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Por que a Lei Áurea não representou a abolição

definitiva?

Por Leonardo Sakamoto* | 13/05/08


O fim da escravidão legal no Brasil não foi acompanhado de políticas públicas e mudanças estruturais para a
inclusão dos trabalhadores. Por isso, os escravos modernos são herdeiros dos que foram libertados em 13 de maio
de 1888

Em 2008, comemora-se os 120 anos da Lei Áurea, quando o Estado brasileiro passou a
considerar ilegal o direito de propriedade de um ser humano sobre outro. Contudo, o ato da
princesa Isabel não foi a causa do fim do regime escravista no país, mas o final (postergado, ao
máximo) de um processo que começou com a proibição do tráfico negreiro entre a África e o
Brasil. E contou com a instituição de garantias prévias para que os proprietários rurais tivessem
mão-de-obra farta e à disposição mesmo após a assinatura que condenou o trabalho escravo à
ilegalidade. Para entender esse processo, portanto, é necessário voltar no tempo e recoorrer
aos acontecimentos do início do século 19. Não apenas àqueles decorrentes da mudança da
família real para o Brasil, mas também à expansão da Inglaterra industrial pelo mundo.
Com a invasão das tropas napoleônicas, a Coroa portuguesa dependia dos ingleses para
retomar o seu país e garantir sua própria segurança no Rio de Janeiro, além da proteção de
suas colônias. Não é de se estranhar, portanto, que a Inglaterra, interessada em tornar o Brasil
e as colônias espanholas do Prata e do Pacífico mercados para seus produtos manufaturados e
fontes baratas de matérias-primas, pressionasse por melhores condições comerciais. O Tratado
de Navegação e Comércio, assinado em 1810, dois anos após a abertura dos portos às nações
estrangeiras, foi instituído nesse sentido. Por um tempo, os ingleses passaram a usufruir de
uma taxa de importação (15%) menor que a própria taxa imposta aos produtos portugueses
(16%).

Junto com esse acordo foi assinado outro entre as duas coroas. Pelo Tratado de Aliança e
Amizade, Portugal se comprometia a limitar o tráfico de escravos entre suas colônias. A bem da
verdade, isso não causou grande impacto na economia brasileira, pois o comércio português de
escravos já estava restrito aos seus próprios domínios na África. Mas foi um dos primeiros
indícios do que viria a ser o comportamento inglês nas décadas seguintes. Prova disso é que,
no Congresso de Viena, cinco anos mais tarde, pressionado pelos ingleses, Portugal concordou
em proibir o tráfico de seres humanos em regiões acima da linha do Equador. O que colocava
de fora desse sistema comercial um dos principais fornecedores de mão-de-obra para o Brasil, a
Costa da Mina, na África Ocidental. O acordo veio ganhar "força de lei" após a inclusão das
canhoneiras ao papel assinado, por meio de uma cláusula adicional, inserida anos mais tarde,
que dava à Inglaterra o direito de abordar em alto-mar embarcações suspeitas de transportar
cativos e de apreendê-las.
Fortaleza de São Jorge da Mina, em Gana: ponto de partida de escravos (foto: Dave Ley/Wikipedia)

A despeito dos acordos internacionais, tanto a Coroa portuguesa quanto o governo imperial
brasileiro que a sucedeu não tornaram efetivas essas promessas para encerrar o tráfico. A
Inglaterra, que teve um papel de mediação no processo de independência do Brasil, continuou
pressionando a nova administração por medidas duras para acabar com o tráfico negreiro.
Exigiu em um tratado de 1826, ratificado em 1827, que o país proibisse o comércio humano em
três anos. Em 1831, o Brasil realmente promulgou a lei que proibiu o tráfico de pessoas da
África e declarou livre os cativos que desembarcassem nos portos do país após aquela data. É
claro que a lei permaneceu como letra-morta em função do fortalecimento da influência dos
proprietários rurais após a abdicação do imperador Pedro I no mesmo ano.
Pois, como afirmou Caio Prado Júnior, a escravidão constituía a mola mestra da vida no país,
repousando sobre ela todas as atividades econômicas. A produção nacional, voltada para
atender às necessidades de gêneros alimentícios (como o café) e matérias-primas para uma
Europa em plena marcha industrial, dependia do trabalho servil. Em decorrência disso, por mais
que houvesse um crescente descontentamento da opinião pública esclarecida com o trabalho
escravo, era enérgica a defesa de sua manutenção pelo setor produtivo. Afinal de contas, não
havia no horizonte visível uma opção (que não desmontasse o sistema) para substituir esse tipo
de mão-de-obra. E a importação era a única forma de suprir o aumento da demanda por força
de trabalho e mesmo sua reposição, haja vista que a reprodução da mão-de-obra escrava em
cativeiro era insignificante.

Na sociedade escravista, o trabalhador não possuía a propriedade de sua força de trabalho. Não
tinha liberdade para vendê-la a quem garantisse melhores remuneração ou condições de
subsistência, estando atado a uma pessoa ou empresa pelo tempo de sua vida. Era mercadoria.
E, por ser mercadoria, também era patrimônio. A riqueza de um homem era comumente
medida pela quantidade de escravos que possuía. Mas um patrimônio com natureza diferente,
comprado pelo fazendeiro em um mercado de força de trabalho, do qual aquele acaba por ser
dependente e refém.

Mercado da Rua do Valongo, no Rio de Janeiro, onde escravos eram vendidos (quadro de J.B. Debret)

O escravo-mercadoria se tornava objeto de lucro pelo comércio internacional antes mesmo de


começar a produzir. Ao investir determinada soma de dinheiro na compra de força de trabalho,
um fazendeiro tinha em mente que ele teria que buscar um retorno equivalente ou superior à
quantidade de recursos necessários para a manutenção da mão-de-obra somada aos recursos
que ele investiu em sua compra mais a taxa de juros que ele ganharia caso investisse o mesmo
valor no mercado. Caso contrário, o negócio não valeria a pena.

Na primeira metade do século 19 já era possível prever que o fim da escravidão era apenas
uma questão de tempo no Brasil. Tanto as pressões externas quanto internas apontavam para
uma mudança no tipo da força de trabalho utilizada na produção, o que, sem dúvida nenhuma,
era condição fundamental para o desenvolvimento econômico e social do país. A dúvida seria
como e quando essa mudança aconteceria e a qual custo – toda alteração no curso de um
sistema tem um custo, que é ponderado no momento de tomar decisões de adoção de políticas
por gestores. Um fator interno que contribuiu para que esse balanço de fatores pendesse para
o fim do tráfico foi a situação exposta acima pelo sociólogo José de Souza Martins. Os
comerciantes de escravos haviam se tornado proeminentes figuras financeiras, tendo os
proprietários rurais do país como seus devedores. A sujeição econômica a essa classe, que já
não gozava de boa reputação e imagem pela sociedade, trazia insatisfação aos produtores.
Vale lembrar que, externamente, o país já enfrentava problemas com a abordagem
internacional de seus navios, sendo eles transportadores de escravos ou não. A justificativa de
impedir o tráfico era usada mesmo quando as embarcações estavam de acordo com o acordos
ingleses. Em 1845, o parlamento inglês aprovou o Bill Aberdeen, declarando legal o
aprisionamento de qualquer embarcação utilizada no tráfico e a sujeição de seus ocupantes ao
julgamento por pirataria. Os navios eram caçados não apenas em alto mar, mas também em
águas abrigadas do Brasil e nos seus portos.
Em 1850, o governo brasileiro finalmente adota ações eficazes para coibir o tráfico
transatlântico de escravos, com a adoção de leis e ações. Os resultados puderam ser sentidos
rapidamente: em 1849, 54 mil escravos entraram no país. O número caiu para 23 mil em 1850,
3 mil em 1851, pouco mais de 700 em 1852, para acabar então definitivamente.

Nos anos seguintes, foram tomadas medidas que libertaram crianças e sexagenários. O que, na
verdade, serviu apenas como distrações para postergar o fim da escravidão. Os escravos que
conseguiam chegar aos 60 anos já não tinham condições de trabalho e eram um "estorvo"
financeiro para muitos fazendeiros que os sustentavam. Já os filhos dos escravos não possuíam
autonomia para viver sozinhos. Muitos, até completarem 18 anos, foram tutelados (e
explorados) pelos proprietários de seus pais. Além disso, uma corrente de tráfico interno vendia
escravos do Nordeste para suprir a crescente produção de café no Sudeste.

Quadros do pintor J. B. Debret retratam a vida dos trabalhadores escravos no Brasil antes de 1888

Mas, por mais que fosse postergada, com o fim do tráfico transatlântico, a propriedade legal
sob seres humanos estava com os dias contados. Em questão de anos, centenas de milhares de
pessoas estariam livres para ocupar terras virgens – que o país tinha de sobra – e produzir para
si próprios em um sistema possivelmente de campesinato. Quem trabalharia para as fazendas?
Como garantir mão-de-obra após a abolição total?

Vislumbrando que, mantida a estrutura fundiária do país, o final da escravidão poderia


representar um colapso dos grandes produtores rurais, o governo brasileiro criou meios para
garantir que poucos mantivessem acesso aos meios de produção. A Lei de Terras foi aprovada
poucas semanas após a extinção do tráfico de escravos, em 1850, e criou mecanismos para a
regularização fundiária. As terras devolutas passaram para as mãos do Estado, que passaria a
vendê-las e não doá-las como era feito até então.
O custo da terra começou a existir, mas não era significativo para os então fazendeiros, que
dispunham de capital para a ampliação de seus domínios – ainda mais com os excedentes que
deixaram de ser invertidos com o fim do tráfico. Porém, era o suficiente para deixar ex-escravos
e pobres de fora do processo legal. Da mesma forma, a lei proibia que imigrantes que tiveram
suas passagens financiadas para vir ao Brasil (ato comum na política de imigração) comprassem
terras até três anos após a sua chegada. Ou seja, mantinha a força de trabalho à disposição do
serviço do capital.

Os preceitos da lei não foram necessariamente respeitados, principalmente por quem possuía
recursos para isso. Afinal, ela não havia sido criada para impor ao capitalismo brasileiro um
problema, mas sim garantir o seu florescimento. De acordo com Emília Viotti da Costa, os
ocupantes de terras e os possuidores de títulos de sesmarias ficaram sujeitos à legitimação de
seus direitos, o que foi feito em 1854 através do "registro paroquial". O documento validava a
ocupação da terra até essa data. Com isso nasceu uma indústria da falsificação de títulos de
propriedades, com a participação de cartórios. Familiar aos proprietários de terra, os
procedimentos para isso eram inatingíveis ao ex-escravo ou ao imigrante, por desconhecimento
ou falta de recursos financeiros para subornar alguém.

Com o trabalho cativo, a terra poderia estar à disposição para livre ocupação. Porém, com o
trabalho livre, o acesso à terra precisava ser restringido. A existência de terras livres garante
produtores independentes e dificulta a centralização do capital e da produção baseada na
exploração do trabalho. Com o fim do tráfico e o livre mercado de trabalho despontando no
horizonte, o governo brasileiro foi obrigado a tomar medidas para impedir o acesso à terra,
mantendo a mão-de-obra reprimida e alijada de seus meios de produção.
Dessa maneira, a Lei de Terras, nascida do fim do tráfico de escravos, está na origem da atual
exploração do trabalhador rural e, portanto, da escravidão contemporânea. As legislações que
se sucederam a ela e trataram do assunto apenas reafirmaram medidas para garantir a
existência de um contingente reserva de mão-de-obra sem acesso à terra, mantendo baixo o
nível de remuneração e de condições de trabalho. Com a Lei de 1850 estava formatada uma
nova estrutura – em substituição àquela que seria extinta em maio de 1888 – para sujeitar os
trabalhadores.

Porém, ela também resolveu outro problema crucial: ao dificultar o acesso e legalizar a posse,
criou valor para algo que até então não o possuía – a terra. Como não era um objeto passível
de ser comercializado, a fazenda consistia, em um primeiro momento, no locus onde ocorria a
exploração e, dali em diante, no trabalho acumulado dos escravos – traduzido em mercadorias
e benfeitorias. Martins explica que a lei possibilitou, dessa forma, a transferência da garantia
dada ao mercado de crédito da propriedade dos escravos para a propriedade da terra. Esse
momento é decisivo. O trabalho, liberto da condição de renda capitalizada, deixa de fazer parte
do capital para se contrapor a ele. Não era mais preciso comprar a capacidade de gerar
riqueza: com o fim do direito à propriedade privada sobre seres humanos, o capital também
ganha a liberdade. Com a diferença de que poderia usufruí-la melhor do que os antigos
escravos.

No dia 13 de maio de 1888, com a Lei Áurea, o Estado deixou de reconhecer o direito de
propriedade de uma pessoa sobre outra. Contudo, isso não significou que todas as relações de
trabalho nas sociedades regidas pelo capital passariam a ser guiadas por regras de compra e
venda da força de trabalho mediante assalariamento, com remuneração suficiente para a
manutenção do trabalhador e de sua família. O fim da escravidão não representou a melhoria
na qualidade de vida de muitos trabalhadores rurais, uma vez que o desenvolvimento de um
número considerável de fazendas continuou a se alimentar de formas de exploração
semelhantes ao período da escravidão. Não apenas no momento da acumulação primitiva
originária – historicamente realizada através de recursos naturais e da força de trabalho – mas
ao longo do tempo, como forma de garantir uma margem de lucro maior ao empreendimento
ou mesmo lhe dar competitividade para a concorrência no mercado.

Dois casos de utilização de formas de exploração semelhantes ao trabalho escravo, mas que
não envolvem propriedade legal de um ser humano sobre outro, tornaram-se referência no pós-
Lei Áurea. O primeiro é o dos nordestinos levados a trabalhar na florescente indústria da
borracha na Amazônia. O segundo o dos colonos estrangeiros trazidos para as fazendas de café
do interior do Estado de São Paulo. Pela descrição da situação, é possível constatar que há um
padrão na forma de exploração desses trabalhadores, que continua praticamente o mesmo nos
dias de hoje – a servidão por endividamento ilegal. Como esse padrão se repetia em diversos
países, ele foi objetivo de discussões internacionais e definido em convenções da Organização
Internacional do Trabalho.

Após 1850, as exportações de borracha cresceram no Brasil devido ao aumento na demanda


internacional pelo produto após o desenvolvimento do processo de vulcanização, que aumentou
a sua resistência e ampliou as possibilidades de moldagem. Entre 1881 e 1890, representava
8% do total de exportações do país e ocupava o terceiro lugar entre os produtos mais
vendidos. Vinte anos depois (1901-1910), a borracha passou a 28% do total de exportações.
Isso levou o luxo à região amazônica, onde estavam concentrados os seringais – riqueza esta
extraída do trabalho de migrantes nordestinos, muitos deles fugidos da seca que atingiu o
Nordeste entre 1877 e 1880. O relato de Caio Prado Júnior vale para aquela época, mas
descreve esse padrão que continua até os dias de hoje:

"As dívidas começam logo ao ser contratado: ele adquire a crédito os instrumentos que
utilizará, e que embora muito rudimentares, estão acima de suas posses em regra nulas.
Freqüentemente estará ainda devendo as despesas de passagem desde sua terra nativa até o
seringal. Estas dívidas iniciais nunca se saldarão porque sempre haverá meios de fazer as
despesas do trabalhadores ultrapassarem seus magros salários. E quando isto ainda não basta,
um hábil jogo de contas que a ignorância do seringueiro analfabeto não pode perceber,
completará a manobra. Enquanto deve, o trabalhador não pode abandonar o seu patrão credor;
existe entre os proprietários um compromisso sagrado de não aceitarem a seu serviço
empregados com dívidas para com outro e não saldadas". E utilizava-se a força para manter o
trabalhador no serviço.

Com o final do tráfico negreiro, deu-se o início da implantação de regimes de parceria em várias
fazendas de café, trazendo colonos europeus para o serviço. Vale lembrar que a escravidão
estava historicamente enraizada em toda sociedade, que girava em torno dela. Portanto, era
claro que a relação fazendeiro/escravo demoraria a ser substituída pela patrão/empregado
tanto ideologicamente quanto na prática – ou talvez que nunca venha a se realizar plenamente.
Um exemplo citado por José de Souza Martins é o da firma Vergueiro & Cia, que contratou
imigrantes para executar o serviço:

"Na parceria, conforme o contrato assinado com os colonos suíços, "vendido o café por
Vergueiro & Cia pertencerá a estes a metade do seu produto líquido, e a outra metade ao (…)
colono. Entretanto, o parceiro era onerado em várias despesas, a principal das quais era o
pagamento do transporte e gastos de viagem dele e de toda a sua família, além da sua
manutenção até os primeiros resultados do seu trabalho. Diversos procedimentos agravavam os
débitos, como a manipulação das taxas cambiais, juros sobre adiantamentos, preços excessivos
cobrados no armazém (em comparação com os preços das cidades próximas), além de vários
abusos e restrições que, no caso da [fazenda] Ibicaba, logo levaram a uma rebelião. Esses
recursos protelavam a remissão dos débitos dos colonos, protelando a servidão virtual em que
se encontravam".

O colono não entrava no mercado de trabalho livre para vender sua força. E se estivesse
insatisfeito com o patrão, teria que procurar outro que comprasse suas dívidas. Perante a lei,
estavam livres, contudo, economicamente, eram similares a escravos. A experiência da
Vergueiro & Cia gerou insatisfação por parte dos colonos, temor por parte dos fazendeiros que
receavam que insurreições como a ocorrida nessa fazenda em 1856 se repetissem e mesmo
desconfiança de outros países fornecedores de mão-de-obra. Situações como essa se repetiram
ao longo de décadas até que a prática da imigração para o colonato estabelecesse um modus
operandi que contou com a participação do governo. Este passou a subvencionar o transporte
dos estrangeiros de seu país de origem até o Brasil, diminuindo os problemas com o
endividamento. Os colonos esperavam obter no trabalho das fazendas de café recursos
suficientes para adquirirem sua própria terra. O colonato passou a ser visto, e incentivado,
como uma etapa necessária para independência econômica.

A exploração degradante e ilegal do trabalho continuou. Ao analisar a situação do colonato do


café entre o final do século 19 e início do século 20 no Brasil, Martins afirmou que a
propriedade capitalista da terra assegurava ao fazendeiro a sujeição do trabalho e, ao mesmo
tempo, a exploração ilegal de seres humanos.

Apesar de trabalharem para a fazenda, os colonos atuavam como arrendatários, ficando cada
grupo com um pedaço da fazenda, cuidando do cafezal e entregando o produto para o
proprietário da terra. Para isso, eram remunerados abaixo do valor do seu serviço e de forma
insuficiente para garantir sua subsistência, tendo que utilizar as terras entre os cafezais ou
próximas deles para produzir seus alimentos. O trabalho absorvido na formação da fazenda de
café era convertido em capital na forma de cafezais. Dessa forma, ela produzia a partir de
relações não-capitalistas de produção boa parte de seu capital.

Durante todo o século 20, a servidão por dívida utilizada contra os seringueiros e os primeiros
imigrantes do café consolidou-se como uma das formas empregadas para reprimir a força de
trabalho nas situações de expansão do capital sobre formas não-capitalistas de produção. Não
há estimativas confiáveis do número de escravos no país hoje. Alguns levantamentos falam de
25 mil, outros de 40 mil. O fato é que de 1995 até hoje, mais de 30 mil pessoas já foram
libertadas em operações dos grupos móveis de fiscalização do governo federal, responsáveis
por apurar denúncias e libertar trabalhadores.

Para além dos efeitos da Lei Áurea que completa 120 anos, trabalhadores rurais do Brasil ainda
vivem atualmente sob a ameaça do cativeiro. Mudaram-se os rótulos, ficaram as garrafas. Marx
afirmava que o "morto apodera-se do vivo". Com base na permanência da escravidão sob
outras formas, constata-se que não são apenas as velhas formas que se inserem nas novas,
mas as novas recorrem às velhas sempre que possível.

*coordenador da ONG Repórter Brasil, é jornalista e doutor em Ciência Política pela


Universidade de São Paulo.

Para saber mais:


– História do Brasil, de Bóris Fausto
– História econômica do Brasil, de Caio Prado Júnior
– Política de terras no Brasil e nos Estados Unidos, de Emília Viotti da Costa,
– Capitalismo e Escravidão no Brasil Meridional: o negro na sociedade escravocrata do Rio
Grande do Sul, de Fernando Henrique Cardoso
– O cativeiro da terra, de José de Souza Martins
– A questão agrária e o capitalismo, de Samir Amin e Kostas Vergopoulos

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