Anda di halaman 1dari 186

UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

Simone Schemberg

EDUCAÇÃO ESCOLAR E LETRAMENTO DE SURDOS:

REFLEXÕES A PARTIR DA VISÃO DOS PAIS E PROFESSORES

CURITIBA

2008
EDUCAÇÃO ESCOLAR E LETRAMENTO DE SURDOS:

REFLEXÕES A PARTIR DA VISÃO DOS PAIS E PROFESSORES

Curitiba

2008
Simone Schemberg

EDUCAÇÃO ESCOLAR E LETRAMENTO DE SURDOS:

REFLEXÕES A PARTIR DA VISÃO DOS PAIS E PROFESSORES

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-


Graduação em Distúrbios da Comunicação da
Universidade Tuiuti do Paraná como requisito
parcial para a obtenção do título de Mestre.

Orientadora: Profª. Dra. Ana Cristina Guarinello

Curitiba

2008
TERMO DE APROVAÇÃO

Simone Schemberg

EDUCAÇÃO ESCOLAR E LETRAMENTO DE SURDOS:

REFLEXÕES A PARTIR DA VISÃO DOS PAIS E PROFESSORES

Esta dissertação foi julgada e aprovada para a obtenção do título de Mestre em


Distúrbios da Comunicação, no Programa de Pós-Graduação em Distúrbios da
Comunicação da Universidade Tuiuti do Paraná.

Curitiba, ____ de _______________ de 2008.

Programa de Pós-Graduação em Distúrbios da Comunicação

Universidade Tuiuti do Paraná

Orientadora: Profª. Dra. Ana Cristina Guarinello

Universidade Tuiuti do Paraná

Profª. Dra. Ana Paula Santana

Universidade Tuiuti do Paraná

Profª. Dra. Sueli de Fátima Fernandes

Universidade Federal do Paraná


Aos meus alunos,

Por motivarem minhas buscas,

Minhas descobertas e

Meu crescimento.
AGRADECIMENTOS

A Deus, por ter colocado sempre em meu caminho pessoas que de uma

forma ou de outra me fazem acreditar que viver vale à pena e que aprender vale

mais ainda.

A meus pais, pelos valores e pelo constante exemplo de humildade e

sabedoria.

Agradeço imensamente ao meu esposo, Hélio, pelo apoio constante e pelos

momentos de felicidades.

A minha orientadora querida, Ana Cristina, por ter guiado minhas reflexões e

pela paciência ao se deparar com as minhas idéias e com minhas inseguranças.

Obrigada por tudo.

Às professoras Ana Paula Santana e Giseli Massi, a quem serei

infinitamente grata por terem proporcionado momentos gratificantes de descobertas

e acima de tudo por terem instigado ainda mais minhas buscas em torno da

linguagem, o que certamente terá continuidade.

Não poderia deixar de fazer um agradecimento a minha querida amiga

Kyrlian, com quem desde o começo pude contar. Agradeço por acreditar em mim, no

meu trabalho e por ter compartilhado de tantas angústias e anseios.

Agradeço imensamente a minha grande amiga Bebieti, por ter estado ao

meu lado o tempo inteiro apoiando, incentivando e ouvindo meus desabafos.

Um agradecimento especial à Professora Sueli Fernandes, com quem

desde sempre pude contar, direta ou indiretamente, por mais uma vez fazer parte de

mais uma etapa da minha vida. E acima de tudo, agradeço por nos presentear com

suas idéias.

OBRIGADA!
Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas...

Que já têm a forma do nosso corpo...

E esquecer os nossos caminhos que nos levam sempre aos

mesmos lugares...

É o tempo da travessia...

E se não ousarmos fazê-la...

Teremos ficado... Para sempre...

À margem de nós mesmos...

Fernando Pessoa
RESUMO

Ao considerar que a inclusão do surdo no ensino regular já vem sendo discutida há


algum tempo, torna-se relevante levantar alguns questionamentos acerca de como
este processo tem se concretizado do ponto de vista de alguns sujeitos envolvidos.
Diante disso, o objetivo desta pesquisa é analisar e discutir a visão dos pais e
professores acerca da educação escolar e do letramento de um grupo de crianças
surdas que freqüentam o Centro de Atendimento Especializado na Área da Surdez
(CAES) em horário contrário ao do ensino regular. Para isto, foram abordados
referenciais teóricos enfatizando a inclusão do surdo no ensino regular,
considerando o contexto da inclusão educacional, bem como aspectos históricos
relacionados a sua educação. Buscou-se também uma fundamentação acerca do
letramento, a fim de embasar as discussões referentes à leitura e à escrita no
contexto da criança surda. Foram desenvolvidas entrevistas com os pais das
crianças que freqüentam o CAES e aplicados questionários aos respectivos
professores do ensino regular. Os resultados deste trabalho demonstram que muitos
são os fatores a serem considerados para que se possa garantir a real concretidude
da inclusão do surdo no ensino regular. Entre estes fatores, foi possível constatar, a
partir dos discursos dos pais e professores, que há uma constante exclusão do
surdo dos contextos lingüísticos, tanto na família, quanto na escola. Diante disso, as
crianças surdas encontram-se em desvantagem, sobretudo, no que diz respeito ao
seu letramento. O CAES acaba por ser o único espaço em que as mesmas podem
ter acesso a conceitos e constituir-se como sujeitos a partir da sua condição
bilíngüe.

Palavras-chave: Inclusão Escolar – Surdez – Família – Letramento


ABSTRACT

This research seeks to approach the deaf school education in this context. It’s
relevant to raise some questions about the way as this process has been discussed
and the point of view of some subjects involved in the school education of the deaf.
So, this research aims to analyze and discuss the point of view of parents and
teachers about school education and literacy of a group of deaf children, who attend
a specialized service in the contrary time of the regular school. For this, were
approached theory references about inclusion of the deaf and historic aspects. We
also seek about the literacy through emphasize the discussions in relation to reading
and writing in deaf children context. We developed interview with deaf children
parents who attend the CAES and their respective teachers of regular school. The
results show that are many factors to be considered for guarantying the concrete and
real inclusion of the deaf in the regular school. It was possible to visualize, from
parents and teachers discourses that there is a constant exclusion of the deaf in the
linguistics contexts, in a family and in school. So the deaf children are at
disadvantage, specially, in relation to their literacy. The CAES ends up being only
place where the deaf children can have access to concepts and constitute
themselves from their bilingual condition.

Keywords: School Inclusion – Deafness – Family – Literacy


LISTA DE QUADROS

QUADRO 1 – DESCRIÇÃO DOS PAIS................................................................87

QUADRO 2 – DESCRIÇÃO DOS PROFESSORES.............................................89

QUADRO 3 – ALGUNS DADOS DAS CRIANÇAS ..............................................90

QUADRO 4 – COMPARAÇÃO DA VISÃO DOS PAIS E DOS PREFESSORES

ACERCA DA LEITURA DA CRIANÇA ...............................................................140

QUADRO 5 – COMPARAÇÃO DA VISÃO DOS PAIS E PROFESSORES

ACERCA DA ESCRITA DA CRIANÇA ..............................................................141


LISTA DE GRÁFICOS

GRÁFICO 1 – FORMA DE COMUNICAÇÃO UTILIZADA COM O ALUNO

SURDO...............................................................................................................103

GRÁFICO 2 – VISÃO DOS PAIS ACERCA DA LEITURA DO FILHO..............132

GRÁFICO 3 – VISÃO DOS PAIS ACERCA DA ESCRITA DO FILHO.............137

GRÁFICO 4 – VISÃO DOS PROFESSORES ACERCA DA LEITURA DO

ALUNO................................................................................................................138

GRÁFICO 5 – VISÃO DOS PROFESSORES ACERCA DA ESCRITA DO

ALUNO................................................................................................................140
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.....................................................................................................12

1.1 DAS INQUIETAÇÕES QUE LEVARAM À PESQUISA.....................................12

2 SURDEZ E INCLUSÃO NO CONTEXTO DO ENSINO REGULAR ....................16

2.1 A SURDEZ CONSTITUÍDA HISTORICAMENTE...............................................16

2.2 INCLUSÃO E SURDEZ: AVANÇOS E DESAFIOS....... ....................................24

2.2.1 Um panorama geral da inclusão......................................................................24

2.2.2. O surdo na escola regular................................................................................27

2.3 O CENTRO DE ATENDIMENTO ESPECIALIZADO NA ÁREA DA SURDEZ

(CAES): FORTALECENDO A INCLUSÃO.................................................................43

3 LINGUAGEM LETRAMENTO E SURDEZ ..........................................................54

3.1 REFLETINDO SOBRE A LINGUAGEM NA CONSTITUIÇÃO DO SUJEITO

SURDO SOB UM PONTO DE VISTA SÓCIO-HISTÓRICO......................................54

3.1.1 O discurso do outro e a interação social enquanto fatores constituintes do

sujeito.........................................................................................................................60

3.2 ALGUMAS REFLEXÕES EM TORNO DO CONCEITO DE LETRAMENTO.....65

3.3 LETRAMENTO E SURDEZ................................................................................70

3.2.1 Práticas de letramento e família......................................................................79

4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS.............................................................85

4.1 A PESQUISA......................................................................................................87

5 ANÁLISE E DISCUSSÃO ....................................................................................92

5.1 A VISÃO DOS PAIS ACERCA DA EDUCAÇÃO ESCOLAR DO(A) FILHO(A)

SURDO(A)..................................................................................................................92
5.2 A VISÃO DOS PROFESSORES ACERCA DA EDUCAÇÃO ESCOLAR DOS

ALUNOS SURDOS..................................................................................................101

5.2.1 Reflexões acerca do trabalho pedagógico considerando a inclusão do aluno

surdo em sala de aula..............................................................................................106

5.3 ASPECTOS RELACIONADOS AO LETRAMENTO..........................................120

5.3.1 Práticas de letramento nos contextos familiar e escolar...............................121

5.3.2 “Acho que ela sabe escrever, mas não sabe ler”: A visão dos pais e

professores acerca da leitura e da escrita do filho/aluno surdo...............................131

5.3.2.1 A visão dos pais........................................................................................131

5.3.2.2 A visão dos professores.............................................................................138

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................143

REFERÊNCIAS........................................................................................................152

APÊNDICES.. ..........................................................................................................167

ANEXOS .................................................................................................................169
12

1 INTRODUÇÂO

1.1 DAS INQUIETAÇÕES QUE LEVARAM À PESQUISA

Colocar-se como autor diante de um determinado tema nos conduz a refletir

sobre muitos aspectos que nos levaram a abordá-lo. Desta forma torna-se

importante um breve relato acerca dos fatores que me instigaram a discutir algumas

questões referentes à Surdez1.

No início da minha caminhada profissional na área do magistério, há sete

anos, foi me proposto assumir um trabalho no Centro de Atendimento Especializado

em Deficiência Auditiva (CAEDA), assim denominado na época, em um município da

região metropolitana de Curitiba. De acordo com as orientações que me foram feitas,

tal atendimento tinha como pressuposto o desenvolvimento de atividades voltadas à

reabilitação auditiva e da fala dos alunos, que, em sua maioria não havia

freqüentado atendimento fonoaudiológico ou escola especial, locais nos quais

geralmente esse trabalho é desenvolvido. No entanto, para mim, isso não era

novidade, pois ao longo de um ano cursei uma Especialização em Deficiência

Auditiva, em que esses aspectos eram abordados incessantemente, bem como as

patologias da audição e as características do deficiente auditivo.

Porém, ao deparar-me com a prática cotidiana, as orientações e

metodologias voltadas à reabilitação oral-auditiva não se aplicavam ao contexto em

questão, sobretudo, porque cada aluno trazia consigo especificidades, necessidades

individuais. Isso me levou a questionar o trabalho que eu vinha iniciando e a

perceber que as poucas tentativas de utilizar técnicas de reabilitação eram

frustrantes para mim e para os alunos.

1
Optamos por utilizar o termo em maiúscula a fim de explicitarmos a Surdez como diferença,
afastando-se de uma visão clínico-terapêutica.
13

Por ser a surdez uma questão que sempre me causou indagações, já no

primeiro ano de trabalho, passei então a buscar outros olhares que vinham ao

encontro das minhas dúvidas com relação ao trabalho que me era proposto, pois

diante das mudanças sociais com relação a alguns conceitos e consequentemente a

alguns termos, como de CAEDA para CAES (Centro de Atendimento Especializado

na Área da Surdez), DA (deficiência auditiva) para Surdez, os discursos em torno da

educação de surdos apontavam para outros encaminhamentos, sobretudo em

relação à real função do trabalho pedagógico. Sendo assim, já no meu primeiro ano

de trabalho no CAES a leitura e a escrita passaram a ser o verdadeiro foco, levando

em conta a inclusão do aluno surdo no ensino regular e suas práticas sociais. Assim,

os métodos de alfabetização dão lugar ao letramento e a língua de sinais passa a

ser considerada fundamentalmente.

Fui trazendo para a prática um trabalho com leitura e escrita partindo de

assuntos propostos pelos próprios alunos. É fato que, inicialmente, houve certa

dificuldade em estabelecer uma interação lingüística efetiva, ou seja, interagir por

meio de uma língua em comum, já que até então, isso não se fazia tão necessário,

considerando que a proposta era voltada à reabilitação da fala. No entanto, a partir

do convívio constante com a língua de sinais, estas interações começaram a se

estabelecer significativamente, de modo que quando comecei a compreender o

sujeito surdo e a partilhar seu modo de perceber o mundo e construir seus conceitos

tornou-se impossível persistir em práticas que desconsideravam a língua de sinais

nesse processo.

Atualmente o trabalho desenvolvido no CAES tem apresentado resultados

satisfatórios, pois, ainda que haja muito a ser repensado, hoje a função pedagógica

é priorizada. Além disso, o CAES torna-se um espaço de possibilidades, no qual


14

ocorrem os encontros surdo-surdo, as trocas de experiências e, sobretudo, o contato

com a leitura e a escrita em práticas de letramento.

Por meio do meu trabalho no CAES, comecei a ter contato com os pais de

meus alunos surdos, bem como com os professores do ensino regular, de modo que

passei a perceber as diferentes maneiras de se conceber o aluno surdo e de

perceber alguns aspectos relacionados a sua educação escolar.

Apesar de a inclusão escolar já estar sendo proposta há algum tempo,

parece que ainda há por parte de pais e professores, um desconhecimento em torno

de questões relativas ao surdo e à Surdez, o que os leva a conceber o sujeito surdo

alicerçados em conceitos preestabelecidos socialmente. Algumas vezes, em

conversas com os professores, ao referirem-se ao surdo em sala de aula, foi

possível ouvir afirmações como: “Nossa, como é difícil trabalhar com esse aluno, ele

não entende nada...” ou “Ela não pára, não presta atenção em nada...” ou “Não sei

se o reprovo, não sei se ele sabe ou não...”.

Essas maneiras de perceber o aluno é que me levaram a refletir sobre como

um mesmo sujeito pode ser visto de maneira tão diferente entre um contexto e

outro? Diante disso, o objetivo desta pesquisa é analisar e discutir a visão dos pais e

professores acerca da educação escolar e do letramento de um grupo de crianças

surdas que freqüentam o CAES e que estão inseridas no ensino regular.

Para isso foram desenvolvidas entrevistas com os pais com os pais dessas

crianças e aplicados questionários a seus professores do ensino regular. Ao abordar

o ponto de vista dos pais será possível buscar compreender seu olhar acerca do

processo de educação escolar de seu filho no contexto da inclusão educacional,

bem como questões relacionadas ao letramento. Do mesmo modo esses aspectos


15

serão discutidos sob o ponto de vista dos professores, sendo possível estabelecer

uma discussão em torno de diferentes pontos de vista sob um mesmo sujeito.

No capítulo 2 serão discutidas as diferentes concepções de surdez

constituídas historicamente e alguns aspectos acerca da inclusão. Ainda que este

seja um tema que possa parecer redundante e já discutido por muitos

pesquisadores, é nesse contexto que se fazem presentes algumas de nossas

inquietações. Para isso serão destacados alguns pesquisadores que têm contribuído

nas discussões em torno do processo de inclusão do surdo (LIMA, 2004; SOARES e

LACERDA, 2004; SIILVA, 2005; PEDREIRA, 2006, SCHENEIDER, 2006). Será

discutido também o papel do Centro de Atendimento Especializado no contexto da

inclusão.

No capítulo 3 serão levantadas algumas reflexões acerca da linguagem sob

um ponto de vista sócio-histórico a fim de explicitar a base teórica em que esta

pesquisa está alicerçada. Nesse ponto, torna-se relevante refletir sobre a interação e

o discurso do outro enquanto fatores constituintes do sujeito. Serão enfatizados

alguns pontos acerca do letramento, considerando as práticas de leitura e escrita

com surdos, trazendo contribuições que destacam a importância da língua de sinais

no processo de letramento dos mesmos (BOTELHO, 2002; FERNANDES, 2003;

SILVA, 2005).

No capítulo 4 será apresentada a metodologia em que foi desenvolvida a

pesquisa e no capítulo 5 serão expostas algumas análises a partir das falas dos pais

e dos professores, diante das quais algumas reflexões serão levantadas,

possibilitando uma discussão em torno do tema abordado nesta pesquisa.


16

2 SURDEZ E INCLUSÃO NO CONTEXTO DO ENSINO REGULAR

2.1 A SURDEZ CONSTITUÍDA HISTORICAMENTE

As diferentes visões em torno da surdez estão relacionadas às

representações e aos discursos a que a mesma foi submetida ao longo do tempo.

A história da surdez, até 1750, é marcada por crenças e concepções que

desconsideravam as capacidades intelectuais e lingüísticas do surdo. Por muito

tempo, a surdez foi considerada uma calamidade e esteve vinculada à idéia de

incapacidade e falta de inteligência, além disso, os surdos eram isolados

socialmente e desconsiderados perante a lei e a sociedade. Somente alguns surdos

de famílias nobres eram submetidos a métodos de ensino, a fim de adquirirem a

fala, para que fossem reconhecidos perante a lei como herdeiros (SACKS, 1998).

Na segunda metade do século XIX, os surdos começaram a ser

reconhecidos social e linguisticamente. Fato este influenciado por Charles Michel

L’Epeé que, na França, desenvolveu um método gestualista, concebendo a língua

de sinais como sendo a melhor possibilidade para o desenvolvimento do

pensamento e da comunicação dos surdos, o que foi considerado um grande passo

na área educacional, pois o propósito era de que o surdo pudesse desenvolver-se

cognitiva e lingüisticamente, de modo a conquistar espaços:

Esse período que agora se afigura como uma espécie de era duradoura na
história dos surdos marcou o rápido estabelecimento de escolas para
surdos, geralmente mantidas por professores surdos, em todo o mundo
civilizado, a emergência dos surdos da obscuridade e da negligência, sua
emancipação e aquisição de cidadania e seu rápido surgimento em
posições de importância e responsabilidade – escritores surdos,
engenheiros surdos, filósofos surdos, intelectuais surdos, antes
inconcebíveis, subitamente eram possíveis. (SACKS, 1998, p.34/35).
17

Percebe-se, que a partir do século XVIII, mudanças ocorreram em relação à

aceitação do sujeito surdo, abrindo-lhe espaço na educação e na sociedade. Avanço

que teve continuidade com a criação, em 1864, da primeira universidade para

surdos - o Colégio Gallaudet, nos Estados Unidos - hoje, Universidade Gallaudet,

em homenagem a Edward Gallaudet, seu primeiro diretor.

Porém, na mesma época em que os métodos de L’Epeé conquistam espaço

na França, Samuel Heinick, na Alemanha, defende uma filosofia baseada na

aquisição da fala, uma proposta de educação oralista2 e funda a primeira escola

oralista, que se expande mais fortemente com as determinações do Congresso de

Milão, ocorrido em 1880, na Itália. A partir das definições estabelecidas nesse

congresso a concepção Oralista ganha maior prestígio, decretando-se, então, a

supremacia da língua oral e a supressão dos gestos nos meios educacionais.

Convém destacar que as decisões estabelecidas em tal Congresso, levaram

em conta somente a visão de um grupo de ouvintes, não promovendo a participação

dos surdos nos debates e nas decisões, negando-lhes a possibilidade de serem

percebidos como sujeitos.

Diante dos avanços científicos e tecnológicos, um dos acontecimentos que

influenciou a supremacia do oralismo, foi a invenção do telefone, por Alexandre

Graham Bell (1847-1922). Bell considerava a surdez de sua mãe e de sua esposa

como um desvio dos padrões da normalidade, motivo que o levou a criar um

aparelho que pudesse substituir a audição, pressupondo fazer uma nova membrana

para os ouvidos de sua esposa. Esse aparelho tinha como propriedade fazer correr

vibrações através de um fio elétrico e, fazendo vibrar outra membrana, reproduzir a

2
A proposta oralista tem como ponto central a aprendizagem da fala, a partir de técnicas específicas
de reabilitação como o treinamento auditivo, o desenvolvimento da fala e a leitura labial. (DORZIAT,
1997)
18

voz, o que resultou na invenção do telefone. Além disso, Graham Bell era professor

e desenvolveu estudos relacionados ao mecanismo da fala, como retrata em sua

obra: The Mechanism of speech (1910), na qual descreve instruções para

professores de surdos, enfatizando o trabalho com a articulação de fonemas e a

leitura labial, o que demonstra sua adesão ao Oralismo. (BELL, 1910)

Em meio a esse conflito entre oralismo e gestualismo houve grandes

prejuízos no desenvolvimento educacional dos surdos, que não ocupavam nenhum

lugar significativo, tanto no que diz respeito às decisões no campo educacional,

quanto à defesa dos seus pontos de vista em relação à língua que eles, enquanto

sujeitos, optariam por utilizar.

Historicamente é possível perceber a forte presença de um discurso clínico-

terapêutico na educação de surdos, ainda que em alguns momentos históricos a

modalidade gestual tenha ocupado espaço significativo.

O modelo clínico-terapêutico reflete uma concepção de surdez ligada à

medicalização, que segundo Skliar (1997), se traduz educativamente em estratégias

e recursos reabilitadores que objetivam corrigir a surdez, percebendo-a como

patologia, diante da qual o surdo estaria comprometido lingüisticamente. A esta idéia

está ligada a visão de que somente a partir da língua oral é que se pode garantir o

desenvolvimento cognitivo do surdo, recorrendo-se, assim, à correção dos defeitos

da fala e a treinamentos que visam desenvolver a leitura labial e a articulação.

No entanto, o reconhecimento da língua oral não se estabelece apenas sob

os interesses educacionais, Skliar (1998) refere que esse conceito é influenciado por

outros fatores históricos decorrentes de pressupostos filosóficos, religiosos e

políticos, nos quais perdura a valorização da linguagem oral, sendo “os filosóficos - o

oral como abstração, o gestual como sinônimo de obscuridade do pensamento; os


19

religiosos - a importância da confissão oral, e os políticos - a necessidade da

abolição de dialetos, já dominantes no século XVIII e XIX.” (p. 17).

É em decorrência dessa maneira de conceber a surdez, sob o aspecto

patológico e reabilitador, que persiste ainda hoje em alguns discursos, a idéia de que

somente a partir da fala é que o surdo poderá desenvolver-se plenamente, ainda

que o fracasso educacional seja obviamente percebido. Para Skliar (1998) a

educação de surdos reflete tal fracasso devido às representações ouvintistas3

acerca do que é a surdez e às práticas que tomam a questão da deficiência como

ponto de partida. Ao se considerar apenas os aspectos biológicos, atendo-se

basicamente à aquisição da fala, desconsideram-se as oportunidades de

desenvolvimento e a constituição da linguagem de maneira significativa. Diante

disso, Góes (1999), quando se refere às práticas oralistas, afirma que:

(...) embora se pretenda propiciar a aquisição da linguagem oral como


forma de integração, esse trabalho educacional acentua, ao invés de
eliminar, a desigualdade entre surdos e ouvintes quanto às oportunidades
de desenvolvimento. Dificulta ganhos nas esferas lingüística e cognitiva por
exigir do surdo a incorporação da linguagem exclusivamente numa
modalidade a qual este não pode ter acesso natural. E, na tentativa de
impor o meio oral, interditando formas de comunicação gestual-visual, reduz
as possibilidades de trocas sociais, somando, assim, obstáculos à
integração pretendida. (1999, p. 40).

As vozes e os discursos que se estabeleceram diante da abordagem oralista

instituíram-se negativamente, sobretudo pela tentativa de “oralizar” o surdo a partir

de práticas que desconsideram a língua de sinais. A visão clínica que permeia essa

abordagem, denota a idéia de cura, de normalização através de técnicas que

possam levar o surdo a aproximar-se do padrão ouvinte, ou seja, a superação da

3
Segundo Skliar, o termo Ouvintismo diz respeito ao conjunto de representações dos ouvintes, a
partir do qual o surdo está obrigado a olhar-se e a narrar-se como ouvinte.
20

deficiência estaria na aquisição da fala (FAVORITO, 2006). Sendo assim, retrata-se

a idéia de reabilitação do sujeito, ligada às expectativas de normalizá-lo.

É contrapondo-se a essa maneira de olhar o sujeito surdo, que suscitam

perspectivas em relação ao processo educacional do mesmo diante das quais a

Surdez é vista como diferença (FERNANDES, 1998, SKLIAR, 1998, GOES, 1999,

FERNANDES 2003, SAMPAIO, 2005). Este é o ponto de partida para se pensar no

processo de constituição do surdo.

A partir desse ponto de vista, vinculado à perspectiva sócio-histórica, é que

se defende a idéia de que o surdo tem o direito de utilizar a língua de sinais

(SKLIAR, 1997) a qual lhe possibilita a apropriação de conceitos e o

desenvolvimento efetivo de suas competências.

O reconhecimento da língua de sinais foi estabelecido após os estudos de

Willian Stokoe, na década de 60, que comprovaram cientificamente sua legitimidade.

Sendo assim, a partir de estudos científicos é que surge um outro modo de concebê-

la, ou seja, como uma língua constituída estrutura e sintaticamente, considerando

que até então era vista apenas como um código que auxiliava na comunicação dos

surdos (SKLIAR, 1998).

A partir de então, a língua de sinais passa a ter um status lingüístico, de

modo que a língua começa a ser considerada independentemente da modalidade

em que é expressa, ou seja, a língua de sinais não se opõe à língua oral, mas é

constituída em via diferente, visual-espacial, cumprindo a mesma função, assim,

como afirma Quadros (1997): “as línguas de sinais são sistemas lingüísticos

independentes dos sistemas das línguas orais (...) são línguas que não se derivaram

das línguas orais, mas fluíram de uma necessidade natural de comunicação entre

pessoas que não utilizam o canal oral-auditivo (...)” (p. 47).


21

É em meio a esse contexto de estudos e discussões em torno da língua de

sinais que os surdos começam a organizarem-se e a reivindicarem seus direitos.

Concomitantemente, o fracasso do Oralismo começa a ser discutido, sobretudo no

que diz respeito à aquisição da linguagem escrita pelo surdo. Em conseqüência

disso, na década de 70, ganha espaço a Comunicação Total, uma filosofia que

enfatiza a utilização de diferentes meios na comunicação com os surdos: a fala, os

gestos, a língua de sinais, o alfabeto digital e outros. Cabe destacar aqui a prática

bimodal ou Bimodalismo, presente na Comunicação Total, já que ainda hoje é

praticada na educação de surdos. Tal prática diz respeito ao uso simultâneo da fala

e dos sinais, o que dificulta a estruturação do pensamento, considerando que é

impossível a utilização de duas línguas simultaneamente, pois cada língua possui

estruturas lingüísticas próprias (BOTELHO, 2002).

Apesar de ter representado um grande avanço, essa filosofia não garantia

aos surdos, como pontua Ferreira Brito (1993), um espaço real para a língua de

sinais e para a constituição de uma língua, pois ainda se privilegiava a fala.

Diante disso, novos estudos apontam para um outro olhar sob a Surdez e o

sujeito surdo que passaram a ser percebidos a partir da diferença, sobretudo, a

diferença lingüística. Ressalta-se aqui a concepção sócio-antropológica, que em

consonância com o ponto de vista sócio-histórico, concebe o sujeito surdo a partir da

diferença e não da deficiência, de modo que a “surdez constitui uma diferença a ser

politicamente reconhecida; a surdez é uma experiência visual; a surdez é uma

identidade múltipla e multifacetada e, finalmente, a surdez está localizada dentro do

discurso sobre a deficiência.” (SKLIAR, 1998).

Com o estatuto da língua de sinais, aliado às conquistas surdas, as quais

dizem respeito à participação efetiva no campo acadêmico, legenda em programas


22

de televisão, direito à intérprete, entre outras, que começam a ganhar forças,

professores e pesquisadores, principalmente dos Estados Unidos, iniciam um campo

de discussões e articulações acerca de outras condições de ensino para os surdos

(LOPES, 2007). Assim, partir da década de 80 e início dos anos 90 do século XX, no

Brasil, o reconhecimento da comunidade surda começa a ganhar um espaço

significativo no âmbito educacional. São constituídos grupos de Estudos Surdos que

objetivam teorizar a surdez a partir de um olhar diferente, contrário ao da deficiência

e da medicalização. Esses grupos, compostos por pesquisadores surdos e ouvintes,

abrem espaço para discussões acerca de questões políticas, sociais e educacionais,

o que contribui efetivamente para alavancar as considerações em torno da condição

bilíngüe do sujeito surdo. Segundo Skliar (1998):

Os Estudos Surdos em educação podem ser pensados como um território


de investigação educacional e de proposições políticas que, através de um
conjunto de concepções lingüísticas, culturais, comunitárias e de
identidades, definem uma particular aproximação – e não uma apropriação
- com o conhecimento e com os discursos sobre a surdez e sobre o mundo
dos surdos. (p. 29).

Além de colocar em pauta discussões em torno das representações

dominantes, hegemônicas e “ouvintistas” sobre a surdez, a língua de sinais, a

identidade surda e os surdos (SKLIAR, 1998), os Estudos Surdos enfatizam a

importância da condição bilíngüe no desenvolvimento do sujeito surdo.

Na proposta bilíngüe de educação para os surdos, a língua de sinais, por ser

adquirida de forma natural4, é considerada sua primeira língua, enquanto a língua

4
Cabe destacar que, no âmbito de nossa discussão, “natural”, de acordo com SKLIAR (1998), “não
se refere a uma certa espontaneidade biológica. Língua natural, aqui, deve ser entendida como uma
língua que foi criada e é utilizada por uma comunidade específica de usuários, que se transmite de
geração em geração,e que muda - tanto estrutural como funcionalmente - com o passar do tempo.”
(p. 27)
23

majoritária do país onde o surdo está inserido deve ser considerada a segunda.

(PEDREIRA, 2006)

O modelo bilíngüe opõe-se à concepção de Surdez enquanto deficiência,

que se mostra, ainda hoje, presente nos pressupostos na área da educação de

surdos, estando atrelados à medicalização, objetivando exclusivamente a fala e

concebendo a linguagem de maneira reducionista e descontextualizada. Assim,

como afirma Pedreira “o/a aluno/a deixa de ser um/a paciente e passa a ser um

sujeito histórico e cultural”. (2006, p. 62)

Segundo Fernandes (1998) a língua de sinais, concebida numa modalidade

gestual-visual, apresenta-se como meio de realização das potencialidades

lingüísticas devido à falta de audição e que desse modo: “os surdos passam a ser

pessoas que, diferentemente dos ouvintes, apresentam uma forma própria e original

de organizar suas idéias e realizar sua comunicação.” (p. 26).

Atualmente algumas experiências de educação bilíngüe têm sido

demonstradas e discutidas em pesquisas (FERNANDES, 2003, APOLINÁRIO, 2005,

QUADROS, 2006a) como sendo o meio mais eficaz para o desenvolvimento do

sujeito surdo, considerando um novo olhar em torno da língua de sinais e do lugar a

ser ocupado pelo surdo na sociedade, sobretudo na esfera educacional.

De acordo com Quadros (1997): “o bilingüismo é uma proposta de ensino

usada por escolas que se propõem a tornar acessível à criança duas línguas no

contexto escolar.” (p. 27). A proposta bilíngüe toma como pressuposto a aquisição

da língua de sinais de forma espontânea e natural, no contato com outros usuários,

de modo que a língua portuguesa escrita (no caso do Brasil) seria considerada a

segunda língua do surdo. Além disso, a condição bicultural, como pontua Lopes

(2007), é outro eixo a ser considerado, pois os surdos “partilham de elos que os
24

posicionam de formas específicas, ora como surdos - quando estão na comunidade

surda-, ora como não ouvintes - quando estão entre ouvintes.” (p. 66).

Entretanto, diante do atual contexto, no qual se preconiza a educação

inclusiva, várias são as implicações a serem levadas em conta no processo

educacional do sujeito surdo. Cabe refletir sobre as possibilidades de o surdo ter

acesso a uma educação bilíngüe no ensino regular, o que está (ou não) sendo feito

para que esta condição seja efetivada. Dessa forma, serão considerados a seguir

alguns aspectos acerca da inclusão do surdo no ensino regular.

2.2 INCLUSÃO E SURDEZ: AVANÇOS E DESAFIOS

2.2.1. Um panorama geral da inclusão

Os debates em torno da inclusão educacional foram alavancados a partir

das definições estabelecidas na Declaração sobre a Educação para Todos e o Plano

de Ação para a Satisfação das Necessidades Básicas de Aprendizagem, aprovado

na Conferência Mundial de Educação para Todos, realizada em 1990, na Tailândia.

A proposta fundamental dessa conferência era estender a educação básica às

crianças, jovens e mulheres dos países em desenvolvimento, sob o ponto de vista

de igualdade para todos.

O reconhecimento político acerca das articulações em torno da inclusão

teve seguimento com a Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas

Especiais: Acesso e Qualidade, ocorrida na Espanha, em 1994, na qual se aprovou

a Declaração de Salamanca, com o objetivo de “promover a Educação para Todos

(...), capacitando realmente as escolas para atender a todas as crianças, sobretudo


25

as que têm necessidades educativas especiais.”. Este documento se define a partir

do princípio de integração e da promoção da igualdade, ou seja, todas as

instituições de ensino, a partir do reconhecimento das diferenças, devem promover e

atender as necessidades individuais dos alunos, sem distinção.

Porém, algumas críticas são atribuídas ao princípio da integração, pois

ainda que, a partir de seus pressupostos, fosse intencionada a socialização das

pessoas com deficiência, não foram estabelecidas mudanças na estrutura física, nas

práticas e programas de atendimento, de modo que o sujeito era considerado o

único responsável por sua adaptação. As possibilidades de atendimento estendiam-

se desde as classes comuns até locais específicos como escola especial e

instituição hospitalar. Assim, a inserção em um dos níveis de integração5 era

dependente das habilidades e aptidões de cada aluno (FERNANDES, 2007).

No Brasil, a idéia de integração tem continuidade com a resolução da

LDBEN/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), que além de reafirmar

a oferta de atendimento a crianças com necessidades especiais no ensino regular,

prescreve atendimentos especializados no próprio âmbito escolar. Ressalte-se que

esta mesma Lei, desde 1961, já mencionava a integração de sujeitos excepcionais

na sociedade, porém, apesar de nessa época estabelecer a idéia de igualdade, na

prática o aluno era considerado como único responsável por suas dificuldades,

tendo que se adaptar à escola e não o contrário (LAPLANE, 2006).

5
Níveis de integração: nível 1- classe regular sem apoio especializado, nível 2- classe regular com
apoio especializado, nível 3- classe regular com apoio especializado ao professor e aluno, nível 4-
classe regular com apoio especializado no contraturno, nível 5- classe especial com participação em
atividades gerais da escola, nível 6- escola especial, nível 7- apoio domiciliar, nível 8- ensino em
instituição ou centro hospitalar. (FERNANDES, 2007)
26

Foi somente em 2001 com a instituição das Diretrizes Nacionais para a

Educação Especial6 na Educação Básica, que a idéia da inclusão se manifestou, de

maneira que a responsabilidade de garantir as condições necessárias para uma

educação de qualidade para todos passou a ser atribuída à escola. Assim como

consta no art. 4º, inciso II do documento:

Art. 4º - Como modalidade da educação básica, a educação especial


considerará as situações singulares (...) de modo a assegurar:
(...)
II - A busca da identidade própria de cada educando, o reconhecimento e a
valorização das suas diferenças e potencialidades, bem como de suas
necessidades educacionais especiais no processo de ensino aprendizagem,
como base para a constituição e ampliação de valores, atitudes,
conhecimentos, habilidades e competências. (p. 01).

Dessa forma, a partir da referida lei, as instituições educacionais vêem-se

frente a um desafio, já que tal definição exige mudanças em todos os aspectos

escolares. A partir de então, coube às escolas organizarem-se para atender a todos

os alunos, considerando diferentes possibilidades e estratégias. Assim, segundo

Laplane (2006), a construção de um projeto pedagógico que leve em consideração a

heterogeneidade, o repensar sobre a função social da escola e o verdadeiro papel

do professor são aspectos fundamentais para a inclusão. Nessa nova visão não

basta, então, apenas propiciar a integração, ou meramente aceitar a inserção da

criança com necessidades educacionais no ensino regular, mas considerar a

bagagem cultural que cada uma traz consigo, levando em conta as diferenças, o

que, segundo Schneider (2006) “se realiza pelo resgate dos valores culturais,

6
De acordo com tais Diretrizes: “Por Educação Especial, modalidade da educação escolar entende-
se um processo educacional definido por uma proposta pedagógica que assegure recursos e serviços
educacionais especiais, organizados institucionalmente para apoiar, complementar, suplementar e,
em alguns casos, substituir os serviços educacionais comuns, de modo a garantir a educação escolar
e promover o desenvolvimento das potencialidades dos educandos que apresentam necessidades
educacionais especiais, em todas as etapas e modalidades da educação básica." (BRASIL, 2001)
27

principalmente daqueles que fortalecem a identidade individual e coletiva, bem como

pelo respeito ao ato de aprender e de construir.” (p. 14).

Sendo assim, teoricamente, a individualidade e as diferenças passam a ser

levadas em consideração, não bastando mais, apenas incluir o aluno no espaço

escolar, mas sim propiciar mudanças que pudessem atender a essas diferenças e

particularidades sem distinções. Em meio a este contexto, é que se discute

incessantemente a inclusão do aluno surdo no ensino regular (LIMA, 2004; SOARES

e LACERDA, 2004; SIILVA, 2005; PEDREIRA, 2006, SCHENEIDER, 2006), pois

mais do que adaptações físicas e estruturais, outras implicações devem ser

consideradas, sobretudo no que diz respeito a mudanças de concepções acerca da

surdez e da constituição do sujeito surdo.

2.2.2. O surdo na escola regular

A inclusão escolar dos alunos surdos tem se processado em meio a

divergências e desafios que vão além da superação de barreiras físicas e

adaptações curriculares. Os obstáculos relacionados às barreiras lingüísticas com as

quais estes alunos se deparam no ensino regular trazem à tona implicações e

imposições que demandam mudanças atitudinais e conceptuais.

Considerando esses aspectos algumas leis, ao serem estabelecidas,

destacam a relevância de se levar em conta os diferenciais lingüísticos no processo

educacional dos alunos surdos. Nesse intuito, a Declaração de Salamanca (BRASIL,

1994) afirma em um de seus pressupostos que:


28

As políticas educativas deverão levar em conta as diferenças individuais e


as diversas situações. Deve ser levada em consideração, por exemplo, a
importância da língua dos sinais como meio de comunicação para os
surdos, e ser assegurado a todos os surdos, acesso ao ensino da língua de
sinais de seu país. Face às necessidades específicas de comunicação de
surdos e de surdo-cegos, seria mais conveniente que a educação lhes
fosse ministrada em escolas especiais ou em classes ou unidades especiais
nas escolas comuns.

Em âmbito nacional, em consonância com os princípios políticos e filosóficos

que permearam a Declaração de Salamanca, a Resolução Nº 2, de 11 de setembro

de 2001 que institui as Diretrizes Nacionais para Educação Especial na Educação

Básica7 também destaca a importância da língua de sinais no acesso aos conteúdos

curriculares, ao afirmar que: ”Em face das condições específicas associadas à

surdez, é importante que os sistemas de ensino se organizem de forma que haja

escolas em condições de oferecer aos alunos surdos o ensino em língua brasileira

de sinais e em língua portuguesa (...)” (p. 45).

Convém considerar as contradições que se fazem presentes em tal

documento em relação à educação dos surdos, pois ao mesmo tempo em que

propõe a inclusão, traz a idéia de que os sistemas de ensino devem se organizar “de

forma que haja escolas em condições de oferecer aos alunos surdos o ensino em

língua brasileira de sinais e em língua portuguesa (...)”, o que pressupõe uma

educação bilíngüe em uma escola que possa efetivamente dispor dessa condição.

Levando em conta o fato de o reconhecimento da condição bilíngüe do

surdo estar presente nesse documento pode-se dizer, a priori, que o mesmo traz

uma representação de surdez não mais atrelada ao aspecto clínico, no entanto, é

preciso considerar que o próprio vem revestido de um discurso ligado à deficiência,

no qual perdura a inferência a atendimentos especializados que possam atender às

especificidades que não seriam efetivamente atendidas no ensino regular.

7
Resolução Nº. 02/2001 aprovada pelo Conselho Nacional de Educação
29

Contudo, essas novas posturas frente à surdez abrem caminho a outras

determinações legais que fortalecem o reconhecimento da língua de sinais em

âmbito nacional. A Lei Federal 10.436, de 24/04/2002, reconhece a Língua Brasileira

de Sinais (LIBRAS) no país, afirmando que o apoio ao uso e sua difusão sejam

garantidos por parte do poder público em geral e das empresas concessionárias de

serviços públicos. Antes disso, ainda, no estado do Paraná, a língua de sinais já

havia sido reconhecida oficialmente por meio da lei 12.095 de 11 de março de 1998.

De acordo com Fernandes (2003), com base no Relatório das ações

desenvolvidas pelo Departamento de Educação Especial - área da Surdez, nos anos

que antecederam o reconhecimento nacional da língua de sinais, o Estado do

Paraná desenvolveu iniciativas voltadas à educação de surdos levando em

consideração a condição bilíngüe, como cursos de Libras, formação de instrutores

surdos e intérpretes da língua de sinais, bem como reflexões acerca de questões

relativas ao currículo e à avaliação diferenciada na educação de surdos.

No entanto apesar de diversas iniciativas e das implicações legais

significarem uma conquista em relação ao reconhecimento da língua de sinais, não

foram estabelecidas providências a serem tomadas em outros aspectos, que não

apenas no seu reconhecimento, como, por exemplo, proporcionar aos sujeitos

surdos o acesso precoce a esta língua. Assim como afirma Fernandes (2003):

A língua de sinais, e sua utilização em diferentes círculos sociais, passou a


ser ‘tolerada’, sem ações sistematizadas mais efetivas que lhe atribuíssem
um espaço privilegiado, ao lado da Língua Portuguesa, nos diferentes
segmentos, com destaque à escola. De nada adiantará, portanto, termos o
respaldo legal de mais uma lei em favor das minorias se não houver
conseqüências para a vida social destes cidadãos. (p. 47)

Dessa forma, as discussões em torno da surdez enquanto diferença

lingüística continuam clamando por providências mais significativas a serem


30

adotadas com relação ao acesso à língua de sinais e ao desenvolvimento efetivo do

sujeito surdo por meio desta língua, apontando assim, sobretudo, para uma

educação bilíngüe (SKLIAR, 2001, FERNANDES, 2003). Em detrimento dessa

urgência em se estabelecer políticas significativas com relação ao reconhecimento

da diferença lingüística, é estabelecida, a partir do decreto 5.626 de 22 de dezembro

de 2005, a garantia a uma educação bilíngüe, diante da qual se reconhece a

importância da precocidade da língua de sinais na vida social do surdo. Sendo

assim, o decreto institui que “são denominadas escolas ou classes de educação

bilíngüe aquelas em que a Libras e a modalidade escrita da língua portuguesa sejam

línguas de instrução utilizadas no desenvolvimento de todo o processo educativo.”

(art. 22, par. 1).

Cabe levantar uma reflexão em torno de alguns pontos a serem

considerados neste decreto. Embora o mesmo traga explícito algumas

considerações com relação à surdez enquanto diferença cultural e experiência

visual, o que poderia ser considerado um ponto de vista sócio antropológico, ainda

deixa transparecer algumas marcas da visão clínica ao destacar aspectos referentes

à “reabilitação por equipe multiprofissional” (Cap. VIII, art. VI) e a obrigatoriedade de

atendimentos especializados.

O decreto 5.626/2005, em seu art. 14, prevê que, seja garantido às pessoas

surdas, obrigatoriamente: “(...) acesso à comunicação, informação e à educação nos

processos seletivos, nas atividades e nos conteúdos curriculares desenvolvidos em

todos os níveis, etapas e modalidades de educação, desde a educação infantil até a

superior.”. Para isso destaca a necessidade da presença do tradutor e intérprete nas

instituições de ensino, bem como a do instrutor de língua de sinais. Além disso, é


31

proposta a inserção da Libras (Língua Brasileira de Sinais) como disciplina curricular

em diversos cursos de formação em diferentes áreas do conhecimento.

É importante ressaltar que a presença do instrutor nas primeiras etapas do

ensino serve como um referencial para a construção lingüística e da identidade do

sujeito surdo e, sobretudo, para o contato precoce com a língua de sinais. Essa

presença seria/é um dos pontos fundamentais para que o processo de inclusão seja

efetivo, pois a partir disto o aluno teria possibilidades de ter uma língua constituída,

conceitos e conhecimento de mundo adquiridos.

Assim como as outras línguas, a língua de sinais passa por um processo de

constituição em que os conceitos e o conhecimento de mundo são construídos.

Dessa forma o acesso o mais cedo possível à língua de sinais é determinante. No

intuito de relevar tal questão, algumas secretarias de educação como a do Paraná

(Lei 12.095/98) e a de Santa Catarina (Lei 11.385/2000), já há alguns anos,

estabeleceram que fosse garantido o acesso à língua de sinais desde a Educação

Infantil. No caso do Estado do Paraná, que foi precursor nessa questão, estabelece

no artigo 2º da lei que:

A rede pública de ensino, através da Secretaria de Estado da Educação,


deverá garantir acesso à educação bilíngüe (Libras e Língua Portuguesa) no
processo ensino-aprendizagem, desde a educação infantil até os níveis mais
elevados do sistema educacional, a todos os alunos portadores de
deficiência auditiva.

Essa questão tem sido levada em consideração por algumas escolas, que

procuram colocar em seu quadro de professores um instrutor surdo. Sampaio

(2005), ao analisar a inclusão de uma aluna surda no ensino regular, juntamente

com o grupo de professores, percebeu que havia uma constante exclusão da aluna

dos contextos de sala de aula, o que levou o grupo a questionar a possibilidade da


32

presença, também, de uma professora surda em sala. Dessa forma, após o ingresso

da mesma no quadro de professores, várias mudanças foram percebidas, tanto com

relação ao desenvolvimento acadêmico quanto lingüístico da aluna, que passou,

assim, a ter um referencial, percebendo-se como sujeito capaz e competente. A

autora concluiu que a presença da professora surda foi fundamental: “mais do que

qualquer outra experiência vivida no cotidiano da escola foi crucial para que

começasse a se perceber como surda, pois foi o encontro surdo/surdo.” (p. 24).

Com base na pesquisa acima é possível perceber que, apesar de as

resistências presentes em muitos contextos escolares frente às diferenças, algumas

práticas já têm sido repensadas, de modo a buscar possibilidades e novos caminhos

em que a heterogeneidade seja levada em consideração. Ainda que sejam algumas

experiências isoladas merecem ser destacadas.

No entanto, apesar da obrigatoriedade da garantia do acesso precoce à

língua de sinais, é possível perceber que, geralmente, há um paradoxo entre o que

diz a lei e o que é estabelecido na prática. De acordo com Soares e Lacerda (2004),

a criança surda deve ter contato com outros surdos e não somente com ouvintes,

como se percebe que está ocorrendo com a proposta de inclusão, em que o surdo

está inserido num contexto onde tudo é pensado baseando-se na audição como via

de acesso aos conteúdos a serem abordados e explorados em sala de aula. As

autoras afirmam que a ausência da convivência com outros surdos pode dificultar a

construção de identidade, tendo em vista que esse contato é que lhe possibilitará a

percepção dos modos de agir, pensar, comportar-se e posicionar-se diante de

diferentes contextos.

Diferentemente da criança ouvinte, que desde cedo têm contato com a

linguagem oral, a criança surda está inserida num contexto onde as interações
33

lingüísticas não são compartilhadas, considerando que 95% são filhas de pais

ouvintes, os quais, em geral, desconhecem ou rejeitam a língua de sinais. (SKLIAR,

1997). A falta de contato com adultos que compartilhem de uma mesma língua pode

significar uma desvantagem no desenvolvimento educacional da criança surda.

É importante destacar que é através da família que o alicerce da

personalidade do sujeito é construído, de forma que o desenvolvimento da criança

surda é também, em grande parcela, de responsabilidade familiar. Como afirma

Schneider (2006): “A escola sozinha não pode dar conta da educação de todos e,

particularmente, dos alunos surdos se não contar com a participação da família,

pois, se quiser desenvolver uma educação emancipadora, deve-se considerar o

mundo da vida da criança” (p. 176).

Em pesquisa realizada Schneider (2006), ao referir-se à visão dos pais,

constatou que apesar de os mesmos destacarem a importância da língua de sinais

no processo escolar de seus filhos, demonstraram não fazer uso da mesma, o que

se reflete em uma das principais dificuldades do surdo: a falta de referenciais para o

desenvolvimento de um processo de identificação e aquisição da língua de sinais.

Além disso, a autora pôde perceber, na narrativa dos pais, que há uma negação

com relação às dificuldades enfrentadas pelos filhos no ensino regular.

Outro ponto a ser discutido com relação ao processo de inclusão do surdo

diz respeito à presença do intérprete da língua de sinais em sala de aula. Segundo

Quadros (2006a), ao se referir à questão do intérprete, pode-se perceber que esta

não tem sido uma proposta bem aceita, sobretudo, por representar um gasto

oneroso, considerando que seria necessário disponibilizar este profissional ainda

que haja apenas um aluno surdo em sala. Fato esse que traz à tona

questionamentos e divergências de opiniões.


34

Lacerda, ao realizar uma pesquisa em uma sala de aula do ensino regular,

(2006) também destaca algumas questões que refletem as contradições que se

fazem presentes no processo de inclusão do aluno surdo. Tal pesquisa

desenvolveu-se a partir de entrevistas com intérpretes, professores e alunos (surdos

e ouvintes) de uma quinta série. Os depoimentos, tanto dos professores, quanto dos

alunos ouvintes, revelaram uma visão satisfatória com relação à inclusão do surdo,

no entanto, numa análise mais aprofundada desses depoimentos a autora constata

que há, na verdade, um desconhecimento acerca dos aspectos relacionados à

surdez, o que ocasiona um ofuscamento da realidade e certo contentamento com a

situação.

Já os depoimentos das intérpretes, segundo a autora, demonstraram

insatisfação, sobretudo com relação ao lugar que lhe é dado no espaço escolar,

visto que os professores não reconhecem a real função do profissional. Revelam,

ainda que, a escola, em geral, não compreende o aluno surdo, nem reconhece os

aspectos relacionados à surdez. Já no que diz respeito aos depoimentos dos surdos,

Lacerda refere que os mesmos se contentam com a situação, apesar de revelarem

não se relacionar diretamente com os professores e estão sempre acompanhados

por um adulto. Segundo a autora, o aluno surdo “por não conhecer outra realidade

mostra-se adaptado a esta situação. Como não conhece algo diferente, acredita que

esta convivência seja plena e se satisfaz com ela.” (ibid., p. 173).

O estudo demonstrou que a presença do intérprete em sala de aula pode

minimizar alguns aspectos relacionados à língua de sinais, porém não é suficiente

para garantir uma inclusão satisfatória. A desinformação, o desconhecimento sobre

a surdez e sobre os modos de atendimentos ao aluno surdo é freqüente, sobretudo

por parte dos professores. Além disso, outras questões são desconsideradas, como
35

por exemplo, as adaptações e reformulações nos modos de planejar, interagir e

avaliar, o que torna a idéia de inclusão contraditória. Acerca disso Guarinello (et al.,

2008) pontuam que “a presença do intérprete não assegura que questões

metodológicas particulares de cada escola sejam consideradas, ou ainda que o

currículo aborde peculiaridades e aspectos culturais da comunidade surda.” (p. 67).

Lima (2004) observou o processo de inclusão de alunos surdos em duas

escolas públicas do ensino regular. A autora pôde observar que as escolas

apresentam projetos de inclusão8 voltados a todos os alunos que apresentam

necessidades educacionais especiais. No que diz respeito ao alunado surdo, esses

projetos promovem a presença de professor especializado juntamente com o

professor regente em sala, a fim de assessorar o aluno sempre que necessário e lhe

prestar atendimento individualizado em período no contraturno. Além do professor

especializado, buscam garantir a presença de instrutores surdos e intérpretes de

língua de sinais, além de outros profissionais.

No entanto, apesar de haver uma busca da legitimação das propostas de

inclusão determinadas ao longo deste século, a autora pôde perceber, a partir de

argumentos presentes nas vozes dos profissionais envolvidos no processo, “um

desejo quase obsessivo de prestar assistências terapêuticas, pedagógicas e

cariativas ao sujeito que não se encaixam, não se adaptam ou não correspondem

aos padrões previamente estabelecidos pela sociedade.” (ibid., p. 177). A partir

disso a autora concluiu que o modelo de medicalização da deficiência ainda se faz

presente em algumas práticas escolares, diante do fato de que os sujeitos são

considerados a partir da deficiência.

8
Os projetos de inclusão referidos na pesquisa dizem respeito a um programa de apoio escolar que
tem como objetivo atender os alunos com necessidades educativas especiais.
36

Lima (2004) destaca ainda que, as escolas observadas visam desenvolver

uma proposta bilíngüe, a fim de possibilitar ao surdo o acesso aos conteúdos em

língua de sinais. No entanto, como referido pela mesma, no decorrer da pesquisa, foi

possível verificar que ao se propor uma educação bilíngüe, vários entraves deixam

de ser levados em conta (familiares, educacionais, sociais, econômicos, políticos e

culturais), além disso, não há uma clareza a respeito das línguas envolvidas no

processo de escolarização do surdo. O conhecimento em torno dos aspectos ligados

ao surdo e à língua de sinais não é visto como ponto a ser considerado, e por isso

estas questões são desconhecidas por grande parte dos profissionais envolvidos.

É fato que as escolas observadas pela autora estão contemplando a

inclusão, porém, não há um reconhecimento acerca de questões que vão além do

não ouvir. Apesar de haver uma proposta de educação bilíngüe não há um

entendimento sobre em que implica e o que significa o surdo ser bilíngüe. Não se

considera a diferença entre os diferentes, pois a “clientela” beneficiada pelo

programa, assim como retratado pela autora, é composta por alunos surdos, cegos,

poliomielíticos, paralíticos cerebrais, paraplégicos, que são percebidos a partir de

uma mesma visão, não sendo consideradas as particularidades de cada um, como

se fossem diferentes dos demais alunos, mas iguais entre si, por terem algo em

comum: as necessidades educacionais especiais. A singularidade é vista a partir da

deficiência e não de cada sujeito.

Ao propor a inclusão seria necessário, então, levar os profissionais a

perceberem as questões pertinentes aos sujeitos envolvidos, o modo pelo qual se

apropriam do conhecimento, sua maneira de constituir a linguagem e suas

particularidades que vão além da deficiência.


37

Outras pesquisas, ainda, revelam uma série de dificuldades enfrentadas pelo

surdo no contexto inclusivo. Borges (2004) constatou, em pesquisas realizadas com

surdos inseridos no ensino médio, que a comunicação no ensino regular, para eles,

é restrita, o que reduz as possibilidades de interação e leva alguns surdos a darem

preferência à escola especial, já que nesta as oportunidades de comunicação são

maiores. Porém, o reconhecimento da escola regular como mais adequada, é

apontado pelo fato de que, é nesta que o surdo tem acesso aos conteúdos

acadêmicos e oportunidades que o favorecerão futuramente. Concordando com

essa autora, Botelho (2002) e Angelides e Aravi (2006/2007) referem que no ensino

regular oportuniza-se ao surdo um nível acadêmico mais elevado e melhores

oportunidades de acesso ao currículo em relação às escolas especiais.

Esse é mais um aspecto que gera discussões e controvérsias, tanto entre

educadores e pesquisadores, quanto entre os pais, ao refletir onde serão

proporcionadas melhores possibilidades de desenvolvimento do sujeito surdo: na

escola especial ou na escolar regular. Não é a intenção aqui levantar discussões

entre qual o local mais adequado para a formação acadêmica do surdo, mas alçar

alguns pontos que se mostram pertinentes no que diz respeito às possibilidades

oportunizadas ou não no ensino regular.

A partir de uma pesquisa realizada com um grupo de professores do Estado

do Paraná, Guarinello (et al., 2006) retratam as dificuldades do aluno surdo em sala

de aula no ensino regular, do ponto de vista dos professores. Tal pesquisa revelou

que as maiores dificuldades do surdo dizem respeito, segundo os professores

entrevistados, em maior percentual, à elaboração, compreensão e interpretação

textual. A interação, o despreparo dos professores e a falta de intérprete também

foram apontados. Além disso, o desconhecimento acerca da surdez e de suas


38

implicações pôde ser constatado. Fato esse que exerce um papel fundamental no

processo de ensino-aprendizagem, já que o desconhecimento pode gerar atitudes e

pré-conceitos que irão interferir constantemente nas interações, podendo suscitar

discursos equivocados e de insatisfação com relação ao aluno e à surdez.

É possível perceber que há uma carência no que diz respeito à real

concretitude do respeito à diversidade. Torna-se necessário articular possibilidades

de ensino-aprendizagem considerando efetivamente a diferença em todos os

aspectos. Não basta apenas reconhecer a existência da diferença e do pluralismo

cultural, mas oportunizar programas de educação bilíngüe nos quais, assim como

pontua Fernandes (2003), “todas as vozes tenham o seu lugar de valorização e

reconhecimento.” (p. 39).

Fernandes (2003) ressalta que “um programa de educação bilíngüe não se

sustenta apenas pela mera constatação da necessidade de um trabalho que envolva

duas línguas no processo educacional.”, há outras questões éticas e políticas que

devem ser levadas em consideração. Nesse sentido a autora destaca algumas

implicações que devem permear o processo educacional dos surdos:

a) a aceitação dos surdos como grupo que constrói aspectos de sua


identidade lingüística e cultural pelo uso de uma língua natural- a língua de
sinais- tal como outros grupos étnicos minoritários;
b) o reconhecimento do estatuto cientifico da língua de sinais e sua
incorporação à agenda de discussões políticas públicas nacionais ao
currículo escolar;
c) a superação da perspectiva clinica na educação de surdos, o que os
submeteu/submete a uma pedagogia terapêutica nas praticas escolares;
d) o reconhecimento do espaço prioritário dos adultos e profissionais
surdos no processo educacional, favorecendo a formação da identidade das
crianças e a vivência de aspectos culturais da comunidade surda;
e) o estabelecimento de uma política de formação inicial e continuada de
professores, em nível nacional, que contemple a questão da pluralidade
cultural presente na escola;
f) o domínio efetivo da língua de sinais por parte dos professores de
surdos, em sua maioria ouvintes, necessário ao encaminhamento de
questões essenciais à prática pedagógica como é o caso do aprendizado da
Língua Portuguesa, por exemplo.
39

É fato que alguns desses aspectos já têm sido privilegiados no âmbito de

propostas políticas, sobretudo a partir do decreto 5626/05, já citado anteriormente.

Entretanto, diante das discussões sobre experiências de inclusão, é possível

perceber que ao se propô-la, muitas questões deixaram de ser levadas em

consideração, sobretudo no que diz respeito às diferentes maneiras de se conceber

o sujeito surdo e de como este se constitui, o que implica a desconsideração às

diferenças. Dessa forma, se a questão da identidade for realmente levada em

consideração, as metodologias, as abordagens educacionais e as atitudes devem

ser repensadas. As justificativas de dificuldades com relação à inclusão do aluno

surdo no ensino regular, ao restringir-se apenas no desconhecimento da língua de

sinais, camuflam as verdadeiras barreiras e dificuldades a serem afrontadas frente

às diferenças. Assim como afirma Quadros (2006a) “(...) a situação bilíngüe dos

surdos está posta. No entanto, os espaços de negociação precisam ser

instaurados.” 9 (p. 21-22).

Diante das atuais discussões e pesquisas no campo da Educação de Surdos

é possível perceber que a proposta bilíngüe tem se mostrado como sendo a mais

satisfatória e capaz de contemplar as necessidades lingüísticas e sociais do surdo

(QUADROS, 2006b, FERNANDES, 2003, PEIXOTO, 2006). Porém não basta

somente definir leis e aceitar a inserção do aluno surdo em sala de aula, mas refletir

sobre novas propostas e concepções que privilegiem o processo de ensino

aprendizagem com vistas as suas diferenças e particularidades, possibilitando-lhe a

compreensão dos conteúdos de modo significativo, inserindo-o de fato nos contextos

lingüísticos de sala de aula. Ainda que falte ao professor o conhecimento em língua

9
Quadros (2006a) refere-se aos espaços de negociação como sendo o reconhecimento do outro nas
discussões e nas tomadas de decisões: ”os espaços de negociação tornam-se possíveis quando o
outro passa a ser um eu no espaço compartilhado, sendo ao mesmo tempo, o outro diante do outro
eu traduzindo-se nas alteridades que convivem umas com as outras.” (p. 22)
40

de sinais, e que a língua seja um fator de extrema importância no estabelecimento

de relações, torna-se necessário a busca de alternativas e recursos que privilegiem

as diferentes maneiras de compreender e constituir conceitos, levando em conta a

heterogeneidade em sala de aula.

De fato, especificamente em âmbito nacional, algumas propostas já foram

estabelecidas em documentos anteriores relacionados à educação inclusiva

(BRASIL, 2000; Brasil 2001; BRASIL, 2006), como adaptações curriculares e de

acesso ao currículo, que dizem respeito aos ajustes graduais que devem ser

contemplados no planejamento escolar e pedagógico, levando em conta as

especificidades e as diferenças presentes no meio escolar. Em outro documento

(BRASIL, 2005b, p. 97) foi proposto, em nível nacional, a flexibilização curricular,

que diz respeito à construção do currículo “a partir do movimento e da dinâmica da

escola e não de um conjunto fechado de possibilidades, decididas previamente (...)”.

Ou seja, a adaptação dá lugar à flexibilização.

No entanto, na prática faz-se necessário uma mudança real, desde o projeto

pedagógico da escola até os critérios de avaliação, já que estes foram,

tradicionalmente, pensados a partir de uma visão homogênea de sala de aula, como

se todos os alunos se desenvolvessem da mesma maneira e ao mesmo tempo,

assim como em uma linha de montagem, como é apontado por Alves (2006) ao

comparar o processo de escolarização a um processo de produção, onde cada peça

deve seguir os moldes de uma peça padrão:

Nossas escolas são constituídas segundo o modelo das linhas de


montagem. Escolas são fabricas organizadas para a produção de unidades
biopsicológicas móveis, portadoras de conhecimento e habilidades. Esses
conhecimentos e habilidades são definidos por agências governamentais a
que se conferiu autoridade para isso. Os modelos estabelecidos por tais
agências são obrigatórios e têm força de leis. Unidades biopsicológicas
móveis que, ao final do processo, não estejam de acordo com tais modelos
são descartadas. É sua igualdade que atesta a qualidade do processo. Não
41

havendo passado no teste da qualidade-igualdade, elas não recebem os


certificados de excelência ISSO-12.000, vulgarmente denominados
diplomas. As unidades biopsicológicas móveis são aquilo que vulgarmente
recebe o nome de “alunos”. (p. 36)

Nessa comparação o autor conduz a uma reflexão acerca dos modelos

estabelecidos na educação, que se analisados tornam a inclusão um processo

inviável, já que esta prevê que as diferenças sejam levadas em consideração, o que

só é possível se o processo educacional for estruturado a partir de uma ótica onde a

heterogeneidade seja contemplada, desvinculando-se das propostas estabelecidas

em outros tempos. Diante dessas reflexões e das pesquisas já desenvolvidas pode-

se perceber que, no caso dos alunos surdos, apesar das exigências legais da

inclusão, as propostas continuam sendo pensadas somente para os ouvintes, de

modo que o modelo de escola existente foi concebido levando em conta as

semelhanças e não as diferenças, fator este que se contrapõe às idéias de inclusão.

Assim, cabe à escola refletir sobre novas posturas a serem adotadas com relação à

inserção do aluno surdo no ensino regular. Acerca disso, Favorito (2006) afirma que:

Não é possível mudar a escola sem romper com as concepções de surdez


como anormalidade, falta, deficiência que levaram a uma pedagogia que
pretende combater supostas limitações dos alunos sempre pensados pelo
que não podem realizar e não para instituí-los de fato por meio de
conteúdos curriculares.
É necessário reconhecer o fracasso da educação especial e das
representações legitimadas por ela e promover uma reconceptualização da
surdez. (FAVORITO, 2006, p. 85).

Strobel (2006) traz uma reflexão acerca das condições propiciadas à criança

surda no atual contexto da inclusão em relação à identidade surda, considerando a

falta de contato com adultos surdos. Dessa forma a autora destaca a escola de

surdos como uma outra possibilidade de educação, não restringindo sua

escolarização à escola regular.


42

Isso significa que a questão vai muito além de implicações lingüísticas, há

necessidade de garantir um espaço em que os próprios surdos possam representar-

se e narrar-se como sujeitos, identificando-se com seus pares, participando dos

debates e da produção construídos histórica e socialmente pelas comunidades

surdas (FAVORITO, 2006, p. 90).

Concretizar de fato a inclusão não é tarefa fácil, entretanto, é uma realidade

que urge em ser efetivada, pois está inserida num contexto social no qual se busca a

equiparação dos direitos e o reconhecimento das diferenças. Sendo assim, torna-se

fundamental que o educador, tanto no ensino regular, quanto nos serviços de apoio

especializado, reflita sobre sua prática em sala de aula e sua contribuição para a

efetivação da inclusão. Diante disso, Schneider (2006), defende que:

(...) seja oferecido ao aluno surdo um ambiente em que a língua de sinais


possa ser adquirida, desenvolvida e usada de forma natural e espontânea
pelos surdos; que a educação regular deve oferecer condições (currículo
adequado, serviços educativos e de apoio, professores de língua de sinais,
etc.) que garantam a sua escolarização com qualidade. (p. 116)

No que diz respeito aos atendimentos especializados assegurados

legalmente em concomitância com o ensino regular, será destacado aqui o Centro

de Atendimento Especializado na área da Surdez (CAES), que diante da proposta

de inclusão desenvolve um importante papel e torna-se relevante. Serão realizadas

discussões acerca das suas funções e alguns aspectos desde a sua implantação até

os dias de hoje, de modo a ressaltar o lugar que foi e é dado ao aluno em cada

momento, as diferentes maneiras de desenvolvimento das propostas de trabalho

com o aluno e como o CAES se estabelece frente à proposta de inclusão. É

importante destacar que o CAES diz respeito a um programa existente no estado do

Paraná, uma vez que na legislação nacional é contemplada a sala de recursos.


43

2.3 O CENTRO DE ATENDIMENTO ESPECIALIZADO NA ÁREA DA SURDEZ

(CAES): FORTALECENDO A INCLUSÃO

A Lei 9394/96, em seu artigo 4º, inc. III faz menção ao “atendimento

educacional especializado gratuito aos educandos com necessidades especiais,

preferencialmente na rede regular de ensino”. No Capitulo V, destinado à Educação

Especial, em seu artigo 58, parágrafo 1º estabelece que: ”Haverá, quando

necessário, serviços de apoio especializado na escola regular, para atender às

peculiaridades da clientela da Educação Especial”. Ainda, menciona que deverão

ser assegurados a esses educandos, professores especializados para o

atendimento especializado e professores capacitados no ensino regular.

É diante dessas propostas e de outras documentações legais que já haviam

sido manifestadas, como a Declaração de Salamanca10, que foram implantados

alguns atendimentos especializados, a fim de subsidiar o ensino regular e

desenvolver propostas que levem em consideração às especificidades do aluno,

como é o caso das salas de recursos11 e das classes especiais12.

A partir dessas modificações no estado do Paraná, em relação à área da

surdez, ainda anteriormente ao movimento de inclusão, no final da década de 80, foi

institucionalizado o CAEDA (Centro de Atendimento Especializado em Deficiência

auditiva), hoje CAES, visando o atendimento especializado em horário contraturno.

10
Documento aprovado na Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais: Acesso e
Qualidade, ocorrida na Espanha, em 1994, com o objetivo de propor a promoção de Educação para
todos, enfatizando o atendimento educacional a todas as crianças, sobretudo às que têm
necessidades educativas especiais.
11
As Salas de Recursos destinam-se à complementação da escolarização dos alunos com
necessidades especiais, em horário contrário ao do ensino regular, sendo as mesmas equipadas com
recursos técnicos, materiais e tecnológicos. (FERNANDES, 2007)
12
São salas de aula organizadas no mesmo espaço da escola regular, que, geralmente, atendem a
alunos com casos graves de deficiência mental ou múltipla, com defasagem considerável
(idade/série) ou limitações que dificultem o desenvolvimento do currículo em classe comum. São
organizadas em série/ciclo/etapa, utilizando recursos, métodos e técnicas especializados.
44

Dessa forma o aluno teria a possibilidade de freqüentar o ensino regular e em outro

turno o atendimento especializado.

Especificamente ao CAEDA, considerado nesta pesquisa13, quando

implantado, em 1999, tinha como objetivo principal proporcionar estratégias de

reabilitação voltadas ao desenvolvimento da fala, à leitura labial e ao treinamento

auditivo, já que a concepção que permeava a educação de surdos era baseada nos

princípios da abordagem oralista. Exercícios repetitivos e impostação de fonemas

eram tidos como ponto de partida para se chegar ao principal objetivo: a fala.

Bastidores14, espelho, bolinhas de isopor, fichas com palavras isoladas, etc.,

compunham os materiais disponibilizados para o trabalho.

De acordo com Dorziat (1997) as metodologias baseadas no Oralismo eram

predominantes nos cursos de formação de professores para atuação em instituições

especializadas para surdos, incluindo os CAEDAs, enfatizando-se as seguintes

técnicas:

O treinamento auditivo: estimulação auditiva para reconhecimento e


discriminação de ruídos, sons ambientais e sons da fala;
O desenvolvimento da fala: exercícios para a mobilidade e tonicidade dos
órgãos envolvidos na fonação (lábios, mandíbula, língua etc), e exercícios
de respiração e relaxamento (chamado também de mecânica de fala);
A leitura labial: treino para a identificação da palavra falada através da
decodificação dos movimentos orais do emissor. (p. 300) (grifo da autora)

Toda essa prática realizada pelos profissionais que trabalhavam nos

CAEDAs partia da idéia de que o surdo só poderia apropriar-se dos conhecimentos

a partir da linguagem oral. Desta forma, assumia-se uma abordagem clínica frente

13
O CAEDA, hoje CAES, é um programa institucionalizado no estado do Paraná, implantado em
diversos municípios. Esta pesquisa trata especificamente da realidade de um CAES localizado na
região metropolitana de Curitiba.
14
Instrumento em forma de círculo envolvido por um tecido fino e escuro, utilizado para trabalhar o
residual auditivo do aluno (treinamento auditivo). O professor colocava o bastidor em frente a sua
boca para que o aluno pudesse identificar auditivamente o que estava sendo pronunciado (por
exemplo: sílabas: PA PA PA, palavras: PATO, etc).
45

às propostas a serem desenvolvidas, vinculada a conceitos de medicalização, onde

métodos e técnicas corretivas eram tidos como base. Acerca disso Limeira de Sá

(1999) afirma que “o fato de ser considerado uma abordagem ‘clínica’ decorre de

que a oralização do surdo (...) é muitas vezes mais enfatizada do que os objetivos

educacionais como um todo (...)” (p. 79).

É importante considerar aqui a idéia construída a partir de uma visão

estruturalista em que a escrita é uma representação da fala, o que justificaria essa

prática em relação à oralidade, pois se pressupunha que somente a partir de quando

o aluno surdo tivesse um domínio da oralidade, poderia apropriar-se da escrita, por

isso o trabalho com a fala precedia qualquer trabalho com a escrita. De acordo com

MARCUSCHI (2005) a escrita não pode ser vista como uma representação da fala,

pois são práticas e usos da língua com características próprias.

Skliar (1997) destaca a representação patológica acerca da surdez e dos

surdos, diante da qual os mesmos são definidos por suas características negativas e

consequentemente “(...) considerados doentes reabilitáveis e as tentativas

pedagógicas são unicamente práticas reabilitatórias derivadas do diagnóstico

médico cujo fim é unicamente a ortopedia da fala.” (p. 113). É importante destacar

que, ainda que as pesquisas e os autores refiram-se a estas concepções como

sendo adotadas pelas escolas especiais, como é possível encontrar em Skliar

(1997), Limeira de Sá (1999), Ferreira Brito (1993), foi esta mesma visão que se

estabeleceu nos Centros de Atendimentos.

Desta forma, aos professores do Centro era proposta a elaboração de

atividades que tivessem como ponto de partida a deficiência do aluno. Lane (1992)

define o trabalho do educador, nesse aspecto, como clínico, pois destaca que sua

tarefa “não é educar, é encontrar um tratamento educacional para aquilo que o


46

otologista e o audiologista não conseguiram tratar: o insucesso da criança em

aprender o inglês (leia-se português). Foi identificada uma diferença, mas começa-

se uma intensa campanha para acabar com ela.” (p. 39).

É possível levantar algumas reflexões acerca da concepção de linguagem

em que se fundavam as práticas pedagógicas: ao mesmo tempo em que era

passível de uma aquisição sistemática, reduzia-se à fala, baseando-se em métodos

e treinamentos fono-articulatórios como pressupostos para sua aquisição. Não se

discutiam questões relacionadas à linguagem enquanto fator social e constitutivo do

sujeito:

A linguagem é um ato fisiológico na qual participam muitos órgãos do corpo


humano e que pressupõe a atividade voluntária do espírito (... ).
O trabalho do professor de surdos é, como se pode deduzir, muito árduo e
muito meticuloso; enquanto o professor de crianças normais inicia o seu
trabalho empregando métodos que se concentram num sentido mais de
extensão que de profundidade, o professor de deficiente auditivo tem que
cuidar inicialmente com profundidade maior que em extensão, do
desenvolvimento das técnicas fundamentais de ensino primário associadas
ao treinamento da leitura da fala (para compreensão do que se lhe disser) e
da fala, mesmo porque o desenvolvimento mental da criança só poderá
efetivar-se com a participação da fala. Quando a criança desenvolve o poder
de elaborar uma idéia geral e específica de pensar “através” das palavras
interiorizadas ou “não vocalizadas” e expressá-las oralmente por meio da
necessária e complexa coordenação física, ela desenvolve um ato altamente
intelectual. (GUIMARÃES, 1981, p. 04).

O modo de conceber a surdez sob uma visão patológica, em que a

deficiência representa um obstáculo a ser superado, denotava um propósito de

reabilitação presente nos encaminhamentos a serem adotados no trabalho

pedagógico. Questões relacionadas à surdez enquanto uma diferença a ser levada

em consideração não ocupavam espaço algum.

É preciso considerar aqui que, todas estas maneiras de conceber o espaço

educacional destinado ao aluno surdo sob o propósito da reabilitação traduzem o

contexto educacional da época e a maneira de perceber a surdez e a constituição do


47

aluno enquanto sujeito, da mesma forma que refletem em que concepções de

linguagem o trabalho do professor e o lugar concebido ao aluno como sujeito

estiveram fundamentados.

Tendo como pressuposto o desenvolvimento de atividades terapêuticas, as

questões pedagógicas eram deixadas de lado. Fator este que teve grande

representatividade no fracasso educacional dos alunos surdos que se encontravam

inseridos no ensino regular, o que reflete ainda o holocausto lingüístico, cognitivo e

cultural a que os surdos estiveram submetidos (SKLIAR, 1998).

Entretanto, diante das discussões que começaram a suscitar em torno da

educação de surdos e das propostas de educação inclusiva, em que as diferenças

são celebradas no contexto do ensino regular e, sobretudo, após o reconhecimento

da língua de sinais, surgem novas perspectivas e os Centros de Atendimento

começaram a ser considerados sob a necessidade de desenvolver propostas

voltadas ao efetivo desenvolvimento do aluno surdo, priorizando os aspectos

pedagógicos e não mais as propostas terapêuticas e reabilitadoras. Tais mudanças

ganham seus primeiros contornos começando pela substituição terminológica de

CAEDA por CAES (Centro de Atendimento/Apoio Especializado na área da Surdez),

o que representa uma alteração não apenas no termo, mas uma mudança na

maneira de conceber a surdez e o ensino.

É importante considerar o contexto político que permeia esses

acontecimentos no estado do Paraná. Em 1998, o estado do Paraná é precursor no

reconhecimento da Língua Brasileira de Sinais, concomitantemente pesquisadores e

movimentos surdos levantam discussões acirradas em torno da necessidade de se

estabelecer uma política voltada ao reconhecimento do sujeito surdo a partir da

diferença. De acordo com Fernandes (2003) no período de 1995-2002 foram


48

publicadas várias teses e dissertações discutindo a necessidade de se repensar a

educação de surdos.

O aluno surdo começou a ser percebido não mais a partir da deficiência,

mas sim das possibilidades de constituir-se de modo diferente. Os aspectos

terapêuticos, diante dos quais o aluno dispensava um tempo árduo e longo, deram

lugar aos aspectos pedagógicos, visando a constituição do sujeito a partir de

possibilidades de construção do conhecimento, considerando sua maneira de

conceber esse conhecimento. Além disso, a língua de sinais começou a ganhar um

lugar privilegiado.

O CAES está de acordo com as atuais discussões em torno das funções da

escola enquanto espaço significativo de aprendizagem e de promoção à igualdade e

valorização das diferenças, nesse espaço novas propostas que estão de acordo com

o documento de Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da

Educação Inclusiva, passaram a ser consideradas:

A Educação Especial, como parte da prática educacional inclusiva, oferta o


atendimento educacional especializado, organizando recursos pedagógicos
e de acessibilidade que eliminem as barreiras e possibilitem o acesso ao
currículo, à comunicação e aos espaços físicos, considerando as
necessidades de cada aluno, promovendo a sua formação integral com
vistas à autonomia e independência. (BRASIL, 2007, p. 15) (grifo meu).

Cabe ressaltar que muitas mudanças ocorreram, e ainda estão ocorrendo,

até que suscitasse esse novo modo de desenvolver um atendimento voltado aos

aspectos pedagógicos dos surdos. No entanto, como defende Santana (2007) “fazer

que a surdez passe de doença à diferença não é uma simples mudança de ponto de

vista; para isto é necessário estabelecer novas normas, o que não é imediato, já que
49

implica mudanças sociais decorrentes da alteração dos padrões ao longo da

história.” (p. 32).

Nesse sentido diversas mudanças nos encaminhamentos e nas

metodologias a serem adotadas já foram instituídas e outras estão sendo

constituídas. As propostas voltadas ao atendimento terapêutico não se fazem

presentes desde o inicio desta década, já que passaram a ser enfatizadas as

propostas pedagógicas. A leitura e a escrita passam a ser o verdadeiro foco,

sobretudo, levando em conta a inclusão do aluno surdo no ensino regular e,

sobretudo suas práticas sociais.

Em nível nacional o documento de Política Nacional de Educação Especial

na Perspectiva da Educação Inclusiva (2008) destaca que:

O atendimento educacional especializado é ofertado, tanto na modalidade


oral e escrita, quanto na língua de sinais (...) O atendimento educacional
especializado é realizado mediante a atuação de profissionais com
conhecimentos específicos no ensino da Língua Brasileira de Sinais, da
Língua Portuguesa na modalidade escrita como segunda língua (...)15

De acordo com Fernandes16 o Centro de Atendimento Especializado tem

como objetivo: “complementar o atendimento educacional comum, por meio do

desenvolvimento de uma proposta de educação bilíngüe - Libras/Língua Portuguesa

- para surdos”. Em 2008 a Secretaria de Estado da Educação do Paraná expede a

instrução nº. 002/2008 que estabelece critérios para o funcionamento do Centro de

Atendimento Especializado na Área da Surdez (CAES), serviço de apoio

especializado no ensino regular e define o CAES como “serviço de apoio

pedagógico especializado, para alunos surdos, que funciona em estabelecimento do

15
Documento elaborado pelo Grupo de Trabalho nomeado pela portaria nº 555/2007, prorrogada pela
portaria nº 948/2007, entregue ao ministro da educação em 07 de janeiro de 2008.
16
Fonte, disponível em: http://www.seed.pr.gov.br/portals/portal/institucional/dee/dee_surdez.
50

ensino regular da Educação Básica, com oferta de Ensino Fundamental das redes:

estadual, municipal e particular de ensino.”. A instrução estabelece, ainda, algumas

considerações com relação a funcionamento, alunado, finalidade, organização e

outros (anexo 3).

Convém destacar que esta instrução difere do documento de Política

Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, citado

anteriormente, no sentido de que este pressupõe, também, o ensino do português

oral nos atendimentos especializados ao aluno surdo, enquanto que na instrução é

previsto que a principal finalidade do CAES, enquanto atendimento especializado, é

a garantia do ensino da Libras e da língua portuguesa escrita como segunda língua

para surdos, destacando:

A oferta do atendimento a alunos surdos matriculados nas diferentes


etapas da Educação Básica (Educação Infantil, Ensino Fundamental e
Médio) ou na modalidade de Educação de Jovens e Adultos, por meio da
proposta de Educação Bilíngüe – Língua Brasileira de Sinais (Libras) e
Língua Portuguesa escrita, para o acesso ao conhecimento formal e à
aprendizagem. (grifo meu)

No que diz respeito ao português oral a instrução 002/2008 propõe que

sejam dados, por parte do professor do CAES, encaminhamentos necessários em

relação ao atendimento fonoaudiológico para o seu aprendizado, caso seja a opção

da família ou do aluno.

Como é possível perceber, estes documentos pressupõem que, no contexto

da inclusão, seja garantida ao aluno surdo uma possibilidade para que o mesmo

tenha acesso ao ensino da língua portuguesa e da língua de sinais. Neste caso, qual

seria então a função do ensino regular para o surdo? Não é este o local que, por

excelência, trata de questões relacionadas à aquisição e compreensão em torno da

língua? Pode-se considerar então a hipótese de que os atendimentos especializados


51

se consolidam pelo fato de que não há possibilidades suficientemente eficientes

para que o surdo possa desenvolver suas competências no ensino regular, o que

seria uma contradição com a idéia de inclusão, que preconiza as especificidades de

cada aluno.

É fato que, diante do atual contexto, em que a inclusão é preconizada em

todos os sentidos o CAES desempenha um importante papel e atua como um local

de possibilidades de desenvolvimento para o surdo.

A fim de ampliar a discussão em torno do CAES, ressalta-se aqui a pesquisa

realizada por Fernandes (2003), que destaca a política de capacitação docente, no

estado do Paraná, voltada à prática de uma proposta de educação bilíngüe no

sistema de ensino, em concomitância com as propostas estabelecidas pelo

MEC/SEESP, no documento de Política Nacional para a Educação de Surdos, que

enfoca o bilingüismo na educação de surdos, ainda que este não descarte a

possibilidade da educação monolingüe e às práticas de reabilitação oral. Aliadas a

estas iniciativas políticas, as manifestações e as discussões em torno da

necessidade de novas propostas, enfatizada por pesquisadores e movimentos

sociais, conduzem a mudanças nas práticas e ao reconhecimento da constituição do

conhecimento a partir de interações significativas, além disso, reconhece a

linguagem enquanto elemento constitutivo do sujeito.

Em sua pesquisa, Fernandes (2003) levantou dados a respeito da filosofia

educacional desenvolvida pelos professores, de escolas comuns e especiais, no

estado do Paraná. A autora concluiu que, na última década um novo discurso se faz

presente nas vozes dos professores, considerando que a maioria deles afirmou que

a educação bilíngüe é a filosofia educacional desenvolvida no seu trabalho com

alunos surdos. Foram analisados 260 questionários, o que representa um número


52

significativo. Porém, a autora pontua que o discurso oficial e as discussões

levantadas socialmente acerca do bilingüismo influenciaram no discurso dos

professores entrevistados, pois ao analisar os depoimentos dos mesmos é possível

verificar que há uma contradição com a prática, em que a concepção de surdez sob

um ponto de vista patológico ainda se faz presente.

Fernandes (2003) também traz um dado importante a respeito do CAES,

referindo que, dos 2076 alunos surdos inseridos no ensino regular do estado do

Paraná, 1684 são atendidos nos CAES’s, em turno contrário ao do ensino comum.

É importante destacar que o projeto político do estado propõe que se

estabeleça um CAES por município. Especificamente no CAES do município de

Piraquara, contexto em que esta pesquisa foi desenvolvida, atualmente visa-se

desenvolver propostas exclusivamente pedagógicas, de apoio à escolarização, a fim

de proporcionar ao aluno surdo, um espaço no qual possa apropriar-se da

linguagem escrita a partir de contextos significativos, com base na perspectiva do

Letramento, considerando a relevância da língua de sinais no processo de

ensino/aprendizagem. Desta forma, preconiza-se a língua de sinais como a primeira

língua. É importante esclarecer de antemão que estão sendo abordados aqui as

concepções e os objetivos que norteiam, especificamente, o trabalho do CAES do

município de Piraquara (Pr), pois apesar de algumas mudanças serem propostas de

maneira geral, torna-se difícil, se não impossível, generalizar os trabalhos

desenvolvidos nos outros Centros distribuídos em todo o Estado do Paraná, ainda

que as determinações estejam sendo estabelecidas por órgãos competentes.

Convém ressaltar que nem todos os alunos têm domínio ou até mesmo o

mínimo de conhecimento acerca da língua de sinais, fator este que, a priori, o

impossibilita de ter acesso aos conceitos por meio desta língua. O desconhecimento
53

da língua de sinais pelo aluno dificulta o trabalho do professor do Centro de

Atendimento, por encontrar dificuldades em estabelecer meios de interação com o

aluno até que esta língua se constitua. Não obstante, algumas vezes, esta

constituição torna-se difícil por motivos como: a falta de contato com outros surdos,

o que faz com que o uso da língua de sinais não seja significativo para o aluno; a

falta de conhecimento da família sobre a língua e a falta de apoio de órgãos

superiores no que diz respeito à implementação de uma proposta bilíngüe, ainda

que esta, como citado anteriormente, já tenha sido decretada.

Torna-se relevante enfatizar que, um dos pontos fundamentais da proposta

do CAES é a abordagem de diferentes gêneros textuais para o trabalho com a

leitura e a escrita, considerando que estas são constituídas a partir de situações

significativas de uso. A interação e o lugar concebido ao aluno denotam um espaço

de interlocuções e constituições de conceitos, no qual o mesmo tem participação

ativa e efetiva.

Diante do atual contexto, que preconiza o acesso à educação sem

distinções, torna-se importante refletir sobre as práticas pedagógicas e o modelo de

escola que se tem hoje, de modo que é necessário consolidar o seguinte desafio,

que segundo Fernandes (2006a) diz respeito a: ”oferecer, desde sempre, a

oportunidade da experiência da língua, em sua totalidade, discursiva e estrutural,

criando espaços de interação dialógica nos quais se possa ter, na língua, a

possibilidade de protagonismo de atuação histórica de nossos alunos.” (p. 142).

Sendo assim, torna-se relevante enfatizarmos algumas questões referentes

ao papel da linguagem e da interação social na constituição do sujeito, bem como o

modo de inserção do sujeito surdo nas práticas com a linguagem.


54

3 LINGUAGEM, LETRAMENTO E SURDEZ

Neste capítulo serão abordadas as concepções que norteiam as práticas

pedagógicas, ou seja, que concepção de linguagem se toma como norte no trabalho

com a língua? Qual o lugar do sujeito no processo educacional? Qual o papel da

escola no desenvolvimento dos sujeitos? Ao se refletir verdadeiramente sobre estas

questões, é possível reconhecer o quanto a maneira com que se concebe a

linguagem e o sujeito pode ser determinante nas práticas, conceitos e valores de

cada sujeito surdo. Não obstante, a maneira com que ele é narrado e percebido pelo

outro são fatores a serem considerados na sua constituição.

Serão abordados ainda, alguns aspectos considerando o modo com que o

sujeito surdo é inserido nas práticas de leitura e de escrita, sobretudo na escola e no

âmbito familiar. Dessa forma, torna-se relevante uma reflexão em torno do

letramento.

3.1 REFLETINDO SOBRE A LINGUAGEM NA CONSTITUIÇÃO DO SUJEITO

SURDO SOB UM PONTO DE VISTA SÓCIO-HISTÓRICO

Historicamente, os discursos em torno da educação refletem contextos,

concepções e modos de perceber as relações sociais e a maneira pela qual os

sujeitos se apropriam dos conhecimentos acumulados ao longo do tempo. Da

mesma forma, diferentes concepções relativas à surdez foram determinadas ao

longo do tempo a partir de diferentes visões em torno dos aspectos relacionados à

linguagem, ao sujeito e ao lugar que este ocupa nos processos de interação social.
55

Propostas de ensino que percebem o sujeito apenas como indivíduo

passível de aprender por meio de métodos e técnicas articuladas, desconsidera

diversos fatores determinantes no processo de constituição da linguagem, como o

contexto e as relações sociais do sujeito, e até mesmo a historicidade da própria

linguagem, já que esta é marcada por discursos sociais e conceitos que foram e são

constituídos historicamente.

Ao desconsiderar tais fatores, muitas vezes, a linguagem é tomada apenas

como um instrumento de comunicação, o que lhe concebe uma visão reducionista,

em que a língua é vista como um código, passível de codificação e decodificação,

bem como ao indivíduo é concebido o lugar de mero transmissor/receptor deste

código. Desta forma, ignora-se a linguagem como aspecto constitutivo do sujeito e o

fato de que a mesma ocorre a partir de situações e interações significativas.

Dessa visão reducionista de linguagem decorre a suposição de que a falta

de audição e o não desenvolvimento da oralidade seriam obstáculos para o

desenvolvimento da linguagem do sujeito surdo, idéia esta que ainda hoje se faz

presente em alguns contextos na educação de surdos (BOTELHO, 2002).

Segundo Botelho (2002), alguns conceitos distorcidos sobre a surdez

tiveram influência de grandes psicólogos que cogitavam a idéia de que o surdo teria

dificuldades de abstração, tomando seu pensamento como concreto. Devido a esses

equívocos que relatam a concretitude do pensamento dos surdos, é que ainda hoje,

quando um surdo apresenta dificuldades de leitura e de escrita, ou ainda para

desenvolver a linguagem oral, recorre-se à explicação de que o mesmo tem

dificuldade de abstração.

Acerca disso Skliar (1997), ao destacar a importância da língua de sinais na

constituição do sujeito surdo, considera que: “a surdez, como déficit biológico, não
56

priva os surdos da faculdade da linguagem, mas total ou parcialmente, da linguagem

oral; a surdez pode criar, e de fato cria, situações atípicas no processo de aquisição

e desenvolvimento da linguagem.” (p. 128).

A questão é que muitos equívocos com relação ao desenvolvimento do

sujeito surdo podem ser atribuídos ao fato de que o mesmo não se desenvolve em

ambiente lingüístico favorável, pois de modo geral, tanto na escola, quanto na

família, raramente compartilha de uma língua em comum, já que a linguagem oral é

a que prevalece nesses contextos.

Por outro lado, se analisado o desenvolvimento de crianças ouvintes, estas,

desde seu nascimento geralmente estão inseridas em situações dialógicas que lhes

permitem constantemente o contato com uma língua, que será assim, adquirida

naturalmente. É mediante a isso que, segundo Fernandes (2006a) essas crianças

irão então “construir hipóteses, categorizações, generalizações, conhecimento sobre

o mundo, desenvolver juízos de valor e, o mais importante, permite-lhes sua

identificação cultural com um grupo de referência, do qual se sentem parte, ao qual

pertencem.” (p. 123).

O mesmo não acontece com a criança surda, considerando que cerca de

90% são filhas de pais ouvintes, que, por ser desprovida do sentido da audição não

participa efetivamente das interações lingüísticas, as quais se limitam, quando

ocorrem, a gestos naturais criados para estabelecer algum tipo de interação, já que

seu conhecimento é constituído a partir das experiências visuais. Por isso, destaca-

se aqui a importância da língua de sinais no desenvolvimento do sujeito surdo, bem

como o acesso precoce a esta língua, para que, assim como a criança ouvinte,

possa construir seus conceitos a partir de uma língua.


57

A linguagem ocupa desde sempre um papel fundamental na formação do

sujeito, o que confere à família um espaço privilegiado nesta formação, pois é no

âmbito familiar que, segundo Dessen e Polônia (2007), ocorrem as primeiras

interações sociais, constituindo-se como um sistema social responsável pela

transmissão de valores, crenças, idéias e significados.

Além da família, o meio escolar representa um espaço significativo na

constituição da linguagem do sujeito, um espaço de transformação, onde serão

proporcionadas construções de significados e constituições de conceitos, de modo

que, assim como afirma Moita Lopes (2002): “as práticas discursivas neste contexto

desempenham um papel importante no desenvolvimento de sua conscientização

sobre sua identidade e a dos outros.” (p. 37). Entretanto, para que as construções de

significados se efetivem verdadeiramente há de se considerar as interações

dialógicas e lingüísticas que se estabelecem a partir da vivacidade da linguagem.

A fim de explicitar melhor a questão da vivacidade da linguagem, Bakhtin

(1992) refere que a língua materna não se constitui a partir de dicionários e

gramáticas, mas de enunciações concretas, que se constituem numa teia de

interações discursivas, diante das quais os significados são estabelecidos e novos

discursos são desencadeados. Dessa forma, ao se abordar um trabalho

sistematizado com a linguagem, fora das interações discursivas, no qual a língua é

tomada como código a ser aprendido, é negado ao sujeito essa discursividade da

linguagem.

Não obstante, o desenvolvimento de práticas discursivas tem a ver com o

compartilhamento de uma língua em comum. Porém, no caso da surdez, diante da

supremacia da linguagem oral, a língua de sinais, em geral, ocupa um lugar

secundário, servindo apenas como um apoio, quando necessário, ou ainda, não


58

ocupando espaço algum. O mesmo ocorre também no contexto das escolas

especiais, local que, por excelência deveria proporcionar ao surdo a oportunidade de

desenvolver-se a partir da língua que lhe é considerada como natural. Além disso,

segundo Botelho (2002), a metodologia de ensino destas escolas “é freqüentemente

pautada no ensino de palavras, considerando a linguagem como um aglomerado de

vocábulos.” (p.52), sem levar em conta o significado e a contextualização.

Sob um ponto de vista vygotskyano, a constituição da linguagem se dá para

além da aquisição de vocabulários e construções de sentenças descontextualizadas,

pois é a partir dos significados que o sujeito compreende e age sobre o mundo:

Uma palavra sem significado é um som vazio; o significado, portanto, é um


critério da ‘palavra’, seu componente indispensável. Pareceria, então, que o
significado poderia ser visto como um fenômeno da fala. Mas do ponto de
vista da psicologia, o significado de cada palavra é uma generalização ou
um conceito. E como as generalizações e os conceitos são inegavelmente
atos do pensamento, podemos considerar o significado como um fenômeno
do pensamento. (Vygotsky, 1989. p. 104)

Compartilhando desse mesmo modo de conceber a linguagem, Góes (1999)

destaca que é ao estabelecer um processo de significação a partir da representação

e da designação da palavra, ou ao estabelecer relações com outras palavras que se

formam os conceitos, permitindo sua compreensão, abstração e generalização, de

modo que estes não se reduzem a um conjunto de impressões estabelecidos a partir

da percepção e da memorização. Desta forma a autora pontua que os significados

em relação ao mundo e ao modo de constituir-se nele são constituídos na

linguagem, de forma que tais significados ao serem estabelecidos refletirão as

relações sociais vivenciadas pelo sujeito.

Nessa mesma linha de reflexão Bakhtin (1990) enfatiza que a palavra reflete

vozes e conceitos repletos de valores, ressignificados em cada enunciação, pois


59

“não são palavras o que pronunciamos ou escutamos, mas verdades ou mentiras,

coisas boas ou más, importantes ou triviais, agradáveis ou desagradáveis, etc. A

palavra está sempre carregada de um conteúdo ou de um sentido ideológico ou

vivencial.” (p. 95).

Cada palavra, então, traz consigo significados que são construídos histórica

e culturalmente nas interações sociais, de modo que a língua não é então um

produto pronto e acabado, mas um produto em constante transformação. Da mesma

forma que o sujeito, enquanto ser histórico e social, é transformado a partir destas

interações, as quais, segundo Geraldi (1997) “não se dão fora de um contexto social

e mais amplo; na verdade, elas se tornam possíveis enquanto acontecimentos

singulares, no interior e nos limites de uma determinada formação social, sofrendo

as interferências, os controles e as seleções impostas por esta.” (p. 6).

Dessa forma, para além do ato de falar, a linguagem denota um espaço de

interlocuções a partir do qual se estabelecem os significados por meio de mediações

e relações. Os significados em relação ao mundo e ao modo de constituir-se nele

são constituídos na e pela linguagem, de forma que o estabelecimento destes

significados é influenciado pelas relações sociais vivenciadas (GÓES, 1999).

Conceber a linguagem como sendo apenas meio de comunicação é ignorar

o fato de que a mesma constitui-se em um trabalho lingüístico, pois os processos

que se desencadeiam nas relações com a linguagem refletem transformações,

formação de conceitos, significações, que só são possíveis na e pela linguagem

(FRANCHI, 1992, GERALDI, 1997).

A linguagem reflete um fazer contínuo, em que cada sentido é marcado por

discursos anteriores que tem como resultado a língua, havendo um retorno diferente
60

em cada acontecimento discursivo, de modo que não constitui um instrumento de

transmissão/recepção.

O trabalho lingüístico, ininterrupto, está sempre a produzir “uma


sistematização aberta”, conseqüência do equilíbrio entre duas exigências
opostas: uma tendência à diferenciação, observável a cada uso da
expressão, e uma tendência à repetição, pelo retorno das mesmas
expressões com os mesmos significados presentes em situações
anteriores. (GERALDI, 1997. P. 12).

Sendo assim, a linguagem não pode ser concebida fora dos contextos

significativos, tampouco como mero instrumento de comunicação e expressão, já

que é a partir dela que os sujeitos se constituem, por meio de interlocuções e

situações discursivas.

3.1.1 O discurso do outro e a interação social enquanto fatores constituintes do

sujeito

“O outro não é um outro natural, mas um outro da


linguagem e dos sistemas de classificação nos
quais estão e estamos insertos, embora em
diferentes temporalidades e espacialidades ou,
melhor, em assimetrias temporais e espaciais.”

CARLOS SKLIAR (2003)

Os processos de interação social, nos diversos âmbitos, e os discursos

estabelecidos nestes processos desempenham um papel fundamental na

constituição dos conceitos pelo sujeito e no modo de como este percebe o mundo e

perceber-se nele.
61

É no espaço das interlocuções que tanto os sujeitos, quanto a linguagem se

constituem, de modo que os processos de interlocução estão constantemente

modificando os conceitos, as crenças, as relações, a maneira com que se percebe o

mundo e até mesmo a própria linguagem (GERALDI, 1997).

É nesse espaço que percebemos e somos percebidos pelo outro, de

maneira que as representações que se tem de si mesmo refletem o discurso e o

olhar do outro. Destaca-se aqui o pensamento de Bakhtin acerca da experiência

exterior na constituição da linguagem e do sujeito, enquanto fato social, de forma

que a consciência se organiza de fora para dentro, diante do que, a formação de

conceitos e as representações tornam-se possíveis a partir do outro, da palavra do

outro:

Tudo o que me diz respeito, a começar pelo meu nome, e que penetra em
minha consciência, vem-me do mundo exterior, da boca dos outros (da
mãe, etc.), e me é dado com a entonação, com o tom emotivo dos valores
deles. Tomo consciência de mim, originalmente, através dos outros: deles
recebo a palavra, a forma e o tom que servirão para a formação original da
representação que terei sobre mim mesmo. (BAKHTIN, 1992, p. 378).

É a partir dos significados atribuídos pelos outros a nós, às nossas ações,

que a capacidade de dar sentido, interpretar e fazer-se entender passam a existir: “o

‘significar o outro’ está na gênese do comportamento ‘significativo’ do ‘eu’, na

gênese do pensamento de cada ser humano, que vai se constituindo inserido em um

mundo simbólico/lingüístico.” (KASSAR, 2000, p. 44).

Assim, ao remeter-se às práticas, sobretudo pedagógicas, é possível

perceber a influência dos discursos do outro na constituição dos sujeitos,

considerando que a partir de um determinado discurso o sujeito passa a narrar-se e

a colocar-se no mundo.
62

Nesse sentido, torna-se fundamental refletir sobre o lugar concebido ao

sujeito, ao aluno, nas práticas educacionais. Conceber-lhe um espaço onde seja

possível refletir, discutir, opinar, colocar-se como parte de um todo e não como mero

receptor, é possibilitar a vivacidade e a discursividade da linguagem, oportunizando-

lhe constituir-se como sujeito social.

Sendo assim, no que diz respeito ao surdo, a construção da sua

subjetividade depende, sobretudo, das relações estabelecidas com os outros (LODI,

2005). Portanto a forma com que o mesmo é percebido e narrado nestas relações e

percebe-se e narra-se frente a estas percepções são pontos determinantes na

construção de seus conceitos e na constituição dos conceitos sobre si mesmo.

É diante desses aspectos que se ressalta aqui, que os diferentes modos de

perceber o surdo e a surdez, nos diferentes contextos, sobretudo, nos âmbitos

familiar e escolar, são pertinentes na sua formação social e cognitiva, da mesma

forma que irão repercutir nas ações do próprio sujeito sobre o mundo.

Outros aspectos a serem considerados em relação à formação do sujeito é a

mediação, ou seja, o outro enquanto mediador e a interação. Vygotsky (1984) atribui

fundamental importância à interação social no processo de constituição das funções

psicológicas superiores. A partir disso, define a zona de desenvolvimento proximal

como um aspecto a ser considerado.

A zona de desenvolvimento proximal é determinada a partir dos níveis de

desenvolvimento real, o qual está relacionado à resolução de problemas de maneira

independente, e potencial, que diz respeito a solucionar problemas sob orientação

ou colaboração do outro:
63

A zona de desenvolvimento proximal define aquelas funções que ainda não


amadureceram, mas que estão em processo de maturação, funções que
amadurecerão, mas que estão presentemente em estado embrionário.
Essas funções poderiam ser chamadas de “brotos” ou “flores” do
desenvolvimento, ao invés de frutos do desenvolvimento. (p. 97).

É justamente nesse ponto, que diz respeito à zona de desenvolvimento

proximal, que a atuação do outro enquanto mediador assume um papel crucial para

que mais tarde o sujeito possa solucionar independentemente o que antes só

conseguia sob orientação. Voltando o olhar à prática pedagógica, seja para o aluno

surdo ou não, o papel de mediador assumido pelo professor será determinante no

desenvolvimento do aluno. É a partir da interação com o adulto que a criança irá

constituir-se socialmente.

No que diz respeito aos problemas de linguagem apresentados por crianças

surdas, em seu processo terapêutico e educacional, Guarinello (2007) afirma que

tais problemas são decorrentes do modo com que estas crianças são inseridas na

linguagem, e não apenas da surdez, destaca ainda a importância da mediação e da

intervenção do adulto que interage com essa criança no processo de aquisição da

linguagem, bem como de se atribuir sentido e significado em seus discursos nos

processos de interação.

É importante destacar que tais reflexões não se referem apenas à educação

de surdos, pois as práticas educacionais, de modo geral, ainda hoje, desconsideram

questões importantes no que diz respeito à forma de se conceber o ensino e,

sobretudo, de se conceber a linguagem, considerando que esta não é, em geral,

uma reflexão presente nas indagações e nos questionamentos acerca do fracasso

escolar.

Em torno disso é que se justificam as críticas aos métodos tradicionais de

ensino baseados na oralidade, como a perspectiva oralista na educação de surdos e


64

mesmo métodos que partem da relação grafema/fonema no ensino comum, pois

estes ao tomar a língua como um código, desconsideram o que Geraldi (1997)

denomina “trabalho lingüístico”, que diz respeito a um fazer contínuo, em que a

linguagem é marcada e constituída historicamente. Geraldi atribui à língua um lugar

privilegiado na construção dos sentidos enquanto trabalho, referindo ainda que cada

discurso reflete outros discursos tomados anteriormente, outros conceitos, outras

vozes. Sendo assim, é impossível conceber o ensino e a linguagem fora de

discursos significativos.

Ao conceber o ensino fora de uma visão ligada à contextualização e à

significação, os profissionais ligados à educação, na maioria das vezes, abordam

práticas que não privilegiam o contexto social e as interações verbais, concebendo

os conteúdos como prontos e acabados, assim como afirma Geraldi:

O diálogo (...) normalmente topicaliza um certo tema. Este é considerado


como o que se tem a aprender. Fala-se sobre ele, lê-se sobre ele. Nestas
interlocuções afloram informações e conformações do tema. Crê-se que foi
aprendido quando, com correção conceitual, sobre ele se fala, sobre ele se
produz. Há, no entanto outra aprendizagem implícita que se dá
precisamente no processo que conduziu esta aprendizagem: porque os
temas destas interlocuções são constituídos como “conteúdos de ensino”,
prontos, acabados, aos quais cabe ao aprendiz “aceder” porque a
interlocução de sala de aula se caracteriza mais como “aferição” de
incorporação do que já estava pronto, acabado; porque os sujeitos
envolvidos se sujeitam às compreensões de mundo que lhes oferecem na
escola, o que se aprende propriamente é que tudo na ciência está pronto
(...) que resta aprendê-lo e que se não se aprende, o déficit não é das
explicações cientificas, mas do sujeito que explica ou do sujeito que
aprende. (1997. p. 7).

Essa maneira de estabelecer as práticas com a linguagem se reflete

intensamente nos processos de leitura e escrita, o que pode ser percebido a partir

de pesquisas que atualmente têm procurado explorar as discussões em torno

desses aspectos sob o ponto de vista do Letramento (RIBEIRO, 2003, SOARES,

2006, BERBERIAN, MASSI, ANGELIS, 2006).


65

Consequentemente, essas discussões recaem nos debates acerca da

surdez e das práticas desenvolvidas no trabalho de leitura e escrita com o surdo,

considerando que este, por constituir-se de maneira diferente do ouvinte, acaba

gerando dúvidas e indagações no que diz respeito ao seu processo de ensino.

É preciso considerar que assim como com os alunos ouvintes, as práticas

estabelecidas em torno da linguagem com o aluno surdo, devem privilegiar a

interação entre os sujeitos, pois, assim como afirma Morato (2000) não há

possibilidades integrais de linguagem fora dos processos interativos. Sendo assim,

as práticas com a linguagem devem constituir-se num espaço de interlocuções, onde

a interação entre os sujeitos age na constituição dos significados e na formação de

conceitos. Nesse mesmo enfoque também as práticas com a linguagem escrita, a

partir de um ponto de vista sócio-histórico, devem priorizar a interação, a mediação e

os aspectos sociais, de modo a percebê-la como uma prática social.

3.2 ALGUMAS REFLEXÕES EM TORNO DO CONCEITO DE LETRAMENTO

As práticas com a leitura e a escrita historicamente são discutidas como

sendo um dos grandes obstáculos a serem encarados pela escola. Por muito tempo

as questões referentes à alfabetização ocuparam espaço significativo no campo

educacional. Ser alfabetizado está relacionado à condição de saber ler e escrever.

No entanto, diante das novas demandas sociais de uso da leitura e da escrita,

apenas ser alfabetizado não é o suficiente.

É em decorrência desse fator que a leitura e a escrita têm sido discutidas a

partir de uma perspectiva do letramento, em que para além da “tecnologia” do ler e


66

do escrever, torna-se relevante o uso social da leitura e da escrita (ROJO, 1998;

SOARES, 2004, 2006; GOULART, 2006).

Segundo Soares (2006) o termo Letramento passar a existir diante da

necessidade de que, no atual contexto, não basta apenas que o sujeito saiba ler e

escrever, mas que saiba fazer uso efetivo da leitura e da escrita, respondendo às

exigências feitas pela sociedade. Sendo assim Letramento é definido pela autora

como sendo “o resultado da ação de ensinar e aprender as práticas sociais de leitura

e escrita. O estado ou condição que adquire um grupo social ou um indivíduo como

conseqüência de ter-se apropriado da escrita e de suas práticas sociais.” (p. 39).

Soares (2006) ao abordar o conceito de Letramento discute a diferença entre

ser letrado e ser alfabetizado:

(...) a pessoa que aprende a ler e a escrever – que se torna alfabetizada –


e que passa a fazer uso da leitura e da escrita, a envolver-se nas práticas
sociais de leitura e de escrita – que se torna letrada – é diferente de uma
pessoa que não sabe ler e escrever – é analfabeta – ou sabendo ler e
escrever, não faz uso da leitura e da escrita – é alfabetizada, mas não é
letrada, não vive no estado ou condição de quem sabe ler e escrever e
pratica a leitura e a escrita. (p. 36).

Em termos gerais, o Letramento está relacionado ao estado ou condição de

uso e prática social da leitura e da escrita, enquanto a alfabetização diz respeito ao

domínio das habilidades de leitura e da escrita, de codificação e decodificação,

Em pesquisa realizada em 2001 pelo IBOPE, sob iniciativa de uma ONG em

parceria com o instituto Paulo Montenegro, foram coletados dados a respeito das

condições de letramento dos jovens e adultos brasileiros. Tal pesquisa identificou

que apenas 26% do total da população encontra-se num nível pleno de domínio das

habilidades de uso efetivo de leitura e escrita (RIBEIRO, 2002). Ou seja, grande

parte da população, ainda que, considerada alfabetizada apresenta dificuldades em


67

utilizar a modalidade da língua escrita nas atividades cotidianas de uso funcional, o

que as distancia de um nível em que possam ser consideradas letradas.

Essa mesma pesquisa revelou que a escolaridade é um fator determinante

na promoção do letramento da população. Fator este que confere à escola como

sendo um espaço privilegiado na constituição dos processos de leitura e da escrita

enquanto fatores de uso social, de modo que a mesma exerce um papel muito

importante na maneira de conceber esses processos pelo sujeito frente às novas

exigências presentes na sociedade. Dessa forma, segundo Ribeiro (2002): “é

preciso que os professores tenham uma visão mais clara sobre o papel crucial da

escola na promoção do letramento das pessoas e da sociedade.” (p. 69).

As novas perspectivas frente ao Letramento alteraram consideravelmente as

concepções acerca do processo de construção da língua escrita, em que a criança

não mais é percebida como dependente dos estímulos externos e de maturação,

mas como sujeito ativo, capaz de interagir com essa língua. A escrita constitui-se

então como um processo contínuo, onde as hipóteses sobre a mesma não são

consideradas erros, mas possibilidades. Dessa forma, assim como afirma Soares

(2004):

(...) a aprendizagem se dá por uma progressiva construção do


conhecimento, na relação da criança com o objeto “língua escrita”, as
dificuldades da criança, no processo de construção do sistema de
representação que é a língua escrita - consideradas “deficiências” ou
“disfunções”, na perspectiva dos métodos “tradicionais” - passa a ser vistas
como “erros construtivos”, resultado de constantes reestruturações. (p. 11).

Desde cedo, sobretudo em uma sociedade em que a escrita ocupa um lugar

privilegiado, a criança se vê rodeada de materiais portadores desta linguagem:

rótulos, embalagens, placas, etc., além de visualizarem as pessoas a sua volta lendo
68

jornais e revistas (PADDEN, 1990; ZIGOURIS-COE, 2001). Porém, mais do que ter

contato é importante que a criança perceba que estas palavras que ela visualiza

constantemente têm uma função e é nesse sentido que a escola deve proporcionar

meios para que o trabalho com a escrita seja uma continuidade daquilo que a

criança vivencia naturalmente, de modo que seja abordada, assim como na vida

diária, em situações significativas de uso.

Entretanto, em geral, a escola preocupa-se fundamentalmente com a

alfabetização, focando-se no desenvolvimento das competências individuais, o que

se distancia das práticas desenvolvidas em outras entidades, como a família, o local

de trabalho e outros (PAN, 2006).

Pan (2006) refere que as práticas de escrita presentes na escola fundam-se

num modelo autônomo, diante do qual a escrita é concebida como produto em si e o

ato de escrever pressupõe um conjunto de habilidades e capacidades cognitivas por

parte da criança que escreve, desconsiderando aspectos culturais, sociais e o lugar

ocupado pelo sujeito. Aliado a essas práticas há forte presença da percepção de que

a escrita e a fala cumprem as mesmas funções, dito de outra forma, a concepção de

que a escrita é a transposição das práticas orais impede que se propaguem as

diversas funções discursivas da modalidade escrita em sala de aula, restringindo-na

a uma abordagem formal da língua, assim como afirma Kleiman (2001), ao referir-se

às práticas de leitura e escrita na educação de adultos:

No contexto escolar encontramos, muitas vezes, em vez do ensino das


novas funções que a língua pode preencher - graças justamente à própria
natureza da escrita -, a limitada prática de substituição de formas- falada
versus escrita - mantendo, todavia, as mesmas funções. E, ainda, na
medida em que apenas os aspectos formais estão envolvidos no processo
- pois as transformações, para serem discursivas, implicariam
transformações de relações internas subjetivas e externas ou sociais mais
profundas-, este vai, então, tornando-se mais difícil e até inviável para o
adulto. (p. 274).
69

Tais práticas não privilegiam uma perspectiva discursiva, em que o foco não

é o ensino da língua em si, mas o desenvolvimento de atividades discursivas que

tenham como conseqüência a constituição de significação e a produção de sentidos

(TRENCHE e BALIERO, 2006).

É contrapondo-se a essa maneira de perceber a linguagem escrita que se

destaca aqui a visão sociointeracionista, na qual a concepção de letramento escolar

está fundamentada em perspectivas sociais e críticas e que, assim como pontua

Pan (2006):

(...) traz uma nova reflexão sobre a criança, seu desenvolvimento e sua
linguagem, anunciando uma nova imagem de sujeito difundida por meio de
práticas pedagógicas libertadoras, renovadoras e críticas, segundo a qual
ele se torna capaz de tomar consciência de suas amarras, opondo-se às
estruturas de poder que o oprimem. (p. 82).

A partir dessas práticas é concebido ao sujeito um lugar nos diferentes

contextos e lhe é oportunizado meios para que possa constituir-se como sujeito

letrado, o que, segundo Botelho (2002) é ainda, “dependente do estabelecimento de

práticas sociais de leitura e de escrita, que dizem respeito ao que, quando, com

quem ou por intermédio de quem, onde, quanto e por que as pessoas lêem e

escrevem, e retratam interesses e competências construídas.” (p. 65).

No que diz respeito às práticas de leitura e escrita com sujeitos surdos é

possível, a partir de pesquisas realizadas (BOTELHO, 2002; FERNANDES, 2003;

SILVA, 2005; NONATO, 2006) perceber que a questão do letramento é ainda mais

agravante, tendo em vista que as práticas de leitura e escrita desenvolvidas em sala

de aula em geral privilegiam aspectos que partem da linguagem oral. Nesse caso o

surdo se encontra em desvantagem, considerando que não há uma participação

ativa do mesmo nos contextos lingüísticos. A falta de uma língua em comum em sala
70

de aula é um dos grandes obstáculos no processo de constituição da escrita pelo

surdo (BOTELHO, 2002), como discutiremos a seguir.

3.3 LETRAMENTO E SURDEZ

As discussões em torno do processo educacional do sujeito surdo e do seu

desenvolvimento escolar, em geral, apontam e analisam suas dificuldades

apresentadas frente ao desenvolvimento da leitura e da escrita. Tais discussões

topicalizam questões que denotam os obstáculos que o surdo apresenta, sobretudo,

com relação à língua portuguesa (FERNANDES, 1990; GÓES, 1999; SILVA, 1999).

Entretanto, pesquisas recentes têm discutido questões relativas ao Letramento dos

sujeitos surdos, o que vai além da abordagem do processo de aquisição da escrita,

pois passa para uma discussão acerca das práticas envolvidas neste processo: do

outro enquanto mediador, da dialogicidade como aspecto fundamental no processo

de constituição de tal modalidade, da contextualização como ponto essencial no

trabalho com a leitura e escrita, da importância da língua de sinais neste processo e,

sobretudo, da função social da escrita (BOTELHO, 2002; FERNANDES, 2003,

2006a, b; LODI, 2004; GUARINELLO, 2007).

Fernandes (2006a) traz uma reflexão acerca de que a maior parte dos

encaminhamentos metodológicos na educação de surdos é pensada a partir de

recursos e estratégias para a alfabetização de ouvintes, tendo a oralidade como

pressuposto. Entretanto, esta é uma realidade inadequada para os surdos,

considerando que os mesmos não estabelecem relações grafema-fonema, por ser

esta uma experiência auditiva. Diante disso, a autora aponta que a alfabetização não
71

deveria ser o foco na educação dos surdos, mas deveriam ser tomadas como ponto

de partida as práticas de letramento.

Ao tomar a oralidade como pressuposto para o ensino da língua o surdo é

privado de estabelecer relações que o levem a construir significados em torno da

mesma. Como afirma Padden (1990), enquanto a criança ouvinte pode usar os

conhecimentos que já possui em torno da linguagem oral na constituição da

linguagem escrita, fazendo conexões e apoiada em uma língua, a criança surda

precisa explorar os conhecimentos em torno da língua portuguesa juntamente com o

aprendizado da escrita. Neste sentido, como refere Gesueli (1998), do ponto de vista

de uma proposta bilíngüe, a aquisição da língua portuguesa para o surdo é uma

tarefa altamente complexa.

Há ainda outras questões que devem ser consideradas, sobretudo no que

diz respeito ao fato de conhecer a surdez e suas implicações, sendo este um

aspecto determinante no processo escolar do aluno surdo. Além disso, é preciso

considerar o modo pelo qual esse sujeito é inserido no mundo da escrita, assim

como destaca Silva (1999):

(...) as condições de aprendizagem de leitura e escrita no processo de


escolarização do sujeito surdo dependem, via de regra, do modo pelo qual
são encaradas suas dificuldades e as diferenças ocorridas no processo
educacional pelas instituições, levando-o a adquirir confiabilidade nas
dificuldades encontradas. Nesta mesma ótica é preciso destacar que o
surdo, antes de ter dificuldades na escola, apresenta dificuldades de
aquisição de língua, instalando-se a grande diferença de escolarização
entre surdo e ouvinte (...) Na verdade, suas dificuldades, em quaisquer
disciplinas, estão relacionadas às estruturas lingüísticas pouco
desenvolvidas, repercutindo na sua educação de modo geral. (p. 41).

A participação em atividades discursivas é desde cedo, restrita para as

crianças surdas, já que em sua maior parte são filhas de pais ouvintes, com os quais

não há o compartilhamento de uma língua (PADDEN, 1990; BOTELHO, 2002;


72

FERNANDES, 2003; KARNOPP e PEREIRA, 2004). Sendo assim, geralmente as

crianças surdas não participam efetivamente de atividades que envolvem o diálogo e

a leitura e a escrita, como por exemplo, a contação de histórias e as narrativas do

cotidiano. Dessa forma, ao contrário da criança ouvinte que já chega à escola com

uma bagagem lingüística, a criança surda não chega com conhecimento suficiente

para a atribuição de sentido à escrita, o que ocasiona uma defasagem no que diz

respeito à criação de expectativas e hipóteses sobre os significados desta

modalidade (KARNOPP e PEREIRA, 2004).

Algumas pesquisas têm buscado investigar o processo de desenvolvimento

da linguagem escrita de alunos surdos incluídos no ensino regular, referindo que a

falta de vocabulário costuma ser apontada como uma das principais dificuldades dos

mesmos no processo escolar (BOTELHO, 2002; ANTIA, REED, KREIMEYER,

2005).

As americanas Antia, Reed e Kreimeyer (2005) realizaram uma pesquisa

com 110 surdos17 de escolas públicas a fim de investigar seu desempenho frente a

um teste de linguagem escrita18. Esse teste foi apresentado em duas partes, sendo a

primeira composta por questões de múltipla escolha a fim de avaliar o vocabulário, a

ortografia e estruturas frasais; e a segunda com a finalidade de avaliar a escrita

espontânea dos alunos a partir de figuras.

Essa pesquisa revelou que, de um modo geral, apenas 17% dos alunos

tiveram um desempenho acima da média, 32% obteve a média e 51% teve um

desempenho abaixo da média, destes 5% não tiveram nenhuma produção que

17
As autoras referem surdos e alunos com dificuldades de audição, assim como em outras pesquisas
americanas (ANGELIDES, ARAVI, 2006/2007; MITCHELL, KARCHMER, 2004) , no que diz respeito a
pesquisas com surdos é utilizado também o termo hard of hearing, a fim de diferenciar o sujeito com
perda auditiva profunda (deaf) e o sujeito com perda auditiva moderada (hard of hearing).
18
O teste TOWL-3 (Hammill & Larse, 1996) é um teste de escrita americano utilizado em larga escala
nos Estados Unidos, sendo utilizado em diversas pesquisas que visam avaliar o nível de letramento
dos sujeitos.
73

pudesse ser considerada, resultando em 0%. Não surpreendentemente, o teste

demonstrou que a maior dificuldade dos surdos foi em relação ao vocabulário e à

sintaxe. Entretanto, no que diz respeito à produção espontânea, a maior parte dos

alunos tiveram um resultado acima da média.

No entanto, ainda que, muitas pesquisas tenham apontado a falta de

vocabulário e a dificuldade com relação à sintaxe na escrita do surdo (FERNANDES,

1990; SILVA, 1999; ANTIA, REED, KREIMEYER, 2005), há outras questões que se

tornam pertinentes, principalmente no que diz respeito a como o processo de leitura

e escrita é abordado e conseqüentemente concebido pelo sujeito. Para Botelho

(2002) a idéia de um vasto vocabulário está associada à perspectiva de construção

do sentido do texto, parecendo que a língua consiste fundamentalmente no léxico,

de modo que o contexto em que esse vocabulário está inserido, na maioria das

vezes, não é enfatizado.

Em pesquisa realizada, Nonato (2006) procurou investigar as

representações construídas por sujeitos surdos adultos em torno da leitura e escrita

em seu processo de escolarização. Diante disso, foi possível perceber, a partir das

narrativas dos surdos, que, a relação desses sujeitos com a escrita é carregada de

frustrações e dificuldades, pois é marcada por situações que não privilegiam o uso

efetivo da linguagem nas atividades de sala de aula, as quais, freqüentemente,

envolvem trabalho com palavras e frases isoladas, centrando-se em atividades como

cópia, produção de textos, ditado e leitura, a fim de estimular a aquisição da

modalidade escrita. No que diz respeito à produção textual, os sujeitos apontaram

que esta era solicitada sem nenhum propósito, sem objetivos, partindo de temas,

diante dos quais deveriam discorrer. No que concerne a atividades de ditado os


74

surdos as referem como sendo inúteis e desgastantes, diante das quais

demonstravam grandes dificuldades, justamente por privilegiar o canal-auditivo.

Ainda que a pesquisa tenha explicitado a narrativa de surdos adultos (com

idades em torno de 28 anos) acerca do processo de escolarização vivenciado

anteriormente, evidencia algumas práticas que ainda perduram no cotidiano escolar.

Tais práticas desvinculam-se de uma perspectiva de letramento ao distanciar-se de

uma função social ao abordar o trabalho com a língua escrita. A atenção para a

codificação/decodificação, pautada em fixação e memorização de palavras pode

fazer com que o sujeito torne-se até um bom decodificador ou copista, porém, com

um perfil de leitor e escritor com pouca autonomia em suas produções escritas

(TRENCHE e BALIERO, 2006).

Em pesquisa realizada no contexto do ensino regular, a partir de

depoimentos de pais e professores, além de observações realizadas em sala de

aula, Silva (2005) pôde perceber que as práticas de letramento realizadas com

alunos surdos em sala de aula do ensino regular são restritas, quando existem,

sendo realizadas com maior ênfase em outros contextos, como em casa ou com

professores especializados. Entre as justificativas para esse fato está a de que o

professor do ensino comum não se sente preparado para atender as demandas do

aluno surdo e, além disso, não o considera como sua responsabilidade.

A autora chama atenção também para a ausência de práticas discursivas

com o aluno surdo, de modo que a ele são proporcionadas atividades quase que

exclusivamente de cópias, diante das quais não há compreensão por parte do

mesmo. Por outro lado, ainda, a questão da cópia gera certo alívio para o professor,

pois a partir desta prática tem-se a impressão de que o aluno está compreendendo.

Assim, a autora destaca a situação de uma aluna surda ao tomar a escrita a partir de
75

cópias: “(...) o fato de a aluna copiar no caderno o exercício correto dá ao professor

a sensação de compreensão do que foi feito e o jogo se completa desta forma: o

aluno pode entender que aprender é sinônimo de copiar e o professor tem a ilusão

de que ensinou.” (p. 135).

Cabe ressaltar que, a falta de atividades significativas em sala de aula, não é

um fato que ocorre somente com os surdos, mas em grande parte das práticas

escolares também com ouvintes. O uso corrente de livros didáticos que não refletem

o uso significativo da linguagem, acaba referindo a linguagem escrita como algo sem

função no ponto de vista do aluno. Sobre esse aspecto Fernandes (2003) destaca

que:

A língua escrita que se apresenta em grande parte dos materiais didáticos


está impregnada da tradição normativa e não reflete o movimento vivo dos
falantes em suas interações diárias, a linguagem em uso, em situações
significativas, tão perseguidas como ponto de partida, mesmo para aqueles
que têm no português sua língua nativa.
A dimensão discursiva da língua, que acaba por definir sua organização
semântica e sintática, não se encontra sistematizada em material escrito
convencional. Pelo menos não na atual indústria editorial dos livros
didáticos (...) que utiliza a orientação estruturalista/normativista em seus
materiais. (p. 118).

É dessa forma que Fernandes (2003) ressalta a necessidade de se tomar as

atividades de leitura e escrita com alunos surdos para além do trabalho com

palavras isoladas e frases descontextualizadas, preconizando-se os textos que

retratem os diversos gêneros discursivos que se fazem presentes no âmbito social,

proporcionando a percepção da função social da linguagem escrita.

Os gêneros discursivos são elaborados pelas diversas esferas de utilização

da língua e mais do que uma função comunicativa têm a função de informar,

convencer, seduzir, entreter, sugerir, etc. (VERCEZE, 2008).


76

Para Bakhtin (1992) os gêneros se definem como “tipos relativamente

estáveis de enunciados” elaborados nos diversos campos de utilização da língua.

Dessa forma refletem o uso vivo da linguagem que circula socialmente e por isso se

justificam como essenciais no trabalho com a modalidade escrita da língua.

Diante disso, ao selecionar um material escrito a ser abordado com aluno

surdo é imprescindível que haja uma reflexão acerca de seu verdadeiro significado e

funcionalidade frente às atividades de leitura e escrita, recorrendo a textos que

estejam presentes socialmente e que sejam percebidos pelo aluno como objeto

cultural. A fim de privilegiar essas questões, Fernandes (2003) sugere que alguns

aspectos constituam a organização de um planejamento que proceda quaisquer

atividades de leitura/produção escrita, os quais dizem respeito à:

1- Contextualização Visual do texto: esse aspecto permitirá ao aluno uma

compreensão prévia a respeito do tema, conduzindo o processo de reflexão e de

interferências sobre a leitura da palavra. É importante proporcionar textos que

ofereçam diferentes linguagens (fotografia, desenho, artes plásticas e cênicas,

programas de TV, filmes, propagandas de jornais e revistas, games, softwares, etc).

“A leitura de imagens e a sua relação com experiências vividas permitirão o

despertar da atenção e do interesse pelas possíveis mensagens que o texto

veicula”. (p. 153).

2- ‘Leitura’ do texto em Libras (ativação de conhecimento prévio de elementos

lexicais, gramaticais e intertextuais): não se propõe que seja feita uma leitura

linear do texto, traduzindo palavra por palavra, mas sim possibilitar a elaboração de

hipóteses pelo aluno e a constituição de sentido, diante do que a mediação do

professor é fundamental. Contudo, é importante que não se perca de vista a

necessidade da sistematização dos vocábulos gramaticais (preposições,


77

conjunções, artigos, pronomes, etc.) aspectos estes constituintes da linguagem

escrita que devem ser incorporados no repertório lexical dos alunos.

3- Percepção de elementos lingüísticos significativos relacionados à tipologia

e estilo/registro do texto: esse aspecto diz respeito à exploração de elementos

lingüísticos de acordo com a função que o texto exerce, de modo que o professor

atua como mediador na percepção dos aspectos formais, como por exemplo, o uso

de letras maiúsculas e minúsculas, sinais de pontuação, e outros pontos relevantes

da escrita. No entanto, é preciso ressaltar que abordar as questões gramaticais não

significa nomear e classificar termos da oração, mas considerar o funcionamento da

língua portuguesa escrita a partir de regras necessárias à sistematização.

4- Leitura individual / verificação de hipóteses de leitura: é o momento em que

será oportunizado ao aluno, a partir da leitura individual, formular hipóteses a

respeito do texto a partir das significações e contextualizações estabelecidas nos

momentos anteriores. Cabe ao professor, buscar meios para verificar as hipóteses

de leitura do aluno e utilizar diferentes estratégias para explorar e conduzir o

trabalho em seguida. O posicionamento com relação ao texto escrito deve ser

levado também em consideração, de forma que: “cobrar um posicionamento, uma

argumentação, uma ponderação, uma atitude responsiva que o faça enxergar o

texto como algo mais que um amontoado de palavras é fundamental à leitura como

atividade”. (p. 160)

5- (Re)elaboração escrita com vistas à sistematização de aspectos estruturais:

As atividades de produção escrita devem partir dos temas abordados anteriormente,

pois esse aspecto demanda um conhecimento prévio para que se possa

argumentar, expandir idéias e dispor de elementos lexicais e gramaticais. As

atividades de produção de texto, entretanto, não devem partir de um pretexto, ou


78

seja, desenvolver certas atividades vivenciais (passeios, resumos, registros de fatos,

etc.) ou experiências, considerando-as como um pretexto para a produção de texto

não significa que se esteja contextualizando a situação antecipadamente ao texto.

Contextualizar implica partir de situações significativas, diante das quais o aluno

possa perceber uma função: “Uma lista de compras, a compreensão de uma bula ou

de uma reportagem de jornal, saber como fazer funcionar um eletrodoméstico ou

entender as regras de um game, preencher uma ficha funcional ou fazer um

currículo para emprego são atividades significativas.“ (p. 161).

Considerando os atuais debates de inclusão do surdo no ensino regular,

ainda que os aspectos acima citados tenham sido propostos diante de uma

realidade de escola especial19, os mesmos merecem consideração ao se trabalhar

com o texto em sala de aula, pois tomar os gêneros textuais e a contextualização

dos mesmos como ponto de partida para o trabalho com a escrita, não trará

privilégios apenas para o aluno surdo, mas para toda uma sala de aula.

Diante das reflexões até aqui expostas é possível perceber que ao abordar a

linguagem escrita é preciso considerá-la como sendo muito mais do que um

processo que se constrói a partir de práticas de sala de aula que simplesmente

apresentam um sistema de escrita para o aluno. Atribuir significados, função e

possibilidades de contextualização constituem um alicerce para que se possa

efetivamente constituir-se como leitor e participar ativamente das práticas de escrita

enquanto atividade social.

Cabe destacar aqui que, ao se tomar as práticas significativas de leitura e

escrita como pontos fundamentais na constituição de sujeitos que possam fazer uso

19
As propostas de práticas de Letramento organizadas pela autora foram desenvolvidas com um
grupo de surdos sob a perspectiva de uma Educação Bilíngüe, em uma Escola de Surdos. Hoje,
essas propostas são desenvolvidas em vários contextos, não é, portanto, apenas um projeto, mas um
fato.
79

efetivo destes aspectos, a escola não é a única responsável por esta questão. É no

âmbito familiar que se deveria oportunizar os primeiros contatos e a construção de

uma relação com a linguagem escrita.

3.3.1 Práticas de letramento e família

As relações estabelecidas com as práticas de leitura e escrita são

dependentes, também, do grau de letramento da instituição familiar. As práticas de

leitura e escrita presentes no cotidiano da criança permitem-lhe fazer recortes e

interpretações que serão por ela usados enquanto sujeito letrado (ROJO, 1998).

Sob esse aspecto é importante discutir sobre o lugar concebido à escrita e

ao sujeito nos processos de constituição da mesma, pois na medida em que se

privilegia a escrita enquanto prática social e discursiva concebe-se aos sujeitos um

lugar de ação e reflexão sobre esta modalidade de língua, passando então a

constituir-se em um objeto significativo para a criança, de modo que, assim como

argumenta Machado (2007): “Na medida em que o adulto vai atribuindo sentido às

ações da criança em relação à escrita e, na medida em que a escrita se constitui

num objeto de importância no contexto familiar, a criança, junto com o adulto, passa

a recortá-lo e atribuir-lhe valor.” (p. 47).

Dessa maneira, é no contexto familiar que a criança, ao ter seus primeiros

contatos com a linguagem escrita, passa a interagir com o mundo letrado, o que fará

diferença futuramente no lugar que será concebido a esta modalidade pelo sujeito.

Se desde cedo uma criança convive com materiais de leitura, como livros, jornais e

revistas, se ouve histórias e observa as pessoas lendo e escrevendo e manipula


80

lápis, borracha, papel, ao ingressar na escola achará tudo muito natural e lógico, já

que será uma continuidade daquilo que já vivenciava em casa (CAGLIARI, 1995).

Em concordância com essa ótica Galvão (2003) refere que: “quanto mais

cedo a criança é exposta a uma diversidade de materiais de leitura em seus

contextos de usos, mais provavelmente se tornará um adulto com maior capacidade

de também usar a leitura e a escrita em seu cotidiano.” (p. 148). Entretanto, a autora

enfatiza que somente a presença de materiais portadores de escrita em casa não

garante o alto grau de escolarização ou letramento, é preciso considerar o uso

efetivo destes materiais e a freqüência de leitura e escrita no cotidiano.

Goulart (2006) destaca que crianças que participam desde cedo de

atividades que privilegiam atos de leitura e escrita, a partir de histórias ou da

visualização do contato dos seus familiares com a linguagem escrita, chegam à

escola sendo capazes de perceber a função social da língua escrita. Por outro lado,

crianças que têm pouco contato ou poucas oportunidades de participação em

eventos de letramento20 chegam à escola, na maioria das vezes, percebendo a

linguagem escrita somente a partir dos textos que lhe são apresentados na escola,

que em geral, são textos “acartilhados”, como denomina o autor. Dessa forma, o

papel desempenhado pelo adulto no processo de constituição do sujeito enquanto

leitor e usuário da linguagem escrita em esferas sociais é de fundamental

importância.

No caso das crianças surdas, como já salientado anteriormente, a inserção

nas práticas discursivas no meio familiar torna-se agravante devido ao fato de que a

maior parte dessas crianças são filhas de pais ouvintes, estando então,

consequentemente, inseridas num contexto onde as práticas de leitura e escrita não

20
A autora referencia que de acordo com Heath (1982, p. 50) eventos de letramento são “eventos em
que a linguagem escrita é essencial à natureza das interações e aos processos e estratégias
interpretativas de seus participantes”.
81

são com elas compartilhadas. Somente cerca de 5% a 10% dos surdos são filhos de

pais surdos21 (PADDEN, 1990; QUADROS, 1997; SKLIAR, 1998), o que lhes

proporciona o contato com a língua de sinais e uma interação significativa de

linguagem, considerando que esta língua é amplamente utilizada pelos surdos

adultos.

Segundo Padden (1990) pesquisas apontam que os surdos filhos de pais

surdos demonstram um melhor desempenho nas habilidades de leitura e escrita em

relação aos surdos filhos de pais ouvintes, devido ao fato da possibilidade de uma

interação comunicativa. Dessa forma, é possível perceber que ao significar a

linguagem para a criança lhe são concebidas possibilidades de compreensão e

apropriação em torno da constituição da modalidade escrita, pois ao deparar-se com

a mesma o sujeito já traz consigo conceitos e significados que foram sendo

constituídos a partir das interações.

Ao contrário, quando não há uma compreensão por parte da família acerca

da importância das interações significativas de linguagem, não se concebe à criança

surda oportunidades de constituição dos significados, sobretudo quando não há um

reconhecimento em torno da surdez e de suas implicações. Da mesma forma, as

representações da família em torno das questões pertinentes à escrita são pontos

determinantes na percepção da criança frente a esta modalidade.

Muitos apontamentos são feitos atribuindo as dificuldades que os alunos

surdos têm para aprender a ler e escrever ao fato de não ouvirem, ou de não

dominarem a linguagem oral. Entretanto, algumas pesquisas (GESUELI, 1998;

ANTIA, REED, KREIMEYER, 2005; DECHANDT, 2006) têm mostrado que muitos

surdos que não desenvolveram a linguagem oral ou tem pouco conhecimento sobre

21
Alguns autores relatam a ocorrência de 5% de surdos filhos de pais surdos, outros relatam esta
ocorrência como sendo de 10%. Isto pode se justificar por termos referenciado pesquisadores do
Brasil e americanos.
82

a mesma são bem sucedidos em relação à leitura e à escrita. Assim, é importante

considerar que, para além dos aspectos relacionados à surdez propriamente dita, a

interação familiar é um fator que deve ser ponderado em relação à constituição da

leitura e escrita por estes sujeitos. Contudo, essa interação, muitas vezes se torna

difícil, devido ao fato de que a maioria das crianças surdas nasce em famílias de

ouvintes, o que implica os pais procurarem um meio para que possam interagir com

seus filhos (PADDEN, 1990).

Além da interação lingüística, outro fator significativo na constituição do

surdo enquanto sujeito leitor são as representações da família em torno da surdez e

de suas implicações, bem como o lugar concebido à linguagem escrita na vida do

sujeito. Acerca disso, Silva (2005) ao buscar investigar as representações da família

em torno da surdez e das questões relacionadas ao letramento dos alunos surdos,

percebeu a partir de depoimentos de familiares dos surdos investigados, que apesar

de haver, por parte da família uma valorização do diploma escolar, como requisito

importante na vida futura do surdo, a escrita não ocupa lugar privilegiado no seu dia-

a-dia, e não é utilizada em situações significativas: “(...) foi possível perceber,

durante as conversas com as mães, pouca ênfase em relação ao uso da escrita fora

dos propósitos escolares, por serem essas mães, geralmente, de camadas sociais

mais pobres e elas mesmas com muito pouco contato com a escrita.” (p. 126).

A autora destaca as representações que as mães entrevistadas fazem em

torno da linguagem escrita, compreendendo-a como um código e referindo-se a

atividades de cópia como essenciais no cotidiano escolar de seus filhos. Ao mesmo

tempo demonstraram uma desvalorização do uso da escrita espontânea pelo filho

em situações do dia-a-dia, pois escrever um bilhete ou em um diário, por exemplo,

não denotam, para algumas mães, situações de uso efetivo da linguagem escrita,
83

pois estas, para elas, só podem ser efetivadas em situações que estejam ligadas a

tarefas escolares.

Assim como para grande parte de professores que atuam com alunos

surdos, sobretudo no ensino regular, para grande parte dos pais, sobretudo de

crianças surdas, a cópia é o meio pelo qual o aluno/filho demonstra estar se

apropriando de determinado conteúdo escrito. Torna-se, assim, uma simulação de

compreensão, tanto para os pais, quanto para o professor, que ao deparar-se com

as cópias do filho/aluno têm a impressão de que está havendo compreensão, da

mesma forma que por meio da cópia o filho/aluno simula estar se apropriando do

conteúdo (SILVA, 2005).

Nesse sentido é possível refletir acerca da interação e das trocas lingüísticas

no âmbito familiar, pois ao passo que não há uma percepção de que se o filho surdo

está se apropriando ou não das questões relativas ao letramento, não há um espaço

nas interlocuções capaz de permitir a este sujeito que demonstre isto. Acerca disso,

enfatiza-se a importância do posicionamento da família frente às manifestações

escritas da criança e de suas hipóteses lingüísticas.

Silva (2005) enfatiza, ainda, que família e a escola constituem juntas o modo

pelo qual a criança irá constituir-se como leitora e autora. Em sua pesquisa, a partir

de análises de depoimentos de uma mãe, pode-se perceber o lugar concebido a

uma criança surda como leitora e autora no âmbito familiar e a valorização de suas

manifestações lingüísticas, diante do que o seu conhecimento em torno da língua

portuguesa começa a despontar em função das práticas significativas de letramento

na escola e, sobretudo, na família:


84

(...) pela forma como foi posicionada em sua casa, como leitora, como
autora e de ter sido apresentada aos livros de forma lúdica e significativa. A
participação dessa menina surda na vida familiar é também diferenciada e
as viagens de que participa, inclusive na escola, lhe deram oportunidade de
adquirir conhecimento sobre o mundo de forma mais crítica que os demais
alunos surdos, de sua idade ou até mais velhos (...).
Mas isso ocorre também em função de essa menina ter sido desde cedo
levada pela família para esse mundo da escrita e terem sido valorizados
esses momentos de escrita em família. (...) Essa mãe, ao contrário das
outras, posiciona sua filha como um ser capaz de aprender a ler, de
escrever e a conseqüência pode ser esta: a menina se sente autorizada a
seguir em frente, fazendo hipóteses, errando, acertando, se cercando do
português - mesmo sendo usuária de uma língua de sinais - e fazendo dele
também algo familiar, se não pelo ouvido, mas pelo maior uso da escrita e
pela leitura em casa e na escola. (SILVA, 2005, p. 152).

Sendo assim, o lugar concebido ao surdo, desde a infância nas experiências

com a língua, influencia, sobremaneira, no seu modo de conceber, utilizar e

relacionar-se com a linguagem escrita, de modo a constituir-se ou não como sujeito

capaz de fazer uso efetivo desta modalidade.


85

4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Ao adotar uma perspectiva sócio-histórica como referencial teórico para esta

pesquisa, é relevante considerar os fatores sociais que desencadeiam a relação dos

sujeitos com determinada situação e os diferentes modos de perceber determinado

processo, que aqui diz respeito à maneira como a educação escolar e o letramento

do sujeito surdo são vistos em diferentes contextos, sob diferentes visões,

considerando a situação de inclusão educacional. Nessa ótica: “o sujeito é percebido

em sua singularidade, mas situado em sua relação com o contexto histórico-social,

portanto, na pesquisa, o que acontece não é um encontro de psiques individuais,

mas uma relação de textos com o contexto.” (FREITAS, 2003, p. 28).

A pesquisa educacional desenvolvida pelo professor-pesquisador denota um

campo de desafios, reconstruções e reflexões. Desafios, por se tratar de uma

experiência que não faz parte do cotidiano docente, ainda que a realização de

pesquisas seja fundamental para a prática pedagógica. Reconstruções, por

possibilitar a reconstrução do desenvolvimento profissional. Reflexões, por provocar

reflexões acerca da prática pedagógica (MOREIRA; CALEFFE, 2006). Assim, é

necessário considerar que a pesquisa não deve configurar-se em um amontoado

aleatório de dados, mas deve ser fundamentada e sistematicamente formulada, de

modo que a crítica e a autocrítica se façam presentes:

A pesquisa é sistemática porque a coleta e a análise dos dados são


sustentadas por uma razão ou uma teoria. Ela é crítica porque os dados
coletados devem estar submetidos a um exame cuidadoso pelo
pesquisador com o propósito de assegurar que estejam precisos e que
representem o que se pretende. Ela é autocrítica porque se espera que os
pesquisadores usem a autocrítica nas decisões que tomam sobre a
investigação. Da mesma forma, espera-se que também sejam críticos de
seus métodos de coletar, analisar e apresentar dados. (MOREIRA;
CALEFFE, 2006, p. 18).
86

A metodologia desta pesquisa é de cunho quali-quantitativo, baseando-se

num paradigma interpretativo em educação. Entre as razões que tornam tal

paradigma muito útil destaca-se o fato de que o significado humano da vida social e

sua elucidação e exposição pelo pesquisador são aspectos importantes na

pesquisa. Esse paradigma, ainda, não se restringe à qualificação, uma vez que

algum tipo de quantificação pode ser usado (MOREIRA e CALEFFE, 2006).

De acordo com Moreira e Caleffe (2006) para os pesquisadores

interpretativos os significados sociais, as crenças e as intenções baseiam a ação

humana, de modo que a partir da interação social os significados são interpretados e

transformados. Nesse ínterim, as pesquisas qualitativa e quantitativa não são vistas

como dicotômicas, mas se colocam em extremos opostos de um contínuo, sendo

assim: “o argumento fundamental é que os dados quantitativos necessitam ser

suplementados por detalhes contextuais fornecidos pelas técnicas qualitativas.” (p.

67). Ao passo que a pesquisa qualitativa explora características e cenários que

dificilmente podem ser descritos numericamente, a pesquisa quantitativa pode trazer

dados numéricos que podem ser úteis para uma melhor compreensão do contexto

explorado. Sendo assim, ambas podem ser usadas ao mesmo tempo.

Analisar os dados qualitativamente é um ponto fundamental desta pesquisa,

considerando que tal abordagem, segundo Chizzotti (1998), parte do principio de

que há uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, há um vinculo entre o

mundo objetivo e a subjetividade do sujeito. Sendo assim, como afirmam Bogdan e

Biklen (1998 citado por TURATO, 2000), o pesquisador tem como alvo

principalmente “(...) melhor compreender o comportamento e a experiência humana.

Eles procuram entender o processo pelo qual as pessoas constroem significados e

descrevem o que são aqueles significados.” (p. 95).


87

4.1 A PESQUISA

Esta pesquisa foi desenvolvida com um grupo de pais e professores, tendo

como foco alunos surdos que freqüentam o Centro de Atendimento Especializado


22
em Surdez (CAES) em Piraquara - município da região metropolitana de Curitiba -

durante um período do dia. No outro período esses mesmos alunos estudam em

escolas do ensino regular do mesmo município.

Fizeram parte da pesquisa doze pais (3 pais e 9 mães) 23 e respectivamente

doze professores de doze alunos que freqüentam o CAES. Abaixo se destacam

alguns aspectos de cada grupo (grupo de pais, grupo de professores):

Grupo de pais: Com o grupo de pais foram desenvolvidas entrevistas (anexo 1),

aplicadas pessoalmente pela pesquisadora. Nas entrevistas foram enfatizados

aspectos relacionados à visão dos pais acerca da educação escolar e do letramento

do filho surdo. Optou-se por utilizar o método da entrevista, a qual sob uma visão

sócio-histórica, tem a particularidade de ser compreendida como uma produção de

linguagem, no qual entrevistador e entrevistado estão dispostos numa situação de

interação verbal em que os enunciados são constituídos numa relação dialógica

(FREITAS, 2003).

Quadro 1: DESCRIÇÃO DOS PAIS

22
O CAES está situado, atualmente, no espaço de uma escola regular da rede pública do município.
23
A entrevista foi proposta para os pais, não especificamente pai ou mãe. Compareceu à entrevista o
responsável que geralmente se faz presente quando solicitado.
88

Como se Fez curso de


Último grau de Tem o hábito de ler
Pai/Mãe comunica com o Língua de
instrução (o quê?)
filho surdo Sinais
Pai 1 8ª série Oralmente Não Sim (jornal, revista)

Mãe 2 5ª série Oralmente Não Sim (Bíblia)

Mãe 3 5ª série Oralmente Não Sim (Bíblia)

Mãe 4 Ens. Médio Completo Oralmente Não Não

Mãe 5 Ens. Médio Completo Oralmente Não Sim (Bíblia)

Mãe 6 6ª série Oralmente Não Sim (Bíblia, bulas)

Mãe 7 Ens. Médio Incompleto Sinais/Oralmente Não Sim (Bíblia)

Mãe 8 4ª série Oralmente Não Não

Pai 9 7ª série Oralmente Não Sim (revistas)

Mãe 10 Ens. Médio Completo Oralmente Sim Não

Pai 11 5ª série Oralmente Não Sim (revistas)

Mãe 12 2ª série Oralmente Não Sim (bilhetes)

Como se pode observar no quadro acima a maioria dos pais estudou até a

4ª série do ensino fundamental. Em relação a como se comunicam com o filho

surdo, apenas uma mãe revela utilizar os “sinais”, além da fala, os demais referem

comunicar-se oralmente. Apenas uma mãe aponta ter feito curso de língua de sinais,

no entanto não cita fazer uso da mesma na comunicação com o filho.

No que diz respeito às práticas de leitura a maioria referiu que tem o hábito

de ler, três mães referiram não ter o hábito de ler. Dentre os materiais de leitura

foram apontados: Bíblia, em grande parte, revistas, jornal, bilhetes e bula de

remédios. É importante considerar que os pais entrevistados estão inseridos num

contexto social de baixa renda, em que, na maioria das vezes, o acesso a bens

materiais e culturais é precário.


89

Grupo de professores: Foram selecionados 12 professores do ensino regular que

têm um aluno surdo em sala de aula que freqüenta o CAES e que atuam no ensino

fundamental (1ª a 5ª série) em diferentes escolas das redes municipal e estadual de

ensino. Para a coleta de dados com os professores foram utilizados questionários

com questões fechadas e abertas (anexo 2), por ser este o instrumento mais

conveniente, já que, na tentativa de entrevistas a serem realizadas in loco, alguns

professores se mostraram indispostos e declararam não terem tempo. Os

questionários lhes foram entregues e devolvidos à pesquisadora dois a três dias

depois. No questionário foram enfocados aspectos referentes à educação escolar do

aluno surdo no contexto da inclusão e ao processo de leitura e escrita do mesmo.

Quadro 2: DESCRIÇÂO DOS PROFESSORES:

Série em Nº de alunos Tempo de Experiência anterior Formação (área


DESCRIÇÃO
que atua em sala docência com aluno surdo da Surdez)

Prof. 1 1ª 28 10 anos Não Não

Prof. 2 4ª 43 17 anos Não Sim*

Prof. 3 1ª 25 5 anos Não Não

Prof. 4 4ª 28 10 anos Não Não

Prof. 5 4ª 35 17 anos Não Sim**

Prof. 6 1ª 26 18 anos Não Não

Prof. 7 5ª 25 23 anos Não Sim**

Prof. 8 5ª 32 15 anos Não Não

Prof. 9 4ª 24 11 anos Sim Sim*

Prof. 10 5ª 40 6 anos Não Não

Prof. 11 5ª 40 5 meses Não Não

Prof. 12 1ª 23 10 anos Não Não

* Libras básico
** Adicional
90

Como se pode constatar no quadro 2, foram selecionados quatro

professores de 1ª série, quatro de 4ª e quatro de 5ª. O número de alunos em sala de

aula é, em geral, acima de 25, sendo que apenas duas professoras relataram ter

menos de 25. Os professores de 5ª série relataram ter um número de alunos

elevado em sala (40 em média). O tempo de docência dos professores é, em geral

superior a cinco anos, com exceção de uma professora que está na área docente há

apenas cinco meses. Dentre os professores, apenas uma professora já havia tido

aluno surdo em ano anterior em sala de aula, para os demais esta é a primeira vez.

A maioria dos professores está na área docente há mais de dez anos, porém

apenas quatro (33%) possuem curso relacionado à área da surdez (Curso Adicional

e Libras). Convém comentar que o curso Adicional24, extinto há cerca de dez anos,

priorizava o ensino voltado à reabilitação da fala e treinamento auditivo, o que na

prática, atualmente, não exerce um valor real, se considerado o atual contexto, em

que não cabe à escola enfocar aspectos reabilitadores, baseados na deficiência.

Serão destacados alguns dados acerca dos alunos, caso possa auxiliar

posteriormente.

Quadro 3: ALGUNS DADOS DAS CRIANÇAS

Criança 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12

Idade 07 13 08 09 12 07 15 11 11 11 11 09

Série 1ª 4ª 1ª 4ª 4ª 1ª 5ª 5ª 4ª 5ª 5ª 1ª

24
O curso Adicional em Deficiência Auditiva perdurou até o final dos anos 90. Segundo Strobel (2006)
até então, o modelo clínico predominou na educação de surdos em detrimento dos objetivos
educacionais, priorizaram-se os objetivos de reabilitação, assim: “(...) houve projetos de formação de
professores leigos que muitas vezes faziam papel de fonoaudiólogos, ficando assim a proposta
educacional direcionada somente para a reabilitação de fala aos sujeitos surdos.” (p. 248)
91

Como é possível perceber a idade das crianças é de 07 a 15 anos e

freqüentam entre a 1ª e 5ª série do ensino regular. Essas crianças freqüentam o

CAES no período contrário ao do ensino regular.

Um dado a ser observado é que se for relacionada a idade com a série a

maioria dos alunos encontra-se na série correspondente, havendo poucas

defasagens.

Por ser o ensino regular o contexto no qual emergem angústias, receios e

inseguranças tanto para os pais destes alunos, quanto para os professores que se

deparam com a presença do aluno surdo e com a surdez em sala de aula, a

presente pesquisa busca coletar dados que possam contribuir para uma discussão e

para a busca de uma compreensão acerca da educação escolar e do letramento de

surdos que estão inseridos no ensino regular do ponto de vista de pais e

professores.
92

5 ANÁLISE E DISCUSSÃO

A análise está dividida em duas partes principais: na primeira será discutida

e analisada a visão de pais e professores acerca da Educação Escolar do filho/aluno

surdo e na segunda será feita uma análise acerca de questões relacionadas ao

letramento, considerando os contextos familiar e escolar.

5.1 A VISÃO DOS PAIS ACERCA DA EDUCAÇÃO ESCOLAR DO(A) FILHO(A)

SURDO(A)

A interação familiar é de fundamental importância na constituição social do

sujeito. A família é, assim como pontua Guarinello (2000), o primeiro local em que as

capacidades das crianças são desenvolvidas, ao mesmo tempo que, como referem

Negreli e Marcon (2006), é no espaço familiar que os valores e as crenças são

transmitidos de geração em geração, de modo que o empreendimento conjunto

entre a criança e o adulto é determinante no seu desenvolvimento. Diante dessas

considerações, é importante destacar que o modo como a criança é tratada no

contexto familiar terá grande influência sob a imagem que terá de si mesma

(STELLING, 1999).

Além da família, a escola desempenha um papel fundamental, enquanto

local privilegiado na formação dos sujeitos. No que diz respeito às crianças surdas, é

importante considerar que, diferentes maneiras de constitui-se como sujeito devem

ser consideradas no âmbito escolar, sobretudo por haver a necessidade de se

reconhecer a importância de uma língua compartilhada para que a escola, enquanto


93

entidade, possa cumprir com sua função. Nesse aspecto, considerando o contexto

da inclusão educacional, convém levantar alguns questionamentos em torno da

participação dos pais no processo escolar da criança surda.

Sendo assim, serão destacados a seguir os seguintes aspectos:

• Como é estabelecida a comunicação com o filho/a surdo/a;

• A participação dos pais no processo escolar do filho/a;

• A visão dos pais a respeito da escola e da atuação do professor em sala de

aula.

Primeiramente, é importante destacar a relevância de se investigar o modo

com que os pais se comunicam com seus filhos justamente para saber se a língua

de sinais é contemplada ou não, e se não é, de que forma os pais percebem o

processo educacional da criança.

Ao serem questionados sobre como estabelecem a comunicação com o filho

surdo, 100% dos pais apontaram que se comunicam por meio da fala, dentre eles

apenas uma mãe afirmou fazer uso também, ocasionalmente, dos sinais. Em outra

questão, ao serem interrogados: “Você já fez algum curso de língua de sinais?”

apenas uma das mães apontou que sim, entretanto não foi esta mesma mãe que

referiu utilizar a língua de sinais com o filho.

A supremacia da linguagem oral na concepção dos pais é percebida em

seus depoimentos ao responderem como se comunicam com seu filho: (estes

episódios retratam todas as demais respostas) “Normal, só pela fala”, “Normal.

Conversando pela fala.” ou ainda: “Verbalmente, não por gestos”.

Considerando as implicações da surdez, sobretudo em relação à língua, é

possível perceber que há uma falta de compreensão dos pais em torno do

reconhecimento da língua de sinais enquanto aspecto fundamental na interação com


94

a criança. Convém considerar que o reconhecimento da língua de sinais, no caso da

criança surda, possibilita estabelecer interações que vão além da comunicação.

Para Bakhtin (1999) a língua é produzida num contexto social e dialógico, em que a

consciência lingüística é construída a partir da interação:

Os signos só emergem, decididamente, do processo de interação entre


uma consciência individual e outra. E a própria consciência individual está
repleta de signos. A consciência só se torna consciência quando se
impregna de conteúdo ideológico (semiótico) e, consequentemente,
somente no processo de interação verbal. (1990, p. 34).

Sendo assim, a surdez não é a responsável por ocasionais dificuldades que

a criança surda venha a apresentar, nem pela sua alienação nos contextos

familiares, mas sim a falta de possibilidades, de interações por meio da língua.

Segundo Sacks (1998) as adversidades em relação à surdez sobrevêm com o

colapso da linguagem, pois se a criança não é exposta ao diálogo e à língua as

questões lingüísticas, intelectuais, emocionais e culturais podem ser comprometidas.

No que diz respeito à participação parental nas questões escolares dos

filhos, apenas 25% dos pais referiram que sempre participam das atividades

escolares e comparecem à escola, como retratado nesta fala: “Eu sempre mando

bilhete pra professora. Cobro tanto dele quanto da professora. Acho que não me

agüentam mais na escola, eu brigo pelo meu filho.” (mãe 4). Nessa fala é importante

considerar o fato de que a educação parece ser uma luta constante para a mãe,

como se estivesse que estar, sempre, cobrando por algo que já é de direito.

A maioria dos pais, 67%, referiu que só participa ou comparece à escola

quando lhes é solicitado, como retrata esta fala: “Sempre que chamam eu vou.”

(mãe 12). Uma das mães (o que corresponde a 8% dos entrevistados) apontou que

nunca comparece à escola, e que a maneira com que participa da vida escolar da
95

filha é olhando o caderno da mesma, entretanto, ressalta que apenas olha o

caderno, mas não entende nada: “(...) Ás vezes olho o caderno, mas não entendo.

Nunca conversei na escola (...) não dá tempo.” (mãe 2). É possível perceber que a

mãe não questiona a filha acerca do que ela não entende, retratando que não existe

um diálogo em torno da compreensão da filha sobre o que ela vê nos cadernos,

parece então que o ato de olhar o caderno tem um fim em si mesmo.

Nessa mesma questão, dentre os pais, tanto do grupo daqueles que

afirmaram participar constantemente da vida escolar do filho, como aqueles que

afirmaram participar só quando solicitados, ou o que não participam, foram feitas

várias referências ao ato de olhar as tarefas e os cadernos dos filhos, a fim de

denotar uma maneira de participar das atividades escolares do mesmo, como se

pode observar nestas falas:

“Às vezes olho o caderno.” (mãe 2)

“De vez em quando eu olho os cadernos e pego ele de jeito...” (mãe 5)

“Olho o caderno dela, vejo a tarefa...” (mãe 6)

“Ele sempre me mostra as atividades da escola” (mãe 7)

“A mãe sempre olha os cadernos...” (pai 11)

A pouca participação dos pais no processo escolar do filho revela um fator

que, ainda que isto não se restrinja às crianças surdas, aponta para a falta de

interação efetiva com o contexto escolar dos filhos. A falta de interação pais-escola é

claramente percebida, o que reflete uma noção de que escola e família são
96

entidades sociais disjuntas, quando na verdade ambas têm em comum a formação

de um mesmo sujeito em diversos aspectos, como defendem Dessen e Polonia

(2007): “Ambas são responsáveis pela transmissão e construção do conhecimento

culturalmente organizado, modificando as formas de funcionamento psicológico, de

acordo com as expectativas de cada ambiente.” (p. 02). Sendo assim, tanto escola,

quanto família são instituições fundamentais para o desenvolvimento da criança.

Por outro lado ao serem interrogados sobre como consideram o

desempenho escolar do filho, 50% dos pais apontaram que consideram que o filho

apresenta um bom desempenho, enquanto 25% apontou que o desempenho do filho

é regular e 25% ruim. Neste sentido convém refletir: de que maneira os pais

percebem se o desenvolvimento do filho é bom ou não, se em sua maioria só

comparecem à escola quando solicitados? Seria o ato de olhar o caderno suficiente

para concluir que o filho está tendo ou não um bom desempenho escolar?

Certamente o simples ato de olhar o caderno não é fator suficiente para que

o pai/mãe avalie o desempenho escolar da criança. Os pais não referem, em

nenhuma das questões levantadas que conversam com o filho sobre questões

escolares. É possível aqui relacionar o fato de que só se utilizam da fala para se

comunicarem com a criança em casa, o que repercutiria nessa falta de troca de

informações a respeito da educação do filho, considerando as dificuldades que as

crianças têm em estabelecer a oralidade.

No que diz respeito ao ato de olhar o caderno, é importante aqui considerar

que apesar de estar com suas atividades em dia no caderno, a criança pode não

estar se apropriando do conteúdo escolar. O fato de estar tudo ‘copiado’ no caderno,

ou de as atividades estarem todas ‘completas’ pode ser decorrente, muitas vezes,

da cópia, já que esta é uma prática comum que muitas vezes não é compreendida
97

pelos pais, e atribuída como apropriação do conhecimento. Essa ocorrência é

constantemente vivenciada no dia-a-dia do CAES. Muitas vezes o aluno traz dúvidas

acerca de conteúdos desenvolvidos em sala de aula, e em geral refere que não

entende o que está escrito em seu caderno, sobretudo, quando isto se refere a

textos que discorrem acerca de um determinado assunto.

Sobre esse aspecto Silva (2005) pôde perceber, em pesquisa realizada, que,

no que diz respeito a pais de alunos surdos, a expectativa em relação à cópia é

praticamente a única valorizada, pois há uma crença de que se o aluno está

copiando, ele está aprendendo.

No entanto, ainda que a pouca participação dos pais no processo escolar

possa ser percebida, ao serem interrogados se a escola corresponde as suas

expectativas, a maioria, 67%, afirma estar insatisfeita. Cabe ressaltar que entre

estes estão justamente aqueles que sempre se fazem presentes na escola, o que

não se pode deixar de considerar, já que, ainda que seja uma minoria (25% dos

entrevistados) interage constantemente com a escola e refletem um mesmo olhar.

Alguns pais justificaram o porquê de estarem insatisfeitos com a escola,

referindo que esta não está preparada para atender às especificidades do aluno:

“(...) hoje em dia é só filme, não dão aula.” (pai1)

“(...) atendem muito mal os alunos. Pior é que não tem outro jeito tem que

deixar ele lá.” (mãe 3)

“A escola deveria ser mais apropriada, está muito defasada. O ensino

deixa a desejar...” (mãe 5)

“Eu acho que deveriam dar mais atenção para este caso. Eles tratam com
98

preconceito.” (mãe 6)

“Eu acho que eles ainda estão meio perdidos (...) não entendem o jeito que

ela aprende.” (mãe 8)

“(...) acho que há professores que não condiz com um tratamento

especializado. Uma vez um professor perguntou porque ela não parava de

olhar.” (mãe 10)

Essas afirmativas conduzem a uma contradição, pois se por um lado, como

analisado em uma questão anterior não há inferência acerca da necessidade de se

reconhecer algumas especificidades na interação com o filho surdo, como a língua

em comum, já nessas questões referentes à postura da escola, os pais parecem

reconhecer que há uma diferença a ser considerada no processo escolar do filho ao

justificarem o porquê de se mostrarem insatisfeitos.

É possível perceber que na maioria das falas os pais referem-se a uma

atenção específica que deveria ser dada ao filho, o que denota o reconhecimento

por parte deles de que há realmente uma diferença a ser levada em consideração

que não está sendo contemplada. O mau atendimento ao aluno, o fato de a escola

não ser “apropriada”, a falta de atenção, o preconceito, o despreparo dos

professores estão retratados nitidamente na voz dos pais. O que significa que estão

insatisfeitos com a política educacional, pois num contexto onde a inclusão é

pressuposta, não são proporcionadas mudanças efetivas no interior da escola, como

por exemplo, em torno da visão em torno do sujeito surdo. A mãe 10 traz uma

questão importante ao afirmar que “Uma vez um professor perguntou porque ela não

parava de olhar.”, o que revela o desconhecimento por parte do professor acerca de


99

que a surdez é uma experiência visual, o “olhar” é que estabelece as condutas para

o surdo. A mãe 3 traz uma fala que chama atenção, ao dizer “pior é que eu tenho

que deixar ela lá” como se o contexto político e educacional que estabelece a escola

regular como mais apropriada estivesse refletido na sua fala.

Quando indagados sobre o que estão fazendo para melhorar, já que estão

insatisfeitos, alguns pais referiram que manifestam sua indignação exercendo certa

cobrança na escola, como é possível perceber em uma das falas que retrata as

demais: “Tô sempre cobrando deles...” (mãe 8). No entanto, algumas afirmativas

chamam a atenção:

“Não reclamo como a maioria faz, nem vou na escola pra saber o que ta

acontecendo...” (pai 1)

“Algumas coisas é ela que não entende mesmo.” (mãe 2)

“Eu vou ficando quieta....” (mãe 3)

Essas falas mostram que há certa acomodação com relação a um

posicionamento destes pais frente à insatisfação, pois mesmo afirmando que a

escola não corresponde ao que esperam, não se vêem no direito de exigir melhoras,

aceitando a situação como se coloca.

A insatisfação dos pais foi retratada também quando interrogados sobre qual

seu ponto de vista a respeito da atuação dos professores com seu filho em sala de

aula: 67% dos pais afirmaram estar insatisfeitos com a atuação do professor em

relação ao filho. Dentre os motivos de insatisfação, foram apontados: falta de


100

atenção ao aluno, falta de paciência, preconceito e falta de preparo profissional. Em

uma das falas, inclusive, foi possível perceber que há um pré- conceito no que diz

respeito a esta questão: “Até agora não conversei com a professora. Mas acho que

é igual às outras, reprime ele, não dá atenção.” (mãe 3). Esse modo de perceber e

julgar a postura da professora retrata, de certa forma, a visão que a mãe tem, mas

não necessariamente possa ser a realidade, já que ela mesma afirma nunca ter

conversado com a professora. No entanto, a mãe traz um histórico refletido na sua

fala que, assim como dos outros pais, retrata um contexto no qual não são tomadas

atitudes e posições que considerem a diferença, a surdez.

Não é intenção aqui, justificar a atenção especializada e diferenciada que

deve ser dispensada unicamente ao aluno surdo, mas ponderar que há uma

diferença a ser considerada no contexto de sala de aula, assim como há

particularidades entre os demais alunos, que não dizem respeito à surdez, mas a

necessidades singulares que se manifestam no processo escolar, como bem retrata

uma outra mãe, ao manifestar seu ponto de vista em relação à atuação do professor

em sala de aula: “Acho que são como são com os outros, não tem um atendimento

que deveriam ter. Ela é só mais uma.” (mãe 2). Nessa fala pode-se supor que a mãe

se refere a uma atenção diferenciada com o filho por parte do professor, sobretudo

por se tratar de um contexto de inclusão, em que as diferenças devem ser levadas

em consideração. Além disso, a mãe retrata que seu filho não é uma exceção, que

assim como ele, os demais deveriam ter uma atenção melhor.

Diante do exposto até aqui foi possível verificar como se constituem as

visões dos pais em torno da educação escolar da criança surda, e como essas

visões mudam e ganham diferentes contornos dependendo do lugar de onde se fala,

pois ao se falar da criança enquanto filho, no âmbito familiar, a pouca participação


101

na educação escolar foi percebida, da mesma forma que a língua de sinais não foi

apontada pelos mesmos, o que denota que a surdez não constitui, para eles, uma

diferença a ser levada em consideração. Por outro lado, ao se colocar como pai de

aluno surdo, aí sim, há uma inferência de que a surdez constitui uma diferença a ser

considerada no contexto escolar, pela escola e pelos professores. Os pais, de certa

forma, atribuem à escola uma responsabilidade que muitas vezes, eles, enquanto

pais, não se dispõem a pôr em prática.

É importante, diante disso, analisar como se dá a educação escolar dessas

crianças surdas a partir do ponto de vista do professor do ensino regular. a fim de

observar se os conceitos e o modo de percebê-la nos diferentes contextos, familiar e

escolar, correspondem ou se desencontram. Será discutida a seguir, a visão dos

professores.

5.2 A VISÃO DOS PROFESSORES ACERCA DA EDUCAÇÃO ESCOLAR DOS

ALUNOS SURDOS

Considerando as diferentes interações que se constituem na escola com o

aluno surdo por parte do professor, a fim de se estabelecer uma relação com o

contexto familiar, foram abordados os seguintes aspectos:

• A visão do professor acerca da participação dos pais no processo

escolar do aluno surdo;

• Como é estabelecida a comunicação com o aluno surdo em sala de

aula;
102

• Como o professor considera seu conhecimento acerca da surdez e da

língua de sinais;

Anteriormente, foi possível perceber, que os pais levantaram várias queixas

com relação à atuação do professor em sala de aula. Será destacado aqui que, em

contrapartida, os professores também revelam a pouca participação dos pais no

processo escolar da criança surda, pois quando indagados sobre como é a

participação dos pais do aluno surdo na escola, 75% dos professores apontaram

que só há participação dos pais quando solicitados, 17% apontou a constante

participação dos mesmos e 8% afirmou não ter conhecimento acerca do fato. Essa

questão coincidiu, em geral, com o que foi afirmado pelos pais, já que a maioria

revelou comparecer à escola somente quando solicitado. Cabe aqui ressaltar que

constantemente há uma cobrança tanto dos pais para com o professor quanto deste

para com os pais, entretanto, não são tomadas atitudes que possam superar esse

problema. Levantar hipóteses de um trabalho em conjunto com a família deveria ser

um propósito contínuo da escola, já que os dois contextos têm em comum a

formação de um mesmo sujeito.

Outro dado a ser pontuado é com relação ao modo com que é estabelecida

a comunicação com a criança surda no âmbito familiar. Ao analisar as falas dos pais,

foi possível perceber que existe uma barreira lingüística que impede a criança,

muitas vezes, de participar ativamente dos contextos lingüísticos que circulam em

casa, considerando que a língua de sinais não foi por eles apontada. Tal barreira,

entretanto, não se faz presente somente no contexto familiar. É sob esse aspecto

que se focaliza nessa pesquisa a questão da inclusão escolar, tendo em vista que é

nesse contexto que tal barreira também se estabelece. Sendo assim, voltar o olhar
103

para as vozes dos professores é de fundamental importância para que se possa

perceber de que maneira os mesmos interagem com seu aluno surdo e se este

ocupa um lugar de sujeito ativo nos contextos lingüísticos de sala de aula.

Ao serem interrogados sobre como é estabelecida a comunicação com o

aluno em sala de aula, 92% dos professores referiram que se utilizam da fala,

somente um professor (8%) apontou os gestos e a escrita, além da fala e da leitura

labial. Outras duas professoras (25%) referiram a leitura labial, sendo que uma delas

apontou somente a leitura labial, como é possível verificar a seguir:

Gráfico 1: FORMA DE COMUNICAÇÃO UTILIZADA COM O ALUNO SURDO:

Forma de comunicação utilizada com o aluno surdo


92%

25%
8% 8%
0

la al s s s
Fa labi to ra ro
a es Lib ut
r G O
i tu
Le

Fala Leitura labial Gestos Libras Outros

Série1 11 3 1 0 1

FONTE: Pesquisa de campo


NOTA: Essa questão consiste em uma questão fechada de múltipla escolha

Como é possível perceber, a maioria dos professores utiliza efetivamente a

fala. Isso leva a questionar sobre a realidade da inclusão. Se não estão sendo

contempladas interações lingüísticas significativas com o aluno surdo, pressupondo

a língua de sinais, então a inclusão não está sendo concretizada. Conforme Bakhtin

(1990) a interioridade lingüística se constrói a partir da absorção de todo um


104

discurso social exterior, o que mostra que a construção da consciência lingüística de

cada sujeito obedece a um movimento de interiorização das construções lingüístico-

sociais de uma coletividade em que estamos inseridos, para depois exteriorizar-se

novamente, o que ocorre através da interação proporcionada pelo uso da língua.

Dessa forma, para além da comunicação, é necessário que a criança tenha acesso

a uma língua, a partir da qual possa constituir seus conceitos. Certamente a

comunicação é um aspecto importante, porém somente a língua é capaz de

promover a consciência lingüística. Nenhum professor referiu-se à língua de sinais, o

que pressupõe que pode haver algum tipo de comunicação, no entanto não há

efetivamente uma interação mediada por uma língua.

Acerca da leitura labial convém aqui fazer um parêntese a respeito da falsa

impressão que a mesma denota. As pessoas tendem a acreditar que os surdos, em

grande parte, fazem leitura labial e consequentemente compreendem o que está

sendo dito. Várias vezes, em conversas com os professores comumente surge o

comentário: “ele (a) faz leitura labial.”, ou: “acho que ele (a) entende pela leitura

labial.” Acerca disso, Botelho (1999) refere que apenas 25% do que se diz pode ser

identificado, isto pelos melhores leitores labiais e que apesar de a leitura labial ser

útil algumas vezes, considerando a interação surdo ouvinte, não garante a

compreensão:

A leitura labial (...) não é definidora da compreensão, especialmente porque


é muito dependente de compreensão do contexto, da integração do
conjunto de elementos verbais e não-verbais, de uma atitude ativa do
sujeito surdo na interação e de eliminação da simulação de compreensão
de ambas as partes (...). Mas não raramente as possibilidades da leitura
labial são superestimadas, e recusados os limites e impossibilidades.
(BOTELHO, 1999, p. 2).
105

Ao se estabelecer uma relação entre a família e a escola é possível perceber

que as dificuldades referentes às interações lingüísticas se mostram como um fator

a ser considerado.

O desconhecimento acerca da surdez e da língua de sinais ocorre tanto na

família, quanto na escola, pois ao serem indagados sobre como consideram seu

conhecimento em torno da surdez e da língua de sinais, a maioria dos professores

(67%) referiu que considera seu conhecimento sobre a surdez regular, pois conhece

apenas algumas teorias, mas tem dificuldades em compreender as implicações

relacionadas à mesma, 33% afirmou não possuir nenhum conhecimento acerca da

surdez, desconhecendo totalmente teorias e implicações.

Quando questionados sobre o conhecimento com relação à língua de sinais,

a maioria, 59%, referiu que considera insuficiente, pois apenas conhecem alguns

sinais, mas têm dificuldades em utilizá-los na comunicação, 33% afirmou que a

desconhecem totalmente. Somente uma professora (8%) afirmou conhecer a língua

de sinais, o que se deve ao fato de ter uma filha surda, entretanto, essa mesma

professora, assim como as demais, não apontou a língua de sinais ao ser

interrogada sobre a comunicação com o aluno, como analisado anteriormente.

O fato de apenas uma professora conhecer a língua de sinais é outro

contraponto no que diz respeito à real concretitude da inclusão. Levando em conta

que esta proposta foi estabelecida já há alguns anos e que a inclusão de surdos no

ensino regular não é uma novidade. Chama a atenção apenas uma professora

declarar que conhece a língua de sinais.

Convém considerar que, apesar de a maioria dos professores estarem na

área docente há mais de dez anos, apenas uma professora (8%) teve aluno surdo

em sala de aula em anos anteriores, as demais nunca haviam tido essa experiência.
106

No que diz respeito à formação para atuar com aluno surdo, apenas 33% possui

algum curso relacionado à Surdez, ainda que não corresponda a cursos

aprofundados. Acerca disso, convém salientar que ainda que o professor deva, por

conta própria, buscar constantemente aprimorar-se no campo educacional, ao se

propor a inclusão, no contexto em questão, de um modo geral, não foram

consideradas as determinações legais que privilegiam a formação do professor para

poder atender à diversidade.

No artigo 18 da resolução 02/2001 é estabelecido que os professores, para

atuar com alunos com necessidades especiais sejam capacitados e/ou

especializados, no entanto, a responsabilidade fica a cargo do professor, não sendo

mencionado claramente a obrigatoriedade do município em ofertar cursos de

formação continuada, mencionando-se apenas que sejam oferecidas formações a

professores em nível médio por instituições de ensino. Da mesma forma, como é

possível observar no contexto escolar do município em questão, para a escolha de

turmas, como ocorre no início de cada ano letivo, não é colocado em evidência a

formação do professor e a presença de alunos com necessidades especiais nesta

ou naquela turma. Tal articulação possibilitaria que o professor com formação em

determinada área pudesse atuar, sendo sua formação um ponto que viesse

ocasionalmente a favorecer o processo de inclusão, o que seria considerar a lei

acima citada.

5.2.1 Reflexões acerca do trabalho pedagógico considerando a inclusão do aluno

surdo em sala de aula


107

No que diz respeito ao trabalho pedagógico, propriamente dito, será

destacada a seguir a visão dos professores com relação a:

• (Há?) Diferenças no processo de ensino-aprendizagem entre o aluno

surdo e os demais;

• Como considera o desempenho escolar do aluno;

• Qual a maior dificuldade com relação ao aluno surdo em sala;

• Uso de estratégias e avaliação diferenciadas com o aluno surdo;

• Teoria/concepção em que é elaborado o plano de trabalho docente.

Levantar essas questões em torno das práticas pedagógicas relacionadas

ao processo de ensino-aprendizagem do aluno surdo em sala regular conduz a

alguns questionamentos em torno do modo com que estas práticas são

estabelecidas. Ao serem indagados: Você percebe diferenças no processo de

ensino-aprendizagem entre o aluno surdo e os demais? Quais? 33% afirmou que

não percebem diferenças, enquanto 67% dos professores afirmaram perceber sim

que há diferenças. De modo geral, tais diferenças parecem consistir no fato de que o

surdo: ‘aprende’ mais lentamente, é desatento, é inseguro, tem dificuldades de

escrita e interpretação, como é possível observar nas justificativas a seguir:

“É mais desatento, não presta atenção nas atividades propostas.” (prof. 1)

“Entrosamento com os colegas.” (prof. 2)

“Ele tem medo de se expor, nega-se a fazer o que julga não ser capaz de

executar.” (prof. 3)
108

“Com o aluno surdo o trabalho é mais lento, deve ser mais detalhado, é

mais difícil manter a atenção do aluno durante a aula.” (prof. 4)

“Demoram um pouco mais para se situar no assunto. Mas quando isso

ocorre são mais ágeis.” (prof. 5)

“O aluno especial (surdo), o processo de ensino-aprendizagem é mais

lento, porém seu esforço é maior é muito mais curioso.” (prof. 7)

“Ele tem mais dificuldade na escrita e na interpretação.” (prof. 8)

“Ele necessita de constante auxílio, pois não sente segurança e confiança

no que faz.” (prof. 12)

Torna-se necessário refletir nesse ponto acerca dos motivos que levam a

esses apontamentos. O fato de o aluno ser desatento não é um fator decorrente da

surdez, mas de situações contextuais em que está inserido, pois se para ele, como é

para o ouvinte, determinada situação não é significativa, seja por não dispor de uma

língua em comum com o professor, seja pelo fato de não se estar utilizando

estratégias que lhe despertem interesse, desviará sua atenção do que está sendo

abordado.

No que diz respeito ao surdo ‘ser lento’, parece claro que quando o meio de

apropriação dos conceitos, o visual, não é privilegiado na abordagem dos

conteúdos, considerando-se somente o aspecto auditivo, o surdo levará mais tempo

para compreender do que se fala. Dito de outra forma, a apropriação de conceitos e

conteúdos ocorre por vias diferentes dos demais alunos, pois enquanto estes

‘ouvem’ as solicitações, a explicação e os apontamentos feitos pelo professor, a


109

criança surda, que se baseia em experiências visuais, está tentando compreender

sobre o quê se fala, buscando alternativas que a levem cumprir o que se pede ou

até mesmo a simular uma compreensão.

Acerca da simulação da compreensão destaca-se aqui a fala de uma

professora, a qual está entre aquelas que afirmaram não perceber diferenças na

aprendizagem entre o aluno surdo e os demais, que diz: “(...) no caso da minha

aluna, pergunto a ela se tem alguma dificuldade, ela diz que está tudo bem.” (prof.

11). Ou seja, a professora conclui que a aluna está compreendendo porque há uma

resposta positiva. Entretanto, essa é uma estratégia comumente utilizada pelo aluno

surdo, a fim de manter-se em sala de aula, como bem pontua Fernandes (2006b): “A

simulação da aprendizagem é uma estratégia de ‘sobrevivência’ em sala de aula e

revela uma atitude de resignação, a despeito da exclusão na interação e na

aprendizagem, movida pela ausência de um território lingüístico compartilhado no

contexto escolar.” (p. 3).

Convém considerar aqui uma reflexão em torno das representações

ouvintistas que se fazem presentes em algumas falas, como por exemplo, dos prof.

4 e 7 ao colocarem que o processo de ensino aprendizagem para o surdo é mais

lento. Segundo Skliar (1998) o ouvintismo diz respeito a conjunto de representações

dos ouvintes a partir do qual o surdo está obrigado a olhar-se e a narrar-se como

ouvinte, de modo a prevalecer a visão da deficiência, do não ouvir.

Ao olhar o surdo e a surdez a partir de uma posição ouvintista, ao colocar-se

no lugar do outro, do surdo, carrega-se sempre as significações dos ouvintes e não

como sujeito que se vê e se narra a partir de experiências visuais, constituindo seus

conceitos de maneira diferente (LOPES, 2007). Ao considerar o surdo desatento, por

exemplo, prevalece a visão ouvintista, sem perceber que a desatenção, assim como
110

já referido, tem a ver com o significado da experiência vivenciada naquele momento

pelo surdo.

As falas dos professores refletem um discurso que circula socialmente. Em

geral, não se colocam as diferenças em relação ao aluno surdo, mas as suas

limitações. Os professores parecem recorrer, em seus discursos, às diferenças de

ordem biológica dos sujeitos, como se a surdez em si causasse a lentidão, as

dificuldades. Os professores não se referiram, por exemplo, à diferença visual, ou

seja não se percebe que o aspecto visual, para o surdo, é muito importante.

Apesar de a maior parte dos professores terem apontado diferenças no

processo de ensino-aprendizagem, ao serem indagados acerca do desempenho

escolar do aluno surdo em sala de aula, 50% afirmou que o aluno apresenta um bom

desempenho, apesar de ressaltarem algumas observações como: “A aluna

demonstra bastante interesse e faz as atividades propostas embora tenha suas

dificuldades.” (prof. 8), “A aluna é repetente na série, mas acompanha bem as

atividades (...)” (prof. 9).

42% afirmou que o aluno apresenta um desempenho regular, ressaltando

que:

“(...) as atividades realizadas pela aluna é só através de registro (cópia).”

(prof 1)

“Apresenta dificuldades em entender os conteúdos e elaborar as atividades

propostas.” (prof.4)

“O fato de não compreender e não saber a língua de sinais dificulta a

relação entre professora e aluno, e ainda a relação desse aluno com os


111

demais colegas.” (prof. 7)

“(...) a maioria das vezes o aluno não consegue entender as atividades

propostas.” (prof. 12)

Como é possível observar, há uma percepção, pelos professores, de que há

uma falta de compreensão por parte do aluno, o que acaba refletindo no seu

desempenho escolar. É interessante observar que um dos professores apontou que

não saber a língua de sinais é prejudicial nesse aspecto.

Apenas 8%, ou seja, um professor, afirmou que o aluno não apresenta um

bom desempenho em sala de aula, justificando que há “pouco empenho do aluno,

nenhuma participação da família, falta de formação e informação do professor.”

(prof. 2). Ou seja, nessa última afirmativa percebe-se que o professor não tenta

mascarar o desenvolvimento do aluno e assume que há vários fatores que

colaboram para que o mesmo não apresente um bom desenvolvimento, não

deixando recair somente sob o aluno tal questão.

Interessante perceber que nas falas dos professores que consideram que o

aluno apresenta um bom desempenho retratam-se diversas dificuldades, no entanto

os professores parecem ter dificuldades em assumir que o aluno não está tendo um

bom desempenho em sua sala de aula. Apesar de afirmarem o bom desempenho,

as afirmações vêm seguidas do “mas”, “embora” (prof. 8 e 9), retratando ainda que o

aluno, na visão do professor, apresenta dificuldades. Mesmo aqueles que apontam o

desempenho regular do aluno, o fazem referindo somente a aspectos negativos. Se

o desempenho é regular aspectos positivos também deveriam ser retratados.

Um dado curioso com relação ao desempenho escolar do surdo é que se for

comparada a visão dos pais, analisada anteriormente, à visão do professor em


112

relação ao mesmo sujeito, apenas 33% das respostas coincide, ou seja, na maioria

das vezes a visão dos pais sobre o desempenho do filho, não foi a mesma do

professor. Há de se ressaltar aqui que as respostas que coincidiram foram aquelas

em que pais e professores afirmaram que a criança apresenta um bom

desempenho. Entretanto, alguns alunos que na visão dos professores se

desenvolvem bem em sala de aula, na visão dos pais tem um desempenho ruim.

É importante considerar aqui várias questões que permeiam o fato de o

aluno apresentar ou não um bom desempenho em sala de aula. Obviamente, não é

a intenção neste ponto, levantar julgamentos acerca do trabalho pedagógico,

tampouco o criticar. O que se pretende é levantar alguns questionamentos capazes

de levar à reflexão em torno de fatores que podem ser determinantes na questão da

inclusão do surdo em sala de aula, que dizem respeito a:

a) reflexão que o próprio professor faz acerca do seu trabalho com o aluno e

do quanto está disposto a reconhecer a necessidade de se considerar as

diferenças diante da inclusão;

b) mudanças atitudinais e conceituais por parte de todo um grupo escolar,

considerando a diferença em sala de aula, desde a construção das

diretrizes que norteiam o trabalho pedagógico até a construção do projeto

político pedagógico da escola;

c) o reconhecimento por parte dos professores em relação as suas próprias

dificuldades no contexto da inclusão.

Ao serem indagados sobre qual a maior dificuldade com relação à inclusão

do aluno surdo em sala de aula, somente 25% dos professores assumiram ou

apontaram a sua dificuldade, referindo a:


113

“Transmitir o conhecimento necessário para seu aprendizado, manter a

atenção do aluno durante a aula.” (prof. 4)

“É desconhecer os aspectos relacionados à surdez e ao sujeito.” (prof. 6)

“A maior dificuldade é em relação a qual metodologia ser aplicada.” (prof.

10).

Essas afirmações refletem o reconhecimento, por parte desses professores,

de que alguns entraves no trabalho com o aluno surdo têm a ver com a sua própria

dificuldade em lidar com a surdez, desse modo assumem que têm dificuldades.

Convém aqui levantar uma reflexão em torno da metodologia a ser aplicada

apontada por um dos professores. Será que se a questão metodológica for

solucionada os problemas em relação ao trabalho com o surdo em sala de aula

estarão resolvidos? É preciso pensar além da metodologia, é preciso pensar

também além de o professor conhecer a língua de sinais. O que se faz necessário é

estabelecer ações políticas que tenham a diferença como parte da educação e não

como algo passível de inclusão. Se a educação fosse pensada levando em conta as

diferenças, até o próprio termo inclusão tenderia a desaparecer, já que não seria

necessário incluir, pois a educação já pressuporia a diversidade.

Diferentemente dos professores que assumiram a própria dificuldade em

relação ao trabalho com o aluno surdo em sala de aula, a maioria, 75%, pontuou

que a dificuldade é ou do aluno, ou da família, ou do sistema, atribuindo a

dificuldade no trabalho com o aluno surdo em sala:


114

“(...) a demora no atendimento por profissional qualificado, (...) a não

aceitação dos responsáveis em reconhecer tais/tal dificuldade.” (prof. 2)

“A receptividade do aluno e o modo como ele reage em relação as suas

próprias dificuldades e as interferências em suas atividades.” (prof. 3)

“O número grande de alunos em sala de aula, não obedecendo a

diminuição de alunos quando há aluno incluso, não há possibilidade de

trabalho individual.” (prof. 5)

“(...) até hoje o estado não nos proporcionou nenhum curso que nos

embasasse para trabalhar com esse tipo de aluno.” (prof. 8)

“A única dificuldade com relação a ela é que sempre esquece o aparelho.”

(prof. 9)

É possível perceber que não há, na maioria dessas falas, inferência a

dificuldades do professor em si, mas apontamentos que parecem justificá-las, pois a

questão não se referia a problemas do aluno, da escola ou de apoios, mas a

dificuldade que o professor tem em relação ao trabalho com o aluno surdo.

Por um lado, é importante ressaltar novamente sobre a necessidade de

formação continuada para que o professor possa ter acesso a novos caminhos e

metodologias a serem adotados frente ao contexto da inclusão, o que no caso

destes professores, não é propiciado por parte do município, como eles mesmos

apontaram. Isso não se aplica ao Estado, contrariando o que foi referido pelo

professor 8, pois como citado em capítulo anterior, a Secretaria de Estado tem

proporcionado constantemente cursos de capacitação. O que ocorre, na maioria das


115

vezes é que, o professor não dispõe de tempo ou ainda não se dispõe a participar

de tais cursos, ou ainda, não lhe são repassados por outros profissionais que têm a

oportunidade de participar.

A reflexão sobre as próprias dificuldades não só com relação ao aluno surdo,

mas no que diz respeito à prática pedagógica, deveria ser um exercício constante,

ainda que não seja uma tarefa fácil, para que a partir de uma análise da própria

prática possam surgir indagações que apontem para novas buscas, novas reflexões

e mudanças metodológicas, sobretudo no que diz respeito à necessidade de se

repensar a respeito da diversidade e ao mesmo tempo da singularidade presentes

em sala de aula.

Sendo assim, é fundamental que o professor possa perceber as diferentes

maneiras pelas quais o aluno constitui seus conceitos e seu aprendizado, em

específico o aluno surdo, o que implica repensar acerca de recursos diferenciados e

o compartilhamento de uma língua em comum. Diante disso, procurou-se investigar

se os professores fazem uso de estratégias e avaliação diferenciadas, considerando

a presença do aluno surdo em sala de aula.

No que diz respeito à questão: Você utiliza alguma estratégia diferenciada

com o aluno surdo? Apenas 50% dos professores afirmaram que utilizam algum tipo

de estratégia, dentre as quais apontaram: atendimento individualizado, auxílio na

execução das atividades, aproximação constante do aluno. Não foram feitos

apontamentos acerca de estratégias diferenciadas a partir de, por exemplo,

trabalhos em grupos, uso de material visual, dramatização, entre outros. Retomamos

aqui a reflexão feita em capitulo anterior que se refere à flexibilização curricular, de

modo a privilegiar diferentes modos de se abordar determinado conteúdo.


116

Nas falas dos professores foi possível verificar que há, na verdade, a falta de

uma noção acerca do que são e de quais estratégias utilizar, o que pode ser

visualizado na fala de uma das professoras que afirma: “(...) procuro não trabalhar

com textos extensos e de difícil compreensão.” (prof. 7). Cabe aqui algumas

pontuações em torno dessa colocação assumida pela professora. O primeiro ponto

diz respeito à noção que se tem de texto. Geraldi (1997) refere que o texto não deve

ser tomado como um produto pronto e acabado, mas como um trabalho produtivo,

constituindo-se num espaço dialógico de produção de sentidos e de interlocução, no

qual “a presença do texto constrói-se como possibilidade de reapropriação, pelo

professor, e pelos alunos, de seu papel produtivo.” (p. 113). Sendo assim, falar-se

em evitar textos de difícil compreensão ou extensos não se justifica quando estes

são contextualizados e abordados a partir de uma função, bem como quando

colocados como um elemento para discussão e reflexão.

O segundo ponto diz respeito à idéia que se tem de que o surdo não

compreenderá um texto extenso ou com certa complexidade, o que pode ser

atribuído justamente ao fato de se ter como base uma língua que ele não domina.

Porém, esse seria justamente um motivo para não reduzir, mas ampliar as

possibilidades de trabalho com a língua portuguesa, abordando o texto considerando

sua função e possibilitando a ampliação lexical por parte do aluno.

Outra questão está relacionada ao desconhecimento em torno do que são

estratégias diferenciadas, o que no caso do aluno surdo, diz respeito a maneiras

diferentes de se abordar determinados conteúdos, materiais diversificados, apoio

visual (o que não contemplaria somente o surdo, mas toda a turma), entre outros.

Acerca disso, Fernandes (2006c) apresenta algumas estratégias diferenciadas a

serem utilizadas em sala de aula, a fim de facilitar a interação/comunicação:


117

- Combinar diferentes tipos de agrupamento de alunos, a fim de facilitar a

visualização da sala toda pelo aluno e sua interação com os colegas;

- Introduzir métodos e estratégias visuais complementares à língua de sinais no

desenvolvimento das atividades curriculares, a fim de facilitar a comunicação e a

aprendizagem dos alunos;

- Planejar atividades com diferentes graus de dificuldade e que permitam

diferentes possibilidades de execução e expressão;

- Propor atividades diferenciadas em torno de um mesmo conteúdo;

- Promover a interação entre professor do ensino regular e da educação

especial a fim de proporcionar orientações acerca da comunicação/interação com o

aluno surdo, indicação de práticas pedagógicas, participação em conselho de

classe, etc.

Fernandes (2006c) ressalta ainda a importância de um trabalho em

conjunto entre professores regentes, equipe técnico-pedagógica e professores

especializados na área da surdez.

No mesmo sentido, pode-se perceber o desconhecimento dos professores

em torno da importância da avaliação diferenciada com o aluno surdo. Ao serem

interrogados se utilizam algum tipo de avaliação diferenciada, 58% dos professores

afirmaram que sim, em geral os mesmos que afirmaram fazer uso de estratégias

diferenciadas, no entanto, dentre os modos de avaliação diferenciada apontaram:

atividades de reforço em caderno diferenciado, utilização de imagens associadas ao

texto, e o que mais chamou a atenção foi o fato de entre estes, 33% afirmar fazer

uso da avaliação oral, como se pode observar nas seguintes falas ao se referirem ao

tipo de avaliação diferenciada que utilizam: “às vezes faço oralmente” (prof. 2), “A

oral para desenvolvimento de sua dicção.” (prof. 10). Ou seja, o aluno é ‘avaliado’
118

justamente sob o aspecto em que mais apresenta dificuldades. É possível perceber

aqui, novamente, a supremacia da linguagem oral e, sobretudo, o equívoco de se

conceber a ‘oralização’ como apropriação do conteúdo, ou ainda, a fala como um

pré-requisito para a aprendizagem.

Dos 42% dos professores que afirmaram não utilizar avaliação diferenciada

apenas um (8%) justificou não o fazer por não dispor de diretrizes específicas, que

privilegiem conteúdos direcionados ou diferenciados. Ou seja, o professor alega não

ter um amparo pedagógico que possa orientá-lo, o que de fato ocorre, pois as

diretrizes curriculares do município em questão não contemplam uma visão à

inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais, de um modo geral.

Entretanto, caberia ao grupo de professores, considerando o atual contexto de

inclusão, reivindicar por mudanças nas diretrizes, já que estas são construídas

mediante discussões, grupos de estudos e apontamentos feitos pelos próprios

professores da rede de ensino.

Acerca da avaliação, cabe questionar ainda: qual o conceito que se tem de

avaliação e de qual é sua função? O que, quando e por que se avalia? Nas

afirmativas apontadas em relação ao tipo de avaliação diferenciada parece não se

conceber a avaliação como um processo contínuo, que por isso não deve se dar em

um momento único, “mas se inserir nas diferentes situações que envolvem o

processo de aprendizagem do aluno.” (BRASIL, 2005b, p. 85).

Certamente é necessário reconhecer que por trás das afirmativas

relacionadas a estratégias e avaliação diferenciada, há uma intenção e uma

tentativa em conceber ao aluno uma oportunidade diferenciada, porém, como se tem

ressaltado constantemente, parece não haver um reconhecimento acerca das

implicações da surdez.
119

Os apontamentos que veicularam em torno da avaliação trazem à tona uma

reflexão a respeito da concepção que fundamenta o trabalho pedagógico. O modo

com que o professor conduz sua prática tem a ver com seu modo de conceber o

ensino e que teorias toma como base para o seu trabalho, de modo que esta

concepção lhe possibilita perceber o sujeito, a linguagem, a aprendizagem de um ou

de outro modo, como foi abordado em capítulos anteriores.

Em torno disso, ao serem indagados, justificando, em que concepção/ teoria

se baseiam na elaboração do planejamento, muitos professores demonstraram

imprecisão e até mesmo um desconhecimento acerca do assunto. Apesar de 58%,

ter apontado a perspectiva sócio-histórica, alguns não justificaram, e os que o

fizeram afirmaram ser porque é a concepção adotada pelo município. Os demais

professores, 42%, fizeram apontamentos que refletem a falta de uma base teórica

que fundamente seu trabalho, diante da questão: Baseado em que teoria/concepção

você elabora seu planejamento? Justifique sua resposta, referiram o seguinte:

“Em diversas teorias que muitas chegam a ser contraditórias, mas ainda

aceitamos o que nos apresentam- SEED.” (prof. 2)

“Tento ser o mais progressista possível.” (prof. 5)

“Tradicionalismo e construtivismo, fazer um trabalho puramente

construtivista é difícil não há como abandonar os conhecimentos adquiridos

no tradicionalismo.” (prof. 8)

“Baseado na realidade escolar. Acredito que nada adianta termos

quantidade e não qualidade naquilo que ensinamos.” (prof. 10)

“Baseado no conteúdo de cada série, em livros didáticos (...)” (prof. 11)


120

É possível perceber, nas falas acima, que os professores parecem não

possuir um conhecimento acerca de concepções que podem nortear o trabalho

pedagógico, o que acarreta em uma falta de direcionamento e embasamento para

sua prática, considerando que é a partir de uma determinada base teórica que se

fundamenta o trabalho em sala de aula. É importante considerar que as políticas

educacionais proporcionam diretrizes e bases teóricas que fundamentam o trabalho

do professor em sala de aula. O que parece, diante dessas falas, é que não há, por

parte dos professores, uma aproximação das concepções que deveriam nortear seu

trabalho, o que denota contradições entre o que é proposto e o que se pratica.

Diante do exposto, é necessário acrescentar que tanto na escola, quanto na

família é possível perceber que há, em geral, falta de compreensão acerca dos

aspectos relacionados à surdez, falta de uma língua em comum e falta do

reconhecimento de que é necessário propiciar a criança surda possibilidades que

não a deixem em desvantagem em relação às outras crianças e que lhe garantam

uma formação integral, levando em conta suas particularidades.

5.3 ASPECTOS RELACIONADOS AO LETRAMENTO

Ao abordar as questões referentes às práticas de leitura e escrita pela

criança surda é necessário colocar em evidência alguns pontos que se estabelecem

como pano de fundo para estas práticas. Na discussão e análise será enfocado

como são estabelecidas as práticas de leitura e a escrita com o filho/aluno surdo e

qual a visão de seus pais e professores acerca desse processo. Sendo assim,

analisar que práticas de letramento permeiam (ou não) estes dois contextos é de
121

fundamental importância para que se possa refletir sobre os modos de inserção do

sujeito surdo no mundo letrado. Para isso serão tomados como norte os seguintes

questionamentos:

• Que tipos de materiais de leitura circundam os contextos familiar e

escolar dos alunos surdos e em que práticas de letramento os mesmos

estão (ou não) inseridos?

• Qual a visão dos pais e professores acerca da relação de seu

filho/aluno com o processo de leitura e escrita?

5.3.1 Práticas de letramento nos contextos familiar e escolar

A possibilidade de a criança tornar-se um adulto capaz de fazer uso efetivo

da leitura e da escrita no seu cotidiano tem a ver, entre outros fatores, com sua

exposição a diversos tipos de materiais de leitura. Dessa forma, os hábitos e as

práticas dos pais no contexto familiar desempenham um papel significativo

(GALVÃO, 2003). Buscando investigar como ocorrem as práticas de letramento no

âmbito familiar das crianças surdas focos dessa pesquisa, procurou-se averiguar

como se estabelecem as relações com a leitura e a escrita pelos pais entrevistados,

bem como de que modo percebem a relação de seu filho com a leitura e a escrita.

Inicialmente serão apresentados alguns dados que traduzem as práticas de

letramento das famílias para que se possa perceber em que práticas de letramento

as crianças estão inseridas. No que diz respeito à presença de materiais de leitura

em casa apontados pelos pais, 100% apontaram a Bíblia, 75% relatou que possuem

livros em casa, 42% citou revistas, 33% jornais e 50% relatou possuir outros tipos de
122

matérias escritos em casa, tais como, gibis, enciclopédias e panfletos. É preciso

considerar que apenas 50% dos pais apontaram possuir mais de dois tipos de

materiais escritos em casa. Os outros 50% referiu somente a presença de livros e

bíblia (25%), ou somente a bíblia (25%).

Como é possível perceber, a presença de material religioso foi referida por

todos os pais entrevistados. Essa ocorrência é muito comum, assim como retratado

na pesquisa realizada pelo INAF em 2001 (RIBEIRO, 2003), sobretudo porque,

assim como refere Galvão (2003) o acesso a esse tipo de material é facilmente

obtido por amplas camadas da população, além disso, as práticas de leitura desses

materiais são mediadas pela oralidade, sobretudo nas igrejas, o que proporciona,

muitas vezes, o reencontro com trechos já memorizados, fazendo com que a leitura

da Bíblia possa parecer mais acessível. No entanto ao enfocar as práticas de leitura

e escrita que circulam socialmente, a Bíblia pouco contribui, já que os gêneros que

circulam demandam outras práticas de leitura.

É preciso ressaltar que a presença de materiais de leitura em casa não

garante o hábito de leitura por parte dos pais, pois quando interrogados sobre se

possuem o hábito de ler, 33% afirmou que não, nunca lê. Dos 67% que afirmaram

ter o hábito de ler, 41% referiu somente a leitura da Bíblia, os demais referiram

também a leitura de revistas. É possível verificar que na questão relacionada ao tipo

de material existente em casa foi feito inferência à presença de jornais,

enciclopédias, gibis, panfletos, entretanto estes não foram referidos como lidos, no

que concerne a o que têm o hábito de ler.

Percebe-se que apesar de a maioria dos pais referirem que têm o hábito de

ler, essa leitura é restrita à Bíblia e a revistas. Cabe aqui, refletir sobre uma questão:
123

Será que realmente interpretam e compreendem o que lêem ou o fazem somente

por uma obrigação que trazem arraigada por fatores religiosos e históricos?

Diante disso, convém indagar sobre qual o lugar da criança surda nessas

práticas de leitura pelos pais, ainda que estas sejam restritas. Se o hábito de leitura

pelos pais é restrito, como a criança insere-se nesse contexto? Visando verificar se

há um compartilhamento de práticas de letramento com a criança surda no contexto

familiar, os pais foram questionados se têm o hábito de ler para/com seu filho surdo.

Nessa questão 67% dos pais afirmaram que às vezes lêem para o filho, enquanto

outros 33% afirmou nunca terem realizado esta prática.

Cabe explicitar que ao serem interrogados (você tem o hábito de ler

com/para seu filho?) em geral, os pais que responderam sim, demonstraram uma

reação de surpresa frente ao questionamento, alguns solicitaram que a pergunta

fosse refeita, outros ficaram quietos por alguns segundos, como se estivessem

pensando em “o quê” responder. Alguns, antecedendo a resposta, expressaram “eh,

não, quer dizer, às vezes”, “Ah, às vezes”. Assim, pode-se supor que na visão dos

pais, ler com/para o filho surdo seria uma tarefa impossível ou desnecessária, já que

se tem a impressão, muitas vezes, de que por não ouvir, o surdo não compreenderá.

Nesse caso a leitura não seria então vista como uma prática social necessária.

Acerca disso Alves e Karnopp (2002) afirmam que é preciso considerar,

prioritariamente, que a leitura não deve ser percebida apenas como decodificação

ou meramente como um hábito, mas como prática social da linguagem, ligada aos

aspectos cultural, social, histórico e ideológico.

Foi possível perceber que justamente entre aqueles que deram uma

resposta negativa, dizendo nunca terem lido com/para o filho (33%) não houve

hesitação, ou seja, a resposta foi curta e objetiva: “Não”. Estes pais, portanto, não
124

procuraram dar uma resposta que soasse a ‘mais politicamente correta’ possível,

encarando como ser comum não compartilhar de leituras com o filho.

É fato que, no caso das crianças surdas, a inserção nas práticas cotidianas

de letramento torna-se custosa se considerado o entrave lingüístico que se

estabelece nas relações diárias, entretanto, o convívio com a língua escrita e com

cenas de leitura lhes trará possibilidades para que possam perceber a função da

linguagem escrita e que mais tarde, ao deparar-se com o ensino formal da língua

portuguesa em âmbito escolar possam estabelecer relações significativas. Não

obstante, a presença de práticas de leitura e escrita no cotidiano da criança se

reflete em possibilidades diversas de constituir-se como sujeito leitor e autor, pois,

assim como refere Fernandes (2003): “O sucesso de sua incursão no mundo da

escrita depende da qualidade e quantidade das experiências de leitura e escrita a

que foram submetidas as crianças na infância. “ (p. 139).

Torna-se importante, então, nesse ponto, trazer à tona algumas

considerações em torno das práticas de leitura e escrita estabelecidas também no

âmbito escolar, pois além da família, a escola é um local que, por excelência, atua

como mediador na constituição do sujeito enquanto leitor e autor. A fim de explanar

como os alunos surdos estão sendo inseridos nestas práticas, buscou-se saber dos

professores como é o trabalho com a leitura e a escrita em sala de aula.

Os professores entrevistados apontaram utilizar diferentes tipos de textos

em sala, os quais dizem respeito, em ordem de maior proporção, à: informativos

(referido por 100% dos professores), descritivos (83%), narrativos (75%),

argumentativos (67%) e discursivos (50%). Com relação aos gêneros textuais, foram

apontados: quadrinhas (83%), contos (83%), reportagens (75%), bilhetes (67%),

notícias (67%), receitas (58%), cartas (58%), piadas (33%). Cabe esclarecer que as
125

questões referentes a tipos e gêneros textuais foram constituídas de múltiplas

respostas, nas quais as opções já estavam pré-estruturadas, o que de certa forma

restringiu as respostas apontadas e ao mesmo tempo pode ter provocado induções.

Entretanto uma das opções dizia respeito a outros (ou seja, outros tipos e gêneros

textuais) a ser apontado pelo professor, o que não teve nenhum apontamento.

Ao considerar esses apontamentos feitos pelos professores, pode-se

concluir que o trabalho com a linguagem escrita se dá de maneira diversificada e a

partir de textos que seguramente desempenham uma função social, entretanto, ao

analisar suas colocações em relação às fontes de onde retiram os textos abordados

em sala de aula, alguns questionamentos podem ser levantados, pois diante da

questão: ”De que fontes você retira os textos a serem abordados em sala de aula?”,

100% dos professores mencionaram o livro didático em primeira instância. Ainda

que alguns professores tenham feito referência a revistas (83%), jornais (42%),

internet (25%), gibis (8%), o livro didático parece ser o grande aliado na seleção dos

textos a serem trabalhados em sala.

Ao adotar o livro didático não se contempla o gênero, pois ainda que se

aborde, por exemplo, uma reportagem, uma receita, uma carta, se estes são

referidos no livro didático, então o gênero é o livro didático, já que é ele o portador

do gênero e não o material em si. Contemplar o gênero em sua plenitude consistiria

em trazer para a sala de aula o jornal, a revista, a bula de remédio e outros, o que

incidiria realmente em práticas de letramento, pois estaria se mostrando de fato a

função de determinado gênero com todos os seus aspectos.

Não se intenciona aqui confrontar o uso do livro didático, já que o mesmo é

um material de apoio, que se bem utilizado, pode beneficiar o trabalho em sala,

entretanto, a questão é que, segundo Guarinello, Massi e Berberian (2007),


126

geralmente os livros didáticos utilizados são ineficientes e não permitem a

percepção da função do texto, ou da escrita, pela criança. Dessa forma, o texto

deixa de ser para o aluno, uma possibilidade de constituir-se enquanto leitor,

servindo apenas como um instrumento para o ensino da língua portuguesa.

Outra questão que chama atenção diz respeito à forma como os textos são

apresentados aos alunos em sala de aula. Os professores apontaram: no quadro de

giz (83%), em folhas digitadas (100%) e no livro didático (67%). É possível perceber

que não houve inferência ao fato de os professores utilizarem-se do texto a partir de

fontes como jornais, bulas de remédios, fonte do texto projetada. Certamente, é

difícil, muitas vezes, para o professor dispor de meios para tornar o acesso a

diferenciados materiais escritos considerando um contexto em que o número de

alunos em sala de aula é excessivo e os recursos materiais são precários, porém,

raramente há uma escola que não disponha de um retroprojetor ou outro meio

multimídia que possa subsidiar na exploração de textos.

De fato, pensar acerca de como se aborda a linguagem escrita em sala de

aula, vai muito além de ater-se à questão em torno de que fontes são retirados os

textos a serem abordados, pois há de se considerar, sobretudo, que o texto

constitui-se, conforme Geraldi (1997), num espaço de interlocução e de produção de

sentidos em que: “a leitura se incide sobre ‘o que se tem a dizer’ porque lendo a

palavra do outro, posso descobrir nela outras formas de pensar que, contrapostas às

minhas, poderão me levar à construção de novas formas, e assim sucessivamente.”

(p. 171).

Geraldi pontua claramente que ao trazer um material escrito para a sala de

aula o professor deve ponderar o que esse material “tem a dizer” e qual a função do

que se aborda, não sendo tomado apenas como um meio de estimular operações
127

mentais, ou ainda, como um pretexto para se abordar determinados conteúdos.

Sendo assim, o trabalho com a linguagem escrita deve ter como base a

contextualização, assim como pontua Fernandes (2006a): “Há necessidade de um

trabalho contextualizado, no qual sejam focados conteúdos relacionados à prática da

produção escrita, ou seja, o conhecimento gramatical e seu efeito retórico deverão

ser decorrentes do uso em atividades significativas de escrita.” (p. 140).

Ressalta-se, ainda, a importância de abordar textos significativos, sobretudo,

considerando a inclusão do aluno surdo em sala de aula, já que se trata para ele, de

uma língua que ainda está se apropriando, diferentemente da criança ouvinte que já

traz consigo algum conhecimento acerca da língua portuguesa ainda que

informalmente, o que não significa que para esta não seja necessária a abordagem

de textos significativos. Ao considerar, portanto, a inclusão do aluno surdo em sala

de aula é preciso que o professor perceba que enquanto a criança que ouve já vem

com alguns conceitos acerca da linguagem escrita, a criança surda terá muito a

compreender:

Diferentemente da criança não-surda que chega à escola “conhecendo”


gramática (saber gramática/linguagem) e que lá passará a conhecer “sobre
gramática” (teoria gramatical/ metalinguagem), as crianças surdas ignoram
completamente o português. Ignoram a questão mais elementar de que
cada coisa tem um nome e que dizer coisas exige uma “ordem”, uma
“seqüência lógica. Ignoram que esses nomes que as coisas têm às vezes
podem referir-se também a outras coisas e que muitas coisas têm mais de
um nome. Ignoram que dizer coisas em uma determinada “ordem” é uma
regra que não vale sempre, pois essa “seqüência lógica” estará
determinada pelas questões que se gostaria que fossem enfatizadas, ou
pelos sentidos que se desejaria produzir. Ignoram, ainda que mesmo
dizendo as coisas em uma ordem compreensível, e esperada pelas
pessoas, podemos mudar completamente o sentido do que dizemos caso
mudemos o “tom” no jeito de dizer. E esses modos de dizer são
dependentes da região onde se vive, da idade que se tem, da origem
sociocultural da pessoa que fala e, o mais importante, do “lugar” do dizer e
para quem se diz. (FERNANDES, 2006a, p. 141).
128

Ainda acerca do trabalho com textos, todos os professores entrevistados

afirmaram trabalhar com a linguagem escrita partindo de textos inteiros, no entanto,

entre esses 41% afirmou também partir de palavras, sílabas isoladas ou letras do

alfabeto. Ou seja, alguns professores ainda não conseguiram desvincular-se dos

resquícios tradicionalistas, nos quais se partia da letra, para a palavra, para a frase e

depois para o texto.

Cabe considerar aqui que quando questionados em que concepção de

ensino o professor toma como base em sua prática, como apontado anteriormente,

em geral, os professores se referiram à concepção sócio-histórica, justificando que é

esta a concepção adotada nas diretrizes curriculares do município em que atuam. É

possível então, relacionar o fato de todos terem apontado o trabalho com a escrita a

partir de textos inteiros, justamente por ser esse um dos pontos abordados em tais

diretrizes. Entretanto, volta-se a questão: há por parte dos professores uma

verdadeira noção teórica que norteia sua prática ou somente é induzido por políticas

educacionais que exigem este ou aquele tipo de abordagens para o trabalho com a

língua? Já que algumas vezes há uma recaída ou uma recorrência a práticas que,

de certo modo, são contraditórias com o que se propõe.

É o que ocorre também com a presença da cópia e do ditado em sala de

aula. A partir dos depoimentos dos professores foi possível verificar que essas

práticas ainda persistem, pois: ao serem questionados sobre quais atividades

utilizam com os alunos para o trabalho com a leitura e a escrita, ainda que todos os

professores entrevistados tenham afirmado trabalhar com propostas de produção

textual, foram feitas inferências a cópia e ao ditado.


129

Com relação à cópia, percebe-se que esta é uma prática constante,

considerando que 67% dos professores entrevistados a apontaram como um dos

trabalhos abordados com a escrita em sala de aula.

A fim de ilustrar essa discussão achamos oportuno compartilhar de uma

experiência no CAES. É comum os alunos que freqüentam o CAES alegarem que

“passaram a manhã/tarde toda só copiando”, reclamam: “copia, copia, copia...”, por

conseguinte, várias vezes ao verificar os cadernos desses alunos é possível

deparar-se com páginas e páginas de textos copiados, tabelas copiadas, frases

repetidamente copiadas. Entretanto, ao questioná-los sobre de quê se trata tal

“cópia” o aluno raramente sabe responder. Diante disso, cabe questionar: qual a

função desse trabalho? O que isso acrescenta para o aluno, que não seja a

exaustão e a não percepção das reais funções da escrita, levando-o, muitas vezes,

a demonstrar certa empatia frente a propostas e atividades que envolvem esta

modalidade. Não obstante, ao abordar a cópia concebe-se a escrita como

codificação, pressupondo-se que ao codificar, o aluno estaria apropriando-se da

mesma.

Outro fator a ser considerado é a prática do ditado, inferida por 25% dos

professores. É possível dizer que são poucos os professores que se referiram a

essa prática, porém, cabe explicitar novamente que os professores participantes

dessa pesquisa têm em sala alunos surdos, o que deveria ser levado em conta ao

se propor tal “exercício”. Se para alunos que ouvem, esta proposta já se traduz

muitas vezes num ato mecânico e sem sentido, quanto mais o é para o aluno surdo,

que certamente, por não ouvir o que está sendo “ditado”, não concluirá a atividade, o

que então confirmaria sua suposta dificuldade em relação à linguagem escrita.


130

Ainda que atividades com ditados possam ser encaminhadas de maneira

diferente que o tradicional “ditado de palavras”, como por exemplo: a professora ditar

um bilhete a ser entregue aos pais, ou o aluno ditar algo para o professor escrever,

ou ainda estratégias que tenham significados com o ditado, se considerada a

presença de um aluno surdo em sala de aula, sob qualquer encaminhamento, um

ditado seria inconveniente e tortuoso, já que esse aluno estaria em desvantagem em

relação aos demais, além disso, não se estaria considerando o contexto da inclusão,

em que devem ser levadas em conta as diferenças.

Contudo, há professores, ainda que seja uma minoria, que procuram

considerar diferentes encaminhamentos no trabalho com a leitura e a escrita com o

aluno, pois 18% fez referência ao trabalho com resumos, comentários, debates,

dramatização, teatro, o que de certa forma leva a supor que nestes contextos o

trabalho com a linguagem escrita é levado em consideração sob diferentes

estratégias. De fato, há de se questionar a pouca inferência a trabalhos

diferenciados com a leitura e a escrita em sala de aula, sobretudo, se forem

considerados os atuais discursos nos quais a diversidade é focada e a inclusão

ocupa um lugar de destaque. O uso de diferentes estratégias no trabalho com a

linguagem escrita é de suma importância tanto para surdos quanto para ouvintes,

pois dessa forma o aluno pode compartilhar os diferentes modos de apropriação.

Diante das reflexões alçadas até aqui, pode-se perceber, a partir das vozes

dos pais e professores que há uma falta de propostas de situações significativas de

práticas de leitura e escrita que considerem realmente o modo como a criança surda

constitui-se frente ao letramento, tanto no âmbito familiar como no âmbito escolar.

Cabe ainda refletir sobre de que modo o surdo irá constituir-se enquanto leitor e
131

autor, se as práticas em que está inserido não privilegiam, antes de tudo sua

diferença lingüística.

Proporcionar um trabalho com a leitura e a escrita em que seja privilegiado o

uso significativo da língua certamente terá um reflexo na maneira como o surdo irá

se constituir como leitor e autor. Sobre esse aspecto, é importante considerar

também como sua relação com a leitura e a escrita é percebida nos contextos em

que está inserido, pois como referido anteriormente, somos constituídos, também, a

partir de como o outro nos percebe.

5.3.2 “Acho que ela sabe escrever, mas não sabe ler”: A visão dos pais e

professores acerca da leitura e da escrita do filho/aluno surdo

5.3.2.1 A visão dos pais

Diante das reflexões desencadeadas em relação às práticas de letramento

realizadas com os surdos nos contextos escolar e familiar é importante considerar se

há a compreensão, por parte dos pais e professores, acerca de como o filho/aluno

está constituindo-se no processo de leitura e escrita, enquanto sujeito letrado, já que

são eles os principais mediadores nesse processo.

Acerca disso procurou-se averiguar como os pais e professores percebem

(se percebem) a constituição do surdo como sujeito capaz de utilizar a leitura e a

escrita, ou seja, como os mesmos concebem a relação de seu filho/aluno com o

processo de leitura e escrita. Para isso foi levantado o seguinte questionamento aos

pais: No seu ponto de vista, seu filho(a) compreende o que lê?

Apenas 17% dos pais afirmaram que seu filho sempre compreende o que lê,

58% afirmou que acham que o filho “às vezes” compreende o que lê 17% afirmou
132

que o filho nunca compreende o que lê e 8% afirmou que não percebem se o filho

compreende ou não, como pode ser visualizado no gráfico 2 a seguir:

Gráfico 2: VISÃO DOS PAIS ACERCA DA LEITURA DO FILHO

8%
17% Compreende o que lê

17%
Às vezes compreende o
que lê
Nunca compreende

Não percebo se
58% compreende ou não

FONTE: Pesquisa de campo

Ao serem solicitados a justificarem como são levados a essa conclusão, os

pais que afirmaram que o filho sempre compreende o que lê: justificaram da

seguinte forma:

“Porque além de ler, ele interpreta. Ele tem muito interesse.” (mãe 4)

“Tem coisas que ela explica o que é e tem coisas que ela pergunta quando

não entendeu.” (mãe 8)

As afirmativas acima demonstram que os pais percebem a compreensão do

filho a partir do interesse que o mesmo parece apresentar. Um fato importante a

destacar é que estas mães estão entre aquelas que afirmaram às vezes ler
133

com/para o filho, o que poderia justificar o fato de perceberem como está sendo a

compreensão do filho em relação ao seu processo de letramento.

No que diz respeito aos pais que afirmaram que o filho nunca compreende o

que lê, foram apontadas as seguintes justificativas:

“Ela não conhece nem as letras. Ela sabe escrever o nome das pessoas da

família só.” (pai 1)

“A gente às vezes pergunta e ela diz que não. Ela não entende nada.” (mãe 2)

Essas afirmativas levam a alguns questionamentos: como os pais são

levados a essas conclusões? Não seria a dificuldade em perceber se o filho

compreende ou não o que lê uma conseqüência da falta de interação lingüística,

pois, como se dá essa interação? De que maneira então, a criança demonstraria sua

compreensão, o que justamente pode-se perceber na justificativa da mãe que diz

não perceber se seu filho compreende ou não o que lê: “Ah, eu não sei...”.

Na primeira afirmativa o pai refere que a filha sabe escrever o nome das

pessoas da família, porém não conhece as letras. O que esse pai espera de uma

filha que cursa a primeira série? É preciso considerar que se trata de uma criança

que está na primeira série e que certamente ainda está se apropriando das primeiras

noções da escrita. Obviamente, é preciso considerar que os pais podem ter uma

visão diferente do que é a leitura em relação ao professor, por exemplo. A

expectativa dos pais pode ser diferente da dos professores.


134

Na última afirmativa (mãe 2) é possivel perceber a noção que a mãe tem de

que a filha não entende nada, ao afirmar “ela não entende nada”, a mãe parece

subestimar o conhecimento que a criança pode estar trazendo, pois só o fato da

criança dar uma resposta negativa não significa que não entende ‘nada’. Pode-se

supor que essa resposta negativa, por parte da filha, seria a súplica por uma melhor

explicação acerca daquilo que ela ainda não compreendeu. No entanto, parece não

haver uma compreensão disso por parte da mãe. É importante considerar que essa

aluna está na quarta série, o que agrava ainda mais o fato de a mãe referir-se desta

forma, ou seja, se a aluna já está na quarta série como é possível não saber nada.

Duas hipóteses podem ser levantadas: ou não está havendo uma troca lingüística

efetiva entre mãe e filha, capaz de levar a mãe a perceber a compreensão da filha,

ou o ensino em que a aluna está inserida está deixando a desejar e ainda assim

aprovando a séries seguintes.

É possível perceber que os pais buscam saber dos filhos se há uma

compreensão em torno do que lêem apelando ao termo ‘entende/não entende’,

porém não colocam situações que a criança faz da leitura no cotidiano. Cabe

ressaltar que esta questão, assim como outras levantadas anteriormente, geraram

inquietação por parte dos pais, sobretudo aqueles que responderam que “às vezes”

o filho compreende o que lê, os quais apontaram as seguintes justificativas:

“Quando ele quer, ele entende, às vezes ele finge que não entende.” (mãe 5)

“Ela lê o nome dela e sabe o que é.” (mãe 6)

“Às vezes ele me pergunta o que não entende, ele quer saber de tudo.” (mãe 7)

“Ela nunca diz que não entende. Às vezes eu explico.” (pai 9)


135

“Pergunto a ela o que entendeu e às vezes demonstra que não entendeu,

‘enrola muito’”. (mãe10)

“Quando ela não entende, ela pergunta.” (pai 11)

“A letra dele melhorou bastante, já ‘tá’ lendo.” (mãe 12)

Convém abrir um parêntese para a fala da mãe 7, pois, assim como

observado em outros episódios de fala, esta parece ser a única que o filho procura,

pergunta, interage, ou seja, que o filho vai até a mãe possivelmente porque tem um

retorno para suas inquietações, o que demonstra haver uma boa interação da mãe

com o filho, evidenciando que há uma reciprocidade.

Cabe levantar aqui, um questionamento acerca de que concepção os pais

têm frente à leitura. Na primeira afirmativa (mãe 5) percebe-se que a mãe refere que

o filho entende quando quer, no entanto, o fato do filho não entender pode estar

relacionado ao significado que a leitura tem em sua vida, poderia se supor ainda

que, há um entendimento daquilo que se lê ao passo que há nesta leitura um

significado, um conhecimento prévio, um estabelecimento de relações.

A última afirmativa (mãe 12) também chama atenção, já que a mãe refere-se

à letra do filho ter melhorado bastante, o que representa para a mãe que o filho ‘já

sabe ler’. Para essa mãe parece que ao haver uma melhora na letra do filho significa

que o mesmo já sabe ler. É importante destacar que em conversas anteriores, essa

mãe revelou não saber ler, nem escrever, fato este que talvez possa explicar a

imagem que a mesma tem acerca da relação do filho com a leitura somente a partir

de sua caligrafia.
136

No que diz respeito a seguinte fala: “Ela lê o nome dela e sabe o que é.”

(mãe 6), a mãe percebe que a filha reconhece a escrita de seu nome a partir da

visualização da palavra, ou seja, da visualização do seu nome. É importante levar

em conta que essa aluna também está cursando a 1ª série.

Cabe ressaltar aqui que a compreensão em torno do quê se lê tem a ver,

sobretudo, com o significado e um conhecimento prévio acerca da leitura em

questão. Ou seja, quando se tem contato com a leitura de um assunto que seja

significante e que o contexto dessa leitura seja algo familiar para o leitor, certamente

haverá uma melhor compreensão. Quando se lê ou se escreve sobre algo que já se

conhece, ler e escrever torna-se menos tortuoso. Entretanto, é importante esclarecer

que não se deve privar o acesso à leitura de materiais que a priori possam parecer

complexos, pois à medida que o sujeito se constitui enquanto leitor, suas

possibilidades de leitura aumentam.

Nesse aspecto é importante destacar o trabalho com a leitura realizado no

CAES que parte de uma contextualização, de uma exploração acerca do tema ou

assunto a ser lido, da mesma forma que ocorre com a escrita, pois é preciso

considerar que, muitas vezes o aluno surdo desconhece muitas informações e

conceitos que se estabelecem durante a leitura, ao contrário da criança ouvinte, que,

em geral, ‘ouve’ falar sobre determinados assuntos, ‘ouve’ explicações constantes

sobre algo e por isso vai construindo seus conceitos auditivamente.

Em geral, no que concerne à visão dos pais em torno da relação do filho

com a leitura, é possível verificar, a partir das justificativas por eles apontadas, que

não há inferência à maneira pela qual os mesmos percebem se o filho compreende

ou não o que lê, não há, por exemplo, uma referência ao fato de o filho manusear

materiais de escrita ou à menção de uma situação em que o filho realize a leitura.


137

De que maneira então os pais são levados a concluir que o filho às vezes

compreende o que lê, se as interações, em geral, se resumem em: perguntar se ele

(o filho) entendeu ou não, ou esperar que o filho pergunte sobre o que não entende.

Outra vez recai a questão acerca da falta de interação dos pais com os filhos.

No que diz respeito à relação do filho com a escrita, ao serem indagados se

na sua visão a criança escreve espontaneamente (sem ajuda), escreve somente

com ajuda ou só copia, 75% dos pais afirmaram que o filho escreve sem ajuda, ou

seja, neste sentido a criança já teria se apropriado da linguagem escrita, enquanto

17% afirmou que o filho escreve somente com ajuda e 8% afirmou que a criança só

copia. Como pode ser visualizado no gráfico 3:

Gráfico 3: VISÃO DOS PAIS ACERCA DA ESCRITA DO FILHO

0%

8%

17% Escreve espontaneamente


Escreve só com ajuda
Só copia
75% Não escreve

FONTE: Pesquisa de campo

É interessante pontuar que houve uma diferença significativa em relação à

percepção dos pais frente à escrita se relacionado com a leitura, pois parece haver

mais precisão quando referente à escrita. Entre os pais que afirmaram que o filho

escreve sem ajuda (75%), somente um afirmou também que o filho sempre
138

compreende o que lê, os demais afirmaram que às vezes ou nunca compreende o

que lê. Neste ponto cabe destacar a visão de uma das mães acerca da sua

percepção em relação à leitura e à escrita da filha. Apesar de afirmar que a filha

escreve espontaneamente, ou seja, sem ajuda, a mãe pontua que a filha nunca

compreende o que lê, afirmando: “Mesmo não entendendo o que escreve, mas

escreve. Acho que ela sabe escrever, mas não sabe ler”. (mãe 2)

Por meio das afirmações de alguns pais com relação à escrita e à leitura,

pode-se levantar a hipótese de que como a escrita é concreta, isto é, o pai/a mãe

visualiza o que o filho escreve, seu processo é percebido com mais facilidade, já no

que diz respeito a leitura, isto não é possível, pois como pais e filhos não possuem

uma língua em comum na maioria das vezes há dúvidas acerca de se os filhos

entendem o que lêem ou não. Ao ter o registro escrito, ainda que se trate de cópias

realizadas pela criança, para os pais já há um domínio da linguagem escrita, no

entanto, a leitura torna-se um aspecto difícil de ser percebido por eles, justamente

por não ser ‘visível’ ou melhor, por não poder ser ‘ouvida’, ao passo que não há, por

parte do filho, a oralização da leitura.

5.3.2.2 A visão dos professores

Em relação à percepção dos professores, no que diz respeito à leitura,

quando interrogados se o aluno compreende o que lê, 25% afirmou que sim, 41%

afirmou que às vezes o aluno compreende o que lê, 17% referiu que o aluno nunca

compreende o que lê e outros 17% afirmaram que não percebem se o aluno

compreende ou não. Conforme gráfico 4 abaixo:

Gráfico 4: VISÃO DOS PROFESSORES ACERCA DA LEITURA DO ALUNO


139

17%
25% Compreende o que lê

Às vezes compreende o
que lê
17% Nunca compreende

Não percebo se
compreende ou não
41%

FONTE: Pesquisa de campo

Um fato interessante a ser discutido diz respeito a aqueles professores que

afirmaram não perceber se o aluno compreende ou não o que lê. Esse é um ponto

que certamente, assim como já abordado anteriormente, revela a falta de

conhecimento acerca das implicações relacionadas ao sujeito surdo. O professor,

muitas vezes, por não “saber” se comunicar com esse aluno dificilmente poderá

perceber se está havendo uma compreensão. No entanto, estes professores, que

apontaram não perceber, assumiram uma realidade que talvez os demais

professores tenham hesitado em assumir.

Ao estabelecer uma relação da visão dos pais com a visão dos professores

acerca da leitura do aluno, é possível perceber que há poucas diferenças. A mesma

criança na visão do professor tem compreensão daquilo que lê, já a visão do

pai/mãe é de que somente às vezes a criança compreende o que lê. As respostas

dos pais e dos professores não se opõem significativamente, ou seja, não houve

casos de o pai/mãe afirmar que o filho compreende o que lê e o professor (da

mesma criança) afirmar que o aluno não compreende o que lê. Como pode ser

visualizado no quadro 4:
140

Quadro 4: COMPARAÇÃO DA VISÃO DOS PAIS E DOS PROFESSORES ACERCA

DA LEITURA DA CRIANÇA

Criança Visão do pai/mãe Visão do professor

1 Nunca compreende o que lê Nunca compreende o que lê

2 Nunca compreende o que lê Não percebe

3 Não percebe Nunca compreende o que lê

4 Compreende o que lê Às vezes compreende

5 Às vezes compreende Compreende o que lê

6 Às vezes compreende Às vezes compreende

7 Às vezes compreende Às vezes compreende

8 Às vezes compreende Às vezes compreende

9 Às vezes compreende Compreende o que lê

10 Às vezes compreende Compreende o que lê

11 Às vezes compreende Não percebe

12 Às vezes compreende Às vezes compreende

Já com relação à escrita a maioria dos professores, 67%, referiu que o aluno

escreve espontaneamente, ou seja, não necessita de um auxílio constante em suas

produções escritas, 17% referiu que o aluno escreve, porém, necessita de auxílio

constante, 8% afirmou que o aluno só copia e outros 8% afirmou que o aluno não

escreve. Como demonstrado no gráfico 5:

Gráfico 5: VISÃO DOS PROFESSORES ACERCA DA ESCRITA DO ALUNO


141

8%
8%

Escreve espontaneamente
17% Escreve só com ajuda
Só copia
Não escreve
67%

FONTE: Pesquisa de campo

Cabe aqui refletir sobre o processo de produção escrita, ou seja, o que se

escreve e como se escreve, já que numa perspectiva de letramento, a qual foi

abordada no capítulo 3, não basta que o sujeito saiba ler e escrever, mas saiba fazer

uso efetivo da leitura e da escrita socialmente.

Nessa questão é importante considerar que há uma relação de 83% de

compatibilidade de respostas dos pais com as dos professores, ou seja, com relação

à escrita pais e professores, em geral, têm uma mesma visão em torno do aluno:

Quadro 5: COMPARAÇÃO DA VISÃO DOS PAIS E DOS PROFESSORES ACERCA

DA ESCRITA DA CRIANÇA

Criança Visão do pai/mãe Visão do professor

1 Só copia Só copia

2 Escreve espontaneamente Escreve espontaneamente

3 Somente com auxílio Não escreve

4 Escreve espontaneamente Escreve espontaneamente

5 Escreve espontaneamente Escreve espontaneamente

6 Somente com auxílio Somente com auxílio


142

7 Escreve espontaneamente Escreve espontaneamente

8 Escreve espontaneamente Escreve espontaneamente

9 Escreve espontaneamente Escreve espontaneamente

10 Escreve espontaneamente Escreve espontaneamente

11 Escreve espontaneamente Escreve espontaneamente

12 Escreve espontaneamente Somente com auxílio

É possível perceber que no que diz respeito à visão acerca da escrita da

criança a maioria dos pais e dos professores tem um mesmo ponto de vista em torno

da mesma criança. Retoma-se aqui a idéia de que parece que a escrita pode ser

mais bem percebida pelos pais e pelos professores.


143

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Há alguns anos atuando na educação de surdos num contexto de inclusão

educacional, foi possível verificar que há inúmeros fatores que devem ser

repensados no que diz respeito ao sujeito surdo e a sua educação. Não somente

acerca da inclusão imposta pela lei, mas, sobretudo nas possibilidades de articular

maneiras de proporcionar aos sujeitos envolvidos na educação escolar dos surdos

um espaço para discutir e perceber a necessidade de se pensar a surdez como uma

diferença, distanciando-se da visão de deficiência. Nesse sentido, esta pesquisa

buscou discutir e analisar a visão de um grupo de pais e professores acerca de

aspectos relacionados à Educação Escolar e ao Letramento de um grupo de alunos

surdos, os quais estão matriculados na rede regular de ensino e freqüentam o

Centro de Atendimento Especializado no contraturno.

De acordo com o que foi discutido, a Surdez é marcada historicamente sob

um ponto de vista clínico, em que o surdo é concebido como deficiente e visto a

partir da falta de audição. Dessa visão decorrem as práticas reabilitadoras, voltadas

à aquisição da fala, que permanecem ainda hoje, em que se busca a padronização

do surdo aos modelos do ouvinte. Contrário a essa visão de surdez, a concepção

sócio-antropológica traz um olhar diferenciado em que a diferença, e não a

deficiência, é levada em consideração, concebendo-se o surdo a partir da sua

experiência visual. Dessa forma, a língua de sinais ocupa um lugar de destaque,

sendo considerada a língua natural do surdo.

É nesse sentido que, no cenário atual que estabelece a inclusão do surdo,

se discutem as necessidades de proporcionar meios para que a língua de sinais, por

ser considerada sua língua natural, seja por ele usufruída e reconhecida pelo
144

sistema educacional, não somente na forma de lei, mas em práticas que possibilitem

ao surdo vivenciar e constituir-se a partir de uma condição bilíngüe.

Em um contexto em que a língua de sinais não é privilegiada, vários

entraves podem ser percebidos, sobretudo no que diz respeito às interações

lingüísticas, a partir das quais se constituem conceitos e conhecimento de mundo.

Nesse sentido a família e a escola têm um papel fundamental. A família por ser o

local primeiro em que a criança forma seus primeiros conceitos e a escola por ser

uma entidade, que por excelência, promove o conhecimento. No entanto, na escola

regular o surdo se vê em desvantagem, justamente porque não se contempla

plenamente sua experiência visual, o que se torna mais agravante no que diz

respeito ao seu letramento. Acerca disso, buscou-se no decorrer desta pesquisa

discutir alguns aspectos relacionados ao letramento.

Procurou-se, então, a partir da visão dos pais e dos professores, levantar

dados sobre a educação escolar da criança surda e questões relacionadas ao

letramento.

Foi conveniente na pesquisa investigar primeiramente como se estabelece a

comunicação com a criança surda tanto no âmbito familiar, quanto no escolar, a fim

de saber se a língua de sinais é contemplada. Pôde-se perceber que a língua de

sinais não é contemplada, nem na escola, nem na família. Na escola, apesar de

serem apontadas outras formas de comunicação, a língua de sinais, que para além

da comunicação seria a promotora das interações lingüísticas significativas para a

criança surda, não foi referida.

A participação dos pais no processo escolar do filho revelou-se pouco

freqüente, por outro lado o índice de insatisfação dos mesmos em relação à escola

foi representativo, de modo que tal insatisfação diz respeito a: mau atendimento ao
145

aluno, o fato de a escola “não ser apropriada”, falta de atenção, preconceito e

despreparo profissional. Da mesma forma a maior parte dos pais mostraram-se

insatisfeitos com a atuação do professor em sala de aula, dentre os motivos foram

apontados: falta de atenção ao aluno, falta de paciência, preconceito e falta de

preparo profissional. Esses dados revelam que os pais têm uma visão acerca da

escola e da atuação do professor, no entanto, pouco participam do processo escolar.

No que diz respeito à visão dos pais e dos professores acerca do

desempenho escolar da criança foi possível constatar que apenas 33% das

respostas coincidiram, ou seja, na maioria das vezes, a visão dos pais sobre o

desempenho do filho, não foi a mesma do professor. Alguns alunos que na visão dos

professores se desenvolvem bem em sala de aula, na visão dos pais têm um

desenvolvimento ruim. Cabe, de fato, considerar que muitas vezes a expectativa do

pai em relação ao processo acadêmico do filho pode não ser a mesma do professor,

já que cada um tem suas bases e seus conceitos.

Considerando o contexto de inclusão educacional em que esta pesquisa foi

desenvolvida buscou-se investigar alguns aspectos relacionados à atuação dos

professores, a partir de suas próprias falas. Nesse aspecto procurou-se saber qual

seu conhecimento acerca da surdez e da língua de sinais. Assim, como foi possível

perceber em relação ao contexto familiar, durante as conversas com os pais, há um

desconhecimento considerável, por parte dos professores acerca da surdez e da

língua de sinais, o que revela um obstáculo, tanto para o professor, quanto para o

aluno surdo. O reconhecimento em torno da diferença lingüística do surdo não se faz

presente, o que se estabelece em um contra-senso com a proposta de inclusão, em

que as diferenças devem ser levadas em consideração.


146

No que diz respeito ao trabalho pedagógico propriamente dito buscou-se

investigar se o professor percebe diferenças no processo de ensino-aprendizagem

entre o aluno surdo e os demais, e ainda se faz uso, em suas aulas, de estratégias e

avaliação diferenciadas. As diferenças apontadas dizem respeito de forma geral à

desatenção, insegurança, lentidão, dificuldade de escrita e interpretação. Tais

aspectos refletem um discurso sobre o surdo que circula socialmente, um discurso

baseado na deficiência em que se percebem as limitações e não as diferenças.

Predomina, portanto, o discurso da limitação.

Ainda que diferenças sejam percebidas pelos professores, o uso de

estratégias diferenciadas em sala de aula foi apontado somente por 50% dos

professores, os quais referiram atendimento individualizado, auxílio na execução das

atividades, aproximação constante do aluno como estratégias. Foi possível observar

que há um desconhecimento por parte dos professores a respeito de que fazer uso

de estratégia diferenciada está relacionado às diferentes maneiras de se abordar

determinado conteúdo, materiais e propostas de trabalho diversificadas e apoio

visual. Da mesma forma em relação ao uso de avaliação diferenciada, apesar de a

maioria dos professores afirmarem fazer uso, foi possível perceber incoerências ao

se referirem, sobretudo, à avaliação oral, o que revela a falta de uma reflexão do

significado e da função da avaliação.

Como sendo um dos principais objetivos dessa pesquisa buscou-se

investigar também, a partir do discurso dos pais e professores como os mesmos

percebem a criança surda frente à leitura e à escrita, considerando as práticas de

letramento que circulam no âmbito familiar e escolar. Nesse sentido ao retratar que

tipo de material de leitura há em casa, foi possível verificar uma restrição de gêneros

textuais, assim como em sala de aula, que apesar de ter sido apontado uma
147

diversidade de gêneros textuais, percebe-se que o material portador do gênero não

é trazido para a sala de aula, ou seja, não é apresentado aos alunos, sendo que o

livro didático é amplamente utilizado.

No trabalho com a escrita em sala de aula, apesar de todos os professores

terem afirmado trabalhar com a produção textual, a cópia e o ditado apresentaram-

se como práticas presentes, o que revela a desconsideração da presença do aluno

surdo em sala de aula, considerando que o ditado é uma atividade que tem como

base a percepção auditiva. No que diz respeito às questões desenvolvidas

metodologicamente em sala de aula em relação ao trabalho com a linguagem escrita

com alunos surdos, Fernandes (1998) argumenta que deve ser considerada a

participação ativa da língua de sinais nos processos discursivos. A autora destaca

ainda a importância de um olhar diferenciado para as produções escritas desses

alunos, de modo a “respeitar as especificidades de uma construção, essencialmente

visual, refletida na escrita.” (p. 167).

Quanto à visão dos pais e dos professores em relação à leitura da criança

surda, houve algumas diferenças, porém essas diferenças não são totalmente

opostas, ou seja, não houve resposta contrária como o pai dizer que o filho

compreende o que lê e o professor dizer que não compreende. Quanto à escrita a

maioria das respostas dos pais e dos professores foi compatível, ou seja, pais e

professores, em geral, têm uma mesma visão em torno da escrita do aluno surdo.

Diante do exposto cabe trazer à tona algumas reflexões. Ao analisar as

questões referentes ao modo com que pais e professores se comunicam com a

criança surda foi possível perceber a supremacia da linguagem oral. A comunicação

dos pais se estabelece pela fala, no entanto não há possibilidades de trocas

lingüísticas que proporcionem ao surdo constituir conceitos e vivenciar experiências,


148

já que prevalece uma língua da qual ele não tem o domínio. O mesmo ocorre na

escola, local que, por excelência, promove trocas de experiências e a construção de

conhecimento a partir de interações, das quais, porém, o surdo não participa

efetivamente, por não ser privilegiada sua experiência visual com a linguagem.

A posição da escola ao assumir uma homogeneização em relação à língua

oral colabora para marcar a surdez como deficiência, o que acaba por favorecer a

exclusão, ao invés de incluir. Essa exclusão acaba por gerar representações que

colocam o surdo em um lugar de desprestígio, em que os conceitos sobre ele são

constituídos assentados na falta de audição, atribuindo-lhe estereótipos a partir de

uma visão ouvintista, como se verificou nos depoimentos dos professores ao

relatarem as dificuldades do aluno surdo em sala de aula, referindo-se à lentidão, à

falta de atenção, às dificuldades na escrita e na interpretação. Esses conceitos,

negativamente estabelecidos, denotam a falta de conhecimento em torno das

implicações da surdez, que se compreendidas mostram que tais fatos ocorrem

porque não é privilegiado o modo com que o surdo constrói seus conceitos e seu

conhecimento de mundo a partir de experiências visuais. Ao olhar o surdo, carrega-

se as próprias significações de alguém que ouve.

Frente ao atual contexto de inclusão educacional, se analisados os dados

levantados nesta pesquisa há muito a se repensar. É um contra-senso dizer que a

inclusão está sendo efetivada, se não há por parte daqueles envolvidos na educação

escolar do sujeito surdo, o reconhecimento de que há uma diferença a ser levada

em consideração. Entretanto enquanto as políticas educacionais estiverem

vinculadas a uma visão de deficiência, os conceitos e os pré-conceitos em relação

ao sujeito persistirão. Diante disso, algumas mudanças se fazem necessárias, tais

como:
149

ƒ Perceber a surdez como diferença, desvinculando-se da visão

patológica – isso exige antes de tudo uma mudança de

posicionamento e acima de tudo um convívio efetivo com o surdo,

abrindo-lhe espaço para colocar-se como sujeito;

ƒ Reconhecer de fato a língua de sinais – não apenas no sentido legal,

mas proporcionando espaços para que a língua de sinais se

manifeste efetivamente como uma língua e não apenas como um

instrumento que auxilia na educação do surdo;

ƒ Reconhecer as implicações da surdez – abrir espaços, sobretudo no

meio escolar, para que os professores possam refletir

verdadeiramente sobre como o sujeito surdo se constitui, sobre sua

experiência visual e sobre questões relacionadas à identidade, a

iniciar pelo acesso dos professores a noções em torno da surdez, da

língua de sinais e do sujeito surdo, antes mesmo de recebê-lo em

sala de aula;

ƒ Articular propostas de educação bilíngüe – contemplar realmente a

condição bilíngüe do sujeito surdo, desde a família. Não basta

estabelecer leis que propõem a língua de sinais, se a inclusão

pressupõe outros espaços para superar a deficiência, e não são

articuladas políticas que viabilizem o acesso à família ao

conhecimento em torno dessa condição.

ƒ Desenvolver políticas públicas voltadas à família – promover o

reconhecimento por parte das famílias em torno da importância da

condição bilíngüe do surdo, articulando uma aproximação da família

com a escola;
150

ƒ Desenvolver espaços para que o letramento seja levado em conta em

todos os sentidos – considerando diferentes possibilidades de

trabalho com a linguagem, reconhecendo as peculiaridades do surdo

com relação à linguagem escrita e sua experiência visual.

Considerando o contexto do CAES de Piraquara, enfatizado nesta pesquisa,

diante das reflexões até aqui abordadas ressalta-se a importância do mesmo no

contexto da inclusão do surdo no ensino regular, sobretudo no que diz respeito ao

trabalho com a leitura e a escrita, pois nesse espaço (pressupõe-se) lhe são

dispensadas oportunidades que, assim como se pôde analisar, muitas vezes não

existem em sala de aula, como é o caso do acesso à língua de sinais, as trocas e

interações lingüísticas que antecedem e procedem qualquer trabalho com a

linguagem escrita e, sobretudo, o lugar que é concebido ao surdo nas práticas com

esta modalidade. Porém, convém refletir aqui em torno da proposta de inclusão que

se estabelece no cenário atual.

Se a inclusão pressupõe o acesso à educação para todos, considerando a

heterogeneidade, por que ainda é necessário se estabelecerem atendimentos

especializados? Se a escola é inclusiva, não deveria então a mesma dar conta do

aluno surdo, sem ser necessário que este tivesse de ter tantos “aparatos” para suprir

o que na verdade não se contempla em sala de aula? Quais as possibilidades que a

criança surda teria de desenvolver-se numa proposta bilíngüe considerando o que

foi possível analisar até aqui?

As atuais políticas em relação à educação de surdos apontam para uma

proposta bilíngüe, na qual a língua portuguesa escrita constitui-se como segunda

língua para o surdo, como foi observado em capítulos anteriores, entretanto, como
151

analisado a partir dos dados, tal proposta não é contemplada no ensino regular. O

CAES acaba sendo o único lugar em que a criança surda pode ter acesso a

conceitos e constituir-se como sujeito a partir de uma língua estruturada, para que

assim possa compreender a língua portuguesa, constituindo-se como sujeito leitor e

autor a partir do uso significativo da linguagem. Ou seja, o CAES supre o que não se

contempla no ensino regular. É inclusão?

Outro fato a ser considerado é em relação à escolaridade: é no CAES que o

aluno surdo tem possibilidades de construir seus conceitos e condições de apropriar-

se de forma significativa do conhecimento em torno da língua portuguesa,

considerando que neste espaço há um conhecimento da sua condição bilíngüe, no

entanto, a avaliação e a “aprovação” para a série seguinte se dá no ensino regular, o

que se mostra uma incoerência. Pode-se dizer que o aluno surdo é sujeito em um

local, no CAES, e assujeitado em outro, na sala de aula do ensino regular.

Esses dados levam a concluir que, acima de tudo, é preciso reconhecer a

necessidade de propiciar à criança surda possibilidades que não a deixem em

desvantagem em relação às outras crianças e que lhe garantam uma formação

integral, levando em conta suas particularidades. A inclusão real do surdo pode

distanciar-se da utopia se for realizada com responsabilidade, de modo que todas as

questões relacionadas a constituição de sujeito (interações lingüísticas, práticas

significativas com a linguagem, língua) sejam consideradas.


152

REFERÊNCIAS

ALVES, R. A escola com que sempre sonhei sem imaginar que pudesse existir. 9.

ed. São Paulo: Papirus, 2006.

ALVES, A. C. C.; KARNOPP, L. B. O surdo como contador de histórias. In: LODI, A.

C. B.; HARRISON, K. M, C.; CAMPOS, S. R.; TESKE, O. (orgs.) Letramento e

Minorias. Porto Alegre: Mediação, 2002. p. 71-75.

ANGELIDES, P.; ARAVI, C., A comparative perspective in the experiences of deaf

and hard hearing individuals as students at mainstream and special schools.

American Annals of the Deaf. v. 151, nº 5. p. 476-485, 2006/2007.

ANTIA, S. D.; REED, S.; KREIMEYER, K. H., Written Language of Deaf and Hard-of-

hearing students in Public Schools. Journal of Deaf Studies and Deaf Educations. p.

244-255. Summer, 2005.

APOLINÁRIO, A. A. O que os surdos e a literatura têm a dizer?- Uma reflexão sobre

o ensino na escola ANPACIN no município de Maringá/ Pr. Dissertação de

Mestrado. Universidade Estadual de Maringá, Maringá, 2005.

BAKHTIN, M. Marxismo e Filosofia da Linguagem. 5 ed. São Paulo: Hucitec, 1990.

___________Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1992.


153

BELL, A. G. The Mechanism of speech: Lectures delivered before the American

Association to promote the teaching of speech to the deaf, to which is appended a

paper., New York : Funk & Wagnalls Company, 1910.

BERBERIAN, A.P.; ANGELIS, C. C. M.; MASSI, G.; Violência simbólica nas praticas

de letramento. In: BERBERIAN, A.P.; ANGELIS, C. C. M.; MASSI, G. (orgs).

Letramento, referências em saúde e educação. São Paulo: Plexus, 2006. p. 15-32.

BORGES, A. R. A inclusão de alunos surdos na Escola Regular. Espaço, Rio de

Janeiro. v. 21, p. 63-68, jun/2004.

BOTELHO, P. Educação Inclusiva para surdos: desmistificando pressupostos. In:

Anais do I Seminário Internacional Sociedade Inclusiva. PUC. Minas Gerais.

Setembro, 1999. Disponível em: http://www.socidadeinclusiva.pucminas.br/anais.php

Acesso em: 08 jun. 2008.

____________ Linguagem e letramento na educação dos surdos- Ideologias e

práticas pedagógicas. Belo Horizonte: Autêntica, 2002.

BRASIL, Coordenadoria nacional para integração da pessoa portadora de

deficiência. Declaração de Salamanca e linha de ação sobre necessidades

educativas especiais, Brasília: CORDE, 1994.


154

__________ Projeto Escola Viva. Garantindo o acesso e permanência de todos os

alunos na escola - Alunos com necessidades educacionais especiais. Secretaria de

Educação Especial. Brasília: Mec. 2000.

__________ Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica.

Res. CNE/CEB n. 02/2001; Parecer CNE/CEB n. 017/2001.

__________ Decreto Nº 5626/2005: Regulamenta a Lei nº 10439/2002, que dispõe

sobre a Língua Brasileira de Sinais- Libras, e o Art. 18 da Lei nº 10098/2000.

Brasília, 2005a.

__________ Saberes e Práticas da Inclusão - Desenvolvendo competências para o

atendimento às necessidades educacionais especiais de alunos surdos. Brasília:

MEC, Secretaria de Educação Especial, 2005b.

__________ Saberes e Práticas da Inclusão - Recomendações para a construção de

escolas inclusivas. 2 ed. Brasília: MEC, Secretaria de Educação Especial, 2006.

__________ Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da educação

inclusiva (versão preliminar), Secretaria de Educação Especial/ Ministério da

Educação, setembro, 2007.


155

__________ Política Nacional da Educação Especial na perspectiva da Educação

Inclusiva. Secretaria de Educação Especial/ Ministério da Educação, janeiro, 2008.

CAGLIARI, L. C. Alfabetização e lingüística. 8 ed. São Paulo: Scipione, 1995.

CHIZOTTI, A. Pesquisa em Ciências Humanas e Sociais. 3 ed. SP: Cortez, 1998.

DECHANDT, S. B. A apropriação da escrita por crianças surdas. In: QUADROS, R.

M. (org.). Estudos Surdos. v. 1. Série Pesquisas. Petrópolis: Arara Azul, 2006. p.

284-322.

DESSEN, M. A.; POLONIA, A. C. A Família e a Escola como contextos de

desenvolvimento humano. Paidéia, Ribeirão Preto, v.. 17, n. 36, p. 21-32. Jan/abr,

2007.

DORZIAT, A. Metodologias especificas ao ensino de surdos: análise crítica. Série

deficiência auditiva, fascículo 3. In: BRASIL, Série Atualidades Pedagógicas,

Educação Especial - Deficiência auditiva. Brasília: MEC, SEESP, 1997.

FAVORITO, W. “O difícil são as palavras”: representações de/sobre estabelecidos e

outsiders na escolarização de jovens e adultos surdos. Tese de Doutorado.

Universidade Estadual de Campinas. Campinas, 2006.

FERNANDES, E. Problemas lingüísticos e cognitivos do surdo. Rio de Janeiro: Agir,

1990.
156

FERNANDES, S. Surdez e linguagens: é possível um diálogo entre as diferenças?

Dissertação de Mestrado. Universidade Federal do Paraná. Curitiba, 1998.

____________ Educação bilíngüe para surdos: identidades, diferenças,

contradições e mistérios. Tese de Doutorado. Universidade Federal do Paraná.

Curitiba, 2003.

____________ Letramento na Educação bilíngüe para surdos. In: BERBERIAN,

A.P., ANGELIS, C. C. M. de, MASSI, G. (orgs). Letramento, referências em saúde e

educação. São Paulo: Plexus, 2006a. p. 117-144.

____________ Práticas de Letramento na Educação Bilíngüe para Surdos. Curitiba:

SEED, 2006b.

____________ Educação Bilíngüe para surdos: desafios à inclusão. Grupo de

estudos- Educação Especial. Curitiba: SEED, 2006c.

____________ Fundamentos para Educação Especial. Curitiba: IBPEX, 2007.

FERREIRA BRITO, L. Integração Social e Educação de surdos. Rio de Janeiro:

Babel, 1993.

FRANCHI, C. Linguagem: atividade constitutiva. Cadernos de Estudos Lingüísticos.

Campinas, n. 22. p. 9-39, jan/jun.. 1992.


157

FREITAS, M. T. A. A perspectiva sócio-histórica: uma visão humana da construção

do conhecimento. In: FREITAS, M. T.; JOBIM e SOUZA, S.; KRAMER, S. Ciências

Humanas e Pesquisa - Leituras de Mikhail Bakhtin. São Paulo: Cortez, 2003. p. 26-

38.

GALVÃO, A. M. O. Leitura: algo que se transmite entre as gerações? In. RIBEIRO,

V. M. (org) Letramento no Brasil: reflexões a partir do INAF 2001. São Paulo: Global,

2003. p. 373-378.

GERALDI, J. W. Portos de Passagem. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

GESUELI, Z. M. A criança surda e o conhecimento construído na interlocução em

língua de sinais. Tese de Doutorado. Universidade Estadual de Campinas,

Campinas, 1998.

GOES, M. C. R. Linguagem, Surdez e Educação. 2. ed. São Paulo: Autores

Associados, 1999.

GOULART, C. Letramento e modos de ser letrado: discutindo a base teórico-

metodológica de um estudo. Revista Brasileira de Educação. Rio de Janeiro, v. 11,

n. 33, p. 450-562, set/dez, 2006.

GUARINELLO, A. C. A influencia da família no contexto dos filhos surdos. Jornal

Brasileiro de fonoaudiologia. Curitiba, n. 03, p. 28- 33. Maio, 2000.


158

______________; BERBERIAN, A. O.; SANTANA, A. P.; MASSI, G.; PAULA, M., A

inserção do aluno surdo no ensino regular: visão de um grupo de professores do

Estado do Paraná. Revista Brasileira de Educação Especial, Marília, v. 12, n. 3, p.

317-330, set/ dez, 2006.

GUARINELLO, A. C. O papel do outro na escrita dos sujeitos surdos. São Paulo:

Plexus, 2007.

GUARINELLO, A. C.; MASSI, G.; BERBERIAN, A. P. Surdez e Linguagem Escrita:

um estudo de caso. Revista Brasileira de Educação Especial. Marília, vol. 13, p. 205-

218, mai- ago. 2007.

GUARINELLO, A. C.; SANTANA, A. P.; FIGUEIREDO, L. C.; MASSI, G. O intérprete

universitário da Língua Brasileira de Sinais na cidade de Curitiba. Revista Brasileira

de Educação Especial. Marília, vol. 14, p. 63-74, jan-abr, 2008.

GUIMARÃES, V. S. Deficiente de audiocomunicação. Curitiba: IEPEP (Instituto

Brasileiro de Educação Professor Erasmo Pilotto) 1981.

KARNOPP, L. B.; PEREIRA, M. C. C., Concepções de leitura e escrita e educação

de surdos. In: LODI, A. C. B.; HARRISSON, K. M. P; CAMPOS, S. R. L. (orgs)

Leitura e escrita no contexto da diversidade. Porto Alegre: Mediação, 2004. p. 33-

38.
159

KASSAR, M. C. M., Marcas da história social no discurso de um sujeito: Uma

contribuição para a discussão a respeito da constituição social da pessoa com

deficiência. Caderno CEDES, Campinas, v. 20, n. 50, p. 41-54, abr. 2000.

KLEIMAN, A. B. Programas de educação de jovens e adultos e pesquisa acadêmica:

a contribuição dos estudos do letramento. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 27,

n. 2, p. 267-281, jul./dez, 2001.

LACERDA, Cristina B. F. De. A inclusão escolar de alunos surdos: o que dizem

alunos, professores e intérpretes. Caderno CEDES, Campinas, v. 26, n. 69, p. 163-

184, maio/ago. 2006.

LANE, H. A máscara da benevolência: a comunidade surda amordaçada. Lisboa:

Instituto Piaget, 1992.

LIMA, M. S. C. Surdez, Bilingüismo e Inclusão: entre o dito, o pretendido e o feito.

Tese de doutorado. Universidade Estadual de Campinas . Campinas, 2004.

LIMEIRA DE SÁ, N. Educação de Surdos: A Caminho do Bilingüismo. Niterói: Eduff,

1999.

LODI, A. C. B. A leitura como espaço discursivo de construção de sentidos: oficina

com surdos. Tese de Doutorado, Pontifícia Universidade Católica – PUC - São

Paulo, 2004.
160

LODI, A. C. B., Plurilingüismo e surdez: uma leitura bakhtiniana da história da

educação dos surdos. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 31, n. 3, p. 409-424,

2005.

LOPES, M. C. Surdez e Educação. Belo Horizonte. Autêntica: 2007.

MACHADO, M. L. C. A., Grupo de Linguagem escrita: uma proposta de intervenção

fonoaudiológica. Dissertação de Mestrado. Universidade Tuiuti do Paraná. Curitiba,

2007.

MARCUSCHI, L. A. Da fala para a escrita – atividades de retextualização. 6 ed. São

Paulo: Cortez, 2005.

MITCHELL, R. E.; KARCHMER, M. A.. When parents are deaf versus hard of

hearing: patterns of use and school placement of deaf and hard-of-hearing children.

Journal of Deaf Studies Education. Oxford University, v. 9, n. 2, 2004.

MOITA LOPES, L. P. Identidades fragmentadas: a construção discursiva de raça,

gênero e sexualidade em sala de aula. Campinas: Mercado das Letras, 2002.

MORATO, E. M. Vygotsky e a perspectiva enunciativa da relação entre linguagem,

cognição e mundo social. Educação e Sociedade, Campinas, n. 71, p. 149-165.

julho, 2000.
161

MOREIRA, H; CALEFFE, L. G. Metodologia da pesquisa para o professor

pesquisador. Rio de Janeiro: DP&A, 2006.

NEGRELI, M. E. D.; MARCON, S. S. Família e criança surda. Ciência, Cuidado e

Saúde. Maringá, v. 5, n.1. p. 98-107, jan/abr, 2006.

NONATO, J. L. Leitura, Escrita e Surdez: A representação do surdo sobre seu

processo de escolarização. Dissertação de Mestrado. Pontifícia Universidade

Católica – PUC - São Paulo, 2006.

PADDEN, C. A. Deaf children and literacy. Internacional Bureau of education.

Geneva: UNESCO, Switzerland, 1990.

PAN, M. A. G. S. Letramento Escolar e processos subjetivos. In: BERBERIAN, A. P.;

MORI- de ANGELIS; C. C., MASSI, G. Letramento- referências em saúde e

educação. São Paulo: Plexus, 2006.

PARANÁ. Lei nº 12095/98. Reconhece oficialmente, pelo Estado do Paraná, a

linguagem gestual codificada na Língua Brasileira de Sinais - Libras e outros

recursos de expressão a ela associados, como meio de comunicação objetiva e de

uso corrente. Curitiba, 1998.


162

__________ Instrução nº. 002/2008 estabelece critérios para o funcionamento do

Centro de Atendimento Especializado na Área da Surdez –CAES- serviço de apoio

especializado. Secretaria de Estado da Educação do Paraná, 2008.

PEDREIRA, S. M. F. Porque a palavra não adianta - um estudo das relações entre

surdos/as e ouvintes em uma escola inclusiva na perspectiva intercultural.

Dissertação de Mestrado. Pontifícia Universidade Católica, Rio de Janeiro, 2006.

PEIXOTO, R. C. Algumas considerações sobre a interface entre a língua brasileira

de sinais (LIBRAS) e a língua portuguesa na construção inicial da escrita pela

criança surda. Caderno CEDES. Campinas, n. 69, p. 205- 229, maio/ago, 2006.

QUADROS, R. M. Educação de surdos - a aquisição da linguagem. Porto Alegre:

Artes Médicas. 1997.

____________. Políticas lingüísticas e educação de surdos em Santa Catarina:

espaço de negociações. Caderno CEDES, Campinas, n. 69. p. 141- 161, maio/ago,

2006a.

____________. Políticas lingüísticas: o impacto do decreto 5.626 para os surdos

brasileiros. Espaço, Rio de Janeiro, n. 25/26. p. 19-25, 2006b .


163

RIBEIRO, V. M. Letramento no Brasil: alguns resultados do indicador nacional de

alfabetismo funcional. Educação e Sociedade. Campinas, v. 23, n. 81. p. 49-70, dez.

2002.

RIBEIRO, V. M. (org.). Letramento no Brasil. São Paulo: Global, 2003.

ROJO, R. H. R. O letramento na ontogênese: uma perspectiva socioconstrurivista.

In: ROJO, R. H. R. (org.). Alfabetização e letramento: perspectivas lingüísticas.

Campinas: Mercado das Letras, 1998, p. 121-171.

SACKS, Oliver. Vendo Vozes - Uma jornada pelo mundo dos surdos. São Paulo:

Companhia das Letras, 1998.

SAMPAIO, C. S. A presença de uma aluna surda em uma turma de ouvintes-

possibilidade de (re)pensar a mesmidade e a diferença no cotidiano escolar. Revista

da Educação Especial. Brasília, Secretaria de Educação Especial, v. 1, n. 1, outubro,

2005.

SANTANA, A. P. Surdez e Linguagem: aspectos e implicações neurolingüísticas.

São Paulo: Plexus, 2007.

SCHENEIDER, R. Educação de Surdos- Inclusão no ensino regular. Passo Fundo:

Ed. Universitária de Passo Fundo, 2006.


164

SILVA, M. P. M. A construção de sentidos na escrita do sujeito surdo. Dissertação

de Mestrado. Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1999.

SILVA, I. R. As representações do surdo na escola e na família: entre a

(in)viabilização da diferença e da deficiência. Tese de Doutorado. Universidade

Estadual de Campinas, Campinas, 2005.

SKLIAR, C. (org). Educação e Exclusão: abordagens sócio-antropológicas em

educação especial. 2. ed. Porto Alegre: Mediação, 1997.

__________. A Surdez: Um olhar sobre as diferenças. Porto Alegre: Mediação,

1998.

__________. Estudos Surdos e estudos Culturais em Educação. In.: LACERDA, C.

B. F.; GÓES, M. C. R. de. Surdez- Processos educativos e Subjetividade. São Paulo:

Lovise, 2000.

__________. Perspectivas políticas e pedagógicas da educação bilíngüe para

surdos. In: SILVA, S., VIZIM, M. (orgs). Educação Especial: múltiplas leituras e

diferentes significados. Campinas: Mercado das Letras, 2001. p. 85-109.

__________. Pedagogia (improvável) da diferença: E se o outro não estivesse aí?

Rio de Janeiro: DP&A, 2003.


165

SOARES, F. M. R; LACERDA, C. B. F. de. O aluno surdo em escola regular- um

estudo de caso sobre a construção de identidade. In: GÓES, M. C. R.; LAPLANE, A.

L. F. (orgs). Políticas e Práticas de Educação Inclusiva. Campinas: Autores

Associados, 2004. p. 121- 147.

SOARES, M._ Letramento e Alfabetização: as muitas facetas. Revista Brasileira de

Educação. Rio de Janeiro, n. 25. p. 5-17. Abril, 2004.

_________.Letramento, um tema em três gêneros. 2. ed. Belo Horizonte: Autêntica,

2006.

STELLING, E. P. A relação da pessoa surda com sua família. Espaço. Rio de

Janeiro, n. 11, p. 45-47, 1999.

STROBEL, K. L. A visão histórica da in(ex)clusão dos surdos nas escolas. Dossiê.

Grupo de Estudos Surdos e Educação. ETD- Educação Temática Digital, Campinas,

v. 7, n. 2, p. 244-252, jun. 2006.

TRENCHE, M.C.B.; BALIEIRO, C.R. Linguagem, escrita, produção de sentidos e a

criança surda: questões para a clínica fonoaudiológica. In: BERBERIAN, A.P.;

ANGELIS, C. C. M. De; MASSI, G. (orgs). Letramento, referências em saúde e

educação. São Paulo: Plexus, 2006.


166

TURATO, E. R. Introdução à metodologia da pesquisa clínico-qualitativa - definição

e principais características. Revista Portuguesa de Psicossomática. Sociedade

Portuguesa de Psicossomática, Portugal, v. 2, n. 1. p. 93-108. 2000.

VERCEZE, R. M. N. Gêneros textuais no processo de ensino-aprendizagem.

Estudos Lingüísticos, São Paulo, n. 37. p. 47-53, maio - ago. 2008.

VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1984.

_______________ Pensamento e Linguagem. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes,

1989.

ZIGOURIS-COE, V. Emergent Literacy. FLaRE Document. Florida Literacy and

Excellence Center. Orlando, 2001. Disponível em: http://flare.ucf.edu/Research/

Emergent%20Literacy.pdf. Acesso em: 18 nov. 2008.


167

APÊNDICE
APROVAÇÃO DO COMITÊ DE ÉTICA
168
169

ANEXOS
170

ANEXO I

Entrevista com os pais

I Dados de identificação
Idade: __________
Último grau de instrução: __________
Idade do filho surdo: __________
Numero de pessoas que moram em sua casa: __________
Grau de instrução dos membros da família: ________________________________
___________________________________________________________________

II Aspectos relacionados à perda auditiva do filho e à interação familiar


Com que idade foi descoberta a perda auditiva do(a) seu (sua) filho(a)? __________
Qual o grau de perda auditiva do(a) seu (sua) filho(a)? __________
Que tipo d comunicação é utilizada em casa com a criança? ___________________
___________________________________________________________________

Você já fez curso de língua de sinais?


( ) não
( ) sim Se sim, onde? __________________________

Você participa das atividades escolares do(a) seu (sua) filho(a)? De que maneira?
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________

III Aspectos relacionados à leitura e escrita


Que tipo de material de leitura há em sua casa:
( ) livros
( ) revistas
( ) jornais
( ) bíblia
( ) outros. Quais?
Você tem o hábito de ler?
( ) não
( ) sim Se sim, o quê?_______________________

Você tem o hábito de ler para/com seu(sua) filho(a)?


( ) sempre
( ) às vezes
( ) não lê

No seu ponto de vista, seu filho compreende o que lê?


( ) sempre
( ) às vezes
( ) nunca
( ) não sei
171

Justifique:___________________________________________________________
___________________________________________________________________
Com relação à escrita, seu(sua) filho(a):
( ) escreve sem ajuda
( ) escreve somente com ajuda
( ) só copia
( ) não escreve

IV Aspectos relacionados à escolarização e atendimentos


Seu(sua) filho(a) já freqüentou escola especial?
( ) não
( ) sim Se sim, por quanto tempo?_____________________

Seu(sua) filho(a) recebe algum atendimento especializado no contra turno?


( ) Fonoterapia
( ) CAES ( Centro de Atendimento Especializado – Surdez)
( ) Psicologia
( ) Outro. Qual? _______________________________
Para os assinalados, você saberia descrever qual a função desses
atendimentos?
Fonoterapia _________________________________________________________
CAES ______________________________________________________________
Psicologia ___________________________________________________________
Outro ______________________________________________________________

Você considera o desempenho escolar de seu(sua) filho(a):


( ) bom
( ) regular
( ) não apresenta um bom desempenho

No que diz respeito à escola, na sua opinião:


( ) corresponde as suas expectativas
( ) não corresponde às expectativas. Por que? ____________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
Se não corresponde as suas expectativas, o que você está fazendo para
melhorar? ___________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________

No que diz respeito à atuação do professor com seu(sua) filho(a) em sala de aula,
qual seu ponto de vista? _______________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________

Quais suas expectativas escolares com relação a seu(sua) filho(a)? _____________


___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
172

ANEXO II

Entrevista com os professores

I Dados de identificação
Idade: __________________
Tempo de docência: ____________________

Último grau de instrução:


( ) Magistério
( ) Superior incompleto
( ) Superior completo. Curso: _________________
( ) Especialização. Curso: ____________________
( ) Mestrado. Onde? ________________________

Série em que atua: _____________


Número de alunos em sala de aula: __________

II Acerca da Surdez
Possui aluno surdo?
( ) não
( ) sim Se sim, desde quando?__________________________

Você sabe qual o grau de perda auditiva de seu(sua) aluno(a)?


( ) não
( ) sim Se sim, qual é? _____________________________

Possui algum curso na área da Surdez?


( ) LIBRAS
( ) Adicional
( ) Especialização
( ) Outro (s). Qual(is)?_________________________________________________

Você considera o seu conhecimento acerca da Surdez:


( ) suficiente, pois conhece os aspectos e implicações relacionadas à surdez e ao
sujeito surdo;
( ) regular, conhece algumas teorias acerca da Surdez, mas tem dificuldades em
compreender as implicações;
( ) desconhece os aspectos relacionados à Surdez e ao sujeito surdo.

Você considera seu conhecimento acerca da língua de sinais:


( ) aprofundado, pois conhece os aspectos gramaticais e não tem dificuldades em
comunicar-se em LIBRAS;
( ) suficiente, conhece os sinais e comunica-se apenas com algumas dificuldades;
( ) desconhece.

III Aspectos relacionados à inclusão e ao aluno surdo em sala de aula

Que tipo de comunicação é utilizado entre você e o aluno(a) surdo(a) em sala?


173

( ) fala
( ) leitura labial
( ) gestos
( ) Libras
( ) Outros. Quais? ___________________________________________

Você considera o desempenho escolar desse(a) aluno(a):


( ) excelente
( ) bom
( ) regular
( ) ruim
( ) justifique sua resposta:______________________________________________

Qual(is) sua(s) maior(es) dificuldade(s) com relação à inclusão do aluno surdo em


sala de aula? ________________________________________________________
___________________________________________________________________

No seu ponto de vista qual(is) a(s) maior(es) dificuldade(s) do(a) aluno(a) em sala?
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________

Seu(sua) aluno(a) faz algum atendimento no contra-turno?


( ) não sei
( ) Fonoterapia
( ) Psicologia
( ) CAES ( Centro de Atendimento Especializado – Surdez)
( ) Outro. Qual? _____________________________________________________
Para os atendimentos assinalados, você sabe qual é a função?
( ) não
( ) sim Se sim, justifique sua resposta: _________________________________
___________________________________________________________________

Como é a participação dos pais do(a) aluno(a) no processo escolar?


( ) participa
( ) não participa
( ) participa só quando solicitado
Justifique sua resposta: ___________________________________________
___________________________________________________________________

IV Aspectos relacionados ao trabalho com a escrita


De que fontes você retira os textos a serem abordados em sala de aula? (ex.; livro
didático, revista...) ____________________________________________________
___________________________________________________________________

Quais os tipos de textos que você utiliza em sala de aula?


( ) descritivo ( ) discursivo
( ) narrativo ( ) informativo
( ) argumentativo ( ) outro. Qual?_______
174

Quais os gêneros textuais abordados em sala de aula?


( ) bilhetes ( ) reportagens
( ) receitas ( ) piadas
( ) cartas ( ) notícias
( ) quadrinhas ( ) outro(s). Qual(is)?_____________
( ) contos

De que maneira(s) você apresenta os textos aos alunos?


( ) no quadro de giz
( ) em papel bobina ou cartaz
( ) no livro didático
( ) em folhas digitadas ou mimeografadas
( ) em retroprojetor, direto da fonte
( ) outros. Quais? _______________________________________________

Como você costuma trabalhar com a linguagem escrita?


( ) a partir de textos inteiros
( ) a partir de sílabas
( ) a partir de palavras
( ) a partir de letras do alfabeto
( ) Outro. _______________________

Que atividades você utiliza no trabalho com a leitura e a escrita?


( ) leitura individual
( ) leitura em grupo
( ) ditado
( ) produção de texto
( ) cópia
( ) outra (s). Qual(is)? ________________________________________________
___________________________________________________________________

Com relação à leitura, você percebe que o(a) aluno(a) surdo(a):


( ) compreende o que lê
( ) às vezes compreende o que lê
( ) não compreende o que lê
( ) não percebo se compreende ou não

Com relação à escrita o(a) aluno(a):


( ) escreve espontaneamente
( ) escreve somente com auxílio
( ) só copia
( ) ao escreve

V Aspectos pedagógicos

Você utiliza alguma estratégia diferenciada com o aluno surdo? Qual(is)?


( ) não
( ) sim Se sim, quais? _____________________________________________
___________________________________________________________________
Em que momentos? ________________________________________
175

___________________________________________________________________

Você percebe diferenças no processo de ensino-aprendizagem entre o aluno surdo


e os demais? Quais? __________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________

Você utiliza algum tipo de avaliação diferenciada com o aluno surdo? Qual?
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________

Baseado em que teoria/concepção você elabora seu planejamento? Justifique sua


resposta: ____________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
176

ANEXO III

Instrução 002/2008 – CAES


177
178
179
180
181
182

ANEXO IV

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Você está sendo convidado (a) para participar de uma pesquisa. As

informações existentes neste documento são para que você entenda perfeitamente

os objetivos da pesquisa, e saiba que a sua participação é espontânea. Se durante a

leitura deste documento houver alguma dúvida você deve fazer perguntas para que

possa entender perfeitamente do que se trata. Após ser esclarecido (a) sobre as

informações a seguir, no caso de aceitar fazer parte do estudo, assine ao final este

documento, que está em duas vias, sendo uma via sua e a outra do pesquisador

responsável.

Informações sobre a pesquisa:

Título do Projeto de pesquisa: Surdez e letramento no contexto do ensino regular

Pesquisadora responsável: Simone Schemberg

Telefone para contato: (41) 3226 53 79

INTRODUÇÃO:

Ao analisar a inclusão do surdo no ensino regular, especialmente no

município de Piraquara, região metropolitana de Curitiba, é possível perceber que há

uma constante exclusão dos contextos lingüísticos pelo mesmo em sala de aula, os

quais têm como base a língua oral. Torna-se, desta forma, imprescindível questionar
183

e discutir quais são as concepções de surdez e linguagem que norteiam as práticas

pedagógicas no ambiente escolar e se, além disso, leva-se em consideração a

língua tida como primeira do sujeito em questão, a língua de sinais.

FINALIDADE DA PESQUISA:

Discutir a inclusão do aluno surdo no ensino regular, analisando as práticas

pedagógicas e metodologias adotadas em sala de aula; Analisar as concepções de

surdez e linguagem que norteiam as práticas pedagógicas.

PROCEDIMENTO:

O trabalho será desenvolvido a partir de pesquisa bibliográfica e pesquisa de

campo.

RISCOS E BENEFÌCIOS:

Não haverá nenhuma forma de risco para os sujeitos e ao final da pesquisa

poderá ter acesso aos resultados.

DESCONFORTO: Não haverá nenhum tipo de desconforto.

CUSTOS: Não haverá nenhum gasto na pesquisa.

PARTICIPAÇÃO: Caso você queira desistir de participar da pesquisa, poderá fazê-

lo em qualquer tempo e no momento que desejar. Todos os participantes da

pesquisa serão informados pela pesquisadora Simone Schemberg, professora,

residente à Rua Goiânia, 1597, sobrado 58, Bairro Cajuru, Curitiba, Pr.
184

DECLARAÇÃO DE CONSENTIMENTO

Eu,__________________________________________________, portador(a)

do RG: __________________, abaixo assinado, concordo em participar do estudo

acima descrito como sujeito.

Fui devidamente informado(a) e esclarecido(a) pela pesquisadora, Simone

Schemberg, sobre a pesquisa. Foi-me garantido que posso retirar meu

consentimento a qualquer momento, sem que isto leve a qualquer penalidade.

Curitiba, ___/___/_____

___________________________________

Assinatura do Sujeito ou Responsável

__________________________________

Assinatura do Pesquisador responsável

Anda mungkin juga menyukai