OS PROCESSOS TERAPÊUTICOS
NO VALE DO AMANHECER*
Amurabi Oliveira**
C
onhecer o Vale do Amanhecer (VDA) é uma experiência, no mínimo, singular,
afinal, a mistura eclética de símbolos e referências culturais deixa qualquer ne-
ófito encantado, o brilho, as cores, os cânticos, tudo conflui para que aquele
espaço seja, ao mesmo tempo, reconhecido como familiar, e também estranho,
completamente novo. O que o Vale produz em quem acaba de chegar é uma in-
tensa uma sensação de dejá vù.
Para os adeptos, a Corrente Indiana do Espaço, mais conhecida como VDA surge me-
diante a necessidade de preparar a humanidade para o novo milênio, o que
seria realizado principalmente por meio da cura espiritual desobsessiva, que é
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* Recebido em: 02.09.2013. Aprovado em: 23.11.2013.
** Doutor em Sociologia pela Universidade Federal de Pernambuco. Professor na Universi-
dade Federal de Alagoas. Pesquisador do Núcleo de Estudo das Religiões Populares e do
Laboratório Interdisciplinar de Estudo das Religiões. E-mail: amurabi_cs@hotmail.com
E foi em meio a esta “abertura ilimitada” que nos propusemos a imergir para investi-
gar a dinâmica dos processos terapêuticos, focando, principalmente no ritual
denominado Trono, por compreendermos a centralidade que ele possui no mo-
vimento. Utilizamo-nos como substrato para as considerações que tecemos
aqui a pesquisa etnográfica desenvolvida junto aos templos do VDA de Dois
Irmãos, na cidade de Recife (PE), e de São Lourenço da Mata (PE).
Para entendermos melhor a realidade que estamos investigando cabe aqui realizar uma
breve contextualização das chamadas “terapias alternativas”, que, em verdade,
abrangem um amplo leque de possibilidades, indo desde aquelas que se apro-
ximam mais de uma lógica religiosa, até aquelas que tendem a se aproximar
de um modelo mais “biomédico”, ainda que tendencialmente busquem se di-
ferenciar de ambos os extremos (TAVARES, 2012). Para Martins (1999, p. 80)
as terapias alternativas:
Elas tendem a constituir uma esfera de suma importância para o movimento NE, uma
vez que muitos daqueles que a vivenciam tendem a se limitar ao consumo e
contato de determinadas “técnicas terapêuticas”, muitas vezes de forma espo-
rádica, havendo destaque para algumas técnicas mais populares como a me-
ditação e a utilização de símbolos xamânicos (AMARAL, 2000). Laplantine
e Rabeyron (1989) utilizam-se da denominação “medicinas paralelas” para se
referirem ao fenômeno, incluindo aí também a medicina popular, e buscando
uma explicação social para o “sucesso” que essas têm alcançado ligam-no à
“[...] nebulosa cultural surgida na crise do racionalismo social” (LAPLANTI-
NE; RABEYRON, 1989, p. 37). Na mesma direção entendemos que:
Ao realizar uma ligação entre as aflições dos pacientes e sua própria biografia o tratamen-
to oferecido pelo Vale dista substancialmente do sistema biomédico, que se mar-
ca, justamente, pela separação entre o doente e sua doença (MARTINS, 2003).
Quando o cobrador se vai o apará volta a receber uma “entidade de luz”, que finalizará
a consulta, nesta terceira e última parte o mais importante são os encaminha-
dos dados, em especial no que diz respeito ao prosseguimento do tratamento
espiritual. Sempre há papel e lápis próximos para que o paciente possa anotar o
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este suscinto trabalho buscou desenvolver uma reflexão em torno dos processos terapêu-
ticos no VDA, focando em um único ritual: o Trono, ainda que haja outros que
ocorrem nesse movimento que mereciam uma análise pormenorizada. Mas, in-
teressa-nos aqui não apenas focar nas idiossincrasias presentes no Vale, mas sim
pensar quais sobre o que isso nos indica sobre o campo religioso mais amplo.
Circunscrevendo-nos aqui ao universo da NE, compreendemos que o Vale nos ajuda a
vislumbrar uma tendência mais ampla que se dá, justamente, no processo de
Notas
1 A pesar da distinção entre doutrina e religião não exatamente no discurso dos praticantes,
que por vezes buscam esclarecer-nos por meio do seguinte exemplo: “A gente não é uma
religião, é uma doutrina, religião é espiritismo, por exemplo”. Parece-nos que ao realizarem
tal afirmativa os adeptos estão mais preocupados em situar o VDA como uma “religião não
Referências