ISSN 1981-979X
Volume 42
Número 1
Janeiro/Abril de 2016
www.sbcs.org.br
A Ciência do solo
e o desastre de
Mariana
A agenda 2016
Publicação editada pela Secretaria Executiva da SBCS.
Tem por objetivos esclarecer as principais atividades
da Sociedade e difundir notícias de interesse dos associados.
Os conceitos emitidos em artigos assinados
são de exclusiva responsabilidade de seus autores,
não refletindo, necessariamente, a opinião da SBCS.
Permite-se a reprodução, total ou parcial, dos trabalhos,
desde que seja, explicitamente, indicada a sua origem.
O Boletim da SBCS é vendido, separadamente, a R$10,00
mais o valor de postagem.
Disponível para download no site da SBCS.
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www.facebook.com/sbcs.solos
Ficha catalográfica
Quadrimestral.
A partir do vol. 22, n.3 publicado em Viçosa.
ISSN a partir do vol. 32, n.3.
ISSN 1981-979X
Caros sócios
No início de maio, ao concluir esta edição, a Fan Page da SBCS alcançou o surpreendente número
de 10 mil amigos. É um número maior do que têm as mídias sociais de algumas grandes universida-
des brasileiras por onde passam milhares de alunos. O mais incrível é que podemos afirmar que os
nossos são amigos de verdade, daqueles fieis e leais que estão sempre ao nosso lado. Isso porque o
índice de curtidas é crescente a cada semana e as “descurtidas” são irrisórias. Ou seja, quem curte a
página e torna-se amigo pela indicação de um post acaba mantendo-se leal a ela e a visita quase to-
dos os dias. E 100% do alcance é “orgânico”, o que significa que o número total de pessoas que aces-
sa as publicações chegou a elas por interesse espontâneo, uma vez que a distribuição não é paga.
As publicações alcançam homens (56%) e mulheres (44%) de forma bem equilibrada. Mais de
90% dos acessos são feitos do Brasil, seguidos do Paraguai, EUA, Peru e Portugal. Por aqui, a maioria
do público acessa dos estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais, São Paulo e Goiânia.
Os elogios também são muitos. Quase todos destacam a credibilidade e a utilidade das postagens,
todas elas de interesse da ciência do solo. Os índices de interação também são altos. Há uma média
de 300 curtidas e de mais de 200 reações por postagem, uma vez que muitos compartilham ou se
manifestam de alguma maneira à publicação, potencializando o alcance das postagens. Da nossa
parte, há sempre um cuidado especial em selecionar temas que valorizem o conhecimento, ainda
que não seja produzido pelos sócios.
A Fan Page da SBCS faz parte de um esforço da Secretaria Executiva em promover a divulgação
científica para todos os públicos. Parece que estamos conseguindo! Popularizando a ciência do solo,
também estamos divulgando o trabalho de uma sociedade científica que se empenha em fortalecer a
ciência na qual milita. A publicação da Revista Brasileira de Ciência do Solo que, desde o início deste
ano, passou por uma grande reformulação editorial, também reflete este esforço da SBCS.
Com este esforço, a ciência do solo está presente em todas as plataformas de comunicação públi-
ca da ciência. No entanto, este empenho não tem se refletido em um substancial aumento de sócios.
Todo início de ano a Secretaria Executiva revive o drama de aguardar as renovações das anuidades
para prever os gastos com a manutenção das rotinas para que os resultados de nossas pesquisas e
nosso trabalho circule para diferentes públicos. É muito importante ressaltar que todos os membros
da Secretaria Executiva, Corpo Editorial e Conselho Diretor trabalham muito e gratuitamente. Mas há
uma dinâmica de secretaria, de organização de eventos e publicações que precisam ser custeadas
pelos sócios. Estes custos estão cada vez maiores e o número de sócios mantém-se estável.
Para todos nós que trabalhamos com a ciência do solo deveria ser uma honra pertencer a uma
sociedade científica prestigiada. Para ter uma inserção política que valorize nosso trabalho é preciso
ser forte e participante e isso depende muito do que a sociedade brasileira conhece e pensa de nós.
Neste sentido, pedimos mais uma vez aos sócios que se empenhem em convidar colegas e alunos
para que se associem e participem ativamente de Núcleos Regionais e Comissões Especializadas.
Isso é participação política e cidadã. O benefício é para todos nós.
Nesta edição do Boletim vamos tratar do desastre de Mariana refletindo sobre o que a ciência do
solo pode fazer para minimizar os danos ambientais, econômicos e sociais desta tragédia. Também
divulgamos um artigo sobre a importância da conservação dos solos no Brasil, aproveitando a data
comemorativa, em abril. No mais temos várias notícias sobre eventos que serão promovidos ainda
este ano pela Sociedade Brasileira de Ciência do Solo que você, caro sócio, está ajudando a fortale-
cer.
Boa leitura a todos e não deixem de acompanhar nossa Fan Page.
Abraço
Fatima Maria de Souza Moreira
Presidente da SBCS
Notícias
4 Está no ar uma nova Revista
Brasileira de Ciência do Solo
12
Núcleo Regional Amazônia Oriental (MA, TO, PA, AP)
Eduardo do Valle Lima (UFRA)
RBMCSA discute conservação
Núcleo Regional Noroeste (AC e RO) e manejo do solo e da água
Alaerto Luiz Marcolan (Embrapa Rondônia)
Núcleo Regional Nordeste (BA, SE, AL, PB, PE, CE, RN, PI)
Júlio César Azevedo Nóbrega (UFRPE)
Núcleo Regional Centro-Oeste (MT, MS, GO, DF)
Milton Ferreira de Moraes (UFMT)
Núcleo Regional Leste (MG, ES, RJ)
13 FERTBIO 2016
Marcos Gervasio Pereira (UFRRJ)
Núcleo Estadual São Paulo (SP)
Zigomar M. Souza (Unicamp)
Núcleo Estadual do Paraná
Arnaldo Colozzi Filho (IAPAR)
14 Uso do solo brasileiro pode melhorar
sem atingir áreas de preservação
Núcleo Regional Sul (RS e SC)
Vanderlei R. Silva (UFSM)
SECRETARIA DA SBCS
Secretária Executiva da SBCS: Cíntia Costa Fontes
Jornalista da SBCS : Léa Medeiros
15 Amazon Soil 2016
CONSERVAÇÃO DO SOLO NO
BRASIL: histórico, situação 28
atual e o que esperar para o
futuro
Variáveis
e unidades SI1/ 34
Sociedades de Ciência do Solo
dos países do grupo BRICS 38
BOLETIM INFORMATIVO DA SBCS | JAN - ABR 2016 3
NOTÍCIAS
conservação do solo
Na semana entre os dias 10 e 17 de abril, a SBCS fez uma
campanha na sua fan page para despertar a atenção para o
Dia Nacional da Conservação do Solo, comemorado dia 15. A
cada dia era postada uma nova mensagem conclamando as
pessoas à refletirem e a comemorarem a data. Vale destacar
que no dia 15, a postagem um simples cartão comemorativo
foi compartilhada por mais de 800 amigos e visualizada por
mais de 80 mil pessoas.
Uma destas postagens chamava a atenção para dois arti-
gos publicados no site da SBCS
• O primeiro, do professor da UDESC, Ildergadis Bertol, tra-
ta do histórico, situação atual e o que esperar para o futuro
da conservação do solo no Brasil e encontra-se publicado
também nesta edição do Boletim.
• O segundo, dos professores Marcos Gervásio e Lúcia He-
lena dos Anjos e do engenheiro ambiental João Henrique
Gaia-Gomes, todos da UFRRJ, trata da degradação dos ção do Solo demonstra esta experiência de sucesso mobili-
solos no ambiente de “Mar de Morros” na região Sudeste: zando um número cada vez maior de jovens pesquisadores e
o exemplo do Vale do Paraíba do Sul. estudantes em torno do tema.
Os autores pertencem à COMISSÃO 3.3 da SBCS– Manejo O Dia Nacional da Conservação do Solo é uma home-
e Conservação do Solo e da Água e prontamente aceitaram nagem ao nascimento de Hugh Hammond, em 1881. Ele é
ao convite da Secretaria Executiva da SBCS para produzirem considerado pioneiro na conservação do solo nos Estados
textos que subsidiassem o debate sobre a conservação do Unidos. A data foi instituída por iniciativa do Mapa, em 13 de
solo no Brasil. A chamada feita no Facebook para a leitura dos novembro de 1989 (Lei 7.876), com o objetivo de aprofundar
artigos no site surtiu excelentes resultados e os artigos foram os debates sobre a importância do solo como um dos fatores
lidos e compartilhados por muitas pessoas. básicos da produção agropecuária.
A SBCS tem usado cada vez mais as mídias sociais para Para acessar os artigos citados nesta reportagem visite o
provocar reflexões e popularizar a ciência do solo. A experi- site da SBCS: (http://www.sbcs.org.br/?post_type=noticia_
ência com as comemorações do Dia Nacional da Conserva- geral&p=5023
Ministério prevê
mapeamento do solo
e criação de banco de
dados
A presidente da SBCS, Fatima Moreira, também partici-
pou das comemorações do Dia Nacional da Conservação do
Solo representando a Sociedade em um seminário sobre
uso, manejo e conservação do solo: desafios para a produ-
ção sustentável, promovido pelo Ministério do Meio Am-
biente e pela Enagro, em Brasília, dia 14 de abril.
Neste evento, representantes do Governo Federal apre-
sentaram proposta de projeto de lei que institui a Política
Nacional de Conservação do Solo e da Água no Meio Rural
para regulamentar as práticas de manejo de solo e o uso de O Seminário apresentou uma proposta de projeto de lei sobre o uso do
recursos hídricos. solo e da água no meio rural.
Inteligência artificial
para amostragem do solo
O pesquisador da UFRRJ e mem- O spsann resolve o problema de
bro da Comissão de Pedometria da encontrar configurações amostrais
SBCS, Alessandro Samuel Rosa, lan- ótimas usando uma técnica chamada
çou a versão 2.0-0 do pacote spsann, recozimento simulado, onde milha-
já disponível para descarregar no res de configurações amostrais são
CRAN. O pacote fornece métodos para avaliadas sequencialmente até que a
otimizar a configuração de amostras configuração amostral ótima para o
espaciais utilizando o recozimento problema à mão seja encontrada. O
simulado espacial. A nova versão im- processo de busca funciona assim:
plementa múltiplas funções para várias spsann inicia com uma configura-
finalidades, tais como estimativa do ção amostral qualquer e avalia a sua
variograma, estimativa da tendência qualidade de acordo com o problema
espacial e interpolação espacial. Uma à mão;
função de recozimento simulado es-
Uma nova configuração amostral é
pacial de uso geral permite ao usuário
produzida mudando a localização de
definir sua própria função objetivo.
uma das amostras.
Técnicas modernas de mapea-
A qualidade da nova configuração
mento do solo usam o modelo estatís-
amostral é avaliada. Se for melhor do
tico Y(s) = m(s) + e(s) para explicar a
que a anterior, a nova configuração
correlação empírica entre as proprie-
amostral é aceita (usada para substi-
dades do solo (Y) e as condições am-
tuir a anterior). Contudo, também há
bientais usando um número limitado
chance de ela ser aceita se for pior.
de amostras (s). Para isso é necessá-
Isso serve para spsann escapar de
rio que a configuração amostral seja
soluções inferiores baseando-se no
ótima para identificar e estimar ambos
princípio de que, por vezes, é preciso
os componentes determinísticos (m)
dar um passo atrás para encontrar so-
e estocástico (e) de variação espacial
luções melhores.
do solo, e permitir realizar predições
espaciais com a menor incerteza pos- O processo continua até que ne-
sível. Obter uma amostra que atenda nhuma nova configuração amostral
aos três objetivos simultaneamente é seja melhor do que a anterior. Quanto
um desafio, dado que a configuração mais próximo de encontrar a configu-
amostral ótima para cada objetivo é ração amostral ótima, menor é a chan-
diferente. ce de aceitar soluções piores.
de ciência do solo
De 31 de agosto a 2 de setembro, o Núcleo Regional Sul
(NRS) da SBCS realizará, em Frederico Westphalen, RS, a XI
Reunião Sul Brasileira de Ciência do Solo. O evento terá como
tema “Qualidade do Solo & Ambiente de Produção”.
Segundo a Comissão Organizadora, o tema tem como ob-
jetivo provocar uma reflexão sobre como estamos cuidando
do nosso ambiente de produção. Será que todo o conheci-
mento gerado nas nossas instituições de ensino e de pesqui-
sa está sendo aplicado na busca pela qualidade do solo? Será
que o nosso ambiente de produção é sustentável?
O evento será composto de apresentação de trabalhos
científicos na forma de pôsteres, conferências e painéis, reu-
niões das sessões técnicas da SBCS e a assembleia geral. Nas
conferências e painéis serão debatidos temas atuais como:
História da Ciência do Solo nos estados do RS e SC, Qua-
lidade de Solos, Aspectos Ambientais de Contaminação de Mais informações no site do NRS. http://www.sbcs-nrs.
Solos, Dinâmica de Carbono e Erosão nos Ambientes de Pro- org.br/ e na fan page: Núcleo-Regional-Sul-Sociedade-Brasi-
dução. leira-de-Ciência-do-Solo
RBMCSA discute
conservação
e manejo do solo e da água
Principal evento da área, a XX Reunião
Brasileira de Manejo e Conservação
do Solo e da Água, será realizada
entre os dias 20 e 24 de novembro em
Foz do Iguaçu
Com o tema “O solo sob ameaça:
conexões necessárias ao manejo e
conservação do solo e água”, o even-
to é promovido pela SBCS e realizado
pelo Instituto Agronômico do Paraná
(IAPAR) e Núcleo Estadual Paraná da
Sociedade Brasileira de Ciência do
Solo (NEPAR-SBCS).
O objetivo é suscitar discussões
acerca dos grandes problemas da
conservação do solo e promover sis-
temas sustentáveis de uso dos recur-
sos solo e água para todos os biomas
brasileiros, além de contribuir com
soluções sobre o aumento de produ-
ção aliado à conservação das terras
agrícolas.
A programação do evento mes-
cla a apresentação de novos conhe-
cimentos científicos com temas de
cunho educacional, de difusão de forma oral ou de pôsteres, com resul- gião de solos férteis que abrigam uma
tecnologia e até mesmo aspectos tados de pesquisa atuais e inovadores agricultura extremamente moderna
legais que envolvem a conservação de todas as subcomissões científicas e produtiva, além das belezas e en-
do solo. São convidados a contribuir, ligadas ao manejo e conservação do cantos naturais das suas cachoeiras e
professores e pesquisadores da mais solo. Esta prevista também a realiza- parques em conjunto com boa malha
alta qualificação e experiência, além ção de minicursos e excursões técni- aérea, capaz de receber participantes
de empresas e representantes da cas a campo. de todo o País.
administração pública que têm ação Os organizadores esperam um
interfacial com o tema. Serão quatro O local do evento público de 600 participantes entre
dias de intensos debates, onde se- A cidade das Cataratas foi escolhi- professores, pesquisadores e exten-
rão realizadas quatro palestras em da para sediar o evento por três moti- sionistas, profissionais da iniciativa
sessão plenária única e 14 painéis vos: a profunda ligação da região com privada, estudantes de graduação,
de discussão técnica com duas ou o tema por situar-se na convergência pós-graduação e agricultores, e a
três contribuições técnicas em cada, de duas das maiores bacias hidro- apresentação de 300 trabalhos cien-
o que irá proporcionar aos congres- gráficas do Brasil, a do Rio Paraná e tíficos.
sistas a discussão e a apropriação de a do Rio Iguaçu, que são precursoras O site da XX RBMCSA (www.
extenso conteúdo técnico. da formação da Bacia do Prata, uma rbmcsa2016.com.br) e o Facebook
Além das palestras e painéis, serão das mais importantes da América do (www.facebook.com/xxrbmcsa) já
apresentados trabalhos científicos na Sul. Além disso, trata-se de uma re- estão no ar com notícias, depoimen-
A RBMCSA é realizada há
mais de cinco décadas
O “I Congresso Nacional de Con-
servação do Solo (CNCS)” aconteceu
na semana de 17 a 23 de julho de
1960, em Campinas (SP), preambular
evento dedicado a essa temática no
Brasil. Três anos depois, a segunda
edição foi realizada em Belo Horizonte
(MG), em 1963.
Em 1970 a Sociedade Brasileira de
Conservação do Solo incorporou-se
à Sociedade Brasileira de Ciência do
Solo (SBCS). Porém, além dos con-
gressos de conservação dos solos ou-
tros eventos similares passaram a ser realizado em Passo Fundo (RS) e em Em 1990, quando da realização si-
promovidos. 1980, em Recife (PE). No mesmo ano, multânea do “VIII Congresso Brasilei-
No Paraná, a primeira reunião de em Brasília-DF, foi realizado, após um ro de Conservação do Solo” e do “8º.
um grupo de pesquisadores interes- intervalo de 17 anos, o III Congresso Encontro Nacional de Pesquisa Sobre
sados em conservação do solo, acon- Brasileiro de Conservação do Solo, Conservação do Solo”, realizados pelo
teceu em 1975, em Londrina (PR), quando foi substituída a palavra “na- IAPAR, foi decido pela fusão dos dois
realizado pelo Instituto Agronômico cional”. Os eventos que se seguiram eventos que, a partir de então, pas-
do Paraná (IAPAR), com o título de foram realizados em Campinas - SP saram a ser nominados de “Reunião
“Encontro Nacional de Pesquisa sobre (1982), Porto Alegre-RS (1984), Cam- Brasileira de Manejo e Conservação
Conservação do Solo com Simulador po Grande-MS (1986) e João Pessoa do Solo e da Água (RBMCSA)”, rece-
de Chuva”. Em 1978, esse evento foi - PB (1988). bendo a mesma sequência numérica.
Paisagens de Lama:
Os Tecnossolos para
recuperação ambiental de
áreas afetadas pelo desastre da
barragem do Fundão, em Mariana
Foto: Hugo Galvão
Carlos Ernesto G. Reynaud Schaefer O restabelecimento dos ecossiste- diretamente e fortemente afetada em
Eliana Elizabet dos Santos mas afetados por desastres socioam- sua integridade ambiental. Por muito
Elpídio Inácio Fernandes Filho bientais da magnitude do acidente da tempo será difícil de estimar todos os
Igor Rodrigues de Assis Barragem do Fundão, em Mariana, danos com alguma certeza!
suscita questões mais imediatas e ób- A ruptura repentina gerou o deslo-
vias, vinculadas à forte degradação da camento de uma onda desproporcio-
paisagem total: rios, planícies fluviais, nal de rejeitos que galgou a barragem
terraços, áreas rurais habitadas, estru- de Santarém, a jusante, e desceu de
turas, pontes, animais, coletividades, forma avassaladora pelos rios Gualaxo
zonas urbanas e todo um modo de do Norte e Carmo até atingir a barra-
vida e um tecido social rompido, des- gem de Candonga. Lá, boa parte des-
continuado ou, ainda pior, irremedia- tes rejeitos ficou represada, mas aca-
velmente perdido. Em meio à miríade bou extravasando um volume ainda
de problemas correlatos, é próprio de gigantesco, que permanece na calha
uma tragédia como essa uma reflexão do Rio Doce. Neste trecho de mon-
sobre nosso papel na natureza e do tante, desde a barragem e por mais
quanto estamos vulneráveis a desas- de 95 km, boa parte das margens dos
tres que trazem consequências impon- terraços baixos, até 4 metros de altura,
deráveis sobre tantas facetas socioam- e toda planície fluvial e leito menor, fo-
bientais. ram recobertos ou assoreados por um
Em termos práticos, o desastre imenso volume de rejeito, atingindo
da Barragem do Fundão evidenciou a profundidade máxima de 200 cm de
morte e a destruição em sua face mais material, além de galhos e restos orgâ-
temível: 17 vidas humanas perdidas, nicos mais leves (Figura 1).
milhões de animais aquáticos e terres- Toda essa dimensão trágica é, con-
tres mortos, uma Bacia Hidrográfica tudo, indutora imediata da busca de
essencial para Minas e Espírito Santo, soluções técnicas e medidas práticas
do entorno possuem valores maiores, H+Al 1,06 1,33 1,53 1,07 3,28 1,23
com destaque para os Cambissolos CTC (T) 2,96 2,09 3,78 1,54 5,67 2,3
das encostas. O Alumínio trocável é MO dag/kg 0,91 1,54 0,85 0,69 1,42 1,03
praticamente nulo em todos os solos P-rem mg/L 28,68 11,07 29,57 11,2 24 9,4
e o teor de MO encontrado foi baixo Fe 499,2 476,01 610,3 528,28 604,72 556,04
e pouco variável, tendo em vista que mg/dm3
Pb 0,41 0,44 0,73 1,38 1,57 1,45
os solos adjacentes foram “truncados”
Areia Grossa 0,16 0,18 0,24 0,21 0,26 0,08
pela erosão antes da deposição da
Areia Fina 0,33 0,19 0,36 0,21 0,2 0,08
lama, perdendo todo o horizonte kg/kg
A mais rico em matéria orgânica. Silte 0,32 0,18 0,16 0,1 0,14 0,07
Contudo, como o rejeito da mineração Argila 0,18 0,17 0,23 0,19 0,39 0,11
é normalmente rico em manganês, Dens. Solo 1,41 0,53 _ _ _ _
os valores devem ser afetados pela Dens. Solo pro-
1,54 0,42 _ _ _ _
oxidação do dicromato pelo manganês fundidade
g/cm3
reduzido presente, e os teores de MO Dens.Part 2,75 0,29 _ _ _ _
seriam, assim, bem menores. Por outro Dens.Part. Pro-
2,8 0,23 _ _ _ _
lado, estudos prévios indicaram baixos fundidade
Medidas de recuperação
e cenário prognóstico nas
áreas cultivadas
Para exemplificar os processos de
recuperação em curso, escolheu-se
a maior área de Tecnossolos, de cer-
ca de 11 ha de terra de várzea soter-
rada pela “lama”, pertence à fazenda
Porto Alegre, voltada à pecuária lei-
teira de alto rendimento, com muitas
instalações de currais e ordenhas se-
veramente afetadas pela inundação
e soterramento. Imediatamente após
o acidente, o proprietário solicitou à
Samarco o empenho na redução ime-
diata dos prejuízos e que fosse traçado
teores de Mn nas barragens de rejeitos um plano de recuperação das áreas
de Germano e Santarém, com a lama do atingidas. O grupo da UFV sugeriu, en-
rejeito sendo constituída, basicamente, tão, que o material tecnogênico (lama)
de Goethita (63 %), Hematita (24 %), fosse tentativamente recoberto com
Quartzo (11 %) e Caulinita (7%), o que uma camada de solo fértil oriunda do
corrobora a baixíssima CTC e condição entorno, o que foi imediatamente im-
eletropositiva. A determinação de plementado com apoio da empresa.
C neste material deve ser realizada Foi realizado uma gradagem prévia
em analisador elementar, por da lama que se encontrava assentada
infravermelho. e selada, com uma camada de 10 cm
A lama possui teor de P extraível de solo solto para permitir romper o
por Melich I mais alto (média 9,34 mg/ selamento natural do material de alta
dm3) que os Cambissolos/ Argissolos densidade e resistente à penetração.
(5,38 mg/dm3) e menores que os Após essa etapa de gradagem, foi de-
Neossolos Flúvicos/Gleissolos (11,05 positado cerca de 50 cm de solo fértil
mg/dm3). São teores relativamente devidamente sistematizado e nivelado,
altos e podem tanto refletir a intensa permitindo recompor o terraço origi-
mistura do material com os solos nal (Figura 2). Os resultados finais pa-
superficiais arrastados pela erosão na recem muito promissores e revelam a
passagem da onda de lama, quanto a exequibilidade de estender a prática à
presença de arsênio, pois o rejeito é boa parte da área afetada.
normalmente pobre em P. Neste caso, Nas encostas onde foi desaterrado
o método colorimétrico não se aplica, o material de solo eutrófico, evitou-se
e teores totais devem ser investigados a exposição do saprolito e foram to-
por espectrometria de emissão óptica madas medidas de recomposição dos
(ICP ou MS). Os teores de Na são taludes para minimizar os processos
maiores na lama e devem refletir erosivos. Já estão sendo implantadas
efeitos do tratamento do minério. pastagens e capineiras nos locais, e
No campo, observa-se um intenso estamos iniciando a montagem de um
e generalizado selamento superficial, experimento para comparar os Tec-
agravado pela erosão preferencial nossolos e os diferentes tratamentos/
do material fino, mais dispersável, estratégias para sua recuperação pro-
Arte:Carlos Schaefer
Figura 2. Cenário atual quatro meses após o desastre. Corte e aterro das encostas vizinhas para promover a formação de um novo
terraço e Tecnossolo com melhores características físicas e químicas (Depósito de Cambissolo sobre lama gradeada). Fazenda Porto
Alegre.
dutiva. O proprietário destinou uma e OLSZEWSKA, 2010); transformações Degradadas (PRAD). Neste sentido,
área experimental para que a UFV minerais e geoquímicas (UZAROWICZ o cercamento das áreas ribeirinhas,
realize ensaio de acompanhamento e SKIBA, 2011) e recuperação de estru- já afetadas, pode auxiliar muito na
das mudanças físicas, químicas e bio- tura e funções ecológicas (MONSERIE recuperação da vegetação ciliar
lógicas com diferentes tratamentos et al., 2009; SERE et al., 2010). (oportunidade aberta pelo desastre)
do material, com e sem sobreposição já que praticamente pouca vegetação
do solo. O projeto trabalha com a di- Restaurar a Vegetação ciliar remanescente existia no trecho
mensão conceitual de Tecnossolos, nas Áreas de Preservação mais afetado. Quatro meses depois,
ou seja: solos que se desenvolvem de Permanente contudo, o simples cercamento e
substratos decorrentes da atividade Além dos Tecnossolos gerados isolamento de acesso aos animais
antrópica, inclusive da mineração, e pelo desastre e perdas de áreas já revela sinais de recuperação
que podem sofrer intervenções visan- cultivadas, houve uma perda incipientes, que podem e devem
do a recuperação da qualidade. igualmente significativa da vegetação ser assistidos por medidas diretas
Para ser considerado um Tecnosso- nas APPs no trecho estudado. que acelerem e facilitem a sucessão
lo, o solo artificial deve conter mais de Segundo o IBAMA (nota técnica) inicial. Isso poderá permitir imaginar
20 % de material tecnogênico nos pri- houve a destruição parcial ou total de uma situação de recuperação de um
meiros 100 cm (IUSS Working Group 1469 ha ao longo de 77 km de cursos corredor contínuo de Mata Atlântica,
WRB 2006), e embora sejam mais d’água, em boa parte APP’s. O avanço hoje praticamente inexistente.
comuns em áreas urbanas, têm sido da gigantesca onda de lama, logo após A prioridade deve ser
cada vez mais detectados em larga o desastre, praticamente devastou ou dada às espécies nativas de rápido
escala em áreas rurais, onde represen- arrancou a totalidade de indivíduos crescimento, típicas de sucessão
tam as maiores áreas contaminadas arbóreos mais próximos à calha dos inicial, que permitam criar (ou recriar)
do planeta (ROSSITER, 2007). Uma rios, com exceção dos bambuzais que os gradientes ambientais dos solos
das principais aplicações dos estudos se curvaram ou quebraram sem sofrer preexistentes, facilitando a entrada de
de Tecnossolos tem sido sua recupe- arranque total. espécies mais tardias da Mata Atlântica,
ração para permitir o uso sustentável e O soterramento concomitante com capacidade para sustentar a
livre de riscos maiores. Assim, estudos do solo, banco de semente e plantas fauna ribeirinha, igualmente arrasada
diagnósticos dos Tecnossolos da área mais jovens ou de menor porte, pelo desastre. Todo um trabalho
afetada fornecem o modelo ideal para comprometeu severamente a sucessão com espécies facilitadoras deve ser
sua recuperação, como denotam es- vegetal. As áreas mais críticas irão buscado, e identificadas as espécies
tudos recentes com ênfase na Matéria necessitar de um amplo e integrado que mostraram maior resiliência e
Orgânica (ZIKELI et al., 2002; HOWARD plano de recuperação de Áreas adaptação aos Tecnossolos gerados.
Referencial
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ROSSITER D G. Classification of Urban and Industrial
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estudos de performance que comparem a sucessão vegetal Journal of Soil and Sediments 7(2)96-100, 2007.
nos dois cenários de Tecnossolos (com e sem lama exposta). SCHAEFER CEGR, CANDIDO HG, CORREA GR, PEREIRA
Deve-se, ainda, buscar a conexão dos fragmentos para A, NUNES JA, SOUZA OFF, MARINS A, FERNANDES FILHO
facilitar a reintrodução de espécies localmente extintas. E, KER JC. Solos desenvolvidos sobre Canga Ferruginosa no
Talvez não seja realmente factível imaginar uma Brasil: uma revisão crítica e papel ecológico de termiteiros.
restauração ecológica em nível pré-desastre, com In: Geossistemas Ferruginosos do Brasil (org. F.F Carmo & L.
heterogeneidade ambiental restaurada, dada a complexidade Y. Kamino, Edi. Int Pristino.) 2015. pp. 77-102.
das perdas correlatas (macrofauna, mesofauna, solos, UZAROWICZ L, SKIBA S Technogenic soils developed
nascentes, afluentes menores) de todo o sistema on mine spoils containing iron sulphides: mineral
afetado. Contudo, o paradigma da restauração ecológica transformations as an indicator of pedogenesis. Geoderma,
contemporâneo visa mais a integridade, resiliência e 163:95–108, 2011.
sustentabilidade dos ecossistemas como objetivos a serem ZIKELI S, JAHN R, KASTLER M. Initial soil development
buscados (Martins et al., 2005). Isso nos parece possível e in lignite ash landfills and settling ponds in Saxony-Anhalt,
realizável no trecho Candonga - Fundão. Ressalta-se que Germany. J Plant Nutr Soil Sci 165:530–536, 2002.
uma característica marcante dos trópicos é sua capacidade
de recuperar-se de distúrbios. Assim, a ciência do solo pode
Autores: Carlos Ernesto G. Reynaud Schaefer é professor do
ser uma grande mediadora que concilie os imperativos da Departamento de Solos da Universidade Federal de Viçosa
recuperação, em suas dimensões físico-química e biótica, de (reyschaefer@yahoo.com.br)
forma mais integrada e harmoniosa. Este ambiente, parcial Eliana Elizabet dos Santos é pesquisadora e aluna de doutorado
ou plenamente recuperado, beneficia toda a sociedade local no Departamento de Solos da Universidade Federal de Viçosa
e, desde já, podemos imaginar alguns frutos positivos e (liliisantos@hotmail.com)
Elpídio Inácio Fernandes Filho é professor do Departamento de
lições educativas dessa tragédia, usando este exemplo como Solos da Universidade Federal de Viçosa (elpidio@ufv.br)
modelo de superação para situações de igual complexidade Igor Rodrigues de Assis é professor do Departamento de Solos da
no Brasil. Universidade Federal de Viçosa (igor.assis@ufv.br)
desastre de Mariana e
dos solos na Bacia do
Rio Doce
João Herbert Moreira Viana
Adriana Monteiro da Costa
sido retrabalhado e misturado aos sedi- relativos à capacidade de retenção de mento dos processos de decomposi-
mentos naturais do rio e das margens. cátions e ânions, à necessidade de adi- ção dos reagentes (etil-aminas e amido
Além disso, também por ter sofrido se- ção ou suplementação de corretivos e de milho) do processo de flotação do
leção e segregação durante o processo de fertilizantes e indicar procedimentos minério de ferro, presentes na lama de
de transporte e deposição, pode diferir de manejo, para evitar problemas cola- rejeito.
daqueles presentes na barragem. terais pela adubação, como a lixiviação
Da mesma forma, as características de nutrientes para os rios. Também aju- Terceira contribuição
do processo e dos locais de deposição darão a prever e entender como será a
A terceira contribuição consiste no
fazem com que esses ambientes sejam evolução desse material, na medida em
estabelecimento das estratégias de re-
distintos das áreas já estudadas nas mi- que as ações promovam o estabeleci-
cuperação das áreas afetadas e de seu
nerações. Assumindo-se que esse ma- mento dos processos pedogenéticos,
acompanhamento e monitoramento.
terial não seja removido, em função do como a acumulação de matéria orgâni-
Essa etapa incluiria a adaptação e/ou o
custo, do tempo e do impacto gerado ca, a formação de estrutura e a translo-
desenvolvimento de técnicas para pro-
pela remoção da gigantesca quantida- cação de materiais nos perfis.
mover a cobertura do terreno por uma
de (da ordem de dezenas de milhões de A física do solo tem papel importan- vegetação, que permita o desenvolvi-
toneladas), torna-se necessário conhe- te na compreensão do comportamento mento dos processos pedogenéticos,
cer o comportamento desse material in do material com relação aos processos a acumulação de matéria orgânica, o
situ, e de sua interação com a biota. de fluxo de água e de gases, à dinâmica estabelecimento de fauna e microbiota
Desdobram-se, assim, as pesquisas da água e às restrições mecânicas ao edáficas funcionais, a estabilização físi-
em várias vertentes. A Química e a Mi- desenvolvimento de plantas. Também ca e a redução da erosão e a recupera-
neralogia podem fornecer as informa- vai permitir avaliar o desenvolvimento ção funcional das áreas, em função dos
ções necessárias ao entendimento do da estrutura e os processos erosivos objetivos previamente estabelecidos.
comportamento desse material, seja nas áreas. A microbiologia tem papel Dentre os objetivos destacam-se o res-
como fonte de nutrientes, seja como importante na escolha de estratégias tabelecimento dos processos produti-
eventual fonte de elementos tóxicos. de revegetação e no monitoramento da vos ou o restabelecimento de vegeta-
Essas informações irão subsidiar os evolução da população de microrganis- ção com funções ambientais.
estudos sobre a fertilidade do material, mos nos locais atingidos e vizinhanças.
Estas técnicas incluiriam a escolha
ajudando a estabelecer seus atributos Também poderá auxiliar no entendi-
de espécies de plantas e microrganis-
CONSERVAÇÃO
DO SOLO NO
BRASIL:
histórico, situação
atual e o que esperar
para o futuro
Ildegardis Bertol
instalada em solo já degradado devido A presença de resíduos culturais na que a cobertura do solo era suficiente
ao PC anterior, o que resultou numa sé- superfície do solo mascarava a erosão para controlar a erosão, criando um
rie de vantagens e também de proble- que continuava a ocorrer, e aumentava clima favorável à eliminação dos ter-
mas. As vantagens foram redução da na SD embora ainda em menor quan- raços agrícolas e cultivo morro-a-bai-
erosão (Figura 1) e custos de produção, tidade do que no PC, tornando-se um xo. Tal fato constitui-se atualmente no
enquanto, os problemas ocorriam devi- sério problema para a sobrevivência da mais grave problema da SD no Brasil,
dos ao efeito residual no solo deixado SD (Figura 2). As perdas de água que do ponto de vista de conservação do
pelo PC adotado anteriormente. Nessas eram altas na SD nunca foram conside- solo. Os agricultores acreditam que os
lavouras, parte ou toda a camada su- radas como um problema, já que, apa- resíduos culturais têm, por si só, con-
perficial do solo havia já sido perdida rentemente, a água “saía limpa” das la- dições de controlar a erosão hídrica na
pela erosão durante o período de ex- vouras. Isto era motivo para afirmações SD. Para eles, isto ocorre independen-
ploração com o PC. A área de cultivo como “a erosão hídrica estava final- temente do relevo, tipo e condições
em SD começou com cerca de 100 ha, mente controlada nas lavouras do Brasil físicas do solo, tipo da SD, forma da se-
em 1969, em algumas lavouras em ca- com o advento da SD”. Tais afirmações meadura em relação ao declive, carac-
ráter experimental, inicialmente no Rio eram feitas por agricultores que não terísticas das chuvas, tipo, quantidade
Grande do Sul e em seguida no Paraná, mais enxergavam erosão, por técnicos, e forma de manejo de resíduo cultural,
atingindo atualmente aproximadamen- inclusive agrônomos representantes dentre outros aspectos. Devido à elimi-
te 30 milhões de ha. de empresas de insumos variados e nação dos terraços, os agricultores pas-
A redução da erosão hídrica foi uma de cooperativas que, por desconheci- saram a efetuar a semeadura na dire-
das grandes vantagens da adoção da mento do assunto, e/ou, para agradar ção de maior comprimento na lavoura,
SD, comparada ao tradicional PC, do os agricultores, afirmavam não mais muitas vezes morro abaixo, quase nun-
ponto de vista da conservação do solo. existir erosão. Com isso, era mais fácil ca em contorno. Como consequência,
As perdas de solo eram diminuídas, ini- comercializar os insumos. Vendedores as perdas de água e as perdas de solo
cialmente, em até mais de 90% enquan- de máquinas agrícolas também afirma- são altas, às vezes tanto quanto as que
to as perdas de água eram de menor vam que os terraços eram um proble- ocorriam no PC.
magnitude. A cobertura do solo pelos ma para o bom desempenho das mes- A elevada erosão que ocorre em
resíduos culturais dissipava a energia mas na lavoura e, por isso, podiam ser boa parte das lavouras em condição
cinética da chuva, mas, não a da enxur- eliminados, até porque, segundo eles, a de SD no Brasil é relacionada, ainda,
rada, o que concorria para a continuida- erosão não mais existia. Com isso, era com as más condições físicas dos solos
de da erosão hídrica. No entanto, a con- mais fácil comercializar as máquinas. A resultantes do manejo adotado ante-
tinuidade da exploração do solo, cada extensão rural oficial não mais atuava riormente no PC. Em especial a com-
vez mais intensa, com maquinaria cada no Brasil em defesa do solo, e com isso, pactação do solo denominada de “pé
vez mais pesada e com número cada vez as afirmações feitas aos agricultores, de de arado” e “pé de grade” e, principal-
maior de operações de manejo durante que a erosão já não era problema devi- mente, a perda da camada superficial
os cultivos, concorreu para o aumento do à eficácia da SD, eram tidas como pela erosão anterior, limita a infiltração
da degradação do solo, principalmente única verdade. de água no solo e potencializa o escoa-
por compactação. Isso resultou em infil- A redução da erosão hídrica nas la- mento superficial e a erosão. Esses pro-
tração e água cada vez menor e erosão vouras conduzidas em SD fez com que blemas, em especial a perda da camada
hídrica cada vez maior, mesmo na SD. os agricultores aceitassem a ideia de superficial do solo herdada do PC, não
eutrofização das águas em mananciais, ralmente em áreas com maior declive res, sem a adoção de práticas comple-
principalmente em ambientes lênticos. do que as de lavouras e pastagens, em mentares de controle do escoamento
Nas áreas de pastagens cultivadas, muitos casos inclusive em áreas íngre- superficial e da própria erosão.
a situação é dramática na maioria dos mes.
casos. Os solos, parte deles marginais Essa é a situação em que se en- O que esperar para o futuro
do ponto de vista de aptidão para esse contra atualmente a conservação do A conservação do solo no Brasil
tipo de exploração intensiva, estão ver- solo no Brasil na maioria das áreas de
não é boa, embora seja muito melhor
dadeiramente sucumbindo aos efeitos lavoura, pas-
do que há algumas décadas. A situa-
da degradação. Tal degradação tem tagem e reflo- Atualmente
no Brasil, ção é melhor quanto às perdas de solo
origem na excessiva carga animal que restamento. No
pouquíssimos por erosão hídrica nas áreas de lavou-
consome demasiadamente a biomassa caso das lavou-
pesquisadores ras submetidas à SD. Constata-se que
aérea e deixa o solo descoberto. A ele- ras, a conser-
dedicam-se vários problemas estão envolvidos e
vada pressão mecânica pelos animais vação do solo
à estudar o concorrem para a situação ainda inde-
pulveriza o solo na superfície e o com- é dependente
comportamento sejável, que necessitam ser resolvidos
pacta, tornando a infiltração de água no quase que ex-
da semeaduta para avançar na conservação do solo
clusivamente
solo muito inferior à chuva (Bertol et al., e da água. Seguramente, o caminho
do sistema SD, direta com a
2008). Assim, criou-se um vicioso ciclo, erosão é continuar avançando nos sistemas
na maioria das
em que o solo é degradado pela com- de manejo conservacionista, tanto em
vezes inade-
pactação e erosão, levando à degrada- áreas de lavoura, quanto de pastagens
quadamente implantada e conduzida
ção da pastagem o que, por sua vez, e reflorestamento. Em especial, é ne-
e, portanto, sem condições de efetiva-
acelera a degradação do solo. cessário haver maior preocupação com
mente controlar eficazmente a erosão
Com o aumento expressivo da área do solo. A ocorrência de eventos de o ambiente como um todo, minimizan-
cultivada com florestas, os solos apre- chuva, cada vez com maior intensidade do os impactos de qualquer forma de
sentam elevada erosão hídrica, princi- e volume, devido, em parte, às mudan- erosão fora do seu local de origem. De
palmente nas fases de plantio e colhei- ças climáticas, concorre para potencia- qualquer modo, não é tarefa fácil fazer
ta e nas estradas internas, sobretudo lizar a erosão, mesmo na SD. Isto torna uma projeção para o futuro. Para isso,
quando o plantio é feito morro-abaixo difícil a sustentabilidade desse sistema é necessário saber-se, com certo grau
com sulcamento do solo. Acrescente- de manejo do solo, na forma como co- de certeza, o que se deve e o que se
-se a isso, o fato desse sistema de uso mumente é adotado e conduzido pelos pretende fazer, efetivamente, em ter-
do solo ser implantado e conduzido ge- agricultores, pecuaristas e reflorestado- mos de manejo e conservação do solo
Variáveis
e unidades SI 1/
1/
Extraído em parte de Grandezas, Dimensões, Unidades (SI) e Constantes utilizadas em química
e fertilidade do solo. Viçosa, 2008. 86 p.
dos países do
grupo BRICS
Julierme Zimmer Barbosa
Giovana Clarice Poggere
(secretário geral, secretário adjunto e Já a Revista Brasileira de Ciência do boletim e outros cinco membros.
tesoureiro); dois ex-presidentes; editor- do Solo, publicada sem interrupção A SCSAS não tem núcleos regionais
chefe da revista científica; presidente desde 1977, se destina à publicação no território da África do Sul, nem
do congresso realizado no início do de trabalhos científicos, num total de divisões científicas permanentes.
período da gestão vigente; diretores 3743 publicados até o volume 39, em Contudo, dispõe de um grupo de
de divisões especializadas (quatro 2015. A SBCS também publica duas trabalho (Atualização do Sistema de
membros) e diretores de núcleos (nove coleções de livros: Tópicos em Ciência Classificação de Solos da África do Sul).
membros). Além disso, ao longo do do Solo, iniciada em 2000 e com nove As principais atividades da
território nacional, tem nove núcleos, volumes, até o momento, e Livros-texto Sociedade envolvem a organização
abrangendo regiões ou estados. Em em Ciência do Solo, que começou em de eventos, a edição de publicações,
relação à estrutura científica, conta 2007, e reúne seis livros. Além disso, a entrega de prêmios e títulos e a
com quatro divisões e 15 comissões editou 30 publicações diversas. divulgação de informações gerais via
especializadas (Figura 4). Na internet, a Sociedade mantém um internet.
As principais atividades da SBCS site, desde 1999, trazendo informações O evento mais tradicional de Ciência
envolvem a organização de eventos, relevantes sobre suas atividades, do Solo da África do Sul é o Congresso
a edição de publicações, a entrega notícias gerais, comercialização de da SCSAS, realizado desde 1965.
de prêmios e títulos, homenagens, produtos (loja virtual) e sendo um canal Embora a periodicidade do evento
a divulgação de informações gerais de comunicação interativa entre os tenha sido variável desde a sua primeira
via internet e a comercialização de sócios. Além disso, tem duas páginas edição, desde 2005 ele vem sendo
produtos via loja virtual. em mídias sociais (no Facebook e no realizado anualmente. Contudo, na 31ª
O Congresso Brasileiro de Ciência Twitter), mantendo-se atualizada nas edição (2011), passou a ser realizado
do Solo é o evento mais tradicional tendências de difusão de informação. no formato de Congresso Combinado,
da Sociedade. Dois fatos chamam a envolvendo outras três sociedades
atenção com relação a esse evento: (I) científicas (Sociedade Sul-Africana
desde o primeiro congresso em 1947 África do Sul de Produção Vegetal, Sociedade
(chamado de Reunião até 1953) até Por fim, a Sociedade de Ciência do Sul-Africana de Ciência das Plantas
hoje, nunca ocorreu interrupção nem Solo da África do Sul (SCSAS) foi a Daninhas e Sociedade Sul-Africana
alteração do padrão de realização (a última sociedade científica dedicada à
cada dois anos); (II) na VIII edição do Ciência do Solo fundada entre os países
congresso (15 a 30 de julho de 1961, do grupo BRICS. A fundação ocorreu
Belém - PA), a sede principal do evento no dia 27 de abril de 1953, na cidade de
foi um navio. Em 2018, pela primeira Pretoria, com 16 membros. O primeiro
vez, a SBCS organizará o Congresso presidente foi Christiaan Rudolph van
Mundial de Ciência do Solo. der Merwe.
A primeira publicação periódica Atualmente, conta com 330
editada pela Sociedade foi o Boletim membros, o que corresponde a 6,1
Informativo, cujo número inicial cientistas do solo para cada milhão
corresponde ao fascículo Janeiro/ de habitantes da África do Sul (Figura
Abril de 1976. O Boletim visa divulgar 1). O seu Conselho Diretor envolve 12
notícias, artigos (informativos e membros: presidente; vice-presidente;
opinativos) e atividades da SBCS. secretário; secretário assistente; editor
Produtividade da soja no
entorno do reservatório de
Itaipu
Após cinco anos
de pesquisa, con-
siderada inédita
no mundo, o Ins-
tituto Agronômico
do Paraná (IAPAR)
lançou o livro que
trata do efeito do
reservatório da Usi-
na Hidrelétrica de
Mais informações no site: http://www.secsuelo.org/app/es
Itaipu no microclima e na produtividade
da soja em seu entorno.
O livro intitulado “Produtividade Assim, isolando-se as variáveis passí- Erosão dos Solos e
da soja no entorno do reservatório de veis de controle (solo, cultivares, data Movimentos de Massa –
Itaipu” foi editado pelos pesquisadores de semeadura e manejo cultural) e me- Abordagens Geográficas
Luiz Antônio Zanão Júnior, Rogério Tei- dindo-se todas as outras variáveis não
xeira de Faria e Paulo Henrique Caramo- O livro cita mais
controladas, tais como precipitação,
ri. radiação solar, temperatura e ventos, de 250 trabalhos
Com base no monitoramento das não existe um padrão de produtividade abordando a ero-
variáveis climáticas, concluiu-se que o da soja no qual a cultura possa sofrer são dos solos e os
lago de Itaipu não influencia o clima no redução de produtividade em gradien- movimentos de
seu entorno. A variação da produtivida- te até 10 km de distância das margens massa, levando em
de da soja ao longo do reservatório da do reservatório da usina hidrelétrica de consideração suas
usina hidrelétrica de Itaipu é influencia- Itaipu. diferentes aborda-
da pela precipitação pluviométrica, com Mais informações em: http://www. gens geográficas.
sua variação no tempo e no espaço de- iapar.br/modules/conteudo/conteudo. h t t p : / / w w w. e d i t o r a c r v. c o m .
pendente de fatores em escala sinótica. php?conteudo=1034 br/?f=produto_detalhes&pid=31492