Estabelece o art. 330 os casos em que a petição inicial deve ser indeferida, o que
acarretará a extinção do processo sem resolução do mérito (art. 485, I). Vale recordar, porém,
que só se extinguirá o processo sem resolução do mérito quando não for possível corrigir-se o
vício, dado o princípio da primazia da resolução do mérito. Pois é exatamente por isso que se
afirma na lei processual, expressamente, que a petição inicial será indeferida quando não
atendidas as prescrições dos arts. 106 e 321 (art. 330, IV), isto é, quando – tendo o juiz
verificado não haver sido preenchido algum requisito da petição inicial – não tenha o autor a
corrigido ou completado, emendando a inicial, no prazo de quinze dias (art. 321), ou quando,
não havendo na petição inicial a indicação dos endereços do advogado do demandante, não
tenha sido o vício corrigido em cinco dias (art. 106, § 1o).
A petição inicial será indeferida quando for inepta (art. 330, I). Considera-se inepta a
inicial quando lhe faltar pedido ou causa de pedir (art. 330, § 1o, I), quando o pedido for
indeterminado e não for caso de admissão de pedido genérico (art. 330, § 1o, II), quando da
narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão (art. 330, § 1o, III) ou quando contiver
pedidos incompatíveis entre si (art. 330, § 1o, IV).
Tem-se, ainda, por inepta a petição inicial quando, tendo a demanda por objeto a revisão
de obrigação decorrente de empréstimo, financiamento ou alienação de bens (e essa
enumeração de contratos é meramente exemplificativa, aplicando-se a regra aqui mencionada
a contratos análogos aos enumerados no texto legal: FPPC, enunciado 290), o autor não tenha
discriminado, na petição inicial, dentre as obrigações contratuais, aquelas que pretende discutir,
quantificando o valor incontroverso do débito (art. 330, § 2o). Esta exigência é feita para o fim
de assegurar que, no curso do processo, os valores incontroversos continuem a ser pagos (art.
330, § 3o).
Também será indeferida a petição inicial se o juiz verificar a ausência de alguma
“condição da ação” (art. 330, II e III), conceito que já foi anteriormente estudado neste trabalho.
Indeferida a petição inicial, é possível a interposição de apelação, facultado ao juiz o
exercício do juízo de retratação, no prazo (impróprio) de cinco dias (art. 331). Caso haja
retratação, a petição inicial não estará mais indeferida, e o processo seguirá regularmente, com
a citação do réu.
De outro lado, caso não haja retratação, mantendo o juiz sua decisão de indeferimento,
o réu será citado para oferecer contrarrazões ao recurso (art. 331, § 1o). Trata-se de dispositivo
ensejador de um retrocesso. Explique-se: este sistema já foi adotado no direito processual civil
brasileiro, até 1994. No final desse ano foi editada uma lei que reformou o CPC de 1973,
estabelecendo que no caso de haver apelação contra sentença de indeferimento da petição inicial
o réu não seria mais citado para oferecer contrarrazões, só ocorrendo a citação se o recurso
viesse a ser provido. Tratava-se de um sistema muito mais lógico. Não há qualquer razão para,
indeferida a petição inicial, trazer-se ao processo o réu, através de uma citação, para que ele
tenha oportunidade de dizer que a sentença apelada está correta e que ele realmente não deveria
ter sido citado. O réu terá sido citado para dizer que não deveria ter sido citado.
Pelo sistema inaugurado com a reforma legislativa operada em 1994, o réu só seria
citado se o recurso fosse provido (e, por conseguinte, se tivesse a petição inicial como apta para
permitir o desenvolvimento regular do processo), sendo certo que, por força do princípio do
contraditório, nada impediria que o réu, uma vez citado, tornasse a suscitar a existência do vício
da petição. Este era um procedimento cuja constitucionalidade já havia, inclusive, sido
reconhecida pelo STF (AI 427533 AgR/Rs, j. em 02.08.2004, rel. p/ acórdão Min. Cezar
Peluso). O sistema estabelecido pelo art. 331, § 1o evita o “retrabalho”, já que traz desde logo
o réu para o processo e impede que, após todo o trabalho desenvolvido pelo tribunal ao examinar
o recurso, a mesma questão seja novamente suscitada pelo réu, para quem a matéria ali discutida
não estaria superada. De outro lado, porém, ter-se-á trazido o réu para o processo
desnecessariamente em todos aqueles casos nos quais, indeferida a petição inicial, tal decisão
venha a ser considerada correta pelo tribunal julgador do recurso.
Goste-se da ideia ou não, porém, determina a lei que, não havendo retratação, seja o réu
citado para oferecer contrarrazões ao recurso, sendo este em seguida encaminhado ao tribunal.
Vindo este a reformar a sentença, o prazo para oferecimento de contestação correrá da
intimação do retorno dos autos (art. 331, § 2o).
Não tendo sido interposta a apelação, e transitando em julgado a sentença de
indeferimento da petição inicial, deverá o réu ser comunicado do trânsito em julgado da
sentença proferida em processo para o qual ele não foi citado (art. 331, § 3o).
O ato judicial que indefere a petição inicial é a sentença, por força do que dispõe o art.
485, I, do CPC. Contra ela o recurso adequado será o de apelação, que se processará na forma
estabelecida no CPC, art. 331: "Indeferida a petição inicial, o autor poderá apelar, facultado ao
juiz, no prazo de 5 (cinco) dias, retratar-se".
Trata-se de apelação dotada de efeito regressivo, em que o juiz tem a possibilidade de,
ponderando os argumentos apresentados pelo autor no recurso, reconsiderar a sua decisão e
determinar a citação do réu. Sempre que houver extinção sem resolução de mérito, a apelação
terá esse efeito, com a particularidade de que no caso do indeferimento da inicial o réu ainda
não foi citado, e precisará sê-lo, para oferecer contrarrazões e acompanhar o recurso.
Se o juiz a reconsiderar, a sentença de indeferimento da inicial ficará sem efeito e será
determinada a citação do réu; do contrário, mantida a sentença, será o réu citado para responder
ao recurso. Caso ele seja provido, o prazo para contestação do réu começará a correr da
intimação do retorno dos autos, observado o disposto no art. 334. Em outros termos, em regra,
com o retorno dos autos, o juiz designará audiência prévia de tentativa de conciliação, e só
depois de sua realização é que fluirá o prazo de contestação. O prazo só correrá efetivamente
da intimação do retorno dos autos se a audiência não for designada, nos casos em que o processo
não admite autocomposição.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CÂMARA, Alexandre Freitas. O novo processo civil brasileiro. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2017.
DIDIER JR. Fredie. Curso de direito processual civil: introdução ao direito processual civil,
parte geral e processo de conhecimento. 17. ed. Salvador: Ed. Jus Podivm, 2015.
GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito processual civil esquematizado. 6. ed. São
Paulo: Saraiva, 2016.