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VERNON JOHNSON

UM SENHOR, UM�t\ FÉ

TRADUZIDO DO INGLES

PELO

PE. ARLINDO VIEIRA, S. J.

Reformatado by:

Editôra Lar Católico


VERNON JOHNSON

UM SENHOR, UMA FÉ

PADRE VERNON

como era chamado o autor dêste livro nos dias do


seu ministério Anglicano, dá aqui conta da sua con­
versão ao Catolicismo.

Traduzido do inglês pelo Pe. Arlindo Vieira, S. J.


Título do original : O NE LO R O

ONE FAITH

IM PRIMI POTEST

S. Paulo, 24 de fevereiro de 1961

Pe. Armando Cardoso, S. J.

IMP R IMATUR

Cúria Diocesana - Juiz de Fora, 8-6-1961

Mons. José Ferrer Ribeiro de Afonseca,


Vig. Geral
"JESUS! Eu quererta amá-lo

Amá-lo como nunca foi ainda amado."

A VERDADE DE DEUS PERMANECE ETERNAMENTE

(Ps. 117, 2).


PREFACIO DO TRADUTOR

A conversão do célebre pastor anglicano Vernon John­


son teve grande repercussão em tôda a Inglaterra. O fato
foi largamente comentado nos meios protestantes e católi­
cos. Tratava-se de um clérigo exímio, grande pregador, ho­
.
mem culto e de vrda exemplar. Dedicava-se êle de corpo e
alma, como celibatário, a seus ministérios na Igreja Angli­
cana.

Dirigia centenas de almas que nê/e depositavam intei­


ra confiança.

A leitura da " História de uma alma", ou a outobiogro­


f ia de Santa Teresa do Menino Jesus, causou-lhe profundo
impressão.

A grande santo que prometera passar o seu céu a fa­


zer bem sôbre a terra, tem levado inúmeros olmos paro Deus.
Vernon Johnson foi uma dessas belos conquistas. Alma reto,
profundomente piedoso, vivia êle, havia já muitos anos, preo­
cupado com o completa desorientação que ia pelos arroiais
do anglicanismo, e mormente com o influência sempre cres­
cente do modernismo que seduzira grande porte do clero e
já estava contaminando o povo.

Punho-se em dúvida o divindade de Nosso Senhor Je­

sivomente 0 dogma do presença real de Cnsto no �ucans­


sus Cristo e os próprios bispos anglicanos co_mbotiom osten­
.

tia e 0 mesma idéio do Sacrifício do Altar. Confundia-se o


s prot�s�ontes
Anglicanismo com uma dessas múltiplos seita
pleto repudio do
que desc omb om 0 olhos vistos para o com
sobrenatural.
10

O livre exame gerou essa multiplicidade


- de sei'tas qu e
se d'1v1'd em e su bd'1v1'dem e voo apressando o total esface
lomento d a reve Iaçao cris . ta _

_ _
.
Vcrnon Joh�son, ho em reto e de inteligência
. da ':l privile­
gia , comp�eend1a tudo isso, como se colige da
_ leitura do
seu livro , cu1a tradução apresentamos.
A leitura da vida de Santa Teresinha foi o iníci
o do
trabalho da graça em sua alma. Duas visitas a Lisie
ux tive­
ram efeito decisivo. Contemplou êle ali, pela primeira
vez,
o mognífico espetáculo da unidade da Igreja Católica.
Santa Teresinha levou-o ao Evangelho que êle come­
çou o ler e o meditar com o mente despida dos preconcei­
tos protestantes.
A exposição doutrinária que êle faz em seu livro, re­
vela um estudo meticuloso do assunto.
Quem busco a verdade de todo o coração, infalivel­
mente a encontra.
Que idéia nos dá êle do divindade de Cristo negada
pelos protestantes modernistas! Com que critério e seguran­
ça expõe a tese do Primado de Pedro, tôda baseada nos tex­
tos do Novo Testamento!
Após alguns anos de luta insana, triunfando da carne
e do sangue, bem como de mil preconceitos, Vernon Johnson
ingressou na verdadeira Igreja que lhe apareceu em todo
o seu esplendor nas páginas do Novo Testa!11ento.
Foi completar os seus estu�os no Colégio Beda, e :J
Roma, instituição eclesiástica destinada as _
, vocaçoes tardias
e ali se preparou para o sacerdócio.
da sua
Celebrou a sua primeira Missa em Lisieux junto
ce:este protetora.
rra fecundo
Hoje o ilustre sacerd. ote exerce na I ng Iªte
ent e m a vacu1'da-
d
muitas a Imas que
f,e qu e só se
apostolad o, orientando
��{
a ira
nessa 5).Igreja
de do anglic anismo e aspiram pela verd � .

fundada por Jesus " to


im. 3 J
encontra na Igreja ,
que é "colun e firmamento ela Verdade (
'
a ·
11
A exp!anação feita pelo Pe. Vernon em seu livro "Um
Senhor, uma Fé" é magnífica e parece vcrdodeiramcnte ins­
pirada. � de crer que a sua celeste protetora, S a n t a Teresa
do Men:no Jesus, lhe tenha assistido de modo muito parti­
cular na redação dessas páginas tão be!as e instrutivas .
. A_ �egunda parte do livro é uma lucidíssirna exposição
doutrinaria que há de entusiasmar os que têm fé e dar mui­
tc: que pensar aos que ainda estão fora da Igreja e buscam
s:Jfregamente a autoridade e unidade que não possuem.
A terceira parte, ou a conclusão do livro, é verdadei­
ramente dramática e retrata ao vivo a luta renhida em que
se empenhou uma alma nobre, sedenta do sobrenatural, que,
com firmeza, vence os maiores obstáculos e afinal deixa de­
finitivamente o êrro para abraçar a Verdade.
Do exposto se colige que a leitura do livro do Pe. Ver­
non fará, por certo, um bem imenso aos católicos que, em
contato com essas páginas cheias de sabedoria celeste, sen­
tirão a sua fé robustecida.
Fará do mesmo modo um grande bem a muitos que se
estão deixando contaminar pelas falácias do êrro e a não
poucos protestantes de boa fé que, mais por ignorância do
que por outro motivo, deixaram a verdadeiro Igreja de Je­
sus Cristo para abraçar uma dessas múltiplas confissões re­
ligiosas inconsistentes e contraditórias.
A primeiro edição do livro do Pe. Vernon saiu em 1929
e, em 1956, ou 27 anos mais tarde, saía o 28'> edição.

seu livro, que ainda hoje se vendem, cada ano, mais de 1.000
Escreveu-me êle, ao dar-me permissão paro traduzir o

exemplares.
Dentre os milhares de protestantes inglêses e dentre
mais de 100.000 protestantes norte-americanos que cada ano
se convertem muitos, sem dúvida, encontraram nessas pági­

nas luminosa o roteiro que os levou a repudiar o êrro para

Os 43.600.000 católicos dos Estados Unidos (Time, 12


abraçar a Verdade.

de setembro de 1960), país ainda ontem quase todo protes-


12
fonte, são uma demonstração iniludível de que os protesto

_

tes iá começam o mudar de idéio ante êsse espetáculo m ­


ravilhoso do unidade e pujança do Igreja, o maior e mais
influente confissão religioso do grande República.
Há anos escreveu na Suíço um pastor protestante: Sin­ 11

to um horror crescente a certo protestantismo que se reduz


o puro anti-catolicismo. Considero não só injustos, senão tam­
bém malfazeios as condenações superficiois e sumárias lavra­
das contra as doutrinas e práticos religiosas dos católicos ro­
manos por protestantes que nunca se deram ao trabalho de
estudar o lgreia Católica Romana num verdadeiro esfôrço de
-
compreensao.
,,

E o Pe. Leonel Franca comenta: "Nodo mais justo e


nada mais sensato. Os que seguiram esta norma de investiga­
ção acabaram na totalidade da luz buscada com alma reto.
Newman foi talvez a maior inteligência que viu a Inglaterra
no século XIX. Longos anos empregou êle, oxfordman de en­
vergadura excepcional, para dilucidar as divergências entre
sua Igreja e o Catolicismo. Durante êste longo itinerário in­
telectual, não tinha na consciência escrúpulo mais delicado do
que o de pecar contra o luz". A mou o luz, amou o verdade
11

e o verdade lhe iluminou o a/mo na plenitude de seus pocí­


ficos esplendores.
O Pe. Vernon também amou a luz, amou a verdade e
o
buscou-a sinceramente no estudo desapaixonado da Escritur .
êle
E a verdade iluminou-lhe a alma, e a verdade que
Se­
expõe com tonta elevocão de espírito em sua obra: "Um
nhor, uma Fé" continu � o iluminar grande número de alm
as
I
li

na plenitude de seus pacíficos esplendores.


11

Rio de Janeiro, 1 O de fevereiro de 1961.

Fe. A rlindo Vieira, S. J.


PREFÁCIO DO AUTOR

Public o êste livro como uma breve explicação em res­


posta o muitos . cortas que tenho recebido, cartas que me in­
t�r�ogom sôbre os motivos que me levaram o tornar-me co­
tol1co.
Após meses de luto insano, quando finalmente vi que
? fim era nevitável, comecei o coligir algumas notas. Fiz

isto com o 1 ntento de esclarecer o meu próprio espírito e de
ter alguma coiso escrito poro delas me servir naqueles mo­
mentos que, eu bem sabia, haviam de vir e nos quais meus
sentimentos humanos poderiam tentar dominar o minha ra­
zão. Mos também o fiz poro ter alguma explicação em mão
poro os outros, coso fôsse isso necessário.
Das inúmeros cortas que tenho recebido claramente se
infere que tal explicação é necessário; e, portanto, humilde e
modestamente, ofereço-os aos amigos queridos que me têm
amado e depositado grande confiança em mim e que noo
logram compreender porque é que dei êsse posso.
Não se trata de nenhum modo de uma polêmico que
passa em revista todos os argumentos pró e contra, mos tão
sàmente de uma relação dos particulares acontecimentos e
razões que me levaram o tomar tal decisão.
Tornar-se-á manifesto que o razão supremo, além de
tôdos os outros foi que eu não pude resistir à reivindicação
Í
do Igreja Cotó ico de ser o verdadeiro Igreja fundada por
.
Nosso Senhor Jesus Cristo paro defender e ensinar o Verda­
de 0 todos os homens até ao fim dos tempos.
Só elo pretende ser infalivelmente f!Uioda p�lo Espíri­

to Santo em seu magistério: só elo po_ s� u1 o ou ortdade e a
unidade necessária poro tal vocação d1v1na; e so e/a, no Pa-
14

pad?, dá uma significação efetiva à posição de S. Pedro na


Escritura. Era o fato positivo da lgreia Católica, ao qual não
podia. furtar-me.


��r conseguinte, o estado da Igreja da Inglaterra foi
.
u!11a dd1cul ade muito secundária e sómente serviu para con­
firmar a minha fé na lgreia Católica.
A controvérsia do Livro de Orações (Prayer Book) foi
para mim antes um sintoma do que outra coisa qualquer; em­
bc:>ra séria, nunca foi tão séria para mim, quanto o moder­
nismo.
O. modernismo, vi-o quando cheguei o compreendê-lo
melhor, estava destruindo completamente a verdadeira con­
cepção da Personalidade de Cristo e da sua Divindade, bem
como a crença nessa verdade fundamental da religião cristã.
Era inevitável que eu fôsse acoimado de desertor. Só
posso lembrar o todos que sempre estive metido no mais
aceso da luta. As dificuldades não me atingiram seriamente
enquanto examinei todo o problema, não por causa das difi­
culdades, mas porque eu tinha visto outra coisa de que não
tinha a menor dúvida que era Divina. Pela primeira vez en­

viva em Lisieux, em 1925.


trei em contato com o Igreja Católica como uma realidade

Poderão admirar-se os leitores de que eu tenha espe­


rado tanto tempo para dar o passo final.
A resposta é que sou um inglês como outro qua qu�r;�
e como tal tinha em mim, engendrado em meus propnos

o sos, todo 10 pavor e mêdo e s�sp�ita de R.o_m�, e o des�on­
f iança do que eu considerava intriga ecles1ast1ca e governo


italiano.
e er­
Eu possuía em alto grau a latente hostilida_d: q�
içao inglesa.
dara, como parte da costumada educação e trad
. do país até
1925. E, quanto me posso lembrar, ate e� �ao uem ambos os
Profundamente insu Iar, nunca e� five -foro
tinha falado
sómente duas vêzes a um sacerdote catolico
:
casos apenas ocasionalmente.
15

Nunca tinha ido a uma função religiosa católica, e só


de passagem penetrei em igrejas católicas. Digo isto porque
o povo em geral, e especialmente os católicos, parece não
se persuadem de quão completamente separados estão um
do outro o Catolicismo e o Anglo-Catolicismo.

Quanto a mim, até 1925, foram mundos inteiramente


� istintos. Nunca me preocupei com a Igreja Católica e sen­
tia-me completamente satisfeito com o Anglo-Catolicismo.

Foi desde que me pus a imaginar que "Roma poderia


estar certa", que comecei a capacitar-me também de quão
arraigado estava em meu próprio subconsciente esta descon­
fiança de "Roma"!

Assim é que, ainda depois que estas coisas se torna­


ram intelectualmente muito claras, tudo estava fora de mim
e me era estranho. Sentia-me ainda prêso pelos liames do
preconceito e do temor.
De outro lado, outra razão que me detinha foi a hesi··
fação opressora em dar um passo que deveria causar pena
inconcebível a inúmeras almas que eu amava ternamente.

Estava também convencido de que não devia deixar


um ministério tão copiosamente abençoado de Deus, enquan­
to houvesse alguma possibilidade de continuá-lo. f sempre
coisa em extremo difícil determinar quando chega o ponto
culminante em alguma grande decisão.

Parece-me que, ao aproximar-se êsse momento, nos

nos persuadimos que é inevit� vel tal passo e, �ntretanto, mal


sentimos tão superexcitados e afadigados com a luta, que

nos levantamos a fim de vacilantes nos encaminharmos para


êle nas trevas.
Para aquêles que sempre forar:n católicos o argumento
e em gra�de pc:r­
dêsse livro parecerá absurdamente simples .
cr�10, qu� foi e_scrito
te exagerado. Hão de imaginar, eu o _
a fase de tran sição reveladora da minha d1spos1çao de
num
quando apenas me
espírito nesta circunstância particular,
achava no limiar da verdade.
16

Po_:o êles o ganho sobrepujo de muito o per


.. da. Mos
eles estao dentro, conhecem o Igreja e esta é 0 sua
. cosa.
A o I mo que esta, de f oro, com1nho as apalpadelas par
,

a
luz, é como se deixass� o seu lar e inúmeros cenas e pessoa
_ . os para deliberada
omont1ss1m mente tomar o cominho do exí­

lio: é um puro ato de fé. E só mais tarde que aquela alma
pode possivelmente convencer-se de que o lugar aparente
do exílio é na verdade o próprio lar.

Se nos últimos páginas dêste livro pareci levantar de­


mais o véu, foi com a máxima desconfiança e por duas ra­
zões que o fiz:

Primeiramente poro levar os inúmeros o/mas que me


têm mostrado amor e confiança a se persuadirem que, em
tudo isto, era precisamente o pressentimento do dor imenso
e da angústia que a minha resolução deveria causar-lhes, o
que me trazia tristeza acabrunhadora.
Em segundo lugar, porque me mostrou a minha �xp_e
­
i nao
riência das almas que deram semelhante passo, que aqu

se trata de coisa fácil, feita nu� ?1omento e emoçã
o, ma �
e tota 1
de um caminho de grande sacrtf1c10, percorndo quas
a que vem
mente nas trevas, apenas iluminado pela certez
da fé.
ON
VERNON JOHNS

8 de setem bro de 1 929


at 99 A l bert Road, N . W. 1 .
1 PARTE

Um Senhor, 2
CAPfTULO 1

OS COMECOS ,

F o i n o o uton o d e 1924. E u esta va n u m conv en­


t o a ng l i ca n o traze n d o nas m ãos u m l ivro a a utob io-
gr afi a d e Sa nta Ter esa d e Lisie ux. '
P usera -o e m m i n has m ãos a Reverenda Madre
do c o n ve n to onde fôra eu m a ndado para pregar u m
ret.i ro .
P rotestei, d izendo q u e ta l l ivro não m e interes­
s a va , q u e eu o havia percorrido a nos antes em u m a
livra r i a cató l ica e havia chegado à conclusão d e
q u e era senti m enta l e a rtificial, a nti-ing lês, e q ue era
m a i s u m ard i l cató l ico romano pa ra excitar a devo­
ç ã o e ntre o p ú b l ico ; d isse mais que desconfiava
d a q u i lo. Rep l i cou a Reverenda Madre que eu n ão
d ev i a fa lar a ss i m . Submeti-me e tomei o l ivro.
Por a q uêle tem po ti nha eu sido ordena do e
exerc ia meus m i n istério s n a I g reja l nglêsa por m a is
de t reze a nos. Ti n ha estad o por dez a nos nu ma con­
frari a a ng l ica n a . E, até e ntão, a Igreja Catól ica ja­
m a i s se a pre sent a ra a meu espí rito com o um pro-
blema .
Sem pre a cons idere i na verd ade com o o ma ior
de tod os os cor pos cris tão s, mas que tinh a inco rrido
2 *
20

em rnui1os e g ra n des erro s, send o o pri ncip a l a


sua
insis tên c i a na s reivi nd ica ções pont ifícia s. Estes err
os
a ti n h arn sepa rado com p l eta me nte d a I g reja An
g li­
ca na, e vag a me nte, s u po n ho, d eseja va q ue e lo en­
cont ras se u m di a seu próprio l ug a r na união final da
Crista nd ade, coisa q ue, e ntreta nto, estav a longe d�­
m a i s p a ra preoc u par-n os s8r i a m e nte.
Mu itos dos q ue 111e l e rem fica rão admi rados de
q ue o l g ué111 p udesse exe rce r seus m i n istério s por ta n­
los a n os como u m Ang lo-Cat ól i co sem ter estado
j ama i s em íntimo con tato com a I g reja Católic a.
Mas trata-se de u 111a i m pressão muito com um. A
ra zão é esta: n a vida d a maior pa rte dos i nglêses
d e h o j e a I g reja Catól ica não passa de u m nome .
Por m a i s q u e toq ue a s suas vidas, sàmente o faz
indi retamente .
Para a l g u ns é e l a u111 fato q u e só a parece em
tem pos d e co ntrovérs i a e a con s idera m sob o pon­
to d e vi sta d e adversários convencidos de que ela
labo ra em êrro.
Estão ce rtos, q uer te n h a m ou não pesad o bem
a s u a posi ção, q u e Rorna está fu nd amental m e�te er­
r a d a , q u e, por s u a visão extrem ista da. auto. ri d? de
�j'­
,

so l a po u a s respo n sa b i l id ades .i nd ividua is, princip


rne nte n o confe ss io ná rio, e privo u o Eva n g e l ho ª
s u a p u reza e s i m p l icida de, fi rma ndo-s e em do�':11ª5
ani
d e s necessá rios e e m s u pe rsti ções med ie. va is . Dinseu
q u e Rorn a perd eu a s u a m e nsag em espi n' t ua 1
em

d esejo d e d o m i n a ção � u n !ª
d' 1
' e que e
, el a o ma1·or

1 m ag 1 na r pa ra o ivr
I" e acesso
i n i m i g o q u e se poss a
21
d as a l mas a Deus. Ta l ponto de vista é claro q ue
imped e q ua lquer conta to íntimo com a lgreia .
Pa ra outros é ela u m museu eclesiástico - o re­
fúg io d a a rte sacra, a mãe das nobres catedrais,
cu ia a rq uitetu ra nos enche de gôzo e admira ção;
mas é essencia l mente estrangeira . O q ue pensa m d a
sua rel ig ião o imag inam como se, d e q ua ndo em
q u ando, a vissem man ifestada por estrangeiros e a
a d u ltera m ju lgando-a i ncerta, i rreverente, e com ple­
ta mente a l heia ao espírito ing lês .
E assi m passam pelas belezas da lgreia sem
compreender a sua a l ma .
Para outros, que refletem mais, é ela u m enigma
insol úvel. Parece-l hes q ue a Igreja Catól ica deveria
já há m uito ter desaparecido da história : ficam ma­
ravi l hados de seu extraordinário poder de reorgani­
zação. Perseguida e expulsa de u m país a pós ou­
tro, a i nda progride, sustentada pelas reivindicações
papais que j u lgam ser de todo fa lsas; tem ela enfren­
tad o m a is de u ma revolta i ntelectual, aparentemente
esmagadora, e contudo permanece, e êles n ão po­
dem deixa r de admira r a assombrosa unidade em
q ue e l a m antém homens e mulheres de tôdas as
na coes.
,
...,

Mas isto não vai mais longe , e explica m a seu


m odo esta I g reja m isteri osa, d izend o a si mesm os
q ue o i nsti nto rel ig ioso é com um a tôda a raça hu­
man a e de todo s os temp os, e que a Igre ja Cató l ica
é a pen as a ma is elevada exp ress ão org aniz ada dês-
te insti nto.
22
O d esgôsto dêstes p e l a a uto r i d a de e o p reca
c e i to n a c i o n a l co n tra t u d o o q u e é estra ng e i r o' ma ­
� _

b a rata q u a l q u e r e n te n d i m e n to m a is p ro fu n do . E as­
s i 1n, ta mbém p a ra êles, o gra n d e seg rêd o d a Igr eja
Cató l i ca p e rm a n ece i nso l úve l .
A i n d a a q uê l es q u e têm am i g os cató l icos não
vão m a is l o n g e . Ace i ta m-n os como Cató l icos Roma­
n os, e p res u m e m q u e hão d e obse rva r ce rtos deve­
res re l i g i osos e a bste r-se d e certa s co isas que fazem
os o u t ros . Pod em, de te m p o e m te m po, esta r côns­
c i os d e que seus a m i g os cató l i cos entende m ma is
de s u a re l i g ião e q u e esta s i g n ifica m a is para êles
d o q u e sucede co m os q u e p e rte n cem à I greja da
I n g l aterra .
Mas, se por u m m o m e n to isto os i m pressi ona ,

d i rão a si mesmos : Sim, mas esta é p ri n c i pa l me n te


u m a re l i g ião de temor, te m o r d os pad res que exa­
g e r a m a sua a utor i d a d e e exp l o ra m em h omens e
m u l h e res o se n t i m e nto d o d eve r. E ntreta nto, a es­
sência da rel ig ião está na l i berdade. H om ens e mu­
lheres deveriam ser l ivres : ir à Igreja p o rq ue tê�
p razer n isso, não porque fora m i nduzi d o s a a g i r
.
a ssim.
Se hoje há uma parte do povo i ng lê s da qua l
podería mos espera r q u e compreende ssem e conhe­
cessem bem a Igreja Catól ica, seriam os Angl o -Ca-
tól icos. . . .
E ns1nam mu itas d outnnas em com u m com
e 1 a,
lêem m u itos d e seus l ivros d e piedad e, e , � t�oe to
a t c
ponto, estudam a sua teologia ; con tu d o e stao
long e de a compreender como q ua isq u e r o u tro s .
23
,� raz �o , m u i �rovàve l me n te é esta: os A n g lo­
� a to l 1 cos tem u m v i vo i n te rêsse, u n1 veeme n te dese-
1º q u e é o � e reco n q u i sta r a In g l aterra pa ra Nosso
Sen � o r, m ed i a n te o ressurg i m e n to da fé ca tó l ica da
l g re1a l n g lêsa .
N este o b j etivo estão centra l izadas tôd as as suas
e n e rg i as, tôd a s as s u a s ora cões' todos os seus sacri­
fíc i o s e es pera n ças. F i rma �-se êles em uma i nter­
p� etação d os form u l ários Angl ica n os que fo i defen­
d i d a p o r h o m e n s cu l tos e p i edosos.
E n co nt ra m i n compreensões por tôda a parte.
São co n s id erados deslea i s por mu itos corre l i g i oná­
r i o s s e u s, e forcad os a ver suas ma is ca ras convic-
,

ç ões n eg a d a s e a i nda rid i cula r i zadas por seus pa­


re ntes e amigos. No passado fo ram ê l es por tôda a
p arte p e rseg u i dos por se us b ispos, e os b ispos hoje,
c o m rara s exceções, n ã o os entendem. E contudo,
co n tra es m a g adora desva n tagem, vi ram ê l es a sua
i n te rpreta ção dos fo rm ulários Ang l i ca nos ace ita co­
m o u m p o n to de vi sta na I gre j a da In g l aterra ; e mui­
t a s d evoções cató l i cas, pela s q u a i s foram ê l es no
p a ss a d o p erseg u id os, são, hoje em d i a prati cadas
reg ularme n te nos serviços de suas Ig rejas.
E m tão renhido co m bate n ã o é de admi rar que
te n h a m tão pouco tempo para se preocupa rem com
" Ro m a". Quando se encon tra, surg e um tropêço
p ara a u n i ão. Podem ad mirá-la e de fato � u ita5 vê­
zes a a d m i ram po r ter e l a p reservado a fe no cc:> r­
rer d os te mpos; mas, a seus o l hos, o dogma da . �n­
fal i b i l idade papa l fechou as portas para esta un1ao
d e todos os cristãos n a fé católica, o q ue é a meta
24

de tôd a s a s suas espera n ças. Nesta u n ião crêem ê les


que a g re j a l n g l êsa deve ser a chave, o traço vita l

de u n 1 ao e ntre as confissões protesta ntes e Roma.
.
Mas, a ntes que isto possa acontecer, Roma deve m u­
dar e mod ifica r suas exigências. Pa ra a maior p a r­
te d o s A n g l o-Cató l i cos, as d iscussões de Molinas fo­
ra m u m pa sso na ve rdade i ra d i reção, mas irreme­
d ià ve l mente prematu ro . A ún ica solução é p rosse­
guir fazendo a vo ntade de Nosso Senhor, onde se
acha m : l eva ndo ava nte o abençoado traba lho da
restauração Ang lo-Catól ica e deixa ndo o futuro n as
mão� de Deus . Os Ang lo-Catól icos a i nda estão l u ­
ta ndo em condições desfavoráveis, com u m a ca ma­
rad agem ci mentada pe las perseg uições, ma l enten­
d i d os e sós, e todo aquêle que os deixa r pa ra se
unir à I g reja Roma na é considerado, ai nda pe los
ma i s g e n e rosos e piedosos, como a l guém que, se
não é tido como tra idor, certa mente os desa mparou
e, de certo modo, ca pitu lou.
O fato de ser tão ma l compreend ido o que se
passa p a ra Roma é uma prova convi ncente d� q uão
.
pou cos Ang lo-Cató l 1 cos compre endem a l g re1 a Ca-
tól ica.
Gera l mente fa la ndo, pa ra o co mum dos i n g l ê-
ses a I g reja Catól ica n ã � pass � ?� u m nome. Por
m u i tas razõe s estão ês t e s 1 m poss 1 b i l 1tado s de a com­
pree nde r. Sob tôdas as outra s razõe s está a ma ior
d e tôda s - o amo r do i n g lês à própri a i nde pe ndê n-
CIO.
.

Nen hu ma i n t e rf er ê n cia, a men or q ue seja , em


re ligião o u, pi or aind a, por u m estra ngei ro!
I nata
25

e p rofu n d a m ente a rra i g ado em seu espírito está a


convicção d e q ue a i ndependência nacion a l e a in­
d ependênci a re l ig i osa a nd a m de m ãos dadas. A I n­
g l a terra, d izem, jamais aceita rá uma Igre ja gover­
n a d a por u m ita l ia n o . Se a lg u m d ia o i n g lês entra
e m í ntimo e pessoa l contato com a vida i nterior da
I g re j a Cató l i ca, a lgo gra nde deve ter suced ido -
u ma tremenda convu lsão em sua vida, a lg u m ser
extre m a mente a mado deve ter passado para outro
l a d o, a lg u ma coisa o tocou pessoa l mente q ue o le­
vou pa ra a lém do preconceito n aciona l e da i ncom­
preensã o pessoa l, de modo q ue começou a ver a
I g re j a Católica como ela rea l mente é .
Contra isto tudo, há outro g rupo de ing lêses -
u m con j u nto relativa mente peq ueno, mas q ue cresce
con sta ntemente, de nenhum modo exclusivo dos An­
g lo-Catól icos, mas q ue tem representa ntes em tôdas
as c l asses da vida i ng lêsa.
Começa m êles a d uvida r. Mu itos q ue não são
A n g l o-Cató l icos estão convencidos da fa lência da re­
l ig iã o i n g l êsa em gera l : estão-na achando i nadeq ua­
da pa ra a s n ecessidades d e suas a l mas : não sabem
p o r q uê, mas sentem q ue está tudo errado.
Conve n cem-se de q ue a rel igião catól ica, esta
re l ig ião q u e há q uatrocentos a nos foi supri m ida pe­
l a s leis penais m a is severas de tôda a nossa h istória
n a ciona l, está reapa recendo com vigor e fôrça q ue
n ã o se pode exp l ica r por a rg u mentos hu manos.
Vêe m q u e a g ra nde fraque � a da reli � ião i n g �ê­
sa são suas seitas e controvérsias sem fi m e estao
bem com penetrados de q ue os catól icos possuem
26

u m a u n i d a d e n ã o conhe c i d a e m q u a l q ue r outra so­


c i e d a d e d o m u n d o.
Se u s p ró p r i os p reco n ce i tos n a c i o n a is vão-se en­
f r a q u ec e n d o a nte o es p í r i to i n tern a c i o n a l q ue a g i ta o
m u n d o, s e n ti n d o ê l es a a traçã o d e u m a I g reja i n ter­
n a ci o n a l .
Vêe m ho m e n s e m u lhe res, d os qua is tudo pode­
r i a m e s p e ra r, m e n os q u e se tornassem cató l i cos, e
a d m irad os e d e s n o rteados p e rg u nta m q u e s i g n ifica
t u d o i sso.
Ta m bém e n tre os An g l o-Cató l i cos há u m peq ue­
n o n ú c l e o e m a n s i oso cresci m e nto. Começa m a per­
s u a d i r- s e q ue a d ifere nça e ntre A n g l o-Cató l i cos e
C a tó l i co s n ã o é a pe n a s q u estão d e pormenores e de
g ra d u a ções .
Vão-se conve n cen d o d e q ue A n g l o-Cato l icismo
e Cato l i ci s m o s ã o coisas i nte i ra me nte d ifere ntes.
N ã o há p e rspectiva de u n i ão . Ju lgava m q u e Ro­
m a p o d i a m u d a r, m a s agora vêem q u e não só o não
fa rá, m a s n ã o o pode fazer.
O Pa p a d o é fund a m e n ta l , é a mesma base de
tô d a a s u a a u to ridade e u n idade.
Vêe m q u e a I g re j a Cató l ica l o n g e d e esta r vi­
s a n d o a u n i ão, se d es p e n d e p ród i g a m e nte em di­
nhe i ro e pe ssoa l, constrói suas própr i a s catedra i s,
sua s igr e ja s e esco l a � , .e a os pou � o s va i -se torna n­
do a m a ior fôr ca re l 191 osa d o pa i s .
E ste núm er � d e a l ma s q u e ad m i ra m e d uvid �
m
os os 1 n­
t au m ent a d o m u ito ulti m a m ent e, e há tod
d�� os de qu e cre s cerá m a i s rà p i d a m e nte no fut u ro .


27
Mas para mim, q ua ndo me achei naq uele outo­
n o d e 1924 com a autobiografia de Sa nta Teresa
_
� a s m aos, estas d úvidas e surprêsas ainda n ão me
ti n h a m ocorrido. Estava de todo absorvido na con­
versão das a lrnas pa ra Nosso Senhor por meio de
um ressu rg _i mento na Igreja lng lêsa.
Eu n ão ti n ha nen h u m temor de insegurança, ne­
n � u mas d úvid as, quaisquer que fôssem, q uanto a
m i n ha posição.
Foi só d epois de ano e meio que experi mentei
o i n ício daquelas dúvidas tortu ra ntes e aquêle fa s­
tid i oso senti mento de temor q ue devia gradualmen­
te a podera r-se do meu espírito.
O " aba lo" tremendo não o ti nha experi menta­
do a i nd a ; d evia sobrevir em Lisieux, mas só depois
de passados dezoito meses.
Levei a vida de Sa nta Teresa pa ra o meu quar­
to e comecei a leitura. Os dois pri meiros capítu los
n ão m e impressionaram : sem dúvida, pareceu-me d i ­
fíci l percorrê- los. Aos poucos, porém, a história em­
p o lg ou-me , sendo de todo impossíve l descrever meu
esta d o de espírit o q ua ndo, afinal, alta madru ga da,
d ep u s o l ivro.
T udo o que posso d izer é que êle moveu todo
0 meu ser com o nenh uma outra leitu
ra jama is o fi-
zera.
A l i esta va a lg uém que hav ia ama do � osso _Se­
n h o r em g ra u sup erio r a tud o o que eu _ti n ha v, 1st ?
rt! ­
a nte s : u m am or tão for te com o o dos a ntig os ma
res , e a ind a com a de lica dez a e ter nur a de um a cri-
28

o n ç a , t ã o d e l i ca d o e terno q u e m a l pod emos com­


pre e n d e r a fo rn a l h a e m q u e êsse a m o r fo i tão ma­
rav i l h o s a m e nte p u ri f ica d o.
A lém d i ss o e ra "o Eva n g e l h o d o sofr i m e n to" da
Sa n ta o d o m m a i s a be n çoado, o ún ico q u e n os po­
d e r .i a u n i r rea l m e n te a Nosso S e n h o r com amor a
tô d a p rova.
Fo i a s u a i nterp reta ção da d o r e do sofrimen­
to, co m o a l g u m a co i sa q u e poderia ser oferecida
e m u n i ã o co m a cruz do Sa lvador pe l a Ig reja e pe­
la s a l m a s, q u e, sob revi n d o à m i n h a vida, q u a ndo as
c o i sa s m e pa recia m extre m a m e nte difíce is, i l u m inou
e to r n otJ rea i s p a ra m i m ce rtas ve rdades es p i rituais
qu e e u a n d ava tatea n d o n a s treva s; verdades essas
qu e e u d esa n i ma ra d e a p reender p o r ju lgá-las mór­
bi d a s e m e n os d ig n a s d e estima e q u e agora se me
a fi g u ra m co m o o ve rdad e i ro fu nda mento da santi­
da d e d e v i d a.
Pel a p r i m e i ra vez co m p reend i as pa lavras de S.
PaL!o: "Co m p l eto n a m i n h a ca rne o q u e resta a pa­
d ece r a Jes u s Cri sto pe lo seu Corpo, q ue é a Igreja"
(Co l. 1 , 24).
Po r s e i s m eses o estud o dêste l ivro i m pu l sio nou­
nha
m e pa ra u m a d a s passa g e n s m a i s difíce is da mi
v i d a.
CAPfTULO 11

PRllv\EIRA VISITA A LISIEUX

N o s �g u i nte m ês d e m a i o, logo d epois d a Pás­


coa, to m e i o d esca nso a n u a l d e três semanas, con ­
fo r m e o costu m e d a confra ria a q u e eu pertencia.
A l g u ns d i a s a ntes d e term i n a r a s m i n has férias,
s u g e r i u - me m i n h a i rm ã a idéia d e fazer u m a peq ue­
na p e re g ri n a çã o a Lisieux e visita r a casa e o con­
vento o n d e vivera Sa nta Teres i n h a .
Tu d o foi d eci d i d o só n o ú ltimo momento. Na­
tu ra l me nte p rocu rei pôr de pa rte a idéia, pois sabia
q ue se fô.:;se a Lisieux teria q u e i r com p l eta mente só,
eu q ue n u n ca ti n h a esta d o na Fra nça e nem fa lado
j a m a i s fra n cês d es d e o tem po d e estuda nte.
Ma l ti n h a tem po pa ra conseg u i r o meu passa por­
te. E stive, pois, p a ra d esisti r d a viagem . Mas fu i . No
H avre, o n d e a b a rca chegou m u ito de m a n hã, a ssis­
ti à m issa e m uma d a s i g re jas. Após a m i ssa, um ve­
l h o sacer d ote p e rcorr ia a i g re j a com d ois acóli tos e
um cruci fixo. U m vel ho e ri d ícu l o sacri stão, d e cha­
p éu n a p o l eô n i co e b a stão , a b ria o cort ejo, todo s
êles ca n ta n d o u m a l a d a i n ha e m l i ngua gem d esco ­
n h eci d a .
30

Ac he i tud ? de sp ro po s ita do e i n e x press i v o


L
brc:> !11 e q u e d i sse e� tre m i m : "Be m, se isto é em­
.

to l 1 c 1 smo ro ma no, s i nto- me fe l iz de não ser u m ca-


0
-

to, 1·1co roma no .,


ca
_

O tre m des l izav a por va les enca ntad ores e d a


'

jan e l i n ha eu via as peq uena s prop rieda des da Nor­


�and ia com seus l i ndos poma res em flor. Ao apro­
x i mar se o trem de Lis ieux, pude avista r a Ba­
-

s í l i ca d o conven to ; dentro daque les m u ros a santa


ti n ha orad o, amado e sofrido. O momento em que
o co ntemplei pela primei ra vez fo i um momento d a
m i n ha vida q u e ja mais esquecere i .
Tendo chegado a Lisieux, d i ri g i-me para o ho­
te l , peq ueno e p ri m itivo, e em seg u ida fu i à capela
d o convento onde está a u rna da Sa nti nha . Mi nha
p ri me i ra i m p ressão foi de g rande repulsa : parecia­
me tu do tão esq u isito, senti me nta l e artifi ci al.
Não pod ia suportar as flôres artifi ciais, os fes­
tões d e rosas de papel . Só mais ta rde soube que tu­
d o aq u i l o era devido à ca nonização da Sa nta que
se ce lebrava em Roma.
Sem o saber, achava-me em Lisieux, justa ment e
n o d ia da sua canonização, para a m i n ha prim ei ra
visita ao seu santuá rio.
Abri cam i n h o entre a m u ltidão até ao san tu ári o,
q ue tam bém não me i m p ressiono u ; d i sse as min ha s
oracões e ret i re i-me.
A tarde vo ltei para visitar a sala das re l íqu ias .
I

Vi aí vá rias coisas q u e a santa ti n ha uti l izado: a .c�­


l h e r e a faca usadas por e la nas refeiç ões, os hab i -
31

tos q ue vesti ra, sua ca ixa de costura, suas sa n d á l ias,


ª. cad e i ra e a mesa de q ue se servira n a enferma­
ria, os q uadros q ue havia pintado, as peq uenas flô­
res a rtificiais que fizera enqua nto estava no le ito de
m o rte e, acima de tudo, sua disci p l i na feita de cor­
d a s e outíos i nstru mentos de pen itência que usava .
E ra rea l mente uma comovente experiência con­
temp l a r os próprios objetos usados por a lg uém q u e,
em tão pouco tempo mereceu a honra dos a ltares e

era agora proclamada Sa nta em todos os pa íses d o


mu ndo e percorrer as mesmas ruas por onde ela pas­
sava, a i nda em nossos dias.
Pouco depois, nessa mesma tarde, visitei a s u a
casa, u ma enca ntadora morada n o meio d e um j a r­
dim onde Sa nta Teresinha, qua ndo cria nça, ti n h a
b rincado.
Neste jardim vi uma cavidade no mu ro, o n d e
e l a erguia u m a ltarzi nho e, por ocasião do Nata l,
o seu pequeno presépio; as mesmas fig u ras que e l a
usou a i nda pod iam ser vi stas.
Entrei na casa pelo quarto ju nto da lareira, o n ­
de e l a costumava colocar seus sapatos, n a n oit e d e
Nata l, assim como as criançass i ng lêsas pend u ra m
a s meias a o pé da cama, e eu recordava aquela n o i ­
te memorá ve l e m q u e e l a o fêz pela ú ltima vez.
Dêste q u a rto passa-se para outro que só pode
ser visto através de portas de vidro. Era a sa la o n ­
d e a fam í l ia tin h a tomado a sua ú ltima refeição a n ­
tes de a santi n h a entrar para o convento. Nesta sa l a
tam bém a cadeira e m q ue seu pai se sentava e ca n-
32
tava p a ra e l a, e o b a nq u i n ho sô b re o q u a l, quan d o
peq u en i na, se sen tava ju nto d o pa i.
No a n d a r superior está o quarto, on d e, grave­
m ente e nfêrma, contemplou o sorriso m i racu loso d e
N ossa Senhora . N o lugar, on d e costumava d orm ir,
h á agora urn a lta r . Fi n a l mente, em outro quarto, po­
d em-se ver os seus bri nque d os, sua pasta escolar e
ca d ernos d e a u l a ; gen uflexório, rosário e catecismo ,
tud o bem g uar d a d o atrás d a porta d e vi d ro.
O contraste entre os brinque d os d a d ébi l crian­
ça e seus instrumentos d e penitência na i d a d e _a d ul­
ta é profu ndamente comovente e um perfeito para­
l e l o d o po d er d a g ra ça d ivina.
Ao voltar, visitei a cate d ra l d e S. Pe d ro e vi o
a lta r on d e a fa m í l ia reu n i d a recebeu pela ú ltima vez
a com u n hão ao reti ra r-se Teresa para a sol i d ão do
claustro.
Atrás d o a ltar-mór está a capela d e Nossa Se­
n h o ra constru í d a, como ato d e repa ração, por Cau ­
chon, b ispo d e Bea uva is, que con d enou Sa nta Joa na
d 'Arc. N este a lta r costuma va Sa nta Teresinh a ou vir
m issa d i à rian1ente, q uan d o menina. Ani mei-me a per­
se
g u nta r a o vel ho sacrist ão, em meu pobre franc ês,
êle havia conheci d o pesso a l mente a Sa nta ; res po n ­
d eu-m e q ue se lemb rava perfe ita ment e d ela .e d�
seu pa i e q ue freq uente ment e ti nha receb i d o dinhei-
ro d a sa nta men i n a .
N a q u e l a noit e, d epo is d e ter ja nta d o n o tmafa-15
obs cu ro ca nto que pu d e enc ont ra r, not a n d o a es
33

j ad e i ra q ue eu estava só, veio conversar comigo por


a l g u m tempo.
Confessou-me que havia freq uentado as mesmas
a u l as d e Sa nta Teresinha na escola do convento e
q u e muitas vêzes se senta ra junto dela.
Assim acabou o pri meiro d ia em Lisieux, dia
cheio de impressões profu ndas e vivas, de uma pe­
netração do sobrenatura l e d e u m sentimento cres­
ce nte d a a proxi mação do I nvisíve l e dos Santos.
N o d i a seg u i nte assist i à m issa no sa ntuário da
S a nta. E n co n tre i-me de novo em uma atmosfera es­
tra n h a e n ão pude adotar-me ao a m b i e nte de n e­
n h u m modo.
À tard e fiz outra visita à casa de Sa nta Teresi­
n h a, com a i nte nção de ler sosseg adamente no j a r­
d i m . E n q u a nto eu l i a, aproxi mou-se u m padre b e l g a
e assento u -se a m e u lado . Conversa mos por a l g um
te m po d o m e l hor modo q u e pudemos, pois meu fra n­
cês era p a u pérrimo.
Lem bro-me d e q ue tratamos do ca ndente pro­
b l em a d o d ivórci o e da restrição da nata l idade. Ao
l eva ntarm o-nos para sa ir, perceb emos q ue, sendo
0 d i a da Ascen são, a casa tinha
sido fechada u ma
h o ra m a i s cedo q ue d e costu me e o portã o do j a r­
d i m ta m bém estava fechado . " Somos pri sioneiro s d e
S a nta Tere si n h a " , exc lamo u o padr e belg a, gra nde­
men te excit ado. " Vou proc urar uma esca da " , d isse­
m e meu peq ueno e robu sto amig o . Por sorte enco n­
tra mos u ma esca da no d epós ito de ferra me ntas no
o u tro lado do jard i m e a co locan1os co ntra o muro .
Um Senhor, 3
34
Mas d e n ovo fracassa mos, pois d o outro lado do
mu ro n ã o h avia n i ng uém a quem p udéssemos re­
correr. Assi m, eu e meu compa nheiro encontramos
uma l ata vel ha, na qual co loca mos uma pedra e sen­
tado j u nto do muro começou êle a ag itá-la com tô­
das as fôrcas.
,

Pouco a pouco começa ram a afl u i r os vizinhos


e o meu amigo pôs-se a revolver a lata e a gritar a
plenos pu lmões : "Somos prisioneiros de Sa nta Tere­
si n ha, eu, pad re belga, e um ing lês. Viva a a l iança ! "
Enquanto isto se passava, permaneci agachado
a os pés do muro, terrlvelmente acanhado e a temer
u ma cena pú b lica em país estra ngeiro. Fina l , m ente ,
subi ao muro em meio de grande aplauso e conse­
g u i descer e a lca nçar a minha l i b ertação.
Era na verdade uma cena cômica, mas as suas
conseq uências eram de muito maior importância do
q ue eu então imaginava. Em razão desta delon ga,
cheg uei atrazado ao hotel para o jantar, encontran­
do o refeitório repleto de peregri nos vi ndos de Ro ­
ma . Fui forçado a trocar meu ca ntinho sol itário por
um l ugar no meio da sa la, onde havia uma só ca ­
deira vazia.
Encontrei-me dia nte de um i rlandês de Glas g ow.
I med iatamente entabolou conversa comigo e pe di �­
me que fôsse com êle no d ia segui nte de man h ã vi­
sita r o cem itério do convento, onde Sa nta Ter esi n ha
Fôra a pri ncípio sep u ltada. Respondi que eu n ão es­
tava muito i nteressado, visto q ue seu corp o j á n � o
se achava lá, pois fôra removido para a ca pel a 0
convento. Mas êle i nsistiu e eu a ca bei cede nd o .
35

O caminh� � u e l eva para o cen1i tério corre por


u m cam po b e l 1ss1mo. As árvores e ntrelaçadas eram
d e u m verd e fresco, e os flôres da pri mavera desa­
brochavam por tôdo a parte. A longa pa isagem atra­
vés do val e é sedutora. Era a vereda por onde pas­
sava a Sa nta ta ntas vêzes a fim de colocar flôres sô­
bre o tú m u lo da sua mãe.
Detive mo-nos n esse tú m u lo, rezamos u ma ora­
ção e prosseg u i mos até ao cem itério do convento.
E n q uanto l á estávamos, u ma francesa começou
a falar da Santa e de sua vida.
Mostrou-nos os túmulos que estavam perto e
disse q u e u m d ê l es era o da Reverenda Madre q u e
havia r ec e b i do Santa Teresinha no convento: aq uê­
l e é o d a sua mestra de novi ças e assi m por d iante.
Ve n do q u e e la possu ía u m ínti mo con heci mento
d o convento, pe di lh e que me d issesse alg u ma coisa
-

sôbre Santa Teres i n ha . . .


Vol tamos à ci dade, acompan hados desta se­
n hora e do seu marido.

No cam i n ho reve l e i- l hes, como já o havia fei to


a meu compa nhei ro irlandês, q u e era u m Ang lo-Ca­

tólico. Ela ficou admirad a e mostrou -se muito i nte­


ressad a e d isse-me que, se eu o d e s e jass e , procura­
ria obter- me uma a udiênc ia especi al da Revere nda
Mad re do Carmelo , Madre I nês, a irmã mais v elh a
da San ta.
Deu-me a entender q ue isso era muito difíci l,
mas que faria o possível para o conseguir.
3 •
36

Combinamos u ma entrevista em certo p on to,


u ma hora mais tarde.
No momento determ i nado estava eu a po stos,
mas a sen hora não apa receu. Estava p ara de sistir
d o encontro e começava a retira r-me. Enganamo­
n os qua nto ao lugar do encontro e estive para per­
der a oportu nidade da visita desejada.
Ti nha ela conseg uido a aud iência e fomos j un­
tos, servi ndo ela de i ntérprete.
E assim sucedeu que eu, um estra ngeiro, de uma
confissão diferente, sem conhecer n i nguém e quase
i n capaz de me fazer compreender, não sei co mo,
me achei de joelhos no pequeno locutório do Car­
n1elo, fa lando com a Mad re I nês - Pau l i na - a irmã
mais vel ha de Sa nta Teresi n ha, prostrado onde, an o s
a ntes, Sa nta Teresinha ti nha a joelhado entre torren­
tes de lágrimas, fa la ndo à mesma irmã, " sua mãezi­
n h a Pau l i na " - ouvi ndo a mesma voz que ela, após
seu ingresso no convento.
A entrevista foi b reve e fa lamos pela grad e com
um véu branco a separa r-nos.
A ú n ica pa lavra de que me recordo foi "a bju­
ra r", quando ela me disse que eu deveria ren u n cia r
a tôdas as minha s· crenca s fa lsas
,
.

Lembro-me de me ter d ito a mim mes m o : "Sim,


é exata mente o que ela poderia d izer, por qu e n ad,�
sabe sôb re a restauraç ão catól ica na Igrej a in g l ês a :
Fora encontra mo s o Cu ra com o qu al travei
b reve conversação. Perg u n tou-me qua l e ra o meu
37

supe rior h i erá rq u i co . Repl iq uei-lh e a leg remente: " o


epis cop ado u n iver sa l " .
Ao q ue observ o u : "Mas onde está êle ? " Lemb ro­
me q ue não pude dar uma resposta convi ncente, mas
conso lei-me a mim mesm o com o pensa mento de
q u e e ra ma is seg u ro ser mu ito vago do que mu ito
exp l ícito .
N a ma n h ã seg ui nte passei mi nhas ú ltimas ho­
ras em Lisieux . Fiz uma breve visita à escola bened i­
ti n a onde a Santa ti nha sido educada e vi o a l ta r
onde fôra confi rmada e fizera a sua primeira Co­
mu n hão .
Depois disto fiz uma visita à peq uena casa de
Sa nta Teresinha pa ra reza r a ú ltima prece. Ao en­
tra r, a i · rmã enca rregada de guardar a casa encami­
n hou-se para mim e perguntou-me se era catól ico.
Disse- l h e que eu era um- Ang lo-Católico.
Mostrou-se mu ito interessada e disse então :
" Quero fazer- l he um favor especia l " .
Com isto, abriu uma porta de vidro e fêz-me
entrar; pude �joelha r-me e rezar dia nte d a mesma
a
mesa onde a Sa nta tinha tomado sua ú ltima refei­
cão e bei jar. o tamborete no qual se sentava. Levou­
�e a i rmã pa ra outra sa la e de novo abriu a porta
de vidro e permiti u�me que t9masse nas mãos a cor­
da de pular da Sa nta e ajoel hasse em seu genufle­
xório e bei jasse o seu catecismo - privi légio que a
irmã raramente conced ia a· outros.
,
Ti nha agora de correr para apanhar o trem e
assim p ássa ram os� meus três d ias de visita a Lisieux.
38

Em Trouv i l l e fui força do a es pera r e aguardei a h ­


o
ra d � p � rtida na pra i a onde Sa nta Te res i nh a viu p�­
l a pri m e ira vez o mar e a í med i te i sôbre os aconte­
cime ntos daque l es ú l timos d i a s.
O efeito pri n cipa l desta v i s i ta foi a experiên­
cia e spir i tua l que eu h a v i a fe ito e sem semelha nte
em tôda a mi n ha v i d a .
Pon do d e pa rte a novi dade de tudo aquilo, a
b e leza d a ve l ha c i d a de de Lisieux, sua e n ca ntadora
posi ção em uma adoráve l pri mave ra N o rma ndo , e
presc i n d i ndo do fato de q ue a Sa n ta morrera entre as
a tra ções d a juve ntude, eu a i nda sentia que, como
nunca a n tes experi mentara, estive a braços com o
sob re natura l .
tomado e
A expressão que o sob ren atura l t i n h a
pe la qua l se man i festara a m i m era a vida de San­
ta Teresi nha, uma vida de amor tão intenso a Nosso
Sen hor, tão completa e sacrifi cada que desafiava
qua l quer ponderação e exced ia todo o entend i men to
h umano. Tão austera em sua abnegaçã o que n os
causa pavor, mas tão stmples e humana em su� 1�­
.

t i m idade que sería mos de todo i n capazes de res1stir­


l he.
Parecia que e l a ven cia o tem po e tra n s ce n d ia
todos os laços humanos . A terra e as coisas terrestres
só t i n ham valor para e la enquanto estavam em har­
mon ia com o amor de Nosso Sen hor pa ra co m ela e
com o absorven te a mor com que ela s ou b e corr
es-

po nder-l he.
39

E ra m os quilates de a m or que tín ham os l i do


nas vidas dos santos e q u e ju l gávamos co i sas u ltra­
passadas. Levou -nos ela d i retamen te para o Co l iseu
de Roma.
Aqui se notava hoje o mes m o a m or s obren a tu­
ral dos p ri m e i ros má rti res, a mesma s a nti d a d e herói­
ca, e m nossos dias, em m e i o desta i d a de t ã o m a te­
r i alizada.
E o amor sob re n a t u ra l m a n i festa d o c o m u m a i n ­
tensi dad e q u e e u n u n ca ti nha en co n tra d o a té en tã o,
a ve rdad e i ra re l a çã o d o i n d ivíd u o pa ra com N os so

Senhor ; a re lação d a c ria t u ra pa ra co m o C r i a d o r,


d a a l ma pa ra com D e u s .
E u ma re lação d e co m p leta adora ção e cu l to , a o
m es m o te m po, e d e pe rfeita u n i ão d a a l m a com seu
Salva dor.
Ne nhu ma h esitação ou d úvida q u a nto à d iv i n ­
dade d e Nosso Se n hor J esus Cri sto e ra pos s íve l em
Lisieux.
Tôdas as d iscussões fast i d i osas, n a s q u a is Nosso
S e n h o r é consid e rado com o o gra nde exem p l o q ue
n os a nima a faze r d esa b roch a r a d ivi n d a d e d e n tro
d e n ós, e ram i n co n ce b íveis. A d ivi ndade d e Cristo p u­
n ha-se d i a n te da m i n ha a l m a e m Lisi eux com u m es­
p lendor des l u m b rante. Mi n ha a l m a b e b ia n a fonte
pura da i ni l u d íve l ve rd a d e d a d i vi n d a d e d e m eu Se­
nhor.
Con he c i -o ao l e r a v i da d e Sa nta Te resi n h a e
m i n ha a l ma d isso se a l i mentava, e m b o ra e u antes
sentisse q ue e la não e ra dêste m u n d o .
40

Mas e m Li sieux estav a a casa e m q ue viv er a 0


bri nq u ed os com q u e se d ivert i ra, os obje tos q u � t i �
nha u sado, a s mesmas ruas por onde passa ra, e t u­
do i sto se dera dentro da n ossa própria exist ênc ia .
O m otivo por que m e detive entre as r e l íq u ias
terre n a s da Sa nta não era de mero senti menta l ismo I

como a lg u ns l eitores pod erão i m a g inar, mas poíq ue


pa reci a m u ma gara ntia d e q ue esta a l ma sa ntà e ra
também m u ito h u ma n a - n ão sàmente uma tradi cão '

santa, mas h u mana, p resente a nós em nossos mes-


mos d i as.
E, ao vê- las, con heci que os d ias da s a n t i d ade
heróica não haviam passado e que um mi lagre da
Gra ca sobrenatu ra l estava a nte m eus ol hos .
,

E ra porq ue eu ti n ha l ido sua vida de i n sa c i á ve l


a mor a Nosso Senhor, rad ia nte em meio dos m a io�
res sofri mentos, físicos e mora is, e visto sua m ort e
tão dolorosa, q ue estas p eq uenas coisas terrestres se
tornara m tão preciosas para m i m .
P e l o poder d a s u a vida e do seu amo r, co n s e­
g u i a p roximar-me mais de Nosso Senh or e v ê- l o
mais clara mente.
A simples retidão do seu a mor ti nha fei to ob­ º.

i eto daquele amor pa recer-me m u ito mais próxi mo


O a mor i rradiava do seu santuá rio e jun ta va em u ma
.

fraternidade esp i ritua l aquêles q ue se ajo � l h� �a �


diante d êle. Eu ti n h a estado onde est a v a � inv�51�:
muito próximo e onde o véu era mu ito, m u i t o t en
·
41

O utro fato i m porta nte de q u e estava p e rs u a d ido


e ra que m i n h a vi si ta ti n h o sido g u iada por ca m- i -
n hos m i steri osos.
U m a b a r rei ra a pós o u tra fô ra tra nsposta e os
obstácu los removi dos sem nen h u m esfôrco da m i n h a
,

pa rte .
A p ri n cí p i o parecia co i n cidência e a l g u n s l e i to­
res assi m o poderão i nte rp reta r; mas, com o correr
do tempo, eu sentia q u e era mais do q u e m e ra co i n ­
cid ê n ci a o q u e m e l eva ra a m i m, u m estra n g e i ro e
d esco n h ecido, a a j oe l h a r-me no locutório do Ca rme­
l o e receber a bêncão da Mad re I n ês, a i rmã d a Sa n -
,

ta . Devo atri b u i r isto às ora ções da p rópria Santi-


nha.
Ao mesmo te mpo, se a ntes de i r a Lisieux eu não
tivesse l i do a sua vida, n u nca teria vencido certas d i ­
fi c u l d ad es su perfi ciais q u e me detiveram e o s ca m i ­
n hos estra n hos q ue e u ta nto aborreço : e posso com ­
p reender m u i to bem q ue não poucos i ng l êses v ã o a
Lisi eux e voltem sem ter a p reendido o seu seg rêd o .
A I g reja Cató l i ca, como ta l, não me atra i u g ra n ­
d emente . Eu ti n ha a penas consciência de u ma ex­
traord i n á ri a experiência espi ritua l pela q u a l sou
i mensame nte g rato a Nosso Sen hor.
Não tive nenhum desejo de torna r-me cató l i co
ou a i nda o pensame nto de que deveria d a r ta l pas­
so : pelo contrá rio, qua ndo, ao vo lta r, l i d u ra nte a
travess ia n u m jorn a l uma afi rmação i n compreensí­
ve l e pouco ca ridosa de um bispo a ng l i ca n o a res­
peito do Sa ntíss i mo Sacra mento, suspirei pelo d i a
42

e m q u e t u do o q u e e u tin ha vis to e m Lisieu x, a de­


voção ao n osso Salvado r n o Sa crame nto do A lta r
fôsse t a m b é m a v i da e a as piração da I g re ja da I n ­
glate rra .

Isto m e fêz to ma r a reso lução d e e m p regar m a is


q ue n unca a min ha vida pa ra conseguir ta l ob ietivo .
Fo i assi m que reto rnei a meus ministérios, pre­
tendendo vo lta r, se poss íve l , a Lisi·eux o ano se­
g uinte.
CAP íTU LO I l i

S E G U N DA V I S I TA

P a s s o u o a n o rà p i d a m e n te, rep l et o de a t i vid a ­


d e m i n i ste r i a l d e tôd a es p éc i e : a ex p e r i ê n c i a de L i ­
s i e u x p e rm a n eci a sem p re e m m e u esp írito.
A esta experi ê n ci a vo ltava e u fr eq u e n tem e n te
p a ra rete m p e r a r a m i n h a a l m a .
De q u a n d o em q u a n d o ti n ha va g a s d ú v i d a s m o ­
t i v a d a s p e l o fato de e u n ã o ter i a m a i s e n co n tra d o
co i s a se m e l h a n te n a l g re i a da I ng l ate rra, m a s a s re­
batia m u i f à c i l m e n t e com a res posta d e q u e i s to e ra
q u e stão d e te m po, e, com o cresc i m e n to d o A n g l o ­
Cato l i ci sm o, a mesma co i sa seria poss íve l e m n os ­
s a l g re i a .
E s táva mos reco nstru i n do os l u g a res asso l a d os, e
i sto ba stava pa ra m i m . Ma i s q ue tudo, m i n h a a titu ­
d e e ra d e g ra n-d e g ra ti d a o por ter fe i to ta l expe r i ê n ­
ci a e d e u m dese io d e p rova r a s u a rea l i d a d e me­
d i a n t e u m a seg u n d a vis i te .
E a ss i m , em maio s e g u i n t e d e 1 926, fiz a m i n ha
s eg u n d a vis ita. O ce nário e ra o m es m o Externamen­
te t u d o era come a n tes, e e n treta n to ca d a c o i s a e ra
.

d i fe r e n te .
44

, � Sa nta con10 q u edesa pa recera e tod o o meu


e s p i r ita se vo l to u , n ão
p a ra a Santa em si mesma,
m a s p a ra o u tro po nto q u e ecl i psava tudo o mais -
" Q u e é q u e torn o u poss íve l ta 1 vida ? Q u e é q ue
p rod uzi u Teresa ? "
Até e n tão e u se m p re ti n h a pensado q u e era a
f é pessoa l d a Santa e s u a g e n e rosa resposta a Nos ­
s o Se n ho r e a s u a d ivi n a vo nta d e, a i n d a nos mo­
m e n tos m a i s crucia ntes.
Mas ag ora t i n h a q ue m e perg u nta r a m i n1 mes­
mo o q u e ente nd i a eu p e l a pa lavra fé.
E d u cado no a n g l ica n i s mo, co m suas i n evitáveis
i n certeza s e seu temor de u m a defi n i ção p recisa em
co i s a s es p i rituais, n u nca a t i n h a defi n ido.
Ta n to q ua nto era poss íve l ra cioc i n a r, i sso sig n i­
fi cava p a ra m i m a ca pacidade de acred i ta r em cer­
tas ve rdades espi ritua i s q ue, em bora n ão pud esse
p rová- l a s, n ão era m contrá ri a s. à m i n h a razão ; a
capacidade d e perma necer fi rme na cre n,ç a d a . bon­
d ad e de Deus e do tri u nfo fi n a l da verdade no meio .
d e ta nta co n fusão em m até ria de fé ; e '"d e ape gar­
m e aos c rité rios cristãos n o meio de i n ú m e ras difi cu l­
d a d e s n o toca nte à mora l .
Mas aq u i, no caso d e Sa nta Teresi n hçi, perc e bi
q ue t i n h a d ia nte de m i m a lg o de i ntei ramente d ife­
re n te, a lg u m a coisa d e m u i to m a i s defi n ida e de fôr­
ça m u i to m a i o r.
Ti n h a e l a cert a me.n te a capacidade de se a p oi � r
n a fé n o s momento s .m a i s sombri os e . d e crer e m c o i ­
sas s uperio res à razã o ; mas tudo i sto · e la p o�s u_íq_ em
45

gra � excepci onal, porq ue atrás e deba ixo de tudo


h ? v1a a certeza sobrenatura l naquelas verdades d i­
vinas que ela sab i a ti n ham sido reveladas e das
qu:i is n u n ca d uvid � u por um momento que fôsse.
Nao punha em d úvida estas verdades : não porq ue
a s � a razão a levava a crer nelas, mas porque era m
ens1 na � as por uma autoridade superior que ela re­
con hecia como detentora de uma autoridade d ivi­
na que nu nca pod er i a e rra r ou contra d izer-se e m
m at é r i a de fé.
E e ra por esta r repo usando neste fu nda mento
q u e, l ivre d e i nterm i n áve i s co ntrovérs ias, s u a a l ma
e r a ca p a z d e crescer e desenvo lver-se de maneira tão
m a rav i l hosa .
E u se m p re havia con siderado ta l certeza em ma­
té ri a d e fé como co isa im poss íve l neste mu ndo e até
i n d es e j á ve l ; pois i sto só poderia conseg u i r-se a ex­
p e n s a s do ca ráter e da i nte l i gência e med ia nte o sa­
crifício d e tôda s i nceridade e prog resso; defend i a e u
a i d é i a q u e pensa r por s i mesmo era a cond ição d o
c a ráte r.
E a i nd a a q u i depa rava com o fato de q ue foi
p reci s a m ente esta certeza recebida por Sa nta Tere­
s a d e u ma a utoridade objetiva e exterior q u e prod u­
z i u a vida sa nta mais criteri osa que j a m a i s co nheci .
Porém, mais do que isto, Santa Teresa não pos­
s u ía, só, a ce rteza ; dela tomava pa rte ca da i nd iví­
d u o dentro da sua I g re ja .

E ra isto como comecei a ver, que ti nha d ado a


L i s i e ux sua i � c o m p a r á ve l qual idade es p iritu a l . Em Li-
46
s i e u x estava m reu n i d a s pesso a s de tôd a s as n a çõe s
d e c ad a pa rte d o m u n d o, tôd a s e m pe rfe ita e recí­
p ro c a h a rm o n i a porq u e t i n h a m p e rfe i ta u n idade em
s u a s c re n ça s .
Ta l u n id a d e e m m a t é r i a d e fé e n tre povos de
tô d a s as p a rtes do m u n d o - d i sso me co n ve n c i a g ra­
d u a l m e nte - não pod e r i a ser i nve n ção h u m a n a . N ã o
e r a p o r ter cad a u m fo r j a d o s u a p rópria idéia da
re l i g i ão c r i stã, e porq u e s u ce d e u esta re m todos de
a cô rd o , m a s e ra p o rq ue tod os c r i a m em u m a a uto­
r i d a d e d efi n i d a q u e sa b i a m ser s o b re n atu ra l e d i ­
vi n a , à q u a l p restava m fi rm e e a m o rosa obed i ê n c i a .
E esta a u to r i d a d e n ã o e ra u m a co isa estro p i a da o u
m u t i l a d a , m a s c r i a d ora e p rod u t iva n o m a i s a l to
g ra u poss íve l .
Co mecei a ve r q u e a m i n h a fé e ra pri n c i pa l m en ­
te o res u ltado d a m i n h a p róp r i a razão . Ace i tava o
q u e n ã o pod i a p rova r, c o n ta n to q u e isso n ã o con­
t ra d i ssesse a m i n h a razão . Ao pa sso q u e pa ra Sa nta
Te resa a fé e ra a c re n ça e m ce rtas ve rd a des porq ue
fo ra m e n s i n a d as e reve l a d a s por u m Mestre su pe­
r i o r a e l a e q ue t i n ha a u tor i d ade d ivi n a e por co n­
s e g u i n te o d i re i to de exig i r a bso l uta obed i ê n c i a .
P a ra m i m, o cen tro d a fé j a z i a em m i m mesmo.
Pa ra e l a , jazia n a I g re j a . Para m i m, de acôrdo co �
a s teo r i a s q u e e u d e fe n d i a e n tão, s u a visão da fe
p a rec i a a ntes i rra c i o n a l, e, entreta n to, com � i s i e u x
a nte m e u s o l h os, reco n h e c i q ue n ã o e ra ass i m .
Eu n ã o ti n ha a i nd a verific ado a estreit a r e l a­
a
c ã o e nt re a razão e a a u tori d a d e ; q u e é fu n ção d
,
47
r az ã o g u i a r- n os pa ra on d e res i d e a a u tor ida de d i­
v i n a , e q u e a a uto ri d a d e po
r s i me sm a d ev e ser ca ­
p az d e e n fre nta r o d esa fio d a raz ão , um d os m a io­
res d o n s d e De us ao h om em ou sen ão d eix a r d e
I
ex1 st1 r, po i s só a ver d a d e po d e pre va lec er
• • •

Ma s � no mo men to, e u esta va ape nas che g a ndo ,


.
e com d 1f1cu l d a d e, à def i n ição
cató l ica da fé : "A fé
é u m d o m sob rena tu ra l d e Deus q ue nos torna capa ­
zes de crer sem somb ra de d úvida tudo qua nto Deus
reve l ou . li

"Tu d o q u a nto Deus revelou. "


O nd e se encontra a revelacão de Deus e onde
,

está a a utoridade revestida de poder para leva r


ava nte a giga ntesca ta refa de guardar esta revela­
,
cão e d e ensi n a r à human idade em todos os tem-
pos ?
O n d e está a fonte desta autoridade q ue exige
ta l obed iência sobrenatu ra l ? Onde está o centro
desta u n idade sobrenatura l ? Só há uma resposta .
Afi n a l , pela primei ra vez na mi nha vida, encontrei­
m e face a face com o Papado como a ma ior fôrça
esp i ritua l n a vida h umana . . �té . ent � o, n unca ti � ha
exam i nado de perto suas re1v1 nd1caçoes e o conside­
rava n a verdade como um gra nde poder, mas um
poder p reva lentemente de i nvenção humana.
Roma t i nha sido o centro do mundo e tinha gra­
d u a l men te assum ido a di reção dos negóci os ecle-
siás tico s.
O pode r temp ora l e a astut� d i p loma cia do . V� ­
tica n o tinh am pou co a pou co fi rma do uma . pos 1 çao
i nve ncív el, m u itas vêzes por mét odo s sus pei tos .
48
A l g u mas n ações tivera m a coragem de procla­
m a r a sua i nd ependência espi ritua l, e perto de me­
tad e d o mu ndo cristão re je itou as exigências papa is.
Foi a í q u e a d eixei.
Mas agora me convenci de que um imenso cor­
po como a I g reja Católica não poderia permanecer
u n ida, sendo a natu reza humana o que é, a não ser
q u e o centro d a u n idade fôsse de origem d ivina .
E então comecei a ver ma is um fato : a sa ber,
q u e essa u n idade i nterio r da fé era o segrêdo da
m a ravi l hosa u n idade externa e visível da Igreja Ca­
tól i ca
Eu ti n h a sempre considerado a u n idade exterior
d a I g reja Catól ica como uma u n idade su perficia l e
i rrea l, im posta ao povo por uma autoridade supe­
rior, u m sistema férreo que faz ca lar todo o pensa-
1ne n to origina l, sem luz nem a r, um sistema no qua l
o i n d ivíduo era completa mente esmagado - uma
u n idade de organ ização e não de espírito.
Vi então que eu não pod ia por mais tempo crer
n i sso. Em Lisieux vi clara mente que o segrêdo da uni­
dade externa devia ser buscado n a u n idade espiri­
tua l da fé.
Qua nto mais refletia, mais patente se me tor na­
va q u e a maravi l hosa u n idade exterior da Igrej a Ca ­
tól ica, ma ntendo u n idas numa obed iência ab s o lu ta
a l mas d e todos os quadra ntes do mundo, nã o p od e ­
ria jamais existi r e a i nd a menos sobrevive r m ais d o
q u e q u a lq uer outro rei no, sôbre qua lque r fu n d a me n­
to que não fôsse sobrena tu ra l e d ivino.
49

A I gre j a Cató l i ca era u ma porq u e a s u a fé era


u m a , n e m p od eri a a u n i d a d e d a fé ser p reservada
a nte ? i nd e pe n d ê n c i a da i nte l i gência h u m a na, s e a
.
a utori d a d e n ão fôsse d ivi n a .
D e n ovo, o fato d e m etade d o m u ndo cri stão,
o u m a i s q u e i sso, ter aco l h id o esta a utoridade e g u a r­
d a d o zel os a me n te esta u n idade e ra, como e u pod ia
ve r, m u i to m a i s i m press i o n a nte q ue o d a outra m e­
t a d e, d ivi d i d a e m i n u me ráveis seitas em g u erra a be r­
ta n ã o só contra a I g reja Catól ica, mas a i nda u m as
co ntra o u tras .
D u ra nte u ma sem a n a med i tei sôbre êstes prob le­
m a s, re p i sa ndo-os em meu espírito enqua nto pas­
seava p e l a s estradas e ca mpos das cerca n ias de Li­
s i e ux e a rg u me ntava desta ou daquela m a n e i ra , mas
afi n a l reco n h eci que eu não poderia ter desca nso se
essa q u estão da a u toridade e da un idade não fôsse
res o lvida.
Prete nd e u Nosso Sen hor q u e sua I g reja fôsse
u ma I g re j a doce nte, possuidora desta abso l u ta a uto ...
ridade, a ensi nar uma fé, e a exig i r esta completa
obed iênci a dos homens ? Pretendeu q u e sua l g reia
fôsse una e vis íve l ? E q u is que S. Ped ro e seus su­
cessores fôssem a a utoridade fi n a l e o centro da u n i­
dade pa ra a sua I g reja ?
Pe rcebi q ue eu não pod ia ser hon esto se n ão
e n fre ntasse êste prob lema.
E u afuge ntava êste pensa me nto com o m áximo
e m pe n ho, pois se ac.eitasse e.orno verdad eiras _as rei­
vi n d i ca ções da l g re 1 a Cato l 1ca Rom a na, sabia que
,
Um Senhor, 4
50

cad a pa sso q u e eu desse a n i q u i l a r i a tôd a a m i n h a


exi stên c i a , d estru i ri a a m i n ha s i tuação, ca u sari a i n ­
fi n ita s p e n a s e desâ n i mos a m u itas a l ma s q u e e u ama­
va m a i s d o que se pode exp ri m i r, e m e l eva ria d i re­
ta m ente a o i so l a mento e a o tem o r d o d esco n h ecido.
Ma s n a q u e l e mon1 e n to eu não estava d e todo
co nve n ci d o e n ão pod i a i ma g i n a r n e m seq uer a pos­
s i bi l id a d e de q u e Nosso Se n ho r exi g isse de m i m ta l
sacrifíci o.
A pe nas me co nve n ci , em ta l c i rc u n stâ n cia, q ue
eu d eve ria l e r e estu d a r o utra vez m e u N ovo Testa ­
m e n to com estas q uestões g ravadas e m meu espíri­
to : A utoridade- U n i d ade-Pedro.
Não posso d escreve r o senti mento de i s o l ame n­
to e d esa m pa ro c om q ue d eixei Lisieux esta seg u n ­
d a vez.
Desa m pa ro, pois eu estava m a l p repa rado para
essa g ig a n tesca ta refa d e ta ntas e tão g raves conse­
q uênci a s ; e iso l a m e nto porq u e nada é tão m a l i nter­
preta d o, a i nd a pe l os m a i s ínti mos a m igos, do qu e
" sé r i a s d ificu l d ades s u scitadas por Roma " .
E a ss i m, com o coração a n g u stiado, voltei pa r ?
o m e u Novo Testa m ento, e a seg u nda pa rte d êst e 1 1-

vro co n tém a h i stória do q u e d esco b ri a l i.


PARTE l i
CA P fTU LO IV

A U TO R I D A D E DO N OVO TESTAM E N TO

P a ra a m ed i a n i a d os i n g l êses d i fi c i l m e n te ocor­
re a q u e stã o d e a l g u m a a uto r i d a d e e m s u a re l ig ião.
O i n g l ê s a ce i ta a q u ê l e a s peto d a l g re i a doce n ­
te d a I n g l a te rra n o q u a l fo i ed u ca d o, A n g lo- Ca tó l i­
co, B ro a d (Mod e r n i sta ) o u Eva n g é l i co, e seg ue-o a té
q u e f a l h e e m s a t i sfazer a s s u a s n e cess i d a d es o u e n ­
tre e m c o n f l i to co m s u a s vistas pessoa is s ô b re D e u s
e rel i gi ão.
S e n do, p o i s, esse n ci a l mente h o n esto e s i n ce ro e
n ã o d e s e j a n d o p rofessa r m a is do q u e c rê rea l m e n te,
o i n g l ês re m ove t u d o o q ue n ã o pode a c e i ta r e de­
s e n vo l v e por s i m esmo uma re l ig i ão p essoa l .
A resp e i to d esta re l ig i ão, a ss i m formada, é ê l e
i n te n s a m e nte reservado, e, i nte rrog a d o sô b re o as­
s u n to, resp o n d e ri a com com p l eta convi cção q u e re l i­
g i ã o p a ra ê l e e ra matéri a i nte i ra me nte confi n a d a e n ­
t r e D e u s e a a l ma, e q ue cada u m devia b u scá - l a por
si m es mo e fazer o poss íve l pa ra vivê- l a .
Ma i s a i n d a : q ue s e êle q u i sesse to m a r p a rtido,
opta r i a s e m d úvida pe l a I g re j a d a I ng l aterra, mas
n ão q ue r p render-se a n e n h u ma cre n ça pa rticu l a r e
s em p re tra ta r i a tôd a s as re l ig i ões com respeito.
54

Ao tom a r esta atitud e seria êle extre ma me nt e


modesto e desconfiado.
Mas desde que haja a lguma sugestão de um a
a utoridade eclesiástica q ue tem o poder de guiar a
rel i g i ão d o homem e de d izer de modo bem defini­
do o q ue deve ou não deve crer, uma autoridade
q u e a lg u mas vêzes exigirá dêle o que é contrário a
s eus j u ízos pessoa is, então imed iata mente se torna
obsti nado e revoltado.
Teme sobretudo ser obrigado a renunciar à in­
dependência da sua consciência em favor de outrem,
e d iz a si mesmo que o poder do sacerdócio come­
teu a busos i nomi náveis nos tempos med ieva is.
Sente ta mbém, em seu subconsciente, que todo
éste temor está consubsta nciado com a vigorosa in­
dependência q ue é característica da nação inglêsa
e foi a fonte da sua gra ndeza ; e, se coagido a lém
de u m certo l i mite, o ing lês modesto e desconfiado
trava rá o mais renh ido combate por sua indepen ­
dê ncia em religião.
Fa rá isto, não porque deseje combater, mas por
causa da sua profunda convicção de que esta in de ­
pendência que ê le preza acima de tudo em qu est õ es
naciona is, é a i nda mais vita l em coisas que con cer­
nem à a lma huma na.
Sem esta i ndepend ência os homens torn a r:i - s e
partidá rios ; pequen os sequaz es de peque nas s ei t ase,,
e perdem aquela l i berdade de pensam e nto qu e a­,
particu larmente ing lêsa e particu lar mente n ece ss
ria nos tempos modernos.
55
Esta d i sposi ção de espírito é fortificada pel o
fato de que entre g ra nde n ú mero de homens há u m a
dúvida crescente no ínti mo das suas a lmas sôbre a
confia nça que merecem os Eva ngel hos ; duvidam q u e
a rel igião cristã seja i mposta a todo o mundo; d uvi­
dam que possamos saber rea lmente q u a l era o ver­
dadei ro ensi no de Nosso S e n h o r .
Hesita m, a ntes d e d ize r q u e crêem q u e Nosso
Se n ho r é verdadei ramente Deus.
Pa ra ê les J es u s Cri sto é o g ra nd e mestre de vis­
tas l a rg a s q ue b a s e i a tudo no a m o r de De u s e n o
a mo r d o s n ossos seme l ha n tes. Que m a i s p od e is de­
seja r ? Ser m a i s exp l ícito é perigoso.
N esta atmosfe ra é óbvio que a a uto ridade n ão
e n co ntra l u g a r rea l . Onde tudo é tão va go, n i ng uém
pod e p rete nder fa l a r com a uto ridade.
H o je, êste afasta mento de tôda a a utoridade
e c l e s i á stica d efi n i d a i nvad e tôda a re l i g i ão n a I g re­
j a d a I ng l a terra . I sto é patente nas I g rejas Eva n g é­
l i c a s e B road (Mod ern i stas), mas existe ta m bém en­
tre os Ang l o-Catól icos, q u e s i n ceramente desejam cer­
ta a uto ridade n a I g rej a . Mas êste desejo visa pri n­
c i p a l mente u m a a utoridade q ue a poie ce rta s d o u­
tri n a s q u e por s u a s i nte l i gências e j u ízos i nd ivi d u a i s
chegara m a aceita r.
Entreta nto, se essa a u toridade entra r e m confl i­
to sôbre q ua lq u e r ponto com aquêle j u ízo e i nte l i ­
g ê n cia, de ixa rá d e ter q u a lq uer pêso.
Ta l visão da a utorida d e abre m a rgem à i nde­
pendência e j u ízo privado.
56

. os cató l i cos , porém , a ceita m a a u torid ade da


lgre 1 a porq u e crêem q ue é uma autorid ade ord e na ­
d a p o r Deus, à q u a l presta m a bsol uta subm iss ão; sa­
bem q ue, a i nd a naquela s doutri nas que pare ce m
i n a c eitáveis à sua razão, a I g reja será afinal reco ­
nheci d a como verdade ira, porqua nto foi estabe leci­
da por Deus para ser mestra da verdade.
Esta concepção da a utoridade n ão deixa mar­
gem a o j u ízo privado.
Só me persuad i de q uão d iferen te é a concep­
ção Ang lo-Catól ica da a utoridade, quando em Li­
sieux me achei face a face com a a utoridade d a
I g re j a catól ica : absoluta e intra nsigente, exige e m
nome de Nosso Sen hor uma completa submissão do
i nd ivíd uo.
Tentei evita r ta l con cepção, cheio de dúvidas e
temores. Seg u ra mente uma extrema visão da autori­
dade era desnecessá ria, deformadora da inteligê n­
cia h um a n a e do prog resso socia l : por certo isto sig­
nificava o s u icíd io da i nd ivid ua l idade .
. Aci ma de tudo, sem sombra de d úvida, isto ul­
trapassava a i ntenção de Nosso Senhor nos Evange­
l hos, e contudo não pude l ivra r-me da convicção d e
q u e h á a lgo de sobrenatura l nesta autoridade, em­
bora a temesse e desconfiasse dela em extremo.
E assim, nesta d ispos ição de espírito, to rn ei ao
Eva n g e l ho, crendo d ifici l mente que êle pude sse d�­
fender ta l concepção d a a utoridade e aind a m e i o
receoso de q ue o pudesse fazer.
C A P fTU LO V

A A U T O R I D A D E D E N O SSO S E N H O R
N O S E VA N G E L H O S

Tor n a n d o a o Eva n g e l h o, a f i m d e exa m i n a r q u e


coi sa e n si n a sô b re a a utori d a d e, d esco b r i q ue, l o n ­
g e d e s e r vag o e i n d eterm i n a d o, e ra e m extrem o c l a ­
ro e d e f i n i d o.
Se nos vo l ta mos p a ra S. Mateus, S. Ma rcos, S.
Lucas, ve m o s com o d e todos ê les se d ed uz niti da m en ­
t e e sta verd a d e.
Ao i n i ci a r o s e u m i n i stério, N osso Sen h o r n os é
a p re s en ta d o com o u m a p essoa q ue e n s i n a com a u­
t or i d a d e ú n i ca :
" E a co nteceu q u e, tendo J esus aca b a d o êste d is­
c u rso, estava m a s m u ltidõ es a d m i radas d a sua d o u ­
tri n a , p o rq ue e n s i n ava com o q u e m ti n h a auto ri d a d e,
e n ã o com o o s escri bas e fa riseus " (Mat. 7, 28-29).
" E fica ra m todos tão ad m i rados, q u e se i nter­
rogava m u ns a o s o utros, d izendo : Que é i sto ? Q u e
n ova d outri n a é esta ? Poi s ê l e m a n d a com a utorida­
d e a té nos espíritos i m u n d os e êstes l he o b edecem "
(Mo re. 1 , 27).
" E espantava m-se d a sua d o utri na, porq ue a
s u a p a l avra e ra com a utoridade" (Luc. 4, 32).
58
" E m u i tos dos q ue o ouviam adm iravam-se d a
sua d outri na, d izendo : Donde vêm a êste tôdas es­
tas coi sa s ? E que sabedoria é esta, q ue l he foi d a­
d a ?" (Ma rc. 6, 2).
Com seus próprios lábios proclama Nosso Se­
n ho r q ue esta autoridade é maior q ue tôdas as q ue
exi sti ra m a ntes, e q ue é sobrenatura l e eterna :
" Ouvistes o que foi d ito aos antigos . . . m as
eu vos d igo" (Mat. 5, 21 ).

N ão admira q ue os seus inimigos o temessem e


não ousassem interrogá-lo :
" E les o temiam, visto q ue todo o povo admirava
a sua doutri na " (Ma rc . 1 1 , 1 8).
" E desde então, ninguém ma is ousava i nterro­
gá-lo" (More. 1 2,34).
Tão defi nida era a a utoridade com que Nosso
Sen hor fa lava e agia q ue impelia os seus inimigos a
fazer- l he um desafio di reto. Pergu ntaram-lhe os
prínci pes dos sacerdotes : "Com q ue autoridade fa ­
zes estas coisas, e q uem te deu esta autoridade ?"
Fina l mente, o próprio Sa lvador, com seus p r ó­
prios láb ios declara exercer absol uta e comple ta a u ­
toridade no céu como na terra :
"Tôda a utoridade me foi dada no céu com o n a
terra " (Mat. 28, 1 8).
"Tôdas as coisas me fora m entregues po r m e u
Pai " (Luc. 1 0, 22).
Nestas passage ns vemos Nosso Sen hor com o al­
guém q ue fa la com a utoridade diferent e de o u tra
59
q ua l q uer, com u m a a uto rid ad e tão cla ra e de fin ida
que todos a reco n h ece m .
Ma rav i l h a m-s e seu s a m igo s ; vira m-s e seu s i n i­
mig os for çad os a des afiá - l o e, red uzid os ao si lên cio
e ao tem or, torn a ra m -se a bso l uta men te inca paz es de
respo nder - l he . ·

Fi n a l men te, exig e Nos so Sen hor par a as sua s pa­


l avra s u m a perm anên cia q ue va i a lém do temp o e
do espa ço, e deli bera dam ente nos d iz que êfe pos­
su i tôda a a utorid ade, não sóme nte na terra, senão
ta mbé m nos céus .
Qua ndo nos voltamos pa ra o Evangelho de S.
J oão, a evidência tra nsparece mais ainda.
P roclama Nosso Senhor definitivamente q ue a
sua a utoridade vem d i retamente de Deus Pai :
" Eu sa í de Deus e vim ; porque não vim de m im
m esmo, mas Ele me enviou " (J oa . 3, 34).
a
" Aq uêle quem Deus enviou, fa la pa lavras de
Deus; porq ue Deus não l he dá o espírito. por med i­
d a . O Pa i ama o Fi l ho, e pôs tôdas as coisas na sua
m ã o " (Jo. 3, 34).
" O Pa i a n i" ngu ém julga, mas deu ao Fi l ho todo
o pod er de ju lga r" (Joa . 5, 22) .
E porq ue seus ensiname ntos vêm de Deus Pai,
são por con seg uinte a verd ade :
" Mas agora procura is matar-m e, a mim, que sou
u m homem que vos disse a verdad e que ouvi de
De u s " ( J o a . 8, 40) .
"Se vós perm anecerde s na minh a palav ra, s � ­
reis verd ade ira men te meu s disc ípulo s, e conh ecer eis
60
a verdade, e a verdade vos torna rá l ivr es " (J oa . 8,
31).
No d i scurso fi n a l, a ntes da Pa ixão, dirigido 0
seus d oze apóstolos, assevera explicitamente : " Eu
sou a Verdade" (J oa . 8, 3 1 ) .
Ma is q ue tudo, a fi m d e mostra r que nisto não
e ra possível enga no, confi rma d e novo esta afirma­
ção d i a nte de Pi latos em um dos momentos mais
cruciais da sua Pa ixão :
"Vim ao mundo d a r testemunho da verdade"
(J oa. 1 8, 37).
Assim, a idéia que nos dá de Nosso Senhor o
Eva ngelho não é apenas a d e quem amou todos os
homens com um a mor ma ior q u e qua lq uer outro ja­
m a is visto, mas a de q uem fa lou com autoridade
ú n ica, afi rma ndo ser o mestre de uma revelação di­
vi n a q u e lhe foi dada por Deus Pai, uma revelaçã o
q ue por êsse mesmo motivo deve ser ouvida e o b e­
decida d e todos os homens, porqua nto é a verdade.
Passa rão o céu e a terra, mas permanecerão os s eus
e n s i namentos, visto que êles são a verdade.
Nosso Senhor sempre ensinou que o ver da dei ro
a mor da human idade deve a nqar pa r a par co m u_m
correspondente amor da verdade. As duas co is as .s o o
n a verdade uma só; e de fato assim deve ser, po 1s 0

a mor q u e não se funda n a verdade não pa ss a d e


sen time n ta l ismo e fraqueza, fa lta ndo-lh e o ele� en,­
to de sacrifício e de ren ú ncia, sem o qu a l n ao e
a mor, mas complacência em si mesmo.
61
Enc a remo s isto b e m d e perto . Ac h amo- nos d i­
ant e d o fato mais prepon d era nte d a h istória d o gê­
nero h u ma no : a sa b er, o fato h istórico que o p róprio
Deus d esceu à terra, não apenas como um g ra n d e
mestre ou u m g ra n d e profeta , mas como Deus que
é, na pessoa d e J esus Cristo e q ue viveu entre os
homens. Pa ra q u ê ? Pa ra revelar aos ho mens a ver­
dade sôbre Deus e sôbre a humanid ade - e p a ra
most rar a o homem o ca m i n ho da sa lvacão .
,

Quando Nosso Sen hor Jesus Cristo fa la, é Deus


q ue m fa l a . D a í se segue q ue seu ensino é todo ver­
dade e traz a pós si tôda a autoridade de Deus.
Este ensino é claro q ue nu nca muda, pois a ver­
dade não pode contrad izer-se a si mesma. Não po­
de e l a pertencer a um povo apenas; pertence a tô­
da a família h u ma na.
Quando Deus fa la, tôda a human idade deve
dar- l he ouvidos e obedecer- l he.
Se u m homem depara face a face com êste mes­
tre divi no e obsti nadamente rejeita o seu ensino, é
conden ado.
E dema is, não é êste mestre apenas um juiz ar­
b itrá rio. E: o maior amante da humanidade q ue ja­
mais viu o mu ndo. Cativou o coração do mundo des­
de q ue apareceu entre os homens.
Seu amor, porém, não é um amor fraco, senti­
menta l, q ue dá largas às misérias humanas, mas u m
a mor forte e vigoroso.
E quando queriam os homens que êle atraiçoas­
se a verdade, entregou-se a si mesmo a fim de mor-
62
rer pela verdad e; ass i m deve fazer todo a mo r v er­
d a d e i r o, pois o a mor e a verdade n u nca po de m e s­
ta r u m contr a o outro .
A m a i s perfeita revelação da verdade é o a m o r
d ivi n o q ue morre sôbre a cruz por a mo r da verd ad e.
Mas, a esta a ltu ra, a lguém poderia mu ito be m
d izer : " Se isto é verdade, achamo-nos d iante de u m
fato tra nscendenta l íssi mo . Mas como saberemos n ós
q u e os Eva ngel hos são u m testemunho digno d e fé ?
N ã o pudera m acaso i ncid ir em êrro os eva n g � l is­
tas ou os trad utores ? Pod emos esta r rea lmente seg u ­
ros d o que na rea l idade d isse Cristo Nosso Se n h o r ?
O próximo capítu lo será consag rado a es ta
q uestão. Por ora, tudo o que podemos dizer é q u e
os Eva ngel hos, q ua nto à sua autoridade, dependem
d a Sociedade que os produzi u. Acred itamos q u e o
testemu n ho das Escritu ras é verdadeiro e i n s p i rado,
porque a primitiva sociedade cristã, a Igreja Cató li­
ca, que os red igiu e sancionou a sua publ ica ção, e ra
e l a mesma d ivi na mente i nspi rada e tinha aut orid a-
d e d ivi na para agir assrm. .is­
E esta Igreja Católica, por sua tradição e m a g
tério, sempre ensinou, desde os primei ros te m po s,
q ue J esus. de Naza ré é .Deus e Homem ve rd ad e -

q u e ela conservou pa ra sempre em seus sí m b ol os


" J esus Cristo, Fi l ho u n igên ito de Deu s, n a s c i d os
d e fé.
d o Pa i a ntes de todos os sécu l os. Verd ad ei ro Deu
d e Deus �er � adeiro, ger � d o, não feito. Sen d c:> d� me�
ma substa nc ia com o Pa i, pelo q u a l tud o foi fe,1 to.
q ua l, por a mor de nós, homens, desc e u d o s c e u s ·
· ·

e se fêz Homem. "


CAPITU LO VI

A AUTO R I DA D E DA I G R EJ A
N O S EVA N G E LHOS

C o m o p o d e m os n ós con hecer q ue tud o i sto é


ver d a d e i ro ? Vi m os n os textos d o Eva n g e l h o q ue N os ­
s o Se n h o r é a o m es m o tem po D e u s e H o m e m - p e r­
f eito D e u s e p e rf eito H om e m .
Q u a n d o N osso Sen h o r fa l a é Deus q ue m fa l a .
Q u a n d o e n s i n a é a verdade tôda ; e s e u e n s i n o
a ca r reta con s i g o tôd a a _a utoridade d e D eus, e o s
q ue o o u ve m d evem p resta r- l he o bed iência.
E l e a sseg u ra c l a ramente que é Deus ; esta re i­
vi n d i ca çã o e ra reco n h ecid a ta nto pelos i n i m ig9s co­
m o p e l o s a m igos. Foi condenado à morte p o r ca u sa
d esta afi rmação e ressuscitou dos mortos pa ra mos­
tra r q ue fa l ava verdade.
Mas como podemos saber q ue êste fato d e g i­
a a ntesco a lca nce rea lme nte se deu ?
'J

A ntes d e aceita r u m a rea l idade tão tra n sce n­


d ente, d evemos esta r seg u ros d os fu ndame ntos em
q u e se estriba.
Como podemos saber q u e são verdadeira s a s
n a rrativas d o Eva nge l h o ? Fêz Nosso Sen hor rea l -
1nente essa afi rmação ? São de fato verdad eir os o s
t' nsi n a rnentos reg istrados n os Eva ng e l hos ?
O s Eva ngel hos fora m escritos a lg u n s a nos depois
q ue E le d eixou êste mu ndo. Que a conteceu nesse
1ne i o tem po ? Porventu ra cessou a a utoridade de
N osso Sen hor a pós a sua a scensão ou de ixou Ele a l­
g u n s representa ntes pelos q uais e l a poderia ser
conti n uada no correr dos tempos ?
Se é a ssim, onde está ela ? A confia nça no Eva n­
g e l h o deve depender de q ua lquer autoridade seme­
l ha nte.
Exa mi nemos os Evangel hos mais uma vez.
Descobri mos nêles que Nosso Sen hor tra nsmitiu
s u a a utoridade aos a póstolos, que d everiam ser as
col unas d a sua I g reja, e esta I g reja o santuá rio da
s u a d ivi na a utoridade até ao fi m dos sécu los.
N otemos as passagens nas q ua is Nosso Senhor
confia êste g ra nd e enca rgo a sua I g reja.
Cada Eva ngel ho regi sta esta delegação :
" Foi-me dado todo o poder no céu e na te rra .
I d e, pois, ensinai tôdas a s g entes . . . ensi n and o- as
a o bserva r tôdas a s coisas que vos m andei ; e eis q u e
estou convosco todos os d ias, até a consu maç ão d os
sécu l os " (Mat. 2g,1 a).
0
" I de por tod o o m u ndo, p rega i o Eva ng e l h o
tô d a a criatura . O q ue crer e fôr batizado , s �rá s a �­
vo; o q ue , porém , não cre r, será conde nad o (Ma ·
1 6, 1 5).
65

" E eu vou ma ndar sôb re vós o prome tido por


m eu Pa i ; e ntreta nto, perma n ecei na cidade, até q ue
sej ais revestidos da vi rtude do a lto " (Luc . 24, 49).
" Assi m como meu Pa i me enviou, também eu
vos envio a vós. Tendo d ito estas pa lavras, soprou
sôbre êles, e disse- l hes : Recebei o Espírito San to.
Àqueles a q uem perdoa rdes os pecados, ser-lhes-ão
perdoados ; e aq uêles a q uem os retiverdes, ser-lhes­
ão retidos" (J oa. 20, 21 ).
Vemos aqui como a I g reja é estabelecida no
mu ndo com uma autoridade sobrenatura l e d ivina;
uma autoridade que é absol uta, e que decorre do
próprio Salvador, que está acima de todos nos céus
e na terra : "Todo o poder me foi dado no céu e na
terra. Ide, pois " .
Confia Nosso Senhor à sua Igreja uma missão
que se identifica nada menos do que com a missão
de q ue o revesti u o Pa i ao enviá-lo ao mundo.
"Ass i m como meu Pa i me enviou, eu vos envio a
VOS.
, li

Poderia a lguma coisa ser mais clara, mais sole­


ne, ou mais d i reta ?
Pros segu e Noss o Senh or torn ando perfe itamente
evid ente a essê ncia dest a miss ão : nada men os do
que ens i nar a tod o o mun � o tôda . a ver.da � e .. que
l:le ens i nou aos Apó stol os. I de, pois , ens1 na1 tod as
as gen tes . . . ens i na i-as a obs erv ar tôd as as coi � as
que vos ma nde i . " " Ide po r tod o o mu ndo , prega i o
Ev angelho a tôda criat u ra . "
Pe nsa i u m i nst a nte n o a lca nc e de sta inc um bê nc ia.
U m Senhor, 5
66

U m peq ueno g rupo de judeus i ncu ltos e ig no­


ran tes, q u e n u nca sai ra m da sua própria terra, e n ­
carregados de d ifu n d i r a suprema reve lação de D e u s
aos homens ; e esta revelação devem êles ensiná-la
a todo o mu ndo. Terão q ue encontra r vá rios tempe­
ram entos de d iferentes nações e aprender suas lín­
guas ; terão q ue im por a aceitação d o seu Evange­
lho a os g ra ndes fi lósofos de Atenas, Corinto e Roma.
E isto sem d úvid a ta refa de todo impossível e

de mu ito superior às suas fôrças, a não ser que l hes


seja dada a lguma assistência sobrenatu ra l que os
preserve de qua lq uer êrro fu ndamenta l e que sejam
conscientes ta mbém de possu i rem uma assistência so­
b re n atu ra 1 .
De outra sorte, como poderiam a n ima r-se a en­
si n a r e como poderia a lg uém ser i nduzido a ace ita r
seus ensina mentos ?
Esta assistência sobre natu ra l prometeu-lhe Nos­
so Sen h o r em d uas ocasiões. Uma ocasião foi quan­
do l hes confiou a g rande m issão, no Evangelho de
S. Mateus, e termi nou prometend o-l hes até ao fim
dos tem pos a sua presença protetor a e i l uminado ra :
" Eis q ue eu estou convosc o todos os d ias, até a con ­
suma cã o d os sécu los " .
,

A segu nda ocasião foi dura n te o solene dis cu r­


so feito aos Apósto los depois da ú lti ma ceia :
" E eu rogarei ao Pa i e Ele vos dará u m o utro
Consolador, para que fique eternamente co n vo sc o,
o Espírito de verdade" (J oa. 1 4, 1 6).
67
" Qu a nd o vier, porém, aquê l e Espírito d e verda ­
de, E l e vos ensi n a rá tôda a verdade " (J oa. 1 6, 1 3) .
" O Espírito Santo, a q uem o Pa i envi a rá e m m e u
nome, E l e vos ensi nará tôdas a s coisas, vos recor­
da rá tud o o que vos ten h o d ito " (J oa. 1 4, 26).
A promessa que E l e fizera em seu d iscu rso a pós
a ú lti m a Ceia, repeti u-a da maneira m a is d ra máti­
ca e com g ra nde ênfase momentos antes da sua As­
cen são, q u a nd o d isse aos Apóstolos : " Vou m a n d a r
sôb re vós o prometido por meu Pai ; entreta n to, per­
m a n ecei n a cidade, até que sejais revestid os d a v i r­
tude d o a lto" (Luc. 24, 49).
E d ifíci l i maginar como poderia Nosso S e n h o r
ter s i d o m a i s exp l ícito o u mais preciso sôbre êste
pon to ca pita l . Se o cristian ismo é a revel a çã o d e
Deus, confiada a sêres h u manos pa ra ser d efe n d i d a
e conservada até a o fi m dos tempos entre os h o­
m e n s, ta l q u a l a con hecemos, pa rece que é esse n ci a l
u m a assistên cia i nfa l ível.
Que esta i nfa l i bi l id ade, esta defesa cont ra o
êrro, foi dada aos Apóstolo s por Nosso Senh o r é
coisa p rovad a pelas terrific a ntes pa lav ras d o Salv a ­
dor e m S. Ma rco s :
" Id e por todo o m undo, pregai o Eva ngel h o a
tôda criatu ra. O q ue crer e fôr batizado , ser á s a l­
vo; o q ue, porém , n ão cre r, será conde nado. "

Que Socied ade se atreve ria a dizer que to do 0


que crer e m seus ens i name ntos será sa lvo e to do 0
q ue obsti nada ment e � ão crer será conde na do, s e
tal Soci ed a d e não estivesse certa de que u ma reve -
s •
68

l a çã o d ivi n a l h e foi confiada pelo p róprio Deus e


l he foi d a d a uma assistência i nfa l ível para e nsi ná-la ?
Além d isso, que efeito teria a condenação d e ta l
Socied ade , se os homens não estivess em persuadido s
d e ser e l a d i rigid a por Deus ?
t: assim que o Eva nge l ho nos asseg ura q ue Nos­
so Sen hor confiou sua a utoridade aos Apóstolos,
l hes ordenou que ensi nassem tôda a verdade a todo
o m u nd o e l hes prometeu preservá-los d e qua lq uer
êrro até o fim dos tempos : e que poderia m exig i r a
obed iência dos homens e que todos os q ue se obsti­
n assem em rejeitar a sua autoridade seria m conde­
nados.
E esta a utoridade, embora defi nida, n ão deve
ser i ncom patíve l com o mais a lto gra u possível do
a mor.
No d iscu rso q ue se seg u i u à ú ltima Ceia, S. João
n os d iz como Nosso Sen hor, que deu ta l autoridade
à sua I g reja, l h es ordenou com o máxi mo empenho
se a massem uns aos outros como E l e os ti n ha amado :
" Como meu Pa i me a mou, assim eu vos amei.
Perma nece i no meu amor" (J oa . 15, 9).
" O meu preceito é êste : que vos ameis u ns ao s
outros, como eu vos a mei " (J oa . 1 5, 12).
" N i n g uém tem maior a mor do que o da qu ele
q ue d á a sua vida por seus a migos" (J oa. 15,1 3).
" Dou -vos u m n ovo m a nd a mento : Que vos am e is
.

u ns aos outros, e q ue, assim como eu vos a m ei, v oo-s


a me i s ta m bém u ns aos outros. Nisto con h ece rã o t
69

dos q u e s o i s meus d i scípu l os, se tiverdes a m o r u n s


aos outro s " (J o a . 1 3, 34-35).
A m o r e a utori d a d e vão d e m ãos d a d a s n o Eva n ­
ge l h o ; n u n ca s e encontra i n d ício d e a lg u m c on f l i­
to e ntre o severo manda mento d e N osso Sen h o r e
seu ter n o a mo r para com a human idade : n e m j a m a i s
s e i nsi n u a q u e a por vêzes severa a uto r i d a d e d a
l g re i a d e C ri sto deva ser contrá ria a o ter n o a m o r
d esta I g reja pela raça humana.
O a m o r d e Nosso Senhor, i rrad iando da cruz,
exig e o b ed iência : o a mor da I g reja Cató l ica, exa l a ­
d o d e s e u s sím b o los d e fé, exige ta mbém o b e d i ê n ­
c i a . E a p a ná g i o desta idade moderna a con ce p ç ã o
d e u m a mo r fraco, senti menta l que receia exi g i r o b e­
d iê n ci a e q ue, por conseg ui nte, destrói a socieda d e
e o l a r.
A O R A C ÃO DE NOSSO SE N H O R
,

PEL A SUA I G REJ A


Mas n ã o é só isso o q ue nos diz a Escrit u ra sô­
b re a I g reja . No ca pítu l o 1 7 de S. J oão, N os so Se­
n h o r n os rev ela o q ue lhe ia no mais pro fu n d o d o
seu cora cão a resp eito de seus Apóstolo s e da I g re ­
ja, d a q � a l se ria m os fu nd ament os.
São pala vras mu ito prec iosa s, porq ue são as ú l­
tim as pa lav r as d itas por Ele na presenç a de to d o s
A.í n os é d a d o
os Ap óst ol o s, a nte s da Sua mo rte . .1v1
pe ne tra r sem d ific u lda de n a me n.te d n a e na s p ro ­
fu n deza s da i nt e nç ão e sa be do r ia de De us .
70
Q ua l é . º n úc leo de to do ês se ca pít u lo? A
dade ta nto i nterna como extern a. u ni -
E u ma pr � ce pe l os Ap óst olo s e sua s nece ssi
da
des, q ue cu l � 1 na n u .ma _ o raçã o para que seja m u m­
com u ma u n idade visível a todo o mu ndo .
CRENCA DOS APóSTOLOS NA
,

D IVI N DADE D E N OSSO SENHOR


Ao i n i c i a r a sua oraçã o revela Nosso S e n h or
q u e a rea l idad e s u p rema q u e d o m i nava sua mente,
com respeito a seus apóstolos, e ra serem êles os h o­
m e n s que o Pa i l h e d eu e a os q ua i s manifestou tôda
a reve la cão d o m esmo Pa i :
,

'
" Ma n ifestei o teu nome aos homens, q u e me
deste d o m u nd o " (J oa . 1 7, 6).
A ê l es confiou as pa lavras que o Pa i l he ti n h a
dado ; e por isso crera m e con hecera m seguramen­
te q ue E l e viera do Pa i. Quer isto d izer que êles cre­
ra m e m Sua m issão d ivi na e e m Sua d ivi ndade :
" Eu l h es dei as pa lavras q u e me deste a m i m ;
e ê les as re.c eberam, e con hecera m verdadei ramen­
te que sa í d e ti, e crera m que me enviaste " (Jo a .
1 7, 8) .
Tendo mencionado esta verdade centr al, a s a ­
ber, Sua d ivi ndad e, e a crença d os Apó stol o s n essu ee
particu lar, conti nu a a o ra r por a l g u ma co isa q u
seria apenas cons eq uência de ta l crenç a : qu e s e l
Apóstolos possa m ser u m com u ma u nid a de t ã o re a
como a U n idade na p rópria D ivi ndade :
71
• pa i Sa n to , g u a rd a e m t
me deste, p a ra
eu n ome
q u e sej a m u m , a qu êl e s q ue
(J oa . 1 7, 1 1 ).
a s si m c om o n ós ·

O C ON F L IT O D O S A Pó ST
O LO S
COM O MU N D O

Pas sa E l e e ntã o a d i z e r q ue e s ta pa 1 avr


d.
a, a ver-
d a d e d e S u a 1v1 n d a d e será à l inh a d iv1s .
º ona, . en-
tre a l g re i a e o m u n do :
·

'

Dei - hes :1 tua p a l a vra , e o mu ndo os od iou,


u �
po r q u e n a o sao d o m u ndo, como eu també m não
sou do m u n d o " (J oa . 1 7, 1 4).
Mas ao mesmo t � � po mostra Nosso Senhor que
e s t a cre nça e m Sua d 1v1 ndade será o verdadeiro f u n ­
dame nto d a santidade dos Apóstolos :
" Sa ntifica-os n a verda de. A tua pa lavra é ver­
da d e " (J oa . 1 7, 1 7) .
Até a q u i vi m o s q ue o prin cip a l pen sam ento de
N osso Sen h or e ra q ue Seu s Ap óst olo s acr ed itas sem
n a verdade da Sua d ivi n a mis são na revela ção so­
b re n a t u ra l q u e n os faz o Fi l ho de De us : vim os que
d i v i n d a d e , qu e No sso Se nh
e s ta c re nca e m Su a
or
c h a m a a Ve rda de , te ria do is res u lt ad os.
'

rá -lo s do m u nd o, po rq � e
P ri m e i ra m e nt e, se pa
e ra u m a cre n ca e fi n id a m e n te so b re na tu r� I, n � o
d I ª en1 ao
d e st e m u nd o. E m u ito i m p orta n t e n o ta r q ue .
,
·

N os s o Se n ho r ti n ha pr ed it o qu e ª. ve � d a � � i r ? f ,,
e
1z ad e
qu a nto à Sua P e rs o na l id a d e, . si g ni fi ca ri a in 1m
e
o m o m u ndo e n ã o com p
r o m i ss o.
72
E agor a toca mos no pont o cu l m i na nte de sta
g ra nd e oraç ão. Esta un idad e entre os Apó s tolo s d e
veria cont i n u a r pel o corr er d os sécu los entre to do s ­

os q ue a cred itasse m em suas pa lavra s,


entr e to do s
os q ue seg u issem a fé Apos tól i ca, e esta
devi a se
uma u n id ade i nterio r e espi ritua l que teria , co m or
sina l visíve l e exterio r, uma u n idade extern a.
E esta u n idade externa d everia ser tão clara e
defi n id a q ue l evasse o m u nd o estra n ho dos que não
c r ê e m à convicção d e q ue ta l u nidade só poderia
provi r d e uma origem d ivi na, só poderia ter sido
fundada por Deus :
" Eu n ão rogo sàmente por êles, mas também
por a q u êles q u e h ão d e crer em m i m por meio das
suas pa lavra s ; pa ra q ue sejam todos um, como t u ,
Pa i, o és e m m i m, e eu e m ti, para que também êles
sej a m u m em n ós, a fim de q ue o mu ndo creia q u e
tu m e enviaste " (J oa. 1 7, 20-21 ).
Antes de ter estado em Lisieux, sempre conside­
rei a u n idade externa como coisa i rreal i z ável neste
mundo, u n idade fictícia porque quase sempre i m pos­
ta a o povo exteriormente, e o que importav a re a l-
men te e ra u m a u n idade espiritual.
E m Lisie ux tudo isto ca i u por terra , um a v e z � u,
e
a d m i ra -
eu t i n h a visto lá u ma u n idad e exte rn a tão
so b r en a-
ve f q ue me conv e n c .
i d e q ue sua orige
·

m e ra
tura f.
. ·i ao d a l g r e 1 a
E a conseq uência essenc i a l d a un od e
-

. e nao p
_

de Cristo com S u a Pessoa d ivi na, . qu ext e r n o .


d
·

de
ser rom p ida, bem co mo a sua u n i a
73
E � go ra, no Eva nge lho , des cob ri que era exa ta­
m ente isso o . q ue Nos so Sen hor dese java que fôs­
se a sua l g re 1 a .
Textos q u e i nconscie ntemente e u havia percor­
rido às pressas no passado, agora se i l umina ram
com novo sig n ificado.
" Que êles seiam um em nós, pa ra q ue o mundo
possa crer. "
De rel a n ce eu vi que na mente d ivina do Mestre,
unidade, i nterna e externa da Sua Igreja, só seria
possível se fôsse fu ndada sôbre a u n idade interior da
Igreja com a Divi ndade, med ia nte a união desta
com seu d ivi no Fu ndador.
Vi, a lém disso, q ue fa ltando esta unidade de fé,
a Igreja fa l h a ria na sua função de Igreja docente
que Nosso Sen hor q u is q ue ela desem pen hasse. E
vi a i nda q ue esta u nidade i nterna, onde quer q ue
rea lmente existi u, não poderia deixar de se exprimir
em uma u n idade externa num mundo sacramenta l
como êste.
Tôda a m i n ha posição como um Sacramenta­
l ista estava baseada na crença de q ue o Espírito se
ma n ifesta a si mesmo por sinais exteriores. Clara­
mente, pois, a u n idade espiritu a l da Igreja . deve ma­
nifestar-se sacra menta lmente em uma un idade ex-
terna.
De mo do q ue a u n ida de ext ern a � ess enc ia l por ­
q ue é o res u ltado da u n ião da l g re1a com seu Se­
n h or e seu Deu s ' e seu Sen hor e Deu s é Um . J á não
p o d e is d ivid i r a i g rej a, co mo nã o po de is d ivid ir seu
Sen h or.
74
E d ifíci l des crev er a com plet a revo luç ão q u e
o pe ro u em me � esp írit o. De sde e tão per ceb i st
e.u n u n ca pod eria ser rea l men te fel�iz em min h ai qu�
r i a d e u m a I g reja visiv el mente d ivid ida, tant o ma te o ­
q u e Nos so Sen hor não faz esta ora ção pela u n idai s
d e u m a vez só, mas a repet e acres centa n do novo s­
p � rmen ores ; most ra ndo q ue, em Sua ment e, a pe r­
fe i çã o d e Sua I g reja esta ria em sua un ida de, inte r­
n a e externa :
" Se j a m um, como ta mbém nós somos um . Eu nê­
l es e tu em m i m, s:;ara que seiam consumados na

u nidade ; e para q ue o mu ndo conheça q ue tu me


enviaste, e q u e os a maste, como tu me amaste tam­
b é m a m i m " (J oa . 1 7, 22-23).
E n esta seg u nd a oração Ele nos diz que a u n i­
d a d e da Sua I g reja deve leva r os i ncréd u l os dêste
m u nd o a recon hecer · a d ivi ndade do Seu Fu ndador
e ta m bé m a reconhecer nesta u n idade um sinal do
a mo r d e Deus à sua I g reja.
Ass i m, se col ig i mos tudo q ua nto nos diz o Eva n ­
g e l ho sôb re a I g reja, verifica mos q ue é ela a So c i e ­

dade fu n d a d a por Nosso Senhor sôbre os Apóst � los .


r
D e u - l h e Nosso Sen h o r autoridade para ens i na
a todo o m u n d o a verdade i ntei ra e comp l eta, c om
o
E l e l hes e n s i n a ra.
Deve rã o leva r essa ver d a d e a tô d as as n açõe s
Essa ver d ade será sempre essenc1a 1 ment a m.e sm a '
.

··

e
. r-s e a s 1 m e s -
r
·

po que a ver d a d e n ão po d e co ntra d 1ze


,.. .1 a d 0 Es p írito
ma.
.1 st enc
·1 5 t 0 c o n fe -
f
Prom ete - l h es a i n a íve l l ass
l
S a n to para g u iá - os a tô a a ve rd d a d e ; e
75
re à Sua I g re j a o po d e r d e exigir obed iência d e to­
dos os homens, e ta nto q ue q u em obstina d amente
rejeita r Seus e n s i n a mentos será condenado.
A verdade centra l é a m issão divina e a d ivin­
dade de N osso Senhor.
Diz à S u a I g reja q u e a la nça rá em confl ito com
o mu ndo, com o q u a l não pode haver comprom isso.
E esta crença da d ivindade de Nosso Sen hor é o ver­
dadeiro fu ndamento da sa ntidade da Igreja.
Fi n a l mente, a u n ião da I g reja com a vida da d i­
vi ndade d eve m a n ifesta r-se em uma un idade externa
e visíve l tão a d m i rável q u e os i ncrédu los do mundo
serão l evados a crer na d ivi ndade do Fu ndador da
Ig reja e verão n isso um s i n a l do amor de Deus para
com a Sua I g reja.
Temos, pois, aí a resposta à questão leva ntada
no fim do ú ltimo cap ítu lo : " Como con heceremos nós
que as na rrações do Eva ngelho são verdade i ra s ? "
Os Eva n g e l hos s ã o a man ifest ação dest a I g re­
ja : escritos por seus mem bros e fi n a l men te sanc io­
nad os pa ra sere m p u b l ica dos sob a sua auto rida de.
Tudo q u a nto e n con tra m os no Eva nge lho sôb re
a d i vi n d a d e d e Nos so Sen hor e sôb re a Sua I g reja

a í est á p orq u e já exis t ia n esta I g reja que No sso Se-


nh o r fu n d o u.
76
I sso n ã o teria l ugar nos Evange l ho s, se já n
tivesse seu l ug a r reconhecido no ensi no d a l g r e�
...

à q ua l p rometeu Ele assistência d ivi n a p a ra p r


es���
vá- l a d o ê rro.
Nos p róxi mos ca pítu los traçaremos o d esenvol­
vi mento d esta I g reja nos Atos dos Apóstolos e nas
E p ísto las.
CA P fTU LO VI I

A I G REJ A NOS ATO S D O S A P óSTO LOS

T ra ça n d o o d e s e n vo l vi m e n to da I g re j a n os Atos
dos Ap ósto l o s e n a s E p ísto l a s, d eve m os l e m b ra r- n os
de q u e os Atos n ã o s ã o u m a com p l eta re l a ç ã o d a s
ativi d a d es d e tod os os A p ósto l os, d i s p e rsos co m o es­
tava m p e l a s d i fere ntes n a ções.
São a p e n a s u m m u i to b reve esbôço d os come­
ços da I g re j a . As E p ísto l a s, p o r sua vez, são ca rta s
escr i t a s d e te m p o s a tem pos p a ra a te n d e r a n e cess i ­
d a d es pa rt i c u l a res e m d i fe re ntes pa rtes d a I g re j a .
E m b o ra n ã o te n h a m s i d o e s c r i ta s p r i n c i p a l m e n te com
o b j et i vos h i stó ri cos, l a n ça m m u i ta l u z sô b re a vi d a
í n ti m a d a I g re j a .
O c u p a m -se espe c i a l m e n te d o m es m o p e r ío d o d a
h i stó r i a d a I g re j a q u e é o b j eto d os Atos : i sto é, o s
tri n ta p r i m e i ros a n o s d e p o i s d a Asce n s ã o .

O S ATOS

A h i stó r i a do n a s c i m e n to d a I g re j a a b re-se nos


d o i s p r i m e i ros ca p ítu l os d os Atos co m u m a b e l íss i ­
ma d es c r i c ã o d os ú l t i m os d i a s d e N osso Sen h o r e m
co nvivê n c i � c o m os Apósto los por E l e esco l h i d o s p a ­
ra serem os fu n d a d o res d a I g re j a .
78

D i z- n os S. Luc as, o a uto r dos Ato s que


S. e � h. o r, p or m e 1 � d o E s p 1 r ito sa nto , d era ord N o s s o
.
/

f 1 n 1 t 1 va , aos Ap ost o l as q u e hav .ia esc ol h ido " em d e-


· ,

.
.Co n ta - n os q ue, d u ra nte u m perí odo de qua r e n ­
ta d i a s, Nos so Se n h or l h es d e u provas tão conv ice

tes d a S u � Ress u rre .i ção, q ue ê l es n ão pode ri a m pô ­
l a e m d u, v 1 d a , e q ue ta mbém l h es d i sse m u i tas cois as
.
a res p e i to do fut u ro da Sua I g reja :
" Aos q u a i s ta m bém se m a n ifestou vivo, depoi s d a
S u a Pa ixão, co m m u itas p rovas, aparece ndo- l h es por
q u a re n ta d i as, e fa l a n d o do re i n o d e Deus " (Atos
1 , 3) .
A s ú lt i m a s p a l avras do E va n g e l ho d e S . J o ã o
n os d iz e m q ue : "Mu i ta s outra s coi sas fêz J esus, as
q u a i s, s e s e escrevessem u m a por u ma, cre io que
.
.

n e m no m u n d o tod o pod e r i a m ca ber os l ivros que


s e r i a p reciso escreve r" (J oa. 21 , 25).
S e exa m i n a rmos estas d u a s pa ssa gens cuidado­
s a m e n te , vere m os q ue N osso S e n hor fêz mui t a s coi­
sas e d e u m u itas i n struções a seus Apósto los q ue só
e ra m co n h ecidas d ê l es, e não fora m i n cluí d a s na Sa­
g rada E s c r itu r a .

E coisa de suma i m po r tâ n c i a verifica r q u e a Es­


critura delibe radam ente relata q u e e ra m os Apó s t o­
l os os deten tores dêste s ensin a mentos não a r q u i -
va do s.
São êstes ensi name ntos que forma m a s a g r a d a
tra d ição q ue os Apó stolo s orde nara m fôss e trman�­a is
m iti d a e q ue eram o fun d ame nto da fé cató li ca ,
tar d e i n c l u ídos nos Cred os d a Igre ja.
79
Prosseg ue a história d izendo como Nosso Se­
nhor os j u ntou tod os e l hes disse que esperassem e m
J � rusa lém � el � " promessa do Pa i q ue, diz E le, ou­
v1st � s d e m i m : e como l h es d isse que seria m fogo
bat izados com o Espírito Santo.
Pergu n ta m- l h e os Apóstolos se Ele va i resta u­
ra r o rei n o terrestre d e I srael e Ele repl ica- l h es d izen­
do de novo : " Espera i até q ue o Espírito Santo ven ha
sôbre vós" e dareis testem u n ho de mim . . . a té às
extrem idades da terra " .
Fazem-nos os Atos u ma breve apresenta ção d os
Apósto los, sendo todos êles mencionados i nd ivid u­
a l mente pelo próprio nome, espera ndo em oração,
com certas m u l heres, e Ma ria a Mãe de J esus, e seus
1 rm aos.
. -

Assim, na rel a ção i n ici a l, vemos mais u ma vez


qua l é a i nten ção de Nosso Sen hor no toca nte à S u a
Igreja. Deve s e r a S u a Sociedade, fu ndada por E l e
mesmo e constru ída sôbre Seus Apósto los.
Estes Apóstol os E l e os i nstru iu pessoa l mente no
que concerne a S i mesmo e a Seu ensino. São ê l es
os ú n icos d epositá rios dêste ensi no e devem tra nsmi­
ti- l o a todo o m u ndo. Mas, a ntes que o faça m, de­
vem espera r a té q ue l hes seja dado poder pa ra i sso
med iante u m dom especia l de Deus q u e Nosso Se­
nhor cha m a o Espírito Sa nto.
Este Espírito Santo deve ser o g u i a .sobrenatu ra l
q u e os p reservará d o êrro e m seus ensi namentos.
Espera m, pois, pelo . Espírito Santo. Afina l rea­
l iz a-s e o g ra nde aconteci mento.
80

D�z d i a s d e p o i s da Asce nsão, enq ua nto esta v


tod o s 1 u n tos, o E sp írito Sa nto desc e sôbr e êles ; ream­
ce
b e m o d o m m i ra c u l oso d a s l ín g u a s para habi l it á-l
a s e r o s mest res do mu ndo. E, t end o a ssi m rece bid s
o
? . s � u Bati s m o, pa rte a I g reja i med i atame nt e p ar a
o
1 n 1 c 1 a r a s u a m i ssão de e n s i n a r a ve rdade da I n ca r­
nação, a d ivi n d a d e d o seu Sen ho r e tudo o que daí
d ecorre, a o m u n d o i nte i ro . S i g a mo-la em seu ca­
m i n ho.
A I G R EJ A E SOB R E NATU RALMENT E GU IADA

A p r i m e i ra coi s a q u e n ota mos, desde o pri ncí­


p i o, é q u e a I g r e ja d eve s e u po d e r e i nspiração ao
Espírito Santo. E uma Sociedade d i ri g i d a sobrenat u ­
ra l men te. Sua sa bedoria vem de cima e não é d êste
m u nd o, pois de fato isto a põe d i e t a m n t e em con­
r e

fl ito com ê le.


E o Espírito Sa nto não é u 111 a cre n ça vaga, sub­
jetiva, mas um fato mu ito defi n ido e o b j e t iv o .

E l e g u ia a I g reja coletiva mente como u ma Socie­


d a d e, e g u i a e i nspira os i nd ivíduos do me s m o m o d o .

A VI DA CO LETIVA DA IGREJA

O Esp írito Sa n to derra ma- se sôbr e a l g reja n u m


R��­
d ia det erm i nad o, o q u i nq uag ési mo d epo is da s �
vi
s u rr e i cão ; tom a perfeit a mente for ma def i nid a . �
' i n idl
ve l 1 a de l íng ua s de fog o , cu jo res ult ad o defn as ti· n5•
ta n g íve l é co me ca rem os Ap ós to los a fa la r
' ra ng e i ras , e os rep re s e n ta n e
g ua s d a s na çõ es est
·
81

dessas n a çõe s est ra n g ei ras os ouv i a m


e e nte n d i a m
enq u a n to ê l es fa l av a m .
Ma n i f � sta -se a s i me sm o a g i ndo n vid col eti­
a a
va d a l g re 1 a , e p a re ce te r sido aco l h i do m u ito n atu­
ra l m e nte e se m ca usa r g ra nd e su rp rêsa .
" E te n d o ê l es ass i m ora do, estr eme ce u o l ugar
o n d e esta va m reu n i dos ; e fora m tod os che i os d o
E s p írito Sa n to " (At. 4, 31 ).

Dep ois d a conv ersã o de S . Pau lo, d ize m-nos os


Atos :
" Ti n h a e ntão paz a I g reja por tôda a J u déia,
Ga l i l é i a e Samar ia, e se ed ificava , ca m i n h a n d o n o
temor d o Sen h o r, e estava cheia da conso l a cão d o '

E s p írito Sa n to " (At. 9, 31 ) .


Foi p e l o E s p írito Sa nto que a I g reja fo i g u iada
em A n t i oq u i a p a ra envi a r Ba rnabé e Sa u l o :
"E q u a n d o ê l es se entreg ava m ao serviço do
S e n h o r e j e j u a v a m , d i sse- l hes o Espírito Santo : Se­
p a ra i - m e Sa u l o e Barn a b é para a obra a que os
d esti n e i " (A t 1 3, 2) . So b retudo , no pri mei ro Con cíl io
d a I g re j a e m J erusa l é m, q u a ndo os Apóst o l o s e os
.

Pres bíter os se reun iram pa ra to m a r u m a d ecisão re­


lativ a ao próp rio fu n d a m ento d a fé e a tod o º. futu­
ro da Igre ja, q u and o q u a l q uer e n g a n o pod eria ter
sido fata l, os Apó sto los sa iram dos d eba tes ca l m � s e
ser enos e pre fac iara m os res u l tad os de sua s del 1 be­
racões co m est as imp res sio na nte s pa l a v ras : " P a r e­
ce � be m ao Es pír ito Sa nto e a nó s" (At. 1 5, 28).
Um Senhor, 6
82

V I DAS I N D I V I D U A I S
N o pri m e i ro serm ã o dep ois do Pen teco ste s f
. oi-
no s d 1 to :
" E n tã o Ped ro, chei o d o Espí rito Sa nto, d i sse . . . "
Q u a n d o fo i n eces sá ri o o rd e n a r sete d i ácon os 0
g ra n d e p r ? b l e m a em q u e i n sisti ra m os Apó sto los f oi
q u e d eve r i a m s e r h o m e n s c h e i os do Espírit o Sa nto :
" Po rta n to, i rm ã os, e sco l h ei dentre vós sete va­
rões d e b o a rep u ta ç ã o, c h e i os do Esp . írito Sa nto " (At.
6, 3).
P o r o ca s i ã o d o m a rt í r i o de Sa nto Estêvão, ou­
vi m os i sto :
" M a s , co m o ê l e estava c h e i o do Espírito Sa nto,
o l h a n d o p a ra o céu . . . (At. 7, 55).
E S . B a r n a bé é d es c r i to como " u m homem bom
e c h e i o do Esp í rito Sa n to " .

E i s a l g u n s a pe n a s, d e n tre m u i tos exem plos qu e


nos m os t ra m q u e a I g re j a é u m a Soci ed ade sobrena­
tura l : n ão d ês te m u n d o ; g u i a d a sobre n atu raime nte
pelo Esp í r i to S a n to ta n to e m s u a vi d a col etiva como
in d ividua l .
Fo i ê ste fa to q u e d e u tão sere n a con fi a n ç a a
seus a m igos e foi pa ra s e u s i n i m i g os u m des co n ce r -

tan te m isté rio.


A I G REJ A FA LA CO M AU TO RID AD E
do E spí r ito
t ra nsf o r-
Co m o res u lta do i me d iat o da vi nd a
Sa n to, pa sso u a I gre ja po r um a com p l eta
ma ç ão psi co lóg ica.
83
?� m e sm.os Ap ósto l os que , pou co ó ntes da Res­
su : re iça o, � st1 v er a m es co nd id os
medo do s iud � us, ago r a sae m intrem um qu arto por
q u � l q ue r op os içã o, e ex ig em o di épi do s, sem temer
en s i na r o m u nd o . re ito e o po d er de
As mu ltid õe s fic a m ate rra da s ao ouv í-los; o su­
mo Sa ce rd ot e e o Si né d rio ou via m-
e a ss om b ra do s : nos ad m i ra dos
"Ve ndo ê les, poi s, a con stâ nci a de Ped ro e de
J oã o, s a be ndo qu e era m ho me ns sem letr as e do
po vo , a d m i ra ram -se " (At. 4, 1 3).
Ou ça mos o prim ei ro serm ão de S. Ped ro. Le­
va nta- se e fa la em um tom inte iram ente novo : fa l a
com a utori dade , não há hesit açõe s nem comp rom is­
sos .
" Homen s judeus, e vós todos os que habitai s em
J erusa lém, seja-vos isto conhecido , e, com ouvidos
a te ntos, ouví as · minhas pa lavras . . . Varões israeli­
tas, ouví estas pa lavras" (At. 1 4, 22).
Fa l a m os Apóstolos com uma autoridade que
exi g e obed iência. Ao terminar S. :, ed ro o sermã � ,
d izem os ouvintes : "Que faremos ? S. ,Ped r? repl � ­
ca : " Fa ze i pen itênci a, e cada um de vos se 1a bat1-
za d o .li

. " E perseverav am na doutr i n a dos


D 1zem os ' Atos : 42).
A pos t o 1 o s " (At 2 De novo, em outra ocas1ao :
. _

, · '

" U m a g ra nd e m u ltid ão de sac erd otes ob e d ec1a a · ,

fé " (At . 6, 7).


.

E a ss i m q u e o s Atos no s mostr a m os Apóstolos,


i let rado s, h om e n s ig no ra nt es a fa lar com uma a u- 6 *
84

to r i d a d e q u e i m põe si l ê n c i o aos ch efes do Si néd rio


e a exi g i r u ma obed i ê n c i a à sua fé e d outri na Ó
q u a l s e s u b m etera m até m u i tos dentre os sacer d o­
tes.
N ã o vemos a pe n a s a I g re j a fa l a n d o com autori­
d a d e a s e u s p ró p r i os m e m b ros, a seus próprios fi l hos .
Leva n ta-se u ma d i s p u ta sôb re o modo de tratar
os c o n ve rtidos d o pa g a n i s mo. J u nta m-se os Apósto­
l os e os Presb íteros pa ra resolver a q uestão em J e­
ru s a l é m e d ã o a s u a d ec i são, co mo vi mos, com estas
solenes p a l avra s : " Pa receu b e m ao Espírito Sa nto e
a n ós " ( A t. 1 5, 28).
D iz-nos então S. Lucas como a d ecisão do Con­
cíl i o foi enviada às diferentes cidades pelos emissá­
rios d o Colég io Apostólico : " E ao passa r pelas cida­
d es, l hes recomendavam q ue observassem os decre­
tos emanados dos Apóstolos e presb íteros reu nidos
e m J erusa lém. E a s I g rejas e ra m co nfi rmadas na fé "
(At. 1 6, 4).
Vem os assim a I g reja ensi nando o mundo exte­
rior e g overn ando seus memb ros ju nto d e la com uma
a ut o r idad e q ue não é d êste mu ndo, mas s obre natu-
ra l e d ivi n a .
os ha i -_
E à me did a q u e a, I g rej a pro gr ide , no t..am e 0
.

g o q ue a pa rec e so b va rio � nom �,s : u m as s de cre·


·
ve ze s

m a -se " a do utr i n a do s Ap ost ol as. ' ou tr e n te " a F é " .


a s "o
tos do s A pó sto los ", ou ta mb é m s 1 m. p l e
sm
1s i
tº a e s t a . d o ut r '1 n a
V ei a mos en tã o em q ue c on s
ou esta Fé.
85
A D IVI N DA D E E A RES SU RRE I C ÃO
D E NO SSO SEN HO R ,
N ã o h á n a d a ma is comovente na h istória da
I g re j a n ascente d o que a maneira tri u nfa nte com q ue
os A postol.. as p roclamam a Divi ndade e a Ressu rrei­
ção d e N osso Sen hor.
E o ponto cu l m i n ante de cada sermão : procla­
m a m- n o em tôd as as ocasiões possíveis, não h esi­
ta m u m momento nem tra nsigem, mostra m-se d este­
m id os d i a n te d a oposição e selam esta verdade com
seu d e rra d e i ro suspi ro.
E êste o fu nda mento de tôdas as suas espera n­
ças, a fonte d e todo o seu poder.
A i m po rtâ ncia da Ressu rreição é ao mesmo tem­
po óbvia . A p reocu pação da primeira alocução pú­
b l i ca de S. Ped ro por ocasião da eleição de Matias,
foi esta : " E: n ecessá rio q u e u 111 seja constitu ído teste­
m u n ha con osco da Sua Ressurreição" (At . 1 , 22) .
Lem b re m os a cen a do Pentecostes . O Espírito
Sa nto acaba de descer sôb re os Apósto los e êles es­
tão fa l a n d o e m l ín g u as estra ngei ras; à volta dêles
está reu n id a a m u ltidão.
A p ri n cípi o o pov o atôn ito se põe a obse rvá-l os
com u m m isto d e a d m i raç ão e de tem or, q u a ndo so­
b rev ém 0 q ue se n ã o pod ia evit a r : cer tos esp íritos
l e via nos d a n u m ero sa ass istê nci a com eça m a ridi ­
cu l a riz á-los d ize nd o q ue est ava m em bri ag ad o s e cur -
ti nd o a bebed e i r a.
86

No m e i o d est a e n ce n a cão , l eva nta - se Ped


c o m a pa ixo n a d o fe rvo r, m � n i fest a - l hes a raz ro e
tudo aqu i lo : ão d �

. " J es u s d e N aza ré . . . vos fo i entr eg ue e o cruc i-


f 1 ca s i es p o r m ãos de i n íq u os e l h e d este s a m o rte
Esse J es u s, D e u s o ress u scito u e d i sso som os tod os t�� �
te m u n h a s . Ass i m q u e . . . e nvio u êste (o E spíri to San­
to) a q u e m vós esta i s ve n d o e ouvi n d o " (At. 2 22
23, 33) .
I I

P e n s a i b e m q u e m s ã o êstes aos q u a i s S. Ped r o


está fa l a n d o . São os m es m os q u e, me nos de dois me­
s e s a ntes, exi g i a m a o s b rados a m o rte de Seu Mes­
t re , m a rg e a n d o a s m e s m a s ruas através das quais
E l e c a r re g a ra a s u a cruz. E, e m pé, no mesmo lu gar
o n d e estivera ta n ta s vêzes seu Mestre, i m põe-l hes
s i l ê n c i o a n u n ci a n d o - l h e s a ressu rrei ção daque le a
q u e m h a vi a m d a d o a m o rte.
Leva a g u e r ra ao c a m po d o i n i m i go, e refor­
c a o s e u t e s te m u n h o l a n ça n d o m ã o do m esmo sa l­
�º com o q u a l o d ivi no Mest re h av i a a ntes co nfun -
d i d o os j u deu s.
Q uas e que est a mo s ouv i ndo a voz do Me stree:
" S e p o i s Da vid o cha ml a seu Sen ho r, co � o p o �
f l ? " E f i n a me nte con l u 1 : 11 Sa iba , p o i s�
.
E l e se r se u i h o �
za , q u
a ca sa d e I sra e l , c om a ma ior ce rte
tôd a s, a quem
u i u Se n ho r e Cr ist o a ês t e Je su
D e u s co ns tit
vó s cru cif ica ste s " . n os
uc os d i as , eis qu e d e n ov o
D ec or rid os po
e nt re u m a m u lti dã o ex cit ad a.
a ch a m os
87
D est a ve z é no Te m p i o.
À vis ta d e tod os est á em pé u m ho mem q ue foi
du ra n te q u a ren ta a nos a lei jad o, e ago ra m i ra c u lo­
sa me n te c u rad o. A seu lad o est ão S . Ped ro e S. J oã o.
S . Ped ro está fa l a ndo :
" Po r q ue vos ad m i ra is disto " d iz êle. E tudo
mu ito c l a ro. " Deu s g lorif icou o seu Fi l ho J es u s . . .
mas vós nega stes o Sa nto e o J usto . . . e mata stes o
a utor d a vida, a q uem Deus ressus citou dos morto s ,
do q u e n ós som os testem u nhas ; e, pela fé no seu no­
me, é q u e êsse mesmo nome deu fi rmeza a êste " .
E n q u a nto fa l a S . Ped ro, um g rupo de homens
aproxi m ava-se da m u ltidão. São as a utoridades do
Tem plo. Observa m o que se passa contra riados e
i rritados.
" E d esco n tentes por verem os apóstolos doutri­
n a n d o o povo e a n u nciando, na pessoa de J esus, a
ress u rreicã o dos morto s " , a d i a ntara m-se e ca l ma me n-
,

te se a pode ra ra m dêles e os la nça ra m na prisã o até


à m a n hã seg u i nte , por q ue já era ta rde .

Ra i a o d i a . O sum o Sac erd ote e tod o o S i né­


drio estã o reu n ido s ; S. Ped ro e S. J oão , colo c ado s
n o m eio, são i nte rro ga dos com que P ? der_ hav ia �
êl es op e rado 0 m i lag r � . E: ca so de re � let 1 r. Sa o aq u e­
les me s mo s ho me ns d i a nte do s qu a is, sem anas an ­
t es es têve p ris io ne iro o pr óp rio Sa lva do r. O l ug ar
é � mesmo on de o M es tre fô.ra i nt er pe la d?�, pe lorg un- su­
m o Sac er d ot e : " l:s a ca so o F i l ho de De us pe
t a s egu i d a log o d a r esp osta :
88

" E u s o u . " O s i l ê n c i o é p rof u n d o. Ped r o


ta -se ; d est a vez n ã o é o Me stre q ue va i fa l ad i a n _

o d '1 sc1 p u 1 o ; o mes mo d i scíp u


'a r mas
,
l o q ue, a pen a s a lg u-
m a s s e m a n a s atrá s, o n eg o u e fu g i u . Que d i rá
. êle?
Ouvi :
" S e j a n otór i o a tod os vós, e a todo o povo de
Isra e l, q u e é e m n o m e d e Nosso Se n ho r J esus Cris­
to N a �a re n o, q u e vós cru cifica stes, e a q uem De us
�ess u s c 1 t,o u _d os .m o rtos, é � o r vi rtud e d êsse nom e que
este esta s a o d i a n te d e vos . . . N ã o há sa lvacã o em
n en h u m o utro, p o rq u e s o b o céu, n e n h u m ou'tro no­
m e fo i d a d o a o s h om e n s, p e l o q u a l n ós d evamo s ser
s a fvos " (At. 4, 1 0) .
E u m a resp osta es m a g a dora, e fata l p a ra o fu­
tu r o d o T e m p l o e p a ra a s u a re l i g i ã o ; mas a mesma
i n t re p i d e z da res posta os espa nta.

E ve n d o o a l e i ja d o c u r a d o, e s a b e n do que o mi­
la g re e r a co m e n ta d o e m tôd a J e rusa l ém, n ão se
a treve ra m a p u n i r o s A pósto l os . E nte n d e m q u e d e ­
vem e s p e ra r e i n t i m a n d o os Apósto los a n ão c o nt i ­
n u a re m p re g a n d o d a q u e l a m a n e i ra , os d e sp e d em .
O res u ltado fo i q u e " os Após to l os, com g ra n d e co­
rag e m , d a va m teste m u n h o d a ress u r rei ção d e J esus
Cri sto N o s s o S e n h o r " (At . 4, 33) .
E evi den te q ue o s u mo S a ce rd ote e a s aut
ori·
uar: é
da d es j u d a i c a s n ão po dem d e i x a r i sto con ti n
ass i m q ue vo l ta m à ca rg a.
cu ado
La n c a m m ã o do s Ap óst o los , q ue ti n h a m �t e ª
O doent
� e os me tem n a pri são . Du. ran. te a � oi
'
co i 50 q u
e
e a pr im e i ra
pr isã o é a b e rta p o r u m a n jo,
89
ouv e o S u m o Sac erd ot e é que os Apó sto los estã o fo­
r a d e n ovo , p reg a ndo no Tem p l o.
Tra ze m-n os per a nte o Con se l ho e d izem a S.
Pe d ro : " Que re i s torn a r -nos resp onsá veis pelo sa n g u e
dêss e h o m e m ? " Mas ê l es a pen as obti veram a m es­
ma respost a, à q u a l Ped ro acresce nta agora o fato
de J es u s d a r a rem i ssão dos peca dos : " O Deus de
no�!:>O S pais ressu scito u J esus, a quem vós mata s tes,
suspE. n d e ndo-o n u m made i ro. A êste elevo u Deus
com a sua dextra como Prínci pe e Sa lvado r, p a ra
d a r a I srae l o a rrepend i mento e a remissã o dos pe­
cad os " (At. 5, 30).
N ã o s a b endo o q u e fazer para os i m ped i r d e
p rega r, o Consel h o p l a neja mata r o s Apósto los,
m a s n ã o se atrevem a fazê-lo. Por isso, tendo-os açoi­
tado, d e ixa ra m - n os part i r.
A p róxi m a cena é i ntei ra mente d iferente . Esta­
mos fora dos m u ros da cidade. Ta mbém a í há u ma
m u l ti d ã o, e no m e i o a l g uém que êles estão a rras­
ta ndo p a ra a morte. É Estêvão. Por que va i êle m o r­
rer ? Pe l a D iv i ndade do seu Senhor. Foi p rêso p e l o
S i n éd rio ' e , n o m e i o d e u m a m u ltidão i rritada, o l h a
estático p a ra o céu, e vendo " a g lória de Deus, e
J es u s q u e estava e m pé à d i reita de D�us", excla­
m a : Eis q ue vej o os céus abertos, e o Fi l ho do H o­
/1

m e m e m p é, à d i re i ta de Deus".
Enco l e rizados, a rrasta m-no para fora da � i � a ­
d e e a í a ped re javam Estêvão, que orava e d 1z1a :
/1

" Se n h o r' J es u s, recebe o meu espírito " (At. 7, 56). E


os q ue 0 a pedre j a ram, d epusera m as suas vestes
aos pés d e u m j ovem q u e se chamava Sau lo.
90

E ag or a de ixa mo s a Pa les t i na e en co ntr


e m Ate n � s . A ass em blé ia ate n ien se est á sen a �� � n s
a nte est a a lg uém qu e fa la e a ass em b l e, t a '
J. i-

Q u e m e o or a d o r ?
, i a o u ve
·
·

. E o j ove m cha mad o Sau lo, a cu jos pé s


sass 1 n os de Estêvão hav iam dep osto suas voses taes -
Q u e m o l e �o u a l i ? E q u a l o assu nto do seu longo :
a rd oros o d iscu rso ?
A D� vi ndad e d � q uele Sen hor e M estre pelo qual
S. Esteva "' o deu a vida.
Va l en do-se da sua g ra nde i nte l igência, tenta tra­
zer � s aten i e nses pelo ca m i n ho de suas próprias fi­
l os ofi a s e a ca ba por descobri r a fi nal idade do seu
d is c u rso:
.., Fixou u m d ia em q u e há de ju lgar o mu ndo con­
r
fo m e a j ustiça, por meio do homem que d estinou,
d o q ue d á certeza a tod os, ressuscitando-o dos mor­
tos " (At. 1 7, 3 1 ) .

Q u a n d o o uvi ra m fa l a r d a ressurreic ão dos mor-


. '

tos, os m e n os a i u iza dos dentre os atenienses ri ram


a be rta m e n te, a o passo q u e os mais ati lados d isseram
com d is p l i cência : " Outra vez t e ouviremos sôbre ês­
te a ss u nto ".
M as n ão con sta q u e vo l tas sem a i nt � rrog_á- lo.
d e 1 n � e l i ge n·
..

De m o d o q ue, em bo ra d ota d o d e g ran


e i a, S. Pa u o torno u-s e ou
l l co po r a mo r d e Cri sto.
o p r is io n ei·
.
Por fi m vo lta mo s a vê - o ag ora , com d rom a-
l
ro e m a n ieta do , em pé d i a n te d o gov er n a or
n o e do Re i
A g rip a.
91
Pau l o, rem ata n9o a s u a g ra nde def esa d i z :
" Co nti n u o até êst e d ia d a ndo test em un ho a p� q u e­
no � e g ra � d e � . . . q u e Cristo havia de pade c e r, q u e
sen a o pri m e i ro d a ress u rrei ção dos mor tos " (At. 26,
2 2) . N esta a l tu ra d isse o gove rnad or Festa em a lta
voz : " Estás l o u co , Pa u lo ; o mu ito sabe r deso ri entou
o teu espírito " .
Mas Pa u lo rep l ica : " Eu não estou louco, ó i l us­
tre Festa, mas d igo pa lavras de verda de e de sa­
bed ori a " .
t ass i m q u e d esde o pri meiro cap ítu lo dos Atos
dos A pósto los até q uase ao ú ltimo, o ún ico tem a
que enche a s suas pág inas é a Ressu rreição e a D i ­
vi ndade d o s e u Sen hor .
J u ntemos, d e tôdas as cenas que acaba mos d e
considera r, os d iferentes títu los que l he atri b u í a m .
t " Sen hor" e " Cristo " ; " Fi l ho d e Deus", " Prínci­
pe", " Sa lvador", doador de " a rrependimento e re­
missão dos pecados " , " o Fi l ho de Deus" ; o q u e está
" à d i reita d e Deus" e " J uiz do mundo " .
A êste e n s i n a mento d a Divi ndade d o seu Sen h o r,
te stem u n ha d o pe l o fato d a Ressu rreiçã o, volta m ê l e s
a cad a passo.
São rid icu l a rizad os por êsse moti vo e conside ra ­
d os lou cos p o r p reg a r esta ver dad e.
São i nti ma dos a com pa rec er per ant e a s i nag o­
g a e a pris io n a d os pe l a ma ior au.t � ri � ade rel i g iasa
d o temp o. Têm d e fug � r d e seu.s 1 n 1 m 1gos . Por esta
d o u tri n a S. Estê vão foi a pe d re 1 ado e che gou,-se a
m a q u i n a r a m o rte de S. Pa u l o. For a m l eva do s a p r e-
92

s e n ça de g ove r n a d o res , com o Fes to e de reis


' , co mo
Ag r i p a .
Mas ê l e s n u n ca hes ita ra m, n u nca se com p rome ­
te ra m . Po r q u ê ? Porq u e a Ressu rrei cão e ra o funda­
m e n to d a s u a espe ra nça . E ra o s u p � emo teste m u n h o
d e q u e Deus ti n h a i nte rv i n d o m i racu losam ente na
h i stór i a da h u m a n i dade e ti n h a re ivind icado p a ra
J es u s C r i sto o títu l o d e Deu s Fi l h o.
D a D ivi n d a d e d e seu Se n hor decor re todo o ca­
rá te r sobre n atu ra l da I g re j a .
Fo i d a u n i ã o d a D ivi n d a d e com a s a g ra d a H u ­
m a n id a d e d a q u e l e q ue é ao mesmo te mpo D e u s e
H o m e m, q u e a I g re j a h a u ri u a sabedoria sob renatu­
ra l q u e d eve r i a p rod uzi r a Fé e os Cred os.
Desta u n i ã o d eco rreria a g ra ça sob re n at u ra l
q u e a l i m e n ta r i a os sacra m e ntos d a I g re j a , e d esta
u n i ã o b rota a u n i d a d e sob re n at u ra l q u e é seu m a i s
c o nv i n c e n te teste m u n h o p e ra nte o m u n d o .
Este é, p o is, o esbôço d a I g re j a , co mo n o- l o
m ostra m os At os .

S u rg e como u m a So c i e d a d e d ifere nte d e tôdas


as o utras socie d a d es d o m u n d o.
Sobre natur a l em sua orige m, é fu n d a d a por
Aq u ê l e q u e é na d a meno s q u e o próp rio Deus sôbre
a te rra .
Atra vés de todo o seu d esen vo l v i men to é
�la
d d e So ci e­
s o b re n atu ra l m e nte g u i ad a ; ta nto n a vi a
o um tod o, com o na vid a d e seu s m em -
dad e, co m
b ros i n d ivid u a l me nte co n s i d erad os.
93

A ss i m ens i n a e l a e fa la com u ma sobre natu r al e


di v i n a a ut o ridad e, e a verdade centra l que ela en­
s in a é que Deus vei o à terra na Pessoa do seu Fun­
da do r, J esus Cristo, e q u e desta verdade decor rem
t ô da a vida sob renatu ra l e as reivi ndicações sobre­
na turai s da g e n u ína l g reia d e Cristo.
Se nos volta rmos para as Epístolas, veremos tu­
do isto rea l izad o com g ra nde riqueza de particu la­
rid ades e confi rmado com as mais convi ncentes pa­
lav ras .
CA P fTU LO VIII

A I G R EJ A . NAS E PISTO LAS

A I G REJA VA I A TO D O O MU N DO
PA RA E N S I N A R A Tô DA S A S NA C õ E S
,

Qu e a m i s s ã o d a I g re j a se este n d a a to d o o
m u n d o , é o q u e s e d e p ree n d e i m ed i a ta m e n te d o
f i m d e sta s c a rta s : s ã o ca rta s a c i d a d es s i tu a d a s m u i ­
to a l é m d os l i m i te s d a Pa l esti n a . S u a s fro n te i ra s v ã o
d e sd e a Á s i a Me n o r até a G réci a , e at ravés d a G r é ­
c i a f i n a l m e n te a té Ro m a , o ce ntro d o m u n d o c i v i l i ­
za d o, e i st o d e n t ro d e u m c u rto l i m i te d e t r i nta a n o s .
A g ra n d e · c a rta d e S . Pa u l o à I g re j a d e Ro m a
co m e c a e t e rm i n a c o m esta d efi n i d a e i l i m i t a a a e x i -
,

g ê n c i a d a I g re j a : " J es u s . . . p e l o q u a l receb e m o s a
g ra ça e o a p o s to l a d o, pa ra q u e obed eç a m e m s e u
n o m e à f é t o d os o s g e n ti o s " ( Ro m . 1 , 5) .
A s s i m c o m eça S . Pa u l o a s u a ca rta e a e n c e r r a
l a çã o d o m i sté­
q u a s e c o m a m e s m a n ota : " A rev e
s a s n a çõe s p a ra
rio . .' · t o r n a d o c o n h e c i d o a tôd a
q u e s e o b e d e ç a à fé " ( R o m . 1 6, 26 ) .
96

A I G R EJ A !: A M E ST RA D IVI NA

.O ob jet o d esta m i ssão u n ivers a l da I g reja é en-


sina r a todo o m u ndo a verda de sobre n atura l , o
q u e e l a fa z co m u m a a utori dade divi n a . A I g reja é
o b a l u a rt e d a ve rdade : " Qu e é a I g re j a d e Deus vi­
vo, co l u n a e firmam ento d a verda de" ( 1 Ti m. 3, 1 5) ;
e s e n d o a co l u n a e fi rma m ento d a ve rd ad e, tem ela
o pod e r d e e n s i n a r a verdad e : " Cristo e m vós, a
q u e m n ós a n u n ci a mos, ad moesta ndo todo o homem
em tôd a a s a b edori a " (Co l . 1 , 28).
" Pe rm a n ecei, pois, co n sta ntes, i rmãos, e con ser·
va i a s tra d ições q u e a pre n d estes, ou por n ossas pa­
l avras, ou por n ossa ca rta " (1 1 T es. 2, 1 5).

A I G R EJA ENS I NA UMA F � D E F I N I DA


Este e n s i n o d a I g re j a é com u m ente ch a mado a
Fé, e é u m a coisa b e m d efi n i d a, q u e será atacada e
à q u a l se d everá a d e r i r c o m l ea l d a d e d i a nte da opo-
s icão :
,

" Exam i n ai-vos a vós mesmos, se e s ta is firmes


n a fé " ( l i Cor. 1 3, 5).
" Se perseve rardes fu ndados e fi rmes na fé e i na­
b a l áveis n a espera nça que vos dá o Evang e l ho" (Col.
l , 23). . e
l
" Não vos deixei s eva r por d outri nas vária s
est ra n h a s " (He b. 1 3, 9).
Tive n eces s i d a d e de vos escre ver agor a, p ar a
vos exo rta r a com bate r pe l a fé, que foi da da ao s
sa n tos u m a vez por tô d as " (J uda s 3) .
97
Tudo isto é exp ost o l u m i nos am e nte por s . p a u f
em su as co r t � s a r·1 mo teo e Tito , b i spo s de Efe so e
o
Cret � re.s pec t 1 va m ent e . y e m os nes tas ca rtas q u a l é
,

o p n me 1 r? d eve r do b i s po, o g u a rd ião da I g re ja


e m s u a d 1 ocese .
Começa S. Pa u l o por d i rig i r-se a Tim óteo co mo
a seu " ª mod o fi l h c:' n a fé " , e nada meno s do que
q u atro veze,. s l h e d i z q u e g u a rde cu id
ados a ment e a
doutr i n a d a fé q u e ê l e rece beu dos Apóst olos :
" Conse rva a fo r m a das sãs pa l avras q u e ouvis­
te de m i m " ( l i Ti m . 1 , 1 3) .
" Ve l a p o r ti e por te u ensi no" ( 1 T i m . 4, 1 6).
Propondo êstes e n s i n a m entos aos i rm ãos, serás
um bom m i n istro de J esus Cristo, n utrido co m as pa­
l avras d a fé e d a boa d o u tri n a " (1 Ti m . 4, 6) .
" E n q u a nto e u não vou, a p l ica-te à l e itura, à
exo rta ção e ao ensi n o " ( 1 Ti m . 4, 1 3) .
Esta d outri n a d eve Timóteo esta r pronto a ensi­
ná- l a com tôd a p a c i ê n c i a , especia l mente à q u e l es
que a ela se opõem : " o servo do Se nhor d eve . . .
ser a pto p a ra e n s i n a r, p a c i e nte, corrig i n do co m mo­
d é st ia os q u e res istem à verd a d e, na espera nça de
que Deus dará a g raça de se convertere m ao co n he­
cim ento da verdade " (l i Ti m . 2, 24) .
Em sua ca rta a Tito , S. Pau lo ta mb ém se d i rige.
a êle com o " am ad o fi lho seg und o a fé com u m " (Tit
1 , 4), e u rge os me sm os po nto s de _qu e tra t � em sua
ca rta a Tim óteo , co m pa lav ras a i nd a m a i s forten-� .
S u a d ou tri na de ve se r pu ra , d ev e fa lar co m a uto
U m S e n h o r, 7
98

dad e d efi n i da e deve repre ende r sever a m ente aq uê­


les q u e se op õe m à fé :
Faze -te a ti mesmo u m modêlo de boas obras
em tudo , na i nteg ridad e da dout ri n a " (Tit. 2, 7) .
11

11 Ensi n a estas coisas e exorta e repreende com


tôd a a a utoridade" (Tit. 2, 1 5).
11 0 b ispo deve ser i rrep reensível . . . aderi nd o
firmemente à palavra fiel segundo a doutri n a ; para
q u e possa exorta r seg u ndo a sã doutri na, e refutar
os q ue a contrad izem . . . aos quais é necessário fe­
c h a r a bôca . . . porta nto repreende-os àspera mente,
p a ra q u e este j a m sãos n a fé" (Tit. 1 , 9-1 3) .
Até a q u i, pois, mostra m-nos a s epístolas a I g reja
com o u m a Sociedade q ue reivi ndica u m a missão uni­
vers a l pa ra ensinar uma fé bem d efi ni d a ; e vemos
q ue é êste o primei ro dever dos b ispos, conservar e
e ns i n a r a fé, persuad í-la e, caso fa l he a persuasão,
re p r eender os q ue a ela se opõem.

A
I G REJA EXI GE O BE D I EN C I A A ESTA Ft
Dos q ue seg uem esta fé, n ã o exige a I g reja me­
ra " a ce itação " ou a p rovação", mas o q ue expri­
/1

mem as d u ra s pa lavras obediência " e /1 submissã o".


/1

Isto é p a rticu l a rmente d ig no de atenção n a car­


ta d e S. Pa u lo a os Rom a n os, à l g reia q u e, podendo
iá c o n s i dera r-se de certo modo o centro de tô d a a
crista n d a de, poderia ach a r mais d u ro obede c e r.
as
Com risc o d e ser enfa d o n ho, dev o re peti r
a ue
pas sag ens d o pri n c íp i o e d o fi m de sua c art q
Iª m e n c 1 o n e 1 a c i m a :
• # • • •
99
" J e sus . . . pe l o qua l rec ebe mo s a gra ça e o a pos ­
to l ado, pa ra q u e obe deça m em seu nom e à fé to­
dos os gentios " (Rom. 1 , 5) .
" A reve l a ção do mist ério . . . torn ado conh e cido
a tôdas as naçõ es para que se obe dece , à fé (Rom.
1 6, 26).
De novo l hes diz:
" A vossa obed iência em tôda a pa rte se tornou
notóri a . Alegro-me, pois, em vós" (Rom. 1 6, 1 9) .
Esta obed iência é urgentemente inculcada :
" Nós vos suplicamos, i rmãos, que tenha is cons i­
deração com aquêles que traba lham entre vós e q u e
vos governa m n o Senhor e vos admoestam e q ue
tenhais para com êles uma caridade particu l a r em
atenção ao seu trabalho" ( 1 Tes. 5 , 1 2).
'' Lembrai-vos dos vossos prelados que vos anun­
cia ra m a pa lavra de Deus . . . imitai a sua fé " (Heb.
1 3, 7).
" Obede cei a vossos superio res, e sêde-lhes su-
jeitos; porqu e êles velam , como quem há de dar
con ta das voss as alm as" (Heb . 1 3, 1 7) .
Obe diênc ia e subm issão são as ealav r as que a
I g r eja usa para expr imi r as suas exigê n cias sôbr e as
alm as dos hom ens. Por que é ela tão insis te nte ? Por­
que esta obe d iênc ia é esse ncia l par a a unid a d e da
l g r ei a.
A U N I DADE DA I G REJA
Esta unidade, como vimos, toma dois asp � tos,
u ma u nidade exterior e visível que brota da un 1da-
7•
1 00

�e i n ter i o � d a fé . Dev e h ave r u m a Fé e u m Cor po .


. a s . a u n i d a d e exte rn a é i m poss íve l sem a u n i d a d e
1 n te r i o r d a Fé
.
A l g u m a s vêze s fa l a -se da u n idade da Fé e m si
m es m a :
" At é q u e cheg u e m os todos à u n i d a d e d a fé "
(Ef . 4 , 1 3) .
" Pe rm a n ecei con sta n tes num mesmo espírito,
l ut a n d o u n â n i mes pela fé do Eva n g e l h o " (Fi l . 1 , 27) .
O u tras vêzes se dá ê nfa se à u n id a d e d o Corpo :
" Tri u n fe e m vossos corações a p a z d e Cristo, à
q u a l ta m b é m fôstes c h a m a d os pa ra u m só Corpo"
(Co l . 3, 1 5). "Ass i m, sendo m u itos, somos u m só cor­
po e m Cristo " (Rom. 1 2, 5).
As vêzes se e n co ntra m j u ntos :
" Porque num mesmo Espírito fo mos b atizados
todos n ós, p a ra sermos u m só corpo" ( 1 Cor. 1 2, 1 3) .
" Há u m só sorpo e u m só Espírito, como tam­
bém vós fôstes cha mados a uma só espera nça p e l a
vossa vocação. H á um só Senhor, u ma só fé, um só
b atismo" (Ef. 4, 4).
E tão vita l esta u n idade da fé e da Sociedade
visível, q u e a d esobed iência à fé é o pior pecado
possíve l ; e o q ue persevera r nêle d eve ser pu nido pe­
l a expu l são da u n idade visíve l da I g reja.
A l ing uagem q ue emprega o Apósto l o é forte e
espa ntosa, d e modo q u e n i nguém pode a l imenta r ?
m e n o r d úvida a êste respeito. Qua ndo e l a pe l a prt ­
m ei ra vez ca i u sôbre m i m, em todo o seu s i g n i f i c a ­

d o, p a re ce u - m e s i m p l esmente esmagadora.
1 01

A n tes d e t u d o s a be mos q u e a ra iz o u ca u s a fu n ­
d a m e n ta l d a d esobed i ê n c i a à fé é o peca d o ca p i ta l
d a soberb a :
" Se a l g u é m e n s i n a d e modo d ife ren te, e n ão
a b ra ça a s s ã s pa l avras d e Nosso S e n h o r J es u s C r i s ­
t o , e a q u e l a d outri n a q u e é co nform e à p i e d a d e, é
u m s o b e rb o q ue n ad a sabe . . . privado d a verd a d e "
( 1 Ti m . 6, 3) .
Por m a i s e l eva da q u e seja a s u a a uto ri d a d e o u
a i n d a espi ritu a l , s e ê l e p rega outra co isa q ua l q u e r
é exco m u n g a d o :
11
Mas a i n d a q u e n ós m esmos ou um a n jo d o c é u
vos a n u n c i e u m Eva n g e l ho d ifere nte d a q u e l e q u e
vos temos a n u n ciado, seja a n átema " (Ga l . 1 , 8) .
Esta u n i d a d e da fé é tão i nd izlve l me n te p re c i o ­
sa p o rq u e é u m a s a l va g u a rd a contra tôd a d outri n a
fa l s a e con tra todos a q u ê l es q u e d e l i b e ra d a m e n te
te n ta m a rru i n a r a fé cristã :
11
Até q ue chegu emos todos à u n id a d e d a fé . . .
pa ra q ue n ã o m a i s seja mos cria nças fl utua ntes, e l e ­
va d o s a o ca pricho d e tod o ven to d e doutri n a , p e l a
m a l ig n id a d e d o s home n s, pela astú cia com q u e i n d u ­
zem a o ê rro " ( Ef. 4, 1 3).
N e n h u m a pa l avra é d e masiado fo rte pa ra exp r i ­
m i r a a ve rsão q ue tem a l g re i a àq u e l es q u e res i ste m
à verd ad e :
11 A p re n d e m se m p re e n u n ca cheg a m a o co n h e c i ­
m e n to d a verd a d e . E a ss i m como J a n es e Ma m b res
res i sti ra m a Moi sés, a ss i m ta m bé m êstes res i ste m à
1 02

ve �dade , home ns corro mpid os do espír ito, répro bos


a cer ca da fé" (l i Tim . 3, 7).
Qual q u er contrad ição na fé, falso ensi name nt o
o u h eresi a, é considera da um mal mortífero, nada me ­
n os d o q ue um câ ncer:
" Sua palavra lavra como uma gangrena ; entre
os q ua i s estão H i meneu e Fileto, que se extravia ram
da verdade, d izendo que já se deu a ressu rreição e
p e rverteram a fé de a lguns" (l i Tim. 2, 1 7).
E como devem ser tratados ? Devem ser admoes­
tados d o seu êrro e depois convertidos. Se não, de ­
vem deixa r a I g reja. E, se não o quiserem fazer, de­
vem ser evitados e expu lsos. t: necessário, custe o
q ue custa r, n ão ter a mizade com êles.
P rimeiramente devem ser persuadidos, se possí­
vel, e convertidos :
"Meus i rm ãos, se a l g u m de vós se extraviar da
verd a d e, e se outro o converter, sai b a que quem re­
con d uz i r u m pecador do seu errado cami n ho, salva­
rá u m a a lm a d a morte " (Tiago, 5, 1 9).
A l g u ns a utomàtica m ente se sepa rara m da l g reja :
" E l es s a i ra m de e ntre nós, m a s não eram dos
n ossos, porq ue se tivesse m sido dos n ossos, ficari am
certa m e n te conosco ; mas para q u e se conheça qu e
n e m todos s ã o dos nossos " (1 J oa . 2, 1 9).
O u a i nda :
h en s
" Este s são os que prov oca m divi sões , om, .
an s si­
s e n s u a is, q ue n ã o têm esp írito . Vós , poréfm, c en
m os, ed ific a n do- vos vós m esm o s sôb re o u n
dam -
1 03

to da vossa santíssima fé, perma necei no a mor de


D eus " (J udas, 1 9).
Se, contudo, aquê l es que são desobedientes à
fé não deixa m a I g re ja, devem ê l es ser evitados. No­
te-se a energ i a e i nsistência com q ue isso é i ncu lcado :
" Rogo-vos, i rmãos, que não perca is d e vista
aquê l es que causam dissencões e escâ nda los contra
a d outri n a que aprendest � s, e apa rta i-vos dêles"
(Rom. 1 6, 1 7).
" Nós vos ordenamos, irmãos, em nome de Nos­
so Sen hor J esus Cristo, q u e vos aparteis de todo i r­
m ão que viver desordenada mente, e não seg u n d o a
d outri n a que recebeu de nós" (l i Tes. 3, 6).
Os homens que recusam obedecer à a utorida­
de devem ser desmascarados :
" Se a l g u m não obedece ao q ue ordena mos pela
nossa carta, nota i-o e não tenhais comércio com êle,
a fi m de q u e se envergonhe" (l i Tes. 3, 1 4).
Fi n a l mente, se necessário, deve ser defi n itiva­
mente expu l so da u n idade da I g reja :
" Foge do homem hereje, depois d a pri m e i ra e
seg u nd a correção" (Tit. 3, 1 O).
" Se a l g ué m vem a vós, e n ão traz esta d outri­
na, n ão o receba i s em vossa casa, nem o saud eis.
Porq ue q uem o saúda, particip a das suas obras más"
( l i Joa. 1 0).
E são estas, pa l avra s d o g ra nde Apóst o l o da
caridade, S. J oão.
� d ifíci l conceber pa l avras mais d rásticas para
estig matiza r os q u e d esobedecem à fé, do q u e es-
1 04

ta s : �xco m u n g a d o, p rivado d a ve rd ade, espí rito s cor­


romp i d os, rep _ robos : s u a d esobed iência é descrita
co m o a stú c _i a m a l i ci osa, m a l i g n i d a d e d os homens, i m ­
postu ra, e c o m o u m a g a n g rena q u e a l astra.
N ã o m e n os d rástico é o trata mento q u e se l hes
d eve d a r. Evitá - l os, n ã o os receber em casa e nem
seq u e r os s a u d a r .

AMO R E U N I DA D E

L i e sta s passa g e n s d a Escritu ra u m a e m u itas vê­


zes, m a s fo i s ó m e nte d e po i s da m i n h a seg u nda v i ­
s it a a Lis i e ux q u e comecei a a p reender seu com pleto
s i g n i f i ca d o
. E i m possíve l d escrever a comoção que
d e m i m s e a po de ro u q u a n d o comecei a a p ropri ar­
m e dêstes fat os Tu d o i sto e ra com p l eta mente a l heio
.

ao e s p í r it o da I g re j a A n g l i ca n a, na q u a l eu ti nha
si do cria do.

Até e n tã o, s e m p re q u e e u e n ca rava êsse prob le­


ma, p a r eci a m e razoáve l e l e g íti m o q u e cada ponto
-

d e vista d a I g re j a Ang l i cana tivesse sua defesa, e


q u e, p o r meio de homens das m a i s diversas idéias
que col a bo ra ssem num espí r ito a m i stoso e cri stão,
a verd ad e g rad ua l mente p r eva le c e r i a .

Pess oa lmen te eu estav a muit o satis feito com êst e


pon to d e vist a, porq ue me ach ava de todo enfr on h �
­
ci­
do n o An g lo Ca t ol ic is m o , e per feit a men te con ven
-

do do seu tri unf o fi n a l na I g re j a da I ng l ate rr


a.
pel a
Nã o t i n h a s i do eu g ra n d e me nte m o l e s t a d o o u
ma
co m p ree n s i b i l ida de An g l i ca na, exc eto � m uxt r e m a .
d u a s oc as iõe s ao ser t orn a d a u ma me
dlda e
1 05

M as então de novo m e parec eu q ue era coi s a


p róp ria de u m espíri to l a rgo respe ita r a s i nce rida d e
de cad a h o mem, e nada d izer, sem contudo des i s ti r
do próprio idea 1 .
Como i ng l ês a m a nte d a l i berdade, mostrava­
me irred utlvelmente contrá rio à caca de heresia sob
qualquer forma, convencido de qu � o ca m i nho m a is
seg u ro era perm iti r a l i berdade de pa lavra e dei­
xa r o êrro morrer de morte natu ra l, e que as co isas
que pa recia m i novações ousadas nesta geração po­
deria m ser consideradas muito norma is na próx i ma .
Mas agora via que tudo isto se opu n ha d i reta­
mente à I g reja, ta l q u a l aparece nas Epístolas. A
I g reja Cristã nos dias dos Apóstolos não con hecia
" g lo ri osa compreensibi l idade", não conhecia com pro­
m issos nem condescendências fora da razão. Via eu
agora, à l uz das Epístolas, que esta ndo em comu­
nhão com menta l idades opostas, eu pa rtici pava d a s
responsa b i l idades de ta i s menta l idades .
A I g reja d os Apóstolos ensi nou uma fé defi n i ­
d a ; e, se a lg uém rompia a u n idade desta fé, era ex­
cl u ído d a u n idade visível da Igreja - exco m u ng ad o
d e fato - por a mo r d o dogma.
Pa ra a menta l idade Ang l i ca na, i sto seria ecle­
siástica estre iteza de esp írito, e i ntei ra mente oposto
ao espí rito de N osso Senhor e a o seu a mor sempre
de bro cas ' a bertos pa ra os homens. Onde está a q u i
o bom Pastor e o seu a mo r aos pecadores ? Evi den­
tem ente isto pa rece torna r estéreis os g ra ndes ide a i s,
ser i nto lera nte e sem coração.
1 06

E, e n t re ta n to , ês tes A pó sto l os , S .
Pa u lo e S .
J oã o, n ã o e ra m h o m e n s es tre ito
s e de sp rov ido s de
ca ridade :
"E a i n d a q u e e u tive sse o d o m d a p
rofeci a e
� o n h e ces s e tod os os m isté rios e tôd a a ciê
nci a e
t i v e s s e tô � a ª fé, a té ?º p o nto d e tra nsp orta
. r os m � n­
tes, se n a o t i ve r ca r i d a d e, n ão sou n ad a " ( 1
Cor .
1 3, 2).
" E a i n d a q u e e u d i str i b u isse todos os meus bens
n o s u st e n to dos p o b res, e e n treg a sse o meu corpo
às c h a m a s, se n ã o tive r c a ri d a d e, n a d a d i sto me
a p rove i t a " ( i b i d ) .
" 1 rmão . . . s e rvi -vos u n s a os o utros pe l a ca r i d a ­
d e " (Ga l . 5, 1 3) .
" Sofre n d o-vos u n s a os outros, e perdoa ndo-vos
m u t u a m e n te, se a l g u m te m razão de q u e ixa contra o
o u tro ; a ss i m como o Se n ho r vos perd oou a vós, as­
s i m t a m b ém vós o d eve i s faze r " (Ca l . 3, 1 3).
11
M a s, a c i m a d e t u d o isto, te n d e caridade, q u e
é o v í n c u l o d a p e rfe i çã o " ( I b i d e m ) .
A ss i m escreve u S. Pa u lo e c o m m u ito m a i s a rdor
o fêz S . J o ã o :
Ca r ís s i mos, a m emo- n os u n s aos ou tros, porq ue
11

a c a r i d a d e ve m de Deus e todo o q ue a m a , na sceu


d e D e u s . Q u e m n ã o a m a , n ão co n h ece a Deus, p o r­
q u e D e u s é ca r i d a d e . . .
C a r ís s i m os, s e D e u s n o s a m o u a s s i m , de ve m o s
n ós ta m bé m a m a r- n o s u n s a os o utros . . . Se n o s
a m a rm o s m utu a m e n te, D e u s p e rm a n ece em nos � e a
,

s u a ca r i d a d e e m n ós é p e rfe ita . Se a lg u ém d i ss e r :
1 07
eu a mo a Deus, e od iar a seu i rmão1 é um mentiro­
so · · · E nós temos êste mandament 0, que aquêle
q u e ama a Deus, a me também a seu i rmão'' (1 J oa .
4, 7). E, contudo, êste é aquêle mesmo que escreveu :
" Se a l g uém vem a vós, e não traz esta doutri­
na, n ã o o receba i s em vossa casa, nem o saudeis :
porq ue q uem o saúda, pa rti cipa das suas obras más"
(l i J oa . 1 O).
Que é o q u e torna êstes homens aparentemente
i nco nsistentes ? Certamente alguma coisa que eu a i n­
d a não ti n h a compreend ido; a qua l teria provoca­
do êstes dois senti mentos, a saber, absol uto horror
a q ue m nega a fé, e o amor das almas - a justados
u m a o outro.
O seg rêdo está na imensidade da Fé confia d a
à g ua rd a d a I g reja.
A D I VI N DADE E A RESSU RREI ÇÃO DE
N OSSO SENHOR J ESUS CRISTO
E n esta verdade centra l da Fé confiada à I g reja
q u e encontra mo � a respost � , isto é, a grande verda­
de q ue o p róprio Deus veio a este " mu � do na P � s­
soa d e J esus Cristo : que Nosso Senhor e Deus feito
Homem : perfeito Deus e perfeito Homem, . e é i sto,
em g ra u supremo, g a ra ntido pela Ressurrei ção.
Neste pa rticu l a r, as Epístolas são tão claras co­
mo os Atos :
"Jesus Cristo, Nosso Sen hor, que nasceu da pos­
teridade de D avid, seg u ndo a carne, e declarou ser
1 08

o F i l ho d e Deus, p e l o poder . . . com q u e ressuscito u


d e ntre o s m o rtos " (Ro m . 1 , 3).
" N ê l e h a b ita corpora l m e nte tôda a p l e n itude d a
D i v i n d a d e " (Ca l . 2,9) .
Ass i m escreveu S. Pa u l o e S. J o ão n ã o é menos
expl ícito :
" Co n h eça m os o ve rd a d e i ro Deus, e este j a m os
n o s e u ve rd a d e i ro Fi l h o . Este é o verd a d e i ro Deus
e a v i d a ete rna " ( 1 J oa . 5, 20) .
" To d o o esp írito q u e co nfessa q u e J esus Cris­
to ve i o em ca r n e, é de D e us, e todo espírito que n ão
co n fessa q u e J es u s C r i sto ve i o em ca rne não é de
D eu s e êsse é o espírito d o Anticristo " (1 J oa . 4, 3).
A í está a ped ra a n g u l a r d a Fé cristã . Vi mos i sto
c o m o o p o n to cu l m i n a nte em tod os os sermões nos
Atos d os Apósto los, a cre n ça d e q u e J esus Cri sto
é D e u s e H o m e m , p e rfe i to Deus e perfe ito Homem.
Q u a lq u e r te ntativa p a ra d ivid i r o u separa r a Divi n­
d a d e d a H u m a n i d a d e n a Pessoa d e Nosso Se n h or
J es u s Cristo é fata l p a ra a I g re j a , e, p o rta nto, desas­
trosa p a ra a re l i g i ã o c r i stã.

A AUTO R I DA D E DA I G REJ A
A re l i g i ã o cristã d e p e n d e, e m tôda ª,
a� plidão
us
d a s u a ce rteza , d o fato d e te r s i d o o prop ri o De
q ue m
q uem a fund ou, de te r s i d o o p ró p r i o D e u s ena ­ ;
m and ou seu s Ap ósto los por tod o o m u n d o orde a e
d o - 1 hes que ens i nas sem a tôd as as n a çõ es a v �
1

que Ele l hes tinh a reve lad o; e tam b ém d eôted ar 5a v0e r-0
pró p rio Deu s q uem pro met eu gu ia- 1 os a t

,
1 09
da d e e pres ervá -los do êrro, e esta r com êles até ao
fi m dos tem pos.
Se o q u e fêz tudo isto não é Deus, mas sóme nte
home m, e ntão a I g reja não é mais do que uma so­
cieda d e h u ma n a como q ua lquer outra. E lá se va i
tôda a sua a uoridade d ivi na e sobrenatu ra l . Não
tem d i reito de exi g i r obed iência aos homens, e n in­
guém seri a tão i nse nsato que lhe prestasse esta obe­
:Jiência.
Qua ndo a re l i g i ão, em a lguma crise de fé e de
mora l, exige dos homens e das mul heres sacrifícios
penosos e q uase superiores às fôrças humanas, ja­
mais êles pensa ria m em su jeitar-se se não soubes­
sem que a autoridade que a isso os chama é divi na
e não pode erra r .
Se Cristo não é Deus , e se a Igreja não é o seu
órgão d ivi namente d isposto para ensi nar a Sua ver­
dade, d esaparece tôda a certeza no que toca à re­
velacão' d ivina : não há autoridade sôbre a terra q u e
e
exi ja a nossa fé sujeição - tudo é incerteza como
dantes.
Ma is u ma vez, se há a lguma contradição dentro
da fé, a I g reja cessa ria a utomàticamente de ser a
Mestra d ivi na, porq ue a verdade deve ser uma -
não pode contrad izer-se a si mesma.
A VI DA SOBRENATU RAL DA I G REJA

De out ra parte, se a hu ma nid ade de No sso Se­


nhor é pos ta em d úvid a ou neg ada , entã o o tod o da
v id a sob renatur a l da Igre ja é des truí do. Pois é por
11o

Nosso Sen hor ter tomado a natureza humana que


n ossa humanidade foi elevada à divindade :
" Era Deus que reconci l iava consigo o mundo em
Cristo " ( l i Cor. 5 , 1 9).
A sagrada Humanidade de Nosso Senhor é o
e l o q ue nos une à Divi ndade. Não há outro elo. t
o ca n a l pelo qual a vida divi na desce sôbre a I gre­
j a - e assim a Igre ja é o Corpo místico de Cristo sô­
b re a terra - a compa nhia de homens e mulheres
q u e são elevados à vida i ndivisível da Divindade, de
ta l modo q ue se tornam rea l mente " participantes da
n atureza d ivina " (Ped. 1 , 4) .
Se Cristo está dividido, tudo isso cai pela base.
Pois a u n ião da Igreja com Cristo depende da un ião
d o H u mano com o Divi no na Pessoa de Jesus Cris­
to - perfeito Deus e perfeito Homem. A Igreja, por­
ta n to, é o Corpo m ístico de Cristo, e tira dêle, qu e
é a cabeça, tôda a sua vita l idade, por meio do Es­
p írito Santo : e porque ela é o seu Corpo místico, não
pode ser d ividida, ass i m como Nosso Senhor não
pode ser d ivid ido. O fato de o Corpo do nosso Mes­
tre d ivino não ter s ido quebrado na cruz profetizav a
esta u n i ão.
Presentemente, a conservação desta u nidade vi­
s ível da l g reia como de um corpo maciço não se
rea l iza à custa da u n ião da a l m a i nd ividual com seu
Sen hor, como iu l g a m mu itos.
-
O cora ção d a re l igião de S. Pau lo era um a i n
,

tim a u n ião com Cri sto :


" Pa ra m i m o v i v er é Cristo. "
111
" Vi vo , ·1 á nã o s ou eu que vivo
· , mas Cris to que
vive em m i m . "
E é S. Pa u lo q u e or a po r se us irm ão s :
" p a ra q ue , segu d o as riqu ezas da sua g lória,
vos con ced a q u e se1�a _1s cor rob ora dos em virt u de,
se � u nd o º. hom em i nter ior pelo seu Esp írito, e q ue
Cri sto h a bite pel a fé nos vos sos cor açõ es " (Ef. 3, 1 6).
E a i nd a S. Pa u lo q uem insiste sôbr e a u n idade
vis ível da I g reja com o de u m corp o.
A razão é que cada i ndivíduo é sàmente u m
com N osso Senhor por meio da Igreja, que é o seu
Corpo. E assi m é no corpo humano - cada membro
só é capaz d e exercer a sua fu nção enqua nto está
em perfeita u n ião com o resto do corpo e com a
cabeca .
,

S. Pau l o explica isto mais simplesmente :


" Porq u e ass i m como o corpo é um, e tem m u i ­
tos m e mb ros, m a s todos os membros d o corpo, em­
bora sejam muitos , são um só corpo; assi m é ta m­
bém Cristo : porq ue num mesmo Espírito fomos ba­
tizad os todo s nós pa ra serm os u m só corp o " ( 1 Cor.
1 2, 1 2).
E p ross eg ue o Apó stolo mos tran d o como Deu s
determi nou no corp o hum ano que houvesse a mais
delicad a e íntim a rela ção entr e todo s os mem b ros
por mei o do corp o; que . cad a mem bro � ó des_em � e­
nha a sua fu nçã o perfeita men te se esta em i ntei ra
união com tod o o corp o ; que se um mem bro sofr e,
tod os os out ros me mb ros tam bém sof rem : e, em se­
guida, d iz q ue Deu s ord eno u tud o ass i m "para que
1 12

��o ho uve s se cism a o cor po " ( 1 Co r. 1 2, 25) ne­


u m a q u eb r a d a u n�i d ad e. F _i n a l men te term i n a com
-

e sta a d m i rá ve l se nte nc a :
,

" O r a vós sois o corpo d e Cristo e memb ros em


p a rte " , s eg u n d o a l i cão
, mais aut � rizad a ( 1 Co r .
1 2, 27 ) .
M a s é tão d ifíci l co nserva r essa u n idade sôbre a
terr ? : s ? m � � te a u n i ão sobre natu ra l da I g reja com
a v i d a 1 n d 1v1 s íve l da D ivi ndade por meio do seu Se­
nho r é q u e p reserva a sua un idade externa .
E a ss i m vo ltam os d e novo à oracão do d ivi n o
,

S a l va d o r :
" Ro g o q u e s eja m u m , co mo ta mbém nós somos
u m, e u n ê l es e tu em m i m , para que sejam co nsu m a ­
d o s n a u n i d a de, e pa ra q u e o m u ndo co n heça q u e
t u m e envia ste, e q u e o s amaste, como m e a ma ste
ta m bé m a m i m " (J oa. 1 7, 22).
J á p o d e m o s ve r porque q u a l q u e r neg ação d a
fé o u d a u n i d a d e extern a d a I g reja é co nsid erada
c o m ta l h o rro r e taxa d a tão severa m e nte por homens
q u e for a m tão a ma ntes d a s a l mas. E porq u e tal n e­
g a ç ã o fere a Pessoa d e N o � so Senho r, destrói t � da
a a u to ridad e d ivina da lgre 1 a, e s o l a pa a s u a vida
sob ren atu ra l .
Pre cav er os h om ens con tra tal catá stro fe n os
têr mo s m a is for tes não é i ndí cio de ecle sias ticis mo
aca n had o, ma s é obr a d e sa lva dor a e mã e das al­
ma s, sem out ro mo tivo ma is que o am or .

Nã o no s m a rav i l h a q ue S. Pa ulo cla me tão


i n­
sistentemente :
1 13

" U m Senhor, u ma Fé, um Batismo" ; e que tam­


bé m o terno S. João diga :
"Todo o espírito que não confessa que J esus
Cristo vei o em carne (ou, na Vu lgata, "todo esp � r� ­
to que d ivide J esus") não é de Deus e ta l é o esp1n­
to do Anticristo" ( l J oa. 4, 3).

U m Senhor, 8
C A P fT U L O IX

C O N C L U SÃO

N ã o n o s é p o s s íve l co n g l o b a r t u d o o q u e e n co n ­
t r a m o s s ô b re N o sso Se n h o r e S u a I g re j a n o N ovo
Testa m e n to .
S a b e m o s q u e N osso S e n h o r afi r m a q u e E l e é
D e u s : q u a n d o fa l a é D e u s q u e m fa l a : q u a n d o e n s i ­
n a , é o e n s i n o d e D e u s q u e s e fa z o u v i r : s u a a u to r i ­
d a d e é a a u tori d a d e d e D e u s : ve i o E l e p a ra tra n s ­
m i t i r a s u p re m a reve l a çã o d e D e u s a o s h o m e n s .
Q u a n d o d e i xo u êste m u n d o, q u e m ed i d a s to ­
m o u E l e p a ra q u e a S u a verd a d e fô sse tra n s m i t i d a
p u ra e i n co rru pto ? O n d e d e ixou a S u a a u to r i d a d e ?
E s c reve u u m l i vro ? N ã o . Tra n s m i t i u a S u a a u to r i d a ­
d e a o s A p ósto l o s : " Tod o o p od e r m e fo i d a d o n o
c é u e n a t e r ra . I d e, p o i s, e e n s i n a i a tô d a s a s n a -
..... "
c, o es .
E p o rq u e ê l e s fo ra m s e u s rep re s e n ta n tes, reves­
ti u - o s d a S u a d i vi n a a u to ri d a d e ; d ev i a m , p o rta n to,
ex i g i r o b e d i ê n c i a ; e a q u ê l es q u e crêsse m s e r i a m s a l ­
vos, e q u e m o b sti n a d a m e n te re i e i ta s s e S e u s e n s i n a ­
m e n to s s e ri a co n d e n a d o .
P a ra to r n á - l o s ca p a zes d e l eva r ava nte esta m i s ­
s ã o , p ro m e te u - l h e s a a ss i stê n c i a d i vi n a d o E s p í rito
8 *
116

Santo que os introduzisse em tôda a verdade - e


d i z q ue Ele esta rá com ê les até ao fi m dos temp os.
O rou para que êles e todos os q ue êles ensi­
n a ssem p udessem ser um na verdadei ra U nidade da
D ivi ndade : " pa ra q ue possam ser um em Nós " . A
esta vida da Divindade deveriam u n i r-se, med i ante
a u n ião com Ele, e esta união deveria man ifesta r­
s e em uma un idade externa tão admirável q u e con­
ven ceria o mundo de Sua Divi ndade, e seria um sinal
d o a mor d e Deus Pai à sua Igreja.
Nos Atos e nas Epístolas vimos o cla ro e l ógi­
co d esenvolvimento desta i nvestidura.
D isse Nosso Senhor aos Apóstolos que esperas­
sem em J erusa lém até q ue viesse o Espírito Santo
pa ra d a r-lhes poder e d i reção. No dia de Pentecos­
tes d esce o Espírito Sa nto e a l g reia sai a ensi n a r
o m undo.
Vêmo-la g u iada sobrenatura l mente pe l o Espíri­
to S a nto, ensinando uma verdade sobren atura l e exi­
g i n d o o b ed iên c ia.
Vêm o- l a ensin a r em tôd a a parte a D ivi ndade d e
N osso Sen hor J esus Cristo, e esta é g a ra ntida pe l a
Ressu rre icão. J esus Cristo é perfeit o Deus e perfeit o
,

Home m : d i a nte de tôda a oposi ção, d i a n t e d os go-


ver n a d o res e reis, é êsse o obiet o d a sua prega ção.
Esta verd a de é a fo nte d a s u a a utor i d a d e e o
seg rêdo d a s u a u n idad e. Esta u ni d ade da Fé e d a
d
Soc ieda de, e l a a p reza c o m o s u a pró pri a vi a .
117
Qua lquer q u e procu re minar a Fé é cons ide ra ­
d o com o máxi m o h orror e la ncado fora d a u n i d a -
' ,
d e visív el d a l g reia .
A u nidade da fé não pode ser d ividida, porq ue
é a verdad e do Senhor e a verdade do Sen h o r d u ra
para sempre : e a unidade d a Sociedade por E l e i ns­
titu í d a não pode ser d ivi d ida porque é o Corpo d e
Cri sto, e Cristo não pode ser divid ido.
Há h oje ta l I g reja ? Se há, tê-la-ei encontra d o ?
A resposta q u e eu con heci em meu coração, foi es­
ta : " Si m,' há ta l I g reja, a I g reja Católica, e eu a e n ­
contrei e m Lisieux. "
A í pude ver que a I g reja Catól ica é a ú n ica
I g re j a no mu ndo q ue afirma possui r autori d a d e d i­
vi n a p a ra ensi nar a tôdas as nações. E e l a a ú n ica
I g re j a que afi rma ter a assistência sobrenatu ra l d o
Esp í rito Sa nto a defendê-la do êrro sempre q u e e n ­
si n a a lg u m a coisa como necessá ria e m matéri a d e
fé e d e mora l .
t: e l a a ú n ica I g reja que exige abso l u ta o b e d i­
ê n c i a de seus fi l hos, e é a única I g reja cap a z d e a s ­
seg u r a r esta obediência , e à q u a l seus m emb ro s s e
s u bm ete m esp ont â nea me nte.
Só e l a ensina u m a verdade onde q u e r q u e s e
a prese n te, e é a ú n ica l g reia que conser va po r to d o
m u nd o uma u n idad e visív el e ínteg ra.
A verda de centra l que ela ensi n a é a Div i n d a d e
do seu Sen hor, g a ra ntida pela Sua Ress u rr e i ç ã o . E
esta a base de tôda a sua autoridade e a fo nt e d a
sua vida sobre natu ra l . Nunca permite que est a f é s e-
118

�� p o s.ta e m d ú v i d a u m só m o m e n to, e q u e m o fizes­


.

r
s e i a � x c l u _1 d o d a s
u a u n i d a d e vis íve l . N ão há ou -
t r � s g re 1 a s q u e se
� .
g e c i a . N e n h u m out
. ?
a p rese nte m co m sem e l h a nte ex i­
ra I g re j a, n e m a O ri e n ta l n e m
ª n g l 1 ca � a , a f i r m a ·s e r a ú n i ca
m estra de tod o o
m u n d o u n i ve rs o.
� a rea l i d a d
, e n ã o há ou tra I g re j a u n ive rsa l . Está
s o , n a o a p e n a s em sua reivi n d i cacã o mas ta m bém
n o fato, p rov a d o p e l a h i stória d � t � r m a ntido ta l
r e i vi n � i ca ç ã o . E l a está só, ú n i � a, exc l us iva, evi d e n ­
t e . F o i a p e rcepç ão d o sob re n atu ra l , co mo e u o des­
c o b r i e m L i s i e u x, q u e me cativou e atra i u a m i n h a
a te n çã o p a ra a I g re j a q u e havia p roduzido seme-
1 h a n te m a ravi l h a .
A s a nta d e L i s i e u x e n ca m i n h ou - me para a I g re­
j a C a tó l i c a . A I g re j a Cató l i ca d i ri g i u- m e pa ra a Sa­
g rada E s c r i t u r a , e a S a g ra d a Escritu ra ree n vi o u - m e
para a I g re j a Cató l ica . E esta deve s e r s e m p re a or­
dem das coisas.
A I g re j a C a tó l i ca n ã o é a l g re i a Cató l i ca p o r­
q ue p o d e i s p rova r q u e e l a é ta l p e l a Sag rada Escri­
tura. E l a ex i ste e m seu p róprio d i reito, faze ndo as
s u a s p ró p r i a s ex i g ê n c i a s pera nte o m u ndo. Exi stiu
a n tes q u e fôss e escr i to o Nov o Test ame nto. Não
p rom ete u No sso Sen hor i nfa l ibi l i ? ade a u m � ivro, mas
p rom eteu a i nfa l i bi l i d ade ao � ns1n o da lgre t� · O N e o

vo Tes tam ent o é-n os ga ran tid o pe l a lgr e 1 a qu com e -


esc rev eu, e no l ivr o q u e esc re veu l em bro u os
h
, d a s ua pró pri a istó ria.
cos
ºd er a r. 1
D
. s-
M as áh a i n d a ou tra co isa qu e co ns i
l ica qu e pa r a p ert en -
se- m e ta m bé m a I g re ja Ca tó
1 19
ce r a e l a é m i ste r esta r e m co m u nhão co m o Papa.
Por q u ê ? Porq u e Nosso S e n hor constitu i u S. Ped ro e
se u s s u cessores como cabeça d a I g reja na terra .
Po r co nseg u i nte é o Pa pa a fo nte â e tôd a a a u­
tori d a d e d a l g reia e o centro d a u n id ad e d a mesma
I g re j a . E s e m p re q u e, em nome d a I g reja, ê l e d efi­
n e a l g u m a coi s a em matéria de fé ou de mora l, o
P a p a é i nfa l ível .
A ntes d a s m i n ha s visita s a Li s i e ux, e u j a m a i s ha­
v i a tom a d o a sério esta reivi n d i cação p a pa l . Per­
c e b i e ntão q u e o d evia faze r. O p róxi mo ca p ítu l o
d á a co n hecer o s res u lta d os dêsse estudo.
CA P ITU LO X

O PAPADO NO EVAN G E L H O

J á n ote i q u e, a p ós a m i n h a v i s ita a L i s i e u x, p a s ­
s a d o s i á u n s q u i n ze a n os d e m i n i sté r i os, co m o A n ­
g l i ca n o, m e e n co n trei pe l a p r i m e i ra vez fa ce a fa ce
c o m a l g re i a Cató l i ca co m o u m a rea l i d a d e e l a n ­
c e i m e u p r i m e i ro o l h a r pa ra os seg red os i n te r i o res
d a s u a v i d a s o b re n atu ra l .
D a m e s m a m a n e i ra , p o r i n críve l q u e pa re ç a , a té
e n t ã o j a m a i s h a v i a co n s i d e ra d o s e r i a m e n te o s textos
P e t r i n os , ou estu d a d o o Eva n g e l h o e os Atos p a r a
v e r q u a l fo i rea l m e n te a p os i çã o d a d a p o r N os s o S e ­
n h o r a S . P e d ro .
A razã o d i sto, s u p o n h o e u , fo i pri m e i ro e a n ­
tes d e t u d o, a co m p l eta co nvi cção d e q u e Ro m a e s ­
t a va fu n d a m e n ta l m e nte e n g a n a d a , u m a co n v i c ç ã o

q u e s u b s i ste n o co ra çã o e n o es � írito ª m a i o r p a r­
.
te d o s i n g l êses ; e m s u ma, eu h a v i a ass i m i l a d o o q u e
t i n h a a p re n d i d o e m m � u Co l ég i o Teo l óg i co s e m exa ­
.
m e a l g u m , e n u n ca m a i s m e p reocu p e i co m o a s s u n t o .
P o r m a i s q u e e u co n s i d erasse a q u estão, v i v i a
p e rs u a d i d o q u e o Pa � a d o e ra o po nto c e n t r � I d a
d i fe re n ce e n tre a l g re 1 a d a I n g l ate rra e a l g re 1 a d e
Ro m a ; � ra u m a a d i ç ã o à fé o rig i n a l e n ã o ti n h a fu n -
1 22

d a me nte rea l � o Eva ng elh o; q ue, na his tór ia s


ubs e ­
q uen t e d a l g re 1 a, ta l situ açã o con sol ido u-se e des
vol ve u -se sob o a mpa ro da Rom a imp eria l, susten ­
tad a � o r u ma não mu ito honr osa d i plom acia e eren­ a,
ess en c i a l me nte , um a coi sa hum ana.
Eu teria susten tado que o Papad o, longe de
s e r o centro d a u n idade, foi uma ca usa de divisão ,
s e n d o respons ável, em g ra nde esca la, pela defec­
ç ã o, p ri me i ro d a I g reja Oriental Ortodoxa , e depois
d a I g re j a Ang l ica n a : e era nosso dever protestar
co n tra as ú ltimas pretensões do Papado, a juda� a
co n stru ir u m cato l icismo não-pa pal, e traba l har pa­
ra q u e u m d ia a u n ião pudesse vi r com o Pa pa co­
m o primaz d a I g reja u n iversa l . Mas, a ntes que
isto p u d esse ser l evado a efeito, deveria haver gran­
d e m o d ificação nas reivi n d i cações papais.
Agora , porém, tudo foi mudado. Em Lisieux en­
contrei o sobrenatura l como jamais o ti n ha encon­
t ra d o a n tes. Con heci q u e a rea lidade católica ro­
m a na e ra o res u l ta d o d i reto d e u m a autoridade e
d e u m a u n i d a d e q u e, por s u a vez, era m i ntei ramen­
te s o b re n a tu ra is. Esta a utorid ade e esta unidad e,
c o m p re e n d i-o então , estav am . d e todo l igada s ?º
P ap ad o . A conc l usão era óbvi a . As vaga s teori a s
q ue e u a té e ntão d efen d er � co_m re l a ç_ão ao Pap a­
d o era m i n a d equ a d as. H avia n isto m ais d o que e u
p e n s ava , e a g o ra c h eg uei a e nfre ntar o pro b l em a.
No m o m e n to em q u e co me cei a est u d.a r ei� pN s­-
o

vo T es ta m e n to ' co m ist o e m me u es pír itod , ftia c a va ad 0


qu
m o a o ver até q u e po nto S. p e d ro se es
resto d o s A pósto l os.
·1 23

. " Eu . semp re havia su posto vaga ment e que a proe­


m 1 nenc1a de S . Ped ro era pri ncipa l mente devid a à
i mpe tuosid ade d o seu ca ráter e que era tendência
natu ra l s u a tom a r sempre a i n iciativa , o q ue i nevità­
vel m e nte o p u n h a mais em desta que .
. 0 a s q u a ndo cheg uei ao Eva ngelho e aos Atos ,
vac i l e i a o ver q u e o nom e de S. Ped ro é a í m e n ci o­
nad o em m a i s de cento e noventa ocasiões, enq u a n ­
to q u e o nome d e J oão, que vem logo a pós, é só
a n u nciado vi nte e nove vêzes. Logo, longe de ser
êste fato d evido ao temperamento de S. Pedro, tô­
das a s vêzes q u e S. Ped ro se apresenta em ta l proe­
m i n ên ci a é por ação deliberada do próprio Mestre
d ivi no.
Consideremos a lg u mas destas ocasiões :
S. P E D RO, O I NTtRPRETE DOS APóSTO LOS
E m p ri meiro lugar, S. Ped ro aparece u ma e m u i­
tas vêzes como o i ntérprete dos Apóstolos.
Na Mon ta n ha da Tra nsfigura ção, u m i n ci d e nte
l e m bra d o pelos três Eva ngelist as, é S. Ped ro q u e
fa l a a N osso Sen hor, e é e m resp osta a ê l e q u e u m a
voz vem d a s nuve ns : " Este é o meu Fi l ho muit o a ma­
d o, o uví -o " (Ma rc. 9, 6).
Na h i stór ia d o jove m rico , é S. Ped ro que m ob­
serva : " Eis q ue dei xa mo s tud o e te seg uim o s " (Ma rc.
1 0, 28).
E: S. Ped ro que cha ma a ate nçã <? de No sso Se­
n h o r p a ra a fig uei ra sêc a e é ê l e a i nda q u e f �z a
/1

perg u nta a N oss o Sen ho r : Sen hor , qua nta s vez es


1 24
P ode rá p eca r me u i rmã o con tra m i m, até que eu
l h e pe rd oe ? " (Mat. 1 8, 21 ) .
De � ovo, é à pergu nta de S. Ped ro (Mat. 1 5, 1 5),
q u e expo e Noss o Sen hor a pará bol a das coisa s que
m an cha m um home m, e, mais u ma vez é em r es ­
P ? s ta à s u a perg u nta : " Sen hor, d izes es t a pa rábo la
s o para n os, ou para todo s ? " (Luc. 1 41 q
2, ) , ue Nos­
so Senh or expô s a pa rá bola do feitor fiel e p ru­
d ente.
Em tôd as estas ocasiões toma a d iante i ra S.
Pedro, tã o natu ra l e i n evitàvel mente, que cresce a
convi cção d e q u e ê l e procede assim, n ão em vi rtu de
d o s e u tem peramento, mas porque é coisa recon h e­
c i d a entre os Apósto los q ue a êle perte nce fa l a r em
n o m e d o s outros.
E i sto especi a l me nte d ig no de aten ção na oca­
s i ão s o l e n e em q u e J esus Cristo Nosso Sen hor en cer­
ra s e u d iscu rso sôbre o Santíss i mo Sacrame nto
(J o a . 6).
A n a rra ção q u e faz S. J oã o dêste i ncide nte é
e m ext rem o d ra má tica .
A cen a p a ssou-s e n a s i n agoga de Cafa rna. u r:n ,
e é desc rita com o o clím ax e a coro ação do m 1 n 1s­
tério g a l i l e u d e Nos so Sen hor, n a me � ma s i nago g a
e m que E l e o in icia ra hav ia a pen as d o i s a nos .
O ser mã o de No sso Sen hor é u m a profu n�drea ªe
pe ne tr a nte exp osi ção sôb re a l n ca rna ç �i m o, e sô
d 1sc ur
Eu ca ris t ia qu e é su a co nti nu aç ão. Nontf s, S.doP d o :
t� �
so , en qu an to ou tro s se re tir am dep sc r� :
um a g ra nd e ro f1s sa o de e es
a po nt ad o a fa ze r
1 25

tas d u a s verd ad es fu nda ment a is em nome dos o u ­


tros Após to l os : " Senh or, para q uem h avem os n ó s
de 1. r ? Tu ten s pa lavr as d e vida eterna ; e a cre d it a ­
mos e con hece mos q u e t u é s Cristo , Fi l ho d e D e u s "
(J ºª . 68) .
· i: d ifíc i l , à l uz d a s ubsequ ente h istória d a I g re­
ja, n ã o consid era r estas pa lavras como profé ticas e ,
n ã o o uvi r n a voz d e S. Ped ro a voz de seus s u c ess o­
res a través d a s idades d efi n i ndo e g u a rd a n d o êste s
dois g ra nd es dogmas, a I nca rnação e o S a ntí ssi m o
Sac ra mento, aos o l h os de u m m u ndo d escre nt e, e m
n o m e d a I g reja Cató l i ca .
E, e ntreta nto, e u ti n h a l ido esta passag e m u m a
e m u itas vêzes e n u nca ti nha a lca n cado a i me n s a
,

i mportâ ncia d a confissão de fé a í a rq u ivad a e d o


fato d e ter s i d o Pedro q uem a fêz.
S. PE D RO E OS MI LAG RES
N a p róx i m a série de i ncidentes, N osso Sen h o r
proposita d a m ente associa S . Ped ro a s i mesmo n a
rea l ização d os m i l a g res. D i sti ng ue-se S. Ped ro com o
u m a p essoa à q u a l está J esus associa d o q ua nd o ma­
n ifesta seu poder m i racu!oso, coisa que n ã o s u ce d e
com nen h u m outro Apóstolo i n d ivi d u a l mente.
O p r i m e i ro é a pesca mi l a g rosa , q u e ve m n a
n a rração q ue faz S. Lucas d a vocaçã o d os A pós t o­
l os. E a Ped ro q ue f a l a N osso Sen h or, é P e d r o q u e
l a n ça a rêde e é a êle q u e N osso Sen h o r d iz : " N ã o
tema s ; d esta hora e m d ia nte será s pesc ad o r d e h o­
m e n s " (Luc. 5, 1 0).
1 26

N a se g u n d a oc a s i ão é d a do a S.
d e ca m .1 n h a r so... b re as ag , Pe d ro o po de r
uas com o f'i zer a seu Me s-
tr e (M ª t · 1 4, 28) . Ped ro fa
l h a em sua p ri m e i ra te nta -

fi a , m a s é l ev a d o
a bo m suc ess o g rac as a um a ma ­
_
n i est a � ª º d o pod er sob ren atu ra '
l de No sso Se n h or,
e, p a rt i c .i pa n d o d êst e po de r com
o Me stre 1 S Ped ro
� o 1 ta c o m E l e p a ra a ba rca , ca m i n ha ndo s Ó bre as
a guas.
De n ovo, e m Cafa r n a u m, é p o r meio d e S. Pe­
d ro � u e N osso S e n h o r opera o m i la g re da moed a
� o t r i b u to p a ra ser d a d a ao co l etor de i m postos
(iV'\ a t . 1 7, 26) .
Vo l ta re m os a êste i n cidente.
E a q u a rta oca s i ã o é a da seg u nd a pesca m i ­
l a g rosa, q u e n os é re l ata da p o r S. J oão (J oa . 21 ,
4-7) . E S. Ped ro q u e está e n ca rregado da ba rca, é
S. Ped r o q u e se l a n ça ao m a r e m d e m a n d a da
p r a i a , e é S. Ped ro q u e a rrasta p a ra terra a rêde
q ue , d esta vez, a m u l ti d ã o d os peixes não co nsegue
rom pe r.
E m todo s êstes m i l a g res, excet o ta lvez no · ú lti­
m o, com o com p l eme nto dêle s, vem os Nos so Sen hor
e mp e n h ado n u m i nte nso diá log o pes soa l co m S. P e ­
Ap ó s-
d ro e m g ra u n u nca vis to com nen hum out ro
to lo.
len e da Pa i­
Se nh o r, ao
Q u a n do se a p ro xi m a o mo me nt o so
xã o ' é po r m ei o de S. Pe d ro q u e N os s ?
1 f
d '
1 sc1 p u os, d ,
ª ª m a i s c o m ove n tee
l ava r os pés dos ,
d .i ro e h e e e, 0 q u
l i c ã o e n s i n a nd o- no s qu e o ve rd a e
,
1 27

s e rve os s e u s s u b o rd i n ad os e q u e o seg rêdo d a ver­


d a d e _i ra g ra nd eza está n o s e rvi r (J o a . 1 3, 4-1 8). ;
D u ra n te a a g o n i a n o G etsêm a n e, é p a ra S. Pe­
d ro q u e se vo l ta N osso Sen ho r, com o q u e m d ê l e es­
p e r a e s p eci a l m e nte a po i o e co m p ree n s ã o : " Si m ã o ,
t u d o rm es ? (Mo re. 1 4, 37), e q u a n d o a fi n a l N osso
S e n h o r é p rêso, é S. Ped ro q u e te n ta d i ri g i r o s A pós­
to l os n a d efes a do seu Mestre (J o a . 1 8, 1 O) .
Q u a n d o j u n ta mos todos êstes exe m p l os n os
q u a i s S . P e d ro s u rg e e m i n egáve l p roe m i n ê n c i a , p ri ­
m e i ro c o m o i n té r p rete d os A.pósto l os, e e m s e g u nd o
l u g a r p e l a i nti m i d ad e c o m o d ivi n o Mestre, j á s e n ã o
e s t r a n h a o s e g u i n te fato e m extrem o s i g n i f i c a tivo e
l óg i co q u e S . P a u l o e S. L u c a s nos rec o rd a m . D izem
q u e foi a S. Ped ro q u e N osso Se n h o r s e m a n i fe sto u
d e p o i s d a s u a Ressu rre i ç ã o, a ntes q u e s e m ostras s e
a os d e m a i s A pósto los.
Até a q u i, pe l o nosso estudo do Eva nge l h o, vi­
m os com evidência p roveniente d e todos os l a dos
q u e S . Ped ro, fôsse qua l fôsse o motivo, ocup ava
u m a p os ição s i n g u l a r d e proemi nência e ntre os o u ­
tros Apósto l os; u m a posição q u e não pode ser a i n d a
a d eq u a d a me nte exp l ica d a , até a o ponto a q u e che­
g a m os, com o m ero resu l ta d o d e seu tempera m ento
i mp etuoso.
Passa re mos a go ra a ver como o Eva nge lh o d e­
l i be ra d a me nte a ce itou e n otou esta p riori d a d e d e S.
Pe d ro d e d u a s m a n e i ra s i nconfu n d íveis.
1 28

A CASA D E S . P E D RO

Ma s, a n tes d e toca rmos êsse po nto, h á ou tro fa ­


t o m u i to i n te ress a n te e d i g n o d e ser n otado. Ass i m
c o m o fo i d a b a rca d e S . Ped ro q u e N osso S e n h o r pre­
g o u s e u p ri m e i ro s e r m ã o à m u l tid ão, a ss i m fo i na
c a s a d e S . Ped ro q u e N osso Se n h o r opero u seu pri­
.
m e i ro m _i l a g re sô b re os d o e ntes, a o s a ra r- l h e a so­
g ra (Ma rc . l , 29) ; fo i à s u a porta q u e naquela tar­
d e, a o pô r d o so l , fo ra m l evados os doentes e pos­
s es s o s e fo i a í q u e J es u s os cu ro u tod os. "Tôda a ci­
d a d e s e t i n h a j u n ta d o d i a nte d a po rta " , d iz o eva n­
g e l i st a .
P a rece q u e N osso S e n h o r e ra p u b l i ca mente re­
c o n h ec i d o como h ós ped e d e S . Ped ro, pois S. Ma­
t e u s , q u e ta m bé m e ra co l eto r de i m postos, nota co­
m o fo i a Ped ro q u e o s co l etores se d i ri g i ram, per­
g u n t a n d o : " Te u Mestre n ã o p a g a o tributo" ? e,
q u a n d o S. Ped ro cheg o u , N osso Se n hor foi ao seu
e n co n tro e o rd e n o u - l he q u e fôsse pesca r u m peixe
q u e p rovi d e n c i a r i a o d i n he i ro n ecessá rio para pa­
g a r o tri b u to . (Ma t. 1 7, 24).

Se, p o i s , a casa d e S . Ped ro e ra a m o rada P?r­


m a n e n te d e N osso S e n h o r em C a f a rn a u m ,
? u pl a s1g­
n i f i c a c' ã o é d a d a a m u i to s i n c
i d ent es e e nsi nam e nt1os
q u e a l i s e ve r i f i ca ra m (M a rc. 2,
1 -6) ; p o r e xe mp 0 '
p a ra l ít i co e a a b so 1 · çao
v1 - d os s e u s pec a-
ª c u ra d o .
d os (M o re . 2, 1 -6 ) ; a ex p l i ca çã o d � �e i_n o
(
3q u�2d i v i d i-0
)· e
e su i �i s s r '0 �m m
d o c o n tra s i m es m o n ã o pod m h e
u e co n ta m i n a
p a rá b o l a s ô b re a s co i s a s q
(7, 1 7).
1 29

. Sobre tu d o, te ria s i d o n a casa d e S . Ped ro q u e


fo i d a d a a ú lti m a i nstru ção, co nforme a re l ata S.
Ma rcos. Todos os S i n óticos l e m bra m a q u estão s u r­
g i d a e ntre os Apósto los sôbre q ua l d eve r i a ser m a i o r
n o Rei n o, q u a nd o Nosso Se n ho r l h es mostra u m a
c ri a n ca co m o mod ê l o .
,

Mas, s e j a como fô r, é ce rto q u e foi à casa d e


S . Ped ro q u e v i e ra m o s co letores rec l a m a r a moeda
do tri b uto e foi aí que N osso Se n h o r, trata n d o d êste
p o n to, d i sse : "Todavia, pa ra q u e os n ã o esca n d a l i ze­
m o s . . . va i b u scá - l o e d á - l ho por m i m e p o r ti " (Mat.
1 7, 26) .
E m bora o d ivi n o Mestre fa l e m u i ta s vêzes d e
s i m es m o e d e seus Apósto los e m p reg a n d o o p ro n o­
m e " n ós " , n u nca faz uso d ê l e q u a nd o se refere a s i
m es m o e a o utro i nd ivid u a l me nte, exceto q u a n d o
fa l a d o Pa i ce l este, e , a q u i, d e S . Ped ro. A mes m a
p a ss a g e m n a q u a l o s Apósto los perg u nta m q u a l se­
r i a o m a i o r, pa rece m ostra r q u e fo i a p roe m i n ê n c i a
d e S. Ped ro q u e d e u ori g e m a êste i n ci d e nte .
E a g o ra vol te m os à s d u a s i n d i scutíve i s m a n e i ra s
co m o os Eva n g e l i sta s a ce i ta ra m e n ota ra m ofi ci a l e
d e l i b e ra d a m e n te a p ri o ri d a d e d e S. Ped ro.
A p ri m e i ra é o s e u re l ato sôbre o c h a m a me nto
d o s Apósto los. Em cada caso l e m b ra m q u e S . Ped ro
fo i o p r i m e i ro q u e fo i c h a m a d o (Mat. 4, 1 8 ; Mo re. 1 ,
1 6; L u c. 5, 1 ).
N o re l ato d e S. Lu ca s êste fato é a ce n tuado p e­
l o h ag ióg ra fo a o d izer n ã o só como S . Ped ro fo i o
p ri me i ro c h a m a do, m a s q u e fo i d e p o i s q u e N osso
Se n ho r ti n h a p reg a d o à m u l ti d ã o da b a rca de S . Pe-
U m S e n h o r, 9
1 30

dr o e d e p o 1 s d a p esc a m i rac u l osa em q ue as


e s five ra m em p e r i g o de se ro m pe r, q u e N oss orêdSe­es
·

'

nh� r a c res ce n to u u m a p ro m essa pes soa l a seu pri­


me1 ro A post , o l o esco l h i do
: " Nã o tem a s, dora va nte
,
ser a s p e s c9 d o r d e h o m e n s. "
A s eg u n d a oca s i ã o e m q u e êstes três eva ngel is­
tas l e m b ra m a p ri o r i d a d e de S. Ped ro é a da esco­
l h a d os d oze Apóst o los. Em ca d a l i sta é S. Ped ro co­
l oc a d o e m p ri m e i ro l ug a r e i g u a l me nte l he é dado
u m n o m e e s p e ci a l :
" E e s co l h e u d oze . . . S i m ão, a q u em pôs o no­
m e d e Ped ro " , etc. (Mo re. 3, 1 4).
" Es co l h e u d oze d e ntre ê l es, a os q u a i s chamo u
Apósto l os ; S i m ão, a q u e m d e u o sobrenome de P e ­
d ro, etc. (Luc. 6, 1 3).
" O ra, o s n o m e s dos d oze Apósto los são êstes : o
p r i m e i r o S i m ã o, q ue se ch a m a Ped ro ", etc. (Mat.
1 o, 2).
S. Ma rcos e S. Lucas, em seu s Eva n g e l hos, fri sam
q u e os A póst o l o s fo ra m esco l h i d os dentre um nú me­
ro m a i o r d e d i s cí p u l o s e q u e, sôbre êste peque no
g rupo d e d oze foi Simã o o p r i me i r o. es : o l h i d o (to d o s
os três S i n ótic os o co l oca m no p r i m e i ro luga r em
s u as l i s ta s ) e · q u e a êle, por alg u m a razã o mist er
io ­
sa No sso Sen hor deu o sob ren om e d e Ped ro .
I ,

nd em os ª e
Si nte tiz em os d e no vo qu
aq u. i . Vi m os q u e o no me de S. Pe d ro
an to a p
é
r e
me nc J
.ion a 0

e n ov e nta vê zes no s E va n g el h os e ".º5


ma i s d e ce nto m en c 1 0-
5 ª 0 P edro
q ue ve a seg u i r , :,
Ato s, e n q u a nto S. J oão ,
·


ve ze s : q u e
na do só me nte vi nte e no ve
1 31
u m a e m u i t a s vêzes a pa rece como i n t é r p rete n a t o
d o s A p ósto l os : q u e N osso Se n h o r e os A p ósto l o s p a ­
rece m a ce i tá - l o sem n e n h u m come n tá r i o o u s u r p rê­
s a : q u e N osso Sen h o r a ss o c i a S. Ped ro a s i m es m o
e m c e rtos m i l a g res : q u e l h e d á u m a l i cã o e s p e c i a l à
'
res p e i to d a a u to r i d a d e p o r oca s i ã o d o l a va - p é s :
q u e o a ssoci a a s i mes mo, de u m a m a n e i ra p a rt i c u ­
l a r m e nte í n t i m a , n o i n c i d e n te d o i m pôsto ex i g i d o p e ·
l o co l eto r : q u e se h os ped a va em casa d e S . Ped ro,
e q u e a pa receu a ê l e p r i m e i ro q u e aos o u tros A p ó s ­
t o l os, d e po i s d e ress u sc i t a d o .
F i n a l m e n te, N osso Se n h o r o c h a m o u a n tes d os
o u t ros A p ósto l os e a ê l e, p o r motivos m i ste r i o s o s ,
mas bem d eterm i n a d os, d e u o s o b re n o m e d e " Pe -
d ro .
li

S e rá só i sto o q u e temos p a ra conso l i d a r o a r­


g u m e n to e m favo r d o Pri m a d o de Ped ro ? tsta r á ê l e
b a se a d o a pe n a s nos i n c i d e n tes j á estu d a d o s ? O q u e
a ss o m b ra é q u e, a pesa r d e t u d o o q u e j á v i m os, a i n ­
d a n a d a p o n d e ra mos d o a rg u m e n to ce n t ra l . A ve r­
d a d e i ra razão n os s e rá reve l a d a pe l o m i steri o s o s o ­
b re n o m e Ped ro. S i g a m os êste g u i a . Por q u e f i z e r a m
o s eva n g e l i stas, S. Mate u s, S . Ma rcos e S . Lu c a s ,
m e n cã o d êste s o b re n om e ?
,

A p r i m e i ra p a s s a g e m q u e se d eve co n s i d e ra r e s ­
tá n o Eva n g e l ho d e S . J oã o . N o seu p ri m e i ro ca p ít u ­
l o ve m os co m o Nosso S e n h o r, a p r i m e i ra vez q u �
e n controu S. Ped ro, d e u- l h e êste misteri oso s o b re ­
n o m e - o q u e não fêz a n e n h u m o utro dos o ut ro s
Apósto los.
9 •
1 32

_ " E J esu s, fixa ndo nêl e o olh ar, diss e : Tu és Si­


m a o, f .i l h o de J ona s, tu ser ás cha mado Cefas, que
.

q ue r d ize r, pe d ra " (J oa . 1 , 42 ).
N o caso do sobr enom e Boan erge s dado mais
ta rd e a Ti ag o e a J oao, vemos o s1gn1� f .1ca d o; pois· ·

era d escr .itiv . o de seu ca ráte


-

r, os fi l hos do trovão.
Mas , n este caso , não hav ia nenh uma rela cão a a l­
g � m a qua l id ade natu ra l d e S. Ped ro ; pois, ' nas rela­
çoes do Evang el ho, êle mostra ser tudo menos u m
roc� edo. P.a rece que isto indica um desti no q u e de­
ver i a seg u i r, e não qual idade natural que porventu­
ra possu 1sse.
Há a lgum semelha nte desti no? Se o há, qual
é ? A m a ior pa rte da história do Evangelho nos dei­
xou n a expectativa e i nsatisfeitos ; o mistério só é
exp l a nado no ca pítu lo d ezesseis d e S. Mateus.
Esta mos em Cesa réia de Fi lipe no fi m do apos­
tol a d o d a Ga l i léia, e Nosso Senhor faz a seus Após­
tol os a suprem a pergu nta sôbre a sua Divi ndade :
" E vós q uem d izeis que sou ? Respo ndend o Si­
m ã o Pedro , d isse : Tu és Cristo , Filho de Deus vivo.
E, resp o n d e n d o J esus , d isse- lhe : Bem -ave ntura do és,
S i m ã o B a r-J o n a , p o rq u e n ã o fo i a carn e e o san­
g u e q u e to rev e l o u , m a s meu Pa i q u e está
nos céu s.
E e u te d i g o q u e t u és Ped ro, e s ô b re . esta pedn ao �o
o i nfe r n o
e d i fi ca re i a m i n h a I g re j a , e a s po rta s d
a l e c e rã o co n tra e l a . E e u t � d a re i � s cha v es do
p rev
r e i n o d o s cé u s ; e t u d o à q u e l i g a res
sob re a ter ra,
cé u s ; e t u d o o q u e de � ata ­
s e rá l i g a d o t a m bé m n o s ,

,
no s ceu s
res n a te rra , d es a ta d o s e rá ta m b ém
·
1 33
Ponde remos estas pa lavras cuida dosam ente. Ne­
l as se d isti n g uem d, u as pa rtes�
a) "Tu és Ped ro, e sôbre esta pedra ed ifica rei
a m i n ha I g reja ; e as portas do i nferno n ão preva le­
cerã o contra e l a . "
Pa ra a l ca n ça r tôda a fôrça e sig n ificado destas
pa l avras d e Nosso Sen h o r, devemos lembra r q ue
E l e fa l ava e m a ra m á ico, e usava a pa lavra Cefas :
E:s Cefas e sôbre êste Cefas ed ificarei a m i n h a I g re­
j a . O m e l hor eq u iva l ente em nossos id iomas seria
" Tu és roc:ha e sôb re esta rocha ed ifica rei a m i n h a
I g re ja . "
Pa ra a mente judaica, e n a selvática reg ião d a
Pa l esti n a, a rocha era o g rande refúgio em tem po d e
g ue rra e o n atura l abrigo n a tem pestade. Sómente
u ma rocha oferece funda mento i namovíve l . Assi m
fa l a Nosso Senhor em sua pa rábola do h o m e m q u e
ed ifi cou s u a casa sôb re a rocha : " E ca i u a ch uva, e
tra nsbord a ra m os rios, e sopra ra m os ventos, e i n­
vesti ra m contra a q u e l a casa e ela não ca i u, porq u e
estava fu n d a d a sôbre roch a " (Mat. 7, 25).
Ass i m p re n u n ci a N osso Senh o r q u e vai con stru i r
a s u a I g re j a sôb re u m a rocha e q u e esta roch a é
Ped ro.
E i mp ressiona nte pensa r q u e é esta a pri m e i ra
vez q ue E l e usa a exp ressão " mi n h a I g rej a " . Até e n ­
tão ti n h a sempre fa l a d o n o rei n o d o s e u Pa i ; agora
fa la d a " m i n h a I g re j a " - s u a p rópria I g re j a - sô b re
a q u a l tem pode r p a ra esco l h e r os co l a b o ra d o res
q ue l h e apraz.
1 34
A pri m e i ra pa rte ter m i n a com a p romessa q ue
c o n tr a e sta I g re j a - esta c i d a d e fu n d a d a sôbre u m �
r o c h � - o s pod e res d a c i d a d e contrá ri a do m a l n u n­
c a t r i u n fa rã o - a s portas d o i n fe r n o n ã o p reva le­
c e r ã o co n tra e l a 11 •
/1

b) 11 E e u te d a re i a s c h aves d o rei n o d os céus �·


e t u d o o q u e l i g a res sôb re a te r ra , s e rá l i g a do tam
b é m n o s cé u s ; e t u d o q u e d esata res sôb re a terra '
s e rá d es a ta d o to m b e m n os cé u s . "
S. P e d ro n ã o d eve ser s ó m e nte o fu n d a me nto d a
I g re j a , m a s ta m bé m a s u a s u p re m a a uto ridade.
Esta pos i ç ã o n ã o cessa com o remate da cida­
d e, m a s d eve d u ra r e n q u a nto existir a cidade. t i m­
p os s ív e l co n ce b e r p a l avra s m a i s fortes do qu e es­
t a s usadas p o r N osso S e n h o r p a ra exp ri m i r a abso­
l uta e s u p r e m a a ut o ri d a d e d e q u e E l e p reten d ia i n ­
v es t i r S. Ped ro e s e u s s u cessores n o d ese n ro l a r d a
h istória da s u a I g re j a .

Ma is do q u e i sso, a co nvi cçã o de q u e Nosso


Sen hor confer e a S. Ped ro ofício e privi l ég i o si n g u ­
lares é sobre·m aneir a corro borad a q u ando pe n s a mo s
q ue os títu los pedra fun�am enta l e det� � t � r d e cha ­
v e s era m títu los reco n hec idos com o me s s 1 a n 1 c o s e
que
p e rten cia·m ao pró prio Cris to.
d
" Por ei nos f u n d a me nto s e Sio n u m a
p7d r a,
d d pre cio s a, qu e s e ra u m
u m a pe ra p rov a a, a ng u l a r,
f d (1 1 6), e tom bem, :
ca sa d e
fi rm e u n am ent o•
" s. 28,
b seu om b ro a ch a ve da
"- E p ore i so re o
A

b f ec h ara' , fe ch ara
,
e nin
· _

Da vi d ; êle a ri rá e n i ng ué m
g u ém a b r i rá " ( I s . 22, 22) .
1 35

Ambos êstes textos encontramo-los no N ovo


Testa mento verificados em Nosso Sen h o r :
11 Por isso s e l ê na Escritura : E i s que eu pon h o em
Sião u ma ped ra p ri ncipa l, angular, esco l h id a , pre­
ciosa : e o que cre r nela não será confu n d id o " (1 Pet.
2, 6), e Isto d iz o Sa nto e o Verdade i ro , q ue tem a
/1

chave de David, que abre e ninguém fecha, q u e fe-


cha e n i nguém abre " (Apoc . 3, 7). ·

Outra passagem da Sag rada Escritura q ue l ança


a i n d a maior l uz sôbre o Pri mado de Pedro está no
Eva ngel ho de S. Lucas. A declaração de N osso Se­
n ho r segu ndo a q ua l S. Ped ro era a rocha e m q u e
edi fica ri a a sua I g reja e a promessa de l he d a r as
chaves do rei no dos céus parece ter causado g ra n d e
celeuma entre os Apóstol os.
Parece ter surg ido certo i nd ício de verd a d e i ra
riva l idade h umana, muito natu ra l em vista d e ter
Nosso Sen hor pouco ma is ta rde conferido semelhan­
tes poderes a tod os os Apóstol os, q uando d i sse : "Tu­
do o q u e l ig a rdes sôb re a terra, será l igado ta mbém
no céu ; e tudo o q u e desatardes sôbre a terra, será
d esatado também no céu " (Mat. 1 8, 1 8), texto q u e é
mu itas vêzes usado para mostra r que Nosso Sen h or
não deu a S. Pedro mais do que ti n h a d a d o ta m­
bé m a os outros Apósto l os.
Sabemos q ue, l ogo a pós, a mãe d e Ti a g o e
J oão vei o ped i r u m especial p rivi l ég i o p a ra seus fi­
l hos, isto é, q u e pudessem senta r-se u m à d i reita e
outro à esq uerd a d o Sen h o r no seu rei no.
Em virtud e da sua posição e ntre os Apósto los e
d a sua fôrça de ca ráter - Fi l h os d o Trovão po- -
1 36

d i a 'r' • parecer eminentemente ta l hados para tal ele­


va � ao, e Nosso Sen hor . parece d izer isso mesmo.
Po is, q uando, em resposta à sua pergunta se eram
capazes . de beber do seu cá l ice, êles d isseram : " Po­
d emos " , retorq u i u-l hes J esus : " Efetivamente haveis
d e beber " . Depois d isto reaparecem no Evangelho
d e S. Lucas estas emu lacões em um dos mais solenes
e · dra máticos momento � da história evangélica, lo­
g o a pós a cerimônia da O ltima Ceia.
Perg unta m os Apóstolos a Nosso Senhor q u a l
dentre êles deve ser considerado o maior. Nosso Se­
n h o r responde em uma passagem na q u a l dá ên­
fase impressiona nte ao poder divi namente dado q u e
d everão exercer os Apóstolos sôbre o mundo. De­
vem form a r um Rei no ; deverão sentar-se à mesa
d o Rei, e j u l ga r as doze tribos de Israel .
N osso Senhor então prosseg ue dizendo q u e na­
q ue le q ue deve ser o maior - e aqui usa de u ma pa­
l avra m u ito m a is vigorosa que a dos Apóstolos, pa­
lavra q ue denota absol uta autoridade e poder - a

g ra nd eza está em se aba ixa r e servi r : l i ção iá ensi­


n a da por ê l e, q uase co m as mesmas pal avras, ao
p rópr i o Pe d ro, n a d escrição que faz S. J oão d o La-
va-pes.
,

E l ogo, i m ed iata mente Nosso S e n ho r se volta


p a ra Ped ro e d iz : "Si mão , Simã o, eis q u e Sat � ná.s
vos (p l u ra l) recl a m o u com i n stâ ncia pa
ra vo s 1 oe1 -
ra r com o tri g o ; m a s e u rog uei por ti, par a q u e a
tua fé n ão d esfa leça " .
No sso Sen hor d isti n g u i u u m do peq u eno
g ru po
nte po r êle . " E tu, u ma vez con -
e o ro u esp ec i a l me
1 37

verti d o " - e m b o ra ê l e possa fa l ha r pa rcia lmente, a


i nte rcessão d ivi n a o h á d e p reserva r " confirma os
teus i rm ã os " - e, depois d a p rova S. Pedro d eve

ser a co l u n a e o g u i a d os o utros Apósto l os.


N osso S en h or d e l i b erada mente sepa ra S. Pedro
d o p eq u e n o g ru po, e frisa b em o fato de q ue, lon­
ge d e Tia g o e J oã o serem o pri meiro e o seg u ndo,
a posi ção de c h efia foi d ada a Pedro. Pred iz N osso
Sen h o r u ma severa p rovação para seu Apósto lo
pri n ci pa l, m a s p romete q ue a sua fé será p reserva­
d a por d ivi n a i ntercessão e fi n a l mente mostra q u e
esta posição é u ma posição d e defi n ida chefia sô­
b re o resto d os Apósto los e u m dom d ivi no, i n depen­
d en te de q u a l q uer q u a l i dade natura l .
A cena fi n a l em q u e N. Senhor corrobora a inda
m a is o primado conferido a S. Ped ro está no Eva nge­
l ho d e S. J oão. Passa-se a cena j u nto do lago de Ti be­
ríad es, depois d a Ressu rreição. S. J oão q ue, em seu
ú lti m o ca p ítu l o, m a l pode mostra r a confi rmação dos
A póstol os e m seus poderes, em razão do desfa leci­
m en to d êstes na Pa ixão do Mestre, mostra a q u i cla­
ra m en te a confirm ação d e S. Ped ro n a pri mazia que
l h e foi confer ida. U m a vez a i nda Nosso Sen hor des­
taca seu pri n c i pa l Após tolo m a is defi n idamente do
q ue n u n ca por estas pa l avra s : "Tu me a mas mais do
que êstes?"
Trê s vêz es l h e per gu nta : "Tu me a mas ? Trê s v � ­
zes o rd en a a S. Ped ro : Ap as·c ent a os me us cor dei ­
ros . . . a pa sce nta os me us corde iro s . . . a pas cen ta as
m i n has ove l ha s " .
1 38
E, nestas pa l avras, confia a seu Apóstolo o de­
ver d e a pascenta r e guardar o Seu reba nho. Consti­
tui -o o supremo Pastor da Sua I g reja.
A fôrça desta i ncumbência apresenta-se com re­
forçado vigor quando nos persuadi mos que, como
no caso d a pedra fu nda mental e da entrega das cha­
ves, tam bém aq u i Nosso Sen hor está delegando a
S. Ped ro outro dos títu los atribu ídos ao Messias :
Apascentará seu reba nho como um Pastor"
( 1 s. 40' 1 1 ) .
11

Pa rece i mpossível q ue os Apóstolos não tives­


sem então con h ecido a a n a logia entre esta cena da
p ra i a do Tiberíades e a de outrora no alto de um
m onte . . . no fim da vida de Moisés. Al i, o grande
l eg is l ador, j ustamente a ntes de morrer, pede a Deus
q u e esco l ha tle mesmo u m homem que seja prep o s­
to a todo o povo, q ue possa sai r e entrar d iante
/1

d ê l es, l evá-l os e trazê-l os, pa ra que o povo do Se­


n ho r não seja como ove l has q ue não têm pastor"
( N u m . 47, 1 6-1 7).
E o Sen ho r i nd icou J osué para tomar o l ugar de
Moisé s. Aq u i Nosso Sen ho r, j ustam ente antes da sua
Asce nsão, i nd ica S. Ped ro para ser o princi pal pa �­
tor d a Sua l g reia depo is da sua volta para � Pai .
N o pri m e i ro ca p ítu l o d o E va nge l ho de S. Jo ao l e ­­
va n ta-s e a cort i n a sôb re a cena na qua l Nos so
Se
n ho r p rofê tica men te a n u nc i a o mist e rios o so br
eno -
m e d o seu pri n c i pa l Apóst olo.
No ú 1 timo ca p ítu 1 o, ca i a f bre o s m e s-
A P ós·to -

cor i na sô
No sso Sen h or e Seu vi-
mo s do is per son ag ens ' ri
l o c hefe , ago ra p l e n a m e n te favo r ec1ºd o co m o s p
1 39

légio s e respo nsabi l idad es q ue envol ve aquêle so­


brenome, q u e deixo u de ser m isterio so.
Desde então o Evang e l ho é arauto da Prim azia
de Ped ro. 1: êle man ifestado como o i ntérprete dos
Apóstolos. E associado pessoa lmente a Nosso Se­
n hor em d iá logos e m i lagres, como nen h u m o utro
Apóstolo. E: o pri meiro q u e foi chamado. E é-lhe da­
do o sobrenome de Ped ro, que sig nifica rocha.
No Eva ng e l ho d e S. Mateus é apontado com o
ped ra fu ndamenta l da I g reja, e a ê l e são dadas a s
chaves, o poder d e governar a Igreja até ao fi m d os
tem pos.
E objeto dt especia l intercessão de Nosso Se­
n hor e é esco l h ido para ser o chefe e sustent éfcu l o
dos Apóstolos. Fina lmente é i ndicado como pri nci­
pa l Pastor da I g reja. Em cada uma destas três ú lti­
mas ocasiões, S. Ped ro é separado dos demais Após­
tolos. E os títulos q ue l he foram dados, Ped ra F u n ­
d a menta l, Detentor das Chaves, Pastor, são títu­
los con h ecidos de todos os Apóstolos como perten ­
cen tes ao Mess ias.
CA P fTU LO XI

O PA PA D O N O S ATOS

Q u a n d o n o s vo l ta m o s p a ra os Atos d os Apó s­
t o l o s e n co n t ra m o s o P r i m a d o de S. Ped ro em p l e n o
e x e rc 1 c 1 0 .
, .

A o a b ri r d o l i vro, S . Ped ro j á a p a rece co m o o


r e c o n h e c i d o c a b e ç a d os A p ósto l o s .
E S . P e d r o q u e d ec i d e e l eva a efe i to a e l e i cão ,

d o n ov o A p ósto l o Ma t i a s . A esco l h a d o s Ap ósto los


fô r a o b ra e xc l u s i va e pess o a l de N osso S e n h o r -
" Vó s n ã o m e e s co l h estes, m a s e u vos esco l h i " . E, n o
c a s o d e S. M a t i a s, n ã o h á n e n h u m a p rova d e q u e
N o s s o S e n h o r te n h a d a d o q u a l q u e r i n stru ç ã o a S .
P e d r o o u à I g re j a . A e s co l h a d e q u e m to m a sse o l u ­
g a r d e J u d a s e ra u m a e m p rês a m u i i m p o rta n te. E,
c o n tu d o, s e m n e n h u m a o r i e n t a ç ã o d o D i vi n o F u n d a ­
d o r d a l g re i a , ve m os S . Ped ro i n i ci a n d o e ata ca n d o
e s ta d i f i c í l i m a e m p rêsa . P o r o utra s p a l avras, n o p r i ­
m e i ro i n c id e n te q u e n os m ostra m o s Atos, v e m os o
p o d e r d e d es e n vo lvi m e nto d a l g re i a q u e, u m a vez
c o m e ca d o n u n ca d eve r i a cess a r ; e v e m o s êsse po­
der � �
a n i f sta r- s e s o b a d i re ç ã o d e S . Ped ro.
1 42
S. P E D RO E O M I RACU LOSO

Ass i m c o m o N osso S e n h o r s i n g u l a rizou S. Ped ro


p a r a s e r e s p ec i a l m e n te a ssoc i a d o a ê l e em ce rtos
m i l a g res, a ss i m , n os Atos, n ota mos q u e o m i ra cu l o­
s o a g u a rd a S . Ped ro o n d e q u e r q u e ê l e vá .
E: S . Ped ro q u e m o p e ra o p r i m e i ro g ra n d e m i ­
l a g re a nte a b e l a po rta d o Te m p l o.
E: à voz d e S. Ped ro q u e An a n i a s e Safi ra ex­
p i ra m . E ra tão g ra n d e a p e rs u a são d o seu p o d e r
q u e o p ovo " l evava os d o e ntes p a ra a s r u a s, e os
p u n h a e m l e i tos e e nxerg ões, a fi m de q u e, a o p a s­
s a r P e d ro, cob r isse a o m e n os a s u a s o m b ra a l g u n s
d ê l e s " (At. 5, 1 5).
E: S . Ped ro q u e l eva n ta Do rcas d e seu l e ito de
m o rte; e é S. Ped ro q u e H e rodes m a n d a p re n d e r, co­
m o rep re s e n ta n te d os A pósto l os, e é p a ra q u e S. Pe­
d ro p os s a esca p a r q u e a p r i s ã o é m i ra cu l osa m e nte
a b e rta.
AS TRES G RANDES DECLARACôES ,

Chega mos agora às três g ra n d es decl a r a çõ es


dog mática s q u e, m a is do q u e o utra coi sa q u a l q u er,
s e rvem para i l ustra r o i n q u esti o náve l Pri mado de
Ped ro nos Ato s.
a) Ao p ú b l ico iudeu :
Qu a ndo , dep ois da des cida do Esp írito S a n t.o
,


no d ia de Pen tec ost es, pa rte a l g reia p a ra a sua m i
ga 0
são de ens i n a r ao m u ndo , é S. Ped ro q u e m p re s a-
, J e ru
pri me1 ro serm ao d ogm a t º1 co a.. m u l t º1 da- o e m
· · -
1 43

l é m . N a m a i s decisi va l i ng uagem e e m tom d e i na­


b a l áve l seg u ra n ça, ensi n a êle a verdade centra l d a
l g re i a Cristã, a D ivindade de seu Fu ndador: " Ho­
m e n s i udeus, e vós todos os q ue h abita is e m J erusa­
lém, seja-vos isto con hecid o e com ouvidos ate ntos
escuta i as m i n has p a lavras . . . Va rões isra e l itas, ouvi
estas pa l avras . . . Deus constitu i u Sen hor e Cristo
êste J esus q u e vós crucificastes" (At. 2, 1 4).
De novo é S. Ped ro, q uem, no fim do sermão, es­
tab e lece as cond ições pa ra entra r na I g reja : Fazei/1

peni tência e cada u m de vós seja batizado e m n o m e


d e J esus Cristo" (At. 2, 36).
b) Ao Sinéd rio j udeu :
1: S. Ped ro q ue m se a presenta dia nte do S i né­
d ri o, onde seu Mestre ti n ha estado pouco a ntes, e
e m nome d a I g reja proclama oficia l mente a D ivi n ­
d a d e daquele q u e o mesmo Si nédrio ti n h a con d e n a ­
do à m o rte. Mostra-l hes que J esus é a ped ra q u e foi
rej e itad a por ê l es e que foi posta por pedra a ng u­
l a r e q ue n e n h u m outro nome foi dado aos h o m en s,
/1

p e l o q u a l nós d eva mos ser sa lvos " (At. 4, 1 2).


Este d iscurso feito d i a nte de u ma asse m b l é i a d e
tão g ra nd e a utoridade e m tôdas as matérias d o cre­
do i ud a i co, ·e ra a p ri me i ra decla ração ofi ci a l d a
l g re ia, com o sociedade a bsol utamente i nd epen d ente
da rel ig ião j u d a ica. Essa p roclamação p rovoca d o.
San ed ri m a p e rseg u ição à I g reja e o m a rtírio d e
seus m e m b ros. E a pessoa q u e fêz esta d ec l a ra çã o
foi S. Pedro.
e) Aos g entios :
1 44

I m p o rta n te e deci s ivo fo i o d i scu rso d e S.


. Ped ro
d i a n te d o S i n éd ri o , mas i n sig n i fi ca
n te se o com pa ra­
m os co m o d i scu rso fe ito a Corné l i a ofi c i
a l ro ma no.
Este i n ci d e nte é o mom e nto m a i s cruc i a l n a vida da
l g r e i a n a sc e nte. A q u estã o em l i tíg i o e ra n a d a me­
� o s .s e os a ca n h a d os p reco n ce i tos do n a c i o n a l ism o
1 u d a 1 co d evi a m ser s u perad os, pa ra a I g re j a a b ra­
çar tôd a s a s n a ções d o m u n d o, o u se a I g re j a de­
v i a restr i n g i r-se às front ei ras d e I srae l .
E: s e m d úv i d a a s u p rema crise testem u n h a d a n os
Atos . C o m o ta l a reco n h ece S. Lucas e a descrev e
d a m a n e i ra m a i s d ra má t i ca. A orie ntacão d ivi n a é ,

v i va m e n te p i n ta d a em d u as vi sões, u m a a Co rn é l i a
e o u tra a Ped ro. À l u z d a reve l a ção, seg u ndo a q u a l
ê l e n ã o d ev i a c h a m a r n a d a co m u m o u i m p u ro, va i
S . P e d ro à casa d o g e n t i o e se d i ri g e a ê l e em n o m e
do S e n h o r J es u s . Te rm i n a a s u a a l ocu cão com esta ,

p e re m p tó r i a d ec l a ra çã o : " Dê l e (d e J esu s) d ã o teste­


m u n h o todos os p rofeta s d e q u e todos os q u e crêem
n ' E l e rece b e m po r m e i o d e seu n o m e a re m i ssão d os
p ecado s " (At. 1 O, 43).
Com esta a u to r i ta t iva a l o cução ca em tôd a s a s
ba rre i ras nacion a is, e S . L u cas c o n ti n u a : " Esta ndo P e­
dro a inda p roferi ndo estas p a l avr ? s, d esce u o E_spí,�
rito Sant o sôbr e todo s os que ouvir am a p rega ç ao .
Ma s, a con teci men to tão revo luci oná rio h avia de
ter l o n g a ress onâ nci a e, . q u a ndo Ped r � tor.nou a· P_ J::
rus a lé m ' a s u a ati tud e fo i fortem ent e d is cu tid a . S1
s u a d e f esa , exp 1 ·
1 can d o a r ev e a ç a o
d ro a p res ent a a . d e a na rra çao te rm .i n a co m
d ivi n a q ue ti n h a rec e b 1 o -

ta s c o ·1 s a s'
E d o ou vi· d o es
e stas p a l av ras : " l es, ten
1 45
aq u i e tara m-se, e g lorifica ra m a Deus, d izendo : Lo­
go . Deus con cedeu ta mbém aos gentios a penitência,
a f i m de que tenham a vida " (At. 1 1 , 1 8).
Aí, pois, está o ponto cu l m i na nte dos Atos. Aí
está o ab ri r das portas aos gentios. E o Apóstolo
q ue as abri u não foi Pau l o, mas Ped ro. Lembro-me
q ue até então era eu levado a considerar S. Pa u lo
como o g ra nde Apóstolo dos gentios, e foi para
m i m u ma g ra nde comoção e u ma completa revela­
ção verifica r que, g ra nde m issioná rio dos gentios co­
m o i nd ubitàvel mente foi S. Pau lo, todo o seu tra ba­
l ho mº1 ssioná rio só foi possível porque S. Ped ro lhe
abriu as portas do mu ndo pagão e porque a I g reja
sa n cionou o fato sob a autoridade de S. Ped ro.
Aq u i não será i n úti l acrescenta r que o fato de
S. Pa u l o fig u ra r tão g ra ndemente na ú lti ma pa rte
dos Atos cessou de ser uma g ra nde dificu ldade pa­
ra m i m, quando percebi que essa pa rte é s i m ples­
mente uma biografia de S. Pa u lo no desempenho
da sua m issão e não uma h istória do desenvolvi men­
to d a I g reja em con j u nto, como é o caso dos pri mei­
ros cap ítu los dos Atos.
Por exempl o, o na ufrágio de S. Pau lo, fato sem
i mportâ ncia em si mesmo, ocupa mu ito mais espaço
d o q ue o i n comparàvelme nte mais i mporta nte Concí­
l io de J erusa lém.
O CONCfL I O DE J E RUSA LtM
Que fo i S. Ped ro a pessoa q ue abri u a porta
aos gentios e q ue foi em vi rtude da sua a u toridade
U m S e n h o r, l O
1 46

q u e a I g re j a a ce i to u o fato, é coisa confi r m a d a pe­


lo C o n cí l i o d e J e rusa l é m .
M u l t i p l i ca m -se os g e n t i o s co nve rti d os e s u a s re­
lações co m o resto da I g re j a d eve m ser reg u l a riza­
das e p a d ro n i za d as. 1: a ss i m q u e um Co n c í l i o do s
Apóst o l o s e P resb íte ros é co nvoca d o .
A n tes d e estu d a r a q u estão c u i d a d os a m e n te,
i m a g i n ava eu q u e T i a g o tivesse s i d o o p res i d e n te
do C o n c í l i o ; m a s, q u a n d o exa m i n e i os fatos, verifi­
quei q u e fo i S. Ped ro q u e m d o m i n o u a ce n a .
A a sse m b l é i a é convo ca d a ; a l i h á m u ita d i s c u s­
são e n tre os m e m b ros. A u m d a d o m o m e nto l eva n ta ­
se Ped ro e a b re a d i scussão ofi ci a l c o m a m a i s ex­
p re s s iva afi r m a çã o da s u a a uto r i d a d e : " H o m e n s i r­
mãos, vós s a b e i s q u e, d e s d e o s p ri m e i ros d i a s, D e u s
ord e n o u e n tre n ós q u e d a m i n h a b ô ca o uvi sse m o s
gentios a p a l avra d o E va n g e l h o e crêsse m " (At.
1 5,7).
Todo ê s te a pê l o s e d eve a o fato d e q u e esta
voz, esco l h ida por Deus, ti nha já d e ci d i d o a a d m is­
são d os gentios na I g reja. Então continua, em vi rtu­
de d a q u e l a m esma a utoridade, a exortá-los a fi m de
não i m p o re m u m a ca rga desnecessá ria sôbre o s om­
bros dos d iscíp u l os.
Que esta a utorida de foi i m ed iata mente rec o­
nhecid a pela assem b léia é claro, pois prosse gue � os
Atos : " Então tôd a a asse m b léia se ca lou e ou vi a m
Barn a bé e Pa u lo conta r q uão g ra ndes m i l a g r e s e
n-
p rodíg ios Deus ti n h a feito por i nterv enç ão dêle s e
tre os g entios " (At. 1 5, 1 2) .
1 47
Depois q u e Ba rnabé e Pau lo expusera m o caso
dos gentios, Tiago, q ue a pa rentemente d efendia o
pa recer d a estrita ci rcu ncisão - pois n o incidente d a
G a l á ci a S . Pa u l o fa l a d e " a lg u ns q ue vieram d a p a r­
te d e Tiago" exig i ndo a circuncisão - levanta-se e
s u gere u ma espécie de comprom isso. Mas, a o i n icia r
o seu d iscu rso, para que autoridade apelou ê l e ?
Para a de Ped ro : " Homens e i rmãos, ouvi-me. Simão
contou como Deus, desde o princípio, cuidou de ti­
ra r no meio dos gentios um povo para o seu nome " .
O compromisso sugerido por Tiago foi aceito e
a matéria foi fi n a l mente reg u lada. Ta l é, nos Atos,
o testemu n ho fi na l da pri mazia de S. Pedro. Aí o ve­
mos em seu verd adeiro l ugar como o chefe e g u !a
dos Apóstolos e como a a utoridade da sua voz n co
encontra a pêlo nem oposição.
Mas, tão forte era a m i nha convicção de que
Tiago fôra o presidente do Concíl io, que só depois
de m u ito tempo pude eu d istinguir a verdade da si­
,
tua cão.
Por a lg u m tempo receiava eu a i nda q ue aq uê-
les p a ra q uem o Concíl io era um a rg umento em fa­
vor da p ri mazia de Pedro, tentava m apenas a pe l a r
para u m ponto controvertido.
Há seg u ra mente m uitos que lerão isto suspeita n­
do tratar-se tão sàmente de um a rg u mento Rom a no
com i ntu itos de controvérsia. Para mostrar q u e não
é assim, c ito as pa l avras do Professor Hort :
" Não h á nada n as pa lavras de S. Lucas q u e sus­
tente, o q ue se tem d ito m uitas vêzes, q ue S. Tiago
presid i u à conferência de J erusa lém. Se assi m fü sse,
� ') *
1 48

seria estranho que o seu nome nunca fôsse mencio ­


n ado s � paradamente no comêço. Na alocução deci­
_ e final, a d i reção é toma·d a por S. Pedro, o pri­
s1v �
m e i ro d os doze. Demais, as pa lavras que i niciam sua
_
(d e S. Tiago) concl usão : " Por isso eu sou de opi nião ",
_ podem razoàvelmente ser entendidas como uma
nao
decis ão autoritativa, i nspirada por uma hi potética
convicção_ de i ndependência pessoal " . (1 )
Estamos fi nalmente em posição de reu n i r agora
tudo o que dizem os Atos sôbre o Primado de S. Pe­
d ro
Vêmo-lo i mediatamente como chefe recon hecido
e g u ia da I g reja na apresentação do Apóstol o Ma­
tias. Milagres após milagres são feitos em suas mãos .
E m todas as decisões públicas da Igreja é S. Ped ro
q uem fa la. Foi S. Ped ro o esco lhido para trazer os
g entios à I g reja. E S. Pedro o chefe no primeiro Con­
c í l io p len ipotenciário da Igreja, e por sua autorida­
de o p ro b lema que a bsorvia o Concílio foi fin a \ men­
te decid ido. Nesta parte dos Atos que dize m com a
l g reia como u m todo, S. Pedro é de modo esmaga­
dor a figu ra domi na nte : tôda a sua posição no de­
s e n ro l a r dos fatos é exatamente a que o nosso estu­
d o d o Eva n ge l ho nos leva ria a esperar. S. Pedro já
é a rocha fu ndamental, o governador que está de
posse das chaves, - o pri � ci pa l Pasto � a vigiar o r � ­
b a n ho confiado a seus c u id a d os, a força que apoi a
e corrobora seus compa nheiros , os Apósto l os.

(1 ) Th e C h r i sti a n Ecc l e s i a , 1 897, pág. 79-8º·


CAP íTU LO XII

O PA PA D O NA H I STO R I A

Vi m os o Pri m a d o d e Ped ro n os Eva n g e l h os e v í­


m o- l o n os Atos . D eve m os a g o ra co n s i d e rá - l o n a h i s­
tóri a .
Q u e c o i s a h á n a s u b seq u e nte h i stó ria d o c risti a ­
n i s m o q u e p o s s a co rres p o nd e r à i rres i stíve l ê n fase
q u e s e dá a o P r i m a d o d e S . Ped ro nos Eva n g e l hos e
n os Atos ?
E se o h á , q u a l é e o n d e está ? H á u ma res· posta
e u m a só : n o P a p a d o .
E m n e n h u m a o utra p a rte se e n contra o u tro p re­
te n d e n te . E o n d e e n co nt ra m o s o Pa pado ? E n co n ­
t ra m o - l o com o fu n d a me n to e ped ra a ng u l a r d a l g re­
ia Cató l i c a , a m es m a l g re i a q u e, como vi mos, é a
ú n i ca q u e c u m p re o m a nd a to d e N osso Se n h o r, e va i
p o r todo o m u nd o p roc l a m a nd o u m a a uto rid a d e d i ­
v i n a p a ra e n s i n a r tôd a s a s n ações.
Só e l a re ivi n d i ca u m a ass i stê n c i a sobre n atu ra l
d o Es p írito S a n to q u e a g u a rd a d o êrro s e m p re q u e
e n s i n a a l g u m a c o i s a c o m o nece ssá ri a n a f é e n a mo-
ra l .
S ó e l a a ss e g u ra a o b e d i ê n c i a e p rese rva . uma . u n

d a d e v i s íve l o n d e q u e r q u e vá ; e esta l g re 1 a afi rm
a
1 50

hoje e sem pre afi rmo u q ue o seg rêdo da sua auto ri­
d ad e e da sua u n idade está no Pri mado de Pedro .
O Pa pad o é a fonte da sua divi na autori dade e 0
centr o d a sua u n idade sob renatura l . Onde encon tr a­
mos o Pa pado, aí encon tra mos u ma Igreja a cumpr ir
as ordens d e Nosso Sen hor, revestid a daquel es p o­
d e res sobren atu ra i s que Ele clara mente deu à sua
I g re j a . Onde não há Pa pado não se encontr a ta l
I g re j a .
E a i nda hoje h á mu itos que, por várias razõe s,
n ã o a cred ita m no Papado e permanece m fora do
seu red i l . As razões não são provàvel mente as mes­
m a s em cada dois casos, e eu só posso fa lar daque­
l a s q u e fora m rea is para m i m quando comecei a en­
ca ra r seriamente a questão.
M i n has d ificu ldades p rovi nham pri ncipal mente da
Escritu ra. Pa recia-me q u e se Nosso Senhor preten­
d ia d a r ofício tão acabru n hador a alguém, se algu­
m a pessoa devia possuir a s chaves do rei no dos céus
e ser o g u ia i nfa l ível e o legislado r da Igreja sôbre a
t e r r a , d everia Ele ter tornado isto sobera namente
c l a ro , tão c l a ro q ue seus Apóst olos não pudes sem
ter-se e n g a n a d o , e q ue a mãe dos fi l hos de Zeb � de �
n ã o tives se o u s a d o s uger i r que fôsse m êles o prim e i-
r o e o s eg u n d o n o s e u r e i n o. .
Ta l fo i a m i n h a d i f i c u l d a d e até eu me cap ac ­
i
ta r d e q u e , e m m i n h a viva a n s i e d a d e d e alca nç
ar 0
do Pa � a­
v e rd a d e e f i ca r a b s o l uta m e nte co nve nci d o
a Es cn tu ­
d o a n tes d e a ce i tá - l o I e u esta va ex1 g 1 n d o d
·
.

g 1 r.
r a n1 u i to m c : s d o q u e t i n h a d i re i to d e e x 1
• •
1 51

E u estava exi g i n d o q ue a escritu ra fôsse u m li­


vro com pl eto d a s reg ra s d a I g reja Cristã, cu i d adosa­
n1ente l i ma d o em cada pormenor.
N ã o p o d i a persua d i r-me d e q ue a ú ltim a a u tori­
d a d e d eve ser sem pre o e n s i no d a I g reja ; e q ue, em­
b o ra o g e r m e d e tôdas as doutri nas fu n da m e n ta is
d a I g re j a se encontre na Escritura, a sua fôrça e va­
l o r só pode m ser aq u i latad os se forem interpretados
p e l a tradição d a I g reja d ivi namente g u iada, à q ual
a s Escritu ras d evem a sua origem e existência, e sem
a q u a l se torna m i n i ntel i g íveis. Compreend i q uão pou­
cas o b ra s e ensinamentos de Nosso Senhor e d os
A pósto los fora m conservad os por escrito no peque­
n o vo l u m e d os Eva ngel hos e dos Atos. E sem d úvida
u ma d eficiência m u ito com u m entre os ing l êses pas­
s a r isto por a lto e trata r as Escritu ras como se tives­
s e m s i d o feitas pa ra u m m u ndo no q u a l não haveria
I g re j a viva e d ocente.
A o p i n ião A n g l o - Catól ica de uma autoridade in­
vis ível a i nd a d á marge m a i nfi nitas i nterpre ta ções in­
d ivid u a is d a Escritu ra. Na persua são de que não há
I g re j a visíve l, a a rte de fazer doutr inas dep ende dos
text os, e d e l oca l iza r vírg u las pa ra dete rm i nar q u e o
q u e N osso Sen ho r ente ndia . é � ssás com preensíve l ;
m a s com ece i a perc ebe r mai s viva men te que trat ar
a s Esc ritu ra s d ess a ma nei ra era d esv i rtua r a sua fi­
na l id a d e pel a ign orâ nci a d o l uga r que ela s oc � pam
em m a is l a rg o p l a n o d e N oss o Sen hor e a rea l ida de
d e u ma I g re j a vis íve l do ce nte .
Se pa rec e ' n esta s pág i nas , trat ar o tex to com o
u ma p rov a d a ver d ad e das dou tri nas, é por que i sso
1 52

m a nife sta d e q ue man eira m i n has opi n iões mud a ra m


e . porq u e de fato enco ntrei
no q uadr o dos prim eir o s
d ia � a post ólico s, deixa do nos Atos e nas Epíst olas, o
m a i s c l a ro teste m u n ho de que a crenç a na Igreja
com o u ma socieda de visível e na posição especia l
d e S. Ped r o, era aceita sem contes tação pela própri a
g eraçã o pri m itiva de cristã os.
Comecei a ver que certas verdades, sôbre as
q u a is eu não a l i mentava a menor dúvida, ti nham mui­
to menos a poio n a Escritu ra do que a Primazia de
S. Ped ro. Por exem plo, a doutri na da Sa ntíssima
Tri ndade, q ue é a base de tôda a teologia cristã,
é m a n ifestada explicitamente em um texto apenas :
" I d e porta nto e ensinai tôdas as nações, batiza ndo­
as e m nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo"
(Mat. 28, 1 9).
A lém disso, eu não tinha a menor dúvida quan­
to a os bispos, no sentido do episcopado históri_c o, c_o­
m o essenci a l à vida da I g reja ; contudo os conscien·
ciosos p resbiteria nos podem ler a Escritu ra e não en­
contra r n e n h u ma prova dessa doutri na.
Estes fatos fizera m-me ver como era i lóg ico pa­
ra m im espe ra r maio r evidê ncia q_uanto ao Pri m � do
d e Pedro d o -q ue q ua nto às doutr i nas da Sant1s, s1m a
Tri n d a d e o u d o Epi sco pa do .
Ma s sem l eva r nad a dist o e m con ta, q uan to ma i s
.

e
est ude i � s tex tos Pet ri nos , ma is c l a ro e def i nid o omn
P a rec eu q u e a ev idê nc ia q u a nto ao Pri ma do era � -
l m a i o r d o q u e no cas o d ª s an f155 1 m a
side ràv e m en te
Tri n d a d e o u d o Epi sco pa do.
1 53
Che g � ei ta m b ém a v � r q u e hav ia u ma resp osta
pa ra a q u e l es de meu s a m i gos q ue semp re u rg i ra m 0
a rg u ment o eva ngé l ico seg u ndo o qua l Ti ago e
J oão, so l icita ndo o pri mei ro e o seg u ndo l ugare s no
Rei no, m ostra ra m q u e j a m a is ti nham ouvido fa l a r da
pri mazia de Ped ro. Pa receu-me a ntes p l a usível suge­
rir q u e fôra precisa mente o ciúme e a inqu ietação
pel a hegemonia conced ida a S. Ped ro o q u e insp irou
a petição dos dois Apósto los.
Mas, em todo o caso, a lentidão inte lectua l dos
Apóstol os não era coisa nova. O próprio Sa lvador
não pod ia fazer- l hes ver certas coisas e mostrava­
se a d m i rado da sua imbeci l idade : "Ta mbém vós sois
ig nora ntes ? Não percebeis nem entendeis ? Tendes
vosso cora cão end u recido ? tendo ol hos não vêdes ?
,

tendo ouvido não ouvís ? e não vos l embra i s ? . . . Co-


mo é que não entendei s ? (Mo re. 1 8, 1 8 e 1 8, 1 7).
Certa mente o método de Nosso Sen hor como é
revelado na Sag rada Escritu ra, pa rece ter sido ensi­
na r coisas q ue não era m perfeitamente apreend idas
no momento, mas que g ra d u a l mente cheg a ri a m à ma­
turidade na mente de seus discípu l os, sob a assistên­
cia do Espírito Sa nto.
Do mesmo modo, não deixou ê l e seu ensi no à
Igr eja plenamente e l a b orado ou a p l icado em todos
os seu s aspetos, mas de l i b eradamente l hes deixou a
aut orid ade d ivi na e o poder sobrenatu ra l de desen­
vo l vê- l o e a p l icá- l o à posterida de sob a assistê ncia
do Espí rito Sa nto.
. c 1p10 ;
.

Outr as d ificu l dades m e surg i ra m a prin ,

1 ) p a r ecia i nverossíme l q ue sendo Ped ro esco l hido


1 54

p a ra p r i m a z d a I g re j a , fô sse tão d ràsti ca m e n te ce n ­


s u ra d o p o r N os s o Se n h o r : " Reti ra -te d e m i m 1 Sat a­
n á s " (Ma rc. 8, 33) ; 2) q u e tivesse fraq u e j a d o ador­
m ec e n d o n o h ô rto e n eg a n d o três vêzes s e u Sen hor
no p a l á ci o d o S u m o S a c e rd ote ; 3) especi a l m e n te q ue
fôs s e a i n d a ca p a z d e e r ra r d e p o i s d o Pen tecostes �·
p o i s, n o i n c i d e nte G a l a c i a n o, vê m a - l o i n d u b itàve l
m e n t e c e n s u ra d o a p o n to d e u m d e s e u s co m pa n he i ­
r o s d e A posto l a d o d e c l a ra r : " E u o contra d i sse ca ra
a ca ra .
li

A p r i m e i ra co i s a q u e m e fêz e n co ntra r l uz p a ra
ê s t e s c a s os fo i t e r e u ve r i f i ca d o q u e, n a mesma oca­
s i ã o e m q u e N osso S e n h o r esta b e l ece u m a i s clara­
m e n t e o p r i m a do d e Ped ro sô b re a I g re j a e sôbre os
d e m a i s A pósto l os, p red i s s e t a m b é m d e l i beradamen­
t e a p róx i m a te n t a ção e a s u a q u ed a : " O rei por ti . . .
e tu, u m a vez co n ve rt i d o . . . " Q u e o utra coi sa pode
s e r i sto s e n ã o u m aviso d o p róx i m o d esfa l e c i m e nto ?
I sto m e fêz v e r q u e N osso S e n h o r n ã o co n s i d e ra a
q ueda p es s o a l como n ecessà r i a m e nte oposta ao Pri­
m ado.
Tudo isto se me tornou mais claro a i nda, q u an­
do vi q ue Nosso Sen hor fêz s e me l h a n te repreensão
ou adve rtência em cada uma das três s o l e n es oca­
s iões e m q ue conferiu o Primado a Ped ro.
a) Em Mateus :
A afir macão : " Es Ped ro e sôb re esta ro cha �d i ­
fica rei a m i �h a I g reja " , é i me d iata men te seg u i e s
da

d o " Ret i ra- te d e m i m, Sat a nás : tu ser ve s-m e de


-

câ n d a l o " (Mat. 1 6, 23).


1 55

b ) E m S . L u ca s :
Q u e m l h e d i s se : " E t u , u m a vez c o n ve rt i d o, c o n ­
f i r m a o s t e u s i rm ã o s " , p re d i z l o g o a p róx i m a n e g a ­
çã o d e P e d ro, q u e s e d e v i a s eg u i r , q u a s e i m ed i a t a ­
m e nte ( L u c . 2 2 , 32) .
c) E m S . J o ã o :
D e po i s d a i n c u m b ê n c i a " Ap a sce n ta a s m i n h a s
ove l h a s " , a p e rg u nta d e S . Ped ro, " Se n h o r, e d êste
q u e s e rá ? " é r e b a t i d a p e l a ce n s u r a , " Q u e t e n s tu
com i s so ? " Tu , s e g u e - m e " (J o a . 2 1 , 1 7-22) .
E m tô d a s esta s o c a s i õ e s p a rece c l a ro q u e N os­
s o S e n h o r s e e m p e n h a em m ostra r q u e o exe r c íc i o d o
P r i m a d o n ã o d e p e n d i a d e dotes pessoais, como se
p ro po s i ta d a m e n te estive s s e fa ze n d o s o b ress a i r a d i ­
fe r e n ça e n t r e o h o m e m e a d i g n i d a d e .
D o mesmo modo, na h istória p oste r i o r d a I g re j a ,
o i n c i d e n te G a l a c i a n o, n o q u a l S . P a u l o resisti u e m
fa c e a S . Pedro, de nenhu m modo comprometeu a
c r e n ç a d a I g re j a n a P r i m a z i a d e S. Ped ro ; e m b o r a ,
n o c a s o d e q u e s e trata, S. Pedro estivesse i nd u bi tà­
ve l mente e m fa lta. O mesmo fato de S . L u c a s , o
g ra n d e a m igo d e S. Pa u lo, nem sequer o mencionar
nos Atos, mostra q ue o i ncidente n u n ca teve, a os
o l h o s da I g reja, a ressonâ ncia q u e os controversistas
anti-pa pa i s p rocu ra m d a r-l he. Qua ndo m u ito trata­
va-se de u m a m atéria pu ra mente d i sci p l i na r o u c e ­
r i m o n i a l : comer à mesa d e uma i nsig n ifica nte fa c­
ç ã o juda ica, q ue a cabava de cheg a r d e J erusa lém,
ou à m esa dos gentios convertid os.
1 56

H averá, e m tudo isto, q u a lquer prenú n cio dê st e


g ra nd e m i stério q u e foi , ta lvez u ma das gra n des p e­
d _ras d e tropêço, n o espírito d os i ng lêses com refe rê n ­
c i a a o Pa pado, isto é, o d esfa l eci mento pess oal e a
corru p ção d e a l g u ns q u e fora m sucessores de S. Pe­
d ro n o g ovêrno d a l g reia sôb re a terra ?
N i n g u é m pod e n eg a r q ue ocorrera m tais d esas ­
tres e o resu l tado é u ma profunda suspeita contra
tôd a a a u to ridade i nocu l ad a até à med u la dos ossos
e ntre os i n g l êses e i nfel izmente a l i mentada muitas
vêzes a pe n a s por pol íticos sem escrúpu lo.
D a í a q uase i nvencível repugnâ ncia de cre r e m
q u a lq ue r i n fa l ibi l idade ce ntra l izad a n u ma s ó pessoa .
Q u e d izer sôbre esta sombra proietada no Pa4
p a d o - sob todos os aspetos o maior fato na h i stó­
ria d a n ossa civi l izacã o ? ,

A p ri me i ra coisa q ue m e escla receu foi que Nos­


s o Sen ho r p revi u fa l ência a i nda no que foi o pri­
m e i ro q ue d esempe n hou tão subl i me cargo, o ún i c?
q u e ti n h a s i d o pessoa l mente doutri nado e esco l h i­
d o p e l o p róprio Deus sôb re a terra. Nestas três a d � er­
tên ci a s a Seu e l e i to, a dvert ência s que devem ter ti do
a s u a razã o p rofu n d a d eterm i nada , most ra o S a lv�s­
d or q ue o Pri m a d o é i n dep end ent e dos don s natu rai
o u d a s fa l h a s pesso a is.
No sso Se n h o r exp ôs- se ao g ra n d e ris· co d e sus ear
a
a Ve rd a d e o bscu rec "i d a q ua n d o or d en o u q umee ns fa
or h o
l g re 1 a fos se g u i a d a e a d m 1 n is t ra d as ai
_
. ,.

l íve i s. " I: n ec ess á rio q u e suc e da m ª � i:


· ·

a t.
1
·

a
M
d
� (
a
,
esc
es c a n d a 0
1 5
o 1
.
d aq u e l e h o m e m por q u e m v em O
1 8, 7) .
1 57
Qu a nd o o rdenou que a I g reja fôsse preservada
de todo êrro em seu ensino oficia l pelo dom do Es­
pírito Sa nto, não deu a seus membros uma isenção
automática d o pecado no seu viver. E assim, com o
maior d e tod os os ofícios n a I g reja, o Primado, quan­
d o prometeu a S. Ped ro, e a seus sucessores prote­
ção contra o êrro em seu ensi no oficia l da Verda ­
d e, n ã o l hes d e u isenção de desfa leci mentos pes-
soa 1s.
.

E m seg u nd o l ugar, ta l exigência qual é a do Pa­


pado - de ser o mestre d os homens desig nado por
Deus na Fé e na Mora l - teria, pelo seu desnortea n­
te e assombroso ca ráter, atra ído sôbre si a i n i m iza­
de de tudo o que há de pior na natureza humana e a
crítica i mplacável de tudo o que há de mel hor. E o
mesmo fato de que, embora ferido no próprio co­
ração pela vida pessoa l de a lguns que exercera m tão
elevado ofício, o Papado a i nda permanece como a
maior fôrça rel ig iosa entre os homens, e é por si mes­
mo u m a p rova seg u ra e certa da sua reivi ndicação
e da sua origem sobrenatu ra l.
Sua reivi ndicacão' é tão terrível que deve ser ou
a m a ior blasfêmia possível ou a mais sublime das
verdades. Se tivesse sido a maior blasfêmia possível,
teria desa p arecido entre o escá rnio e o ridícu lo d os
homens há m u itos sécu los.
1 N FALI B I LI DADE

Já fa lei acima da d ificu ldade do ing lês em g � ­


ra l para crer que a i nfa l i b i l idade pode ser centra l i -
1 58

zad a em u m ú n ico i nd ivíd u o . E: isto l a rg a mente d evi ­


d o à cre n ça de q u e a i nfa l ibi l i dade s i g n ifica i ncap a­
c i d a d e de peca r ou de i n correr em q ua l q uer enga no.
E m bo ra eu jamais tivesse parti l hado essa idéia,
contudo foi só a pós a m i n ha visita a Lisieux que co­
m ecei a ter uma concepção exata do q ue sign ifica
i nfa l i b i l idade - a saber, q ue sempre q u e o Papa, di­
rig i nd o-se a tôd a a I g reja, em seu ofício d e Chefe su­
p re n10, d efi n e a lg u ma coisa em matéria de Fé e de
Mora l obriga ndo a tôd a a I g reja, é d ivinamente
p reservad o d o êrro.
Não é mister d izer q ue o a rg u mento, bem como
a p recisa d efi n ição d a i nfa l i bi l idade, sempre m e
a tormenta ra m m u ito. N ã o poucos dentre os m e u s
a m i g os a rg ü i ra m fortemente q u e, enqua nto estáva­
m os d ispostos a a ceita r a Pri mazia de S. Pedro e de
seus s ucessores, não pode ri a m admiti r a ú ltima de­
fi n icão d o Con cílio Vaticano.
,

Q u a n to m a is considere i a q u estão, mais cla r o


m e p a receu q u e e ra fora d e p ro pósito criticar a in­
terp retação papa l d a Pri mazia d e S. Pedro, a não
ser q ue a lg uém suge risse como a lternativa outra ex-
p l icação satisfatória .
u n �-
.
E m seg u ndo l ug a r, tornou -se-me claro que a ,

ca Socied ade q ue preservou a sua u nida�e e a � t.o r i ­

d ade era ta mbém o ú n ico órgã o capa z àe def1 n 1 ª


r
n atu r� za do Papa do q u e a habi l it ara a pre servá- l � s .
a e u o che g asse a co m p re en d e r, ai r ·
Ma s , , em bor
uda r
d a cont1 n u e 1 a ver em meu prop no caso , a o . e. st l d a -
· ,
·
·

·
· cu
o Eva n g e l ho, q u e u m a d a s m 1 n h as m a i ore s d 1f 1 º d 0 de
ri
de s co n sist ia n a a ce i tac ão de q ua lq u e r a uto
,
1 59
i nfa l íve l cen tra l iza da ou n u ma Soc ied ad e, a I g reja,
ou n u m i nd iví d u o, o Pa pa .
_ Co � o n � o fa l ta m l eito res nas mes mas d ispo s i­
çoe s ps 1 c� l ?, g 1ca s, isto é, que em bor a o q ue l era m l hes
pa reça 1 0 9 1 � 0 e c l a ro, toda via não o pode m aceit a r,
va m os con s ide ra r esta m até ria sob out ro asp eto.
S e o crist ia n ismo é a supr ema reve l acã o de Deu s
a os hom ens; e se, na Pess oa de Noss o Senho r J esus
Cristo , o p róprio Deus ba ixou à terra para ensi n a r a
Verd a d e aos home ns - então , qua ndo Ele deixo u o
m u nd o, d everia haver a l g uma Socied ade ou Autori ­
d a d e p a ra transmi tir os seus ensinam entos através
d o s tempos.
N esse caso, se há uma Verdade reve l ada pa ra
ser con hecida de todo o mu ndo, deve haver também
u m a Sociedade na qua l possamos confiar e que nos
e n s i n e essa Verdade sem i ncorrer em nen h u m ê rro.
Ta l Sociedade d eve ser u na, isenta de divergências
no q u e se refere a essa Verdade - pois, qualquer d i ­
v i s ã o n este ponto é fata l.
Não h á a lternativ a entre ta l guia e a minha pró­
p ri a opi n iã o pessoa l ou meu j u ízo privad o. Ou há u ma
revel acã o com u m da Verd ade ou, de outro modo , u m
pâ n ta �o d e opi n iões indi vid uais .
Com o fato h istór ico, no â mag o da trans missão
e p rese rvaç ão da Verd a de s � r � i u uma Soc ! eda de a
p roc l a ma r esta Aut orid ade d 1v1 � a par a e � � t nar essa
Ver da de sob u m a d i reçã o esp ecia l do Esp 1 r1to Sa nto.
E a l g reia Cat ó l ica .
Nã o pod e h ave r d úvi da sér ia d e que a I g reja
Cat ó l ica é h oie uma e ú n i ca Soc ieda de com auto ri-
1 60

dade adeq uada para êsse fim, j ustament e co mo a


I g reja Cató l i ca d o tempo de S. Agosti nho er a es s a
ú n ica Sociedade.
Não se trata d e uma q uestão reservada ao teó ­
l og o o u a outra espécie d e i n telectua is. Se D eu s é
b o m, como é, e se deu uma revelação defi n iti va, de­
verá ter d i sposto que esta pudesse ser reco nhe cid a
por q u a lq uer pessoa, ta nto simples e incu lta mas
desprovi d a d e . preconceitos e assisti ? a pela gra ça ,
q ua nd o a considera, como pelo espírito ma is culto e
a cadêm i co.
E ass i m tornamos ao mesmo ponto. Como reali­
d a d e sàl ida mente esta b e l ecida, i n controverso, há h o ­
j e u m a e sómente u ma Sociedade ta l : a Igreja Cató­
l ica. E l a s u rg e aos o l h os d o m u n do, protestando q u e
é a Mestra d o m u nd o o rdenada por Deus; ela pr o ­
c l a m a q u e o seg rêdo d a sua u nidade, da sua auto ­
ridade e d o seu poder d e ensinar está fi rmado no
Pa pado, p a ra q u e a a l m a mais simp les possa ver e
e ntender. E la n os mostra o Eva ng e l ho e afirma q u e
as o rigens d o Papado podem nêle ser encontra das
n a s p ro m essas feita s a S. Ped ro.
Litera l m en te não há outro riva l que reivin d iqu e
o títu l o d e mest � e d o m u nd o ou de dep ositá ri o d aes
p romessas fe itas a S . Ped ro. Em m i n ha próp ri � e� �i o, ­

riênc ia tôdas as d ificu l d ades que senti a p r i n c i pp a -


'

e tão forte s ' e m cert os texto s d a Escr it ura qu e m em - s e


·

rec i a m i r d e e n co ntro a o p a pa d o, d e sv an e ce ra
es m a g a d o r da-
e
o
d
com o a n d a r d o tem po, a nte o pes"

an
to
evid ência d a Escrit u ra toma da co m o um º�te
e n e­
t e o fato fu l g u ra nte d e n ã o h a ve r se g u r a m
1 61

n h u m a o u tra Soci e d a d e q u e d ê efeti vo s i g n i f i c ado às


p ro m essas fe i t a s a S . Ped ro.
V i a - m e fo rça d o ou a a ce i ta r a i n te r p retação da
I g re j a C a tó l i ca , e a s u b m et e r- m e a o P a p a do, ou en­
t ã o a esva s i a r os textos Pet ri n os de todo s i g n i f i ca d o,
q u a l q u e r q u e fô sse .
Preci sa m e n te d a m e s m a m a n e i ra , a l g u m a s d i fi­
cu l d a d es h i stó r i ca s q u e me p a re c i a m e m b a raça ntes
e q u e e ra m tão co n s i ste n te m e n te u rg i d a s por m e u s
a m i g os, co meça ra m a p e rd e r s e u pod e r a n te o m a i o r
co n h e c i m e n to d a I g re j a Cató l i ca como u m a d o m i ­
n a n te e viva rea l i d a d e.
Ta l é a o b j eção s e g u n d o a q u a l n ã o é evi d e nte
q u e na i n te n çã o de Nosso S e n h o r o P r i m a d o cievês­
se passa r a os s u cessores d e S . Ped ro ou q u e êste s e m­
p re d evêsse d u ra r.
A res posta é a g o ra ce rta m e n te c l a ra pa ra m i m
co m o a l u z d o d i a , p o i s Nosso S e n h o r n u n ca t e r i a
d a d o à S u a I g re j a u m a ca b eça p a ra l h a ti ra r q u a n­
d o e ra m a i s n e cessá r i a.
O m e s m o s u ced i a co m m u i t a s o u t r a s q u e stões
q u e o ca s i o n a l m e n te m e o p r i m i a 111 .
L i b é r i o co m p ro m ete u a fé ? Q u e p e n s a r d a con­
d e n a cão de H o n ó ri o ? Foi G a l i l e u of i c i a l m e nte con-
,

d e n a d o ? Q u e d i z e r d o s a n t i - p a p a s ? Tô d a s estas
q u e stõe s p o d e m s e r e tê m s i d o d e b a t i d a s in infini­
tum d e a m bos os l a d os. Ma s q u a n d o fi q u e i co nve n ­
c i d o d o q u e e ra o Pa p a d o , tôd a s e l a s c o i ra m n o � e �
n a d a co m o, p o r a ss i m d ize r, a rg u m e n tos d e ca u s 1 d 1 -
co s, e sà m e n te s e m a n i fe sta ra m c o m o a p a re n tes ex-
Um S e n ho r, 11
1 62
ceções sem pêso a lg u m contra a persistente vita l ida ­
de d a I g reja.
Todos êstes a rg u mentos, e l a bo rados antes com
monóton a reg u l a ridade, torna ra m-se semelha ntes a
empoei rad os vol u m es de vel h a b i b l ioteca compara­
dos com a p u j a nte rea l idade d a I g reja ; perdem tôda
a s u a eficácia d esde q u e a lg uém ava nça no conheci­
mento d a I g re j a Cató l ica, como e l a hoje se manifes­
ta, a pesa r d e tudo, fu ndada sôb re a rocha de Pedro,
a presen ta ndo tão c l a ra me nte os si nais da sua voca­
ção d ivi n a, conservada e m paz m u ltissecu lar e sem­
pre a le rta d a e m cada m em bro ; a mais idosa e ain­
da a m a is jovem e a m a i s ativa d e tôdas as fôrças
rel i g i osas d os nossos d ias. Só po de ria ha�er uma con­
c lusão :
O nd e está Ped ro, a í está a I g reja Ubi Petrus,
ibi Ecclesia.
-
CA P fTU LO XIII

A N G LO-CATO L I C I SMO

Q u e d i re i s ô b re o m ovi m e n to A n g l o - c a tó l i co, a
c a u s a q u e p o r q u i n ze a n os fo i o a bs o rve n te i n te rê s ­
s e d a m i n h a vi d a ?
P rovàve l m e n te p o u cos fo ra m m a i s f i r m e m e n t e
e m b e b i d os n o A n g l o-cato l i c i s m o, m a i s i n te i ra m e n te
a b s o rv i d o s p o r ê l e o u m a i s com p l eta m e n te s a t i sfe i to s
d o q u e e u o e ra e m 1 924.
D úv i d a s s ô b re o m ovi m e n to j a m a i s m e p a s s a ­
ra m p e l a c a b eça : p e rs p ectiva s sa l u ta res s e a b r i a m
p a ra ê l e d e todos os l a d os ; em c a d a d i reção s e m a ­
n i fe s t a va o s e u p rog resso ; pa róq u i a s m o rt a s ress u r­
g i a m r à p i d a m e n te p a ra a v i d a e a s a l m a s e m tôd a
a p a rte res po n d i a m a o e n s i n o com u m corres p o n d e n ­
t e a u m e n to d e p rofu n d a p i ed a d e.
P e s s o a l m e n te e ra e u a be n ço a d o com u m m i n i s­
té r i o q u e me ce rcava do a m o r e d evota m e n to de
m u i t a s a l m a s e me t i n h a a be rto a s p o rta s p a ra os
m a i s í n t i m os s e g red o s d e m u i tos l a res i n g l êses e os
c o ra cões de i n ú m e ro s i n g l ês es .
,

Q u e é q u e m e s e p a ro u d a m i n h a fi d e l i d a d e ?
Q u e é q u e m e d es a r r a i g o u d e u m a s i tu a çã o q u e, e s­
.
p i ri t u a l e h u m a n a m e n te, me deu q u a nto e u pod i a
11 •
1 64

d es e j a r e q u e p a re c i a c l a ra m e n te trazer sô b re s i 0
si n a l de Deus ?
.� respo sta p a ra m i m , a g o ra é c l a ra . Fo i a I g reja
� a to l 1 c a c o m o a e n con tre i em L i s i e u x . E esta q u e eu
t i n h a v i sto e m L i s i e ux, c o m t u d o o q u e eu t i n h a com­
p re e n d i d o n o s Eva n g e l h os, t u d o i sto fo i fata l pa ra a
p o s i ç ã o e m q u e m e e n co n trava, por p rospera e se­
g u ra q u e , à p r i m e i ra v i sta, m e pa recess e.
O s d o i s p rob l e m a s fata i s fo ra m os dois p rob le­
m a s d a Autoridade e da U n idade.

AUTO R I DA D E

Co m p ree n d i e n tã o q u e D e u s t i n h a fu ndado a
S u a I g re j a pa ra s e r Mestra d i v i n a d o m u n do : q u e Ele
l h e t i n h a p ro m et i d o o d o m d o E s p í r i to Sa n to para
g u i á - l a a tôd a a v e rd a d e e q u e E l e esta r i a com ela
a té a o f i m d o s te m po s .
" I d e e e n s i n a i a s n a ções . . . e e i s q u e estou co n­
v o s co a té ao fi m d o m u n d o " .
A S u a I g re j a d eve r i a s e r a voz viva q u e m a n i ­
fes t a e c o n s e rva a S u a Ve rd a d e - n ã o por i nterv a­
l os , m a s s e m p re e e m t o d o s os t e m pos a té ao fi m .
D i z e r q u e e l a j á n ã o t i n h a pod e r d e e n s i n a r eq u i va­
.
l e r i a a d i z e r q u e N os s o S e n h o r j á n ã o está com ela
e� ­
E n tã o a m i n h a p o s i ç ã o c o m o An g l o-Ca tó l i c ?
a ti ­
t a va tô d a b a s e a d a n a co n v i cçã o d e q u e a l g re 1
r : qu �
n h a r e a l m e n te p e rd i d o o s e u p od e r d e e n s i n a
e O c !-
d es d e a p ri m e i ra g ra n d e d i v i s ã o e n tre O r i e n te
n t i n o p l a e R o m a , a 1 g re 1
• a n u n ca m a i s
d e n te, C o n sta
b s o l u ta a u to r i d a d e : e es t 0
fo i a pta p a ra fa l a r c o m a
1 65
i n ca p acid a.d e m a i s. : e a ce ntuou desde que a comu­
n hão Ang l i ca n a re 1 e 1 tou o Pa pad o ci nco sécu los ma is
t arde.
M eu a pê l o, porta nto, d i rige-se para o ensi no da
que eu cha mava I g re j a i nd ivisa. Quer isto d izer que,
embora a I g re j a estivesse exteriormente d ividida em
três difere ntes Comu n h ões sepa radas exteriormente
entre si, j u l gava que era possível fazer uma síntese
de tôdas a s d outri nas ma ntidas e ensinadas em co­
mum por tôdas e l as, e q ue estas doutrinas pod iam
ser ensi nadas como verdade i nfa l ível que obriga a
todos os homens.
As três Com u n h ões de que se trata eram a I g re­
ja Ortodoxa Ori enta l, a Romana e a Angl ica na - por
serem as três g ra ndes Sociedades Cristãs que pos­
suem o E piscopado histórico e por conseg ui nte uma
forma com um de g ovêrno, o Sacerdócio histórico, os
Sacra mentos e os dogmas da fé .
Sendo assim, n e n h u m ensino que não fôsse mi­
n istrado em com u m pelas três Comun hões era essen­
cia l ; e n esse terreno eu ti n h a até a l i rejeitado o Pa­
pado .
Considerava-o como a lgo acrescentado à Fé,
como se pode ver em m i n has " Nota s sôbre a Rel i­
g iã o Cató l ica . "
A idéia pa pa l da auto rida de e u a cons idera � a
m uito aca n h ada e tota l ment e desat ua l iz ada. Eu cri a
q ue R om a com p l eta ra a sua u n idad e l i m ita nd.o suas
f ron teiras ao m ín i m o e q u e, por isso, tin ha a l ie n ado
m eta d� do mu ndo crist ão.
1 66

Considerava como certamente i mpossível e pro­


vàvel me nte i ndesejável na presente situação da Cris­
ta ndade certa concepção mais defi n ida da Autorida ­
d e d o q u e a da I g reja i n d ivisa. A mesma indetermi­
nação da teoria Ang lo-Católica parecia ' um ponto em
seu favor : a u n ião fi nal da Crista ndade era o alvo de
todos os nossos esforços, mas isto não parecia ser
pa ra o nosso tem po . Nosso dever era continuar on­
d e estáva mos : possui ndo a g raça sacramental, po­
d e ría m os viver a nossa vida católica : e Deus efetua­
ria a u n i ão a seu tem po, desde que todos seguísse­
m os d o mel hor modo possível a luz como a víamos.
A l uz como a vía mos ! E é esta exata mente a cou­
sa d a p resente turbação.
U ma nova l uz se projetara sôbre m i nha vida -
a pri ncípio não m u ito clara, mas desti nada a cres­
cer g radua l mente até tra nsformar tôda a m i n ha
pers pectiva.
Em Lisieux eu ti n h a visto uma Autoridad e sobre­
n atura l e d ivi n a, ativa e o perosa no m u nao de hoje.
Centra l izada e m u m ponto da terra, estend ia co ntu­
d o a s u a i nfl uênci a aos mais remot os confin s d o
m u n do.
Reco n heci entã o que esta Auto rida de n ão er a
u m a cois a estr opi ada , mut i lada , mas que exi gia vo­
as
l u n tá ri a o b ed iênc ia d e homens e mul ·he res de tôd
os
as naç ões d a terr a ' que esta o b e d 1enc 1 a t orn ava p -
·

de
sível uma vida so brenatu ra 1 d e f e,, d esc o n he cida
,.

m i m até aq uêle moment o.


1 67

As pa l avras a utoridade, obed iência, fé estavam


tôdas então l i ga d a s i nsepa ràvel mente para m im e
tôdas poss u ía m q u a l idade i nte i ra mente nova.
Meu estud o d a Escritu ra confi rmou a reivi nd ica ­
ção d a I g reja Cató l i ca q ue por êstes s i n a is d evia
ser recon h ecid a como uma I g reja fu ndada por Nos­
so Sen h or. A l uz de tudo isto c heguei a ver que eu
devia ma nter a opi nião de que a Igre ja, d ivi namente
autorizada por Nosso Sen h or pa ra ensi nar a verda­
de a todo o m u ndo, n u nca poderia deixa r de fa l a r e
de ensi nar com uma seg u rança q ue seria claramente
entend ida.
Cheg uei g rad u a l mente a ver que a I g reja Orto- .
doxa Orienta l estava na mesma posição que a An­
g lo-Católica ; pois ma ntém ta mbém ela que a l g reia
n u n ca mais foi a pta pa ra fa l a r com a utoridade d i­
vi na depois dos sete primeiros Concíl ios Ecu mên i cos.
Assim, ta nto os Ang lo-Católicos como os Ortodoxos
Ori entais baseiam sua posi ção na crença d e q u e,
a u m certo ponto da história, a Igreja de Cristo ces­
sou de ensi nar o mu ndo, posição que eu já não po­
dia tolera r.
A l uz de Lisieux cheguei a ver como é mera men­
te teórico êste a pêlo a u ma Igreja I nd ivisa .
E: rejeitada por outros dois Corpos que formam
a Côrte de Apelação - o Oriental e o Roma no.
Nen huma destas Comun hões recon h ece ta l au­
toridade na I g reja I nd ivisa. Ma is a i nda. Ta l autori­
dade é adm itida só por u ma mi noria da Comu n hão
Ang l icana à q u a l eu pertencia.
1 68

C o m o p o d i a e u s u st e n t a r esta opinião con t ra


f ô r ç a s t ã o s u p e r i o re s ?
. ...º p róx i 111 0 p o n to q u e c o m eç o u a me pert u r b a r
fo 1 e s t e : Co n1 0 t ra b a l h a esta a u to r i d a d e d a I g re j a
l n d 1 v .1 s ? ? P a ra o n d e está v o l ta d a ? Q u a l o órg ã o p a ­
.

ra a p l i ca, - l a ? F o r a d a Co m u n h ã o A n g l i ca n a , ne n h u m .
D e n t r o d a Co m u n h ã o A n g l i ca n a a a u to r i d a d e n o r­
m_a l, a q u e e u s e m p re d e s e j e i s e g u i r, e ra o b i spo d a
d ioces e o u o Co n s e l h o d os B i s pos.
Ea í c o m e ce i , p e l a p r i m e i ra vez, a i n q u ieta r - m e
q u a n to a os b i s p os.
Até a q u i eu t i n h a e s ta d o a b sorv i d o n os m i n i s­
té r i o s a q u e 111 e d ed i ca ra d e c o r p o e a i m a .
T o d os, à vo l t a d e m i m , e ra m h o m e n s da m a is
p ro f u n d a s i n ce r i d a d e, h o m e n s q u e estava m faze n d o
g ra n d es s a c r i f í c i os, h o m e n s d e co m p rova d a pi edade ,
tod os a a p o i a r a s m e s m a s o p i n i ões q u e eu n u tri a .
Tod os ê l e s c r i a m fi r m e m e n te q u e, com o correr d o
te m p o, o m ov i m e n to A n g l o- C a tó l i co g a n h a ri a a lg re­
ia l n g l ês a ; e q u e os b i s pos, q u e i n d iscutive l m ente e s­
tava m e m pos i ç ã o m u i to d i fíci l , c h eg a ri a m aos po u ­
cos a co m p re e n d ê - l o - t a n to m a i s q u e a l g u n s bi spos
estã o se t o r n a n d o c a d a vez m a i s a cess íveis .
Pessoa l m e n te, m u i p o u ca s vêzes m e te n h o en co n ­
trad o ofi c i a l m e n te com a l g u m d os b i s pos , e m bo r a 0
te n h a fe i to m u i t a s vêzes d e o u tras m a n e i ra s ; e m os ­
tra ra m -se, s e m e.xceção, m u i to a t e n c i os os, c o r t es � s ,
cava l h e i ros c r i stãos, esfo rça n d o-se, e m ci rc u ns t â n c .5 d
m u ito d i fíce i s, p o r co m p r ee n d e r e u n i r sob a s u a i­
reção três p o n tos de v i sta com p l et a m e n te d iv e r g.e n ­
o.
tes - o Eva n g é l i c o, o Mod e r n i sta e o A n g l o -C a t ó l i c
1 69
E fo i s e m p re pa ra m i m u m ª
a
v eri f i c a r q ue , co m tod o 0 s e u d es e �1 0 udsae d e tri st ez a
pr ee n s 1vo s, pa rec era m te r tão p o uc o cosne re m co m-
·

h ec im en to
d a a uto ri d a d e Ca tó l i ca .
.rida d e,aso a g o ra , ve n � o a vi ta l ne ce ss id ad e da au to-
M
prob l e_m a i m põ e-s e a m º1 m com um a 1ns 1s-· ·

t' enc
' ·1a q u e e � n a o pos so i l ud i r. Co mo é
que os bis-
pos , nos � u a 1s d evo nor m a l me nte ver a aut orid ade ,
ten ha m too peq u e n a com pree nsão do que sign ifica
a utorid _ a d e cató l i ca ?
O q ue a ntiga m ente pa recia u ma a noma l ia tem­
porá ria, a g o ra pa recia tornar-se mais profu nda. Co­
m ecei a i nterroga r-me a m i m mesmo : Como pode a
Igreja l ng l êsa ser pa rte d a I g reja Católica quando o
prog resso d a fé Catól ica dentro das suas fronteiras
d epende d a conversão d os bispos a esta mesma fé ?
Em o utras pa l avras, e u estava a braços com a q ues­
tão d e s a b e r com o e ra possível aos bispos Ang l ica­
nos sere m b ispos Cató licos, a i nda em desac ôrdo
com a fé h istó rica d o Orie nte e do Ocid ente em pro­
b lem a s vita i s com o o Sac erd ócio e a Gra ça Sac ra­
me nt a l ? E a ss i m d a q ues tão da a uto rida de pas sei pa­
ra a d a u n id a d e - o utr a g ra nd e qu est ão tra nsc end en­
ta l pa ra a po siç ão do An g lo- Ca tól ic o.
U N I DADE
T e n d o vis to a re l ac' ão ess • 1 en t re Au to ri da-
en c1a
d.e e U n i d a d e d o l a d o po s1t1 · ux, e te n do
· · v o em Lº1sie
vis to n a Escrit u ra com o a 1 g r e •1 a t '1 n h ª 5 em pr e 'brda d �
es d e
o s p ri m e i r os d ia s ' co ns id er ad o q u a l q ue r qu �
a to r
U n ·1 d a d e com o o p i· o r d os pec a d os, co m e c ei
1 70
n a r -me m u � t � � a is persuad ido desta verdade , e co m
m a _i s pers p 1 ca c 1 a, do lado negativo.
U m a vez q ue adm itís que a I g reja cessou de fa­
l a r com a utoridade , nesse caso cessou també m a
u n idade .
Pude ver então tudo claramente - como, desde
q u e nos sepa ra mos da suprema Autoridade consti­
tu ída pelo próprio Cristo, nos tornamos d ivididos
não sàmente como u m corpo senão ta mbém em dou­
tri na.
Tornou-se claro para m i m que o resu ltado da
Reforma foi o estabelecimento de u ma série de Igre­
jas Nacionais, tôdas i ndependentes umas das outras,
das q u a is u m a é a I g reja da I ng laterra.
Desde a m i nha ordenacão eu ti nha a cred itado
,

q u e a i ntro m issão do Estado nas coisas da Igreja


em nosso pa ís era letra morta - uma rel íquia do pas­
sado, u m a cond ição temporá ria na qual nós, por
u m tem po, tín ha mos ca ído. Foi sàmente a parti r dos
ú lt i m os dois ou três a nos q u e fu i forçado a ad mitir
contra todos os meus desejos, q u e, arg u mentem ou­
t ros como q uiserem, a superi ntendência do Estado sô ­
b re a I g reja é i nseparável da p resente constituiçã o
d a l g reia d a I ng laterra.
O s recent es debat es pa rlame nta res prova ram

i sto m u ito c l a rame nte. A l g reia da I ng late rra é um a


s,
I g reja Nac iona l, i nde pen dente de tôda s as out raEs -
e seu s form u lá rios dou trinais estã o suje it os a o
ta d o.
1 71
Q u a n.d o começa mos a o b serva r mais seriamen­
te as l g re 1a s O rtodoxas do Oriente, d esco b rimos que
com elas se dava o mesmo.
E u sem p re ti n ha su posto q ue a Igreja Orienta l
Ortod oxa era u ma n a fé e no govêrno. A verdade,
porém, é q u e, d epois de se ter separado da autori­
dade do Pontífice Roma no, a I g reja Orienta l Orto­
doxa d ivid i u-se em I g rejas Nacionais. Como lá não
há su prema a utoridade espi ritua l, surg i ram I g rejas
nacionais e i ndependentes.
A I g reja Russa a b riu o ca mi n ho e foi a primeira
q ue esta b eleceu a sua i ndependência : e o seu exem­
plo foi seg uido pela Grécia, Sérvia e Rumên ia, e u l ­
ti ma mente pe la Bu lgá ria ta mbém.
Em razão da sua crença segundo a qual depois
dos sete Concíl ios Ecumên icos a defi nicão de tôda
,

doutri na necessá ria estava completa, e por fôrça do


seu conservatismo nacional, guardaram a u n idade
da fé em um a lto g rau, mas n a prática torna ram-se
com pleta mente secu la rizadas.
U N I DADE DOUTRINAL
Mas m u ito mais séria era a questã o das d iferen­
ças de doutri n a . Desde q u e vos afasta i s da suprem a
a uto ridade d o Pa pado n ão há mais vigi lâ ncia sô bre
a do utri n a ; e, em l ugar d e u ma voz u nida, depara is
c om d iv ergências doutri nais sem n úmero.
Na I g r eja O rien ta l a u n idad e de dou trin a tem
si d o lar gamente conservada ; mas a razão é po� ­
q u e ela defend e não have r mais defi n içã o de doutr i -
1 72
n a depois dos três primei ros Concílios : q uer isto di­
zer q ue a I g reja cessou de fa l a r com uma só voz _

o p i n i ã o essa q u e eu já não pod ia manter.


Assi m a u n idade da I g reja Orienta l em matéria
d e fé é a ntes u ma u n idade de estag nação, signi fi­
ca n d o q u e não há possibi l idade d e encontrar u lte ­
rio res n ecessid ades doutri n a is, enqua nto o mundo
ava nça ; perdeu o poder de u lteriores decisões.
Mas na I g reja Ang l ica n a era i nteiramente d ife­
rente . Aq u i h avia três d isti ntos pontos de vista : o
Eva n g é l ico, o Modern ista e o Anglo-Catól ico.
E êstes três modos de ver era m com pleta mente
co ntraditórios, embora todos d i nâmicos e operosos.
A existência dêstes três pontos de v ista lado a
l a d o não me pertu rbou m u ito.
Pa recia-me mu ito razoável e bom que existissem
tod os lado a lado, e que a q uêles que os ma nti nham
p u d essem traba l ha r do modo mais a m igável possível
d e n tro d e u m a mesma Com u n hão e que por fim a
verda d e p reva leceria . Eu noo d uvidava que a verda­
d e estivesse com os Ang lo-Católicos.
Agora, porém, tudo m udou. Em vez de c? nsi­
d e ra r isto como coisa boa, meu espírito senti u- s e
tortu rado d e a n s iedade pu ngente.
Com o po d eriam d uas conc epçõ es com ple tam � n ! e
cont ra d itóri as da suce ssão Apo stóli ca, o · Sac er d � sct1 ?1 r
x1
e os Sacr a men tos ' espe cia l men te a Euca1 r is tºia, eau to-
l a d o a l a do d entr o d e u m a I g reja q ue f a a co m
rida d e d ivi n a ao m u nd o i ntei ro ?
1 73
� � l e râ n ci a co � o p ri n cíp io, esp írit o de co mp r e­
e n s .1 b d 1 d a d e, fo i coisa d estru ída pa ra m i m pelo Eva n­
.
ge l h o e pe l a s Epís to l a s e d estr u ída par a sem pr e.
Vej o a g o ra q ue a com p reen si b i l idad e da I g re­
ja d a I ng l aterra n ã o e ra u m pri n cípio mas u ma triste
nece ssi d a d e, u ma fata l i d a d e porq u e não havia au­
torid a d e q u e p u d esse d izer q u a l e ra a opi n ião ver­
dadei ra e q u a l a errônea . A I g reja Ang l ica n a como
Mestra cessou de exi sti r.
A ú n i ca a utoridade e ra o prestíg io da pessoa ou
g ru po d e pessoa s q ue defe n d i a cada u ma seu pon­
to de vista . Os form u l á ri os da I g reja da I ng laterra
não ti n h a m a utoridade, pois pod i a m ser i nterpreta­
dos ao gôsto d e cad a pa rtido. Em todo o caso, es­
ta r em com u n hão com Eva n g é l icos e Modernistas, vi-o
então, era ser fiador do q ue ê l es ensi n a m ; era a poiar
o q ue e u sabia n ã o ser verdade.
Embora e u visse o a l ca nce d esta i l ação, d ecor­
reu a i nda m u ito tem po a n tes q ue eu pudesse pessoa l­
mente apree n d er a plena conseq uência de ta l atitude.
Os a ntigos a rg u me ntos a i n d a ti n h a m a sua fôr­
ça, tão firme estava e u n o a ntigo ponto de vista l
" A prim itiva d ou tri n a estava sendo u ltrapassa­
da. O Ang l o-cato l icismo ia crescen d o sempre. Por
que i n q u i eta r-n os com teor i a s sô b re a utoridade q uan­
do há ta nto tra b a l h o p a ra s e faze r ? "
A ssi m a rg u me n tava m m e u s a m ig os, e assi m de­
s ej av a e u ta m b é m a rg u m e nta r. Mas, q ue d izer d o
Mo d er n i s mo, n ova d outri n a q ue n a I g reja tenta fa­
z e r a r ev e l a cão s o b ren at u ra l a d o ta r-se à estr utu ra
,
1 74
dos con h eci mentos hodiernos; e, a fim d o o ro a l i zu r '
tenta desvi rtua r o m i racu l oso e re b ater as r eivi nd i -
cações d ivi nas d e Nosso Sen h o r ?
Eu sempre me compenetrei de que isso ora obra
da facção da " Broad Chu rch " ; e o q ue eu tinha ou­
vido d a Confe rência de G i rton em 1 921 e das del i­
berações ali tomadas ca usara m-me um terrível mol­
esta r. Outra vez a i nda a lguns amigos me observa­
ra m que êsses pseudo-mestres eram críticos acadê­
m i cos, i ntel ectuais excêntricos, professôres un iversi­
tá rios sem contato com a vida huma n a ; que seus en­
si n a mentos eram puramente destrutivas, sem nada de
positivo q u e dar ao comum da human idade e que
por conseg ui nte de ta is teorias nada resultaria de
d u raduoro.
O Ang l o-Cato l icismo ti n h a uma mensagem po­
s itiva e porta nto aca b a ria por preva l ecer.
Aceitei esta expl icação como vinda de homens
m u ito ma is vel hos que eu e que conheciam a situa­
ção m u ito mel h o r, ta nto mais que me guiei sempre
p o r êste p r i n cípio : mais prudente e mais elegante é
viver e deixar viver, respeitando nos outros a libe r­
d ad e d e d izer fra ncamente o q ue pensam.
'" ª s à l uz de Lisieu x e d os fatos de auto rid ad �
e u n idade como os ti nha visto lá, e d o que me en � 1-
n o u o Novo Testa mento sôbre a u n i d a de da l g re 1a

e da sua fé, torne i-me entã o mu ito mais sen sív el i s
esta s q u estõe s ; e q u a nto mais as cons i der ava ,
ma
séria s se m e rep resenta va m.
re n ce
Sen te n ca s do rela tório da "G ir ton Co nfe
,

of Mod ern C h u rchm en " (1 921 ) ta is com o :


1 75
Cristo " nã o reivi n d icou p a ra si mesm o a D ivi n­
da de " .
Ou
" Devemos de tod o em tod o re jeita r (isto é, pôr
de lado) a noção trad i cio n a l q u e a Sua Persona l ida­
de não era h u ma na mas d ivi n a . "
Ou -
" Nem por u m momento supon h o q ue J esus ja­
mais se j u lgasse a si m esmo como Deus. "
Sentencas como estas enc h e ra m-me d e u m tortu-
,

ra nte senti m ento d e i nseg u ra nça q u a l n u n ca ti n h a


a i nd a experi mentado. Gosta ria d e crer q ue ta is sen­
tenças e ra m meras teorias a cadêmicas, a l h eias a o
contato com a vida h u ma na . Mas como me seria isso
possível, ven d o eu q ue ta is d ou tri nas era m ensina­
das pelo d i retor · d e u m Col ég i o Teo lóg ico recon h e­
cido pela I g reja da I ng l a te rra ? Era m ensi n a mentos
que devia m d ifu n d i r-se pelas paróq u ias.
Eu não poderia d eixa r de concl u i r q ue, fervoro­
sos e devotad os como i n d ubitàve l mente e ra m êstes
modernistas em seu d esejo d e adota r a Fé Cristã a os
prob lemas i ntelectua is modern os, êles estavam red u­
zin do Cristo a o n ível de u m h omem, como fizera m os
raci ona l ista s d o tempo de S. J oã o : "Todo o espírito
q ue não confessa q u e J esus Cristo vei o e m ca rne
n ã o é de Deu s " .
E era d ês tes q ue o Após to l o d o Amor s e senti u
fo rç ad o a d iz e r :
" Se a l gué m vem a vós, e n ã o tra z esta dout � i­
n a , n ã o o rec e b a is em voss a casa , nem o saud eis :
1 76
p o rq u e q u e m o sa úda pa rtici pa das suas obra s m á
( l i J oa . 1 0, 1 1 ). s
. E n co n t rava -me eu agor a em aná loga situa çã o .
V i a-o s a ê l es, os Mode rn istas, d ivid i ndo a Crist o
d estr u i nd o a Perso na l idade de Nosso Sen hor - esta �
vam d e fato destru i ndo a Divi ndade de Cristo.
. Tão forte, entreta nto, era o meu habitua l esp J.
rito d e tolerâ ncia em q u e, como q u a lq uer ang l icano
e u ti n h a sido educad o, e tão forte o meu temor de
q u a lq u e r coisa q ue se pa recesse com a caça à here­
s i a q ue, embora eu pudesse ver a coisa clarament e,
a i n d a conti nuei d izendo pa ra mim mesmo : "Certa­
m ente estou enca recendo mu ito um assunto que se
a presentou d esfig u rado à minha perspectiva " .
M a s a q u i depa rei a i n d a com outro fato. Pode­
ri a ser ou não ser verdade q ue o Eva ngel icismo es­
tivesse morrendo; mas uma coisa ti nha eu por certa,
e e ra q u e o modern ismo estava vivo e crescia em
m u itas d i reções . E é aberta mente pregado em alguns
dos m a is importa ntes pú l pitos da I g reja da I nglate r ­
ra . N otei isto d e uma maneira crescente entre o cle­
ro, (por vêzes ju l g uei q u e o mesmo se passava entr e
os A n g lo-Cat ó l icos) e, acima de tudo, estava ven d o
os seus efeit os sôbr e o l a icato .
Estiv esse ou não a D ivi ndad e eJe Noss o Sen hro rl
a s e r n ega da hoje pelo s mod ern istas , o efeit o ge a
r
sôb re o l a i cato - n ão só Ang lo-C atól ico, mas saôbn �i
o l a icat o e m g e ra l - e ra q u e ê l es esta vam de md a fn ­-
ra cre sce n te sob a imp ress ão d e q u e a Igre ja te p o n -
g late rra se m ostr ava vag a e ase i 1 ant e so b re om
,.. es
,..

a s a1-
to. Qu a n to ma is e u m e p u n h a em con tat o c
1 77
ma s, es pe cia l me nte as q u e esta va m fora do mun do
A n g l o-C ató l i co, em tôda s as class es de vida e de ca­
da ti po, mai s me con ven cia de que o mod ern is mo es­
ta va sola pa ndo a vida sobre natu ra l entre os ing lês es
cris tãos.
E a I g reja da I ng l ate rra está desamparada . Os
bispos, em seus esforços pa ra reafi rmar a lg uma au­
toridade ,estão-se senti ndo a si mesmos, até certo pon­
to, contra riados, i mpel idos pel a opi nião públ ica mal
informada a usar da sua recém-recuperada autorida­
de pa ra supri m i r o culto do Sa ntíssimo Sacra mento
que é, em suma, u ma das maiores manifestações da
fé na Divi ndade de Cristo.
Ag indo assim, causam imenso pesa r à parte
mais piedosa de seu povo.
Ao mesmo tempo são impel idos a deixar o cam­
po l ivre ao ensino modern ista, precisamente por cau­
sa da mesma opi n i ão p ú b l ica q ue se ofenderia com
qualquer restrição ao l ivre pensa mento. Dêsse modo
se encontra m os bispos i n capazes de defender a dou­
trina da Divindade do seu Senhor.
A q uestão do Livro de Orações (Prayer Book)
nu nca assom o u tão g ra ndemente a meu espírito .
Er a ela apena s u m sintoma de ma l muito, muito mais
p rof und o isto é, a incapacidade da Igreja da l ng l � ­
-

t e r r a de ma nte r q u a lq uer u n idade ai nda nas d outri­


n a s m ais fu ndamentais .
.s i t u aEst as, porta nto, eram as d uas ame aça s fata is à
ç ão do s Ang lo-Cató l ic os.
U m Se n h o r, 1
2
1 78
Pri m e i ra mente a q uestão d a Autoridad e : a cr e n­
ça de q ue a I g reja, a Mestra do m u ndo cons tit u íd a
por Deus, pod i a cessa r para sem pre d e ensinar cla­
ra e a utoritativa m ente : e, em segundo lugar, a cren­
ça d e q u e a I g reja pod i a ser d ivid ida seja visivel­
me nte em sua vida soci a l, seja em seu patrimônio dou­
tri n a l .
Autoridade e u n idade era m i nsepa ráveis. O An­
g lo-Cato l icismo não tem a utoridade, e está em visí­
vel com u n hão com doutri nas q ue são contrárias à fé
tra d i ciona l e contrad itória s entre s i ; e são destruti­
vas d a verd adeira cre n ça n a própria Persona l idade
de N osso Senhor - o fu nda mento da Re l igião Cristã .
O essenci a l da I g reja é ser e l a a Sociedade fun­
d ada por N osso Sen hor; sua a utoridade vem dEle;
e se E l e é a penas o q ue êstes m estres modern istas
fa n ta si a m e ensi nam, então a reivi ndicação da lgre ­
ia, n o toca nte à fide l id ad e ou obed iência dos ho ­
mens, é u ma reivi n d icação sem fu ndamento h istóri­
co n e m dog mático.

O RDENS SACRAS
Tud o o q u e vou d izer sô b re êste del ica díssi m o
ass u n to q ue ro d izê- lo com o máxi mo ca ri nho e re v� ­
rên c i a pa ra com aq uêles q u e a i nda susten ta m a o p i ­
n ião q u e e u o utror a suste ntei tão estrê nu am en te. _

Pod e pare cer estr a n h o a m u itos, mas a qu es t ?n-0


das O rd e n s Sac ra s foi u ma d a s ú lti ma s qu e m e sti � -
q u ieta ra m . U m a raz ão, p en so eu, foi por q u e- e up n� n c 1
va b e m seg u ro d a s u a va l i d ad e ; mas a ra zo o
-
1 79
pa i foi po rq u e eu via , de sde o i n ício , qu e a qu est ão
sup rem a era sem pre a da Au tor ida de e da U n ida de .
_ F u i pa � l ati n a me nte l eva do à con vic ção de q ue a
l g r e 1 a Cat o l .1 ca era esta Aut orid ade d ivin a. Nen h u m
riva l tent ou a pro pria r-se d e ta l a utor idad e. E u esta ­
va i ntei ra m ente a bsor vido n este pon to e só qua ndo
me torn ei cons cient e do ca ráter d ivino desta Auto ri­
dade foi q u e come cei a capa cita r-me da tra nscen­
dênci a d o fato de ter sido essa a utorid ade a que se
pro n u n ci o u contra a va l idade das Orden s e Sacra­
mentos.
Por m u ito tempo ti n h a eu ensi nado e acred itado
que, visto a I g reja Angl ica na ter a sucessão Apostó­
l ica e o Sacerdócio h istórico e os Sacra mentos, era
por isso mesmo uma pa rte da Igreja Catól ica. Era
êste o ensi n o do meu pa nfleto " Notas sôbre a Re l i ­
g i ã o Cató l i ca " .
Mas comecei a ver que não era assim. A questão
pri ncipal é e sempre deve ser esta : Onde está a I g reja
autoritativa de Cristo, u n iversa l e visível, que fa l a ao
mundo com a sua d ivi na Autoridade ?
Desde q ue achastes esta I g reja, deveis subme­
ter-vos e i nteg ra r-vos nela. Se não fazeis assim,
a i nda q ue possuais Ordens e Sacramentos vá l idos,
esta is fora d a I g reja Cató l i ca ; ta l é o caso da I g reja
Orienta l Ortodoxa, cujas Ordens e Sacra mentos a
Igreja Cató l ica recon heceu como vá l idos.
Quem leu essas m i n ha s " N otas sôbre a Re l ig ião
C ató l ica " sabe q u e eu sem pre baseei o meu ens i no
q ua nto à rea l idade das O rdens Ang l i ca n as nas pa­
l av r as do prefác i o ao Ritu a l da O rdena ç ão no Livro
12 •
1 80

d e O ra ção, especi a l mente nestas : " na i nte nçã o d e


q ue estas O rdens possa m ser conti n uad as " ; e ta m­
b é m n o fato d a i m posição das mãos pelo bis p o e
n a s pa l avras " Recebe o Espírito Sa nto para o ofí cio
de u m sacerdote n a I g reja de Deus, agora conf iad o
a ti pela i m posição das n ossas mãos " .
N i sto me sentia patroci nado por ver prog redir
e con so l id a r-se a crença no Sacrifício do Alta r e na
p resen ça rea l de J esus Cristo na Euca ristia .
Ma nti n h a essa crença em comum com numerosos
devotos, homens e m u l heres abnegados, de cu ja sin­
ceridade e honestidade jamais tive nem nunca terei
s o mb ra de d úvida. Tudo i sto contribu i u pa ra dar- m e
u ma completa seg u ra n ça n a m i n h a fé.
Afl ig ia-me mu ito, porém, que outros não tives­
sem a mesma crença, mas eu estava perfeitamente
convencido de q ue era a penas questão de tempo e
q ue tôd a a I g reja seria conq uistada quanto a êste
pon to.
Mas q u a ndo comecei a aprofundar mais a ques -
tão, descobri q u e havia outros fatos que eu não ti­
n h a con hecido a ntes e que mi nara m os meus próp rio s
a rg u mentos e debi l itava m a mi nha posição. � lha n d o
p a ra trás, persua d i-me d a deficiê ncia da minh a do ­
taçã o teoló g ica que cons istia em um único ano usua l
n o Co lég io Teol óg i co.
Dura nte aq uêle temp o o gran de dese jo de e.a1 dea,
u m era sa i r e mete r-se a trab al har; por co nse gsi� n!a ,
ºl u l g an do-se a bso l utamen te seg uro na pró p ria p o ç ?ia
ar e c
com o u m Ang l i ca n o, q u a n d o nen h u ma ou t.raa vpa m a .i s
.
estri ba r-se em razõe s sól i d as, n 1 ng ue, m d uv i d
.
1 81
da su a h a b i l i ta çã o p a ra o futu ro d ese m pe n h o d o seu
m i n i sté rio.
Foi só co m o u m res u l ta d o d a m i n ha visita a Li­
sieux q u e eu fu i l evad o a conside ra r o assu nto d as
O rd e n s sob u m â n g u l o tota l m ente d iverso.
P ri me i ro s u rpre en d e u - m e q u e em n osso Ritu a l ti­
vesse s i d o exc l u íd a q u a l q uer referência ao Sa crifí­
cio. Tôdas a s expressões q ue sugeri a m c l a ra e d ef.i n i­
tiva m ente ser o fi m d a o rd e n ação sag ra r sacerdotes
pa ra oferecer o S acrifício d o A l ta r fora m rem0vi­
das.
E nas atu a i s p a l avras d a Ordenaçã o que hoje
usa mos : " Recebe o Espírito Sa nto pa ra o ofício e tra ­
b a l h o d e u m Pad re " , etc., a pa l avra " Pa d re" foi i n ­
c l u íd a h á u m sécu l o a penas.
Não s ó isto, mas q u a l q u e r menção d e consa g ra r
o Corpo e o S a n g u e d e N osso Senhor, como pa rte d o
ofício d o Sacerd ote, ta m b é m d esapa receu.
Q u a n d o c h ega mos ao rito da Sag rada Comu­
n hão, e n co n tra m os d e n ovo o m esmo si ntoma.
O cer i m o n i a l foi o rg a n izado pa ra i mped i r q u e
o Sac rifíci o p u desse s e r considera d o n o senti d o em
q ue Sac rifíci o sem pre ti n h a sido co n h ecido, não só­
m ente n a l g re i a Cató l ica, m a s ta m b é m n a O rtodoxa
O rie n ta l . Q u a se tôdas a s referên cias a o Corpo e
San g ue d e C risto ti n h a m s i d o rem ovi d as, e a s pouc as
c m q u e eu ta n to confia va e ra m rea l m e nte a m b íg uas
e t i n h a m sido s e m p re i nterpre ta d a s de d ifer e ntes ma­
n e .i r a s.
1 82

N o cate c i s m o a s p a l avras " O Corpo e o Sa n g u e


d e C r i sto, q u e fo ra m ve rd a d e i ra m e n te e ce rta m e nt e
to m a d os p e l os fi é i s n a C e i a d o Se n h o r " , p or m i m
ta n ta s vêzes u s a d as, n ã o ti n h a m a i n d a s id o acr es­
c e n ta d a s a té q u a re nta a n os a trás .
T u d o i sto to r n o u evi d e n te p a ra m i m q u e d i fic i l ­
m e n te pod i a esta r seg u ro d e n ã o ter h a v i d o n e n h u m a
m u d a n ç a n a d o utri n a d o Sa n to . Sacrifíc i o do A l ta r e
d a p rese n ça rea l d e N osso S e n h o r n a E u ca ristia . De­
p o i s, o u t ro fa to n u n ca a ntes a dverti d o por m i m no seu
p l e n o s i g n i f i ca d o com eço u a to rtu ra r-me : eram os
a tu a i s res u ltados h i stóri cos d estas a lte ra cões na re l i- ,

g i ã o i n g l ês a . Refi ro- m e à remoção dos a lta res em


c a d a i g re j a do p a ís, m u i ta s vêzes a co l ocação d a
p e d ra d e a ra à e ntra d a d o te m p l o p a ra que pudes­
se s e r p is a d a com d e s p rêzo, e o te r-se dado ao p ú l­
p ito e a o p reg a d o r a p r i n ci p a l i m po rtâ ncia nos atos
re l i g i osos d a I g re j a .
S e m p re j u l g u e i i sto c o m o u m a crise tra nsitória na
I g re j a d a I n g l ate r r a , e s u ste n tava q u e a s u a Cato l i ­
c i d a d e n ão ti n h a s i d o d estr u í d a m a s sàme nte te m p o­
r à r i a m e n te o bs c u re c i d a e q u e o re n a s c i m e nto Ang lo­
C a tó l i co h ave r i a de resta u ra r o s ve l h os sa ntu ários de-
v a sta dos. .
m in-
Pa ra m i m e ra isto a pe n a s u m estí m u l o e .u
com e ce i ª v e _r
ce n ti v o a m a i o res esfo rce ' s. Ma s a g o r a
• 1 ·1 ne r e n te 0
muda , n t e
.1 t u i d a n a R e -
n c 1 a m e
.
q u e esta n ca e ra esse
1 g re j a d e I n g l at e r ra , ta l com o fo i co n st ,

fo r m a .
1 83
U m a a l te r a ç ã o tã o d rá s t i c a n a re l i g i ã o ofi c i a l
d o p a ís n ã o s e te r i a d a d o s e n ã o t ivesse h av i d o ta l
mu d a nca .
'

To r n o u -s e i sto m a i s evi d e n te à l u z d o fato d e


Cra n m e r e tod o s o s res p o n sáve i s p e l a m u d a n ça te­
rem m a n ti d o o p i n i õe s d i f e re ntes q u a n to a o e n s i n o
h i stór i co d a I g re j a C a tó l i ca e d a O rtodoxa O r i e n ta l
a res pe i to d o S a c r i fíc i o d o A l ta r e d a p re s e n ça rea l
d e Nosso Se n h o r n a E u ca ri s ti a . Pa ra ê l es , é c l a ro, a
p a l avra " Pa d re " n ã o exp ri m i a o q u e e x p r i m i u até
aqu i.
Co m ecei a ve r ta m b é m q u e, reco n st i t u i n d o o
m e u c a s o q u a n to à s O rd e n s A n g l i ca n a s , e u m e esta ­
va a peg a n d o a p o u co s p o r m e n o res q u e ti n h a m p e r­
ma neci d o s e m a te n d e r a e n o r m es a l tera ções q ue ti­
n h a m s i d o l eva d a s a c a b o , n e m a os g ra v ís s i m o s e n ­
c a rgos q u e h avi a m s i d o a bo l i d os .
F i n a l m e n te, s e m p re estive s o b a i m p re ss ã o d e
q ue a d e c i s ã o d a I g re j a Cató l i ca c o n tra a v a l i d a d e
d a s nossas O rd e n s t i n h a s i d o a ntes u m a to a g ress ivo
e a rb i trá r i o : m a s d es c o b r i , exa m i n a n d o o a ss u n to,
q u e a I g re j a Cató l i c a só se p ro n u n c i o u co m o res p os­
ta a o a pê l o de c e rtos m e m b ro s da I g re j a A n g l i c a n a
q u e esperava m u m a d e c i s ã o favo ráve l .
A I g r e j a Cató l i ca n ã o ti n h a n ecess i d a d e d e to­
m a r ta l d e c i s ã o . S u a p o s i ç ã o t i n h a s i d o a té e n tã o
m u i t o c l a ra . Ti n h a s e m p re re- o rd e n a d o todos o s q u e
a e l a s e a g r e g ava m d e p o i s d e tere m p a s s a d o p e l a s

o rd en a çõ es a n g l i c a n a s .
1 84

E, q u a n d o co n s u l ta d a , fêz o m a i s cu i d a d o s o es­
tud o d o a ss u n to, a ca b a n d o por d ec l a ra r i nvá l i d a s ta is
o rd e n a ções.
Q u a n to m a i s e u co n s i d e rava êste fato, m a i s cla­
ra m e n te via co m o e ra p a ra a I g re j a Catól i ca i m pos­
sível a g i r de o utro m od o .
Co m o p o d e r i a e l a d i zer q u e o s Ang l i ca n os pos­
s u ía m u m Sa cerd óc i o e u m Sacri fíci o, q u a ndo dois
têrços d o c l e ro A n g l i ca n o te r i a m rep u d i a do comp le­
ta m e n te ta l s e n te n ca ?
,

Fo i a I g re j a Cató l i ca c r i t i ca d a por ter b a seado


esta d e c i s ã o n a i n te n çã o d os b i s pos, mas segura ­
m e n te esta i n t e n cão é d e m od o evid ente corrobora-
,

d a p e l o m i n istério a n g l i ca n o q u e a p rod uzi u .


T u d o isto e ra extrem a m e n te d ifíci l é:I e enfrentar
e de a d m it i r com o u m fato. t m u i to d ifíci l ren u n ci a r
a l g u é m às s u a s m a i s ca ras convicções ; mas q u a ndo
êss e s a crifíc i o va i m a g oa r a m u i tos q u e a m a mos e
p a rece m e n os p reza r o tra b a l ho d e a l g u n s dos m a is
d evotados compan h eiros, torna-se q u ase su perior a
tudo o q u e se p ode suportar.
Mu itos dos q ue me l êem pergu ntarã o a si mes­
m os : " Co nside ro u o a utor como i rreai s tod os os
seus m in istér ios pass ados , todo s os s e u s atos m i n i s-
ter i a is ?
a
A resp osta dep end e d o sent ido que se dá à p ­
l avra i rrea l . Se i rrea l s i g n ifica enga no - sim . Ma s s e
por i rrea l se e n ten de q u e as a l mas assi sti das nrão . r e­
e de qu e p eci sa­
cebe ra m as g ra ças q u e espe rava m . ent e.
v a m , e n tã o a res pos ta ser á m uito d ifer
1 85
Ten ho por certo q u e a g ra nde maio ri a dela s re ­
ce ber a m tud o o d e q u e n ecessita va m, mas não do
m o do que i magi nava m, q uero d izer, não por eficá­
cia sac ra m e nta l , mas em atenção a b oa fé que as
a ni m av a .
.

t: impossível crer q u e Deus n ão possa fazer fru­


tifi ca r sa l utarmente os enganos i nvol u ntá rios dos q u e
procedem d e b oa fé.
Como posso pen sa r d e outro modo, quando foi
através do movimento Anglo-Cató l i co e através da
associação e ca maradagem de ta ntos dos seus de­
votados cooperadores q u e Nosso Sen hor me prodi­
gal izou ta nta5 b ênçãos - g u iando-me por meio dêles
a esta defi n itiva visão d a verdadei ra fé ?
Depois que se dá uma ta l visão, por mais q u e
desejeis perma necer no m esmo teor d e vida, torna­
se i mpossível estacionar e não se d e ixa r atra i r a
novos horizontes.

RESUMO DA 1 1 PARTE
Chegamos agora ao fim do nosso a rgume nto.
Em Lisi e ux, pela pri meira vez em m i nha vida, achei­
me fa ce a face com a I g reja Cató l i ca como uma
re a l id a d e viva.
Rec o nh eci imed iata mente q u e eu estava na pre­
s e n ç a d o sob renat u ra l maneira como nun ca
d a nt e s ti n h a estad o . de uma
Es t a vid a sobre n atu ra l q ue vi era o resul tado
d e u m a c erte za a cêrca d a Ver dad e.
1 86

Esta certeza d a Ve rd a d e e ra d evid a a u m a


I g re j a q u e se d i z i a s e r Mestra d i vi n a m ente a u t o ri­
z a d a d o m u n d o i n tei ro. Afi r m a n d o poss u i r a a ssi s­
tê n ci a d ivi n a d o Esp írito Sa nto, e l a e n s i n a va a m e s­
m a fé o n d e q u e r q u e se e n co n trasse e exi g i a a o be­
d i ê n ci a d e tôd a s as ra ças, e e ra exte rna e visi ve l­
m e n te u n a .
A fo n te d a s u a a u to ri d a d e e o cen tro da sua
u n i d a d e reafi rm ava e l a , por i n d i ca çã o exp ressa de
N osso S e n h o r, e n co ntra r-se e m um ú n i co órgão, 0
P a p a d o, e p o rta n to p a ra s e p e rte n cer a esta I g reja
e r a n ecessá r i a a s u b m i ss ã o ao P a p a d o .
Q u a n d o m e vo ltei p a ra a s Escri t u ras, vi isto
m es m o confi rm a d o p o n to p o r p o nto.
N osso S e n h o r o rd e n o u q u e a s u a I g reja fôsse
u m a i g re j a d oc e n te q u e se d i fu n d i sse pe l o m u ndo
t o d o e e n s i n a sse tôd a a h u m a n i d a de. D oto u-a da
s u a p ró p r i a A u t o ri d a d e d iv i n a p a ra q u e fizesse j us
à o b e d i ê n c i a d e tod o s o s h o m e n s . Prometeu q u e o
E s p í r i to S a n to a c o n d uz i r i a a tôd a a verdade e que
E l e m es m o esta r i a com e l a a té ao fi m dos te mpos .
N os s o S e n h o r ta m bé m o ro u p a ra q u e a sua I g re­ d
ja fôsse exter na e visive l ment e u n a , p a ra q u e to o
er
o m u ndo, a o ver a sua u n idad e, p u d esse reco n h � �
a s ua orig em so b rena tu ra l e conv ence r - se da D iv i n -
d a d e d o seu fu ndado r.
Esta u n id a d e ext ern a não dev eria ser a l gon .t·
da u 1 a­
i na,
e xo
de i nte rior d a l g re º1 a do tad a de um a vid a uiv.
refl
d
d
pôs to e for a, m a s ti n h a de ser o . •
d
A ss 1
· m ª n i a-
m e d i a nte a u n ião com seu Sen hor.
1 87
de d a I g re j a n ã o poderia ser q uebra d a, d a mesma
maneira q ue n ã o pode ser q uebra d a a u n idade d a
Divi n dade.
E n ã o é só i sso. Fêz N osso Sen hor a S. Ped ro
promessas especi a i s, fê- l o chefe d os Apóstol os e
nomeou-o ped ra fu n d a m e nta l e a p ri n c i pa l a utori­
dade bem como leg i s l a d o r da sua I g re j a visíve l sô­
b r e a terra .
A verd ade centra l e n s i n a d a pe l os Apósto los, e
que não a d m iti a a m e n o r som b ra de tra nsigência,
era a D ivi ndade d o seu Sen hor; d esta verda d e se
ded uz tôd a a sua a utoridade sob re n atu ra l e tôda
a vida sobrenatu ra l d a I g reja. Q u a l q uer q ue d uvi­
dasse da Divi ndade do seu Sen h o r era i med iata m e n ­
te excluído d a u n idade d a I g reja.
Onde existe ta l I g re j a hoje e m d ia ? Pod e a
I g reja Ang l ica na, de q ua l q uer m a n e i ra , reivi n d ica r
pa ra si os foros d a gen u í n a I g reja q ue n os Eva n g e­
lhos vi mos ter s i d o fu n d a d a por N osso Sen h o r ? N ã o
o pode fazer por d ua s razões : n ã o tem a utori d ad e :
e não tem u n idade. E l a n e m a o m e n os se d iz a Mes­
tra i nfa l íve l, e porta nto n ã o pode exi g i r obed i ê n ci a .
Aq uêles outros m e m bros q ue d eseja m a l g u m a a u ­
t orid ade, o s Ang l o-Catól i cos, devem o l h a r para o
p ass ad o e desta m a n e i ra são forcad os a recon h ecer
I

q ue a I g reja d e Cristo cessou d e fa l a r com a u tori-


d a d e; ou então têm q ue o l ha r pa ra o futu ro espera n­
d o o dia em q ue a Crista n d a d e vo lte a se reu n i r.
U m a cois a, porém, n ã o pode m êles fazer : a po n ­
ta r pa ra u m a
Auto rid a d e d ivi n a q ue fa l a hoje e m
t om cl a ro e i rrev og áve l . E por n ão have r essa a u-
1 88

t o r i d a d e n a I g re j a A n g l i c a n a , n ão há n e l a u n i d a d ·
D o u tr .i n a s contra d itó r i a s são e n s i n a d a s no seu red ' �
t a n to n o q u e respeita a o s i g n ifi cado da sucess�
A postó l i ca co mo a o s i g n i f i c a d o d os próprios Sac r a �
m e n tos.
Co m o pode u m a I g re j a q u e perm i te que doutri­
n a s c o n tra d i tó r i a s s e j a m e n s i nad as, ser de q u a l q uer
m a n e i ra a tutora da Ve rd a d e ú n i ca ?
Mas, a i n d a p i o r q u e i sso : todo o se u e n s i n a­
m e n to é tão i n certo q u e d ei xa seus fi l hos em cruel
i n c e rteza q u a nto à Perso n a l i d a d e de Nosso S e n h o r .
P e r m ite u m e n s i n o q u e dá a seus fi l h os a i m pressão
d e q u e N osso Sen h o r e Sa l va d o r J es u s Cri sto n ã o
é v e rd a d e i ro D e u s . N ã o pode h aver s i tuação m a i s
t re m e n d a.

S e p o i s a I g re j a A n g l i ca n a d e i xa de cu mpri r a s
o r d e n s de N osso Se n ho r, exist i rá a lg u ma I g rej a que
as c u m p re ? Exi ste, s i m . A I g re j a Cató l i ca . 1: ela a
ú n i ca I g re j a q u e va i p e l o m u ndo todo reivi ndican­
d o p a ra si o d i re i to d iv i n o d e ensi � a r a t.ôdas �s
gente s. l: e 1 a a única. q u e d 1 z p o ss u 1 r a o r! e n taç a o
.
s o b re n at u ra l d o E s p í r i to Sa n to q u e a mo ntem af ? s­
tad a d o ê rro s e m p re que ela e n s i n a q u a l q u er coisa
n ec essá ria à fé e à mora l .
Sóm e n te e l a exig e de seus fi l h o s abs ol u ta o bbee­·
d iê n ci a e só a ela se pre sta es p o nt â n e a m e n te o
0 de o
n-
d iê n cia.
Só me nte e l a ens ina um a 1 nde fet 1
, ve l ver d
.

t e e l a c o n s e rv a
tod o.
d e q uer q ue se enc ont re e s om
, en
u m a u n id ad e vis íve l atr av és do mu n do
1 89
A ver d ad e cen tra l q ue e l a ens i na e ª 0 .iv .i n
de J e s u s' Cristo seu Sen h o r. t: a bas e d ª su a Adauto de
,

-
ri'd a d e, e a f o n t e d e to"' d a a sua vida sob re na t ur a 1
N u n ca per m º1 t e d uv1 , º d a s sôb re esta verdad e, ne �
p or u m m o m e nto. E se a lg uém desc rêss e ' ser ·1 ª ex
e 1 u '1 d o d a s u a u n ºi d a d e visíve
_

· l.
Sàm e nte e l a d á u m s i g n ificado efetivo às pro ­
mes sas feitas por N osso Senhor a S. Ped ro, pela
dou tri n a do Pa pado, q ue é, ao mesmo tem po, a
fonte d a s u a a utori d a d e e o centro da sua unidade.
Nen h u m a o utra I g reja reivi ndica ta l prerroga­
tiva p a ra s i . Basta-se a s i m esma tornando- se mani­
fiest a a tod o o m u ndo. U ma concl usão se me i mpu­
nha. Por m a i s q ue eu a m asse as associ ações que se
havia m reu n id o e m tôrno d a I g reja da I nglat erra ;
por estre itos q ue fôss em os vínc u los de amiz ade
que me p re n d esse m a m u i ta s a l mas do seu reba nho :
a I g reja d a I n g la terr a já não pod i a rete r . a min � a
fide lidade e e u ti n h a d e m e s u bme ter à ún ica l gre 1 a
que afi rm a e m a n ife sta ter Au tor ida ? e d ivi na ! et1?-
única q u e c u m p re os p rec eit os e rea l iza os ob1
vos d o d ivi n o F u n d a dor.
TERCEI RA PARTE
C O N C L U SÃ O

Vi m os n os ca p ítu l os p re ce de nt es o re su lta
. do do
est u d o da E s c r i t u ra , . ao q u a l fu i l eva d o pel a m ·1 n h a
seg u n d a v .1 s .1 t a a L '1 s 1 e ux.
�eve m os a g o ra ret o m a r o fio da h i stó ria ond e
o d e i xa m o s a o e n ce rra r a q u e l a seg u n d a visit a. I s­
to é n ecessá r i o p o rq u e n ã o é a pe n a s a a rg u menta­
ção q u e n o f .i m se to r n a o fator decisiv o.
E: m u i to d i fe re n te a q u i l o q u e m ove a a l ma a
tom a r a reso l u ç ã o d ec i s iva e sa lva d o ra . E: possível
ver o a rg u m e nto e n ã o a g i r d e n tro da lóg i ca, q u e
co nve n ce a i n te l i g ê n c i a , m a s n e m sem p re ren d e a
vo nta d e .

Ao p a rt i r d e L i s i e u x d a seg u n d a vez, tudo o


q u e e u sa b i a é q u e ti n h a d i a n te de m i m u m a ta re­
fa q u ase i m poss íve l d e l eva r a ca bo. Ti n h a q u e ver
a I g re j a Cató l i ca l i b e rto d e p reven ções e p recon ­
ce i tos ; n ão s a b i a a b s o l u ta m e n te como o co nseg u i r.
De n ovo ca d a pas so d a d o n essa d i reçã o trop e­
c ava com as rea cõe s d o m e u s e n t i m e nto n atu ra l e
I I

da s m i n h a s i d é i a s e s p i ritu a i s .
Esp i rit u a l m e nte p a re c i a - n1 e d e tod o i m p o: síve l
q u e N osso S en h o r m e fize sse i n te r ro m p e r ou por d e
l a d o o m i n istér i o q u e E l e h a v i a tão c l a r a m � nte
a b e n ço a d o se m q u a l q u e r m e r e c i m e n to d a m i n ha
U m S e n h o r, 1 3
1 94

pa rte ; h u ma n a me nte, se porve ntu ra se torna sse c l a


r? q u e " Ro m a " estava com a razão , i sto s i g n i f ica ­
­
r i a u m e n o rm e tra n stô rno n a m i n h a v i d a e a re n ú n­
cia a u m futu ro n u m a i d a d e em q u e é q u ase i m ­
possív e l o reco m eça r ; a l ém d i sso, d ever i a ro mp er
com tôd a s a s m i n h a s a ssoc i a cões e víncu l os h u m o -
,

nos.
Todos os esfo rços p a reci a m i m potentes contra
o p ê s o e a i nf l u ê n c i a d e u m pa ssad o p l e n a m ente
a s s i m i l a d o d es d e a i nfâ n c i a . Qua l q u e r pa sso nessa
d i re ç ã o m e p a reci a tão cu rto em com p a ração da
e n or m e d i stâ n c i a q ue era forçoso pe rco rrer, a ntes
d e p o d e r c h eg a r a u m p o n to d e vi sta objetivo .
As vêzes e u d es i stia p o r a l g u n s meses, deses pe­
rad o d e e n co n tra r u m a s o l u çã o ; mas a penas para
reco m eça r m a is ta rd e. Só posso res u m i r, m u i to por
a lto, o p rocesso p e l o q u a l p reve n ções e ma l enten­
d i d os se v i e ra m a d iss i p a r.
A pri m e i ra p a rte fo i d e est u d o a n s i oso . Lembro­
m e m u i to b e m q ue me e ntreg u e i a u ma leitura cu i­
d a d os a d a s " Re iv i n d i cações da I g re j a Catól i ca " do
b ispo Gore de um l a d o e a resposta d e Dom Ch ap -
m a n d o o u tro.
Com o pode ria e u , q u e co n h ecia tão ma l todo s
os f a t o s, d isti n g u i r q u a l d ê l es e ra o certo e q u a l 0
errado ?
No fim ' e ntre ta nto , o seg u i nte fato par e cia 5 01:
b ress a i r com p lena c l a reza . A .1 nter p re t aça.... o A n g i -
d
ca n a d as pro me ssa s feit as a S. Ped ro , s e gu ntr a°z .i 0a
_

te n d o
b ispo Go re ' er a p u ra m e nte de str uti va e n ao
.. a ra o m u n d o '
nen h u ma m ensa gem pos1t 1va p
1 95
na r � a l idade � red uzido u m cáos d e opin iões em
co nfl ito entre s 1 mesmas, ao passo q ue a interpre­
tação Rom a n a d estas promessas, conforme a expl i­
cação d e Dom C h apman, ti n h a a sua verdade i ra
expressão n a real idade d u m a I g reja de âmbito m u n­
d ial, m u n i d a d e Autoridade e persisti ndo indestrutí­
vel .
Tod os o s outros l ivros, que l i, me leva ra m à
mesma conclusão, isto é, q ue a ún ica interpretação
com efeitos rea is, das promessas a S. Pedro, é a
i nterpretação Catól ica, concretizada no Papado.
Esta fase de leitura e estudo constitu i natura l­
mente u m dever pa ra todos aq uêles que têm tem­
po e capacidade para a empreender; mas desde o
pri ncípio n u nca pude senti r que fôsse necessá rio b us­
ca r na História a verdade sôbre a Igreja Cató l ica ;
sem pre me pareceu que deveria estar noutro l ugar.
Mais tarde verifiquei quanto isto era absolutamen­
te verdadeiro.
Estou certo de q ue é importa nte frisar êste pon­
to : que o estudo da história por si só não é o ú n i ­
co, e n u nca poderia ser o pri ncipal método pa ra
se chega r à verdade . Deve haver a lgum meio co­
mu m e acessív el a tôdas as menta l idades e a tôdas
a s condicões da sociedad e.
,

Algum tempo depois q ue comecei a estudar o


assunto, recebi u ma carta q ue expunha isto mu ito
bem : " Reconhece plena mente que eu deveria estu­
dar o assu nto � ais de perto e lerei com cuidado
q ua lquer coisa que o sr. me recomendar; ao mes­
mo tempo, porém, não posso deixar de senti r que

13
1 96

U '_21 co n h e � i m e n to de doc ume ntos h i stór icos ,


etc. ,
� a o d eve r i a s e r n eces sá rio pa ra se desc obri r a l g re -
1 ª d e C r i sto . E ntret a n to, h ave n d o d e q u a l q uer ma­
.

n e i ra com pe tê n c i a pa ra e m p ree nder a leitu ra, é


na­
t u ra l m e n te um d ev e r " .
F r i s o êste ponto porq ue a l g u m a s a l mas estã o
i n c l i n a d a s a e n ca ra r o p rob lema a l ém da sua ca­
p a c i d a d e de o resolver, p e n sa ndo q u e n u nca pode­
rã o a p re n d e r os verd ad e i ros fatos da h i stóri a ; e
ta m b é m p o rq u e m u i ta ge n te é i n c l i nada a i ntimidar
a q u ê l es q u e sabem esta r em d úvida (certa me nte
c o m b o a i nte n ção) torn a n do-os cu l pados da sua
fa l t a d e co n he c i m e ntos h i stóricos .
P a ra m i m u m a d a s m a i ores d ificu l d ades, a prin­
c íp i o, fo i o fa to d e q u e "A I g re j a Cató l i ca Romana"
m e p a rec i a e s se n ci a l me n te estra ngei ra ; e por isso
e u a te m i a e d esconfi ava d e l a como de q u a l q uer
co isa d e o u tra terra e estra n h a ; e ta mbém me pa­
r e c i a q u e n u n ca e l a teri a a m e n o r poss i b i l idade de
co n q u ista r a n a çã o i n g l ê s a .
Tor n a r m e c at ó l i c o sig n i f i ca ri a exc l u i r-me da
-

atu a l m e n ta l idad e i ng lêsa , o q u e para q u em q u ase


n u n c a s a i ra d a I ng late rra , n ã o era cois a fác i l de
e n frenta r.
T u d o i sto re pu g na va à m i nh a men tal ida de , e o
cas o p a rec ia- me des esp era do . . de pe rto , l o -
uest ...,
ao m a �
Mas q uem e n ca ra a q m un d " a l po-
'
g o vê q ue n e n h u m a 1 g re 1 a d e e� pa n s ao

d e rá j a m a i s se r p u ra me nt e na cio na l.
1 97
Eu b e n1 p od i a ve r q ue e ra o n a c i o na l i s mo q
ue
es ta va a m ea ça n d o t o" d a a est rut u r a d a civ i l iz ac ão
Oc i d ent ? l e m a ss u nto s m ? ter ia is, o que exi g ia c � d a
vez m a i s a l g u ma b ase i nter na c i o n a l p a ra a vida
h u m a n a ; e se n d o êste o caso e m assu ntos m era men ­
te h u ma n os, é c l a ro q ue se torn a d e rn u ito m a ior
i m p o rtâ nc i a q u a n d o se trata d a rel ig i ão .
A l i á s, n u merosa s d e no m i naçõ es prote sta ntes
dão si n a i s paten tes d esta m e n ta l idade e estão l uta n­
do para conseg u i r a l g u m a u n i ã o i nternac ion a l. Mas
fu ndada sô b re q u ê ? E: d ifíci l vê-los confiar em ou­
tra coi sa q ue n ã o seja a b oa vontade das pessoas
i nteressada s n o m ovi m en to, o q ue seria i nsuficien­
te para d. e be l a r q u a l q u e r g ra nde crise i nternacion a l
que su rg i sse .
O i ntern a c i on a l is m o cató l i co, por outro l ado,
fu nd a-se, n ão n a boa vontade h u ma na, mas nas
pro m essas d ivi na s de N osso Sen h or à Sua I g reja,
que n u n ca pod e m fa l h a r.
E 1 com o rea l id ad e h i stóri ca, é a I g reja Cató li­
ca a ú n ica q ue sobr eviv eu, tri u nfa ndo repe tidam en­
te d os m a i s d evas ta d o res cata clism os que com ta n­
ta freq uência têm a ba la d o a face da Europa .
Dizer, poré m, q u e a I g reja Cató l ica é . i nter n_a ­
ci o n a l e porta nto e m g ra nd e pa rte estr a nge i ra, n ao
si g n i fi � a q ue por isso e l a não po derá gan har 0
p ov o i n g lês. Po is, q ua nto m a is eu pe rsc ru...ta:v a ª
q u e stã o, ma is c l a ro s e m e torn a va que 0 9d" 'º d , 0

I g r ej a Catól i ca est ava j u sta me nte no fat o e q ue


a o m e smo tem po q ue m a nt1· n .h a f'i r me m e n te o ao s eu
c a r á ter i nte rnaci o n a l, conseg u i a d e m o do e xtr r
_
1 98

d i n á r i o a d o ta r-se a tod os e a re f l eti r a s ca r a ct erí s­


t i c a s d a s d i ve rs a s n a cões .
,

Esta, com eçava e u a vê- l a , e ra a res po sta a o


a rg u m e n to q u e me e ra a p rese ntado tão fre q uen t e­
m e n te : " Le m b re-se d e q u e você vê Rom a n o q u e
e l a tem d e m e l h o r n a I n g l a terra ; você d ev eria i r p a ­
r a o estra n g e i ro a fi m d e vê- l a como rea l m e n t e é. "
I sto e ra i n s i n u a r q u e a I g re j a Cató l i c a m u ndi a l
s e l e c i o n a va c u i d a d o s a m e nte t u d o o q u e e l a tinh a
d e m e l h o r e co n ce n t rava a s s u a s e n e rg i as para i r d e
e n co n t r o à s ex i g ê n c i a s es peca i s d a a l m a i n g l êsa ,
e q u e m e n os c u i d a d o e ra n ecessá r i o no toca nte às
d e m a i s n a cões .
E fo ra d e d úv i d a q u e ta l a rg u me nto, de q u a l­
,

q uer maneira q ue se apresente, trai u m a g ra n de


fa l ta d e proporção e ao mesmo te m po u m a certa
co nviccão naciona l.
,

A verdadei ra resposta é que o catol icismo,


q u a n d o p raticado por i n g lêses, é l óg i ca me nte me­
n os a ntipátic o aos seus patrício s do que o cat? ! i ­
cismo q ue tem por cená rio a lgum país estran g e ir� ,
cu ios h á b itos e m a n e i ras de pens ar lhe s ão m a i s
avess os e refra tá rios .
s t rad ­
O a rg um ent o de qu e é nec ess ári o ir ª ºtat, � ca
de fei tos na Igr eja é a ! n a .1s ,
e
- s e prec on ceit as n a c 1 o
g e i ro pa ra . en co ntr ar
. p reve n çoe
q ue m m ob i l iza e n ao
_

qu ez a -
lan ça m a o
e ce r ta m e nte co ns tit u i u m sin al de fr a
, , dê le
o l i c1 s
. .

d e qu em .

t
d e fô rca n a po sic ão
os do c a -

Em vis ta d os g ra n d es pro g res s rr a, se ri· a te m e-


m o n os ú l tim os ce m a no s na I ng la te
1 99

rá rio pro fetiz a r q ue ê l e n u n ca m a is reco n q u istar á a


raca i n g l êsa.
'

A l iás p a rece-me a g o ra m u ito m a is p rovável q ue,


com o atua l m ovi men to p a ra o i nternaciona l ismo
e a tendência u n iversa l pa ra o materia l ismo d o pen­
samento e p a ra o l a icis m o na p o l ítica, a s a l m a s q ue
a nsei a m por u m a fé sobre n atu ra l, q ue é seu d irei­
to de s a n g u e, se verã o i m pe l idas, em todos os re­
ca ntos d o m u ndo, a buscar refúg io n a q u e l a l g reia
m u n d i a l , a ú n ica q ue con seg u i u conservá - l a .
De fato com eça m os a ver q ue êste e l e m ento es­
trangei ro permite a q ue m a b raça o cato l icismo u ma
l ibertação d o preconceito naciona l ista e o acesso a
u m a visão m u ito m a i s a m p l a das suas necess idad es.
E ntreta nto, em bora tudo isto se ven h a a verifi­
ca r no futu ro, presentemente é i nd u bitáve l q ue q u a l­
q uer q u e reg resse à I g reja Cató l ica tem q u e d issen­
ti r em g ra nd e pa rte da menta l idade rei n a nte entre
o povo i ng lês ; e só sob o ponto de vista nacion a l,
será forçad o a perder m u itos de seus m e l ho res
.

a m i g os.
Tudo i sto rep u g n a i m enso àq ueles pa ra q u e m a
I ng l aterra e tudo o q ue a I ng laterra sign ifica foi
sem pre o centro d e sua vida.
Pa ra q uem exerceu seus m i n istérios por a lg uns
a nos n a I g reja Ang l ica n a, êste duplo obst � � u lo cres­
ce de m a neira especia l . Ao torna r-se catol 1 co entra
para u m a I g reja m u nd i a l q ue possu i a experiência
dos tempos e o conhecimento d e · tôdas as nações;
mas ao mesmo tempo e ntra nas fi leiras dos q u e n a
200

I ng l at e r r a s ã o a tu a l m e n te u m a m i n o r i a ; e d aq u e l e
m o m e n to e m d i_ a n te é o l h a d o como u m estra n g e i ro.
Tod o s o s ca m i n h os p a ra se cheg a r à vida púb l i ­
c� n a I n g l ate rra , a be rtos p e l a I g re j a A n g l i ca n a, i m e­
d i ata m e n t e se fech a m pa ra ê l e . D u ra nte os meus ú l ti­
mos d i a s como A n g l i ca n o, vi m u i to da vida típ i ca de
a l d e _i a d a I n g l aterra ; e cada vez m a i s se me torn ava
evi d e n te q u e e u m e i a afa sta n d o d o q u e era por cer­
to u m a d a s m a i ores g l ó r i a s da I n g l aterra, suas a l ­
d e i a s c a m pestres com s u a s i g re j a s p a roq u 1 a 1s, e
q u e, d esvi a n d o- m e p a ra Roma, re n u n ci ava à mi nha
a n ti g a e s p e ra n ça d e reco n q u i stá - l a p a ra a fé, com
o a ux í l i o e boa vontade d o seu c l ero, m e i o i n a pre­
c i áve l d e e fetiva r essa espera n ça .
A l é n1 d i sso, eu s a b i a q u e tod os os m e u s l a ços
pesso a i s c o m a s U n ivers i d ades e Co l ég i os, com tô­
d a e s s a j uve n t u d e, n o b a i rro pobre de Lo n d res e
n o s g ra n d es c e nt ros i n d u stri a i s d e tod o o pa ís, que
me t i n h a m teste m u n h a d o t a n ta confi a n ça e cujas d i­
f icu l d a d es até ce rto p o n to me ti n h a sido perm itido
so l u c io n a r, todos êsses v í n c u l os se rom periam auto-
m à t i ca m e n i-e.
E, m a i s q u e tu d o, u ma p e rd a de o portu n id � d e
a i nd a m a io r s e m e a nto l h ava ao p e n s a r nas n:i u 1� as
a l mas e m q u e me fôra dad o p en e t ra r nas m 1s soo es� �
d as g ra nde s cida des. i ndu stria is em todo s os rec
tos d a I ng late rra , m issõ es que o ze o. e a com ! l�
__

gen e r
o i­
dad e dos An g lo-C ató licos, ta nto cl e rig os
go s I m e hav i am pos sib i lita d o em pre end er. d ºI Q
Q
cla reza via a p r ox i m a r � s e o
x1 l a d

Co m ass. ust ad ora em


ern q ue d evi a ca m ·1 n h ar qua se com 0 u m e
20 1
m i n ha. p róp ria terr a, p assa n d o pela s i g re ·i a s e p a -
róq u 1 o s o u t ror a t a- o q ue ri. d a s e qu e ag cr a me con -
si der a v a m com o u � estra ng e i ro ; pass a n d o a i nd a
p e l a s p o rtas d e m u itos l a res q u e se fech a riam ime ­
dia ta me nte p a ra m i m, q u a n d o n o pass ad o me aco­
l hiam com tão b o a s o mb ra .
Aq u ê l e p a ra q u e m a I g re j a Ang l ica n a ti n h a si­
do d u ra nte a nos o tea tro d e seus m i n istérios e o
centro d a s s u a s espera n ça s, i a ser tritu rado por uma
mágoa q u e as p a l avra s h u m a nas não sabem des­
crever.
Eu ti n h a s i d o forçad o a convencer-me de que
não era verd a d e a q u i l o e m q ue a cred ita ra até en­
tão, que n ã o e ra verd a d e q ue a I g reja Ang l icana
perma n ecera cató l i ca n ã o o b sta nte a Reforma, e
que nem e ra verd a de q u e o tem po removeria os obs­
tácu los q u e i m ped i a m a s u a reu n ião a tôda a Igre­
ja. E q u e, pelo contrá rio, a d u ra verdade era que
qualq uer atmosf era Cató l i ca q ue n e l a a i nda su bsis­
tisse e ra d evid a a o n ú mero relativ a mente l i mitado
de " a l m a s natu ra l me nte catól ica s " que se agarr a­
va m a c re n ça s q ue e u agor a me via força do a
ab an do na r.
O utro p onto q u e e m cert a épo ca mu ito me preo ­
c u pav a e ra o fato d e a I g reja Cató lic a com . ta n � a
f re q uên cia se i ns u rg i r con tra g ove rno s nac io nai s,
s e n d o ta nt as vêze s por ê l es perse g u ·i d a e n ao ..., ra ro
ex pu ls a d e u m pa ís.
P a r ec ia q ue d evi a h ave r a l g u m a coi s a err ad a
n u m s ·i ste ma . q ue com ta n ta f req u e n c ·1 a s e vi a e m co n-
"
202

f l ito. co m r e p res e nta nte s l ivr em e nte


e l eit o s da v 1'd a
nacional.
S u s p e ita va eu q u e a g ra n d e au tor ida
s e v i a d o t a d a a 1 g re 1 a Ca tol 1 ca te nd i a de d e q ue
c a sta s a � e r d ota l po d e ros a, ca pa z d e ob strucri a r u m a
a

·

, •

.
i r 0 pro ­
g res so c1v 1 I .
Ac hav a - m e poi s tod o ao l ado d e u m a exp
s ã o d e a uto rida de sac erd ota l men os pod erosa res­
e
f e n d i a o s i stem a A n g l i ca n o n o q u a l hav ia com pde­
ro­
.

m i sso e ntre o pod er e c l esiás tico e o secu lar. J u lga va


q u e fô ra isso q u e p rese rva ra a po l ítica inglê sa de
q u a l q u e r vio l ê n c i a a nt i c l e r i ca l e faci l itar a à reli­
g i ã o p e n etra r em tod os os setore s da vida nacion a l.
D u ra n te êstes ú lti m os a nos meu modo de pen­
s a r m u d o u m u ito n estes po n tos . Com a crescente se­
c u l a ri z a ç ã o d a vida p ú b l i ca , torn ava-se cada vez
m a i s c l a ro q ue d ever i a h aver a l go d e muito mu nda­
n o e a n ti cristão em u m a I g re j a q u e n u nca se levan­
tava d i a n te do Esta d o em defesa do sobrenatural na
fé e n a m ora l .
Como Nosso Sen hor fundara a Sua I g reja co m
Autorid ade d ivi n a para orient ar o mundo n a fé e
n a mora l, se n u n ca houv esse surg ido q u alqu er o po­
s ição às sua s l eis, isto seri a prova de que . o seue 1 tb­o d
J.
jeti vo fôr a coi sa sup érf l ua. Ma s ê l e h.av1a p .
d e m a n e i ra inc on tes táv el qu e tal � onfl i tod se di � �� �
" Cu ida do co m os ho me ns . . . Ser eis levad eosm .i m 11

d os g ove rna dores e d os reis por cau s a


n te p o r
·
·

Vi afi n a.l q u e a l g re .1 a e a t ,
0 r! . ve 1 m e n t e e n -
ca , 1 u s t a m e
ser a g u a rd 1 a . d o so b ren a t u ra 1 1 n ev1 tam u n d o e s era,
'
,

- /

trará em confl i to com os go ver n os d o


2 03
p e r se g u i d a i n e.x oràve l m e n te por aquê l es cu jos j u í­
z o s d e ve m e stri b a r-se, a ntes d e tud o, n o p l a n o n atu­
ra l .
Tai s conf l i tos e p erse g u i ções constituem u m si­
nal da Cruz, s u rg i n d o d a opos i çã o q u e o sobrenatu­
ra l d everá oferecer ao natu ra l ; e q uando ta l oposi­
ção não exi ste, as m a i s d a s vêzes é porque a rel i­
gião não é- rea l . N as I g re jas nacionais é quase im­
possív e l que essa o p os i çã o i n evitável seja eficaz.
Dêsse m o d o, tôd a a recente l eg islação na As­
sembléia da I g re j a q ue tende a dar mais a utorida­
de aos Co nsel hos paroq u ia i s e ao laicato em gera l,
coi sa q u e e m o utro tem po e u j u lgava m uito sen­
sata, agora me p a reci a u m êrro m uito g rave e
fato 1 .
Na p rática d estru i ria seus próprios fins. Visa
conq u i sta r respeito e pop u l a ridade do público, dan­
do- l he m a ior a utoridade, mas o ú n i co resultado é
uma d i m i n u ição p ro porcional na crença do p ú b l i­
co e m q ua lq ue r Autoridade d ivi na na I g reja.
Na rea l i d ad e, a verd a d e, o certo é o contrá rio
de ssa tra ns i g ê n ci a com a a utoridade . A ú nica I g re­
ja q u e h o j e m a ntém os seus adeptos é a . I g reja � � ­
tól i ca . I sto porq u e e l a poss u i u ma � � to � 1dade d 1v...1-
n a à q u a l seu s fi l h os pre stam obed 1 enc1 a. espo nt� ­
ne a. Pos s u i n d o esta a utor idad e, n u nca h es �ta em d i­
zer tô d a s a s verd a d es a g over nos e a reis.
A me d i d a q u e p ros seg u i a me u m .i nis té � io, eu
se n tia q u e se tor nav a cad a vez ma is1 r mp entneosdae f?1-
n e ce ssid a d e de a l g um a Autor ºi d a d e c a r a me d
n ·1 d a . I sto e ra ó b v1 0 , nao so, em q ues tõe s d e
· -
out ri· -
20 4

n a , se n ã o ta m bém d e mor a l : por exem plo


q ue s t-oes d e 1·1 m 1 taça- o d a p ro 1 e e d o d ivór cio n a s
,

n o u -s� ca d a vez m a i s i m poss íve l arvo ra r qu a lq O r-


ue
p a d ra o sob re n atu ra l s e m u ma Auto rida de d ivi n r
a 0
n o s a m pa ra r p a ra d a r- l he fôrça e s i g n i f icad o.
Torn o u -se avass a l adora m e n te c l a ro q ue em to­
d os o s p ro b l e m a s d e ca sa m ento ou de sexo nada se ­
n ã o u m a A u to ri d a d e d ivi n a poder ia l eva nt ar ba rre i­
r a à o n d a q u e i m pe l e a socied ade para u m n íve l pu­
ra m e n te p a g ã o .
E a ú n i ca soci edad e q u e pos s u i u m a Auto rida ­
d e d iv i n a ca p a z d e sa lva r a n ossa civi l izacã o é a ,

I g re j a Catól i ca .
O utra co i sa q u e co m eçou a d e i xa r- m e perple­
xo n o trato co m as a l m as foi a necessidade de qual­
q u e r co i sa q ue p u d esse refre a r aquela escravidão
d a m od a m o d e r n a q u e l eva ta n tos ao prurido de
c h a ma r a a te n çã o p a ra o seu meio . A vida de hoj e
e m d i a é teci d a n ão raro d e u m a série de moda s
e d e fa n ta s i a s d e pouc a d u ra . Todo s c e d e m víti mas
d es s a ú l ti m a l o u cu ra . 1: pre ciso ser ori g i n a l . Sua s
e bus ­
v i d a s con ve rte m -s e e m pe rpé tua afe taç ão
e s er

ca n d o s e m p re a ú lti m a n ov ida de dei xam e u m ª
st as
ho i·e o qu e fo ra m - on te m. U m a vid a de p ar a a ref l e -
vo o . N a-o h a , t e m po
xa- o tu d o é mo vim en to s up 1 c 1 a 1 a 1 es t a, - s e p e rd e n
co rre ri a sem tro . . co m n o m e d e p r o -
er f
g re sso . A ve rd a d e i ra v i d a pe ss?
' •
-

o� f
d o . I sto se vê cla ra me nte n a � d a Ç ª a r e a f i na l
1 s s _ d o lar in-

g lês. Não há temp o p a ra ª. v i


·

d �o mu� e a sua
d e c ontas o l a r co m . ª su a vird a er ra vi d a e d o c a ·
d�
d i scip l i n a é a g a ra nt ia da v e
205
ró te r. T u d o i sto se ref l ete, .n a I g re ja Ang l ica na . � e,
em e 1 e� a d o � ra_u , u m a v 1 t 1 m a d a épo ca e m qua l-
q u e r cir cu n sta nc i a q ue s e a p re sente . Em seu e m pe­
n h o de e nfre nta r a s d ific u l d ad es da men ta l ida de
m oder na está d em a s i a d o i nc l i n ad a a abra ca ' r e a
p res tig i a r as i d é i a s e teori as mom entâ nea me nte cor­
re ntes e a d a r- l h es u m a i mportâ ncia q ue rea lmente
não se j u stifi ca .
O ú ltimo p l a n o pa ra a mel horia socia l, as ú lti­
mas teorias em psi co l og i a , os ú lti m os resultados da
c rítica Bíb l i ca são p rega dos d os seus p ú l pitos, es­
creve-se sôbre êles e são d ebatidos em reu n iões de
uma manei ra q u e obscu rece a s verdades da rel i­
g i ão cri stã .
O resu ltad o é q u e a I g reja Ang l ica na apresenta
o aspecto de u m a socieda d e d e debates a d iscuti r
questões abertas, em vez d e se apresenta r como
mestr a das verd a d es eternas reve ladas por Deus pa­
ra a orienta ção d a vida espi ritua l do m u ndo.
Vi como a I g re ja Catól i ca, conserva ndo sua
id e ntid ade através d os tem pos, era, entreta nto ,
e ter nam ente a pta pa ra e n ca ra r cada nova fase do
p en sa m ento e da vida, a bsorven do o que fôsse ver­
d a de e rejeita n d o o q ue fôsse erra do.
E as sim , te ndo-a visto p reserva r cónsta n t ��_: n­
t e o s s eu s fi l ho s de u m i rriq u ieto tu m u lto de op1 n 1 � es
p a s � a g eira s, comecei a cap acita r- me, com m a i or
a c u i d ad e q ue a n tes, d o q ue sig n ifica va ? fa lta d �
t a l t u tel a . To rnei-m e ca d a vez mais côns cio do efei ­
to_ m o r t al d essa vag a i n ce rteza d e q u e a I g re
ja An ­
g l i c a n a c er c a os seus fi l h os, a té q u e fi na l m ent e me
20 6

c o n ve n e c i d e q u e e l a estav a e m p l e n a contr a d i cã
' o
c o m a vo n ta d e exp ressa d e Nosso Sen ho r.
N ã o l eva à verd a d e, m a s si m a u m a terrív e l in ­
c e rteza e a u m a ve rd a d e i ra pa ra l i s i a d a fé.
A p o b re n a t u reza h u m a n a p recisa m a is q u e tu­
d o de u m a o r i e n ta çã o q u e a e l eve a c i m a das he­
s i t a ções d a m e nta l i d a d e h u m a n a e d o d i l úvio das
p a i xões h o d i e r n a s . E s à m e n te a I g re j a Ca tó l ica 0
p o d e rea l i za r.
E: q u a se i m poss íve l d escrever o processo pelo
q u a l s e c h e g a à certeza em q uestões da a l ma. Só
p osso l e m b ra r m u i to p o r a lto a evo l ução das coisas,
c o m o e l a s se m e a p rese nta m h o j e .
D u ra nt e os a n os q u e s e seg u i ra m à m i n h a visi­
ta a L i s i e ux, d u a s co rre ntes tra b a l h ava m lado a la­
d o e m m i m . De um l ad o o estu d o da Escritu ra e tô­
d a l e i tu ra q u e e u conseg u i a l ev a r ava nte, e de outro
l a d o u m a g ra d u a l e crescente confi rmação de que
tudo o q ue eu h av i a e n co n tr a d o na Escritu ra cada
vez se c o r ro b o rava m a is p e l a m i n h a experiência das
a l m as n u m m i n i sté r i o m u i to va r i a d o q u e a bra ngia
q uase tod os os t i pos da v i d a i n g l êsa.
E m u ito d if íc i l dete rm i n a r a g o ra com exat id ão

o pon to em q ue n ovos fato s exer ce ra m m a i or i nfler­
xo psic o l óg ico, e os pas sa d os o com eça ra m a pto u
d e r ou a i n da em q ue pon to a co nvi cç ão sup lan
,

a i ncerteza.
Na p r i m e i r a fase a qu es tã o tô da se res ad uz t ª
ia
u m a va g a d úv ida n o fu nd o d o me u p en.i n ar�t0" :�
t ão va g a q ue só pe ra nte a lg u m fat o d et erm
2 07
as s oc iaç ã o d e i d é i a. s e .l a vi n h a à ton a : por exe m p 1 o,
ca to 1 .� c � síl} O o u o o uvi r f a I a r d e a lg u m a con ver são ao
0 p as sa r por u m a 1 g re 1 a cat ó I ica ; o ler a lgo sôb
. . re o
ca to l 1c1 smo.
Tôdas esta s cois as com eça ra m a i nfl u i r em 111 i m
pois �� � s p od i a . � elac iona r com a m i n ha próp ri �
experienc1a e m L 1 s 1 eux. Repe tida ment e lemb rava m­
me que e ra ao cato l icism o, como eu o havia visto
lá, que e u d evi a a m a is profu nda experi ência so­
brenatu ra l d a m i n h a vida .
A seg u nd a fase deu-se qua ndo vagas dúvidas
se torna ra m i nce rtezas d efi n idas, ao passo q ue não
havia q u a l q ue r certeza do outro lado para as neu­
tra l iza r. No pri ncípio h avia m u ito m a ior pêso para
o l ado d o Ang l o-Cato l icismo e d a I g reja Ang l ica na .
Eu p rocu rava todo o tem po um apoio pa ra a
m i n ha p rópria opi n ião e sentia-me incl inado a ver
a ntes a s fa l has do outro lado : temendo sempre que
os a rg u me n tos cató l icos se mostrassem irrespondí-
.

veis.
D u ra n te esta fase era nece ssá rio gra nde esfôr­
ço p a ra tom a r u m l ivro q u e favo rece sse à outr a par­
te ; e ra ta mbé m m i ster eno rme esfô rço de von.t ade
p a ra l e r q u a lq u e r cois a q ue me leva sse a ma 1or � s
d ú vid as, coi sa q ue eu tem ia ma is � o que tu do, _ poi s
ti n h a mu ita esp era n ça de desco bri r que as m i nha s
opi n iõe s e ra m certas.
De ve z em q ua nd o eu co ns eg u ·i a po r tnuao " do de
q ue s t oe
- s q u e _ h a-
lad o po r u m tem po , po is e ra m
via m ch eg a d o a i n d a a a bso rve r-m e d e tod o .
208

N esta f ? se a p o i ava - m e em q u a l q uer a rg u m en­


t o ou receb i a com e n t u s i a s m o q u a l q ue r pessoa que
m e d e s s e u m a exp l i cação das co isas.
Ma s cresc i a a i n certeza e m u i to l en tamente tôda
a q u estão s e to rnou avassal ad ora, e só ela a bsorvia
o s m e u s p e n s a m e ntos . Tudo ag ora se torn ava i n ­
c e rto . C o m ecei a ve r q u e eu estava perdendo a fé
n o q u e me e ra m a i s ca ro e, no enta nto, n ada ga n h a ­
v a q u e p u d esse tom a r o s e u l ug a r.
E ra co m o se m e movi menta sse n u m nevoe i ro
i m p e n et ráve l . Como pod e ri a eu j a m a i s vo l ta r a o
esta d o d e ce rteza ? Cheio d e d úvidas q u a nto à m i ­
n h a p ró p r i a pos i ção, e u estava i g u a l me nte i n certo
d a s re iv i n d i ca cões c a tól icas. Le mbro-m e de ce rto
I

d i a , n u m p a sse i o, ter para d o d e re pe nte, di zendo


p a ra m i m m es m o : Pod e rá h ave r i n certeza mais p ro­
/1

fu n d a d o q u e esta ? Se a l g u m d i a eu recu pera r a cer­


teza, s e rá seg u ra me nte coisa sobre n a tu ra l " .
E a ca d a m o m e nto, q u a n d o tudo o m a i s era i n­
ce rto u m a c o i s a me pa recia te rrive l mente c l a ra : era
a a p � re n te r u í n a d e t u d o na m i n ha voca ção se por
f i m R o m a " t i ves se raz ão.
/1

M a s m u i to m a i s d u ro a i n d a , era o pês o d a . res­


p o n sa b i l id a d e q u e me o p ri m i a ao pen sa r
na tr1 � te­
ar a � u 1ta s
z a e d e s a p o n ta m e n to q ue i ri a oc as ion
E de ve r-s e-1 0 ar-
a l m a s q u e m e j u l g a r i a m d es � rto r.
za ?
r i s ca r t u d o i sto só p o r u ma i n ce rte
. . e m m e u p e n s a-
N e st e p o n to, a ú n i ca co i sa ce

ta
ve r i a co n t i -
fo,.. sse ca p a z d e r ea 1 ·1 z a- lo , q u e n ã o
o m eu tr a b l h o de
m e n to e ra q u e to do
n u a r e n q u a n to e u
,
20 9
d e ve ri a m o ve r-m e aentes d e n1 e s e ntir a b s o 1
t e i m p e l ºd
1 o a isso . o m e f e .ito , l a nça r m u ·1 to u ta m e n-
.

os e n a co n f us ...
ao e m s o u tros
o
n . c a � ter u ma co nv i cçã o ce r-
tís s i m a , seri. a u m a tem e ri d ad e tre me nda .
Se ª a lg. u é m p a re.ce r q ue pr ot ele i de ma siad o
m e u m 1 n 1 sterio d e e ns i n a r e p regar , pe ço que re fli­
. . _ 0

t a u m mo m e nto sob ,. re a tre me nda res


pon sab i l id ade
que eu con tra i ri a per m itin do q ue qua lq uer d úvid a
p a$ sasse d e m i m p a ra os outr os, ante s de eu sabe r
s e a d úvida seria perm a nent e . Ta nto q ue deixe i de
pre gar, mu i tos começ a ra m a fica r preoc upa dos. Che­
garam ao extremo d e escreve r aos jorna is rel igio­
sos indagando a razão d o meu si lêncio, e por al­
gum tem po tive q u e vo lta r à pregação públ ica para
acalmar essas d úvidas e temores. t: q ue cheio de in­
certezas eu não pod i a conseg uir a convicção ne­
cessá ria para d a r u m passo, q ue iria i nfluir sinistra­
mente em m u itos. E ra rea l mente u ma situação ter­
rível .
Pa ra os q u e sem pre fora m cató l icos � ? ifícil
c o mp reen d er com o t a l i ri cert eza pude sse ex 1st1 r.
Com a I g re j a Cat ól ica a am par á-l os e a f� imu ­
táv el a p a uta r a s sua s vida s, dev e ser q uase imp os-
sí v e l que o com preen d a m .
. i o ade
ex a gO
q u e d e ixo escr ·ito aci· m a par ec er á i n díc
e rad o senso d e respo n sa b i l i da de . Ma:, jura ca
n-
d o a a ut orid ade ec le s i á st ic a é tã o va ga e ta o e a
c o m o é a l g re 1·a Ang l i ca n a, o 1 n d "i vi' d u 0 a ss u m ·to i
m a .i o r .1 m p ortâ n c .1 a e a per so n a 1 ·1 d d t e rr: m uau
·

m a ·i s ·1 n fl uên ªt ol
, �
-
cia d o q u e n a 1 g r e •1 a C a 1 c a ' o n d e
U m S e n h o r,
14
21 0

tori d a d e e u n i d a d e to rn a m o i n d ivíd uo m a i s d ep e n ­
de nte.
E ra j u sta m e n te êste a s p eto te rrive l m e nte i nd ivi ­
d u a l d o m e u m i n i sté r i o u m a d a s ca usas q u e me l e­
va ra m a ve r tão c l a ra m e nte a fa l ta d e autoridade
e d e u n i d a d e n a I g re j a A n g l i ca n a .
N e l a a p e rso n a l i d a d e dese m pe n h a u m papel d e
d e m a s i a d a i m po rtâ n c i a . As verd a d e i ras re l a ções d a
perso n a l i d a d e i nd ivi d u a l pa ra c o m a I g reja consi d e­
rad a c o m o u m tod o, n ã o são com pree n d i d as pel os
Ang l i ca n os. Por i sso criticam ê l es severa mente a ne­
cess i d a d e de s u b o rd i n a r o i nd i víd uo à vida da l g re­
ia Cató l i ca . Mas ta l s u bo rd i nação é i nd ispensável
em tôd a Sociedade q u e p ossua q u a l q u e r sombra de
a u to r i d a d e e u n i d ade.
" Se fu l a n o se co nverter p a ra Ro ma, será o seu
fi m " Q u a n ta s vêzes ouvi esta frase, qu ando rea l­
.

mente a ve rd ade é q u e, ao to r n a r-se cató l i ca uma


pessoa, e n co ntra a s u a verdad e i ra re l a ção com tô­
da a I g re j a e fu nde-se na g ra n deza do seu carater ,
e da s u a v i d a .
O ut ra coisa q u e m e reve l o u nessa a l tu ra quan �
to e u m e i a afa sta n d o d a m i n h a a ntiga posiç ão : fo i
s enti r q u e j á n ã o pod i a respo nder a certo s
prob l e -
. s
mas e perg u ntas n e m a 1 u d a r o prox 1 mo e m ce rta
' ·

dificu l da d e s.
pe r-
Com o p od e r i a e u res pon d er a q uem m e
,. d ife re nt e s
gu nta sse p o r q u e ca d a b"1 s po ens ·i n a va .
. q ue m d e v iam
doutri ri a s ? Co m o po d e r i a eu .1 n d "1 c a r a
21 1

as a l m as obe dec e r, q u a nd o n ã o hav ia voz q ue as


g u ia sse ?
Com o pod e ri a e u responder a perg u ntas dêste
gênero q u a n d o esta fa lta de a utoridade e de u n i­
dade q u e e u via na I g reja da I ng laterra estava a
marte l a r meu cérebro o d i a i ntei ro ?
As vêzes receava q ue a lguma fa lta de h u m i lda­
de ou d e a prêço pelo m i n istério q ue me fôra con ­
fi ado fôsse a ca u sa de e u m e tornar tão i n seg u ro e
i ncerto sôb re a m i n ha m issão. Os a m igos i nte rvi­
nham para me sig n ifica r q ue provàvelmente a m i n h a
hesitação era devida a q ua l q uer obsessão psico ló­
gica ou a u m temperamento n atu ra l mente vaci l a n te.
Outra coisa a i nda a u me ntava a confusão em
que me achava : era a va riedade de suposições q ue
se faziam q u a nto a os motivos que me g u iava m . D i ­
ziam u ns que eu estava cedendo, deserta ndo, b us­
ca ndo m i n ha própria sa lvação à custa dos outros,
ataca ndo a l i n ha de menor resistência ; outros decla­
rava m q ue eu estava tom a ndo um ca m i n h o pato l ó­
gico de sacrifício, q ue ti n h a u m gên io auto-tortu­
rante. Ma is a i nda, d iziam-me u ns que e u era eg oís­
ta porque em Roma não e ncontra ria empeci l hos e o
meu m i n istério a í seria mais fáci l ; a o passo que ou­
tr os d iziam q ue n o momento em que me tornasse
cat ólic o, eu já não seria de n en h u ma uti l idade. E
a ssi m pros seg u i a m a s coisas até fi n a l mente me con­
ven ce r que e ra i n úti l conti n u a r a ouvi r quem quer
q u e fôs se .
. Mais a rrasadores, porém, eram a i nda o.s �ue
d i zi a m que ta l revi ravolt a poder ia ta lvez a n iq u i lar

14
21 2

d e tod o a m i n h a fé, aca b a n d o por me leva r a o


a g n os ti ci s m o, p o i s se h o j e eu ti n h a d úvidas q u a nto
ao A n g l i ca n i smo, poderia tê- l a s a m a n h ã q u a n to a o
c a·t o l i c i s m o ro ma n o . Dizia m-me conti n u a m e n te que
a q u ê l es que se co nve rt i a m a Roma era m fe l izes só­
m e n te por a l g u m te m po e depois se d es i l ud i a m pa ra
fi n a l m e n te p i o ra rem .
I sto m e fo i d i to espec i a l mente por a l g u ém q u e
m e a co n se l h a ra m a co n s u lta r, po i s sua sa oed o r i a e
i d a d e ava n ça d a d ava m pêso co n s i d eráve l às s u a s
o p i n i ões.
Vi n d a de ta l pessoa, sua opi n i ão fo i esma g a d o­
ra, a té q u e, ao l e r a v i d a d e J a n et Ers k i n e Stu a rt,
ve rif i q u e i q u e q u a ndo a m a n d a ra m a co n se l h a r-se
c o m G l a d sto ne, em idêntica s ci rc u n stâ n ci a s, ê l e l h e
d i ss e ra a mes m a co isa, i sto é, q ue ta l pa sso s i g n ifi­
c a r i a r u í n a e s u i cíd i o m o ra l e esp i ri tu a l .
M a i s ta rd e tor n ou-se e l a Mad re Gera l d a Co n ­
g re g a ç ã o d o S a g ra d o Coração, o q u e mostrou q u e
o d es a s tre d e q u e eu t i n h a s i d o p reve n i d o n ã o se
s e g u i a i n ev itàve l m e n te ao passo q u e te n c i o n ava d a r.
M a s, n a q u e l e te m p o, t u d o i sto m e d e p r i m i a,
m a is do q u e se p o d e e x pri m i r, e m i n ava a m i n ha
coragem.
Gra d u a l mente, entretanto, fu i passa ndo para a
fase seg u i nte - aquela em que a certeza começava
a se fazer sentir.
A prin cípi o era a pen as uma cres cen te �o nv 1 c-
.

ção d e q u e não h avia resp osta ao que a lgre 1a C�­


tól i ca re ivi nd icava, nem exi stia a rg um ent o de esp e -
21 3

c i e a l g u m a e m f a v o r d o A n g l o - C a to l i c i s m o e
q e,
n ã o o bsta n t e t o d o o b e m f
q u e n ê l e h avi a ' est a va o
-
ra d a I g re j a C a tó l i ca .
N e � te p o n to d a m i n h a ca m i n h a d a , t u d o 0 q u e
e u s e n t i a e ra u m a ce rteza i n te l ectu a l q u e a p r i ncí­
p i o n ã o i n f l u i u e m q u a l q u e r o u tra p a rte da m i n h a
perso n a 1 i d a d e .
M e u c o ra ç ã o e m i n h a vo n t a d e estav a m a i n d a
p resos a tôd a s a s a ss o c i a çõ e s d a m i n h a v i d a p a s s a d a .
E u p o d i a ve r a ve rd a d e d o q u e d i z i a a I g re j a
Cató l i c a , e , e ntreta nto, i ss o co m o q u e p a reci a fo ra
da m i n h a v i d a p esso a l d e m o d o m u i to cu ri oso.
E, e n t ã o , d e u m a m a n e i ra m i ste ri osa, ta m b é m
i sso co m e ç o u a m u d a r, e ca d a p a rte d a m i n h a p e r­
so n a l i d a d e e d a m i n h a v i d a e r a i nvad i d a p o r pe­
q u e n a s e i n cessa n te s co n f i r m a ções da verd a d e i n ­
te l ectu a l q u e a té e n t ã o ti n h a esta d o fora d e m i m .
Peq u e n os i n c i d e n tes, c i rcu n stâ n c i a s e m q u e m e
ach a va , c o i s a s q u e d i z i a m, pessoas q u e e u e n co n ­
trava , c a rtas q u e e u rece b i a , t u d o co meçou a a po n ­
ta r d e ce rto m od o a c u m u l a tivo, p a ra u m a mesma
d i re cã o .
,

Livros q u e e u to m av a o u m e e r a m d a dos p a ra
ler a fi m d e seg u ra r- m e t i n h a rn u m efei t o i ntei r a m e n ­
t e con trá ri o. E, a esta a l tu ra, sern q u a l quer esfôrço
d a minh a pa rte, por u m p roces so clara me nte i nde­
.
p e n d en te d e m i m cad a coisa come ca va a ca i r. em
' ,

s e u l u ga r com ra p idez s e m p re m a ior, e torn e i-me


d e s a p ai xon a d a m ente con ve n c ido de q ue só po de­
r i a h a ve r u m a sol u çã o, u ma ver dade ce ntra l .
21 4

_ E n q u � n to posso j u l g a r, n u n ca tive q u a l q u er a t ro ­
ço o e m o c i o n a l p a ra com a I g re j a Ca tó l i c a . T i n h a s i ­
d o t u d o u m a co n s c i ê n c i a g ra d u a l m e n te cresce n te do
res u l ta d o i n ev i táv e l de me ve r fa ce a fa ce co m o
q u e, c o n t r a tôd a s a s m i n h a s i n c l i n a ções n a tu ra i s '
d es co b ri a s e r a ver d a d e .
A l g u n s m e d i z i a m q u e eu estava fa sci n a do pe l o
" fe i t i ço " d a v i d a re l i g iosa Cató l i ca e pe l a " m a g i a
de Roma " .
Mas, p a ra m i m , ta i s fra ses n a d a s i g n i f i cava m -
e ra u m a l i n g u a g e m q u e eu n ã o co m p ree n d i a . A
ú n i ca a tração pa ra m i m era q u e a I g re j a Cató l i ca
e ra o s o l a r d a Ve rd a d e . Pou co te mpo d e po i s d e i o
p r i m e i ro p a sso n a i nte nção de sepa ra r- me d e tôd a s
a s a s s o c i a ções d o passa d o ; e de ixei a Co m u n i d a ­
d e, a f i m d e p a ssa r u n s tem pos n u m v i ca ri ato fora
da c i d a d e p a ra u m pouco d e re pouso e q u i etu d e .
N o m o m e n to e m q u e d e i êsse passo d efi n i tivo
s u ce d e ra m d u a s co i s a s . Pri m e i ra m e n te tôd a a c l a ­
rez a d a v i s ã o, tô d a a vív i d a con sci ê n c i a d a ve rd ade
q u e e u t i n h a me d esa m p a ra ra m . E u s a b i a tão só­
m e n te q u e ti n ha p a rt i d o p a ra u m a j o r n a d a i n evitá­
vel e q u e h avia a pe n a s u m a coi sa q u e faze r : mas
tod os os m otivo s p a ra a fazer p a reci a m ter d esa-
p a recido.
A seg u n d a cois a foi que todo s os q u e est ? va m
en­
m a is l ig a d os a m i m ver ifi ca ra m q u e o s a co n tec1 meles
tos se i a m tor n a ndo ma is def i nid os : e to d os ..

l a n ca ram m ã o da que le g ra nde a pêl o fi n a l , de to ­


' il d e sup ort a r, o a pê lo_ em p ro l de
do s o m a is d ifíc
ue m e u ta nto a ma v a e q u e se
tôd a s as a l m a s a q
21 5

v e ri a m d esori e n ta d a s se e u d esse o pass o defi r.�­


tivo .
" Pa rece- m e q u e a l g u m sacrifício pessoa l é ne­
cessá rio d a sua pa rte em benefício dos q ue depen
dem d e você " , foi o q ue me escreveu um d os meus
1nel h ores a m igos. O utros d izia m que dá mostras de
verdadei ra cora g e m o q u e perma n ece onde está e
não o q u e a ba nd o n a o n avio q ue sossobra : ou com
1n uita d e l i ca d eza i ns i n u ava m q u e d everia h aver a l­
g u res egoísmo o u fa lta d e a mor pa ra eu pensar em
fazer uma coisa q ue i ri a feri r ta ntas a l mas.
Poderia um homem, p a ra q ue m o a pêlo de u ma
alma e m d ificu l d a d e h avia sempre sido u m í m ã i r­
resistíve l, experi menta r a g o n i a m a is confra ngedora
do q u e ser cen s u ra d o d e esta r l a n ça nd o sem n eces­
sidade sôb re a s tristezas cruéis do m u nd o pe nas a i n­
da m a i s esm a g a d o ra s ?
E d izerem-l h o p recisamente q u a ndo todo o seu
ser se nti m enta l a ns i ava p o r o n ã o fazer e q u a ndo
todo o pêso da consciência e a l uz das razões por
que deveria fazê- fo pa recia m ter-se escondid o, era
rea l mente terrível .
Co mo s e e ng a n a m os q u e com ta nta faci l i d ade
fal a m d o " d eserta r pa ra Rom a " os q u e e m p u n h a � ­
d o p ena fluente a n a l is a m d o lado de fora os moti ­
vos d e o utra a l ma e m s u a h o ra de p rova çã o, a ssoa ­
l h a nd o a o m u nd o tod o a títu l o d e con tras te com o
êle s m es mo s esti ver a m e m per i g o d e d a r o me sm o
P ? � s o , sen d o po rém d eti do s po r u m a exp er; ê nci a es­
pi r it u a l m a i s profu n d a !
216
Q u ã o p o u co co n h ecem o m i sté rio sôbre o q u a l
escr � ve m ! C ad a u m a d a s s u a s fases prova q ue n u n ­
ca t i vera m a m í n i m a co m p ree n são d o prob l e m a .
U m d êsses c i to u a passa g e m d e u m d os m e u s l ivros
a fi m d e m ostra r q u e e u ti n ha " i d o para Roma "
porq u e m e fa lto u a q u e l a exp e r i ê n c i a es p i ri t u a l que
ê l e p res u m i a ter t i d o : o caso é q u e nessa passagem
eu fa l ava d e u m a experi ê n c i a n ão es pi ritu a l , mas
emoci o n a l ; o q u e êle não cheg o u a com preender.
U m p o r u m , pesso a s e l u g a res ati ng i d os pelo
meu caso, d esfi l ava m a n te meu esp írito . A l mas q u e
eu s a b i a estava m l u ta n d o co ntra a l g u ma gra nde
ten t a ç ã o ou a l g u m a d ifíci l p rova ção em seu l a r ; o u ­
tra s q u e j a z i a m i n c u ráve i s e m u m leito d e dor : jo­
ve n s q u e a pe n a s com eçav a m a ver e a entender; pa­
róq u i a s o n d e e u d e ra m i ssões e onde vi gári os, com
os q u a i s estivera e m co n tato, ter i a n1 q ue fazer fren­
te a g ra n de s o bstá c u l os e n ã o poderi a m deixar de
sentir q u e fa l h a ra u m e m q u em h avi a m confi ado.
T ud o isso perpa ssava pe l a 111 i n h a mente . Mas,
pior q u e tudo, o s ofr i m e nto m a i s p u n g ente vi nha do
fato de m u itos dêle s j a m a i s com p r e en de r em que � ra
iusta m e n te o meu amo r p a ra com êl e � q u e me i m ­
pe l ia a faz er aq u i lo mes mo q u e pa reci a prova r- l he s
que e u já não me i nte res sav a pel a s u a s or te .

N u nca pod eri am con ven cer -se d e q u e. e . eu n��_

po de ria tra i r po r qu a lqu er fa lta de s 1 nce � 1da d


nç a qu e
fu ga da ve rd ad e em me u mi nis tér io a co nfi a
d epo sita va m e m mim .
r e b e la r a m
_

Tôd as as m i n h as af e1 co
.

es h um an a s se
e l h as
d ian te d esta h o rrí ve l co nti ng e nc ia : t0 d a s a s v
.
"'
,. ·
'
21 7

a ssoc i aç õ es c l a m av a. m a o me u co rac ão m · n h a
. 1
" e e m p e r i g o d e ce d er a nte a · to rm en v en -
,

ta d e es t ev ta .
Ma s h o u ve q u a l q u er co isa q u e ve io em me u so
co rro . D u ra nte os ú lti mo s a no s eu ti n ha vis to ou ­­
tros _ a b ra ços co n1 a me sm a situ açã o ; ent re êst es
havi a q u atr o a l ma s m u ito d e l i cad a me nte afi nad as
que h avi a m s i d o forç ad a s, cad a u ma, a faze r face
ao . m e s � o. co n j u n to d e ci rcu nstâ ncia s que pare ciam
ma i s t _1 ra n 1 ca s e d o l orosa s em seus caso s parti cu la-
res.
Fiq u e i com o q ue fora de m i m ao ver os sacri­
fícios q u e tivera m q ue enfrenta r e fazer, e à med i ­
da q u e a s via passa r d a l uta e da obscu ridade à
certeza e à l uz, convenci-me d e q ue aqui a l guma
coisa d e i negàve l m ente so b renatura l suced ia ante
meus o l h os. N a d a menos q u e isso me pod eria ter
m i n i strad o fôrças pa ra a g uenta r o combate, nenhu­
m a outra coi sa pod eria ter d ado a persevera nça até
ao fi m .
A cora g e m d essas a l mas deixava-me envergo­
nhad o d a m i n h a fraq ueza. Outros sem conta estão
c erta mente p a ssa n d o pel a mesma agonia, mas não
d is põe m d e m eios p a ra dá- l a a con hecer ao próxi­
m o e a ss i m p a ssa d esperce bida a sua l uta . E , ! á
q ue me ped i ra m q u e fizesse u m a decl a ração, dese 1 0
l an ça r mão d êste exped i ente a fi m d e a j uda r h_? ­
me ns e m u l h e res a com p reender q ue esta que stao
é u m a voz d e N osso Se n h o r às a l mas. De qua l que r
m a n ei ra sig n ifica n ã o pe q ueno sofr i m ento e qu er o
sup l i ca r q u e q u a n d o s o b revier u m c h a m a men to co­
m o ês te, os a m i g os e p a re n tes q ue o con hece r em fa -
21 8

ça m d ev e ra s t u d o o q u e p u d e rem pa ra se cer
tif ica ­
re m . d a s u a v e rd a d.e, e n u n ca o ten h a m por
mer o
c a p � 1 c h o o u fa n ta s i a n e m te n tem v i o l e nta r 0 s a
n
t u á r i o d a s consc i ê n c i as e m o u tras pesso as .
_

A l i be r dad e d a a l m a é a m a i o r dád iva de Nos­


so S e n h o r a o h o m e m . Te n h o v i sto freq u e nteme nte co­
m o n esta q u estão pa rti c u l a r se i n c l i n a m os i n g l ês es
a n eg a r à q u e l es, a q u e m a m a m , a l i berda de da
a l m a.
A a l m a é co i s a d e l i ca d a e a q u ê l es que i nterfe­
rem n a s u a a t i v i d a d e to m a m sôbre si uma terr íve l
r es p o n s a b i l i d a d e . O q u e co n s i d e ra m u m ato de
a m o r s e co n ve rte e m t i ra n i a es p i ritua l e ass i m a u ­
m e n ta m o m a rtírio d a q u e l es a q u em a m a m e o s cru­
c i f i ca m d e u m a m a n e i ra q u e m a l co mpreendem.
Fo i a ss i m q u e t u d o o q u e e u t i n h a vi sto nestas
a l m a s ve i o e m m e u soco rro . O tri u nfo q u e a l cança­
r a m m os t ro u - m e q u e a q u estão n ã o era u m a s i m p les
o b s es s ã o p e s so a l n e m a rd i l os a s u g estão do demô n i o .
Esse tri u nfo l a n çou uma l uz c l a ra sôbre o q u e
isto s i g n ificava rea l mente p a ra m i m , d a mesma ma­
n e i ra q u e para elas nen h u ma afeiç ão, por verda dei­
ra e p u ra q ue fôss e, deve ria a ntec i par- se à verd ade.
N ã o hav ia n a d a q ue eu não quis esse t � r fe � o
pela s a l mas às q ua is m i n ha dec isão teria fe : 1 d o tao
er
p rofu n d a men te, e entr eta nto eu não po de.na faz
por ela s · o sac rifí cio q ue a lg u ma s me pe dira m q u 9
fizesse.
0 que
Po rq ue , em b o ra o nã o co mp ree nd es se m,
m e ped ia m era q ue sacr ific asse a Verda de.
21 9
O l eito r seg u ra me � te com pre end e q ue só 0
a mo r d a Ver d a d e pod e r i a ter- m e pos sibi l ita do a re­
sis tê nc i a a ta l a pê l o.
O ú � i co ca m i n ho que rest ava era d a r a l g u m pas ­
so dec1_ s 1vo em d e m a nda da I g reja Catól ica ; por
ês se motivo fu i passa r a lg u ns d ias com um a m igo
c ató l i co, d isposiç ão pre l i m i na r pa ra me co loca r n u m
reg i me d e i nstrução.
Fiz i sto sem nen h u m i ntu ito de satisfação : era,
nem mai s nem m e n os, a ú n i ca co isa q ue eu pod i a
fazer .
Cêrca d e d ez d i a s d epois a i m prensa obteve
de a lg u ma fonte d escon hecida para m i m, confi r­
mação dos ru mô res q u e corri a m q u a nto à m i n h a d e­
cisão e noticiou q u e p ràxi ma mente eu seria rece­
bido na I g reja Cató l ica . I sto não a lterou os meus
pla nos, mas a s u a reve l a çã o prematu ra prod uzi u o
efeito q u e eu tem ia . E ra a gora i m possível i nforma r
todos aq uêles q ue e u s a b i a fica ria m pen a l izados
com a notíc i a . I med iata m e nte chovera m ca rtas de
meus a m ig os, m ostra ndo q ue o sofrimento q u e eu
i mag i nava ter- l hes pou pa d o e ra a gora rea l i d ad e
concreta e d efi n itiva ; a g rava d a pa ra ê les pe l o fato
de a i m pre nsa i n d iscreta m e ter torn a d o i m possíve l
i nf or má-l os p essoa l m e nte d a m i n h a d ecisão. Pare ­
ci a q ue tud o i a ca i n d o e m ru ínas à vo lta d e m i m .
A sit u açã o conti n uava a i nd a s e m l uz, n e m certez a
n e m a l ívi o . Mas afi n a l d is s i p a ra m-se a s n uve n s e co­
me ç? u a ra i a r a l uz. Ag u a rd e i m a i s u ns d i as e r � ­
s ol v 1 e ntã o receb e r i nstrucão e m u m a O rde m Rel i-
.

g i o s a . P a ra logo so b reve i o a paz .


,
22 0

Fati g a d o e exa usto, e u pod i a fi n a l m e n te d e s ­


c a n s a r ; p o i s d es a p a recera o senti m e nto a ca bru nha­
? o_r d e i n ce rte za . A dor h u m a n a e a a p reensão d e
1 m 1 n e ntes d es gostos era p o r certo a g uda, mas ha­
v i a a go ra u m fu n d a m e nto q ue tornava m enos d ifíci l
s u p o rtá - l a s .
O futu ro e m s u a p l e n itude só é conhecido d e
N os s o S en ho r ; mas p e l o m e n o s con hecemos que,
e m b o ra p rofu n d a m e nte sepa ra d os n e ste m u n d o da­
q u e l es q u e m a is a ma mos, n ã o h á contud o separa­
ção n a eter n i d a d e p a ra os q ue b us ca m s i n cera men­
te a d ivi n a Vo nta d e .
Aq u e l es q u e o ra ra m p o r m i m n o passado rogo
q u e n ã o o d eixem d e f azer ta m b ém agora. Só pos­
so d ese i a r e e s p e ra r q u e m u i tos, se n ã o h oie, ao me­
n os n os d ia s q ue estã o p o r v i r, poss a m e n co ntra r cer·
tez a p a ra a s s ua s a l m a s o n d e e u a e n co ntrei . A êste
f i m tô d a s a s m i n h a s o ra ções serão d i ri g i d as e a mi­
n h a v i d a ta m b ém, se a V o nta d e d ivi n a m' a conser·
va r.
SA N C TA T ERES / A , ORA PRO NO B I S !

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