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ATUALIDADE

ENTREVISTA

David Graeber: “O mercado financeiro é o principal


criador de trabalhos de merda”
Mordaz e implacável com o papel dos economistas antes e durante a
Grande Recessão, Graeber escreveu uma obra provocadora que
desmantela a idealização que as sociedades ocidentais fazem do emprego

David Graeber, retratado na London School of Economics MANUEL VÁZQUEZ

QUINO PETIT

14 OUT 2018 - 16:29 BRT

Ele é um dos líderes intelectuais do pensamento radical contemporâneo. Anarquista


indie, filho de um membro das Brigadas Internacionais, fez parte do movimento Occupy
Wall Street e hoje dá aulas de antropologia na London School of Economics. Mordaz e
implacável com o papel dos economistas antes e durante a Grande Recessão, escreveu
uma obra provocadora que desmantela a idealização que as sociedades ocidentais
fazem do emprego

David Graeber, nova-iorquino de 57 anos, é um anarquista que dá


aulas na London School of Economics. Um antropólogo outsider que
compartilha conhecimentos no templo de estudos do capitalismo
global. Um professor exilado à força em Londres, desde que mais de
20 universidades de seu país rejeitaram seu currículo após uma
partida abrupta de Yale, depois de sair em defesa de um aluno que
tentava organizar um sindicato de estudantes. Um acadêmico
provocador que tem escrito em seus momentos livres obras tão
peculiares como Dívida - Os Primeiros 5.000 Anos e The Utopia of
Rules (“a utopia das normas”). Um homem, em suma, que define a si
mesmo como um workaholic e agora tem um dos livros mais
estimulantes da temporada, Bullshit Jobs: A Theory (“trabalhos de
merda: uma teoria”), lançado em espanhol pela editora Ariel com o
título de Trabajos de Mierda.

A gênese do novo livro de Graeber parte de um artigo que ele


publicou em uma revista alternativa em 2013. O artigo viralizou
rapidamente nas redes sociais, foi traduzido para 13 línguas em duas
semanas e catapultou sua popularidade entre as elites do
pensamento radical. Aquela aproximação ao fenômeno dos
trabalhos de merda − que povoam, segundo sua versão, distintas
latitudes do planeta − acabou se transformando em um divertido
livro de mais de 400 páginas onde seu autor afirma, entre outras
provocações, que cerca de metade dos empregos atuais poderiam
ser eliminados sem que ninguém notasse. O motivo? São absolutamente
desnecessários por sua tendência à burocratização e managerização das organizações:
“Depois de perguntar a pessoas de diversas áreas o que fazem realmente em sua
jornada de trabalho, você percebe a grande quantidade de tempo que perdem em
tarefas que não servem para nada. Keynes tinha razão: a jornada de 15 horas semanais é
e já deveria ser viável − e, é claro, sustentável. Todos teríamos uma vida melhor”.
David Graeber, retratado na London School of Economics MANUEL VÁZQUEZ

Filiado a correntes anticapitalistas de militância como Occupy Wall Street, da qual foi
um dos líderes intelectuais, não é de estranhar que Graeber tenha vindo recentemente a
Liverpool, no norte de Reino Unido, para participar dos debates em torno do futuro da
esquerda organizados pelo Momentum, um movimento decisivo no impulso do líder
trabalhista britânico Jeremy Corbyn. Esses encontros, nos quais Graeber deixou sua
marca anarquista com estética de roqueiro indie, coincidiram no espaço e no tempo
com o congresso anual do Partido Trabalhista, onde foi notícia a insistência de Corbyn
em relação à possibilidade de realização de um segundo referendo sobre o Brexit e seu
pedido de eleições antecipadas se o plano da primeira-ministra britânica, Theresa May,
fracassar nas tensas negociações com a União Europeia (UE).

Indo além da especulação em torno de se o Brexit se materializará finalmente em sua


forma dura ou branda, David Graeber manifesta dúvidas sobre se, de fato, a saída
britânica da UE chegará a ocorrer: “Eleições poderiam pôr Jeremy Corbyn à mesa de
conversações com a Europa. E ele poderia dizer: eu represento o contrário do que vocês
não gostavam dos trabalhistas nesta negociação. Comecemos de novo”. Interpretando
à perfeição o papel de professor distraído que acabou de se levantar no meio da amanhã
e ainda não tomou café, elegantemente despenteado, usando blazer escuro, colete
verde, camisa branca com vários botões desabotoados, calça marrom e sapatos
combinando, tudo de segunda mão e com um acentuado toque britânico − “moro de
aluguel muito perto de Portobello Road e compro toda minha roupa lá” −, Graeber se
senta no movimentado lobby do hotel de Liverpool onde passou a noite antes de
participar das conversas sobre o futuro da esquerda.

"37% dos trabalhadores afirmam que seu trabalho não contribui


para absolutamente nada e apenas 15% ou 20% dizem ser felizes”

Pergunta. Quer dizer que 50% dos trabalhos que temos são uma merda?

Resposta. Não sei de maneira exata, mas o que sugiro com essa cifra é a quantidade de
empregados que pensam que o que fazem não serve para nada. Para escrever sobre
esse assunto, falei com diversos tipos de trabalhadores. Apenas 15% ou 20% diziam ser
felizes com seu trabalho. E 37% afirmavam que o que faziam não contribui para
absolutamente a nada. É algo que acontece em muitas organizações do mundo. Se uma
enfermeira passa a maior parte de seu tempo preenchendo formulários em vez de
atender os pacientes, sua essência está se desnaturalizando. E quando essa pessoa tem
consciência da situação é que eu aplico a definição de trabalho de merda.

P. Você classifica os empregos como “não muito”, “altamente” e “totalmente” de


merda. Ninguém está a salvo.

R. Exato. Eu também sofro disso. Há dezenas de obrigações e papelada que tenho de


fazer e que há cinco anos ninguém precisava. Quanto mais pessoal administrativo há em
uma universidade e mais postos de supervisão são criados em diferentes níveis, maior é
a quantidade de burocracia exigida entre departamentos e menor é o tempo para
pesquisar, dar aulas e ensinar.

P. Quanta merda você tem de aguentar em seu cargo?

R. É difícil medir. No meu caso, acho que meu trabalho não é ruim. Mas sou um
workaholic. Trabalho o tempo todo. E em meus momentos livres escrevo livros.
“A melhor analogia do Brexit é com a Primeira Guerra Mundial. As
consequências serão catastróficas: novas leis, tratados que ninguém
entende...”

P. Tem família?

R. Não. Meus pais e meu irmão, minha família nos Estados Unidos, morreram. Eu
gostaria de formar uma algum dia.

P. E o que faz um anarquista na London School of Economics?

R. É preciso trabalhar. Depois que não renovaram meu contrato em Yale, enviei meu
currículo a mais de 20 universidades dos Estados Unidos. Mas não me quiseram. Por
isso, vim para o Reino Unido. A London School of Economics é uma instituição peculiar.
Há departamentos que não têm nada a ver entre si.

P. Havia alguém relacionado ao pensamento anarquista em sua família?


MANUEL VÁZQUEZ

R. Meu pai foi membro das Brigadas Internacionais. Lutou na Espanha durante a Guerra
Civil e viveu em Barcelona. Aos 16 anos, deu-me de presente um exemplar de
Homenagem à Catalunha, de Orwell. A maioria das pessoas não considera o anarquismo
uma má ideia, e sim uma loucura. Mas uma das coisas que aprendi com ele foi que estas
ideias não são um disparate, e que as pessoas podem conduzir a si mesmas.

P. Agora que vive no Reino Unido, quantos trabalhos de merda acredita que o Brexit vai
deixar?

R. Não sei, mas para os advogados será a melhor coisa que já aconteceu. Será
necessário reescrever tudo, conceber novas leis aqui e na União Europeia para um novo
cenário. Embora eu não saiba se o Brexit chegará a se materializar. Não acredito que os
trabalhistas tivessem uma ideia clara do que estavam fazendo quando o propuseram,
embora tenham levado isso adiante. Há muitos precedentes deste tipo de catástrofe na
história. Vejamos de novo a Primeira Guerra Mundial: nenhum dos atores tinha intenção
de fazer o que anunciava, mas eles seguiram em frente e aconteceu o que aconteceu.

P. O Brexit lhe parece comparável à Primeira Guerra Mundial?

R. É a melhor analogia possível. Um cenário que também está cheio de tratados que
ninguém entende, no qual ninguém esperava que acontecesse o que está acontecendo.
Não acredito que as pessoas cheguem a lutar como na Primeira Guerra, mas os
resultados serão catastróficos. Surgirão novas obrigações, legislações complexas... Por
isso, se houver um coletivo que sairá ganhando com o Brexit, serão os advogados.

P. Como avalia o papel que instituições importantes como a London School of


Economics desempenharam antes do referendo do Brexit?

R. É um problema: é chato que apontem para nós quando a maioria dos estudantes
desta universidade é de fora do Reino Unido. É uma instituição internacional. E uma das
coisas que me assustaram com o anúncio do Brexit é que há uma parte de
financiamento europeu. Talvez pudesse haver alguma complacência antes do referendo,
mas ninguém acreditava que Donald Trump ganharia as eleições nos Estados Unidos. A
partir de um movimento como o Occupy Wall Street, contra a corrupção do sistema
político, tentamos alertar que as pessoas já não aguentavam mais.

P. Talvez movimentos como o Occupy Wall Street tenham ajudado a impulsionar a raiva
necessária para acabar elegendo Trump?

R. Não acredito que tenhamos esse poder. A ira daqueles eleitores já estava lá. Nós
dizíamos o que nenhum meio de comunicação nem membros da classe política diriam,
embora todos pensassem assim. Todo mundo está de acordo quanto ao fato de que os
sistemas políticos são corruptos. Se não foram apresentadas soluções construtivas, as
pessoas apostarão em medidas destrutivas. Daí o avanço de Governos populistas eleitos
democraticamente. E o aumento de suicídios, assassinatos e mortes por overdose em
países como os Estados Unidos.
“Passamos tanto tempo trabalhando duro, ou fingindo, que não
sabemos o que aconteceria deixássemos de fazer isso”

P. Até que ponto os economistas poderiam ter ajudado a entender o que estava
ocorrendo antes da quebra do Lehman Brothers, há 10 anos, e da eclosão da Grande
Recessão?

R. Às vezes as pessoas gostam de falar mal dos economistas com base na estupidez.
Não acredito que o problema seja a estupidez, e sim a corrupção. Praticamente todos os
economistas que não faziam parte da estrutura institucional sabiam o que iria
acontecer. Era óbvio. Mas o papel dos economistas era negar, porque para isso eles
eram pagos.

P. E o mercado financeiro é, para você, o paradigma de criação de trabalhos de merda.

R. Sim, é aí que tudo começa. Se você se dedica a extrair riqueza e a redistribuí-la, não
há nenhuma motivação para ser eficiente; quanto mais ineficiente você é, mais você
pode reter.

P. Por que você acha que parece impossível cumprir a profecia de Keynes sobre a
jornada de 15 horas semanais?

R. Há várias razões. Por exemplo, politicamente sempre se disse que ter mais empregos
é algo bom. Ninguém diz que temos muitos em nossa sociedade. Sempre se elogia o
valor das famílias que trabalham duro. E o que acontece com as famílias que fazem isso
com intensidade moderada? Não merecem nada? Sempre existiu uma pressão política
para a criação de empregos. Isso é prosperidade? Depende do que cada um entende o
que significa esse conceito, principalmente se valoriza o tempo livre.

P. Mas você precisamente se declara viciado em trabalho.

R. Dedico meu tempo livre a ler e escrever livros, mas aí não estou trabalhando para
ninguém a não ser eu. Também gosto do meu ofício. Há algo perverso nisso, na verdade.
Embora eu também acredite que meu trabalho crie um valor social. Recebi muitos
telefonemas de estudantes anos depois de terem sido meus alunos para me agradecer
pelo que aprenderam comigo. Não sei se com os banqueiros isso ocorre muito.

P. Entre os componentes de um trabalho de merda você identifica as reuniões


desnecessárias, as interrupções absurdas, o tempo dedicado ao correio eletrônico...

R. Talvez o foco devesse ser colocado então na nefasta organização interna nas
empresas. Sim. Muitas companhias são especialistas em criar merda interna. Qualquer
organização faz isso. E diante da pressão de criar mais empregos, todas tendem a
aumentar sua equipe com postos que não são tão necessários e criam mais níveis
intermediários.

P. Você concentra o fogo nos advogados comerciais, mas muitos deles não acham que
exercem um trabalho de merda. E, é claro, adoram o que ganham.

R. Principalmente os que estão no topo do ranking.

P. Você acredita que a ganância é a única motivação dos trabalhos de merda?

R. No caso dos advogados comerciais, sim. E depois está a máfia, que emprega
diretamente o diabo. Mas temos de ser justos. Também não podemos criticar quem diz
que não poderia desempenhar uma função que gere benefícios sociais e ao mesmo
tempo pagar o aluguel.

P. Fomos enganados na escola quando nos disseram que seríamos melhores se


trabalhássemos duro?

R. Com certeza. Predomina essa ideia de que você não é uma boa pessoa a menos que
trabalhe mais do que realmente quer. Há estudos sociológicos que concentram a
maioria dos valores ocidentais no emprego, mas ao mesmo tempo a maioria das
pessoas odeia o que faz.

P. Lacaios. Capangas. Capatazes. Essas são algumas das categorias que você usa para
afirmar que nos países ocidentais, mais que no capitalismo, predomina uma espécie de
feudalismo medieval com incontáveis hierarquias entre proprietários e servidores. Mas
talvez estejamos em uma situação um pouco melhor do que na Idade Média.

R. Há vantagens e desvantagens. Entre estas últimas se destacam os altos níveis de


vigilância e supervisão: elogiam-se aqueles cargos que tomam decisões por outros.
Sempre se pensou que só as pessoas que fabricam copos deveriam orientar quem
fabrica copos: isso gerava certa autonomia. Mas hoje se tende a acreditar no contrário:
só os formados nas escolas de negócios podem dirigir qualquer um. Quanto às
vantagens do nosso tempo, há alguns elementos de democracia, avanços científicos...

P. Para você, uma receita para mudar o que não funciona seria a renda básica universal,
garantida vitaliciamente a todo mundo, de modo que quem quisesse poderia se dedicar
à poesia ou a ser cantor de rock. Independentemente da viabilidade da proposta e de
que todo mundo tivesse talento para ser poeta, talvez nem assim muita gente chegasse
a ser feliz.

R. O que está claro é que uma alta porcentagem dos empregados consideram que o que
fazem diariamente não serve para nada. Outra coisa são os trabalhos perigosos ou
desagradáveis, mas necessários, que deveriam ser mais bem pagos. Na grande maioria,
aqueles que consideram seu trabalho desnecessário são infelizes. Não só no Ocidente.
Recebi testemunhos parecidos de muitos lugares do planeta. Talvez devêssemos ajudar
a repensar o significado do dinheiro.

P. E há aqueles que adoram o que fazem, mesmo que considerem seu trabalho uma
porcaria.

R. Apenas 6%, segundo os estudos que tenho, estão satisfeitos com seu posto, apesar
de não encontrarem nenhum propósito naquilo que fazem.

P. Acredita que são manipulados pelo mercado? Ou pelo 1% que monopoliza a maior
parte da riqueza?

R. Não, provavelmente odeiam suas famílias. Ou algo parecido. Falando sério: o


capitalismo descarrilará mais cedo do que tarde. Acontecerá em 30, 40 ou 50 anos. E
isso não quer dizer que virá algo melhor. Pode ser algo até mesmo pior.
14/10/2018 David Graeber: “O mercado financeiro é o principal criador de trabalhos de merda” | Atualidade | EL PAÍS Brasil

P. Você acha que a vida é uma merda?

R. A vida é o contrário. Por isso é tão absurdo vivê-la fingindo estar ocupado. O
funcionário de uma loja que fica a maior parte do tempo reorganizando prateleiras até
que entre um cliente, simplesmente para que seu chefe acredite que ele está ocupado,
está transformando seu trabalho em uma merda. É um exemplo que vale para qualquer
outro âmbito. Estamos presos em um círculo vicioso. Passamos tanto tempo
trabalhando duro, ou fingindo que batalhamos duro, que não sabemos o que aconteceria
se parássemos de fazer isso. Do ponto de vista liberal, sempre se disse que isso geraria
mais crime e mais drogados, que as pessoas não saberiam administrar tanto tempo
livre. Muito bem, coloquemos as pessoas na prisão durante oito horas por dia. Afinal, é o
mesmo efeito causado pelos empregos desnecessários. Esse é um dos motivos do
aumento dos casos de depressão: é contra nossa natureza conviver com a moral que
exige que passemos oito horas trabalhando continuamente, independentemente de
haver ou não algo a fazer.

https://brasil.elpais.com/brasil/2018/10/10/actualidad/1539173321_857486.html 11/12

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