me acuesto un po-
quito. A las cuatro hago la merienda, as seis […]
como é tomo banho mesmo?
Professora: A las seis me ducho
Roberto: A las siete voy a la iglesia, llego en casa a
las nueve e media […] janto como é mesmo?
Professora: ceno
Roberto: Ceno y […] me acuesto a las once.
(informação verbal).

Como nas aulas anteriores, a professora inicia as ativida-


des do dia com uma explicação oral sobre o tema, apresenta um

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diálogo simulando o real e, então, sugere que os alunos façam o mes-


mo, trazendo o conteúdo aprendido para a sua realidade cotidiana.
De acordo com João Luiz Gasparin (2003, p. 19), o professor,
“antes de iniciar o seu trabalho com os alunos já deve ter realiza-
do o planejamento de suas atividades [...] Sua própria condição de
guia de trabalho pedagógico implica que já tenha realizado, como
preparação, todo o percurso pelo qual o aluno vai passar”. Nota-se,
nesse episódio, que a professora apresenta a atividade por passos,
para que os alunos primeiro compreendam do que se trata a aula e,
em seguida, possam ter contato com o conteúdo para, então, rea-
lizar a atividade oral, com base nos conteúdos que teve acesso em
aulas anteriores somados ao novo tema.
No início da fala, a professora conta sua própria rotina, para
exemplificar aos alunos o que devem fazer; assim eles têm aces-
so a mais de um modelo. Segundo Gasparin (2003, p. 89), “a ação
do professor é fundamental na operação mental do aluno”, pois o
que ele consegue realizar sozinho está em interação com os conhe-
cimentos dos quais se apropriou, “pela imitação do modelo que
aprendeu”. No entanto, mesmo com os modelos, Diego aguarda a
professora iniciar, apesar de ser seu momento de falar, buscando
auxílio para realizar a atividade. O aluno não demonstra segurança
para começar, diferentemente de Roberto, que, em seu momento
de falar, mostra destreza na articulação das ideias apresentadas e
bom uso da língua. No entanto, Roberto estava sem o material im-
presso em braile, ao contrário de Diego.
Sabemos que cada indivíduo tem modo e tempo próprio de
apropriar-se do conhecimento. Além disso, a história de vida es-
colar é um fator relevante a ser considerado, dado que Roberto e
Diego estudaram em escolas distintas. A cegueira de Roberto, que,
no senso comum, seria compreendida como um fator que dificulta
o aprendizado do aluno, no episódio referido constata-se que não
foi uma barreira para a compreensão e realização da atividade. No

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entanto, Diego, que tem baixa visão e estava de posse do material


didático, teve um pouco de dificuldade em realizá-la sozinho, no
início. Com esse aluno, a professora precisou fazer mais interven-
ções. Contudo, pode-se afirmar que a atividade realizada por Diego
também foi bem sucedida, necessitando apenas de mais interven-
ções do que com Roberto.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em meio à discussão sobre como ensinar língua estrangeira,


os estudos mostram diversas perspectivas sobre como se deve ensi-
nar e quais métodos empregar nesse processo. Neste estudo, vimos
que não se trata de aplicação de métodos ou de elaboração de ma-
terial didático específico aplicável a todos os alunos nas mesmas
condições; trata-se, sim, de compreender o sistema educacional na
atualidade, que, conforme Saviani (2008a), é um sistema que repro-
duz, no interior da escola, a realidade de desigualdade que acontece
do lado de fora de seus muros.
De posse dessa compreensão, o professor tem em suas mãos
a possibilidade de trazer à sala de aula mudanças que possam, efeti-
vamente, promover uma educação que forme os alunos para a atua-
ção na sociedade, não de forma passiva, e sim como sujeito ativo e
participante. Essa é a função inicial da escola, é nesse conceito que
se deveria fundamentar a sua base, conforme afirmamos no início
deste artigo. Para que isso possa ser uma realidade, as bases teóricas
aqui apresentadas propõem uma reflexão por parte do professor e
de todos os profissionais da educação. Por isso, concordamos com
Saviani quando este afirma que todo ato educativo deve ser inten-
cional e que o trabalho docente é basicamente mediador. Essa con-
cepção de educação e de ensino é extensível a todos os professores,
incluindo, aqui, os de língua estrangeira. Portanto, para que o tra-
balho de mediação seja eficaz, o professor precisa ter consciência

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ISSN 2237-258X

de seu papel social na sala de aula, na formação do indivíduo. De


posse desse conhecimento, ele poderá, então, aprimorar seu fazer
docente e deixar de lado os métodos de ensino, máxima de todo
professor de língua.
A partir da pesquisa realizada que gerou este artigo, pode-
mos levantar algumas hipóteses a respeito do ensino de línguas
para alunos com deficiência visual. Uma delas é que não existe um
único método possível, aplicável para proporcionar o aprendizado
efetivo desse aluno; existe, sim, uma teoria pedagógica, a Pedago-
gia Histórico-Crítica, que fornece aporte teórico para o trabalho
pedagógico, inclusive no ensino de língua estrangeira. Por isso, é
importante mostrar, aqui, que, ainda que com poucos recursos, é
possível promover a esses alunos o acesso não apenas às salas de
aula, mas também ao conhecimento científico, que liberta, promo-
ve a cidadania e assegura os direitos sociais. Viabilizar esse acesso é
papel da escola e do professor.
O conceito de mediação, discutido por Saviani e usado como
base para esse trabalho, mostrou que, mais do que materiais adapta-
dos ou que estimulem os demais sentidos do aluno cego e com baixa
visão, existe a necessidade de um professor presente, interagindo e
mediando os processos cognitivos, seja com o material didático ou
com o conhecimento anterior, sempre por meio da linguagem.
Toda a organização inicial do curso realizado considerou
o fato dos alunos serem indivíduos com deficiência visual, preo-
cupando-se não com relação ao nível e à quantidade de conteú-
do a ser ensinado, mas sim com relação à necessidade de adapta-
ção do material (braile e ampliado) para que os alunos pudessem
participar da aula com autonomia. No entanto, ressalta-se aqui
que, mesmo em momentos em que os alunos não estavam com o
material impresso em mãos, a aula aconteceu, apesar de maiores
dificuldades em alguns conteúdos, o que foi suprido pela mediação

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da professora ao explicá-los oralmente, fazendo uso de exemplos e


modelos para a realização das atividades orais.
O propósito era que os alunos pudessem iniciar a comuni-
cação em espanhol, que conseguissem ter boa compreensão audi-
tiva e pudessem compreender o que leem. Para isso, foi necessário
ter consciência de que, sem planejamento, não haveria meios de
ministrar aulas a esse grupo. Além disso, apresentar as intenções
formativas, em um planejamento que considere todas as necessida-
des dos alunos, pode contribuir para o desenvolvimento de práticas
conscientes no ensino de espanhol, indicando quais aspectos de-
vem ser priorizados no ensino dessa disciplina, revelando possibili-
dades de adequação para o ensino de alunos com deficiência visual.
Com o aumento no número de matrículas de alunos com de-
ficiência nas escolas, tanto no ensino fundamental como no ensino
médio, caberia uma proposta aos cursos de licenciatura em Letras
que formam professores de língua estrangeira: faz-se necessário
contemplar conteúdos relacionados ao ensino da LE para alunos
público-alvo da Educação Especial, de modo a romper as dúvidas
que ainda rondam os professores sobre a incapacidade desses es-
tudantes ou sobre a dificuldade de se elaborar material didático
específico para eles. A disciplina de Libras, nos cursos superiores
de licenciatura, é uma pequena conquista para o rompimento de
barreiras e estigmas sobre alunos surdos. Porém, é pouco, pois
muitos são os estudantes com deficiência visual e outras tantas
Necessidades Educacionais Especiais que, hoje, estão na escola e
que chegam ao Ensino Médio e encontram professores inseguros e
sem formação para a realização de seu trabalho com esses alunos.
É imprescindível, portanto, que haja um trabalho de interface entre
a Educação Especial e os cursos em licenciatura, para que a demo-
cratização do ensino seja plena e efetiva e para que todos os brasi-
leiros possam ter acesso a uma educação de qualidade, formativa,
que promova a participação social.

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214 Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.189-215, maio/ago. 2015
Segunda Parte

Práticas pedagógicas e
Atendimento Educacional
Especializado
ISSN 2237-258X

A EDUCAÇÃO ESPECIAL, A SALA DE


RECURSOS E OUTROS SERVIÇOS
ESPECIALIZADOS NO BRASIL (1973-1986)
Special Education, the Resource Room and other
specialized services in Brazil (1973-1986)
La Educación Especial, Clase del Recursos y otros
servicios especializados en Brasil (1973-1986)

Andressa Santos Rebelo1

Resumo
Neste texto, objetivamos analisar a Educação Especial, a Sala de Recursos
e outros serviços especializados previstos nos documentos educacionais,
no Brasil, no período de 1973 a 1986, que corresponde à criação e ex-
tinção do Centro Nacional de Educação Especial (CENESP). A fim de
cumprir tal objetivo, buscamos empreender tal análise em documentos
(normativos e orientadores), a fim de estabelecer: de que forma as Salas
de Recursos são definidas nos documentos do Ministério da Educação e
Cultura (verificando se há identificação com o atendimento especializa-
do); como se desenvolve o conceito de atendimento especializado ofere-
cido nas Salas de Recursos em cada documento, verificando o momento
em que é introduzido o termo “Atendimento Educacional Especializado”;
e quais serviços estão previstos como atendimento especializado.

PALAVRAS-CHAVE: Educação Especial. Sala de Recursos. Serviços es-


pecializados.

1
Professora da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) - Campus
Pantanal, doutoranda em Educação pela mesma instituição.
E-mail: andressa.rebelo@ufms.br

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ISSN 2237-258X

Abstract
In the paper, we aimed to assess Special Education, the resource room
and other specialized services included in educational documents in
Brazil from 1973 to 1986. The period corresponds to the creation and
extinction of the National Special Education Center (CENESP). We thus
analyzed (normative and guidance) documents, in order to establish: the
way the documents of the Ministry of Education and Culture defined
the Resource Rooms (by checking whether they were identified with
specialized services); the way the concept of specialized care offered in
Resource Rooms appeared in each document (by checking when the
term “Specialized Education” was introduced); and what services were
listed as specialized care.

KEYWORDS: Special Education. Resource Room. Specialized Services.

Resumen
Este trabajo tiene el objetivo de evaluar la Educación Especial, la sala de
recursos y otros servicios especializados en los documentos educativos
en Brasil desde el 1973 hasta el 1986. Este período corresponde a la
creación y extinción del Centro de Educación Especial Nacional
(CENESP). Para cumplir con esta proposición, se busca realizar
un análisis en los documentos normativos (y asesores) con el fin
de establecer: cómo se definen las características de las Clases del
Recursos en los documentos del Ministerio de Educación y Cultura
(comprobación de identificación y servicios especializados); cómo se
desarrolla el concepto de la atención especializada que se ofrece en las
Clase del Recursos en cada documento, identificando la fecha en que
el término “Educación Especializada” surge en las proposiciones; y qué
servicios se proporciona como una atención especializada.

PALABRAS CLAVE: Educación Especial. Clases del Recursos. Servicios


especializados.

INTRODUÇÃO

A primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional


(LDBEN), Lei nº 4.024/1961, condiciona a educação do excepcional

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“no que for possível” no sistema geral de educação, mantendo-se


a subvenção a “toda iniciativa privada considerada eficiente pelos
conselhos estaduais de educação”, recebendo dos poderes públicos
“tratamento especial mediante bolsas de estudo, empréstimos e sub-
venções” (BRASIL, 1961, grifo nosso). Criadas na primeira metade
do século XX, as instituições especializadas de caráter filantrópico,
mesmo ainda não possuindo uma estrutura burocraticamente or-
ganizada, já se faziam presentes no cenário político enquanto pos-
sibilidade de consolidação do atendimento ao excepcional. Assim,
a passagem que se refere ao tratamento especial a essas instituições
quanto a subvenções, nessa lei, sinaliza tanto a tentativa de tornar
a inserção do deficiente no sistema geral de educação, “no que for
possível”, um horizonte (JANNUZZI; CAIADO, 2013), como tam-
bém a busca pela naturalização e legitimação dessas instituições
enquanto defensoras dos direitos das pessoas com deficiência.
Na Lei Educacional n.º 5.692/1971, afirma-se que “os alu-
nos que apresentem deficiências físicas ou mentais, os que se en-
contrem em atraso considerável quanto à idade regular de matrícula
e os superdotados deverão receber tratamento especial, de acordo
com as normas fixadas pelos competentes Conselhos de Educação”
(BRASIL, 1971, art. 9°, grifo nosso). Nesse dispositivo legal, não
se garante a obrigatoriedade dos serviços a serem prestados, nem
se cita sob que condições as pessoas com deficiência deveriam ser
atendidas. Destaca-se o fato de ser incluído no rol daqueles que
deveriam receber tratamento especial os alunos com dificuldades
de aprendizagem, em situação de distorção idade-série.
Considerando o período posterior à promulgação desses dois
importantes dispositivos legais, neste texto, objetivamos analisar a
Educação Especial, a Sala de Recursos e outros serviços especia-
lizados previstos nos documentos educacionais no Brasil entre
1973 e 1986. Tal período corresponde à criação e extinção do Cen-
tro Nacional de Educação Especial (CENESP). Importa destacar,

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também, que, no ano de 1986, são criadas a Coordenadoria Nacio-


nal para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência (CORDE)
e a Secretaria de Educação Especial (SESPE) em substituição ao
CENESP.
A fim de cumprir tal objetivo, buscamos empreender tal aná-
lise em documentos (normativos e orientadores), a fim de estabe-
lecer: de que forma se define as Salas de Recursos nos documen-
tos do Ministério da Educação e Cultura (MEC) (verificando se há
identificação com o atendimento especializado); como se desen-
volve o conceito de atendimento especializado oferecido nas Salas
de Recursos em cada documento, verificando o momento em que
é introduzido o termo “Atendimento Educacional Especializado”; e
quais serviços estavam previstos como atendimento especializado.

Serviços e atendimentos em Educação Especial no Brasil


(1973-1986)

Como consequência de uma preocupação já sinalizada em


documentos educacionais anteriores, no ano de 1973 foi criado
pela Secretaria Geral do Ministério da Educação e Cultura (MEC)
um grupo-tarefa destinado a realizar a implantação do Centro Na-
cional de Educação Especial (CENESP), promover a extinção da
Campanha Nacional de Cegos (CENEG) e da Campanha Nacional
de Deficientes Mentais (CADEME) e elaborar a estrutura e regi-
mento interno daquele Centro (BRASIL, 1973a, 1973b). A concep-
ção era de que a inserção e o acesso de tais pessoas aos serviços
educacionais se tornaria instrumento de participação (progressiva)
na sociedade. O próprio Decreto n.º 72.425/1973, que cria o CE-
NESP, estabeleceu que este órgão deveria atuar de forma a propor-
cionar oportunidades de educação, propondo e implementando
estratégias decorrentes dos princípios doutrinários e políticos que
orientam a Educação Especial no período pré-escolar, nos ensinos

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ISSN 2237-258X

de 1º e 2º graus, superior e supletivo para os deficientes visuais,


auditivos, mentais, físicos, educandos com problemas de conduta,
para os que possuam deficiências múltiplas e para os superdotados,
“visando sua participação progressiva na comunidade” (BRASIL,
1973c, grifo nosso).
Na mesma década, foi publicada a Portaria Interministerial
n.º 186/1978, firmada entre o MEC e o Ministério da Previdência e
Assistência Social (MPAS). No momento da assinatura e da publi-
cação da Portaria, L. G. do Nascimento e Silva, então Ministro da
Previdência e Assistência Social sinalizou em seu discurso:

[...] quero salientar que nada poderíamos fazer não


fossem o apoio, o auxílio, a abnegação das entida-
des que se dedicam a essa proteção, além do auxílio
dos senhores e das senhoras, que de fato, se orga-
nizaram através de várias entidades por todo esse
Brasil, para atender a esse problema humano da
maior gravidade e que aflige incrivelmente a paz,
tendo conotações com o próprio complexo fami-
liar, porque, de fato, quem quer que tenha um ex-
cepcional no seio familiar, sabe o que representa
essa circunstância infeliz e das dificuldades para
a educação dos demais filhos quanto à harmonia
familiar (BRASIL, 1978a, p. 55, grifo nosso).

Na mesma ocasião, o Ministro da Educação e Cultura, Ney


Amiethas de Barros Braga, afirmou:

Temos [...] um compromisso em favor daqueles


que mais precisam de nós. Ajudando os excepcio-
nais estaremos cultivando o amor e atendendo a
uma das classes mais humildes e menos favoreci-
das. Assim, Senhor Ministro Nascimento e Silva,
vamos assinar uma Portaria que aprova um Re-
gimento que poderá ser melhor analisado, reexa-
minado, revisto, aperfeiçoado, para que somemos

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esforços, como estamos somando agora, em favor


do excepcional. A nossa geração tem pois o dever,
generoso e humano, de contribuir para a solução
de um dos graves problemas que afetam o nosso de-
senvolvimento (BRASIL, 1978a, p. 57, grifo nosso).

Para além das demonstrações de estreito relacionamento


entre Estado e instituições especializadas, passando pela questão
da solidariedade e de concepções que hoje nos parecem precon-
ceituosas (ao se referir à deficiência como “circunstância infeliz”),
fica claro, através dessas colocações, que o estabelecimento dessas
diretrizes visava resolver um grave problema social, que era enten-
dido como perturbação à organização racional da sociedade, pois,
além de afligir incrivelmente a paz, afetava o desenvolvimento, aqui
entendemos, econômico. Esses fragmentos ilustram os discursos
correntes na sociedade, cujo modo de produção econômica está
intimamente relacionado ao desempenho, à performance e ao
mérito. Nessa forma de organização, o espaço do deficiente estava
mais que determinado.
Conforme a Portaria Interministerial n.º 186/1978, o atendi-
mento educacional deveria ser prestado em estabelecimentos dos
sistemas de ensino regular, em cursos e exames do ensino supleti-
vo, em instituições especializadas, simultaneamente, nos sistemas
de ensino regular ou supletivo (em classes comuns ou classes es-
peciais) e em instituições especializadas de natureza educacional
(BRASIL, 1978b,). A Educação Especial se vinculava, portanto, ao
Atendimento Educacional Especializado, quase se identificando
com este, pois se reconhece que os alunos considerados deficien-
tes deveriam receber atendimento educacional diferenciado. Para
excepcionais em “classes comuns” ou “classes especiais” seria ofere-
cido, “na medida do possível e sempre que necessário”, atendimen-
to complementar individual ou em grupo, sob orientação de pro-
fessor especializado em “salas providas de recursos”, devidamente

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instalados e equipados (BRASIL, 1978b). Estavam previstas assis-


tência técnica e financeira do MEC às unidades federadas, presta-
das, principalmente, nas áreas de adaptação, ampliação ou cons-
trução de unidades de Atendimento Educacional Especializado,
compreendendo, dentre outras, Salas de Recursos, classes especiais
e oficinas pedagógicas (BRASIL, 1978b).
No documento Proposta Curricular para Deficientes Mentais
Educáveis (1979),2 diz-se que a Educação Especial “tem sido defini-
da como um serviço de complementação e suplementação do pro-
grama escolar regular proporcionando a uma criança excepcional,
no sentido de assisti-la em seu desenvolvimento e em suas poten-
cialidades e/ou corrigi-las em suas dificuldades” (BRASIL, 1979a,
p. 13, grifo nosso). Os conceitos de complementação e suplementa-
ção dos serviços especializados aos serviços educacionais comuns,
atualmente muito presentes na política de inclusão escolar brasilei-
ra, já eram enfatizados nas propostas do CENESP. Entretanto, ao
contrário do que se afirma na atualidade, que a Sala de Recursos
deve ser o lócus prioritário para o Atendimento Educacional Es-
pecializado complementar (a estudantes com deficiência e trans-
tornos globais do desenvolvimento) e/ou suplementar (para estu-
dantes com altas habilidades ou superdotação) (BRASIL, 2011), na
Proposta de 1979 se afirmava:

Do mesmo modo como está conceituada a educa-


ção especial, ela se insere no contexto educacio-
nal regular, seja como complementação (em salas
especialmente equipadas que são chamadas de sa-
las de recursos), seja como suplementação (e, no
caso, em classes comuns). A essas modalidades de
atendimento, salas de recursos e classes especiais,
somam-se: atendimento com o recurso de pro-
fessores itinerantes, atendimento em instituições

2
Baseando-se nos escritos de Samuel A. Kirk (1972) (BRASIL, 1979a).

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especializadas, atendimento em classe hospitalar


e atendimento domiciliar (BRASIL, 1979a, p. 13,
grifo nosso).

Assim, os sentidos do que seria complementar ou suplemen-


tar eram outros, não necessariamente relacionados à deficiência do
alunado, pois se previa que o atendimento em Salas de Recursos se
inseria no contexto educacional regular de modo complementar. O
complementar cabia, portanto ao atendimento em Salas de Recur-
sos e o suplementar, ao atendimento oferecido em classes comuns.
O documento afirma ainda que cada criança possui características
especiais, “daí a necessidade de diversificação de tratamentos espe-
ciais, que serão indicados a esta ou àquela criança, de acordo com
suas necessidades” (BRASIL, 1979a, p. 13).
Ainda na Proposta (1979a, p. 13-14, grifo nosso), eram pre-
vistos os seguintes atendimentos:

Salas de recursos: [...] local onde, num determi-


nado período do dia, a criança com aprendizagem
lenta recebe aulas especiais de um professor trei-
nado para esse atendimento. Essa modalidade im-
plica em que o aluno permaneça na sala de aula co-
mum, participando das atividades diárias com seus
companheiros ditos normais, recebendo, porém, as-
sistência especializada nessa sala de recursos.

Classes especiais: São salas exclusivamente desti-


nadas a crianças excepcionais, com um número
reduzido de matrícula por turma (15 a 20 alunos).
Esse grupo tem permanente o mesmo professor
especializado, que prepara o plano de curso e os
de aula, de acordo com as necessidades de seus
alunos. Fora do período de sala de aula, as crian-
ças podem ter contato com seus colegas de classes
regulares, seja na hora do recreio, na merenda, nas
atividades extraclasse, em comemorações, etc.

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Professor itinerante: É uma espécie de consultor


especializado, que trabalha junto ao professor re-
gular, fornecendo-lhe subsídios para as aulas su-
plementares a serem oferecidas às crianças retar-
dadas que estiverem em sua turma.

Instituições especializadas: São estabelecimentos


que dispõem de recursos materiais e humanos,
onde os deficientes mentais podem permanecer em
regime de atendimento de externato, semi-interna-
to ou internato. As instituições especializadas desti-
nam-se a excepcionais de determinada categoria e,
exceto sob circunstâncias especiais, não tem contato
regular com crianças ditas normais.

Atendimento em classe hospitalar: O próprio tipo


já sugere que esse recurso é específico àqueles que,
provisória ou - em alguns casos menos freqüen-
tes-, permanente, necessitam permanecer interna-
dos em hospitais. Tal modalidade é mais comum
para deficientes físicos, com ou sem retardo men-
tal. A classe hospitalar é atendida por professor
especializado, que atende às crianças, individual-
mente ou em grupo, sempre dentro das necessida-
des do educando.

Atendimento domiciliar: Destina-se àqueles que,


por razões de força maior, não podem deslocar-se
para centros comunitários assistenciais. Há tam-
bém a modalidade de atendimento domiciliar
como complementação das atividades da escola
regular, onde o aluno apresenta dificuldades, po-
dendo beneficiar-se com as “aulas particulares”.

Nosso projeto englobará estudos sobre as modali-


dades da sala de recursos (em princípio previsíveis
para os lentos) e as das classes especiais (aparente-
mente a solução mais imediata a ser adotada, seja
para os lentos e/ou para os educáveis propriamente

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.215-236, maio/ago. 2015 225
ISSN 2237-258X

ditos). O que nos parece fundamental é, sinteti-


zando as características dos educáveis, apresentar
alguma informação que substancie o trabalho do
professor.

Essa disposição dos serviços demonstra o que fora anterior-


mente afirmado no documento: a depender das características do
público da Educação Especial, os serviços seriam diversificados.3
A criança a ser encaminhada à Sala de Recursos possuiria a carac-
terística de ter aprendizagem “lenta”, enquanto as classes especiais
incorporariam um público maior, abrangendo “lentos e educáveis”.
Entre os serviços dispostos, o documento sugere ser o atendimento
em Sala de Recursos menos segregador. Entretanto, não se expli-
cita a natureza do atendimento a ser disponibilizado nesse espaço,
principalmente no que se refere à escolarização formal, pois o sig-
nificado de “assistência especializada” a ser prestada nessa sala não
chega a ser esclarecido. O mesmo ocorre em relação à descrição do
atendimento em classes especiais e em classes hospitalares, prio-
rizando-se a sua caracterização em detrimento do detalhamento
sobre o trabalho pedagógico a ser executado.
A figura do professor itinerante é apresentada como auxiliar
à do professor do ensino comum, denominado professor regular.
Entre os serviços, têm-se as instituições especializadas, ressaltan-
do o aspecto de que nelas os excepcionais não teriam contato com
os demais. O atendimento domiciliar se destinaria tanto àqueles
que não pudessem frequentar instituições especializadas, quanto
aos que frequentassem o ensino comum (provavelmente em classes
especiais) e necessitasse de atendimento especializado complemen-
tar. Tomada como objetivo a ser concretizado em longo prazo, a

3
Nesse sentido, é importante assinalar que, além de serem previstas Salas de
Recursos para deficientes mentais, estavam previstas também Salas de Recursos
exclusivas para deficientes visuais (BRASIL, 1979b).

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ISSN 2237-258X

instalação de Salas de Recursos, conforme o documento, deveria


ceder espaço às classes especiais, solução esta “mais imediata” e,
portanto passível de ser concretizada.
Na Proposta Curricular para Deficientes Mentais Educáveis
- Manual do Professor (1979), dispõe-se sobre a organização das
modalidades de atendimento em forma de pirâmide, segundo a
qual, obedecendo a uma hierarquia, tem-se na base os casos mais
leves a serem atendidos em classes comuns, e, no vértice, os casos
mais extremos a serem atendidos em hospitais. Considerando os
serviços menos segregados (base, com maior número de casos) aos
mais segregados (topo), recomendavam-se as seguintes modalida-
des: “outros problemas atendidos em classes”, “classe regular com
consultor”, “classe regular com ensino suplementar ou tratamento”,
“classes regulares mais salas de recursos”, “classe de tempo parcial”,
“escola especial (tempo integral)”, “escola especial (externato)”, “es-
cola residencial”, “escola em hospital”, “hospitais e centros de trata-
mento” (BRASIL, 1979c, p. 10-11).
A Proposta Curricular para Deficientes Auditivos (1979) con-
siderava as seguintes possibilidades para o atendimento dessa po-
pulação específica:

Dentre as diversas modalidades existentes na edu-


cação do deficiente auditivo, consideramos que
existem três possibilidades que poderiam propor-
cionar as melhores condições para o seu atendi-
mento: a inserção em escolas regulares, a colocação
em classes especiais anexas a escolas regulares, ou,
então, a inserção em escolas especializadas. Consi-
deradas as premissas básicas levantadas, em rela-
ção aos fins da educação especial, ao tipo de clien-
tela eleita e aos estágios de desenvolvimento social
que atingimos, optamos pela segunda alternativa,
que nos pareceu a de melhores perspectivas de re-
sultados positivos. [...] A população escolar referi-
da não poderia participar integralmente de classe

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regular, pois, para isso, seria necessário um tra-


balho desde os primeiros meses de vida, a fim de
que sua comunicação oral se desenvolvesse, pos-
sibilitando essa inserção. Estes poderão e deverão
ser encaminhadas para classes regulares (BRASIL,
1979d, p. 31, grifo nosso).

Estava posta, portanto, a condição para a inserção desse pú-


blico no ensino comum. Dessa forma, o atendimento em classe es-
pecial, além de ser considerado menos segregacionista, por colocar
os portadores de deficiência em convivência com os demais em
certos espaços (com exceção da sala de aula), e por ser, conforme o
documento, de fácil disseminação, também deveria ser fomentado
por outros motivos:

Este nos parece um esquema viável de atendimen-


to, pois reúne por um lado, uma forma de atuação
que possibilitará o verdadeiro desenvolvimento
dos deficientes da audição eleitos para participa-
rem deste projeto, ao mesmo tempo que, em termos
sociais e econômicos, parece ser a melhor solução
(BRASIL, 1979d, p. 32, grifo nosso).

No texto, o desenvolvimento da oralidade era o critério para


que os deficientes auditivos fossem encaminhados ao ensino comum
(BRASIL, 1979d). Em contrapartida, ao não se explicitar quem deve-
ria frequentar as classes especiais, deduz-se que estes seriam todos os
outros que não alcançassem esse tipo de desenvolvimento.
A Proposta Curricular para Deficientes Auditivos - Manual
do Professor (1979) especifica as condições mínimas necessárias à
integração do aluno com deficiência auditiva às classes ou escolas
comuns. Poderia ser feita a integração total dos deficientes auditi-
vos em classe de 1ª série, a integração em classe comum dos alunos
que foram submetidos à proposta e o encaminhamento dos alunos
que tenham sido atendidos em classes especiais que aplicaram a

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proposta curricular para continuarem seus estudos em classes co-


muns. Os critérios para o encaminhamento dependeriam do nível
de comunicação alcançado, do nível de escolaridade, das condições
emocionais do aluno e da continuidade do processo de reabilitação
da linguagem. As equipes responsáveis pela execução e pelo enca-
minhamento da proposta deveriam fazer orientações adequadas ao
aluno para enfrentar situações adversas na classe comum, à família
para colaborar e auxiliar no processo de integração, e à comuni-
dade, preparando-a para que o ingresso do deficiente auditivo no
meio social fosse facilitado (BRASIL, 1979e).
Na década seguinte, o documento Subsídios para organiza-
ção e funcionamento de serviços de educação especial: área da defi-
ciência mental (1984, p. 15) afirmava a possibilidades das seguin-
tes alternativas de atendimento a pessoas com deficiência mental
entre 7 e 14 anos:

Classe comum, com serviços de apoio especializa-


do, para o aluno DME [deficiente mental educável];
Sala de recursos, que oferece orientação e reforço
ao aluno DME que freqüenta a classe comum;4
Classe especial, integrada à escola comum para os
DME que não possam ser satisfatoriamente aten-
didos em classe comum;
Ensino itinerante, que poderá ser desenvolvido
no lar e no hospital, bem como na escola comum
onde não houver professor especializado. Essa al-
ternativa pode ser indicada para o aluno DME ou
DMT [deficiente mental treinável], de acordo com
cada caso;

4
No glossário do documento, o termo Sala de Recursos é descrito como mo-
dalidade de atendimento oferecida ao educando deficiente mental, em local ap-
ropriado, com professor especializado, que dispõe de material e recursos ped-
agógicos adequados para a orientação e/ou reforço da aprendizagem, sempre
que necessário (BRASIL, 1984).

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Escola especial, mais indicada para o aluno DMT e, so-


mente em casos especiais, para o aluno DME, quando
este apresentar outro tipo de comprometimento, ou em
regiões carentes, onde não haja possibilidade de outra
modalidade de atendimento (grifo nosso).

Mais uma vez, a Sala de Recursos é disposta como subsídio


à frequência em classe comum no caso, para o deficiente mental
educável. Em relação às especificações dos aspectos pedagógicos
do trabalho a ser realizado neste espaço, afirma-se que:

O atendimento em sala de recursos exige plane-


jamento conjunto entre o professor da sala de re-
cursos e o da classe comum; avaliação periódica
e sistemática da programação elaborada junto
ao educando; observação de critérios adequados
para agrupamentos dos alunos (idade cronoló-
gica, problemas, relacionamento no grupo, nível
de aprendizagem, entre outros). Será necessário,
também, seleção e disponibilidade de equipamen-
tos e materiais didáticos especializados, assim
como cronograma de atividades que possibilite o
atendimento adequado dos diferentes grupos, de
acordo com o número e as necessidades dos alunos
(BRASIL, 1984, p. 21, grifo nosso).

O atendimento em Salas de Recursos requeria, portanto um


planejamento conjunto entre o seu professor e o da classe comum,
uma avaliação sistemática e periódica e o agrupamento dos alunos
feito de forma criteriosa. Os materiais didáticos deveriam ser dis-
ponibilizados conforme as necessidades e número de alunos. Ao
citar o tipo de material didático e a formação do profissional para
atuar neste local, em relação ao público que possuía deficiência
mental, coloca-se que:

O tipo e quantidade de material didático e escolar


dependerão, principalmente, dos recursos financeiros
disponíveis, do nível da classe e da criatividade e

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conhecimento do professor, da necessidade de in-


troduzir novos métodos e tecnologias de ensino-
-aprendizagem. A formação do professor para a
sala de recursos poderá ser a nível de 2º grau, com
especialização para a área da deficiência mental,
elevando-se, gradativamente, a nível de formação
de acordo com as necessidades e disponibilidades
locais. O pessoal técnico (supervisor, orientador,
diretor e demais pessoas de equipe técnico-admi-
nistrativa) deverá receber, periodicamente, orien-
tação e informação especializada sobre os pro-
gramas desenvolvidos pelos professores especia-
lizados, junto aos educandos deficientes mentais
educáveis, a fim de facilitar a aceitação e integra-
ção dos mesmos nas atividades das classes comuns
(BRASIL, 1984, p. 22, grifo nosso).

Alia-se o material didático e escolar à disponibilidade de recur-


sos financeiros e à criatividade do professor responsável, o que nos pa-
rece denunciar certa improvisação do processo pedagógico. A forma-
ção mínima solicitada ao professor da Sala de Recursos era em nível de
2º grau, com especialização em deficiência mental, sem especificá-la.
Afirmava-se, ainda, a necessidade de capacitação do pessoal técnico, a
fim de facilitar a aceitação dessas pessoas no ensino comum.
Em relação às questões governamentais, em 1985, o então
Presidente da República, José Sarney, promulgou o Decreto nº
91.782/1985, que instituiu um comitê que, sob a presidência do
Ministro de Estado da Educação, pudesse traçar uma política de
ação conjunta, destinada a aprimorar a Educação Especial e a in-
tegrar, na sociedade, as pessoas portadoras de deficiências, proble-
mas de conduta e superdotação (BRASIL, 1985a, art. 1º).5 Junto à

5
O Comitê seria composto de “representantes dos Ministérios da Educação, Saú-
de, Previdência e Assistência Social, Interior, Justiça e Trabalho, da Secretaria de
Planejamento da Presidência da República, de federações nacionais representa-
tivas de grupos ligados ao problema, das classes empresarial e trabalhadora, das
lideranças comunitárias, dos portadores de deficiências devidamente credencia-
dos, e de especialistas e pessoas de notório saber” (BRASIL, 1985b, art. 2º).

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ISSN 2237-258X

promulgação desse Decreto, na Exposição de Motivos n° 219/1985,


o então Ministro da Educação, Marco Maciel, afirmou que era che-
gada a hora de se redefinir a política da Educação Especial, a fim
de compatibilizá-la com as “diretrizes consignadas no programa
Educação para Todos”, “com vistas a abrigar no sistema educativo
formal parcela da população que depende, fundamentalmente, de
iniciativas do poder público” (BRASIL, 1985c, p. 13). O ministro
também afirmou a necessidade de ser proporcionada a todos “a
participação nos processos educativos, que se distinguirão dos mé-
todos convencionais tão-somente pela adoção de técnicas apropria-
das às condições especiais dos deficientes” (BRASIL, 1985c, p. 13,
grifo nosso). Assim, para cumprir esse amplo objetivo, a Educação
Especial estava encaminhada como um problema cuja solução re-
quereria apenas ajustes de natureza técnica.
Essa declaração coincide com o período de tentativas de re-
democratização do país, com o Estado mobilizado à frente desse
processo. À época, o presidente José Sarney assinalou a urgente ne-
cessidade de o Estado brasileiro voltar-se à Educação Especial. En-
tretanto, seu discurso é permeado por uma noção de que, para isso,
seria suficiente a mudança de concepções e ideias da consciência
coletiva sobre a temática:

Para enfrentar o problema em suas várias faces,


é necessária, assim, a conscientização coletiva. A
sociedade tem de aceitar como normal a pessoa
deficiente. Aceitando-a, sem medos nem senti-
mentalismos, as soluções virão naturalmente. E
cabe ao Estado, ao governo, liderar tal mobilização
(BRASIL, 1985c, p. 3, grifo nosso).

No ano seguinte a essa declaração, em 1986, são realizadas


mudanças administrativas, sendo criada a Coordenadoria Nacio-
nal para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência (CORDE)

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ISSN 2237-258X

(BRASIL, 1986a), subordinada ao Ministro de Estado Chefe do Ga-


binete Civil, para atuar sob sua direta e imediata supervisão. No mes-
mo ano, é criada a Secretaria de Educação Especial (então denomi-
nada SESPE) como órgão central de direção superior do Ministério
da Educação (BRASIL, 1986b), em substituição ao CENESP.
Nesse mesmo ano, ao definir o público do Atendimento
Educacional Especializado como deficientes mentais, visuais, au-
ditivos, físicos e os que possuíam deficiências múltiplas, a Porta-
ria n.° 69/1986 faz a caracterização destes como “educandos que
apresentam determinados sintomas” e que, por isso, “necessitam
de métodos, recursos didáticos e equipamentos especiais para sua
educação”. Quanto aos alunos com problemas de conduta e os su-
perdotados, se diz que são educandos que apresentam determina-
das características (diferenças ou sintomas), “necessitando de aten-
dimento educacional especializado” (BRASIL, 1986c, art. 3°).
A existência de certa identificação entre o Atendimento Edu-
cacional Especializado a “utilização de métodos, técnicas, recursos
e procedimentos didáticos desenvolvidos nas diferentes modalida-
des de atendimento por pessoal devidamente qualificado” (BRA-
SIL, 1986c, art. 6º) mais uma vez identifica sua caracterização sob
um aspecto técnico. Ainda conforme o documento se constituíam
modalidades de atendimento educacional “classe comum”, “classe
comum com apoio de professor itinerante”, “classe especial”, “esco-
la especial”, “centro de educação precoce”, “serviço de atendimento
psicopedagógico”, “oficina pedagógica”, “escola empresa” e:

- Classe comum com apoio de sala de recursos:


alternativa de atendimento a educandos com neces-
sidades especiais, que freqüentam a classe comum e
recebem atendimento complementar em local espe-
cial, com professor especializado, material e recur-
sos pedagógicos adequados (BRASIL, 1986c, art. 7º,
grifo nosso).

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.215-236, maio/ago. 2015 233
ISSN 2237-258X

Entre as modalidades de atendimento educacional, tem-se o


acréscimo das modalidades não previstas na Portaria Interminis-
terial n.° 186/1978, como o centro de educação precoce, o serviço
de atendimento psicopedagógico, a oficina pedagógica e a escola
empresa. Os atendimentos em classe hospitalar e domiciliar pre-
sentes naquele documento não são citados, e o termo “instituições
especializadas de natureza educacional” nele empregado é substi-
tuído por “escola especial” (BRASIL, 1986c), o que pode sugerir
uma forma de procurar identificar/reforçar o atendimento especia-
lizado prestado nesses locais como educacional/escolar.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na década de 1970, tínhamos a previsão de Salas de Recur-


sos, que atenderiam a uma parcela específica do público com de-
ficiência: Salas de Recursos para deficientes mentais, Salas de Re-
cursos para deficientes auditivos, Salas de Recursos para deficientes
visuais, etc. (BRASIL, 1979a, 1979b, 1979c, 1979d). Na década de
1980, afirmou-se a necessidade de haver um cronograma de ativi-
dades que possibilitasse “o atendimento adequado dos diferentes
grupos, de acordo com o número e as necessidades dos alunos”
(BRASIL, 1984, p. 21). Atualmente, a sua caracterização em uma
forma única e multifuncional, atendendo às diversas deficiências
em um mesmo espaço (BRASIL, 2006, 2011), faz-nos refletir sobre
os motivos e argumentos que justificam essa proposição.
O documento Sala de recursos multifuncionais: espaço para
atendimento educacional especializado, de 2006, traz a seguinte de-
finição para esse espaço, adotada pela política de inclusão escolar
em curso:

A sala de recursos multifuncionais é [...] um espaço


organizado com materiais didáticos, pedagógicos,

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equipamentos e profissionais com formação para


o atendimento às necessidades educacionais es-
peciais. A denominação sala de recursos multi-
funcionais se refere ao entendimento de que esse
espaço pode ser utilizado para o atendimento das
diversas necessidades educacionais especiais e para
desenvolvimento das diferentes complementações
ou suplementações curriculares. Uma mesma sala
de recursos, organizada com diferentes equipamen-
tos e materiais, pode atender, conforme cronograma
e horários, alunos com deficiência, altas habilida-
des/superdotação, dislexia, hiperatividade, déficit
de atenção ou outras necessidades educacionais es-
peciais. Para atender alunos cegos, por exemplo,
deve dispor de professores com formação e recur-
sos necessários para seu atendimento educacional
especializado. Para atender alunos surdos, deve se
estruturar com profissionais e materiais bilíngües.
Portanto, essa sala de recursos é multifuncional em
virtude de a sua constituição ser flexível para pro-
mover os diversos tipos de acessibilidade ao currícu-
lo, de acordo com as necessidades de cada contexto
educacional (BRASIL, 2006, p. 14, grifo nosso).

O que justificaria esse movimento? A sala de recursos, hoje


multifuncional, será suficiente para colocar em prática tão ampla
política, tal qual a de inclusão escolar? Entendemos que a racio-
nalização de recursos financeiros não deveria ser preponderante
nesse processo, pois se torna uma tentativa de simplificação de uma
política que não deveria fugir do enfrentamento à sua complexi-
dade. Para além dessas questões, outra se impõe: o fechamento
de classes especiais, nesse período, no país, se relaciona com essas
ações? Para responder adequadamente, faz-se necessário averiguar
se, nesse período, as classes especiais, consideradas viáveis na dé-
cada de 1970 (BRASIL, 1979d), foram substituídas em número por
Salas de Recursos e outros serviços, ou se tratou-se apenas de uma

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.215-236, maio/ago. 2015 235
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solução econômica por parte do poder público. É preciso ter claro


que o que se procura induzir através do discurso pode não ser o que
aconteceu de fato. Nesse sentido, o estudo quantitativo dos serviços
especializados poderá substanciar uma avaliação mais definitiva.

REFERÊNCIAS

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educação nacional. Brasília, 1961.

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1º e 2º graus, e dá outras providências. Brasília, 1971.

BRASIL. MEC. Portaria n.º 215, de 20 de agosto de 1973. Brasília,


1973a.

______. Portaria n.º 233, de 4 de setembro de 1973. Brasília, 1973b.

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da outras providências. Brasília, 1973c.

BRASIL. MEC/MPAS. Portaria Interministerial n.° 186, de 10 de


março de 1978. Brasília, 1978b.

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Departamento de Documentação e Divulgação, 1979b. v. 1.

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______. Proposta curricular para deficientes mentais educáveis –


Manual do Professor. Brasília: MEC, Departamento de Documen-
tação e Divulgação, 1979c. v. 1.

______. Proposta curricular para deficientes auditivos. Brasília:


MEC, Departamento de Documentação e Divulgação, 1979d. v. 1

______. CENESP. Proposta curricular para deficientes auditivos –


Manual do Professor. Orientações gerais. Brasília: MEC, Departa-
mento de Documentação e Divulgação, 1979e. v. 1.

BRASIL. MEC. CENESP. Subsídios para organização e funciona-


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pecial 1981. Brasília, 1985a. v. 3.

______. Presidência da República. Decreto n,° 91.782, de 4 de no-


vembro de 1985. Institui Comitê para traçar política de ação con-
junta, destinada a aprimorar a educação especial e a integrar, na
sociedade, as pessoas portadoras de deficiências, problemas de
conduta e superdotadas. Brasília, 1985b.

BRASIL. MEC. CCS. Presidência da República. O resgate da educa-


ção especial. Brasília, 1985c.

BRASIL. Presidência da República. Decreto nº 93.481, de 29 de ou-


tubro de 1986. Dispõe sobre a atuação da Administração Federal
no que concerne às pessoas portadoras de deficiências, institui a
Coordenadoria para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência
- CORDE e dá outras providências. Brasília, 1986a.

______. Decreto n.º 93.613, de 21 de novembro de 1986, que ex-


tingue órgãos do Ministério da Educação e dá outras providências.
Brasília, 1986b.

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.215-236, maio/ago. 2015 237
ISSN 2237-258X

BRASIL. MEC. CENESP. Portaria n.° 69, de 28 de agosto de 1986.


Expede normas para fixação de critérios reguladores da prestação
de apoio técnico e/ou financeiro à Educação Especial nos sistemas
de ensino público e particular. Brasília, 1986c.

BRASIL. MEC. SEESP. Sala de recursos multifuncionais: espaço


para atendimento educacional especializado. Brasília, 2006.

BRASIL. Presidência da República. Decreto n.° 7.611, de 17 de no-


vembro de 2011. Dispõe sobre a Educação Especial, o atendimento
educacional especializado e dá outras providências. Brasília, 2011.

JANNUZZI, G. de M.; CAIADO, K. R. M. APAE: 1954-2011: algu-


mas reflexões. Campinas: Autores Associados, 2013.

Recebido: 10/12/2014
Aprovado: 11/12/2014

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ISSN 2237-258X

Atendimento educacional
especializado: das diretrizes
políticas à escolarização
dos alunos com deficiência
intelectual 1

Specialized educational service: from policy guidelines to


schooling of students with intellectual disabilities
Atención educacional especializada: de las directrices políticas
a la escolarización de los alumnos con deficiencia intelectual

Flávia Faissal de Souza2


Márcia Denise Pletsch3

Resumo
Em nosso país, a Educação Especial se realiza por meio do Atendimen-
to Educacional Especializado (AEE). Porém, como a atual política de

1
Uma versão preliminar deste texto foi apresentada no VI Congresso Brasileiro
de Educação Especial/IX Encontro Nacional dos Pesquisadores da Educação Es-
pecial, UFSCar, em 2014.
2
Doutora em Educação. Professora adjunta da Faculdade de Educação da Baixada
Fluminense (FEBF) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Está-
gio Pós-Doutoral PNPD/CAPES no Programa de Pós-Graduação em Educação,
Contextos Contemporâneos e Demandas Populares (PPGEduc) da Universidade
Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). E-mail: faissalflavia@gmail.com
3
Doutora em Educação. Professora adjunta do Departamento Educação e Socie-
dade e do Programa de Pós-Graduação em Educação, Contextos Contemporâ-
neos e Demandas Populares (PPGEduc) da Universidade Federal Rural do Rio
de Janeiro (UFRRJ). E-mail: marciadenisepletsch@gmail.com

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.237-257, maio/ago. 2015 239
ISSN 2237-258X

Educação Especial tem como foco a escolarização dos alunos com deficiên-
cia intelectual no ensino regular, parece-nos haver um descompasso, pois
o principal foco é um serviço complementar e/ou suplementar ao ensino
regular. Essa proposta nos causa indagação, ainda mais por assumirmos a
perspectiva histórico-cultural do desenvolvimento humano, em especial as
noções de escolarização, ensino e aprendizagem, nas quais estes processos
se constroem nas práticas cotidianas escolares. Assim, o objetivo deste tex-
to é apresentar, a partir de pesquisa documental em diálogo com dados de
cinco redes da Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro, uma discussão sobre
o lugar do AEE na política de Educação Especial e o seu papel no processo
de escolarização dos alunos com deficiência intelectual. A partir da análise,
evidenciamos que o papel do AEE não é claro no processo de escolarização
de alunos com deficiência intelectual. Em grande medida, fica a cargo do
sujeito com deficiência a responsabilidade de transladar o apreendido no
AEE para a sala de aula, apesar das características que marcam a sua inser-
ção no processo de ensino-aprendizagem.

Palavras-chave: Educação Inclusiva. Atendimento Educacional


Especializado (AEE). Deficiência intelectual.

Abstract
In our country, Special Education takes place through the Specialized
Educational Services (AEE). However, considering that the current
Special Education policy focuses on education of students with intellectual
disabilities in regular education, it seems to be a mismatch, when the
main focus is a complementary and/or supplementary service to regular
education. This proposal cause us indignation, that even though we
assume the historical-cultural perspective of human development, in
particular the schooling, teaching and learning notions, in which these
processes are based on school daily practices. The objective of this paper
is to present, from documentary research in dialogue with data from five
networks of Baixada Fluminense in Rio de Janeiro, a discussion about
the role of AEE in the policy of Special Education and the its role in the
education of students with intellectual disabilities. From analysis we
observed that the role of the AEE is not clear in the educational process
for students with intellectual disabilities. The responsibility largely rests
with the disabled individual, to transfer what has been grasped by the
AEE into the classroom, despite all the characteristics that mark their
inclusion into the teaching-learning process.

Keywords: Inclusive Education. Specialized Educational Services


(AEE). Intellectual disability.

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ISSN 2237-258X

Resumen
En nuestro país, la Educación Especial se realiza por medio de la
Atención Educacional Especializada (AEE). Sin embargo, la actual política
de Educación Especial tiene como foco la escolarización de los alumnos
con deficiencia intelectual en la enseñanza regular, así hay una divergencia,
cuando el foco es un servicio complementario y/o suplementario a la
enseñanza regular. Esta propuesta nos causa indagación, aún más porque
asumimos la perspectiva histórico-cultural del desarrollo humano, en
especial las nociones de escolarización, enseñanza y aprendizaje, en las
cuales estos procesos se construyen en las prácticas escolares. El objetivo de
este texto es presentar, a partir de estudio documental en diálogo con datos
de 5 redes de Baixada Fluminense en Rio de Janeiro, una discusión sobre
el lugar de AEE en la política de Educación Especial y el papel del mismo
en el proceso de escolarización de los alumnos con deficiencia intelectual.
A partir del análisis evidenciamos que el papel de la AEE no es claro en
el proceso de escolarización de alumnos con deficiencia intelectual. E
queda a cargo del alumno con deficiencia la responsabilidad de trasladar
lo aprendido en la AEE al sala de clases, a pesar de todas las características
que marcan su inserción en el proceso de enseñanza- aprendizaje.

Palabras clave: Educación Inclusiva. Atención Educacional


Especializada (AEE). Deficiencia intelectual.

Palavras iniciais

O presente texto integra um dos estudos desenvolvidos no


âmbito de um projeto em rede4 cujo foco central é analisar as di-
mensões que envolvem a escolarização de alunos com deficiência
intelectual, notadamente as que se referem ao ensino e aprendi-
zagem destes nas classes regulares, no Atendimento Educacional

4
O projeto é desenvolvido pela UFRRJ, pela UDESC e pela Univali sob o título
“A escolarização de alunos com deficiência intelectual: políticas públicas, pro-
cessos cognitivos e avaliação da aprendizagem”, com apoio financeiro da CAPES,
pelo Programa Observatório da Educação, e da FAPERJ, pelo Programa Jovem
Cientista do Nosso Estado.

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ISSN 2237-258X

Especializado (AEE) e no seu consequente desempenho nas avalia-


ções nacionais de rendimento escolar. Para este artigo, optamos por
apresentar uma discussão sobre o Atendimento Educacional espe-
cializado (AEE) a partir da análise dos documentos do Ministério
da Educação (MEC) que sinalizam as diretrizes e estratégias para a
implementação de uma política nacional de Educação Especial sob
a égide das políticas de Educação Inclusiva.
Em termos metodológicos, optamos pela pesquisa qualitativa
empregando prioritariamente dados documentais (LÜDKE; An-
dré, 1986; Prieto, 2006). A opção pela análise dos documentos
se dá em função da possibilidade de aproximação com as diretrizes
e estratégias políticas traçadas pelo Ministério da Educação (MEC)
para a implementação do serviço de AEE, visando a escolarização
dos alunos com deficiência intelectual. O período dos documentos
analisados foi de 2003 a 2013; essa escolha ocorreu em função das
mudanças iniciadas pelo governo Lula (2003-2010), como a am-
pliação dos investimentos políticos e financeiros para promover a
inclusão social e educacional em diferentes setores, incluindo as
políticas de Educação Inclusiva direcionadas para o público-alvo
da Educação Especial (PLETSCH, 2011; SOUZA, 2013). Tais aná-
lises serão brevemente cotejadas com dados coletados nos anos de
2013 e 2014, por meio de entrevistas semiestruturadas com gestores
educacionais e professores que atuam no AEE pertencentes a cinco
municípios da Baixada Fluminense, Estado do Rio de Janeiro.
Ainda sobre o conjunto de documentos a serem analisados,
cabe mencionar que as indicações das políticas de Educação In-
clusiva sugerem a matrícula dos alunos com deficiência no ensino
regular. Todavia, o principal eixo dessa política é o AEE, um ser-
viço que funciona paralelamente à sala de aula do ensino regular,
na Sala de Recursos Multifuncionais (SRM), com um professor
que deverá ser especialista em Educação Especial, no contraturno
do ensino regular. Como estratégia de integração entre os espaços

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pedagógicos, é previsto o planejamento conjunto ou colaborativo


do professor especialista com o professor do ensino regular, a fim
de garantir a inserção do aluno com deficiência nos processos de
ensino e aprendizagem (BRASIL, 2008a, 2008b, 2011).
Esse desenho da política de Educação Especial na perspec-
tiva da Educação Inclusiva nos chama atenção. Sustentadas pelos
pressupostos da perspectiva histórico-cultural do desenvolvimento
humano, em especial pelos estudos de Vigotski (1997), questiona-
mos o deslocamento do principal eixo de investimento político,
cujo o foco é a inserção do aluno com deficiência, da sala de aula
para um serviço previsto no contra-turno. Nossas indagações es-
tão ancoradas pelas idéias nas quais o ensino e a aprendizagem são
processos que se constroem nas relações interpessoais, em especial
entre professor-aluno e aluno-aluno, nas práticas cotidianas escola-
res. É a partir dessa premissa que propomos a análise sobre o lugar
do AEE na Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva
da Educação Inclusiva (BRASIL, 2008a) e o seu papel no processo
de escolarização dos alunos com deficiência intelectual a partir dos
depoimentos coletados na pesquisa de campo. Nessa direção, orga-
nizamos os resultados de nossa pesquisa em dois eixos, a saber: a)
o lugar do AEE nas políticas de inclusão; e, b) o papel do AEE no
processo de escolarização dos alunos com deficiência intelectual.

O lugar do AEE nas políticas de inclusão

Desde o primeiro ano do governo do Partido dos Trabalha-


dores (PT), em 2003, vêm sendo efetivadas ações na direção da im-
plementação de uma Educação Inclusiva, assumidas como políticas
de governo. Segundo Mendes (2006), o modelo que esse governo
assumiu, dentre os diversos desenhos e concepções de políticas de
Educação Inclusiva, se aproxima mais da perspectiva da inclusão

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ISSN 2237-258X

total, que preconiza que todos os alunos sejam educados apenas em


classe da escola regular, porém tendo como suporte complementar
e/ou suplementar à educação por meio do AEE.
Sobre a incorporação do modelo de Educação Inclusiva ado-
tado pelo governo brasileiro, Mendes (2006, p.401) é enfática ao
declará-lo como “uma adoção ao modismo importado [...] da cul-
tura norte-americana”, assim como em outras reformas no cam-
po da educação básica. Na mesma direção, Pereira (2010), Souza
(2013) e Pletsch (2014a) discorrem sobre o papel, especialmente,
do Grupo Banco Mundial e de outros órgãos do Sistema ONU
como divulgadores dos preceitos da Educação Inclusiva em nosso
país, marcados pelos pressupostos neoliberais e pelas reivindica-
ções da sociedade civil.
Sobre a disseminação da Educação Inclusiva, Kassar (2012)
traz análises acerca de um movimento paralelo ao aqui descrito: a
dinâmica de fechamento das classes especiais e oficinas pedagógi-
cas, que vinham sendo criticadas por serem espaços de exclusão
educacional e social. Essa dinâmica foi sustentada pelos pressu-
postos da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência
(CDPD) (BRASIL, 2009), que são: a matrícula no ensino regular é
considerada a única aceitável e a no ensino especializado, atitude
discriminatória; a municipalização do ensino básico obrigatório,
não prevendo espaço para atendimento de alunos com deficiência;
e a ampliação da parceria público-privada nas ações sociais, sobre-
tudo na década 1990, com recuo do poder público aos serviços de
atendimento às pessoas com deficiência.
Nesse cenário, é ainda importante destacar que, desde as
primeiras ações do governo, a locação da responsabilidade pela
educação das pessoas com deficiência está no MEC, em secretarias
paralelas à da Educação Básica (SEB). Primeiramente, elas eram
foco de trabalho da Secretaria de Educação Especial (Seesp); mais
tarde, em 2011, a responsabilidade foi transferida para a Diretoria

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de Políticas de Educação Especial da Secretaria de Educação Conti-


nuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (Secadi). Tal fato vem
sendo justificado pela ideia da transversalidade da Educação Espe-
cial nos diferentes níveis, etapas e modalidades de ensino (BRASIL,
2007). Entendemos que, nessa configuração, a Educação Especial
continua sendo a protagonista de uma política que deveria incidir
em uma ampla reforma da Educação Básica, e que tal configura-
ção, de alguma forma, contradiz a própria colocação do MEC, que
afirma que a “implementação da Educação Inclusiva requer a supe-
ração da dicotomia eliminando a distância entre o ensino regular
e o especial” (BRASIL, 2005, p. 33). A esse respeito, nossos dados
de campo evidenciaram que, apesar dos avanços legais, a Educação
Especial, por meio do AEE, continua sendo considerada priorita-
riamente o espaço do aluno com alguma deficiência ou outra con-
dição atípica do desenvolvimento. Ainda nessa direção, ficou evi-
dente que a cultura sobre o desenvolvimento como uma condição
estática continua predominando nas concepções dos entrevistados.
Em grande medida, os sujeitos continuam sendo classificados em
“normais” e “anormais”; os primeiros teriam acesso aos conheci-
mentos escolares, enquanto aos segundos o espaço escolar seria re-
servado, na maioria das vezes, para desenvolver habilidades básicas
para a vida diária, particularmente em se tratando de sujeitos com
deficiência intelectual.
Sobre os pressupostos que sustentam a Educação Inclusiva
proposta pelo MEC, desde as primeiras publicações (SESSP/MEC,
2004) e dos primeiros documentos – por exemplo, o Decreto n.º
5.296 (BRASIL, 2004) e o Decreto n.º 5.626 (BRASIL, 2005) – já
eram explicitados os princípios da equalização de oportunidades
e não discriminação diante da deficiência, com ênfase na ideia de
que a Educação Inclusiva se insere na reformulação de um projeto
societário pautado pela igualdade na diversidade, sendo a escola
compreendida como o núcleo dessa construção. Para Prieto (2010,

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ISSN 2237-258X

p. 31), esses princípios estão baseados em um “otimismo ingênuo”,


posto que a desigualdade tem sua gênese fora da escola, no contex-
to social mais amplo. Contudo, à escola é designada a missão de
alavancar o desenvolvimento do sujeito e, nessa lógica, o desenvol-
vimento econômico da nação; é como se ela tivesse uma autonomia
absoluta, capaz de acabar com a pobreza e a miséria que se estru-
turam primeiramente fora dela. Do mesmo modo, há de se ter cau-
tela com o discurso da igualdade e da diversidade na matriz libe-
ral do conceito de inclusão assumido, em face do apagamento das
diferenças individuais e sociais, e da concretude das construções
conceituais e dos conflitos histórico-culturais no cotidiano escolar
(Laplane, 2004; GARCIA, 2006, 2010; PRIETO, 2010; KASSAR,
2011; SOUZA, 2011, 2013; PLETSCH, 2014a, 2014b).
Com base nesses princípios, em 2003, foi lançado o Programa
Educação Inclusiva: Direito à Diversidade, que foi implementado
em diversos municípios brasileiro. O objetivo desse programa era
disseminar os princípios da política de Educação Inclusiva, com
foco nos alunos da Educação Especial (PLETSCH, 2011; REBELO;
KASSAR, 2014). Nessa esteira, em 2007, o governo lançou o Pla-
no de Desenvolvimento da Educação (PDE), no qual a temática da
educação de pessoas com deficiência teve como foco, conforme a
Meta IX do Compromisso Todos pela Educação: “Garantir o acesso
e permanência das pessoas com necessidades educacionais espe-
ciais nas classes comuns do ensino regular, fortalecendo a inclusão
educacional nas escolas públicas” (BRASIL, 2007). Partindo da pre-
missa da “diversidade na igualdade como fundamento primeiro do
ato educativo”, propôs-se “arranjos educativos específicos nos quais
se promove o desenvolvimento humano de todos e de cada um”
(BRASIL, 2007, p. 37). De tal forma, foram incorporados ao PDE
programas já existentes, bem como foram lançados outros, na lógi-
ca do modelo de gestão com a sistemática de editais e financiamen-
to direto aos municípios, conforme discutido por Garcia (2009).

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Somente em 2008, foi publicada a Política Nacional de Edu-


cação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL,
2008a), que prevê a matrícula de todos os alunos com deficiência,
transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades na rede
regular de ensino, com suporte do AEE. Nesse documento, foi re-
tirada a modalidade substitutiva da Educação Especial (na esteira
de outros documentos e programas implementados), e a Educação
Inclusiva é assumida como:

Um paradigma educacional fundamentado na


concepção de direitos humanos, que conjuga
igualdade e diferença como valores indissociá-
veis, e que avança em relação à ideia de equidade
formal ao contextualizar as circunstâncias histó-
ricas da produção da exclusão dentro e fora da
escola (BRASIL, 2008a).

Tal proposta tem como referência, entre outros documentos,


a Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência (CDPD)
(BRASIL, 2009), que já estava em vias de ser homologada com ca-
ráter de emenda constitucional5, efetivando a Educação Inclusiva
como política de Estado. A CDPD afirma que para “efetivar esse
direito sem discriminação e com base na igualdade de oportuni-
dades, os Estados Partes assegurarão sistema educacional inclusivo
em todos os níveis, bem como o aprendizado ao longo de toda a
vida”. Assim, o objetivo da Educação Inclusiva proposto na CDPD
é o pleno desenvolvimento “da personalidade, dos talentos e da
criatividade das pessoas com deficiência, assim como de suas ha-
bilidades físicas e intelectuais”, que a levem à plena participação
social, em uma sociedade mais justa e igualitária (BRASIL, 2009).
Tais premissas foram assumidas na Política Nacional de Educação

5
A CDPD foi homologada com valor de emenda constitucional em 2009, pelo
Decreto n.º 6.949/2009.

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Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL, 2008a)


e vem se efetivando por meio de programas. O principal eixo de
investimentos é o Programa de Implantação de Salas de Recursos
Multifuncionais, o qual, sob a égide das ideias de acessibilidade,
visa apoiar os sistemas de ensino na organização e na oferta do
AEE por meio da seguinte ação:

disponibiliza às escolas públicas de ensino regular,


conjunto de equipamentos de informática, mobi-
liários, materiais pedagógicos e de acessibilida-
de para a organização do espaço de atendimento
educacional especializado. Cabe ao sistema de
ensino, a seguinte contrapartida: disponibilização
de espaço físico [...] bem como, do professor para
atuar no AEE (BRASIL, 2005).

É importante ressaltar que o AEE é um serviço de educação


complementar e/ou suplementar, oferecido no contraturno aos
alunos com deficiência matriculados em classes comuns do ensi-
no regular (BRASIL, 2008a). A normatização e as diretrizes desse
serviço foram estabelecidas no Decreto n.º 6.571 (BRASIL, 2008b),
posteriormente revogado pelo Decreto n.º 7.611 (BRASIL, 2011),
sendo que, neste último, é ressaltada a ideia de que hoje, em nos-
so país, a Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva
se faz por meio do serviço de AEE. Em outras palavras: embora o
foco das políticas de Educação Inclusiva seja a matrícula e a esco-
larização dos alunos com deficiência no ensino regular, a principal
estratégia para sua implementação é o AEE.
Todavia, nem todas as redes têm conseguido implementar o
AEE tal como proposto pelas diretrizes federais. Como já indica-
mos em publicação anterior, uma das primeiras constatações das
nossas pesquisas e das realizadas pelo Observatório Nacional de
Educação Especial ― coordenado pela Profª. Drª. Eniceia Mendes,
da Universidade Federal de São Carlos, com apoio do Programa

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Observatório da Educação da CAPES, da qual participam 203 pes-


quisadores de 16 estados e de 20 instituições de Ensino Superior ―,
é a falta de clareza das redes de ensino para realizar o trabalho pe-
dagógico nas salas de AEE, que é muito variado e, em muitos casos,
é desenvolvido por profissionais, que não tem a devida qualificação
(MENDES, 2014; PLETSCH, 2014a).
Também identificamos problemas diversos nas pesquisas de-
senvolvidas em cinco municípios da Baixada Fluminense, no Rio
de Janeiro, tais como: a) a não instalação do material distribuído
pelo Ministério da Educação nas Salas de Recursos Multifuncionais
– muitas redes receberam os equipamentos tecnológicos (compu-
tadores, impressoras e outros) em 2009, mas, em 2012, ainda não
haviam sido instalados; b) a falta de acessibilidade arquitetônica;
c) Salas de Recursos Multifuncionais superlotadas; e d) dificulda-
des na realização de práticas colaborativas entre o AEE e a classe
comum. Dessa forma, reclamamos o eixo dessa política, posto o
referencial teórico-metodológico que assumimos, no qual a apren-
dizagem não é um processo individual, ou seja, não está somente
na capacidade e/ou possibilidades do aluno, mas é um processo
que se constitui nas relações entre o aluno, o mediador (no caso,
principalmente o professor, mas também seus pares de sala de aula)
e o conhecimento construído ao longo da história da humanidade
(VIGOTSKI, 1988). É sobre esse processo que nos deteremos a se-
guir, enfatizando os alunos com deficiência intelectual.

O papel do AEE no processo de escolarização dos alunos com


deficiência intelectual

O aluno com deficiência intelectual ocupa um lugar de des-


taque nas questões referentes à Educação Especial desde tempos
remotos. Jannuzzi (2004) nos faz pensar que, na história das so-
ciedades, e não diferentemente em nosso país, a relação entre

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deficiência e educação é tão estreita que a deficiência intelectual


foi dada a conhecer na medida em que se deu a escolarização de
uma sociedade anteriormente rural, além de ser historicamente
marcada pelo conhecimento médico, por interesses filantrópicos e
religiosos e pelo descaso político.
Segundo a Associação Americana de Deficiência Intelectual
e do Desenvolvimento (AAIDD), a deficiência intelectual é:

Uma deficiência caracterizada por limitações sig-


nificativas no funcionamento intelectual (raciocí-
nio/atividade discursiva, aprendizagem, solução de
problemas) e no comportamento adaptativo, que
abarca uma série de habilidades sociais e práticas
do cotidiano. Essa deficiência deve ser originada
antes dos 18 anos (AAIDD, 2010). [tradução nossa]

Já no ICD-10 (WHO, 2010), documento que pretende ser o


parâmetro universal para descrição dos estados de saúde e doença,
a nomenclatura, diferentemente da adotada na CDPD, é o retardo
mental, compreendido como:

Uma condição de desenvolvimento interrompi-


do ou incompleto da mente, que é caracterizado
especialmente por um prejuízo das habilidades
manifestas no período de desenvolvimento, que
contribuem para o nível global de inteligência,
isto é, funções cognitivas, de linguagem, de mo-
tricidade e do comportamento social. O retardo
mental pode ocorrer associado ou não a um outro
transtorno mental ou físico (WHO, 2010). [tradu-
ção nossa]

Nosso entendimento sobre a pessoa com deficiência intelectual


está sustentado pela perspectiva histórico-cultural do desenvolvi-
mento humano (LUNARDI, 2001, 2004; CARVALHO, 2006; SOU-
ZA, 2013; PLETSCH, 2014, 2014a), segundo o qual, ao tratarmos

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da escolarização dos alunos com deficiência intelectual e da sua in-


serção no processo de ensino e aprendizagem, faz-se necessário um
forte investimento em um currículo que privilegie ações que tenham
sentido e significado no cotidiano do aluno e que sejam da ordem da
construção da rede conceitual cognitiva, motora, afetiva, linguística,
entre outras. Para tal, faz-se necessário um trabalho ombro a ombro,
um cotidiano de reiteração e recolocação constante dos conceitos
apreendidos ou em processo de apreensão; em outros termos, é pre-
ciso superar concepções sobre as não possibilidades desses sujeitos
como, ainda hoje, fortemente presentes nas pesquisas.
Em determinados momentos, as falas dos nossos entrevis-
tados apontaram que o importante para esse sujeito é que tenha
acesso à socialização, negando-lhe o direito de apreender o co-
nhecimento científico (PLETSCH, 2014a). Sobre isso, lembramos
que o foco na inserção no processo de aprendizagem se dá sobre
o desenvolvimento cultural. Para Vigotski (1988), a aprendizagem
é uma das funções psicológicas superiores na qual o homem, na
medida em que se apropria de conceitos, de gestos, dentre outros
elementos, a partir do vivido nas relações sociais, especialmente
nas práticas pedagógicas, vai redimensionando tanto sua matriz
biológica (organismo) como suas possibilidades de participação
nas práticas sociais. Em outras palavras, é pelo processo de apren-
dizagem (apreender, tornar próprio, apropriar-se, incorporar), em
seu sentido mais amplo, que nos desenvolvemos.
Essa questão torna-se central quando olhamos para ela a
partir do pressuposto de que a aprendizagem é a fonte do desen-
volvimento. No processo de aprendizagem, importam situações,
relações e conhecimentos quase novos, pois é por meio da apro-
priação (do apreender) do quase novo que o sujeito se desenvolve
(maturação e organização neurológicas, formação de rede concei-
tual, organização neuromotora, etc.) (Luria, 1991; VIGOTSKI,
1988, 1997). Em relação à aprendizagem escolar, Vigotski (1988),

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destaca, ao propor o papel do docente como mediador no processo


de apropriação do aluno com o conhecimento, que a aprendizagem
se constrói de forma relacional, na interação, especialmente, entre
professor-aluno e aluno-aluno. Em outras palavras, é na construção
cotidiana de sala de aula, a partir de propostas pedagógicas desafia-
doras, mas coerentes com as possibilidades perceptivas, sensitivas,
de atenção, mnemônicas, cognitivas e motoras de cada aluno, que
o processo de aprendizagem se constrói. Dessa forma, o processo
de ensino e aprendizagem deverá resultar em novas formas/possi-
bilidades de comportamento, e não corroborar com a interrupção
do desenvolvimento.
Do mesmo modo, ocorre, perante uma das ideias centrais
que sustentam nossa leitura do processo de escolarização, com o
aluno com deficiência intelectual, a compensação social da defi-
ciência, ou seja, o redimensionamento (reorganização neurológica,
reestruturação das funções psicológicas, entre outros) dos limites
impostos pelas condições orgânicas, impeditivos ao desenvolvi-
mento, pelas/nas práticas sociais, que necessariamente envolvem a
aprendizagem, conforme postulado na perspectiva histórico-cultu-
ral. A esse respeito, Dainêz e Smolka (2012) afirmam que Vigotski
traz a compensação como metodologia do trabalho educativo, mas
o qualificativo da educação não é compensatório; é social. Ou seja,
é uma condição do desenvolvimento cultural humano. Ainda se-
gundo as autoras,

a educação não é tratada como um auxílio, um


complemento e/ou suprimento de uma carência
(orgânica e/ou cultural), o que implica pensar na
falta de algo, mas é a produção de uma ação que
torna possível a criação de novas possibilidades de
participação social, ativa e integral da pessoa na
sociedade – e aí reside a compensação (DAINÊZ;
SMOLKA, 2012, p. 5).

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Igualmente, ratificamos que o pressuposto assumido em re-


lação ao processo de ensino e aprendizagem está imbricado na me-
diação/relação com o professor e os seus pares; em outras palavras,
o processo se constrói nessa relação cotidiana da sala de aula. Dian-
te dessas premissas, temos questionado o efetivo papel do AEE no
processo de escolarização de alunos com deficiência intelectual.

Considerações finais

Para concluir, verificamos, a partir de nossa análise, que as


diretrizes sobre o AEE acabam não fortalecendo a relação entre
professor do ensino regular e aluno com deficiência; posto que, as
mesmas estão deslocadas do lugar de acontecimento do processo
de ensino e aprendizagem. A partir da análise dos documentos po-
demos depreender, também, que o trabalho do AEE incide sobre o
aluno, e não necessariamente sobre o processo de mediação entre
ele e o professor na sala de aula regular, excetuando-se as orienta-
ções que a professora de AEE, que trabalha com o aluno, possa dar
à professora do ensino regular. Afirmamos, ainda, que, nos docu-
mentos analisados, fica implícito o papel do aluno com deficiência
intelectual em fazer a transladação do que aprende no AEE para o
espaço de sala de aula, posto que a estratégia principal da política
para escolarização desses alunos não se materializa diretamente na
sala de aula, e sim no espaço complementar. Tais aspectos foram
verificados também em nossa pesquisa empírica.
Contudo, não distante das proposições referentes à Educa-
ção Inclusiva, tanto no âmbito das políticas municipal e federal
como no das propostas internacionais, tratar da questão da escola-
rização e inserção no processo de aprendizagem é tratar do âmago
dessas políticas. Fala-se, no escopo da ONU, em “Aprendizagem
para Todos”, em detrimento do movimento “Educação para Todos”
(WB, 2011a, 2011b); assume-se, também, na Política de Educação

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Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, que um de seus obje-


tivos é, de fato, a aprendizagem dos alunos com deficiência (BRASIL,
2008a), mas ao mesmo tempo traça-se, nas diretrizes, que sua estra-
tégia principal está fora do escopo do ensino regular, da sala de aula.
A partir dessas reflexões, esperamos contribuir para o debate
sobre a implementação das políticas de inclusão escolar e os supor-
tes pedagógicos oferecidos aos alunos público-alvo da Educação
Especial, em particular aqueles com deficiência intelectual, sobre-
tudo se levarmos em consideração que esse aluno continua sendo
visto como sujeito das impossibilidades e não das possibilidades.
Igualmente, esperamos trazer reflexões sobre o fazer pedagógico
no espaço das salas de AEE, de forma que as práticas lá desenvol-
vidas sejam de fato colaborativas com as ações desenvolvidas pelos
professores em classe comum.

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Recebido: 10/12/2014
Aprovado: 11/12/2014

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.237-257, maio/ago. 2015 259
ISSN 2237-258X

PRÁTICAS PEDAGÓGICAS INCLUSIVAS


EM SALA DE AULA COMUM EM
DIÁLOGO COM AS SALAS DE RECURSOS
MULTIFUNCIONAIS: ATENDIMENTO
EDUCACIONAL E APRENDIZAGENS
APRENDIZAGEM COM SUCESSO
Inclusive pedagogical practices in regular classroom in
dialogue with Multifunctional Resources Room’s:
educational treatment and successful learning
Prácticas pedagógicas inclusivas en aula común en diálogo
con las Clases del Recursos Multifuncionales:
atención educacional y aprendizajes con éxito

Ivanilde Apoluceno de Oliveira1


Kátia do Socorro Carvalho Lima2

1
Professora do Programa de Pós Graduação em Educação da Universidade do
Estado do Pará (PPGED-UEPA), coordenadora do Núcleo de Educação Popular
Paulo Freire e da Rede de Educação Inclusiva na Amazônia Paraense da Univer-
sidade do Estado do Pará. Doutora em Educação pela Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo (PUC-SP) e pela Universidad Autonoma Metropolitana
(UAM) - Iztapalapa, no México e pós-doutora em Educação pela Pontifícia Uni-
versidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RIO).
E-mail: nildeapoluceno@uol.com.br
2
Mestre em Educação pela Universidade do Estado do Pará (UEPA). Docente
da mesma instituição, coordenadora acadêmica da Pós Graduação da Faculdade
Integrada Brasil Amazônia, gestora da Escola de Surdos Prof. Astério de Campos
e integrante da Rede Educação Inclusiva na Amazônia Paraense da Universidade
do Estado do Pará. E-mail: katiasclima@gmail.com

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ISSN 2237-258X

Resumo
Neste artigo, objetiva-se analisar a prática pedagógica inclusiva de uma
professora do Ensino Fundamental da Rede Municipal de Ensino de
Ananindeua, no Pará, buscando verificar a interação entre a prática pe-
dagógica desenvolvida por uma professora da sala de aula comum com
os docentes das Salas de Recursos Multifuncionais no Atendimento Edu-
cacional Especializado e identificar como as atividades educacionais são
planejadas, executadas e avaliadas, visando a inclusão e o sucesso escolar
de alunos com deficiência e transtorno de desenvolvimento global. Que
estratégias pedagógicas a docente realiza para obter a aprendizagem de
sucesso por parte dos educandos e a inclusão escolar? Trata-se, portan-
to, de uma pesquisa de campo de abordagem qualitativa e um estudo
de caso. Entre os procedimentos metodológicos utilizados, foi realizada
uma entrevista semiestruturada com a professora e um levantamento bi-
bliográfico sobre o tema em estudo. A análise dos dados foi efetivada por
meio de categorizações temáticas. Apresentamos, além disso, informa-
ções sobre a escola e sobre a prática pedagógica da professora, apontando
as estratégias metodológicas realizadas. Finalizamos o texto tecendo re-
flexões sobre os resultados da prática interativa e colaborativa da profes-
sora no processo de inclusão escolar dos educandos.

Palavras-Chave: Práticas pedagógicas inclusivas. Atendimento


Educacional Especializado. Aprendizagem com sucesso.

Abstract
This article aims to analyze the inclusive educational strategies of a Basic
Education teacher, from Ananindeua-Pará Municipal Scholar Network,
searching verify the interaction between pedagogical practices developed
by this teacher in regular classroom with teachers of Multifunctional
Resource Room in the Specialized Educational Treatment and identify
how the educational activities are planned, performed and evaluated,
aiming inclusion and scholar success of students with disabilities and
global developmental disorder. Which pedagogical strategies the teacher
realizes to obtain a successful learning by the students and the scholar
inclusion? It is a field research of qualitative approach and a case report.
Between the methodological proceedings it was realized semi-structured
interview with the teacher and bibliographic research about the study
subject. Data analyzes was performed by thematic categorization. We

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ISSN 2237-258X

present information about the school and pedagogical practice of the


teacher, appointing the methodological strategies adopted. We finalized
weaving reflections about the results of interactive and collaborative
practice of the teacher in the scholar students inclusion process.

Keywords: Inclusive pedagogical practices. Specialized Educational


Treatment. Successful learning.

Resumen
Este artículo objetiva analizar la práctica pedagógica inclusiva de
una profesora de la Enseñanza Fundamental de la Red Municipal de
Ananindeua-Pará, tratando de verificar la interacción entre la práctica
pedagógica desarrollada por la profesora en aula común con los docentes
de las aulas de Recursos Multifuncionales en la Atención Educacional
Especializada e identificar cómo las actividades educacionales son
planeadas, ejecutadas y evaluadas, buscando la inclusión y el éxito
escolar de los alumnos con discapacidad y trastorno generalizado del
desarrollo. ¿Qué estrategias pedagógicas la docente realiza para obtener
un aprendizaje exitoso por los estudiantes y por la inclusión escolar? Es
una investigación de campo con abordaje cualitativo y un estudio de
caso. Entre los procedimientos metodológicos fue realizada entrevista
semiestructurada con la profesora y búsqueda bibliográfica sobre el tema
en estudio. El análisis de datos se realizó a través de categorías temáticas.
Presentamos informaciones sobre la escuela y la práctica pedagógica
de la profesora, señalando las estrategias metodológicas adoptadas.
Finalizamos tejiendo reflexiones sobre los resultados de la práctica
interactiva y colaborativa de la profesora en el proceso de inclusión
escolar de los estudiantes.

Palabras clave: Prácticas pedagógicas inclusivas. Atención


Educacional Especializada. Aprendizaje exitoso.

Introdução

Desde os anos 90, a política de Educação Inclusiva vem sendo


implantada em escolas das redes municipais e estaduais de ensino,
objetivando a oferta de escolarização de qualidade e com sucesso

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ISSN 2237-258X

a todos os educandos. O atendimento educacional, no ensino re-


gular, aos alunos com deficiência, altas habilidades e transtorno
de desenvolvimento global é realizado nas salas comuns, e o es-
pecializado, em Salas de Recursos Multifuncionais (SRMs). Para
Maria Teresa Eglér Mantoan (2003, p. 24), “a inclusão implica
uma mudança de perspectiva educacional, pois não atinge ape-
nas alunos com deficiência e os que apresentam dificuldades de
aprender, mas todos os demais, para que obtenham sucesso na
corrente educativa geral”.
A implantação da Educação Inclusiva em escolas públicas
vem sendo questionada por educadores em termos da formação
dos professores para a inclusão, bem como a forma de Atendimen-
to Educacional Especializado (AEE) nas Salas de Recursos Multi-
funcionais, principalmente, entre outras questões, pela falta de ma-
terial e pela ausência de diálogo com os docentes das salas comuns.
Oliveira et al (2014, p. 26), sobre a pesquisa realizada com profes-
sores de escolas públicas de Belém, relatam que as professoras das
salas comuns “pouco conhecem sobre o atendimento educacional
especializado realizado nas SRM e também sentem falta de mate-
riais específicos para trabalharem com os alunos com necessida-
des educacionais na sala comum. Reivindicam também mais apoio
pedagógico das professoras das SRM”. Entretanto, apesar de as
pesquisas apontarem críticas ao processo de inclusão escolar, iden-
tificamos que alguns professores vêm realizando atividades peda-
gógicas significativas nas escolas, contribuindo para o processo de
inclusão escolar. Entre esses docentes, encontra-se uma professora
que atua em sala de aula comum em uma escola no município de
Ananindeua, no Pará (PA), e cuja atuação é considerada por seus
pares como favorecedora da aprendizagem com sucesso e da inclu-
são escolar. A professora, denominada neste estudo de Wivi, tem
51 anos, formação em Licenciatura em Pedagogia, com Habilitação

264 Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.259-286, maio/ago. 2015
ISSN 2237-258X

em Administração Escolar, Licenciatura Plena em Magistério do


Pré-Escolar e 1ª a 4ª série do Ensino Fundamental e especialização
em Currículo e Avaliação na Educação Básica. Ela atua no magis-
tério há 32 anos, sendo onze deles na Educação Especial e dois na
turma pesquisada (2012 a 2013).
O objetivo deste estudo, então, é analisar a prática pedagógi-
ca inclusiva dessa professora do Ensino Fundamental da Rede Mu-
nicipal de Ensino de Ananindeua (PA), buscando verificar a intera-
ção entre a prática pedagógica desenvolvida por ela na sala comum
e a realizada pelos docentes das Salas de Recursos Multifuncionais
no Atendimento Educacional Especializado, identificando como
as atividades educacionais são planejadas, executadas e avaliadas,
visando a inclusão e o sucesso escolar de alunos com deficiência e
transtorno global do desenvolvimento. Os questionamentos nor-
teadores são: que estratégias pedagógicas a docente realiza para
obter uma aprendizagem de sucesso por parte dos educandos e a
inclusão escolar? Como estes interagem com a Sala de Recursos
Multifuncionais? Trata-se, portanto, de uma pesquisa de campo
de abordagem qualitativa e de um estudo de caso. Entre os proce-
dimentos metodológicos, foi realizada entrevista semiestruturada
com a professora, que respondeu de forma escrita o roteiro da en-
trevista e forneceu materiais didáticos e fotografias para subsidiar a
análise dos dados. Realizou-se, ainda, um levantamento bibliográ-
fico sobre o tema em estudo. A análise dos dados foi efetivada por
meio de categorizações temáticas.
A seguir, apresentamos, inicialmente, informações sobre a
escola e, posteriormente, sobre a prática pedagógica da professora,
apontando as estratégias metodológicas realizadas. Nas considera-
ções finais, tecemos reflexões sobre os resultados da prática inte-
rativa e colaborativa da professora no processo de inclusão escolar
dos educandos.

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ISSN 2237-258X

Sobre a escola: localização, estrutura física e turma

A escola onde foi realizada a pesquisa está localizada em área


periférica do Município de Ananindeua, no Pará. Ela possui uma boa
estrutura física, sendo constituída por 14 salas de aula de diferentes
tamanhos, todas com ar condicionado. O espaço físico é composto
de uma Sala de Recursos Multifuncionais, três salas para Educação
Infantil, um laboratório de informática e uma sala de leitura. As de-
mais instalações são constituídas de salas para uso coordenação e
dos técnicos, banheiros, cozinha, refeitório, pátio coberto, área livre
descoberta e rampa de acesso para o usuário da cadeira de roda.
Uma desvantagem, apontada pela professora, é o espaço fí-
sico interno das salas, que é pequeno para a quantidade de alunos
matriculados, acumulando-se mesas e cadeiras, o que reduz a lo-
comoção dos alunos e a interação com os colegas e dificulta a reali-
zação das atividades educacionais. Por isso, praticamente todos os
dias a professora mudava a organização da sala de aula para viabi-
lizar o desenvolvimento das atividades, de maneira que os educan-
dos “interagissem, ficassem se olhando”3 (informação verbal).
A professora atuava na sala comum, em turma do 3º ano do
Ciclo I, com 32 alunos, sendo quatro dele portadores de deficiên-
cias (um com Síndrome de Down, dois com deficiência intelectual
e um com deficiência auditiva unilateral) e dois, de transtornos
globais do desenvolvimento (TGD) ou transtorno psicótico. A fai-
xa etária da turma era entre 8 e 14 anos. Alguns alunos já tinham
sido retidos no 3º ano por duas ou três vezes; outros apresentavam
idade prevista para o 3º ano (8 anos) e havia, também, três alunos
com deficiência com idade-série defasadas. Segundo a professora,
apesar da heterogeneidade de idade e das características de apren-
dizagem (pessoas deficientes ou não), a maioria da turma, no início

Todas as informações verbais fornecidas são de autoria da professora entrevista,


3

Wivi.

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ISSN 2237-258X

do ano, não sabia escrever seu próprio nome, não sabia copiar do
quadro para o caderno, não conhecia a margem do caderno e a di-
reção da escrita, não reconhecia as letras do alfabeto do seu nome
e também não diferenciava letras, números e outros símbolos; ou
seja, os direitos de aprendizagem ainda não tinham sidos consoli-
dados nem no 1º, nem no 2º ano do Ciclo I. Além isso, entre esses
alunos retidos nos anos anteriores, alguns apresentavam dificulda-
des de aprendizagem e a troca de letras na fala, o que se refletia na
escrita, bem como tinham dificuldades na matemática. Destaca-se,
ainda, que, com a climatização, a sala ficou silenciosa, pois profes-
sora e alunos não mais suavam, expressando os alunos bem-estar
na sala, proporcionado pelo ar condicionado. Como não podiam
colar nada na parede, “a opção foi fazer varal de acordo com as
produções feitas” (informação verbal).
A professora construiu um cantinho da leitura com a aquisi-
ção de livros do acervo do Pacto pela Alfabetização na Idade Certa,
considerado por ela um excelente recurso pedagógico. A turma re-
cebeu também uma caixa de jogos de alfabetização, que, junto com
o kit de recursos e de materiais da professora, aumentou o interesse
de todos os alunos pela leitura.
Assim, o espaço físico da sala, bem como os equipamentos e
recursos pedagógicos e as estratégias pedagógicas propostas para a
turma estavam articulados e, segundo a professora, contribuíram
para o desenvolvimento do pensar dos alunos e encorajaram-lhes a
socializar as produções escolares com os colegas, o que facilitava o
desenvolvimento das capacidades sociais e cognitivas das crianças.

Prática interativa e colaborativa com a Sala de Recursos


Multifuncionais

O atendimento aos alunos na Sala de Recursos Multifuncio-


nais deveria ser realizado no contraturno da escolarização; no caso,

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os alunos deveriam retornar no turno da tarde. Entretanto, como


eles faltavam muito, todos os alunos terminaram por serem atendi-
dos no turno da manhã, em dias diferentes, duas vezes na semana.
A professora Wivi socializava com as docentes da Sala de Re-
cursos Multifuncionais, discutindo o que planejava, a participação,
o envolvimento e o interesse dos educandos nas situações didáticas
e aquilo que gostaria que elas dessem continuidade em termos do
atendimento individual. Ela estimulava o uso de recursos didáti-
cos para trabalhar a concentração dos alunos e, também, sempre
conversava com elas sobre os alunos com TGD, pois os mesmos,
quando não medicados, ficavam agitados e havia a necessidade da
presença de outro profissional que desse apoio pedagógico. Ressal-
ta-se também que, em certas situações, havia a necessidade de dar
atenção, em sua sala, às colegas da Sala de Recursos.
Uma vez a professora fez um trato com a turma, o que consi-
derou fundamental para que os alunos entendessem e aprendessem
a gostar dos alunos com deficiência e a acolhê-los: ela estabeleceu
um sistema de ajuda mútua na classe, ficando alguns alunos res-
ponsáveis por apoiar os colegas com dificuldades de aprendizagem
– entre eles, os com deficiência.

Não foi fácil, mas foi muito interessante, porque


tinha uma aluna que queria ficar “responsável”, to-
dos os dias, por um dos meninos com TGD e a re-
lação estabelecida por ela e aceita por ele fez com
que ele ficasse atento, porque ela conversava com
ele, [dizendo] que ele tinha que cumprir com as
tarefas, que não podia errar, não podia sair da sala
toda hora, se não todos os coleguinhas do grupo
iam “perder” e ele não ia conhecer o trabalho (in-
formação verbal).

Peter Mittler (2003) afirma que o sucesso da inclusão e a par-


ticipação efetiva de alunos em sala de aula depende significativa-
mente dos outros alunos:

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em geral, ajuda e apoio são determinados casual-


mente e sem o planejamento ou a intervenção dos
professores, embora em países com classes com
um grande número de estudantes, os professores
assegurem que as crianças com habilidades va-
riadas sentem-se próximas, de forma que as mais
capazes possam ajudar seus colegas vizinhos que
podem estar lutando para entender o que é espe-
rado deles (MITTLER, 2003, p. 172-173).

Nessa perspectiva, a professora estabeleceu um sistema de tu-


toria em sala de aula, concordando, de certa forma, com o autor: “o
apoio mútuo tem-se mostrado, em particular, efetivo no ensino de
leitura, desde que o ‘tutor’ (o aluno que apoia) esteja apropriada-
mente preparado e apoiado e o aluno que recebe o apoio esteja dis-
posto a aceitar a ajuda” (MITTLER, 2003, p. 173). Dessa forma, nos
dias em que a professora da Sala de Recursos ia buscar os alunos
para o atendimento e observava que o aluno estava concentrado,
envolvido na tarefa, ela trocava o horário de atendimento, “porque
o importante era o aluno estar com interesse nas tarefas da classe
comum, nos direitos de aprendizagem, do acesso ao conhecimento,
de querer, de conseguir se concentrar” (informação verbal).
Apesar de haver uma boa relação com as professoras da Sala
de Recursos Multifuncionais, afirma a professora Wivi que não
ocorriam reuniões regulares para a troca de informações, a não
ser nos intervalos do recreio e na chegada e saída das mesmas da
escola. Nesses momentos, conversava-se sobre as características
dos alunos com transtorno psicótic/TGD, apresentava-se o con-
teúdo das aulas e mostrava-se as conquistas dos alunos, entre ou-
tras questões. Primordial, para ela, seria que “os professores da sala
multifuncional tivessem um diálogo com trocas de experiências e
de orientações agendados, que se fosse determinado no projeto da
própria Sala de Recursos Multifuncionais com a sala comum” (in-
formação verbal). Assim, seria atendido o disposto na Resolução

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CNE/CEB nº 4/2009, art. 10º, de que a escola de ensino comum,


por meio do Projeto Político Pedagógico (PPP), deve instituciona-
lizar a oferta do AEE, prevendo, dentre os requisitos da sua orga-
nização, as redes de apoio no âmbito da atuação profissional, da
formação, do desenvolvimento da pesquisa, do acesso a recursos,
serviços e equipamentos, que maximizem o AEE (BRASIL, 2009).
A professora Wivi destaca ser interessante que as professo-
ras da Sala de Recursos acompanhassem, uma vez por semana, em
determinada hora, as suas atividades em sala de aula, pois, estan-
do presente, poderiam, por meio de suas observações e avaliações,
dar dicas aos docentes da sala comum, assim como possibilitar aos
mesmos refletirem sobre o atendimento do alunado público da
Educação Especial. Ela aponta, também, a necessidade da atuação
do professor da SRM na sala de aula comum, sinalizando a possi-
bilidade da bidocência ou ensino colaborativo no AEE. No Brasil,
segundo Rejane de Souza Fontes (2009), são poucas as experiências
com ensino colaborativo. Para Hugo Otto Beyer (2006), o sistema
de bidocência numa sala de aula inclusiva necessita da colaboração
de um segundo professor ao considerar que:

[a sala de aula] é constituída por um grupo hete-


rogêneo de alunos, onde há crianças com as mais
variadas capacidades, e, também, necessidades.
Pode-se afirmar que a classe inclusiva representa
uma heterogeneidade desejada. Caso esta classe
seja atendida apenas por um professor, ele con-
seguirá realizar a individualização do ensino com
dificuldade (BEYER, 2006, p. 31).

Assim, a organização do ensino colaborativo favoreceria a


Educação Inclusiva e evitaria que as salas de inclusão fossem res-
ponsabilidade apenas de um professor, como ressalta Wivi. A co-
laboração entre os docentes da sala comum e da Sala de Recursos
Multifuncionais facilitaria o atendimento escolar, porque, nesses

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espaços, na interação com o outro, com o coletivo, os alunos conse-


guiriam avançar e aprender a respeitar o outro.
Durante a semana, a professora planejava aulas e com a utili-
zação do computador, socializava aos alunos os conteúdos de His-
tória e Geografia, além da leitura e da história da numeração.
Os direitos de aprendizagem são os princípios gerais do tra-
balho pedagógico e as concepções acerca dos objetos de ensino
expostos nos documentos curriculares oficiais das Secretarias de
Educação. Em muitos desses documentos, são estabelecidos alguns
direitos de aprendizagem fundamentais, compreendendo as diver-
sas áreas do conhecimento:

direitos de aprendiza­gem como os relativos à


aprendizagem do componente curricular Língua
Portuguesa (Leitura, Produção textual, Lingua-
gem oral e Análise Linguística, incluindo a Apro­
priação do Sistema de Escrita Alfabética) em con-
textos de reflexão sobre os gêneros textuais, em
atividades de textos cujas temáticas são de áreas
diversas (MENDES; CUNHA; TELES, 2012, p.7).

Em seu planejamento, a professora Wivi levava em conta vá-


rias situações didáticas:

O principal é ter a ideia de como os alunos, na


faixa etária e série em que estão, de como conse-
guem pensar sobre os direitos de aprendizagem,
de como constroem seu aprendizado. Mas pen-
so que estão articuladas uns ao outro, tais como,
como levar o ensino de forma que os direitos de
aprendizagem dos alunos sejam aprendidos sig-
nificativamente e sem ser de forma mecânica,
como, observava, no início, quando escreviam
seus nomes, mas não identificavam as letras dos
mesmos, embora escrevessem corretamente a gra-
fia. Como dar vida ao conteúdo, a esses direitos de

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aprendizagem? Quais estratégias e recursos facili-


tariam esse acesso? (Informação verbal).

Como a turma era bastante ativa, a professora necessitava de


estratégias para chamar atenção; por isso, ela propunha situações
didáticas considerando a faixa etária, a forma como aprendem nes-
sa faixa etária, os ritmos de aprendizagem e as diferenças. Entre as
estratégias metodológicas, considera-se como válida qualquer si-
tuação didática e metodológica que encoraje o aluno a pensar sobre
o objeto do conhecimento de forma significativa e não mecânica,
bem como as atividades interativas e colaborativas.

Uma ideia já norteia o meu fazer didático, é a con-


vicção de tudo que levasse para a turma partiria da
interação entre eles, pois a interação com seus pares,
seja em dupla, em grupo maior ou no coletivo, ati-
va o pensar do aluno, encoraja-o, é muito mais rico
para eles, pois todo o ensino, em termos de garantir
os direitos de aprendizagem inclui como os alunos
pensam sobre o objeto do conhecimento. [...] É re-
levante e desafiador para incluir os alunos, pois eles
conversam, se corrigem, se ajudam, observam e pen-
sam sobre o que erram (informação verbal).

Explica a professora que tudo que leva para a turma, em


termos de aula, metodologias, recursos e equipamentos, é com o
propósito de trabalhar estratégias interativas, sempre avaliando se
houve ou não aprendizagem por parte dos educandos. Destaca-se
que essa forma interativa de organizar o ensino ainda está em cons-
trução, porque algumas situações didáticas propostas, às vezes, não
davam certo. Isso significa que a professora considera e aprende
com os erros e está sempre construindo ações educacionais desa-
fiadoras para melhorar o aprendizado dos educandos.
A professora usa estratégias interativas como práticas de le-
tramento, o uso dos livros dos acervos do Ministério da Educação

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(MEC) e dos jogos de alfabetização do MEC e do seu acervo pes-


soal. Para ela, “os saberes dos alunos são construídos tendo seu re-
pertório e tendo em vista os direitos de aprendizagem, garantin-
do o acesso ao conhecimento linguístico, lógico matemático, das
ciências da natureza e sociedade” (informação verbal). Explica a
professora que, nas estratégias interativas,

busco recursos visuais, tais como letras móveis,


fichas com letras em diversos tamanhos, calen-
dário, fita métrica, régua, números móveis, fichas
com numerais, dinheirinho, revistas, encartes,
som, jogos com letras, jogo da memória envol-
vendo escrita e leitura, material dourado, blocos
lógicos, dominó de matemática, bingo de letras,
bingo de palavras, bingo de frases, livros variados
de literatura do acervo, jogos com rimas, alfabe-
to manual, cruzadinhas, computador, teclado do
computador [...] fichas de palavras, crachás com
nomes em letras de forma e cursiva, fichas com
o nome completo da turma, fichas com os nomes
dos dias da semana, brinquedos dos alunos, fichas
com os nomes dos meses do ano, mapa, jornal,
tesoura, cola, data show, som, dvd, vídeos, jornal,
revistas entre outros recursos que sejam acessíveis
para a aquisição do processo de alfabetização (in-
formação verbal).

A docente, portanto, utilizava uma variedade de recursos di-


dáticos, como alguns equipamentos, brinquedos, materiais prontos
e outros, confeccionados por ela. As estratégias interativas e os re-
cursos didáticos utilizados distanciam-se da prática tradicional do
uso predominante do quadro, da cópia e do ditado.
A professora relata experiências exitosas na sala comum em
articulação com a Sala de Recursos Multifuncionais, entre as quais
ações interativas com os livros de literatura do acervo do MEC. A
partir do segundo semestre, com a chegada dos vários acervos de

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literatura do MEC (o que complementou os seus kits) e com a che-


gada da professora auxiliar, que atuava diferentemente de outras
auxiliares, mais pedagogicamente do que como “babás”, passou-
-se a utilizar, por meio de ações interativas, os livros de literatura
do acervo do MEC, possibilitando que os alunos mais experientes
orientassem seus colegas e mobilizassem seu pensar.
A auxiliar, na sua primeira vivência na turma, buscava levar
os alunos a resolverem as tarefas propostas: “ela ‘dava’ a resposta
pronta para eles, ao invés de fazê-los pensar sobre o objeto a ser
aprendido nas interações em grupo, por meio dos recursos e estra-
tégias interativas” (informação verbal). Por isso,

aos poucos fui mostrando para ela que não preci-


samos ter pressa em jogar os conteúdos sem que
os alunos construam, pensem e repensem; mes-
mo que suas respostas não sejam as corretas, num
dado momento, com as nossas intervenções, eles
iriam reconstruí-las se oferecêssemos as condi-
ções para ele pensar, encorajando-o. E, assim, ela
entendeu e se reorganizou na condução do meu
propósito, que, a partir de então, era conjunto essa
conquista, priorizando os alunos deficientes e os
com outras necessidades educacionais especiais
que também requeriam atenção, devido às várias
repetências (informação verbal).

Essa fala evidencia que a professora Wivi tem por base uma
visão construtivista do ensino, na qual o educando tem de pensar
e levantar suas próprias hipóteses no processo de aquisição dos co-
nhecimentos.

Imersa em um mundo onde há a presença de siste-


mas simbólicos socialmente elaborados, a criança
procura compreender a natureza destas marcas
especiais. Para tanto, não exercita uma técnica es-
pecífica de aprendizagem. Como já fez antes com

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outros tipos de objeto, vai descobrindo as pro-


priedades dos sistemas simbólicos através de um
prolongado processo construtivo (FERREIRO;
TEBEROSKY, 1990, p. 43).

Incentivando a escolha livre de livros, a professora construiu


um cantinho da leitura para fixar os livros na sala e iniciar o traba-
lho com os acervos. Dessa forma, todos os alunos, na hora da ati-
vidade nesse cantinho, escolhiam os livros e, junto com os colegas,
interagiam em torno deles. A professora trabalhou também com os
variados recursos pedagógicos articulados com os livros do acervo,
o que despertou mais interesse nos alunos, em termos de pensar.
Dessa forma, a professora inclui todos os alunos, pois, apesar de
cada um ter seu ritmo próprio de aprendizagem, as estratégias e
recursos utilizados atendiam a todos, pois, no início, a turma apre-
sentava, praticamente, o mesmo perfil, e as dificuldades eram as
mesmas. Como foi interesse de todos o cantinho da leitura com
os livros expostos na sala, ela começou a organizar as aulas através
de sequência didáticas de um determinado livro do acervo que a
maioria da turma escolhesse.
Conforme Adelma B. Mendes, Débora A. Cunha e Rosinalda
Teles (2012, p. 6), o trabalho com sequência didática (SD):

torna-se importante por contribuir para que os co-


nhecimentos em fase de construção sejam consolida­
dos e outras aquisições sejam possíveis progressiva-
mente, pois a organização dessas atividades prevê
uma progressão modular, a partir do levantamento
dos conhecimentos que os alunos já possuem.

Oliveira (2013, p. 53) conceitua sequência didática:

É um procedimento simples que compreende


um conjunto de atividades conectadas entre si, e
prescinde de um planejamento para delimitação

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de cada etapa e/ou atividade para trabalhar os


conteúdos disciplinares de forma integrada para
uma melhor dinâmica no processo [de] ensino-
-aprendizagem.

Em síntese, a sequência didática organiza de forma sistemáti-


ca o processo de ensino e aprendizagem com atenção à participação
dos alunos, que ocorre desde o momento inicial do planejamento
da sequência até a sua culminância e avaliação.
Ressalta a professora entrevistada o caráter democrático da
atividade:

Interessante é que todos os dias, no momento da


tarefa do cantinho da leitura, assim como eles es-
colhiam livremente o livro para fazer sua leitura
de mundo, também escolhiam um para [eu] ler
para eles. E, a partir disso, eles fizeram propostas
para que eu lesse o deles, o que foi uma democra-
cia na sala, pois tinha que atender todos ao mesmo
tempo (informação verbal).

Nessa vivência, construída com os alunos, a professora apre-


sentou à turma a sequência didática do o livro Os três jacarezinhos.
Um dos alunos com TGD, todos os dias, apropriava-se desse livros
e os colegas sentiram interesse em saber do que ele tratava. A partir
disso, a sequência foi organizada seguindo algumas etapas e em
dias diferentes, conforme sintetizado a seguir.

Livro do acervo selecionado: Os três jacarezinhos, de Helen


Ketteman, ilustrado por Will Tery

Durante o período de sete dias, as atividades atenderam aos


seguintes objetivos: a) desenvolver os direitos de aprendizagem do
período básico de alfabetização, por meio de estratégias interativas

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e recursos, proporcionando aos alunos desafios para que, junto


com o outro e no coletivo, pensem sobre o objeto do conhecimento
(no caso, leitura e escrita) e, assim, construa o processo de alfabeti-
zação; e b) encorajar a turma a produzir juntos uma nova história,
recontando-a, em que eles mesmos seriam os autores, não podendo
ninguém da turma ficar de fora dessa produção.
A organização da sequência foi realizada em quatro etapas:
1ª Etapa, realizada na sala de aula: apresentação do livro
em mãos. Foi pedido aos alunos para observar e analisar a capa
do livro, frente e costas. O livro foi passado de mão em mão para
cada aluno pudesse manuseá-lo. Posteriormente, questionou-se
oralmente: O que aparece na capa? Qual é o nome? Qual é a auto-
ra? Quantas palavras formam o nome do livro? Qual é a editora?
Quem é o ilustrador? Que cor é a capa? Como está escrito o nome
do livro? Qual é a forma da letra? O que tem na capa de trás do
livro, o que os autores trazem de informações? O que a autora fala
de si, onde nasceu, o que faz? Vamos conhecer o livro?
Relata a professora sobre esse primeiro momento da atividade:

Na primeira etapa, o aluno TGD que “conhecia”


o livro, ficou sendo o responsável por apresentar
para cada um o livro, a passar de mão em mão.
Embora no momento da apresentação do livro,
com os questionamentos feitos sobre o nome do
livro, as cores, a capa, o ilustrador, ele observava e
repetia o nome do livro, queria logo que eu lesse.
Após esse diálogo, ele levantou e foi contente mos-
trar para a turma, para que cada um visualizasse
nesse primeiro momento a ilustração da capa. Os
outros colegas com deficiência e a turma toda es-
tava na expectativa, porque, propus levar a turma
para a sala de informática para ler o livro utilizan-
do o recurso do data show, porque para eles esse
recurso seria como se fosse um telão. E o aluno
responsável, sentindo-se o dono do livro, chamava

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atenção da turma, porque o livro era dele (infor-


mação verbal).

Nessa etapa, o princípio didático que fundamenta a prática


da professora diz respeito ao ensino reflexivo, quando estimula os
alunos a refletirem sobre o conhecimento e anula as situações de
mera transmissão, a partir de uma dinâmica centrada numa pers-
pectiva sociointeracionista de ensino (LEAL; LIMA, 2012).
2ª Etapa, realizada na sala de informática: O livro foi apre-
sentado escaneado no data show para que os alunos observassem,
na leitura, as imagens. Fez-se uma primeira leitura, com entonação
e sem intervenção, e, posteriormente, questionou-se oralmente: o
que acharam? Com qual história se compara? Como iniciou a his-
tória? O que acharam das ilustrações? Quantas páginas tem? Foi
realizada uma nova leitura, de forma a encorajá-los a pensar: do
que se trata o livro? O que aconteceu? Como a autora chamou cada
um dos jacarezinhos? Após mais uma leitura, questionou-se: como
as letras aparecem? Que nomes e palavras rimam? Quantos qui-
los imaginam que tem cada jacarezinho, qual é seu comprimento,
quantos litros de água eles tomam? E o Javali, quantos quilos têm?
E seu comprimento, quantos litros de água ele toma? Fez-se tam-
bém os alunos observarem, nas imagens, as formas dos desenhos,
quais figuras lembram (“com quais sólidos geométricos a casa dos
Jacarezinhos se parece, com um cone? Com um cubo?). Propôs-se
também uma situação problema: “o Jaca um fez sua casa de pedras,
o Jaca dois, fez de graveto e o Jaca três fez de areia. Imaginem o ta-
manho de cada jacaré; com que quantidade de graveto, de pedras e
de areia que levou cada tipo de casa construída? ”
Expressa a professora sobre essa segunda etapa:

a turma foi para o espaço do laboratório de infor-


mática e os resultados construídos, a partir da lei-
tura do livro no “telão”, foi muito produtivo, pois

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o recurso utilizado deu vida para a interpretação,


para exploração das imagens, do enredo, de tudo
que foi proposto para essa etapa. Nessa etapa,
articulamos de forma interdisciplinar e sociali-
zamos alguns dos direitos de aprendizagem ge-
rados a partir da leitura e das ilustrações, pois fi-
zemos vários questionamentos. Eles perceberam
que a história lembrava “Os três porquinhos” (in-
formação verbal).

Dessa forma, nessa etapa, os alunos foram desafiados a res-


ponder questões em uma prática pedagógica pautada na proble-
matização. Segundo Paulo Freire (2002, p. 28), uma educação com
rigorosidade metódica tem como objetivo “reforçar a capacidade
crítica do educando, sua curiosidade”. Assim, educador e educan-
dos tornam-se instigadores, curiosos e criativos e se aproximam do
fazer educativo crítico e construtivo. Nesse sentido, o ato de ensi-
nar exige o desenvolvimento do senso crítico.
3ª Etapa, realizada na sala de aula: Foi realizada uma pro-
dução textual coletiva, que consistiu no recontar a história lida,
registrando-a no quadro, tendo o professor como o mediador das
ideias e do registro no quadro. Escreveu-se o título do livro no qua-
dro, em destaque e no centro, para, em seguida, iniciar a história
contada em síntese pelos alunos. Incentivou-se os alunos a pensar
que a história tinha início, meio e fim, que os personagens eram a
mãe dos jacarezinhos, os três jacarezinhos (Jaca Um, Jaca Dois e
Jaca Três) e o Javali e lembrar de tudo o que aconteceu para poder
registrar a história sintetizada. Após o registro das falas dos alunos,
leu-se a história contada e registrada, organizando as ideias para
rever algumas palavras ou trocá-las.
Destaca a professora sobre a terceira etapa:

no espaço da sala de aula, propus organizar um


texto em que eles recontassem a história dos três

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jacarezinhos, sendo eu a escriba e [que] todos


juntos, por sua vez, falassem o que lembravam
da história lida na sala de informática. Antes do
registro, escrevi o mesmo nome no quadro (“Os
três jacarezinhos”) e pedi a eles para que fechas-
sem os olhos e começassem a pensar, a imaginar a
história [...] Assim, os alunos foram recontando a
história coletivamente, e todos os alunos, por sua
vez, manifestaram sua fala, a qual [eu] registrava e,
no final, reorganizava as ideias deles [...] Os resul-
tados construídos foram relevantes pelo interesse
e envolvimento dado à tarefa (informação verbal).

4ª Etapa - trabalhando com a história recontada: A turma


foi dividida em 5 grupos, aos quais foi entregue papel 40 kg e de-
mais materiais para escrever o título do texto e o nome do grupo.
Cada grupo escreveu o texto no papel e depois fez uma ilustração.
Isso fez os alunos pensar sobre o texto, sobre a margem, os parágra-
fos, a escrita das palavras ao copiar, pois não poderiam deixar de
escrever determinada letra ou trocar de letra, pois isso modificaria
a palavra. Após o registro da história, cada grupo faz a socialização,
tentando ler o seu texto e mostrando os desenhos correspondentes.
O princípio de ensino centrado na interação em pares (LEAL;
LIMA, 2012) caracteriza a prática da professora nessa etapa, quan-
do oportuniza situações em que a aprendizagem se deu por meio
da interação em pequenos e grandes grupos e que culminou em
momentos de socialização e discussão.
Relata a professora sobre essa etapa:

Nos resultados construídos, observamos a intera-


ção dos alunos em grupo para fazerem a transcri-
ção para a folha de papel 40 kg [...]. Organizamos
os grupos e observamos as decisões deles para que
todos participassem da tarefa, até porque sempre
conversávamos sobre cada um no grupo. Os alu-
nos com deficiência, de acordo com o seu ritmo,

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participavam ora escrevendo, ora pintando os de-


senhos, mas interagiam com o seu grupo (infor-
mação verbal).

Foto 1 – Trabalhando com letras móveis

Foto 2 – Socialização do texto produzido

Fonte: acervo pessoal da professora entrevistada

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A professora explicou, ainda, que tenta articular os direitos


de aprendizagem de Língua Portuguesa, Matemática, História,
Geografia e Ciências do Período Básico de Alfabetização com as
experiências dos alunos e com seu repertório de vivências adquiri-
do fora da escola. Dessa forma, a professora trabalha uma prática
interdisciplinar, pois articula e mobiliza dialeticamente as diferen-
tes áreas do conhecimento com os saberes dos alunos. Ao valorizar
o conhecimento prévio dos alunos, ela demonstra bases pedagógi-
cas freireanas, pois cabe “ao professor, ou mais amplamente, à esco-
la o dever de respeitar os saberes com que os estudantes, sobretudo
das classes populares, chegam a ela” (FREIRE, 2002, p. 3).

O nível de aproveitamento escolar dos alunos

No início do ano, os alunos não tinham consolidado os di-


reitos de aprendizagem do 1º e 2º ano do Ciclo I, a turma ainda
não dominava o conhecimento mínimo necessário desses anos.
Assim, no 3º ano, o trabalho seria para consolidar os direitos de
aprendizagem, e os alunos, no final do ano, deveriam estar todos
no nível alfabético da escrita, apesar das diferentes deficiências e
dificuldades em termos de escolaridade. No desenvolvimento das
estratégias interativas em classe, a professora observava todos os
alunos, o desempenho deles, seus erros, seus avanços e seus recuos.
Uma conquista ressaltada pela professora foi o aluno com
TGD/transtorno psicótico que não conseguia escrever do quadro
para o caderno. Em uma determinada tarefa, cada aluno deveria
registrar seu primeiro nome no quadro branco, podendo pesquisar
no crachá. Todos cumpriram a tarefa, corrigiram, observaram as
letras que faltavam, as letras a mais, e esse aluno, durante toda a
tarefa, ria e gritava, sempre prestando atenção na aula, nos colegas
que iam individualmente no quadro, se divertindo. Ao chegar a vez

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dele, ele não quis ir; nesse momento, a professora perguntou para a
turma: “vamos ajudá-lo? ”. Ele resistiu um pouco, mas depois ten-
tou escrever seu nome do seu jeito, com uma escrita pré-silábica.
Uma colega propôs que ele pegasse o crachá e fosse novamente para
o quadro, e ele, então, realizou a tarefa com o auxílio da pesquisa, o
que significou o início do seu interesse em aprender a escrever seu
nome. Observa a professora que o aproveitamento dos alunos com
deficiência dependia das situações de aprendizagem que lhes pro-
porcionava, dos tipos de recursos, de tentar conhecer o potencial
de cada um, de saber mediar e propor atividades de forma que os
colegas favorecessem condições de eles acompanharem a aula.

Avaliação da aprendizagem dos alunos

A avaliação da aprendizagem dos alunos foi feita a partir das


várias construções efetivadas, em cada etapa, pela observação das
respostas dos alunos, tanto no individual como no coletivo, bem
como da sua concentração, atenção, desempenho, interesse, parti-
cipação, da forma como interagiu com os colegas, de como incluiu
os colegas, de como aprendeu com seus pares, entre outras. Dessa
forma, a aprendizagem foi efetivada de acordo com a mediação esta-
belecida na sala pela professora, observando-se a trajetória do pensar
inicial ao novo pensar construído pelo educando, sempre a partir de
estratégias interativas. Assim, a avaliação foi feita processualmente,
buscando-se identificar como o aluno tentou resolver as questões e
suas tentativas, ora individual, ora em interação com o grupo.
Na tarefa com a ficha do alfabeto, o comando era que cada
aluno pegasse uma ficha e depois organizasse no chão da sala a
ordem do alfabeto. Explica a professora que os alunos com defi-
ciência conseguiram identificar algumas letras, principalmen-
te as de seu nome. No final do ano, eles “falavam com conheci-
mento [sobre] cada letra, uma a uma pela ordem, como também,

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conheciam cada letra do seu primeiro nome e começavam a cons-


truir seu pensar sobre o alfabeto, no sentido de diferenciar letras de
numerais” (informação verbal).
Uma outra situação avaliativa na qual os alunos com defi-
ciência apresentaram avanços foi a experiência de socialização de
uma tarefa construída pela turma a partir de um livro do acervo do
MEC, Viviana, a rainha do pijama. Nessa atividade, foi desenvol-
vido um trabalho com alguns tipos de gêneros textuais. Os alunos
foram divididos em grupos, cada grupo foi sorteado com um de-
terminado gênero textual e, depois, fizeram a construção da ativi-
dade culminando na socialização para o coletivo.

Grupos de Trabalho: produção colaborativa

Foto 3 – Produção de gêneros textuais

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Foto 4 – Socialização das produções coletivas

Fonte: acervo pessoal da professora entrevistada

Após toda essa construção, cada grupo apresentou oralmente


sua produção e os alunos com deficiência também falaram sobre o
que fizeram. Ela avaliou de forma processual também a sua prática
pedagógica, buscando aprimorá-la e replanejá-la de acordo com as
necessidades educacionais dos educandos.

Considerações finais

Por meio das atividades interativas e colaborativas, a turma


se envolveu e novas relações foram construídas com os colegas, as-
sim como seu repertório foi ampliado. Nesse sentido, foram dadas
condições para encorajar a imaginação das crianças, conseguindo
avanços na sua forma de pensar e, consequentemente, de aprender.
A professora considera que, em sua prática pedagógica, está
caminhando para a inclusão escolar, porque busca garantir a to-
dos os educandos seus direitos de aprendizagem em todas as áreas

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do conhecimento e oferecer-lhes qualidade nesse atendimento. Ela


considera que sua prática pedagógica favorece a inclusão escolar
na medida em que, ao desenvolver a prática, propõe a construção
do pensar nos alunos quanto aos direitos de aprendizagem me-
diados por estratégias interativas, o que faz uma grande diferença
na sala de aula. Nessas tentativas, constatou-se que eles aprendem
um com o outro, interagindo e pesquisando com o outro. A convi-
vência grupal e lúdica faz com que os educandos se percebam im-
portantes no grupo, fazendo parte deste e ajudando. As atividades
estavam articuladas à forma como os educandos constroem o seu
aprendizado e a professora sempre observava se realmente estavam
aprendendo, pois considera um grande desafio tornar os direitos de
aprendizagem vivos na sala de aula.
A prática pedagógica da professora favoreceu o sucesso es-
colar. Em primeiro lugar, porque refletia criticamente sobre a sua
prática, avaliando-a, visando atender às demandas do alunado; em
segundo, porque havia a preocupação em desenvolver uma prática
educacional inclusiva, atendendo à heterogeneidade da turma, o
que a levou a usar a estratégia interativa e colaborativa, que, a seu
ver, facilitaria a aprendizagem dos educandos.

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Recebido: 10/12/2014
Aprovado: 11/12/2014

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ISSN 2237-258X

TECNOLOGIAS ASSISTIVAS NO PROCESSO


DE ESCOLARIZAÇÃO DE ALUNOS COM
DEFICIÊNCIA SENSORIAL1
Assistive Technology in the schooling process
of students with sensorial deficiency
Tecnologías de Asistencia con estudiantes en processo
de escolarización con discapacidad sensorial

Celi Corrêa Neres2


Nesdete Mesquita Corrêa3

Resumo
A política educacional brasileira, no tocante à educação dos alunos com
deficiência, tem orientado que a escolarização destes seja realizada no
ensino comum, conforme a proposta de inclusão escolar em curso; essa

1
Este texto emergiu de reflexões iniciais no desenvolvimento do projeto de pes-
quisa “A inclusão escolar de alunos com deficiência sensorial: estudo sobre as
tecnologias assistivas”, do qual participam pesquisadores da Universidade Esta-
dual de Mato Grosso do Sul (Uems), da Universidade Federal de Mato Grosso
do Sul (UFMS) e da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), com
financiamento da Fundação de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino, Ciência e
Tecnologia do Estado de Mato Grosso do Sul (Fundect).
2
Doutora em Educação. Docente do Curso de Pedagogia e do PPGE/Unidade
Universitária de Paranaíba e do PROFEDUC/Unidade Universitária de Campo
Grande da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (Uems).
E-mail: celi@uems.br
3
Doutora em Educação. Docente do PPGE/CPAN/UFMS/Campus de Corumbá e
do Curso de Pedagogia do Centro de Ciências Humanas e Sociais da Universidade
Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). E-mail: nesdetemesquita@gmail.com

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ISSN 2237-258X

tarefa, portanto, passa a ser responsabilidade das escolas comuns, que


devem contar com o apoio do Atendimento Educacional Especializado
(AEE), principalmente na organização das Salas de Recursos Multifun-
cionais (SRM). A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva
da Educação Inclusiva (2008) define que esse atendimento tem como fi-
nalidade identificar, elaborar e organizar recursos pedagógicos e de aces-
sibilidade que eliminem as barreiras para que os alunos possam partici-
par de todas as atividades, considerando suas necessidades específicas.
Dentre esses recursos, destacam-se as Tecnologias Assistivas (TA), que
buscam apoiar o trabalho didático envolvendo alunos com deficiência
e englobam metodologias, estratégias, práticas e serviços que possam
subsidiar a acessibilidade ou o processo pedagógico, visando autonomia,
independência, qualidade de vida e inclusão de pessoas com deficiências,
incapacidades ou mobilidade reduzida. Sendo assim, este texto tem como
objetivo discutir o uso da TA no atendimento de alunos com deficiências
sensoriais em SRMs, com vistas a contribuir para a discussão dos proces-
sos e práticas de escolarização dos alunos com deficiência auditiva, com
surdez e/ou deficiência visual.

Palavras-chave: Deficiência. Inclusão escolar. Tecnologias Assis-


tivas (TA).

Abstract
The Brazilian educational policy concerning the education of students
with disabilities has guided the schooling of these students is held in
common education, as proposed by school inclusion in progress and
therefore this task is the responsibility of the public schools that should
count with the support of the Educational Service Specialist (ESA),
especially in the organization of Multifunctional Resource Classrooms
(SRM). The National Policy on Special Education in Inclusive Education
Perspective states that this service is to identify, develop and organize
educational and accessibility features that eliminate barriers for students
to participate in all activities, considering their specific needs. Among
these features stand out the Assistive Technology (AT) that seek to
support the educational work involving students with disabilities and
include methodologies, strategies, practices and services that can support
accessibility or the pedagogical process to autonomy, independence,
quality of life and inclusion of people with disabilities, disability or

290 Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.287-306, maio/ago. 2015
ISSN 2237-258X

reduced mobility. This text aims to discuss the use of T.A. in the care
of students with sensory disabilities in SRM in order to contribute to
the discussion of the processes and student enrollment practices with
hearing, deaf and/or visual impairment.

Keywords: Disability. School inclusion. Assistive Technologies (T.A.).

Resumen
La política educativa brasileña en relación con la educación de los
estudiantes con discapacidad ha guiado a la escolarización de estos
alumnos se lleva a cabo en la educación común, tal como propone la
inclusión escolar en curso, por lo que esta tarea es responsabilidad de
las escuelas públicas que deben contar con el apoyo del Servicio de
Especialista en Educación (ESA), sobre todo en la organización de las
Salas de Recursos Multifunción (SRM). La Política Nacional de Educación
Especial en la Perspectiva de la Educación Inclusiva establece que este
servicio es identificar, desarrollar y organizar las funciones educativas
y de accesibilidad que se eliminen las barreras para que los estudiantes
participen en todas las actividades, teniendo en cuenta sus necesidades
específicas. Entre estas características destacan la Tecnología de
Asistencia (T.A.), que buscan apoyar el trabajo de educación que incluye
estudiantes con discapacidad e incluir metodologías, estrategias, prácticas
y servicios que pueden apoyar la accesibilidad o el proceso pedagógico
a la autonomía, la independencia, la calidad de vida y inclusión de las
personas con discapacidad, la discapacidad o movilidad reducida. Este
texto tiene como objetivo discutir el uso de la asistencia técnica en la
atención de los estudiantes con discapacidades sensoriales en SRM con el
fin de contribuir a la discusión de los procesos y prácticas de inscripción
de estudiantes de la audición, sordos y/o deficiencia visual.

Palabras clave: La discapacidad. La inclusión escolar. Tecnologías


de Asistencia (T.A.).

Introdução

Historicamente, a educação de alunos com deficiência se


materializou em uma rede paralela de ensino, em instituições de

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ISSN 2237-258X

caráter privado, muitas subvencionadas por meio de verbas públi-


cas (NERES, 2010). Na década de 1960, por influência direta do
movimento de integração, muitas críticas foram feitas ao trabalho
desenvolvido nas instituições sob o argumento de que esse tipo de
atendimento levava à segregação da pessoa com deficiência. Entre-
tanto, a defesa da integração não impediu que diversas instituições
continuassem a oferecer o atendimento especializado. Naquele
modelo, havia um entendimento de que, em alguns casos, era ne-
cessária uma preparação anterior à inserção dos alunos nas escolas
comuns e de que esse trabalho poderia ser realizado nas institui-
ções (NERES, 2010).
A partir dos anos de 1990, com o movimento de inclusão, as
críticas em relação ao atendimento ofertado em espaços especializa-
dos tornaram-se mais contundentes, e as expressões “inclusão”, “edu-
cação inclusiva”, “escola inclusiva” e “inclusão escolar” tornam-se
presentes na elaboração de políticas educacionais. A proposta da
inclusão escolar, nesse período, aparece como alternativa para a su-
peração das condições sociais de uma grande parcela da população
considerada excluída e está diretamente ligada ao movimento da
escola para todos (NERES, 2010). A inclusão dos alunos excluídos
é considerada via de “inclusão social”, reafirmando o papel da esco-
la como instrumento de equalização social. No campo da Educação
Especial, a inclusão de alunos com deficiência em escolas comuns
passa a ser defendida como meio de superação das condições de
segregação e de exclusão social a que foram historicamente subme-
tidos (KASSAR, 2012). A autora também ressalta que, ao tratar da
educação dos alunos com deficiência, especificamente no caso do
Brasil, é imprescindível considerar dois aspectos que são intrínse-
cos à formação da sociedade brasileira: “a desigualdade e a diversi-
dade” (KASSAR, 2012, p. 3)
No bojo do movimento pela inclusão escolar, a Educação Es-
pecial, definida como modalidade de ensino pela Lei de Diretrizes

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ISSN 2237-258X

e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei n.º 9.394/1996, tem sido


conclamada para apoiar a inclusão de alunos com deficiência no
ensino comum, por meio da organização e oferta do Atendimento
Educacional Especializado (AEE). A Política Nacional de Educa-
ção Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (PNEEI, 2008)
define que o AEE “[...] tem como função identificar, elaborar e or-
ganizar recursos pedagógicos e de acessibilidade que eliminem as
barreiras para a plena participação dos alunos, considerando suas
necessidades específicas” (BRASIL, 2008a, p. 10). Dentre esses re-
cursos, destacam-se as Tecnologias Assistivas (TA), que buscam
apoiar o trabalho didático envolvendo alunos com deficiência e
englobam metodologias, estratégias, práticas e serviços que pos-
sam subsidiar a acessibilidade ou o processo pedagógico, visando
a autonomia, a independência, a qualidade de vida e a inclusão de
pessoas com deficiência, incapacidades ou mobilidade reduzida.
A disponibilização das TA no processo de inclusão escolar é
importante, considerando-se que essas são instrumentos que po-
dem favorecer aos alunos com deficiência o acesso às atividades
escolares, aos conteúdos e aos conhecimentos necessários ao seu
desempenho acadêmico e social, conforme apontam Sartoretto e
Bersch (2014, on line):

A tecnologia assistiva é um recurso ou uma estra-


tégia utilizada para ampliar ou possibilitar a exe-
cução de uma atividade necessária e pretendida
por uma pessoa com deficiência. Na perspectiva
da educação inclusiva, a tecnologia assistiva é vol-
tada a favorecer a participação do aluno com defi-
ciência nas diversas atividades do cotidiano esco-
lar, vinculadas aos objetivos educacionais comuns.
São exemplos de tecnologia assistiva na escola os
materiais escolares e pedagógicos acessíveis, a co-
municação alternativa, os recursos de acessibilida-
de ao computador, os recursos para mobilidade,

Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.287-306, maio/ago. 2015 293
ISSN 2237-258X

localização, a sinalização, o mobiliário que atenda


às necessidades posturais, entre outros.

Diante do exposto, vale questionar se as Tecnologias Assisti-


vas têm sido disponibilizadas aos alunos em processo de inclusão
escolar e como essas se articulam com o serviço de AEE nas escolas
comuns e, ainda, de que forma essas tecnologias são usadas en-
quanto ferramenta de apoio ao processo de escolarização de alunos
com deficiência. Isso porque, muitos pesquisadores, tais como Pa-
dilha (2004), Góes (2004), Laplane (2004), Bueno (2008) e Kassar
(2012) têm revelado a fragilidade do sistema de ensino brasileiro
e suas dificuldades em proporcionar, sobretudo aos alunos com
deficiência, a pretendida educação de qualidade, seja pela falta de
recursos disponíveis nas escolas, seja pela falta de preparação dos
professores em trabalhar com esses recursos.
Ao analisar a constituição histórica da instituição escolar,
verifica-se que a organização do trabalho didático assentou-se ba-
seado em uma pedagogia homogênea, na qual o ensino coletivo
sustenta a ação docente. Já o ensino especializado, aquele destinado
às pessoas com deficiência tem adotado, via de regra, a pedagogia
especial, na qual a relação pedagógica é apoiada na individualiza-
ção do ensino (LANCILLOTTI, 2006). Baptista (2006) analisa a or-
ganização pedagógica das escolas comuns no Brasil e aponta para
o desafio imposto frente ao processo de inclusão escolar, tais como
mudanças relativas à concepção de ensino, ao trabalho docente e às
metodologias específicas.
Nesse contexto, o objetivo deste texto é tecer algumas con-
siderações acerca do uso da TA no atendimento de alunos com
deficiência sensorial com vistas a contribuir para a discussão dos
processos e práticas de escolarização de alunos com deficiência au-
ditiva, com surdez e/ou deficiência visual.

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O uso das Tecnologias Assistivas na escolarização de alunos


com deficiência sensorial

Verificam-se, no âmbito da política educacional brasileira,


nos últimos anos, por força do movimento de inclusão escolar, nor-
mas que orientam, de maneira direta, a ampliação de matrículas
de alunos com deficiência nas escolas comuns. É possível perce-
ber, nos últimos anos, um aumento considerável no quantitativo
de crianças e jovens com deficiência que têm acesso à Educação
Básica. Melletti (2010) pontua que é possível verificar, por meio dos
Censos Escolares, realizados pelo Ministério da Educação (MEC) e
pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira (Inep), esse aumento, demonstrando o acesso e a perma-
nência dessa população nas escolas comuns. É necessário questio-
nar, entretanto, se esse acesso tem se traduzido em atendimento
adequado, bem como se as necessárias condições de permanência
desses alunos na escola estão sendo atendidas.
Em 2011, de acordo com os dados técnicos do Inep, cerca de
80% do total de matrículas da Educação Especial concentravam-
-se nas escolas públicas e quase 20%, nas instituições privadas.
Dados do Inep de 2011 confirmam que, no Brasil, temos 752.305
matrículas, contabilizando as realizadas nas escolas comuns e
especiais, reafirmando o crescimento do número de alunos com
deficiência em escolas comuns. Considerando a Educação Infan-
til, o Ensino Fundamental e Médio, a Educação Profissional e a
Educação de Jovens e Adultos, o aumento, entre 2010 e 2011, foi
de 15,3% (BRASIL, 2011a).
Pesquisas que se dedicam a analisar a inclusão de alunos com
deficiência na escola comum têm apontado para as lacunas e con-
tradições existentes, considerando a realidade das escolas brasilei-
ras. Laplane (2004, p. 18), ao analisar a política de inclusão, salienta
a contradição existente na medida em que

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ISSN 2237-258X

[...] o discurso contradiz com a realidade educa-


cional brasileira, caracterizada por classes super-
lotadas, instalações físicas insuficientes, quadros
docentes cuja formação deixa a desejar. Essas con-
dições de existência do nosso sistema educacional
levam a questionar a própria idéia de inclusão
como política que, simplesmente, insira alunos
nos contextos escolares existentes.

Esse apontamento da autora nos leva a questionar as orien-


tações propostas pela política educacional que delega à escola co-
mum o atendimento aos alunos com deficiência, reponsabilidade
que outrora não foi totalmente assumida pelo Estado, tendo em
vista que, historicamente, a Educação Especial foi assumida pelas
instituições de caráter privado (NERES, 2003).
Para entender a orientação das políticas de inclusão, faz-se
necessário analisá-las como um grande movimento que se inten-
sifica a partir da década de 1990, quando se percebe um redimen-
sionamento das políticas públicas para promover a inclusão de
pessoas que vivem em processo de extrema exclusão social. Assim,
para se compreender a defesa da inclusão escolar das pessoas com
deficiência, é preciso dimensioná-la na proposta de educação para
todos como um grande movimento educacional que se fortalece
nos anos 1990 e que vem responder a uma necessidade da escola de
atender todas as crianças que dela estão excluídas.
A partir dos anos 1990, o cenário político-econômico, de-
lineado pela lógica do capitalismo em sua configuração expressa
pela globalização e neoliberalismo, traduz-se numa realidade so-
cial marcada pelo aumento do desemprego e, por consequência,
pela exclusão. Essa situação se reflete nas propostas educacionais,
como a tentativa de criação de uma política pública que seja capaz
de dar respostas às crises sociais e à exclusão. Sobre essa configu-
ração social Dupas (1999, p. 133) pontua que, quando se percebe

296 Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.5, n.13 p.287-306, maio/ago. 2015
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que o modelo global de produção agrava a exclusão social, provoca


o desemprego formal e a flexibilização do trabalho, a tendência é
aumentar “a pressão sobre os Estados nacionais exigindo a retoma-
da de políticas públicas eficazes na área social”. Verifica-se que a
educação está na linha de frente dessas políticas. Nesse contexto, a
educação, enquanto política pública4 de corte social tem sido con-
clamada como estratégia de enfrentamento da exclusão e de redu-
ção das tensões sociais. Lancillotti (2006, p. 35), ao analisar esse ce-
nário social e sua ligação com o discurso da inclusão, salienta que:

Na sociedade capitalista contemporânea há um gi-


gantesco e crescente número de excluídos. A des-
peito de todos os avanços e riquezas decorrentes
do trabalho humano historicamente acumulado,
grande parcela da população vive em condições
de miséria, e bem poucos podem fruir das am-
plas possibilidades abertas pela produção huma-
na. Esta face perversa do sistema social tem sido
enfrentada por meio de ações inclusivistas, marca-
damente compensatórias, que vêm no sentido de
atenuar os efeitos da exclusão, passando ao largo
de seus determinantes materiais.

Uma tarefa importante imposta à Educação é atender todos


aqueles considerados excluídos, entre eles, as pessoas com deficiên-
cia. Para tanto, essa educação passa a ser denominada “inclusiva”,
que atende a todos, sem distinção. A manifestação das propostas de

4
O conceito de políticas públicas adotado neste estudo baseia-se na definição
de Azevedo (1997, p. 5) que afirma: [...] em um plano mais concreto, o conceito
de políticas públicas implica considerar os recursos de poder que operam na
sua definição e que têm nas instituições do Estado, sobretudo na máquina
governamental, o seu principal referente. Outra importante dimensão que se deve
considerar nas análises é que as políticas públicas são definidas, implementadas,
reformuladas ou desativadas com base na memória da sociedade ou Estado em
que têm lugar e por isso guardam estreita relação com as representações sociais
que cada sociedade desenvolve de si própria[...].

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inclusão escolar encontra, a partir da década de 1990, amparo nas


declarações internacionais, dentre as quais destacam-se a Declara-
ção Mundial sobre a Educação para Todos (1990), a Declaração de
Salamanca (1994), a Declaração de Dakar (2000), a Declaração de
Madri (2002) e a Declaração de Sapporo (2002). Observa-se que
esses documentos têm como finalidade chamar a atenção dos paí-
ses em desenvolvimento para a necessidade de firmar compromis-
so com a educação enquanto política pública importante frente às
distorções sociais.
A defesa da escola para todos é a ideia central desses docu-
mentos. A partir daí a escola passa a ser o locus da educação e da
escolarização de alunos com deficiência, condução assumida pela
atual Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da
Educação Inclusiva (PNEEI). No texto do documento, a Educação
Especial passa a integrar a proposta pedagógica da escola regular e
é definida como:

[...] uma modalidade de ensino que perpassa to-


dos os níveis, etapas e modalidades, realiza o aten-
dimento educacional especializado, disponibili-
za os recursos e serviços e orienta quanto a sua
utilização no processo de ensino e aprendizagem
nas turmas comuns do ensino regular (BRASIL,
2008a, p.10).

Assim, conforme a PNEEI, a Educação Especial, por meio do


atendimento especializado, tem a função de promover a inclusão
escolar de alunos com deficiência. Entretanto, as condições de fun-
cionamento e organização didática das escolas do ensino comum
não são consideradas quando se preconiza a inclusão escolar dessa
população. O que se propõe é a oferta do atendimento especializa-
do. Segundo o texto da Política, a Educação Especial deixaria sua
condição de “sistema paralelo de ensino” (BRASIL, 2008a).

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Observa-se que o texto da PNEEI remete a uma discussão


presente na área que é exatamente a atuação da Educação Espe-
cial como um reparo do ensino comum. Ao analisar os discursos
de inclusão presentes na política educacional, Garcia (2008, p. 14)
conclui que tais discursos exercem uma função reparadora:

[...] Os documentos aqui referidos têm em co-


mum discursos que defendem práticas inclusivas
no campo educacional como promotoras de inclu-
são social, mas numa perspectiva que não questio-
na o atual sistema social, ao contrário, propõem
reparos sociais para aqueles que deles necessitam.
Da mesma forma, não questionam a organização
escolar na qual a educação básica ocorre.

A PNEEI define que as funções do atendimento especializa-


do são: “[...] identificar, elaborar e organizar recursos pedagógicos
e de acessibilidade que eliminem as barreiras para a plena partici-
pação dos alunos, considerando suas necessidades específicas [...]”
(BRASIL, 2008a, p. 15). Ressalta-se que o documento informa que
as atividades desenvolvidas no Atendimento Educacional Especia-
lizado não substituem a escolarização, mas complementam e/ou
suplementam a educação dos alunos com deficiência e contribuem
para sua inclusão escolar. Garcia (2008, p. 14) lembra que o “aten-
dimento especializado, na forma de serviços e de recursos espe-
ciais, é seguidamente relacionado na política vigente com práticas
denominadas inclusivas”. Em relação ao local de realização desse
atendimento, a ênfase é dada aos espaços das escolas comuns como
uma oferta obrigatória em todas as etapas e modalidades da Edu-
cação Básica.
A efetivação das orientações da PNEEI foi garantida legal-
mente pelo governo federal por meio do Decreto n.º 6.571, de 17
de setembro de 2008, que dispõe sobre o Atendimento Educacio-
nal Especializado (AEE) e que, em seu Art. 1º, define que a União

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prestará apoio técnico e financeiro aos sistemas públicos de ensino


com vistas a ampliar a oferta desses serviços aos alunos com defi-
ciência matriculados no ensino comum (BRASIL, 2008b). Com a
adoção dessa medida, o Estado reforça e estimula a matrícula dos
alunos com deficiência no ensino comum. Na leitura do Art. 6º,
pode-se verificar essa ação do Estado define que deve ser computa-
da em dobro a matrícula do aluno com deficiência que está no en-
sino regular e no especializado da rede pública. Assim, os recursos
do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica
e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB) passam
subsidiar a matrícula dos alunos no ensino comum e nos serviços
especializados:

Art. 6o O Decreto n. 6.253, de 13 de novembro de


2007, passa a vigorar acrescido do seguinte artigo:
Art. 9º-. Admitir-se-á, a partir de 1o de janeiro de
2010, para efeito da distribuição dos recursos do
FUNDEB, o cômputo das matriculas dos alunos
da educação regular da rede pública que recebem
atendimento educacional especializado, sem pre-
juízo do cômputo dessas matrículas na educação
básica regular (BRASIL, 2008b).

Dessa forma, a partir de 2010, os alunos com deficiência


foram contabilizados duplamente nos recursos do FUNDEB, por
meio de sua matrícula em escolas comuns e no atendimento espe-
cializado. Essa medida tem contribuído para o aumento das matrí-
culas dos alunos com deficiência nas escolas comuns.
Outro dispositivo legal utilizado para a implantação das
orientações da PNEEI foi a homologação do Parecer CNE/CEB
n.º 13/2009, que dispõe sobre as Diretrizes Operacionais para o
AEE na Educação Básica, modalidade Educação Especial, para
orientar os sistemas de ensino na implantação do AEE aos alunos
com deficiência matriculados no ensino comum (BRASIL, 2009a).

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Fundamentado nesse parecer, em 2009, o Conselho Nacional de


Educação publicou a Resolução CNE/CEB n.º 4/2009. Segundo
esta, a oferta do AEE deverá acontecer prioritariamente em espa-
ços definidos como “salas de recursos multifuncionais” nas escolas
comuns, em conformidade com a defesa do movimento da inclu-
são escolar (BRASIL, 2009b). Essas salas têm se ampliado junto às
escolas no sentido de oferecer o AEE e subsidiar a escolarização
dos alunos com deficiência.
Em 2011, com a publicação do Decreto n.º 7.611/2011
(BRASIL, 2011b), que dispõe sobre a Educação Especial e o AEE,
revogou-se as ações estabelecidas pelo Decreto n.º 6.571/2008
(BRASIL, 2008b), anteriormente destinado para o mesmo fim.
Segundo Sartoretto e Bersch (2014), as Salas de Recursos cons-
tituem-se em espaços privilegiados para que o aluno com deficiên-
cia aprenda a usar as Tecnologias Assistivas como ferramenta para
o desenvolvimento da aprendizagem e da autonomia. O Comitê de
Ajudas Técnicas (CAT), instituído no Brasil pela Portaria n.° 142, de
16 de novembro de 2006, define Tecnologias Assistivas como:

[...] uma área do conhecimento, de característica


interdisciplinar, que engloba produtos, recursos,
metodologias, estratégias, práticas e serviços que
objetivam promover a funcionalidade, relaciona-
da à atividade e participação de pessoas com de-
ficiência, incapacidades ou mobilidade reduzida,
visando sua autonomia, independência, qualidade
de vida e inclusão social (CAT, Ata da Reunião
VII, SDH/PR, 2007).

As TA e o seu uso no trabalho didático pode se configurar


como instrumento mediador, que permite ao aluno com deficiência
acessar o conhecimento e participar de atividades variadas que se
desenvolvem no âmbito da escola. Sanfelice (1989, p. 33) pondera
“que uma escola igual para todos, em uma sociedade cujo alunado

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é social e culturalmente distinta ou físico e mentalmente diferen-


ciada, será teoricamente democrática e na prática discriminadora”.
A questão que se coloca é como gerenciar ações didáticas, incluin-
do-se os instrumentos que favoreçam o atendimento às diferenças
na sala de aula. Um caminho seria possibilitar a sistematização de
uma ação pedagógica, de início diferenciada, mas que, ao longo do
processo educativo, seja capaz de levar o aluno com deficiência à
possibilidade de acesso ao conhecimento, como nos mostra Sanfe-
lice (1989, p. 31):

[...] Trata-se do reconhecimento das característi-


cas reais de que cada clientela escolar é portado-
ra para, a partir daí, iniciar o processo educativo.
Diferentes procedimentos, portanto, no início da
ação pedagógica, mas que tanto quanto possível
estariam destinados a levar, ao longo do processo
pedagógico, a resultados de aprendizagem seme-
lhantes e próximos entre si.

Assim, pensar em uma ação pedagógica que atenda as dife-


renças inclui, necessariamente, estratégias didáticas diferentes que
possibilitem a aprendizagem. Os instrumentos, as tecnologias e as
ações didáticas devidamente planejadas para alunos com deficiên-
cia sensorial em sala de aula são os mediadores nesse processo. So-
bre esse aspecto, Sartoretto e Bersch (2014, on line) destacam que:

A tecnologia assistiva encontra sentido quando


segue com o aluno, no contexto escolar comum,
apoiando a sua escolarização. Portanto, o trabalho
na sala se destina a avaliar a melhor alternativa de
tecnologia assistiva, produzir material para o alu-
no e encaminhar estes recursos e materiais pro-
duzidos, para que eles sirvam ao aluno na escola
comum, junto com a família e nos demais espaços
que frequenta.

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Pelosi e Nunes (2009, p. 151), ao analisarem as ações dos pro-


fessores itinerantes e o uso das TA no atendimento aos alunos com
deficiência física, concluíram que:

A utilização dos recursos de Tecnologia Assistiva


prosseguia limitada a recursos de baixa tecnolo-
gia, mesmo em escolas onde havia laboratório de
informática. A Comunicação Alternativa e Am-
pliada mostrava-se nos estágios iniciais de im-
plementação, sendo que a maior parte dos alunos
utilizava recursos artesanais como alternativa para
a escrita e possuía pranchas de apoio às atividades
escolares, mas não possuíam pranchas para favo-
recer a sua comunicação social.

Manzini (2012) salienta que, no caso da aplicação das TA,


não basta ter os recursos disponíveis, mas é de fundamental im-
portância que se tenha domínio de estratégias para o uso adequado
no sentido de atender os alunos. O autor chama atenção para a ne-
cessidade de formação continuada de professores para que se possa
incorporar as ferramentas dessas tecnologias no trabalho didático
envolvendo alunos com deficiência.

Considerações finais

Ressalta-se, a partir dessas considerações, que o desenvol-


vimento do processo de escolarização de alunos com deficiência,
frente à proposta de inclusão escolar, merece análises que desvelem
os processos e as práticas operacionalizadas na escola comum. Pes-
quisas desenvolvidas por Prieto (2006), Ferreira (2005), Mendes
(2008), Oliveira (2008), entre outros apontam para a inadequação
da escola e para a falta de investimento na formação de professores
e de recursos necessários para desenvolver propostas de inclusão.

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É de fundamental importância a investigação por meio de


pesquisas que privilegiem as ações desenvolvidas no seio da esco-
la e que possam contribuir para o desvelamento de processos e,
por consequência, com o aprimoramento de práticas educacionais
que favoreçam a educação das pessoas com deficiência, sobretudo,
aquelas que vislumbrem investigar o uso da TA no processo de es-
colarização dessa população.

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Recebido: 10/12/2014
Aprovado: 11/12/2014

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