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Revista Jurídica Consulex nº 378

Matéria de Capa
Rolf Madaleno
Advogado especialista em Direito de Família. Professor em diversas universidades.
Autor e coordenador de várias obras jurídicas, dentre elas, de sua autoria, Curso de
Direito de Família (4. ed., Forense).
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15/10/2012

A AFETIVIDADE COMO PRINCÍPIO JURÍDICO CONSAGRADO NO


DIREITO DE FAMÍLIA

A partir da Carta Política de 1988 foi sendo desconstituída a ideologia


da família patriarcal, edificada em uma família monogâmica, parental,
patriarcal, heterossexual e patrimonial, que reinou absoluta na sociedade brasileira, asfixiando o livre trânsito do afeto ao
dar prevalência e exclusividade aos vínculos patrimoniais do casamento. A família do passado não tinha preocupação alguma
com o afeto e a felicidade das pessoas que formavam seu núcleo de convivência, pois seus interesses de ordem econômica
estavam centrados unicamente no modelo de um pai e uma mãe e filhos financeiramente dependentes. Nem mesmo os
modelos de entidades familiares lembrados pela Constituição Federal de 1988 abarcam toda a diversidade familiar presente
na contemporânea sociedade brasileira, cujos vínculos advêm do afeto, este, representado pelo sentimento de duas pessoas
que se afeiçoam pelo convívio diuturno, unidas por um destino comum, embora este não seja requisito indispensável para
haver uma família, nem que a relação afetiva seja sempre entre um homem e uma mulher, nem que haja sempre um pai e
uma mãe na estrutura familiar.

Embora a pluralidade familiar sempre tenha estado presente na sociedade brasileira, tirante o casamento civil, todas as
demais entidades familiares viviam literalmente à margem de uma rígida legislação que só reconhecia no matrimônio
tradicional forma legítima de constituir família. A Constituição Federal de 1988 edificou o princípio do pluralismo das
entidades familiares ao tirar o casamento civil do isolamento legal, dispondo que lhe fariam companhia constitucional a
união estável e a família monoparental, que também passaram a merecer a proteção estatal.

Nitidamente, o afeto passou a ser a nota de destaque das relações familiares. Como ensina Paulo Lôbo, a consagração da
força normativa dos princípios constitucionais representou um dos maiores avanços do Direito brasileiro após a Constituição
Federal de 19881 e como princípio geral, ao lado da igualdade, da liberdade, da convivência familiar e do melhor interesse
da criança, destacou-se aafetividade, fonte principal de constituição de uma entidade familiar, sob cujas bases, por sinal, não
faz muito tempo, o Supremo Tribunal Federal reconheceu que, igualmente dos relacionamentos homoafetivos emanam
efeitos jurídicos como aqueles inerentes à união estável.

O STF, no julgamento conjunto da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n° 132-RJ e da Ação Direta de
Inconstitucionalidade n° 4.277-DF (Rel. Min. Ayres Britto, DJe 14.10.11), conferiu ao art. 1.723 do Código Civil de 2002
interpretação conforme a Constituição Federal, para excluir do dispositivo legal todo significado que impeça o
reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar.

Na mesma direção se pronunciou o Superior Tribunal de Justiça no Recurso Especial n° 1.183.378-RS (Rel. Min. Luis Felipe
Salomão, DJe 01.02.12), ao destacar serem múltiplos os arranjos familiares, não havendo como negar a proteção estatal a
qualquer família, independentemente de orientação sexual dos seus partícipes, pois todas possuem os mesmos núcleos
axiológicos da dignidade das pessoas de seus membros e o afeto.

São exatamente os valores supremos da dignidade humana e o afeto os princípios constitucionais presentes na construção
dos vínculos familiares, e quando a Carta Federal tutela a pluralidade familiar, justifica sua função a partir da promoção da
pessoa humana, literalmente desencarnada do seu precedente biológico, para ceder espaço aos elos psicológicos do afeto e
sua comunhão contígua e solidária, os quais se sobrepõem aos valores materiais e hereditários valorizados no passado. Esta
família do presente parte de uma relação de estabilidade, coabitação em regra e livre desejo de criar um núcleo familiar de
proteção recíproca, solidariedade e interdependência econômica, tudo inserido em um projeto de vida em comum.

Sujeito de direitos, cada partícipe dessa diversidade familiar tem a liberdade de formar, ou não, sua própria família, sem
ser obrigado a aderir a um modelo único de um elenco fechado de entidade familiar, diante de um perfil de família plural
que se estrutura e convive a partir da afetividade, que advenha de uma tradicional família matrimonial, de uma família
informal da união estável, de uma família monoparental, de uma família homoafetiva, de uma família anaparental, de uma
família reconstruída, de uma família paralela, de uma família eudemonista e de uma família poliafetiva, como há pouco
noticiou a imprensa acerca da lavratura de escritura pública consignando a existência de união afetiva entre um homem e
duas mulheres que afirmam viver em harmônica coabitação em única moradia, não se confundindo esta com a família
paralela, na qual um homem, em regra, vive ao mesmo tempo com duas mulheres, mas em residências distintas.

DA UNIÃO ESTÁVEL

Foi com o aval constitucional que a união estável adquiriu o status de entidade familiar, posta ao lado do casamento e da
família monoparental, sendo que ela se forma à imagem do casamento, quando presentes alguns pressupostos previstos em
lei, e que passam pela diversidade de sexos para a união estável heterossexual, ou pela identidade de sexos, quando se
refere à união estável homoafetiva – viabilizando a lei, para a primeira hipótese, e a jurisprudência, em especial do STF e do
STJ, para o segundo exemplo, a possibilidade de as uniões estáveis heterossexual e homoafetiva serem transformadas em
casamento –, além dos requisitos de uma convivência pública, contínua e instituída com o objetivo de constituir família.
Família que se forma pela comunidade de vida e pela comunidade de afeto, na qual os conviventes buscam compartir um
projeto e estilo próprio de vida, com grau e intensidade igualmente desejados e desenvolvidos pelos cônjuges e de cuja
entidade familiar a união estável não se diferencia no plano fático, envoltos os conviventes em assistência e cooperação
mútuas, expressadas em vínculos de solidariedade e companheirismo, para desfrutarem das alegrias e satisfações da vida,
bem assim para enfrentarem as situações adversas.

FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA

O real valor jurídico da filiação está na verdade afetiva e jamais sustentada na ascendência genética, porque esta, quando
desligada do afeto e da convivência, nada mais representa do que um efeito da natureza, quase sempre fruto de um
indesejado acaso, obra do descuido e da pronta rejeição. Não podem ser considerados genitores pessoas que nunca quiseram
exercer as funções de pai ou de mãe, e sob todos os modos e ações se desvinculam dos efeitos sociais, pessoais e materiais
da relação natural de filiação.

A filiação consanguínea só coexiste com o vínculo afetivo, com o qual se completa a relação parental. Não há como
aceitar uma relação de filiação apenas biológica sem ser afetiva, esta, externada quando o filho é acolhido pelos pais que
assumem plenamente suas funções do poder familiar, previstos pelos arts. 1.634 e 1.690 do Código Civil.

Mas não deixará de ser genitor aquele ascendente com temperamento mais frio, menos afetuoso e mais distanciado, por
decorrência de sua própria educação, por seu excesso de afazeres profissionais e por sua formação familiar, mas que não
deixou de se fazer presente na vida, direcionamento, criação e educação do filho. Em contrapartida, não pode ser
considerado genitor o ascendente biológico, tão só porque forneceu o material genético para a concepção e o nascimento do
filho que nunca desejou criar.

Não é outra a reiterada interpretação jurisprudencial quando enfrenta e invariavelmente nega a tentativa de ruptura de
sólidos elos afetivos de um genitor eminentemente registral e socioafetivo, porque esse foi o verdadeiro doador de amor
desinteressado e não aquele do mero elo genético e que nunca exerceu sua função de pai.

Uma demanda ajuizada para desconstituir a relação afetiva e dar lugar ao frio vínculo puramente biológico não deve
encontrar respaldo na jurisprudência nacional quando sempre existiram pais socioafetivos e registrais, que indiferentes à
conexão biológica sempre exerceram o papel de “pais do coração”.

A união e o relacionamento afetivo construídos no ambiente familiar estão sacramentados e se tornam vínculos perenes,
que não podem ser apagados por uma sentença judicial de desconstituição do liame familiar, pois o registro parental e a
verdade biológica nada significam quando pais e filhos sempre estiveram unidos pelos sinceros laços da espontânea afeição. É
o ascendente socioafetivo que desempenha a função parental e atua como educador, ao irradiar afeto, amizade e
compreensão. É ele que, sem vacilar, empresta seu nome para completar a personalidade civil daquele que acolheu por
amor, não sendo aceitável que, eventualmente, um decreto judicial atue como prenúncio de morte da filiação de candente
afeição, para priorizar vínculos de filiação entre personagens ausentes, em que um jamais quis participar da vida do outro.

Impossível desconsiderar como cerne da relação familiar a coexistência dos laços de interação parental, vivendo e
convivendo os componentes de uma família em recíproco afeto e solidariedade familiar. A paternidade ou a maternidade
mais importante nasce dos vínculos do tempo e do amor incondicional, e a paternidade ou a maternidade consanguínea
podem registrar um elo biológico, mas em nada expressam um vínculo paterno ou materno dos pais doadores do material
genético. Verdadeiros pais são aqueles que criam seus dependentes como filhos, com ou sem o registro civil, e, se também
registram a prole, consignando por escrito seu afeto e dedicação parental.

Como têm decidido os tribunais, em nada difere um ato de adoção jurídica da prática desenvolvida pela adoção à brasileira,
consistente no ato de registrar uma pessoa falsamente como se fosse um filho biológico. Apesar de o ato estar fora dos
ditames legais da adoção, justamente burlando os cuidados, princípios e pressupostos ordenados na legislação, ninguém
sustenta em sã consciência que esta adoção informal não se trate de um gesto de amor. E se há o sincero desejo de
aproximar pelo afeto duas ou mais pessoas em vínculos de filiação não biológica, é inaceitável qualquer decisão judicial
capaz de fazer retornar o filho adotivo aos vínculos naturais de parentesco por motivos econômicos.

Conforme prescreve o art. 1.603 do Código Civil, a filiação é determinada pela certidão do termo de nascimento
registrada no Registro Civil e, se bem visto, esse dispositivo carrega em sua gênese o princípio explícito da paternidade
socioafetiva, porque atribui o status jurídico de pai pelo assento do nascimento levado a registro e não por consequência do
eventual vínculo de sangue.

Quem acolhe desde o nascimento como genitor do coração, constitui a voluntária paternidade ou maternidade socioafetiva
da solidariedade, com gestos reais de amor que formatam e contam a verdadeira história de uma filiação, pois como informa
Paulo Lôbo, “a Constituição não elegeu a origem biológica como fundadora da família. Ao contrário, dispensou-a, para fixar-
se na relação construída no afeto e na convivência familiar, tendo ou não consanguinidade [...]. O reconhecimento do
genitor biológico não pode prevalecer sobre a paternidade construída na convivência familiar, que frequentemente ocorre
entre a mãe que registrou o filho e outro homem, com quem casou ou estabeleceu união estável, e que assumiu os encargos
da paternidade”.2

O ABANDONO AFETIVO

Tem sido fonte frequente de demandas processuais a indenização pelo dano moral do abandono afetivo dos pais em
relação a seus filhos, porquanto, dentre os inescusáveis deveres dos pais, figura o de assistência moral, psíquica e afetiva, e
quando um deles deixa de exercer o verdadeiro e mais sublime de todos os sentidos da paternidade ou da maternidade,
certamente afeta a higidez psicológica do descendente rejeitado.

Embora possa ser dito que não há como o Judiciário obrigar a amar, também deve ser considerado que o Poder não pode
se omitir de se pronunciar contra o covarde e incompreensível gesto de rejeição dos filhos e aqueles que se descurem dos
seus deveres de cuidado para com a prole por eles gerada, mormente constando do art. 227 da Constituição Federal ser
obrigação dos pais assegurar aos filhos a convivência familiar, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência,
discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Justamente neste sentido se pronunciou o STJ, pelo voto da
Relatora Ministra Nancy Andrighi, no Recurso Especial n° 1.159.242-SP (DJe 10.05.12), ao mencionar não se tratar de
obrigação paterna amar, mas de imposição legal cuidar, que é dever jurídico, corolário da liberdade das pessoas gerarem ou
adotarem filhos. Aduziu a Ministra, ainda, que o amor é pura motivação, questão que refoge os lindes legais, mas o cuidado é
dever concreto e pode ser juridicamente tutelado. Não há, no entanto, interpretação jurisprudencial unânime nesse sentido,
como mostra o Poder Judiciário do Estado de Santa Catarina, no julgamento da Apelação Cível n° 2011.073787-1, em decisão
da lavra do Desembargador Jorge Luis Costa Beber, ao concluir não ser função do Judiciário tutelar o amor ou o desafeto,
jurisdicionalizando os sentimentos, pois a afeição compulsória, não espontânea, forjada pelo medo da responsabilidade
pecuniária, é tão ou mais funesta do que a própria ausência de afeto.

SÍNDROME DA ALIENAÇÃO PARENTAL

Talvez ainda mais perverso que o abandono afetivo e material, por demonstrar covarde ausência de cuidados e de afeto
para com os próprios filhos sob sua guarda e direção, é a prática criminosa da alienação parental. Nela, o ascendente se
mostra infantilmente preocupado com seu próprio bem-estar e corrompe covardemente a inocência de seus filhos enquanto
crianças e adolescentes. Em razão da nefasta síndrome, programa os filhos para que odeiem, sem qualquer justificativa, um
de seus genitores, tratando a própria criança ou adolescente de contribuir para a desmoralização do progenitor visitante,
obstruindo a relação afetiva com o filho que, ao lado do ascendente alienado, é igualmente vítima da prática. Dentro dessa
dura realidade de pais que jogam com a estrutura psíquica dos filhos para atordoarem, com suas desinteligências mentais, a
harmonia familiar, impõe-se que urgentes demandas logrem efetivamente interromper esse círculo criminoso de alienação
parental, obrigando-se o Judiciário a atuar, com energia e determinação, quando percebe presente qualquer uma das três
fases (leve, moderada e severa) da prática de alienação parental, notadamente em seu momento inicial, quando é crucial
abortar e impedir sob todas as formas que o ascendente guardião inicie os atos de alienação parental e projete na criança ou
adolescente os seus sentimentos negativos, de indignação e de rancores do ex-parceiro.

O Poder Judiciário deve garantir a comunicação do ascendente alienado com o seu filho, bem como o direito às visitas, e,
igualmente, assegurar que esta comunicação não seja interrompida, até mesmo por intermédio de ação cominatória que
imponha multa pecuniária ao genitor alienante que se recuse a participar de intervenção terapêutica ordenada em seu
próprio favor.

NOTAS
1 LÔBO, Paulo. Princípio da solidariedade familiar. In: PEREIRA, Rodrigo da Cunha (Coord.). Família e solidariedade. Teoria e prática do Direito de Família.
Lumen Juris; IBDFAM, 2008, p.3.

2 LÔBO, Paulo Luiz Netto. In: AZEVEDO, Álvaro Villaça (Coord.). Código Civil comentado. São Paulo: Atlas, 2003, p. 130.

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