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JUVENATRIX

JUVENATRIX – Fanzine de Horror & Ficção Científica


ANO 27 – Número 188 – AGOSTO 2017
JUVENATRIX – Desde Janeiro de 1991 – total 4.538 páginas
“A morte é apenas o começo... de uma eterna vida de dor...”
Editor – Renato Rosatti
Capa – Angelo Júnior, extraída do álbum de ilustrações “Fantasia, Luz & Sombra”,
publicado pelo “Clube de Autores” / Contra capa – HQ “Atrás da Porta”, por
Angelo Júnior
INTERNET
Blogs: www.infernoticias.blogspot.com.br & www.juvenatrix.blogspot.com.br
E-mail: renatorosatti@yahoo.com.br / Twitter: www.twitter.com/juvenatrix

Lançamento dessa edição: 28/08/2017 – São Paulo/SP


Distribuição gratuita – Solicite o envio do arquivo PDF por e-mail

HORROR E METAL EXTREMO


Música: The End of Human Race / Banda: Dark Funeral (Suécia)
Álbum: Angelus Exuro Pro Eternus (2009)

Here they come, the winged minions of the dark lord. As black clouds, they block the light of the sun. By their side, flies the
king of the demon locusts. The destroyer lord, and chosen son of the apocalypse. This for sure, is the end - of human race.
Thunder roars, the abyss now, gaping wide. Darkness unleash, it's armies upon the world. The air filled with the stench of
sulphur... And burning flesh... When the humans thought, they had seen the worst of hell. The ground explodes and fills the sky
of dirt, and shattered bone. The necro-lord, rises from below. Gathered stands, the rest of his merciless horde. The merciless
horde. The very few that might be alive, will be taken by the flames. The world is on fire, the flames climb higher... The
humans – erased. Now on the site, of where this slaughter took place. One building rise, built by the infernal race.
A monument of evil, entirely made out of bones. It's all that remains - of the human race. The world is on fire - the flames climb
higher... "A time lost to the pestilent horrors of a new demonic age". "Impaled atop the monument the tortured will burn".
"Forever..." The very few that might be alive, will be taken by the flames. The world is on fire - the flames climb higher... The
humans erased...
“Vital Remains” (EUA): show no “Clash Club” (Barra Funda, São Paulo/SP) em 13/07/17

“Deicide” (EUA): show no Clash Club (Barra Funda, São Paulo/SP) em 12/08/17

DIVULGAÇÕES & CURIOSIDADES & OBITUÁRIOS


Álbum de quadrinhos de fantasia: “A Viajante Leopoldina”, de Angelo Júnior
Leopoldina só desejava ir para praia, curtir merecidos momentos de lazer, mas foi parar em um mundo desconhecido sem saber
o porquê. A Viajante Leopoldina é a história de uma bela morena brasileira, de corpo sinuoso, quadris volumosos (padrão
nacional!) e de muita personalidade, que, de repente, sem querer, acaba adentrando em alguma dimensão desconhecida, um
mundo extraordinário. Nesta aventura, que dá início à série, o nobre leitor irá encontrar seres mitológicos, dinossauros,
duendes, magos, ogros, tribos exóticas, sensualidade, paisagens incomuns e muito mais. A irresistível garota curvilínea
enfrentará verdadeiros perigos e desafios na busca do caminho de volta para a sua casa, a nossa dimensão. Viaje com ela!

Número de páginas: 50. Edição: 1 (2017). Formato: A4 210x297mm. Coloração: Preto e branco. Acabamento: Brochura
sem orelha. Tipo de papel: Offset 75g

Mais informações: https://clubedeautores.com.br/book/237240--A_VIAJANTE_LEOPOLDINA#.WWK6AhXyu1t


Antologia de contos de vampirismo: “O Sangue dos Vampiros”, organizado por Adriano
Siqueira
O livro "O Sangue dos Vampiros" é uma antologia de contos de vampirismo organizada por Adriano Siqueira, em
Curitiba/PR. Ele tem oito autores.
O book trailer foi produzido como se fosse um curta metragem cheio de suspense, que pode ser conferido nos links:
https://www.youtube.com/watch?v=lwV2sxVtu98
https://www.youtube.com/watch?v=HwLgNwviRuk

Livro “O Sangue dos Vampiros” - Antologia organizada por Adriano Siqueira.


A capa tem a imagem da modelo Isabelle Aguilar, que interpreta a personagem Vampirelle (foto por Adriano Siqueira).
O livro tem a participação de oito autores - Adriano Siqueira, Bianca Luna, Dione M. S. Rosa, Eduardo B. S. Silveira,
Francisco Souto Neto, Mustafá Ali Kanso, Rubens Faria Gonçalves e Valter Cardoso.
O livro tem 9 histórias sobre vampiros e começa com um prefácio sobre o tema.

Página do facebook sobre o livro: https://www.facebook.com/osanguedosvampiros/


Site da editora: http://www.editorafragmentos.com.br/pd-4aa1fb-em-breve-o-sangue-dos-vampiros.html
Adriano Siqueira: http://www.contosdevampiroseterror.blogspot.com
Trailer: curta metragem “Casulos”, de Joel Caetano (RZP Filmes)
A RZP Filmes, responsável por curta metragens premiados como “JUDAS” (2015) e “ENCOSTO” (2017), exibidos em
festivais por todo mundo está lançando um novo filme.
“CASULOS” é um curta-metragem de ficção científica que conta a história de uma mulher solitária que se depara com algo
vindo de muito, muito longe em seu quintal. Ela só queria descansar, mas terá que enfrentar algo de consequências cósmicas.
O trailer acabou de sair (pode ser visto abaixo) e o filme será lançado ainda este ano no circuito de festivais.
https://www.youtube.com/watch?v=2JBmSDw87eQ&feature=youtu.be

CASULOS
Dir. Joel Caetano/ Curta-metragem/ 13 min/ HD 2K/ 2017
Sinopse: Ela só queria descansar, mas algo vindo de muito distante atrapalha seus planos.

A direção é de Joel Caetano que além dos filmes citados também é um dos diretores do longa-metragem de antologia "As
Fábulas Negras" no segmento "A loira do banheiro", que ganhou menção honrosa como melhor segmento e maquiagem de
efeitos no Montevideo Fantástico 2015, o filme também foi vencedor do júri-popular no Festival de Vitória (2015) além outros
e participou de diversos festivais pelo mundo.

Os trabalhos da RZP Filmes podem ser conferidos nos links abaixo e o longa-metragem "As Fábulas Negras" no canal SPACE,
Itunes e Google Play.
http://rzpfilmes.blogspot.com.br/
http://www.rzpfilmes.com/

Fanzine “Quadrinhos Independentes” 146


“Quadrinhos Independentes”
Foi lançada a edição 146 (Julho / Agosto de 2017), editado por Edgard Guimarães, com 36 páginas, formato meio ofício e
impressão digital.
Conteúdo: quadrinhos, artigos, anúncios, ilustrações, seção de cartas dos leitores e divulgação de fanzines.
Traz também o encarte “Artigos Sobre Histórias em Quadrinhos – O Pequeno Xerife Xuxá”, de Carlos Gonçalves, com 12
páginas.
Contatos: A/C Edgard Guimarães – Rua Capitão Gomes 168 – Brasópolis/MG – CEP 37530-000
e-mail: edgard.faria.guimaraes@gmail.com
Mais informações: http://mensagensdohiperespaco.blogspot.com.br/2017/08/qi-146.html

Quadrinhos de Gilberto Queiroz


Timeless 01 traz uma coletânea de belas histórias curtas de autoria de Gilberto Queiroz, mostrando técnicas distintas e
inteligentes experimentalismo e exercício de narrativa. Formato 14x20 cm, 28 páginas, miolo PB e capa colorida.

Timeless Especial traz uma Coletânea de HQs adaptadas de contos de Charles Dickens e Rynaldo Papoy. Formato A4, 48
páginas, miolo PB e capa colorida. Adaptação e desenhos de Gilberto Queiroz.

O Sétimo Beijo na Boca, Roteiro de Rynaldo Papoy e desenhos e adaptação de Gilberto Queiroz: Uma fábula sobre vida,
morte e destino. Buscando inspiração a princípio no filme “O sétimo selo”, de Ingmar Bergman, mas depois seguindo rumos
diferentes com filosofia e humor. Imperdível!
Formato A4, 36 páginas, Miolo PB, Capa colorida.

Link para compra: http://queirozestudio.loja2.com.br/

Inktober 2016, artbook com 31 artes realizadas no Inktober 2016 por Gilberto Queiroz. O Inktober é um evento mundial
criado pelo Artista Jake Parker em 2009, e pode ser considerado um desafio pessoal no desenvolvimento do desenhista, pois
propõe que o artista faça um desenho diário a nanquim no mês de outubro e poste-os nas redes sociais com a # inktober.
Formato 14 x 20, miolo PB, capa colorida. Lançamento no HQ Fest Indaiatuba em 16 de setembro.

Gilberto Queiroz trabalha com área gráfica, vendendo e produzindo cartões de visita, folhetos, etc… e também faz caricaturas
de encomenda, retratos, e ilustrações. Desenvolve quadrinhos, muitos em parceria com Rynaldo Papoy.
Blog: www.gilbertoqueiroz.blogspot.com.br
Facebook: https://www.facebook.com/gilberto.queiroz.3
Instagram: @queirozestudio

Livro: “Retalhos de Paranapiacaba”, de Marcos T. R. Almeida

Livro “Retalhos de Paranapiacaba”, com artigos, poemas, fotos e ilustrações sobre a cultuada e misteriosa vila de
Paranapiacaba, que é um distrito do município de Santo André/SP.
https://pt.wikipedia.org/wiki/Paranapiacaba

Formato: 14 x 21 cm. 140 páginas. Edição independente.


Contatos com o autor Marcos T. R. Almeida: e-mail – almeida.romanopax@gmail.com

“HorrorCon” 26/08/17 em São Paulo/SP: fotos de algumas palestras

Marcelo Milici e Rodrigo Ramos (site “Boca do Inferno”) falando sobre o livro “Medo de Palhaço”.
“Diário de Um Exorcista”, com Renato Siqueira (diretor do filme).
“O cinema gótico de Mario Bava”, com Fernando Brito.
"O que faz um quadrinho assustador" ("Editora Draco"), com Thiago Zanetic, MJ Macedo, Rodrigo Ramos (convidado como
mediador), Raphael Fernandes e Airton Marinho

R.I.P. George Romero (cineasta, 1940 / 2017)


R.I.P. Martin Landau (ator, 1928 / 2017)

R.I.P. Tobe Hooper (cineasta, 1943 / 2017)

CONTOS

Praça de Sonhos por Angelo Júnior


Estas noites de outono tem sido de extrema melancolia. Prenúncio do inverno que não tarda.
Tenho tido constantemente o mesmo sonho. Enigmático. Fruto talvez, da grande lacuna que agoniza no meu peito por
tempos a fio. A charada central de minha vida. O divisor de águas dos meus sentimentos.
Nem a dor da viuvez recente, depois de anos de matrimônio com a mulher que mais amei, entre todas que já pisaram
este mundo perene, serve de comparação, a dor que lateja fundo em minha alma.
Agora me vejo por inteiro, como que desnudo de obrigações, contemplando a vastidão desta cidade através da janela
do meu apartamento. Exílio intencional e pequeno bálsamo evasivo para feridas que não cicatrizam. Sozinho. Com dois filhos
casados, morando longe e sem as outras duas partes do vitral da capela de minha vida.
Nunca consegui ver o rostinho angelical de minha filha, nos meus sonhos. Há séculos que sonho com uma praça,
envolta em densas névoas, sem flores, sem vegetação que se destaque, com algumas árvores raquíticas, as alamedas e os seus
bancos tradicionais, um precário gramado, numa cidade irreconhecível. Como se estivesse sendo preparado ali, um novo
ajardinamento, depois de terem sido erradicadas todas as pragas vigentes, ou quem sabe, algum tipo de mal.
No canteiro central vejo uma figura misteriosa. Não consigo decifrá-la, pois, parece uma sombra. Uma penumbra em
forma de silhueta humana. Ao tentar aproximar-me, sinto sufoco e ansiedade, vou com os passos de câmera lenta que só os
sonhos tem. Enquanto tento chegar, fito angustiado aquela figura, que impassível, afunda gradativamente no solo, até sumir...
Acordo sempre assustado. Que desespero, meu Deus!
Resolvi, então, nos dias que se sucederam, voltar para a minha pequena e bucólica cidade natal.
No terminal de ônibus, antes do embarque, observo com os olhos conformados a cidade que me abrigou por tanto
tempo. Gigantesca, louca, poluída, violenta, porém... humana.
Durante a viagem, em meio a um milhão de divagações e pensamentos cruzados, acaricio o crucifixo dourado com
pedrinhas semi-preciosas, o qual minha filha usava. Presente de minha falecida esposa.
A pacatez ainda é a mesma; porém há mais movimento nas ruas. Tanto de veículos quanto de pessoas. Nota-se
claramente o crescimento e progresso de minha querida terra.
Passo pelo Largo da Matriz, vejo o jardim mal cuidado, com as árvores sem poda, a grama alta infestada de ervas
daninhas e o calçamento deteriorado. Passo pelos bares centrais e vejo o seu Antonio num deles.
- Nossa, ainda vivo? Deve ter uns noventa anos... Que saúde!
A cada passo empregado, revolvo uma reminiscência. Os velhos conhecidos vem me dar as boas vindas. Afinal,
hospitalidade é com gente do interior. Ainda bem que não tocam no assunto que me aflige.
- Seja bem-vindo, meu amigo!
- Como você está conservado, não?
- A minha casa está a sua disposição.
- Lembra dos jogos de futebol?
Antes mesmo de concretizar aquilo que havia planejado, ou seja, me hospedar em um hotel, já estava instalado na
residência de um velho e querido amigo. Lucas.
Depois de um generoso jantar, sem pauta prévia, fomos colocar a conversa em dia. E o inevitável aconteceu. No
fundo, acho que o meu subconsciente me conduziu a falar sobre...
- Sabe Lucas, preciso desabafar com você. Tenho tido diversos dissabores na vida, alguns, fazem parte do percurso
cotidiano, mas...
- Sei... sua filha, né?
- É... tantos anos se passaram e ainda sinto um gigantesco vácuo dentro de mim.
- Fale comigo, estou aqui para ouvir.
- Tadinha... tão meiga, doce... nas mãos daquele maldito jardineiro... indefesa... que o inferno o tenha! Como pôde
abusar da minha florzinha delicada, só tinha treze aninhos... e ainda, a matou... maldito seja!
- Sei que é doloroso demais, eu...
- O pior de tudo Lucas, é que nunca conseguimos encontrar o corpo dela. Assim que o maldito foi descoberto, tentou
fugir e foi baleado pelos policiais, vindo a falecer. Com isso, carregou consigo o segredo do lugar onde havia enterrado ela. É
uma obsessão para mim. Um pesadelo sem fim.
- O destino prega cada peça na gente. Francamente, nem sei o que dizer para confortá-lo, caro amigo. Não tenho
palavras.
- Não Lucas... não há palavras, gestos, ações, feitos, que possam remir tal perda. Só atenuantes...
Horas depois, tento dormir. Não consigo. Pego um livro para ler, levanto, vou até a janela, olho o luar
resplandescendo sobre a cidade adormecida, pego o crucifixo dourado com pedrinhas semi-preciosas e por momentos me
conforto. Deito e cochilo.
Acordo cedo e encontro Lucas tomando o seu café da manhã, o qual me puxa conversa:
- Você se lembra do Tenório?
- Sim, o açougueiro. Lembro bem dele. Como poderia esquecer, jogávamos futebol juntos.
- Pois é, virou Prefeito.
- Ora, quem diria hein, Lucas? Que o Tenório iria enveredar pelos caminhos da política. Uma simpatia de pessoa, bom
amigo.
Dias depois encontro o dito cujo, que me convida para ir até o seu gabinete.
- Então, Tenório, o Lucas estava me contando de você. Não imaginava que possuía dotes políticos, ah! ah!
- É o tempo, prezado amigo. É ele que esculpe o nosso destino. Mesmo que não desejemos, somos metamorfoseados
por ele. E você, o que faz aqui? Veio de mala e cuia?
- Acho que sim, Tenório. Perdi a Janete...
- Oh! Meu Deus! Sinto muito! Meus pêsames.
- Obrigado... e os meus filhos, casados, moram longe. De repente, me vi sozinho. Ultimamente estava muito ansioso,
acho que todos os caminhos me traziam para cá. Não foi só circunstância... algo me atraía para cá...
- Pretende exercer alguma atividade por aqui?
- Não sei Tenório. Vou ser franco a você. Na verdade, depois do acontecido com minha filha, sempre fugi dos fatos
mais negativos que pudessem lembrá-la. Mas, agora, acho que necessito exorcizá-los. Quero sim, encontrar algo para me
ocupar, mas ainda não sei o que...
- Não sei se devo, mas tenho uma proposta para lhe fazer. Não, pensando bem, acho que vou ser inconveniente.
- Pode dizer Tenório, fique a vontade.
- Estou montando uma equipe para cuidar dos jardins de nossa cidade. Quero refazer todos eles, deixá-los mais
modernos e bonitos. Você deve ter observado o Largo da Matriz em que estado se encontra. Até nisso, a administração passada
foi catastrófica. Por que você não vem trabalhar conosco? Sei que é difícil pelo passado, mas quem sabe possa vir a ser uma
terapia?
Terapia não poderia ser, pois o algoz de minha filha, tinha tal profissão. Mas, como necessitava vencer todos os meus
demônios interiores, aceitei o convite de Tenório.
Fui para a casa de Lucas, onde depois do jantar, mais uma vez numa noite enluarada, conversamos sobre o passado.
Desta vez sem qualquer resquício de mágoa.
Ao deitar como habitualmente faço, peguei a caixa em que guardo o crucifixo de minha filha e não o encontrei.
Desesperado, reviro o quarto e nada. Passo a noite em branco, chocado. Era a única lembrança material de minha filhinha.
De manhã:
- Lucas... Lucas... Fui roubado! Pelo amor de Deus! Fui roubado!
- O que aconteceu?
- Roubaram um crucifixo dourado com pedrinhas semi-preciosas, lá no meu quarto... era de minha filha.
- Mas, como? Só se alguém entrou aqui sem ser visto.
Lucas foi se certificar, se faltava mais alguma coisa de valor pela casa, auxiliado por sua esposa. E o crucifixo não foi
achado.
Desolado, resolvi me entregar a uma atividade que exigisse de mim, mais prática do que teoria.
Como havia aceitado a oferta de Tenório, comecei a trabalhar no jardim do Largo da Matriz. O plano era praticamente
replantar toda a área do jardim, colocando novas mudas de árvores e flores diversas. E refazer os canteiros para dar um visual
mais moderno a praça, segundo o que dizia a profissional contratada, para tal serviço.
Depois de arrancada a maioria das árvores, deixamos só as mais belas. Plantaríamos outras no lugar em breve.
Refizemos os canteiros, abrimos novas alamedas e começamos a plantar uma variedade de flores. Além, de umas fileiras de
palmeiras, na alameda que dá acesso a porta principal da Igreja Matriz.
Fiquei encarregado de abrir uma cova relativamente grande. Pois, seria recolocada uma árvore de grande porte. Era
um final de tarde belíssimo, por momentos, antes de começar a escavar a terra, contemplei todo o perímetro da praça. Aquela
imagem, meio desoladora, me lembrou não sei porque, um campo aberto de batalha em uma guerra. Devastado, com apenas
algumas árvores que resistiram ao bombardeio.
Olhava o sol se pondo atrás das casas, horizonte que se apresentava no momento, e via o manto avermelhado,
irradiado por ele, cobrir toda uma porção da cidade.
Depois de momentos de plena letargia, voltei ao plano real. Comecei finalmente a escavar o terreno.
A cova estava quase concluída, quando, na derradeira enxadada, senti um volume relativamente grande. Pensei ser
alguma pedra de tamanho maior que as demais, até então encontradas.
Então, resolvi manusear o fundo da cova. Notei ser composto por um tecido rústico. Escavando ao redor do volume,
suficientemente para ser trazido a superfície, pude constatar uma espécie de encerado grosso, amarrado em algumas voltas por
uma corda.
Ao abrí-lo, chorei... chorei copiosamente...
Aos soluços, coração batendo no limite, emiti o maior grito de minha história...
Dentro do encerado, repousava os restos de um esqueleto humano. E entre os ossos do pescoço, carcomidos pelo
tempo, reluzia um... crucifixo dourado com pedrinhas semi-preciosas...

Obs: Conto publicado originalmente na fase impressa do fanzine “Juvenatrix” número 26 (Agosto de 1998).

O TOMO MAIS MALDITO – o evangelho de Cthulhu


por Caio Alexandre Bezarias

Por que tantos seres espantosos, tão maiores e mais poderosos que a humanidade se interessam tanto por
uma espécie aparentemente tão baixa e pequena como a nossa?

Sou um mortal e fui escolhido pelos Grandes Deuses Exteriores, fui banhado por seus eflúvios, iluminado pela fagulha
de conhecimento que me concederam, para executar uma tarefa para meus senhores. O deleite que experimentei ao ser o
escolhido para essa missão, ao receber esses eflúvios, superar a desprezível condição de mamiferóide mortal cuja existência é
indigna até mesmo da indiferença dos senhores do universo, foi superior a todos os minúsculos e ridículos prazeres ou
arrebatamento que os homens cultivam e perseguem com seus ridículos fanatismo e empenho. Julguei essa escolha, os deuses
apontarem sua magnitude na minha direção, o acesso a conhecimentos arcanos que nem mesmo os sacerdotes mais versados
poderiam uma única vez, em todos os eons, acessar, o segredo final que me libertaria da condição de mortal de sangue quente a
qual menosprezo desde meu despertar como ser consciente. Porém essa tarefa me revelou segredos tão arcanos e terríveis sobre
o universo que pensamentos e sensações tão típicos da espécie humana, a qual ainda pertenço somente em parte, venceram os
obstáculos de minha condição híbrida e me fustigaram e ainda me fustigam: a dúvida, o questionamento, a contestação
inconsequente, maldições mesquinhas, que imaginei, superaria imediatamente, assim que recebesse os dons necessários para
cumprir a missão sagrada e arcana à qual fui designado.
Pois ocorreu o oposto, e a maldita humanidade da qual provenho mostrou-se a fundamental para a execução da missão.
Afirmo mais uma vez: não sou mais por completo humano e amaldiçoo o que ainda dessa condição há em mim, essa
desprezível carnalidade cuja percepção das forças que percorrem e governam o cosmo é tão limitada, tão estreita! Pois minha
nova natureza de servo dos senhores do cosmo foi vencida por essa condição abjeta, a qual me fez cometer a blasfêmia de
duvidar das intenções de meus mestres e da extensão de seu conhecimento e sabedoria, permitiu que a contradição, esse traço
humano pueril, se assentasse em meu ser com tal força que não é possível extirpá-la ou calá-la inteiramente. Tudo isso devido
ao segredo que descobri e que fui incumbido de ocultar de modo definitivo nas infindáveis camadas, aspectos e matizes da
realidade, mas que se mostra uma demanda cada vez mais impossível, pois não consigo ocultá-lo da minha consciência, tão
horrenda é.
Magia, ciência, razão, loucura, criação, caos, ordem, entropia, vida, destruição, matéria, energia, o começo e o fim.
Tudo que se entrelaça para compor o multiverso é manifestação da origem última, as vibrações infinitesimais que brotam do
vazio cósmico, e que compõem e agitam o tecido infinito-tesimal que então se desdobra sem cessar em uma multitude de
universos, em uma escala de complexidade que cresce a níveis cósmicos.
O horror que descobri e me paralisa desde então é a descoberta que há uma disciplina, um poder capaz de manipular
essas vibrações, não, mais! De destruir e reordenar um universo ou a força fundamental que permeia todos os universos. Existe
uma maneira de manipular essas vibrações, na extensão de todo um universo, ou até mesmo em vários universos, de um só
golpe, se o executor da ação e portador de conhecimento tão arcano for insano e indiferente o bastante à enormidade da ação,
capaz de alterar as configurações mais básicas dos universos alvos dessa manipulação, inclusive APAGAR DESSA
REALIDADE AS ENTIDADES CÓSMICAS QUE SÃO MANIFESTAÇÕES DESSAS FORÇAS, POIS AS PRÓPRIAS
FORÇAS SERIAM DESFEITAS E RECRIADAS. Em termos compreensíveis a meros mortais: existe um poder que repousa
em alguma fímbria do fundamento da realidade composta pela infinita multitude de universos que compõem a multidão
cósmica, o qual permite configurar, refazer, alterar e até eliminar qualquer poder, encarnação desse poder ou entidade que
comanda esse poder, não importa quão fundamental seja esse poder para o universo em questão e quão poderosa essa
encarnação ou agente seja, pois esse poder definitivo é fonte de todos os fundamentos das realidades. Um poder muito além das
profundidades em que as partículas elementares fervilham, que manipula essas forças tão fugidias e arcanas como se fossem
seixos grosseiros empilhados e arranjados segundo seu capricho, ou segundo os desejos e interesses daqueles que aprenderem
como mobilizar e manipular esse poder.
Isso é pavoroso. Isso é a hecatombe cósmica definitiva, o vazio do nada a anunciar sua voracidade que eliminará tudo. É
possível eliminar ou recriar por completo até mesmo as forças cósmicas primárias de um universo e por simples consequência
os seres que as personificam e as conduzem. Meus senhores poderiam ser obliterados desse e de todos os universos em que
agem e se manifestam se esse conhecimento for encontrado e dominado por algum blasfemo ou adversário deles. E eu, ser
mortal, fui escolhido por eles para encontrar os fragmentos dispersos desse conhecimento, agir para que fiquem ainda mais
dispersos e incompreensíveis a mortais, magos, deuses, potestades, outras personificações das forças primárias e assim torná-lo
inacessível a ponto de permanecer mais oculto e ínfimo que as mais fundamentais forças que compõem o multiverso.
Encontrar as partes desse saber espalhadas por eons, mundos, galáxias e até universos inteiros seria uma demanda
titânica e impossível a um ser de meus saberes e experiência, se não tivesse sido embebido com os poderes e percepção que os
Grandes Deuses Exteriores me infundiram. E embora tenha desvelado um segredo sobre a dispersão (e paradoxalmente, sobre a
ligação) desse conhecimento intrigante a princípio e assustador ao ser visto de perto; tornar esse saber ainda mais disperso e
inacessível mostrou-se uma tarefa que só poderia ser executada se o curso da existência de tantas espécies e mundos inteiros
fosse alterado, que a ação anunciava a necessidade de interferir em galáxias inteiras; por fim, a última missão de que meus
senhores me incumbiram mostrou-se a mais imensa, dificultosa e a mais assustadora. É esta tarefa, minúscula e ao mesmo
tempo incomensurável de tão vasta, a fonte de todo o horror que experimento, pois ela levou a uma revelação capaz de mais
que destruir a ordem cósmica, pode apagá-la a ponto de sequer um caos amorfo resultante da entropia suprema restar, um nada
tão absoluto que suspeito até meus senhores se encolhem de terror confrontados com essa possibilidade, daí convocarem um ser
tão desprezível como eu, cuja pequenez de sua condição, intelecto e capacidades impedem que compreenda de fato o que
descobriu e assim, protegido pelo véu da ignorância, leve a cabo a tarefa.
Ah, ironia suprema e maldita! Exatamente o que sempre detestei e busquei abandonar, desde que era um jovem mago a
buscar nos cantos mais remotos e nos tomos mais arcanos e temidos do meu mundo de origem e de outros, a minha condição
física e mortal, é que permitirá consumar minha missão e servir os Senhores como nenhum outro ser serviu antes e como
nenhum mais conseguirá, em todos os ciclos cósmicos vindouros. Fui
escolhido e incumbido de ocultar esse conhecimento de deuses e mortais e até mesmo ocultar das entidades cósmicas menores
e dos antagonistas dos meus mestres, que até então eram estância máxima de poder cósmico, assim eu acreditei por longo
tempo, agora, não mais tenho como absoluto esse conceito. São os Grandes Deuses Exteriores fonte ou somente personificação
dos poderes que regem o multiverso? Uma dúvida sobre a natureza e estatuto dos meus senhores, até há pouco, seria uma
abominação tão insuportável que eu daria cabo de minha existência como punição por tamanha monstruosidade. Não cometi
esse ato de desespero porque esse questionamento foi me plantado justamente devido à busca sagrada que empreendi para os
Anciãos, pois sei que não passo de uma minúscula arma casual perdida nos campos de batalha cósmicos e essa condição é uma
dádiva para um acólito dos Senhores do cosmo, mas essa servidão agora me amaldiçoa. O início de minha missão
levou-me, por meio da abertura e manipulação de fendas no espaço-tempo, ao território e momento em que a vida orgânica
multicélulas começava a medrar na superfície ou nos mares revoltos de uma quantidade quase infinita de mundos, pois já
naquelas ignóbeis criaturas de corpo mole e indefeso os perscrutadores dos mistérios cósmicos, como eu, podem distinguir os
primeiros traços daquilo que centenas de milhões de ciclos solares adiante seriam o impulso a conduzir os seres pensantes a
buscar conhecimento e poder para resistir em um universo hostil, impulso manifesto em energias ainda informes e tênues,
perdidas entre as forças orgânicas que guiavam as primitivas ações por sobrevivência e reprodução daqueles meros
aglomerados de células. Esse primeiro estágio da missão arcana não exigiu intervenção ativa: apenas registrei a primeira
aparição daquilo que mais tarde daria origem ao que eu deveria banir da ordem multiuniversal. Tendo compreendido o que eu
deveria encontrar e vigiar pelos planetas e galáxias, fui levado através de uma sucessão interminável de portais, por um agente
que jamais divisei, sem dúvida outro serviçal dos meus Senhores, para percorrer uma miríade de outros mundos nos quais
repeti a ação de busca e registro, sempre encontrando a mesma força bruta primal oculta sob formas e ações diferentes. Assim,
durante milhões de ciclos acompanhei a aparição, evolução, ascensão e extinção de tantas formas de vida que mal posso
lembrar de uma única em particular, além daquela a que uma vez pertenci. Seres menos devotos ou fracos tomariam ter de
repetir essa tarefa numa escala quase infinita como uma brincadeira macabra das supremas entidades cósmicas, mas eu sabia
que havia um propósito final, que algo se modificaria e assim ocorreu, mesmo sem sinal místico algum enviado por meus
mestres.
Logo atentei para um acontecimento que acometia todas as espécies de seres materiais complexos o bastante para seus
cérebros acomodarem e lidarem com esse evento, tão constante em todas as linhagens de seres mortais que eu acompanhava, na
minha galáxia de origem e em outras que especulei ser uma lei cósmica obscura por mim descoberta: em dado momento de sua
existência, por razões fortuitas desprovidas de qualquer propósito ou força mais intensa e consciente a dirigi-las, todos os seres
multicelulares de uma certa complexidade erguiam seus órgãos dos sentidos para o brilho dos corpos celestes que dominavam
os céus de seus mundos. E com esse simples ato selavam o destino e a natureza de todos seus descendentes. A visão de
nebulosas multicoloridas a encher o céu; o brilho infindável de um aglomerado estelar cegante a queimar eternamente o
firmamento; o desfile de várias luas de diversos tamanhos durante a noite, ocultando o brilho de estrelas e depois revelando; a
combinação de anéis luminosos e chuvas de meteoros preenchendo o céu; a escuridão quase absoluta causada por uma
incomensurável estrutura artificial que cobria seu mundo, erigida por uma espécie muito mais avançada estabelecida em um
mundo próximo; não importa como o firmamento se apresentava, essa visão causou uma alteração irreversível nesses seres,
despertou neles, ainda que irracionais, totalmente desprovidos de linguagem complexa e pensamentos elaborados, um bruxulear
de inquietação, de dúvida, de curiosidade, que eons adiante se desfraldaria na percepção do mistério cósmico, se condensaria
em uma força sólida, definida por um sem-fim de conceitos e elevada a razão da existência das civilizações que seus
descendentes remotos ergueriam, levando esses seres às descobertas que tanto alarmaram os Grandes Deuses Exteriores e são a
razão de minha missão. Essa foi outra descoberta importante, no decorrer de
minha missão sagrada: a força primitiva, física, celular, da busca pela mera sobrevivência, expressa nas abjetas exalações
orgânicas dos seres celulares, se fragmentou e dela despontou a curiosidade para com o universo em que existiam.
Completamente dominados pelo desejo de subsistir e se multiplicar buscavam os meios para tal e por total acaso, durante suas
buscas desesperadas pelos meios para satisfazer essas forças implacáveis, tiveram o primeiríssimo vislumbre da vastidão do
cosmos, vislumbre que entranhou-se e ocultou-se em seus mais recônditos traços, mas não passaram desapercebidos de mim,
que percebi, de imediato, que era essa nova e então humilde energia que eu deveria vigiar e seguir, durante a jornada desses
seres rumos à consciência e à manipulação das forças que regem o universo.
Mais e mais complexidade seus organismos adquiriam mais poderosas suas mentes se tornavam, até o momento em que,
em diversos mundos, o brilho do pensamento racional e de meios de transmiti-lo em linguagem elaborada medrou e em alguns
vingou e floresceu. No entanto, o número de mundos a que vigília deveria se voltar diminuiu em uma progressão além de
qualquer meio de classificação, conforme as eras se passavam, uma vez que miríades e miríades de estrelas, sistemas solares,
mundos e espécies desapareciam do multiverso, aniquilados pela implacável lei segundo a qual as forças cósmicas engendram a
existência de seres mortais, permitem que prosperem e depois os exterminem com total indiferença, lei essa que age em todos
os universos e realidades sem distinção ou variações na sua intensidade.
Aos seres que resistiam a essa razia cósmica o bastante para a energia primeva transmutar-se em curiosidade e busca
sistemáticas aos segredos cósmicos, meus mestres me ordenaram dispensar a atenção mais acurada, por meio de sinais arcanos
incríveis, inconcebíveis mesmo a minha hipertrofiada imaginação de mago versado nos mais hórridos grimórios, pois sem
dúvida dessas criaturas torpes, durante sua jornada pelo tempo e espaço, emergiriam os maiores riscos do poder supremo sobre
a realidade ser descoberto e manipulado.
E assim foi. As mais diversas e espantosas espécies de vida orgânica consciente devotaram-se a essa busca, se resistiam
o bastante à razia cósmica e dispunham de meios para tal, em meio à luta para continuar a existir em um universo totalmente
cego a elas, a uma busca em verdade vã para seres tão minúsculos, uma empresa que não passava de uma quimera moribunda
ao qual muitas mentes vaidosas dessas raças se apegavam como uma prova de sua superioridade e grandeza perante o cosmos,
quando era somente a inescapável maldição que antepassados primitivos lhes impingiram por total acaso.
Hilário, nauseante e digno do mais acre desprezo a parafernália forjada por estes seres para justificar sua busca e para
consumá-la. Disciplinas inteiras, sistemas de pensamento cuja elaboração levou milênios e encheriam uma vastidão de
volumes; ordens e agrupamentos secretos cujos conhecimentos acumulados ergueram ou destruíram impérios; complexas
tramas e estruturas para angariar e conservar poder, que mantiveram milhões e milhões de membros de suas próprias raças
escravizados e ignorantes, para assim servirem, das mais diversas maneiras, à busca profana conduzida por essas pretensas
elites de seres mais sábios e poderosos; experiências sobrenaturais e científicas que consumiram milhões de seres, voluntários
ou vítimas, cujos resultados, em muitas ocasiões, produziram aberrações físicas gigantescas que se voltaram contra seus agentes
e os aniquilaram; bibliotecas e bibliotecas que ocupavam continentes inteiros de planetas enormes: acompanhei elaborarem
tudo isso e mais, muitas vezes infiltrado entre os participantes dessas obras, sem desconfiarem de minha real natureza ou
propósito.
Essa atividade repetiu-se tantas vezes sem conta, sempre em busca da espécie e do conhecimento dotados do mais
perigoso potencial para cometer a blasfêmia suprema, até que, a extinção que cedo ou tarde assola a imensa maioria dos
mundos, a degeneração, perda de propósito, transformação em outras espécies, em síntese, todos os eventos que se abatem
sobre seres inferiores, sujeitos às intempéries cósmicas, fez o número de mundos e de seres os quais meus mestres julgaram
mais temerários aos se reduziram muito em quantidade e minha busca parecia próxima de sua consumação.
Foi nesse estágio que recebi a ordem para me dirigir ao mundo que abrigava a espécie cujas capacidades mais se
voltavam para o mistério arcano a ser ocultado para todo o sempre e de todos, uma espécie que, meus senhores suspeitavam,
estava a registrar esse conhecimento no mais maldito e mais inusitado de todos os tomos já escritos em todos os universos e
níveis de existência possíveis. Foi-me ordenado se dirigir para esse mundo e nele agir para descobrir o quanto esses seres vis
tinham acumulado de conhecimento sobre os fundamentos da realidade e intervir para que esse saber não fosse reunido, se
necessário aniquilando essa espécie, embora eu e os Grandes Deuses Exteriores soubéssemos, mesmo a destruição de uma
espécie toda talvez não eliminasse em definitivo os riscos.
O mundo a que fui enviado para minha mais importante missão era o terceiro planeta a orbitar uma estrela laranja
mediana jogada na periferia de uma galáxia qualquer. Esse mundo era a Terra e a espécie, os homens, dos quais fui parte um
dia.
Assim, por uma ironia cósmica titânica, para cumprir a missão definitiva em nome e louvor dos seres mais poderosos de
todos os universos e os quais, desde que soube de sua existência infinita e eterna, sempre busquei seguir com fidelidade
absoluta, fui atirado de volta ao mundo e à espécie os quais odiei desde minha primeira idade; tive de caminhar mais uma vez
entre os homens, desta feita vestindo como quase insuportável disfarce a simplória condição dos primatas bípedes falantes na
qual surgi, sempre desprezei e da qual busquei me livrar, em múltiplos sentidos, pois não havia outro método para acompanhar
as descobertas feitas pelos membros da espécie em que o impulso imemorial da curiosidade sobre os mistérios cósmicos foi
dominante e perigoso como em nenhuma outra espécie na vastidão do multiverso.
E minha jornada pela superfície e pelas profundezas do tempo e do espaço de meu mundo natal se iniciou. Não me
detive nas eras anteriores ao homem, em que a Terra foi disputada, mal tinha se solidificado, por civilizações avançadas na
técnica e nas artes, que se sucediam no domínio dessa orbe e por ela se digladiaram durante eras geológicas, pois essas mentes
tão brilhantes em momento algum de sua história realizaram incursão nos mistérios da natureza do cosmo tão perturbadora e
perigosa quanto a perpetrada pelos homens, assim os meus mestres me fizeram saber e ordenaram.
Milhões de anos adiante, após cataclismos consecutivos e a extinção de grupos e mais grupos inteiros de seres vivos,
presenciei os primeiros homens, surgidos pelo acaso das leis naturais, se renderem à majestade tentacular do sacerdote dos
Grandes Deuses Exteriores, evento que neles alimentou a chama maldita que carregavam e já era desperta. Assim, inflamados
por essa inquietação ancestral e guiados pela submissão ao grande Cthulhu, alguns de seus indivíduos, mais destemidos e
curiosos, empreenderam a procura pelos segredos deixados pelos seres que governaram a Terra antes da arrogância humana
ocupar o planeta, busca que lhes custou sua existência, mas gerou uma massa de saberes que atravessaram todas as eras e que
por mais lacunares e obscuras que fossem, por mais mergulhadas nas sombras da lenda e do incerto que estivessem, surgiam
das formas mais inesperadas milênios adiante; não importando quão débeis fossem, estimularam aquela curiosidade maldita
que habitava os homens a tentar descobrir mais e mais sobre aquilo que não deveriam conhecer.
Tempos depois observei as primeiras civilizações dos homens surgirem e serem conduzidas pelos designíos arcanos que
se manifestavam na Terra desde muito antes; nessa era a descoberta blasfema que abalou minha confiança nos poderes
supremos para sempre minha mente e perturbou foi me revelada: pois se a curiosidade e espanto para com o cosmo gerou os
pensadores, filósofos e cientistas que buscaram explicar o universo, foi a fé absoluta nos Grandes Deuses Exteriores, gerada
por essa mesma força primitiva e bruta que levou uma linhagem incerta mas contínua de hierofantes, magos, e demais
desbravadores do proibido e do sobrenatural que prosperaram durante toda a passagem do homem pelo universo a iniciarem
um acúmulo contínuo de descobertas que tornou esse mundo tão perigoso a meus senhores.
Testemunhei porções desse conhecimento serem engolfadas pelos acontecimentos sombrios que se abatiam sobre as
cidades e criações dos homens, impingidos, muitas vezes, pelos próprios. Essas destruições por vezes aniquilaram regiões e
povos inteiros em um curto lapso de tempo. Assisti, enfadado, à ilha gigante no centro do mais jovem oceano do planeta,
mantida acima do mar pela poderosa magia dos magos governantes da civilização espalhada sobre sua superfície, desaparecer
da face do cosmo em uma única noite, por ter desagradado o Todo em Um; acompanhei a desdita do continente que cobria a
maior parte do que se tornou o maior dos oceanos da Terra, o qual teve o mesmo destino após os enormes humanoides que o
habitavam falharem em uma experiência sobrenatural cujo objetivo sequer posso insinuar. Outros eventos destruidores tiveram
causas oriundas da hostilidade da natureza. Distúrbios geológicos ou bombardeios cósmicos que assolavam o planeta
obrigavam muitos a realizar migrações que levaram a embates com outros grupos e a reconfigurar toda a feição do mundo.
Tempos depois, as culturas surgidas desses movimentos violentos adquiriam poder e conhecimento para erigirem novos e
vastos impérios, o que fatalmente gerava o desejo por mais poder e posses, levando a novas guerras e destruição, que por fim se
voltavam contra esses impérios. E mais uma vez os saberes arcanos por mim buscados pareciam se perder em definitivo, mas
não me iludi e não me permiti aliviar minha angústia ou o rigor que dominava a missão ao ver essas parcelas de poder
soterradas, pois eu conhecia a obsessão pelo passado e o oculto que sempre dominaram indivíduos como eu era quando um
homem e descobri, durante essa busca, a existência de outra lei obscura que me perturbou ainda mais, tão inescapáveis e
universais pareciam suas manifestações: mais fragmentário e encoberto por lendas esse conhecimento era, mais essa
curiosidade doentia a respeito que assolava os homens era intensa; assim eu sabia que cedo ou tarde essas blasfêmias seriam
reencontradas, pois sempre havia na era subsequente uma sombra, um mito, uma lembrança distorcida de maravilhas e
mistérios dos tempos passados a estimular os destemidos e os insanos.
Envergando identidades múltiplas participei de expedições, aventuras, jornadas, experimentos de toda ordem, sempre
atento ao momento em que alguma mente celerada ou um grupo roçaria no controle sobre o universo, pronto a aniquilar aqueles
seres e provocar uma hecatombe para sua existência ser esquecida com plena convicção. E então para me trazer mais espanto,
outra lei cósmica oculta se desvelou a mim: todo ser solitário, congregação ou civilização inteira que, as seus próprios olhos se
aproximava demais desse conhecimento proibido, era dominado por uma força insana de autodestruição, de negação de si
mesmos e da verdade cósmica, até mergulhar em uma espiral de decadência seguida de violência sem razão e por fim realizar
uma autoimolação apoteótica. Era como se esses míseros e arrogantes mortais percebessem que não eram dignos de atingir esse
nível de consciência cósmica e ao sentirem quão perto dele estavam preferiram fenecer como míseros mortais que eram a
ascender a uma nova e superior condição. Pouquíssimos foram os viventes a existir sobre a Terra capazes de suportar essa
descoberta e obviamente tornei-me o maior deles.
Esse comportamento pueril a princípio seria indicação que em verdade não havia perigo real a temer quanto à Terra e
seus habitantes simiescos, pois essa tendência à autodestruição jamais os faria atingir o degrau tão temido por meus senhores.
Um ser de vida breve e que teve acesso somente a parte do conhecimento acumulado eons afora poderia afirmar isso do alto de
sua estreiteza, mas eu, caminhante da eternidade que acompanhei toda a história do planeta, logo percebi que em a barreira a
separar os desbravadores e audaciosos da verdade diminuía mais e mais e essa obscenidade era alimentada pelo fascínio que as
lendas do passado criavam.
Em certos períodos e lugares a busca pelo conhecimento enveredou pelo método chamado pelos homens de ‘ciência’ e
em outros inclinou-se na direção do que eles julgavam o antípoda da ciência, e por eles chamado de ‘magia’. De fato, durante o
período mais ridículo e arrogante da história dos homens, aos meus olhos, essa dicotomia foi tomada como uma verdade e
levada a um máximo causador de tantas tensões entre os partidários e praticantes de cada uma dessas disciplinas que não
contive meu deleite ao presenciar quão patéticos poderiam ser os homens, enfrentando-se em nome de uma oposição
inteiramente falsa, pois eu de antemão sabia – e saberia, mais adiante, com uma clareza esmagadora – que ambos os termos
não passavam de sombras manipuladas pelas forças cósmicas para zombar de suas crias.
Foi assim que a busca pelo mais maldito dos tomos confinou-se à Terra, em que esse conhecimento ou talvez uma
indicação de como encontrá-lo e mobilizá-lo estaria reunido. E isso ainda mais me surpreendeu, pois já nesses momentos ainda
imberbes da história dos homens recebi indicações que esse saber não estava e jamais estaria reunido em um só compêndio ou
lugar, mas é claro que isso só tornou mais claro a mim após eras e eras estudando as realizações de meus outrora companheiros
de raça. Eras inteiras perseguindo, perdidas em meio à ignóbil obsessão dos homens por poder material e vulgares prazeres
físicos, destruição sem sentido e significados transcendentes que nunca se revelaram, sinais da verdadeira revelação cósmica, a
princípio sugeriram, depois indicaram e muito adiante finalmente afirmaram: o tomo mais maldito é o surgimento, evolução,
feitos, decadência e extinção das espécies mortais, em especial a maldita espécie humana, que fez da inútil luta para superar
essa invencível lei cósmica a busca total de sua existência. A totalidade da existência de vida racional na Terra, sobretudo a
existência dos homens, o registro de sua história e saberes, as marcas que deixaram na estrutura do planeta, nos planos
imateriais, os produtos de sua imaginação, tudo isso organizado como um único corpo de conhecimento era o saber maldito que
busquei, revelado plenamente quando o planeta se reduzia a uma bola de rochas escaldadas pelo seu sol, que inchava e tornava-
se uma nova.
Ao final dessa busca profana, minha mente danificada cometeu mais uma blasfêmia: imaginou haver um poder maior
que meus senhores Grandes Deuses Exteriores e para meu horror, a busca pelo tomo e sua ocultação definitiva mostrou que de
fato esse poder existe, mas não é uma entidade ou um panteão tão enorme e incomensurável que capaz de esmagar os mestres,
não! Fiz a descoberta mais horrenda e paradoxal, pois o segredo final é outra desconcertante contradição, o poder supremo
provem da tensão entre o macrocósmico e o infinitesimal, esta a chave para o segredo último, que é minúsculo e está muito
abaixo na ordem cósmica, é a base de todas as realidades, é o além-vazio escuro e primevo do qual fervilham as energias que
compõem tudo, inclusive os seres situados muito acima na escala cósmica. Desde que descobri a existência de meus senhores e
a eles devotei todo meu ser, acreditei, sem uma nesga de dúvida, que eles eram absolutos e eternos, os poderes máximos sobre
tudo. Não pude suportar a revelação que algo tão minúsculo era mais poderoso que eles e que a abjeta espécie na qual tive
origem era o meio para atingir e manipular esse poder. Desesperado, deixei a realidade em que fiz essa descoberta e transitei a
esmo por entre os planos do multiverso, até que prostrei-me e urrei:

Ó Senhora fecunda, mãe de incontáveis!


Ó Sultão supremo que reina cego e indiferente no centro de tudo!
Ó alma e porta voz dos supremos!
Concedam-me o esquecimento de tudo que descobri!!!
E Eles não responderam.

Por que tudo que envolve a espécie dos homens é corrompido pela contradição? Por que essa raça miserável e seu
mundo não são absolutos e íntegros, como os seres, reais ou imaginados, a que tanto prestam culto e louvores? Por que o
universo não é íntegro, absoluto, inteiriço, como meus deuses que o governam sempre se mostraram a seus seguidores mais
ardorosos? Conheci a resposta e não ouso formular essa blasfêmia.
Vaguei universos afora, liberto das amarras do tempo e do espaço, até ser fulminado pela conclusão que a única forma
de cumprir minha missão sagrada é utilizar o conhecimento que angariei para alterar a própria estrutura básica da realidade e
impedir que esse conhecimento seja identificável e utilizável, pensamento tão estarrecedor quanto os demais, pois isso alteraria
a realidade em tal escala, que refazeria os poderes que regem a realidade, o que impediria algum ser solitário, todo um mundo
ou até um deus de alcançar e manipular outra vez esses fundamentos, mas tal ação implicaria em recriar meus senhores, horror
interdito a uma criatura tão pequena como eu. Mas se eu levasse a cabo essa ação, os protegeria dessa ameaça, no entanto,
dessa forma eu acabaria exatamente por executar esse horror, o que os destruiria mas também os protegeria, a não ser que, no
decorrer do processo, eu absorvesse a essência deles, a retivesse em minha mente, para depois devolvê-los à plenitude de sua
condição. Isso é inconcebível, jamais poderia ousar apanhá-los e mantê-los em meu ser! Sou um mortal e eles os Grandes
Deuses Exteriores, essa é a mais sagrada verdade, que deve permanecer para sempre. Mas para manter essa ordem o multiverso
deverá ter seus fundamentos intocados. E se assim continuar, o conhecimento maldito continuará porventura acessível. A única
forma de impedir isso é utilizá-lo para recriar a realidade, mas ao fazer isso destruirei meus senhores. E se não o fizer, eles
poderão ser destr...

Lamentável Constatação em 2117 por Miguel Carqueija


Antes existiam neste planeta Terra:
Elefantes, leões, onças, antas, hipopótamos, bisões, capivaras, serpentes, jacarés, gnus, antílopes, girafas, camelos,
dromedários, baleias, tubarões, águias, avestruzes, onças, leopardos, tigres, alces, ursos, castores, esquilos, morcegos, arraias,
lagartixas, sapos, salamandras, cutias, pacas, tigres, javalis, urubus, andorinhas, bacalhaus, rinocerontes, gorilas, saguis,
orangotangos, raposas, lobos, hienas, peixes-bois, botos, golfinhos, garoupas, lhamas, flamingos, condores...
E hoje temos apenas robôs e hologramas de tudo isso!
Rio de Janeiro, 1° de agosto de 2117

LITERATURA

Medo de Palhaço
O site de Horror “Boca do Inferno” foi criado em 2001 por Marcelo Milici e é uma importante fonte de informações
gerais e resenhas, principalmente de cinema. Um monstro eletrônico que, assim como a criatura alienígena “A Bolha” (The
Blob) do filme “B” clássico de 1958, está sempre se alimentando, devorando cada vez mais conteúdos sobre o gênero
fantástico, especialmente o Horror, crescendo de forma exponencial. Para se ter uma ideia, seu catálogo de resenhas possui a
expressiva quantidade de aproximadamente 2650 filmes analisados, com os números cada vez aumentando mais, num colossal
banco de análises sem paralelo na internet brasileira.
Parte de sua equipe de redatores juntou esforços e como resultado foi lançado no final de 2016 o primeiro livro
representante do “Boca do Inferno”. “Medo de Palhaço” publicado pela “Editora Évora” (São Paulo/SP), é uma
enciclopédia definitiva sobre palhaços assustadores na cultura pop, falando sobre a coulrofobia (o nome técnico para o medo de
palhaço) e abrangendo todas as mídias passando por cinema (principalmente) e televisão, além da literatura e dos quadrinhos
(com textos especiais sobre os vilões “Coringa” e “Violador”).
O livro é resultado de um trabalho extenso e de grande qualidade sobre o assunto abordado. Os destaques certamente
ficam por conta das resenhas de cinema, a maior especialidade do site, com dezenas de análises muito bem escritas e
informativas. Com seções especiais para os filmes mais lembrados dentro do tema, “Palhaços Assassinos do Espaço Sideral”
(1988) e “It: Uma Obra-Prima do Medo” (1990). A produção geral do livro também é ótima, com uma bela capa chamativa,
formato grande e acabamento caprichado.
Porém, uma falha é a falta de créditos da maior parte dos textos e de todas as resenhas, as quais deveriam ser
identificadas por seus respectivos autores, utilizando-se uma legenda com as iniciais dos nomes, uma vez que o livro foi escrito
por cinco pessoas.
O capítulo sobre o assassino em série John Wayne Gacy, um americano que gostava de atuar como palhaço e foi
condenado pela morte de muitos jovens, possui logicamente um interesse e importância dentro do tema, mas o texto é extenso
demais com excesso de informações cansativas sobre sua vida e os processos que enfrentou na justiça, até ser condenado e
executado no corredor da morte por injeção letal. O capítulo poderia ser menor e mais dinâmico, eliminando muitos detalhes
sem relevância.
Tem um pequeno erro de informação na resenha sobre “Slasher House” (2012), dizendo que o músico Blaze Bayley,
que fez a voz de um demônio, foi o primeiro vocalista da banda inglesa de heavy metal “Iron Maiden”, porém tiveram outros
vocalistas antes dele como Paul Di´Anno e até mesmo Bruce Dickinson, que saiu em 1993 dando seu lugar para Bayley, e que
depois retornou em 1999 permanecendo até os dias atuais.
Outra pequena oportunidade de melhoria seria a menção do país de produção dos filmes analisados, logo na pequena
ficha que inicia as resenhas. Além do fato de que algumas delas caíram na armadilha de citar datas futuras para eventuais
lançamentos ou informações similares, e que já se tornaram passado no lançamento do livro. Sabemos que impedir que um
texto torne-se datado é uma tarefa difícil, e talvez não registrar datas seja a solução.
Entretanto, independente dessas pequenas observações, o livro é uma referência de valor inestimável para qualquer
tipo de pesquisa, estudo e catalogação sobre a origem, história e participação dos palhaços na cultura pop, em especial o
cinema. Agregando imenso valor ao tema e ajudando a evidenciar a alta qualidade do conteúdo do portal de Horror “Boca do
Inferno”, responsável pelo projeto, em parceria com a “Editora Évora”.
Que sejam bem-vindos mais títulos similares abordando outras fobias igualmente interessantes.

“Medo de Palhaço” (2016)


Organizado por Marcelo Milici, com textos diversos e resenhas de Filipe Falcão, Gabriel Paixão, Matheus Ferraz, Rodrigo
Ramos e Marcelo Milici (equipe do site de Horror “Boca do Inferno” – www.bocadoinferno.com.br)
Editora Évora (São Paulo/SP). Formato: 210 x 280 mm. 270 páginas. (RR – 28/07/17)

CINEMA

Comentários de Cinema – Parte 33


Ao Cair da Noite (It Comes at Night, EUA, 2017)
Ataque do Tubarão de 5 Cabeças, O (5-Headed Shark Attack, EUA, 2017)
Condenadas, As (L´ultima Orgia Del III Reich / The Gestapo´s Last Orgy, Itália, 1977)
El Caminante (The Traveller, Espanha, 1979)
Maciste no Inferno (Maciste all´inferno, Itália, 1962)
Mortos Falam, Os (The Devil Commands, EUA, 1941, PB)
* Ao Cair da Noite (2017)
O triunfo da Morte
O fã de cinema de horror que está procurando diversão escapista, barulheira, correrias desenfreadas, tiroteios, sustos
fáceis, sangue em profusão, tripas expostas, monstros em CGI, não irá encontrar no filme “Ao Cair da Noite” (It Comes at
Night, 2017), que estreou em circuito comercial restrito nos cinemas brasileiros em 22/06/17, com cópias originais legendadas.
Porém, quem aprecia e procura uma história tensa, com constante atmosfera sombria e perturbadora, carregada de paranoia,
mistério, pessimismo, com narrativa mais cadenciada onde toda esperança está abandonada, num ambiente de grande pressão
psicológica, além de um final depressivo, então esse é o filme indicado.
Com direção e roteiro de Trey Edward Shults, temos uma família morando isolada numa casa no meio da floresta,
formada pelo pai protetor, Paul (o australiano Joel Edgerton), a esposa Sarah (a inglesa Carmen Ejogo), e o filho adolescente
de 17 anos, Travis (Kelvin Harrison Jr.), que tem pesadelos terríveis frequentemente. O clima é de tensão constante, numa luta
pela sobrevivência contra uma contaminação misteriosa que aparentemente mergulhou o mundo no caos. Eles precisam
eliminar a ameaça que tomou o corpo do avô, Bud (David Pendleton), enterrado com o cadáver cheio de feridas pestilentas e
carbonizado por segurança. Porém, as coisas se complicam mais ainda após a chegada de outra família pedindo refúgio,
formada pelo jovem casal Will (Christopher Abbott) e Kim (Riley Keough), e o filho pequeno Andrew (Griffin Robert
Faulkner).
Distanciando-se da fantasia tradicional do cinema, “Ao Cair da Noite” se aproxima mais de uma possível realidade
com o mundo mergulhando numa contaminação devastadora não explicada, onde os sobreviventes precisam lutar ferozmente
por suas vidas fragilizadas. Trazendo à tona seus instintos mais selvagens de sobrevivência, utilizando-se de violência e
desconfiança para a autopreservação, eliminando gradativamente os sentimentos e emoções que caracterizam a humanidade,
dando lugar à frieza e indiferença.
Indo na contra mão do cinema que prioriza o entretenimento com pipoca e refrigerante, “Ao Cair da Noite” aposta no
mistério, na falta de informação sobre os trágicos acontecimentos externos, no clima de tensão devido à luta selvagem pela
sobrevivência, no desespero crescente do fim aparentemente inevitável da humanidade, dizimada por uma doença sem nome.
Após ver o filme e com o sentimento perturbador e desconfortável que invade o espectador, temos a sensação de que
seriam pessoas de sorte todas aquelas que fossem carregadas pela Morte logo no início do apocalipse, caso um dia uma
pandemia devastasse a Terra.
(RR – 03/07/17)

* Ataque do Tubarão de 5 Cabeças, O (2017)


Fazendo parte da moda de filmes com tubarões mutantes patéticos, temos um com tantas cabeças
que nem cabem no corpo
A produtora americana “The Asylum” é conhecida pelos seus filmes ruins. Porém, na maioria das vezes tão ruins que
não divertem, sempre com histórias rasas, elenco amador e efeitos toscos com CGI vagabundo e inconvincente. Eles sempre
estão contribuindo com a moda de filmes ridículos com tubarões assassinos, intensificada principalmente após o sucesso
popular da franquia “Sharknado”, iniciada em 2013. São tantos filmes absurdos com essa temática que nem vale a pena um
esforço para catalogação de tanta tranqueira lançada sem o mínimo de controle de qualidade. Em 30/07/2017, em parceria com
o canal de TV a cabo “SyFy”, foi lançada mais uma bagaceira: “O Ataque do Tubarão de 5 Cabeças” (5-Headed Shark Attack),
com direção do estreante Nico De Leon..
Uma ilha em Porto Rico tem sua rotina paradisíaca alterada após a ocorrência de várias mortes violentas no mar, que
são creditadas para um imenso tubarão mutante com cinco cabeças, uma anomalia da natureza ávida pela carne humana. O
dono inescrupuloso de um aquário, Thaddeus Marshall (Jeffrey Holsman) decide pressionar a bióloga marinha Dra. Angie Yost
(Nikki Howard) junto com alguns jovens estagiários, para tentarem capturar o tubarão vivo, com o objetivo de exposição ao
público e com isso alavancar os negócios com o aquário decadente, nem que signifique algumas perdas de vidas na caçada.
Eles contam com a ajuda de um caçador experiente e mercenário, Red (Chris Bruno), e também com os esforços de salvamento
da polícia local, representada pelo Capitão Sterling (Nicholas Nene).
A história é superficial, com conversas banais e tentativas mal sucedidas de piadas em meio às cenas de ataques do
tubarão. Tudo apenas para preencher o tempo e que não funcionam, contribuindo ainda mais para nossa torcida pelo monstro.
Os roteiristas não estão interessados em gastar energia com qualquer tipo de criatividade, utilizando clichês exaustivos de
dezenas de filmes similares com tubarões comedores de gente. Para se ter uma ideia da bizarrice desse filme e da total falta de
vontade dos realizadores em tentar inovar, nem que seja apenas um pouco, já tivemos anteriormente outros filmes praticamente
iguais, apresentando tubarões de duas e três cabeças. São eles: “Ataque do Tubarão Mutante” (2-Headed Shark Attack, 2012) e
“O Ataque do Tubarão de 3 Cabeças” (3-Headed Shark Attack, 2015), este último contando no elenco com o cultuado e
veterano ator especialista em bagaceiras Danny Trejo, sendo ambos também produzidos pela “The Asylum”. Como não existe
espaço físico suficiente para a colocação de mais cabeças no tubarão, talvez as 5 do monstro desse filme sejam o limite.
O filme é tão bagaceiro e seus realizadores tão desinteressados com o espectador, que o tubarão mostrado em boa
parte do filme tem “apenas” 4 cabeças, provavelmente pela dificuldade de espaço físico, e somente depois de muitos ataques e
mortes, veio a revelação do nascimento de uma quinta cabeça na cauda. A criatura mutante que estampa o pôster de divulgação
não existe.
Em minha resenha do filme do tubarão com 3 cabeças, publicada tanto no blog “Almanaque da Arte Fantástica
Brasileira” http://almanaqueafb.blogspot.com.br/2015/08/o-ataque-do-tubarao-de-3-cabecas-3.html, como no site “Boca do
Inferno” http://bocadoinferno.com.br/criticas/2015/09/o-ataque-do-tubarao-de-3-cabecas-2015/), conclui o texto de forma
tolerante com os produtores, que estavam entregando uma porcaria descompromissada com a coerência e talvez até certo ponto
honesta com o público, que sabia o que iria consumir. Mas, depois de lançarem um tubarão com 5 cabeças, fica difícil manter
qualquer tolerância. Existe uma competição entre os roteiristas sobre a mais ridícula, bizarra e absurda história de tubarão
assassino, com os mesmos exageros de sempre e efeitos falsos de computação gráfica nas cenas supostamente sangrentas. Esse
tema já está desgastante e cansativo.
Curiosamente, como homenagem ou simples brincadeira, tem uma citação da bióloga Dra. Yost sobre a cultuada série
de filmes “Sharknado”, quando ela diz que os grandes tubarões brancos não atacam pessoas em barcos e ironizando se eles
voassem através de tornados.
(RR – 07/08/17)

* Condenadas, As (1977)
Obscuro nazisploitation com sadismo, torturas e violência contra mulheres prisioneiras de guerra
Lançado em fita VHS no Brasil pela “Century Video”, “As Condenadas” é um filme italiano de 1977 que tem o
sonoro título internacional “The Gestapo´s Last Orgy”, tradução literal em inglês do original “L´ultima Orgia Del III Reich”. É
um obscuro “nazisploitation” repleto de sadismo e violência contra mulheres judias num campo de concentração alemão na
Segunda Guerra Mundial, um local especial para receber as prisioneiras com o intuito de entreter os oficiais e soldados
nazistas.
Com direção de Cesare Canevari (1927 / 2012), a história apresenta uma bela e jovem mulher, Lisa Cohen (Daniela
Poggi, creditada como Daniela Levy), que se encontra com o antigo amante num campo de concentração abandonado em
ruínas, após o fim da Segunda Guerra Mundial. Ele era o líder do presídio, Comandante Conrad von Starker (Adriano
Micantroni, creditado como Marc Loud), que dirigia o lugar com crueldade, sendo responsável por torturá-la até que se
tornasse sua amante.
Primeiramente, como ela sentia-se culpada pela morte dos pais, perdeu o interesse pela vida e reagia com frieza e sem
emoções diante das torturas físicas e psicológicas. Depois, recuperou o desejo de viver e cedeu às imposições do comandante
alemão. Porém, depois de engravidar e ver o destino terrível de seu filho com sangue judeu, Lisa espera o fim da guerra para
reencontrar seu algoz, reviver o passado tenebroso e terminar o pesadelo.

“Vou destruir seu corpo e sua mente. E o único modo, o único de temer a morte, é ficando viva. E quando
aquele momento, só quando aquele momento chegar, você morrerá.” – Comandante Conrad von Starker

O filme fez parte da lista de “vídeos nasty” por causa do conteúdo violento, sendo banido na Inglaterra, tanto que essa
informação está estampada num dos cartazes originais, como forma de chamar a atenção do público. O fato pode ser explicado
pelas inúmeras cenas perturbadoras de horror bizarro e violência contras as mulheres prisioneiras. Elas são espancadas e
utilizadas como escravas sexuais para os soldados alemães estressados com os conflitos nos campos de batalha, e para
satisfazer os sádicos oficiais que sentem prazer em infligir castigos dolorosos.
Entre as bizarrices incompatíveis com qualquer senso de racionalidade, temos uma mulher oferecida viva como
alimento para cães raivosos, atos de coprofagia, estupros coletivos, execuções em câmera de gás e reservatório de ácido,
mulheres penduradas de cabeça para baixo próximas de ratos famintos aguardando a refeição. Ou, podendo servir como um
ápice para esse conjunto de atrocidades, uma mulher é embriagada e depois queimada no meio de um jantar de gala dos
oficiais, onde o prato principal é carne humana de judeus executados e bebês recém-nascidos.
A violência apresentada nem é tão gráfica, existindo uma infinidade de outros filmes mais extremos e sangrentos.
Porém, o que o aproxima de ser considerado perturbador são as várias cenas de conteúdo transgressor e que chocam pela
crueldade.
Curiosamente, “As Condenadas” também possui outro título original igualmente estranho e incomum, “Calígula
Reincarnated as Hitler”, numa referência ao cruel tirano e imperador romano Calígula, retornando dos mortos e reencarnando
no ditador alemão Adolf Hitler.

“Quando o super-homem deseja se divertir, ele deve fazê-lo com o preço da vida dos outros.” – introdução do
filme – palavras de Friedrich Niezsche (1844 / 1900), filósofo e poeta alemão conhecido pelos textos recheados de
metáforas, ironias e aforismo.

(RR – 03/08/17)

* El Caminante (1979)
Mais uma preciosidade do multifuncional Paul Naschy, que dirige, escreve e atua num filme
obscuro de horror com elementos de crítica social
O espanhol Paul Naschy (1934 / 2009) é um dos grandes nomes do cinema de horror bagaceiro europeu, com uma
carreira imensa como ator, roteirista e diretor. “El Caminante” (1979, também conhecido pelo título em inglês “The Traveller”)
é mais uma pérola obscura de seu produtivo currículo, dirigindo e escrevendo a história sob o pseudônimo Jacinto Molina,
além de atuar liderando o elenco repleto de belíssimas mulheres em várias cenas de nudez.
Ele interpreta Leonardo, um viajante que caminha sem destino, enfatizando um discurso que defende a ideia que a
humanidade é uma raça corrompida de natureza ruim e mesquinha. E que a religião, os escrúpulos e a consciência são
bobagens para fracassados. Segundo ele, a vida apenas vale a pena com dinheiro e prazer, e que para obtê-los não se deve
medir esforços, sendo permitido matar se necessário, e até vender a alma ao diabo.
O andarilho encontra em seu caminho e resgata o jovem Tomás (David Rocha), que era um servo maltratado por seu
mestre, um velho cego. A partir daí, eles andam juntos e Leonardo decide mostrar como eles poderiam melhorar de vida
rapidamente enganando e roubando as pessoas que cruzassem seu caminho. Para ele, soberba, malícia, ira, gula, inveja e
preguiça são características humanas que facilmente condenam uma alma ao diabo. Debochando o tempo todo da honestidade e
da religião, ele é o próprio demônio caminhando na Terra, se divertindo com os homens fracos que matam, roubam, fraudam,
invejam e odeiam, terminando sempre nas mãos do diabo.
Entre as peripécias do obscuro caminhante, com a eventual ajuda do jovem aprendiz, temos vários momentos onde
enganam e roubam tanto ricos como pobres, se escondem num convento, assumem identidades falsas de religiosos, se
aproveitam das freiras, e se envolvem com prostitutas de um bordel. Entre as vítimas, uma mãe deprimida e com tendências
suicidas depois que é enganada pelo viajante na tentativa de salvar sua filha doente. Porém, a ganância e falta de caráter os
coloca inevitavelmente um contra o outro, tornando-se inimigos, numa reviravolta que apenas valida a ideologia de uma
humanidade caracterizada essencialmente pela desonestidade.
“El Caminante” é um passeio do diabo na forma humana pela Terra, com uma história interessante e divertida, focada
na crítica social denunciando a natureza pervertida da humanidade. Com elementos de humor negro impagáveis como a freira
obesa que está sempre dormindo e soltando gases, ou as conversas hilárias entre Leonardo e Tomás sobre um incidente no
bordel onde o mais jovem foi vítima de uma conspiração do experiente andarilho.
Curiosamente, Leonardo utiliza seu poder sobrenatural com o intuito de mostrar para Tomás em imagens de pesadelos,
o futuro da humanidade numa sucessão de cenas perturbadoras e depressivas de guerras, mortes em campos de concentração e
destruição com bombas atômicas.
(RR – 26/08/17)

* Maciste no Inferno (1962)


Uma mistura de horror gótico com herói justiceiro, numa aventura literalmente pelo inferno para
salvar um vilarejo da maldição de uma bruxa
Maciste é um herói justiceiro similar ao popular Hércules, que defende os pobres, fracos e oprimidos contra as forças
do mal. Extremamente forte e musculoso, ele é interpretado pelo ator italiano Adriano Bellini (creditado com o manjado
pseudônimo americano Kirk Morris) em vários filmes com o mesmo personagem. Em “Maciste no Inferno” (Maciste
all´inferno), produção italiana de 1962, sua aventura para salvar os aldeões de um pequeno vilarejo, livrando-os de uma
maldição lançada por uma bruxa executada na fogueira, o leva literalmente para um passeio no inferno. Combatendo animais
violentos como um leão, uma cobra enorme, uma águia carniceira e uma manada de bois ferozes, além de um homem gigante,
em efeitos extremamente toscos e bizarros.
Com direção de Riccardo Freda (com o pseudônimo Robert Hampton), a história mistura elementos de horror gótico
com filmes épicos de fantasia. Um jovem casal formado por Charley Law (Angelo Zanolli) e Martha Gaunt (Vira Silenti)
muda-se para um castelo sinistro na Escócia, e são mal recebidos pelos aldeões do vilarejo próximo, que decidem hostilizá-la
com tochas e ferramentas cortantes acusando-na de ser uma descendente de uma bruxa queimada na fogueira da inquisição em
1515, e que havia prometido vingança e maldição aos seus executores, sob o comando do juiz Edgar Parris (Andrea Bosic).
Maciste aparece do nada e salva a mulher do linchamento, mas não consegue impedir que ela seja julgada por um
tribunal inquisidor e condenada à morte na fogueira por suposta bruxaria. Para tentar impedir a execução, Maciste vai para o
inferno em busca da bruxa. No caminho, enfrenta animais ferozes, encontra pessoas sofrendo torturas infindáveis de monstros e
demônios, remove pedras gigantescas com as mãos, nunca usa armas e ao atravessar uma porta de fogo encontra uma bela e
misteriosa mulher, Fania (Hélène Chanel), que tenta ajudá-lo em sua missão.
O filme desperta algum interesse em seu primeiro ato, ao explorar elementos sempre atraentes do horror gótico, com
um castelo sombrio repleto de morcegos, aldeões supersticiosos e uma bruxa queimada na fogueira, amaldiçoando seus
executores. Depois, quando surge o herói justiceiro sem camisa, com suas boas intenções de mocinho, numa improvável
viagem ao inferno, a história mudou de rumo e inevitavelmente seguiu em direção ao tédio. Nem os efeitos toscos de um filme
bagaceiro, nas lutas com animais falsos (ou grandes bichos de pelúcia), ou as pedras de isopor do inferno, conseguiram
minimizar a sensação de sonolência no espectador. Seguem as palavras do próprio Maciste, que fala pouco e fica o tempo todo
demonstrando ações de força bruta: “Meu destino é ajudar as pessoas que sofrem pela opressão e crueldade ao redor do
mundo”. Dessa forma, os elementos de horror gótico do início do filme deram lugar para uma aventura simples e patética de
um herói fazedor de justiça.
Entre as curiosidades, vale citar:
* enquanto Maciste está no inferno, temos várias cenas simulando imagens do passado, reproduzindo suas aventuras
anteriores como uma luta contra um ciclope e contra um exército tirano chinês.
* Nos Estados Unidos o filme recebeu o título “The Witch´s Curse”.
* As cenas ambientadas no inferno foram filmadas numa região de cavernas na cidade italiana de Bari, e são bem
interessantes, independente da história trivial do filme.
* Em 1961 teve outro filme italiano similar, “Hércules no Centro da Terra” (Hercules in the Haunted World), dirigido
por Mario Bava e com Christopher Lee, sobre a aventura do fortão Hércules no submundo, um lugar que podemos chamar de
inferno.
* Outros filmes do ator Kirk Morris creditado como Maciste: “O Triunfo de Maciste” (1961), “Hercules in the Valley
of Woe” (1961), “Colossus and the Headhunters” (1963), “Atlas Against the Czar” (1964) e “Hércules, o Invencível” (1964).
(RR – 23/07/17)
* Mortos Falam, Os (1941)
Quando o diabo manda, Karloff obedece...!
O ícone do cinema de horror Boris Karloff (1887 / 1969) ficou eternizado na história por seu papel do “monstro de
Frankenstein”. Mas, em sua carreira produtiva com mais de 200 créditos, também se destacam suas performances como o
tradicional “cientista louco” que trabalha incansavelmente em descobertas científicas para o bem da humanidade, e que se sente
incompreendido pela sociedade com suas criações transformando-se em tragédias. É o caso de “Os Mortos Falam”, filme do
distante ano de 1941, dirigido por Edward Dmytryk, produzida pela “Columbia” com fotografia em preto e branco e duração
curta de apenas 65 minutos. Uma das taglines promocionais do filme (reproduzida acima) brinca com seu nome original “The
Devil Commands” e o apelo comercial do nome de Boris Karloff como astro do Horror, imortalizado para sempre junto com
Bela Lugosi, Vincent Price, Peter Cushing, Christopher Lee e outros.
Karloff é o “cientista louco” Dr. Julian Blair, que faz experiências com ondas cerebrais humanas, e acredita que
mesmo após a morte, elas continuam vivas e podem ter seus impulsos gravados numa máquina especial criada por ele,
estabelecendo dessa forma um tipo de comunicação com os mortos (dessa ideia deve ter vindo a escolha do título nacional). Ele
é auxiliado pelo também cientista Dr. Richard Sayles (Richard Fiske), e juntos trabalham num laboratório repleto de aparelhos
elétricos enormes, com botões medidores e alavancas de acionamento para todos os lados. Porém, tudo começa a mudar para
pior depois que a amável esposa do Dr. Blair, Helen (Shirley Warde), é vítima fatal de um bizarro acidente de carro nas
proximidades do laboratório. Muito perturbado e desorientado por causa da morte repentina da esposa, e com seu trabalho
científico desacreditado pelos colegas, o cientista decide se mudar para uma mansão isolada no alto de um penhasco na costa
da Nova Inglaterra.
Nesse local sinistro, em meio a tempestades constantes, ele continua suas experiências macabras, influenciado por uma
vidente de caráter duvidoso, Sra. Blanche Walters (Anne Revere), que tem interesses obscuros no sucesso dos testes com os
cérebros humanos. Também conta com os serviços braçais de Karl (o ator Cy Schindell, creditado como Ralph Penney), um
homem bruto e desajeitado que teve o cérebro torrado numa das experiências mal sucedidas do cientista.
Uma vez preocupada com o bem estar e ações misteriosas do pai, a jovem filha do cientista, Anne Blair (Amanda
Duff), tenta localizá-lo com a ajuda do Dr. Sayles, para persuadi-lo a interromper seu trabalho suspeito. Enquanto
paralelamente o xerife local, Ed Willis (Kenneth MacDonald), está investigando o desaparecimento de cadáveres do cemitério
próximo ao laboratório do Dr. Blair, desconfiado de alguma conexão com as bizarras experiências do cientista, cada vez mais
temido e indesejável pelos moradores do vilarejo vizinho da mansão.
“Este mago louco mata à vontade a serviço de Satã!” – uma das taglines promocionais do filme
“Os Mortos Falam” é mais uma bagaceira divertida que pertence ao sub-gênero “cientista louco”, com a participação
do lendário Boris Karloff, motivo mais que suficiente para o filme se destacar entre a incontável quantidade de produções
similares. Temos todos os principais elementos característicos como o laboratório científico exagerado, muito bizarro para a
época (quase 80 anos atrás), a mansão no alto de um penhasco à beira do mar, um ambiente extremamente sinistro e apropriado
para uma história de horror, e o cientista com boas intenções que foi vítima de uma tragédia pessoal, sendo corrompido pela
descrença e obcecado por um objetivo científico com resultados catastróficos. Suas ações suspeitas, resultado da obsessão em
se comunicar com a esposa falecida, despertaram a desconfiança das autoridades e a ira cega dos vizinhos, que por temerem o
desconhecido, desejavam sua destruição.
O maior destaque, além da atuação convincente de Boris Karloff como o cientista de boas intenções distorcido para
“louco”, são as cenas das experiências com os mortos, vestindo armaduras de aço parecidas com trajes espaciais toscos, com
seus cérebros conectados uns aos outros, simulando uma única grande rede de ondas cerebrais. Remetendo-nos totalmente ao
cinema fantástico bagaceiro, onde o horror e a ficção científica caminham juntos para um resultado bizarro de puro
entretenimento.
“Se a Ciência puder abrir a mente humana, poderá descobrir os segredos de cada cérebro humano.” – Dr. Julian
Blair
(RR – 26/06/17)

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