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AGOSTINHO NETO

Biografia

1922-1979

Angola

Agostinho Neto nasceu em 1922 e faleceu em 1979. Foi o 1º


Presidente da República Popular de Angola e líder do MPLA.

Ainda o meu canto dolente


e a minha tristeza
no Congo, na Geórgia, no Amazonas
Ainda o meu sonho de batuque em noites de luar
Ainda os meus braços
ainda os meus olhos
ainda os meus gritos
Ainda o dorso vergastado
o coração abandonado
a alma entregue à fé
ainda a dúvida
e sobre os meus cantos
os meus sonhos
os meus olhos
os meus gritos
sobre o meu mundo isolado
o tempo parado
Extractos do poema “Aspiração” In: ...Ainda o meu sonho... 2ª edição.
Luanda, UEA, 1985, p.7-8

António Agostinho Neto nasceu a 17 de Setembro de 1922 em


Kaxikane, Icolo e Bengo e faleceu a 10 de Setembro de 1979 em
Moscovo, vítima de cancro. Fez os seus estudos secundários e liceais
em Luanda, no então denominado Liceu Nacional Salvador Correia
(hoje Liceu Mutu Ya Kevela). Enquanto estudante do liceu participou
no Movimento dos Novos Intelectuais de Angola, que tinha por lema
“Vamos descobrir Angola”. Depois de terminar o liceu trabalhou nos
Serviços de Saúde de Luanda até 1947, quando seguiu para Portugal
para estudar medicina primeiro em Coimbra e depois em Lisboa,
onde se licenciou em 1958.

Durante a sua permanência como estudante em Portugal participou e


esteve estreitamente ligado a actividade sociais, políticas e culturais
da Casa do Estudante do Império, fundando em Lisboa, com outros
estudantes africanos como Marcelino dos Santos, Mário Pinto de
Andrade o Centro de Estudos Africanos e o clube Marítimo Africano,
que asseguravam um elo de ligação entre os angolanos em Angola e
em Portugal. Esteve sempre envolvido em actividades políticas, o
que resultou na sua prisão por diversas vezes. A sua primeira prisão
foi em 1951. Em 1957 estando na cadeia foi eleito pela Amnistia
Internacional “Prisioneiro Político do Ano”. Regressou a Angola em
1959 onde abriu um consultório médico, mantendo sempre as suas
actividades políticas de uma forma activa. Voltou a ser preso e
deportado para Cabo Verde, de onde devido às pressões
internacionais foi transferido para Lisboa, com residência vigiada.
Em 1962 conseguiu evadir-se de Portugal com a família indo para
Léopoldville, onde estava sediado o Movimento Popular de
Libertação de Angola – MPLA. Foi eleito presidente do MPLA em
1962, passando a liderar a luta armada de libertação nacional contra
o colonialismo. A 11 de Novembro de 1975 proclama a
independência de Angola, tornando-se o primeiro presidente,
funções que exerceu até a sua morte, a Setembro de 1979.

Sobre o papel que o escritor deveria desempenhar Neto afirmava:


“todos nós, creio que concordamos em que o escritor se deve situar
na sua época e exercer a sua função de formador de consciência, que
seja agente activo de um aperfeiçoamento da humanidade.” In:
...Ainda o meu sonho... (Discursos sobre a Cultura Nacional).2ª
edição. Luanda, UEA, 1985, p.27.

Ao longo de toda a sua vida a escrita revelou-se uma actividade


fundamental, inserida na sua vida de homem público. Participou
como colaborador em várias publicações periódicas em Angola,
Portugal e Brasil, encontrando-se os seus textos dispersos em
diversos jornais e revistas como Mensagem, Cultura, Itinerário,
Notícias de Bloqueio, etc. As suas primeiras colaborações escritas
datam dos anos de 1942-1944, publicadas no jornal O Estandarte.

As suas principais obras publicadas são: Náusea (1952); Quatro


Poemas de Agostinho Neto (1957); Poemas (1961); Com os Olhos
Secos – edição bilíngue portuguesa/italiana (1963); Sagrada
Esperança (1974); A Renúncia Impossível (edição póstuma, 1982);
Poesia (edição póstuma, 1998).

O Oceano separou-me de mim Enquanto me fui esquecendo nos


séculos E eis-me presente Reunindo em mim o espaço Condensando
o tempo

Na minha história Existe o paradoxo do homem disperso Extractos


do poema “Confiança” In: Sagrada Esperança. 1985, São Paulo, Ática;
Poesia. 1998, Luanda, INALD, p.34

Além das obras publicadas, alguns dos seus discursos ou reflexões


sobre questões da cultura angolana estão também publicados tais
como: Sobre a União dos Escritores Angolanos (1975), Sobre a
Literatura (1977), Sobre a Cultura Nacional (1979), Sobre as Artes
Plásticas (1979), Sobre a Associação dos Escritores Afro-Asiáticos
(1979), ...Ainda o Meu Sonho. Discursos sobre a Cultura Nacional
(1980; 1985), Sobre a Poesia Angolana (1988).

Sobre a cultura nacional dizia: “... a cultura não pode inscrever-se no


chauvinismo, nem pretende evitar o dinamismo da vida.... A cultura
evolui coma s condições materiais e em cada etapa corresponde a
uma forma de expressão e de concretização de actos culturais. A
cultura resulta da situação material e do estado do desenvolvimento
social.” In: ...Ainda o meu sonho... (Discursos sobre a Cultura
Nacional).2ª edição. Luanda, UEA, 1985, p.41-42

A sua obra Sagrada Esperança é a mais publicada e traduzida em


diversas línguas, servindo de base para muitos estudos.

Pires Laranjeira, falando da poesia de Agostinho Neto refere: “Na


poesia de Agostinho Neto deparamo-nos com a representação de um
poder imperial-colonial explicitamente recusado em “A renúncia
impossível - negação”, tão violentamente rechaçado que o texto ficou
inédito até 1982....” Pires Laranjeira concorda com Leonel Cosme
quando ele diz que “a poesia do fundador do Estado-nação angolano
nega o poder imperial do ocidente, do mundo branco, e procura
instituir um humanismo não universal mas negro.” In: “Literatura,
Cânone e Poder Político”. Comunicação apresentada ao Encontro de
Literatura.....

Foram-lhe atribuídos diversos prémios político e literários entre os


quais Prémio LOTUS (1970) e Prémio Nacional de Literatura (1975).

Carlos Ervedosa escreveu “o canto de Agostinho Neto distingue-se,


logo de início, dos restantes camaradas do «Movimento». Ele
ultrapassa as fronteiras de Angola, é um canto dirigido a todos os
seus irmãos de raça, da África e das Américas, aos seus irmãos que,
espalhados pelo mundo, sofrem e lutam pela sua dignificação: «Eu
vos sinto/ negros de todo o mundo/ eu vivo a vossa Dor/ meus
irmãos». Poema de Neto ‘Mussunda amigo’. In: Carlos Ervedosa.
Roteiro da Literatura Angolana. Luanda, Edição da Sociedade
Cultural de Angola, 1974, p. 82:
Noite

Eu vivo
nos bairros escuros do mundo
sem luz nem vida.

Vou pelas ruas


às apalpadelas
encostado aos meus informes sonhos
tropeçando na escravidão
ao meu desejo de ser.

São bairros de escravos


mundos de miséria
bairros escuros.

Onde as vontades se diluíram


e os homens se confundiram
com as coisas.

Ando aos trambolhões


pelas ruas sem luz
desconhecidas
pejadas de mística e terror
de braço dado com fantasmas.

Também a noite é escura.


Civilização Ocidental

Latas pregadas em paus


fixados na terra
fazem a casa

Os farrapos completam
a paisagem íntima

O sol atravessando as frestas


acorda o seu habitante

Depois as doze horas de trabalho


escravo

Britar pedra
acarretar pedra
britar pedra
acarretar pedra
ao sol
à chuva
britar pedra
acarretar pedra

A velhice vem cedo

Uma esteira nas noites escuras


basta para ele morrer
grato
e de fome.

SAGRADA ESPERANÇA
ANTIGAMENTE ERA

Antigamente era o eu-proscrito


Antigamente era a pele escura-noite do mundo
Antigamente era o canto rindo lamentos
Antigamente era o espírito simples e bom

Outrora tudo era tristeza


Antigamente era tudo sonho de criança

A pele o espírito o canto o choro


eram como a papaia refrescante
para aquele viajante
cujo nome vem nos livros para meninos

Mas dei um passo


ergui os olhos e soltei um grito
que foi ecoar nas mais distantes terras do mundo

Harlem
Pekim
Barcelona
Paris
Nas florestas escondidas do Novo Mundo

E a pele
o espírito
o canto
o choro
brilham como gumes prateados

Crescem
belos e irresistíveis
como o mais belo sol do mais belo dia da Vida.
(1951)

O CHORO DE ÁFRICA

O choro durante séculos


nos seus olhos traidores pela servidão dos homens
no desejo alimentado entre ambições de lufadas românticas
nos batuques choro de África
nos sorrisos choro de África
nos sarcasmos no trabalho choro de África

Sempre o choro mesmo na vossa alegria imortal


meu irmão Nguxi e amigo Mussunda
no circulo das violências
mesmo na magia poderosa da terra
e da vida jorrante das fontes e de toda a parte e de todas as almas
e das hemorragias dos ritmos das feridas de África

e mesmo na morte do sangue ao contacto com o chão


mesmo no florir aromatizado da floresta
mesmo na folha
no fruto
na agilidade da zebra
na secura do deserto
na harmonia das correntes ou no sossego dos lagos
mesmo na beleza do trabalho construtivo dos homens

o choro de séculos
inventado na servidão
em histórias de dramas negros almas brancas preguiças
e espíritos infantis de África
as mentiras choros verdadeiros nas suas bocas

o choro de séculos
onde a verdade violentada se estiola no circulo de ferro
da desonesta força
sacrificadora dos corpos cadaverizados
inimiga da vida

fechada em estreitos cérebros de máquinas de contar


na violência
na violência
na violência

O choro de África é um sintoma

Nós temos em nossas mãos outras vidas e alegrias


desmentidas nos lamentos falsos de suas bocas - por nós!
E amor
e os olhos secos.

(Poemas, 1961)

"Quintandeira"

A quitanda.
Muito sol
e a quintandeira à sombra
da mulemba.

- Laranja, minha senhora,


laranjinha boa!

A luz brinca na cidade


o seu quente jogo
de claros e escuros
e a vida brinca
em corações aflitos
o jogo da cabra-cega.
A quitandeira
que vende fruta
vende-se.

- Minha senhora
laranja, laranjinha boa!

Compra laranjas doces


compra-me também o amargo
desta tortura
da vida sem vida.

Compra-me a infância do espírito


este botão de rosa
que não abriu
princípio impelido ainda para um início.

Laranja, minha senhora!

Esgotaram-se os sorrisos
com que chorava
eu já não choro.

E aí vão as minhas esperanças


como foi o sangue dos meus filhos
amassado no pó das estradas
enterrado nas roças
e o meu suor
embebido nos fios de algodão
que me cobrem.

Como o esforço foi oferecido


à segurança das máquinas
à beleza das ruas asfaltadas
de prédios de vários andares
à comodidade de senhores ricos
à alegria dispersa por cidades
e eu
me fui confundindo
com os próprios problemas da existência.

Aí vão as laranjas
como eu me ofereci ao álcool
para me anestesiar
e me entreguei às religiões
para me insensibilizar
e me atordoei para viver.

Tudo tenho dado.

Até mesmo a minha dor


e a poesia dos meus seios nus
entreguei-os aos poetas.

Agora vendo-me eu própria.


- Compra laranjas
minha senhora!
Leva-me para as quitandas da vida
o meu preço é único:
- sangue.

Talvez vendendo-me
eu me possua.

-Compra laranjas!
ANTONIO CARDOSO

Biografia

Angola

ntónio Dias Cardoso nasceu em Luanda a 8 de Abril de 1933/2006,


fazendo nessa cidade os seus estudos até ao 5º ano. Foi empregado
bancário e comercial, trabalhou na Secretaria da Associação dos
Naturais de Angola-ANANGOLA, em 1961.

Esteve preso por duas vezes em 1959 e em 1961, sendo libertado em


1974. Foi presidente do Directório do Movimento Democrático de
Angola-MDA em 1974, integrando-se em 1975 no MPLA, onde teve
intensa actividade política. Depois de ter saído da cadeia, exerceu a
actividade de jornalista da imprensa escrita, chefiou os Serviços de
Informação da ex-Emissora Oficial de Angola. Dirigiu a página
literária intitulada «Resistência» do extinto Diário de Luanda e
trabalhou na extinta Secretaria de Estado da Cultura. Sempre
participou em actividades políticas, culturais e sociais. Antes da sua
morte, em 2006, 26 de Julho, encontrava-se a viver em Portugal por
razões de saúde.

Exílio

Eu vivo na minha terra


Mas estou exilado.
Quem vive nela não sou eu
Mas outro que em mim vive.

A minha terra está por vir


E o meu outro ser vive, vive...
...vive à espera desse porvir

in Poemas de Circunstância (2003)


Teve a sua estreia literária no boletim dos estudantes do liceu
Salvador Correia (hoje Mutu Ya Kevela), além de ter colaborado em
diversas outras revistas. Tem trabalhos seus publicados em várias
revistas de Angola, Brasil, Argentina, Portugal, Moçambique,
nomeadamente, em Angola na revista Mensagem e Cultura II no
Jornal de Angola. É membro fundador da União dos Escritores
Angolanos e exerceu as funções de Secretário Geral.

"...Sô'bílio era dono de muitas cubatas, quase todas a cair mesmo,


umas de adobe e zinco, rebocadas, caiadas, outras, só pau-a-pique e
capim, chovia em todas, no entanto, tinha no peito dele uma pedra...
Da nossa cor mesmo, nunca que perdoava... Usava sempre fato
escuro, chapéu, bengala, falava parecia padre, muito doce, mas
ninguém lhe convencia... Assim rico, habitava uma casa podre: seu
orgulho mesmo, era aquele filho que estava em Lisboa no estudo,
quase engenheiro mesmo... Volta meia volta. Se desculpava: não
posso mana, um filho gasta muito dinheiro, livros, comida, você
julga Lisboa é Luanda..." Extracto do conto "Lavadeira da Baixa", In:
António Cardoso, do livro Baixa & Musseques, União dos Escritores
Angolanos, 1980, 1ª ed.

As suas obras editadas são: São Paulo, poema, Caderno Colectivo da


Colecção Imbondeiro, Sá da Bandeira (actual Lubango), 1960,
Poemas de Circunstância (1961), Caderno da Casa dos Estudantes do
Império (CEI), Lisboa, Panfleto (1979), 21 Poemas da Cadeia (1979),
Economia Política (Poética), (1979), A Fortuna-Novela de amor,
INALD 1979, Baixa & Muceques, UEA, 1980, A Casa de Mãezinha-
Cinco Histórias Incompletas de Mulheres, (novela) INALD, 1980,
Lição de Coisas (poesia), INALD, 1980, Nunca é Velha a Esperança,
(poesia) INALD, 1980, Chão de Exílio (1980) e Poemas de
Circunstâncias, (poemas de 1949-1960), Editorial Nzila, Luanda, 2003.

O poeta Mário António fez o seguinte comentário sobre os poemas


de António Cardoso dizendo que os poemas: "continuam a
inspiração revelada em Mensagem, nº 2. Poesia inquieta,
perscrutadora dos dramas do mundo, sempre dolorosa do grand
écart entre o sonho e a vida, mas que revela, em dez anos de
existência, uma quase incapacidade de realizar o auto-domínio, a
atenção crítica, a construção literária sem os quais os poetas não
podem fazer poemas. Constitui esta poesia, contudo, um testemunho
de determinada posição do homem em África e isso lhe confere um
valor além de literário", In: Mário António Fernandes de Oliveira.
Reler África. Apresentação, revisão e nota bibliográfica de Heitor
Gomes Teixeira. Coimbra, Instituto de Antropologia/Universidade de
Coimbra, 1990, p.187.

Há Momentos

Há momentos na vida de um Homem


Em que sabe que acordou diferente
E que já não é o mesmo para ele,
Mesmo que o seja para toda a gente...

Há momentos na vida de um Homem


Onde só pode entrar uma Mulher
Aquela que lhe trouxer
A flor do sexo
Desenhada a vermelho no ventre
E nada lhe perguntar...

Há momentos na vida de um Homem


Onde só pode entrar uma mulher
Aquela que lhe trouxer,
Num abraço total,
A ilusão da vida inteira...
E, depois, partir
Com a esperança de vida que ele semeou...

Há momentos na vida de um Homem


Onde só pode entrar uma Mulher
Para todo o Mundo se resumir
À flor vermelha
Como um bocado de sol
Que desponta numa telha!

21-2-55
"A paixão e agudeza com que António Cardoso trata, por outro lado,
suas personagens femininas - predominantes na ficção - reflectem a
opção sensível pelos segredos das relações humanas, independente
do período e do maniqueísmo colonizador-colonizado. Como tema
coerente da obra poética ou da prosa aflora sempre a luta do amor
para vencer o ódio. Ou, como ele próprio diz, mete-se com as pessoas
(personagens) para ver se as mete em um lugar onde fiquem
melhores." In: Auto-retrato, in C.A. Medina. Sonha Mamã África,
p.260, citado por Aldónio Gomes, Fernanda Cavacas. Dicionário de
Autores de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa. Lisboa,
Editorial Caminho, 1997, p.50.

É Inútil Chorar

É inútil chorar:
«Se choramos aceitamos. É preciso não aceitar.»
Por todos os que tombam pela verdade
Ou que julgam tombar.
O importante neles é já sentir a vontade
De lutar por ela,
Por isso é inútil chorar.

Ao menos se as lágrimas
Dessem pão,
Já não haveria fome.
Ao menos se o desespero vazio
Das nossas vidas
Desse campos de trigo.

Mas o que importa


É não chorar:
«Se choramos aceitamos. É preciso não aceitar.»
Mesmo quando já não se sinta calor
É bom pensar que há fogueiras
E que a dor também ilumina.

Que cada um de nós


Lance a lenha que tiver,
Mas que não chore
Embora tenha frio:
«Se choramos aceitamos. É preciso não aceitar.»

21-2-55

O jornalista Mário Dionísio, também ensaísta, nas linhas que assina


sobre os poemas do último livro intitulado «Poemas de
Circunstâncias», escreve que os poemas de AC são "deveres de
palavras difíceis, tal qual as que levámos como trabalho de casa nos
tempos de escola. E dou comigo a interrogar-me sobre o que é que
quer dizer?, onde quer chegar?, da razão de tanto enigma. AC não
complica o que de singelo tem a poesia: pão é pão, amor é festa, ou
dor, aí está, claramente dito. Sem artifícios outros que não os da
escrita e inevitável sensibilidade, chão onde levanta a sua casa de
poemas. Homem de esquerda que se lhe vê no texto, sem vergonha
de o ser; AC é um rebelde. Inconformado com o statu quo, como com
a resignada comodidade a que se remeteram muitos dos seus
companheiros de percurso, AC não é dos que lançam agora na conta
de um já distante entusiasmo juvenil os sonhos revolucionários de
uma nova estética, social pela política, pessoal pela poética. E mais
adianta que "Cardoso segue vivendo uma visão romântica do mundo
com aqueles que partilham a utopia. E contudo marcando ponto.
Com 70 anos na pele, a sua poesia é saborosamente caligráfica e sorte
de clássico tinteiro onde ainda podemos mergulhar o aparo da
sensibilidade, meio séc. passado sem risco de borrar a escrita com o
frenetismo rebuscado que faz moda, ou mesmo escola. Onde triunfa
uma exibição desenfreada de oca intelectualidade. Em Ac
encontramos o sossego bendito das coisas apetecidas" e já no fim do
seu texto conclui que "é sua arte desvendar a poesia onde outros não
a suspeitam"
Árvore de Frutos

Cheiras ao caju da minha infância


e tens a cor do barro vermelho molhado
de antigamente;
há sabor a manga a escorrer-te na boca
e dureza de maboque a saltar-te nos seios.

Misturo-te com a terra vermelha


e com as noites
de histórias antigas
ouvidas há muito.

No teu corpo
sons antigos dos batuques à minha porta,
com que me provocas,
enchem-me o cérebro de fogo incontido.

Amor, és o sonho feito carne


do meu bairro antigo do musseque!
ANTÓNIO JACINTO

Biografia

1924-1991

Angola

António Jacinto, cujo nome completo é António Jacinto do Amaral


Martins, nasceu em Luanda em 1924 e faleceu em 1991. Orlando Távora
é o pseudónimo utilizado por António Jacinto como contista.

Por razões políticas esteve preso entre 1960 e 1972. Militante do MPLA,
foi co-fundador da União de Escritores Angolanos, membro do
Movimento de Novos Intelectuais de Angola e participou activamente
na vida política e cultural angolana. Foi empregado de escritório e
técnico de contabilidade, Ministro da Educação de Angola e Secretário
de Estado da Cultura.

Colaborou com produções suas em diversas publicações nomeadamente


Jornal de Angola, Notícias do Bloqueio, Itinerário, Império e Brado
Africano e foi membro da revista Mensagem.

António Jacinto é considerado, por muitos, um dos maiores escritores


angolanos.

Eu queria escrever-te uma carta


amor,
uma carta que dissesse
deste anseio
de te ver
deste receio de te perder
deste mais que bem querer que sinto
deste mal indefinido que me persegue
desta saudade a que vivo todo entregue...

Extractos do Poema “Carta do contratado” In: Carlos Ervedosa. Roteiro


da Literatura Angolana. Luanda, Edição da Sociedade Cultural de
Angola, 1974, p. 74.

António Jacinto é o pseudónimo literário do poeta António Jacinto do


Amaral Martins, nascido em Luanda aos 28 de setembro de 1924 e
falecido em Lisboa a 21 de Junho e 1991. Fez os seus estudos no Golungo
Alto e em Luanda, onde concluiu no liceu Salvador Correia o curso
complementar de Ciências. Trabalhou durante alguns anos como
escriturário, desenvolvendo nessa altura actividades literárias e
patrióticas.

“O meu gosto pela leitura e pela poesia é influência da minha mãe. Na


minha infância vivíamos no interior de Angola, numa terra muito
pequena, muito isolada, com muito pouco convívio (Cambondo), e a
minha mãe contava-me contos infantis, da tradição portuguesa e não só,
e também ela conhecia – até de cor – poemas de poetas portugueses, que
recitava e muitas vezes também cantava! Daí ficou esse gosto pela poesia
e pela literatura Eu lembro-me que o meu primeiro escrito seria dentro
dessa linha de contos infantis e, talvez, o meu primeiro poema – uma
quadra – surgiu ainda no período de infância.” Extractos da entrevista
concedida a Michel Laban, para a sua obra “Angola: Encontro com
Escritores”.

Foi um dos fundadores do Partido Comunista Angolano que funcionou


na clandestinidade, o redactor dos Estatutos do Partido da Luta Unida
dos Africanos de Angola (PLUAA), foi preso em 1959, aquando do
“Processo dos Cinquenta”. Preso novamente em 1961, onde é condenado
após o julgamento de 1963 a 14 anos de cadeia, sendo deportado para o
Tarrafal (Cabo Verde). Resultado de uma campanha internacional em
1972, é-lhe fixada residência em Lisboa, onde trabalha na empresa
transitária ARNAUD até 1973, data em que foge para Argel (Argélia)
para a guerrilha do MPLA. Foi director do CIR (Centro de Instrução
Revolucionária) Kalunga na 2ª Região Político-Militar e do CIR Binheco
no Mayombe.Integrou a 1ª Delegação Oficial do MPLA que chegou a
Luanda em 8 de Novembro de 1974. Após a independência ocupou
cargos de responsabilidade no país, como o de Ministro da Educação e
Cultura, Secretário de Estado da Cultura, e na Direcção do MPLA.

Não é este ainda o meu poema


o poema da minha alma e do meu sangue
não
Eu ainda não sei nem posso escrever o meu
[poema
o grande poema que sinto já circular em mim

O meu poema anda por aí vadio


no mato ou na cidade
na voz do vento
no marulhar do mar
no Gesto e no Ser

Extractos do “Poema da Alienação” In: Poemas. Luanda, INALD; 1985,


p. 48-51.

Participou em actividades literárias na Sociedade Cultural de Angola, no


Cine-Clube de Angola, no movimento “Movimento dos Novos
Intelectuais de Angola”, na criação da revista Mensagem em Luanda.
Colaborou em diversos jornais e revistas como Mensagem (CEI), Cultura
(II), Boletim Cultural do Huambo, Jornal de Angola, Itinerário, Brado
Africano, Império, Notícias do Bloqueio, entre outros. Como contista por
vezes usava o nome literário de Orlando Távora, também usou o de
Kiaposse. Foi membro fundador da União dos Escritores Angolanos. Foi
galardoado com o Prémio LOTUS em 1979; com o Prémio Nacional de
Literatura em 1987, com o Prémio NOMA e com a Ordem Félix Varela de
1ª Classe, do Conselho de Estado da República de Cuba. Em 1993, o
Instituto Nacional do Livro e do Disco (INALD) do então Ministério da
Cultura instituiu o «Prémio Literário António Jacinto»

Seus contos e poemas integram diversas antologias e publicações


colectivas entre outras: Antologia dos Poetas de Angola (1950), Caderno
da Poesia Negra de Expressão Portuguesa (1953), Antologia da Poesia
Negra de Expressão Portuguesa (1958), Contistas Angolanos (1960),
Estrada Larga (s.d.), Poesia Africana di Rivolta (1969), Antologia da
Poesia Pré-Angolana (1976), No Reino da Caliban. Antologia Panorâmica
da Poesia Africana de Expressão Portuguesa II (1976).

Suas obras publicadas são: Poemas (1961; 1985), Vovô Bartolomeu (1979),
Em Kiluange do Golungo (1984), Sobreviver em Tarrafal de
Santiago(1985), Prometeu (1987), Fábulas de Sanji (1988), Vôvô
Bartolomeu (1989).

Pires Laranjeira escreveu que “António Jacinto produziu uam poesia de


escalpelização dos temas típicos do sócio-realismo: a dominação e a
exploração coloniais, o analfabetismo, a prostituição, o alcoolismo, a
alienação e a consciência de classe, a revolta e a transformação política
da sociedade. No grande Desafio contra o poder colonial, a união no
campo político está expressa nos textos em que todos se aglutinam sob o
foco iluminador do sujeito consciente de carregar a odiosa máscara
branca da dominação da terra dos negros que quer ajudar a libertar.” In:
Pires Laranjeira. Literatura, Cânone e Poder Político. Comunicação
apresentada .....p.1

Carlos Ervedosa escreveu referindo-se à década de 50 e o “Movimento


dos Novos Intelectuais de Angola” e à poesia de Jacinto: “António
Jacinto escreve então alguns dos mais belos poemas do Movimento, com
temas que se inscrevem tanto no mundo urbano como no mundo rural.
Deste, dá-nos o escritor, entre outros poemas, a “Carta de um
contratado”, onde nos transmite a angústia do homem do campo,
saudoso, longe da terra e da sua amada, escolhendo o poeta, com
precisão as palavras e as imagens, a forma em suma, que melhor pode
servir o texto.” In: Carlos Ervedosa. Roteiro da Literatura Angolana.
Luanda, Edição da Sociedade Cultural de Angola, 1974, p.73.

Obra:

Poemas, 1961
Outra vez Vovô Bartolomeu , 1979
Sobreviver em Tarrafal de Santiago, 1985
Naquela roça grande não tem chuva
é o suor do meu rosto que rega as plantações;

Naquela roça grande tem café maduro


e aquele vermelho - cereja
são gotas do meu sangue feitas seiva.

O café vai ser torrado,


pisado, torturado,
vai ficar negro, negro da cor do contratado.

Negro da cor do contratado!

Perguntem às aves que cantam


aos regatos de alegre serpentear
e ao vento forte do sertão:
Quem se levanta cedo? quem vai à tonga?
Quem traz pela estrada longa
a tipóia ou o cacho de dendém?
Quem capina e em troca recebe desdém

fuba podre, peixe podre,


panos ruins, cinquenta angolares
"porrada se refilares"?

Quem?

Quem faz o milho crescer


e os laranjais florescer
- Quem?

Quem dá dinheiro para o patrão comprar


máquinas, carros, senhoras
e cabeças de pretos para os motores?

Quem faz o branco prosperar,


Ter barriga grande - ter dinheiro
- Quem?
E as aves que cantam
os regatos de alegre serpentear
e o vento forte do sertão
responderão.
- "Monangambééé..."

Ah! Deixem-me ao menos subir às palmeiras


Deixem-me beber maruvo, maruvo
e esquecer diluído nas minhas bebedeiras
- "Monangambééé..."
Carta De Um Contratado

Eu queria escrever-te uma carta


amor,
uma carta que dissesse
deste anseio
de te ver
deste receio
de te perder
deste mais bem querer que sinto
deste mal indefinido que me persegue
desta saudade a que vivo todo entregue...

Eu queria escrever-te uma carta


amor,
uma carta de confidências íntimas,
uma carta de lembranças de ti,
de ti
dos teus lábios vermelhos como tacula
dos teus cabelos negros como dilôa
dos teus olhos doces como maboque
do teu andar de onça
e dos teus carinhos
que maiores não encontrei por aí...

Eu queria escrever-te uma carta


amor,
que recordasse nossos tempos na capopa
nossas noites perdidas no capim
que recordasse a sombra que nos caía dos jambos
o luar que se coava das palmeiras sem fim
que recordasse a loucura
da nossa paixão
e a amargura da nossa separação...

Eu queria escrever-te uma carta


amor,
que a não lesses sem suspirar
que a escoindesses de papai Bombo
que a sonegasses a mamãe Kieza
que a relesses sem a frieza
do esquecimento
uma carta que em todo o Kilombo
outra a ela não tivesse merecimento...

Eu queria escrever-te uma carta


amor,
uma carta que ta levasse o vento que passa
uma carta que os cajús e cafeeiros
que as hienas e palancas
que os jacarés e bagres
pudessem entender
para que o vento a perdesse no caminho
os bichos e plantas
compadecidos de nosso pungente sofrer
de canto em canto
de lamento em lamento
de farfalhar em farfalhar
te levassem puras e quentes
as palavras ardentes
as palavras magoadas da minha carta
que eu queria escrever-te amor....

Eu queria escrever-te uma carta...

Mas ah meu amor, eu não sei compreender


por que é, por que é, por que é, meu bem
que tu não sabes ler
e eu - Oh! Desespero! - não sei escrever também.
MONANGAMBA

Naquela roca grande não tem chuva


é o suor do meu rosto que rega as plantações;

Naquela roca grande tem café maduro


e aquele vermelho-cereja
são gotas do meu sangue feitas seiva.

O café vai ser torrado


pisado, torturado,
vai ficar negro, negro da cor do contratado.

Negro da cor do contratado!

Perguntem as aves que cantam,


aos regatos de alegre serpentear
e ao vento forte do sertão:

Quem se levanta cedo? quem vai a tonga?


Quem traz pela estrada longa
a tipoia ou o cacho de dendém?
Quem capina e em paga recebe desdem
fuba podre, peixe podre,
panos ruins, cinquenta angolares
"porrada se refilares"?

Quem?

Quem faz o milho crescer


e os laranjais florescer
- Quem?
Quem dá dinheiro para o patrão comprar
maquinas, carros, senhoras
e cabeças de pretos para os motores?
Quem faz o branco prosperar,
ter barriga grande - ter dinheiro?
- Quem?

E as aves que cantam,


os regatos de alegre serpentear
e o vento forte do sertão
responderão:
- "Monangambééé..."

Ah! Deixem-me ao menos subir ás palmeiras


Deixem-me beber maruvo, maruvo
e esquecer diluído nas minhas bebedeiras

- "Monangambéé...'"

(Poemas, 1961)
VADIAGEM

Naquela hora já noite


quando o vento nos traz mistérios a desvendar
musseque em fora fui passear as loucuras
com os rapazes das ilhas:
Uma viola a tocar
o Chico a cantar
(que bem que canta o Chico!)
e a noite quebrada na luz das nossas vozes
Vieram também, vieram também
cheirando a flor de mato
- cheiro gravido de terra fértil -
as moças das ilhas
sangue moço aquecendo
a Bebiana, a Teresa, a Carminda, a Maria.
Uma viola a tocar
o Chico a cantar
a vida aquecida com o sol esquecido
a noite é caminho
caminho, caminho, tudo caminho serenamente negro
sangue fervendo
cheiro bom a flor de mato
a Maria a dançar
(que bem que dança remexendo as ancas!)
E eu a querer, a querer a Maria
e ela sem se dar
Vozes dolentes no ar
a esconder os punhos cerrados
alegria nas cordas da viola
alegria nas cordas da garganta
e os anseios libertados
das cordas de nos amordaçar
Lua morna a cantar com a gente
as estrelas se namorando sem romantismo
na praia da Boavista
o mar ronronante a nos incitar
Todos cantando certezas
a Maria a bailar se aproximando
sangue a pulsar
sangue a pulsar
mocidade correndo
a vida
peito com peito
beijos e beijos
as vozes cada vez mais bebadas de liberdade
a Maria se chegando
a Maria se entregando
Uma viola a tocar
e a noite quebrada na luz do nosso amor...

(Poemas, 1961)
UM PERFIL

em duas décimas

OLHOS NEGROS, PEQUENINA


BASTOS CABELOS DOIRADOS
PENA É MINHA MENINA
SEREM OXIGENADOS

É linda, muito ladina,


Elegante, vaporosa,
Redondinha, bem jeitosa,
OLHOS NEGROS, PEQUENINA,
Pequenino pé, traquina,
Com pulsos bem modelados,
Formosos lábios pintados,
Perna bem feita, catita,
Face redonda, bonita,
BASTOS CABELOS DOIRADOS.

Tangendo a lira divina,


Gloso o mote do Fresquinho:
Mas se me falta o jeitinho
PENA É MINHA MENINA
Pois sendo como a bonina
Queres versos inspirados
E os meus serão rasgados
E para sempre desfeitos
Por teus cabelos bem feitos
SEREM OXIGENADOS.

(Luanda, Junho de 1945)


RECORDANDO

Oh! Meu Golungo em que a floresta assume


Graças infinitas; doce perfume
Que o Zenza lendário vem beijando
Recordando fatal amor tão nefando!

Zenza caprichoso, me vens contando,


Quando sereno te estava fitando,
Uma história de louco ciúme,
Numa noite de vibrante ciúme.

Em que Ela, embalada, terna e amante


Em meus braços, chorosa e anelante
Me jurava amor eterno. Tão querida!

(Sem indicação de local e data)

Nota: O manuscrito, em papel quadriculado fino e escrito a verde,


provavelmente parte de uma carta, contém a seguinte dedicatória:
“dedicado à terra da Natália e do Reinaldo”, dois irmãos do poeta.
C. Bom

Paisagem em frente
No espelho do horizonte
Imagem é
do fogo a Ilha de fronte.

E o Mar! O Mar
de envolver volveres de solidão?
Obsessivo
O desejo de partir
E esta maldição
Imular
De nunca chegar
E de jamais voltar!

(CT. Chão Bom, 29/3/1967)

Nota: Este poema foi publicado, como já referi, em “Sobreviver em


Tarrafal de Santiago” Na versão do livro o primeiro verso passa a
título, “Paisagem em Frente”, começando no verso seguinte. O nono
verso do texto publicado contém a palavra “Imular” mas na versão
do livro foi substituída por “Insular”.
OUTROS POEMAS

Carta dum contratado

Eu queria escrever-te uma carta


amor,
uma carta que dissesse
deste anseio
de te ver
deste receio
de te perder
deste mais que bem querer que sinto
deste mal indefinido que me persegue
desta saudade a que vivo todo entregue...

Eu queria escrever-te uma carta


amor,
uma carta de confidências íntimas,
uma carta de lembranças de ti,
de ti
dos teus lábios vermelhos como tacula
dos teus cabelos negros como dilôa
dos teus olhos doces como macongue
dos teus seios duros como maboque
do teu andar de onça
e dos teus carinhos
que maiores não encontrei por aí...

Eu queria escrever-te uma carta


amor,
que recordasse nossos dias na capôpa
nossas noites perdidas no capim
que recordasse a sombra que nos caía dos jambos
o luar que se coava das palmeiras sem fim
que recordasse a loucura
da nossa paixão
e a amargura da nossa separação...

Eu queria escrever-te uma carta


amor,
que a não lesses sem suspirar
que a escondesses de papai Bombo
que a sonegasses a mamãe Kiesa
que a relesses sem a frieza
do esquecimento
uma carta que em todo o Kilombo
outra a ela não tivesse merecimento...

Eu queria escrever-te uma carta


amor,
uma carta que ta levasse o vento que passa
uma carta que os cajus e cafeeiros
que as hienas e palancas
que os jacarés e bagres
pudessem entender
para que se o vento a perdesse no caminho
os bichos e plantas
compadecidos de nosso pungente sofrer
de canto em canto
de lamento em lamento
de farfalhar em farfalhar
te levassem puras e quentes
as palavras ardentes
as palavras magoadas da minha carta
que eu queria escrever-te amor...

Eu queria escrever-te uma carta...

Mas, ah, meu amor, eu não sei compreender


por que é, por que é, por que é, meu bem
que tu não sabes ler
e eu - Oh! Desespero - não sei escrever também!
(Poemas)
Monangamba

Naquela roça grande não tem chuva


é o suor do meu rosto que rega as plantações:

Naquela roca grande tem café maduro


e aquele vermelho-cereja
são gotas do meu sangue feitas seiva.

O café vai ser torrado


pisado, torturado,
vai ficar negro, negro da cor do contratado.

Negro da cor do contratado!

Perguntem às aves que cantam,


aos regatos de alegre serpentear
e ao vento forte do sertão:

Quem se levanta cedo? quem vai à tonga?


Quem traz pela estrada longa
a tipóia ou o cacho de dendém?
Quem capina e em paga recebe desdém
fuba podre, peixe podre,
panos ruins, cinquenta angolares
"porrada se refilares"?

Quem?

Quem faz o milho crescer


e os laranjais florescer
- Quem?

Quem dá dinheiro para o patrão comprar


maquinas, carros, senhoras
e cabeças de pretos para os motores?
Quem faz o branco prosperar,
ter barriga grande - ter dinheiro?
- Quem?

E as aves que cantam,


os regatos de alegre serpentear
e o vento forte do sertão
responderão:
- "Monangambééé..."

Ah! Deixem-me ao menos subir às palmeiras


Deixem-me beber maruvo, maruvo
e esquecer diluído nas minhas bebedeiras

- "Monangambééé..."

(Poemas)
Poema da alienação

Não é este ainda o meu poema


o poema da minha alma e do meu sangue
não
Eu ainda não sei nem posso escrever o meu poema
o grande poema que sinto já circular em mim

O meu poema anda por aí vadio


no mato ou na cidade
na voz do vento
no marulhar do mar
no Gesto e no Ser

O meu poema anda por aí fora


envolto em panos garridos
vendendo-se
vendendo

“ma limonje ma limonjééé”

O meu poema corre nas ruas


com um quibalo podre à cabeça
oferecendo-se
oferecendo

“carapau sardinha matona


ji ferrera ji ferrerééé...”

O meu poema calcorreia ruas


“olha a probíncia” “diááário”
e nenhum jornal traz ainda
o meu poema

O meu poema entra nos cafés


“amanhã anda a roda amanhã anda a roda”
e a roda do meu poema
gira que gira
volta que volta
nunca muda

“amanhã anda a roda


amanhã anda a roda”

O meu poema vem do Musseque


ao sábado traz a roupa
à segunda leva a roupa
ao sábado entrega a roupa e entrega-se
à segunda entrega-se e leva a roupa

O meu poema está na aflição


da filha da lavadeira
esquiva
no quarto fechado
do patrão nuinho a passear
a fazer apetite a querer violar

O meu poema é quitata


no Musseque à porta caída duma cubata

“remexe remexe
paga dinheiro
vem dormir comigo”

O meu poema joga a bola despreocupado


no grupo onde todo o mundo é criado
e grita

“obeçaite golo golo”

O meu poema é contratado


anda nos cafezais a trabalhar
o contrato é um fardo
que custa a carregar
“monangambééé”

O meu poema anda descalço na rua

O meu poema carrega sacos no porto


enche porões
esvazia porões
e arranja força cantando

“tué tué tué trr


arrimbuim puim puim”

O meu poema vai nas corda


encontrou sipaio
tinha imposto, o patrão
esqueceu assinar o cartão
vai na estrada
cabelo cortado

“cabeça rapada
galinha assada
ó Zé”

picareta que pesa


chicote que canta

O meu poema anda na praça trabalha na cozinha


vai à oficina
enche a taberna e a cadeia
é pobre roto e sujo
vive na noite da ignorância
o meu poema nada sabe de si
nem sabe pedi
O meu poema foi feito para se dar
para se entregar
sem nada exigir
Mas o meu poema não é fatalista
o meu poema é um poema que já quer
e já sabe
o meu poema sou eu-branco
montado em mim-preto
a cavalgar pela vida.

(Poemas)
Castigo pro comboio malandro

passa
passa sempre com a força dele
ué ué ué
hii hii hii
te-quem-tem te-que-tem te-quem-tem

o comboio malandro
passa

Nas janelas muita gente


ai bô viaje
adeujo homéé
n'ganas bonitas
quitandeiras de lenço encarnado
levam cana no Luanda pra vender

hii hii hii


aquele vagon de grades tem bois
muú muú muú

tem outro
igual como este dos bois
leva gente,
muita gente como eu
cheio de poeira
gente triste como os bois
gente que vai no contrato

Tem bois que morre no viaje


mas o preto não morre
canta como é criança
"Mulonde iá késsua uádibalé
uádibalé uádibalé..."
Esse comboio malandro
sozinho na estrada de ferro
passa
passa
sem respeito
ué ué ué
com muito fumo na trás
hii hii hii
te-quem-tem te-quem-tem te-quem-tem

Comboio malandro
O fogo que sai no corpo dele
Vai no capim e queima
Vai nas casas dos pretos e queima
Esse comboio malandro
Já queimou o meu milho

Se na lavra do milho tem pacacas


Eu faço armadilhas no chão,
Se na lavra tem kiombos
Eu tiro a espingarda de kimbundo
E mato neles
Mas se vai lá fogo do malandro
- Deixa!-
Ué ué ué
Te-quem-tem te-quem-tem te-quem-tem
Só fica fumo,
Muito fumo mesmo.

Mas espera só
Quando esse comboio malandro descarrilar
E os brancos chamar os pretos pra empurrar
Eu vou
Mas não empurro
- Nem com chicote -
Finjo só que faço forca
Aka!

Comboio malandro
Você vai ver só o castigo
Vai dormir mesmo no meio do caminho.

(Poemas)
Ah! Se pudésseis aqui ver poesia que não há!

Um retângulo oco na parede caiada Mãe

Três barras de ferro horizontais Mãe


Na vertical oito varões Mãe
Ao todo
vinte e quatro quadrados Mãe
No aro exterior
Dois caixilhos Mãe
somam
doze retângulos de vidro Mãe
As barras e os varões nos vidros
projetam sombras nos vidros
feitos espelhos Mãe
Lá fora é noite Mãe
O Campo
a povoação
a ilha
o arquipélago
o mundo que não se vê Mãe
Dum lado e doutro, a Morte, Mãe
A morte como a sombra que passa pela vidraça Mãe
A morte sem boca sem rosto sem gritos Mãe
E lá fora é o lá fora que se não vê Mãe
Cale-se o que não se vê Mãe
e veja-se o que se sente Mãe
que o poema está no que
e como se vê, Mãe
Ah! Se pudésseis aqui ver poesia que não há!

Mãe
aqui não há poesia
É triste, Mãe
Já não haver poesia
Mãe, não há poesia, não há
Mãe

Num cavalo de nuvens brancas


o luar incendeia carícias
e vem, por sobre meu rosto magro
deixar teus beijos Mãe, teus beijos Mãe

Ah! Se pudésseis aqui ver poesia que não há!

(Sobreviver em Tarrafal de Santiago)


Oração

Mãe
Agora que tu partiste
que será do teu menino?
Quem rirá da minhas partidas
e travessuras?
Quem terá indulgências aos erros meus
e sentirá as minhas amarguras?
Quem me contará histórias de encantar
das fadas e do fantástico
-ainda preciso delas, Mãe-
quem me ensinará as primeiras letras da Cartilha Maternal
me falará das estrelas
da África
da Europa do Atlântico do Universo
me ensinará amor pelas andorinhas e pelos humildes
e me ensinará humanidade?
Quem?
Agora que te foste embora
(quantas lágrimas por mim choraste,
e choraste por ti à partida?)
onde um regaço para pousar minha cabeça de cansaços?
Mãe
agora que partiste
o teu menino está perdido na floresta de gigantes maus
escuta Mãe
o teu menino será forte
como quiseste
(«come Antoninho»
«come Antoninho»)
E saberá pelas estrelas
Encontrar o caminho da nossa casa
Mãe.
Agora que tu partiste
Ainda estamos sempre juntos
(cordão umbilical inquebrável nos ligou)
ainda estamos juntos
a cada raio de sol
a cada revérbero de Lua no mar
a cada murmuro lamento da floresta no Golungo
-sempre juntos
Mãe.

(Sobreviver em Tarrafal de Santiago)


ARLINDO BARBEITOS

Biografia

ANGOLA

Arlindo Barbeitos nasceu em 1940, em Catete, Angola. Em 1961


aquando da sua incorporação no Exército exilou-se em França, tendo
nesta altura aderido ao MPLA.

Arlindo Barbeitos frequentou o liceu em Angola e em Portugal,


estudou antropologia e sociologia na Universidade de Frankfurt e é
doutorado em Etnologia. Em 1973 passou a desempenhar as funções
de assistente auxiliar do Instituto de Etnologia da Universidade Livre
de Frankfurt.

Quando regressou a Angola, em 1975, iniciou funções no Instituto de


Investigação Científica de Angola. A sua obra poética tem sido
publicada em diversas revistas na Alemanha, em Angola e em
Portugal.

olhos de peixe são teus dedos oh meu barco oh meu barco à busca de
continentes ainda por descobrir se afundou o meu barco no mar do
teu ventre oh meu barco oh meu barco olhos de peixe são teus dedos

In: Arlindo Barbeitos. Angola, Angolê, Angolema. Luanda, União dos


Escritores Angolanos, 1976, p.53.

Arlindo do Carmo Pires Barbeitos, nasceu a 24 de Dezembro de 1940


em Catete, Icolo e Bengo, Província do Bengo. Passou a sua infância
entre Catete e o Dondo, fez os seus estudos primários e secundários
em Luanda. Aos 17 anos foi para Portugal, de onde saiu com 21 anos
por motivos políticos, indo para França, Alemanha, onde fez estudos
de Sociologia, Antropologia, além de Filosofia, Economia e Estatística
na Universidade de Frankfurt. Nesse período também viajou por
toda a Europa.

“E então, esse regresso – se é que é regresso – às culturas africanas, o


desejo de as conhecer bem, de articular de uma maneira elaborada
aquilo, que eram coisas que eu tinha visto na minha infância – coisas
em que algumas pessoas da minha família mesmo haviam
participado, e, parcialmente, até eu... -, isso me levou a uma outra
coisa: foi, em certo momento, aceitar que uma pessoa é como é e não,
por vergonha ou outra razão, o que poderia ou deveria ser.”. In:
Michel Laban. Angola. Encontro com Escritores. Porto, Fundação
Eng. António de Almeida, 1991, II vol. p. 529.

Em 1971 aderiu ao MPLA, regressando a Angola integrado nas suas


fileiras, dando aulas na Frente Leste. Em 1972 vítima de doença vai
tratar-se na Europa, onde volta a estudar, iniciando uma tese de
doutoramento em Etnologia sobre “As realezas sagradas”. Em 1975
na sequência da Revolução de 25 de Abril de 1974, regressou a
Angola. Foi professor no ISCED (Lubango), Adido-Cultural na
República da Argélia.

Poeta, é considerado como integrante da geração dos anos 70. É


membro fundador da UEA, com colaboração dispersa em vários
jornais e revistas angolanas, portuguesas e outras.

Suas principais obras publicadas são: Angola, Angolê, Angolema


(1976), Nzoji (1979), O Rio. Estórias de Regresso (1985), Fiapos de
Sonho (1992).

oh veleiro encarnado
em lata de cacau

oh veleiro
singrando de velas enfunadas
por mares de prata
oceanos de saudade
não me leves

não me leves
oh negreiro de sonhos
para onde não quero
singrando de velas enfunadas
por mares de prata
oceanos de saudade

oh veleiro encarnado
em lata de cacau

embarcados
em nau de fumo
que a ilusão branca arrasta
navegam
pássaros roxos
por oceanos de embuste

In: Arlindo Barbeitos. Fiapos de Sonho. Lisboa, Veja, 1992, p.32-35.

Para Francisco Soares: “em Nzoji, de Arlindo Barbeitos, as fusões da


instituição escrita com a tradicional atingem uma contenção, um
rigor e um alcance invejáveis, levando a reencontrarmos os vasos
comunicantes da poesia japonesa, das adivinhas e provérbios
africanos e da lírica europeia de 60... Na lírica de Barbeitos a
transculturação é completa, por isso mesmo, por tocar o corpo, a
forma, e não só a alma, a «mensagem» do enunciado.”. In: Francisco
Soares. Notícia da Literatura Angolana. Lisboa, Imprensa Nacional-
Casa da Moeda, 2001, p. 233.

almas de feiticeiros desaparecidos


repousam de noite nas copas de árvores antigas

nuvens brancas
pássaros nocturnos

o hóspede de sandálias de pacaça


aproxima-se do fogo e adormece

almas de feiticeiros desaparecidos


repousam de noite nas copas de árvores antigas

In: Arlindo Barbeitos. Angola, Angolê, Angolema. Luanda, União dos


Escritores Angolanos, 1976, p. 15.

Obra:

Angola, Angolê, Angolema, 1976


Nzoji Sonho, 1979
O Rio, 1985
Fiapos de Sonho, 1992
em mão frágil de amarelo
se quebra o galho de gajajeira
pela tardinha vermelha em flor
sussurrar de vento
não é voz de capim crescendo
é murmúrio impaciente
de gentes
no azul de parte alguma
em mão frágil de amarelo
se quebra o galho da gajajeira
pela tardinha vermelha em flor

(Angola, angolê, angolêma)


saudade
é o tempo de pacassas pardas
e macacos sem rabo servindo de administradores
quando o calor ia derretendo o céu
e a chuva se vendia na farmácia
do comerciante de cabelos de fio
saudade
é o tempo de patos bravos
e macacos sem rabo servindo de padres

quando o medo ia gelando a terra


e o pranto se dava de beber aos porcos
do comerciante de cabelos de fio

(Angola, Angolê, Angolêma)


HENRIQUE ABRANCHES

Biografia

Angola

“Um eco quase absurdo pela sua natureza antiquíssima chega-me


aos ouvidos que já distinguem mal os ruídos que os homens deitam
pelo tempo fora, como se o tempo fosse o dorso arqueado da
Montanha de Ossão. Eu o oiço, meus filhos, vindo de longe, de muito
longe, percurtido, talvez, nas pedras que fazem eco e que costumam
testemunhar as as coisas antigas...eu oiço, meus pequenos, e assim
como o oiço vejo vossa pele que se arrepia e fica toda pontilhada,
como se o eco antiquíssimo perturbasse também os vossos ouvidos
ainda inexperientes...”

In A konkhava de Feti, 1981 – Página - 73.

Henrique Moutinho ABranches, nasceu em Lisboa, a 29 de Setembro


de 1932. Tem nacionalidade angolana automaticamente concedida
pelo Art.º 6º. Da Constituição, resultado da sua participação na Luta
de Libertação Nacional. Veio para Angola em 1974 onde estudou os
últimos dois anos do Ensino Secundário no Liceu Salvador Correia
em Luanda, que só termina em Lisboa, onde frequenta também a
cadeira de desenho da Sociedade de Belas artes. Frequentou também
durante alguns anos, em Argel, a Faculdade de Belas artes, Curso de
Artes Plásticas. Nos anos cinquenta volta a Angola. Toma parte
numa exposição colectiva com os pintores da época no Museu de
Angola. Publica uma série de artigos de etnologia na revista
“Cultura” da Sociedade Cultural de Angola, um organismo
associativo que incluía toda a intelectualidade revolucionária
angolana, e jornal da ANAGOLA, então dirigido por António Jacinto.

“Ó Nambalissita meu Senhor e meu Pai, como posso eu contar-te


uma história de amor quando no meu coração ecoa apenas o mais
profundo ódio? E Nambalissita compreendeu a impossibilidade
daquela narração que tanto desejava ouvir, porque a Nambalissita
como a Onhoka são preciosas as histórias de amor, visto que é o
amor e não o ódio que implica as gerações, ao passo que é o ódio e
não o amor que estabelece entre elas a confusão, donde só se sai com
a subtileza de Onhoka, com herói da lenda antiga ...”

In: A konkhava de Feti, 1981 – Página - 206

Em 1959 vai estabelecer-se no Kwando- Kubango com a esposa, como


tipógrafo da Brigada de Construção do Caminho de Ferro de
Moçamedes, encontrando-se entre os quadros e trabalhadores que
levaram a via férrea até á Menongue. Em 1960 transfere-se para uma
Brigada do Caminho de Ferro de Luanda e instalando-se em
Ndalatando, donde é forçado a demitir-se por razões de opressão
ideológica. No ano seguinte, realiza uma série de conferências sobre
diversos temas de antropologia, uma exposição de arte tradicional e
um festival de concerto de solista virtuosos temas de antropologia.
Teve participação na Luta de Libertação Nacional, chegando mesmo
a ter a sua cabeça a prémio e fotografia na primeira página do Diário
de Notícias. Em Paris, sob recomendação de Agostinho Neto com
quem aí se encontrou, viaja para Argélia e funda, com os outros
companheiros( entre eles Pepetela ) o Centro de Estudos Angolanos
onde fica a funcionar e onde publica vários trabalhos entre eles a
“Historia de Angola, Mais tarde editada em afrontamento no Porto, a
primeira banda desenhada angolana “ contra a escravidão”
prefaciada por Agostinho Neto, que teve grande impacto no povo,
como arma , esclarecimento e mobilização revolucionários.

Criou a maioria dos Museus actuais de Angola “entre eles os Museus


Nacionais de Antropologia em Luanda e de Arqueologia em
Benguela”, criou também uma escola de Banda Desenhada de onde
saiu a equipa que trabalhou mais tarde no “Jornal do Mam Kiko”
uma revista de Banda desenhada.

É membro da União dos Escritores Angolanos (UEA). Tem as


seguintes obra publicadas : “A Konkhava de Feti ,1981” que recebeu
o Prémio Nacional de Literatura , “ O Clã de Novembrino” que
recebeu também o Prémio Nacional de Literatura , “ Kissoko de
Guerra” , Dialogos,1962

Sob encomenda da Petrofina, parte para o Soyo e realiza aí um novo


trabalho de pesquisa antropológica de campo, assistido pelo Sr. Lito
Silva . Em 1991, publica o resultado dessa pesquisa num volume
intitulado “Sobre os Bassolongo Arqueologia da tradição oral”
editado pela Fina em edição de luxo. Redigiu e publicou várias obras
literárias, nomeadamente, “Sobre a Colina de Kalomboloca” um
caderno de poesia 1961 Titânia, duas novelas , 1966,editado pelas
Edições Dom Quixote em Lisboa, tem publicado um romance, de
caracter histórico “ Misericórdia para o Reino do Kongo”, tem
também três manuscritos de Romance que aguardam edição, assim
como um caderno de poesia, “ O elogio paradoxo”, ganhou também
o Prémio Literário Cidade de Luanda com o manuscrito “ O arcano
do Leão”, Contos Divagantes”, ganhou o 2º lugar no concurso de
conto e poesia dos Jogos Florais de Chá de Caxinde . Nos últimos
dois anos faz pequenos trabalhos, entre eles uma comunicação sobre
mitologia para uma Conferência Internacional sobre o Ensino da
História de áfrica (“ O mito solongo de Diogo Cão), um relatório
arqueológico sobre o Chantier da Kitala( editado na revista Leba em
Coimbra) , colaboração com o F.AS num workshop no Namibe.
Ao Bater da Chuva

A porta fechada é uma obsessão.


As vozes caladas em torno de nós,
as pausas alongadas em silêncios de uma angústia
nova,
são a descontinuidade do tempo interrompido
dentro da casa que arrombaram ontem,
no coração da aldeia do Mazozo.
A chuva cai em bátegas doces, a chuva bate o capim
molhado,
e soa...
A humanidade é fria.

As mulheres já choraram tudo


- A Mãe Gonga comandou o coro.
Esvaem-se agora em surdina muda,
que agudiza o bater da chuva.
Os homens dizem de quando em quando
um nome obstinado.

Chamava-se Infeliz
aquele rapaz
que levaram ontem
do coração da aldeia.

A chuva matraqueia ainda e sempre


na porta fechada como uma obsessão.
Como ela nos lembra o som odiado
que dia após dia
nos sobressalta!
Como ela recorda o som da metralha,
que dia após dia
desce o morro da Calomboloca
e bate naquela porta fechada,
obsecada de protecção!

A gente conhece o som da metralha


quando ela vem no fim do dia.
Quando ela vem, silencia a aldeia,
então, em sobressalto, o povo diz:
- Foram fuzilados...

E ninguém sabe do Infeliz,


aquele rapaz que levaram ontem...
JOÃO MAIMONA

Biografia

Angola

“inventei alegorias. Palavras cobrindo sublavras: eram metáforas


quando meus dedos cantaram o rosto do meu retracto e concebi o
lúmem atravessado por silêncios”

In Idade das Palavras.

João Maimona

Nascido em Kibokolo, Maquela do Zombo, província do Uíge, João


Maimona, é actualmente deputado da Assembleia Nacional, pela
Bancada do MPLA Estudou humanidade cientifica em Kinshasa,
República Democrática do Congo. Em 1978, fixou residência na
província angolana do Huambo, onde licenciou – se em Medicina
Veterinária.

“as palavras que desciam uma e outra . a síncope/ da realidade não


podia silenciar o sismo e os rios/ d’africa que espreitavam subúrbios:/
o sonho apaixonado de um destino comum…””

In Festa da Monarquia

João Maimona é diplomado em estudos superiores especializados em


virologia médica e epidemiologia animal, pelo institut pasteur de
Paris e pela École Nationale Vétérinaire d´Alfort, na França.

Poeta, ensaísta e crítico literário, foi membro fundador da Brigada


jovem de literatura no Huambo. Foi laureado duas vezes com um
dos mais prestigiados prémios nacionais, o prémio Sagrada
Esperança, com as obras Trajectória Obliterada (1984) e Idade das
Palavras (1996).

Em 1987 foi distinguido com a medalha de bronze no concurso


internacional de poesia organizado pela academia brasileira de letras,
na cidade do Rio de Janeiro. Sua obra poética é objecto de estudo em
diversas universidades, nomeadamente na Faculdade de Letras da
Universidade de Lisboa (Portugal) e na Pontifícia Católica de Minais
Gerais (Brasil).

“fiz voar uma noite consciente/ apenas/ uma lágrima imensa deixei
cair/ á beira da palavra perfeita/há uma noite que sobrevive em cada
lágrima”.

In Idade das Palavras.

Figura em distintas antologias em Angola, Portugal, Brasil, Espanha,


Bélgica, França e Macedónia. Alguns dos poemas seus foram objecto
de tratamento no âmbito da escultura, numa belíssima amostra de
intertextualidade protagonizada pelo escultor angolano Massongi
Afonso, um dos mais proeminentes nomes das artes plásticas
angolanas, intitulada O falar das Máscaras. Poesia e escultura,
exposição essa que sob os auspícios da Alliance Française de Luanda,
esteve aberta ao público durante o mês de Abril de 2000, na
associação dos franceses de Angola. JM é autor de 7 obras,
nomeadamente: Trajectória Obliterada (Poemas – 1985), Les Roses
Perdeus de Cunene (Poemas – 1985), Traço de União (Poemas –
1987), Diálogo com a Peripécia (teatro – 1987), As Abelhas do Dia
(Poemas – 1988),
ARTE POÉTICA

Que erosão
no choque genésico das marés
de encontro às pedras habitadas.

Cai areia na areia.

Assim o gasto da palavra


limando os duros conformismos
libertando as verdades mais remotas
tão necessárias ao fruir dos gestos.

(1979)
AS MURALHAS DA NOITE

A mão ia para as costas da madrugada


As mulheres estendiam as janelas da alegria
nos ouvidos onde não se apagavam as alegrias.

Entre os dentes do mar acendiam-se braços.

Os dias namoravam sob a barca do espelho.


Havia uma chuva de barcos enquanto o dia tossia.
E da chuva de barcos chegavam colchões,
camas, cadeiras, manadas de estradas perdidas
onde cantavam soldados de capacetes
por pintar no coração da meia-noite.

Eram os barcos que guardavam as muralhas


da noite que a mão ouvia nas costas
da madrugada entre os dentes do mar.
MEMóRIA

Baloiçando nos escombros de teu itinerário


saberás que os gados constroem estradas.
E quando a mão dezlizar pela margem
das cicatrizes que se afundam na noite
saberás que a tua mão viaja para a
colina dos dias sem escombros
e saberás que no berço da noite jaz a luz
drogada e ouvida pela cruz sobre quem viajaste.
JOFRE ROCHA

Biografia

1941

Angola

JOFRE ROCHA
(Cachimane, Angola, 1941-)

“Que mais dizer – te,


Meu amor perdido?
resta – me apenas agarrar
essa réstia de luar
sinfonia a bailar em esperança
Que sempre recordo com saudade”

In 60 Canções de amor e Luta – página 52

Jofre Rocha, pseudónimo literário de Roberto António Victor


Francisco de Almeida, nasceu em Icolo e Bengo , a 05 de fevereiro de
1941.

Fez os estudos primários na Escola da Missão Evangélica em Luanda,


ingressando depois no Liceu Nacional Salvador Correia, na mesma
cidade, que frequenta de 1952 a 1961.

Em Junho de 1961 é detido pela PIDE á sua chegada, no aeroporto de


Lisboa, permanecendo nessa situação na Cadeia do Aljube até
Setembro do mesmo ano, data em que é recambiado para Luanda,
sempre sob prisão . Cumpre assim um período de prisão sem culpa
formada, que se prolonga até Fevereiro de 1963.

“Vida das pessoas é assim mesmo. Pessoa ás vezes faz uma coisa sem
poder pensar que essa coisa vai dar muita volta, vai esticar tanto até
dar uma maka grande que vira a vida da gente. Como uma chuva
que está ainda começar com gotas pequeninas, que começa ainda
trazer alegria na cara dos monandengues, sem ninguém poder
adivinhar nessa chuva pequenina a chuva grande que vai fazer cair o
barro das cubatas e estragar a semente nas lavras, é assim também
outras coisas que vêm na vida das pessoas...”

In Jofre Rocha – Estórias do Musseque”

Em 1970, matricula-se na faculdade de Direito da Universidade de


Lisboa (não havia na altura Faculdade de Direito em Angola ),
estudando o 1º ano como aluno á distância ... por dificuldades várias
acaba por desistir. Em 1989/90, conclui em Luanda a licenciatura em
ciências sociais .

Aquando da conferência pronunciada na Faculdade de Letras da


Universidade Federal do Rio de Janeiro, em Setembro de 1984, Jofre
Rocha teve ocasião de referir o seguinte: “ O inicio do século XIX
caracteriza – se por uma marcada penetração capitalista mais
acentuada na colónia de Angola. Em 1906 foi criado o imposto de
trabalho, que veio sobremaneira tornar mais difícil a vida dos
camponeses, forçando – os a assalariar – se. Por outro lado, para que
os monopólios pudessem assumir integralmente a sua actividade de
exploração dos recursos de Angola e assegurar os interesses de
Portugal, o governo colonial tomou medidas tendentes a eliminar a
burguesia local, afastando – a também dos postos da administração e
da economia. Essa conjuntura política provocou a agudização da luta
entre a colonização e o colonizador, reflectindo – se também na
imprensa. Origina – se aqui um protesto colectivo de intelectuais
angolanos contra um artigo ultra – reaccionário publicado na Gazeta
de Loanda, em 1909. Esse protesto intitulado “ A voz de Angola
clamando no deserto” assume um caracter combativo e constitui um
libelo polémico e bem documentado a favor da situação do
colonizado, onde se verifica já uma tomada de posição nacionalista e
a aspiração pela dignificação do homem angolano. Os primeiros
textos da poesia angolana que se conhecem, abordam a temática
lírico – sentimental, tecendo sobretudo à terra à beleza da mulher
africana.”

In Literatura Angolana ontem e Hoje – 1984 – Página – 9.

Membro do MPLA , após a Independência do país em 1975, foi


chamado a desempenhar vários cargos tanto no governo como no
seu partido. Só para citar alguns: Director – Geral do Ministério das
Relações Exteriores, Vice- Ministro das Relações Exteriores, Ministro
do Comércio Externo, Ministro do Planeamento e é desde 1996,
Presidente do Parlamento angolano.

Membro fundador da união dos escritores Angolanos, teve


colaboração dispersa em vários órgãos nacionais e estrangeiros,
figurando no cancioneiro “Angola, Poesia 71” e nas antologias
“Poesia Angolana de revolta “, de Gluseppe Mea, “ No Reino de
Caliban” , de Manuel Ferreira (// Vol.) “ Os Anos da Guerra “, de
João de Melo, “ Manguxi da nossa Esperança “, Caderno Lavra e
Oficina nº 26 , dedicado a Agostinho Neto , e “ Poemas a la Madre
África “, de Xosé Lois Garcia. Figura ainda na obra “ Angola –
Encontro com Escritores, de Michel Laban e antologia “ Poesia da
África ao Sul do Sahara, editado pela UNESCO . No período de 1978,
em que deixou de publicar, foi director da Revista “ NOVENBRO. É
autor de várias obras literárias, entre elas: Tempo de Cicio –
Cadernos Capricórnio, Lobito – 1973, Estórias do Musseque –
Edições 70, Lisboa – União dos Escritores Angolanos 1979, Colecção
2k – 2ª Edição, União dos Escritores Angolanos – 1979, Editora Ática
– São Paulo, Brasil – 1970, Assim se Fez Madrugada – Edições Asa,
Porto – 1977, Estórias de Kapangombe – Caderno Lavra e Oficina Nº
13, União dos Escritores Angolanos – 1978, Crónicas de Ontem e de
Sempre – Caderno Lavra e Oficina Nº 47 – União dos Escritores
Angolanos – 1984, Estória Completa – Caderno Lavra e Oficina Nº 56
– União dos Escritores Angolanos – 1985, 60 Canções de Amor e Luta
– Edições Asa, Porto Portugal. Entre Sonho e Desvario – Caderno
Lavra e Oficina, 1985.
Sobre o escritor, o poeta António Jacinto escreveu: “Jofre Rocha,
revela a mesma posição face aos problemas do povo angolano, revela
a mesma força telúrica e o mesmo patriotismo. Militante enquanto
homem, permanece militante enquanto poeta. E acrescenta um novo
e oportuno vigor à poesia, abarcando o internacionalismo que a
militância impõe. Com homens, militantes e escritores como Jofre
Rocha, «Assim se faz (e vem fazendo) Madrugada».

Para Aires de Almeida Santos, Jofre Rocha: “ Caminhava no trilho


aberto pelos “Mais Velhos”, sem vacilações. No decorrer dos anos,
ele, que vinha cumprindo uma trajectória corajosa dentro da
Revolução, conseguiu sempre ocultar essa coragem por detrás de
uma modéstia insuspeita, um cabaz de sorrisos para todas as
crianças, inflexibilidade de princípios e muito amos. Recordo desse
tempo, que Jofre Rocha sempre se manteve apegado ao estudo. Lia
tudo, aprendia tudo. Tinha a certeza de que, o que hoje aprendesse,
amanha seria útil, a si e ao seu povo, principalmente ao seu povo.
Pires Laranjeira, professor Universitário e crítico literário português,
opina da seguinte forma, sobre a geração poética de Jofre Rocha:
“Quatro poetas no ghetto angolano, numa viagem de década,
publicam alguns livros que, circulando com bastantes dificuldades
(directas, com tiragens reduzidas), se impõem com discursos
poéticos novos – um discurso poético novo - de diferente , portanto
da mensagem ou da cultura. João Maria Vilanova; Vinte Canções
para Ximinho – 1971, Ruy Duarte de Carvalho, Chão do aperto –
1972, Jofre Rocha; Tempo de Cício – 1973, David Mestre; Crónica do
Ghetto – 1973. Estes são os livros que, no inicio dos anos 70, tempo
que antecede o 25 de abril, foram publicados em Angola, com um
real valor de inovação.”
PAISAGEM DO NORDESTE

rio estátua
braço sem carne

chuva no mar
em terra seca

sol na paisagem
terra em desgraça

fome nos lábios


fome nos olhos

ossadas brancas
urubus em volta

terra em brasa
ar calcinado

plantas com fome


homens com fome

fome nos olhos


no ar morte

(Tempo de cicio, 1973)


QUANDO A MANHÃ VIER

Quando a manhã vier


com um sol maduro
ofertando beijos
aos órfaos da ternura
quando a manhã vier
em apoteose de luz
a semear no vento
risos de alegria

quando a manhã vier


definitivamente
em alvorecer roseo
de paz e tranquilidade

de mãos nas mãos


saberemos chegado o nosso dia.

(1961)
MANUEL RUI

Biografia

Angola

Manuel Rui Alves Monteiro nasceu na cidade do Huambo a 4 de


Novembro de 1941. Efectuou os seus estudos primários e secundários
no Huambo, seguindo para Portugal, onde estudou Direito na
Universidade de Coimbra, terminando o curso em 1969. Enquanto
estudante foi activista cultural da Casa dos Estudantes do Império
(CEI), participou em acontecimentos literários e políticas, tenso sido
preso por dois meses em Portugal. Exerceu advocacia em Coimbra e
Viseu

“O Huambo era uma cidade muito específica, em que não acontecia


uma pequena-burguesia negra, em que, me recordo, andava eu no
meu 5º ano do liceu quando apareceu o primeiro funcionário da
secretaria da escola comercial negro, ido daqui de Luanda... As
primeiras pessoas que apareceram a instigar a ideia nacionalista – e
que eram do convívio do meu pai – eram principalmente
enfermeiros, idos aqui de Luanda, e missionários estrangeiros,
alguns médicos...” Palavras do escritor sobre a sua cidade natal. In:
Michel Laban. Angola. Encontro com Escritores. Porto, fundação
Eng. António de Almeida, 1991, II vol. p. 713.

Foi membro da redacção da revista Vertíce, fez parte da direcção da


Editora Centelha, participou em trabalhos do Centro de Estudos
Literários da Associação Académica de Coimbra em 1969, coordenou
o Sintoma, suplemento literário do Jornal do Centro.

Regressou a Angola em 1974, onde foi Director Geral da Informação


e Ministro da Informação no Governo de Transição. Após a
independência ocupou diversos cargos entre os quais o de Director
da Faculdade de letras do Lubango e do Instituto Superior de
Ciências da Educação (ISCED). Foi também professor universitário e
jurista.

Fecha só os olhos meu amor. E devagar escuta os mesmos sons. A


água escorre para a sede quente: areia de pés nús.

Encosta só o ouvido. Respira esta harmonia deste corpo. Os mesmos


sons projectos do tamanho deste mar.

Extractos do Poema “O Búzio” In: Manuel Rui. Cinco Vezes Onze


Poemas em Novembro. Luanda, União dos Escritores Angolanos,
1985, p.135.

Poeta, contista, ensaísta, crítico, escreve com frequência comentário


críticos para jornais e revistas angolanas. Tem alguns livros de
literatura infantil publicados. É o autor do Hino Nacional, versão
angolana da Internacional, Hino da Alfabetização, bem como de
outros poemas que integram o cancioneiro angolano. Colaborou em
diversos jornais como o Planalto, República, «Mosca», suplemento do
Diário de Lisboa, Jornal de Angola, Correio da Semana. Foi
galardoado com o Prémio «Caminho das Estrelas» de 1980, do
Concurso de Literatura Camarada Presidente, outorgado pelo
Instituto Nacional do Livro e do Disco de Angola (INALD).

A sua obra está incluída em: Monangola. A Jovem Poesia Angolana


(1976), No Reino de Caliban. Panorâmica da Poesia Africana de
Expressão Portuguesa II (1976), Lavra & Oficina. Caderno Especial
dedicado à Literatura Angolana em saudação à VI Conferência dos
escritores afro-asiáticos (1979), Poemas para Pioneiros (1979),
Manguxi da Nossa Esperança (1979), No Ritmo dos Tantãs (1991),
Textos Africanos de Expressão Portuguesa (s.d.), Poemas a la Madre
Africa. Antología de la Poesía Angolana del siglo XX (1992).

As suas obras publicadas são: Poesia sem Notícia (1967), A Onda


(1973), Regresso Adiado (1973), 11 Poemas em Novembro. Ano Um
(1976), Sim, Camarada (1977), 11 Poemas em Novembro. Ano Dois
(1977), A Caixa (1977), 11 Poemas em Novembro. Ano Três (1978).
Agricultura (1978), 11 Poemas em Novembro. Ano Quatro (1979),
Cinco dias depois da independência (1979), Memória de Mar (1980),
11 Poemas em Novembro. Ano Cinco (1980), 11 Poemas em
Novembro. Ano Seis (1981), Quem me dera ser onda (1982), 11
Poemas em Novembro. Ano Sete (1984), Cinco vezes Onze Poemas
em Novembro (1985), 11 Poemas em Novembro. Ano Oito (1988),
Crónica de um Mujimbo (1989), 1 Morto & os Vivos (1992), Rio Seco
(1997), Da Palma da Mão (1998), Assalto (s.d.) Saxofone e Metáfora
(2001).

O seu livro “Quem me dera ser Onda” foi editado diversas vezes e
traduzido para algumas línguas. Uma obra que suscitou grande
interesse do público leitor, pois aborda de uma forma satírica e
mordaz os problemas sociais da sua época. Inocência Mata diz-nos
sobre essa obra: “O primeiro convite que a leitura do texto de Manuel
Rui nos sugere é uma análise sociológica: a leitura de uma teia
textual em que quase numa visão caleidoscópica, Angola actual –
através da sua cidade-cérebro – se nos apresenta, é lida, é analisada
na sua trama social, sua História e sua Cultura social... Sintetizando
qualquer abordagem sociológica a este texto, pode dizer-se que é um
retrato realista da actual sociedade angolana, feito de forma irónica e
satírica, mas de uma ironia pedagógica.” In: Inocência Mata.
Literatura Angolana. Silêncios e Falas de Uma Voz Inquieta. Lisboa,
Mar Além, 2001, p.154.

“O meu pai é um reaccionário porque não gosta de peixe frito do


povo e ralha com a minha mãe. Ele é que é um burguês pequeno mas
diz que o Cranaval da Vitória é um burguês [...] Carnaval da Vitória é
revolucionário porque quando meu pai bateu em mim e no meu
irmão Zeca ele lhe quis morder. Nós não vamos deixar matar
Carnaval da Vitória porque a luta continua e o responsável da
comissão de moradores não sabe as palavras de ordem que os
pioneiros é que lhe ensinaram.” In: Manuel Rui. Quem me dera ser
Onda. P.44.

A Professora Laura Padilha diz-nos sobre “Rio Seco”: “é a


representação literária da possibilidade do encontro alquímico do
poeta (senhor da letra e da transformação) com o nômade (senhor da
voz e da tradição)...” In: Laura Cavalcante Padilha. “Em memória do
rio (Um esboço de leitura de dois romances angolanos)”. I Congresso
Internacional sobre Literatura Angolana, Luanda, 10-13 de Dez. 1997,
p.6.

“É largo este rio. Para chegarmos a contra-costa por terra, agora, só


atravessando este rio de barco. A ilha ficou dividida. São duas ilhas.
Barcos para a água doce e barcos para a água do mar?” In: Manuel
Rui. Rio Seco, 1997, p.531.
Não Vale a Pena Pisar

O capim não foi plantado

nem tratado,

e cresceu. É força

tudo força

que vem da força da terra.

Mas o capim está a arder

e a força que vem da terra

com a pujança da queimada

parece desaparecer.

Mas não! Basta a primeira chuvada

para o capim reviver.


http://br.geocities.com/poesiaeterna/angola.htm

http://www.uea-angola.org/quem.cfm

http://resistente.3e.com.pt/joomla/index.php?
option=com_content&view=article&id=39:antonio-jacinto-poeta-
angolano&catid=2:trabalhos-publicados

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