REVISTA
MARÍTIMA
BRASILEIRA
(Editada desde 1851)
v. 129 n. 04/06
abr./jun. 2009
R. Marít. Bras. Rio de Janeiro v. 129 n. 04/06 p. 1-320 abr. / jun. 2009
A Revista Marítima Brasileira, a partir desta edição,
passa a adotar o Acordo Ortográfico de 1990, com base no
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editada pela
Academia Brasileira de Letras – Decretos nos 6.583, 6.584 e
6.585, de 29 de setembro de 2008.
SECRETARIA-GERAL DA MARINHA
Almirante de Esquadra Marcos Martins Torres
Diagramação/Assinatura/Distribuição
Celso França Antunes
Impressão / Tiragem
Prelo Artes Gráficas e Fotolito / 7.000
A REVISTA MARÍTIMA BRASILEIRA é uma publicação oficial da MARINHA DO BRASIL desde
1851. Entretanto, as opiniões emitidas em artigos são da exclusiva responsabilidade de seus autores. Não
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Revista podem ser reproduzidas, desde que citadas as fontes.
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do exterior, por vale postal
SUMÁRIO
238 NECROLÓGIO
SUMÁRIO
Aspectos estratégicos
Submarinos convencionais e submarinos nucleares
Submarinos na estratégia naval brasileira
O significado da posse do submarino nuclear
O salto tecnológico
O desenvolvimento de uma indústria nacional de defesa
Conclusão
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NOSSA CAPA – A IMPORTÂNCIA DA CONSTRUÇÃO DO SUBMARINO DE PROPULSÃO NUCLEAR BRASILEIRO
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NOSSA CAPA – A IMPORTÂNCIA DA CONSTRUÇÃO DO SUBMARINO DE PROPULSÃO NUCLEAR BRASILEIRO
Não obstante ter logrado êxito na cons- rinha. Mesmo entre os anos de 1994 a 2006,
trução, falta à Marinha a capacidade de de- quando se constatou a insuficiência de re-
senvolver projetos de submarinos. O cami- cursos de outras fontes governamentais, a
nho seguido pelas potências que produzem MB cuidou de mantê-lo vivo, ainda que em
submarinos nucleares foi o de, a partir do estado quase vegetativo, com o sacrifício
pleno domínio do projeto de convencionais, exclusivo do orçamento da Força. Se tives-
evoluir, por etapas, para um submarino nu- se sido descontinuado, o custo da retoma-
clear, cujos requisitos, em termos de da seria simplesmente impagável. A mudan-
tecnologia e controle de qualidade, supe- ça havida, a partir de 2007, foi o aporte de
ram em muito aqueles de um convencional. mais recursos governamentais, fruto de
Assim, o caminho natural para o Brasil se- nova visão política da atual administração
ria, da mesma forma, o de desenvolver su- de mais alto nível do País.
cessivos protótipos, até que se chegasse a Mesmo assim, a mencionada alteração no
um projeto adequado, para abrigar uma plan- status quo é anterior à revelação das desco-
ta nuclear. Como não se dispõe do tempo bertas do pré-sal, que, no entanto, só fazem
nem dos recursos ne- enfatizar ainda mais sua
cessários para tanto, a necessidade. Mais de
solução delineada pela 90% do nosso petróleo
MB, no intuito de, com – 2 milhões de barris por
segurança, saltar eta- dia – são extraídos do
pas, foi a de buscar par- mar. Da mesma forma,
cerias estratégicas com mais de 95% do nosso
países detentores de comércio exterior – cer-
tais tecnologias e que ca de US$ 300 bilhões,
estivessem dispostos a entre exportações e im-
transferi-las. No nosso portações – são trans-
caso, tendo em vista o portados por via maríti-
processo evolutivo in- ma. Também as nossas
dispensável, a parceria águas jurisdicionais,
teria que ser buscada junto a países que que costumamos chamar de Amazônia Azul,
produzissem, simultaneamente, submarinos contêm, na imensidão da massa líquida e do
convencionais e nucleares. Depois de lon- vasto território submerso de milhões de qui-
go e acurado processo de escolha, a França lômetros quadrados, riquezas biológicas e mi-
foi o país selecionado. nerais, largamente ameaçadas pelas explora-
ção predatória e cobiça internacional.
O significado da posse do submarino Como se vê, os interesses marítimos do
nuclear Brasil são de tal magnitude que exigem fi-
car confiados à proteção da Marinha. A
Desde a divulgação das notícias refe- falta de meios de defesa para tanta riqueza
rentes ao petróleo existente no pré-sal, é pode acabar se constituindo em convite a
comum que se pergunte se tais descober- determinadas ações lesivas à soberania na-
tas influíram na retomada do investimento cional. Daí a necessidade de uma Força
no submarino nuclear. Naval capaz de desencorajá-las.
Ora, releva notar que, desde o início, o No caso do submarino nuclear, é evi-
programa jamais foi interrompido pela Ma- dente que sua ação específica não deverá
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NOSSA CAPA – A IMPORTÂNCIA DA CONSTRUÇÃO DO SUBMARINO DE PROPULSÃO NUCLEAR BRASILEIRO
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NOSSA CAPA – A IMPORTÂNCIA DA CONSTRUÇÃO DO SUBMARINO DE PROPULSÃO NUCLEAR BRASILEIRO
Cherbourg, na França, com a participação O resultado foi tão bom que, de um uni-
da equipe de construção de submarinos verso inicial de mais de 200 empresas, a
do AMRJ, que absorverá os métodos, nor- França já selecionou e está negociando
mas e processos franceses de construção, com mais de 30, e há outras dezenas de
algo diferente do sistema alemão, a que já candidatas.
estão acostumados. Em linhas bastante gerais, esse será o
b) De volta ao Brasil, esse grupo cons- processo de transferência de tecnologia.
tituirá o núcleo de transferência de Entretanto, o que vai aqui descrito em pou-
tecnologia para a Sociedade de Propósito cas linhas ocupa mais de 300 páginas de
Específico (SPE), que será constituída para um anexo específico do contrato firmado
operar o novo estaleiro para a fabricação entre as partes.
dos novos submarinos.
c) Depois dessa fase, o grupo atuará, O DESENVOLVIMENTO DE UMA
pela MB, como fiscal das obras e garanti- INDÚSTRIA NACIONAL DE DEFESA
dor do controle de qualidade.
3) Transferência de Tecnologia Medi- Em todos os países desenvolvidos, exis-
ante a Nacionalização te uma indústria de defesa, responsável
a) Cerca de 20% de todo o material a ser pelo desenvolvimento e a construção do
empregado nos submarinos serão produzi- material bélico, atendendo aos requisitos
dos no Brasil, inclusive sistemas comple- estabelecidos pelos Ministérios da Defesa
xos. São cerca de 36 mil itens a serem fabri- e Estados-Maiores das respectivas Forças
cados aqui. Armadas. As próprias Forças desenvol-
b) No curso das negociações, ficou vem, em alguns casos, protótipos daquilo
acertado que tudo o que pudesse ser pro- que desejam, mas a produção cabe sempre
duzido no Brasil, a custo equivalente ou à indústria.
inferior ao da França, seria fabricado aqui. Países que não possuem tal parque in-
Caso o produto já fosse comercializado, dustrial específico veem-se na contingên-
seria simplesmente adquirido e incorpo- cia de importar material fabricado por ou-
rado ao conjunto de materiais. Caso con- tros, segundo especificações que poderão
trário, a tecnologia de produção seria atender no todo ou em parte às suas ne-
transferida à empresa selecionada, que, cessidades e, em lugar do custo, pagarão o
então, o fabricaria. preço, muitas vezes político, do produto.
c) Nesse processo, desde o início, a MB O Brasil vive uma situação intermediá-
adotou a postura de não indicar qualquer ria, segundo a qual adquire meios usados,
empresa. Caberia aos franceses selecioná- em compras de oportunidade, ou constrói
las, de acordo com critérios próprios, meios novos, mediante aquisição do direi-
qualificá-las e homologá-las. A MB não pri- to de uso do projeto, como aconteceu no
vilegiaria ou rejeitaria qualquer empresa, AMRJ no caso das fragatas classe Niterói
evitando intermináveis controvérsias fu- (modelo Vosper MK-10, britânico) e dos
turas. De outra forma, caberia abrir uma li- submarinos classe Tupi e Tikuna (modelo
citação pública, para o processo seletivo IKL-209, alemão).
que, no mínimo, demoraria demasiado, dada No caso dos novos submarinos, inclusi-
a quantidade de recursos e embargos le- ve nucleares, em lugar da construção se dar
galmente possíveis de ser interpostos por no AMRJ, ocorrerá em um novo estaleiro
empresas desqualificadas ou perdedoras. dedicado, atendendo a todos os requisitos
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NOSSA CAPA – A IMPORTÂNCIA DA CONSTRUÇÃO DO SUBMARINO DE PROPULSÃO NUCLEAR BRASILEIRO
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NOSSA CAPA – A IMPORTÂNCIA DA CONSTRUÇÃO DO SUBMARINO DE PROPULSÃO NUCLEAR BRASILEIRO
Diretamente ligada ao problema da água, Finalmente, mas não por último, temos a
há a questão da escassez de alimentos. Ora, Amazônia, permanentemente em foco, quer
mais de 90% do território brasileiro recebe por sua biodiversidade quer por sua influên-
chuvas abundantes durante o ano, e as cia sobre o clima mundial, e sobre a qual a
condições climáticas e geológicas propici- soberania brasileira não aceita contestações
am a formação de uma extensa e densa rede e que representa um enorme compromisso
de rios, o que, associado à abundância do nacional em preservá-la, coibindo qualquer
sol tropical, contribui para uma agricultura devastação.
de produção em grande escala, realmente Como se observa, o Brasil periférico da
capaz de tornar o Brasil um dos grandes segunda metade do século XX não existe
produtores mundiais. mais. O Brasil do século XXI ocupa uma
Outra crise que já se faz aguda é a posição mais próxima dos polos estratégi-
energética. A despeito da momentânea que- cos do mundo, o que significa que cada
da do preço do petró- vez mais, independen-
leo, sua escassez, em temente de sua vonta-
breve, deverá restabe- de, ver-se-á, com algu-
lecer o quadro anterior O Brasil periférico da ma frequência, envol-
ao atual. Durante o sé- segunda metade do século vido por turbulências
culo XX, fomos impor- mundiais.
tadores, com graves
XX não existe mais. O Em face disso, será
consequências em Brasil do século XXI ocupa indispensável dispor
nossa balança de paga- uma posição mais próxima de meios suficientes
mentos e da economia capazes de tornar a via
nacional. Hoje, além de dos polos estratégicos do diplomática mais atra-
vivermos relativa mundo ente para a solução de
autossuficiência, cria- controvérsias do que
mos uma nova realida- o caminho da pressão
de no cômputo das reservas mundiais, com o inaceitável, da ameaça ou da imposição.
descobrimento do óleo existente no pré-sal. Nesse particular, a posse de submari-
Ainda no contexto energético, de uns nos nucleares é apenas um primeiro passo.
anos para cá, a energia nuclear passou a O dimensionamento das Forças Armadas
ser considerada “uma forma de energia lim- não poderá ficar em descompasso com a
pa”, por não contribuir para o efeito estu- grandeza e o significado econômico do País
fa. E o Brasil possui consideráveis reser- no concerto das nações, sob pena de pri-
vas de urânio e domina o seu processo de varmos as gerações futuras de um porvir à
enriquecimento. altura da história da Nação.
Como se não bastasse, somos detento- Em resumo, esta análise apresenta, na
res de tecnologia de ponta, temos solo, cli- visão da Marinha, a importância da cons-
ma e sol em abundância para a produção trução do submarino de propulsão nuclear
de biocombustíveis. brasileiro.
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UM IRLANDÊS NA MARINHA DO BRASIL
Causas e conseqüências
UM IRLANDÊS
NA MARINHA DO BRASIL
e apartes dignos de seu invulgar tirocínio, da qual tinha tanto orgulho: “Co-
cultura e inteligência. mandar e pilotar uma aeronave re-
Aviador naval, líder de uma gera- presentam duas benesses divinas
ção, assim definia sua especialidade, jamais esquecidas”.
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O JAPÃO, PEARL HARBOR E A SAGA DO
ALMIRANTE KIMMEL
Parte XXII
– Gabinete do Subsecretário de Defesa para Pessoal e Prontidão
1o de dezembro de 1955
Promoção do Contra-Almirante Kimmel e do Major-General Short
Na lista de oficiais da reserva
(2a e última parte)
SUMÁRIO
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O JAPÃO, PEARL HARBOR E A SAGA DO ALMIRANTE KIMMEL – Parte XXII
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O JAPÃO, PEARL HARBOR E A SAGA DO ALMIRANTE KIMMEL – Parte XXII
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O JAPÃO, PEARL HARBOR E A SAGA DO ALMIRANTE KIMMEL – Parte XXII
buição fundamental do Magic e Púrpura para grafia traduz seus esforços, alguns dos quais
o esforço de guerra significa que perguntas foram citados nesta apresentação.
não poderiam ser respondidas enquanto a Com a publicação do trabalho da Co-
guerra ocorria, e, neste sentido, de alguma missão Conjunta do Congresso – uma mina
maneira, as reputações do Almirante Kimmel de ouro de fontes primárias – e a cada vez
e do General Short foram sacrificadas em maior contribuição do mundo acadêmico,
benefício do esforço de guerra. Conquanto um responsável e crescentemente acurado
a concentração neles desviasse a atenção, e justo entendimento dos erros em Pearl
talvez convenientemente, não existe evidên- Harbor está emergindo.
cia de uma intenção organizada para fazer Neste processo, o Almirante Kimmel e o
do Almirante Kimmel e do General Short General Short estão encontrando seu verda-
bodes expiatórios e há pouca probabilidade deiro lugar. Não existe nada que o governo
de existirem esforços para difamá-los pes- pode ou deveria fazer para alterar o processo.
soalmente. Em particular, não há clareza de
ações do governo dirigidas somente contra OPÇÕES PARA OUTRAS AÇÕES
suas reputações. Também não existe qual-
quer ação de governo Promoção baseada
para desviar o ceticis- em performance
mo em relação ao Al- As reputações do Almirante
mirante e ao General. Kimmel e do General Short Nenhum erro signi-
Pearl Harbor acon- ficativo foi cometido
teceu no meio de um foram sacrificadas em em qualquer das três
acirrado debate entre benefício do esforço de ações pessoais*. Seu
isolacionistas e efeito cumulativo co-
intervencionistas. As guerra locou o Almirante
energias desse debate Kimmel e o General
não arrefeceram com Pearl Harbor; pelo con- Short em seus permanentes postos de duas
trário, ele foi redirecionado. Em certa exten- estrelas na lista de oficiais da reserva. Dis-
são, o Almirante Kimmel e o General Short pensa e passagem para a reserva tornaram-
tornaram-se causes célèbres nessa disputa se inevitáveis, e não foram injustas e in-
partidária. Isso foi, e ocasionalmente ainda corretas dentro das circunstâncias.
é hoje, o resultado de um mundo envolvido Promoção é baseada no potencial e não
pela política, no qual oficiais ostentando po- no desempenho anterior. Isto é, promoção
sições de três e quatro estrelas tornam-se é baseada na expectativa da performance
envolvidos, em razão de suas altas funções ao nível para o qual o indivíduo está sendo
públicas, frequentemente com considerado para a promoção. Ao tempo
consequências desproporcionais ao seus do ataque japonês a Pearl Harbor, o Almi-
talentos ou posições como militares profis- rante Kimmel e o General Short haviam sido
sionais. Certamente, o Almirante Kimmel, promovidos a quatro e três estrelas, res-
desejosamente e mesmo ansiosamente, en- pectivamente, baseados nos seus poten-
trou nessa rixa, levando o assunto de sua ciais de performance para o exercício nes-
reputação ao debate público; sua autobio- se nível de comando. Suas dispensas, em
* N.A – 1) Dispensa de seus comandos em Pearl Harbor. 2) Passagem para a reserva. 3) Decisões para não
promovê-los na lista da reserva.
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O JAPÃO, PEARL HARBOR E A SAGA DO ALMIRANTE KIMMEL – Parte XXII
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O JAPÃO, PEARL HARBOR E A SAGA DO ALMIRANTE KIMMEL – Parte XXII
cupadas com os efeitos protelatórios de plicaria duplo padrão para promoções nas
notícias publicadas ao longo dos últimos Forças Armadas.
50 anos. Eles argumentam que o stigma e Os mais altos postos na reserva aos
obloquy desta época persiste, e demandam quais um oficial pode aspirar não devem
ação governamental, dizendo que “o veí- ser conferidos a ninguém como uma des-
culo que nós escolhemos” para restaurar a culpa. Antes, esses postos devem estar
reputação desses oficiais é a promoção na reservados para aqueles oficiais cujas
lista de oficiais da reserva. performances se encontrem acima das dos
Contudo, tal promoção não é a maneira outros.
apropriada para curar ofensas à reputação.
Com o término da guerra e a publicação CONCLUSÃO
dos resultados das investigações das For-
ças e do Comitê Conjunto do Congresso, Um exame nos assentamentos não mos-
ficou esclarecido que o Almirante Kimmel tra que as promoções do Almirante Kimmel
e o General Short não foram os únicos res- e do General Short na lista de oficiais da
ponsáveis pelo desastre em Pearl Harbor e reserva seja justificada.
que os erros de julgamento por eles come-
tidos não atingiram o nível de dereliction, O VEREDICTO DA HISTÓRIA
e que outros também cometeram tal tipo de
erros. Assim, a posição oficial sobre o as- A comunidade acadêmica continuou a
sunto encontra-se onde deveria. produzir várias obras de excelentes méritos
É indisputável que o Almirante Kimmel e para o que o trabalho do Departamento da
o General Short receberam mais do que aqui- Defesa chamou de veredicto da história.
lo que lhes impuseram uma imprensa ten- Dentre elas, provavelmente o mais com-
denciosa nos primeiros anos da guerra, e pleta, para muitos o trabalho definitivo so-
que os erros de outros, os quais contribuí- bre Pearl Harbor, coube a Robert B.
ram para o desastre em Pearl Harbor, geral- Stinnett, autor de O dia da fraude – A ver-
mente foram poupados de censuras. A pro- dade sobre FDR e Pearl Harbor, cuja 1a
moção post mortem, todavia, necessariamen- edição foi publicada no ano 2000. Citei-o
te teria que ser calcada no julgamento de ao longo de meu trabalho.
que, no mínimo, eles serviram satisfatoria- Em nota do tradutor, na Revista Maríti-
mente como três e quatro estrelas. Seus su- ma Brasileira v. 127, no 10/12, out/dez 2007,
periores, na época, decidiram que não, e não p. 70, assim me expressei: “Na documenta-
há como compelir para que essas primeiras ção por mim consultada, o livro de Robert
decisões sejam modificadas. B. Stinnett é, sem dúvida, o mais completo
Usar promoções post mortem para com- relato sobre a tragédia que se abateu sobre
pensar tratamento severo na mídia, como Pearl Harbor. Segundo Tom Rooser, do
forma de desculpa oficial ou como um ato Chicago Sun Times, é, talvez, o mais
simbólico, não seria apropriado. Adicio- revelador dos documentos de nosso tem-
nalmente, não existe precedente para tal po”. Escreve John Alterian, do Detroit
promoção. News: “Apoiado em 17 anos de pesquisa e
Finalmente, usar avanço ou promoção usando mais de 200 mil entrevistas e docu-
para tais propósitos seria verdadeiramente mentos desclassificados [para mim, articu-
injusto em relação àqueles que mereceram lista, feito notável], Stinnett faz devasta-
promoções em razão da performance e im- doras revelações...”.
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O JAPÃO, PEARL HARBOR E A SAGA DO ALMIRANTE KIMMEL – Parte XXII
* N.A – http://www.independent.org/tii/news/020311cirignano.html.
** NA – http://resistir. Info/11set/pearl_harbor_port.html.
*** N.A – Stinnett dedicou seu livro ao congressista John Moss (D., CEL), autor do Ato de Liberdade de
Informação.
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O JAPÃO, PEARL HARBOR E A SAGA DO ALMIRANTE KIMMEL – Parte XXII
Cirignano – O Sr. escreveu que, no final Stinnett – Ele trabalhou para a Inteligên-
de novembro de 1941, foi enviada uma or- cia Naval em Washington. Ele também era o
dem a todos os comandantes militares dos oficial de comunicações do Presidente
EUA que dizia: “Os Estados Unidos dese- Roosevelt. Assim, todas essas interceptações
jam que o Japão cometa o primeiro ato aber- iriam para o Comandante Mc Collun e a se-
to”. Segundo o secretário de Guerra guir ele as encaminharia para o Presidente.
Stimson, a ordem vinha diretamente do Pre- Não há dúvida sobre isso. Ele era também o
sidente Roosevelt, comprometido em apoi- autor do seu plano para levar o Japão a ata-
ar esta política de provocar o Japão a co- car-nos em Pearl Harbor. E ele nascera e fora
meter o primeiro ato de guerra aberta? criado no Japão.
Stinnett – Não sei se ele revelou isso ao Cirignano – Mc Collun escreveu esse
gabinete. Ele pode ter revelado o plano a plano, esse memorando, em outubro de
Harry Hopkins, seu confidente próximo, 1940. Era dirigido a dois dos mais próximos
mas não há qualquer evidência de que al- assessores de Roosevelt. No mesmo, Mc
guém no gabinete soubesse disso. Collun exprime que é inevitável que o Ja-
Cirignano – Penso que escreveu no seu pão e a América caminhem para a guerra e
livro que eles sabiam... Que alguns deles que a Alemanha nazi tornava-se uma ame-
estavam a par.... aça à segurança da América. Mc Collun está
Stinnett – Bem, alguns sabiam. O secretá- a dizer que a América tem que se envolver
rio de Guerra Stimson sabia, como se vê no na guerra. Mas ele também diz que a opi-
seu diário, e também provavelmente Frank nião pública é contra isso. Assim, Mc Collun
Knox, o secretário da Marinha, sabia. Mas sugere, em consequência, oito coisas es-
Frank Knox morreu antes da investigação ter pecíficas que a América deveria fazer para
principiado. Assim, tudo o que temos real- levar o Japão a tornar-se mais hostil, a ata-
mente é o diário de Stimson. Este revela mui- car-nos, de modo que o público apoiasse o
to ali, e eu considero isso no meu livro. O Sr. esforço de guerra. E como ele nascera e
deve querer dizer o seu gabinete de guerra. fora criado no Japão, entendia a mentalida-
Sim. O diário de Stimson revela que nove de japonesa e sabia como os japoneses re-
pessoas no gabinete de guerra – três milita- agiriam.
res – sabiam desta política de provocação. Stinnett – Sim. Exatamente.
Cirignano – Embora Roosevelt tenha fei- Cirignano – Foi a existência deste me-
to declarações em sentido contrário para o morando do Comandante Mc Collun algu-
público, não sentiria ele e os seus conse- ma vez revelada ao público antes de seu
lheiros que a América estava, no fim das livro aparecer?
contas, indo rumo à guerra? Stinnett – Não, não. Eu o recebi em
Stinnett – Correto. Bem, sua declaração consequência do meu pedido ao Foia, em
era: “Não enviarei os nossos rapazes para janeiro de 1995, de extração dos Arquivos
a guerra, a menos que sejamos atacados”. Nacionais. Eu não sabia que ele existia.
Assim, ele concebeu esse ataque para re- Cirignano – FDR e os seus conselhei-
almente nos levar à guerra contra a Alema- ros militares sabiam que se as oito ações
nha. Mas penso que essa era sua única de Mc Collun fossem implementadas – coi-
opção. Manifestei-me no livro. sas como manter a frota do Pacífico em Pearl
Cirignano – Quem era o Tenente Coman- Harbor e debilitar a economia do Japão com
dante Arthur Mc Collun e qual era sua co- um embargo – não havia dúvida de que
nexão com o ataque de Pearl Harbor? isso levaria o Japão – cujo governo era
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O JAPÃO, PEARL HARBOR E A SAGA DO ALMIRANTE KIMMEL – Parte XXII
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O JAPÃO, PEARL HARBOR E A SAGA DO ALMIRANTE KIMMEL – Parte XXII
Stinnett – Elas foram interceptadas. Isso missões de rádio navais japonesas inter-
é correto. Foram enviadas pelas comunica- ceptadas entre 28 de novembro e seis de
ções da RCA. E Roosevelt enviou David dezembro confirmam que o Japão tencio-
Sarnoff, que era o chefe da RCA, a Honolulu nava começar a guerra e que começaria por
de modo que este facilitasse a obtenção Pearl Harbor”. Viu registros dessas
dessas mensagens ainda mais rapidamente. interceptações com seus próprios olhos?
Embora estivéssemos também as intercep- Stinnett – Sim. E também temos novas
tando a partir do éter, de qualquer forma. E informações sobre outras interceptações
de 2 de dezembro a 6 de dezembro o espião na nova edição que saiu em maio de 2001.
indicou que Pearl Harbor iria ser o alvo. E a Não há dúvida sobre isso.
2 de dezembro foi interceptada uma mensa- Cirignano – Segundo “O dia da fraude”,
gem, sendo decodificada e traduzida antes em 25 de novembro o Almirante Yamarusto
de 5 de dezembro. A mensagem de 6 de de- enviou uma mensagem de rádio à frota ja-
zembro... não é realmente prova; foi inter- ponesa. Em parte da mensagem lê-se: “A
ceptada, mas há toda espécie de histórias força-tarefa, mantendo seus movimentos
de encobrimento sobre se chegou ou não estritamente secretos e mantendo guarda
ao Presidente. Mas há prova de que ele re- serrada contra submarinos e aviões, avan-
cebeu outra informação do que iria aconte- çará dentro de águas havaianas e no ins-
cer no dia seguinte, de qualquer modo. tante da abertura das hostilidades atacará
Cirignano – Viu os registros destas in- a força principal da frota dos Estados Uni-
terpretações com seus próprios olhos? dos no Havaí e desferir-lhe-á um golpe
Stinnett – Sim. Tenho isso. mortal...” Qual é a prova de que o registro
Cirignano – E todas essas mensagens dessa interceptação existe? O Sr. o viu?
que a Marinha interceptava constantemen- Mais uma vez, Roosevelt soube disso?
te mostravam exatamente onde estavam os Stinnett – A versão em inglês dessa men-
navios japoneses que estavam preparan- sagem foi divulgada pelos Estados Unidos.
do-se para a guerra e que estavam dirigin- Tenho cópias dos registros de rádio da Es-
do-se diretamente para o Havaí. Certo? tação H –, uma estação de monitoragem do
Stinnett – Está certo. Nossos detectores Havaí. Eles provam que a Marinha intercep-
de direção de rádio localizaram os vasos tou 83 mensagens que Yamamoto enviou
de guerra japoneses. entre 17 e 25 de novembro. Tenho esses
Cirignano – O Sr. diz que Roosevelt recebia registros, mas não as interceptações origi-
regularmente cópias dessas interceptações. nais, 86% das quais não foram divulgadas
Como elas lhe eram entregues? pelo governo*... Até que Roosevelt, no prin-
Stinnett – Pelo Comandante Mc Collun, cípio de novembro de 1941, ordenou que as
reencaminhando a informação para ele. Elas interceptações originais japonesas fossem
eram preparadas em forma de monografia. entregues diretamente a ele pelo seu adjun-
Chamavam isso monografia... eram envia- to naval, Capitão** Beardall. Por vezes, se
das ao Presidente por meio do Comandan- Mc Collun sentia que uma mensagem era
te Mc Collun, que as despachava por meio particularmente quente, entregava-a pesso-
do adjunto naval do Presidente. almente a FDR.
Cirignano – Na página 203 da edição Cirignano – No fim do dia 6 de dezembro e
encadernada do seu livro, lê-se: “Sete trans- nas primeiras horas da manhã de 7 de dezem-
* NA – Grifos do articulista.
** NA – Capitão de Mar e Guerra.
RMB2 o T/2009 29
O JAPÃO, PEARL HARBOR E A SAGA DO ALMIRANTE KIMMEL – Parte XXII
bro, os Estados Unidos interceptaram mensa- Stinnett – Correto. Mas o Sr. verifica que
gens enviadas ao embaixador japonês em eles queriam que ocorresse o ato aberto
Washington. Essas mensagens constituíam por parte do Japão. Aquilo unificou o povo
basicamente uma declaração de guerra – o Ja- americano.
pão estava dizendo que rompia negociações Cirignano – Isso parece o caso clássico
com a América. Naqueles mesmos momentos, de superiores que fazem algo questionável
mostraram as interceptações ao General e a seguir conseguem que as pessoas abai-
Marshall e ao Presidente Roosevelt. Quando xo deles arquem com as culpas. O Almiran-
FDR as leu, disse: “Isso significa guerra”. te Husband Kimmel estava à frente da fro-
Quando a última interceptação foi mostrada a ta de Pearl Harbor e foi rebaixado e culpa-
Roosevelt, ainda faltavam horas para o ata- do pelo ataque. Isso justifica-se?
que a Pearl Harbor. Nessa última interceptação, Stinnett – Não. Não se justifica. E o Con-
o Japão dava a data final de quando iria rom- gresso, como sabe, em outubro de 2000,
per relações com os EUA – a data final era a votou em isentá-lo porque foi-lhe retirada
hora exata em que Pearl Harbor foi atacada. a informação. Isto é muito importante. Mas
FDR e Marshall deveriam então ter enviado estava sujeito à aprovação do Presidente
uma advertência de emergência ao Almirante Clinton, que não assinou. Mas pelo menos
Kimmel em Pearl Harbor. Mas eles atuaram de o Congresso atuou, fez o que devia**.
forma displicente e não enviaram nenhuma ad- Cirignano – O Sr. afirma que ao Almiran-
vertência a Kimmel. te Kimmel e ao General Short – que dirigia
Stinnett – Sim. Esta é a mensagem envia- o Exército no Havaí – foi negada por Wa-
da do Ministério das Relações Exteriores do shington a informação que lhes teria per-
Japão ao embaixador japonês em Washing- mitido saber que o ataque estava por vir.
ton, D.C. E ele atuou assim... rompeu rela- De que modo foi negada informação a
ções com os Estados Unidos e estabeleceu Kimmel e a Short?
um cronograma para 13 horas de domingo, 7 Stinnett – Bem, eles foram postos de
de dezembro, fuso horário da costa leste. lado... Não lhes foi dito que o espião esta-
Cirignano – A hora exata em que Pearl va ali, e não lhes foram dados esses docu-
Harbor foi bombardeada. mentos cruciais, as informações dos
Stinnett – Correto. Eles, com toda sua in- detectores de direção de rádio***. Toda
formação, perceberam isso. E então o Gene- essa informação ia para toda a gente, exceto
ral Marshall, apesar disso, sentou-se em cima para Kimmel e Short. Isso é muito claro...
da mensagem durante cerca de 15 horas por- Num certo momento, Kimmel especifica-
que não queria enviá-la... não queria advertir mente solicitou que Washington o infor-
os comandantes do Havaí a tempo... não que- masse imediatamente acerca de quaisquer
ria que eles interferissem com o ato aberto. desenvolvimentos importantes, mas eles
Finalmente acabaram por enviar, mas a men- não o fizeram.
sagem não chegou senão após o ataque*. Cirignano – Foi dada alguma informa-
Cirignano – Roosevelt também viu isso. ção a Kimmel, porque duas semanas antes
Eles deveriam ter enviado uma advertência do ataque ele enviou a frota do Pacífico ao
ao Almirante Kimmel no Havaí, não é? norte do Havaí num exercício de reconhe-
* NA – Aparece em uma cena ao final do filme “Pearl Harbor”, mais um romance do que uma narração
histórica.
** N.R.: Grifo do articulista.
*** NA – Radiogoniômetros.
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O JAPÃO, PEARL HARBOR E A SAGA DO ALMIRANTE KIMMEL – Parte XXII
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O JAPÃO, PEARL HARBOR E A SAGA DO ALMIRANTE KIMMEL – Parte XXII
Sr. não menospreza FDR nem tem uma vi- Cirignano – Quanto do seu livro nunca
são negativa dele. havia sido revelado antes ao público?
Stinnett – Não, não tenho uma visão Stinnett – A rotina do silêncio rádio. O
negativa. Penso que era a única opção atu- fato de que os navios japoneses não man-
ar assim. E cito o principal criptógrafo da tiveram silêncio quando se aproximaram do
frota do Pacífico, que disse: “Foi um preço Havaí... A decifração dos códigos japone-
bonito e barato que se teve de pagar para ses – quero dizer, a prova completa disso.
unificar o país”. Códigos militares, enfatizo... E também as
Cirignano – Esse criptógrafo, o Comandan- oito ações do Memorando Mc Collun, que
te Joseph Rochefort, era um confidente de Mc constituem a essência do meu livro. Se eu
Collun. Ele trabalhou em estreita ligação com não houvesse obtido isso, o livro não se-
Kimmel em Pearl Harbor. Poder-se-ia argumen- ria tão importante.
tar que Rochefort, que Cirignano – Sua
era o mais próximo de investigação parece
Kimmel, foi o mais res- Quantas pessoas sabiam provar que podem
ponsável por negar a que o Japão estava existir conspirações
Kimmel informação vital. do governo. Na sua
E ele fez tal declaração. prestes a atacar Pearl ótica, quantas pesso-
Mas o Sr. concorda com Harbor mas mantiveram as diria que, afinal de
isso? Muitas pessoas fi- contas, sabiam que o
cariam ofendidas e
silêncio sobre isso e Japão estava prestes
enraivecidas com uma encobriram-no antes a atacar Pearl Harbor
tal declaração. Muitas e após o evento? mas mantiveram si-
pessoas não concorda- lêncio sobre isso e en-
riam com isso. – Eu cito no livro 35 cobriram-no antes e
Stinnett – Sim, eu pessoas que certamente após o evento?
sei. Quando falo acer- Stinnett – Eu cito
ca disso com as famíli-
sabiam disso. no livro 35 pessoas
as, elas começam a Stinnett que certamente sabi-
chorar. Ficam terrivel- am disso. E prova-
mente inquietas... Mas, como sabe, foi usa- velmente há mais do
da pelo Presidente Polk na Guerra Mexica- que isso.
na, em 1946. E também pelo Presidente Cirignano – Também parece como um
Lincoln em Fort Sunter. E também, como eu clássico encobrimento de Washington. No
disse, no Vietnã, neste caso no Golfo de seu livro, usa a frase “fraudes de Pearl
Tonkin. Harbor”. Desde o ataque têm faltado do-
Cirignano – Podia ser uma filosofia tra- cumentos, há documentos alterados, pes-
dicional dos militares, a ideia de que os soas sendo insinceras e pessoas come-
militares tem por vezes de provocar o ata- tendo perjúrio diante de comitês de inves-
que do inimigo, sacrificar os seus próprios tigação de Pearl Harbor. Correto?
soldados, de modo a unificar um país para Stinnett – Está correto. Totalmente. E
a guerra. como sabe, o Departamento da Defesa
Stinnett – Penso assim. Julgo que pro- etiquetou algumas das minhas solicitações
vavelmente poder-se-ia remontar aos tem- sobre Pearl Harbor como “Segredos da
pos de César. Defesa Nacional B1”, e eles não os entre-
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O JAPÃO, PEARL HARBOR E A SAGA DO ALMIRANTE KIMMEL – Parte XXII
garão. Eu digo isso no livro. Janet Reno* cia emergiu para que se modificasse uma
não os entregaria para mim. decisão de 50 anos. Porém, Thomas Kimmel
Cirignano – E a todos os comitês ofici- foi capaz de apresentar, pelo menos, uma
ais do Congresso sobre Pearl Harbor foi dúzia de novos e significantes itens de evi-
negada e não foi entregue toda essa infor- dências que claramente mostravam que o
mação relevante e secreta? Almirante Kimmel foi injustamente acusa-
Stinnett – Correto. Eles também foram do e deslealmente difamado”.**
afastados do assunto. É possível que Edward R. Kimmel não
Muitas pessoas provavelmente não tenha percebido que o secretário de Defe-
querem acreditar que um presidente faria sa de George Bush, o pai, Dick Cheney,
tal coisa. agora era o vice-presidente da República.
DO TRADUTOR/ARTICULISTA –
FINAL
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O JAPÃO, PEARL HARBOR E A SAGA DO ALMIRANTE KIMMEL – Parte XXII
possam ou queiram reservar algum tempo guns deles ultrarradicais de direita e seus
para o ocorrido em Pearl Harbor. inimigos políticos, para levar o país à guer-
ra contra Hitler, àquela altura já detectado
pelo Presidente como o grande flagelo da
humanidade.”
Embora implícita, não escrevi no
Minhas palavras finais são para reafir- panegírico que lhe dediquei a palavra “co-
mar o que registrei na RMB, 4o t/2006, p. 66 ragem”, coragem moral sobretudo.
sobre Franklin Delano Roosevelt, sob o tí- O Almirante Husband E. Kimmel, afi-
tulo O Estadista: nal, teve sua honra, com toda justiça, res-
“Roosevelt encontrara a solução para o gatada pelo Congresso dos Estados Uni-
grande problema que o afligia, o convenci- dos da América. Não poderia ter sido de
mento dos isolacionistas americanos, al- outra maneira.
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A GUERRA DAS CHATAS*
SUMÁRIO
Introdução
Antecedentes
Concentração dos aliados
Combate de Corales
Batalha Naval do Riachuelo e sua consequência
A “Guerra das Chatas”
A chata artilhada paraguaia
Missão da Marinha Imperial
Marinha Imperial assume posição
Os duelos de artilharia
A morte de Mariz e Barros
Mais duelos de artilharia
A artilharia aliada de terra
Mais duelos de artilharia
Reconhecimento da “Ilha Pequena”
Mais duelos de artilharia
*
N.A.: Este artigo baseia-se na magnífica obra História da Guerra entre a Tríplice Aliança e o Paraguai,
em cinco volumes, com mais de 1.870 páginas, de autoria do General de Divisão Augusto Tasso
Fragoso, editada em 1934 pela Imprensa do Estado-Maior do Exército, e inclui inúmeras outras
informações contidas na bibliografia. Preferi não fazer paráfrases e abusar das transcrições para
obter mais autenticidade nos relatos.
É também parte de um trabalho maior sobre as ações bélicas de toda a guerra, com o propósito
de dar à massa da oficialidade uma visão geral, fácil de ser lida, ressaltando a participação da Marinha
naqueles longos anos de beligerância, com a esperança de que os mais jovens se motivem para
empreender novas pesquisas.
A GUERRA DAS CHATAS
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A GUERRA DAS CHATAS
*
Para outros detalhes, ver artigos de Alvanir B. de Carvalho na RMB 4o trim./1995, p. 111 a 114.
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A GUERRA DAS CHATAS
Chata artilhada
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A GUERRA DAS CHATAS
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A GUERRA DAS CHATAS
dos acampamentos das tropas argentinas pés na sua parte mais larga e sua altitude
e uruguaias – Corales; mais junto à mar- sobre o nível da água do rio era de 20 pés.
gem ficavam os avisos Lindoia e Onze de Se estivesse armada de artilharia pesa-
Junho e o Transporte Iguassu. da de grosso calibre, talvez tivesse sido
Nesse trecho, o Rio Paraná tem 2 mil metros útil; mas, no estado que estava, só servia
de largura, mas está cheio de ilhas e bancos de de espantalho aos aliados.”
areia de 5 a 10 pés de profundidade. Mais adiante, quando tratou da ocupa-
Além desses navios, encontravam-se na ção da Ilha Pequena (Cabrita), o mesmo
área os encouraçados Barroso e Tamandaré, Thompson8 informa: “No dia seguinte à ocu-
as canhoneiras Beberibe e Henrique pação pelos brasileiros, López fez instalar
Martins*, dois avisos e três transportes. Per- em Itapiru um canhão de oito polegadas e
maneciam em Corrientes a Fragata Amazo- em seguida outro, alguns dias depois”.
nas (devido ao seu grande calado para o rio), Talvez por essa razão o largo emprego
a Canhoneira Maracanã e o Vapor Igurei, das chatas artilhadas lá estacionadas.
além de sete transportes fretados** O leitor deverá estar avisado de que, como
Ao todo, 125 canhões!6 (Thompson) as águas da área não eram conhecidas dos
aliados, encalhes eram bastante frequentes
Os duelos de artilharia e, em vários, aqueles navios ficavam ao al-
cance da artilharia inimiga; bem como os che-
Os duelos de artilharia entre os navios fes aliados compareceram, pessoalmente, em
e as chatas, o forte e as baterias volantes alguns esclarecimentos.
eram muitos frequentes. Vejamos alguns exemplos para poder-
Thompson7, sempre pronto a diminuir mos ter uma ideia de como era o dia a dia
os feitos aliados, declara que Itapiru, na das tripulações dos navios da Marinha
época, não poderia ser considerada uma Imperial lá operando, uma movimentação
“fortaleza”, tal a sua precariedade bélica: intensa e permanente, não importando se
“Itapiru, que os aliados honravam com o de dia ou de madrugada, se em dia últil,
nome de fortaleza e que achavam que de- sábado, domingo, feriado ou dia santifica-
veria ser destruída até a base antes de pas- do, e que exigia competência profissional,
sar o rio, era uma antiga bateria construída dedicação, espírito de sacrifício e, acima
no início do reinado de López I, em uma de tudo, muita coragem.
ponta de terra que entrava no Rio Paraná e No dia 18 de março de 1866, um domin-
que tinha por base um montículo de ro- go, o Chefe Alvim, a bordo do Tamandaré,
chas vulcânicas. A terra era revestida por fez um reconhecimento até o Paso de la
uma parede de ladrilhos que havia caído Patria, desafiando os canhões de Itapiru
em um de seus lados. Seu armamento con- ao passar a meia milha do inimigo. Não
sistia em uma peça raiada de 12. Media 30 houve troca de tiros.
*
.N.A.: Chamamos a atenção do leitor para a participação quase permanente da Canhoneira Henrique
Martins, sob o comando do Primeiro-Tenente Jerônimo Gonçalves, nas ações ocorridas na
área. Seu comandante terá participação notável e controvertida nos primeiros dias da República.
**
N.A.: Rio Branco 5 informa: “Os argentinos tinham em Corrientes os pequenos vapores Guardia
Nacional, Chacabuco, Buenos Aires, Pavón e Libertad, às ordens do Coronel-Major Chefe de
Divisão Muratori. O Almirante Tamandaré não se utilizou desses navios porque não podiam servir
para combate. Só foram empregados três vezes... Depois da passagem do Rio Paraná pelos aliados,
retiraram-se esses navios”.
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A GUERRA DAS CHATAS
No dia 21, partiu uma expedição com- Pela manhã do dia 24, seguiram a
posta do Tamandaré, da Araguari e da Beberibe, a Mearim e a Henrique Martins
Henrique Martins, tendo a bordo do pri- para desencalhar o Tamandaré. Às 10 ho-
meiro o Chefe Alvim além de Silveira da ras, o forte abriu fogo contra os navios
Mota (secretário de Tamandaré, comandan- que não foram atingidos. Às 11 horas, o
te de navio e futuro Barão de Jaceguai). Na Tamandaré estava livre.
passagem de ida avistaram duas chatas Ainda no dia 24, sábado, novo reco-
artilhadas ao abrigo de Itapiru, que atacou nhecimento, mesmo duelo de artilharia, só
os navios sem resultado. Na volta, de ma- que desta vez o Brasil foi atingido.
drugada, a Araguari encalhou em uma Às 14h50, aparece junto ao Forte Itapiru
pedra e foi alvo de fogo do forte e das duas um vapor rebocando uma chata artilhada
chatas que lá estavam. Não houve acertos. que, colocada em “posição conveniente,
Às 9 horas de 22, seguiu a Mearim com principiou a atirar em direção ao Apa [na-
Mota e o Vapor Voluntário para socorrer a vio-almirante]... Todos os navios iniciam a
Araguari, operação coroada de êxito. No- atirar e a chata e o vapor fugiram... Foram
vos tiros de Itapiru, felizmente sem acerto. boas as direções [de nossos navios] e su-
Ainda no dia 22, o Barroso, testa da põe-se que uma bomba arrebentou na cha-
coluna responsável pelo bloqueio da foz ta e outra na popa do vapor... Fez-se às 15
do Rio Paraguai, foi alvo da artilharia mó- horas o sinal 45 (cessar-fogo) logo que
vel inimiga posicionada na margem desapareceu o vapor”.10 (Rocha)
paraguaia das Três Bocas. Não houve da- No dia 25, domingo santificado da
nos nem resposta. Anunciação, no início da tarde, uma chata
No dia 23, Tamandaré transferiu-se para paraguaia foi posicionada convenientemen-
o Vapor Cisne, onde se encontrou com te e abriu fogo contra o Apa. Obteve um
Mitre, Flores e Osório*; presentes os esta- acerto que “atravessou a proa, foi ao paiol
dos-maiores dos dois maiores chefes. da bolacha e depois à dispensa da praça-
Às 11h50 suspenderam e seguiram em d’armas, onde fez estragos”.11 (Rocha)
coluna Rio Paraná acima a Henrique Martins, Imediatamente, partiram o Tamandaré
o Tamandaré, a Mearim, o Voluntário e o (com Chefe Alvim a bordo) e a Henrique
Cisne. Ao passarem por Itapiru, onde conta- Martins para combater a chata. Seguiram
ram oito peças de artilharia, foram alvo de os escaleres do Bahia e do Brasil com gente
vários tiros, inclusive das chatas lá abrigadas, armada para capturá-la. “Pouco depois,
que não obtiveram acerto. Mais tarde, os partiu o Lindoia, com o secretário Mota e
navios foram alvo de uma chata artilhada que o prático Etchbarne, com instruções para
se apresentou rebocada por um vapor, mas tomar a chata, o que não puderam fazer (ape-
desta vez houve resposta brasileira. sar de ter ido um escaler bem perto), por ter
Na volta, pela madrugada (do dia 24), o de terra cerca de mil homens feito vivo fogo
Voluntário encalhou em uma pedra; o e atirado muitos foguetes... Segunda ten-
Tamandaré, ao manobrar para socorrer o tativa foi feita para tomar a chata e sem
companheiro em dificuldade, também en- resultado, porque de terra a infantaria fez
calhou. Curiosamente, o Voluntário con- vivíssimo fogo. Cessado o fogo do forte,
seguiu safar-se com os próprios meios, continuou o Tamandaré a atirar para a cha-
permanecendo preso o Tamandaré. ta até 21h30.”12 (Rocha)
*
N.A.: Carneiro da Rocha9 relata apenas Tamandaré e Mitre.
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A GUERRA DAS CHATAS
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A GUERRA DAS CHATAS
pediu um charuto e fumou-o enquanto os teve a ideia – logo aceita por Osório – de
médicos procediam à triste e dolorosa opera- artilhar a margem esquerda do Rio Paraná
ção.”20 (Fragoso) em frente ao forte inimigo. Assim, no dia
No diário de Carneiro da Rocha21 cons- 28, já se tinha instalada em Corales uma
ta que nesse dia “Chefe Alvim foi ferido bateria brasileira, e a 2 de abril, outra uru-
nas costas”. guaia, com canhões cujos projetis atraves-
savam o rio e atingiam o forte sem que os
Mais duelos de artilharia canhões inimigos pudessem alcançá-las.
*
N.A.: Veja em “A Guerra das Canoas”, na RMB do 1o trim/2008, p. 110, outra participação do prático.
**
Sirga – Corda com que se puxa uma embarcação ao longo da margem (Novo Dicionário Aurélio).
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A GUERRA DAS CHATAS
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A GUERRA DAS CHATAS
No dia 5, embora tudo levasse a crer López mandara colocar perto do extremo
que Mitre e seus chefes estavam cientes nordeste da Ilha de Santana logo que teve
de que o desembarque das tropas para a conhecimento da subida do general argen-
invasão seria na área de Itapiru, parece que tino”.41 (Fragoso)
Mitre não estava tão seguro assim, pois Na noite de 5 para 6 de abril, os brasi-
expediu ordem para o General Hornos, com leiros desembarcaram na Ilha Pequena
um pequeno destacamento, explorar, de (Cabrita) e a ocuparam. O assunto foi trata-
novo, o setor de Itati (quatro companhias do no artigo “A Henrique Martins na defe-
de infantaria, duas peças de artilharia e um sa da Ilha Cabrita”, na RMB do 2o trimestre
regimento de cavalaria). de 2008, pág. 67 a 80.
Às 7 horas daquele dia, suspenderam a A Ilha Pequena passou a ser denomina-
Itajaí, a Henrique Martins e a Greenhalgh, da Ilha do Cabrita, ou simplesmente Ilha
juntamente com os pequenos Chacabuco Cabrita, em homenagem ao Tenente-Coro-
e Buenos Aires, sob o comando do Chefe nel Willagran Cabrita (patrono da Enge-
Alvim, e subiram o Paraná até Passo nharia do Exército), que, com a sua compe-
Lengues, que se situa ao dobro de distân- tência, sua liderança e seu heroísmo (e a
cia de Itati a Itapiru, sendo ela a travessia participação da Marinha Imperial), soube
mais estreita do Alto Paraná. conquistar e depois defender a posição do
Em exploração anterior, Hornos já havia esforço paraguaio em retornar à ilha. Foi
informado que “a margem paraguaia em uma vitória brasileira contundente.
frente a Itati não se prestava a um desem- Quando a luta terminou, enquanto fazia
barque”39. (Fragoso) uma refeição, foi atingido por uma bala da
Hornos desembarcou em Lenguas, artilharia de Itapiru e veio a falecer.
provocando a fuga da guarda de cava- Com a posse da ilha, agora Ilha Cabrita,
laria que o vigiava e examinou-lhe os terminou, praticamente, a “Guerra das Cha-
arredores. “Toda a costa inimiga são tas” e foi iniciado um prolongado duelo de
banhados e malezais intransitáveis; as guar- artilharia das baterias da ilha (e dos navios
das comunicam-se mediante picadas estrei- também) na tentativa de silenciar Itapiru e
tas abertas em grande trecho nos carriçais possibilitar o desembarque das tropas ali-
até chegar-se a terra firme. 40 (Palleja) adas naquela área.
Consequentemente, também impróprio para Mas a realidade foi bem diferente, como
o desembarque. já vimos no artigo “A Marinha Imperial no
Na volta, a expedição “foi hostilizada Dia D da Guerra do Paraguai”, na RMB do
por uma bateria volante de seis peças que 3o trim./2008, p. 44 a 53.
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A GUERRA DAS CHATAS
NOTAS
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A GUERRA DAS CHATAS
BIBLIOGRAFIA
BIBLIOGRAFIA SUPLEMENTAR
1. BARRAN, José Pedro. Historia uruguaya (Tomo IV – Apogeu y crisis del Uruguay pastoril
y caudilhesco), Montevidéu, Uruguai: Ed. Banda Oriental da Republica, 1998 (155 páginas).
2. BENITEZ, Luiz G. (Professor). Manual de Historia del Paraguay, Assunción, Paraguay, s/
data (200 páginas).
3. CHIAVENATO, Júlio José. Genocídio americano: a Guerra do Paraguai. Rio de Janeiro:
Círculo do Livro, s/data (224 páginas).
4. H.P.C. “Passagem de Humaitá”. Revista Marítima Brasileira, Rio de Janeiro, 1909, p. 1.553
a 1.565.
5. MARCO, Miguel Angelo de. La Guerra del Paraguay. Buenos Aires, Argentina: Grupo
Editorial Planeta, 1995 e 2003 (350 páginas).
6. SCHNEIDER, Louis. A Guerra da Tríplice Aliança contra o Governo da República do
Paraguay (3o volume, 1o fascículo), Rio de Janeiro. Imprensa do Estado-Maior do Exército,
1924 (418 páginas).
7. VINHAES, Augusto. “Passagem de Humaitá”. Revista Marítima Brasileira. Rio de Janeiro,
1928, p. 1.157 a 1.165.
8. TAVARES, Raul (Capitão-de-Fragata). “A Passagem de Humaitá”. Revista Marítima Brasi-
leira, Rio de Janeiro, Ano XLVI, no 7 e 8, p. 633-695.
9. A PASSAGEM DE HUMAITÁ. Revista Marítima Brasileira. Rio de Janeiro, 1908, p.
1.293-1.298 (Editorial).
10. A PASSAGEM DE HUMAITÁ. Revista Marítima Brasileira. Rio de Janeiro, 1921, p. 669-
673 (Editorial).
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A CAMPANHA NAVAL NA GUERRA DA TRÍPLICE
ALIANÇA CONTRA O PARAGUAI*
* N.R.: Transcrição da conferência pronunciada pelo autor no Instituto Histórico e Geográfico Brasilei-
ro, em 29/10/2008.
A CAMPANHA NAVAL NA GUERRA DA TRÍPLICE ALIANÇA CONTRA O PARAGUAI
1
Alguns analistas consideram que a Guerra da Crimeia só teve início em1853, quando ocorreu a interven-
ção anglo-francesa no conflito entre a Rússia e a Turquia.
2
Somente a Guerra de Secessão, conforme veremos, iria fazer pleno uso do navio encouraçado para
sobrepujar fortalezas de terra.
3
Temporária, pois o canhão Armstrong teve de ser retirado por muito tempo de serviço devido aos
defeitos apresentados no seu sistema de disparo.
RMB1 o T/2009 49
A CAMPANHA NAVAL NA GUERRA DA TRÍPLICE ALIANÇA CONTRA O PARAGUAI
entre dois navios encouraçados – o Monitor nas 33 eram de propulsão mista e os demais,
e o Merrimack (Virginia) –, na batalha na- a pano. Todos tinham o casco de madeira e
val de Hampton Roads, quando ficaram de- muitos já usavam canhões de alma raiada e
monstradas, definitivamente, a superiorida- carregamento pela culatra; 609 oficiais e 3.627
de dos navios a vapor encouraçados sobre praças tripulavam esses navios. Entretanto,
os navios sem essa proteção e as vanta- nem todas essas embarcações podiam ser
gens da propulsão a vapor. Em Hampton concentradas no Prata, e muitas tinham que
Roads, o navio confederado Merrimack, ser mantidas ao longo de nossas extensas
usando o esporão de que era dotado, afun- costas, engajadas em tarefas específicas. A
dou a Corveta Cumberland, de 30 canhões, flotilha do Prata, que, pouco antes, sob o
podendo aproximar-se para o abalroamento comando de Tamandaré, havia intervindo no
graças à sua couraça.4 Uruguai contra o governo de Manuel Aguirre,
O duelo entre os dois encouraçados não era composta por 19 vapores, dos quais mui-
foi conclusivo, pois um não podia furar a tos ainda usavam a roda (por exemplo, a fra-
couraça do outro. As operações navais gata capitânia de Barroso em Riachuelo, a
empreendidas pelas forças do Norte, sob o Amazonas), e três transportes a vela. A
comando de David Farragut, contra Nova Niterói, que fazia parte da flotilha, por força
Orleans e Mobile (1862 e 1864, respectiva- de seu calado não podia operar nos rios
mente) vieram mostrar o que a Guerra da Paraná e Paraguai, e assim pouco contribuía
Crimeia já permitira vislumbrar: a capacida- para o esforço de guerra.
de de uma força naval de forçar a passa- A flotilha de Mato Grosso, envolvida
gem de pontos estratégicos defendidos por nas operações, compreendia apenas seis
fortalezas. Essa lição seria importante para pequenos vapores, que, no total, dispu-
os brasileiros na Guerra do Paraguai. nham apenas de dois canhões.
Não se pense, porém, que as forças na- O grande fator de força, porém, estava
vais que se defrontaram na Guerra da no Arsenal da Corte, que, além de apoiar
Tríplice Aliança acompanharam a evolução os navios existentes, deu início a um gi-
tecnológica de países como a Inglaterra e a gantesco programa de construção naval:
França. As esquadras argentina e brasilei- em 65, foram lançados a canhoneira a va-
ra que se enfrentaram na Cisplatina (1825- por Taquari, dois navios encouraçados –
1828) pouco diferiam da esquadra anglo- o Tamandaré e o Barroso; em 66, o
franco-russa que em 1827, na mesma épo- Encouraçado Riachuelo e as Bombardeiras
ca portanto, derrotou a esquadra turca em Pedro Afonso e Forte de Coimbra; em 67,
Navarino, na Guerra da Independência da a Corveta Vital de Oliveira, os Monitores-
Grécia. O mesmo não se pode dizer em rela- Encouraçados Pará, Rio Grande e
ção aos navios que tomaram parte na Guer- Alagoas; em 68, mais três monitores-
ra da Crimeia e aos navios brasileiros e encouraçados, Piauí, Ceará e Santa
paraguaios que participaram da Guerra do Catarina, e é iniciada a construção da
Paraguai, tecnologicamente bem mais atra- Corveta-Encouraçada Sete de Setembro, do
sados (pelo menos no início do conflito). Vapor Level e do Rebocador Lamego.
A frota brasileira, no começo de 1865, com- Há que destacar o extraordinário esfor-
preendia 45 navios armados, dos quais ape- ço dos engenheiros Napoleão Level e
4
O esporão podia atingir o navio inimigo onde este não era protegido pela couraça. A aproximação para
o abalroamento era possível graças à resistência da couraça ao poder de fogo dos canhões da época.
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A CAMPANHA NAVAL NA GUERRA DA TRÍPLICE ALIANÇA CONTRA O PARAGUAI
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A CAMPANHA NAVAL NA GUERRA DA TRÍPLICE ALIANÇA CONTRA O PARAGUAI
va, isto é, a batalha que termina com a des- rações contra o Paraguai, de atacar os for-
truição quase total da esquadra inimiga. tes de Curuzu e Curupaiti, à margem direita
Apesar de pouco adequada às condições do Rio Paraguai, para ameaçar Humaitá. Ata-
da área de combate – um trecho do Rio Paraná cada de surpresa, Curuzu foi conquistada
de difícil navegação, já que abrangia um ca- pelas tropas do Barão de Porto Alegre a 3 de
nal tortuoso, entre bancos de areia, inade- setembro de 1866, mas Curupaiti resistiu ao
quado para a manobra dos navios brasilei- assalto de cerca de 20 mil argentinos e bra-
ros de grande porte –, tendo de enfrentar, sileiros, que sofreram uma esmagadora der-
além dos navios paraguaios e das chatas rota: morreram cerca de 5 mil homens, dos
artilhadas, a forte artilharia instalada nas quais apenas cerca de 200 eram paraguaios.
barrancas ao norte e ao sul de Riachuelo e O apoio da esquadra brasileira, sob o co-
os infantes armados, que das barrancas al- mando de Tamandaré, não evitou a derrota.
vejavam as guarnições dos navios, a divi- As dissensões entre os chefes aliados
são brasileira, sob o comando do chefe-de- levaram à substituição de Osório por
divisão Francisco Manoel Barroso da Silva, Caxias; Tamandaré, doente, foi substituí-
obteve uma vitória decisiva, graças, princi- do pelo Almirante Joaquim José Inácio, fu-
palmente, à arrojada manobra do chefe na- turo Visconde de Inhaúma.
val brasileiro, que, mesmo seu navio não Em meados de 1867, Mitre, de volta ao
dispondo de esporão, abalroou os navios comando dos exércitos, deu ordens para que
inimigos, que, de menor porte, não resisti- a esquadra forçasse a passagem de Curupaiti
ram (um ano mais tarde, na guerra austro- e Humaitá. A 15 de agosto, duas divisões de
prussiana, em Lissa, os austríacos usariam encouraçados (ao todo, dez navios) ultra-
a mesma tática contra os italianos, aliados passaram, sem perdas, Curupaiti, mas tive-
da Prússia). A eliminação da esquadra ram de se deter diante dos canhões de
paraguaia – apenas quatro navios escapa- Humaitá. Inhaúma resistiu bravamente às
ram da destruição –, teria importantes pressões de Mitre para forçar a passagem
consequências estratégicas: impediu a in- de Humaitá por julgar, com razão, que isso
vasão da província de Entre-Rios, isolou as colocaria em risco os seus navios. Os navi-
tropas de Estigarribia que estava atacando os brasileiros que ultrapassaram Curupaiti
o Rio Grande do Sul e pôs fim ao poder na- ficaram em situação muito difícil, separados
val paraguaio. Entretanto, em termos totais do restante da esquadra pelo forte de
ela não foi estrategicamente decisiva, pois Curupaiti e impedidos de seguir adiante pela
as fortalezas e as chatas paraguaias – “ver- fortaleza de Humaitá. Para apoiá-los foi ne-
dadeiros monitores de madeira”, armadas cessário construir, na margem direita do Rio
com canhões de 68 (os maiores da época) – Paraguai, quase em frente a Humaitá, uma
eram um obstáculo formidável, impedindo pequena base avançada, Porto Elisário, e
que a esquadra brasileira se deslocasse li- também, em pleno Chaco, uma ferrovia li-
vremente pelo Rio Paraguai para dar o indis- gando a base a Porto Quia.
pensável apoio às tropas de terra. Em Novas dissensões entre os chefes alia-
consequência, as operações, no período de dos fizeram com que Mitre mais uma vez se
abril de 1866 a julho de 1868, concentraram- afastasse, assumindo Caxias o comando em
se na confluência dos rios Paraná e Paraguai. chefe. Após a chegada dos navios
Um bom exemplo dessas dificuldades encouraçados, inclusive os construídos no
ocorreu em 1866: a tentativa de Bartolomeu Arsenal da Corte, foi decidido que havia con-
Mitre, então comandante em chefe das ope- dições para ultrapassar Humaitá. Em feverei-
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A CAMPANHA NAVAL NA GUERRA DA TRÍPLICE ALIANÇA CONTRA O PARAGUAI
ro de 1868, a passagem foi forçada pelos 1868, três divisões do Exército Brasileiro
encouraçados Barroso, Bahia e Tamandaré, foram embarcadas na esquadra imperial na
cada um levando a contrabordo, por bom- margem esquerda do rio, atravessando-o;
bordo, um monitor, respectivamente, o Rio essas tropas desembarcaram então na mar-
Grande, o Alagoas e o Pará. A praça de gem direita, percorreram a pequena estra-
Humaitá foi cercada pelas forças de terra, ren- da construída até atingirem o porto de
dendo-se em julho de 1868. A força brasileira Valleta, onde foram reembarcadas, atraves-
que forçou a passagem foi comandada pelo sando de novo o rio em direção à margem
Capitão de Mar e Guerra Delfim Carlos de esquerda, desembarcando nos portos de
Carvalho, que, por esse feito, foi mais tarde Santo Antônio e Ipané, cerca de 20 quilô-
Barão da Passagem. metros à retaguarda das tropas paraguaias
Os monitores, por força de seu pequeno em Piquissiri, o que surpreendeu López
calado, puderam cruzar sobre as correntes completamente, já que ele não julgava pos-
que bloqueavam o rio nas proximidades de sível que uma tropa considerável pudesse
Humaitá e, por serem rasos com a água, ofe- se deslocar através do Chaco.
reciam alvo muito pequeno ao fogo inimigo, A 6 de dezembro de1868, as tropas inici-
além de, graças à cou- aram o avanço para o
raça, resistirem melhor sul, dando início ao
caso fossem atingidos. O Brasil pagou um alto que ficou conhecido
Pelo fato de disporem preço pela guerra. Dos como a Dezembrada.
de torres couraçadas, Itororó, Avaí e Lomas
conteiráveis, não cor- cerca de 160 mil brasileiros Valentinas são etapas
riam o risco, caso elas que nela tomaram parte, 50 da vitória aliada. As
fossem atingidas, de forças navais, usando
explodir, como aconte-
mil perderam a vida e o porto de Valleta,
cera em Itapiru com os cerca de mil ficaram mantiveram as tropas
encouraçados Taman- inválidos de Caxias reabasteci-
daré e Barroso. das. A queda de Lomas
Com a queda de Valentinas levou à de
Humaitá, a esquadra imperial teve seu ca- Angostura. A 30 de dezembro, López e um
minho livre até Assunção, passando a bom- pequeno contingente de paraguaios fugia
bardear a capital inimiga. As tropas terres- para o norte. Nos primeiros dias de janeiro
tres, porém, não conseguiam avançar, pois de 1869, Assunção foi ocupada e, em ter-
os paraguaios tinham se entrincheirado ao mos políticos, a guerra estava encerrada.
longo do Arroio Piquissiri, barrando o ca- Entretanto, ela só o seria definitivamente a
minho para Assunção. Essas defesas eram 1o de março de 1870, quando uma lançada
apoiadas pelos fortes de Lomas Valentinas do cabo Chico Diabo pôs fim à vida de
e de Angostura, este à margem esquerda. Solano López em Cerro Corá.
As tropas aliadas estavam concentradas O Brasil pagou um alto preço pela guer-
em Palmas, em frente às fortificações de ra. Dos cerca de 160 mil brasileiros que nela
Piquissiri. Para vencer o impasse, Caxias tomaram parte, 50 mil perderam a vida e cerca
desenvolveu uma das mais brilhantes con- de mil ficaram inválidos.
cepções da guerra. Em pleno Chaco, fez Da mesma forma que em outros confli-
contruir uma estrada de 11 km em apenas tos no século XIX, as altas taxas de morta-
23 dias. Nos primeiros dias de dezembro de lidade foram uma consequência das péssi-
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... O oceano é um meio diferente da terra, tão diferente de fato que nos
força a pensar diferentemente. O oceano, onde tudo flui e tudo é
interconectado, nos força a desfocar, a repelir nossos velhos conceitos e
paradigmas – a refocar sobre novo paradigma.
Conceitos fundamentais, desenvolvidos por milênios na terra, como
os de soberania, fronteiras geográficas e propriedade, simplesmente não
funcionarão no meio oceânico, onde novos conceitos políticos, jurídicos e
econômicos estão emergindo.
Elisabeth Mann Borgese1
SUMÁRIO
Introdução
Oceanopolítica
Discussão preliminar de conceitos de Oceanopolítica
O dimensionamento de um Espaço Oceanopolítico: roteiro básico
Considerações complementares
* N.R.: Artigo baseado no texto de palestra proferida no Clube Naval. O CA Ilques é atualmente Coman-
dante da 2a Divisão da Esquadra.
1
The Oceanic circle: governing the seas as global resource. New York. United Nations University, 1998.
Tradução de Marcos Lourenço de Almeida.
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trole dos mares, ao longo da história3, ca- propulsoras, os navios mercantes amplia-
racterizou um fator de força decisivo em to- ram a autonomia e algumas forças navais
das as guerras. Na linguagem militar-naval ainda passaram a contar com eficiente apoio
da atualidade, poderíamos substituir guer- logístico móvel5. As novas plantas propul-
ras por situações de conflito. Tal argumento soras e o apoio logístico móvel contribuem
decorre do entendimento de “quem contro- para a redução da dependência dos navios
la o intercâmbio, controla as riquezas; e quem das bases de apoio, ou seja, dos portos.
controla as riquezas, controla o Mundo”. A superioridade dos conceitos postulados
Com o mesmo entendimento e muito antes por Mahan, em comparação aos de Mackinder,
de Mahan, tivemos o Almirante é respaldada pelos seguintes fatos:
Temístocles, vencedor da Batalha Naval de a) ao longo da história, as vitórias das
Salamina, que considerava o “comando do potências marítimas nos confrontos com
mar como primordial para o comando de to- as potências terrestres;
das as coisas”, e Ratzel, ao destacar a im- b) o comércio mundial, prioritariamente
portância do tráfico marítimo4 e o valor es- realizado por meio de navios mercantes6;
tratégico das ilhas oceânicas em sua obra O c) a magnitude dos recursos naturais
mar, origem da grandeza dos povos. existentes no mar e o constante desenvol-
Para Mahan, os mares facilitam a mobili- vimento de tecnologias para a exploração
dade, pois não existem obstáculos naturais, desses recursos;
exceto em situações de mar adverso. O d) a identificação da importância dos
ordenamento jurídico relativo aos espaços oceanos para a preservação ambiental da
oceânicos pouco restringia a movimenta- vida humana no planeta; e
ção dos navios e a disponibilidade de por- e) a crescente ocupação humana dos
tos era fundamental para o apoio logístico espaços oceânicos, inclusive em áreas
aos navios. Atualmente, a tecnologia per- onde o ordenamento jurídico deixa de con-
mite que situações de mar adverso sejam templar direitos de soberania nacional.
evitadas e, como será comentado, observa- As considerações relativas à influência
mos uma crescente complexidade no dos espaços oceânicos nos destinos dos
ordenamento jurídico, que passou a impor Estados foram consolidadas pelo que pas-
restrições à navegação nos mares, tanto a sou a ser denominado de Teoria do Poder
mercante como a realizada por navios de Marítimo, tendo no Almirante Mahan seu
guerra. Devido à modernização das plantas principal formulador.
3
Na história da humanidade, encontramos diversos exemplos em que ocorre o predomínio do poder
marítimo sobre o terrestre, quais sejam: a Cultura Grega, cuja disseminação, que tanto influen-
ciou a civilização ocidental, decorre da vitória dos gregos sobre os persas na Batalha Naval de
Salamina; a Pax Romana, que perdurou enquanto o Mar Mediterrâneo era o mare nostrum; as
Grandes Navegações, que permitiram a um país de reduzidas dimensões territoriais transformar-
se em um império; a Pax Britânica, em que um país insular e carente de recursos naturais,
amparado nas “regras” da Royal Navy, também forma um império; e, finalmente, o que alguns
autores denominam de Pax Americana, em que a importância da liberdade de navegação respalda
o pré-posicionamento dos poderosos grupos de batalha da Marinha dos EUA, nucleados em porta-
aviões com propulsão nuclear.
4
Tráfico Marítimo – compreende o comércio marítimo, a atividade empresarial do transporte marítimo
e a consequente exploração do navio como meio de transporte.
5
Como exemplo de apoio logístico móvel, apontamos a Marinha dos Estados Unidos da América, que
promoveu a substituição das tripulações com os navios ainda em operações no mar.
6
Atualmente, navios mercantes transportam 90% do comércio mundial.
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7
Site www1.folha.uol.com.br/folha/mundo.
8
Jornal O Globo de 23 de agosto de 2008.
9
Expressão que representa a rota de navegação empregada pelo tráfico marítimo. Os navios mercantes
navegando materializam as linhas de comunicações marítimas.
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ção de poder nas relações internacionais. decorrentes das características dos oceanos
Temos para ordenar as influências dos Es- e da magnitude da influência do ambiente
tados a Convenção das Nações Unidas marítimo no destino da civilização humana
sobre o Direito do Mar, a Constituição do recomendam que esses estudos tenham um
Mar. desenvolvimento que considere, além do Es-
No futuro, fatores político-estratégicos, tado, o fato de que o oceano, como indica
energéticos, econômicos e ambientais am- Elisabeth Mann Borgese, “... é um meio dife-
pliarão ainda mais a importância do aten- rente da terra, tão diferente de fato que nos
dimento dos objetivos dos Estados nos força a pensar diferentemente. O oceano, onde
oceanos. tudo flui e tudo é interconectado, nos força a
Assim como no passado e no presente, desfocar, a repelir nossos velhos conceitos e
o futuro também indica que a projeção de paradigmas – a refocar sobre novo
poder nos oceanos continuará tendo como paradigma...”
protagonista o Estado. As organizações A Oceanopolítica envolve a elaboração,
internacionais permanecerão dependendo a disseminação e a implementação de dire-
dos Estados para a trizes relacionadas
celebração de acordos com a ocupação de es-
e tratados, que, sendo No futuro, fatores político- paços oceânicos, a
otimista, devem impe-
dir a repetição dos
estratégicos, energéticos, preservação e a explo-
ração de recursos e o
mesmos erros cometi- econômicos e ambientais acompanhamento do
dos pela civilização ampliarão ainda mais a tráfico marítimo, assim
humana na ocupação como quanto ao usu-
e exploração do ambi- importância do fruto do lazer propici-
ente terrestre, princi- atendimento dos objetivos ado pelo mar.
palmente as guerras. Como estamos ini-
Dessa maneira,
dos Estados nos oceanos ciando uma viagem de
considerando o Esta- estudos em espaços
do como núcleo de irradiação de poder na- oceânicos, temos a convicção de que mui-
cional, apontamos que os conceitos da tas milhas ainda precisam ser navegadas
Oceanopolítica demonstram que as fron- para alcançarmos uma adequada amplitu-
teiras são delineadas nos espaços de e profundidade de conhecimentos so-
oceanopolíticos, onde são projetadas as bre Oceanopolítica. A convicção no êxito
influências dos Estados. dessa navegação decorre da qualidade da
Em termos amplos, a Geopolítica deve ser tripulação, os descendentes dos grandes
a matriz inicial e a moldura dos estudos de navegadores de Sagres: os marinheiros –
Oceanopolítica. Todavia, as especificidades civis e militares – do Brasil.
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nal”. Revista Política e Estratégia, Santiago, Chile, no 105, p. 58/81, 2006.
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ESTRATÉGIA DE DEFESA DA AMAZÔNIA BRASILEIRA
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ESTRATÉGIA DE DEFESA DA AMAZÔNIA BRASILEIRA
edade cujo capital foi subscrito pelos em- das, antes da implantação da Agência da
presários da praça de Lisboa, com o propó- Capitania dos Portos em Munguba (o por-
sito de alijar os intermediários no comércio to de Monte Dourado).(N.R.2)
com a região, sobretudo os ingleses. O Grupo Executivo para a Região do
A estratégia pombalina tem prevale- Baixo-Amazonas (Gebam) demonstrou para
cido até hoje, embora posta em prática as autoridades governamentais, inclusive
inconscientemente. para o próprio Presidente da República, que
O Exército Brasileiro, ultimamente, vem havia descaminho de madeiras em toras e
se empenhando em consolidá-la por inter- beneficiadas, cujo valor, a preços de 1982,
médio de um projeto denominado Calha Nor- ultrapassava a casa de US$ 1,2 bilhão.
te, que consiste, basicamente, no aumento Respaldavam essa revelação o cotejo en-
dos efetivos das unidades dispostas ao lon- tre o inventário florestal, levantado alguns
go da fronteira ao norte do Rio Amazonas, anos antes pelo Radambrasil, e o volume de
além da criação de novos grupamentos mili- madeiras contido na área desmatada; a ca-
tares na mesma região lindeira.(N.R.1) pacidade das três serrarias instaladas na
Essa medida, embora contribua para a pro- área; o depoimento dos práticos do Rio Jari;
teção da fronteira, não e a frequência de atra-
é de todo eficiente no cação de navios no
que tange ao tampona- A estratégia pombalina tem porto de Munguba.
mento, pois o espaço Todo esse volume
amazônico não é pro-
prevalecido até hoje, de madeiras transpor-
priamente continental, embora posta em prática tado ilegalmente cru-
eis que se assemelha a inconscientemente zou a foz do Amazonas
um imenso arquipéla- pelo chamado Braço
go, tal a quantidade de Norte, na verdade a foz
rios e igarapés que cortam o terreno. do grande rio, sem que fosse detectado.
A Força Aérea Brasileira acaba de O segundo exemplo ocorreu em época
tamponar, com eficiência, o espaço aéreo da mais recente, setembro de 2001, quando o
região, mediante a instalação de uma rede navio Artic Sunrise, de bandeira inglesa e
de radares e o estacionamento de aerona- pertencente à organização não-governa-
ves de combate nas bases existentes, com o mental estrangeira Greenpeace, penetrou
que o contrabando e o descaminho de ma- no Rio Amazonas para executar a demarca-
teriais de valor decresceram sobremaneira. ção das terras reservadas para os 361 nati-
Com essa inovação, todos os bens nor- vos da tribo Deni, estabelecidos entre o
malmente transportados pelas aeronaves Rio Xeruã, afluente do Juruá, e o Rio
piratas foram desviados para as hidrovias, Cuniuá, da bacia do Purus.
cujo patrulhamento é ainda frágil. Aplicando os mesmos critérios “metafí-
A fragilidade do tamponamento das sicos” usados para a concessão de reservas
hidrovias pode ser ilustrada com três exem- para os silvícolas, os Deni foram aquinhoados
plos lapidares. com uma área de 998.400 hectares.
O primeiro exemplo relaciona-se com o Pois bem, o Artic Sunrise suspendeu
descaminho de madeiras, em toras e serra- do porto de Manaus, no dia 20 de setem-
N.R.1: Os recursos do Projeto Calha Norte atualmente também contemplam a Marinha e a Força Aérea.
N.R.2: A Agência da Capitania dos Portos do Pará em Munguba esteve ativada desde 1979 até 1999.
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bro de 2001, demandando a área concedi- compromisso constitucional de demarcar
da aos Deni e levando a bordo o cacique todas as terras indígenas até 1993”.
Haku Varashadeni, da tribo em questão, di- Os dois exemplos alinhados demons-
rigentes da Coordena- tram a necessidade de
ção das Organizações instalação de uma Es-
Indígenas da Amazô- Os dois exemplos alinhados tação Naval nas proxi-
nia Brasileira (Coiab),
representantes do
demonstram a necessidade midades de Macapá,
dotada com navios-
Conselho Indigenista de instalação de uma patrulha e com insta-
Missionário (Cimi) e Estação Naval nas lação fixa de radares de
da Operação Amazô- superfície, para
nia Nativa (Opan), to- proximidades de Macapá tamponar a foz do
dos reunidos para pro- Amazonas e apresar
ceder à demarcação da reserva, já que o navios envolvidos em operações ilegais ou
“governo brasileiro não havia cumprido o antinacionais.(N.R.3)
N.R. 3: Ver proposta similar do Vice-Almirante (Refo) José Luiz Feio Obino, publicada na RMB do 4o
trimestre de 1998.
N.R. 4: Gaiola – Embarcação de navegação fluvial, empregada para transportar sobretudo passageiros.
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ESTRATÉGIA DE DEFESA DA AMAZÔNIA BRASILEIRA
N.R. 5: Mais detalhes do ataque ao Ajudante estão descritos no livro “Fronteiras da Amazônia – uma
guerra silenciosa”, do Capitão de Mar e Guerra (Refo) Aécio Pereia de Souza. Partes do livro foram
publicadas na RMB do 2 o trimestre de 2001.
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ESTRATÉGIA DE DEFESA DA AMAZÔNIA BRASILEIRA
direita do Amazonas, como são os Rios Ma- Naval que dará apoio à Esquadra do Norte.
deira, Purus e Juruá. Nos três casos, seria Tal escolha não admite outra alternativa
suficiente equipar as Organizações Milita- devido às águas profundas e protegidas
res da Diretoria de Portos e Costas, isto é, da citada baía, que permitirão o estaciona-
a rede de capitanias, delegacias e agênci- mento seguro de navios de maior calado,
as, com lanchas-pa- inclusive aqueles do-
trulha armadas e ins- tados de domos de
talações fixas de rada- A estratégia delineada pelo sonares com dimen-
res de superfície, em Marquês de Pombal, mais sões avantajadas.
Porto Velho, Rio Bran- Esta Esquadra do
co e Eirunepé. do que nunca, é vital para o Norte também deverá
Ademais, como a exercício da soberania e contribuir, com grande
Estratégia de Defesa
Nacional, recentemen-
manutenção da integridade eficiência, para o
tamponamento avança-
te divulgada, preconi- territorial da Amazônia do da foz do Amazonas.
za a presença de For- brasileira Para concluir, deve
ças Navais oceânicas ser enfatizado que a
no norte do País, para continuidade de aplica-
se contrapor às ameaças oriundas da re- ção da estratégia deli-neada pelo Marquês
gião de onde sopram os ventos boreais, de Pombal, mais do que nunca, é vital para o
parece óbvia a escolha da Baía de São exercício da soberania e manutenção da inte-
Marcos, no Maranhão, como sede da Base gridade territorial da Amazônia brasileira.
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O SUBMARINO NUCLEAR BRASILEIRO. UMA VISÃO
SUMÁRIO
Antecedentes
Os principais desafios
Por que um submarino nuclear?
Outras considerações relevantes
Perspectivas
da América iniciava ambicioso programa vi- ficas componentes do Poder Naval, cuja
sando à construção e operação de um sub- esgrima fundamental estava, e assim per-
marino empregando um reator nuclear para manece até os dias de hoje, lastrada no
a geração de vapor, e que propiciaria ao meio, aperfeiçoamento constante no campo
portanto, permanecer oculto sem a necessi- tecnológico, formidável patrimônio e ins-
dade de quebrar suas margens de discrição trumento que sempre irá credenciar o mais
para carga de baterias, operação que, nos bem preparado a galgar o próximo e superi-
submersíveis de então, mesmo aqueles or degrau na escala da dissuasão.
construídos com o melhor existente no es- Passado algum tempo, mas já em 1954, a
tado da arte, implicava alguma exposição Marinha dos Estados Unidos apresentava
acima da superfície, ainda que limitada ape- o Nautilus, produto final de histórico pro-
nas ao periscópio de observação e a um jeto de construção de submarino com pro-
conduto de admissão que permitia aspirar o pulsão nuclear, livrando-o da necessidade
ar exterior (o esnorquel), sistema introduzi- de recarregar baterias na superfície ou em
do na Campanha do Atlântico ao final da esnorquel e tornando-o, portanto, o tipo
Segunda Guerra Mundial. de navio que podia ser realmente chamado
Decorrente do expressivo sucesso dos de submarino em substituição ao vocábu-
ataques conduzidos pelos submarinos con- lo submersível, que denota a realidade de
tra os navios de superfície durante aquela todos os seus antecessores ou daqueles
guerra, logo surgia, em reação, a inovação que, ainda na atualidade, dependem de al-
tecnológica da detecção radar, notável con- guma forma do comburente oxigênio para
quista britânica. a propulsão ou recuperação do nível ade-
A introdução desse recurso permitiu quado de carga de suas baterias que acu-
identificar os submarinos que atacavam mulam energia elétrica.
navegando na superfície, tirando proveito No Brasil, em 1979, a Marinha, com o
da escuridão associada ao baixo perfil da descortino das grandes e decisivas reali-
reduzida superestrutura exposta acima zações, batizava de Chalana um embrião
d’água. Contudo, a descoberta da existên- de projeto cujo objetivo buscava adquirir
cia e compreensão desse novo tipo de condições, conhecimentos e competênci-
detecção produziu efeitos que resultaram as visando a permitir nosso ingresso no
em acentuar o entendimento da necessida- seletíssimo grupo de países capazes de
de da ocultação submersa, que propiciaria projetar, construir e operar um submarino
a efetiva discrição da aproximação por par- com propulsão nuclear, sonho, desde en-
te dos submarinos. tão, permanentemente acalentado pelos
A resposta, configurada pelo sistema componentes da Força Naval.
adrede comentado, que passou a ser co- O levantamento de todos os fatos e o
nhecido como esnorquel, permitia a carga detalhamento do caminho percorrido nes-
de baterias com o submarino mergulhado tes últimos 30 anos passam ao largo da pro-
e, certamente, marcou o início do sofistica- posta deste trabalho. Contudo, sem apon-
do e crescente desafio, confrontando a tar todos os nomes que certamente a histó-
possibilidade da oportuna detecção da ria da Marinha do Brasil fará a justiça de
ameaça, diante da capacidade efetiva da reconhecer e consagrar ao longo do tem-
aproximação furtiva e concretização do ata- po, vamos destacar o elenco das conquis-
que bem-sucedido. Em outras palavras, tas mais marcantes e decisivas que pavi-
começava o embate entre parcelas especí- mentaram o terreno firme da estrada per-
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O SUBMARINO NUCLEAR BRASILEIRO. UMA VISÃO
corrida até aqui, a qual, inequivocamente, das pela engenharia naval brasileira e
aponta para prognóstico muito promissor construído em estaleiro nacional pelas
nessa empreitada que esteve por várias mãos dos nossos técnicos e operários.
razões adormecida e hoje, quando alcança Há que comentar e incluir nessa visão a
idade madura, felizmente desperta com o existência de inúmeras intercorrências, que
vigor necessário para alcançar o objetivo devem ser consideradas englobadas nas
há tanto tempo estabelecido. capacidades de projeto e construção, e que
abrangem os sistemas de armas, de con-
OS PRINCIPAIS DESAFIOS trole da plataforma, sensores e armamento,
setores vitais e sobre os quais ainda expe-
A partir de exposição de motivos do Mi- rimentamos lamentável dependência exter-
nistério da Defesa apresentada ao Presidente na, cuja superação precisa ser viabilizada.
da República em dezembro de 2007, foi au- Ao lado disso, merece destacar que foi
torizado que aquele Ministério iniciasse en- com indiscutível perseverança, criativi-
tendimentos diretos dade, coragem, inteli-
com a área econômica gência, habilidade e
do governo visando à Desde o início do projeto muita competência
construção do subma- que inúmeros obstá-
rino nuclear S(N) bra- do submarino com culos foram supera-
sileiro. Renasciam ali as propulsão nuclear da dos, até aqui, por to-
esperanças da Mari- dos aqueles que, de
nha e iniciava-se o
Marinha, em 1979, o alguma forma, estive-
chamado Programa de domínio do ciclo do ram envolvidos, des-
Desenvolvimento do combustível, obtido em de o início, no trato
Submarino de Propul- dos assuntos que se
são Nuclear (Prodesn). 1982, constituiu a primeira relacionavam com a
Desde logo, é im- formidável vitória obtenção do submari-
portante ficar claro no com propulsão nu-
que determinadas clear, sejam sob o pris-
capacitações devem ser necessariamente ma da sua conveniência estratégica para a
atendidas de modo que a Marinha possa, Marinha do Brasil, os fundamentos da sua
efetivamente, concretizar suas pretensões. operação, as dificuldades do projeto e da
Entre essas competências, merece rele- construção, os óbices para a obtenção do
vo e é obrigatório enumerar, minimamente: combustível passando pelo processo para
a conquista da capacidade de projeto; a o enriquecimento do urânio, além da
consolidação das capacidades de constru- miríade de problemas acessórios e
ção, de manutenção e operação; além de, intercorrentes que uma obra dessa enver-
logicamente, dar continuidade à questão gadura traz atrelada.
do combustível e trabalhar na concepção e Contudo, se ainda resta um bom cami-
construção do reator e periféricos a serem nho a percorrer, convém registrar que ba-
testados em terra, em conjunto, para final- ses sólidas foram alicerçadas e, neste mo-
mente evoluir no sentido da instalação e mento, a Marinha deixa evidente que tra-
integração da planta de propulsão nuclear balha para fazer prosperar o formidável pro-
no submarino, cujo casco, espera-se, terá jeto que, conforme previamente comenta-
sido projetado sobre pranchetas trabalha- do, já alcançou a maturidade.
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O SUBMARINO NUCLEAR BRASILEIRO. UMA VISÃO
Vamos, portanto, tentar elucidar o quan- que a realidade e a evolução dos fatos
to já vencemos nessa singradura e, ainda mostraram ter sido irreversível e decisivo.
mais relevante, comentar sobre as etapas Os desdobramentos dessa empreitada,
remanescentes e também as mais importan- com a sofisticação de centrífugas de geni-
tes, as quais, uma vez satisfeitas e supera- al concepção nacional e a montagem de
das, ao juízo deste autor, propiciarão a che- cascatas seriadas, levaram ao enriqueci-
gada e “atracação” ao porto seguro do al- mento do combustível ao nível de protóti-
mejado objetivo. po laboratorial em grau adequado e com a
Desde o início do projeto do submarino possibilidade concreta da obtenção do
com propulsão nuclear da Marinha, em quantitativo suficiente para o abastecimen-
1979, o domínio do ciclo do combustível, to dos futuros submarinos nucleares que
obtido em 1982, constituiu a primeira for- serão fabricados no País.
midável vitória, que consagrou com lugar Entretanto, para que essa possibilidade
de destaque na nossa história um grupo se transforme em realidade, resta equacionar
seleto de oficiais e engenheiros navais li- a questão da escala de produção que efeti-
derados pelo Vice-Almirante Othon Luiz Pi- vamente assegure a quantidade de combus-
nheiro da Silva, cujas tível suficiente para
habilidades e compe- atender a todos os fu-
tências ficam difíceis
de traduzir em pala-
No que tange à planta de turos submarinos,
mesmo que ainda não
vras frias, especial- propulsão, já foi divulgado necessariamente inclu-
mente diante da apa- que a Marinha do Brasil ídos no Programa ini-
rente simplicidade do cial, mas já visuali-
feito. Destarte, pouco trabalha celeremente no zados diante de ótica
tempo depois, em seu centro de excelência estratégica de prazo
1987, o então Presi-
dente José Sarney
tecnológica de Aramar, na maisNão longo.
menos essen-
anunciava ao mundo, região de Iperó, em São cial, associado a essa
com justificado orgu- Paulo, para prontificar um preocupação será vital
lho e pompa, a con- agir no sentido de evi-
quista brasileira. protótipo de reator nuclear tar a vulnerabilidade
Mas é sensato es- em terra de estrangulamento do
timar quantas dificul- processo pela simples
dades das mais diver- interrupção de forneci-
sas naturezas não terá sido preciso supe- mento do hexafluoreto de urânio, que hoje
rar para tornar concretas as concepções e ainda passa pelo Canadá e pela Europa. Pro-
mostrar resultados práticos sobre visões videncialmente, acertos e parcerias com as
teóricas, sem mencionar os difíceis e quase Indústrias Nucleares Brasileiras (INB) dão
inescapáveis obstáculos interpostos pela curso seguro e promissor a este assunto.
observação atenta e atuação poderosa dos No que tange à planta de propulsão, já
países mais desenvolvidos que, sob a égide foi divulgado que a Marinha do Brasil tra-
das chamadas salvaguardas internacio- balha celeremente no seu centro de exce-
nais, buscaram criar barreiras, ainda bem lência tecnológica de Aramar, na região de
que em vão, na tentativa de impedir que a Iperó, em São Paulo, para prontificar um
Marinha e o nosso país dessem este passo protótipo de reator nuclear em terra.
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O SUBMARINO NUCLEAR BRASILEIRO. UMA VISÃO
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O SUBMARINO NUCLEAR BRASILEIRO. UMA VISÃO
serviços para outra Marinha sul america- duro” de selecionado grupo de engenhei-
na, como foi o caso da Força de Submari- ros navais brasileiros.
nos da Armada Argentina, que enviou ao Tal entendimento, contudo, não prevê
Brasil submarino para consecução de Perí- qualquer ajuda no que envolve a propul-
odo de Manutenção Geral, ocasião que são nuclear em si mesma. E isso não pode-
impunha a abertura do casco resistente do ria, realmente, ser diferente, em face da exis-
navio, procedimento executado de forma tência de efetivas salvaguardas internaci-
perfeita e que atesta e comprova cabalmen- onais sobre o assunto. Ademais, seria ilu-
te que dominamos técnica restrita a pou- sório acreditar que algum país entregue seu
cos países em todo o mundo. patrimônio tecnológico tão exclusivo para
Também é fato que aos desdobramen- outro, mesmo que cobrando muito por esse
tos do processo de obtenção dos IKL pode valor intangível.1
ser associado ensaio de capacidade de pro- Retornando ao citado acordo com os
jeto. Porém parece ser equilibrado e sensa- franceses, tem expressivo valor, e merece
to assinalar que esta é, ainda, uma compe- ser enfatizado, o aspecto representado pela
tência essencial não preocupação da parte
inteiramente domina- brasileira em eliminar a
da e que precisa ser O acordo prevê a carência existente na
conquistada. parte de projetos.
Justo nesse senti- aquisição da essencial A história deixa evi-
do, a Marinha buscou capacidade de projeto, a dente que as Mari-
parceria externa que nhas que hoje contam
atendesse às deman-
ser implementada na com submarino nucle-
das brasileiras. O re- França e no Brasil ar nos seus inventári-
sultado já é de domí- os acumularam expres-
nio público, uma vez que foi amplamente siva experiência prévia na construção na-
divulgado pela mídia nacional e internaci- val e, em especial, na de submarinos. E isso
onal. Desse modo, sabemos que, em de- ocorreu de forma lógica e em sequência a
zembro de 2008 foi firmado acordo entre um processo evolutivo natural, decorren-
Estados, com o envolvimento direto dos te, também, dos investimentos feitos pelos
Presidentes do Brasil e da França, acertan- respectivos países que, por variadas ra-
do entendimentos que culminam na cons- zões, mais cedo despertaram para o poten-
trução, no País, do primeiro submarino nu- cial do emprego da arma e, na mesma medi-
clear brasileiro, após a fabricação, também da, logo deram conta da importância dos
no Brasil, de quatro convencionais da classe submarinos para o fortalecimento de seus
Scorpene, cujo detalhamento de projeto poderes navais.
será conduzido pela parte brasileira. É consequência natural que essas po-
Além disso, em providência fundamen- tências estejam, hoje, em patamares
tal, o acordo prevê a aquisição da essenci- tecnológicos superiores e em condições de
al capacidade de projeto, a ser implemen- realizar, efetivamente, aquilo que o melhor
tada na França e no Brasil para um “núcleo do estado da arte pode oferecer. No caso
N.A.1: Na verdade, tal transferência somente ocorre em situações especialíssimas e limitadas – podem
ser citadas as parcerias dos Estados Unidos e Reino Unido e, de forma um tanto diferenciada e
peculiar, da Rússia e a Índia – ressalvando que considerações sobre tais casos específicos fogem
inteiramente à proposta de abordagem deste trabalho.
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O SUBMARINO NUCLEAR BRASILEIRO. UMA VISÃO
brasileiro resta implícito, sem importar as Conveniente lembrar, ainda, que se des-
razões, que do nosso lado, em tempos pas- conhece exemplo de Marinha que tenha
sados, não promovemos as mesmas priori- decidido partir para o projeto e construção
dades. Mas, logicamente, e justo para abre- de um submarino nuclear sem antes ter tri-
viar etapas na velocidade possível, a Mari- lhado o caminho prévio do convencional.
nha do Brasil buscou e encontrou a parce- Entretanto, é exatamente neste ponto que
ria internacional comprometida em atender reside o maior desafio e aparece a oportu-
a nossas demandas. na e a ousada solução: abreviar o proces-
É oportuno destacar, mais uma vez, con- so, de forma segura e sem comprometer
forme previamente comentado, que, no pro- seus estágios!
cesso da capacitação da construção dos IKL Mesmo sob o risco de sermos repetitivos
(classes Tupi e Tikuna), algum esforço foi neste argumento, convém assinalar que o
feito na tentativa de adquirir experiência em processo normal e em absoluta sintonia com
projeto. Entretanto, impõe reconhecer que os acontecimentos registrados nos anais
os progressos não foram suficientes para dos submarinos já construídos no mundo
que pudéssemos con- recomenda passar, an-
siderar satisfatoria- tes, pelo projeto, e de-
mente conhecida ou pois pela construção
inteiramente dominada Desconhece-se exemplo de de um convencional
tal competência. Marinha que tenha para, então, do alto
Assim, ordenando dessa experiência e
ideias, convém assina-
decidido partir para o lastrado nos conheci-
lar que a posição atual projeto e construção de um mentos adquiridos,
no que tange aos sub- submarino nuclear sem partir para um casco e
marinos remete a um sistemas mais sofisti-
nicho de tecnologia antes ter trilhado o cados que abriguem
que permite construir caminho prévio do uma planta de propul-
aquilo que, em essên- são nuclear. Mas, con-
cia, não foi por nós
convencional venhamos, a Marinha
nativamente projetado. do Brasil tem a pressa
Nesse campo, constitui um lapidar exem- que justifica ajustar essa sequência em be-
plo o caso das corvetas Inhaúma e Barro- nefício da velocidade dos resultados!
so, classes, respectivamente, projetadas e Justamente tal conjunção de fatos ex-
reprojetadas, e depois construídas pelos plica e justifica o curso das ações atuais na
nossos engenheiros e técnicos. E, muito direção da parceria com a França que pre-
relevante registrar, a Barroso resulta da in- vê, além da construção de quatro conven-
clusão de aperfeiçoamentos exatamente cionais, ajuda e exercícios de projeto ao
derivados da experiência antecessora. final dos quais nossos engenheiros, so-
A alusão às corvetas torna-se pertinen- mando vivências, preparo e conhecimen-
te para fundamentar um paralelo com os tos prévios, poderão alcançar o nível ade-
submarinos, ainda que distante, tendo em quado de expertise para desenvolver o
vista que o acúmulo de experiências é sem- grande esforço de concepção do nuclear.
pre muito desejável e se aplica, igualmen- É necessário ter a dimensão perfeita do
te, às bases de aprimoramento de ambos passo que a Marinha e o País pretendem
os meios considerados. dar. Significa cruzar atalho fantástico e inu-
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O SUBMARINO NUCLEAR BRASILEIRO. UMA VISÃO
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O SUBMARINO NUCLEAR BRASILEIRO. UMA VISÃO
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O SUBMARINO NUCLEAR BRASILEIRO. UMA VISÃO
submarino que, com inabalável certeza, ao tados Unidos, cuja Marinha, na realidade,
cabo de alguns anos, vamos concretizar. cerceava ou, minimamente, não se mostra-
va preocupada em transferir conhecimen-
POR QUE UM SUBMARINO tos, as tripulações brasileiras não eram con-
NUCLEAR? templadas com o adestramento possível e
nem travavam contato com os procedimen-
A motivação para a obtenção de uma tos de emprego que, embora pudessem
razoável parcela de submarinos na compo- corresponder à rotina habitual para uma
sição do Poder Naval brasileiro decorre de força de submarinos de Marinha de primei-
tradicional identificação da MB com o em- ro mundo, certamente representariam vali-
prego destes meios, desde o distante 1914, osas novidades para nós.
ocasião da chegada ao País do primeiro Assim, sem qualquer desdouro àqueles
classe “F”, quando tudo começou. que em fase anterior muito ajudaram a es-
Após período inicial atrelado à obten- crever a saga da Força de Submarinos da
ção de submarinos fabricados na Itália, o atualidade, foram certamente os novos cur-
intenso fluxo de transferência de meios de sos, adestramentos e exercícios no mar, que
origem americana nos anos 60 e 70, inicial- se aproximavam dos limites máximos das
mente “Fleet-Types” e, em continuidade, verdadeiras condições de combate, reali-
os “Guppies”, cujo significado do acróstico zados com a Marinha britânica durante o
era “Great Underwater Propulsion Power”, recebimento dos Oberon, que forjaram uma
correspondendo, literalmente, a um sensí- nova mentalidade de emprego que rapida-
vel acréscimo de desempenho de motores, mente se espalhou e contagiou todos os
geradores e capacidade das baterias, a For- submarinistas brasileiros.
ça de Submarinos experimentou uma fase Em estágio adiante, durante a obtenção
em que chegou a alcançar o acervo expres- da nova classe Tupi, recebida sem repetir
sivo de dez submarinos. as condutas de natureza operativa empre-
Contudo, o episódio pregresso de mai- gadas nos classe Humaitá, os conhecimen-
or significado e impulsão em termos quali- tos adquiridos já estavam incorporados,
tativos que resultaram em aprimoramentos bastando ajustar procedimentos à nova
no emprego tático do meio ocorreu quan- plataforma, quando necessário.
do, ainda na segunda metade da mesma Outro ponto facilitado pela conjuntura
década de 70, chegaram ao Brasil os sub- e decorrente do estabelecimento de novos
marinos Oberon da classe Humaitá. níveis de exercícios no mar agora, diferen-
A possibilidade da realização de intensos temente de tempos de outrora, foi o fato de
e extenuantes exercícios, conduzidos na In- que a Esquadra passou a alocar meios em
glaterra sob a supervisão direta dos rigoro- pleno benefício do adestramento dos sub-
sos inspetores da Royal Navy, ao longo de marinos. Este aspecto, que se tornou sis-
processo de adestramento chamado de work- temático e foi incorporado à rotina, sem
up, terá sido, provavelmente, um divisor de sombra de dúvidas contribuiu decisiva-
águas para lançar os submarinistas a um pa- mente para consolidar a desejável e hoje
tamar de conhecimento de emprego tático da destacada capacidade de emprego tático
arma sem precedentes na história da Força dos nossos submarinos.
de Submarinos da Esquadra. O esmerado culto ao adestramento, o
Enquanto estivemos limitados ao rece- emprego seguro e taticamente correto, além
bimento dos robustos submarinos dos Es- dos elevados parâmetros de desempenho
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O SUBMARINO NUCLEAR BRASILEIRO. UMA VISÃO
exigidos dos oficiais submarinistas em ge- sam maiores considerações sobre sua im-
ral e, em especial, dos futuros comandan- portância, a não ser lembrar que as LCM
tes de submarinos, germinam estimulando são preservadas pela existência e atuação
o pensamento nativo e fazem prosperar de um Poder Naval compatível.
aprimoramentos. Logo isso se torna con- Ademais, e constitui outra vulnera-
creto e bem evidenciado pelos resultados bilidade que merece atenção, a produção
apresentados e sucessos colhidos em ope- nacional de petróleo está praticamente toda
rações no mar. concentrada no mar, na plataforma conti-
Estavam, portanto, criadas as condições nental brasileira, de onde são extraídos mais
para o efetivo crescimento, valorização e 1,6 milhão de barris por dia, que ao ano
importância dos submarinos como parcela superam o valor de 45 bilhões de dólares.
fundamental da nossa Esquadra e, em deri- Com as recentes descobertas das formi-
vada primeira, do Poder Naval brasileiro. dáveis reservas do pré-sal, que chegam a
Chegava a hora adequada para os momen- alçar o País entre os maiores detentores de
tos que hoje vivemos, quando a lúcida vi- campos de óleo e gás em todo o mundo,
são do Comando da Marinha resolve bus- mesmo que considerando estimativas ini-
car ferramentas para a construção do pri- ciais conservadoras, este quadro passa a
meiro submarino nuclear brasileiro. Em ou- ser pintado com cores muito mais vivas e
tras palavras: foi adotada a decisão, sob a até preocupantes diante de tamanha rique-
ótica do emprego do meio, de evoluir da za, que, indiscutivelmente, recomenda a
“Estratégia de Posição” para a “Estratégia existência de instrumentos que contribu-
da Mobilidade”! am para desencorajar qualquer tipo de ação
Não deve haver controvérsias sobre a aventureira que possa ameaçar a integri-
conveniência e mesmo imperiosa necessi- dade desse patrimônio.
dade da existência de um Poder Naval ade- Os recursos minerais marinhos repre-
quadamente dimensionado para país que sentam outro tema importante, uma vez que
possui litoral de mais de 8 mil quilômetros exprimem grande filão econômico. Japão e
de extensão e uma área marítima de sobe- Nova Zelândia extraem magnetita do mar.
rania econômica superior a 4 milhões de Há tempos que Indonésia, Tailândia e
quilômetros quadrados, hoje conhecida Malásia exploram os depósitos de
como Amazônia Azul, tendo em vista a sua cassiterita em suas plataformas continen-
equivalência ao território da renomada tais, sem contar a exploração de ouro feita
Amazônia Verde, além da consideração nas praias do Alasca e no Oregon, nos
dos paralelos que podem ser estabeleci- EUA. França, Inglaterra, Holanda e Dina-
dos entre os valores das riquezas que marca também se destacam na exploração
ambas encerram. de granulados (cascalhos, areias e argilas)
Pela Amazônia Azul transitam mercado- usados na fabricação de cerâmicas e na
rias que superam 95% da totalidade do co- construção civil.
mércio exterior praticado pelo Brasil, qua- Outras potencialidades, como os nó-
se todo dependente de extensas linhas de dulos polimetálicos no leito do mar, tam-
comunicações marítimas (LCM), cujo sig- bém devem ser consideradas, a despeito
nificado para a economia nacional corres- de serem menos tangíveis, posto que sua
ponde a quase 300 bilhões de dólares/ano, exploração ainda se revela economicamen-
cerca de ¼ do nosso Produto Interno Bru- te inviável. Eles são constituídos de con-
to, cifras que de tão expressivas dispen- centrações de óxidos de ferro, manganês,
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O SUBMARINO NUCLEAR BRASILEIRO. UMA VISÃO
níquel, cobre e cobalto e apresentam am- Por outro lado, ainda falando das esca-
plas perspectivas de futura viabilização ramuças do mesmo conflito, agora da ou-
de aproveitamento. tra parte, bastou a ameaça de ataques de
Todos esses aspectos, associados à submarinos argentinos para que um gran-
grandeza das dimensões envolvidas e à de esforço e dispendiosas medidas de de-
complexidade das tarefas impostas para a fesa fossem impostas, obrigando a adoção
preservação da soberania e a manutenção de inúmeras ações de cautela, que, entre
dos interesses nacionais brasileiros em área outros aspectos, reduziram muito o grau
marítima tão vasta e valiosa, remetem à ne- de liberdade de operações das forças de
cessidade de um Poder Naval que possa superfície britânicas.
apresentar capacidade de resposta efetiva Estes, indubitavelmente, são exemplos
a quaisquer ameaças, mesmo aquelas recentes do inusitado conflito anglo-argen-
difusas ou subjetivas. Estamos falando, tino ocorrido no Atlântico Sul. Inesperado
portanto, de capacidade dissuasória! e emblemático, posto que deixa claro que
A Estratégia Nacional de Defesa, docu- diante de certas controvérsias o uso da
mento de mais alto ní- força para a preserva-
vel recentemente ção de interesses
aprovado, estabelece A Estratégia Nacional de pode vir a ser inevitá-
que o Brasil deve ado- vel via de solução.
tar como opção de de- Defesa, documento de mais Mas é exatamente
fesa nacional a Estra- alto nível recentemente a estratégia da dis-
tégia de Dissuasão.
Isto, vale dizer, signi-
aprovado, estabelece que o suasão, documen-
tadamente adotada
fica obter nível ade- Brasil deve adotar como pelo Estado brasileiro,
quado de deterrência, opção de defesa nacional a que constitui o feliz
cujo efeito mais persis- paradoxo a assegurar
tente pode ser tradu- Estratégia de Dissuasão que o confronto mili-
zido como a redução tar sempre tende a ser
da probabilidade da ocorrência de ações evitado, uma vez que quanto mais bem su-
hostis, sejam elas de quaisquer origens, ficientemente preparadas e poderosas es-
uma vez que a avaliação do risco da retali- tiverem as partes envolvidas menor será a
ação passa a ser demasiado elevada para o probabilidade do afastamento da negocia-
agres-sor, em face do poder do oponente ção pela via diplomática, em alternativa
que seria agredido. daquela que deságua no emprego da força,
Ao encontro dessa linha de raciocínio opção que passa a constituir a mais teme-
pode ser apresentado o oportuno exemplo rária e temida.
do conflito pelas Ilhas Falklands/Malvinas, Destaca-se aí, nos desdobramentos da
quando a confirmação da presença de um estratégia da dissua-são, a imprescindível
único submarino nuclear britânico nas recomendação para a obtenção de meios
águas ao largo da costa argentina, após o que fortaleçam a atual capacidade da For-
afundamento do ARA Belgrano, obrigou ça de Submarinos da Marinha do Brasil.
os navios de superfície daquela Armada a O Plano Estratégico da Marinha con-
manterem-se abrigados nos portos, diante templa um número maior de submarinos do
da possibilidade de novos ataques que que aquele que nossa Esquadra hoje pode
poderiam levar a custos inaceitáveis. contar. A justificar essa proposta, está a
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O SUBMARINO NUCLEAR BRASILEIRO. UMA VISÃO
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O SUBMARINO NUCLEAR BRASILEIRO. UMA VISÃO
nhecida e respeitável credibilidade ao país nas proximidades da Nuclep, que será res-
que possui tal meio no acervo do seu Po- ponsável pela construção de todos os cas-
der Naval. cos resistentes, e encontra, ao fundo de
Portanto, todo esse conjunto de circuns- terreno de boas dimensões, encosta alta e
tâncias fortalece os argumentos que reco- firme constituída pelo prolongamento de
mendam e justificam ao país contar com sub- pedreira que se estende do lado oposto,
marinos táticos de propulsão nuclear, vetores configurando bom abrigo natural se consi-
emblemáticos da capacidade dissuasória de derada a hipótese de qualquer acidente de
um Poder Naval que pretende preservar seus natureza radioativa, enquanto que o aces-
soberanos interesses no mar. so ao mar é assegurado por canal de sufici-
ente profundidade que também já serve ao
OUTRAS CONSIDERAÇÕES vizinho porto de Itaguaí.
RELEVANTES Evidentemente, só após o primeiríssimo
passo da efetiva realização das obras de
A concepção do sondagens e levanta-
novo estaleiro e da mentos geológicos do
nova base terá que in- Além da construção de novo terreno de interesse
corporar atributos di- será possível confir-
retamente relaciona- estaleiro e base de apoio mar todas essas ex-
dos com a planta de dedicados aos submarinos, pectativas favoráveis.
propulsão do novo Além da constru-
submarino, que, além
será muito importante ção de novo estaleiro
do apoio e cuidados cuidar da formação e do e base de apoio dedi-
específicos ao reator e preparo do pessoal, ponto cados aos submari-
acessórios correlatos, nos, será muito impor-
exige o cumprimento igualmente de grande tante cuidar da forma-
das normas legais que impacto para a MB ção e do preparo do
regulam o trato com pessoal, ponto igual-
sistemas de geração mente de grande im-
de energia por meio da fissão nuclear. pacto para a MB.
A começar, a aprovação do local passa Isso passa pelo grupo de engenheiros
pelo atendimento obrigatório das condicio- que nos próximos anos estará diretamente
nantes e características hidrogeológicas envolvido com o projeto e a construção
que satisfaçam a todos os postulados dos classe Scorpene, forjando e adquirin-
ambientais e de segurança previstos e exi- do o conhecimento necessário para a con-
gidos pelo conjunto de órgãos (Ibama e cepção do projeto do submarino com pro-
Cnen) legalmente encarregados da conces- pulsão nuclear que surge logo adiante.
são das licenças devidas para início e pros- Ao lado dessa providência se torna es-
seguimento da obra. sencial pensar na seleção e na instrução
Tudo indica que, dentre as diversas alter- específica para oficiais e praças submari-
nativas cogitadas pela MB, a escolha deve nistas que deverão ser formados para o
recair sobre terreno na Ilha da Madeira, den- guarnecimento do submarino. Certamente
tro da Baía de Sepetiba, Rio de Janeiro. a formação ora adotada pelos franceses e
Se for assim, a opção será muito feliz, até os processos empregados por outras
uma vez que posiciona o futuro complexo Marinhas que operam S(N) poderão servir
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O SUBMARINO NUCLEAR BRASILEIRO. UMA VISÃO
N.A. 2: A França possui um sistema semelhante ao Tacamo, conhecido como Avion Station Relais de
Transmissions Exceptionnelles. Enquanto os americanos operam com plataformas E-6A Prowler,
os franceses utilizam aeronaves Transall C-160H.
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O SUBMARINO NUCLEAR BRASILEIRO. UMA VISÃO
BIBLIOGRAFIA
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A ESTRATÉGIA DO IMPERADOR: AUSTERLITZ E TRAFALGAR
NO CONTEXTO ESTRATÉGICO DE NAPOLEÃO
SUMÁRIO
Introdução
A estrada da glória
Na poeira de Austerlitz
Trafalgar
A grande aposta
A geopolítica sobre Napoleão
Conclusão: a natureza de seu inimigo
ram as armas francesas a uma das maiores zendo severas reformas, como o Código
vitórias militares da História, nas colinas Civil, uma amálgama de leis que protegiam
gélidas de Austerlitz, naquele fatídico de- a propriedade. Também incentivou a ma-
zembro de 1805, e o que sobreveio. Não é nufatura interna, um programa de obras
uma revisão histórica o que pretendemos públicas e a reforma da educação. Num
aqui, mas confrontar Napoleão, o guerrei- édito fantástico, baniu a Marselheuse, o
ro, com o imperador corso dos franceses, o hino dos infantes revolucionários. Conso-
estadista. lidava uma revolução burguesa sem fazer
uma revolução social. Em suas próprias
A ESTRADA DA GLÓRIA palavras, “a revolução estava encerrada”.
No Consulado, ele manejou para tornar-
Bonaparte tornou-se cônsul-geral da se absoluto de fato. A Revolução Burgue-
França em 1799, num episódio imortalizado sa que negociou com a grande burguesia
como O 18 Brumário pelo calendário da nacional demandava um governo forte.
Revolução, ou O 9 de Novembro. Notável Esse governo deveria ser legitimado pelo
que seu sucesso político tenha advindo povo. Assim, foi decidido um plebiscito no
ao meio de um revés militar. qual o povo se manifestaria a favor ou não
Mais uma vez, uma coligação de monar- do Império. Vencedor por uma margem
quias europeias se alinhou contra a Fran- “alargada”2, marcou sua entronização.
ça. Bonaparte empreendeu uma campanha Ao tronar-se monarca absoluto em 2 de
militar no Egito. Vencedor da Batalha das dezembro de 1804, apenas fechava um cír-
Pirâmides, soube das articulações em casa culo. Havia vencido a oposição interna, dis-
para acabar com o Diretório. Preparou sua solvido a ameaça externa derrotando a Coli-
volta imediata. Naquela ocasião, suas co- gação, sedimentado as reformas burguesas
municações foram cortadas pela vitória da e assumido a “paternidade” da revolução,
Armada inglesa do Almirante Nelson so- que passou a educar a sua maneira. Ao es-
bre a francesa em Abukir. Mas chegou à colher o título de imperador, que na Roma
França, praticamente “escapado” a bordo Republicana era dado aos tiranos que ocu-
de uma solitária fragata, que quase fora in- pavam simultaneamente o governo e a lide-
terceptada. Ao botar os pés em solo pátrio, rança militar, como os césares antes dele,
foi aclamado pelo público e renegado pela Napoleão militarizava o Estado. Mas para
direção política. Num golpe de mão muito que a militarização se legitimasse era preci-
tributável ao seu irmão Lucien, apoderou- so um estado de ameaça permanente.
se do comando do Estado, dissolvendo a Napoleão, que proclamara a “revolução
baionetas a Assembleia Nacional1. como encerrada”, passou a propagar a ideia
Soldado carismático e arrojado, não he- de que ainda havia povos que não a tinham
sitou em atacar o centro do problema, fa- experimentado, e por isso deveria ser expan-
1 Esse episódio foi quase cômico. Bonaparte apresentou-se ao plenário, que o enxovalhou e enxotou sob
os gritos de “fora tirano”. No meio do caminho da saída, seu irmão apareceu e o fez retornar. Dessa
vez, com uma companhia de infantes à sua frente, que inflectiu furiosamente contra os deputados,
fazendo-os fugir em desespero de causa. No dia seguinte, retornou ao plenário para assumir um
triunvirato de fachada, tendo ele como cônsul-geral.
2 Napoleão realmente venceu o plebiscito, mas ordenou torcer o resultado de uma maneira, no mínimo,
curiosa. A votação foi corporativa, isto é, em setores sociais. Ao perceber que vencera no Exército,
o Grande Armée, pela menor margem, ordenou que se “permutassem” os números. Afinal, como um
imperator poderia ser menos ratificado em seu exército?
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A ESTRATÉGIA DO IMPERADOR: AUSTERLITZ E TRAFALGAR NO CONTEXTO ESTRATÉGICO DE NAPOLEÃO
dida aos demais habitantes da Europa. Era a do”, animava-os ao nacionalismo, extrema-
primeira edição da revolução permanente3. do pela sucção dos recursos nacionais e
Nisso foi muito ajudado pela hostilidade e pela desastrosa ação de seus insossos
pelo belicismo das demais monarquias agentes. Abriu mão de um grande império
europeias, o que permitiu que mantivesse um colonial em favor de uma obtusa política
constante estado de guerra, um exército leal de conquista.
e mobilizado e um povo cativo em seu nacio- Diagnosticando corretamente a Ingla-
nalismo enviesadamente universalista. Con- terra como epicentro da coligações
tudo, Napoleão deixou que sua obsessão europeias, Bonaparte surpreendeu pela ana-
pela beligerância obliterasse seu argumento crônica visão de capitão, tomando todas
reformador. as medidas necessárias para fazer face, mas
Ainda cônsul, vendeu a colônia france- pouco compreendendo a natureza de sua
sa da América do Norte, a Luisiana, aos oposição. Preparou a invasão das ilhas bri-
Estados Unidos como forma de fazer caixa tânicas, recorrendo a qualquer ideia
para as suas reformas e sua política milita- alucinada que lhe caía nas mãos para trans-
rista. Em seu favor, mesmo que conseguis- por o canal com seu exército – de submari-
se uma Marinha para garantir as comuni- nos, passando por balões e até um
cações com o conti- suspeitíssimo túnel
nente americano, não sob o Canal Inglês, li-
poderia lá manter um Napoleão deixou que sua gando Calais a Dover.
Exército forte o bas- Contudo compreen-
tante para evitar o as- obsessão pela beligerância deu que a maneira
sédio dos ingleses ou obliterasse seu argumento mais coerente era neu-
a sanha expansionista tralizar a ameaça naval
da jovem nação ameri-
reformador inglesa. Não sendo
cana sem que se ame- marinheiro, deixou a
açasse a sua posição na Europa. Porém a tarefa a outros e seguiu nos preparativos.
decisão da venda denota uma visão sinuo-
sa da Grande Estratégia. A estratégia de NA POEIRA DE AUSTERLITZ
Estado não se limita a cálculos militares.
Doutro lado, o imperador procurou Em meados de 1805, um grande contin-
gestar seu Império com parâmetros nas ins- gente do Grande Armée começou a con-
tituições do Velho Regime, ainda que pro- centrar-se no porto da região de Boulogne,
pagando o Código Civil e as agências bur- enquanto Bonaparte fazia arranjos diplo-
guesas. Fez de suas irmãs princesas e de máticos para juntar a frota espanhola a sua
cunhados e generais próximos, príncipes – armada de invasão à Inglaterra. Juntas eram
vários deles saídos da sargentada, onde uma força formidável. Porém a Royal Navy
os recrutou mais pela capacidade de lhe tinha capacidade tanto para obstar uma
obedecerem do que por qualquer invasão quanto para ameaçar o território e
genialidade que possuíssem – e regentes as comunicações inimigas. Os cooperati-
de estados satélites da França. Desse vos espanhóis insistiam na eliminação des-
modo, ao invés de conquistar os povos sa ameaça antes da campanha. Napoleão
dos países que ia invadindo e “libertan- aquiesceu.
3 Leon Trotsky nada “criou”. Mas foi, sem dúvida, um excelente aluno de História.
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A ESTRATÉGIA DO IMPERADOR: AUSTERLITZ E TRAFALGAR NO CONTEXTO ESTRATÉGICO DE NAPOLEÃO
Nesse meio tempo, uma nova coligação entregar Viena às forças francesas. Os mi-
se formou, e pretendia ameaçar diretamen- lhares de canhões de bronze inimigos cap-
te a França. Informado, Napoleão abando- turados foram conduzidos à França, onde
nou a concentração de invasão e moveu seriam fundidos para construção de um
seu exército para o interior. Sua estratégia grande monumento em homenagem a essa
era desbaratar as forças inimigas antes que vitória épica, com uma estátua de Bonaparte
se concentrassem. O primeiro alvo foi a bem no topo. Na noite fria após a batalha,
Áustria. os soldados franceses entoaram a
Após uma marcha forçada de seis se- Marselheuse. O imperador permitiu e a res-
manas, os franceses alcançaram as tropas tituiu como o Hino Nacional francês.
do General Carl Mack. Numa batalha curta E, novamente, sua vitória se obscure-
mais intensa, os franceses fizeram 27 mil ceu num fracasso militar.
prisioneiros. Aberto o caminho para Viena,
austríacos e russos concentraram um exér- TRAFALGAR
cito de 90 mil homens para barrar Napoleão,
que, com uma formação de 60 mil, partiu Enquanto Napoleão dirigia-se para o
para o encontro. Os opositores se confron- encontro com Carl Mack, a frota aliada fran-
taram na localidade de Austerlitz. cesa e hispânica desenvolvia o plano para
Aquela prometia ser uma batalha épica. neutralizar a armada inglesa.
Era o conflito de três monarcas. De um lado A armada dos aliados partiria para as
Napoleão, o plebeu que se fez imperador, e colônias francesas nas costas das Anti-
do outro Francisco I da Áustria e o jovem lhas, atraindo parte da força de bloqueio
Alexander I, czar da Rússia. O comandante inglesa. Ao atingir seu destino, a frota alia-
nominal da coligação era o general russo da faria junção com a frota colonial, e ambas
Kutuzov. Contudo, o czar insistia em tomar dariam meia-volta em direção à Europa. Lá
as decisões. Diante da mais fina nobreza, chegando, com uma força superior, destrui-
Alexander não poderia recuar frente ao atre- riam a força inglesa de bloqueio e trans-
vido imperador corso. portariam a força de invasão postada em
Napoleão rompeu as regras do combate Bologne para as costas inglesas.
mais uma vez. Entregando a posição mais A armada aliada de “embuste” seguiu os
elevada ao inimigo, o Monte Pratzen, deu- planos à risca. Reuniu-se à frota colonial e
lhes uma sensação de segurança falsa. esperou a chegada da força de perseguição
Quando os russos tomaram o monte, con- inimiga. Tão logo se fez o contato, a frota
tra-atacou, transpondo a posição e desem- aliada partiu para a Espanha. O almirante
bocando ao centro das linhas da coliga- francês supôs que o estratagema funciona-
ção. A contundência do avanço francês fez ra, pois perdeu o contato com os persegui-
os russo debandarem, e toda a linha inimi- dores, imaginando que não perceberam a
ga se desfez. Nessa batalha de poucas ho- manobra ou, partindo a posteriori, não o
ras, os franceses perderam 6 mil e os coli- perseguiam. Contudo, semanas depois,
gados 19 mil, não contando os feridos, os quando as duas armadas aliadas se
capturados e os que debandaram. conectaram, foram surpreendidas por uma
“Diga ao seu imperador que ele realizou frota inglesa completa, esperando perto da
grandes coisas hoje”, disse Alexander ao entrada do Canal Inglês (Mancha). Não ape-
emissário de trégua de Napoleão. Francis- nas os ingleses se aperceberam do que acon-
co I retirou-se do campo para, mais tarde, tecia, como fizeram a meia-volta e chegaram
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A ESTRATÉGIA DO IMPERADOR: AUSTERLITZ E TRAFALGAR NO CONTEXTO ESTRATÉGICO DE NAPOLEÃO
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A ESTRATÉGIA DO IMPERADOR: AUSTERLITZ E TRAFALGAR NO CONTEXTO ESTRATÉGICO DE NAPOLEÃO
4 Não é correto denominar a resistência espanhola de guerra de guerrilha. Não se limitava a táticas
furtivas e da surpresa, com emboscadas e ataques de oportunidade. Assessorados e supridos pelos
ingleses, os espanhóis procuravam criar várias frentes de luta, deslocando as tropas inimigas e
evitando a sua concentração com táticas variadas e até pouco ortodoxas.
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A ESTRATÉGIA DO IMPERADOR: AUSTERLITZ E TRAFALGAR NO CONTEXTO ESTRATÉGICO DE NAPOLEÃO
levante prussiano consumiram o que res- cariam fora de um combate, mesmo com as
tava das forças de Bonaparte. O “atoleiro escoltas em número superior, pois os com-
peninsular” e a retirada de Moscou – sem bates navais eram muito próximos, corpo a
que Napoleão tivesse sofrido nenhum re- corpo. As rotas eram bem inflexíveis, dan-
vés em campo de batalha singular – deram do a uma Marinha adversária duas opções:
mostra do Grande General, tanto por su- dispersar-se para localizar e abater suas
bestimar seus inimigos quanto por supe- presas, ou assestar-se defronte dos por-
restimar a si mesmo. tos principias.
Três tarefas confrontavam a esquadra
“Onde Estão minhas Legiões”5 francesa: proteger as comunicações litorâ-
Cezar Otávio Augustos neas; defesa dos portos bloqueados; e ata-
car a navegação do inimigo que vivia do
Napoleão aprofundou a revolução militar mar. A fragata de um ou dois costados se
de sua época. Conhecia a tática e a psicolo- desempenhava melhor na tarefa6: como
gia de seus inimigos aristocratas, mas falhou corsário, podia acossar os mercantes len-
no quesito da grande estratégia. O fez por tos; como escolta, podia opor-se aos seus
etapas, percalços e sem se aperceber. equivalentes ou confrontar navios maio-
Após Trafalgar, não abandonou a ideia res, permitindo a fuga dos mercantes; como
de vencer no mar. Menos de três anos após incursor rápido, ameaçar a costa e portos
a derrota, a Marinha da França estava re- inimigos; ou, simplesmente, servir às co-
composta, ainda que não pudesse contar municações da esquadra, numa época de
com a armada espanhola. A esquadra de ausência total da virtualidade.
linha chegou a superar a inglesa em núme- O custo operativo acabou pesando para
ros, mas a sua fraqueza estratégica era no- a Marinha da França ao longo da guerra.
tável. O comando francês estava disperso, Navios de linha, de grandes equipagens e
e se perderam tripulações e lideranças após construção demorada e cara, eram de ma-
1805. Os navios de linha eram os cavalos nutenção proibitiva. As tripulações preci-
de batalha errados para a estratégia do Blo- sam treinar o que requer tempo e munição.
queio Continental. Com o tamanho da Grande Armée e a ca-
O comércio na era da vela, nos estertores rência de recursos, produziu-se no mar um
da revolução industrial, obedecia a uma desenho de força sem decisão visível.
logística muito complexa e fluida. Os por- Ao optar pela intimidação como estra-
tos e os navios não estavam adequados a tégia política, Napoleão seguiu um rito su-
um fluxo concentrado, contínuo e rápido mário, mas não inédito, tanto no argumen-
requerido em tempos de guerra. Isso difi- to quanto nos resultados. Do mesmo modo
cultava a manobra de comboio. Concen- que os atenienses contra os espartanos
trar uma armada para fins de escolta ape- (Guerra do Peloponeso) ou os genoveses
nas desfalcava outros cenários. A prote- contra os venezianos (século XV), equivo-
ção dos navios era operosa pela condição cou-se ao transformar um parceiro comer-
do desenho dos barcos. Bem mais lentos e cial, neutro, num inimigo. Abusou de igno-
desarmados, os mercantes dificilmente fi- rar a força comercial-diplomática inglesa (a
5 Foram as palavras do primeiro imperador romano quando soube da perda de três de suas legiões de elite
da Germânia, em 9 d.C.
6 Os ingleses costumavam usar pequenas flotilhas de fragatas em pacotes combinados de um ou mais
navios de linha.
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A ESTRATÉGIA DO IMPERADOR: AUSTERLITZ E TRAFALGAR NO CONTEXTO ESTRATÉGICO DE NAPOLEÃO
mesma que tentava desbaratar com a es- sudeste da Inglaterra no século XII às in-
tratégia do Bloqueio), a capacidade militar cursões inglesas à França nos séculos XIII
da Royal Navy (que experimentara em e XIV, e na Guerra dos Cem Anos no século
Trafalgar), e a fluidez da aristocracia que XV. Estabelecidas as respectivas monarqui-
tanto desprezava, a qual não se furtou em as nacionais, o clima de guerra não dimi-
abandonar seu próprio país – não antes de nuiu. A Reforma Protestante opôs, de um
realizar um butim até nos monumentos de lado, uma monarquia católica na França, e
Lisboa, fugindo para as suas colônias e lá de outro lado, a monarquia protestante in-
perpetrando um novo butim para os senho- glesa, por sua vez seccionada entre um
res britânicos7. anglicanismo oficial e o calvinismo sectá-
“Onde estão meus 200 mil hussardos rio. O rei Carlos I, na tentativa de solver o
gelados?”8 Ao retornar da Rússia, em 1813, problema na busca de uma monarquia es-
Napoleão completava um cíclo de respos- tável, casou-se com uma nobre francesa.
tas equivocadas pelo sucesso. Ao imagi- Mas acabou por agravar sua política inter-
nar que poderia contornar os obstáculos na, desgastada pela guerra na Irlanda e a
com rápidas e fulminantes campanhas mili- falência do Estado. Desembocou numa
tares, repetia o lendário General Pirro em guerra civil. Tentando construir um gover-
escala devastadora. Talvez julgasse que, no absolutista num país onde, desde a Car-
ao contrário daquele, sempre teria exérci- ta Magna e as reformas de 1265, o poder
tos para lutar ou inimigos que pudesse civil se equiparava ao real, Carlos acelerou
abater. o fim da própria monarquia, sucedida pela
ditadura de Cromwell.
A GEOPOLÍTICA SOBRE NAPOLEÃO A partir da segunda metade do século
XVII, impulsionada pelas reformas de
A originalidade e a heterodoxia de Cromwell, França e Inglaterra saíram de
Bonaparte estavam muito na conta de sua uma disputa transnacional para uma aber-
erudição militar, personalidade e destreza ta rivalidade internacional, uma hostilida-
como grande “capitão”. Suas opções estra- de mútua incansável que dividiria a Euro-
tégicas, se inteiramente arroladas por ele ou pa. Os ingleses encontrariam nos
não, mas de sua inteira responsabilidade, prussianos seus parceiros ideais, enquan-
derivavam menos de ensaio e erro do que to a França se aliaria a qualquer um que
do histórico das relações franco-saxônicas. estivesse disposto a cerrar fileiras contra
Criado numa tradição militar monárquica, os britânicos.
estrangeiro entre seus pares, Bonaparte as- No século XVIII, as duas superpotênci-
sumiu uma nação tradicionalmente “posses- as da Europa envolveram-se em sucessivas
sa” com seus vizinhos ingleses. guerras no continente, a maioria de inspira-
Durante cerca de 300 anos, franceses e ção duvidosa, que culminariam com uma
ingleses estiveram em constante refrega, autêntica guerra mundial: a Guerra dos Sete
animados pelas disputas territoriais das Anos (1756-1763). Praticamente todas as
casas nobres: da ocupação normanda do monarquias ocidentais e a Rússia se envol-
7 No Brasil, além de criar o Banco do Brasil para sugar os recursos da colônia, D. João vendeu títulos de
nobreza a uma ridícula fração da elite colonial “deslumbrada”, para fazer caixa de seus “compromis-
sos”.
8 Na verdade, Napoleão deixara 70 mil deles mortos fora do gelo em Mayaroslavsky, na sangrenta
retirada de outono.
veram, sendo a guerra levada a todos os Marinha aristocrática, porém bem mais pro-
oceanos e todas as colônias. A vitória anglo- fissional. Embora a Marinha francesa te-
prussiana deixou a Inglaterra como senhora nha sofrido uma reforma estrutural quase
dos mares, maior império colonial de qual- simultânea à inglesa11, a Royal Navy obri-
quer tempo. Mas longe de cessar a disputa. gou-se a uma linha de promoção mais por
Em 1775, eclodiu a revolta nas 13 colô- mérito que por nascimento, principalmente
nias inglesas da América. No ano seguin- após a derrota na América e a Revolta dos
te, as colônias declararam sua independên- Marinheiros em 1797. A devastação do co-
cia e começou a guerra. A Coroa da França, mando naval francês foi bem menor que no
convencida pelo inadvertido entusiasmo Exército, porém foi imposta uma mentalida-
do Marquês de Lafaiete, envolveu-se no de jacobina somente removida com
conflito do lado dos sediciosos yankees. Napoleão, que pouco ou nada se envolveu
Os franceses obtiveram uma vingança com- com os assuntos navais.
pleta, pois não apenas ajudaram a derrotar Bonaparte confrontou-se com exércitos
seu inimigo como obtiveram uma vitória comandados de uma mentalidade aristocrá-
estratégica no mar 9. tica e feudal, que con-
Porém a Paz de Paris trastava com as fileiras
em 1783 selou o desti- No mar, isso não refletiu mistas de servos cam-
no da monarquia fran- poneses ou mercená-
cesa. Falida e incapaz
como o esperado. O rios. A vontade de lu-
de lidar com as contra- Império napoleônico tar e a lealdade dessas
dições da ordem enfrentava uma Marinha legiões muito se apoi-
estamental estabele- avam na força da tra-
cida desde o Édito de aristocrática, porém bem dição ou na “bolsa”. A
Nantis (1588), foi da mais profissional Revolução mudou o
crise à revolução em tom ao inculcar a “de-
apenas seis anos. fesa da pátria, do
A Revolução Francesa de 1789 não ape- povo”; o Consulado exaltou a defesa da
nas foi um marco na História ocidental Nação; e o Império, a defesa da Libertação.
como criou uma nova realidade estratégi- As vitórias do Grande Armée não estavam
ca. O comando militar aristocrático foi var- apenas no gênio de seu grande “capitão”
rido da França10. A guerra contrarrevolu- ou na fleuma dos voluntários franceses. A
cionária que se seguiu fez surgir a ideia da determinação de vencer residia igualmente
nação em armas, que permitiu que a ascen- na munição ideológica que precedia as cam-
são militar de outros talentos – como panhas bonapartistas, no agito revolucio-
Bonaparte, um então obscuro oficial de ar- nário que semeou adeptos e floresceu mes-
tilharia – mais amoldados a esse tipo de mo após a partida de Napoleão.
guerra. O campo de batalha mudara. Ironicamente, a mesma “munição ideo-
No mar, isso não refletiu como o espera- lógica” desvaneceu-se nas desídia do Im-
do. O Império napoleônico enfrentava uma pério, ou encontrou nos ingleses uma von-
9 De fato, não apenas negaram aos ingleses uma batalha decisiva como, apesar das perdas, puderam
manter as comunicações rebeldes e atacar as britânicas.
10 Antes da revolução, um em cada 30 oficiais generais era da nobreza. Esse número se inverteu em 1791.
11 A reorganização da estrutura e dos regulamentos da Marinha inglesa ocorreu com Samuel Pepys em
1683. A francesa, em 1701.
tade nacional quase tão dura e assentada a partir do século XV. O povo, após uma
num poder civil à altura dos ideais sucessão de conflitos nobiliários pela Co-
libertários. As fileiras da oposição cerra- roa, pagou com sangue o direito de se pôr
ram-se num ar de quase salvacionismo12 em armas. Com a Guerra Civil de 1643, a milí-
diante de mais um conquistador que se er- cia ganhou corpo e se tornou The Army (O
guia no Velho Mundo. Era aquela velha Exército), colocando-se em pé de igualdade
história: não seria Bonaparte mais um tira- com o Parlamento que deveria representar e
no, afinal? proteger. Quando o Parlamento decidiu de-
bandar o Exército, a criatura voltou-se con-
CONCLUSÃO: A NATUREZA DE SEU tra o criador, e Cromwell impôs uma ditadura
INIMIGO que lançou a Inglaterra, definitivamente, no
mapa geopolítico da Europa.
A conta do sucesso de Napoleão não é A restauração dos Stuart procurou pri-
debitável apenas em sua genialidade, as- meiro se apossar e depois destruir a auto-
sim como não se pode deduzir seus fracas- nomia dessa corporação. O fim da monar-
sos pelo seu “gênio”. A importância e o quia de fato, com a Revolução Gloriosa,
paralelismo de ambos aprofundou o modelo
os eventos, Trafalgar que passou a ser de
e Austerlitz, não sur- Napoleão nada trabalhou uma força comandada
preende. O que chama para cessar os efeitos de por uma aristocracia
a atenção é a pereni- profissional prepara-
dade do aftermath nas sua derrota no mar, que da na Academia de
decisões estratégicas não terminou ou começou Sandhurst; uma tropa
do imperador. “multinacional”, aber-
A decisão de ir
em Trafalgar ta aos “não ingleses”
contra a Inglaterra pa- (escoceses, irlande-
rece ter sido baseada tanto na superesti- ses, galeses) mercenários ou aventureiros,
mação da Marinha Real, como atestou a súditos de sua majestade. Essa força, apoi-
estratégia do Bloqueio, quanto na ada pela Marinha Real, foi capaz de uma
subestimação da força terrestre inimiga. prolongada guerra de desgaste contra os
Correto estava Napoleão em estimar que franceses, de garantir o Império colonial
somente precisaria de “seis horas para cru- britânico e, ainda, de participar da derrota
zar o canal, derrotar os ingleses e levar final de Bonaparte, após seu regresso da
Josefina para passear nos corredores de Rússia e na Batalha de Waterloo13. O impe-
Bukingham”. O Exército britânico era uma rador corso da França, tão hábil em perce-
piada se comparado ao francês, porém a ber a nova “guerra nação” e os limites de
fortuna do Império Britânico não se assen- seus inimigos, não entendeu o que era lu-
tava apenas nele. tar contra um império insular apoiado numa
A Inglaterra nunca tivera um Exército tríade diplomática, econômica e militar.
nacional. Um longa tradição de regimentos A cada insucesso, Napoleão respondeu
feudais deu lugar às “milícias dos comuns” com a leitura de rara simplicidade de um
12 Na Inglaterra, tornou-se muito popular uma canção de ninar que dizia: “Cuidado, criança/vá logo
dormir/seja boazinha/ou o velho Bony [Bonaparte] virá te pegar.”
13 Lord Wellington, arquiteto da manobra aliada em Warterloo, fez sua carreira nas guerras coloniais da
Índia e no atoleiro francês da Campanha Ibérica.
BIBLIOGRAFIA
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KENEDY, Paul. A Ascensão e Queda das Superpotências, RJ, Campus, 1990.
REFERÊNCIAS
SUMÁRIO
Introdução
A Marinha na Estratégia Nacional de Defesa
Reaparelhamento da Marinha
Recursos para reaparelhamento e adequação
Submarinos convencionais e nucleares
Navios de superfície
Navio-aeródromo e Aviação Naval
Tendências para o futuro da Aviação Naval
Aviação de patrulha marítima
Desenvolvimento de novas aeronaves de patrulha
Emprego futuro de sistemas não tripulados
Armamento e sistemas de comando e controle
Conclusão
Tabela no 1
Tabela no 2
(*)
Trabalho submetido à Revista Marítima Brasileira em fevereiro de 2009. Atualização da palestra
apresentada pelo autor em seminário interno do Núcleo de Estudos Estratégicos da Universidade
Federal Fluminense (Nest/UFF), realizado na Fundação de Estudos do Mar (Femar) em 2/10/2008.
(**)
Especialista em Relações Internacionais, professor no Centro de Produção da Universidade do Estado do
Rio de Janeiro (Cepuerj), colaborador permanente do Centro de Estudos Político-Estratégicos da Escola
de Guerra Naval (Cepe/EGN) e da Revista Marítima Brasileira e membro do U.S. Naval Institute.
MARINHA DO BRASIL: PERSPECTIVAS
1
Cf. Presidência da República, Decreto no 6.703, de 18/12/2008 – Aprova a Estratégia Nacional de
Defesa (END) e dá outras providências (Brasília, 18/12/2008). Texto completo disponibilizado em
http://www.defesa.gov.br/.
2
Cf. Eduardo Italo Pesce & Iberê Mariano da Silva, “Perspectivas para a defesa em 2009”, Monitor
Mercantil, Rio de Janeiro, 13/2/2009, p.2 (Opinião). Cf. também Consulta Orçamentária da União,
Planilhas do Siafi 2005-2008. Dados disponibilizados em http://www.contasabertas.uol.com.br/.
3
Ibidem. Cf. também Regina Alvarez, “Crise reduz Orçamento em 25%”, O Globo, Rio de Janeiro, 28/1/
2009, p.3 (O País).
4
Cf. Presidência da República, Op. cit., p.12.
5
Ibidem, p.12.
6
Ibidem, p.12.
7
Ibidem, p.41. Cf. também Eduardo Italo Pesce, “Uma Esquadra para defender a Amazônia”, Monitor
Mercantil, Rio de Janeiro, 14/1/2009, p.2 (Opinião).
8
Cf. Pesce & Da Silva, Op. cit. Cf. também Pesce, Op. cit. Cf. ainda Eduardo Italo Pesce, “Uma Marinha
com duas Esquadras”, Monitor Mercantil, Rio de Janeiro, 18/9/2008, p.2 (Opinião). Cf. também
Eduardo Italo Pesce, “Uma Marinha para o Hemisfério Sul”, Monitor Mercantil, Rio de Janeiro, 18,
19 e 20/10/2008, p.2 (Opinião).
9
Cf. Presidência da República, Op. cit., p.14.
10
Cf. Roberto Gama e Silva, Estratégia de Defesa da Amazônia Brasileira (Rio de Janeiro, 14/2/2009).
Texto divulgado pelo autor na internet via correio eletrônico.
11
Cf. Pesce & Da Silva, Op. cit.
17
Ibidem.
18
Ibidem.
19
Cf. Diretoria Geral de Material da Marinha, Ordem do Dia n o 5/2008, de 26/09/2008 – Ativa a
Coordenadoria Geral do Programa de Desenvolvimento de Submarino com Propulsão Nuclear (Rio
de Janeiro, 26/9/2008). Disponibilizado em http://www.defesanet.com.br/. Cf. também Júlia Ennes
& Fernanda Guimarães, Marinha ativa construção de submarino nuclear no Brasil. (São Paulo, 29/
9/2008). Disponibilizado em http://www.dci.com.br/ e em http://www.panoramabrasil.com.br/.
20
Cf. Moura Neto, Op. cit. Cf. também Ennes & Guimarães, Op. cit. Cf. ainda R. Ruizree, “AIP: o Brasil
de fora?”, Segurança & Defesa 25 (93): 26-33 – Rio de Janeiro, 2009.
US$ 1,5 bilhão. O custo de construção das Estão sendo incorporados à Esquadra
unidades seguintes poderia ter uma redu- dois navios de desembarque de carros de
ção de até 15% cada. Analistas acreditam combate (NDCC) adquiridos à Grã-Bretanha:
que seriam necessários à Marinha do Bra- o Garcia d’Ávila (entregue em 2008) e o
sil pelo menos seis submarinos com pro- Almirante Sabóia (com entrega prevista
pulsão nuclear.21 para 2009).25 A incorporação desses navios
O Brasil desenvolveu, sem ajuda exter- amplia a capacidade de apoio à projeção de
na, o ciclo do combustível nuclear, o reator poder sobre terra da Marinha do Brasil.
de água pressurizada e as máquinas de pro- A um custo estimado de R$ 11,5 milhões,
pulsão.22 A opção por assistência técnica está prevista ainda a modernização do NDD
estrangeira para projetar o casco foi certa- Ceará, um dos dois navios de desembar-
mente motivada pela necessidade de en- que doca de origem norte-americana em ser-
curtar o horizonte de tempo, para o desen- viço. Pelo menos um navio-transporte de
volvimento do projeto do primeiro subma- apoio (NTrAp), projeto nacional desenvol-
rino brasileiro com propulsão nuclear. vido pelo Centro de Projetos Navais (CPN),
deverá ser construído
NAVIOS DE por R$ 209,3 milhões.
SUPERFÍCIE Seriam necessários à Para as Forças Dis-
tritais, está prevista a
Com relação aos Marinha do Brasil pelo construção, em estalei-
meios de superfície da menos seis submarinos com ros nacionais, de pelo
Esquadra, deverão ser menos 12 navios-patru-
modernizadas as três
propulsão nuclear lha (NPa) de 500 tone-
fragatas remanescen- ladas, de projeto fran-
tes da classe Greenhalgh (a um custo de cês, cujo custo unitário de obtenção é esti-
R$ 23 milhões cada) e as quatro corvetas mado em R$ 80 milhões. O número total de
da classe Inhaúma (por R$ 13,8 milhões unidades desta classe poderá chegar a 27.
cada).23 A Corveta Barroso, cuja constru- Também devem ser construídos cinco
ção havia sido iniciada em 1994, foi final- NPa de 1.000 toneladas, de um projeto de-
mente incorporada em 2008. senvolvido no Brasil pelo CPN, a um custo
Poderão ser construídas três novas fra- unitário de R$ 104,5 milhões. Está prevista
gatas de 6.000 toneladas, de uma classe ain- ainda a construção de quatro novos navi-
da a ser definida, possivelmente armada com os-patrulha fluviais (NPaFlu) de 100 tone-
mísseis superfície-ar de defesa de área. O ladas, a um custo de R$ 18,5 milhões cada.
custo unitário destes navios é estimado em Devem ser construídas 11 novas unida-
R$ 690 milhões, o que representaria um cus- des para o Sistema de Sinalização de Trans-
to total de obtenção de R$ 2.070 milhões.24 porte Aquaviário (SSTA), a um custo total
21
Cf. Ennes & Guimarães, Op. cit. Cf. também Ministério das Relações Exteriores, Acordo entre o Governo
da República Federativa do Brasil e o Governo da República Francesa na área de submarinos (Rio
de Janeiro, 23/12/2008). Texto disponibilizado em http://www.defesanet.com.br/.
22
Cf. Eduardo Italo Pesce, “Poder Naval, autonomia tecnológica e capacidade polivalente”, Monitor
Mercantil, Rio de Janeiro, 20/2/2008, p.2 (Opinião).
23
Cf. Moura Neto, Op. cit.
24
Ibidem.
25
Ibidem.
de R$ 80,3 milhões. Além disso, devem ser limitado. Pelo menos 12 aeronaves podem
modernizados cinco navios-hidrográficos ser modernizadas pela Embraer.
(NHi) por R$ 15 milhões. Recentemente, fo- Seis dos 12 helicópteros de esclarecimen-
ram recebidos o Navio-Hidroceanográfico to e ataque Agusta Westland AH-11A Super
(NHo) Cruzeiro do Sul e o Navio Polar Lynx, que operam com navios de escolta,
(NPo) Almirante Maximiano.26 devem ser modernizados a um custo de R$
34,7 milhões.30 Poderiam ser adquiridas ae-
NAVIO-AERÓDROMO E AVIAÇÃO ronaves adicionais, para substituir as perdi-
NAVAL das em uso. A Marinha também receberá 16
novos helicópteros Eurocopter EC 725
Está prevista a modernização do NAe (UH-14) Super Cougar/Caracal, produzi-
São Paulo, que voltou à atividade em 2008, dos pela Helibras.31
após um período de manutenção e reparos Além da Força Aeronaval, atualmente
no AMRJ. Entre as obras a serem realizadas, constituída por seis esquadrões de heli-
com previsão de prazo de três anos, a um cópteros e um de aviões, a Marinha dispõe
custo de R$ 43,8 milhões, estão o reparo de de três esquadrões regionais de helicópte-
um dos eixos propulsores e a instalação de ros de emprego geral, sediados em Manaus
um Sistema de Controle Tático (Siconta) (AM), Ladário (MS) e Rio Grande (RS), que
nacional, em substituição ao Senit francês.27 atuam nas áreas dos respectivos Distritos
Por R$ 87,5 milhões cada, foram adquiri- Navais. Poderiam ser criados mais três, em
dos quatro (com opção para mais dois) heli- Belém (PA), Natal (RN) e Salvador (BA).
cópteros Sikorsky S-70B (SH-60) Seahawk, Uma aviação embarcada polivalente, ca-
para missões antissubmarino e contra navi- paz de operar a partir de NAe e de outros
os de superfície. O total pode chegar a 12 tipos de navios de superfície, constitui com-
aeronaves (em três lotes de quatro), para ponente essencial de uma verdadeira Mari-
substituir os Sikorsky SH-3A/B Sea King.28 nha oceânica. Apesar de sua longa autono-
Também foi adquirido um lote inicial de oito mia de voo, a aviação de patrulha marítima
mísseis ar-superfície antinavio AGM-119B baseada em terra não é capaz de substituir
Penguin.29 plenamente os meios aéreos embarcados.
A modernização das aeronaves A Marinha do Brasil ainda não conse-
McDonnell Douglas A-4 (AF-1) Skyhawk guiu dotar seu NAe de um grupo aéreo
que operam com o NAe é uma necessidade completo, constituído por aviões de
imediata. Em 1998, foram adquiridas 23 ae- interceptação e ataque, reconhecimento,
ronaves deste tipo (20 AF-1 de um só lugar guerra eletrônica, guerra antissubmarino,
e três AF-1A de dois lugares), mas o núme- alarme aéreo antecipado (AEW – Airborne
ro de aeronaves atualmente disponível é Early Warning) e reabastecimento em voo
26
Ibidem. Cf. também João Mauro Uchôa, “Chefe do Estado-Maior da Marinha aponta os desafios da
vigilância das fronteiras marítimas” – Entrevista com o Almirante Júlio Sabóia, A Tarde, Salvador,
4/9/2008. Disponibilizado em http://www.defesanet.com.br/.
27
Cf. Moura Neto, Op. cit.
28
Cf. Eduardo Italo Pesce, “Aviação Naval, 92 anos”, Monitor Mercantil, Rio de Janeiro, 12/8/2009, p.2
(Opinião).
29
Cf. Marinha adquire mísseis AGM-119B Penguin (Rio de Janeiro, 22/12/2008). Notícia disponibilizada
no sítio da revista Segurança & Defesa em http://www.segurancaedefesa.com/.
30
Cf. Moura Neto, Op. cit.
31
Cf. Ennes & Guimarães, Op. cit. Cf. também Pesce, “Aviação Naval, 92 anos”, Op. cit.
32
Cf. Pesce, Op. cit.
33
Cf. Pesce, Op. cit. Cf. também José Alves Daniel Filho, O S-2T é uma boa opção para a Marinha (Juiz
de Fora, 2008). Disponibilizado em http://www.defesa.ufjf.br/. Cf. ainda Sebastião de Andrade Cam-
pos Neto, “Momento de decisão para a Aviação Naval”, Segurança & Defesa 24 (89): 27-32 – Rio
de Janeiro, 2007.
34
Cf. Luciano Melo Ribeiro. “E o amanhã? – O futuro da aviação de caça na Marinha do Brasil”, Revista
Força Aérea 13 (53): 64-71 – Rio de Janeiro, ago./set. 2008.
35
Cf. Ribeiro, Op. cit.
36
Cf. Alexandre Fontoura, “A short-list do F-X2”, Segurança & Defesa 25 (93): 16-19 – Rio de Janeiro,
2009.
37
Cf. Eduardo Italo Pesce & Mário Roberto Vaz Carneiro, “Aviação de patrulha marítima”, Monitor
Mercantil, Rio de Janeiro, 12/8/2008, p.2 (Opinião). Cf. também Eduardo Italo Pesce & Mário
Roberto Vaz Carneiro, “A adequação da aviação de patrulha”, Segurança & Defesa 24 (92): 4-10 –
Rio de Janeiro, 2008.
38
Ibidem.
39
Ibidem.
40
Cf. FAB compra lote de mísseis antinavio Harpoon (5/2/2009). Notícia disponibilizada no sítio da
revista Asas em http://www.revistaasas.mil.br/.
41
Cf. Pesce & Carneiro, “Aviação de patrulha marítima”, Op. cit. Cf. também Pesce & Carneiro, “A
adequação da aviação de patrulha”, Op. cit.
42
Ibidem.
43
Cf. Pesce & Carneiro, “A adequação da aviação de patrulha”, Op. cit.
44
Cf. Pesce & Carneiro, “Aviação de patrulha marítima”, Op. cit. Cf. também Pesce & Carneiro, “A
adequação da aviação de patrulha”, Op. cit.
48
Cf. Moura Neto, Op. cit.
49
Cf. Milton Júnior, Op. cit.
50
Cf. Moura Neto, Op. cit.
51
Cf. Uchôa, Op. cit.
52
Cf. Rajat Pandit, “India’s secret N-submarine project nearing completion,” The Times of India, 12 Feb.
2009. Disponibilizado em http://timesofindia.indiatimes.com/.
RMB2 o T/2009
1 Modernização de cinco submarinos da classe Tupi 812,7 11 anos
2 Cinco navios-patrulha de 1.000 t (R$ 104,5 milhões cada) 530,7 Até 2013
3 Quatro (#) helicópteros antissubmarino S-70 (SH-60) Seahawk (R$ 87,5 milhões cada) 350,0 3,5 anos
4 Modernização de três fragatas da classe Greenhalgh (R$ 23 milhões cada) 69,0 n.d.
4 Três (#) fragatas de 6.000 t (R$ 690 milhões cada) 2.070,0 3 anos (?)
4 Modernização de quatro corvetas da classe Inhaúma (R$ 13,8 milhões cada) 55,2 n.d.
5 Quatro navios-patrulha fluviais de 100 t (R$ 18,5 milhões cada) 74,0 5 anos
6 11 unidades para Sistema de Segurança do Tráfego Aquaviário (SSTA) 80,3 10 anos (?)
8 Carros de combate e equipamentos para o Corpo de Fuzileiros Navais 126,0 Até 2014
Tabela organizada pelo autor. (*) Estimativas de setembro de 2007 sujeitas a revisão. (#) Número de encomendas poderá ser maior.
FONTE: Moura Neto, Op. cit.
117
MARINHA DO BRASIL: PERSPECTIVAS
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examinar o pé direito isoladamente. Somente Enquanto isso meu alfaiate fará suas vestes
quando segurar um par completo perceberá profissionais, e de hoje a seis dias você será
várias diferenças, mas não deixarei que saiba empossado. Até amanhã. E, agora que você
qual delas é a responsável pela correção. é Grande Almirante, somente dará ordens a
Trabalhou um dia inteiro, fez seis pares, Bacchylides, o atual Grande Almirante. Ele
provou-os em Xerxes e marcou, em cada pé, dará as suas e as dele ao Vice-Almirante
sinais estranhos. Todos aumentaram a altu- Misanias, de modo que nunca alguém saiba
ra de Xerxes, tinham palmilhas espessas e se partiram dele ou de você. Ele obedecerá a
tão macias que retardavam a noção de apoio você devido a seu título, jamais direi a ele
no solo. Cada solado tinha a cinta vertical que respeite você, o título basta. Ele ensinará
elevada o suficiente para impedir a dedução tudo o que você disser que deseja saber,
visual da distância interna entre a sola do acrescentará explicações que julgar neces-
pé e o chão. Fez mais seis pares, provou sárias. Quando você quiser mudar um proce-
quatro deles e, em seguida, disse a Xerxes: dimento dele, basta assinalar que é decisão
– O senhor pode calçar os dois que não sua. Posso confiar em suas decisões porque
provei, esses são os corretos. você mostrou habilidade com o próximo. Co-
– Como você pode dizer isso sem eu calçá- mentará com você treinos, aquisições e ações
los, portanto sem ver como ficaram em mim? dos outros países. Quando for empossado,
– Ao fim deste dia conheço seu pé es- você conhecerá seus subordinados. Sem que
querdo e seu pé direito profissionalmente, peça, eles mostrarão tudo o que sabem, mas,
portanto melhor que o senhor, pois é mi- até que esteja apto a combater o Ocidente,
nha profissão e não é a sua. você será representado perante os contra-
Ato contínuo, Xerxes calçou um dos pares almirantes pelo Vice-Almirante Misanias.
intocados, andou um pouco sobre o tapete, Todos pensarão que os planos, os movimen-
sobre o mármore, sobre a grama e sobre casca- tos e as novidades de atuação partem de
lho. Ficou extasiado, saltou numa e noutra você. Você ocupará o posto da direção du-
perna, flexionou a perna do fim do passo como rante os exercícios, os desfiles serão volta-
se desse um toque de espada a fundo, alegre dos para você, que presenciará a saudação
como não se sentia havia tempos. dos chefes, seguida pela transmissão por
– Cairos, assim como não descubro seu Misanias de suas ordens a eles.
segredo, escondo de todos meu poder, essa Nos tempos seguintes, Misanias foi vis-
é minha profissão. Posso e quero satisfazer to treinando os remadores, os velejadores,
o maior desejo que você tenha e me informe. os carpinteiros e os arremessadores nas
– Em vez de dizer meu desejo, prefiro di- manobras de aproximações, abordagens e
zer o sonho que sempre tive, sonho porque afastamentos.
nunca seria realidade. Creio que assim não Quando estavam a sós, Cairos surpre-
ofenderei o senhor. Desde pequeno sonha- endeu Bacchylides:
va ser o almirante de todas as esquadras, o – Preciso ver exercícios de ação coorde-
Grande Almirante da Marinha da Pérsia. nada entre os barcos mais leves da esquadra
– Cairos, neste instante nomeio você Gran- com outros ainda mais leves, transportados
de Almirante da Marinha da Pérsia. Vamos pelos grandes, ideia minha, chamando-os li-
dormir que já é muito tarde. Amanhã você geiros, que somente se aproximarão do ad-
volta para casa, conversa com sua família, versário após iniciado o enfrentamento com
prepara sua mudança para a casa que meus os adversários correspondentes, podendo
conselheiros escolherem para você e os seus. então atuar sem oposição. Mande construí-
los. Teremos de fazer ensaios com essas em- mantida até destruir a última fração, e então
barcações para garantir que atuem surpreen- o todo terá deixado de existir.
dentemente. Os senhores usam surpresa de Tempos depois, Cairos disse a
modo terminante, eu de modo contínuo. Ima- Bacchylides:
gine que após iniciar o enfrentamento com – Envie comitivas às Marinhas rivais da
um barco leve o inimigo só perceba a presen- ateniense, para seduzi-las com a glória de
ça do ligeiro quando os hoplitas dele estive- derrotá-la. Como glória não é poder, nada
rem matando seus coordenadores. perderemos de nossas posses nem eles
Ponderou Bacchylides: ganharão alguma posse, mas a possibili-
– Esses ligeiros terão efeito duvidoso dade de ganharem, graças a nosso enge-
em comparação com o custo de levá-los, nho, respeito do inimigo perene. Será van-
mormente porque o efeito dos mais leves tagem dupla para nós, porque ganhamos
já é desprezível e por vezes inútil havendo apoio dos rivais e o negamos ao inimigo.
vento fresco e espaço para os maiores. Nos seis anos após a posse de Cairos, a
– Serão decisivos quando não houver Marinha persa não combatera ninguém, mas
tempo fresco nem espaço para os maiores. treinara revezar remadores com hoplitas,
E mesmo quando houver, o ligeiro aleijará mantendo com menos cansaço os dispositi-
o leve caso mate o comandante, o timonei- vos de engajamento e de abordagem. Trei-
ro ou o mestre dele. Além disso, não inicia- nara também obstrução de estreitos, cerco
rei nem aceitarei combate quando não achar de ilhas e penetração frontal, por ação si-
que as circunstâncias me favorecem. multânea de barcos pesados com a escolta
Nem bem Bacchylides se refizera do es- leve integrada, ainda desconhecida das
panto causado pela ideia do sapateiro, ou- Marinhas da época. Cada barco pesado
viu o seguinte: persa tinha duas escoltas de barcos leves,
– Não combaterei quem for mais forte no uma para afastar do pesado adversário a
ponto de contato nem quem não estiver en- escolta dele, a outra para atacar o bordo
frentando outros adversários noutros pon- oposto ao atacado pelo pesado persa. A
tos. Não quer dizer que ficarei esperando a abordagem era praticada próximo à linha-
sorte, pois você vai operar também vários d’água, entre os remos. Já havia um arreme-
barcos desarmados, velozes e disfarçados do de castelo e outro de tombadilho, liga-
como transporte de comerciantes. Estarão dos por passarela a meia-nau, mas a ponte
junto aos navios de guerra de Atenas desde de abordagem surgiu um século mais tarde.
a Espanha até Antioquia e desde a Rússia Houve treino de lanceiros e arqueiros na
até o Egito, indo e vindo para dizer onde passarela. Cairos criou a catapulta para uma
estão as forças deles. Nós faremos delas bola de aniagem e breu em chamas, treina-
fraquezas se chegarmos com mais força e mento conjugado com inversão de marcha
mais mobilidade junto a alguma fração de- das embarcações, a fim de anular risco de
las, que estiver em luta contra a Liga Deliana fogo, do inimigo ou próprio. Seus capitães
ou apoiando revoltas contra nós, talvez es- navegaram em barcos comerciais quanto
timuladas por nós se isso servir para afastá- puderam no litoral do Egito, nas ilhas do
la do restante das forças deles. Então ataca- Mar Egeu e no litoral sul da Pérsia, pois Ate-
remos essa fração para destruí-la e a outras nas estava ocupando o ocidental. Os seis
sucessivamente. Esta ideia de enfrentar fra- anos serviram para Cairos treinar o relacio-
ção em vez do todo, de agir sucessiva mas namento dele com o pessoal do mar, onde
nunca simultaneamente, pode muito bem ser não entendia do tempo, nem da navegação
nem do manejo, mas conseguiu movimentar mos, destrua um atrás de outro, até que os
como quis cada barco ou grupo de barcos. pesados fiquem desprotegidos por leves.
Em pouco tempo todos os comandantes – Assim estou fazendo, senhor.
sentiram coerência nas ordens recebidas. Após a destruição dos leves por com-
O mundo consumia trigo de três origens: bate entre as tripulações, foi ininterrupta a
da Rússia, via portos de alta latitude, na destruição por incêndio do resto da fração
margem nordeste do temido Mar Negro; da da ateniense, os pesados. Seguiu dali para
distante Sicília, no reino de Syracusa; e ali o Peloponeso, área dominada por Esparta,
do Egito, no delta do Nilo. A incorporação onde descansou e aparelhou novamente a
de Boeotia, Locris e Phocis, em 457 a.C., na indene Marinha persa.
Aliança Ateniense, forçou Egina a ingres- Buscou e encontrou em Oenophyta, em
sar na Liga Deliana e fez Atenas hegemôni- pleno domínio ateniense, a outra fração da
ca na Grécia Central, ateniense que dois
encorajando-a a tentar anos antes derrotara
controlar o trigo do No mar ou em terra, uma esquadra de Tebas
Egito, então compro- Cairos nunca deixara o e Esparta.
metido com a Pérsia – Misanias, inau-
pelos egípcios. A cir-
modo meticuloso e guremos a penetração
cunstância favorável a completo de raciocinar que frontal.
Cairos foi a decisão havia feito dele o melhor – Senhor, estou ini-
ateniense de apoiar ciando pelos três pesa-
militarmente a oposi- sapateiro da Pérsia. Em dos mais avançados.
ção política egípcia seis anos esse modo o Com esta destruição
contra a situação. Pela total da Marinha
primeira vez, parte da
transformou de melhor ateniense, Cairos devol-
Marinha ateniense, sapateiro em melhor veu à Pérsia Samos e
sob seu Almirante almirante da história da Mileto, bem como o
Cleon, operaria longe resto do litoral ociden-
de suas bases, quase Pérsia tal. Repartia com os ali-
tão longe quanto a ados o domínio do Me-
Marinha persa das bases dela. Cairos se diterrâneo Oriental, pois não viu vantagem
aliara à Liga Deliana com Esparta, Tebas, na hegemonia e porque a Liga era dócil a ele.
Corinto e Egina, fruto das missões junto às Apresentando-se a Xerxes na capital,
Marinhas rivais dos atenienses. Pediu a Susa, relatou a campanha e ouviu dele:
seus aliados que se mantivessem próximos – Naquele dia em que você fez meus
a outras partes da Marinha ateniense, as- sapatos, vi seus raciocínios e entendi que
sim as entretendo, sem entrar em combate você empregaria bem qualquer técnica que
até a chegada dele. lhe fosse entregue. Eu tinha gente para tal
Partiu de Byblos em 455 a.C., direto para entrega. Produzi um Grande Almirante!
Inaros, com toda a Marinha persa. Os re- – Senhor, minha gratidão é imensa. Sou
madores persas chegaram mais descansa- grato ao senhor, sem sua direção eu nada
dos que os atenienses, graças ao percurso seria, nada teria feito. Fiz meu trabalho, es-
menor e ao revezamento criado por Cairos. tou idoso, fui bem tratado em cada um de
– Misanias, aborde com nossos leves e meus dias à frente da Marinha persa. Peço
ligeiros os leves atenienses como treina- que me permita encerrar o serviço nela!
– Agradeço o serviço prestado e conce- cinar que havia feito dele o melhor sapatei-
do seu término. ro da Pérsia. Em seis anos esse modo o
No mar ou em terra, Cairos nunca deixa- transformou de melhor sapateiro em me-
ra o modo meticuloso e completo de racio- lhor almirante da história da Pérsia.
SUMÁRIO
Introdução
Breve síntese, sob o prisma de interesse da indústria
nacional de defesa
Alguns comentários
O mecanismo das Golden Shares
de tecnologias que terão quase sempre uti- rior a uma “transferência substancial de
lidade dual, militar e civil”. tecnologia”; e adota várias outras medi-
Na parte voltada para as Medidas de das voltadas para a redução dos fatores de
Implementação da sistemática formulada, fraqueza identificados. Muitas delas, aliás,
é inicialmente descrito um contexto no qual são reforçadas e novamente enfatizadas no
se identificam como vulnerabilidades da capítulo voltado para a política de ciência,
atual estrutura de defesa do País (dentre tecnologia e inovação de interesse para a
muitas outras) a insuficiência e defesa nacional.
descontinuidade na alocação de recursos No capítulo das Medidas de Implemen-
orçamentários para a defesa; a tação especificamente dedicado à Indús-
obsolescência do material das Forças Ar- tria de Material de Defesa, é de início res-
madas e sua dependência logística exter- saltado que a relação entre Ciência,
na; a ausência de uma direção unificada Tecnologia e Inovação na área de defesa é
para a aquisição de produtos de defesa; os fortalecida pela Política de Desenvolvimen-
limitados recursos destinados à pesquisa to Produtivo – PDP (lançada em maio de
tecnológica e ao desenvolvimento de ma- 2008, contemplando 32 áreas), coordenada
terial bélico; a ausência de planejamento pelo Ministério do Desenvolvimento, In-
capaz de integrar centros de pesquisa de dústria e Comércio Exterior, e que o progra-
universidades, indústria e Forças Armadas ma estruturante do Complexo Industrial de
para o desenvolvimento de produtos de Defesa está sob a gestão do Ministério da
elevado conteúdo tecnológico; a Defesa e sob a coordenação do Ministério
inexistência de regras claras que priorizem da Ciência e Tecnologia. É no contexto des-
a indústria nacional, no caso de produtos sa intrincada estrutura que o referido pro-
fabricados no País; a excessiva carga tri- grama deverá se desenvolver, com o decla-
butária incidente sobre esses produtos, rado objetivo de “recuperar e incentivar o
favorecendo a importação; as dificuldades crescimento da base industrial instalada,
de financiar a indústria nacional do setor; ampliando o fornecimento para as Forças
os bloqueios tecnológicos impostos por Armadas brasileiras e exportações”. Qua-
países desenvolvidos; e a ineficiência dos tro desafios são a seguir identificados para
sistemas nacionais de logística e a consecução do objetivo: aumentar os
mobilização. Para superar essas investimentos em pesquisa, desenvolvi-
vulnerabilidades, a END sugere maior mento e inovação; promover isonomia tri-
engajamento da sociedade brasileira nos butária em relação a produtos e materiais
assuntos de defesa; defende a regularida- importados; expandir a participação nos
de e continuidade da alocação de recursos mercados interno e externo; e fortalecer a
orçamentários para a defesa, o adequado cadeia de fornecedores no Brasil. Da PDP,
aparelhamento das Forças Armadas para o é extraído e listado um conjunto de ações
cumprimento da missão e a otimização dos sugeridas como auxiliares na superação
esforços de pesquisa e desenvolvimento dos desafios, consistindo na ampliação das
afetos ao setor, novamente enfatizando a compras nacionais, expansão e adequação
integração das instituições nacionais ca- do financiamento, promoção das vendas e
pazes de contribuir nesse sentido; reitera a capacitação de empresas brasileiras e for-
necessidade de um regime jurídico especi- talecimento das bases de pesquisa, desen-
al para a indústria de defesa; enfatiza o volvimento e inovação tecnológica. Final-
condicionamento das aquisições no exte- mente, é destacado que a superação dos
dústria; e o fato de ter sido eleita a reorga- pesquisa, exequível sem longos e vultosos
nização da indústria nacional de defesa investimentos?
como um dos eixos estruturantes da nova A conquista de mercado externo, bas-
END agrega históricas preocupações quan- tante incentivada pela END, é sem dúvida
to ao seu sucesso. Aí reside, talvez, a mais um importante lenitivo para amenizar as li-
desejável participação do Estado: assegu- mitações internas, mas é improvável que
rar encomendas com vulto expressivo e prosperem vendas ao exterior sem que os
continuidade. Se o Estado não puder alocar clientes em potencial constatem que se trata
substanciais recursos às encomendas de de produtos solidamente adotados pelas
meios de defesa, esse eixo perde robustez, Forças Armadas do país que pretende
e, com sua debilitação, debilita-se a pró- vendê-los. Em outras palavras, primeiro há
pria END. que consolidar uma expressiva demanda
A diretriz voltada para a “capacitação da interna, para só então ambicionar exporta-
indústria de defesa para que conquiste auto- ções. Este mecanismo dificilmente funcio-
nomia em tecnologias indispensáveis à defe- na ao contrário.
sa” é sempre desejável, mas mostra-se um Esse incentivo à busca de mercado ex-
tanto vaga e pretende buscar sustentação terno é também expresso na END pela “bus-
num regime jurídico e tributário especial ca- ca de parcerias com outros países, com o
paz de assegurar a continuidade das com- propósito de desenvolver a capacitação
pras públicas, exigindo, porém, em tecnológica e a fabricação de produtos de
contrapartida, que o Estado possa exercer defesa nacionais, de modo a eliminar, pro-
seu poder estratégico sobre as empresas as- gressivamente, a compra de serviços e pro-
sim protegidas. Tentativas passadas de con- dutos importados”. A consolidação da
ceder a empresas estatais um regime jurídico União de Nações Sul-Americanas (Unasul)
especial que lhes permita desatar os nós im- é mencionada como capaz de “atenuar a
postos pela Lei de Licitações têm esbarrado tensão entre o requisito da independência
em contestações e questionamentos diver- em produção de defesa e a necessidade de
sos, inclusive no Tribunal de Contas da compensar custo com escala, possibilitan-
União. Por sua vez, a interferência do Estado do o desenvolvimento da produção de de-
na estratégia e na administração de empre- fesa em conjunto com outros países da re-
sas privadas – que a END traduz como “su- gião”. Cabem dois comentários sobre essa
bordinar as considerações comerciais aos im- ambição: o primeiro é que os países deten-
perativos estratégicos” – não tem contado tores de tecnologia não costumam se incli-
com a simpatia dos empresários, sempre aten- nar na direção da cessão de tecnologias
tos aos riscos da submissão do capital aos que lhes tire mercado (especialmente se
interesses governamentais. Outrossim, a forem tecnologias de ponta, “estado da
mesma diretriz declara que ao setor estatal de arte”); o segundo é que, mesmo que se
material de defesa será atribuída a missão de admita a consolidação da Unasul (impro-
operar “no teto tecnológico”, o que pode ser vável, na opinião do autor), seus membros
traduzido como conviver com o “estado da são muito mais carentes de tecnologia do
arte” da indústria bélica, ou seja, com um dos que nós, e as parcerias – “experimentos
níveis de desenvolvimento tecnológico mais binacionais”, como qualifica a END – que
avançados do mundo. Seria essa missão, venham a se desenvolver nesse cenário
mesmo que amparada por estreita coopera- tendem a ser de auxílio aos menos desen-
ção com centros nacionais avançados de volvidos, mas não de obtenção de novas
rumos da empresa privatizada; e a legitimi- oitiva prévia do poder público dotado des-
dade jurídica dos atos dos agentes do go- ses poderes especiais. Desde que observa-
verno não fica isenta de questionamento. do o prazo prescricional previsto na lei
Sobre este último ponto, é oportuno vol- societária, é legítima essa linha de ação go-
tar a considerar a Lei das S/A, em seu arti- vernamental, à medida que seja inequivoca-
go 159. Reside aí um dos aspectos mais mente demonstrado que o interesse público
complexos da questão. Se, na sua atuação foi prejudicado pelas decisões dos acionis-
reguladora, o agente do Estado exerce o tas majoritários.
poder de veto sobre decisões de alto peso Como se depreende, não é isenta de in-
nos rumos da empresa, fica caracterizada a tempéries essa preservação de alguma pre-
responsabilidade estatal sobre essa inge- sença governamental gerencial na ativida-
rência. Nessas circunstâncias, não é des- de econômica das empresas privatizadas.
prezível a hipótese de vir a ser questiona- Quando não se tratar de privatizações,
da a legalidade da ação desse agente, sob o assunto apresenta complexidades ainda
a alegação de uso indevido – abusivo, ar- maiores. Nas privatizações, o ente desesta-
bitrário, viciado ou tizante, além de ser
contaminado por des- governo, desfruta, até
vios ideológicos, por É reconhecidamente certo ponto, de condi-
exemplo – do poder de saudável e moderna a ção privilegiada, po-
veto; e essa hipótese dendo colocar seu
é tanto mais verdadei- progressiva retirada do peso na redação dos
ra quanto mais adver- Estado da atividade artigos estatutários
samente afetados fo- que irão refletir seus
rem os lucros dos aci-
econômica produtiva, poderes especiais
onistas (na forma de reservando-se apenas ao (mesmo que venha a
redução, ou prejuízos, papel regulador ser uma participação
decorrentes da deci- acionária minoritária).
são do agente do Es- Quando a empresa
tado). Se a Justiça entender que houve ile- alvo já nasceu na condição de empresa pri-
galidade, o Estado é responsabilizado – e vada, mas por alguma razão desperta o in-
pode ser onerado – pelo ato ilícito e por teresse do governo em ter alguma partici-
suas consequências, e o ônus pode recair pação – na forma de golden shares, por
sobre o contribuinte, em geral alheio a es- exemplo – na condução dos seus rumos, a
sas circunstâncias mercadológicas. situação é outra.
Do mesmo modo, também não é De fato, a evolução da atividade econô-
despicienda a possibilidade de o Estado (ain- mica pode estimular a participação (ou a
da que minoritário, mas possuidor de ações geração) de empresas genuinamente pri-
preferenciais que lhe confiram direitos es- vadas voltadas para ramos de negócios que
peciais, como as golden shares) vir a recor- sejam de elevado interesse estratégico para
rer à Justiça para anular deliberações de o País. Como exemplos (não exaustivos),
assembleias de acionistas sobre assuntos tem-se a participação privada nas ativida-
que tenham sido motivo de manifestação des de geração e distribuição de energia,
estatal contrária. Isso pode ocorrer no caso na prospecção de recursos minerais, no
de vetos previamente manifestados e não transporte de cargas e passageiros, nas
acatados, ou no caso de não ter havido a comunicações e na defesa nacional, foco
deste artigo. Identificada a conveniência tros fatores incompatíveis com as boas prá-
da presença governamental para, ainda que ticas do mercado, a convergência de inte-
a título regulatório, ter ingerência na con- resses não ocorrerá; ou só ocorrerá se es-
dução desses negócios, o governo terá que tiverem muito bem defendidos – contra
negociar com os acionistas (nacionais e/ aquelas incertezas – os interesses dos aci-
ou estrangeiros) das empresas de interes- onistas investidores.
se. Dependendo, então, da proporção rela- Para entender o receio ou a desconfian-
tiva de sua participação no capital, pode ça dos investidores ao cogitar de parcerias
tornar-se difícil (ou pouco expressiva) a com o governo, basta olhar para a América
concretização estatutária de seus poderes do Sul, presentemente plena de exemplos
especiais. Os empresários, os acionistas da prevalência de motivações ideológicas e
majoritários, tentarão sempre minorar o populistas no traçado das estratégias go-
poder estatal de ingerência nos seus ne- vernamentais, não raro resultando na que-
gócios e procurarão cláusulas defensivas bra de contratos (o caso boliviano é exem-
dos interesses dos plar). Basta olhar, ain-
portadores majoritári- da, para a degeneração
os dos quinhões de De fato, a evolução da da saudável iniciativa
capital, dificultando a de criação das Agên-
concretização dos de- atividade econômica pode cias Reguladoras em
sejos de ingerência do estimular a participação nosso país, que vêm
Estado. A postura de-
fensiva do empresa-
(ou a geração) de empresas sendo progressiva-
mente desviadas de
riado é particularmen- genuinamente privadas seu propósito regula-
te influenciada pela voltadas para ramos de dor – conceitualmente
avaliação da serieda- autônomo e indepen-
de e da credibilidade negócios que sejam de dente – para se trans-
do Estado na condu- elevado interesse formarem em instru-
ção de seus próprios mentos da política go-
negócios. Nas socie-
estratégico para o País vernamental (ou, o que
dades mais desenvol- é pior, instrumentos de
vidas (e aqui se pode dar novamente como atuação de partidos políticos e de políticos
exemplo a União Europeia), a articulação influentes, capazes de apadrinhar a nomea-
governo/iniciativa privada é bastante faci- ção de seus dirigentes). Essas agências, ori-
litada pelas abundantes evidências de ginalmente criadas para serem conduzidas
priorização dos interesses mais legítimos – como ocorre no mundo desenvolvido –
do Estado, pela fiel aderência a esses inte- por dirigentes especialistas nos respectivos
resses e pelo respeito aos contratos que setores, passaram a ser progressivamente
os envolvam. O mesmo não se pode dizer ocupadas por representantes de interesses
no caso de sociedades ainda longe de se- político-partidários, perdendo seu caráter
rem consideradas desenvolvidas sob os genuinamente regulador. Basta olhar tam-
pontos de vista econômico, político e soci- bém (ainda que não seja matéria especifica-
al. Se as posturas governamentais revela- mente concernente ao uso de golden shares)
rem motivos para incertezas, dúvidas quan- para o que está ocorrendo no Brasil diante
to à aderência aos termos das avenças, da descoberta de promissores megacampos
polarização ideológica das decisões e ou- de petróleo na camada do pré-sal, no Su-
deste. O governo logo cogitou de criar uma politização de suas Diretorias e de seus Con-
nova estatal, acabar com as licitações de selhos de Administração? Estariam os em-
concessões de campos e rever os critérios presários e acionistas seguros de não virem
de pagamentos de royalties aos estados e a ser afetados por possíveis danos gerados
municípios vizinhos, dentre outras ideias por uma mentalidade ideológica e estatizante?
estatizantes do poder central. A Petrobras e Particularizando para o Brasil e para a
seus sócios ficaram perplexos com as posi- defesa nacional, objeto de nosso maior in-
ções manifestadas pelo Ministério de Mi- teresse, é ponto pacífico o reconhecimen-
nas e Energia e mostraram-se assustados to de que a indústria de defesa e a avança-
com a possibilidade de quebra de contra- da tecnologia inerente a esse ramo indus-
tos. Esse petróleo, se confirmado, está a 300 trial são aspectos estratégicos de elevada
quilômetros da costa, a 7 mil metros de pro- importância para a segurança nacional, e
fundidade e requer muitos bilhões de reais particularmente para o adequado apresta-
de investimento para mento de nossas For-
ser explorado econo- ças Armadas.
micamente, mas, pelo Para entender o receio ou Se, nos idos dos
fato de ser a Petrobras a desconfiança dos anos 1970, foi possível
uma empresa pública estimular a participa-
de economia mista, investidores ao cogitar de ção de empresas priva-
que tem inclusive aci- parcerias com o governo, das de peso (ou de es-
onistas estrangeiros,
ficou preconceituo-
basta olhar para a América tatais criadas com esse
objetivo) na produção
samente ameaçada de do Sul, presentemente de itens de elevada
ser afastada, como se plena de exemplos da significação para a se-
sua presença fosse gurança do Estado
desnacionalizar nos- prevalência de motivações (blindados, aeronaves,
sas riquezas. É o mes- ideológicas e populistas no munição, armas e seus
mo nacionalismo extre- sistemas), por outro
mado praticado pelo
traçado das estratégias lado a falta de regulari-
bolivarianismo vene- governamentais, não raro dade e de volume nas
zuelano, boliviano e resultando na quebra de encomendas estatais
equatoriano, afastan- resultou no seu desa-
do os investidores ex- contratos parecimento, ou no
ternos e internos, cujas desvio de suas finali-
participações – mediante licitações trans- dades originais. Essas empresas foram sem-
parentes – seriam cruciais para viabilizar o pre vítimas da endêmica escassez de recur-
empreendimento. sos para a defesa, principalmente por não
Sob o prisma do empresariado e dos in- haver a percepção, pela sociedade e pelo
vestidores privados, a credibilidade gover- parlamento, de ameaças externas relevan-
namental fica abalada por episódios dessa tes, pelo menos no curto prazo. Nos dias
espécie, e os receios de negócios que envol- presentes, o mesmo modelo não se mostra
vam o Estado resultam aumentados, em face aplicável, sendo imperioso que se associe –
da percepção do risco assim criado. Estariam à luz de metas alcançáveis – o aprestamento
as empresas das quais o governo tenciona- das Forças Armadas ao complexo industrial
ria adquirir golden shares sujeitas ao risco de e tecnológico já disponível no País (a me-
nos que se queira eternizar a dependência ses do governo. Mas é imperioso que o
estratégica industrial e logística do exterior, governo, ao estudar tais mecanismos, seja
vulnerabilizando nossa soberania). E a me- capaz de demonstrar ao empresariado do
lhor forma de fazê-lo é usando o potencial ramo que suas intenções são essencialmen-
produtivo e tecnológico da iniciativa priva- te regulatórias e efetivamente norteadas pe-
da, concedendo-lhe liberdade para obter no los objetivos e interesses estratégicos na-
exterior os insumos materiais e tecnológicos cionais mais relevantes, isentos de polari-
de que possa necessitar, de vez que o de- zação política e ideológica. É igualmente
senvolvimento autônomo de tecnologias importante que não dê margem a incerte-
terá que estar sempre atrelado ao grau de zas que possam colocar em risco a confi-
desenvolvimento alcançado pelo País. Não ança no respeito aos contratos, tal como é
se trata de eternizar dependências logísticas imperativo no Estado de Direito.
estratégicas do exterior, mas sim de integrar No lado industrial, é muito importante
os desenvolvimentos nacionais ao mundo que o empresariado do setor enxergue, nas
globalizado, conferindo-lhes velocidade de diretrizes, iniciativas e projetos governamen-
avanço satisfatória e tais, metas realmente
nível tecnológico – alcançáveis e vislum-
não necessariamente A credibilidade bre reais possibilida-
de ponta – adequado des de continuidade –
às necessidades. governamental será o leia-se encomendas
Para concretizar principal atributo que contínuas – nos em-
objetivos industriais e empresários e acionistas preendimentos que
tecnológicos que ne- irão comprometer seu
cessariamente estão colocarão na balança ao capital. Como já men-
ligados à revitalização pesar decisões de parceria cionamos antes, a mais
de nosso Poder Mili- desejável participação
tar, há que encontrar com o governo do Estado no setor de
os caminhos pelos defesa reside na colo-
quais o governo possa dirigir suas enco- cação contínua de encomendas expressivas,
mendas de equipamentos, sistemas, mate- assegurando a sobrevivência dos empreen-
rial bélico e desenvolvimentos tecnológicos dimentos e prestigiando o material bélico
específicos a empresas nacionais de reco- produzido no País, inclusive para que se
nhecida qualificação no ramo (sejam elas torne atraente ao observador externo.
de capital exclusivamente nacional ou não). Em outras palavras, a credibilidade go-
Para tanto, além de revisar e adaptar a le- vernamental será o principal atributo que
gislação licitatória, há que estudar a empresários e acionistas colocarão na balan-
aplicabilidade de mecanismos como os ofe- ça ao pesar decisões de parceria com o go-
recidos pelas golden shares, ajustando-os verno, seja na forma de golden shares, ou em
à realidade nacional e à defesa dos interes- qualquer outra forma legítima e viável.
GERMANO DE FREITAS
Capitão-de-Mar-e-Guerra (EN-RM1)
* N.R.: O texto, que continua atual, se refere a discurso do autor proferido em 7 de setembro de 2008, em
comemoração à Independência do Brasil, na Praça Coronel Fernandes Prestes, em Sorocaba, SP.
SOBRE A INDEPENDÊNCIA DO BRASIL
que se encontrava após a luta contra o exér- E hoje, 186 anos após a conquista da
cito francês e as disputas internas entre as nossa independência, ao que assistimos?
Cortes e o Rei D. João VI. Em nome dos nossos índios, ONGs de fa-
Na realidade, esta foi a principal razão chada criticam o Brasil. Organizações inter-
de nossa independência: a incapacidade nacionais de reconhecidos méritos em de-
de Portugal continuar a exercer o seu do- fesa da ecologia e dos direitos humanos se
mínio no território de além-mar, fato este aliam a organizações não tão sérias, daque-
apontado claramente por José Bonifácio a las que servem somente aos interesses
Dom Pedro na carta que lhe foi entregue às escusos do empresariado internacional, pre-
margens do Ipiranga. Escreveu José gando a demarcação de terras indígenas e
Bonifácio naquela carta: incentivando a formação de nações indíge-
“Senhor... nas independentes, inclusive em áreas onde
...O momento não comporta mais delon- o Brasil faz fronteira com outros países.
gas ou condescendências. A revolução ja Um belo dia, algum país ou organismo
está preparada para o dia de sua partida. internacional poderá decretar a internacio-
Se parte temos a revolução do Brazil nalização da Amazônia.
contra Portugal e Portugal actualmente Quando for “proclamada a independên-
não tem recursos para subjugar um le- cia” de uma dessas reservas indígenas, por
vante que é preparado occultamente, apenas uma “pequena parcela do povo bra-
para não dizer quaze visivelmente...”. sileiro”, serão retirados do nosso território
Também bastante elucidativo e convin- quase 10 milhões de hectares – terra esta
cente é um trecho do manifesto de Joaquim que nos foi arduamente legada pelos nos-
Gonçalves Ledo enviado a Dom Pedro em sos antepassados e que representa mais de
1o de agosto de 1822: 10% da área do nosso país. Quem reagirá?
“Não temais as Nações Estrangeiras: Nossas Forças Armadas estão sendo siste-
a Europa que reconheceu a Independên- maticamente sucateadas desde o governo
cia dos Estados Unidos da América, e fi- de Fernando Collor de Mello.
cou neutra na luta das colônias espanho- Será que continuaremos “deitados eter-
las, não pode deixar de reconhecer a do namente em berço esplêndido, ao som do
Brasil, que com tanta justiça, tantos mei- mar e à luz do céu profundo”, como se
os e recursos, procura também entrar na nada estivesse acontecendo, ou será que
grande família das Nações.” a “Pátria amada Brasil” poderá realmen-
Vivemos hoje em um país com um territó- te ver que “um filho teu não foge à luta”?
rio de mais de 8 milhões de quilômetros qua- Recordando um fato mais recente, ocor-
drados, pois nossos bandeirantes empurra- rido na década de 50, Zé Dantas, por oca-
ram a demarcação do Tratado de Tordesilhas sião do lançamento de um CD contendo
para oeste, e o nosso território foi, desse músicas de sua autoria em parceria com Luiz
modo, ampliado, porque a Espanha, tal como Gonzaga, escreveu o seguinte texto sobre
Portugal, não tinha condições de impedir a a composição “Vozes da Seca”:
ação dos nossos bandeirantes. “Em 1953, o Nordeste sofreu uma das
Enfim, da conjunção de todos esses fa- maiores secas entre as que periodicamen-
tores, fatos e motivos, a Independência do te assolam aquela região, deixando a ter-
Brasil foi proclamada por Dom Pedro de ra calcinada e a população faminta. Por
Alcântara – I do Brasil e IV de Portugal – essa época, foi lançado um apelo à gene-
na tarde do dia 7 de setembro de 1822. rosidade do povo do Sul em favor dos
SUMÁRIO
1 SPROUT, Margaret Tuttle. “Mahan: evangelist of sea power”. In: EARLE, Edward Mead. Makers of
modern Strategy. Princeton: Princeton University Press, 1973, p. 415.
ALFRED THAYER MAHAN: O HOMEM (I)
temas navais e influenciou sobremaneira Desde cedo, Alfred desejou entrar para
as políticas nacionais de diversos países? a Marinha de Guerra, apesar da oposição
de seu pai, que acreditava ser mais produ-
ALFRED THAYER MAHAN:
tiva para o seu filho a vida em uma profis-
UM MARINHEIRO RELUTANTE E
são liberal. Sobre isso, disse Alfred:
AUTOR VIGOROSO
Alfred Thayer Mahan nasceu em 27 de Minha entrada na Marinha foi totalmen-
setembro de 1840, na cidade de West Point, te contra o desejo de meu pai. Não me
estado de Nova Iorque, Estados Unidos. lembro de todos os seus argumentos,
Filho do professor de engenharia civil e mi- mas me disse que eu era muito mais pre-
litar da Academia Militar de West Point, parado para a vida civil do que para a
Dennis Hart Mahan,2 e de Mary Helena Okill vida militar, pelo que ele me conhecia.
Mahan, uma professora protestante profun- Eu acredito, hoje em dia, que no fundo
damente religiosa3, Alfred, desde cedo, ad- ele estava certo; apesar de eu não ter
quiriu de seu pai um profundo sentido de motivos para reclamar de qualquer
dever e um comportamento cortês e polido. insucesso, estou convencido de que
Apesar de seu pai ter sido criado na re- faria melhor na vida civil.6
ligião católica em virtude de sua origem Apesar da oposição de seu filho em se-
irlandesa, Alfred tornou-se protestante guir a vida civil, Dennis ajudou-o, enviando
episcopal, fruto da ascendência de sua avó cartas de apresentação ao secretário da
Mary Jay, que muito o influenciou.4 Guerra, Jefferson Davis, para obter uma no-
O jovem Alfred viveu a maior parte de meação para a Academia Naval de
sua infância em West Point, local onde seu Annapolis. Como era costume na ocasião, o
pai permaneceria como professor por qua- jovem Alfred Mahan enviou uma carta ao
se 40 anos. Com 12 anos de idade foi envi- deputado de seu estado, Nova Iorque,
ado à escola secundária em Hagerstown, Ambrose Murray, solicitando indicação para
no estado de Maryland, e, dois anos de- Annapolis. Escreveu Alfred o seguinte:
pois, entrou para o Columbia College, hos-
pedando-se na casa de seu tio, Milo Não posso permitir que essa ocasião
Mahan5, professor de história eclesiástica passe sem expressar minha sincera grati-
no Seminário-Geral Teológico na cidade de dão pelo gentil apoio que o senhor me
Nova Iorque. Milo teve profunda influên- tem dado para obter o fim que tenho em
cia na vida religiosa de Alfred. mente. Sua gentileza tem sido muito apre-
2 Dennis Hart Mahan nasceu em 1802, em Norfolk, Virginia. Graduou-se pela Academia Militar de West
Point em 1824 como primeiro aluno de sua turma. No ano seguinte, seguiu para a França, onde se
formou em engenharia de fortificações. Em 1838, tornou-se professor dessa academia, lá permane-
cendo até sua morte, em 1871. Casou-se com Mary Helena em 1839. Fonte: SEAGER II, Robert.
Alfred Thayer Mahan. The man and his letters. Annapolis: United States Naval Institute, 1977, p.
3. No subitem 2.2.2 será discutida com maior profundidade a influência de Dennis Mahan sobre o
pensamento de Alfred.
3 Ibidem, p. 3.
4 TAYLOR, Charles Carlisle. The life of Admiral Mahan, naval philosopher. op. cit, p. 3 e SEAGER II,
Alfred Thayer Mahan. The man and his letters op. cit, p. 6.
5 Milo Mahan foi professor de Teologia e de Filosofia, tendo estudado em profundidade os filósofos
gregos. Segundo Robert Seager, Milo teve considerável influência sobre Alfred Mahan. Fonte:
SEAGER, Alfred Thayer Mahan. The man and his letters, op. cit. p. 5.
6 MAHAN, Alfred Thayer. From sail to steam. New York: Harper & Brothers Publishers, 1907, p. xiv.
ciada, pelo meu profundo desejo de en- de compreender e a clareza de perceber pro-
trar nessa profissão [da Marinha], e real- blemas, que o faziam se distinguir entre os
mente seria um grande desapontamento seus pares pela inteligência”.10
eu ser obrigado a desistir desse desejo7. O desempenho acadêmico de Mahan foi
acima da média. Com o passar dos anos na
Em 30 de setembro de 1856, o jovem Academia, entretanto, Mahan tornou-se
Alfred era declarado aspirante de Marinha introvertido e solitário, incapaz de se rela-
na Academia Naval de Annapolis, estado cionar satisfatoriamente com seus colegas
de Maryland. de turma. Durante os anos em Annapolis,
PRIMEIROS TEMPOS NA MARINHA Mahan fez poucos amigos e tornou-se uma
figura impopular.
Mahan tinha 15 Mahan permaneceu
anos quando entrou três anos em Annapolis,
para Annapolis. No “Ele [Mahan] tinha uma vindo a graduar-se em
início de sua estada na brilhante memória, mas 2 lugar na classe de
o
7 Carta de Alfred Thayer Mahan a Ambrose Murray de 14 de abril de 1856, escrita de Nova Iorque.
Fonte: SEAGER II, Robert; MAGUIRE, Doris. Letters and papers of Alfred Thayer Mahan. V1, op.
cit, p. 3.
8 SEAGER II, Alfred Thayer Mahan. The man and his letters, op. cit. p. 12.
9 Ibidem, p. 12.
10 TAYLOR, op. cit. p. 8.
11 O primeiro aluno da turma de 1859 foi William Briggs Hall, que pediu demissão da Marinha quando foi
deflagrada a Guerra de Secessão. Agregou-se ao Exército da Confederação e, depois do término da guerra,
foi assessor do Exército egípcio, indicado pelo General Sherman. Fonte: TAYLOR, op. cit. p. 10.
12 MAHAN, From Sail to Steam, op. cit. p. 75.
uma vez que havia, segundo ele, liberdade na uma visão tipo ‘terremoto’; o Pão de Açú-
troca de experiências com os professores e car, a distante Serra dos Órgãos, as altas
instrutores.13 montanhas próximas que nos rodeiam, as
O ambiente em Annapolis era favorável numerosas curvas de sua linha de costa e
à causa do Sul, inclusive com muitos aspi- diversificadas escarpas que nos dão a co-
rantes de lá provenientes, ardorosos de nhecer são contínuas novidades”18.
seus ideais. Acreditavam que a Justiça es- Em 31 de agosto de 1861, foi promovido
tava a seu lado e que a União queria limitar a capitão-tenente19, embarcando, logo após,
seus direitos e liberdade14. O cerne da des- na corveta a vapor USS Pocahontas20 des-
confiança entre os dois lados já contagia- tacada na Flotilha do Rio Potomac. Sua
va o ambiente acadêmico e, dentro de pou- ascensão rápida a capitão-tenente foi mo-
cos anos, muitos daqueles colegas de tur- tivada pela aceleração das promoções du-
ma estariam lutando em lados opostos, in- rante o primeiro ano da Guerra de Seces-
clusive Mahan, que se são, deflagrada pouco
agregou à União, mais tempo antes.
para preservá-la do Mahan travou contato com Mahan se filiou à
que para abolir a escra- causa da União e parti-
vidão, principal causa as péssimas condições dos cipou no Pocahontas
da guerra15. escravos na Carolina do do ataque às forças
Após sua gradua- confederadas em Port
ção em Annapolis, o Sul, tornando-se Royal, na Carolina do
G u a r d a - M a r i n h a 16 imediatamente um Sul, em novembro de
Mahan foi designado abolicionista 1861. Em seguida, o na-
para a Fragata USS vio foi designado para
Congress 17 , que se a Estação de Bloqueio
encontrava em patrulha no Atlântico Sul, do Atlântico Sul, em patrulha entre
na função de ajudante de ordens do Georgetown, na Carolina do Sul, e Ferdinanda,
comodoro Joshua Sands, comandante da na Flórida, longe dos grandes combates na-
Estação Naval do Brasil. Nessa oportuni- vais entre a União e a Confederação. Nessa
dade, teve a chance de conhecer o Rio de estação de pouca atividade bélica, Mahan tra-
Janeiro. Disse ele, sobre a cidade brasilei- vou contato com as péssimas condições dos
ra, que “a magnífica paisagem do Rio per- escravos na Carolina do Sul, tornando-se ime-
manece e precisa permanecer próximo de diatamente um abolicionista.21
13 Ibidem, p. 84.
14 Ibidem, p. 85.
15 TAYLOR, op. cit. p. 11.
16 Em inglês, passed midshipman.
17 O USS Congress era um navio a vela do tipo fragata com 1.867 toneladas de deslocamento, comple-
tada em 1842, armada com 50 canhões de diversos calibres. Foi afundada durante a Guerra de
Secessão pelo navio confederado USS Virginia. USS significa “United States Ship”. Fonte: SEAGER
II, Letters and papers, v. 1, op. cit. p. 84.
18 MAHAN, From sail to steam, op. cit. p. 147.
19 Em inglês, lieutenant na Marinha dos EUA.
20 O USS Pocahontas era uma corveta deslocando 694 toneladas, com 11 canhões e uma tripulação de
173 homens. Fonte: SEAGER II, Alfred Thayer Mahan. The man and his letters, op. cit. p. 36.
21 Ibidem, p. 37.
Em setembro de 1862, Mahan foi desig- rante Dahlgren, a bordo do USS James
nado para servir como instrutor de Adger26, quando este almirante entrou, em
marinharia na Academia Naval, transferida abril de 1865, no Porto de Charleston, recen-
de Annapolis para Newport, Rhode Island, temente capturado das forças confederadas.
de modo a afastá-la dos combates da guer- O historiador Robert Seager II atestou que
ra. Mahan lá permaneceu por cerca de um seu desempenho como oficial de armamento
ano. Sendo um oficial que mantinha distân- do esquadrão, sob as ordens de Dahlgren,
cia dos aspirantes, não deixou boas lem- não foi dos melhores, uma vez que este almi-
branças. Ainda na Academia, foi designado rante o transferiu de volta ao Seminole por
para o USS Macedonia22, acompanhando não controlar adequadamente os estoques
os aspirantes em uma viagem de instrução. de munição do esquadrão27. Parecia que
Esse período no Macedonia foi de mui- Mahan não se sentia à vontade em navios.
ta alegria para Mahan, pois o navio foi des- A guerra finalmente terminara, e Mahan
tacado para um cruzeiro à Europa, onde não participou ativamente de sua conclu-
teve oportunidade de visitar Paris, que são, ora estacionado em navios afastados
muito o encantou. Além disso, nesse mes- do campo de lutas, ora prestando serviços
mo navio, travou estreito contato com o em terra, como na Academia Naval, onde
comandante, capitão de corveta23 Stephen permaneceu por pouco mais de um ano.
Luce, que viria a ter um importante papel Nesse mesmo ano de 1865 foi promovido a
na carreira de Mahan, e com William capitão de corveta, tendo sido designado
Sampson, futuro almirante que se destaca- imediato do USS Muscoota28, onde sofreu
ria na Guerra Hispano-Americana, em 1898. com uma forte febre tropical, permanecen-
No regresso de sua comissão, Mahan foi do muitos dias afastado do serviço. Nova-
designado para servir no USS Seminole24, mente foi atingido por forte depressão, sen-
agregado ao Esquadrão de Bloqueio do Gol- tindo-se frustrado, solitário e sem amigos
fo, em frente a Sabine Pass e Galveston. Essa próximos29. A vida no mar definitivamente
fase lhe foi extremamente frustrante. Dizia ele não lhe agradava de maneira alguma.
que essa comissão era desesperadamente Depois de um breve período no Estalei-
tediosa e que “nunca tinha visto um grupo ro Naval de Washington, Mahan foi desig-
de homens inteligentes reduzidos à total im- nado para servir na Fragata USS Iroquois,
becilidade como os meus colegas de navio”.25 na Estação Asiática, onde pôde visitar a
Logo em seguida, foi designado para o esta- China, o Japão e o Extremo Oriente. Nessa
do-maior do comandante em chefe do Es- região, Mahan foi atingido novamente por
quadrão de Bloqueio do Atlântico Sul, Almi- forte doença quando em Nagasaki30, afas-
22 O USS Macedonia era um navio obsoleto, armado com quatro velhos canhões. Tinha a tarefa de
adestrar os aspirantes da Academia Naval nas fainas marinheiras. Fonte: Ibidem, p. 37.
23 Capitão de corveta é tenente-comandante (lieutenant-commander) na Marinha norte-americana.
24 O USS Seminole era uma pequena chalupa armada com nove canhões. Fonte: Ibidem, p. 38.
25 Ibidem, p. 38.
26 O USS James Adger era uma escuna a vapor armada com 17 canhões. Fonte: SEAGER II, v. 1, Letters
and papers, op. cit. p. 88.
27 Ibidem, p. 41.
28 O USS Muscoota era uma barca de madeira armada com dez canhões de diversos calibres. Fonte:
SEAGER II, v. 1, Letters and papers, op. cit. p. 94.
29 SEAGER II, Alfred Thayer Mahan. The man and his letters, op. cit. p. 43.
30 TAYLOR, op. cit, p. 18.
tando-se de seu navio por breve período No período entre 1870 e 1875, serviu ora
de tempo. Sentia-se mal a bordo, e aquele em unidades de terra ora em navios (no
tipo de vida lhe desagradava. Em abril de segundo caso a contragosto), tais como
1867, escreveu o seguinte para a sua mãe: no Navio Mercante USS Worchester33, e
em fevereiro de 1873 no comando do USS
Minha situação a bordo é de grande iso- Wasp34, no Rio da Prata, um navio em pés-
lamento, e muitas vezes é difícil supor- simas condições operacionais. A inabilida-
tar. Sobre mim o peso é maior porque de de Mahan em manobras marinheiras
não estou certo de que isto é o que que- mostrou-se mais uma vez, quando no co-
ro fazer. Tenho dúvidas se devo insistir, mando do Wasp.
quando menciono minhas dificuldades Um fato inusitado ocorreu em junho de
e dúvidas. Deus me colocou em uma si- 1874. Ele chocou-se com a porta flutuante
tuação, como disse, de quase total iso- de um dique seco em Montevidéu, impedin-
lamento, de sofrer a do a sua retirada até o
dúvida da discipli- reparo total da porta.
na e da incerteza.31 A inabilidade de Mahan em Ficou preso nesse di-
que por cerca de dez
O período a bordo manobras marinheiras dias. Não satisfeito,
do Iroquois, embora mostrou-se mais uma vez, logo depois Mahan
extremamente penoso,
foi profícuo para sua
quando no comando do Wasp chocou-se com uma
barca no mesmo porto,
formação intelectual. e, em 3 de novembro de
Mahan leu avidamente obras de John 1874, colidiu o seu navio com um vaso de
Motley, Leopold Von Ranke e de François guerra argentino no porto de Buenos Aires,
Pierre Guizot. A História começou a fazer durante uma tempestade.35
parte de sua vida. As lides do mar, por ou- Pouco antes de assumir o comando do
tro lado, só traziam desesperança e temor. Wasp, Mahan casou-se, em junho de 1872,
O ano de 1870 foi um ano importante com Ellen Lyle Evans. Foi um relaciona-
para Mahan, pois, ao passar pela Europa, mento que perdurou durante toda a sua
pôde assistir à queda do Império francês, vida. Dessa relação nasceram duas mulhe-
esmagado pelos alemães. Esse aconteci- res, Ellen Evans, nascida em Montevidéu
mento histórico, segundo ele, fez desapa- em 1873, e Helen Kuhn, em 1877, e um ho-
recer o velho, Napoleão III, e surgir o novo, mem, Lyle Evans, em 1881. A Ellen Lyle pode
o Império alemão, uma “força organizada e ser imputada parte do sucesso editorial de
disciplinada”.32 Esse fato provocou profun- Mahan, já que foi uma grande incen-
do impacto em seu pensamento. tivadora de seu marido, muitas vezes trans-
31 Carta de Alfred Mahan para sua mãe, Mary Helena Okill Mahan, escrita a bordo do USS Iroquois em
28 de abril de 1867. Fonte: SEAGER II, v. 1, Letters and papers, op. cit. p. 99.
32 TAYLOR, op. cit, p. 19.
33 O USS Worchester era um mercante armado de 3.050 toneladas de deslocamento, com 14 canhões.
Fonte: SEAGER II, v. 1, Letters and papers, op. cit. p. 359.
34 O USS Wasp foi um navio britânico que forçava o bloqueio estabelecido pela União, tendo sido
capturado durante a Guerra de Secessão. Seu nome fora mudado para Wasp em junho de 1865.
35 LANKIEWICZ, Donald. The Reluctant Seaman. 2007, p. 4. página www.thehistorynet.com. Acesso
em 26 de abril de 2007.
crevendo seus textos em máquina de es- po, no entanto lera um grande volume de
crever e revisando os manuscritos. relatórios dos dois lados e se correspondeu
Em agosto de 1875, Mahan foi designa- com numerosos participantes dos eventos
do para o Arsenal Naval de Boston, já ca- ocorridos, o que lhe fez escrever um traba-
pitão de fragata,36 e em 1877 voltou a lho com razoável sustentação argumen-
Annapolis como chefe do Departamento tativa. Nessa obra, Mahan elogiou o Almi-
de Artilharia, onde permaneceu por três rante David Glasgow Farragut, tanto no
anos. O evento mais importante ocorrido ponto de vista político como no militar, por
com Mahan nesse período foi o 3o lugar sua rápida captura de Nova Orleans em
obtido em um concurso de monografias, 186240. Alguns anos depois, Mahan escre-
com um trabalho sobre a educação naval, veria duas biografias, uma de Lorde Horatio
patrocinado pelo United States Naval Nelson, seu modelo de herói naval, e outra
Institute em 1878. Embora na competição exatamente de Farragut, seu modelo de al-
tenham concorrido apenas dez artigos, o mirante vencedor.
texto de Mahan foi Mais uma vez, a
considerado reformis- inabilidade em mano-
ta, uma vez que propu- Mais uma vez, a brar navios se fez pre-
nha a modernização
dos currículos da Aca-
inabilidade em manobrar sente. Mahan colidiu,
em um dia claro e mar
demia Naval, de modo navios se fez presente. calmo, com uma barca
a incrementar as qua- Mahan colidiu, em um dia a vela que tinha, sem
lificações acadêmicas dúvida alguma, prefe-
dos aspirantes37. Com claro e mar calmo, com rência de passagem. O
esse artigo, Mahan uma barca a vela que tinha, Wachusset deveria
tomou gosto pela es- permitir que a barca
crita, uma fuga dos fra-
sem dúvida alguma, passasse, porém mais
cassos como oficial de preferência de passagem uma vez Mahan come-
Marinha embarcado. teu um erro, levando à
Em julho de 1880, voltou a servir no Ar- colisão. O Tenente Hugh Rodman, oficial
senal Naval de Nova Iorque, no Brooklin, do navio, em conversa com um colega ofi-
onde permaneceu até 1883, quando assu- cial logo após o acidente, recebeu como
miu o comando do USS Wachusset38, esta- resposta sarcástica em relação ao ocorrido
cionado em Callao, no Peru. Em 1882, o seguinte comentário: “O Oceano Pacífi-
Mahan escreveu seu primeiro livro, The co não foi grande o bastante para o
Gulf and Inland Waters39, que tratou das Wachusset se manter afastado do caminho
operações navais ocorridas durante a Guer- dos outros”.41 Sua falta de intimidade com
ra de Secessão. Ele servira no teatro de as lides marinheiras passava a ser discuti-
operações da guerra durante pouco tem- da por todos de modo jocoso.
36 O posto de capitão de fragata na Marinha brasileira corresponde a commander na Marinha norte-
americana. Mahan foi promovido a este posto em 1872.
37 SEAGER II, Alfred Thayer Mahan. The man and his letters, op. cit. p. 120.
38 O USS Wachusset era uma escuna lançada ao mar em 1861, armada com sete canhões de diversos
calibres. Fonte: SEAGER II, v. 1, Letters and papers, op. cit. p. 556.
39 MAHAN, Alfred Thayer. The Gulf and Inland Waters, New York: Charles Scribner, 1883.
40 SUMIDA, Jon Tetsuo. Inventing Grand Strategy and teaching command. op. cit, p. 19.
41 LANKIEWICZ, op. cit. p. 4.
Foi nesse ambiente hostil e de poucas específico que penso ser necessário
alegrias pessoais que Mahan recebeu, possuir. Temo que o senhor me dê mais
quando o seu navio estava em Guaiaquil, crédito do que realmente possuo e ter
no Equador, um convite que o deixou dado mais atenção à questão do que
extasiado. O Comodoro Stephen Luce42 es- eu... minha resposta ao senhor é sim, eu
tava organizando a Escola de Guerra Naval gostaria de servir [na EGN-EUA], se o
dos EUA (EGN-EUA) em Newport, Rhode senhor, depois de ler minha carta, ainda
Island43. Ele precisava de um instrutor de me quiser. Certamente não acredito es-
história naval e estratégia para se agregar tar certo em me recusar a ajudar neste
ao corpo docente da escola. Mahan não novo, difícil e necessário trabalho, se
foi o primeiro nome escolhido por Luce44. no julgamento de outros eu for útil.45
Ele convidara o Capitão de Corveta Caspar
Goodrich, que acabara de se estabelecer Imediatamente, Mahan se dedicou aos
em Washington, e estudos históricos,
que, em virtude do de- preparando-se para
sejo de permanecer A designação de Mahan assumir a instrutoria
nessa cidade, decli- em Newport. O histo-
nou do convite.
para a EGN-EUA foi o riador William Livezey
Mahan foi a escolha ponto de virada em sua afirmou que a designa-
que se seguiu. Prova- apagada carreira ção de Mahan para a
velmente Luce leu o EGN-EUA foi o ponto
primeiro livro de de virada em sua apa-
Mahan, The Gulf and Inland Waters, de gada carreira. Disse Livezey que, “de um
1883, o que lhe deve ter agradado, daí tê-lo amplo ponto de vista, a carreira de Mahan
convidado para a função de instrutoria na começou com a criação, em 1884, da EGN-
Escola de Guerra. Mahan aceitou imediata- EUA”46. A existência da escola se devia para
mente o convite e em carta para Luce disse qualificar oficiais dos postos mais eleva-
o seguinte: dos da Marinha dos EUA em estratégia e
na arte de conduzir a guerra, de modo a
Gostaria muito de assumir essa função. que estivessem preparados para assesso-
Acredito ter a capacidade e talvez algu- rar os chefes navais em política naval naci-
ma atitude natural para o estudo em onal e quando ordenado assumir o coman-
questão. Ao me questionar, não acredi- do de importantes unidades da Marinha
to ter neste momento o conhecimento no “intrincado mundo da guerra”.47
42 O Comodoro Stephen Luce é considerado o “pai” da EGN-EUA (Naval War College). Nasceu em 1827
e faleceu em 1917. Fonte: SEAGER II, v. 1, Letters and papers, Op. cit. p. 577. No subitem 2.2.2
será discutida a sua influência sobre Mahan.
43 A EGN-EUA acabou sendo estabelecida em 6 de outubro de 1884. Fonte: SEAGER II, Letters and
papers, op. cit. p. 577.
44 Segundo o professor Phillip Crowl, Mahan foi efetivamente a terceira escolha. O segundo nome
escolhido por Luce não foi por ele citado. Fonte: CROWL, Phillip. Alfred Thayer Mahan: the naval
historian. op. cit, p. 446.
45 Carta de Alfred Mahan para Stephen Luce de 4 de setembro de 1884, a bordo do USS Wachusset, em
Guaiaquil, no Equador. Fonte: SEAGER II, v. 1, Letters and papers, op. cit. p. 577.
46 LIVEZEY, William. Mahan on Sea Power. op. cit, p. 11.
47 TAYLOR, op. cit. p. 37.
Por cerca de dois anos ele se preparou tória era “não só reacionária, como impraticá-
com afinco para a sua nova função, que vel”, segundo Phillip Crowl.51
muito lhe agradava. Conduziu, assim, um Ao se preparar para a tarefa de transmi-
estudo sistemático da história naval, tir conhecimentos sobre estratégia e táti-
centrando suas pesquisas nos séculos cas navais para os alunos da Escola de
XVII e XVIII, procurando analogias entre Guerra, Mahan tinha uma série de
as guerras terrestres e navais, de modo a questionamentos. Em carta a seu colega
constituir uma teoria de tática naval.48 William Anderson, disse o seguinte:
A carreira acadêmica de Mahan realmen- Quando fui inicialmente designado para
te começou em Newport, onde atingiu sua ministrar aulas de história naval em nossa
maturidade intelectual. Escola de Guerra Naval, me perguntei
como transformar a experiência com navi-
A MATURIDADE INTELECTUAL os a vela de madeira, com seu armamento
rudimentar, em utilidade no presente? A pri-
Em 1886, Mahan iniciou suas palestras meira resposta que obtive foi demonstran-
na EGN-EUA, lá permanecendo até 1893, do a tremenda influência que o poder na-
com pequenas interrupções em 1889, no val, sob qualquer forma, exerceu no curso
Arsenal de Puget Sound, e em poucos anos da história. A segunda resposta veio com
em que a escola não ministrou cursos re- o prosseguimento de meus estudos, que
gulares. Nessa função, Mahan foi promo- foi demonstrar que os princípios de guerra
vido a capitão de mar e guerra49 em 1886, receberam confirmação na velha experiên-
vindo posteriormente a substituir Luce na cia naval, da mesma forma que eles recebe-
presidência da escola50, designado este ram em relação à guerra terrestre em todas
para comandar a Força Naval do Atlântico as várias fases nos últimos 25 séculos. O
Norte. presente trabalho é esse resultado.52
Houve muita resistência à Escola de Guer-
ra nos círculos navais no período. Em uma A partir de suas palestras, abarcando o
época de grandes avanços tecnológicos no período dos séculos XVII e XVIII, Mahan es-
campo da guerra naval, os estudos de histó- creveu e publicou em 1890 o livro que se tor-
ria naval e das táticas realizadas por Nelson naria um clássico de história naval: o The
nas guerras napoleônicas eram considerados Influence of Sea Power upon History, 1660-
irrelevantes e anacrônicos. O importante para 1783. Em seu prefácio, Mahan estabelece como
qualquer oficial da época era estudar as ino- finalidade proceder a um exame geral da histó-
vações técnicas agregadas aos sistemas de ria da Europa e da América, com vistas ao efei-
máquinas e de artilharia modernas e não his- to que teria o poder marítimo sobre os rumos
tória. Considerava-se que o que ocorreu no dessa história. Essa obra teve imediato impac-
passado não teria qualquer aplicação na nova to no meio naval, principalmente na Grã-
guerra do final do século XIX. Para esse gru- Bretanha. As razões para isso eram evidentes.
po considerável de oficiais, a ênfase na his- O livro baseava-se na própria história naval
britânica e, o mais importante, respaldava o uma série de guerras universais que dura-
sucesso de suas políticas navais do período. riam enquanto Luís XIV vivesse”.54 Para
Mahan iniciou a introdução do livro apre- ele, nessas guerras contínuas o poder ma-
sentando a sua argumentação política, na qual rítimo tivera, em menor ou maior grau, uma
os negócios marítimos tiveram um grande e grande importância.55 O período abarcado
decisivo efeito sobre o curso da história e na pelo seu estudo transita até 1783, isto é, o
prosperidade das nações.53 O seu argumento fim da Revolução Americana, com o trata-
político-econômico foi baseado na proposi- do de paz assinado em Versailles em 3 de
ção básica de economia de que as viagens e o setembro de 1783.
tráfego marítimo foram mais fáceis e mais bara- O historiador naval inglês Sir John Knox
tos do que em terra. Desde o início de sua Laughton, ao comentar o livro de Mahan
proposição, Mahan procurou enfatizar a no Edinburgh Review, da Escócia, disse
centralidade do mar nos destinos das nações. que o The influence of Sea Power upon
Uma interessante dis- History era uma “es-
cussão foi a realizada em
relação às seis condições
Durante os dois últimos plêndida apoteose da
coragem, tenacidade,
que afetavam o poder dias gastei metade do meu habilidade e poder da
marítimo, que serão apre- tempo, atarefado como Inglaterra”. Era a acei-
56
Os ingleses se abismaram por ter sido erro se ele não se converter num clássico
um norte-americano e não um britânico que naval”.61 Além do apoio de Roosevelt, o
melhor descrevera as políticas navais ingle- senador Cabot Lodge também ficou viva-
sas da época, o que não deixou de ser uma mente impressionado com o livro, uma vez
grande surpresa. Além disso, a época em que era partidário da expansão de seu país
que o livro foi lançado não poderia ter sido em direção ao Caribe e ao Pacífico. Mahan
mais propícia para o autor, assim como para defendera com entusiasmo a obtenção de
o Almirantado inglês. No ano de 1889 havia bases nessas regiões como um dos pilares
sido estabelecida a política do “Two Power para o estabelecimento de um poder maríti-
Standard”59, e Mahan, sem perceber, proveu mo poderoso. Por seu lado, seu comandan-
de argumentos os políticos ingleses que te, o Almirante Luce, disse o seguinte, a res-
desejavam a expansão britânica no mar. peito dessa obra de Mahan:
Na Alemanha, o livro foi um retumbante
sucesso. O kaiser, ao ler o livro de Mahan, Esta obra é um trabalho excepcional;
viu o respaldo neces- não existe nada como
sário para a expansão isso em toda a litera-
colonial de sua nação Mahan desejava tura naval. Nenhum
e o desenvolvimento demonstrar a importância outro autor com o qual
de um forte poder ma- mantive contato con-
rítimo, de modo a con-
que o mar tinha para o duziu esse tema com o
testar o poder da Grã- desenvolvimento das espírito liberal e, por
Bretanha. Em maio de nações, tomando como que não dizer, filosófi-
1894, diria que não es- co ou comentou a his-
tava lendo somente o exemplo a Grã-Bretanha tória da Marinha e
livro de Mahan, mas suas realizações nos
sim o devorando, com o propósito de negócios do Estado, apontando a sua
decorá-lo e fazer com que sua leitura fosse importância para a vida nacional. Este
obrigatória nos navios de sua Marinha.60 trabalho é inteiramente original em sua
No país de Mahan, os EUA, o livro inici- concepção, brilhante em sua constitui-
almente obteve menor impacto, no entanto ção e acadêmico em sua execução62.
foi avidamente lido por Theodore
Roosevelt, que viria a ser Presidente da Re- Em outros países, o impacto dessa obra
pública. Roosevelt não só adorou o livro de Mahan foi também considerável. Tra-
como disse: “Durante os dois últimos dias duções para francês, alemão, japonês, rus-
gastei metade do meu tempo, atarefado como so, espanhol e italiano foram logo dissemi-
estava, lendo o seu livro. Incorro em grave
59 Política agressiva inglesa estabelecida em 1899 que determinava que a esquadra de batalha desse país deveria
ser igual ou maior em números que os dois poderes navais que se seguiam. Utilizava-se como referência
o número de encouraçados componentes da esquadra de batalha, segundo memorando de Reginald Mc
Kenna, primeiro lorde do Almirantado, para o primeiro-ministro H. Asquith, de maio de 1909.
60 CAMINHA, João Carlos Gonçalves. “Mahan: sua época e suas ideias”. Revista Marítima Brasileira.
Rio de Janeiro: Serviço de Documentação da Marinha, 3o trim 1986, p. 22. Excelente artigo escrito
pelo Almirante Caminha e que merece leitura complementar.
61 Ibidem, p. 22.
62 TAYLOR, op. cit. p. 46.
nadas. Incompreensivelmente, não houve Power upon the French Revolution and
traduções para o português63. Empire65. Novo sucesso de vendas e de crí-
O que efetivamente Mahan desejava com tica. Ao contrário do primeiro livro, esta obra
o seu livro era demonstrar a importância que baseou-se em algumas fontes primárias, sen-
o mar tinha para o desenvolvimento das do que o período abarcado foi cerca de 1/5
nações, tomando como exemplo a Grã- do anterior; no entanto, devido à profundi-
Bretanha. Além disso, queria compreender dade e extensão da pesquisa, foi publicada
quais princípios governavam a guerra do em dois volumes. Em sua essência, esta vas-
mar desde a antiguidade. O que efetivamen- ta obra era uma continuação da primeira; no
te queria Mahan era despertar na classe entanto, sua análise foi mais detalhada. Se-
política dos EUA a centralidade das políti- gundo Sumida, a diferença marcante entre
cas navais para o desenvolvimento nacio- essa obra e a anterior foi a forma como o seu
nal. Considerava que a texto foi analisado, “al-
Marinha norte-ameri- terando-se fundamen-
cana tinha uma postu- O que efetivamente queria talmente a forma e a
ra defensiva, voltada Mahan era despertar na substância de seu ar-
para a guerra costeira,
sem pretensões além-
classe política dos EUA a gumento governamen-
tal”66. Nela encontra-se
fronteiras. Acreditava centralidade das políticas uma frase célebre, em
que essa postura era navais para o que o autor norte-ame-
deficiente e equivoca- ricano comentou que
da, indicando que o desenvolvimento nacional “o mundo jamais viu
melhor caminho era a uma demonstração
ofensiva e a projeção internacional. mais impressionante da influência do poder
Por muito pouco Mahan não se viu marítimo na história. Aqueles navios dis-
retornando para o mar. O chefe do Bureau tantes e desgastados por tempestades com
de Navegação da Marinha norte-america- os quais a Grand Armée francesa nunca se
na, Comodoro64 Francis Ramsay, pretendeu preocupou se contrapunham a ela e ao do-
movimentá-lo para uma nova função mínio do mundo”.67 Queria dizer que naque-
embarcada, logo após a publicação de seu la esquadra combativa e desgastada da Grã-
livro. Acreditava Ramsay que não era fun- Bretanha estava a própria dominação mun-
ção de um oficial de Marinha escrever li- dial, fato não percebido por Napoleão. Há
vros. Se não fosse pelo prestígio de Mahan certamente na afirmação de Mahan um cer-
e o sucesso de seu livro, ele seria fatalmen- to exagero, no entanto a frase tornou-se fa-
te transferido. mosa nos círculos navais.
Em 1892, Mahan lançou o segundo livro As duas obras compuseram, juntamen-
da série, chamado de The influence of Sea te com Sea Power in its relations to the
63 Existe um projeto a ser conduzido pela Escola de Guerra Naval do Brasil no ano de 2009 para
finalmente se traduzir esse livro para o português.
64 Posto não existente na Marinha brasileira, correspondendo a um grau intermediário entre capitão de
mar e guerra e contra-almirante.
65 MAHAN, Alfred Thayer. The influence of Sea Power upon the French Revolution and Empire 1793-
1812. v. 2, Boston: Little Brown, 1892.
66 SUMIDA, op. cit. p. 33.
67 MAHAN, Alfred Thayer. The influence of Sea Power upon the French Revolution and Empire 1793-
1812. op. cit p. 118.
68 MAHAN, Alfred Thayer. Sea Power in its relation to the War of 1812. 2. v. Boston: Little Brown,
1905.
69 SUMIDA, op.cit. p.120. Sumida inclui o livro The life of Nelson como o quarto livro da série. No
entanto essa obra foi uma detalhada biografia de Nelson e assim seria melhor classificada dentro da
série de suas biografias.
70 COLOMB, Phillip. Naval Warfare. 3. ed. London: Allen, 1899.
71 TILL, Geoffrey. Maritime Strategy and Nuclear Age. New York: St Martin Press, 1982, p. 28.
72 SCHURMAN, Donald. The Education of a Navy.op. cit, p. 66.
73 CROWL, op. cit. p. 447.
74 MAHAN, Alfred Thayer Mahan. Admiral Farragut. New York: Appleton, 1897.
75 TAYLOR, op. cit. p. 54.
76 Ibidem, p. 55.
77 SCHURMAN, op. cit. p. 66.
78 SEAGER II, v. 2, Letters and papers, op. cit. p. 103.
designação seria muito comemorada por ram, além de Mahan e Erben, o vice-rei da
qualquer oficial de Marinha daquele tem- Irlanda, diversos membros do gabinete, al-
po, no entanto para Mahan não foi. Disse mirantes e generais. Em seguida, Mahan
ele o seguinte: foi convidado para jantar com a rainha Vi-
tória, o que o deixou profundamente emo-
Eu estava pronto para ir para o mar, en- cionado e preocupado, pois foi a primeira
tretanto neste período decidi que escre- vez que deveria jantar com o seu uniforme
ver tinha para mim maiores atrações que de gala, ornado de medalhas e espada. Fi-
seguir com minha profissão e me pro- cou vivamente impressionado com o luxo
porcionaria melhor remuneração. Eu de- dos uniformes e das condecorações utili-
veria ter solicitado logo a minha reser- zadas pelos almirantes ingleses. Compare-
va, se tivesse os necessários 40 anos ceram ao banquete em sua homenagem,
de serviço, no entanto ainda faltavam além da rainha, o príncipe de Gales (poste-
quatro anos. Meu propósito era escre- riormente rei Eduardo VII), o duque de
ver logo a Guerra de 1812, enquanto Yorke (posteriormente rei George V), lorde
os eventos dessa guerra estivessem vi- Roberts, o Almirante de Esquadra Sir Henry
vos na minha mente, e por isso solicitei Keppel, além de inúmeros dignitários in-
não embarcar em navio algum, alegan- gleses e estrangeiros80.
do que solicitaria minha reserva quan- Semelhantes elogios Mahan recebeu,
do completasse 40 anos. Minha solici- também, na França. O crítico francês
tação foi descabida, pois eu não dera Auguste Moireau disse que “depois de seu
nenhuma garantia para isso, e a abertu- primeiro livro, e especialmente a partir de
ra desse precedente seria ruim para a 1895, Mahan estabeleceu a base para todo
Marinha.79 o pensamento em assuntos navais; foi as-
sim visto claramente que o poder marítimo
Assim, Mahan assumiu o comando do era o princípio que determinaria se os im-
Chicago e logo depois rumou para a Europa, périos cresceriam ou cairiam”.81
compondo uma força-tarefa norte-americana, No Japão, o próprio governo colocou
sob o comando do Almirante Henry Erben. os livros de Mahan em todas as escolas, e
Logo que o Chicago chegou ao Reino as academias militares adotaram The
Unido, um grande número de pessoas influ- influence of Sea Power upon History como
entes quis conhecer Mahan, convidando-o livro-texto. Livezey afirmou que o Japão
para diversas solenidades. Em Queenstown, estava se preparando para Tsushima e as-
na Irlanda, Mahan recebeu um telegrama da sim estabeleceu os fundamentos de sua
embaixada norte-americana em Londres di- política de “esfera de co-prosperidade”.82
zendo que Lorde Spencer, primeiro lorde do Em sua segunda visita à Inglaterra, ainda
Almirantado, gostaria de convidá-lo para um como comandante do Chicago, no ano se-
jantar e perguntava qual seria a data mais guinte, em 1894, Mahan foi homenageado
conveniente para esse evento. com um banquete público patrocinado pelo
Esse jantar realmente ocorreu na chega- lorde prefeito de Londres no St James Hall e
da do navio à Inglaterra, e a ele comparece- que contou com cerca de 400 convidados,
83 Ibidem, p. 64.
84 Viria depois a ser doutor honoris causa em História pelas Universidades de Harvard, Yale, Columbia,
Dartmouth e McGill. Fonte: TAYLOR, op. cit. p. 107.
85 LIVEZEY, op. cit, p. 68.
86 Ibidem, p. 75.
87 SEAGER II, Alfred Thayer Mahan. The man and his letters, op. cit. p. 255.
88 O Almirante Erben escreveu para o Bureau de Navegação em dezembro de 1893 dizendo que os
interesses de Mahan estavam fora da Marinha e que ele se importava pouco com a sua profissão,
sendo, assim, um mau oficial de Marinha. Seus interesses estavam voltados para a “literatura”,
segundo suas palavras, e sem qualquer conexão com o serviço naval. Fonte: SEAGER, Alfred Thayer
Mahan. The man and his letters, op. cit. p. 278.
89 Carta de Alfred Mahan para Samuel Ashe escrita de Genova, a bordo do USS Chicago, em 24 de
novembro de 1893. Fonte: SEAGER II, Letters and papers, op. cit. p. 181.
90 MAHAN, Alfred Thayer. The life of Nelson: the embodiment of Sea Power of Great Britain. 2. v.
Boston: Little Brown, 1997.
Desde o seu livro The influence of Sea nio ilumina o processo mental de Nelson,
Power upon the French Revolution and porém não é só por meio do raciocínio, quan-
Empire, Mahan se envolveu com esse per- do cara a cara com o perigo, ao ultrapassar o
sonagem fascinante que se confrontou abismo, que separa a percepção, apesar de
com a poderosa esquadra de Napoleão, clara, da convicção interna que sozinha sus-
impedindo o domínio do mar francês. tenta a ação mais elevada”94.
Mahan, em sua biografia de Nelson, afir- Mahan também abordou o Nelson ho-
mou que esse almirante inglês atuava como mem, com sentimentos, defeitos e qualida-
um verdadeiro agente do Estado britânico, des. Ao contrário de outros biógrafos mais
fazendo cumprir os ditames governamen- inquisitivos, inclusive em relação a Robert
tais onde fosse necessário com os seus Southey,95 que escrevera uma biografia de
navios de guerra. Mahan procurou, tam- Nelson em 1813, de cunho bem mais crítico
bém, enfatizar as características de coman- da conduta deste, principalmente na ques-
do de Nelson, que possuía uma combina- tão dos fuzilamentos por ele ordenados em
ção de qualidades políticas, administrati- 1799, depois dos jacobinos já terem se ren-
vas e militares, raras, segundo ele, em ape- dido honradamente no Reino das Duas
nas um homem. Nelson exibiu, de acordo Sicílias, Mahan procurou descobrir os im-
com sua opinião, superioridade nesses três pulsos privados nas ações públicas de
campos.91 Nelson96, procurando analisar sua vida ín-
Em Nelson, Mahan apontou “uma apre- tima. Um dos pontos mais polêmicos de
ciação sagaz das condições reinantes, com- Nelson foi o seu relacionamento com Emma
binada com sua alta resolução e firme discri- Hamilton, que foi devidamente discutido
ção”.92 Com esse tipo de percepção, Nelson por Mahan; no entanto, o autor norte-ame-
procurava sempre a decisão pela batalha ricano mencionou o caráter manipulador de
como uma questão de princípio. Esse ponto Emma sobre seu marido, Sir William Hamil-
era muito admirado por Mahan, que via nes- ton, embaixador britânico no Reino das
se procedimento de Nelson o toque ofensi- Duas Sicílias, e sobre o próprio Nelson,
vo e resoluto em destruir a esquadra inimi- “amante devotado, um homem crédulo que
ga, quando e onde se fizesse necessário. necessitava de adulação”97, segundo pa-
Mahan, além disso, considerava Nelson lavras do historiador Peter Gay. Para
um gênio, e sua admiração por ele igualava- Mahan, Nelson possuía as qualidades que
se à de Antoine Henri Jomini93 por Napoleão. o fizeram a incorporação do poder maríti-
Dizia Mahan que “um alto grau de raciocí- mo da Grã-Bretanha.98
Como não poderia deixar de ser, o livro teve Grã-Bretanha e os EUA, as perspectivas
imediata aclamação na Grã-Bretanha. Seu edi- estratégicas do Mar do Caribe e do Golfo
tor inglês, R. B. Marston, disse o seguinte: do México, o futuro do poder marítimo dos
EUA, perspectivas da política externa nor-
O senhor trouxe Nelson à vida novamen- te-americana, a sua preparação para a guerra
te. Como inglês e o primeiro a ler o seu naval e prognósticos para o século XX.
livro, posso verdadeiramente agradecer Em resumo, esses ensaios foram escri-
em nome de toda a minha nação, entre- tos para diversos periódicos entre dezem-
tanto tudo que farei é lhe anunciar que bro de 1890 e outubro de 1897, contudo
os agradecimentos da Grã-Bretanha es- essa obra de compilação não obteve o mes-
tão vindo tão cedo quanto Little Brown mo reconhecimento obtido com seus livros
enviar os livros para as livrarias.99 anteriores, sendo mais um trabalho
ensaístico, sem o rigor histórico das obras
O crítico literário do The Times, de Lon- anteriores. No entanto, ele foi escrito em
dres, J. R. Thursfield, profetizou que o Life um período importante da história norte-
of Nelson se tornaria um dos maiores clássi- americana, quando o Caribe passou a pre-
cos da literatura naval. Disse ele que muitas ocupar a sua política externa, culminando,
memórias de Nelson foram escritas, mas o no ano seguinte, na Guerra Hispano-Ame-
livro de Mahan não tinha rival à altura. To- ricana. Em realidade, o livro obteve mais
dos os estudantes de História que crédito na Grã-Bretanha do que nos EUA.
pesquisarem Nelson deveriam ler esse livro Contudo, com o advento da guerra em 1898,
como a “mais autorizada, acurada, adequa- esses ensaios foram lidos com maior deta-
da e psicológica biografia”100 do herói in- lhe e “entusiasticamente resenhados por
glês, segundo Thursfield. Realmente, essa jornais norte-americanos, influenciados
obra de Mahan até hoje é pesquisada como pelo momento do conflito com a
relevante e fundamental para se conhecer a Espanha”.103 Hoje em dia esse livro tem sido
vida de Horatio Nelson. A busca em fontes pouco mencionado.
primárias lhe rendeu bons frutos. Em 1898, logo depois da eclosão dessa
Nesse mesmo ano de 1897, Mahan lan- guerra, Mahan foi chamado para compor o
çou outro livro The interest of América in Naval War Board, com o propósito de for-
Sea Power, present and future101, uma se- necer ao secretário da Marinha, John Long,
leção de oito ensaios escritos por ele102, assessoria técnica e estratégica sobre as
nos quais foram discutidas questões rela- operações em curso.104 Segundo o historia-
tivas ao Havaí e sua importância para os dor Russell Weigley, o Naval War Board não
EUA, a necessidade de se obter o controle teve qualquer interferência na questão es-
do istmo do Panamá, as possibilidades de tratégica, uma vez que, embora não existis-
uma união de objetivos comuns entre a sem planos contingentes, a Marinha dos
EUA já tinha decidido atacar o “decrépito Pode parecer estranho, mas Mahan não
esquadrão naval espanhol nas Filipinas de estava na vanguarda do imperialismo108
modo a já obter superioridade na eventual norte-americano, representado por
mesa de negociações de paz”105. Theodore Roosevelt e Cabot Lodge, que
A posição de Mahan perante a guerra viam nessa iniciativa um projeto nacional e
contra a Espanha era clara. Acreditava que que a vitória sobre os espanhóis por Cuba
a causa norte-americana era justa e que a traria a oportunidade de anexar também as
Constituição de seu país deveria ser inter- Filipinas. Segundo Robert Seager II, Mahan
pretada para permitir a aquisição e admi- percebeu desde 1896 a necessidade e a
nistração de colônias106. Estava convicto oportunidade de expansão comercial no
de que a emergência dos EUA na arena in- Pacífico e nos mercados chineses, no en-
ternacional traria à tanto não existe, se-
consciência do povo gundo Seager, qual-
norte-americano que Mahan percebeu desde quer evidência ligando
uma aliança com a Grã- a anexação do arquipé-
Bretanha era necessá-
1896 a necessidade e a lago filipino com o im-
ria, sendo essa união oportunidade de expansão perialismo tradicional
anglo-saxônica bené- comercial no Pacífico e nos rooseveltiano. Acredi-
fica para o mundo. Em tava Mahan que a
carta a seu amigo in- mercados chineses aquisição de estações
glês George Sydeham de carvoagem em
Clark, disse o seguinte: Manila, Guam e na foz do Rio Yang-Tse era
adequada à futura expansão comercial em
Pessoalmente acredito que essa guerra direção à China.109 Certo, no entanto, foi
[contra a Espanha] é não somente justa, que Mahan acreditava que Deus conduzia
mas que os sentimentos de nossa de- os EUA para uma missão civilizadora nes-
mocracia como um todo, ao entrarmos sas colônias convertidas.110
na guerra, são livres de qualquer conta- No ano seguinte, Mahan foi convoca-
minação[...] a extensão da influência dos do para compor a delegação de seu país
EUA, a expansão territorial e de colôni- como especialista naval111 na primeira Con-
as são aceitas como quase uma unani- ferência de Paz de Haia, sob a presidência
midade de pensamento107. de Andrew White. Um fato que marcou a
105 WEIGLEY. Russell. The american way of war. Bloomington: Indiana University Press, 1977, p. 183.
106 SEAGER II, Alfred Thayer Mahan. The man and his letters, op. cit. p. 388.
107 Carta de Alfred Mahan para George Sydeham Clarke, escrita em 24 de maio de 1898 de Washington
DC. Fonte: SEAGER II, Letters and papers, op. cit. p. 556.
108 Define-se imperialismo como o conjunto de práticas e teorias que um centro metropolitano elabora
para controlar um território distante. O imperialismo promoveu disputas por fontes de matérias-
primas entre trustes e cartéis que, já tendo dominado o mercado interno em seus países de origem,
precisavam se expandir para além de suas fronteiras, defrontando-se com cartéis e trustes de países
concorrentes. Fonte: SILVA, Kalina Vanderlei; SILVA, Maciel Henrique. Dicionário de Conceitos
Históricos. São Paulo: Contexto, 2005, p. 218.
109 SEAGER, Letters and papers, op. cit p. 391.
110 Ibidem, p. 394.
111 Delegação composta, além de White e Mahan, por Seth Low e Stanford Newel, políticos norte-
americanos; William Crozier, do Exército; e Fred Holls, secretário da delegação. Fonte: TAYLOR,
op. cit. p. 94.
Nesse ano, 1900, Mahan recebeu uma Cambridge disse, em sua alocução de
comenda que muito o emocionou: a Meda- premiação, o seguinte:
lha de Ouro Chesney, conferida pela Royal
United Services Institution (Rusi)119. Essa A Medalha de Ouro Chesney foi criada
sociedade inglesa foi fundada em 1831, com em memória do falecido General Sir
o propósito de ser um local de debate para George Chesney, um distinto oficial do
oficiais da Marinha e do Exército interes- Corpo de Engenheiros. Essa comenda é
sados em assuntos militares. No início da para ser conferida, por decisão do Con-
existência da Rusi, os assuntos apresenta- selho da Rusi, ao autor que produzir um
dos eram de natureza tecnológica, no en- trabalho literário original, tratando de
tanto conferências sobre táticas e estraté- ciência militar e naval e literatura, em
gia foram, depois de certo tempo, proferi- prol do engrandecimento do Império
das120. Anualmente era escolhida a melhor britânico. A primeira comenda conferida
monografia, em uma competição aberta a pelo Conselho foi ao senhor, [Mahan]
todos que se dispusessem a escrever. A em consideração a seus três grandes li-
Rusi patrocinava também palestras de per- vros, The influence of Sea Power upon
sonalidades importantes que para lá se di- History, The influence of Sea Power
rigiam para discutir assuntos de defesa do upon the French Revolution and Empire
Império. Sir John Knox Laughton e Sir Phillip e The life of Nelson. É com grande satis-
Colomb foram expositores constantes na fação que lhe afirmo que seu nome foi
instituição. O Rusi também tinha outra ta- escolhido por unanimidade122.
refa importante, que era permitir que ares-
tas entre as Forças Armadas fossem lá apa- Dois anos depois de receber a Medalha
radas. Era também um local onde os milita- Chesney, Mahan foi eleito por unanimidade
res podiam debater abertamente assuntos novamente para ser membro honorário per-
que, por sua natureza, não seriam permiti- pétuo da Rusi, em retribuição pela dissemi-
dos dentro da caserna121. Com o passar do nação e prestígio conferido à história naval
tempo, a instituição passou a ser conside- britânica. Nesse mesmo ano, 1902, Mahan
rado um local respeitado e considerado pela foi eleito presidente da Associação Históri-
qualidade dos trabalhos apresentados. ca Americana, já sendo associado da Socie-
O Conselho da Rusi, sob a presidência dade Histórica de Massashusetts, da Soci-
do Duque de Cambridge, primo da Rainha edade Geográfica de Lisboa, em Portugal.
Vitória e comandante em chefe do Exército Alguns anos depois, entrou para a Socieda-
britânico, por unanimidade, resolveu con- de Histórica de Minnesota.123
ceder anualmente ao melhor autor selecio- Em 1906, Mahan foi promovido a contra-
nado a Medalha de Ouro Chesney, em re- almirante na reserva por um ato do Congres-
conhecimento pelos trabalhos e livros pu- so que permitiu a promoção daqueles ofici-
blicados sobre assuntos de Defesa do Im- ais que tivessem lutado na Guerra Civil.
pério britânico. Mahan foi, por esse moti- Mahan manteve o título de captain até o fim
vo, o primeiro escolhido pelo Conselho a de seus dias, embora já fosse legalmente con-
receber essa medalha. O Duque de tra-almirante. Continuou, também, como
palestrante emérito na EGN-EUA, enquanto Anos. O segundo foi George Brydges, Lorde
participou de diversos comitês designados Rodney (1718-1792), vencedor da Batalha dos
pelo Presidente da República, seu amigo Santos, em 1782, durante a Guerra de Inde-
Theodore Roosevelt. Em 1909, foi designado pendência americana. Disse Mahan que
para compor um grupo de oficiais que rece- “Hawke e Rodney são ilustrações destaca-
beu a incumbência de reorganizar a Marinha. das, o primeiro representando o espírito, o
Desse grupo faziam parte, além de Mahan e segundo a forma, de como eram os eficientes
inúmeros congressistas e almirantes, seu elementos do progresso humano naval ocor-
velho comandante e rido no século XVIII”.125
amigo Stephen Luce. O terceiro foi Richard
Em 6 de junho de Lorde Howe (1726-
1912, Mahan foi refor- 1799), vencedor da Ba-
mado e se afastou de talha do Glorioso 1o de
todas as tarefas gover- Junho, nas guerras da
namentais a ele deter- Revolução Francesa.
minadas, três meses Mahan o nomeou o al-
antes de completar seu mirante tático por exce-
72o aniversário. lência. O quarto biogra-
De 1901 a 1912, fado foi John Jervis, Earl
Mahan escreveu nove Saint Vincent (1735-
livros, quase um por 1823), vencedor da Ba-
ano. O primeiro deles talha do Cabo São
foi em 1901, Types of Vicente. Mahan a ele se
naval officers, drawn refere como o grande
from the History of disciplinador e estrate-
British Navy124. Esse gista. O escolhido se-
livro foi um libelo à Marinha Real britânica, guinte foi James Lorde Saumarez (1757-1836),
por ele sempre admirada. Mahan escolheu brilhante oficial de esquadra e comandante
seis oficiais dessa Marinha para demons- de divisão naval. Por fim, Edward Pellew, Vis-
trar as qualidades que ele reputava como conde Exmouth (1757-1833), destacado co-
necessárias para transformar oficiais co- mandante de fragata e oficial eficiente. Trata-
muns em líderes de homens. se, assim, do terceiro livro biográfico de
Ele começou descrevendo as condições Mahan, seguindo as vidas de Farragut e Nel-
gerais da guerra naval no início do século son, por ele escritas.
XVIII e o progresso ocorrido durante o trans- No ano seguinte, 1902, Mahan publicou
correr desse período. O primeiro chefe naval Retrospect and Prospect: Studies in
escolhido foi Edward Lorde Hawke (1705- International Relations, Naval and
1781), vencedor da Batalha da Baía de Political.126 Essa obra seguiu o formato das
Quiberon, em 1759, durante a Guerra dos Sete anteriores com artigos publicados em perió-
124 MAHAN, Alfred Thayer. Types of naval officers drawn from the History of the British Navy; with
some account of the conditions of Naval Warfare at the beginning of the Eighteenth Century and its
subsequent development during the Sail Period. Boston: Little Brown, 1901.
125 Ibidem, p. 152.
126 MAHAN, Alfred Thayer. Retrospect and prospect: studies in International Relations Naval and
Political. London: Sampson Low, Marston, 1902.
dicos, compilados em um livro127. Nessa obra, seguir a um conflito, afirmando que “falhan-
Mahan discutiu as condições determinantes do em criar, antes da guerra, uma Marinha
para a expansão naval dos EUA, a influência competente, capaz de aproveitar oportuni-
da Guerra da África do Sul sobre o prestígio dades surgidas para atacar unidades hostis
e os motivos que levaram à formação do Im- no mundo todo, não era possível, depois de
pério britânico, considerações que afetaram começado o conflito, corrigir o erro”128.
a disposição das Marinhas, o papel do Golfo Mahan concluiu que uma modesta Marinha
Pérsico nas relações internacionais, algumas poderia se contrapor a um poder naval mais
considerações sobre a regra militar de obedi- poderoso, quando condições geográficas e
ência e, por fim, um elogio ao Almirante outras possibilidades fossem consideradas.
Sampson, protagonista principal da Guerra Essa concepção se encaixava perfeitamente
Hispano-Americana. no caso dos EUA, após seus estudos da
O próximo trabalho de Mahan seria o Sea guerra no mar do século XVII ao XIX.129
Power in its relations to the War of 1812, o Em 1907, dois livros foram lançados:
terceiro volume da trilogia The influence of Some Neglected Aspects of War130 e From
Sea Power. Essa obra monumental de dois Sail to Steam. O primeiro era no estilo dos
volumes foi abordada de modo distinto por anteriores, com artigos selecionados já pu-
ele. Ao invés de apontar os benefícios que blicados; no entanto houve uma diferença
advêm para um país com o desenvolvimen- nesse trabalho: a inclusão de textos de dois
to de seu poder marítimo, ele discutiu as outros autores, Henry Pritchett e Julian
desastrosas consequências que a falta de Corbett. O primeiro discorreu sobre o esta-
preparação para a guerra no mar pelos EUA belecimento do princípio da arbitragem in-
motivou na Guerra de 1812 contra a Grã- ternacional e o segundo sobre a captura de
Bretanha. Com esse recado explícito, Mahan propriedade privada no mar. Mahan, por sua
queria convencer os cidadãos dos EUA de vez, abordou os aspectos morais e práticos
que o poder marítimo era importante para o da guerra, considerações sobre a Conven-
país. Afirmou categoricamente que a pros- ção de Haia de 1907 e a questão da imunida-
peridade comercial norte-americana depen- de da Marinha Mercante na guerra e, por
dia da segurança das linhas de comércio. fim, a guerra vista de um ponto de vista cris-
Uma de suas claras conclusões apontou tão, assunto que o interessava demasiado131.
para o fato de que um país que negligencie No segundo livro publicado, From Sail
o poder marítimo estará em uma posição de to Steam132, Mahan escreveu sua autobio-
inferioridade na mesa de negociação que se grafia, em que descreveu alguns aspectos
127 Os capítulos foram compostos de artigos publicados nos periódicos The World Work, Leslie Weekley,
The National Review, The Nattional Review and International Monthly e The Fortnightly Review.
Fonte: Ibidem, p.ix e x.
128 Ibidem, v. 1, p. 310.
129 SUMIDA, op. cit. p. 41.
130 MAHAN, Alfred Thayer. Some neglected aspects of war. Boston: Little Brown, 1907.
131 Esses artigos foram compilados do The Atlantic Monthly de julho de 1907 para o caso de Henry
Pritchett, ex-presidente do Instituto de Tecnologia de Massashussets; o The Nineteenth Century
and After de junho de 1907 para Sir Julian Corbett; e North American Review, National Review e um
trabalho apresentado em um congresso religioso realizado em Providence, Rhode Island, em no-
vembro de 1900 para o caso de Mahan. Fonte: Idem, p. xxiii.
132 MAHAN, Alfred Thayer. From Sail to Steam: recollections of naval life. London: Harper &
Brothers Publishers, 1907.
Esse livro realmente foi a sua última gran- of Royal Navy em sete volumes, organiza-
de obra histórico-teórica e não afetou a sua do pelo historiador Sir William Laird
reputação. Um ponto significativo dessa Clowes, correspondente naval do The Ti-
obra foi a conclusão de Mahan de que a mes e influente escritor.147 Por autorização
guerra era uma arte e não uma ciência. Ele especial do editor148, Mahan pôde trans-
discutiu intensamente a história da estra- crever o seu capítulo, que recebeu o título
tégia naval e os princípios, segundo ele, de Major Operations 1762-1783, transfor-
inalteráveis da estratégia e da tática. mando-o em livro de cerca de 280 páginas,
Os dois últimos anos de vida de Mahan com 14 capítulos descrevendo a Guerra da
foram de saúde debilitante. Nos anos de 1907 Independência dos EUA sob o ponto de
e 1908 sofrera duas operações, segundo ele vista naval.
motivadas pela pressão dos editores para A idade avançada de Mahan, acrescida
que escrevesse sempre mais. Seu coração do problema cardíaco, não o fazia perder as
cambaleava e sentia-se muitas vezes fraco. forças. Para seu amigo Clark disse que ainda
Nesses dois últimos anos dedicou-se a es- “podia andar numa velocidade de quatro mi-
crever Armaments and Arbitration144 e lhas por hora, embora não pudesse mantê-la
Major operations of the navies in the War por mais que uma hora”.149
of American Independence145. O primeiro li- No início de 1913, realizou com sua es-
vro, de 1912, foi composto de dez artigos posa e duas filhas viagens à França e à
publicados no North American Review e Itália, o que lhe trouxe muita alegria. Con-
no Century Magazine nos anos de 1911 e tava com 72 anos de idade.
1912. Os seis primeiros artigos, segundo Por ocasião da abertura das hostilida-
Mahan, foram escritos para apresentar ar- des da Grande Guerra, em agosto de 1914,
gumentos, frequentemente ignorados, que Mahan recebeu diversos convites para es-
nem o arbitramento em sentido geral nem o crever sobre os acontecimentos da guerra
arbitramento como forma específica de de- no mar150, no entanto se viu impedido de
cisão judicial, baseado em um código legal, publicá-los, devido a uma ordem especial
podem, em todas as oportunidades, ser apli- do Presidente dos EUA, Woodrow Wilson,
cados em processos que seguem um curso que determinou a todos os oficiais da ativa
natural das forças envolvidas, principalmen- e da reserva das Forças Armadas norte-
te quando envolvem o poder nacional. Em americanas que se abstivessem de escre-
seguida, discutiu o papel da força nas rela- ver sobre a Grande Guerra por ser “alta-
ções internacionais entre os Estados.146 mente indesejável e impróprio que oficiais
O segundo livro, de 1913, o seu último da Marinha e do Exército dos EUA façam
publicado, compôs um capítulo da History qualquer declaração na qual expressem
144 MAHAN, Alfred Thayer. Armaments and Arbitration. New Yorke: Harper & Brothers, 1912.
145 MAHAN, Alfred Thayer. Major Operations of the navies in the War of American Independence.
London: Sampson Low, Marston Ltd, 1913.
146 MAHAN, Alfred. Armaments and Arbitration. op. cit., p. iv.
147 SCHURMAN, op. cit. p. 91.
148 O editor foi Sampson Low and Marston.
149 TAYLOR, op. cit. p. 273.
150 Os periódicos que queriam artigos regulares de Mahan sobre o transcurso da guerra foram o The
Independent, de Nova Iorque, pagando cerca de 100 dólares semanais por cada artigo, uma boa
soma para a época, e o Leslie, também de Nova Iorque, pela mesma quantia semanal. Fonte: Ibidem,
p.279.
* Este texto foi escrito pelo autor em partes e épocas distintas. A Direção da RMB julgou que eles se
encadeiam de forma lógica e decidiu publicá-los em um mesmo artigo, oferecendo aos leitores uma
visão ampla sobre o tema. A primeira parte – A guerra naval até o emprego do canhão – foi publicada
na RMB do 2 o trimestre de 1993, págs. 165-185.
** Bacharel em História e doutor em Filosofia. Professor de História Naval, na Escola Naval.
1 Cf. Emery, Walter B. Archaic Egypt. Harmondsworth: Penguin, 1984, p. 38-9.
EVOLUÇÃO DA GUERRA – A guerra naval até o emprego do canhão – A guerra na idade moderna
dos povos do mar, que àquela altura amea- empregadas a bordo devem ter sido exclu-
çavam entrar no Delta2. Tais invasores eram sivamente as já citadas, de uso da infanta-
povos marítimos que haviam sido expulsos ria embarcada, incapazes de causar danos
do Mar Egeu e de Creta pelos dórios no fim à estrutura do navio inimigo. O homem ad-
do século XII a.C., e que tentaram estabele- versário terá sido o grande objetivo na
cer-se no Egito vindos a bordo de grandes guerra naval; abatê-lo significava pôr fora
frotas piratas3. Para rechaçar o ataque, de operação o navio ou, pelo menos, torná-
“Ramsés III reforçou as defesas de fronteira lo inofensivo. Os testemunhos conhecidos
e distribuiu a frota nos portos fenícios”4, indicam, assim, que a batalha naval con-
destruindo uma força naval inimiga num sistia num grande engajamento a curta dis-
porto sírio e atacando com grande êxito, por tância, ou mesmo corpo a corpo, a bordo
meio de aramas de arremesso, os navios dos navios, muito parecido com o que se
adversários que já operavam no Delta. Es- dava na batalha terrestre. Esse tipo de
ses dois casos ilustram, pois, o que deve ter engajamento não haveria de variar muito
sido o emprego básico do navio egípcio ao longo dos séculos que se seguiram, até
antigo, sempre ligado a tropas de infantaria, que uma arma nova, o canhão, uma vez
em operações navais de defesa do litoral, posto a bordo, fosse capaz de causar da-
com a profundidade possível, que seria am- nos sérios ao navio adversário.
pliada em tempos posteriores, quando os Quando, entre os séculos XII e XI a.C.,
navios tenderam a combater afastados da os dórios invadiram a Península Helênica e
linha costeira. Ainda quanto aos egípcios, é chegaram ao Mar Egeu provenientes do
interessante notar que não apenas os navi- Norte, trouxeram como marca de sua supe-
os transportavam tropas, mas estas também rioridade guerreira a arma de ferro. Sabe-se
transportavam navios devidamente des- que desenvolveram atividades marítimas e
montados, que eram empregados a longa tiveram como navio militar uma embarca-
distância no Mar Vermelho ou no Rio ção afilada (grande relação comprimento/
Eufrates, por exemplo. Isso foi possível gra- boca), movida a remos, que dispunha de
ças ao excelente desenvolvimento de cons- uma proa pontiaguda voltada para vante,
trução naval em madeira alcançado pelos enquanto a popa era bastante levantada,
egípcios, fazendo embarcações cujas tábu- conforme se pode constatar por meio de
as encaixavam-se completamente sem o au- pinturas antigas em fragmentos de vasos
xílio de um único prego5. de cerâmica. Landström supõe que essas
No Egito antigo, os navios não devem embarcações devem ter tido cerca de 20m
ter disposto de nenhum armamento propri- de comprimento por 1,5m de boca, empre-
amente seu, integrado a suas partes gando uns 12 remadores em cada bordo6.
constitutivas ou a sua estrutura. As armas Seu aspecto permaneceu longamente como
2 Björn Landström atribui a esse episódio a primeira representação conhecida de uma batalha naval,
encontrada no túmulo de Ramsés III, em Medinet Habu (Landström, Björn. The Ship. Londres:
Allen and Unwin, 1976, p. 24). A representação indicada em 1 é cerca de 2.000 anos mais antiga.
3 Cf. Yoyote, Jean. “Egypte Ancienne”, in Histoire Universelle. Encyclopédie de la Pléiade. Paris:
Gallimard, 1965, v. 1, p. 206.
4 Mella, Federico A. Antonio. O Egito dos Faraós (trad. de Attilio Cancian). S. Paulo: Hemus, 1981, p. 234.
5 Cf. Mokhtar, G. (coord.) História Geral da África (trad. de C.H. Davidoff e outros). S. Paulo: Ática, 1983,
v. II, p. 156-157. Importante notar que é possível ter certeza quanto a essa técnica de construção
porque há barcos egípcios antigos preservados inteiros em túmulos, como o do faraó Quéops.
6 Cf. Landström, Björn. Ob. cit., p. 28.
sendo o dos navios de guerra do Mar Me- 50 remadores (25 de cada bordo), medindo
diterrâneo, variando basicamente apenas cerca de 38m de comprimento, com boca não
o tamanho, o número de remos e o de pes- superior a 4m, mantendo-se uma relação
soas a bordo. A proa afilada para vante pode comprimento/boca de aproximadamente 10:1
ter sido apenas uma talha-mar, como suge- no máximo. Acredita-se que os navios des-
rem antigos desenhos de navios tidos se tipo tiveram seu comprimento limitado
como mistos (mercante/guerra), ou também pela máxima possibilidade de construção em
se pode interpretar tal aspecto como ser- madeira com a tecnologia da época, enquan-
vindo, desde os tempos arcaicos, para to sua largura era medida pela necessidade
abalroar o navio inimigo e pô-lo a pique. de espaço para alojar os remadores lado a
Tal finalidade — de fato existente mais tar- lado numa mesma bancada, considerando-
de e reconhecida em textos antigos — foi se que um pouco menos da terça parte do
mais bem atendida com o recobrimento em remo se movimentaria dentro do navio.
bronze daquela protuberância — chamada A preocupação dos gregos em desen-
esporão —, aumentando-lhe a desejável volver uma força naval para emprego ex-
resistência para o choque7. Até o século IV clusivamente militar deve-se, certamente,
a.C., o esporão haveria de ser a única arma ao elevado ponto atingido por seus inte-
propriamente do navio. resses marítimos, especialmente os do co-
Os navios de guerra a remo logo evoluí- mércio. O navio mercante mediterrâneo,
ram daquela embarcação primitiva — na ver- quer fenício, quer grego, era de arquitetura
dade, uma canoa comprida — para um na- completamente diferente da do navio de
vio mais resistente e maior, já nos tempos guerra. Enquanto este tinha no seu remo
homéricos (a partir do século IX a.C.), cha- elemento propulsor básico para garantir-
mado penteconter. Tal navio era movido por lhe velocidade e precisão nos movimen-
7 Cf. Foley, Vernard e Soedel, Werner. “Ancient oared warships”, in Scientific American, abril de 1981,
p. 199.
tos, o navio mercante movia-se lentamen- seu país, “solo, produtos, vegetação, ani-
te, a vela, disposta num único mastro, va- mais e vida humana são igualmente regula-
lendo-se do remo apenas em ocasiões ex- dos pelo grande rio”9. Este era o Nilo, em
traordinárias. Enquanto o navio de guerra cujas águas navegaram variados tipos de
era longo e estreito, o navio mercante era embarcações para transporte de pessoas,
curto e largo, dispondo de uma relação animais e mercadorias diversas. Björn
comprimento/boca que, na Idade Média, Landström estudou algumas delas, desde
chegou a cerca de 2:1. A navis longa dis- as mais primitivas, que ele supôs serem de
punha de pouquíssimo espaço a bordo papiro, até navios de comércio e de guerra
para carga, sendo muito pequena sua au- feitos inteiramente de madeira. A maior des-
tonomia, o que a obrigava a reabastecer-se sas embarcações certamente foi a grande
aproximadamente a cada três dias, resul- barca da Rainha Hatchepsut, cujas dimen-
tando em curta permanência em qualquer sões ele estimou em cerca de 65m de com-
teatro de operações (aproximadamente um primento por 24m de boca10. Tal barca foi
dia)8. Já o navio redondo (navis rotunda empregada para transporte de obeliscos
para os romanos), como ficou conhecido o daquela soberana em meados do segundo
navio de comércio, tinha boa capacidade milênio a.C. Outras embarcações foram tam-
de carga (em relação às possibilidades da bém empregadas para transportar blocos
época). Enquanto os egípcios tinham seus de pedra, desde as jazidas até as proximi-
navios voltados especialmente para a na- dades das colossais construções egípci-
vegação fluvial, fenícios e gregos constru- as, como as pirâmides e a esfinge de Gizé,
íram os seus barcos mercantes para a na- separadas por centenas de quilômetros das
vegação marítima. pedreiras de Assuã11. Desde, pois, primiti-
Os egípcios haviam se desenvolvido ba- vos barcos de papiro, de curta duração (ape-
sicamente como uma civilização fluvial. Em nas alguns meses), até grandes barcas de
Navio egípcio
8 Cf. Lewis, Michael. The Navy of Britain. London: George Allen and Unwin, 1948, p.61.
9 Burgh, W.G. de. The legacy of the ancient world. Harmondsworth: Penguin, 1967, p. 15-16.
10 Cf. Landström, Björn. Ob. cit., p. 22-23.
11 Cf. Lissner, Ivar. Ainsi vivaient nos ancêtres. Paris: Buchet/Castel, Corrêa, 1957, p. 42-43.
Birremes fenícias
12 O país de Punt estaria situado às duas margens do Mar Vermelho, podendo ser, portanto, a Arábia e a
Somália. Cf. Savant, Jean. Histoire mondiale de la marine. Paris: Hachette, 1961, p. 14-15.
13 Cf. Samhaber, Ernest. História das viagens de descobertas (trad. de A. Della Nina). S. Paulo:
Melhoramentos, 1965, p. 20-21; e Savant, Jean. Op. cit., p. 15.
14 Cf. Albuquerque, A. L. Porto e. História geral do Ocidente. Rio de Janeiro: Serviço de Documentação
Geral da Marinha, 1985, p. 19; e Savant, Jean. Ob. cit. p. 23 e 24.
15 Cf. Rodgers, William L. Greek and Roman naval warfare. Annapolis: U. S. Naval Institute, 1964, p.
31-32.
16 Cf. Tucídides. Histoire de la Guerre du Péloponnèse (trad. de Charles Zevort). Paris: Charpentier;
1869, p. 16.
17 Rodgers, William L. Ob. cit., p. 38.
diversas em dois níveis. Landström atri- todos ao mesmo tempo remando, com o fim
bui-lhe um comprimento de cerca de 27m de se poupar a guarnição.
(incluindo o esporão), tendo por boca um No início do século V a.C., outro tipo de
pouco menos de 4m18. A birreme era navio navio de guerra passou a ser adotado em
bastante leve e de linhas elegantes, sendo larga escala pelos gregos: a trirreme ou triere,
possível ser levado à praia pela guarnição galera com três ordens de remos em cada
para passar a noite, encalhado pela popa. bordo. Diz Tucídides que as primeiras
A birreme, também empregada pelos fení- trirremes foram construídas em Corinto, e
cios, dispunha de mastro e vela para nave- que já no fim do século VIII a.C. havia al-
gação em cruzeiro, podendo tal propulsão guns poucos desses navios. Rodgers esti-
ser conjugada com o remo, exceto em com- mou que as menores dimensões de uma
bate ou em rumo desfavorável ao vento, trirreme podem ter sido 25m de comprimen-
quando só o remo era empregado; neste to e 4m de boca (na linha-d’água), sendo
caso, o mastro podia ser abatido, como se guarnecida por 90 remadores, dez oficiais e
vê claramente em pinturas antigas. O Almi- marinheiros e 20 soldados, num total de 120
rante Rodgers fez estudos detalhados para homens. Ao tempo da Guerra do Peloponeso
mostrar que a velocidade máxima que es- (431-405 a.C.), as trirremes atenienses tive-
ses navios podiam alcançar era de cerca de ram guarnição de 200 homens e dispunham
7 nós quando movidos a remo, contando de um convés protetor dos remadores cha-
com 24 remadores; mesmo assim, tal velo- mado catastrona. As trirremes anteriores,
cidade só seria mantida por menos de 20 porém, como as das guerras greco-pérsicas,
minutos. Nos navios antigos a remo, as tra- especialmente as da Batalha de Salamina (480
vessias eram feitas por quartos alternados, a.C.), eram menores e não dispunham de
de modo que os remadores não estivessem convés de proteção. A velocidade máxima
A trirreme grega
das trirremes também era em torno de 7 nós, cia e a abordagem, ensejando esta o corpo a
segundo o Almirante Rodgers, variando sua corpo, luta com armas brancas. O uso do
velocidade de cruzeiro entre 3,5 e 5 nós, apro- esporão demandava, sobretudo, precisão na
ximadamente. Embora esse autor reconheça manobra; explica-se isso porque a espessu-
que estudiosos contemporâneos tenham ra do casco de uma galera antiga não devia
estimado a autonomia dessas galeras em ultrapassar 6 cm, sendo frequentemente
dois a três dias, ele pessoalmente atribui- muito menor, o que tornava fácil o arromba-
lhe cinco dias. Foley e Soedel, no trabalho mento do casco pelo esporão de uma galera
já citado, admitem uma velocidade máxima adversária, que, por volta de 500 a.C., devia
de 11,5 nós para uma trirreme com mais de deslocar umas 50 t. Portanto, a velocidades
150 remadores (cerca de 170), mencionando relativamente pequenas, uma imprecisão de
ainda que tal limite podia ser acrescido de manobra poderia avariar gravemente tam-
50%, segundo engenheiros navais que ar- bém a galera atacante, em face de alguma
gumentam com a leveza do casco. De qual- manobra defensiva do navio atacado. O
quer forma, tal limite só poderia ser mantido objetivo visado pelo atacante poderia ser
por cinco ou dez minutos. Estudando um — como de fato foi muitas vezes — a pro-
outro caso, em condições excepcionais, os pulsão do inimigo, ou seja, os remos, de
mesmos autores estimaram em 9 nós a velo- modo a imobilizá-lo ou restringir-lhe a ma-
cidade média de cruzeiro de uma trirreme, nobra, favorecendo, por exemplo, a aborda-
que pode ter levado uma guarnição extra gem (desejada por quem tinha superiorida-
para fazer rodízio com toda uma bancada de de no combate corpo a corpo). Como para o
cada vez, substituindo, em cada quarto, um emprego do esporão a direção do ataque
terço dos remadores. Tão comum tornou-se devia coincidir com a do deslocamento do
entre os gregos a navegação a remo, que navio, quando da organização de uma for-
Heródoto de Helicarnassos, ao empreender matura de ataque de navios a remo antigos
suas viagens no século V a.C., indo visitar o deveria prevalecer a linha de frente. Outras
Egito, “o país mais célebre que havia no formaturas também eram possíveis, como,
mundo”19, mencionou dentre seus limites por exemplo, a circular, tentada, sem êxito,
geográficos o grande golfo formado pelo pelos coríntios contra os atenienses
Mar Vermelho, expressando seu longo com- (Fórmion) no Golfo de Patras (429 a.C.). En-
primento, desde a extremidade mais ao nor- fim, para emprego do esporão, duas eram as
te até o Oceano Índico, em “40 dias de nave- principais manobras executadas pelos gre-
gação para um navio a remo.”20 Consideran- gos: a primeira, chamada diekplous, visava
do o esporão como a arma principal do na- à ruptura da linha inimiga, atravessando-a
vio até o começo do século IV a.C., o remo (linha de frente contra linha de frente), com
era de fato a única propulsão possível em o propósito de atingir os remos do adversá-
batalha. Diz o Almirante Rodgers que, na rio — essa manobra seria seguida de uma
Antiguidade, somente na Guerra do guinada simultânea (ideal) de 180o por
Peloponeso o esporão foi bastante usado, boreste ou por bombordo, feita o mais rapi-
sob o comando de Fórmion21. Fora isso, pre- damente possível, chamada anastrofe, de
dominou a tática do combate a curta distân- modo a abalroar, com o esporão, os navios
19 Larcher, Pierre-Henri. “Plan de l’Histoire d’Herodote”, in Histoire d’Herodote, Paris, Garnier, s.d.p.
XXVI.
20 Heródoto. Histoire (trad. de Pierre-Henri Larcher) Paris, Garnier, s.d., v. I, p. 134.
21 Rodgers, William L. Ob. cit., p. 10.
inimigos que estariam tentando manobrar nando o esforço dos remadores muito peno-
para também oferecer as proas aos atacan- so. Assim, as galeras devem ter evoluído para
tes que lhes haviam penetrado a formatura quadrirremes com três ordens de remos, sen-
anteriormente; a outra manobra dos gregos do dois remadores no remo superior, ou com
para o ataque com as galeras a remo era a duas ordens de remo, sendo dois remadores
periplous, que consistia em envolver os por cada remo, ou mesmo com apenas uma
flancos do adversário (que também estaria ordem de remos, com quatro remadores por
em linha de frente), de modo a atacá-lo an- cada remo. É claro que, nessa hipótese, a boca
tes que lhe guinasse para também oferecer da galera tendeu a aumentar para alojar mais
as proas de seus navios. A periplous exigia remadores em cada bancada. Já no tempo de
maior número de navios ou, pelo menos, Alexandre, o Grande, por volta de 330 a.C.,
superioridade na manobra, de modo a pôr havia quadrirremes e quinquirremes (sendo
os navios atacantes nos dois flancos do que nestas havia dois remadores em cada
inimigo, ou, pelo menos, envolvê-lo em par- remo da ordem superior e da ordem interme-
te de sua linha. Sabemos que Fórmion e diária, e um na ordem inferior). Foley e Soedel
Agripa empregaram a diekplous no Golfo ainda registram navios com sete, 13 e 16 re-
de Patras (429 a.C.) e em Ácio (31 a.C.), res- madores por cada bordo em cada seção trans-
pectivamente, enquanto Temístocles evitou versal de bancadas, navios estes construídos
o periplous dos persas em Salamina (480 por Antígono e Demétrio, sucessores de Ale-
a.C.), protegendo os flancos de sua forma- xandre, ao findar o século IV a.C. Pela mesma
tura com o litoral do estreito onde se encon- época, Lisímaco teria construído galeras de
trava. Já os cristãos efetuaram com êxito essa oito remadores em cada bordo, em cada se-
manobra em Lepanto (1571), quando trava- ção transversal de bancadas. Sabe-se muito
ram contra os turcos a última batalha naval pouco desses navios, e é óbvio que mais do
a remos de importância reconhecida. que dois remadores por bancada exigia que
Além do esporão, os navios a remo dis- os demais remassem de pé para fazer os mo-
punham de artilharia mecânica que arremes- vimentos junto ao punho do remo, andando
sava pedras e dardos. Essas catapultas fo- para a frente e para trás. Foley e Soedel estu-
ram empregadas a bordo de trirremes nos pri- daram tecnicamente o assunto e julgaram
meiros anos do século IV a.C. Tais trirremes possível a construção e o emprego de imen-
eram maiores do que as comumente usadas à sos navios do tipo catamarã, com dois cas-
época, e as catapultas instaladas em seu con- cos em paralelo, de modo a dividir por ambos
vés superior devem ter sido empregadas pela o número de remadores, que poderia chegar
primeira vez em 398 a.C., por Dionísio de a 20 em cada bordo de cada casco, em cada
Siracusa, no sítio que empreendeu à cidade seção de bancadas, evitando-se, assim, boca
insular de Mótia, no litoral oeste da Sicília. A excessivamente grande (esse navio, com to-
partir dessa ocasião, os navios tenderam a tal de 40 remadores por cada bordo, por cada
aumentar de tamanho, sem contudo dispor seção, chamou-se tessera-conter e teria sido
de mais do que três ordens de remos, confor- construído para Ptolomeu IV). O importante
me explicam Foley e Soedel22, porque o quar- a considerar, porém, é que as antigas trirremes
to remo mais acima seria muito difícil de ma- tenderam a aumentar o deslocamento, assim
nobrar devido a seu tamanho e peso e ao como outros tipos de galeras. A quinquirreme
ângulo de mergulho de sua pá na água, tor- de Dionísio, do início do IV século a.C., tam-
bém chamada pentere, tinha, segundo Miles, em 260 a.C., na Primeira Guerra Púnica,
Rodgers, cerca de 34 m de comprimento por 7 ocasião em que inauguraram aquele disposi-
m de boca, deslocando 140 t, dispondo, se- tivo em ação tática.
gundo seu entendimento, de cinco remado- O que, porém, neutralizou o emprego do
res por cada remo, numa única ordem de re- esporão, ou pelo menos diminuiu seu poten-
mos. Esse aumento nos tamanhos das gale- cial como arma ofensiva, foi o emprego das
ras tornou-as menos ágeis na manobra, em- grandes armas de arremesso, que tanto atira-
bora não necessariamente mais lentas. Uma vam pedras como dardos24. No século III a.C.,
octere (oito remadores por seção por cada Arquimedes construiu uma catapulta naval
bordo), com duas ordens de remos, em prin- capaz de alcançar cerca de 200 m com pedras
cípios do século IV a.C., podia deslocar umas de uns 80 kg. Com munição de menor peso, o
270 t, alcançando 7 nós com 320 remadores alcance podia dobrar. Os dardos e as pedras
(levando ainda uma tripulação de mais 60 podiam penetrar o convés superior das gale-
homens — oficiais, marinheiros e mecânicos ras ou entrar pelos traveses e atingir fatal-
— e 170 soldados). A perda das qualidades mente a guarnição de remadores, assim como
manobreiras tornou os navios a remo mais quebrar remos e destruir parcialmente a es-
vulneráveis — teoricamente — ao esporão trutura do navio. Já nos primeiros anos do
do adversário. Entretanto, a tática do século IV a.C., durante o sítio de Siracusa
abalroamento foi perdendo a importância em pelos cartagineses, os violentos combates
favor da abordagem, o que resultou no au- navais travados no porto mostraram a ne-
mento da tropa embarcada. As quinquirremes cessidade de maior proteção dos remadores
romanas, por exemplo, transportavam 120 sol- por placas laterais que fechavam o través até
dados a bordo. Sendo os romanos pouco o catastroma; tal proteção chamou-se de
afeitos às lides marinheiras, ao terem que en- catafrata e visava justamente à defesa dos
frentar os cartagineses, hábeis homens do remadores em relação às armas manuais de
mar, inventaram um dispositivo que imobili- arremesso, tais como a flecha e a funda. O
zava o navio inimigo, liquidando com sua su- que se pretendia, principalmente, era evitar
perioridade na manobra. Tal dispositivo foi o danos à propulsão por ferimento ou morte de
corvo, que consistia numa prancha de uns 6 um remador. Isso também explica a opção por
m de comprimento por 1,5 m de largura, arti- mais de um homem em cada remo, à medida
culada numa das extremidades, que, saindo que os navios aumentavam de tamanho e
da posição vertical (presa num mastro à proa), incorporavam a catapulta.
caía sobre o convés da galera inimiga, pren- Considerando que a situação mais favo-
dendo-a por meio de um gancho metálico rável para o abalroamento com o esporão é
pontiagudo em forma de bico de corvo — atacar perpendicularmente à galera-alvo, no
donde o nome; favorecia-se, assim, a abor- caso de existência de catapulta a bordo dos
dagem, mesmo no caso de a galera inimiga navios oponentes, dá-se o seguinte: a gale-
ter conseguido abalroar o navio romano23. ra atacada pode parar e atirar projetis sobre
Com o emprego do corvo, portanto, os roma- o navio atacante; nesse caso, o balanço do
nos pretendiam obrigar os adversários à abor- navio não é problemático na alteração da
dagem, com o que venceram a Batalha de elevação da catapulta, porque o erro se dará
23 Rodgers admitiu que os 40 remadores de cada sessão estariam divididos em 20 por cada bordo, sem que
o navio fosse catamarã (ob. cit., p. 256). Segundo esse autor, tal galera disporia de 3 mil remadores
e outros 4 mil homens embarcados, entre soldados, marinheiros e serviçais.
24 Ver descrição detalhada do corvo em Rodgers, William L., ob. cit., p. 275.
no alcance, ou seja, os tiros serão mais cur- tres, “sua coragem hesitava diante das ame-
tos ou mais longos, mas deverão alcançar o aças misteriosas de uma natureza desconhe-
alvo por ser a galera um navio longo. Isso cida”26. No entanto, enquanto estiveram em
significa que o erro não deverá desenquadrar expansão, sob frequente ameaça de guerra,
o alvo; já para a galera, que se movimenta os romanos não descuidaram de sua Mari-
para usar o esporão perpendicularmente ao nha militar. Empregaram-na por toda a parte
navio-alvo, se usar também a catapulta, os aonde chegou seu poder, desde o Mar do
erros em elevação causados pelo movimen- Norte, onde Tácito referiu-se ao adversus
to do navio a remos poderão resultar em oceanus, até o extremo leste do Mediterrâ-
desenquadramento do alvo, que é bastante neo. Plínio, o Velho, que, além de naturalista
estreito. Ao estudarem essa questão, Foley e historiador, foi militar e comandou a princi-
e Soedel concluíram que, para um navio em pal esquadra romana, sediada em Misena (na
movimento perpendicular a outro, com o fim extremidade do Golfo de Nápoles), mostrou
de usar o esporão, empregar a catapulta, um alguma perplexidade com os movimentos da
erro de 1,5o em relação à vertical poderá re- maré, que deixavam incerta a eterna questão
sultar num tiro a uma distância de 200 m.25 posta pela natureza para se saber se a linha
Isso mostra como a catapulta tornou-se uma costeira pertence afinal à terra firme ou ao
arma poderosa contra o esporão, levando à domínio das águas27. Além do mar, os roma-
decadência a tática do abalroamento. nos estendiam suas forças navais pelos rios,
Durante a República, Roma conheceu o como o Reno e o Danúbio, limites com os
apogeu de sua Marinha de Guerra. Ainda bárbaros. Na região renana, ao tempo do Im-
assim, apesar do grande esforço feito na Pri- perador Augusto, estavam sediados o exér-
meira Guerra Púnica, os romanos jamais che- cito superior e o exército inferior, com quatro
garam a ser marinheiros ousados — nunca legiões cada um. A tais legiões “somava-se a
tiveram verdadeiramente grande intimidade esquadra do Reno, a qual, presente em todo
com o mar e buscaram-no apenas pressiona- o curso do rio, garantia a margem romana e
dos pela necessidade. Malgrado o grande servia como ponte móvel em direção à mar-
êxito e a formidável segurança que geralmen- gem oposta”28. Nota-se aí, porém, o caráter
te demonstravam em suas campanhas terres- um tanto subalterno das forças navais den-
25 Jurien de la Gravière, J.P.E. La Marine des anciens, Paris, E. Plon et Cie., 1880, p. 203.
26 Foley, Vernard e Soedel, Verner. Ob. cit., p. 128.
27 Geffroy, A. Rome et les barbares Paris, Didir et Cie. 1874, p. 23.
28 Plínio, O Velho. Histoire Naturalle (trad. de E. Littré), [Livro XVI, 1], Paris J.J. Dubochet, Le
Chevalier et Comp., 1848, t. I, p. 568.
tro da estratégia de Roma. Berthaut, de um tro desse último nome, que designava um
modo radical, afirma que a Marinha militar de tipo de navio de guerra então empregado no
Roma foi “feita unicamente para ser a auxiliar Império Bizantino, muito embora Augusto Jal
indispensável das legiões”29. afirme que tais navios, bastante rápidos (don-
Nos três séculos e meio que se sucede- de o nome), estavam “em uso nos primeiros
ram à Batalha de Ácio (31 a.C.), as ações na- séculos da Era Cristã”33. Rodgers conside-
vais de Roma voltaram-se contra os piratas, rou o deslocamento médio dos navios-trans-
especialmente quando Pompeu, valendo-se porte da operação de Justiniano contra os
dos extraordinários poderes que lhe foram vândalos em torno de 160 t, enquanto os
dados pela Lei Gabínia, comandou a repres- drômons deviam deslocar 17 t, com tripula-
são à pirataria no século I a.C.30 Malgrado o ção de 30 a 35 homens. Os drômons de então
êxito de Pompeu, as incursões piratas sobre eram unirremes e dispunham de proteção
o tráfego marítimo ressurgiriam de tempos vertical nos traveses (catafrata) de modo a
em tempos, acabando por resultar numa que- preservar os remadores com relação às ar-
da do comércio marítimo e na diminuição do mas de arremesso do inimigo.
tamanho dos navios mercantes, os quais, Duas décadas depois, os godos amea-
deslocando menos, carregavam menos, re- çaram gravemente a Itália. Eles haviam pi-
duzindo-se os riscos em face da insegurança lhado o litoral da Grécia e interceptavam os
no mar31. Os próprios navios de guerra tam- navios-transporte que supririam o exército
bém tenderam a diminuir de porte durante a do General Narses, encarregado pelo Impe-
Pax Romana, pois a missão da Marinha mili- rador Justiniano do comando em chefe na
tar reduziu-se à guarda do litoral. Veem-se na Itália. Os godos finalmente bloquearam
Coluna de Trajano, em Roma, representações Ancona, no litoral italiano do Mar Adriático.
dos navios então empregados como guarda- Para tentar suspender o bloqueio naval, uma
costas, os quais eram birremes com 48 remos esquadra bizantina demandou Sena Gálica,
no total, segundo estudo do Almirante a noroeste de Ancona, quando se deu uma
Rodgers; considerando um acréscimo de 27 batalha naval com os godos, em que estes
homens como oficiais, marinheiros e solda- foram derrotados. Nessa batalha, travada em
dos, ter-se-ia, segundo o mesmo, um navio 551, os bizantinos manobraram o esporão,
cuja velocidade máxima deveria ser por volta assim como armas leves de arremesso, e
de 6 nós32. abordaram os inimigos. Os arqueiros inicia-
Quando, em 533, o Imperador Justiniano vam o engajamento a curta distância e, no
moveu guerra contra os vândalos na África caso de abordagem, a luta dava-se no con-
do Norte, enviou contra eles o General vés superior (catastroma), com espada e lan-
Belisário, com 10 mil infantes e 5 mil cavalei- ça. Os dromons bizantinos empregados em
ros. Segundo Procópio, secretário de Sena Gálica já eram maiores do que os cita-
Belisário, tal força foi transportada por 500 dos anteriormente. Não tinham apenas a
navios escoltados por 92 dromons. Prova- proteção nos traveses, mas o catastroma,
velmente, pela primeira vez apareceu o regis- que protegia pelo alto os remadores; devem
ter deslocado cerca de 80 t, e sua tripulação Esta havia sido drasticamente reduzida no
somava de 60 a 160 homens, dentre mari- século VIII, quando a ameaça marítima ára-
nheiros, remadores e soldados. No século be declinara. A esse respeito Runciman,
IX, os drômons haviam já evoluído: os mai- grande estudioso das cruzadas e de
ores desses navios tinham duas bancadas Bizâncio, comenta com simplicidade e força
superpostas, com duas ordens de remos, esse suicídio naval bizantino: “Foi uma po-
com um total de 100 remadores, sendo 25 lítica errônea. No século I, as frotas árabes
por cada bordo e cada ordem. Nesses navi- voltaram a aparecer e tomaram ao Império a
os, parece que os remadores também luta- Sicília e, pior ainda, Creta, transformando-a
vam como soldados; por isso, por volta do numa base de piratas que punha em perigo
ano 900, recomendava o Imperador Leão VI todo o litoral do Egeu. Tornava-se necessá-
que, se os soldados que lutavam no convés rio ressuscitar a armada”35. De fato, o poder
superior fossem postos fora de combate por naval de Bizâncio foi restaurado, com o es-
ferimentos, deviam ser substituídos por re- tabelecimento de forças navais em provín-
madores da ordem inferior de remos34. Tam- cias marítimas chamadas temas . No século
bém recomendava o mesmo em sua obra IX, um esquadrão imperial em Constanti-
Táticas: que tanto os remadores da ordem nopla e cinco esquadras provinciais cobri-
superior como os demais homens do con- am todo o litoral do Império, desde a Itália
vés superior deveriam estar guarnecidos até a costa sul da Ásia Menor.
com capacetes e peitorais para sua defesa, A par do dromon, navio que lhes era
empregando piques, dardos e espadas para típico, os bizantinos dispuseram, desde o
a luta. Tais drômons do tempo do Imperador século VII, de uma poderosa arma: o fogo
Leão (886-912), com duas ordens de remos e
um convés corrido pelo meio do navio, fica-
ram conhecidos como dromons panfílios;
cerca de meio século depois apareceram re-
gistros de dromons maiores, deslocando 175
t, com cerca de 40 m de comprimento, 6 m de
boca, 200 remadores e outros cem homens
entre oficiais, soldados e marinheiros. Se-
gundo Augusto Jal, grande estudioso de
assuntos navais no século XIX, a constru-
ção desses dromons foi recomendação do
próprio Imperador Leão VI a seu filho e su-
cessor, Constantino VII. Leão, certamente, grego. Sabe-se que o fogo em si mesmo foi
aprendera a reconhecer a importância das o grande destruidor de navios durante a
forças navais para a segurança do Império Idade Média. Seu uso, porém, requeria cer-
Bizantino. Seu pai, Basílio I, e seus ta habilidade para que o navio que o em-
antecessores imediatos, Miguel III e a Im- pregasse também não fosse vítima dele —
peratriz Teodora, haviam se esforçado em se dois navios se atracassem empregando
restaurar a Marinha de Guerra de Bizâncio. a garateia ou outro meio, era preciso rapi-
34 Jal, Auguste. Glossaire Nautique, Paris, Firmin Didot Fréres, 1847, p. 604 e 605 (verbetes Dromo,
Dromon e DrOmwn).
35 Cf. Jal, Auguste. “La flotte de César” in Études sur la Marine antique, Paris, Firmin Didot Frères, Fils
et. Cie., 1861, p. 121-122.
dez e agilidade para que um se desvenci- ante. Gibbon descreve a reunião das forças
lhasse do outro no caso de usar-se o fogo, formidáveis de terra e de mar que se prepa-
sob pena de ambos arderem, como realmen- ravam para demandar Constantinopla e diz
te chegou a acontecer. O fogo grego, por que por muito tempo uma semelhante arma-
sua vez, era uma mistura incendiária de da não havia cruzado o Mar Adriático: 120
composição até hoje desconhecida, que navios de fundo chato (palanders) para
devia incluir nafta, enxofre e salitre ou cal tranportar os cavalos, 240 navios-transpor-
virgem, e era atirado por meio de catapulta, te repletos de homens e armamentos, 70 car-
já ardendo em potes para isso preparados, gueiros abarrotados de provisões e 50 gale-
ou por tubos de metal (bronze ou ferro), ras prontas para o encontro com o inimi-
soprado por foles ou algum outro aparelho go39. O mesmo autor descreve a travessia, a
pneumático, ou bombeado com água do operação anfíbia contra o litoral bizantino e
mar, usada para impulsioná-lo. Seu efeito todo o movimento militar que levou ao co-
foi devastador quando empregado contra lapso da capital do Império. Não deixou,
os árabes. Consta que os búlgaros apode- porém, de mencionar antes a longa viagem
raram-se de 26 tubos com a mistura secreta dos flamengos a bordo de navios que os
bizantina em 812 e que os sarracenos usa- trouxeram pelo Atlântico e pelo Mediterrâ-
ram-na no sítio de Tessalônica em 90436. neo para juntarem-se a seus aliados na gran-
Michael Lewis afirma que imitações do fogo de campanha. Que tipo de navio vinha do
grego foram usadas por outras Marinhas, Mar do Norte e como ele fazia a guerra na-
inclusive por forças navais cristãs do Nor- val? Pode-se aqui deixar um pouco o Medi-
te, onde o termo fogo grego tornou-se si- terrâneo e examinar questões de guerra na-
nônimo de qualquer artefato que se desti- val em outros mares europeus.
nasse a incendiar navios inimigos37. Seu Ao estudar as questões navais perti-
uso perdurou até o aparecimento do ca- nentes ao norte da Europa, surge em pri-
nhão, no século XIV. meiro plano a Escandinávia. Assim como a
O ressurgimento da Marinha binzantina Germânia, a Escandinávia foi ponto de par-
duraria até o século XII. O Imperador Ma- tida de diversas migrações. Enquanto os
nuel I (1143-1180), com especial pendor por germânicos movimentaram-se mais inten-
ideias ocidentais, preferiu depender dos samente sobre o Império Romano entre os
navios italianos para a defesa dos interes- séculos III e V, os escandinavos fizeram
ses navais do Império. Os preços dessa de- suas migrações em duas fases: a primeira,
pendência militar foram concessões comer- bem cedo, no século II a.C.; a segunda, já
ciais a Veneza, Gênova e Pisa38 e a ruína do tardia, entre os séculos VIII e X. O primeiro
poder naval bizantino. A consequência mais movimento escandinavo, ainda um tanto
trágica dessa política suicida foi a queda de obscuro, fez-se com címbrios e teutões que
Constantinopla em 1204, assaltada pela deixaram a península da Jutlândia em dire-
Quarta Cruzada. Naquela ocasião, o Império ção à Gália e à Itália. Essa primeira migra-
foi incapaz de qualquer defesa em profundi- ção foi exclusivamente terrestre. As outras,
dade, como caberia a uma força naval atu- porém, foram acentuadamente navais. Gra-
36 Runciman, Steven. A civilização bizantina (trad. de Waltencir Dutra), Rio de Janeiro, Zahar, 1977, 2a
ed., p. 119.
37 Rodgers, William L. Ob. cit. em 32, p. 4.
38 Lewis, Michael. Ob. cit., p. 406.
39 Runciman, Steven Ob. cit., p. 43.
40 Gibbon, Eduward. The decline and fall of the Roman Empire, Londres, Encyclopaedia Britannica,
1955, v. II, p. 429-430.
41 Musset, Lucien. “Le monde scandinave”, in Historie Universelle, Encyclopédie de la Pléiade, Paris,
Gallimard, 1964, v. 2, p. 1.076.
famoso e um dos maiores navios nórdicos malha e escudo. As batalhas navais davam-
celebrados na sagas foi o Serpente Longa, se em águas restritas, tais como em fiordes,
do rei Olavo, construído ao fim do século enseadas, estreitos etc., e nelas tomavam
X; ele tinha 34 bancos para remadores, parte, em grande maioria, os navios peque-
portanto, uns 55 m de comprimento máxi- nos. Quando do engajamento, a vela era
mo e talvez uns 9 m de boca máxima, deslo- recolhida e o mastro, retirado. Brogger e
cando cerca de 220 t. Havia ainda navios Shetelig, ao tratarem da tática naval
bem menores. Todos eram movidos a re- viquingue, estabelecem três fases para a
mos e a vela. De modo geral, os navios batalha: a primeira fase era a da manobra
viquingues podem ser classificados em três para que os navios ocupassem a posição
tipos: os navios grandes, os de 20 bancos mais favorável ao engajamento; nessa fase
e os navios pequenos. Cada banco tinha era primordial o trabalho dos timoneiros,
um remador para cada bordo. Os espaços ou seja, dos homens que operavam os re-
entre os bancos chamavam-se comparti- mos de governo do navio. A segunda fase,
mentos, sendo que cada um destes que começava ainda durante a manobra,
correspondia a dois remos em números; era a aproximação até o alcançe das armas
assim, um navio de 35 compartimentos ti- de arremesso e o efetivo emprego destas,
nha 70 remos. Os navios grandes tinham tendo início com o uso das flechas e pas-
30 ou mais compartimentos (o Serpente sando para o lançamento de projetis de
Longa tinha 34); os navios pequenos ti- todo tipo, de ferro e de pedra. A terceira
nham menos de 20 bancos, como o de fase era a da abordagem, usando-se
Gokstad, que tinha 1642. O tamanho das es- garateias para fixarem-se os navios adver-
quadras em operação variou muito entre sários um a contrabordo do outro; nessa
poucas dezenas e algumas centenas de fase acontecia a luta corpo a corpo e a ba-
navios. A tripulação também variou e, con- talha era decidida44. Os navios viquingues,
siderando os homens embarcados para o como se sabe, não tinham esporão, de modo
combate, estima-se que para uma força de que não se decidia o combate, normalmen-
cem navios haveria uma média de 50 a 60 te, sem a luta direta entre os homens em-
pessoas a bordo de cada um deles. O Ser- barcados. Diz Rodgers que a renúncia ao
pente Longa talvez embarcasse uns 300 esporão talvez se deva ao interesse em pre-
homens, ou até 400, para a batalha43. servar o navio inimigo enquanto presa, a
Para o combate no mar, os viquingues qual era vista como podendo conter carga
usavam as mesmas armas que utilizavam e ser pilhada. Ainda o mesmo autor afirma
em terra: espada, lança e um grande ma- que, quando uma força naval tinha inten-
chado que manejavam com ambas as mãos; ções prévias defensivas, amarrava seus
empregavam ainda armas de arremesso, próprios navios uns a contrabordo dos
como arco e flecha, e pedras, que lança- outros e engajava, deixando desprotegidos
vam com as mãos ou com uma funda. Por apenas os traveses dos navios mais de
isso os navios eram carregados com pe- fora; assim, era mais fácil o apoio mútuo
dras adequadas para uso como munição. entre os homens da mesma força durante a
Defensivamente, usavam capacete, cota de abordagem. Era também usual que peque-
45 Preston, Richard A. e Wise, Sydney F. Men in Arms, Nova Iorque, Holt, Rinehart and Winston, 1979,
4a ed., p. 71.
culo XIII, já se vê o leme de cadaste. Nos que também se fez no topo do mastro (uma
registros das lutas entre ingleses e france- espécie de cesto de gávea), tinham a finalida-
ses, na segunda década do século XIII, já de de ampliar o horizonte do observador e
aparecem cogas, junto com outros navios, favorecer o lançamento de armas de arremes-
em operações da esquadra francesa. so. Percebendo-se a vantagem que ofereciam
Embora os ingleses dispusessem ainda de tais castelos para a defesa do navio, e consi-
alguns navios longos — galeras a remo —, derando-se a insegurança dos mares em face
prevaleceu imensamente em sua Marinha o da pirataria, aquelas estruturas acabaram por
navio redondo a vela (uma única vela permanecer nos navios mercantes, mesmo em
quadrangular num único mastro) para empre- tempo de paz. Levando-se em conta que a
go militar. Michael Lewis resumiu três razões tática naval até o século XIV permaneceu
pelas quais os ingleses não empregaram pri- inalterada, a abordagem continuou sendo par-
mordialmente as galeras em sua Marinha: a te dela, e a luta travada no convés poderia ser
primeira, por questão climática, considerando favorecida com tais castelos e com o cesto de
que, sendo o Mediterrâneo um mar fechado, gávea. Neste último alojavam-se arqueiros e
não tem ondas tão avantajadas quanto as do besteiros. Na Batalha de Dover, por exemplo,
Atlântico, no qual o tempo próprio para uso travada em 1217, a ação teve início com as
das galeras é percentualmente bem menor do armas de arremesso, até que os ingleses obti-
que naquele outro mar; a segunda razão refe- veram superioridade suficiente para abordar
re-se ao manejo dos navios, que, no caso das os navios franceses.
galeras, dependia de serviço forçado dos re- Nas batalhas medievais no mar, até o
madores, normalmente escravos, ainda exis- século XIV, as armas empregadas tinham
tentes na Idade Média mediterrânea (mouros como objetivo o homem adversário. Embo-
prisioneiros), e que muito antes desaparece- ra houvesse armas mais pesadas de arre-
ram na Inglaterra (já os navios a vela eram messo postas nos castelos de proa e de
manobrados por homens livres); a terceira ra- popa, destinadas a atirar pedras e barras
zão seria econômica, ou seja, a dificuldade de de ferro que poderiam causar algum dano
recursos levou o rei inglês a aproveitar o na- material, o navio de guerra medieval nos
vio mercante para duplo emprego, sem neces- mares do norte da Europa continuou sen-
sidade de despender dinheiro para ter um na- do uma plataforma de homens muito mais
vio exclusivamente para emprego militar que do que uma plataforma de armas. O empre-
só lhe desse despesa, como era o caso das go de equipamentos mais pesados a bordo
galeras a remo46. Dessa maneira, enquanto no era extremamente difícil, embora se saiba
Mar Mediterrâneo o navio de guerra era radi- que os navios transportavam tais armas
calmente diferente do navio mercante, na In- certamente para serem empregadas em ter-
glaterra não havia diferenças fundamentais en- ra em operações de sítio. O que verdadei-
tre um e outro. Algumas providências, porém, ramente decidia a batalha naval de então
eram necessárias para habilitar um navio mer- era a abordagem e o corpo a corpo no con-
cante à guerra. Diziam elas respeito a algumas vés, demandando coragem e habilidade.
adaptações, como a construção de superes- Buscando o vento favorável, uma força
truturas na proa e na popa, como se fossem naval com intenções ofensivas poderia cair
torres, às quais deu-se o nome de castelos. sobre outra empregando ainda outros ex-
Tais construções em madeira, assim como a pedientes que favoreceriam, como lançar
cal virgem sobre o inimigo ou mesmo sa- em registros existentes. Sabe-se, porém,
bão líquido, ou ainda artefatos de ferro com que, para o sítio de Calais, em 1346, o rei
três pontas, que, fixando-se com uma de- Eduardo III enviou 738 navios, com 14.958
las no convés, ofereciam suas outras duas homens embarcados, o que dá uma média
pontas perigosamente para o soldado em- de 20 homens por navio, devendo cada
barcado, que sobre elas poderia cair. navio ter deslocado 60 t.47
Além do fogo, já citado como destrui- A guerra medieval no mar começaria a
dor de navios, pouco mais poderia pôr fora mudar depois que, no correr da Guerra dos
de combate o navio redondo senão a mor- Cem Anos (1337-1453), introduziu-se uma
te ou o ferimento de seus homens. arma nova: o canhão. As alterações de tá-
Após a Batalha de Dover, nenhuma ou- tica, porém, deveriam ainda demorar, de-
tra de grande importância se registrou até pendendo do desenvolvimento da nova
a Guerra dos Cem Anos. O tamanho dos arma, ainda durante muito tempo incapaz
navios aumentou, alcançando um máximo de causar danos maiores à estrutura do
de 300 t no último quartel do século XIV navio.
sições fortificadas. Daí se entende a im- cante, a Inglaterra entrou numa fase de gran-
portância da engenharia militar, reforçada de progresso na arte naval. Com o tempo,
e ampliada desde a segunda metade do sé- os castelos de proa e de popa diminuíram de
culo XVII, com a fundação de academias tamanho, sendo que o castelo de proa aca-
especializadas na Europa e no ultramar, in- bou por desaparecer, enquanto o de popa,
clusive no Brasil. bastante reduzido, veio a servir como uma
Embora ainda em uma dimensão, aos espécie de passadiço a ré, de onde o co-
poucos a guerra evoluiu para a prevalência mandante podia observar a manobra.
da estratégia sobre seus demais elementos. Durante o período de tempo que prece-
Apesar do surgimento de outros grandes dia o combate iminente, a manobra dos na-
generais nessa época (como Frederico, o vios visava a “possuir o vento”. Normal-
Grande, da Prússia, e o Duque de mente, a esquadra manobrava para obter a
Marlborough), somente Napoleão daria à posição de barlavento, com a finalidade de
estratégia sua maior dimensão, por meio, garantir a iniciativa do ataque. Nem sempre,
sobretudo, da aplicação dos princípios do contudo, essa era a posição preferida. No
movimento e da concentração, no que revo- caso de ser mais fraca, uma esquadra deve-
lucionaria completamente a arte da guerra. ria procurar manter-se a sotavento, a fim de
Na Idade Moderna, retirar-se da batalha
também no mar foram mais facilmente, em
grandes as inovações. Aos poucos a guerra caso de necessidade.
Com o aumento do ta- Durante o reinado
manho, do peso e do evoluiu para a prevalência de Elisabeth I, que su-
poder ofensivo, os ca- da estratégia sobre seus cedeu a Henrique VIII,
nhões passaram a ser foi adotada a linha de
importantes armas na-
demais elementos fila, de modo que os
vais. Sua instalação a navios assim forma-
bordo acabou sendo feita cobertas abaixo, dos não cobrissem o fogo uns dos outros.
pelos traveses, a fim de não se comprome- No século seguinte, em 1653, Blake baixou
ter a estabilidade do navio com peso alto. as primeiras “Instruções para o Combate”
Tais armas foram colocadas pelos bordos, da Marinha Real, que formalizaram a linha
e seu alcance máximo foi de cerca de 1 1/4 de fila para a batalha; seu artigo 3o dizia:
de milha. Alguns pequenos canhões foram “Todos os navios de qualquer esquadrão
dispostos pela popa. devem se esforçar para manter a linha com
Foi no reinado de Henrique VIII (1509- o chefe...” Posteriormente, em 1665, duran-
1547), na Inglaterra, que se deu a novidade te a segunda guerra anglo-holandesa, o
da colocação dos canhões cobertas abai- Duque de York, irmão do Rei Carlos II da
xo, e foi no mesmo período, em 1545, que, Inglaterra, então comandante das forças
num combate ao largo de Shoreham, se navais inglesas, baixou novas “Instruções
verificou a eficácia daquela arma contra o para o Combate”, que vieram a consagrar a
navio inimigo, não mais apenas contra o formatura em coluna, sendo estabelecida a
homem. Iniciava-se uma nova e duradoura distância padrão de 100 jardas entre os
fase da guerra naval. navios.
Com a introdução do uso do canhão pelo Depois das “Instruções” do Duque de
través, e com a decisão de Henrique VIII de York, surgiram na Inglaterra duas escolas
ter uma Marinha de Guerra, além da Mer- táticas principais, que se chamaram
vento
A
B
Figura 1 – Linhas equivalentes fora de alcance
vento
A
B
Figura 2 – Aproximação da esquadra de barlavento com a de sotavento parada
vento
B
Figura 3 – Aproximação da esquadra de barlavento com a de sotavento em movimento
vento A
A
vento
B
A
B
Figura 5 – Manobras de emassar
vento
A
A
B
Figura 6 – Manobras de envolver
A
vento
SUMÁRIO
Propósito
Introdução
Evolução das práticas avaliativas
Experiências de avaliação institucional em debate
O Sistema Nacional de Avaliação da Educação
Básica (Saeb) em questão
O Sistema Nacional de Avaliação da Educação
Superior (Sinaes) em questão
Considerações finais
tos e elementos: alunos, professores, mé- A prática avaliativa está sempre ligada a
todos de ensino, currículo, equipamentos uma concepção de educação, de pessoa e de
e recursos de ensino, disciplina, programa, sociedade. Portanto, é preciso que o avalia-
curso, projetos, gestões, estabelecimentos dor tenha conhecimento das diferentes abor-
e instituições de ensino, políticas educaci- dagens avaliativas, tenha clareza do porquê,
onais, sistemas de ensino, enfim, toda uma para que e de como avaliar e faça sua opção
gama de fatores intervenientes do proces- consciente. Se não há certeza do que se quer,
so de educar. a avaliação pouco contribuirá. Uma nova
Neste estudo iremos focalizar a avalia- cultura de avaliação se faz necessária e só
ção institucional considerando como pon- será possível com “...um amplo processo de
to de partida o pensamento de Fernandes busca de re-significação teórica e prática.
(2001, p. 75) de que a avaliação institucional Nesse contexto, construir um sentido novo,
é “... um processo complexo, e não há, pron- uma nova intencionalidade para a avaliação,
to para consumo, um modelo ideal e único é decisivo”. (Vasconcellos, 1998, p. 65)
para as escolas. Ela precisa ser construída. Reconhecendo a importância do
É o desafio de uma longa caminhada pos- posicionamento político do avaliador, consi-
sível e necessária”. deramos fundamental definirmos o conceito
Embarcando nessa caminhada pretende- que temos de avaliação. Compactuamos com
mos a seguir discutir as práticas de avaliação o conceito de Luckesi (1995, p. 69), que en-
institucional mais recentes no Brasil, como o tende avaliação como “um juízo de qualidade
Sistema Nacional de Avaliação da Escola Bá- sobre dados relevantes, tendo em vista uma
sica (Saeb) e o Sistema Nacional de Avaliação tomada de decisão”.
da Educação Superior (Sinaes). Não preten- A seguir resgatamos a trajetória históri-
demos definir um modelo ideal de avaliação ca das abordagens avaliativas para melhor
institucional, pois sabemos que cada institui- fundamentar as análises que faremos das
ção tem as suas peculiaridades e precisa ser práticas de avaliação institucional ocorri-
respeitada na sua identidade, mas buscare- das no Brasil nos últimos anos.
mos compreender os pressupostos teórico-
metodológicos que fundamentam os EVOLUÇÃO DAS PRÁTICAS
paradigmas e modelos de avaliação AVALIATIVAS
institucional praticados no Brasil, para melhor
fundamentar futuras propostas de avaliação. De acordo com Guba e Lincoln (2003), as
Concordamos com a ideia de Barreira práticas avaliativas vêm sofrendo uma evo-
(2002, p. 44) quando afirma que lução conceitual que atravessa pelo menos
quatro gerações. E as abordagens avaliativas
“é o programa e a proposta de investi- variam de acordo com essas gerações.
gação avaliativa que determinam a es- Na primeira geração, conhecida como
colha das abordagens e os instrumen- medição, não se distingue o ato de avaliar
tos. Na base dessa escolha está a dire- do ato de medir. A preocupação dos avalia-
ção proposta, consubstanciada em dores se voltava para a elaboração de ins-
paradigmas teórico-filosóficos, reconhe- trumentos de medida e testes para a verifi-
cendo que cada abordagem guarda cação do rendimento escolar dos alunos. O
especificidades, e não podem ser apro- avaliador desempenhava um papel de téc-
priadas de forma linear para diferentes nico e utilizava critérios quantitativos para
situações avaliativas”. medir o progresso dos educandos. Trata-se
contexto”. (Sobrinho e Ristoff, 2002, 156). as avaliações para a regulação e para a diversi-
Esta prática faz com que os gestores se dade, utilizando tanto critérios objetivistas quan-
preocupem muito mais com o aspecto ad- to relativistas. Acreditamos que a grande con-
ministrativo das instituições do que com o tribuição do Sinaes está nesta mediação entre
aspecto pedagógico. os dois enfoques avaliativos, em trabalhar es-
Porém cabe ressaltar que elaborar um sis- sas tensões.
tema nacional de avaliação da educação que O tipo de avaliação que propõe o Sinaes
estabeleça parâmetros comuns e indicado- pode ser situado na quarta geração relatada
res coerentes necessários a todas as insti- no texto de Guba e Lincoln (2003), a chamada
tuições de ensino, sem desconsiderar, no avaliação construtivista responsiva, na medi-
entanto, as características próprias de cada da em que inclui avaliações interna e externa e
instituição, é uma tarefa de extremo cuida- autoavaliação. O Sinaes introduz práticas de
do, um desafio, melhor dizendo. meta-avaliação em que a “avaliação da avalia-
Quando o novo governo criou o Sinaes, ção contribuirá para o permanente processo
percebemos que houve de construção coletiva
um cuidadoso trabalho visando ao aperfeiçoa-
de mediação entre o Esta concepção de mento do sistema”. (So-
modelo de avaliação
regulativa com o de
avaliação apresentada pelo brinho, 2004, p. 121)
O sistema em ques-
avaliação para a diver- Sinaes leva em tão representa um
sidade, conforme veri- consideração tanto os avanço em relação às
ficaremos a seguir. outras sistemáticas de
dados quantitativos quanto avaliação da educa-
O Sistema Nacional
de Avaliação da
os qualitativos e considera ção porque se leva em
Educação Superior importante o respeito às consideração a “com-
plexidade filosófica,
(Sinaes) em questão diversidades e às epistemológica, ético-
O Sinaes entende identidades de cada política e, então, a
que a avaliação não é plurifuncionalidade da
neutra, mas requer instituição avaliação”. (Sobrinho,
juízos de valor e méri- 2004, p. 114)
to. A concepção de avaliação que se tem Acreditamos que há muito se esperava uma
rompe com a ideia de que avaliar é mensurar ruptura com o modelo de avaliação para a
e controlar e amplia o conceito de avaliação mensuração e controle com objetivos exclusi-
da educação destacando os papéis vos de premiar ou punir, acirrando a competi-
educativo, social, pedagógico e formativo ção entre as instituições de ensino. Era preci-
do ato de avaliar. O sistema não propõe uma so superar a avaliação preocupada
dicotomia entre regulação X diversidade e prioritariamente com os dados quantitativos,
objetivismo X relativismo. com o produto e com o fim em si mesma. Esta
Os princípios norteadores do Sinaes são concepção de avaliação apresentada pelo
bem amplos e abarcam a complexidade de fato- Sinaes leva em consideração tanto os dados
res que devem ser levados em consideração ao quantitativos quanto os qualitativos e consi-
se criar um sistema de avaliação institucional. O dera importante o respeito às diversidades e
sistema tem como uma de suas características a às identidades de cada instituição. Acredita-
flexibilidade, o que permite um equilíbrio entre mos ser de extrema importância que qualquer
prática avaliativa se preocupe em dar voz a do que mostra ou aponta aquilo que deve
todos os sujeitos apreciados por meio da ser retomado e trabalhado novamente de
autoavaliação e que permita a discussão cole- outra forma e o que é imprescindível que a
tiva de soluções para melhoria da instituição instituição conheça. Para Hoffmann (1998,
como um todo, buscando cumprir de maneira p. 16), “a busca incansável por padrões de
eficiente suas responsabilidades sociais. A mensuração objetivos e uniformes é um dos
avaliação será, nesse sentido, um processo maiores entraves a um processo avaliativo
permanente e valorizará o princípio da conti- em respeito à individualidade do educan-
nuidade, presente na proposta do sistema. do” como também da instituição.
Concordamos com Sobrinho (2004, p. 121 Também não podemos nos esquecer dos
e 122) quando define que o Sinaes “é concebi- instrumentos utilizados para avaliar, que
do de modo a promover a interatuação e a fundamentam este processo decisório e
mútua alimentação da avaliação e da regulação. necessitam de questionamentos, não só
Com caráter vinculativo, a avaliação subsidia quanto à sua elaboração, mas quanto à
os processos regulatórios e destes se serve coerência e adequabilidade. É necessário
para construir as novas dinâmicas avaliativas o uso de instrumentos e procedimentos de
na perspectiva do permanente aperfeiçoamen- avaliação adequados. Para Bonniol e Vial
to de funções institucionais”. (2001, p. 179), a avaliação “não é e nem
Em relação às práticas avaliativas anteri- pode ser ciência, o que não significa que
ores, Sobrinho (2004, p.121) ressalta que a não deva tender ao rigor e que não deva
grande mudança consiste nas concepções utilizar procedimentos verificáveis. Contu-
de avaliação e de Educação Superior. Ele do, o que condiciona sua validade é o fato
afirma que a mudança de paradigma que pro- de ser um processo de reflexão, retomado
põe o Sinaes não se dá pela escolha de dife- permanentemente no próprio processo que
rentes técnicas e instrumentos avaliativos, dá origem à avaliação”.
mas pela mudança epistemológica, filosófi- Fernandes (2001, p. 71) acredita que as
ca e política da concepção de avaliação. ações metodológicas da Avaliação
Quanto à concepção de avaliação, aban- Institucional estão baseadas em três critéri-
dona-se a operação de instrumentos isolados os: a visão de totalidade, a participação co-
centrados no estudante e no curso e a avalia- letiva e o planejamento e acompanhamento.
ção passa a considerar como foco central a A visão de totalidade significa que a insti-
avaliação institucional. Avaliam-se todas as tuição de ensino deve ser avaliada como um
dimensões de uma instituição por meio da todo, com seus serviços, desempenhos e
autoavaliação e da avaliação externa. Neste inter-relações. O referencial será o projeto
novo paradigma, a função principal da avalia- político-pedagógico da instituição, que deve
ção não é mais a de controle e comparação, em ser de conhecimento de todos por se tratar
que a competição entre as instituições de en- da identidade da instituição.
sino reinava, mas sim a de permanente aperfei- A participação coletiva também é muito
çoamento das funções institucionais, utilizan- importante para o processo avaliativo, que
do distintos instrumentos articulados entre si. deverá ser discutido por todos os segmen-
tos, desde seu início. Fernandes (2001) afir-
CONSIDERAÇÕES FINAIS ma que “as vantagens da participação co-
letiva decorrem da visão multidimensional
A avaliação unicamente “medida”, ran- (várias dimensões) proporcionada pelos
ço do positivismo, mais oculta e mistifica vários segmentos da escola... Além disso,
existe o compromisso que decorre da parti- Vasconcelos (1998, p. 85) argumenta que
cipação e da valorização de todos”. a “avaliação é um processo de captação das
E, por último, é por meio do planejamen- necessidades, a partir do confronto entre a
to e acompanhamento que se podem asse- situação atual e a situação desejada, visando
gurar a continuidade e a unidade do proces- a uma intervenção na realidade, para favore-
so de avaliação e, consequentemente, o cres- cer a aproximação entre ambas”. Ou seja, o
cimento da instituição. A avaliação dos efei- valor da avaliação encontra-se no fato de a
tos de uma instituição de ensino requer a instituição poder tomar conhecimento de
elaboração e o planejamento prévio de uma seus avanços e dificuldades para superar
teoria do estabelecimento, que seria o seu essas dificuldades e continuar progredindo.
projeto político-pedagógico, definindo quais Portanto, ela precisa ser diagnóstica e ser um
são as suas finalidades e seus objetivos instrumento dialético do avanço e da identi-
educacionais, políticos e sociais. ficação de novos rumos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
SUMÁRIO
Introdução
Conceito
Histórico
A crise hipotecária norte-americana
Como a hipoteca derrubou a economia
Condições das instituições financeiras brasileiras diante do choque sistêmico
Melhoria da fiscalização bancária brasileira
Princípios para uma supervisão bancária efetiva
Regras relativas à constituição e organização de bancos
Regulamento prudencial e exigências no gerenciamento do risco
Maneiras de fiscalizar instituições financeiras
Necessidade de supervisão global e troca de informações entre bancos centrais
Conclusão
Quando ocorre o choque e este se trans- A regulação prudencial vem, nos últi-
mite em forma de contágio, tal dinâmica mos anos, sendo objeto de sucessivas atu-
pode ocorrer por meio de dois mecanismos: alizações. A meta da regulação sempre foi a
– a existência de uma ampla rede de em- mesma: evitar que o risco sistêmico ocor-
préstimos entre instituições possibilita que resse com o espalhamento do choque de
a insolvência de um comprometa outros, e confiança por entre as instituições bancá-
se tal situação se alastrar pode colocar todo rias. No entanto, os focos da regulação
o sistema em risco; e prudencial mudaram ao longo dos tempos.
– pelo fato de que todos os bancos ope-
ram o sistema de pagamentos da econo- HISTÓRICO
mia. Assim, à medida que um vá à falência,
seus depositantes não têm como saldar suas Até recentemente, o grande esforço das
obrigações. autoridades se restringia a controlar as re-
Os bancos e instituições financeiras que servas monetárias que os bancos são obri-
lidam com valores macroeconômicos de toda gados a constituir para garantir seus paga-
espécie, como empresas que são, podem mentos, preservando a capacidade dessas
estar expostos a uma instituições de honra-
série de riscos, dentre rem os depósitos de
eles: serem geridos de A regulação prudencial é seus clientes.
forma incompetente; uma forma de intervenção Tradicionalmente,
serem atingidos por portanto, a regulação
desastres naturais ou corretiva no sistema financeira era uma
acidentes; ou caírem financeiro a fim de evitar a questão restrita a go-
em desgraça ou des-
crédito aos olhos pú-
manifestação do contágio vernos possuía
nacionais e
caráter
blicos, seja por proble- focado no risco de
mas de reputação seja por problemas de liquidez, o que os estudiosos chamavam
mudança de preferência dos clientes. Este de Estratégia Tradicional da Regulação
último é o fator conhecido como papel da Financeira.
confiança do público nos mercados. A partir da década de 80, esse cenário
mudou. Os bancos passaram a concentrar
CONCEITO em seu balanço riscos de toda natureza, as
operações cresceram e novos mercados
A regulação prudencial é uma forma de surgiram. A partir de 1980, houve o impulso
intervenção corretiva no sistema financei- ao processo de securitização, o desenvol-
ro a fim de evitar a manifestação do contá- vimento dos mercados específicos para o
gio, ou seja, redução da exposição do sis- risco e a transformação da firma bancária.
tema financeiro a riscos que possam se pro- Desse modo, houve um clima propício a
pagar por toda a economia. Tal regulação mudanças e acertos. O marco regulatório in-
se dá de duas formas principais, com a cri- ternacional ficou conhecido como Acordo
ação de redes de segurança, para evitar que da Basileia I. O Comitê da Basileia para
choques possam causar riscos sistêmicos; Regulação Bancária é um dos comitês manti-
e com a definição de regras de regulação e dos pelo Banco de Pagamentos Internacio-
supervisão que reforcem a capacidade do nais (BIS), se reúne a cada dois meses na
sistema de evitar ou absorver choques. cidade de Basileia, na Suíça, e sua primeira
tudo isso, cada parte desse desastre econô- sentam alto risco de inadimplência nos
mico, foi causado por um só instrumento empréstimos. Mas todos os concessores
financeiro: o empréstimo hipotecado. fizeram todos os esforços, no início da dé-
Títulos de empréstimos hipotecados são cada de 2000, para que esses mutuários se
simplesmente ações de um empréstimo voltassem para o mercado imobiliário. Foi
residencial vendidos a investidores. Um ban- criado o empréstimo sem documentação,
co empresta o dinheiro ao mutuário para com- tipo de empréstimo para o qual não era ne-
prar uma casa e recebe pagamentos mensais cessário fornecer nenhuma informação, e
pelo empréstimo. Esse empréstimo e vários o mutuário também não as oferecia.
outros, talvez centenas, são vendidos a um Pessoas que podiam estar desemprega-
banco maior, que unifica os empréstimos em das recebiam empréstimos de centenas de
um título hipotecário. E assim por diante. milhares de dólares, mesmo que o
A princípio, isso parece ser uma maneira concessor soubesse de seu desemprego.
excelente e segura de ganhar dinheiro quan- Isso ocorria porque, com a introdução dos
do o mercado imobiliário está em alta. No iní- títulos de empréstimos hipotecados, as pes-
cio do século XXI, o mercado imobiliário dos soas que concediam empréstimos não as-
Estados Unidos estava sumiam mais o risco de
em alta. Uma pessoa inadimplência. Elas
que comprasse uma Os bancos queriam saber simplesmente emitiam
casa nova em janeiro de tudo sobre a estabilidade o empréstimo e o ven-
1996 por 155 mil dóla- diam imediatamente a
res poderia ter a expec- financeira do requerente. outras pessoas que
tativa de lucro de 100 Isso mudou após a assumiriam o risco
mil dólares ao vendê-la
em agosto de 2006.
introdução dos títulos de caso os pagamentos
cessassem. E, como os
Mas 2008 não foi igual empréstimos hipotecados empréstimos hipote-
a 2006, pois o mercado cados criados inicial-
imobiliário dos Estados Unidos não estava mente eram feitos com base nos concedi-
mais em alta. Antes da primeira década do dos a mutuários melhores e mais confiáveis,
século XXI, era costume dos bancos dos tudo funcionava bem. Funcionava tão bem
Estados Unidos a realização de uma investi- que os investidores pediram mais. Como
gação do histórico do requerente ao consi- resposta, os concessores diminuíram as
derar empréstimos de dinheiro para uma hi- restrições dos requerentes e fizeram em-
poteca. Os bancos queriam saber tudo sobre préstimos pesados para criar fluxo de caixa
a estabilidade financeira do requerente: ren- para os empréstimos e gerar mais hipote-
da, dívidas e avaliação de crédito. E queriam cas. Afinal, sem as hipotecas, não haveria
confirmar essas informações. Isso mudou títulos de empréstimos hipotecados.
após a introdução dos títulos de emprésti- Os investidores em títulos de emprésti-
mos hipotecados. mos hipotecados enfrentaram o mesmo ris-
Em determinado momento, os clientes co e o sistema de recompensa ao qual esta-
mais qualificados e desejáveis sumiram, pois va sujeita a antiga relação concessor-mutu-
já tinham suas casas. Então, os bancos re- ário, mas em uma escala muito maior, devido
correram aos clientes que tradicionalmen- ao valor de hipotecas unificadas nos títulos
te evitavam: os mutuários subprime, que, de empréstimos hipotecados. Depois de
com uma avaliação de crédito baixa, apre- chegarem aos mercados financeiros, os tí-
ambas estão tão bem estabelecidas na eco- A satisfação dos bancos brasileiros é
nomia dos Estados Unidos que o governo justificada, visto que nos últimos anos, di-
federal tomou o controle das corporações ferente de parceiros internacionais, princi-
em setembro de 2008, em meio a valores de- palmente norte-americanos, eles estão lide-
cadentes; Freddie Mac informou uma perda rando o processo de adequação das empre-
de 38 bilhões de julho a agosto de 2008. sas brasileiras às novas exigências
Fannie Mae e Freddie Mac são exemplos prudenciais, tais como Sarbanes-Oxley, além
de como cada parcela da economia está re- de terem passado a usar os novos instru-
lacionada. Se as coisas vão mal com Fannie mentos de controles internos como ferra-
Mae e Freddie Mac, também vão mal no se- mentas de gestão, o que produziu melhorias
tor imobiliário. Os concessores emitem em- importantes em seus principais indicadores.
préstimos imobiliários e os vendem a uma O Banco Central, braço do governo fede-
das empresas, ou usam os empréstimos ral que orquestra toda a regulação bancária
como garantia para conseguir mais emprés- brasileira, flexibilizou algumas regras para
timos; a função de cada gigante é introduzir adequação ao Acordo de Basileia, exigindo
dinheiro na indústria do empréstimo. Se Mac menos capital próprio para cobrir perdas nos
e Mae não emprestam dinheiro ou compram empréstimos a varejo, como cheque especial
títulos de empréstimos, os concessores di- e empréstimo consignado. Tudo isso dentro
retos têm menos probabilidade de empres- de um cenário de crescimento médio de 25%
tar dinheiro aos consumidores. ao ano das operações de crédito e, claro, re-
Se os consumidores não conseguem di- petidos recordes de lucro. Ainda no Brasil,
nheiro emprestado, não podem gastá-lo. Se um outro ponto forte foi o aumento de segu-
não podem gastá-lo, as empresas não ven- rança ao cliente, evolução que mostra que as
dem produtos; menos vendas significam tentativas de fraudes financeiras apresenta-
valor diminuído, e, assim, o valor das ações ram redução de 26% de 2007 até agora, de-
da empresa diminui. As empresas cortam monstrando que boas políticas de gestão de
despesas demitindo funcionários; o desem- riscos podem trazer ótimos resultados.
prego aumenta e os consumidores gastam Para muitos, com o Brasil utilizando em
ainda menos. Quando um grande número larga escala e disciplinarmente ferramen-
de empresas perde seu valor ao mesmo tem- tas de controle pelos setores de auditoria
po, a bolsa de valores cai. A queda pode interna, houve a criação de uma padroniza-
levar à recessão. Uma crise forte o suficien- ção de tal forma que todos os profissio-
te pode causar depressão e, em outras pala- nais envolvidos passaram a prestar contas
vras, o fim de uma economia. dos resultados de suas atividades.
Alguns bancos nacionais, como o Itaú e o
Condições das instituições financeiras Unibanco, passaram a utilizar-se de
brasileiras diante do choque sistêmico metodologias de medição de riscos
operacionais para cada linha de negócios por
A princípio, as instituições financeiras es- meio de modelos estatísticos, alcançando su-
tão apenas se precavendo contra eventuais cesso na previsão de perdas esperadas. As
problemas de origem sistêmica e estão apli- diferenças de postura entre os bancos brasi-
cando mais aperto na regulação prudencial leiros e os norte-americanos não passaram
brasileira. No entanto, elas não escondem a despercebidas também pelos grandes investi-
satisfação por estarem passando sem muitos dores, que passaram a avaliar melhor bancos
problemas pela crise que ocorre nos EUA. nacionais, elevando o patamar de valor de mer-
deverão identificar e informar ao Banco Cen- com os bancos e procurar entender por com-
tral os clientes (pessoas físicas e jurídicas) que pleto os diversos tipos de operações bancá-
possuam saldo devedor igual ou superior a rias. As informações reportadas pelos ban-
R$ 50 mil, permitindo à instituição fiscalizadora cos devem ser comprovadas via fiscalização
disponibilizar para as instituições financeiras, direta e/ou com a ajuda de auditores exter-
com a permissão do titular da conta, a dívida nos, e a supervisão bancária deve ser feita de
total desse cliente. Isso possibilita melhor ava- forma consolidada, incluindo as participações
liação da capacidade de pagamento dos gran- do banco em outras empresas.
des devedores e, portanto, maior eficiência e Esse conjunto de princípios vem sendo
menor custo no processo de concessão de observado no processo de reestruturação que
crédito, o que tende a reduzir os spreads co- está ocorrendo nos procedimentos de fiscali-
brados nos empréstimos bancários. zação do Banco Central do Brasil. De uma fis-
Além dos benefícios diretos gerados pela calização baseada principalmente em relatóri-
implantação da Central de Risco de Crédito, os enviados pelos próprios bancos (off-site
ela vai possibilitar, em breve, a completa refor- supervision) e de caráter eminentemente bu-
mulação dos critérios de rocrático, o Banco Cen-
classificação de riscos. tral passou a adotar pro-
Na legislação atual, a cedimentos mais moder-
constituição de provi- Além dos benefícios diretos nos de fiscalização.
sões decorre basica- gerados pela implantação Note-se que, com a
mente da ocorrência de MP no 1.334, de 13/3/96,
inadimplência do toma-
da Central de Risco de o Banco Central insti-
dor; nas novas regras, Crédito, ela vai possibilitar, tuiu a responsabilidade
as provisões deverão em breve, a completa das empresas de audi-
considerar a avaliação toria contábil ou dos
ex ante do risco de cada reformulação dos critérios auditores contábeis in-
operação, refletindo as- de classificação de riscos dependentes em casos
sim os riscos de de irregularidades na
inadimplência futura e instituição financeira,
não somente as perdas já incorridas pela insti- forçando que estes informem ao Banco Cen-
tuição financeira. Em resumo, abandonar-se-á tral sempre que sejam identificados proble-
um sistema preocupado com o passado, ado- mas ou que o banco esteja se negando a
tando-se em seu lugar uma abordagem divulgar informações.
prospectiva, mais adequada ao gerenciamento Além disso, o Programa de Aperfeiçoa-
do risco por parte dos administradores de ban- mento dos Instrumentos de Atuação do
cos e da fiscalização do Banco Central. Banco Central do Brasil junto ao Sistema
Financeiro Nacional (Proat) deve entrar bre-
Maneiras de fiscalizar instituições fi-
vemente em funcionamento. Seu principal
nanceiras
objetivo é proporcionar treinamento ade-
Esses princípios estabelecem que a su- quado para o pessoal envolvido nas ativi-
pervisão bancária deva se basear tanto em dades de fiscalização bancária e estudar uma
relatórios periódicos escritos pelos bancos reformulação das informações contábeis a
quanto na fiscalização efetuada diretamente serem exigidas das instituições financeiras
em cada um deles. Os responsáveis pela fis- de forma a uniformizá-las e torná-las compa-
calização devem manter contato frequente ráveis aos padrões internacionais.
Necessidade de supervisão global e tro- zação não seja permitida ou garantida pelo
ca de informações entre bancos centrais país estrangeiro, implicará dedução em seu
patrimônio líquido de todas as participa-
Estes três últimos princípios especificam ções do banco no exterior, para fins de apu-
que a fiscalização dos bancos deve consoli- ração dos limites operacionais; e
dar as operações domésticas com aquelas re- IV) consolidação das demonstrações fi-
alizadas pelo banco no exterior. A importância nanceiras no Brasil com as do banco no
dessa consolidação evita, por exemplo, a pos- exterior (incluindo dependências e partici-
sibilidade de que o banco venha, via subsidi- pações em empresas financeiras e não fi-
ária no exterior, a esconder problemas na sua nanceiras das quais participe com, pelo
carteira de empréstimos. menos, 25% do capital social), para efeitos
O Banco Central editou a Resolução no de cálculos dos limites operacionais do
2.302, de 25/7/96, alte- Acordo de Basileia.
rando a legislação que
trata da abertura de de- Com o uso mais intenso da CONCLUSÃO
pendências dos ban- regulação prudencial pelas
cos no exterior, e con- Com o uso mais in-
solidou as demonstra- instituições financeiras tenso da regulação
ções financeiras dos brasileiras, assim como prudencial pelas institui-
bancos no Brasil com
suas participações no
com a ajuda poderosa do ções financeiras brasilei-
ras, assim como com a
exterior, permitindo governo federal, pode-se ajuda poderosa do go-
uma efetiva supervi- verificar um maior preparo verno federal, pode-se
são bancária global verificar um maior pre-
consolidada por parte do Sistema Financeiro paro do Sistema Finan-
do Banco Central. Nacional para o ceiro Nacional para o
Os principais pon- enfrentamento da crise
tos dessa medida são:
enfretamento da crise econômica. Pode-se
I) aumento do capi- econômica perceber também a im-
tal mínimo exigido para portância crucial do
a constituição de bancos com dependên- gerenciamento de riscos pelos bancos, a fim
cias (agências, escritórios de representa- de que se possa proteger a propriedade alheia.
ção, filiais) no exterior; Conforme disse no final de 2008 Dominique
II) aumento do capital mínimo exigido para Strauss-Khan, diretor-geral do FMI: “As in-
a constituição de dependências no exterior; tensas tentativas de resgate de algumas das
III) permissão para que o Banco Central maiores instituições financeiras dos EUA e da
passe a fiscalizar as operações das depen- Europa empurraram o sistema financeiro glo-
dências e empresas em que o banco tenha bal para perto do derretimento sistêmico”. E
participação no exterior. Caso essa fiscali- assim está sendo.
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* N.R.: Publicado originalmente na edição de dezembro de 1934 da revista A Galera, da Escola Naval,
como editorial.
1 N.R.: Hoje vice-almirante (Refo). Historiador naval e colaborador assíduo da Revista Marítima Brasi-
leira. É de ressaltar que este texto foi produzido cinco anos do início da Segunda Guerra Mundial.
ULTIMA RATIO
O BOMBARDEIO DE ALVEAR
ANTÔNIO GONÇALVES MEIRA
Coronel (Refo)
Número de páginas: 9
Identificação: AV 028/09 – # 1.735 – RMB 2o/09
CIR: GUERRAS; Incidente; Bombardeio; História da Marinha do Brasil;
Números de páginas: 16
Identificação: AV 029/09 – # 1.730
CIR: APOIO; Logística; Força Aérea Brasileira; Nacionalização;
Tucano, o Hércules e outras, que possuem equipamentos descontinuados pelos seus fabri-
cantes, voam atualmente graças ao esforço da nacionalização realizado no Celog.
Normalmente são priorizados para a nacionalização os itens de utilização geral per-
tencentes a conjuntos maiores que, em princípio, não requerem investimentos elevados
para a fabricação e têm consumo considerável, tais como: resistores, anéis, buchas, elemen-
tos filtrantes, escovas de gerador, gaxetas, juntas, contatos, lâmpadas, capacitores, relés,
transistores, molas, engrenagens, parafusos, porcas, arruelas, pinos, pastilhas de freio,
peças de plástico, acrílico e vidro, itens de apoio à aviação como estropos, garfos de
reboque, calços e outros. Tais itens possuem elevado prazo de entrega, quando fabricados
no exterior, ou são obsoletos, entretanto são fundamentais para manter disponível a frota
de aeronaves.
Além dos itens de utilização geral, cujos processos de nacionalização duram de seis
meses a um ano e não costumam trazer grandes retornos financeiros para a FAB, há outros
considerados estratégicos, em face das dificuldades de serem encontrados, muitas vezes
decorrentes da descontinuidade da produção no exterior. Estes itens são complexos, e a sua
nacionalização geralmente representa uma economia significativa para a FAB. Pode-se des-
tacar, dentre outros:
a) Pastilha de Freio do Mirage – a tecnologia de fabricação desenvolvida em parceria
com uma empresa nacional e o material utilizado foram inovadores, motivando a empresa
francesa Dassault Aviation, fabricante da aeronave, a fechar um contrato de fornecimento
com a empresa nacional para todas as aeronaves Mirage III, Mirage V, Mirage 50, Super
Etendard e Atlantic ATL 1 existentes no mundo. A economia anual para a FAB na aquisição
de pastilhas de freio para o Mirage é de R$ 300 mil;
b) Tubo de Exaustão do Xavante – item de responsabilidade fabricado no País por
uma indústria do setor petrolífero, após desenvolvimento do projeto pelo Celog. Foi entre-
gue um lote de 50 tubos, disponibilizando as aeronaves e gerando uma economia para a
FAB de R$ 6.300.000,00;
c) Tubo do Pistão do Trem de Pouso Principal do Bandeirante – item descontinuado
pelo fabricante. A fabricação no Brasil de um lote de 70 peças trouxe uma economia para a
FAB de R$ 2.065.000,00, quando comparada à última aquisição no exterior;
d) Itens Estruturais dos Trens de Pouso do Tucano – itens descontinuados. A
empresa fabricante da aeronave solicitou um prazo de 24 meses para a entrega dos itens ao
custo de US$ 9,936,000.00 para equipar toda a frota. Os itens foram projetados pelo Celog
em parceria com uma empresa de engenharia nacional, e o protótipo foi fabricado e ensaiado
quanto à fadiga no IAE/CTA. Estima-se que a nacionalização e a aquisição de lote necessá-
rio para a frota de aeronaves destes itens gerarão uma economia de US$ 7,900,000.00 para a
FAB. Além disso, por tratar-se de uma melhoria no projeto original, será requerida a patente
do item, o que se traduzirá em receitas futuras de royalties para a FAB nas vendas dos itens
do trem de pouso do Tucano para as forças armadas de diversos países que possuem a
referida aeronave.
O Celog é uma Organização Militar de referência da FAB que desenvolve atividades
relacionadas à logística de transporte, aquisição e nacionalização de itens de emprego
aeronáutico e bélico.
O sucesso obtido na nacionalização de itens de suprimento para as aeronaves da
FAB está apoiado principalmente nos seguintes pontos:
MOMENTOS EM IMBITUBA
A viagem que poderia ter acabado em tragédia
Logo após 31 de março, o cruzador re- bordo, lotados nos departamentos de Ope-
cebeu um novo comandante e um novo rações, Armamento e Máquinas, os repa-
imediato, vindos da Diretoria do Pessoal ros do navio foram terminados com êxito.
Militar da Marinha (DPMM), além de ou- Em fins de maio, o Barroso estava pronto.
tros oficiais mais modernos. Não vimos Certa tarde, o comandante do navio cha-
mais o capitão de corveta chefe do Depar- mou-me à câmara: “Quero convidá-lo para
tamento de Navegação e alguns tenentes. ser meu encarregado de Navegação” – dis-
Soube, então, que ele, figura divertida na se ele.
praça-d’armas, que fazia o pessoal da mesa Fui pego de surpresa!
rir muito, fora para o México para incorpo-
rar-se ao Partido Comunista mexicano, de- A VIDA DO NAVEGADOR
pois, obviamente, de ter feito as cabeças
de certos tenentes. Também depois soube Eu conhecia a bordo um segundo-te-
que, nas cobertas abaixo, habitadas pela nente muito esperto e pedi ao comandante
guarnição, o comandante navegador fazia para que ele me fosse cedido, para assumir
preleções para as praças, às escondidas. a divisão “N”. Quanto a mim, afora a sur-
O comandante do navio, um capitão de presa do convite, a função não me era es-
mar e guerra maquinista, e o imediato, um tranha, pois fora encarregado de Navega-
capitão de fragata também maquinista, am- ção do Guanabara, convidado por um ca-
bos de saudosa memória, puseram mãos à pitão de fragata exigente, e diversas vezes,
obra. Com a ajuda da oficialidade, princi- em 1959, o NE entrara e saíra da baía da Ilha
palmente dos capitães-tenentes antigos a Grande, em viagens com os alunos do Co-
légio Naval, inclusive para Vitória. Depois, à praia, com as máquinas em baixa rotação,
em Belém, na Corveta Mearim, quando o aguardando a ordem de parar as máquinas e
navio suspendia com destino ao oceano, o largar o ferro no ponto determinado.
imediato caía no beliche, “mareadíssimo”, Passamos sobre o ponto de fundeio às
e sobrava para mim a navegação, enquan- 15 horas. Como ficava distante da praia para
to o outro oficial do navio ficava cuidando arriar a lancha e o mar se apresentasse tran-
das máquinas. Quase mensalmente, como qüilo, o comandante determinou que con-
corveta de socorro, íamos para São Luís tinuássemos navegando em marcha redu-
do Maranhão ficar duas semanas fundea- zida, a fim de que, estando mais próximo de
dos. Assim, depois da experiência de má- terra, fosse facilitada a manobra da lancha.
quinas, da calibragem dos equipamentos Estávamos ainda navegando pela carta
de artilharia e da aferição da agulha mag- 1.907 quando o ecobatímetro começou a
nética, estávamos prontos para viajar. acusar profundidades mais baixas, decres-
Do início de junho de 1964 em diante, o cendo a 20 metros. Eu teria, então, que tro-
Barroso fez-se ao mar diversas vezes, em via- car de carta, da 1.907, na qual estava nave-
gens de curta duração, e outras maiores, visi- gando, que só ia até 20 metros de profun-
tando Santos, Salvador e Recife. Inclusive o didade, e passar o ponto estimado para a
navio escoltou o cruzador francês Colbert, carta 1.908, da enseada de Imbituba, que
que trouxe ao Brasil o General De Gaulle. começava próximo à isobática de 20 metros.
Enquanto fazia a troca da carta, o eco acu-
A VIAGEM PARA IMBITUBA sou 16 metros. Veio, então, o susto: com o
ponto ainda estimado na carta 1.908, o
No meio do ano, se não me falha a memó- ecobatímetro indicou profundidade “zero”,
ria, a Ordem de Movimento do Comando em voltando a crescer logo em seguida para
Chefe da Esquadra determinava que o Barro- 14 metros. O Barroso, então, fundeou, com
so, com o Comandante em Chefe (ComemCh) quatro quartéis de amarra.
a bordo, rumasse para o sul do País, na região Estávamos, em minha opinião, mal fun-
de Imbituba, Santa Catarina, a fim de que fos- deados, a 14 metros de profundidade, pró-
se escolhida a praia onde seria realizada a Dra- ximos das pedras mais ao norte, sobre as
gão, operação anfíbia, em novembro de 1964. quais o Barroso deve ter “roçado” a qui-
Não me lembro mais se foi a Esquadra lha, quando o eco marcou fundo “zero”.
que determinou o ponto de fundeio ou o Além disso, o tempo começou a virar. O
comandante do navio, porém ele foi marca- perigo seria o ferro desunhar e o navio
do na carta 1.907 em profundidade bem garrar, e, dada a sua grande estrutura, po-
superior a 20 metros, próximo à entrada da der ser levado pelo vento ou pela maré para
enseada de Imbituba, quando seria arriada a praia ou, o que talvez fosse pior, cair para
a lancha de bordo, que conduziria os ob- cima das pedras, sem que as máquinas ti-
servadores para o reconhecimento da praia, vessem tempo de atuar.
após o que seriam recolhidos e o navio Pensamentos sombrios passaram pela
suspenderia para prosseguir viagem. minha cabeça: já imaginava o grande cru-
Durante a aproximação para o ponto de zador encalhado na praia em frente, bem
fundeio, o cruzador estava bem navegado, próxima, caso a amarra cedesse, repetindo
pois tivéramos uma boa posição astronômi- a tragédia da Corveta Angostura em junho
ca de meio-dia e o tempo apresentava-se de 1958, na praia de Itaipu, em Niterói, quan-
bom. O Barroso fazia a aproximação aproado do ficou encalhada para tentar salvar o
Camboinhas, safando-se somente após que nos levaria a passar a 500 jardas do mor-
duas semanas de muita faina. ro. Depois que o navio começasse a girar, o
Sei que arriaram a lancha, na qual em- ferro seria suspenso, as velocidades seriam
barcaram os observadores. Eu só tinha aumentadas e o leme pouco a pouco viria a
olhos para a proa, batendo com força, pois meio. Quando o navio terminasse de comple-
o mar encrespara rapidamente, e já estava tar 180º, a proa deveria estar apontada para a
escurecendo. Para piorar a situação, no entrada da enseada. Aí o leme estaria a meio
morro a bombordo o farol estava apagado. e as máquinas aumentariam as rotações para
A praia apresentava uma vegetação rastei- “toda a força adiante”. Era assim que esperá-
ra, sem pontos propícios para a obtenção vamos que tudo fosse acontecer.
de uma distância e uma marcação seguras, A navegação de praticagem foi posta
pelo radar de superfície, utilizado para a de lado, uma vez que a escuridão total não
navegação. O único ponto mais preciso era nos permitia enxergar qualquer acidente
o morro a bombordo. A boreste, a praia pro- geográfico em terra.
longava-se, sem pontos observáveis. No regresso da lancha do navio, com os
Chamei o meu ajudante e pedi que apa- observadores, ela não conseguiu ser içada,
nhasse o Livro do Navio, para conferirmos pois o mar estava agitado e ventava muito.
seus dados, suas curvas de giro, o efeito do Os observadores tiveram que ser recolhi-
seu leme para diversas velocidades. Come- dos pela rede do guindaste da popa e a
çamos, na noite que chegava, a “redesco- lancha foi deixada no local, fundeada.
brir” o Barroso, velho barco construído em 20 horas. Navio “pronto para suspender”.
1934/1937 e, detalhadamente, fomos colo- Quando a popa começou a girar, pelo efei-
cando no papel nossa estratégia para sair to dos hélices, e a proa, já com o ferro pelos
daquela situação. cabelos, iniciou a descrever um imenso meio
O Barroso continuava a manter a proa círculo, dava a impressão que iríamos colidir
oscilando na direção da praia, oposta à com o morro, pois os sinaleiros acenderam o
entrada da enseada. holofote de 36 polegadas, iluminando a área.
Rapidamente, o navio foi se aprumando para a
UMA MANOBRA DELICADA entrada da enseada. Sugeri então ao oficial de
manobra que determinasse “leme a meio” ao
A manobra de saída da enseada de timoneiro e “toda a força adiante” para as má-
Imbituba consistiria em manter a proa presa quinas. Parecia que tínhamos acordado de um
pelo ferro de fundear, enquanto os dois eixos pesadelo e vivíamos, naquele instante, um so-
de boreste davam adiante e os dois eixos de nho: o navio, construído 30 anos antes, o ex-
bombordo davam a ré, com o leme todo a Philadelphia, de tão bela passagem na Se-
bombordo. Guinaríamos por bombordo, uma gunda Guerra Mundial, respondera como se
vez que guinar por boreste não era conveni- tivesse saído do estaleiro naquele momento.
ente devido à ausência total de qualquer pon-
to de referência para a manobra. Tinha obser- CONCLUSÃO
vado, nas viagens efetuadas, que o navio
descrevia uma curva de giro de 1.500 jardas, A entrada na enseada de Imbituba po-
com as máquinas a meia força e algum ângu- deria ter causado um sério acidente de na-
lo de leme. Ele teria, em Imbituba, que reduzir vegação envolvendo um cruzador de 185
a curva de giro para 1.000 jardas, ajudado metros, de manobra difícil em áreas restri-
pelos quatro eixos, e carregar todo o leme, o tas, em local de mar quase sempre agitado,
sem sinalização para as pedras submersas, lizado para a navegação em águas restri-
em uma área sem pontos notáveis para se tas, não é o mais indicado para aquele tipo
fazer uma boa e segura navegação; além de navegação, no qual os pontos notáveis
do mais, distante da principal base naval, eram rasteiros e não provocavam ecos mui-
representada pelo AMRJ, e dos navios de to precisos.
socorro sediados no Rio de Janeiro.
Como os oficiais do Corpo da Armada sa- OUTRAS CONSIDERAÇÕES
bem perfeitamente, sempre que se muda o
ponto de uma carta para a outra, de escalas Depois de passado tanto tempo, tive a
diferentes, o ponto transportado não ficará ideia de escrever alguma coisa sobre a via-
exatamente onde se previra e, em conse- gem a Imbituba. Afinal de contas, volta e meia
quência, a localização do navio fica alterada. o assunto me vem nitidamente à lembrança.
Em Imbituba, isso aconteceu, com o agra- Nada mais conveniente, então, que recordas-
vante de que o transporte do ponto foi feito se aqueles momentos (quase) trágicos ou-
em situação que não dava tempo para mano- vindo aquele meu antigo encarregado da di-
bra evasiva, pois quando foi trocada a carta visão “N” do Barroso. O hoje capitão de mar
de navegação da 1.907 para a 1.908 pratica- e guerra na inatividade, ótimo oficial cursado
mente o navio estava “em cima das pedras”. em eletrônica, atencioso como sempre, for-
Tudo se passou quase num piscar de olhos. neceu-me preciosos detalhes que concorre-
Também parece importante salientar que ram para dar mais veracidade à história da-
o radar de superfície, embora possa ser uti- quele fundeio na enseada de Imbituba.
1
N.R.: Nos cruzadores Barroso e Tamandaré, a faina de “lona e areia” envolvia praticamente toda a
tripulação, animada pela banda de música. Os encarregados de Divisão ou seus ajudantes comanda-
vam os cabos e marinheiros, supervisionados por sargentos. Cada divisão ficava responsável por
setores do convés principal. A lona da mangueira servia como uma lixa, que, junto à areia e à água
salgada, deixava o tabuado do convés muito limpo.
DOADORES
Biblioteca Nacional
Biblioteca do Exército
Centro de Mísseis e Armas Submarinas da Marinha
University of Florida
PERIÓDICOS RECEBIDOS
ALEMANHA
Tecnologia Militar – v. 31 no 1/2009
ARGENTINA
Boletin del Centro Naval – v. 126 no 822 out./dez. 2009
CANADÁ
Canadian Naval Review – v. 4 no 3 FALL 2008
CHILE
Revista de Marina – v. 126 no 908 jan./fev. 2009
Politica y Estratégia – no 111 jul./set. 2008; no 112 out./dez. 2008
ESPANHA
Revista de História Naval – v. 26 no 103/2008
Revista General de Marina – v. 225 out./2008; v. 225 dez./2008;
v. 256 mar./2009 supl./mar./2009
ESTADOS UNIDOS
Naval Forces – v. 29 no 6, 2008; v. 30 no 1, jan./2009; v. 30 no 2, 2009
Naval War College Review – 62 no 1 WINTER 2009; v. 62 no 2 SPRING 2009
Politics & Policy – v. 36 no 5 out./2008; v. 36 no 6 dez./2008; v. 37 no 1 fev./2009
Proceedings – mar./2009
UNITAS 50 – 2009
Via Inmarsat – jul./set. 2009; abr./jun. 2009
HOLANDA
Revista Europea de Estudos Latinoamericanos y Del Caribe – no 86 abr./2009
DOAÇÕES E PERIÓDICOS RECEBIDOS
ITÁLIA
Rivista Marittima – v. 142 jan./2009
Rivista Militare – v. 1 jan./fev. 2009
PORTUGAL
Revista da Armada – v. 38 no 429 abr./2009
Cadernos Navais – no 28 jan./mar. 2009
BRASIL
Asfalto em Revista – v. 1 no 3 jan./fev. 2009
Boletim do Clube Naval – mai./2009
Círculo Militar de São Paulo (CMSP) – v. 29 no 348 mai./2009
Clube Naval – abr./2009; v. 117 no 349 jan./fev./mar./2009
Conexão Brasília – v. 6 ed. verão 2009
O Corujão – v. 4
A Defesa Nacional – v. 94 no 812 set./out./nov./dez. 2009
A Galera – 1956
Informativo Marítimo – v. 16 no 4 out./dez. 2008
LUBES em foco – v. 2 no 11 fev./mar. 2009
Museu Aeroespacial –
NOMAR – v. 44 no 798 out./2008; v. 444 no 800 dez./2008
NOTANF – no 4 out./2008; jan./fev./mar. 2009
Notícia Bibliográfica e Histórica – v. 39 no 202 jan./jun. 2007
Pesquisa Fapesp – no 159 mai./2009
Portos e Navios – v. 50 no 578 mar./2009; v. 51 no 579 abr./2009; v. 51 no 580 mai./2009
Relatório Anual 2008 Wilson Sons Limitewd –
A Ressurgência – no 3/2009
Revista Brasileira de Saúde Ocupacional RBSO – v. 222 no 118 jul./dez. 2008
Revista de História da Biblioteca Nacional – v. 4 no 43 abr./2009; v. 4 no 44 mai./2009
Revista de História Naval – v. 26 no 103/2008
Revista de Ciências Sociais teoria & pesquisa – v. 17 no 1 jan./jun. 2009
Revista de Marinha – no 947 dez./2008/jan./2009; no 948 fev./mar./2009;
abr./mai./2009; no 256 mar./2009 supl
Revista do Clube Naval – v. 117 no 349 jan./fev./mar. 2009
Revista do Empresário da ACRJ – v. 68 no 1398 mar./abr. 2009
Revista do Exército Brasileiro – v. 145 3o quadrimestre 2008
Revista de Instituto Histórico Geográfico da Bahia – no 103/2008
Revista de Instituto Histórico Geográfico do Rio Grande do Sul – v. 88 no 143/2008
Revista Intermarket – v. 8 no 44/2009; v. 8 no 45/2009
Revista Militar e Ciência e Tecnologia (C&T) – v. 25 3o quadrimestre 2008
Tecnologia & Defesa – v. 26 no 117
Comissões: Encouraçado São Paulo; Cru- Medalha de Serviços de Guerra com 3 estre-
zador Rio Grande do Sul; Escola de Aviação; las; Medalha da Força Naval do Nordeste
Navio Mercante Camaquã; Cruzador Bahia; (grau Prata); Ordem do Mérito Naval (grau
Grupo de Caça-Submarinos; Comissão Naval Grã-Cruz); Ordem do Mérito Militar (grau
Brasileira em Miami; Caça-Submarinos Jundiaí Grande-Oficial); Ordem do Mérito Aeronáu-
(imediato); Base da Flotilha de Submarinos; tico (grau Grande-Oficial); Ordem de Rio Bran-
Submarino Humaitá; Caça-Submarinos co (grau Grande-Oficial); Ordem do Mérito
Guaíba; Diretoria do Pessoal da Marinha; Di- Judiciário Militar (grau Grã-Cruz); Medalha
retoria da Marinha Mercante; Escola de Guer- Militar de Ouro com Passador de Platina; Me-
ra Naval; Estado-Maior das Forças Armadas; dalha de Campanha do Atlântico Sul; Meda-
Escola Superior de Guerra; Adido Naval à Em- lha Naval de Serviços Distintos; Medalha do
baixada do Brasil em Lima – Peru (adido); Ca- Pacificador; Medalha Mérito Santos Dumont
pitania dos Portos dos Estados do Pará e (grau Prata); Medalha Comemorativa do Nas-
Amapá (capitão dos portos); Comando do 4o cimento de Ruy Barbosa; Grande Estrela ao
Distrito Naval (comandante interino); Estado- Mérito Militar (grau Grã-Cruz) – República
Maior da Armada; Comissão Mista Brasil-EUA do Chile; Legião do Mérito (grau Oficial) –
(assessor militar); Comando da Força de Cru- República dos EUA; Estrela das Forças Ar-
zadores e Contratorpedeiros (comandante in- madas do Equador (grau Grã Estrela Militar);
terino); Gabinete do Ministro da Marinha (che- Medalha Mérito Militar de 1a Classe – Repú-
fe); Secretaria-Geral da Marinha (secretário- blica de Portugal; Ordem de Mayo ao Mérito
geral); Estado-Maior da Armada (Chefe); e Naval – República da Argentina; e Ordem da
Gabinete do Ministro da Marinha (ministro Cruz do Mérito Naval (grau Grã-Cruz) – Re-
interino). pública do Peru.
Em reconhecimento aos seus serviços, re- À família do Almirante Gualter Maria
cebeu inúmeras referências elogiosas e foi Menezes de Macalhães, o pesar da Revis-
condecorado com as seguintes medalhas: ta Marítima Brasileira.
O RELATORIO DA MARINHA
(RMB, maio/1909, p.1.049 a 1.981)
Abrimos hoje as paginas desta Revista cessidades do momento, como ponto de par-
com a transcripção da introdução do tida para a formação da poderosa esquadra
relatorio apresentado este anno pelo sr. de que o Brazil, no seu rapido desenvolvi-
ministro da marinha, almirante mento, ha de precisar forçosamente dentro
Alexandrino de Alencar, ao sr. presidente de poucos annos.
da Republica. Essa importante introducção consubstancia,
É um trabalho notavel e que dá desde além disso, quanto nos temos adeantado nes-
logo a quem o lê uma clara idéa da tes ultimos annos nesse particular,
competencia e da tersa orientação que photographando ao mesmo tempo o espirito de
presidio á genesis e ao desdobramento do actividade e de progresso que anima a nossa
nosso programma naval; programma que administração naval, reflectindo-se rapidamen-
accrescido, como deve ser, de mais um cou- te para o cabal desempenho da alta tarefa que
raçado do mesmo typo e de mais algumas lhe compete no concerto nacional.
unidades secundarias, em numero propor- Por todos esses motivos é com verdadei-
cional a esse forte nucleo de navios de com- ra satisfação que aqui a registramos.
bate, corresponderá perfeitamente ás ne- Exmo. Sr. Presidente da Republica (...)
ACONTECEU HÁ CEM ANOS
RIACHUELO
(RMB, junho/1909, p. 2.199 a 2.225)
“Ainda que a tendencia do espirito mo- louvabilissimo e mais que justificado orgu-
derno seja a de apagar as reminiscencias da lho patriotico, da grata tarefa de fazer
luta, as recordações de sangue, os traços de reviver ante a memoria das modernas gera-
desunião e de odio que eram guardados nas ções as homericas figuras dos que com
civilisações antigas como uma herança na- indeleveis tintas o inscreveram nas paginas
cional, as datas que rememoram os gran- da historia, que hoje nos sentimos á vontade
des feitos de armas na defesa da patria para enveredar por outro caminho e encarar
permanecem glorificadas, apezar de tudo, esse grande feito de nossa marinha de guer-
porque representam, com o correr dos ra sob outro aspecto que não o da simples
annos, não uma expressão de colera odiosa, gloria, embora immensa, que delle jorrou por
mas sim exemplos de generosa renuncia e sobre toda a nação brazileira – queremos
de coragem cavalheiresca, que guardam. dizer – para considereal-o pelos outros pris-
É sem duvida de um grande valor para mas – si não brilhantes, talvez mais uteis –
um povo saber-se capaz de emprezas a que se prestam sempre acontecimentos
magnificas e de desprendidos sacrificios dessa ordem.
por amor do seu solo e da sua bandeira; mas Nesse intuito, porém, nada de melhor
é, sem duvida, de maior valor affirmar que poderiamos aqui fazer do que depor a mal
essas qualidades viris formam o deposito adestrada penna e deixar que a esse res-
de virtudes da raça e que só temos motivos peito nos instruam, encantando-nos a um
para nos orgulharmos dos que viveram an- tempo, as seguintes paginas que, data venia,
tes de nós, como os que vierem depois se vamos reproduzir de um dos tomos já im-
orgulharão dos que morreram por elles.” pressos da magnifica obra DE ASPIRAN-
Esses belos conceitos publicados ha dias TE A ALMIRANTE, com que o sr. almi-
em um dos principaes orgãos da imprensa rante Arthur Jaceguay veio em boa hora
diaria desta capital, a proposito do enriquecer a historia ainda tão deficiente
anniversario da renhida batalha campal de dos nossos feitos navaes durante a prolon-
Tuyuty – a cujos heroes, extinctos ou so- gada campanha do Paraguay.
breviventes ainda, seja-nos permittido ren- Dessas paginas, que fazem parte das
der aqui, de passagem, o nosso preito de que o autor denominou “Reflexões criticas
extrema veneração – taes conceitos, sobre as operações combinadas da esqua-
diziamos, podiam igualmente servir-nos de dra brazileira e exercitos alliados” e que já
introito á glorificação que mais uma vez foram devidamente abonadas pelo reputa-
intensamente fazer do grande prélio na- do e elegante publicista sr. José Verissimo,
val do Riachuelo, ferido, como se sabe, com da Academia Brazileira – a que hoje
a mais inexcedivel bravura, de parte a par- tambem pertence por seus excepcionaes
te, no memoravel dia 11 de junho de 1865. meritos literarios o sr. almirante Jaceguay
Mas esta Revista já o tem feito tantas – assim como por outros notaveis
vezes, desempenhando-se assim, com escriptores nacionaes, dimana tanta luz
sobre essa tremenda peleja, que julgamos narrativa em que perfeitamente se discri-
prestar um bom serviço, não só a todos os mina a mais severa imparcialidade a par da
nossos camaradas como a quantos nos le- mais completa analyse das diversas faces
rem, divulgando por toda parte a que cos- desse suprehendente feito naval.
tuma chegar a nossa Revista essa fidedig- Cedemos, pois, sem mais demora a pala-
na narrativa de um dos episodios mais cul- vra ao emerito historiographo.
minantes daquella porfiada campanha; “O RIACHUELO (...)”
REVISTA DE REVISTAS
ABRIL – 1909 É exactamente quando a estatistica
dos sinistros maritimos augmenta con-
FRANÇA sideravelmente.
Refere-se o mesmo artigo aos signaes
A SEGURANÇA DA NAVEGAÇÃO sonoros em tempo de cerração, mas diz
PELA TELEGRAPHIA SEM FIO – La muito judiciosamente que são recursos
Nature , a bella e instructiva revista falliveis; podem conduzir os navegantes a
franceza, que tanto se recommenda por uma erros compromettedores, devido ao redu-
escolhidissima variedade de assumptos, zido alcance das ondas sonoras e á sua pou-
traz no seu numero de 27 de fevereirfo um ca precisão nas indicações da direcção, pois
longo artigo sobre a epigraphe acima. são bem conhecidos os phenomenos de re-
Começa referindo-se aos serviços pres- flexão e refracção dos signaes acusticos.
tados á navegação pela genial descoberta Tratando da telegraphia sem fio, diz
de Hertz e cita o facto do abalroamento de que as suas indicações são muito mais pre-
dous paquetes, o Florida , italiano, e o cisas e, feitas em dadas condições, podem
Republic, americano, prevenir muitos de-
em pleno oceano. sastres que com tanta
Nessa catastrophe a frequencia se dão,
Nessa catastrophe a
telegraphia sem fio pres- muito principalmente
tou extraordinarios ser- telegraphia sem fio prestou nas proximidades dos
viços, e graças ás suas extraordinarios serviços portos e costas de
communicações foram grande movimento
levados immediatos commercial.
soccorros ao logar exacto do sinistro. Em pou- Cita o exemplo, aliás muito frequen-
cas horas o paquete abalroado ficou cercado de te, de dous navios navegando nas mes-
navios que receberam a bordo os seus passagei- mas paragens e ambos com estação
ros antes de ter o mesmo desapparecido nas rediotelegraphica.
profundezas do oceano. Emquanto a distancia que os superar
O Republic ficou gravemente avariado fôr maior que o alcance das ondas
e delle foram recolhidos a bordo dos navios hertzianas, os dous navios em questão po-
salvadores perto de 600 naufragos. derão navegar com toda segurança.
Esse sucesso da telegraphia sem fio cau- Dado, porém, o caso de se approximarem
sou enorme sensação e mais uma vez veio de modo a perceberem os signaes
justificar a razão de ser da sua rapida e radiotelegraphicos um do outro, podem to-
universal aceitação. mar certas medidas de precaução, isto é, re-
Nos casos de abalroamento, o novo dis- duzir as suas marchas á proporção que os
positivo telegraphico presta relevantissimos signaes se forem tornando mais intensos.
serviços, principalmente nos constantes tem- Farão, nestes casos, indicações recipro-
pos de cerração das épocas invernosas. cas dos rumos e marchas que levam.
NOTICIARIO MARITIMO
ABRIL – 1909 do juramento á bandeira por 622
grumetes destinados ao serviço da ma-
MARINHA NACIONAL rinha de guerra.
Essa tocante e patriotica solemnidade,
JURAMENTO Á BANDEIRA – que tanto concorre para maior acatamento
Foi solemnemente realizado, no dia 6 ao pavilhão nacional, teve logar na fortale-
do corrente mez, com a presença do sr. za de Villegaignon, séde do Corpo de Ma-
almirante Ministro da Marinha, o acto rinheiros Nacionaes.
A pratica deste e de outros actos seme- lançar um novo cabo submarino entre
lhantes muito contribuirá para estimular, Teneriffe e o Brazil.
nos jovens servidores da patria, a dedica- A concessão desta nova linha foi obtida
ção e o fervor pelo serviço militar, que tem pela Deutsch Atlantische Telegraphen
de ser executado á sombra da bandeira – Gesellschaft.
sagrado symbolo da patria a que acabam de Os trabalhos do lançamento do cabo se-
prestar juramento de fidelidade e amor. rão confiados á sociedade de electricidade
Os noveis marinheiros são todos oriun- Telten Guilhaum-Lahmeyer.
dos das nossas escolas de aprendizes, que A exploração da nova linha será feita
tão bons serviços estão prestando á mari- por uma sociedade organisada com a deno-
nha brazileira. minação de Deutsch Südamerikanische
Telegraphen , com sede na cidade de
O NOVO-ARSENAL – De ha muito vêm Colonia.
as administrações navaes preoccupando-se com Será estabelecida tambem uma linha
a mudança e transformação do actual arsenal telegraphica entre Allemanha, Teneriffe,
de marinha, já obsoleto e situado em local Liberia e Brazil de um lado, e Allemanha e
reconhecidamente improprio. suas colonias de Cameron e Sud-Oeste da
Varios logares foram lembrados com suas Africa, do outro.
vantagens e inconvenientes, tendo sido fi- O governo allemão concedeu garantia
nalmente resolvido, pela actual adminis- de juros para o capital effectivamente em-
tração, o aproveitamento da parte norte da pregado. Este capital é quasi todo for-
ilha das Cobras para a fundação do novo necido pelos principaes bancos do Imperio.
arsenal.
Os trabalhos receberão brevemente um ESTADOS UNIDOS
grande impulso, devendo ser executados
de conformidade com os planos organisados FREIOS PARA NAVIOS – Fizeram-
pela Inspectoria de Engenharia Naval e se experiencias com uns freios hydraulicos
sob sua fiscalisação. inventados por um canadense, destinados
Uma parte dessa importante obra será, a fazer parar instantaneamente os navios
provavelmente, confiada a constructores a cujos cascos estiverem adaptados.
civis, que deverão cingir-se ás condições Cada freio compõem-se essencialmente
estabelecidas no edital de concorrencia já de um cylindro com embolo que, offerecendo
publicado e cujas bases principaes são as grande resistencia á agua que entra pela
seguintes: parte anterior, que se abre no momento
(...) preciso por meio de uma alavanca collocada
no passadiço, e parada a machina, impede o
ALLEMANHA seguimento do navio, fazendo-o estacar
quasi repentinamente.
CABO TELEGRAPHICO – Annuncia Comprehende-se facilmente que, mano-
se a fundação de uma nova companhia com brando-se com um só destes freios e a um
um capital de quatro milhões de marcos para tempo com o leme e com a machina do bordo
tro cruzadores aereos typo Zeppelin de Faço minhas todas as razões apresenta-
12000 a 14000 metros cubicos a custo das por elle em favor da politica de man-
approximado de 750 contos. ter-se um certo prestigio naval, como o me-
Dois destes cruzadores estacionarão em lhor meio de conservar a paz com outras
Wilhelmshaven e outros dois em Kiel. nações e garantir o respeito aos nossos di-
reitos, a defesa de nossos interesses e a
ESTADOS UNIDOS nossa influencia nos negocios
internacionaes.”
A MARINHA NA OPINIÃO DO
NOVO PRESIDENTE – O sr. Taft, JAPÃO
actual presidente, na sua mensagem inau-
gural, usou das seguintes expressões com EXPERIENCIA TELEGRAPHICA –
referencia á marinha de guerra do seu paiz: O vapor japonez Aki-Maru, tendo partido
“Uma esquadra moderna não póde ser de Seatle, nos Estados Unidos, com desti-
improvisada. Deve, ao contrario, estar per- no ao Japão, manteve, fazendo funccionar
feitamente constituida e prompta para o apparelho telegraphico de que é provido,
qualquer emergencia que reclame a sua in- durante toda a viagem, permuta constante
tervenção. de signaes com a estação telegraphica
Meu distincto antecessor, em seus dis- daquelle porto, ao qual por fim avisou a
cursos e mensagens, demonstrou claramen- sua chegada a Yokohama.
te, numa linguagem inflammada e incisiva a Sabendo-se que a distancia percorrida
necessidade de mantermos uma forte mari- pelo Aki-Maru foi de 4240 milhas, este
nha, proporcional á extensão das nossas cos- resultado é, sem duvida, digno da maior
tas e ao commercio exterior da nação. attenção e por isso aqui o registramos.
SUMÁRIO
(Matérias relacionadas conforme classificação para o Índice Remissivo)
ARTES MILITARES
ESTRATÉGIA
A Ásia no debate estratégico norte-americano (252)
GUERRA
O futuro da guerra naval – Declínio da decisão humana nas operações navais? (255)
COMUNICAÇÕES
COMUNICAÇÕES
O celular corporativo (ou como um acessório pode se converter em pesadelo) (255)
FORÇAS ARMADAS
ARMAMENTO
Soft kill versus mísseis antinavio (259)
COMANDO DA MARINHA
Os comandantes respondem (260)
PODER NAVAL
Marinhas do mundo em revista (260)
REVISTA DE REVISTAS
INFORMAÇÃO
SISTEMA DE INFORMAÇÃO
Sete mitos da inteligência (261)
PODER MARÍTIMO
ABALROAMENTO
Abalroamento nas profundezas (264)
POLÍTICA
TERRORISMO
O terrorismo marítimo na estratégia da Al Qaeda (267)
SAÚDE
ALIMENTAÇÃO
A contribuição do vinho nas dietas dos homens do mar (268)
China, precisamos entender a Ásia. Precisa- Entretanto, pondera o autor, novos go-
mos engajar e equilibrar”, afirma. vernos apresentam tendência a importar
Prosseguindo, o autor avalia que a or- novas ideias estratégicas que colidem com
dem internacional está, cada vez mais, de- a realidade em pouco tempo. Acrescenta,
finida por forças transnacionais fora do porém, que ainda não está claro o quanto o
controle de estados individuais e que a enfoque em mega-ameaças e a crescente
excepcionalidade norte-americana está fi- resistência à lógica do equilíbrio de pode-
cando defasada. Essas questões, na pers- res influenciarão o novo presidente. Se-
pectiva asiática, formam uma visão cons- gundo ele, Barack Obama já demonstrou
trangedora sobre o papel da América do ser bastante pragmático, além de ter herda-
Norte no mundo para seus aliados e na- do duas guerras e uma grave crise finan-
ções amigas, que são forçados a viver se- ceira mundial. Afirma o autor que “qual-
gundo uma realidade política de busca de quer que seja a evolução do pensamento
equilíbrio de poderes no seu dia a dia e que estratégico sobre a Ásia, as implicações
se voltam para os EUA para segurança e para a Marinha são significativas”.
liderança. Green busca então indicar de forma resu-
“A Ásia é um teatro essencialmente mida as implicações da questão asiática para
marítimo, e a Marinha americana está a Marinha de seu país. Assim, ele coloca:
posicionada no fio da navalha em cada um • Será necessária uma força de superfí-
de seus desafios e oportunidades”, afirma cie tão grande quanto a existente hoje no
Green. Segundo ele, nas operações de Pacífico?
2004/2005 em apoio às vítimas do tsunami • Quão longe deve ir a Marinha em ter-
e no exercício Malabar 2007 (Índia, EUA, mos de alocar novos meios e aumentar a
Japão, Austrália e Cingapura), na Baía de interoperabilidade com o Japão ou avan-
Bengala, entre outras inúmeras ações exe- çar no planejamento para a defesa de
cutadas na Ásia, foi demonstrado pelas Taiwan, podendo dessa forma causar rea-
democracias marítimas da área que elas ção de Pequim?
possuem a capacidade de operar e coope- • Se as questões existentes relativas à
rar entre si para manter abertas as linhas de venda de armamento para Taiwan e Japão
comunicação marítimas e criar normas para são por demais provocativas, qual outra
interdição de transferências de materiais forma existe para diminuir o crescente abis-
associados a armas de destruição em mas- mo entre nossos aliados e as capacidades
sa. Nessas ocasiões, a Marinha reforça os da PLA?
objetivos nacionais norte-americanos e • Em paralelo a essas questões, existem
contribui para a dissuasão. ainda a crise financeira mundial e os cres-
Para Green, a “A cooperative strategy centes requisitos orçamentários do Exército
for 21st century Seapower”, divulgada em americano no teatro do Comando Central.
outubro de 2007 (ver “Uma estratégia coo-
perativa para o Poder Naval no século XXI” Na visão de Michael J. Green, em resu-
– RMB V. 128, no 01/03 – jan./mar. 2008, pág. mo, a nova estratégia para os serviços na-
28-42), contempla todas as dimensões en- vais norte-americanos – Marinha, Fuzilei-
volvidas na segurança da Ásia, desde a ros Navais e Guarda Costeira – provê o
administração dos espaços comuns e a ferramental necessário de que o novo presi-
construção de alianças até a dissuasão do dente poderá necessitar para se desincumbir
uso da força por possíveis adversários. dos complexos desafios na Ásia, desde as
mega-ameaças até à tradicional competição dear mais a parte relativa à dissuasão, à con-
por poder. Poderá ser necessário, em fun- tenção e às vitórias da missão da Marinha
ção de restrições materiais e dependendo no Pacífico, de modo a não permitir a desva-
de para onde vá o debate estratégico, alar- lorização da sua capacidade.
“As guerras são travadas entre huma- do pelos comandantes navais – elemen-
nos. O elemento humano é o mais impor- tos-chave nos processos de planejamento
tante na guerra em geral, e, na guerra na- e de tomadas de decisões –, que são, em
val, isso não foi exceção no passado e nem última instância, os responsáveis pelas
será no futuro. O requisito básico para o decisões relativas ao emprego das forças
sucesso em combate é a compreensão, pelo navais, o que não pode ser delegado a
comandante, das capacidades e limitações máquinas; o processo de tomada de deci-
da natureza humana. Na guerra naval, o são em diferentes ambientes; a possibili-
material é o meio e não o fim. A natureza dade de formação de um único e abrangente
humana mudou muito pouco, apesar das quadro tático propiciada pelas novas
vastas modificações na tecnologia naval. tecnologias de informação; e as possibili-
Entretanto, dentro das limitações que se- dades dos sistemas automáticos de apoio
rão discutidas, o apoio de máquinas pode à decisão.
melhorar o processo de tomada de deci- Em sua conclusão, Vego, por conside-
são.” Esta é a assertiva que introduz o arti- rar a guerra naval uma atividade por de-
go de Milan Vego, no qual procura demons- mais complexa e imprevisível, reafirma que
trar que o homem será sempre relevante as novas tecnologias não substituirão o
nos processos dos conflitos armados. homem, mas aumentam a capacidade de os
Ao longo de seu interessante texto, o comandantes navais, em todos os níveis,
autor analisa detidamente o fator humano se desincumbirem de suas responsabilida-
versus a tecnologia; o papel desempenha- des com maior eficácia.
O CELULAR CORPORATIVO
(OU COMO UM ACESSÓRIO PODE SE CONVERTER
EM PESADELO)
(Revista General de Marina, Espanha, abril 2009, págs. 463-468)
Capitão de Mar e Guerra (Espanha) José Ramón Alemany Márquez
Neste artigo crítico e divertido, o autor ços tecnológicos e de como certas urgên-
trata da dificuldade vivida pelos integran- cias da vida moderna são mal digeridas por
tes de sua geração em relação a certos avan- eles. Na introdução, desculpa-se junto aos
* Professor de Operações no Naval War College desde 1991. Autor, dentre outros, dos livros Soviet Naval
Tactics (1992) e Naval Strategy and Operations in Narrow Seas (1999; 2003). É também autor do
livro-texto Operational Warfare (2001).
jovens que tenham a “má sorte” de ler suas lo fora desse lugar ou horário, para assun-
linhas, pois não se sentirão identificados to que requeira pronta reação ou que trate
com o problema ou, talvez, sequer reco- de tema urgente, que não permita atraso.
nheçam a sua existência. Mas, admite, uma coisa é a teoria e outra a
“Mesmo que se diga que nos acostu- realidade e, na Armada, elas quase sempre
mamos e que a tudo nos adaptamos, isso são divergentes. Por isso, e para ajudar na
não é totalmente certo, sobretudo quando compreensão do tema, ele se põe a narrar
atravessamos o umbral dos 50 e se começa casos reais vividos por ele, faz algumas
a regressão à infância”, afirma. E prosse- considerações e chega a conclusões so-
gue: “A partir daí, nossos parâmetros de bre as quais, já adianta, alguns não estarão
comparação também retroagem e julgamos de acordo. Por julgá-los interessantes e di-
as coisas de acordo e em contraste com o vertidos, a RMB passa a apresentar adap-
que se conheceu na infância, que, para isso, tações desses relatos:
salvo casos isolados, é a época mais feliz
de nossa existência”. Cena primeira
1
N. R.: Equivale a quatro arrobas.
2
N. A.: Esta cena se repetiu em duas ocasiões distintas, ambas em domingos.
* Colaborador regular da Naval Forces. Autor do Naval Institute Guide to World Naval Weapons, Fifth
Edition (Guia de Sistemas de Armas Navais do Instituto Naval, Quinta Edição). Dentre muitos de
seus outros livros encontram-se The U.S. Maritime Strategy - 1988 (A Estratégia Marítima dos
EUA) e Seapower as Strategy: Navies and National Interests – 2001 (Poder Naval como Estraté-
gia: Marinhas e Interesses Nacionais).
OS COMANDANTES RESPONDEM
(Proceedings, EUA, março/2009, pág. 14-33)
* Consultor de Defesa em Washington, D.C.. Autor do Guide to Combat Fleets of the World, 15ª Edição,
do Naval Institute.
* Oficial da ativa da Marinha dos Estados Unidos da América (EUA). É oficial de Inteligência de carreira
e serve atualmente no Grupo de Ataque de Navio-Aeródromo – 8.
para a defesa naval ou para planejamentos ele, melhorar a integração é isso e muito mais.
contra Marinhas adversárias. Ele reconhe- A genuína integração deve ser uma via de
ce, porém, a existência de falhas nas mão dupla na qual combatentes e especia-
interfaces entre a ONI e a esquadra, o que listas em inteligência municiam uns aos ou-
propicia algum isolamento entre os orga- tros, produzindo sinergia e resultados.
nismos. Noticia também que, em reconhe- Para o autor, “a característica essencial
cimento a esse problema, a ONI inaugu- da integração ops-intel é a simbiose, em que
rou, em fevereiro de 2009, o Centro Nimitz nenhum planejamento ou ação operativa é
de Inteligência Operacional, com o propó- iniciada ou encerrada sem que os principais
sito de servir como ponto de conexão com atores estejam no núcleo confiável”. Essa
a esquadra e nó de ligação principal para o observação é importante, pois, segundo ele,
apoio aos centros de operações marítimas. ainda persiste a tendência em alguns
planejadores militares ou políticos de alto
Mito 7: O sucesso da integração escalão de realizarem consultas unilaterais
operações/inteligência envolve, seletivas junto a especialistas em inteligên-
principalmente, a inteligência entrar cia, ou a de fazê-lo tardiamente, depois que
em sintonia com os combatentes os eventos já adquiriram inércia significati-
va. E afirma: “Alcançar a verdadeira integra-
“As falhas na integração operações/in- ção não é fácil, e ambos, oficiais operativos
teligência (ops-intel) são normalmente in- e de inteligência, devem fazer sua parte para
terpretadas como desafios da inteligência. aperfeiçoá-la”.
Para muitos oficiais da Marinha americana, Em conclusão ao artigo, Mike Studeman
aperfeiçoar a integração envolve melhorar a alerta que os sete mitos levantados incluem
reação da inteligência aos legítimos apelos alguma verdade, mas que cada um é merece-
dos combatentes...”, afirma Studeman. Para dor de maior reflexão, pois são enganosos.
“Se algo pode sair mal, sairá mal” – pri- milhas de largura no Hemisfério Norte, se-
meira Lei de Murphy. Invocando essa lei, o gundo maior oceano do planeta, menor
Almirante Treviño Ruiz considera que ela apenas do que o Pacífico.
se aplica ao abalroamento ocorrido entre Nele, um SSBN britânico que desloca
um submarino nuclear (SSBN) britânico e 15.980 ton. em imersão, o HMS Vanguard
um francês na imensidão do Oceano Atlân- (S 28), armado com 16 mísseis balísticos
tico. Segundo ele, a chance dessa ocorrên- intercontinentais Trident 2 (D5) e com 48
cia é de uma em 106 milhões. Entretanto, ogivas nucleares, navega possivelmente na
acrescenta, pela Lei de Murphy, basta uma cota de 100 metros, a velocidade entre 3 e 5
única probabilidade... nós, patrulhando zona ao sul da Islândia,
próxima a sua base escocesa.
O teatro de operações No mesmo teatro, um SSBN francês de
14.335 ton. em imersão, o Le Triomphant
O teatro de operações é o Oceano Atlân- (S618), portando 16 mísseis balísticos M45,
tico, com seus 106 milhões de km2 e 3.000 cada um com seis ogivas nucleares de 100
dantes dos navios, alcançando, provavel- tros submarinos nucleares balísticos deve-
mente, oficiais em postos ainda mais altos rão se fazer ao mar, apertando ainda mais o
nas respectivas cadeias hierárquicas de co- programa de manutenção e adestramento
mando. Em acréscimo, para que se mante- dessa classe de navios, que já tem calendá-
nha a dissuasão nuclear permanente, ou- rio de pouca capacidade de flexibilização.
O TERRORISMO MARÍTIMO NA
ESTRATÉGIA DA AL QAEDA
(Revista General de Marina, Espanha, jan/fev 2009, p. 47-53)
Juan Alfonso Merlos García
sua vinculação operativa e ideológica por sua escolta é inviável e que os sistemas de
meio da “Al Qaeda no Magreb Islâmico”; radar de que são dotados se prestam à na-
2) Ormuz, que conecta o Golfo Pérsico com vegação e são virtualmente insensíveis aos
o Mar da Arábia, por onde passam 15 mi- ecos de pequenas embarcações que se
lhões de barris de petróleo por dia e que já aproximam.
foi alvo de tentativas frustradas de ata- Finalizando, alerta àqueles que acompa-
ques; 3) Bab el-Mandeb, que serve de en- nham o movimento mundial da Jihad islâmica
trada para o Mar Vermelho e por onde tran- e sua capacidade de criar um clima de inse-
sitam 3,5 milhoes de barris de petróleo dia- gurança em entroncamentos marítimos es-
riamente; e 4) Málaca, que separa a tratégicos, provocando um golpe duro no
Indonésia da Malásia, por onde passam 50 comércio internacional, que é um erro
mil navios por ano. flexibilizar ou abrandar a resposta à ameaça
O autor conclui afirmando que os terro- que eles representam. Dessa forma, asseve-
ristas são conscientes de que todas as ra Merlos García, se estaria aumentando ir-
embarcações que seguem rotas previsíveis responsavelmente a margem de manobra
são vulneráveis e, também, que 2/3 do pe- daqueles que empregam a destruição em
tróleo mundial são transportados por via massa, tanto material como humana, para
marítima. Sabem que, por razões diversas, consecução de seus propósitos.
sob o título XXIV, Lei de Partida II, são Ao longo do século XVIII, em anos e
postuladas considerações de natureza hi- épocas distintas, as aplicações do vinho
giênicas navais e se recomenda levar a bor- prosseguem da mesma forma. No século
do dos navios determinados alimentos, XIX, em 1852, aparecem recomendações
dentre eles o vinho e a sidra. sobre o acondicionamento do vinho a
Prossegue o autor em sua análise identifi- bordo dos navios, estabelecendo-se o
cando que, ao longo da história, o mau acon- uso obrigatório de cintas de metal e o
dicionamento do vinho causou doenças e embarque obrigatório, em todos os navi-
mortes e foi motivo de denúncias de falta de os que navegassem com destino à Amé-
limpeza nos navios da Armada, gerando as rica, de um “cuartillo de vino, por plaza
instruções dadas pelo General Dom Pedro de de dotación”. Além disso, foi disposto
Arana (1587) recomendando especial cuida- que a marujada, depois de exercícios de
do na limpeza de seus recipientes e na dimi- tiro com canhões, de velas, de postos de
nuição das rações. O vinho passou a ser con- combate ou outros em que ocorresse
trolado detalhadamente, e a abertura dos bar- abundante transpiração, dever-se-ia for-
ris era revestida de formalidade, na qual a necer-lhes quantidade suficiente da be-
autoridade designada bida vulgarmente co-
para fazê-lo era acompa- nhecida como sangria,
nhada do mestre – es- composta de água, vi-
crivão e intendente de nho tinto, limão ou
bordo –, certificando-se groselha e açúcar mis-
da quantidade e da qua- turados em quantida-
lidade da bebida. des proporcionais de
Nos hospitais, o vi- modo a darem um “gra-
nho também se apresen- to sabor ácido”
ta nas dietas dos doen- (1852). Chegou-se, in-
tes com finalidade medi- clusive, afirma o autor,
cinal, aparecendo nos a proibir-se a prática
estojos de primeiros so- de castigos por meio
corros, entre outros me- da privação do vinho
dicamentos. Nos anos (1870).
1740, esses estojos con- Ao final do século
tinham, além de poma- XIX, o vinho e a cer-
das, unguentos, pós e veja passam a constar
aguardente, “vinho ca- das dietas nos hospi-
tólico” (“batizado” com água). Em 1750, o tais navais e nos de guerra, podendo ser
médico da Armada Pere Virgili propõe o esta- administrados facultativamente. Com a
belecimento de caixas de remédios nos navi- chegada do século XX, a rapidez dos mei-
os reais baseado nas experiências das via- os de transportes fez perder o caráter ur-
gens ao Novo Mundo, nas quais os mari- gente e extraordinário dessas “dietas”, di-
nheiros eram atendidos de maneira precária. minuindo o valor do vinho e de outras
Virgili sugere, para compensar deficiências bebidas com essa finalidade. Mas nem por
dietéticas, a necessidade de se enviar vinho isso, finaliza o Coronel Martinez Cerro,
e aguardente para suprir as necessidades dos deixou-se de beber nos navios e hospi-
hospitais. tais espanhóis.
SUMÁRIO
(Matérias relacionadas conforme classificação para o Índice Remissivo)
ADMINISTRAÇÃO
ATIVAÇÃO
Ativação da Policlínica Naval de Manaus (273)
Ativação da adidância na Índia (274)
Ativação do Depósito de Material de Saúde da Marinha no RJ (275)
CERTIFICADO DE QUALIDADE
Delegacia da Capitania dos Portos em Macaé recebe ISO 9001:2000 (276)
COMEMORAÇÃO
25o aniversário do IEAPM (276)
Aniversário da Batalha Naval do Riachuelo – Data Magna da Marinha (278)
Aniversário da DPHDM (283)
Congresso comemora 50 anos do Tratado Antártico (284)
Dia da Vitória (285)
Dia Internacional dos Mantenedores da Paz (286)
INAUGURAÇÃO
Inauguração da nova sede da Capitania Fluvial da Amazônia Ocidental (288)
INCORPORAÇÃO
Incorporação do NDCC Almirante Saboia (290)
POSSE
Assunção de cargos por almirantes (293)
NOTICIÁRIO MARÍTIMO
PROMOÇÃO
Promoção de almirantes (294)
TRANSFERÊNCIA DE NAVIO
Recebimento do AviPa Barracuda (294)
APOIO
CONSTRUÇÃO NAVAL
Acordo Brasil-França (294)
Marinha construirá 3.300 lanchas para estudantes (295)
DOCAGEM
Base Naval do Rio de Janeiro doca submarino (296)
ESTALEIRO
Novos estaleiros para Rio Grande (296)
INDÚSTRIA AERONÁUTICA
Embraer entrega jato Phenom 100 à Força Aérea do Paquistão (297)
ATIVIDADES MARINHEIRAS
BUSCA E SALVAMENTO
Marinha resgata velejadores a 2.000 km da costa (298)
CARTOGRAFIA
Primeiras imagens da cartografia terrestre da Amazônia são processadas (299)
PREVISÃO METEOROLÓGICA
Programa Nacional de Boias (300)
PRECAUÇÃO DE SEGURANÇA
Prevenindo incêndios no mar (301)
CIÊNCIA E TECNOLOGIA
TESTE
Marinha testa mina na Bahia (302)
CONGRESSOS
CONFERÊNCIA
Conferência Naval Interamericana (303)
FEIRA
LAAD reúne setor de Defesa (303)
REUNIÃO
Conselho de Cultura se reúne na Ilha Fiscal e ganha novo integrante (306)
SIMPÓSIO
Encontro de tecnologia em acústica submarina (307)
Casnav recebe certificação NBR ISO 9001:2008 e promove simpósio (308)
EDUCAÇÃO
ESPORTE
Resultados esportivos (308)
FORÇAS ARMADAS
OPERAÇÃO
NDD Rio de Janeiro participa de Operação Haiti VII (309)
VEÍCULO AÉREO NÃO-TRIPULADO
Brasil terá seu veículo aéreo não-tripulado (309)
PESSOAL
EFETIVO
Efetivos de Oficiais da Marinha do Brasil (310)
PESSOAL
Marinha e Petrobras assinam termos de cooperação (312)
PODER MARÍTIMO
PORTO
Obra do porto de Santos deve ficar pronta em 2010 (313)
SEGURANÇA DA NAVEGAÇÃO
LRIT começa a operar no Brasil (313)
POLÍTICA
POLÍTICA DA RÚSSIA
Rússia divulga plano para militarização do Ártico (315)
PSICOSSOCIAL
AJUDA HUMANITÁRIA
Capitania dos Portos do Piauí presta apoio às vítimas de enchentes (315)
Delegacia de Santarém entrega donativos às vítimas de enchentes (316)
CULTURA
Casa do Homem do Mar (316)
LANÇAMENTO DE LIVRO
O Conselho de Estado e a política externa do Império (317)
REVISTA
Substituição da diretoria da Revista da Marinha – Portugal (318)
RELAÇÕES INTERNACIONAIS
ACORDO
Acordos com a França (318)
VIAGENS
VISITA
Comandante da Marinha em visita à China (319)
naval e prestar maior apoio logístico de saú- Estão ainda disponíveis os serviços de
de às Organizações Militares. Nessa oca- Pronto Atendimento 24 horas, Distribuição
sião, tiveram início as ampliações, com au- de Medicamentos (SeDiMe), Serviço de
mento do número de consultórios médicos, Arquivamento Médico (Same), uma enfer-
nova emergência e dependências da JRS. maria com dois leitos e uma ambulância
Em 2007 foi iniciada a construção da UTI, bem como serviços médico-periciais
nova Odontoclínica, ocupando o andar realizados por uma Junta Regular de Saúde
superior do Ambulatório, cuja inauguração e uma Junta Superior de Saúde.
ocorreu em 29 de agosto de 2008 e inte- Com instalações ampliadas e moderni-
grou todo o atendimento nas suas depen- zadas, o Ambulatório Naval de Manaus,
dências, haja vista que as antigas instala- que também disponibiliza os profissionais
ções funcionavam em prédios separados. da área de saúde para os navios do Co-
Para ampliar os serviços de assistência mando da Flotilha do Amazonas, nas via-
nos anos de 2007, 2008 e no começo de gens de assistência hospitalar, transforma-
2009, foram realizadas várias modificações se hoje em uma nova Organização Militar
nas edificações, bem como o embarque de da Marinha do Brasil, integrando o Siste-
mais profissionais e a aquisição de novos ma de Saúde da Marinha e subordinada
equipamentos. diretamente ao Comando do 9o Distrito
No que tange às instalações físicas, Naval, contribuindo para a ampliação do
houve a reorganização e, mais uma vez, a Poder Naval na Amazônia.
ampliação dos consultórios médicos, as- Nesta data, ao ativarmos a Policlínica
sim como a criação dos consultórios de Naval de Manaus, cuja cerimônia ocorre
oftalmologia e ginecologia e a alteração dos apenas nove dias após a assinatura de seu
espaços físicos dos serviços de fisiotera- documento de criação, temos a certeza de
pia e laboratório. As possibilidades de exa- que ela nasce com maturidade, resultado
mes e diagnósticos passaram a ser maio- do trabalho que se realiza há várias déca-
res, tais como: testes ergométricos e holter, das nesta margem esquerda do Rio Negro.
cardiotocógrafo, cabine audiométrica e Ao diretor e à primeira tripulação dessa
uma sala de fonoterapia. nova Organização Militar, desejo pleno êxi-
A assistência médica hoje dispõe ainda to nessa nobre missão. Que os 30 anos da
de cirurgia geral, ortopedia, otorrinolarin- cruz verde, símbolo da saúde naval, sejam
gologia, pediatria, psiquiatria e radiologis- pilares resistentes e seguros, dando o ali-
ta, além do apoio de farmácia, fonoaudio- cerce necessário para que continuem a agir
logia, nutrição e fisioterapia. A Divisão de com abnegação sempre presente na tarefa
Odontologia possui dez consultórios, inerente aos profissionais de saúde: salvar
escovódromo, laboratório de próteses e vidas.”
sala de esterilização. (Fontes: Bonos nos 192 e 193, de 25/3/2009)
ente marinho, o IEAPM é fundamental para cas e de correntes de superfície nas esta-
a tão almejada ‘conquista’ da nossa ‘Ama- ções situadas em Arraial do Cabo e Lagu-
zônia Azul’, no sentido de conhecer pro- na (SC), com o emprego do radar náutico;
fundamente, difundir, vigiar, defender e pre- – capacitação humana e desenvolvimen-
servar, explorando-a em sua plenitude, es- to de protótipo de multiperfilador oceano-
tratégica e economicamente, de maneira gráfico descartável, o XBT nacional;
racional e sustentada. Mais do que nunca, – Atlas Digital de oceanografia e
como tão bem profetizou o Almirante Pau- meteorologia para construção naval, que
lo Moreira, temos que ‘nos apropriar des- visa fornecer parâmetros ambientais para
se mar com uma posse real, profunda, apai- auxílio no desenvolvimento de projetos
xonada e definitiva’. para a construção de meios de superfície e
O exercício continuado da pesquisa oce- submarinos;
anográfica básica e aplicada por um Insti- – Projeto Remo – rede temática de mo-
tuto da Marinha com a credibilidade do delagem e observação oceanográfica, lide-
IEAPM é condição necessária para a pro- rado pela Petrobras, que visa implementar
dução de conhecimentos fundamentais ao modelos numéricos de circulação oceâni-
planejamento das Operações Navais e à ca para previsão de condições meteo-oce-
utilização adequada dos modernos siste- anográficas;
mas de armas, constituindo apoio impres- – Projeto Ramb – ruído ambiental sub-
cindível ao emprego do Poder Naval. marino, que visa criar um banco de dados
A decisão do Estado brasileiro de cons- de ruído ambiental contínuo na área de Ar-
truir e operar submarinos de propulsão raial do Cabo;
nuclear torna indispensáveis os conheci- – Projeto Docaar – dados oceanográfi-
mentos produzidos no nosso Instituto. cos coletados com aeronave de asa
Nesse contexto, o IEAPM executa hoje di- rotativa, o XBT lançado por aeronave;
versas atividades, muitas delas de interes- – Projeto Bionatura – desenvolvimento
se dual, em parceria com organizações mili- de tintas anti-incrustantes sem componen-
tares da Marinha do Brasil, órgãos gover- tes agressivos ao meio ambiente;
namentais, empresas públicas e privadas, – estudos de bioincrustação;
universidades e institutos de pesquisas, – gerenciamento de água de lastro;
dentre os quais: – estudos de propagação de energia
– Projeto Sispres – previsão do ambien- acústica, com emprego dual na construção
te acústico para o planejamento das opera- de bancos de dados de ruído ambiental
ções navais; submarino, de dados geológicos e
– Projeto OAEx – exploração acústica geofísicos, e na realização de experimen-
dos oceanos, que visa preencher lacunas tos acústicos;
científicas e tecnológicas de modo a defi- – monitoramento de radionuclídeos na
nir metodologias, tecnologias e procedi- costa brasileira, que visa coletar dados
mentos para implementação do monitora- confiáveis sobre as atuais concentrações de
mento ambiental acústico submarino, com radionuclídeos artificiais na água (Césio 137
a participação de universidades de Portu- e Estrôncio 90), antes do início das ativida-
gal, Bélgica, Canadá e da UFRJ; des com o submarino de propulsão nuclear;
– medição de ondas e correntes de su- – influência do meio ambiente nas mi-
perfície com radar náutico, que visa obter a nas de fundo e de fundeio;
medição de parâmetros de ondas oceâni- – geoacústica submarina;
MENSAGEM DO PRESIDENTE DA
REPÚBLICA
de. E deixará uma sólida herança para as Paraguai, vias navegáveis fundamentais
gerações vindouras. para a logística do adversário e cujo domí-
Sejam muito felizes!” nio ditaria os rumos da contenda. Ciente
da situação, o comandante em chefe da
ORDEM DO DIA DO COMANDANTE Esquadra, Almirante Joaquim Marques Lis-
DA MARINHA boa, então Visconde de Tamandaré, desta-
cou duas divisões para participarem da re-
A seguir, transcrevemos a Ordem do tomada de Corrientes. Sob o comando do
Dia do comandante da Marinha lida nas Almirante Francisco Manoel Barroso da
cerimônias: Silva, as belonaves fundearam um pouco
“Há exatos 144 anos, uma sequência de abaixo da reconquistada cidade argentina,
atos hostis conduziu o Brasil e os seus vizi- próximo à foz do Riachuelo.
nhos do sul ao emprego das armas para a Ao raiar do dia 11 de junho de 1865, a
solução das divergências geopolíticas da- tranquilidade reinante não indicava aos
quela realidade histórica, envolvendo-os em nossos tripulantes que estava prestes a ter
um conflito que se estenderia por mais de início um dos mais marcantes feitos da nos-
cinco anos: a Guerra da Tríplice Aliança. sa história. O silêncio foi quebrado com o
A eclosão do litígio, em novembro de alarme de ‘inimigo à vista’, ao serem
1864, deu-se de modo inesperado, após a visualizadas, pelos vigias, as primeiras uni-
invasão das províncias de Mato Grosso e dades oponentes.
Rio Grande do Sul, encontrando-nos Conscientes da importância daquela
despreparados para responder à agressão, posição para a manutenção de seu esforço
pois, naquele momento, além da falta de de campanha, os antagonistas lançaram-
mobilização de nosso Poder Militar, o que se em direção à nossa frota, visando rom-
garantiu ao rival alguma vantagem inicial, per a obstrução imposta naquela via de
os navios disponíveis da Força Naval eram abastecimento. Assim, além de dispor de
apropriados para mar aberto, inadequados, oito naus com seis barcaças artilhadas a
portanto, para as características geográfi- reboque, o oponente manteve tropas e ca-
cas do teatro de operações, predominante- nhões ocultos ao longo da margem esquer-
mente fluvial. da do Paraná, no intuito de golpear nossos
À nossa instituição foi dada a missão barcos de forma ainda mais contundente.
de realizar o bloqueio dos Rios Paraná e Após o suspender imediato, Barroso
determinou a disseminação de seu primeiro
sinal: ‘Bater o inimigo o mais próximo que
cada um puder’. Principiava a batalha cujo
desencadeamento iria registrar memoráveis
proezas que enobrecem o nosso passado.
Em seguida, determinou o hasteamento de
sua mais decisiva ordem: ‘O Brasil espera
que cada um cumpra o seu dever’.
Ao encontrar um opositor motivado e
com efetivo numericamente superior, foi
iniciado um combate cruel, causando pe-
Vice-Presidente José Alencar cumprimenta o sadas baixas a ambos os lados. Por volta
Pavilhão Nacional das 12 horas, o quadro tático se apresenta-
ANIVERSÁRIO DA DPHDM
A Diretoria do Patrimônio Histórico e deve ser perseguida e acredito que foi
Documentação da Marinha (DPHDM) com- alcançada durante o 65o ano de existência
pletou, em 8 de junho último, seu 66o aniver- da DPHDM.
sário. O diretor da DPHDM, Vice-Almirante Graças à cooperação e competência de
Armando de Senna Bittencourt, expediu a seus excelentes servidores civis e milita-
seguinte Ordem do Dia alusiva à data: res, a DPHDM vem apresentando resulta-
“Em 8 de junho de 1943, a Marinha re- dos notáveis. Durante o ano anterior, des-
solveu fundir a Biblioteca da Marinha, o tacaram-se:
Arquivo da Marinha, o Departamento de – a restauração da galeota de D. João
História Marítima e Naval e a Revista Marí- VI, concluída em novembro;
tima Brasileira e criar o Serviço de Docu- – a realização do Congresso Mundial
mentação da Marinha, que desde julho de de Museus Militares do Comitê Internaci-
2008 se denomina Diretoria do Patrimônio onal dos Museus e das Coleção de Armas
Histórico e Documentação da Marinha e de História Militar (Icomam Rio 2008), no
(DPHDM). Rio de Janeiro, em agosto;
Cabe à DPHDM preservar e divulgar o – a exposição conjunta com o Museu
patrimônio histórico e a memória da Mari- da Marinha de Portugal “O Império que Veio
nha, contribuindo para o desenvolvimen- do Mar”, de agosto de 2008 a março de
to da consciência marítima brasileira. Isso 2009, nas salas de exposições temporárias
precisa ser realizado com qualidade com- do Museu Naval, participando das come-
patível, em criatividade e originalidade, com morações do bicentenário da chegada da
o melhor padrão internacional. Esta meta Família Real Portuguesa, em 1808;
DIA DA VITÓRIA
Foi comemorado, em 8 de maio último, o 8 de maio de 2009. Dia da Vitória. Dia de
Dia da Vitória, que marcou o fim da Segun- reverenciar aqueles bravos que tombaram
da Guerra Mundial. Para lembrar a data, o em solo europeu, os pracinhas que já parti-
ministro de Estado da Defesa, Nelson Aze- ram para uma nova vida e esses heróis da
vedo Jobim, emitiu a seguinte Ordem do FEB que ainda nos brindam com a sua pre-
Dia: sença, seus exemplos e suas demonstra-
“8 de maio de 1945. Terminara a Segun- ções inequívocas de patriotismo.
da Guerra Mundial. Nova era começara Precisamos lembrar que a Marinha do
para uma parte significativa da humanida- Brasil, além de patrulhar nossa extensa cos-
de. Mais de 30 milhões de pessoas sofre- ta, singrou o Atlântico com seus navios,
ram as privações e os horrores da guerra. participando da escolta de mais de 250 com-
Hoje celebramos a vitória da paz, da de- boios, entre o Rio de Janeiro e Trinidad. É
mocracia, da liberdade, do progresso, do dia de lembrar que a Força Aérea Brasileira
amor ao próximo, do bom senso e da escreveu páginas heroicas nos céus da Itá-
justiça. A sociedade brasileira foi parceira lia, onde sempre esteve ‘sentando a pua’.
dessas vitórias. Os combatentes da Força O Ministério da Defesa, consciente de
Expedicionária Brasileira – FEB – lutaram suas responsabilidades para com a história
com bravura para escrever as heroicas pá- do Brasil, aliou-se às instituições nacionais
ginas de Monte Castelo, Montese, que lutam pela preservação histórica dos
Fornovo, Castelnuovo, Camaiore e outras feitos de nossos marinheiros, soldados e
mais. aviadores na Segunda Guerra Mundial. Com
Os pracinhas brasileiros superaram a o Decreto no 5.023, de março de 2004, criou a
defasagem tecnológica, o clima adverso e o Medalha da Vitória. Ela representa o reco-
terreno desconhecido e desfavorável com nhecimento à atuação do Brasil em defesa
muita coragem, inteligência e a principal for- da liberdade e da paz mundial.
ça do combatente naquela situação – o va- Anualmente, no Monumento Nacional aos
lor moral –, que posso resumir na vontade Mortos da Segunda Guerra Mundial, no Rio
firme, na consciência de que ali representa- de Janeiro, reverenciamos nossos heróis e
vam sua Pátria e que lutavam pela liberdade. agraciamos militares e civis brasileiros e es-
trangeiros que tenham contribuído para a di- ram o que é voar nas asas de um ideal buscan-
fusão dos feitos da FEB e dos demais comba- do sempre a glória do nosso Brasil.”
tentes brasileiros. São pessoas que entende- (Fonte: Bono Especial no 317, de 7/5/2009)
São estes fatores fundamentais para que O Brasil tem um histórico de sucesso
se mantenha um bom nível de aprestamento, neste tipo de operação. A experiência da
além de permitir um intercâmbio de vivências, Marinha do Brasil em missões começou em
conhecimentos, experiências e o salutar cul- 1965, sob o controle da Organização dos
tivo da camaradagem. Estados Americanos (OEA), quando uma
Encerro minhas palavras e me dirijo di- parcela do setor operativo foi convocada
retamente aos mantenedores da paz de on- para contribuir com a solução de um pro-
tem e de hoje para agradecer pelo sacrifí- blema militar em Santo Domingo, Repúbli-
cio, pela ausência do lar, pelo orgulho com ca Dominicana. Na época, atuou em con-
que representaram e representam o Brasil. junto com tropas do Exército Brasileiro e
Escreveram, escrevem e escreverão pá- do Corpo de Fuzileiros Navais norte-ame-
ginas históricas, algumas heroicas, sem- ricanos, formando a Força Interamericana
pre deixando o verde-amarelo de nossa da Paz, a Faibras. No decorrer dos anos,
Bandeira nas mentes daqueles que tiveram vem participando ativamente, enviando mi-
a honra e o prazer de conviver com o sol- litares para atuarem como observadores in-
dado brasileiro. tegrando os Estados-Maiores das Missões
Parabéns a todos!” de Paz, a serviço do componente militar do
Department of Peacekeeping Operations
ORDEM DO DIA DO COMANDANTE (DPKO).
DE OPERAÇÕES NAVAIS Buscando inspiração em um glorioso
passado, atualmente o País lidera o con-
“A data de 29 de maio foi instituída como tingente da ONU no Haiti. Nossos milita-
sendo o Dia Internacional dos Mantenedores res, superando dificuldades e preocupa-
da Paz das Nações Unidas, simbolizando a ções decorrentes do afastamento dos
retribuição aos militares, homens e mulheres seus lares, enfrentam um ambiente
pela nobre missão de levar esperança a ou- operacional desconhecido, conscientes
tros povos e o culto à memória daqueles que de estarem zelando pelo bem comum. Fa-
perderam suas vidas quando contribuíram zer com que se colabore no processo di-
na intermediação necessária para que se al- plomático e no restabelecimento da or-
cançasse a paz nas mais diversas regiões em dem social, numa demonstração de espí-
conflito. rito de sacrifício, profissionalismo e em-
A Organização das Nações Unidas (ONU) penho daqueles que, com conduta exem-
é uma instituição internacional, fundada após plar, servem aos interesses da Pátria,
a Segunda Guerra Mundial para preservar a onde quer que se faça necessário, tem
segurança dos países, fomentar relações cor- sido a silenciosa missão dos nossos ‘ca-
diais entre as nações, promover progresso pacetes azuis’.
social, criar melhores condições de vida e No momento em que se comemora tão
assegurar os direitos humanos. O emprego relevante data, apresento os meus cumpri-
de tropas aumentou, consequentemente, sua mentos a todos os marinheiros e fuzileiros
participação em número, alcance e complexi- pelo trabalho realizado, que a cada dia rea-
dade. Este século, rico em diferenças políti- firma a credibilidade do nosso Brasil no
co-sociais, tem exigido vigilância permanen- concerto das nações.
te para que não sejam iniciadas guerras e haja Bravo Zulu!”
também a manutenção da paz em regiões con- (Fontes: Bono Especial no 369, de 28/5/
turbadas. 2009 e no 367, de 29/5/2009)
Em cerimônia presidida pelo Subchefe mando do navio foi assumido pelo Capitão
de Organização e Assuntos Marítimos do de Mar e Guerra Oscar Moreira da Silva
Comando de Operações Navais, foi incor- Filho.
porado à Marinha do Brasil, em 21de maio O NDCC Almirante Saboia será empre-
último, na cidade de Falmouth, Reino Uni- gado no transporte de tropa e carga em
do, o Navio de Desembarque de Carros de operações anfíbias, ribeirinhas e de apoio
Combate (NDCC) Almirante Saboia. O co- logístico móvel. Por ocasião dessas opera-
PROMOÇÃO DE ALMIRANTES
Foram promovidos por decreto presi- Guerra Nélio de Almeida e Paulo Martino
dencial, contando antiguidade a partir de Zuccaro.
31 de março de 2009, os seguintes oficiais. – No Corpo de Intendentes da Marinha:
– No Corpo da Armada: ao posto de ao posto de Vice-Almirante, o Contra-Al-
Contra-Almirante, o Capitão de Mar e Guer- mirante Indalecio Castilho Villa Alvarez; ao
ra José Luiz Ribeiro Filho. posto de Contra-Almirante, o Capitão de
– No Corpo de Fuzileiros Navais: ao Mar e Guerra Helio Mourinho Garcia Junior.
posto de Vice-Almirante, o Contra-Almiran- – No Corpo de Saúde da Marinha: ao
te Carlos Alfredo Vicente Leitão; ao posto posto de Contra-Almirante, o Capitão de
de Contra-Almirante, os Capitães de Mar e Mar e Guerra Sérgio Pereira.
ACORDO BRASIL-FRANÇA
estado do mar não permitia que os navios nhecida por pickup, em que o casal foi res-
navegassem em direção ao local onde o gatado do veleiro para o helicóptero por meio
veleiro se encontrava. de um guincho. O Navio Mercante Artic
Devido à grande distância do local onde Trader permaneceu ao lado do veleiro até a
estava o veleiro (aproximadamente 2.000 km remoção do último tripulante. O Veleiro
da costa do Rio de Janeiro), a Marinha do Dalkiri foi abandonado em processo de afun-
Brasil acionou o navio de serviço da Es- damento.
quadra, a Fragata Bosísio, que suspendeu Devido à distância do local do resgate e
às 2 horas da manhã do dia 2, com um heli- às buscas realizadas, a Marinha do Brasil
cóptero. A Força Aérea também foi aciona- precisou acionar o Navio-Tanque Gastão
da para auxiliar nas buscas ao veleiro. Até Motta, que partiu do Rio de Janeiro para
o dia 3 não havia sido realizado outro con- encontrar a fragata no seu regresso, para
tato com o veleiro. Nesse dia, a Força Aé- reabastecimento de combustível. A Fraga-
rea Brasileira (FAB) enviou um Hércules ta Bosísio chegou ao Rio de Janeiro na noite
(C-130) para auxiliar nas buscas, em coor- do dia 8 para 9 de maio.
denação com um navio mercante. (Fonte: Seção de Comunicação Social
No dia 4, a Marinha do Brasil solicitou o do Comando do 1 o Distrito Naval e
apoio dos navios mercantes Green Harvest www.defesa.gov)
e Artic Trader, que foram ao en-
contro do Dalkiri. No final da
tarde, os navios mercantes con-
seguiram estabelecer comunica-
ções com o veleiro, que ainda
estava com problemas de alaga-
mento e sem possibilidades de
navegar. Na madrugada do dia
5, os navios encontraram-se com
o veleiro, reportando que o mar
estava bem melhor e que os tri-
pulantes passavam bem.
Nesse mesmo dia, a Fragata
Bosísio chegou na área e, ao final
da manhã, realizou o salvamento
dos tripulantes, utilizando o seu
helicóptero, em uma manobra co-
Fragata Bosísio
Para se salvar vidas e prejuízos ao ma- tante frisar que a prevenção desses inci-
terial e às cargas, é vital se reduzirem os dentes, além de salvar vidas, contribui para
riscos de fogo e de explosões no mar. se reduzir os custos impostos por incêndi-
Consequentemente, o Lloyd’s Register e o os, que já chegam a mais de 20 milhões de
UK P&I Club* produziram em conjunto o dólares por ano, considerados os últimos
Marine Fire Safety Pocket Checklist (lista 20 anos.
de verificação de bolso sobre segurança A maioria dos incêndios em grandes car-
contra fogo marítimo), a fim de contribuir gueiros começa nos porões. Outros acon-
para a redução de incidentes no mar e de tecem em praças de máquinas, tanques,
riscos para os portos. O manual foi lança- áreas habitáveis e compartimentos de bom-
do em Londres, em 26 de maio passado. bas. Alguns incêndios dos mais comuns
Para a composição do manual, as insti- são iniciados por meio de combustão es-
tuições citadas analisaram deficiências de- pontânea de cargas como algodão, tabaco,
tectadas por inspetores em todo o mundo, madeira em raspa e carvão. Estivadores
ao longo de período de três anos. É impor- fumantes são causas proeminentes, além
* Clube de seguros existente há 140 anos na Inglaterra, atuando ininterruptamente. P&I significa
proteção e indenização.
Foi realizada na Escola de Guerra Naval, problemas marítimos que afetam o Conti-
no Rio de Janeiro, em 20 de abril último, a nente Americano.
transferência da Secretaria-Geral da Confe- A XXIV CNI será realizada na cidade do
rência Naval Interamericana (CNI) da Arma- Rio de Janeiro, em setembro de 2010, sen-
da do Equador para a Marinha do Brasil. do esta a quarta vez que o Brasil sediará
A CNI foi criada em 1959 para proporci- este evento, o que já ocorreu em 1964, 1976
onar um foro para intercâmbios de ideias, e 1996.
conhecimentos e entendimento mútuo dos (Fonte: Bono 263, de 20/4/2009)
Foi realizada no Riocentro, Rio de Ja- empresas dos setores aéreo e de defesa de
neiro, de 14 e 17 de abril, a sétima edição da mais de 30 países, entre eles Estados Uni-
Latin America Aero & Defence (Laad 2009), dos, Alemanha, Bósnia, Israel e Rússia.
a mais importante feira do setor de Defesa Promovida e organizada pela empresa
e Segurança da América Latina. O evento Clarion Events, a feira teve o apoio
foi aberto pelo ministro da Defesa, Nelson institucional e operacional do Ministério
Jobim, e contou com a presença do Presi- da Defesa e das três Forças Armadas do
dente da República, Luiz Inácio Lula da Sil- Brasil, além do apoio da Associação Brasi-
va. A feira expôs armas de guerra e de se- leira das Indústrias de Materiais de Defesa
gurança pública, além de produtos de 330 (Abimde) e da Associação das Indústrias
Aeroespaciais do Bra-
sil (Aiab).
A Laad 2009 atraiu
um público qualificado
estimado em 16 mil visi-
tantes, entre eles dele-
gações oficiais de 50
países, convidadas di-
retamente pelo Minis-
tério da Defesa, milita-
res do Brasil e de ou-
tras nações.
O evento foi palco
de encontro entre os
principais fabricantes
Ministro da Defesa e Comandantes de Força na abertura da Laad 2009 da indústria de defesa
Ministro da Defesa e representantes das instituições militares e civis participantes da Laad 2009
ENCONTRO DE TECNOLOGIA EM
ACÚSTICA SUBMARINA
Em cumprimento ao calendário de Processamento de Sinais Acústicos Sub-
Simpósios de Ciência & Tecnologia para marinos, os Sistemas Sonar e tecnologias
2009, o Instituto de Pesquisas da Marinha de materiais empregados na área de Acús-
(IPqM) realizará o VIII Encontro de tica Submarina.
Tecnologia em Acústica Submarina (VIII Informações sobre inscrição para parti-
Etas). O evento acontecerá no período de cipações e submissão de trabalhos, entre
25 a 27 de novembro, nas dependências do outras, poderão ser obtidas pelos telefo-
IPqM, na cidade do Rio de Janeiro (RJ). nes (21) 2126-5749/5785 ou Retelma 8115-
O Etas tem por objetivo propiciar o 5749/5785, ou selecionando o ícone do VIII
intercâmbio entre os integrantes da co- Etas na página do IPqM na internet http://
munidade científica e a Marinha do Bra- www.ipqm.mar.mil.br.
sil, na área de Acústica Submarina e seus Os interessados devem observar as se-
segmentos, dando ênfase aos assuntos guintes datas: 11 de setembro – entrega de
de especial interesse para a Força. Como resumo; 25 de setembro – notificação da
tais, destacam-se a Engenharia de Equi- aceitação do trabalho; 23 de outubro – en-
pamentos Acústicos Submarinos, a Oce- trega do trabalho completo e inscrição para
anografia Acústica, a Propagação Acús- palestrantes; e 20 de novembro – inscrição
tica Submarina, o Posicionamento Acús- para ouvintes.
tico, a Bioacústica, a Geoacústica, o (Fonte: Bono 398, de 9/6/2009)
RESULTADOS ESPORTIVOS
IV JOGOS BRASILEIROS DAS POLÍ- de Desportos da Aeronáutica. A Marinha,
CIAS E BOMBEIROS representada por 24 atletas, conquistou um
total de 20 medalhas.
As competições de Judô e Tae-Kwon-Do – Campeões de Judô Masculino: (-81kg)
dos Jogos foram realizadas no período de 8 a MN Vicente (Centro de Educação Física Almi-
11 de abril de 2009, no ginásio da Comissão rante Adalberto Nunes – Cefan); (-90kg) 1oSG
Para a última campanha de testes em voo lhões para 31 projetos considerados estra-
foram contratadas as empresas Flight tégicos. Dentre esses projetos, foram
Technologies (piloto automático), BCC- selecionadas seis propostas relacionadas
Bossan Computação Científica (software a veículos aéreos não tripulados.
embarcado) e Johansen Engenharia (enge- No Brasil existem mais de dez iniciativas
nharia de sistemas). Todos os voos tive- públicas e privadas na área de Vant. Entre
ram ainda o acompanhamento de um heli- elas está a da Flight Solutions, que desen-
cóptero CH-55 Esquilo, do Grupo Especial volve um Vant de curto alcance, com aplica-
de Ensaios em voo, do CTA. ção em operações de reconhecimento.
Caberá à Avibrás o desenvolvimento de A empresa, que iniciou suas atividades
um Vant operacional, de média altitude e 15 em uma incubadora de tecnologia
horas de autonomia de voo. A fase de aeroespacial, atualmente está instalada no
certificação do Vant, segundo o CTA, tem Parque Tecnológico de São José dos Cam-
uma previsão de absorver mais R$ 80 mi- pos (SP). A empresa AGX Tecnologia, em
lhões, mas os recursos ainda estão sendo parceria com a Universidade de São Carlos
negociados. e a Empresa Brasileira de Pesquisa
O desenvolvimento de veículos aéreos Agropecuária (Embrapa), está desenvolven-
não tripulados no Brasil conta com o apoio do um Vant para aplicações agrícolas, como,
da Finep, por meio do programa de sub- por exemplo, para observação de safras.
venção econômica, que liberou R$ 80 mi- (Fonte: http://www.defesabr.com)
A Marinha do Brasil, representada pelo quadra João Afonso Prado Maia de Faria;
Centro de Instrução Almirante Graça Ara- o diretor de Portos e Costas, Paulo José
nha (Ciaga) e pelo Centro de Instrução Al- Rodrigues de Carvalho; o presidente da
mirante Braz de Aguiar (Ciaba), assinou, Femar, Vice-Almirante Lucio Franco de Sá
em 16 de fevereiro último, em Brasília, dois Fernandes; o comandante do Ciaga, Con-
Termos de Cooperação com a Petrobras. tra-Almirante José Carlos Mathias; o dire-
Os documentos têm como propósito ele- tor-geral da ANP, Haroldo Borges
var o quantitativo das tripulações Rodrigues Lima; e o diretor de Abasteci-
disponibilizadas para a Marinha Mercante mento da Petrobras, Paulo Roberto Costa,
e manter o nível de qualidade na formação entre outras autoridades civis e militares.
dos homens e mulheres que embarcam nos Os Termos de Cooperação preveem o
navios mercantes brasileiros. repasse de cerca de R$ 78 milhões, a serem
Os Termos de Cooperação foram assi- aplicados nos Centros de Instrução para a
nados por intermédio do Centro de Pes- modernização dos seus recursos instru-
quisas da Petróleo Brasileiro S. A. (Cenpes/ cionais, aumento da capacidade de aloja-
Petrobras), com a interveniência da Fun- mento para alunos e ampliação do corpo
dação de Estudos do Mar (Femar) e com o docente da área do Ensino Profissional
aval da Agência Nacional do Petróleo, Gás Marítimo, cabendo à Femar controlar a apli-
Natural e Biocombustíveis (ANP), bem cação desses recursos.
como do Programa de Mobilização da In- Os recursos serão aplicados em 45 pro-
dústria Nacional do Petróleo e Gás Natural jetos ao todo. Estes deverão ser concluí-
(Prominp). dos nos próximos três anos e, além de pro-
Estiveram presentes à assinatura dos piciarem melhores condições de conforto
Termos de Cooperação o comandante da e habitabilidade aos futuros oficiais da Ma-
Marinha, Almirante de Esquadra Julio Soa- rinha Mercante, contribuirão significativa-
res de Moura Neto; o chefe do Estado- mente para a ampliação da capacidade de
Maior da Armada, Almirante de Esquadra formação dos Centros de Instrução, possi-
Aurélio Ribeiro da Silva Filho; o chefe do bilitando o atendimento tempestivo da de-
Estado-Maior da Defesa, Almirante de Es- manda de marítimos que vem ocorrendo no
os navios construídos após 1o de julho de do, isto é, estar de acordo com a Regra V/
2009, o prazo será até a Vistoria de Instala- 19-1 da Solas e com a Seção 4 do Padrão de
ção Rádio desses navios. Desempenho Revisado da Resolução
Os navios dotados de LRIT transmiti- MSC.263(84) e ter concluído satisfatoria-
rão, automaticamente, a identificação do mente o Teste de Conformidade previsto
navio (no IMO), nome, posição (latitude e no Apêndice 1 da CircularMSC.1/Circ.1296.
longitude) e a data/hora da posição. Após ter passado na vistoria e nos testes
Os equipamentos instalados a bordo do sistema LRIT, o N/M Frota Argentina
deverão atender ao Padrão de Desempe- foi o primeiro navio brasileiro a ser intro-
nho Revisado estabelecido pela Resolução duzido no CDNL.
MSC.263(84). Devem ser do tipo Aprova- (Fonte: Informativo Marítimo jan/mar 2009)
O CONSELHO DE ESTADO E A
POLÍTICA EXTERNA DO IMPÉRIO
SUBSTITUIÇÃO DA DIRETORIA DA
REVISTA DE MARINHA – PORTUGAL