Introdução
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PPH/LEAM/UEM – CAPES
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PPH/LEAM/UEM – Orientadora
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possíveis a serem seguidos, ambos, porém, poderiam levar a consequências funestas para o
regime.
A Stoa e o Alto Império
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Continue à diriger la conscience des grands.
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nos afastar dos assuntos relativos à física, por exemplo. Mas essa diretriz precisará ser
rompida, aqui e em outros momentos, pois para os estoicos a religião não era um dado
metafísico; a presenças dos deuses, suas vontades e desígnios eram dados tão reais, embora
esporádicos e misteriosos, quanto os fatos mais comuns da vida cotidiana, pois
A explicação da filosofia estoica do mundo, dessa forma, via na religião uma forma
de acesso ao logos divino, embora não se utilizasse de instrumentos suficientemente
racionais os cultos antigos constituíam-se como pontos de contato entre realidades
universais distantes, mas interligadas. Em suma
Vemos assim, portanto, que a Stoa tinha motivos importantes para acolher em seu
sistema filosófico as tradições religiosas romanas. Ao encontro disso vinha a sensação de
decadência dos costumes da sociedade romana, sobre a qual foi depositada em grande
medida as razões para a queda da República, com suas trágicas conturbações que era
preciso evitar. Como o desconforto moral permanecia sensível sob os tempos do império a
filosofia do Pórtico não deixou de preocupar-se.
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autor persegue paralelos entre o Pórtico e o cristianismo 4, porém, de nossa parte
ressaltaremos os aspectos que interessavam naquela conjuntura às construções ideológica
dos césares. Desapego aos bens materiais e igualdade entre os homens são dois apelos
importantes para os políticos romanos, o primeiro recordava-o para o respeito aos valores
rústicos prezados por seus ancestrais da Urbe, o segundo exortava o estadista que deveria
manter a coesão do imenso império, cuja composição cultural diversificada poderia
oferecer aos olhos de muitos uma hierarquia de estatuto entre os povos, o que seria
prejudicial para a pacífica integração do mundo romano.
Para os imperadores, a manutenção do poder era um problema complexo. Às
medidas já destacadas no tópico que dedicamos ao novo regime alguns césares juntaram o
apoio ideológico da filosofia, principalmente seus aspectos morais e religiosos que estivam
em consonância com o mos maiorum. Sobre os últimos anos da República sabemos que “à
autoridade política, social e militar dos imperatores foi alinhada a autoridade acadêmica,
representada pelos especialistas que o cercavam” (MENDES, 2006, p. 23), tendência que
se estendeu ao período imperial. Os exemplos começam com Augusto, o fundador do novo
regime contava em seu círculo pessoal com a presença de dois estoicos eminentes,
Atenodoro e Ário Dídimo que fizeram o papel de conselheiros do príncipe (SEDLEY,
2006, p. 33). A presença do pensamento estoico no Principado de Augusto pode ser
percebida em certos aspectos de sua propaganda pessoal e de seu projeto restaurador.
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seu pai e no seu próprio destino. Não ensinavam o Estóicos (cujas lições
ele ouviu, proferida por Atenodoro) que as almas ditosas alcançavam o
empíreo, entre os astros, que eram, eles próprios seres divinos? Não era
nada inverosímel, pois, que o cometa miraculoso fosse verdadeiramente a
alma de César na sua ascensão ao céu (GRIMAL, 2008, p. 24).
Esse acontecimento ilustra o que dissemos acima acerca da junção entre a física e a
teologia da Stoa. Um fenômeno astronômico apresentava-se como o portador de uma
revelação divina, uma via de acesso para que os homens interpretassem as vontades de
deus, ou seja, era interpretado como um auspício, “um meio de comunicar ao homem o
incomunicável, de lhe dar certo acesso a um transcendente que o ultrapassa infinitamente,
mas que também o engloba” (BRUN, 1986, p. 56). Os auspícios “eram os meios pelos
quais os romanos procuravam verificar se os deuses favoreciam uma iniciativa”
(HARVEY, 1987, p. 75), parte importante da religião que, como vimos, era valorizada
pelo Pórtico. Nesse sentido os auspícios também gozaram de prestígio dentro da filosofia
estoica que via nas práticas primitivas formas rústicas de acesso ao logos. De acordo com
Gill (2006, p. 41) e Algra (2006, p. 171), para o estoicismo a análise racional dos
fenômenos naturais eram maneiras de compreender a providência divina por meio da
interpretação dos oráculos e dos vaticínios. Algra (2006, p. 204), ressalta ainda que para os
estoicos os estudos dos signos divinos eram tratados como ciência e não como superstitio.
Assim, a promoção pessoal de Augusto obteve duplo respaldo apoiada nas crenças
tradicionais, que com o Pórtico ganhavam estatuto elevado no meio intelectual. A junção
do antigo e o novo concorriam para legitimar a posição do príncipe.
Em relação ao projeto restaurador de Augusto sabemos que ele situava-se tanto no
campo político quanto, nos aspectos morais da sociedade romana. Todavia, em alguns
aspectos não interessava ao príncipe ou à aristocracia o total retorno à ordem republicana,
pois
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Portanto, para solidificar as bases de seu poder o príncipe precisava dar garantia às
elites que o apoiava. Guiando-nos pela noção dos ideais da res publica podemos entender a
natureza dessa garantia e sua face estoica sob Augusto. André (1994, p. 24) afirma que “o
estoicismo imperial revaloriza a célula familiar”. Embora, na Stoa tal revalorização
tendesse para uma equiparação entre o homem e a mulher Augusto fez uma leitura
enfatizando a revalorização dos papéis do homem e da mulher para reavivar o prestígio das
famílias aristocráticas dizimadas no fim da República (ROULAND, 1997 p. 361-365). Ele
reprimiu o celibato e as práticas sexuais fora do matrimônio, incentivou a natalidade por
meio do jus trium liberorum, benefício concedido às famílias cuja fertilidade fornecesse
três ou mais filhos para a recomposição da ordem superior do Estado. Assim, a seu modo e
a serviço do Império, Augusto buscou reativar os papéis do pater famílias e da matrona
romana, dessa forma homem e mulher equiparavam-se do ponto de vista de suas
responsabilidades tradicionais perante a sociedade.
Para levar a cabo o papel de protetor que as altas camadas da sociedade romana lhe
demandavam, Augusto buscou afirmação em uma ideia moral e política tradicional, a
auctoritas, que à época nutria-se da filosofia do Pórtico. Veremos que, também nesse
ponto, o aporte da Stoa foi importante para dar a uma noção, surgida em tempos remotos,
quando o poder pessoal era suspeito, uma nova significação para a época em que ele era
imprescindível. Afinal a estabilidade repousava da figura de Augusto, temia-se que sem ele
o regime se degradasse em novas disputas e conturbações semelhantes aos do final
República.
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No meu sexto e sétimo consulados, após haver posto fim às guerras civis
e assumido o poder absoluto por consenso universal, transferi a República
do meu domínio para o arbítrio do Senado e do Povo Romano. Por esse
motivo e pelo meu próprio mérito foi-me atribuído, por decisão
senatorial, o título de Augusto, e as ombreiras da minha casa foram
publicamente recobertas de louros, uma coroa cívica foi fixada sobre a
minha porta e um escudo de ouro foi colocado na Cúria Júlia, como
testemunho, através da inscrição nele registada, que o Senado e o Povo
Romano mo haviam dado graças à minha virtude, clemência, justiça e
devoção. Depois dessa época, fiquei acima de todos em autoridade;
[auctoritas] porém, não tive mais nenhum poder além do que tinham os
outros que também foram meus colegas de magistratura (Res Gestae Divi
Augusti, 34 apud GRIMAL, 2008, p. 7).
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Não negamos a presença da Stoa no intervalo negligenciado, todavia, como nosso interesse é apenas ilustrar
a presença da filosofia do Pórtico durante o Principado ressaltaremos apenas os períodos mais marcantes da
atuação dessa filosofia na política de Roma.
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que indagam se ele era de fato estoico ou até mesmo filósofo. Brun (1986, p. 23) escreve:
“Podemos perguntar se Séneca terá verdadeiramente direito ao título de filósofo”, alguma
linhas adiante ele acrescenta: “é necessário dizer que o estoicismo de Séneca é indulgente,
insípido e que se presta a muitas concessões”. Apesar de tais restrições serem fonte de
debate não nos preocuparemos com elas, pois como aqui interessa-nos, sobretudo, a
presença do pensamento estoico no Principado fica em segundo plano a preocupação do
estatuto de Sêneca como filósofo. Em relação a apontada peculiaridade de pensamento
senequiano, entendemos que se ele não se encaixa nos moldes de um estoicismo “clássico”
isso se deve, em grande parte a adaptação de sua Stoa ao regime Imperial. Tal adequação é
o que mais importa em um estudo diacrônico do da filosofia do Pórtico, onde devemos
entender de que maneira as transformações do estoicismo favoreceram o fortalecimento do
poder pessoal e a idealização política dos césares que se acentuava cada vez mais em sua
jornada do Principado ao Dominado, que se instalaria no Baixo Império. Diante disso
destacaremos a seguir as opiniões de pesquisadores modernos a respeito de Sêneca e de sua
atuação durante o governo de Nero.
Para Grimal (s. d.), Sêneca via a si mesmo como um estóico autêntico que, no
entanto reservava para si certa independência e criatividade para lidar com a filosofia do
Pórtico. Vemos nessa constatação a presença do espírito prático do romano Sêneca, que
sabia que o pensamento da Stoa deveria adaptar-se às demandas políticas e sociais da
época. O autor destaca também que o sábio cordovês, ao se tornar conselheiro de Nero
imitava Zenão, que também orientou governantes. Esse dado revela um resgate da Stoa
antiga, que apoiou os monarcas helenísticos e que no Império serviu para justificar o poder
absoluto dos césares após o hiato em que a filosofia favorecia a manutenção do poder
oligárquico em Roma. Segundo Grimal (s. d.) é com Sêneca que esse novo aspecto do
estoicismo aparece na Urbe, uma exaltação da figura do sábio em face da ausência da
possibilidade da atuação política nos moldes republicanos, o que fará com que ele assuma
o papel de conselheiro quando vislumbrou na juventude de Nero a possibilidade de
reformar o Principado e extirpar traços de tirania que se fizeram presentes no governo de
Cláudio. Seu projeto era o de um imperador caracterizado pelas virtudes e de qualidades
divinas, fracassado com Nero tal ideal continuou ecoando em Roma e serviu de exemplo
para o desenvolvimento da instituição imperial sob o governo ideal de um vir bonus a
partir de Trajano e seus sucessores.
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A atuação senequiana no cenário político romano se deu principalmente pelo
filósofo ter sido o preceptor de Nero nos primeiros anos da juventude deste, estendendo
seu trabalho como conselheiro do jovem príncipe durante alguns anos de seu governo do
império. A obra que caracteriza esse período e expressa o pensamento de Sêneca em
relação à prática política do principado é o De Clementia, escrito por volta de 55-56 d. C.,
consiste em uma obra de três livros da qual conservamos o primeiro e parte do segundo6,
na qual é feito elogios a Nero no contexto dos primeiros anos de seu governo, o
quinquenuim neronis (HARVEY, 1987, p. 151). Para Braren (1990), o De Clementia atesta
o engajamento político do filósofo estoico em consonância com seu tempo, pois, afirma,
“neste tratado Sêneca apresenta a cristalização de suas ideias políticas e uma resposta ao
diagnóstico das carências que encontrou em seu momento histórico-político” (BRAREN,
1990, p. 13). O objetivo da obra é de conciliar a necessidade do poder absoluto e
autoritário, porém humanizado por uma virtude, a clementia, que possibilita o exercício do
poder de acordo com a lei da natureza segundo a concepção do Pórtico, sem corrupção,
portanto. O De Clementia propunha ainda uma restauração de certos aspectos do mos
maiorum e um restabelecimento da divisão de poder entre o príncipe e a cúria, em suma,
um retorno moderado de algumas instituições republicanas, principalmente em relação à
autoridade do Senado. Enfim, Braren (1990) destaca que a ênfase de Sêneca na clementia é
a busca de
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Em Braren (1990), na introdução do Tratado sobre a Clemência há uma discussão esclarecedora acerca da
situação e das disposições propostas para o texto latino do De Clementia.
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O estoicismo sob os Flávios
De acordo com André (1994, p. 23-24) durante a dinastia Flávia nas relações de
amicitia foi onde os adeptos da Stoa se organizaram contra a tirania imperial,
especialmente sob Domiciano, todavia não foi apenas no governo do último Flávio que o
Pórtico esteve em conflito com o poder. Desde a crise de que sucedeu à queda de Nero a
filosofia estoica se organizou junto aos altos círculos senatoriais como um grupo de
oposição, mas esta postura não indicava aspirações verdadeiramente republicanas,
possibilidade que a poucos interessava, segundo André (1994, p. 35). Os estoicos
reivindicavam a libertas, pedra fundamental do Principado, que seria garantida aos
cidadãos por um príncipe virtuoso, diante disso, tendo em vista que os filósofos do Pórtico
eram ciosos das virtudes dos homens políticos, percebemos de que maneira nascia a
oposição da Stoa aos imperadores que não estivessem de acordo com suas diretrizes morais
(VENTURINI, 2011, p. 179). Esta atitude estoica em relação ao Principado pode ser
sentida de forma aguda principalmente sob os imperadores Flávios, conforme afirma Gill
(2006, p. 37). De fato, Vespasiano, por sua origem itálica e não aristocrática e por sua
ascensão militar “não gostava dos pretensiosos nem daqueles que não tinham outros
méritos senão os da fortuna ou dos títulos, nem dos ideólogos que confundiam política e
filosofia estoica” (ENGEL, 1978, p. 60). Verificamos assim que, apesar da Stoa ter se
adequado ao pragmatismo moral romano, as orientações do Pórtico não eram capazes de
satisfazer prontamente as necessidades políticas que o desenvolvimento do Principado
impunha, não podia tampouco guiar as intenções de um imperador como Vespasiano que,
alcançando sua posição pela força, não poderia suportar a presença de uma filosofia que
pregava a aceitação da lei da natureza, pois a crise de 69 d. C. e a intervenção das legiões
podiam ser compreendidas como um golpe ao ideal de vivere naturae, e se devido às
conjunturas as soluções se reduziram a uma opção que não satisfazia os filósofos o
rompimento era inevitável. Nesse sentido, o caso de Helvídio Prisco, apontado por André
(1994, p. 37), é exemplar. Se a implantação de uma nova dinastia era coerente com a
necessidade de prevenir possíveis conturbações era, por outro lado, contrário ao ideal que
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exigia a escolha de um imperador sábio segundo os padrões estoicos, Helvídio Prisco que
defendia a segunda posição pagou com sua vida por divergir do imperador.
No governo do sucessor de Vespasiano, Tito, seu filho mais velho, apesar de
algumas reprovações que mancham os elogios ao seu governo (ENGEL, 1978), não temos
notícias de grandes atritos com o Pórtico. Todavia, o hiato da época de Tito pode ser
sentido de forma mais aguda devido à perseguição que seu irmão, Domiciano, empreendeu
contra os estoicos. As observações acerca governo do último dinasta Flávio mistura elogios
a uma administração profissional e horror em relação à crueldade e tirania, principalmente
contra os senadores. Como a gestão racionalizada do Estado beneficiava majoritariamente
as camadas baixas e médias e os testemunhos que nos alcançaram são frutos dos letrados
da alta aristocracia romana temos em geral testemunhos negativos sobre Domiciano.
Apesar dessas parcialidades e das diferenças de concepção entre política e filosofia
apontadas no período de Vespasiano não há como relativizar completamente a perseguição
empreendida pelos Flávios contra os pesadores do Pórtico. Finalizando a dinastia como seu
pai a começara, em 93 d. C. Domiciano expulsou os filósofos estoicos ao redor dos quais a
aristocracia se reuniu, descontente com as desconfianças e perseguições do príncipe
(ENGEL, 1978, p. 65).
Nessa época de terror adeptos do Pórtico somente poderiam sobreviver em Roma
com discrição (HARVEY, 1987, p. 403), assim, no mesmo ano em que os filósofos eram
afastados Plínio, o Jovem assumia sua primeira pretoria (BOWDER, 1980, p. 211), assim o
panegirista figura como um exemplo pontual das oscilações a que o Pórtico submeteu-se
sob a alternância das políticas dos césares. Isso fica mais evidente quando observamos a
liberdade de expressão que gozou sob Trajano, principalmente na escrita do Panegírico,
pois mesmo em um discurso político que reprova os antecessores e elogia o príncipe no
poder podem surgir interpretações ambíguas que atinjam o césar governante. A
aproximação aos interesses senatoriais, imbuídos da ética estoica, permitiu na época de
Trajano a liberdade aos adeptos do Pórtico.
De acordo com Engel (1978, p. 72-73) o início da dinastia Antonina, como Nerva e
Trajano inaugurou um novo período de entendimento entre a cúria e o príncipe, que Homo
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(1950) chamou de uma época de restauração senatorial. Foi concedida mais liberdade aos
interesses e responsabilidades do ordo senatorius, que readquiriu parte de seu prestígio
perdido e o príncipe obedeceu a moderatio e não exerceu a magistratura máxima do
consulado por vezes além do limite considerado adequado. Esse comportamento
concessivo tinha por trás de si a realidade de um regime de absoluta centralização, mas ao
permitir o funcionamento de algumas instituições republicanas o príncipe demonstrava
sabedoria e respeito para com as leis da natureza que se confundia com a noção de mos
maiorum, que tradicionalmente garantia o perfeito funcionamento do Estado. Apesar do
testemunho do Panegírico, que sublinha o antagonismo entre Domiciano e Trajano,
Blázquez (2003) e Cizek (1983) afirma que em parte houve certa continuidade nas
políticas adotadas. Diante disso podemos considerar que a aprovação presente na obra de
Plínio tenha decorrido da conciliação entre o Senado e o príncipe e ao alinhamento às
diretrizes do Pórtico, que podem ser sentida na propagando em torno da designação do
sucessor no âmbito mais amplo do império e por meio da adoção, o que atendia aos ideais
estoicos da escolha de um governante sábio e aos valores ancestrais, além disso
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necessariamente o Pórtico, fizeram oposição ao regime, porém com sucesso exíguo,
demonstra a preocupação que reprovação moral devia causar entre os césares que
estabeleciam políticas surdas aos apelos éticos da cúria e da Stoa.
O apoio do estoicismo possibilitou que os Antoninos governassem com um nível de
poder absoluto que fora tentado antes, porém sem sucesso pelos césares anteriores, que não
souberam aproveitar as vantagens que a filosofia do Pórtico podia oferecer. Grimal (1981,
p. 55-59) afirma que os sucessores dos Flávios tiveram êxito em remeter as origens de seu
poder à esfera celestial, sendo, inclusive, adorados como soberanos divinos. A associação à
Stoa lhes permitiu demonstrar em sua propagando ideológica que a divinização não era um
ato de orgulho, como fora sob o Júlio-Cláudios, mas a afirmação das virtudes do príncipe
que os tornava semelhante aos deuses. No plano político e cultural do império a integração
das províncias correspondia à concepção estoica do universo, um cosmos em que todas as
partes se unem ao logos pela simpatia universal. O império romano era bilíngue,
comerciantes, pensadores, administradores e soldados nas províncias do Oriente e Ocidente
se faziam entender em latim ou grego, por isso é significativo que Marco Aurélio, exemplo
mais bem acabado de imperador estoico, tenha escrito suas Meditações na língua helênica.
Governando o império sob os primeiros sintomas que eclodiriam na crise do século
III, principalmente o rompimento do limes pelas tribos germânicas, Marco Aurélio
encontrou no estoicismo uma maneira de lidar com as questões que afligiam seu governo.
Esta característica do imperador filósofo exige que o observemos entre os demais
Antoninos, pois, se na época de Trajano a filosofia do Pórtico voltava a orientar a conduta
moral do príncipe, com Marco Aurélio ela era uma maneira de encontrar respostas para as
aflições pessoais do césar. Ascendendo ao poder em 161 d. C., após a morte de Antonio
Pio (BOWDER, 1980), Marco Aurélio representava a realização do sonho de Platão, pois
nele um filósofo governaria (ULLMANN, 1996, p. 80). Tendo adotado a filosofia do
Pórtico na juventude Marco Aurélio nela perseverou durante toda sua vida.
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Se Marco Aurélio não foi um grande contribuidor da doutrina estoica foi, segundo
Ullmann (1996, p. 87), seu mais fiel praticante. O mesmo autor ressalta que examinava
sua própria consciência e do alto de seu poder absoluto prevenia-se para não se entregar
aos abusos, comodidades e prazeres que poderiam seduzi-lo, demonstrava assim
capacidade para observar as orientação do Pórtico e distinguir o que era bom daquilo que
era preferível. Em relação ao respeito às tradições romanas provou estar de acordo com a
teologia estoica, pois permaneceu fiel aos cultos públicos. Ullmann (1996) destaca que, ao
observar seus deveres antes de seu interesses pessoais, Marco Aurélio obedecia à Stoa e
os valores ancestrais do homem político traduzidos na noção de virtus. Entendendo que
sua posição a frente do império era um privilégio que lhe fora legado pelos deuses ele não
deixava de conceber a si mesmo como parte da comunidade humana unida pelo logo, e
pautava seu comportamento pela gravitas e iustitia. Enfim, ressaltando, junto com Brun
(1986, p. 27), o humanismo universalista de Marco Aurélio, notamos o quanto o
estoicismo era significativo para um imperador que precisava zelar pela manutenção de um
império multicultural, reforçando sua coesão para fazer frente às graves ameaças externas
que se faziam sentir. Apesar de todo esse panorama favorável, uma questão importante
permanece, pois o testemunho de seu ao apego ao estoicismo é dele próprio. Todavia,
mesmo sem podermos medir a sinceridade das Meditações temos em seu interesse em
expressar suas preocupações pessoais e de administrador do império a partir da Stoa a
certeza da penetração e da importância que essa filosofia gozava junto às questões morais e
políticas do Principado.
O pensamento estoico prossegue em Roma após Marco Aurélio rumo a um
humanismo que convergiria para o cristianismo, porém depois do penúltimo Antonino a
Stoa não produz mais nenhum grande nome. Além disso, o regime transmuta-se de
Principado para Dominado, e uma filosofia moderadora do poder e que favorecia a
conciliação entre a cúria e o príncipe não mais importava quando se desnudou
completamente o caráter absoluto do poder imperial, fundado mais do que nunca no poder
militar e cada vez menos no entendimento com o Senado.
Considerações finais
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A substituição da República pelo Principado recoloca a Stoa diante de questões
importantes. Nos circuli os debates em torno do pensamento estoico fundamentavam as
críticas aos imperadores que exerciam seu poder de maneira tirânica, afastando-se
demasiadamente dos modelos republicanos ainda vivos e que representavam nas mentes
senatoriais o exercício da vida política segundo a natureza e nos moldes delineados pelo
mos maiorum. Quando o imperador comportava-se de maneira coerente com os valores
ancestrais e com as diretrizes do Pórtico os adeptos elogiavam suas virtudes e ilustravam
sua propaganda com os ideais estoicos, justificando sua posição política, aproximando-o
do panteão divino e transformando-o em pater de todo o império, figura integradora da
comunidade sobre a qual convergiam os valores ancestrais e os ideais do Pórtico a respeito
do logos universal.
Essa dualidade de situações colocou os adeptos do estoicismo em condições
instáveis durante o Alto Império. De conselheiros imperiais sob o governo de Augusto a
perseguidos pela dinastia dos Flávios os estoicos do período imperial podem ser ilustrados
pela figura de Sêneca. Vivendo as duas realidades o filósofo cordovês tentou atuar junto ao
imperador Nero para reformular o Principado e livrá-lo das degenerações através das
virtudes, porém a tirania do príncipe frustrou suas intenções levando-o ao suicídio. Nesse
contexto incerto, no qual muitas vezes a defesa intransigente das diretrizes do Pórtico
poderiam acarretar consequências funestas, a sobrevivência dos adeptos da Stoa não raro
dependia de sua discrição, principalmente para aqueles que aspiravam as altas
magistraturas, pois sob o Principado uma carreira política de sucesso dependida, acima de
tudo, do apoio do príncipe. Neste caso a figura modelar é Plínio, o Jovem, que gozou dos
favores de Domiciano para pular etapas do cursus honorum e foi prudente, compartilhando
suas críticas ao poder apenas aos que mais confiava. Sua conduta ponderada favoreceu sua
maior ascensão sob Trajano como ideólogo do césar, em cujo governo alcançou o
consulado e teve liberdade para expressar em um discurso público, o Panegírico, críticas à
conduta moral dos príncipes anteriores e conselhos ao imperador.
A importância das orientações estoicas na construção de um poder imperial
legítimo em consonância com os valores apreciados pela aristocracia senatorial pode ser
ilustrada de duas formas muito contundentes. A primeira diz respeito às perseguições
empreendidas por alguns imperadores contra os filósofos e adeptos das doutrinas do
Pórtico, tais atitudes devem ser entendidas como medidas preventivas de um poder
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absolutamente maior, que controlava as legiões, a guarda pretoriana e tutelava o Senado,
contra reprovações morais de setores descontentes da aristocracia imperial. A segunda,
tomando as ideias da Stoa de forma mais positiva, contempla a penetração do estoicismo
entre os membros da elite romana como a melhor maneira de atender as demandas morais
que esses grupos exigiam dos governantes, dessa forma temos, enfim, com Marco Aurélio
o exemplo mais bem acabado da busca do ideal de homem político a partir do Pórtico. O
penúltimo imperador Antonino, ao expressar-se em suas Meditações por meio da Stoa,
mostrou-nos o quanto a preocupação pessoal do homem político do Alto império
encontrava no estoicismo a forma mais adequada e aceita pelos romanos para traduzir suas
preocupações em relação à condução do império.
REFERÊNCIAS:
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Odysseus, 2006.
ANDRÈ, Jean-Marie. Les écoles philosophiques aus deuz preimiers siècles de l’Empire.
ANRW. Berlim/New York (Dijon): De Gruyter, II, 36.1: 8-77, 19, 1994.
BOWDER, Diana. Quem foi quem na Roma antiga. São Paulo: Art Editora, 1980.
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Janeiro: Jorge Zahar, 1987.
HOMO, Léon. Les instituitions politiques romaines: de la cité à l’état. Paris: Albin
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MENDES, Norma Musco. O sistema político do Principado. In: MENDES, Norma Musco;
SILVA, Gilvan Ventura da. Repensando o império romano: perspectiva
socioeconômica, política e cultural. Rio de Janeiro/Vitória: Mauad/EDUFES, 2006.
SEDLEY, David. A Escola, de Zenon a Ário Dídimo. In: INWOOD, Brad. Os estoicos.
São Paulo: Odysseus, 2006.
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