Guardadas as devidas proporções, algo semelhante ocorreria na China. Nos primeiros anos após a
Revolução Chinesa de 1949, o líder comunista Mao Tsé Tung escreveu em seu livro Sobre a arte e
a literatura ideias praticamente idênticas às de Lênin e Trotsky, como a seguinte: “Devemos nos
apoderar do rico legado deixado pela literatura do passado, tanto na China como no exterior, e
continuar suas belas tradições”.[7] Quase duas décadas depois, após a revolução cultural de 1966,
Mao passou a defender estratégias distintas, que negavam toda e qualquer cultura chinesa e
estrangeira que não fosse “maoísta”, apelando para um estilo de propaganda artística muito
semelhante ao realismo soviético preconizado por Stalin. Dado que governou por tanto tempo, de
1949 a 1976, Mao Tsé Tung sozinho acabou conduzindo na China as duas fases soviéticas (sendo a
primeira, mais aberta, de 1917 a 1928-29, e a segunda, essencialmente stalinista, depois de 1928-
29).[8]
O cinema soviético mudou com o stalinismo. O período de relativa liberdade artística, encerrado
entre 1928 e 1929, foi então seguido de uma fase terrível – em todos os sentidos.
Depois de sua tríade de sucessos (A Greve, O Encouraçado Potemkin e Outubro), Eisenstein deixou
a Rússia em 1929 logo depois de terminar um filme com viés mais melodramático (A Linha Geral,
que sofreu cortes de burocratas para conseguir ser distribuído). Ele iniciou uma viagem de três anos
pelo mundo, para conhecer outras escolas de cinema e se aprimorar como diretor e teórico.
Conheceu os Estados Unidos, onde esteve com Walt Disney, Charles Chaplin e D.W. Griffith,
filmou no México financiado por produtores norte-americanos e somente voltou a Moscou em
1931, quando seu visto venceu e, também, quando eram robustas as teorias de conspiração sobre
sua longa viagem ao Ocidente. Em 1931, Moscou era uma cidade completamente diferente. A
União Soviética mudara muito e os olhos de Eisenstein também eram outros. Era agora o país da
industrialização forçada, sem qualquer debate político (com o esmagamento das oposições à
esquerda e à direita), com paranoia coletiva e espionagem interna, e, para completar, com milhões
de pessoas e animais morrendo de fome após as quebras de safras por estiagem e pela desastrosa
política de coletivização forçada.
Os artistas razoavelmente livres não existiam. “Os jornais já não traziam anúncios do último filme
de Mary Pickford nem relatavam fatos triviais como acidentes de trânsito”, observou Fitzpatrick, “o
contato com o Ocidente ficou muito mais restrito e perigoso”. O poeta Maiakovsky cometera
suicídio em 1930, no mesmo ano em que o pintor Kazimir Malevich, professor e vanguardista nas
artes plásticas, fora preso, interrogado e torturado (ele morreria cinco anos depois). Homens e
mulheres em todas as correntes culturais eram censurados, execrados em público, perseguidos,
torturados, assassinados – e a sina recaía também sobre seus familiares e amigos. O grande
compositor Dmítri Chostakóvitch pode ser invocado como exemplo desse período bárbaro, uma vez
que o terror dos Grandes Expurgos fora ensaiado meses antes: sua amante Elena Konstantínoskaia
foi presa em 1935; sua assistente de trabalho Galina Serebriákova foi mandada aos gulags em 1936,
de onde só voltaria mentalmente deformada quinze anos depois; além deles, também a irmã, o
cunhado, o tio e a sogra do compositor foram presos. O escritor A. Lejnev fora grampeado pelo
regime criticando a ditadura stalinista e a perseguição que faziam sobre Chostakóvitch. Resultado:
Lejnev foi fuzilado em 1938, no mesmo ano em que um dos pais da revolução, o teórico marxista
Bukhárin (e líder da “oposição à direita”) também foi assassinado após julgamento fajuto.[9]
Com o Segundo Plano Quinquenal (1933-37), o apelo pela industrialização veloz e a qualquer custo
ganhou ainda mais vigor, enquanto também a situação internacional ficara mais aguda, com a
eleição de Adolf Hitler para o comando da Alemanha. Para completar esse quadro sinistro, Stalin, o
terrorista-mor, comandaria os Grandes Expurgos de 1937-38, quando centenas de milhares de
pessoas foram executadas e um volume ainda maior de seres humanos punidos com o trabalho
forçado. Segunda a historiadora Sheila Fitzpatrick em sua versão mais recente de A Revolução
Russa, lançado há um mês no Brasil em bonita edição da Todavia, os Grandes Expurgos
representaram o fim da Revolução Russa.
Mesmo concluídos os Grandes Expurgos, o terrorismo de Estado continuou, mas de forma menos
abrangente e mais cirúrgica. Em 1940, o diretor de teatro Vsevolod Meyerhold, que
entusiasticamente defendera a revolução de 1917 e cujo trabalho influenciara diretamente o cinema
de Eisenstein, teve a esposa esfaqueada dentro de casa por homens da ditadura stalinista enquanto
ele era torturado na cadeia. Meyerhold seria executado pelo esquadrão de morte do governo,
acusado de trotskismo e de oposição ao realismo socialista nas artes. No mesmo ano, 1940, o
escritor Isaac Babel, que vivia no ostracismo com suas obras proibidas de circular, também foi
assassinado por fuzilamento depois de confessar sob tortura que era trotskista. Também Górki, que
recebera Stalin para a conversa com escritores em sua casa em outubro de 1932, onde começara a
ser germinado o “realismo socialista”, morreu de forma misteriosa quatro anos depois. O horror
atingiu também um dos capatazes – Iejov, o chefe da polícia política NKVD, que entre setembro de
1936 e dezembro de 1938 comandara as mais de 680 mil execuções, além das torturas e dos exílios
forçados a campos de trabalho. Iejov, que gozara da confiança total de Stalin para conduzir todo
esse processo, foi pouco depois também preso e fuzilado. Relata Fitzpatrick:
Em 1924, durante o interlúdio da NEP, um moscovita que voltasse depois de dez anos
de ausência podia apanhar a lista telefônica de sua cidade (imediatamente reconhecível,
pois seu velho design e formato praticamente não foram alterados desde os anos pré-
guerra) e ter uma boa chance de encontrar o registro de seu velho médico, do advogado
ou até mesmo do corretor de valores, do confeiteiro (ainda com uma discreta
propaganda do melhor chocolate importado), da taverna local e do padre da paróquia,
bem como das firmas que, em outros tempos, consertaram seus relógios. Dez anos mais
tarde, em meados dos anos 1930, quase todos esses registros teriam desaparecido, e o
viajante que voltasse ficaria ainda mais desorientado por causa dos novos nomes de
muitas ruas e praças de Moscou, além da destruição de igrejas e outros pontos de
referência até então familiares. Mais alguns anos e a própria lista telefônica da cidade
teria desaparecido, para ser publicada de novo somente meio século depois.
O cinema não saiu impune do terror. A criatividade e relativa liberdade artística dos anos 1920
foram totalmente esmagadas a partir de 1928-29. Com o advento do “realismo socialista”, em 1934,
e os Grandes Expurgos de 1937-38, estava consolidada a morte de qualquer arte que não fosse
aquela desejada ou autorizada pelos burocratas stalinistas. Foi quando inclusive o cinema, tal qual
as outras manifestações artísticas, passou a ser determinado como parte da história oficial. História
não: manipulação da memória humana, como definiu Renmick, em outro grande livro lançado este
ano (O Túmulo de Lênin, pela Companhia das Letras, traduzido por José Geraldo Couto, também
responsável pela versão em português do supracitado A Revolução Russa de Fitzpatrick):
Stalin herdou a tradição de manipular a memória humana, e chegou perto da perfeição
nisso. Nos primeiros dez anos após a Revolução Bolchevique houvera certo grau de
coexistência entre os historiadores, um debate entre marxistas ortodoxos e seus
oponentes “burgueses”. Tudo isso chegou ao fim na primeira – e única – Conferência
Nacional de Historiadores Marxistas realizada em 1928, mesmo ano em que Stalin se
tornou o líder inconteste do Estado. Como a conferência deixou claro, a consolidação do
poder de Stalin lhe dava controle absoluto sobre a história. Em 1934, o Comitê Central
do Partido Comunista emitiu um decreto determinando que uma versão ideológica
estrita da história se tornasse doutrina em todos os livros didáticos, escolas,
universidades e institutos. O próprio Stalin supervisionou pessoalmente a escrita e a
publicação de uma tiragem de 50 milhões de exemplares do famoso “Curso Breve”, um
raivoso panfleto ideológico que era, nas palavras do historiador Genrikh Josse, “como
um martelo enfiando pregos de falsidade no cérebro de cada aluno”.
Em meio a tudo isso estava o cinema. Vertov, que ainda lançaria Três Canções para Lênin (de
1934), perdeu acesso a recursos financeiros para fazer filmes conforme se adensava a percepção de
“realismo socialista”. Seus filmes passaram a ser considerados herméticos demais pelo governo.
Morreria esquecido em fevereiro de 1954, uma década e meia antes de ser venerado por Godard na
França.
Eisenstein, questionado pela ditadura por conta de sua longa viagem ao Ocidente, passou a ter
enormes dificuldades para rodar seus filmes. Depois da intervenção forçada em A Linha Geral,
concluído em 1929 pouco antes de seu embarque para a Europa ocidental, os Estados Unidos e o
México, Eisenstein teve a partir de 1931, quando voltou a Moscou, censura como regra: precisou
abandonar filmagens de dois longas no meio (O prado de Bejin, de 1935-37, e O canal de Fergana,
de 1939) além de outros roteiros que não eram sequer aprovados. No meio do caminho, no entanto,
ele ainda gozaria de apreço oficial depois de dirigir Alexander Nevsky, um sucesso de público e de
propaganda russa (apesar de ser um filme tolo e infinitamente pior que suas três obras anteriores). O
filme tem um background curioso: Eisenstein aceitou o projeto como “última chance” concedida
por Stalin a ele e entregou um filme de época com propaganda nada sutil da Rússia contra a
Alemanha nazista. O longa foi lançado no fim de 1938. Poucos meses depois, Stalin fechou seu
acordo com Adolf Hitler e o filme foi imediatamente retirado da distribuição oficial, mesmo sendo
um sucesso de público. Dois anos depois, em 1941, quando o acordo tinha sido rompido e a
Segunda Guerra Mundial estava no auge, o filme voltou a ser distribuído, tanto na União Soviética
quanto no exterior, e voltou a ser sucesso de público.[10] Eisenstein ganhou medalhas de honra de
Stalin e voltou a ter prestígio para seu projeto seguinte – a trilogia Ivan, o Terrível. A primeira parte
saiu em 1944 e ganhou, mais uma vez, o sinal verde de Stalin. Multidões foram às salas de projeção
para assistir ao filme e Eisenstein foi mais uma vez elogiado e prestigiado pela ditadura. A segunda
parte, no entanto, desagradou e os censores soviéticos proibiram sua exibição. Eisenstein morreria
em 1948, sem que a terceira parte fosse sequer terminada (os negativos do terceiro longa foram
quase totalmente destruídos pelo governo).
O único a seguir de forma razoavelmente inabalável durante todo o período pós-1929 foi Pudovkin.
Ele se converteu de corpo e alma ao stalinismo e passou a acumular medalhas de honra do governo
e a gozar de enorme carinho dos burocratas soviéticos. Inevitavelmente, sua arte estava morta. Tão
logo Hitler subiu ao poder na Alemanha, no início de 1933, o Partido Comunista Russo passou a
esperar filmes que atacassem o fascismo alemão. Pudovkin foi rápido: no mesmo ano filmou e
lançou O Desertor, que conta a história de um operário alemão que fugiu de seu país e foi morar na
União Soviética, onde encontrou os camaradas comunistas e percebeu que era necessário voltar para
a Alemanha para fazer a revolução por lá. Depois, quando os burocratas decidiram que era preciso
alertar Hitler que era melhor manter o pacto de não-agressão fechado com Stálin, lá estava
Pudovkin filmando Suvorov, de 1940, que conta a história do general russo que vencera todas as
batalhas europeias dois séculos antes. Apesar do sucesso e do conforto em vida, ele nunca mais
repetiria filmes poderosos como seus três primeiros e, mesmo tendo seguido a cartilha stalinista,
precisou se desculpar ao Partido Comunista Russo em algumas oportunidades, por filmes que não
acompanhavam totalmente a bula indicada. Faleceria em junho de 1953, aos 60 anos, apenas três
meses depois de Stalin.[11]
Poucos anos mais tarde, o escritor russo Vladimir Nabokov, radicado nos Estados Unidos, diria em
discurso no Festival de Artes de abril de 1958 da Universidade Cornell que na Rússia sempre houve
restrição ao pensamento artístico, mas que antes do período soviético “não se davam ordens” aos
artistas. No auge do sucesso de seu livro mais famoso, Lolita, prestes a ser adaptado ao cinema por
Stanley Kubrick, o escritor foi convidado a falar sobre a literatura de seu país originário. A lógica
apresentada por ele vale perfeitamente para o que ocorria no cinema. Nabokov, inclusive, destaca
frase do sucessor de Stalin, Nikita Kruschvev (que ele inclusive ridiculariza ao se questionar sobre a
grafia correta do sobrenome), dita na União Soviética poucos meses antes do colóquio sobre
literatura:
Nada mudou na filosofia do Estado quando Lênin foi substituído por Stálin, e nada
mudou agora com a ascensão de Kruschev ou Kruschov ou como quer que ele se chame.
Permitam-me citar o que ele disse sobre literatura numa recente reunião do partido
(junho de 1957):
Uma vez que se estabelece um limite para a imaginação e a vontade do autor, todo
romance proletário precisa ter um final feliz, com o triunfo dos soviéticos, razão pela
qual o escritor e confrontado com a terrível tarefa de gerar uma trama interessante
quando o desfecho é oficialmente conhecido pelo leitor por antecipação.
Obituário
No cinema, a revolução russa de 1917 e a consequente vitória dos bolcheviques na guerra civil e a
instituição da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) gerou sete anos de filmes
magníficos, entre 1923 e 1929, seguidos de controle estatal e o emburrecimento inevitável,
assassinatos, depressão e seguidos anos de filmes abaixo da crítica, com raríssimas exceções (a
principal delas sendo Chapaev, filme de 1934 dos irmãos Vasilyev, que ganhou prêmios nos Estados
Unidos e na França). Moniz Bandeira descreveu corretamente que as obras do chamado “realismo
socialista”, iniciado após a radicalização da revolução promovida por Stalin, refletiram, em sua
mediocridade, “não o desenvolvimento de uma cultura proletária, mas a degenerescência
burocrática que se cristalizou no stalinismo”. Com a radicalização total promovida por Stalin entre
1928-29, o cinema como posto de experimentações criativas foi também assassinado aos poucos. O
fundo do poço, em qualidade e em quantidade, foi atingido em 1952, quando apenas cinco filmes
foram lançados: a causa principal era o estrangulamento de uma burocracia censuradora, que atingia
dimensões quase incríveis, uma vez que cada roteiro tinha de ser esquadrinhado por 28 repartições
diferentes antes que a produção pudesse começar e, mesmo depois de concluído, o filme poderia ser
editado, a mando do partido, ou simplesmente proibido. O “ressurgimento” do cinema soviético dos
anos 1960 e 1970 foi muito mais fruto das experimentações isoladas de Andrei Tarkovisky do que
propriamente um movimento de cineastas, bem como ocorre nas últimas duas décadas com
Alexandr Sokurov.[12]
Quase 100 anos depois, aqueles poucos filmes soviéticos do imediato pós-revolução continuam
relevantes. Influenciaram direta ou indiretamente ao menos três grandes escolas de cinema: o
Cinema Novo brasileiro e os citados Neorrealismo Italiano e Nouvelle Vague francesa. No caso
brasileiro, os filmes soviéticos eram reverenciados por cineastas como Nelson Pereira dos Santos,
Glauber Rocha e Leon Hirzman. Glauber foi além: homenageou Eisenstein no sertão baiano, ao
filmar cenas muito semelhantes ao icônico massacre da escadaria de Odessa (o trecho mais
marcante de O Encouraçado Potemkin) com os moradores de Monte Santo, no final do seu Deus e o
Diabo na Terra do Sol, filmado em 1963. Na França, Godard abandonou a Nouvelle Vague e foi
liderar um grupo que levava no nome Dziga Vertov.
Depois do fracasso da União Soviética, desmantelada em 26 de dezembro de 1991, a Rússia saltou
de cabeça em modelo político e econômico radicalmente distinto. Depois de duas duras crises
econômicas (a de 1992-94 e a de 1998-99), o país surfou no período de forte alta de preços de
produtos primários e seu onipresente líder Vladimir Putin retomou os ideais de “Grande Rússia” ao
recuperar o intervencionismo bélico (vide o que foi feito na Geórgia em 2008, na Ucrânia em 2014
e o apoio russo ao regime do ditador sírio Bashar Al Assad). Agora, a Rússia foi palco da Copa das
Confederações de 2017 e será da Copa do Mundo de 2018. Escrevia Eisenstein na primeira metade
do século passado:
No início dos anos 1920, todos viemos para o cinema soviético como para algo ainda
inexistente. Não chegamos a uma cidade já construída: não havia praças nem ruas
traçadas; nem mesmo pequenas alamedas tortuosas e becos sem saída, como os que
podemos encontrar nas metrópoles cinematográficas de hoje. Chegamos como beduínos
ou caçadores de ouro a um lugar de possibilidades inimagináveis, das quais apenas uma
pequena parte foi explorada até hoje.
O cinema russo, em meio a tudo isso, continua à espera de uma nova escola. O eco da censura que
aniquilou a explosão de criatividade parece continuar ensurdecedor.
______
PS: O autor agradece muito os comentários do professor-doutor de cinema da Universidade Federal
de Goiás (UFG), Rodrigo Cássio, para esse texto.
______
BIBLIOGRAFIA
EISENSTEIN, Sergei. A Forma do Filme. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2002.
FITZPATRICK, Sheila. A Revolução Russa. São Paulo: Todavia, 2017.
FURHAMMAR, Leif e FOLKE, Isaksson. Cinema e Política. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2001.
MONIZ BANDEIRA, Luiz Alberto. “O marxismo e a questão cultural” escrito em agosto de 1968
como prefácio de Literatura e revolução. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2007.
NABOKOV, Vladimir. Lições de literatura russa. São Paulo: Três Estrelas Editora, 2014.
RENMICK, David. O Túmulo de Lênin. São Paulo: Companhia das Letras, 2017.
ROSS, Alex. O resto é ruído: escutando o século XX. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.
SARAIVA, Leandro. “Montagem Soviética”, capítulo do livro História do cinema mundial,
organizado por Fernando Mascarello. Campinas: Papirus, 2006.
TROTSKI, Leon. Literatura e revolução. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2007.
TUCKER, Robert. Stalinism: Essays in Historical Interpretation. Inglaterra: Routledge, 1998.
ZIZEK, Slavoj. Às portas da revolução: seleção dos escritos de Lênin de fevereiro a outubro de
1917. São Paulo: Boitempo, 2005.
______
NOTAS
[1] Chaplin com “O Grande Ditador”, de 1939, e Welles com o inacabado “É Tudo Verdade”,
filmado no Brasil em 1942 com financiamento do governo americano, que tinha como objetivo
ampliar os laços com a América Latina durante a Segunda Guerra Mundial.
[2] Somente no fim da década de 1920 é que novas escolas voltaram a surgir, como o “cinema
poético” de Jean Vigo e Jacques Feyder. No mesmo período, Luís Buñuel começou o surrealismo
espanhol e Mizoguchi e Ozu iniciaram seus primeiros trabalhos no Japão. Essa agitação na França,
na Espanha e no Japão, no entanto, ocorreria somente depois do surgimento e da consolidação do
cinema soviético. Daí que dizemos aqui que, quando os russos começaram a formar sua escola
cinematográfica, em 1923-25, as escolas realmente consolidadas eram o antigo cinema italiano de
Turim (1911-1914), o de Nova York-Hollywood americano (1907 em diante) e o expressionismo
alemão (1919 em diante).
[3] O registro vem de Film Propaganda: Soviet Russia and Nazi Germany, do historiador Richard
Taylor (1979).
[4] Aliás, Godard criou um movimento denominado Groupe Dziga Vertov com o intuito de
radicalizar a mensagem (já em si radical) do mestre soviético. O grupo durou de 1968 a 1972. Um
dos filmes dirigidos por Godard neste período, e que faz parte do movimento, é “Vento do Leste”
(1970), que tem o brasileiro Glauber Rocha como protagonista.
[5] Os diários, referentes a anotações de 1933 a 1943, foram citados por ZIZEK (pg. 203, 2005).
Em uma anotação de 7 de novembro de 1937, Dimitroff deu a senha do stalinismo: “Por que
triunfamos sobre Trotsky e outros? Sabe-se que, depois de Lênin, Trotsky era o mais popular em
nossa terra… Mas tínhamos o apoio dos quadros intermediários, e eles explicaram às massas nossa
compreensão da situação… Trotsky não prestou atenção a esses quadros”.
[6] Segundo Zizek, a política de Stalin de 1928 em diante foi “resultado paradoxal da tentativa de
estabilizar a União Soviética como um Estado igual a qualquer outro, com limites e instituições
firmes – quer dizer, o terror foi um gesto de pânico, uma reação de defesa contra a ameaça à
estabilidade do Estado” (pg. 335).
[7] Em MONIZ BANDEIRA (1968).
[8] Algo semelhante também ocorreu em Cuba. Nos primeiros anos após a revolução de 1959, Fidel
Castro dirigia-se aos intelectuais de seu país pregando “a boa cultura”, que não precisava ser
política. Ele disse isso claramente em discurso de 13 de março de 1962: “prefiro um bom poema de
amor a um mau poema político, porque o mau poema político desserve à revolução”. Como
governou diretamente por longos 49 anos, quando passou o poder para o irmão Raúl, Fidel também
coordenou uma espécie de revolução dentro da revolução, fechando o regime, censurando as artes e
asfixiando o debate cultural, tal qual ocorrera na União Soviética pós-1928 e na China pós-1966.
[9] ROSS, pg. 249 (2009). Bukhárin só seria reabilitado em 1988, cinquenta anos depois.
[10] A trilha sonora de “Alexander Nevsky” foi assinada pelo grande compositor Serguei Prokoviev,
também perseguido pelo regime e que, tal qual Eisenstein, voltou a ganhar proeminência com o
sucesso do longa. Duraria pouco: logo a perseguição voltaria e Prokoviev morreria
desgraçadamente esquecido, no mesmo dia que Stalin, 5 de março de 1953, mas horas antes do
ditador.
[11] Kulechov, tal qual os demais, veria os recursos para financiar seus filmes praticamente
desaparecer a partir da década de 1930, quando também seu “formalismo” foi duramente atacado
ante a nova moda do “realismo socialista”. Seu último filme foi realizado em 1943 e ele passaria os
últimos 17 anos de sua vida sem filmar. Apesar das pressões e da execração pública, Kulechov foi o
único dos quatro grandes diretores soviéticos a viver durante o período de “desestalinização”,
iniciado em 1956: Kulechov faleceu em 1970, aos 71 anos de idade, tendo passado a vida toda
como professor de cinema em Moscou.
[12] Sokurov impressionou Tarkovsky, nos anos 1970, mas seus primeiros filmes foram censurados
pelos burocratas soviéticos. Seu cinema somente conseguiu deslanchar após o fim da URSS.