024
Resumo
As causas da deterioração da permeabilidade da carga no alto-forno sob taxas altas de injeção de carvão pulverizado
ainda não são bem conhecidas. Sabe-se na prática operacional que variações na qualidade das cinzas dos carvões
injetados podem afetar a estabilidade do forno. Trabalho anterior analisou o comportamento de cinzas de carvões a altas
temperaturas em relação às suas composições químicas e mineralógicas. O objetivo deste trabalho foi avaliar o mesmo
comportamento em misturas de carvões. Amostras de quatro carvões e sete misturas foram queimadas entre 800-850°C
e suas cinzas analisadas por fluorescência e difração de raios X e por testes de fusibilidade e viscosidade. Cinzas com
teores mais altos de Si e Al apresentaram alta temperatura de fluidez e maior viscosidade a 1.500°C, devido à grande
proporção de mulita e à baixa basicidade. Cinzas com teores significativos de Fe, Ca e S apresentaram temperaturas de
fluidez e viscosidade mais baixas, em função da transformação de mulita em anortita e/ou da mais alta basicidade.
Palavras-chave: Injeção de carvão pulverizado; Cinzas; Carvão; Fusibilidade; Viscosidade.
Some aspects of permeability deterioration in blast furnace process at high rates of pulverized coal injection
are not well known yet. At operational practice variations in the ash quality of injected coals can affect the furnace
performance. Previous work has investigated the behavior of individual coals ash at high temperatures in relation to the
chemical and mineralogical compositions. This work aimed to assess this behavior for coal blends. Four coals and seven
blends were selected and ashed at 800-850°C. The samples were analyzed by X-ray fluorescence and X-ray diffraction
techniques and ASTM ash fusion (AFT) and viscosity tests were performed. Ash containing high contents of Si and
Al showed higher fusion temperatures and higher viscosity at 1500°C, due mainly to the higher content of Mullite and
to the low basicity, while those presenting significant contents of Fe, Ca and S had lower fusion temperatures and lower
viscosity, due to the higher content of Anorthite and/or to the higher basicity.
Key words: Pulverized coal injection; Ash; Coal; Fusibility; Viscosity.
1
Engenheira Metalúrgica, Aluna do Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Minas, Metalúrgica e de Materiais, Universidade Federal do Rio
Grande do Sul – UFRGS, Av. Bento Gonçalves, 9500, Cep 91501-970, Porto Alegre, RS, Brasil. E-mail: luisa.ghiggi@ufrgs.br
2
Dr. Ing. Prof. do Departamento de Metalurgia da Escola de Engenharia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS, Av. Bento
Gonçalves, 9500, Cep 91501-970, Porto Alegre, RS, Brasil. E-mail: vilela@ufrgs.br
3
Doutor em Engenharia, Prof. do Departamento de Metalurgia da Escola de Engenharia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS,
Av. Bento Gonçalves, 9500, Cep 91501-970, Porto Alegre, RS, Brasil. E-mail: eosorio@ufrgs.br
4
Engenheiro Metalurgista, Especialista em Alto-Forno ArcelorMittal Tubarão, Av. Brigadeiro Eduardo Gomes, 930, Cep 29163-970, Serra, ES, Brasil.
E-mail: ricardo.tauffer@arcelormittal.com
5
Engenheiro Metalurgista, Especialista em Alto-Forno ArcelorMittal Tubarão, Av. Brigadeiro Eduardo Gomes, 930, Cep 29163-970, Serra, ES, Brasil.
E-mail: roberto.dacruz@arcelormittal.com.
162 Tecnol. Metal. Mater. Miner., São Paulo, v. 9, n. 2, p. 162-171, abr.-jun. 2012
Influência das composições química e mineralógica de cinzas de misturas de carvões para PCI no comportamento de fusibilidade...
Nas duas últimas décadas, a maioria dos processos Foram selecionados quatro carvões usados no
de produção de ferro primário em altos fornos tem utili- processo de PCI, denominados A, B, C e D. Desses
zado a tecnologia de injeção de carvão pulverizado (PCI) carvões foram preparadas três misturas binárias AD e
em função dos benefícios econômicos, operacionais e 4 misturas ternárias ABC, visando formar misturas que
ambientais atingidos. tivessem uma qualidade adequada para o processo de
Os principais fatores que afetam o desempenho combustão no alto-forno. Na Tabela 1 encontram-se a
da injeção de carvão no alto-forno são as propriedades análise imediata dos carvões (ASTM D7582-10(6)), a de
do carvão e as condições de combustão, moagem, trans- enxofre total (ASTM D4239-10(7)) e as proporções dos
carvões nas misturas.
porte e injeção do carvão.(1) Uma vez que a tecnologia de
Os carvões e misturas foram queimados entre
injeção está bem consolidada, o decréscimo na permeabi-
800°C-850°C, em forno mufla, e suas cinzas preparadas
lidade da carga na região inferior do alto-forno geralmente
para análise química por espectrometria de fluorescência
está associado a uma má combustão dos carvões na
de raios X (FRX), análise mineralógica por difração de
zona das ventaneiras e à geração de excesso de finos de raios X (DRX), testes de fusibilidade e testes em viscosí-
“char”. Entretanto, quando os carvões apresentam uma metro rotacional de 1.600°C.
combustão adequada para o processo e a permeabilidade Na análise química das cinzas por FRX
cai, buscam-se as causas nas variações da composição (ASTM D4326-04(8)) foram determinados somente os
química das cinzas dos carvões. Os mecanismos pelos principais elementos, descritos na forma de óxidos, SiO2,
quais a qualidade das cinzas afeta a estabilidade opera- Al2O3, Fe2O3, CaO, MgO, Na2O, K2O, TiO2, P2O5 e o teor
cional do alto forno ainda não estão bem estabelecidos. de SO3 (ASTM D5016-08e1(9)).
Ichida et al.(2) sugeriram, que as cinzas do carvão pulve- Para a discussão dos resultados, calculou-se a
rizado em altas taxas de injeção podem modificar as razão entre os teores de sílica e alumina e a basicidade,
características da escória gotejante acima das ventaneiras, pela razão entre o somatório da fração molar dos óxidos
promovendo a formação do birdsnest e deteriorando a básicos (Fe2O3, CaO, MgO, K2O, Na2O) e o somatório da
permeabilidade na zona do homem-morto. Para evitar a fração molar dos óxidos ácidos (Al2O3, SiO2) nas cinzas,
excessiva basicidade da escória da região da rampa devido considerando o Fe3+ agindo como óxido básico devido a
à injeção de carvão pulverizado, Wikström et al.(3) utili- seu comportamento anfótero.(10)
zaram a co-injeção de carvão pulverizado com pó de A técnica utilizada para DRX, difratômetro com
coletor de alto-forno e escória de aciaria (conversor LD) monocromador de C, usando radiação Cu Kα, permite
num alto forno experimental. Esses autores observaram identificar os minerais e as fases cristalinas presentes acima
que a redução da acidez da escória de ventaneira, evitava de 5% em volume. Para essa análise, as amostras de cinzas
foram reduzidas a –325 mesh. A análise mineralógica foi
a formação de birdsnest e deixava a operação mais suave
realizada nos carvões in natura, nas cinzas dos carvões e
e estável.
misturas queimadas entre 800°C-850°C e nas cinzas aque-
Trabalhos anteriores(4,5) analisaram o comporta-
cidas até 1.240°C, resfriadas ao ar.
mento de cinzas de carvões em temperaturas altas, através
Nos testes de fusibilidade, as amostras de cinzas,
de testes de fusibilidade e viscosidade e sua relação com as preparadas na forma de um cone, foram aquecidas a uma
composições química e mineralógica. Como normalmente taxa de 8 ± 3°C/min, em atmosfera de ar, até atingir a
se usam misturas de carvões alto (AV) e baixo voláteis (BV) fluidez (ASTM D1857-04(11)). Foram determinadas as
no processo de injeção de carvão para obter a combustão temperaturas características de fusibilidade dos cones
e a taxa de substituição coque/carvão desejadas, o objetivo (Figura 1):
deste trabalho é avaliar o comportamento de fusibilidade e • IT - temperatura de início de deformação (arre-
de viscosidade a altas temperaturas de cinzas de misturas dondamento) da ponta do cone;
de carvões em relação às composições química e mine- • ST - temperatura de esfera: altura H = largura
ralógica, para dar suporte à seleção de carvões para PCI. L da base;
Tabela 1. Análise química dos carvões e composição das misturas em base seca (% em massa)
Amostra Cz MV Stotal ABC1 ABC2 ABC3 ABC4 AD1 AD2 AD3
A 7,99 37,03 0,83 50 40 30 20 60 50 40
B 7,39 37,06 1,73 10 20 30 40 - - -
C 9,16 12,40 0,26 40 40 40 40 - - -
D 5,38 19,67 0,77 - - - - 40 50 60
Cz: Cinzas; MV: Matéria volátil.
Tecnol. Metal. Mater. Miner., São Paulo, v. 9, n. 2, p. 162-171, abr.-jun. 2012 163
Ghiggi et al.
Tabela 2. Análise química por FRX, razão sílica-alumina e basicidade das cinzas dos carvões individuais
SiO2 Al2O3 Fe2O3 CaO MgO Na2O K2O TiO2 P2O5 SO3 SiO2/ B
Cz
% % % % % % % % % % Al2O3 %
A 58,03 23,90 8,00 2,30 2,02 0,22 1,94 0,99 <0,03 1,65 2,42 0,14
B 49,22 23,70 17,89 2,71 0,61 0,26 1,87 1,20 0,28 1,15 2,07 0,18
C 42,75 32,53 6,19 6,31 1,40 0,22 1,74 1,76 2,68 2,57 1,31 0,20
D 32,29 21,07 12,51 12,51 1,89 0,22 1,37 1,16 <0,03 14,66 1,53 0,49
B = Basicidade ; Cz = Cinzas.
164 Tecnol. Metal. Mater. Miner., São Paulo, v. 9, n. 2, p. 162-171, abr.-jun. 2012
Influência das composições química e mineralógica de cinzas de misturas de carvões para PCI no comportamento de fusibilidade...
3.2 Análise Mineralógica dos Carvões e das Cinzas intenso que no carvão ”A”, sugerindo uma menor quan-
por Difração de Raios X tidade desse mineral no carvão “B”. O carvão “B” possui
o maior teor de pirita entre os carvões, de acordo com
o maior teor de S encontrado em sua análise química na
3.2.1 Principais minerais nos carvões Tabela 1. No carvão “C”, os principais minerais são caoli-
nita, calcita e fluorapatita. Destacam-se a ausência do
A Figura 2 apresenta os difratogramas de raios X
quartzo e a presença de minerais ricos em Ca. De acordo
das amostras dos carvões. Devido ao efeito de diluição na
matéria orgânica,(5) aparecem somente os picos das fases com a análise química das cinzas, Tabela 2, o carvão “C” é
mais importantes. No carvão “A”, os principais minerais rico em Al e a razão sílica/alumina é a menor entre os
são caolinita e quartzo, sendo o pico mais importante carvões. Isto permite concluir que o carvão “C” possui o
do quartzo (101) de grande intensidade. No carvão “B”, maior teor de caolinita entre os demais. No carvão “D”,
aparecem os picos correspondentes aos argilominerais aparecem os minerais caolinita, calcita e quartzo, sendo
caolinita e ilita e aos minerais quartzo e pirita. Observa-se o pico do quartzo de menor intensidade que aqueles dos
que o pico principal do quartzo no carvão “B” é menos carvões “A” e “B”.
Tabela 3. Análise química por FRX, razão sílica/alumina e basicidade das cinzas das misturas de carvões
SiO2 Al2O3 Fe2O3 CaO MgO Na2O K2O TiO2 P2O5 SO3 SiO2/ B
Cz
% % % % % % % % % % Al2O3 %
ABC1 51,26 27,12 8,47 3,85 1,62 0,24 1,80 1,30 1,05 1,94 1,89 0,17
ABC2 50,35 27,05 9,60 3,88 1,47 0,23 1,74 1,32 1,07 1,88 1,86 0,17
ABC3 49,47 26,98 10,69 3,90 1,32 0,23 1,67 1,34 1,08 1,82 1,83 0,18
ABC4 48,61 26,92 11,76 3,93 1,17 0,23 1,61 1,36 1,09 1,76 1,81 0,18
AD1 50,06 23,02 9,40 5,46 1,98 0,22 1,76 1,04 0,03 5,68 2,17 0,22
AD2 47,67 22,76 9,81 6,41 1,97 0,22 1,71 1,06 0,03 6,89 2,09 0,24
AD3 45,10 22,48 10,27 7,43 1,95 0,22 1,65 1,08 0,03 8,19 2,01 0,27
B = Basicidade; Cz=cinzas .
Figura 2. Difratogramas dos carvões A, B, C, D. Nas figuras: C = calcita[CaCO3]; Fa = fluorapatita [Ca5(PO4)3F];K = caolinita [Al2Si2O5(OH)4];
I = ilita [K0,5(Al,Fe,Mg)3(Si,Al)4O10(OH)2]; P = pirita [FeS2]; Q = quartzo [SiO2].
Tecnol. Metal. Mater. Miner., São Paulo, v. 9, n. 2, p. 162-171, abr.-jun. 2012 165
Ghiggi et al.
3.2.2 Principais fases minerais nas cinzas dos rizadas por uma grande intensidade do pico principal da
carvões e misturas anidrita, em concordância com os mais altos teores de
CaO e SO3 na análise química. O aparecimento de sulfato
A Figura 3 mostra os difratogramas das cinzas dos de alumínio hidratado nas cinzas não tem uma origem defi-
carvões. A metacaolinita, fase mineral mais importante nas nida e deve ser melhor investigada.
cinzas, é amorfa e, portanto, dificulta a análise de fases A análise qualitativa por difração de raios X não se
com menores concentrações. As fases cristalinas principais mostrou uma boa metodologia para avaliar as cinzas das
nas cinzas dos carvões são quartzo, anidrita, hematita, ilita misturas de carvões, porque as fases cristalinas principais
e sulfato de alumínio hidratado. Nas cinzas “A” também são as mesmas (quartzo, hematita, anidrita, ilita e sulfato
aparece o plagioclásio, porém o que mais se distingue de alumínio) e existe pouca variação na análise química das
nestas cinzas é a mais alta intensidade dos picos do quartzo, misturas selecionadas. A diferença mais importante entre
indicado pelo teor mais elevado de sílica da análise química os dois tipos de misturas é a presença de mais picos de
e que vai originar a razão sílica/alumina mais alta e a basi- anidrita e sua maior intensidade nas misturas “AD”, de
cidade mais baixa. Nas cinzas “B”, o pico principal do acordo com os mais altos teores de CaO e SO3 encon-
quartzo é um pouco menos intenso, e a hematita derivada trados nessas misturas.
da pirita é uma fase cristalina importante, de acordo com
o mais alto teor de Fe encontrado nessa amostra. Nas 3.2.3 Principais fases minerais após aquecimento
cinzas “C”, destacam-se uma menor intensidade do pico das cinzas a 1.240°C
do quartzo, o não aparecimento da ilita e a presença de
fases contendo Ca, anidrita (da reação do S da pirita com Nos testes a 1.240°C, resfriados ao ar, as cinzas
a calcita) e fluorapatita, cuja importância está relacionada “C” e principalmente as cinzas “D” e das misturas “AD”,
ao teor de P (mais alto) desta amostra. A baixa intensidade apresentaram visualmente fase líquida (fase sólida colada
dos picos de todas as fases cristalinas presentes nas cinzas no fundo do cadinho). A presença de fase líquida amorfa
“C” está relacionada à maior quantidade de fases amorfas, interfere nos resultados de DRX, impossibilitando a iden-
principalmente metacaolinita. As cinzas “D” são caracte- tificação de fases de menores concentrações.
Figura 3. Difratogramas das cinzas A,B,C,D. Nas figuras: Ad = anidrita [CaSO4]; F = feldspato de potássio [KAlSi3O8]; Fa = fluorapatita
[Ca5(PO4)3F]; H = hematita [Fe2O3]; Q = quartzo [SiO2]; I = ilita [(Na,K)1–x(Al,Fe,Mg)2(Si,Al)4O10(OH)2]; S = sulfato de alumínio hidratado
[Al2(SO4).16H2O].
166 Tecnol. Metal. Mater. Miner., São Paulo, v. 9, n. 2, p. 162-171, abr.-jun. 2012
Influência das composições química e mineralógica de cinzas de misturas de carvões para PCI no comportamento de fusibilidade...
A Figura 4 mostra os difratogramas das amos- A Tabela 4 apresenta os resultados dos testes
tras de cinzas dos carvões e das misturas sinterizadas a de fusibilidade das cinzas dos carvões e das misturas de
1.240°C. Os resultados de DRX mostram que as fases carvões. Observa-se que as cinzas dos carvões “A” e “B”
cristalinas mais importantes nas cinzas “A” e “B” são mulita, iniciam o processo de amolecimento em temperaturas
quartzo e hematita. Nas cinzas “C”, observa-se a mulita mais altas que as cinzas “C” e “D”. No entanto, as cinzas
como fase majoritária, hematita e anortita, enquanto que “B” e “D” apresentam temperaturas de fluidez mais baixas.
nas cinzas “D”, a anortita como fase majoritária, hema- As cinzas A, preparadas a 1.240°C foram fáceis de moer
tita e magnetita. Ressalta-se que nas cinzas “C” e “D”, para a DRX, indicando uma menor quantidade de líquido
o quartzo não aparece. A mulita é formada a partir dos formado até esta temperatura. Segundo Vassilev et al.
argilominerais, principalmente da metacaolinita, enquanto
(14)
, teores altos de quartzo e mulita tendem a elevar as
que a anortita é formada principalmente na reação da temperaturas de fusibilidade. O amolecimento começa
mulita com o CaO liberado na decomposição da anidrita quando existe extensiva quantidade líquido, com compo-
(950°C-1.200°C).(14) Nos difratogramas das cinzas da série sição próxima a ferrocordierita,(16) conforme diagrama
de misturas “ABC”, aquecidas a 1.240°C, verifica-se que as de equilíbrio SiO2-Al2O3-FeO(Fe2O3). A maior quanti-
principais fases cristalinas presentes são mulita, quartzo e dade de quartzo e a difusão de cátions de Fe e de outros
hematita. Os difratogramas das cinzas “AD” sinterizadas a cátions básicos do líquido para a mulita levam a tempe-
1.240°C mostram que as fases mais importantes são anor- ratura FT para 1.434°C. Nas cinzas “B”, mais ricas em
tita, quartzo e hematita. Portanto, a principal diferença hematita, provavelmente a formação de mais espinélios
entre as misturas“ABC” e “AD” é que as primeiras têm (Fe3O4,AlFe2O4,MgFe2O4) retarda a formação de líquido(14)
como fase majoritária em temperaturas altas a mulita e as e o amolecimento inicia em temperatura mais alta. No
entanto, a maior proporção de hematita nas cinzas resulta
últimas, a anortita.
num intervalo de amolecimento e fusão menor (32°C), e
numa FT de 1405°C. Nas cinzas do carvão “C”, as fases
3.3 Testes de Fusibilidade de Cinzas
cristalinas presentes a 1.240°C são mulita, anortita e hema-
tita. A temperatura IT mais baixa dessas cinzas indica maior
Os testes de fusibilidades de cinzas são testes dinâ-
proporção de fases de mais baixo ponto de fusão, porém
micos, onde com o aumento da temperatura ocorrem
o teor maior de mulita e menor de quartzo dessa amostra
vários processos como sinterização das partículas de
estende o intervalo de amolecimento e fusão (281°C) até
cinzas, difusão de espécies químicas, formação de uma
1.514°C. Conforme Vassilev et al.,(14) a mulita, fase mais
fase de escória líquida a partir de partículas de baixo ponto
refratária do sistema, eleva mais as temperaturas HT e
de fusão; decomposição de alguns compostos com libe-
FT do que o quartzo. As cinzas do carvão “D”, mais ricas
ração de gás; dissolução de partículas sólidas no líquido em Ca e S, elementos fluxantes, apresentam a 1.240°C
formado. Como resultado do aumento de fase líquida com como fases cristalinas, a anortita, em maior proporção, e
o aumento da temperatura, o cone de cinzas se deforma, hematita. O quartzo no teste de 1240°C já foi assimilado
muda para forma esférica e para semi-esférica antes de no líquido. A difusão dos cátions de Fe e de outros cátions
fluir. Entre os fatores que afetam a cinética de dissolução básicos (provavelmente na fase líquida) na rede da anor-
das cinzas estão a composição mineralógica e o tamanho tita e/ou sua dissolução no líquido reduzem o intervalo de
da partícula.(15) amolecimento e fusão (35°C) e a FT para 1.339°C.
3.3.1 Testes de fusibilidade das cinzas dos carvões 3.3.2 Testes de fusibilidade das cinzas das misturas
Os testes de fusibilidade podem ser divididos em Observa-se também na Tabela 4 que as tempe-
dois intervalos: o intervalo de amolecimento, entre a raturas de fusibilidade das cinzas “ABC1” têm um
temperatura de deformação inicial (IT) e a de semi-esfera comportamento de fusibilidade mais próximo das cinzas
(HT) e o intervalo de fusão, entre a temperatura de semi- “A”, porém com um intervalo de amolecimento e fusão
-esfera (HT) e a de fluidez (FT). aumentado em 29°C, resultando numa FT maior, devido
Tecnol. Metal. Mater. Miner., São Paulo, v. 9, n. 2, p. 162-171, abr.-jun. 2012 167
Ghiggi et al.
Figura 4. Difratogramas das cinzas dos carvões (A, B, C, D) e das séries de misturas (ABC e AD) aquecidas a 1240°C e resfriadas ao ar. Nas figu-
ras: An = anortita [CaAl2Si2O8]; C = cal [CaO]; H = hematita[Fe2O3]; Q = quartzo[SiO2]; M = mulita [Al4,57Si1,41O9,7]; Ma = magnetita[Fe3O4].
168 Tecnol. Metal. Mater. Miner., São Paulo, v. 9, n. 2, p. 162-171, abr.-jun. 2012
Influência das composições química e mineralógica de cinzas de misturas de carvões para PCI no comportamento de fusibilidade...
principalmente às cinzas “C”, mais ricas em mulita. Nas tipos de comportamento. As cinzas “A”, com a mais baixa
cinzas “ABC2”, percebe-se que há um aumento da influ- basicidade (B = 0,14), apresentam uma escória longa e
ência das cinzas “B” (com mais hematita e menos quartzo viscosa até 1.580°C, devido à grande quantidade de sílica
que “A”) em função do aumento das temperaturas IT, ST presente, sem o teor necessário de cátions básicos para
e HT e uma redução do intervalo de fusão em relação a romper totalmente a cadeia de tetraedros da sílica. Na
“ABC1”, mas com FTs iguais. Nas cinzas “ABC3” e “ABC4”, temperatura de fluidez, a viscosidade é de 1.115 poise. As
verificam-se a maior influência da mulita e menor do cinzas “B” têm uma escória de baixa viscosidade, menor
quartzo nas temperaturas de fusibilidade, com a elevação
que 250 poise, a partir de 1.419°C, em função da maior
das temperaturas ST, HT e FT. É importante notar que a
quantidade de óxidos básicos, em comparação à amostra
mudança na análise química das amostras “ABC” é rela-
“A”. As cinzas “C” mostram viscosidades baixas somente
tivamente pequena (Tabela 3) e, portanto, a composição
mineralógica é mais importante na fusibilidade das cinzas. acima de 1.510°C. Abaixo dessa temperatura com o
As temperaturas de fusibilidade dessas misturas não são início da cristalização da mulita aumenta rapidamente
aditivas em relação àquelas dos carvões componentes, a viscosidade. As cinzas “D” apresentam as mais baixas
uma vez que a FT da mistura “ABC4”, por exemplo, é viscosidades entre as cinzas no intervalo de temperatura
praticamente igual a das cinzas “C”. testado (3-57poise). Isto se deve à alta concentração de
Os resultados de fusibilidade das cinzas das misturas óxidos básicos presentes, para uma razão sílica/alumina
“AD”, na Tabela 4, mostram temperaturas mais próximas relativamente baixa.
das cinzas do carvão “D” do que “A”, sendo que as cinzas Comparando as cinzas dos carvões a 1500°C, veri-
da mistura “AD2” apresentam IT, ST, HT menores que “D” fica-se na Figura 5 que as escórias das cinzas “A” e “C” têm
e a mesma FT. As cinzas “AD1” e “AD3” apresentam o alta viscosidade em função dos teores mais altos de Si e
mesmo intervalo de amolecimento e pequena diferença Al e de teores insuficientes de Fe, Ca e demais elementos
(15°C) no intervalo de fusão, enquanto que a amostra alcalinos e alcalinos-terrosos, enquanto que as escórias
“AD2” apresenta as menores temperaturas de fusibilidade. “B” e “D”, devido principalmente aos maiores teores
Isto indica novamente a não aditividade das temperaturas desses elementos tem viscosidade baixa.
de fusibilidade das misturas em relação àquelas das cinzas
dos carvões componentes. As cinzas “AD” em 1.240°C têm
3.4.2 Viscosidade das cinzas das misturas de
como fases principais a anortita, hematita e quartzo em
carvões
proporções diferentes, enquanto que as cinzas do carvão
“A” apresentam mulita, hematita e quartzo e as cinzas
A Figura 6 apresenta as curvas de viscosidade das
“D”, anortita e hematita. Isto significa que as quantidades
de Ca e Fe presentes nas cinzas “D” são suficientes para cinzas das misturas “ABC” vs. temperatura, comparadas
transformar a mulita presente nas cinzas “A” em anortita, àquelas dos carvões componentes. A 1.500°C essas escó-
nas proporções de carvões testadas, levando as misturas rias são viscosas, devido ao mais alto teor de Al. A mistura
para regiões de temperaturas liquidus mais baixas. “ABC4” têm curva de viscosidade em função da tempe-
Comparando as misturas “AD” e “ABC”, observa- ratura semelhante àquela das cinzas “C”. Entretanto,
-se que as primeiras se tornam líquidas em temperaturas as viscosidades de “C” são mais baixas entre 1.550°C e
inferiores devido à formação e maior proporção de anor- 1.600°C devido à maior basicidade. Em 1.600°C todas as
tita e as últimas fundem em temperaturas mais altas devido misturas têm viscosidade menor que 100 poise, porém as
à maior proporção de mulita. misturas “ABC1” e “ABC2” apresentam viscosidades supe-
riores a “ABC3” e “ABC4” em função do maior teor de
3.4 Testes de viscosidade de cinzas sílica.
As curvas de viscosidade em função da temperatura
A viscosidade é a medida da resistência de um das misturas “AD”, na Figura 7, mostram que são escórias
fluido ao escoamento. Nos silicatos líquidos, a estrutura longas, com comportamentos intermediários às cinzas dos
é fortemente ligada por pontes de oxigênio e são neces- carvões “A” e “D”. A queda da viscosidade de “AD1” para
sários cátions básicos (modificadores) para provocar a “AD3” se deve ao aumento da basicidade e ao decréscimo
quebra das cadeias de ânions e reduzir a viscosidade.(10) da razão sílica/alumina.
Comparando a viscosidade das escórias “ABC” e
3.4.1 Viscosidade das cinzas dos carvões “AD” a 1.500°C, as primeiras apresentam viscosidade mais
alta em função dos maiores teores de Al e da baixa basi-
As curvas de viscosidade das cinzas dos carvões cidade, enquanto que as últimas mostram viscosidades
em função da temperatura, na Figura 5, mostram que as mais baixas, devido principalmente à maior basicidade em
escórias líquidas das cinzas dos carvões têm diferentes cinzas com razões sílica/alumina mais altas.
Tecnol. Metal. Mater. Miner., São Paulo, v. 9, n. 2, p. 162-171, abr.-jun. 2012 169
Ghiggi et al.
REFERÊNCIAS
1 DEFENDI, G. A. et al. Development of knowledge on combustion and ash behavior of pulverized coals injected in
ArcelorMittal Tubarão blast furnaces. Revue de Metallurgie - CIT, n. 7-8, p. 346-55, juil.août 2008.
2 ICHIDA, M. et al. Behavior of pulverized coal ash and physical property of dripping slag under high pulverized coal
injection operation. ISIJ International, v. 41, n. 4, p. 325-32, 2001.
3 WIKSTRÖM, J.-O., e al. Improuved slag formation in the blast furnace by co-injection of basic fluxes, together with
pulverized coal, through the tuyeres. In: INTERNATIONAL BF LOWERZONE SYMPOSIUM, 2002, Wollongong.
Proceedings... Carlton Victoria: Australasian Institute of Mining and Metallurgy, 2002. p. 18-1-18-14.
4 BAGATINI, M. C. et al. Estudo de fusibilidade das cinzas de carvões em função da composição química e
mineralógica.Tecnologia em Metalurgia e Materiais, v. 3, n. 4, p. 52-58, abr.-jun. 2007. http://dx.doi.org/10.4322/
tmm.00304009
5 BAGATINI, M. C. et al. The behaviour of coal ashes for PCI at high temperatures in relation to their chemical
and mineralogical composition - experimental and computational analysis. Ironmaking and Steelmaking, v. 36, n. 8,
p. 583-589, Nov. 2009. http://dx.doi.org/10.1179/030192309X12492910938050
6 ASTM INTERNATIONAL. ASTM D7582-10. Standard test methods for proximate analysis of coal and coke by
macro thermogravimetric analysis. West Conshohocken, 2010.
7 ASTM INTERNATIONAL. ASTM D4239-10. Standard test methods for sulfur in the analysis sample of coal and coke
using high-temperature tube furnace combustion methods. West Conshohocken, 2010.
8 ASTM INTERNATIONAL. ASTM D4326-04. Standard test method for major and minor elements in coal and coke
ash by x-ray fluorescence. West Conshohocken, 2004.
9 ASTM INTERNATIONAL. ASTM D5016-08e1. Standard test method for total sulfur in coal and coke combustion
residues using a high-temperature tube furnace combustion method with infrared absorption. West Conshohocken,
2008.
10 VARGAS, S.; FRANDSEN, F. J.; DAM-JOHANSEN, K. Rheological properties of high-temperature melts of coal
ashes and other silicates. Progress in Energy and Combustion Science, v. 27, n. 3, p. 237-429, 2001. http://dx.doi.
org/10.1016/S0360-1285(00)00023-X
11 ASTM INTERNATIONAL. ASTM D1857-04. Standard test method for fusibility of coal and coke ash. West
Conshohocken, 2004.
12 ASTM INTERNATIONAL. ASTM C-965-96(2007). Standard practice for measuring viscosity of glass above the
softening point. West Conshohocken, 2007.
13 DEUTSCHES INSTITUT FÜR NORMUNG. DIN 51730-1998-04. Testing solid fuels. Determination of fusibility of
fuel ash. Berlin, 1998.
14 VASSILEV, S. V. et al. Influence of mineral and chemical composition of coal ashes on their fusibility. Fuel Processing
Technology, v. 45, n. 1, p. 27-51,Oct. 1995. http://dx.doi.org/10.1016/0378-3820(95)00032-3
15 JAK, E. Prediction of coal ash fusion temperatures with the F* A* C* T* thermo-dynamics computer package. Fuel,
v. 81, n. 13, p. 1655-68, Aug. 2002. http://dx.doi.org/10.1016/S0016-2361(02)00091-1
16 WALL, T. F. et al. Coal ash fusion temperature-New characterization techniques and implications for slagging and
fouling. Progress in Energy and Combustion Science, v. 24, n. 4, p. 345-53, 1998. http://dx.doi.org/10.1016/S0360-
1285(98)00010-0
Tecnol. Metal. Mater. Miner., São Paulo, v. 9, n. 2, p. 162-171, abr.-jun. 2012 171