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Introdução Territórios do fazer e territorialidades
do devir da cultura
Considerarmos que a cultura é
muito mais do que um conceito normativo Partimos da concepção conceitual
empregado para definir distinções entre que a cultura é uma prática significante
práticas sociais, ou mesmo para deter- de apropriação e uso do território. Sob
minar juízos de produção/consumo de esta angular, o território se nos apresenta
bens estéticos. A cultura diz respeito às como uma relação eminentemente inter-
vivências concretas dos sujeitos no ato subjetiva, constantemente atualizada e
de conceber e conhecer o mundo, a partir reiventada em nossas atuações de com-
do reconhecimento de semelhanças e de partilhamento no mundo da vida: “o ter-
diferenças que são construídas em seus ritório é o fundamento do trabalho, o lu-
territórios de existência. gar da residência, das trocas materiais e
espirituais e do exercício da vida” (SAN-
Pode-se afirmar, então, que a cul- TOS, 2002, p. 10).
tura é produto do encontro de saberes
e fazeres na pluralidade da vida social. No território estão as cristalizações
Portanto, devemos considerar que a cul- de símbolos, de memórias e de valores
tura se constrói do movimento próprio que encarnam o sentido da cultura. E, por
das relações dos indivíduos entre si e meio da apropriação do território que se
com a experiência de realização da vida geram os usos e os estilos, combinando
com outros diferentes, promovendo a maneiras de fazer e invenções de sabe-
significação do seu ser-no-mundo indivi- res inscritos em posições culturais social-
dual e coletivo. mente construídas. O território emerge
como um acervo prático-simbólico, onde
Na mesma direção devemos tudo pode ser continuamente reconstruí-
sublinhar que as culturas urbanas re- do e reordenado das mais diferentes ma-
sultam igualmente de cenários da di- neiras possíveis.
ferença, sendo possível afirmar que a
produção e o consumo cultural são pró- Nesta perspectiva, não devemos
prias às trocas simbólicas em redes de considerar o território como um recorte
sociabilidade. Todavia, como podemos de chão fechado em si mesmo e com
afirmar a cultura como ato e potência fronteiras absolutamente rígidas ou im-
da diferença em espaços socialmente permeáveis. O território deve ser per-
ordenados em hierarquias de consumo cebido e vivido a partir de franjas po-
de bens simbólicos, geralmemte funda- rosas, por onde as relações de troca
dos em arbítrios de superioridade so- de ideias, de valores, de práticas e de
cial (e, não raras vezes, racial)? objetos se realizam em intensidades
diversas. Um universo de abrigos da
Para enfrentar o desafio da cultu- diferença de vidas socialmente cons-
ra como expressão da diferença se faz truídas. Ou seja, a construção de uma
urgente recusar de identidades essen- ordem de proximidades, de afetivida-
cialistas e acabadas, para colocar em des e de conflitos que fazem a cultura
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assumir uma geografia de ações e in- ção de coletivos e grupos sociais su-
tenções humanas. balternizados na cidade:
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tes galeras; e batalhas de hip hop mobi- as que visam garantir as condições
lizando seus rappers e bailarinos de rua materiais do fazer e a visibilidade de
- são expressões contundentes de uma suas realizações.
cultura de massas que nascem, mas
transbordam as favelas, em misturas É imperiosa a publicização dos
de alegrias, dramas, recusas, paixões recursos de financiamento do Estado,
e protestos que assumem perspectivas considerando a produção cultural e
outras de apropriação estética do/no es- artística como parte integrante e in-
paço urbano. Reside nesta cartografia tegradora da vida social nas favelas.
de ações um conjunto de oportunidades Os investimentos públicos no âmbito
reais para desenvolvimento econômico da cultura deverão estar orientados
e social nas escalas local e urbana. para o afeiçoamento ao território usa-
do pelos praticantes da cultura. Ou
A destacada criatividade permite seja, reconhecer as práticas culturais
projetar uma um promissor desenvol- e artísticas como ato de sujeitos e po-
vimento local em bases efetivamen- tência de sociabilidades inovadoras.
te comunitárias, com enlaces de uma
economia de compartilhamentos de Não se preconiza aqui, eviden-
produção, comunicação e fruição es- temente, uma economia de espetácu-
tética. Para tanto, se faz necessária los que certamente fará das favelas um
à formulação e à implementação de objeto de consumo de classes médias
políticas culturais de investimentos em esclarecidas e ardorosas de entreteni-
redes colaborativas - envolvendo indi- mento cultural. Mas uma virtualidade
víduos, grupos e coletivos que atuam de empoderamento da criação e da
nos territórios populares - justamente fruição estética em curso nas favelas.
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