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Herrero

Kant inaugura na história da filosofia uma nova forma de fazer


ética. (p. 18)

Primeiro passo: contexto.

Segundo: fundamentação do princípio da moralidade, o


imperativo categórico.

Haverá a demonstração do significado do imperativo categórico


para a distinção entre Moral e Direito.

1) Contexto.

Kant, no texto "O que é esclarecimento" lança o tema "tem


coragem de servir-te de teu próprio entendimento". A
Aufklärung é a saída do estado de minoria de idade. Minoria de
idade é a incapacidade de servir-se do próprio entendimento
sem a direção do outro. (p. 18)

Kant entende que, por sermos seres humanos, todos temos a


consciência de possuirmos um valor absoluto.

"E o homem, todo ser humano, tem um valor absoluto porque é


capaz de boa vontade, isto é, porque tem consciência de colocar
seu agir sob o ditame da razão prática. É porque o ser humano é
sujeito da razão prática que ele consegue autarquia, que ele é
autonômo, que ele se dá sua própria lei".

O ser humano, por ser sujeito da razão, tem dignidade, e não um


preço, porque seu valor é absoluto. (p. 19. Herrero referencia a
fundamentação da metafísica dos costumes)

Kant pretendeu dar ao homem moderno a consciência de sua


posição no mundo. "Ele deve apresentar-se nesse mundo como
aquele que tem de exercer sua cidadania na plena consciência
de estar realizando sua liberdade política e sua função
insubstituível de legislador, e como aquele que pode exigir de
todos o reconhecimento desta posição. É por isso que Kant
pretende fundar uma moral, na qual se trate dos deveres que
fazem justiça ao valor absoluto do ser humano". - p. 19

"Moral e Direito, são, pois, as duas peças-chaves capazes de


promover o lugar que compete à dignidade e ao valor absoluto
do homem no mundo moderno". - p. 19

É só pela razão que o homem consegue autarquia e se torna


autônomo, e por isso, a moral de Kant é uma moral da razão
pura prática. (p. 19)

A autonomia do ser humano se dá em função da sua razão


incondicional. A razão é incondicionalmente legisladora, e ela
torna o homem incondicionavelment elegislador. (p. 19). Por
isso, conclui Herrero: "Se a razão é incondicionalment
elegisladora, então nenhuma regra de decisão da razão
instrumental, estratégica ou funcionalística, nenhuma
racionalidade meios-fins, nenhuma eticidade convencional do
mundo da vida poderá prender substituir o papel absolutamente
inalienável da razão, que tem sua sede no ser humano". -(p.
19/20)

É uma ética do dever, deontológica. Nada humano é desprezível.


Tudo deve ser avaliado a partir da posição do homem como
autolegislador. (p. 20)

"Não serão, então, os desejos e inclinações dados naturalmente,


não serão os interesses contingentes e históricos que
determinarão o que é humano. É o homem mesmo como
autolegislador, e ao mesmo tempo como destinatário de suas
próprias leis, que dá à sua existência o caráter da necessidade,
de autodomínio e de superioridade sobre todos os outros estados
que provêm de fora" - p. 20

No mundo há muitas coisas boas "para algo", mas só a boa


vontade é um bem incondicionado. A boa vontade não é
resultado de qualquer ação, mas uma vontade que o homem
produz ao se fazer senhor de si, autolegislador de si mesmo.
Determina-se pela sua prpopria lei, que é a lei da razão. A
atitude de avaliar as coisas conforme essa voa vontade é
chamada "Gesinnung".

O que é uma boa vontade? Esse é um problema da relação da


vontade com a razão, que pode ser respondido a partir do
imperativo categórico. (p. 20_

2) Fundamentação do supremo princípio da moralidade

Quando Kant escreveu sua Ética, já tinha dado as bases dessa


ética na Crítica da Razão Pura.

Três pressupostos são importantes para compreender as obras


morais de Kant.

1) Distinção entre coisa em si e fenômeno.

"Nosso conhecimento não pode ultrapassar os limites da possível


experiência, ele se refere só aos fenômenos. A coisa em si é
incognoscível." - p. 21.

Conhecer é algo que se faz apenas no mundo dos fenômenos.


Além do mundo do entendimento, existe o âmbito da razão, que
é o mundo das idéias regulativas, e o âmbito da razão prática, ou
mundo do agir, no qual podem ser pensadas a liberdade e a
moralidade.

No entanto, as ações da liberdade também se constituem


fenômenos. Existe portanto uma distinção o mundo "noumenal",
no qual residem os princípios a priori da razão, e o "mundo
fenomenal", que deve ser regulado pela lei da razão.

Na Fundamentação da Metafísica dos Costumes, Kant estabelece


como meta a fixação do princípio supremo da moralidade. (p. 21)

Primeira seção: conceito de "boa vontade". Nas ações cotidianas,


estamos pressupondo o princípio d amoralidade. O conceito de
boa vontade pressupõe o imperativo categórico. p. 22

Segunda seção: parte do conceito de "faculdade da razão


prática" e mostra que ele pressupõe o conceito de dever. Nessa
seção, Kant mostrará que a determinação desse dever tem a
forma de um imperativo categórico, e que a formulação
encontrada coincide com o princípio do conhecimento moral
encontrado na primeira seção (p. 22 )

Tanto a "boa vontade" da vida quotidiana como o conceito


filosófico de "faculdade prática da razão" mostram que os dois
pressupõem o imperativo categórico. Assim, pelo caminho
analítico, vemos que o supremo princípio da moralidade (um
princípio implícito nos conceitos morais) é o imperativo
categórico. (p. 22)

Para estabelecer que o imperativo moral é categórico ( =


prescreve incondicionalmente), temos de admitir um uso
sintético da razão pura prática. Esse uso da razão pura prática é
sintético porque não está ligado analiticamente a outra ação já
pressuposta. Quando o imperativo pressupõe uma outra ação,
quando existe uma ação condicionante, o imperativo é
hipotético. Já o imperativo categórico prescreve a priori uma
síntese necessária, conectando o querer de uma ação com o
conceito de uma vontade racional. Se uma ação é proveniente de
um ser racional, ela pressupõe uma lei racional a priori,
precedente e independente de experiência. É então que Kant
leva a cabo a tarefa de deduzir o imperativo categórico. - p. 23

Vejamos a argumentação de cada parte.

Para Kant, o conceito de "obrigação" só surge para uma vontade


que não é apenas racional, mas também emírica, como é o caso
dos seres humanos. "Para o ser humano, já na vida cotidiana, o
conceito de dever contém o de uma boa vontade, mas o contém
sob certas limitações".

A primeira condição para que o conceito de dever contenha o de


uma vontade é a existência de uma motivação subjetiva correta.
A ação deve ser praticada por dever. Em segundo lugar, a ação
realizada por dever deve corresponder Pa lei a priori que a
determinada, ou seja, o dever pressupõe um princípio do querer
a priori como determinante da ação". - p. 23/24
"O conceito de dever é, pois, empregado de forma que o valor
moral de uma ação depende, por um lado, da motivação
subjetiva e, por outro lado, de uma 'lei a priori' ou de sua
necessidade". p. 24

O que liga essas duas condições é o "sentimento de repeito". Ou


seja, é preciso que o respeito pela lei a priori leve à motivação
subjetiva da ação. É por isso que Kant definirá dever como "a
necessidade de uma ação por respeito à lei". p. 24

Lei a priori constitui o bem por excelência, o bem moral. A lei


será "devo proceder sempre de modo que eu possa querer
também que a minha máxima se torne uma lei natural". p. 24

Segunda Seção: parte do conceito da faculdade prática da razão.


Quer provar que também a faculdade prática da razão pressupõe
o conceito de dever. p. 24

Apenas o ser racional tem a faculdade de agir segundo a


representação das leis. Um ser puramente racional agiria
exclusivamente segundo a representação das leis: ele teria uma
vontade pura. Os seres humanos não são puramente racionais. A
razão não determina unicamente por si a sua vontade, ainda está
sujeita a condições, nem sempre age segundo a representação
das leis. "E é aí que a relação da faculdade da razão prática com
a vontade empírica, isto é, afetada por inclinações, tem de ser
representada como obrigação (Nötigung), porque também o ser
dotado de vontade empírica conhece a necessidade objetiva das
ações do ser racional. Dito com outras palavras: se nós
compreendermos os conceitos implicados no conceito de
faculdade de razão prática, teremos de pensar a relação de
razão prática e vontade empírica como obrigação". p. 25

"Mas bem entendido: a relação entre lei objetiva e vontade só


assume a forma de uma obrigação quando a vontade não é só
racional. Se a vontade fosse unicamente racional, todas as suas
ações seriam de antemão objetiva e subjetivamente necessárias.
A prescrição não teria qualquer sentido. Daí que, para uma
vontade pura, os princípios objetivos, entre eles a lei moral, são
descritivos. Mas para uma vontade que também é sensível e que,
portanto, nem sempre age unicamente pela pura representação
a lei, esta assume a forma de um imperativo, que se exprime
pelo verbo dever. Para ela a lei moral é prescritiva". p. 25

"Isso significa: quando eu penso em um imperativo hipotético,


não sei de antemão o que ele poderá conter, mas quando penso
um imperativo categórico, aí sim sei de antemão o que ele
contém. Ele contém exatamente a necessidade incondicional da
máxima de ser conforme a essa lei, e como a lei não contém
nenhuma condição que a limite, então o que resta é a
'universidade de uma lei em geral, à qual a máxima da ação deve
conformar-se'. Por isso o imperativo categórico é só um, e o
único que este imperativo representa como necessária é
propriamente essa conformidade da máxima com a lei. E é por
isso que podemos encontrar exatamente como deve rezar esse
imperativo: "Age só segundo aquela máxima, pela qual tu possas
querer, ao mesmo tempo, que ela se torne universal". " - p. 26

Assim, coincide a formulação do imperativo categórico com o


princípio do conhecimento moral da razão humana comum.

"Tendo descoberto o imperativo categórico como pressuposto


tanto do conceito quotidiano de boa vontade como do conceito
filosófico de razão prática, está posta a base para a aplicação do
método sintético. Agora poderá ser provado que o imperativo
categórico não é só um pressuposto conceptual, mas que vale,
isto é, que surge com a pretensão incondicional de validade para
o agir de todo ser racional. É com a “dedução” do imperativo
categórico que a tarefa de Kant estará concluída." - p. 27

A dedução do imperativo categórico implica dois aspectos.

Primeiro: como se justifica a pretensão incondicional da validade


do imperativo categórico. Ou seja, com que direito podemos
considerar o imperativo categórico como válido?

Segundo: o imperativo categórico liga a vontade pura e a


vontade empírica. Como essa conexão é possível? Como é
possível a síntese que a obrigação do imperativo categórico
prescreve a priori?

"Os dois aspectos são, pois, como pensar a obrigação e como


pensar a conexão existente a priori na obrigação do imperativo
categórico. Kant trata ambos os aspectos na terceira seção". p.
27

"E agora vem a premissa central: mas como o mundo inteligível


contém o fundamento e as leis do mundo sensível, o ser
puramente racional tem que considerar sua vontade (pura) como
legisladora, e o ser sensível terá de pensar-se como submetido a
essa lei do mundo inteligível que é o mundo da razão. Portanto, o
ser humano, que é tanto racional como sensível, terá de pensar-
se como legislador e como submetido à lei da razão e, em
conseqüência, as leis do mundo inteligível terão de ser pensadas
como imperativos, e as ações conformes a este princípio como
deveres." - . p28

Segundo aspecto: "O terceiro termo que faz a conexão a priori


no imperativo categórico é a liberdade".

Liberdade é a propriedade da causalidade da vontade. Livre é


aquele que não é determinado por algo externo. A liberdade
também tem sua lei, embora não seja lei natural. A liberdade não
pode ser determinada por causas estranhas, apenas por ela
mesmo. A liberdade é autonomia. Esta lei caracterizaria o
"princípio" de seu agir. A máxima que desdobra as ações da
liberdade deve ser tal "que possa ter-se a si mesma também por
objeto como lei universal". Coincide com o imperativo
categórico. A autonomia da vontade (ou seja, o fato de ser livre)
é também sua sujeição ao imperativo categórico. (?)

Para isso, precisamos atribuir a liberdade a todos os seres


racionais.

"Como Kant prova essa proposição? Sempre que atribuímos a


um ser razão e vontade, nós pensamos a razão desse ser como
prática, isto é, como causalidade com relação a seus objetos.
Mas a razão não pode tirar os princípios nela envolvidos de
nenhuma outra parte senão de si mesma, pois do contrário “o
sujeito atribuiria a determinação da faculdade de julgar não à
sua razão, mas a um impulso”. Daí que, seja como razão prática,
seja como vontade de um ser racional, ela tem de considerar-se
a si mesma como livre (com sua lei própria). Portanto, a todo ser
racional que tem uma vontade temos de atribuir-lhe
necessariamente também a idéia de liberdade." - p. 29

Retornando, então, à conexão entre vontade empírica e vontade


pura. A idéia de liberdade possibilita a conexão entre as duas.

"A idéia de liberdade possibilita a conexão entre as duas, porque


é ela que faz de cada ser humano um membro do mundo
inteligível e um membro do mundo sensível, mas o faz de forma
que a vontade, enquanto pertencente ao mundo inteligível,
sendo “pura, prática por si mesma, contém a condição suprema
da primeira [isto é, da vontade afetada por apetites sensíveis]
segundo a razão”. De modo que se eu fosse unicamente membro
do mundo inteligível, “todas as minhas ações seriam sempre
conformes à autonomia da vontade”. Mas como sou também
membro do mundo sensível, “essas minhas ações devem ser
conformes a esta autonomia”. Portanto, só a idéia de liberdade
possibilita ligar a vontade pura como legisladora com a vontade
empírica. Assim a obrigação é a forma que assume a lei da
vontade pura quando se dirige à vontade empírica. E o juízo diz
que a vontade pura obriga a vontade empírica a determinadas
máximas, mas essa obrigação só pode existir, isto é, o juízo só
pode levantar com direito essa pretensão, se nós nos pensamos
como livres. Está assim provada a validade do imperativo
categórico" - p. 29/30

O imperativo categórico pode ser apresentado em quatro


fórmulas:

a)"Primeiro temos a fórmula fundamental: “age só segundo


aquela máxima pela
qual tu possas querer ao mesmo tempo que ela se torne lei
universal” - p. 30
b) Ora, se a fórmula fundamental do imperativo categórico exige
uma validade universal das máximas da ação, fundada pela
razão, então podemos conceber a fórmula da autonomia. (..)A
vontade é autolegisladora. Age “...de tal modo que a vontade
possa considerar-se a si mesma pela sua máxima ao mesmo
tempo como legisladora universal”51. - p. 30/31

c) fórmula do fim em si ou do “Selbstzweck”, porque nenhum


ser autônomo poderá ser tratado como mero meio para
satisfação de interesses particulares: “Age de tal modo que uses
a humanidade, tanto na tua pessoa como na pessoa de qualquer
outro, sempre e ao mesmo tempo como fim, e nunca com meio” -
p. 31

d) então podemos passar para o conceito comunitário de reino e


para a fórmula do reino dos fins, pois cada membro deste
reino é legislador para si mesmo e para todos os outros e é, ao
mesmo tempo, o fim supremo dessa legislação universal. Por
isso, a terceira fórmula reza: “Age segundo máximas de um
membro legislador em ordem a um reino dos fins meramente
possível” - p. 31

3) Razão Pura Prática e Direito

"A Ética de Kant não se reduz ao imperativo categórico. Este é


apenas o princípio supremo da moralidade. Ele tem de poder
mostrar toda sua força humana e racional no desenvolvimento
da Ética e do Direito. Chave para qualquer interpretação da
filosofia prática de Kant é a doutrina da auto-legislação da razão
pura pratica". - p. 32

"A razão prática da moral kantiana, à diferença da razão


substancial da tradição metafísica, da recta ratio do direito
natural e da razão meios-fins do cientificismo, se caracteriza,
pois, pelo universalismo e procedimentalismo. Ela se manifesta
nos diferentes princípios de universalização e regras de
procedimento. Ela é propriamente um processo de
universalização caracterizado pela igualdade e eqüidade. Pois
conforme à razão é um princípio quando é capaz de ser
universalmente reconhecido, quando pode ser pensado como
resultado de uma decisão de seres livres e iguais, que se
respeitam reciprocamente, em condições de
eqüidade, isto é, que não privilegiam ninguém e não prejudicam
ninguém." - p. 32

"Assim, como lei fundamental da liberdade interna do homem, a


racionalidade universal e procedimental assume a figura do
imperativo categórico. Como princípio moral, o imperativo
categórico se concentra no motivo interno da liberdade. O
homem deve agir unicamente motivado pela forma de sua razão,
isto é, pelo dever incondicional" - p. 32

"Como lei fundamental de sua liberdade externa, a racionalidade


universal e procedimental assume a figura de um princípio do
direito, que diz: “conforme ao Direito é uma ação quando
permite ou cuja máxima permite à liberdade do arbítrio de cada
um coexistir com a liberdade de todos segundo uma lei
universal”57. Como lei da liberdade externa, o princípio do
direito se concentra unicamente na contratualidade formal da
liberdade externa de um com a liberdade externa do outro.
Como limitação do uso individual da liberdade às condições de
universalidade e de igualdade, o princípio do direito formula a
condição de coexistência de indivíduos livres, a condição de
igual liberdade para todos." - p. 32/33

A legislação ética só admite o dever como móbil para a execução


das exigências da razão e, como tal, “afeta a todo o que é dever
em geral”. A legislação jurídica, pelo contrário, permite outros
móbiles externos para a realização das exigências da razão. Ela
exige o cumprimento dos deveres, não por respeito à lei, mas
pelo motivo externo da coação - p. 33

Mas, então, antes de estabelecer as condições dessa


coexistência livre e simétrica dos homens entre si, temos de
perceber que o direito é um princípio da liberdade externa. Isso
significa: se nós, seres humanos, estamos submetidos a priori à
ordem da razão, é porque somos seres autônomos e, como tais,
possuímos um direito à liberdade, o qual, é um “direito inato” e
“na medida em que pode coexistir com todas as outras
liberdades segundo uma lei universal, é o direito único,
originário, que compete a todo homem em virtude de sua
humanidade”.
Este direito é o ponto de partida para todas as ulteriores
considerações de Kant sobre o direito político e o direito
internacional. - p. 34

O Direito político de Kant concentra-se sobre a idéia de contrato.


A razão prática, como fundamento normativo das relações
externas intersubjetivas, tem a forma de contrato. Por isso, para
Kant, o contrato é originário, porque ele é a manifestação na
sociedade da razão pura prática. É pela unificação de todos em
forma de contrato que a razão pura prática consegue
efetividade. E se ele é manifestação da razão prática na
sociedade, então fica superado o contratualismo moderno da
filosofia do Estado, com sua fundamentação voluntarista do
Estado e com sua racionalidade meramente instrumental - p. 34

Mas esse contrato é originário, isto é, não surge da vontade


contingente dos indivíduos, possui a priori uma necessidade
prática, pois surge da razão prática. Ele atua como princípio de
universalização no plano jurídico-estatal. Conseqüentemente, o
critério do contrato caracteriza como juridicamente
inadmissíveis leis que tratam iguais de modo desigual e que
conduzem a uma distribuição desigual de direitos e deveres. O
legislador deve perguntar-se se cada cidadão pode ser co-
legislador da lei em questão e se ela distribui de igual modo
liberdade para todos. E igualmente os cidadãos possuem no
contrato um
critério válido universalmente para avaliar o grau de justiça das
leis em
vigor. - p. 34

E, finalmente, as exigências universais da razão fazem com que


a Filosofia
do Direito de Kant desemboque numa república mundial. - p. 35

A Filosofia do Direito de Kant é a única filosofia política moderna


que elevou o desejo de paz de todo ser humano à dignidade de
um direito da humanidade. O conceito de paz é uma exigência
jurídica categórica, que tem como conteúdo e fim o direito. A
ordem jurídica, fundada a priori pela razão da liberdade externa
dos homens, só se completa quando as relações entre os Estados
forem submetidas à razão normativa.

______________

"A Idéia de Justiça em Kant: seu fundamento na liberdade e na


igualdade"
Joaquim Carlos Salgado

Capítulo II: A Ideia

§15º: A Importância da Ideia

"Na Crítica da Razão Pura, Kant chama de noção o conceito puro


que tem origem tão só no entendimento. Quando a noção se
torna transcedente, isto é, ultrapassa toda possibilidade da
experiência, tem-se a ideia ou o conceito da razão." - p. 43

"A idéia é uma exigência de uma síntese total e incondicionada,


que só pode ser conseguida pela razão, já que as sínteses do
entendimento são parciais." p. 43

"O interesse da razão, especulativo e prático, é pela liberdade.

A razão é, portanto, a faculdade que produz a ideia. Às vezes


essa palavra é tomada num sentido amplo e tradicional,
envolvendo também o entendimento. Só interessa, porém, o
sentido técnico que a palavra receve na exposição de Kant." -
p.44

"A razão, portanto, aspira, pela sua própria natureza, ao


incondicionado, é metafísica por excelência." - P. 44.

"A ideia representa na filosofia kantiana o ponto de passagem da


filosofia teorética para a prática. Demonstrando através da
dialética da razão pura a impossibilidade de ela alcançar um
conhecimento por puras ideias, Kant mostrará o caminho certo
da razão na esfera do agir, quando a razão opera um retorno em
si mesma e, não mais como intelecto que se volta para o sensível
para conhecer, mas como vontade que se desdobra sobre si
mesma para agir, percebe que ela mesma é o seu objeto e seu
único interesse (Rohden) visto que na ordem prática a razão
recobra o seu mais alto valor" - p. 45

§16º: Platão, Razão e Ideia

Kant continuará a trajetória de Platão, que era idealista. p. 46

§17º Crítica a Platão

"Platão reconhece a dignidade da filosofia, ao mesmo tempo em


que procura mostrá-la como uma reflexão sobre a realidade, mas
enquanto essa realidade é expressa no conhecimento científico.
A sua filosofia alicerça-se, pois, na ciência de seu tempo, de
certa forma, diferentemente da tendência aristotélica que
pretende fazer da filosofia um conhecimento autônomo,
separado do conhecimento da realidade material mediatizada
pela ciência" - p. 47

"Como seguidora direta de Platão, a filosofia de Kant é o pensar


do conhecimento científico do seu tempo, isto é, a resposta à
indagação: como é possível a reflexão filosófica sobre a natureza
conhecida pelos métodos da física galileana? Matematizando o
conhecimento dos fenômenos naturais, o mundo sensível deixou
de ser um problema à maneira platônica, para ser a razão de ser
de todo o conhecimento. Essa recuperação do sensível opera-se
pela revolução realizada por Kant, isto é, a centração do
pensamento filosófico no eu, ou seja, a interiorização da
filosofia." - p. 48

"Daí chamar Hegel a filosofia kantiana de filosofia da reflexão, ao


contrário da sua filosofia que é a recuperação da ontologia, da
identificação do ser e do pensar" - p. p. 48

§18º Ideia e Razão para Kant

a) A Razão

"O conceito fundamental que suporta todo o sistema moral


kantiano é a razão no sentido prático." - P. 49

"(...) para Kant a razão, em sentido amplo, envolve também o


entendimento, mas somente na medida em que ele cria
coinceitoa a priori, os quais, por isso mesmo, não se ligam,
quanto à sua origem, aos sentidos. É também a faculdade dos
princípios, do conhecimento a partir de princípios (cognitio ex
principiis), nao de fatos empíricos (cognitio ex datis). Os
conceitos a priori estão voltados para os objetos. Entretanto, a
razão pura, no sentido estrito, significa, ainda, a razão que cria
ideias, ideias que são conceitos puros considerados em si
mesmos objetos. A razão alcança essas ideias quando indaga das
origens das premissas de seus silogismos ou, com relação à
categoria da causalidade, quando perquire a causa da causa, até
chegar à ideia d euma causa incondicionada que explica a
totalidade da série de causas." - p. 49/51

"Vale dizer, a razão prática é a faculdade que temos de agir por


princípios ou máximas, as quais, somente, tornam possível uma
ação entendida como um acontecimento que tem origem na
vontade. Dizer que o homem tem vontade é dizer que ele pode
representar-se uma lei e agir de acordo com ela. Essa faculdade
de 'determinar-se na ação segundo a representação de certas
leis', ou seja, segundo máximas é que Kant chama de razão
prática ou vontade. A razão teorética detecta as leis segundo as
quais os objetos da naturea se relacionam. A razão prática ou
vontade representa, a si, leis, segundo as quais o ser racional
deve agir" - p. 50.

"As ideias procuram a coisa em si (o noumenon), como as


categorias procuram o fenômeno. Daí a necessidade da crítica
para rebater a arrogância da razão, demonstrando que a
metafísica especulativa, transcedente, que procura um objetodo
conhecimento para além de toda experiência possível, não é
conhecimento e que somente é possível uma metafísica
imanente, isto é, "uma sistemática exposição dos princípios a
priori da experiência e das ideias reguladoras".

b) A Ideia

"A ideia é, posi, para Kant, "produto da razão", que se manifesta


como prática ou teorética." - p. 52

"A ideia é o resultado do interesse da razão em indagar para


além do sensível, na direção do incondicionado. É próprio da
razão aspirar ao incondicionado; nesse esforço, ela cria as
ideias. Daí porque se legitima o esforço metafísico, não a
metafísica como tal. A ideia pode ter um valor positivo; não é
ficção, imagem arbitrária, mas desempenha um papel
importante, mesmo na esfera do conhecimento, desde que se
apresente como uma máxima do "querer teórico", um imperativo
para o pensamento científico, como resultado de uma "vontade
teorética" do entendimento elevado à dignidade da razão, como
entendimento que quer, ou seja, razão prática. - p. 52/53

Página 53: características da Ideia: é conceito da razão pura;


não é imaginária; é transcedente (ultrapassa a toda experiência
possível).

"As ideias são para Kant regras para a faculdade de conhecer do


sujeito, não leis constitutivas do objeto. Como regras para o
sujeito, elas colaboram na sistematização do conhecimento
científico." p. 53

"Do mesmo modo que as categorias são leis ditadas pelo


entendimento à sensibilidade, as ideias são regras ditadas pela
razão ao entendimento. Mais precisamente: não são leis para os
objetos, mas regras para o sujeito" - p. 53

"A ideia não é, portanto, apenas uma quimera, ainda que como
regra não seja observada, isto é, "ainda que ninguém aja de
acordo com ela", pois "todo juízo de valor e desvalor só é
possível por meio dessa ideia"; fundamenta o progresso no
sentido da perfeição que ela delineia, ainda que a não
consigamos em razão dos obstáculos, dos impedimentos opostos
pela nossa natureza humana, sujeita também à determinação
sensível." - p. 55

"O entendimento, sim, este produz objetos, ao subsumir a


matéria da sensibilidade nas categorias, produzindo
subjetivamente juízos sintéticos a priori e e juízos sintéticos a
posteriori; objetivamente, desse ato de subsunção resultam
objetos puros e empíricos. Entretamento, da unificação de vários
condicionados sob um princípio incondicionado, ou seja, da
subsunção do entendimento na razão, "resulta a estrutura lógica
do silogismo a que nenhum objeto corresponde". Essa reflexão
kantiana lega ao idealismo, de modo mais preciso, um dado
positivo, o conceito de ideia como totalidade, que em Hegel
aparecerá como união do conceito e do conceituado, isto é, do
sujeito e do objeto, do ser e do pensar da tradição eleática". p.
56

"As ideias são, pois, transcendentes. A ideia, afirma Kant, é o


conceito d eum maximum, que jamais ocorre na realidade
concreta de modo adequado ou, pelo menos, é possível que
jamais ocorra. É da sua natureza ser um "conceito" a que se
aproxima a razão sem que ela jamais consiga a sua execução. É
um ponto distante a que se deve chegar, sem que o consiga, mas
que, considerada na esfera da liberdade, pode ser executada, já
que a liberdade pode ultrapassar qualquer limite" - p. 56

"A ideia assume um caráter metodológico, porque não


conseguirá provar a sua objetividade, nem empírica, nem
transcendente." - p. 57

§19º A IDEIA E A PASSAGEM PARA A FILOSOFIA PRÁTICA DE


KANT

a) Ideia e Fim

Em Platão, "A ideia aparece como um cânon e também como


uma tarefa. O homem formula um projeto e procura realizá-lo." -
p. 57

"Pensar na finalidade é pensar na razão prática, na vontade.


Como vontade, a razão capta a ideia como realidade." - p. 57

"Kant recrimina, como se disse acima, Platão por ter estendido o


conceito de ideias às coisas da natureza, que é o reino da
causalidade necessária. A ideia como fim só é possível na obra
humana, no fazer do ser que realiza a cultura, que é tudo aquilo
que o homem faz, ao lado da natureza (natura) que lhe é dada. A
natureza - a não ser que seja pensada como obra de um ser
inteligente, que tem vontade - não tem finalidade. Nada tem fim
na natureza, a não ser se criado por um ser inteligente. Na
cultura, porém, tudo é dotado de uma finalidade. Nada do que o
homem faz deixa de ter uma finalidade, ainda que essa não seja
uma utilidade imediata. Se o homem pode criar, fazer cultura, ou
seja, dar finalidade ou significado às coisas é porque é dotado de
vontade." - p. 58

"Para Kant, é a vontde mesma que justifica considerarmos o


homem como fim último d anatureza porque só ela é
"ilimitadamente boa"." - p. 58

"A vontade é o 'poder de produzir alguma coisa' de conformidade


com a 'ideia chamada fim'." - p. 59

"Na moral, é um princípio de ação a ideia prática de finalidade,


que torna real pelas nossas ações o que não tem realidade." - p.
59

"A ideia como fim opera a passagem e, portanto, a ligação da


razão teorética com a razão prática, passagem essa que mais
tarde será facilitada com o estudo da crítica do juízo. Se a
faculdade de conhecer, o entendimento, tem como princípio a
priori a conformidade à lei, a qual é aplicada à natureza, se a
faculdade de querer (a razão prática) tem como princípio a priori
uma finalidade última aplicada à esfera da liberdade, a faculdade
do sentimento do prazer, o juízo, cujo princípio a priori é a
finalidade que tem aplicação na arte, realiza essa função entre
duas faculdade, a de conhecer (entendimento) a natuireza e a de
querer ou agir (razão) por liberdade. A ideia de finalidade é,
pois, uma regra do sujeito que se dirige à natureza, na medida
em que aquele que conhece (o sujeito cognoscente) sistematiza
os seus conhecimentos, ordena a natureza por um princípio que
lhe possibilita orientar-se nela." - p. 59/60

"Essa ponte entre o mundo sensível, regido pelo entendimento, e


o mundo inteligível, regulado pela razão através da lei da
liberdade, se faz pelo coneito de fim, pelo qual podemos julgar
(beurteilen) - não conhecer (wissen) - "se um objeto corresponde
a um fim que nos propusemos"." - p. 61

b) A ideia na razão prática

"Na ordem prática, o ideal, o inteligível é que é o real para Kant.


O empírico e o sensível não têm qualquer função fundamental.
Na natureza é a experiência a fonte de toda verdade, dado que
nenhum conhecimento se dá no homem senão quando a
sensibilidade ofereça a matéria a pensar. É a mesma
experiência, de outro lado, quando se trata de conceber a lei
moral, fonte de simples aparências. Daí porque indigno do
filósofo é o "plebeu apelo" à experiência, que é contraditória,
para encontrar os fundamentos da ética em "conceitos
grosseiros", em vez de buscá-los na ideia." - p. 62

"De qualquer forma, a ideia na razão prática adquire uma


especificidade: é princípio de ação, ao passo que na ordem
teorética é o resultado de um processo de conhecimento no uso
dialético da faculdade de pensar, em busca do incondicionado.
No âmbito da razão prática, a ideia, embora conserve a
característica fundamental da regra que se dirige ao sujeito,
assume a natureza de lei, com as mesmas exigências de validade
da lei de causalidade constituída pela síntese operado pelo
entendimento do diverso da intuição sensível; sua característica
é a universalidade como exigência absoluta da razão. Só que,
desta vez, a razão não se dirige ao sujeito para prescrever-lhe
regras de organização dos juízos que lhe oferecem o
entendimento, mas para revelhar-lhe a sua própria constituição.
A razão legisla tanto para a natureza quanto para a liberdade." -
p. 63

§20º A REVOLUÇÃO ÉTICA DE KANT

"Toda a filosofia crítica tem como alvo a derrubada da metafísica


clássica e a construção de uma metafísica em bases compatíveis
com a ciência física de Galileu." - p. 64

"Nenhuma teoria da moral, nenhuma ética até Kant procurou


assentar-se em princípios a priori, por isso universalmente
garantidores de sua validade". - p. 64

"Só a ética kantiana procura princípios próprios para a sua


fundamentação. Daí a preocupação mais importante de Kant no
preparo de seu edifício ético: o combate à ética empírica e à
ética eudemônica através de dois elementos decisivos de sua
experiência histórica: a razão, que Kant soube colher como a
mais positiva influência da ilustração, e o dever, a reverência à
lei como será definido, herdado da sua formação pietista pelo
exemplo de sua mãe e pela educação escolar. A razão dar-lhe-á
os princípios fundamentais a priori, da ética, que a faz válida
universalmente e a liberta das contingentes éticas empíricas. O
dever é um elemento bastante, que deve ser cultuado ou uma
vantagem que se almeja; dever pelo dever, que por si só dá
validade à ação moral e que desproverá a ética kantiana de todo
interesse que não seja o próprio dever." - p. 65

Razão e dever estão no pensar, e não no ser. Estão no sujeito,


não no objeto. (p. 65)

"Semelhantemente a Sócrates, Kant procura mostrar na


Fundamentação que todo ser dotado de razão tem capacidade
moral e não necessita de nenhum código ditado pelos filósofos
para conhecer a lei moral e decidir-se pelo bem ou pelo mal,
cumprindo-a ou não." - p. 66

"Sócrates crê poder ensinar a virtude porque ela está dentro de


cada ser humano; por isso é bastante ensiná-la (revelá-la) para
que seja praticada. Esse revelar da virtude como um revelar do
interior do sujeito é que torna a ética socrática próxima à de
Kant." - p. 66

(...) para Kant só é possível a ação moral se arazão pura for


também prática, isto é, se ela puder ter um emprego real, sem
ser movida externamente, mas por si mesma." - p. 67

CAPÍTULO 3 - O DESENVOLVIMENTO DA ÉTICA DE KANT

§ 21º - O DIREITO NA ÉTICA EM SENTIDO AMPLO

Sócrates é o fundador da Ética.

"Também a preocupação de Kant é encontrar um grau razoável


de "cientificidade" para a Ética, isto é, uma objetividade
traduzida na necessidade e universalidade dos seus princípios
diante da mutabilidade do éthos, entendido como um conjunto
de regras do agir humano. Kant encontra a origem dessa
"objetividade", que no âmbito prático se designa como validade,
na razão." - p. 74

"Kant usa o termo ethisch ou Ethik com dois significados: sem


sentido amplo, é a ciência das leis da liberdade, que tem para
ele o sinônimo de leis éticas, as quais se dividem em morais e
jurídicas; em sentido estrito, ética é a teoria das virtudes e,
como tal, diferencia-se do direito. Dessa forma, direito e ética
em sentido estrito 'são forma sparticulares de uma legislação
universal, cujos princípios a ética em sentido amplo contém." - p.
74

"Em ambos, o princípio supremo (de toda a eticidade) é a


liberdade. Em ambos aparece o imperatico categórico como
critério de validade das máximas: por exemplo, nem no direito,
nem na moral é conceíbel que alguém descumpra o seu contrato
(pacta sunt servanda)." - p. 75

Existem diferenças entre direito e moral, e Kant as demonstra de


diversos modos, mas isso "não elimina o seu fundamento
comum: a liberdade. É que a filosofia kantiana investiga duas
esferas: a da natureza, em que Kant estuda a possibilidade da
legalidade dos fenômenos, a partir do fato das ciências, e a da
liberdade (portanto, da vontade ou da razão prática), em que
Kant investiga a possibilidade de sua legalidade, a partir de um
fato que não é externo, a lei moral como único "fato da razão",
ou seja, a consciência dessa lei moral. A liberdade aparece como
a própria lei moral, considerada como o resultado de uma
máxima que busca a sua validade não externamente, mas na
própria razão e aparece, assim, sob a forma de imperativo
categórico." - p. 76

"Em resumo: o imperatico categórico é o superior critério de


validade do ético em geral, do direito e da moral." - p. 76

§22º A VONTADE

Vontade: elemento central da filosofia kantiana

"Ela é a própria razão pura prática(...)" - p. 76

"Se é razão a vontade, garante-se, com isso, a introdução do


universal na ética ao mesmo tempo em que se faz necessário
demonstrar a total inviabilidade de uma ética empírica." - p. 76

"No plano teórico (do conhecimento), o verdadeiro (o objetivo) é


o universal, que é dado a priori, pelo qual é possível a
objetividade das leis da natureza. Na esfera da razão prática,
não se trata de uma objetividade no sentido estrito em que esse
conceito é usado no plano teórico, mas na validade das leis
ditada spela razão. Essa validade só é dada pelo critério da
universalidade da lei moral: só é valida no plano prático a lei que
se reveste da universalidade. O dever ser subjetivo da máxima
deve conformar-se com o dever ser universal do imperativo
categórico. A ação moral resume, com isso, em elevar o
individual e subjetivo ao plano do universal e objetivo (válido) do
imperativo categórico" - p. 77

"O ato moral tem de nascer da própria vontade que, concebida


como desprovida de conteúdo e não se determinando por nada
no exterior, mas por si mesma, é vontade pura." - p. 77

"A vontade dá a forma de sua própria determinação, sob pena de


o ato decorrente não ser moral. Essa natureza formal da
vontade, que lhe garante universalidade, e sua natureza
autolegisladora, que a torna independente de todo motivo
externo, sensível ou não, introduzem uma novidade no
pensamento ético: a rejeição de toda ética empírica,
transcendente, eudaimônica, enfim, de toda ética heterônoma." -
p. 77

Rejeita-se uma ética empírica para fundar uma ética de


princípios universais; essa universalidade Kant buscará nos
próprios sujeitos, demonstrando que os princípios também não
pertencem à ordem das sensações. - (p. 77, paráfrase)

"Kant já havia preparado as suas investigações no campo da


razão prática ao desdenhar a "plebéia vocação" dos que tentam
encontrar, nas contradições dos comportamentos empíricos, os
princípios éticos ou com eles combater uma ética fundada na
liberdade" - p. 78

"Ora, os motivos da ação "moral devem ser representados


plenamente a priori pela razão" e não alcançados como um
conceito geral do entendimento, através da comparação das
experiências por ele levadas a efeito. A fonte de todo motivo
genuinamente moral é a razão pura e não o entendimento pelo
seu processo de generalização dos dados da experiência,
fornecidos pela sensibilidade. Na ordem prática a sensibilidade
não interfere; é a razão que determina o agir, do mesmo modo
que, na esfera teórica, é a sensibilidade que determina o
conhecimento. - p. 79

§ 23º VONTADE PURA E BOA VONTADE

Só uma vontade, que pode ser vontade santa, vontade pura,


arbítrio humano. - p. 79

"A máxima da ação criada pelo arbítrio [vontade] pode ser


contrária à lei moral. Em virtude dessa possibilidade, a lei
aparece como imperativo categórico e a relação da vontade com
ela, um dever, o que não ocorre com a ideia (mero ideal ou
modelo) de vontade santa, para a qual não há contradição entre
máxima e lei moral." - p. 79

"Ora, a vontade é boa em si mesma, porque, não submetida às


afecções dos sentidos, não está contaminada por nada que possa
torná-la má. A vontade não deve ser julgada por um critério
exterior: ela própria é o critério de todo valor, do bem e do mal."
- p. 80

Vontade cria leis; ações da razão pura prática são boas em si


mesmas.

"é boa a ação conforme a vontade pura, a vontade boa, vale


dizer, a ação ditada pela razão prática." - p. 81

"E por ser boa em si mesma, nenhum valor está fora dela, mas
todos são por ela produzidos. Embora não seja ela o único bem,
é, contudo, o bem supremo, enquanto "condição incondicionada"
ou moralidade." - p. 81

Não é meio de realização de algum propósito, nem mesmo a


felicidade. Com isso Kant se afasta de uma ética eudaimônica.
(p. 81)

§24º A VONTADE E O FORMALISMO ÉTICO

"Todas essas considerações sobre a vontade estão a mostrar que


a ética de Kant, exatamente por constituir-se de princípios a
priori, válidos universalmente, é uma ética formal, por suportar-
se na vontade formal como faculdade da ação moral, ou seja, 'a
capacidade de o ser humano agir segundo princípios', ou ainda,
a faculdade de determinar-se segundo o que "a razão,
independentemente de qualquer inclinação reconhece como
praticamente" (moralmente) necessário. E o que é praticamente
necessário é bom." - p. 82

"A lei moral é o critério supremo do bem e do mal." - p. 82

"O formalismo da ética kantiana é uma exigência da autonomia


da vontade e a autonomia da vontade é uma decorrência da
necessidade de uma ética constituída em princípios universais,
necessários ou válidos." - p. 83

"Somente a máxima totalmente afastada de qualquer motivo


material da vondade pode elevar-se à condição de "lei universal
prática". Interessa aí a pura forma forma de uma legislação
universal que, por ser totalmente separada de qualquer matéria
e independente de toda lei natural dos fenômenos, pode
constituir um motivo da vontade, a qual, em virtude dessa
independência, é livre. É uma ética exclusivamente voltada para
o sujeito, portanto, transcedental, e não uma érica dirigida ao
objeto, no sentido de conhecê-lo, o que a colocaria na questão
fundamental do "que posso saber?" e não na do "que devo
fazer?". - p. 83

Razão é formal e o sensível é material e a posteriori. p. 84

"O formalismo ético de Kant provém da necessidade de


universalidade da lei moral e se traduz na idéia de dever ser
como criação da razão a partir de si mesma, isto é, sem recorrer
a qualquer conteúdo externo. Em Kant, o que está do lado do
sujeito é a forma. Daí as formas puras da sensibilidade e do
entendimento; matéria é o exterior das sensações. Se não recebe
a moral qualquer matéria externa para dar conteúdo e origem às
suas leis, criadas tão só pela razão (forma), é legítimo dizer que
a ética kantiana é formal, ainda que receba, de outro ladom a
matéria externa no momento da sua aplicação." - p. 85

"No âmbito da razão prática a forma ocupa uma posição de


precedência, como já ocupava no da teórica. Não fora isso, não
seria possível uma ética assentada em princípios universais." - p.
85

"De qualquer modo, a confusão entre matéria e forma nunca


ocorre no idealismo transcedental, visto que a forma se refere
sempre ao sujeito transcedental (não psicológico) e não à coisa,
seja enquanto considerada como um dado das sensações, seja
enquanto considerada em si mesma, mas externa ao sujeito" - p.
87

"A ética de Kant, portanto, não é formalista no sentido de ser


uma ética abstrata, que nenhum compromisso possui com a
realidade; é formalista no sentido de que a exigência de validade
universal dos seus preceitos não permite que eles sejam
extraídos do empírico, mas do racional. Trata-se de uma ética a
priori. E só no sentido de ser a priori é que se pode chamá-la
formal. Mas é um a priori que se dirige também ao sensível
externo." - p. 88

"A lei moral está voltada para a realidade das ações humanas e
pode ser realizada." - p. 88

"De que devemos, do fato de a lei moral nos impor certa


conduta, decorre que podemos cumpri-la. Isso é de tal modo
evidente para Kant, que nem seria necessário demonstrá-lo. Se a
lei moral é criação da razão humana para si mesma, é impossível
que a lei que ela mesma se dá não possa por ela ser cumprida." -
p. 89

"Em nenhum momento afirmou Kant a existência de uma pura


forma sem conteúdo, pois que isto seria o vazio sem significado
para a sua filosofia. Toda forma, inclusive na moral, destina-se a
um conteúdo. Isso é válido para a filosofia teórica e também para
a filosofia prática." - p. 89

"O que pretende dizer o formalismo kantiano é que a Ética como


ciência não deve ter suas leis estudadas a partir do empírico,
mas a priori na razão, tal como ocorreu na Crítica da Razão
Pura, que demonstrou como é a ciência possível através da
consideração da universisalidade de suas leis, como momento a
priori da razão. A ética nada tem a ver com as condições
históricas, empíricas; a todo momento, em qualquer tempo ou
circunstâncias, o homem está sempre sujeito ao imperativo
categórico, exatamente porque, sempre, pode a razão pura ser o
motivo da sua ação, isto é, porque é livre." - p. 90

§ 25º Ser e Dever Ser

"A razão teórica é o que, na tradição filosófica, se convencionou


chamar intelecto, a razão prática, a que se denominou vontade" -
p. 91

Intelecto se ocupa do ser; a vontade cria o dever ser.

Sem os obstáculos do desejo, a razão prática diria apenas "eu


quero"; como encontra nos desejos seu obstáculo, ela diz "eu
devo". - p. 91/92

"Em Platão, a ideia representa um dever ser com que aquele


filósofo procura explicar também a realidade do ser. Em Kant,
porém, o dever ser não é apenas a ideia, na acepção do ser
perfeito, como modelo a ser atingido (por exemplo, a mesa
harmônica que o marceneiro deve fazer), mas a própria lei
moral, como ditame da razão prática. A identificação entre ser e
dever ser, feita por Platão ao negar o ser aparente e sensível (a
ideia é o ser de toda realidade, da ordem prática e da ordem
teórica), é que Kant procura desfazer ou, pelo menos, analisar
criticamente." - p. 92

"Para Kant, pois, o dever ser não pode ser deduzido do ser." - p.
93

Questão do conhecimento que homem tem de si mesmo.


Conhece a natureza pelos sentidos, e também conhece a si
mesmo como fenômeno. Mas o homem também se conhece pelas
suas autodeterminações internas, pela espontaneidade de sua
razão. O homem se conhece como fenômeno e como noumenon.
Assim, o homem deve buscar sua causalidade para além de uma
causalidade natural, pois não se rege pela mesma causalidade
que se encontra na natureza. - p. 93

O imperativo, que é a forma do dever ser, têm origem na


vontade, e só podem se dirigir a outra vontade. - p. 94
Uma vontade, ao ser exteriorizada, passa a se determinar pela
causalidade da natureza. (p. 94). Já no campo da razão prática, o
dever ser coincide com o ser, e não se submete às leis naturais e
externas. (p. 95)

"Se na natureza (esfera do ser) não encontramos uma causa


última que marque o ponto final da série, na esfera do dever ser
há uma causa originária e que dá fundamento, que cria: a
liberdade. O dualismo exige, pois, um aprofundamento maior,
radical que só é possível pela investigação filosófica." - p. 96

"A liberdade é o núcleo do pensamento kantiano. Essa liberdade


sabida, plna, elevada em termos de conceito, é que gera o dever
puro e o dever (Sollen, pois que impossível a existência do dever,
a não ser em um ente livre. O dever ser, para Kant, não se
encontra no mundo da natureza, mas no da liberdade." - p. 104

§ 28º OS ESTUÁRIOS DO DUALISMO

§29º DEVER SER E LIBERDADE

A ação se torna necessária consequência do dever ser.


O dever ser é motivo e fim de uma ação, e isso faz dele
incondicionado. Só será necessário, incondicionado, se for
decorrente da própria razão prática, ou seja, se entendido como
atividade da razão pura prática. P. 112

Em outras palavras, a vontade pura pode determinar-se, e isto se


chama liberdade positiva. (p. 113)

"Porque não tem origem fora da vontade pura, mas na vontade


pura ou razão prática, na razão que age, cujo agir é o
autodeterminar (a liberdade), o dever ser é incondicionado e
incondicional. Incondicionado no sentido de não se determinar
por algo estranho à vontade pura e não no sentido de não ter
origem senão em si mesmo, visto que só a liberdade seria esse
incondicionado." - p. 113

"O Sollen só existe para um ser que se coloca no conflito entre


os impulsos e inclinações dos sentidos e o império da vontade
pura que se expressa na forma do Sollen, a lei moral, embora
esta possa conceber-se como válida para qualquer ser racional."
- p. 114

"O direito busca seu fundamento na liberdade como ideia. E


buscar o seu fundamento na liberdade como ideia é buscar um
critério de validade para suas normas. A moral nada mais é do
que o exercício pleno da liberdade e suas leis são
desdobramentos da liberdade, mas o direito positivo não tem nas
suas normas o fluir natural da liberdade, pois elas não são
constituídas necessariamente por princípios racionais puros,
mas se deixam elaborar por motivos contingentes, externos,
porque atendem também a certas condições da realidade que
devem regular. Nesse sentido, a norma jurídica é imperativo
hipotético, que coloca um objeto a ser alcançado numa
realidade, cuja estrutura ôntica tem de ser atendida: um
imperativo hipotético, contudo, que tem seu limite no imperativo
categórico" - p. 115

"A esfera do dever ser, da razão pura prática, da vontade livre é


a esfera privilegiada da filosofia e nela não penetram os métodos
do conhecimento científico, limitado às formas da intuição
sensível do espaço e do tempo, para além dos quais se situa o
dever ser. A liberdade aaparece aqui como ponto central de toda
reflexão na esfera do dever ser ou do agir, de que ela é o
fundamento último, pois "prático é tudo que é possível através
da liberdade", que, entretanto, só se revela a partir da lei moral"
- p. 117

§ 30º A Lei Moral: princípio, máxima e lei

Princípio é um conhecimento que dá fundamento a outro


conhecimento. É a priori quando seu fundamento é a própria
razão. - p. 117

"O que Kant quer na Fundamentação é encontrar esse princípio


supremo da moralidade, absoluto, e justificá-lo. E deve encontrá-
lo, visto que, no âmbito prático, o princípio é uma regra que dá a
última razão do agir, ou, na linguagem do próprio Kant, o
princípio é a "representação das leis", segundo as quais um ser
racional deve agir" - p. 117/118

"Agir segundo a representação de uma lei é introduzir no mundo


o elemento vontade e, com isso, a liberdade." - p. 118

Princípio técnico (alcançar fim proposto) e princípio da


prudência (alcançar a própria felicidade) são diferentes do
princípio da moralidade, pois este tem validade incondicionada.
Os dois primeiros princípios se sujeitam a suas próprias
externalidades e contingências, além de se submeterem ao
princípio da moralidade. - p. 119

"As máximas empíricas materiais, sendo a posteriori, não


encerram em si a universalidade necessária para que
prevaleçam todo ser racional; possuiriam, no máximo, a
generalidade tirada da experiência, mesmo porque o sentimento
de prazer ou não prazer, que ela revela, varia de indivíduo para
indivíduo. Só a máxima formal se expurga do conteúdo empírico
e garante a universalidade que caracteriza a lei. Por isso, faz-se
coincidente com a lei e válida como lei" - p. 120

O homem, por não ter uma vontade santa, sempre de acordo


com a lei moral, lança mão da reverência à lei para operar a
mediação do processo pelo qual o universal se particulariza na
máxima. A reverência à lei, despertada pelo conhecimento da lei,
leva o ser racional a aceitá-la e a fazê-la sua máxima. A ação
deve realizar a máxima, como seu princípio objetivo. A máxima
deve realizar a lei, como seu princío objetivo. Assim, a lei é o
critério objetivo de validade da máxima; a máxima, o critério
subjetivo de julgamento da ação. Máxima e lei, porém, se
identificam quando a máxima for a regra de agir de uma vontade
pura. Nesse caso, o dever ser se identifica com o querer" - p. 121

A lei é universal. "Essa universalidade da lei aparece na esfera


moral não só pela sua origem a priori, na razão, mas também
pela sua aplicação, isto é, levado em conta o momento da sua
incidência nos atos humanos. A lei é universal, porque válida
para todos indistintamente." - p. 121

§ 31º A lei moral como fato da razão

Lei moral não é deduzida nem induzida da experiência. É


proposição sintética a priori. - p. 122

§ 32º A LEI MORAL E O IMPERATIVO


A lei moral, como princípio formal, é universal, e isto define sua
validade para todo ser racional. - p. 124/125

"Fosse o homem apenas razão (vontade pura não perturbável


pelos sentidos, santa), então não apareceria a lei moral sob a
forma de imperativo, um mando que coage, como: "tu deves",
mas seria a pura espontaneidade da ação do ser racional. Como
o homem é formado de razão e natureza (esta como impulsos e
inclinações), de parte inteligível e de parte sensível, é necessário
que esta se submeta à esfera racional e que a razão domine
totalmente a região sensível humana, para que seus atos sejam
morais, visto que a lei moral tem origem exclusiva na razão. A lei
moral na esfera das condições humanas surge, pois, como
imperativo, lei da vontade motivada pelo dever (Pflicht), de uma
vontade que pode ser afetada por inclinações e impulsos
sensíveis." - p. 126

"A presença do sensível simplesmente faz com que a lei moral,


que tem origem tão só na razão, que é um desdobramento
espontâneo da razão pura prática, se imponha ao sensível como
um mandamento, com toda a força do seu império." - p. 127

§ 33º OS IMPERATIVOS

§34º AS ESPÉCIES DE IMPERATIVOS

"Os princípios objetivos não se realizam automaticamente na


forma da máxima, em virtude das inclinações sensíveis ou
porque o "homem nem sempre faz o que faria um ser racional, se
a razão dominasse completamente as suas paixões"." - p. 129

"A vontade pura é o bem supremo; por isso, o bem não é algo
externo, pelo qual se determina a vontade, mas a própria
determinação da vontade a partir de si mesma. O bem é
"deduzido" da vontade. A vontade pura como bem, entretanto,
não é o único bem, embora seja o mais alto." - p. 130

Princípios da destreza, da felicidade, da moralidade.

Aqueles que se pautam pela relação meio e fim informam


imperativos hipotéticos. Aqueles incondicionados, que ordem
ações de modo incondicional, vez que são ações boas em si
mesmas, informam o imperativo categórico. - p. 131

§ 35º POSSIBILIDADE DOS IMPERATIVOS

§ 36º OS IMPERATIVOS HIPOTÉTICOS

"Na verdade, os imperativos hipotéticos, se são imperativos, hão


de ser práticos. Mesmo que alguém só possa alcançar
determinado fins usandos os meios adequados para consegui-lo,
essa circunstância traduz sempre uma relação que envolve a
vontade humana como um elemento que define o fim, embora
tenha de determinar-se, quanto ao meio, pelas leis naturais que
o tornam viável e exequível" - p. 134

§ 37º O IMPERATIVO CATEGÓRICO E SUA


POSSIBILIDADE

"A experiência só nos diz como as coisas são e não como devem
ser. Daí que o imperativo categórico não é um imperativo
empírico, mas uma proposição prática a priori, isto é, princípio
formal da razão pura prática, na medida em que se dirige a
condições subjetivas, embora seja objetivo, necessário." - p. 135

"Esse comendo ou imperativo é categórico porque ordena


incondicionalmente; e ordena incondicionalmente porque
exprime uma universalidade absoluta; para exprimir uma
unviersalidade absoluta tem de ser formal, independente de todo
conteúdo, de todos os motivos e fins particulares, pessoais,
sociais ou culturais, considerados como valores. Qualquer
conteúdo determinaria o imperativo e tirar-lhe ia o caráter da
universalidade." - p. 136

"Do mesmo modo, no imperativo categórico, considerado como


um juízo prático, sintético a priori, o elemento que torna possível
a conjunção entre a obrigação emanada do imperativo e a
vontade racional é a liberdade. Somente sob o pressuposto da
existência da liberdade é que é possível que o homem não só
observe e conheça, mas também aja. O agir humano só é
possível no pressuposto da ideia de liberdade." - p. 137

§ 38º - AS FÓRMULAS DO IMPERATIVO


- GERAL
- UNIVERSALIDADE
- HUMANIDADE (COMO FIM)
- AUTONOMIA (VONTADE SE AUTODETERMINA)

§ 39º UNIVERSALIDADE E IGUALDADE

"A ação do indivíduo sem lei moral é cega, irracional e sem


validade. Só o apelo à universalidade da lei moral pode conferir
moralidade à ação individual." - p. 145

__________

Fundamentação da Metafísica dos Costumes - Kant

Introdução

"Toda a gente tem de confessar que uma lei


que tenha de valer moralmente, isto é como fundamento duma
obrigação, tem de ter em si uma necessidade absoluta; que o
mandamento: «não deves mentir», não é válido somente para os
homens e que outros seres racionais se não teriam que importar
com
ele, e assim todas as restantes leis propriamente morais; que,
por conseguinte,
o princípio da obrigação não se há-de buscar aqui na natureza
do homem ou nas circunstâncias do mundo em que o homem
está posto, mas sim a priori exclusivamente nos conceitos da
razão pura, e que qualquer outro preceito baseado em princípios
da
simples experiência, e mesmo um preceito em certa medida
universal, se ele se apoiar em princípios empíricos, num mínimo
que seja, talvez apenas por um só móbil, poderá chamar-se na
verdade uma regra prática, mas nunca uma lei moral." - p. 15

SEÇÃO I - TRANSIÇÃO DO CONHECIMENTO MORAL DA


RAZÃO VULGAR PARA O CONHECIMENTO FILOSÓFICO

Ainda mesmo que por um desfavor especial do destino, ou pelo


apetrechamento avaro duma natureza madrasta, faltasse
totalmente
a esta boa vontade o poder de fazer vencer as suas intenções,
mesmo que nada pudesse alcançar a despeito dos seus maiores
esforços, e só afinal restasse a boa vontade (é claro que não se
trata
aqui de um simples desejo, mas sim do emprego de todos os
meios
de que as nossas forças disponham), ela ficaria brilhando por si
mesma como um jóia, como alguma coisa que em si mesma tem
o
seu pleno valor. A utilidade ou a inutilidade nada podem
acrescentar
ou tirar a este valor - p. 24

Ainda mesmo que por um desfavor especial do destino, ou pelo


apetrechamento avaro duma natureza madrasta, faltasse
totalmente
a esta boa vontade o poder de fazer vencer as suas intenções,
mesmo que nada pudesse alcançar a despeito dos seus maiores
esforços, e só afinal restasse a boa vontade (é claro que não se
trata
aqui de um simples desejo, mas sim do emprego de todos os
meios
de que as nossas forças disponham), ela ficaria brilhando por si
mesma como um jóia, como alguma coisa que em si mesma tem
o
seu pleno valor. A utilidade ou a inutilidade nada podem
acrescentar
ou tirar a este valor - p. 25

Pelo contrário, conservar cada qual a sua vida é um dever, e é


além disso uma coisa para que toda a gente tem inclinação
imediata.
Mas por isso mesmo é que o cuidado, por vezes ansioso, que a
maioria dos homens lhe dedicam não tem nenhum valor
intrínseco e
a máxima que o exprime nenhum conteúdo moral. Os homens
conservam a sua vida conforme // ao dever, sem dúvida, mas não
por
dever. Em contraposição, quando as contrariedades e o desgosto
sem esperança roubaram totalmente o gosto de viver;
quando o infeliz, com fortaleza de alma, mais enfadado do que
desalentado ou abatido, deseja a morte, e conserva contudo a
vida
sem a amar, não por inclinação ou medo, mas por dever, então a
sua
máxima tem um conteúdo moral. - p. 28 - - AÇÕES CONFORME
O DEVER/POR DEVER

E sem dúvida também assim que se devem entender os passos


da Escritura em que se ordena que amemos o próximo, mesmo o
nosso inimigo. Pois que o amor enquanto inclinação não pode ser
ordenado, mas o bem-fazer por dever, mesmo que a isso não
sejamos levados por nenhuma inclinação e até se oponha a ele
uma
aversão natural e invencível, é amor prático e não patológico,
que
reside na vontade e não na tendência da sensibilidade, em
princípios
de acção e não em compaixão lânguida. E só esse amor é que
pode
ser ordenado. - P. 30

[segunda proposição] Uma acção praticada por dever tem


o seu valor moral, não no propósito que com ela se quer atingir,
mas
na máxima que a determina; não depende portanto da realidade
do
objecto da acção, mas somente do princípio do querer segundo o
qual a acção, abstraindo de todos os objectos da faculdade de
desejar, foi praticada. (...) Não pode residir em
mais parte alguma senão no princípio da vontade, abstraindo dos
fins que possam ser realizados por uma tal acção; pois que a
vontade
está colocada entre o seu princípio a priori, que é formal, e o seu
móbil a posteriori, que é material, por assim dizer numa
encruzilhada; e, uma vez que ela tem de ser determinada por
qualquer coisa, terá de ser determinada pelo princípio formal do
querer em geral quando a acção seja praticada por dever, pois
lhe foi
tirado todo o princípio material." - p. 30

A terceira proposição, consequência das duas anteriores,


formulá-la-ia eu assim: — Dever é a necessidade de uma acção
por respeito à lei. (...) Só pode ser objecto de respeito e
portanto
mandamento aquilo que está ligado à minha vontade somente
como princípio e nunca como efeito, não aquilo que serve à
minha inclinação mas o que a domina ou que, pelo menos, a
exclui do cálculo // na escolha, quer dizer a simples lei por si
mesma. - p. 31

Mas que lei pode ser então essa, cuja representação,


mesmo sem tomar em consideração o efeito que dela se espera,
tem de determinar a vontade para que esta se possa chamar boa
absolutamente e sem restrição? Uma vez que despojei a vontade
de todos os estímulos que lhe poderiam advir da obediência a
qualquer lei), nada mais resta do que a conformidade a uma lei
universal das acções em geral que possa servir de único
princípio
à vontade, isto é: devo proceder sempre de maneira que eu
possa
querer também que a minha máxima se torne uma lei universal. -
p. 33

E aqui não nos podemos furtar a uma certa admiração ao ver


como a capacidade prática de julgar se avantaja tanto à
capacidade teórica no entendimento
humano vulgar. Nesta última, quando a razão vulgar se atreve a
afastar-se das leis da experiência e dos dados dos sentidos, vai
cair em puras incompreensibilida-des e contradições consigo
mesma ou, pelo menos, num caos de incerteza, escuridão e
inconstância. No campo prático, porém, a capacidade de julgar

então começa a mostrar todas as suas vantagens quando o
entendimento vulgar exclui das leis práticas todos os móbiles
sensíveis. - p. 36

É assim, pois, que a razão humana vulgar, impelida por


motivos propriamente práticos e não por qualquer necessidade
de
especulação (que nunca a tenta, enquanto ela se satisfaz com ser
simples sã razão), se vê levada a sair do seu círculo e a dar um
passo para dentro do campo da filosofia prática. Aí encontra ela
informações e instruções claras sobre a fonte do seu princípio, //
sobre a sua verdadeira determinação em oposição às máximas
que
se apoiam sobre a necessidade e a inclinação. Assim espera ela
sair das dificuldades que lhe causam pretensões opostas, e fugir
ao perigo de perder todos os puros princípios morais em virtude
dos equívocos em que facilmente cai. Assim se desenvolve
insensivelmente na razão prática vulgar, quando se cultiva, uma
dialéctica que a obriga a buscar ajuda na filosofia, como lhe
acontece no uso teórico; e tanto a primeira como a segunda não
poderão achar repouso em parte alguma a não ser numa crítica
completa da nossa razão. - p. 38

Segunda Seção: Transição da Filosofia Moral popular para a


Metafísica dos Costumes

Não se poderia também prestar pior serviço à moralidade do


que querer extraí-la de exemplos. Pois cada exemplo que me seja
apresentado tem de ser primeiro julgado segundo os princípios
da
moralidade para se saber se é digno de servir de exemplo
original, isto é, de modelo; mas de modo nenhum pode ele dar o
supremo conceito dela. - p. 42

Mesmo o Santo do Evangelho tem


primeiro que ser comparado com o nosso ideal de perfeição
moral
antes de o reconhecermos por tal; e é ele que diz de si mesmo:
«Porque é que vós me chamais bom (a mim que vós estais vendo)
? Ninguém é bom (o protótipo do bem) senão o só Deus (que vós
não vedes).» Mas donde é que nós tiramos o conceito de Deus
como bem supremo? Somente da ideia que a razão traça a priori
da perfeição moral e que une indissoluvelmente ao conceito de
vontade livre - p. 42

presa.
Ora uma tal Metafísica dos costumes, completamente
isolada, que não anda misturada nem com a Antropologia nem //
com a Teologia, nem com a Física ou a Hiperfísica, e ainda
menos com as qualidades ocultas (que se poderiam chamar
hipofísicas), não é somente um substrato indispensável de todo o
conhecimento teórico dos deveres seguramente determinado,
mas
também um desiderato da mais alta importância para a
verdadeira
prática das suas prescrições. Pois a pura representação do dever
e
em geral da lei moral, que não anda misturada com nenhum
acrescento de estímulos empíricos, tem sobre o coração humano,
por intermédio exclusivo da razão (que só então se dá conta de
que por si mesma também pode ser prática), uma influência
muito
mais poderosa do que todos os outros móbiles que se possam ir
buscar ao campo empírico em tal grau que, na consciência da
sua dignidade, pode desprezar
estes últimos e dominá-los pouco a pouco. . - p. 46

Para, porém, neste trabalho avançarmos por uma gradação


natural, não somente do juízo moral vulgar (que aqui é muito
digno de respeito) para o juízo filosófico, como de resto já se fez,
mas duma filosofia popular, que não passa além do ponto onde
pode chegar às apalpadelas por meio de exemplos, até à
metafísica (que não se deixa deter por nada de empírico e que,
devendo medir todo o conteúdo do conhecimento racional deste
género, se eleva em todo o caso até às ideias, onde mesmo os
exemplos nos abandonam), temos nós de seguir e descrever
claramente
a faculdade prática da razão, partindo das suas regras
universais de determinação, até ao ponto em que dela brota o
conceito de dever. - p. 47

Tudo (1
) na natureza age segundo leis. Só um ser racional
tem a capacidade de agir segundo a representação das leis, isto
é,
segundo princípios, ou: só ele tem uma vontade. Como para
derivar as acções das leis é necessária a razão, a vontade não é
outra coisa senão razão prática. Se a razão determina
infalivelmente a vontade, as acções de um tal ser, que são
conhecidas como objectivamente necessárias, são também
subjectivamente necessárias, isto é, a vontade é a faculdade de
escolher só aquilo que a razão, independentemente da
inclinação,
reconhece como praticamente necessário, quer dizer como bom.
Mas se a razão só por si não determina suficientemente a
vontade, se esta
está ainda sujeita a condições subjectivas (a certos móbiles) que
não coincidem sempre com as objectivas; numa palavra, se a
vontade não é em si plenamente conforme à razão (como
acontece realmente entre os homens), então as acções, que
objectivamente são reconhecidas como necessárias, são
subjectivamente contingentes, e a determinação de uma tal
vontade, conforme a leis objectivas, é obrigação (Nötigung);
quer dizer, a relação das leis objectivas para uma vontade não
absolutamente boa representa-se como a determinação da
vontade de um ser racional por princípios da razão , sim,
princípios esses porém a que esta vontade, pela sua naturea, não
obedece necessariamente. - p. 48

A representação de um princípio objectivo, enquanto


obrigante para uma vontade, chama-se um mandamento (da
razão), e a fórmula do mandamento chama-se Imperativo. - p. 48

Todos os imperativos se exprimem pelo verbo dever


(sollen), e mostram assim a relação de uma lei objectiva da razão
para uma vontade que segundo a sua constituição subjectiva não
é por ela necessariamente determinada (uma obrigação). Eles
dizem que seria bom praticar ou deixar de praticar qualquer
coisa, mas dizem-no a uma vontade que nem sempre faz
qualquer coisa só porque lhe é representado que seria bom fazê-
la. Praticamente bom é porém aquilo que determina a vontade
por
meio de representações da razão, por conseguinte não por
causas
subjectivas, mas objectivamente, quer dizer por princípios que
são válidos para todo o ser racional como tal. - p. 48/49

Por isso os imperativos


não valem para a vontade divina nem, em geral, para uma
vontade santa; o dever (Sollen) não está aqui no seu lugar,
porque o querer coincide já por si necessariamente com a lei.
Por
isso os imperativos são apenas fórmulas para exprimir a relação
entre leis objectivas do querer em geral e a imperfeição
subjectiva deste ou daquele ser racional, da vontade humana por
exemplo - p. 49

Ora, todos os imperativos ordenam ou hipotética- ou


categoricamente. Os hipotéticos representam a necessidade
prática de uma acção possível como meio de alcançar qualquer
outra coisa que se quer (ou que é possível que se queira). O
imperativo categórico seria aquele que nos representasse uma
acção como objectivamente necessária por si mesma, sem
relação com qualquer outra finalidade.
Como toda a lei prática representa uma acção possível como
boa e por isso como necessária para um sujeito praticamente
determinável pela razão, // todos os imperativos são fórmulas da
determinação da acção que é necessária segundo o princípio de
uma
vontade boa de qualquer maneira. No caso de a acção ser
apenas boa
como meio para qualquer outra coisa, o imperativo é hipotético;
se
a acção é representada como boa em si, por conseguinte como
necessária numa vontade em si conforme à razão como princípio
dessa vontade, então o imperativo é categórico.
- . p 50.

Há por fim um imperativo que, sem se basear como


condição em qualquer outra intenção a atingir por um certo
comportamento, ordena imediatamente este comportamento.
Este
imperativo é categórico. Não se relaciona com a matéria da
acção e com o que dela deve resultar, mas com a forma e o
princípio de que ela mesma deriva; e o essencialmente bom na
acção reside na disposição (Gesinnung) (*), seja qual for o
resultado. Este imperativo pode-se chamar o imperativo da
moralidade. - . p. 52

O querer segundo estes três princípios diferentes dis-tinguese


também claramente pela diferença da obrigação imposta à
vontade. Para tornar bem marcada esta diferença, creio que o
mais conveniente seria denominar estes princípios por sua
ordem,
dizendo: ou são regras da destreza, ou conselhos da prudência,
ou
mandamentos (leis) da moralidade - . p. 53
Quando penso um imperativo hipotético em geral, não sei de
antemão o que ele poderá conter. Só o saberei quando a
condição
me seja dada. Mas se pensar um imperativo categórico, então sei
imediatamente o que é que ele contém. Porque, não contendo o
imperativo, além da lei, senão a necessidade da máxima (*) que
manda conformar-se com esta lei, e não contendo a lei nenhuma
condição
que a limite, nada mais resta senão a universalidade de uma lei
em geral à qual a máxima da acção // deve ser conforme,
conformidade essa que só o imperativo nos representa
propriamente como necessária - p. 59

Se agora prestarmos atenção ao que se passa em nós mesmos


sempre que transgredimos qualquer dever, descobriremos que
na
// realidade não queremos que a nossa máxima se torne lei
universal, porque isso nos é impossível; o contrário dela é que
deve universalmente continuar a ser lei; nós tomamos apenas a
liberdade de abrir nela uma exeepção para nós, ou (também só
por esta vez) cm favor da nossa inclinação. Por conseguinte, se
considerássemos tudo partindo de um só ponto de vista, o da
razão, encontraríamos uma contradição na nossa própria
vontade,
a saber: que um certo princípio seja objectivamente necessário
como lei universal e que subjectivamente não deva valer
universalmente, mas permita excepções. Mas como, na
realidade,
nós consideramos a nossa acção ora do ponto de vista de uma
vontade totalmente conforme à razão, ora, por outro lado, vemos
a
mesma acção do ponto de vista de uma vontade afectada pela
inclinação, não há aqui verdadeiramente nenliuma contradição,
mas
sim uma resistência da inclinação às prescrições da razão
(antagonismus), pela qual resistência a universalidade do
princípio
(universalitas) se transforma numa simples generalidade
(generalitas), de tal modo que o princípio prático da razão se
deve
encontrar a meio caminho com a máxima. Ora, ainda que isto se
não
possa justificar no nosso próprio juízo imparcial, prova contudo
que
nós reconhecemos verdadeiramente a validade do imperativo
categó-
rico e nos permitimos apenas (com todo o respeito por ele)
algumas
// excepções forçadas e, ao que nos parece, insignificantes. - p.
63

- Não pode ser hipotético, não pode ter finalidade. Deve-se agir
de tal modo que se queira que a ação seja universal. Se o homem
age conforme a finalidade, agiu hipoteticamente, ignorando
aquilo que sabe ser o mandamento categórico.

Aqui deve ela provar a sua


pureza como mantenedora das suas próprias leis e não como
arauto daquelas que lhe segrede um sentido inato ou não sei que
natureza tutelar, as quais no seu conjunto, sendo melhores que
coisa nenhuma, nunca poderão aliás fornecer princípios que a
razão dite e que tenham de ter a sua origem totalmente a priori
e
com ela simultaneamente a sua autoridade // imperativa: nada
esperar da inclinação dos homens, e tudo do poder supremo da
lei e do respeito que lhe é devido, ou então, em caso contrário,
condenar o homem ao desprezo de si mesmo e à execração
íntima - p. 65

Se, pois, deve haver um princípio prático supremo e um


imperativo categórico no que respeita à vontade humana, então
tem de ser tal que, da representação daquilo que é
necessariamente um fim para toda a gente, porque é fim em si
mesmo, faça um princípio objectivo da vontade, que possa por
conseguinte servir de lei prática universal. O fundamento deste
princípio é: A natureza racional existe como fim em si. É assim
que o homem se representa necessariamente a sua própria
existência; e, neste sentido, este princípio é um princípio
subjectivo das acções humanas. Mas é também assim que
qualquer outro ser racional se representa a sua existência, em
virtude exactamente do mesmo princípio racional que é válido
também para mim (*); é portanto simultaneamente um princípio
objectivo, do qual como princípio prático supremo se têm de
poder derivar todas as leis da vontade. O imperativo prático será
pois o seguinte: Age ‘de tal maneira que uses a humanidade,
tanto na tua pessoa como na pessoa de qualquer outro, sempre e
simultaneamente como fim e nunca // simplesmente como meio.
- p. 69

É que o princípio de toda a


legislação prática reside objectivamente na regra e na forma da
universalidade que a torna capaz (segundo o primeiro princípio)
de ser uma lei (sempre lei da natureza); subjectivamente, porém,
reside no fim; mas o sujeito de todos os fins é (conforme o
segundo princípio) todo o ser racional como fim em si mesmo:
daqui resulta o terceiro princípio prático da vontade como
condição suprema da concordância desta vontade com a razão
prática universal, quer dizer a ideia da vontade de todo o ser
racional concebida como vontade legisladora universal. Segundo
este princípio são rejeitadas todas as máximas que
não possam subsistir juntamente com a própria legislação
universal da vontade. A vontade não está pois simplesmente
submetida // à lei, mas sim submetida de tal maneira que tem de
ser considerada também como legisladora ela mesma , e
eactamente por isso e só então submetida à lei (de que ela se
pode olhar como autora).- p. 72

Porque, se nos limitávamos a conceber o homem como


submetido
a uma lei (qualquer que ela fosse), esta lei devia ter em si
qualquer interesse que o estimulasse ou o constrangesse, uma
vez
que, como lei, ela não emanava da sua vontade, mas sim que a
vontade era legalmente obrigada por qualquer outra coisa a agir
de certa maneira. Em virtude desta consequência inevitável,
porém, todo o trabalho para encontrar um princípio supremo do
dever era irremediavelmente perdido; pois o que se obtinha não
era nunca o dever, mas sim a necessidade da acção partindo de
um determinado interesse, interesse esse que ora podia ser
próprio
ora alheio. Mas então o imperativo tinha que resultar sempre
condicionado // e não podia servir como mandamento moral.
Chamarei, pois, a este princípio, princípio da Autonomia da
vontade, por oposição a qualquer outro que por isso atribuo à
Heteronomia - p. 75

A moralidade consiste pois na relação de toda a acção com a


legislação, através da qual somente se torna possível um reino
dos fins. Esta legislação tem de poder encon-trar-se em cada ser
racional mesmo e brotar da sua vontade, cujo princípio é: nunca
praticar uma acção senão em acordo com uma máxima que se
saiba poder ser uma lei universal, quer dizer só de tal maneira
que
a vontade pela sua máxima se possa considerar a si mesma ao
mesmo tempo como legisladora universal. Ora se as máximas
não
são já pela sua natureza necessariamente concordes com este
princípio objectivo dos seres racionais como legisladores
universais, a necessidade da acção segundo aquele princípio
chama-se então obrigação prática, isto é, dever. O dever
não pertence ao chefe no reino dos fins, mas sim a cada membro
e a todos em igual medida - p. 76 (resquício de igualdade)

A razão
relaciona pois cada máxima da vontade concebida como
legisladora universal com todas as outras vontades e com todas
as
acções para connosco mesmos, e isto não em virtude de
qualquer
outro móbil prático ou de qualquer vantagem futura, mas em
virtude da ideia da // dignidade de um ser racional que não
obedece
a outra lei senão àquela que ele mesmo simultaneamente dá. - .
p. 77

E o que é então que autoriza a intenção moralmente boa ou a


virtude a fazer tão altas // exigências? Nada menos do que a
possibilidade que proporciona ao ser racional de participar na
legislação universal e o torna por este meio apto a ser membro
de
um possível reino dos fms, para que estava já destinado pela sua
própria natureza como fim em si e, exactamente por isso, como
legislador no reino
dos fins, como livre a respeito de todas as leis da natureza,
obedecendo somente àquelas que ele mesmo se dá e segundo as
quais as suas máximas podem pertencer a uma legislação
universal (à qual ele simultaneamente se submete). Pois coisa
alguma tem outro valor senão aquele que a lei lhe confere. A
própria legislação porém, que determina todo o valor, tem que
ter
exactamente por isso uma dignidade, quer dizer um valor
incondicional, incomparável, cuja avaliação, que qualquer ser
racional sobre ele faça, só a palavra respeito pode exprimir
convenientemente. Autonomia é pois o fundamento da dignidade
da natureza humana e de toda a natureza racional. - . p. 79

Podemos agora acabar por onde começámos, quer dizer pelo


conceito de uma vontade absolutamente boa. E absolutamente
boa a vontade que não pode ser má, portanto quando a sua
máxima, ao transformar-se em lei universal, se não pode nunca
contradizer. A sua lei suprema é pois também este princípio: Age
sempre segundo aquela máxima cuja universalidade como lei
possas querer ao mesmo tempo; esta é a única condição sob a
qual uma vontade nunca pode estar em contradição consigo
mesma, e um tal imperativo é categórico. E pois que a validade
da vontade, como lei universal para acções possíveis, tem
analogia com a ligação universal da existência das coisas
segundo
leis universais, que é o elemento formal da natureza em geral, o
imperativo categórico pode exprimir-se também assim: Age
segundo máximas que possam simultaneamente
ter-se a si mesmas por objecto como leis universais da
natureza. // Assina fica constituída a fórmula de uma vontade
absolutamente boa. p . 81

A vontade, cujas máximas


concordem necessariamente com as leis da autonomia, é uma
vontade santa, absolutamente boa. A dependência em que uma
vontade não absolutamente boa se acha em face do princípio da
autonomia (a necessidade moral) é a obrigação. Esta não pode,
portanto, referir-se a um ser santo. A necessidade objectiva de
uma acção por obrigação chama-se dever. - p. 84

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