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capítulo 1

Construção e
Engenharia na
Antigüidade
1000 a.C. a
500 d.C.
Pessoas e Eventos

Materiais e A partir de c. 1500 a.C. Grandes colunas e vigas de pedra usadas em templos e palácios

Tecnologia A partir de c. 1500 a.C. Grandes peças ocas de bronze fundido na China
A partir de c. 1400 a.C. Primeiro arco de tijolo conhecido
em uma edificação, Ur, Mesopotâmia (vão de 0,8 m)

A partir de c. 1200 a.C. Idade do Ferro

Conhecimento e
Ensino

A partir de c. 1000 a.C.


Métodos de Projeto Procedimentos geométricos
de projeto de edificações

Ferramentas de Projeto: A partir de c. 1000 a.C. ou antes


Plantas baixas, elevações e maquetes
Desenhos e Cálculos em escala no Egito, na Grécia e em Roma

A partir de c. 1000 a.C. ou antes Uso


primitivo do ábaco na China, na Índia,
no Oriente Médio e nos países
mediterrâneos

A partir de c. 1000
Cálculos geométricos
com o uso da régua e
do compasso

Edificações c. 1780 a.C. Leis para construção no Código de Hamurábi, na Babilônia


c. 1600 a.C. Palácio do Rei Minos, Cnosso, Creta
c. 1300 a.C. Templo de Amon,
Carnac, Egito

1700 1600 1500 1400 1300 1200 1100 1000 900 800
c. 720–320 a.C. Grécia Helênica c. 320–c. 100 a.C. Grécia Helenística c. 10–75 d.C. Héron de Alexandria (engenheiro)
c. 725–700 a.C. A Ilíada, de Homero fl. 300 a.C. Euclides (geômetra) 79 d.C. Erupção do Vesúvio, soterrando Herculano e Pompéia

c. 640–546 a.C. Tales (geômetra) c. 55 d.C.–c. 130 d.C. Apolodoro de Damasco (engenheiro)
c. 582–507 a.C. Pitágoras (geômetra e cientista) 395 d.C. Império Romano
c. 287–c. 212 a.C. Arquimedes (engenheiro e físico) se divide em Império
Romano do Ocidente e
c. 280–c. 220 a.C. Filon de Bizâncio (engenheiro) Império Romano do Oriente
c. 285–c. 222 a.C. Tesíbio de Alexandria (engenheiro) 410 d.C.
Roma Imperial
c. 429–347 a.C. Platão (filósofo) c. 80–c. 25 a.C. Vitrúvio (engenheiro)
sucumbe aos
c. 428–c. 347 a.C. Arquitas 27 a.C. Otávio Augusto se torna Imperador de Roma invasores
(autor do primeiro livro-texto sobre mecânica)

c. 720 a.C. Primeira abóbada de berço conhecida, Assíria c. 150 a.C.–50 d.C. Aquedutos com arcos de alvenaria para fornecimento de água em Roma
A partir de c. 100 a.C. Tesouras de telhado de madeira
A partir de c. 500 a.C. Vigas (de pedra) A partir de c. 100 a.C. Arcos de alvenaria nas edificações
que refletem momentos fletores A partir de c. 100 a.C. Cúpulas de alvenaria em edificações
A partir de c. 100 a.C. Janelas com vidros
A partir de c. 80 a.C. Calefação central com dutos (hipocausto)
A partir de c. 50 a.C. Uso generalizado de cimento hidráulico e ferro forjado em edificações
c. 70 d.C. Vidros duplos em banhos públicos em Herculano
c. 80 d.C. Primeiro uso conhecido do efeito estufa para
calefação de edificações (aquecimento solar passivo)

A partir de c. 600 a.C. Livros de matemática e ciências c. 25 a.C. Vitrúvio, De Architectura (livro sobre engenharia da edificação e engenharia militar)
A partir de c. 400 a.C. Livros de matemática e engenharia
c. 500 a.C. Pitágoras é o pioneiro na ciência da acústica
290 a.C. “Museu” (universidade) de Alexandria, Egito, fundado por Ptolomeu Soter
c. 230 a.C.–646 d.C. Escola de Engenharia em Alexandria, Egito, fundada por Tesíbio

A partir de c. 450 a.C. Vários procedimentos numéricos de projeto de armamentos e edificações

500 a.C. ou antes Cálculos numéricos com frações

c. 700 a.C. Templo de Hera (Heraion), Olímpia, Grécia (primeiro grande templo dórico) c. 72–80 d.C. Anfiteatro Flaviano ou Coliseu, Roma, Itália
c. 600–270 a.C. As Sete Maravilhas do Mundo Antigo (exceto as Pirâmides de Gizé) c. 104–109 d.C. Banhos de Trajano, Roma
c. 450–438 a.C. Partenon, Atenas, Grécia c. 112–13 d.C. Coluna de Trajano, Roma
c. 200 a.C. Insulae (edifícios c. 118–26 d.C. Panteon, Roma
de apartamentos romanos)
c. 126–c. 127 d.C. Banhos de Adriano, norte da África
c. 211–16 d.C. Banhos de Caracala, Roma
c. 298–306 d.C. Banhos de Diocleciano, Roma
308–25 d.C. Basílica de
Magêncio/Constantino,
Roma

700 600 500 400 300 200 100 a.C. 0 100 d.C. 200 300 400 500
13 Construção e engenharia antes da Grécia helênica
16 Engenharia e construção na Grécia antiga
23 Matemática, ciência e engenharia na Antigüidade clássica
25 Os engenheiros da Grécia helenística
27 Engenharia e construção na Roma antiga
28 Marco Vitrúvio Polião
30 Vitrúvio e as etapas do projeto grego
31 Vitrúvio e a engenharia ambiental
33 Vitrúvio, acústica e projeto de teatros
34 O legado da engenharia romana
40 Os edifícios de apartamentos romanos: as insulae
43 Calefação e climatização em Roma
44 Os “Grands Projets” da Roma imperial
46 O anfiteatro flaviano, ou Coliseu (c. 72–80)
48 Apolodoro e os Grands Projets dos imperadores Trajano e Adriano
49 O Fórum e o Mercado de Trajano (c. 98–112)
49 A Coluna de Trajano (c. 112–113)
49 Os Banhos de Trajano (c. 104–109)
51 O Panteon (c. 118–126)
55 Os Banhos de Caracala (211–216)
60 Estruturas abobadadas tardias de Roma
Construção e Engenharia
na Antigüidade
1000 a.C a 500 d.C.

Construção e engenharia antes da Grécia helênica ção de pedras de forma adequada e à orientação corre-
É apropriado se começar a usar a palavra “engenharia” ta de uma planta baixa em um terreno, provavelmente
em associação a projeto e a construção de edificações em relação ao Sol e às constelações astronômicas. No
a partir do momento em que as pessoas passaram a caso das pirâmides egípcias, os projetistas também ti-
preferir o uso de grandes blocos de pedra em detrimen- nham que planejar a forma e a localização de inúmeras
to de madeira, tijolos de barro ou pequenas pedras que salas e túneis em seu interior, e construí-las exigia gran-
podiam ser erguidas por uma ou duas pessoas. des conhecimentos de geometria e técnicas de medição
Levantar e manobrar grandes pedras em certas posi- tridimensional. Também se imagina que foram necessá-
ções exigia grande habilidade. Têm sido um tópico de rios planejamento e gerenciamento consideráveis para
especulação freqüente o modo como os antigos egíp- organizar, dirigir e motivar cerca de 100.000 trabalhado-
cios extraíram e manipularam cerca de 2,3 milhões de res ao longo de períodos de aproximadamente 20 anos.
pedras, cada uma pesando aproximadamente 2.500 Tais conhecimentos profissionais permitiam aos antigos
kg1, para construir a Grande Pirâmide de Quéops engenheiros planejar – ou, em linguagem moderna, pro-
(Khofu) em Gizé por volta do ano 2500 a.C. Isso se con- jetar – suas grandes obras antes de iniciar a execução.
seguiu sem que os blocos fossem erguidos do solo; as A história da engenharia da edificação é, enfim, a histó-
forças necessárias para seu transporte eram reduzidas ria de como os engenheiros têm planejado suas edifica-
à escala humana, arrastando-se as pedras, usando-se ções e a crescente precisão com a qual eles têm apren-
rampas e uma variedade de cunhas e alavancas. dido a fazer previsões.
Aproximadamente na mesma época, na Inglaterra, blo-
cos de pedra de cerca de 20.000 kg foram levantados As primeiras evidências claras que temos do uso da
1 a cerca de 6 m de altura para construir Stonehenge. Por matemática, da engenharia e dos procedimentos de
volta de 1500 a.C., os engenheiros egípcios extraíram, projeto formais e seqüenciais datam de cerca de 450
moveram e ergueram três obeliscos de pedra, cada um a.C., nos territórios sob a influência da civilização
com aproximadamente 450 toneladas. A remoção pos- grega a leste do Mar Mediterrâneo. Tanto a matemáti-
terior de um deles (conhecido como o Obelisco do ca como a ar te de projetar grandes edificações e cida-
Vaticano) do Egito, seu levantamento em Roma e subse- des foram introduzidas na Europa pela Índia e o Oriente
qüente relocação foram obras de engenharia também Médio. Na verdade, talvez a primeira evidência escrita
impressionantes (veja o Capítulo 3, p. 159-63). da ar te da construção possa ser encontrada no código
de leis da Babilônia (c. 1780 a.C.) estabelecido por
Tão importantes quanto os conhecimentos técnicos de seu primeiro soberano, Hamurábi, que reinou de 1792 3
mecânica necessários para construir estruturas feitas a 1750 a.C. O Código de Hamurábi, que regrava todos
com grandes blocos de pedra eram os profundos conhe- aspectos da sociedade, incluía leis específicas sobre
cimentos de medição e topografia necessários à produ- construção, o que nos transmite tanto a idéia de res-
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 14

1 2

Se um empreiteiro
construir uma casa para
um homem e completá-
la, (este homem) deverá
lhe pagar dois siclos por
SAR da casa como
remuneração.

Se um empreiteiro construir
uma casa para um homem e
não fizer sua construção
sólida e a casa que ele
construiu desabar, causando
a morte do dono da casa, o
empreiteiro será condenado
à morte.

Se ela causar a morte do filho do


dono da casa, o filho do empreiteiro
será condenado à morte.

Se ela causar a morte de um


escravo do dono da casa, ele dará
ao proprietário da casa um escravo
de mesmo valor.
4
Se o colapso destruir alguma
coisa, o empreiteiro restituirá
tudo aquilo que foi destruído, e,
como a casa que ele construiu
não ficou firme e ruiu, ele deverá
reconstruir a casa que desabou
com seus próprios recursos (às
suas custas).

Se um empreiteiro
construir uma casa para
um homem e não
garantir que sua
construção seja
adequada e uma parede
cair, o empreiteiro irá
reforçar a parede às
suas custas.

5
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 15
ponsabilidade profissional como o fato de que tal ativi- das edificações provavelmente era feita de barro ou tijo-
dade exigia conhecimentos específicos. los de barro e madeira e coberta com palha. A escala
era humana – o pé-direito raramente era superior a 3 ou
Alguns dos mais bem preser vados vestígios desta 4 metros – e as casas eram construídas com materiais
época se encontram na ilha mediterrânea de Creta, e componentes de fácil manuseio por alguns carpintei-
onde floresceu a civilização minóica, especialmente ros e outros trabalhadores pouco especializados. Os ma-
entre os anos de 1800 e 1600 a.C. O palácio real de teriais eram bastante baratos, e mesmo a mão-de-obra,
2 Minos, construído em Cnosso, não chamava tanto a o custo principal, provavelmente representava pouco
atenção por sua escala, mas por representar os últi- mais do que a comida dos trabalhadores.
mos avanços em confor to arquitetônico para a família
real. Poços de luz garantiam bons níveis de iluminação Um templo, em contraste, tinha que ser grande, para
natural; havia água encanada no palácio, e o sistema abrigar a estátua de um deus, e envolvia vãos a serem
hidrossanitário incluía um recurso para descarga dos vencidos que eram muito superiores àqueles das edifica-
vasos sanitários. ções domésticas. Sua forma precisava ser diferente
para atender à sua função especial, e talvez fosse esco-
Por volta de 1500 a.C, os templos e palácios encomen- lhida inspirada em outros templos de cidades distantes.
dados pelos soberanos das inúmeras dinastias egípcias Esperava-se que fosse relativamente duradouro, o que
já chegavam aos limites tecnológicos possíveis do uso pedia o uso de pedra e, para cobertura, talvez o uso das
das colunas e vigas de pedra que eram comumente uti- telhas de barro cozidas introduzidas por volta de
lizadas na construção de grandes colunatas e salões 1800–1700 a.C. Não apenas havia maiores custos en-
com um pavimento. Uma das mais impressionantes des- volvidos, mas também conhecimentos de edificação e
4 sas edificações primitivas é o Grande Templo de Amon, métodos de construção não-tradicionais. Um templo
em Carnac, construído em várias fases por reis sucessi- com 8 ou 10 metros de altura envolvia quantidades enor-
vos a partir de cerca de 1550 a.C. O salão hipostilo co- mes de pedra que, às vezes, tinham que ser transporta-
bria uma área de cerca de 100 m por 50 m – aproxima- das por grandes distâncias, encomendadas com muita
damente o tamanho de um campo de futebol ou de uma antecedência e exigiam o trabalho de muitas pessoas. O
grande catedral medieval. A cobertura era feita de gran- indivíduo encarregado de executar um projeto tão grande
des placas de pedra apoiadas em vigas de pedra, as precisava ter seus orçamentos aprovados, e se espera-
quais, por sua vez, eram sustentadas por 134 colunas. va que ele mostrasse ao seu cliente ao menos um esbo-
As 12 colunas da colunata central têm cerca de 22 m de ço ou uma pequena maquete. Ele também tinha que es-
altura, cerca de 3,5 m de diâmetro, e a distância entre timar o prazo de execução da obra e dar uma idéia de
seus eixos é de aproximadamente 7,2 m; as demais quanto os materiais custariam. A mão-de-obra precisava
122 colunas têm, cada uma, cerca de 13 m de altura e ser organizada e receber instruções precisas sobre o nú-
quase 3 m de diâmetro. A colunata central era ilumina- mero e as dimensões das pedras necessárias. As dife-
da por um clerestório com cerca de 5 m de altura, e o rentes equipes de trabalhadores também precisavam
resto do salão tinha iluminação natural através de fen- saber como suas contribuições separadas iriam se en-
das inclinadas no forro de placas de pedra. caixar no todo. Além disso, eram necessárias reuniões
usando-se conceitos mutuamente compreendidos e ar-
Mais ou menos na mesma época temos um exemplo pri- gumentos racionais. Em suma, tínhamos um processo
5 mitivo de desenho egípcio feito sobre papiro represen- pouco diferente daquele que hoje temos em qualquer
tando uma edificação, mas não sabemos se este era um projeto de uma grande edificação.
projeto a ser executado ou o registro de uma obra já
construída. Em geral, foi durante os mil anos que transcorreram
entre aproximadamente 1500 e 500 a.C. que os egíp-
Projetar e executar um monumento como o Templo de cios e os gregos antigos do período helênico desenvolve-
Amon exigia uma estratégia de construção extremamen- ram o que hoje conhecemos como “projeto” de um pré-
te diversa daquela que seria adequada a prédios domés- dio. Ele surgiu da necessidade de planejar e construir
ticos de pequena escala. Na Antigüidade, a maior parte edificações grandes e cada vez mais sofisticadas, e se

1 Stonehenge, Wiltshire, Inglaterra, c. 2000 a.C. Gravura de William Stukeley, década de 1720. 2 Palácio do Rei Minos,
Cnosso, Creta, c. 1600 a.C. Planta baixa. 3 Leis para construção no Código de Hamurábi, c. 1780 a.C. Gravado em uma
estela com escrita cuneiforme, com tradução inglesa à direita. 4 Templo de Amon, Carnac, Egito, c. 1300 a.C. Entrada do
hipostilo. Fotografia de Gustave le Gray, 1867. 5 Elevações lateral e frontal de um santuário egípcio desenhadas em papiro,
c. 1400 a.C.
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 16

tornou possível graças à prosperidade econômica, à ri- área, ele ainda assim exigia muitas horas de trabalho
queza cultural e aos conhecimentos intelectuais que se paciente para a locação de cada tambor.
desenvolviam rapidamente durante o mesmo período.
Nós conseguimos acompanhar a história apenas a partir No nível da cobertura, os blocos de pedra que constituí-
do momento em que surgem registros escritos, ou seja, am o friso e a arquitrave eram conectados entre si por
por volta de 500 a.C, com a emergência da cultura meio de grampos de ferro em H. Esta idéia já havia sido 8
grega, a qual dominou os muitos povos unidos pelo Mar usada pelos egípcios, e muitas variações haviam sido
Mediterrâneo. experimentadas, usando-se grampos de cobre e bronze,
além do ferro. De acordo com o naturalista romano
Engenharia e construção na Grécia antiga Plínio, o Velho (c. 23–79 d.C.), as vigas de pedra, que
As cidades-estado na costa oriental do Mediterrâneo co- venciam vãos de mais de 8 m entre colunas e pesavam
meçavam a prosperar por volta do século VIII a.C. quase 20 t, eram erguidas e posicionadas usando-se
Através do comércio e da guerra, os gregos haviam es- rampas de terra.
tabelecido uma herança cultural que transcendia frontei-
ras geográficas e mesmo lingüísticas. Era o Período As antigas edificações de alvenaria se baseavam em
Helênico, no qual Homero (c. 750–700 a.C.) escreveu o longas vigas de pedra apoiadas em duas colunas. A pa-
que se tornaria a história comum que uniria as diversas lavra latina para viga, trabs, nos dá a expressão “arqui-
comunidades antes díspares. À medida que se desenvol- tetura arquitravada”. Algumas questões cruciais para o
viam a identidade e o orgulho dos gregos, também cres- projetista de edificações da época eram: qual é o tama-
cia seu desejo de estabelecer manifestações impressio- nho do vão que uma viga de pedra pode vencer? Para
nantes e duradouras de sua cultura. Eles começaram a dado vão, que altura e largura a viga deveria ter? O re-
construir em uma escala muito maior – tanto em tama- tângulo é a seção transversal mais eficiente? Será que
nho como em quantidade – do que em épocas anterio- uma viga deveria ter uma seção transversal constante
res. E, assim como muitos povos que viriam, eles queri- ao longo de todo seu comprimento? Estas perguntas
am ter a certeza de que suas edificações refletiriam sua não foram respondidas em termos científicos e mate-
identidade cultural e se diferenciariam daquelas de máticos até que Galileu publicou Discursos Sobre as
povos vizinhos ou do passado, com os quais haviam Duas Novas Ciências em 1638, e então foram explora-
aprendido tanto. Eles também estavam determinados a das por muitos cientistas. Isso não significa, no entan-
garantir que suas construções fossem feitas com res- to, que os engenheiros gregos não soubessem algumas
ponsabilidade. das respostas. Qualquer criança sabe que pode quebrar
um graveto dobrando-o e que uma fina ripa de madeira
As cidades-Estado floresceram por todo o território que verga mais facilmente do que uma tábua grossa. A par-
hoje conhecemos como Grécia Continental, Turquia e tir destas e de outras observações relacionadas, não é
sul da Itália, além das ilhas na costa oriental do um grande salto se dar conta de que o aumento da es-
Mediterrâneo, e começaram a declarar e a ostentar pessura no centro de uma viga é uma forma efetiva de
sua prosperidade na forma de edificações públicas, aumentar sua resistência. Por outro lado, diminuir a es-
como mercados, templos, teatros e outros locais de pessura de uma viga nas suas extremidades seria um
reunião. Ao contrário das poucas e enormes edifica- modo inteligente de torná-la mais leve, sem grande
ções construídas para os faraós, estes prédios públi- perda de sua capacidade estrutural. Ainda que raramen-
cos representavam a criação de um ambiente constru- te vejamos evidências deste tipo de raciocínio nas edi-
ído mais democrático e replicado muitas vezes em ficações, devido às razões discutidas anteriormente,
muitos lugares. Embora os gregos houvessem aprendi- acreditamos que os antigos artesãos e engenheiros en-
do a projetar grandes edificações com os egípcios, tendiam per feitamente estas questões. O projeto sofis-
eles formalizaram os procedimentos de projeto, desen- ticado de armas gregas como as ballistae (balistas) é
volvendo muitas soluções criativas para melhoria dos evidência suficiente de seus conhecimentos de enge-
processos construtivos e da qualidade dos prédios nharia e habilidades técnicas.
acabados. Por exemplo, era prática comum no século
V a.C. colocar cada tambor de pedra de uma coluna Embora tal nível de sofisticação estrutural raramente
centralizado sobre uma cavilha de madeira de lei e as- seja encontrado em edificações gregas, há exemplos
sentar a coluna sobre apenas um pequeno anel circu- suficientes para indicar que alguns de seus engenhei-
6 lar per feitamente plano, garantindo a estabilidade da ros de construção tinham bons conhecimentos sobre
coluna. Embora este método fosse mais econômico e esforços de flexão. Por exemplo, uma vez que a pedra
prático do que tentar garantir o nivelamento de toda a tem resistência à tração muito inferior do que à com-
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 17
6

pressão, a seção transversal mais eficiente para uma gens do aumento da altura da viga na sua porção inter-
viga tem mais material no local onde ela transfere es- mediária. Sua elevação corresponde aproximadamente 10
forços de tração do que onde sofre tais esforços. Em ao que hoje chamamos de diagrama de momento fletor,
uma viga apoiada em duas colunas ou duas ombreiras o qual indica a resistência que uma viga deve apresen-
de janela ou porta (uma verga), a parte reforçada seria tar à flexão para que possa suportar seu peso próprio e
a parte inferior da viga, e isso é exatamente o que en- as cargas transmitidas a ela.
contramos nas ruínas de inúmeras vigas de pedra data-
9 das dos séculos VI a IV a.C. Se já havia tal conhecimento, então por que ele não era
empregado de forma mais ampla? A resposta provavel-
Uma viga notável encontrada na ilha de Samotrácia, ao mente é de natureza econômica. A madeira e a pedra
norte do Mar Egeu, com 6 m de comprimento e datada eram os principais materiais estruturais, e ambos se tor-
do século IV a.C., demonstra o conhecimento das se- nam componentes construtivos ao serem cortados, nos
ções transversais mais efetivas, assim como das vanta- tamanhos adequados, de uma árvore e uma grande

6 Templo de Afaia, Egina, Grécia, c. 500 a.C. Corte perspectivado mostrando a construção.
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 18

rocha, respectivamente. Embora fosse possível continu- res redigiram listas do que consideravam ser as maio-
ar a trabalhar os materiais de modo a se obter a forma res conquistas da humanidade. Por volta do ano 100
estrutural mais eficiente e mais leve possível, rapida- a.C., havia-se chegado àquela que chamamos de as
mente se chegava ao ponto em que os custos adicionais Sete Maravilhas do Mundo Antigo, e é interessante
dos trabalhos extras não compensavam os benefícios do notar que seis entre as sete maravilhas eram obras
desempenho estrutural; para muitos fins, uma viga de dos melhores engenheiros civis e de construção da-
seção transversal retangular e uniforme era adequada. quela época. A mais antiga era a Grande Pirâmide de
De forma geral, o tamanho e o peso das pedras eram re- Quéops, a qual, com seus quase 150 m de altura, con-
duzidos àqueles que seriam convenientes para o trans- tinuou a ser a mais alta construção do mundo até o
porte ao terreno e a montagem no prédio. Por questões surgimento das flechas nas catedrais do século XIV, e
de segurança, não seria sensato, em geral, se tentar al- é a única das Sete Maravilhas que ainda resta. A se-
cançar a solução com peso mínimo, pois esta aumenta- gunda Maravilha mais antiga era os Jardins Suspensos
ria o risco de colapso estrutural, e o principal objetivo do da Babilônia, construídos juntos ao rio Eufrates, que
projeto de estruturas é manter os riscos em níveis acei- datam de cerca de 600 a.C. Embora o tamanho, a lo-
táveis. A exceção ocorre quando é necessário o uso da calização e a idade dos lendários jardins ainda sejam
estrutura mais leve possível para o vencimento de vãos discutidos, muitas descrições deixam claro que eles
máximos – como ocorreu na viga da Samotrácia. Esta eram realmente impressionantes. (“Suspenso” era a
regra geral se aplica à maior parte dos elementos de palavra usada para descrever muitas construções com
pedra e madeira que usamos nas edificações ainda pé-direito alto, inclusive, por exemplo, a enorme cúpu-
hoje. Foi somente com a introdução do ferro fundido no la de alvenaria de Santa Sofia, em Constantinopla,
final do século XVIII que a economia obtida com o peso construída entre 532–37 d.C.) A água necessária para
do material se tornou um fator dominante no dimensio- a irrigação contínua dos jardins tinha que subir cerca
namento de elementos estruturais; ao contrário da ma- de 50 m em relação ao nível do rio através de máqui-
deira ou da pedra, o custo de uma viga de ferro fundido nas com tração humana e canais construídos com
aumenta em proporção direta ao peso do ferro que ela barro e impermeabilizados com folhas de chumbo ou
contém. asfalto. O escritor grego Estrabo (c. 63 a. C – 21 d.C.)
descreveu os jardins no século I d.C., ou seja, cerca
Uma vez que a madeira se decompõe, restam poucos de 500 anos após a época em que se imagina que te-
testemunhos da maneira como as estruturas dos tem- nham sido construídos, por tanto é provável que já não
plos gregos eram formadas. Em sua maior parte, elas se funcionassem per feitamente ou mesmo estivessem
constituíam de terças inclinadas apoiadas em ambas ex- em ruínas:
tremidades. Esta técnica usa madeira à flexão, esforço Eles consistem em abóbadas assentadas, umas sobre as
para qual ela é bastante adequada, já que apresenta outras, em fundações cúbicas dispostas em xadrez. As fun-
alta resistência a tração. Entretanto, como a madeira dações são ocas e têm cobertura de terra tão profunda que
não é muito rígida, uma vez carregada, ela tende a gran- nelas foram plantadas as maiores árvores possíveis, e
de deflexão, logo os vãos precisavam ser bastante pe- foram construídas com tijolos cozidos e asfalto... A ascen-
quenos – no máximo 6 ou 7 metros. Para vãos maiores, são aos terraços mais altos é por uma escadaria; e ao
as terças precisavam de apoios intermediários, para evi- longo destas escadas havia canais através dos quais a
tar grandes deflexões provocadas pelas pesadas telhas água era continuamente conduzida do Eufrates aos jardins
de barro. Na Grécia antiga, não há evidência de treliças por pessoas designadas para tal função.2
de telhado do tipo que se tornou comum durante o perí-
odo medieval. Outra das Sete Maravilhas era o Templo de Ártemis, em 7
Éfeso, completado por volta de 300 a.C. O primeiro san-
É mais fácil de julgar o sucesso destes vários avanços tuário para a deusa Ártemis havia sido construído em
nas construções em alvenaria com os melhores exem- Éfeso por volta de 550 a.C., e acredita-se que continha
plos construídos durante os períodos helênico e hele- uma pedra sagrada (um meteorito) que havia “caído de
nístico. Durante os séculos III e II a.C., vários escrito- Júpiter” – o termo grego antigo equivalente a “caído do

7 Segundo Templo de Ártemis, em Éfeso, completado em c. 300 a.C. no sítio de um santuário anterior, de c. 550 a.C.
Reconstrução digital. 8 No alto: grampos de ferro em I e em Z usados para conectar pedras adjacentes na construção de
templos gregos e romanos; embaixo: tambores de pedra de uma coluna, com uma cavilha central de ferro ou madeira de lei.
9 Seções de vigas de pedra talhada em edificações gregas. 10 Seções de uma viga de pedra usada para sustentar um teto
de mármore com caixotões, da Samotrácia, fim do século IV a.C.
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 19
7

280 mm
A

corte BB
910 mm
teto com caixotões 410 mm

560 mm
B
corte AA

6150 mm
10

8
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 20

Paraíso”. O templo original tinha colunas com aproxima- colosso foi destruído por um terremoto em 224 a.C. e
damente 18 m de altura e provavelmente ocupava uma muitas de suas par tes ficaram abandonadas onde caí-
área similar àquela do segundo templo, cuja construção ram até o momento em que os árabes conquistaram
iniciou-se na década de 350 a.C. no mesmo terreno, Rodes, em 656 d.C.
após a destruição do templo original por um incêndio. O
templo reconstruído tinha mais de 120 colunas de 19 m; Uma das Sete Maravilhas do Mundo Antigo que mais
sua estrutura tinha cerca de 129 metros de comprimen- perdurou foi o farol construído na ilha de Faro, marcan- 11
to e 68 metros de largura. O volume compreendido por do a entrada ao por to da nova cidade de Alexandria, no
esta estrutura era mais de sete vezes superior àquele do nor te do Egito. Alexandre, o Grande, havia fundado a ci-
Partenon de Atenas (447–438 a.C.), que media 66 me- dade em 332 a.C., mas morrera em 323 a.C., deixan-
tros por 32 metros e cujas colunas tinham cerca de 10 do a obra apenas iniciada, e os trabalhos foram conti-
metros de altura. O Templo de Ártemis durou mais de nuados por seu sucessor como governante do Egito,
700 anos, até que foi demolido e suas pedras usadas Ptolomeu Soter. Dois por tos para navios de grande ca-
para a construção de uma igreja cristã. Em um livro es- lado foram construídos na extremidade oeste do delta
crito por volta de 230 a.C., o qual descrevia as Sete do rio Nilo, um para o tráfego fluvial do Nilo, o outro
Maravilhas, o autor expressa sua admiração especial para o comércio com o Mar Mediterrâneo. Ptolomeu en-
pelo Templo de Éfeso: comendou a construção do farol em 290 a.C., para que
Eu vi as muralhas e os Jardins Suspensos da antiga ser visse como ponto de referência aos navegadores e
Babilônia, a estátua de Zeus, em Olímpia, o Colosso de também como ícone para a nova e próspera cidade. Ele
Rodes, as Grandes Pirâmides e o túmulo de Mausolo em foi terminado em 270 a.C., durante o reino do filho de
Halicarnasso. Mas quando vi o templo de Éfeso erguendo- Ptolomeu Soter, Ptolomeu II. O farol foi construído com
se sobre as nuvens, todas estas outras maravilhas ficaram pedra aparelhada assentada sobre folhas de chumbo,
na sombra.3 para melhoria do assentamento entre as fiadas, e con-
sistia de três par tes. Vários estudiosos estimam que ti-
O Colosso de Rodes, uma estátua terminada por volta vesse cerca de 300 cúbitos de altura (cerca de 120 m).
de 230 a.C., celebrava a vitória da cidade contra o A primeira seção era uma edificação de planta baixa
sítio das tropas de Demétrio, um dos generais de quadrada com aproximadamente 32 metros de largura
Alexandre, o Grande. Rodes havia se aliada a um outro e 65 metros de altura, dentro da qual havia cerca de
dos ex-generais de Alexandre, Ptolomeu Soter, que 50 recintos e uma rampa para o transpor te dos mate-
posteriormente se tornaria soberano do Egito, em riais de construção, levados por carroças puxadas por
Alexandria, sob o nome de Ptolomeu I (c. 367–283 cavalos. Sobre esta base, erguia-se uma torre or togo-
a.C.). A estátua localizava-se na entrada do porto na- nal com cerca de 32 metros de altura e 12 metros de
tural da cidade de Rodes, a capital da ilha de mesmo diâmetro, com uma escadaria que levava até a cúpula,
nome que se situa a cerca de 30 km da costa sudes- onde a chama queimava e os guardiões do farol viviam
te da Turquia moderna. Ela tinha cerca de 35 metros e armazenavam o combustível para a fogueira. Dizem
de altura e ficava sobre um plinto de cerca de 16 me- que a luz, à noite, ou a fumaça, de dia, produzida pelo
tros de altura. Sua figura era na pose grega tradicio- farol podia ser vista a uma distância de 60 quilôme-
nal: um homem nu usando uma coroa com pontas, tros.
protegendo seus olhos do sol nascente com a mão di-
reita, e com um manto caindo de seu braço esquerdo. O projetista do farol, Sóstrato de Cnidos, se tornou imor-
Filon de Bizâncio (veja a p. 26) escreve que o Colosso tal devido a um subterfúgio bastante esperto. Tendo
consistia de um núcleo com duas ou três colunas de Ptolomeu II recusado seu pedido para que tivesse seu
pedra que chegavam até o nível da cabeça e eram co- nome entalhado na base da estrutura, ele desafiou o go-
nectadas por arquitraves ou vigas de pedra, provavel- vernante esculpindo a seguinte inscrição na alvenaria:
mente em mais de um nível. Das colunas foi construí- “Sóstrato, filho de Dexífano de Cnidos, em nome de
da uma armação de ferro forjado que avançava até o todos os marinheiros, e para os deuses salvadores”.
local onde a super fície da estátua seria suspensa. Esta inscrição foi coberta por uma camada de argamas-
Nestas barras de ferro foram rebitadas chapas de sa, na qual foi entalhado o nome de Ptolomeu. Com o
bronze que haviam sido fundidas, mar teladas e poli- passar do tempo, no entanto, a argamassa caiu, reve-
das, cirando a super fície externa da estátua. Dizia-se lando a inscrição de Sóstrato.
que grande par te do metal usado na estátua havia
sido reciclado das inúmeras máquinas de guerra dei- O Farol de Alexandria era uma grande atração turística.
xadas para trás com a derrota e fuga de Demétrio. O Vendia-se comida na plataforma de observação que fica-
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 21
va no topo do primeiro nível, e os visitantes podiam subir lunatas permitiram que o sol de inverno, mais baixo, en-
ao pináculo da torre de oito lados para uma vista melhor. trasse profundamente em uma edificação e, ao mesmo
Há relatos de que o farol mantinha-se intacto e em fun- tempo, fornecesse proteção solar contra o sol de verão,
cionamento ainda em 1115, embora houvesse sofrido mais alto. Os cômodos internos também eram mantidos
alguns danos devidos a terremotos. Assim como muitas aquecidos com o uso de pequenas janelas voltadas
antigas estruturas a leste do Mediterrâneo, seu destino para o norte (hemisfério norte), minimizando o efeito de
foi finalmente selado pelos movimentos da Terra. Após aquecimento provocado pela incidência solar direta e
grandes danos causados por um terremoto em 1303, o oferecendo alguma ventilação. Como na época não se
farol veio abaixo com outro, em 1326. usava vidro nas janelas, elas eram fechadas por posti-
gos de madeira, que mantinham as casas aquecidas no
A construção daquela época, assim como a de hoje, inverno.
tinha seus impactos sobre o meio ambiente; na Grécia
Antiga, tanto as sérias conseqüências econômicas como A próspera cidade de Olinto, no norte da Grécia, nos for-
os exemplos de projetos criativos ajudaram a mitigar nece outro exemplo de projeto solar. Quando, no século 12, 13
estes efeitos. À medida que as cidades-Estado do mundo V a.C. se precisou de habitação para cerca de 2.500
grego cresciam e construíam cada vez mais, mais eram pessoas, um grande loteamento foi planejado na zona
exauridos seus recursos naturais. A madeira era neces- norte da cidade existente com o mesmo cuidado que
sária em grandes quantidades para a produção tanto de hoje se projeta qualquer conjunto habitacional. As ruas
embarcações como de edificações e era especialmente tinham orientação leste-oeste, para garantir que os apar-
importante para o carvão vegetal usado na fundição de tamentos fossem voltados para o sul (hemisfério norte),
minérios. Enormes quantidades de metais eram produzi- e estes eram de dois tipos, conforme estivessem no
das – estanho, chumbo, cobre, bronze, e principalmente lado norte ou sul da rua. Cada apartamento era projeta-
ferro – e cada tonelada de metal consumia muitas outras do com cômodos voltados para o sul e abertos para pá-
toneladas de carvão para sua fabricação. tios centrais, garantindo o aproveitamento máximo do
sol de inverno.
Já no século V a.C. muitas partes da Grécia já não ti-
nham praticamente nenhuma floresta. O filósofo Platão Muitas outras cidades gregas testemunham este plane-
achava que as colinas de sua Ática nativa eram “como jamento, e Priene, na atual Turquia, é uma das mais es-
os ossos de um cadáver, desprovido de suas carnes ou- petaculares. Como a cidade velha era cada vez mais as-
trora vivas”.4 À medida que os combustíveis escassea- solada por inundações e suas conseqüências nefastas à
ram, os governos das pólis foram obrigados a legislar; saúde pública, decidiu-se, por volta de 350 a.C., relocar
Atenas em certo momento baniu o uso de madeira de toda a comunidade de cerca de 4.000 pessoas para um
oliveira para produção de carvão e proibiu a exportação sítio melhor, do outro lado da colina. Este grande deslo-
de qualquer tipo de madeira de construção para regiões camento permitiu aos planejadores urbanos definir
vizinhas. Na ilha de Cós, a madeira para calefação e co- todos os detalhes de sua nova cidade, incluindo um bom
zimento doméstico foi taxada para que seu uso fosse sistema de suprimento de água e esgoto. A orientação
controlado, enquanto em Delos, que não tinha fontes lo- das edificações e ruas levou em consideração não ape-
cais, a venda do carvão foi assumida pelo Estado, para nas a posição solar, para que se gozassem os benefíci-
evitar o mercado negro. A séria escassez de madeira os dos ganhos solares, mas também a direção dos ven-
para construção também deve ter contribuído para o uso tos dominantes. Os ventos frios de inverno vinham do
crescente da alvenaria nas edificações. norte, assim, as paredes das casas voltadas para o
norte eram mais espessas, conseguindo melhor isola-
Além do uso da madeira em edificações, navios e fundi- mento térmico.
ção de minérios, ela também era essencial para fins do-
mésticos, sendo o único combustível disponível para co- Diversos filósofos e cientistas, incluindo Sócrates,
zimento e calefação das casas durante os frios inver- Platão e Ésquilo, chamaram atenção em seus escritos
nos. Uma resposta criativa à falta de combustível foi a para estas e outras formas criteriosas de planejamento
redução da necessidade de calefação, através do de- urbano e arquitetônico como ilustrações dos princípios
senvolvimento de edificações mais sofisticadas. Os pro- científicos que estavam elaborando para explicar como o
jetistas aprenderam a coletar e aproveitar a energia mundo funcionava. Aristóteles (384–322 a.C.) observou
solar para aquecimento do invólucro das edificações, em um de seus livros que uma “abordagem racional” ao
durante o dia, e liberação gradual do calor durante as planejamento de cidades e edificações era “a última
noites mais frias. Recursos de sombreamento como co- moda” na sua época.5 Aqui, a palavra-chave é “racio-
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 22

11 12

13

11 Farol da Ilha de Faro, Alexandria, 270 a.C. Projetista: Sóstrato de Cnidos. Reconstrução. 12 Planta da cidade de Olinto,
norte da Grécia, século V a.C. 13 Bloco de casas em Olinto. Perspectiva isométrica (reconstrução).
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 23
nal”, pois ressalta o que talvez possamos identificar de esferas concêntricas (perfeitas) cujos raios tinham
como a principal contribuição do filósofo grego à enge- relações simples correspondentes aos intervalos musi-
nharia: a formalização da lógica e seu uso para conven- cais. Na verdade, a harmônica serviu aos gregos quase
cer as pessoas de certos pontos de vista através da ar- tanto como a física e a química moderna hoje nos auxi-
gumentação lógica. liam a explicar por que o universo é da forma que ele é.
A importância da harmônica como chave para compreen-
Matemática, ciência e engenharia na são do mundo pode ser apreciada por sua sobrevivência
Antigüidade clássica como uma das principais disciplinas lecionadas nos cen-
Não estamos exagerando nem um pouco quando dize- tros de ensino até o século XVII. Johannes Kepler,
mos que os filósofos gregos estabeleceram o modo Galileu, René Descartes e até mesmo Isaac Newton
como as pessoas do mundo ocidental vêem o mundo. transitavam com facilidade e lógica da matemática para
Eles nos legaram abordagens metódicas para a descri- a astronomia, harmônica, estática e ótica em seus estu-
ção do mundo – a música, a astronomia, a botânica, a dos dos movimentos planetários.
zoologia etc. Os filósofos gregos buscavam estruturar e
ordenar suas idéias, estabelecer padrões, relações e hi- Os filósofos, matemáticos e físicos gregos desenvolve-
erarquias. A taxonomia era a rainha das ciências, ou me- ram a ciência da mecânica e usaram o mesmo rigor ló-
lhor, a princesa, pois, acima de tudo, o objetivo destas gico desenvolvido no estudo da geometria para explicar
mentes filosóficas era conectar idéias através daquela e comprovar a idéia dos benefícios mecânicos que esta-
linha invisível chamada lógica. vam por trás de recursos-chave que permitiam ao
homem multiplicar o poder de sua força limitada: a ala-
Uma das ferramentas mais poderosas que os gregos de- vanca, a cunha, o parafuso e a polia. Esta abordagem
senvolveram e exploraram foi a geometria. Eles defini- de explicação do mundo físico foi registrada por escrito
ram dois tipos de geometria, uma baseada em objetos pela primeira vez por volta do ano 400 a.C. por Arquitas
do mundo real, a outra, em idéias do mundo abstrato. (c. 428–c. 347 a.C.) de Tarentum (Tarento, uma peque-
Eles aprenderam a distinguir uma pedra quadrada de na cidade no sul da Itália), o qual é às vezes chamado
outra circular, cujas formas podem ser conferidas por de o pai da mecânica matemática. Arquitas viera da es-
medições, de um quadrado ou um círculo, cujas dimen- cola pitagórica de física e matemática, e seus livros
sões e diversas propriedades geométricas podem ser Tubos e Mecânica são as mais antigas obras sobre o as-
conhecidas sem que seja necessário o uso de verifica- sunto que chegaram até nós. Sua obra sobre mecânica
ções físicas. Matemáticos como Tales (fl. 636–c. 546 estabeleceu as bases que foram seguidas e desenvolvi-
a.C.), Pitágoras (c. 582–507 a.C.) e Euclides (fl. 300 das por praticamente todos os demais escritores sobre
a.C.) usaram a geometria como veículo para as mais ele- matemática e física durante o período clássico, até
vadas das artes gregas: a lógica e a retórica. Usando li- Antêmio e Eutócio, no século VI d.C. Entre as muitas ou-
nhas mentais abstratas – talvez esboçadas no papel tras obras de Arquitas sobre matemática está
para aqueles que não as conseguiam imaginar claramen- Harmônica, que descrevia a ciência baseada em teoria
te – conseguiam argumentar com certeza absoluta que, musica e geometria e que lhe foi importante para expli-
por exemplo, uma certa linha tinha o dobro do compri- car como o mundo funcionava como a mecânica.
mento de outra. Aristóteles escreveu sobre sua admiração por um certo
brinquedo mecânico que Arquitas fez para divertir crian-
Em um mundo incerto e imprevisível, a capacidade de se ças. Arquitas fez um passarinho de brinquedo que de al-
provar algo sem deixar dúvidas oferecia aos filósofos guma maneira era movido a ar comprimido e voava por
uma chave para desvendar os mistérios do universo. A quase 200 metros, e ele também escreveu uma incrível
geometria era uma manifestação das regras pelas quais viagem imaginária ao redor do mundo em uma esfera
o mundo fora construído. Esta era a premissa subjacen- hermeticamente vedada.
te à incrível obra de Pitágoras e seus seguidores, que se
esforçaram para explicar o mundo em termos de geome- Ainda que muitos dos primeiros filósofos, matemáticos
tria e de proporções simples. Seu exemplo arquetípico e cientistas da Grécia antiga talvez tenham trabalhado
era a música e o estudo das propriedades físicas do por diletantismo, muitos de seus esforços se relaciona-
som musical, a harmônica. Os vários intervalos musi- vam com preocupações bem mais mundanas – em par-
cais consonantes – a oitava, a quinta, a quarta e assim ticular, a arte da guerra. Esta abarcava levantamentos
por diante – correspondiam a subdivisões simples (2:1, topográficos, medições, e projeto e execução de navios,
3:2, 4:3) do comprimento de uma corda vibratória. De fortificações e armamentos como catapultas e balistas.
forma similar, o universo era concebido como uma série Estes filósofos e cientistas também faziam pesquisas
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 24

G EOM ETR IA: DE MON STRAÇÕE S E AXIOMAS

Os fundamentos formais da geometria são um pequeno número de axiomas. Todas as verdades ou teoremas da
geometria são gerados a partir desses axiomas, através da aplicação de várias regras de inferência e de teore-
mas anteriormente comprovados.

DA D O : A

Um quadrilátero ABCD
D
PE DE-S E:
Construa um triângulo de área igual à do quadrilátero
ABCD.

CON STR UÇÃO:


Una AC . Passando por D , trace o lado D E paralelo a AC , E
B
C
chegando a E , definido pela continuação do lado B C . O
triângulo requerido é A B E

DE MON STRAÇÃO:
Área do quadrilátero ABCD = ∆ A B C + ∆ AC D em área
∆ AC D = ∆ AC E em área (na mesma base AC entre as mesmas paralelas AC e DE)
Área de ∆ A B C D = ∆ A B C + ∆ AC E em área

Área de ∆AB E = ∆ABC + ∆ AC E em área


Área de ABCD = ∆AB E Quod erat demonstrandum (O que devia ser demonstrado)

para descobrir, por exemplo, como aumentar a força de uniu ao corpo docente e se sabe que ele lecionou retóri-
arremesso das armas e a rapidez e efetividade das em- ca e dialética. A academia perdurou de várias formas até
barcações. Aparentemente havia dois meios formais de 529 d.C.
se adquirir conhecimentos de engenharia que poderiam
ser aplicados para fins militares: um aprendizado era Aristóteles deixou a academia de Platão após 20 anos e
dos conhecimentos práticos necessários para a constru- logo recebeu o apoio de Alexandre, o Grande, na funda-
ção de edificações e fabricação de máquinas de guerra, ção de uma instituição rival, o Liceu, em Atenas, em 335
o outro, era mais profundo. As habilidades bélicas eram a.C. O Liceu oferecia aulas formais em uma ampla vari-
lecionadas em colégios militares, ao passo que uma for- edade de disciplinas, muitas das quais lecionadas pelo
mação mais geral e científica, que incluía o estudo de próprio Aristóteles – lógica, física, astronomia, meteoro-
disciplinas acadêmicas como mecânica, geometria e as- logia, zoologia, metafísica, teologia, psicologia, política,
tronomia, era oferecida nas escolas onde os grandes economia, ética, retórica e poética. Uma das mais impor-
acadêmicos de então lecionavam. É provável que muitos tantes conquistas de Aristóteles foi dar fundamentação
de tais estabelecimentos servissem a ambos propósi- lógica às ciências teóricas a partir de uma série de axio-
tos. Infelizmente, poucas informações chegaram até nós mas, como na geometria. Sua obra precedeu a estrutu-
sobre estas escolas. Platão (429–347 a.C.) estabeleceu ra formal de axiomas de Euclides para a geometria em
sua academia em Atenas em 387 a.C., tendo em mente 30 ou 40 anos.
fins tanto educacionais como políticos, e vários filóso-
fos, advogados, astrônomos e matemáticos estavam as- Em 290 a.C. Ptolomeu Soter (Ptolomeu I) fundou o
sociados à escola. Desconhecemos se havia currículos Museu de Alexandria, com o fim declarado de coletar
ou mesmo aulas formais naquela época, mas quando todas as obras escritas importantes, promover o estudo
Aristóteles estudou lá, 20 anos depois, sabemos que da literatura e da arte, e estimular e auxiliar investiga-
ele aprendeu retórica e política. Aristóteles em breve se ções e pesquisas experimentais e matemáticas.
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 25
A palavra “museu” significava um santuário para as putação se tornou lendária, tanto em sua terra como nos
Musas, mas hoje seria mais apropriado chamá-lo de territórios de seus inimigos. As mais bem sucedidas e
uma universidade. Ele se inspirava, em parte, no currícu- famosas de suas façanhas foram as máquinas que ele
lo amplo do Liceu, e se tornou a mais bem-sucedida de criou para defesa de sua terra natal, Siracusa, quando
todas as escolas da Antigüidade, o modelo no qual se esta foi atacadas pelos romanos no sítio de 212 a.C.
baseiam todas instituições acadêmicas e de ensino atu- Plutarco escreveu:
ais. Durante os 900 anos seguintes, ele atraiu estudio- Quando Arquimedes começou a manejar suas máquinas
sos e alunos de todos os confins do futuro Império e a atirar contra as forças terrestres dos atacantes todos
Romano do Ocidente e do Oriente. Uma importante os tipos de projéteis e imensas massas de rocha, que
parte do complexo do Museu era a famosa Biblioteca de caíam com barulho e velocidade inacreditáveis, nada con-
Alexandria, na qual se acredita que houvesse 750.000 seguia evitar o peso deles, e estes projéteis arrasavam
livros em seu apogeu. tudo que estivesse em seus caminhos, causando grande
confusão entre os inimigos. Ao mesmo tempo, enormes
A lista de nomes relacionados à Universidade de vigas eram subitamente arremessadas das muralhas e
Alexandria como professor ou aluno é impressionan- caíam sobre os navios, afundando rapidamente alguns
te, incluindo, entre outros, o geômetra Euclides e deles; outros eram capturados pela proa com o uso de
os engenheiros Arquimedes, Tesíbio, Filon e Hiéron garras de ferro ou ganchos que pareciam ganhos de guin-
de Alexandria. Para que possamos ter uma idéia do daste, eram erguidos no ar, e então tinham suas proas le-
alto padrão que a engenharia grega e romana alcan- vantadas e eram jogados para o fundo do mar, ou giravam
çou, vale a pena examinarmos as carreiras, as con- várias vezes, puxados pelas máquinas de guerra da cida-
quistas e os escritos dos mais eminentes destes de, até se chocarem contra as pontas de aço que projeta-
homens. vam das muralhas, massacrando os guerreiros a bordo,
que morriam nos escombros. Muitas vezes também um
Os engenheiros da Grécia helenística navio era retirado da água e ficava em pleno ar, girando
Arquimedes de Siracusa, uma cidade-Estado da Sicília aqui e acolá, um espetáculo horrível, até que toda sua tri-
(c. 287–212 a.C.), provavelmente estudou na pulação tivesse sido arremessada para todos os lados, e
Universidade de Alexandria e rapidamente se tornou então era lançado vazio contra as muralhas ou libertado
muito conhecido por ter inventado duas das máquinas das garras que o mantinham.7
mais duradouras da humanidade: o parafuso de
Arquimedes, ainda hoje usado para erguer água, e a Apesar de tudo, Arquimedes era um engenheiro um
polia composta. O historiador romano Plutarco, escre- tanto relutante. Ele desenvolvia as máquinas de guerra
vendo por volta do ano 100 d.C., descreve um dramáti- apenas sob solicitação de seu amigo, o rei de Siracusa,
co experimento que o rei de Siracusa, Hiéron, preparou e não escreveu nada sobre seus conhecimentos milita-
para que Arquimedes pudesse demonstrar sua polia res. Plutarco relata bem a atitude ambivalente de
composta. Em uma carta ao Rei Hiéron, Arquimedes afir- Arquimedes:
mou que, dada força suficiente, qualquer peso podia ser Arquimedes possuía um espírito tão elevado, era uma alma
movido por seu sistema de polias. tão profunda, e tinha tamanho conhecimento científico
Hiéron maravilhou-se com isto e pediu a Arquimedes uma que, embora suas invenções lhe tivessem trazido reputação
demonstração prática na qual um grande peso poderia ser e fama de ter uma perspicácia super-humana, ele não con-
movido por uma pequena máquina. Um dos navios de cordou em deixar para trás qualquer tratado sobre o tema,
carga da frota do rei – que não podia ser movido do cais a e, considerando ignóbil e vulgar a obra de um engenheiro
não ser com muito esforço e muitos homens – foi selecio- militar, assim como qualquer outra arte que prestasse au-
nado, enchido com passageiros e carga total, e Hiéron se xílio às necessidades da vida, ele devotou seus maiores es-
sentou para assistir. Praticamente sem esforço, forços apenas àqueles estudos cuja sutileza e charme não
Arquimedes puxou a corda da polia composta e moveu o são afetados pelos chamados da necessidade. Estes estu-
navio em linha reta, de forma tão suave e estável como se dos, ele considerava, não podiam ser comparados a ne-
ele estivesse no mar.6 nhum outro; neles a matéria em estudo rivaliza com a de-
monstração, o primeiro (a matéria) oferecendo grandiosida-
As habilidades de engenharia de Arquimedes lhe puse- de e beleza, o segundo (a demonstração), precisão e poder
ram a serviço do rei como engenheiro militar, e sua re- insuperáveis.8
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 26

Naturalmente, é este aspecto dos grandes talentos de experimentos práticos foi registrado. Ele é conhecido por
Arquimedes que firmou sua reputação atual como o nós especialmente por seu tratado sobre operações mi-
maior de todos os físicos e matemáticos da Antigüida- litares e a arte do sítio. Filon aumentou quaisquer conhe-
de. Ele é universalmente conhecido por seu famoso cimentos anteriormente adquiridos sobre a engenharia
princípio: todo corpo submerso em um fluido experimen- militar com informações colhidas com aqueles que as ti-
ta um empuxo vertical e para cima igual ao peso do flui- nham em primeira mão. Ele visitou os grandes arsenais
do deslocado. Ele também leva o crédito de ter desen- de Rodes e Alexandria para conversar com os engenhei-
volvido um antecessor primitivo do cálculo, seu método ros sobre as mais recentes estratégias militares e o pro-
de exaustão, um processo de integração que lhe permi- jeto e a construção dos últimos armamentos. Em
tia calcular área de formas irregulares. No entanto, a Alexandria, por exemplo, ele encontrou Tesíbio, que há
obra de Arquimedes sobre matemática e física era virtu- pouco desenvolvera sua nova catapulta com cabos de
almente desconhecida durante sua vida e por muito bronze torcidos. O tratado de Filon foi escrito em nove li-
tempo após sua morte. Ela foi amplamente difundida vros:9
apenas quando editada e publicada pelo cientista grego 1. Introdução
Eutócio de Ascalon (c. 480–540), aproximadamente 2. Alavancas
700 anos depois. 3. Construção de Portos Marítimos
4. Catapultas
Tesíbio de Alexandria (c. 285–222 a.C.) era um enge- 5. Pneumática
nheiro militar egípcio cuja reputação foi superada ape- 6. Teatros Automáticos
nas pela de Arquimedes. Ele escreveu dois livros sobre 7. Construção de Fortalezas
a mecânica aplicada à guerra e às máquinas bélicas, 8. Sítio e Defesa de Cidades
ambos perdidos: Memorando Sobre Mecânica e 9. Estratagemas
Belopoietica. Ele projetou numerosas catapultas, inclusi-
ve uma que usava cabos de bronze torcidos, cuja vanta- Infelizmente, apenas quatro destes livros chegaram
gem sobre os cabos feitas de materiais orgânicos (cor- aos nossos dias (os livros 4, 5, 7 e 8). Seu Livro 8 ofe-
das e tendões de animais) era que seu desempenho não rece conselhos sobre as várias formas de defender as
era afetado pela umidade. Sua obra sobre a compressi- muralhas das cidades contra o sítio, tanto por terra
bilidade e elasticidade do ar também foi importante e como por mar. Para capturar uma cidade sitiando-a,
lhe rendeu o título de “pai da pneumática”. Ele inventou Filon primeiro aconselha que é impor tante fazer uso
a bomba de sucção que ainda hoje é usada para bombe- adequado de máquinas como catapultas e outras má-
ar água verticalmente e muitas máquinas movidas a quinas de guerra. Mas, como ele prossegue, também
água ou energia pneumática, algumas incorporando en- é impor tante tentar fazer com que os habitantes da ci-
grenagens mecânicas. Entre estas estava um guindaste dade passem fome, subornar as pessoas adequadas
hidráulico capaz de erguer grandes pesos, e seu famoso para ajudar, envenenar os sitiados, e usar criptografia
relógio de água. para passar mensagens secretas. Ele também ressal-
ta a impor tância de um bom médico, e afirma que
Talvez o maior feito de Tesíbio no desenvolvimento de aqueles que foram feridos em batalha de forma tão
todas as formas de engenharia seja o fato de que ele é grave que já não podem trabalhar deveriam receber
considerado como o fundador e primeiro diretor da pensões, e que se deveria cuidar das viúvas dos mor-
Escola de Engenharia de Alexandria. Fundada em 230 tos.
a.C. e intimamente relacionada com o Museu de
Alexandria, seu fim era educar e treinar engenheiros mi- Seu livro sobre catapultas (Livro 4) é o mais importante
litares e engenheiros mecânicos. Se o “museu” de para a história do projeto de engenharia. Embora seja
Ptolomeu Soter hoje deveria ser chamado de universida- uma das primeiras obras substanciais sobre mecânica,
de, então seria melhor chamar a escola de Tesíbio de não é obra de um matemático acadêmico. Ele oferece as
“école polytechque”, para usarmos o termo cunhado bases científicas do funcionamento de muitos engenhos
para a nova escola de engenharia fundada na França do e máquinas de guerra, e, o que é mais importante, re-
século XVIII, dedicada a aproximar a teoria da prática gistra as etapas de projeto usadas pelos engenheiros
(veja o capítulo 6, p. 302). militares romanos para a determinação das dimensões-
chave de armas como catapultas e balistas. Embora
Filon (ou Filão) de Bizâncio (c. 280–220 a.C.) era prova- Filon estivesse relatando os métodos de projeto de en-
velmente um engenheiro militar, mas nenhum de seus genharia militar de sua época, eles eram, evidentemen-
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 27
te, apenas os últimos de uma longa tradição. Dada sua eram influenciadas pelas práticas e pelos eventos dos
sofisticação, não é absurdo supor que eram as versões lugares com os quais Roma comerciava. Tanto o
mais atualizadas de métodos similares que existiam há, Império Romano como a cidade de Roma haviam se tor-
pelo menos, 100 anos. nado mais prósperos durante o século I a.C., e houve-
ra uma enorme campanha para a construção de estra-
Filon nos conta que os gregos projetavam balistas para das, aquedutos e for tificações por todo o império. No
o arremesso de pedras e catapultas para lançar flechas ano de 45 a.C. houve uma mudança dramática, quan-
usando fórmulas que relacionavam cada uma das dimen- do Júlio César (100–44 a.C.) foi eleito como o primeiro
sões da máquina terminada com apenas uma unidade (e último) Dictator Perpetuus; um ano depois, ele foi as-
básica: o “módulo”. Chamado de palintone no caso da sassinado. Em 27 a.C., após uma década e meia de
balista grega, o módulo era o diâmetro da pedra a ser governo compar tilhado e disputado, o Senado romano
lançada. A fórmula de projeto havia sido determinada conferiu ao sobrinho-neto e filho adotivo de César,
através da experiência e de testes, e estabelecia que, Otávio (63 a.C–14 d.C), que já era cônsul da cidade, os
para que se conseguisse determinado alcance de tiro, o títulos de Augustus (“o sublime”) e Princeps (“principal
diâmetro (D) das cordas torcidas variava com a raiz cúbi- cidadão”). O senado lhe jurou um voto de lealdade
ca da massa (M) do projétil de pedra, ou seja, D = 1.1 como Imperator, e então, com controle total do exérci-
3√(100 M). O método de projeto descrito por Filon pros- to romano, ele se tornou o líder efetivo de todo o
segue, dando as dimensões de mais de uma dúzia de Império Romano. Assim como outros líderes antes e
componentes chave do palintone, todos baseados em depois dele, Otávio Augusto estabeleceu e marcou sua
múltiplos do módulo fundamental, o diâmetro das cor- autoridade através da construção – e ele construiu em
das ou cabos torcidos, D. Em 250 a.C., estes cálculos uma escala sem precedentes. Antes de examinar algu-
eram um desafio para o projetista de uma catapulta - mas dessas obras-primas, contudo, esta discussão irá
como achar a raiz cúbica de um número – e uma das enfocar aspectos mais corriqueiros da construção e da
contribuições de Filon à matemática foi que ele conse- engenharia.
guiu bolar uma solução geométrica para este problema
de cálculo. Bem, na verdade, muitas vezes a resposta Um dos mais impor tantes meios pelos quais os roma-
poderia ter sido simplesmente obtida em tabelas que nos mantiveram o alto nível de conhecimentos em en-
forneciam os valores pré-calculados para uma seleção genharia alcançado pelos gregos foi através de uma
de dimensões comuns de catapultas, mas o uso desta infra-estrutura de ensino que havia sido estabelecida
relação cúbica é incrivelmente maduro para sua época e principalmente pela universidade e escola de engenha-
não foi superado em termos de sofisticação por mais de ria de Alexandria. Esta continuou sendo o principal es-
500 anos. Este tipo de processo de projeto era muito si- tabelecimento de ensino durante toda a duração da
milar àquele usado pelos projetistas de edificações de República Romana e do Império Romano. Lá a enge-
então, como posteriormente foi registrado por Vitrúvio nharia era lecionada com base nos livros dos grandes
(veja a seguir). escritores gregos e, acredita-se, também de muitos
mestres romanos cujas obras e nomes se perderam.
Engenharia e construção na Roma antiga Praticamente os únicos livros de engenharia que per-
Não houve uma transição clara ou repentina entre a en- duraram deste período são aqueles escritos por Héron
genharia grega e a romana. Roma era uma cidade, ou de Alexandria (10–75 d.C), que foi provavelmente o
melhor, um Estado que vinha crescendo em impor tân- mais prolífico escritor sobre ciência e tecnologia de
cia desde a fundação da República Romana, em 509 sua época.10 Nada se sabe sobre sua juventude, mas
a.C. Seus conhecimentos e avanços em engenharia ha- é provável que tenha estudado engenharia, e ele se
viam se desenvolvido junto com aqueles das demais ci- tornou conhecido como professor na universidade e
dades-Estado ao redor do Mediterrâneo. A arquitetura escola de engenharia de Alexandria. Ele, sem dúvida,
clássica de Atenas já havia influenciado Roma no sécu- tinha grandes conhecimentos da prática, assim como
lo V a.C., quando o Templo de Saturno (498 a.C.) e o dos aspectos matemáticos e científicos da mecânica.
Templo de Castor e Pólux (484 a.C.) foram construídos, Seus livros-texto e suas notas de aula compreendiam
e estas edificações, mesmo após muitas reformas, trabalhos pessoais, assim como comentários e rein-
ainda gozavam de destaque no Fórum romano de 200 terpretações dos temas clássicos estabelecidos antes
d.C (cujas ruínas ainda existem). Assim como ocorria dele por Euclides, Arquimedes e outros. De uma longa
com todas as cidades antigas, as novas construções lista de livros atribuídos a Héron, os seguintes geral-
de Roma eram sobrepostas às anteriores, e todas mente são reconhecidos como seus:
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 28

Mechanica (em três livros) Architectura (Arquitetura), escrito por Vitrúvio (Marcus
Metrica, dedicada a métodos de medição Vitruvius Pollio – que trabalhou de 46 a 30 a.C) e pu-
Zygia, ou Equilíbrio (perdido), mencionado pelo matemáti- blicado em Roma por volta de 25 a.C. Embora tenha
co grego Papo (Pappus) de Alexandria (c. 290–350 sido escrito no período romano, o conteúdo desta obra
d.C.) per tence, em termos culturais, tanto à Grécia como a
Dioptra, que trata de teodolitos e topografia Roma. Fica claro nos agradecimentos do texto que
Comentário sobre os Elementos de Euclides muitos autores já haviam escrito sobre os mesmos as-
Belopoeica, que descreve como construir máquinas de suntos durante os séculos anteriores, e Vitrúvio admi-
guerra e cobre assuntos similares àqueles das obras te que se baseia muito neles. Assim, quando Vitrúvio
de Filon e Vitrúvio escreve sobre como projetar um templo, não fica clara
Camarica, ou Abóbadas (perdido), mencionado por Eutócio a idade de tais orientações. No contexto atual, isso
de Ascalon não faz muita diferença. Das evidências tiradas de
Pneumatica (em dois livros), um estudo das máquinas muitas edificações que restaram da Grécia antiga, pa-
mecânicas acionadas a ar, vapor ou pressão da água rece-nos provável que muitas de suas orientações
O Teatro Automaton, descrevendo um teatro de fantoches para projeto remontavam a, pelo menos, três ou qua-
com cordões, polias, tambores e pesos tro séculos antes – aproximadamente 400 a.C. Isso
Relógios de Água (em quatro livros) vale especialmente para suas descrições dos méto-
Catoprica, tratando da luz, da visão e dos espelhos dos dóricos e jônicos de projetar templos. Em alguns
Uma obra perdida sobre como usar um astrolábio, menci- assuntos, como acústica, Vitrúvio transcreveu literal-
onada no século X. mente idéias e palavras de gregos de muitos séculos
antes. Em outros temas, como materiais e projeto de
Mechanica, o tratado de Héron sobre mecânica para en- manufatura de armamentos, Vitrúvio escreve com
genheiros, basicamente segue as idéias de Arquimedes, base em sua própria experiência, assim, podemos
cobrindo os conceitos teóricos e os princípios de funcio- pressupor que suas orientações eram práticas corren-
namento de várias máquinas e dando exemplos práticos tes por volta do ano 50 a.C.
de seus usos. O Livro 1 examina como construir formas
tridimensionais proporcionais a determinada forma. Ele Vitrúvio foi um engenheiro que trabalhou durante o sé-
também examina a teoria do movimento e certos proble- culo I a.C., primeiramente a ser viço de Júlio César e
mas de estática, incluindo a teoria do equilíbrio. No Livro de Otávio Augusto. Ele estudou e começou sua carrei-
2, Héron discute o levantamento de objetos pesados ra como engenheiro militar, construindo e conser tando
com o uso de uma alavanca, polia, cunha ou parafuso. balistas e scorpiones (catapultas). Mais tarde, seus
Há uma discussão sobre o centro de gravidade de figu- conhecimentos de gerenciamento de engenharia e pro-
ras planas. O Livro 3 examina vários métodos de movi- jeto fizeram que fosse encarregado de vários projetos
mentação e transporte com guindastes e trenós, e ele públicos de engenharia civil (provavelmente para for-
também examina as prensas de lagar (de vinho) como necimento de água), e ele teve um impor tante (mas
uma das aplicações da força mecânica do parafuso. desconhecido) papel na reconstrução de Roma, a cida-
Também interessa à engenharia da edificação uma única de de que Otávio Augusto posteriormente se orgulha-
e espantosa referência feita pelo matemático e escritor ria por “havê-la encontrado feita de tijolo e deixá-la
técnico do século VI, Eutócio de Ascalon, a um livro per- feita de mármore”.12 Sabemos de apenas um projeto
dido sobre abóbadas, também escrito por Héron. O ma- ao qual seu nome pode ser associado: a grande basí-
temático Papo de Alexandria descreveu a abordagem de lica de Fano, uma cidade da Itália central, na costa do
Héron: Mar Adriático.
Os engenheiros [mechanikoi] da escola de Héron dizem
que a engenharia pode ser dividida em uma parte teórica Vitrúvio escreveu seu livro no final da vida – provavel-
e outra prática; a parte teórica é composta da geometria, mente já aposentado, se imaginarmos que a vida profis-
aritmética, astronomia e física; a parte prática compreende sional de engenheiros de obras e gerentes de projeto
a manufatura de objetos de metal, construção, carpintaria, era, na época, tão atribulada como hoje – e dedicou-a a
pintura e tudo que envolva habilidade com as mãos.11 Otávio Augusto, que havia sido seu principal cliente. É
impressionante que seu livro seja conhecido de forma
Marco Vitrúvio Polião quase ininterrupta há mais de 2.000 anos. Muitas cópi-
Apenas um livro sobre projeto e construção de edifica- as manuscritas chegaram ao século XV, e em 1486 a pri-
ções do período greco-romano chegou até nós: De meira edição impressa foi publicada. No entanto, todas
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 29
D E A R C H I T E CT U R A , E S C R I TO P O R V I T R Ú V I O ( C . 2 5 A . C . )

A obra é dividida em 10 livros, dos quais o último, sobre engenharia militar, a profissão original de Vitrúvio, é o
maior. O conteúdo de cada um é:

1 . A E D U CA Ç Ã O D O E N G E N H E I R O E D O P R OJ E T I S TA D E E D I F I CA Ç Õ E S ; O E S C O P O DA E N G E N H A R I A ; P L A N EJ A M E N -
TO D E C I DA D E S
2 . M AT E R I A I S D E C O N S T R U Ç Ã O PA R A E D I F I CA Ç Õ E S
3 . P R OJ E TO E C O N S T R U Ç Ã O D E T E M P LO S
4 . A R Q U I T E T U R A E E S T I LO S D O S T E M P LO S
5 . P R OJ E TO E C O N S T R U Ç Ã O D E E D I F Í C I O S P Ú B LI C O S
6 . P R OJ E TO E C O N S T R U Ç Ã O D E CA S A S P R I VA DA S
7. M AT E R I A I S PA R A ACA B A M E N TO D E E D I F I CA Ç Õ E S
8 . C O M O E N C O N T R A R E F O R N E C E R Á G UA À S C I DA D E S
9 . A S T R O N O M I A , R E L Ó G I O S D E S O L E R E L Ó G I O S D E Á G UA
1 0 . E N G E N H A R I A M E C Â N I CA – M Á Q U I N A S PA R A LE VA N TA R P E S O S E E LE VA R Á G UA ; R O DA S D ’ Á G UA E M O I N H O S ; A R -
M A M E N TO S , I N C LU S I V E CATA P U LTA S E B A LI S TA S , E M Á Q U I N A S PA R A S Í T I O .

Ele alterna entre projeto e construção – como determinar as dimensões, as posições relativas, a orientação dos
componentes, e como selecionar e usar materiais adequados. Ele ressalta especialmente a importância da econo-
mia – o gerenciamento adequado de materiais e do canteiro de obras, bem como o uso do bom-senso para redução
de custos, evitando-se, por exemplo, materiais que não estivessem disponíveis na região e aqueles difíceis de traba-
lhar e usar. Ele também aconselha tomar cuidado com o custo das obras e o tamanho do bolso do cliente, além da
necessidade de entregar ao cliente uma edificação adequada ao fim desejado.

Vitrúvio distingue três ramos da engenharia (architectura); engenharia da edificação, manufatura de relógios e fabrica-
ção de máquinas, tanto aquelas para uso na construção como grandes armas de guerra. Ele considera que estas
três artes baseiam-se em comum em três habilidades: saber trabalhar os materiais para fazer coisas, ser capaz de
medir e fazer levantamentos topográficos, e ser capaz de calcular usando a geometria e a aritmética.

E N G E N H A R I A DA E D I F I CA Ç Ã O
C I DA D E S F O R T I F I CA DA S E O B R A S P Ú B LI CA S
DE FE SA: Muralhas, torres, portões e recursos permanentes para se resistir a ataques hostis
U S O R E LI G I O S O : Templos e outros monumentos aos deuses imortais
F I N S U T I LI T Á R I O S : Portos, locais de reunião pública como mercados, teatros, banhos públicos, colunatas, passeios
públicos
O B R A S PA R A I N D I V Í D U O S PA R T I C U L A R E S ( CA S A S )

R E LÓG IOS
R E L Ó G I O S D E S O L E R E L Ó G I O S D E Á G UA

E N G E N H A R I A M E C Â N I CA
M Á Q U I N A S E E Q U I PA M E N TO S PA R A C O N S T R U Ç Ã O
G U I N DA S T E S , G R UA S , H O D Ô M E T R O
A R M A M E N TO S
B A LI S TA S , CATA P U LTA S , T E S T U D O S
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 30

estas cópias devem ter permanecido misteriosas para Vitrúvio e as etapas do projeto grego
os leitores do norte da Europa, pois elas não continham Da descrição detalhada feita por Vitrúvio sobre os proce-
ilustrações das edificações descritas por Vitrúvio. dimentos de projeto para templos dóricos e jônicos con-
cluímos três coisas sobre o planejamento e a constru-
As primeiras traduções de Vitrúvio foram para o fran- ção na Grécia antiga: primeiro, que os gregos haviam de-
cês, em 1673, e para o inglês, em 1692. Como é de senvolvido processos seqüenciais para o projeto de edi-
se esperar, estas e as versões subseqüentes tendem ficações; segundo, que tais atividades dependiam do
a refletir a formação e as posturas do tradutor além uso do desenho e da geometria; terceiro, que tais méto-
das de Vitrúvio. Isso talvez fique mais evidente no uso dos de certa forma incorporavam meios de transmitir ao
das palavras “arquiteto” e “arquitetura” para descre- projetista a confiança de que a edificação resultante fi-
ver Vitrúvio e o conteúdo de seu livro. Um architeckton caria de pé e funcionaria nas formas previstas.
grego era literalmente um controlador e organizador da
mão-de-obra – talvez poderíamos chamá-lo de gerente Os projetos para templos dóricos e jônicos foram criados
de projeto na linguagem de hoje. A palavra grega archi- por volta de 600 a.C. – os dóricos na Grécia continental
tecktura abarcava o que atualmente seria chamado de e no sul da Itália e na Sicília; os jônicos, na Ásia Menor
engenharia mais arquitetura, e Vitrúvio usa a palavra e nas ilhas do Mediterrâneo. Eles diferiam não apenas
architecti como transliteração da língua grega, já que em aspecto, mas também na forma em que eram execu-
não havia uma palavra correspondente adequada em tados.
latim. As dificuldades que Vitrúvio teve em traduzir
idéias gregas para o latim foram aumentadas pelas di- Os projetos dóricos, como repetiu Vitrúvio usando suas 14
ficuldades dos tradutores do texto em latim de Vitrúvio fontes gregas, tinham uma concepção de elegante simpli-
para as línguas européias modernas; muitos equívo- cidade. Eles exigiam a seleção de um módulo único e fun-
cos sobre as técnicas de construção foram introduzi- damental que correspondia à metade do diâmetro de uma
dos por tradutores que não dominam o assunto. A se- coluna, “e, uma vez estabelecido este módulo, todas as
guinte tradução das linhas de aber tura do Livro I, partes da obra eram ajustadas a partir de cálculos base-
Capítulo I, talvez respeite suas posturas como enge- ados nele”.15 Assim como em outras seções de De
nheiro um pouco melhor do que a maior par te das tra- Architectura, onde ele descreve antigas práticas gregas,
duções modernas: Vitrúvio usa a palavra grega embates para módulo, já que
Architektura [engenharia e arquitetura] é um conjunto de não havia uma palavra latina correspondente. Assim, de
conhecimentos que engloba muitas disciplinas e ciências acordo com um conjunto particular e uma seqüência de
que também podem ser aplicadas a outras artes. As obras cálculos usados, as etapas de projeto para as várias di-
acabadas nascem da perícia na manufatura e no projeto. A mensões de toda a edificação podiam ser estabelecidas,
perícia na manufatura advém do estudo constante da mão- permitindo que o arquiteto tivesse uma certa liberdade
de-obra qualificada e do uso de materiais para se criar de para selecionar múltiplos e proporções adequados ao uso
acordo com o resultado desejado. Projetar é a habilidade da edificação. Este é exatamente o mesmo método que
de se transmitir o esquema do objeto finalizado para as de- havia sido desenvolvido pelos projetistas de catapultas 15
mais pessoas, e dar uma explanação racional para o esque- ou balistas, e, considerando que a tecnologia militar sem-
ma, usando conhecimentos de engenharia e princípios ci- pre esteve à frente da tecnologia civil, podemos pressu-
entíficos.13 por que o uso do módulo tenha sido desenvolvido primei-
ramente para a construção de armamentos.
As linhas originais em latim são as seguintes:
Archtecti est scientia pluribus disciplinis et variis eruditioni- Os projetos jônicos eram mais complexos e sofisticados
bus ornata quae ab ceteris artibus perficiuntur. Opera ea do que os dóricos. Nem todos os elementos da edifica-
nascitur ex fabrica et ratiocinatione. Fabrica est continuata ção se relacionavam com um único módulo, mas havia
ac trita usus meditation, quae manibus perficitur e materia uma série de derivações, de tal modo que as dimensões
cuiuscumque generis opus est ad propositum deformatio- de cada elemento eram calculadas sucessivamente a
nis. Ratiocinatio autem est, quae res fabricatas sollertiae partir de outro elemento, que geralmente era o imediata-
ac rationis proportione demonstrare atque explicare po- mente anterior. As proporções entre as partes consecuti-
test.14 vas também eram mais complexas do que no estilo dóri-
co, e as proporções entre partes muito afastadas eram
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 31
muito difíceis de se calcular. Este plano de projeto dava mentava a confiança nos métodos geométricos e aritmé-
margem a experimentação e variação muito maiores. ticos usados nos procedimentos de projeto. É impossí-
vel dizer com precisão como tais tentativas de explicar o
Seguir as etapas de um projeto do tipo dado por Vitrúvio mundo usando a harmônica, a geometria e a mecânica
para templos dóricos e jônicos envolvia tanto cálculos ajudaram os projetistas; não temos registros escritos ou
aritméticos simples como desenhos geométricos feitos muitas edificações bem preservadas que possam nos
com esquadros e compasso. Isso tornava possível calcu- oferecer provas definitivas. O que importa é que a geo-
lar, antes que a construção começasse, as dimensões metria e a mecânica não eram ciências abstratas, mas
de toda a edificação e de seus componentes, que então artes práticas. Com o uso da geometria e da mecânica
podiam ser comunicadas à equipe de trabalhadores. se podia chegar a resultados confiáveis e, o que é mais
Quando olhamos desta forma, vemos que um procedi- importante, previsíveis.
mento de projeto era muito mais do que um conjunto de
instruções a serem seguidas pelos trabalhadores. Na Mas, perguntaria uma mente do século XXI, o que isso
linguagem de hoje, elas são um modelo matemático da tem a ver com a engenharia? Sem dúvida, estes procedi-
edificação – uma representação abstrata da estrutura mentos de projeto gregos eram puramente geométricos
que nos permite experimentar, tentar as idéias antes de ou “arquitetônicos”. Onde está a análise de carregamen-
realmente executá-las. Tais ferramentas nos permitem to e deflexão e dos esforços estruturais que os engenhei-
prever as conseqüências das decisões de projeto, e ex- ros estruturais fazem atualmente? De certo modo, a per-
plorar o possível surgimento de problemas durante o gunta é meramente anacrônica; os conceitos matemáti-
processo de projeto e evitá-los. Este é o verdadeiro lega- cos modernos de cargas e esforços simplesmente ainda
do dos engenheiros gregos que foi desenvolvido a partir não existiam. Por outro lado, a pergunta é sobre evidên-
do século VI a.C. A codificação dos processos de proje- cias de como os gregos sabiam dos esforços estruturais
to também serviu como meio conveniente de registro sofridos pelos materiais que usavam e como eles relaci-
dos aprendizados obtidos com projetos passados, pos- onavam estes esforços com as dimensões dos vários
sibilitando que outras pessoas pudessem acessar tais elementos da edificação. A resposta tem que ser a se-
informações e disseminá-las pelos territórios. Um proce- guinte: os primeiros procedimentos e regras de projeto,
dimento de projeto podia viajar na cabeça de apenas como aqueles transmitidos por Vitrúvio, incorporavam
uma pessoa. Na verdade, foi o fato de que muitas pes- todas as principais influências de um elemento construti-
soas diferentes podiam projetar edificações similares vo sobre a forma final – sua aparência, sua função estru-
que levou à própria idéia de um estilo mais ou menos tural, suas propriedades materiais, o método construtivo
unificado; de outro modo, as edificações que surgiriam etc. Os procedimentos de projeto que hoje nos parecem
em territórios vizinhos ou províncias provavelmente refle- “apenas” geométricos também se fundamentavam em
tiriam as preferências estéticas e os diferentes níveis de muitos conhecimentos práticos acumulados por todos os
perícia em projeto e construção. engenheiros experientes: o maior tamanho possível de
um componente de pedra que podia ser erguido usando-
Um procedimento bem-sucedido e consolidado geraria, se diferentes meios, a distância que podia ser vencida
sem dúvida, confiança em seus usuários. Havia, no en- por uma viga de diferentes tipos de pedra, a área de te-
tanto, algo muito mais importante envolvido. Na Grécia lhado que um barrote de madeira podia sustentar. É um
antiga, a geometria era muito mais do que um mero erro presumir que a falta da ciência da engenharia moder-
ramo da matemática, como a descreveríamos atualmen- na significava que os engenheiros gregos ignorassem
te. Da mesma forma que hoje usamos a física, a quími- como as estruturas trabalhavam. Na verdade, ainda não
ca e outras ciências, os geômetras gregos efetivamente haviam sido inventados os meios para se armazenar tais
inventaram as idéias de prova e lógica. Usando mera- conhecimentos de forma escrita ou diagramática, e, por-
mente a geometria e simples regras matemáticas, eles tanto, os meios para transferi-los de uma pessoa a outra.
elucidaram as leis fundamentais que explicavam como o Mais de 1.500 anos transcorreriam até que estes meios
mundo funcionavam. O estudo grego da harmônica havia fossem desenvolvidos.
identificado as muitas relações complexas entre os com-
primentos das cordas que criavam as notas musicais, Vitrúvio e a engenharia ambiental
em harmonia ou dissonância. Tais relações certamente Vitrúvio recomenda orientar uma casa de modo a obter
também poderiam ter uso racional no projeto de edifica- o benefício máximo da calefação solar, e também acres-
ções. A mecânica também já era bastante desenvolvida centa conselhos de como diferentes leiautes de cômo-
para explicar, por exemplo, alavancas e polias, e isso au- dos, estilos de casa e detalhes de projeto são mais ade-
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 32

Escolha a largura do templo, W Em geral, de 15 a 30 m

+ Tetrástilo (4)
Hexástilo (6)
Escolha o número de colunas Octostilo (8)
(o intercolúnio típico é de
3 a 6 metros)
Picnostilo (1,5 D)
+ Sistilo (2 D)
Eustilo (2,25 D)
Escolha a razão entre o diâmetro Diástilo (3 D)
da coluna (D) e o intercolúnio Areosistilo (3,5D)

Calcule o “Módulo”, M Sistilo Diástilo Etc.


Tetrástilo W/19,5 W/27
Hexástilo W/29,5 W/42

Calcule os detalhes da coluna Diâmetro na base, D =2M


Altura, h = 14 M
Altura do capitel =M
Largura do capitel = 13 M/6
Diâmetro no topo = 5 D/6, para h<15 pés
5,5 D/6,5, para h= 15–20 pés
6 D/7, para h= 20–30 pés, etc.

Calcule os detalhes do Altura da arquitrave =M


entablamento Altura da tênia = M/7
Altura das gotas = M/6
Métopas = 1,5 M de altura x 1,5 M de largura
Tríglifos = 1,5 M de altura x 1 M de largura
Coroamento (cornija) = M/2 de altura, 2M/3 de projeção

Calcule as demais dimensões Comprimento do templo = 2 W (W é sua largura)


do templo Largura da cela = W/2
Comprimento da cela = 5 W/8

14 15

quados aos vários locais do Império Romano, conforme Vitrúvio devota um capítulo inteiro à orientação das
a temperatura, o regime de chuvas, a umidade, os ven- ruas em relação aos ventos – quatro, de acordo com al-
tos dominantes e a latitude. Ele também dá recomenda- guns, mas oito, conforme “investigadores mais cuida-
ções, em seu modo racional típico, sobre a implantação dosos”16 – e dá instruções detalhadas de como identi-
de cidades em relação ao mar, aos rios, a pântanos que ficar as direções destes ventos com precisão, usando
emitem vapores insalubres etc. Os templos deveriam a sombra de um ponteiro (como em um relógio de sol).
estar voltados para o oeste, de modo que aqueles que Em uma cidade na ilha de Lesbos, por exemplo, as pes-
se aproximassem do altar com oferendas ou sacrifícios soas aparentemente adoeciam quando o vento sopra-
estivessem voltados para o nascer do sol. Caso isso não va do sul, começavam a tossir quando vinha do noroes-
fosse possível, a orientação deveria garantir que o deus te, e, embora se recuperassem quando o vento vinha
abrigado no santuário tivesse a melhor visibilidade pos- do nor te, não conseguiam ficar nas ruas, devido ao frio
sível da cidade, e vice-versa. Os templos junto a rios ou intenso. Um conselho mais geral era que todos os ven-
estradas deveriam estar voltados para estes, possibili- tos traziam doenças, assim as casas deveriam ter a
tando aos transeuntes verem os deuses em seus santu- melhor vedação possível, para que os ventos fossem
ários e fazerem suas preces cara a cara. barrados.

14 Elementos das ordens dórica e jônica. 15 Fluxograma indicando os procedimentos para o projeto de um templo no estilo
dórico, c. 600–400 a.C., a partir de uma descrição dada por Vitrúvio, c. 25 a.C.
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 33
De igual importância à saúde pública era o fornecimen- Quanto à escolha da localização de um novo teatro,
to de água potável; Vitrúvio devota todo um livro para o Vitrúvio diz ao leitor que a acústica do sítio deve ser le-
assunto. Ele considera que as águas pluviais são prefe- vada em consideração. O terreno não deve provocar
ríveis às do subsolo porque, de acordo com ele, elas ecos ou provocar for te reflexão do som que possa in-
foram produzidas pelo calor – a evaporação da água que ter ferir com o som que chega ao ouvinte diretamente,
formou as nuvens. Muitas casas coletavam água da prejudicando a inteligibilidade. Vitrúvio então discute o
chuva e a armazenavam para uso doméstico. Vitrúvio som no auditório – em par ticular, a necessidade de que
fala da pureza variável da água de poços artesianos e da os sons de diferentes freqüências cheguem do palco
água das fontes, recomendando que, em geral, quanto aos ouvidos de cada espectador de forma direta, da
mais clara e menos aromática a água, mais salubre ela mesma forma que as ondas provocadas por um casca-
é; a fervura da água melhora sua qualidade. Ele também lho atirado na água. Isso leva à conclusão lógica da ne-
discute os vários sais que as águas das fontes podem cessidade de assentos escalonados e plantas baixas
conter, muitos deles medicinais. Algumas nascentes, no semicirculares. Ele adver te sobre super fícies ver ticais
entanto, deveriam ser usadas com cuidado. Em uma an- refletivas que evitarão que o som chegue às arquiban-
tiga fonte, a água era excelente para banhos, mas, se in- cadas superiores, afetando especialmente a inteligibili-
gerida, fazia com que as pessoas perdessem seus den- dade das terminações das palavras, o que, em latim e
tes no mesmo dia. Quanto ao delicado assunto de ba- grego, é vital para sua compreensão. Estas ondas re-
nheiros e do destino das águas fecais, Vitrúvio silencia verberadas podem, segundo ele, também inter ferir
– o que é estranho, especialmente devido ao fato de que com as ondas diretas e distorcer os sons que chegam
ele trabalhou por algum tempo como engenheiro de aos ouvintes. Estas explanações são incrivelmente se-
águas em Roma. melhantes às dos princípios básicos de acústica de
hoje.
Vitrúvio, acústica e projeto de teatros
Se, por um lado, a estratégia de saúde pública dos gre- Vitrúvio também discute o uso de ressonadores (atual-
gos era ainda bastante primitiva, não se pode dizer o mente conhecidos como ressonadores de Helmholtz,
mesmo de seus conhecimentos sobre acústica, especi- em homenagem ao físico alemão que explicou seu fun-
almente de teatros. Assim como para outros tipos de cionamento), os quais reforçam cer tas freqüências da
edificação, Vitrúvio dá conselhos sobre a localização – voz humana e aumentam sua inteligibilidade. Estes re-
eles devem estar afastados de “bairros pantanosos e de cipientes com uma extremidade aber ta eram feitos de
outras áreas insalubres”17, uma boa idéia para teatros bronze e afinados para seis notas da escala cromática.
ao ar livre – e sua orientação. Ele também trata de ques- Dois grupos de seis ressonadores eram assentados
tões geométricas importantes, como plantas baixas, se- sob uma fileira de assentos de modo simétrico em re-
ções, linhas de visão, número e localização de entradas lação à linha central do teatro. Para um teatro especi-
e saídas, e seus aspectos construtivos em geral. Uma almente grande, duas fileiras adicionais de ressonado-
boa circulação do ar é necessária para que a audiência res deveriam ser instaladas em arquibancadas mais
não fique desconfortável. altas, cada uma alguns semitons mais baixos – totali-
zando 36 diferentes notas. Vitrúvio admite que ele não
No final, Vitrúvio aprofunda-se longamente em detalhes conhece teatros em Roma com ressonadores. Isso por-
teóricos sobre a acústica. Isso não era obra sua. Ele es- que os “muitos teatros construídos em Roma a cada
tava em grande parte apenas repetindo o que deve ter ano contêm grande quantidade de madeira, a qual não
encontrado em vários tratados gregos sobre acústica, os acarreta os mesmos problemas de reverberação que a
quais provavelmente remontam à época de Pitágoras, o pedra”.19 Além disso, ele diz, os próprios painéis de
primeiro a desenvolver o assunto, por volta de 530 a.C. madeira podem funcionar de madeira similar a um res-
Vitrúvio discute a acústica sob diversos pontos de vista. sonador, melhorando a inteligibilidade do som. Quanto
Ele introduz a harmônica – “um ramo obscuro e difícil da à efetividade dos ressonadores, não se provou que
ciência da música, especialmente para aqueles que não eles aprimorem a inteligibilidade, e é provavelmente
conhecem o idioma grego”18 – e reconhece os escritos por isso que eles não eram usados em Roma. Não sa-
do filósofo e teórico da música Aristoxeno, do século IV bemos se os teatros romanos eram tão bons quanto os
a.C. A harmônica explica a altura das notas e os interva- gregos, mas não resta dúvida que ambos eram projeta- 16
los entre elas na escala musical grega, bem como por dos de acordo com profundos conhecimentos de acús-
que algumas combinações entre notas são harmoniosas tica e perícia para alcançar resultados comprovada-
e outras, desarmoniosas. mente superiores.
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 34

Uma última recomendação feita por Vitrúvio sobre acús- O arco e sua sucessão, a abóbada de berço, permitiram
tica era para o edifício do Senado. Segundo ele, a altura que pedras ou tijolos relativamente pequenos e fáceis
do prédio deveria corresponder à metade de sua largura, de manusear formassem estruturas capazes de vencer
e as coronae, ou cornijas, deveriam ser feitas de madei- grandes vãos – tanto para pontes como para aquedutos,
ra ou estuque e fixadas na meia altura das faces inter- e, posteriormente, para coberturas e em estruturas de
nas das paredes ao redor de toda a sala. Sem estas, ele uso universal em edificações. Este era um contraste
diz, as vozes das pessoas envolvidas nos discursos se imenso em relação às gigantescas pedras necessárias à
perderiam com o pé-direito alto. As cornijas permitem construção de um templo grego. As economias de tempo
que o som das vozes seja “contido antes de subir”, e e dinheiro devem ter sido enormes. Como trabalham por
assim seja mais inteligível aos ouvidos.20 compressão, os arcos podem ser feitos de pedra de pra-
ticamente qualquer qualidade, ao contrário das vigas
O legado da engenharia romana das construções arquitravadas, que exigiam material da
Talvez o aspecto mais notável sobre a engenharia da edi- mais alta qualidade. Pedras adequadas a arcos podiam
ficação e os métodos construtivos usados no período ser encontradas em praticamente qualquer lugar, não
grego e no início do período romano seja o fato de que precisando ser transportadas de pedreiras específicas;
eles foram basicamente os mesmos usados nos dois elas podiam ser carregadas com facilidade em peque-
mil anos que se seguiram. Isso não significa denegrir as nas carroças, e, sempre que não havia pedras disponí-
gerações posteriores a eles, mas sim reconhecer o pro- veis, podiam ser substituídas por tijolos de barro. Para
gresso incrível que já havia sido feito por volta de 100 uso em edificações, onde um acabamento superficial de
a.C. Há muitas coisas impressionantes nas técnicas de alta qualidade era muitas vezes necessário, pedras ou ti-
construção daquela época, mas entre as mais surpreen- jolos de qualidade baixa ou irregular podiam ser revesti-
dentes para os dias de hoje podemos listar: dos com estuque ou argamassa e pintados. Os romanos
• a precisão dos métodos de medição e topografia também descobriram os benefícios econômicos do uso
• a produção de materiais de construção artificiais (tijolo, da argamassa em suas alvenarias: ela significava que
concreto e ferro) em enormes quantidades apenas a superfície visível de uma estrutura de pedra ou
• a descoberta do cimento hidráulico (veja o Apêndice D) tijolo precisava ter alta qualidade de acabamento. As de-
• o uso do arco e da abóbada de berço mais faces podiam ter acabamento mais rústico, pois
• o uso de armações estruturais de madeira em pontes e qualquer irregularidade seria coberta com argamassa.
cimbres em arcos, abóbadas e cúpulas Levando esta idéia ao extremo, os romanos desenvolve-
• o uso de procedimentos de projeto e plantas baixas, ele- ram a técnica de se colocar tijolos ou pedras na face in-
vações e perspectivas como parte corriqueira do traba- terna de uma fôrma de madeira e encher o vazio com
lho de um projetista de edificações concreto. Quando a forma era removida, o efeito era de
• a capacidade de manuseio de pedras de peso e ta- uma parede de concreto revestida com tijolos ou pedra.
manho gigantesco, bem como de erguê-las a gran- Diferentes tipos de aparelhos recebiam nomes distintos.
des alturas Opus reticulatum, por exemplo, era feito usando-se tijo-
• a capacidade de logística necessária para arranjar los ou pedras na forma de uma pirâmide de base qua-
enormes suprimentos de materiais de construção drada, assentados em padrão diamante sobre a face
• o treinamento e a organização de grandes números de aparente da parede. Quando se usava tijolo ou pedra de
trabalhadores. qualidade inferior, a superfície podia ficar quase perfeita,
revestindo-se com uma camada de estuque ou reboco.
Os engenheiros romanos haviam aprendido e desenvol-
vido estas habilidades principalmente através da cons- Arcos e abóbadas de pedra reduziram substancialmente
trução de estradas e pontes para fins tanto militares o tempo e o custo de construção em comparação à exe-
como comerciais, construindo fortificações e criando cução de alvenarias tradicionais. O uso generalizado do
meios de fornecimento de água para a demanda das ci- concreto provavelmente levou a reduções ainda maio-
dades em crescimento. Suas conquistas nestas áreas res. (Para detalhes sobre o concreto e seu preparo, veja
foram aceleradas, e o custo de tais obras foi reduzido o Apêndice 3.) As matérias-primas estavam disponíveis
através da exploração de dois avanços tecnológicos em por todo o império e podiam ser transportadas soltas ou
particular: o arco e o uso do concreto. Os romanos não em recipientes de qualquer tamanho; água haveria no
inventaram nenhuma destas tecnologias – ambas re- canteiro-de-obra ou próximo a ele. A cal virgem, usada
montam ao início da civilização – mas, sem dúvida, nin- para se fazer a argamassa de cal, precisava ser trans-
guém as explorou de modo tão efetivo. portada do forno de cal mais próximo, mas os agregados
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16

16 Teatro romano, Triers, Alemanha, c. 200 d.C. Reconstrução. 17 (Página seguinte) Aquedutos romanos. Pintura de Zeno
Diemer, 1914. O Aqua Marcia foi terminado em c. 145 a.C. (observe os reparos sendo executados à direita); Aquae Tepula
e Julia foram acrescentados em 127 a.C. e 33 a.C. Aqua Anio Novus, construído sobre o Aqua Claudia (à esquerda), foi ter-
minado em 52 d.C.
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 38

miúdos e arenosos estavam disponíveis em praticamen- partir do século II a.C. Cada arco e abóbada que os ro-
te qualquer lugar, e agregados graúdos também podiam manos fizeram deve ter exigido uma estrutura de madei-
ser encontrados em pedreiras locais ou feitos moendo- ra substancial para sustentar o peso considerável das
se rochas ou pedras de qualquer qualidade. O concreto pedras, dos tijolos ou do concreto até que o vão fosse
podia assumir todas as formas com o uso de fôrmas de fechado. Detalhes sobre esses cimbres provavelmente
madeira, e era ideal para preparo e lançamento por gran- continuarão sujeitos à especulação, uma vez que eram
des quantidades de trabalhadores ou tropas relativa- temporários. Acredita-se que alguns venciam vãos de
mente desqualificadas. As fôrmas de madeira muitas mais de 20 metros. Sabemos, no entanto, que a ponte
vezes eram o material mais escasso, mas, com certo de madeira construída sobre o Rio Danúbio pelo enge-
cuidado, podiam ser usadas muitas vezes. nheiro Apolodoro a mando do Imperador Trajano (que go-
vernou de 98 a 117 d.C.), tinha 21 vãos, cada um com
Os romanos têm o grande crédito, é claro, de terem des- 35 a 40 metros. Baseando-nos apenas nesta evidência,
coberto e explorado o uso do cimento hidráulico, que é razoável supor que, já no século II a.C., os engenhei- 18
completa o processo químico da cura na presença de ros romanos tinham habilidades em carpintaria que po-
água em excesso – em outras palavras, ele endurece diam, no mínimo, rivalizar com aquelas dos construtores
imerso em água. Embora a pulvis Puteolanus (atual pozo- das catedrais medievais. Uma treliça de cobertura em
lana), seu ingrediente crucial, fosse encontrada em mui- madeira para um vão de 20 m estaria, portanto, dentro 19
tos locais na base do Monte Vesúvio, foi a cidade de de suas capacidades, embora nenhuma evidência direta
Puteoli (atual Pozzuoli) que lhe deu o nome. Na verdade, tenha chegado aos nossos dias.
os romanos não foram os primeiros a descobrir que a
adição de certos minerais à argamassa de cal lhe confe- Nesta época, ferro e bronze também eram abundantes,
riria tal propriedade. Entre outros materiais que produ- embora seu uso em edificações fosse limitado. O ferro era
zem o mesmo efeito, está o que Vitrúvio chama de pedra usado em grampos para locação de estruturas de alvena-
carbuncular, produzida com o aquecimento de certas pe- ria e às vezes era inserido no concreto, embora não o re-
dras. Sejam lá quais forem suas origens, o cimento hi- forçasse da forma como o empregamos atualmente. O
dráulico revolucionou o uso do concreto a partir do ano bronze era ocasionalmente usado para outros fins além
150 a.C., possibilitando a construção de estruturas da decoração. Três colunas de bronze com cerca de 7 me-
como aquedutos impermeáveis, portos marítimos e fun- tros de altura, além do capitel de uma quarta, originárias
dações de concreto em terrenos alagadiços. do período romano, estão na Basílica de San Giovanni in
Laterano (São João em Laterano), em Roma. A igreja data
A primeira ponte com arcos de alvenaria de Roma, a do início do século IV, mas foi profundamente alterada na 20
Pons Aemilius, foi construída entre 179–142 a.C; duas Idade Média e no Renascimento. Uma lenda conta que o
outras foram erigidas por volta de 62 e 46 a.C. No en- bronze usado foi retirado das proas dos navios de Marco
tanto, as estruturas mais impressionantes foram fei- Antônio (c. 82–30) capturados no Egito.
tas para se fornecer água a Roma: os aquedutos. Um
17 destes, fazendo parte do Aqua Claudia, completado Vitrúvio atuou como engenheiro nas últimas décadas
por Cláudio (que governou de 41 a 54 d.C.), carregava antes de Augusto transformar Roma com a construção
água à cidade através de uma estrutura de arcos com civil. Como introdução à esta era impressionante, vale a
13 km de comprimento, e grande parte dele ainda está pena examinar a única edificação que temos certeza que
de pé. O aqueduto romano de Segóvia, na Espanha, foi projetada e construída por Vitrúvio, a nova basílica
completado em 109 d.C., permaneceu em uso até o em Fano, no sudeste da Itália, logo a sul de Rimini. 21, 23
século XX. Embora já não exista, ela representou o clímax de 500
ou 600 anos de desenvolvimento contínuo de técnicas
O uso da madeira para construção em Roma represen- de construção e engenharia em toda a Itália, Grécia e
tou um indiscutível avanço em relação à Grécia antiga. mais além, e era um exemplo típico de muitos prédios
Não sabemos quando foi desenvolvido o uso de arma- civis da Itália pré-imperial. Ela consistia de um pátio in-
ções estruturais com sambladuras de encaixe. Tais terno fechado em três lados por uma edificação de dois
construções provavelmente foram empregadas em tor- pavimentos, a qual tinha um grande salão com pé-direi-
res de cerco e estruturas temporárias – por exemplo, to duplo e uma colunata fechando o quarto lado. O pátio
para suporte e acesso durante a construção de grandes interno era coberto por um telhado em vertente sobre
embarcações. A evidência mais direta que temos do uso um vão de 18,5 metros por 35 metros. O telhado era
de construções com estrutura de madeira são os muitos sustentado por vigas de madeira quadradas, com cerca
arcos de alvenaria que estavam sendo construídos a de 60 cm de largura, as quais, por sua vez, eram apoia-
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18

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18 Ponte de Trajano, sobre o Danúbio, na atual Romênia, c. 100 d.C. Projetista: Apolodoro de Damasco. Mostrado no relevo
da Coluna de Trajano, Roma, 113 d.C. 19 Relevo mostrando estrutura de telhado em madeira e sistemas de sustentação
temporários em Roma.
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 40

das em colunas de pedra de 15m de altura e 1,5 metro de 30 X 50 metros em planta, embora sejam conhecidos
de diâmetro. exemplos muito maiores ou muito menores. As plantas
baixas dos diferentes pavimentos eram bastante simila-
Embora não seja impressionante na história da constru- res, e o prédio tinha um único telhado. Costumavam ter
ção, é exatamente isso que torna a basílica de Vitrúvio quatro ou cinco pavimentos, mas alguns provavelmente
digna de nota. Aqui temos uma edificação comum execu- eram bem mais altos, pois Augusto impôs um limite de
tada em uma pequena cidade na costa do Mar Adriático altura de 70 pés romanos – sete ou talvez oito andares.
que, apesar de tudo, exigiu conhecimentos considerá- Tais edificações já eram construídas no século III a.C. ou
veis: as maiores vigas tinham cerca de 20 metros de antes – temos evidências escritas de que certa vez uma
comprimento e provavelmente pesavam entre 4 e 5 to- vaca subiu sozinha até o terceiro pavimento de uma in-
neladas; já os tambores das colunas principais devem sula romana. Elas também não eram construídas apenas
ter pesado quase 20 toneladas cada um. Erguer e ma- na Itália; quando os romanos saquearam Cartago em
nobrar objetos tão pesados, colocando-os em suas posi- 146 a.C., encontraram edifícios de seis pavimentos. Um
ções corretas sem usar energia elétrica ou a vapor, não grupo de apartamentos, ou cenaculae, era acessado por
era pouca coisa e seria um grande desafio para enge- uma escada comum que levava até a rua. As insulae
nheiros de até mesmo hoje em dia, mas, ainda assim, também tinham abastecimento de água para consumo,
tal habilidade era certamente comum no início do banho e esgotamento das latrinas, que eram conectadas
22 Império Romano. Esta edificação e inúmeras outras tes- ao sistema público de esgoto. Esta água, no entanto, era
temunham a capacidade dos romanos de reunir técnicas disponibilizada apenas no pavimento térreo, pois a tubu-
bastante modestas para produzir estruturas e prédios de lação de chumbo que distribuía a água dos aquedutos
grande variedade e qualidade, sem deixar de racionalizar não conseguia sustentar a pressão de água necessária
o uso dos recursos. De modo familiar a nós, Vitrúvio ob- para fornecer água aos demais pavimentos. A partir do
servou, no que se chamaria hoje de “Engenharia de século I a.C., as insulae geralmente tinham cozinhas,
Valor” (Value Engineering), que ele evitou em Fano várias embora alimentos cozidos fossem rapidamente forneci-
tarefas de construção complicadas ao omitir um entabla- dos nos muitos restaurantes e nas tabernae, o equiva-
mento ornamental, além de uma segunda colunata so- lente romano de nossos restaurantes de fast-food. No
breposta e uma faixa de painéis internos, e, assim, con- século I d.C., muitas insulae – várias de Pompéia e
seguiu reduzir o custo geral do prédio. Herculano e uma de Óstia, o porto no Mediterrâneo que
servia Roma – tinham latrinas no segundo pavimento, as
Ainda que a basílica de Vitrúvio não mais exista, há mui- quais eram conectadas diretamente ao esgoto público.
tos vestígios contemporâneos que confirmam que as ci-
dades romanas do período eram extremamente sofisti- Na verdade, as insulae viraram a casa privada romana
cadas – especialmente o porto de Óstia, perto de Roma, ao avesso. Ao contrário da casa vitruviana clássica, ou
e as cidades de Herculano e Pompéia, que foram mumi- domus, que se voltava para um pátio interno, o átrio, a
25 ficadas no ano 79 d.C. com a erupção do Monte Vesúvio. fachada de uma insula era aberta e pública, e os habi-
Uma cidade da província de Roma era um lugar belo e or- tantes olhavam para a cidade. Dentro de algumas insu-
gulhoso. Muitas das avenidas eram pavimentadas, e lae, o pátio interno fornecia luz às janelas dos recintos
havia fornecimento público de água e algum esgoto. que não abriam para a fachada da rua. Os apartamentos
Além de uma variedade de habitações privadas, cada ci- mais disputados eram nos pavimentos térreo e segun-
dade provavelmente tinha uma dúzia de edificações pú- do, não apenas por que deles se podia ver melhor a rua,
blicas mais importantes, incluindo muitos templos, uma mas por que eram mais fáceis de evacuar em caso de
basílica, o fórum, o mercado público, diversos banhos incêndio.
públicos e teatros, e um anfiteatro, tudo protegido por
uma muralha. Não obstante, as novas fachadas voltadas para a rua ti-
nham seus problemas, especialmente o barulho, ainda
Os edifícios de apartamentos romanos: as insulae que no século II as janelas com vidros já tivessem subs-
Nas maiores cidades da Itália, os romanos erigiam edifí- tituído a maior parte daquelas que tinham apenas corti-
cios de apartamentos chamados de insulae (ilhas). Cada nas ou postigos de madeira. No Livro 12 de sua coleção
um destes prédios ocupava toda uma quadra definida de epigramas, o satirista Marcial (c. 40 – c. 104 d.C.) diz
por uma retícula urbana ortogonal, tinha lojas varejistas a seus leitores que é o ruído da cidade que tantas vezes
24, 26 no pavimento térreo, e as fachadas, muitas vezes com lhe leva para sua villa relativamente modesta no campo.
sacadas, eram voltadas para a rua, de modo bastante Em seu apartamento no quarto pavimento de uma insu-
parecido com os prédios de hoje. Em geral, teriam cerca la do Monte Quirino, em Roma, ele era constantemente
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21 ESCALA EM PÉS GREGOS

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20 Basílica de San Giovanni in Laterano, Roma, inaugurada pela primeira vez em 324 no terreno de um palácio romano.
Redesenhada por Francesco Borromini, 1646–50. Três das colunas de bronze datam de c. 100 d.C. 21 Basílica, Fano, Itália,
c. 30 a.C. Planta baixa. 22 Relevo do sarcófago do túmulo da família Haterii, Roma, c. 100 d.C., mostrando um guindaste ro-
mano tracionado por cinco homens em uma roda de degraus. 23 Basílica de Fano. Arquiteto e engenheiro: Vitrúvio. Interior.
42
B U I LD I NG AN D E NG I N E E R I NG I N ANCI E NT TI M E S

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25 26

24 Casa de Diana, um típico edifício de apartamentos romano, chamado de insula, Ostia, Itália, século I a.C. Maquete (re-
construção). 25 Construção romana com estrutura de madeira, Pompéia, Itália, século I a.C. 26 Pintura mural mostrando
trabalhadores em ação, túmulo de Trebius Justus, Roma, início do século IV d.C.
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 43
perturbado. Antes do raiar do sol, era despertado pelo ta, para que as primeiras unidades estivessem prontas o
barulho dos padeiros, e com a manhã vinha o ruído dos mais rápido possível e pudessem gerar renda para que
professores escolares. O dia inteiro havia o martelar se pagasse o empréstimo provavelmente tomado para o
constante dos trabalhadores em cobre e batedores de financiamento do projeto. Como ocorre com todas as
ouro, além das moedas tilintantes dos cambistas. Havia construções governadas por pressões comerciais, o de-
os gritos dos mendigos e comerciantes, os cantos e as sejo de se construir rapidamente levava à qualidade infe-
danças dos adoradores envolvidos nos ritos religiosos. rior e a construções frágeis. Mesmo que muitas insulae
Com a noite, vinham os ruídos das panelas e dos mari- fossem construídas com concreto de boa qualidade e ti-
nheiros bêbados. Além disso, havia o barulho incessan- jolos cozidos, isso nem sempre acontecia. Ao passo que
te de carroças, os gritos dos carroceiros e os guinchos os prédios com mais de dois pavimentos tinham que ser
de eixos mal engraxados, não apenas durante o dia, de tijolos cozidos ou concreto revestido com tijolos, era
mas também durante toda a noite. O congestionamento prática comum entre empreiteiros usar grandes quantida-
do tráfego já era um problema tão sério nas ruas estrei- des de caliça nas paredes e, conseqüentemente, menos
tas de Roma que há mais de um século Júlio César havia concreto. Embora tais paredes fossem propensas à fissu-
decretado que a maior parte dos veículos com rodas só ração, colapsos não eram comuns. Foi provavelmente na
podia circular a noite. construção destas insulae para o setor privado que os be-
nefícios comerciais do uso do concreto foram mais pron-
Os incêndios eram uma ameaça constante às edifica- tamente reconhecidos – paredes de concreto com fino
ções, apesar do fato de que as paredes eram feitas com paramento de tijolo poderiam ser levantadas em muito
materiais não-combustíveis – tijolos de barro não-cozidos, menos tempo do que aquelas com pedra de cantaria ou
nos prédios baixos, e tijolos cozidos e concreto, nos mais tijolos cozidos de alta qualidade.
altos. Muitas pequenas edificações tinham uma armação
estrutural de madeira preenchida com alvenaria e vigas e Pelo menos um investidor imobiliário desenvolveu um mé-
tábuas de piso de madeira, e a maior parte delas apre- todo criativo, senão cruel, de fazer fortuna explorando a
sentava estruturas de cobertura de madeira sustentando vulnerabilidade de muitos edifícios a incêndios, em uma
telhas de barro. A situação era agravada pelo uso persis- época em que Roma não tinha corpos de bombeiros or-
tente de pau-a-pique nas paredes externas e internas – ganizados. O general e político Marco Licínio Crasso
um tipo de construção que Vitrúvio queria que jamais ti- (Marcus Licinius Crassus) (c. 115–53 a.C.) era proprietá-
vesse sido inventado – e, é claro, pelas ruas estreitas de rio de um grupo de escravos treinados como bombeiros.
Roma. Vitrúvio recomendava o uso de lariço, especial- Quando um prédio pegava fogo, ele corria para o lugar e
mente para as tábuas usadas nos beirais das insulae, tentava comprá-lo do proprietário desesperado, muitas
para evitar que o fogo passasse para os prédios adjacen- vezes negociando um bom preço durante o pânico.
tes, pois, segundo ele, esta madeira não pegava fogo Imediatamente após a compra do imóvel, os bombeiros
com as chamas que saltavam ou com as cinzas levadas de Crasso entravam em ação. Geralmente o prédio era
pelo vento. Após o enorme incêndio que envolveu grande salvo, e, após os reparos e as reformas necessários, ele
parte de Roma, no ano 64 d.C., o imperador Nero (37–68 era alugado ou vendido com lucro. Essa técnica se mos-
d.C.) exigiu que as ruas fossem mais largas e que a altu- trou muito bem-sucedida, pois Crasso se tornou o inves-
ra das insulae fosse limitada a 60 pés romanos ou a seis tidor imobiliário mais abastado e mais poderoso de sua
pavimentos, para garantir evacuação mais rápida em época. Apesar desses vários perigos, por volta do ano
caso de incêndio, e que os estabelecimentos comerciais 300 d.C. a maior parte da população de Roma vivia em
que fizessem uso do fogo, como padarias e ferrarias, fos- insulae – havia mais de 45.000 delas, enquanto havia
sem separados de edificações residenciais adjacentes menos de 2.000 residências unifamiliares.
por paredes duplas com cavidade de ar. Ele exigiu que
fossem usadas construções à prova de fogo e que fos- Calefação e climatização em Roma
sem construídas sacadas, permitindo evacuação mais rá- Os engenheiros e empreiteiros de obras romanos eram
pida em caso de incêndio. Ele também investiu em me- plenamente capazes de resolver a maioria das questões
lhorias no sistema urbano de fornecimento de água, de que hoje chamamos de “habitabilidade” – o conforto
modo que houvesse acesso facilitado à água necessária acústico, lumínico e térmico dos ambientes internos.
para combater incêndios. Tanto edificações comuns como os grandes prédios fazi-
am uso inteligente da luz natural e do sombreamento e
As insulae geralmente eram de propriedade privada. Um eram adequadamente ventilados. A água da chuva era
empreendedor inicialmente buscava permissão para geralmente coletada dos telhados, descendo até o átrio
construir, e então a execução era provavelmente imedia- central aberto, onde também ficava a fogueira necessá-
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 44

ria ao cozimento de alimentos; foi o escurecimento das Vitrúvio defende a prática grega de fechar as fachadas
paredes e da cobertura causado pelas cinzas do fogo norte das casas (hemisfério norte) e abrir as fachadas
que originariamente deu ao átrio seu nome, pois a pala- sul para o calor do sol. Ele aconselha àqueles que estão
vra latina para preto é ater. construindo casas em climas mais temperados voltar
suas salas de jantar para o sol poente, de modo que
Na época de Vitrúvio, já era comum que as casas maio- possam gozar de seus benefícios durante o jantar. A par-
res tivessem calefação central nas localidades onde o tir do século I d.C., os construtores romanos começaram
inverno era rigoroso, tanto na Itália como além, à medi- a instalar vidros ou finas lâminas de mica ou selenita
da que os romanos se deslocaram para o norte, coloni- nas janelas das casas mais luxuosas; o estadista e filó-
zando a Europa. O hipocausto romano climatizava as edi- sofo Sêneca (3 a.C.–65 d.C.) menciona em uma carta
27 ficações através do ar que era aquecido e circulado por escrita perto do fim de sua vida que as janelas translú-
um pleno sob os pisos de pedra, no pavimento térreo, e cidas haviam sido inventadas no tempo em que ele vivia.
então levado para o alto através de muitos dutos feitos Os panos transparentes não somente admitiam a luz,
de argila e embutidos nas paredes. Em algumas edifica- mas também permitiam o efeito estufa, pois deixavam
ções com dois pavimentos, o ar quente era insuflado que a radiação luminosa (de alta freqüência) entrasse no
ainda mais para cima através de dutos no segundo pavi- recinto, mas evitavam que a radiação térmica (de baixa
mento e de saídas de ar no nível do telhado, para que freqüência) escapasse pelas janelas – os mesmos prin-
fosse gerada a diferença de pressão necessária para cir- cípios usados hoje em dia. Plínio, o Jovem (c. 61–113),
cular o ar através dos dutos. Considera-se que o hipo- se refere a um de seus cômodos favoritos como um he-
causto foi inventado e amplamente comercializado por liocaminus – um forno solar. Os banhos da Vila de
volta do ano 80 a.C. pelo empresário Sérgio Orata Adriano, em Tivoli (construídos entre 120 e 125), tinham
(Sergius Orata), que usava o sistema para aquecer a uma dessas salas, e havia outra, que incluía piso radi-
água de seus criadouros de peixes. Orata aparentemen- ante, nos banhos públicos construídos por volta de 150
te enriqueceu instalando sistemas de calefação com for- em Ostia. Todos esses ambientes tinham janelas com vi-
nalha em banhos públicos e em casas privadas. Embora dros ou mica. Os jardineiros romanos dessa época usa-
o uso dos hipocaustos em banhos públicos (thermae) vam o mesmo princípio para proteger suas plantas exó-
tenha se popularizado rapidamente, foi apenas a partir ticas com estruturas térmicas envidraçadas durante o in-
do século III d.C. que eles foram instalados nas casas verno, e os romanos abastados cultivavam plantas exó-
dos ricos, especialmente nas regiões mais frias ao norte ticas em pequenas estufas; o satirista Marcial reclamou
do império. que os recintos de seu apartamento em uma insula
eram tão frios que ele se sentiria melhor se fosse trata-
No entanto, o hipocausto exigia combustível, e o único do como uma das plantas de seus mecenas.
combustível disponível na Itália era a madeira. Um hipo-
causto grande podia consumir 120 kg de madeira por Os “Grands Projets” da Roma imperial
hora, ou uma tonelada por dia. O historiador romano Tito A formação do Império Romano em 27 a.C. assinalou o iní-
Lívio (Titus Livius, 59 a.C.–17 d.C.) comentou que, por cio do período mais extraordinário da engenharia e da
volta de 350 a.C., as colinas perto de Roma tinham flo- construção de edificações romanas. Seu sucesso era de-
restas quase tão densas como as da Alemanha. Na vido ao próprio sistema político: autoridade absoluta com-
época de Vitrúvio, a maior parte da Itália já estava des- binada com a necessidade de se disfarçar, de certo modo,
matada, e, embora se plantassem algumas árvores para também de se justificar como uma conseqüência das as-
carvão, madeira para todos os fins já era importada de pirações populares. As muitas gerações de ditadores e lí-
localidades a centenas de quilômetros de distância. deres romanos, mas especialmente os imperadores a par-
Mais ou menos na mesma época, o geógrafo Estrabo (c. tir de Otávio Augusto, se sentiam praticamente obrigadas
63 a.C.–21 d.C.) relatou que os moradores da ilha de a investir assombrosas quantidades de dinheiro em obras
Elba haviam fechado suas minas de ferro por falta de públicas – edifícios administrativos, templos, infra-estrutu-
combustível, e o naturalista Plínio, o Velho, atribuía o de- ra urbana, lugares de lazer e entretenimento, e, é claro,
clínio da produção de metal da região da Campânia, no monumentos que comemorassem a grandeza do império.
sul da Itália, à mesma causa. Não seria a primeira nem a última vez que o setor da cons-
trução seria crucial à realização de ambições políticas. A
A escassez e o alto custo do combustível forçou os ro- arrancada da construção civil era, em grande parte, con-
manos, assim como está nos forçando atualmente, a seqüência direta da Pax Romana, o nome dado aos dois
buscar meios mais efetivos de usar a energia solar. séculos de relativa paz na Europa que iniciaram com a as-
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 45
27

censão de Otávio Augusto ao poder. A construção de pré- era simplesmente colossal. Exceto por algumas exce-
dios cívicos e de infra-estrutura urbana era a melhor forma ções notáveis, mas extremamente raras, nunca mais na
de se manter as habilidades dos engenheiros militares en- história da humanidade se construiu em tal escala com
quanto não eram solicitados para a construção de fortifi- o uso da madeira e alvenaria ou concreto. Foi apenas
cações ou equipamentos de sítio. com o uso do ferro e do aço em meados do século XIX
que muitas das conquistas romanas foram superadas.
As aspirações dos imperadores romanos puderam ser al-
cançadas somente graças ao desenvolvimento extraordi- O progresso na engenharia, assim como na matemática
nário da engenharia que havia ocorrido durante os sécu- e nas ciências, é cumulativo. No entanto, tal progresso
los anteriores. Em apenas 200 ou 300 anos, os gregos se desenvolve de diferentes modos, conforme a nature-
haviam aprendido a construir edificações colossais za de cada disciplina. A matemática e a ciência são ca-
como o Partenon. Por volta de 50 a.C., já era rotina para racterizadas por serem conhecimentos do tipo que
os romanos erigir grandes edificações em um império podem ser escritos e, portanto, ensinados, aprendidos e
que se expandia. Os 250 anos seguintes testemunha- facilmente transmitidos e desenvolvidos de geração para
ram o que deve ter sido o período mais incrível da histó- geração. Desde a época dos primeiros escritos sobre en-
ria da construção e da engenharia de obras – talvez genharia na Grécia antiga, era reconhecido que a enge-
ainda mais impressionante do que o próprio século XX, nharia difere da ciência por consistir de dois tipos de co-
pois foi alcançado sem a ajuda da ciência, que torna tão nhecimento: um lado teórico ou científico que pode ser
fácil modelar nossos prédios e prever seus comporta- escrito, e um lado prático que só pode ser aprendido fa-
mentos, e sem motores movidos a eletricidade, a gasoli- zendo. Os conhecimentos na engenharia apenas podem
na ou a diesel, que nos permitem movimentar e elevar crescer e avançar se houver continuidade em ambos
materiais com tanta facilidade. No século I d.C., o cres- seus lados componentes. No apogeu do Império
cimento acelerado da construção incluía toda uma gama Romano, o ensino de engenharia florescia no principal
de edificações de uso público e privado, além da maior “politécnico” ou escola de engenharia, em Alexandria, e
parte da infra-estrutura de engenharia civil que conhece- nas muitas escolas locais nas quais eram treinados os
mos hoje. A escala de tais edificações e de outras obras milhares de engenheiros militares necessários aos exér-

27 Corte perspectivado de um hipocausto romano típico, mostrando a estrutura sob o piso e a fornalha, os dutos nas pare-
des e a exaustão no nível da cobertura.
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 46

citos romanos. Lá se ensinavam a geometria e a mecâ- que um grupo de arquibancadas em torno de uma arena.
nica desenvolvidas pelos grandes matemáticos, cientis- O primeiro anfiteatro permanente de Roma foi construí-
tas e engenheiros da Grécia antiga. A geometria permitia do durante o governo de Augusto, mas foi provavelmen-
aos engenheiros visualizar e comunicar formas bi e tridi- te destruído pelo incêndio de 64 d.C.
mensionais, e lhes fornecia os meios para definir o de-
senho tanto de um pequeno componente como de uma No ano de 72 d.C., o clima político mais uma vez era pro-
grande edificação, de modo que se pudesse instruir os pício para a construção de uma grande obra pública, e o
artesãos ou empreiteiros. Era lecionado o funcionamen- novo imperador, Vespasiano (que governou de 69 a 79
to mecânico dos quatro meios fundamentais para se d.C.), o primeiro soberano da dinastia flaviana, aprovei-
obter vantagem mecânica, da mesma forma que ainda tou a oportunidade e mandou construir um novo anfitea-
(ou melhor, novamente) eles eram ensinados no século tro destinado a entretenimento gratuito e regular para o
XIX: a alavanca, a cunha, a polia e o parafuso. Na verda- povo. As atrações incluíam lutas entre gladiadores
de, a capacidade de projetar e construir armamentos e (porém, ao contrário da imagem transmitida por
edificações, baseada na compreensão teórica da mecâ- Hollywood, elas raramente resultavam em mortes huma-
nica e da prática dos materiais e esforços, diferia muito nas). A arena também era usada para a apresentação de
pouco entre o período romano e o início do século XVIII. leões, tigres, elefantes e outras feras exóticas que fre-
qüentemente eram postas para lutar entre si até a morte
Quando Augusto assumiu o poder, ele precisava fazer ou eram massacradas em grande número por gladiado-
uma declaração imediata e dramática de suas intenções res. Dizem que em uma ocasião logo após sua inaugura-
grandiosas para os povos de Roma e demais províncias, ção o Coliseu foi alagado para a apresentação de uma
e ele se pôs a reconstruir a capital. Durante seu reinado batalha naval simulada.
de 45 anos ele a transformou, justificando plenamente
o fato de se gabar, quando velho, que encontrara Roma O anfiteatro foi construído no terreno onde, no passado,
construída em tijolo e a deixava construída em mármo- havia um lago artificial ornamental do jardim do palácio do
re. Ainda assim, havia muito que ser feito após a morte ex-imperador Nero. Acredita-se que o nome moderno do
de Augusto, em 14 d.C. Mesmo hoje, o mapa de Roma anfiteatro flaviano – o Coliseu (Colosseum), registrado pela
testemunha os esforços feitos pelos imperadores suces- primeira vez no século XI – é devido a sua proximidade a
sivos para deixarem suas marcas na cidade, assim uma estátua gigantesca, ou “colossal”, que Nero havia
como os presidentes da França fizeram no século XX, encomendado de sua imagem como um Rei Sol, e que foi
com seus “grands projets”, como o Centre Pompidou. erguida na entrada de seu palácio, o Domus Aurea. Com
aproximadamente 35 metros de altura (incluindo sua
É dificílimo selecionar uns poucos projetos que possam base), esta estátua era similar àquela mais famosa que
ilustrar o incrível legado dos imperadores, e se concen- havia junto ao porto de Rodes e que fora construída 300
trar em Roma significa ignorar outros excelentes proje- anos antes. O “Colosso de Nero” consistia de uma arma-
tos de edificações romanas na França, na Espanha, na ção estrutural (provavelmente feita de bronze) sustentan-
Inglaterra e em outros lugares. De qualquer forma, os do uma camada de chapas de bronze ornamentadas.
exemplos incluídos mostram o melhor da engenharia e Quando Vespasiano assumiu o poder, ele reformou a ca-
do projeto de edificações romanos. beça original de modo que já não parecesse Nero, e,
cerca de 50 anos depois, o imperador Adriano mandou
O anfiteatro flaviano, ou Coliseu (c. 72–80) afastá-la – dizem que usando 24 elefantes – colocando-a
O anfiteatro permanente mais antigo que se conhece na algumas dezenas de metros mais perto do anfiteatro,
Itália foi concluído por volta de 80 a.C. em Pompéia, ofe- para dar lugar a um novo templo a Vênus e Roma.
recendo assentos para 20.000 espectadores em uma
edificação que media 133 por 102 metros. O primeiro O anfiteatro flaviano foi o maior já construído e levou
anfiteatro de Roma remonta à época de Júlio César, cerca de 10 anos para sua finalização. Ele foi completa- 28
quando fora construída uma estrutura de madeira tem- do durante o reinado do filho de Vespasiano, Tito (ou
porária e modesta, que provavelmente não era mais do Titus, que governou de 79 a 81) e inaugurado em 80

28 Anfiteatro flaviano, ou Coliseu, c. 72–80. Visto em uma maquete de reconstrução de Roma antiga. 29 Afresco de
Pompéia, mostrando um velarium sombreando alguns dos assentos do anfiteatro, século I d.C. 30 Anfiteatro flaviano, ou
Coliseu. Corte transversal e corte perspectivado isométrico.
28

TRAVERTINO TUFO CONCRETO


CALCÁRIO

29 30
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 48

d.C. O prédio foi seriamente afetado por um incêndio clados há muito tempo, deixando os grandes furos que
causado por raios em 217 d.C., que destruiu todas suas vemos hoje. As paredes internas dos dois níveis inferio-
estruturas de madeira, incluindo o piso, mas foi restau- res foram feitas de tufo calcário, de baixo peso. A maio-
rado pelo imperador Alexandre Severo (que governou de ria das abóbadas em todos os níveis e toda a estrutura
222 a 235) e voltou à sua glória original. dos dois últimos pavimentos foram feitas em concreto
massa; somente as paredes foram revestidas com tijo-
De certa forma, a engenharia do Coliseu não chama a los cozidos.
atenção, embora sua complexa geometria tridimensional
deva ter sido muito difícil de projetar. A estrutura é uma Ainda hoje há um certo mistério envolvendo o que foi o
série de 80 abóbadas de berço escalonadas e de seção mais audacioso desafio da engenharia de estruturas do
variável, que, de certo modo, já eram de uso comum, e Coliseu: sua cobertura de lona, o velarium, que podia
não há grandes vãos. O antigo lago artificial do jardim do ser aberta em ocasiões especiais para sombrear parte
palácio de Nero foi aterrado e foram lançadas gigantes- dos assentos. Sabemos que marinheiros do porto vizi-
cas fundações de concreto e pedra. Sobre estas foram nho de Ostia manipulavam o velarium do Coliseu, mas o
construídos os assentos escalonados, feitos principal- sistema mecânico empregado ainda não foi satisfatoria-
mente com concreto revestido de tijolo ou travertino e ro- mente explicado ou recriado, e as tentativas, em sua
chas leves chamadas de tufo calcário. Os dois anéis ex- maior parte, são muito fantasiosas. É pouco provável
30 ternos da edificação foram construídos principalmente que ele cobrisse toda a área de assentos ou que fosse
com travertino maciço, de cor branca e muito brilhante. O sustentado por um sistema radial de cordas conectadas
piso da arena elíptica, com cerca de 86 por 54 metros, ao topo de mastros de madeira. Qualquer marinheiro
era de madeira, coberto com areia e sustentado por um sabe que os mastros não agüentariam. É mais provável
labirinto de paredes e abóbadas de concreto. Durante a que apenas algumas centenas de assentos fossem
vida do prédio, várias melhorias foram feitas na maquina- sombreados por lonas penduradas sobre mastros para-
ria do subsolo, que às vezes tinha até três pavimentos, lelos e horizontais, como sugere uma pintura encontrada
incorporando jaulas para animais selvagens, cômodos nas ruínas de Pompéia, que mostra esse tipo de cober-
para pessoas, corredores e elevadores mecânicos que tura em seu anfiteatro. O Coliseu permaneceu em uso
podiam levar ao piso da arena propriamente dito. por mais de 400 anos, embora as máquinas sofistica- 29
das empregadas para o manuseio de animais provavel-
O que torna a edificação absolutamente incrível, no en- mente tenham quebrado com bastante freqüência. Após
tanto, é seu tamanho impressionante. Em planta baixa, muitas reformas feitas por vários imperadores, o Coliseu
é uma elipse de 188 por 156 metros no seu eixo prin- teve seu último espetáculo em 532. O prédio foi final-
cipal noroeste-sudoeste, cobrindo uma área de 6 acres mente abandonado após sofrer grandes danos causa-
(2,4 hectares). Mais de 100.000 metros cúbicos de dos por vários terremotos; depois ele foi usado como
mármore travertino tiveram que ser transportado ao fortaleza na Idade Média e, durante a Renascença, refor-
sítio por um exército de carroças puxadas por bois. O mado para uso em touradas. No entanto, ele serviu mui-
Coliseu tinha 48 metros de altura – o equivalente a um tas vezes como uma fonte conveniente de materiais de
edifício de escritórios moderno de 16 pavimentos. construção. Dadas as necessidades de arquitetura da
Embora as estimativas de sua capacidade de especta- Renascença e do Vaticano, é graças à resistência do
dores sentados variem, 50.000 pessoas é um número concreto romano ao clima e ao comércio de reciclagem
bastante comedido. de materiais que ainda temos este e tantos outros rema-
nescentes da Roma antiga.
A estrutura que sustenta os assentos escalonados é
uma série de arcos e abóbadas que nascem de paredes Apolodoro e os Grands Projets dos imperadores
ou pilares, e é, em sua maior parte, oca. Isso não so- Trajano e Adriano
mente representou grandes economias nos custos de Quando Trajano assumiu o poder, em 98 d.C., o Império
construção, como a colméia de espaços criados proveu Romano havia quase chegado ao seu tamanho máximo,
todas as rotas de acesso e circulação para levar os e a tradição dos “grands projets” já estava fortemente
50.000 ou mais espectadores aos assentos. As funda- arraigada. Trajano teve muita sorte em ter como seu ar-
ções eram de concreto, enquanto os pilares e as arca- quiteto chefe Apolodoro (Apollodorus, c. 55–c. 130), um
das dos dois primeiros níveis foram feitos de mármore dos mais talentosos engenheiros de estruturas de
travertino. Muitos destes blocos foram conectados com todos os tempos. Acredita-se que Apolodoro tenha
grampos de ferro forjado, que foram removidos e reci- vindo de Damasco (na Síria de hoje), perto da fronteira
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 49
oriental do Império Romano. Depois de uma carreira teca, uma basílica e outras edificações em torno de uma
como engenheiro militar, ele foi consecutivamente no- grande praça, com um mercado público a nordeste. O
meado engenheiro chefe de obras públicas (praefectus mercado é notável devido ao uso que Apolodoro fez de 31
fabrum) por dois dos maiores imperadores romanos, arcobotantes, os quais transferiam o empuxo lateral de
Trajano (que governou de 98 a 117) e Adriano (que go- cinco grandes abóbadas de concreto a paredes de cisa-
vernou de 117 a 138). Assim como Vitrúvio, ele escre- lhamento, as quais, por sua vez, levavam os esforços es- 33
veu sobre máquinas militares e engenhos de cerco, truturais para as fundações.
mas seus escritos não chegaram até nos e sabemos
pouquíssimo sobre sua vida além das impressionantes A Coluna de Trajano (c. 112–113)
obras que ele executou. Assim como Rubens e A Coluna de Trajano foi construída durante sua vida,
Shakespeare, já houve sugestões de que ele não pode- para celebrar suas muitas conquistas. Além do relevo
ria ter feito toda a obra atribuída a ele, que talvez tenha esculpido, que narra tais vitórias, a coluna chama aten-
havido dois ou três indivíduos com o mesmo nome e ção por sua construção, especialmente pelo fato de 32
que, na verdade, ele foi responsável por muitas outras que foram erguidos 19 grandes tambores cilíndricos,
obras nas quais ele realmente não trabalhou. Assim cada um com cerca de 3,7 metros de diâmetro e pe-
como em uma firma moderna de engenheiros de estru- sando umas 20 toneladas. A pedra do cume, com 55 34
turas, Apolodoro, como diretor, sem dúvida participou toneladas, teve que ser erguida 37 metros antes de
de muitos projetos que foram feitos principalmente por ser deslocada para o lado e assentada sobre os outros
sua equipe, e ele certamente colaborou com outros pro- tambores da coluna. Tudo isso foi executado à distân-
jetistas que se preocuparam mais com aspectos estéti- cia de apenas 6 metros da edificação adjacente, e é
cos do que a técnica construtiva. A lista a seguir de surpreendente o fato de que isso foi feito com o uso de
grandes projetos que são associados a seu nome é ge- sete ou oito guindastes, cada um com capacidade de 8
ralmente aceita e é realmente impressionante. Como toneladas.
muitas obras imperiais (especialmente de Trajano), mui-
tas das obras são conhecidas pelo nome do imperador Os Banhos de Trajano (c. 104–109)
que as mandou construir. De todos os grands projets de Trajano, talvez o mais es-
• O Fórum de Trajano (c. 98–112), incluindo várias edifi- petacular tenha sido o complexo dos banhos públicos,
cações equivalente a uma gigantesca estação de águas termais
• A Basílica de Trajano (c. 98), no Fórum moderna, que tinha tamanho e luxo de causar inveja a
• Os Banhos Públicos de Trajano (c. 104–109) todo o mundo. Em uma era na qual poucos tinham as
• Os Edifícios Públicos do Mercado de Trajano (c. instalações ou o espaço para se lavar em casa, os ba-
98–112), incluindo arcobotantes, construídos no lado nhos públicos (balnea) já eram há muito tempo parte cor-
norte do Fórum de Trajano riqueira da vida urbana. Nessa época, acredita-se que
• Um auditório (não identificado) Roma tivesse centenas de banhos públicos, um número
• A Ponte de Trajano, sobre o Rio Danúbio, na atual que havia chegado a mais de 800 no século IV, mas
Romênia (c. 105–106). Esta era uma sucessão de 21 estes eram pequenos edifícios utilitários. A idéia de
arcos treliçados de madeira, cada um vencendo um vão construir banhos, ou thermae, com proporções colossais
de 35 a 40 metros, os quais foram apoiados em pilares iniciou com o imperador Agripa, por volta de 20 a.C.
de alvenaria com 40 metros de altura, formando uma Seus banhos, construídos bem próximos do primeiro edi-
ponte com comprimento total de aproximadamente 1 fício do Panteon, também encomendado por ele, eram
km. É retratada na Coluna de Trajano. inicialmente para o uso exclusivo do imperador. Ele os
• A Coluna de Trajano (c. 112–113), construída na extre- doou à cidade, e seu grande sucesso com o público ins-
midade oeste do Fórum de Trajano pirou diversos imperadores a usar meios similares de
• O Panteon (c. 118–126) ganhar popularidade. Os banhos de Nero foram inaugu-
• O Templo de Vênus e Roma (c. 121–135), consistindo de rados em 62 d.C., e o imperador Tito construiu seus ba-
duas gigantescas abóbadas de berço cobrindo um vão nhos, assim como havia construído o Coliseu, sobre
de 20 metros. parte do terreno ocupado pelo palácio de Nero, em
79–81 d.C. Contudo, foi Trajano que transformou as
O Fórum e o Mercado de Trajano (c. 98–112) thermae em verdadeiros palácios para as pessoas, em
No ano em que ascendeu ao poder, Trajano começou o uma escala comparável até mesmo à dos maiores cen-
primeiro de seus grands projets, planejando um enorme tros de lazer de nossos dias.
fórum novo no centro de Roma, o qual incluía uma biblio-
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 50

31

32

Cor te no plano dos arcobotantes


Cor te passando entre dois arcobotantes
Nível do terreno / rocha
Caminho das cargas no plano dos arcobotantes

33 34

31 Mercado de Trajano, Roma, c. 98–112. Projeto de estrutura: Apolodoro de Damasco. Corte perspectivado isométrico. 32
Coluna de Trajano, Roma, c. 112–13. Projetista e engenheiro: Apolodoro de Damasco. 33 Mercado de Trajano. Diagrama
mostrando arcobotantes transferindo esforços das abóbadas para as paredes de cisalhamento e para as fundações. 34
Coluna de Trajano. Corte perspectivado da construção. Cada tambor de pedra contém meia volta da escadaria e foi cortado
antes de ser sobreposto.
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 51
O projeto e a execução dos banhos foram obra do enge- criativas como os arcobotantes que seriam desenvolvi-
nheiro chefe de Trajano, Apolodoro. Ele aproveitou uma dos 1.000 anos depois, e demonstram a alta capacida-
série de idéias que já vinham sendo usadas em escala de que os projetistas haviam desenvolvido para a visua-
menor e conseguiu usar o mecenato imperial para exe- lização de esforços estruturais, não apenas em duas di-
cutar uma obra-prima em escala imperial. O terreno re- mensões, mas também em três. Uma das característi-
tangular se estende por mais de 10 hectares, e o edifí- cas mais interessantes dos espaços com abóbadas é
cio principal tinha cerca de 175 por 135 metros. Os que eles têm plantas baixas retangulares, e isso levou a
Banhos de Trajano eram realmente enormes, com capa- uma variação singular e importante do hábito romano de
cidade para aproximadamente 1.500 banhistas senta- usar apenas abóbadas semicirculares em suas edifica-
dos e lotação total de talvez 3.000 pessoas, além dos ções. Se dois arcos têm a mesma altura no centro da
35 inúmeros funcionários do local. No núcleo do complexo abóbada, mas cobrem vãos diferentes, há somente
há quatro espaços principais: o caldarium, o tepidarium duas alternativas possíveis: uma das abóbadas é de
e o frigidarium (respectivamente, recintos e banhos seção elíptica ou tem que ser levemente pontiaguda,
36 quente, morno e frio), e o natatio, uma piscina ao ar como eram muitas abóbadas góticas.
livre. Nos lados opostos destas áreas principais havia
várias salas menores para massagem, exercícios e des- É nesse salão de uma casa de prazer romana que temos
canso. Com um vão livre de 23 metros, o frigidarium era o protótipo da arquitetura das igrejas cristãs que domi-
mais largo do que qualquer nave central das catedrais nou a Europa nos 800 anos seguintes ao reinado de
subseqüentes – a maior parte das catedrais góticas Trajano. Ele estabeleceu os limites práticos máximos de
tinha nave central com cerca de 12 metros de largura – altura e largura possíveis sem o uso substancial de ferro
e os Banhos de Trajano, com seus 32 metros de altura, ou aço. Ele estabeleceu os meios de concentração de
só seriam ultrapassados pela catedral de Beauvais. O cargas de uma cobertura basicamente apoiada em qua-
tamanho total dos Banhos de Trajano somente pode ser tro colunas dispostas em uma malha de retícula quadra-
comparado ao da catedral de Florença, cuja nave central da ou retangular, permitindo o acesso pelos quatro
tem aproximadamente 20 metros de largura e mais de lados. Ele estabeleceu a idéia dos vãos estruturais livres
40 de altura. Sabem-se menos detalhes sobre os de paredes, que daria aos arquitetos uma flexibilidade
Banhos de Trajano do que sobre os de Adriano, constru- sem precedentes nas formas de suas edificações, uma
ídos de acordo com o projeto de Apolodoro no fim de sua vez que poderiam ser repetidos conforme a necessidade
vida em Leptis Magna, no norte da África. O leiaute e a e até mesmo em duas direções.
aparência de seu frigidarium eram similares, embora ele
fosse um pouco menor. O Panteon (c. 118–126)
Concebido apenas 40 anos após a finalização do
O enorme frigidarium retangular era composto por três Coliseu, o Panteon representa um grande avanço em
vãos estruturais com planta quadrada. Cada vão era co- termos de engenharia de estruturas, e é quase certo 38
berto por uma abóbada de arestas de concreto, com que Apolodoro tenha tido uma importante participação
18,5 metros de comprimento, 23 de largura e cerca de em seu projeto. Ele foi encomendado pelo imperador
32 de altura, formada pela interseção de duas abóbadas Adriano para substituir um prédio pré-existente no
de berço em ângulos retos. Essa idéia já havia sido mesmo terreno, que havia incendiado e que, por sua
usada muitas vezes antes em escala menor – na verda- vez, substituíra o Panteon original fundado pelo cônsul
de, era a solução padrão para cobertura de um espaço Marco Agripa por volta de 25 a.C., o qual também havia
quadrado. Nos Banhos de Trajano, contudo, as abóba- sido destruído pelo fogo no ano 80 d.C. Talvez foi o des-
das não somente venciam vãos enormes como também tino dos telhados de madeira das edificações primitivas
eram muito mais altas do que qualquer abóbada de ares- que levou à busca de uma solução a prova de fogo e à
tas anterior, e foram necessários grandes cuidados para subseqüente criação do maior vão estrutural construído
transferir os empuxos laterais às fundações. Isso se antes do século XIX. A cúpula do Panteon vence um vão
conseguiu com o uso de grandes abóbadas laterais que de 44 metros e sua altura é praticamente igual. Até
transferiam os empuxos dos planos curvos da abóbada mesmo a cúpula de Brunelleschi para a Catedral de
e os transformavam em esforços de cisalhamento, do Florença (1434) e a cúpula da Catedral de São Pedro
mesmo modo que uma parede de cisalhamento é usada (1590) têm cerca de um metro a menos. Além da pró-
nos dias de hoje para transferir as cargas eólicas às fun- pria grandiosidade do tamanho do prédio, o Panteon
dações de um prédio. Estas abóbadas de cisalhamento, mostra o talento de Apolodoro, usando as abóbadas de
ou botaréus, são um grande avanço na engenharia, tão cisalhamento.
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 52

O domo do Panteon foi construído principalmente com resto da cúpula é de camadas alternadas de tufo calcá-
concreto, mas essa palavra mascara muitas sutilezas de rio leve e pedra-pomes.
engenharia. As cúpulas de concreto não eram novidade.
As primeiras que conhecemos são duas semicúpulas em Além de reduzir a densidade do concreto usado, toda a
Pompéia que foram construídas mais de 200 anos antes. seção transversal da cúpula diminui progressivamente
O Palácio de Nero, a Domus Aurea (Casa Dourada), tinha de sua nascente à coroa, e o centro do domo é totalmen-
uma cúpula octogonal com diâmetro de cerca de 14 me- te aberto, formando um óculo. As partes mais baixas da
tros. Todas eram feitas com a mistura de concreto roma- cúpula também foram aliviadas em cerca de 10% de
no usual – camadas alternadas de pasta de cimento e ti- seus pesos com o uso dos profundos caixotões do teto.
jolos quebrados, não o material quase homogêneo que
usamos atualmente. Mas a cúpula do Panteon tem três O concreto foi lançado em camadas horizontais. A partir
vezes o diâmetro daquela na Domus Aurea. de determinado ponto, dependendo da rigidez das fôr-
mas, da rapidez de cura do concreto e de quando as fôr-
Com base nos conhecimentos adquiridos nas cúpulas mas foram removidas, o concreto passou a trabalhar
construídas anteriormente ou nos grandes arcos e abó- como uma verdadeira cúpula, desenvolvendo esforços
badas de concreto, os engenheiros da cúpula sabiam que de compressão radiais e esforços de tração pertos da
esse tipo de estrutura tende a se abrir na sua nascente nascente. Embora um concreto de boa qualidade prova-
e que, da mesma forma que ocorre com um arco, os bo- velmente fosse suficientemente forte para suportar
taréus precisam resistir ao momento de tombamento, estes esforços de tração, o concreto da cúpula do
sendo espessos em suas bases. Esse empuxo para fora, Panteon fissurou em linhas radiais junto à base. No en-
provocado por uma série de segmentos da cúpula, tam- tanto, essas fissuras ocorreram apenas uma vez em
bém faz com que a circunferência tenda a aumentar seu toda a história do prédio, e não afetam a estabilidade
comprimento perto da nascente. Em uma cúpula de alve- geral da cobertura, pois cada par de segmentos opostos
naria, os tijolos ou blocos de pedra individuais (aduelas) se contrabalança. As fissuras internas foram bem res-
tendem a se afastar entre si, enquanto que em uma cú- tauradas, por razões estéticas, e as externas foram fe-
pula monolítica se desenvolvem esforços de tração, de- chadas para evitar infiltração de água. Teria sido mais
formando a base da cúpula. Em inglês, estes esforços preocupante se a fina cúpula abaulasse, devido a uma
são chamados de hoop stresses (esforços dos aros), em relação desproporcional entre carregamento próprio e
analogia aos aros (hoops) de metal usados em barris de espessura, mas a grande espessura da cúpula perto da
madeira. A magnitude desses esforços de tração depen- nascente evitou que isso ocorresse.
de do peso total do material acima, e pode ser reduzida
tornando-se a cúpula o mais leve possível. As paredes têm sua própria história estrutural para con-
tar. Na verdade, elas não têm nada de maciças. Além
No Panteon, o peso da cúpula é reduzido de diversas dos grandes nichos no pavimento térreo e de outros me-
41 formas. Em primeiro lugar, o concreto usa caementae, nores em níveis superiores, elas contêm vazios e um
ou, como chamaríamos hoje, agregado, progressiva- corredor perfeitamente disfarçado. Assim, as paredes 39
mente mais leve à medida que a edificação se eleva. possuem muito menos material do que se fossem maci-
Nas fundações, o agregado é constituído de lascas de ças, uma economia em volume de material que varia
mármore travertino, os resíduos do aparelhamento dos entre 65%, no nível do ático, a 50%, no nível do pavimen-
grandes blocos de travertino usados em partes da edi- to térreo. É claro que isso trouxe economias em materi-
ficação. No primeiro nível do Panteon, o agregado con- ais de construção, e, especialmente no térreo, os nichos
siste de camadas alternadas de travertino e tufo calcá- também tinham a importante função de abrigar estátuas
rio. No segundo pavimento, o agregado é camadas al- que provavelmente representavam as sete divindades
ternadas de tufo calcário e fragmentos de ladrilhos, en- planetárias às quais o prédio era dedicado. Mas a efici-
quanto o último pavimento e a parte inferior da cúpula ência estrutural desse projeto também é assombrosa.
têm agregado feito principalmente de cacos de tijolo. A Mantendo-se as paredes constantemente largas, ainda
camada seguinte, que é uma fina banda da cúpula, tem que ocas, sua estabilidade a tombamento é mantida,
um agregado que consiste de camadas alternadas de além das economias supracitadas. Além disso, como as
cacos de tijolo e tufo calcário, enquanto o agregado no partes mais densas e mais pesadas da parede estão no

35 Banhos de Trajano, Roma, c. 104–9. Projetista e engenheiro: Apolodoro de Damasco. Reconstrução. 36 Banhos de
Trajano. Planta baixa. 37 Panteon, Roma, c. 118–26. Desenho mostrando os arcos e as abóbadas de descarga, que atuam
como abóbadas de cisalhamento dentro das paredes. 38 Panteon.
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CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 53


CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 54

na nascente da cúpula
na cúpula

40
no nível térreo

39

41

abóbada de berço

abóbada de arestas Caldarium


cúpula

espaço Tepidarium
desco- espaço
desco-
espaço berto berto
desco-
berto

semi- Frigidarium
espaço
cúpula
desco-
berto

Natatio
espaço
descoberto

0 20 40 60 80 100 120 metros

42 43
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 55
44 45

alto, isso também ajuda a transferir o caminho das car- nária 400 anos depois na igreja de Santa Sofia, em
gas mais rapidamente para a vertical, tendo o mesmo Bizâncio.
resultado que os pináculos sobre os botaréus góticos.
Os Banhos de Caracala (211-216)
Não obstante, o recurso estrutural mais fantástico do Os Banhos do Imperador Caracala (que governou de 211
Panteon fica praticamente escondido de nossos olhos. a 217), construídos a apenas algumas centenas de me- 42, 43,
Sobre a entrada e sobre cada um dos sete nichos do pa- tros de distância dos Banhos de Trajano, eram ainda 44, 45
vimento térreo, há dois arcos, ou melhor, duas peque- maiores e ofereciam mais comodidades do que os primei-
nas abóbadas de berço sobrepostas, atravessando os 6 ros. Embora estes banhos tenham sido construídos cerca
37, 40 m de profundidade da parede. Elas têm dois propósitos: de 100 anos após aqueles projetados por Apolodoro,
agir como arcos ou abóbadas de descarga, recolhendo eles eram praticamente uma cópia. Além disso, como
as cargas de gravidade que estão acima e direcionando- uma proporção considerável dos prédios ainda existe,
as para as paredes portantes que no térreo trabalham eles se mostraram um frutífero objeto de estudos, nos
como colunas. Esta artimanha era muitas vezes usada permitindo uma boa compreensão de como foram execu-
em estruturas de tijolo romanas, mas raramente em tal tados. Além dos três recintos principais aquecidos, as
escala. Mas as abóbadas têm um papel igualmente im- thermae, o complexo total tinha quase 50 espaços meno-
portante trabalhando como estruturas de cisalhamento, res, com vestiários, salas para jogos com bola e outros
ou contrafortes, para resistir à tendência que a abóbada esportes, salas de ginástica, massagistas, cabeleireiros,
tem a se abrir na base, da mesma forma que são usa- auditórios, bibliotecas e lojas. Outra peculiaridade dos
das para transferir os empuxos para fora das abóbadas Banhos de Caracala era o gigantesco caldarium, de plan-
de arestas dos Banhos de Trajano. Seu uso no Panteon ta baixa circular e coberto por uma cúpula de concreto;
mostra o toque de Apolodoro e representa um avanço ele era uma réplica quase fiel do Panteon, com largura le-
sutil no modo em que elas foram criativamente integra- vemente inferior (35 metros), mas com a mesma altura
das à parede do prédio. Abóbadas de cisalhamento simi- (43 metros). Nas paredes desse caldarium, assim como
lares seriam empregadas de forma ainda mais extraordi- no Panteon, abóbadas de cisalhamento e paredes de ci-

39 Panteon, Roma, c. 118–26. Planta mostrando os vazios da estrutura em diferentes alturas. 40 Banhos de Trajano, Roma,
c. 104–9. Projetista e engenheiro: Apolodoro de Damasco. Diagramas mostrando cargas verticais e horizontais sobre abóba-
das de cisalhamento. 41 Panteon. Corte transversal mostrando as características da construção e o uso do concreto: sua
densidade diminui com a altura. 42 Banhos de Caracala, Roma, 211–16. Reconstrução do frigidarium. 43 Banhos de
Caracala. Planta baixa. 44 Banhos de Caracala. Maquete (reconstrução). 45 Banhos de Caracala. Desenho de reconstrução,
corte perspectivado.
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46 Banhos de Caracala, Roma, 211–16. Diagrama dos tubos de queda pluviais e tubos de esgoto. 47 Banhos de Faustina,
em Mileto, atual Turquia, século II d.C. Reconstrução de uma janela com vidraça. 48 Diagrama de estrutura abobadada ro-
mana, em ferro, conforme descrição de Vitrúvio, c. 25 a.C. 49 Banhos de Caracala. Reconstrução (hipotética) da cella
solearis, mostrando uma porção central da abóbada.
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 57
salhamento são usadas para transferir os empuxos late- Assim, a maior parte do calor dos banhos vinha da for-
rais da cúpula para as fundações. nalha subterrânea por baixo do piso, como em uma
fonte natural de águas termais. Gases aquecidos tam-
Embora os gigantescos prédios dos banhos públicos bém passavam por um sistema de dutos tubulares de ar-
fossem notáveis por sua engenharia de estruturas, é gila embutidos nas paredes, fornecendo calor adicional.
claro que eles somente se tornaram possíveis graças (Essa característica foi introduzida no hipocausto a par-
ao desenvolvimento de um sistema de calefação alta- tir do início do século I d.C.)
mente sofisticado capaz de fornecer enormes quanti-
dades de água quente e ar quente; a temperatura do Vitrúvio diz que os tetos abobadados dos banhos públi-
ar em um laconium, ou sala de transpiração, o ances- cos funcionariam melhor se fossem feitos de alvenaria.
tral romano de nossa sauna, excedia 100 °C. Isso era No entanto, ele prossegue e descreve que eles deveriam
possível mediante o uso de enormes caldeiras a lenha ser construídos como se fossem uma “armação estrutu- 48
e do hipocausto. O núcleo do hipocausto era o praefor- ral” com cerâmica na parte inferior:
nium, ou a fornalha, que era alimentada com lenha e Faça barras ou arcos de ferro e os pendure na armação es-
funcionava constantemente; um sistema grande que trutural (de madeira), ou use ganchos de ferro que devem
fosse desligado precisaria de dois ou três dias para estar o mais próximos possíveis, e afaste essas barras
chegar à temperatura ideal. Os gases aqueciam a entre si de tal forma que cada par delas possa fixar e sus-
água de três caldeirões de bronze que eram alimenta- tentar o peso de um ladrilho. Desse modo, toda a abóbada
dos por água pré-aquecida. A água dessas caldeiras será completamente sustentada por ferro. Estas abóbadas
era então distribuída às piscinas apropriadas dos ba- devem ter as juntas da face superior chapiscadas com
nhos. O calor produzido era também usado para aque- barro misturado com pêlos, e a face inferior, voltada para o
cer os inúmeros recintos, aquecendo a pele da edifica- piso, deve primeiramente receber uma camada de arga-
ção, e também insuflando ar quente diretamente em massa de cal com ladrilhos moídos, e depois ser coberta
cada ambiente, por meio de dutos. Também havia um com estuque liso ou com relevos. As abóbadas dos banhos
sistema sofisticado de esgoto usado para as águas quentes funcionarão melhor se forem duplas e com câma-
pluviais e dos banhos, com vazão equivalente à do for- ra-de-ar, pois então a umidade do ar não estragará a ma-
46 necimento de água. deira ou armação e poderá circular melhor entre as duas
abóbadas.22
Vitrúvio deu orientações sobre a construção de ba-
nhos mais de um século antes dos Banhos de Trajano Por fim, Vitrúvio discute a construção de um laconium,
serem planejados. Ele recomendou que o prédio deve- ou sauna. Tal recinto, segundo ele, deve ser contíguo
ria ter seus ambientes mais quentes voltados para o ao tepidarium, para se beneficiar do calor adjacente.
sul (hemisfério nor te), para aproveitar ao máximo o Ele deve ser circular, para garantir que o calor seja dis-
calor solar das tardes – e, de fato, todos os três ba- tribuído de forma uniforme, e seu pé-direito deve cor-
nhos imperiais de Roma têm essa orientação. No Livro responder ao seu diâmetro. Uma aber tura deve ser
V, Capítulo 10 de De Architectura, Vitrúvio prossegue e deixada no cume da cúpula, a qual será fechada por
descreve como construir as fornalhas e os pisos ele- um disco de cobre pendurado por correntes, o qual
vados ou “suspensos” do hipocausto, chamados de será erguido ou baixado, regulando a temperatura da
suspensurae: sauna.
Os pisos elevados dos banhos quentes devem ser constru-
ídos da seguinte maneira. Em primeiro lugar, o piso deve Os banhos públicos romanos usavam, para seu aqueci-
ser revestido com ladrilhos de um pé e meio e ter inclina- mento, não somente o hipocausto, mas também gran-
ção em direção à fornalha, de modo que se largarmos uma des janelas com vidros, retendo o ar quente dos recintos
bola, ela rolará para a boca do fogo; assim, os gases aque- e obtendo algum ganho solar, além de certo nível de ilu-
cidos pela fornalha se espalharão melhor sob o piso. Sobre minação natural. O vidro havia se tornado um importan- 47
este piso, pilaretes com tijolos de oito polegadas (20 cm) te componente arquitetônico por volta do ano 100 a.C.
serão construídos com afastamento suficiente para que se No século II d.C, já se conseguia produzir lâminas de
possam assentar ladrilhos de dois pés (65 cm) entre eles. vidro de até 1,5 metro por 0,5 ou 0,75 metro, que eram
Os pilaretes deverão ter dois pés de altura (65 cm) de altu- sustentadas por mainéis de pedra e fixadas por barras
ra e receber uma camada de argila misturada com pêlos, de ferro, de forma bastante similar à empregada nas ca-
sobre a qual serão assentados as lajotas de dois pés que tedrais medievais. As maiores das janelas dos Banhos
sustentam o piso.21 de Caracala provavelmente tinham cerca de 8 metros de
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 59
51

largura e 18 metros de altura. Em um banho público em Panteon. A cella solearis era aquecida por um hipocausto
Herculano há evidências de que se usaram vidraças du- à temperatura de talvez 45 °C. Localizava-se ao sul do pré-
plas, tanto para melhorar o isolamento térmico como dio e tinha cinco janelas superiores envidraçadas, cada
para reduzir o problema da condensação que causaria o uma com cerca de 12 metros de altura e 8 de largura,
apodrecimento das esquadrias de madeira. sobre outras janelas com cerca de 10 metros de altura.
Para que se mantivessem as altas temperaturas, a cober-
Há um mistério intrigante a respeito de uma das salas dos tura provavelmente era uma abóbada fechada, sem um
Banhos de Caracala, um tipo de recinto chamado de cella óculo aberto em seu ápice, como aquele do Panteon.
solearis, ou caldarium, como hoje a chamamos. Há um re- Essas janelas grandes poderiam ajudar a aquecer o recin-
lato praticamente contemporâneo que comenta especifi- to com os ganhos térmicos solares, como o heliocaminus
camente aquela sala, dizendo que “treliças de bronze ou mencionado anteriormente. No entanto, mesmo com a luz
cobre foram instaladas no alto (do recinto), sustentando fornecida por estas janelas, uma abóbada fechada teria
toda a abóbada” e que “o vão é tão grande que engenhei- tornado o interior relativamente escuro. Este cenário suge-
ros experientes dizem que ele não poderia ter sido cons- re uma solução bastante plausível para o mistério das
truído”.23 Os arqueólogos ainda não chegaram a um con- “treliças de bronze ou cobre”. É perfeitamente possível
senso sobre como a cella solearis era coberta. A sala era que tenha sido construída uma gaiola de ferro abobadada,
circular, tinha cerca de 43 metros de pé-direito até a face de concepção similar às estufas ou palácios de cristal eu-
interna da abóbada e 35 metros de diâmetro – ou seja, ropeus do início do século XIX, formando um grande óculo
tinha aproximadamente três quartos do tamanho do sobre a cúpula de concreto. As barras de ferro talvez te-

50 Banhos de Diocleciano, Roma, c. 298–306. Pintura de Edmond-Jean-Baptiste Paulin, 1880. 51 Basílica de Magêncio
(Basílica de Constantino), Roma, 308–25. Representação artística.
CONSTRUÇÃO E ENGENHARIA NA ANTIGUIDADE 60

nham sido feitas de bronze ou ferro revestido com folhas foi alcançado de forma mais genial na universidade e es-
49 de bronze, e sem dúvida seriam espetaculares o suficien- cola politécnica de Alexandria, cujo modelo foi adotado
te para atrair a adoração dos visitantes. (em escala menor) em Constantinopla e provavelmente
em outras cidades.
Estruturas abobadadas tardias de Roma
As abóbadas colossais de Apolodoro e, na verdade, o lei- Os maiores progressos foram alcançados na engenha-
aute de toda a thermae romana formavam um preceden- ria de estruturas, através do uso de alvenarias (e do
te usado em muitas ocasiões. Cerca de 70 anos depois concreto), em parte porque a estabilidade da alvenaria
dos Banhos de Caracala, o imperador Diocleciano (que independe da escala. Se uma maquete de abóbada de
governou de 284 a 305) mandou construir a maior de tijolo de um metro se sustenta, então também se sus-
50 todas as thermae, a qual oferecia assentos para cerca tentará uma abóbada de geometria similar 20 vezes
de 3.000 banhistas e talvez acomodasse um total de maior – um fenômeno que beneficiaria os engenheiros
5.000 usuários. das catedrais da Idade Média e de depois. Em outras
palavras, as maquetes sem dúvida eram partes efetivas
O incrível é que o frigidarium destes banhos existe ainda do processo de projeto. Isso não é válido para estrutu-
hoje, no século XXI, e é usado diariamente, tendo sido ras que envolvem elementos estruturais sob flexão. Os
transformado pela genialidade característica de Miguel métodos de projeto usados em algumas armas para o
Ângelo (Michelangelo), em 1563, na Igreja de Santa arremesso de projéteis de pedra do século V a.C. indi-
Maria degli Angeli (Santa Maria dos Anjos). Para tal, ele cam que os engenheiros da Antigüidade clássica sabi-
aproveitou a natureza bidirecional da forma abobadada, am que nem todos fenômenos variam em relações line-
transformando os três vãos transversais do prédio roma- ares. Essa compreensão não seria reconhecida nova-
no na nave central de sua igreja. Cerca de 200 anos de- mente (de forma escrita) antes do início do século XVII,
pois, o eixo do espaço foi mais uma vez rotado e os três nos escritos de Galileu.
vãos originais foram transformados em um transepto,
para que a igreja assumisse sua forma atual mediante a
ampliação e adição de uma nova nave.

O exemplo final das estruturas tripartidas de Apolodoro


foi seu uso, por volta de 310 d.C., na basílica do impe-
51 rador Magêncio (que reinou de 306 a 312), a qual foi
completada e modificada pelo imperador Constantino du-
rante seu reinado (312–37). Essa foi a maior de todas
as versões de estruturas abobadadas, com três vãos,
cada um com 23 metros de comprimento, 36 de altura
e incríveis 25 metros de largura. Somando as naves la-
terais da sala principal, o edifício inteiro cobria uma área
de aproximadamente 60 metros por 80 metros, com
apenas quatro colunas no pavimento térreo.

Sem sombra de dúvida, os engenheiros gregos e roma-


nos alcançaram tudo que era possível sem o uso da ci-
ência da engenharia moderna. Eles tiveram tal sucesso
aplicando o que poderíamos chamar de ciência qualitati-
va, que consiste em argumentos racionais baseados na
experiência, que os permitia pensar além do que haviam
conseguido anteriormente e chegar a uma solução. A ela
se somavam experimentos, ou seja, novas idéias eram
tentadas, e os sucessos eram incorporados às práticas
de construção correntes. Algo que surgiria novamente,
especialmente no século XVIII, era o fato de que os en-
genheiros e cientistas gregos e romanos desenvolveram
formas de conservar parte de suas experiências e co-
nhecimentos em livros e currículos educacionais. Isso

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