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NATUREZA E TRANSPARÊNCIA EM ROUSSEAU


Gustavo Cunha Bezerra

Docente do Curso de Filosofia da Universidade do Oeste Paulista – UNOESTE – Presidente Prudente – SP. E-mail:
gustavocunha@unoeste.br

RESUMO
mais conhecidas e divulgadas do pensamento de Jean-Jacques Rousseau é a sua defesa da
Uma das facetas
bondade natural dos homens e a condenação da sociedade moderna por ser resultado de um constante
afastamento do estado de natureza. Tal diagnóstico pessimista da vida social moderna é elaborado
primeiramente no Discurso sobre as Ciências e as Artes, e posteriormente no Discurso sobre a Origem e os
Fundamentos da Desigualdade entre os Homens. Nestas obras Rousseau argumenta sobre a perda da
transparência, da comunicação sincera dos sentimentos. No romance A Nova Heloísa, por sua vez, cria-se
uma pequena comunidade rural que consegue resgatar, através do bom uso da razão, essa transparência
perdida.
Palavras-chave: Rousseau, natureza, sociedade, Filosofia Moderna, literatura.

NATURE AND TRANSPARENCY IN ROUSSEAU

ABSTRACT
One of the best known and publicized facets of the thought of Jean-Jacques Rousseau is its defense of
natural goodness of men and the condemnation of society as a result of a constant removal of the state of
nature. Such a pessimistic diagnosis of modern social life is produced primarily in the Discourse on the
Sciences and Arts, and later in the Discourse on Inequality. In these works, Rousseau argues about the loss
of transparency, honest communication of feelings. In the novel The New Heloïse, in turn, creates a small
rural community can gather, through the proper use of reason, that transparency lost.
Keywords: Rousseau, nature, society, Modern Philosophy, literature.

Colloquium Humanarum, Presidente Prudente, v. 9, n. 1, p. 62-68, jan/jun 2012. DOI: 10.5747/ch.2012.v09.n1.h117


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INTRODUÇÃO cidades, ao tipo de lugar onde a corrupção


A relação do homem com a natureza manifesta-se em seus extremos. Primeiramente é
possui grande importância na formulação do necessário compreender a relação entre a crítica
pensamento rousseauniano. Encontramos à vida citadina e o ataque de Rousseau contra as
constantemente nas obras de Jean-Jacques ciências e as artes. É interessante notarmos que
Rousseau referências que situam a natureza num a última, originada no Discurso sobre as Ciências
plano em que a felicidade e a virtude podem ser e as Artes, inspira-se exatamente num olhar de
conquistadas. reprovação lançado sobre Paris.
A teoria sobre o estado de natureza A primeira impressão, em 1731, e a
apresentado no Discurso sobre a Origem da decepção imediata de Jean-Jacques sobre Paris
Desigualdade atribui ao homem natural uma são relatadas no livro IV das Confissões (p.110):
harmonia com a natureza que lhe conserva no Como, à primeira vista,
Paris desmentiu a idéia que
gozo da plena felicidade e da posse imediata da
dela fazia!(...) Entrando
verdade, pois verdadeiro e falso ainda não são pelo arrabalde de Saint-
Marceau; só vi ruas
diferenciados. Mas o homem se desviou desse
pequenas, sujas e mal
destino natural. As conjeturas de Rousseau falam cheirosas, casas escuras e
miseráveis, um ar de falta
em adversidades climáticas que obrigam o
de limpeza, de pobreza,
homem a fazer uso de sua perfectibilidade para mendigos, carreteiros,
palmilhadeiras, pregoeiras
sobreviver. O problema é que o homem “(...) não
de tisanas e de chapéus
cessou de acrescentar suas invenções aos dons velhos. Tudo aquilo
chocou-me tanto a princípio
da natureza. E desde então a história universal,
que, tudo o que vi depois
embaraçada pelo peso continuamente crescente em Paris de realmente
magnífico, não conseguiu
de nossos artifícios e de nosso orgulho, adquire o
destruir aquela primeira
andamento de uma queda acelerada na impressão e ficou-me para
sempre uma aversão em
corrupção (...)” (STAROBINSKI, 1991, p.23). A
morar na capital.
vida em sociedade cria um homem de
aparências; o seu destino agora será a Depois de uma década Rousseau retorna
desigualdade e a infelicidade. a Paris, Ernst Cassirer (1999, p.42) comenta
Tanto no Contrato Social quanto no sobre as conseqüências desse retorno: “O
Emílio encontramos tentativas daquilo que desenvolvimento espiritual autônomo de
Starobinski denominará de retorno à Rousseau começa apenas no momento em que
transparência, tarefa que ao transportar-se para o ele chega a Paris, com quase trinta anos. Ali ele
plano concreto revela-se extremamente difícil e vivencia primeiramente o verdadeiro despertar de
complexa. Podemos questionar, entretanto, sobre sua autoconsciência intelectual.” O mundo no
a possibilidade de algum tipo de relação social qual o tempo é regulado pelo trabalho e deveres,
que propicie a preservação da transparência desagrada Rousseau, mas durante certo tempo
desejada por Rousseau. ele consegue se adaptar às regras exteriores;
estabelece contato com Diderot e com isso
O problema das grandes cidades. garante acesso à vida literária e social parisiense.
A resposta pode ser iniciada através da No entanto, toda a cortesia da recepção que ele
análise da crítica de Rousseau às grandes teve nesta cidade acaba por incomodá-lo, pois a

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falsidade aí se mostra evidente; Rousseau “sente sublinhadas por Starobinski. A acusação injusta
de maneira cada vez mais intensa que esse tipo acompanhada de uma terrível punição, a
de amabilidade desconhece qualquer ligação contradição entre ser-inocente e parecer-culpado,
pessoal” (CASSIRER, 1999, p.42). fazem Rousseau descobrir
Cassirer salienta que é nessa que as consciências são
separadas e que é
constatação da impossibilidade da verdadeira
impossível comunicar a
amizade que se deve procurar uma explicação evidência imediata que se
experimenta em si mesmo.
para misantropia de Rousseau. A influência do
Desde então o paraíso está
desprezo pela sociedade parisiense na sua perdido: pois o paraíso era
a transparência recíproca
carreira literária será consumada quando ele
das consciências, a
perceber que os intelectuais sofrem do mesmo comunicação total e
confiante. O próprio mundo
mal. O primeiro Discurso se ocupará então de
muda de aspecto e se
reclamar o espírito verdadeiro, denunciando a obscurece.
(STAROBINSKI, 1991,
falta de originalidade e a uniformidade enganosa
p.20)
da intelectualidade.
Nessa obra, a partir da qual Rousseau Jean-Jacques sofre a injustiça antes de
passa a ser reconhecido entre os seus conhecê-la; era apenas isso o que a sua
contemporâneos, pode-se perceber o reflexo inocência lhe permitia:
desse escândalo com que Jean-Jacques se Não tinha ainda raciocínio
suficiente para sentir como
depara (1999a, p.191 e 192):
as aparências me
Como seria doce viver condenavam e para pôr-me
entre nós, se a contenção no lugar dos outros.
exterior sempre Mantinha-me no meu e
representasse a imagem tudo o que eu sentia era o
dos estados do coração, se rigor do castigo pavoroso
a decência fosse a virtude, para um crime que eu não
se nossas máximas nos havia cometido. (...)
servissem de regra, se a Terminou aí a serenidade
verdadeira filosofia fosse de minha vida infantil.
inseparável do título de Desde aquele momento,
filósofo! deixei de gozar a
(...) incessantemente a verdadeira felicidade e hoje
polidez impõe, o decoro mesmo sinto que a
ordena; incessantemente recordação dos encantos
seguem-se os usos e de minha infância termina
nunca o próprio gênio. Não ali. (ROUSSEAU, s/d, p.22
se ousa mais parecer tal e 23)
como se é(...)
Tal incidente não desperta na infância de
Temos, portanto, o conflito de Rousseau
Rousseau nenhuma reflexão filosófica sobre a
com uma sociedade classificada por ele como um
oposição entre ser e parecer, porém, ao escrever
rebanho, na qual a relação entre os homens é
o primeiro Discurso, esse será o tema essencial
determinada pela aparência enganosa.
com o qual ele se defrontará: “Que ser e parecer
Starobinski nos reporta à infância de
sejam diversos, que um “véu” dissimule os
Jean-Jacques para indicar o momento em que
verdadeiros sentimentos, esse é o escândalo
Rousseau descobre a força das aparências. As
inicial com que Rousseau se choca, esse é o
seqüelas do incidente do pente quebrado,
dado inaceitável de que buscará a explicação e a
relatado no primeiro livro das Confissões, são

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causa, essa é a infelicidade de que deseja ser pareçam voar ao meu


encontro. Mas é disso
libertado” (STAROBINSKI, 1991, p.17)
justamente que me queixo.
Mas Rousseau (1999a, p.192) não perde Como ser logo amigo de
alguém que nunca se viu?
de vista sua condenação às cidades:
O honesto interesse da
Não mais amizades humanidade, a efusão
sinceras; não mais estima simples e tocante de uma
real; não mais confiança alma sincera tem uma
fundada. As suspeitas, as linguagem muito diferente
desconfianças, os temores, das falsas demonstrações
a frieza, a reserva, o ódio, a da polidez e das
traição serão ocultados aparências enganosas que
incessantemente sob esse o hábito da sociedade
véu uniforme e pérfido de exige. Tenho muito medo
polidez, sob essa de que aquele que desde o
urbanidade tão louvada que primeiro momento me trata
devemos às luzes de nosso como um amigo de vinte
século. anos não me trate, ao final
de vinte anos, como um
desconhecido se tivesse de
Apesar de encontrarmos tal referência
pedir-lhe um grande favor;
pejorativa à urbanidade no primeiro Discurso, e quando vejo homens tão
distraídos ter um tão terno
será no romance A Nova Heloísa que Rousseau
interesse por tantas
expressará com maior clareza o seu pessoas, presumiria
facilmente que não tem por
posicionamento ante as grandes cidades e a sua 1
ninguém. (ROUSSEAU,
admiração pela vida rústica do ambiente rural. 1994, p.210 e 211)

Podemos confrontar este reino da


A Nova Heloísa
opacidade com o momento de deslumbre de
O primeiro contato do personagem Saint-
Saint-Preux na admiração da natureza
Preux com a sociedade parisiense revela-lhe um
montanhosa do Valais. A natureza exótica desta
mundo de solidão e de máscaras, no qual a
região
intimidade é simulada e a amizade resume-se
produz para os olhos uma
numa simples adulação. Saint-Preux descreve à
mistura inexprimível cujo
Julie, assim, sua experiência: encanto aumenta ainda
pela sutileza do ar que
Entro com um secreto
torna as cores mais vivas,
horror neste vasto deserto
os traços mais marcados,
do mundo. Este caos
aproxima todos os pontos
oferece-me apenas uma
de vistas; as distâncias
solidão horrível onde reina
parecem menores do que
um triste silêncio. Minha
nas planícies, onde a
alma aflita procura
espessura do ar cobre a
expandir-se nele e por toda
terra com um véu, o
parte sente-se comprimida.
horizonte apresenta aos
Nunca estou menos só do
olhos mais objetos que
que quando estou só, dizia
parecem conter.
um antigo; quanto a mim,
(ROUSSEAU, 1994, p.83)
somente estou só na
multidão, onde não posso
pertencer a ti nem aos
outros (...)
Não é que não me
ofereçam uma boa 1
acolhida, amizades, Vemos, ainda na mesma carta, referência à desigualdade
social de Paris: “(...)é talvez no mundo a cidade em que as
cortesias, e que mil fortunas são mais desiguais e em que reinam, ao mesmo
cuidados obsequiosos não tempo, a mais suntuosa opulência e a mais deplorável
miséria”.

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A transparência é conquistada aqui pela instaurou o da igualdade” (STAROBINSKI, 1991,


contemplação do espetáculo da natureza. Porém, p.111). O que é evidenciado pelo modo com que
de acordo com Starobinski (1991, p.93) Wolmar, o patrão, visando à instauração da
(...) essas cores e essas ordem necessária para a prosperidade de
formas tornadas mais
Clarens, dissimula seu mando ao fazer os
intensas, essa tonalidade
mais límpida do ar não são servidores acreditarem que estão agindo
privilégio da montanha nem
livremente, criando nestes um sentimento de
de nenhuma paisagem: é
uma qualidade do olhar, igualdade.
uma figura mítica da
De qualquer forma, Starobinski destaca
felicidade, uma
metamorfose que a um elemento que permite a apreciação desta
exaltação da alma é capaz
pequena sociedade como uma comunidade
de projetar no mundo que a
cerca. (...) A transparência virtuosa. Trata-se da “festa das vindimas”. Neste
dos corações restitui à
dia de festa a felicidade reina, pois é o dia em que
natureza o brilho e a
intensidade que ela os corações são transparentes, em que se cria a
perdera.
ilusão do retorno à idade de ouro; “a embriaguez
alegre resultará da perfeita evidência de cada um”
A transparência é uma característica do
(STAROBINSKI, 1991, p.103). A ficção procura,
olhar que preserva sua natureza, como o do
assim, realizar o sonho rousseauniano da
homem natural do segundo Discurso que não
transparência.
possui nenhum obstáculo perante a exterioridade;
O trabalho não deixa de fazer parte desta
“(...) a sensação se abre diretamente para o
festa, “e os atos do labor mal se distinguem dos
mundo, a ponto de o homem mal saber distinguir-
jogos do regozijo” (STAROBINSKI, 1991, p.98).
se daquilo que o cerca. O homem experimenta
Aí se reúne de forma exemplar o agradável ao
então um contato límpido com as coisas”
útil. A igualdade criada durante a festa das
(STAROBINSKI, 1991, p. 37). Nesse momento
vindimas faz com que seja justificada a
ele só conhece o imediato, a existência atual, pois
desigualdade dos dias não festivos:
seus desejos, em pleno acordo com as
Rousseau está pronto a
necessidades físicas, estão sempre ao alcance
aceitar um mundo onde
de suas mãos. existe apenas uma pseudo-
igualdade social, com a
Mas toda essa inocência original está
condição de que seja
perdida; o homem se entregou ao devir, ao possível, algumas vezes,
fazer de modo a que todos
progresso de seu conhecimento, velando assim o
se sintam iguais. Tudo se
espetáculo da natureza. Em A Nova Heloísa, passa como se a essência
da igualdade consistisse no
“sabendo que o homem não pode mais voltar ao
sentimento de ser igual.
estado natural, Rousseau coloca seus Esse “platonismo do
coração” (a expressão é de
personagens num ambiente campestre, rural,
Burgelin) torna legítimo o
onde a pequena sociedade se entrega a criação, recurso a ilusão. Será
mesmo muito desculpável
ao plantio, enfim, ao enriquecimento da natureza
enganar os outros, se é
e não à sua destruição” (MORETTO, 1994, p.16). para o seu bem, isto é, se é
para inspirar-lhes felizes
Essa pequena comunidade, uma
ilusões. (STAROBINSKI,
propriedade rural denominada Clarens, na qual 1991, p.110 e 111)
não deixa de existir o senhor e os servidores,
“não restabeleceu o reino da inocência e não

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Outro elemento que propicia a felicidade a suficiência do estado de


natureza e o trabalho
para Clarens é a independência em relação ao
doravante indispensável. A
mundo exterior; a autossuficiência é seu único independência primitiva
volta a ser compatível com
objetivo econômico. Starobinski distingue dois
o emprego dos meios da
tipos de autonomia conquistados e necessários civilização.(...) É a razão,
agora, que define o
para o êxito desta comunidade:
necessário, suprime o
Se a festa exprime a supérfluo, ajusta o trabalho
perfeita autonomia das às necessidades legítimas;
consciências, revela-se que ela determina, assim, os
ela tem como cenário uma limites no interior dos quais
prosperidade agrícola que todos viverão num
torna possível a perfeita contentamento frugal, abole
autonomia material da o reino de opinião,
comunidade. O sucesso de apagando o mal do estado
Clarens consiste, com de civilização sem suprimir
efeito, na conquista suas vantagens.
simultânea de uma e de (STAROBINSKI, 1991,
outra forma de autonomia. p.117)
(STAROBINSKI, 1991,
p.115)
A comunidade rural possui tudo o que é
necessário para a sua autossuficiência, basta o
A independência da consciência depende
bom uso da razão e teremos uma comunidade
da independência econômica. Mas é importante
livre e feliz. Um símbolo da suficiência e da
notar que tal independência econômica não deve
harmoniosa combinação, atingida em Clarens,
ir além do suprimento das necessidades
entre natureza e cultura, é o Eliseu de Julie.
razoáveis, todo o ganho deve ser imediatamente
Trata-se de um jardim fechado, localizado no
consumido. As trocas intermediadas pelo dinheiro
centro das terras da comunidade, que possui a
são evitadas ao máximo: “o dinheiro,
singular característica de parecer obra exclusiva
intermediário abstrato, não é necessário nessa
da natureza, ou seja, proporciona a ilusão de um
sociedade que consome imediatamente o que
lugar que não possui a mínima intervenção
produz e que se nutre da substância de seu
humana, uma natureza selvagem. Mas tudo ali foi
trabalho” (STAROBINSKI, 1991, p.115). O caráter
ordenado por Julie e sua construção não
mediato do dinheiro retira a pureza do consumo
representou nenhum gasto: “o lugar é luxuriante,
daquilo que ele compra.
mas foi a natureza que se encarregou do luxo.
A satisfação com aquilo que se tem,
Assim, o sanctus sanctorum da família civilizada é
revela para Rousseau uma forma de liberdade.
um lugar que oferece a imagem da natureza tal
Nas Confissões leremos: “o dinheiro que se
como ela era antes que a civilização a houvesse
possui é o instrumento da liberdade; o que se
transformada.” (STAROBINSKI, 1991, p.115).
procura ganhar é o da escravidão” (ROUSSEAU,
Starobinski (1991, p.119) observa
s/d, p.34). A eterna busca por novas satisfações
também que a liberdade conquistada pela
causa a infelicidade e a escravidão do homem
autonomia de Clarens “constitui o privilégio
social, pois o sentimento de insuficiência o
essencial da solidão”, mas:
acompanhará sempre.
enquanto que, para
Mas em Clarens, no mundo
subsistir, o indivíduo
da síntese em que as belas
solitário é obrigado a
almas reconciliam em si
buscar uma contribuição
mesma natureza e cultura,
exterior, o mesmo já não
ver-se-á harmonizarem-se
ocorre com a comunidade

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ideal. Concebida como um por Rousseau na vida campestre. A comunidade


organismo único no qual
rural pode produzir o seu próprio alimento e tudo
todas as partes se
completam, imaginada aquilo que lhe é razoavelmente necessário. A
como um eu coletivo, a
cidade não possui as qualidades necessárias
comunidade trabalha sem
sair de si mesma. para tal; aí o supérfluo é “indispensável” e a
simplicidade campestre não é atraente.
É esse o lugar que Rousseau inventa e
No pensamento rousseauniano, as
se encanta. O símbolo ideal da vida campestre.
ciências e as artes, tais como foram empregadas
Vimos aqui alguns elementos que suscitam a
pelo homem, representam um mal do qual
admiração de Rousseau pelo ambiente rural,
podemos nos libertar através da restituição da
elementos estes que não sensibilizam os
transparência numa vida comunitária que
corações urbanos:
consegue reestabelecer a bondade das primeiras
As pessoas da cidade não
sociedades.
sabem amar o Campo, nem
mesmo sabem viver nele;
mal sabem o que se faz
REFERÊNCIAS
quando aqui estão.
Desprezam seus trabalhos, CASSIRER, E. A Questão Jean-Jacques
seus prazeres, ignoram- Rousseau; tradução: Erlon José Paschoal. São
nos, estão em casa em Paulo: Editora UNESP, 1999.
país estrangeiro, não me
espanto por não se MORETTO, F. Introdução de A Nova Heloísa. In:
sentirem bem. É preciso A Nova Heloísa Edição da editora da Unicamp,
ser camponês na aldeia ou 1994.
não ir, pois que se vai lá
fazer? Os habitantes de ROUSSEAU, J. J. Discurso sobre as Ciências e
Paris que pensam ir para o as Artes. In: Os Pensadores (Rousseau vol.2);
campo, não vão, carregam tradução: Lourdes Santos Machado. São Paulo;
Paris consigo. Os cantores, Editora Nova Cultural; 1999a.
os pedantes, os autores, os
parasitas são o cortejo que ___________________ Discurso sobre a Origem
os segue. O jogo, a música, e os Fundamentos da Desigualdade entre os
o teatro são lá sua única Homens. In: Os Pensadores (Rousseau vol.2);
ocupação. Sua mesa é tradução: Lourdes Santos Machado. São Paulo;
abundante, como em Paris, Editora Nova Cultural; 1999b.
comem as mesmas horas,
são servidos os mesmos ___________________ A Nova Heloísa.
pratos, com o mesmo tradução e introdução de Fulvia Moretto.
aparato, fazem apenas as Campinas, SP, Editora da Unicamp; 1994.
mesmas coisas; era
preferível ficar, pois, por ___________________ As Confissões de Jean-
mais rico que se possa ser Jacques Rousseau. tradução Wilson Lousada,
e por maiores cuidados que Ediouro, s/d.
se tenha tomado, sentem-
se sempre alguma privação STAROBINSKI, J. Jean-Jacques Rousseau: a
e não se poderia trazer transparência e o obstáculo; seguido de sete
Paris inteira. Assim, fogem ensaios sobre Rousseau; tradução Maria Lúcia
desta variedade que lhes é Machado. São Paulo: Companhia das Letras,
tão cara, conhecem sempre 1991.
apenas uma maneira de
viver e dela se entediam
sempre. (ROUSSEAU,
1994, p.519)

Podemos dizer que a urbanidade é


incompatível com o ideal de felicidade aspirado

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