Da dogmática a alternatividade: a busca da interisciplinariedade no Direito
por Raquel Fabiana Lopes Sparemberger
Palavras-chave: Direito realidade monismo pluralismo alternativo hermenêutica. RESUMO Este artigo aborda uma temática de extrema importância no âmbito jurídico: a interdiscip linariedade no Direito. Tal relação, no entanto, para se concretizar precisa question ar o monismo (dogmática jurídica) e sua configuração, para posteriormente compreender a c oncepção pluralista (antidogmática). Para isso, este artigo perpassa por várias discussões como Direito alternativo e hermenêutica jurídica. INTRODUÇÃO O presente artigo analisa a questão do Direito e sua relação com a realidade a partir de um enfoque interdisciplinar. Para a realização de tal abordagem, faz-se necessário estudarmos as concepções jurídicas do monismo (ou dogmática jurídica) e do pluralismo (concepção antidogmática), para, a partir destes conceitos, demonstrar a idéia de um Direito alternativo ligado a uma hermenêu tica social, que atenda aos anseios de cidadania e justiça na modernidade periférica . Por fim, analisa as possibilidades de superação de certas ideologias presentes hoj e no nosso sistema jurídico, rumo à realização de um Direito justo . 1 DIREITO E REALIDADE: POR UM ENFOQUE INTERDISCIPLINAR O saber jurídico por excelência comporta diversas faces e perspectivas de análise. Não p or acaso, o Direito tem despertado interesse nos mais variados ramos do saber (s ociologia, psicologia, economia, etc). Sobre o Direito, então, podem ser lançados di versos pontos de vista, podendo ser objeto de estudo das mais diversas áreas do co nhecimento. Dentre as várias perspectivas de análise, três delas destacam-se e, portan to, devem ser estudadas numa perspectiva interdisciplinar: a ciência do Direito ou dogmática jurídica, a ciência social do direito e a ciência do direito, cada uma delas voltadas para preocupações específicas. Por isto, objetiva-se neste trabalho estudar e stas preocupações, bem como analisar as possibilidades advindas de interpretação que pod em surgir a partir da conjugação de uma ciência formal ou dogmática para uma ciência socia l mais aberta e interdisciplinar. 2 A CIÊNCIA FORMAL DO DIREITO OU DOGMÁTICA JURÍDICA A ciência formal do direito ou dogmática jurídica é entendida como: parte da ciência do direito que tem por objetivo o direito positivo vigente, tendo por finalidade construir conceitos interprodutivos da norma sob o ponto de vist a lógico-formal, tomando-se útil a aplicação do direito, que através de sua técnica proporc ona uma aplicação uniforme aos casos semelhantes, garantindo desta forma a segurança j urídica. A aplicação do direito seguindo a dogmática jurídica é neutra, demonstrando não le em conta os valores econômicos, políticos ou sociais, pois seu objetivo é aplicar ao caso concreto independente de quem esteja sendo julgado a lei/legislação (ANDRADE, 1 996, p. 19). A dogmática, tendo como principal objetivo a aplicação da lei ao caso concreto sem qua lquer valoração, permite a demonstração de seus principais pressupostos ideológicos: a pos itividade e a estabilidade que estão ligados a idéia de um direito positivo. Esses pressupostos caracterizam a idéia de um direito único, de um princípio monista, ou seja, o direito positivo é visto como um fenômeno social por excelência, e o pressu posto da estabilidade enfatiza o Estado como órgão próprio, criador do direito (COELHO , l992). Conforme Luiz Fernando Coelho, <font face="courier new"=size2>o direito positivo visto como fenômeno social foi s e afirmando e se consolidou com a formação do Estado moderno, eis que o Estado moder no é construção da classe dominante no mundo ocidental, organizado burocraticamente pa ra servir seus próprios interesses de proprietários e, sendo assim, as normas de con duta, elaboradas e garantidas através dessa organização, deveriam impor-se a todos os grupos microssociais, absorvendo as normas de outra gênese e, valendo o único direit o, o direito em si (l992, p. 253-296). A validade de um direito em si, único, monista, é reflexo de um direito positivo rep resentado por uma sociedade que não precisava e nem permitia alterações significativas , porque atendia aos anseios daquele povo, naquela época histórica, em que o princípio da estabilidade, através do Estado, as condições necessárias para a existência de tal dir eito, pois continha o elemento lógico da autoridade competente (COELHO, l992, p. 253 -296). Observamos, até então, a predominância de um direito fechado em si, isento de qualquer influência de outras formas de conhecimento (social, político, econômico), a não ser o lógico-formal previsto pela dogmática jurídica, ou seja, pré-estabelecido e garantido po r uma ordem jurídica estatal. Ainda sobre a questão da ciência formal ou dogmática jurídica, temos as colocações de Viehw g a respeito da dicotomia entre a dogmática e zetética, variando-se o enfoque confor me acentuássemos o aspecto resposta ou o aspecto pergunta, respectivamente. Aqui, a integração, ou a interdisciplinaridade entre os saberes jurídicos , dar-se-ia ao nível d combinação entre necessidade da decisão (dogmática) e aperfeiçoamento do sistema (zetética ). Tércio Ferraz Júnior explica que: do ângulo zetético, o fenômeno comporta pesquisas de ordem sociológica, política, econômica filosófica, histórica, etc. Nesta perspectiva, o investidor preocupa-se em ampliar as dimensões do fenômeno, estudando-o em profundidade, sem limitar-se aos problemas relativos à decisão dos conflitos sociais, políticos, econômicos. Esse descompromissamen to com a solução de conflitos torna a investigação infinita, liberando-a para a especulação (l989, p. 40-49). Sintetizando estas colocações, poderíamos entender que a possibilidade de um saber críti co e interdisciplinar do Direito só pode ser pensada no interior da ciência jurídica d ogmática, resgatando seu aspecto zetético, ou seja, o direito se caracterizaria por aspectos de idealidade e realidade. Todavia, é por estas questões que constata-se uma aceitação generalizada, sobretudo do e nfoque dogmático, pois há uma formação conservadora e lógico-formal que garante a idéia de egurança, mas não permite a discussão crítica e interdisciplinar. Propomos, neste ensaio , um enfoque essencialmente crítico e interdisciplinar sobre o problema do direito alternativo, sua conceituação e interpretação na realidade brasileira. Para isso, vamos abordar as concepções jurídicas do monismo e do pluralismo jurídico como pontos fundame ntais para a discussão do Direito alternativo . 3 DO MONISMO AO PLURALISMO JURÍDICO