Mídia e
Sociedade
e m t rans f or m a ç ã o
Editora Unesp
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CEP 01001-900 - São Paulo, SP
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MÍ D I A E
SO C I E D A D E
E M T R A N S F O R M A Ç Ã O
Sumário
Apresentação
Parte 1
13 Consumo midiático
midiático ee consumo
consumomidiatizado:
midiatizado: a
aproximações
proximações eediferenças.
diferenças.Uma
Uma contribuição
contribuição teórico-
-metodológica
-metodológica
Eneus Trindade e Clotilde Perez
Parte 2
69 O direito à comunicação, as relações midiáticas e a
diversidade de sistemas na radiodifusão
Renan Milanez Vieira e Carlo José Napolitano
Parte 4
185 Manifestações pró-impeachment Dilma
Rousseff e comunicação política no Twitter
Teresinha Maria de Carvalho Cruz Pires
Os organizadores
1
PARTE
13
Consumo midiático e
consumo midiatizado:
aproximações e
diferenças.
Uma contribuição
teórico-metodológica1 INTRODUÇÃO
Eneus Trindade
A partir de abordagem con-
ceitual cujo objetivo é re-
fletir sobre as dimensões da
Clotilde Perez presença midiática na constru-
ção dos vínculos de sentidos
entre as expressões das marcas,
produtos e serviços e seus con-
sumidores, busca-se a análise
dos indicadores de gradientes
destas dessas interações nos
contextos da comunicação
midiatizada, que ajudariam a
explicar os processos de midia-
tização do consumo nos vários
setores da vida material, con-
forme os postulados históricos
de Braudel (1970) e de suas di-
mensões táticas e estratégicas
no cotidiano (DE CERTEAU,
1994; DE CERTEAU; GIARD;
MAYOL, 1997).
O capítulo identifica as
aproximações e diferenças entre
14
o consumo midiático e o consumo midiatizado, observando as espe-
Mídia e Sociedade em Transformação
1
Este capítulo corresponde à revisão e à ampliação do texto “Dimensões do consumo
midiatizado”, originalmente apresentado no II Confibercom, no GT de Publicidade, reali-
zado na Universidade do Minho em Braga-Portugal, em abril 2014.
15
mídia e cultura, que têm privilegiado nos últimos anos a discussão do
Neto (2010) e Fausto Neto e Sgorla (2013). Tais autores estão ligados
à tradição socialconstrutivista do termo midiatização, trazendo ao ce-
nário brasileiro uma contribuição importante, mas nenhum deles es-
tuda o consumo midiatizado, como iremos propor mais adiante.
Para Braga (2006), em sua influência dada a partir de Berger e
Luckmann (1967), a midiatização é um processo que ainda não se
consolidou, mas que visa a implementação de processos culturais de
referência, a exemplo do que significa(ou) a comunicação escrita e
sua consolidação para o sentido de acesso e participação da/na cul-
tura letrada. As novas mídias também seriam capazes de construir
realidades, mas suas regras e lógicas ainda não estariam consolidadas
como práticas culturais de referência (talvez nunca estejam), embora
já se perceba os sinais de novas práticas culturais midiatizadas. Para
Braga (2012), tais práticas culturais midiatizadas se dariam como
contextos da comunicação/interação, reveladoras de gradientes de
intensidades, qualidades que modulariam as lógicas da força comu-
nicativa na construção das realidades.
Já Fausto Neto e seus colaboradores têm influência da concepção
de midiatização de Eliseo Verón (1997), buscando no âmbito dos
fenômenos do jornalismo e da midiatização das religiões oferecer
caminhos teórico-metodológicos para o estudo da midiatização, so-
bretudo aqueles manifestados pelos fenômenos da circulação midiá-
tica. Estes aproximam emissão e recepção, tornando evidente a zona
de contato entre esses polos, em seus vestígios nas redes digitais, nas
experiências de interação digital e presencial, permitindo experi-
mentar a compreensão de estratégias dos usos midiáticos estudados
caso a caso, suas regras e suas lógicas, bem como os confrontos de
sentidos da interdiscursividade gerada nas zonas de contato nos pro-
cessos de circulação midiáticos.
Essas contribuições tornaram-se nosso objeto de interesse no
campo comunicacional, tendo em vista o espaço profícuo que as re-
lações comunicação e consumo podem oferecer, a partir dessa pers-
pectiva teórica, para o entendimento de seus fenômenos.
A comunicação de marcas via ações estratégicas do sistema publi-
citário gera práticas de referências culturais de consumo, cujo objeto
de verificação é o contexto das interações entre marcas e consumi-
dores. McCracken (2003, p. 99-101), a partir do olhar antropológico
sobre o consumo, sinaliza o papel dos sistemas publicitários e da moda
na transferência de significados, valores e sentidos dos bens de consu-
19
mo nas culturas para a vida dos consumidores.
A função social
da comunicação
pública: extensão
universitária
e habilidades
executivas civis INTRODUÇÃO
1
Para a educação para a cidadania, ver, por exemplo, Moledo e Rego (2009). Os autores
apresentam a obra esclarecendo que a educação para a cidadania, em uma perspectiva
intercultural, não nos deixa esquecer que boa parte do sentido moral da cidadania vem
buscando uma consciência maior da pluralidade cultural nos países e no mundo global.
(p. 18-19).
Para o “lado escuro da força” aplicado ao capital social, ver Schuman e Anderson (1999).
2
31
extensão o desafio de equilibrar inevitáveis conflitos com coesão
COMUNICAÇÃO PÚBLICA
3
Vale mencionar a atuação de Bernardo Kucinski, que informa ministrar “curso de
extensão pioneiro sobre comunicação pública” na ECA/USP (www.kucinski.com.br).
4
Toda cultura e cada sociedade institui uma moral, isto é, valores concernentes ao bem
e ao mal, ao permitido e ao proibido e à conduta correta e à incorreta, válidos para
todos os seus membros. [...] No entanto, a simples existência da moral não significa a
presença explícita de uma ética, entendida como filosofia moral, isto é, uma reflexão
que discuta, problematize e interprete o significado dos valores morais. [...] A filosofia
moral ou a disciplina denominada a ética nasce quando se passa a indagar o que são,
de onde vêm e o que valem os costumes.” (CHAUÍ, 2008, p. 310).
34
ação (simbólica ou material) pública pode desencadear. Em resumo: o
Mídia e Sociedade em Transformação
COMUNICANDO PUBLICAMENTE
5
Sobre a relação entre comunicação pública e deliberação, ver Nobre (2011).
38
nal, levado a efeito na esfera pública. Essa comunicação que quer
Mídia e Sociedade em Transformação
6
Nobre e Nobre (2013, p. 22) associaram a comunicação pública com a convergência
do entendimento, e a comunicação política com a convergência da ação. A questão
agora é: e se tais convergências (saber e fazer) conduzirem à ruptura social em um
momento posterior?
7
Um dos objetivos específicos de García (2008) é justamente uma “Reflexión en torno a
la contribución de la comunicación pública a la convivencia y la cohesión social”.
8
The bias has since become stronger as Putnam and others have recommended social
capital and its twin, social trust, as a solution for current problems, as if social capital
had no downside. Yet there are several distinctly negative aspects of social capital that
these analyses miss.” (PORTES; LANDOLT, 1996)
39
legal e é legítima, mas não será comunicação pública. Este “novo”
9
Naval et al. (2011, p. 83) abordam a extensão universitária da formação ético-cívica
enquanto um compromisso social.
42
communication competence.” (SHAH; McLEOD; LEE, 2009, p. 102).
Mídia e Sociedade em Transformação
10
www.citizensuk.org/training
www.governor.ny.gov/news/governor-cuomo-launches-citizen-preparedness-corps-training-program
11
12
www.tinyurl.com/orc4usk
13
www.tinyurl.com/nwzmuqq
www.mncampuscompact.org/wp-content/uploads/2013/05/workforce-development-and-CE.pdf
14
15
www.eces.eu/posts/diplocat
www.patch.com/california/ranchobernardo-4sranch/lifeguards-firefighters-training-citizens-cpr
16
17
www.tinyurl.com/oongldo
www.thersa.org/about-us/media/2012/08/training-citizens-to-respond-to-anti-social-behaviour/
18
19
www.cardboardcitizens.org.uk/training-consultancy
20
www.britishcouncil.org/active-citizens/how-active-citizens-works
21
www.inspironconsulting.in/index.php/training/corporate-training/communication-skills-training
44
A FUNÇÃO SOCIAL DA COMUNICAÇÃO PÚBLICA
Mídia e Sociedade em Transformação
CONCLUSÃO
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46
KUNSCH, M. M. K. Comunicação pública, sociedade e cidadania. São
Mídia e Sociedade em Transformação
Comunicação pública
digital da ciência
para a democracia:
um campo em
construção INTRODUÇÃO1
Danilo Rothberg
A comunicação pública se
constitui no Brasil nas três
décadas posteriores à redemo-
Aline Cristina Camargo cratização em direções comple-
xas, que têm sido objeto de pes-
quisas de campos disciplinares e
convergências interdisciplinares
sob perspectivas diversas. Com
a popularização do acesso à in-
ternet, a dinâmica de expansão
das dimensões comunicativas da
vivência democrática determi-
nou uma dramática renovação
dos modos potenciais de exercí-
cio dos direitos civis e políticos,
sobretudo por meio do crescente
atendimento do direito à infor-
mação sobre formulação, execu-
ção e avaliação de políticas públi-
cas. No contexto, a comunicação
pública proveniente de governos
eleitos passa a se projetar no am-
biente on-line como fonte cada
vez mais relevante para o apro-
fundamento da cidadania.
50
Cada área de gestão pública tem recebido demandas diferencia-
Mídia e Sociedade em Transformação
1
Este trabalho se beneficia de reflexões trazidas por Aline Cristina Camargo na disserta-
ção de mestrado “Comunicação pública, cidadania e internet: a popularização da ciên-
cia nos portais eletrônicos de governo”, realizada com orientação de Danilo Rothberg no
Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Faac/Unesp e apoiada por bolsas de
mestrado no país e pesquisa no exterior da Fapesp, pelas quais agradecemos (Proces-
sos 2013/01819-3 e 2014/13042-6). Agradecemos também ao professor Joseph Dean
Straubhaar (University of Texas at Austin) pela orientação na bolsa Bepe/Fapesp. As
opiniões, hipóteses e conclusões ou recomendações expressas neste material são de
responsabilidade dos autores e não necessariamente refletem a visão da Fapesp.
51
No percurso do texto, em primeiro lugar são revisadas conceitu-
um campo em construção
Comunicação pública digital da ciência para a democracia:
ações correntes sobre comunicação pública no âmbito das demandas
contemporâneas da democracia brasileira, em particular com o foco
em ciência e tecnologia. Em segundo lugar, aspectos dos Estudos
CTS (Ciência, Tecnologia e Sociedade) são retomados a fim de in-
dicar a relevância de tal linha de investigação para a definição de ca-
racterísticas da comunicação pública de ciência que busque o aten-
dimento do direito à informação sobre políticas públicas da área. Em
terceiro lugar, são trazidas considerações sobre governo eletrônico e
democracia digital, tidos como sustentáculos de realização da comu-
nicação pública democrática de C&T. Considerações finais sinteti-
zam a contribuição do texto.
um campo em construção
Comunicação pública digital da ciência para a democracia:
interesse público ao informar, explicar, disponibilizar, treinar, ha-
bilitar, ouvir e contribuir para o exercício da cidadania” (WEBER,
2011, p. 105).
Especificamente no campo da comunicação pública em C&T,
cabe indicar, conforme Caldas (2004, p. 30), que “o avanço científico
e tecnológico brasileiro não é acompanhado, na mesma velocidade,
de uma mudança cultural sobre o papel estratégico, econômico e so-
cial que a C&T ocupa na melhoria da qualidade de vida”.
De acordo com Barbosa (2011, p. 163), a comunicação pública
de C&T deve atender a três requisitos: “prestação de informações,
informação significativa e participação”, de forma a situar-se na in-
tersecção entre transparência, direito à informação e participação
política. “Não basta disponibilizar documentos (e) digitalizar rela-
tórios”, salienta Barbosa (2011, p. 166); “é necessário dar sentido às
informações, conectá‐las, ordená‐las”.
Para Dagnino, Lima e Neves (2008), o problema da comuni-
cação pública da ciência envolve três níveis de ignorância: 1) ig-
norância de base, ou a falta de conceitos fundamentais sobre C&T
que deveriam fazer parte da educação básica dos indivíduos; 2)
ignorância do que está acontecendo, ou falta de informação sobre
assuntos atuais da ciência que exigem acompanhamento constante;
3) ignorância das implicações, que envolve uma incapacidade de
contextualizar os assuntos científicos em suas dimensões políticas,
legais, éticas e sociais.
Uma das críticas que Lewenstein e Brossard (2009) apresentam
à comunicação da ciência diz respeito à falta de clareza nas pró-
prias ações de incremento da compreensão pública sobre ciência.
Não haveria sequer um consenso sobre os objetivos da ampliação
de tais conhecimentos e qual estratégia de comunicação deveria ser
aplicada, considerando-se a prática nos âmbitos de quatro modelos
possíveis: déficit cognitivo; contextual; expertise leiga; participati-
vo ou democrático. Estes modelos se orientam, em seus extremos,
segundo Lewenstein e Brossard (2009), por duas tendências: pro-
cessos de comunicação em uma única via, desde os cientistas até
a sociedade, em que o objetivo é a divulgação de informações; e
processos comunicativos que propõem diálogos, nos quais a parti-
cipação e a postura ativa do público são o foco.
O modelo de déficit cognitivo refere-se à “transmissão linear de
informações de especialistas ao público” (LEWENSTEIN e BROS-
54
SARD, 2009, p. 33). Perfis e necessidades do receptor não são efe-
Mídia e Sociedade em Transformação
um campo em construção
Comunicação pública digital da ciência para a democracia:
políticas públicas que envolvam gestão e aplicação de ciência e tec-
nologia”. Para Sousa et al. (2011, p. 18), o modelo de participação
pública parte do compromisso com a democratização da ciência e da
tecnologia, “pressupondo, como condição necessária para o desen-
volvimento dessas atividades, a valorização do diálogo entre cientis-
tas e não cientistas”.
Tem-se aqui a hipótese de que a disponibilização de informa-
ções de qualidade é um primeiro passo, sem o qual se torna mais
difícil o engajamento político e a participação: “o cidadão político
é mais que somente um membro da comunidade oficialmente re-
conhecido, mas um constituinte potencialmente ativo de um corpo
político, capaz de exercer influência democrática sobre seus com-
panheiros cidadãos, assim como sobre o Estado político”, segundo
Coleman e Blumler (2009, p. 4).
Esta concepção normativa encontra, no campo da sociologia da
ciência, respaldo dos Estudos CTS (Ciência, Tecnologia e Socieda-
de), que projetam uma perspectiva multidisciplinar segundo a qual
as visões dos cidadãos precisam ser incluídas nos processos de for-
mulação, execução e avaliação de políticas públicas, em particular na
área de ciência e tecnologia, para o exercício integral da cidadania.
Este é o foco da próxima seção.
um campo em construção
Comunicação pública digital da ciência para a democracia:
sidera que a informação científica não deve ser vista como produto
acabado, mas sim como vetor de mudança social, em processos que
devem ser objeto de escrutínio democrático. Para Sousa, Berbel, Ro-
thberg e Hayashi (2011, p. 15), a partir do olhar dos Estudos CTS, a
comunicação da ciência pode atribuir status distintos para emisso-
res, receptores e demais elementos que influenciam a mediação de
significados na relação comunicativa existente no âmbito da política
democrática: “se em um ponto inicial o receptor é tido como sujeito
passivo e manipulável, repositório vazio à espera de conteúdos ple-
nos e unívocos, no ponto final admite-se que as perspectivas dos in-
divíduos precisam ser incluídas no próprio processo de formulação
de políticas públicas de ciência e tecnologia”.
A divulgação científica coloca-se no contexto da educação cien-
tífica e tecnológica e alia-se ao ensino formal na “construção de uma
sociedade alfabetizada científica e tecnologicamente, capaz de re-
fletir criticamente e atuar a respeito dos assuntos de C&T em seu
contexto” (BAZZO; VALERIO, 2006, p. 3-4). Os autores apontam a
crescente inserção e impacto das inovações científicas/tecnológicas
no âmbito social, nos termos de uma “onipresença da C&T em nosso
cotidiano, conferindo novos significados para os sentimentos e va-
lores humanos, numa mostra do que parece ser a característica mais
marcante de nossos dias”.
De acordo com as características apontas por Hayashi, Hayashi,
Furnival (2008, p. 49) em relação à pesquisa, os Estudos CTS trazem
uma “alternativa à reflexão tradicional em filosofia e sociologia da
ciência, promovendo uma nova visão não essencialista e contextu-
alizada da atividade científica como processo social”, e alicerçam a
necessidade de criação de mecanismos democráticos que facilitem a
abertura de processos de tomada de decisão em questões referentes
a políticas de C&T.
Sousa et al. (2011, p. 36) sugerem que a comunicação da ciência,
sob a influência dos Estudos CTS, deveria ser “realizada com aten-
ção sobre as repercussões das decisões implícitas em determinadas
escolhas de políticas científica e tecnológica, com contexto e profun-
didade sobre os antecedentes que justificam certas opções, alternati-
vas possíveis, conflitos envolvidos e meios de negociação, resultados
esperados, custos e retornos devidos”.
Dagnino, Lima e Neves (2008, p. 4) salientam que “a criação de
condições para a participação social nos processos de tomada de
58
decisão acerca da C&T depende da existência de um sistema edu-
Mídia e Sociedade em Transformação
um campo em construção
Comunicação pública digital da ciência para a democracia:
No Brasil, a aprovação da Lei de Acesso à Informação (lei 12.527,
de 18 de novembro de 2011) avança na consolidação da democracia
ao possibilitar a ampliação da participação cidadã e fortalecer os ins-
trumentos de controle da gestão pública.
A legislação sobre a matéria, já existente em ao menos 100 países
(MENDEL, 2009; DARBISHIRE, 2014), situa-se em um percurso de
crescente reconhecimento da relevância do que se considera como
cidadania informada, capaz de estimular “o que se espera que sejam
melhores decisões, contribuindo para o processo político”, segundo
Froomkin (2004, p. 4), com potencial para conferir integridade ao
processo decisório: “o único processo de tomada de decisão que é
significativamente aberto a todos é capaz de tomar decisões que po-
dem ser consideradas legítimas”.
A disponibilização de informações oficiais não constitui diá-
logo, mas tem capacidade de melhorá-lo: “no processo de delibe-
ração, a informação desempenha um papel central. A igualdade
de acesso à informação e o uso de um meio de acesso ilimitado
são fundamentais para uma prática mais eficaz de discurso”, aponta
Gimmler (2001, p. 31).
Embora o exercício do direito à informação não dependa, na-
turalmente, das tecnologias de comunicação, elas podem prover
suportes decisivos para sua expansão e são, inclusive, citadas por
leis como a brasileira, que, em seu artigo 8º, determina que é “de-
ver dos órgãos e entidades públicas promover, independentemente
de requerimentos, a divulgação em local de fácil acesso, no âmbito
de suas competências, de informações de interesse coletivo ou geral
por eles produzidas ou custodiadas”, incluindo “dados gerais para o
acompanhamento de programas, ações, projetos e obras de órgãos
e entidades” (inciso V). Para este propósito, “os órgãos e entidades
públicas deverão utilizar todos os meios e instrumentos legítimos
de que dispuserem, sendo obrigatória a divulgação em sítios oficiais
da rede mundial de computadores (internet)” (§ 2, BRASIL, 2011).
Ao mesmo tempo em que facilitam a circulação de informa-
ções, os sistemas de democracia digital abrem a possibilidade de que
consultas e audiências públicas, fóruns deliberativos e a atuação de
comissões parlamentares se tornem permeáveis a pressões e influên-
cias exercidas por meio de canais de participação eletrônica. Witsch-
ge (2004, p. 109) salienta que a tecnologia carrega o potencial para
60
a superação de uma visão em que a democracia estaria restrita a um
Mídia e Sociedade em Transformação
um campo em construção
Comunicação pública digital da ciência para a democracia:
processos governamentais significa uma mudança nos objetivos de
governo eletrônico. Na verdade, isso significa que se deslocam da
entrega on-line de serviços públicos e informações (governo ele-
trônico), para a governança eletrônica, que busca o envolvimento
do público em linha direta no governo. “Ao invés de ser apenas um
meio para agilizar serviços, reduzir custos e aumentar a eficiência do
governo, o desenvolvimento de ferramentas de engajamento cívico
foca no papel do público no processo político” (LBJ SCHOOL OF
PUBLIC AFFAIRS, 2011, p. 6).
De acordo com o modelo de Baum e Di Maio (2000), revisado
por Backus (2001), a primeira fase em direção à governança eletrô-
nica é marcada pela presença na web e o fornecimento de informa-
ções de qualidade ao público. Na segunda fase, a interação entre o
governo e o público é estimulada com várias aplicações. As pessoas
podem fazer perguntas por e-mail e são capazes de baixar formulá-
rios e documentos. Na terceira fase, a complexidade da tecnologia
aumenta. Transações completas podem ser feitas, como pagamento
de impostos, renovação de licenças e votação on-line.
Na quarta fase, sistemas de informação são integrados, e o público
pode obter serviços em um balcão virtual. Um ponto de contato para
todos os serviços é o objetivo final. “O aspecto complexo para alcançar
este objetivo é, principalmente, no lado interno, por exemplo, a neces-
sidade de mudar drasticamente a cultura, processos e responsabilida-
des dentro das instituições de governo”, segundo Backus (2001, p. 17).
De acordo com a Unesco (2005), a governança eletrônica se es-
tende para além da prestação de serviços mediados por via eletrô-
nica para os sistemas e as inter-relações que governam a sociedade,
atingindo a ideia de aplicação das tecnologias para garantir envolvi-
mento de cidadãos, instituições, organizações não governamentais e
empresas privadas no processo de tomada de decisão.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este texto articulou perspectivas teóricas em três direções
distintas, englobando comunicação pública, estudos sociais da
ciência e democracia digital para a construção de um raciocínio
específico, que se coloca como contribuição às considerações
normativas sobre o papel da comunicação pública digital de ci-
ência e tecnologia para o fortalecimento da democracia.
62
A comunicação pública foi caracterizada em seu contexto sin-
Mídia e Sociedade em Transformação
um campo em construção
Comunicação pública digital da ciência para a democracia:
neidade, qual seja, o de contribuir para transformar uma dimensão da
vida pública usualmente situada fora do contexto democrático, por ser
historicamente considerada neutra e superior, em um campo que deve
ter esmiuçada sua contribuição à busca por igualdade e justiça social.
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66
2
PARTE
69
O direito à
comunicação, as
relações midiáticas
e a diversidade
de sistemas na
radiodifusão INTRODUÇÃO
1
A pesquisa “Diversidade de conteúdo midiático, relação entre os meios e a concorrên-
cia: os valores-notícia na cobertura do jornal O Estado de S. Paulo sobre o canal Record
News” está sendo realizada junto ao Programa de Pós-graduação em Comunicação da
Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação da UNESP de Bauru/SP. Orientação:
Prof. Dr. Carlo José Napolitano. Segue em etapa de desenvolvimento na presente data
(agosto de 2015).
71
uma disciplina jurídica, pertencente ao ramo do direito públi-
2
Essa regra somente foi flexibilizada com a Emenda Constitucional n. 36/2002.
75
interpretação, tem-se as atribuições de natureza individual, relacio-
REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Dispo-
nível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.
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cacoes/anais-comunicacao/textos/44.pdf>. Acesso em: 22 maio 2015.
______; VANZINI, Kátia V. da S. Direito à Comunicação: contribuições
86
para a definição de um conceito. Revista Comunicação Midiática, Bauru,
Mídia e Sociedade em Transformação
As prisões do
“mensalão” e a
construção do mito
barthesiano INTRODUÇÃO
O CASO
OS RÉUS
A DENÚNCIA
REFERÊNCIAS AO PROCESSO
AS PENAS
Pena (31), prisão (28), regime (19), Prisão (31), regime (21), pena (15), prisão
trabalho fora da prisão (4), penas domiciliar (10), algemados/algemas (3),
alternativas (3), execução penal (3), prisão com saída regrada (1), confisco de
algemados/algemas (3), primeira noite na bens (1), pagamento de multa (1),
cela (1), integrantes do sistema prisional detenção (1), ainda no conforto do lar (1),
(1), vestidos com uniformes brancos (1), abandono por quem considerava amigo
banho frio, beliche com colchão de (1), know how para receber réus ilustres
espuma, almoço servido em marmita (1), (1), passaporte apreendido (1), processo
regime mais rígido que o determinado (1), de cassação (1), primeira noite sem
perda automática do mandato (1), custou o liberdade (1), sob custódia (1), impressão
mandato, agora a liberdade (1) de estar em um quartel (1), bloqueio de
aposentadoria (1)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
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LAGE, Nilson. Linguagem jornalística. 7 ed.São Paulo: Ática, 2004.
100
LAZARSFELD, Paul; MERTON, Robert. Comunicação de massa, gos-
Mídia e Sociedade em Transformação
A morte do
missionário:
a identidade
do comentador
de notícia no
webjornalismo
1
A transcrição dos textos dos comentadores será literal, inclusive com as abreviações e
imprecisões constantes nos textos.
115
namento que também impregnou seu portal de notícias (SILVA,
As palavras grafadas em caixa alta constam no original dos comentários aqui reproduzidos.
2
117
A caracterização estigmatizada dos fiéis desdobrou-se na qua-
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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122
GARCÍA CANCLINI, Néstor. Diferentes, desiguais e desconectados. 2ª.
Mídia e Sociedade em Transformação
Underground no
O Pasquim: uma
experimentação
histórica de
jornalismo1 Este texto analisa a coluna
Underground, de Luiz Carlos Ma-
ciel, publicada no O PASQUIM
no período de maio de 1970 a
Célio J. Losnak fevereiro de 1972. O viés de abor-
Giuliana Chorilli dagem é identificar historicidades
do periódico alternativo nas in-
terfaces entre ditadura, movimen-
tos sociais e imprensa, nas tensões
entre tendências dominantes do
jornalismo e experiências autô-
nomas e insurgentes, nos anos
1960 e 1970, suscitadas por movi-
mentos culturais de contestação,
experimentais e contraculturais.
A coluna Underground se nutria
de tendências e debates políticos e
culturais internacionais, dialoga-
va com movimentos críticos aos
saberes consolidados, racionais e
à moral tradicional e alimentava
propostas irreverentes, conside-
radas libertadoras para além da
política partidária, estava orga-
nicamente interligada ao jornal
semanal e revela uma proposta
particular de jornalismo.
128
O PASQUIM E SEU TEMPO
Mídia e Sociedade em Transformação
Este artigo é dedicado à Fabia Renata de Oliveira, que nos abriu as portas para
a Underground.
1
Este texto parte de uma pesquisa de iniciação científica financiada pela FAPESP
(CHORILLI, 2012).
2
O autor divide os jornais em dois grupos. Um é constituído de objetivos políticos e revo-
lucionários, orientados por tendências partidárias; no livro, o destaque vai para Opinião,
Movimento e Em Tempo. O outro grupo seria movido por interesses jornalísticos, e o
destaque do autor vai para O Pasquim, Versus, Coojornal e Reporter.
3
Alguns se apresentavam no viés leninista como instrumento de partido.
129
e até financiamentos extras, a atividade fim era ser ator político. O
4
Kucinski afirma que inúmeros periódicos tiveram vida curta. Apenas vinte e cinco circu-
laram por até cinco anos. Dentre os cento e cinquenta pesquisados, “uma em cada dois
não chegava a completar um ano de existência. Vários ficaram apenas nos primeiros
dois ou três números” (Idem, p. XXIV). Do total, apenas O PASQUIM teria sobrevivido
durante a segunda metade dos anos 1980 e circulado até 1991 (JAGUAR; AUGUSTO,
2006).
5
Em abordagem mais ampla, Moreira (1986) insere a imprensa alternativa no movimen-
to cultural alternativo dos anos 1960 e 1970 que adquiria variadas denominações. “Ser
alternativo no início da década de 1970”, afirma ela, “significava produzir fora da zona
de influência direta do Estado ou à margem do aparato industrial que cercava qualquer
produto...” (Idem, p. 30). A tendência opunha-se à ditadura e, portanto, à cultura oficial,
mas também se opunha à “cultura oficial de esquerda” dirigida pelo CPC da UNE.
130
imperceptíveis pelos leitores – e, por outro lado, aceitação, autocen-
Mídia e Sociedade em Transformação
6
Silva (1991) mapeia profissionais que atuaram nos EUA e depois implantaram algumas
técnicas no Brasil, tais como Pompeu de Souza e Danton Jobim, no Diário Carioca, e Al-
berto Dines, no Jornal do Brasil. As mudanças do Jornal do Brasil durariam vários anos;
o momento inicial ocorreu em 1956-57, posteriormente, em 1961, era iniciada uma
nova fase sob coordenação de Alberto Dines que, por exemplo, introduziu as editorias
(FERREIRA, 1996; ABREU, 2002).
131
cipalmente entre 1964 e 1968. “Rebeldia contra a ordem e revolução
7
E o anticapitalismo (historicista e vanguardista) foi incorporado e reelaborado pela
indústria cultural (RIDENTE, 1991, p. 101). Dentre os vanguardistas, destacam-se os
tropicalistas, um segmento do Cinema Novo, o Teatro Oficina, Hélio Oiticica, os irmãos
Campos e o neoconcretismo que se mantinham em constante tensão com os partidá-
rios da linha nacional-popular.
8
Há versões diferentes para o processo de criação, principalmente em torno do pro-
tagonismo dos atores. A equipe inicial que decidiu pela abertura teria sido composta
por Jaguar e Tarso de Castro, que convidaram Sérgio Cabral, Claudius, Carlos Prosperi.
Todos eram sócios com 10% cada um. Os dois últimos trabalharam com o projeto gráfi-
co (JAGUAR; AUGUSTO, 2006). Metade do negócio pertencia à Distribuidora Imprensa,
empresa proponente do jornal. Na versão de Luiz Carlos Maciel, ele também teria
participado das reuniões iniciais.
9
Jaguar afirma que o periódico circulou até 1991, 11 de novembro de 1991 (JAGUAR;
AUGUSTO, S., 2006, p. 8).
132
final de 197010. A partir da libertação e reorganização da direção,
Mídia e Sociedade em Transformação
10
A prisão ocorreu em 1º de novembro de 1970, momento em que estava sendo
rodada a edição 72, e teria durado até o fim de dezembro. Naquele momento, foram
presos Ziraldo, Paulo Francis, Luiz Carlos Maciel, Paulo Garcez, Haroldinho e Jaguar. As
informações são desencontradas, mas tudo indica que os números de 73 a 77 foram
produzidos de maneira improvisada e com alguns colaboradores, a edição 78 já fora
feita pela equipe libertada e lançada em 30 de dezembro de 1970. O número 80 já era
dirigido por Sérgio Cabral, com a saída de Tarso de Castro.
11
Sérgio Cabral permaneceu na direção e no grupo até dezembro de 1971. No início de
1972, Jaguar assumiu a presidência e Ziraldo e Henfil passaram a ser vice-presidentes.
A Underground foi publicada até a edição 135, de fevereiro de 1972. Depois disso,
Maciel continuou a colaborar ocasionalmente com o periódico. Essa fase denominada
de “longa travessia” se caracterizaria por intensificação do jornalismo com maior partici-
pação de ampliação de profissionais da informação.
12
Importante observar que, desde o início, ele parte de uma proposta empresarial lança-
da pela Distribuidora Imprensa e que detinha inicialmente 50% da propriedade do jornal.
133
rístico-político13, de oposição à ditadura14. Com o tempo, foi sendo
13
É comum o jornal ser caracterizado por lançar mão do humor. Almeida (2006, p.
33-34) prefere o conceito de derrisão para valorizar o impacto social, político e cultural
das capas. Derrisão está além do riso, que funde “indiferença e desdenho”, ridiculariza,
menospreza, buscando a contestação, a oposição à ordem.
14
Braga (1991, p. 214-15) elenca alguns elementos que são reveladores do posiciona-
mento de oposição do O PASQUIM à ditadura: evidenciar as contradições do governo;
estruturar-se numa ordem em defesa da igualdade e da autonomia, e alternativa à
ordem política da obediência cega e com hierarquia rígida; contra o planejamento gover-
namental, praticavam a criação improvisada; a uma concepção utilitária do trabalho e
fundada no dever e no sacrifício, o grupo propunha o “exercício lúdico motivado pelo
gozo”; à “lógica da eficiência, a produção da patota contrapõe valores humanos como a
amizade, a irritação, a simpatia”.
15
Braga identifica a oralidade dos textos não como transcrição da fala, mas por um tipo
de escrita que permitia maior expressividade e eficácia informativa sem as normas do
texto vigente nas redações tradicionais.
134
(1991) reproduz essa ideia enfatizando que a “patota” era uma or-
Mídia e Sociedade em Transformação
16
Décadas depois, permanece na memória o glamour do desregramento e a irreverên-
cia mesmo diante do descalabro financeiro. “No fundo, o Pasquim não passava de um
Hebdo anarquista, misto de Haraquiri e Village Voice. E, acima de tudo, anárquico – em
todas as suas instâncias, inclusive na vigilância aos que administravam a empresa,
uma sucessão inesgotável de larápios e aldrabões. Enquanto estes agiam (demais
ou de menos), a redação e agregados curtiam e regiam a boemia ipanemense [...]”
(JAGUAR; AUGUSTO, 2006, p. 11). Braga entende esses posicionamentos como a au-
toironia, uma maneira de rir de si mesmo. É possível concordar, mas parece que, além
disso, essas práticas assemelham-se a estratégia de marketing, elaborando a imagem
do grupo com boa reputação de rebeldia e irreverência.
135
quantitativamente, e estava disseminado em quase todas as páginas,
17
Na ausência de uma categoria mais apropriada, optamos por denominar essa parte
do O PASQUIM de coluna devido à sua marca autoral. É uma produção que não se
encaixa bem nas categorias de gênero jornalístico e o termo não tem pretensões con-
ceituais por riscos de simplificar uma produção híbrida e heterodoxa.
18
A geração beat (beatniks) era anti-intelectual, escrevia e vivia sob o efeito de álcool e
drogas, buscando aventura desmedida, defendia o cotidiano regido pela sensorialidade,
ludicidade e o desprezo pela carreira e rendimento regular. A polêmica nos EUA em
torno da Cuba comunista sensibilizou Maciel a se interessar pelo marxismo, ainda que
não o tenha incorporado como referência de doutrina política.
19
O autor atribui à geração dele a preocupação com duas questões, articulando
rebeldia política e rebeldia existencial (MACIEL, 1996, p. 15): a) “a busca da liberdade
individual e a felicidade pessoal”, centrada no indivíduo e no afetivo; b) “a busca revolu-
cionária por uma sociedade mais justa e humana”, voltada para a questão histórica. Em
1995, momento de redação do livro, ele reconhece que a força de impulsão daqueles
jovens vinha da mescla de romantismo e ingenuidade, permeados pela sensação/cren-
ça de coragem e desejo de ser herói (Idem, p. 73-85).
136
a juventude voltava-se para a rebeldia em relação às gerações ante-
Mídia e Sociedade em Transformação
20
Para Roszak (1972), a contracultura surgiu no contexto da sociedade regida pela
tecnocracia e em fase altamente industrializada, administrada tecnicamente por meio
da racionalização e planejamento. Nela, os indivíduos deveriam submeter-se a rígidas
estruturas de funcionamento e comportamento voltadas para o trabalho produtivo, o
controle do desejo e a satisfação fruída por meio do consumo. O movimento rebelde
apresentava inúmeros vieses, do flower power, psicodelismo e hippies ao apoio a mo-
vimentos políticos como Gay Power e Women’s Lib, ou Black Panthers (MACIEL, 1987,
1978, 1996; ROSZAK, 1972; PEREIRA, 1992).
21
Marcuse e Brown são trabalhados por Roszak (1972) como importantes mentores dos jo-
vens rebeldes da contracultura. Segundo ele, ambos partem das interpretações freudianas,
incorporam o romantismo do jovem Marx, mas conceituam a alienação como fenômeno
psíquico. Para Marcuse, a libertação viria com a eliminação da “exploração psíquica” e
a “dessublimação repressiva”, que eram mantidas pelo consumo e erotismo da mídia.
Para Brown, a libertação viria pela criação de um “senso erótico de realidade”, findando a
oposição entre vida e morte, emergindo um “ego dionisíaco” e buscando apoio no universo
mágico, como, por exemplo, no misticismo tibetano (ROSZAK, 1972, p. 106-107).
137
do incorporada pela sociedade de massas, pela mídia e transformada
22
Maciel rememora que embora a proposta fosse fundamentada no conhecimento que
ele tinha sobre o assunto, ficara perplexo pela polêmica que desencadearia. Para a es-
querda, o tema era considerado alienação, o desbunde era entendido como importação
de uma cultura norte-americana e fuga da luta política. A direita e os militares conside-
ravam a contracultura imoral e desagregadora da sociedade.
23
Imprensa Underground. Underground. PASQUIM. Rio de Janeiro, 24-30 jun. 1971, ed. 103.
24
O Rato Sigmund era usado como símbolo do O PASQUIM e fora criado por Jaguar e
Ivan Lessa como personagem de uma HQ lançando a cerveja Skol (JAGUAR; AUGUS-
TO, 2006).
25
Esse cabeçalho, que nem sempre permanece no alto da página, foi alterado apenas
na edição n. 131 (de 04-10 jan. 1972), com fonte arredonda e estilizada, de tamanho
padronizado e contendo na linha de baixo uma imagem espelhada toda em preto, por-
tanto, são duas linhas paralelas e contíguas e invertidas, uma de fundo branco e outra
totalmente preta. Quanto ao retângulo contendo o ratinho e os desenhos, foi extinto na
mesma edição.
138
tempo que buscava inserir elementos que delineariam a experimen-
Mídia e Sociedade em Transformação
26
Braga (1991, p. 130-31) argumenta que O PASQUIM é jornal de interesse geral,
informativo e interpretativo, e não revista cultural. Os pontos destacados por ele para
defender essa tese são: aborda “problemas sociais concretos, em uma perspectiva
política“; apresenta a atualidade; texto adaptado para o grande público.
27
MACIEL, L. C. JIMMI. Underground. PASQUIM. Rio de Janeiro, 30 set/06 out. 1970, ed. 67.
28
Um exemplo é o poema de Capinam abordando a vida de Jimi Hendrix: JIMI. Under-
ground. PASQUIM. Rio de Janeiro, 30 set./06 out., 1970, ed. 67.
29
Subterrânia. Underground. PASQUIM. Rio de Janeiro, 07-13 out., 1970, ed. 68. Na
mesma página o título está grafado de duas maneiras: subterrânea e subterrânia.
139
A posição da coluna no jornal também não é fixa. Ela é encon-
30
Hippies. Underground. PASQUIM. Rio de Janeiro, 21-27 out. 1970, ed. 70. A partir
desse ponto, para facilitar a leitura das notas, simplificaremos a citação dos textos
mencionados da coluna (U.P.) sem citar cidade e data complementar.
31
Richie. U.P. 28 out. 1970, ed. 71.
32
Woodstock. U.P. 04 nov. 1970, ed. 72.
33
A Nova Família em Julgamento. U.P. 25 jun. 1970, ed. 53.
34
Sem Sexo. U.P. 18 jun. 1970, ed. 52.
140
da página, podem aparecer no meio dela ou embaixo da matéria, qua-
Mídia e Sociedade em Transformação
35
Bechmalina. U.P. 13 ago.1970, ed. 60.
36
Sérgio Augusto afirma que Maciel teria inventado ou popularizado expressões como
“barato”, “curtir”, “sarro”, da mesma maneira em que o jornal também explorou diver-
sas gírias (JAGUAR; AUGUSTO, 2006).
141
minado assunto; “amarrado num som”, apreciando uma boa música;
37
Por exemplo: reprodução de uma entrevista realizada por duas jornalistas norte-ame-
ricanas, não identificadas, com o líder hippie Louis H. Rapoport de São Francisco (U.P.
20 ago. 1970, ed. 61), entrevista de John Lennon por Robin Blackburn e Tariq Ali para
a revista Ramparts (U.P. 22 jul. 1971, ed. 107), entrevista de Baby Consuelo e de os
Novos Baianos por Glauber Rocha (U.P. 08 abr. 1971, ed. 92).
38
Richie Havens. U.P. 28 out. 1971, ed. 71.
39
Poemas de Jorge Mautner (U.P. 10 jun. 1971, ed. 101), de L. C. Maciel (U.P. 16 nov.
1972, ed. 124), letras de Gilberto Gil e de Caetano Veloso (U.P. 04 jun. 1970, ed. 50).
Ainda podem ser encontrados versos de autores destacados como Wally Sailormoon
(ed. 113), Rogério Duarte (ed. 124), Hélio Oiticica (eds. 68 e 95), Capinam (ed. 67).
40
Por exemplo, de autoria de Maciel: sobre Hermann Hesse e algumas de suas obras
(U.P. 17 ago. 1971, ed. 111), comentário sobre o livro de Norman O’Brown (Vida contra a
Morte – I. U.P. 31 ago. 1971, ed.113; Vida contra a Morte – II. U.P. 14 set. 1971, ed.115;
Vida contra a Morte – III. U.P. 21 set. 1971, ed. 116; Vida Contra a Morte – IV. U.P. 28
set. 1971, ed. 117), uma resenha do livro Beyond Theology, de Allan Watts, criticando a
teologia cristã (Além da Teologia. U.P. 03 jun. 1971, ed. 100).
41
Lançamentos de discos, atuação de músicos, comentários sobre eles e até um núme-
ro exclusivo com letras de músicas dos Beatles e reproduções de algumas ilustrações
do livro Beatles Illustrated Lyrics (U.P. 10 ago. 1971, ed. 110).
42
Cursos da Anti-universidade de Londres – III Semestre de 1968 (U.P. 02 jul. 1970, ed.
54); relato de Thymoty Leary sobre sua estada na prisão (LEARY, T.; NOTES, Jail. De um
diário de prisão. U.P. 04 jan. 1972, ed. 131), extrato de um folheto da organização Free
dando dicas de como proceder diante de efeitos ruins da droga (Cortando do bode. U.P.
18 jun. 1970, ed. 52), reprodução da ficha criminal de Leroy E. Cleaver, um dos líderes
do Black Panther Party, distribuída pelo FBI (U.P. 21 jan. 1971, ed. 81). Além de inúme-
ros trechos de livros e artigos de conhecidos intelectuais e artistas.
142
comentários e explanação sobre um determinado tema ou autor,
Mídia e Sociedade em Transformação
43
Por exemplo: menção ao livro clássico do taoísmo Tao Te Ching (Tarefas Adiadas. U.P.
30 nov. 1971, ed. 126); informações sobre o Zen-budismo (Zen. U.P. 13 ago. 1970, ed.
60); apresentação de Wilheim Reich (U.P. 27 ago. 1970, ed. 62); discussão sobre a rela-
tividade da normalidade psíquica na atualidade a partir das teses do psiquiatra Ronnie
Laing (U.P. 21 jan. 1971, ed. 81); sobre Martin Heidegger (U.P. 08 jul. 1971, ed. 105).
44
Por exemplo: dois textos de Antonio Bivar como público em dois festivais de música
ocorridos na Inglaterra, na Ilha de Wight (BIVAR, A. WIGHT. U.P. 17 set. 1970, ed. 65) e
outro na cidade de Bath (BIVAR, A. Bath. U.P. 23 jul. 1970, ed. 57).
45
Destacamos os seguintes autores de traços: Tomi Ungerer (eds. 53, 63), Guidacci
(eds. 91 e 122), If (ed. 93, 103, 129), Rodolfo Mesquita (eds. 95, 100, 109, 113, 128),
Altan (eds. 97, 111, 135), Emil (eds. 98, 119, 131, 132), Zé Luco (eds. 131, 132, 133,
134, 135), Ivan (eds. 131, 134), Luís Carlos Maciel (ed. 80).
46
Por exemplo: texto de um psiquiatra paulista explicando os efeitos do LSD: HADDAD,
J. A. Verdades sobre o LSD. U.P. 18 jun. 1970, ed. 51.
143
experiências sobre sociabilidades, valores, linguagem, descobertas
47
U.P. 28 mai. 1970, ed. 49; U.P. 04 jun. 1970, ed. 50
48
U.P. 09 jul. 1970, ed. 55; U.P. 09 jul. 1970, ed. 55.
49
U.P. 13 ago. 1970, ed. 60.
50
U.P. 09 jul. 1970, ed. 55.
144
público de expressão, debate e reflexão entre o profissional, leitores,
Mídia e Sociedade em Transformação
51
Braga (1991, p. 175) afirma que publicidade não era um problema para O PASQUIM.
Em todo o período de existência da publicação, o perfil da propaganda se concentrava
em editoras/livrarias/jornais/revistas (18,3%), roupas/boutiques/cabelereiros/perfu-
mes (14,03%), restaurantes/bares/bebidas (11,17%), teatro/shows (9,85%) voltados
para o segmento da classe média “jovem profissional de nível universitário”.
52
“Se V. ainda acha que o brasileiro só é bom de bola, está atrasado. Nós provamos
que também é bom da bola” (U.P. 18 jun. 1970, ed. 52). Os anúncios vindouros também
utilizarão recurso humorístico e, às vezes, gráfico para se apresentar. Outra questão
reveladora da publicidade é o encolhimento do conteúdo da coluna.
53
Posteriormente, aparecerão o Centro de Psicologia Aplicada (CEPA), escola de inglês
e de aviação, faculdades Mackenzie de São Paulo, desodorante, lançamento de filme,
lojas de roupas (boutique), revendedora autorizada paulistana da Volkswagen, Almana-
que do Jaguar, hotel, piteira. O destaque irônico fica para o “no-cigar”, um remédio para
abandonar o hábito de fumar que é apresentado pela frase “não se suicide lentamente”
(U.P. 04 jan. 1972, ed. 131). O humor disfarça a preocupação com saúde e a morte
num veículo e numa coluna extremamente dionisíacos.
54
“Tem uns caras aí que pensam que o barato do MACKENZIE é.....”, Anúncio de abertu-
ra de cursos de Desenho e Plástica, Desenho Industrial e Comunicação Visual (U.P. 04
nov. 1970, ed. 72).
145
1971, apresenta alguns números com apenas uma página, inúmeros
CONSIDERAÇÕES FINAIS
55
U.P. 01 jul. 1971, ed. 104. Flor do Mal teria sido idealizado por Maciel, era dirigido por
ele e por Tite de Lemos, Rogério Duarte e Torquato Mendonça. Um tabloide semanal,
com viés experimental, contracultural e literário, cultuado em segmentos artísticos e
underground, sobreviveu durante cinco números publicados no segundo semestre de
1971. Outra produção do jornalista foi Rolling Stone. Uma versão brasileira da revista
norte-americana de mesmo nome, impressa durante um ano, entre 1972 e 1973,
tratava de música, particularmente o rock and roll, e contracultura. Maciel foi designado
editor para abrir e conduzir a revista (BARROS, 2007).
56
U.P. 14 set. 1971, ed. 115.
146
Considerando os temas da contracultura abordados, a linguagem
Mídia e Sociedade em Transformação
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Jorge Zahar Editor, 2002.
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nalísticas de resistência. Dissertação (Mestrado em Linguística), IEL, UNI-
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o exercício cotidiano, da dominação e da resistência. O Estado de São Paulo
e Movimento. Bauru: EDUSC, 1999.
BARROS, P. M. “Provocações Brasileiras”: A imprensa Contracultural
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& a Rolling Stones Brasileira (172-1973). Tese (Doutorado em História) -
FCL, UNESP, Assis, 2007.
147
BRAGA, J. L. O Pasquim e os anos 70: mais pra epa que pra opa. Brasília:
Por um percurso da
noticiabilidade à
estética jornalística1 PARA SITUAR O DEBATE
1
Uma versão preliminar deste capítulo foi apresentada no XIII Encontro Nacional de
Pesquisadores em Jornalismo (SBPJOR), realizado em novembro de 2015 em Campo
Grande (MS).
2
Apesar de ser tido como britânico, Stuart Hall nasceu na Jamaica no período em que a
ilha caribenha era ainda considerada colônia da Inglaterra.
151
Nesse cenário, a delimitação teórico-conceitual da noticiabilida-
UM OLHAR RETROSPECTIVO
Quando observados sob uma ótica histórica, são inúmeros os
estudos clássicos que reconhecem a existência de parâmetros de no-
ticiabilidade como princípios responsáveis por retirar o peso da es-
colha noticiosa de uma perspectiva substancialmente subjetiva dos
jornalistas. Entre eles, destacam-se obras como a famosa tese do eru-
dito alemão Tobias Peucer, elaborada ainda no século XVII e con-
siderada o primeiro registro acadêmico sobre o assunto no mundo
ocidental3, e a tipologia de fatores de noticiabilidade apresentada na
década de 1960 pelos pesquisadores dinamarqueses Johan Galtung e
Mari Holmboe Ruge (1965) – abordagens representativas, cada uma
em seu contexto, que colocam em relevo a noção de “desvio” (aquilo
que rompe com uma ordem preestabelecida) como padrão clássico
da seleção de notícias.
Outras sistematizações mais recentes e também respaldadas
pelos estudos acadêmicos do jornalismo auxiliam na tarefa de in-
3
A tese de Tobias Peucer foi traduzida para a língua portuguesa por Paulo da Rocha
Dias e publicada na Revista Comunicação e Sociedade, da Universidade Metodista de
São Paulo. Ver: Peucer (2000). O estudo também tem suas principais ideias sistemati-
zadas no texto Tobias Peucer: o progenitor da Teoria do Jornalismo, de Jorge Pedro Sou-
sa, publicado no Brasil pela Universidade Federal de Santa Catarina. Ver: Sousa (2004).
152
troduzir novas diferenciações à discussão. O sociólogo norte-a-
Mídia e Sociedade em Transformação
4
O livro Deciding what’s news: a study of CBS Evening News, NBC Nightly News, Newswe-
ek and Time, de Herbert J. Gans, foi originalmente publicado em 1979 e tornou-se uma
das referências para os estudos sobre jornalismo no contexto norte-americano. Utiliza-
se neste trabalho a edição ampliada comemorativa ao 25o aniversário da publicação
original. Ver: Gans (2004).
153
I – A compreensão dos critérios noticiosos como dissonâncias/
5
As reflexões aqui sistematizadas são decorrências do trabalho no âmbito da Universi-
dade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) no Grupo de Pesquisa Cotidiano e Noticia-
bilidade, cadastrado no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(CNPq); do projeto de pesquisa Cotidiano e noticiabilidade na imprensa sul-mato-gros-
sense: interfaces entre jornalistas, assessores e público, cadastrado na Pró-Reitoria de
Pós-Graduação, Pesquisa e Inovação (PROPP/UFMS); e da disciplina Cotidiano, Estética
Jornalística e Noticiabilidade, oferecida desde 2014 no Programa de Pós-Graduação em
Comunicação, iniciativas sob responsabilidade do autor deste artigo.
6
Ver, por exemplo, as classificações Wolf (2003) e Traquina (2008), dentre outras, mais
tarde sistematizadas por Silva (2005).
7
Estudos de naturezas distintas comprovam a aplicabilidade operacional das pesqui-
sas de critérios noticiosos com base em levantamentos quantitativos. Nesse sentido,
consultar, por exemplo, o caso significativo do estudo de Shoemaker e Cohen (2006) a
partir de um levantamento quantitativo sobre noticiabilidade em dez países de diferen-
tes continentes.
8
Perspectiva assumida pelo sociólogo norte-americano desde o final dos anos 1970 em
sua clássica análise sobre a história dos jornais norte-americanos.
154
Por conseguinte, compreende-se que adiante de um entendi-
Mídia e Sociedade em Transformação
9
Sobre o trânsito simbólico de acontecimentos jornalísticos do plano pragmático ao pla-
no expressivo, ver as reflexões de Gomes (2009), no horizonte da Filosofia, e de Koch
(1990), no horizonte da Semiologia.
156
ticiáveis se relacionam com a própria expressão estética dos
Mídia e Sociedade em Transformação
10
Nesse sentido, por exemplo, Walter Benjamin, em um de seus clássicos – O narrador:
considerações sobre a obra de Nikolai Leskov –, nota preliminarmente que, no século
XX, a informação rompe com a narrativa; posição que, à frente, seria seguida por Theo-
dor Adorno. O rompimento das formas narrativas, aliás, seria, nesta perspectiva teórica,
um dos “traços distintivos” da modernidade tardia. Para detalhes sobre tal posição na
obra do autor alemão, ver: Benjamin (1994).
11
A discussão apresentada nos próximos dois itens foi previamente abordada na tese de
doutorado A construção cultural da narrativa noticiosa: noticiabilidade, representação
simbólica e regularidade cotidiana e, de modo mais específico, no capítulo Seleção noti-
ciosa, critérios de noticiabilidade e valores-notícia, redigido no processo de amadureci-
mento das reflexões aqui trabalhadas. Para detalhes, ver: Silva (2013a) e Silva (2014c).
157
CONCEITOS DISTINTOS PARA UMA PROBLEMÁTICA SEMELHANTE11
12
O levantamento de critérios de noticiabilidade desenvolvido por Shoemaker e Cohen
(2006) em dez países de diferentes continentes serve atualmente de parâmetro para
o projeto de pesquisa Cotidiano e noticiabilidade na imprensa sul-mato-grossense:
interfaces entre jornalistas, assessores e público, em desenvolvimento no âmbito da
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). O projeto objetiva dimensionar as
reflexões teóricas sobre as dinâmicas de seleção e de compreensão das notícias para
a realidade sul-mato-grossense, apresentando como recorte empírico as relações entre
cotidiano e noticiabilidade em quatro cidades: Campo Grande, Corumbá, Dourados
e Três Lagoas. Do ponto de vista metodológico, sobretudo em relação aos aspectos
referentes à coleta de dados empíricos, a pesquisa segue um desenho estrutural similar
ao estudo de Shoemaker e Cohen (2006) – notadamente, a utilização de técnicas da
análise de conteúdo para o estudo de jornais e de procedimentos qualitativos (grupos
focais e entrevistas) para o estudo dos atores envolvidos nas dinâmicas de produção e
de compreensão das notícias. Para detalhes, ver: Silva, 2014b.
13
Essa concepção de notícia admitida por Shoemaker e Cohen (2006) foi anteriormente
trabalhada por Shoemaker e Reese (1996).
161
rão efetivamente noticiados – em uma linha mais próxima ao debate
14
Ver nesse sentido as interessantes reflexões de Franco Moretti (2009) sobre a disse-
minação social dos romances novecentistas europeus em consonância com os padrões
culturais que respaldavam a vida cotidiana da ascendente burguesia do período.
163
REFERÊNCIAS
Mundo multipolar,
mídia multipolar PRIMEIRAS CONSIDERAÇÕES
Antonio Ribeiro
A anarquia reina nas relações
entre os Estados (JACK-
SON; SORENSEN, 2010), ma-
de Almeida Junior nifestando-se de modo contun-
Thales Novaes Andrade dente em nosso cotidiano. Por
exemplo, as informações que
recebemos tornam-se, cada vez
mais, propaganda geopolítica
(McCHESNEY, 2008; HER-
MAN; CHOMSKY, 2003). A
distorção dos fatos é intensa e
imensa. Uma glamourização da
guerra é administrada de modo
sistemático pelos grandes meios
de comunicação do ocidente e
do Brasil1 . O império norte-a-
mericano e seus parceiros euro-
peus mentem de modo descara-
do e sistemático sobre fatos da
maior relevância para a vida das
pessoas (ROBERTS, 2015).
A quase totalidade da mídia
ocidental, e também a brasilei-
ra, não desafia os discursos pro-
feridos pelos donos do poder
em Washington (ROBERTS,
2015). Do mesmo modo, a aca-
demia ocidental silencia sobre
os problemas (CHOMSKY,
2004, p. 48-55; CHOMSKY,
168
2015; COHEN, 2015; THE US FOREIGN POLICY ACTIVIST CO-
Mídia e Sociedade em Transformação
OPERATIVE, 2015).
A academia brasileira não faz muito melhor e, de modo geral,
ignora (nos vários sentidos da palavra) as questões geopolíticas em
curso. Grande parte do chamado movimento pacifista permanece
perfeitamente apática diante de situações alarmantes. Os direitos hu-
manos são invocados como armamentos contra os designados como
inimigos do império norte-americano2 . Aqueles que denunciam os
problemas e relatam fatos expõem-se a retaliações que têm origem
em grupos política e economicamente poderosos.
Neste momento, somos ameaçados pelo confronto, potencial-
mente mortal, entre dois poderosos blocos de países. De um lado,
a OTAN e o Japão, liderados pelos EUA, e do outro lado, a Rússia
e seus potenciais aliados (COHEN, 2015; MEASHMAYER, 2015;
BULLETIN OF THE ATOMIC SCIENTISTS, 20153). Alvo das hos-
tilidades norte-americanas4 , europeias e japonesas, a China tem se
posicionado favoravelmente à Rússia, inclusive fechando grandes
acordos comerciais e políticos com aquele país5 . Em maio de 2015,
durante as comemorações dos setenta anos da vitória sobre os na-
zistas, soldados chineses desfilaram em Moscou ao lado de soldados
russos, indianos e de vários outros países6 . Foi a primeira vez que
isto ocorreu. No início de setembro de 2015, nas celebrações pela
1
Consciente ou inconscientemente, muitos brasileiros desejam que o Brasil e os brasi-
leiros venham a ser aceitos como parte do “Ocidente”. Mas, de fato, este desejo precisa
ser analisado e devidamente descartado.
2
http://www.intrepidreport.com/archives/16162.
3
O Bulletin of the Atomic Scientists mantém um relógio que avalia os riscos de apoca-
lipse. Em 2015, este relógio foi colocado a apenas três minutos da meia-noite ou da
catástrofe. Em poucos momentos na história recente, o relógio esteve tão perto da
meia-noite. http://thebulletin.org/
4
A natureza destas disputas pode ser percebida no documento: Revising U.S. grand
strategy toward China. http://carnegieendowment.org/files/Tellis_Blackwill.pdf
5
Os artigos a seguir mostram isto:
1) http://www.bloomberg.com/news/articles/2014-11-10/russia-china-add-to-
400-billion-gas-deal-with-accord
2) http://www.presstv.ir/Detail/2015/01/03/391370/Russia-and-China-mock-divide-
-and-rule
6
http://edition.cnn.com/2015/05/09/europe/russia-victory-day-celebration/
169
vitória sobre os japoneses na Segunda Guerra, soldados russos e de
7
http://www.rt.com/news/313073-beijing-parade-russia-japan/
https://www.rt.com/news/314176-china-military-parade-wwii/
http://www.bbc.com/news/world-asia-china-34125418
8
http://www.paulcraigroberts.org/2015/05/11/war-threat-rises-economy-declines-paul-
craig-roberts/
170
no Texas, os EUA incorporaram parte do território texano e deixa-
Mídia e Sociedade em Transformação
9
Conn Hallinan produziu uma boa avaliação do que ocorreu na Ucrânia em: https://
zcomm.org/znetarticle/ukraine-to-the-edge/
10
http://www.spiegel.de/international/world/nato-s-eastward-expansion-did-the-west-
-break-its-promise-to-moscow-a-663315.html
171
sobre sua solicitação de incorporação à Federação Russa12 . Também
11
Parte dos argumentos neste sentido é estabelecida a partir de uma conversa telefô-
nica interceptada entre Victoria Nuland (Assistente do Secretário de Estado dos EUA)
e Geoffrey Pyatt (Embaixador dos EUA na Ucrânia no momento do golpe de Estado),
conforme publicado na internet e reproduzido pela BBC (http://www.bbc.com/news/
world-europe-26079957). No entanto, há muito mais, como, por exemplo, a presença
de políticos norte-americanos de primeiro escalão na Ucrânia. Dois casos notórios são
o Senador John McCain e o Vice-Presidente Joe Biden (http://www.bbc.com/news/
world-europe-30141772). Ou a presença de tropas do grupo mercenário Blackwater
(http://www.telesurtv.net/english/news/Blackwater-Mercenaries-Spotted-in-East-Ukrai-
ne-20150421-0042.html). Há ainda informações que reforçam este argumento no site:
http://www.washingtonsblog.com/2014/12/head-stratfor-private-cia-says-overthrow-
-yanukovych-blatant-coup-history.html.
12
O artigo de Rick Feinberg para o Huffington Post é um destes raros casos de reflexão
sensata (http://www.huffingtonpost.com/american-anthropological-association/crimea-
-russian-aggression_b_5105991.html).
13
Uma avaliação dos motivos para a incorporação da Crimeia como parte da Ucrânia
encontra-se em http://www.wilsoncenter.org/publication/why-did-russia-give-away-cri-
mea-sixty-years-ago.
14
http://www.rt.com/shows/boom-bust/311321-russian-sanctions-Ukraine-Crimea/
15
https://www.congress.gov/bill/113th-congress/senate-bill/2277/text
172
principal ameaça aos EUA, com especial destaque para a Rússia16 . A
Mídia e Sociedade em Transformação
16
http://news.usni.org/2015/07/02/document-2015-u-s-national-military-strategy;
http://foreignpolicy.com/2015/07/06/how-to-read-the-new-national-military-strategy/.
17
A atividade de ONGs pró-EUA dentro da Rússia pode ser avaliada a partir de um artigo
publicado no Pravda: http://english.pravda.ru/russia/politics/29-07-2015/131523-rus-
sia_ned-0/.
18
“Americans like to say that the world changed as a result of the September 11, 2001,
terrorist attacks on the World Trade Center and the Pentagon. It would be more accurate
to say that the attacks produced a dangerous change in the thinking of some of ours
leaders, who began to see our republic as a genuine empire, a new Rome, the greatest
colossus in history, no longer bound by international law, the concerns of allies, or any
constraints on its use of military force.” (JOHNSON, 2004, p. 3).
173
Nosso primeiro objetivo é prevenir a emergência de um novo
19
“Our first objective is to prevent the re-emergence of a new rival, either on the territory
of the former Soviet Union or elsewhere, that poses a threat on the order of that posed
formerly by the Soviet Union. This is a dominant consideration underlying the new regio-
nal defense strategy and requires that we endeavor to prevent any hostile power from
dominating a region whose resources would, under consolidated control, be sufficient to
generate global power.” (http://www.globalresearch.ca/americas-pursuit-of-empire-wa-
shingtons-post-cold-war-hegemonic-project/5457089).
20
http://csis.org/files/publication/150601_Murdock_ProjectAtom_Web.pdf.
21
http://www.globalresearch.ca/us-nato-powers-intensify-preparations-for-nuclear-war-in-
-response-to-russian-aggression/5458679
174
Hoje, a emergência da China, da Rússia e de outras nações, in-
Mídia e Sociedade em Transformação
22
Porta-helicópteros
Ao fazer isto, a França contraria seus interesses comerciais para atender às pressões
23
dos EUA. As consequências para a França vão muito além dos custos destas transa-
ções, pois está em jogo sua credibilidade como fornecedor de equipamentos bélicos.
Sobre o tema da retenção destas embarcações, ver, por exemplo, http://www.bbc.com/
news/world-europe-29060398.
24
http://www.nzherald.co.nz/world/news/article.cfm?c_id=2&objectid=3098577
175
INFORMAÇÃO GEOPOLÍTICA EM GRANDES VEÍCULOS
Sobre os BRICS, leia a declaração do VII BRICS Summit que ocorreu em UFA, Federa-
25
be.com/watch?v=D_7dlG7qPio.
28
Uma avaliação sensata dos fatos sobre o caso do voo MH 17 foi escrita por Paul Craig
Roberts e se encontra disponível no site do Russia Today: http://www.rt.com/op-edge/
310103-mh17-russia-tribunal-media/.
Há um documentário feito pelo Russia Today sobre a queda do voo MH 17: https://www.
youtube.com/watch?v=D_7dlG7qPio.
177
29
O Oxford Advanced Learner’s Dictionary dá a seguinte definição de pariah: “[…] a
person who is not acceptable to society and is avoided by everyone (syn) outcast” (uma
pessoa que não é aceitável para a sociedade e é evitada por todos). Este sentido cor-
responde ao sentido figurado da palavra pária na língua portuguesa.
30
http://en.kremlin.ru/
179
em que estavam ocorrendo combates31 . A condenação de Putin e da
31
https://www.rt.com/shows/documentary/273670-malaysia-airlines-flight-crash/
180
Portanto, antes mesmo do início das investigações, “a culpa de
Mídia e Sociedade em Transformação
COMENTÁRIOS FINAIS
REFERÊNCIAS
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www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.ht-
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Cuban missiles crisis. Disponível em https://www.youtube.com/watch?-
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der econô-mico no uso da mídia. São Paulo: Futura, 2003.
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www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm,
acessado em 21/set/2015.
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McCHESNEY, Robert. The political economy of media: enduring issues,
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MEARSHEIMER, John. The West Blew It Big Time and Irreversibly En-
dangered European Security (2015). Disponível em: https://www.youtube.
com/watch?-v=rKwKW7gDdeg. Acesso em: 9 jul. 2015
THE US FOREIGN POLICY ACTIVIST COOPERATIVE. In the study of
Peace, American university is lacking. Disponível em: http://www.coun-
terpunch.org/2015/04/22/in-the-study-of-peace-american-university-is-
-lacking/. Acesso em: 28 jul. 2015.
182
4
PARTE
185
Manifestações
pró-impeachment
Dilma Rousseff e
comunicação política
no Twitter1 Entender o que democracia
significa é entender a batalha
que se trava nessa palavra: não
simplesmente o tom de raiva
ou desprezo que pode afetá-la,
Teresinha Maria de mas, mais profundamente, os
Carvalho Cruz Pires 2 deslocamentos e as inversões
de sentido que ela autoriza ou
que podemos nos autorizar
a seu respeito. (Jacques Ran-
cière, 2014).
INTRODUÇÃO3
1
Uma primeira versão deste artigo intitulada Manifestação de rua e os novos modos
de produção da opinião pública. Brasil Março 2015 foi apresentada no IV Congreso
Internacional de Estrategias de Comunicación Política y Campaña, realizado na Univer-
sidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, de 17 a 19 de setembro de 2015, Área
1 “Comunicação de Governo”, Mesa 3 “Comunicación política en tiempos de crisis: el
segundo mandato de Dilma Rousseff”.
2
Professora doutora do Programa de Pós-graduação em Comunicação Social, “Inte-
rações Midiáticas”, da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas).
E-mail: pires@pucminas.br
3
Gostaria de agradecer ao Caio Cesar Oliveira pela grande contribuição na compreen-
são da lógica de funcionamento do Twitter, à Nayla Lopes pelas pertinentes sugestões
na qualidade de comentarista do artigo, à Maria Céres Castro, Milton Rego Mozahir
Bruck e Ana Maria Oliveira pelas ricas sugestões, e ao Sérgio Pires pelas interlocuções
ao longo do processo de elaboração do texto.
187
tar um balanço da manifestação ocorrida no dia anterior. Nele são
4
Uma versão na íntegra deste documento está disponível em: http://www1.
folha.uol.com.br/poder/2015/03/1604299-em-documento-interno-planalto-diz-
-que-comunicacao-e-errada-e-erratica.shtml.
188
dificilmente seriam obtidos – sobre as estratégias de construção de
Mídia e Sociedade em Transformação
5
No dia 24, a edição impressa da revista se esgotou e uma segunda tiragem foi posta
em circulação no sábado, dia 25 de outubro.
190
modo exemplar, “ao mesmo tempo, [como] instrumento e o lugar (e
Mídia e Sociedade em Transformação
6
Toma-se, no âmbito deste artigo, o termo impeachment como uma “fórmula discursiva”
no sentido formulado pela autora. Como uma palavra que permite visualizar, a partir do
modo como circulou na cena pública, “a forma como diversos atores sociais (homens
e mulheres políticos, militantes de associações, representantes sindicais, dirigentes de
empresas, comunicadores, jornalistas, profissionais, intelectuais...) organizam, por meio
dos discursos, as relações de poder e de opinião”. (KRIEG-PLANQUE, 2010, p. 9).
7
O tucano fez a primeira pergunta e questionou Dilma sobre o escândalo de corrupção
na Petrobras: “A senhora sempre diz que não sabe de nada. De quem é a responsabili-
dade por tantos desvios da Petrobras?”.
191
[...] não posso me calar frente a este ato de terrorismo eleitoral
8
Sobre as estratégias adotadas na campanha presidencial de Dilma Rousseff de 2010
para lidar com o tema da corrupção, ver Teles e Pires (2014).
192
eleitoral. De modo interessante, uma matéria publicada pelo portal
Mídia e Sociedade em Transformação
9
No dia 18 de março, o líder da oposição, deputado Bruno Araújo (PSDB-PE), e os de-
putados Nilson Leitão (PSDB-MT) e Elizeu Dionizio (SD-MS) protocolaram requerimento
para solicitar convocação do então ministro-chefe da Secom para que ele esclarecesse
supostas contratações de robôs e financiamentos de blogs para favorecer o governo fe-
deral. Na ocasião, o líder da oposição justificou assim o seu pedido: “É inadmissível que
um órgão oficial se utilize dessa prática e envolva recursos públicos para o pagamento
de blogueiros, crackers ou hackers a serviço do governo, ou ainda, que os incentive a
publicar matérias favoráveis ao governo e contrárias à oposição.” (JUNGBLUT, 2015). No
dia 25 de março, como resposta direta ao vazamento do documento, Thomas Traumann
pede exoneração do cargo e, no dia seguinte, é publicada sua demissão no Diário
Oficial da União.
10
“Abreviação em inglês de walkover, que significa alguma coisa que foi conquistada
muito fácil, muito usada em esportes, quando o oponente não comparece e é dado
como derrotado”. (Dicionário Criativo).
HEDERSON, Bruce. The essential of strategies. Harvard Business Review, nov./dez.
11
1989, p. 139-143.
196
privilegiados para o ataque, a zombaria e a propagação de palavras
Mídia e Sociedade em Transformação
12
Até o dia 27 de setembro de 2015, o vídeo contabilizava 44.723 visualizações, tendo
sido curtido por 436 usuários e não curtido por outros 266.
13
No original: “Hashtags are another important feature of the Twitter platform. They allow
users to annotate tweets with metadata specifying the topic or intended audience of a
communication. [...] Each hashtag identifies a stream of content, with users’ tag choices
denoting participation in different information channels.”
197
DISPUTANDO SENTIDOS SOBRE O IMPEACHMENT: EMBATES
14
No original: “Retweets act as a form of endorsement, allowing individuals to rebroa-
dcast content generated by other users, thereby raising the content’s visibility (boyd,
Golder, and Lotan 2008). Mentions function differently, allowing someone to address a
specific user directly through the public feed, or, to a lesser extent, refer to an individual
in the third person (Honeycutt and Herring 2008). These two means of communication –
retweets and mentions – serve distinct and complementary purposes, together acting as
the primary mechanisms for explicit, public user-user interaction on Twitter”.
199
sagra a rapidez de circulação na informação como nova medida.
15
Os elementos constitutivos desse discurso político que articula igualdade x pobreza
foram tratados pela autora no artigo intitulado Em defesa da “igualdade de oportunida-
des”: o discurso político eleitoral de Dilma Rousseff na campanha presidencial de 2010
(PIRES, 2012).
200
um número expressivo de membros da classe média os des-
Mídia e Sociedade em Transformação
16
O link de acesso no tuíte: http://bit.ly/1DnWeGX. Endereço do post no blog: http://
blog.planalto.gov.br/governo-defende-carater-pacifico-e-democratico-das-manifestaco-
es/. Endereço do vídeo no Youtube: https://www.youtube.com/watch?v=S95yKFYUp4M.
203
“Em atos contra o governo, militantes defendem a democracia”
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Movimentos
sociais, ativismo
e participação
na sociedade da
informação
timos três ou doze meses, e esse acesso poderia ter ocorrido em casa,
local de trabalho, escola ou qualquer outro local. Portanto, é preciso
questionar se um acesso único é inclusão digital, principalmente em
um recorte temporal muito grande para a internet.
A mesma pesquisa – a Pesquisa Nacional por Amostra de Do-
micílios 2013 (Pnad) – apontou que 48% dos lares brasileiros tem
acesso à internet, 88,4% através do microcomputador, 53,6% tam-
bém pelo celular e 17,2% por tablets. Porém, não se discute qual é
o uso que as pessoas fazem da internet, se são adeptas da discussão
política, se buscam por informações da sua cidade ou se só usam
esses meios como forma de entretenimento.
Tendo problematizado a sociedade da informação e a internet,
partimos para a discussão sobre como a participação política e social
se dá no ambiente digital.
1
Considerando população com 10 ou mais anos de idade.
2
Fonte: ftp://ftp.ibge.gov.br/Acesso_a_internet_e_posse_celular/2013/questiona-
rio2013.pdf.
215
Então, o campo político está – de certo modo – aberto a ações
3
Tradução livre para “full political participation”.
217
rar e executar ações defendendo uma ideia, uma causa ou ideologia.
À GUISA DE CONCLUSÃO
AGRADECIMENTOS
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223
PERUZZO, Cicilia Maria Krohling. Movimentos sociais, redes virtuais e
Mídia concentrada,
democracia
fragilizada?
Interpretando
estruturas de mercado
de mídia como legado
autoritário INTRODUÇÃO
1
O fenômeno path-dependence pode ser assim conceituado: “Clearly, in any conception
of institutions, the cost of change whether formal or non-formal and whether financial or
organizational must be part of what an institution confers. Equally, the political costs of
trying to disturb the status quo are far greater where the struggle involves many actors
with diverse preferences rather than only a few with homogeneous preferences. So, any
system that makes decision-making difficult tends toward the preservation of existing
institutions. But none of this is absolute” (RHODES; BINDER; ROCKMAN, 2008, p. XV).
235
forma como um mercado se estrutura, por sua vez, pode ser direta-
2
Sobre o debate acerca de democracia enquanto substância e enquanto procedimento,
cf. Held (1987) e Macpherson (1978).
3
A respeito do conceituo de instituições formais e informais, cf. Parsons (2010) e Levit-
sky e Helmke (2006).
237
decisão democrática e de pôr em prática os seus resultados” (TILLY,
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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240
McCHESNEY, Robert W. (eds.). The international political economy of
Mídia e Sociedade em Transformação
Juventude e
cidadania: a ação de
Isadora Faber para
além do Facebook e
do Participatório INTRODUÇÃO
1
Os dados apresentados não incluíram a faixa etária dos 12 a 14 anos, uma vez que os
indicadores do IBGE (2011) trazem números referentes à população de 10 a 14 anos,
correspondendo a 17.192 milhões de pessoas. Tendo em vista não ser possível ter
em mãos a precisão do dado que contempla a faixa etária em estudo neste trabalho,
optamos por desconsiderar esse número na somatória apresentada. Vale ressaltar que
a análise do IBGE apresenta a divisão por faixas etárias, a saber: 15 a 19 anos (17.192
milhões de pessoas); 20 a 24 anos (16.027 milhões de pessoas); e, 25 a 29 anos
(16.292 milhões de pessoas).
247
social. Acredita-se que, enquanto uma política pública, assim como
Facebook e do Participatório
Juventude e cidadania: a ação de Isadora Faber para além do
as leis que regem direitos e diretrizes para adolescentes e jovens, o
Participatório seja um alicerce para a valorização juvenil e um espa-
ço no qual ela possa exercer, livremente, seu protagonismo.
Com os apontamentos resultantes do debate aqui iniciado, pre-
tende-se articular reflexões a fim de apresentar um contexto emer-
gente para a juventude conectada e até mesmo questionamentos
acerca de um exercício de cidadania que pode ter o jovem como um
agente social crítico, participativo e eficaz.
“Eu Isadora Faber, estou fazendo essa página sozinha, para mos-
trar a verdade sobre as escolas públicas. Quero melhor não só pra
mim, mas pra todos.” Esse trecho foi extraído da página do Facebook
na qual a adolescente, desde 11 de julho de 2012, iniciou suas ativi-
dades on-line para mostrar a situação de sua escola, a Escola Básica
Municipal Maria Tomázia Coelho, em que estudou durante todo o
Ensino Fundamental em Florianópolis, no estado de Santa Catarina.
Facebook e do Participatório
Juventude e cidadania: a ação de Isadora Faber para além do
nalistas também reverberaram o exercício de cidadania promovido
por Isadora. Uma das manchetes ressalta “Pequena grande cidadã” e
no exterior “Brazil’s school flaws highlighted by citizen activism”2 .
Os pais da garota também destacam seu papel social e apontam que
“ela não é cordeirinho, ela pensa, questiona e pergunta sim senhor.
Ensino a todas as minhas filhas que liberdade de expressão é fun-
damental. Quem pensa questiona, e se não se convence, questiona
novamente, não sendo suficiente, reivindicam seus direitos” (MEL
FABER, 2012 apud FABER, 2014, p. 130). Vale pontuar que os pais
foram criticados e até mesmo se chegou a cogitar que eles seriam os
autores das postagens e que manipulavam a filha para terem desta-
que na sociedade e se beneficiarem do que ela estava conquistando,
como cursos de idiomas e viagens para participar de eventos e pro-
gramas de televisão.
Considerando a autonomia com que Isadora lutou pelas melho-
rias, é inegável que muitas mudanças só foram possíveis, em tão cur-
to período de tempo, devido à visibilidade conquistada no universo
on-line. Porém, a garota saiu da página do Facebook e debateu junto
2
Traduzindo: “Falhas escolares do Brasil destacadas pelo ativismo cidadão”. Publicação
do Jornal International Student Magazine na Irlanda.
250
a diretores, professores e pais questões envolvendo a problemática
Mídia e Sociedade em Transformação
3
Não é objetivo deste trabalho apresentar uma análise das ações da ONG Isadora Faber
nem da recém-iniciativa do “Diário das escolas”, mas pontuá-las como exemplo de um
exercício a priori com motivos cidadãos. Em pesquisas futuras, pretende-se aprofundar
esse debate com teoria e metodologia pertinentes à problemática.
251
to à sociedade e ao poder público, mesmo que seja apenas como um
Facebook e do Participatório
Juventude e cidadania: a ação de Isadora Faber para além do
incentivo ao debate. Debate, este, já sabido pela Secretaria Nacional
de Juventude?
A INICIATIVA DO PARTICIPATÓRIO
4
O Observatório Participativo da Juventude – Participatório está inserido no Portal da
Juventude no endereço: http://participatorio.juventude.gov.br
252
com as redes sociais digitais e blogs, de forma que os diálogos que
Mídia e Sociedade em Transformação
Facebook e do Participatório
Juventude e cidadania: a ação de Isadora Faber para além do
destaca que o que for debatido poderá auxiliar, por exemplo, para o
aperfeiçoamento ou a criação de políticas públicas, legislação, pro-
dução de conhecimentos e outras questões relevantes para a juventu-
de brasileira. Ainda segundo a portaria, os recursos humanos, tecno-
lógicos, logísticos e orçamentários para a implantação, manutenção
e operacionalização do Participatório serão disponibilizados pela
Secretaria Nacional de Juventude da Secretaria-Geral da Presidência
da República (BRASIL, 2013c). Nesse sentido, o Governo brasileiro
volta parte de suas ações para a juventude5 , considerando que “o
segmento juvenil é estratégico para o desenvolvimento nacional e
para a construção de políticas públicas que assegurem a autonomia e
o direito dos nossos jovens” (BRASIL, 2011).
Com essa proposta participativa, na plataforma oferecem-se re-
cursos on-line para fomentar a comunicação e a interação entre os
atores sociais jovens ou não que tenham como causa a juventude.
Entre os conteúdos disponíveis no Participatório, estão:
Boletins Temáticos: boletins bimestrais, produzidos em parceria
com o IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), com
análise de dados sobre temas específicos que tem impacto sobre
a juventude (educação, trabalho, cultura, saúde, dentre outros).
Revista Eletrônica Juventude e Políticas Públicas: revista ele-
trônica técnico-científica com seleção pública de trabalhos, de
tiragem semestral.
Biblioteca Digital: reúne em um único local virtual a produção
bibliográfica da SNJ, do CONJUVE e também de repositórios de
Universidades sobre juventude. Desenvolvida em Dspace.
Centro de Documentação e Pesquisa sobre Juventude e Polí-
ticas Públicas (CEDOC-PPJ): Espaço de referência para docu-
mentação do acervo da SNJ e do CONJUVE, aberto à visitação
5
Vale ressaltar, ainda, como iniciativa do Governo a realização das Conferências da
Juventude, em nível territorial, municipal, estadual e nacional. Em 2008 e 2011, foram
realizadas as primeiras edições da Conferência. A 3ª está em andamento desde maio
deste ano com o objetivo de ser “um amplo processo de debate e participação sobre o
que a juventude quer para o Brasil” (BRASIL, 2015). Embora reconheçamos o potencial
das conferências para a agenda jovem do país e até mesmo para o que se defende nes-
te trabalho, não dirigimos nossa análise para as conquistas e os limites de tais debates,
temática que pode ser contemplada em estudos futuros.
254
do público. Também pode ser acessado virtualmente, por meio
Mídia e Sociedade em Transformação
6
Dados retirados em consulta no dia 14 de julho de 2015.
255
Além disso, um dos estudos citados acima aponta que o portal
Facebook e do Participatório
Juventude e cidadania: a ação de Isadora Faber para além do
surge como um outro espaço para a juventude que foi às ruas em
junho de 2013, sistematizado pelo poder público.
A comunicação pública digital exerceria o papel de catalisar e
organizar a expressão política juvenil, afastando assim o risco de
manifestações não submissas, por meio da oferta de canais ale-
gadamente permanentes e confiáveis [...] Ou seja, ao propor um
método supostamente organizado de canalizar a participação
política e acolher o desejo de influenciar os rumos das políticas
públicas que importam aos jovens, o Participatório poderia aju-
dar a esfriar a insatisfação que tomou as ruas. (LUVIZOTTO;
ROTHBERG; VANZINI, 2014, p. 229).
Nessa perspectiva, o Participatório possibilitaria uma manifes-
tação dos jovens sob a tutela do Estado, o que a nosso ver poderia
impactar na livre expressividade e até mesmo no direito à liberdade
de expressão e acesso à informação. Embora a proposta seja possibi-
litar o acesso a informações pertinentes aos jovens e propiciar canais
informativos e dialógicos, tal juventude poderia se circundar apenas
nesses meios e perder os espaços das ruas e das demais mídias so-
ciais, como a atividade provocativa do “Diário de Classe” de Isado-
ra Faber. Considerando esses apontamentos é que se torna legítimo
indagar como validar um protagonismo cidadão jovem em meio ao
acesso, produção e difusão de informações em plataformas virtuais
on-line e também nos espaços públicos off-line.
Facebook e do Participatório
Juventude e cidadania: a ação de Isadora Faber para além do
dimensão de um desses direitos trazendo mais benefícios para
a sociedade o que não deixa de ser um ganho de cidadania. [...]
sem essa participação [a popular], as necessidades e expectati-
vas humanas se satisfarão de um modo incompleto beneficiando
mais um grupo do que outro. (VICENTE, 2009, p. 75).
Facebook e do Participatório
Juventude e cidadania: a ação de Isadora Faber para além do
Debater o potencial da juventude brasileira é um desafio e tam-
bém uma tarefa de grande complexidade devido ao perfil dos indiví-
duos que estão entre 12 e 29 anos de idade, em um país marcado por
nuances democráticas, mas longe ainda de garantir direitos e deveres
substanciais a todos os segmentos sociais. Entre esses direitos, ado-
tamos como foco o acesso às informações e a liberdade de expressão,
os quais possibilitam, a nosso ver, uma maior participação dos jo-
vens em questões referentes às suas demandas, como a educação de
qualidade, em especial no sistema público.
Além dessa dimensão, torna-se imprescindível nesse País de-
mocrático a existência de instrumentos de cidadania que assegu-
rem essa participação dos atores sociais, dentre os quais está uma
juventude que se torna mais crítica e ativa, principalmente devido às
apropriações dos meios de comunicação, como a mídia digital e suas
ferramentas interativas. Ao fomentar a interação e o diálogo entre
esses atores, seria possível garantir mais espaços de expressividade
que se transformem em palco de discussões e ações concretas.
Em meio a políticas públicas, propostas por uma Secretaria Na-
cional de Juventude, está em discurso a preocupação com as deman-
das dos jovens e com a sua participação em um processo democrá-
tico de construção de políticas para essa mesma juventude. Um dos
mecanismos foi apresentado aqui com o Observatório Participativo
da Juventude – o Participatório –, cuja nomenclatura já denota sua
proposta. No entanto, ainda não se consolidaram ações efetivas so-
bre e com a juventude. A elaboração de um estatuto, a realização
de pesquisa sobre o perfil da juventude, a consulta às opiniões dos
jovens são, sim, ações positivas, porém ainda distantes de valorizar
uma juventude cidadã, atuante por si, sem quaisquer obstáculos à
sua manifestação.
Diante de um ato corajoso, sem grandes pretensões iniciais, a
iniciativa pontual de Isadora Faber com o “Diário de Classe” mostra
que é possível participar da realidade de uma escola, de uma cidade,
de um país, em prol de uma demanda coletiva, a educação. Essa ação
de Isadora é, a nosso ver, uma expressão de cidadania. É demonstrar
que é possível se apropriar do on-line e repercutir on e off-line. É
incentivar mais ações de jovens que lutam por interesses que não
são individuais, são coletivos. É provocar políticas públicas. É um
260
verdadeiro exercício de educação libertária e de ação-reflexão-ação
Mídia e Sociedade em Transformação
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263
Sobre os autores
CLOTILDE PEREZ
Docente do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comuni-
cação e do Curso de Publicidade e Propaganda da Escola de Comu-
nicações e Artes da Universidade de São Paulo – USP. Livre-Docente
em Comunicação pela USP.
DANILO ROTHBERG
Doutor em Sociologia pela UNESP. Docente do Departamento de
Ciências Humanas e dos programas de pós-graduação em Comuni-
cação (Faac) e Educação para Ciência (FC) da UNESP – Universi-
dade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Campus de Bauru.
ENEUS TRINDADE
Docente do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comuni-
cação e do Curso de Publicidade e Propaganda da Escola de Comu-
nicações e Artes da Universidade de São Paulo – USP. Livre-Docente
em Comunicação pela USP.
265
GIULIANA CHORILLI
Sobre os autores
Jornalista (FAAC-UNESP). Trabalha como assessora de comunica-
ção corporativa. Foi bolsista FAPESP com pesquisa de IC. É aluna
do curso de pós-graduação lato sensu em Cinema e Documentário
da FGV-SP.
JULIANO DOMINGUES-DA-SILVA
Jornalista (UNICAP), cientista social (UFPE), mestre e doutor em
Ciência Política (UFPE). Professor e coordenador do Curso de Jor-
nalismo da Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP).