Dalmo Dallari
A Cidadania na Antigüidade
A palavra cidadania foi usada na Roma antiga para indicar a situação política de uma pessoa e
os direitos que essa pessoa tinha ou podia exercer. A sociedade romana fazia discriminações e
separava as pessoas por classes sociais. Havia, em primeiro lugar, os romanos e os
estrangeiros, mas os romanos não eram considerados todos iguais, existindo várias categorias.
Em relação à liberdade das pessoas era feita a diferenciação entre livres e escravos, mas entre
os que eram livres também não havia igualdade, fazendo-se distinção entre os patrícios –
membros das famílias mais importantes que tinham participado da fundação de Roma e por
isso considerados nobres – e os plebeus – pessoas comuns que não tinham o direito de ocupar
todos os cargos políticos. Com o tempo foram sendo criadas categorias intermediárias, para
que alguns plebeus recebessem um título que os colocava mais próximos dos patrícios e lhes
permitia ter acesso aos cargos mais importantes.
Dois anos depois, em 1789, ocorreu na França um movimento revolucionário semelhante, que
passou para a história com o nome de Revolução Francesa. Esse movimento foi muito
importante porque influiu para que grande parte do mundo adotasse o novo modelo de
sociedade, criado em conseqüência da Revolução. Foi nesse momento e nesse ambiente que
nasceu a moderna concepção de cidadania, que surgiu para afirmar a eliminação de privilégios
mas que, pouco depois, foi utilizada exatamente para garantir a superioridade de novos
privilegiados.
No dia 14 de julho de 1789 o povo invadiu a prisão da Bastilha, na cidade de Paris, onde se
achavam presos os acusados de serem inimigos do regime político absolutista. Esse fato
marcou o início de uma série de modificações importantes na organização social da França e
no seu sistema de governo, estando entre essas modificações a eliminação dos privilégios da
nobreza. Por esse motivo a tomada da Bastilha passou a ser comemorada como o dia da
Revolução Francesa, mas a revolução se caracteriza por um conjunto de fatos que tem início
bem antes daquela data.
Uma das inovações importantes, ocorrida algumas décadas antes, foi justamente o uso das
palavras cidadão e cidadã, para simbolizar a igualdade de todos. Vários escritores políticos
vinham defendendo a idéia de que todos os seres vivos nascem livres e são iguais, devendo ter
os mesmos direitos. Isso foi defendido pelos burgueses, que desejavam Ter o direito de
participar do governo, para não ficarem mais sujeitos a regras que só convinham ao rei e aos
nobres. O povo que trabalhava, que vivia de salários e que dependia dos mais ricos também
queria reconhecimento da igualdade, achando que se todos fossem iguais as pessoas mais
humildes também poderiam participar do governo e desse modo as leis seriam mais justas.
Cabe lembrar que as mulheres tiveram importante participação nos movimentos políticos e
sociais da Revolução Francesa. Quando se falava no direito da cidadania a intenção era dizer
que todos deveriam ter o mesmo direito de participar do governo, não havendo mais diferença
entre nobres e não-nobres nem entre ricos e pobres ou entre homens e mulheres.
A partir daí a cidadania continuou a indicar o conjunto de pessoas com direito de participação
política, falando-se nos “direitos da cidadania” para indicar os direitos que permitem participar
do governo ou influir sobre ele, o direito de votar e ser votado, bem como o direito de ocupar os
cargos públicos considerados mais importantes. Mas a cidadania deixou de ser um símbolo de
igualdade de todos e a derrubada dos privilégios da nobreza deu lugar ao aparecimento de
uma nova classe de privilegiados.