A palavra temperamento, por si só, já nos dá uma ideia do seu significado. Ela remete a
tempero. Algo que dá um gosto, um sabor peculiar à comida.
Melancólico: depressão
Colérico: violência
Sanguíneo: inconstância
Fleumático: desinteresse
Todo temperamento unilateral denota algum desequilíbrio, que na escola pode ser
tratado pedagogicamente. Este desequilíbrio é, na verdade, um tipo de força que a
criança tem demais, e que ela precisa “gastar”. Assim, o professor precisa aprender a
atuar com cada criança de acordo com as características de seu temperamento, e não
simplesmente tentar forçá-la a mudá-lo, aplicando castigos etc. Steiner afirma que o
temperamento está fundamentado na natureza mais íntima do homem e devemos levar
em consideração que só conseguiremos amenizá-lo de forma pedagógica. Só a partir da
exercitação dirigida do próprio temperamento é que ele cria forças para transformar-se.
“Sendo assim, não contamos com o que a criança não tem, mas com o que ela tem”.(4)
Steiner indica algumas estratégias básicas para lidarmos com as crianças de acordo com
seu temperamento predominante:
Sanguíneo
Mais do que qualquer outra, a criança sanguínea precisa desenvolver o amor pelo
professor. Para educá-la, devemos fazer-nos amar por ela. “Amor é a palavra mágica. É
por esse caminho indireto do afeto por uma determinada personalidade que toda a
educação da criança sanguínea precisa passar”. Esta criança caracteriza-se por não
conseguir manter algum interesse duradouro. Precisamos então tentar descobrir o que
pode interessá-la mais, e escolher atividades com as quais ela possa ser sanguínea.
Steiner afirma:
“Precisamos tratar de cercar a criança com toda sorte de coisas pelas quais ela nutre
um interesse mais profundo. Então ocuparemos a criança com tais coisas, por espaços
de tempo determinados, coisas em que um interesse passageiro é justificado, junto às
quais ela, por assim dizer, pode ser sanguínea, coisas que não merecem que a pessoa
mantenha interesse por elas. Devemos deixar que estas coisas falem à sanguinidade,
devemos deixar que elas atuem sobre a criança; e então devemos tirá-las dela, para
que a criança as deseje novamente e elas tornem a ser-lhes dadas. Devemos, assim,
deixar que elas atuem sobre a criança”.(5) Rudolf Steiner
Colérico
O colérico tem um grande ímpeto de liderar e realizar coisas. Para controlar este ímpeto
em sala de aula, o professor sempre lhe deve propor o que é difícil de realizar, sendo
importante, inclusive, que ele não consiga vencer todos os obstáculos. “Devemos criar
obstáculos, de forma que o temperamento colérico não seja reprimido, mas possa
justamente expressar-se através do confronto com determinadas dificuldades que ela [a
criança] tem que superar […] devemos organizar o ambiente de modo que esse
temperamento colérico possa esgotar-se ao ter de superar obstáculos.”
Assim, quando um colérico tem seu ataque de fúria, por exemplo, em vez de tentarmos
reprimi-lo na hora, o que costuma ser impossível, o remédio é dar-lhe logo uma
atividade difícil, para esgotar sua cólera, e comentar o motivo da cólera só depois que
ela houver passado.(6)
Melancólico
A criança melancólica tem a característica de achar que o mundo está contra ela, que
tudo acontece para feri-la, e apega-se profundamente aos obstáculos. A via de acesso do
educador para o melancólico são as dificuldades e sofrimentos que o próprio professor
teve de viver. A criança precisa sentir que o professor já passou por sofrimentos. Steiner
sustenta que “a criança melancólica é predisposta ao sofrimento; ela tem capacidade
para sentir dor, desengano; isso está arraigado em seu íntimo, não podendo ser extinto à
força – porém pode ser desviado […] Uma pessoa que, com sua narrativa, pode fazer
com que o melancólico chegue a sentir como ela foi provada pelo destino, essa traz um
grande benefício a esse tipo de criança”.(7)
De nada adianta tentar alegrar ou consolar um melancólico, a não ser fazer com que sua
melancolia piore ainda mais. É preciso que ele vivencie dores justificadas, que ele saiba
que sofrimentos existem, e como os homens podem triunfar sobre eles. E é importante
demonstrar que respeitamos os sacrifícios que ele faz e os obstáculos que supera. O
aluno melancólico precisa sentir que o professor tem uma atenção especial para ele, e
não devemos dar-lhe qualquer tarefa. Ele precisa sentir que está fazendo algo por
alguém, um sacrifício pelo professor, por ele ou pela classe; aí ele faz um bom trabalho.
Fleumático
A criança fleumática tem dificuldades para se envolver com o que acontece ao seu
redor. Seu ponto negativo é esta falta de interesse. Para conseguir seu interesse o melhor
caminho é promover sua integração com outras crianças, para que conviva com os
interesses de seus colegas. No entender de Steiner, não são as coisas por si mesmas que
atuam sobre o fleumático. Não é através de um assunto da tarefa escolar ou doméstica
que conseguiremos interessar o pequeno fleumático, e sim através do caminho indireto,
passando pelos interesses de outras crianças da mesma idade. É justamente quando as
coisas se refletem em outras pessoas que estes interesses se refletem na alma da criança
fleumática.(8)
Os coléricos são aqueles aos quais o professor vai pedir mais ajuda. Segundo afirma a
professora Celina Targa, para lidar com a energia do colérico é importante dar sempre
atividade para ele, inventar coisas para ele fazer! “Vai buscar na secretaria uma
apostila.” Ou então: “Faz favor! Abre a porta aqui pra mim que está calor.” “Abre a
janela.” “Apaga a lousa.” Devemos dar atividade para ele, que é disso que ele gosta e
ajuda a desanuviar.”(9)
Os fleumáticos devem ficar separados dos coléricos e perto do professor, pois tendem a
querer ser mais espectadores do que participantes da aula. Os fleumáticos não gostam de
muita agitação. Targa afirma que “então eles precisam ficar próximos do professor por
que daí a gente pode acompanhá-los melhor. […] Onde eles se sintam cercados diante
de um palco. Então as primeiras fileiras são um lugar muito bom, pois senão eles ficam
esquecidos”. Já os sanguíneos, como gostam muito das novidades, ajudam o professor a
disseminar o assunto entre os colegas. Podem ficar entre os coléricos e os fleumáticos.
Os alunos com maior potencial de tumultuar os trabalhos devem ficar nos extremos da
primeira fileira, e nunca no cento da sala. Os melancólicos, segundo Targa, “precisam
de calma. Eles não gostam dessa turbulência do colérico. Isso faz mal para o
melancólico. Então uma região mais acolhedora, quente, em geral perto das janelas num
cantinho”. De tempos em tempos o professor pode ir fazendo pequenas mudanças e
variações mas sempre sem perder de vista a harmonia da classe. Para atuar
positivamente sobre os temperamentos de seus alunos, é fundamental que o professor
trabalhe seu próprio temperamento. Esta disposição anímica é, segundo Steiner, de
suma importância, pois a criança é educada ‘de alma para alma’.
É incrível o que se passa nos fios subterrâneos que vão de uma alma à outra. Muita
coisa acontece quando os senhores permanecem impassíveis diante de uma criança
colérica, ou quando se interessam intimamente pelo que se passa numa criança
fleumática. Aí a própria disposição anímica terá, no plano suprassensível, um efeito
educativo sobre a criança. A educação se realiza pelo que os senhores são, […] em meio
às crianças. Nunca percam, realmente, isso de vista.(10)
Bibliografia