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ALFABETIZAÇÃO E POBREZA ; TRÊS FACES DO PROBLEMA

Terezinha Nunes Carraber ___

Introdução

Os sistemas de escrj ta cooS-t.ituem 11lt:3-Ctia.ç.ão _ cultu~


ral, que é institucionalizada-por uma sociedade em seu uso e sua
- -- ~ue--temsua realização efetiva <'luando um indivíduo
lê ou escreve. Essa junção de níveis implica que a ~uestão da alfa-
betização e pobreza seja examinada em suas três faCéS ~ antropológi ~'
ca, so~ial~ - psicoLógica. A análise antropológica e~ emergência da
- esctita e de seus usos --DUma q:OID110 j dade oferece- ,-impcrtantes . insights
sobre as condições ligadas ao aparecimento da escrlta, sua relevân-
cia n- . ~rida cotidiana. dos membros da comunidade, e as habilidades
que a prática da leitur-ae -escrita exigem e # sinml t3ne.a me nt..e, -des9!!,
'yolvem.. A sociedade, por sua vez, cria mecanismos para a implanta ~
9ão da leitura entre seus membros, instituciona~izaudo seu ensino
na escola e tornando a escrita a forma oficial de comunicação; des-
'~a forma, a sociedade provoca a inclusão da alfabetização entre os
~roblemas sociais do País. No ent2.nto, nunca se pode esquecer '. '_que
, ~J.ê:,:,OU;l6$Çreve érrllln±odi~1 ' e no indivíduo que ocorrem os proces-
$OS que tornam a leitura um ato concreto, o que significa que os
;
processos psicológicos inf~uenciam decisivamente o desenrolar da
~quisição e realização da leitura . O presente estui~:aborda essas
jrês faces da alfabetização ~ os processos psicológicos de sua reali
I

/
! zação, os problemas sociais relacionados ã alfabetização e as condi
9ões culturais ligadas a seu uso a sua relevância. Embora voltando-o
.$~ também paxa generalizações de caráter mais aroplo, o estudo visa
piincipalmep..te uma i;l.nálise da situação brasileira - nosso sistema
~e escr~ta, nossos problemas de ortografia, nossos sucessos ~ fra ~
I
tassos na alfabetização e nossas condições sociais e culturais .
Tratando em primeiro lugar a questão psicológica,por
ser es·:'a talvez mais simples e a mais pesquisada, t~ntaremos anali -
sar as capacidades humanas engajadas no exercício da leitura, sem
prenderj no entanto, que elas independam de influincias sociais e
culturais. O estudó procura partir do mais simplss ?ara o mais com-
}?lexo, e:mp'liando a compreensão das questões ' relativas ã alfabetiza·-
, ção de crianç~s pobres Fel~ inserção dos problemas psicológicos num

mcrg.
g:u.adro--mais anplo. Fin2_1mence i O estud0 prc~::ura -re.sum i r O q ue s abe--
mos hoje sobre a alfabetiza..ção--de --crianças pobres e apr.esen-tar espe-
culações sobre modos de influenciar os rumos que esta ?ode tomar no
futuro. Durante todo o estudo i serão apresentadas criticas ã prática
_.-ft~da-.alfahetizaÇc=i_o--r - S-erl'. _uf:.c-e ss ariamen::e nos reportarmos a todos
os métodos de ensino e a todos os tipos de escola -simultaneamente. É
a partir desta critica que eS!=leramos poder._.cc~truir---suge.st.ões-.para
uma prática mais produtiva.

~.
'Os PROCESSOS PS ;'CCLÓGICOS Dl\ :'~ E ITU RA E ESCHI~A
_ _
T""')~'~ _tj''''-~Tr ~-.c.: ~ :.::u ~'~=''-'''. ~ :ca:::c::><K"%~_' -

- " - í" ~'

~saracteristicas do sist ema de escrita


_.-- e requisitos que ele impõe sobre c leitor

Os sistemas d ~ escrita alfabé t i cos, como o do portu--


-
gues, ,
sao sistemas extremament.e -- poderosQs-f' .CO!iLJlm: :-pequeno numero de
letl:as __ pod.emoS-----escreve.r,,~toda s a s palcrnasde noss a língua. ~ este
- ' - " -.
·-----poder._gue. reflete a capacidéldE' gerati va que têm as, pessoas que apreg
dem a ler e escrever f ou seja ? a capacidade.. J:la-.g.e.r-O:ll:_--~.representações
-' escritas para pa lavras_ q1.."!.e--.nul:.ca _.leram an tes ou de ler .palavras que
nunca lhes foram ensinadas. Em última aná l ise, o ensino da leitura
não pode visar a aquisição de um repertório reduzido de palavras e~ ·
cotas e lidas. I S20 s er i:1 querer limit_aT () fun cionamento do sujei----
to, violando as próprias c a ra :-; ~: eri sti cas do s istema. Embora pouco se
saiba em psicolog:la sobre 8_ t rar'. sm issão dE~ sls cemas simbólicos, os J

estudos da linguagem demonstram amplamente a e xistência de uma tal


capacidade gerativa (ver; por exe~plo, Brown. 1973; Clark e Clark,
1977; Slobin, 19 8 0) do mesmo Dado que os e s tudos da aquisição de sis
temas numéricos exemplific2ffi e ssa capacida de humana em outro contex-
to (ver Saxe, 1982, para um e xem:rllo fascin n.n t e sobre o uso desta c~
'pacidade gerativa para :-esolve r proble:nas n'C~rr;éricos em uma comunida-
de na Nova Guinã) . Temos, pois, evidªncia s claras da exist~ncia des -
ta c a pacidade gerativa , que é julgada un i versa l, em outros campos.
Não
,.
existe razão para duvidarmo s de sua ut il i za ção para ler e escre-
ver.
)
No entanto , 6 ne cessário que con?r e 8 n da~o s como a palavra escri
~a e a palavra falada se relacionam, como esta capacidade gerativa i
'~specif icamente usada na escrita alfabé t ica I e que outros elementos
éstâo envoavidoG 2D s eu u s o .
A escrita alfaté tica r e~r es enta a palavra enquanto s~
qüência de sons , e não di retarrente o s e u s l gn i :!: icad·:). Por exemplo ,
a representação escrita das p i:'I lavras " bol a" G "esfera" , que são seme
03

lhantes em-sign.if..icado-.r nada-têm em.-camllm, ..enquanto-que-a...represen-


tação escrita das palavras "papa" e "papagaio",de significado t~o
diferente, é exatamente igual no que diz respeito às primeiras qua=
tro letras. Esta característica dos sistemas alfabéticos impõe um
requisito sobre o indivíduo que deseja aprender a ler : exige que
ele seja capaz de diferenciar palavras enquanto seqUências de sons
de seus significados, Segundo tal análise, um , indivíduo que não co~
ceber a palavra como envolvendo dois aspectos . independentes, um si9.
nificado e um significante, teria dificuldades em aprender a ler.
Tais foram as especulações feitas por Carraher (1978) e, subseqüen-
temente F os resultados obtidos por Carraher e Rego em uma série de
__estudos f descritos r:. seguir.
Num primeiro estudo (Carraher e Rego, 1982) crianças
em processo de alfabetização foram entrevistadas quanto a sua con-
cepção da independência entre palavra e significado, tendo sido sua
performance classificada em três níveis. No nível mais elementar;as
crianças tendiam a atribuir 'à palavr:l algumas das características
4e seus referente, como . exemplificado nos extratos de entrevistas
):ranscr.it.o.s- .abaixo ~
J
./
Diga aí umas palavras grandes.
Cr. (AC, 5 anos) ~ Kombi, caminhão. Maverick e um
carro bem grande. Eu se lembro de uma grande pa
nela.
'E~ Agora diga umas palavras pequenas.
Cr~ Morango, flor , toalha.

E~ Por que morango e uma palavra pequena?


Cr ~ O morango é bem pequenininho (Retirado de
Carraher e Rego, 1981, p. 5) .
E~ Por ,qüenavio fi uma palavra g:rande?
Cr. (CH, 7 anos) ~ Porque o nome é grande.
E~ E o que é um nome grande .;.
Cr ~ Nome grande é de coisa grande. Os tamanhos e
grande então o nome deve ser grande. (Retirado
Carraher e Rego, 1981, p.5).
E: Qual a palavra maior, aranha ou boi;
Cr . (MG, ti anos) ; Boi
o

E~ Veja bem; a · ra ·nha. Qual a palavra maior 7


erg Aranha.
Eg Por q)..ll~?
Cr: Nio sei porquª ?
E: Qual a palavra maior, trem ou telefone ';
Cr ; Trem.
E~ Por quê?
Cr.~Porque ele e mais grande.

E g Qual a palavra maior, anãozinho ou gigante:


Cr.~Gigante.

E~ Porquê ?
Cr~~Porqueele e maior~ u{Re.tirado .de--Carraber_.e Rego,
1981,p. 5).
E; Dê uma palavra parecida com bola.
Cr. (FC, 5 anos);Círculo, cilindro.
-E ~ .Por ·· que. . -a.s-- -palavra.s--cir.cul.o-...e--~_pare­
cidas com õ8 palavras bola;
Crg Porque é,

I
) Cr; Bico.
E~ Por que a b'alavra bico e parecjda c.om. a palavra
pato t'
Cr; . Porque é:
E~ As--palavr:a.s_~-S.ão-pa rec; da s 2.
Cr~ são.
E~ Porque?
Cr ~ Porqu2 o s a po pula e o meninQ_pula_lsubentenden---_.-- ..
do=s2 provavelmente que, se o menino pula, seu '
sapato pule com ~le)o (Retirado de Carraher e Re
go, 1981 1 p . 6).
I
\
\ Esta tendência da criança de atribuir características
~o referente a palavra já ro i t ilY.'JJém documentada por outros autores ,
bomo Piaget (1929) e MaI'krr:Ctn (l9 73), os quais, no entanto, não rela
~jonaram o fenômeno à aprendizê,rJem da leitura.

/
/ . Em um nível int ermediário do desenvolvimento desta
concepção, as crianças ora atri. buí~m à palavra características de seus
/'
-'
referentes ora mostravam ~· se capazes de atender às características a-
I
cústicas das palavras.
Eg Diga ~~as palavras grandes.
Cr o (LF,7 anos) ~ Telhado, coqueiro,cabeça, vassoura.
E~ Diga umas palavras pequenas.
Cr ~ Pinto,sal, iarro, luz.

E " Por que te l hado 8 uma palavra grande ?


Cr o Porque tem muitas letras .
E ' E por que ~. uz é uma palavra pequena'.;·
Cr. Porque t e m 00ucas letras,
E g Me C8 U:;:1êe pa lavra parecida com bola.
Cr . Boca.
--------------~-------~~- -------~----~---

E: Por que as palavras bola e boca sao parecidas?


'i' ,Fo rque ê bo e bo. (Retirado de C:lrraher e Regos 1981 p.6). 9

Carraher e Rego (198l)observaram neste estudo que


nehura das crianças cujo desempenho havia sido classificado no nfvel
GJis elementar mostrou Drogresso significativo ap5s um ano de alfa-
betização embora todas procedessem de famflias de renda média e alta
e f ossem todas alunas das mesmas classes. No entanto, aquelas que
mostravam ou um nfvel interm odi~ rio ou um nfvel superior no desenvol
vi mcn to deste conceito apre sentavam uma aprendiza gem escolar mais
Jvançada em l e itura . de acordo com a avaliação da escola, e melhor
desempenho num t e st e de l ei tura de frases. Em estudo posterior.Car -
r ah0 r e Rego (1984 ) demonstraram tamb~m que a classificação das cri
anças se gu ndo seu desempenh o nest~ tarefa permite-nos predizer seu
sucess o final da alfabetização ind epe nd entemente da camada de renda
de que a criança pr ocede e do tipo de abo~dagem - silãbica ou fonêti
cn - usada pe la professora na alfabetizaçãoi Esta a n~lise veio escla
rOC2r por qUG crianças com ma ior sensibilidade para rimas tem ~aiGr
nrobabilidade de s uCesso na 21fab e tizaç~o (ver 9 Por exemploiMattingly
1972. Bradley e Bryént. 1983 ).
Os result ad os de estudos sobre a relação entre esta
consci~ncia da palávra enquanto sequ~ncia de sons, denomi nada consci
~ncia metalingufstica. sã c extrema~ente encnrajadores pois nã0 56 jã
foi ~ossfVel demo~strar ex~erimentalmente uma relação causal éntre
este ti~o de consci~nci ~ metalingufstita e brogresso em leitura cnmo
tJmb~w demrnstrru~se quP ~ ~oss{vEl mrlh 0 rar ~ s e nsibilidade ~ ri~a
~eln tr e ih c sistem~tico. Bradley e BryAnt ( 1983 )~ em cuidados estu
do (;:x;;erimental realizad r, durante um nerfodo de cinco anos, observa-
ram que e r~ nossfvel melhorar significativament e n desempen ho em l~i
tura de crianças que nraticassem a produç ão i identificaçâo de rt~as
em sala de aula. Esse treina era ainda mais efetivo quando associadr
numa atividade e~crita em "que as partes comuns ~s duas palavras que
rimavam eram sistematicamente isoladas pela criança .
Outr& caract erfsti c a da escrita alfab~tica que merece
discussão eo nível de ' anãlise em que ti ptJ de sistema se , baseiõ.. Ac
contrário das escritas silãbicas , que representa m as unidades natu -
rais de prDnGncia,assílabas~a escrita alfabetica exige que seu usuE
rio segment~ él fala em nlveis ni}o rronu nciãveis , os fonemas, "imnis
abstatos do que a ' silaba porque n~o re~resentam ex ~ e ri~ n cias concre-
tas de se gme ntaç~n d~ fal a dos indivfduns.Por ex emplosse uma criança
~ ' interro~ida no fhlar. e ln ntderf fazer UmR ~ôusa entre' dU0S ~ a l~vras

-
, - _. _ ~
.
--
.-.- .- .. - -- ~ • y. - s
laba~ nem se faz corresponder UDa criança a uo fonema p apontando pa-
ra três crianças ao se pronunciar iluni I I . duas ao se pronunciar ': tê n ~
etc. A sílaba é nao somente uma unidade natural da pronuncia mas ta~
bém uma unidaJe que encontra uma representaç~o consciente mais prec~
cemente na criança (ver Liberman~Shankweiler~ Fisher e Carter 1974 ;
Ehri~ 1980; Carraher e Rego~ 1981).
Ferreiro e Teberosky (1979) e 9 posteriormente~tambêlil
Carraher e Rego (1984) observaraEi que 9 quando pediuos a uma cr~ ança
n~o alfabetizada que escreva alguma palavra,ela fre q uen te Iílen te se
disp~e a faz~-lo e apresenta-nos? deste cada. sua - .
proprl.a concepçao
escrita. Carrher (1983) observou que as pr~me~ras tenta tivas feitas
pela criança ao tentar escrever refleteB sua dificuldade em conceber
a palavra como una realiJade inuei)endente de seu significado.Inicia..!..
nente, ao ;" escr 2ver"~ a crL:.mça faz rabiscos Elaiores parél represen-
tar graficamen te objetos grnndes e rabiscos menores para representar
objetos pequenos. A forma dos rabiscos pede tamb~rn incluir uma repr~
embora a criança afiroe que est; escre
vendo a Valavra. NUITln ::::2G\2 pusterior~ !\~screvern passa a si gni ficar
;lfazer letras (eu riscos s2Elelh~mtes a letras ( no papel".
Carraher e Rego (19B3 g 1933) identificaram quatro ti-
pos pr inci pais de deseE~enhu entre crianças aind~ n~o éllfabetizadas
ao iniciarem seu priociro ano de a?rendizagen de escrita e l-aitura.
No nível mais elementar. o deseopenho da criança n~o revela o estabe
lecimento de relaç~es sistem~ticas entre a palavra escrita e a pala-
vra falada. f ~
enom~no
· - 'naV1a
que Ja · · s~o
d o b servado
- anteriormente tam-
b~m por Rozin~ BrcssDélo e Taft (1974) e Ferreiro e Teberosky (1979).
Neste nível de a criança tende a usar o mesmo numero - de
sinais para representar qualquer palavra que lhe pediDOS que escre-
va. independentemente de seu comprimentu. SiDultaneamente~ ao ler a
criança parece fazer apenas UEa correspond~ncia global entre a pala-
vra escrita e a falada~ seu desemvenho nie indicando qualquer tenta-
tiva de an~liie da palavra pela criança.
'1';
.'1 u- "1
... ,-, ,'" c;'"
i:) ' -
p'ln .I.. -10
U ....... 'on 1
fi:;" v\,.;..
r1 .<.>
-....~_ desempenho. a leitura começa a
mostrar sinais de ac;lise ela pa lavra falada e de uma busca de corres
pond;ncia entre os elementus obtidus e as letras usadas, apesar da
escrita nia ter inicinlnente refletido tais tend~ncias, una cria.nça~

por exenplo, \i USOU as letras CRAHDB para a palavra cadeira. Ao ler ~

fez correspondências entre n5 sílaba ';c a n e "uelo e as letras C e R~


deixando o restant e das l e tras, A li D B para corres~onder a sílaba
lira" (Carrah'er G R.:q;o" 1984). N~H4te nível ele deseupenho, a correspo~
d~ncia estabeleci dn p el a criança no l~rg corno ve mos. pode niu ser
rigorosa. e ela concilia sua representnç~o escritn com a ~alavra fa-
lada, aceitando v5rios elementus CUDO corres p ondentes ; ~ltioa síla-
ba.
da c r~illça ~á re = ~e ~ e s uas ~ en~a~~vas ~e a ná~~se ~Q ?aiavra = a ada.E~
ta análise dá=se ao nível natural de análise da pronúncia, a sílaba,
e a criança exibe, desta forma,uma concepção sibábica de escrita.Assim
a palavra "formiga" é escrita com três letras, a palavra "urso" com
duas letras, a palavra "urubu" com três etc. Crianças nesta fase de
descoberta do código escrito que já aprenderam as vogais podem mesmo
identificar as vogais presentes na palavra e representá- la graficame~
te por suas vogais,; a palavra "urubu", por exemplo, foi freqUentemen-
te escrita por uma seq~ência de três USo É interessante observar que
tais exemplos de escrita silábica são extremamente claros e ocorrem
em culturas onde o sistema de escrita é alfabético. Ferreiro e Tebe-
rosky (1979), observaram que o prognóstico para aprendizagem da leit~
ra em crianças cujo desempenho é deste tiDo ao início da alfabetiza _.
ção é extremamente favorável e que a concepção alfabética de escrita
desenvolve~se facilmente sob a influência da alfabetização na escola.

Finalmente, no mais elevado nível de desempenho,a cr!


ança estabelece uma relação sistemática entre a palavra falada e a es
crita,utilizando um número de letras que corresponde aproximadamente
ao número de fonemas. É interessante observar que a representação es-
crita apresentada pelas crianças nesta fase reflete freqUentemente a
pronúncia local de modo fiel.A palavra "urubuzinho", cuja pronúncia em
Pernambuco envolve a redução do sufixo "zinho" a uma única silaba em
que o i é nasalizado e "nhoU é pronunciado como um u final, brando,foi
freqUentemente escrita como URUBUZIU por crianças que ainda não haviam
aprendido sua grafia em sal::l. de aula.
No estudo descrito acima, Carraher e Rego (1984) nao
só confirmaram com crianças brasileiras a existência de uma renresenta ,- -
ção silábica espontânea na criança como também observaram que o desen~-
volvimento da capacidade da criança de conceber a palavra e seu referen
te como realidades indevendentes.Além disso, Carraher e Rego notaram
também que as crianças em processo de alfabetização com ensino basea-
do na smlaba progrediam mais rapidamente em leitura e escrita ào que
outras da mesma camada de renda envolvidas em processo de alfabetiza--
ção vaseado nos fonemas.Aparentemente, a utilização pela escola da u-
nidade de análise mais natural e accessivel à criança harmoniza=se me
lhor com seu modo de pensar e 9romove, assim, maior progresso na arre~
dizagem. Finalmente ç Carraher e Rego notaram também que a defasagem e~
tre as crianças de camadas de baixa renda alfabetizadas por ?rocessos
silábicos e aquelas de camadas de renda alta alfabetizadas por proces~
sos fonéticos Dode ser considerada como equivalente a um semestre es-
colar.Portanto, quando, ao final do ano, a avaliacão escolar aplica
criterios semelhantes para aprovação em ambos os grupos,aquele da es~
cola pública tende a fracassar, apesar de registras de ?rocesso ,. acentu~
do relativo ao inicio do ano em inúmeras crianças. Carraher e Rego s~
geriram, em conclusão, a importância de se ver a avaliação esco1arnes
te caso como uma medida do progresso da criança, utilizada para sep~
gramar o que a criança fará no ano que se segue, e não como um oadrão
externo que deva ser alcançado a fim de se evitar o fracasso total.
Um último aspect~ da capacidade gerativa envolvida na
alfabetização ~ sua relação com a natureza do sistema de escrita que
usamos refere~se a delicada questão dos erros de ortografia. Quando a
criança descobre o sistema alfabético, ela ainda tem muito o que apr~
der sobre ortO]rafia. Embora ela se torne capaz de gerar uma represen
... -
tação escrita, compreensIvel mesmo para outros leitores, para pala-
vras que nunca leu antes, a ortografia destas palavras freqUentemente
não será correta pois a escrita da criança assemelha-se mais a uma
trnacrição fonética usando as letras do nosso a1fabeto.De fato, exis-
tem diferenças entre a 1ingua falada e a 1ingua escrita que a criança
só poderá descobrir através de contato com a lingua escrita.Por exem-
plo, em Minas Gerais, fa1a~.,se "mininu" e não "menino". A escrita da
criança ooderá refletir essa pr~núncia regional antes que as diferen-
ças entre a língua escrita e a lingua falada sejam .descobertas.Em Re-
cife, pronuncia-se "bãu" e nao banho". A substituição do "nh" na es-
c~ita por "ãu" (ou"au", pela aus~ncia de notação 9ara a nasalizaç~o )
é UlJl erro ortográfico que observamos freqUentemente entre crianças na
região. Assim, neste moment0 verdadeiramente triunfal em que a criança
descobre o código a'lfabético e domina as correspondências entre letras
e sons na leitura, seu prazer na aprendizagem pode ser destruido pela
e$cola por uma insistência exagerada na correção ortográfica. A esco-
~~ ignora as diferenças entre a lingua falada e, particularmente; en-
tre as variações dia1etais e a linqua escrita, e quer exigir da cria~
ta uma perfeição ortográfica que só será alcançada após longa evolução
(ver, por exemplo, Marsh, Friedman, Welch e Desberg, 1980. para uma
êBscrição dos estágios nesta evolução) o

Não ~ demais salientar aqui que quanto maior a dife -


rença entre a variedade dialetal falada pela criança e a língua padrão
___ idealizada, que não é falada por ningu~m ~__mais freqUentes se-
rao seus erros de ortografia. Coma a escola desconhece as questões l~
vantadas aqui sobre o desenvolvimento da escrita, sua insistência so-
bre a correção ortoqráfica leva-~a a discriminar sistemática e negati-
vamente aquelas crianças cujo dialeto muito se afasta da língua-padrão
ou seja, as crianças pobres."Fia" ao invés de "filha", "tauba" ao
invés de "tábua", "nóis " ao invés de "nós" são exemplos de pronúncias
que marcam distinções lingUísticas entre camadas sociais. Tais dife-
renças de pronúncia vêem gerar, pelo mesmo processo cognitivo, um nu-
mero de erros ortográfico muito maior entre crianças pobres do que en
tr ~ ~r~~~ç~s ~i c~ s ;levando as professoras a urna avaliação muito mais
ne (]a tiva daquelas do que destas embora não podemos deixar de in-
si s tir estejam todas gerando a ortografia de palavras novas pelos
me smos sofisticados pr.oce ssos de compreensão da escrita alfabética.Ve
mos, assim, que a uma idcnl:idade em termos de competência podem corre,ê.
ponde r diferentes desempenhos na ortofrafia e que, apesar da semelhan
ça entre os proceSSO;3 ind:Lviduais, as d'iferenças sociais levam a uma
di sc riminação contra as cr ianças ryobres e em favor das procedentes das
camadas sociais domina~t2s.

2. A PSICOLOGIF. ")0 FRr"\CASSO NI". ALFABETIZAÇÃO

Apesar de referências aos fatores motivacionais apare


cerem com uma c ar ta fresü~n cia, a pesquisa de fatores psico16gicos a~
sac i ados ao frac2sso na alfabetização no Brasil é inspirada principa!
mente pela prát ica cl Inicn e pelo conceito de dislexia (ver, por exem
pIo, Poppovic; 196B); e (2) ~ literatura relacionada ao fracasso das
pobres (lue adota a abordagem da "privação cultural", e explica o in-
y

sucesso destas crianças em termos de deficiências em fatores cogniti-


vos impGrtantes para a a1')rendizagem (Poppovic,Esposito e Campos,1975).
A primeira tendincia na explicação do insucesso na
alfabetização aplica o discutido conceito de dislexia,implicita ou ex
pl:J.':;i t2:J.O::,ê:Tte " ê. todos os )~ i?os de dificuldades na aprendizagem da le!
tU l~ 3.. Em})ora uma. análise netalhada da dislexia fuja ao escopo do pre-

sente trabalho, c abem agE! algumas explicações, essenciais ã critica


da aplicaçao ir Ci scrirninada deste conceito ao fracasso na alfabetiza-
çã ~ das crianç 2~ pobrsa. Distinguem-se, tradicionalmente, dois tipos
bá s icos de dis lexias, as dislexias adquiridas e as dislexias de dese~
vo lvimento. As 6 islexias adquiridas são resultantes, em geral, de al-
G alfabetização já ter sido completada.Elas,
po :::~ tanto
f pouco interessam ao exame da questão "alfabetização e pobr~
za H • As dislexia s de desenvolvimento são dificuldades persistentes de
ap re ndlzage~~i da leitura observadas em crianças e adolescentes. Ape-
sa:,:.· de inúmeras ,:;ontrovó:r:s ias quanto ã definição (ver ,por exemplo ,Ru!.
te ~. ~ To 1978; Eisenb0rg, 1978 i r.1attis, 1978), costuma··· se distinguir 2n-

tre dois tipos amplos d~ dislexias do desenvolvimento (Rutter,1978).


(1 ' atraso geral nq capacidade de leitura, e (2) atraso especifico de
le itura. O atraso geral d2 leitura seria uma condição de desempenho
pobre na 1 ,~:it1.1ra p"Olra a idade e independentemente da inteligên-
leitura e umtermo usado quando se aescre-
ve ':t."TIa dif icul:3,.';L:Áe '3SF(~cíf ica; neste caso, utiliza-se o termo apenas
qU2.n do a crianr;'J. l.e s:Lr~it~' .::ativamente abaixo do que seria esperado a
par'cir de seu nlvel d!~ .L.yt.~ligência. Embora as causas subjacentes ao
aparecimento das dislexio.s ainda sejam bastante controvertidas ,Rutter
10

e Yule (1975) e Rutter (1978) argumentam que esses dois tipos de dis-
lexia pod~m ser diferenciados porque~ (1) as dificuldades especificas
de leitura aparecem mais freqüentemente em meninos, enquanto que os a
trasos gerais da leitura aflicgem igualmente meninos e meninas; (2) de-
sordens neurológicas são mais freqUentes em crianças com atraso geral
na leitura do que dificuldades específicas de leitura; (3) ascrianças
com atraso geral na leitura manifestam vários outros tipos de atraso
no desenvolvimento, enquanto que as dificuldades especificas de leitu
ra estão mais relacionadas a problemas de linguagem (Vellutino, 1978;
Bryant e Bradley, 1985); (4) uma percentagem maior de crianças com a-
traso geral na leitura do que com dificuldadesespecificas.dG leitura
procede de camadas de baixa renda. O atraso geral na leitura, portanto
parece constituir principalmente um atraso acadêmico geral,enquanto
que as crianças com dlficuldades especificas de leitura mostram apren-r
dizagem normal da matemática. Bryant e Bradley (1985), após cuidadosa
revisão da literatura, suger~ram que é pouco provável que as criancas
com dificuldades especificas de leitura constituam um grupo especial,
diferenciado da população geral por traços peculiares ou clínicos.Sua
análise sugere que o mais provável é que as dificuldades de aprendiz~
?em da leitura nessas crianças sejam relacionadas a um desenvolvimen-
to mais lento de alguma habilidade relacionada à aprendizagem da lei-
~ura, provavelmente de natureza lingUística r pois as diferenças em ha
filidades perceptua~s entre bons leitores e l~itores com atraso desa-
~arecem quando a tarefa não envolve a intervenção de desempenho verbal
(ver Vellutino, 1978). Se, de fato, estas crianças não constituírem
Acasos clínicos", argumentam Bryant e Bradley, as mesmas práticas ~ue
~á demonstraram ser eficientes na aceleração da aprendizagem da leit~
~a em crianças normais, como a identificação e produção de rimas
i
(Bradley e Bryant, 1983), deverão também produzir efeitos positivos '
pom crianças que exibem dificuldades específicas de leitura.Esta é F
certamente uma perspetiva animadora diante da questão "alfabetização
e pobreza", pois a escola não precisaria identificar que crianças s~
frém desta dificuldade, uma vez que os mesmos exercícios beneficiariam
a todos.
A incidências das dislexias varia entre países com lí~
guas diferentes, sendo mais comum em países em que a escrita mostra
maior irregularidade, como no caso do inglês, e menos comum entre países
em que a correspondência entre grafemas e fonemas é mais regular,como
no caso do italiano (Rutter, 1978). Estimativas da incidência das disl~
xias variam entre 4% e 15% em países de língua inglesa (ver Vellutino,
1978)! sendo, pois, de sê esperar que sua incidência seja menor no Bra~
sil, uma vez 1ue o ~ortuguês mostra muit~ maior regularidade nas corres
. .-
"'-~_es
- - ._- - --
~ _ ~ ..... '-" _ C--
- - ..-
~ :.c~:.:_::.-=.

des de alfabetização. Po?poviC (1968), que publicou um interessante


estudo sobre tais dificuldades, não se referiu especificamente ao ca
so das crianças pobres. No entanto, como salientou Schneider (sem da
ta), o exame praticado nas escolas pÚblicas quando se constatam difi
culdades de aprendizagem na alfabetização, indica que a suspeita de
professores, supervisores e' psicólogos é , neste caso, de "imaturida~
de" para a aprendizagem, o que equivale a dizer que existe-..bas.icame~·
te uma suspeita de dislexia do desenva.lv.i.mento..., ..-f.a.ze.nd.o-se afirmações
-~
sobre patologias a partir de discriminações sociais, Schneider conti
nua: "Tais afirmações são geralmente feitas simultanealnente com decla
·raçoes acerca de subnutrição e ausência de cuidados · médicos~ntudo,
isto é confundir pobreza material e física com pobreza cultural "(p.58).
Novaes (1977) exemplifica claramente esta tendência, quando afirma
que "a privação das mesmas ,oportunidades para o desenvolvimento leva
crianças de níveis sócio-·econômicos baixos a dificuldades de adapta-
_ , _ f
çao as situaçoes de aprendizagem organizadas e prepara?as para outro
tipo de população trazendo, como conseqüência lógica,percentual mui-
to significativo de evasão escolar e de problemas ' de aprend.izagem,d~
correntes de atrasos de vários anos.{ .•• ) Tais características rela-
cionam-se com a aten ção instável e dispersiva, com o pensamento mág~
co predominante, com o autoconceito deficiente, com os sentimentos de
insegurança e inferioridade, com as dit'iculdades perceptivas, de fr~
ca retenção mnemônica ... " (p.59·60). Embora a autora não pa~se a pro-
por, a seguir, a ~eeducação das crianças de. níveis sócio-econômicos :;
baixos, é necessário concluir que essa seria sua única esperança de
a?aptação à escola a partir da lista de características negativas a
elas atribuídas.
Craidy, Grossi e Fialho ' (1983) também apontaram ames
~a orientação clínica no tratamento do insucesso escolar das crianças

<las classes populares no Brasil, quando salientaram, como tendências . ~

_ . ----- ·----nitid--;s--de~s;_ tratamento ~--a- -inclusã'ode II atandimento psicológico Tl e


.~
ltreeducação". No entanto, é necessário questionarmos se podemos estar,
- --
de fato, diante de algum tipo de patologia, ou seja, se o tratamento
clínico psicológico, pela reeducação psicomotora, como sugerem alguns
ou pela psicoterapia, como sugerem outros; é uma resposta apropriada
;>,,-
aos altos índices de repetência na Drimeira série entre crianças po-
bres.
Considerando·.. se as estimativas de incidência. dis~
~

lexias entre n6s, seris razoável e~plicarmos tão altos níveis de re?~
tªncia na primeira s~rie em função de problemas clinicos i Não caberia ,
uma crítica sim?les l baseada no próprio senso comum, de que tais iDd!
ces de incidência não podem evidenciar patologias'; Quais seriam os ar
g-"mencos ::;:..:e -'~r;-.";r:l _ essa exp ] j ração?
Um dos argumentos-qu~do-~tjJjzarl e-pa ra manter
a explicação do fracasso escolar em termos de atrasos no desenvolvi-
, mento é o baixo ni veJ, de desempenho de :"desempenho--de crianças po-
bres em testes de- prontidãO-para a leitura~ como o ABC, de Lourenço
Filho, e o Teste Metropolitano de Prontidão. No entanto 1' __ á __necessâ-
rio que consideremos -q ue o estabelecimento de padroes __ - em testes
t
s ~ '} . , psicométricos ,~ , no:rmativo, baseia"se em estatísticas desenvolvidas , :: I ,; ,
~5
para determinadas 90pulações em certas condiCÕes. ' Tais_padrões~ corno !
"
sal:i:enta Cunha, _(1977), têm raízes culturais por demais acentuadas - pa
ra que se possa atribuir processos patológicos àqueles que não 'se-
guem as normas determinadas em um contexto~cio-cultural particu-
lar. Além disso"nada existe na natureza da escrita-alfabetica, como
vimos pela análise a~terior, que exija da , criança a ser alfabetizada
uma idade mental de 6 anos, -por exemplo, ou um determinado nível de
desempenho em qualquer um dos testes 1ue têm sido usados para avali-
ar a prontidão para a alfabetização. Quando examinamos criticamente
tais testes, vemos que poucos itens refletem o exame de alguma habi-
lidade envolvida no processo de execução ou aquisição da leitura. D~
finir palavras I montar quebra ~·cabeças, encontrar a figu/r a que pode
ser formada quando arranjamos as partes desconectadas de um desenho
ou copiar figuras geométircas, exemplos de itens dos vários testes
usados na avaliação da prontidão para a alfabetizâção , não são te re~
fas que exigem do sujeito aquilo que e~tá envolvid~ na compreensão'
do código alfabét,ico. Finalmente, como puderam demonstrat Gatti, Pa~
fo ', 'Costa, Kopit e Almeida (1981), num estudo deta l hado sobre alunos
~:.

aprovados e retidos na primeira série em uma Gscola carente e outra


não-carente, um baixo nivel de desempenh0 nos testes de prontid~o
não pode ser considerado como causa suficiente para a reprovação. De
fato, na escola carente, 24% dos anrovados classificam-se no Teste
Metropolitano de Prontidão como tendo desempenho médio inferior e ,
na escola não --carente, 31% dos aprovados obtiveram esta classifica-
_ . ___ _ _ _
ção. Entre os retidos, a percentagem de crianças mostrando esse ní··
. _._ ~ --- - - -- ---_._- - - - - - - - -- - - ---- - _. _ . __ • • __ o _ _ -

vel de desempenho nas escolas carente e não ,carente foram, respecti-


ª
. ~.

vamente I iguais 4;> __e_ 26. Similarmente, esses autores apontam que
o mesmo padrão se re?ete com relação aos resultados da Escala de
Weschler (WISC), pois foram encontradas "não s6 crianças retidas co-
.-
mo também a?rovadas nas categorias de classificação 'médio inferior ',
'limltrofe,' e "deficiente"! (p... _ l ~ __tanto na _Bscola- c.ar;e-nte- como na
não-carente. 'Assim, embora constatada a suposta causa -' baixo desem~e
nho nos testes Metropolitano de pr0n~idão e no WISC - não foi observa
do o efeito esperado. Resultados claros como esse sao raros em psico-
logia I porém pe rmi tem'o nos afastar a hipótese de uma relação causal
entre desempenho baixo nesses teste s e frac a ss o a lfabetização . De --
e==:::.= - -: -=
na literatura resultam de uma terceira variável, que tende a estar
associada as anteriores.
O segundo tipo de ex?licação mencionado acima, es ?~.
cificamente desenvolvido para o caso das crianças pobres, trata o
\

fracasso destas crianças como resultado da "marginalização" ou "pri-,


vação cultural". A abordagem da "privação cultural" difere da ante -
rior por não tratar o fraçasso das crianças . pobres em alfabetização
como casos clínicos, que exigem "atendimento psicológico" ou "reedu-
cação". As criancas pobres são vistas como estando em desvantagem
com relação àqueles de camadas mais abastadas, podendo, porém, ultr~
passar estas desvantagens pela educação co~~ensatória. Entre psicó-
logos, o esforço mais sistemático em pesquisar a questão do fracasso
.JJ.a...-aprendizage.m da lei-tura no Brasil foi rea~izad.o-.--se.m--dÚ:\l.ida ,__.__- por
Ana Maria Poppovic e seus colaboradores. Seus estudos (1972; 1973;
1975; 1977), pioneiros entre os trabalhos de pesquisa psicológica r~
levante a esta questão, tim grande import~ncia e serão comentados
detalhadamente, a fim de co~pararmos posteriormente a abordagem sub -
jacente a tais estudos e aquela que será proposta no presente traba -
lho. Necessário se faz, em primeiro lugar, comentar que, apesar. de
todas as críticas que'aqui faremos ao trabalho do grupo , de pesquisa-
dores dirigido por Ana Maria Poppovic, a importância de seu trabalho
não é negada por nós. De fato, seus estudos tiro gerado maior intere~
se na análise desse grave fenômeno, a reprovação na primeira série
do primeiro ·grau, do que qualquer outro grupo de trabalhos produzido
por um psicólogo brasileiro. Sua contribuição é inegável. No entan'~
to, cabe aos pesquisadores investigarem diversas possibilidades, di~
cutirem diversas saídas para o mesmo problema, e, nesse'-processo, di:.
vergirem entre si, sem que tais ~ivergincias constituam desrespeito
ao trabalho realizado por aqueles com quem não concordamos por qual-
quer razão de natureza teórica ou empírica,
A estratégia de pesquisa utilizada por Poppovic e
seus colaboradores (1975) constitui em selecionar um certo número de
testes (conhecimentos gerais; funções psiconeurológicas; conhecimen-
to de convenções da leitura; conhecimento de elementos matemáticos;
conceitos básicos; operações de análise, síntese e ordenação percel2.
tual; solução de problemas; conhecimento de grar:ática e vocabulário)
e aplicá .. los a duas amostras de crianças, uma escolinha entre famí ~
lias de renda média e outra entre famílias de renda baixa. Os resul -
tados mostraram grandes diferenças entre os dois grupos de crianças
.
as quais, segundo Poppovic. Esposito e Campos (1975), explicam "cla-·
Q

ramente os índices alarmantes de repetência em nível de primeira sé ~ ·


rie" (p437). Diante desses resultados, poppovic e seus colaboradores
criaram um programa especialmente talhado para o ensino da leitura a
crianças pobres (Poppovic, 1977) o qual inclui exercícios em t ~ ·- ,.
I
as habilidades em que as crianças pObres haviam anteriormente apre-
sentado performance inferior àquelas das crianças de famílias mais
abastadas.
Esta abordagem ao problema~.do fracasso escolar na
primeira série de acord0 com poppovic (1981), reconhece a importâne~
cia dos fator6 ~ ·. sociais na produção dos aI tos índices de fracasso
na parendizagem da leitura entre as crianças pobres e propoe que a -
. escola é parcia.lmente responsável por tal fracasso. A escola, insi~_.
te poppovic, precisa m0dificar-se de tal forma que os programas of~
recid0 às crianças :;?obr,e s satisfaçam suas necessidades, oferecendo--
lhes treinamento especial naquelas habilidades em que, por qualquer
razao, sua perforrnance mostre deficiências. Patto (1981) e Carraher ,
Carraher e Schlieman (1982) salientaram que, apesar de algumas dif~
+enças, a proposta subjacente a esta abordagem constitui essencial -
/

~ente uma forma de educação compensatória na escola, ao invés de


~ programa compensatório ·no período pré· escolar, como foi experi-
~entadonos Estados Unidos gelo pr~jeto He~~ Start. .
J O programa de' ens~no pro?osto por Poppov~c e seus

~
\ olaboradores " o Programq.Alfa tem inúmeras qualidades. Em pri-
eiro lugar, baseia o ' processo de aprendizagem na análise da pala-
.ra a nível silábico, que, como vimos anteriormente, é mais compati
, I

tel com o modo de pensar da criança ao início da alfabetização. Em


r~gundO lugar, o progralta inclui, embora poucos , alguns exercíci o s
re identificação ge rimas, que, corno vimos anteriormente, benefici-
todas as crianças, urna vez que o desenv0lvimento do conhecimento
etalinguístico está associado a um maior progresso em leitura. Em
lugar, a avaliaçâo da aprendizagem ~~~ .~ ~ ~ proposta neste
não é feita a partir de um padrão ~redeterminado, que se ?~
a os bem-~sucedidos dos fracassados, mas constitui uma avaliação do
rogresso da crinaça, sendo que seu trabalho no ano subseqüente de -
e continuar do ponto onde ela Darou, instituindo os criadores do

__!J:g:::i~~!;ã:m~q::!:~: _::v:u:a~:r f_;:P::~::~i::~q~:~!_t::~o~e::i:: _____


~
ificações propostas pelo prograraa n.&o carecem ter sanado o mal pa- ;:
a o qual o rem~dio foi criado. Apes~r do fato de que o Programa
lfa prevê um tempo maior para a aprendizagem da leitura do que ou-·
t~os métodos tradicionalmente usados na escola pública, a quanti ~a-
de de material a s~r coberto ~ela profess~ra foi reduzida durante
este ano, uma demonstração clara de que professores e alunos esta --
vam encontrando dificuldade em satisfazer o que se esperava que pu ~
desse 'ser estudado em um ano . Per optro lado; as estatísticas favo-
ráveis referentes à redução do índice de rp/rovação oferecidas Dor .I. .

aqueles que têm apresentado avaliações do Alfa não podem ser aC 2i.·
casso na alfabetização, uma vez que uma das (boas) características
do programa consiste em insistir em que a criança não deve ser re-
provada. Supõe-se, as sim? que se o mét odo está sendo bem utilizado,
avaliações dos efeito s do Alfa que se baseiam em estatísticas refe~
rentes à redução do fracasso escolar não podem ser usadas como ava-
liações cientificamente aceitáveis de sua eficácia.
Em vis ta das ' diversas características positivas do
Programa Alfa citadas acima, torna-se necessário analisar o progra-
ma e levantar possíveis hipóteses para a explicação de sua incapac!
dade de sanar o problema.
Em primeiro lugar, salienta-se o fato de que Poppovic
e s eus colaboradores não demonst.raram em seus traba lhos uma relação
causal entre as habilidades a serem desenvolvidas durante o período
preparatório de seu prog:rruua e a.prendizagem da leitura . Ainda que a
tese da privaCão cultural possa ser correta, os exerclc ios propostos
para vencer essa privação e ,preparar as crianças pobres para a apreg
dizagem da leitura talvez nuo sejam os adequados.Esta ê, de fato,Qma
conclusão razoável, quando se considera, por um lado, a análise do I
c ód igo alfabético a p~e3Gntada anteriormente e os requisitos que sua
aprendizagem impõe sobre o alfabetizando e, por outro, o tipo de exer
... . d
ClClO " ' do prepaj: a tor
o perlO - .lo neste programa. Em segun d o 1 ugar, e..
possível que o programa, embora bom em si, não possa produzir resul-
tados quando aplicado de modo impróprio. A. ma qualificação do corpo
docente seria um i Xtlpecilho à sua imp lantação. Em terceiro lugar,
observa-se que o Programa Alfa está primariamente centrado na ques-
tão da descoberta do c:Sd:Lrjo . Embora mEt~odos desta natureza tenham-
se mostrado mais efeUvo s na alfabet ização de outra s clientelas (ver,
a este respeito, revisão apresentada por Cha ll, 1967), ê possível
qUE, para o grupo de crianças em questão, uma certa ~nfa se no signif!
cado seja elemento essencial ~ara se obter níveis de motivação ade1u~
dcs para e s sa com?lexa aprendizagem. Seliar e Pelandré (1984) ·também
já apontaram, num comentário geral sobre as razões do insucesso na
alfabetização a possibilidade de que a ênfase exagerada sobre exercí-
cio s perceptuais e sobr e o decifrado do código possa ter efeitos ne-
gat i vos para esta client e~. a.. Para constatarmos o papel secundário que
tem o significado da le itura neste programa, basta comparar os textos
nele propostos para ' leitura com outros ~ue sejam comparáveis em nível
de dificuldade quanto ao decifrado do código e que dêem, porém, maior
atenção ao s igpifieado e aos interes ses de cr ianças na faixa etária
em que se dá a alfabet.ização inicialmente. Um exemp lo de uma .. das lei-
tura s proposta no Progran~Gi. .Alfa e stá contido no Quadro 1.
A ênfase do decifrado do código é tão extrema neste
texto que podemos mesmo identificar a 'lfamília de silabas" que estava
sendo praticada quando o texto foi introduzido. O texto nao tem pro-
priamente uma 'estrutura de estória~ não há um personagem que se encon
tre em uma situação problema, a qual finalmente encontraria uma solu ~
çao, ainda que mágica, ao final. Não há algo que possa motivar a cri ~
ança a leitura no texto em si pois este foi elaborado exclusivamente
para a realização de uma tarefa escolar. A atividade de leitura não é
instrumento para diversão, ' comunicação ou aprendizagens novas. É uma
atividade com um fim em si mesmo.
Ao contrário do observado no texto do Quadro 1, o
texto apresentado no Qua,dro 2 ~, escrito por uma mãe envolvida com a
alfabetização de seu filho - apresenta uma história. Embora curta e
utilizando apenas elementos conhecidos pela criança 'na mesma fase do
programa em que o texto do Quadro 1 pode ser utilizado, a história do
Quadro 2 tem princípio, meio e fim, desenvolve uma situação-problema e
utiliza um tema de interesse nessa faixa _>'tária g a bruxa. Apenas uma
palavra com elementos desconhecidos foi introduzida, a própria pala.~
vra bruxa, cuja leitura não çausou problema para a criança pois arar~
ceu tantas vezes no texto que acabou sendo reconhecida após a primei-
ra leitura pela mãe, logo no título. As frases da história são cur=
tas e não exigem esfor~o exagerado na síntese de seu significado. No
entanto, o significado é ordenado o suficiente para que a criança pa~
ticipe desde cedo uma das importantes habilidades que deve desenvol ·-
ver ao ler~ extrair o significado G auxiliar a si mesma na decodifica
çao a partir do significado do material que já foi lido. Tal habilid~
de dificilmente.poderia ser praticada em textos cujo significado e
truncado pela necessidade de praticar int~nsivamente a ~ltima "famí-
lia de sílabas" estudada pela criança.
Apesar da importância das duas primeiras considera-
ções feitas quanto às dificuldades do Programa Alfa, julgamos que a
última talvez seja a mais grave, com base em estudos sobre a relevân~
cia da leitura para o alfabetizando, os quais discutimos a seguir.

uso DA LEITURA NA VIDA COTIDIANA ;


A CONTRIBUIÇÃO DA ANTROPOLOGIA

A escrita é uma invenção antiga e não emergiu nas


sociedades tecnológicas
, atuais. As condições de vida típicas das carnR
das ' de renda mais abastadas em nossa sociedade sao, provavelmente~

mais semelhantes às condições de vida daqueles que chamamos de "cult~


ralmente privados" 10 que às dos letrados dos tempos antigos. Não nos
podemos permitir aceitar hipótese que afixmem que qualquer condiçã'"J
típica das camadas mais abastadas de nossa população seja necessária
à aprendizagem da leitura , tornando aqueles ~ue não desfrutam desta
condição "culturalmente" deficientes para o processo de alfabetização
Pretendemos, nesta seção, discutir um caso interessante de alfabetiza
ção sem escolas, cuidadosamente descrito por Scribner e Cole (1978
1980), procurando extrair dessa descrição algumas lições importantes-
para o caso brasileiro.
Os vais, o grupo onde o estuqo de Scribner e 'Cole
foi feito, constituem uma sociedade tradicional na costa noroeste da
Libéria, a qual se tornou conhecida pela invenção de uma escrita silá
bica há aproximadamente 150 anos. Este sistema de escrita é transmiti
do de uma geração a outra sem escolas ou professores treinados.
Stewart (1967) e Scribner e Cole (1978) estimam que aproximadamente -
20 a 25% dos homens vais são alfabetizados em sua escrita. A escrita'
é parte da vida dos homens vais. Com ela, eles registram presentes
nos funerais e seus doadores, contribuições políticas, atividades ad
ministrativas e transações comerciais. Conseqfiêntemente, as mulheres '
quase nunca aprendem a usar o sistema de escrita vai. A aprendizagem'
da léitura em vai não é uma atividade para crianças; é uma atividade'
para jovens e adultos do sexo masculino. Como não há escolas que ens~
nem a escrita em vai é uma atividade voluntária. As motivações surgem
entre os jovens das mais diversas formas~ alguns aprendem a ler e es
crever para organizar festas e corresponder-~e com n2fl1oradas em al
deias vizinhas, outros para ler as cartas de parentes distantes, ou
tros para anotar transações comerciais ao substituírem o pai em seus 1
negócios. A instrução ocorre naturalmente, na vida diária, por dife-'
rentes métodos .. A aprendizagem pode du'r ar, de a,oordo com as observa-'
ções de Scribner e Cole (1981), de apenas algumas semanas (com quatro
ou cinco horas de instrução por semana em situaçQes inteiramente in
formais) a~é um ano, segundo o testemunhó de alguns. Scribner e Cole
registraram informações de desistência na aprendizagem do sistema com
pouca freqt1ência. Aqueles considerados maus"aprendizes, sobre os
quais os informantes falavam com uma certa atitude de superioridade 1
nunca se incluindo nesta categoria, eram os que adquiriam o uso fun
cional do sistema em alguns meses mais exigiam UIJ\ ano para "completar
o processo II •
Numa comparaçao entre as habilidades dos homens aI
fabetizadores em vai e de um grupo semelhant~ quanto a habilidades
cognitiva~ e perceptuais diversas, Scribner e Cole (1978; 1981) nao
encontraram muitas diferenças, o que pode levar-nos a concluir que o
grupo de alfabetizados não era constituído por uma elite intelectual;
dos vais, o que poderia justificar-- o--sucessQ_Jie-.Slla a J fabetizAÇão em
condições adversas, incluindo problemas de nutrição e saúde (a vida '
média dos vais é bastante baixa e a mortalidade infantil excede 50%) ,
vida predomL'1antemente no campo ou em pequenas aldeias, cont.acto di~
rio com um grande número de analfabetos, aprendizagem com pessoas
não-treinadas para o ensino e em condições pouco sistemáticas. Tais
condições para a ap~endizagem são, freqUentemente, mencionadas no
Brasil para explicar nossos índices elevados de insucesso na alfabe -
tização. Por outro lado, algumas correlações interessantes aparecem'
entre veri~veis de natureza social e alfabetização em vai, todas
elas indicadoras de motivações especiais. Os alfabetizadores em vai
era, frequentemente, os chefes da casa, tinham negócios que exigiam '
um registro para melhor controle como artesanato ou mais de uma cul-,
tura em suas fazendas, e tinham atitudes mais tradicionais, sendo
mais "conservadores" da cultura vai original de sua sociedade. Ap~

sar das condições adversas para a aprendizagem mencionadas acima ,


dois fatores se destacam como provavelmente importantes para expli- l
car o fato de que desistências no processo de alfabetização são p o~
co comuns na aprendizagem da escrita vai ; a relevância de sua apren ·-
dizagem para o alfabetizando e a rêlação informal, inteiramente dif e
rente da relação professor ~aluno, característica do processo de aI
fabetização em nOS$O meio. A questão da relevância da escrita enqua~
to instrumento para algo será discutida nesta seção. O problema da
relação professor- aluno será discutido na seção seguinte.
Diante desses resultados de Scribner e Cole, C ar~a
her (1984) propôs-, se a estudar a questão da ~elevância da leitu~ p~.
ra aquelas crianças cujas perspectivas de fracasso . ~a alfabetização :
são grandes. A relevância não foi definida por Carraher simplesmente
como uma questão do conteúdo das cartilhas pela inclusão de pa Üó.'iri:-: ':
como tapioca no Nordeste e E~E-a no Sul, como se faz nas chamadas
"cartilhas regionais", mas como envolvendo a valorização da leitura
enquanto instrumento, o que ela pode fazer pelo indivíduo e o que o
indivíduo pode fazer com ela. Quando uma criança de uma família mais
rica aprende a ler, ela encontra imediatamente os mais diversos usos
para a leitura. Sua casa está repleta de livros e revistas para a di
versão daqueles que sabem ler. Seus pais, enquanto modelos, estão
frequentem\nte lendo e escrevendo . Quando alguém telefona, anota- se
I

um recado . Quando alguém viaja, escreve uma carta. Quando não


quer esquecer um encontro importante. anota-se em uma agenda. Quarido
queremos ~prender a fazer um bolo, anotamos a receita. No entanto
\
quais seriam as portas abertas pela leitura pa ra a criança pob rC' "
h
r
Qual a relev ânci a
Quai s sao as vanta gens da leitu ra em seu ambi ente?
teme nte.,__.quai s as mo
da leitu ra ?ara sua vida cotid iana ? E y conse qften
.~a?
tivaç ões em que sua aprc;ld~z2~ gGm. da leit.u .ra se base
o
A abord a<j2I:: suge: :'ida pçr Carr aher (1984 ) para
lve um 'mod elo psi- .
fraca lSso das crian ças pobr es nn alfGI.. bct.1. zação envo
ovic e seuscolabor~
coló gico C:eferente ~daq1.1.elede ';envolvid() por Popp
.c"...o s--eu ltura is entre
.._ ~-....dores.....B-orq.u.e.~xp.lor.3. as ccns.2.~~üencias Ô.>.'L'3. difaren
so
crian ça:i pob~es e:r:ic a s sobre a !ll0t~v;~~s.~~~ .para a
leitu ra, e não
pos.s ibilid ade de di
bre S1:as ~lid.3.de3. Esta pC::Ji ção . não 8>;.-: !lui.a ..
· ·~ ~feren.ca s .....dena. turez .a __c':)gr :itiv.:-l entre c .-.:ian
çasd e· dj.fercnt~5.-_camadas I
'J.põe que, dada a
.-' de rend a, mas a relegaa'Seg:..~r~ do plar. o) pois press
pax'a a leitu ra se
moti vaçd o nece ssá:: ia, as ha!:ô :,..idad. as. reg:1 2r idas
d.t?--alfahE.:.t..i~ação~_ Tal . pos.!..
.~_,..J:ão.-de.senvol~:J;das no . doco rre:i: 3.0 p~o.::.es.so
(1984 ) de que , e!!!
ção é coer ente com a obs2 rva ç :l') de Carr aher e Rego
_.--= bera . inicialme~.muito..._at
:rtl'~ ;dda.s ...ern~éu conhecin~:to meta lingü ísti-
.' I~lUitas crian ças p~
coqu ancto con1p arada s' co!!. aE c ::ianç a.,s-1 ;·w.is rica s,
c~e alfab etiza ção ,
bres progrcdi&..'T'.. _sign j,'.:.ica t -'.:. Yi:::,~l!;:.lJ.t8.dl~J::an.~:.e· um· ano ~
~; ;l grl1? , ~ sd . ..a:; >roxi Ir.ad ament e-~__ seme stre '" §
. _~E!duzindo.. adife re.nç a €.:1J.:re.. ~
!1~;i-: 1} prop ôs que; (l) a esco la de ~
de esco lariz ação . AS:':;~ il i C2.r ltÍ1e r
q'le ' visru n a alfa beti za-
. " ----se .nvol ve um . determina~Q.n'~"T: E'~2:';) de 2.t.:i_" 'i da~es
ativi dade s ligad as à
ção; (2) em famÍ lias .. o.ç; 1:e:'~~2 alta '.) i..l :'lé j j.a, as ·
vaçôe s e dese nvol -
leitu ra e q1.:e ?Cor:r.2ill em ca3 ~;, Gferec' ; '~' cert:: !s !:,;,oti
::,. . ' :u~a. iJase SÓJ.ií.J.a para a alfab e
/ --''Vem cel. tas. habL; icl:::..:ies : que C~C)~:st:L\::.'I.e
L..,.. ~: " ' '''_ ~.~-J I!l••p,las ."" iênci a
J..' n ...._on"'c dos
tizaç ão ,. (3) a esco la .'. -'~ - y.".__, ...1_men
""";;rc,\)
.:..J.~....... , r>. J.. " "!::-(~. Ç" .
vaç6 u3 e não cont ri -
prof esso res, pre5s~poe a exi~ t3 ~~i ~ d e ta is rn0ti
rend a baix a, as
buí para o seu dese:'lvolvim(~E :_.; ~ (4~ C ' ~; 'f:;:lllí lias de
t~n outro carã ter e
ativi dade s e motlv~ç6G~ ligQ d~ s i al~ 2b~ Liz~ção
não co""-- --r:' 'lemen tam J. c:-_ . . '~('"\
port'-=>:-,
.: . ·_L . , "'> ; ., l"'O"L
\...t. .... '~ " '" ;'I C-::... ""~ " ;:'-:-"; c' o I o tJ..~"'balho esco lar ,c_o
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aI tu.. Tal anál ise '


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la certa ment e de_
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de vistf). do deS2 1~"i"clvirr.en to da crian ça. Urna
mentê.. ..:~es ~. do ponto
· Hear th (1938 ) I
anál ise seme l;n.nt 8 foi feita ~ por e~{Grrpl oj' p0r Ed.c2
desn nvol viam em casa
que most rou que as mÊÍ.es · c">:; ur ,:: . c:erté ; CC·:rii:...m idade
COtli suas' crian ças um·:} fO~L:'a I' -:: :c:tiC::--1
: l':1 i.' é~ {: le~~ histó rias ante s de ir
ék.c:e s esco lares de
para a cama , a qUê.l p j::-epa ~~av ,:; :1 cri:::~ r;0 p:'i~ ~ ativi

c omun idade e eS
d'et., Bric e· He'lt h obsc ':'.'Gi1 UTii , dcsc o r:. t .. In.1.:.:J. c:>..d.C entre
preta ç5o. As di
cola c om re~ . ~ç~o ~o c c ~c2it~ ~ ~ ~i~ t~~i~ a sua intcr
·-f-eren'ças-entre-cormm j df'de -e-esca1.a--res ultavam em dificul.d.a.d..e-pa~ .
te das crianças na interpretação -do. que delas seJ:.ia __~spérado na esco-
la ao realizarem narrativa e análise do significado de hist6rias.
A fim de -identificar--a -exist-ência .. .de--tais --motivaçÕes
pressupostas pela escola· e oferecidas pelas famílias diferentemente ,
de acordo com sua posição sócio~eqonômica' , Carraher (1984) ,entrevis- '
:tou os responsáveis por crianças de duas escolas que .exibiam elevados
indices de reprovação .na primeira série nos últimos cinco anos em
dois bairros contíguos na periferia de Recife. As entrevistas levant§:
vam, além de informações sobre variáveis sócio~· econômicas e demográfi
cas, informações relativas ao uso de valorização da leitura e da es-'
crita na vida cotidiana dos entrevistados. Além disso, foram observa-
das as nove professoras das escolas freqüentadas por es s as mesmas cri
anças, analisando·"se os usos da leitura é escrita em sala de aula, a
fim de constratá- los com o que fosse observado na comunidade. Os re-'
sultados deste estudo revelaram as seguintes tendências ~ (1) não se
observou associação entre renda fami1iar l e sucesso escolar ; nesta fai-
xa da população; (2) não se observou correlação ~ignifi~ativa entre o
nível de instrução paterno ou materno e aprovação escolar, embora os
coeficientes, nesse caso, tenham ~pD®X:i.màdo :) o' ·i:rirfvél de significância-
de 0,05; (3) não se observou associação entre o número de filhos, ou
~

o numero. 'ie pessoas na ca,sa, ou a posição familiar da criança e apro-


vação escolar. Tais resultados indicam que, embora as variáveis macro
estruturais tenham uma associação com o sucesso escolar quando se exa
mina a s~ciedade como um todo, elas nao desempenham o mesmo papel
quando .39 examina apenas uma porçao desta sociedade. Coimbra (1981)
também obteve resultados semelhantes aos nossos, não observando dife-
renças sócio'"'econômicas entre crianças da periferia de Salvador apro-
vadas e repro~Tadas ao fim do ano, Ela, porém, não deu ênfase a esse '.
importante resultado em seu trabalho. Uma interessante implicação de
resultados como esse é que possivelmente a associação entre as variá-
veis estruturais e o ~ucesso escolar é mediada por outras variáveis '
que, em geral mas nem sempre, estão associadas às variáveis estrutu-'
rias. Quando se examina uma porção menor da sociedade, em que a asso-
ciação entre as variáveis mediadoras do sucesso escolar e as variá- '
veis-~uturais pode não ser tão clara, a associação entre as variá-
veis est~turais e o sucesso escolar desaparece. Seria portanto, inte
r essante ~bs~rvar também se tal associação desapareceria quando cons~
derássemo~ apenas crianças de famílias de renda média e alta.
\
No entanto, faz - se necessário perguntar~ quais pod~
riam ser variáveis mediadoras ? Bourdieu (1977) e Willis (1977)-
\
\
\
2i;

sugerem que nao se pode aceitar a influ~ncia de fatores s6cio-eco n 6rni


cos de modo determinJ.st:a e auto~nâtjJ':\J. É n(~cessário mostrar como es-
ses fatores s~o culturalmente mediados a nIvel da ação individual.As-
sim, Carraher (1984) buscou na s motiva ções existentes para a l eitura
e escrita as mediadoras culturais das influ~ncias s6cio-econ6micas so
bre o fracasso na a1fab8tiz~ cã o de cri~nças pobres. Replicando res ul
tados observados p or Oliveira (1984) f C3. rraher observou que o uso mais
comum da escrita e hdtura nesta pOI:ção da sociedade e para a corre.ê.
pondência com pa r entes ~ 75% de todos 03 e n trevis-tados mencionaram usar
a leitura ou escrita p 3.ra tal fim. Esse uso ultrapassa mesmo os níveis
de alfabetização individual, pois mesmo maãs analfabetas mantinham cor
pondências com seus parentes atrav&s de terceiros que liam e escreviam
por elas. Em contrastey apenas 32,5% mencionaram usar a escita para ~

notar coisas de que gostar iam de poder J_ernbrar-se mais tarde u 39% me!!.
cionaram ler livros; jornais, revistas, ou a SIbliaJ 12,5% mencionaram
usar a leitura o u escrita em SU2S ocupaç5es remunerada s e 17,5% menci2
naram qualquer outro uso de lei t ura ou escrita não incluído entre os
acima. Um resu J.-::ac.o (:"X~:': ~: Z-l'.::tE~.,:: ' 1 -t.8 inteT':; ssante deste estudo foi a obser
vação de uma associação signific at iva. entre o hábito da mãe de ler na "' . o.

ra a criança e o suces~m escolar ao fj.na.l da alfabetização. O mater ial


lido era freqüentemente a corresPGn d~ ncia recebida de parentes e, 'oca-
sionalmente, hist6rias : Quando 3e C02~raG ta a si tuação em casa e aqu~
la na escola r O :x3.psl e1~e rc~. c'i o pala rilo t:ivação p ara a aprendizagem de·~

senvolvida em cas a fica ai.nda rT:l.is cli::D:o pois, em nenhuma das ocasiões
de observação em sala de aula, as professoras levaram as crianças a
utilizar a leitura 2 c~c~~~~ ~~~ic~~lD2nt 3 . As professoras liam para
as crianças apenas as instruções das tarefas a serem realizadas em elas
se, quando estas eram esc r H:as p e as crianças em nenhuma ocasião prec~

saram utilizar a leitura ou escrita para conseguir mais do q ue a sim-


ples realização da tarefa e s colar proposta pela professora. Nos raros
casos de leituras de frases seqüenciadas p as quais nao merecem o nome
de h i stória, a criança tinha a tarefa de re sponder curtas perguntas I

sobre as frases lidas • .. Em outras pa lavras l a leitura e a escrita j a-=


mais fora m 'sadas C G~C in 3t= il~ento pa ra c onsegu ir algo al~m da real i-
zação da tarefa escolar.Esta s ituação, que permanece inalterada quando
examinamos os diversos, rn~todos para a lfabetização propostos nos li-
vros disponíveis, se j am eles ~cartilhas regionais" ou não,ilustra a
irrelevância da lei t.uI'a para aç;üelas crianças que não convivem com a
leitura e ~scrit a como iastruffiento s ignificat i vo em seu dia - a-dia.P a -·
rece~nos, pois; mais fácil apo,-ltal:- a falta de en1zrosamento entre esco
la e vida diária das c ria:1çaG de car,iadas de baixa renda quanto à moti
vação para alei tm:.-a o ll. e sco la preSZUi)Oe esta motivação, não assumindo
a resp::msabilidac.e d e L . . ::- ~l 2. :: a 2.~itiJ. ::2. e esc~ita atividades signific~
tivas e funcionais para a cr iança. A criança p assa , em sala de aula ,
grande quantidade de tempo examinando as características do comPtexo
código de escrita que usamos, pa sso certamente necessário à aprendi z ~
gem da leitura, sem , no entanto , ter oportunidade de encontrar uma m~

tivação mais potente para a realização de atividadé tão complexa .


Aquelas crianças que convivem com a leitura e escrita em contextos
funcionais em suas casas , aquelas cujas mães lêem para elas e mantêm
correspondência com seus parentes tem maior probabilidade de aprova-
ção ao final da primeira série do que aquelas em cujas famílias a lei
tura não parece ter utilidade no cotidiano.
Carraher (1984) examinou ainda o tipo de valorização
atribuido a leitura entre os entrevistados em sua pesquisa. Da mesma
forma que Carvalho (1932), Carraher observou uma atitude clara de es-
tigmatização do analfabeto nesta camada da sociedade. Tal atitude es--
tá claramente refletida nos seguintes comentários ~
nUma pessoa que não sabe ler era melhor ser cego por-
que nao sabe nada do mundo e tem que tá perguntando pros outros .1!
"Eu queria saber ler porque ai eu podia entrar num lu-
gar e saber de tudo. Quando eu entro num bar e aí eu quero pedir uma
coisa e nao sei o que tem, eu tenho v ergonha de ~erguntar e o povo sa
be que eu não sei ler . Eu morro de vergonha ."
;'É uma vergonha o povo quando não sabe ler. Vai num
banco e nao sabe nem assinar o nome. Tem de melar o dedo e botar . De -
pois, pode limpar. aquele preto que não sai direito e mesmo quando sai
do banco todo mundo sabe que tá com o dedo melado é porque nao sabe
nem assinar o nome."
!lEu não sei ler nada mas eu conheço o nome do meu ôni-·
bus . Pego direitinho o ônibus pros cantos que eu conheço. Mas se eu
for proutros cantos que não conheço, ai eu tenho de perguntar e fico
com a maior vergonha . Era melhor ser cego do que ter que ficar pergu~

tando mesmo vendo. A gente vê aqueles ônibus todos e não sabe qual e_
Urna vez eu tive tanta vergonha que pra pedir pro homem ler pra mim eu
disse que nao tava enxergando porque tava sem óculos ."
Contrariamente a Carvalho (1982) i e de acordo com ob-
servaçoe s anteriores de Carraher e Carraher (1982), Carraher (19 84)
concluiu que o significado atribuído à alfabetização entre os entre ~
vistados é principalmente a questão de uma boa apresentação socié.:.1
(face~ saving , na terminologia de Goffman, 1963) ~ ou, melhor ainda ,
de uma apresentação social menos vergonhosa y não estigmatizada . Nossa
sociedade tende a estigmatizar o analfabeto e ninguém deseja ser asso
ciado a este estigma em p úbl ico, como salientou Freire (1970) q o anal
fabetismo é tratado como um traço que de svalori za o indivíduo. Tal e
a necessidade de evitar este estigma que observam-se tentativas de
"passar por um no rmal" , no sentido de Goffrnan (1963) f corno foi o caso
.: =:.=~=::= --~ - -- - ---

do, quand0 questiona::::os objetÍ".ram.ente sonre a utilida(~e da lei tura


em sua profissão 1 os entrevist::.tdos tendiam a negar que a alfab8t:.i za-
Drof :Ls8~~onal.
Embora expre ssando ., Cor~10 aquel ,:!s entrevistados pGr Carvê.:.ho n~32),
a opinião de que um analfabeto não consegue qualquer énprego f 72,5%
das maes entrevistad~s afirmarlm não precisar da leitura de modo al-
gum para o e xercício de suas a :'ividadGs remur:.eradas. ES .s a crcnq a de
que aprendeu a ler não tem mui tas conseqüªncias para sua
profissional, ta~h~ru obscrvaJ~ Dor Fletshcr ~1983) e~ alunos do
MOBRAL, é c].a.ramente a.;.:)Oiéld.<1 y;:,::;l. G S d;;,Ó.GB obtldc-s par'C~ a amostra. ss ·~>.1

foi obsexvad"l qU2.lquer profissional q':."a ndo se


~7H2;:Lhor i.:1 cor:;parcu ü
nível profissional dos 3nalf~betos e o daqueles que havian apenas si

a quarta série a fi!TI de se obt ~; r uma melhoria em sua situação profi~


sional, enquanto que para clS' ~ulheres a escolaridade necessãria para
-,
uma melhoria de nível profissicm.::ü apê:T '~C2~ e. partir c.a q:.ünta serleo

quando a leit:''. .ll:,a () escrita. não ccc'.istituem um instx.'tC:ient.o significatJ:


vo na vic~a cotidiana; o tipo ék: va.lorização que es·ta s ati.~,idades têm
nesta camada da população cert ~~ent e não pede rã servir de motivação
para as c~iançaso ~ pouco provivel que crianças de 7 ou B anos ~eJam
propriamente motivadas para a aprendizage~ da leitura apenas para
eVl.'tar o ec::ti:-;"""a ;c
"lo..'
.. a'~::>'f·-"i·)'~~-~"Mo
....J.\k:
w ... ,=,4.LI ~ .. ""',-'
J..,:,.l_t.
.,.I,1. .4! ,·... .;... ....... ·1,~..,-i("\ n"'ra a
·,' ·~~·n';:::
u.~:... ,::.~.L.(.!'l .:.~J. ealfabetiza
;:.\.I,.,:.;I_".~j)., .,r. .. •·...... ,,-,~.tt,, _~ ~:. a_c

ção certamcn'::'e tem reduzido a p·,'}::"o eLt.rs as ~rianças o

A INSTITUCIONALI ZAÇÃO DE LEITU >.1'l rELA ESCOY..,11.

de alfabetizar. ConseqÜentemente , raros são os esforços de alf~~~~i-

zaçâo fora da escola no Brasil . E p mais particularmente, o E~ ~ado


chamou para ~Ü a responsabil id;lde 0e:~a aI :Eabetização de tod:: s ao
constituir, gelo menos por lei. o ensino at6 a oitava s~ric co~o ~~
direito e dever de todos. No entanto, essa responsabilidada não est~
sendo curllDri uo. o 'I';:)rri.a-sc~ :Lr~.i::er T':~i·,·o q~e se procure a!1.alisar por q )3.
A questão, ã, por~m, tão complexa que podemos apenas examinar alg~ns
de seus aspectos uma vez que estão envolvidos fatores his 'tóricos li -o
gados ao papel da escola n~ D2ssado e no pre sente, fatores econ6mi-
~ducacionais mais especifi-

cos, como os fa tores relacion3dos ~ formn;ã8 daqueles a quem a soei!


da de entrega pe ssoalmente a t ~refa da alfabetização. A~sim, sem pre-
tender uma aná lise exaust:iva dos prob16mas relacionadc-s à instituciQ
nalizaç50 d.::t alfabetizaç3..::, J l e"'antare,,:,,:o:1? e. s3quir 1 algs"'1::!s q'..:est3es
1. As duas trilhas do sistema educacional

o sistema ' e:s colar bras'ileiro ,é sabidamente consti tui-


do por duas linhas para],elas, _uma pública, patroCirlada pelos gover-
nos estciduais e 'muniéhpais, e outrapart.lcular. Embora existam vari~
eões históri~as,
(ver Freit~g. 1980, ' párJ Wna~ análise .do desenvolvi-
mente dos sistemas educacionais nO Brasil) , ,e alguma's exceções, o
s1stema particular e o sistema público são paralelos . entre si duran-
te os quatro pl:imeiros anos. Após esse periodo, muitos · dos--clientes
do sistema público ingressam nas escolas particllJa~es .mais baratas e
de flll1cionamento noturno, para conciliar trabalho e eS.tu.d.o..r-adquiri!!,
do urna educação notoriamente defi.cient.e . _ guando~· comparada àquela rec~
bida pelos que participam do sistema particula~ desde os primeiros
anos. Finalmente, ao nivel universitário, as duas linhas tendem a
.c ruzar-se, pois os clientes do sistema particular mais .caro passam a
utilizar .as universidades federais,. melhor equipadas e de maior pr e!
tigio, enq\lanto que os sobreliventes da outra trilha passam a utili-
zar as universidades particulares. Algumas diferenças entre os dois
. caminhps nos primeiros anos merecem atençãof'
1. As escolas particulares constituem ura ' :p~i1Z'ia;égio
daqu~les que podem pagar SUas taxas. Diferentes niveis de excelên-
cia, . :qe acordo com a opinião geral, estão cor:celacionados...-eolt'l o va-
lor das taxas mensais. Aqueles que não podem pagar aS (cada dia .//
mais) elevadas taxas do sistema particular levam · seus filhos para à~
escolas públicas.
2. As escolas particulares hab~ua1mente incluem de
dois a quatro anos de . pré-escola. As criancas aprendem a ler na pré-
escola e, ao ingressarem na . primeira série do primeiro grau aos sef's
'-'.V ,......
Y

ou sete anos dei idade, ; já são leitores relativamente fluentes. No


sistema público, a existência da pré-escolas é uma 'questão politica . . . .
Os investimentos em classes pré-escolares tem sido assistemáticos e
flutuam de acordo com ae, mais diversas pressões sobre o sistema. Por
outro lado, poucos estudos tem procurado demonstrar a importância da
educação pré--escoJ,ar para a adaptação posterior da criança ao primá ...
rio, permitindo aos. ,p esquisadores argumentarem mais eficientemente
quanto a sua importância. Um deles (Alencar e Nascimento, 1977), re~
lizado em pequena escal<;l, produziu éfeitos decisivamente desencoraj~
dores 'i apesar da introdução .' de inúmeras medidas consideráveis favo -
ráveis ao deseqvolvimentoda . criança, corno assistência médico~odont2.
lógica e orientação das p:r:ofessoras po'r psicológa e pe s quisadora de
ari::a qualificação, além do próprio programa pedagógico , os ganhos
com o treinamento pré-escolar não foram significativos o suficiente
para i mpressiona r em agências financiadoras aa educação pré-escolar.
1. As dua s trilhas do sistema educacional

o sistema essolar brasileirc 'ésabidamente constituí-


do por duas linhas paraleláà, . uma públ ica, patrocirladá pelos gover-
nos e~taduais
.
e 'munic\ipais, I.e outra . particular • Embora existam .vari5!.
. .

ções h{stóricas(ver Freita9', 1980, para ' uma".a.nálise do de s envoÍv i-


, " .. \

mento dos sistemas educac~dnais no Brasil) , ,e alguma'g exce,çp~ ' , o


sj,stemaparticular e o sistéma público são paralelos ehtre ,s~duran­
t e oS quatro pliimeiros anos. Após esse período, muitos -d.qS--clientes
do sistema público ingressa!h h~s escQlaS partjClllara~Inais barátas e
de funcionamento noturno, para conciliar trabalho e eS.t~dquirlh ~.:. - -
do uma educação notoriamente deficie.nt..e.. quandó- -compal:'ª'i.à ~quela rec~
bida pelos que participam do sistema particular desde os primettós
anos. Finalmente, ao nível universitári o, as duas lirih.a$ tendem a
cruzar-se I pois os clientes do sistema particul~r mais caro pas·sam a
utilizar as universidades federais, melhor equipadas e de maior: pres
tígio, enquanto que os sobreyiventes da outra trilha passam a utili-
~

zar as universidades particulares. Algumas diferenças .e ntre os dois :


caminhps nos primeiros anos merecem atenção f
1. A.s escolas particulares constituem um·. rp~i~ia;égio
daqueles que podem pagar suas taxas. Diferentes níveis de excelên ~
cia, de acordo com a opinião geral, estão corEelaciona.do~lno va-
lor . das taxas mensais. Aqueles que não podem pagar as (cada dia
mai s) elevadas taxas do sistema particular lévam ,..seus filhos para as
escolas públicas.
2. As escolas particul.ar.es .habif u .;3]mênte incluem de
doi s' a quatro anos de pré-escola . As crianças aprendem a ler na pre-
escola e, ao ingressarem na primeira série do primeiro grau aos seis
ou sete anos dei idade, já são leitores relativamente fluentes . No
sistema público, a existência da pré -escolas é uma 'questão política.
Os investimentos em classes pré-escolar es tem sido assistemáticos e
' flutuam de acordo com ae· mais diversas pressões sobre o sistema. Por
outro lado, poucos estudos tem procurado demonstrar a importância da .
educação pré--escolar para a adaptação posterior da criança ao primá-
rio, permitindo aos pesquisadores argumentarem mais efic.i entemente
quanto a sua importância . Um deles (Alencar e Nascimento ; 1977), re~
lizado em pequena escala, produ.ziu efe itos decisivamente desencoraj~
dores I apesar da introdução .' de inúmeras medidas consIderáveis favo-
ráveis ao desenvolvimento da criança, como assistência médico~odonts?'
lógica e orien-êaçãô da s professoras por psicológa e pesquisanora de
al"t.a
.
qualificação I além do próprio . programa pedagógico, os ganhos
.com o treinamento pré---escolar nãq foram significativos o suficiente
para impressionarem agências fin anc iadoras da educação pré-escolar.
po~ pesq uisad ores na
Outr o, de maio r p or t e , r ealiz ado conj~ntamente
98 2) f a p esar de encon
Arge ntina , Chil e, Bolí via e Colôm bia (Po z ner,1
pe la p r 6p ~ia auto r a I
trar resu ltado s posi tivos , não ~ inter preta do
r::.o f u:na E:0h: ção de
como indic ando que o pr~-escolar s e ja, em s.i pré1?
izi:tgem . P..css al t a Pozne l:
term inan te (grif o usado pela auto ra) d a ar).:::-end
j a ou não-f reqG ência
que, mais impo rtant es do que a simp lés freq tiênc
, sâo a Ei t ~a
ã pr~-escola na deter mina ção da apren dizag e m postA rior
c olar freqü enta j o p e=
ção s6cio -econ ômic a e o tino de insti tuiçã o es
zner obse rvou nIve is
la crian ça. Aind a assim , vale ress altar ç ue Po
a prov ação entre cria:?:
sign ifica tivam ente maio res de alfab etiza çiiG e
ent a do o pr~-escol a r:
ças de cama das de baix a renda que havia m freqU
a de renda que n ~o
do que entre crian ças proc eden tes da mesm a camad
havia m freqü entad o o pré~escolar.
ro pr!
3. As escol -:ts part icula res que ofere cem os quat
perío dos apena~ o As
meir os anos de ensin o tende m a func ionar em dois
, tende m a func iona r
esco las p6blic~s, espe cialm ente as mais care ntes
da esco lar e três '
em três ou até quat ro turno s, o que reduz a jorna
nberg (1932 ) e Bran dão,
hora s e meia . Tal redu ção; como apon taram Rose
índic es de repro vaçã o,
Beat a e Roch a (19 8 3); está asso ciada a maio re s
,
apare cend o princi~almente nas esco las care ntes
ão cla~
4. Há; nas esco las ~articularesv uma preoc upaç
ment o do corpo doc e n -
ra com as inova ç6es meto doló gicas , 0 aperf eiçoa
priv ilegi ados 8&0 nov~
te e a busc a de nevo s recu rsos didá ticos , "Os
sofis ticad o , comp~
ment e prem iados com um anara ·to técni co-·p edag ógico
s. Enqu anto isso , a
rãve l ao das boas esco las de paíse s desen vo l vido
, ?adec endo 6 8 ~~-,
esco la p~blica vive aband onad a ã sua próp ria sorte
do tipo de carê ncia pred ios sem cond iç6es de segu rança , fa:~ ~
s em sala (~ e
de recu rsos mate riais e hUlna nos, exce sso de aluno
- ~ - -, tendo de reco rrer ãs Asso ciaç6
es de Pais e Mestre s para a S 5 ~ r \
1982) .
rar cond iç6es mínim as de ::unc ionam ento:' (Rose nberg g
~~
5. As atitu Jes das prof esso ras com relaç~o a seus
acent uada ment e . AF ? -
nos nas esco las p~blicas ~ part icula res difer em
seus aluno s em ge r-
fesso ras das esco las parti cula res acred itam que
de s e desenvol ve -~
apren derão a ler e escre ver sem grand es dific ulda
dos. Seus al uno~
esta s habi lidad es até níve is de sofis ticaç ão eleva
l para a apre n d ü :; .:J, .·
sao cons idera dos intel igen tes, cheio s de p9te ncia
para tais desen vo l v i ·
gem esci lar e motiv ados peJo ambi ente fami liar
itam de seus alu~o s i
mento " As nrof esso ras das esco las públ icas acred
~.
~ .

redu zido por suas


têm um pote ncia l ~ara a apren dizag em extrema~ ente
olvim ento físico (Me ll~
expe riênc ias fami liare s e sua hist6 ria de G\:3 senv
o a 120 prof esso ras d a
19 81). Em resp osta a um ques tioná rio apres entad
reali zado s Dor uma e ..
rede públ ica e~ três Semi nário s de trein ame nto
perna mbuc o(Ca rrahe r,
quip e de prof esso res da Utiv ersid ade Fede ral de
e~
1982) r observou~seque 62% dela s conco rdava m com a afirmativa;"Inf
que a grand e maio ria de
lizm ente, a reali dade da esco la públ ica é tal
a apren dizag em" oAlém
noss as crian ças não tem qualq uer pote ncia l para
o) apon taram també m a
disso , Rose nber (1982 ) e Buar que (em prep araçã
esso ras nas clas ses'
clara marg inali zaçã o de certo s grup os pela s prof
ou "frac os , os quai s
li

de alfab etiza ção, cham ados de "caso s perd idos"


o ~rocesso de alfa
não receb~ mais o mesm o incen tivo para comp letar
Buar que estim a que
betiz ação após terem sido assim class ifica dos o
r meta de das crian ças.
frequ entem ente, estes grup os chega m a cons titui
lógi ~
Tais cren ças enco ntram apoio nas teor ias psico ( 1 \
ram realç ar que Üma
cas de priva ção cultu ral que, como vimo s, procu
frequ entam as esco las
notá vel perce ntage m dos pais das crian ças que
pais das crian ças de
públ icas é cons tituí da por anal fabe tos ; (2) os
no suce sso esco lar
esco las públ icas não estar iam muito inter essa dos
da esco la sem hesi ta-
de seus filho s e estar iam disp osto s a tirá los
úteis ao suste nto fami
ção para enga já-lo s em ativi dade s lucr ativa s,
estim ulas impo rtant es I
liari (3)0 ambi ente fami liar seria care nte de
a num cons eque nte
para o desen volvi ment o cogn itivo , o que resu ltari
atitu dina is são extre~
atras o nesse desen volvi ment o. Tais difer ença s
rvaçõ es de .. _,.,Ro senta hl
marne nte impo rtant es quand o consi deram os as obse
expe ctati vas dos
e Jacob son (1981 ); que mostr am a iMpo rtânc ia das
alun os.
prof esso res para o desem penho acadê mico de seus
a
6 0 O ajust amen to do trein amen to das prof esso ras
e as part icula res o Co
sua clien tela difer e entre as esco las públ icas
das cama das popu la-
mo suge re Bran dão (198 2), o acess o das crian ças
nova clien tela v para
res à esco la públ ica intro duzi u nas esco las uma
quad a. Prep arada s com
a qual a form ação de noss as prof esso ras é inade
desen volvi ment o aplic á
base em uma psico logia que enfa tiza norm as de
filos ofia que visa a
veis as cama das de renda mais eleva da e em uma
visão da dime nsão so
reali zaçã o integ ral da natu reza huma na, sem uma
esco la públ ica sao
cial e polí tica da educ ação f as prof esso ras da
alien ada, no senti ~
form adas "den tro de uma pers pect iva intei rame nte
, assim como dos re~
do do conh ecim ento da crian ça e da sua reali dade
uma efeti va e efic i ·· ,
quis itos cien tífic o· ·técn ico indis pens áveis para
lado , esta mesm a forma
ente inser ção prof issio nal" (p.56 )? Por outro
das esco las part icula -
ção não as alien a tão forts ment e da clien tela
ment o ensin adas apro x i
res, pois , pelo meno s p as norm as ee desen volvi
o Barr eto (19 8 l } s~
mam·- s.e da reali dade que ' ta:"s prof esso ras enco ntram
prof esso ras das csco -
lien ta ainóa as dific ulda des que enco ntram as
obed iênci a a uma di s-~
las de peri feria em cons eguir de seus aluno s a
ento asso ciado s a p;; , .
cipli na esco lar mold ada em 'padr oes de comp ortam
. Tais dific ulda de s I
gras de conv ivio das cama daS de renda mais alta
de disc iilin as :.~is
levam as prof =ssor~s d co~~ice~arem os Jrobl ernas
fundamentais do que os próprios problemas pedagógicos que encontram o
7, Diante dos fatos mencionados acima ; nao e surpres::l
observarmos que a dicotomia escola pública ~ escola particular p corre.:?
pondem índices de sucesso roarcadamente diversos.CastrO'>ee';Banguinetty
(1980) apontam que 80% dos que iniciam a escola particular graduam -
se, enquanto que Bran~ão, 9aet3 e Rocha (1982), apos extensa revisão
da literatura sobre evasão e repetência . indicam que as taxas de eva
são e repetência; quando se consideram todas as primeiras séries do
primeiro grau no perlodo 1974-1 978, Dodem chegar a 56%. Tal estrangu
. h _

larnento-nãQ_29J.la,--obv.iame n t.e, ser ex?licado por fracasso na.. ..escola !

particular, Mello (1981) chega_.a_~consideJ:ar_ a questão de "quem (~ 8e -·


lecionado" pelo sistema escolar como praticamente " re tórica"p pois ~

considera óbvia a res?osta. Ainda assim? vale a ?ena ressaltar que


apeJ.e.tividada. do sistema não se relaciona apenas à nobresa mas tam ·~

b5m ao ~ipo de instituição que a criança frequenta. Rosenberg (1982)


e Mello (1979) no Brasil e Filp , Cardemil f Danoso, Torres, Diéq~cs e
Schiefelbein (1981) no Chile, insistem na importância dos fator2s i~

tra-escolares além dos mõ.croestruturais, observando que as e s colas


de crianças das classes populares não são apenas "escolas de caran .
tes, múito menos escolas para carentes :; são escolas carentes (Rosen
berg , 1982, po27 g grifo da autora) . Como esses autores notaram uma
certa variação no nível sócio·econômico tanto em escolas carentes co
mo em não - carentes g ambos ~uderam obter os índices de aproveitamento
para as crianç3s do mesmo nlvel sócio-econ6mico nos dois tipos de e~
cola. Ficou , assim, aDarente que, controlando se o nível · sócio - ec~n6
mico e para todos aqueles nívei.s cbservados; o desempenho de cri:~n '.
ças em escolas não " carcnt8s 5 superior àquele de crianças que fre -
quentúm escolas carentes. Carraher e Sohliemann (1983) observaram
além disso! que, embora as crianças por elas entrevistadas nas esco ~
las núblicas e particulares demonstrassem , em seu estudo de habilid~

des cognitivas e matemáticas, níveis comparáveis de competência, ape


nas 2% das crianças das esc()las particulares foram reprovadas em ma ~·

temãtica ao final do ano enquanto que 3 2% daquelas frequentando as


escolas públicas o foram.
Cabe , po~s, perguntar se nao seria causa do insucesso
na alfabetização das C~:i ~~l: ::-_ S pob:>::'e s a própria frequência ao sistema
público de ens~no . Nã~ s~r~am causas suficientes para explicar o
fracasso ~centuado das crian~as pobres as diferençaq s6cio· ccon5mi -
cas entre est:a3 e as bem 3..:t'::::'=f::idas crianças mais ricas ' Não s e ria a
ausência de pré-escoL,> _" ur far:o.c tã') importante na desadaptaç ão das
crianças pobres ã escola q~e S~& ap~endizag€m da leitura setaria se-
riamente com1?rometida J senco esta unia explicação suficiente para o
seu fracasso ? ~ão ser~~ a 3tltude negati ~ ~e suas ryrofessoras s~fi -
"

c:i.ente para explicar a reprova,çao . final em mass~ E, principalmente i


:r1 ~O seria a conjunção de tais fatores, já tão grav~Uando tomados
isoladamen te ? mais jo (F~-2 sufic-:i:-en.te p ara exnlicar o fr~casso esco =
,
.~
~
.:' b J:"' ,
lar na primeira s~rie 7 A todas eSSdS qu oPS 50 r'= causas SU...."-.~clen-.,

iciente e sem ".


pre seguida pelp ·e.f..eU-o-que--produz. No entan-to I
ses fatores, enquanto metade das crianças fracassam , a outra
~btãm a promoç~o e ~. ?rcva~elnente, alfabetizada. Apesar de todas
essa s consideraç8es , não podemos dizer que encontramos nesta tão de-
siqual distribuiç\=-io clos"be:1s" da educação a expliC3cão final das d.:!:.

.------
. f;cul.dades de ","'1 fabet-i zacão-da-eriança p.obre~ . É
cia deste tipo de expli~açãof ou, mais pro?riamente! diante da neces
à luz da insuficiên-,

sidade de explicar como; apesar de todos esses fatores negativos, m~

tado das crianças obtém succ~sso, sue o s estuclos.x..eJ aci opado.s-aos. - fa ~

tores que aum2ntam a probabilidade de . ..suce.sso, descritos na seção a~

terior, torna~ · se ma is significativos. Não ~ demais insistir ~ apesar


de todas as desigualdade..s--exi steD:t.e.~rtas-crj anças-tra-,
~--€!xped ." ência-,cotidian'J. um siqnificado funcional Dara a lei
_ J.. __

tura f o qU>:.:~ a t.orna uma habilidade importante para essas crianças ~ e


as motiva para sua aprandizagem a No entanto, aquelas que nao trazem
tais motivações para a escola, deveriam encontrar na propr ia escola
esta fonte de motivaçao.

2. As funções sociais da escola

Freitag (1980), em excelente revisão do papel escola


no Brasil, argum~n~a que a escola brasileira foi, a partir da dicada
de 60~ "totalmente reestruturada e redefinida , para funcionar em toda
a sua eficácia n a s várias instâncias corno divulgadora da ideologia
dominante; corno r S9rodutora das relações de classe , como agente a
serviço da n'Jvc. estrut ür3. de dorainar'ão e corno instrumento de reforço
da p rópria base materi~l: possibilit~ndo a reprodução da força de
trabalho". Como ela, diversos autores (ver, por exemplo, Weber,198l ;
Rosenberg; 193 2,; Suviani, 19 82; Brandão., Baeta e Rocha, 1983) apon·-
tam a função de manutenção da (~strutura de classe a qual a escola
vem s ervindo , princi?almente atra?is da reprovação seletiva dos alu -
nos das camadas Dopulare s , da inculação da idéia de iguais chances
educacionais a conseqüentemente ac~itação do fracasso corno reflexo
de menor c~pacid~de dos a:ünos dessas camadas da sociedade c da cria
ç ão de sistemas alternativos de e~3~no que nâo qualificam aqueles
poucos indiv~du OG des~~s c3.mada.s "q'...le· porventura conseguem alcançar a
I

un i~erSid.a~. ;C,s:iW, n o 6 n e cess~~i o insistirmos que as idiias de


,C;, L. é.< fcs ~; soe i0L)'7 '~<. 212r0'02US s -·,n:. :>r icar, .J s como Althusser , Dour-
dieu, Passeron, Apple, Gramsci, Snyders e outros parecem oferecer,
também no caso brasileira, um modelo interessante para a análise do
papel da escola na sociedade. Como tal linha de análise tem sido ex-
plorada exaustivamente e de modo excelente, não discutiremos aqui
estas análises, apenas referindo os interessados para as interessan-
'tes análises mencionadas acima . No entanto, não podemos deixar de
ressaltar, ao analisar a questão "alfabetização e pobreza", alguns
pontos que simplesmente mencionamos abaixo.
1. "O ensino primário vem-se fazendo um processo pur9:,
mente seletivo. A ênfase está 1)0 puramente. -« • • • )Se todo ele passar
a ser um processo de seleção, isto é, de escolha de alguns, destina "~
dos a prosseguir a educação em níveis pós-primários, estará prejudi -
cada sua função essencial" (Teixeira, 1978,p. 389), que, segundo Tei
xeira, seria oferecer uma educação de base p útil a todos.
2. Dentro desse quadro seletivo, a escola utiliza a
reprovaçao a partir de padrões estabelecidos para outros grupos como
instrumento de grande utilidade. A reprovação após um ano de alfabe-
!

tização leva as crianças pobres a repetirem exatamente o mesmo cami-


nho qu~ as levou ao fracasso, sem que seja possível encontrarmos em
qualquer sistema pedagógico uma explicação aceitável para essa forma
de "tratar" o problema.
3. No entanto, a escola é também um palco onde se de~~,
senrolam as mesmas contradições existentes na sociedade. Para que as
camadas oprimida,s sejam cooptadas e aceitem sua dominação, elas pre-
cisam crer que tiveram iguais oportunidades e simnlesmente fracassa-
ram. Assim, a escola; que reproduz a estrutura de classes, como apo~
ta Snyders (1977), pode também abrir espaço para a possibilidade de
libertação. porém,enquanto ela mantiver o caráter puramente seleti-
vo, apontado por Teixeira (1978), es~-e espaço será necessáriamente
fictício.
4. liA conquista de vagas, na escola pu.blica r por par ~
te de grupos cada vez maiores de crianças de origem social mais bai~·
xa, representa um avanço em direção à democratização da escola. Tor ~
na a escola um espaço onde a atuação de educadores comprometidos com
um projeto de transformação da sociedade é p mais que oportuna, indis
pensável" (Rosenberg, 1982).
5. Finalmente, salientamos ainda, como fez poppovic
(1979), que esta atuação 10s educadores comprometidos com a mudança
das relações presentes e~tre alfabetização e prbreza não pode res-
tringir ~ se a conteúdos curriculares e novas metodologias . É também
necessáriQ que as professoras seja~ esclarecidas nos seus valores e
sua perspE:;ctiva social, .:lprendendo a entender outras maneiras de ser,-
viver e p4nsar, e aprendendJ tamb€~ a ensinar crianças cujos padrões
-- .... ----
y-- ::;-
Conclusões

Resumindo brevemente a contribuição da psicologia,vi~

mos que a psicologia d~s dificuld2des de aprendizagem, usada inicial


mente para esclarecer os p~oblemas das crianças pobres ao serem alfa
betizadas, parece hoje ccnstituir quadro teórico inapropriado para o
exame da questão por v&rias razõeso Primeiro , a incidência de disle~
xia específi~a que ~oderia ser esperada entre nós não pode aproximaE
se da s ~ltas taxas de repro~ação otservadas . Segundo, os testes de
prontidão para a leitura, além. d2 c~lturalmente tendenciosos em seus
conteúdos e b~seados cn nc~mas estatísticas para outros grupos, nao
tiveram até hoje sl~a v~lidade ccmprovRda nem experimentalmente nem
por meio de uma an&:ise ::-içorosa do;:; p:.':"é ~· requisitos para a compreen-
sao do códigoalfab5Lico . Finalmen:e, já foi demonstrado que a imat~
ridade em tais testes nâo pode s ~r considerada causa suficiente pa-
ra explicar o fracasso na alfabetização de crianças pobres uma vez
que criança3 "imc.turas:: de acorco com estes testes também são alfabe
tizadas. No entanto, é 7..moortante ressaltar que, ao contrário do que
observa:nos nas pesquieds em nosso I:',eioj' a própria psicologia das di-
ficuld~des na aprendiz3gem de leitura apresentou evolução considerá-

vel nos úl t~.P."os a_1C.S" have~-:.c.o urna rr.udança ní tidê'. da ênfase em habili
dades derceptuais 9a~~ uma ênfase maiúr em habilidades lingüísticas.
~lém disso, parece provável que; ~€ qualquer forma p não sejam neces -
sários "exam::s de pro::1tidh.o" para seleção dos IImaduros!! nessas novas
habilidades, pois to~~s a~ crianças: rn~is 0 1 menos privilegiadas, b!
neficiam-- se do ' mesm:,) L.lno tl'! experi ê:~c:'a por ocasião de sua alfabeti
zação. Lspeciiicamen~e, 3abemos hoje que a prática em atividades que
desenvolvem o conh 0C lm~nto ~etalin~1ístico está casualmente relacio-
nada a um mai~r ~~ogrcsso na apre~1izagem da leitura.
Explic:1Gocs do fré,Ci'lSSO da criança pobre na alfabeti-
zaçao baseadc.f' na !II-,sicologia da c:r.L:mça carente" também são insufi-
cientes poi~ . como vimos acima, crianlas COffi idênticos nIveis de
H
"prontidão para a leitura são e daixam de s er alfabetizadas. No en-
tanto, se exist~~, de f~to~ um d~s~rvolvimento mais lento de habili-
dades metal i-:-- ~üí['. tic2.,:J ~r. ~r..3 as cl'!...:::nças de camadas p opulares f como
observado por Carraher R ?ego (i98J~ e Ferreiro e Teberosky (1979) I
uma análise mais detalf"ladas do dese:'l.rolar do processo de alfabetiza·,·
çao torna" 'f,e j.!n1')e~ati va .'l\ ~scola desconhece hoje as fases
o desse
processJ " ~lão :?:::'0cura ,,=,eccI'Lhecer; por exemylo p que a criança que já
desenvolveu UDa conc2pçã0 ~lfabétic~ da esc~ita e aprendeu as corres
.
pond~nciu~ l~tra · Z~n 006e ~~r co~~i ; :erada basicamente alfabetizada.
Ela pr:.(:isa ç: f>ena~ .:-rc .~: )r3.r sua a'-)'Ct::ndizagem, desenvolvendo ~ {a} um
conhecirnentC"J3ie , '}~~d_ :'~;':" (lÇ.s d:,Y ';:Lsa:;; opçocs para representar o
mesmo som (por exemplo, o uso de s, x ou z para re?resentar o mesmo
som como em casa, exército e zebra), (b) um conhecimento detalhado
da mudança de valor das letras em. função de 'seu contexto na palavra
(por exemplo, cabelo e cebola) I e (c) uma compreensão da distinção
entre a lIngua falad~ e escrita, tanto no que diz respeito as varia-
ções dialetais marcadas na pronúncia como no que diz respeito às di-
ferenças entre o estilo oral e o escrito. A escola, no entanto, col~
ca todas essas fases no mesmo plano de alfabetização. Privilegiado
no Brasil, como em qualquer outro lugar (ver, por , exemplo.,Bernstein,
1973; 1975), o código lingtlist.;i..co da classe dominante, a escola pen~
liza a criança pobre mais rigorosamente por seus 'e rros de ortografia
do que a criança rica, pois aquela, com a mesma compreensão ~ do siste
ma de escrita e o mesmo conhecimento de correspondências letra-som,
comete mui tos mais erros·, ortográf icos do que esta. A correção orto-
gráfica exagerada nesta época pode apenas desencorajar a criança,
transmitindo-lhe a noção de que ela não compreend~u aquilo que, de
fato, compreendeu, e interfe~indo, assim, em seu progresso.
A análise antropológica, por seu turno, sugere-nos
que os, nIveis motivacionais da criança pobre são, provavelmente,mais
baixos do que os das crianças mais ricas o Enquanto estas últimas co~
vivem com a leitura, conhecendo-lhe o significado funcional e a imen
sidão de possibilidades que ela lhe oferece; as crianças pobresfre-
qüentemente vivem entre ·adultos para quem aprender a ler é apenas
uma forma de evitar um estigma social. A antropologia ensina~nos,

pois, que "relevância" não é uma questão do uso de um vocabulário re


gional; tornar a leitura relevante significa mostrar que portas ela
abre, revelar seu significado funcional, descobrir as diferenças en-
tre uma cultura oral e urna cultura letrada. vimos que os homens vais,
vivendo em condições extremamente desfavoráveis do nosso ponto de
vista e comparáveis às de nossas crianças pobres, raramente desistem
de aprender a ler, uma vez decididos a isto 9 pois a aprendizagem da
leitura é iniciada por eles volu~tariamente e para atingir fins de -
terminados.
Finalmente, as an&lises de nosso sistema de ensino e
das funções da escola em nossa sociedade apontam a má distribuição
dos "bens" da educação pelo Estado, o caráter puramente seletivo da
escola primária, sua função reprodutora da sociedade de classe em
que vivemos, sua adoçã0 de práticas pedagógicas injustificáveis como
a repeti~ão do caminho q~e levou as fracasso, e as relações sociais
entre os agentes concretos nesse sistema = ~ dministradores, professo
re~ e alunos - como fatores desagradáveis à alfabetização das crian-
ças pobres, tcdos esses hoje, objeto de consciência de pesquisadores
desta questão ,
32

No entanto, nossa análise nao pode completar-se sem


um ato mais pessoal, sem um "exame de consciência". Enquanto se f a ~
tão pouco para mudar esta situação, do que é ,que estamos privando as
crianças pobres? Da d,iversão dos livros . Da liberdade de movimentos
numa sOciedade letrada. De importantes pontos de informação . De
iguais oportunidades na sociedade e perante a lei . De iguais oportu-
nidades de expressão. De experiências de análise critica que so a
leitura pode oferecer. De experiências estéticas que nos causam ra ro
prazer. Enfim, de muitas coisas que exigimos para nós e para nossos
filhos. Resta, pois, perguntar ~ Há quem esteja disposto , a . --enfrentar
o desafio e-iniciar as mudanças?

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--'~-------------- .....

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