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ALESSANDRA

Antagonismo entre o discurso legal, pautado em ideais democráticos e


humanitários, e a realidade do sistema penal. (Anyiar de Castro)
Lei de Drogas, tratamento mais rigoroso dado ao tráfico de drogas - vedações
e restrições (progressão de regime, regime inicial, substituição da pena),
prisões provisórias excessivas, encarceramento em massa. Abrandamento do
porte de drogas.
Tendência da legislação sobre droga afastar-se dos princípios gerais do direito.
“direito penal mínimo” - critério inspirador de uma justiça penal adequada aos
princípios do Estado de Direito e aos Direitos humanos (Copalbo, Baratta)

Discursoproibicionista justificou-se em argumentos médicos e


científicos, quando o fato é principalmente político e ideológico (Copalbo).
A inconsistência dos discursos atuais sobre drogas refletem seu caráter
ideológico e sua falta de rigor científico (Copalbo; Baratta)
Preconceito e desinformação em relação ao crack.

A
busca do eficientismo (Vera Regina) e o punitivismo revelados na Lei
de Drogas e na Guerra às drogas. Também: (Baratta e Copalbo)
Punitividade populista – chamada do Direito Penal para fazer frente a
determinados problemas sociais caracterizada por sua repercussão midiáticca
"La prohibición de drogas es un hecho social, económico y jurídico de primera
magnitud que ha marcado de una forma radical la marcha de la sociedad."
(Copalbo). Comparação com a proibição do álcool nos EUA, 1919

Disfuncionalidade do sistema penal (Baratta)


Sistema penal aparente X sistema penal subterrâneo (Anyiar de Castro)
Ressocialização, defesa social X Estigmatização, seletividade

Crise causa mais delitos X crise causa uma escalada de repressão


(Aniyar)
Manipulação do sentimento de insegurança (Anyiar)
Segurança pública (Baratta) – Lei de Drogas. Aumento da violência
policial X Segurança social – redução de danos
Incapacidade do sistema penal de garantir as condições de segurança (Anyar
de Castro).

Eficientismo X Minimalismo e abolicionismo (Vera Regina)

ELMIR DUCLERC
a) conceito de Direito Penal e modelos gerais de intervenção estatal nos conflitos;

Referência aos diversos modelos de intervenção penal nos conflitos: reparador, do direito privado,
de intervenção direta, do direito administrativo, e punitivo, do direito penal, como etapa necessária à
reflexão sobre um conceito de direito penal, à luz da ideia de “pena”.

b) concepção "agnóstica" ou "negativa" de pena;

Referência à teoria “agnóstica” ou negativa de pena, como intervenção estatal que não “repara” o
dano provocado pelo conflito nem “intervém” diretamente nele e, carecendo de justificação racional,
se “justifica” da mesma maneira que a guerra, ou a vingança.

c) da Teoria Geral do Processo a uma Teoria do Processo Penal;

Falar sobre a necessidade de desenvolvimento de uma teoria do processo penal, desvinculada de


qualquer pretensão de teoria geral do processo, como forma de alcançar efetividade da base
principiológica do direito processual penal. Marcar a distinção entre o fenômeno processual penal e
o fenômeno processual não penal, a partir da distinção entre os modelos de intervenção e da noção
negativa ou agnóstica de pena.

d) "Jus puniendi" e poder punitivo; e) poder punitivo e poder de persecução penal;

A partir da ideia de agnosticidade da pena, falar sobre a necessária passagem da ideia de “jus
puniendi” para a de poder punitivo, e da reconstrução da ideia de ação penal como “poder” de
persecução penal em juízo, tendente a constituir o poder jurídico de punir, que só ocorrerá com o
trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

f) persecução penal e titularidade da ação;

Enfrentar a questão da titularidade da ação penal, abordando a necessidade de aumentar o poder


de disposição da vítima, uma vez que se reconheça a pena como vingança.

f) ação penal e subsidiariedade da intervenção penal.

Falar sobre a necessária revisão da principiologoia da ação penal pública, para incorporar o
princípio da fragmentariedade da intervenção penal, e suas consequências no que respeita à
disponibilidade/indisponibilidade.

BAREMA DA PROVA DE SELEÇÃO DE MESTRADO – CANDIDATOS INSCRITOS


PARA O PROJETO DE PESQUISA DO PROF. DANIEL OITAVEN
TEXTO “THE PASSION FOR REASON” – PECZENIK:

(1) Caracterizar a noção de “coerência” (“coherence”) como relevante para a argumentação


jurídica (0,5)

Trechos de referência:

“one does not weigh isolated arguments but, precisely as Habermas demanded, all arguments to be
considered ‘as exhaustively as possible’, whereby one must pay attention to "coherence of the system of
rules as a whole” (p. 16 do arquivo em .pdf)

“Coherence is related to the well-known theory of reflective equilibrium. One aims at mutual adaptation
of the general principles and individual moral convictions. However, coherence of a total belief system is
much more complex than reflective equilibrium. Metaphorically speaking, a coherent belief system is
like a network ofargumentative circles, mostly quite big ones.

[…].

A single chain of arguments, P1-Pn, may be represented as a circle. In such a chain, PI supports P2, P2
supports P3, etc. But "supports" does not always mean "deductively entail". Often the step from PI to P2,
etc. is only explicable as a reasonable support: P2 follows from P1 together with another premise, say R1.
This premise is reasonable, which simply means that it is a member of another such circle.

The following restatement of Laurence Bonjour's theory is a good (though not entirely unproblematic)
answer to this question.

‘A system of beliefs is a justification-conferring, coherent system if:

(i) It is logically consistent,

(ii) It has a high degree ofprobabilistic consistency,

(iii) It has a significant number ofrelatively strong inferential connections among

component beliefs,

(iv) It is relatively unified, i.e., does not divide into relatively unconnected

subsystems,

(v) It contains few unexplained anomalies,

(vi) It provides a relatively stable conception of the word and remains coherent

(i.e. satisfies (i) - (v) in the long run) and

(vii) It satisfies the observation requirement, i.e., it must contain laws attributing a

high degree of reliability to a reasonable variety of cognitively spontaneous beliefs, including


introspective beliefs’” (p. 18-9 do arquivo em .pdf)
“‘our justification for what we accept depends on a system of acceptance containing general claims about
our competence and truthworthiness. When there is an adequate match between acceptance and reality,
coherence converts to knowledge’. ‘Knowledge’ is an epistemic concept. It is not logically equivalent to
any combination of natural (non-epistemic) concepts. ‘Coherence is the glue which bonds the natural
world, as we conceive of it, to the world of epistemic value, as we conceive of that’” (p. 26 do arquivo em
.pdf)

“postulate that the law should be as coherent as possible” (p. 38 do arquivo em .pdf)

(2) Explicar a relação entre coerência (“coherence”), verdade (“truth”) e discurso racional
(“rational discourse”) (0,5)

Trechos de referência

“ […] coherence certainly is no method of rationality, yet it is a supreme postulate of rationality.” (p. 41
do arquivo em .pdf)

“Now, is the recourse to stability of the belief system in the society a more efficient criterion of truth
than a recourse to the background system of acceptances and preferences of an individual? In one respect,
it seems to be an even less suitable tool for the search for knowledge. For surely, various members of the
society have different beliefs about a lot of things, not to speak about different desires. Pressure towards
incoherence is thus greater in the collective system than in an individual system. It is not obvious that all
(or almost all) members of the society could agree on one single coherent system of acceptances and
preferences, regardless how much they work on belief revision and belief updating.

Yet, from another point of view, the social perspective brings us a hope. For there is no doubt that the
members of the society communicate with each other and thus make it possible for any single person to
correct errors in her system of acceptances and preferences. In other word, asking what other persons
think is a good method to pass from a personally justified belief system to "verific system", that is, that
part of a person's (coherent) acceptance system which contains all her true acceptances but has been
purged of all her false acceptances (see above).

One may refine this idea by only taking into account what others rationally think. Discourse theories
(like Habermas’) provide an idealised procedure for admitting rational opinions only. This claim is
justifiable if and only if people participating in the rational discourse would agree that. […]. The
perfectly rational discourse would exist in the ideal speech situation in which intellectual communication
of people would not be impeded by violence and everybody would have the same chance to ask and
answer questions, interpret others' views, recommend actions, etc. Robert Alexy has elaborated a well-
known theory of rational practical discourse. Some among Alexy's rationality rules express the idea of
coherence. For example: every speaker must give reasons for what he or she asserts when asked to do so,
unless he or she can cite reasons, which justify a refusal to provide a justification. Other rules introduce
the relation between persons participating in the discourse. For example: everyone who can speak may
take part in discourse. These rules flow from the idea that neither discrimination between persons nor
violence is a reason. An optimally rational debate, by definition governed by reasons alone, must thus be
free of both discrimination and violence.”

(p. 22-3 do arquivo em pdf)


(3) Explicar que a dedicação à racionalidade (“rationality”) e à coerência (“coherence”) não
conferem respostas jurídicas perfeitas, mas são melhores do que a irracionalidade e a violência
(0,6)

Trecho de referência

“A philosopher is like Sisyphus - always attempting to give non-defeasible answers to questions that do
not have such an answer.

[…].

even if moral and legal theory cannot be as precise as physics, it still can be deemed as more or less
reasonable. We all pursue rationality, both in morality and in the law. Why? If this is not the problem of
truth, I do not see any other answer than that we have a preference towards rationality. More precisely, a
preference towards coherence. A passion for reason.

You think you do not have it? All right, go and shout at each other, and fight.

[…]. […]

[…] no living person is a Hercules who efficiently can put all her beliefs into a coherent system. This is
only the goal of knowledge and a goal of morality, unreachable but irresistible. Once again, a human
being is often like a Sisyphus, pursuing unreachable goals like reason, truth, justice and coherence.”

(p. 37-8; 41)

TEXTO “JUSTIÇA AUTOSUBVERSIVA” – TEUBNER

(4) Conceituar “justiça jurídica” (0,5)

Trechos de referência

“A Sociologia do Direito deve, então, desenvolver um conceito de justiça que cuide da racionalidade e da
normatividade próprias do Direito – justiça jurídica.”

(p. 8 do arquivo em .pdf)

“a justiça é a fórmula de contingência do sistema jurídico. […]. a tematização da justiça, sobretudo no


sistema jurídico, ativa uma dinâmica social de irritação que torna drasticamente visível para todos a
contingência do Direito: o Direito justo poderia/deveria ser de outro modo! A irritação da justiça começa
já com a emergência dos conflitos sociais, prossegue por meio da sua tradução na linguagem artificial do
Direito, na praxis da aplicação do Direito, nas táticas advocatícias, nos conflitos de interpretação, na
tomada de decisão judicial, na imposição do cumprimento da lei, na observância às regras, e termina com
a não observância das normas e decisões jurídicas, com o protesto dos homens e sua revolta contra a
injustiça do Direito. Como a justiça atua nessas práticas? Não como regra, não como princípio, não como
valor, e não como critério de decisão do Direito. Mas também não como um critério externo ao Direito,
com auxílio do qual se poderiam mensurar as decisões legais, não como virtude moral, não como objetivo
político, não como uma ideia reguladora, que poderia ser contraposta ao direito positivo.

[…].

A justiça jurídica é utilizada como a fórmula de orientação central, irrefutável, e não pode entrar em
concorrência com qualquer princípio, jurídico ou extra-jurídico. […]. A fórmula de contingência quer
dizer: proibição da negação, canonização, irrefutabilidade. E a sua dinâmica revela um paradoxo. A busca
necessária pelo irrefutável, quando esta pode ser observada enquanto uma busca, produz sempre novas
contingências. Contingência necessária – necessidade contingente. A fórmula de contingência do Direito
– a justiça – aparece, consequentemente, como um necessário ‘esquema da busca por fundamentos ou
valores, que só podem adquirir validez jurídica na forma de programas’.

[…].

A fórmula de contingência opera na fronteira entre o Direito e seu ambiente externo e se dirige
simultaneamente à variabilidade histórica da justiça e à sua dependência do ambiente. O clamor por
justiça – e este é o núcleo da fórmula de contingência – requer que consequências sejam extraídas da
dependência do Direito quanto a […] seus ambientes social, humano e natural. Com isso, entram em jogo,
além da consistência formal, pontos de orientação materiais. Na definição “complexidade adequada do
decidir consistente”, o aspecto decisivo é a adequação social em sua relação com a consistência […]. A
intenção da justiça se dirige, não à maximização da consistência dogmática, mas a responder-se
sensivelmente às mais divergentes demandas vindas de fora e, assim, a buscar-se a máxima consistência
possível. A fórmula de contingência não se dirige a uma justiça imanente ao Direito, mas a uma justiça
transcendente do Direito.

[…].

Como a justiça pode transcender o fechamento do Direito, se a transferência de validez com base no
código binário jurídico/antijurídico somente ocorre nas cadeias recursivas de decisões judiciais, atos
legislativos e contratuais? Aqui, a justiça parece se ver confrontada com o fechamento primário do
Direito: fechamento operativo por meio do concatenamento de atos jurídicos – estruturas jurídicas – atos
jurídicos. Devido à auto-referencialidade improdutiva e ao isolamento radical do Direito de seu ambiente
social, o próprio fechamento operativo se tornou, como é sabido, uma fonte significativa de injustiças no
Direito.

[…].

[…] re-entry do extrajurídico no jurídico. Enquanto operações jurídicas constroem, com o auxílio de sua
sequencialização, uma fronteira entre Direito e não-Direito, entre comunicação jurídica e outras formas de
comunicação social, as auto-observações jurídicas utilizam esta mesma diferenciação “Direito/não-
Direito”, só que dentro do mundo simbólico do Direito. Sempre que a diferenciação “Direito/não-Direito”
(“não-Direito” no sentido de “extrajurídico”, não de “antijurídico”!) entra novamente na sequência de
operações jurídicas, e que a argumentação jurídica é colocada em posição de ser capaz de diferenciar
entre normas e fatos, […] entre conceitos jurídicos e interesses da sociedade […], então é chegado o
momento em que o discurso da justiça debate uma decisão sobre essas diferenciações e lança a questão
sobre se as decisões jurídicas fazem justiça àqueles aspectos do mundo exterior da mesma forma como
eles foram […] reconstruídos. Este é o paradoxal resultado do duplo fechamento – das operações e das
observações. Enquanto tanto atos jurídicos produtores de normas como argumentos conectores de normas
permanecem em seus círculos fechados de concatenações […], a justiça, enquanto auto-observação
jurídica de Direito/não-Direito, com o auxílio das diferenciações […] entre auto-referência e hetero-
referência, relaciona o Direito com seu ambiente social […].

A justiça como praxis discursiva extrai consequências da re-entry do extrajurídico no Direito.”

(p. 11-4 do arquivo em .pdf)


“ […] a justiça sabota as decisões jurídicas. Em oposição ao desejo do Direito pela certeza nas decisões, a
justiça jurídica, como uma praxis discursiva, abre um novo espaço de incerteza e de indeterminação do
Direito. A justiça mina a rotina da recursão a decisões judiciais e questiona insistentemente se, à luz das
demandas externas dirigidas ao Direito, uma lide não deve ser decidida de outro modo. A justiça protesta
contra as tendências naturais do Direito de se vincular a precedentes, rotina, segurança, estabilidade,
autoridade e tradição. Contra as tendências de auto-continuidade bem-ordenada embutidas no Direito, a
justiça exibe sua preferência pela desordem, revolta, divergência, variabilidade e mudança.”

(p. 16 do arquivo em .pdf)

“A justiça jurídica seria, para antecipar as reflexões subsequentes em uma fórmula, um processo
obstinado de auto-descrição no Direito, que interrompe, bloqueia, sabota, mina a ininterrupta auto-
reprodução do sistema jurídico, a recursividade rotinizada das operações jurídicas; que, com isso,
compele o Direito à sua auto-transcendência sobre cada sentido; que, entretanto, se coloca ao mesmo
tempo de volta sob o compelimento a continuidade da produção de novas operações jurídicas; e que,
assim, se auto-sabota, porque gera, exatamente através disso, novas injustiças. Pois após a xperiência
“irracional” da transcendência, após a “travessia do deserto”, ele se compele a reconstruir essa
experiência sob as condições restritivas do sistema jurídico – compelimento à decisão, compelimento à
normatização, compelimento à fundamentação. Consequência inexorável desse compelimento à
continuidade é, todavia, que o processo jurídico, especialmente após a auto-provocação em sua auto-
descrição “justiça”, que se traduz em novos critérios jurídicos, gera sempre novas injustiças, contra as
quais a justiça deve novamente protestar, para então se expor mais uma vez aos compelimentos do
sistema jurídico”. (p. 19 do arquivo em pdf)

(5) Conceituar “compelimento à fundamentação” (0,5)

Trecho de referência

“o sistema jurídico estabelece imposições cognitivas praticamente insuportáveis para a busca pela justiça.
Não é permitido que a busca se perca em sentimentos irracionais de injustiça ou em aspirações vagas à
justiça. Ao invés, ela é constrangida pelas aporias especificamente estruturadas do processo jurídico,
mencionadas acima, a expor-se com toda a intensidade à experiência da irracionalidade, do senso de
justiça, da alteridade, do sofrimento, da dor, do vazio e da plenitude da transcendência. Ela deve, então,
transformar essa experiência em fundamentos racionais, argumentos técnico-jurídicos, dogmática jurídica
conectável – compelimento à fundamentação. […]. a decisão deve estar apoiada em fundamentos que
ousem empreender a inútil tentativa de conectar plausivelmente consistência e responsividade.” (p. 30 do
arquivo em pdf)

(6) Explicar a insuficiência da razão e da argumentação jurídica para preencher o hiato entre
estrutura (norma jurídica) e operação (ato jurídico) (0,6)

Trechos de referência

“As maiores dificuldades […] se apresentam quando se procura compreender o que significa, no discurso
da justiça, a auto-transcendência do Direito face ao hiato entre normas e atos jurídicos. Em termos de
teoria dos sistemas, esse hiato surge na junção entre operação – estrutura – operação (ato jurídico – norma
jurídica – ato jurídico). […] . Operações geram, de fato, estruturas, mas estruturas não podem gerar as
operações daí subsequentes; elas podem somente criar um compacto espaço de possibilidades, no qual
então uma nova operação “acontece”. Essa nova operação deve sempre, entretanto, ainda que diante da
mais sólida estrutura, ultrapassar um momento de indeterminação fundamental. […]. cada ato jurídico
(lei, contrato, decisão do julgador) modifica a situação jurídica, na medida em que produz uma nova
norma jurídica. Mas essas normas jurídicas não podem, por seu turno, gerar qualquer novo ato jurídico,
mas apenas referências mais ou menos concretas a novos possíveis atos jurídicos.

[…] para superar o hiato, a argumentação jurídica inicia o seu trabalho incansável – prolífico e, ao mesmo
tempo, vão. A argumentação jurídica, de fato, divergências decisórias, mas ela não é capaz de decidir o
conflito, ela não é capaz – contrariamente às auto-proclamações de teoréticos da argumentação – de
transpor o intervalo entre estrutura e operação, norma e ato jurídico. A argumentação jurídica pode apenas
transformar diferenças e apresenta, então, uma nova alternativa de decisão. Ela converte a alternativa de
decisão existente em uma outra, que, se tudo correr bem, é mais adequada ao conflito jurídico que a
alternativa desprovida de fundamentação. A argumentação jurídica não decide. Ela não justifica. Ela
também não tem nada a esconder. Ela transforma apenas alternativas de decisão, de forma drástica […].
Uma decisão ainda permanece necessária; acontece apenas que, após a argumentação jurídica, a
alternativa de decisão que se apresenta é transformada em uma outra.

Qual novo ato jurídico então finalmente sucederá, permanece sem resposta. Neste ponto, na diferenciação
estrutura/operação, norma jurídica/ato jurídico, ou argumentação/ato jurídico, abre-se o hiato, o espaço
intermediário entre norma e decisão, que, mesmo por meio de fundamentações racionais, não é
superável. As aporias da decisão jurídica não são acessíveis ao discurso racional, não são passíveis de
fundamentação, de justificativa, não são nem justas nem injustas. […]. O discurso da justiça elege o valor
de rejeição da alternativa do decisionismo ou da racionalização. Este é quem primeiro faz com que se
esteja consciente da aporia da decisão jurídica (notadamente, o não poder ir adiante por meio da travessia
do rio) através de um ato reflexivo da auto-descrição. Ele não procura evitá-las ou simplesmente as negar,
mas as articula abertamente como limite da possibilidade racional de fundamentação, as conduz à
experiência dolorosa e a eleva ao insuportável. Esta tentativa de superação das aporias do processo
jurídico por meio da elevação da reflexividade até à auto-transcendência do Direito é a condição de
partida necessária do processo da justiça no interior do Direito, no qual nem a sociedade, nem as teorias
sociais ou uma outra instância externa do Direito ditam seus critérios normativos, mas no qual o Direito
realiza o seu próprio processo” (p. 20-22 do arquivo em pdf).

“Aquilo que nós abordamos acima como uma estranha peculiaridade da fórmula da justiça jurídica,
nomeadamente a combinação de alta indeterminação (auto-transcendência) e alta determinação (o
compelimento à forma do jurídico), estimula o desenvolvimento de energias criativas. No “espaço
imaginário” da re- entry, as fantasias jurídicas de construção encontram sua grande chance.” (p. 31 do
arquivo em pdf)

“a fórmula de busca diretiva do processo distingue-se por uma estranha combinação de alta
indeterminação e alta estruturação. Vale observar que a relação de indeterminação e estruturação não
deve ser compreendida como mediação, compromisso ou um encontro em um meio-termo como
“indeterminação relativamente estruturada”, mas sim como uma radicalização mútua: “introduzir o caos
na ordem” (p. 20)

TEXTO “ECONOMIA DA DÁDIVA” – TEUBNER


(7) Caracterizar autopoiese e desconstrução como duas perspectivas que, embora sejam
contraditórias, se suplementam ao observarem o mundo por ângulos distintos e concordam que
a irracionalidade cumpre papel fundamental na dinâmica jurídico-decisória, o que demanda um
aumento nas exigências à justiça (0,6)

Trechos de referência

“[…] colocam os protagonistas da teoria dos sistemas e da desconstrução: a provocante tese: a rotina das
decisões jurídicas e econômicas contém um componente de loucura, de irracionalidade, de misterioso, de
sacro, que não deve ser visto simplesmente como uma sobra desprezível num processo crescente de
racionalização, mas como a verdadeira dinâmica condutora da própria decisão.

[…].

“Desconstrução e análise sistêmica concordam que arbítrio, contradições, antinomias, paradoxos,


irracionalidade e mesmo violência são os verdadeiros fundamentos até das construções mais refinadas da
moderna racionalidade jurídica […]. […]. Ambas as teorias […] revelam a pretensão de incrementar as
exigências à qualidade dos cálculos, tomando em conta os paradoxos. […] a descoberta do irracional da
decisão não significa, para os dois autores, suspender as questões de justiça, e sim, ao contrário, aumentar
as exigências à justiça.

[…] esse confronto entre sistema e différance não consiste certamente na descoberta de isomorfias,
analogias e afinidades […]. Essa técnica de construção seletiva perseguida pelos teóricos dos sistemas
[…] encaixa fragmentos desconstrutivos da différance, da itération, do trace e da marge na fachada do
palácio conceitual autopoietico, […] sem modificar seus princípios fundamentais construtivos. […] não
está nem em tal incorporação nem na confrontação rigorosa de suas oposições, que resultariam numa
imunização mútua entre as teorias.

[…] Em relação a essas teorias, eu empreenderia uma leitura que trouxesse às claras uma dinâmica
paranóica entre elas, uma dinâmica de suas perseguições mútuas. […] elas começam com um consenso
sobre os paradoxos de fundação do direito […], permitindo-lhes uma ligação, mas produzindo, num
piscar de olhos, construções da realidade incompatíveis entre si, de forma a tornar-se cegas e traiçoeiras
umas com as outras. […]. Teoria dos sistemas e desconstrução: qual é o produto cognitivo de uma mania
de perseguição mútua que resulta numa intensa agitação entre movimentos desconstrutivistas e
contramovimentos da teoria dos sistemas, num comportamento crescente de estabilizações e
desestabilizações? […]. Sistemas sociais autopoieticos, como o pesadelo de Derrida. A dádiva da jutiça,
como a redenção de Luhmann.” (p. 57-9 da publicação)

“Escrita/linguagem versus comunicação/consciência são as duas diferenças diretrizes contraditórias entre


si, cada qual repousando no ponto cego da outra e não podendo ser integrada numa síntese. O que resta ao
observador externo é somente uma permanente ‘troca’ de uma a outra, com o resultado de uma quase
simultânea observação do mundo com duas perspectivas contraditórias, mas suplementares. A condição
dessa suplementariedade é ela estar em condições de aclarar mutuamente seus pontos cegos.” (p. 65 da
publicação)

(8) Caracterizar as dificuldades de compreender a diferenciação funcional e de distinguir


consciência e comunicação como as razões pelas quais Derrida se sente amedrontado pelo
projeto sistêmico de Luhmann (0,5)
Trechos de referência

“a diferenciação, importante para Derrida, entre escrita e linguagem é de tal forma construída que se torna
cega em relação à diferenciação central de Luhmann entre consciência e comunicação e, ao mesmo
tempo, é constantemente provocada por ela.

[…] pesadelo de Derrida. Sistemas sociais estão no ponto cego de sua diferença diretriz. Ele pode
desconstruir sistemas sociais como o direito […] somente como texto e intertextualidade, mas sua
incansável autopoiesis persegue-o constantemente, sem tornar-se visível à luz da desconstrução. Sistemas
sociais desconstroem a desconstrução, naturalmente não no sentido de que sejam capazes de excluí-la por
longo tempo, mas de que postergam, suspendem, disseminam, historizam a própria desconstrução,
alterando, enfim, drasticamente as condições de possibilidade da desconstrução. Os conceitos de
Luhmann, para Derrida, são não-conceitos, monstros, que perseguem seus esforços desconstrutivistas
permanentemente com suas desparadoxizações. Isso vale especialmente para os conceitos centrais de
Luhmann, como sistemas sociais, diferenciação funcional e operação e auto-observação.

A façanha dos sistemas sociais consiste no fato de que eles suspendem os paradoxos do encontro com o
outro […] por meio do deslocamento a um novo nível de sentido: o da comunicação […] como um
terceiro, uma esfera autônoma de produção de sentido. Com isso, o paradoxo permanece […] intacto, mas
é reconstruído e homogeneizado na esfera da comunicação, em duas construções comunicativas
socialmente interdependentes, ego e alter, o que […] o torna inofensivo. […]. […] essa transformação do
paradoxo do encontro com o outro, perdido na infinitude particular do outro, nos paradoxos fundantes dos
mundos de comunicação, por exemplo, no paradoxo do direito, não é reconstituída por Derrida. Sua
análise […] do direito permanece presa aos paradoxos originais da alteridade.

[…].

O próximo monstro sistêmico – diferenciação funcional […]. A determinação de esferas de sentido


autônomas na sociedade, sua constituição de acordo com cada um dos próprios códigos e programas, e
especialmente seu fechamento mútuo permitem a elas um novo modo de lidar com a desconstrução. Um
de seus efeitos é a sua imunização em relação a outros mundos de sentido e seus paradoxos. […]. No
direito, a desconstrução somente conta mediante o paradoxo do direito, que ameaça a aplicação do código
binário lícito/ilícito.

[…].

Uma forma superior de resistência à desconstrução é […] alcançada quando a diferença entre operação e
auto-observação institucionaliza-se firmemente em sistemas sociais. Associam-se, assim, as operações do
sistema jurídico numa rede autônoma de decisões, cuja validade não depende diretamente das
argumentações jurídicas, mas somente acopla-se a elas de maneira estruturalmente “frouxa”. Tal
separação entre auto-observação e operação constitui um problema para a análise desconstrutiva, já que
ela não conhece qualquer diferença sistemática entre textos confrontados e instituições sociais […]. Nesse
caso, os paradoxos, surgidos regularmente no exercício argumentativo do direito, não possuem efeitos
diretos no seu funcionamento decisório.” (p. 65-8)

(9) Caracterizar a unidade da “différance” como a principal razão pela qual Luhmann se sente
amedrontado pelo projeto desconstrutivo (0,5)

Trecho de referência
“começa a assombração dos sistemas estruturalmente acoplados pela desconstrução, a perseguição da
pluralidade não-suspendível de sistemas por meio da unidade (!) da différance. Isso porque, na visão de
Derrida, a constituição de sentido não apareceria como uma pluralidade de recursões separadas, mas
paralelas, de sistemas fechados e, muito menos, como separação de sistemas sociais e psíquicos. A
dinâmica da différance é muito mais um acontecimento diferenciado, constituído paradoxalmente,
mutável de acordo com o contexto, que está constantemente adiando seu significado, mas, ainda assim, é
um acontecimento conexo (e não desagregado, de acordo com o modelo discursivo/sistêmico ou
psíquico/social), que compreende, em sua relacionalidade, aspectos jurídicos, econômicos, políticos,
interacionais e organizacionais, sociais e psíquicos. Sua tese é que tal conceito de différance, não
compatível, e sim suplementar ao aparato conceitual da teoria dos sistemas, é capaz de articular a dança
aberta das próprias operações sistêmicas, a rede de relações, a coordenação, o jogo conjunto de diferentes
aspectos, sem transformá-los novamente num sistema fechado de operações semelhantes e conexas. Esse
entendimento da différance não seria mais sistemicamente integrável. Ele poderia somente agir como uma
assombração amedrontadora do sistema fechado.

[…].

[…] para Luhmann, a unidade da diferença não é um tema apropriado da justiça, nem para a fórmula de
contingência de um sistema social. Todavia, […] a esse paradoxo, mira Derrida a diferença difícil e
inconstante entre justiça e direito positivo: ‘uma diferença entre justiça (infinita, incomensurável,
renitente contra toda regra, estranha em relação à simetria e hetetotrópica) e seu exercício na forma de
direito, da legitimidade ou da legalidade (compensável, de acordo com as disposições, comensurável, um
sistema de prescrições regularizadas, codificadas, registradas)’. O conceito de justiça, de Derrida,
diferencia-se do de Luhmann ‘exatamente em razão dessa infinitude e da relação heterônoma com o
outro, com a face do outro, cuja infinitude eu não posso tematizar, mas à qual estou entregue’.

[…]. A justiça tampouco é exigeência social, moral ou política ao direito, mas objetiva – diferente do que
diz Luhmann – diretamente à transcendência do direito, por princípio não atingível pelas operações
jurídicas, mas sobre cujas exigências a justiça assenta-se constantemente. Na medida em que a
desconstrução acentua a intransponível diferença entre direito positivo e justiça, ela formula […] uma
observação do mundo do direito como unidade da diferença entre direito e não-direito, o que resulta
necessariamente em paradoxos.

[…]. A sociologia de Luhmann recusa-se a abordar tais temáticas. Ocupa-se a princípio somente com
questão de imanência do direito, de positividade do ato jurídico, das normas jurídicas, da relação com o
ambiente como construção positiva do mundo exterior, inacessível ao direito. Apenas […] o encontro do
direito […] com o próprio paradoxo seria […] de fato, da perspectiva da teoria dos sistemas, uma maneira
de o direito conviver com sua própria transcendência. No entanto, exatamente essa questão exclui a teoria
dos sistemas […]. Trata-se, para evitar o bloqueio das operações, de tornar o paradoxo invisível, e não de
confrontá-lo. (p. 70-3 da publicação)

TEXTO “PERFECTING JUSTICE” – BANKOVSKY

(10) Conceituar “justice-to-come” e sua relação com as noções de “undecidability”, “art of the
possible” and “constructive justice” (0,8)

Trechos de referência
[…] “‘an art of the possible’, a conception of justice that is realistic and practicable, the standard against
which public institutions are to be judged. Designed to respond to the problems that individuals face
within their collective lives, each theory assigns a concrete content to the normative idea of justice,
allowing the needs, interests and claims of distinct individuals to be compared and assessed through the
lens of impartiality. […]. […] justice requires, but is not exhausted by, an ‘art of the possible’. On the
one hand, a practical commitment to the possibility of constructing justice is necessary […]. On the other
hand, justice is not exhausted by […] determined content […]. No local determination can ever fully
reconcile the conflicting demands that Derrida believes our historical concept of justice includes –
namely, responsibility for the unique person and impartiality among all. Deconstruction requires the
pursuit of […] constructive strategies while, conversely, drawing attention to the pragmatic implications
of the impossibility of exhausting justice’s demands in the form of laws, principles and procedures.

[…] justice sustains its critical function for the present precisely because it is not exhausted by its
determination, however realistic and practicable this might be. As Derrida puts it, this position should not
produce insensitivity towards injustice but rather responsibility for the concrete effects of determined
accounts of justice […]. Were justice to be determined and achieved once and for all in a present context,
it would no longer play the critical role we want it to fulfil. The inadequacy of the ideal and the actual
effectively motivates the ongoing effort to seek justice in the present […]. […]. justice is perfectible, a
project to be pursued: the ideal of justice motivates the critique of its determined forms.

[…].

the constructive orientation, in a loose sense, can be said to define each theorist’s approach: a solution to
the problem is discovered by reference to the considered judgements, rational presuppositions or
normative expectations of those real persons implicated by the problem, making sense of a set of agents’
own experiences of, and reflections about, justice.

[…].

Committed to the possibility of constructing a solution that coincides with and explains the experiences
and reflections of agents themselves, philosophers of ‘constructive justice’ – again loosely defined – are
often reluctant to concede the two positions defended in this book; namely, that justice exceeds its
constructed determination, and that this excess is the condition for its critical function. A constructive
philosopher would say that if the determination does not satisfy its own criteria, then it should be revised,
again assuming that a satisfactory solution can be constructed. […].

Justice’s imperfect forms can only be corrected by identifying and responding anew to the problems that
theories of justice either leave unchallenged or reproduce” (p. 1-4)

“I am suggesting that it may be productive to bring to constructive theory Derrida’s idea that the
negotiation of justice’s two demands inevitably fails, usually privileging impartiality among persons over
the request for justice from the particular other person.

A philosopher, in our context, would demand accountability for the concrete forms of injustice that are
either produced or maintained by the constructive orientation towards justice’s possibility.” (p. 24)

“Derrida thereby insists on the undecidable status of justice’s determination. The non-negotiable (that is,
justice’s responsibility for the unique Other and for all Others as equals) must be negotiated for the sake
of ethics itself. Moreover, Derrida also defends the view that there are clearly better and worse
negotiations.

[…].

Derrida begins his analysis of our historical concept of justice by identifying two contradictory
requirements the ideal implies, after which he argues that law, in its determined form, is incapable of fully
addressing both demands.
The call of justice, experienced by us as individuals, involves two demands. […] This first demand is for
fairness in the form of individual consideration. […] The second demand is […] the demand for fairness
no longer as individual consideration but as impartiality. A law of justice subjects all Others to its law,
and this means that it must also treat all equally in accordance with its law.

Derrida then points out that these two demands – namely, for both individual and impartial consideration
– contradict each other and cannot be reconciled with one determined law. Either the law responds to the
specific demands of a particular individual (in which case it does not consider the demands of all Others
equally) or the law responds to the demands of all particular individuals using the ideas of impartiality
and equality (in which case it overlooks the unique demands of the particular individual).

In a third step, Derrida argues that despite the contradiction between justice’s two demands, a decision
must be made. Since neither demand is to be privileged over the other, the decision passes through a
moment of indetermination or ‘undecidability’ […] which can be said to characterize the determination
of any decision about the content of laws and principles. Uniting both the affirmation of possibility with
an attention to impossibility, Derrida can thus be said to depart from Levinas by instead committing to
‘imperfect justice now’ for the sake of ‘justice-to-come’”. (p. 11-12)

(11) Citar e explicar os três traços fundamentais da “constructive justice” (“impartiality”, “an
idea of moral personhood” e “practicability”) (0,8)

Trechos de referência

“Derrida must […] commit to three interrelated ideas that characterize the constructive project; namely,
impartial judgement, an ideal of moral personhood and the practicability of the conception” (p. 14)

“impartiality”: “[…] ethical obligation for more than one Other necessitates commitment to a principle
of equality and, consequently, impartiality. When responsibility for the interests, welfare or difference of
the Other becomes plural, responsibilities need to be compared, ordered and hierachized. Although
incomparable, comparison is required because a response to the demands of every Other is owed to each
equally.” (p. 14)

“An idea of moral personhood”: “Ethical obligation and impartiality differ, first, in their intention, and
second, in the ideal of the person that they imply. Regarding the first, the ultimate goal of ethical
obligation is responsibility for the fates of different Others and its content thus depends on the Others that
one faces. In contrast, Rawls and Habermas clearly define the intention of impartiality as the
determination of a public viewpoint that is acceptable to those individuals who are subject to it. […]. The
goal is not, as Levinas puts it, responsibility before Others in the particular, but responsibility before other
persons in the capacity of moral agent; that is, to others who are also committed to the impartial or
reciprocal standpoint of fairness. […]. […] the Derridean commitment to possibility suggests that we
require that the Other also take up the position of impartiality in determining which interests and pursuits
he or she should, in fact, uphold.

Levinas grants absolute privilege to the concept of the person as a self infinitely obligated to the Other in
the particular. In contrast, Rawls, Habermas and Honneth define individuals as moral persons; that is, as
the bearers of those capacities that enable them to commit to the possibility of the impartial standpoint
[…]. An ideal of moral personhood is necessary for broadly constructive reasons: if impartiality is
possible, then persons must view themselves as capable of committing to it. As Rawls correctly points
out, when a citizen affirms an institutional context committed to impartiality among persons, then ‘from
that context a duty arises on those citizens to follow the criterion of reciprocity. This is a duty arising
from the idea of [the] reasonableness of persons’. […].

[…] if justice is possible, as Derrida believes, then we must conceptualize ourselves as bearers of those
capacities that make justice both necessary and possible. […]. if justice is possible, then responsibility to
others must now mean responsibility to other moral persons, and not only responsibility before the Other
in the particular.” (p. 16)

“practicability”: “I am presenting Derrida’s account of the possibility of communication, here, as a


commitment to the practicability of norms. Words, here, are normative, since their meaning depends
largely on a set of shared practices, including a certain way of determining the elements of a context.
Norms, in this sense, have a practical function, allowing for communication. At the same time we can see
that Derrida also draws attention to the essential possibility that communication will fail. When it comes
to justice, given that we saw Derrida distinguish himself from Levinas by committing to impartiality and
to an ideal of moral personhood, we can now say that just norms will be those that aspire to both
impartiality and to sensitivity towards others in their particularity, and that the content of these norms will
largely depend on a shared practice of determining context in particular ways.” (p. 19-20)

TEXTO “A LUTA ESTRATÉGICA DOS MOVIMENTOS SOCIAIS POR


RECONHECIMENTO E A CONTRADIÇÃO PERFORMATIVA” – DANIEL OITAVEN

(12) Explicar as noções de “corrupção de discurso” e “placar deôntico” (0,5)

Trecho de referência

“[…] realizar asserções implica a responsabilidade de justificar as pretensões quando questionadas e, por
conseguinte, reconhecer o direito do auditório de compreender como a existência de um compromisso a
formulação daquela pretensão. Os tecidos sociais de compromissos geram a confiança de que se possa
esperar dos outros que não ajam arbitrariamente e que obedeçam às regras de envolvimento social. Nesse
sentido, o modelo de democracia deliberativa impõe que a discordância entre falantes seja compreendida
à luz de tais comprometimentos e, por conseguinte, que os participantes da interação explicitem as
inferências implicadas em suas pretensões ou ações, dispondo-se, inclusive, a ajustar suas crenças quando
surgirem evidências de que são incorretas ou a reconhecer o surgimento de consequências não previstas
de certas obrigações. A corrupção da linguagem, pois, "não diz respeito a inferências mal compreendidas,
mas, sim, à circunstância de que torná-las explícitas não tem nenhuma força motivacional porque um
falante compromete-se com (a afirmação de) novas crenças ou normas ajustadas, mas não seguem aquilo
que se deriva da inferência - isto é, o que os outros têm licença para inferir do discurso", de modo que as
palavras se desvinculam dos compromissos que elas implicam.

[…].

[…] a deliberação exige que estes sejam assumidos explicitamente pelos participantes de uma interação,
tendo em vista o vínculo de confiança intrínseco ao jogo de linguagem argumentativo. Warren, remetendo
à ideia de “placar deôntico” de Brandom, considera que praticar atos de fala significa fazer o outro
registrar no “placar deôntico”, como inferência de tal ato, o direito de esperar do falante o cumprimento
de um dever correlato de respeito. Participar de uma deliberação, pois, significa performativamente
assumir a obrigação de respeitar o interlocutor, da mesma maneira que este, quando responde, assume
uma obrigação recíproca. Quem fala, pois, assume a responsabilidade pelo conteúdo de suas pretensões, e
uma dessas responsabilidades é a de respeitar o seu interlocutor. Como diz Brandom (2001, p. 164 –
tradução nossa) a respeito dos compromissos e da confiança, “uma maneira de pensar sobre as
reivindicações pelas quais compromissos discursivos são expressos é em termos da interação entre
autoridade e responsabilidade inferencialmente articuladas. Ao fazer uma afirmação, o sujeito confere sua
autoridade ao conteúdo afirmado, autorizando os outros a assumirem um compromisso correspondente a
ser utilizado como premissa em seu raciocínio”. Os tecidos sociais de compromissos, no contexto da
argumentação pública, ensejam a confiança de que os participantes da argumentação não agirão
arbitrariamente e estarão dispostos a ajustar suas crenças quando confrontados com argumentos razoáveis.
É à luz de tais comprometimentos que se compreende a prática democrático-deliberativa”.

(p. 497; 526 da publicação)

(13) Caracterizar a noção de “frame” e explicar a sua relevância discursiva (0,5)

Trecho de referência

“as instituições decisórias tendem a produzir resultados mais legítimos quando incluem no processo
deliberativo os afetados pelas decisões. Porém, o debate público frequentemente envolve polarizações,
desconsideração de evidências, poucas alternativas e, eventualmente, discursos racistas ou etnocêntricos,
o que destrói as condições de deliberação. Nesse contexto, devemos considerar o que os psicólogos
políticos chamam de "framing effects". Ora, os "frames", ao organizarem a cognição mediante o
enquadramento agregado de pretensões, conferem a qualquer uma destas o efeito de carregar consigo
juízos irrefletidos sobre as demais pretensões a que esteja conectada. Esse caráter pré-reflexivo dos
"frames" é prejudicial à autonomia dos juízos individuais, pois envolve pré-juízos sobre os outros, de
maneira a fragilizar o status dos indivíduos como seres suscetíveis à persuasão. Os "framing effects" são
inerentes à política, mesmo em sua compreensão deliberativa. Ora, os "frames" estabelecem as estruturas
cognitivas que proporcionam aos sujeitos o entendimento do que se está a discutir, a definição de suas
preferências, e o compartilhamento de um arranjo de referências comuns na discussão. Os "frames", pois,
são necessários ao próprio diálogo e ao próprio pensamento. Ademais, os "framings effects" não podem
ser evitados na política pelo fato de que muitas instituições democráticas incentivam os "frames" quando
consideramos a grande presença dos conflitos nos discursos desenvolvidos em uma democracia. O
discurso estruturado competitivamente, como nos debates legislativos, nos apelos midiáticos e nas
campanhas, assume como estratégia a produção de "framing effects" efetivos.”

Calvert e Warren […] preocupam-se, de pronto, em caracterizar os problemas epistêmicos e éticos


causados pelos frames ao ideal de democracia deliberativa. Os "frames", ao consubstanciarem a ênfase do
falante em aspectos potencialmente relevantes, induzem os indivíduos a destacarem tais aspectos ao
construírem suas opiniões. Para o cumprimento dessa tarefa, os "frames" podem ser formulados mediante
expedientes como metáforas, analogias, símbolos e narrativas, convertendo-se, em tais em contextos, em
mecanismos de estratégia política. Remetendo a Benford e Snow, os autores explicam que os movimentos
sociais utilizam os "frames" para identificar uma condição problemática e, em seguida, vinculá-la a
supostos culpados, articular alternativas e estimular os prejudicados a agirem para resolver a questão.
[…].

Quando consideramos, porém, os efeitos dos "frames" à luz das teorias democrático- deliberativas,
percebemos que eles geram problemas para a satisfação de uma exigência primordialmente epistêmica
intrínseca a tal vertente, qual seja, a autonomia. Ora, a influência normativamente desejável pelo ideal
deliberativo exige a apresentação, pelos sujeitos que formulam pretensões, de razões que reflitam os
juízos a elas vinculados. Tais razões justificantes têm que ser próprias daqueles que realizam as
reivindicações, e não uma mera repetição irrefletida de argumentos concebidos por autoridades ou pela
mídia. A referida exigência epistêmica, pois, está relacionada à ‘abrangência das considerações que
podem ser introduzidas na deliberação, o peso dado a elas e a profundidade da reflexão sobre as
pretensões’.

[…].

A despeito do papel estratégico cumprido pelos "frames", devemos considerar que eles são uma parte
inevitável dos pleitos de reconhecimento e, muitas vezes, podem contribuir […] para a deliberação, pois
quando vinculam um tema a um valor específico, como igualdade ou liberdade, oferecem às pessoas
termos de referência para um debate produtivo. Os "frames", portanto, podem beneficiar a cognição ou
funcionar em prol da manipulação, estando, na maioria das vezes, em um ponto intermediário.

[…].

[…] os "frames" modificam a acessibilidade das crenças, cumprindo uma função de envolvimento
emocional. Nesse sentido, a literatura da psicologia política, com destaque para Brewer, distingue entre o
modelo de receptores "passivos" e o modelo de receptores "reflexivos". No primeiro modelo, os "framing
effects" conformam a acessibilidade das crenças pelo fato de que os cidadãos não gastam muito tempo
refletindo sobre os "frames" que lhes são apresentados, respondendo a eles, isso sim, mediante processos
psicológicos automáticos. No segundo modelo, por sua vez, admite-se que os cidadãos possam responder
ativa e deliberativamente aos "frames" que chegam a eles, de modo que os efeitos da utilização do
"frame" dependerão propriamente do modo como este é recebido pelo auditório.

[…] Os "frames", portanto, não produzem apenas modificações de opinião, mas, sim, moldam as
formulações das respostas a perguntas, pois, por exemplo, um "frame" axiológico - o qual liga posições
sobre um tema a um núcleo de valores - induz os participantes de uma interação, ao descreverem suas
posições, a invocarem o valor a ele vinculado. Esse mecanismo, por um lado, pode proporcionar o
compartilhamento de um "frame" em torno do qual o debate sobre uma dada temática possa girar, mas,
por outro, pode fragilizar a pluralidade da deliberação pública ao limitar o raio de considerações a
integrarem o objeto da discussão.

[…] segundo Calvert e Warren, é sempre possível que os "frames" venham a ser prejudiciais à
deliberação, seja ‘mediante a subsunção direta de juízos autônomos a metas e interesses de atores
estratégicos, seja indiretamente, pela via da fragilização das condições éticas para a deliberação’.
Buscando explicar como e quando os "frames" se tornam problemáticos, os autores mencionam a troca de
razões que Habermas relaciona à ideia de "força do melhor argumento" e recorrem, com maior atenção, à
abordagem pragmática da linguagem como um "placar deôntico" de Robert Brandom para explicar a
influência dos "frames" em termos de estruturas de inferência”.

(p. 502-6 da publicação)

(14) Explicar como o agir estratégico de movimentos sociais ofende um padrão de racionalidade
argumentativa, o que prejudica a qualidade epistêmica da atividade de deliberação pública no
contexto legislativo (0,6)

Trecho de referência

“é comum que o enquadramento de um tema pelos movimentos sociais seja acompanhado pela colocação
de um rótulo de ‘adversário estrategicamente entrincheirado’ no grupo oposto, rótulo este que justificaria
uma resposta igualmente entrincheirada por parte dos movimentos. Em outros termos, o fato de haver
uma desconfiança por parte dos movimentos em relação a grupos que consideram seus adversários é
utilizado como justificativa para que constituam uma identidade em torno de um “frame” articulado
coletivamente e assumam uma postura política ofensiva e/ou defensiva. De certa maneira, os próprios
rótulos colocados sobre os adversários compõem a identidade concebida em torno do “frame”, visto que
os membros dos movimentos sociais frequentemente se referem aos seus interlocutores com expressões
ou conotações depreciativas, muitas vezes com o intento estratégico de difusão da linguagem conflituosa,
a qual, simultaneamente, reforça os vínculos de identidade entre os membros do movimento. Como
rótulos, os “frames baseados em grupos” inserem um componente emocional significativo na apreciação
das pretensões expostas pelos grupos estereotipados negativamente. Fecha-se, pois, o espaço epistêmico
para que a deliberação cumpra o seu papel, já que os argumentos do grupo oposto são desconsiderados
pelo mero fato de terem origem em tal grupo, cujos membros têm seu reconhecimento como falantes de
igual status negado. Nesse contexto, os movimentos sociais costumam justificar sua desconsideração do
outro como interlocutor com o argumento de que este outro é "ideológico, de mente fechada ou
dogmático", o que significa não reconhecer esse outro como digno de reconhecimento quanto à sua
capacidade de contribuir socialmente (Honneth) para uma deliberação pública pelo mero fato de que este
outro, supostamente, se recusaria a reconhecer o outro cujo reconhecimento é defendido pelo movimento
social específico. Os “frames baseados em grupos”, pois, permitem aos movimentos sociais qualificarem
as pessoas como objetos, e não como sujeitos da deliberação, inviabilizando a troca de razões e
estimulando que os ditos adversários, efetivamente, se comportem como tais, perpetuando uma
circularidade estratégica.

O tipo de ação estratégica acima descrito pessoaliza nos grupos assumidos como adversários a
responsabilidade pelos supostos desrespeitos sofridos pelos membros dos movimentos sociais e por
aqueles por eles defendidos. Nesse ponto, faz-se pertinente a menção aos “frames polarizadores”, pois de
tal pessoalização são derivados subarranjos que limitam o alcance das soluções aceitáveis, de maneira que
o endosso ou a rejeição a uma pretensão individual passa a ser compreendido como uma aceitação ou
recusa de todo um arranjo de crenças sobre um problema.

A estratégia de polarização grupal induz ao entendimento de que concordar com o argumento de um dos
grupos significa concordar que o outro grupo é culpado pela questão difícil a ser solucionada. Ocorre um
desestímulo à deliberação, pois os membros de ambos os grupos desconsideram reciprocamente as
considerações do outro, atribuindo a estas menor valor não apenas por terem origem no grupo adversário,
mas também pelo fato de estarem vinculadas ao “frame” concorrente, independentemente de seu
conteúdo. Comprometer-se com um “frame polarizador”, pois, significa desconsiderar a relevância de
razões atreladas ao “frame” oposto.

Diante do exposto, os sujeitos, ao optarem por um dos “frames” polarizadores, tendem a escolher aquele
que se compatibiliza melhor com as suas preferências pessoais, o que resulta em uma deficiência quanto
ao teste das conexões fático-axiológicas entre o “frame” e a pretensão objeto do debate. O juízo sobre as
pretensões de validade apresentadas pelos grupos opostos deixa de ser realizado tendo como critério a sua
qualidade moral, dando espaço a uma avaliação que tem como critério a vinculação de tais pretensões aos
“frames polarizadores” e à pessoalidade dos grupos que articularam tais “frames”, o que significa que
estes determinam a validade ou invalidade da pretensão sobre análise, inviabilizando que os argumentos
possam ser testados com a qualidade necessária a uma deliberação compatível com a democracia. O
resultado de tal cenário é a resolução das questões em debate de acordo com a prevalência do apelo de um
dos “frames” sobre o outro ou, pior ainda, do poder de um dos grupos em definir tal problema quando
comparado com o do outro, e não com base nas razões apresentadas na formulação das respectivas
pretensões de validade.

[…] é nocivo à democracia que os “frames” sejam recebidos passivamente, sem questionamentos,
meramente pelo fato de serem utilizados por aqueles que se autodeclaram como vítimas de desrespeito,
pois esse tipo de recepção envolve uma interferência do sentimento de compaixão perante o pretenso
oprimido na cognição, o que talvez nos permita caracterizar propriamente uma manipulação emocional,
como bem notado por Calvert e Warren em sua abordagem sobre os “frames baseados em grupos.”

[…].

Recorrendo à abordagem de Warren sobre os compromissos, podemos dizer que a deliberação exige que
estes sejam assumidos explicitamente pelos participantes de uma interação, tendo em vista o vínculo de
confiança intrínseco ao jogo de linguagem argumentativo. Warren, remetendo à ideia de “placar
deôntico” de Brandom, considera que praticar atos de fala significa fazer o outro registrar no “placar
deôntico”, como inferência de tal ato, o direito de esperar do falante o cumprimento de um dever correlato
de respeito. Participar de uma deliberação, pois, significa performativamente assumir a obrigação de
respeitar o interlocutor, da mesma maneira que este, quando responde, assume uma obrigação recíproca.
Quem fala, pois, assume a responsabilidade pelo conteúdo de suas pretensões, e uma dessas
responsabilidades é a de respeitar o seu interlocutor. […]. Os tecidos sociais de compromissos, no
contexto da argumentação pública, ensejam a confiança de que os participantes da argumentação não
agirão arbitrariamente e estarão dispostos a ajustar suas crenças quando confrontados com argumentos
razoáveis. É à luz de tais comprometimentos que se compreende a prática democrático-deliberativa.

De tal maneira, quando os movimentos sociais recorrem a vôos de sentido a partir das noções de
democracia e seus respectivos universais no contexto deliberativo, vinculam-se à cadeia de compromissos
em que tais noções estão tradicionalmente envolvidas na historicidade daquele jogo de linguagem.
Apresentar pretensões no contexto de uma deliberação, pois, significa assumir um compromisso em
relação às derivações de tais pretensões e, ao mesmo tempo, reconhecer as regras do jogo de linguagem
que se está a jogar em conexão com tais compromissos. Ora, o jogo de linguagem argumentativo envolve
a expectativa de que as pretensões dos falantes permitam que os seus interlocutores as entendam no
contexto do sistema de compromissos a que elas estão atreladas.

[…].

[…] no jogo de linguagem da argumentação pública, justamente pelo fato do pluralismo contemporâneo,
é necessária a explicitação dos tipos de compromissos atribuídos e assumidos, sob pena de inviabilidade
mesma da comunicação devido à falta de um terreno comum para tanto.

Os falantes comprometem-se por suas ações e são responsáveis pelas inferências que os interlocutores
realizam a partir delas. Quando os movimentos sociais participam da argumentação pública, aderem
performativamente às regras de seu jogo de linguagem, o que significa não poderem pretender,
iterativamente, corrompê-las radicalmente por dentro, sob pena da prática de uma contradição
performativa. Ora, se participar da argumentação pública pressupõe um compromisso e um jogo de
linguagem, isso também envolve um respeito à historicidade dos sentidos dos universais interpretados, de
maneira que as regras do jogo de linguagem democrático fecham as portas para que a indecidibilidade e o
resquício de violência sempre presentes nas iterações sejam convertidos em arbitrariedade.

Ademais, se cada compromisso discursivo tem uma articulação inferencial específica, a qual indica o que
serve como evidência, com o que se está comprometido e com o que não se pode se comprometer, os
movimentos sociais, ao apelarem para um olhar ao outro, comprometem-se em respeitar o outro, e ao
fundamentarem suas lutas nas experiências e nos sentimentos de desrespeito, comprometem-se a não
gerar esse tipo de sentimento em seus interlocutores. Porém, quando desenvolvem suas lutas por
reconhecimento estrategicamente, quebram performativamente tais compromissos, visto negarem o
reconhecimento do outro como interlocutor e, consequentemente, gerarem no outro sentimentos de
desrespeito.

[…].

A assunção de uma postura estratégica no espaço deliberativo vai de encontro ao princípio (U), dado que
este exige dos sujeitos dotados dos mesmos direitos de participação que se coloquem na perspectiva de
todos os demais para realizar uma avaliação sobre a possibilidade de que uma norma sob debate se
converta em lei geral. Ora, se eu desejo ser reconhecido pelo outro e ajo de modo a alcançar tal
finalidade, é imperativo que a norma que pretendo converter em lei geral seja universalizável e, portanto,
que eu me vincule a esta norma, o que me impede de perseguir o referido objetivo estrategicamente, sob
pena de incorrência em uma contradição performativa violadora do princípio (U). Ademais, o agir
estratégico que configura a mencionada contradição pressupõe uma ofensa às regras procedimentais de
justificação prescritas pelo princípio (D) referentes à veracidade e, por conseguinte, à universalidade de
livre manifestação com oportunidades simétricas, dado que a impossibilidade de se conhecer
propriamente a posição do interlocutor a respeito do tema sob debate implica uma sonegação da
possibilidade de problematização dos respectivos proferimentos (trata-se, aqui, do mencionado problema
da confiança). Se o princípio (U) está atrelado ao princípio (D), não é surpreendente notarmos que a
ofensa às referidas condições ideais de fala implica uma violação ao mandamento habermasiano de
universalização, visto que: retira a viabilidade de consideração do ponto de vista interpretativo do outro
com quem se está a interagir; e lesa a autonomia do sujeito para se constituir simultaneamente como co-
autor e como co-destinatário das normas às quais, como resultado do procedimento deliberativo, será
submetido.”

(p. 516-37 da publicação)

ARTICULAÇÃO DOS CONCEITOS MENCIONADOS NOS ITENS ANTERIORES

(15) Explicar que caso os movimentos sociais, ao explorarem criativa e desconstrutivamente o


espaço de indeterminação constitucional, incorram em corrupção discursiva, estarão a
negligenciar a face construtiva da justiça, bem como a quebrar o equilíbrio da relação entre
consistência e responsividade do sistema jurídico, o que assombra a perspectiva autopoietica
(1,0)

(16) Explicar que um padrão coerentista de argumentação jurídica, embora, devido à inexorável
falibilidade da justiça por-vir, não tenha como garantir uma colmatação perfeitamente racional
do intervalo entre estrutura (no caso, a norma constitucional) e operação (no caso, a criação do
texto infraconstitucional), assombra a desconstrução caso seja assumido para satisfazer o
compelimento sistêmico à fundamentação e a correlata alta estruturação, de maneira a garantir
que a opção dos movimentos sociais por uma dada alternativa decisória não fragilize a
diferenciação funcional e o equilíbrio entre as faces construtiva e desconstrutiva da justiça (1,0)

BAREMA
Prova de Seleção para o Curso de Mestrado em Direito 2016 - UFBA
Prova de Conhecimento Jurídico
Prof. Dr. Dirley da Cunha Júnior

Neste ano de 2017, a Jurisdição Constitucional no Brasil completa 126 anos de história
constitucional. Assim, considerando esse período, aborde os seguintes pontos:

a) a construção do Sistema Brasileiro de Controle de Constitucionalidade desde sua origem


até presentemente e os modelos que o influenciou (pontuação: 2,5);

BAREMA (letra “a”): O candidato deve indicar, com profundidade de informações e


argumentos: 1) a origem e as principais razões históricas do Sistema Brasileiro de Controle de
Constitucionalidade; 2) como cada Constituição brasileira organizou o Controle de
Constitucionalidade e qual o modelo adotado por cada uma delas, desde a CF/1891 até a
CF/1988; 3) as premissas teóricas utilizadas na construção dos modelos adotados e seus
principais autores; 4) as características fundamentais de cada um dos modelos de controle; 5)
as principais diferenças entre os modelos; 6) a disciplina atual, com fundamento na CF/1988,
do Controle de Constitucionalidade, destacando a natureza mista do Sistema Brasileiro de
Controle de Constitucionalidade.

b) os efeitos da decisão que declara a inconstitucionalidade da lei, no caso concreto e em


abstrato, apontando, se houver, suas diferenças de acordo com a principal doutrina sobre a
matéria (pontuação: 2,5);

BAREMA (letra “b”): Ao tratar dos efeitos da decisão, o candidato deve indicar, com
profundidade de informações e argumentos: 1) os distintos efeitos nos dois modelos, se inter
partes ou erga omnes; 2) os efeitos declaratórios ou constitutivos; 3) os efeitos ex tunc ou ex
nunc; 4) a possibilidade ou não de modular os efeitos gerais e os efeitos temporais nos
modelos abordados; 5) a possibilidade de converter os efeitos inter partes em erga omnes; 6) a
influência dos precedentes no sistema americano (stare decisis et non quieta movere); 7) os
efeitos repristinatórios; 8) os efeitos da decisão que declara a inconstitucionalidade da lei, no
caso concreto, com o advento do NCPC e o sistema de precedentes, sobretudo em face do seu
art. 489, § 1º, VI.

c) as técnicas utilizadas nas decisões que declaram a inconstitucionalidade da lei (pontuação:


2,5); e

BAREMA (letra “c”): Ao tratar das técnicas utilizadas nas decisões que declaram a
inconstitucionalidade da lei, o candidato deve indicar, com profundidade de informações e
argumentos, citando exemplos da jurisprudência constitucional do STF: 1) a técnica da
interpretação conforme; 2) a técnica da declaração parcial de inconstitucionalidade sem
redução de texto; 3) a técnica do apelo ao legislador; 4) a técnica da declaração de
inconstitucionalidade sem pronúncia de nulidade; 5) a possibilidade de sentenças aditivas e
manipulativas.

d) as principais distinções processuais entre as ações do controle abstrato de


constitucionalidade (pontuação: 2,5).
BAREMA (letra “d”): Ao final, o candidato deve indicar, com profundidade de informações e
argumentos: 1) as ações diretas manejáveis no controle abstrato (ADI, ADO, ADC e ADPF) e a
finalidade de cada uma; 2) as leis processuais que regulam o processo e o julgamento das
ações diretas (Lei 9.868/99 e Lei 9.882/99); 3) a jurisprudência constitucional do STF a respeito
das principais diferenças entre as ações direitas.

PROF. EDILTON MEIRELES


QUESTÃO

Ao longo da história o trabalho subordinado foi valorado de diversos modos. Disserte sobre a
evolução da valorização do trabalho subordinado ao longo da história, apontando as
particularidades do contrato de emprego e a forma como o trabalho subordinado foi
recepcionado, do ponto de vista jurídico, na Constituição brasileira de 1988, abordando sua
relevância para a formação dos modernos estados sociais.

BAREMA

A resposta deve abordar os seguintes aspectos:

1. A visão e valorização/desvalorização do trabalho por conta alheia


(subordinado) ao longo da história, desde a Grécia antiga, passando
pelas ideias difundidas pelas religiões, em especial da Igreja católica e a
doutrina protestante, a perspectiva surgida com a revolução industrial e
as ideias socialistas.
2. Também deve abordar os aspectos que particularizam o contrato de
emprego, especialmente destacando que ele tem como objeto o
labor/fazer da pessoa humana (em seu corpo/mente), posto à
disposição/serviço de outrem, abordando a condição de hipossuficiência
do trabalhador e a desigualdade contratual.
3. Deve abordar a valorização dada pelo constituinte de 1988 ao valor
trabalho, revelado no amplo rol de direitos específicos dos trabalhadores
(arts. 7º a 11), passando por regras que influenciam a política
socioeconômica (arts. 187, 201, 205, 214, 218 e 227), tributária (arts.
150 e 153), assistencial (arts. 7º, 201, 203, 227 e 239), de proteção à
saúde (arts. 7º, 200 e 201) e de organização do Estado (arts. 11, 21, 22,
92, 128, 194 e 202), bem como abordar a valorização do trabalho como
fundamento da República (art. 1º), fundamento (art. 170, caput) e
princípio (inciso VIII do art. 170) da ordem econômica e como valor base
da ordem social (art. 193).
4. Por fim, deve ser abordada a importância do trabalho como fator para
formação dos estados sociais, destacando sua contribuição para a
geração de riqueza e distribuição da renda.
UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

SELEÇÃO PARA O PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO 2017

PROVA DE CONHECIMENTO JURÍDICO

GABARITO DO PROF. EDVALDO BRITO


LINHA: Estado Democrático de Direito e Acesso a Justiça
PROJETO: As limitações constitucionais ao poder de tributar na jurisprudência do
Supremo Tribunal Federal
Professores: Edvaldo Pereira de Brito
Paulo Roberto Lyrio Pimenta

QUESTÃO:

A DISSERTAÇÃO SOBRE O TEMA “AS LIMITAÇÕES CONSTITUCIONAIS


AO PODER DE TRIBUTAR NA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL” TRATADO NAS REFERÊNCIAS INDICADAS, NO
EDITAL, CONSISTIRA, NO SEGUINTE:
A) – O CANDIDATO TEM DE IDENTIFICAR, NO TEXTO QUE
ESCREVER, O QUESTIONAMENTO (PROBLEMA), AQUI,
EXPOSTO, APONTANDO CAUSA E EFEITO;
B) – O CANDIDATO TERÁ DE OFERECER AS SUAS RESPOSTAS
(HIPÓTESES) PARA O PROBLEMA, COMO SENDO AS SUAS
CONCLUSÕES À PESQUISA QUE REALIZOU NAS OBRAS
INICIADAS NAS REFERÊNCIAS.

O PROBLEMA

A CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL ESTABELECE


NORMAS SOBRE TRIBUTAÇÃO A QUE, NO LIVRO INDICADO NAS
REFERÊNCIAS, O AUTOR ANTONIO ROBERTO SAMPAIO DÓRIA ANALISA
EM NÚMERO DE 07 (SETE) E AS CARACTERIZA COMO PRINCÍPIO.

FACE AO EXPOSTO, O CANDIDATO TERÁ DE UTILIZAR DE SUAS PRÓPRIAS


PREVISÕES (HIPÓTESES) REVELADORAS DE COMO SE POSICIONA, EM
RAZÃO DA PESQUISA QUE REALIZOU NAS OBRAS INDICADAS NAS
REFERÊNCIAS, RESPONDENDO:

1º) O QUE É PRINCÍPIO E O QUE É PRINCÍPIO


CONSTITUCIONAL TRIBUTÁRIO?
PRINCÍPIO É NORMA JURÍDICA DISTINTA DA NORMA
JURÍDICA SIMPLES, APENAS, PELA FORMA E PELA
DIMENSÃO. A FORMA, NO PRINCÍPIO, NÃO É,
EXPLICITAMENTE, BINÁRIA, POR ISSO, BUSCA-SE A
ENDONORMA (NORMA PRIMÁRIA) E PERINORMA (NORMA
SECUNDÁRIA) EM DISPOSIÇÕES DISPERSAS NO TEXTO
NORMATIVO.

O PRINCÍPIO TEM FUNÇÃO BASILAR NO SISTEMA, TANTO


QUE A SUA DIMENSÃO, QUE NELE É MAIOR DO QUE A
NORMA TANTO QUE ELE É COMUM A VÁRIOS SISTEMAS
JURÍDICOS POR CONTER PAUTAS DE VALORES QUE
SERVEM PARA BALISAR AS NORMAS SIMPLES.

2º) QUEM ELABOROU ESSE ROL DE PRINCÍPIOS NO SISTEMA


NORTE AMERICANO E A PARTIR DE QUE CONCEITO?

A ELABORAÇÃO DO ROL DOS 07(SETE) PRINCÍPIOS É DA


SUPREMA CORTE NORTE AMERICANA E ELA O FEZ A
PARTIR DO DIFUSO CONCEITO SUBSTANTIVO DE “DUE
PROCESS OF LAW”

3º) HÁ SIMILITUDE ENTRE ESSES 07(SETE) PRINCÍPIOS DO


SISTEMA NORTE AMERICANO COM AQUELES EXISTENTES NA
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL?
INDIQUE UM A UM NOS DOIS SISTEMAS.

HÁ. O CANDIDATO FARÁ A INDICAÇÃO UM A UM. Ex:

Sistema Norte Americano Sistema Brasileiro

4º) O LIVRO AFIRMA QUE O SISTEMA BRASILEIRO OS ACOLHE


OU OS REJEITA? EM QUALQUER DAS SUAS RESPOSTAS,
EXPLIQUE E DIGA SE O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
ACOLHE O “DUE PROCESS OF LAW” COMO ESPECÍFICO
PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL TRIBUTÁRIO.

O LIVRO AFIRMA QUE SISTEMA BRASILEIRO OS ACOLHE.


A POSIÇÃO DO AUTOR É EXPRESSA NO DESDOBRAMENTO
QUE FAZ DESSES PRINCÍPIOS NO LIVRO (O CANDIDATO
TERÁ QUE FALAR DESSE DESDOBRAMENTO). O STF NÃO
ACOLHE O “DUE PROCESS OF LAW” COMO ESPECÍFICO
PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL TRIBUTÁRIO.
5º) COMO O AUTOR DESDOBRA O PRINCÍPIO DA CAPACIDADE
CONTRIBUTIVA? EXPLIQUE O DESDOBRAMENTO.

O AUTOR DESDOBRA O PRINCÍPIO DA CAPACIDADE


CONTRIBUTIVA EM DOIS ELEMENTOS: OBJETIVOS E
SUBJETIVO. OBJETIVAMENTE ELE É A EXTERIORIZAÇÃO
DE RIQUEZAS. SUBJETIVAMENTE ELE É A DETERMINAÇÃO
DE QUAL PROPORÇÃO DA RENDA OU PATRIMÔNIO QUE
DEVE SER ABSORVIDA PELA TRIBUTAÇÃO,
CONSIDERADOS OS FATORES ECONÔMICOS INDIVIDUAIS

FREDIE
A Teoria Geral do Processo, Teoria do Processo, Teoria Geral do Direito Processual
ou Teoria do Direito Processual é uma disciplina jurídica dedicada à elaboração, à
organização e à articulação dos conceitos jurídicos fundamentais (lógico-jurídicos)
processuais.
São conceitos jurídicos fundamentais (lógico-jurídicos) processuais todos aqueles
indispensáveis à compreensão jurídica do fenômeno processual, onde quer que ele
ocorra. Ou seja: são conceitos que servem como pressuposto para uma abordagem
científica do Direito positivo. São exemplos: processo, competência, decisão, cognição,
admissibilidade, norma processual, demanda, legitimidade, pretensão processual,
capacidade de ser parte, capacidade processual, capacidade postulatória, prova,
presunção e tutela jurisdicional.
A Teoria Geral do Processo é uma parte da Teoria Geral do Direito.
A Teoria Geral do Processo é, em relação à Teoria Geral do Direito, uma teoria
parcial, pois se ocupa dos conceitos fundamentais relacionados ao processo, um dos
fatos sociais regulados pelo Direito.
É uma disciplina filosófica, de viés epistemológico. Nesse sentido, como excerto da
Epistemologia do Processo, é ramo da Filosofia do Processo.
A Teoria Geral do Processo pode ser compreendida como uma teoria geral, pois os
conceitos jurídicos fundamentais (lógico-jurídicos) processuais, que compõem o seu
conteúdo, têm pretensão universal. Convém adjetivá-la como “geral” exatamente para
que possa ser distinguida das teorias individuais do processo, que têm pretensão de
servir à compreensão de determinadas realidades normativas, como o Direito brasileiro
ou italiano.
O Direito Processual Civil é o conjunto das normas que disciplinam o processo
jurisdicional civil – visto como ato-jurídico complexo ou como feixe de relações
jurídicas. Compõe-se das normas que determinam o modo como o processo deve
estruturar-se e as situações jurídicas que decorrem dos fatos jurídicos processuais.
A Ciência do Direito Processual Civil (Ciência Dogmática do Processo ou,
simplesmente, Ciência do Processo) é o ramo do pensamento jurídico dogmático
dedicado a formular as diretrizes, apresentar os fundamentos e oferecer os subsídios
para as adequadas compreensão e aplicação do Direito Processual Civil. O Direito
Processual Civil é o objeto desta Ciência.
Cabe à Ciência do Direito Processual Civil, por exemplo, a elaboração, articulação e
sistematização dos conceitos jurídico-positivos, construídos para a compreensão de
um determinado direito positivo. Um exemplo: é a Ciência do Processo que definirá o
que são a apelação, uma liminar, uma decisão interlocutória, uma penhora, uma
reconvenção etc., para o direito processual civil brasileiro.
Note, assim, que são dois planos distintos de linguagem: o plano normativo
(Direito Processual) e o plano doutrinário (Ciência do Direito Processual). O plano da
linguagem doutrinária opera sobre o plano normativo, por isso a linguagem
doutrinária é considerada uma metalinguagem: linguagem (científica) sobre
linguagem (normativa).
A relação entre a Teoria Geral do Processo e a Ciência do Direito Processual é a
mesma que se estabelece entre a Teoria Geral do Direito e a Ciência (dogmática) do
Direito. Ambas são linguagens científicas – não normativas, pois. A relação entre esses
dois níveis de linguagem é permanente e inevitável, mas é preciso que fiquem sempre
claras as suas diferenças.
A separação entre as linguagens da Teoria Geral do Processo e da Ciência do
Processo é imprescindível para a boa qualidade da produção doutrinária. Há
problemas de direito positivo que, por vezes, são examinados como se fossem
problemas gerais. Essa falha de percepção compromete a qualidade do trabalho
doutrinário.
Uma coisa é discutir o conteúdo das normas de um determinado Direito Positivo –
saber a) se o juiz pode ou não determinar provas sem requerimento das partes; b)
qual é o recurso cabível contra determinada decisão; c) se determinada questão pode
ser alegada a qualquer tempo durante o processo; d) como se conta o prazo para a
apresentação da defesa etc. Esses são problemas da Ciência do Direito Processual.
Coisa bem distinta é saber o que a) é uma decisão judicial, b) se entende por
prova; c) torna uma norma processual; d) é o processo. Essas são questões anteriores
à análise do Direito positivo; o aplicador do Direito deve conhecê-las antes de
examinar o Direito Processual; são pressupostos para a compreensão do Direito
Processual, pouco importa o conteúdo de suas normas. Esses são os problemas
atinentes à Teoria Geral do Processo.
Enfim, a Teoria Geral do Processo tem como objeto a Ciência do Direito
Processual (civil, penal ou trabalhista etc.), e não o Direito Processual. Ela não se
preocupa com o Direito Processual; ou seja, não se atém ao conteúdo das suas normas.
É uma terceira camada de linguagem.
Direito Processual Civil (linguagem 1, normativa) = objeto da Ciência do Direito
Processual Civil (linguagem 2, doutrinária).
Ciência do Direito Processual (jurisdicional, administrativo, legislativo ou
privado) = objeto da Teoria Geral do Processo (linguagem 3, também doutrinária).

GIDI
A pergunta é a seguinte:

Pode o juiz controlar a adequação do representante do grupo nos


processos coletivos? Como isso pode ser feito?

Barema:
Gidi, Rumo a um CPC Coletivo, capítulo 2.6
Gidi, A Class Action como instrumento de tutela coletiva dos
direitos, capítulo 3.5
LUCIANO

QUESTÃO:
Considere o seguinte texto:
“Vê-se na liberdade sindical um rico exemplo de direito fundamental cuja eficácia
horizontal é indiscutível. O comando nele inserido extrapola os limites da exigência de
abstencionismo do Estado para alcançar também os comportamentos dos particulares.
Não há como negar que a sociedade pode exigir não apenas do Estado, mas dos agentes
privados de um modo geral, o dever de respeito à liberdade sindical em seus âmbitos
individual ou coletivo. O Estado, afinal, não é o único inimigo das liberdades. Como
bem pontuou José João Abrantes (2005, p. 68), ele se tornou até, nos países
democráticos, ‘um aliado natural da pessoa e, mais do que isso, tem-se mostrado
inclusivamente o principal impulsionador e veículo da liberdade e igualdade materiais’.
[...]. A plena liberdade sindical assume, aliás, posição fundamental na garantia dos
direitos sociais. Num verdadeiro processo de catálise, ela modifica a velocidade das
reações existentes nos vínculos de trabalho na medida em que assegura a ação de um
sindicalismo forte e comprometido com a progressividade social.” (MARTINEZ,
Luciano. Condutas Antissindicais. São Paulo; Saraiva, 2013, p. 114-115).
Com base nele, e considerando a liberdade sindical como questão de fundo, disserte
sobre as eficácias dirigente (ou efetivadora) e irradiante (ou horizontal) dos direitos
fundamentais.

RESPOSTA DESEJADA:
A perspectiva objetiva dos direitos fundamentais é, na visão de Vieira de Andrade
(2009, p. 109), “pensada como estrutura produtora de efeitos jurídicos, enquanto
complemento e suplemento da dimensão subjetiva”. Comporta, por isso, além da norma
objetivamente (seja princípio, seja regra), uma força jurídica adicional, autônoma,
tonificada, que não se vê literalmente escrita no texto de lei, mas que dele emerge com
considerável potência e evidente aptidão de ampliar direitos subjetivos.
Diz-se “objetiva” a perspectiva aqui em análise porque ela coloca em primeiro plano
o “direito objetivo” e a sua vocação de produzir efeitos para além dos limites do
correspondente e antagônico “direito subjetivo” sem ser um mero reverso da moeda ou,
como dizem Dimoulis e Martins (2011, p. 118), sem afastar nem diminuir a importância
da dimensão subjetiva. Esses efeitos são de múltiplas ordens e independem da mens
legislatoris, ou seja, independem do sentido pretendido pelo legislador no momento em
que produziu o texto normativo. Quando publicado, o texto normativo passa a ter vida
própria, dissociada daquilo que pensou ou imaginou o legislador no momento de sua
construção.
Entre os mais significativos efeitos produzidos a partir da perspectiva jurídico-
objetiva dos direitos fundamentais estão os que visam à promoção das eficácias (aqui
entendidas como o poder de produzir efeitos) desenvolvimentista, valorativa,
dirigente (ou efetivadora) e irradiante sobre particulares. Serão aqui tratados os dois
últimos:

Eficácia dirigente (ou efetivadora)


Os direitos fundamentais contêm uma ordem dirigida ao Estado no sentido de que a
este incumbe a obrigação permanente de sua concretização e realização (Sarlet, 2009, p.
146). Para que tal ocorra, emergirá o dever geral de efetivação, atribuído ao ente estatal
para que zele, inclusive preventivamente, pela proteção dos direitos fundamentais dos
indivíduos, não apenas contra os comportamentos dos próprios Poderes Públicos, mas
também contra agressões que provenham de terceiros. É também variável desse dever o
oferecimento de garantias institucionais, assim entendidas as cautelas legislativas
constitucionais que visam proteger determinadas instituições ou institutos contra a ação
erosiva do legislador. Nesse particular, Vieira de Andrade (2009, p. 140) lembra a
existência de um princípio de “proibição de défice”, que, segundo ele, obrigaria o Estado
“a assegurar um nível mínimo adequado de proteção dos direitos fundamentais, sendo
responsável pelas omissões legislativas que não assegurem o cumprimento dessa
imposição genérica”. A insuficiente implementação dos deveres de proteção do Estado,
aliás, além de caracterizar violações ao princípio em apreço, constitui flagrante ato
antijurídico.
Anote-se, por outro lado, que o dever geral de efetivação está associado ao
monopólio estatal do exercício da força. Com isso, deseja-se dizer que, diante da
vedação à autotutela, não se pode esperar a concretização compulsória de qualquer
outro sujeito que não seja o próprio Estado. Ele – em qualquer um dos seus poderes –
está juridicamente vinculado à materialização das providências ou deveres de proteção1
e, no caso especial da liberdade sindical, de medidas capazes de combater a
antissindicalidade. Em resumo, e com base nas palavras de Villavicencio Ríos (2010, p.
62),

[…] de la obligación de garantizar la libertad sindical […] resulta un expreso


mandato a todos los poderes del Estado para que se preocupen de procurar un
hábitat suficiente y libre de obstáculos para la expresión de las diversas facultades
que conforman este complejo derecho, de instituir los procedimientos y
mecanismos dirigidos a tutelar su ejercicio y de establecer las facilidades y
prerrogativas necesarias para que pueda expresarse y desarrollarse.

Soma-se aos incrementos proporcionados pela eficácia dirigente da dimensão


objetiva dos direitos fundamentais o direito de participação no plano da organização e
do procedimento como mecanismo que tem a força de atribuir maior consistência a
determinados direitos subjetivos na proporção em que os próprios cidadãos participem
das estruturas que proporcionaram a sua criação e condução.

1 Entre as “providências de proteção” está o dever de progressiva implantação de direitos econômicos,


sociais, culturais e ambientais e de ampliação de uma cidadania inclusiva (SARLET, 2010, p. 16). Trata-
se de um dever de intervenção positiva do Estado de modo juridicamente vinculante, vale dizer, um
dever com eficácia, capaz de ser levado aos tribunais como fundamento de postulação. Algumas questões
importantes, entretanto, emergem dessa problemática. Enfim, a quem competirá a definição do protetor?
Como se controlará a eficácia desse dever de proteção?
De qualquer modo, essas “providências de proteção” devem ser “suficientes”, justificando, em alguns
casos e não unicamente por meio dela, a produção de mandados de criminalização contra as condutas
violadoras do bem jurídico que se deseja proteger.
Eficácia irradiante sobre particulares
Importante desdobramento da força jurídica autônoma dos direitos fundamentais,
conforme bem lembrado por Sarlet (2009, p. 147), está também na sua eficácia
irradiante2, vale dizer, na sua aptidão de extrapolar os lindes do direito objetivo para
operar no plano exterior, impulsionando e dirigindo a aplicação e a interpretação do
direito infraconstitucional. Tal desdobramento tem importância, pois dele emerge a
problemática da eficácia dos direitos fundamentais na esfera privada.
Apesar de se tratar de uma questão aberta – porque, em princípio, apenas o Estado e
os seus órgãos seriam destinatários das normas sobre direitos fundamentais – existem,
segundo Canaris (2009, p. 52-55), consideráveis reflexões doutrinárias e decisões
jurisdicionais em caráter permissivo, notadamente quando as próprias normas de
direitos fundamentais se dirigem direta ou indiretamente contra sujeitos de direito
privado. É o que ocorre especialmente com a liberdade sindical.
Vê-se na liberdade sindical um rico exemplo de direito fundamental cuja eficácia
horizontal é indiscutível. O comando nele inserido extrapola os limites da exigência de
abstencionismo do Estado para alcançar também os comportamentos dos particulares.
Não há como negar que a sociedade pode exigir não apenas do Estado, mas dos agentes
privados de um modo geral, o dever de respeito à liberdade sindical em seus âmbitos
individual ou coletivo. O Estado, afinal, não é o único inimigo das liberdades. Como
bem pontuou José João Abrantes (2005, p. 68), ele se tornou até, nos países
democráticos, “um aliado natural da pessoa e, mais do que isso, tem-se mostrado
inclusivamente o principal impulsionador e veículo da liberdade e igualdade materiais”.
Impossível argumentar que o empregador estaria legitimado, por exemplo, a preterir
candidatos à oportunidade de emprego pelo simples fato de serem ou não filiados a uma
determinada entidade sindical, ou a despedir empregados por conta da evidência de sua
participação em movimento grevista. É claro que, além do forte traço de tratamento
discriminatório evidenciado nesses exemplos (imposto em nome da eficácia externa dos
direitos fundamentais), há, e não se pode negar, a irradiação da norma constitucional
garantidora da liberdade sindical.
A plena liberdade sindical assume, aliás, posição fundamental na garantia dos
direitos sociais. Num verdadeiro processo de catálise, ela modifica a velocidade das
reações existentes nos vínculos de trabalho na medida em que assegura a ação de um
sindicalismo forte e comprometido com a progressividade social.
Observe-se, por fim, que, conforme se disse em tópicos anteriores, emergem da
liberdade sindical claros deveres de promoção e de proteção não apenas para o Estado,
mas também para os particulares – empregadores, associações patronais, os próprios
trabalhadores e seus sindicatos e outros sujeitos que com estes mantenham algum
vínculo. É em nome dela que se impõe aos empresários o dever de respeito à atividade
e independência das associações de trabalhadores e o compromisso de oferecimento e
manutenção de espaços para as reivindicações coletivas.

Pois bem. O direito fundamental à liberdade sindical, por ser essencialmente um


direito defensivo, possui elevado grau eficacial e considerável carga de justiciabilidade.
Essas evidências, entretanto, não tornam ociosa uma análise específica – ainda que não

2 A questão era tratada, segundo o magistério de Canotilho (1993, p. 591), sob o nome jurídico
“eficácia externa” ou “eficácia em relação a terceiros” (Drittwirkung). Hoje se prefere a fórmula
“efeitos horizontais” (Horizontalwirkung) ou a expressão “eficácia dos direitos, liberdades e garantias
na ordem jurídica privada” (Geltung der Grundrechte in der Privatrechtsordnung).
exaustiva – das principais questões que giram em todo da vinculação dos órgãos estatais
e dos particulares a esses mandamentos.

A vinculação dos órgãos estatais


É importante anotar que os direitos fundamentais não se encontram na esfera da
disponibilidade dos Poderes Públicos. Em qualquer caso e em qualquer circunstância,
como bem esclareceu Jorge Miranda (2008, p. 291), qualquer ato de Poder Público deve
tomá-las “como fundamento e como referência” e, além desses lindes, deve tender a
conferir-lhes a máxima eficácia possível, observadas, é claro, as particularidades que
dizem respeito ao exercício de cada um dos poderes estatais.
Os juízes e tribunais, tendo em conta a competência própria para o controle da
constitucionalidade das leis, podem e devem aplicar os preceitos legislativos conforme a
Constituição ou, em determinadas situações, apenas a própria Constituição para afastar a
incidência de normas que com ela colidam. Cabe-lhes, nas sábias palavras de Vieira de
Andrade (2009, p. 199), a reavaliação do juízo do legislador e, na hipótese de conclusão
quanto à não recepção ou à inconstitucionalidade da lei ordinária, o “poder de
desaplicação” dessa norma. Nesse caso, na lição do referido mestre português, os juízes
devem decidir “como se essa lei não existisse, aplicando diretamente, em vez dela, os
preceitos constitucionais, devidamente interpretados e concretizados”.
A vinculação dos tribunais aos preceitos sobre direitos fundamentais, a propósito,
traduz-se mesmo na expectativa de que eles efetivamente interpretem, integrem e
apliquem os referidos direitos de modo a conferir-lhes a máxima eficácia possível
dentro de um sistema jurídico. É, no dizer de Jorge Miranda (2009, p. 297), a faceta
positiva da vinculação dos integrantes do Poder Judiciário que complementa a faceta
negativa de não aplicabilidade dos preceitos legais que desrespeitem os direitos
fundamentais.
Os juízes e tribunais têm o poder-dever de dizer o direito de acordo com a Carta e de
interpretar cada disposição infraconstitucional de modo que ela se integre perfeitamente
à sistemática constitucional. Essa missão toma elevadas proporções no âmbito da
liberdade sindical porque a principal norma jurídica infraconstitucional que regulamenta
esse direito defensivo e suas variáveis no Brasil é a Consolidação das Leis do Trabalho
(CLT), um diploma produzido segundo o pensamento social, econômico e jurídico das
primeiras décadas do século XX e que, inegavelmente, tem infundido um espírito
corporativista que não mais se adapta à leitura democrática atual. A despeito disso, a
jurisprudência demonstra uma pletora de interpretações que desprestigiam a
Constituição e os direitos fundamentais de liberdade sindical entre as quais podem ser
referenciadas aquelas tomadas no Recurso Extraordinário 193.345/SC (Rel. Min. Carlos
Velloso), que limitou a quantidade de dirigentes sindicais detentores de estabilidade ao
número previsto no art. 522 da CLT, independentemente da dimensão e da
representatividade da entidade sindical; no Recurso em Mandado de Segurança
21.305/DF (Rel. Min. Marco Aurélio Mello), que vedou a criação de organização
sindical a partir do desdobramento de categoria disciplinada em lei como única (os
pilotos queriam constituir um sindicato próprio para se desgarrar do sindicato nacional
dos aeronautas); na Ação Direta de Inconstitucionalidade 505/DF (Rel. Min. Moreira
Alves), que reconheceu ser exigível, na forma do art. 535 da CLT, o número mínimo de
três federações para a constituição de uma confederação (observe-se que a Carta
constitucional não prevê número mínimo de integrantes em sindicatos, federações ou
confederações, tampouco que estas últimas devam ter sede necessariamente na capital
da República).
Para além do poder-dever de dizer o direito de acordo com a Carta e de interpretar
cada disposição infraconstitucional de modo integrativo-constitucional, o julgador
assume também um papel promocional nos processos de difusão de consciência coletiva
e social. Situação exemplar de satisfação de aspirações políticas mediante a atuação
jurisdicional pode ser oferecida a partir da análise do direito de “redução dos riscos
inerentes ao trabalho” (art. 7º, XXII, do texto constitucional). Se o órgão estatal
incumbido de criar políticas de redução dos riscos não atuar de modo consentâneo com
a realidade da medicina laboral, é admissível que o Judiciário, se invocado a coibir
ilegalidade ou a colmatar injustificável omissão do Legislativo ou do Executivo, defina
conteúdos (como, por exemplo, pode fazê-lo em relação ao conceito de “penosidade”),
estabeleça limites (até onde é aceitável o “risco” no âmbito das normas regulamentares
do Ministério do Trabalho e Emprego?) e contemporize situações (que racionalizem,
ilustrativamente, o direito à “proteção contra a automação” e o direito à “redução dos
riscos inerentes ao trabalho”)3. Vê-se, assim, como bem fez Rodolfo Mancuso (2001, p.
707-751), que

[...] as decisões judiciais tendem a se libertar do confinamento nos autos em que


foram proferidas para projetar reflexos ao exterior, em face de outros
jurisdicionados, e principalmente perante os demais Poderes do Estado, numa
força coercitiva mais ou menos ampla, que sob esse aspecto vai aproximando os
produtos legislativo e judiciário.

Situações como esta trazem para o processo e para o magistrado discussões sobre o
controle das políticas públicas e revelam que o Judiciário pode estar fortalecendo o
conceito de cidadania. Canotilho (2004, p. 73) compartilha esta ideia, ao opinar no
sentido de que

[...] o cidadão, ao desfrutar de instrumentos jurídico-processuais possibilitadores


de uma influência direta no exercício das decisões dos poderes públicos que
afetam ou podem afetar os seus direitos, garante a si mesmo um espaço de real
liberdade e de efetiva autodeterminação no desenvolvimento da sua
personalidade.

Os legisladores, aqui entendidos todos os que produzem atos normativos com força
jurídico-pública (atos de emenda constitucional, lei complementar, lei ordinária,
regulamento, acordo coletivo, convenção coletiva etc.), estão também vinculados aos
direitos fundamentais, mas sob lógica de iniciativa diferente daquela que submete os
magistrados. Enquanto estes dependem da provocação do jurisdicionado para controlar
a constitucionalidade das normas que dão fundamento jurídico às suas decisões, os
legisladores têm liberdade de iniciativa e, por força dela, criam novas normas para
preencher espaços legislativos vazios ou para revogar normas anteriores.
Tirante esse aspecto correspondente à disposição dos órgãos com função judicante e
legiferante, há identidade entre eles no tocante à conformação aos parâmetros
fornecidos pelas normas de direitos fundamentais. Para o legislador, tal qual para o
julgador, existe uma dupla limitação material. De um lado, fala-se na proibição de
edição de atos legislativos que afrontem as normas de direitos fundamentais (limitação

3 Para aprofundar, veja-se, do autor deste estudo, o artigo “A efetividade sob a perspectiva da
coletivização do processo do trabalho”, publicado na Revista da Academia Nacional de Direito do
Trabalho, v. 18, p. 99-113, 2010.
negativa)4; de outro, refere-se a um dever de realização ou de aperfeiçoamento da
legislação existente (limitação positiva). Gilmar Mendes (2010, p. 378) intitula este
último dever simplesmente como “dever de legislar”, vale dizer, de conferir conteúdo e
efetividade aos direitos constitucionais.
Os órgãos administrativos vivem a situação mais complexa em virtude da sujeição
especial da atividade administrativa ao princípio da estrita legalidade e da ausência de
uma competência específica para realizar controle de constitucionalidade. Não se pode
esperar que o administrador público considere, ele próprio, por sua pessoal cognição e
vontade, uma lei inconstitucional, salvo em casos extremos, a exemplo das situações em
que a aplicação da lei signifique a prática de um crime (é importante lembrar que
existem na Constituição alguns mandados expressos de criminalização5) ou em que as
leis violem escancaradamente6 o núcleo essencial dos direitos fundamentais. Exceto
nessas hipóteses, cabe ao agente público, na maioria das vezes, diante da
responsabilidade pela juridicidade de sua atuação, em vez da inaplicabilidade do texto
legal que lhe pareça inconstitucional, a suspensão da atividade de aplicação da norma
supostamente contrária à Constituição e a imediata provocação da autoridade judiciária
competente7.
Assim, se para um magistrado é perfeitamente possível, por exemplo, declarar a não
recepção pela Constituição de 1988 da regra contida no art. 534 da CLT no ponto em que
este exige a associação de número não inferior a cinco sindicatos para a constituição de
uma federação, o mesmo não pode ser feito por um servidor do Ministério do Trabalho e

4 Por considerar violado o princípio constitucional da liberdade sindical (art. 8º, I), o Plenário do STF,
por maioria, julgou parcialmente procedente pedido formulado em ação direta proposta pela
Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo – CNC para declarar a
inconstitucionalidade da expressão “com a participação do Governo do Estado de Santa Catarina”,
contida no parágrafo único do art. 2º da Lei Complementar n. 459/2009, dessa mesma unidade federativa.
O preceito impugnado estabelecia que a atualização dos pisos salariais fixados naquele diploma
legislativo seria objeto de negociação coletiva entre as entidades sindicais dos trabalhadores e
empregadores, com a participação do governo estadual.
Entendeu-se que a exigência da participação do governo nessas negociações coletivas, ainda que os
valores dos pisos salariais tivessem sido fixados por via legislativa, implicaria restrição à autonomia
sindical, uma vez que competiria aos interlocutores sociais, e não ao Estado-membro, a iniciativa
autônoma de inaugurar, desenvolver e concluir as negociações coletivas (ADI 4.364/ – SC, Rel. Min.
Dias Toffoli, 2-3-2011).

5 Assim, será inconstitucional qualquer lei ou ato administrativo que descriminalize o racismo, o tráfico,
a tortura, o terrorismo, a ação de grupos armados civis e militares contra a ordem constitucional e o
Estado Democrático de Direito, a retenção dolosa de salários, as condutas lesivas ao meio ambiente e o
abuso, exploração e violência contra as crianças e adolescentes. Os tipos penais que definem ou venham a
definir essas condutas criminosas podem ser alterados, preservando-se o conteúdo essencial dos
comandos constitucionais, mas não podem ser extintos. Em relação ao assunto, consulte-se, para fins de
aprofundamento, a obra de Luiz Carlos dos Santos Gonçalves, Mandados expressos de criminalização e
a proteção de direitos fundamentais na Constituição brasileira de 1988, publicado em Belo Horizonte
pela Editora Fórum, 2007, especialmente as p. 135-139 e 153-172.

6 Segundo Vieira de Andrade (2009, p. 203-204), “se a inconstitucionalidade for evidente, deve
prevalecer o princípio da vinculação constitucional direta das autoridades administrativas. Um suporte
dogmático para a solução poderá ser constituído pela aplicação da ‘teoria da evidência’ em matéria de
invalidade, ligando a um vício de inconstitucionalidade desse tipo a consequência da nulidade-
inexistência”.

7 Cf. Vieira de Andrade (2009, p. 201).


Emprego no momento em que realizar o registro da entidade sindical. Este último está
adstrito, como mencionado, ao princípio da estrita legalidade e, por isso, ainda que
intimamente discorde do requisito imposto pela lei e que entenda existente violação à
liberdade sindical coletiva, deverá exigir, na forma da disposição normativa, que a
entidade sindical que se apresente como federação revele um quadro associativo de pelo
menos cinco sindicatos. Como alternativa, resta-lhe a possibilidade de provocar a
autoridade judiciária para determinar-lhe o comportamento.
Além das fronteiras das situações aqui analisadas, não se pode esquecer que o
administrador público tem, em algumas circunstâncias, uma margem de liberdade de
atuação outorgada pela própria lei para a prática de atos discricionários, assim
entendidos, na doutrina de Celso Antônio Bandeira de Mello (2010, p. 432-433),
aqueles em que o administrador, diante do caso concreto, tem o dever de integrar a
norma com sua vontade ou juízo, a fim de dar satisfação aos objetivos consagrados
pelo sistema jurídico. Em tais casos, e no dizer de Sarlet (2009, p. 371), quanto menor
for a sujeição da administração às leis, tanto maior deverá ser a sua adstrição ao
conteúdo dos direitos fundamentais.
Pode-se dizer mais: quando houver margem para a discricionariedade do agente
público e este agir contra o direito fundamental à liberdade sindical, estará constatada a
prática de conduta antissindical, salvo diante de alguma eximente de antijuridicidade”8.

A vinculação dos particulares


Conforme mencionado em item anterior, e a despeito das polêmicas que ainda
rondam o tema, a dimensão objetiva do direito fundamental à liberdade sindical tem
como um dos efeitos mais expressivos o que permite a sua irradiação, direta e imediata,
sobre os particulares. Não há, enfim, maiores dificuldades no reconhecimento de que,
por exemplo, a vedação de interferência e de intervenção do Poder Público na
organização sindical (art. 8, I, da Carta) também se estende aos particulares,
especialmente aos empregadores e às associações patronais que amiúde violentam a
autonomia organizacional e acional das entidades sindicais obreiras.
Há também um consenso jurisprudencial no sentido de que a norma contida no art.
8º, V, da CF/88, segundo a qual “ninguém será obrigado a filiar-se ou a manter-se
filiado a sindicato” é aplicável com muito mais intensidade em relação às próprias
entidades sindicais, patronais ou operárias, do que contra o Estado. Não há dúvidas de

8 Veja-se, em relação a esse assunto, a seguinte ementa de acórdão do STJ: RECURSO ORDINÁRIO
EM MANDADO DE SEGURANÇA – SINDICATO – LIBERDADE SINDICAL – CONTRIBUIÇÃO
VOLUNTÁRIA – ATO ADMINISTRATIVO DETERMINANDO A SUSPENSÃO DOS DESCONTOS
DE CONTRIBUIÇÃO EM FOLHA DE PAGAMENTO – DESVIO DE FINALIDADE – ATO
ABUSIVO – CUNHO EMINENTEMENTE POLÍTICO – DIREITO LÍQUIDO E CERTO –
INOBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA MORALIDADE, FINALIDADE E LIBERDADE
SINDICAL. 1. Ainda que a lei estadual dê ampla margem discricionária à autoridade administrativa para
retirar a consignação em folha de pagamento da contribuição voluntária devida pelos filiados do
Sindicato, impossível assim proceder por revidação estritamente política. 2. Ocorre desvio de poder e,
portanto, invalidade, quando o agente serve-se de um ato para satisfazer finalidade alheia à natureza do
ato utilizado. 3. Nenhum ato é totalmente discricionário, pois será sempre vinculado, ao menos no que diz
respeito, ao fim e à competência. 4. Ato abusivo que vai de encontro ao princípio da moralidade,
impessoalidade e liberdade sindical, vistos nos arts. 37 e 8º, inciso I, da Constituição Federal, bem como
art. 2º, item I, da Convenção 98 da OIT, ex vi do art. 5º, § 2º, da Constituição Federal. 5. Direito líquido e
certo configurado. Recurso ordinário conhecido e provido, para anular o ato coator (RMS 17.081 / PE.
Recurso Ordinário em Mandado de Segurança 2003/0169854-0. Rel. Min. Humberto Martins, 2ª T., j. em
27-2-2007, DJ, 9-3-2007, p. 297).
que algumas das mais expressivas condutas antissindicais praticadas por particulares
estão associadas a esse dispositivo, entre as quais podem ser mencionadas a imposição
de cláusulas de segurança sindical e a exigibilidade de aportes financeiros de quem não
se filiou à entidade que realiza a cobrança.
Quem, afinal, pode negar que se dirigem especialmente aos particulares – apenas
citando algumas passagens expressivas – as normas constitucionais: i) que atribuem ao
sindicato a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria (art. 8º,
III)9; ii) que impõem a participação dos sindicatos operários nas negociações coletivas
de trabalho; iii) que garantem ao aposentado filiado o direito de votar e de ser votado
nas organizações sindicais (art. 8º, VII); iv) que vedam a dispensa do empregado
sindicalizado a partir do registro da candidatura a cargo de direção ou representação
sindical e, se eleito, ainda que suplente, até um ano após o final do mandato, salvo se
cometer falta grave nos termos da lei?
Outro exemplo claro e pungente de norma fundamental que vincula os particulares, e
não apenas o Estado, diz respeito ao direito de greve. Ao declarar “assegurado o direito
de greve” e ao atribuir aos trabalhadores a decisão sobre a oportunidade de exercê-lo e
sobre os interesses que devam por meio dele defender, o legislador constitucional
incorporou no ordenamento jurídico interno a mais clássica das formas residuais de
autotutela e admitiu a irradiação de seus efeitos não apenas em face dos particulares
singularmente considerados (empregadores, para quem se atribuiu deveres de
contenção), mas também em face de toda a comunidade, haja vista a admissão do seu
exercício, ainda que limitado pelo legislador infraconstitucional, em relação aos até
então imunes serviços ou atividades essenciais.
A vinculação dos particulares em matéria de direitos da liberdade sindical merece
uma menção particularizada à sua exigibilidade nos processos legislativos privados.
Refere-se, aqui, não apenas ao processo produtivo de atos normativos com força
jurídico-pública expressamente reconhecida pelo texto constitucional (art. 7º, VI, XIII,
XIV, e art. 8º, VI, da Carta), como é o caso dos acordos coletivos e das convenções
coletivas de trabalho, mas também ao processo de confecção de instrumentos sem força
normativa, mas que têm, por conta da autonomia individual privada, status de fonte
autônoma de direitos e deveres como, por exemplo, estatutos, regulamentos e contratos,
com destaque especial para o contrato de emprego. Quem, enfim, pode negar que esses
atos jurídicos estão submetidos ao dever de conformação aos parâmetros fornecidos
pelas normas de direitos fundamentais?
Nesses termos, pode-se afirmar, sem maiores resistências, que o direito fundamental
à liberdade sindical irradia a sua eficácia sobre os processos legislativos privados e
motiva efeito nulificante de disposições que, por exemplo, restrinjam ou turbem, por via
contratual, o direito: i) de o trabalhador filiar-se a uma determinada entidade sindical ou
de participar dela ativamente; ii) de o trabalhador não se filiar a uma determinada
entidade sindical; iii) de o trabalhador ter acesso, em condições de igualdade, a todas as
vantagens egressas do contrato de emprego; iv) de as entidades sindicais participarem
dos processos decisórios que envolvam interesses laborais de natureza transindividual,
entre outras igualmente importantes.
MANOEL JORGE
QUESTÃO 1) O que é o princípio da reversibilidade da opção e qual a sua
aplicação prática, segundo Manoel Jorge e Silva
Neto? Resposta: É o princípio segundo o qual ninguém
pode ser obrigado por outrem a qualquer opção pessoal irreversível. Hipótese
de aplicação práticas se dá no tocante à extirpação clitoriana, pois se é certo
que bebês não possuem autonomia da vontade, não podem os seus pais
formular opção de compostura irreversível, como é a retirada do clitoris,
devendo obrigatoriamente ser aguardado o momento para a ocorrência de
válida manifestação de vontade (cf. Manoel Jorge, Proteção Constitucional à
Liberdade Religiosa, p. 93).
QUESTÃO 2) O assédio sexual carateriza ofensa a interesse transindividual
trabalhista? Resposta: Embora não se possa recusar ao
assédio sexual o caráter de pratica insidiosamente vulneradora do direito
individual à intimidade, há repercussões quando ocorrido o assédio na empresa
que não se encaixam apenas no estreito campo da tutela individual à
intimidade da pessoa. A circunstância de as mulheres serem as principais
atingidas com a conduta sexual irregular no meio ambiente de trabalho, aliada
ainda à tendência de não denunciarem o assediante, faz com que o problema
do assédio sexual na empresa seja analisado dentro de um contexto de
proteção coletiva das trabalhadoras, porque é evidente ser o assédio ofensivo
não apenas à empregada atingida, mas também a todas as outras que estão
em atividade na empresa (cf. Manoel Jorge, Teoria Jurídica do Assédio e sua
Fundamentação Constitucional, p. 99)
MARIA AUXILIADORA
O consentimento como expressão de autonomia no direito penal e sua possível
distinção da heterocolocação em perigo.

Barema

1.Autonomia e consentimento: repercussões no direito penal


1.1 flexibilização de comandos e de proibições pelo exercício da autonomia
1.2 disponibilidade de tutela do bem jurídico e consentimento
2. Consentimento: posições dualistas e posições monistas
3. Heterocolocação em perigo e consentimento
3.1 Posição de Roxin
3.2 Posição de Strantenwertn
MAURICIO REQUIÃO

Questão

Partindo da bibliografia indicada, disserte sobre a relação entre capacidade e


vulnerabilidade.

Barema

1. Discorrer sobre capacidade apresentando: distinção entre capacidade de gozo e de


exercício; causas de limitação da capacidade; breve histórico sobre as situações de
incapacidade no direito brasileiro; incapacidade como causa de limitação da autonomia;
incapacidade como sistema protetivo x prejudicial ao incapaz.

2. Discorrer sobre vulnerabilidade apresentando: definições de vulnerabilidade;


identificação da vulnerabilidade em diversas causas (tais quais, mas não
exclusivamente: social, física, psíquica, sensorial, de gênero); necessidade de promoção
da autonomia do sujeito vulnerável.

3. Identificar que a incapacidade pode ser um fator de limitação da autonomia, tornando


o sujeito vulnerável. Apresentar situações concretas de vulnerabilidade por força da
situação de sujeito incapaz com autonomia diminuída.

4. Apresentar questões relativas ao Estatuto da pessoa com deficiência (EPD), que


possam modificar a dinâmica entre autonomia, capacidade e vulnerabilidade. Discorrer
sobre as modificações na curatela, interdição e na criação da tomada de decisão apoiada
trazidas pelo EPD e pelo novo Código de Processo Civil.

5. Citar a bibliografia indicada, a saber: “Estatuto da pessoa com deficiência,


incapacidades e interdição”, de Maurício Requião, e “Holocausto brasileiro”, de Daniela
Arbex. Citar leituras complementares.
MONICA AGUIAR

O candidato deve ser capaz de mostrar que Potter apresenta a bioética como uma
ponte entre a ciência biológica e a ética. Sua intuição consistiu em pensar que a
sobrevivência de grande parte da espécie humana, em uma civilização , dependia do
desenvolvimento e manutenção de um sistema ético. Esta nova ciência,
bioethics,combina o trabalho dos humanistas e cientistas sob uma nova orientação
porque, para ele, a sobrevivência do homem estava em jogo. Os valores éticos devem
ser testados em termos de futuro e não podem ser divorciados dos fatos biológicos.
Ações que diminuem as chances de sobrevivência humana são imorais e devem ser
julgadas em termos do conhecimento disponível e no monitoramento de “parâmetros
de sobrevivência” que são escolhidos pelos cientistas e humanistas.
Na introdução de Bioethics: bridge to the future, afirma: Se existem duas culturas que
parecem incapazes de dialogar – as ciências e humanidades – e se isto se mostra como
uma razão pela qual o futuro se apresenta duvidoso, então, possivelmente,
poderíamos construir uma ponte para o futuro, construindo a bioética como uma
ponte entre as duas culturas. As duas margens ligadas por esta ponte são os termos
gregos bios (vida) e ethos (ética), sendo que bios representa o conhecimento biológico,
a ciência dos sistemas vivos, e ethos o conhecimento dos valores humanos. Potter
almejava criar uma disciplina em que promovesse a dinâmica e a interação entre o ser
humano e o meio ambiente. Ele persegue a intuição de Aldo Leopold e, sob tal ótica,
antecipa-se ao que atualmente se tornou preocupação mundial: a ecologia.
SELEÇÃO 2017: MESTRADO

PROFESSORA PAULA SARNO BRAGA

QUESITO

“Definir e correlacionar processo e procedimento, justificando a importância da


distinção”.

O artigo 22, I, CF, confere competência privativa à União para legislar sobre
“direito processual”. Mas a grande extensão territorial da República Federativa
Brasileira, somada às diferenças regionais, fez surgir a necessidade de atribuir-se aos
seus Estados-membros (e ao Distrito Federal) o poder de compatibilizar a disciplina do
processo jurisdicional à realidade local. Assim, prevê o art. 24, XI, CF, a competência
concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal para legislar sobre
“procedimentos em matéria processual” - e sobre o “processo” nos juizados (art. 24, X,
CF).
Esse regramento, à primeira vista simples e equilibrado, gera, contudo, a
dificuldade para o intérprete de diferenciar as normas de “direito processual” (de
competência privativa da União) das normas procedimentais (de competência
concorrente da União, Estados e Distrito Federal).
O processo é procedimento, i.e., é ato complexo de formação sucessiva, cujos
atos integrantes são reunidos em cadeia causal, ordenada e progressiva - em série de
atos e posições -, que seguem rumo à obtenção de um ato único e final.
É sucessão de atos, teleologicamente entrelaçados, e potencialmente eficazes.
Desenvolve-se de modo que cada ato se realiza com base em uma situação jurídica e a
partir dela; bem assim que cada ato faz nascer uma nova situação jurídica, dando origem
a ela.
As diferentes situações/relações jurídicas funcionam como elo entre atos, ao
longo dessa corrente fática. Assim, existem, enquanto fundamento e efeito desses atos,
não tendo razão de ser observá-las ou regrá-las sem com eles correlacioná-las – ou
simplesmente deles (atos) dissociando-as.
O processo se instaura por provocação de um ente autorizado e/ou capaz que
postula a produção de decisão/norma (por instrumentos como a petição inicial,
requerimento administrativo ou proposta legislativa) perante autoridade estatal
investida em poder normativo. É o que basta para “existir” no mundo do Direito
processual, para “ser” processo.
É, assim, dado indispensável para sua configuração, que o ato de provocação
inicial desse procedimento veicule a postulação de que se produza processualmente um
ato normativo. Processo que é processo tem, por fim último e principal, a produção
normativa.
Todo processo estatal visa ter como resultado uma decisão, típico ato jurídico de
natureza normativa, sendo que, em estado democrático de direito, para que seja válido,
pressupõe que seja produzida em contraditório, ou seja, com a participação direta ou
indireta daqueles que serão atingidos pela norma jurídica daí resultante.
Por isso se diz que o processo: i) ontologicamente é ato; ii) teleologicamente
visa à produção normativa; sendo, enfim, iii) axiologicamente um instrumento de
participação democrática.
E isso se justifica em todas as esferas estatais: jurisdicional, administrativa e
legislativa.
Em todos esses casos, o Estado-Juiz, o Estado-Legislador e o Estado-
Administrador conduzem processos estatais, com observância do contraditório, voltados
para a produção de uma dada norma jurídica (ato estatal normativo).
Especificamente o processo jurisdicional, é aquele que culmina em uma decisão
judicial, da qual decorre a norma jurídica que regulamenta a situação jurídica trazida a
juízo pelas partes interessadas. Trata-se, portanto, de ato decisório que se particulariza e
se distingue dos demais pela sua peculiar vocação à imutabilidade (coisa julgada).
Todo o processo jurisdicional, instaurado em um estado democrático de direito,
deve desenvolver-se com a participação das partes (ou seus substitutos processuais) que
serão atingidas pelos efeitos do ato decisório (normativo) ali produzido.
Em termos ontológicos, quando investigada a natureza jurídica do processo e do
procedimento, à luz das mais diversas teorias historicamente consideradas, com análise
crítica daquelas que se predispõem a diferenciá-los entre si, conclui-se que processo é
procedimento (no ordenamento jurídico brasileiro, democrático) de produção de ato
normativo, marcado por sucessão de atos processuais (e situações jurídicas
correlatadas). Não há nada de processual que não seja essencialmente procedimental e
vice-versa. Cada ato processual é também, em si, ato procedimental, e integra essa
cadeia dirigida à produção normativa visada.
Podem ser encontrados, em doutrina, 04 diferentes critérios (os principais)
utilizados para diferenciar processo e procedimento, sendo que nenhum deles infirma a
conclusão acima já colocada, como se pretende demonstrar.
O primeiro deles é o critério da dissociação fático-social, com base no qual se
diz que o processo é entidade complexa que abrange o procedimento (elemento
externo) e a relação jurídica (elemento interno). Ocorre que, para fins de repartição de
competência legislativa (arts. 22, I, e 24, XI, CF), é irrelevante diferenciar o ato
(integrante do procedimento) dos seus efeitos (situação jurídica nascente, relacional ou
não); não é razoável extremar a situação jurídica que se exerce do ato com base nela
praticado, afinal, ela justifica e dá razão de ser ao ato.
O segundo é o critério do objeto, a partir do qual sustenta-se que o processo
teria por objeto uma lide, e o procedimento, não. Revela-se postura sincretista e
ultrapassada, facilmente questionável, na medida em que, no processo jurisdicional,
são tuteladas situações jurídicas materiais não-litigiosas, como uma ameaça de lesão a
direito (quando ainda não há pretensão a ser resistida), bem como aquelas relativas
unicamente a um sujeito (ex.: direito de alterar o próprio nome).
O terceiro é o critério teleológico que é usado para conceber o processo numa
ótica finalística ou teleológica, i.e., como conjunto de atos concatenados e destinados
ao alcance de um resultado final (decisão para o caso concreto), bem como o
procedimento numa ótica estrutural e formal, ou seja, como o aspecto extrínseco,
exterior, visível, palpável do processo e/ou, simplesmente, como a forma ou modo
como caminha o processo.
Ainda que o procedimento pudesse ser tomado, de fato, como simples aspecto
exterior e extrínseco do processo ou a forma de sua realização, seriam eles intimamente
relacionados entre si, não havendo como separá-los de modo a considerá-los fenômenos
distintos, ainda mais para fins legislativos.
Tais doutrinadores identificam o processo como fenômeno imbuído dos fins a
serem alcançados (perspectiva teleológica) e o procedimento com realidade puramente
formal, despida de fins, que se reduz à condição de “técnica”. Questiona-se, contudo, se
o procedimento assim visto como meio indispensável para desenvolvimento e
realização do processo poderia ser absolutamente destituído de fins, como se propõe. O
procedimento como toda técnica pressupõe fins e deve ser apto a alcançá-los. Não pode
ser um caminho ou veículo para chegar a lugar nenhum.
E o último critério, enfim, é o da estrutura dialética, que permite a definição do
procedimento gênero e o processo, espécie. O processo seria uma espécie de
procedimento que se dá em contraditório. É, como diz Fazzalari, um procedimento em
contraditório, democrático, que se deve dar com a participação daqueles que serão
atingidos pelos efeitos do ato final. E a conclusão é possível, diz-se, porque há
procedimentos que não se caracterizam pela peculiaridade que identifica o processo, que
é o contraditório. Basta pensar naqueles adotados em ordenamentos que não decorram
de um regime democrático. Já o processo tem todos os atributos que qualificam o
procedimento – é atividade de preparação de um provimento. Assim, não há nada de
processual que não seja procedimental, o que torna inviável diferençá-los.
Por muito tempo, na chamada fase sincretista ou praxista do Direito processual
(até meados do século XIX), o processo jurisdicional se resumia à condição de
procedimento – ou seja, de atos e formas sequenciados.
Com a afirmação científica do Direito processual observada a partir da segunda
metade do século XIX, o processo passa a ser predominantemente visto como relação
jurídica, assumindo o procedimento posição, quando muito, secundária (de aspecto
externo, exteriorização de movimento, o modo ou a forma como caminha e se
desenvolve).
Só quando se chega mais próximo do final do século XX que o processo passa a
ter, para muitos, como elemento essencial o procedimento, sendo visto como
procedimento de exercício de função estatal.
Hoje, pode-se dizer que a tendência é o reconhecimento de que o processo é
procedimento democrático de produção de ato normativo.
Sucede que, tomado o processo como conceito jurídico fundamental, o
contraditório não pode ser considerado em sua definição, como elemento constitutivo
de seu núcleo conceitual, na medida em que há que se admitir ordenamentos não-
democráticos que se valem do fenômeno processual sem contraditório inerente. Além
disso, em ordenamentos democráticos, há processos nulos, sem contraditório, mas
que são processos.
Daí dizer-se não ser o contraditório elemento constitutivo ou imprescindível
para a existência de um processo, mas um requisito de validade seu, juridicamente
positivado.
Mesmo assim, não se pode negar que a noção de processo como procedimento
de produção normativa que exige, para sua validade, o contraditório é a apropriada
para a explicação do fenômeno processual em países democráticos, em que atuação
estatal (e privada) desse viés deve se aperfeiçoar com a participação dos interessados.
Em especial, quando os termos “processo” e “procedimento” (ou termos afins,
como “direito processual”) são conceitos jurídicos indeterminados positivados na
CF/1988 (art. 22, I, e 24, X e XI, CF), para fins de repartição da competência legislativa
brasileira sobre tais matérias, devem ser eles analisados e interpretados à luz do
contexto da própria ordem constitucional e infraconstitucional brasileira e da realidade
dominante, que é de democracia. Devem ser objeto desse olhar sistemático, que
reclama a presença do contraditório.
Desse modo, o que se pode concluir é que processo é procedimento. Que não
há nada de processual que não seja essencialmente procedimental e vice-versa. Cada
ato processual é também, em si, ato procedimental, e integra essa cadeia dirigida à
produção normativa visada.
E não há nada do processo/procedimento, sobretudo o jurisdicional, que possa
ser útil e legitimamente realizado sem atenção ao contraditório. De tudo devem estar
as partes cientes, de tudo devem participar, sempre com oportunidade de se
manifestar, com poder de influência e cooperativamente. Logo, todo ato processual é
procedimental e deve ser concebido para ser praticado democraticamente. Ao menos
assim é no Direito brasileiro.
Enfim, não há como cogitar processo/procedimento que não abranja exercício de
poder normativo (ou de decisão) ou não tenha como exigência (de validez), em um
ordenamento democrático, o contraditório.
Processo e procedimento são, em essência, noções indissociáveis entre si. E
legislar sobre um significa legislar sobre o outro.
Por essa razão, a CF/1988, ao conceder competência privativa à União e
competência concorrente à União, Estados e Distrito Federal sobre uma mesma matéria
(processo/procedimento), incorre em um conflito aparente de competência, que deve ser
solucionado mediante uma interpretação histórica, teleológica e sistemática das normas
de competência legislativa em questão, assentada na própria Constituição, e que garanta
a unidade e integração político-constitucional, atribuindo eficácia ótima às normas
constitucionais levadas em consideração.
Teleologicamente, vislumbra-se ser opção do Constituinte de 1988 admitir leis
estaduais (e distritais) suplementares e supletivas sobre “procedimento em matéria
processual” com o objetivo de viabilizar que a legislação genérica da União seja
adaptada às diferentes necessidades e realidades locais – que devem ser atendidas e
supridas, ainda que a União seja omissa –, considerando-se a dimensão territorial e a
variedade social, cultural, estrutural e econômica brasileira.
A ideia é que se mantenha um mínimo de uniformidade nacional sobre a
matéria, com leis federais gerais, naquilo que seja de interesse de todos ou em que haja
risco de atrito na interação federativa se não for objeto de tratamento homogêneo em
todo país. Mas sem deixar de garantir certa dose de descentralização e autonomia
estadual, permitindo a compatibilização desse manancial normativo genérico às
particularidades regionais e locais, com leis estaduais suplementares e supletivas.
Sistematicamente, autorizar a produção de leis estaduais suplementares e
supletivas de processo e procedimento (indissociáveis entre si) é o padrão
constitucional, por exemplo, para processos dos juizados especiais estaduais (art. 24, X,
CF) e para os processos licitatórios (art. 22, X, CF), permitindo-se também que os
Estados disciplinem plenamente seus processos administrativos em geral.
Ainda sistemática, mas também historicamente, a distinção de processo e
procedimento está superada em doutrina e sequer é acolhida nos mais diversos
dispositivos da Constituição (a ex. dos arts. 5.º, LXXII e LXXVIII, 24, X, 37, XXI, 41,
§1.º, 59, caput, 84, III, 166, §7.º, CF/1988). Não se justifica servir de base para repartir
a competência legislativa neste mesmo diploma constitucional, cujo art. 24, XI,
certamente, por um lapso, não acompanhou essa evolução conceitual, ecoando o
passado.
Demais disso, os princípios constitucionais do devido processo legal, da
autoridade natural e da competência adequada, bem como o princípio federativo e do
interesse predominante (moldado pela subsidiariedade) são determinantes para a
adequada interpretação dessas regras.
É necessário identificar e tutelar o interesse regional ou local, que sobressai
prevalecente, em adequar normas processuais gerais às especificidades do modo de
exercício da jurisdição estadual – naturalmente, sem contrariar a legislação federal e
sem gerar disparidades nacionais perniciosas.
Afinal, o legislador estadual (e distrital) está próximo dos problemas locais,
relativos à Justiça do seu Estado (ou do Distrito Federal), o que o torna a autoridade
natural e titular da competência adequada para, conduzindo um processo legislativo
devido, moldar o processo instituído por lei federal ao ambiente jurisdicional regional.
Nada mais razoável do que reconhecer o poder dos Estados (e do Distrito
Federal) de suplementar e suprir a legislação que rege o instrumento de trabalho de uma
função sua, a jurisdição estadual – até mesmo como um poder implícito ou resultante,
que assegura e viabiliza a implantação dos fins constitucionalmente visados.
Equilibram-se, dentro da razoabilidade, os interesses da uniformidade nacional
(com legislação federal plena para a jurisdição federal e geral para a jurisdição estadual)
e da adaptabilidade local (com legislação estadual suplementar e supletiva para
jurisdição estadual), conservando-se o núcleo essencial da esfera legislativa dos entes
federados implicados.
A razoabilidade da proposta de reconhecer-se a competência legislativa estadual
(e distrital), em tema de processo jurisdicional estadual, sobressai ainda mais por não
ser gravosa para o interesse nacional ou para a uniformidade e homogeneidade daquilo
que há de fundamental no âmbito do Direito processual.
Afinal, só quando não há lei federal com normas gerais sobre a matéria, admite-
se que o legislador estadual exerça sua competência legislativa de forma plena
(supletiva) e, havendo (lei federal), ficará adstrito a uma atuação em caráter suplementar
(art. 24, §§2.º e 3.º, CF). E, em ambos os casos, agirá com a produção de leis (supletivas
ou suplementares) que, por só terem eficácia local, e regramento voltado para aquilo
que é peculiar à realidade ali vivida, não gerariam prejuízos ao interesse nacional, mas,
só, benefícios locais.
Desse modo, a partir dessa leitura teleológica, sistemática, histórica e
principiológica dos arts. 22, I, e 24, X e XI, CF, pode-se concluir que:
i) a União tem competência legislativa plena para disciplinar o processo
jurisdicional federal;
ii) a União, os Estados e o Distrito Federal têm competência legislativa
concorrente para tratar do processo (que é procedimento) voltado para o desempenho de
jurisdições estaduais.
Questão única para candidatos do Mestrado e Doutorado –
Professor Ricardo Maurício Freire Soares

Com base na leitura da obra - o princípio constitucional da


dignidade da pessoa humana, da lavra do Prof. Ricardo
Maurício Freire Soares, examine criticamente os aspectos
propostos pelo Autor para a promoção de uma releitura da
fundamentalidade jurídica como caminho para o direito
justo, tendo em vista a dimensão semântica da norma
principiológica da dignidade da pessoa humana

(valor do quesito: 10 )

Barema de Resposta para o Colegiado PPGD/UFBA:

O candidato deve considerar o capítulo 7 da obra - o


princípio constitucional da dignidade da pessoa humana
(pp.149-162), de autoria do Prof. Ricardo Maurício Freire
Soares, e examinar criticamente os seguintes itens:

 a aceitação da aplicabilidade direta e imediata dos


direitos fundamentais (valor: 2,5);

 o reconhecimento da fundamentalidade dos direitos


sociais de cunho prestacional (valor: 2,5);

 a inadequação do conceito de “ reserva do possível” no


constitucionalismo brasileiro (valor: 2,5);;

 a aceitação da ideia de vedação ao retrocesso no campo


dos direitos fundamentais(valor: 2,5);
 a recusa à hipertrofia da função simbólica dos
direitos fundamentais (valor: 2,5).

Valor total do quesito único: 10 (dez)


Questão – Roxana: Disserte sobre o contrato a partir de uma perspectiva
funcional, com base na bibliografia indicada.
Item Fonte Página Pontos Atribuição

Artigo de Gustavo Tepedino


1 O princípio da autonomia privada não é absoluto - 3 1,0
autonomia privada adquire assim conteúdo positivo,
impondo deveres à autoregulamentação dos
interesses individuais, de tal modo a vincular, já em
sua definição conceitual, liberdade à
responsabilidade.

2 Crítica ao viés voluntarista da autonomia da vontade 4 0,5

Artigo de Roxana – Função ambiental do contrato (e Tepedino e


Martins-Costa)
3 Crítica ao contrato como instrumento de realização 237 0,5
da liberdade pessoal, o que pressupõe a falsa
premissa da igualdade entre as partes e a liberdade
de contratar.

4 Crítica ao estudo meramente estrutural do contrato 237 0,5

ou (aceitar também):

crítica à análise estática do contrato (Judith Martins-


Costa)

5 Afirmar o contrato como instrumento de realização 237 0,5


de interesses privados – sua característica passa a ser
a função que desempenha

ou (aceitar também):

contrato como instrumento que rege os interesses


práticos das partes (Judith Martins-Costa)

ou (aceitar também):

contratos de fato (atividade contratual sem negócio


jurídico) (Gustavo Tepedino)

6 Fundamento constitucional na função social da 237 0,5


propriedade

ou (aceitar também):

referência à solidariedade, dignidade, aos arts. 1º e


3º da CF, livre iniciativa, art. 170 da CF

7 Fundamento legal no 421 do Código Civil. 237 0,5


8 Contribui para a proteção do equilíbrio contatual 237 0,5

ou (aceitar também):

crítica à segurança jurídica como fim em si mesmo.

9 Aspecto interno da função social do contrato (0,5): 238 1,5

- utilidade do contrato quanto à satisfação dos


interesses das partes (0,5),

- justa causa do contrato (0,5).

10 Aspecto externo da função social do contrato (0,5): 238 2,5

- proteção da coletividade (0,5),

- reflexos sociais do contrato (0,5),

- exercício da liberdade de contratar de forma


socialmente útil (0,5),

- proibição do abuso de direito(0,5).

Correção da linguagem, clareza, estrutura do texto

11 Correção da linguagem 0,5

12 Clareza 0,5

13 Estrutura do texto 0,5

Total 10,0
QUESTÃO SAULO CASALI:

“A magistratura nem sempre percebe que agrava os problemas que pretende corrigir”.
Comente esta expressão à luz do pensamento dos professores Rogério Gesta Leal e
Richard Posner.

BAREMA:

A resposta deve conter necessariamente considerações sobre:

a aa) O consequencialismo, como necessidade de aferir os efeitos práticos das decisões


no mundo real, evitando-se que o doutrinarismo, o livre discricionarismo ou o
voluntarismo permitam a criação de consequências absurdas ou socialmente
indesejadas;
b) O ativismo judicial, relacionando-o com a separação de poderes e a democracia, o
abandono da técnica pelo Judiciário, e a desconstrução de políticas públicas que
deveriam ser eficientes em relação à coletividade;
c) A utilidade da análise econômica do direito, com suas técnicas e princípios, para
evitar o desperdício social e para o estabelecimento da decisão correta, considerando as
circunstâncias do caso concreto.
SEBASTIAN

Doutorado- Um dos fundamentos utilizados para a condenação de réus na AP 470 foi a


aplicação da teoria do domínio do fato. Em que medida a compreensão desta teoria se mostrou
acertada ou equivocada e como relacionar sua incidência com a tese de domínio da
organização?

Barema

A teoria do domínio parece ser, no Século XXI, o


caminho mais acessado para tentar identificar autores e
partícipes no âmbito da pessoa jurídica. No entanto, a
maneira com a qual ela vem sendo interpretada não
resolve, como em princípio se pretende, os problemas
da responsabilidade pessoal no âmbito da empresa.
Com efeito, a referida teoria tem como função
dogmática fazer a distinção entre autor e partícipe, e
não fundamentar a punição de algum acusado.

Desde o julgamento da Ação Penal 470, perante o


Supremo Tribunal Federal, também conhecida como
julgamento do “Mensalão”, alguns fundamentos foram
utilizados para justificar a responsabilidade penal de
quem não seria o executor material do delito, sob o
pretexto de utilização da teoria do domínio do fato.

Na forma como foi interpretado, o suposto “domínio do


fato” considera que alguém é autor de um delito
quando ocupar uma posição de destaque na estrutura
hierárquica da entidade. Isto acarreta uma espécie de
responsabilidade automática por tudo o que ocorre no
interior da organização, ainda que o sujeito não tenha
realizado o fato pessoal e diretamente. Em suma, como
pondera Alaor Leite, o domínio do fato foi utilizado
como fundamento da punição de pessoas que exerciam
determinadas funções de comando.

Seguindo por este viés, a autoria decorre de uma cadeia


de responsabilidades que obrigatoriamente recai sobre
a alta cúpula da empresa, deduzindo-se ou presumindo
a responsabilidade a partir da posição de destaque
ocupada. Assim, não seria preciso, a partir desta linha
interpretativa, buscar relevância causal da conduta do
dirigente da pessoa jurídica, pois a posição de comando
seria, por si só, suficiente para justificar a
responsabilidade penal.

Poder-se-ia entender que se trata de domínio do fato


pela utilização de um aparato organizado de poder. Na
verdade, esta interpretação da teoria do domínio do
fato apenas faz presumir que alguém, pela sua posição,
tinha conhecimento, dever e poder agir para evitar atos
ilícitos no âmbito de uma organização. Ocorre que,
quanto maior e mais complexa é a estrutura de uma
organização empresarial, mais difícil é estabelecer uma
relação causa entre aquele que está no topo e aquelas
repartições de competências.

A concepção original de Roxin sobre dominio da


organização prevê três elementos estruturais para
aplicação da hipótese de domínio da vontade mediante
aparato organizado de poder:
1. A fungibilidade dos executores individuais, isto é, os
subordinados estarão apenas cumprindo ordens de
tal modo que a recusa de um deles acarretará sua
pronta e imediata substituição por outro que
cumprirá a ordem e executará conduta típica;
2. Uma organização vertical estruturada
hierarquicamente, de modo que exista uma cadeia de
subordinações e competências que assegure ao
superior a certeza de que sua ordem será cumprida;
3. Que este grupo ou associação esteja à margem do
direito, isto é, que se trate de um grupo ou
organização ilegal, como, por exemplo, uma
organização criminosa, uma milícia.

Este último ponto não foi considerado pelo Supremo


Tribunal Federal
SEBASTIAN MESTRADO

1 – Mestrado – É possível haver critérios de autoria num microssistema jurídico que sejam
distintos dos critérios estabelecidos no art. 29 do Código Penal?

Barema

O processo de hipertrofia penal causada pelo surgimento


de microssistemas jurídicos pode apresentar, em princípio,
uma “rachadura” na ordenação sistemática do Direito
Penal.

O caminho para a interpretação do conflito que se


instaura entre as normas penais codificadas e os tipos
previstos nos microssistemas jurídicos passa pela
hermenêutica do artigo 12 do Código Penal

Uma análise superficial do mencionado dispositivo legal


conduziria à idéia de que o próprio código consagra a
prevalência da legislação extravagante, ao dispor que as
regras codificadas só são aplicáveis quando lei dita
especial não trouxer disposição em sentido diverso.
Estaria justificado qualquer critério de autoria em nome
da "especialidade"

Não se pode, porém, tencionar que os crimes previstos


nos microssistemas, na condição de meras regras
jurídicas, possam ser inspiradas apenas pelo caráter
simbólico do Direito Penal, deixando-se de lado seus
princípios fundamentais. Se os microssistemas utilizam-se
da função simbólica do Direito Penal, os crimes ali
previstos devem, por conseguinte, inserir-se
harmonicamente no subsistema jurídico-penal, e, por
conseqüência, subordinar-se a seus princípios
fundamentais

Assim, critérios de autoria nos microssistemas ,


estabelecidos de modo distinto daqueles do código penal,
somente serão válidos se observarem os princípios
fundamentais do ordenamento jurídico penal, tais como
aqueles que estabelecem critérios de responsabilidade
penal pessoal e subjetiva
Enviado do meu iPad
BAREMA DE CORREÇÃO DA QUESTÃO DOS PROFESSORES HERON GORDILHO, DAVID CASSUTO
E TAGORE TRAJANO SILVA:

LINHA – Direitos Pós-Modernos: Bioética, Cibernética, Ecologia e Direito Animal.

QUESTÃO 01.

De acordo com o livro “Direito Animal e Ensino Jurídico: Formação e autonomia de um saber
pós-humanista”, a inserção do art. 225, parágrafo 1º, inciso VII na Constituição de 1988
representou uma verdadeira virada kantiana em prol dos interesses não-humanos. Pode-se
dizer que o constituinte brasileiro deixou as portas abertas para a pós-humanização de sua
Carta ao atualizá-la com ideais que vão além da categorização humana.

Com base no texto da presente linha, responda:

a) O art. 225, parágrafo 1º, inciso VII na Constituição de 1988 descreve um


princípio ou uma regra jurídica?

Explicar a diferença entre normas jurídica (regra e princípios) e a evolução do


constitucionalismo ecológico, bem como suas premissas fundamentais: uma normatividade da
Constituição, reconhecendo que seus dispositivos são normas jurídicas dotadas, como as
demais, de imperatividade; uma supremacia da Constituição sobre o restante da ordem
jurídica; uma mudança de perspectiva jurídica.

Os princípios possuem uma dimensão de peso ou importância. Os princípios não apresentam


uma pretensão de exclusividade, mas sim orientam os fundamentos através de um
balanceamento de valores e interesses encontrados em outros princípios, sem que nenhum
deles perca sua validade. Princípios são mandamentos de otimização e exigem sua realização
na maior medida possível, mas sempre de acordo com as possibilidades fáticas e jurídicas do
caso concreto.

A vedação constitucional de crueldade contra os animais deixa um claro sinal de


reconhecimento da existência de um dever no tratamento e nas práticas dos

Assim, o texto constitucional um imperativo categórico em defesa dos não-humanos, um sinal


invisível dizendo: “Entrada proibida”, a impedir que: 1) os homens não são livres para tirar
vidas ou ferir a integridade dos demais seres como bem entenderem; e 2) o ser humano não é
livre para interferir nas escolhas dos demais seres da Terra, esculpindo narcisicamente os
moldes da vida no planeta.

Com efeito, não se observa grau de generalidade ou abstração no comando constitucional,


podendo a regra ter aplicação imediata e direta nas situações em que haja indício de maus
tratos em desfavor dos animais. Esse foi o entender do próprio constituinte ao tratar do caso
de maus-tratos acontecido na farra do boi, como visto nos fundamentos do art. 225, §1º, VII
ainda durante a Assembleia Constituinte, juízo compartilhado posteriormente pelo Supremo
Tribunal Federal na decisão do Recurso Extraordinário nº 153.531-8/SC.

b) A partir da concepção supramencionada, quem seriam os titulares do


direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e seus
destinatários?

Explicar a evolução do constitucionalismo ecológico


A constitucionalização dos direitos dos animais pós-humaniza o processo interpretativo,
apresentando um novo caminho, ao entender que todos (= todos os seres vivos humanos e
não-humanos da Terra) têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, devendo
defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações (= presentes e futuras gerações
de vida no planeta).

Este novo Constitucionalismo: verde, animal, ecológico, socioambiental e preferencialmente


pós-humanizado, abrange o novo conceito de Constituição Ecológica difundida já nos países
europeus (Alemanha e Suíça) e ganhando forma nos países sul-americanos como a Venezuela,
Bolívia e Equador.

c) Para o autor, a dignidade animal é um conceito que pode ser extraído da


Constituição de 1988. Como compatibilizar o presente entendimento
com aquele encontrado no artigo 1º, inciso III da Carta Magna que prevê
a dignidade da pessoa humana como princípio fundamental do Estado
brasileiro?

A dignidade, desta forma, não seria atributo exclusivo da pessoa humana, mas também de
todas as formas de vida em geral, reconhecendo valores fundamentais não apenas a vida
humana, mas a preservação de todos os recursos naturais, incluindo as outras formas de
existência.

Há um verdadeiro reconhecimento do valor inerente dos animais não-humanos, asseverando


seu status de sujeito-de-uma-vida.

Observa-se que a resposta não é simples e advém do processo de interpretação sistêmica da


própria Lei Fundamental, porquanto: 1) os preceitos constitucionais devem incidir sobre todas
as relações sociais; 2) não existem normas sobrando no texto da Carta de 1988, sendo todas
vigentes e operativas, cabendo ao intérprete tão-somente descobrir o âmbito de incidência de
cada uma; e, 3) não há conflitos reais entre as normas da Constituição, mas apenas conflitos
aparentes, seja porque elas foram promulgadas conjuntamente, seja porque não existe
hierarquia nem ordem de precedência entre seus dispositivos.

A noção de dignidade sofre uma guinada epistemológica, pós-humanizando a Constituição e


seus princípios, apresentando-se como norte interpretativo para todos aqueles detentores de
direitos fundamentais

d) Explique os princípios do antiespecismo, veganismo e não-violência.

Antiespecismo: O princípio antiespecista garante uma igualdade perante a lei, sem


discriminações ou favoritismos interespécies, bem como combate formas de desigualdade na
própria lei, a ser observado no momento de valoração de todos os atos normativos que
submetam os não-humanos à crueldade, sintoma que macula a norma com o sinal de
inconstitucionalidade
Não-violência: A compreensão do princípio da não-violência corrobora com a filosofia que
busca direitos para os animais, porquanto deixa claro uma postura de pacificação
interespécies. O objetivo é esclarecer a população do mal que se causa aos animais,
possibilitando, a cada indivíduo, uma tomada de posição. Esta atitude evita qualquer erro de
interpretação ao relacionar as diversas formas de manifestação popular com violência, ou até
mesmo terrorismo. A radicalização tem que ser pacífica, com ideias e educação constante
(satyagraha). Pode ser que demore, mas o ideal ahimsa é de, acordo com a história, o mais
eficaz para uma reviravolta definitiva dos valores sociais, pois possibilita uma tomada de
atitude por todos os membros da sociedade na busca de paz e equilíbrio interespécies.

Veganismo: O princípio do veganismo evidencia que o reconhecimento do Direito Animal


possibilita uma mudança de atitudes globais e individuais em favor do planeta. Em âmbito
individual, estabelece-se uma nova agenda a defender uma mudança substancial de atitude
em defesa dos não-humanos como uma forma de compromisso político e ético a ser
incorporado pela ciência jurídica. No plano global, há um evidente direcionamento para uma
real mudança de paradigma, a avançar além de posturas benestaristas em direção a uma
perceptiva abolicionista de defesa dos animais. Existe uma rejeição à condição instrumental do
animal, reconhecendo o seu valor inerente
QUESITOS PARA A SELEÇÃO DO MESTRADO E DO DOUTORADO

LINHA DE PESQUISA 4 – Direitos Pós-Modernos: Bioética, Cibernética, Ecologia e Direito


Animal

PROJETO - Direito, “sentido” e complexidade social, Prof. Walber Araujo Carneiro

QUESITO PARA A SELEÇÃO DO MESTRADO:

“A policontexturalidade implica não somente que haja operações


transjuncionais entre o código ‘lícito/ilícito’ do sistema jurídico do
Estado Democrático de Direito e outros tipos de códigos sociais
binários (‘ter/não-ter, ‘poder/não-poder’, ‘verdadeiro/falso’,
‘transcendente/imanente’, ‘amor/desamor’, ‘belo-feio’,
‘consideração/desprezo’, etc.), mas também que ocorram operações
polivalentes entre o código ‘lícito/ilícito’ sob o qual o referido sistema
opera e outras manifestações do código binário do direito.” (NEVES,
Marcelo. Entre Têmis e Leviatã, pg. 265)

“Neste primeiro tempo, a realidade complexa em meio à qual a


conduta se dá deve ser enfrentada direta e contratextualmente. (...)
O momento de abertura contratextual é uma etapa privilegiada para
a formação de um diálogo interdisciplinar, fato que só se torna
possível porque assumimos o problema como o elemento que
tematiza a formação da rede.” (CARNEIRO, Wálber Araujo.
Hermenêutica Jurídica Heterorreflexiva, p. 252-254)

Considerando a complexidade social pressuposta nas concepções teóricas defendidas nas


obras que formam a referência bibliográfica para a seleção, bem como os excertos acima
transcritos, explique como a Hermenêutica Jurídica Heterorreflexiva enfrenta,
metodologicamente, as exigências de interdisciplinariedade decorrentes da
policontexturalidade do ambiente social. Na resposta, enfrente, necessariamente, a) a noção
de “jogo dialógico contratextual”, b) a relevância do “problema”, c) a estruturação da forma
“consenso/dissenso” e d) o papel dos “princípios jurídicos”.

BAREMA

No livro, especial atenção para os itens 4.5.2.3 e seguintes (pg. 251-256)

A complexidade social identificada nas perspectivas sistêmicas de Marcelo Neves e Gunther


Teubner é assimilada, na perspectiva hermenêutica heterorreflexiva, mediante um “jogo” de
duas fases. Em um “primeiro tempo, a realidade complexa em meio à qual a conduta se dá
deve ser enfrentada direta e contratextualmente. O objetivo é promover uma abertura
compreensiva do caso concreto que não obstaculize o acontecer da razão moral-prática que
emergirá fenomenologicamente. Essa perspectiva poderia, por parte daqueles que defendem
a necessidade de redução de complexidade em sociedades complexas, atrair a crítica quanto à
sua inviabilidade. De fato, não podemos ignorar a complexidade e liquefação de sentidos que a
modernização provovou, nem tampouco acreditar que iremos mapear esse universo plural
mediante uma reflexão abstrata. (...). Dito de outro modo, o problema é o nosso redutor de
complexidade; é nele que jogamos e nele que compreendemos. (...) No jogo em que nos
abrimos ao problema, também nos abrimos ao outro. (...) O momento de abertura
contratextual é uma etapa privilegiada para a formação de um diálogo interdisciplinar, fato
que só se torna possível porque assumimos o problema como o elemento que tematiza a
formação da rede. O modelo problemático situado reflexivamente em dois tempos é,
portanto, condição de possibilidade para pensarmos a interdisciplinaridade e a crítica sem,
entretanto, prejudicarmos a autonomia do direito. (...) A abertura permitida pelo jogo
dialógico contratextual amplia o horizonte de sentido, densifica as referências ontológicas
que permitem consensos e, ao mesmo tempo, delimita a zona de conflito para a atuação
pragmática do sistema jurídico [zona do dissenso]. O momento de abertura retratado não
garantirá, portanto, a realização do consenso, sendo justamente essa a razão pela qual
necessitamos de um processo dialógico mediado por um sistema jurídico. (...) Cumprida a
etapa contratextual, somente agora podemos iniciar o segundo tempo do nosso processo
reflexivo, quando a dimensão apofântica [da linguagem, i.e. da linguagem que viabiliza o que
se diz] poderá ser compreendida a partir de um horizonte hermenêutico amplificado e
densificado. (...) enfrentaremos [nesse segundo tempo] em um primeiro nível apofântico o
conteúdo substancial dos princípios jurídicos; em um segundo nível, o conteúdo tecnológico
das regras jurídicas, opções político-estratégicas do sistema; em um terceiro nível a doutrina,
rede dialógica decorrente da produção acadêmica e, em um quarto nível, a jurisprudência,
tradição institucionalizada derivada da concretização do direito pelos tribunais. (...) Os
princípios não se comprometem com uma determinada solução político-tecnológica, a
exemplo do que faz a regra. Assim, se os princípios dissessem algo para além de uma mínima e
necessária entificação voltada à institucionalização de razões práticas deixariam de cumprir o
seu papel. Ao não dizerem nada sobre uma determinada solução tecnológica, os princípios
podem, por outro lado, ‘ouvir’ tudo sobre a institucionalização da razão moral-prática. (...)
Princípios são conexões que sustentarão (...) regras, bloqueando através de seu conteúdo
deontológico – que é derivado do alinhamento compreensivo [consenso] obtido no jogo
dialógico contratextual – possibilidades aplicativas e, ao mesmo tempo, determinando a
opção por outra [solução tecnológica, i.e., por outra regra]” (CARNEIRO, 2011, p. 252-256 –
grifos nossos).

QUESITO PARA A SELEÇÃO DO DOUTORADO:

Analisando as propostas teóricas de Teubner, Marcelo Neves dirá que:

“A policontexturalidade implica não somente que haja operações


transjuncionais entre o código ‘lícito/ilícito’ do sistema jurídico do
Estado Democrático de Direito e outros tipos de códigos sociais
binários (‘ter/não-ter, ‘poder/não-poder’, ‘verdadeiro/falso’,
‘transcendente/imanente’, ‘amor/desamor’, ‘belo-feio’,
‘consideração/desprezo’, etc.), mas também que ocorram operações
polivalentes entre o código ‘lícito/ilícito’ sob o qual o referido sistema
opera e outras manifestações do código binário do direito. Essas, por
seu turno, não se reduzem nem àqueles códigos jurídicos que se
afirmam, respectivamente, em outros sistemas jurídicos estatais
segmentariamente diferenciados, nem ao código binário que se
apresenta no direito internacional público, mas incluem igualmente
os códigos binários específicos das ordens jurídicas globais plurais.
Quer dizer: a referência à unidade não trivial, complexa e múltipla do
sistema jurídico do Estado Democrático de Direito não exclui uma
pluralidade de outras ordens jurídicas que estejam em relações
permanentes de concorrência com esse sistema; portanto, não é, em
princípio, incompatível com o pluralismo jurídico da sociedade
mundial.” (NEVES, Marcelo. Entre Têmis e Leviatã, pg. 265-266)

Diante disso, indaga-se: as ordens jurídicas globais, plurais e fragmentadas descritas por
Teubner constituem sistemas jurídicos autônomos em face dos respectivos sistemas sociais
parciais da sociedade global com os quais estão acopladas do mesmo modo que o sistema
jurídico se apresenta em face da política no âmbito do Estado Democrático de Direito? Na
resposta, considere a avaliação crítica de Marcelo Neves em “Entre Têmis e Leviatã”, bem
como dinâmica da constitucionalização descrita por Teubner em “Fragmentos constitucionais”.

BAREMA

A pergunta reproduz, em verdade, o questionamento que o próprio Marcelo Neves faz em


“Entre Têmis e Leviatã” quando analisa criticamente (pg. 265 e seguintes) o fenômeno da
fragmentação descrito por Teubner. E, dessa forma, responde o próprio Marcelo Neves:

“Pode-se, certamente, a partir de uma releitura, retirar dos próprios textos de Teubner
elementos que sugerem uma resposta negativa a essa questão. As ordens jurídicas globais
construídas com base em “private governments” encontram-se antes em uma relação de
subordinação para com os [seus] respectivos sistemas mundiais. Teubner concentra sua
abordagem no direito econômico mundial, especificamente na lex mercatória, destacando-a
entre outras law’s global villages. No tratamento dessa forma de direito mundial, aponta para
sua falta de autonomia em face dos processos econômicos globais e chama a atenção para as
perspectivas negativas ‘de uma evolução jurídica independente da lex mercatória’, porque ‘a
variação e a seleção autônomas da lex mercatoria são tão subdesenvolvidas que a formação
desse direito ficará atrelada à evolução externa do sistema econômico, sem, contudo,
engendrar uma evolução autônoma’. Com o exemplo do direito econômico mundial, portanto,
pode-se constatar claramente que as ordens jurídicas globais permanecem dependentes dos
respectivos sistemas mundiais dinâmicos, afastados da esfera pública, sendo
instrumentalizadas por esses. Isso resulta, então, em formas concretas de trivialização do
direito a cada vez que as correspondentes esferas funcionais da sociedade mundial recorram
ao código jurídico. (...) No caso das relações das ordens jurídicas globais com os sistemas
mundiais, especialmente no exemplo do sistema econômico global, não há acoplamentos
estruturais [a exemplo da constituição do Estado democrático de direito], mas sim
dependências unilaterais e subordinações estruturais e difusas do direito a ‘dominadores’
invisíveis. (...) Têmis é violada por diversos Leviatãs irresponsáveis. Teubner não desconsidera
[alerta Marcelo Neves] o problema da corrupção estrutural, irresponsabilidade e oligarquia
nos private governments (...) [mas acredita que eles] podem ser democratizados (...) mediante
formas de procedimentos democráticos correspondentes aos do Estado de Direito. (...)
[Teubner, afirma Marcelo Neves,] recorre, por fim, à concepção predominantemente
normativa da repolitização desse tipo de direito econômico mundial, por via da qual os
mecanismos dessa ordem jurídica entrariam mais nitidamente ‘no campo de visão do debate e
controle públicos’. [Mas, discordando, entende Marcelo Neves que] a introdução de
procedimentos democráticos baseados na rule of law e de controles públicos contraria
exatamente a razão do surgimento e a utilidade específica do direito econômico mundial dos
‘governos privados’, que pretendem, em nome da ‘flexibilidade’, e eficiência, escapar da
‘imobilidade’ de tais procedimentos e controles. [E arremata, afirmando categoricamente que]
de maneira nenhuma, constituem formas ju´ridicas que estejam em condições de reaizar o
princípio da igualdade e o due process of law e de submeter-se ao debate e controle público,
tal como o direito autônomo, constitucionalmente amparado, do Estado Democrático de
Direito.”(NEVES, Marcelo. Entre Têmis e Leviatã, pg. 266-267)

Todavia, o enfrentamento da segunda exigência trazida pelo enunciado da questão – i.e., da


dinâmica da constitucionalização descrita por Teubner em “Fragmentos constitucionais” –
poderá arrefecer as críticas que Neves faz ao modelo de Teubner. Diz Teubner (pg. 150 e
seguintes) acerca da “constitucionalização em desequilíbrio dinâmico”: “Não é de se esperar
que, a longo prazo, o constitucionalismo mundial se limite, dessa forma – i.e. unilateralmente
e de forma ‘neoliberal’ – à sua função constitutiva. É apenas uma questão de tempo até que as
energias sistêmicas libertas, justamente com o inegável lado produtivo de seus efeitos,
desencadeiem também consequências desastrosas em tal medida que os conflitos sociais
atuais exijam uma drástica correção da política constitucional. (...) um movimento ‘(...) não
apenas de forças plurais, mas de forças mutualmente contrárias que são responsáveis pela
dinâmica específica do capitalismo, uma dinâmica posta em movimento não em uma direção
retilínea, mas em ondas cíclicas de institucionalização e desinstitucionalização. Em tais
processos de um ‘desequilíbrio dinâmico’, nos quais liberação e limitação da lógica funcional
se intercalam reciprocamente, atingiu-se um ponto de virada após uma longa fase constitutiva.
Agora, instituições se tornam indispensáveis para combater os perigos horizontais à
integridade. Em vez de normas constitucionais constitutivas, agora são requeridas normas
constitucionais limitativas [ressaltando que o ‘constitucional’ aqui não está associado à
constituição política do Estado nacional, mas aos processos de autoconstituição jurídica no
âmbito dos próprios sistemas parciais fragmentados]. (...) Decerto, a política
[auto]constitucional constitutiva suspendeu todas as limitações impostas pelos Estados
Nacionais aos sistemas funcionais em suas tendências expansivas. Desimpedidos das restrições
dos Estados Nacionais, os sistemas funcionais são agora capazes de perseguir mundialmente a
maximização de seus programas. (...) Desse modo, trata-se de identificar quais as dinâmicas
que aceleram espirais de crescimento de um setor social de tal modo que elas se tornam
destrutivas por colidirem com outras dinâmicas sociais. (...) A experiência da contingência
propriamente dita não é o ‘momento constitucional’ [grife-se, autoconstitucional], mas sim a
experiência da iminência da castástrofe. Com isso, não se aponta para o momento no qual a
dinâmica de aumento autodestrutivo deixa de transparecer o perigo abstrato de um colapso -
esse é o estado normal -, mas sim o momento no qual o colapso se apresenta como
diretamente iminente. A sociedade diferenciada funcionalmente parece ignorar as
possibilidades mais brandas e autocorreção (...). Os processos de autoincremento endógeno
são tão dominantes que eles permitem uma autocorreção apenas no último segundo. A
similaridade com os fenômenos individuais é inevitável: ‘é preciso chegar no fundo do poço!’.
(...) Quando processos excessivos de crecimento deixam um sistema social fora de controle
dessa forma, então, colocam-se as alternativas: intervenção estatal ou constitucionalização
interna. Uma permanente estatização dos sistemas parciais não é mais uma opção seriamente
discutível após a experiência com os totalitarismos políticos do último século. Antes,
preferivelmente, apresentam-se regulações políticas de processos parciais por global
regulatory regimes. (...) De duas, uma: ou o controle administrativo de processos
comunicativos globais ou autolimitação das opções do sistema forçada a partir de um ponto
externo. Se é correto que a proteção contra os três perigos de colisão é central –
autodestruição do sistema, dano ao ambiente em sentido amplo (ameaça aos ambientes
humano, social e natural) e a ameaça à sociedade global – então, é de se priorizar a segunda
opção. Essa é a mensagem central do constitucionalismo social [no sentido de societal].”
(TEUBNER, Gunther. Fragmentos constitucionais, pg. 151-160)

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CARNEIRO, Wálber Araujo. Hermenêutica Jurídica Heterorreflexiva. Porto Alegre: Livraria do


Advogado, 2011.

NEVES, Marcelo. Entre Têmis e Leviatã - Uma relação difícil. São Paulo: Martins Fontes, 2012.

TEUBNER, Gunther. Fragmentos constitucionais: constitucionalismo social na globalização. São


Paulo: Saraiva, 2016.
UFBA – PPGD
SELEÇÃO 2017.1
PROFESSOR ANDRÉ PORTELLA
DIREITO FINANCEIRO E TRIBUTÁRIO
FINANCIAMENTO PÚBLICO
E EFETIVIDADE DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
QUESTÃO PARA A PROVA ESCRITA
A partir da leitura dos estudos de Thomas Piketty e de Evilásio Salvador,
e sem
desconsiderar estudos de outras fontes, elabore uma análise-crítica da
estrutura e da
realidade do financiamento público brasileiro; e a partir de tal análise,
formule as
linhas gerais, com respectivos fundamentos, do que considera um
modelo de
financiamento público alinhado com a Constituição Federal de 1988.
BAREMA PARA A CORREÇÃO PELA BANCA
CRITÉRIO DE AVALIAÇÃO Pontuação
Qualidade gramatical do texto (erros de gramática), e conhecimento de normas ABNT 1,0
Estilo da linguagem (científica, objetiva, clara, direta, com remissão a dados empíricos,
históricos e
comparados)

Será especialmente valorada a inclusão de dados empíricos referentes a arrecadação


tributária, receita,
despesa (principalmente aquelas voltadas ao financiamento dos direitos fundamentais e
sociais – saúde,
educação, previdência e assistência social), citação dos tributos que compõem o
sistema tributário
nacional (impostos, taxas, contribuições); dívida e endividamento público; cruzamento
de tais dados
com outros dados empíricos, tais como índices de analfabetismo, saneamento,
mortalidade infantil e
afins. 1,0

Conhecimento da estrutura de financiamento público existente no Brasil, e capacidade


de análise-crítica
sobre a mesma

Demonstração de conhecimento sobre os tributos existentes no país; a divisão da


competência
tributária numa perspectiva federativa (tributos municipais, estaduais e federais);
percepção de que
Estados e principalmente municípios são profundamente prejudicados pelo modelo de
divisão de
competência existente no Brasil; percepção de que a tributação indireta sobre o
consumo (ICMS, IPI,
PIS, COFINS, ISS) é intrinsecamente injusta em comparação com os chamados tributos
diretos sobre
renda e propriedade (IR, IPTU, IPVA, ITR, ITIV, ITD); percepção de que o sistema
tributário brasileiro é
dotado de um extremo caráter regressivo, de forma a tributar mais onerosamente
aqueles que têm
menor riqueza. Demonstração de conhecimento das razões históricas que levaram o
Brasil a ter um
sistema tributário regressivo e pautado na tributação sobre o consumo (Colonização;
crise de 29;
modificação dos padrões internacionais de influência política, com maior
preponderância dos EUA,
sobretudo a partir do pós-guerra; crise do petróleo e financeirização da economia na
década de 70; crise
da dívida pública na década de 80). Percepção de que no Brasil a carga tributária é maior
sobre a pessoa
física assalariada, do que sobre as empresas; e de que dentro do universo empresarial
as grandes
empresas são especialmente favorecidas.
Percepção de que historicamente 45% a 50% do orçamento público tem sido voltado ao
pagamento da
dívida pública, em detrimento dos gastos com saúde (menos de 4%), educação (menos
de 4%),
assistência social (cerca de 3%), saneamento (menos de 0,1%), cultura (menos de 0,1%)
e direitos de
cidadania (menos de 0,1%) 2,0

Demonstração de conhecimento de obras críticas sobre o modelo de financiamento


brasileiro, inclusive 3,0
em termos históricos e comparados, além daquelas indicadas na questão proposta

Além dos mesmos itens considerados anteriormente, Indicação e conhecimento da obra


de Thomas
Piketty (perspectiva histórica e comparada do sistema de financiamento público) e
Evilásio Salvador
(perspectiva empírica e crítica da arrecadação tributária do Brasil atualmente). Estas
fontes foram
indicadas no edital e considera-se a sua leitura obrigatória para a prova.
Conhecimento de obras críticas sobre a realidade política, econômica social e financeira
do Brasil e
comparada: James O’Conner (perspectiva norte-americana e histórica da conformação
do sistema de
financiamento público); David Harvey; Giovanni Arrighi; Celso Furtado; Milton Santos;
Sérgio Buarque
de Holanda; Gilberto Freyre; Darcy Ribeiro; Clássicos da Economia, da Sociologia e da
Política.
Clássicos do Direito Financeiro, Ciência das Finanças e Direito Tributário: Aliomar
Baleeiro, Sylvio de
Faria, Johnson Barbosa Nogueira, Geraldo Ataliba, Alfredo Augusto Becker, etc.

Capacidade de elaboração de propostas para o modelo de financiamento público


brasileiro, com vistas à
realidade atual e à perspectiva crítica lançada sobre esta realidade, nos termos do item 3
acima

A partir dos dados e das fontes de estudo indicadas acima, verificar a capacidade de
proposição para
uma reforma do sistema de financiamento público brasileiro. Algumas perspectivas de
proposição serão
especialmente valoradas:
i. propostas de modelos de financiamento que enfatizem a eficácia dos direitos
fundamentais e
da implementação das políticas sociais, especialmente no tocante à saúde, previdência,
assistência social e educação;
ii. propostas voltadas ao fortalecimento dos entes municipais no âmbito no federalismo
fiscal;
iii. preocupação para com a questão da progressividade tributária (carga tributária maior
sobre
quem tem menor renda e patrimônio);
iv. alternativas a uma realidade tributária que favorece a concentração de renda e
patrimônio;
v. alternativas a uma realidade tributária que favorece a perpetuação da acumulação de
renda e
patrimônio (ênfase na tributação da renda, da propriedade e da herança, como
alternativa à
tributação sobre consumo e produção);
vi. alternativas a um modelo de financiamento pautado no pagamento dívida e no
endividamento
público;
vii. alternativas a um modelo de financiamento que extrai as riquezas construídas pela
população
brasileira e que é exportada para o estrangeiro, por meio do pagamento de tributos
canalizados ao pagamento da dívida pública. 3,0

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