O “TERCEIRO SETOR” E O EFEITO CURATIVO: BREVE REFLEXÃO1[1]
Prof.Dr. Felipe Luiz Gomes e Silva
Do Departamento de Administração Pública da Facudade de Ciências e Letras da UNESP – Universidade Estadual Paulista, campus de Araraquara
Além do “Primeiro Setor” (composto por instituições do Estado) e do
“Segundo Setor” (constituído pelas empresas privadas que objetivam lucro) há, segundo alguns pesquisadores, um “Terceiro Setor”. A noção “Terceiro Setor”, “é uma expressão de linguagem que foi traduzida da língua inglesa (Third Sector)” (Fernandes, 1977:28). Segundo Coelho (2000) foi usada pela primeira vez por pesquisadores norte-americanos na década de 70. Essa noção, que pretende definir um fenômeno social complexo, exige dos estudiosos uma leitura atenta e cuidadosa. Como sabemos, qualquer conceito é apenas uma aproximação da realidade e essa realidade pode manifestar - se de formas variadas, ou seja, depende muito do contexto social, do tempo e do lugar. A palavra é um instrumento ideológico por excelência. (Bakhtin, 1997) Sendo assim, tentando FINS SETOR demarcar as fronteiras entre o “Primeiro, Segundo e Terceiro Setores” numa primeira aproximação da complexa realidade social, vejamos a ilustração abaixo: AGENTES Privados Para Privados Mercado (segundo setor) Públicos Para Públicos Estado (primeiro setor) Privados Para Públicos Terceiro Setor Públicos Para Privados (corrupção) lucros e respondem a necessidades coletivas.” (Fernandes, 1994b: 21). O conceito é certamente amplo e passível de qualificações sob diversos aspectos. As variações ocorrem, e os casos fronteiriços suscitam disputas polêmicas, como acontece com qualquer classificação.” (Fernandes, 1995: 32). Como exemplos de instituições que pertencem ao “T.S.” podemos citar, a Fundação Abrinq (S.Paulo), a Anistia Internacional, a ONG “Projeto Axé de Educação Infantil e Adolescente” (Salvador), o Orfanato Renascer em Araraquara, Circus em Assis (OSCIP), e também todo um conjunto de entidades assistenciais e caritativas. Logo, dada esta diversidade de instituições e de objetivos a noção é imprecisa e problemática. Para nós, a questão não se resume a uma mera dificuldade formal de classificação, como já apontamos acima, resulta de seu caráter ideológico. Segundo Oliveira, as Organizações Não-Governamentais (ONGs), por exemplo, "são importantes elementos de ativação da sociedade em geral quando fazem o trabalho de passagem das carências para os direitos". (Oliveira,1995:17). Indagamos: quantas, de fato, realizam essa passagem? Ressaltemos que para Fernandes (1994) o “T.S.” não pretende substituir a ação do Estado, a sua dinâmica deve ser complementar. É fruto das insuficiências e dos limites da atuação do Estado e do mercado. Mas, como sabemos independente da vontade e das boas ações humanas, o denominado “T.S.” tem, na realidade, crescido como efeito das perversas políticas neoliberais. Com a crise do Estado de Bem Estar Social (nos países centrais) e do Estado Desenvolvimentista (nos países periféricos), a ideologia do “T.S.” passa a ser funcional/operacional ao capitalismo neoliberal, ocultando as raízes do desemprego, da precarização do trabalho, da pobreza e da miséria. Em resumo, sendo o crescimento do “T.S.” fruto da modernidade, do progresso técnico e da ampliação do exército industrial de reserva é um efeito da própria natureza do modo de produção capitalista, da dinâmica da economia competitiva/monopolista de mercado que opera sob um regime de acumulação predominantemente financeiro. Portanto, a pobreza somente será superada com a construção de uma nova sociabilidade humana livre da lógica do capital. O assistencialismo e a cidadania menor (renda mínima, fome zero etc.), práticas inerentes ao chamado “T.S.” e às políticas pseudoliberais, talvez possam, por algum tempo, “animar” parte da sociedade, e amenizar, parcialmente, o sofrimento humano, o que Robert Kurz (1997) chama, apropriadamente, de simples efeito curativo.