RELIGIÃO E DEMANDA:
O FENÔMENO RELIGIOSO EM ESCOLAS PÚBLICAS
CAMPINAS-SP
2016
Agência(s) de fomento e nº(s) de processo(s): CNPq, 140137/2012-2; CAPES
Ficha catalográfica
Universidade Estadual de Campinas
Biblioteca do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas
Cecília Maria Jorge Nicolau - CRB 8/3387
Este trabalho não é resultado de uma epopeia, mas tem em comum o longo trajeto
percorrido, que teve seu início em 2011. De lá para cá, muitas pessoas se juntaram
a ele de múltiplas formas. É neste momento que surge o desafio de recordar cada
nome, num esforço de não esquecer ninguém.
Sou grato aos professores Graça Setton, Salomão Ximenes, Rui Luis Rodrigues e
Rodrigo Toniol, membros da banca de defesa, pelas arguições, críticas e sugestões
recebidas.
Agradeço a orientação paciente do Ronaldo; afinal, como ele mesmo disse durante a
defesa pública: “O Milton não é uma pessoa óbvia”.
Provavelmente não há nada mais apropriado,
mais homogéneo à história das religiões e à
própria religião do que tudo aquilo que não é a
história da própria ideia de religião.
Maurilio Adriani
(2000:157; itálicos no original)
RESUMO
Inserted in a broader perspective of the growth of the religious in the Brazilian public
sphere, this thesis covers the mandatory offer of religious education (RE) in the
official educational systems. Starting from the literature produced in different areas of
Human Sciences, it has as axis the usage and sense that the concept of religion (as
sociological, historical and cultural phenomenon) acquires in this controversial
facultative discipline for the student and officially devoid of doctrinal or catechetical
character. I analyze the law that standardizes its offer by the state; its demands
(disputes, debates or conflicts) among favorable and contrary groups concerning its
permanence in the public school; its epistemological models (confessional, inter-
religious, phenomenological RE etc.); the content offered in textbooks in national
circulation; the RE brochures elaborated from the partnership of professors and
researchers of the State University of Campinas (UNICAMP) and the State
Secretariat of Education of São Paulo (SEE-SP); the definitions of religion present in
the empirical / bibliographic material and the place (or abscence of a place) that it
reserves for the religions of African origin in Brazil. In this debate, which involves
multiple voices and interests of ideological and scientific nature, the concept of
religion is almost always used in the sense of an extraordinary, timeless and
identifiable phenomenon among all peoples and cultures; dimension immanent to the
subject, to the point of exempting any previous rationalization; cultural heritage
composed of a complex arsenal, that allows religions to identify and express
themselves through symbols, objects and various liturgies. As supports for a
discipline having the religious diversity as justification, the sources of research on RE
examined tend to highlight candomblé and umbanda, in detriment of other Afro
models of cult. Besides, although sharing common characteristics that allow
comparing them to other forms of coexisting religions in the country, the Afro-
Brazilian religions rarely receive the same treatment in the didactic material and in
the RE classes observed in loco at the state public schools visited during the field
research carried out in São Paulo (capital) and Campinas.
CAPÍTULO 1
DE FIEL À CIDADÃO: CONTROVÉRSIAS EM TORNO DO ENSINO RELIGIOSO
EM ESCOLAS PÚBLICAS / 29
CAPÍTULO 2
NA ENCRUZILHADA ENTRE A FÉ E A CIÊNCIA: MODELOS E FORMAS DE
ABORDAGEM DO FENÔMENO RELIGIOSO / 54
CAPÍTULO 3
PELOS MARES DA RELIGIÃO: O ENSINO RELIGIOSO VISTO A PARTIR DOS
LIVROS ESCOLARES / 82
CAPÍTULO 5
COSTUMES, CRENÇAS E RITOS: PERCEPÇÕES SOBRE RELIGIÃO E ENSINO
RELIGIOSO EM ESCOLAS PÚBLICAS ESTADUAIS DOS MUNICÍPIOS DE SÃO
PAULO E CAMPINAS/SP / 163
APÊNDICES
A Pesquisas realizadas em Instituições de Ensino Superior (IES) / 228
B Pesquisas realizadas por ano de defesa / 229
C Pesquisas defendidas por Região, Nível e Área de Conhecimento / 230
D Roteiro de Pesquisa: Ensino religioso em escolas públicas (professores) / 231
E Roteiro de Pesquisa: Ensino religioso em escolas públicas (alunos) / 233
ANEXOS
1 Ofício da Diretoria de Ensino - Região Campinas Leste (DECLESTE) / 234
2 Informativo Tambor (ano III, nº 24, p. 2, Guararema-SP, ago.2001) / 235
3 Informativo Tambor (ano III, nº 27, p. 2, Guararema-SP, nov.2001) / 236
4 Informativo Tambor (ano III, nº 28, p. 2, Guararema-SP, dez.2001) / 237
15
INTRODUÇÃO
1
Doravante, ER.
16
2
A Resolução CEB/CNE 7/2010, em seu art. 15, usa a nomenclatura “Ensino Religioso”: “Os
componentes curriculares obrigatórios do Ensino Fundamental serão assim organizados em relação
às áreas de conhecimento: I – Linguagens: a) Língua Portuguesa; b) Língua Materna, para
populações indígenas; c) Língua Estrangeira moderna; d) Arte; e) Educação Física; II – Matemática;
III – Ciências da Natureza; IV – Ciências Humanas: a) História; b) Geografia; V – Ensino
Religioso.”Cf.<http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/rceb007_10.pdf>. Acesso em: jan.2015.
3
Trecho do comentário referente ao texto “Religião: sistema de crenças, feitiçaria e magia em sala de
aula”, da antropóloga Paula Montero (2010), publicado em Sociologia, obra distribuída pelo Ministério
da Educação (MEC) aos professores do ensino médio. Disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=7843-2011-
sociologia-capa-pdf&category_slug=abril-2011-pdf&Itemid=30192>. Acesso em: set.2013.
17
quando criança, por decisão de seus pais, ou, quando adulto, por
escolha pessoal; de mudar de religião, por determinação voluntária
ao longo da vida, sem restrições de ordem civil; e de não ter religião,
como opção consciente. O que caracteriza, portanto, a inserção
social do cidadão, desse ponto de vista, é o respeito, a abertura e a
liberdade.4
4
BRASIL. Parâmetros curriculares nacionais: pluralidade cultural, orientação sexual. Secretaria de
Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1997, p. 30-31. Disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro101.pdf>. Acesso: jan.2015.
5
As “verdades religiosas não se subordinariam ao julgamento de mérito, um processo corriqueiro a
todos os campos científicos” (DINIZ; LIONÇO, 2008b, p. 16).
6
No caso desta pesquisa, são eles: os autores e organizadores de livros didáticos e cadernos
pedagógicos de ER; os professores de ER atuando em escolas da rede estadual paulista e os
professores-formadores que atuam exclusivamente nas oficinas pedagógicas das Diretorias
Regionais de Ensino de São Paulo (capital) e Campinas/SP.
18
7
Sobre os efeitos do neopentecostalismo no campo religioso afro-brasileiro, indica-se a coletânea
organizada por Silva (2007), a etnografia de Almeida (2009) sobre “A Igreja Universal e seus
demônios”, bem com o artigo de Miranda e Maia (2014) sobre religião, política e controvérsias da luta
contra a intolerância religiosa.
8
STEEL, Cultura religiosa, Módulo 1 (O conhecimento individual para mais consciência na vida
comunitária), “Pluralismo religioso”, p. 19; grifos em negrito no original. Os livros didáticos de ER
examinados nesta pesquisa serão citados desta forma nas notas de rodapé (referências completas
podem ser conferidas no final do trabalho). Com isso, os leitores poderão acompanhar os conceitos,
temas e títulos escolhidos pelos autores dessas fontes de pesquisa examinadas no terceiro e quarto
capítulos.
19
9
Quanto ao "Grupo do Sim” ao ER (CÂNDIDO, 2007), pode-se falar de “demanda” pelo religioso em
sentido amplo; isto inclui não somente as escolas públicas, mas também as particulares.
10
Para o catálogo do Portal Capes, ver <http://bancodeteses.capes.gov.br/>. Acessos entre 2012 e
2015.
11
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Universidade de São Paulo (USP), Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Paraná (PUC-PR), Campinas (PUCCAMP),
Universidade Metodista de São Paulo (UMESP), Universidade Estadual Paulista (UNESP),
Universidade Presbiteriana Mackenzie, universidades federais e estaduais com cursos de graduação
e pós-graduação em ciência(s) da religião (Paraíba, Juiz de Fora, entre outras.)
21
A maior parte das pesquisas encontradas foi realizada entre 1995 e 2014,
sendo que em 2012 foram defendidos 32 trabalhos de pós-graduação – detalhes
deste levantamento podem ser conferidos nos Apêndices desta tese. O Sul e o
Sudeste são as regiões brasileiras com o maior número de estudos acadêmicos
sobre o ER, realizados em diferentes áreas do conhecimento: a primeira região com
38 trabalhos e a segunda com 58.
A leitura dos resumos, das introduções, dos sumários e das conclusões das
teses e dissertações levantadas, evidencia que a maioria das pesquisas tem um
caráter nitidamente ideológico de defesa do ER.12 Nota-se a prevalência das
abordagens que, partindo de diferentes campos do conhecimento – em especial,
teologia, ciências da religião e educação –, enfatizam questões sobre a
regulamentação e a implementação do ER nos Estados brasileiros; do ER nas
Constituições federais e legislações educacionais; dos debates entre os defensores
da laicidade e os que aprovam a legitimidade do ER enquanto componente curricular
e outros enfoques. Em caráter mais abrangente, alguns trabalhos de mestrado
discutem certos aspectos de interesse para esta tese, entre os quais os modelos de
ER – confessional, ecumênico, inter-religioso etc. –, que serão retomados em outros
momentos deste estudo (LIMA, 2003; BRASILEIRO, 2010).
12
Derisso (2006) apresentou diagnóstico parecido como o nosso ao informar que teve dificuldade
para localizar estudos específicos com abordagem crítica. Observou, entretanto, a recorrência de
materiais de divulgação utilizados como suporte para a aplicação do ER e artigos provenientes de
instituições confessionais ou de professores e intelectuais comprometidos com o ER.
13
A lei nº 10.639/2003 obriga a inclusão do ensino de história da África e da cultura afro-brasileira nos
currículos escolares (artes, história, literatura, etc.) dos estabelecimentos de ensino públicos e
22
O “ER tem sido tema evitado pelos laicos – apenas seus defensores mais
ostensivos dele tratam”, confirma Luiz Antônio Cunha, em estudo sobre religião,
moral e civismo no Brasil (CUNHA, 2006). Religião e educação é, de fato, um
capítulo pouco visitado pela história, pela antropologia e pela sociologia das
religiões. Talvez o que ainda falta, nas ciências humanas de modo geral, é
considerar que as religiões, “enquanto produtoras de cultura” e “sistemas de
símbolos”, compõem uma das matrizes socializadoras do indivíduo contemporâneo
(SETTON, 2008, p. 16). Isto não quer dizer, como visto nesta tese, que as religiões
possam se vivenciadas no espaço da escola pública da mesma forma como são
vividas no interior das comunidades religiosas.
privados. Um dos objetivos dessa norma é estimular medidas em prol de uma educação antirracista,
que repudie quaisquer formas de preconceito, racismo institucional e discriminação étnico-racial.
14
Espaço público é entendido como o campo de relações, fora do âmbito doméstico, no qual ocorrem
as interações sociais. A esfera pública equivale ao universo discursivo, onde normas e ideias são
difundidas e submetidas ao debate público (CARDOSO DE OLIVEIRA apud MIRANDA; MAIA, 2014,
p. 82, nota 3).
23
A obtenção dos dados sobre o ER, em São Paulo, foi árdua e marcada
por algumas dificuldades previsíveis (falta de retorno das assessorias dos dirigentes
regionais de ensino, desconfiança em relação à pesquisa, desconhecimento e
dificuldade dos servidores para localizar e fornecer informações mínimas sobre as
escolas com turmas de ER homologadas). Isso ocasionou mudanças nos rumos da
pesquisa de campo que, inicialmente, abarcaria somente escolas públicas
localizadas no município de São Paulo. Algumas escolas estaduais da região de
Campinas e suas Diretorias de Ensino – Região Campinas Leste (DECLESTE) e
Região Campinas Oeste (DECOE) – foram incorporadas ao estudo. Nestas
diretorias de Campinas tive amplo acesso aos seus dirigentes regionais e aos
profissionais que atuam nos Núcleos Pedagógicos, cujos professores responsáveis
pelo ER contribuíram com planilhas contendo as relações das escolas que
homologaram, ou não, turmas de ER a partir de 2013.15
15
Após o levantamento numérico de 2013, solicitado através da Assessoria do Dirigente Regional de
Ensino, foi possível verificar que das 42 escolas de 5ª a 8ª séries abrangidas pela DECLESTE, 39
encaminharam os dados sobre a formação de turmas de ER de 2003 a 2012. Desde 2009, as escolas
24
públicas estaduais da Região Leste de Campinas não têm homologado turmas de ER, inclusive em
2013 (ver Anexo 1).
16
As duas escolas públicas estaduais localizadas no município de Valinhos (SP) pertencem ao
quadro oficial da DECOE (Diretoria de Ensino - Região Campinas Oeste).
17
O trabalho de campo nas diretorias de ensino e escolas públicas estaduais sediadas no município
de São Paulo foi realizado em 2012. Em 2015, retornei em algumas escolas paulistanas para coletar
dados pós-qualificação – em especial, consultas aos Planos Políticos Pedagógicos (PPPs), a fim de
verificar se havia alguma referência, nestas fontes, ao ER. Voltarei ao percurso empírico no quinto
capítulo.
25
18
A pesquisa de campo nas diretorias de ensino e escolas públicas estaduais do município de
Campinas ocorreu entre 2013 e 2015. Voltarei a isto no capítulo cinco.
26
II
19
Trecho do artigo do arcebispo de São Paulo, Dom Odilo Sherer, publicado jornal O Estado de S.
Paulo, 9 de maio 2009, p. A2, aspas no original. O fragmento citado foi publicado nos volumes de ER
da coleção Entre Amigos, “Suplemento para o Professor de Ensino Religioso”, subitem “Ensino
Religioso: direito cidadão no Estado laico” (EDITORA MODERNA, 2009, vol. 9, p. 5).
28
CAPÍTULO 1
20
Projeto de lei nº 1036/1999, do ex-deputado José Carlos Stangarlini (PSDB).
21
Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz1110200111.htm. Acesso em: jun. 2014.
Grifos meus.
22
Parte das normas, princípios, dispositivos jurídicos, etc., citados ao longo deste estudo ode ser
encontrada em Junqueira, Corrêa e Holanda (2007), cujo livro-referência reúne as legislações
educacionais que normatizam o ER em âmbito nacional e nos Estados brasileiros.
30
23
Entidades religiosas, organizações da sociedade civil, representantes dos sistemas públicos de
ensino, bem como especialistas em ER, estiveram em Brasília para discutirem o Acordo entre o Brasil
e a Santa Sé, decretado em 2010, que prevê o oferecimento do “ensino católico e de outras
confissões religiosas” nos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental. A Ação
Direta de Inconstitucionalidade do Acordo (ADI 4439), proposta em 2010 pela Procuradoria-Geral da
República (PGR), aguarda julgamento do ministro Luís Roberto Barroso.
31
24
As referências que serviram de base para este capítulo podem ser conferidas em: Albuquerque
(2004), Cury (2004), Pauly (2004), Carneiro (2004), Giumbelli e Carneiro (2006), Junqueira (2007),
Giumbelli (2008), Casseb (2009), Fonaper (2009), entre outras.
32
25
Considerando seus limites e propósitos, não se pretende recuperar aqui todos os debates travados
entre estes personagens da história nacional, que não se limitavam, em complexidade e alcance, às
discussões sobre ter ou não ter aulas de religião no ensino público. O que estava em jogo, para
muitos, era a formação e a consolidação de uma sociedade brasileira secular na primeira metade do
século XX.
33
26
Mediante consulta ao amplo material bibliográfico disponível, não é presunçoso afirmar que parte
razoável dos estudos acadêmicos sobre o ER em escolas públicas reserva pouca ou nenhuma
atenção aos protestantes (igrejas Presbiterianas, Batista, Metodista, Congregacional e Episcopal, as
igrejas de missão) que, desde as primeiras décadas do século XX, estavam preocupados, assim
como os segmentos católicos, em participar mais intensamente da “intrincada teia política do país”
(ALMEIDA, 2002, p. 26). Esta preocupação não se limitava às atuações parlamentares em defesa da
laicidade na vida nacional, mas ambicionavam uma “participação política ampla, estendida a temas
instigantes e densamente interligados” (ALMEIDA, 2002, p. 26).
27
Ortografia oficial da época, também presente noutras referências citadas neste capítulo.
34
28
Quanto ao domínio do pensamento religioso num determinado período da educação brasileira,
Santo avalia “que o que acontece no Brasil em termos de atraso não se deve a um modelo
educacional eclesiástico, mas ao descaso que a educação foi submetida tanto pelos governos
coloniais, como imperial. Sem a participação da Igreja a educação estaria em condições muito pior”
(2005, p. 102).
29
Para os especialistas preocupados em distinguir os termos, a catequese refere-se à “educação
permanente e sistemática da fé” então seguida pelo adepto que participa espiritualmente de uma
35
comunidade religiosa (CRUZ, 1997, p. 13). No entanto, a associação entre ER e catequese, para
muitos considerada problemática, é frequente, seja na escola pública, em particular, seja na
sociedade mais ampla. Voltarei ao ER catequético no segundo capítulo.
36
30
“Em que pese esse cenário, o ensino religioso continuou sendo ministrado em alguns estados,
como Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Santa Catarina, Ceará, Sergipe e Pernambuco, contando
com o apoio de alguns juristas da época” (LEITE, 2011, p. 49). Em 1924 o governo de Minas Gerais
autorizou sua oferta em escolas oficiais fora do horário normal; em 1928, autorizou aulas de
catecismo; em 1929, expandiu o ER para as escolas primárias, secundárias e normais (OLIVEIRA,
2008, p. 114).
37
33
Não se localiza no escrito do Pe. Leonel Franca nenhuma referência à organização do espiritismo,
das religiões afro-brasileiras e do protestantismo dividido em diferentes denominações. Ele indaga,
aliás, se era verdade que existiam, na população brasileira dos anos 1930, “grupos tão consideráveis,
pertencentes a outros credos”; se houvesse, recomendou-lhes que convivessem harmônica e
socialmente uns ao lado dos outros (FRANCA, 1953, p. 105). Essa “quebra da hegemonia católica”
poderia fomentar a diversidade religiosa e beneficiar os adversários históricos do catolicismo, entre os
quais o protestantismo brasileiro (ALMEIDA, 2002, p. 27).
40
34
Franca postulava que o projeto da “seita” maçônica era demolir a religião. “O fim explícito da
maçonaria é destruir a religião nas almas, combater o catolicismo, e para este fim faccionário, lançar
mão de todos os recursos do Estado” (FRANCA, 1953, p. 58; itálicos no original).
41
35
Para Ghiraldelli Jr. (1991), citado em Pauly (2004, p. 175), a Carta Constitucional de 1934 era a
mais progressista em “matéria educacional”, pois o Artigo 150 determinava como competência da
União “fixar o plano nacional” de educação.
42
[...]
36
O Decreto-Lei nº 869/1969 dispôs sobre a disciplina de Educação Moral e Cívica como matéria
obrigatória nas escolas públicas de todos os graus e modalidades. No artigo 2º, consta como
finalidade: “A defesa do princípio democrático, através da preservação do espírito religioso, da
dignidade da pessoa humana e do amor à liberdade com responsabilidade, sob a inspiração de
Deus”.
43
dos saberes escolares, fato que perdura até hoje (FIGUEIREDO, 1996). “Dá-se
abertura para o proselitismo, uma vez que o serviço voluntário é responsável pela
prática escolar, legitimado pela autoridade respectiva a cada confissão religiosa”
(BERTONI, 2009, p. 154).
37
A Reforma Capanema, realizada ao longo da Era Vargas (1930-1945), sob o comando do ministro
da educação e saúde Gustavo Capanema, institui as Leis Orgânicas que criaram os ramos de ensino:
primário, secundário, industrial, comercial e agrícola.
38
Parecer nº 540/1977, p. 33. Disponível no acervo de fontes do Grupo de Estudos e Pesquisas
“História, Sociedade e Educação no Brasil”, Faculdade de Educação, UNICAMP. Disponível em:
<http://www.histedbr.fe.unicamp.br>. Acesso em jul.2016.
45
39
Parecer nº 540/1977, p. 33.
46
40
“Participaram ativamente desse lobby: a Associação Interconfessional de Educação de Curitiba/ PR
– Assintec –, o Conselho de Igrejas para a Educação Religiosa de Santa Catarina – Cier – e o
Instituto Regional de Pastoral do Mato Grosso/MS – Irpamat; mas foi o esforço conjunto da
Confederação Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB –, Associação de Educação Católica do Brasil –
AEC – e Associação Brasileira de Escolas Superiores Católicas – Abesc – que conseguiu juntar em
uma só emenda a proposta governamental para os estabelecimentos privados visando manter o
ensino religioso nas escolas públicas” (LUI, 2007, p. 334).
47
pelo aluno ou por seus responsáveis legais. Pela primeira vez abre-se espaço para
o ensino interconfessional. Admite-se ou flexibiliza a diversidade religiosa,
favorecendo assim “a fragmentação da transmissão simbólica de sentidos
religiosos de mundo, produzidos por múltiplos agentes e agências, sejam igrejas ou
instituições religiosas” (ALBUQUERQUE, 2004, p. 16).
41
Conselho Nacional de Educação, Parecer 05/1997, p. 2. Disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/PNCP0597.pdf>. Acesso em: 13 fev. 2013.
48
42
Estes “que fixam os rumos das ciências e dos saberes e, a partir daí, vão disseminando o
conhecimento, até este chegar ao ensino básico” (MONTEIRO, 2008, p. 100)
43
Entidades civis e religiosas que participaram deste lobby foram: CNBB, CONIC, AEC, Fonaper,
entre outras.
44
Paulo Renato Souza, ex-ministro da educação (1995-2002), defendeu a revisão do artigo 33 pois a
proibição do financiamento público provocaria “restrição para a atuação das diferentes denominações
religiosas” (CARON, 1998, p. 59).
49
45
O “poder temporal da Igreja repousa também sobre o controle de cargos que podem dever sua
existência à simples lógica econômica (quando vinculados a empreendimentos econômicos
propriamente religiosos, como as peregrinações, ou com dimensão religiosa, como as empresas da
imprensa católica) ou à ajuda do Estado, como os cargos de ensino” (BOURDIEU, 1996, p. 195;
itálicos no original).
46
Nilton de Freitas Monteiro, Procurador Geral do Estado de São Paulo, ressalta que ideologias e
crenças influenciam na elaboração das leis; no entanto, um professor de ER ou de outra matéria do
currículo escolar “não pode, em princípio, fazer proselitismo político em aula, em nome do socialismo
e do liberalismo, pois isso romperia com o princípio da laicidade” (MONTEIRO, 2008, p. 92).
50
47
Depoimento concedido ao jornal Folha de S. Paulo, Cotidiano, 18 de agosto de 2001. Disponível
em: <http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff1808200118.htm>. Acesso em: 7 abr. 2014.
48
Edson Machado foi chefe de gabinete do MEC durante o período de 1995 a 2001.
51
discuti-las, quer elas adentrem o espaço da sala de aula de forma inusitada, quer
elas sejam uma escolha racionalmente planejada.
49
Luiz Antônio Cunha, líder do Observatório da Laicidade na Educação (OLÉ) e professor da
Faculdade de Educação (UFRJ), sublinha que no caso francês, o ensino sobre o fato religioso é
tratado na disciplina de história (CUNHA, 2006, p. 1242).Ver
<http://www.scielo.br/pdf/es/v27n97/a08v2797.pdf>. Acesso em dez.2015.
53
50
Por “paradigma” entende-se “modelo”, “esquema mental” ou “referencial” que, além de fundamentar
uma visão da realidade, também orienta concepções e atitudes (CORDEIRO, 2004, p. 10).
54
CAPÍTULO 2
___________________________________________________________________
NA ENCRUZILHADA ENTRE A FÉ E A CIÊNCIA:
MODELOS E FORMAS DE ABORDAGEM DO FENÔMENO RELIGIOSO
51
Teólogo, professor da PUC-SP e coordenador de Grupos de Trabalho (GTs) sobre religião
educação e sociedade.
52
Artigo 11 (decreto nº 7.107/2010, que rege a Concordata Brasil-Santa Sé), artigo 210 (Constituição
Federal de 1988) e artigo 33 (LDBEN 9.394/96).
56
54
Dantas propõe que a “Religiosidade” está associada à “abertura do homem ao sentido radical, mais
profundo de sua existência (fé em sentido amplo, abertura a tudo aquilo que lhe transcende e dá
sentido à sua existência) e a “Religião” seria uma forma concreta do indivíduo “viver a sua
religiosidade, o que supõe adesão a um credo e pertença a uma comunidade de fé (fé
institucionalizada, pública), sujeita a todas as contingências históricas e culturais que isto implica”
(2007, p. 122). Para Francisco Catão, as religiões são organizações, associações ou instituições com
“finalidades religiosas”, tratadas como “pessoas jurídicas de direitos e deveres perante a lei”, que têm
“suas exigências internas de ordem doutrinária, cultual, moral e disciplinar”, e que desempenham, “na
sociedade, algum papel, julgado mais ou menos irrelevante (...)” (CATÃO, 1995, p. 18; 123).
58
55
A antropóloga Eunice Durham (ex-conselheira do Conselho Nacional de Educação) foi uma das
relatoras do Parecer CNE nº 97/1999. Documento disponível no banco de dados do CRE-Mário
Covas. Ver:
http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:M1HR_QlqtSYJ:www.crmariocovas.sp.gov.
br/pdf/diretrizes_p0596-0601_c.pdf+&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br. Acesso em: 13 fev. 2013.
60
2.2.1 Catequético
2.2.2 Teológico
2.2.4 Ecumênico
[...] dê-se a ele que nome for, traz consigo riscos de muitas violações
de direitos. Por exemplo, a afirmação frequente nesses casos de
que a divindade “é sempre a mesma”, esconde uma ânsia, ainda
que inconsciente, de submeter o outro a certa visão de fé, que não é
necessariamente a dele (FISCHMANN, 2004; aspas no original).56
58
Será adotado, neste trabalho, o termo “ciências da religião”, pois trata-se de uma nomenclatura
usada para definir um dos modelos aqui apresentados (PASSOS, 2007, p. 64-67). Existem outros
termos em uso. Quem opta pela “ciência da religião” tende a pressupor a existência de um método
científico para um objeto unitário. Quem opta pelas “ciências das religiões” o faz por estar convencido
tanto do pluralismo metodológico quanto do pluralismo do objeto, cuja estrutura é dinâmica e aberta.
“Entre estes dois termos encontramos duas soluções intermediárias: os que falam de ciência das
religiões ou, pelo contrário, os que preferem falar de ciências da religião” (FILORAMO; PRANDI,
1999, p. 12). No Brasil, a maioria dos cursos de bacharelado, licenciatura plena e pós-graduação,
emprega a nomenclatura “ciências da religião”, ao passo que outros docentes de universidades
públicas e Instituições de Ensino Superior confessionais defendem a “ciência da religião”, no singular,
como área autônoma e modelo de referência para o ER. A propósito da institucionalização desse
campo disciplinar em países da Europa, em especial na Alemanha, ver Frank Usarski (2007; 2013).
Para o caso brasileiro, confiram as publicações de Teixeira (2007), Camurça (2008), Soares (2010) e
Rodrigues (2013).
70
2.2.7 Fenomenológico
59
Pontifícias Universidades Católicas (PUCs) e outras instituições de ensino confessionais;
universidades públicas federais e estaduais, que oferecem cursos de ciências da religião, algumas
com a oferta de licenciaturas em ER (Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Universidade
Federal de Sergipe (UFS), Universidade Estadual do Pará (UEPA), Universidade Federal da Paraíba,
etc., entre outras instituições públicas).
71
60
Resolução completa disponível no acervo online do GPER (Grupo de Pesquisa Educação e
Religião). Ver: <http://www.gper.com.br/biblioteca_download.php?arquivoId=112>. Acessos em: 2015;
2016.
61
Ver: SANTA CATARINA (Estado). Decreto nº 3.882, de 28 de dezembro de 2005. Regulamenta o
Ensino Religioso nas escolas de Ensino Fundamental da rede pública estadual. Disponível em:
<http://www.edulaica.net.br/uploads/arquivo/sc_decreto_n_3882_2005.pdf.>. Acesso em: nov.2014.
73
o que não quer dizer que tais aspectos – menos institucionalizados – não exerçam
alguma influência na sociedade.
62
Para Eduardo Basto de Albuquerque: “Fazer História das Religiões não é fácil, porque exige a
disposição de manter certo afastamento, se é possível isso ser feito!” (2004, p. 61).
75
De fato, não são todas as áreas das ciências humanas que estão
interessadas, ou preocupadas, em fornecer respostas para certas perguntas – “de
onde viemos?”, “para onde vamos?” ou “qual o futuro da humanidade?”. Essas
interrogações estão associadas ao universo das religiões. Daí advém a recepção
crítica à proposta de ER mais laicizada que se tentou implantar nas escolas públicas
da rede estadual paulista – esta observação será discutida com mais
aprofundamento no quinto capítulo.
63
Cientista da religião, ex-Assessora de Ensino Religioso da Associação de Educação Católica de
São Paulo (AEC/SP).
64
Decerto, as denominações religiosas minoritárias – em especial, os grupos evangélicos – também
querem exercer alguma influência no espaço público das escolas, seja por meio da participação na
seleção e execução dos conteúdos de ER, seja na escolha dos responsáveis pelo desenvolvimento
destes conteúdos.
77
em torno deles, sendo isto um reflexo da “história dessa disciplina (...) dependente
da ideologia religiosa católica e de conjuntura políticas dominantes, até meados do
século XX” (DANTAS, 2007, p. 60). Além disso, “legislações de ensino antagônicas
se alternam e até convivem, não sem conflitos, num mesmo momento histórico ou
espaço físico, o que não é exclusividade do Ensino Religioso” (DANTAS, 2007, p.
60).
71
Há uma Ação Direta de Inconstitucionalidade em tramitação junto à Procuradoria Geral da
República, “instando o Supremo Tribunal Federal a se pronunciar sobre a legitimidade do modelo
confessional” (GIUMBELLI, 2011, p. 262). Em outubro de 2015, mais de trinta entidades religiosas ou
ligadas à educação participaram da audiência pública convocada pelo ministro Luís Roberto Barroso
(STF), na qual se debateu a constitucionalidade ou não de se incluir o “ensino confessional católico e
de outras confissões” no quadro das disciplinas das escolas da rede pública.
72
Sobre o Acordo entre o governo brasileiro e a Santa Sé relativo ao Estatuto Jurídico da Igreja
Católica no Brasil, firmado na Cidade do Vaticano, ver:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Decreto/D7107.htm. Acesso em: ago.2016.
80
73
A adoção do modelo confessional nas escolas públicas estaduais do Rio de Janeiro foi sancionada
após a lei nº 3.459/2000.
74
“Das quinhentas vagas disponíveis, trezentos e quarenta e duas foram destinadas aos professores
“católicos”, cento e trinta aos “evangélicos” e vinte e seis aos “outros credos” (MIRANDA; MAIA, 2014,
p. 85).
81
CAPÍTULO 3
77
INCONTRI; BIGHETO, Todos os jeitos de crer, Apresentação, vol. 1 (Vidas), p. 3; itálico no original.
84
“versão preliminar” da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) 78. Esta Base
poderá valer, segundo palavras do ex-ministro da Educação (MEC), Renato Janine
Ribeiro, para todas as escolas do país.
78
Documento não analisado nesta pesquisa. Aguarda-se tanto sua aprovação e/ou reprovação pelo
MEC, bem como a decisão do STF em relação ao decreto que rege a Concordata Brasil-Santa Sé.
Dificilmente será decretado o fim do ER nas escolas públicas brasileiras, uma vez que se discute, no
âmbito federal, a criação de uma diretriz oficial para esta disciplina. O que se espera, do STF, é a
proibição do ER confessional vigente nos marcos legais de alguns Estados brasileiros.
79
Ver notícias do FONAPER em: <http://www.fonaper.com.br/noticia.php?id=1760>. Acesso: abr.
2016.
80
A Folha de S. Paulo tem uma posição publicamente contrária à oferta pública do ER. No dia em
que Renato Janine Ribeiro, então ministro da educação, anunciou a consulta online da Base Nacional
Comum Curricular (BNCC), a Folha... publicou uma breve matéria, com a seguinte manchete:
“Proposta de ministério para currículo nacional faz crítica a ensino religioso”. Nota-se o modo
enviesado escolhido para noticiar a proposta tramitada na esfera federal. A crítica do MEC, bem como
do STF, não é em relação ao ER de modo geral, mas em relação à oferta do ER em sua modalidade
confessional, que tende a resvalar para o ensino católico.
Cf.<http://www1.folha.uol.com.br/educacao/2015/09/1686895-proposta-de-ministerio-para-curriculo-
nacional-faz-critica-a-ensino-religioso.shtml>. Para editoriais da Folha... sobre o ER:
<http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz0103201102.htm>. Ver também:
<http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz2108200103.htm>. Acessos em: mai.2016.
85
81
A expressão “cultura escolar” designa o “conjunto de teorías, ideas, principios, normas, pautas,
rituales, inercias, hábitos y prácticas (formas de hacer y de pensar, mentalidades y comportamientos)
sedimentadas a lo largo del tiempo en forma de tradiciones, regularidades y reglas de juego no
puestas en entredicho, y compartidas por sus actores, en el seno de las instituciones educativas”
(VIÑAO apud AZEVEDO, 2011, p. 106). Ela “propicia aos indivíduos um corpo comum de categorias
de pensamento que tornam possível a comunicação”, escreve Pierre Bourdieu (2007, p. 205) em sua
reflexão sobre o papel de integração cultural assumido pela escola.
82
Ainda hoje se pergunta por que a reformulação do artigo 33 da citada lei federal fez desaparecer o
conectivo “e”, transformando a diversidade cultural e religiosa em “diversidade cultural religiosa”
(FISCHMANN, 2008, p. 213).
86
83
O livro paradidático costuma ser adotado de forma paralela e complementar aos livros
convencionais – daí o sentido do “para” (MENEZES; SANTOS; 2001). É um recurso lúdico e
conceitual, que apresenta uma linguagem ficcional e “o imaginário como suporte ou manipulação do
conceitual” (COELHO; SANTANA apud BAPTISTA, 2008, p. 11).
84
Estereótipos "(...) não flutuam sobre o nada. Razão pela qual eles podem nos informar de maneira
bastante útil sobre as realidades concretas e afetivas que eles deformam sempre, camuflam quase
sempre e, finalmente, revelam" (JEANNENEY apud MORAND, 2012, p. 85).
85
Para Azevedo as lacunas teóricas e de conteúdo de um livro didático são compreensíveis. Os
autores deste gênero bibliográfico realizam suas escolhas seguindo critérios editoriais ou que
julgarem mais relevantes. Alguns temas podem ser mais privilegiados que outros; “isso é plenamente
aceitável, uma vez que os autores têm autonomia para proporem o que deve ser discutido”
(AZEVEDO, 2005, nota 14, p. 116).
86
Ver GUIA DE LIVROS DIDÁTICOS PNLD 2012: História. Disponível em:
<http://www.fnde.gov.br/index.php/pnld-guia-do-livro-didatico>. Acesso em 26 fev. 2012.
87
Livros didáticos não são simples suportes pedagógicos, acima disso, eles
se constituem como objetos culturais que devem ser considerados em sua
complexidade. O conjunto dos elementos textuais e visuais neles veiculados como
fontes não se limitam à maneira como explicam ou apresentam um determinado fato,
mas também remete às representações sociais nele contidas.88 Como nada é
“neutro, politicamente falando, em educação” (CRUZ, 1997, p. 102), logo, não é
impossível localizar, ao longo de suas páginas, algum aspecto ou tratamento
conceitual do qual se possa discordar.
87
A partir de uma pesquisa baseada na análise de quatro coleções de ER, Diniz afirma que o
“estímulo à homofobia e a imposição de uma espécie de ‘catecismo cristão’ em sala de aula são uma
constante nas publicações”. Cf. “Ensino religioso no Brasil estimula o preconceito e a intolerância”,
Secom UnB (Secretaria de Comunicação da UnB), 21 de junho de 2010. Disponível em:
<http://www.unbciencia.unb.br/index.php?option=com_content&view=article&id=552%3Aensino-
religioso-no-brasil-estimula-o-preconceito-e-a-intolerancia&catid=57%3Alivros&Itemid=1>. Acessos:
2015; 2016.
88
Representações são “sistemas de interpretações sociais que regem nossa relação com o mundo
e com os outros, que orientam e organizam as condutas e as comunicações sociais” (JODELET,
2001, p. 22). Por "representações sociais queremos indicar, escreve Serge Moscovici, um conjunto
de conceitos, explicações e afirmações interindividuais”, que equivalem, “em nossa sociedade, aos
mitos e sistemas de crenças das sociedades tradicionais; poder-se-ia dizer que são a versão
contemporânea do senso comum" (MOSCOVICI apud COSTA; ALMEIDA, 1999). Artigo
originalmente publicado em periódico acadêmico, disponibilizado em online livre sem a devida
paginação. Ver: <http://www.ufmt.br/revista/arquivo/rev13/as_teorias_das_repres.html>. Acesso
em. nov. set. 2015.
88
89
Essa observação poderia ser estendida aos livros escolares de história do Brasil, onde fatos reais
são narrados de forma mítica, como se fossem grandes sagas ou epopeias heroicas.
90
Oliveira (2006, p. 40) reporta-se, em nota explicativa, ao estudo realizado por Circe Bittencourt. Em
pesquisa realizada em escolas de São Paulo, Bittencourt comenta que para os estudantes de baixa
renda, a posse individual do livro didático conferia um status social e até mesmo garantia de
segurança em caso de “batidas” policiais ocorridas fora dos perímetros das escolas.
89
91
Ressalta-se que também existem “professores que abominam os livros escolares, culpando-os pelo
estado precário da educação escolar” (BITTENCOURT, 2010, p. 71). Este repúdio ao uso do livro
didático pode ser decorrente das políticas de seleção, distribuição e controle do Estado sobre a
escola pública brasileira.
90
elaboração de seus próprios textos, a partir de livros não didáticos”, afirma Paulo
Meksenas (2010, p. 30) em sua análise dos manuais de sociologia.
92
Para Azevedo (2005, p. 110) é “ilusório, já que empiricamente impossível nas atuais circunstâncias,
o professor pensar que ele terá condições de produzir seu próprio material didático. A dupla jornada
de trabalho – em alguns casos a tripla jornada – não permite sequer que o professor prepare as aulas
com outros materiais pedagógicos. Essas são as condições históricas nas quais os professores do
Ensino Fundamental e Médio se encontram”.
91
95
Gilz é pedagogo, mestre em Educação pela PUC-PR, membro do GPER (Grupo de Pesquisa
Educação e Religião), professor universitário e pesquisador do CEP (Centro de Estudos e Pesquisas
Bom Jesus).
96
Filósofo, mestre e doutor em Educação pela Universidade Federal Paraná. É professor de filosofia
na PUC-PR.
94
97
Projeto de pesquisa intitulado “Mapeamento do Ensino Religioso no Brasil: definições normativas e
conteúdos curriculares”, proposto pelo ISER (Instituto de Estudos da Religião) e apresentado ao
Programa de Apoio a Projetos em Saúde, Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos (PROSARE
EDITAL 2007).
98
Amapá, Pará, Alagoas, Paraíba, Piauí, Goiás, Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, Paraná, Santa
Catarina, Rio Grande do Sul.
95
99
Pesquisa intitulada “O ensino religioso nas escolas públicas brasileiras: qual pluralismo?”, que teve
apoio da CCR (Comissão de Cidadania e Reprodução) e do Programa de Apoio a Projetos em
Sexualidade e Saúde Reprodutiva (Prosare). Diniz e Lionço (2010a) analisaram as coleções de ER
das editoras FTD, Ática, Saraiva, Moderna, Vozes, Paulinas, etc., sem se aterem à noção de religião,
mas com foco no proselitismo e na diversidade religiosa.
100
Parte desse acervo foi doada para a Biblioteca “Prof. Joel Martins”, Faculdade de Educação,
UNICAMP.
96
deste capítulo:
QUADRO 2
Livros didáticos de ensino religioso: amostra examinada
no mercado editorial brasileiro, das oito editoras listadas na tabela anterior, FTD
(Grupo Marista), Vozes (Franciscanos) e Paulinas (Filhas de S.P.), são
reconhecidamente católicas.101 Quanto às demais não há informações suficientes
que possam atestar a associação com congregações religiosas, o que não quer
dizer que suas coleções de ER sejam “seculares” ou não-religiosas.
Além disso, Ática, FTD, Scipione e Moderna, têm o livro didático como
trabalho significativo em todas as áreas do conhecimento, o que inclui, portanto, o
ER; mas, este não é o caso das editoras Vozes e Paulinas, que não são
tradicionalmente voltadas ao mercado editorial didático. No geral, todas elas têm
“produtos cristãos” em seus catálogos, incluindo a editora Rideel, especialista em
literatura jurídica, mas que também publica os livros do padre carismático Cleodon
Amaral de Lima.
101
Em seu artigo Bittencourt (2014, p. 117) trata do “livro católico”, examinando “os efeitos da
circulação internacional das congregações religiosas na produção editorial no Brasil, buscando
compreender as estratégias e os investimentos do clero e de leigos dedicados à produção de livros,
revistas e jornais católicos”.
102
Possagnolo é pedagoga, licenciada em artes cênicas pelas Faculdades Integradas Teresa D’Avila;
especialista em psicopedagogia pelo Centro Universitário Santo André; professora de ensino
fundamental na rede particular de ensino.
98
Nos títulos destinados às séries iniciais (1º ao 5º ano), o foco recai sobre
a vida de Jesus e a origem do Cristianismo. Nas séries finais (6º ao 9º ano)
trabalha-se com conceitos oriundos da história, sociologia e da “antropologia
religiosa”, mas sem “perder o foco no ensino da doutrina e da liturgia da igreja
Católica”104, nos princípios da ética e da moral cristã, nos ensinamentos e na
doutrina social da Igreja.
103
MODERNA, Entre Amigos, 9º ano, contracapa.
104
Ibidem, p. 2.
105
Ibidem, p. 2.
99
106
“Deus nos ama e não quer o substituamos por falsos deuses”, escrevem Correa e Schneiders
(2007, p. 121), autores de outra coleção, numa nítida referência aos deuses da antiguidade, que
exigiam “sacrifícios de animais” (incluindo humanos), em troca de proteção contra as “desgraças”,
garantia de “pesca, caça e colheitas abundantes”.
107
“Na verdade, o que seria o modelo não confessional não designa uma configuração tão precisa
quanto a primeira [a modalidade de caráter confessional]; daí a multiplicação dos termos para
denominá-lo (...): interconfessional, supra-confessional, não-confessional, ecumênico, inter-
religioso...” (GIUMBELLI, 2011, p. 262).
100
108
MODERNA, Entre amigos, 9º ano, cap. 6 (O cristianismo contemporâneo), Descobrir [seção]:
Diálogo Inter-religioso: Os cristianismos sincréticos, p. 135-137.
109
Cf. <http://www.livrariacultura.com.br/p/de-maos-dadas-ensino-religioso-1-ano-ensino-
fundamental-i-1-ano-42752790>. Acesso em: jun.2016.
110
Avelino A. Correa é professor de Ensino Médio, formado em Filosofia e Teologia. Amélia
Schneiders é professora de Ensino Religioso no Ensino Fundamental e Médio e de Didática e Prática
de Ensino nos cursos de Magistério.
111
CORREA; SCHNEIDERS, De mãos dadas, 5ª série/6º ano, Assessoria pedagógica,
“Apresentação”, p. 3.
112
Ver: <http://www.jornalplaneta.com/produto/L/269012/de-maos-dadas---ensino-religioso---7o-ano---
6a-serie---ensin.fundam.-amelia-schneiders-avelino-guedes.html>. Acessos em: jul.2016.
101
113
Confira: <http://www.aticascipione.com.br/produto/de-maos-dadas-6-ano-777>. Acessos em
jul.2016.
114
Carniato pertence à Congregação das Irmãs Paulinas, é bacharel em filosofia pela Universidade
Estadual do Ceará, bacharel em Teologia pela Faculdade de Teologia Nossa Senhora da Assunção
em São Paulo, mestranda em Dogmática pelo CES (Centro de Estudos Superiores da Companhia de
Jesus de Belo Horizonte) e estudante de Teologia Judaica (Confederação Israelita de Belo
Horizonte). Foi membro do GRERE (Grupo de Reflexão de Ensino Religioso) da CNBB
(Confederação Nacional dos Bispos do Brasil), da equipe de reflexão pastoral do Regional Sul III da
CNBB, do grupo de teólogas do CONIC (Conselho Nacional das Igrejas Cristãs), do conselho editorial
da editora Paulinas, e atualmente trabalha no SAB (Serviço de Animação Bíblica), com assessoria de
conteúdo e metodologia para agentes de pastoral bíblica. Informações disponíveis no site da editora
Paulinas,
<http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:U1kCyq3RCy4J:www.paulinas.org.br/edito
ra/%3Fsystem%3Dautores_ilustradores%26action%3Ddetalhes%26autor%3D105410+&cd=2&hl=pt-
BR&ct=clnk&gl=br>. Acesso em: fev.2016.
115
CARNIATO, Nossa opção religiosa, “Convite a quem ama a educação”, vol. 9, 9º ano, p. 5 e 10.
102
116
Ibidem.
117
Informações divulgadas no folheto de divulgação da coleção distribuído nas filiais da livraria
Paulinas.
118
Ibidem.
103
119
Do latim substratu, “o que está estendido no chão, o que é essencial, o que serve de suporte ou de
fundamento para alguma coisa” (GILZ, 2009, p. 100).
120
POZZER, Redescobrindo o universo religioso, vol. 8 Unidade 1 (Cultura e religiosidade), p. 13.
121
Explicar ou contextualizar o título da coleção é um recurso pertinente, porém ausente em Todos os
jeitos de crer, Novo fé na vida, De mãos dadas etc. Grosso modo, esta informação tem que ser
depreendida pelo leitor a partir da associação entre aportes visuais (capas e ilustrações), conteúdo e
objetivos pretendidos.
104
122
Pozzer é mestre e doutorando em Educação pela UFSC. Bacharel em Ciências Religiosas pela
PUC-PR (2002). Graduação em Ciências da Religião - Licenciatura em Ensino Religioso pela FURB
(2010). Especialização em Formação de Professores para o Ensino Religioso (2006). É membro dos
grupos de Pesquisa Ethos, Alteridade e Desenvolvimento (GPEAD/FURB) e Hermenêuticas da
Cultura, Mundo e Educação (UFSC). Coordenador da Comissão de Currículo do Fórum Nacional
Permanente do Ensino Religioso (FONAPER, 2014-2016). Assistente Técnico-Pedagógico da
Secretaria de Estado da Educação de Santa Catarina (SED/SC) e Professor no Centro Universitário
Municipal São José (USJ). É um dos membros da “Equipe de Assessores e Especialistas”
responsáveis pelo ER incluído na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que está em tramitação
junto ao MEC (Ministério da Educação). Informações disponíveis
em:<http://lattes.cnpq.br/9395941287057357>. Acesso em: mai.2016.
123
POZZER, Redescobrindo o universo religioso, vol. 8 Unidade 1 (Cultura e religiosidade), p. 14.
124
Dora Incontri é jornalista, especialista em “educação espírita”, doutora e possui pós-doutorado em
Educação pela Universidade de São Paulo (USP), com a pesquisa Ética, filosofia, religião e artes, um
projeto interdisciplinar em escola pública. Alessandro Cesar Bigheto é pedagogo, mestre em História
e Filosofia da Educação pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e membro do
Histedbr/UNICAMP – Grupo de Estudos e Pesquisas “História, Sociedade e Educação no Brasil”.
125
INCONTRI; BIGHETO, Todos os jeitos de crer, vol. 1 (Vidas), Manual do Professor, p. 3.
105
126
Idem, Todos os jeitos de crer, vol. 3 (Tradições), cap. 1 (Onde mora a divindade?), p. 18.
127
Idem, Todos os jeitos de crer, vol. 1 (Vidas), Apresentação, p. 3.
106
128
Idem, Todos os jeitos de crer, vol. 3 (Tradições), cap. 3 (A força negra), p. 37.
107
129
INCONTRI; BIGHETO, Todos os jeitos de crer, vol. 4 (Ideias), p. 24-25; 107; 210.
130
Não foram localizadas informações sobre a autora Margarida Regina de Almeida. José Donizetti
dos Santos, que assina sua página pessoal como “Professor Doni”, atua no ensino fundamental e
médio lecionando “Filosofia, Educação para a Vida e Sociologia”. Possui “formação internacional
avançada em hipnose ericksoniana” e especialização em “Neurociências e Psicanálise Aplicadas à
Educação”, pelo Centro Universitário São Camilo. Mais informações disponíveis em:
<http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:7qONLE08VgUJ:www.profdoni.pro.br/hom
e/index.php/a-travessia/perfil+&cd=20&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br&client=firefox-b-ab>. Acesso em:
mai.2016.
131
ALMEIDA; SANTOS, Novo fé na vida, “Apresentação”, vol. 4, p. 5.
132
Ibidem, p. 5.
133
Ibidem, p. 5.
134
Ibidem, p. 6.
108
ou relacionadas ao sentido da vida (“Quem sou eu?”, “De onde vim?”, “Para onde
vou?”, “Que faço aqui?”). Que ele também possa compreender o papel das diversas
religiões em seus respectivos contextos socioculturais; que possa “interpretar
construtivamente” as afirmações destas “tradições religiosas” e seja “esclarecido
sobre o direito à diferença e sobre a importância da valorização do outro para uma
sociedade baseada em valores como liberdade e justiça”.135
Segundo a orientação teórica de Rodrigues (2003), estes pontos
“constituem verdadeiro programa de ensino”, dirigido ao cultivo da paz, liberdade,
respeito mútuo, e pode ser desenvolvido entre estudantes de qualquer crença
religiosa ou mesmo não crentes.136 Tal programa reitera os cinco eixos temáticos do
Fonaper em torno dos quais também se apoiam os autores de Novo fé na vida
(culturas e tradições religiosas; escrituras sagradas e/ou tradições orais; teologias;
ritos; ética).
Dessa coleção de nove exemplares foram separados o quarto e o quinto
volumes do Ensino Fundamental I. No quarto o conteúdo é composto pelo “16º
Encontro: Sobre a religiosidade” e “17º Encontro: Sobre a comunicação com o
sagrado”. O quinto reúne o “11º Encontro: A busca do sentido da vida” e o “13º
Encontro: Liberdade religiosa: um direito de todos”.
135
Ibidem, p. 6.
136
Ibidem, p. 6.
137
Steel é bacharel em letras, com licenciatura em língua portuguesa e inglesa pela Universidade
Paulista (UNIP), revisor e produtor de textos didáticos na editora amazonense Novo Tempo.
109
para designar uma vivência individual” (GIUMBELLI, 2010, p. 63). Pode-se dizer
que esta expressão sinaliza a aproximação de pessoas que partilham crenças
comuns, isto é, que se alimentam de uma cultura religiosa.
138
STEEL, Cultura religiosa, Introdução, p. 5.
139
Ibidem, Módulo 1 (O conhecimento individual para mais consciência na vida comunitária),
“Autoconsciência”, p.12.
140
Ibidem, p. 12.
141
Ibidem, “Pluralismo religioso”, p. 20.
110
Figura 2
Ilustração da capa do livro Cultura religiosa (Edson Steel, Global)
142
Ver Indicação CEE-SP, nº 07/2001, disponível em:
<http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:DQEujf0zWloJ:www.regiaolapa.org.br/edu
cacao/index.php%3Foption%3Dcom_phocadownload%26view%3Dcategory%26download%3D17:cart
ilha-do-educador%26id%3D2:apostila-de-ensino-religioso%26Itemid%3D12+&cd=3&hl=pt-
BR&ct=clnk&gl=br#12>. Acesso em abr.2016.
143
Não foram localizadas informações sobre a qualificação acadêmica ou inserção profissional de
Ana Vasconcelos. Raramente esses dados são publicados nos livros didáticos.
112
***
da editora Paulinas.
144
INCONTRI; BIGHETO, Todos os jeitos de crer, vol. 1 (Vidas), “Por dentro do seu livro", p. 4.
114
145
Dom Odilo Scherer. Estado laico e Ensino Religioso. O Estado de S. Paulo,9 de maio de 2009, p.
A2. Citado em: MODERNA, Entre amigos, vol. 9, Suplemento para o professor, p. 5.
146
Correspondência digital por e-mail de Felipe F. Furtado recebido em 18.02.2013. Outras editoras
apresentadas no quadro 2 também foram contatadas mas não retornaram com as repostas
solicitadas.
147
Correspondência digital por e-mail de Celmo Carlesso (Supervisor de Divulgação) recebido em
18.02.2013.
115
[...] esta coleção [de ER] existe desde a década de 1990 e já passou
por três revisões e ampliações, conforme foram ocorrendo avanços
nas Diretrizes Curriculares da Educação e também no Ensino
Religioso. A última versão é a de 2010, que inclui o Ensino
Fundamental de 9 anos, a nova ortografia e as leis sobre a inclusão
da música e da cultura afro-brasileira e indígena na escola. Esta
coleção, em seus quase 20 anos de existência foi adotada parcial
ou totalmente por diversas secretarias municipais148, como
também a Diálogo - Revista de Ensino Religioso, mas infelizmente,
com as trocas de partidos nos governos, os cortes de verbas e a
mudança de pessoas referências nas equipes técnicas das
secretarias, as adoções não são permanentes. Existe também o
grande problema da multiplicação indevida do material no âmbito das
próprias secretarias. Os livros são adotados com mais frequência e
estabilidade por colégios particulares.149 (grifos meus)
Não há garantia formal de que tal compra seja efetuada diretamente pelos
órgãos estaduais ou municipais de educação. Faltam dados que possam comprová-
la. O único registro desta tentativa de compra ocorreu no Estado do Rio de Janeiro,
aponta Junqueira (2010): trata-se de uma coleção produzida pela Arquidiocese do
Rio de Janeiro/Vozes, de caráter explicitamente confessional, seguindo o modelo de
ER “separado por credos” vigente nas escolas públicas fluminenses.150
148
O setor de divulgação da Paulinas não retornou e-mail sobre quais secretarias adquiriram, no
passado, as coleções de ER (grifos meus).
149
Correspondências digitais por e-mails: 18.01.2013; 21.01.2013.
150
Ver comentários de Sérgio Junqueira em: Editorial do GPER, Grupo de Pesquisa Educação e
Religião, de 4 de julho de 2010. Disponível em: <http://www.fonaper.com.br/noticia.php?id=966>.
Acessos: abril; maio; junho/2016.
116
defini-los como tais? Mas com quantos, ou quais, elementos se produz uma religião?
Quem decide sobre isso?151
Propor essas questões em pleno século XXI talvez pareça absurdo para
muitos que, no calor da hora, não hesitariam em propor alguma resposta a respeito
deste que é considerado um dos principais fenômenos da humanidade. Se,
conforme Geertz (2001, p. 151), existem “coisas demais a que se quer dar o nome
de ‘religiosas’”, alguns talvez arriscassem dizer que a religião é um fenômeno
“natural”, estranho ao devir, cujos significados (ou pressupostos) a ele atribuídos
seriam isentos da revisão ou submissão crítica. Outros poderiam concebê-la como
sinônimo de crença ou fé em alguma divindade distante e onipresente ou talvez
mencionassem a adesão às atividades cerimoniais, rituais e a frequência aos cultos
e reuniões de uma congregação religiosa qualquer (POMPA, 2008; ALMEIDA,
2010).
151
Os manuais de introdução aos estudos das religiões geralmente se detêm em cinco elementos
supostamente universais: origem histórica das religiões, doutrina, culto, ética, livro sagrado (se
houver). Este roteiro também se repete nos livros didáticos de ER.
117
152
Dentre os aspectos relacionados ao cristianismo está a “crença em um ser supremo, que (...)
ordena um comportamento moral na terra, prometendo uma vida após a morte” (GIDDENS, 2005, p.
427). Sobre o fideísmo cristão, que pautou a cultura ocidental, recomenda-se o texto de Pompa
(2008, p. 153), onde o conceito de religião é submetido “à mesma revisão crítica sofrida pelo conceito
de cultura”.
119
canções, a ingestão de certos de alimentos etc.) que podem sofrer variações e exigir
a celebração coletiva ou a experiência isolada e solitária.
Daí o retorno à hipótese posta inicialmente: parece pouco provável que tanto
as crises do conceito de religião, quanto a sua revisão crítica alcancem as coleções
de livros didáticos de ER. A visão essencialista em torno desse conceito pode se
intensificar segundo o perfil dos autores (formação universitária, militância e
participação em entidades civis ou religiosas vinculadas à implementação do ER) e a
intencionalidade das coleções (e das editoras, é claro!).
153
Por exemplo, o budismo, que já foi citado por Durkheim, embora não negue a “existência de seres
divinos”, é ateu, pois não está interessado no problema de saber se existem ou não existem deuses
(AUGÉ, 1994, p. 180).
154
Um “dos marcos da vida tradicional [africana] é a extensão em que as crenças, atividades, hábitos
mentais e comportamentos em geral são perpassados pelo que os europeus e norte-americanos
chamariam de “religião”’ (APPIAH, 1997, p. 156; grifado no original).
121
155
POZZER, Redescobrindo o universo religioso, vol. 8, Unidade 3 (O jovem e a religiosidade), cap. 1
(O jovem e as expressões religiosas), p. 36.
156
CORREA; SCHENEIDERS, De mãos dadas, 5ª série/6º ano do ensino fundamental, cap. 8
(Religiosidade), p. 63
122
157
Malba Tahan citado em CORREA; SCHENEIDERS, De mãos dadas, 5ª série/6º ano do ensino
fundamental, cap. 8 (Religiosidade), p. 63.
158
VASCONCELOS, Manual compacto de ensino religioso, cap. 2 (O sagrado na vida humana), p.
29.
159
Ibidem, p. 29.
160
Ibidem, p. 28.
161
Ibidem, p. 29.
162
MODERNA, Entre amigos, 9º ano, Unidade 1 (Religião e sociedade), cap. 1 (Sistemas de crença:
fé e ateísmo), p. 33.
123
163
Ibidem, cap. 2 (Religião e sociedade), p. 57.
164
Ibidem, cap. 1 (Sistemas de crença: fé e ateísmo), p. 10.
165
POZZER, Redescobrindo o universo religioso, vol. 9, cap. 2 (Religião: como surgiu, o que é e para
quê?), p. 20; destaques em letras maiúsculas no original.
166
Ibidem, p. 20.
124
[...] maneira como o ser humano lida com essas potências nas
diferentes Tradições Religiosas, por meio dos seus ritos e cultos,
pode se tornar positiva e benéfica, ou também prejudicial, à medida
que leva pessoas ao fundamentalismo, gerando atitudes
discriminatórias e preconceituosas em relação ao Outro.167
167
Ibidem, p. 20.
168
CARNIATO, Diversidade religiosa no mundo atual, Unidade 2 (O caminho da montanha), 8º ano,
p. 23.
169
MODERNA, Entre amigos, 9º ano, Unidade 1 (Religião e sociedade), cap. 1 (Sistemas de crença:
fé e aeísmo), p. 11.
170
VASCONCELOS, Manual compacto de ensino religioso, cap. 2 (O sagrado na vida humana), p.
29. Cito Durkheim (2003, p. 32), que definiu a religião como “um sistema solidário de crenças e de
práticas relacionadas com coisas sagradas, isto é, separadas e interditas, as quais unem numa única
comunidade moral, chamada Igreja, todos aqueles que a elas aderem” (itálicos meus).
125
171
MODERNA, Entre amigos, 9º ano, Unidade 1 (Religião e sociedade), cap. 1 (Sistemas de crença:
fé e ateísmo), p. 33.
172
Ibidem, p. 34
173
Ibidem, p. 10.
174
VASCONCELOS, Manual compacto de ensino religioso, cap. 2 (O sagrado na vida humana), p.
30.
175
“Fé não é apenas confiar, mas confiar e acreditar com afeição, com amor naquilo que acredita,
confia e aposta” (ALMEIDA; SANTOS, 2010, vol. 4, p. 120).
126
176
MODERNA, Entre amigos, 9º ano, Unidade 2 (As religiões do passado e presente), cap. 3. (A
religião na Antiguidade), p. 59.
177
INCONTRI; BIGHETO, Todos os jeitos de crer, vol. 3 (Tradições), cap. 1 (Onde mora a
divindade?), p. 10.
178
MODERNA, Entre amigos, 9º ano, Unidade 2 (As religiões do passado e presente), cap. 3. (A
religião na Antiguidade), p. 56; destaques em negrito no original.
179
ALMEIDA; SANTOS, Novo fé na vida, vol. 4, 16º Encontro (Sobre a religiosidade), p. 120.
180
STEEL, Cultura Religiosa, Módulo 1 (O conhecimento individual para mais consciência na vida
comunitária), “Religare”, p. 26.
181
Ibidem, p. 26.
127
182
MODERNA, Entre amigos, 9º ano, Unidade 2 (As religiões do passado e presente), cap. 3. (A
religião na Antiguidade), p. 59.
183
INCONTRI; BIGHETO, Todos os Jeitos de crer, vol. 1 (Vidas), cap. 1 (Cada um com a sua crença),
p. 12.
184
Idem, Todos os Jeitos de crer, vol. 3 (Tradições), cap. 1 (Onde mora a divindade), p. 10.
128
185
Ainda nos termos de Steel, a “religião é a “ponte” entre o sobrenatural e as pessoas, ou a “ligação”
entre o ser humano e o Ser supremo, do qual imaginamos depender e ao qual reverenciamos de
acordo com o nosso entendimento” (STEEL, Cultura Religiosa, Módulo 1 (O conhecimento individual
para mais consciência na vida comunitária), “Autoconsciência”, p. 25).
186
INCONTRI; BIGHETO, Todos os jeitos de crer, vol. 4 (Ideias), cap. 1 (Onde está a verdade?), p.
10.
187
Para uma abordagem crítica do inatismo religioso em Jung, por exemplo, ver Dalgalarrondo
(2008).
188
“(...) o vazio, um “buraco”, manifesta-se no coração pela ausência de uma coisa bem mais simples
que qualquer um pode dar: afeto!” (STEEL, Cultura Religiosa, Módulo 1 (O conhecimento individual
para mais consciência na vida comunitária), “Autoconsciência”, p. 13).
189
Cultura Religiosa, Módulo 1 (O conhecimento individual para mais consciência na vida
comunitária), “Autoconsciência”, p. 26.
129
190
MODERNA, Entre amigos, 9º ano, Unidade 1 (Religião e sociedade), cap. 1 (Sistemas de crença:
fé e ateísmo), p. 35. Cito trecho literal: “Segundo pesquisadores da Universidade Estadual de
Campinas (Unicamp-SP): “[...] estudos realizados em diferentes contextos socioculturais demonstram
que em populações de estudantes adolescentes e jovens verifica-se a associação entre não ter
religião [...], ter pouca crença religiosa, não frequentar igreja e cultos e maior uso de álcool e drogas”’
(MODERNA, 9º ano, 2009, p. 35).
191
Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais.
192
Desde as primeiras publicações da coleção da Paulinas passaram-se mais de dez anos. Apesar
das alterações nas edições mais recentes, o conteúdo severamente criticado por Albuquerque, em
2004, permanece quase inalterado. As edições da mesma editora incluídas na amostra deste capítulo
são mais recentes e foram publicadas em 2010.
130
CAPÍTULO 4
193
Convenção Nacional das Assembléias de Deus no Brasil (ARANHA; MENDONÇA, 2008, p. 114).
132
194
A procedência etimológica pode ser o termo banto makuba – “reza” ou “invocação” – encontrado
nas línguas Kikongo e Kimbundo (CASTRO, 2005).
195
A origem da palavra umbanda vem da raiz banto mbanda, “tabu”, “coisa sagrada”, “súplica” ou
“invocar os espíritos” (CASTRO, 2005, p. 347).
133
Heitor dos Prazeres era frequentador das macumbas de Tia Ciata, João
Alabá, João Abedé e outros “tios” e “tias” baianas que migraram de Salvador/BA
para a antiga capital federal. No precioso e colorido encarte (uma pintura do próprio
Heitor dos Prazeres), que vai do didático ao artístico, a palavra macumba nomeia
196
Macumba. Heitor dos Prazeres e sua gente (Long Play). Rádio Serviços e Propaganda Ltda. Rio
de Janeiro-RJ, 1955. A aproximação entre santos e orixás foi originalmente destacada, no encarte,
em letras maiúsculas.
197
Quatro dias após a primeira declaração, em 20 de maio de 2014, o juiz reconheceu publicamente,
diante do “forte apoio dado pela mídia e pela sociedade civil”, que os cultos afros eram, ou melhor,
são religiões. Reportagem completa, incluindo íntegra do texto no qual o “juiz volta atrás” em:
<http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2014/05/juiz-federal-volta-atras-e-afirma-que-cultos-afro-
brasileiros-sao-religioes.html>. Cobertura parcial realizada pela imprensa paulista (Folha de S. Paulo
e O Estado de S. Paulo), que menciona a participação de fiéis e pastores evangélicos, mas não
informa aos leitores que os vídeos foram postados no site Youtube pela IURD – “bispo Macedo
135
decisão, ele afirmou que “macumba, umbanda, candomblé ou quimbanda” não eram
religiões. A contradição perceptível nesta decisão – que passou despercebida pela
imprensa, comentaristas e pareceristas que surgiram de todos os cantos – é que ao
se referir aos “cultos afro-brasileiros”, o juiz empregou a expressão “manifestações
religiosas centenárias” (itálico meu), para negar-lhes, em seguida, o qualificativo
“religiosas” anteriormente atribuído.
entrevista ex-pai-de-santo que o desafiou”. Vale destacar que o mesmo juiz também classificou a
Igreja Universal como não-religião. Ver <http://www1.folha.uol.com.br/poder/2014/05/1455758-
umbanda-e-candomble-nao-sao-religioes-diz-juiz-federal.shtml>. Acessos em: abr./mai.2016.
136
198
Quer cultuem um único Deus (monoteísmo), quer celebrem inúmeros deuses (politeísmo), as
instituições religiosas necessitam de especialistas preparados para lidar com a(s) força(s) divina(s).
No candomblé, assim como em outras denominações próximas, não é diferente. Suas relações de
poder são hierarquicamente ordenadas mediante laços de parentesco ritual (famílias-de-santo)
expressos em termos africanos: abiã, primeiro degrau, pessoa não-iniciada, aspirante, que participa
de algumas cerimônias, sobretudo públicas; iaô, filha ou filho-de-santo iniciada(o); ebomin, adepta(o)
que cumpriu suas obrigações de sete anos de iniciada(o); babalorixá e ialorixá, pai e mãe-de-santo,
os postos mais elevados na hierarquia sacerdotal dos terreiros. Há, ainda, os postos auxiliares
ocupados pelas equedes (mulheres que cuidam dos orixás manifestados e de seus objetos rituais) e
pelos ogãs (homens responsáveis pelos cânticos, toques de atabaques e outras atividades
masculinas) (SANTOS, 2012).
199
A civilização nagô, ou ioruba, é composta por vários subgrupos étnico-culturais – oyó, ijexá, ketu,
entre outros. Sobre a etnogênese Ioruba, recomenda-se a leitura de Matory (1998).
137
201
Fonte: INCONTRI; BIGHETO, Todos os jeitos de crer, vol. 4 (Ideias), p.107.
Obatalá foi o primeiro ser criado por Olorum– o dono do Orum, espaço
infinito202 –, de quem recebeu a missão de criar a Terra. Entretanto, ao se descuidar
das oferendas de Exu – senhor do movimento –, Obatalá é acometido por uma sede
inumana, embriaga-se de vinho de palma e cai num sono profundo. Oduduwa, outro
lendário ancestral dos Ioruba, rapidamente recolheu o saco que continha a terra
primordial e lançou-a sobre o mundo inacabado. Plantou uma palmeira de igiopé –
dendezeiro – e uma galinha d’angola ciscou e espalhou a terra. Esta Terra recém-
criada mais tarde seria batizada de Ilê-Ifé, centro difusor da cultura iorubana. A
iniciativa de finalizar a criação do mundo gerou uma discórdia entre Obatalá e
Oduduwa. Com isto, Olorum conferiu ao primeiro (Obatalá dirigiu-se ao ser supremo
200
INCONTRI; BIGHETO, Todos os jeitos de crer, vol. 4 (Ideias), cap. 8 (O paraíso onde fica?), p.
107.
201
No centro da ilustração (cortejo) encontra-se Oxalufã acompanhado por: 1) Ogum (deus guerreiro
de espada na mão), em seguida, 2) Obaluaiê (de capuz de palha, orixá da cura), atrás dele, no canto,
3) Ossaim, o deus das folhas rituais e medicinais; ao seu lado, 4) Oxum, a deusa do amarelo, do ouro
e da beleza; 5) outro Obaluaiê (de capuz de palha) e, a sua frente, 6) Xangô, orixá da justiça, que
carrega um machado duplo (a justiça, enquanto princípio, tem, no mínimo dois lados).
202
“Devemos pensar que o Orum, o lugar de Olodumaré e de onde partiram Odudua e Obatalá, é lido
não como céu, mas como o outro lado, o longínquo” (ARNAUT; LOPES, 2005, p. 32; itálicos meus).
138
E quanto ao que foi exposto acima, o que diriam os autores dos manuais
voltados ao ensino das religiões? Como definem ou classificam as religiões de
matrizes africanas no Brasil? Seriam elas politeístas ou monoteístas? Seitas,
crenças ou tradições culturais?
Entretanto, são poucas edições que tratam, com mais profundidade, das
religiões afro-brasileiras em comparação com outras formas de religiosidade
coexistentes no país. Após observar a amostragem reunida, considerando sua
totalidade e abrangência, percebe-se, por contraste, o espaço diminuto destinado
para as religiões afros, muitas vezes centrado no sincretismo religioso afro-brasileiro,
sem propor outros desdobramentos. Como sinalizado anteriormente, sem
desconsiderar que as “tradições” afro-religiosas compartilham características
203
CARNIATO, Nossa opção religiosa, 9º ano (professor), “Convite a quem ama a educação”, p. 5.
139
204
POZZER, Redescobrindo o universo religioso, vol. 8, Unidade 4 (O jovem: diferenças e
discernimento), cap. 2 (Discernimento e Tradições Religiosas), p. 54.
205
INCONTRI; BIGHETO, Jeitos de crer, 3º ano, cap. 4 (Os orixás que protegem a vida), p. 42-43.
206
Idem, Jeitos de crer, 4º ano, cap. 4 (Deuses na Bahia-de-Todos-os-Santos), p. 58.
140
207
ZUBIRI, Xavier. El problema filosófico de la historia de las religiones, Madrid: Alianza, 1993, in
MODERNA, Entre amigos, 9º ano, 2009, p. 58.
208
O conceito de nação, outrora político e associado às origens geográficas, étnicas e culturais das
religiões de matriz africanas, transformou-se numa categoria teológica e classificadora do padrão
ritual que distingue as variações de candomblé (“nações”) existentes no Brasil, cujas crenças, práticas
e liturgias subdividem-se em angola (banto), jeje (ewe-fon) ou queto (nagô-ioruba). Para Raul Lody
(1994, p. 2), as nações de candomblé “caracterizam cada terreiro como uma África em miniatura”. No
entanto, os candomblés não são sistemas religiosos fechados em si mesmos, do tipo exclusivista,
pois os processos de mudança fizeram surgir, em diversas regiões do país, terreiros que podem ser
identificados, simultaneamente, como queto-angola-caboclo (PARÉS, 2006). Para revisão do conceito
141
ilê axé, etc.) onde são realizadas as cerimônias públicas. Entre os candomblés mais
antigos, estão aqueles que foram fundados na Bahia (Engenho Velho da Federação,
Alaqueto, Bogum, Gantois, de Mãe Menininha, Axé Opô Afonjá, Bate Folha etc.) e
noutros Estados do Brasil onde as religiões afro-brasileiras são reconhecidas como
patrimônio histórico-cultural.
de “nação”, ver Vivaldo da Costa Lima (1976) em texto que completou 40 anos, mas sua relevância
não se apagou com o passar dos anos e avanços dos estudos afro-brasileiros.
209
A grafia “escravos africanos” empregada por Steel (2010, p. 144) e demais autores de livros
didáticos de ER, incorre num erro primário em relação à empresa escravista. Os africanos eram
capturados em suas terras, transformados primeiramente em cativos pelos traficantes (que contavam
com a ajuda e interesse comercial das realezas africanas ou chefias locais) e posteriormente
vendidos como escravos para a realização de trabalho compulsório no “Novo Mundo”. Portanto, o
correto seria o inverso, africanos escravizados. Ressalva semelhante vale para as populações
indígenas também escravizadas em territórios do Brasil – indígenas escravizados, e não índios
escravos (ALMEIDA, 1987).
142
Além desses, existem ao menos dois aspectos não abordados por Steel e
pelos demais autores, exceto Pozzer, que assina os exemplares da editora Vozes.
Um destes aspectos refere-se ao processo iniciático (feitura do santo) nas
comunidades-terreiro, que estabelece o vínculo e o pertencimento religioso. Esta
iniciação implica em um estágio de recolhimento por um período de dias, durante o
qual o neófito vivencia uma série de rituais. O segundo, decerto o aspecto mais
controverso de todos, diz respeito à ausência do orixá Exu no material examinado –
a exceção fica por conta da coleção Jeitos de crer (Ática) –, mas trata-se uma
ilustração (desenho), sem informações adicionais.
210
Steel escreve “Omolum”, mas o termo êmico é Omolu, orixá também conhecido como Obaluaiê –
do ioruba obá, rei, e ayê, terra, “o rei ou o dono da terra” –, associado à varíola, à cura desta e de
outros males, não só os do corpo, mas também os espirituais.
211
STEEL, Cultura religiosa, Módulo 2 (Autoconhecimento: necessidade fundamental para a
compreensão da existência), “Candomblé”, p. 144 – todas as citações sublinhadas entre aspas foram
extraídas desta mesma página referenciada.
143
212
Ibidem, p. 144.
144
213
STEEL, Cultura religiosa, Módulo 2 (Autoconhecimento: necessidade fundamental para a
compreensão da existência). “Umbanda”, p. 145; itálicos meus.
145
214
Ibidem, p. 145. O autor emprega o “j” e não com “g” – pombagira –, forma também encontrada na
literatura acadêmica e doutrinária. A escrita com “j” remete erroneamente, segundo discurso religioso,
ao inquice (nkisi, equivalente a orixá no candomblé angola) Pambu Njila ou Nzila, cujo arquétipo se
aproxima do orixá Exu, sendo igualmente associado aos caminhos, fronteiras, encruzilhadas e à
mediação entre humanos e inquices.
215
INCONTRI; BIGHETO, Jeitos de crer, 3º ano, cap. 4 (Os orixás que protegem a vida), p. 42.
146
216
Citação extraída do opúsculo Macumba, publicado pela Confederação Nacional dos Bispos do
Brasil (CNBB), com intuito de “encarar com discernimento a situação criada pelo sincretismo
religioso”, de modo a “encontrar pistas para um equilibrado aproveitamento de elementos da
religiosidade popular em nossa vivencia eclesial” (ISNARD, 1976, p. 5).
217
INCONTRI; BIGHETO, Todos os jeitos de crer, vol. 3 (Tradições), cap. 3 (A força negra), p. 40.
218
Ibidem, p. 40.
219
VASCONCELOS, Manual compacto de ensino religioso, cap. 2 (O sagrado na vida humana), p.
30; grifado em negrito no original.
220
Ibidem, p. 30.
221
Ibidem, p. 30.
147
222
Ibidem, p. 30.
148
Para além dos exemplos descritos, é importante observar que o uso mais
alargado da noção de sincretismo tem sido empregado para descrever e explicar as
práticas de outras denominações religiosas. Isto pode ser observado na vertente
carismática e no catolicismo popular e devocional – uma “leitura subalterna” do
catolicismo romano, diriam Brumana e Martínez (1991). A mesma observação pode
ser estendida para o novo pentecostalismo, Santo Daime ou as religiões japonesas
no Brasil (NOVAES, 2001).
A Igreja Universal do Reino de Deus (IURD), por exemplo, incorporou em
seus cultos, elementos rituais e uma legião de espíritos ou entidades supostamente
223
MODERNA, Entre amigos, 9º ano, cap. 6 (O cristianismo contemporâneo), Descobrir [seção]:
Diálogo Inter-religioso: Os cristianismos sincréticos, p. 135.
224
Ibidem, p. 135. Há um erro de localização geográfica no trecho destacado. Os povos de origem
Ioruba não estão localizados na África Central, e sim na África Ocidental. Durante o tráfico negreiro,
eles provinham da antiga Costa dos Escravos, área correspondente aos litorais do Togo, Benin e
Nigéria.
149
“malignas” oriundas dos cultos afros. Almeida chamou este processo de inversão
simbólica, baseado numa chave estritamente negativa, de “sincretismo às avessas”
(2009, p, 123). A “síntese elaborada [pela IURD] buscou no polo negativo da
religiosidade cristã – o diabo – o elemento equivalente às entidades” – leia-se os
seres supostamente malignos da umbanda e do seu reverso, a quimbanda
(ALMEIDA, 2009, p. 123).
Observamos, assim, o emprego da ideia de equivalência, uma expressão-
chave para a compreensão do sincretismo, mas que pode “disfarçar-se com
sinônimos mais elegantes”, mais ou menos “conflituais”, como “pastiche, patchwork,
marronização, híbrido, mélange, mulatismo, aculturação: todos ligados ao jogo, por
excelência ambíguo, da chamada contaminação” (CANEVACCI, 1996, p. 13; itálicos
no original). Em consonância com as suas dinâmicas, variações e diversas
configurações, o “trabalho sincrético” também pode se realizar enquanto
“bricolagem, reinterpretação, ressemantização, “misturas”, transferências de
matrizes a matrizes, deslizamentos e novas construções” (SANCHIS, 2001, p. 47).
225
Ibidem, p. 135.
226
Dentre os “elementos mínimos” constituintes da religiosidade popular brasileira, segundo Lísias
Nogueira Negrão, citado em artigo no qual Pierre Sanchis discute os “percursos do sincretismo no
Brasil”, estão a “crença em Deus e nos espíritos, a manipulação destes últimos e das demais figuras
sagradas intermediárias entre Aquele e os homens, dentro de um contexto moral cristão (...)”
(SANCHIS, 2001, p. 19).
227
Além da romaria dos neófitos às Igrejas, da identificação entre santos e orixás, há outros aspectos
do sincretismo afro-religioso: o modo de festejar os santos católicos sincretizados; a superposição
dos calendários religiosos; a ressignificação dos dias da semana (sexta-feira é dia do Senhor do
Bonfim e de Oxalá também); a lavagem das escadarias de Igrejas e de outros espaços públicos; as
missas rezadas em memória dos mortos etc. (CONSORTE, 2004).
150
228
MODERNA, Entre amigos, cap. 6 (O cristianismo contemporâneo), Descobrir [seção]: Diálogo
Inter-religioso: Os cristianismos sincréticos, 9º ano: ensino fundamental, p. 135.
229
Ibidem, p. 135.
230
Ibidem, p. 135.
231
Ibidem, p. 135.
151
Figura 7 – Ogum
Escultura de Tati Moreno (Dique do Tororó, Salvador/BA)
232
MODERNA, Entre amigos, cap. 6 (O cristianismo contemporâneo), Descobrir [seção]: Diálogo
Inter-religioso: Os cristianismos sincréticos, 9º ano: ensino fundamental, p. 137.
233
INCONTRI; BIGHETO, Todos os jeitos de crer, vol. 3 (Tradições), cap. 3 (A força negra), p. 39.
234
MODERNA, Entre amigos, cap. 6 (O cristianismo contemporâneo), Descobrir [seção]: Diálogo
Inter-religioso: Os cristianismos sincréticos, 9º ano: ensino fundamental, p. 135.
235
INCONTRI; BIGHETO, Todos os jeitos de crer, vol. 3 (Tradições), cap. 3 (A força negra), p. 40.
153
236
Ibidem, p. 40.
237
Ibidem, p. 41.
238
Para Diniz e Lionço (2010a, p. 83), a função dos índios nos livros de ER é meramente retórica,
uma vez que representam, assim como os povos e culturas africanas, o elemento não-cristão da
matriz religiosa brasileira. Os indígenas do Brasil, escreve um dos autores da coleção Redescobrindo
o universo religioso, “são animistas, ou seja, tudo tem alma, Deus está em tudo, nas árvores, nas
pedras...” (PEREIRA, 2012, p. 36).
239
INCONTRI; BIGHETO, Jeitos de Crer, 5º Ano (Mudando o mundo), cap. 3 (Os povos precisam se
unir), p. 41.
154
240
Idem, 1º ano (Sendo gente), contracapa.
241
Idem, Apresentação, p. 3.
155
diz ter “uma vida boa”, que adora “música e dança”, ouve música num fone de
ouvido; Susi, a oriental, abraça um coração e, num ato de devaneio, vê-se adulta,
casada e carregando um bebê nos braços; Mirela (branca) tem um livro aberto sobre
as mãos; Davi (branco) está diante de um computador, visto que “adoro aprender,
saber de tudo, pesquisar e matar a curiosidade”; Muhamed estuda numa
escrivaninha, ama “poesia” e “as palavras bonitas e rimadas”.242
242
Idem, cap. 1 (Viver é muito bom!), p. 10-11.
243
Idem, 3º ano (Vivendo a vida), cap. 4 (Os orixás que protegem a vida), p. 37.
244
DALDEGAN, Redescobrindo o universo religioso, vol. 1, cap. 1 (Um mundo tão diferente), p. 11.
156
Outro aspecto relevante de certo modo atrelado ao que foi dito tem a ver
com outro fenômeno muitas vezes colado ao sincretismo: o trânsito inter-religioso de
sujeitos que deambulam pelo campo religioso, desenvolvem um interesse por
práticas religiosas diversas, mas não se alienam em relação a nenhuma delas.
Sobre isto, num dos volumes de Jeitos de crer, é possível ler que “uma pessoa
[pode] ser católica, mas também frequentar um centro espírita; outra vai a um culto
evangélico, mas se interessa pelo estudo do budismo, e assim por diante”.245
245
INCONTRI; BIGHETO, Jeitos de crer, vol. 4 (Buscando Deus), cap. 4 (Deuses da Bahia-de-Todos-
os-Santos), p. 48.
246
VASCONCELOS, Manual compacto de ensino religioso, cap. 3 (Religiões universais), “Budismo”,
p. 56.
157
247
POZZER, Redescobrindo o universo religioso, vol. 9, Unidade 4 (Após a morte a vida continua?),
cap. 1 (Niilismo, ancestralidade indígena e africana), p. 52; itálicos no original.
248
Idem, Redescobrindo o universo religioso, vol. 8, Unidade 4 (O jovem: diferenças e discernimento),
cap. 2 (Discernimento e Tradições Religiosas), p. 54.
249
DALDEGAN, Redescobrindo o universo religioso, vol. 1, Unidade 2 (Aprendendo grades lições),
cap. 2 (Encontro com o sagrado), p. 28.
158
250
PEREIRA, Redescobrindo o universo religioso, vol. 4, Unidade 1 (Sou religioso?), cap. 1 (A
iniciação na comunidade religiosa), p. 15.
251
POZZER, Redescobrindo o universo religioso, vol. 6, Unidade 4 (Textos sagrados na formação
religiosa das comunidades), cap. 2 (Práticas religiosas), p. 48.
159
corpo do consulente, cuja finalidade pode ser tanto a “movimentação das energias
do universo onde a pessoa se dirige ao espírito”, quanto um ritual de limpeza ou
purificação.252
252
Ibidem, p. 48.
160
Se admitido que num livro didático a imagem não pode ser meramente
decorativa, mas que deve encerrar funções cognitivas, incluindo a de despertar
emoções e atitudes, fornecer subsídios que agucem o interesse do leitor etc., o que
reter, portanto, da ilustração que revela o rito de purificação umbandista (leia-se
também rito de descarrego) agora retomado? Ela apresenta alguma “analogia” com
o texto abaixo sublinhado, que lhe serve de complemento?
253
CARNIATO, Nossa opção religiosa: 8º ano, professor. São Paulo: Paulinas, p. 51; grifos meus.
161
254
Expressão registrada durante diálogo com uma velha senhora umbandista, cujo Templo do
Caboclo Pele Vermelha está localizado na Zona Leste de São Paulo, próximo ao Cemitério da Vila
Formosa. Ela rejeitava qualquer associação entre umbanda e candomblé, por isso preferia o termo
“madrinha”, ao invés de mãe-de-santo, que remete ao segundo. A diferença entre ambos é mínima,
pois se originam de mater – mãe em latim –, sendo a madrinha uma espécie de segunda mãe. No
âmbito dos terreiros, independente da modalidade praticada – umbanda ou candomblé –, tanto a
mãe-de-santo quanto a madrinha exercem papeis rituais semelhantes, de liderança religiosa.
255
Os umbandistas “cultuam, além dos orixás e santos católicos, inúmeros guias, espíritos ou
entidades que, segundo discurso religioso, tiveram vida terrena, mas que retornam ao mundo dos
homens incorporando em seus médiuns para orientar, aconselhar ou guiar através de seus poderes e
conhecimentos mágico-curativos. Eles são agrupados em linhas, falanges ou legiões (de espíritos)
lideradas por um orixá ou um santo católico que, ao atuar dentro de uma determinada faixa ou
corrente vibratória, desempenham funções específicas” (SANTOS, 2012, p. 15; itálicos no original).
162
CAPÍTULO 5
COSTUMES, CRENÇAS E RITOS:
PERCEPÇÕES SOBRE RELIGIÃO E ENSINO RELIGIOSO EM ESCOLAS
PÚBLICAS ESTADUAIS DOS MUNICÍPIOS DE SÃO PAULO E CAMPINAS/SP
256
Por “horário normal”, leia-se que o ER é oferecido durante o período de permanência do aluno na
escola. Alguns servidores afirmaram que o horário normal é o período de funcionamento integral da
escola. A Deliberação CEE nº 16/2001 permite o ensino confessional em escolas estaduais paulistas,
porém ministrado fora do horário normal, sob execução das autoridades religiosas, mediante
autorização prévia da gestão escolar, após avaliação do conteúdo pelo Conselho de Escola e
autorização expressa dos pais ou responsáveis. O artigo 244 da Constituição do Estado de São
Paulo (1989) também determina que o ER público tenha caráter facultativo.
164
das aulas.257 Sendo o ER paulista restrito aos alunos do 9º ano (antiga 8ª série),
com apenas uma aula semanal, frequentemente “prejudicada” (expressão usada nas
secretarias) por motivos diversos (feriados, falta de professores, aula preenchida
com atividades de outra matéria etc.), optou-se pelas escolas que apresentaram ao
menos duas aulas consecutivas de ER (“dobradinhas”) no mesmo dia e,
preferencialmente, no mesmo turno.
257
Em cumprimento ao anonimato acordado entre pesquisador, professores, alunos e equipes de
gestão escolar, as identidades dos sujeitos e os nomes das escolas serão preservados. Dentre os
documentos utilizados em campo, estão uma carta de apresentação geral da pesquisa (assunto,
objetivos, recorte empírico, metodologia etc.) e um termo de consentimento de entrevista.
258
Diretorias de Ensino de São Paulo (capital): Centro, Centro Oeste, Centro Sul, Leste 1, Leste 2,
Leste 3, Leste 4, Leste 5, Norte 1, Norte 2, Sul 1, Sul 2 e Sul 3.
259
Importante ressalvar que a confirmação desses números não foi concretizada por todas as
diretorias de ensino, em especial as diretorias das regiões Sul 1 (32 escolas) e da Leste 1 (13
escolas), cujos números despontam em relação às demais áreas citadas.
165
260
Encaminhei uma solicitação para a Assessoria de Gabinete da DECLESTE, onde perguntei sobre
os motivos desta diretoria não ter escolas com turmas de ER nos últimos anos – as últimas turmas
foram formadas em 2009. Havia algum motivo que explicasse esse “desinteresse” pelo religioso?
Não obtive retorno da Assessoria e a situação permanece sem explicação. Procurei alguma pista
pessoalmente, no primeiro semestre de 2015, durante as conversas informais com os supervisores
de ensino da DECLESTE, que ficaram confusos e tampouco souberam fornecer uma informação
mais segura, apesar de cada um deles ser responsável por um número determinado de escolas, as
quais acompanham e supervisionam ao longo do ano letivo.
261
Trata-se de um diferencial em relação às trezes diretorias de ensino paulistanas, nas quais não
obtive nenhuma informação sobre atividades de formação continuada dirigida aos professores de
ER.
166
262
Somando os dois municípios investigados, 14 professores de ER foram entrevistados, sendo 6 em
São Paulo (capital) e 8 em Campinas. A entrevista ocorreu por meio de aplicação de questionário e,
em alguns casos, através de conversas gravadas preservando-se o mesmo roteiro do questionário
(ver Apêndice D). Do total citado, 9 professores eram licenciados em história, 2 em filosofia, 1 em
geografia, 1 em teologia, 1 em Recursos Humanos. Este último entrevistado, especializado em
Logística (curso também realizado na Universidade Paulista (UNIP), onde trabalhou no setor de
recursos humanos), estava desempregado ao efetuar o cadastro para contratação temporária de
professores da rede estadual de ensino. Mesmo sem formação específica em ciências humanas, no
ano letivo 2014, ele assumiu as aulas de história e ER na mesma unidade estadual localizada na
região Oeste de Campinas.
167
268
As aulas de ER podem ser atribuídas como carga horária suplementar aos professores titulares,
não efetivos ou aqueles contratados temporariamente, portadores de licenciatura plena nas três áreas
informadas (Resolução SE nº 5, de 2016, artigo 10, inciso 3). Enquanto hipótese, a pouca frequência
de licenciados em ciências sociais e filosofia ministrando ER nas escolas públicas estaduais talvez se
explique em razão dessas disciplinas serem oferecidas apenas no ensino médio. Em sua maioria, os
professores de ER são licenciados em história. Nos Núcleos Pedagógicos das diretorias de ensino, os
Professores Coordenadores de Núcleo Pedagógico (PCNPs) responsáveis pelas atividades de
formação do ER também são licenciados em história. Há uma queixa frequente em relação à
sobrecarga de trabalho, que também acomete as demais áreas e seus respectivos professores-
formadores.
169
Visto que o discurso oficial pró-ER insiste que os alunos conheçam novas
formas de religiosidade e os elementos que as constituem, em junho de 2002 foi
promulgado o Decreto nº 46.802. Essa normatização ratifica que o ER, mantido no
quadro curricular das escolas públicas estaduais paulistas, seria oferecido na
modalidade
269
O texto de abertura de cada brochura é assinado por Gabriel Chalita, ex-secretário de educação
de São Paulo (2003-2007). Em seus termos, o “ensino religioso tem de ser uma ponte que conduza
os estudantes ao caminho do bem, aos valores humanistas construídos com as bases sólidas do
amor, da fraternidade, da bondade, da honestidade, da humildade e, principalmente, do respeito
àqueles cujas opiniões divergem das nossas” (CHALITA, 2002, vol. 1, p. 5-6).
172
270
Professor, 57 anos, formado em história pela extinta Universidade São Marcos (Santana). Efetivo.
Leciona história, com carga suplementar em ER na mesma escola estadual localizada na Zona Norte
de São Paulo. Declarou-se católico não praticante. Entrevista realizada no 2º semestre/2012.
173
ensinar sobre religião sem que nenhuma religião fique de fora e principalmente sem
que haja qualquer tipo de proselitismo nas aulas” (grifado no original).
Consequentemente, o conteúdo desenvolvido nos cinco volumes desse material
segue em direção oposta ao ER dogmático, exclusivista ou concebido sob o ponto
de vista da confessionalidade. O material trata de temas clássicos e centrais,
seguindo uma visão transdisciplinar, que relaciona as contribuições de diferentes
campos do conhecimento interessados no estudo dos fenômenos religiosos.271
Chama atenção, entretanto, que a terceira brochura é integralmente dedicada ao
cristianismo, sem contar os capítulos e itens dos outros volumes que, de alguma
forma, tratam desta vertente religiosa.
271
Cada brochura tem, em média, cinquenta páginas.
174
272
Os participantes da capacitação realizada em 2003 receberam um CD com as imagens ilustradas
neste volume, que ainda contém indicação de bibliografia básica, informações sobre vídeos e
recomendações sobre como trabalhar com websites de instituições religiosas.
175
273
Texto sem autoria reconhecida – inclusive o trecho entre aspas –, consultado no Núcleo
Pedagógico da Diretoria Regional de Ensino Centro-Sul (São Paulo-SP).
274
Professor, 37 anos, graduou-se em história numa universidade no interior de São Paulo. Curso
incompleto em filosofia. Efetivado em história, mas com carga suplementar de ER na mesma unidade
escolar da Zona Sul de São Paulo. Nascido em família católica. Foi seminarista, mas resolveu
abandonar o sacerdócio e recomeçar a vida na capital paulista. Declarou-se “católico apostólico
romano”, identidade religiosa manifestada em um visível crucifixo preso ao pescoço.
176
275
O uso da expressão “História das Religiões” foi estabelecido pela diretora da unidade escolar
visitada, mas nem sempre lembrado pelos alunos, visto que parte deles registrou o nome “Aula de
Religião” ou apenas “Religião” em seus cadernos, provas e trabalhos escolares. O plano de aula do
professor citado não contém nenhuma referência bibliográfica, legislação federal ou estadual sobre o
ER. Parte do argumento utilizado por ele foi originalmente publicado na Indicação CEE nº 07/2001.
Mantive o trecho citado conforme o texto original, incluindo as palavras grifadas em negrito. Os
itálicos no final a citação são meus.
177
série) seja acrescida de uma aula semanal para o desenvolvimento dos conteúdos de
“História das Religiões”. Apesar disso, nenhum dos eixos descritos no termo formulado
pela escola supracitada menciona este conteúdo programático oficialmente adotado
pelo Estado de São Paulo. Outro ponto a ser destacado é que a mesma Resolução SE
nº 21/2002 encerra uma ambiguidade reproduzida no ambiente escolar: Afinal, o que
deve ser oferecido aos alunos da rede pública estadual? Aulas de “ensino religioso” e/ou
de “história das religiões”?
conhecidas. Os motivos para isso não são diferentes dos encontrados no Rio de
Janeiro ou em uma escola pública do Sul do Brasil – fato esse que mostra a
existência de certos problemas relacionados ao ER que se repetem
independentemente da localidade geográfica.
A saída pela tangente, isto é, pela história das religiões, também foi a
solução posta em prática por um grupo de três professoras, todas com carga
suplementar de ER durante o ano letivo de 2012. Uma delas lecionava geografia e
as outras eram professoras de história, todas efetivadas na mesma unidade escolar
– lembremos que a legislação paulista proíbe aos licenciados em geografia
assumirem a regência de ER. Durante uma conversa informal, gravada, com
participação das três professoras, uma delas informou que:
277
Professora, 62 anos, licenciada em história pela PUC-SP. Aposentada pela rede de ensino do
Estado de São Paulo. Em 2012, era professora contratada na “categoria O” (contrato temporário) para
lecionar ER na última escola da Zona Norte onde trabalhara. Declarou-se católica.
180
278
Estive com as duas professoras citadas numa única ocasião, na qual a conversa informal foi
registrada.
181
Posto isso, o que ensina numa aula que aposta no convívio pacífico entre
diferentes religiões? O que se aprende numa disciplina frequentemente associada à
catequese e ao ensino confessional cristão? Quais conteúdos são repassados aos
alunos? Quais recursos são empregados para implementá-los?
279
Ao responder “sim” para a oferta do ER em escolas públicas, a diretora que sugeriu a
nomenclatura “Falando de Deus” manteve esta sugestão ao concluir que “é necessário que falemos
de DEUS para os jovens, muitos cultivam esse amor no coração” (termo “Deus” destacado em letras
maiúsculas no questionário recebido através de correspondência digital (e-mail) do Núcleo
Pedagógico/DECOE).
280
Pesquisa nacional realizada no âmbito do projeto “Afro-brasileiros e Religiosidade no Ensino
Médio”, da atual Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão
(SECADI), na época SECAD (OLIVEIRA, 2006).
182
Político Pedagógico constava que não existiam por ali “redes de lojas e serviços
diversos”, como posto policial, hospital, outras escolas públicas ou particulares,
cartório, áreas de lazer/cultura e transporte coletivo. Quanto ao transporte, na
verdade, o bairro era servido por lotações e duas linhas de ônibus: uma delas
conduzia os passageiros até uma estação de metrô da Linha Azul (Zona Norte); a
outra seguia em direção à região central da cidade, cujo trajeto levava, no mínimo,
uma hora de viagem.
“anarquista”. Eis a sua explicação posterior enviada por correspondência digital (e-
mail), quando retomei contato com ele:
Eu sabia que daria um "nó" em sua cabeça. Sou católico, não recebo
hóstia, mas aceito os preceitos da Igreja. Politicamente o anarquismo
tem minha simpatia, adoto posturas ideológicas desse movimento.
Quanto à religiosidade, frequento sim, todas essas religiões,
mas no intuito de conhecê-las e ter subsídios significativos
junto aos alunos, por fim, não sou ateu, mas não dou crédito às
religiões, vejo-as como produtos culturais; embora sou convicto que
o universo tem um propósito isso não quer dizer que sejamos os
protagonistas desse propósito. Eu, como professor de ER, tenho
minha subjetividade, como meio para conviver com o ‘outro’. Eu não
respeito, mas também não chuto macumba. (Allan, professor de ER
e história, São Paulo-SP). (Grifos meus)
Numa direção não muito simpática, uma das respostas obtidas afirma que
“religião é uma instituição para orientar ou disciplinar seus fiéis”. Uma espécie de
“instrumento, um freio capaz de moldar o ser humano para o bem, criar na
consciência humana um mundo mais civilizado e justo”. Afinal, “ela é feita de
normas e regras que devemos seguir a partir de uma filosofia que acreditamos”.
Religião que “permite religar a alma ao seu Criador. O encontro do ser consigo, com
o próximo, com uma força cósmica (Deus) que rege o universo”.
dito, durante uma aula, que “umbanda não era religião” – informação confirmada
pela coordenadora pedagógica. Em conversa comigo, ele negou.
283
Trata-se de um diversificado material reunido ao longo da pesquisa de campo nas escolas:
cadernos de alunos, trabalhos e avaliações bimestrais; reportagens (jornais e revistas); livro didático
de Geografia; verbetes obtidos em sites específicos; Revista Despertai! (Igreja Testemunha de
Jeová); folheto do Pr. Juarez Subirá (Igreja do Nazareno/Campinas); “Mentoreando Jovens com
sucesso” (cartilha sem autoria/referência); fotonovela (cartilha realizada pelo Instituto Avon) e outras
fontes de pesquisa.
190
1) católico;
4) não confessional;
5) “acredito que ensina história das religiões”; História das religiões, sem
foco numa determinada religião; História das religiões, sem caráter
confessional; “existe uma diversidade muito grande abrangendo várias
religiões”;
192
284
A professora responsável pela orientação técnica cita, num dos slides, um trecho do livro De
religiões e de homens, de Jean Delumeau e Sabine Melchior-Bonnet, presente na primeira brochura
de ER redigida por Silva e Karnal (2002c, p. 9): “Esclarecer para compreender e aceitar os outros:
essa viagem pelo universo religioso de ontem e de hoje, na verdade, só se justifica se levar à
tolerância e, portanto, a atitudes pacificadoras. As religiões não são intolerantes por natureza; mas
nas mãos dos homens podem vir a sê-lo e muitas vezes o foram, é precisamente a diversidade que
faz sua riqueza (...)”.
193
Além desses pontos, foram citados os cuidados com o ER, que não
poderia ser um amontoado de conteúdos voltados à evangelização, procura por
seguidores, nem imposição de dogmas, rituais ou orações. Em resumo: a busca por
prosélitos é oficialmente proibida. Em linguagem jurídica, em conformidade com as
normas federais ou estaduais, a percepção referente à proibição do proselitismo é
mais presumida que propriamente conhecida dos professores de ER. Sobre isso,
argumenta uma professora da Zona Norte de São Paulo:
Evangélico.
Disse que eu estava questionando, ensinando o filho a questionar a
religião dele, a não aceitar os dogmas da religião. Não é nada disso.
Então a gente enfrenta alguns problemas... Nas outras escolas tive
orientação, mas nessa... “Não se toca em religião! Fala sobre
cidadania, bullying, racismo, qualquer coisa. A importância seletiva
da coleta de lixo”.
Todos esses assuntos eram abordados na aula de ensino religioso,
mas, propriamente dito, a questão da fé, de instrução de vários tipos
de religião que existem, que você possa conhecer, isso não tinha.
Nunca teve! (Professora de filosofia e ER, São Paulo-SP)
285
Comunicado CGEB, de 18-1-2012, orienta que a não opção pela matrícula facultativa em ER, seja
substituída pelo acréscimo de uma aula de matemática ou língua portuguesa. Cf.:
<http://desaocarlos.edunet.sp.gov.br/publicacoesdoe/2012/janeiro/doe_19_01.htm>. Acessos: 2015;
2016.
286
Foram aplicados 113 questionários entre alunos matriculados exclusivamente nas aulas de ER
oferecidas em escolas estaduais da região Oeste de Campinas e 62 entre os alunos de escolas
estaduais da capital paulista. Por esse motivo, o número total de respostas pode apresentar alguns
desníveis. É um número pequeno se considerarmos que, em cada escola visitada – 15 ao todo – há,
195
no mínimo, três salas de 9ª ano em cada uma delas, com aproximadamente 35 alunos em cada uma,
o que alcançaria um total de quase 1.600 alunos. O questionário proposto, a fim de que pudesse ser
respondido em um curto período, não podia exceder uma folha (frente e verso). Foram respondidos
durante os intervalos, espaços físicos fora das salas, aulas vagas, jornadas inteiras no interior da
escola. Em certas situações, os professores resolveram aplicá-lo como atividade pedagógica. Alguns
adotaram o mesmo instrumento, com pequenas modificações, para coletar as opiniões dos alunos
sobre as aulas que ofereceram – avaliações ocorridas no final de 2014. A pesquisa de campo se
beneficiou dos resultados de uma sondagem docente, realizada no início de 2013, na qual os alunos
tinham que escrever uma “Opinião sobre religião” – retomarei estas opiniões adiante.
196
287
A pergunta era “para você, religião é...?”, que foi mal compreendida por alguns entrevistados
mesmo após receberem orientações adicionais do pesquisador. Acharam que se tratava de uma
avaliação da disciplina de ER. Essa confusão entre as nomenclaturas indica, para nós, que o ER
pode, no cotidiano da escola pública, ser literalmente confundido com aula de “religião”.
197
288
Ainda que não seja uma curiosidade universal da parte dos alunos, a antropóloga Marilu Márcia
Campelo (2005) percebeu algo semelhante em seus dados coletados numa pesquisa realizada em
escolas públicas estaduais dos municípios de Belém e Ananindeua/PA. Durante as conversas
informais, a autora notou que grande parte os estudantes das séries iniciais do ensino médio tinham
curiosidade em saber mais sobre a cultura e a religiosidade afro-brasileira.
289
A didática do professor citado pela aluna foi negativamente avaliada pela turma. Consistia em
ditados, que os alunos tinham que copiar, muitas vezes interrompido em razão do término da aula,
sem retomada ou finalização na aula seguinte. Lembremos da equação do caso paulista: ER = 1 aula
semanal = 45 minutos de duração. Essa queixa não se restringe ao ER, ouvi relatos semelhantes em
relação ao método do professor de artes da mesma escola.
198
1ª Opinião:
Olá, hoje eu vou falar sobre a “umbada” [sic]. Pois Umbanda como
todos já sabem é uma religião que tem seus direitos a serem
respeitados.
290
Uma ialorixá baiana, há décadas instalada em Campinas, atuante na lavagem das escadarias da
Catedral, informou que no bairro onde fica a escola existem muitos terreiros da nação angola – culto
afro de matriz banto predominante no município. Essa informação sobre a quantidade de terreiros no
bairro da escola não foi mencionada durante as conversas com o professor de história e ER.
291
Para Antonio Viñao, uma das formas de aproximar-se dos alunos é estudando o “produto de seus
trabalhos” (2008, p.17). Essa produção inclui uma variedade de registros escritos (exames, cópias,
redações, ditados, deveres escolares etc.), aqui concebidos como “documentos” que podem ser
usados como fontes de informação (ALVES-MAZZOTTI; GEWANDSZNAJDER, 2001, p. 169).
292
As transcrições preservaram literalmente os grifos, aspas, letras maiúsculas, etc., dessas fontes,
conforme originais fotografados.
199
Na Umbanda tem que ter respeito com os “guias”... Guias são almas
que precisam de luz para conseguirem entrar no Céu...
Na Umbanda tem dois lados a Esquerda [aluna escreveu em
vermelho] e a direita [idem]. Na esquerda tem Pombagiras e Exús
[sic], já na direita são guias de luz como Baianos, Caboclos, Pretos
velhos, Iemanjá, Cosmi-Damião [sic], Boiadeiro, Marinheiro... Esses
fazem parte da direita cada um deles como espíritos tem uma missão
para ser cumprida para poderem ir pro Céu...
Irá fazer 13 anos que eu frequento a Umbanda e nunca tive
preconceito.
Eu admiro muito o trabalho deles, gosto de cada um deles, e nem por
isso irei criticar a religião dos outros.
A Umbanda é
paz e amor
É a força que
me da vida.
2ª Opinião:
Bom, professor nem sei como começar, mas vamos lá né eu consigo!
Eu não gosto de criticar a religião dos outros, porque a partir do
momento que Reencarnamos já temos o Livre Arbítrio; e cada um
tem o direito de escolher sua religião!
Sei também que tem muitas pessoas, que criticam a minha religião
Umbanda, como falando várias coisas tipo: Sai isso é coisa do...
[diabo?], mas eu não to nem ai porque é uma coisa que ta no meu
sangue, nas minhas raízes. Tem muitas pessoas que são assumidas,
vão em centro recebe e são pessoas muito boas!
[Aluna desenhou uma estrela de Davi]: “A umbada [sic] é paz e amor
é força que nos da [sic] vida...”.
Fim.
Não se pode esquecer que a escola, além de ser uma “instituição formal
instrucional” (SETTON, 2008, p. 15), é também um espaço de integração cultural.
Sua estrutura compreende “não apenas as relações ordenadas conscientemente
mas, ainda todas as relações que derivam da sua existência enquanto grupo social”,
ensina o clássico texto “A estrutura da escola”, de Antônio Cândido (1974, p. 197).
293
Licenciado em Filosofia (PUC-Campinas), 28 anos, com especialização em libras. Trabalhava,
mediante aprovação em concurso interno, como tradutor e intérprete temporário na UNICAMP.
Homossexual assumido na “vida lá fora” e no interior da escola também. Não se declarou religioso,
porém tinha um interesse especial (e amigos iniciados) pelo candomblé. Tema que resolveu “encarar”
com o apoio da diretora, sem objeções da coordenadora pedagógica, publicamente evangélica.
201
294
“Projeto: O Paradigma da Religião: Vivências diferentes do mesmo fenômeno”, Campinas, 2015, p.
1.
202
dos animais sacrificados são reservadas aos orixás e o restante consumido pelos
fiéis e convidados em dias de festa pública).
Reunindo todos esses elementos vistos até aqui, é possível dizer que este
capítulo se beneficia da ampla discussão empreendida neste trabalho. Primeiro
porque retoma a historicidade jurídica dessa disciplina na escola pública, em
particular na paulista. Segundo, porque ele atravessa o debate sobre a classificação
dos modelos de ER citados, direta ou indiretamente, nos marcos legais federais, nos
Estados e na literatura especializada. Este percurso facilitou a chegada ao modelo
supraconfessional do tipo paulista. Ele é o único do país que apresenta uma
proposta de ER que, em teoria, deve ser desenvolvida sob o ponto de vista histórico-
cultural, e não sob o viés confessional, catequético e proselitista.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Essas duas orientações estão presentes nas abordagens dos autores dos
livros escolares de ER, mas ambas são empregadas de maneira diversa daquela
mais afeita às ciências humanas dedicadas ao estudo científico das religiões. No
âmbito acadêmico exige-se, dos pesquisadores, uma coerência nas escolhas
teóricas e metodológicas, porém, o mesmo não se observou entre os autores e
206
296
INCONTRI; BIGHETO, Todos os jeitos de crer, vol. 3 (Tradições), cap. 1 (Onde mora a
divindade?), p. 18.
297
PLATAFORMA DHESCA BRASIL – REDE NACIONAL DE DIREITOS HUMANOS. Relatoria do
direito humano à educação. Informe preliminar. Missão: Educação e racismo no Brasil (2010). Eixo:
Intolerância religiosa na educação. Disponível em: <www.dhescabrasil.org.br>. Acessos: 2015; 2016.
208
escolar que insiste tratar as religiões como se elas fossem experiências culturais
isoladas, e não como fenômenos socioculturais que se relacionam com outras
dimensões da vida social. Ou que ainda insista no ensino de cosmovisões
religiosas, valores éticos ou questões existenciais sobre o “sentido da vida”. É essa
perspectiva que tem orientado as narrativas dos livros escolares, bem como os
programas e aulas de ER dos municípios pesquisados. Realidade, essa, que
provavelmente se repete em outras regiões do país.
Posto isso, reitero que este trabalho não teve como propósito dar a
solução para as questões diretivas propostas, pois trata-se de um campo de
estudos ainda por ser explorado. Conhecemos experiências de pesquisas
desenvolvidas nos grandes centros urbanos – sobretudo nas capitais do Sul e do
Sudeste –, mas ainda resta muito por descobrir em relação ao ER que se processa
nas escolas públicas (e também nas instituições particulares confessionais e não-
confessionais) de outras regiões do país, onde, quiçá, o ensino confessional católico
reina soberano.
210
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São Paulo: Editora Ática, 2010.
APÊNDICE A
EST 18
PUC-SP 25
PUC-PR 8
UFPB 8
UNIDA 6
UFRJ 4
UNICAP 4
PUC-GO 3
PUC-MG 3
UNESP 3
PUC-RS 2
UERJ 2
UFC 2
UFJF 2
UFSC 1
UnB 2
UNICAMP 2
UPM 2
USP 2
FURB 1
PUC-RJ 1
UCP 1
UEL 1
UEM 1
UEPA 1
UFPR 1
UFS 1
UFSC 1
UFSCAr 1
ULB 1
UMESP 1
UNILASALLE 1
UNISANTOS 1
UNISINOS 1
UNISUL 1
* UNIVERSIDAD
COMPLUTENSE DE 1
MADRID (Espanha)
TOTAL 116
APÊNDICE B
APÊNDICE C
NÍVEL
Doutorado 20
Mestrado 96
Total 116
ÁREA DO CONHECIMENTO
Educação 37
Teologia 45
Ciências da Religião 23
Ciências Sociais 3
Direito 2
Antropologia e Sociologia 2
Antropologia Social 1
Educação, Arte e História da Cultura 1
Filologia e Língua Portuguesa 1
Filosofia 1
Total 116
APÊNDICE D
QUESTIONÁRIO DO PROFESSOR
NOME:
ESCOLA:
DATA:
BLOCO I
8. Qual nível de ensino leciona atualmente? (Pode assinalar mais de uma resposta)
( ) Ensino Fundamental I
232
( ) Ensino Fundamental II
( ) Ensino Médio
( ) EJA - Ensino Fundamental
( ) EJA - Ensino Médio
BLOCO II
10. Trata-se de uma disciplina inserida no horário normal de aulas? Como as turmas
de ER são formadas e homologadas nas escolas públicas estaduais de São Paulo?
11. Como foi a recepção dos alunos do 9º ano (antiga 8ª série) em relação ao ER?
BLOCO III
16. Teve alguma facilidade e/ou dificuldade em abordar alguma religião específica
durante suas aulas de ER?
Sim ( ) Não( ). Fale dessa experiência.
APÊNDICE E
QUESTIONÁRIO DO ALUNO
DATA:
NOME:
ESCOLA:
IDADE:
BAIRRO ONDE MORA:
5. Você lembra sobre o que aprendeu nas aulas desta matéria ao longo deste ano?
7. Existe alguma religião que você gostaria de aprender na aula de ER? Qual (ou
quais)?
234
ANEXO 1
Art. 7º: o Ensino Religioso, obrigatório à escola e facultativo ao aluno, será oferecido
aos alunos do 9º ano do Ensino Fundamental, se houver demanda, na conformidade
do que dispõe a Resolução SE nº 21/2002.
Esperamos, com essas informações, que tenhamos esclarecido suas dúvidas e nos
colocamos à disposição para outros esclarecimentos que venham a contribuir com
seus estudos.
Nivaldo Vicente
RG 19.124.239-1
Dirigente Regional de Ensino
235
ANEXO 2
Informativo Tambor (ano III, nº 24, p. 2, Guararema-SP, ago.2001)
236
ANEXO 3
Informativo Tambor (ano III, nº 27, p. 2, Guararema-SP, nov.2001)
237
ANEXO 4
Informativo Tambor (ano III, nº 28, p. 2, Guararema-SP, dez.2001)