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Aspectos Técnicos

em Cirurgia
I
II
CLÍNICA BRASILEIRA DE CIRURGIA
COLÉGIO BRASILEIRO DE CIRURGIÕES

Aspectos Técnicos
em Cirurgia
Editor Convidado

Nelson Fontana Margarido


Professor Livre-Docente do Departamento de Cirurgia da Faculdade de
Medicina da Universidade de São Paulo. 2o Vice-Presidente Nacional do
Colégio Brasileiro de Cirurgiões. Diretor Clínico do Hospital Universitário
da Universidade de São Paulo. Cirurgião do Corpo Clínico do Hospital
Sírio-Libanês de São Paulo

ANO V — VOLUME II
1999

Atheneu
São Paulo • Rio de Janeiro • Belo Horizonte

III
EDITORA ATHENEU

São Paulo — Rua Jesuíno Pascoal, 30


São Paulo — Tels.: 222-4199
São Paulo — Fax: 3362-1737 • 223-5513
São Paulo — E-mail: info@atheneu.com.br
São Paulo — www.atheneu.com.br

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Belo Horizonte — Rua Domingos Vieira, 319 — Conj. 1.104

PLANEJAMENTO GRÁFICO — CAPA: Equipe Atheneu

PRODUÇÃO GRÁFICA: O. Prado

CBC — Clínica Brasileira de Cirurgia


EDITOR — Samir Rasslan

MARGARIDO N. F.
Aspectos Técnicos em Cirurgia

©Direitos reservados à EDITORA ATHENEU — 1999

IV
Colaboradores

ACCYOLI MOREIRA MAIA


Professor Titular de Clínica Cirúrgica do Departamento de Cirurgia da
Faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense (UFF).
Coordenador do Curso de Mestrado em Cirurgia Gastroenterológica
ALDO DA CUNHA MEDEIROS
Doutor em Cirurgia, Professor Adjunto Coordenador da Disciplina de
Técnica Operatória da Universidade Federal do Rio Grande do Norte
(UFRN). Chefe do Núcleo de Cirurgia Experimental da Universidade Federal
do Rio Grande do Norte (UFRN)
ALDO JUNQUEIRA RODRIGUES JUNIOR
Professor Titular da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
(USP) — Disciplina de Topografia Estrutural Humana. Chefe do
Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina da Universidade de São
Paulo (USP)

ALEXANDRE MARGUTTI FONOFF


Professor Instrutor e Mestre do Departamento de Cirurgia da Faculdade de
Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo

ANDERSON BENÍCIO
Médico Assistente da Divisão Cirúrgica do Instituto do Coração do Hospital
das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

ANDRÉ DE MORICZ
Pós-Graduando do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências
Médicas da Santa Casa de São Paulo

V
ANDRÉ PAULO NEMETZ
Professor de Clínica Cirúrgica I, Fundação Universidade Regional de
Blumenau (FURB). Especialista em Cirurgia Plástica pela Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), Serviço Professor Ivo
Pitanguy
CARLOS ALBERTO MALHEIROS
Professor Adjunto-Doutor do Departamento de Cirurgia da Faculdade de
Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo
EDUARDO H. PIROLLA
Médico Assistente da Divisão Cirúrgica do Instituto do Coração do Hospital
das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).
Cirurgião do Serviço de Emergência do Hospital Sírio-Libanês de São Paulo.
Cirurgião do Corpo Clínico do Hospital Sírio-Libanês de São Paulo
EDVALDO FAHEL
Professor Adjunto de Cirurgia da Faculdade de Medicina da Universidade
Federal da Bahia. Chefe do Serviço de Cirurgia Geral do Hospital São Rafael
— Fundação Monte Tabor
ERASMO SIMÃO DA SILVA
Professor Doutor da Disciplina de Topografia Estrutural Humana do
Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina da Universidade de São
Paulo (FMUSP)
FRANCISCO CÉSAR MARTINS RODRIGUES
Professor Assistente-Doutor do Departamento de Cirurgia da Faculdade de
Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo
ITALO ACCETA
Professor Titular de Clínica Cirúrgica do Departamento de Cirurgia da
Faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense (UFF).
Subcoordenador do Curso de Mestrado em Cirurgia Gastroenterológica
JOÃO BATISTA DE SOUZA
Professor Adjunto do Departamento de Clínica Cirúrgica da Faculdade de
Ciências da Saúde da Universidade de Brasília (UnB)
JOSÉ ANTONIO GOMES DE SOUZA
Titular do Colégio Brasileiro de Cirurgiões. Fellow do American College of
Surgeons. Ex-Professor de Cirurgia da Universidade de Brasília (Unb)
JOSÉ WAZEN DA ROCHA
1º Vice-Presidente Nacional do Colégio Brasileiro de Cirurgiões. Chefe da
Cirurgia do Hospital de Clínicas de Ipanema — AMIL. Chefe e Responsável
pelo Centro de Hemorragia Digestiva do Hospital do Andaraí (1875-1986)

VI
LUIZ ALBERTO SOARES
Professor Doutor da Disciplina de Técnica Cirúrgica e Cirurgia Experimental
do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina da Universidade de
São Paulo (FMUSP)
LUIZ GUILHERME BARROSO ROMANO
Presidente do Colégio Brasileiro de Cirurgiões. Mestre em Cirurgia Plástica
pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), Serviço
Professor Ivo Pitanguy
MARCELO DOMINGUES MANSANO
Residente da Disciplina de Cirurgia de Tórax da Faculdade de Ciências
Médicas da Santa Casa de São Paulo
MÁRCIO BOTTER
Pós-Graduando da Disciplina de Cirurgia de Tórax da Faculdade de Ciências
Médicas da Santa Casa de São Paulo
NELSON FONTANA MARGARIDO
Professor Livre-Docente do Departamento de Cirurgia da Faculdade de
Medicina da Universidade de São Paulo. 2º Vice-Presidente Nacional do
Colégio Brasileiro de Cirurgiões. Diretor Clínico do Hospital Universitário
da Universidade de São Paulo. Cirurgião do Corpo Clínico do Hospital
Sírio-Libanês de São Paulo
NOEDIR A. G. STOLF
Professor Adjunto, Professor Livre-Docente e Professor Associado da
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo — Departamento de
Cardiopneumologia, Diretor da Divisão Cirúrgica do Instituto do Coração do
Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São
Paulo
ORLANDO MARQUES VIEIRA
Membro Titular do Colégio Brasileiro de Cirurgiões. Professor Titular do
Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina da Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
PAULO GONÇALVES DE OLIVEIRA
Chefe do Serviço do Coloproctologia do Hospital Universitário de Brasília,
Mestre e Doutor pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto —
Universidade de São Paulo (USP). Professor Adjunto do Departamento de
Clínica Cirúrgica da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de
Brasília (UnB)

VII
PEDRO PUECH-LEÃO
Professor Titular da Disciplina de Cirurgia Vascular do Departamento de
Cirurgia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
PERETZ CAPELHUCHMIK
Professor Titular do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências
Médicas da Santa Casa de São Paulo (Área de Coloproctologia)
RAUL CUTAIT
Professor Associado do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina
da Universidade de São Paulo (FMUSP). Cirurgião do Hospital Sírio-Libanês
de São Paulo
ROBERTO SAAD JR.
Professor Titular da Disciplina de Cirurgia de Tórax e Professor
Livre-Docente do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências
Médicas da Santa Casa de São Paulo
RODRIGO ALTENFELDER SILVA
Professor Assistente-Doutor do Departamento de Cirurgia da Faculdade de
Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo
SU CHAO
Aluno de Pós-Graduação do Departamento de Cirurgia da Faculdade de
Medicina da Universidade de São Paulo (USP)

VIII
Prefácio

Este é mais um volume da Clínica Brasileira de Cirurgia — CBC,


analisando diferentes aspectos técnicos em cirurgia e que tem o TCBC Nelson
Fontana Margarido, professor de Técnica Operatória, como Editor
Convidado.
Na sua estruturação foram selecionados temas importantes e de interesse
para os cirurgiões de distintas especialidades.
Teoricamente, quando a indicação operatória é precisa, os aspectos
técnicos do procedimento rigorosamente obedecidos e os cuidados
pós-operatórios adequados, a evolução do doente deve ser favorável.
O cirurgião está habituado a grandes desafios, incisões magistrais e
grandes operações, mas para a maioria as atividades diárias são
caracterizadas por intervenções de menor porte. No entanto, pequenos
procedimentos nem sempre são valorizados, sendo delegados a cirurgiões em
formação ou em fase de treinamento muitas vezes sem a orientação de um
profissional mais qualificado.
Estes procedimentos mais simples podem ter repercussões “complexas”
se não conduzidos de forma correta ou observados os princípios técnicos que
norteiam a sua realização. Assim, uma drenagem abdominal inadequada pode
levar à necessidade de uma reintervenção; da mesma forma, uma falha na
drenagem de tórax (erro na escolha do local, mau posicionamento do dreno,
remoção precoce ou tardia do mesmo) pode acarretar iatrogenias ou sérias
complicações.
Alguns temas são controversos, como drenar ou não a cavidade
abdominal, na vigência de peritonite difusa, e realizar ou não sutura ou
anastomoses intestinais na presença de contaminação ou infecção.
Os temas escolhidos são básicos para os interessados na especialidade
cirúrgica de seus autores, experientes no assunto.

IX
Esta é a razão pela qual Aspectos Técnicos em Cirurgia constitui mais
uma publicação da coleção CBC, que tem por objetivos o aprimoramento e a
educação continuada do cirurgião brasileiro.
Agradecemos ao TCBC Nelson Fontana Margarido e a seus
colaboradores por esta significativa contribuição ao Colégio Brasileiro de
Cirurgiões.
Samir Rasslan, TCBC
Editor Responsável

X
Apresentação

Este livro foi idealizado e escrito com o escopo de auxiliar os cirurgiões


recém-graduados, que precisam desenvolver conhecimentos e condutas para
diferentes procedimentos técnico-cirúrgicos.
Certamente ele será consultado também por cirurgiões de reconhecida
experiência, para atualização técnica, em algum tema específico que tenha
sofrido recentes modificações. Os assuntos selecionados representam uma
amostra do universo da atuação do cirurgião.
Contamos com o apoio de especialistas experientes, que contribuíram de
forma exemplar a respeito dos diversos aspectos focalizados.
Não temos dúvidas de que os esforços despendidos pelos autores, na
tarefa de redigir atualizações significativas, servirão para esclarecer e
ilustrar a todos. Foi um trabalho enorme por parte de todos, bem como da
equipe da Editora Atheneu.
Acreditamos que este livro cumpre com seu principal objetivo: fornecer
subsídios para que os cirurgiões possam tratar de maneira mais adequada e
atual os seus pacientes.
Expressamos nossa gratidão a todos os colaboradores por esta
excepcional oportunidade a nós confiada, e aproveitamos para dedicar — em
especial — este trabalho ao Colégio Brasileiro de Cirurgiões e aos médicos
do Brasil.
Nelson Fontana Margarido

XI
XII
Sumário

1 Esterilização, Assepsia e Anti-Sepsia — Preparo da Parede Abdominal, 1


Accyoli Moreira Maya
Italo Accetta

2 Equipamento e Instrumental de Videocirurgia: O Que Há de Novo?, 19


Rodrigo Altenfelder Silva
André de Moricz

3 Anatomia Cirúrgica da Parede Abdominal, 23


Aldo Junqueira Rodrigues Júnior
Erasmo Simão da Silva

4 Incisões Torácicas, 31
Roberto Saad Jr.
Marcelo Domingues Mansano

5 Cirurgia Minimamente Invasiva, 45


Nelson Fontana Margarido
Luiz Alberto Soares

6 Drenagem Abdominal nas Peritonites, 53


José Wazen da Rocha
José Antonio Gomes de Souza

7 Drenagem Torácica, 65
Roberto Saad Júnior
Marcio Botter

8 Fechamento da Parede Abdominal, 77


Luiz Alberto Soares
Nelson Fontana Margarido

XIII
9 Fechamento de Toracotomias, 87
Noedir A. G. Stolf
Anderson Benício

10 Princípios Gerais de Hemostasia, 99


Pedro Puech-Leão
Su Chao

11 Fios de Sutura, 113


Aldo da Cunha Medeiros

12 Suturas Digestivas, 123


Orlando Marques Vieira

13 Suturas em Situações Críticas, 133


Eduardo H. Pirolla
Nelson F. Margarido

14 Suturas Mecânicas, 141


Carlos Alberto Malheiros
Francisco César Martins Rodrigues

15 Nós e Suturas em Videocirurgia, 155


Edvaldo Fahel

16 Preparo Intestinal para Cirurgia Colorretal, 183


Peretz Capelhuchnik
Alexandre Margutti Fonoff

17 Cicatrizações da Ferida Operatória, 199


Luiz Guilherme Romano
André Paulo Nemetz

18 Cuidados com a Ferida Operatória — Infecção, 215


João Batista de Souza

19 Bases da Cirurgia Oncológica, 237


Eduardo Pirolla
Raul Cutait

XIV
Esterilização, Assepsia e
1 Anti-Sepsia — Preparo da
Parede Abdominal

Accyoli Moreira Maya


Italo Accetta

INTRODUÇÃO

Um dos grandes problemas da cirurgia que remonta a tempos imemoriais é a


infecção. Apesar dos esforços dos pesquisadores, a partir das posturas de Sem-
melweis27, Holmes8 e Lister13, entre outros, o desafio de seu controle, mesmo na
era da antibioticoterapia, tem permanecido como um teorema ainda não totalmen-
te equacionado. Embora, tenha-se obtido um precioso acervo de informações,
granjeadas pela experiência vivenciada através dos tempos e consubstanciada nos
avanços tecnológicos, sem dúvida alguma, o seu controle permanece muito aquém
do desejado. Isto posto, apesar da constante evolução dos conhecimentos científi-
cos este capítulo da medicina permanece como um desafio ímpar, sobretudo na
área da cirurgia. Vale lembrar que na virada dos séculos sempre tem ocorrido volu-
mosa gama de transformações caracterizadas por uma série de descobertas que
abalam conceitos antigos já arraigados ou sedimentados pelo uso. No entanto, as
medidas de combate ou controle das infecções, não têm sido traduzidas por res-
postas totalmente satisfatórias, no que concerne aos resultados obtidos.
Deste modo, os cirurgiões sempre atentos a esta problemática e por consti-
tuírem um segmento importante, no que se refere a apreciação e resolução destas
questões, têm procurado aprimorar, cada vez mais, seus cuidados, não só através
de regras rígidas de esterilização do material envolvido nas operações, como
também obedecendo a um rigoroso ritual de assepsia e anti-sepsia que precedem
ao ato operatório. Estas normas de conduta são acompanhadas por princípios de
refinamentos técnicos, cujo objetivo é obter resultados de melhor qualidade.
Ressalte-se ainda que um preparo cuidadoso da parede abdominal constitui inco-
mensurável medida para afastar, ou pelo menos manter dentro de padrões aceitá-
veis, os problemas relativos às infecções.
É a respeito dos aspectos envolvendo este ritual que estão diretamente relaci-
onados com as atitudes que precedem a sua atividade quotidiana, o ato cirúrgico,

1
que chamaremos a atenção de cada item procurando destacar a importância dos
processos de esterilização, de assepsia e de anti-sepsia e ainda sobre o preparo da
parede abdominal. Neste sentido, procuraremos promover uma revisão atualiza-
da sobre a influência de cada item e sua situação vigente, agregando todo o arse-
nal de medidas que ora dispomos, traduzida pela incansável busca do aprimora-
mento científico que tanto excita, qualifica e diferencia o cirurgião.

ESTERILIZAÇÃO

Por definição, é o processo pelo qual se promove a completa destruição ou


remoção de todas as formas de vida microbiana de um determinado ambiente ou
objeto, através da ação de agentes físicos e/ou químicos.
Conseqüentemente, estão incluídos neste tópico todo material médico-
cirúrgico manuseado direta ou indiretamente durante a operação (instrumental
cirúrgico, fios de sutura, gazes, compressas, aventais e campos cirúrgicos etc.). É
importante lembrar que as peças selecionadas para a esterilização devem ser sub-
metidas previamente a uma limpeza rigorosa, seja por processo mecânico manu-
al e/ou por máquinas de lavar, seja por exposição das mesmas ao limpador ul-
tra-sônico de instrumentos27. Este procedimento tem como finalidade remover
qualquer substância que possa comprometer ou interferir deleteriamente na efi-
cácia da desgerminação, especialmente quando existem manchas de sangue, gor-
duras hidrofóbicas, pus e outras secreções, que possam bloquear e/ou retardar a
ação do agente utilizado na esterilização. Observados estes preceitos, deve-se
acomodar todo material em caixas metálicas perfuradas na parte superior (instru-
mental cirúrgico sem o material de corte) e/ou sob a forma de pacotes confeccio-
nados com envoltórios apropriados (algodão cru, musseline, papel laminado,
etc.). Aspecto não menos importante é a maneira pela qual as peças devem ser
acondicionadas, uma vez que sua arrumação deverá obedecer a uma disposição
que permita, não só o fácil acesso do agente responsável pela esterilização, como
também ser capaz de servir como uma barreira à contaminação do material até a
sua utilização.
Como meio de controle da eficiência do processo esterilizante, coloca-se no
interior dos pacotes indicadores ou marcadores (químicos ou biológicos) sob a
forma de fitas adesivas ou tubos contendo líquido que alteram a coloração quan-
do atinge as condições consideradas ideais12,27.

MÉTODOS USUAIS DE ESTERILIZAÇÃO

A escolha do processo está sempre relacionada com a especificidade do pro-


pósito e com a qualidade do material, de modo que os listaremos e teceremos co-
mentários específicos sobre cada modalidade:

2
Esterilização pelo Calor

Calor Seco

É usualmente empregado para esterilizar componentes de vidro e instrumen-


tal de aço inoxidável. O processo consta da colocação do material em estufas elé-
tricas equipadas com termostato e ventilador para promover o aquecimento rápi-
do, controlado e uniforme da câmara, capazes de proporcionar temperaturas de
até 180°C. A 121°C, ocorre a esterilização em 6h, a 170°C em uma hora e a
180°C em 30 minutos27. Existem ainda estufas aquecidas por raios infraverme-
lhos que podem atingir 180°C e a esterilização se processa em 15 minutos1.

Calor Úmido

Obtido através de autoclaves na forma de vapor úmido saturado sob pressão,


atingindo temperaturas de 121°C e 132°C, esterilizando em 15 e três minutos
respectivamente. É o modelo mais aplicado no tratamento do material cirúrgico
(instrumental, artigos têxteis) e, sem dúvida alguma, constitui a forma mais con-
fiável para a destruição da microbiota. O potencial microbicida deste método re-
sulta de duas ações, sendo ambas associadas: umidade e calor1. O vapor saturado
possui as seguintes características, algumas das quais se constituem em vanta-
gens e outras em desvantagens:
Vantagens:
— Os sólidos são rapidamente umedecidos e aquecidos; os poros do mate-
rial têxtil sofrem penetração rápida e são umedecidos enquanto está sen-
do aquecido.
— No processo de secagem, os esporos resistentes ao calor seco são destruí-
dos em curto período de tempo, em 13 minutos de exposição em vapor
saturado a 121°C.
— Não deixa resíduos tóxicos.
— Baixo custo.
Desvantagens:
— A presença de ar residual, entre as peças arrumadas no pacote ou nas cai-
xas metálicas, faz baixar a temperatura e prejudica a esterilização.
— Vapor superaquecido quando entra em contato com o material desidra-
tado diminui o potencial microbicida para o ar seco à mesma tempera-
tura.
— Vapor à temperatura usual é impróprio, inconveniente para a esteriliza-
ção de gorduras, óleos anídricos e materiais termoplásticos.

3
Esterilização a Vácuo com Ciclos de Vapor

A despeito de se tratar de um mecanismo complexo e bastante oneroso em


relação ao consumo de água e energia, a esterilização a vácuo com ciclos de va-
por está sendo reintroduzida na prática hospitalar. A recuperação do valor deste
método deve-se ao fato de sua atuação se processar através de mecanismos de
propulsão e extração do ar “viciado” de forma alternada, o que permite banhar
por muitas vezes o material com vapor saturado sob pressão, antes de atingir seu
pico final. Esta ação objetiva não só abreviar como estandardizar a infiltração e
difusão do vapor sobre artigos e peças a serem esterilizados. Dependendo da ve-
locidade do ciclo, pode ocorrer um indesejável superaquecimento sobre compo-
nentes têxteis e, conseqüentemente, reduzir o potencial microbicida. No entanto,
o fato de promover a remoção do ar do interior de cateteres constitui uma das im-
portantes vantagens deste tipo de esterilização. Como benefício adicional, tem
ainda a primazia de extrair a umidade ao final do ciclo. Neste modelo, nenhuma
atividade microbiológica é capaz de resistir a ação do jato de ar aquecido no inte-
rior do esterilizador1

Esterilização Gasosa

Óxido de Etileno

Embora seja dotado de grande atividade microbicida, a esterilização pelo


óxido de etileno tem se restringido a certos equipamentos e a alguns artigos e/ou
peças que não tenham capacidade de suportar a ação do calor (fios de suturas,
borrachas, plásticos, couros etc.).
Os esterilizadores a óxido de etileno variam desde pequenos aparelhos que
operam em temperatura ambiente, sem controle de umidade, a equipamentos
mais sofisticados que dispõem de câmaras de esterilização, bomba de vácuo,
aquecimento a 60°C, aeração, produção e controle de umidade constante em
33%, por período de 150 minutos15.
Por possuir grande poder de difusão e efeito cumulativo sobre todo material
submetido a seu tratamento, deve ser exposto a uma aeração, de preferência em
cabines ventilatórias, por um tempo igual ou superior a 24 horas. Esta medida
tem como objetivo eliminar o gás residual e impedir que haja queimaduras ter-
moquímicas pelo seu contato com a superfície corporal.
Quando utilizado na esterilização de componentes de próteses, o tempo de
aeração deve ser de 10 a 15 dias1.
É importante que se usem marcadores com alteração de cor, para controlar a
validade da esterilização27. Alguns cuidados especiais devem ser observados,
dentre eles uma perfeita secagem do material, uma vez que o óxido de etileno
forma produtos condensados com a água retida nas borrachas, plásticos e couros,

4
que resultam em resíduos tóxicos, como o etilenoglicol. Não pode ser usado em
materiais que já tenham sido submetidos a esterilizações prévias, sobretudo
quando o foram por irradiações, pois nestas circunstâncias, é capaz de gerar
substâncias de alta toxicidade tipo o cloridrato de etileno, que possui ação alta-
mente deletéria, podendo inclusive provocar fenômeno de hemólise, quando em
contato com a superfície corporal1. Considerando-se que sempre existe a possi-
bilidade de ocorrer vazamentos, é terminantemente proibido que seja manuseado
por gestantes, já que tem efeito mutagênico sobre o feto.

Formaldeído
É um gás incolor, cáustico para a pele e mucosas, dotado de atividade bacte-
ricida, virucida e fungicida, mas não esporicida27. Em geral é utilizado em salas
de cirurgias sob a forma líquida e/ou de pastilhas para a produção de vapores em
caixas metálicas contendo todo e qualquer material que não pode ser submetido a
altas temperaturas e/ou umidade.
O tempo mínimo para a esterilização por este processo à temperatura ambi-
ente é de 36 horas, mas na vigência de aquecimento a 60°C é de 20 horas12.

Esterilização Química
Glutaraldeído

Uma alternativa freqüentemente utilizada nos processos de esterilização é a


solução aquosa de glutaraldeído. Possui excelente poder microbicida, mesmo na
presença de material orgânico, não causa coagulação de proteínas nem exerce
ação corrosiva sobre os fibroendoscópios, borrachas ou plásticos6.
Sua atividade microbicida resulta da alquilação de grupos sulfídricos, hidro-
xílicos, carbóxidos e amínicos dos microrganismos, alterando a síntese do DNA,
RNA e proteínas6,26. A concentração mínima eficaz é de 1%, entretanto, a maio-
ria dos produtos é comercializada em titulação a 2%, todavia, na sua forma co-
mercial, tem que ser submetido a um processo de ativação, isto porque ao ser ati-
vado eleva-se-lhe o pH da solução para uma faixa entre 7,5 e 8,5, que não só au-
menta o seu potencial microbicida, como amplia a estabilidade de 14 para 28
dias. Entretanto, há que se ter cuidado com o fenômeno da polimerização que so-
brevém com o decorrer do tempo, o que acarreta a perda de sua atividade espori-
cida6,12,27.
A maior aplicabilidade do glutaraldeído tem sido reservada para tratar: apa-
relhos de endoscopias, tubos de espirometria e de diálise, equipamentos anestési-
cos e de terapia respiratória e também transdutores e instrumental odontológico,
todavia, por apresentar atividade tóxica, particularmente para a pele, mucosas e
globos oculares6,23, exige que sua utilização seja precedida de uma adequada eli-

5
minação de resíduos tóxicos submetendo-os a uma minuciosa lavagem com água
destilada recém-processada.

Outros Processos de Esterilização

Radiações Ionizantes

Este modelo de esterilização emprega, em geral, raios gama (Co60) e/ou elé-
trons de alta energia (aceleradores lineares). Tem como vantagem não necessitar
de qualquer período de quarentena para a sua utilização. A desvantagem corre
por conta da necessidade de dispor de aparelhagem de custo elevado, razão pela
qual sua aplicabilidade restringe-se ao setor industrial de materiais médico-
hospitalares adotados sobretudo no tratamento de produtos termoplásticos des-
cartáveis27.

Irradiação Ultravioleta
A irradiação por ultravioleta tem maior aplicabilidade como processo de es-
terilização do ar pela indústria farmacêutica. Caiu em desuso já algum tempo
como método válido para utilização em hospitais12,27.

Filtração
É um processo que usa membranas microporosas, para reter microrganismos
patogênicos existentes no ar e/ou nos líquidos. É mais utilizado em instalações
industriais, mas também é adotado em hospitais, particularmente, para a descon-
taminação de água para hemodiálise e esterilização de infusões parenterais no
momento da utilização12,27.

Esterilização do Instrumental Cirúrgico


Utiliza-se preferencialmente a esterilização a vapor d’água saturado para o
tratamento do instrumental cirúrgico, respeitando rigorosamente as normas de
condutas já devidamente especificadas, seja quanto à limpeza individual das pe-
ças, como no que se refere aos cuidados de sua arrumação. O tempo de exposição
depende da temperatura desenvolvida no interior do módulo esterilizador, po-
rém, usualmente é de 15 minutos a 120°C e de três a 131°C24.
No caso particular de instrumental empacotado, é necessário expô-lo a um
período de tempo adicional, para permitir a penetração do vapor através do invó-
lucro em quantidade suficiente capaz de atingir a temperatura desejada1. No pre-
paro do material para a estocagem, as caixas e/ou bandejas devem ser protegidas

6
por envoltórios dotados de porosidade, isto porque é indispensável que haja vo-
lume suficiente de vapor para penetrar e deslocar o ar do interior do recipiente
que contém o instrumental e, ainda aquecê-lo à temperatura da esterilização. No
entanto, nas estocagens por períodos de tempo prolongados é mais seguro utili-
zar invólucros impermeáveis1,27.
Uma vez que a esterilização é regida por fenômenos físicos como tempo e
temperatura, é essencial que estes efeitos sejam cuidadosamente observados e
conduzidos por profissionais especializados e altamente qualificados, capazes
de controlar, tanto o procedimento básico, como a distribuição do material.

Esterilização do Instrumental nas Emergências

A necessidade de uma esterilização ultra-rápida em condições de emergên-


cia constitui um fato bastante freqüente na vida de qualquer cirurgião. Este acon-
tecimento representa não só uma modificação no que se refere ao comportamen-
to normal da rotina do trabalho quotidiano, como também sistematicamente con-
duz ao retardo das intervenções cirúrgicas. Este tipo de transtorno exige provi-
dências rápidas traduzidas por ações, que nem sempre respeitam os rígidos prin-
cípios que regem a esterilização. Assim, não é incomum que no afã de obter uma
resposta imediata no menor tempo possível, mergulhe-se o instrumento em reci-
pientes com soluções detergentes germicidas por um ou dois minutos e considere
tal atitude como tratamento eficaz, no que tange à descontaminação. Este tipo de
comportamento é indefensável, pois infringe todas as normas de segurança a res-
peito da esterilização. Nunca é demais lembrar que um procedimento adequado
pode ser feito de maneira rápida e eficiente, em uma pequena autoclave que dis-
ponha de um sistema de controle apropriado e que tenha a capacidade de atingir a
pressão de vapor de 17 libras por polegada quadrada. Nestas circunstâncias, co-
loca-se o instrumental em uma solução detergente, capaz de dissolver as gordu-
ras e/ou amolecer as eventuais crostas que lhes estejam aderidas, depois, lava-se
e escova-se cuidadosamente com sabão e água e em seguida, após secá-lo, colo-
ca-se-lhe em uma caixa metálica perfurada e a introduz no receptáculo do esteri-
lizador. O vapor é então propulsionado na câmara tão rapidamente que em 40 se-
gundos atinge 131°C (270°F). Esta medida é suficiente para eliminar esporos da
maioria dos microrganismos resistentes ao calor, pois os mesmos são destruídos
nessa temperatura em dois minutos. Aguarda-se então um período de três minu-
tos e a pressão da câmara poderá ser aliviada rapidamente, e o material pronto
para ser usado1.
Na total impossibilidade de dispor deste sistema, alguns autores recomen-
dam, como alternativa, a utilização de uma solução de glutaraldeído a 2%, tam-
ponada com bicarbonato de sódio para um pH entre 7,5 e 8,56,12,25, enquanto ou-
tros sugerem a imersão do instrumento em uma solução de hipoclorito de sódio e
ácido lático com titulação centesimal, tendo-se o cuidado de usá-la minutos após

7
a mistura. Existe ainda um método que utiliza radicais liberados ou formados
pela eletrólise, mas não tem angariado muitos defensores1.

Esterilização de Equipamentos Especiais

Equipamento de Angiografia

A esterilização de equipamentos utilizados em angiografia apresenta alguns


problemas, sobretudo porque freqüentemente existe um acúmulo de sangue em
forma de coágulos que atuam como verdadeiros corpos estranhos no interior do
aparelho, onde se assestam bactérias pirogênicas que não são destruídas pelos
procedimentos usuais1. Deste modo, é necessário que os resíduos existentes nos
lumens dos cateteres e tubos intermediários do instrumental sejam obrigatoria-
mente removidos. Em geral, lava-se o material em sua parte externa com um de-
tergente apropriado enquanto os ductos são submetidos a tratamento com jatos
de água e/ou com um líquido detergente (peróxido de hidrogênio, hipoclorito de
sódio a 5,25%) com poder germicida a fim de retirar qualquer partícula que pos-
sa eventualmente propiciar crescimento bacteriano.
Outra modalidade de manuseio é submetê-lo à limpeza mecânica, utilizando
estiletes para desalojar coágulos maiores que possam estar aderidos às paredes
internas do aparelho. Uma vez removidos todos os resíduos localizados na luz
dos cateteres, estes devem ser meticulosamente lavados e inspecionados, a fim
de certificar-se de que realmente não existe nenhum problema. A inobservância
destas medidas pode resultar na permanência de partículas, que certamente so-
frerão fragmentação durante o uso, constituindo-se numa fonte de contaminação
e de liberação de corpos estranhos e/ou êmbolos. Cumprido todo o ritual do pre-
paro, o equipamento deve ser acondicionado em bandeja metálica e empacotado
com envoltório permeável, selado e conduzido a esterilização, pelo óxido de eti-
leno e/ou por vapor saturado a 121°C, por 30 minutos.
É importante ainda considerar que o preparo do material deve ser coordenado
com o processo de esterilização, particularmente, se for química, para que haja re-
dução do tempo entre a limpeza e o procedimento propriamente dito e deste modo
impedir eventuais contaminações que possam ensejar o crescimento de bactérias
Gram-negativas, sobretudo no resíduo aquoso deixado pela esterilização.

Equipamento Urológico

A maior parte do material utilizado em urologia é estéril e descartável. Na


eventualidade de um reaproveitamento ele deve ser cuidadosamente lavado, em-
pacotado e esterilizado, preferencialmente pelo óxido de etileno. A outra alter-
nativa é tratá-lo pela imersão na solução de glutaraldeído a 2%, por um período

8
de tempo não inferior a 30 minutos e observar os cuidados previamente assinala-
dos, antes da reutilização.

Equipamento Endoscópico
Este tipo de material exige atenções especiais de tratamento, uma vez que as
medidas adotadas nos processos de esterilização têm que ser rápidas e eficientes
e não podem comprometer o funcionamento do aparelho. Sabe-se entretanto,
que estes instrumentos apresentam potenciais elevados de contaminação, razão
pela qual necessitam de cuidados adicionais no seu manuseio, de modo a evitar
complicações clínicas infecciosas como conseqüência do contágio por uma uti-
lização inadequada. Como exemplo, podemos citar o uso de um cistoscópio con-
taminado, que pode desencadear uma infecção urinária aguda ou até mesmo
uma obstrução ou ainda contrair uma hepatite como decorrência de um exame
laparoscópico. Alerte-se que neste último caso, a doença pode permanecer ocul-
ta por algum tempo em conseqüência do retardo da soroconversão1. Deste
modo, podemos inferir que há necessidade de extrema cautela na execução das
endoscopias nos pacientes contaminados, até porque, na atualidade, não se pode
afastar a possibilidade do exame de um portador do vírus HIV. Por estas razões,
manda a prudência que seja observado um rigoroso controle dos processos de
descontaminação dos equipamentos. Deduz-se, portanto, que a esterilização dos
endoscópios exige, pelo menos, que haja uma exposição adequada da superfície
a ser esterilizada por ação do germicida. E nunca é demais lembrar que todos os
componentes removíveis, sejam conectores, tubos, adaptadores e roscas, devem
ser retirados e cuidadosamente lavados e tratados individualmente. A parte prin-
cipal do aparelho é submetida a imersão em solução detergente com função ger-
micida e, ao ser retirada do banho, além da limpeza geral, aplicam-se jatos
d’água esterilizados em todos os canais e/ou orifícios e em seqüência oxigênio,
para secá-los adequadamente.
Dentre os meios mais seguros para a esterilização dos equipamentos endos-
cópicos está o óxido de etileno. Para que este tipo de tratamento alcance o efeito
desejado, torna-se necessário protegê-lo com um invólucro poroso para permitir
a penetração do gás. Pode-se também utilizar um esterilizador, com câmara de
esterilização, conforme descrito anteriormente. Contudo, o material assim trata-
do apresenta um grande problema, ou seja, a necessária inativação de 24 horas
para que haja a eliminação completa do gás tóxico, o que certamente limita este
procedimento, tendo em vista que o aparelho permanece indisponível por um
tempo extremamente alongado. Desta forma, há que se ter alternativas de abor-
dagens e o agente que tem merecido maior preferência para a esterilização deste
tipo de equipamento é uma solução de glutaraldeído a 2%, tamponado com clo-
reto de sódio para um pH entre 7,5 e 8,56,25. O tempo de imersão deve ser no mí-
nimo de 30 minutos25. Quando for totalmente impossível manter este último es-
quema, por necessidade absoluta da utilização do aparelho, pode-se optar por

9
tratar o equipamento mergulhando-o alternadamente por 10 minutos nas solu-
ções abaixo:
Solução A:
Chlorox (5,25% de hipoclorito de sódio) ........................................... 300ml
Água destilada q.s.p..........................................................................4.000ml
Solução B:
Ácido ascórbico ...................................................................................... 48g
Triton X 100 ............................................................................................8ml
Água destilada q.s.p......................................................................... 4.000ml

Equipamentos Utilizados no Trato Respiratório

Há muito se sabe da necessidade da esterilização da aparelhagem utilizada


no trato respiratório. Evidentemente, a adoção de tal medida tem como objetivo
prevenir a penetração de microrganismos patogênicos que sejam capazes de pro-
vocar infecções. Estes cuidados devem ser redobrados, sobretudo na vigência de
procedimentos invasivos, como intubações, aspirações e ainda nas terapias com
aerossóis1. Assim, todo material usado na árvore respiratória, seja cateteres de
intubação orotraqueal e/ou de aspiração e/ou aparelhos complexos, deve ser cui-
dadosamente lavado e esterilizado. Neste particular, adota-se preferencialmente
o óxido de etileno, segundo as normas já referidas. Na impossibilidade de utilizar
este processo, ter-se-á como alternativa o tratamento pela imersão em soluções
germicidas, conforme preconizado para o equipamento endoscópico.
A título de prevenção, todas as peças interpostas entre o aparelho de assis-
tência ventilatória e o paciente devem ser trocadas a cada 48 horas, e o respirador
deverá ser substituído semanalmente.

Equipamento de Anestesia

A introdução do óxido de etileno e o aprimoramento dos processos da esteri-


lização têm tornado possível tratar e descontaminar de modo adequado todo
equipamento de anestesia. É sempre importante alertar que o óxido de etileno,
retido nos diferentes tipos de instrumentos, seja de borracha, plástico e/ou qual-
quer outro equipamento submetido a este modelo de esterilização, deve ser eli-
minado através de uma aeração adequada.
O tratamento do material de anestesia raquiana e/ou peridural, constituído
por peças metálicas e/ou de vidro, deve ser submetido à autoclave, obedecendo à
orientação já descrita, entretanto, quando colocadas em soluções germicidas, de-
vem ser rigorosamente lavadas, isto porque relatam-se casos de aracnoidite e pa-
raplegia pós-anestesia peridural cuja responsabilidade tem sido atribuída à pre-
sença de resíduos de detergentes nas agulhas e seringas8,17. No que tange aos cui-

10
dados com o local da punção, é bom lembrar que deve merecer a mesma atenção
dispensada pelo cirurgião no preparo dos acessos abdominais.

ASSEPSIA

Processo pelo qual se eliminam os microrganismos patogênicos de um deter-


minado ambiente, objeto ou campo operatório.
A assepsia, portanto, representa a pedra angular dos princípios em que se ba-
seia o cirurgião moderno, para afastar ou controlar todo e qualquer germe que
possa causar infecção. Assim, sua frente de combate tem como principal alvo
bloquear as fontes potenciais de contaminação. Isto é feito não só pela esteriliza-
ção de todo o equipamento, que direta ou indiretamente está comprometido com
a operação, mas envolve também o preparo adequado da equipe cirúrgica, do pa-
ciente e ainda o controle do ambiente hospitalar particularmente no âmbito da
sala de operações8. Este tipo de abrangência é tão elástico que Spaulding22 houve
por bem classificar o material médico-hospitalar, segundo o risco de transmissão
de microrganismos, em três categorias:
— Críticos — aqueles que penetram em tecidos estéreis do organismo
(material de corte e de ponta, pinças, afastadores, cateteres vasculares,
próteses, fios de sutura, soluções endovenosas etc.);
— Semicríticos — os que entram em contato com a mucosa indene capaz
de impedir a invasão de tecidos epiteliais (equipamentos de anestesia,
endoscopia, cateteres etc.);
— Não-críticos — os que apenas contatam a pele íntegra e ainda os que não
têm relação direta com o paciente (aparelho de RX, microscópicos ci-
rúrgicos, mobiliário hospitalar, artigos de higiene etc.).
Assim, o modelo de esterilização selecionado para cada peça ou instrumento
estará comprometido com esta classificação. Deste modo, o processo poderá va-
riar desde a desinfecção de alto nível, reservada para os materiais críticos, pas-
sando pelo nível médio, composto pelos semicríticos e/ou ainda os de baixo nível
para os não-críticos.
Por outro lado, seguindo o mesmo princípio classificatório, os diferentes
ambientes que fazem parte da planta física do hospital12,24 são também classifi-
cados em três áreas:
— Críticas — a) aquelas relacionadas à diminuição da resistência antiinfec-
ciosa dos pacientes, salas de operação e/ou de parto, de recuperação anes-
tésica, CTI, berçário, unidades de queimados e de transplantes de órgãos,
centro de hemodiálise etc.; b) as que apresentam elevados riscos de contá-
gio e/ou transmissão de infecções: salas de isolamento de doenças infec-
tocontagiosas, de necropsia e/ou de laboratórios de análises clínicas, ban-
co de sangue, lavanderia de hospitais etc.

11
— Semicríticas — aquelas nas quais estão os portadores de doenças
não-infecciosas e/ou infecciosas não-transmissíveis.
— Não-críticas — compreendem todas as repartições administrativas,
cujo acesso ao público é proibido ou controlado.
Ainda dentro dos cuidados inerentes ao processo de assepsia, importa lem-
brar ao pessoal que compõe a equipe cirúrgica, bem como aos demais integrantes
do sistema operacional da sala de cirurgia que não é permitido transigir com
qualquer tipo de violação das normas de assepsia. Todos os componentes do gru-
po devem, obrigatoriamente, não só estar convenientemente paramentados —
roupas apropriadas, gorro, máscaras e sapatilhas21, e gozar de boa saúde —
como, também, manter perfeitas as condições de higiene corpórea, pois a sim-
ples presença de infecções dérmicas implica o afastamento do componente afeta-
do8.
Na vigência de surtos infecciosos em pacientes recém-operados, é mandató-
ria a execução de uma pesquisa, no sentido de localizar, identificar e afastar o
agente causador do problema.
A prática da assepsia iniciada por Lister há 121 anos13 tem sofrido intensa
modificação, principalmente a partir da metade deste século. Tal acontecimento,
está relacionado com o melhor conhecimento da interação das relações entre o
meio ambiente, as bactérias e os mecanismos de defesa do paciente. Infere-se,
portanto, que a prevenção de infecções cirúrgicas requer uma abordagem que in-
corpore os princípios de assepsia, com uma boa prática de anti-sepsia aliada à
execução de um ato operatório cercado de cuidados especiais e perfeitamente in-
tegrados dentro destes preceitos.
Entretanto, apesar de todos os avanços alcançados, conseguindo-se até a mo-
nitorização das infecções emergentes, ainda não a erradicamos completamente,
mesmo após cirurgias limpas.

ANTI-SEPSIA

É um conjunto de medidas empregadas para suprimir, total ou parcialmente,


a proliferação de microrganismos patogênicos das superfícies orgânicas, como
pele e mucosa, por um determinado período de tempo, sem causar necessaria-
mente a eliminação de todas as formas viáveis.
A anti-sepsia é antes de tudo uma ação de prevenção, pois resulta da utiliza-
ção de anti-sépticos contra germes patogênicos que habitam tecidos vivos27. Tal-
vez por esta razão seja tão freqüentemente referenciada como sinônimo de desin-
fecção. Esta, no entanto, deveria ser resguardada, para referir o combate aos ger-
mes que se assestam sobre a superfície de objetos inanimados. Existem também
outros termos que são eventualmente empregados, com objetivos bastante pare-
cidos, como é o caso da sanitização, que tem como proposição-alvo, conseguir
através da limpeza e desinfecção adequadas, reduzir o número de microrganis-

12
mos patogênicos a uma proporção que os torne incapazes de provocar dano para
a saúde; e ainda tem a desgermação, que refere-se a erradicação total ou parcial
da microbiota da pele e/ou mucosas por processos físicos e/ou químicos24.
Como se trata realmente da ação de prevenção contra as infecções procuran-
do inibir ou destruir a microflora patogênica, ainda que temporariamente, as me-
didas de anti-sepsia utiliza agentes germicidas que possam desempenhar com su-
cesso esta função.
Vale lembrar que usualmente existem dois tipos de flora microbiana que vi-
vem na superfície corporal dos indivíduos: a residente, representada pelos estafi-
lococos epidermitis coagulase-negativos e os difteróides anaeróbicos, que são
encontrados na superfície da pele, nos folículos pilosos e nos ductos das glându-
las sebáceas, e a flora transitória, que é composta pelos microrganismos que co-
lonizam temporariamente a superfície da pele. Esta é variável e dependente da
ecologia bacteriana a que o indivíduo está exposto, de modo que, quando este
permanece em ambiente hospitalar, rapidamente é colonizado por germes deste
meio, representados, principalmente, por cepas patogênicas de estafilococos e
enterobactérias Gram-negativas antibiótico-resistentes. É possível conseguir a
redução do número destas bactérias por um determinado período de tempo mas
não erradicá-las totalmente18.
Os microrganismos que habitam as mãos e antebraços da equipe cirúrgica
devem ser removidos mecânica e quimicamente, pois o fato de usar luvas para a
execução das operações não confere segurança absoluta contra a contaminação
da ferida operatória, uma vez que é perfeitamente conhecido que no decorrer de
uma operação com tempo igual ou superior a duas horas, existe uma média de
perfurações das luvas em torno de 30% e mesmo orifícios microscópicos são ca-
pazes de permitir a passagem de milhares de bactérias em poucos minutos8,12.
A microbiota da pele pode ser convenientemente erradicada, mas a flora re-
sidente dos folículos pilosos e glândulas sebáceas não, assim, elas são capazes de
emergir e povoar a referida superfície em poucos minutos.
Diante desta realidade, seria importante que pudéssemos dispor de um an-
ti-séptico ideal. Entretanto, este teria que conter uma gama de propriedades tão
abrangente que torna-se praticamente impossível atingi-lo, uma vez que deveria
reunir as seguintes vantagens: ser solúvel em água, não manchar a pele nem o
vestuário, ser estável e ativo em baixas concentrações, ter amplo espectro de
ação, sendo bactericida e bacteriostático, possuir atividade prolongada e não ser
dotado de toxicidade e por fim ser de baixo custo. Todavia, como ainda não al-
cançamos tal patamar, o controle dos microrganismos da pele dependerá: da téc-
nica de remoção mecânica pela escovação, do tipo de agente utilizado e do tempo
empregado no processo.
A interação destes três itens tem merecido bastante atenção, de modo que a
escovagem está sempre associada a diferentes agentes, para o combate da flora

13
microbiana da pele. Dentre as substâncias mais utilizadas para a desgermação
das mãos e antebraços temos:
— Sabão — que tem como vantagem o baixo custo, mas possui apenas ati-
vidade mecânica.
— Iodofóricos — são complexos orgânicos composto por iodo e um deter-
gente sintético transportador (iodopovidone). É hidrossolúvel em alta
pressão coloidal e osmótica e tem ação surfactante, liberando 10% a
30% de iodo livre. A concentração germicida mínima é de 10% de iodo
livre com bom efeito residual. São ativos contra Gram-positivos e nega-
tivos, mas não agem contra esporos12. Não coram a pele e praticamente
não produzem reações alérgicas (0,04%). Sua principal ação residual se
prolonga, no mínimo, por quatro horas26. Os produtos comerciais con-
têm cerca de 1% de iodo na fórmula, que é liberado quando o composto
entra em contato com a água. O detergente aumenta sua atividade bacte-
ricida.
— Hexaclorofeno — bactericida eficiente, mas que necessita de contato
prolongado para atuar de modo significativo contra a flora bacteriana.
Sua ação se faz, principalmente, contra alguns fungos e bactérias, mas
não possui atividade contra Gram-negativos. As preparações comercia-
is contêm hexaclorofeno a 3%. Deixa na superfície da pele uma camada
ativa que, entretanto, é removida por uma única lavagem com sabão co-
mum. Apresenta um importante problema, ou seja, é absorvido pela pele
e membranas mucosas, razão pela qual podem provocar edema e dege-
neração esponjosa do cérebro e medula espinhal2,10,17.
— Clorexidina — composto orgânico com boa atividade antibacteriana,
destruindo-as através de lesões de suas paredes e também por precipitar
seu conteúdo celular. Tem boa ação fungicida, mas pouca atividade
contra bacilos da tuberculose e é pobremente virucida. É bastante ativa
quando aplicada na pele, mas é tóxica para o ouvido médio17 e/ou quan-
do mantém contato com a córnea23. É usada na concentração de 4%.
Não é alergênica, não mancha a pele e/ou roupa e exerce boa atividade
residual.
— Álcoois etílico e isopropílico a 90% e 70% — respectivamente, são
agentes bactericidas, muito embora não tenham ação contra esporos.
Tem como vantagem seu baixo custo, secar rapidamente e remover a
umidade da pele, o que facilita a colocação das luvas. O principal incon-
veniente é o fato de não terem qualquer ação residual, razão pela qual,
tem-se adicionado alguns emolientes, não só para impedir sua rápida
evaporação, como também evitar que resseque a pele após repetidas
aplicações9,11.
Estudos recentes mostram que a utilização de uma solução de hexaclorofeno
e/ou iodopovidone produz igual depressão do número de bactérias, quer após

14
cinco minutos quer após 10 minutos de escovagem5,16,17,21. Entretanto, não há
dúvida de que a escovação com boa técnica por cinco minutos é melhor do que
uma mal conduzida, por mais longo que seja o tempo empregado9, até porque o
Colégio Americano de Cirurgiões recomenda uma escovagem de apenas dois
minutos, seja usando clorexedine ou iodóforos. Sabe-se também que uma vigo-
rosa escovação de um minuto com álcool constitui eficiente método de an-
ti-sepsia da mão11,17.

PREPARO DA PAREDE ABDOMINAL

O preparo da parede abdominal, compreendendo a região a ser operada, tem


início pela remoção local dos pêlos. Isto deve ser feito com aparelho de barbear
descartável e/ou com cremes depilatórios e ser bastante abrangente7,20. Em geral
tem como limite superior os mamilos, enquanto o inferior atinge o terço médio
anterior das regiões femorais. Obedecendo a esta dimensão, obtém-se uma boa
margem de segurança em relação a incisão cirúrgica. Há uma concordância de
que a depilação seja realizada momentos antes do início da intervenção cirúrgi-
ca, para evitar que eventuais cortes ou escoriações da pele possam funcionar
como foco de infecção20. Nas oportunidades em que a tricotomia for realizada na
véspera da operação, é conveniente lavar e aplicar sobre o local, ainda na enfer-
maria, um anti-séptico para evitar a contaminação bacteriana, sobretudo quando
houver escoriações, e colocar sobre a região depilada uma compressa esteriliza-
da, totalmente coberta com esparadrapo, que só será removida momentos antes
da anti-sepsia que precede o ato operatório.
Na sala de operações, com o paciente anestesiado, lava-se generosamente a
parede abdominal com uma compressa esterilizada e embebida em líquido ger-
micida, exercendo uma suave fricção, por um determinado período de tempo
(cinco minutos), retira-se o excesso do mesmo e em seguida aplica-se uma solu-
ção anti-séptica, preferencialmente colorida, para facilitar a observação e não dei-
xar nenhum espaço sem a devida cobertura. Para tal, utilizam-se gazes dobradas
e aprisionadas na ponta de uma pinça longa, do tipo Museux ou Forster, não só
para facilitar a visibilidade mas, também, para manter a mão longe da pele e evi-
tar a contaminação da luva15. A aplicação do anti-séptico envolve dois tempos:
primeiro a demarcação do local para a desinfecção, delimitando-a com o líquido
selecionado e depois a anti-sepsia propriamente dita. Esta abrangerá toda a re-
gião depilada. Vale ainda lembrar que o germicida deve, inicialmente, envolver a
zona de menor contaminação e depois as potencialmente contaminadas, orien-
tando-se sempre do centro para a periferia, não podendo jamais retornar ao ponto
inicial. Os agentes mais utilizados são o álcool etílico associado ao iodo (álcool
iodado), o gluconato de clorexidina a 4%, o iodopovidine (PVPI), sendo que nos
casos de infecção por estafilococos pode-se fazer a opção pela solução de hexa-
clorofeno a 3%. Importa também assinalar que os mercuriais do tipo merbromi-

15
no (mercúrio cromo), timerosal (mertiolate) e o nitromersol (metafem), por apre-
sentarem um coeficiente de anti-sepsia de 50%, têm a sua utilização desaconse-
lhada. Existem autores que preconizam a aposição de uma lâmina de plástico so-
bre o abdome, justificando tal adoção como sendo uma medida complementar de
proteção do campo operatório, pois esta impediria o contato das mãos da equipe
cirúrgica com a pele do paciente17,19. Entretanto, estudos recentes mostraram
que esta atitude não é capaz de trazer qualquer benefício, e, mais, o fato de causar
transpiração local facilitaria uma possível infecção8,19. Seqüencialmente, colo-
cam-se os campos primários que cobrem o paciente, primeiro o podálico seguido
do cefálico e então os laterais, deixando descoberta obviamente a região reserva-
da para incisão e acesso cirúrgico bem como a cabeça, área de ação do anestesis-
ta. A região a ser operada é a seguir delimitada pela colocação de campos secun-
dários esterilizados. A proteção local é complementada pelo isolamento da feri-
da cirúrgica, após a abertura da pele e subcutâneo, e pela fixação de compressas
às bordas da incisão.

COMENTÁRIOS

Apesar de todas as pesquisas e dos cuidados observados para se obter uma


total eficiência no conjunto de processos que visam impedir o desenvolvimento
de infecções cirúrgicas, ainda não se conseguiu alcançar globalmente o tão dese-
jado coeficiente zero.
Embora saibamos que, do ponto de vista teórico, os procedimentos emprega-
dos nos diferentes processos de esterilização sejam capazes de eliminar todos os
microrganismos viáveis em qualquer equipamento médico-cirúrgico, na prática
tem-se esbarrado no fenômeno que poderíamos chamar de “imponderável”, aqui
traduzido pelas falhas humanas e mecânicas que ainda não foram contornadas e
desta forma acabam por comprometer a desejada obtenção da resposta ideal, ou
seja o controle total da contaminação. Vale lembrar que, apesar da normatização
da metodologia e da rigidez da disciplina que rege o manuseio de todo material
médico-hospitalar que faz parte da atividade quotidiana do cirurgião, um percen-
tual de infecções em torno de 3% é tido como aceitável, na maioria dos centros
considerados de alto nível3,8.
Deve-se ter em mente que não é admissível que haja um relaxamento nos
princípios e cuidados de assepsia sob a falsa justificativa de que hoje se dispõe de
antibioticoterapia eficiente — isto é inaceitável. Cabe sobretudo ao cirur-
gião-chefe comandar uma efetiva vigilância, para que não ocorra nenhuma trans-
gressão neste sentido e, conseqüentemente, manter todos os preceitos já consa-
grados pela experiência.
Ainda que os germicidas mais utilizados para o exercício da anti-sepsia não
se enquadrem dentro dos critérios propostos para uma solução ideal, entretanto,
já oferecem respostas, cada vez mais animadoras, não só no que se refere a ativi-

16
dade residual, como também, no controle e erradicação dos agentes patogênicos
da superfície da pele.
Estas ponderações são também válidas em relação ao preparo da parede ab-
dominal, para a execução dos diversos tipos de operações, uma vez que os parâ-
metros das ações e resultados são superpostos.
A ocorrência destes fatos tem de ser entendida como uma situação que mere-
ce ser analisada por um prisma favorável e deve servir como paradigma de estu-
dos, cada vez mais aprofundados, na busca de soluções que aufiram resultados
mais consistentes.

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gia — Ferraz EM (ed). Ed. Médica e Científica — Rio de Janeiro, 577-608, 1996.

18
Equipamento e Instrumental
2 de Videocirurgia: O Que Há
de Novo?

Rodrigo Altenfelder Silva


André de Moricz

INTRODUÇÃO
Passados mais de 10 anos da realização da primeira colecistectomia videola-
paroscópica1, continuamos a presenciar avanços terapêuticos e desenvolvimen-
to de equipamentos e instrumentos. Procedimentos novos em diferentes especia-
lidades cirúrgicas têm sido descritos, particularmente na cirurgia cardíaca, cirur-
gia vascular, urologia e cirurgia endócrina, envolvendo a utilização de instru-
mental específico.
Na cirurgia geral e na cirurgia do aparelho digestivo, a busca do menor trau-
ma possível impulsiona o aperfeiçoamento de instrumentos de menor diâmetro e
equipamentos que associem eficiência, qualidade, durabilidade e custos mais re-
duzidos.
Assim, poderíamos dizer que o panorama atual da videocirurgia se caracte-
riza por amadurecimento e investigação. Se há alguns anos o cirurgião era de-
pendente de uma tecnologia que ele desconhecia, hoje ele amadureceu e já é ca-
paz de conhecer detalhes mais complexos do funcionamento de equipamentos e
instrumentos.
Com isso, a análise dos produtos existentes é hoje mais rigorosa e muitos ci-
rugiões passaram a selecionar os instrumentos de trabalho. Isso contribui para o
aparecimento de um profissional mais exigente e para o desenvolvimento dos
equipamentos e instrumentais.
Desse modo, o presente capítulo tem por objetivo analisar os avanços mais
significativos no desenvolvimento de equipamentos e instrumentos videocirúr-
gicos, bem como em relação à sua limpeza e esterilização.

EQUIPAMENTOS
Embora tenham ocorrido modificações em todos os equipamentos (fonte de
luz, microcâmera e insuflador), os principais avanços ocorreram nas microcâ-

19
meras. Nos últimos anos verificamos a preocupação na produção de equipamen-
tos capazes de gerar imagem de melhor qualidade e com mais alta definição, cul-
minando recentemente no aparecimento das microcâmeras que produzem ima-
gens em três dimensões (3D).
Apesar de sempre se ter afirmado que um dos problemas da videocirurgia
era a perda da terceira dimensão, que não permitia a noção de profundidade, as
avaliações preliminares sobre a utilização dessas novas microcâmeras não fo-
ram totalmente favoráveis. Algumas queixas de dificuldade de orientação e o
aparecimento de náuseas e tontura durante a intervenção chamaram a atenção2.
Mesmo sem a terceira dimensão, os novos recursos tecnológicos incorpora-
dos às microcâmeras, tais como: filtros, capacidade de intensificação de deta-
lhes, ajuste automático da intensidade de iluminação e sistema eletrônico de ex-
posição automática, permitiram a produção de equipamentos de alta qualidade.
As modificações introduzidas nos insufladores envolveram, praticamente,
sua capacidade de reposição de gás, recuperando mais rapidamente as eventuais
perdas do pneumoperitônio. A maioria dos insufladores eletrônicos trabalhava
com uma velocidade de reposição de gás de 10 litros/minuto. Os equipamentos
mais modernos passaram a ter uma velocidade de reposição de até 20 litros/mi-
nuto, tornando-se mais rápidos e eficientes na manutenção do pneumoperitônio.
Nas fontes de luz, observamos o lançamento de equipamentos com diferen-
tes potências. Embora os tipos de lâmpadas não tenham sido modificados, ou
são halógenas ou a gás (xenon), encontramos equipamentos de 100 a 300 watts
de potência, com diferentes períodos de vida útil das lâmpadas. Devemos lem-
brar que as fontes mais potentes e com lâmpadas a gás são as que produzem
maior luminosidade.

INSTRUMENTOS
A análise do desenvolvimento recente dos instrumentos videocirúrgicos
permite identificar avanços tanto na produção de instrumental permanente como
do descartável. Além de novos instrumentos, verificamos a preocupação na re-
dução do calibre dos mesmos.
Desse modo, encontramos óticas, clipadores, afastadores e diversas pinças
de apreensão e dissecção inicialmente fabricadas com diâmetro de 10 mm, com
diâmetro de 5 mm ou menos.
As óticas, por exemplo, são disponíveis em calibres de até 1 mm, podendo
ser utilizadas em procedimentos diagnósticos, ou para a realização de biópsias
dirigidas. Na cirurgia experimental, onde temos trabalhado com animais de pe-
queno porte (coelho e rato), os instrumentos de 3 a 4 mm, idealizados para uso
em crianças, se adaptam melhor.
Dos instrumentos descartáveis, além de pinças de menor calibre, observa-
mos o aparecimento de trocartes mais elaborados e clipadores específicos para

20
herniorrafia inguinal. Em relação aos trocartes, alguns passaram a ter redutor
universal e outros um componente permanente (cânula). Essas modificações ob-
jetivaram facilitar os procedimentos e reduzir o custo dos instrumentos.
Embora não seja um equipamento ou instrumento específico videocirúrgi-
co, devemos também ressaltar o aparecimento do bisturi ultra-sônico. Idealizado
tanto para procedimentos cirúrgicos convencionais como videolaparoscópicos,
quando utilizado com pinças próprias para laparoscopia, contribuem de maneira
significativa na redução do tempo cirúrgico de alguns procedimentos avança-
dos, como nas operações para a correção do refluxo gastroesofágico e nas res-
secções do cólon.
Assim, temos verificado uma preocupação da indústria em desenvolver
equipamentos e instrumentos que possibilitem maior rapidez e facilidade na
execução dos procedimentos videocirúrgicos. Embora os custos nem sempre se-
jam baixos, a qualidade dos produtos melhorou, possibilitando ao cirurgião uti-
lizar uma tecnologia mais avançada no tratamento de seus pacientes.

ESTERILIZAÇÃO
O processo de eliminação de microrganismos de instrumentos cirúrgicos
pode ser realizado por: limpeza, desinfecção e esterilização3.
A limpeza é um processo mecânico que visa a remoção de microrganismos
através de escovação e lavagem geralmente com substância detergente de partí-
culas de muco, fezes, sangue e tecidos. Pode ser empregada em instrumental ci-
rúrgico e endoscópico e é utilizada previamente à desinfecção.
A desinfecção é um processo químico que visa à eliminação de todas as for-
mas vegetativas como bactérias patogênicas, vírus e alguns esporos do material
cirúrgico. É realizada com o auxílio de substâncias “desinfetantes” ou “germici-
das”, cujo espectro de ação varia em baixo, médio ou elevado nível de desinfec-
ção.
A esterilização é definida como um método químico ou físico, capaz de pro-
mover a total destruição de microrganismos, incluindo os vírus e os esporos
mais resistentes. Pode ser feita por calor úmido (autoclave), com gás (óxido de
etileno) ou com irradiação (raio gama).
Um dos germicidas mais utilizados para desinfecção de materiais de lapa-
roscopia é o glutaraldeído alcalino a 2%, cujo espectro de ação é de elevado ní-
vel de desinfecção. Através dele consegue-se com eficácia a eliminação de bac-
térias, bacilo da tuberculose, fungos, vírus e esporos, após exposição de 20 mi-
nutos ao produto. O seu grande problema é o risco de danificar o instrumental
em exposições prolongadas, além de causar dermatite e sinusite4.
Em termos de avanços na desinfecção e esterilização vale ressaltar o apare-
cimento de autoclaves de pequenas dimensões que podem ficar na sala de cirur-
gia e que fazem o ciclo de esterilização num período de 20 minutos. Além disso,

21
em função da retirada progressiva do mercado do glutaraldeído e do óxido de
etileno, novas formas de esterilização têm sido pesquisadas, principalmente com
uso de gases e outras substâncias.

BIBLIOGRAFIA
1. Dubois F, Berthelot G, Levard H. Cholecystectomie par coelioscopie. La Nouv. Presse Médicale, v. 18,
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Surgical Clinics of North America, 72:1021-1032, 1992.

22
3 Anatomia Cirúrgica da
Parede Abdominal

Aldo Junqueira Rodrigues Júnior


Erasmo Simão da Silva

INTRODUÇÃO

O abdome é a região do tronco que está localizada entre o tórax e a pelve,


sendo delimitado externamente pela parede abdominal. Esta fixa-se posterior-
mente à coluna vertebral, superiormente às costelas e apêndice xifóide e inferi-
ormente aos ossos da pelve. A cavidade abdominal é separada superiormente da
cavidade torácica pelo diafragma e inferiormente continua-se com a cavidade
pélvica sem interrupção (o limite entre as duas ocorre através de um plano entre
o promontório e a superfície superior do púbis). A parede abdominal reveste to-
talmente a cavidade abdominal nas suas porções anterior, lateral e posterior.
Para a maioria das intervenções cirúrgicas no abdome e pelve a parte de inte-
resse da parede abdominal é a anterolateral (para muitos autores, do ponto de
vista prático, a parede do abdome é a parede anterolateral). Esta região é com-
posta por sete camadas de tecidos dispostas consecutivamente, organizadas da
superfície para a profundidade em: pele, fáscia superficial (tecido subcutâneo),
camada musculoaponeurótica, fáscia endoabdominal (transversal) e peritônio.
Na porção anterior apenas uma camada muscular está presente, o músculo reto
do abdome, com fibras dispostas longitudinalmente e interrompidas pelas inser-
ções tendíneas transversais, que são geralmente em número de três mas podem
apresentar uma outra abaixo do umbigo, enquanto na porção lateral três múscu-
los estão superpostos (os músculos largos do abdome): o oblíquo externo (fibras
com disposição no sentido súpero-lateral para ínfero-medial), oblíquo interno
(fibras com disposição súpero-medial para látero-inferior) e transverso (fibras
com disposição transversa). Na parte lateral, o plano entre o músculo oblíquo in-
terno e transverso tem importância de destaque pois é o trajeto dos nervos e va-
sos da parede abdominal. Os ramos torácicos ventrais (ou anteriores) de T7 a T12
(vértebras torácicas) e o primeiro lombar (L1- primeira vértebra lombar), com
seus ramos, os nervos ilio-hipogástrico e ilioinguinal passam entre estes múscu-

23
los para inervação da parede, sendo acompanhados por artérias e veias intercos-
tais. O VII e o VIII nervos intercostais têm um sentido ascendente após deixar o
espaço intercostal para inervar a parede anterior do abdome, enquanto o IX e o X
se dispõem em sentido transverso e o XI, XII e os mais inferiores têm disposição
oblíqua com sentido descendente.
Os ramos arteriais intercostais e veias intercostais acompanham o trajeto
dos nervos mencionados acima. Esta relação anatômica implica que uma incisão
transversa acarretaria menor dano vasculonervoso no abdome superior, como
também uma incisão oblíqua no sentido lateromedial e súpero-inferior na porção
inferior e lateral da parede. Já uma incisão oblíqua (subcostal) superior poderia
acarretar dano de até três feixes vasculonervosos (Fig. 3.1). Ainda com relação à
lesão neurológica o limite lateral do músculo retoabdominal é crítico para iner-
vação deste músculo, pois é por esta região que os ramos nervosos intercostais
penetram no músculo para inervá-lo. Portanto uma incisão longa vertical e late-
ral (pararretal externa) ao músculo reto do abdome acarretaria extensa denerva-
ção, com possível dor neurítica e fraqueza muscular.
A irrigação da parede abdominal é feita também pelas artérias epigástrica
inferior (ramo da artéria ilíaca externa) e epigástrica superior (ramo da artéria to-

Fig. 3.1 — Três tipos de incisão com suas prováveis lesões neurológicas. Notar que a subcostal
tem o potencial de lesar maior número de ramos neurológicos.

24
rácica interna). Estas duas artérias têm disposição vertical ao longo do músculo
reto abdominal (anteriores à sua bainha posterior), anastomosando-se entre si dois
centímetros acima do umbigo. Importante fato é que a artéria epigástrica inferior
tem trajeto lateral e a artéria epigástrica superior é medial considerando suas rela-
ções com o músculo reto do abdome e a linha mediana. Portanto, incisões ou
punções no abdome superior devem evitar a borda medial do músculo, enquanto
as realizadas abaixo do umbigo, quando localizadas lateralmente sobre o mes-
mo, têm maior probabilidade de dano vascular.
A função da parede abdominal além de conter os órgãos da cavidade abdo-
minal consiste no auxílio da flexão da coluna vertebral e reservatório de tecido
adiposo. A função respiratória pode sofrer influência de processos mórbidos loca-
lizados na parede abdominal ou de incisões nesta parede, pois em decorrência da
dor, os movimentos respiratórios podem ficar limitados, já que os músculos do
abdome se inserem na parede torácica e são mobilizados passivamente durante a
respiração tranqüila e ativamente na expiração forçada.
Para o adequado acesso cirúrgico aos órgãos da cavidade abdominal uma in-
cisão deve permitir exposição adequada até a região acometida, ser de natureza
tal que se possa prolongar facilmente, poupar na medida do possível estruturas
como os nervos, vasos e músculos, facilitar a recuperação pós-operatória (ser
pouco dolorosa e determinar pequena interferência em outros sistemas, p. ex. o
respiratório) e eliminar ou diminuir as complicações crônicas, como hérnias e
dor neurítica.
As incisões na parede abdominal obedecem a três orientações no plano fron-
tal, a saber, a longitudinal, a transversa e a oblíqua, podendo ser combinadas em
mais de uma orientação (Tabela 3.1).

LONGITUDINAIS

Mediana

Incisão sobre a linha alba (ponto de confluência das aponeuroses dos mús-
culos largos — oblíquo externo, oblíquo interno e transverso), que forma as bai-
nhas do músculo reto do abdome.
Mediana supra-umbilical e infra-umbilical: existem duas diferenças funda-
mentais nestas duas incisões apesar de serem realizadas sobre a mesma linha
alba. Na porção infra-umbilical, 3 a 4 cm abaixo do umbigo, todas as bainhas
aponeuróticas passam anteriormente ao músculo reto do abdome, acima deste
ponto as aponeuroses dos músculos largos se distribuem anterior e posterior-
mente a este músculo. Na porção supra-umbilical os músculos largos do abdome
tracionam o músculo reto do abdome, com tendência de afastar as bordas da in-
cisão mediana. Este fato é atenuado na região infra-umbilical pela presença da

25
Fig. 3.2 — Disposição das artérias epigástricas inferior e superior em relação músculo reto do ab-
dome e músculos largos.

inserção muscular na crista ilíaca e no ligamento inguinal, diminuindo a tração


lateral sobre os músculos retos.

Paramediana

Incisão paralela à linha mediana. Pode ser feita com deslocamento lateral do
músculo retoabdominal (pararretal interna), na porção supra-umbilical, in-
fra-umbilical, paraumbilical ou desde o apêndice xifóide até a região púbica. A
incisão paramediana pode ser feita com deslocamento medial do músculo reto
do abdome (pararretal externa) na sua porção infra-umbilical ou supra-
umbilical. Por último a incisão paramediana pode ser realizada através do mús-
culo reto, com divulsão das suas fibras (transretal). Importante ponto a ser lem-
brado nas incisões paramedianas diz respeito, novamente, à disposição das apo-
neuroses dos músculos ântero-laterais do abdome, que é diferente acima e abai-

26
Tabela 3.1
Principais Incisões na Parede Abdominal
Supra-umbilical
Mediana
Infra-umbilical
Supra-umbilical
Paraumbilical
Longitudinais Pararretal interna
Infra-umbilical
Xifopúbica
Paramediana Transretal
Supra-umbilical
Pararretal externa
Infra-umbilical
Parcial
Supra-umbilical
Total
Transversas Parcial
Infra-umbilical
Total
Subcostal
Supra-umbilical
Oblíquas
Infra-umbilical
Lombo-abdominal
Mistas

xo da cicatriz umbilical. Em toda a porção supra-umbilical e nos primeiros três a


quatro centímetros abaixo da cicatriz umbilical (linha arqueada de Douglas) o
músculo reto abdominal é coberto pela sua bainha que possui uma lâmina anteri-
or e outra posterior. A bainha anterior é formada pela aponeurose do músculo
oblíquo externo e interno, e a posterior pela aponeurose do músculo oblíquo in-
terno (que se divide em duas lâminas) e pela aponeurose do músculo transverso.
Abaixo deste ponto (linha arqueada) todas as aponeuroses passam anteriormente
ao músculo reto abdominal, determinando uma fraqueza nesta região, pois após
ser feita uma incisão neste local o fechamento contará apenas com um plano
aponeurótico anterior.
TRANSVERSAS
Totais
Estendendo-se para os dois lados da parede abdominal (direito e esquerdo),
acima ou abaixo da cicatriz umbilical. Uma ampla incisão pode ser obtida se for
feita 2 cm acima ou abaixo do umbigo. Acima destes pontos ou abaixo o rebordo
costal e a crista ilíaca limitam a extensão transversal da incisão.

27
Parciais
Limitam-se a um lado do abdome, acima ou abaixo da cicatriz umbilical.

OBLÍQUAS

Estas incisões são geralmente realizadas na região do lateral do abdome


(flancos) ou junto aos rebordos costais. Elas podem ser associadas a outras inci-
sões do tipo transverso para complementação do acesso cirúrgico. As clássicas
incisões oblíquas são as subcostais (no hipocôndrio direito para a colecistecto-
mia), infra-umbilicais (do lado direito para apendicectomia — McBurney) e na
região do flanco (simpatectomia lombar, acesso retroperitoneal para aorta). A
incisão transversa no abdome superior para colecistectomia é superior, como já
mencionado, à subcostal pela orientação dos ramos nervosos neste local. Esta
última poderia acarretar a lesão de até três ramos intercostais. A incisão oblíqua
infra-umbilical deve acompanhar o trajeto dos ramos que inervam a parede neste
local (Fig. 3.1), mas uma lesão do décimo-primeiro nervo intercostal e do sub-
costal acarreta abaulamento ou hérnia e dor neurológica na parede abdominal.
Inúmeros estudos, tanto clínicos como experimentais, demonstraram as
vantagens fisiológicas das incisões transversas sobre as longitudinais. A tendên-
cia para afastamento das bordas das incisões longitudinais (devido à ação dos
músculos largos do abdome) produz aumento da tensão sobre a ferida operatória
acarretando dor acentuada e predisposição à eventração e a hérnias incisionais.
O ato de tossir e a expansão torácica ampla são inibidos devido à dor, e as com-
plicações pulmonares perioperatórias (pneumonia e atelectasia) são mais fre-
qüentes. Nas incisões transversas, a secção de músculos, vasos e a possibilidade
de lesão de nervos intercostais (mais freqüentes nas incisões oblíquas) são com-
pensadas por uma diminuição da tensão nas bordas da ferida operatória, deter-
minando menos dor pós-operatória e melhora da função respiratória.
Apesar de estes dados já terem sido comprovados em análises experimentais
e na prática clínica, as incisões longitudinais ainda são, genericamente, as mais
empregadas. Este fato ocorre devido à facilidade e rapidez de abertura e fecha-
mento; aliada a esta praticidade estas incisões podem ser facilmente ampliadas
se necessário e via de regra produzem excelente exposição aos órgãos das cavi-
dades abdominal e pélvica.

INCISÕES NA PAREDE ABDOMINAL PARA LAPAROSCOPIA


A laparoscopia ou o diagnóstico e tratamento por videoscopia conciliou, do
ponto de vista de acesso a uma estrutura na cavidade abdominal, o desejo de mui-
tos cirurgiões, que é o de poder avaliar e tratar uma lesão com a menor incisão
possível. Em que pese os problemas relacionados ao método, como a necessida-

28
de do pneumoperitônio e a manipulação indireta das estruturas através de instru-
mentos, com pequenas incisões, a videolaparoscopia, proporcionalmente ao ta-
manho da ferida operatória, oferece um acesso mais amplo e com trauma à pare-
de abdominal incomparavelmente menor (as incisões geralmente não ultrapas-
sam os dois centímetros de extensão).
Obviamente as localizações das vias de entrada da ótica e do instrumental na
parede do abdome sofrem variações baseadas na localização do órgão-alvo. Se o
objetivo é assistir a uma biópsia hepática ou a um processo ginecológico, as por-
tas de entrada serão distintas.
As incisões na parede do abdome para colocação da ótica e das pinças de
manipulação das estruturas são pequenas e portanto podem não permitir a visua-
lização dos vasos e nervos, acarretando possibilidade de lesões destas estruturas.
O conhecimento da anatomia de superfície do abdome diminui a possibilidade
destas lesões, que algumas vezes levam a inconvenientes problemas, como gran-
des hematomas. Exemplificando, a artéria epigástrica inferior tem seu trajeto
partindo do ponto médio de uma linha que une a espinha ilíaca ântero-superior à
sínfise púbica, em direção ao umbigo. Nesta região ela tem trajeto ascendente
mantendo-se eqüidistante à linha alba e à linha semilunar até anastomosar-se
com a artéria epigástrica superior, que é ramo da artéria torácica interna e tem a
mesma disposição em relação ao músculo reto do abdome, porém com tendência
a um trajeto medial (Fig. 3.1). Um par de veias acompanha estas artérias.
Na porção lateral da parede abdominal os vasos têm trajeto oblíquo, no sen-
tido súpero-inferior, a partir da borda inferior 10ª, 11ª e 12ª costelas até a linha
média. Como a inervação nesta região é composta pelos nervos intercostais e o
subcostal, existem áreas com inervação por mais de um ramo, assim a lesão de
pequenos ramos não acarreta em geral inconvenientes (sobreposição da inerva-
ção).
Apesar dos procedimentos laparoscópicos serem utilizados há muito tempo,
em particular para diagnóstico, pode-se afirmar que a sua utilização, no campo
do tratamento, recebeu um impulso acentuado com a popularização da colecis-
tectomia videolaparoscópica. Nesta abordagem utiliza-se a região periumbilical
e mais três sítios na parede para realização das pequenas incisões que possibili-
tam a introdução do instrumental. Estes sítios são geralmente a linha mediana
entre o apêndice xifóide e a cicatriz umbilical, na região do hipocôndrio direito,
e uma terceira na região do flanco direito. Podem ser necessários outros sítios
complementares, até no flanco esquerdo ou entre a região umbilical e a segunda
incisão na vigência de dificuldades como na colecistite aguda ou conforme varia-
ções anatômicas dos pacientes.
Como são inúmeras as possibilidades de acesso laparoscópico às cavidades
abdominal e pélvica, que vão variar dependendo do órgão-alvo, da anatomia do
paciente (ângulo infra-esternal maior ou menor) e da preferência do cirurgião, as
regras gerais para se evitar lesões poderiam ser:

29
— a linha mediana é segura para acesso, porém abaixo do umbigo a aponeu-
rose é mais delicada, portanto a introdução dos trocartes afiados deve
ser mais delicada;
— sobre o músculo reto do abdome, acima do umbigo, a artéria epigástrica
superior localiza-se mais medialmente, enquanto abaixo dele a artéria
epigástrica inferior tem trajeto lateralizado;
— a linha semilunar (borda lateral do músculo reto do abdome) deve ser
evitada pois por esta região chega a inervação do reto abdominal;
— a projeção da linha hemiclavicular no abdome constitui um sítio seguro
às pequenas incisões laparoscópicas;
— o bom senso deve nortear a escolha e pesar os riscos dos acessos alterna-
tivos.

BIBLIOGRAFIA
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8. Meinero M, Melotti G, Mouret PH. Cirurgia laparoscópica. Buenos Aires, Editorial Médica
Panamericana, 1996.

30
4

INTRODUÇÃO

A parede torácica é revestida por grandes grupos musculares que têm função
principalmente relacionada aos movimentos do ombro e do tronco. Quando seccio-
nados, sua porção distal tem a inervação comprometida, perdendo força contrátil e
sofrendo considerável atrofia. A contração da parte proximal se apóia na cicatriz
resultante21. Assim, devemos reduzir ao máximo as secções musculares e quando
da necessidade de ampliarmos a incisão a mesma deverá ser baseada na divulsão
das fibras e nos descolamentos musculares.
Depois do diafragma, os músculos intercostais são os que têm maior função
na dinâmica da ventilação pulmonar. Quando incisados são inutilizados, porém,
os supra- e infra-adjacentes suprem sua função.
As incisões que solicitam grande secção muscular provocam muita dor no
pós-operatório. Isto deve ser levado em conta quando da escolha da incisão a ser
realizada visando à recuperação mais rápida do paciente, com menos dor.
A anatomia da parede e principalmente da cavidade e órgãos intratorácicos
deve ser muito bem conhecida pelo cirurgião para que a incisão escolhida e o
procedimento proposto sejam realizados com segurança.
Na atualidade, há tendência à realização de cirurgias minimamente invasi-
vas, principalmente com a videotoracoscopia8,15,17,24, poupando agressões à pa-
rede e as complicações que acarretam no pós-operatório recente e tardio. Neste
capítulo, daremos ênfase às principais incisões torácicas.

TORACOTOMIA PÓSTERO-LATERAL

É a incisão de escolha para a maioria das cirurgias intratorácicas pois permi-


te amplo acesso à cavidade torácica. É indicada para todas as ressecções pulmo-
nares, abordagem do mediastino, esôfago, diafragma e aorta ascendente.

31
A desvantagem é a eventual dificuldade às trocas gasosas devido à posição
dependente do lado não operado.
O paciente é posicionado em decúbito lateral. Os membros inferiores ficam
separados por coxim, sendo o de baixo mantido em flexão e o de cima em exten-
são. O membro superior do lado não operado é mantido em extensão e em abdu-
ção a 90°C em relação ao tronco, ficando apoiado em suporte adequado. O do
lado operado pode ser colocado em frente ao rosto, ficando pendente para fora
da mesa operatória e com isso alargando os espaços intercostais e deslocando a
escápula ântero-superiormente, ou pode ser colocado adiante, fletido à altura da
cabeça. Sob coxim dorsal, próximo à axila, para evitar lesão do plexo braquial, a
posição é mantida com a fixação do paciente à mesa com largas faixas de fitas
adesivas ao nível do quadril (Fig. 4.1).
Antes de se iniciar a incisão cutânea, vários parâmetros anatômicos devem
ser identificados: mamilo, espaços intercostais, escápula e coluna vertebral. Rea-
liza-se uma incisão curvilínea estendendo-se da linha axilar anterior até um pon-
to médio entre a coluna vertebral (ao nível da quarta vértebra torácica) e a borda
posterior da escápula, acompanhando o quinto espaço intercostal. Por haver níti-
do deslizamento dos planos superiores para frente (quatro a oito centímetros),
deve-se realizar marcas perpendiculares à futura incisão com bisturi para poste-
rior fechamento correto dos planos (Fig. 4.2). A pele e o tecido celular subcutâ-
neo são incisados expondo-se o grande dorsal e parcialmente o serrátil anterior e
o trapézio. O grande dorsal é seccionado com eletrocautério, sendo realizadas
eventuais ligaduras para perfeita hemostasia. O serrátil anterior pode ser desin-
serido ou mesmo seccionado próximo às suas inserções costais, sendo elevado
anteriormente. O trapézio pode ser facilmente rebatido posteriormente, ou ser
parcialmente seccionado se houver necessidade, proporcionando boa exposição
do gradil costal e dos espaços intercostais (Fig. 4.3). Escolhido o espaço inter-
costal a ser aberto, realiza-se a incisão dos músculos intercostais e a pleura parie-
tal com eletrocautério na borda superior da costela evitando-se lesão do feixe

Fig. 4.1 — Toracotomia póstero-lateral: posicionamento do doente e incisão.

32
Fig. 4.2 — Marcas perpendiculares à futura incisão para se evitar defasagem dos bordos no fecha-
mento.

vásculo-nervoso. Deve ser realizado com cuidado após a exploração digital da


cavidade certificando-se de que o pulmão esteja desinsulflado e/ou da ausência
de aderências pleuropulmonares.
Em pacientes brevilíneos, obesos, com musculatura espessa ou em situações
de instabilidade de costelas por fraturas, retrações costais ou grande espes-
samento pleural, pode-se realizar a exérese subperiostal de um fragmento poste-
rior ou mesmo de todo um arco costal para permitir ampla exposição dos órgãos
intratorácicos e a execução dos procedimentos com segurança21. O fechamento
se inicia com a aproximação dos arcos costais com pontos simples de fio absor-
vível de categute cromado 2, evitando-se a lesão do feixe vásculo-nervoso inter-
costal. Os músculos seccionados são suturados com fio absorvível de vicryl 1 de

Fig. 4.3 — Exposição do gradil costal após secção muscular: 1- grande dorsal 2 — serrátil anterior
3 — trapézio 4 — sacroespinhal.

33
forma contínua. Habitualmente não suturamos os intercostais e a pleura por não
julgarmos necessário. Esta pode ser realizada quando da exérese de um arco cos-
tal com fio absorvível de vicyrl 1.0. O serrátil anterior é reinserido ou suturado se
inicialmente seccionado. O grande dorsal é suturado de acordo com as marcas
iniciais na pele evitando-se defasagem dos bordos da incisão. O tecido celular
subcutâneo e a pele são cuidadosamente aproximados com fio de náilon 4.0 em
pontos simples.
Caso haja necessidade, esta incisão pode ser prolongada posteriormente, as-
cendendo-se no espaço interescápulo-vertebral, seccionando-se parcialmente os
músculos rombóide e trapézio.

TORACOTOMIA POSTERIOR
Esta incisão foi amplamente utilizada no passado quando não havia sonda
de duplo lúmen6 e para as toracoplastias no tratamento de cavidades residuais de
tuberculose1,1,22.
As vantagens são a melhor ventilação pulmonar, drenagem brônquica sem
risco de aspiração contralateral, dissecção mais segura do hilo pulmonar entre
outras. As desvantagens são a posição inconveniente do doente e a exposição
inadequada do tórax anterior e do mediastino.
O paciente é posicionado em decúbito ventral (Fig. 4.4) ou mesmo em decú-
bito lateral. A incisão cutânea se estende da linha axilar posterior, ascendendo
no espaço interescápulo-vertebral até a borda superior da escápula. O grande
dorsal é seccionado com eletrocautério expondo parcialmente o serrátil anterior

Fig. 4.4 — Toracotomia posterior: posicionamento do paciente.

34
e o trapézio. Após a secção do trapézio ficam expostos o rombóide maior e o ser-
rátil anterior que são também seccionados. O sacroespinhal pode ser rebatido
posteriormente completando ampla exposição do gradil costal. Esta incisão é a
que maior exige secções musculares, porém permite ressecção de extensos seg-
mentos dos arcos costais posteriores, desde a primeira até a oitava costela. O es-
paço intercostal escolhido é aberto por secção dos intercostais e pleura com ele-
trocautério na borda superior da costela.
Para o fechamento, os arcos costais são aproximados com categute cromado
2 em pontos simples, os músculos são suturados individualmente com fio de
vicryl 1 em sutura contínua. O tecido celular subcutâneo e a pele são corretamen-
te aproximados com fio de náilon 4.0.

TORACOTOMIA ANTERIOR
Esta incisão pode ser utilizada para as lobectomias superiores e em cirurgia
cardíaca, principalmente quando em mulheres por ser mais estética. Quando am-
pliada, a lobectomia média e a esofagectomia total são passíveis de serem reali-
zadas. Permite boa visualização e dissecção do hilo pulmonar, da veia cava su-
perior e do tronco simpático paravertebral. As vantagens são a facilidade e rapi-
dez na sua execução, sendo a incisão de escolha nas urgências traumáticas11, pe-
quena perda de sangue e facilidade para o seu fechamento. A desvantagem é de
não permitir boa visualização do lobo inferior e permitir escape aéreo ocasio-
nando enfisema do tecido celular subcutâneo por dificuldade ao fechamento dos
arcos costais próximo ao esterno. A toracotomia anterior é a que acarreta meno-
res distúrbios funcionais à parede torácica por requerer menor secção muscular.
O paciente é posicionado em decúbito dorsal horizontal sendo o lado a ser
operado mantido elevado 30 a 45°C à mesa operatória por coxim. O membro su-
perior é fletido ao nível do cotovelo e elevado e mantido em suporte adequado.
A incisão é curvilínea, submamária, estendendo-se da borda esternal à linha
axilar média acompanhando o quinto espaço intercostal (Fig. 4.5). O peitoral mai-
or é seccionado com eletrocautério. A seguir, o peitoral menor é também seccio-
nado expondo o serrátil anterior o qual, se necessário é desinserido e rebatido su-
periormente (Fig. 4.6). Para melhor exposição, o grande dorsal pode ser descolado
e rebatido posteriormente. Os intercostais e a pleura são seccionados na borda su-
perior da costela. Deve-se ter cuidado com os vasos mamários que se localizam 1 a
2 centímetros da borda esternal atrás das cartilagens costais, os quais podem ser li-
gados e seccionados sem dificuldades. Para facilitar a abertura e melhorar a expo-
sição da cavidade pode-se realizar a ressecção subpericondral de fragmentos de
cartilagem costais ou mesmo promover a desarticulação condroesternal.
Para o fechamento, os arcos costais são aproximados com pontos simples de
categute cromado 2. A sutura dos intercostais e da pleura é opcional. Não consi-
deramos necessária a fixação condroesternal. O restante da musculatura é sutu-
rada com fio absorvível de vicryl 1 de forma contínua.

35
Fig. 4.5 — Toracotomia anterior.

Fig. 4.6 — Exposição dos arcos costais após secção muscular: 1 — peitoral maior 2 — peitoral
menor 3 — serrátil anterior 4 — grande dorsal.

36
TORACOTOMIA ANTEROLATERAL
Por esta incisão pode ser realizada lobectomia inferior, pericardiectomias,
pericardiotomias, ressecções de tumores mediastinais. Permite bom acesso ao
esôfago e à aorta descendente.
O paciente é mantido em decúbito lateral ligeiramente dorsalizado. A inci-
são se estende do bordo esternal até a linha axilar posterior acompanhando o
sexto espaço intercostal. Os músculos peitorais maior e menor são seccionados.
O serrátil anterior pode ser seccionado ou desinserido. Se necessário ampliar a
incisão, o grande dorsal pode ser descolado e rebatido posteriormente e os inter-
costais podem ser seccionados até a borda dos músculos paravertebrais. As car-
tilagens costais podem ser seccionadas ou desarticuladas do esterno para facili-
tar a abertura. Os mesmos cuidados devem ser tomados com os vasos mamários.
Para o fechamento, os arcos costais são aproximados e os músculos são sutura-
dos conforme citações anteriores.

TORACOTOMIA LATERAL OU AXILAR


A grande maioria das cirurgias pulmonares, da parede torácica, mediastinais,
esofágicas, cardiovasculares pode ser realizada com esta incisão7. As vantagens
são de ocasionar menor trauma à parede e conseqüente menor dor e interferência
com a função pulmonar, ser de fácil execução e proporcionar melhor aspecto es-
tético pós-operatório.
O paciente é posicionado do mesmo modo como para toracotomia póste-
ro-lateral. As incisões podem ser verticais ou horizontais ou inclinadas acompa-
nhando a borda do grande dorsal, e a sua extensão depende do procedimento pla-
nejado (Fig. 4.7A e B). Após a incisão, o serrátil anterior bem como a borda lateral
do peitoral maior e a borda anterior do grande dorsal são expostos. Sobre o serrátil
anterior identifica-se o nervo torácico longo que deve ser preservado (Fig. 4.8). A
borda anterior do grande dorsal é desinserida, sendo o mesmo descolado e rebati-
do posteriormente. O mesmo pode ser realizado com o peitoral maior. As fibras do
serrátil são divulsionadas ou seccionadas próximas às inserções costais, expondo
as costelas e os espaços intercostais (Fig. 4.9). A exérese de um arco costal pode
ou não ser realizada para facilitar a exposição7. O tempo gasto para o fechamento
é pequeno. Os intercostais e a pleura podem ser suturados. As fibras do serrátil são
aproximadas, o grande dorsal é reinserido e o tecido celular subcutâneo e a pele
são cuidadosamente aproximados.

TORACOTOMIA BILATERAL TRANSESTERNAL


Ampla exposição das cavidades pleurais, hilos pulmonares, grandes vasos e
do mediastino anterior são oferecidos com esta incisão. É utilizada para o trans-
plante pulmonar bilateral, ressecção bilateral de metástases, pericardiectomias,

37
A

B
Fig. 4.7A e B — Toracotomia lateral: A — incisão vertical e B — incisão acompanhando o bordo
anterior do grande dorsal.

ressecção de aneurisma de ventrículo. No nosso serviço, o seu uso tem se amplia-


do para os casos de emergência traumática, nos ferimentos penetrantes, princi-
palmente cardíacos, quando da dificuldade de exposição do coração por
toracotomia e nos ferimentos transfixantes do mediastino11. O prolongamento
para o lado contralateral é rápido e facilmente executado após secção esternal
com uma simples serra de Gigli.

38
Fig. 4.8 — Toracotomia lateral: 1 — exposição do nervo torácico longo 2 — serrátil anterior 3 —
grande dorsal rebatido posteriormente.

Fig. 4.9 — Divulsão das fibras do serrátil anterior e exposição do arco costal que poderá ser resse-
cado.

39
O paciente é mantido em posição supina com os membros superiores abdu-
zidos ao longo do corpo. A incisão é curvilínea, submamária, no quarto espaço
intercostal bilateral, estendendo-se da linha axilar média de um lado ao outro
(Fig. 4.10). Os peitorais maior e menor são seccionados, o serrátil anterior é de-
sinserido bilateralmente e rebatido superiormente. Os intercostais e a pleura são
abertos, os vasos mamários ligados e seccionados em ambos os espaços inter-
costais. Por um túnel retroesternal, rente a sua face posterior, passa-se uma serra
de Gigli e o esterno é seccionado com cuidado. A hemostasia pode ser feita com
eletrocautério ou cera de osso. A utilização desta, não é de nossa preferência por
se tratar de um corpo estranho, podendo interferir na cicatrização do esterno.
Para o fechamento, os arcos costais são aproximados. O esterno é suturado
com dois pontos simples de fio de aço 4. Os fios são apertados de forma firme e
cuidadosa para se evitar instabilidade esternal. Os músculos são reinseridos e su-
turados quando seccionados com fios absorvíveis.

ESTERNOTOMIA MEDIANA
De execução simples e segura, sem grandes perdas sangüíneas, permite boa
exposição do coração, vasos da base e mediastino. Fornece amplo acesso às ca-
vidades pleurais, porém há dificuldade em expor os segmentos pulmonares pos-
teriores. Utilizada para cirurgias cardíacas, ressecções de metástases pulmona-
res bilaterais, timectomias, ressecções de estenoses traqueais em concomitância
com cervicotomia. Nós indicamos no trauma11, quando da realização de uma ja-

Fig. 4.10 — Toracotomia bilateral transesternal.

40
nela pericárdica que se mostrou positiva e o paciente apresenta-se em plena esta-
bilidade hemodinâmica.
O paciente é mantido em posição supina com os braços em abdução. A inci-
são é realizada na linha média esternal estendendo-se da fúrcula até 2 a 3 cm do
apêndice xifóide (Fig. 4.11). Todos os planos são abertos até o periósteo com
eletrocautério e também a linha alba expondo a gordura pré-peritoneal. Reali-
za-se a dissecção e liberação da região da fúrcula esternal, havendo eventual-
mente a necessidade de se ligar o arco jugular, resultante da junção da veias ju-
gulares anteriores. O mesmo é feito na região do apêndice xifóide. O descola-
mento do plano posterior pode ser feito digitalmente ou por dissecção romba
com gaze na extremidade de uma pinça longa. O esterno é seccionado manual-
mente com uma serra de Gigli ou com serra circular oscilatória. A hemostasia do
mesmo é feita com eletrocautério e/ou com cera de osso. A fenda esternal deve
ser vagarosamente aberta com afastador mecânico evitando-se lesões pleurais.
Se ocorrerem, podem ser simplesmente suturadas após hiperinsuflação, não sen-
do necessário a drenagem pleural. O esterno é suturado com pontos simples, em
média de 8, em X ou em U, com fio de aço 4, os quais são apertados firmemente
evitando-se instabilidade esternal, osteomielite e/ou mediastinite. Os planos são
aproximados na linha média com fio absorvível de vicryl 1 em sutura contínua.
Cuidado especial é tomado na sutura da linha alba evitando-se futuras hérnias
epigástricas.

INCISÃO TORACOABDOMINAL
As cavidades pleural e abdominal são convertidas em uma única, com esta
incisão permitindo excelente exposição de estruturas intratorácicas baixas e ab-

Fig. 4.11 — Esternotomia mediana.

41
dominais altas. Pode ser utilizada quando à direita para as reconstruções do trato
biliar, hepatectomia direita, exérese de tumores renais e da adrenal, derivações
portocava. Quando à esquerda, possibilita a ressecção do esôfago distal, gastrec-
tomia total, esplenectomia nas grandes esplenomegalias, derivações esplenorre-
nais.
O paciente pode ser posicionado em decúbito lateral completo ou não, de-
pendendo do procedimento a ser realizado. A incisão pode ser realizada do quin-
to ao oitavo espaço intercostal, cruzando o rebordo costal sobre a parede abdo-
minal até a linha média (Fig. 4.12). Os músculos da parede anterolateral do tórax
e anterior do abdome (grande dorsal, serrátil anterior, oblíquo externo, oblíquo
interno, transverso do abdome e retoabdominal) assim como as suas aponeuro-
ses são seccionadas, sendo então identificado o espaço intercostal e o peritônio a
serem abertos. O local da secção do diafragma depende da cirurgia proposta, po-
rém, quanto mais lateral, menor número de fibras do nervo frênico são lesadas e,
conseqüentemente, menor porção diafragmática será paralisada.
O fechamento da incisão se inicia com a sutura diafragmática com fio de
seda 2 ou vicryl 1 com pontos simples ou em U. O peritônio é suturado de forma

Fig. 4.12 — Incisão toracoabdominal.

42
contínua ancorada, os arcos costais aproximados, os músculos suturados com
fios absorvíveis.
Não utilizamos de rotina esta incisão em nosso serviço. Preferimos, quando
necessário, realizar incisões separadas, isto é, uma no tórax e outra no abdome,
mantendo o arcabouço ósseo íntegro.

MEDIASTINOTOMIA ANTERIOR (CHAMBERLAIN)

O procedimento de Chamberlain é utilizado no estadiamento da neoplasia


pulmonar quando da realização de biópsias de gânglios mediastinais e para o diag-
nóstico de tumores mediastinais quando da falha de métodos ou impossibilidade
da realização de métodos menos agressivos (punção transparietal, mediastinosco-
pia cervical). O paciente em posição supina é submetido a uma incisão vertical pa-
ralela a borda esternal sobre a segunda e terceira cartilagem costal. Após a abertu-
ra muscular, pode-se realizar uma ressecção subpericondral ou apenas uma secção
com bisturi da cartilagem costal para facilitar a abertura. Se houver necessidade,
os vasos mamários podem ser ligados e seccionados. A pleura parietal é rebatida
lateralmente ou taticamente aberta para acessar ao mediastino. As biópsias ou res-
secções ganglionares podem ser feitas muito facilmente. Porém, a hemostasia
deve ser cuidadosamente revisada para se evitar hematomas no pós-operatório. A
drenagem pleural é necessária quando da abertura pleural. Os músculos são sutu-
rados com fio absorvível de vicryl 1 e o tecido celular subcutâneo e a pele são de-
vidamente aproximados.

Agradecimentos:

Os autores agradecem ao residente Lucio Issamo Nakayama, pela confecção


dos desenhos e figuras.

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44
5 Cirurgia Minimamente
Invasiva

Nelson Fontana Margarido


Luiz Alberto Soares

INTRODUÇÃO

A Medicina é uma ciência que possui verdades mutáveis. No passado era


alardeado que na cirurgia “grandes cirurgiões, grandes incisões”. Por outro lado,
nos Centros Cirúrgicos de Hospitais Escolas, quando um médico residente esta-
va diante de alguma dificuldade técnica e solicitava o concurso do médico assis-
tente responsável, a primeira atitude deste era ampliar a incisão cirúrgica, alicer-
çado que uma ampla incisão permitiria melhor apresentação e, por conseguinte,
“uma boa apresentação significaria meia operação realizada”.
Com a evolução dos conceitos fisiopatológicos associados ao advento de
novos recursos técnicos e farmacológicos, idéias cirúrgicas sofreram mutação.
Assim, inicialmente na cirurgia abdominal, começamos a identificar iniciativas
no sentido de realizar vias de acesso com dimensões menores.
Guimarães, em 1969, estudando pacientes com hipertensão portal e que ti-
nham sido submetidos a anastomose esplenorrenal, após um ano, procedia à “pe-
quena laparotomia” como via de acesso para realizar manometria portal, porto-
grafia e biópsia hepática. Considerando que a sua pesquisa tinha por objetivo o
tratamento das hemorragias gastroesofágicas, esta conduta de técnica cirúrgica
não foi valorizada.
Strack e colaboradores, em 1971, propuseram “procedimento integrado” ba-
seado em laparotomia de pequena dimensão, para o rápido diagnóstico de obs-
trução biliar, hipertensão portal ou de hepatopatias de etiologia incerta.
Em 1975, Stein, com a preocupação no diagnóstico das icterícias, introduziu
na literatura o termo “minilaparotomia” para a realização de colangiografia tran-
sepática aberta.
Dubois e colaboradores, mais recentemente em 1982, empregaram a minila-
parotomia para a realização de colecistectomias. Apresentaram experiência clí-
nica de 1.500 colecistectomias por minilaparotomia; conceituando, indicando

45
as vantagens, segurança e limitações da referida via de acesso. Essa variante
técnica de via de acesso não teve difusão no meio médico; e com o advento da
videocirurgia, que se constituiu na grande novidade da cirurgia dos anos 90, a
minilaparotomia foi relegada para plano secundário.
No início de século, Kelling (1901) recorreu a um cistoscópio para realizar
experimentalmente em cão a inspeção da cavidade abdominal. Jacobeaus em
1910, empregou o mesmo tipo de aparelho para estudar em seres humanos a ca-
vidade pleural. A partir da quarta década deste século foi introduzido na prática
médica a realização do pneumoperitônio, que criou espaço real e permitiu avan-
ço nos diagnósticos de afecções intra-abdominais. Nos anos 60, o melhor con-
trole da confecção e manutenção do pneumoperitônio, associado a competentes
fontes de luz fria e surgimento da fibra óptica possibilitou significativos avanços
na laparoscopia (Stellato, 1992).
Na Alemanha, Semm desenvolveu instrumentos que permitiram manipular,
diagnosticar e realizar cirurgias ginecológicas. Semm, em 1982, realizou a pri-
meira apendicectomia por via laparoscópica.
A laparoscopia depois evoluiu para a realização de diagnósticos e estadia-
mento de afecções intra-abdominais, destacando-se entre nós o trabalho sobre
câncer gástrico de Possik (1990).
Coube a Mouret apresentar em Lyon, na França, em 1987, a execução da pri-
meira colecistectomia laparoscópica. No ano seguinte Dubois e colaboradores,
incentivados pelo pioneirismo de Mouret, apresentaram inicialmente série de 36
colecistectomias laparoscópicas, publicada em 1990. Este estudo consagrou a
maior novidade cirúrgica da última década do século: a videocirurgia (Dubois et
al., 1990).
Dentro ainda da idéia de cirurgia minimamente invasiva devemos lembrar
das cirurgias endoscópicas representadas pelas polipectomias, ligaduras elásti-
cas e esclerose de varizes, papilotomias endoscópicas, retirada de cálculos da
via biliar principal, colocação de drenos nasobiliares e, mais recentemente, a
técnica da mucosectomia para lesões gástricas iniciais. Cabe ainda lembrar os
procedimentos intraluminais como as angioplastias e colocação de próteses au-
to-expansivas (stent). Precisamos lembrar também dos procedimentos urológi-
cos, bem como ortopédicos.
Finalmente temos que ter em mente que as cirurgias minimamente invasivas
são procedimentos alternativos somente quanto à via de acesso, e portanto preci-
sam atender a todos os requisitos do tratamento da doença passível de cirurgia.
Jamais podemos recorrer a condutas incompletas ou ultrapassadas apenas por-
que as mesmas se adaptam melhor a uma via de acesso de menor dimensão.

EQUIPAMENTOS
Para a adoção de cirurgia minimamente invasiva são necessários equipa-
mentos e instrumentos específicos.

46
A correta visualização do campo operatório é requisito primordial para a
execução segura dos diferentes tempos cirúrgicos. Assim a iluminação é fator li-
mitante para a possível escolha da via de acesso de pequenas dimensões.
Para a realização de minilaparotomias ou de toracotomias mínimas necessi-
tamos inicialmente de fonte de luz fria, cabos maleáveis de fibras ópticas e afas-
tadores especiais que sejam dotados de iluminação fornecida pelos dois equipa-
mentos anteriormente enunciados. Precisamos de diferentes tipos de afastadores
dotados de luz fria, para executarem tarefas distintas; assim para a colecistecto-
mia por minilaparotomia são necessários três afastadores, ou seja: um para atuar
na superfície, outro maior para afastar o fígado e iluminar o pedículo da vesícula
biliar e, finalmente um afastador estreito e longo, para eventualmente afastar na
profundidade o duodeno e o colo transverso.
Estes afastadores especiais, ao lado da fonte de luz fria e cabos de fibra ópti-
ca, são de fácil obtenção, de baixo custo e de grande versatilidade (Margarido,
1998). É evidente que são necessários os demais instrumentos cirúrgicos para as
intervenções convencionais.
Quanto à laparoscopia os avanços tecnológicos da óptica e de transmissão
da luz aumentaram a segurança e precisão do método. O aperfeiçoamento da cria-
ção e manutenção do pneumoperitônio, e principalmente a introdução das ima-
gens por vídeo, possibilitaram aos cirurgiões a realização de operações mais so-
fisticadas, e adaptação e confecção de novos instrumentos. A videocirurgia per-
mitiu que toda a equipe cirúrgica participasse dos procedimentos no mesmo ins-
tante e com a mesma visão. A laparoscopia intervencionista se popularizou e a
videocirurgia passou a ser a maior novidade cirúrgica da última década do sécu-
lo XX.
Os equipamentos para a videocirurgia são mais sofisticados e caros quando
comparados com os empregados nas minilaparotomias. Assim para a videoci-
rurgia necessitamos de insuflador de CO2, minicâmera de vídeo, fonte de luz,
amplificador de imagens, trocarteres, redutores, pinças, tesouras, clipadores,
grampeadores e outros instrumentos específicos.
Para os procedimentos endoscópicos, cada especialidade tem suas peculiari-
dades e especificidades, que não cabem discutir dentro deste tema. É evidente
que o mesmo vale para os procedimentos intraluminais.

PROCEDIMENTOS TÉCNICOS

Os cirurgiões têm compromisso com o paciente e nunca com o método ou


via de acesso. A cirurgia minimamente invasiva se trata de alternativa válida
para tratamento de doenças passíveis de procedimentos operatórios. Portanto, o
que se pode realizar com acessos minimamente invasivos, nem sempre é o que
se deve executar.

47
A partir destas premissas iremos apresentar elenco de procedimentos técni-
cos passíveis de serem realizados por vias de pequenas dimensões.
Apenas por facilidade didática separaremos os procedimentos em abdomi-
nais e torácicos. Não nos preocuparemos com as cirurgias mais ou menos indica-
das, e por conseguinte as mais freqüentemente realizadas.
No abdome podemos realizar por meio de acessos de pequenas dimensões, o
tratamento das seguintes afecções:
— colelitíase e litíase da via biliar principal;
— hérnia hiatal, doença do refluxo gastroesofagiano;
— apendicite cecal; diverticulite de Meckel;
— úlcera duodenal: vagotomia troncular, vagotomia superseletiva;
— colecistojejunostomia;
— obstrução de intestino delgado;
— diverticulite de cólon;
— fechamento de colostomia; fechamento de cirurgia a Hartmann;
— tumores de supra-renal;
— esplenectomia;
— linfadenectomia pélvica;
— gastrectomia;
— estadiamento de câncer;
— cistos hepáticos periféricos;
— câncer de cólon;
— pancreatoduodenectomia;
— lesões de retroperitônio;
— laparotomia exploradora: abdome agudo;
— ooforectomia; ooforoplastia;
— anexectomia;
— histerectomia.
Ainda dentro do segmento abdominal, ao nível da parede, temos as hérnias
inguinais por técnicas pré- e transperitoneal.
Quanto ao segmento torácico citaremos:
— trauma de tórax: hemotórax, pneumotórax e hemopneumotórax;
— retirada de corpo estranho intrapleural;
— ferimento transfixante de mediastino;
— ferimento na transição toracoabdominal;
— biópsias pleurais e mediastinas;
— estadiamento do câncer pulmonar;
— estadiamento e tratamento do empiema pleural;
— ressecção de nódulos pleurais;
— tumores do esôfago torácico;
— simpatectomia dorsal;
— pericardioscopia e pericardiectomia;

48
— resseção de cistos mediastinais;
— bulectomias e pleurodese.
Voltamos a insistir que o que pode ser feito, nem sempre é o que deve ser fei-
to; temos que obedecer aos princípios oncológicos, à idéia de radicalidade, às
ressecções em monobloco, aos cuidados com a contaminação da cavidade, à pre-
cisa confecção das anastomoses, à segurança das ligaduras, em fim respeitar a
todos os princípios de técnica cirúrgica.
É evidente que para cada procedimento cirúrgico acima enunciado podere-
mos apresentar considerações peculiares quanto à anestesia, posição do paciente
na mesa, tempos e táticas cirúrgicas, realização de exames contrastados in-
tra-operatórios, emprego de grampeadores, tipos de fio, uso de drenos etc.
Devido à enorme variabilidade de aspectos para cada intervenção, e inclusi-
ve existindo critérios meramente pessoais, não cabe o desenvolvimento dos
mesmos dentro do tema genérico de cirurgia minimamente invasiva.

CIRURGIA VIDEOASSISTIDA

A cirurgia videoassistida é uma operação chamada de mista, em que se asso-


cia uma via de acesso aberta de pequena extensão auxiliada ou complementada
pelo emprego de uma videocâmara. Essa idéia é válida tanto para a cavidade ab-
dominal (Altenfelder, 1993) quanto para o tórax (McKnealy et al., 1992).
Essa verdadeira simbiose entre a miniincisão com a videocirurgia amplia
em muito o aspecto da visualização do campo operatório ao lado de permitir o
emprego de instrumentos cirúrgicos convencionais, realização de ligaduras e su-
turas dentro do maior rigor da técnica cirúrgica, e ressecções e ou remoções de
peças operatórias de dimensões compatíveis com a via de acesso, sem ter que se
recorrer ao inconveniente e incômodo processo de fragmentação das mesmas.
A cirurgia videoassistida aumenta em muito a exploração da cavidade abdo-
minal ou torácica, aproximando-se, neste aspecto, ao que se realiza nas opera-
ções convencionais.

ANÁLISE CRÍTICA

O emprego de cirurgia minimamente invasiva não é ilimitado; assim, exis-


tem contra-indicações. Algumas vezes os mesmos impedimentos para as mini-
incisões podem vir a se constituir em pontos positivos da videocirurgia e vi-
ce-versa, portanto a análise sobre as vantagens e desvantagens da cirurgia mini-
mamente invasiva precisa às vezes ser enfocada em separado, mas sempre tendo
como referencial as cirurgias realizadas com vias de acesso convencional.
Como desvantagens das vias de acesso de dimensões mínimas podemos
apontar os seguintes itens:

49
1. As miniincisões não permitem a exploração sistematizada das cavidades,
principalmente a peritoneal. O correto estudo pré-operatório, com auxílio de
métodos por imagens, endoscópicos e laboratoriais pode compensar em parte
esta deficiência (Margarido, 1997). Essa desvantagem não pode ser imputada
para a videocirurgia, uma vez o cirurgião tem recursos para inspecionar quase
todos os diferentes quadrantes abdominais (Cohen et al., 1997).
2. A cirurgia minimamente invasiva é de resolução técnica mais difícil e
desconfortável que a cirurgia pela via convencional.
3. As vias de acesso de reduzidas dimensões exigem maior habilitação, ex-
periência e tranqüilidade por parte do cirurgião e sua equipe. A adoção dessa téc-
nica por cirurgião neófito, e principalmente sem equipamentos e instrumentos
específicos e adequados é um convite para graves acidentes (Nogueira et al.,
1992; Torres et al., 1994).
4. A cirurgia minimamente invasiva, principalmente as miniincisões não es-
tão indicadas para as situações de emergências. Vias de acesso limitadas podem
determinar avaliações incompletas e conduzir a adoção de condutas equivoca-
das com graves e funestas conseqüências. Na atualidade, em casos selecionados,
começam a ser normatizadas condutas de videocirurgia no trauma penetrante
abdominal (Kawahara, 1998).
5. Em pacientes obesos as miniincisões são formalmente contra-indicadas;
pelas inerentes dificuldades de visualização do campo operatório. Esta desvan-
tagem não pode ser estendida a videocirurgia tanto é verdade, que no passado a
obesidade se constituía em contra-indicação para o tratamento cirúrgico da do-
ença do refluxo gastroesofágico; enquanto que a indicação cirúrgica pela técnica
videolaparoscópica não sofre restrições por essa condição clínica (Cohen et al.
1997).
6. Pelas dificuldades técnicas inerentes a via de acesso de menores dimen-
sões, os procedimentos operatórios podem ser mais demorados, e esse aumento
de tempo cirúrgico e anestésico pode vir a se constituir numa desvantagem e
possível contra indicação de operação por miniincisões.
Como aspectos positivos, ou seja, vantagens da cirurgia minimamente inva-
siva, podemos destacar o seguintes aspectos:
1. Acarreta menor traumatismo cirúrgico do que ocorre com a via de acesso
convencional.
2. Em geral, determina menores fenômenos dolorosos e desconforto no
pós-operatório imediato. Teoricamente requer menor carga de analgésicos (Gar-
cia González et al., 1995; Moreira Filho et al., 1997).
3. Em determinados procedimentos cirúrgicos, as miniincisões, pela menor
manipulação da cavidade abdominal, permitem realimentação precoce após oito
a 10 horas, semelhante à conduta para o pós-operatório da maioria das videoci-
rurgias.

50
4. Menor comprometimento respiratório no período pós-operatório do que
na cirurgia convencional. Por outro lado, as incisões de dimensões restritas não
acarretam os inconvenientes da elevação das cúpulas diafragmáticas, como é
inevitável nos procedimentos videolaparoscópicos. Entre nós, Coelho et al.
(1993), em estudo comparativo do comprometimento da função respiratória, no
período pós-operatório de colecistectomias realizadas por três diferentes vias de
acesso (videolaparoscopia, minilaparotomia e incisão convencional subcostal
direita) concluíram pela superioridade da videocirurgia em relação aos outros
dois tipos de incisões.
5. A cirurgia minimamente invasiva possibilita melhores resultados estéti-
cos do que a cirurgia convencional (Casanova et al., 1993).
6. No que concerne à deambulação precoce pós-operatória, tempo de perma-
nência hospitalar e retorno às atividades sociais e profissionais, as intervenções
cirúrgicas com vias de acesso de dimensões reduzidas têm teoricamente índices
mais favoráveis do que quando realizadas por incisões convencionais. Estes fa-
tos são verdadeiros para pacientes menos privilegiados e cuja atividade profissio-
nal depende da atividade braçal; por outro lado, para o profissional intelectual,
de melhor poder aquisitivo, cujo trabalho pode ser desempenhado sentado e em
sua própria residência, sem necessidade de locomoções ou carregar equipamen-
tos ou malas pesadas e volumosas, essas vantagens diminuem ou podem até
mesmo desaparecer.
7. Finalmente quanto aos custos hospitalares, as cirurgias realizadas com
miniincisões, em face do baixo valor dos equipamentos necessários podem, no
cômputo geral, ser menos dispendiosas quando comparadas com as interven-
ções convencionais. Por outro lado, as videocirurgias, atualmente no Brasil, são
seguramente mais onerosas que a operações clássicas, contrariando os maiores
artifícios matemáticos e exercícios imaginativos desenvolvidos pelos ferrenhos
defensores da videocirurgia.
Após esta discussão a cirurgia minimamente invasiva se constitui em impor-
tante alternativa de via de acesso. Deve ser indicada e praticada por cirurgião ex-
periente e motivado.
Não podemos esquecer que temos que atender a todos os requisitos do trata-
mento da doença passível de cirurgia; que o nosso compromisso é com o pacien-
te e jamais com os métodos; e o que pode ser feito através de uma técnica mini-
mamente invasiva, nem sempre é o que deve ser feito.

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52
Drenagem Abdominal nas
6 Peritonites

José Wazen da Rocha


José Antonio Gomes de Souza

INTRODUÇÃO

As peritonites permanecem como um grave problema a ser enfrentado por


clínicos e cirurgiões tanto no aspecto do diagnóstico etiológico, apesar da gama
de exames complementares incorporada pela moderna tecnologia médica, como
também na preocupação de evitar o ressurgimento do problema tóxico. Para isto
são usados os diversos tipos de drenagem abdominal, que continua a se constitu-
ir em motivo de discussões das mais variadas desde o tipo de dreno até a valida-
de ou não da drenagem. As afirmações de Howard Kelly (“a drenagem é a con-
fissão de uma operação cirúrgica imperfeita”), Halsted (“quanto mais imperfeita
a técnica do cirurgião maior a necessidade de drenagem”) e Yates (“a drenagem
completa da cavidade peritoneal é física e fisiologicamente impossível”), trou-
xeram ainda mais controvérsias com relação ao emprego das drenagens perito-
neais (Moss).
Os cirurgiões têm três preocupações ao tratar pacientes com peritonites se-
cundárias que são causadas por perfurações traumáticas ou afecções agudas do
trato gastrointestinal: eliminar a fonte causadora da contaminação peritoneal, re-
duzir o grau de contaminação bacteriana e tentar prevenir a recorrência da infec-
ção (Nathens).
A cavidade peritoneal não é um saco inerte como o seu nome induz a crer. É
um órgão desenvolvido e especializado que mantém a integridade das vísceras
intra-abdominais e oferece uma superfície onde as alças intestinais podem se
mover livremente, além de favorecer a reabsorção de secreções e combater bac-
térias, como demonstrado por Gravitz (Moss, Maddaus). O peritônio abriga uma
série de células importantes nas peritonites como os macrófagos que têm Fc e C3
receptores e secretam produtos fisiologicamente ativos como o fator
pró-coagulante, as prostaglandinas e o leucotrieno; além disso os eosinófilos e
basófilos que contêm mediadores histamínicos que produzem vasodilatação e

53
aumento da permeabilidade vascular. Havendo estímulo inflamatório aconte-
cem reações imediatas com liberação de histamina e prostaglandina, ocorrendo
vasodilatação e aumento da permeabilidade vascular seguida por exsudação de
grande quantidade de líquido rico em complemento, imunoglobulinas, fatores
de coagulação e fibrina.
Três mecanismos tentam limpar a cavidade peritoneal das bactérias: os lin-
fáticos diafragmáticos, os macrófagos peritoneais e o afluxo de neutrófilos. Com
a passagem das bactérias para a corrente sangüínea surgem os sinais clínicos, he-
modinâmicos e respiratórios da sepse.
Após controlar a fonte de contaminação peritoneal, a preocupação seguinte
é reduzir o líquido purulento, geralmente espesso, que pode se acumular entre as
alças formando verdadeiras lojas, assim como nos espaços subfrênicos, no fun-
do-de-saco de Douglas e nas goteiras parietocólicas. A lavagem abdominal deve
ser realizada com abundante quantidade de soro fisiológico (no mínimo quatro a
cinco litros), até se obter a limpeza completa da cavidade, chegando ao que
Hudspeth denomina desbridamento peritoneal radical. Durante algum tempo foi
proposto o uso de antibióticos no líquido de lavagem peritoneal, providência
abandonada após estudos randomizados não mostrarem vantagem de tal prática.
A terceira fase do tratamento das peritonites é tentar prevenir a recorrência da in-
fecção peritoneal através da drenagem cavitária com a utilização dos mais varia-
dos tipos de drenos, até as relaparotomias programadas ou de lavagem peritone-
al contínua que voltou a ser empregada nas pancreatites agudas graves como
proposto por Berger.
Vale ainda ressaltar que existem métodos especiais no tratamento das peri-
tonites como as lavagens (ou diálises) peritoneais contínuas, já citadas, as rela-
parotomias programadas ou “de necessidade”, e as laparotomias (peritoneosto-
mias) também programadas e “de necessidade”. As relaparotomias programadas
ou as “de necessidade” são realizadas após 48 ou 72 horas da operação inicial,
em situações nas quais a contaminação da cavidade abdominal não foi debelada
na primeira operação, para tentar impedir o ressurgimento da infecção peritone-
al ou quando há dúvidas na viabilidade de alguma víscera com por exemplo na
isquemia mesentérica, com o fim de remover o conteúdo tóxico abdominal antes
de aparecerem os sinais clínicos de sepse. São também conhecidas como second
look operations. As laparotomias ou peritoneostomias são utilizadas quando há
dificuldade de fechamento da parede abdominal por desproporção entre o conti-
nente e o conteúdo, e na peritonite difusa com manifestações sistêmicas de fa-
lência de um ou mais sistemas orgânicos. Após um período de emprego liberal,
na década de 80, as laparotomias tornaram-se um método de utilização restrita
no tratamento das peritonites. Podem ser realizadas com compressas, náilon, ou
telas de polipropileno, protegendo as alças intestinais contra o ressecamento,
aproximando-se as bordas da ferida com equipos de soro ou mesmo com sutura
com fio inabsorvível (Figs. 6.1 e 6.2). Na ocasião de revisão, quando se usa tela

54
Fig. 6.1 — Peritoneostomia. Proteção das alças intestinais com compressa e aproximação das
bordas da ferida com “pontos” de equipo de soro.

Fig. 6.2 — Peritoneostomia. Aproximação das bordas da ferida com pontos de náilon.

55
de polipropileno, o acesso à cavidade abdominal pode ser feito através da sua
secção tela com a posterior sutura da própria tela (Fig. 6.3), com uso de zíper
como descrito por Healderich ou o fechamento definitivo da parede. Já quando
se usa compressa com equipo de soro para aproximar as bordas da ferida, o fe-
chamento final pode ser com este material (Figs. 6.4 e 6.5). Deve ser relembrado
que o fechamento da parede abdominal após as laparostomias é seguido quase
sempre de alguma seqüela como evidenciam as Figs. 6.6 e 6.7. Além do mais, o
alto índice de mortalidade, que pode alcançar 50%, tornou-se mais um fator res-
tritivo ao seu emprego (Garcia-Sabrido).
O uso dos drenos abdominais continua a ser assunto de grande discussão e
polêmica entre os cirurgiões, pois os mesmos podem ser causa de erosões visce-
rais ou vasculares causando fístulas digestivas ou sangramento intracavitário,
assim como podem servir como fonte de infecção retrógrada. Na realidade, a
grande vantagem do uso de drenos é para esvaziar cavidades abscedadas bem
definidas permitindo uma drenagem satisfatória, ou para servir de escoamento
na lavagem peritoneal contínua. Recentemente esta técnica foi utilizada por Ber-
ger no tratamento das pancreatites agudas graves que apresentavam complica-
ções como abscessos residuais e fístulas digestivas. Consiste na introdução de
cerca de dois litros de soro por hora na cavidade peritoneal, em locais previa-
mente determinados na tentativa de remover todas as secreções. Exige um traba-

Fig. 6.3 — Peritoneostomia. Contenção visceral com tela de polipropileno que foi seccionada para
revisão e lavagem da cavidade peritoneal e posteriormente suturada.

56
Fig. 6.4 — Fechamento da parede após peritoneostomia com fio de náilon.

Fig. 6.5 — Fechamento da parede após peritoneostomia com equipos de soro.

57
Fig. 6.6 — Aspectos da parede abdominal após a cicatrização da peritoneostomia fechada com
equipo de soro.

Fig. 6.7 — Aspectos da parede abdominal após a cicatrização da peritoneostomia fechada com
equipo de soro.

58
lho intenso de enfermagem em Unidade de Terapia Intensiva, podendo acarretar
complicações sérias como a hipovolemia.
Os drenos são dispositivos utilizados para escoamento de fluidos (sangue,
pus, secreções diversas e ar) originadas por várias afecções ou por procedimen-
tos cirúrgicos, evitando o seu acúmulo e as complicações decorrentes do mesmo.
Servem ainda para a realização de estudos diagnósticos (injeção de contras-
te-fistulografia) e terapêuticos (lavagem da cavidade e instilação de antibióti-
cos).
Desde os tempos de Hipócrates, o emprego dos drenos era indicado para o
tratamento dos empiemas. A evolução das drenagens cirúrgicas está relacionada
com a criatividade dos cirurgiões e também com o avanço tecnológico dos mate-
riais com os quais são confeccionados os drenos.
Os tubos de borracha foram introduzidos por Chassaignac em 1859. O deno-
minado “dreno em cigarrete” constituído por um tubo fino de borracha com gaze
em seu interior foi idealizado por Kehrer em 1882. Kellog, em 1882, criou o pre-
cursor do dreno de dois tubos, e em 1898 Heaton apresentou a drenagem aspira-
tiva (Yates).
Até hoje, mesmo com o aprimoramento dos materiais, os novos modelos de
drenos e a metodologia científica utilizada, ainda existem controvérsias sobre as
indicações das drenagens, principalmente da cavidade abdominal.

INDICAÇÕES
A drenagem tem por finalidade favorecer a saída de líquidos e/ou secreções
por capilaridade, gravidade ou aspiração. Quanto à função, os drenos podem ser
profiláticos ou preventivos e curativos, únicos ou múltiplos segundo o número
de drenos utilizados.
Apesar da controvérsia existente e do aforisma de Tait (1887): “quando em
dúvida drenar”, existem situações nas quais parece haver um consenso entre os
cirurgiões sobre a necessidade do uso de dreno. São elas:
— coleções purulentas, bloqueadas com a cavidade ou loja bem definida.
— anastomoses ou suturas do tubo digestivo consideradas como de “alto
risco” (tensão na linha de sutura, infecção, ausência de serosa no órgão
— esôfago, reto — e irrigação deficiente);
— grandes descolamentos que propiciem acúmulo de secreção se-
ro-hemática, biliar ou digestiva;
— desbridamentos incompletos nas operações de trauma;
— hemostasia deficiente;
— diminuição de “espaço morto”.
Deve ser enfatizado que se não existe unanimidade quanto ao uso da drena-
gem profilática, a aceitação da drenagem curativa é mais uniforme como vere-
mos a seguir.

59
DRENAGEM PROFILÁTICA

A vascularização segmentar, a ausência de serosa e a dificuldade técnica fa-


zem com que as anastomoses e suturas do esôfago sejam consideradas de maior
risco de deiscência, sendo para alguns indicação formal de drenagem profilática.
A secção duodenal com fechamento do coto tecnicamente insatisfatório está in-
cluída na mesma indicação anterior.
É de emprego disseminado a drenagem preventiva da cavidade abdominal
nas operações das vias biliares quando há exploração e abertura do colédoco. No
entanto, nas colecistectomias, embora possa ocorrer pequena lesão de canalícu-
los biliares do leito hepático, com extravasamento de secreção biliar, a drena-
gem utilizada visando evitar peritonite biliar é motivo de discussão (Fava). Com
relação ao pâncreas, devido à peritonite pancreática ser uma complicação de mai-
or gravidade do que uma fístula externa, a tendência da grande parte dos autores
é a drenagem.
Com o emprego crescente das operações conservadoras do baço como as su-
turas do órgão e as ressecções segmentares, a drenagem subfrênica passou a ser
utilizada. Já na esplenectomia total, o uso de drenos ainda encontra divergências.
A tendência atual é de não se drenar a cavidade abdominal após anastomo-
ses digestivas, a não ser nas situações citadas anteriormente, ou em casos de ur-
gência, desnutrição, imunodepressão e infecção. Nunca é demais lembrar que se
as condições locais são adversas, não se deve realizar uma anastomose e confiar
no dreno, pois ele não previne o surgimento de complicações, apenas favorece o
diagnóstico precoce das mesmas.

DRENAGEM CURATIVA

A ocorrência de peritonites localizadas de qualquer etiologia, a presença de


coleções subfrênicas, nas goteiras parietocólicas e na pelve, constituem as prin-
cipais indicações para o emprego de drenagem curativa, uma vez que sua locali-
zação tenha sido confirmada com precisão. Nas peritonites disseminadas é im-
possível a drenagem de toda a cavidade abdominal tanto do ponto de vista anatô-
mico como funcional devido às diferentes áreas de declive e aos movimentos
dos líquidos pela ação da pressão intracavitária, e da função frenodiafragmática.
Além do mais ocorre um encapsulamento e bloqueio ao redor do dreno, e não se
pode prever os locais mais prováveis do acúmulo de líquido.

TIPOS DE DRENOS

Diversos tipos de drenos foram idealizados e abandonados. Considera-se


que os drenos devem ser flácidos, lisos, não devem causar irritação aos tecidos,
ser estáveis ou seja, não sofrer alterações com a umidade e temperatura nem com

60
líquidos orgânicos, e ter a capacidade reduzida de formar coágulos ou rolhas de
material protéico em seu interior. Com a intenção de evitar estas complicações
estão sendo pesquisados os drenos de PVC impregnados com uroquinase (Sugi-
tachi). Na seqüência serão descritos vários tipos de drenos, como funcionam,
sua utilidade e desvantagens.

Drenos Filiformes
São constituídos por um feixe de fios cirúrgicos inabsorvíveis. Drenam por
capilaridade de seus fios, são usados em áreas muito pequenas e com coleções lí-
quidas, e por isso têm pouca utilidade.

Drenos de Gaze
Estão em desuso nos dias atuais. Eventualmente são empregados como cu-
rativos de feridas cutâneas deixadas abertas para cicatrização por segunda inten-
ção como nas operações de ressecção ou marsupialização de cisto sacrococcí-
geo, ou ainda para tamponamento de hemorragias intra-abdominais
não-controladas por outros métodos, e nas peritoneostomias realizadas nos ca-
sos de pancreatite aguda.

Drenos de Penrose
São constituídos por um tubo de borracha bastante maleável, que com as pa-
redes colabadas forma uma lâmina dupla e atua por capilaridade. Além de serem
os mais comumente usados pelos cirurgiões, é comum o emprego de artifícios
com a colocação de gaze ou de um dreno tubular fino em seu interior com o intuito
de melhorar seu desempenho, formando o chamado dreno combinado. Têm
como desvantagem o estrangulamento parcial no orifício de saída pela musculatu-
ra da parede abdominal o que dificulta sua função. Outra manobra com finalidade
de tornar a drenagem mais eficaz é o uso de vários drenos de Penrose amarrados
entre si, conhecido com dreno de Hager (Parra).

Drenos Tubulares
Seu funcionamento dá-se por gravidade ou pressão. São constituídos de bor-
racha com rigidez mínima para que não haja colabamento das paredes pela com-
pressão dos tecidos. Têm as vantagens de permitir a introdução de substâncias
terapêuticas ou contraste, a instalação de aspiração e não serem deformados pelo
orifício de saída na parede abdominal. Por outro lado apresentam inconveniên-
cias como a erosão dos tecidos vizinhos (necrose por pressão) levando à forma-

61
ção de fístulas digestivas ou à ocorrência de hemorragias e além do mais drenam
uma área muito restrita. Neste grupo também estão incluídos os drenos conheci-
dos como “calhados”, fruto da criatividade dos cirurgiões que às vezes não dis-
põem do dreno ideal, mas que satisfaz plenamente à sua proposta. São construí-
dos por três ou quatro segmentos de um tubo de polietileno (equipo de soro),
abertos longitudinalmente e amarrados entre si em uma das extremidades for-
mando um feixe. Funcionam por capilaridade, são mais maleáveis do que os dre-
nos tubulares, podem drenar uma área maior e não são pinçados pelo orifício
muscular da parede abdominal. Fazem ainda parte deste grupo os diferentes ti-
pos de cateteres como Pezzer, Malecot, Nelaton e Kehr, usados principalmente
para drenagem visceral (bexiga, rins, vias biliares).

Drenos Bitubulares
Também conhecidos como sump drain, derivam de uma combinação de um
dreno tubular com outro de menor calibre que passa pelo seu interior (respiro).
São utilizados quando se necessita de aspiração no local drenado pois o respiro
deixa passar o ar na área de drenagem, impedindo o vácuo e a oclusão dos orifí-
cios do tubo maior pela aspiração. Estes tipos de drenos permitem a lavagem
contínua do foco a ser drenado.

Drenos Ativos

Conhecidos como sistemas de aspiração fechado, são formados por drenos


tubulares multiperfurados acoplados a aspiradores de plástico sanfonados. São
utilizados com freqüência crescente, principalmente na prevenção de coleções
como nos grandes descolamentos do subcutâneo, operações das glândulas ma-
márias, dermolipectomias, tiroidectomias e em locais com fechamento herméti-
co da cavidade drenada.

MECANISMOS DE FUNCIONAMENTO DOS DRENOS


O funcionamento de um dreno está relacionado com as forças motrizes que
interferem na eliminação das secreções, com a sua própria capacidade de capta-
ção das secreções e de transportar essa secreção para o meio exterior.
Existem três mecanismos que agem na eliminação das secreções: gravidade,
capilaridade e pressão dos tecidos vizinhos que poderão ser auxiliados por aspi-
ração ativa tornando a drenagem mais eficiente.

PRINCÍPIOS TÉCNICOS
Na prática da drenagem devem ser seguidos alguns princípios técnicos com
a finalidade de diminuir a morbidez e as complicações. Em primeiro lugar o ori-
fício de saída do dreno deve ficar localizado na porção de maior declive, prefe-

62
rencialmente nos flancos (no caso de drenagem abdominal). Não deve ser exterio-
rizado pela incisão cirúrgica, pois facilita a ocorrência de contaminação da feri-
da operatória e predispõe à deiscência da parede podendo, conseqüentemente,
haver mais tarde a formação de uma hérnia incisional. O trajeto entre a área dre-
nada e a saída do dreno deve ser o mais curto possível evitando tortuosidades e
prejuízo da sua função. O orifício de saída deve ser amplo o suficiente para evi-
tar o estrangulamento do dreno que deve ser fixado à parede com pontos ou alfi-
nete de pressão (segurança). A mobilização dos drenos deve ser realizada o mais
precocemente possível e sua retirada está condicionada às finalidades para as
quais foi utilizado, ou seja, quando diminui ou cede a saída de líquidos, ou quan-
do o risco de complicações foi ultrapassado. Esta retirada deve ser progressiva
exceto nas drenagens urológicas quando sua remoção é feita de uma só vez. Não
podemos esquecer que outros fatores como os curativos cuidadosos no pós-ope-
ratório e a proteção da pele em torno dos orifícios de saída dos drenos são de
grande relevância no sentido do bom funcionamento dos mesmos e da diminui-
ção da morbidez.

COMPLICAÇÕES

As complicações decorrentes do uso dos drenos estão relacionadas a proble-


mas técnicos, aos próprios drenos e aos cuidados dispensados aos mesmos no
pós-operatório. Embora a incidência de complicações seja irrelevante, a maioria
pode ser evitada e serve para alertar e enfatizar que o emprego de drenos não
deve ser encarado como substituto da técnica cirúrgica correta, e sim como com-
plementação que eventualmente apresenta grande importância nas indicações
anteriormente citadas.
A hemorragia por lesão vascular da parede no orifício de saída do dreno
pode passar despercebida e ser causa de hemoperitônio no pós-operatório ime-
diato de um procedimento abdominal. A construção de um orifício de saída ex-
tremamente largo pode ocasionar evisceração ou mais tardiamente a ocorrência
de uma hérnia incisional.
A infecção ascendente é uma das complicações que mais interfere na indi-
cação da drenagem da cavidade abdominal, principalmente quando o dreno é
exteriorizado através da própria incisão cirúgica ou muito próximo a estomas,
ainda mais quando não são observados os devidos cuidados de assepsia duran-
te os curativos.
A erosão de alças ou vasos intra-abdominais pode ocorrer no caso dos dre-
nos tubulares de borracha rígida, levando a fístulas digestivas e/ou hemorragias.
Além de atuarem como corpos estranhos pela reação inflamatória, os drenos têm
sido responsabilizados pela maior formação de aderências o que propiciaria mai-
or índice de obstrução intestinal. A migração do dreno para o interior da cavida-
de abdominal pode acontecer quando sua fixação parietal for deficiente.

63
A permanência do dreno por tempo prolongado dificulta o fechamento das
fístulas digestivas no pós-operatório. Após 10 a 12 dias de drenagem, mesmo com
saída de secreção digestiva, o dreno deve ser removido pois seu trajeto já está for-
mado e orientado para o exterior. Por outro lado, a retirada precoce ou a saída aci-
dental do dreno na presença de uma fístula digestiva pode fazer com que haja o fe-
chamento do trajeto e ocorra a formação de uma coleção intracavitária.
Finalmente, nunca é demais enfatizar que a colocação e a escolha de um dre-
no devem ser resultantes de um julgamento criterioso e experiente, com conhe-
cimento dos princípios básicos das drenagens.

BIBLIOGRAFIA
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64
7 Drenagem Torácica

Roberto Saad Júnior


Marcio Botter

INTRODUÇÃO

O aumento da incidência dos traumatismos torácicos20,27, bem como a melho-


ria dos serviços médico-hospitalares e dos meios diagnósticos nas doenças pleuro-
pulmonares fazem com que a drenagem da cavidade pleural seja um dos procedi-
mentos cirúrgicos mais executados atualmente pelos serviços de cirurgia.
Pela elevada freqüência e simplicidade na sua execução, a drenagem pleural
muitas vezes é negligenciada e, por esse motivo, acaba apresentando índices de
complicação desproporcionais a esta simplicidade, o que revela desconheci-
mento de princípios de fisiologia respiratória, da técnica cirúrgica e dos cuida-
dos na manutenção do sistema pelas equipes médicas e de enfermagem.
Assim, na tentativa de esclarecer as possíveis dúvidas em relação ao assun-
to, analisaremos aqui os aspectos técnicos e funcionais, as principais indicações
e as complicações de drenagem torácica fechada, com e sem aspiração contínua
da cavidade.

SISTEMA DE DRENAGEM

O mecanismo ventilatório é bem conhecido: na inspiração há, grosso modo,


ampliação do volume da caixa torácica pelo abaixamento do diafragma e eleva-
ção dos arcos costais pela musculatura respiratória acessória. A pressão intrapleu-
ral, diminui, tornando-se menor que a pressão atmosférica, de modo que o ar flui
pelas vias aéreas para o interior dos pulmões. Na expiração ocorre o inverso, ou
seja, o diafragma sobe e os arcos costais descem, diminuindo o volume da caixa
torácica; a pressão intrapleural aumenta, torna-se maior que a pressão atmosféri-
ca e o ar, agora com maior conteúdo de CO2, sai dos pulmões para o ambiente
externo.

65
Estes princípios são observados no funcionamento dos sistemas de drena-
gem torácica, que se constituem, basicamente, em quatro partes: o dreno, propri-
amente dito, um conector, uma extensão intermediária e um frasco coletor28.
Os drenos atualmente utilizados são tubulares, multiperfurados e siliconiza-
dos, mas semi-rígidos, com múltiplos orifícios em uma das extremidades. Seu
calibre varia de 6 a 26 French (2 a 6 mm no diâmetro interno) para uso pediátrico
e de 20 a 40 French (5 a 11 mm) para adultos.
O conector é uma peça tubular que une o dreno à extensão. Deve ser prefe-
rencialmente de material transparente e com o mesmo diâmetro interno do res-
tante do sistema. A extensão intermediária é outra peça tubular, em geral de
plástico ou látex, que une o frasco coletor ao resto do sistema e deve igualmente
permitir a visualização do seu conteúdo. A equação de Poiseuille12, mostra que o
fluxo de gases através de um tubo é proporcional ao raio do tubo e inversamente
proporcional ao seu comprimento. Assim é recomendável que a extensão seja a
mais curta possível e que apresente um diâmetro também compatível com o res-
to do sistema.
Equação de Poiseuille
V = P π r4/ 8 ι v
(V = velocidade de fluxo; P = pressão de saída do gás; r = raio interno do
tubo; l = comprimento do tubo; v = viscosidade)
O frasco coletor, de plástico ou vidro, é graduado, para permitir o controle
do aspecto e o volume drenado. Comunica-se com o meio externo através dos
respiros, que permitem a saída de ar do interior do frasco e com o restante do sis-
tema através do tubo longo, do qual uma extremidade conecta-se à extensão e a
outra projeta-se no interior do frasco, mergulhando 2cm dentro de uma coluna lí-
quida, o selo d’água, que funciona como válvula, impedindo o refluxo do conteú-
do do frasco ao interior da cavidade.
Para que isso aconteça, a pressão intrapleural deve ser aumentada em 2cm
de água, nível facilmente atingível durante a expiração, fala, tosse etc., para fa-
zer com que a coluna de água baixe 2cm na porção submersa do tubo, vencendo
a resistência da coluna líquida e permitindo o escoamento do conteúdo da cavi-
dade. Durante a inspiração, mesmo profunda, a pressão intrapleural é insuficien-
te para aspirar de volta à cavidade o conteúdo do frasco, que deve permanecer
sempre num nível mais baixo do que o do tórax do doente de modo que, dessa
maneira, cria-se uma válvula que permite a saída do conteúdo e impede o retorno
do mesmo à cavidade e o pulmão, desde que sadio, se expande progressivamen-
te3,25,26.
Em algumas situações a expansão pulmonar não é adequada, apesar da pre-
sença do dreno, o que pode se dever a diversos fatores, como o encarceramento
pulmonar, por exemplo. Nestes casos, pode-se lançar mão da aspiração contí-
nua da cavidade pleural, que consiste em, através de um frasco regulador, criar

66
uma pressão “negativa” no interior da cavidade, facilitando a expansão do pul-
mão12,25.

INDICAÇÕES E CONTRA-INDICAÇÕES

A inserção de um dreno na cavidade pleural está indicada sempre que hou-


ver a presença de coleção aérea ou líquida no seu interior que não possa ou não
deva ser tratada por toracocentese ou observação clínica, isto é, quando a etiolo-
gia do problema persistir, mantendo ou levando ao aumento do volume da cole-
ção apesar do tratamento clínico. As principais indicações de drenagem pleural
estão relacionadas na Tabela 7.1.
No trauma de tórax, a drenagem está indicada, sempre que houver hemotó-
rax, pneumotórax ou hemopneumotórax, mesmo de pequeno volume, desde que
sintomáticos ou progressivos ao exame radiológico. Quando volumosos, como
acontece no hemotórax médio (350 a 1.500ml), ou grande (acima de 1.500ml)
ou no pneumotórax que ocupa mais de 1/3 da cavidade, a drenagem é indicada
em qualquer situação27. Nos doentes com trauma torácico que se encontram em
situação de risco, como hemotórax maciço, pneumotórax hipertensivo ou aberto
etc., é impossível a realização de exames radiológicos devido às más condições
hemodinâmicas ou respiratórias. Nestes casos estará também indicada a drena-
gem torácica, pelo menos como parte do tratamento inicial27.

Tabela 7.1
Indicações de Drenagem Torácica

1. Trauma torácico

}
• Pnt pequeno (até 1/3 da cavidade)
• Hmt pequeno (até 350 ml) sintomáticos ou progressivos ao RX
• Hpnt pequeno

• Pnt, hmt ou hpnt médio ou grande


• Doente in extremis, com sinais de trauma torácico
2. Pnt, hmt ou hpnt espontâneos ou iatrogênicos — igual aos traumáticos
3. Derrame pleural neoplásico sintomático ou recidivante
4. Empiema pleural — fase aguda ou subaguda
5. Quilotórax
6. Pós-procedimento cirúrgico com abertura da pleura.
Pnt = pneumotórax; hmt = hemotórax; hmpt = hemopneumotórax.

67
O pneumotórax espontâneo ou o iatrogênico segue as mesmas considera-
ções do traumático quanto às indicações de drenagem. Atenção especial deve ser
dada ao doente que desenvolve barotrauma quando submetido a ventilação me-
cânica com uso de pressão expiratória final positiva (PEEP), devido ao grande
risco destes desenvolverem pneumotórax hipertensivo. Tais doentes devem ser
submetidos a drenagem logo que estabelecido o diagnóstico.
A drenagem torácica é indicada nos derrames pleurais de natureza neoplási-
ca, especialmente se sintomáticos ou recorrentes, quando se faz necessária a pleu-
rodese. O quilotórax também deve ser sempre inicialmente tratado através da
drenagem do tórax, associado a medidas dietéticas.
O empiema pleural tem indicação de tratamento cirúrgico assim que diag-
nosticado e, inicialmente, o tratamento de escolha é a drenagem fechada, especi-
almente nas fases aguda e subaguda, seja a coleção septada ou livre na cavidade
torácica.
Finalmente, após todo procedimento cirúrgico em que há abertura da pleura,
a cavidade torácica deve ser drenada para permitir a adequada reexpansão pul-
monar e o escoamento de pequena quantidade de sangue ou líquido aí coletada.
Não há contra-indicações absolutas à drenagem torácica. As contra-indi-
cações relativas referem-se àquelas condições em que o doente pode ser tratado
através de medidas conservadoras e menos agressivas.
É o caso do pneumotórax pequeno (ocupa no máximo 1/3 da cavidade) e do
hemotórax pequeno (menor que 350ml), desde que assintomáticos e não pro-
gressivos, já que estes podem ser esvaziados por punção1 ou mesmo observados
clinicamente, associados ou não a antibióticos profiláticos26.
Os derrames pleurais inflamatórios (parapneumônicos, tuberculosos, reu-
máticos) podem ser tratados por toracocentese e terapêutica específicas. As co-
leções multisseptadas geralmente requerem toracotomia ou videotoracoscopia,
sendo dificilmente tratadas de modo adequado através de um único dreno inseri-
do na cavidade pleural. O hidrotórax devido à ascite deve ser tratado, na medida
do possível, por punção e medidas específicas, devido à grande expoliação pro-
téica e eletrolítica por perda líquida através do dreno torácico12,24. Finalmente, é
também controversa a indicação de drenagem “profilática” de doentes que apre-
sentam enfisema subcutâneo ou daqueles sabidamente portadores de enfisema
bolhoso, que serão submetidos a ventilação mecânica ou anestesia geral. Nestes
casos, a observação clínica rigorosa durante a ventilação mecânica pode tornar
desnecessária a drenagem.

TÉCNICA CIRÚRGICA

O local onde será introduzido o dreno é determinado pela natureza do mate-


rial a ser drenado e seu estado no interior da cavidade, se livre ou septado.
Assim, o pneumotórax espontâneo pode ser drenado no 2º espaço intercostal, na

68
linha hemiclavicular e com tubo fino, como uma sonda de Folley26, ou com o
uso de cateteres percutâneos23 30. Uma coleção septada deve ter o local de drena-
gem determinada previamente através de exames radiológicos ou ul-
tra-sonográficos e deve ser usado dreno calibroso. Coleções líquidas ou com ní-
vel hidroaéreo livres na cavidade devem ser drenadas com tubo calibroso e, pre-
ferencialmente, no 5º ou 6º espaços intercostais, na linha axilar média, pois na
expiração profunda, o diafragma pode subir até a altura do 4º espaço intercostal.
Para a introdução do dreno, o doente é colocado na posição sentada, ou, se
seu estado clínico permitir, em decúbito lateral. É realizada, após anestesia, uma
incisão de cerca de 2cm de extensão, paralela aos arcos costais, no nível da borda
superior do arco costal inferior no espaço selecionado para a drenagem. Cria-se
um túnel subcutâneo através de dissecção romba de todos os planos até a pleura
parietal, que é então aberta. É então realizada a exploração digital do interior do
tórax com o objetivo de observar a presença de eventuais aderências pleuroplu-
monares e desfazê-las, se possível.
Com o auxílio de uma pinça tipo Kelly ou Rochester, o dreno é introduzido
no interior da cavidade e direcionado ao ápice e para trás, tomando posição pós-
tero-superior, o que favorece tanto a drenagem de líquido como de ar. O dreno é
conectado ao sistema, sendo que, nesse momento, deve ser observada a oscila-
ção da coluna líquida no interior da extensão do frasco coletor. A ausência de os-
cilação é um indicativo de dreno dobrado ou fora da cavidade pleural! O dreno é
fixado à pele com ponto em “U” (fio inabsorvível), interessando pele e subcutâ-
neo, abraçando o dreno sem transfixá-lo. É dado um nó frouxo e o fio é trançado
ao redor do tubo à moda de “bailarina”. Caso a incisão da pele tenha permaneci-
do parcialmente aberta, a mesma deverá ser adequadamente suturada para impe-
dir a entrada de ar no interior da cavidade. É feito um curativo oclusivo ao redor
do orifício cutâneo e, a seguir, o dreno é fixado à pele através de faixas largas de
fita adesiva, para impedir o seu deslocamento. As conexões do sistema devem
ser também fixadas com fita adesiva para impedir deslocamentos acidentais. Na
Tabela 7.2 há um roteiro prático para realização da denagem e retirada do dreno.
A retirada do dreno deve também obedecer a alguns princípios técnicos.
Após a retirada das fixações e curativos, afrouxa-se o nó previamente dado e so-
licita-se ao doente que expire profundamente, para aumentar a pressão intrapleu-
ral, impedindo a entrada de ar na cavidade durante a retirada do dreno. Após sua
retirada o nó é novamente apertado, fechando o orifício cutâneo e é então reali-
zado curativo oclusivo9.
O dreno poderá ser retirado, basicamente, em duas situações distintas:
— dreno obstruído, que não se consegue desobstruir: o doente é redrenado,
se necessário;
— dreno que cumpriu sua função inicial, na ausência de borbulhamento,
com baixo débito (< 100mL / 24 horas) e com boa expansão pulmonar.

69
Tabela 7.2
Roteiro da Técnica de Drenagem e Retirada do Dreno

Drenagem

1. Doente na posição sentada ou em decúbito lateral.


2. Bloqueio anestésico no local escolhido para inserção do dreno.
3. Incisão cutânea de 2cm de extensão, paralela aos arcos costais e no nível da
borda superior da costela inferior.
4. Realizar hemostasia cuidadosa.
5. Divulsão romba dos planos subcutâneos e perfuração da pleura parietal.
6. Exploração digital do interior da cavidade: procurar sentir a presença de aderên-
cias pleurais e desfazê-las; na suspeita de ferimento toracoabdominal, procurar
palpar vísceras abdominais ou lesão no diafragma.
7. Introduzir o dreno na cavidade para cima e posteriormente.
8. Conectar o dreno ao sistema. Obrigatoriamente deverá ocorrer oscilação da co-
luna líquida. O contrário indica erro na drenagem.
9. Fixar dreno, sem perfurá-lo, com ponto em “U” de fio inabsorvível e resistente
(mononáilon 2.0, por exemplo).
10. É dado um nó e confeccionada bailarina, amarrando o fio apenas na última vol-
ta Uma fixação afrouxada pode significar escape do dreno e morte do doente.
11. Fechamento rigoroso da incisão cutânea.
12. Curativo oclusivo.
13. Fixação do dreno à pele com fita adesiva.
14. Fixação das conexões com fita adesiva.
15. Não são necessários raios X de tórax no pós-operatório imediato desde que o
dreno esteja funcionante e com oscilação da coluna líquida.
Retirada do dreno

1. Desfazer todas as fixações com fita adesiva.


2. Cortar a amarração e desfazer a bailarina, mantendo o fio tracionado para impe-
dir a entrada de ar na cavidade pleural.
3. Solicitar ao doente que expire prolongadamente para aumentar a pressão intra-
pleural.
4. Retirar rapidamente o dreno.
5. Amarrar o fio, selando a cavidade.
6. Curativo oclusivo por 24 horas.

70
Um dreno torácico deve permanecer o menor tempo possível no interior da
cavidade, para que seu aproveitamento seja máximo. Deve-se ter sempre em
mente que o dreno é inserido na cavidade para cumprir uma determinada função.
Uma vez executada, ele passa a ser não só desnecessário, mas indesejável.

COMPLICAÇÕES

As complicações da drenagem de tórax estão, quase sempre, relacionadas a


erro diagnóstico ou de técnica cirúrgica. Apesar de potencialmente fatais, em ge-
ral apresentam evolução favorável, embora relacionem-se a aumento de morbi-
dade, tempo de internação e custos hospitalares11,12,14,19,21,26,28.

Complicações Relacionadas ao Diagnóstico

As principais situações que podem causar dúvida diagnóstica são as hérnias


diafragmáticas traumáticas onde, em geral, o doente é vítima de trauma abdo-
minal fechado, chegando ao pronto-socorro com dispnéia e diminuição da aus-
culta pulmonar, além de poder apresentar velamento de um hemitórax e presen-
ça de nível hidroaéreo ao RX de tórax, simulando um hemopneumotórax; as ate-
lectasias, especialmente se total de um pulmão, podem simular um grande derra-
me pleural; os derrames encistados podem levar a erro quanto ao local de drena-
gem se não previamente pesquisados; as grandes bolhas enfisematosas podem
simular até mesmo um pneumotórax hipertensivo.
Em todos estes casos, deve prevalecer a história clínica e o exame físico do
doente, que na maioria das vezes não é compatível com situações em que a dre-
nagem torácica é indicada. Em caso de dúvida diagnóstica, todos os exames ne-
cessários, como broncoscopia, exame radiológico contrastado de estômago e
duodeno, enema opaco, ultra-sonografia e tomografia torácicas, além de punção
de derrames encistados, devem ser realizados2,4,27.

Complicações Relacionadas à Técnica Cirúrgica

Em relação ao dreno, as principais complicações são a sua obstrução por


coágulos ou fibrina, por ser de fino calibre, ou seu colapso por compressão das
costelas. O uso de drenos calibrosos, rígidos e siliconizados, minimiza estes pro-
blemas.
Muitas vezes o dreno não oscila após a drenagem e isto é interpretado como
obstrução por coágulos. No entanto, não é raro que o dreno esteja dobrado no in-
terior da cavidade pleural, ou mesmo que tenha sido inserido na cavidade abdo-
minal ou então no tecido subcutâneo do tórax. Já foram descritas lesões do dia-
fragma, coração, pulmão, estômago, fígado e baço durante a introdução do dre-

71
no12,14,19,21,26,28. Todas estas complicações podem ser evitadas pela simples ex-
ploração digital da cavidade antes de se introduzir o dreno4,15,18.
A incisão da pele em local e tamanho adequados previne a entrada de ar na
cavidade e lesões do feixe vásculo-nervoso intercostal, uma vez que o mesmo
localiza-se abaixo e posteriormente à borda inferior das costelas. Em doentes
idosos o cuidado deve ser redobrado, devido à tortuosidade acentuada dos va-
sos5,8,16.
Quanto à fixação do dreno, deve-se evitar tanto a transfixação do dreno pela
agulha de sutura como a permanência de algum orifício do dreno no subcutâneo
ou mesmo no meio externo, pois ambas as situações propiciam a entrada de ar na
cavidade, dificultando a expansão pulmonar e causando insuficiência respirató-
ria em alguns casos.
Outro cuidado importante a ser tomado é com relação ao transporte dos do-
entes do centro cirúrgico à UTI ou à enfermaria. Deve-se procurar não fechar o
dreno, especialmente se este estiver borbulhando, devido ao risco de se desen-
volver pneumotórax hipertensivo, com risco de desvio do mediastino e morte do
doente.
Quanto à retirada do dreno, o erro mais comum é pedir ao doente que inspire
nesse momento, ao invés de expirar, o que gera pressão negativa e permite a en-
trada de ar na cavidade. A não-oclusão da ferida após a retirada do dreno tam-
bém pode favorecer a entrada de ar e persistência de pneumotórax.

Complicações Relacionadas ao Sistema de Drenagem

Uma situação freqüentemente observada na prática clínica é a persistência


do borbulhamento no frasco coletor durante vários dias após uma drenagem de
tórax. Apesar da hipótese de fístula aérea ser possível, verifica-se que esta ocor-
re muito raramente, sendo que na maioria dos casos, o que realmente acontece é
a entrada de ar no espaço pleural por alguma falha no sistema. Assim, diante de
uma situação como esta, é prudente verificar exaustivamente o curativo, o orifí-
cio cutâneo e todas as conexões antes de se indicar uma toracotomia por suspeita
de fístula aérea.
O uso de conexões de fino calibre ou extensões intermediárias muito longas
dificulta o escoamento do material drenado. A drenagem é igualmente dificulta-
da pela altura da coluna líquida no frasco coletor. Não é raro que o frasco não
seja esvaziado constantemente, de tal forma que o débito drenado soma-se à co-
luna líquida. Assim, para que haja a saída do material da cavidade para o frasco,
será preciso vencer uma resistência cada vez maior, de 5, 10, até 20cm de água.
Tais situações podem ser contornadas com o uso de materiais adequados e esva-
ziamento do líquido do frasco, ou mesmo interpor um outro frasco coletor entre
o dreno e o selo d’água, se necessário. As situações clínicas mais freqüentemen-
te encontradas na drenagem pleural estão relacionadas na Tabela 7.3.

72
Todo o aparato de drenagem é, na realidade, um sistema de vasos comuni-
cantes. Assim, o frasco coletor deve permanecer sempre num nível mais baixo
do que o do tórax do doente para que o fluxo no sistema se oriente do doente para
o frasco. Caso contrário, haverá dificuldade de drenagem ou mesmo infecção pleu-
ral por refluxo. Este erro só pode ser evitado através de boa orientação, especial-
mente da equipe de enfermagem.
Outro erro que pode levar a complicações sérias é o uso de aspiração do
sistema sem que seja interposto o frasco regulador, gerando uma pressão cada
vez mais negativa no interior da cavidade, o que pode provocar a aspiração de
segmentos periféricos do pulmão, com conseqüente necrose dos mesmos, com
risco de aparecimento de fístulas aéreas e infecção pleural11,20.

Outras Complicações

Uma complicação rara, porém freqüentemente fatal, é o edema pulmonar de


expansão rápida7,21,29, que ocorre em doentes que permanecem com o pulmão
colapsado por tempo prolongado. Nestes casos, parece haver uma redução gra-
dual da produção de surfactante. Uma vez drenado e, principalmente, se instala-
Tabela 7.3
Situações Clínicas mais Comuns na Drenagem Torácica
Situação Causas Conduta
• Dreno pára de oscilar • Dreno dobrado • Verificar sistema
logo após sua inserção • Dreno obstruído • Aspirar dreno com
(coágulos, fibrina) cateter de aspiração
• Dreno no abdome • Redrenar, se necessário
• Sistema fechado
(clampeado)
• Débito diminui • Dreno obstruído • Verificar sistema
gradualmente mas • Intermediário, longo ou • Aspirar dreno com
imagem radiológica estreito cateter de aspiração
persiste • Frasco cheio (coluna • Propedêutica armada —
d’água > 2cm) RX, USG, tomografia etc.
• Erro diagnóstico • Redrenar, se necessário
• VATS, toracotomia
• Borbulhamento • Orifício cutâneo • Verificar sistema
persistente alargado • Videotoracoscopia
• Verificar sistema toracotomia
• Conexões mal
adaptadas
• Defeito no frasco coletor
• Fístula aérea
• Orifício do dreno no
subcutâneo ou fora do
tórax

73
da aspiração da cavidade sob alta pressão, há rápida expansão pulmonar com
extravasamento de líquido para o interstício e sacos alveolares, levando a edema
pulmonar. Tal complicação pode ser evitada se não se usar aspiração contínua
com elevada pressão de aspiração em doentes com derrames ou pneumotórax de
longa evolução.
As complicações infecciosas decorrentes da drenagem torácica apresentam
uma incidência que varia de 2% a 25%5,10,27. A maior parte dos autores tem de-
monstrado que a infecção relaciona-se principalmente a falha do tratamento (re-
tardo do diagnóstico, evacuação incompleta da cavidade e retenção de coágulos
na cavidade, múltiplas manipulações do dreno e permanência do dreno por pe-
ríodo prolongado) ou à presença de traumatismos associados (lesão diafragmáti-
ca e de vísceras abdominais, contusão pulmonar) e uso de ventilação
mecânica6,10,14,16,21,22. Apesar de existir ainda controvérsia não se tem recomen-
dado o uso de antibioticoterapia profilática na drenagem torácica, desde que sem
traumas associados e que a drenagem seja satisfatória5,10,13,17,22.
A drenagem de tórax, como dissemos no começo, é um procedimento sim-
ples, que não requer nenhum recurso tecnológico na sua execução. Em cerca de
20% dos casos, no entanto, complicações perfeitamente evitáveis e, em geral, re-
lacionadas a descuido em alguns de seus princípios básicos5 geram aumento da
morbidade do procedimento.
Uma vez realizada, o dreno deve permanecer na cavidade pleural o tempo
exato para que execute a função à qual se destina, o que, com adequados cuida-
dos de enfermagem e de manutenção do sistema de drenagem, propicia um me-
nor tempo de internação do doente e redução dos custos hospitalares.

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75
Fechamento da Parede
8 Abdominal

Luiz Alberto Soares


Nelson Fontana Margarido

INTRODUÇÃO

Preocupar-se com a técnica cirúrgica do fechamento da parede abdominal


frente a toda evolução da cirurgia ocorrida nas últimas décadas parece no míni-
mo uma atitude anacrônica. Entretanto, estudo realizado com referência às deis-
cências das feridas da parede abdominal após 1984, com 18.133 incisões, conti-
nua mostrando incidência de 1,2%, associada a alta taxa de mortalidade de 25%
(Carlson, 1997). Estes resultados são semelhantes aos estudos de Poole (1985)
envolvendo 320.000 incisões no período de 1950 a 1984.
Esses estudos referem-se a falha aguda na cicatrização da ferida abdominal
ou deiscência da ferida operatória com evisceração ou eventração, sendo esta úl-
tima caracterizada pela separação das camadas músculo-aponeuróticas. A deis-
cência da parede abdominal é percebida pelos pacientes ao relatarem a “sensa-
ção de rompimento dos pontos” seguida de saída de líquido sero-hemático atra-
vés da incisão. Na maioria das vezes a deiscência com evisceração ocorre no sé-
timo dia do pós-operatório, podendo mesmo ocorrer entre o primeiro dia e a ter-
ceira semana depois da cirurgia.
A falta de cicatrização da ferida abdominal perturba a função da parede ab-
dominal na contenção das vísceras abdominais, prejudica a mecânica respirató-
ria do paciente (Pareja et al., 1989) e impede a prensa abdominal durante os atos
de exoneração fecal e urinária.
Vários fatores de risco corroboram para a ocorrência da deiscência da ferida
cirúrgica. Esses fatores, do ponto de vista didático, podem ser divididos em dois
grupos: os relacionados ao paciente e os relativos à cirurgia.
Todavia, a maioria dos casos de deiscência da cicatriz cirúrgica abdominal
decorre da associação de diferentes fatores (Tabela 8.1).
Os fatores relacionados ao paciente são na sua maioria inerentes à doença de
base, muitas vezes difíceis de serem excluídos ou compensados no período

77
Tabela 8.1
Análise Multifatorial dos Fatores de Risco da Deiscência da Ferida Cirúrgica
Abdominal (Modificado de Riou et al., 1992)

Fatores de Risco Fatores de Risco


Não-significantes (p > 0,05) Significantes (p < 05)

Relacionados ao Feminino Masculino


paciente Idade inferior a 65 anos Idade superior a 65 anos
Anemia Hipoalbuminemia
Diabetes Septicemia
Icterícia Obesidade
Uremia
Suporte nutricional
Doença maligna
Ascite
Corticóide
Hipertensão
Relacionados à Emergência Infecção da ferida
cirurgia Corpo estranho Doença pulmonar
Tipo de incisão Hipotensão arterial
Tipo de sutura Estomias

pré-operatório. Os fatores relacionados à cirurgia são os únicos elementos em


que o cirurgião tem participação direta, e dessa forma eles podem ser corrigidos
ou aprimorados.
Num estudo realizado por Riou et al. (1992) com 31 casos de deiscência da
ferida cirúrgica em 2.761 pacientes submetidos à cirurgia abdominal, esses auto-
res demonstraram, por análise multifatorial, que a falha de cicatrização da ferida
abdominal estava associada a 22 fatores de risco. Demonstraram que os enfer-
mos que tivessem cinco fatores de risco significantes apresentavam 30% de de-
iscência da ferida cirúrgica. Caso os pacientes operados apresentassem mais de
oito fatores de risco significantes, a incidência de deiscência alcançava 100%. A
mortalidade operatória nesse grupo foi de 29% e estava associada a mais de 10
fatores de risco.
Nos últimos anos muitos estudiosos do processo de cicatrização da ferida
abdominal tentaram demonstrar qual a melhor técnica operatória a ser aplicada
na síntese da parede abdominal. O objetivo desses estudos era encontrar caracte-
rísticas técnicas que pudessem diminuir a incidência das deiscências, minimizar
o número de hérnias incisionais, baixar o risco de infecção das feridas e contro-
lar os custos dos materiais de síntese empregados.
A melhor técnica encontrada para síntese primária da parede abdominal foi
a sutura contínua em plano único aponeurótico (aponeurose e músculo), sem
sutura do plano peritoneal. Essa técnica proposta por Wadstron e Gerdin, em
1990, tinha por característica menor incidência de deiscência da ferida cirúrgica

78
e ser de execução mais rápida que a técnica clássica de fechamento por planos
com pontos separados.

FECHAMENTO DA PAREDE ABDOMINAL

Plano Peritoneal — Não Deve Ser Suturado

Estudos experimentais e clínicos demonstraram que a sutura do plano peri-


toneal aumenta a incidência de aderências dos órgãos intracavitários. Soares
(1991) demonstrou em animais de experimentação que a sutura do plano perito-
neal com fio de categute, como era proposto classicamente, aumentava a inci-
dência de aderências de estruturas intra-abdominais na linha de sutura. O autor
demonstrou naquele trabalho experimental que a sutura do plano peritoneal pio-
rava as características biomecânicas da cicatriz abdominal, uma vez que a sutura
do plano peritoneal com fio de categute determinava menor resistência tênsil à
tração (7.9 x 105 dinas) em relação a ferida em que não se sutura o plano perito-
neal (9.9 x105 dinas). Conforme se observa na Fig. 8.1 a resistência tênsil da fe-
rida cujo plano peritoneal foi suturado com fio de categute era menor que a feri-
da abdominal cujo plano peritoneal não foi suturado. A explicação para a piora
das características biomecânicas estava no fato de ter sido encontrada maior rea-
ção inflamatória e menor quantidade de colágeno na ferida suturada com fio de
categute.

Fig. 8.1 — Distribuição das forças de tensão da rotura da parede e das cicatrizes abdominais sob
tração considerando a sutura do plano peritoneal com fio de categute (Soares, 1991).

79
Plano Aponeurótico — Sutura Contínua e Pontos de Retenção em “U”

Não existe diferença nas características biomecânicas entre a sutura contí-


nua e a sutura com pontos separados da ferida abdominal (Soares et al., 1991).
Por outro lado, a sutura contínua permite melhor distribuição da tensão no fio ci-
rúrgico, evitando o efeito de “estrangulamento” tecidual prejudicial ao processo
de cicatrização (Wadstron e Gerdin, 1990).
Baseado no fato de que nos casos de obstrução intestinal ou íleo paralítico a
circunferência abdominal aumenta 27%, e a distância xifopúbica torna-se mais
longa 37%, Jenkis (1976) propôs que o plano aponeurótico fosse suturado em
plano único contínuo cujo fio tivesse comprimento quatro vezes maior que o ta-
manho da incisão.
O emprego de fio monofilamentado dificulta o desenvolvimento de infecção
da ferida, principalmente nos casos de cirurgia contaminada e suja. O fio multi-
filamentar permite que as bactérias penetrem na trama do fio, diminuindo a ação
efetiva dos macrófagos na intimidade do fio. Nos casos de cirurgias limpas ou
potencialmente contaminadas o uso de fio absorvível multifilamentado tem de-
monstrado excelentes resultados (Soares, 1992).
Inicia-se o fechamento do plano aponeurótico pelos ângulos, com dois fios,
um em cada ângulo, sendo que o término da sutura ocorrerá no meio da incisão,
amarrando-se o primeiro fio com o segundo. Esse procedimento facilita a aplica-
ção dos pontos nos ângulos e permite que os últimos pontos sejam dados com se-
gurança no meio da incisão sob visão direta das estruturas intracavitárias.
Pontos de retenção internos em “U ” deverão ser aplicados no plano aponeu-
rótico nos casos de pacientes que apresentam fatores de risco significantes para
deiscência da ferida abdominal (Margarido, 1988, e Soares, 1992). Os pontos de
retenção internos devem substituir aqueles conhecidos como pontos subtotais
externos. A vantagem do primeiro está no fato de que os subtotais externos
quando amarrados sobre a pele causam trauma na derme mesmo se protegidos
por cânulas plásticas. Outro fato relevante é a possibilidade de os pontos subto-
tais externos servirem de via de disseminação da infecção da ferida para o sub-
cutâneo adjacente.
Os pontos de retenção em “U” devem ser aplicados antes do início do fecha-
mento do plano aponeurótico. Aplicados a uma distância de 3 cm da margem da
incisão, deve envolver a aponeurose e o músculo, sem atingir o peritônio, for-
mando um quadrilátero de 3x3 cm. Cada ponto em “U” deverá ficar entre inter-
valos de 3 a 5 cm ao longo da ferida, mantidos reparados com pinça hemostática
até o fim da sutura contínua do plano aponeurótico (Fig. 8.3).
Os pontos em “U” serão tracionados e amarrados até ocorrer a diminuição
da tensão da sutura contínua do plano aponeurótico. Deve-se usar fios absorví-
veis para evitar a formação de granulomas ao redor do nó embaixo da pele.

80
Pele e Subcutâneo
Nas cirurgias limpas e potencialmente contaminadas o plano celular subcu-
tâneo da ferida só deverá ser suturado em pacientes obesos, com a finalidade de
eliminar os espaços mortos deixados pela incisão. O fio de categute jamais deve-

Fig. 8.2 — Desenho esquemático demonstrando a sutura contínua amarrada no meio da incisão,
com o ponto em “U” não englobando o plano peritoneal.

Fig. 8.3 — Pontos de retenção em “U” aplicados ao longo da incisão, reparados com pinças he-
mostáticas e com sutura contínua do plano aponeurótico.

81
rá ser utilizado no subcutâneo pois causa reação inflamatória deste tecido e faci-
lita o desenvolvimento de infecção.
A limpeza mecânica do plano celular subcutâneo é muito importante na re-
moção de coágulos, tecidos desvitalizados, “glóbulos” de gordura, ou bactérias
que possam estar presentes na ferida. Tecnicamente essa limpeza mecânica é ob-
tida com jatos de soro fisiológico produzidos pela expressão das “pêras de borra-
cha” ou pela compressão dos êmbolos das seringas.
No grupo de cirurgias limpas e potencialmente contaminadas, a pele poderá
ser suturada com pontos intradérmicos nos casos em que a pele apresente carac-
terísticas elásticas, semelhantes às encontradas nos pacientes jovens. Deverão
ser empregados pontos separados com boa coaptação das margens, tipo Donati,
quando a elasticidade da pele não for adequada, por exemplo a pele dos pacien-
tes idosos.
Nas cirurgias contaminadas ou sujas a melhor opção é a cicatrização primá-
ria retardada. Por essa técnica a pele e o subcutâneo são deixados abertos, e só
deverão ser suturados após o aparecimento do tecido de granulação, que ocorre
no quarto ou quinto dias do pós-operatório. A presença de tecido de granulação
aumenta a resistência da ferida à invasão bacteriana, diminuindo assim o risco
de infecção (Gottrup et al., 1982).
Os curativos devem ser feitos no Centro Cirúrgico e deixados por 24 ou 48
horas. Compressas de gazes secas sem anti-sépticos deverão ser colocadas sobre
a sutura com fitas adesivas microporosas.
Após esse período, a pele está completamente fechada, fato esse que impede
a entrada de qualquer líquido na intimidade da ferida. Dessa maneira não tem
sentido o uso de soluções anti-sépticas no pós-operatório tardio, uma vez que
sua ação será restrita somente à derme superficial adjacente à ferida.

LAPAROSTOMIA

O fechamento da parede abdominal começou a receber atenção especial


com os estudos do tratamento da sepse intra-abdominal. Lundgren et al. (1977) e
Steinberg (1979) preconizaram as laparostomias nos casos de peritonites gene-
ralizadas, isto é, deixar a ferida abdominal aberta sem suturar a incisão do abdo-
me, com a finalidade de obter-se boa drenagem. Segundo a experiência dos auto-
res as vísceras abdominais eram cobertas com compressas úmidas até a forma-
ção de aderências capazes de impedir a evisceração do conteúdo abdominal.
A laparostomia tem sua maior aplicação quando existem dificuldades na
aproximação da parede abdominal nos pacientes que apresentam infecção peri-
toneal generalizada (Margarido, 1991). Nestes casos as alças intestinais apre-
sentavam-se distendidas e edemaciadas, acarretando aumento do volume do
conteúdo abdominal. O reposicionamento das alças naquelas condições dentro
da cavidade abdominal altera muito a dinâmica respiratória, diminuindo a capa-

82
cidade vital respiratória do paciente. Por outro lado, a ausência de sutura na pa-
rede abdominal nas laparostomias protege as margens da ferida cirúrgica. Isto é,
diminui o trauma da parede abdominal que na maioria das vezes apresenta-se
com infecção local e com tecido friáveis à fixação dos pontos de sutura.
Nesses casos em que a aproximação das margens da ferida abdominal é im-
possível devido à falta de compatibilidade entre o conteúdo abdominal e o conti-
nente cavitário, deve-se empregar material sintético para contenção das vísceras.
Atualmente as próteses sintéticas formadas por telas de náilon ou polipropi-
leno são as mais utilizadas na contenção das vísceras abdominais. Essas telas ci-
rúrgicas apresentam malhas de tamanhos diferentes que facilitam a drenagem do
líquido abdominal e devem ser fixadas na face interna da parede abdominal, com
fios inabsorvíveis sintéticos tipo náilon ou polipropileno.
Hoje em dia as laparostomias são empregadas principalmente nos casos de
infecção peritoneal grave; necessidade de drenagem ampla da cavidade abdomi-
nal; perda de tecido abdominal (fascite necrotizante); ou tensão exagerada para
aproximação das bordas.
Os pacientes que apresentam infecções peritoneais graves, com dissemina-
ção intracavitária generalizada poderão ser tratados com o emprego de múltiplas
reoperações abdominais, utilizando-se dos conceitos das laparostomias. Toda-
via trata-se de conduta de exceção, que apresenta altos índices de morbidade e
mortalidade pós-opertória (Rasslan et al., 1988).
Particularmente nos casos de reoperações programadas pode-se utilizar pró-
teses de náilon com zíper. Essas próteses foram desenvolvidas com a finalidade
de facilitar o acesso à cavidade abdominal nas reoperações programadas, e de
proteger a parede abdominal do trauma de suturar as margens da ferida em cada
procedimento cirúrgico (Utiyama et al., 1988).

RESSUTURA DA PAREDE ABDOMINAL

Como foi visto no início deste capítulo, as deiscências da ferida abdominal


continuam ocorrendo nas mesmas proporções do passado, apesar da evolução
dos conhecimentos cirúrgicos e do material desenvolvido para a síntese da pare-
de abdominal. Por outro lado, os pacientes com deiscência da ferida abdominal e
evisceração apresentam também comprometimento importante do estado geral,
traduzido pelo alto índice de mortalidade.
A ressutura da parede abdominal é um procedimento que deverá ser realiza-
do na sala cirúrgica com emprego de técnicas anestésicas que permitam relaxa-
mento muscular adequado. A ferida cirúrgica deverá ser totalmente revisada
com retirada de todo material de síntese usado anteriormente.
A nova síntese da parede abdominal deverá ser realizada por meio do fecha-
mento em plano único, com pontos separados de Smead-Jones, mantendo-se as
alças intestinais cobertas com epíploo.

83
Fig. 8.4 — Abertura da prótese de tela de náilon com zíper para acesso à cavidade abdominal nas
reoperações programadas.

A primeira alça maior dos pontos de Smead-Jones deverá ser aplicada na


fáscia muscular a 3 cm da margem da ferida abdominal englobando aponeurose,
músculo, sem considerar o plano peritoneal. As mesmas características apli-
cam-se na outra margem da ferida, formando então a segunda alça maior.
A primeira alça menor do ponto é feita com mesmo fio, passando-o mais
próximo da margem da ferida, 1 a 1,5 cm no lado contrário, isto é, no lado em
que o ponto foi iniciado. Passa-se no outro lado a 1 a 1,5 cm, formando a segun-
da alça menor, para a seguir amarrar com a extremidade da primeira alça maior.
Como regra mnemônica temos o ponto “longe-longe perto-perto”.
O ponto de Smead-Jones apresenta uma característica biomecânica de
grande importância para o processo de cicatrização. A tração produzida na alça
maior do fio de um lado tem como contraponto de tração a alça menor do fio no
outro lado da ferida. O arranjo espacial deste ponto cirúrgico evita a existência
do “estrangulamento” do tecido muscular que se encontra no centro do ponto ci-
rúrgico, durante a contração da parede abdominal, fato que costuma ocorrer com
o emprego de pontos simples.
Previamente a aplicação dos pontos de Smead-Jones é mandatória a limpeza
da ferida, com remoção do material de síntese do fechamento anterior, e drena-
gem dos focos de infecção. Os pontos de Smead-Jones deverão ser aplicados
conforme a técnica descrita, em intervalos de 2 a 3 cm, mantidos reparados por
pinças hemostáticas até o término da sutura. Então o cirurgião inicia os nós, com
o auxiliar tracionando os pontos de maneira alternada para cada lado da ferida.

84
Fig. 8.5 — Representação esquemática do ponto de Smead-Jones na ressutura da parede abdo-
minal.

O relaxamento muscular adequado produzido pela anestesia é de capital im-


portância para a execução de todos os nós. O tecido celular subcutâneo e a pele
deverão ser deixados abertos, sem sutura (cicatrização primária retardada) se
existir processo inflamatório infeccioso na ferida; caso contrário faz-se a síntese
primária com pontos simples espaçados, para facilitar a drenagem.
O emprego de pontos subtotais deverá ser abolido nestes casos porque disse-
mina a infecção para o tecido celular subcutâneo adjacente, além de traumatizar
a pele. Do ponto de vista do poder de ancoragem na aponeurose, os pontos de
Smead-Jones são semelhantes aos pontos de retenção em “U”.
Em resumo, fica evidente que mesmo com o aparecimento de novos materi-
ais de síntese cirúrgica, com a evolução do entendimento da biomecânica da pa-
rede abdominal, do controle das infecções com antibióticos de última geração e
de suporte nutricional adequado, as falhas de cicatrização da ferida abdominal
continuam a ocorrer e o cirurgião precisa estar preparado para resolvê-las com
eficiência e competência.

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86
Fechamento de
9 Toracotomias

Noedir A. G. Stolf
Anderson Benício

INTRODUÇÃO

No fechamento de uma toracotomia, como também de qualquer outra inci-


são operatória, seguem-se alguns preceitos básicos de técnica cirúrgica.
O fechamento adequado de uma ferida operatória inicia-se durante sua aber-
tura. Inicialmente, uma rigorosa anti-sepsia local é fator essencial para que ocor-
ra uma boa cicatrização, sem eventuais processos infecciosos.
Ao procedê-la, deve-se ter o cuidado e a atenção para obter bordas lineares,
regulares e simétricas. A irregularidade das bordas da ferida condicionará uma
má coaptação, e portanto, uma cicatrização inadequada.
Uma hemostasia perfeita, além de proporcionar um campo operatório limpo
e organizado, promove uma adequada justaposição dos tecidos sem eventuais
formações de hematomas e coleções. Quando a hemostasia é realizada dentro de
um bom padrão técnico, evitará não só perdas sangüíneas desnecessárias mas
também um tempo cirúrgico prolongado, que levaria a um aumento da morbida-
de pós-operatória.
A inspeção da cavidade é importantíssima, no sentido de se evitar a perma-
nência de corpos estranhos (compressas e gazes) no interior da cavidade, o que
poderia levar à formação de coleções e abscessos, exigindo reoperação e dificul-
tando a cicatrização dos tecidos.
Durante a síntese propriamente dita, a aplicação de uma boa técnica operató-
ria é fundamental. Os planos de incisão e/ou dissecção devem ser aproximados
com rigor técnico, eliminando todos os espaços mortos, evitando assim acúmulo
de sangue ou secreções.
A coaptação das bordas da ferida deve ser realizada sem compressão exage-
rada dos tecidos por sutura muito apertada, o que levaria à isquemia e necrose da
região podendo evoluir com infecção e deiscência da ferida operatória.

87
A regularidade com a qual os pontos devem ser aplicados justifica-se pela
adequada distribuição da tensão sob a pele, além do emprego adequado do tipo
de fio para determinado tecido. Os pontos devem ter a mesma distância entre um
e outro, sendo que todos devem ter a mesma profundidade e espessura (distância
entre o ponto e a borda da ferida) de forma simétrica, fazendo com que a tensão
sob cada ponto seja a mesma, evitando assim processos isquêmicos em pontos
isolados da ferida.
O respeito à anatomia local, preservando vasos e nervos, favorece o restabe-
lecimento da função de uma forma mais fisiológica e rápida. Do mesmo modo, o
respeito às linhas de força da pele contribui para uma cicatrização mais estética.

ESTERNOTOMIA MEDIANA

O desenvolvimento da Cirurgia Cardíaca fez da esternotomia mediana a in-


cisão torácica mais comum. É a incisão de escolha para a maioria dos cirurgiões
cardiovasculares, e para muitos cirurgiões torácicos em lesões do mediastino an-
terior, para procedimento bilateral como o tratamento de pneumotórax espontâ-
neo bilateral, e para ressecções de lesões pulmonares múltiplas.
O adequado fechamento do esterno está diretamente relacionado com a qua-
lidade de sua abertura. Deve ser a mais regular possível, simétrica e retilínea. O
desenvolvimento de serras apropriadas facilitou este tipo de procedimento, di-
minuindo bastante o risco de acidentes; principalmente de lesões cardíacas ou
dos vasos da base.
A abertura não simétrica do esterno predispõe a complicações pós-ope-
ratórias como por exemplo, instabilidade do esterno e principalmente infeccio-
sas (mediastinite).
O fechamento se inicia com o posicionamento dos drenos. É posicionado
medialmente, distando 3,0 a 4,0 cm da incisão. Introduz-se, por contra-abertura,
na linha mediana, um dreno tubular 3/8” através da aponeurose do reto abdomi-
nal, posicionando-o no mediastino anterior. Em transplante cardíaco, a despro-
porção do saco pericárdico do receptor em relação ao coração doador pode ser
tal, que haja a necessidade do posicionamento de um dreno na região posterior
do coração.
A aproximação do esterno geralmente é feita com fios de aço número 5. A
princípio, o manúbrio é aproximado transfixando-o com dois ou três fios. No
corpo do esterno, a aproximação se faz nos espaços intercostais; um ponto para
cada espaço. Alguns cirurgiões preferem no espaço logo abaixo do manúbrio, a
passagem de dois pontos para obter uma maior estabilidade na porção superior
do esterno. Há também a possibilidade da realização de “pontos em x”. Os fios
são então simplesmente torcidos numa tensão suficiente para deixar o esterno
firme e estável. Durante a passagem dos fios de aço deve-se tomar cuidado para
evitar lesões da artéria torácica interna. Os pontos devem ser passados próximos

88
à borda lateral do esterno (Fig. 9.1). Outra técnica bastante difundida é a de Ro-
bicsec10. Descrita por esse autor, consiste na realização de uma sutura contínua
de fio de aço, passada longitudinalmente pelos espaços intercostais, bilateral-
mente. Novos fios são passados transversalmente também nos espaços intercos-
tais (Fig. 9.2). É aplicada em casos de fragilidade esternal (osteoporose), deis-
cência esternal ou mesmo profilaticamente, considerando a obesidade, a possi-
bilidade de longa permanência em ventilação mecânica, reoperações ou erro téc-
nico em aberturas do esterno.
Procedida a esternorrafia, faz-se de grande importância a aproximação do
periósteo juntamente com o tecido celular subcutâneo com rigorosa técnica. A
presença de espaço morto, hematomas ou eventuais coleções nesta região, é ex-
tremamente crítica. A possibilidade de uma mediastinite torna-se grande, o que
aumentaria significativamente não só a morbidade como também a mortalidade.
A síntese do tecido celular subcutâneo pode ser realizada através de uma sutura
contínua com fio absorvível ou com pontos separados de fio inabsorvível.

TORACOTOMIA PÓSTERO-LATERAL
É utilizada na grande maioria das intervenções cirúrgicas da cavidade torá-
cica, promovendo um excelente campo operatório. Entretanto, devido à espes-
sura da parede nesta região, seu fechamento torna-se mais demorado do que ou-
tros tipos de incisões. Os músculos envolvidos são, na seqüência em que apare-
cem, grande dorsal, trapézio, rombóide e serrátil maior. Dependendo do tipo
de intervenção, pode ou não haver a ressecção de um arco costal (geralmente o
quinto).
A síntese da toracotomia começará pela aproximação da abertura intercos-
tal. Utiliza-se fio de categute cromado ou de vicril nº 1. Estes pontos devem res-
peitar a anatomia evitando a constrição dos nervos intercostais e síndromes do-
lorosas no pós-operatório6.
Se a toracotomia tiver sido intercostal por ruginação da borda superior ou in-
ferior da costela, a reinserção do feixe intercostal se conseguirá respectivamente
por pontos pericostais inferiores ou superiores.
A aproximação da musculatura deve ser feita sem tensão, evitando isquemia
tecidual. É com fio inabsorvível tipo mersilene nº 3-0 ou 2-0.
O tecido celular subcutâneo deve ser aproximado eliminando completamen-
te o espaço morto bem como a tensão sob a pele. É feita com vicril nº 2-0 ou 3-0.
A pele pode ser aproximada tanto com pontos separados (simples ou Donati;
náilon nº 4-0) ou com sutura contínua (intradérmica; prolene nº 4-0) (Fig. 9.3).
Muitos cirurgiões realizam um bloqueio nervoso intercostal com um anestésico
local de ação prolongada, como por exemplo a bupivacaína a 0,5% com epinefri-
na no instante do fechamento do tórax. Outros advogam que um bloqueio inter-
costal deve ser evitado, pois caso seja feito em um vaso, pode acarretar conse-

89
Fig. 9.1 — Representação esquemática do fechamento da esternotomia mediana.

qüências cardiovasculares graves6. Caso o bloqueio seja realizado, usualmente é


realizado do segundo ao sétimo espaço intercostal. Injeta-se a solução a mais ou
menos 8cm da linha média no sentido de se evitar a injeção subdural que produ-
ziria uma anestesia espinhal. Outra técnica é a realização, no início da anestesia,
de um bloqueio peridural. Com a introdução de um cateter no espaço peridural
para a administração de drogas, além de promover uma anestesia sem repercus-
sões cardiovasculares, permite uma potente analgesia no período pós-ope-
ratório.
No posicionamento dos drenos deve-se tomar muito cuidado no que diz res-
peito à lesão dos nervos intercostais6. A secção do nervo intercostal resulta em
dor persistente durante o período pós-operatório. Geralmente é posicionado no

90
Fig. 9.2 — Representação esquemática da técnica de Robisec.

sexto ou sétimo espaço intercostal ao nível da linha axilar média ou posterior.


Dependendo do porte da operação, pode haver a necessidade do posicionamento
de dois drenos: um anterior e outro posterior. Incluem-se nas complicações rela-
cionadas a drenagem, lesões pulmonares, lesões do diafragma, drenagem do te-
cido celular subcutâneo e posicionamento inadequado do dreno, deixando suas
perfurações fora da cavidade pleural9.
A principal vantagem da toracotomia póstero-lateral é a excelente exposi-
ção dos órgãos intratorácicos para a maioria dos procedimentos cirúrgicos.
Como desvantagens, temos síndromes dolorosas mais freqüentes no período
pós-operatório, além do tempo um pouco mais prolongado para o fechamento
devido à extensão da incisão e à espessura da parede decorrente da densa muscu-
latura nesta área.

91
Fig. 9.3 — Representação esquemática do fechamento da toracotomia póstero-lateral. Aproxima-
ção dos planos musculares.

Além do intercosto, a musculatura deve ser aproximada de forma adequada


para que sua anatomia fique mais próxima do normal possível, evitando assim
degraus e sobreposições de tecidos e planos musculares. É mais segura a aproxi-
mação da musculatura com pontos separados de fio inabsorvível apesar de au-
mentar em algo o tempo cirúrgico em relação à sutura contínua com fios absor-
víveis.

TORACOTOMIA ANTEROLATERAL
A toracotomia anterior tem a vantagem de permitir ao paciente permanecer
em posição supina, resultando numa melhora da função cardíaca. Sua indicação
tem diminuído, principalmente em decorrência dos avanços do manuseio e téc-
nicas anestésicas, e do desenvolvimento de novos procedimentos tais como a
mediastinoscopia e a mediastinotomia. Mantém-se como a incisão de escolha
para muitos cirurgiões, fornecendo um ótimo campo para as biópsias de pulmão.
É ocasionalmente usada no procedimento de Ivor Lewis (em casos de carcinoma
de esôfago), evitando o reposicionamento do paciente após a fase intra-abdo-
minal da operação14.

92
O fechamento da toracotomia anterolateral é semelhante ao da póste-
ro-lateral, variando apenas os grupos musculares.
A variação na drenagem baseia-se no fato de ser feita ao nível da linha axilar
média ou anterior.
O quarto arco costal é posicionado sob o terceiro, e sua musculatura é apro-
ximada. Procede-se à sutura partindo-se da musculatura do terceiro intercosto fi-
xando-se na musculatura do quarto intercosto, passando por sobre a quarta cos-
tela. Este tipo de fechamento fornece um primeiro plano bastante seguro, além
de favorecer uma reconstrução bastante próxima à anatomia, evitando as suturas
pericostais, usualmente dolorosas.
Após esse plano, o peitoral maior, o peitoral menor e o serrátil anterior são
aproximados com sutura contínua utilizando fio absorvível ou pontos separados
com fio inabsorvível.

TORACOTOMIA AXILAR
A toracotomia axilar foi inicialmente desenvolvida para as operações do sis-
tema nervoso simpático torácico superior. Foi modificada pela ressecção do 1º
arco costal para a síndrome do desfiladeiro torácico.
Esta incisão é particularmente útil quando se faz o uso de cânula endotra-
queal de duplo lúmen, o que favorece o controle de atelectasias combinado à ha-
bilidade do anestesista em elevar o mediastino em direção ao campo operatório
favorecendo as condições operatórias.
A extraordinária vantagem desta incisão é a facilidade e a rapidez com a
qual ela pode ser realizada, com reduzida perda sangüínea e uma mínima secção
muscular, resultando em uma recuperação pós-operatória bastante confortável.
O fechamento pela sobreposição das costelas é completado pela aproxima-
ção da musculatura intercostal do 4º espaço por sobre a quinta costela fixando-a
na musculatura do 5º espaço intercostal e periósteo. Com a retirada do aproxi-
mador, as costelas retornam à posição normal14.
A toracotomia axilar não é recomendada para o cirurgião torácico ocasional
ou para uma operação difícil, pela limitada exposição em relação à toracotomia
póstero-lateral.

FECHAMENTO DE TORACOTOMIAS FRENTE A ALGUMAS


COMPLICAÇÕES
MEDIASTINITE
A mediastinite após a cirurgia cardíaca aberta é uma condição potencial-
mente incapacitante e até mesmo letal. A utilização de retalhos musculares re-
verteu a história natural desta temida complicação. A compreensão da fisiologia

93
e anatomia dos retalhos musculares ampliou consideravelmente sua utilização,
reduzindo significativamente a taxa de mortalidade.
Algumas condições clínicas impõem ao paciente um maior risco de infecção
mediastinal após esternotomia mediana. Estes incluem: doença pulmonar obs-
trutiva crônica, obesidade, diabetes melito, estado crônico de debilidade protéi-
ca e terapia corticosteróide a longo prazo. O uso insuficiente de antibióticos
pré-operatórios e o preparo asséptico inadequado da pele na sala de operação são
fatores operatórios predisponentes. No período pós-operatório, a necessidade de
ressuscitação cardíaca com o tórax fechado, o aumento de sangramento intrato-
rácico, a circulação extracorpórea prolongada e a reexploração por sangramento
são fatores que aumentam a probabilidade de infecção. A ventilação mecânica
prolongada com a necessidade de realização de traqueostomia e o surgimento de
pneumonia associa-se à maior incidência de mediastinite. Por fim, a instalação
de um quadro de baixo débito cardíaco com longos períodos de hipotensão ca-
racteriza-se outra condição na qual o paciente torna-se vulnerável a processos
infecciosos, no caso do mediastino. Quanto à utilização da artéria torácica inter-
na, apenas quando utilizada bilateralmente representaria uma pequena elevação
na taxa de incidência de mediastinite13 (Tabela 9.1).
O agente etiológico mais freqüente é o Staphylococcus aureus ou Staphylo-
coccus epidermidis12.
Apesar de raros, outros agentes podem causar mediastinite. Agentes como o
Micoplasma hominis7,11,16 são descritos, entretanto o tratamento cirúrgico não
difere do convencional.
O diagnóstico da infecção mediastinal deve ser feito o mais precoce possí-
vel. A taxa de mortalidade diminui consideravelmente com o reconhecimento e
tratamento precoce da mediastinite. Usualmente, é pronunciada por febre, leu-

Tabela 9.1
Fatores de Risco para Ocorrência de Mediastinite

Fatores Clínicos Fatores Operatórios Fatores Pós-operatórios

DPOC Uso insuficiente de Massagem cardíaca


Obesidade antibiótico pré-operatório, externa
Diabetes melito profilático Sangramento excessivo
Estado crônico de Anti-sepsia inadequada CEC prolongada
debilidade da pele Reintervenção cirúrgica
Terapia corticosteróide Técnica operatória Baixo débito cardíaco
longa inadequada Ventilação mecânica
prolongada —
traqueostomia
Pneumonia

94
cocitose, instabilidade esternal e secreção superficial. A tomografia computado-
rizada consiste em um exame bastante útil na detecção do processo.
O objetivo da terapia cirúrgica consiste em obter uma ferida fechada com
uma parede torácica estável e uma boa cobertura do coração e dos grandes vasos.
A mediastinite está associada à uma alta taxa de mortalidade. É por demais
provável que o paciente com mediastinite venha a sofrer morbidez de múltiplas
operações, hospitalização prolongada, deformidade estética e um resultado ope-
ratório precário.
A princípio, existem basicamente três métodos para o tratamento cirúrgico
da mediastinite e das infecções profundas após esternotomia mediana: a técnica
aberta, a técnica fechada e a técnica de cobertura com retalhos musculares4,13.

Técnica Aberta
A técnica aberta representa apenas um significado histórico, pois, na atuali-
dade, é utilizada apenas raramente. O esterno é aberto, desbridado e deixado
aberto para cicatrizar por segunda intenção. Esta abordagem é demorada, mal to-
lerada pela maioria dos pacientes e ainda está associada a uma taxa de mortalida-
de próxima a 35%12.

Técnica Fechada
Descrita inicialmente por Shumaker e Mandelbaum em 196315 e modificada
a seguir por Bryant, Spencer e Trinkle2, a técnica fechada consiste de desbrida-
mento e fechamento sob um sistema de irrigação. Os tubos de tórax são deixados
no local por sete a 14 dias e o mediastino é irrigado com uma solução antibiótica
ou de povidine, em uma concentração de 0,5%, com velocidade de infusão de 1 a
2 ml/kg/h4.
Esse método é valioso quando o acometimento esternal ou mediastinal for
limitado. Raramente é eficaz quando a infecção é significativa ou quando existe
um acometimento mais extenso.
Culliford e Rosenfeld3 reviram 77 infecções esternais graves após 7.949
operações cardíacas abertas consecutivas. Quando a infecção era tratada dentro
de três semanas após a operação cardíaca aberta, obteve-se uma taxa de sucesso
global de 76%. Quando a infecção era descoberta além de três semanas, advo-
gou-se o desbridamento aberto e fechamento com retalhos musculares. Foi rela-
tada uma taxa de mortalidade global de 28%.

Cobertura com Retalhos Musculares


Usualmente, este método só se aplica quando ocorre falha no método fecha-
do ou quando a extensão da infecção esternal promove um desbridamento exten-
so do esterno, cartilagens costais e tecidos adjacentes.

95
Em 1976, Lee e colaboradores5 relataram pela primeira vez a utilização de
um pedículo epiplóico vascularizado, com fechamento primário de pele.
Em 1980, Brown, Fleming e Jurkiewicz1 utilizaram o músculo peitoral mai-
or como um retalho rotacional, tipo ilha, para cobrir um grande defeito na linha
média da parede torácica após excisão de um tumor.
Após este relato, alguns autores aprimoraram ainda mais a técnica de rota-
ção de retalhos no tratamento da mediastinite, tomando como base a anatomia
dos pedículos vasculonervosos e principalmente dos ramos perfurantes proveni-
entes da artéria torácica interna, o que possibilitou a utilização de novos grupos
musculares nesta técnica, tais como: o músculo retoabdominal e o grande dor-
sal12 (Fig. 9.4).

Abordagem Atual

Quando os sinais de instabilidade esternal e de infecção são mínimos e


quando o processo de infecção mediastinal torna-se evidente dentro de 10 a 14
dias após a cirurgia, costuma ser possível levar o paciente à sala de operações
para desbridamento esternal e fechamento primário sobre um cateter de irriga-
ção. A ferida é irrigada por duas a três semanas com antibiótico de acordo com as
culturas realizadas da ferida mediastinal2.
Este método pode ser utilizado quando a evidência de infecção é mínima,
quando o esterno pode ser desbridado facilmente e quando os tecidos adjacentes
e mediastinais forem flexíveis o suficiente para preencherem completamente o
espaço morto retroesternal. Se a infecção esteve presente por mais de duas sema-
nas e existe contaminação macroscópica, como deiscência da ferida operatória e
instabilidade esternal, uma melhor abordagem consiste no fechamento direto
por retalhos musculares. Pode-se dispor de retalhos musculares do peitoral mai-
or, do retoabdominal e do grande dorsal para a reconstrução do mediastino e da
parede torácica. Os músculos mais utilizados são: o peitoral maior e o retoabdo-
minal12 (Tabela 9.2).
Um único retalho modificado e invertido do grande peitoral com base nos
ramos perfurantes da artéria torácica interna constitui uma primeira escolha nes-
te tipo de procedimento. Nahai e colaboradores8 aprimoraram esse procedimen-
to para permitir a preservação da forma da prega axilar anterior e da função do
terço lateral do músculo peitoral. Este músculo é sistematicamente fendido na
direção de suas fibras para poder alcançar as partes inferior e superior da ferida.
Raramente são necessários outros retalhos. O retalho do retoabdominal é igual-
mente útil, e sua transposição resulta em poucas complicações da parede abdo-
minal, em torno de 3%.
Quando os retalhos musculares não são suficientes para o reparo, o epíploo
constitui um ótimo retalho a ser utilizado nas feridas profundas. Em geral repa-
ra-se a base do retalho epiplóico na artéria gastroepiplóica direita13.

96
Fig. 9.4 — Representação esquemática da rotação de retalhos (peitoral maior e retoabdominal) no
tratamento da mediastinite.

Tabela 9.2
Retalhos Usados para Reparo Esternal Após Cirurgia Cardíaca

Tipo de Enxerto Seleção do Retalho

Enxerto venoso Peitoral fendido unilateral modificado


Retoabdominal unilateral
Peitoral com rotação-avanço
Retalhos combinados
Art. torácica interna unilateral Peitoral fendido contralateral modificado
Retoabdominal contralateral
Peitoral com rotação-avanço
Combinado
Peitoral segmentar modificado
Retoabdominal
Avanço peitoral com dois pedículos
Epíploo
Grande dorsal

97
Ao comparar os resultados da cobertura por retalhos com aqueles obtidos
por irrigação fechada ou granulação aberta, observa-se uma redução significati-
va na taxa de mortalidade, juntamente com quedas consistentes na morbidez e na
duração da hospitalização, com a utilização de retalhos. Portanto, a cobertura
por retalho muscular ou retalho epiplóico deve ser considerado como tratamento
de primeira escolha em todos os pacientes com mediastinite pós-esternotomia.

BIBLIOGRAFIA
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mediastinal infection following sternotomy. Cardiac Surg State of Art Ver 2:459, 1988.
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cardiovascular surgical patients. Ann Thorac Surg 61(1):99-103, 1996.

98
10 Princípios Gerais de
Hemostasia

Pedro Puech-Leão
Su Chao

BASES FISIOLÓGICAS DA HEMOSTASIA

Os mecanismos hemostáticos foram selecionados pela evolução para coibir


hemorragia nos casos de rupturas no sistema vascular. Não importando que a cau-
sa da lesão do vaso sangüíneo seja mecânica, química, biológica ou celular, a
produção local de trombina gera um coágulo fibrinoplaquetário no sítio da lesão
vascular impedindo o extravasamento do conteúdo intravascular. A hemorragia
pode ocorrer na presença de problemas quantitativos e qualitativos dos compo-
nentes da hemostasia que incluem o endotélio, as plaquetas, a cascata de fatores
de coagulação, a formação de fibrina e a fibrinólise. A trombose pode ocorrer
quando o estímulo hemostático está desregulado ou os mecanismos anticoagu-
lantes são sobrepujados pelo grau de estímulo.

ENDOTÉLIO VASCULAR

O endotélio vascular exerce papel importante na regulação da coagulação da


fibrinólise, do tônus vascular, do crescimento celular e sua diferenciação, bem
como nas respostas imune e inflamatória e processo de aterosclerose. O endoté-
lio é notavelmente não-trombogênico e, enquanto íntegro, não reage com pla-
quetas ou fatores de coagulação na circulação. Materiais sintéticos em contato
com sangue tais como próteses vasculares, cateteres arteriais e venosos, próteses
de válvulas cardíacas, filtro de cava e máquinas de hemodiálise têm complica-
ções tromboembólicas devido à falta de uma superfície endotelizada. Células
endoteliais sintetizam prostaciclina (prostaglandina I2 [PGI2]), a qual inibe a
agregação plaquetária e causa relaxamento da musculatura lisa e vasodilatação.
A prostaciclina aumenta a atividade da adenilatociclase das plaquetas e, portan-
to, eleva os níveis de adenosina monofosfato cíclica (cAMP). Altos níveis de
cAMP previnem a ativação das plaquetas. Aumentos locais no fluxo sangüíneo

99
devido à vasodilatação causados pela prostaciclina podem ajudar a depurar os
agregados de plaquetas em formação, então limitando a resposta hemostática in-
travascular. Os produtos da lipoxigenase do metabolismo da prostaglandina en-
dotelial também inibem a adesão plaquetária. A atividade da enzima ectonucleo-
tidase endotelial também afeta a função plaquetária pela degradação da adenosi-
na difosfato (ADP) plasmática, um composto que ativa plaquetas e estimula sua
agregação.
As células endoteliais também produzem fator de relaxamento derivado do
endotélio (EDRF), o qual foi identificado como sendo o óxido nítrico (NO). Tal
como a prostaciclina, o NO é um potente inibidor de contração da célula muscu-
lar lisa e causa vasodilatação. Também inibe a agregação plaquetária, estimula a
desagregação, inibe a adesão plaquetária e monocitária à superfície endotelial e
a proliferação de célula muscular lisa.
Além da inibição da adesão e agregação plaquetária, o endotélio vascular
também age contra as reações enzimáticas da coagulação. Células endoteliais
sintetizam glicosaminoglicanos heparina-símile que possuem atividade anticoa-
gulante. O heparan sulfato ativa a antitrombina III circulante (ATIII), que efeti-
vamente neutraliza os fatores ativados XII, XI, X, IX e II (trombina) ao nível da
superfície celular, assim limitando a produção de trombina. Trombomodulina é
um receptor de superfície endotelial que se liga à trombina e inibe a habilidade
da enzima em clivar fibrinogênio, o qual acelera a ativação da proteína C pela
trombina mais de 1.000 vezes. A proteína C ativa, por sua vez, inativa fatores Va
e VIIIa e aumenta fibrinólise, provavelmente pela ligação com um inibidor de
ativação de fibrinogênio. A atividade da proteína C é facilitada pela proteína S, a
qual funciona como um co-fator. A ATIII circulante também inativa a trombina
ligada à trombomodulina e isto é acelerado pelo heparan sulfato. A ligação da
trombina com a trombomodulina resulta em perda de seu efeito anticoagulante e
aumento de sua habilidade de ativar a proteína C, a qual age como um anticoagu-
lante e inibe trombogênese.
O endotélio sintetiza e secreta ativadores de plasminogênio. É a principal
fonte in vivo de ativador tecidual de plasminogênio (tPA), o qual converte plas-
minogênio em plasmina que, por sua vez, lisa a fibrina. A eficiência da fibrinóli-
se local é também aumentada pelos receptores da superfície celular do endotélio
que se ligam ao plasminogênio. Esta fibrinólise local pode agravar hemorragia
em alguns pacientes suscetíveis, bem como em pacientes sem produção normal
de inibidores de ativação de plasminogênio (PAI-1).
Lesão da parede vascular pode levar à lesão da célula endotelial com disfun-
ção desta, e formação subseqüente de trombo. A lesão direta ocorrre, por exemplo,
no trauma vascular, nos procedimentos de radiologia intervencionista e endovas-
cular, na lesão térmica e nos procedimentos cirúrgicos. A lesão indireta à célula
endotelial pode ocorrer por ação de bactérias, vírus, imunocomplexos, produtos
do cigarro, colesterol, hemocisteína sangüínea elevada, turbulência localizada

100
ao redor de áreas de estenose e enzimas produzidas por plaquetas e leucócitos
ativados. Perda de propriedades antitrombóticas do endotélio resulta em ativação
de atividade procoagulante endotelial. Isto pode ser induzido pelas endotoxinas
bacterianas, trombina, interleucina-1 e fator de necrose tumoral. A célula endote-
lial danificada expressa fator tecidual o qual age como um co-fator do fator VII
para ativar a via extrínseca da cascata de coagulação. Ademais, a célula endotelial
também induz a expressão de receptores que se ligam aos fatores de coagulação
que podem gerar trombina e aumentar o coágulo em superfície celular local.

PLAQUETAS

Plaquetas são elementos celulares anucleados formados a partir de proje-


ções citoplasmáticas de megacariócitos na medula com vida útil de oito a 12
dias. As plaquetas contêm, em sua superfície, receptores moleculares que se li-
gam ao colágeno e às proteínas de adesão localizadas na parede vascular. As
principais proteínas de adesão incluem o fator de Von Willebrand (vWF), a fi-
bronectina, a laminina, a trombospondina e a vitronectina. Com a lesão da pare-
de vascular, estruturas subendoteliais são expostas para a circulação, as quais le-
vam à adesão plaquetária, a fase inicial na formação de trombo. O receptor de
plaquetas, glicoproteína Ib (GPIb), de uma plaqueta não ativada, liga-se com
vWF que está presente no subendotélio. Esta ligação não requer ativação pla-
quetária. A adesão plaquetária é também auxiliada por outras GPs, com fibrina e
colágeno subendotelial servindo como substratos. A ligação direta da GPIa ao
colágeno finalmente resulta em ativação plaquetária, que é necessária para for-
mação e crescimento de trombo. O complexo GPIIb:IIIa é o receptor de fibrino-
gênio, e é responsável pela adesão plaquetária à rede de fibrina.
A secreção plaquetária é induzida por agentes que causam agregação pla-
quetária. A secreção e agregação plaquetária provavelmente ocorrem ao mesmo
tempo in vivo, e devem ser coletivamente referidas como ativação plaquetária.
Substâncias liberadas pela secreção plaquetária causam recrutamento de outras
plaquetas e contribuem para o crescimento do trombo. O evento inicial na ativa-
ção plaquetária é a ligação de um agonista tal como trombina ou ADP com o do-
mínio extracelular de um receptor de membrana específico de plaqueta, o qual
então ativa a fosfolipase C (PLC), iniciando a via fosfoinositídea através da hi-
drólise do fosfolípide de membrana fosfatidil 4,5 bifosfato (PIP2), o qual gera
dois segundos mensageiros plaquetários, o inositol 1,4,5-trifosfato (IP3) e o dia-
cilglicerol (DAG). O IP3 induz liberação de cálcio do sistema tubular denso pla-
quetário, causando um aumento no cálcio citossólico, o qual é componente im-
portante na ativação plaquetária. O DAG ativa a proteinocinase C, a qual por sua
vez promove fosforilação protéica. Isto leva à secreção plaquetária com expres-
são de receptor de fibrinogênio, GPIIIb:IIIa, causando agregação plaquetária.
Outros agonistas de ativação plaquetária incluem colágeno, epinefrina, trombo-

101
xane A2 e fator ativador de plaquetas (PAF), o qual causa esvaziamento do con-
teúdo dos grânulos densos e α-grânulos das plaquetas.
A agregação plaquetária ocorre simultaneamente com a secreção plaquetá-
ria, com ADP estimulando a expressão de receptor GPIIb:IIIa. O fibrinogênio
serve como elo entre plaquetas agregadas, e a ligação do fibrinogênio ao seu re-
ceptor é um pré-requisito para agregação plaquetária. Este elo de ligação é cál-
cio-dependente e envolve alguns dos produtos dos α-grânulos das plaquetas in-
cluindo fibronectina, trombospondina, vitronectina e vWF. Outros agonistas de
agregação plaquetária são tromboxane A2, colágeno, trombina e PAF. As vias
tanto de secreção quanto de agregação provavelmente agem através como uma
via final comum, envolvendo mobilização intracelular de cálcio do sistema tu-
bular denso da plaqueta no citosol e a ligação do cálcio à calmodulina. Esta re-
sulta em ativação de proteinocinases levando à agregação. A recaptação do cál-
cio para os túbulos densos é dependente de cAMP. Drogas que aumentam cAMP
reduzirão a mobilização de cálcio decorrente de todos os agonistas e assim inibe
a ativação da plaqueta.

CASCATA DA COAGULAÇÃO
A coagulação é a seqüência de eventos que leva à formação de coágulo de fi-
brina. Esta era inicialmente concebida como duas vias distintas, a intrínseca e a
extrínseca. Na via intrínseca, o fator XII é ativado pela superfície de contato e li-
gação, seguido pela ativação seqüencial de fatores XI, IX, X e protrombina. A
função da via intrínseca é mensurada pelo tempo de tromboplastina parcialmen-
te ativada (TTPa). Na via extrínseca há formação de um complexo entre fatores
teciduais e fator VII, o qual é então seguido pela ativação de fatores VII, X e pro-
trombina. A função da via extrínseca é mensurada pelo tempo de protrombina
(TP). A via comum ocorre da ativação do fator X.
In vivo, os fatores de coagulação teciduais são os mais importantes em he-
mostasia e trombose. Fator tecidual é um componente normal na superfície de
células não vasculares e é expresso na superfície de monócitos estimulados e cé-
lulas endoteliais. O domínio extracelular de fator tecidual é o receptor de fator
VII, e a exposição de superfície celular expressando o fator tecidual para proteí-
nas plasmáticas circulantes leva à ligação do fator VII com fatores teciduais. Isto
gera a forma ativada do fator VII, fator VIIa, o qual ativa fatores IX e X. O fator
Xa em complexo com fator Va ativa então a protrombina. Esta leva à geração de
trombina, a qual cliva fibrinogênio para fibrina monomérica. A fibrina monomé-
rica polimeriza-se para formar o coágulo de fibrina.

SISTEMA FIBRINOLÍTICO
Fibrinólise no sangue circulante é um processo natural e constante dirigido
para manter a patência do vaso sangüíneo pela lise de trombo de fibrina. A ativi-

102
dade fibrinolítica ocorre quando o plasminogênio β-globulina é convertido para
a enzima proteolítica ativada, plasmina, por diversos ativadores de plasminogê-
nio sintetizados pelas células endoteliais e outros tecidos. A plasmina então de-
grada a fibrina pela hidrólise em polipeptídeos solúveis chamados produtos de
degradação de fibrina.
A interação entre componentes do sistema fibrinolítico toma lugar dentro do
ambiente local do coágulo sangüíneo. Tanto o plasminogênio quanto o tPA são
derivados do endotélio adjacente e ligam-se especificamente à fibrina, com tPA
convertendo o plasminogênio ligado ao coágulo em plasmina que é ligada a fi-
brina e parcialmente protegida da inibição pela α2-antiplasmina, que é o princi-
pal inibidor circulante de plasmina. A plasmina é liberada após a fibrinólise,
onde é rapidamente neutralizada pela α2-antiplasmina com o excesso de plasmi-
na sendo inativado pela α2-macroglobulina.
O endotélio exerce um papel importante na modulação da fibrinólise in vivo.
Células endoteliais que são expostas à trombina são estimuladas para sintetizar
tanto tPA como inibidor de ativação de plasminogênio PAI-1.

AVALIAÇÃO CLÍNICA E LABORATORIAL

A avaliação pré-operatória da competência hemostática é obrigatória em to-


dos os pacientes, independentemente da magnitude do procedimento cirúrgico.
Um procedimento menor em um paciente com um defeito hemostático pode tor-
nar-se desastroso. Uma história detalhada deve ser tomada, e exame físico reali-
zado em todos os pacientes, com questões específicas dirigidas para sangramen-
to anormal. A história deve delinear tanto o paciente que sangra espontaneamen-
te como aquele que sangra em resposta a um trauma menor. As respostas à extra-
ção dentária e a operações menores e maiores são extremamente úteis. As mani-
festações de sangramento podem dar uma pista para a natureza do defeito.
Trombocitopenia ou uma desordem quantitativa de plaquetas podem ser sugeri-
das por facilidade para equimoses, epistaxes ou sangramentos de mucosa oral.
Por outro lado, hemorragias em articulações, hematomas musculares profundos
e sangramentos retroperitoneais são usualmente causados por defeitos de coagu-
lação. Uma história familiar de tendências hemorrágicas é muito importante e
pode ajudar a identificar o defeito específico. É de especial importância a pes-
quisa, na história, de medicamentos que estejam em uso pelo paciente e que po-
dem causar distúrbios de coagulação. O mais comum entre estes é o ácido acetil-
salicílico.
Pacientes com doenças mieloproliferativas, alguns tipos de neoplasias, cola-
genoses e insuficiência renal têm elevado risco de sangramento. Esplenomega-
lia é associada à trombocitopenia. Hepatopatas apresentam queda na produção
de fatores de coagulação.

103
No exame físico, inspeção deve ser feita com atenção especial para equimo-
ses, petéquias, púrpura, hemangioma, icterícia, hematoma e hemartroses.
Equimose pode ser resultante de anormalidade de coagulação, da parede
vascular ou de plaquetas. Petéquias são associadas a plaquetopenia. Hematomas
e hemartroses freqüentes podem ser atribuídos a doenças hemorrágicas hereditá-
rias.
O tempo de sangramento, um teste muito sensível para hemostasia, é pro-
longado para deficiência qualitativa de plaquetas, baixos níveis de fibrinogênio
e fatores V e VIII. O tempo de protrombina (TP) avalia a via extrínseca e seu au-
mento demonstra deficiência da protrombina, fibrinogênio, fatores V, VII e X.
O tempo de tromboplastina parcial ativado (TTPa) avalia principalmente a
via intrínseca e é prolongado na deficiência de fatores VIII, IX, XI e XII; em me-
nor extensão a via comum que seriam os fatores V, X, protrombina e fibrinogê-
nio. O TTPa também é utilizado para mensurar a eficiência da heparinização. O
tempo de trombina (TT) é alongado nos casos de hipofibrinogenemia, fibrina
defectiva e heparinização.
O tempo de protrombina (TP) avalia a via extrínseca e seu aumento demons-
tra deficiência da protrombina, fibrinogênio, fatores V, VII e X.
Num paciente submetido à operação eletiva, a contagem de plaquetas é o
mais importante teste laboratorial. Sangramento espontâneo pode ocorrer quan-
do contagem de plaquetas é inferior a 20.000/mm3. Valores entre 30.000 e
50.000/mm3 são suficientes para assegurar hemostasia desde que não exista
defeito funcional da plaqueta ou desordem de coagulação. De 50.000-100.000/mm3
são necessárias para estabelecer hemostasia durante sangramento.
Os testes devem ser solicitados baseados na história e exame físico e inclu-
em TP, TTPa, tempo de sangramento e contagem de fibrinogênio. Diretrizes fo-
ram propostas por Rappaport (1983) para atribuir o nível de risco de sangramen-
to intra-operatório, como segue:
Nível 1. História de sangramento é negativa e o procedimento é menor. Ne-
nhum exame laboratorial é recomendado.
Nível 2. História de sangramento é negativa mas o procedimento é maior.
Contagem de plaquetas e TTPa detectam trombocitopenia ou a presença de anti-
coagulante que podem ter sido desenvolvidos sem nenhuma alteração na hemos-
tasia.
Nível 3. História de sangramento eleva a possibilidade de uma desordem he-
morrágica, ou um procedimento maior com múltiplas transfusões é antecipado,
ou trata-se de um paciente no qual mesmo um sangramento menor pode ser peri-
goso (i.e. cirurgia intracraniana, prostatectomia aberta). Tempo de sangramento,
TP, e um teste de solubilidade de coágulo são realizados para determinar defi-
ciência para fator XIII além da contagem de plaquetas e TTPa.
Nível 4. História de sangramento é fortemente positiva para uma desordem
hemorrágica. Além dos testes de rastreamento usados no nível 3, agregometria

104
de plaquetas, testes específicos para fatores VIII e IX para detectar hemofilia A
ou B, um tempo de sangramento para detectar doença de Von Willebrand ou ou-
tras desordens qualitativas de plaquetas, e um tempo de trombina para detectar
disfibrinogemia ou um anticoagulante circulante.

PRINCIPAIS DESORDENS RELACIONADAS À HEMOSTASIA

DESORDEM HEMORRÁGICA DEVIDO À DEFICIÊNCIA DA PAREDE


VASCULAR

Deficiência adquirida ou congênita da parede vascular dificilmente é res-


ponsável por episódios de sangramento severo em pacientes cirúrgicos. Pode-
mos incluir a síndrome de Ehlers-Danlos, pseudoxantoma elástico e síndrome
de Marfan.
Pacientes com síndrome de Ehlers-Danlos apresentam tecidos fragilizados,
articulações hipermóveis e hiperextensíveis e diáteses hemorrágicas; no tipo IV,
os pacientes apresentam quantidade de colágeno tipo III diminuído e 70% fale-
cem de rotura arterial espontânea. Aneurismas e dissecções são também fre-
qüentes. Nestes pacientes deve ser evitada indicação cirúrgica eletiva devido ao
risco de sangramento elevado e dificuldade de cicatrização.
Pseudoxantoma elástico, transmitido por um gene autossômico recessivo,
causa um defeito nas fibras elásticas que provoca uma “fácies” característica
com pele redundante e fraqueza da parede vascular. Estes pacientes são predis-
postos a desenvolver ateromatose precoce e tendência aumentada para trombose
de vasos maiores. Hemorragias espontâneas podem ocorrer principalmente em
trato digestivo ou espaço subaracnóide. Não há alterações nos resultados de tes-
tes laboratoriais.
A síndrome de Marfan é transmitida por um gene autossômico dominante
caracterizado por aracnodactilia, membros longos, defeitos oculares e anormali-
dades cardiovasculares. A principal causa de óbitos é a insuficiência aórtica e
dissecção, porém podem apresentar sangramento excessivo quando submetidos
à operação eletiva.
As causas adquiridas que levam à fraqueza da parede vascular são mais co-
muns que as congênitas. Escorbuto causa diminuição de colágeno e diminuição
da adesão plaquetária. Amiloidose pode resultar em púrpura, equimoses e san-
gramento espontâneo.
A síndrome de Cushing tem a púrpura característica que é secundária à per-
da do tecido conjuntivo dermal.
Doenças inflamatórias, diabetes melito, doenças infecciosas e reação a dro-
gas podem ser responsáveis pela fragilidade da parede vascular.

105
DESORDEM DE PLAQUETAS

Produção deficiente de plaquetas ocorre em pacientes com anemia de Fan-


coni, uma desordem congênita caracterizada por aplasia de medula óssea. Os
efeitos tóxicos da radiação ou drogas como bussulfan, tiazidas e cloranfenicol
levam ao decréscimo da produção de plaquetas. Infecções podem causar trom-
bocitopenia como resultado da produção diminuída bem como causada pela le-
são endotelial, levando ao consumo aumentado de plaquetas. Finalmente,
trombocitopenia pode ser devido à redistribuição de plaquetas por seqüestro ou
diluição.
Trombocitopenia usualmente segue transfusões maciças de sangue estoca-
do. Apenas 10% das plaquetas permanecem íntegras no sangue mantido em es-
toque refrigerado por mais de 24 horas. A porcentagem de plaquetas funcional-
mente normal é ainda menor. Trombocitopenia dilucional, seguida a transfusões
maciças em pacientes cirúrgicos, é extremamente amplificada pelo consumo de
plaquetas pelo processo de coagulação iniciado pelo trauma operatório.
Hipotermia (menos de 32°C) pode também causar trombocitopenia. O me-
canismo de diátese hemorrágica induzido pela hipotermia não é claro. Entretan-
to, o seqüestro de plaquetas durante a hipotermia é bem documentado. Plaquetas
parecem ativas, liberando produtos dos grânulos alfa, agregam-se e são seqües-
tradas na circulação portal. Reaquecimento causa retorno de mais de 80% das
plaquetas circulantes em estudos em animais. Investigadores também têm des-
crito casos de coagulação intravascular disseminada (CID) induzida por hipoter-
mia, talvez causada pela liberação de tromboplastina do tecido lesado pelo frio.
A coagulopatia induzida pelo frio é prevenida pela transfusão de hemoderivados
aquecidos e mantendo a temperatura corpórea acima de 32°C.
Quando as deficiências quantitativas de plaquetas estão presentes no in-
tra-operatório, transfusões de plaquetas são necessárias para aumentar a conta-
gem de plaquetas para mais de 50.000 plaquetas/mm3. No pós-operatório, pla-
quetas devem ser transfundidas em qualquer paciente com menos de 50.000 pla-
quetas/mm3. Pacientes sem sangramento com menos de 20.000 plaquetas/mm3
devem ser seguidos atentamente para sinais de sangramento espontâneo e trans-
fusão se sangramento ocorrer.
Cada bolsa contém 5,5 x 1010 plaquetas em 50 a 70ml de plasma. Em um in-
divíduo adulto, de cerca de 70kg, espera-se que cada unidade aumente em
5.000-10.000 plaquetas/mm3 na contagem periférica.

DEFICIÊNCIAS QUALITATIVAS DE PLAQUETAS

As deficiências qualitativas de plaquetas devem sempre ser suspeitadas


quando ocorre sangramento espontâneo em pacientes com exames laboratoriais
de coagulação e contagem de plaquetas normais.

106
Elas podem ser congênitas ou adquiridas (mais freqüentes).
Doença de Von Willebrand é o distúrbio de coagulação congênito mais co-
mum. É mais freqüentemente transmitida como um caráter autossômico domi-
nante, mas herança recessiva pode ocorrer. A doença é caracterizada por um
defeito hemostático dual. Primeiro, há uma deficiência ou disfunção do fator de
Von Willebrand (vWF), o qual é importante na adesão plaquetária para a super-
fície subendotelial. Este é mediado pelo receptor plaquetário, GPIb, de uma pla-
queta inativa que se liga com vWF que está presente no subendotélio. Este
defeito causa prolongamento do tempo de sangramento devido à formação pre-
judicada de tampão plaquetário. Embora a adesão plaquetária esteja anormal em
pacientes com doença de Von Willebrand, a secreção plaquetária e agregação
não são afetadas. Segundo, há uma deficiência de atividade coagulante do fator
VIII (defeito primário da hemofilia A) que contribui para o defeito hemostático.
A redução na atividade do fator VIII:C não é maior que aquela vista na hemofilia
A e é usualmente variável.
O subtipo mais comum de doença de Von Willebrand é o tipo I, o qual é pre-
sente em 80% dos casos; manifesta-se por diminuição quantitativa no antígeno
vWF e pela atividade do co-fator ristocetina. Uma anormalidade qualitativa na
proteína que previne formação de multímeros está presente no subtipo IIa; tipo
IIb é causado por uma anormalidade qualitativa na proteína que causa clarea-
mento rápido de grandes formas multiméricas. O tipo IIa tem um decréscimo
marcante na atividade do co-fator ristocetina e pode, portanto, ser diferenciado
daqueles outros subtipos. No tipo III da doença de Von Willebrand, o antígeno
vWF e a atividade do co-fator ristocetina são virtualmente ausentes; esta é uma
desordem autossômica recessiva rara. A pseudodoença de Von Willebrand é ca-
racterizada por clareamento rápido de multímeros grandes de vWF do plasma
devido a uma anormalidade na GPIb plaquetária. Pacientes afetados desenvol-
vem uma leve trombocitopenia.
Os defeitos qualitativos adquiridos são freqüentemente associados à ingestão
de drogas que inibem a agregação plaquetária, sendo a mais comum o ácido acetil-
salicílico.
A adesão aumentada de plaquetas é observada após parto e intervenções ci-
rúrgicas, em doença cardíaca isquêmica, aterosclerose, esclerose múltipla, tu-
mores intracranianos, tromboembolismo e hiperlipemia.
Diversos agentes vasopressores agregam plaquetas, por exemplo, adrenali-
na, noradrenalina e serotonina. Por outro lado, várias drogas hipotensoras ou va-
sodilatadoras tais como intensain, papaverina, fentolamina, propranolol e
trinitrato de gliceril, inibem a agregação plaquetária. É possível, portanto, que
vários agentes vasoativos presentes na circulação possam influenciar a agrega-
ção plaquetária e adesão plaquetária.

107
DESORDENS DE FATORES DE COAGULAÇÃO

Desordens congênitas de fatores de coagulação incluem hemofilias A e B,


doença de Von Willebrand e deficiências de outros fatores, desordens na con-
versão de protrombina, anormalidades de fibrinogênio e desordens congênitas
de plaquetas. Pacientes com estas desordens geralmente têm uma história fami-
liar positiva ou história pessoal positiva para problemas de sangramento.
Desordens congênitas de coagulação freqüentemente envolvem um único
fator. Transfusão pré-operatória de fator apropriado é necessária e pode ser re-
querida durante a operação e no pós-operatório. Deficiências de fator XII, cini-
nogênio de alto peso molecular e pré-calicreína causam prolongamento do TTPa
mas não causam diátese de coagulação significativa. Deficiências dos fatores re-
manescentes (exceto III e IV) podem resultar em sérios sangramentos consecuti-
vos à operação ou ao trauma.
Hemofilia A é o mais comum dos defeitos de coagulação. É devida à defi-
ciência de fator VIII. Hemofilia B (doença de Christmas) é clinicamente indis-
tinguível da hemofilia A e devida à deficiência de fator IX. Tanto a hemofilia A
quanto a hemofilia B são desordens recessivas ligadas ao sexo, mas a hemofilia
A é sete vezes mais freqüente (1:10.000). Quantidades deficientes de fatores
VIII e IX resultam em insuficiências para hemostasia secundária e são freqüen-
temente associadas a sangramento episódico em tecidos profundos, com resul-
tantes hematomas e hemartroses. Sangramento excessivo freqüentemente segue
o trauma ou operação. A severidade destas desordens depende da quantidade de
atividade de fator VIII ou IX plasmático que está presente; a presença de mais
que 5% de atividade normal do fator plasmático prevenirá o sangramento espon-
tâneo. A atividade de fator VIII:C plasmático deve ser 50% do normal para a ma-
ioria das operações eletivas; pacientes tratados pelas cirurgias cardíaca, vascular
e neurocirurgia necessitam de 80-100% de atividade normal do fator VIII:C.
Níveis apropriados de fator VIII podem ser restaurados pela transfusão de
plasma fresco congelado, crioprecipitado ou fator VIII purificado. Plasma fres-
co congelado ou fator IX purificado podem ser utilizados em pacientes com do-
ença de Christmas. Atividade de fatores plasmáticos deve ser seguida no
pós-operatório e mantida acima de 25% até ocorrer cicatrização adequada. Paci-
entes podem necessitar de transfusões por sete a 21 dias. Acima de 10% dos pa-
cientes com deficiência de fator VIII desenvolverão anticorpos para fator VIII.
Estes pacientes necessitarão de grandes quantidades de fator VIII para mante-
rem níveis adequados de atividade plasmática. Níveis de fator VIII podem ser
suficientemente aumentados pelo DDAVP (desmopressina) em pacientes com
hemofilia A leve, para permitir operação eletiva segura. Sangramento de feri-
mentos superficiais ou superfícies intra-operatórias podem ser controladas pela
combinação de pressão ou trombina tópica.

108
Anormalidades do fibrinogênio podem também ser hereditárias. Afibrino-
genemia é herdada com caráter autossômico recessivo e é muito rara. Disfibri-
nogenemia refere-se a traço autossômico dominante caracterizado pela síntese
de fibrinogênio estruturalmente anormal. Pacientes com estas desordens podem
desenvolver complicações hemorrágicas. O nível de fibrinogênio normal neces-
sário para hemostasia é 100 mg/dl. Este nível pode ser obtido pela transfusão de
crioprecipitado ou plasma fresco congelado.
Estados hiperfibrinolíticos congênitos que podem resultar em sangramento
têm sido descritos. Os estados hiperfibrinolíticos congênitos incluem deficiênci-
as heterozigotas ou homozigotas de α2-antiplasmina, níveis elevados de t-PA e
PAI-1 funcionalmente anormais. Ácido épsilon aminocapróico (EACA) é reco-
mendado para tratar pacientes que podem sangrar devido ao estado hiperfibrino-
lítico congênito.

DESORDENS ADQUIRIDAS

Alguns pacientes desenvolvem desordens de coagulação adquiridas devido


a deficiências de proteínas de coagulação, síntese de fatores de coagulação
não-funcionantes e consumo ou reposição inadequada de proteínas de coagula-
ção. A insuficiência hepática pode contribuir para sangramento significante em
pacientes cirúrgicos como resultado de redução em fatores II, V, VII, IX, X, XIII
e fibrinogênio. Entretanto, níveis de fator VIII:C e VIII:vWF podem estar eleva-
dos nestes pacientes. A presença de CIVD subclínica em pacientes com insufi-
ciência hepática de longa duração ou severa tem sido postulada. A correção da
coagulopatia em pacientes com insuficiência hepática avançada pode não ser
possível exceto pela terapia de reposição. Reposição de proteínas de coagulação
com plasma fresco congelado é recomendada porque a administração de vitami-
na K1 isolada não pode, especialmente com insuficiência hepática avançada, re-
verter a coagulopatia. A trombocitopenia associada com insuficiência hepática
deve ser tratada com transfusões de plaquetas.
Deficiência de vitamina K pode causar diátese hemorrágica como resultado
da síntese de formas não-funcionais de fatores de coagulação vitamina
K-dependente (II, VII, IX e X). A deficiência de vitamina K pode ser causada
por dieta pobre em vitamina K, antibioticoterapia, função hepática anormal e
obstrução biliar. A administração de vitamina K1, 10 a 20mg subcutâneo ou in-
tramuscular, corrigirá o defeito hemostático em 24 a 48 horas, se a função hepá-
tica estiver adequada. Vitamina K1 intravenosa (2,5mg) ajudará a restaurar o de-
feito de coagulação mais rapidamente. Plasma fresco congelado pode ser usado
para corrigir o defeito hemorrágico prontamente e é preferível se o paciente será
anticoagulado com warfarina novamente. A vitamina K1 deve ser administrada
no pré-operatório em pacientes com insuficiência hepática, icterícia obstrutiva e

109
estados de má absorção ou desnutrição para aumentar o nível de proteínas de coa-
gulação vitamina K-dependentes.
O sangue estocado utilizado para transfusão maciça contém pouca, se algu-
ma, plaqueta funcional e pode ser deficiente em fatores V e VIII. A diluição de
fatores V e VIII circulantes devido à transfusão maciça, entretanto, mais signifi-
cativamente, potencia a diátese hemorrágica pós-operatória freqüentemente as-
sociada com operações longas complicadas pela hipotensão e pela perda maciça
de sangue.
Pacientes com doenças vasculares podem ter complicações hemorrágicas
secundárias a anticoagulação excessiva. A heparina tem meia-vida de 90 minu-
tos; portanto, a infusão de heparina deve ser parada uma a duas horas no
pré-operatório para assegurar a hemostasia. Sangramento decorrente de hepari-
na excessiva pode ser neutralizado pela administração de sulfato de protamina
diluído, 1mg/100 unidades de heparina, lentamente para evitar hipotensão. Paci-
entes devem aguardar dois a quatro dias após a parada da anticoagulação com
warfarina antes de serem submetidos a operação eletiva. Deficiências de fatores
de coagulação vitamina K-dependente podem ser corrigidas lentamente com ad-
ministração de vitamina K e mais rapidamente com plasma fresco congelado.
A coagulação intravascular disseminada é caracterizada pela coagulação in-
travascular com consumo de fatores de coagulação e plaquetas e ativação secun-
dária do sistema fibrinolítico. Sua etiologia pode ser atribuída a destruição teci-
dual maciça, sepse, hipotensão, trauma, reação transfusional, fístula arteriove-
nosa, hemangioma cavernoso, vasculite, insuficiência hepática e aneurisma. De-
posição de fibrina e plaquetas ocorre na microcirculação enquanto o plasmino-
gênio é convertido em plasmina, a qual inicia fibrinólise e mantém a patência da
microcirculação. Hemorragia é associada com CIVD severa porque as deficiên-
cias de fatores de coagulação e plaquetas desenvolvem-se como resultado do
consumo intravascular contínuo. Os produtos de degradação de fibrina, resul-
tantes da fibrinólise secundária, possuem um forte efeito anticoagulante e poten-
ciam a diátese hemorrágica.
A CIVD pode existir naqueles em que os fatores de coagulação e plaquetas
são repostos e então consumidos (isto é, uma CIVD compensada). Este tipo de
CIVD é diagnosticado apenas pelos testes laboratoriais. A presença de equimo-
ses e petéquias em pacientes devem alertar o cirurgião para a possibilidade de
CIVD de baixo grau. Durante a operação, a CIVD pode ser acelerada pelo trau-
ma tecidual, hipotensão e/ou reações transfusionais; com o consumo de fatores
de coagulação e plaquetas agora ocorrendo mais rapidamente que eles podem
ser repostos, levando à hemorragia excessiva. Apesar da etiologia, o cirurgião
deve estar alerta para o desenvolvimento de CIVD, tanto pelo sangramento per-
sistente de superfícies novamente incisas, indicando uma falha da hemostasia,
quanto pelo sangramento “fresco” de áreas previamente secas, indicando lise de
coágulos previamente formados.

110
Uma combinação de resultados de testes laboratoriais anormais, incluindo
trombocitopenia, prolongamento do TP e TTPa, hipofibrinogenemia e aumento
nos produtos de degradação de fibrina, confirma o diagnóstico clínico de CIVD.
No momento da operação um teste de coagulação de sangue total pode ser reali-
zado colocando-se 1ml de sangue em um tubo de vidro e avaliando a formação
de coágulo. Falha do sangue em coagular ou a formação de coágulo friável que
sofre lise dentro de uma hora sugere a presença de CIVD.
O primeiro objetivo do tratamento é a eliminação da causa de CIVD. Quan-
do possível, a coagulação intravascular cessa com o retorno da hemostasia nor-
mal. Em CIVD severa, com perda de sangue contínua, pacientes são mais bem
tratados pela reposição de elementos deficientes do sangue utilizando sangue to-
tal, plasma fresco congelado e plaquetas enquanto a causa precipitante da CIVD
é eliminada. Se a causa da CIVD não pode ser eliminada, transfusão de hemode-
rivados pode aumentar o consumo de fatores de coagulação.
Alguns investigadores têm proposto que a heparina pode ser benéfica em
parar o processo de consumo em CIVD. A administração de heparina é ocasio-
nalmente benéfica naqueles pacientes com sangramento ativo nos quais a repo-
sição de hemoderivados é incapaz de restaurar os níveis de fatores de coagula-
ção. A heparina deve ser utilizada cuidadosamente, em dose de ataque de 3.000
unidades intravenosas seguido de 300-500 unidades/hora, com observação clí-
nica cuidadosa pela monitorização laboratorial. O EACA, o qual inibe a lise do
coágulo por prevenir a ligação do plasminogênio a fibrina, não deve ser usado
para tratar qualquer hiperfibrinólise secundária persistente. Entretanto, quando
o estímulo para a coagulação intravascular for removido e a CIVD estiver con-
trolada, o EACA pode ser usado para tratar qualquer hiperfibrinólise secundária
persistente. A dose usual de EACA é 5mg intravenosa como dose de ataque e
1g/hora até que a lise excessiva seja controlada, usualmente em três a seis horas.
A hiperfibrinólise primária é uma causa rara de sangramento e é freqüente-
mente difícil de distinguir da hiperfibrinólise secundária da CIVD. Ambas as
condições são caracterizadas pela redução de proteínas de coagulação. A conta-
gem de plaquetas é normal em pacientes com hiperfibrinólise primária e é dimi-
nuída em pacientes com CIVD. Hiperfibrinólise primária está associada com
condições que causam ativação fibrinolítica excessiva, tais como trauma elétri-
co, circulação extracorpórea, hipoxemia aguda, acidose severa e leucemia. O
tratamento consiste na remoção (isto é, circulação extracorpórea) ou melhoria
das condições (isto é, hipoxemia, acidose, leucemia) que levaram a hiperfibrinó-
lise primária. O EACA é oferecido se o estado hiperfibrinolítico persistir.

BIBLIOGRAFIA
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112
11 Fios de Sutura

Aldo da Cunha Medeiros

INTRODUÇÃO
O fio de sutura começou a ser usado para o fechamento das feridas 3.500
anos antes de Cristo, no Egito22, e até hoje o ato de suturar continua o método
mais comum para reaproximação das bordas das feridas cirúrgicas. A seleção do
material de sutura deve ser baseada nas propriedades biológicas dos tecidos a se-
rem aproximados, nas características físicas e biológicas dos fios e nas condi-
ções da ferida a ser fechada.
Mesmo com o avanço atual da tecnologia, permanece verdadeira a idéia de
que nenhum fio de sutura tem todas as características que o classifiquem como o
fio ideal.

QUALIDADES DO FIO DE SUTURA IDEAL


• Resistência adequada.
• Mínima reação tecidual.
• Não se degradar em produtos tóxicos.
• Não facilitar a infecção e permanecer estável na sua presença.
• Calibre e resistência constantes.
• Coeficiente de atrito adequado.
• Capacidade de manter a resistência até quando necessária.
• Velocidade de absorção não afetada pelos líquidos corporais.
• Ser de fácil manuseio — nó fácil e firme.
• Elasticidade adequada.
• Não ser alterado com a esterilização.
• Ter baixa capilaridade.
• Não-alergênico e não-mutagênico.

113
• Ser de baixo custo.
Os fios de sutura podem ser classificados de acordo com vários parâmetros
que dizem respeito a sua estrutura, origem do material e permanência nos teci-
dos. Assim, quanto à degradação que eles sofrem in vivo são classificados em
duas grandes categorias como absorvíveis e inabsorvíveis, ambas com fios que
são fabricados de fibras naturais ou de materiais sintéticos. Embora os fios de
fibras naturais tenham sido usados por muito tempo e até hoje o são com bons
resultados, os fios sintéticos mais modernos são considerados mais adequados.
Entre outras razões, pela reação tecidual mais baixa quando comparados com
os fios naturais ou orgânicos21. Os fios de sutura podem também ser caracteri-
zados por sua configuração física. Aqueles constituídos de um único filamento
são ditos monofilamentares e os formados por múltiplas fibras, trançadas ou
torcidas, são chamados multifilamentares. O náilon e o aço são exemplos de
fios disponíveis tanto como monofilamentares quanto multifilamentares.
A classificação geral dos fios de sutura pode ser observada na Fig. 11.1,
onde foram acrescentados os nomes comerciais de alguns deles, com a única fi-
nalidade de facilitar a identificação dos mesmos.
A decisão do uso de fio absorvível, inabsorvível, monofilamentar ou multi-
filamentar depende de uma série de fatores. Há que se considerar o tempo ne-
cessário para a ferida cicatrizar, a tensão suportada pelos tecidos durante o pro-
cesso de cicatrização e a questão da necessidade temporária ou permanente do
fio de sutura para garantir o suporte mecânico. Estudos experimentais revela-
ram que os fios de sutura em feridas da parede abdominal pararam de exercer
suporte mecânico entre os dias 15 e 28 do pós-operatório13, e que a aponeurose
readquiriu apenas 41% de sua resistência inicial dois meses após ter sido sutu-
rada8. Tanto achados como estes, quanto a complexa dinâmica das estruturas
músculo-aponeuróticas da parede abdominal e sua suscetibilidade a hérnias in-
cisionais e deiscências, têm provocado discussão a respeito da escolha do me-
lhor fio de sutura a ser usado.
As variações no comportamento dos diferentes tipos de materiais de sutura
têm sido amplamente estudadas in vivo, in vitro, experimental e clinicamente,
cada estudo ressaltando as qualidades de cada um deles. Em geral, os fios monofi-
lamentares são apontados como mais vantajosos, pois os multifilamentares pro-
porcionam condições propícias para o desenvolvimento de infecção, uma vez que
colônias bacterianas são formadas nos espaços entre os filamentos17. Os fios ab-
sorvíveis naturais (categute) são responsáveis pela reação inflamatória mais in-
tensa entre todos os fios de sutura, além de apresentarem um tempo de absorção
muito curto e imprevisível. O aparecimento dos fios absorvíveis sintéticos foi
muito promissor, por vários motivos: a) desencadeiam reações inflamatórias sig-
nificativamente menores que os absorvíveis naturais; b) mantêm muito da sua
resistência até que o processo de absorção tenha início e se complete; c) são dis-
poníveis com tempos de absorção curto, médio e longo, dando oportunidade

114
Fig. 11.1 — Classificação dos fios de sutura disponíveis.

para o cirurgião escolher o fio adequado para cada caso; d) a qualidade mecâni-
ca dos nós é a mesma para todos os fios absorvíveis sintéticos testados24.
A descrição de cada fio de sutura é feita a seguir.

ABSORVÍVEIS
Categute
Fio fabricado a partir do colágeno extraído da submucosa do intestino de
ovinos ou da serosa intestinal de bovinos, existe disponível sob a forma de cate-

115
gute simples e categute cromado. O simples perde metade da resistência após
cinco a sete dias nos tecidos e 100% após três a quatro semanas. O tratamento do
fio com sais de cromo prolonga o tempo de absorção e aumenta sua resistência à
tensão. O categute cromado perde 50% da resistência em 19 a 20 dias e 100%
após cinco semanas nos tecidos. Trata-se de um fio monofilamentar, absorvido
pelo mecanismo de digestão enzimática, que provoca reação tecidual significati-
vamente mais intensa do que os absorvíveis sintéticos27.
Deve ser evitado em suturas de tendões e fáscias, uma vez que são estruturas
de cicatrização lenta, que são submetidas a esforços e tensões constantes. Além
disso, o tempo de absorção do categute é imprevisível. É contra-indicado em su-
turas de úlceras duodenais sangrantes ou perfuradas, anastomoses pancreatoje-
junais e anastomoses biliares, pois pode ser rapidamente desintegrado pela ação
de enzimas proteolíticas 5.

Ácido Poliglicólico (Dexon)


Fio multifilamentar trançado, sintético, absorvível por hidrólise, na qual é li-
berado o monômero ácido glicólico solúvel. Foi demonstrado experimental-
mente que o ácido poliglicólico perde totalmente sua resistência após 28 dias
nos tecidos e é 100% absorvido decorridos 60 dias20. Estudo clínico mostrou que
o fechamento de parede abdominal com ácido poliglicólico resultou em 16% de
infecção, índice significativamente maior do que os 7% de infecção que ocorre-
ram quando as feridas foram fechadas com fio absorvível sintético monofila-
mentar15. Estudo in vitro3 concluiu que o ácido glicólico tem ação antibacteriana
potente, podendo ser importante na destruição de bactérias associadas com in-
fecção de feridas operatórias. Estudo in vivo não confirmou essa hipótese9.

Poliglactina 910 (Vicril)


Multifilamentar, é formado por 90% de ácido glicólico e 10% de ácido láti-
co. Cerca de 50% do fio é absorvido por hidrólise após o 28º dia pós-operatório e
100% após o 70º dia4,20. Quando comparado com a polidioxanona (PDS) em su-
turas intradérmicas quanto à presença de eritema, enduração, infecção e cicatriz
hipertrófica, não houve diferença significativa4. Usado em pieloplastia experi-
mental em coelhos, revelou-se o fio mais adequado em comparação com outros
fios absorvíveis naturais e sintéticos27.
Os materiais de sutura interagem com células imunocompetentes, podendo
afetar a imunidade do hospedeiro. Em trabalho experimental foi estudada a in-
fluência de fatores solúveis de vários fios de sutura sobre a função dos macrófa-
gos. Verificou-se que sua capacidade de fagocitose, de aderência, de produção
de lisozima e de fator de necrose tumoral foi significativamente mais afetada
pela poliglactina, em comparação com os demais fios26.

116
Polidioxanona (PDS)

Fio monofilamentar produzido a partir da polimerização da paradioxanona.


De cor violeta, absorvido por hidrólise, seu tempo de absorção é mais prolonga-
do que o da poliglactina. Estudo em ratos mostrou que a polidioxanona estava
presente em anastomoses vasculares após 120 dias, sugerindo que esse material
é seguro em suturas vasculares23. Em média a absorção do fio inicia-se após 90
dias e termina após 180 dias. Microanastomoses realizadas em úteros de ratas
mostraram que a polidioxanona provocou a menor reação inflamatória quando
comparada com ácido poliglicólico, poliglactina, seda e polipropileno16. Estudo
in vitro demonstrou que os fios de sutura liberam fatores imunotóxicos que in-
fluenciam consideravelmente o comportamento dos macrófagos e que esses efei-
tos podem ter implicações clínicas importantes. Dentre os fios testados no estu-
do, a polidioxanona e o aço foram os materiais que provocaram menor inibição
nas funções dos macrófagos26.

Poliglecaprone (Monocril)

Monofilamentar absorvível, é um copolímero da épsilon-caprolactona e gli-


colida. Testes laboratoriais mostraram que apresenta excelente facilidade de
manuseio, resistência mínima durante a passagem através dos tecidos e resistên-
cia à tensão adequada. O tempo de absorção completa-se entre 90 e 120 dias de
implantação nos tecidos, com mínima reação tecidual2.

Poligliconato (Maxon)

Monofilamentar de absorção lenta, apresenta alta resistência. Estudo clíni-


co randômico demonstrou que o poligliconato, mesmo usado com menor diâ-
metro do que o ácido poliglicólico, manteve grande resistência à tensão no
pós-operatório, quando empregado no fechamento de parede abdominal25. Em
se tratando de fio monofilamentar, apresentou índice de infecção significativa-
mente menor (7%) no fechamento de laparotomias, quando comparado com o
ácido poliglicólico (16%)15. Apresenta o nó mecanicamente mais seguro do
que o poliglecaprone e poliglactina24. Estudo realizado em coelhos, em que fo-
ram realizadas anastomoses da artéria femural sob tensão normal e aumentada
mostrou, à microscopia óptica e eletrônica, que o fio de poligliconato mantém
a resistência à tensão até a completa cicatrização das anastomoses. A reação te-
cidual revelou-se mínima e a absorção completa foi seguida de regeneração to-
tal da parede vascular, demonstrando que o fio é adequado para esse tipo de te-
cido6.

117
INABSORVÍVEIS
Algodão, Linho e Seda
São fios multifilamentares de fibras naturais, possuem elevada resistência,
são de fácil manuseio e proporcionam nó mecanicamente firme. Sua grande vir-
tude é o baixo custo, razão pela qual ainda hoje são amplamente utilizados em
muitos hospitais. Por serem multifilamentares de alta capilaridade, potenciali-
zam a infecção mais do que os fios monofilamentares inabsorvíveis. A intensa
reação inflamatória que provocam diminui a resistência dos tecidos à infecção e
a estrutura multifilamentar retém as bactérias na sua intimidade. Isso facilita a
infecção de parede, a formação de fístulas e a eliminação de pontos através das
feridas operatórias. Desse modo, esses fios devem ser evitados na sutura de feri-
das que apresentam contaminação bacteriana grosseira. A seda, em particular,
exerce um considerável efeito inibidor sobre as funções dos macrófagos, preju-
dicando principalmente a adesividade dessas células26.

Poliéster (Dacron, Mersilene)


Confeccionado através da polimerização de éster resultante da combinação
do etilenoglicol com o ácido tereftálico, é multifilamentar, trançado, de alta re-
sistência. Por ser um fio de alto coeficiente de atrito, o manuseio não é dos mais
fáceis, o que torna seu uso limitado. Os nós apresentam qualidades mecânicas
desfavoráveis, o que fez com que se tentasse a melhoria da qualidade revestindo
sua superfície com teflon, silicone e polibutilato, visando também diminuir sua
capilaridade.
O poliéster induz uma reação tecidual significativamente maior do que o po-
lipropileno no fechamento de feridas abdominais, com maior risco de infecção7.
A adição de materiais inertes e impermeáveis como cobertura dos filamentos de
poliéster não alterou significativamente a resposta inflamatória tecidual, nem
fez diminuir a incidência de infecção em feridas contaminadas suturadas com
esse fio. Assim sendo, deve ser evitado em feridas com essas características.

Poliamida (Náilon)
Disponível como monofilamentar e multifilamentar trançado, o náilon pro-
voca pequena reação tecidual, pode ser utilizado e é bem tolerado em tecidos in-
fectados na apresentação monofilamentar. É de baixo custo, de fácil manuseio,
porém, os nós podem desfazer-se com muita facilidade. Tal característica obriga
o cirurgião a confeccionar múltiplos nós em cada ponto de uma sutura, fazendo
com que bactérias proliferem nas reentrâncias desses nós.
Tido outrora como material quimicamente inerte, o náilon decompõe-se ao
longo do tempo em 1-6-hexanodiamina e ácido adípico, de maneira que após

118
seis meses nos tecidos perde quase totalmente sua resistência à tensão12. Essa
perda de resistência dá-se pela degradação química e não por fenômenos físi-
cos como exaustão da matéria ou desfeita dos nós. Enzimas proteolíticas
provocam a hidrólise ao atacarem o grupo amida do polímero, resultando em
1-6-hexanodiamina e ácido adípico. Estudo in vitro indicou uma provável ação
antibacteriana desses produtos de degradação do náilon, capazes de reduzir o
número de colônias de Staphylococcus aureus em concentrações variadas3.
Entretanto, quando o fio foi implantado no subcutâneo de ratos por um período
prolongado, seus supostos produtos de degradação não apresentaram qualquer
ação antibacteriana10.

Polipropileno (Prolene, Surgilene)

Fio monofilamentar, disponível na cor azul, biologicamente inerte mesmo


na presença de infecção. É de fácil manuseio, o nó é firme, tem elasticidade ade-
quada e grande resistência química a ácidos, álcalis e enzimas1. Sua resistência à
tensão permaneceu imutável em testes realizados após vários anos de implanta-
ção nos tecidos. O polipropileno apresenta grande resistência à ruptura, embora
possa com facilidade ser fraturado pelo porta-agulhas, como ocorre freqüente-
mente com os fios monofilamentares. A alta resistência, aliada à adequada elas-
ticidade, faz dele um fio adequado para anastomoses vasculares, anastomoses de
tendões14 e suturas da parede abdominal13.

Politetrafluoroetileno (PTFE)

Recentemente introduzido no mercado, é um fio monofilamentar


não-absorvível que está sendo testado com bons resultados na cirurgia plástica.
Em estudo comparativo com 10 outros fios de sutura, foi verificado que o PTFE
provocou a menor reação tecidual, tornando-o considerado o fio de escolha para
a cirurgia plástica facial, onde são críticos os resultados funcionais e estéticos21.

Polibutester (Novafil)

Monofilamentar sintético não-absorvível que apresenta elasticidade, flexi-


bilidade e resistência à tensão, diferenciando-o dos outros fios da mesma catego-
ria. O grau de alongamento no momento da ruptura e a segurança dos nós são se-
melhantes aos encontrados nos outros fios de sutura inabsorvíveis sintéticos mo-
nofilamentares18. Essas características o tornam potencialmente benéfico para
fechamento da parede abdominal19. O fio foi testado na pele da parede abdomi-
nal para aferir o grau de hipertrofia e largura da cicatriz, e a presença de marcas
transversais. Concluíram os autores que o polibutester diminui o risco de cicatriz

119
hipertrófica por possuir especial elasticidade, que permite adaptação dos tecidos
à tensão que é exercida sobre eles. Quando comparado com o náilon, mostrou-se
superior em todos os parâmetros estudados18. Em anastomoses vasculares o po-
libutester demonstrou grande facilidade de manuseio, nó firme, e elasticidade
mais adequada que o polipropileno para acompanhar a complacência dos va-
sos11.

Aço (Aciflex)

O índice de infecção relativamente alto encontrado com o uso de fios de aço


mono ou multifilamentares pode ser o resultado de suas características físicas e
químicas. O aço não é tão inerte quanto os polímeros sintéticos. O metal pode
degradar-se através da corrosão ou por eletrólise, resultando em lenta transfe-
rência de íons metálicos para os tecidos. Ambos os processos são muito lentos,
mas podem ter importância na etiologia da infecção de ferida operatória. Os fios
de aço, por serem rígidos, podem provocar considerável irritação mecânica nos
tecidos com os movimentos dos operados, gerando desconforto. O tecido assim
lesado pode tornar-se suscetível à infecção.
O fio de aço é de alta resistência e de difícil manuseio pela escassa flexibili-
dade que apresenta. É freqüentemente utilizado nas suturas em massa da parede
abdominal, nas esternorrafias e na cirurgia traumato-ortopédica.

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121
12 Suturas Digestivas

Orlando Marques Vieira

INTRODUÇÃO
O propósito desta apresentação é o de descrever os fundamentos básicos das
suturas digestivas. É de nosso alcance a possibilidade do emprego de várias for-
mas de suturas como as mecânicas, no entanto, achamos conveniente uma dis-
cussão sobre os procedimentos cirúrgicos fundamentais na cirurgia digestiva,
ainda hoje em uso rotineiro.
As operações de fechamento, as suturas, da parede dos segmentos esôfago,
gastrointestinais ou as anastomoses entre os diversos segmentos do tubo digesti-
vo são freqüentes e portanto aplicadas comumente, quer em cirurgias eletivas,
quer em procedimentos de emergências.
O êxito das suturas ou anastomoses digestivas dependerá do emprego de
uma técnica cirúrgica adequada e deverá seguir princípios básicos que são: 1)
aproximação adequada dos planos; 2) boa perfusão; 3) evitar a tração; 4) ser her-
mética; 5) boa hemostasia; 6) evitar a contaminação; 7) evitar a estenose e 8) re-
mover as coleções próximas das suturas7,8.
No tubo digestivo são utilizadas suturas em pontos separados ou contínuos.
Levando em consideração os planos envolvidos da parede, podem ser em pla-
no único (Figs. 12.1, 12.2 e 12.3) ou em vários planos, neste caso a mais co-
mum é a sutura em dois planos (Fig. 12.4), que foi a preferida durante vários
anos.

SUTURAS DIGESTIVAS

a) Pontos separados Plano único


ou
b) Contínuas Vários planos (dois planos)

123
Fig. 12.1 — Esquema de ponto em sutura em plano único (Lager L, Patel J). Notar que a agulha
atinge a serosa até a muscular e deixa livre a camada mucosa.

Fig. 12.2 — Sutura em plano único seromuscular. O ponto permite a invaginação da borda da feri-
da.

124
Fig. 12.3 — Ponto único total. Todas as camadas são englobadas na sutura que deve provocar a
invaginação da borda.

Fig. 12.4 — Sutura em dois planos. O plano total será sepultado pelo plano seromuscular.

125
SUTURA EM UM OU DOIS PLANOS

Durante décadas predominou o emprego da técnica em dois planos. A sutura


em plano único, embora aplicada há muito tempo, somente a partir dos anos 60
foi utilizada amplamente. A técnica em plano único evita a criação da crista cau-
sada pelo enrugamento da sutura mucosa e como já demonstrado tem uma cica-
trização mais adequada.

Esôfago

O esôfago, por não ter serosa no revestimento é sempre suturado com risco
de deiscência. As suturas da parede esofagiana podem ser realizadas de diversas
formas, mas a preferência recai sobre as suturas em pontos separados e com
aproximação independentes da mucosa (Fig. 12.5) com fio absorvível ou inab-
sorvível a seda-000 por exemplo, e da muscular com fio não absorvível. Não fica
descartado o uso de plano único com sutura exclusiva da muscular.
Como as suturas esofagianas são de risco elevado, quanto a deiscência, al-
guns preferem o fechamento ou as anastomoses em dois tempos, que consiste,
por exemplo, no nível cervical, em realizar uma esofagostomia proximal e anco-
ramento do coto distal e no segundo tempo fechamento definitivo cem realiza-
ção da anastomose5.

Fig. 12.5 — Sutura do esôfago em dois planos. À esquerda o primeiro plano, só suturada a muco-
sa. À direita, fechamento do plano muscular.

126
Suturas Gastrointestinais

As suturas do estômago, do duodeno, jejuno, íleo e colo seguem os mesmos


princípios. É necessário acentuar, no entanto, que a parede gástrica, com uma
rica rede vascular, principalmente na submucosa, obriga a cuidados de hemosta-
sia importantes, sem dúvida; quando da realização de uma sutura em plano úni-
co, a ligadura dos vasos da submucosa é importante.
Ao suturarmos uma alça intestinal podemos aplicar o ponto separado, em
plano único, ou mesmo o plano total, neste último, havendo a necessidade de su-
tura invaginante, promovendo a adesão da camada serosa, princípio básico a ser
aplicado nas rafias intestinais.
Os pontos separados em plano único, a conhecida sutura de Lambert, é a se-
romuscular que favorece a aproximação da serosa.
Além da sutura em plano único, é muito usada, ainda, a sutura em dois pla-
nos a primeira total com a sutura englobando todos as camadas e o segundo pon-
to, seromuscular, invaginando a primeira sutura. No fechamento, em dois pla-
nos, diversos fios são utilizados, os mais comuns são os absorvíveis, para as su-
turas totais, e os inabsorvíveis, para a seromuscular.
O fechamento em sutura contínua, muito comum, pode ser feito de diversos
modos, sempre mantendo os princípios básicos das suturas digestivas, a boa
aproximação dos planos, a hemostasia e serem herméticos.
A sutura contínua mais elementar é a sutura total em pontos simples poden-
do ou não ser interrompida (Fig. 12.6). Outros tipos de suturas contínuas mere-
cem citação, sempre procurando invaginar a parede e ajustando a serosa.
As suturas mais comuns são: a sutura contínua com o ponto de Schmieden
(Fig. 12.7), na qual o fio sempre entra pela mucosa. O ponto de Connell-Mayo
(Fig. 12.8) é o ponto em U em cada lado da sutura, o meio mnemônico é o sero-
sa-mucosa e mucosa-serosa do mesmo lado, a seguir do outro lado. Todos estes
tipos de fechamento de uma alça intestinal têm a propriedade de invaginar as
bordas da ferida.

Anastomose Terminoterminal

Bom afrontamento das bocas é essencial. Inicia-se a sutura posterior, contí-


nua, total realizada na superfície mucosa com pontos interrompidos ou não. A
sutura anterior deve ser feita em plano total, mas invaginando as paredes, o que
favorece a aproximação da serosa (Fig. 12.9).
Na sutura em plano único um fio de seda em sutura contínua ou pontos sepa-
rados deve atingir toda a circunferência4.
Nas suturas do tubo digestivo as agulhas atraumáticas, conhecidas como sertix
são as mais conhecidas e preferidas, cilíndricas e com os fios no mesmo diâmetro.

127
Fig. 12.6 — Sutura simples contínua. A sutura Fig. 12.7 — Sutura contínua com pontos de
poderá também ser entrecortada. Schmieden.

Os fios, sem dúvida, permitiram um grande apuro na técnica e conseqüente-


mente, nos resultados. Os fios sintéticos são elaborados com intuito de provocar
menos reação e terem resistência maior.
Os fios são absorvíveis (categute simples ou camada e os sintéticos como o
vicril e o poliglactina; e os não-absorvíveis, seda, este biodegradável, linho, al-
godão e os sintéticos como os de poliglicólicos, o “Prolene”. Nas suturas sero-
musculares devem ser preferidos os fios não-absorvíveis. Nas suturas em plano
único a sutura pode ser contínua ou em partes separadas, mas o fio de preferência
é o não-absorvível.
Na sutura em dois planos, com a sutura interna total, portanto, incluindo a
mucosa, a preferência é pelos fios absorvíveis em sutura contínua e a seromus-
cular em pontos separados com fios inabsorvíveis.

Complicações das Suturas Digestivas


A mais temível complicação das suturas digestivas é a deiscência com o
conseqüente surgimento de fístulas. Várias são as causas que provocam a aber-

128
Fig. 12.8 — Sutura contínua com pontos de Connel-Mayo.

tura de uma sutura, no entanto, dois grupos podem ser citados: os defeitos técni-
cos, e os fatores locais e gerais.
Os defeitos técnicos são facilmente compreendidos e de fácil entendimento;
os fatores locais como a infecção, as peritonites, são considerados como causa-
dores das deiscências. Entre as causas gerais, a desnutrição e conseqüente hipo-
proteinemia são consideradas causas importantes.
A presença de infecção, peritonite, provoca a deiscência e a necessidade de
uma nova sutura, considerada de risco, inclusive.
As suturas de risco, as ressuturas ou reanastomoses obrigam a várias mano-
bras ou artifícios. A primeira é o fechamento e conseqüente programa para
acompanhamento, neste caso o second look será importante, a relaparotomia
para avaliação do estado da sutura.
Nos casos de sutura de risco é permitida a coloração da sutura ou subcutâneo
ou mucosa à mostra para acompanhamento evolutivo. Embora de alto risco, estas
possibilidades permitem o acompanhamento e novas tentativas de fechamento.

129
Fig. 12.9 — Anastomose terminoterminal, sutura total em pontos separados. Em cima: ponto total
com o nó para dentro da luz. A sutura é invaginante. Em baixo: sutura da parede anterior da anas-
tomose (notar o nó para dentro de luz da alça).

OUTROS TIPOS DE SUTURAS

As suturas mecânicas1 reapareceram a partir da década de 70, embora fos-


sem conhecidas há alguns anos. A aceitação pelos cirurgiões foi lenta, tendo em
vista o alto custo inicial e as dificuldades de manuseio na fase de treinamento;
hoje é uma técnica de escolha e amplamente empregada.
As colas cirúrgicas também devem ser citadas e várias tentativas já foram
realizadas, principalmente nas suturas de risco. No entanto, com a probabilidade
de um sucesso não ser alcançado, seu emprego é limitado.
Os anéis de sutura como a de Voltrac podem ser usados nas suturas intestinais
e apresentam facilidade no seu manuseio. O aspecto mais importante é o do em-
prego de anéis com material biofragmentável, no caso o do ácido poliglicólico.
Deve ser colocado em evidência que o anel de Voltrac, passível de ser fragmenta-
do, não deve ser empregado em situações graves de infecção como as peritonites,
sendo aconselhado o seu uso em pacientes sem complicações abdominais3,6.

130
BIBLIOGRAFIA
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131
13 Suturas em Situações
Críticas

Eduardo H. Pirolla
Nelson F. Margarido

INTRODUÇÃO

As suturas ou sínteses cirúrgicas consistem em ato operatório fundamental


envolvendo a aproximação dos bordos das estruturas seccionadas ou resseca-
das. Associando-se ao processo de cicatrização que se instalará, a sutura, que é
participante desse processo, constituirá a reparação do tecido lesado.
O principal material utilizado nas suturas são os fios, absorvíveis ou inab-
sorvíveis. Desde 1906, quando os irmãos Hütl (médico e engenheiro), da Uni-
versidade de Budapeste, desenvolveram o primeiro aparelho para sutura
mecânica, esta tem sido cada vez mais utilizada, ampliando suas indicações e
eficácia, paralelamente ao maior treinamento dos cirurgiões. Inicialmente os
aparelhos eram totalmente metálicos, grosseiros e de uso perene. Atualmente os
instrumentais são descartáveis, porém mais recentemente, em decorrência dos
custos elevados e do aperfeiçoamento dos instrumentais permanentes de sutura
mecânica, tem-se preferido a utilização destes últimos, apenas com troca da car-
ga dos grampos para a anastomose.
A sutura manual realizada por cirurgião experiente consegue resultados di-
ficilmente superados pela sutura mecânica. No entanto, alguns trabalhos como o
da Faculdade de Medicina e Cirurgia da Universidade de Pisa, através de análise
histopatológica, demonstram e concluem pela superioridade da cicatrização
com suturas mecânicas.
Muitas situações desfavoráveis podem estar ocorrendo no momento de uma
sutura, porém para podermos comentá-las, torna-se necessário tentarmos classi-
ficar didaticamente cada condição crítica. Deste modo, para cada situação, co-
mentaremos a melhor agulha, fio ou grampo, prótese, tipo e particularidades da
sutura.

133
APARELHO DIGESTIVO: CÓLON, RETO E ÂNUS

No segmento esofagogástrico, as ressecções por tumores talvez sejam as


condições onde estes órgãos estão mais suscetíveis a situações de risco para as
anastomoses. No delgado, as tromboses mesentéricas, herniações encarceradas
ou estranguladas e os casos mais raros de tumores, são as situações de maior ris-
co e que exigem cuidados, como os que serão comentados.
No segmento colorretal, as situações de diverticulite aguda, isquemia me-
sentérica e hipoxemia dos cólons (comum principalmente nos pós-operatórios
complicados de cirurgias cardíacas ou cardiopatas graves, como temos observa-
do há 10 anos nos pacientes do INCOR do HCFMUSP) são, sem dúvida, as que
merecem os comentários.
Os fios utilizados mais freqüentemente são os sintéticos absorvíveis deriva-
dos do ácido poliglicólico (Dexon) ou poligláctico (Vicril), que hidrolisam-se,
em média, com 60 a 90 dias, com conseqüente perda da força tênsil. Estes fios
são multifilamentados, podendo, como em qualquer material com esta caracte-
rística estrutural, abrigar bactérias no seu interior as quais escapariam da fagoci-
tose. Têm-se optado pelos fios de polidioxanona (Maxon, PDS), que também
são sintéticos e absorvíveis (polímero da poliparadioxanona) apresentam as van-
tagens de serem monofilamentados e de manterem sua força tênsil em média 175
dias. Os fios de náilon e polipropilene (não-absorvíveis) são uma boa opção,
quando não dispomos dos fios anteriormente comentados. O tipo e a técnica da
sutura a serem empregados devem ser aqueles ao qual o cirurgião está mais habi-
tuado, porém alguns detalhes como não comprimir ou “apertar” muito os nós ci-
rúrgicos ou laçadas nos pontos separados ou ainda na sutura contínua devem ser
basicamente respeitados. Os comentários sobre números de planos já foram ob-
jeto de várias publicações, tendo também como consenso que o melhor é aquele
ao qual estamos mais habituados. Deve-se, durante a sutura, observar a irrigação
das bordas anastomosadas, a perfeita coaptação das mesmas e a sua continência.
Torna-se fundamental a valorização dos preceitos básicos (alguns anterior-
mente citados) das suturas gastrointestinais, como:
— perfeita coaptação dos bordos;
— irrigação da anastomose;
— concordância das camadas anastomosadas;
— anastomose pérvia;
— integridade dos tecidos;
— ausência de tensão na anastomose,
— concordância das bordas mesenteriais.
Tratando-se de vísceras ocas, as agulhas indicadas são atraumáticas ou cilín-
dricas, e preferencialmente com fio montado industrialmente, pois esses conjun-
tos não oferecem resistência à progressão da agulha e fio, e deste modo, por ser
menos cortante, causarão dano menor ao tecido. Outro aspecto importante refe-

134
re-se ao estudo que demonstra que a sutura contínua retarda a deposição de colá-
geno na anastomose, e interfere mais no suprimento sangüíneo da anastomose
quando comparada a sutura com pontos separados, principalmente quando esta
anastomose já está sendo realizada em condições adversas. Alguns estudos têm
sugerido a utilização de uma cola para adesão tecidual, como o butil-2-cia-
noacrilato, que complementaria a anastomose nos casos de sutura intestinal em
situações de alto risco de deiscência.

VIAS BILIARES
Nesse segmento as condições críticas mais prováveis ocorrem em casos de
colangites, tumores das vias biliares, síndromes (síndrome de Caroli), e nos
transplantes.
Para todos os casos deve-se destacar que fica afastado o uso de fios inabsor-
víveis, que podem causar reação tipo corpo estranho, levando a retrações cicatri-
ciais, e eventual subestenose. Os fios inabsorvíveis, mas de confecção orgânica,
são fagocitados, causando maior reação local, e, por esse motivo devem ser evi-
tados. Os multifilamentados podem sofrer depósitos de sais, pigmentos biliares
e/ou colesterol entre as fibras, ocasionando novos cálculos nas vias biliares.
Seja para anastomoses colédoco-colédoco ou colédoco-delgado, ou qual-
quer outro segmento da via biliar, é mais indicado a utilização de fios absorvíve-
is sintéticos monofilamentados, 5-0 ou 6-0 para colédoco-colédoco, e 4-0 para
biliodigestivas. A agulha deve ser sempre atraumática. Os pontos devem ser
sempre separados, pois desse modo tem-se facilidade para ajustar os bordos dos
cotos, bem como controle maior sobre a pressão ideal para cada nó. Em todos os
casos o nó deve ficar para fora da luz da anastomose.
Deve-se, ainda, nesses casos observar muito bem a irrigação dos cotos anas-
tomosados tendo em vista as particularidades da irrigação das vias biliares.

BAÇO
A importância do baço vem desde a sua inclusão como órgão do antigo siste-
ma hematopoiético, e apesar desde fato, até passado não muito remoto, a esple-
nectomia era a cirurgia de escolha quando o órgão sofria traumatismo importan-
te, bem como, muitas vezes, como manobra tática operatória em cirurgias de
esôfago, cólon ou estômago. Contudo, estudos anatômicos desde Neder (1958) e
Zappalá (1958; 1959) demonstraram os segmentos esplênicos, e, associados aos
estudos da fisiologia do baço, muito contribuíram para os trabalhos da literatura
envolvidos na preservação do órgão.
Todas as suturas no baço são realizadas em condições críticas, pois sempre
que necessária, envolve situação de politraumatismo ou lesão intra-operatória
em qualquer outro procedimento cirúrgico.

135
A principal condição a ser considerada é o fato de ter-se cirurgião treinado
nas técnicas de preservação do baço. Torna-se necessário boa exposição do ór-
gão para que se possa definir qual a melhor técnica de sutura. Os fios mais utili-
zados são os absorvíveis, como o categute cromado, porém mais recentemente
tem-se utilizado com bastante sucesso os derivados dos ácidos poliglicólicos e
poligalácticos. A justificativa se baseia, segundo alguns autores, no fato de que a
absorção do fio evitaria a ocorrência de reação de corpo estranho e assim perpe-
tuar ou desenvolver processo infeccioso, que se constitui numa das piores com-
plicações da cirurgia de preservação do baço. O calibre do fio deve variar entre 0
e 2-0, pois fios muito finos podem traumatizar mais o baço. A agulha deve ser
sempre atraumática e com o fio embutido, ou seja, fio agulhado.
As técnicas são as mais variadas possíveis, desde a transfixação do baço
com agulhas longas, como de raquianestesia e passagem do fio no seu interior
(Buntain e Lynn, 1979), até a utilização de telas de prolene ou náilon (Manssur,
1988), ou mesmo fragmentos de gelfoam para sustentar os pontos. Muitos cirur-
giões utilizam o epíploo como se fosse uma tela, para auxiliar na sutura (epiplo-
onplastia). Outra alternativa técnica seria a utilização das colas biológicas, à
base de colágeno, para complementar as suturas.
A principal complicação, e também a mais temida, é a infecção do baço pre-
servado, que pode ocorrer principalmente quando o politraumatismo envolveu
outras lesões abdominais, e em 100% dos casos, quando a outra estrutura lesada
é uma víscera oca, como o colón (Manssur, 1988). Nesses casos, existe con-
tra-indicação formal na rafia com o objetivo de preservação do baço. Outra situa-
ção bastante freqüente em nosso meio é a ocorrência de endocardite, diabetes e
lesão esplênica, associação essa que, quando presente, pela alta incidência de in-
fartos do baço, com trombos sépticos, e conseqüente abscesso, estabelece con-
tra-indicação relativa para a preservação do órgão em questão (Pirolla e cols,
1998).
Deste modo, cada caso deve ser avaliado individualmente, levando-se em
conta a experiência da equipe cirúrgica, os riscos da preservação e os recursos
institucionais.

FÍGADO

À semelhança do baço, a grande maioria das suturas hepáticas é realizada


em condições críticas. Cabe salientar que recomenda-se utilizar fios absorvíveis,
do tipo categute cromado, ou mais recentemente polidioxanona, com agulhas
atraumáticas, e se possível com interposição de epíploo nas lacerações hepáticas
maiores. Torna-se fundamental o conhecimento anatômico da segmentação he-
pática, bem como da disposição das veias e vias biliares, para orientar a tática
operatória bem como a sutura.

136
RINS, VIAS URINÁRIAS E BEXIGA

As cirurgias realizadas nos chamados traumas urológicos devem ser prece-


didas do fato de que o cirurgião tenha treinamento suficiente para tais suturas.
Algumas situações de trauma em vias urinárias podem ocorrer em cirurgias
complicadas de tumores entéricos, do cólon ou ginecológicos, reforçando a afir-
mação anterior. Alguns aspectos são de grande importância, como o poder lito-
gênico da urina e a infecção, haja vista o fato de que geralmente o fio está em
contato com a urina.
Para toda a via urinária, o fio preferível é o categute, e no caso de reimplante
de ureter ou anastomose terminoterminal, a sutura deve envolver todas as cama-
das do órgão, com pontos separados (preservando a vasculatura e evitando este-
noses e fístulas).

PAREDE ABDOMINAL

A rafia da parede abdominal tem elevado grau de relevância, tendo em vista


o fato de ter uma de suas camadas, a aponeurose, que confere a resistência no fe-
chamento abdominal. Após, em média, 120 dias, a cicatrização alcança 60% a
70% da resistência do tecido completamente sadio, e portanto a síntese da pare-
de, no que se refere à técnica e tipo de fio, é muito importante.
As principais situações críticas que envolvem a sutura da parede abdominal
estão relacionadas à presença de infecção e ressuturas tardias ou recentes. A sín-
tese da parede abdominal deve ser segura, mesmo na vigência de infecção, sen-
do necessário empregar fio bem tolerável pelo organismo, que seja resistente e
não facilite a instalação de infecção ao nível do fio de sutura.
A escolha do fio ideal está ligada a alguns preceitos básicos como a resistên-
cia tênsil, ser absorvível, fácil manuseio e produzir nós seguros. Muito se utili-
zou, principalmente na década de 80, os fios à base de ácido poliglicólico e a po-
liglactina. Podemos afirmar, hoje, que talvez não sejam os fios ideais, pois estu-
dos mostram perda de até 50% de sua força tênsil em 20 dias. Alguns fios absor-
víveis mais recentemente desenvolvidos, como a polidioxanona, demonstram
manter ainda 60% de sua resistência ao final 30 dias.
Num estudo comparativo, os fios sintéticos inabsorvíveis apresentam menor
incidência de hérnia incisional, principalmente em situações após infecção ab-
dominal (pós-operatório de abdome agudo infeccioso). Os fios do tipo mononái-
lon têm sua força tênsil em cerca de 80%, mesmo após três meses de sutura.
Outros aspectos importantes na sutura da parede abdominal nestas condi-
ções estão relacionados ao não esgarçamento tecidual, passagem dos pontos
com intervalos de 1,0 cm (pontos separados), e com distância de 1,5cm das mar-
gens ressecadas (fato esse pouco observado) pois evita-se a zona de colagenólise
que ocorre até em média o 10º dia de pós-operatório.

137
Em relação ao tipo de sutura, os pontos separados têm algumas vantagens
clássicas como: interromper menos a irrigação dos tecidos, no caso de despren-
dimento de algum nó cirúrgico, isto seria amenizado pois ficaria restrito a ape-
nas um ponto da anastomose. No entanto, a sutura contínua não ancorada e bem
realizada envolve helicoidalmente o tecido, o que não compromete a circulação
(Soares, 1991). Outro aspecto é o fato de a sutura contínua absorver melhor as
distensões abdominais, pois distribui de forma homogênea a tensão, sendo tam-
bém de execução mais rápida, o que muitas vezes é importante no caso de paci-
entes graves.

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139
14 Suturas Mecânicas

Carlos Alberto Malheiros


Francisco César Martins Rodrigues

INTRODUÇÃO

O objetivo de qualquer sutura ou anastomose digestiva é reunir condições


locais apropriadas ao desenvolvimento, sem complicações, dos fenômenos de
cicatrização. A cirurgia mecânica tem como princípio a realização de suturas di-
gestivas por grampos metálicos aplicados por intermédio de um aparelho mecâ-
nico acionado pelo cirurgião. A sutura mecânica não é novidade. Seus primeiros
registros são do início do século passado. O objetivo dos pesquisadores, então,
era de encontrar alternativas aos maus resultados das enterossínteses manuais.
Com o tempo, estas últimas foram se aprimorando progressivamente, superando
amplamente a sutura intestinal mecânica. Paralelamente, os grampeadores tam-
bém se aperfeiçoaram. Hoje, as técnicas não competem entre si, são comple-
mentares. A sutura mecânica é uma opção para o cirurgião e representa ajuda va-
liosa, quando bem empregada.
As aplicações da sutura mecânica são amplas, incluindo cirurgia vascular,
torácica, ginecológica, e nas sínteses de vísceras parenquimatosas, como fígado,
baço e pâncreas, além de instrumentos para ligadura e secção de vasos e sutura
de pele4,12,13,21. A experiência acumulada pelo nosso grupo — estômago e duo-
deno da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo — é muito
boa, contribuindo em muito nos bons resultados das anastomoses digestivas, es-
pecialmente na esofagojejunal. Entretanto, trataremos neste capítulo apenas dos
princípios das enterossínteses por esse método.

HISTÓRICO

No início do século passado, os cirurgiões concluíram amplamente que a ci-


catrização das suturas intestinais só poderia ser de primeira intenção, com apro-
ximação hemostática e impermeável das bordas da víscera. A partir daí, inúme-

141
ros métodos foram criados, dos quais procuraremos apenas listar os de maior im-
portância em suturas mecânicas6,9,10,15,16,20,27.
• 1826 — Denans propôs pela primeira vez um sistema para anastomose
intestinal, que consistia na colocação de anéis nas luzes dos segmentos a
serem suturados, com posterior encaixe e aproximação das serosas. No
mesmo ano, Henroz formulou um sistema também de anéis, aplicados
externamente à luz, para realização das anastomoses evertidas, ou seja,
com aproximação das mucosas.
• 1892 — Murphy demonstrou um “botão” anastomótico, inicialmente
utilizado para as derivações colecistoduodenais e posteriormente para as
gastrointestinais. Nos anos seguintes, este sistema ganhou inúmeras mo-
dificações de diversos cirurgiões europeus.
• 1909 — Hültl elaborou e publicou os princípios da cirurgia mecânica vá-
lidos até hoje: compressão e imobilização dos tecidos num primeiro tem-
po; aplicação dos grampos num segundo tempo; fechamento dos
grampos em forma de “B” após sua penetração nos tecidos num terceiro
tempo. No entanto, o instrumento de Hültl pesava cerca de 3,5kg e era de
manuseio extremamente complicado.
• 1921 — Von Petz criou um instrumento com princípios semelhantes aos
de Hültl, porém mais leve e mais simples. Seus grampos eram mais lar-
gos e aplicados em dupla fila paralela. Apesar da grande popularidade
que o aparelho de Von Petz atingiu, os grampos modernos são finos,
como propusera Hültl.
• 1934 — Friedrich e Neuffer aperfeiçoaram o aparelho de Von Petz crian-
do um instrumento capaz de aplicar todos os grampos em um só golpe.
Seu aparelho tinha o mesmo desenho básico dos aparelhos de sutura me-
cânica linear não cortante de nossos dias.
• 1954 — Nakayama simplificou mais o aparelho de Von Petz, utilizado
até hoje para fechamento visceral sob o nome de instrumento de Nakaya-
ma — Von Petz.
• 1956 — Androsov e Gudov divulgaram os resultados das pesquisas ini-
ciadas ao término da Segunda Guerra, apresentando vários grampeado-
res, dentre os quais merecem destaque:
— um aparelho para sutura linear lateral ou terminal, que inspirou mais tar-
de os grampeadores lineares hoje utilizados (p. ex., TA®, RL®);
— um instrumento para criação de anastomoses látero-laterais do tubo di-
gestivo, com o qual era possível aplicar uma fila linear de grampos de
cada lado de uma lâmina cortante; este aparelho deu origem aos gram-
peadores lineares cortantes de hoje (p. ex., GIA®, PLC®, TLC®);
— um grampeador para a realização de anastomoses circulares térmi-
no-terminais e término-laterais capaz de inverter as túnicas intestinais

142
aproximando as serosas na anastomose; a partir deste instrumento, de-
senvolveram-se os grampeadores circulares intraluminais atualmente
utilizados (p.ex., EEA®, CEEA®, ILS®, ILS-DHC® etc.)
• 1958 — Ravitch iniciou extensa pesquisa, utilizando e desenvolvendo os
aparelhos russos, que culminou com o início da comercialização dos ins-
trumentos e de seu uso difundido a partir de 1966. Os grampeadores re-
ceberam os nomes de TA® (thoraco-abdominal) para suturas lineares,
GIA® (gastro-intestinal anastomosis) para as lineares-cortantes e EEA®
(end-to-end anastomosis) para as circulares.

PRINCÍPIOS DA SUTURA MECÂNICA


OS GRAMPOS

É possível escolher, além das pinças a serem utilizadas, o tamanho e a espes-


sura dos grampos. Entretanto, todos apresentam algumas características co-
muns. São de aço inoxidável ou, mais recentemente, de titânio — que apresen-
tam a vantagem de diminuir as distorções que usualmente aparecem nos exames
de imagem com o grampo de aço. Antes do grampeamento, têm a forma de um
retângulo aberto; durante o fechamento, assumem a forma de “B”, mais ou me-
nos fechada (Fig. 14.1). Cada grampo equivale a três pontos totais eqüidistantes,
assegurando a coaptação e, conseqüentemente, a cicatrização das túnicas diges-
tivas anteriormente aproximadas23.
Os grampos são extremamente finos, com calibre variável de 0,20 a 0,23mm
e tamanho de 2,5 a 4,8mm. É importante o conhecimento dessas características
quando da escolha de diferentes tipos de grampeamento de acordo com a espes-
sura do tecido a ser suturado22.

Fig. 14.1 — Forma do grampo após fechamento completo e incompleto.

143
A SUTURA

A cirurgia mecânica contraria um princípio da cicatrização intestinal que é a


aproximação das bordas da sutura, de modo que as túnicas fiquem niveladas
lado a lado. Desta maneira, o processo de cicatrização inicia-se a partir do tecido
conjuntivo, ou seja, da submucosa e da subserosa. O tecido de granulação perde
sua celularidade a partir do oitavo dia até tornar-se fibroso em torno do vigésimo
primeiro. A regeneração mucosa é um processo concomitante e secundário à
qualidade da cicatrização conjuntiva. Em torno do sétimo dia, a reepitelização é
considerável3,5.
Estes fenômenos não ocorrem nas suturas mecânicas, já que nenhum apare-
lho consegue a aproximação borda a borda das superfícies de secção digestiva.
Ao contrário, esta é feita através de pontos totais e “face a face”, seja ela inverti-
da ou evertida. Na primeira, a aproximação dos tecidos faz-se pela serosa e na
última, pela mucosa.
A sutura invertida é a que mais se assemelha à sutura manual ideal, já que a
aproximação se faz pelas serosas (Fig. 14.2). No plano experimental, em que
pesem as dificuldades de remoção dos grampos dos tecidos — não há micrótomo
capaz de cortá-los — foi possível verificar que a característica fundamental neste
tipo de sutura é a ausência de necrose no tecido cicatricial. Após uma fase curta de
edema e congestão, sobrevém um granuloma inflamatório rapidamente substituí-
do por fibrose fina e fibrilar entre o 10º e 15º dias. Neste período, a reepitelização
é constante, notando-se uma transição abrupta de uma mucosa à outra.
Já a eversão das suturas manuais quase sempre foi considerada elemento
predisponente ao retardo da cicatrização e, conseqüentemente, às fístulas. No
entanto, os primeiros grampeadores, como o de Von Petz, realizavam este tipo
de grampeamento. E mesmo atualmente, essas complicações são raras neste tipo
de sutura. Do ponto de vista experimental, as suturas evertidas caracterizam-se
histologicamente pela rápida substituição das mucosas aproximadas por um te-
cido de granulação e fibrose mais celular e mais espessa que nas suturas inverti-
das. Entretanto, após três meses é impossível diferenciar no plano histológico
uma sutura evertida de uma invertida.
Há que se ressaltar que a sutura mecânica, seja evertida ou invertida, permite
sempre a irrigação adequada da linha de anastomose, já que a forma em “B” dos
grampos preserva a passagem da microcirculação entre os pontos8,11.

APLICAÇÕES BÁSICAS EM CIRURGIA DIGESTIVA

1. Grampeador circular: amplamente utilizado nas anastomoses esofago-


gástricas, esofagojejunais e colorretais, tanto término-terminais como termino-
laterais. Há disponibilidade dos diâmetros de 21, 25, 29 e 33mm (®Ethicon) e de
21, 25, 28 e 31 mm (®Autosuture), que devem ser escolhidos após avaliação do

144
diâmetro das vísceras a serem suturadas. A luz da anastomose é cerca de 10 mm
inferior ao diâmetro do aparelho. Deve-se confeccionar uma sutura em bolsa nas
bordas a serem aproximadas, podendo-se ou não utilizar pinças próprias (pinça
para sutura em bolsa — purse string). Após o adequado posicionamento do ca-
nhão e do anteparo nas vísceras, realiza-se seu encaixe seguido de fechamento
do instrumento até a aproximação ideal das mesmas. Em seguida, destrava-se o
gatilho e dispara-se o aparelho (Fig. 14.2). Após a retirada do aparelho, deve-se
ter especial atenção na observação dos “anéis” de tecido recém-seccionados pela
lâmina circular deste tipo de grampeador: a integridade em toda sua circunferên-
cia e túnicas é o principal sinal de que todas as paredes foram devidamente sutu-
radas1,2,14,17,26.
2. Grampeador linear cortante: a sua aplicação baseia-se no simples encai-
xe dos elementos, seguido do disparo por alavanca deslizante (Fig. 14.3A, B, C).
É de manipulação mais fácil que o circular, podendo ser utilizado em secções
viscerais, fechamento de coto duodenal (Fig. 14.4A, B, C) e nas diversas técni-
cas de anastomoses látero-laterais. Os aparelhos disponíveis permitem a substi-
tuição da carga de grampos, podendo ser utilizados até seis vezes durante a mes-
ma intervenção. Este tipo de grampeador ganhou recentemente grande populari-
dade por ser o mais utilizado nas operações por videolaparoscopia (modelo endo-
linear cortante)7,18,19.
3. Grampeador linear: é o menos utilizado em nosso meio, apesar de ampla-
mente difundido em outros países. Sua aplicação restringe-se ao fechamento de
vísceras durante o preparo para anastomoses, diminuindo a possibilidade de
contaminação. Pode também ser empregado no fechamento do coto duodenal7.

Fig. 14.2 — Grampeamento com instrumento circular, produzindo sutura invertida com aproxima-
ção pelas serosas.

145
Fig. 14.3A — Esquema de secção visceral com grampeador linear cortante. Posicionamento dos
dois elementos do aparelho.

VANTAGENS DA SUTURA MECÂNICA


— É uma sutura impermeável, devido à perfeita regularidade da disposição
dos grampos em dupla fila.
— Permite a realização de cirurgias com vísceras praticamente fechadas,
com menor grau de contaminação (Fig. 14.5A, B).
— A rapidez do ato, variável de acordo com a experiência do cirurgião, é
indiscutível.
— Menor traumatismo tecidual: em um só golpe são aplicados todos os
pontos com intervalos e aproximação constantes; não há assim trauma-
tismos decorrentes de preensão com pinças, de diferentes pontos de pe-
netração de agulhas, nem diferenças na tensão dos nós.
— Não há isquemia na linha de sutura. A vascularização intramural da vís-
cera é respeitada entre os grampos e também graças à forma dos gram-
pos. No entanto, quando as vísceras são muito espessas (p. ex., por
edema, no megacólon etc.), deve-se tomar cuidado com a escolha dos

146
Fig. 14.3B — Esquema de secção visceral com grampeador linear cortante. Após o encaixe dos
dois elementos, o grampeador é travado e disparado.

grampeadores de compressão forçada constante, como os lineares cor-


tantes, que podem, nestes casos, levar à isquemia ou até a fratura da li-
nha de sutura. Em tais situações, deve-se optar por grampeadores
especiais, com cargas de grampos mais longos.
— O material de síntese, aço ou titânio, é praticamente inerte, não interfe-
rindo negativamente no processo de cicatrização, além de manter sua
forma constante no decorrer do tempo, sem os problemas relacionados à
perda de resistência tênsil.

147
Fig. 14.3C — Esquema de secção visceral com grampeador linear cortante. Após o disparo, o
aparelho é aberto, demonstrando as bordas seccionadas e grampeadas de maneira evertida.

PRECAUÇÕES NA REALIZAÇÃO DE SUTURAS MECÂNICAS


1. A cirurgia mecânica deve respeitar todos os princípios da técnica cirúrgi-
ca, tais como dissecção limpa e atraumática, hemostasia cuidadosa, respeito
com relação à viabilidade e ao suprimento sangüíneo do tecido e suturas sem
tensão24,25.
2. A falha do aparelho no grampeamento é uma situação rara que, entretanto,
deve ser sempre lembrada. É importante verificar o cartucho do grampeador an-
tes e depois de utilizado para ter-se certeza que o procedimento ocorreu com per-
feição.
3. O exagero no fechamento dos grampeadores de aproximação variável
(circulares) aumenta o risco de deiscência por má irrigação e esmagamento do
tecido. Da mesma maneira, o uso de grampeadores de aproximação constante
(lineares cortantes), quando em tecidos espessados ou edemaciados, pode causar

148
A B

Fig. 14.4A — Fotografia intra-operatória: fechamento de coto duodenal com grampeador linear
cortante. Posicionamento do aparelho e encaixe de seus dois componentes. B — Fotografia in-
tra-operatória: fechamento de coto duodenal com grampeador linear cortante. Após completa-
mente encaixado, o aparelho é disparado. C — Fotografia intra-operatória: fechamento de coto
duodenal com grampeador linear cortante. Aspecto final, com as setas mostrando as duas extre-
midades recém-grampeadas e seccionadas.

149
Fig. 14.5A — Fotografia intra-operatória: gastrectomia subtotal com reconstrução com boca parci-
al; fechamento da pequena curvatura com grampeador linear cortante.

Fig. 14.5B — Fotografia intra-operatória: gastrectomia subtotal com reconstrução com boca parci-
al; fechamento da pequena curvatura com grampeador linear cortante. Aspecto final do fechamen-
to da pequena curvatura.

150
Fig. 14.6 — Esquema ilustrando a aproximação adequada e insuficiente dos elementos do gram-
peador circular.

Fig. 14.7 — Esquema ilustrando a interposição de tecidos na superfície de grampeamento.

151
dos grampeadores de aproximação variável leva ao fechamento imperfeito do
grampo e à não coaptação adequada dos tecidos (Fig. 14.6). Daí a importância da
correta avaliação da espessura do tecido e do conhecimento das características
do instrumental a ser utilizado.
4. O fechamento dos grampeadores de aproximação variável (circulares)
com interposição de tecidos desvitalizados (Fig. 14.7) aumenta o risco de deis-
cência por distanciar as bordas da cicatriz.
5. No momento da retirada de um grampeador circular, deve-se ter o cuida-
do de liberar os segmentos proximal e distal, afastando-se adequadamente o ca-
nhão do anteparo do instrumento. Quando feita de maneira incorreta, esta mano-
bra pode levar à laceração e ao desluvamento da mucosa.

CONCLUSÃO
O desenvolvimento da sutura mecânica permitiu a criação de técnicas origi-
nais na cirurgia digestiva. A observação da literatura mundial mostra-nos a ima-
ginação e a criatividade de nossos colegas de diversos países incluindo o nosso,
que muito contribuíram e produzem para esse desenvolvimento. As anastomo-
ses grampeadas são hoje tão seguras quanto as manuais. Entretanto, a habilida-
de, a inteligência, o bom senso e sobretudo o conhecimento e o respeito à técnica
cirúrgica são indispensáveis à correta escolha do método e ao sucesso do proce-
dimento.

BIBLIOGRAFIA
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Technique originale d’emploi des procedés de suture mecanique. Nouv Press Med 10:247, 1981.

153
Nós e Suturas em
15 Videocirurgia

Edvaldo Fahel

CONCEITO

Define-se “nós” como manobras realizadas com fios para a aproximação ou


ligadura de estruturas; juntos e de maneira ordenada compõem as suturas.
A execução destes nós tem sido limitada ao uso direto das mãos ou por inter-
médio de pinças convencionais como os porta-agulhas. Contudo, o desenvolvi-
mento tecnológico trouxe a realização de cirurgias avançadas e por novos aces-
sos, sendo que o marco nesta evolução certamente é representado pela endoci-
rurgia, exigindo um aprimoramento e especialização da equipe cirúrgica.
Os nós devem ser firmes, fáceis e rápidos de execução, seguindo uma ordem
de movimentos: configuração; execução; segurança.

CLASSIFICAÇÃO

Com a cirurgia endoscópica, um novo parâmetro foi adicionado à tipagem


dos nós, sendo então denominados de internos ou externos, conforme a realiza-
ção intra ou extracorpórea (Tabela 15.1).

Tabela 15.1
Tipos de Nós Utilizados em Endocirurgia
Internos Externos
Quadrado Tay side
Duplo Roeder
De cirurgião Melzer (Roeder modificado)
Mayo
De ligadura

155
Os internos ou intracorpóreos são realizados dentro da cavidade com instru-
mental adaptado ao acesso (porta-agulhas, pinças de apreensão e redutores).
Estão entre os mais utilizados: o nó quadrado, dois seminós opostos, utilizado
em ligadura de vasos e anastomoses com fios monofilamentares (Fig. 15.1); o nó
de ligadura, dois seminós iniciais e contínuos, seguidos de um seminó único,
mais seguro que o nó quadrado (Fig. 15.2); o nó duplo, dois seminós duplos e
opostos, mais seguro que os anteriores (Fig. 15.3); o nó Mayo, três seminós úni-
cos e opostos, certamente o mais utilizado na prática cirúrgica convencional
(Fig. 15.4); e por fim, o nó de cirurgião, um seminó duplo seguido de dois semi-
nós opostos, utilizado como nó preferencial endocirúrgico (Fig. 15.5)1.
Os externos ou extracorpóreos são confeccionados fora da cavidade operada
(Figs. 15.6 a 15.14) e deslizados até a estrutura intracavitária mediante aplicado-
res de sutura e uma pinça de apreensão. Neste grupo de nós encontramos os
pré-formados como os endoloops (Figs. 15.15 a 15.17), com aplicadores própri-
os, facilitando o ato em cirurgias sobre estruturas pediculares (ooforectomias),
tubulares (apendicectomias) e cirurgias com a visualização do campo limitada.
Somente fios com boa memória e resistência podem ser utilizados nesta sutura2.

MATERIAL PARA SUTURA ENDOCIRÚRGICA


Na cirurgia endoscópica dois pontos relevantes diferem da cirurgia conven-
cional: percepção visual e manipulação do instrumental.
Agulhas — Deve-se utilizar o material que cause menor lesão tissular, me-
nor risco de sangramento e menor risco de escape na anastomose. Com estes ob-
jetivos, a escolha da agulha baseia-se na configuração, tamanho e qualidade
(Fig. 15.18).

Fig. 15.1 Fig. 15.2

156
Fig. 15.3 Fig. 15.4

Fig. 15.5 Fig. 15.6

Fig. 15.7 Fig. 15.8

157
Fig. 15.9 Fig. 15.10

Fig. 15.11 Fig. 15.12

Fig. 15.13 Fig. 15.14

158
Fig. 15.15

Fig. 15.16 Fig. 15.17

INTEGRIDADE DA AGULHA

Quando a agulha é corretamente escolhida, esta deve promover uma boa se-
gurança quanto ao porta-agulha e ser o mais atraumática possível, respeitan-
do-se a regra de não posicionar o porta-agulha na porção proximal, nem na por-
ção distal, sob pena de deformar a agulha durante a sutura (Fig. 15.19). Ainda
mais que o instrumental endocirúrgico, por ser mais longo, favorece o uso inde-
vido da força exercida pelo cirurgião.

TAMANHO

O diâmetro e o comprimento devem ser escolhidos de acordo com a estrutu-


ra e a distância a ser suturada, ato este que não difere da cirurgia convencional.

159
Fig. 15.18

FORMATO

As agulhas retas, embora de fácil introdução através dos redutores, mais fá-
ceis de manuseio sob a visão em duas dimensões e mais bem adaptadas aos por-
ta-agulhas endoscópicos, não preenchem os critérios como agulhas ideais já que
são traumáticas à sutura, sendo neste aspecto mais favorável o uso de agulhas
curvas3.
Baseando-se nestes conceitos, desenvolveu-se um grande número de agu-
lhas das mais variadas curvaturas, tópico este que foge ao objetivo deste capítu-
lo, estando entre elas a agulha de Endoski (Fig. 15.20) com componentes curvo e
reto desenvolvidos especialmente para o uso laparoscópico4.
Algumas particularidades do método endoscópico vêm dificultar a realiza-
ção das suturas no que se refere ao uso das agulhas:

160
Fig. 15.19 Fig. 15.20

• Dificuldade de visualização adequada da agulha devido a sangue, secre-


ções, baixo pneumoperitônio, podendo-se utilizar agulhas de cores di-
versas ou até mesmo fluorescentes para minimizar o problema.
• A possibilidade de perda da agulha deve ser reduzida, evitando-se dimi-
nutas e visualizando-as desde a saída do redutor.
• Apreensão segura pelo instrumental, estando este item diretamente rela-
cionado com a qualidade do material e experiência do cirurgião.
Fios de Sutura — As propriedades biológicas dos fios, como biodegradabi-
lidade, reatividade ou resposta tissular, incorporação pelos tecidos e suscetibili-
dade à infecção determinam o tipo ideal de sutura a ser realizada, tanto no méto-
do convencional, quanto no endocirúrgico5.
Conceitos básicos a serem seguidos:
• Diâmetro do fio ≥ 2.0 sempre que possível devido à tração externa.
• Força de tração proporcional ao diâmetro do fio.
• Evitar fios monofilamentares devido à menor força tênsil.
• Memória adequada do fio.
Devido ao campo visual mais limitado com a cirurgia endoscópica, devem
utilizar fios com comprimento de até 15cm, tornando a técnica mais fácil. O ca-
tegute cromado vem sendo amplamente utilizado nesta cirurgia6.

INSTRUMENTAL CIRÚRGICO

Sistema de Imagem — Não há dúvidas que para uma adequada sutura endos-
cópica um ponto primordial é a qualidade da imagem, devendo haver uma esco-
lha criteriosa deste material considerando-se:
• Sistema de lentes

161
Fig. 15.21

• Fibra óptica
• Eixo óptico
• Videocâmera
• Videomonitor
O que realmente difere entre a execução das suturas endoscópicas e as con-
vencionais é o fato de serem realizadas, geralmente, com visão bidimensional, e
dependerem de um posicionamento adequado dos trocateres, da distensão gaso-
sa e tração dos retratores para abertura do campo cirúrgico, como nos casos das
laparoscopias, da iluminação adequada e da familiaridade do cirurgião com o
acesso.
As suturas são mais bem realizadas com eixo óptico a 30° ou 45°, em vez de
0°, devido à possibilidade de visualização de vários ângulos da sutura, favore-
cendo a técnica de execução e controle quanto à possibilidade de escapes (Fig.
15.21A, B).
Hoje, já dispomos de sistema óptico articulado que permite maior angula-
ção, devido à movimentação circular da extremidade. Apesar de estar se desen-
volvendo o sistema de imagem em 3D, a óptica de 30° ou 45° em 2D permanece
como a mais utilizada, já que a imagem em 3D não está otimizada quanto à lumi-

Fig. 15.22

162
nosidade e coloração; e exceto no sistema Zeiss, opera-se com distância fixa en-
tre a óptica e a sutura7,8.
Para se obter uma boa imagem e conseqüente boa sutura, aconselhamos
“manter a óptica aquecida e limpa”, manipulada por um médico afeito a este mé-
todo.
Instrumentos Cirúrgicos — Os porta-agulhas devem promover uma ade-
quada apreensão da agulha. Assim como seu formato deve ter empunhadura er-
gonômica acompanhando o eixo do instrumento, e não formar um ângulo com
este, para oferecer conforto na confecção da sutura. Uma curvatura coaxial na
porção distal do instrumento pode facilitar a realização das suturas (Fig. 15.22).
A realização das suturas mediante o uso de dois porta-agulhas fez com que
os cirurgiões necessitassem adaptar-se ao uso das duas mãos.
Pinças de apreensão atraumáticas podem auxiliar a sutura, manipuladas pelo
cirurgião auxiliar, mantendo a tensão da sutura através do reparo do fio.
O instrumental utilizado para a divisão tecidual como tesouras e eletrocauté-
rios também é utilizado na realização das anastomoses, porém não serão aborda-
dos neste capítulo.

TÉCNICAS DE SUTURAS ENDOCIRÚRGICAS


Os critérios técnicos na realização das suturas não são diferentes dos já exis-
tentes com a cirurgia convencional. Devem então obedecer a algumas regras:
• Qualidade da imagem
• Ergonomia dos movimentos
• Não cruzar os instrumentos
• Coreografia do nó próxima ao tecido
• Evitar pinçamento no fio
• Tração adequada
O tecido a ser suturado geralmente deve estar perpendicular ao cirurgião.
Define-se então um triângulo imaginário com o vértice no centro (óptica) e dois
trocateres distando 20cm entre eles e 15cm do tecido a ser suturado e colocados
em posições laterais ao vértice. Evita-se com isto o cruzamento entre os instru-
mentos e proporciona-se uma visão mais próxima possível da visão em cirurgias
convencionais.
Para uma sutura laparoscópica eficiente, três condições básicas devem ser
consideradas:
1. Percepção visual em uma dimensão diferente, correspondendo a 50% de
importância para o resultado final.
2. Estratégia para decidir as manobras a serem executadas, responsável por
40%.
3. Execução da sutura, preenchendo 10%.

163
Fig. 15.23 Fig. 15.24

Fig. 15.25 Fig. 15.26

Fig. 15.27

164
Fig. 15.28 Fig. 15.29

Fig. 15.30 Fig. 15.31

Fig. 15.32 Fig. 15.33

165
Fig. 15.34

Fig. 15.35 Fig. 15.36

Fig. 15.37

166
Fig. 15.38

Fig. 15.39 Fig. 15.40

Fig. 15.41

167
Fig. 15.42

Conclui-se que 90% da eficiência de uma sutura laparoscópica depende de


uma boa estratégia por parte do cirurgião, sendo necessário saber qual é o posicio-
namento ideal do material para um bom resultado da sutura (Fig. 15.23).
A descrição técnica da confecção de cada nó endocirúrgico certamente seria
tedioso, por isso ilustraremos a realização do nó quadrado e lembramos que os
critérios são os mesmos para todas as suturas, diferindo somente na coreografia
destas. (Figs. 15.24 a 15.42).

TÉCNICAS EM ANASTOMOSES
Os princípios básicos das anastomoses endoscópicas mantêm-se os mesmos
da cirurgia convencional:
• Suprimento sangüíneo adequado

Fig. 15.43 Fig. 15.44

168
Fig. 15.45 Fig. 15.46

• Sutura livre de tensão


• Ausência de contaminação
No que tange ao método endocirúrgico, um fator importante que vem difi-
cultar o ato é o extravasamento de secreções ou sangramentos, devido ao prejuí-
zo de imagem já limitada pelo método. Deve-se, então, fazer uso de manobras
para evitar esta dificuldade:
1) Aspiração sempre que possível do conteúdo das vísceras.
2) Oclusão temporária da luz das vísceras por meio de balões intraluminais.
3) Hemostasia das bordas.
4) Lavagem copiosa do local da anastomose e dos recessos anatômicos.
Há duas maneiras de se realizarem anastomoses, com o uso de stapplers ou
sutura manual através de instrumental endocirúrgico. Como a realização das su-
turas é, na grande maioria, intracorpórea com visualização por sistema de vídeo,

Fig. 15.47 Fig. 15.48

169
deve-se escolher o método que cause menos fadiga ao cirurgião, sem contudo
perder em segurança.

TIPOS DE SUTURA
Plano Único — Quando realizada de maneira meticulosa, apresenta baixa
taxa de deiscência devido à menor redução do suprimento sangüíneo em relação
à sutura em dois planos e mais rápida execução pelo método endocirúrgico.
As camadas utilizadas nas suturas vão depender das estruturas a serem anas-
tomosadas, sendo a camada seromuscular a de escolha para aproximação das es-
truturas. Deve-se observar que este tipo se sutura é mais bem indicada em vísce-
ras de parede fina e com serosa bem definida (Figs. 15.43 e 15.44).
Um princípio importante na sutura em plano único é a introdução da agulha
a poucos milímetros das bordas das vísceras, diminuindo com isto os processos
isquêmicos e inflamatórios e conseqüentemente a possibilidade de deiscência,
porém na prática este princípio pode estar sujeito à dificuldade de acesso e tama-
nho reduzido das estruturas como vias biliares ou ureter.
Para realização das anastomoses pode-se optar por suturas contínuas, por
pontos separados ou por combinações destas, como por exemplo, a realização da
sutura posterior de uma anastomose com técnica contínua e anterior por pontos
separados (Figs. 15.45 e 15.46).
Sutura Contínua — Geralmente dá-se preferência a essa técnica quando a li-
nha de anastomose ultrapassa 3cm, proporcionando a realização de uma sutura
mais rápida.
Não deve utilizar mais de 20cm de fio em uma sutura contínua. Caso isso
ocorra, deve-se optar pela interrupção da sutura e a utilização de vários fios.

Fig. 15.49 Fig. 15.50

170
Fig. 15.51 Fig. 15.52

Fig. 15.53 Fig. 15.54

Fig. 15.55 Fig. 15.56

171
Fig. 15.57 Fig. 15.58

Fig. 15.59 Fig. 15.60

Fig. 15.61 Fig. 15.62

172
Fig. 15.63

Fig. 15.64 Fig. 15.65

Fig. 15.66

173
Fig. 15.67 Fig. 15.68

Fig. 15.69 Fig. 15.70

Fig. 15.71 Fig. 15.72

174
Fig. 15.73 Fig. 15.74

Fig. 15.75 Fig. 15.76

Fig. 15.77 Fig. 15.78

175
Fig. 15.79 Fig. 15.80

Fig. 15.81 Fig. 15.82

Fig. 15.83 Fig. 15.84

176
Fig. 15.85 Fig. 15.86

Fig. 15.87 Fig. 15.88

Fig. 15.89 Fig. 15.90

177
Fig. 15.91

Fig. 15.92

178
O posicionamento da agulha em relação ao porta-agulha deve representar
um ângulo de 90 graus, exceto quando a situação da víscera exige uma angula-
ção obtusa ou aguda (Figs. 15.47 e 15.48).
O início de uma sutura contínua é dado por um nó que pode ser pré-formado,
como o nó de Sopper ou de Jamming Loop (Figs. 15.49 a 15.67).
A pegada das bordas deve ser simétrica em relação à entrada dos pontos e
aos nós.

Nós Para Início das Suturas Contínuas

• Slipping Knots
• Jamming Loop
• Stopper

Nós Para Finalização de Suturas (Figs. 15.68 a 15.83)

• Nó do cirurgião.
• Retrograde Slipping Knot.
• Aberdeen.
Sutura Interrompida — Prefere-se esta à sutura contínua, quando as estrutu-
ras são pequenas e de difícil acesso, também tendo uma possibilidade maior de
estenoses. Uma manobra útil é o reparo das extremidades da ferida a ser suturada
(Figs. 15.84 e 15.85).
Suturas com Stappler — Sem dúvida o uso do stappler é mais um grande
avanço para a cirurgia endoscópica, envolvendo a criação e excisão de anasto-
moses tanto para restaurar como para confeccionar bypasses em obstruções in-
testinais. O uso do stappler não exclui a utilização concomitante de sutura por
fio, podendo esta ser feita para otimização dos resultados (Figs. 15.86 a 15.90).
As vantagens da utilização do stappler são:
• Menor risco de contaminação.
• Rapidez de execução.
• Redução na utilização de clamps intestinais.
• Resultado cirúrgico uniforme.
Essas vantagens estão diretamente relacionadas com o aprimoramento e a
experiência do cirurgião. Porém, algumas desvantagens podem ser listadas na
utilização do stappler.
• Alto custo da aparelhagem.
• Dificuldade do uso em estruturas tubulares e/ou delicadas.
• Contra-indicação, seu uso em tratos biliar e urinário.
• Tendência maior à estenose.

179
TIPOS DE STAPPLER

• Linear não-cortante: usado para fechamento de vísceras ou oclusão de


pedículos vasculares sem cortar as estruturas.
• Linear cortante: ideal para criação de anastomose laterolateral e termino-
lateral. O comprimento varia de 3 a 6cm.
• Circular cortante: indicado nas cirurgias de esôfago e cólon.
• Circular cortante flexível: utilizado em todo trato gastrointestinal.
• Aplicador de grampos: utilizados para ligadura de vasos, correção de de-
feitos herniários ou interrupção de suturas.

Princípios para o Uso Adequado do Stappler

A espessura da víscera é de importância capital na escolha do stappler a ser


utilizado. Para isso, medidores de pressão sempre acompanham esses apare-
lhos. O posicionamento das vísceras para uma sutura mecânica nunca deve dei-
xar as alças intestinais tracionadas. Caso isso ocorra, não se deve utilizar o
stappler.
A confirmação de uma sutura mecânica bem realizada deve ser feita medi-
ante a confirmação de ausência de sangramento e/ou perda de conteúdo visceral
pela linha de sutura, assim como a confirmação da integridade dos fragmentos
remanescentes dentro do stappler.

Técnica de Anastomose Contínua Laterolateral

Os seguintes passos devem ser seguidos na confecção dessas suturas:


• Aproximação entre os órgãos e reparo dos ângulos.
• Enterotomia para passagem do stappler.
• Introdução das hastes do stappler.
• Aproximação das hastes após checar o bom posicionamento.
• Sutura do orifício de saída das hastes.
• Checagem da competência da anastomose.

TÉCNICA DE ANASTOMOSE TERMINOLATERAL OU TERMINOTERMINAL

Um excelente exemplo dessa anastomose é o tratamento de varizes esofági-


cas por transecção do esôfago (Figs. 15.91 e 15.92).

180
BIBLIOGRAFIA
1. Ashley CW. The Ashley Book of Knots. London: Faber and Faber, 1944.
2. Brown RP. Knotting Technique and Suture Material. Br J Surg 79:399-400, 1992.
3. Semm K. Tissue Puncher and Loop ligation: news aides for surgical therapeutic pelviscopy
(laparoscopy): endoscopy intra-abdominal surgery. Endoscopy 10:119-127, 1978.
4. Cushieri A, Nathanson LK. Instruments and basis techniques. In: Cushieri A, Berci G (eds.).
Laparoscopy biliary surgery, 2nd EDN. Oxford Blackwell Scientific Publications, 62-3, 1992.
5. Katz S, Lirici M, Mirelman D. Bacterial adherence to surgical sutures: a possible factor in suture induced
infection. Ann Surg 194:35-41, 1981.
6. Shimi SM, Lirici, Vander Velpen G, Cushieri A. Comparative study of the holding strength of slip knots
using absorbable and non absorbable ligature materials. Surg Endosc 8:1285-9, 1994.
7. Crosthwaite G, Chung T, Dunkley P, Shimi S, Cushieri A. Comparison of direct vision and electronic
2-D and 3-D display sistems on surgical task efficiency in endoscopic surgery. Br J Surg (in Press).
8. Kim W, Tendreck F, Stark L. Visual enhancement in pick-and-place tasks: human operators controlling
a simulated cylindrical manipulator: Ieee J Robotic Automat Ra-3(5):418-25, 1987.

181
Preparo Intestinal para
16 Cirurgia Colorretal

Peretz Capelhuchnik
Alexandre Margutti Fonoff

INTRODUÇÃO

As investigações e descobertas de Pasteur e Koch mostraram a importância


dos germes na produção de doenças.
A seqüência lógica desses novos conhecimentos foram a assepsia e an-
ti-sepsia iniciadas por Lister (1867)79.
Estas conquistas científicas bem como o início da era da anestesia iniciada
por Morton (1846)79 foram o suporte para os pioneiros que desenvolveram a ci-
rurgia abdominal.
As técnicas de sutura, ressecções e anastomoses já eram bem conhecidas no
princípio do século XIX. As operações sobre os diferentes segmentos do apare-
lho digestivo já eram bastante freqüentes.
Entretanto, no final do século XIX uma boa experiência acumulada mostrava
que as operações sobre os cólons e reto apresentavam uma mortalidade e morbida-
de bem maior do que as realizadas nas outras partes do aparelho digestivo.
Os estudos que se seguiram e as técnicas operatórias criadas tiveram como
finalidade vencer os embaraços causados pela infecção e reduzir as complica-
ções32,33.
Assim Bloch (1894), Paul (1895) e Mikulicz (1903), trabalhando indepen-
dentemente, idealizaram as ressecções extraperitoneais realizadas em quatro
tempos, inicialmente para o sigmóide e depois para outros segmentos mobiliza-
dos. Assim evitavam a fatal peritonite.
Esse procedimento reduziu a mortalidade de 42,9% para 12,5%, marcando a
primeira grande conquista32.
Técnicas com anastomose asséptica tipo Parker-Kerr foram utilizadas para
evitar a contaminação. A crítica a esse procedimento era o conceito errôneo de
que a contaminação no momento da cirurgia seria responsável pela infecção, de-
iscências de sutura, peritonite e morte.

183
A ingenuidade daquele conceito não resistiu muito tempo, pois logo com-
preendeu-se que a contaminação era de origem endógena. Sabemos que o conteú-
do fecal contém cerca de 108 a 1012 bactérias por cm3 de fezes.
De 1930 a 1945 a utilização de uma colostomia de início desfuncionalizante
em duas bocas20 e depois em alça era prática obrigatória realizada três a quatro
semanas antes da ressecção do cólon esquerdo. Este procedimento permitia uma
cirurgia em cólon vazio e limpo, portanto com menor chance de contaminação e
complicações.
Após a Segunda Guerra Mundial iniciou-se o uso dos antimicrobianos. As
sulfas26 foram as primeiras drogas utilizadas. As sulfas inabsorvíveis, sulfaguani-
dina, succinilsulfatiazol e ftalilsulfatialol, ministradas por via oral, supositórios ou
enemas demonstraram a sua capacidade em reduzir a flora bacteriana intestinal.
A segurança obtida então, e a introdução dos antibióticos — penicilina, neo-
micina, e estreptomicina — foram os responsáveis pelo gradual abandono das
colostomias prévias32, que são hoje raramente utilizadas.
O objetivo do preparo do cólon para a cirurgia é a redução bacteriana máxi-
ma possível uma vez que a sua supressão total é utópica33,44,45,73.
Os procedimentos disponíveis com essa finalidade são dois: preparo mecâ-
nico e uso de agentes antimicrobianos: antibióticos e quimioterápicos.

PREPARO MECÂNICO
Define-se preparação mecânica do cólon como o conjunto de métodos de re-
moção do conteúdo luminal fecal com a finalidade de facilitar, encurtar o tempo
e diminuir a morbidade dos procedimentos diagnósticos e operatórios sobre o in-
testino grosso. Sem dúvida nenhuma, é de grande conveniência para os cirur-
giões, radiologistas e colonoscopistas lidar com o intestino completamente lim-
po57. Isto tem sido tão amplamente aceito como sensato e lógico, que poucos se
arriscam a operar sobre os cólons sem um preparo adequado.
De maneira simples e objetiva, podemos dividir os métodos de preparo me-
cânico dos cólons em dois tipos3,43:
a) Retrógrados — que são preparados no sentido inverso ao trânsito intesti-
nal, quase sempre associados a uma dieta e laxantes orais. São denominados mé-
todos convencionais.
b) Anterógrados — que se fazem no sentido normal do trânsito intestinal.
O método de escolha nos dias atuais para limpeza intestinal, seja para exa-
mes diagnósticos como colonoscopia, seja para cirurgia colorretal, é o método
anterógrado, mais especificamente o oral. Consiste na ingestão de laxativos as-
sociados a substâncias que exercem poder osmótico na luz intestinal, de volume
líquido variável de acordo com o tipo de solução, até que se obtenha evacuação
líquida, livre de resíduos fecais67. A intensidade do preparo varia de acordo com
a necessidade. Em qualquer tipo de preparo, uma dieta livre de resíduos vegetais
por um ou dois dias antes do procedimento é de fundamental importância.

184
Para o enema opaco, não é necessário a ingestão de soluções osmóticas além
de laxativos de contato. Para colonoscopia e cirurgia, a mucosa intestinal livre
de resíduos fecais é primordial1,32,43, embora uma minoria conteste tal afirmati-
va no que se refere às operações colorretais, desde que sejam utilizados antibió-
ticos de forma profilática e terapêutica13,24,42,74.
A preparação retrógrada, feita por clisteres ou enemas de soluções salinas,
está em progressivo desuso, sendo reservada para situações especiais. Alguns
centros ainda utilizam o esquema clássico de Nichols63 combinando a prepara-
ção retrógrada com os antibióticos orais eritromicina e neomicina.
Entre os métodos anterógrados, os mais utilizados são o manitol a 10%, so-
lução eletrolítica de polietilenoglicol (SEPEG) e fosfo-soda.
A solução de lactulose a 10% tem sido por nós utilizada com resultados se-
melhantes e com algumas vantagens em relação a alguns outros métodos orais27.
MÉTODO RETRÓGRADO (CONVENCIONAL)
Muito utilizado de 1950 a 1970, consistia em: dieta pobre em resíduos; uso
de laxantes, catárticos ou purgativos; e clisteres.
A dieta era pobre em resíduos e prolongada (quatro a sete dias).
Vários tipos de catárticos, laxantes ou purgativos associados a enemas fo-
ram utilizados por muitos cirurgiões no preparo de seus pacientes. Assim o óleo
de rícino em doses de 60 a 80ml era ministrado dois dias antes do procedimento
cirúrgico sendo por nós abandonado pelo sabor insuportável e nauseante.
O sulfato de sódio ou magnésio foi por nós utilizado em doses totais de 25 a
30g ou em frações de 5g ministradas de quatro em quatro horas até o início de
uma diarréia profusa.
Também nós utilizamos de óleos minerais na dose de 15ml, três a quatro ve-
zes ao dia com a intenção de amolecer as fezes e facilitar a sua exoneração.
Os enemas, geralmente soluções salinas ou glicerinadas, eram utilizados vá-
rias vezes ao dia até a emissão de líquido claro e sem resíduos.
Os resultados quanto a limpeza e vacuidade dos cólons e reto eram na maio-
ria bastante satisfatórios.
Entretanto o preparo assim realizado demandava vários dias, causava des-
conforto ao enfermo, alterações de seu equilíbrio hidrossalino56 e sobrecarrega-
va a enfermagem. Tornou-se economicamente inviável mas ainda hoje alguns
serviços o preconizam47,76,77.
MÉTODOS ANTERÓGRADOS
Lavagem Intestinal por Sonda Nasogástrica
A metodologia de preparo de cólon de forma anterógrada teve início em
1973 com a lavagem intestinal por sonda nasogástrica39. Também conhecida por
lavagem gastroenterocólica ou total, foi idealizada a partir de estudos prelimina-
res para investigação do fluxo de íons no cólon54,55, baseado no conceito de que

185
a capacidade limitada de absorção intestinal de água durante a irrigação com
grandes volumes de solução salina em curto intervalo de tempo promove diar-
réia com exoneração total do conteúdo cólico21,54.
Caracterizada pela infusão por sonda nasogástrica de grandes volumes de
solução salina isotônica (10 a 12 litros) aquecida a 35°C, contendo aproximada-
mente 100mEq de sódio/litro na forma de cloreto e bicarbonato, além de cloreto
de potássio, produziu excelentes resultados em qualidade de limpeza58. Efeitos
adversos caracterizados por um alto grau de intolerância e sobrecarga hidroele-
trolítica foram verificados com freqüência32, uma vez que 15% do volume in-
fundido era absorvido e lentamente eliminado por via urinária. Foi demonstrado
que o novo método era mais tolerado que o clássico e que seu maior incômodo
consistia na utilização de sonda nasogástrica16. O método era contra-indicado
nos portadores de colites agudas, megacólon e tumores obstrutivos do intestino
grosso43 e considerado no mínimo arriscado em pacientes idosos, cardiopatas,
hepatopatas e nefropatas32.
Também o manitol foi empregado na irrigação intestinal através de sonda
nasogástrica, em volume de 5.000ml a 4% para evacuação de melena em pacien-
tes cirróticos38 bem como no preparo para cirurgia colorretal, explorações radio-
lógicas e endoscópicas14. Donovan22 et al. e Minervini et al.58, em 1980, utiliza-
ram o manitol como agente osmótico imediatamente antes das irrigações sali-
nas, possibilitando a redução do volume de infusão e da retenção de água e sódio
que invariavelmente se fazia presente. Estudos mais pormenorizados com a as-
sociação de osmóticos, desta vez com o polietilenoglicol (PEG), realizados por
Davis et al., em 198018, concluíram haver inibição da retenção de água e eletróli-
tos nas perfusões intestinais mesmo com grandes volumes.
O método certamente sempre fora mais eficiente que o método retrógrado
mas muito mal aceito pelos pacientes15. Para alguns, se a sondagem nasogástrica
não fosse tão mal tolerada, o uso de agentes osmóticos combinados a soluções
salinas se constituiria no método de preparo do cólon ideal50.

Lavagem Intestinal por Via Oral

Soluções Salinas

A maior objeção à irrigação total foi o uso da sonda nasogástrica. Por esta
razão, Levy et al.53 propuseram, em 1976, a ingestão de solução eletrolítica em
volume semelhante outrora infundido por sonda nasogástrica, empregando-a no
preparo de enemas baritados. Uma redução do volume a ser ingerido para
3.500ml da solução associado a uso de metoclopramida oral diminuiu significa-
tivamente os efeitos adversos71, e a limpeza intestinal apresentou boa qualidade
em 90% dos casos.

186
Manitol

Somente com a utilização de substâncias osmóticas inabsorvíveis pelo trato


intestinal, que a preparação do cólon por via oral pode ser realizada com inges-
tão de volumes bem menores com a mesma eficiência das lavagens totais em ter-
mos de qualidade de limpeza. Newstead e Morgan (1979)61 foram os primeiros a
utilizar o manitol via oral para o preparo de cólon. Obtiveram excelentes resulta-
dos com 500ml de solução a 10% e 20%. O método foi sendo gradativamente
abandonado na Europa e nos Estados Unidos em função de relatos ocasionais de
explosão de cólon durante eletrocauterização em operações ou colonoscopi-
as2,7,46,69,80,87.
A fermentação do manitol pelas bactérias intestinais produzia hidrogênio e
metano responsáveis por combustão e explosão.
Apesar disso, o preparo com soluções de manitol destacou-se em nosso meio,
principalmente pela simplicidade, eficiência e segurança3,6,11,12,36,37,60. É o méto-
do mais empregado no preparo de cirurgia colorretal em nosso país. Uma publi-
cação nacional expressiva de 3.400 casos utilizando o manitol em volume fixo
de 750ml a 10% no preparo para colonoscopia (método “expresso”) verificou
grande eficácia, boa tolerabilidade e ausência de complicações)4.
Alguns autores propuseram a insuflação de CO2 para diminuição do risco de
explosão durante eletrocauterização, independentemente do método de preparo
de cólon5,9,52,72,86. Entendemos que os riscos de explosão, principalmente na co-
lonoscopia, são quase nulos, uma vez que os procedimentos térmicos somente
são realizados após avaliação completa do cólon e durante a retirada do apare-
lho. Neste momento, praticamente todo gás combustível que porventura existis-
se já teria sido substituído pelo ar ambiente, em virtude das repetidas manobras
de insuflação e aspiração.

SOLUÇÃO ELETROLÍTICA DE POLIETILENOGLICOL (SEPEG)

Os resultados dos estudos experimentais de Davis et al.com PEG17,18 em so-


lução isotônica abriram a possibilidade para a utilização de novo produto na pre-
paração do cólon, tanto para colonoscopia quanto para cirurgia colorretal85, sen-
do demonstrada rapidez e boa qualidade de limpeza, alterações hidrossalinas
discretas, baixo custo e aplicabilidade em pacientes de alto risco (idosos, hepa-
topatas, cardiopatas e nefropatas). Pelo menos até o início da década de 90, era a
solução de preparo de cólon mais utilizada na América do Norte e Canadá.
A presença de sulfato de sódio, pouco palatável, associada à necessidade de
ingestão de grande volume de solução de PEG, em torno de 4.500ml, para obten-
ção de exoneração total do conteúdo fecal é o maior inconveniente. Fordtran et
al.31 obtiveram produto mais agradável com a retirada do sulfato de sódio da so-
lução eletrolítica.

187
Em nosso meio Patrício67 observou vantagens relacionadas à tolerabilidade
e eficiência do PEG sobre o método convencional como preparo de cirurgia co-
lorretal eletiva em pacientes com ou sem suboclusão. Desde então, o preparo de
cólon para cirurgia com PEG tornou-se a rotina em nossa instituição (Área de
Coloproctologia do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médi-
cas da Santa Casa de São Paulo) até a introdução das soluções de lactulose por
nós iniciadas em 1993.

Laxativos Orais
Uma grande variedade de laxativos orais31 tem sido utilizada no preparo in-
testinal. Constituem-se em componentes fundamentais associados à dieta sem
resíduos tanto na preparação retrógrada quanto nos diversos métodos orais.
Mais recentemente têm sido empregados de forma isolada, e pelo menos dois
compostos merecem maior destaque: o picossulfato de sódio associado ao citra-
to ou sulfato de magnésio (Picolax®) e o bifosfato de sódio, conhecido por fos-
fo-soda oral (Fleet Phospho-Soda®).
Meio milhão de doses de Picolax, aproximadamente, são utilizadas por ano
na Inglaterra no preparo de cólon para cirurgia, radiologia contrastada dos có-
lons ou colonoscopia, com altos índices de qualidade de limpeza intestinal51.
Em nosso meio, constatou-se alta eficiência com produto semelhante, o sulfato
de sódio por via oral (Solução de Glauber), ressaltando-se o encontro de volume
residual cólico reduzido em cirurgia colorretal68.
A fosfo-soda foi de início utilizada por via oral na preparação do cólon por
Vanner et al. em 1990, que referiram excelentes resultados quanto à qualidade
de limpeza e menores índices de efeitos adversos quando comparada ao PEG84.
Um dos inconvenientes relatados diz respeito à formação de bolhas de gás que
dificultam o exame endoscópico, problema contornado com a adição de simeti-
cone à solução de preparo78.
A maior vantagem do método, é a boa tolerabilidade, pois pequenos volu-
mes são necessários para o preparo do cólon. Recomenda-se a ingestão dos 90ml
padronizados da forma comercial da fosfo-soda em dose única na véspera da ci-
rurgia ou algumas horas antes do exame endoscópico34.
Este produto não é comercializado em nosso meio. Oliveira e Zuccaro65 uti-
lizaram a solução de enema salino (fleet) por via oral na dosagem de 240ml diluí-
dos em 200ml de suco coado e obtiveram bons resultados no preparo de cólon
para colonoscopia.

Lactulose
A idéia do uso da solução de lactulose (Lactulona®) como opção de preparo
do cólon pelo nosso grupo partiu do mesmo raciocínio feito para o manitol como

188
agente osmótico na lavagem intestinal anterógrada. Inicialmente empregado
(1964) para evacuação de melena em pacientes cirróticos na prevenção da ence-
falopatia hepática40,41, é inovação recente a sua utilização para exoneração de
fezes normais do lúmen cólico com finalidade de limpeza intestinal para colo-
noscopia e com potencial semelhante para preparação pré-operatória27-30. Estu-
dos mais pormenorizados comprovaram que o uso de lactulose promove queda
dos níveis séricos de amônia por aumento da sua excreção, em decorrência da
acidificação intestinal66, proveniente da lise da lactulose em produtos ácidos a
partir de sua metabolização por bactérias sacarolíticas (Lactobacillus sp.). Esta
acidificação intestinal ocorre principalmente no ceco10, promovendo efeito la-
xante e aceleração do trânsito por estímulo da motilidade intestinal. Um segundo
efeito desta acidificação orgânica do cólon é o aumento da pressão osmótica in-
traluminar. A quantidade de ácidos produzidos é proporcional às doses empre-
gadas e tem poder osmótico. Cada 30 mililitros de xarope de lactulose ingerido
corresponde, após duas horas, a aumento do volume fecal em torno de 300 mili-
litros8.
Como a acidificação a partir da metabolização da lactulose ocorre apenas do
ceco em diante, seu efeito osmótico é seletivo, podendo significar uma grande
vantagem em relação aos outros agentes osmóticos utilizados para preparo do
cólon, que atuam desde as porções iniciais do intestino delgado, causando desi-
dratação e edema de mucosa significativos.
Em nossa experiência, o uso de lactulose a 10% como preparo para colonos-
copia27 em estudo prospectivo e comparativo revelou ser muito proveitoso, com
taxas de eficácia em torno de 96% e tolerabilidade à ingestão da solução melhor
que o manitol a 10%.

COMO REALIZAR O PREPARO

Metodologia de Preparação Mecânica dos Cólons dos Produtos Que


Consideramos mais Utilizados e mais Eficientes

Qualquer que seja o tipo de preparo oral, são necessários os seguintes cuida-
dos, considerando-se o procedimento operatório às 7:30 horas.
a) Antevéspera da operação: dieta geral sem resíduos no desjejum e no al-
moço e dieta leve sem resíduos no jantar.
b) Véspera da operação:
1) Dieta líquida sem resíduos até as 10 horas.
2) Bisacordil 5mg (dulcolax) 4 cps VO às 11 horas.
3) Solução de preparo às 18 horas. Tomar toda a solução em 60 minutos,
permitindo a ingestão de água ou chá até as 23 horas.

189
Jejum absoluto após as 23 horas. Utilizar antiemético parenteral conforme a
necessidade (Metoclopramida 10mg intramuscular se o paciente tiver náuseas
ou vômitos).

Preparo das Soluções

Manitol: diluir dois frascos de 250ml de manitol a 20% em 500ml de solven-


te (água, sucos coados ou chás sem açúcar) — Produto final = 1.000ml de solu-
ção de manitol a 10%.
Lactulose: diluir um frasco de 1/4 do frasco do xarope a 50% (já padroniza-
do em farmácia) em 850ml de solvente (da mesma forma que para o manitol) —
Produto final = 1.000ml da solução de lactulose a 10%.
É a solução de escolha em nossa instituição, desde os estudos preliminares
de 1993.
Polietilenoglicol: o produto já vem preparado pela farmácia hospitalar. Ofe-
recer volume fracionado por via oral até que se obtenha efluente líquido isento
de resíduos fecais. Em geral é necessária a ingestão de 2.500 a 4.000ml da solu-
ção para um resultado eficiente. A cada litro de água destilada é adicionado um
composto granulado cuja fórmula é a seguinte: cloreto de sódio 1,18g, sulfato de
sódio 4,56g, cloreto de potássio 0,7g, bicarbonato de sódio 1,34g, PEG 47,22g.
A solução tem osmolaridade aproximada = 199, 14 osmóis por litro.
Na preparação para colonoscopia, a metodologia é a mesma, mudando-se
apenas o horário de administração dos produtos. Para as colonoscopias matinais,
o dulcolax deve ser ingerido entre 18 e 22 horas da véspera e a solução de prepa-
ro, no mínimo três horas e não mais que seis horas antes do procedimento endos-
cópico.

Casos Especiais

Merecem uma consideração especial os pacientes com oclusão intestinal,


por câncer ou megacólon e os idosos.

Oclusão Intestinal por Câncer

Os enfermos ocluídos podem ser preparados com laxativos orais de forma


suave e mais prolongada. São utilizados os óleos minerais, citrato ou sulfato de
magnésio por via oral associados a enemas de pequenos volumes até que se ob-
tenham evacuações aquosas e sem resíduos.
Quando a obstrução for completa além das colostomias ou ressecções ime-
diatas, geralmente a jusante do tumor e a montante da válvula ileocecal, segui-
das de anastomose, tem sido preconizada a lavagem intestinal intra-operatória,

190
segundo as técnicas de Muir59 ou Dudley23. São procedimentos tediosos e ainda
controversos.
Os raios laser (Ng: Yag) têm sido indicados para recanalizar tumores obs-
trutivos do cólon esquerdo e do reto25.
Recentemente o uso de stents, próteses metálicas auto-expansivas19,81 tem
sido introduzido na estenose tumoral para recanalizá-la, desobstruí-la e permitir
o preparo adequado para cirurgia.
Os dois últimos procedimentos ainda não aceitos como rotina pela comuni-
dade cirúrgica representam uma importante opção futura.

Oclusão no Megacólon

Ocorre de duas formas: volvo e fecaloma.


Volvo. É uma obstrução em alça fechada devido à torção do sigmóide.
Coloca-se o paciente em posição genupeitoral. Introduz-se o sigmoidoscó-
pio lubrificado com manobras cuidadosas até o ponto de torção. Uma sonda Le-
vine nº 16 ou Fouché guiada pelo sigmoidoscópio é delicadamente pressionada,
vence o obstáculo com resultado satisfatório e surpreendente. Segue-se uma
emissão de gases com alívio imediato.
Retira-se o sigmoidoscópio e a sonda permanece in loco durante três dias
enquanto o paciente é preparado para a cirurgia eletiva.
Fecaloma. É um aglomerado composto de fezes desidratadas que oblitera a
luz intestinal.
Quando este é acessível, procuramos demoli-lo após toques repetidos e segui-
dos de enemas cujo volume não deve ultrapassar de 1.000ml para evitar o volvo.
Associamos o uso de laxantes por via oral, geralmente petrolatos, que ajudam a
amolecer a massa fecal. Este procedimento pode levar dias e é muito tedioso.
Atualmente, se o paciente estiver em boas condições praticamos a remoção
do fecaloma após anestesia peridural ou raqui baixa. O ânus é dilatado e um au-
xiliar comprime a massa do fecaloma através da parede abdominal, tornando-o
acessível ao operador que, com manobras digitais vai destruindo-o e irrigando-o
intermitentemente. Uma vez desobstruído, o doente passa a ser preparado para a
cirurgia eletiva.
Os idosos são geralmente pacientes frágeis que, por incapacidade física, não
conseguem fazer força suficiente para uma exoneração adequada.
A esse grupo especial os enemas são freqüentemente indicados além das so-
luções orais referidas.
O preparo é mais lento, mas com paciência se consegue um resultado ade-
quado.

191
Preparo dos Cólons com Agentes Antimicrobianos (Antibióticos
e Quimioterápicos)

Sabemos que mesmo após um bom preparo mecânico e redução da quanti-


dade de fezes, o conteúdo remanescente contém o mesmo número de bactérias
por grama de fezes. Assim o potencial para infecção permanece e somente pode
ser melhorado com o uso de antimicrobianos.
O preparo colônico pré-operatório com agentes antimicrobianos iniciou-se
em torno de 1940 com o emprego de preparados sulfamídicos, promovidos após
os trabalhos de Firor e Poth26.
A sulfaguanidina, ftalililsulfatiazol e a sulfassuxidine, agentes de baixa ab-
sorção intestinal e portanto de maior ação local, foram largamente utilizados.
Aos poucos os antibióticos, que surgiram durante a Segunda Guerra Mundi-
al, foram alijando as sulfas e agora, produzidos em escala industrial, começaram
a dar cobertura aos atos cirúrgicos.
As sulfas não-absorvíveis foram abandonadas, suplementadas ou substituí-
das pelos antibióticos como: penicilina, tetraciclina, cloranfenicol, estreptomi-
cina e neomicina de ação ampla e eficiente contra a flora bacteriana colônica.
Não tardaram as comunicações de suas ações nocivas, como enterocolites pro-
duzidas pelo crescimento de germes resistentes como o estafilococo ou fungos,
produzindo diarréias profusas e estomatites.
Afortunadamente essas complicações hoje são uma raridade com o uso dos
modernos antibióticos de largo espectro utilizados em tempo mais restrito.
Recentemente Nichols et al. (1973) reconheceram a importância dos mi-
crorganismos anaeróbios, principalmente o Bacteroides fragilis na produção de
complicações sépticas pós-operatórias.
Assim surgiram diversas associações de antibióticos ou quimioterápicos,
como neomicina e tetraciclina ou eritromicina que se mostraram potentes contra
anaeróbios. Também foram utilizados a lincomicina e o metronidazol, e princi-
palmente este último que se tornou bastante popular.
Graças aos estudos de Burke (1961)13, ficou claro que os antibióticos eram
realmente eficientes quando ministrados antes da cirurgia, e da invasão bacteria-
na dos tecidos lesados.
A compreensão deste fato resultou na conduta do uso prévio de antibióticos,
que são ministrados uma hora antes do ato cirúrgico. A aceitação desta conduta
hoje é universal.
A nossa experiência com várias associações medicamentosas29,30,48,49 foi
iniciada em 1965, quando estudamos diversas séries e vem sendo atualizada de
acordo com as novas aquisições de antimicrobianos mais potentes mais bem to-
lerados e com menor índice de complicações.
Iniciamos nossa experiência com o uso de sulfas não-absorvíveis (sulfatali-
dina), ministrada a cada quatro horas em dose de 9g ao dia durante sete dias. Os

192
resultados foram bons, mas o procedimento era bastante oneroso e de longa du-
ração.
A associação de eritromicina e neomicina, 1g de cada em três tomadas, 19
horas antes da cirurgia foi também coroada com bons resultados. Entretanto,
eram freqüentes as náuseas e vômitos por intolerância principalmente à eritro-
micina.
O uso oral do metronidazol 400mg de seis em seis horas durante 48 horas
também não foi satisfatório. A incidência de infecção chegou a 23,3%.
Os resultados com o tinidazol, 500mg de seis e seis horas durante 48 horas
também não foram satisfatórios. A incidência de infecção chegou a 50%.
Os melhores resultados foram obtidos com a utilização da associação de clo-
ranfenicol e amicacina endovenosa durante 48 horas ou sete dias, respectiva-
mente a incidência da infecção foi 8,3% e 14%.
A cefoxitina, 1g endovenosa de oito em oito horas durante 24 horas, mos-
trou um índice de 12,5% de infecção.
O preparo mecânico sem uso de antibióticos em pequena experiência (13 ca-
sos) e que pelos resultados e respeito à ética foram interrompidos mostrou a inci-
dência de 61,5% de infecção.
O ideal seria conseguir taxas menores que 10% de infecção.
Devemos lembrar que nos casos de amputação abdominoperineal a infecção
da ferida perineal é muito mais freqüente, elevando muito os resultados globais e
índices de infecção.
Os resultados com incisões abdominais são melhores. A incidência de infec-
ção estaria entre 4% a 6%.
A Tabela 16.1 mostra de forma esquemática os resultados obtidos por nós
com vários esquemas antimicrobianos.

Estado Atual — Preferência

O uso sistemático do preparo mecânico e antimicrobiano para a cirurgia co-


lorretal sofreu uma nítida evolução nos últimos anos. A tônica dominante sem
dúvida foi a procura de métodos e medicamentos mais eficientes e mais bem to-
lerados.
Apesar de muitos cirurgiões ainda estarem ligados às práticas do passado, a
tendência atual é o uso de preparo mecânico oral e antibióticos sistêmicos.
Em inquérito recente entre cirurgiões norte-americanos, Nichols64 revelou
os seguintes dados: o preparo oral com polietilenoglicol é utilizado por 70,9%,
28,4% usam o fosfato de sódio oral associado ou não ao Bisacordil, 86,5% asso-
ciam antibiótico oral e parenteral, 11,5% somente utilizam antibiótico parente-
ral, 77,8% utilizam a neomicina e eritromicina ou metronidazol via oral em
combinação com antibióticos parenterais.

193
Tabela 16.1
Preparo do Cólon — Índice de Infecção — Vários Métodos

Esquema Número Infecção (%)

Sulfatalidina (1,5g v.o. 4/4 h 7 dias) 76 9,1


Neomicina + eritromicina (19 horas) 70 11,1
1g de cada (13h, 14h e 23h)
Metronidazol (v.o., 48 horas) 400mg 6/6 horas 30 23,3
Tinidazol (48 horas) 500mg v.o. 6/6 horas 14 50
Mecânico 13 61,5
Amicacina (500mg e.v. 12/12 horas) (A) 36 8,3
Cloranfenicol (500mg e.v. 6/6 horas) 48 h
Amicacina + cloranfenicol — 7 dias (B) 57 14,1
Cefoxitina — 1g e.v. 8/8 horas 24 horas 48 12,5

A tendência é o preparo ambulatorial um dia antes da internação e os anti-


bióticos parenterais são iniciados uma a duas horas antes da cirurgia.
Nossa preferência para o preparo mecânico do cólon tem sido o uso oral de
polietilenoglicol ou solução de lactulose a 10%.
Os esquemas antimicrobianos por nós utilizados são: associação de cloran-
fenicol e amicacina ou cefoxitina como descritos no texto.

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197
Cicatrizações da Ferida
17 Operatória

Luiz Guilherme Romano


André Paulo Nemetz

INTRODUÇÃO
A ferida operatória constitui-se em uma solução de continuidade causada
por uma injúria em um tecido. E a cicatriz, da maneira pela qual este tecido se re-
para, através de uma série de fenômenos celulares, fisiológicos e bioquímicos
que se processam até que ocorra a sua estabilização.
O objetivo seria a cicatrização da homeostase, porém, o grau de síntese do
tecido fibroso neste processo pode ser prejudicial até o ponto de destruir o pró-
prio organismo que deveria preservar. Ou seja, o reparo da parte lesada, pode
ocorrer de duas formas: a regeneração (vem do latim regenerare, que significa
tornar a gerar, reproduzir o que está destruído), que é a substituição da parte lesa-
da por células parenquimatosas do mesmo tipo, geralmente sem deixar marcas,
ou então pela cicatrização propriamente dita, que é a substituição por um tecido
conjuntivo, deixando uma marca permanente. Em termos práticos, a cicatriz do
tecido cardíaco no enfarto, a cicatriz do fígado tipo cirrose, a cicatriz tipo hiper-
trófica e quelóide da pele, são exemplos de cicatrizes indesejáveis, que em últi-
ma análise são uma resposta exagerada do organismo e motivo de muitos estu-
dos, pois os fenômenos que os cercam envolvem de maneira complexa um nú-
mero incontável de fatores que, inter-relacionados, geram dúvidas e nem sempre
podem ser controlados.
Este capítulo busca desenvolver um tema que seja interessante não apenas
ao cirurgião mas também ao não especialista, tentando trazer de forma clara e
objetiva os processos da fisiologia da cicatrização, dando ênfase à cicatrização
da ferida operatória (conseqüente a incisões cirúrgicas).

ASPECTOS HISTÓRICOS
Através de uma visão panorâmica observamos de maneira interessante as
mudanças de atitude dos cirurgiões no desafio de obter melhores resultados com

199
a cicatrização. Às vezes, se formos analisar de maneira contemporânea, pode
nos parecer até peculiar: nos primeiros tempos, até o início da era cristã, o médi-
co era um mero espectador, e o tratamento embasava-se na interferência míni-
ma, com a aplicação de mel e tecido limpo sobre o ferimento, aguardando sua re-
solução a custo do que se entende atualmente de cicatrização por segunda inten-
ção. Na época seguinte, com o advento da pólvora (Idade Média), os cirurgiões
assumiram uma posição mais agressiva, com o uso de óleo fervente ou metais
aquecidos sobre a ferida, prevalecia então o conceito paradoxal de que a presen-
ça de secreção purulenta era benéfica, pois supunha-se que ela acelerava a cica-
trização. Estes conceitos permaneceram estáveis até 1586, quando Ambroise
Parré retomou o princípio da interferência mínima que foi consubstanciado na
seguinte frase: “...a natureza fará a cicatrização desde que o médico não atrapa-
lhe a sua evolução”. À propositura de Parré somaram-se nesse século os concei-
tos de Halsted e Carrel, que aprimoraram técnicas de limpeza minuciosas de fe-
ridas e uso de sutura para aproximação de suas bordas. Evidenciaram-se também
dentro desta época, Lister, Pauster e Samelweiss, cujos princípios de assepsia e
anti-sepsia permitiam o controle das infecções, e por Princípios de Halsted
(princípios estes que até hoje são ensinados aos jovens estudantes de Medicina e
devem ser respeitados e observados como básicos pelo bom cirurgião).

PRINCÍPIOS DE HALSTED
— Limpeza.
— Delicadeza.
— Afrontamento de bordos.
— Boa hemostasia.
— Bom suprimento vascular.
— Evitar tensão.
— Evitar espaço morto.
Finalmente, graças às aquisições de conhecimentos em metabologia cirúrgi-
ca bioquímica e nutrição, surgiu um nova época na qual se pretende interferir na
biologia molecular, influindo na síntese das substâncias responsáveis pelos fe-
nômenos cicatriciais; entretanto, em nível local, persiste o princípio de interfe-
rência mínima. Surpreendentemente, dentre os recursos empregados no trata-
mento tópico, retomou-se o uso do açúcar e do mel (e até de subprodutos afins,
como é o caso do bio-fill, película de celulose derivada do favo de colméias, in-
dicado como substituto temporário da pele em alguns casos) para facilitar a cica-
trização, de forma idêntica àquela proposta pelos antigos egípcios.

FISIOLOGIA
Como foi dito acima, trata-se de um processo complexo e dinâmico em que
fases estão inter-relaciondas, como podemos encontrar numa etapa elementos

200
que compõem as outras, ou seja, não ocorrem eventos únicos ou isolados. No en-
tanto, o exame de todos os processos de modo simultâneo pode gerar confusão,
por isso, com finalidade didática, divide-se a cicatrização em três fases:
• Inicial ou inflamatória aguda.
• Proliferativa ou de fibroplasia.
• Maturação ou contração da ferida.

SEQÜÊNCIA DE EVENTOS

Após a ruptura da integridade do tecido pelo bisturi do cirurgião, dá-se iní-


cio a uma série de modificações morfológicas marcantes.
Na primeira fase, inicial ou inflamatória, há vasodilatação e diminuição do
fluxo sangüíneo. Os leucócitos “marginalizam-se” e migram através da parede
vascular. Ao mesmo tempo, forma-se uma corrente plasmática, do interior para
fora do vaso, que carrega consigo os eritrócitos. Tal seqüência independe do te-
cido agredido, correspondendo à resposta inflamatória ao trauma, e sua intensi-
dade relaciona-se com o tipo e grau de agressão. Como conseqüência, do ponto
de vista fisiopatológico, no local da ferida forma-se um exsudato, que é traduzi-
do por tumor, calor, rubor e dor.
Após isto, há no local do trauma um afluxo de fibroblastos que se depositam,
multiplicam e sintetizam substâncias. Assim, esta fase é denominada fibroplasia
e contém uma intensa proliferação endotelial, de maneira que se constitui em um
tecido denominado granulação, devido a seu peculiar aspecto macroscópico.
Ao estudar o tecido de granulação, constatou-se que ele tinha capacidade de
se contrair (graças a esta propriedade, devido a modificações bioquímicas e físi-
cas, as feridas abertas diminuem a área da superfície cruenta, facilitando, nas le-
sões cutâneas, o revestimento epitelial ou, de um modo geral, a epitelização). A
conjunção da contração com a epitelização define a última fase da cicatrização,
que é a maturação. Naquelas feridas, cujas bordas foram aproximadas à custa de
sutura, também há uma fase de maturação; todavia, é menos expressiva se com-
parada àquela dos ferimentos abertos, que dependem, efetivamente, da contra-
ção. Este aspecto, tão distinto, caracteriza a cicatrização, no último caso, por se-
gunda e, no anterior, por primeira intenção. Em qualquer uma das circunstânci-
as, estrutura-se o tecido cicatricial com a atinente força tênsil. Conseqüentemen-
te, cessam as atividades dos fibroblastos, bem como atenuam-se as do epitélio
recém-arquitetado.

FASE DE INFLAMAÇÃO

As alterações vasculares são os primeiros eventos que ocorrem após injúria


celular, durante os primeiros cinco a 10 minutos. Observa-se um breve período

201
de vasoconstrição que é seguido por vasodilatação, esta sim mais duradoura.
Acompanhando a vasodilatação, há um aumento da permeabilidade e conse-
qüente extravasamento de componentes plasmáticos para o foco da ferida. Esta
fase estende-se até 72 horas após a injúria.
Tais fenômenos são modulados por vasoaminas locais e sistêmicas que,
após uma injúria, são liberadas entre elas:
— Histamina: liberada pelos mastócitos, atua rapidamente, durante, no
máximo, 30 minutos.
— Serotonina: também liberada pelos mastócitos, parece ser coadjutora da
histamina — em estudos recentes, foi observado que estas substâncias
não tem importância na cicatrização no ser humano, apesar de serem im-
portantes no rato.
— Leucotaxina: liberada pela degradação enzimática da albumina, é um po-
lipeptídeo que substitui a ação da histamina e da serotonina na permeabi-
lidade capilar. Alguns autores propõem que seja responsável também
pela quimiotaxia dos leucócitos, porém este fato ainda é controverso.
— Cininas: é uma enzima plasmática, a calicreína, cliva a globulina levan-
do à formação da bradicinina e calidina. Em presença desta e de certas
frações do complemento as células locais produzem prostaglandinas.
— Prostaglandinas: principalmente PGE1, PGE2 e PGA2 são os mediado-
res bioquímicos mais importantes da cicatrização, já que atuam em to-
das as fases. São derivadas do ácido araquidônico. Estão envolvidas
com o aumento da permeabilidade capilar, com a migração e prolifera-
ção dos fibroblastos e também com a contração das feridas abertas.
— Linfocinas: são substâncias produzidas pelos linfócitos no local da feri-
da. Parece que estão associadas à fibroplasia.
— Interleucina: é sintetizada pelo complexo monócito/macrófago; leva à
produção de prostaglandinas e proteínas presentes no tecido de granula-
ção. A IL-I produzida pelos queratinócitos em resposta à injúria atua so-
bre os fibroblastos estimulando seu crescimento e induzindo a síntese de
colágeno por estas células e sobre os próprios queratinócitos também esti-
mulando seu crescimento e quimiotaxia. Estas células sofrem ainda in-
fluência do KGF (keratinocyte growth factor — fator de crescimento dos
queratinócitos). Esta indução é mediada por duas vias intracelulares que
envolvem a proteína quinase C e proteínas quinases dependentes do AMP.
Quase simultaneamente a esta fase de alterações vasculares, observa-se uma
hemocoagulação. Há formação de rede de fibrina que, além de controlar o san-
gramento, serve como superfície para a adesão e degranulação das plaquetas,
além de ser uma orientação na migração dos fibroblastos.
A degranulação das plaquetas, além de ser uma orientação na migração dos
fibroblastos, é responsável pela liberação do PDGF (platelet-derived growth
factor ou fator de crescimento derivado das plaquetas), que é de suma importân-

202
cia na modulação da proliferação de células mesenquimais; participa da quimio-
taxia dos fibroblastos e aumenta a atividade da colagenase fibroblástica. A injú-
ria celular crônica poderia produzir expressão genética irreversível, levando ao
crescimento celular desregulado e patológico.
O passo seguinte na resposta inflamatória é a fase celular. Os leucócitos ade-
rem às superfícies endoteliais e, por diapedese, chegam ao local da lesão, junta-
mente com as hemácias, proteínas plasmáticas solúveis e feixes de fibrina, que
vão formar um exsudato inflamatório altamente celular.
Inicialmente, as células inflamatórias no local da lesão são as mesmas do
sangue periférico. A quimiotaxia propriamente dita começa algumas horas
após o trauma, quando os leucócitos polimorfonucleares (PMN) constituem a
maioria das células no sítio da injúria. Os responsáveis pela migração dos
PMN são vários, incluindo os leucotrienos B4 e a fração C5 do complemento.
Já foi descrita a influência da fibronectina, que é uma proteína de alto peso mo-
lecular e é produzida por vários tipos de células (fibroblastos, monócitos e cé-
lulas endoteliais, além de outras). Em associação com a fibrina, facilita a ade-
são, migração e os processos fagocíticos dos leucócitos. Além disso, em outra
fase, esta proteína fornece o substrato primário para a organização e deposição
do colágeno. Estas substâncias produzem um gradiente químico através do
qual os PMN irão migrar, chegando ao foco da ferida. Ainda que estas células
não sejam importantes no metabolismo do colágeno, são essenciais na defesa
contra infecções.
Os neutrófilos são responsáveis pela remoção de corpos estranhos, mas rapi-
damente sofrem degeneração gordurosa e lise. Isto se torna muito importante,
pois o exsudato (visível na ferida operatória) pode ter um aspecto purulento sem
contudo necessariamente apresentar contaminação bacteriana.
Já os monócitos irão se modificar e transformar em macrófagos, que podem
manter sua atividade de fagocitose por várias semanas. Além dos derivados dos
mastócitos, os macrófagos locais também são recrutados. O macrófago chega ao
sítio da injúria celular aproximadamente 24 a 36 horas após a lesão e é uma célu-
la-chave na cura das feridas. Estas células não somente fagocitam restos celula-
res e bactérias, como também produzem várias substâncias importantes no pro-
cesso de cicatrização. Algumas destas substâncias são: um fator similar ao
PDGF, um inibidor da síntese do colágeno ao nível da transcrição, além de fibro-
nectina e do próprio colágeno. Já foi proposto que a concentração de produtos
dos macrófagos é capaz de modular a proliferação do colágeno.
Os linfócitos T e B são os tipos inflamatórios finais a ocupar a ferida.
Foram identificados dendrócitos, células da derme, como parte do processo
de cicatrização. Estes expresssam o fator de coagulação XIIIa — ou fator estabi-
lizador da fibrina — e têm seu número aumentado também em certas dermatoses
inflamatórias.

203
FASES DE FIBROPLASIA

A partir do 2º ou 3º dia após a lesão começa a haver acúmulo de fibroblastos


no sítio da injúria em intensa atividade mitótica e estes dominam a população ce-
lular até o 10º dia, quando param de se reproduzir e passam, então, a secretar
substâncias responsáveis pela substância fundamental e colágeno. Os fibroblas-
tos, no processo de cicatrização têm a forma oblonga e suas características cito-
plasmáticas foram bem identificadas através da microscopia eletrônica. Apre-
sentam um núcleo grande, em cujo interior se encontram um ou mais nucléolos.
Têm uma estrutura reticular endoplásmica bem como um aparelho de Golgi sob
forma de vesícula. O citoplasma do fibroblasto contém inúmeras mitocôndrias e
apresenta ribossomas que se aproximam da membrana. Todas com capacidade
de sintetizar ativamente proteínas. Em relação ao processo de cicatrização, o fi-
broblasto é o responsável pela síntese protéica do tecido conjuntivo.
Sua origem, na cicatrização, é ainda assunto controverso, pois, segundo al-
guns autores, o fibroblasto adviria do tecido conjuntivo vizinho ao ferimento,
entretanto segundo outros, ele seria resultante da evolução de células mesenqui-
mais, que migrariam até a região da ferida, através da circulação.
Quando os fibroblastos começam a mover-se para dentro da ferida, este es-
paço começa a ser preenchido por feixes de fibrina, derivados do fibrinogênio
presente no exsudato inflamatório, que vão formando uma rede. Não é ainda
confirmado se esta rede de fibrina é um guia de orientação para a migração fibro-
blástica porém, sabe-se que os fibroblastos necessitam de um substrato sólido ou
semi-sólido para sua movimentação, diferentemente das células amebóides. O
processo pelo qual os fibroblastos páram de se movimentar é chamado inibição
por contato. A parte dianteira do fibroblasto em movimentação consiste em uma
delgada membrana em forma de leque, com a largura de 5 a 10mm, em que se
movimenta constantemente, por contração de microfilamentos intracelulares.
Quando duas membranas pregueadas encontram-se, há uma leve contração celu-
lar e a migração cessa naquela direção. Assim as populações celulares são força-
das a migrar para dentro de espaços livres de células.
Os fibroblastos secretam IGF I e II (insulin-like growth factor I e II — fator
de crescimento tipo insulina I e II) e respondem a estes fatores. Estudos mostram
que sua ação deve ter a influência na diferenciação e função destas células nos
estágios tardios das feridas. O nível de IGF é baixo na pele sã e após 24 horas de
trauma. Em um a 24 dias, os níveis aumentam significativamente.
A proliferação vascular, ou angiogênese, ocorre graças à interação dos ma-
crófagos com as prostaglandinas e tromboxanos. Formam-se brotos vasculares
quando as células endoteliais próximas à lesão sofrem rápidas mitoses, enquanto
a membrana basal do vaso preexistente sofre degradação enzimática, as células
que estavam em contato com esta vão movendo-se para a área da lesão. Vai sen-
do formada uma rica rede endotelial que contém um fator ativador do plasmino-

204
gênio, que destrói a rede de fibrina, impedindo que grandes quantidades desta
inibam a migração dos fibroblastos. Estes cordões endoteliais canalizam-se for-
mando novos vasos sangüíneos que, junto com os fibroblastos dão aspecto ma-
croscópico do que será denominado de tecido de granulação.
Quando está produzindo colágeno ativamente, o fibroblasto é caracterizado
por um retículo endoplasmático rugoso em forma de longas cisternas comuni-
cantes com filas duplas de polissomos aderidos às membranas. Este retículo é o
local de produção de colágeno. Para que haja a produção de colágeno isto é reali-
zado pela transmissão, processamento e transferência do RNAm maduro para o
ribossomo. O RNAm então fornece o padrão necessário para ocorrer a síntese.
Apesar de todos os tipos celulares terem a informação genética para a produção
de colágeno, isto raramente ocorre. Quando presente, pode gerar patologias gra-
ves, como a síndrome de Ehlers-Danlos.
Conforme vai diminuindo a população de fibroblastos, aumenta a quantida-
de de fibras colágenas, que vão dominando a ferida. O depósito de colágeno ini-
cia-se no quarto ou quinto dia após a lesão e promove a formação de uma densa
estrutura maciça: a cicatriz que une assim os bordos lesados.

FASE DE MATURAÇÃO

A conjunção da contração com a epitelização define esta que é a última fase


da cicatrização. Esta é muito mais exuberante nas feridas abertas do que naque-
las fechadas por sutura, mas existe ambas.
Uma substância de extrema importância nesta fase é o colágeno, que aqui irá
depositar-se, agrupar-se e remodelar-se enquanto o endotélio irá regredir.
A epitelização tem início em torno de 10 a 15 horas após a injúria celular,
quando a epiderme imediatamente adjacente à margem da ferida começa a es-
pessar-se. As células presentes nesta área sofrem um processo de desdiferencia-
ção ou anaplasia e mitoses intensas. As células basais, que tinham forte ligação
com a derme sobre a qual encontravam-se, aumentam de tamanho e começam a
migrar para o centro da lesão em movimentos amebóides. Estes provavelmente
são guiados pelos feixes de fibrina e inibidos por contato. Forma-se, assim, um
estrato granuloso e uma membrana basal na interface dermoepidérmica (quatro
a cinco dias) e após as células da superfície sofrerem queratinização, há a criação
de um estrato córneo (em torno do 10º dia) que geralmente será mais espesso que
o da pele sã circunjacente.
O processo de epitelização é controlado por um mediador bioquímico deno-
minado chalona, cuja estrutura é de um complexo glicoprotéico produzido pelas
próprias células epiteliais. A atividade da chalona é interdependente dos hormô-
nios da supra-renal; com efeito, acurados estudos histoquímicos revelaram que a
mitose epitelial é estimulada pela chalona, cuja atuação é mais efetiva nos perío-

205
dos de repouso; portanto, em condições de baixos níveis séricos de corticóides e
adrenalina.
Já foi descrita também a regulação hormonal da epitelização, controlada
pela epibolina, que seria necessária para a migração. O EGF (epidermal growth
factor — fator de crescimento epidermal) seria necessário para a mitose.
Até o momento, não há descrição de nenhuma substância capaz de acelerar a
epitelização artificialmente. O que se sabe é que o epitélio migra melhor em su-
perfícies úmidas, assépticas, livres de traumas e protegidas da destruição por
agentes químicos em geral, além da necessidade de um bom suprimento de oxi-
gênio tecidual (área onde se desenvolvem rapidamente a pesquisa e o desenvol-
vimento da utilização de técnicas de medicina hiperbárica) sempre considerando
também o indivíduo ter condições nutricionais adequadas.
Em feridas onde a inibição por contato não ocorre, seja porque a área é mui-
to grande ou por estar repetidamente traumatizada, haverá constante estímulo
para diferenciação celular. Com isso, algumas células podem começar a apre-
sentar características anormais, já que a taxa de mitoses será alta, criando um es-
tado pré-neoplásico. Assim, feridas crônicas podem ter como desfecho o apare-
cimento de carcinoma epidermóide (conhecido como úlceras de “Marjolin”). O
tempo para a formação deste irá depender do tipo de ferida e do agente causador
desta.
Nesta fase (maturação) observamos também a regressão endotelial, que
pode ser confirmada pela observação da coloração local, que passa do rosado
para o esbranquiçado.
Um evento que ocorre em feridas abertas, com perda de substância, é a con-
tração. Este é um processo biológico que diminui as dimensões da ferida (e de-
ve-se acrescentar é diferente de contratura, que vem a ser o resultado da contra-
ção). A contração inicia-se após dois ou três dias, quando as bordas da lesão co-
meçam a mover-se em direção centrípeta. Neste processo não há formação da
pele nova e sim estiramento da pele já existente, muitas vezes levando a condi-
ções patológicas graves, tipo retrações cicatriciais (exemplo: retração mentoto-
rácica como seqüela tardia nas queimaduras cervicais, ou então na forma de bri-
das nas cicatrizes cirúrgicas mal planejadas).
A contração pode ser inibida pelo EGF e estimulado pelo TGFβ1 (transfor-
ming growth factor β1 — fator de crescimento transformante β1). Estudos com-
provaram que há contração até mesmo no feto e que esta é tanto maior quanto for
a idade gestacional.
Cerca de 30% dos fibroblastos presentes no tecido de granulação diferenci-
am-se numa população celular específica, que tem comportamento análogo ao
das células musculares lisas, conferem capacidade contrátil ao tecido de granu-
lação, por conseguinte, reduzem a área cruenta da ferida nos processos por cica-
trização em segunda intenção. É conhecido como miofibroblasto, um fibroblas-
to modificado que possui retículo endoplasmático bem desenvolvido e várias ca-

206
racterísticas da célula muscular lisa. Este foi identificado em quase todos os ti-
pos de tecido em contração desde a fáscia palmar na contratura de Dupuytren até
cápsulas ao redor de implantes de silicone. Também é produzido na fase de fi-
broplasia e acumula-se até esta fase, quando inicia a sua função.
O colágeno é uma macromolécula de 300mm de comprimento e 15mm de
largura, peso molecular de 270.000. É composto de três cadeias polipeptídicas
alternantes, na sequência: prolina — glicina — hidroxipolina; lisina — glicina
— hidroxilisina. As hidroxilações da prolina e da lisina ocorrem no interior do
fibroblasto estão dependentes de certos co-fatores, como pO2, ácido ascórbico,
íons ferrosos, α-cetoglutarato e radical sulfidrila. Há necessidade também de en-
zimas, como a prolil hidroxiliase. Com essas hidroxilações, forma-se a estrutura
primária ou protocolágeno, que é excretada pelos fibroblastos, e será clivada por
uma peptidase, formando, assim, a estrutura secundária ou procolágeno. Este é
constituído por três cadeias, cada uma com cerca de 1.000 aminoácidos. Há duas
cadeias tipo α1 e uma cadeia tipo α2. O tropocolágeno, estrutura terciária, é o ar-
ranjo destas três cadeias em uma hélice, com pontes entre elas. Estas pontes são
polimerização do tropocolágeno forma-se então a estrutura quaternária, os fila-
mentos, fibrilas e fibras colágenas. São estes que irão fornecer a força tensora da
cicatriz. Esta força depende da elasticidade, tamanho e forma da cicatriz, e sua
organização física é extremamente importante.
O arranjo das cadeias pode-se dar de várias formas, resultando em pelo me-
nos 10 tipos diferentes de colágeno, que ocorrem em maior ou menor quantidade
dependendo do tecido. A pele, por exemplo, tem 80% de colágeno tipo I e 20%
do tipo III. As artérias, que são mais elásticas, por exemplo, têm 80% do tipo III
e 20 % do tipo I.
Pesquisas recentes demonstram que, nas feridas fetais, a produção de colá-
geno tipo I é 3 a 5 dias após a lesão. Já no adulto, este pico se dá no sétimo dia.
Descobriu-se que, no feto, isto ocorre por aumento do número de células na área
da ferida, enquanto que no adulto há indução do gen do procolágeno tipo I e mi-
gração de fibroblastos.
Para que haja um processo normal de cicatrização, deve haver um equilíbrio
entre a produção e a degradação do colágeno. Se este equilíbrio se perder, haverá
reparação tissular anormal. Se houver diminuição na degradação, ocorrerá a for-
mação de quelóides e cicatrizes hipertróficas; se houver aumento desta, ocorrerá
uma falha na cura ou deiscência da ferida.
A responsável pela degradação do colágeno é a colagenase, que o despoli-
meriza. Esta enzima, foi identificada em praticamente todos os tecidos, sabe-se
na verdade que não se trata de apenas uma enzima, mas sim, de um sistema cola-
genese, produzido por células variadas e com funções diferenciadas em circuns-
tâncias diversas. A colagenase dos mamíferos cliva o colágeno em dois frag-
mentos, Tca e TCb, que são desnaturados a 37ºC e podem ainda ser quebrados até
ficarem solúveis na circulação plasmática. A hidroxiprolina e a hidroxilisina são

207
encontradas quase que exclusivamente no colágeno, havendo ainda uma peque-
na parcela na fração C1q do complemento e na enzima acetilcolinesterase. Se es-
tas últimas não estiverem presentes, os níveis séricos destas substâncias são in-
dicativos da degradação do colágeno.
O antigo conceito de colágeno como uma substância estática e adinâmica é
errôneo. Na verdade, o colágeno presente em uma cicatriz de ferida é uma estru-
tura relativamente dinâmica que, como outros tecidos, sofre remodelação e
substituição constantemente. Após o 42º dia de cicatrização, não há um aumento
mensurável na quantidade de colágeno em uma ferida em cicatrização, e, não
obstante, a cicatriz continua a adquirir força durante pelo menos dois anos. Por-
tanto, devem estar ocorrendo alterações no colágeno, como, por exemplo, o au-
mento na formação de ligações cruzadas e o rearranjo das fibras e fibrilas. O
tempo de remodelação do colágeno em uma ferida em cicatrização é extenso. A
maior parte do colágeno recém-sintetizado é substituída à medida que a cicatriz
amadurece e, literalmente, todo o colágeno presente em um transplante fibroso,
como um enxerto cutâneo, será removido e finalmente substituído.
Entre as fibras do tecido conjuntivo, existe um material viscoso, amorfo, se-
melhante a um gel, denominado substância fundamental ou matriz, que é elabo-
rada pelos fibroblastos. A substância fundamental contém água, eletrólitos e um
complexo de ácidos mucopolissacarídeos. Há um conjunto de hipóteses para ex-
plicar sua função (entre elas aquelas que envolvem estas substâncias com a pro-
dução, orientação e comprimento da fibracolágena).

PROPRIEDADES DAS CICATRIZES

É importante ressaltar que a síntese de colágeno não tem relação direta com
o ganho de força da ferida. Esta irá resultar da organização espacial do colágeno
e de suas ligações entre as moléculas. Apesar de haver um ganho de força signi-
ficativo, que se inicia imediatamente após a sutura e é máximo principalmente
entre a 3ª e 8ª semana, a ferida jamais terá a mesma tensão da pele normal (duas
semanas após a lesão, a cicatriz é frágil, tem 5% da sua força tênsil normal, esta
aumenta progressivamente até um ano após a lesão, mas terá sempre no máximo
80% da força tênsil normal). Além disso, a cicatrização converte tecidos maleá-
veis e elásticos a massas inelásticas, duras e quebradiças.
A concentração de miofibroblastos também é importante, pois também de-
termina a força tênsil da cicatriz.
As cicatrizes, sejam profundas ou superficiais, modificam-se lenta e pro-
gressivamente durante os anos, modificações estas na sua massa e forma. A ex-
plicação para este fenômeno ainda não é conhecida, mas parece resultar da alte-
ração das fibras colágenas ou de novos padrões arquiteturais que estas desenvol-
vem com o tempo.

208
Em nível de pele, onde a fase de maturação foi mais bem estudada, a recons-
trução da continuidade associa-se à epitelização. Assim, 10 a 15 horas após a le-
são, as células epiteliais da margem da ferida migram sobre o tecido subjacente
com movimentos amebóides, formando camadas estratificadas, de modo que no
prazo de quatro a cinco dias, em condições ideais de assepsia, identificamos um
estrato granuloso e uma membrana basal na interface dermoepidérmica. Em tor-
no do 10º dia há um estrato córneo, que, comumente, é mais espesso do que o da
pele sã circunjacente.
O processo de epitelização é controlado por um mediador bioquímico deno-
minado chalona, cuja estrutura é de um complexo glicoprotéico produzido pelas
próprias células epiteliais. A atividade da chalona é interdependente dos hormô-
nios da supra-renal; com efeito, acurados estudos histoquímicos revelam que a
mitose epitelial é estimulada pela chalona, cuja atuação é mais efetiva nos perío-
dos de repouso; portanto, em condições de baixos níveis de corticóide e adrena-
lina.
Nas cicatrizes cutâneas a regressão endotelial pode ser confirmada pela ob-
servação da coloração local, que gradualmente, passa do matiz rosado para o es-
branquiçado graças à redução da vasculatura do tecido conetivo.

FATORES GERAIS QUE INTERVÊM NA CICATRIZAÇÃO

Conhecendo-se como ocorre a cicatrização de uma ferida resultante de uma


incisão cirúrgica, pode-se prever uma série de situações que, eventualmente, in-
terfiram na evolução dos processos que têm por finalidade a reparação e restau-
ração da solução de continuidade.

DEFICIÊNCIA PROTÉICA

Como regra geral, todo paciente cirúrgico apresenta inanição por um inter-
valo de tempo variável. Embora raramente haja comprometimento do perfil pro-
téico, essa situação deve ser criteriosamente observada.
Em casos graves — após traumatismos severos de doentes portadores de do-
enças consumptivas — a reserva protéica diminui, consideravelmente, acarre-
tando danos à reparação cicatricial.
Conquanto os recursos e as técnicas de reposição nutricial estejam adianta-
dos, a depleção protéica favorece e agrava-se pela sobreposição de infecções nos
estados patológicos aludidos.
No local da ferida a presença de exsudato inflamatório exuberante propicia a
instalação de infecções que, em termos finais, compromete a cicatrização pela
destruição do colágeno recém-formado. Essa situação, sobretudo no grande quei-
mado, contribui para o aumento da perda protéica.

209
Experimentalmente, comprovou-se que a desnutrição protéica retarda a
contração das feridas abertas por alteração do substrato morfológico responsá-
vel pela reparação; todavia, essa situação reverte-se à normalidade pela introdu-
ção de dieta com níveis protéicos adequados.
Como foi dito no início, alguns conceitos têm muita importância no manuseio
das feridas; à guisa de ilustração, citamos abaixo os Princípios de Halsted (prin-
cípios estes que até hoje são ensinados aos jovens estudantes de Medicina e de-
vem ser respeitados e observados como básicos pelo bom cirurgião).
— Limpeza.
— Delicadeza.
— Afrontamento de bordos.
— Boa hemostasia.
— Boa vascularização.
— Evitar tensão.
— Evitar espaço morto.
Além destes, outros fatores têm influência. Citaremos alguns.

OXIGENAÇÃO

A hipoxia sistêmica reduz a capacidade de cicatrização. Pacientes anêmicos


ou com problemas ventilatórios têm retardo na cicatrização de uma ferida.
Localmente, submetendo-se a ferida à oxigenação, sob pressão moderada,
favorece-se a cicatrização. Cabe salientar que tal procedimento deve ser alterna-
do, a fim de não comprometer os fenômenos vasculares, em nível capilar, que
ocorrem durante a cicatrização.
Submetendo-se a ferida à isquemia, há retardo na cicatrização, com conse-
qüente diminuição da força tênsil da cicatriz.
Em linhas gerais, o aumento da pressão de oxigênio no local da ferida favo-
rece a epitelização e contribui para o aumento da força tênsil da cicatriz.
Observação: O fumo tem grande influência na cura das feridas retardando a
cicatrização. A nicotina faz vasoconstrição, diminui a nutrição da ferida, aumen-
ta a agregação plaquetária e, com ela, o risco de trombose. Há ainda diminuição
da proliferação de células do sangue, fibroblastos e macrófagos.

Deficiência de Vitamina C

Uma vez que as hidroxilações da prolina e da lisina dependem da presença


da vitamina C, a deficiência dessa diminui ou retarda a produção de colágeno.
Embora o escorbuto seja muito raro, é sempre prudente administrar a vita-
mina C, quer no pré-operatório, quer no pós-operatório.

210
Vitamina A e Cortisona

A vitamina A exerce um efeito antagônico à cortisona na cicatrização de


uma ferida. Enquanto a cortisona fixa a membrana do ribossoma, impedindo,
portanto, a síntese do colágeno, a vitamina A ativa as enzimas presentes na mes-
ma membrana, favorecendo a sua produção. Assim, em pacientes cirúrgicos, sob
corticoterapia, preconiza-se o uso local e sistêmico de vitamina A.
Em nível de epitélio, a vitamina A intervém nos processos de proliferação,
estratificação e queratinização, sendo que genericamente favorece a epidermi-
zação.
Pacientes submetidos a corticoterapia prolongada, são suscetíveis a infec-
ções, portanto, além de diminuição da síntese, poderão ter lise acentuada do co-
lágeno.

Complexo B

As deficiências graves de componentes do complexo B podem alterar a ci-


catrização das feridas. Tal interferência é indireta, pois o complexo B age como
coadjuvante em diversos sistemas enzimáticos atuantes no metabolismo das
proteínas, carboidratos e lipídios, que serão importantes no processo de cicatri-
zação.

Vitamina E

A vitamina E é um co-fator na síntese do colágeno e, embora, sejam raros os


casos de avitaminose E, é recomendável administrar pequenas doses dessa vita-
mina a pacientes em recuperação de atos cirúrgicos.

Zinco

O zinco é importante constituinte de algumas enzimas, como polimerases e


transferases, que intervém nas diversas fases da cicatrização de uma ferida.
Em nível de epitélio, o zinco favorece a proliferação celular. Alguns autores
preconizam o uso local de sulfato de zinco que favoreceria a liberação de oxigê-
nio nascente, importante na síntese do colágeno.

Ferro

O processo de hidroxilação da prolina e da lisina deve contar com a presença


de Fe++. Por outro lado, as anemias ferroprivas, além de alterarem o transporte

211
de oxigênio, intervêm diretamente na produção de colágeno, eis que concorrem
a alterações metabólicas e facilitam instalação de infecções.

Choque e Septicemia
Tanto o choque, independentemente de sua etiologia, quanto a septicemia,
têm como tônica a hipóxia e a acidose, que alteram a função celular e, em temos
finais, modificam os processos que disciplinam as diversas fases da cicatrização.

Insuficiência Renal
O portador de insuficiência renal freqüentemente apresenta acidose em
graus variáveis, podendo ter alteração da função celular, conseqüentemente,
com eventuais falhas na cicatrização. Além disso, in vitro, as soluções concen-
tradas de uréia quebram a estrutura helicoidal do colágeno com precipitação das
proteínas componentes da fibra.

Insuficiência Hepática
A insuficiência hepática contribui para a diminuição da síntese das proteí-
nas, cujas conseqüências, em relação à cicatrização das feridas, já foram ante-
riormente citadas.

Diabetes Melito
A microangiopatia diabética leva à hipóxia tecidual e obstrução arterial.
Uma hiperglicemia (acima de 200mg%) pode levar a alterações celulares (defi-
ciência de função dos leucócitos diminuindo a quimiotaxia, fagocitose).

Irradiação
A irradiação local de uma ferida, com doses em torno de 1.000 rad, retarda a
cicatrização. Doses superiores a 3.000 rad destroem irreversivelmente o tecido
de granulação.
Quando todo o corpo é irradiado há diminuição da força tênsil da cicatriz.

Drogas Imunossupressoras Quimioterápicas e Corticoideterapia


Tais substâncias, com freqüência, determinam aplasia medular, anemia e
inadequada deposição de plaquetas. Com certa regularidade, pacientes sob tal
terapêutica, quando submetidos a cirurgia, têm deiscência de sutura, além de ou-

212
tros fenômenos gerais, como choque e septicemia, que comprometem ainda
mais a cicatrização da ferida. Esses pacientes devem receber, se possível, ade-
quada atenção pré-operatória, como transfusões de sangue e plaquetas, o ambi-
ente o mais asséptico possível, prévia esterilização do intestino etc.

Testosterona e Esteróides Anabolizantes

Em que pese a importância dessas substâncias no processo de hidroxilação


da prolina e da lisina, a forma como agem é ainda assunto discutível. Experi-
mentalmente, ficou comprovado em animais de laboratório, que com a adminis-
tração dessas drogas, três ou quatro dias antes da incisão da pele, obtinha-se uma
cicatriz com força tênsil maior e mais precocemente.

Aspirina e Antiinflamatório

Essas drogas têm capacidade de fixar os processos de usinagem bioquímica


do tecido conjuntivo e, por via de conseqüência, comprometer os processos de
reparação (mesmo em pequenas doses).
A indometacina e o ibuprofen impedem a síntese das prostaglandinas a par-
tir do ácido araquidônico. A ação dessas drogas sobre os eventos cicatriciais é
objeto de inúmeras controvérsias e vem merecendo acurados estudos.

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213
Cuidados com a Ferida
18 Operatória — Infecção

João Batista de Souza


Paulo Gonçalves de Oliveira

“Cicatrização é uma questão de tempo, mas é, às vezes,


também uma questão de oportunidade.”
Hipócrates

INTRODUÇÃO
As feridas representam um apanágio das operações. O trauma tecidual desen-
cadeia uma série de processos e ativa várias células e elementos que visam à restau-
ração funcional do órgão acometido. Cabe ao cirurgião reconhecer estes fenôme-
nos, sua seqüência e cuidados nas diferentes fases, para melhor contribuir para a
rápida e plena recuperação do paciente. Vários fatores podem interferir negativa-
mente sobre este processo, sendo a infecção um dos mais importantes por estar re-
lacionado a aumento de morbidade e mortalidade.

CICATRIZAÇÃO DAS FERIDAS


O trauma decorrente de uma ferida, mesmo uma ferida operatória realizada
em condições assépticas, desencadeia uma série de eventos que visam à repara-
ção tecidual denominada cicatrização. O processo cicatricial se inicia e segue
uma seqüência que, muito embora possa ser denominada de acordo com os fenô-
menos predominantes do período, é interdependente e cada fase influencia as
demais. Didaticamente pode ser dividida em: hemostasia e inflamação; prolife-
ração; e maturação ou remodelagem66.

HEMOSTASIA E INFLAMAÇÃO
Hemostasia
O trauma tecidual desencadeia alguns fenômenos e ativa células e elemen-
tos celulares. O dano tecidual leva à liberação de grande número de mediadores

215
químicos e substâncias mensageiras intercelulares chamadas citocinas. Estas
moléculas podem agir tanto como fatores estimulantes quanto inibitórios e dar
início a uma complexa série de eventos inter-relacionados que levam à hemosta-
sia e cicatrização53.
Quando os vasos sangüíneos são lesados, as plaquetas, ativadas pelo coláge-
no exposto na parede dos vasos, tornam-se viscosas e aderem à parede e entre si
formando agregados. As plaquetas se agregam por ação do tromboxane A2, uma
prostaglandina sintetizada por plaquetas ativadas. Elas então formam tampões
temporários no sítio de lesão. Prostaciclinas produzidas por células endoteliais
previnem a aderência de plaquetas à superfície endotelial não lesada. Plaquetas
também liberam serotonina e outros vasoconstritores em resposta ao trauma.
Isto ajuda a limitar a perda sangüínea imediata por constrição dos vasos lesa-
dos78.
O trauma do endotélio vascular também desencadeia a cascata de coagula-
ção. Parede vascular lesada, plaquetas e fatores de coagulação são os três com-
ponentes que interagem na formação do coágulo. O mecanismo de coagulação é
desenvolvido de modo que o produto final de cada reação na cascata ativa a pró-
xima reação. Íons de cálcio e fosfolipídeos são necessários para que ocorram
muitos estágios da coagulação. Estas reações produzem trombina, que forma o
coágulo por converter fibrinogênio em fibrina. A fibrina forma uma rede que age
retendo elementos celulares do sangue. A trama de fibrina ajuda também a esta-
bilizar o tampão de plaquetas46,79.
A cascata de coagulação é precisamente regulada. Uma vez formado o coá-
gulo em resposta ao trauma e servido ao seu propósito ele é lisado por plasmina,
uma protease sérica que age sobre a fibrina. A plasmina é formada por ativação
de plasminogênio presente no plasma. O exato papel dos produtos da degrada-
ção de fibrina e outros mediadores liberados nesta fase sobre a cicatrização ain-
da não está estabelecido5.

Inflamação

Inflamação é a resposta tecidual inicial ao trauma. Ela ativa mecanismos


protetores e prepara os tecidos para as fases seguintes. A inflamação é mediada
pela liberação de grande número de substâncias químicas, os mediadores, tais
como os leucotrienos, frações de complemento, fator ativador de plaquetas, pro-
dutos da degradação da fibrina, serotonina e histamina. A liberação de mediado-
res na ferida resulta em vasodilatação, aumento da permeabilidade capilar e esti-
mulação das fibras dolorosas78,79.
A fase inflamatória perdura por até seis dias e a persistência dos sinais infla-
matórios por mais tempo, habitualmente, está relacionada com problemas na ci-
catrização, principalmente infecção de ferida.

216
Várias células são atraídas à área da ferida e ativadas para cumprirem seus
papéis no processo cicatricial. As primeiras células a chegarem à ferida são os
neutrófilos, que são atraídos por substâncias como complemento, interleuci-
na-1, fator de necrose tumoral 4 — α (FNT-α), fator transformador do cresci-
mento — β, (FTC-β), fator plaquetário — e produtos bacterianos79.
Após cerca de 72 horas da lesão, os macrófagos se tornam as células domi-
nantes, fagocitando células mortas e bactérias. Mais tardiamente, em torno do
sexto dia pós-lesão, os linfócitos se tornam as células de defesa predominantes
na ferida71,79.
A contribuição de cada população celular no processo cicatricial é variável.
Macrófagos e linfócitos exercem papéis essenciais porém, desde que não haja
contaminação bacteriana, os neutrófilos não são fundamentais para a cicatriza-
ção. Isto decorre de que o seu papel na fagocitose e defesa antimicrobiana pode
ser suprido pelos macrófagos48,69.
Macrófagos ativados cumprem várias funções na cicatrização, como71,79:
— na angiogênese, via liberação de fatores de crescimento e citocinas
como o FNT-α;
— no recrutamento e ativação de células como os linfócitos, que liberarão
linfocinas como interferons e interleucinas, e fibroblastos que participa-
rão na síntese de colágeno;
— na regulação da síntese da matriz celular, via fatores de crescimento, ci-
tocinas, prostaglandinas e outras enzimas como arginase e colagenase;
— no desbridamento da ferida, tanto por fagocitose quanto pela liberação
de enzimas como colagenase e elastase;
— na função antimicrobiana, pela produção de óxido nítrico e outros radi-
cais livres.
A fase inflamatória afeta de modo decisivo as etapas seguintes da cicatriza-
ção. A diminuição do estímulo inflamatório resulta em quimiotaxia diminuída e
fagocitose alterada, o que facilita o aparecimento de infecções e redução na de-
posição de colágeno.

PROLIFERAÇÃO
A fase de proliferação de novos tecidos segue-se à resposta inflamatória.
Inicia-se em torno do quarto dia pós-trauma e perdura, em geral, até o décimo
quarto dia71,79.
Esta fase envolve três processos:
— granulação, que leva à formação de uma rede de novos vasos sangüíneos
(angiogênese) em uma matriz rica em colágeno;
— contração, que contribui para a diminuição do tamanho da ferida;
— e epitelização, que recobre a ferida por epitélio regenerado, habitual-
mente partindo de suas margens para seu centro.

217
Granulação

A formação de tecido de granulação se inicia em torno do quinto dia


pós-trauma. Macrófagos são atraídos à ferida e secretam vários fatores de cresci-
mento e fatores quimiotáticos em resposta à baixa tensão tecidual de oxigênio.
Os fibroblastos respondem a estes fatores de crescimento e quimiotáticos na fe-
rida por multiplicação, migração e deposição de matriz celular. Células endoteli-
ais de vasos sangüíneos também respondem formando novos capilares que cres-
cem através da ferida (angiogênese)10,59.
Nesta fase a matriz rica em colágeno do tipo III secretado pelos fibroblastos
provê o substrato para macrófagos, fibroblastos e novos vasos sangüíneos. Os
novos vasos, por sua vez, provêm nutrientes e oxigênio para o crescimento con-
tinuado59,79.
A vitamina C age como uma coenzima, na síntese de colágeno, para a hidro-
xilação de prolina em hidroxiprolina. A hidroxiprolina contribui para o entrecru-
zamento das fibras de colágeno, que resultará em maior força e resistência destas
fibras recém-formadas10,59.

Contração

A contração é um processo gradual e deste modo nem sempre é facilmente


observada na prática clínica. Entretanto, pode diminuir de modo significativo a
área a ser coberta por epitélio10,59.
A contração das feridas parece ser função de fibroblastos da ferida diferen-
ciados, os miofibroblastos, que contêm fibrilas de actina e de miosina. Estes es-
tão presentes em grande número em feridas em contração25.
A contração pode ser inibida por enxerto de pele de espessura total por meio
de mecanismo ainda não esclarecido59.

Epitelização

Epitelização é a cobertura da ferida por células epiteliais. Em feridas de es-


pessura total, ou seja, que acometem todas as camadas da pele, a regeneração
ocorre a partir das margens da ferida. Nas feridas de espessura parcial, remanes-
centes de folículos pilosos parcialmente lesados também contribuem para a ree-
pitelização. As células epiteliais se multiplicam e migram para cobrir a ferida.
Este processo de migração centrípeta acontece até que uma camada contínua de
epitélio recubra a ferida. A migração é então inibida pelo contato entre as células
epiteliais provenientes de regiões opostas das margens da ferida. Este epitélio
inicialmente formado é delgado e pode ser facilmente rompido10.

218
Alguns fatores podem interferir sobre a epitelização tais como a presença e
tipo de curativos, a temperatura e o pH. A epitelização pode ser retardada pela
presença de corpos estranhos, dessecação e infecção10,59.

MATURAÇÃO OU REMODELAGEM

Esta fase se inicia em torno do oitavo dia pós-lesão e permanece por tempo
variável. O principal aspecto desta fase é a deposição de colágeno, cuja síntese
encontra-se aumentada por pelo menos quatro a cinco semanas. Muitas altera-
ções de cicatrização se manifestarão, do ponto de vista clínico, neste período.
Acontecerão seja por deficiência de deposição de colágeno, como no diabetes ou
uso crônico de corticosteróides, como também por síntese excessiva de coláge-
no nos casos de cicatriz hipertrófica e de quelóides71,79.
Inicialmente a matriz tecidual ao nível da ferida é composta de fibrina e fi-
bronectina. Glicosaminoglicanas e proteoglicanas, e também outras proteínas,
são em seguida sintetizadas e representam o suporte para a deposição de outros
componentes. Em seqüência o colágeno torna-se a proteína predominante na
área da ferida79.
O colágeno tipo I é o principal componente da pele normal (80% a 90%), en-
quanto o tipo III é encontrado em menor quantidade (10% a 20%). Em tecido de
granulação o colágeno tipo III está aumentado (30%), enquanto que na cicatriz
madura esta proporção diminui (10%). O papel desempenhado pela deposição
aumentada de colágeno tipo III na fase inicial da cicatrização não está esclareci-
do, porém é reconhecido que ele não contribui para a resistência da ferida59,79.
Na maturação o colágeno tipo III, que iniciou sua formação durante a fase de
proliferação, será convertido em tipo I e submetido a extenso processo de reor-
ganização. Uma vez que a base de colágeno esteja estabelecida, o conteúdo total
de colágeno permanece constante, porém, trata-se de um balanço dinâmico em
que está ocorrendo constantemente síntese e degradação. Com o progredir do
processo de remodelagem a atividade celular se reduz e o número de vasos san-
güíneos na área reparada diminui10,59,71,79.

TIPOS DE CICATRIZAÇÃO DAS FERIDAS

Cicatrização por Primeira Intenção ou Primária

Este tipo de cicatrização ocorre quando as bordas de uma ferida de espessura


total são aproximadas logo após a produção da lesão. A epitelização decorrente é
mínima e em 24 a 48 horas a ferida já foi lacrada por epitélio, o que evitará a con-
taminação bacteriana. A contração da ferida apresenta papel pouco relevante
neste tipo de cicatrização8,71.

219
É o método habitualmente utilizado após operações, especialmente nos ca-
sos de operações limpas. A aproximação das bordas poderá ser feita com pontos,
grampos ou mesmo tiras de adesivos que permitam o perfeito apropinquamento
das bordas.

Cicatrização por Segunda Intenção ou Secundária

Este é o tipo de cicatrização que ocorrerá após perdas de pele ou tecidos mo-
les, em que os processos biológicos naturais se desenvolverão sem intervenção
cirúrgica. É o procedimento em que a ferida é deixada aberta sendo a contração o
fenômeno mais importante neste tipo de cicatrização8,71.
Esta opção é também utilizada nos casos de feridas maciçamente infectadas,
como nos casos de drenagem de abscessos, e após grandes desbridamentos de
áreas necrosadas.
A cicatrização por segunda intenção pode demorar semanas ou meses, de-
pendendo do local e tamanho do defeito.

Cicatrização por Terceira Intenção ou Primária Retardada

É aquela em que a correção cirúrgica se dá após a formação de tecido de gra-


nulação. Ou seja, a ferida é deixada aberta por um período e então o cirurgião
promove a aproximação das bordas da lesão8,71.
Encontra especial indicação nos casos de fechamentos de incisões maciça-
mente contaminadas, que podem acontecer após operações infectadas, em que
seu fechamento é protelado, dando tempo para que as respostas inflamatórias e
imunológicas do paciente possam controlar a contaminação.
Como exemplo podemos citar os casos de apendicectomias com abscesso e
contaminação grosseira da ferida operatória. A ferida é então deixada aberta, re-
alizados curativos, e em torno do terceiro ou quarto dia pós-operatório, caso não
haja sinais de infecção, é então fechada. Caracteristicamente este tipo de proce-
dimento não interfere sobre a força e resistência da ferida, que apresentará valo-
res semelhantes às feridas fechadas por primeira intenção.

CUIDADOS COM A FERIDA OPERATÓRIA

Os cuidados com a ferida visam à cicatrização e à obtenção de resultados


funcionais e estéticos pela promoção de seu curso fisiológico e a prevenção ou
eliminação de fatores, sejam locais, sistêmicos ou externos, que possam pertur-
bar a cicatrização.

220
A FERIDA CIRÚRGICA

Em cirurgia, as incisões são feitas para se ganhar acesso às estruturas adja-


centes. Estas incisões, habitualmente lineares, são realizadas em condições as-
sépticas e estão associadas com mínimo dano aos tecidos circunvizinhos.
A sutura da ferida causa trauma adicional, embora de menor monta, e tam-
bém pode levar ao aparecimento de cicatrizes puntiformes. Dentro dos tecidos o
material de sutura age como corpo estranho e pode se tornar infectado com pro-
dução de abscesso ou trajeto fistuloso.
Os cuidados com a ferida operatória iniciam-se já no pré-operatório, prosse-
guem no transoperatório e devem continuar no pós-operatório. O reconhecimen-
to de condições que podem interferir na cicatrização e a adoção de medidas ade-
quadas que possam atenuar ou abolir estas alterações é parte fundamental do
preparo do paciente.

PREPARO PRÉ-OPERATÓRIO

Dentre as principais condições encontradas no pré-operatório e que podem


interferir na cicatrização destacam-se: desnutrição; diminuição do volume cir-
culante; anemia; hipertensão; diabetes; uso de medicamentos; quimioterapia e
radioterapia; e infecções, locais ou a distância.
O paciente deve ter avaliado seu estado nutricional e medidas de suporte nu-
tricional devem ser tomadas de imediato com correção de deficiências de vita-
minas e outros elementos. Deve ser considerado porém que apenas a desnutrição
grave pode justificar retardo do procedimento operatório. Qualquer dos métodos
de suporte nutricional pode ser utilizado considerando-se a melhor indicação, se
oral, enteral ou parenteral, porém, o suporte iniciado no pré-operatório deve ser
continuado no pós-operatório18,39.
Para a cicatrização é fundamental o aporte de oxigênio e elementos nutriti-
vos à ferida bem como o perfeito funcionamento da microcirculação o que faci-
litará o desencadear da resposta inflamatória adequada. Portanto, o combate à
desidratação, à hipovolemia, à anemia, à hipertensão e à vasoconstrição é parte
importante do preparo pré-operatório39,71.
O diabetes deve ser controlado pois, além da microangiopatia e arterioscle-
rose comuns nesta condição, está relacionado com disfunção leucocitária e alte-
ração no aporte de vitamina C às células. Recomenda-se o controle do diabetes,
preferencialmente, com infusão contínua de insulina e avaliações freqüentes da
glicemia. A vitamina C também deve ser suplementada na dose de 500 a 2.000
mg/dia18,39.
Os antiinflamatórios esteroidais interferem no processo inflamatório e ini-
bem a contração59. Se não puderem ser descontinuados, a utilização de vitamina
A em doses de 25.000 UI/dia, via oral, pode reverter este efeito inibitório tempo-

221
rariamente38. Foi também demonstrado que a utilização de vitamina A pode cor-
rigir os efeitos deletérios da radiação e do diabetes49,67.
A radioterapia e a quimioterapia interferem no processo cicatricial, especi-
almente nas fases inflamatória e proliferativa, devendo portanto, sempre que
possível, serem iniciadas após o vigésimo primeiro dia pós-operatório71.
As infecções interferem na cicatrização devendo ser controlados todos os
possíveis focos contaminantes26. O uso de antibióticos profiláticos deve obede-
cer rigorosamente aos princípios de sua utilização70.
A tricotomia deve ser restrita à área a ser operada e, sempre que possível,
deve ser evitada70. Quando utilizada deve-se tomar cuidado especial para evitar
que aconteçam escarificações na pele que poderão funcionar como portas de en-
trada para infecções.

CUIDADOS INTRA-OPERATÓRIOS

Os antibióticos eventualmente iniciados no período pré-operatório devem


ser continuados e as doses repetidas de acordo com a meia-vida da droga. Habi-
tualmente utilizam-se repetições a cada duas vezes a meia-vida do antibiótico e
o mesmo é suspenso ao final da operação39,70.
A técnica operatória deve ser suave evitando-se o uso de ligaduras e cauté-
rio. A ferida deve ser mantida úmida evitando-se sua dessecação. Os fios de su-
tura devem ser apropriados para o tecido e a finalidade desejada. De modo geral
utilizam-se fios inabsorvíveis na pele e aponeuroses, podendo ser substituídos
por fios absorvíveis de longa duração em aponeuroses. Dá-se preferência, sem-
pre que possível, aos fios monofilamentados e que apresentem menor potencial
de reação do tipo corpo estranho39.
O fechamento das feridas deve ser feito com a aproximação das bordas sem
contudo promover isquemia. Deve ser lembrado que com a resposta inflamató-
ria a ferida apresentará edema e por vezes a sutura que parecia justa pode se tor-
nar apertada71.
A cobertura da ferida pode ser feita, habitualmente, apenas com uma cama-
da de gaze fixa com fitas adesivas pouco irritantes. Quando se optar por fecha-
mento primário retardado deve-se utilizar curativo hidrófilo, absorvente, que
será trocado assim que apresentar acúmulo de secreções, quantas vezes necessá-
rio39,71.
A vasodilatação periférica e a diminuição na produção de calor decorrentes
da anestesia associadas a baixas temperaturas nas salas de operações sem que o
paciente esteja devidamente aquecido culminam com hipotermia importante52.
Deve-se manter temperatura ambiente adequada para o paciente e utilizar cober-
tores e mesmo bolsas e compressas quentes para manter o paciente normotérmi-
co. Antes da utilização de infusões resfriadas deve-se aquecê-las ao menos até a
temperatura ambiente ou, preferencialmente, à temperatura corporal.

222
CUIDADOS PÓS-OPERATÓRIOS

A oxigenação tecidual é fundamental para a cicatrização, portanto deve-se


evitar a vasoconstrição mantendo a temperatura corporal do paciente e também a
hidratação adequadas52. Uma vez que a dor é forte estímulo vasoconstritor de-
vem ser utilizados analgésicos que mantenham o paciente confortável e se possí-
vel sem dor.
Habitualmente a antibioticoprofilaxia é suspensa com uma última dose do
antibiótico ao término da operação. A manutenção de antibioticoterapia é desne-
cessária e mesmo deletéria na maioria das situações a menos que a contamina-
ção continue ou que uma infecção esteja presente70.
O suporte nutricional deve ser mantido ou mesmo iniciado caso se possa
prever período superior a sete dias sem alimentação. A hidratação parenteral
deve prover a necessidade mínima de calorias e nutrientes ao paciente. A utiliza-
ção de suplementos vitamínicos deve ser dirigida às carências reconhecidas po-
rém a vitamina C, fundamental no processo de cicatrização, por ser hidrossolú-
vel, de baixa estocagem e ser carencial em grande parte dos pacientes pode ser
suplementada no pós-operatório71.
A hipertensão, o diabetes e outros distúrbios sistêmicos devem ser controla-
dos rigorosamente pois podem apresentar descompensação nesta fase pós-ope-
ratória e ser sinais iniciais de complicações ou conseqüência destas71.

PREPARO DO LOCAL A SER OPERADO E A ESCOLHA DA INCISÃO

O banho pré-operatório é recomendável, se possível com soluções detergen-


tes como polivinilpirrolidona-iodo (PVPI), clorexedina ou hexaclorofeno70.
A tricotomia deve ser restrita aos casos em que os pêlos impeçam a visuali-
zação do campo operatório ou dificultem a colocação de curativos. Sua realiza-
ção não deve exceder a duas horas do início da operação, sendo feita de preferên-
cia com barbeador elétrico65,70.
A anti-sepsia do campo operatório deve ser feita preferencialmente com so-
luções que apresentem atividade bactericida instantânea e também atividade re-
sidual. As soluções de iodo, a clorexedina, o álcool e o hexaclorofeno apresen-
tam boa atividade bactericida, porém atividade residual variável. As soluções al-
coólicas de PVPI cumprem satisfatoriamente esta função e suas soluções aquo-
sas podem mesmo ser utilizadas em mucosas.
A incisão operatória deve ser escolhida principalmente em função do ade-
quado acesso à região a ser operada. O aspecto estético não é fundamental, po-
rém é importante e contribui para o fechamento da ferida com menor tensão.
Sempre que possível devem seguir as linhas de Kraissl. Músculos e aponeurose
devem ser seccionados no sentido de suas fibras71.

223
No abdome, dados retrospectivos mostraram maiores taxas de deiscências
com incisões na linha média que incisões transversas7. Alguns estudos sugeri-
ram que incisões supra-umbilicais têm maiores riscos de deiscência que as in-
fra-umbilicais, porém, estes dados não foram confirmados em avaliação pros-
pectiva7,61. De modo geral deve-se evitar a abertura de aponeurose com bisturi
elétrico e dar preferência ao bisturi frio.

O FECHAMENTO DA FERIDA OPERATÓRIA — A ESCOLHA DO FIO

Pele e Subcutâneo
O objetivo do fechamento é a coaptação das bordas de modo que ocorra a ci-
catrização primária.
A utilização de fios absorvíveis está restrita aos casos de feridas limpas, pois
a contaminação em presença de material absorvível, que sabidamente provoca
maior reação inflamatória, poderá contribuir para a infecção da ferida. A prefe-
rência está portanto com os fios inabsorvíveis. Embora possam ser utilizados
fios como algodão ou seda, os fios sintéticos, como o náilon e o polipropileno,
apresentam menor reação do tipo corpo estranho e, por serem monofilamenta-
res, têm menor superfície para albergar bactérias o que representa significativa
vantagem, ressalvados os seus custos. Existem também fios multifilamentares
que são encapados e agregam as vantagens dos fios monofilamentares à melhor
maleabilidade daqueles multifilamentares39.
O tipo de ponto preferencial será aquele que com menor tensão promova a
coaptação das bordas. Para isto a sutura simples é satisfatória. Nos casos de es-
pessa camada gordurosa subcutânea pode-se optar pelos pontos do tipo Donnati,
que diminuem o espaço morto porém à custa de resultados estéticos piores. A su-
tura intradérmica pode ser utilizada nos casos de operações limpas e com pouca
tensão na linha de sutura, como por exemplo em incisões em colar para tiroidec-
tomias ou aquelas seguindo a prega inguinal em hernioplastias71.
O subcutâneo poderá ser aproximado nos casos de operações limpas, porém,
devemos nos lembrar que é melhor a colocação de drenagem aspirativa fechada
em um grande espaço morto do que tentar sua aproximação com suturas70,71.

Parede Abdominal
Alguns aspectos no fechamento da parede abdominal merecem ser analisa-
dos por ainda apresentarem controvérsias, dentre os quais podem ser destaca-
dos:
— o fechamento do peritônio — não é fundamental para se prevenir deis-
cências. Vários estudos demonstraram que não há diferenças entre o fe-
chamento englobando ou não o peritônio, por outro lado, o fechamento

224
do peritônio foi associado com maior formação de aderências, o que
pode ser um efeito nocivo desta conduta22,35,37;
— sutura total (em massa) ou sutura por camada — apresentam índices de
deiscência semelhantes, porém, a sutura total parece ser preferível pois
é segura, eficaz e rápida2;
— pontos interrompidos ou sutura contínua — os dois tipos de sutura apre-
sentam índices semelhantes na prevenção de deiscências, porém, a sutu-
ra contínua parece ser superior pois além de ser segura, rápida e eficaz, é
de menor custo, caso se utilize o mesmo tipo de fio28,61,76;
— uso de pontos de retenção — não há, até o momento, dados que justifi-
quem a adoção desta prática rotineiramente, porém sua utilização em si-
tuações de risco não foi testada36,50;
— tipo de fio — ensaios casualizados não mostraram diferença entre os
fios absorvíveis ou não-absorvíveis, desde que utilizados aqueles de ab-
sorção lenta; do ponto de vista de suas resistências à ruptura in vitro,
apresentam maior força os fios monofilamentares de absorção lenta (po-
lidioxanona e poligliconato), seguidos pelos monofilamentares
não-absorvíveis (náilon e polipropileno), suturas trançadas (poliglacti-
na, ácido poliglicólico e poliéster), categutes e também a seda que apre-
senta, por exemplo, 15% da resistência do fio de polidioxanona6,31,45;
— distância entre os pontos e quantidade de tecido englobado — a propor-
ção recomendada entre o tamanho do ponto e a distância entre os pontos
deve ser uma taxa superior a 2:1, isto significa, em sutura contínua total,
a utilização de pontos de 2 cm ou mais, metade em cada lado da ferida, e
distantes entre si 1 cm7,42,45.

CURATIVOS

A utilização de curativos visa proteger as feridas do ambiente externo. Eles


formam uma barreira física que impede a entrada de agentes externos, retém
umidade e exsudação e reduz a perda de calor.
As feridas limpas necessitam, habitualmente, apenas de uma cobertura com
fina camada de gaze hidrófila, seca, que será mantida por cerca de 24 horas.
Após este período poderá ser deixada descoberta, pois, em decorrência da epite-
lização já apresenta uma barreira de proteção ao meio externo71.
Outra opção que pode ser utilizada é a cobertura da ferida limpa, após sutu-
rada, com colódio elástico. Este tipo de curativo é especialmente indicado em
crianças que por vezes tendem a retirar os curativos ou tocar a ferida repetida-
mente71.
No caso de feridas com secreções deve-se utilizar maior quantidade de ga-
zes e devem ser trocadas tantas vezes quanto necessário para se manterem
limpas. Para auxiliar na retirada de debris devem ser utilizadas soluções de NaCl

225
0,9%, estando o uso de soluções anti-sépticas restritas à pele sadia em torno da
ferida19,71.

A RETIRADA DOS PONTOS

O tempo que a sutura deve ser mantida na ferida é questão de julgamento.


Apenas sugestões gerais podem feitas.
O suprimento sangüíneo à área suturada, a tensão e a mobilização a que está
sujeita a ferida em razão de sua localização bem como a idade e condições gerais
do paciente e também fatores cosméticos, todos precisam ser considerados para
esta escolha.
De modo geral feridas na face desenvolverão resistência suficiente em qua-
tro a cinco dias e as suturas poderão ser retiradas, diminuindo os efeitos cosméti-
cos residuais. Feridas no dorso ou em membros necessitarão suporte de pontos
por mais tempo e podem ser mantidos por dez dias ou mais. As suturas no abdo-
me geralmente são retiradas com seis a sete dias71.
Artifícios para se retirar mais precocemente os pontos da ferida e melhorar
seus efeitos cosméticos são a retirada intercalada dos pontos e a colocação de fi-
tas adesivas apoiando a sutura.
Os pontos intradérmicos são, habitualmente, retirados com sete dias ou mais
precocemente com a utilização de fitas adesivas auxiliares para sustentação.

QUELÓIDES, CICATRIZES HIPERTRÓFICAS E CICATRIZES RETRÁTEIS

Estas complicações tardias das feridas representam distúrbios fibroprolife-


rativos dérmicos. Os quelóides representam o crescimento e extensão de tecido
cicatricial para além dos limites da ferida, em pessoas com predisposição famili-
al, e que raramente regride espontaneamente. Cicatrizes hipertróficas são lesões
fibróticas, elevadas, que respeitam os limites da ferida original e podem apre-
sentar resolução espontânea, ao menos parcial, estando freqüentemente associa-
das com retração da ferida. As cicatrizes retráteis representam o encurtamento
patológico do tecido cicatricial resultando em deformidades e disfunções75.
Esses distúrbios fibroproliferativos dérmicos representam aberrações no
processo cicatricial normal em decorrência de alterações na migração e prolife-
ração celular, na inflamação, na síntese e secreção de citocinas e matriz extrace-
lular, e na remodelagem da matriz sintetizada75.
Antecedentes familiares ou presença de quelóides e cicatrizes hipertróficas
e também a localização anatômica da ferida em ombros, região torácica anterior,
pescoço, membros superiores e face podem ser preditivos para o aparecimento
de lesões fibroproliferativas71,75.

226
A prevenção do aparecimento destas lesões inclui a escolha de incisões ao
longo das linhas de tensão da pele, o manuseio delicado dos tecidos e a tentativa
de limitar a resposta inflamatória que é importante estímulo para a fibrose75.
As medidas conservadoras incluem moldes de pressão, gel de silicone e ou-
tras opções que visam, basicamente, diminuir a tensão de oxigênio na ferida, o
que diminuirá a síntese de colágeno, e elevar a temperatura local, desta forma
aumentando a atividade da colagenase29,44,47.
A injeção intralesional de corticosteróides de ação prolongada, como a tri-
amcinolona, está associada com taxas de sucesso superiores a 50%. Estas inje-
ções devem ser feitas na ferida e a 0,5cm de suas bordas, preferencialmente com
anestesia tópica ou local, e com dosagens de até 40mg/ml, muito embora se sai-
ba que doses de até 5mg/ml apresentam menores índices de atrofia e pigmenta-
ção local. Outros efeitos adversos incluem formação de telangiectasias, necrose,
ulceração ou efeitos sistêmicos, sendo que estes podem ser evitados com aplica-
ção do corticóide em intervalos acima de quatro semanas43,71,75.
A excisão cirúrgica está associada com taxas de recorrência de 50% a
80%17. De modo geral os melhores resultados estão associados com a utilização
de medidas complementares como a infiltração de corticosteróides e radiotera-
pia.
As cicatrizes retráteis podem ser tratadas com o uso de moldes de pressão
estando a liberação cirúrgica indicada nos casos de lesões refratárias ou que, por
sua localização, não permitam seu manuseio conservador75.

INFECÇÃO DA FERIDA OPERATÓRIA

A infecção da ferida operatória é, dentre as complicações infecciosas, a mais


freqüente no paciente cirúrgico70. Esta complicação é responsável por aumento
significativo nos índices de morbidade e mortalidade e nos custos hospitala-
res3,57. Algumas medidas simples podem ajudar o cirurgião a reduzir a infecção
da ferida operatória: inicialmente, identificar os pacientes com risco aumentado
e, se possível, melhorar as condições pré-operatórias predisponentes; antibioti-
coprofilaxia criteriosa; utilização de barreiras de proteção e procedimentos de
desinfecção que reduzam a contaminação intra-operatória; técnica cirúrgica me-
ticulosa; e rotina de vigilância que inclua a busca das prováveis causas e meca-
nismos da infecção com comunicação e discussão com a equipe cirúrgica.

DEFINIÇÃO

Na prática cirúrgica, infecção é definida como o produto da entrada, cresci-


mento, atividade metabólica e os resultantes efeitos patofisiológicos de micror-
ganismos nos tecidos do paciente12.

227
Em 1992, o The Surgical Wound Infecction Task Force publicou as defini-
ções de infecções do sítio cirúrgico em que foram separadas as infecções incisio-
nais, superficiais e profundas, das infecções que acometem órgãos e espaços
profundamente localizados, como, por exemplo, peritônio e ossos34.
As infecções incisionais, que serão consideradas como infecções de ferida
operatória, foram definidas em:
a — Infecção incisional superficial
— drenagem de secreção purulenta pela ferida;
— isolamento de microrganismos de cultura de fluidos ou tecidos obtidos
assepticamente;
— ao menos um dos sinais ou sintomas de infecção — dor, tumor, rubor ou
calor — em ferida deliberadamente reaberta pelo cirurgião, a menos que
a cultura da incisão seja negativa;
— diagnóstico de infecção incisional superficial pelo cirurgião ou médico
assistente.
b — Infecção incisional profunda
— drenagem de secreção purulenta, que não seja proveniente de órgãos ou
espaços profundos;
— ferida profunda com deiscência espontânea ou deliberadamente reaber-
ta pelo cirurgião quando o paciente apresenta febre (>38°C) e/ou
dor/sensibilidade localizada, a menos que a cultura da incisão seja nega-
tiva;
— achado de abscesso ou outra evidência de infecção profunda na incisão,
seja por exame direto, durante reoperação ou por exame histopatológico
ou de imagem;
— diagnóstico de infecção incisional profunda pelo cirurgião ou médico
assistente.

FATORES QUE INTERFEREM NA INCIDÊNCIA DE INFECÇÕES DE FERIDAS


OPERATÓRIAS
Ressalvado que os fatores envolvidos na gênese da infecção são múltiplos,
complexos e, por vezes, interdependentes e superponíveis, pode-se conside-
rá-los como relativos ao paciente e à ferida em suas relações com os microrga-
nismos contaminantes.

Relativos ao Paciente e Procedimento


Fatores Endógenos
São os fatores pessoais de risco de cada paciente que podem ou não ser alte-
rados no pré-operatório:

228
— idade — os extremos de idade parecem associados com aumento na inci-
dência de infecção de feridas, provavelmente por alteração na imunocom-
petência, embora haja discordância se este é um fator independente15,32,54,70;
— doenças concomitantes — múltiplos diagnósticos, avaliados pelo índice
de risco SENIC (Study on the Efficacy of Nosocomial Infection Con-
trol) ou com a utilização da classificação da American Society of Anest-
hesiologists (ASA)16,26,32,65;
— diabetes — fisiopatologia provavelmente relacionada com distúrbio na
cicatrização14,55;
— obesidade — parece haver relação, embora fraca, e talvez apenas para
incisões específicas, como esternotomias14,21,55;
— tempo de internação pré-operatória — embora não esteja devidamente
comprovado, teoricamente está relacionado com a colonização da pele
com organismos resistentes14,15,26,54;
— infecção a distância — apesar de não estar provado, é prudente que se tra-
te infecções em sítios distantes no pré-operatório, se possível20,26,40,74;
— desnutrição — parece ser mais importante como fator de comorbidade,
associado a outras variáveis14,21,30,68.

Fatores Exógenos

É relacionado com as características do procedimento operatório, indepen-


dentemente do paciente:
— duração da operação — embora se considere que operações com mais
de duas horas são prolongadas, é mais preciso assim considerar aquelas
que estão fora do 75º percentil de duração para procedimentos simila-
res14,15,16,26,32;
— operação de emergência — não parece, como fator independente, clara-
mente predispor a infecções de ferida26,27.

Relativos à Ferida

Classificação das Operações

Este talvez seja o mais importante fator de risco independente para infecção
de feridas. Os dados de cinco estudos prospectivos5,15,32,56,57, com 208.049 paci-
entes, foram avaliados por Evans & Meakins23 em 1994, e podem ser vistos na
Tabela 18.1.

229
Tabela 18.1
Taxas de Infecções de Ferida em Três Décadas de Acordo
com a Classificação das Feridas
Classificação Definição Taxa de Infecção nas Três Décadas
1960-69 1970-79 1980-89
Limpa Técnica estéril, ferida não- 5,1% 1,5% 2,3%
traumática, sem foco
inflamatório ou abertura da
luz digestiva, urinária ou
respiratória.
Potencialmente Abertura controlada da luz 10,8% 7,7% 3,4%
contaminada digestiva, urinária ou
respiratória sem escape
grosseiro de conteúdo;
quebra leve no rigor da
técnica e assepsia.
Contaminada Abertura da luz digestiva, 16,3% 15,2% 8,5%
com extravasamento
abundante de conteúdo ou
abertura de trato
geniturinário ou biliar na
presença de urina ou bile
infectadas; quebra
grosseira na técnica;
ferida traumática recente.
Infectada Inflamação bacteriana 28,0% 40,0% 12,6%
aguda ou contaminação
fecal prolongada; retenção
de tecido desvitalizado ou
presença de corpo
estranho; ferida traumática
tardia.

Contaminação das Feridas


Vários estudos têm demonstrado que existe um nível crítico de microrganis-
mos contaminantes nos tecidos para que uma ferida se torne infectada. Este nível
parece se situar acima de 100.000 microrganismos por grama de tecido muito
embora alguns fatores, como a presença de corpos estranhos por exemplo, redu-
zam de modo significativo este valor de contaminantes9,26,63,64.

Irrigação da Ferida Aguda


A irrigação da ferida é importante para a retirada de debris, sendo utilizadas,
habitualmente soluções de NaCl 0,9%.

230
A irrigação com baixa pressão é capaz apenas de retirar contaminação su-
perficial, mesmo com utilização de grandes volumes. Recomenda-se que, quan-
do se pretender a retirada de microrganismos mais profundamente, deve-se utili-
zar irrigação de alta pressão e intermitente64.
Em feridas pequenas pode-se utilizar uma seringa com agulha 19 e aplica-
ção de jatos de solução salina72.
A utilização de antibióticos tópicos não demonstrou benefícios significati-
vos e não encontram aplicação rotineira65.

Perfusão Tecidual

A perfusão das feridas é crítica para a cicatrização, especialmente para o


aporte de oxigênio e neutrófilos, que diminuem seu poder de fagocitose e res-
posta aos quimiotáxicos em ambientes com hipoxia65.

DIAGNÓSTICO

O diagnóstico definitivo é feito pela detecção de material purulento na feri-


da ou pela disseminação de inflamação além daquela esperada no processo cica-
tricial. Isto também pode ser feito pela avaliação quantitativa do número de bac-
térias por grama de tecido, na ferida64.
O achado de cultura quantitativa de biópsia de tecidos com mais que 105
bactérias por grama de tecido ou a presença de estreptococos beta-hemolíticos
são sugestivos de infecção de ferida64.
A cultura quantitativa de tecidos, muito embora possa fornecer informações
importantes, necessita de 24 a 36 horas para se obter resultados, o que é uma li-
mitação quanto à adoção de conduta imediata nas feridas suspeitas62.
Existe porém um teste derivado da cultura quantitativa que é capaz de esti-
mar a presença de contaminação acima de 105 bactérias por grama de tecido e
tem como vantagem o baixo tempo dispendido, estimado em 15 minutos33.

CUIDADOS GERAIS COM A FERIDA

Prevenção de Infecção de Ferida Operatória


Além dos cuidados gerais, já anteriormente delineados, as principais medi-
das para prevenção de infecção de ferida são:
— cuidados locais: remoção de tecidos desvitalizados; remoção de micror-
ganismos por limpeza da ferida; uso de curativos para evitar contamina-
ção.
— cuidados sistêmicos: administrar antibióticos profiláticos.

231
Cuidados Locais
A maneira mais rápida de se remover tecido morto é a excisão cirúrgica, po-
rém, quantidades menores de tecido podem ser desbridadas pela troca freqüente
de curativos.
A limpeza da ferida pela irrigação de soluções salinas (NaCl 0,9%) pode re-
duzir o número de microrganismos presentes na ferida, e os curativos, utilizados
nas primeiras 24 a 48 horas pós-trauma, contribuem para a formação de uma bar-
reira que impede a contaminação.
As feridas tratadas por cicatrização secundária ou primária retardada reque-
rem cuidados especiais de curativos até que ocorra a epitelização de toda super-
fície.

Cuidados Sistêmicos — Antibióticos Profiláticos


O uso racional de antibióticos profiláticos é parte fundamental nos cuidados
com a ferida operatória e está diretamente relacionado ao sucesso do tratamento
cirúrgico3,58,70.
Para seu uso deve-se considerar:
— quanto ao momento de início: necessita-se de seis a oito horas, desde a
incisão da ferida, para que as defesas imunológicas do organismo, espe-
cialmente celulares, sejam efetivas; neste período é fundamental o apoio
de antibióticos que, portanto, devem ser utilizados com o objetivo de se
obter níveis teciduais máximos no momento da incisão, o que para os
antibióticos de modo geral pode ser obtido com aplicação da primeira
dose entre uma hora antes até a indução anestésica4,11,23,58;
— quanto à duração: em vários estudos tem sido demonstrado que é desne-
cessária a continuação do antibiótico além do período crítico para conta-
minação e até, em alguns, com aumento dos índices de infecção; pode-se
concluir que, mesmo que doses prolongadas não aumentem as taxas de
infecções, o uso por período restrito será mais barato11,41,58;
— quanto aos patógenos-alvo: devem ser conhecidos os microrganismos
que contaminem com maior freqüência as infecções de ferida em deter-
minadas operações, o que está diretamente relacionado com a flora pre-
sente nestes órgãos e deve ser o esteio da cobertura pretendida41,58;
— quanto às operações: há indicação de seu uso em operações contamina-
das e potencialmente contaminadas; as operações limpas, de modo ge-
ral, apresentam índices tão baixos que não justificam sua utilização; as
exceções para o uso em operações limpas incluem os procedimentos em
que infecções seriam catastróficas, como operações cardiovasculares e
neurológicas, ou aquelas que, por vigilância epidemiológica, apresente
em determinado serviço índice de infecção acima de 3%; a utilização ro-
tineira em cirurgia plástica não é recomendável pois os riscos de utiliza-

232
ção de antibióticos superam os prováveis benefícios de sua
utilização41,58,60;
— quanto aos efeitos colaterais: deve-se optar por antibióticos com menor
potencial de efeitos adversos, preferencialmente uma droga apenas, lem-
brando que muitos antibióticos interferem sobre a quimiotaxia de neutró-
filos ou podem selecionar cepas resistentes e portanto devem ser
evitados3,58,70.

Cuidados com a Ferida Operatória Infectada


Uma vez que tenha sido diagnosticada uma infecção, o tratamento consiste
de drenagem da ferida, remoção de material estranho e avaliação quanto à neces-
sidade de antibioticoterapia.

Drenagem da Ferida
É o passo inicial do tratamento e consiste habitualmente da retirada de al-
guns pontos da pele que permitam a drenagem efetiva da coleção de fluidos lo-
calizada. Neste instante, deve-se proceder à coleta de material para cultura, anti-
biograma e bacterioscopia. A extensão a ser aberta depende da área infectada.

Curativos na Ferida Infectada


Curativos podem desbridar feridas por meio: mecânico; químico; enzimáti-
co; ou de promoção de autólise.
O método mais simples de se obter desbridamento por curativos é a aplica-
ção de gaze seca à ferida. A gaze irá se aderir ao tecido e, durante sua troca, reti-
rará pequenas quantidades de tecido desvitalizado. Tem os inconvenientes de
ser trabalhoso, causar desconforto e promover lesões seguidas sobre a ferida.
Vários curativos sintéticos têm sido apresentados no comércio tais como hi-
drocolóides, hidrogéis e outros, que manteriam a ferida úmida e promoveriam a
remoção de tecidos por autólise1,77.

Limpeza
Feridas infectadas devem ser lavadas para retirada de debris, material estra-
nho e bactérias. A lavagem não deve causar dano adicional aos tecidos normais e
viáveis.
A irrigação copiosa solução salina 0,9% ou fluidos não-iônicos é o método
considerado padrão. No passado, várias soluções fortes, como o peróxido de hi-
drogênio, foram utilizadas para limpeza. Não foi comprovado benefício à cica-
trização e há evidências, in vitro, de dano às células vivas.

233
A exploração em Centro Cirúrgico pode ser indicada para feridas profundas,
eventualmente sob anestesia.

Antibioticoterapia

A utilização de antibioticoterapia está relacionada à presença dos principais


sinais de síndrome da resposta inflamatória sistêmica, quais sejam febre, leuco-
citose e taquicardia. Localmente, estes achados, geralmente, estão associados
com sinais significativos de celulite localizada com calor rubor e dor.
A escolha do antibiótico deve se basear na flora esperada para a complica-
ção, baseado na operação ou doença de base, até que se tenha a cultura e antibio-
grama específicos.

Vigilância

A adoção de política rigorosa de vigilância é considerada a melhor maneira de


se contribuir para a redução das taxas de infecção de feridas3,13,15,24,57,65.
Em 1992, o The Surgical Wound Infection Task Force73, apresentou algu-
mas recomendações para o controle e vigilância de infecções de ferida:
— a definição de infecção de ferida deve ser padronizada (será utilizada a defi-
nição de infecção do sítio cirúrgico, conforme descrito anteriormente);
— a observação direta ou técnicas tradicionais de controle e vigilância de
infecções são aceitáveis para a procura de casos de infecção;
— a vigilância pós-alta é importante e deve ser feita;
— os procedimentos cirúrgicos devem ser classificados de acordo com seu
potencial de infecções e a suscetibilidade dos pacientes a infecções ava-
liados por escore de ASA e duração de operações;
— a taxa de infecções para cada cirurgião deve ser calculada e informada
aos chefes de serviços e a cada cirurgião em particular, sempre estratifi-
cada pelo risco e preferencialmente de modo confidencial.

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237
19 Bases da Cirurgia
Oncológica

Eduardo Pirolla
Raul Cutait

INTRODUÇÃO

A cirurgia constitui-se na mais antiga forma de tratamento do câncer, tendo


sido já referida em papiros egípcios da época de 1600 a.C., sendo a primeira mo-
dalidade terapêutica que realmente interferiu com a evolução da doença neoplá-
sica. Contudo, foi somente neste século, em especial nas últimas décadas, que
novas técnicas operatórias foram desenvolvidas, criando melhores oportunida-
des para cura, melhores opções para paliação, menos mutilações para os pacien-
tes, e menores morbidade e mortalidade.
Métodos diagnósticos mais sofisticados auxiliam nas tomadas de decisões
cirúrgicas, enquanto que anestesias cada vez mais seguras, cuidados
pós-operatórios mais rigorosos e maior disponibilidade de antibióticos permi-
tem ao cirurgião realizar procedimentos mais agressivos. Por outro lado, o atual
enfoque de se cuidar de pacientes com câncer com equipes multidisciplinares,
que envolvem radioterapeutas, oncologistas clínicos e outros especialistas, per-
mite melhores tomadas de decisões, gerando melhores resultados. Dentro deste
conceito, cabe ao cirurgião conhecer não só os avanços da cirurgia, mas também
estar familiarizado com os outros métodos terapêuticos.

INDICAÇÕES

Na atualidade, mais de 60% dos pacientes com câncer são submetidos a al-
gum tipo de procedimento cirúrgico, com uma ou mais das seguintes finalida-
des: diagnóstico; estadiamento; tratamento; acesso vascular; prevenção; reabili-
tação e reconstrução.

239
DIAGNÓSTICO
Diagnóstico Citológico
Citologia Esfoliativa
Esta abordagem baseia-se no fato de que as células tumorais descolam-se
mais facilmente que as células normais das superfícies teciduais. Essa liberação
celular pode ser facilitada de duas formas, que são o esfregaço da superfície ou a
lavagem desta superfície que contém as células-alvo. Dois bons exemplos deste
procedimento são o esfregaço cervical do colo uterino e os lavados brônquicos.

Aspiração
A punção aspirativa, realizada por meio de agulhas finas, é um procedimen-
to relativamente simples e muito útil no diagnóstico de determinados tumores
sólidos, como, por exemplo, de tireóide, mama, abdome, e tórax. Sempre que
necessário, utiliza-se o auxílio da ultra-sonografia ou tomografia computadori-
zada, para a melhor definição do local a ser puncionado. A experiência do pato-
logista é fundamental para a interpretação do material obtido, onde células tu-
morais podem ser confundidas com células inflamatórias ou de regeneração. A
aspiração pode, também, ser de fluidos, tais como líquido cefalorraquidiano, lí-
quido pleural ou ascite.

Diagnóstico Histológico
Biósia com Agulha Grossa
Esta técnica baseia-se na obtenção de pequenos fragmentos de tecido tumo-
ral através de agulhas especiais, tais como tru-cut, Vin-Silverman, Franklin e
Chibba. Em relação à técnica de aspiração, tem-se a vantagem do diagnóstico
histológico, em geral mais fácil do que o citológico. Tem sua maior indicação
nos casos de tumores de parede, linfonodos superficiais e de massas abdominais
ou torácicas.

Biópsia Incisional
Constitui-se na ressecção de pequena parte de massas tumorais. Está indica-
da quando não se consegue material adequado ou suficiente por punção por agu-
lha ou, então, quando a ressecção de toda a massa tumoral pode ser de risco ou
prejudicar o tratamento definitivo. Esta é a principal técnica para o diagnóstico
de tumores de cavidade oral, de lesões de pele, mama, partes moles e ósseas, e
pode ser eventualmente empregada em abordagens endoscópicas.

240
Biópsia Excisional
Consiste na ressecção completa do tumor ou lesão suspeita com finalidade
diagnóstica. Tem a vantagem de ser o tratamento definitivo quando a lesão é be-
nigna ou, então, em situações de malignidade onde se reconhecem margens de
segurança. A biópsia excisional tem ampla indicação para lesões de pele e nódu-
los de mama e tireóide, entre outros.

ESTADIAMENTO
Em algumas situações clínicas, os exames de imagem, endoscópicos ou la-
boratoriais não permitem definir o real estadiamento da doença, impondo-se a
indicação de procedimentos cirúrgicos com a finalidade de gerar informações
que irão definir a conduta terapêutica. Um exemplo clássico é a doença de Hodg-
kin, cujo estadiamento cirúrgico implica a realização de esplenectomia, biópsias
hepáticas, exérese de linfonodos periaórticos e biópsia de crista ilíaca. Mais re-
centemente, alguns grupos têm indicado a laparoscopia como rotina no estadia-
mento dos tumores gástricos e pancreáticos. O estadiamento pode ser ampliado
com procedimentos complementares, como, por exemplo, a ultra-sonografia la-
paroscópica, que pode ser de valiosa ajuda na definição da invasão de estruturas
contíguas a tumores do pâncreas ou de metástases hepáticas.

TRATAMENTO
A cirurgia de caráter terapêutico pode ter finalidades distintas, como será
apresentado a seguir. A decisão depende do estadiamento do tumor, das condi-
ções clínicas do paciente, da possibilidade de se utilizarem métodos terapêuticos
complementares, tais como radioterapia e quimioterapia, em caráter de adjuvân-
cia ou neo-adjuvância, bem como da experiência do cirurgião e das condições da
instituição onde o paciente é tratado.

Cirurgia com Intenção Curativa


Para a grande maioria dos tumores sólidos, a cirurgia é a única modalidade
de tratamento que permite a cura do paciente. O preceito básico da cirurgia com
finalidade curativa é o de oferecer a maior chance de cura para o paciente, com a
menor mutilação possível, de modo a se poder preservar ao máximo a qualidade
de vida. Em inúmeras situações, o emprego de tratamento adjuvante ou
neo-adjuvante modifica a abordagem cirúrgica.
Como exemplo, pode-se citar a cirurgia do câncer do reto. Atualmente, exe-
cuta-se a amputação abdominal em apenas 20% dos tumores, contrastando com
70% a 80% dos casos de há cerca de 20 anos. Mais ainda, aprendeu-se a se fazer

241
a cirurgia preservando-se a inervação autonômica pélvica, para prevenir compli-
cações urogenitais, e a excisão do mesorreto, que diminui os índices de recidiva
local. Em câncer de mama, a quadrantectomia e a nodulectomia com rádio e qui-
mioterapia adjuvantes substituíram a mastectomia, enquanto que o rabdomios-
sarcoma, que é o tumor de partes moles mais comum em recém-nascidos e crian-
ças, apresentou expressivo aumento de cura, de 10% a 20% para mais de 80%,
com a quimioterapia e radioterapia complementares.

Cirurgia Citorredutora

O princípio da cirurgia citorredutora é diminuir ao máximo a massa tumoral,


proporcionando condições para efetiva atuação da quimioterapia e/ou radiotera-
pia complementar. No câncer de ovário, por exemplo, a cirurgia ampliada, com
ressecção de nódulos menores de 1cm de diâmetro, associada à pan-histerecto-
mia e à epiplectomia, permite que, com posterior quimioterapia, cerca de 30%
das mulheres com tumor estádio III possam ser curadas.

Cirurgia para Doença Metastática

A exérese de lesões metastáticas pode permite maior sobrevida e até mesmo


cura, o que justifica a agressividade cirúrgica em algumas situações específicas.
Exemplo significativo é o de pacientes submetidos à ressecção de metástases
pulmonares de osteossarcomas, o que proporciona cura em aproximadamente
30% dos casos. Por outro lado, a ressecção de metástases únicas de fígado, origi-
nárias de tumores colorretais, proporciona sobrevida de cinco anos para aproxi-
madamente 25% dos pacientes.

Cirurgia Paliativa

Os procedimentos paliativos visam basicamente prolongar o tempo de so-


brevida do paciente e, em especial, melhorar sua qualidade de sobrevida. Suas
indicações mais frequentes são: a) procedimentos para diminuição da dor, tais
como as ressecções de massas tumorais para descompressão, cordotomias, rizo-
tomias; b) restabelecimento das condições funcionais, como nas obstruções in-
testinais por carcinomatoses; c) controle de situações com risco de vida, como
nas hemorragias digestivas; d) ciurgia para supressão hormonal nos tumores
hormônio-dependentes, como as orquiectomias em tumores de próstata e as oo-
forectomias em tumores de mama; e) via de acesso para suporte nutricional, con-
feccionando-se jejunostomias ou gastrostomias.

242
Cirurgia Oncológica na Emergência

Como em todas as especialidades cirúrgicas, identificam-se emergências


em pacientes oncológicos que requerem tratamento cirúrgico. As mais freqüen-
tes são as hemorragias, as perfurações, os abscessos e as obstruções ou suboclu-
sões intestinais.
Na vigência de tratamento adicional, aumentam os riscos de complicações.
Assim, pacientes na vigência de quimioterapia podem apresentar neutropenia e
maior incidência de fenômenos tromboembólicos, o que gera sepse e hemorra-
gia. Enfermos submetidos à radioterapia não raro desenvolvem abscessos e per-
furações. A identificação dessas complicações deve ser feita o mais precoce-
mente possível, com o intuito de diminuir sua gravidade.

Acesso Vascular

Vários dos atuais esquemas quimioterápicos, assim como os transplantes de


medula óssea, implicam a necessidade de quimioterápicos por períodos prolon-
gados,com drogas que provocam irritação e tromboses das veias periféricas.
Este fato ampliou sensivelmente a indicação para a instalação de cateteres cen-
trais e de reservatórios vasculares totalmente implantáveis em sistema venoso
central. Para os transplantes de médula, utilizam-se comumente os cateteres de
duplo lúmen, pois facilitam as afereses, enquanto que para quimioterapia sistê-
mica tem-se dado preferência aos reservatórios totalmente implantáveis, por
oferecerem maior comodidade ao paciente.
Em algumas condições específicas, pode-se administrar o tratamento quimio-
terápico diretamente no sistema arterial, como, por exemplo, nos casos de me-
tástases hepáticas, em que o cateter é colocado na artéria gastroduodenal e co-
nectado a um reservatório ou bomba de infusão, implantável ou não.

Prevenção

Atualmente, reconhecem-se situações nas quais existe maior risco de se de-


senvolver câncer. Estas se relacionam a doenças preexistentes ou à hereditarie-
dade.
Nos casos de hereditariedade, é clássica a situação de polipose adenomatosa
familiar comprometendo o intestino grosso. Uma vez identificada a doença, in-
dica-se a colectomia total ou mesmo a proctocolectomia com reservatório ileal,
uma vez que 100% dos pacientes não tratados acabam desenvolvendo câncer co-
lorretal. Mais recentemente, tem-se discutido a conveniência da colectomia e
histerectomia profiláticas para portadores da síndrome do câncer colorretal he-
reditário não polipose (HNPCC).

243
Quanto à prevenção do câncer de mama, tem sido proposta a adenomastec-
tomia profilática, com retirada de “todo” o tecido mamário em pacientes com
BRCA1 e BRCA2 positivos. Outra indicação atualmente aceita é para portado-
ras de hiperplasia epitelial atípica já submetidas a múltiplas cirurgias, e que
apresentam algum outro fator de risco para câncer de mama, tal como nulipari-
dade, menarca precoce ou menopausa tardia.
Uma associação bastante contundente, como afecção preexistente, é a ob-
servada em pacientes com retocolite ulcerativa, cujo risco de desenvolver câncer
aumenta com o tempo de evolução da doença, entre outros fatores. A identifica-
ção de displasia grave de mucosa intestinal é, para vários grupos, indicativa de
colectomia profilática.

Cirurgia para Reconstrução e Reabilitação

Algumas cirurgias para neoplasias são mutiladoras, podendo promover


comprometimento não só estético, como também funcional. Estas são mais fre-
qüentes em ressecções de tumores de cabeça e pescoço, mama, reto e extremida-
des. O advento de novas técnicas operatórias e de novos suportes tecnológicos,
como, por exemplo, os grampeadores, tem permitido ressecções menos mutila-
doras. Por outro lado, técnicas de reconstrução utilizando a microcirurgia para
transplantes de retalhos, músculos e mesmo de extremidades, favorecem melho-
res resultados estéticos e funcionais, muitas vezes associados a programas de
reabilitação.

O CIRURGIÃO FRENTE À CIRURGIA DO CÂNCER

Decisões que envolvem a cirurgia do câncer devem passar por profissional


familiarizado com a história natural da doença, atualizado em relação às opções
cirúrgicas e habilitado a discutir abordagens multidisciplinares. Deve, ainda, ter
competência para realizar a cirurgia mais adequada para cada um de seus pacien-
tes e a humildade e o bom senso de encaminhar o caso em situações mais difíce-
is, nas quais sua experiência pessoal pode ser fator limitante.
É essencial que cirurgiões envolvidos com o tratamento do câncer tenham
formação adicional em áreas complementares, que permita melhor compreensão
da doença e das outras formas de tratamento, a fim de que as decisões terapêuti-
cas sejam as melhores possíveis para seus pacientes.

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