Biografia
1922-1979
Angola
Eu vivo
nos bairros escuros do mundo
sem luz nem vida.
Os farrapos completam
a paisagem íntima
Britar pedra
acarretar pedra
britar pedra
acarretar pedra
ao sol
à chuva
britar pedra
acarretar pedra
SAGRADA ESPERANÇA
ANTIGAMENTE ERA
Harlem
Pekim
Barcelona
Paris
Nas florestas escondidas do Novo Mundo
E a pele
o espírito
o canto
o choro
brilham como gumes prateados
Crescem
belos e irresistíveis
como o mais belo sol do mais belo dia da Vida.
(1951)
O CHORO DE ÁFRICA
o choro de séculos
inventado na servidão
em histórias de dramas negros almas brancas preguiças
e espíritos infantis de África
as mentiras choros verdadeiros nas suas bocas
o choro de séculos
onde a verdade violentada se estiola no circulo de ferro
da desonesta força
sacrificadora dos corpos cadaverizados
inimiga da vida
(Poemas, 1961)
"Quintandeira"
A quitanda.
Muito sol
e a quintandeira à sombra
da mulemba.
- Minha senhora
laranja, laranjinha boa!
Esgotaram-se os sorrisos
com que chorava
eu já não choro.
Aí vão as laranjas
como eu me ofereci ao álcool
para me anestesiar
e me entreguei às religiões
para me insensibilizar
e me atordoei para viver.
Talvez vendendo-me
eu me possua.
-Compra laranjas!
ANTONIO CARDOSO
Biografia
Angola
Exílio
Há Momentos
21-2-55
"A paixão e agudeza com que António Cardoso trata, por outro lado,
suas personagens femininas - predominantes na ficção - reflectem a
opção sensível pelos segredos das relações humanas, independente
do período e do maniqueísmo colonizador-colonizado. Como tema
coerente da obra poética ou da prosa aflora sempre a luta do amor
para vencer o ódio. Ou, como ele próprio diz, mete-se com as pessoas
(personagens) para ver se as mete em um lugar onde fiquem
melhores." In: Auto-retrato, in C.A. Medina. Sonha Mamã África,
p.260, citado por Aldónio Gomes, Fernanda Cavacas. Dicionário de
Autores de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa. Lisboa,
Editorial Caminho, 1997, p.50.
É Inútil Chorar
É inútil chorar:
«Se choramos aceitamos. É preciso não aceitar.»
Por todos os que tombam pela verdade
Ou que julgam tombar.
O importante neles é já sentir a vontade
De lutar por ela,
Por isso é inútil chorar.
Ao menos se as lágrimas
Dessem pão,
Já não haveria fome.
Ao menos se o desespero vazio
Das nossas vidas
Desse campos de trigo.
21-2-55
No teu corpo
sons antigos dos batuques à minha porta,
com que me provocas,
enchem-me o cérebro de fogo incontido.
Biografia
1924-1991
Angola
Por razões políticas esteve preso entre 1960 e 1972. Militante do MPLA,
foi co-fundador da União de Escritores Angolanos, membro do
Movimento de Novos Intelectuais de Angola e participou activamente
na vida política e cultural angolana. Foi empregado de escritório e
técnico de contabilidade, Ministro da Educação de Angola e Secretário
de Estado da Cultura.
Suas obras publicadas são: Poemas (1961; 1985), Vovô Bartolomeu (1979),
Em Kiluange do Golungo (1984), Sobreviver em Tarrafal de
Santiago(1985), Prometeu (1987), Fábulas de Sanji (1988), Vôvô
Bartolomeu (1989).
Obra:
Poemas, 1961
Outra vez Vovô Bartolomeu , 1979
Sobreviver em Tarrafal de Santiago, 1985
Naquela roça grande não tem chuva
é o suor do meu rosto que rega as plantações;
Quem?
Quem?
- "Monangambéé...'"
(Poemas, 1961)
VADIAGEM
(Poemas, 1961)
UM PERFIL
em duas décimas
Paisagem em frente
No espelho do horizonte
Imagem é
do fogo a Ilha de fronte.
E o Mar! O Mar
de envolver volveres de solidão?
Obsessivo
O desejo de partir
E esta maldição
Imular
De nunca chegar
E de jamais voltar!
Quem?
- "Monangambééé..."
(Poemas)
Poema da alienação
“remexe remexe
paga dinheiro
vem dormir comigo”
“cabeça rapada
galinha assada
ó Zé”
(Poemas)
Castigo pro comboio malandro
passa
passa sempre com a força dele
ué ué ué
hii hii hii
te-quem-tem te-que-tem te-quem-tem
o comboio malandro
passa
tem outro
igual como este dos bois
leva gente,
muita gente como eu
cheio de poeira
gente triste como os bois
gente que vai no contrato
Comboio malandro
O fogo que sai no corpo dele
Vai no capim e queima
Vai nas casas dos pretos e queima
Esse comboio malandro
Já queimou o meu milho
Mas espera só
Quando esse comboio malandro descarrilar
E os brancos chamar os pretos pra empurrar
Eu vou
Mas não empurro
- Nem com chicote -
Finjo só que faço forca
Aka!
Comboio malandro
Você vai ver só o castigo
Vai dormir mesmo no meio do caminho.
(Poemas)
Ah! Se pudésseis aqui ver poesia que não há!
Mãe
aqui não há poesia
É triste, Mãe
Já não haver poesia
Mãe, não há poesia, não há
Mãe
Mãe
Agora que tu partiste
que será do teu menino?
Quem rirá da minhas partidas
e travessuras?
Quem terá indulgências aos erros meus
e sentirá as minhas amarguras?
Quem me contará histórias de encantar
das fadas e do fantástico
-ainda preciso delas, Mãe-
quem me ensinará as primeiras letras da Cartilha Maternal
me falará das estrelas
da África
da Europa do Atlântico do Universo
me ensinará amor pelas andorinhas e pelos humildes
e me ensinará humanidade?
Quem?
Agora que te foste embora
(quantas lágrimas por mim choraste,
e choraste por ti à partida?)
onde um regaço para pousar minha cabeça de cansaços?
Mãe
agora que partiste
o teu menino está perdido na floresta de gigantes maus
escuta Mãe
o teu menino será forte
como quiseste
(«come Antoninho»
«come Antoninho»)
E saberá pelas estrelas
Encontrar o caminho da nossa casa
Mãe.
Agora que tu partiste
Ainda estamos sempre juntos
(cordão umbilical inquebrável nos ligou)
ainda estamos juntos
a cada raio de sol
a cada revérbero de Lua no mar
a cada murmuro lamento da floresta no Golungo
-sempre juntos
Mãe.
Biografia
ANGOLA
olhos de peixe são teus dedos oh meu barco oh meu barco à busca de
continentes ainda por descobrir se afundou o meu barco no mar do
teu ventre oh meu barco oh meu barco olhos de peixe são teus dedos
oh veleiro encarnado
em lata de cacau
oh veleiro
singrando de velas enfunadas
por mares de prata
oceanos de saudade
não me leves
não me leves
oh negreiro de sonhos
para onde não quero
singrando de velas enfunadas
por mares de prata
oceanos de saudade
oh veleiro encarnado
em lata de cacau
embarcados
em nau de fumo
que a ilusão branca arrasta
navegam
pássaros roxos
por oceanos de embuste
nuvens brancas
pássaros nocturnos
Obra:
Biografia
Angola
Chamava-se Infeliz
aquele rapaz
que levaram ontem
do coração da aldeia.
Biografia
Angola
João Maimona
In Festa da Monarquia
“fiz voar uma noite consciente/ apenas/ uma lágrima imensa deixei
cair/ á beira da palavra perfeita/há uma noite que sobrevive em cada
lágrima”.
Que erosão
no choque genésico das marés
de encontro às pedras habitadas.
(1979)
AS MURALHAS DA NOITE
Biografia
1941
Angola
JOFRE ROCHA
(Cachimane, Angola, 1941-)
“Vida das pessoas é assim mesmo. Pessoa ás vezes faz uma coisa sem
poder pensar que essa coisa vai dar muita volta, vai esticar tanto até
dar uma maka grande que vira a vida da gente. Como uma chuva
que está ainda começar com gotas pequeninas, que começa ainda
trazer alegria na cara dos monandengues, sem ninguém poder
adivinhar nessa chuva pequenina a chuva grande que vai fazer cair o
barro das cubatas e estragar a semente nas lavras, é assim também
outras coisas que vêm na vida das pessoas...”
rio estátua
braço sem carne
chuva no mar
em terra seca
sol na paisagem
terra em desgraça
ossadas brancas
urubus em volta
terra em brasa
ar calcinado
(1961)
MANUEL RUI
Biografia
Angola
O seu livro “Quem me dera ser Onda” foi editado diversas vezes e
traduzido para algumas línguas. Uma obra que suscitou grande
interesse do público leitor, pois aborda de uma forma satírica e
mordaz os problemas sociais da sua época. Inocência Mata diz-nos
sobre essa obra: “O primeiro convite que a leitura do texto de Manuel
Rui nos sugere é uma análise sociológica: a leitura de uma teia
textual em que quase numa visão caleidoscópica, Angola actual –
através da sua cidade-cérebro – se nos apresenta, é lida, é analisada
na sua trama social, sua História e sua Cultura social... Sintetizando
qualquer abordagem sociológica a este texto, pode dizer-se que é um
retrato realista da actual sociedade angolana, feito de forma irónica e
satírica, mas de uma ironia pedagógica.” In: Inocência Mata.
Literatura Angolana. Silêncios e Falas de Uma Voz Inquieta. Lisboa,
Mar Além, 2001, p.154.
nem tratado,
e cresceu. É força
tudo força
parece desaparecer.
http://www.uea-angola.org/quem.cfm
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angolano&catid=2:trabalhos-publicados