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O sol é a sombra do Deus. Imagine, então, como é o Deus? Anjos não fazem
sombra em nada. Anjo é quando o Deus desiste de ser o Deus para ver que o
Deus é o Outro em nós: baleia, violoncelo, pêssego, mulher, homem, criança,
penhasco, água, palavra, música, pedra; enfim, o Outro dentro e fora de nós.
A seguir, as diferentes essências dos Anjos modificadas pela lente dos signos.
O Anjo é onde a luz está. Luz visível ou invisível. O seu signo solar é seu Anjo
natural. Sua essência mais que profunda.
O Anjo Ariano é Hermesael, que faz do natural um epifania regida pelo fogo da
palavra. Anjo que, no interior da palavra fogo, sabe dos primórdios do fogo
sem palavra. O cérebro é seu talismã, sempre impulsivo. Quem for Anjo Ariano
cuida só de saber seu próprio mistério por meio da convenção social que é a
língua. Domar o potro de sono e fogo que acontece no cérebro é a principal
tarefa de Hermesael. A velocidade: um de seus mais flagrantes atributos.
Apazigua homens e feras, mas pode ser destruído por sua Alma, se duvidar
dela. O Anjo Ariano é o guia que aponta para o potencial criativo
desconhecido. Mestre dos quatro elementos, ele os mistura para que venha à
tona o mais precioso, a quintessência. Hemesael não vem quando é chamado,
mas quando intuímos que sabemos mais do que pensamos.
Sua frase é: “Nenhum som teme o silêncio que o extingue” (John Cage).
O Anjo Leonino, Quironael, habita o segundo sol: o ego. O maior poder do ego
é o de saber que o ego não tem poder nenhum. Sua função é criar as
condições para que o Eu profundo (o Deus) –o primeiro Sol – atue. O único
que cura o ego é a humildade. Sua luz é a da manhã e a do entardecer, nunca
a do meio-dia. Leva acesa em si a candeia longínqua. Pequenos desejos,
grandes perfumes. É o pelicano que em alto-mar bica o próprio peito para
saciar a sede de seus filhotes. A Quironael é dada toda alegria se for
suficientemente maduro para permitir que o Eu profundo o fisgue. Algo atira,
algo acerta. O alvo não importa. Mesmo que ele estivesse com uma venda nos
olhos, acertaria o alvo. Conhecimento: luz do coração. Pode curar com um
simples toque.
Sua frase é: “E não é incrível que a luz se acenda no exato instante em que
se extingue?” (Plotino).
O Anjo Virginiano é Heafroatenael. Seu mais íntimo dom é ver tudo nos
mínimos detalhes. Ver com a palavra. Anjo nascido a um palmo do fogo do
Santo Espírito (o subconsciente), ele medita sobre cada detalhe da matéria e a
desvenda com desenhá-la numa simples folha de papel em branco. Crítico
severo consigo e com os outros, deve aprender a relaxar escutando sinos ao
vento. Deve prestar muita atenção no seguinte: aqueles que supervalorizam a
palavra oca são vítimas da própria palavra oca. Sua dificuldade é escolher
entre duas matérias: um copo d’água ou de vinho? O Anjo Virginiano tem o
dom de suspender a faculdade crítica e se dedicar mais ao silêncio que
observa em cada átomo. A fala é então sua luz. A Alma de diamante (o Átman
que, em sânscrito quer dizer “indestrutível”) é por destino sua luz.
Dica preciosa: Heafroatenael intui que as máscaras da tragédia grega tinham
uma função mágica. As palavras em sua boca são usadas com doçura. Não se
deixa levar por cegos impulsos.
Dica preciosa: Aresael tem seu centro supremo na Harmonia, filha do Amor.
Ter uma visão espiritual desenvolvida não é tudo para este Anjo. Uma vontade
de ferro é mais valiosa para ele.
Dica preciosa: Atenael respeita o feitiço íntimo das coisas. O que um vai
saber, não sabendo, já sabe. Deve aprender a respirar no último íntimo, o
mim da fundura.
Sua frase é: “Tamanco faz zoada, mas não fala” (adágio popular brasileiro).
Dica preciosa: Irisael ganha muito ao conduzir o fluxo das emoções com
delicadeza. O ardor impõe sua candura. A verdade absoluta deve ser afastada
de seu coração.
Sua frase é: “Não procure a perfeição, não há nada lá” (Paulo Lemisnki).
Sua frase é: “Minha mãe bordava lágrimas desertas nos primeiros arco-íris”
(Vicente Huidobro).
Uranael, o Anjo Aquariano, jorra água de estrelas. Para este Anjo parecem
vivas todas as constelações e, no entanto, aparentemente não se mexem.
Grava em fita indestrutível o vento do futuro. Crucificado ao silêncio da
revelação, seu abismo é manchado de alto azul. Infante terrível, Uranael não
tem medo de perder objetos. Ele não sabe a Voz que fala em si, mas entende
que, se não ouvir, não poderá ver, e que se não ver não poderá ouvir. Ele
sabe que sua Voz é memória. A melancolia é sua decadência. Limpidez da Voz:
seu alvo. E a palavra é a seta.
Sua frase é: “Além da conversa das mulheres, são os sonhos que seguram o
mundo na sua órbita. Mas são também os sonhos que lhe fazem uma coroa de
luas, por isso o céu é o resplendor que há dentro da cabeça dos homens, se
não é a cabeça dos homens o próprio e único céu” (José Saramago).
PEIXES (19 de fevereiro a 20 de março)
O Anjo Pisciano, Moirael, é o mais próximo do Deus. Aquele que deve estar
iluminado antes que a iluminação aconteça. É o louco divino. Único a existir
em seu Terceiro Olho (a glândula pineal, o Olho do Deus), este Anjo torna
cristalino o silêncio. Médium convicto, ele lapida o centro invisível com a
clareza de quem sabe ser a vida enlevo e fúria. Moirael esquece a vontade e
se mistura à sombra e ao mel que lhe curam a máscara oca. Seu coração só
constrói decepado. Tudo ritma seu coração. Dias e dias este Anjo permanece
em segredo, e retorna em quedas sobre um aquático feliz. Quando a lógica
cervical da essência do Deus encontra a lógica fulgurante de Moirael, é preciso
traduzir este encontro inédito esvaziando as ânforas do medo e acariciando as
serpentes como se fossem rosas.
Dica preciosa: Moirael não transcreve o que foi falado, nem pensado, mas o
que foi visto, posto que ver é sua principal tática para alcançar o objeto
perdido da satisfação.
Sua frase é: “A vida inteira correu por minhas rugas como ágata a fim de
modelar a mais bela das máscaras fúnebres” (Paul Éluard).
Publicado em 20/12/2007
Wilson Bueno
É escritor, autor de "A Copista de Kafka" (ed. Planeta), entre outros títulos