BELO HORIZONTE
2018
RESUMO
*
Advogado fundador do escritório Botinha e Cabral em 1999, formado pela UFMG, pós Graduado pela
UFPR. Mestrando pela UFMG. Membro do IBDFAM e Comissões de Direito Internacional e Família
OAB/MG. Especialista em Direito Internacional.
Agradecimentos ao time do escritório Botinha e Cabral pelo incessante e paciente estudo da
Convenção de Haia e sua aplicação no Brasil e aos nossos clientes, que emprestam à pesquisa
acadêmico o sofrimento vivido em seus casos de vida.
2
ABSTRACT
1 INTRODUÇÃO
3
Toda vez que esses eventos se concretizam, uma enorme carga de angústia
passa a ser vivenciada pelos atores que os vivenciam. Além da natureza internacional
ser relevante para chamar atenção para esses casos, a pungente angústia vivenciada por
pais abandonados, por vezes a milhares de milhas de distância de seus filhos é também
fator agravante.
Artigo 11
2
FREEMAN, Marilyn. Parental Child Abduction: The Long-Term Effects. Revista da International
Centre for Family Law, Policy and Practice. Herts, 2014.
3
Decreto 99.710/90
5
Além disso, numa visão consequencialista, o Brasil ser visto como um “safe
haven” ou abrigo seguro para genitores que se dispõem a tal prática de abdução (como
já é possível detectar em diversos estudos estrangeiros acerca do tema) gera enorme
insegurança jurídica para famílias internacionais com conexões no Brasil. Um pai ou
mãe que está em litígio com o outro genitor brasileiro, simplesmente não tem segurança
de poder deixar seu filho vir ao Brasil, mesmo com um Tratado assinado pelo país que
deveria dar tal segurança, justamente pela interpretação que se dá a tal tratado pelo
judiciário brasileiro.
próprio texto convencional que assinou, vez que o Tratado impede a adaptação como
escusa para o retorno, se o pedido judicial de retorno foi rapidamente manejado.
Mas esse mesmo direito internacional privado não pode prescindir, para sua
correta utilização, de um grau relativamente amplo de segurança, certeza e
previsibilidade. Bem por isso, trata-se de ramo onde a codificação é
perfeitamente possível e até desejável.4
4
RODAS, João Grandino. A Conferência da Haia de Direito Internacional Privado: a Participação do
Brasil. Ed. Ática, pag.88.
7
convenção, por vários anos já, é possível que em futuro próximo a aplicação da Lei
Sean and David Goldman possa ser verificada nas relações binacionais.
5
Disponível em
http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/visualizarEmenta.asp?s1=000095772&base=basePresidencia
Consulta em 12 jul. de 2017
6
Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes
princípios: (...) IX - cooperação entre os povos para o progresso da humanidade;
8
Artigo 13
(...)b) que existe um risco grave de a criança, no seu retorno, ficar sujeita a
perigos de ordem física ou psíquica, ou, de qualquer outro modo, ficar numa
situação intolerável.
7
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem,
com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária,
além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade
e opressão.
10
“EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO DE
MENOR. CONVENÇÃO DE HAIA SOBRE OS ASPECTOS CIVIS
DO SEQUESTRO INTERNACIONAL DE CRIANÇAS. FILHO DE
PAI AMERICANO E MÃE BRASILEIRA, TAMBÉM COM
NACIONALIDADE AMERICANA, NASCIDO NOS ESTADOS
UNIDOS DA AMÉRICA, PAÍS DE SUA RESIDÊNCIA
HABITUAL ANTES DA SUBTRAÇÃO E RETENÇÃO NO
BRASIL. ORDEM DE RETORNO DENEGADA. PRESENÇA, NO
CASO, DIANTE DOS CONTORNOS FÁTICOS DO CASO,
ANALISADOS EM PROVA PERICIAL SOB METODOLOGIA DE
ESTUDO PSICOSSOCIAL, DA EXCEÇÃO PREVISTA NA
ALÍNEA “B” DO ARTIGO 13 DA CARTA CONVENCIONAL.
1. Pleiteado o exame do agravo retido interposto pela parte autora,
contra interlocutória decisão naquilo que indeferiu seu pleito para
oitiva das testemunhas que arrolara, conhece-se do recurso, impondo-
se, porém, negativa de seu provimento, pois não se há cogitar de
comprometimento de direito de defesa na negativa de reiteração de
11
De outra sorte, várias vezes são utilizados como “desculpa” para o não
retorno, contratempos relativos à readaptação do infante ao local de residência habitual
ou afastamento do genitor que provocou o sequestro que, obviamente não hão de ser
considerados como “grave risco”, de modo a afastar a determinação de regresso. No
caso acima ementado, a mera litigiosidade do casal, situação que existe praticamente em
todos os casos onde uma criança é abduzida, é usada como razão para a criança não ser
retornada ao país de residência habitual.
8
MARTINS, Natália Camba. Subtração internacional de crianças: as exceções à obrigação de retorno
previstas na Convenção de Haia de 1980 sobre os aspectos civis do sequestro internacional de crianças:
interpretação judicial da adaptação da criança - 1 ed. Curitiba: CRV, 2013, p. 115-116.
13
9
Disponível em
http://www.menores.gob.ar/userfiles/perez_vera_elisa_informe_explicativo_del_convenio_de_la_haya_d
e_1980.pdf Consulta em 18 set. 17.
10
MARTINS, Natália Camba. Subtração internacional de crianças: as exceções à obrigação de retorno
previstas na Convenção de Haia de 1980 sobre os aspectos civis do sequestro internacional de crianças:
interpretação judicial da adaptação da criança - 1 ed. Curitiba: CRV, 2013, p. 132.
14
E mais:
11
MENDES, Gilmar Ferreira; , MONEBRANCO, Paulo Gustavo. Curso de Direito Constitucional. 9ª
Ed. São Paulo : Saraiva. 2014. p. 1275
12
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 38ª Ed. São Paulo : Saraiva.
2012 p. 225
13
BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e Aplicação da Constituição. São Paulo: Saraiva. p. 233
14
BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e Aplicação da Constituição. São Paulo: Saraiva. p. 233.
16
15
CANOTILHO, Joaquim José Gomes. Direito Constitucional. 6ª Ed. Livraria Almedina : Coimbra.
1993. P. 219
16
Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d3413.htm>. Consulta em 19 set. 17.
17
17
NOVELINO, Marcelo. Manual de Direito Constitucional. 9ª Ed. Editora Gen: São Paulo, 2014. P. 245
18
Levar a criança para um lugar distante pode parecer uma medida protetora,
mas os pais não podem fazer a lei com suas próprias mãos. Isso pode parecer
um exemplo fácil, mas temos problemas para manter a mesma lógica quando
a situação é inversa. Queremos que as crianças que são subtraídas do nosso
país sejam devolvidas imediatamente, mas não somos tão ágeis quando
retornamos crianças para outros países. Temos o desejo natural de protegê-las
e, portanto, nos concentramos nas alegações de abuso em vez dos requisitos
legais da Convenção.
Sem passar por tal teste, nenhuma negativa de retorno deveria prosperar:
seriam possíveis ações ou coordenações de medidas que assegurassem o retorno de
forma segura? Tal indagação há de ser impreterivelmente efetuada pelo magistrado
antes de emitir qualquer ato decisório.
A corte sugere que, qualquer que seja a natureza do perigo, a criança deve ser
retornada ao seu local de residência habitual, sempre que se garantir que os
órgãos julgadores deste último estão em posição de avaliar os méritos do
perigo que assola da criança e protegê-la, se necessário. A proteção pode vir,
por exemplo, pela inclusão de garantias e/ou a obtenção de “decisões
espelho” ou “ordens de porto seguro” ao retorno da criança a um ambiente
protetivo, até que as alegações sejam avaliadas no país de residência habitual.
18
Friedrich v. Friedrich (Friedrich II), 78 F.3d 1060, 1068 (6th Cir., 1996); também Gaudin v. Remis, 415
F. 3d 1028, 1035 (9th Cir., 2005).
21
mencionadas por Natália Camba19 (“A proteção pode vir, por exemplo, pela inclusão de
garantias e/ou a obtenção de “decisões espelho” ou “ordens de porto seguro” ao retorno
da criança a um ambiente protetivo, até que as alegações sejam avaliadas no país de
residência habitual”).
Assim, temos que várias soluções ponderadas outras podem ser propostas
junto com a determinação do retorno. A sentença de retorno, nesse sentido,
representaria uma verdadeira sentença “estruturante”.
Nas lições de Fred Diddier, estruturante será a decisão que buscar implantar
uma estruturação mais ou menos complexa, de forma a “realizar uma política pública ou
resolver litígios complexos”. Outra característica é a possibilidade de provimentos em
cascata, onde são verificadas, antes da efetivação de um próximo passo, as
concretizações de condicionantes estipuladas pelo juízo. A sentença estruturante trata-se
19
MARTINS, Natália Camba. Subtração Internacional de Menores.CRV: Curitiba. 2013. P. 135/136.
22
Ou ainda:
U.S. courts require the abducting parent to show not only that there is a
grave risk of psychological and physical harm but also that there are
no mitigating measures that can be taken in the country of habitual
residence to reduce that risk.22
6 CONCLUSÃO
Tendo em vista que a concepção de grave risco não pode dar-se da forma
extremamente alargada a ponto de aniquilar irremediavelmente a letra convencional, é
imprescindível a parcimônia do aplicador ao se deparar com situações de repatriação.
Há ele de ter em vista as peculiaridades próprias de demandas dessa natureza quando de
sua solução, jamais se olvidando de estar diante de lide de cunho internacional. Desta
feita, a adequação dos diplomas internacionais disponíveis ao ordenamento interno deve
ser efetuada tendo em vista tal feição extraordinária.
O melhor dessa técnica é que ela garante de forma abrangente que haja
respeito não somente às ordens internacionais e comunitaristas, como também à
proteção integral ao menor e à dignidade humana dos envolvidos.
24
REFERÊNCIAS