ELEMENTOS CABALÍSTICOS
ESO TÉRI CO S E
Tese de doutoramento a p r e s e n t a da
ao De pa rta men to de H ist óri a da
Faculdade de Filosofia, Letras e
O R I E N T A D O R : PROFESSOR DOUTOR
VICTOR DEODATO DA SILVA
1
APRESENTAÇÃO .........................................
1. I
1. Dados iniciais I
2. Distinções ................................................
............................................................ 09
1. Introdução ...............................................
82
no .......................................................
......................................................... 99
A. Sensualismo ...........................................
......................................................... 99
3
B. Tendências ao incesto .............................. 102
4
1. Observações preliminares ............................... 278
5
2.
3. A divindade, os anjos e a criação do mundo . • • 279
4. A emanação dos espíritos ..............................
292
8. A
doutrina tradicional católica sobre a reprodução humana no
Paraíso ... 418
9. A posição gnóstica, cabalista e esotérica face ao
6
CAPITULO VI O pecado Original 444
.......................................................
........................................................... 448
7
5. Conseqüências do pecado original .......................
................................................................ 498
..................................................
....................................................... 506
........................................................... 544
Verbo ......................................
8
................................................ 584
1. Introdução ...........................................
584
9
CAPITULO IX Outros Temas Esotéricos nas Visões de Anna Katharina
Emmerick .....................................
................................................... 643
E. Antinomismo 653
10
6. O profeta Elias e sua missão de fundar o Reino de
Deus - Nova Revelação .................................
............................................................ 681
X CONCLUSÕES ...........................................
697
11
Sumário
Apresentação ............................................................................................................................................................. 13
CAPITULO I ............................................................................................................................................................. 33
Capítulo II - CLEMENS BRENTANO ................................................................................................................... 115
CAPÍTULO III - Anna Katharina Emmerick .......................................................................................................... 444
Capítulo IV - Análise das visões de Anna Katharina Emmerick ............................................................................. 466
Capítulo V - Adão e Eva.......................................................................................................................................... 490
CAPÍTULO VI ........................................................................................................................................................ 507
CAPÍTULO VII .............................................................................................................................................................. 517
CAPÍTULO VIII ............................................................................................................................................................. 577
CAPÍTULO IX .................................................................................................................................................................. 628
x. CONCLUSÕES ................................................................................................................................................... 682
12
Apresentação
no Brasil.
13
Deveríamos mencionar ainda duas outras pessoas ... Seu
pedido de não citá-las redobra a gratidão que temos para com elas.
por demais.
14
APRESENTAÇAO
1. DADOS INICIAIS
de Jesus Cristo.
15
unseres Herrn. Jesu Christi," junto com um resumo da vida da freira (1)
.
(1) C.B. Das bittere Leiden unseres Herrn Jesu Christi - Nach den
Gesichten der Dienerin Gottes Anna Katharina Em
merick aufgezeichnet von Clemens Brentano; Citaremos a
edição organizada por P.C. Niggermann, Druct und Verlag
von Friedrich Pustet, Regensburg, 1894.
(2) C.B. (A.K.E.) Leben der heilige Jungfrau Maria - Nach den
Betrachtungen der Jottseligen Anna Katharina Emmerick, Au
16
último livro. Tais notas são reveladoras da doutrina cabalista e
Emmerick.
17
a freira a experiências magnéticas, procurando levá-la
a estados extáticos por meios artificiais (ver cap. III desta tese).
de Dülmen.
lhe revelara. Nesse tempo, ainda não se sabia a que profundos cortes
(6).
(6) THOMAS WEGENER - Das innere und aussere Leben der gottse ligen
Dienerin Gottes Anna Katharina Emmerick aus dem
A ugustineror den. Citaremos a 2ª. edigáo. Paul Pattloch Verlag
Aschaffenburg, 1974.
18
O autor foi um dos postuladores do processo de
informações da Igreja para a canonização da freira de Dülmen, o qual,
sue" (7).
Emmerick.
19
VI.
"gli scritti attribuiti alia Serva di Dio erano opera del Brentano
a difusão das idéias que a Santa Sé não aprovava no texto das visões.
20
VII.
Emmerick.
santos.
21
Calmet.
22
Entretanto, se a obra do Pe. Hümpfner comprovava
23
IX.
esotéricas e cabalistas.
do texto completo das visões porque isto daria à nossa tese uma
24
Também não é de nosso interesse discutir se a vidente
era uma pessoa santa ou não, se de fato ela tinha estigmas e carismas,
nossa tese não pretende responder. Como também nos recusamos - com
26
Proveniente do misticismo da Merkabah, que já era gnóstico (8), a
Cabala lança suas raízes mais longínquas na Gnose pagã. Mais tarde,
doutrinas neo-platônicas influíram no pensamento místico judaico,
cooperando para a formação do sistema cabalista Gershom Scholem
observa que a Gnose judaica precedeu a Gnose cristã. Ele crê ainda
que, mesmo que não houvesse liames históricos diretos entre a Cabala
e a Gnose, o misticismo judaico , por sua própria lógica interna,
desenvolveria uma forma de Gnose (9) .
resplendor (17).
27
Por sua vez, o termo esoterismo implica sempre em um
paradisíaco.
anos do Romantismo.
28
Emmerick uma arma dada pelo céu na luta em defesa da religião contra
a freira era tanto maior quanto mais o confirmava nas suas concepções
fundamental.
Petrus Galatinus.
podem ser
no texto das visões de Katharina Emmerick (19) não consta que haja
nenhum trabalho que estude essas visões sob esse prisma ,nem que
uma única tese que trata da relação da Cabala com os Romanzen vom
30
Rosenkranz de Brentano, mas nenhuma
31
SIGLAS UTILIZADAS
32
CAPITULO I
ORIGENS DO ROMANTISMO ALEMÃO
inapreensível. Ele tem algo como o esgarçar das nuvens. Seus con-
extensão"(3).
(1 ) - N i c o l a i H a r t m a n - A f i l o s o f i a d o i d e a l i s m o a l e m ã o , L i s b o a ,
Gubelkian, 1983, pp. 189-190.
(2) - Cf r. Mario Puppo - Il Romanticis mo , Roma, Studium, 1967,
p. 10.
(3) - "Non ti posso mandare la mia interpretazione della parola
‘romantico’( . . . ) e s s a é l u n g a 1 2 5 f o g l i " ( a p u d L a d i s l ao Mittner
- S to r i a della l e t te r a tu r a te d e s c a , “Dal Piet is mo al
Ro man tic is mo , 1700 -1820", To rino , Giu lio E in au di , 1 9 7 7 , p . 6 9 9 .
33
Albert Béguin, interrogando -se sobre o Romantismo
da natureza dessa escola, por sua natureza paradoxal ou, mais pre-
cisamente, dialética.
( 4 ) - A l b e r t B é g u i n - L ' a m ê r o m a n t i q u e e t l e r ê v e , P a r i s , J o s é Co r t i ,
1966, p. X I I .
(5) - L. Mittner - op.cit., p.699 - sublinhado nosso.
34
O conhecimento do incognoscível daria ao homem o saber
35
e l e q ue r d es c o bri r o c am i n ho d e v o l t a. P a ra t a nt o ,
precisa comer mais uma vez da árvore do conheci mento
infinito e alcançar de novo, pelo outro la do, o paraíso
da inocência, de uma segunda inocência. (...) 0 grande
sonho dos românticos é a ino cência, a segunda inocência
que englobe ao mesmo tempo todo o caminho percorrido
a t r a v é s d a c u l t u ra, isto é, uma inocência que não seria mais
a primit i v a , a d o j a r d i m d o É d e n , m a s u m a i n o c ê n c i a s á b i a .
É a f a m o s a c r i a n ç a i r ô n i c a d e N o v a l i s , um dos grandes
símbolos do movimento romântico"(7).
36
todos os seres e, felicidade suprema! eu viverei para
sempre neste conhecimento . Sim, foi-me concedida a
força de conhecer o que há de mais alto - eu amá-la-ei
eternamente, Serpentina - jamais empalidecerão os
r a i o s d a r o s a , p o r q u e , c o m o a f é e o a m or , e te r n o é
o c o n he c i me n t o ( 8 ) .
(8) - "Serpentina! - la foi que j'ai eue en toi, l’amour pour toi m'ont
ouvert les profondeurs les plus s écrètes de l a nature - Tu
m'as apportée la rose, née de l'Or, force primitive de la Terre,
avant même que Phosphorus n'eut fait naître la pensée - la rose
m'a fait connaître l'harmonie sacrée de tous les êtres et, bonheur
suprême! je vivrai à jamais dans c ette conna issance. Oui, l a grâce
me f ut accordée de c on n a î tr e ce qu'il y a de pl u s h a u t - je
t'aimerai éternellement, Serpentina - jamais ne pâliront les
rayons de la rose, car, de même que la foi et l 'amour, éternelle
est la connaissance" (E.T.A. HOFFMANN - "Le vase d'or" in Romantiques
Allemands, Paris, NRF - Plêiade, 1963, vol.I, p.864, sublinhado
nosso).
37
Definir o indefinível, conhecer o incognoscível, obter
( 1 1) - H e n r i -Ch ar l e s PUE C H - E n q u ê t e d e l a g n o s e , P a r i s , G a l l i m a r d ,
1978, v.1, p.236.
38
Com ele concorda Serge Hutin ao dizer:
" i l n ' es t p a s ar b it r a i r e d e p o se r u n c o n c e pt g é n é r a l d e
gnose 'connaissance' salvatrice"(12).
ao dizer:
39
Estas palavras também se aplicam perfeitamente ao
"To rn ar – se D eu s, se r h om em , for ma r –s e, s ão
e x pressões sinônimas"(15).
( 1 6 ) - S . d e P É T R E M E N T , o p . ci t . p . 3 4 4 .
40
Hume dizia que a melhor definição para o Romantismo era
a de "religião difusa":
2. Distinções:
41
alemão e o de outros países. Com efeito, o Romantismo Alemão pode
caráter metafísico"(19).
a s s a i s p e ss o un de s i d e ri o ir r e al i zz a b i l e p e rc h é
42
tempo (...) 'Sensucht' e veramente una ricerca del
desiderio, un desiderare il desiderare, un de si deri o c he
è sentito come inestinguibile e che proprio per ciò
t r o v a i n s è i l p r o p r i o p i e n o a p pagamento” (20).
43
de ânimo anti-iluminista.
pensamento de Schelling.
ao universo e ao homem.
44
É este último aspecto que enfocaremos de modo
objetivo.
A. o veio esotérico;
B. o veio religioso;
C. o veio filosófico.
45
que há vários romantismos, com fontes diversas, mas de todas
46
effectivement religieux, qui sont éclairés d'en haut, à
propor ti on de l a pu re té de le ur c oe ur et du
sen ti m e n t p r o f o n d d e l ' i n s u f f i s a n c e e t d e s b o r n e s
d e leur propre raison"(26).
v i s i o n n a ir e s , m a i s e n c or e d e l a r e l i gi o n
des
vra is ch ré ti en s, et qu i n' on t p ri s l e no m
d'i l luminés, ou en allemand der Illuminaten, que
47
comme un nom de guet, un terme de ralliement,
u n e n o u v e l l e c o n f u s i o n d a n s l e s i d é e s . . . C e s o n t eu x
l i é p e n d a n t s o n s é j o u r à B e r lin..."(27).
que ilumina e guia o homem vem de Deus e não da razão. Não se confunde,
48
iluminação divina.
c o m m e d ' a il l e ur s t o u t e t h é os o p hi e ( 2 9 ) .
o esoterismo.
idades:
s u p é r i e u r ; l’inspiration', et le plus
souvent,
et d u cu lt e re ç u, s e li vr ent à d es r ec he rch es
49
n o m m e n t p r i m i t i f " ( J . d e M a i s t r e — " Q u a t r i è m e c h a pitre
50
les décrivait Joseph de Maistre; on en voit d'ailleurs
q u i n o i e n t l a t r a n s c e n d a n c e d u c h r i s t i a nisme dans je ne
sais quelle 'religion naturelle"(30).
(31) - E.T.A. HOFFMAN - "Le vase. d'or", 8a. Vigília, ed. cit.
51
Pasquallys)e o chamado Martinismo do "filósofo desconhecido",
52
préexistence des âmes dans cet homme-verbe, sa
répartion de l'unité, sa corporisation, son
exil, son retour à l'unite...; sa transformation en
Dieu... Le s y m bol is me e t l a th éor ie de s
nom br es, l a th éur gi e
et la po sse ss i on du mo nde in vis ib le p ar l a
mag ie
ou par l 'a mou r , c omp lè te nt c et ens em bl e d e
dogmes invariables...Le panthéisme est au terme
de tous ces systèmes" (32).
macro-antropos.
anti-dogmática.
53
c) teosofia. Preocupação e pretensão de conhecer o
sexual.
divino.
Universo e o Homem.
54
l) Deus se revelaria no coração de cada homem,
de revelação.
meios.
que se redime.
55
espírito, matéria sublimada.
l e c o r d o n i e r t h é o s o p h e d u X V I I s i è c l e e t les romantiques"(33).
57
que cresceu em meio às disputas que opunham místicos e alquimistas
nascente) (1612).
58
"Boehme's labyrinthine system, although more elaborated
than that of the alchemists, would in
itself require a volume of commentary" ( 3 6 ) .
Sua fil oso fia t em pro fun dos la ço s com a a lqu imi a:
philosophic system"(37).
59
que corresponde ao Ein Sof da Cabala e ao Deus gnóstico de Basilides
e de Valentim. Esse Ungrund enquanto Uno é o Absoluto, a Liberdade
absoluta(40).
Do uno, proviriam dialeticamente a Vontade e o
É quando se criam tais coisas que Deus passa a ser, porque só então
passa a ter corpo(43).
60
Logo, o mal, tanto quanto o bem, teria origem divina.
O universo seria vivo. A vida seria o grande fluxo, a Tinctur,
que, saindo de Deus, se derrama sobre o universo e reconduz tudo a
Deus(46).
No homem, como em todas as coisas, haveria um quid divino que o torna um microtheos. A
61
Em todo ser manifestar-se-ia um processo dialético
pois cada coisa seria feita de sim e de não. O choque destes princípios
Deus revelado;
Cabala;
de princípios opostos;
evolutivo;
Boehme;
de Deus;
62
g) a crença de que em Deus há elementos sexuais
masculinos e femininos;
existência de Eva;
oculto.
63
a) Boehme conhecia a Cabala(51);
Notaricon.
64
"A doutrina de Boehme das origens do mal, que
criou tanta agitação, na verdade, ostenta
todos os traços do pensamento cabalístico
(...)Boehme, mais do que qualquer outro
m í s t i c o cri st ã o, mostra a mais estreita afinidade
com o cabalismo (...), a conexão entre suas idéias
e as da Cabala teosó fica e ra m b em e vi den te s
par a s eus se gui do res , d es de Avraha m Von
F r a n c k e n b e rg (m. 1652) até Franz Von Baader (m.
1841) e ficou a cargo da literatu ra moderna a
tarefa de obscurecê -la" ( 5 7 ) .
" ( . . . ) i l ( O e t i n g e r ) f i t c o n n a i t r e e n Allemagne le
visionnaire et érudit suédois Emanuel Swedenb e r g .
D ' a u t r e p a r t i l i n a u g u r a u n é c h a n g e d'idées a v ec
les répré sentan t s de la Kabba le j uive, c e m o u v e m e n t
m y s t i q u e q u i n ' é t a i t p a s r e s t é inc o n n u à B o e h m e
l u i - m ê m e . L o r s q u ' i l r e n d i t v i s i t e à Kopp el He ch t,
célèbre kab bali ste a pparte nant à la comunauté
juive de Francfort, afin d'obtenir d e l ui des
i n fo r ma ti o ns su r l ' és o té ri s me jui f , c e l u i - c i l ui
f i t u n e r é p o n s e m é m o r a b l e . O e t i n g e r racconte ainsi
l'entretien:
et ceux de la Kabbale'.
(1765-1841)"(58).
66
O Pietismo
anabatistas.(59)
67
fiéis, pois se preocupava apenas com cerimônias leis, dogmas e
excomunhões. Era "igreja de pedra", vazia do Espírito e que perseguia
a Igreja do Coração formada pelos fiéis em que cujas almas se revelava
o Espírito de Deus.(60).
Consideravam os místicos que uma Igreja organizada,
institucionalizada, tal como o Estado, era um mal necessário. A Igreja
de Pedra era como a lâmpada, enquanto por seu lado a Igreja do Coração,
a Igreja Mística, seria como a luz.(61)
A corrente mística do protestantismo teve seu "profeta"
europeu.(62)
68
porque os sectários usavam continuamente a palavra "pietas".(63)
69
questão de proclamar seu espírito de renúncia e de concessão em
era o da Redenção por Cristo, não se julgue porém que eles o entendiam
no sentido comum. Cristo era o Redentor, mas não era Deus. Cristo
.
(65) Cfr. L. MITTNER - op. cit.,p.43.
(66) Cfr. L.MITTNER - op. cit., p.43.
(67) Cfr. L. MITTNER - op. cit., p.41.
70
gnósticos. Na Gnose Valentiniana e na Kabala é que se fala numa Sofia
inferior apresentada como elemento feminino em Deus.(68)
Para o Pietismo, seguidor de Boehme, o mundo era uma
emanação da divindade e o espírito de Deus se achava espalhado por todos
os seres do universo. Esse imanentismo levava o pietismo a ter um culto
religioso da natureza, a buscar fundir-se no Todo universal, a procurar
estabelecer um contato com os outros homens, e mesmo com as coisas,
por meio de uma simpatia universal. O pietista vivia dialeticamente,
sentindo Deus distante e, ao mesmo tempo, próximo; Deus "absconditus"
e Deus manifesto; e vendo o infinito imanente nas coisas finitas.
71
Essa renúncia à vontade levava o pietista à
melhor seria, pois seriam sentimentos vagos, sem razão, sem base
crepúsculo".(70)
72
do sentimento íntimo e individual, a religião das amizades místicas.
Essa amizade mística, sentimental e lânguida, principiava na relação
da alma com Cristo. O pietista devia ter para com Cristo uma amizade
pessoal, igualitária, sentimental. Dessa primeira amizade deveriam
decorrer todas as outras.
O pietismo era então organizado em células de três
pessoas que deviam ter entre si uma amizade "particular", sentimental
e mística. Era o que eles chamavam "o trevo". Os três participantes
do trevo deviam estabelecer um pacto de amizade, confirmado, muitas
vezes, por uma comunhão. O trevo era o primeiro núcleo ou célula de
um conventículo pietista. O próprio matrimônio era visto como "amizade
conjugal", amizadede almas, de fundo religioso. No matrimônio também
se formava, muitas vezes, um trevo ou triângulo filadélfico entre os
dois cônjuges e um terceiro elemento que patrocinara ou favorecera
o casamento, renunciando a seu amor por um dos cônjuges. Esse terceiro
elemento, que sacrificava seu amor, era como que um substituto de
Cristo, um vice-Redentor. Esse amor, entre os pietistas e r a c h a m a d o
amor filadélfico e se opunha ao amor filantrópico
preconizado pelos racionalistas que mandavam amar igualmente todos
os homens.
Em consonância com essa concepção, Zinzendorf
renunciou a duas noivas, oferecendo-as a outros pietistas, para
convertê-los. Casou-se, depois, e sua mulher lhe deu filhos. Então,
ele a deixou para um amigo, enquanto partia para os Estados Unidos com
uma "irmã" jovem que ia auxiliá-lo na fundação de uma colônia pietista
na América. Quando sua mulher morreu, ele se casou
73
com essa jovem.
w r i t i n g s , a n d o n e o f h i s l a t e r a n d m o r e f a n a t i cal
74
voluminous 'History of the Church and Heretics'. It is possible to say
the re for e th at wh er eve r in Germany Pietism was
strong, as it was in Frankfurt, there was likely to
b e a l s o s o m e belief in the vali d ity o f alc he my" . ( 7 2 )
75
A mística pietista obrigava o adepto a passar por uma
para uma nova vida, A pessoa então sentia-se jovem, convertida. Daí
Esta passagem de uma fase de angústia e de morte para uma nova vida
vontade de Deus.
Cabe um paralelo. Enquanto para o iluminismo o mundo
era uma grande máquina que a luz da razão podia compreender, para o
pietismo ,em contraste o universo era um grande ser vivo cuja alma era
76
características do pietismo.
Como muitos outros movimentos gnósticos, o pietismo
e em suas crenças, isto não significa que ele não tivesse uma
organização que era fluída, mas também secreta. Diz Mittner a esse
respeito:
77
A influência pietista foi imensa na religião, na
78
79
l'évolution créatrice dans le règne de l'histoire.
l'idéalisme allemand,
80
Para Bengel, o Apocalipse daria a chave para se
compreender a História assim como seria também a Revelação da própria
período duraria 666 anos, ele marcou o início do milênio para 1809,
81
"règles que l'on retrouvera dans la méthaphysique
h i s t o ri q u e d e l ' id é a l i sm e al l e ma n d" . ( 7 7 )
------------------------------------------------------------
(77) E. BENZ, op. cit., p. 44.
82
chrétiens; en tout cas elles amenèrent l'auteur à
83
Para Oetinger, o Espírito Santo, "aquele que há de
vir", o Amor, reuniria não só o Pai e o Filho, mas também Deus com o
universo e com todos os homens.
Assim como os cabalistas e, mais tarde, os idealistas,
Oetinger considerava que todo espírito sem corpo ou que não pudesse
tê-lo, seria mau. O universo seria o corpo do qual Deus seria a alma.
84
senhora dela, se tornasse Deus e, querendo bem a ela, se tornasse
natureza.
85
"... la philosophie sacrée d'Oetinger devrait mê me être
Oetinger".(83)
isto, não haverá nesse Reino do Amor propriedade privada. Tudo será
possuído em comum.
86
Terceira condição de felicidade desse Reino é a
---------------------
87
tant en France qu'en Allemagne. Il incarne la tradition
é s o t é r i q u e d e s s o c i e t é s é c r é t é s e t de la m aço nne r ie
(... )" ( 8 5 )
Katharina Emmerick-Brentano.
88
"On ne dira jamais assez ce que le Baader du journ a l d o i t
a l'illustre prélat: toute sa religion, sa manière
de concevoir Dieu, le rôle qu'il attache à
l ' h i s t o i r e , a u x É c r i t u r e s e n t a n t que tel les et a u
christia nisme en tant que rév élation, la place
q u ' i l f a i t à J é s u s , f i l s d e D i e u et m é d i a t e u r , l e
désir de saisir Dieu par le coeur d'une manière
v i v a n t e e t n o n p a s d e l e déduire d ' u n c er ta i n no m bre
d ' ar g um en t s lo giq u es , l e pr i x a t t a c h é p a r a i l l e u r s
e t u n e f o i s l a révélation a d m i s s e à l a r a i s o n p a r c e
q u ' e l l e n o u s éclaire s u r l a v r a i e n a t u r e d e D i e u ,
t o u t c e l a e s t pénétré d e la méth ode et de l' espr it
de Saile r(... )" .
89
Baron de Gleichen, précédés d'une notice par M.Paul
" N ã o s e e s p a n t e , e n t ã o , c o m o m e u naturalismo; v o c ê n o t a r á
que ele é bastante inocente e, a rig o r , menos
herético que o spinozismo - porque eu o tirei da mesma
fonte de que o tirou Spino za (apenas não tão
profundamente) - a velha Cabala judaica - esse tronco
d a m a i s a n t i g a c i ê n c i a d a natureza".(88)
E comenta Susini:
" N a t u r w e i s h e i t " ; l e m o t e s t c a r a c t é r i s t i q u e . Il ne
s ' a g i t p a s d ' u n e ' s c i e n c e ' n a t u r e l l e p u r e et s i m p l e , m a i s
d ' u n e ' s a g e s s e ' , d ' u n e connaissance r e l i g i e u s e , m y s t i q u e ,
é s o t é r i q u e , d ' u n e théosophie".(89)
90
Ora, a Cabala é reconhecidamente uma gnose judaica.(90)
91
A gnose em suas formas mais radicais negava qualquer
matizadas:
necessária de Deus;
1º) Deus.
-.
92
nem monoteísta, nem panteísta, nem maniqueísta.(92) Ele não aceita uma
e matéria eram coisas unidas, mas que não se deviam confundir, como
sua concepção, Deus existe em si, mas se torna Deus na criação que o
93
Se o mundo se distingue de Deus, se a multiplici dade
2º)Satã e Lúcifer
que este último é uma criatura enquanto Satã não o é. ( 96 ) O mal (Satã)
3º) Criação
Baader.
94
Entretanto o universo material teria sido criado como
único remédio possível, como um dique para deter a irrupção do mal. Como
conseqüência dessa primeira queda de Lúcifer teriam surgido também o espaço
e o tempo.(98)
4º) A matéria
" C o n f o n d r e o u s é p a r e r e s p r i t e t m a t i è r e , comme f o n t l e
panthéisme et le spiritualisme, constitue une erreur;
f a i r e d e l ' e s p r i t e t d e l a matière deu x principes hostiles
en constitue un autre(...)
95
Il n'y a pas séparation entre l'esprit et la matière, du fait
(101)
qu'on les distingue; il n'y a non plus hostilité."
96
Este Adão andrógino não passou por uma primeira prova
quando Deus lhe apresentou a natureza animal. Em conseqüência disso,
depois dela, Deus criou Eva, isto é, separou o sexo feminino de Adão,
que assim deixou de ser andrógino.(104)
Antes dessa queda; Adão se reproduzia de modo superior.
animais, uma companheira exterior. Por isso, Eva foi retirada dele.
97
6º) Adão e a "Virgem Celeste"
98
e n 1 8 3 7 , a r é s u l t é d u f a i t q u e s o n â m e o u s a v o l o n té a
refusé de pénétrer dans l''idée' qui lui avait été donné par
Dieu comme compagne, et, s'associant à elle, de
devenir avec elle une créature unique (IV,
335-336). L'Idée s'est dès lors séparée de l'h o m m e
c o m m e d ' u n ho mm e a d u l t è re ; el l e s'est év a n o u i e
en lu i; el le s 'es t ret ir ée ' dan s le ca l me d e la
non - cré ati on' ( .. .)."
" D è s l or s , la V i e r g e S o p h i a e n t a n t q u ' Id ée ou
E s p r i t , e s t e nc o r e à l 'é t a t ' i n c o r p o re l '
(unleibhaft). Mais elle aspire, depuis que par la
faute d e l ' h o m m e e l l e a p e r d u s o n c a r a c t è r e
c o n c r e t , à l e r e t r o u v e r . E ll e t e n d à r e n t r e r o n
possession de sa 'corporeité' (Leibhaftigkeit) (IV,
214)".(110)
99
" L ' a m o u r , e x p l i q u e B a a d e r , l ' a m o u r e n t e n d u au
100
qu'elle n'est plus pour lui qu'une apparence
( I I I , 3 0 9 ) . L e b u t supérieur de l'a mo u r e s t d e
fix er c et te i ma ge d e Di eu d ev e nue fugitive, de
la rendre essentielle et permanente, d e
r é e n g e n d r e r e n D i e u l e s d e u x a m a n t s ( I I I , 3 0 8 – 309)".
(112)
"La p r é o c c u p a t i o n d e B a a d e r e s t d ' é t a b l i r , p a r l a
m é t h o d e d e l ' ét y m o l o g i e e n pa r t i c u l i er , l'idée
q u e l ' o r ig i n e d e l ' ê t r e, t a nt m a t é r i el
qu'intér i e u r , e s t u n co n f l i t en t r e u n e c e r t ain e
t h è s e ( a t t r a ct io n d a n s le m o n de m a t é r i el , d é si r
dans le monde moral) et une antithèse (expansion
d'une part, contraction de l'autre), conflit qui se
rés ou t en u ne c omb in ais on d es deu x mo uv eme nt s,
u n e s y n t hè s e , q u i e s t mo u v e me n t
101
circulaire, g i ratoire dans le monde concret, et
a n g o i s s e , chaleur ang ois san te da ns le mon de
inté rie ur" . ( 1 1 4 )
102
9º) Espaço e Tempo
um mal em si, e sim um mal menor, como um dique necessário para impedir
manifestação do mal.
103
superior, paradisíaco, que deveria ter sido o mundo real do homem e
do qual ele caiu, não seria possível conhecer por meio da razão e
dos sentidos; pois ele se tornou para o homem um mundo figurado ou
mágico.(119)
104
" N o t r e p o s s e s s i o n d e D i e u n ' e s t d o n c p a s l e rés u l t a t d e
l ' e n t e n d e m e n t . D i e u r é p o n d à u n appel d u c o e u r . I l n e f a u t
pas reconnaître la valeur de l ' h i st o i re , l a va l e ur d e
la révelation; mais la
" L a v é r i t a b l e É g l i s e d u C h r i s t e s t p o u r l u i i n v i s i bl e ;
e l l e n ' es t p a s un e i n s t it u t io n of f i c i el l e , u n c o r p s
s o c i a l o r g a n i s é ; e l l e n e vit q u e 'dans l ' â m e d e q u e l q u e s
s a g e s ' . O u d u m o i n s e l l e ne s a u r a i t ê t r e o r g a n i s é e s u r
u n m o d e autocratiq u e ' . (126)
5. Os filósofos idealistas
105
" ( . . . ) L a ' v i s i o n c e n t r a l e ' d e l a philosophie idéaliste
e x p é r i e n c e m y s t i q u e d e d i v i n i s a tion".(127)
"On p o u r r a i t d é m o n t r e r q u e l e c o n c e p t idéaliste d u M o i
c h e z F i c h t e e s t d i r e c t e m e n t i n f l u e n c é par l e s
spéculations du mysticisme allemand du Moyen Âg e comme
V o n B r a c k e n l ' a p r o u v é d a n s s o n livre sur Fichte et Maitre
Eckhart".(128)
XVI. Como vimos, quem melhor escreveu sobre a Cabala nesse país foi
106
Desde muito cedo, ficou patente que o idealismo
"Nel 1835 a p p a r v e l a m o n u m e n t a l e o p e r a d i F e r d i n a n d
R e l i g io n ph i l oso p h i e in i h r er g e sc h i c hl i c hen
f i l o s of i a m o de r n a d e ll a r e l ig i o ne ', l 'u l t im a p a r t e d i
q u e s t ' o p e r a p a s s a i n e s a m e 1 ) la teosof i a d i B ö h m e ; 2 )
l a f i l o s o f i a d e l l a n a t u r a di S c h e l l i n g ; 3) la dottrina
r i s a l ga n o a l l ' antichità".(132)
g n o s t i c o a v e v a a c q u i s i t o u n a g r a n d e r i levanza
sociale".(133)
( 132) Er ic VO EG ELI N - I l m i t o d e l m o n d o n u o v o , M i l l a n o , R u s c o n i -
Editori, 1976, pp. 57-58.
(133) Cfr. Eric VOEGELIN, op. cit., p. 58.
107
Não cabe aqui fazer uma análise pormenorizada do
108
Esse dualismo de um princípio obscuro e outro de luz
2. O problema do mal
3. A criação do universo
(138) Cfr. S c h e l l i n g , C o n f é r e n c e s , e d . c i t . , p p . 3 1 6 - 3 1 7 .
(139) Cfr. G. SCHOLEM, op. cit., p. 220.
(140) C f r . N i c o l a i H A R T M A N , o p. c i t . , p . 1 6 9 .
(141) C f r . G . S C H O L E M , K a b b a l a h , K e t t e r . , J e r u s a l é m , 1 9 7 4 , p p . 1 2 2 a 128.
(142) C f r . SCHELLING, C o n f é r e n c e s , e d . c i t . , p . 3 1 5 .
(143) Cfr. SCHELLING, Philosophie et Religion in Essais, ed. cit., pp. 195-196.
109
essa mesma idéia aparece em Boehme e na Cabala.(144)
A esse respeito diz Scholem:
"(...) f o r a l l t h a t c o n c e p t o f z i m z u m w a s in f a c t v e r y
close to the ideas that later develo ped in modern
i d e a l i s t s p h i l o s o p h i e s , s u c h a s t h o se of Schelling and
Whitehead".(145)
110
6. Matéria, individualização, tempo, espaço e morte
111
8. Homem, redentor de si mesmo e da natureza
do Absoluto
112
10. O Reino milenarista ecumênico
113
identified with the Father of Trinitarian
theology. The Second period, the Paul i n e ,
starts with the Protestant Reformation. It
is characterized by the idea of freedom and
correlated with the ideal principle in God,
identified with the Son. And Schelling looks
forward to a third period, the Johannine,
which will be a higher synthesis of the first
two periods. And u n i t e together law and
f r e e d o m i n t h e o n e Christ i a n c o m m u n i t y . T h i s
third period is correlated which the Holy
Spirit, the divine love, interpreted as a
synthesis of the first two moments in God's
inner life".(156)
regra.
(156) C f r . C O P P L E S T O N E S . J . - A H i s t o r y o f P h i l o s o p h y , I m a ge
Books, New York, 1 9 6 5 , vol. VII, p . 1 7 5 e Marjorie REEVES. T h e
i n f l u e n c e o f p r o p h e c y i n t h e l a t e r M i d d l e - A g e s , Oxford-Clarendon
Press, 1969, p.135-137.
CAPÍTULO II
114
Capítulo II - CLEMENS BRENTANO
1.Introdução
esta fora dos limites de nossa tese. Como também não nos
115
a sua vida. Aos seis anos de idade ele foi afastado dela
para ser criado, junto com sua irmã Sophie, por uma tia,
Luise Moehn, irmã de sua mãe. Essa separação magoou
c r i a n ç a e m d u a s e t a m b é m a tia M u h m e ; a c r i a n ç a
sou eu e a cr ia nç a mo rta é v o c ê ”
116
Na dedicatória do conto "Gockel, Hinkel und Gackeleia",
Brentano diz:
" O d i a e m q u e e u , m e n i n o a i n d a , o u v i n o e m p ó rio
jogar-lhes ág u a p a r a s e p a r á - l o s , a r e s p e i t o d o
que ess e
117
E, quando ele soube que existia de fato um lugar
chamado Vadutz, no Lichtenstein, ele se revoltou, recusando-se
a aceitar isso como verdade. Ninguém, nem os mapas podiam
convencê-lo. Quando afinal teve que aceitar a realidade,
mostrou-se profundamente decepcionado. Para ele o mundo do
sonho é que era real. A realidade destruía o que o sonho tinha
de melhor: a não existência concreta (5).
Idealismo/
(4) "Da ich als ein Knabe im dem Comptoir den gelehrten - Rabbi
Gedalia Schnapper mit dem unvergleichlichen Abarbanel Meyer
auf Tod und Leben, so dass man mehrmals Wasser auf sie giessen
musste, um sie auseznanderzu - bringen, über die Lage eines
wunderbaren Landes disputieren_ hörte welches der Fluss
Sabbation unfliest, der die ganze Woche ein unzugängliches
Steinmeer/ ist und nur am Sabbath seine Wogen bewegt floh ich
-
118
e do Romantismo. Foi lá que Brentano aproximou-se dos
119
Logo Brentano lançou-se como escritor, publicando um
teve que se casar com Brentano, pois dele esperava uma criança.
mais feliz desta vez, e a vida do novo casal foi uma continua
120
definitivamente em 1809. Divorciaram-se três anos depois, mas
Brentano continuou cheio de ódio por ela, o que acabou por
levá-la ao suicídio em 1832.
Müller.
121
De 1811 a 1813, Brentano viveu em Praga. Com
122
e tornou-se amigo de Ernst Ludwig von Gerlach, Que era
exorcísticas.
123
Enfin Les " E r w e c k te n " attendent le retourdu
124
Por esse tempo, Brentano se mostrava mais
Foi nessa situação de crise religiosa que Brentano encontrou Luise Hensel,
em outubro de 1826. Ela tinha então, 18 anos e Brentano 38. Era filha
196-198.
( 13) " J e d o i s m ' é l e v e r i c i c o n t r e l ' o p i n i o n d e s
p r o t e s t a n t s qui croient que Clemens Brentano a exercé
une influence sur mon retour à l'Église. J'étais déjá plus
catholique que lui lorsque je fis sa connaissance"(In
"Luise Hensel und Christoph Bernhard Schlüter, Briefe aus
dem deutschen Biermeier 1832-1876, hg von Josefi ne
Nettesheim, Munster, Regensberg 1962, p.312, apud E.
Tunner, op. cit. vol. II, p. 686).
(14) SCHOEPPS, "Aus den Jahren Preussischer Not um
Erneuerung Tagebücher und Briefe der Gebrüder Gerlach und
125
Luise influiu muito para que Brentano
com S a i l e r e C h r i s t i a n n a c a s a d o c o n d e d e S t o l b e r g e n o
f i c a r i a c i n c o a n os (1 8 18 - 18 24 ).
126
Trataremos das relações de Brentano com
Katharina Emmerick no próximo capitulo, quando
veremos que ele passou de um entusiasmo
religioso, que o fez pensar em tornar-se
sacerdote, a uma certa desilusão, pois nem
sequer compareceu ao enterro da religiosa.
Partiu, levando suas anotações e relíquias da
estigmatizada.
(15) G O RR E S - Br i ef e, vo l . II I, p . 3 2 , ap u d E. TU N NE R, op .
c i t. , vo l .I I, p . 8 5 6
(16) ADOLF STOLF, Friedrich Carl von Savignys
Professorenjahre in
Berlin 1810-1842, p.313, apud E.TUNNER,op.cit.vol. II, p.856.
127
profeta que ele tomava e que se recusava a ouvir a feiúra
- da "Dolorosa Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo", escrita
- por Clemens classificando-a de "universo de mentiras exalta
das" (17). Bettina, aliás, não cria sequer no catolicismo
- de Brentano e o julgava "sempre capaz de cair nos braços
do primeiro muçulmano que chegasse, com a condição de que
este lhe oferecesse uma casa e uma bela mulher para converter,
ou então de se fazer luterano e de se consagrar à apologia
do protestantismo" (18).
128
rentes ao estabelecimento das Irmãs de S. Carlos em Coblença.
129
Munich, Lammenais, Montalambert, Lacordaire, Edmond de
Cazalès, o conde de Falloux, o príncipe de Polignac. Brentano
tornou-se então especialmente amigo de Montalambert.
juventude por Arnim. (19). Foi para Steinle, bem como para
Luise Hensel e
(19) "Il avoue alors à Steinle qu'il n'ose pas Zui montrer
combien il l'aime, de peur de trop souffrir, si son
ami se détourne de lui. L'idée de vivre dans Ze même
ville que Steinle ne le quitte plus; il essaie - en
vain - d'obtenir sa nomination à l'Académie des Beaux
130
Emilie Linder que ele dedicou várias de suas últimas poesias.
com a religião.
" A s s i m , u m a n o i t e , n a r r a P h i l i p s , e n t r o u C l e mens
e m n o s s a sala de j a n t a r e e n c o n t r o u a l i
m u i t o bo n s am i g os . L o g o c om e ç ou a c onv e r s a r c o m
m a d r u g a d a a i n d a e s t áv a m o s à m e s a , e t í n h a m o s
enquanto u t i l i z a d o p a r a a v i d a " ( 2 0 ) .
(20) “So trat nun Clemens auch eines Abens”, erzählt Philips, “in
unser Speisezimmer und fand dort mehrene gute Freunde. Bald finger
an, die Gesellschaft zu unterhalten und unterhielt sie so, dass
mir noch um zwei-Uhr in der Nacht am Tische fassen und uns halb
Krank/ gelacht hatten. Und was war der Gegensand? Der heilige
romisch Katechismus in Ruck an wendugen auf das Leben”.
Diel = KREITEN, Clemens Brentano- Ein Lebensbild, Heder’sche
Verlags handlung Freiburg im Brisgau, 1877, vol. II, p. 464.
131
Também nessa fase, William Wordworth, que se
ao apresentá-la a Arnim.
A - SENSUALISMO
crisma. Tendo visto uma menina, sentiu por ela tal amor, que
132
castigo por seu pecado. (22).
e não o literário.
levia -
133
Schweitzer, 18-IV-1842-vol. IX, p. 427.
134
nos que ele encontrou numa carruagem, Caroline Tourmon; a
poetisa Caroline von Günderode; Hannchen Kraus; sua segunda
e uma religião que não é sensualismo não tem homens". (25). Na mesma obra
defende ele ainda que para ser feliz, o homem deve seguir os seus
135
riam" as poetisas do próprio corpo". ( 26) .
B - TEN D ÊN C IA S AO IN C ES T O
d e m e u ra i t d a n s s o n i m a g i n a t i o n , l ' i n c a r n a t i o n
i m a g e - s u r l e p la n d e r a ve e t d u M y t h e e t l a
136
viendront la grace et le salut". (27)
a achou parecida com sua mãe. Tunner considera por isso, que
(27) E . T U N N E R , o p . c i t . , vol. I, p . 2 3
(28) M..BR ION, op.cit., v o l . I, p.111
(28) "Ich Kenne eine M e n s c h e n , der g 1 a b t e , a l l e F r a u e n z i m m e r , w e l c h e
ihm
w o h l g e f i e l e n , glichen s e i n e r v e r s t o r b e n e n M u t t e r , s i e g l i c h e n
aber e i g e n t l i c h der g e f a l l e n e n Eva".
C.B.,Gesarmmelt e S c h r i f t e n , C a r t a a um pi nt or -Vol .II p. 22
137
(30) E . T U N N E R , op. cit., v o l . I , p. 45
138
É sintomático que, ao conhecê-la, ele lhe tenha
E diz:
nostalg i a e r a g r a n d e d e m a i s e q u e t u n ã o
te dizer" (31).
"Il y a u n e a u d a c e s i n g u l i è r e , e t b i e n d a n s l e
sent i
(31)Mutter und Kind. Ó Mutter, halte dein Kindlein warm/ Die Weltist kalt und hell
Freuden auch und Schmerzen". C.B., Gedichte -Sauerländ's Verlag, Frank-
139
furt am Main, 1861, pp. 57 a 59.
140
de la mère se répercutent et rèsonnent -
' e n f a n t q u ' e l l e p o r t e e n e l l e . L e p o t e é p r o u v e l a p e r t e e t l e d és i r d e
é t r a n g e i n ti m i t é d ' a v a n t l a n a î s s a n c e , d e c e t t e b o u l e v e r s a n t e u n i t é d o n t
vée, à dépasser l'in timité des an nés d'enfance, à redevenir cette partie
ère elle-même qu'il était jusque la "crise" - qui dut être tragique pour
ide clarté, qui est aussi le signe distinctif du monde de la raison, opposé
141
No final do poema, ele relaciona o seio materno
Afirma Tunner:
142
Esse elemento pode ser encontrado especialmente no Codw i:
T e r r a ; Na Mãe eu preciso
"escavar" Conforme a
misericórdia divina"
Surgiu da terra;
143
"Ce qui fappe dans ces deux strophes, c'est d'
d a n s l es en t r ai ll e s d e s a mère" (38).
eines fahrender Schülers), as relações da mãe com seu filho são descritas ambiguamente, revelando
encanta-se pela beleza de sua mãe, por sua pele branca, por
144
"la matéria prima, a la tierra madre, al estado
primordial de la naturaleza".
al e g o r i a s h á c e n a l u s i o n a l a c ó p u l a d e u n a m a d r e
y s u hi j o , e q ui v al e n d o l a ma d r e a l a f u er z a
extension" (40).
a questão:
"Le fait qu'ils ne s'étaient presque jamais connus dans leurs années d'enfance
de l ' a m o u r f r a t e r n e l q u ' i l y e u t e n t r e e u x
l a s a g e s s e de n e p a s l a i s s e r s'égarer s u r l e
145
fut jalouse des femmes que Clemens aimait, et
c e p e n d a n t , a u f e u d e la pa s s i on . D' i n c e st e à
q u e s t i o n . I l e s t a s s e z t r o u bl a n t d e r e m a r qu e r ,
p o u r t an t , d an s leur c o rr e s pon d a n c e, le
s i n g u li e r i n té r et q ue Be t t in a - prend aux
l i a i s o n s d e s o n f r è r e e t , a u m ê m e t e m p s , q u e lq ue
a i mée (42).
146
l'inceste à cause de l'affection poètique
confirma como era esse amor "juste et bon" que ele tinha por
Betti na:
C - TENDÊNCIA HOMOSSEXUAL
147
ê sua tendência ao homossexualismo, que se manifestava pela
vocation de sa vie"(45):
- p è re i d e a l q ui l ui a to u jo u rs fa i t d é fa u t
- po u r mo i l 'â g e d ' o r; c u lt i v er , la b o ur e r et
148
« Brentano a voua a Arnim une de ces adorations
c h a s s e u r e t t o i l e c e r f , e t p o u rt a n t c h ac u n de
n o u s e s t l 'u n e t l ' a u t re . J e n e p e u x r i e n t e
au bord du Thin"(47).
o v er d a d ei r o g oz o q u e m e e xc i t a o c o ra ç ã o ,
149
47) C.B.. Carta de Brentano a A r n im , a g o s t o de 1803, apud
150
g a n h a r o a m o r . ( M a s d i t o i s t o e n t r e nós, e u te
mesm o p ara - B e t t i n a eu nã o e s c re vo t ã o t ra n q üi l o e í n t im o e
em t u d o i s s o , e te n h o de n o vo u ma s a n t a v e n er a ç ã o p o r i s s o ,
e n t ã o e u s i n t o q u e e u a m o . Q u a n d o - eu co nte mpl ei o s e r d e
assim é c o m o s e t u f o s s e s p a r a m i m o m e u a m a d o , t e u rosto
e l o g o o m u n d o r e c o n h e c e r á o t e u r o s t o . E n t ã o t u a i n da m e
151
Adeu s, Ar nim , pen sa em mi m, pe nsa q ue eu no mei o
com estas palavras o maior amor de toda a minha vida, que toda
(48) "Wenn ich deine Briefe lese, und wiederlese, und die
hohe lust recht betrachte, die sie mir im Herzen
erregen, so kann ich es immer nicht fassen, wie
dumich nur so lieben kannst, und Weiss nicht wie ich
- es ansteilen soll, es zu verdienen. (Aber unter
uns gesagt, ich liebe dich doch mehr als du
mich)...Aber seiversichert Arnim ich schreibe ich
nicht so ruhig, und seelig, und an Klytemnestra kann
ich gar nicht - mehr freudig schreiben, in deinen
Liede an mich hat m ic h de r Ve rs besonders bewegt.
Und Phylades erscheint
Und führet sein en Freund
Und weinet wenn er weinet etc.
die Verse fliessen dir so voll und gluhend, so ein -
fältig prächtig, und wenn ich deiner gedenke, so wie
ich deinen Arbeiten entstehen und wacksen sehe, wie
ich mit allem dem so vertraut bin, und dock wieder
- eine heilige Ehrfurcht davor habe ann fühle ich
dass
ich dick liebe. Wenn ich, das Wesen deinen Poesie -
betrachte, und meine Empfindung für dick du Wesen
aller Poesie, so ist es mir, als wärst du meire
Geliebt e, dein Gesíicht wäre noch verhüllt, aber ich
zöge -
die Nadeln aus deinen aufgewikelten Lokken, und da
Fliessen die Goldnen Gesänge nieder, aber ich
kenne
dich schon, und, bald wird die Welt dein
Angesicht – auch erkennen, wirst du mich
dann noch liegen?
“Lebe wohl Arnim, gedenke meiner, gedenke,
dass ich mit diesen Worten das Liebste
thrste menes Lebens benenne, dass sich meine
ganze Seele bewgt, wennich dir sage, du
lieber, lieber, lieber liebe Arnim. Vergiss
mich nicht – Dein Clemens”.
Clemens Brentano - Austellung - Freies Deutches
Hockstift - Frankfurter Goethes Museum, 1978, pp.
36 -3 7.
152
Em outra carta, Brentano diz a Arnim:
esp e s s o b o s q u e d e A r v o r e s , e e u a c a b a v a d e d a r
(49).
Ou ainda:
n o mundo: tu me r e c o n h e c e r á s ? N ã o s e r e i p a r a
mais sobre a terra" (51). E noutra carta para esse pintor, ele
pergunta:
( 4 9 ) T r a d u z i d o do f r a n c ê s , a p u d A.GARREAU, C l e m e n t B r e n t a n o ,
153
D e s c l é e de B r o u w e r , P a r i s , s e m d a t a , p . 6 7 .
(50) T r a d u z i d o do f r a n c ê s , a p u d A. GARREAU, op. ci., p.85.
154
"Que farei aí em Coblença sem você?" (52).
en lui" (54).
155
(54) E. TUNNER, op. Cit, vol. I, p. 302.
156
Marcel Brion confirma que havia algo de feminino em Brentano
"La Pi e d r a F il o so f a l , o b j et i v o de la obra
todo s l o s e l e m e n t o s g e n i t o r e s " . ( 5 6 ) .
157
D - SENSUALISMO DIALÉTICO
respeito J. Adams:
c o n t i n u a çã o da q ue l a s li n h as p ri nc i p a i s até
e s s a c on v e rs ã o . De m o d o ma i s d if e re n c i a do e
v i v ê n c i a d e B r e n t a n o c o m S o ph i e M ér ea u , q u e d e
D ü l m e n . J á q u e a s d u a s v iv ê n ci a s , e m b r a se
(57).
“übrigens zum -
158
Bernhard Gajek confirma isso ao concluir que
as relações do poeta com a freira tinham um fundo erótico
-
159
Nesse mesmo veio, em sua obra sobre as "Irmãs
E - MISTICISMO ERÓTICO
160
"(.. .) il se fa it une id ée ass ez h aute de l'
s ' a c c o m p a g n e d'illum i n a t i o n s q u i r é v è l e n t u n m o n d e
t r a n s c e n d e n t et p e u t r é v e t i r u n c a r a c t èr e r e l i g i e u x " ( 6 3 ) .
panteístas. Esse Deus não é Deus pessoal, ele é universo -imanente, não
a " r e a l i d a d e p o é t i c a o u reli gio sa" , que esta crença tem por objeto,
que o amo r se e l e v a p a r a a b e m - a v e n t u r a n ç a ( g l ó r i a ) , p a r a a
161
sua própria vida mais s a l t a " e lá "no ín t i m o " e
poética" (64).
162
quer o conhecer intelectual, quer a relação sexual. Daí,
p a r o l e" ( Wo r t au sens de Lo g o s, le V er b e
163
se apresenta a ela como Jesus, denominando o seu
servir apenas a um deus, Sophie, que ele ama, adora e canta (71)
Deus" (72).
F - SADISMO E MASOQUISMO
os seus
164
(72) Apud E. TUNNER, op.cit, vol.I, p.796
(73) E. TUNNER, idem, vol. I, p. 193. .
1
9
5
165
estigmas e suas perdas de sangue. Emocionava-o
s i l e n ci e u se d on t l e s l èv r e s s o nt
166
un symbole du péché original dont tout être humain est cou
" B o a n oi t e a nj o q ue r i do . A h ! q ue r v oc ê o s ai b a
167
"Ele s e j o g o u n o ch i o , d e s ej a n do s er p i s ot e a do ,
e e l a o fez r e a l m e n t e c o m n o j o . E n t ã o e l e c o r r e u
c o m o u m f u r i o s o e d i s s e q u e m e r e c i a i s s o " (78).
que Brentano
" s e l a i ss a it do m in e r vo l on t ie r s p ar l a f e mme
(79).
quis abraçá-lo.
avec G ö r r e s a v a i t e n e f f e t d é b u t é d e la même
(80)
168
Por extensão, mostrava-se covarde, jamais quis
r e t i r a r i a p a r a u ma i l h a co m a lg u n s a m i g o s. ..
M e u D eu s , o n de ir?" (81).
169
traço fazia de Brentano, necessariamente, um homem com
Dissemos que, para Brentano, a Poesia era superior à História. Por isso
a lenda e o mito valiam mais do que os fatos reais. Daí ele nunca se importar com a objeti-
vidade histórica do que relatava, especialmente se a deturpação dos fatos ocorridos favorecesse
História" (83).
histórica,
170
porque é a verdade poética ou imaginativa que dá uma
compreensão mais exata da vida e da arte (84).
No romantismo de C. Brentano, a rea lida de se
171
cos narrados pelos Evangelhos e pelo Antigo Testamento. É
por essa razão também que, durante toda a sua vida, ele
kranz (86).
Por isso ele preferia o magnetismo como meio de cura. Daí ele
172
tendência incestuosa dos sentimentos que tinha para com sua
que no Godwi, -romance escrito na juventude, - Brentano defendeu a completa liberdade sexual não
só como ideal de vida, mas ato como meio de revelação religiosa. A esta posição extremada se
Por outro lado, seu complexo de culpa fazia com que ele i-
173
em que o homem vivia, após a queda original.
divine" (89).
imaginativo.
174
Não há dúvida, por esse comentário, que Brentano
caráct è r e t r a n s i t o i r e d e n o t r e e x i s t e n c e e t
Brentano" (91).
175
Toda a angústia que Brentano sofria, o seu sen-
e atingir o absoluto.
"Com esta tendência para o absoluto, a procura de Brentano ganha, segundo a
moral, um traço novo e decisivo. Ela entra no âmbito da Religião e se torna, pura e
Sophie) ele
176
adora o p r ó p r i o Deus: "Ó Deus bondoso, tú e s t á s
o m n i p r e s e n t e , t u e s t á s e m m i m e n e l a , n e l a em
q u e t u a p a r e c e s t ã o h u m a n o e tão d i v i n a m e n t e
amigável".
D e u s . A go r a e u qu e r o t e a ma r , t e a d o r a r , te
p o e t i z a r . E u só quero d e s e j a r - t e , a b r a ç a r - t e ,
e possuir-te". (94).
(94) "Mit dieser Tendenz zum Absoluten gewinnt Brentanos Suchen nach Halt einen neuen
entscheiden den Zug: estritt ein in den Bereich des Religiösen, wird zum Verlangen
nach "Heil", nach Erlösung schelechthin, überträgt auf den geliebten Menschen die
Merkmale eines Heilandes und gibt seinen Beziehungen zu ihm die Färbung eines
religiösen Glaubens. Er selbst gibt ineiner schwerwiegenden Aussage
den Schlüssel zu dieser Deutung seiner
Erlösungssehnsucht: "Da die Zeit mir den
Glauben genommen hatte, so kannte sie mir doch nie das
Bedürfniss dazu nehmen. Meine Liebe, meine Hinneigung
zu andern waren die Sakramente, von welchen ich allen
himmlischen Trost begehrte, und so musste freilich
meine Hoffnung oft neiderbreceen" ( …)
In diesen Bereich der Absoluten und des Religiösen
erhebt Brentano nun auch das poeoisch Leben, das aus
der Liebe zu Sophie Méreau hervorgehen soll:
"Ein solches Leben erfordert einem heiligen Glauben an irgend etwas Ewiges". Die Frau
wird in die Rolle eines gott-menschlichen Wesens, eines Heilandes hinaufgesteigert:
"Eine Gottheit? Wollen Sie diese Gottheit sein? So werden Sie Mensch,
und erlösen Sie mich".
In ihrer menschlichen Erscheinung betet er
177
Uma outra característica fundamental de
d e s t r u í d o e o es c u r o , o p e s a d o , o m a c i ç o e
178
No drama Die Gründung Prags, Brentano expõe a
sua concepção dualista do mundo e da divindade. Para ele, há
é,
179
de fato, colocado na simetria do "bom e do mau",
e s t á a " f a l sa fi lo s o f i a" ) e o pr i nc í p i o b o m d a
e spir itu al i d ad e , d o s o br e na t ur a l, d a a sc e se
herdada" (97).
(97) "Der Sinn des We rkes, die Erlösung aus der Gewalt der
dämonischen d u r c h d i e h i m m l i s c h e n M ä c h t e , - b e w i r k t a u c h d i e
dualistische Grundstruktur. A l l e s - i s t i n d e t T a t a n g e l e t a u f
d i e S y m m e t r i e v o n " gut und b ö s e , f r o m m u n d u n f r o m m , o d e r
s a g e n w i r b e s s e r , h e i l i g u n d v e r r u c l i t . S i e zieht s i c h d u r c h d i e
g a n z e D i c h t u n g m it ü b e r t r i e b e n e r D e u t l i c h k e i t . G o t t u n d
T e u f e l , H i m - mel and H ö 1 1 e , M a r i a und V e n u s : a l l e
G e s t a l t e n ten bewegen sick zwischen den beiden "Mächten".
(E. Staiger a.a. 0.90). Zwischen dem bösen Prinzip der
Sinnlich - keit (die "falsche Dhilosophie" steht in ihrem
Dienst) und dem guten des Geistigen, des übersinnlichen - der
rettenden Askese, entb rennt der Kampf, der m i t dem Sieg des
Guten, der Lösung der Erbschuld, endensollte". (J. Adams op.
c i t . p p . 39-40).
180
de todas essas fontes como viveu numa época em que o romantismo
universo e da divindade.
além" (98).
a mentalidade
181
dualista, o desejo e a idéia de que ó possível ao homem alcançar
182
Conclui-se, portanto, que Brentano não teve
uma formação intelectual ordenada e não era
por temperamento um homem sistemático, do que
resultou um grande embaralhamento - de suas
idéias. Para facilitar nosso estudo,
queremos distinguir alguns veios ou temas
principais do pensamento de Brentano:
a. o esoterismo e o misticismo;
b. o teosofismo;
c. a alquimia;
d. o
magnetismo; e.
a Cabala.
A - O ESOTERISMO E O MISTICISMO
DE BRENTANO
183
(100) E.TUNNER, op. cit. vol. I, pp. 31-32
184
irmãos morávios, mas falhou em tudo isso. Tornou-se depois professor e pregador religioso em
Berlim, desta vez com sucesso, ingressando inclusive na Academia de Belas Artes de
Berlim como professor. Paralelamente fundou o Magazine para a ciência experimental da alma,
pois era apaixonado por problemas psicológicos e escreveu dois romances: Anton Reises e
185
Brentano se entusiasmou de tal modo pelas idéias
da maçonaria mística, expostas nesse livro, que pensou
fazer-se maçon. Erika Tunner considera provável que ele
tenha se tornado então membro d o s " C o n s t a n t i n i s t a s " , grupo
de carácter maçônico (102). A esse respeito, Albert Garreau
publica uma reprodução de um busto de Brentano jovem, feito
por F. Tieck em Iena em 1803, e que mostra a assinatura de
Brentano nesse tempo e comenta:
tenha
(102)C f r . E . T U N N E R , o p . c i t . , v o l . p . 3 2
( 10 3) Cfr. A.GARREAU, Clement B r e n t a n o , Desclé
186
sido por essa influência que Brentano colocou na "Fundação
187
(104) Traduzimos do francês apu. A. GARREAU,
188
autores ligados à corrente esotêrico-mística. Lá se podem
189
que teve influência na conversão de Brentano ao catolicismo
Companhia de Jesus quando ela foi extinta por Clemente XIV - em 1773. Ele fora aluno do j esuíta
Stattler, cuja obra Demonstractio Catholica fora posta no Index por conter erros/ febronianos.
Sailer sempre se mostrou fiel a seu mestre, defendendo a obra condenada durante toda a sua vida. Ele
exerceu uma grande atividade, quer como professor nas universidades bávaras, quer como autor de
obras religiosas, quer ainda, no fim de sua vida, como Bispo de Ratisbona. Interessava-se pelo
misticismo em voga no seu tempo, tendo sido demitido da Universidade de Ingolstadt sob a acusação
de ser iluminado. De fato, ele sempre teve boas relações pessoais com os místicos iluminados quer
católicas, quer protestantes pietistas. Era, ainda, simpático aos Rosacruzes. Suas idéias eram tão
poucas definidas que algumas de suas obras eram aceitas por católicos e protestantes. Como os
iluminados esotéricos, ele trabalhava para afusão das várias confissões cristãs,deixando os
dogmas à sombra.
Um de seus discípulos foi o famoso Padre Martin Boos
(1762-1825), um dos lideres do movimento"Erweckten"
(Despertados) da Baviera, o qual defendia a mesma te se
de Lutero: a fé justifica o homem sem necessidade de boas
obras. Sailer defendeu seu antigo discípulo e acreditava
que tudo o que Boos fazia vinha de Deus, mas quando o
190
movimento "Erweckten" degenerou, Sailer se afastou um tanto/ dele,
dúvida, q u e e l e e s t ã o d e d i c a d o a l é m d e t o d a
m e d i d a a o mi s ti c is m o .( . .. ) . Cr e io t a m bé m q ue
e l e s e ja da
191
mesma opinião que a conhecida Senhora Krüdener (...). E l e e s t e v e l i g a d o a o f a m o s o
s u í ç o L a v a ter, o qual era de seita de Zwinglio, tanto que em
Zurique se costumava dizer: Sailer tornará - Lavater católico,
e os católicos diziam: Sailer convencido por Lavater adotará a
doutrina de - Zwinglio. Não há dúvida que ele fez causa comum
c o m o s s e p a r a t i s t a s d e W ü r t e m b e r g . E s s e s s ã o uma espécie de
luteranos que desejam um cristia nismo sem forma e sem culto
exterior. Por isto muitos deles emigraram para a América, por
terem sido perseguidos por seus pastores por seu cristianismo por
demais interior. Eles mesmos - batizavam seus filhos, e não
reconheciam nenhum ministro da religião.
amor, mas esta caridade parece -me uma coisa tão fria, que depois
Por vezes eles falam da Igreja, mas eu n ão sei que Igreja eles
entendem.(...).
192
o famoso Stark e outros de se
tornarem católicos. (...). Por isso eles
dizem que ele é ainda mais perigoso
que Lutero que abertamente proc urou
m udar a I grej a de Deu s, e nqua nto que
Sailer procura fazer isso secretamente.
193
Sailer estava de fato relacionado com inúmeros membros
Eckartshausen (107).
(106) (cont.) ais Liebe und wieder Liebe; aber diese Liebe
k a m m i r s o k a l t vor, d a s s s i e m i c h a n e k e l t
nachdem - ich ein paar solcher Briefe gelesen
halte.
( . . . ) d e n n s i e s a g e n , e r s e i n o c h g e f ä h r l i c h e r a ls
Luther, der offen erklärte, er wolle die Kirche
G o t tes u m g e s t a l t e n , während Sailer das im
Geheimen zu erreichen suche.
194
A partir de 1815 Sailer e Brentano mantiveram - laços de
B - BRENTANO E A TEOSOFIA
tempo ele era entusiasta de Novalis e Schlegel que - como vimos - sonhavam
195
apaixonou, lera Boehme e Swedenborg, mas os considerava orgulhosos (110).
Não é de estranhar que no Godwi apareçam traços do pensamento de Boehme.
segundo crê Van Rijnberg, formou uma ordem secreta própria. O certo é
que Saint Martin, por suas obras e pelas traduções que fez de Boehme, teve
(112).
(112) C.B., Gesammelte Schriften, carta a Ringseis, fevereiro de 1816, vol. III, p. 186.
196
de Boehme, de Paracelso e da Cabala. Foi ele um dos que
transmitiu o cabalismo cristão de Oetinger aos românticos. - Brentano se
afastou dele por ciúmes. Baader foi professor de Emilie Linder, e o poeta
C - ALQUIMIA E MAGIA
(113), mas também em Fichte, Schelling, Hegel, assim como nos literatos tais
197
fe dos chamados "Iluminados de Avignon", ex-beneditino, da
Congregação de S. Mauro que traduziu Swedenborg para o francês e fundou
D - MAGNETISMO
biblioteca de Brentano:
(114)Apud B. Gayek "Clemens und Christian Brentano Biblioteken", Carl Winter Universi
198
Sob o nome de magnetismo designavam-se então as
para-normais.
199
se trata do magnetismo dos planetas e das estrelas; da
faculdade magnética dos elementos; da arte ou força magnéti-
ca; do magnetismo da Terra, do Sol e da Lua; do magnetismo -
animal; do magnetismo enquanto medicamento; do magnetismo
e a música; do magnetismo do amor, e de Deus como grande
Magneto Universal.
Philosophie (116).
acreditava que possuia em suas mãos uma força magnética que invadia todo
200
Acusado de praticar magia, Mesmer teve que deixar a
Ernst Benz:
idealismo alemães.
terra, se
201
encontram de volta nos filósofos da natureza,
(117)Alle hier blizartig anklingenden Ideen von der Wissenschaft der Magie, die mi
in der Gegenwart, von ihrer Wiederkher in den kommenden Zeiten der allge
meinen Verbesserung der Erde finden sich bei den Na turphilosophen, der
Romantik wieder - bei Saint Martin in Frankreich, der sowohl von der
theosophischen - Tradition Jacob Boehmes wie von den mesmerischen Ideen
berührt war, in Deutschland bei Passavant, Friedrich von Mayer,
Hufeland, Ennemoser und Justinus Kerner bei Schelling, Franz
von Baader und nicht zuletzt bei Leopold Ziegler um einen anderen
grossen Philosophen des Bodensees aus unserer Zeit zu nennen".
202
de transe. Apôs a queda de Napoleão, houve na Europa uma
grande difusão de misticismo esotérico. É bem conhecida a
203
distingüia o magnetismo animal de outro que ele gostaria de
terapêuta.
204
da natureza (120), idéias que Brentano adotou e expôs nos
livros em que narrou as visões de Katharina Emmerick. Para
não realizava propriamente milagres, e que, por isso, suas curas não eram
já fora submetida a elas por seu médico, Dr. Wesener, e por seu confessor,
205
intimamente ligado ao esoterismo, à magia e ao misticismo,
gnóstica:
"What these texts presents is Gnosticism - and their
essentially gnostic character cannot in my
206
"there is a striking affinity between the
known today" ( 1 2 6 ) .
gnósticos (128).
207
O Sefer-ha-Zohar, obra fundamental da Cabala,
Simeon ben Yochai, quando seu real autor principal foi o Rabi
208
"Se me pedissem para caracterizar numa palavra os traços
a vida misteriosa; al é m d is s o s u st e n ta qu e o s mi st é r io s d a
209
Nessa obra Scholem mostra que a Cabala está
(131) G.G.SCHOLEM, A m í s t i c a j u d a i c a - A s g r a n d e s
c o r r e n t e s d a m í s t i c a j u d a i c a , pp. 207-208.
(132) Cf r . S C H O L E M , i d e m , p p . 2 3 7 , 2 4 0 , 2 4 1 .
(133) Cfr. G. G. SCHOLEM, S a b b a t ai Se v i , t he m y s t i c al M e s si a h ,
Princeton
ton University Press, 1973.
210
para libertar as partículas divinas aprisionadas pelas "K1ippot".
6. 0 CABALISMO CRISTÃO
christianisme; qu'
211
it les révèle et en fournit même l' explication"
(135).
212
for example, that the apparent differences were i n m a n y c a s e s m e r e l y
scheme" (137).
mirifico verbo, libri III", Basileia, 1494 e o "De arte cabalistica, libri
III", ambos tentando - mostrar que a Cabala foi uma revelação original que
do que cristã.
213
falou mais abertamente do que o Zohar (138). Deve-se confiar em Scholem
c riou tant a agi taç ão, n a ver dade ost enta todo s
o s t r a ç o s d o p e n s a m e n t o c a b a l í s t i c o . Boehme
214
a conexão entre suas idéias e as da Cabala
obscurecê-las" (139).
215
A terceira parte da Cabbala Denudata intitula-se
216
que a Cabala chegou aos homens que produziram o "Sturm und Drang" e o
Romantismo.
217
Em várias obras de Clemente Brentano transparece um grande interesse pelo
judaísmo em geral e pela Cabala em particular. Os "Romanzen vom Rosenkranz", especialmente, dão toda
uma visão cabalista da criação e do universo (144), enquanto nas notas da Leben der
cita indicam que os conhecimentos que ele tinha da Cabala não eram de primeira
mão. Por exemplo, as citações que ele faz do Zohar nas notas da Leben der
- como é de praxe (145). Além disso, o Zohar não consta da relação dos livros
da biblioteca de Brentano publicada por Bern - hard Gajek, o que não impede,
contudo, que Brentano tivesse a obra de Moisés de Leon em alto apreço. Como
- revelação primitiva feita por Deus a Adão, revelação essa - que teria
sido conservada por tradição oral entre os judeus, e que fora, mais tarde,
218
Em várias passagens das supostas visões de Katharina Emmerick, ele alude
o que não está exato na Sagrada Escritura e que teria sido feito em
219
Anzahl von Propheten und auch erleuchteten Heiden
an der Ausarbeitung eines heiligen Buches
gearbeitet".
J. ADAMS, op. cit., p. 345.
220
Abraão teria tido um livro sagrado contendo a revelação primitiva que
ele ensinava aos homens e que teria deixa do para Isaac e para seus
(148)
de um grande livro muito antigo que, no futuro, seria dado aos homens.
(149).
221
Esse livro muito antigo, contendo o fundamento
conseguir novamente a
222
posse de uma parte da "verdade antiga" (150).
223
Convém, ainda, citar alguns outros autores e obras de
um comentário particular.
gem Maria teriam sido feitos de uma matéria retirada do corpo de Adão
224
contém elementos cabalísticos retirados das obras de Pico,
de Reuchlin, de Archangelo de Borgonuovo e de Blaise de
Vigenére (1523-1596), o maior dos cabalistas alquimistas
(155). Fludd comete erros enormes em matéria de Cabala,
referindo-se, por exemplo a Rabi Zöhar, Rabi Bahir e Rabi
Bereschit, como se os livros fundamentais da Cabala fossem
pessoas (156).
Brentano possuia também o livro Cogitationes super 4. priora capituli
libri I Moysés Genesis nominator de franciscus Mercurius van Helmont
(1613-1699). Este autor foi amigo de Knorr von Rosenroth, do cabalista
inglês Henri More e de Leibnitz (157) e cooperou na Cabbala Denudata.
Van Helmont/ procurou conciliar num sistema único o neoplatonismo, a
Cabala, a teosofia de Boehme e as ciências modernas e forneceu a Rosenroth
algumas de suas idéias mestras:
"Tanto em Henry More quanto em Van Helmont,
cristã eram
225
idênticas entre si, em seu núcleo esotérico, ou,
objetivo." (158)
famoso que viveu na Alemanha, Polônia e França. Sua principal obra cabalista
esotéricos. Ele escreveu ainda o livro Magnes sives de arte magnetica opus
tripartitus, que influenciou Mesmer (159). Ele foi simpático aos Rosacruzes
(158) "Sowohi bei Henry More taie bei Van Helmont land Knorr
von Rosenroth die beiden Hauptideen ausgesprochen,die ihn zu
einer noch intensiveren BeschJtftigung mit den Kabbala
veranlassten: einmal den Gedanken, dass die Kabbala eine Art
von Uroffenbarung darstelle, die vom Anfang der Welt an ais ein
esoterisches Geheimwissen+ die geistige Entwicklung der
Menschheit begleitet ha-be, und welter den Gedanken, dass
jlldischer und christlicher Glaube in ihrem esoterischen Kern
miteinander identisch seien, das heisst, doss die j7ldische
Kabbala bereits die christlichen Glaubenswahrheiten enthal te
und auf diese hinziele".
226
Outro autor que muito influenciou Brentano em matéria de
tinha muitas obras. Várias histórias que aparecem nas visões de Katharina
assim como o relato de uma suposta viagem de Cristo a Chipre, são diretamente
informações que Brentano fornece sobre literatura rabínica, ele as auferiu nos
produção do Adam Kadmon e a emanação dos dez Sefiroth (165); os quatro mundos
da Cabala luriânica:
227
1) Atziluth, mundo da divindade e da emanação;
Yetzirah, mundo da formação (167), bem como trata ainda da criação dos
( 1 66 ) C f r. G . G . SC HO LE M , A m ís ti ca ju d ai ca , p. 27 5.
( 1 67 ) C r. CB, R o m a n ze n v o m R os e n k ra n z , XI, 144.
(168) Idem, XII, 47.
(169) Idem,
(170)Cfr. Tiraboschi-Storia della letteratura italiana-Mi lano, 1823, vo
228
como um grande conhecedor do Cabala e das teorias de
Isaac Luria, o que é um clamoroso erro histórico, pois Luria
é do século XVI, enquanto Pietro d'Abano viveu nos séculos
- XIII e XIV.
Romantismo.
Brentano.
229
(171) Cfr. W. HÜMPFNER – op. Cit, p. 56.
230
Outra pessoa que influenciou diretamente Brentano em matéria de
Cabala foi Franz Joseph Molitor, que ele conheceu em 1824 e cuja obra
publicada já em 1826.
chegou à conclusão que ele conhecia o Zohar desde 1825 - (174). Se "conhecia"
razão. Mas, se por "conhecia" se deve entender que Brentano estudara e lera o
Zohar diretamente,
231
ficamos bem mais incertos. Pessoalmente, não julgamos que se possa afirmar,
"tout court”; que Brentano estudou ou leu o Zohar. Nossa dúvida deriva do fato
que ele faz alusões vagas demais ao Zohar como texto fundamentador do que
ele chama de "gérmen da bênção", pois, como já dissemos, ele não cita os
capítulos e versículos do livro de Moisés de Leon, nos quais se trataria
dessa questão, mas menciona apenas as páginas do Zohar, segundo uma edição
que ele possuía. Ora, quem quer que tenha lido o Zohar sabe perfeitamente
Zohar os textos que Brentano diz existirem lá. Por outro lado,
cabalistas cristãos.
232
a aceitação de doutrinas esotéricas;
seitas cristãs.
Tendo ela vivido numa época de grande antagonismo entre a ciência e a fé, houve logo quem quisesse utilizá-la para
demonstrar a realidade do mundo espiritual, enquanto os racionalistas acusavam-na de fraude. Tal disputa deixou
resquícios até nossos dias.
A controvérsia não discutiu apenas os estranhos fatos que se davam com a vidente. O papel de Brentano na questão
veio alimentar ainda mais a polêmica.
Discutiu-se:
2. se suas pretensas visões tinham origem sobrenatural, ou eram fenômenos provocados artificialmente pela
hipnose, pelo magnetismo, ou ainda se eram resultantes de uma natureza patológica;
3. se Katharina Emmerick era uma santa, uma charlatã, ou uma simples desequilibrada;
4. se Brentano fora um relator fiel das visões que a freira dizia ter;
5. se as idéias expressas nas visões de Katharina Emmerick eram de responsabilidade apenas de Brentano, ou da
vidente também.
Embora este trabalho tenha um escopo alheio a essas questões, seremos obrigados, pelo próprio desenrolar lógico do
tema, a tratar delas, ainda que de modo apenas incidental. Queremos tão somente verificar se, nos textos publicados
das visões de Katharina Emmerick, há traços de cabalismo e de esoterismo.
Brentano publicou "Das bittere Leiden unseres Herrn Jesu Christi, nebst dem Lebensumriss der
Erzählerin",em1833.
Nesse trabalho o autor apresenta um quadro romanticamente piedoso da vida de Katharina Emmerick, do ambiente
e da região em que ela vivia, com o claro objetivo de comover e obter a simpatia piedosa dos leitores. A publicação
444
da obra enquadrava-se na reação geral do misticismo romântico e do tradicionalismo contra as idéias da Revolução
Francesa e do racionalismo. O trabalho não tinha, contudo, nenhuma objetividade histórica.
Ao morrer, o poeta entregou as anotações dasVisõesao futuro Bispo de Speier, Daniel Bonifaz Hanneberg, que as
repassou ao padre redentorista Karl E. Schmoeger. Este publicou uma vida de Katharina Emmerick (1). Citaremos a
versão francesa dessa obra feita pelo padre E. de Cazalès, amigo pessoal de Brentano (2).
O padre Schmoeger é um dos maiores responsáveis pela grande confusão na questão Emmerick-Brentano. Seu
trabalho foi inescrupuloso. Ele suprimiu textos e omitiu fatos. Analisando os trechos supressos, verifica-se que ele
procurou evitar que o público conhecesse tudo o que - quanto a idéias e costumes na vida de Katharina Emmerick -
pudesse escandalizar a mentalidade católica da época. A publicação dos textos originais veio revelar a falta de
objetividade - seria o caso de dizer "desonestidade"? - do Pe. Schmoeger.
As obras de Diel-Kreiten (3) e do Padre T. Wegener (4) são ainda bastante parciais por causa de sua preocupação
apologética e piedosa.
O próprio processo de canonização da freira, introduzido em 1892-1894, se mostrou marcado pela mesma falta de
objetividade e pela preocupação dos postuladores em salvar a qualquer custo a canonização dela.
O resultado foi a transformação do processo em uma verdadeira embrulhada ("un vero guazzabuglio"), na pitoresca
expressão do voto I da "Relatio et vota Congressus Peculiaris 10-II-1981", documento da "Sacra Congregationis Pro
Causa Sanctorum" p. 1225. E"verdadeira embrulhada exatamente na reprodução daqueles documentos(das
testemunhas)feita de modo cientificamente bárbaro, e com critérios que escapam a qualquer classificação, e que não
é nem possível intuir qual seja, tanto eles são arbitrários e fora do mais elementar bom senso, de forma caótica"(5).
Foi entretanto o processo de canonização que começou a trazer alguma luz à questão Emmerick. Ao se chegar à fase
do processo que exige o exame dos escritos da "Serva de Deus" (título dado a quem está em processo de
canonização) encontrou-se um sério obstáculo: as idéias expressas nos escritos de Brentano impediam a
canonização da vidente.
Em 1917, os três censores encarregados do exame dos escritos atribuídos à freira de Dülmen, chegaram
unanimemente à mesma conclusão: os textos eram de exclusiva responsabilidade de Brentano. Portanto, o processo
poderia prosseguir. Entretanto, os Cardeais decidiram que eram necessários estudos mais profundos a respeito da
autoria das "Visões", e incumbiram o Padre Winifrid Hümpfner, O.E.S.A., de estudar a questão. O resultado foi uma
obra na qual Hümpfner concluiu que os textos de Brentano a respeito dasVisõesda freira de Dülmen
são"mistificação científica, consciente e premeditada"(6).
Tendo em vista essas conclusões, acolhidas pela congregação dos Cardeais que julgava o caso, a Sagrada
Congregação dos Ritos emitiu, em 18 de maio de 1927, um decreto declarando expressamente que"os escritos
atribuídos à Serva de Deus eram obra de Brentano, e, conseqüentemente, nada obstava a que se procedesse ad
ulteriora"(7).
O processo, entretanto, não foi adiante em virtude de veto do Santo Oficio em 30 de novembro de 1928,
considerando impossível uma continuação, pois uma eventual canonização de Katharina Emmerick viria dar grande
autoridade aos escritos que se lhe atribuiam.
"Os escritos do Brentano, por isso, não devem ser considerados como ditados pela Emmerick, e nem mesmo
autênticas transcrições das suas afirmações e de suas narrações, mas sim uma obra literária de Brentano, e com tais
amplificações que "não é possível estabelecer um núcleo verdadeiro e próprio, que se possa atribuir à Emmerick"
(8).
Parece-nos, entretanto, que a grande preocupação desses estudos, feitos em função do processo de canonização, foi
eximir a freira de qualquer responsabilidade pelos escritos de Brentano, a fim de que o processo pudesse ir adiante e
manter-se fora de questão a posição de Katharina Emmerick quanto às idéias expressas por Brentano nos textos das
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"Visões". Apesar das limitações inerentes a seu trabalho, um dos méritos do Pe. Hümpfner foi, porém, o de provar a
falta de escrúpulos de Schmoeger, pondo a nu as falsificações realizadas por ele e por Brentano. Além disso, depois
de seu estudo, exigiu-se o exame dos originais das anotações do poeta, abandonando-se o estudo da questão com
base em Schmoeger.
Desde então podemos notar duas tendências nos estudiosos do problema Emmerick:
1. Uma corrente puramente científica que analisa os documentos originais, sem se preocupar em determinar a
santidade de Katharina Emmerick. A esta corrente pertencem as obras de Joseph Adams, S.C.J. (9), e as de Anton
Brieger (10).
2. Uma corrente que, embora apresente obras documentadas, tem a preocupação de, comprovando a inocência da
vidente, facilitar sua canonização. Entre essas obras de preocupação piedosa, deve-se citar"In Banne des
Creuzes-Lebensbild der stigmatisierten Augustinerin Anna Katharina Emmerick"(1774-1824) de P.H.J. Seller,
O.E.S.A., e Pe. Ildefonz Maria Dietz, O.E.S.A.
Nestas obras, está ausente o tratamento das questões doutrinárias dos textos de Brentano e das idéias expressas por
Katharina Emmerick.
Para nosso estudo da vida da freira de Dülmen utilizaremos o"Diário do Dr. Wesener",além dos textos de Brentano,
tais quais foram publicados por Adams e Brieger. Consultaremos ainda as obras de Hümpfner, Diel-Kreiten e Dietz,
além de autores secundários. Aproveitaremos do Pe. Schmoeger informações não controversas, ou textos que
tragam alguma luz sobre a questão.
Katharina Emmerick nasceu em 8 de setembro de 1774, em Flamske, aldeia próxima a Coesfeld, na Westfália. Era
filha de Bernard Emmerick e de Anna Hillers. Foi batizada logo após o nascimento, na paróquia de S. Tiago de
Coesfeld (11).
Seus pais eram camponeses e tiveram nove filhos, dos quais Anna Katharina Emmerick foi a quinta. Adams cita
palavras de Katharina Emmerick sobre o seu nascimento que Schmoeger, aliás, omite:
"Eu fiquei sabendo que vim ao mundo com um sinal raro: uma planta como uma espiga de milho, chamada a espiga
da sabedoria. Minha mãe tirou-a por insensatez e, com isso, perdi algo. Eu veria, possuindo-a, muito mais
claramente as coisas; sim, tão claramente, como jamais nenhum homem recebeu o dom de ver, sendo capaz de vir a
saber e reproduzir tudo. Mas, para tudo recordar e esgotar o assunto eu vi, em minha juventude e depois, que muitas
coisas foram destruídas, por causa da insensatez e ignorância das pessoas, especialmente dos padres" (12).
(12). Segundo Katharina Emmerick, um sinal parecido a essa"espiga da sabedoria"existiu também em José do Egito
e nos profetas do Antigo Testamento. No Tagebuch, X, 8, 2, ela menciona também essa espiga, afirmando que ela se
encontrava"acima do umbigo, na região do estômago onde tinha agora o sinal da cruz latina". "Trêsmulheres
estavam assistindo meu nascimento, e uma delas me desatou (a espiga)"(13).Note-se a contradição dos textos: num
é a mãe, noutro, uma das parteiras que lhe desata a"espiga da sabedoria".
Ora, há nessas afirmações uma grave confusão entre a ordem natural e a ordem sobrenatural. Nenhum apêndice ou
excrescência física pode produzir, de si, o dom da profecia, que é uma graça de Deus. Esta confusão entre natureza
e graça é típica da Gnose romântica.
Brentano faz uma descrição romântica da região de Katharina Emmerick e da moralidade dos habitantes que
Schmoeger faz questão de citar:
"Não posso esquecer como uma manhã bem cedo, passando perto de uma cerca, ouvi uma voz de criança:
aproximei-me devagarinho e vi uma pastorinha em farrapos, de aproximadamente sete anos, que caminhava atrás de
alguns gansos num prado, com uma vara de salgueiro na mão. Ela dizia com um acento inimitável de piedade e de
sinceridade:
"Bom dia querido Senhor Deus! Louvado seja Jesus Cristo! Bom Pai, que estais no céu! Eu vos saúdo Maria, cheia
de graça! Eu quero ser boa, quero ser piedosa! Bons santos do paraíso, bons anjos, eu quero ser boa. Tenho um
pedaço de pão para comer, eu vos agradeço por esse querido pão! Ah! Protegei-me também para que meus gansos
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não vão para o meio dos trigais, e que algum malvado rapaz não mate alguns deles a pedradas! Protegei-me,
portanto. Eu quero ser uma boa menina, querido Pai que estais no céu'' (14).
(14). Brentano procura fazer crer que assim eram as crianças de Münster. Que assim foi Katharina Emmerick
pequenina. Que a região era quase o paraíso da inocência. Só não se compreende como nesse ambiente, tão
idilicamente piedoso, houvesse"rapazes maldosos"que se divertiam matando gansos a pedradas...
Schmoeger conta ainda que, segundo asVisõesque Katharina Emmerick teve de si mesma, ela possuíra o uso da
razão desde o nascimento e que, ao ser batizada, teria contraído núpcias místicas com Jesus Cristo (15). Entretanto,
segundo o Dr. Wesener, ela nunca tinha visões sobre si mesma (16). Por isso, as supostas visões da freira sobre si
mesma gozam de ainda menos credibilidade que as demais (17).
Brentano afirma que, quando pequena, ela tinha visões de Jesus jovem e de João Batista menino, aos quais ela
chamava de "Jungsten" e "Hanneschen"(18), sendo que o primeiro a ensinava a fazer vestidos para a sua boneca. Diz
também que, quando menina, contava ao pai cenas bíblicas que assistia em visão e o pai, comovido, chorava,
perguntando onde ela aprendera tais coisas (19).
De 1786 a 1789, ela trabalhou como empregada na casa de um seu parente, Gerhard Emmerick, e depois foi
aprender o oficio de costureira na casa de Elisabeth Krabbe, onde ficou até 1794 (20). Trabalhou no oficio de
costureira até 1799.
Ela desejou ser freira, mas por ser muito pobre e doente, teve dificuldades em ser recebida em conventos. Foi
recusada pelas agostinianas de Borken, pelas trapistas de Darfeld, pelas clarissas de Münster (21). Pensou então em
aprender a tocar órgão, o que lhe abriria mais facilmente as portas de alguma casa religiosa. Para isso, entrou como
empregada na casa do organista Söntgen, em Coesfeld. Lá tornou-se amiga da filha do organista, Klara Söntgen, que
também queria ir para o convento. Segundo Wesener, nessa casa, ela não aprendeu a tocar órgão, mas aprendeu a ler
e a escrever (22). Na verdade, foi o pai que a ensinou a ler e a escrever.
Os biógrafos costumam dizer que ela leu pouco. Brentano diz que ela nunca leu a Bíblia, o que é surpreendente, pois
ela leu várias obras piedosas e místicas:
"Meu próprio pai me ensinou a ler. (...) Eu nunca li muito. Eu não posso ler muito, logo saio fora de mim (ficava em
êxtase). Eu não posso ler um capítulo completo de Thomas de Kempis. Eu não sou perseverante, para mim tudo tem
que ser breve. (...) Eu gosto de ler o baixo alemão do pregador Tauler. É um dos poucos livros com os quais posso
entreter-me bastante. Eu entendo o livro, e ele me entende. Mas, mesmo assim, eu não o leio muito, mas algumas
vezes tenho ouvido lê-lo, o que várias vezes me provocou visões muito bonitas" (23).
(23). Permaneceu com os Söntgen de 1799 a 1802, e, nesse último ano, segundo afirmou mais tarde, teria recebido
misticamente a coroa de espinhos de Cristo, mas sem efusão de sangue, apenas com um inchaço na fronte, nas
têmporas e até nas faces. Foi só mais tarde, quando já estava no convento, que sua testa começou a sangrar, em
pequenos pontos (24).
Quando ela tinha 16 ou 17 anos, os pais pensaram em casá-la, mas ela recusou porque tinha uma invencível aversão
pelo estado matrimonial (25):
"Quando já em minha primeira juventude eu fui instruída de modo sobrenatural a respeito da geração temporal dos
homens, sem ter que pensar muito sobre o assunto, a minha fantasia, pela graça de Deus, nunca se preocupou com
isso, e, quanto ao que me concerne, permaneci totalmente inocente a respeito dessas coisas, e essa questão era para
mim mais uma causa de aversão e de compaixão para com as pessoas do que algo contra o que tivesse que lutar,
como as outras crianças. Ainda muito criança, eu fazia censuras a meu Deus amado, dizendo que podia ter feito
essas coisas de modo diferente. Eu sempre tive aversão pelo casamento. E quando via uma noiva não podia deixar
de chorar" (26).
(26). Ora, esta aversão ao casamento não é natural, e indicava nela, ou idéias gnósticas, ou pelo menos, uma
mentalidade doentia. Jamais uma santa pensaria assim.
Quando Katharina Emmerick decidiu entrar para o convento, os pais ficaram desgostosos, mas não conseguiram
demovê-la. Junto com sua amiga Klara Söntgen, foi recebida no convento de Agnetenberg, das agostinianas de
Dülmen, em 03 de novembro de 1801. Tornou-se noviça em 13-XI-1802, e fez os votos em 13-XI-1803.
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No convento, Katharina Emmerick teve uma vida sofrida, estando constantemente doente. Segundo o Dr. Wesener,
todas as suas doenças tinham um caráter nervoso próprio (27), e além dessas doenças de caráter nervoso, sofreu um
acidente em que machucou a bacia. Ademais, moralmente, sofria ao constatar a não observância da regra
conventual.
Em 3 de dezembro de 1811, o convento de Agnetenberg foi supresso pela aplicação de um decreto napoleônico de
14-XI-1811. A região de Münster teve soberano eclesiástico até 1802, o último dos quais foi o irmão do Imperador
José II da Áustria, o príncipe bispo Maximiliano-Xavier. Quando da vacância da Sé episcopal em 1802, a Prússia
ocupou a região e, em 1803, por decisão imperial, a Prússia ficou na posse da cidade de Münster, enquanto a região
ao sul foi dividida por vários príncipes. Depois da batalha de Iena, a região de Münster passou a fazer parte do
Grão-Ducado de Berg, criado por Napoleão, para o primogênito da Rainha Hortência. A partir de 1810, toda a
região foi anexada ao Império francês, e assim ficou até o Congresso de Viena, quando voltou a pertencer à Prússia
(28).
Katharina Emmerick permaneceu ainda algum tempo no edifício conventual, mas, nos primeiros meses de 1812,
teve que sair, indo morar juntamente com o capelão do convento, o padre emigrado e refratário francês Jean Martin
Lambert, que sempre a apoiara, na casa da viúva Roters. Katharina Emmerick pretendia servir seu ex-capelão, que
estava adoentado, mas depois caiu tão doente que foi ela quem teve que ser servida. Segundo seu depoimento no
inquérito estatal, foi em 28-VIII-1812, festa de S. Agostinho, patrono de sua ordem, que ela recebeu um primeiro
sinal místico: sobre seu estômago apareceu uma cruz sangrenta. Semanas depois teria aparecido uma segunda cruz,
parecida com a cruz de Coesfeld, sobre o osso esterno, sangrando periodicamente. No dia de Santa Catarina
(25-XI-1812), uma outra cruz, semelhante à antecedente, apareceu sobre o osso esterno, acima daquela que já
recebera, formando uma só marca. No natal de 1812, ela recebeu os estigmas de Cristo nas mãos e nos pés. E
finalmente, a 29-XII-1812, recebeu a chaga do peito de Cristo, no seu flanco.
Todas estas datas foram citadas por ela em seu depoimento a Overberg, em 1812, mas Anton Brieger dá datas
diferentes para cada caso. Em 28-VIII-1812, ela teria recebido o estigma da cruz no peito; no dia de Santa Catarina
(25-XI-1812), uma segunda cruz; e, no final de 1812, as chagas nas mãos, nos pés e no flanco (29).
"A dupla cruz sobre o esterno sangrava, a maior parte das vezes, às quartas-feiras. As chagas do flanco e da cabeça,
apenas às sextas-feiras" (30).
(30). O padre Joseph Alois Limberg, dominicano cujo convento fora fechado, e que morava em Dülmen, foi
chamado para ouvir Katharina Emmerick em confissão, na quaresma de 1812. Quem o chamara fora sua tia, ex
mestra de noviças no convento da vidente. Desde então, ele se tornou seu confessor ordinário. Em 31 de dezembro
de 1812, ao levar-lhe a comunhão, constatou pela primeira vez o sangramento das chagas nas costas das mãos. Em
28 de janeiro de 1813, o Pe. Limberg pôde ver, pela primeira vez, as chagas dos pés de Katharina Emmerick (31).
Os estigmas de Katharina Emmerick começaram a ficar conhecidos do público a partir de 28-II-1813, quando sua
amiga e companheira de convento Klara Söntgen viu as chagas sangrarem. Logo, toda Dülmen falava do caso. Não
eram porém, só as chagas que causavam maravilha: Pe. Limberg assegurava que, desde que a freira recebera os
estigmas, não tomara mais nenhum alimento sólido, a não ser a comunhão (32).
Logo que caiu no conhecimento público que havia em Dülmen uma freira com estigmas, o padre Rensing, decano da
cidade, comunicou o fato ao Vigário Geral de Münster, Clemens Auguste Dröste-Vischering, enquanto o Dr.
Wesener, que fora chamado para tratar da freira, juntamente com os Padres Lambert e Limberg, o decano Rensing,
e o Dr. Peter Krauthausen, médico que cuidara de Katharina Emmerick durante sua vida no convento, decidiram
fazer um exame geral da paciente, e redigir um protocolo que seria comunicado às autoridades eclesiásticas.
Tal exame se deu em 22-III-1813 e o protocolo diz o seguinte a respeito das chagas de Katharina Emmerick,
segundo Schmoeger:
"Nas costas das suas duas mãos nós notamos crostas de sangue seco, sob as quais havia uma chaga. Na palma das
duas mãos, havia crostas semelhante de sangue coagulado, só que elas eram menores. Nós encontramos estas
mesmas crostas sobre a parte exterior dos pés e no meio da planta do pés. Elas eram dolorosas quando se as tocavam,
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e aquela do pé direito tinha sangrado, havia pouco tempo. No flanco direito nós vimos, um pouco acima da quarta
costela, contando a partir de baixo, uma chaga longa de aproximadamente três polegadas, que deve sangrar algumas
vezes. Sobre a cavidade do estômago nós vimos algumas marcas de formato redondo, que pareciam um cruz
fendida. Pouco mais abaixo, nós vimos uma cruz comum, formada por largas faixas de meia polegada, e
semelhantes a ferimentos. Na parte superior da testa, nós vimos, em grande número, como que picadas de agulha,
que iam dos dois lados, até a raiz dos cabelos" (33).
(33). Conforme o diário do Dr. Wesener, a cruz latina de largos traços, estava situada no baixo-ventre, abaixo do
umbigo (34). Segundo o protocolo da primeira pesquisa, de 22-III-1813, ela estava exatamente acima do umbigo, o
que é mais crível. Rensing enviou então um relatório ao Vigário Geral de Münster, falando das virtudes de
Katharina Emmerick, de seu jejum habitual (dizia que ela só tomava água e recebia a comunhão, qualquer outro
alimento era vomitado), de seus desmaios ou "êxtases", e de seus estigmas. O relatório tem a data de 25-III-1813
(35).
"Durante este desmaio, que eu chamaria antes de um santo êxtase, ela ficava rígida como uma tábua" (36).
(36). No dia 28 de Março de 1813, o vigário geral de Münster, C.A. Dröste-Vischering, acompanhado do famoso
decano Overberg e de seu médico pessoal, Dr. Druffel, chegou a Dülmen, submetendo Katharina Emmerick a um
rigoroso exame, do qual se redigiu um processo verbal. Em seguida, esse homem que unia"a uma inquebrantável
força de caráter, uma sensibilidade de alma, levada a tal ponto, que lhe acontecia, muita vezes, de comprar pássaros
engaiolados para lhes dar a liberdade"(37),incumbiu o Pe. Overberg de investigar a vida, interior e exterior de
Katharina Emmerick, ordenando a esta que nada lhe ocultasse. Ele nomeou em 31-III-1813 o decano Rensing, como
diretor extraordinário de Katharina Emmerick, recomendando-lhe que observasse com todo o cuidado a freira, bem
como determinou ainda que o Dr. Krauthausen tudo fizesse para curar as chagas e doenças da paciente. O Vigário
obrigou ainda Klara Söntgen a fazer-lhe um relatório secreto sobre tudo o que se passasse com Katharina Emmerick.
A 7 de abril de 1813, o Vigário Geral voltou a visitar a vidente, ficando muito satisfeito com o que viu e ouviu, e
retornou uma terceira vez, em 28 de abril, juntamente com Overberg e o médico protestante Stadtlohn. Por seu lado,
o decano Rensing e o Dr. Krauthausen assistiram ao novo exame a que Katharina Emmerick foi submetida, sobre o
qual Dröste-Vischering fez um relatório acompanhado dos desenhos das chagas (38), que reproduzimos a seguir:
O decano Rensing não ficou totalmente certo da sinceridade de Katharina Emmerick, na questão de seu jejum
absoluto - sobre o qual o próprio Pe. Limberg tinha dúvidas (39) - vindo, com o tempo, a afastar-se de Katharina
Emmerick, sem lhe dar crédito. Suspeitava-se, com efeito, de que Katharina Emmerick se alimentasse às
escondidas, e mesmo de que seus estigmas fossem produto de uma fraude. Decidiu-se, em decorrência, que ela seria
vigiada continuamente durante dez dias, por vinte pessoas de Dülmen, e que, durante esse período, o Pe. Lambert,
sobre quem recaiam as acusações de fraude, ficaria afastado da freira. Nesses dez dias, a vidente só tomou água e
ninguém tocou em suas chagas, tendo sido constatado sangramento dos estigmas nos dias 16 (4a. feira - as cruzes),
18 e 19 (6a. e sábado - os estigmas) (40).
Feito tudo isso, dissiparam-se as suspeitas, e o vigário geral de Münster concluiu pela veracidade dos fenômenos
que se davam em Katharina Emmerick, sem, todavia, excluir a possibilidade de que se continuasse a examiná-la, e,
em 1817, sugeriu ao conselheiro de Estado Ludwig Von Vincke (41), que fosse feita nova investigação por uma
comissão mista da Igreja e do Estado prussiano, proposta porém, que não foi aceita.
Em 3 de fevereiro de 1819, o conselheiro Vincke convocou uma Comissão para investigar o caso Katharina
Emmerick. O Chefe da Comissão era o subprefeito de Münster, Clemens Maria Von Bönninghausen. Os demais
membros eram o Dr. Alexander Rave, médico em Borken, perto de Dülmen, o Dr. Busch, de Münster, o pároco
Niesert, de Velen, o vigário Roseri, de Leyden, e o professor Roeling, de Münster. Os padres pretendiam ter ordem
do vicariato de Münster para participar da Comissão, o que não era verdade. Na seqüência, Bönninghausen pediu a
Katharina Emmerick que deixasse levá-la à casa do Conselheiro Mersmann.
Nesse tempo, Brentano já estava instalado em Dülmen, junto à vidente, e pediu para ser arrolado como testemunha
do inquérito, mas, tanto Bönninghausen quanto Vincke repeliram a proposta, e Brentano, a pedido de Katharina
Emmerick, foi para Bokholt, enquanto durou o inquérito.
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A 6 de agosto, chegou a Dülmen o Conselheiro de Medicina Borges, protestante e muito hostil a Katharina
Emmerick, que logo se integrou à comissão de inquérito. No sábado, 8 de agosto de 1819, Bönninghausen levou à
força Katharina Emmerick para a casa do conselheiro Mersmann, onde ficou vigiada e submetida a interrogatórios,
até 28 de agosto. Procurou-se separar a freira dos padres seus amigos, do Dr. Wesener e de Brentano, porque se
queria averiguar, se as suas chagas não eram feitas artificial e fraudulentamente, como também confirmar se, de
fato, ela não se alimentava às escondidas.
Estava essa comissão cheia de preconceitos racionalistas contra a religião, e os estranhos fatos que se davam com
Katharina Emmerick eram vistos como uma fraude, para sustentar a luta da fé contra o racionalismo:
"A pesquisa de 1819 se situa assim claramente no pano de fundo dos conflitos entre a Igreja Católica e os poderes
públicos protestantes da Prússia"(42), diz Erika Tunner. Mais. As violências que sofreu então Katharina Emmerick
só se explicam pela luta acirrada que havia, então, entre o racionalismo iluminista e o misticismo romântico,
especialmente na Alemanha.
Já na primeira noite do seqüestro, houve um incidente que pesou muito contra Katharina Emmerick, e que
Schmoeger cuidadosamente evita mencionar, embora o Dr. Wesener, cujo relato ele diz ser"muito fiel e muito
verídico'', o conte (43):
"Sábado, 7 de agosto, a enferma foi levada à força, acompanhada por soldados, à casa do Sr. Conselheiro
Mersmann, onde chegou sem sentidos, mas viva. Como eu não sabia se poderia visitá-la em sua prisão, enviei o
pedido anexo ao presidente da Comissão de investigação. A visita me foi permitida. Então eu tirei a enferma da
cama e a mantive sobre meus joelhos, por cerca de uma hora. Ela estava muito fraca, porém contente... Agradeço a
Deus, disse ela, que hoje me deu paciência. Ela espera gozar a dita graça por mais tempo. Depois que eu estava com
ela há cerca de três quartos de hora já, entrou no quarto o Conselheiro Médico do Governo, um homem doentio,
portador, segundo consta, de uma doença venérea. Estava escuro e a enferma não percebeu sua presença. Mas,
quando ele tomou assento a dois passos dela, ela se aconchegou a mim e disse ter um medo extraordinário. Eu lhe
perguntei em voz alta: "Você sente medo, mas o que a amedronta?" Respondeu: "Eu não sei, mas é alguma coisa que
me provoca medo. Eu não percebi nada senão um desagradável odor de cânfora". Em seguida, o médico Dr. Bush,
da Comissão de Investigação, encarregado da vigilância, comunicou-me que minhas visitas não podiam mais se
realizar. Por isso, eu me dirigi nessa mesma noite ao supremo presidente, Von Vincke, a quem apresentei e repeti as
advertências contidas na carta dirigida ao Sr. Conselheiro, afirmando que o trabalho braçal, para alívio da enferma,
não poderia ser feito convenientemente por uma mulher, etc. para a qual eu anexei a carta, que recebi do Sr.
presidente, no dia 10. Aqui devo encerrar meu diário, até que agrade ao Senhor Jesus, louvado na eternidade, me
permitir continuá-lo" (44).
(44). É sintomático que o Pe. Schmoeger tenha omitido esse incidente. Realmente, é muito estranho para uma
estigmatizada, com fama de santidade, ser encontrada, à noite, no colo do seu médico, e no primeiro processo de
canonização de Katharina Emmerick, introduzido em 1892-1894, o advogado do diabo objetou esse fato contra a
santidade da Serva de Deus. Entretanto, os defensores da causa responderam que isso nada tinha contra a castidade
e a modéstia da paciente, sendo antes preciso admirar a caridade e a paciência do médico (45).
Se assim fosse, a justiça mandaria que se admirasse também a paciência e a caridade do médico, do Pe. Limberg e de
Brentano, em cujos braços Katharina Emmerick dormia, por vezes:"Ela dorme em meus braços como uma criança
(...)"escreveu Brentano para Luise Hensel, no seu diário de Dülmen (46).
O Vigário Geral de Münster proibiu imediatamente qualquer participação de eclesiásticos na comissão de inquérito
prussiana. Os padres Roseri e Niesert, deixaram então Dülmen (47).
Enquanto Katharina Emmerick ficou à disposição da Comissão de Inquérito, permaneceu num leito colocado no
meio de uma sala, de modo que era fácil vigiá-la. Duas pessoas permaneciam de guarda, além de uma Sra. Wietner,
encarregada de servir a enferma, e de espioná-la. Durante os 20 dias que durou o inquérito, Katharina Emmerick foi
submetida várias vezes a longos interrogatórios, e seu corpo foi examinado várias vezes, sem cuidado, nem respeito.
Com efeito, diz Schmoeger:
"Na sua brutalidade selvagem, eles nem suportaram que a tímida virgem, consagrada a Deus, se cobrisse o peito:
cada vez que ela se cobria, tremendo, eles abriam brutalmente os panos, e retrucavam seus súplices lamentos com
brincadeiras cínicas " (48).
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(48). Evidentemente, a atitude brutal dos inquisidores é condenável, mas parece-nos que o Pe. Schmoeger romantiza
um tanto a situação, uma vez que"a tímida virgem"se deixava despir muitas vezes pelos padres que a assistiam, tanto
que isso constituiu uma das "Animadversiones " levantadas pelo advogado do diabo contra a sua canonização (49),
e os padres continuaram a despi-la e a vesti-la, mesmo depois que o Vigário Geral de Münster determinou que isto
só fosse feito por pessoa do sexo feminino.
No dia 13 de agosto de 1819, uma sexta feira, Katharina Emmerick teve uma leve efusão de sangue, na fronte, e os
inquisidores logo a acusaram de ter provocado isso, esfregando a testa com as mãos, num momento em que a
enfermeira havia se afastado. Outra mancha de sangue teria aparecido na sua camisola, provinda da chaga de seu
flanco, e os inquisidores afirmaram que ela havia derramado café sobre a roupa. Em suma, os membros da comissão
eram tão prevenidos, e agiam com tal preconceito, que seu relatório final não pode ser levado a sério, o que não
significa admitir que os fenômenos que se davam em Katharina Emmerick fossem de ordem sobrenatural.
De qualquer modo, a partir dessa investigação, o decano de Dülmen, Bernard Rensing, que antes era favorável a
Katharina Emmerick, tornou-se contrário a ela, pondo em dúvida a veracidade de seus estigmas, que ora ele
suspeitava que tivessem origem natural, ora artificial, ou ainda diabólica. Katharina Emmerick foi, afinal, liberada
em 28- VIII-1819, sendo levada de volta para sua casa. A investigação acabou nada provando contra ela, embora
alguns pontos tenham deixado dúvida:
1º. o fato de Katharina Emmerick ter confessado que arrancou as cascas de suas chagas;
2º. o fato de terem cessado bruscamente as hemorragias das chagas, pouco antes de se começar a investigação de
1819.
0 médico de Katharina Emmerick, Dr. Franz Wilhelm Wesener (1782-1832), foi discípulo de Schelling. Estudou em
várias Universidades alemãs, entre as quais a de Halle, onde aprendeu algo de magnetismo com o Dr. Reil (50).
Conheceu Katharina Emmerick, em 1807, quando ela ainda estava no convento, e ele fora chamado para uma
consulta pelo médico das freiras, Dr. Krauthausen, e voltou a vê-la somente em 23 de Março de 1813, quando seus
estigmas já eram de conhecimento público. Nesse tempo, ele ainda era um homem sem fé.
Assim que começou a tratar da freira estigmatizada, Wesener deu inicio a um diário dos fatos que se passavam com
ela, o qual vai de 23-III-1813 até 03-XI-1819, quando cessa bruscamente. Além do diário, Wesener escreveu uma
pequena biografia de sua paciente.
O diário de Wesener é um documento de extraordinário valor para se elucidar a questão Emmerick, visto que ele é
bem mais objetivo e sincero do que Brentano. Veja-se o que ele conta da primeira visita que fez a Katharina
Emmerick:
"Depois que entrei em seu quarto, o ex dominicano Pe. Limberg a (Katharina Emmerick) levantou da cama, e a
colocou no colo de sua irmã. Ela permaneceu num estado de desfalecimento. Antes, trocaram-lhe a roupa a qual
estava molhada de suor como se tivesse sido mergulhada na água. Do mesmo modo, estavam molhados os lençóis.
Também os travesseiros, e o chão embaixo da cama estavam molhados.
"Por ordem do Pe. Limberg eu toquei os ombros dela com minhas mãos. Ela estremeceu suavemente, e depois ficou
novamente tranqüila. Então o Pe. Limberg a tocou com os dois dedos consagrados. Ela esboçou um sorriso, e seus
ombros passaram a ter um movimento convulsivo.
"Nós fizemos esta experiência, várias vezes, com o mesmo resultado. Ainda mais freqüentemente fizemos a
seguinte experiência: o Pe. Limberg movimentava os dois dedos consagrados até cerca de duas polegadas dos lábios
dela. Logo, o seu corpo rígido, como o ferro atraído por ímã, se curvava em direção aos dedos. E quando ela
alcançava os dedos com os seus lábios, ela os beijava e chupava o dedo indicador. 0 Sr. Pe. Limberg animava-a
instantemente a morder um pedaço do dedo, mas ela dizia que não podia fazer isso, e como o Sr. Limberg lhe
perguntasse por que ela chupava o dedo, dizia: 'Porque ele é tão doce'! Depois disso, por ordem do Pe. Limberg, eu
colocava meu dedo na boca dela, mas ela permanecia em seu desfalecimento, e não se movimentava mais.
"Tudo isso aconteceu estando ela rígida e desfalecida, com os olhos bem fechados.
"No meio desse desfalecimento, o Pe. Limberg curvou sua cabeça bem devagar em direção a ela. Quando estava a
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cerca de três polegadas do seu rosto, o corpo, aparentemente morto, se ergueu para o crânio do Pe. Limberg, e ela
encostou a boca na cabeça dele. Quando o Pe. Limberg a colocou de novo sobre o travesseiro, seu corpo todo estava
duro como um pedaço de madeira, tanto que, se eu a segurasse pela cabeça, talvez pudesse endireitar todo o seu
corpo. 0 Pe. Limberg fechou a cortina da cama, o francês Lambert colocou uma dupla coberta de lã, e então o Pe.
Limberg se dirigiu ao meio do quarto, e fez uma cruz com a mão e disse bem baixinho: Abençoe te Deus o Pai, o
Filho e o Espirito Santo. Imediatamente, a mão mortalmente fraca se moveu lentamente sob o lençol, e fez o sinal da
cruz" (51).
A cena é absolutamente estranha, e, a respeito desse caso, Erika Tunner afirma:"Os padres têm um poder absoluto
sobre ela (Katharina Emmerick), sua devoção pelos dedos consagrados está no limite do patológico"(52)].
Sem pretender dar uma opinião num campo que não é absolutamente o nosso, e no qual não temos nenhuma
competência, é preciso, entretanto, frisar que a cena descrita pelo Dr. Wesener tem, mesmo para um leigo, forte
conotação sexual.
Por outro lado, as ações do Pe. Limberg sobre a paciente e suas reações, se enquadram perfeitamente no que então
praticavam os seguidores do magnetismo, o que prova que já antes do contato com o Dr. Wesener, o Pe. Limberg
aplicava seus conhecimentos de magnetismo sobre Katharina Emmerick.
No diário do Dr. Wesener se verifica que era comum o Pe. Limberg curar as dores de cabeça, ou dores de dentes de
Katharina Emmerick, dando-lhe os seus dedos consagrados a chupar (53). É claro que, cenas como essas, não
podiam aparecer nas biografias "piedosas" de Katharina Emmerick, feitas por Brentano, ou pelo Pe. Schmoeger.
A vidente sentia, aliás, atração pelos dedos consagrados de qualquer sacerdote. Quando o cônego Bernhard
Overberg, famoso pedagogo e reformador do clero da Westfália, foi visitá-la, em 1815, ao dar-lhe a mão, Katharina
Emmerick segurou apenas o polegar e o indicador do padre dizendo: "São esses que me alimentam" (54).
Antes de tratar das ações de magnetismo praticadas, sobre Katharina Emmerick, pelo Pe. Limberg, pelo Dr.
Wesener, e pelos irmãos Brentano, convém dizer algo sobre os vários tipos de êxtase ocorridos com ela.
1. um estado que o médico chama de "allgemeine Tetanus", no qual o corpo da monja ficava rijo como uma estátua,
e mais pesado do que o normal. Nesse estado, ela tinha visões alegóricas, morais e religiosas, via imagens ou
quadros a respeito das relações dos homens com Deus, ou então era levada, em espírito, a lugares distantes;
2. um segundo estado, denominado por Wesener de "ausência espiritual","geistesabwesenheit", que, sob certos
aspectos, era o contrário do anterior. Parecia então que a alma da vidente estava no céu. Seu corpo se tornava mais
leve, e seus membros ficavam tão moles e flexíveis, que pareciam querer desconjuntar-se. Quando ficava assim, ela
só atendia ou ouvia o que lhe diziam os padres, em nome da obediência. Era sensível também às bênçãos
sacerdotais, pois fazia o sinal da cruz, quando o padre a abençoava;
Enquanto sonhava, ela falava desconexamente. Em geral, seus sonhos versavam exclusivamente sobre a vida de
Cristo (55).
Como dissemos, desde que recebeu os estigmas, Katharina Emmerick deixou de se alimentar, mas em 3 de Janeiro
de 1817, Wesener deu-lhe um pouco de leite e água, que ela tomou sem vomitar a seguir, como em geral acontecia
quando tomava algo. Em 17 de Outubro de 1817, tendo em vista a extrema fraqueza da doente, o Dr. Wesener
resolveu dar-lhe leite humano.
"Nós agora chegamos à idéia de alimentar a enferma com o leite de uma ama, e já que eu estava tratando do mamilo
ferido de uma senhora, conhecida e parente do Pe. Limberg, senhora que havia dado à luz há seis semanas, eu a
procurei para que, algumas vezes por dia, ela desse o peito à enferma, porque ela tinha leite em abundância, e o seu
filho não podia se amamentar no peito ferido. A senhora compreendeu isso com alegria, e assim, no dia 18 de
Outubro, sábado, começamos com o leite da ama". A doente, devido à sua fraqueza não pôde mamar muito. Ela
reteve o leite, queixando-se, contudo, à noite, de dor de barriga" (56).
Em 9 de Novembro, Wesener registra que Katharina Emmerick lhe contou que, quando ainda estava no convento,
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muito doente, teve uma visão de uma bela mocinha que lhe oferecia o seio regorgitante de leite. De início, a vidente
sentira repugnância, mas, depois, aceitara tomar o peito (57). Na sexta feira, 28-XI-1817, o Dr. Wesener escreveu:
"A doente na semana passada, esteve na maioria das vezes melhor. Ela toma o peito três vezes por dia" (58).
Ora, mesmo que a medicina romântica daqueles tempos recomendasse o leite humano a certos doentes, fica difícil
imaginar que se recomendasse também, como necessário, que os pacientes tomassem o leite diretamente do peito da
ama. Evidentemente, o Pe. Schmoeger, como também outros biógrafos piedosos de Katharina Emmerick, não dizem
uma palavra a respeito desse estranho método terapêutico.
(Caso, um dia, Katharina Emmerick fosse canonizada, ficaria dificílimo explicar ao público, como seria possível
considerar santa, praticante de virtudes heróicas, uma freira que se amamentava, várias vezes por dia, ao seio de uma
mulher.)
Os biógrafos apresentam-na como uma camponesa inculta e de poucas leituras. Brentano afirma que ela jamais leu
nem o Antigo, nem mesmo o Novo Testamento. Quais eram suas idéias? Compartilharia ela as opiniões expressas
nasVisõestais quais foram anotadas por Brentano?
A tese da inteira objetividade das anotações de Brentano, defendida pelo Pe. Schmoeger, fazia Katharina Emmerick
responsável por tudo o que é dito nessasVisões.Ora, como aí há muitas afirmações contrárias à Fé Católica, ela
jamais poderia ser canonizada. Quando do exame dos escritos de Katharina Emmerick, no processo de canonização
de 1817, chegou-se à conclusão de que os textos dasVisões,e o que nelas se diz, eram responsabilidade de Brentano,
e não da vidente, e, por isso, o processo pôde continuar.
Determinaram-se então novos estudos do problema, tendo sido encarregado deles o Pe. Winifrid Hümpfner que, em
1924, submeteu à Sagrada Congregação dos Ritos seu trabalhoGlaubewürdigkeit. A posição oficial da Igreja é, até
agora, como vimos anteriormente, a mesma que a do Pe. Hümpfner: as idéias expressas nos textos dasVisõessão de
Brentano e não da vidente. Joseph Adams diverge um tanto dessa tese. Para ele, embora os textos
dasVisões,anotadas por Brentano, não devam ser atribuídos de modo absoluto a Katharina Emmerick, já antes da
chegada de Brentano, ela expressava idéias semelhantes às dele, às do Dr. Wesener e às de Overberg (59).
Diz Adams:
"Do mesmo modo, é significativo que a vidente, em conversas freqüentes, às vezes de horas, com o médico sobre
problemas teológicos, bíblicos e políticos contemporâneos, manifeste uma acentuada originalidade de idéias e
autonomia de julgamento" (60).
É interessante notar que tais idéias "originais" e "autônomas'' vão se mostrar muito afins com as idéias de Brentano.
E a primeira prova disso é a questão do magnetismo.
0 tema do magnetismo é tratado muito ambiguamente por Katharina Emmerick, e por seus biógrafos. Vimos que, já
na primeira visita do Dr. Wesener à doente, o Pe. Limberg realizou uma verdadeira demonstração de magnetismo. 0
tema voltou a ser tratado pelo Dr. Wesener em 14 de Abril de 1815. Nesse dia, ele conta que conversou com o Pe.
Limberg sobre o magnetismo animal e suas semelhanças com os fenômenos que se davam em Katharina Emmerick.
Para Wesener, o que acontecia com a vidente não eram fenômenos de magnetismo, mas uma "clarividência de um
tipo completamente diferente" (61). Nessa ocasião, o Pe. Limberg disse que, certa noite, estando só com a doente,
fez várias experiências magnéticas nela, mas sem resultado (62).
Poucos dias depois, em 27-IV-1815, o médico conta que realizou experiências magnéticas em Katharina Emmerick,
enquanto ela estava em êxtase, mas sem obter resultado. Quando, porém, o Pe. Limberg disse: "Alô! Obedeça! Onde
está você?, a vidente acordou imediatamente, dizendo ter ouvido alguém chamá-la".
A 26 de Janeiro de 1816, há nova descrição de experiência magnética, feita pelo Pe. Limberg, assim descrita pelo
Dr. Wesener:
"Às nove horas ela teve um êxtase. Eu pedi, então, ao Sr. Limberg para fazer uma experiência de magnetismo
animal, ou seja, para perguntar a ela qual a sua doença, e onde se situava seu ponto central, e o lugar onde
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principalmentese situava. Ele fez isso várias vezes, e insistentemente, mas a enferma não respondeu" (63).
Em 5 de Abril de 1817, Katharina Emmerick recebeu pela primeira vez, a visita de Christian Brentano, que vinha
vê-la com a licença do Vigário Geral de Münster, Clement Auguste Von Droste-Vischering. Como vimos, Christian
era médico, e muito favorável ao magnetismo, e a monja mostrou-se muito simpática a ele, tendo feito elogios a seus
excelentes princípios morais e religiosos. As idéias de Christian a respeito do magnetismo encontraram também boa
acolhida no Pe. Limberg e no Dr. Wesener, e já no dia 16 de Abril de 1817, o diário do médico registrava uma
experiência magnética extraordinária:
"0 Pe. Limberg fê-la dormir colocando a palma da mão sobre o local do coração, e inclinou sua cabeça em direção à
cabeça dela.
"Sua pulsação era filiforme e espaçada; a respiração curta e fraca; a doente apresentava um quadro de extrema
fraqueza.
"No dia anterior, o Sr. Limberg e eu, através de uma conversa instrutiva com o Dr. Brentano, tínhamos nos tornado
mais confiantes com a essência e as visões produzidas pelo magnetismo, e acabamos por compreender que o
magnetismo não é mais que um transbordamento da plenitude da saúde e da vida que, através da religião e da
pilastra principal da mesma, vai inflamar o amor para com Deus, para com o Redentor e para com o próximo. Assim,
o Pe.Limberg, cheio de confiança, dirigiu sua boca contra a boca aberta da doente, soprando nela seu hálito vivo.
Após três ou quatro repetições desse ato, a doente respirou sempre mais profunda e sofregamente, e, finalmente,
despertou com um tal fortalecimento e sensação de bem estar, que ela mesma estava extremamente surpresa.
"Mesmo a desagradável sensação de fraqueza e de vazio na região do estômago tinha inteiramente desaparecido, e a
doente não compreendia de modo algum, de onde tinha vindo essa rápida melhora.
"Eu acho necessário manifestar-me brevemente, aqui, sobre a manipulação através da qual a doente é levada ao sono
tranqüilo. Visto que somente agora este fenômeno me é explicável pela concepção de magnetismo, que acabo de
receber. Já há muito tempo, e freqüentemente, o Pe. Limberg tem o poder de fazer a doente dormir, logo, através da
mencionada manobra, sem poder explicar esse fenômeno: ele coloca sua mão sobre aprecordiondela, e inclina a
cabeça em direção à sua. Isso deu certo, todas as vezes, tanto que o Padre queria apostar com a doente que, em dois
ou três minutos, a faria dormir" (64).
É interessante comparar este texto com a versão dos acontecimentos apresentada por Schmoeger:
"Graças às conversas instrutivas com o Sr. Doutor N...(é Christian Brentano), com o Sr. Limberg e comigo, nós nos
familiarizamos mais ainda com o magnetismo, e nós reconhecemos que ele não é outra coisa "senão o escoamento
de um espírito vital, atuando sobre o enfermo".
"Este espírito, que está espalhado em toda a natureza, é recebido pelo enfermo por meio de uma comunicação
espiritual, ou mesmo corporal; ele age, então, naquele que o recebe, conforme a natureza do seu princípio,
acendendo nele uma chama que pertence seja à terra, seja às regiões superiores, seja mesmo às inferiores, e
realizando, conforme sua origem, efeitos salutares ou perniciosos. Este espírito vital, o cristão pode e deve
inflamá-lo pela religião e pelo amor a Deus e ao próximo, de forma a torná-lo salutar para o corpo e para a alma". (65
A posição pessoal de Katharina Emmerick a respeito do magnetismo, já antes da chegada de Brentano, era hesitante
e ambígua. Em 20 de Abril de 1817 - portanto, já depois da chegada de Christian Brentano, que deu novo impulso às
experiências magnéticas, que o Pe. Limberg e o Dr. Wesener faziam com a freira - ela disse ao Dr. Wesener que
inicialmente aceitou com indiferença o que ele, o Pe. Limberg e o Dr.Christian Brentano lhe haviam dito a respeito
do magnetismo. Mas que, após refletir, teve uma visão em que se lhe revelou que o Magnetismo não era uma coisa
boa, e "que a maior parte da coisa é ilusão do demônio". Afirmou, entretanto, que ainda não estava com o assunto
totalmente resolvido. Mas que "se nós quisermos fazer o que os profetas e apóstolos faziam, precisamos ser também
como eles eram, e então não precisaremos de nenhuma manipulação artificial". E ainda: "que as pessoas se esforcem
por curar doentes através de algo que passa de uma pessoa sã para os doentes, em si não é ruim, mas toda mágica é
neste caso ridícula e ilícita. O sono magnético e a contemplação de coisas futuras, se distantes são ilusões do
demônio, sob a aparência de devoção" (66).
Ao ouvir isto, o Dr. Wesener teve um sobressalto de consciência, pois estava nessa época curando o braço de uma
camponesa, por meios magnéticos. Katharina Emmerick perguntou, então, o que ele fazia para curar a camponesa e,
tendo-o ouvido, disse:
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"O aquecer com hálito e o aquecer o membro do doente através da mão da pessoa sadia, eu acho válido como
remédio natural, mas os passes e o puxar com as mãos são absurdos e levam a superstição (ela quis dizer
misticismo.)" (67).
A freira disse ainda que era preciso ser prudente ao tratar do tema com Christian Brentano, o qual teria boas
intenções, mas estaria equivocado. 0 médico falou, então, com Brentano, que tratou do assunto com Katharina
Emmerick:
"0 Sr. Brentano relatou-me que falou com a doente a respeito do magnetismo, e principalmente sobre as
questionadas visões do mesmo. Assegurou-me que ficou contente com as suas declarações, quando se convenceu
que ela via o magnetismo somente pelo lado negro e demoníaco. Mas a doente pareceu demonstrar um pouco de
embaraço quanto à sua declaração durante minha visita, pois confessou acreditar ter sido um pouco precipitada. Eu
a tranqüilizei sobre isso." (68).
Vê-se, pelo relato, que Katharina Emmerick, ou por receio de desagradar Christian Brentano, ou por não estar
segura, hesitava. Ela, pelo menos, admitia que no magnetismo havia um lado bom e outro ruim. Esta hesitação se
confirma pelo fato de que ela continuou a admitir que o Pe. Limberg curasse suas dores de dente e de cabeça por
magnetismo, como aconteceu seis dias depois de conversar com Brentano, a 25 e 28 de Abril (69).
Alguns dias depois (2-V-1817), Katharina Emmerick contou ao Dr. Wesener que tivera uma visão a respeito do Dr.
Brentano e do magnetismo:
"Eu recebi agora, também, a instrução correta a respeito da imposição das mãos, e da cura de minhas dores. Devo
renunciar a isso. Devo suportar com paciência minhas dores, e o Padre não pode fazer em mim, senão aquilo a que
estava acostumado."
"Eu lhe perguntei então o que ela me aconselhava em relação ao uso do magnetismo, para minha pessoa".
"Você pode, mesmo assim, utilizá-lo quando estiver seguro que não colocou a si mesmo, nem a outra pessoa, em
tentação ou em perigo." (70).
Vê-se, por esse texto, que a ambigüidade continua. De um lado, o magnetismo é condenado. De outro, o Padre pôde
continuar fazendo o que já fazia. Ora, algo do que ele estava acostumado a fazer eram ações tipicamente
magnetizadoras. E também o Dr. Wesener pôde continuar a fazer curas magnéticas, desde que não houvesse perigo.
Portanto, ela distingue um magnetismo diabólico e ilícito, e outro bom e permitido. Clemens Brentano seguirá a
mesma linha ao distinguir, com Windischman, um magnetismo animal e diabólico, de outro espiritual e divino (71).
Pelo magnetismo animal, Katharina Emmerick manifestará total repulsa, e o comparará a magia:
«A prática do magnetismo termina na magia; só que não se invoca o diabo, mas provém dele mesmo. Todos que a
isto se entregam tomam da natureza alguma coisa que não pode ser adquirida legitimamente senão dentro da Igreja
de Jesus Cristo, e que não pode se conservar com o poder de curar e de santificar, senão em seu seio; porque a
natureza, para todos os que não estão em união viva com Jesus Cristo, pela verdadeira fé e pela graça santificante,
está cheio da influência de Satã ». (...) (71)
« Eu vejo a própria essência do magnetismo como verdadeira; mas há um ladrão que é desencadeado, nessa luz
velada ».
« (...) uma das faculdades do homem antes da queda, faculdade que não está totalmente morta, é ressuscitada de uma
certa forma, para deixá-lo mais desarmado e num estado mais misterioso, exposto interiormente aos ataques do
demônio. Este estado é real, ele existe, mas ele está coberto por um véu, porque é uma fonte envenenada para todos,
exceto para os santos ».
« Eu sinto que os estado destas pessoas (magnetizadas) segue, sob certos aspectos, um caminho paralelo ao meu,
mas indo para outro lado, vindo de algum lugar, e tendo outras conseqüências » (72).
Assim, continuavam as experiências magnéticas com a vidente, possivelmente com o seu consentimento:
"À noite, as fraquezas eram maiores. Quando foi erguida, ela caiu em desfalecimento mortal. 0 Pe. Limberg colocou
sua boca sobre a boca dela, e soprou fortemente. Depois que repetiu isso três ou quatro vezes, voltaram o pulso e a
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respiração, e a enferma voltou a si novamente" (73).
"De noite, desfalecimento mortal, ao mínimo movimento. 0 Padre a faz voltar a si, de novo, pelo sopro. A doente
esclareceu que o sopro do padre, era, para ela, como um vento tépido, que ia através de todo corpo até a ponta dos
dedos e dos artelhos". (74).
(74). Nesses textos das visões de Katharina Emmerick, já do tempo em que Brentano estava a seu lado, estão
resumidas as teses do chamado "catolicismo mágico" de Brentano, isto é, um catolicismo que aceitava um
magnetismo bom, de origem divina, distinto do magnetismo animal, embora parecido com ele.
5. Os que estão unidos a Cristo e a Igreja, os santos, podem utilizar essa força, sem perigo, e fazer curas.
6. Os que não estão unidos a Cristo só conseguem utilizar a força magnética com a ajuda do demônio, o que faz com
que suas práticas confinem com a magia, e tenham conseqüências graves.
7. Materialmente é difícil distinguir os fenômenos dos dois magnetismos. Eles só se distinguem formalmente. Daí a
semelhança entre as ocorrências do magnetismo animal, e o que acontecia com Katharina Emmerick.
Em coerência com essas teses, afirmavam que o poder taumatúrgico e os carismas dos santos consistiam em usar
forças naturais, unidos a Deus, o que levava a confundir o sobrenatural com o natural, a graça com a natureza. A
identificação do sobrenatural com o natural - tese cara ao romantismo - vai se tornar mais clara, quando Katharina
Emmerick narrar os milagres de Cristo. Essa identificação é heterodoxa, do ponto de vista católico, mas está
inteiramente de acordo com o pensamento esotérico e gnóstico: é no próprio homem, e na própria natureza, que se
encontram as forças capazes de redimir o homem. 0 homem é o Salvador de si mesmo, o que é uma afirmação típica
da Gnose.
Um segundo ponto interessante é a opinião de Katharina Emmerick sobre Jakob Boehme, que aparece no diário de
Wesener em 15 de Janeiro de 1818:
"Quando eu, na noite passada, li para ela um trecho do "Despertar da Aurora", de Jakob Boehme, perguntei-lhe a sua
opinião sobre esse homem notável. Ela me disse que bem pode ser verdade aquilo que ele escreveu sobre o ser de
Deus, mas que é necessário ser precavido no tocante à sua explicação das coisas naturais. Aliás, afirmou, existe uma
espécie de vida interior e uma concepção do ser das coisas que não vem do Espírito Santo, mas que resulta de outras
forças. Se eu pudesse escrever, disse ela, poderia fazer um grande livro sobre isso"(75).
"Sobre a concepção de Deus de Jakob Boehme e sua "explicação das coisas naturais", assim como a respeito da
teoria e a prática do magnetismo, ela tem sua própria opinião"(76).
A atitude que a freira demonstra face a Jakob Boehme não parece ser a de uma pessoa que entra em contato pela
primeira vez com o texto de um autor, pois ela dá sua opinião sobre o homem, Jakob Boehme, e sobre sua obra, e
não sobre o texto lido. De qualquer modo, se não ela, pelo menos seu médico lia Boehme, e comentava com ela a
obra desse teósofo, sem que ela repelisse as doutrinas de Boehme à respeito de Deus, pelo que a defesa que
Humpfner faz de Katharina Emmerick, nesse ponto, não é convincente.
Um terceiro tema abordado pela vidente, ainda antes da chegada de Brentano, é o da astrologia:
"Eu pensava que cada luz, e cada estrela, fossem um corpo como a nossa terra, provavelmente habitados por seres
como nós. Ela achava que a Lua era exatamente assim, mas não as estrelas. Pois estas continham os destinos
humanos. Haveria estrelas benéficas e estrelas maléficas, tendo cada homem a sua estrela boa e sua estrela má. As
estrelas maléficas estariam atrás das boas, e não poderiam atuar tão diretamente sobre os homens. Se pudessem,
ninguém poderia viver sobre a terra" (78).
0 quarto tema, que convém lembrar, é a opinião de Katharina Emmerick a respeito do fogo do purgatório e do
inferno, expressa antes da chegada de Brentano a Dülmen. Em 9 de abril de 1814, conversando com o Dr. Wesener
acerca desse assunto, disse ela:
"De resto, não se deveria pensar que os infelizes, no inferno e no purgatório, são castigados por fogo verdadeiro; isto
seria apenas uma representação simbólica. A única e terrível fonte de castigo, para os infelizes, é a ira de Deus" (79).
0 que é uma opinião bem moderna,mas nada de acordo com a ortodoxia e, portanto, bem estranha na boca de uma
pessoa em processo de canonização.
"Numa conversa que tive com o Sr. Limberg, sobre a obra de S. Agostinho,De Gratia, fiz a afirmação que nós todos
teríamos igual participação na graça divina, e que a única coisa realmente necessária para isso é sermos moralmente
bons. Isso bastaria para nos tornarmos participantes da graça divina.
Mas, o Padre Limberg dizia que a graça é uma dádiva voluntária do Altíssimo, a qual Ele distribui segundo a sua
santa vontade, fundamentando essa opinião na sentença de S. Paulo (II Tim I, 29), e na conversão de um dos ladrões,
na cruz. A doente interessou-se vivamente por minha afirmação, e opinou que não estaria de acordo com a justiça
infinita de Deus que um homem procurasse corretamente a graça, e não a pudesse obter. 0 Pe. Limberg permaneceu
na sua opinião, e se fundamentou na letra da Sagrada Escritura. A doente afligiu-se visivelmente com isso" (80).
Ora, embora Deus conceda a graça suficiente a todos, Ele não distribui graças iguais para todos os homens. Esse
conceito igualitário sobre a distribuição das graças, que Katharina Emmerick manifesta, é realmente contrário às
Escrituras, como bem lembrou o Pe. Limberg, mas está bem de acordo com a filosofia e o pensamento em voga na
Alemanha romântica.
Defesa de magnetismo cristão, simpatia por Böehme, idéias favoráveis à astrologia, conceito igualitário da
economia da graça, negação do fogo do inferno e do purgatório, todas essas idéias são pontos de uma estrutura de
pensamento muito comum na época do Romantismo, restando perguntar onde, ou com quem, Katharina aprendeu
tudo isso.
É bem difícil encontrar resposta para essa questão. A única pista que encontramos foi uma declaração do decano
Bernard Rensing incluído na "Positio". Segundo consta, quando ele falou da pretensa iluminação de Katharina
Emmerick com o cartuxo Padre Anselmo Kroutz, este sorriu e disse:
"Muitas coisas que ela sabe de religião e de vida espiritual, provavelmente ela apreendeu comigo, porque, nesta
matéria, ela era muito ávida de saber, e, com esta finalidade, ela vinha freqüentemente ao meu quarto, nas suas horas
livres, para conversar de coisas espirituais, e eu lhe explicava ora sobre este, ora sobre aquele ponto" (81).
Evidentemente, isso, só, não prova muito, mas é mais um indício de que a tese de que Katharina Emmerick era uma
camponesa absolutamente ignorante não se sustenta tão facilmente. Falando de suas leituras ao decano Bernard
Overberg, Katharina Emmerick teria dito que lera muito pouco na sua vida, e com dificuldade, pois logo caía em
contemplação extática, e citava, como exemplo de leitura, a Imitação de Cristo, de Thomas de Kempis (82):
"Taulerus é o primeiro e o único livro com o qual eu posso entreter-me. Eu entendo todo o seu conteúdo, com ele
estou bem" (83).
Como vimos, Brentano costumava ler para ela livros de mística, para provocar êxtases nela.
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"Muitas vezes, quando eu lia para ela sermões de Tauler, ou um livro espiritual, por alguns minutos, ou tinha
conversas sobre religião com seu confessor ou com seu médico, estando ela presente, ela mergulhava em sono
extático, e parecia que sua alma tinha deixado o corpo, o qual parecia abandonado, sem sentido, como morto,
assumindo tal rigidez, que se podia pegá-la pela cabeça, como se estivesse petrificada" (84).
[Eram lidos para ela, ainda]: "Tauler, Teerstegen, antigos livros de devoção, algo do "Diálogo no Pequeno Convento
da Cruz entre Jesus e uma alma, extraído de um antigo livro de oração", vidas de santos, "A Cidade de Deus", de
Maria de Ágreda. Em 4 de maio de 1819, ele diz: "0 Peregrino Querúbico" (de Angelus Silesius) é para ela um total
e agradabilíssimo. entretenimento... A leitura da "Teologia Alemã" a alegrou extraordinariamente, e ela adormeceu.
"Não somente o peregrino (Brentano), mas também a vidente mostravam um amplo conhecimento da literatura de
visões místicas." Ela indica agora: Theresa, Catarina de Siena, Clara de Montefalco, Brígida, Hildegarda, Verônica
Giuliani, Maria de Jesus, etc. de cujas visões o peregrino observa que ela só teve um conhecimento interior" (85).
Tudo isso mostra que Katharina Emmerick não era propriamente a camponesa iletrada e absolutamente inculta, que
alguns pretendem apresentar. Note-se, que a lista de livros místicos relacionados é uma mistura de santos e de
autores, cuja doutrina e terminologia podem ser facilmente entendidas de modo gnóstico ou esotérico, como é o caso
de Angelus Silesius.
Clemens Brentano chegou a Dülmen em 24-IX-1818, a fim de conhecer Katharina Emmerick, de quem lhe haviam
falado, entre outros, Christian Stolberg, Ludwig von Gerlach, e seu irmão, Christian Brentano.
0 Conde F.L. von Stolberg, antigo Iluminado da Baviera, convertera-se ao catolicismo, e passara a ter contato com a
chamada "Sagrada Família" de Münster, grupo católico que girava em torno da família Droste Vischering. Em 1813,
pouco depois de se tornar público o fato de que havia uma freira estigmatizada em Dülmen, o Conde von Stolberg
foi vê-la com a licença de seu antigo amigo o vigário-geral Dröste Vischering, junto com o decano Bernard
Overberg. Stolberg escreveu uma carta, relatando o que viu em Dülmen, carta que foi publicada e que seu filho
Christian, mostrou a Brentano. Em 1815, Christian von Stolberg e Ludwig von Gerlach foram a Dülmen, e voltaram
a Berlim, contando o que haviam visto a Clemens Brentano e demais companheiros da "Tischgesellschaft"
[Sociedade da Mesa].
Como vimos no capítulo II deste trabalho, Christian Brentano esteve em Dülmen, em contato íntimo com Katharina
Emmerick, de 5 de abril a 4 de julho de 1817. A seguir, foi a Berlim tentar convencer seu irmão Clemens a ir ver
Katharina Emmerick. Era pelo ângulo do Magnetismo que Christian, médico e magnetizador, se interessava pelo
caso Emmerick. Clemens Brentano, entretanto, estava nesse tempo apaixonado por Luise Hensel, e por nada no
mundo queria se afastar dela.
Em 1818, Christian Brentano preparou nova visita a Dülmen, desta vez em companhia do Pe. Sailer, que tinha
grande influência sobre Clemens, e ambos rogaram ao poeta que os acompanhasse na visita a estigmatizada. Luise
Hensel, tendendo a converter-se ao catolicismo, pressionou também o seu apaixonado Clemens a fazer a viagem,
tendo nisso um duplo interesse: o religioso e o pessoal, pois queria livrar-se de Brentano, pelo menos durante certo
tempo, já que ele estava se excedendo em suas manifestações de amor por ela:
"0 peregrino [apelido para designar Clemens Brentano], se tornou para ela um horrível fardo; ele ficava sentado na
sua cama, todas as noites, enquanto ela esteve doente!... Ele a perseguia por todas as ruas, e a espionava nas
esquinas; se ela conversava com outros, ele ia atrevidamente ao seu encontro. Ele se atirou ao chão, e pediu que ela
o pisoteasse, o que ela fez realmente, com repugnância. Então ele vagueou sem direção como um louco, dizendo que
merecia isso" (86).
Em 14-IX-1818, Brentano deixou Berlim, para ir encontrar-se com Sailer, no castelo dos Stolberg, em
Sondermühlen. No dia seguinte, chegou a Münster, onde cativou a amizade de Overberg, confessor de Katharina
Emmerick. Em 24-IX-1818, estava em Dülmen, onde ficara, com pequenos intervalos, até 1824.
Brentano chegava a Dülmen em meio a uma grave crise religiosa e sentimental. Apaixonado por Luise Hensel a
ponto de querer tornar-se protestante, para casar-se com ela, - sua segunda esposa, Augustine Busman, vivia ainda -
e vendo-se recusado, em suas aspirações, por influência de Luise, acabara por converter-se, fazendo uma confissão
geral. Vivia ainda o "fervor de noviço". Além disso, há pouco se interessara sobremaneira pelosErwektenda Baviera
[Despertados da Baviera, uma espécie de seita carismática] e pelas teorias do pastor pietista Hermes, e já vimos,
458
também, que nesse tempo, recrudescera seu interesse pelos temas esotéricos e místicos, pois lia
Böehme,Swedenborg, Saint-Martin, aDeutsche Theologie, e obras sobre a Cabala. Seu irmão Christian o
aproximara do magnetismo.
Nos anos anteriores, 1815-1816, a arte fôra para Clemens Brentano uma espécie de religião:
"Pela poesia, pelo amor, ele esperava sempre poder satisfazer sua necessidade imperiosa de restabelecer uma
unidade comprometida pelo pecado original. Depois, ele compreendeu que ele aspirava a um impossível retorno a
um mundo, no qual não haveria mais divisão e ruptura, nem sexos, nem desejo, e nem pecado" (87).
Segundo J. Adams, do Diário de Brentano se conclui que ele julgou encontrar, em Dülmen, com katharina
Emmerick, três coisas que procurara durante toda a sua vida:
2. inserir-se, através dessa mulher, num todo maior, no corpo da Igreja, na realidade viva da comunhão dos santos,
no tesouro das graças;
3. uma missão, a missão de sua vida: redigir tudo o que a estigmatizada dizia do mundo sobrenatural (88).
Todo o relato de Brentano sobre sua chegada a Dülmen, a descrição dos costumes do povo da região, e seus
primeiros contatos com Katharina Emmerick, estão eivados de uma grande distorção romântica e sonhadora. Ele
descreveu o que queria ver, e, por exemplo, ele achou Katharina Emmerick extraordinariamente parecida com Luise
Hensel, de quem ele não se esquecia (89). Escrevendo para ela um diário de tudo o que via, e do que não via;
enviando-lhe então as visões que Katharina Emmerick teria tido sobre ela, Luise, e sobre os perigos espirituais que
ela corria em Berlim, ele procura, deste modo, trazê-la também para Dülmen. Mais tarde confessou à mesma Luise,
que tais visões tinham sido invenção dele: "puros produtos da imaginação exaltada e mórbida de poeta" (90).
Em 1842, Luise pediu ao jovem Van der Meulen, que perguntasse a Clemens Brentano o que realmente Katharina
Emmerick vira a respeito dela, visto que ela pensava tornar-se religiosa, já que, numa suposta visão, Katharina a
relacionara com um convento. A esta questão, Clemens Bretano respondeu então que, sobre Luise, Katharina
Emmerick não vira nada (91).
Logo, entre Clemens Brentano e a freira estigmatizada, se estabeleceu uma grande intimidade. Ele obteve a chave de
seu quarto, e passava lá noites inteiras, o que causou uma onda de murmúrios maledicentes, em Dülmen (92) e ele
mesmo, no seu diário para Luise Hensel, contou que, em seus sonhos, a freira foi prevenida de que a caridade de
Brentano era apenas uma máscara da "paixão muito violenta que ele concebera por Katharina Emmerick" (93).
Bernard Gajek mostrou, por outro lado, através da análise das poesias que Brentano fez durante sua estadia em
Dulmen, que ele procurava, então, sublimar a atração que sentia pela vidente:
"A relação de Brentano com ela (Katharina Emmerick) tinha coloração erótica, é o que se torna evidente em seus
relatórios" (94).
Vimos [no capítulo II] que também J. Adams chegara a uma conclusão semelhante, ao dizer que, embora em níveis
diferentes,as relações de Brentano com Katharina Emmerick e com Sophie Mereau,mostram extrema semelhança
de estrutura" (95).
Para se ter uma idéia da intimidade que o poeta tinha com a freira, veja-se o seguinte texto:
"Estranho movimento no corpo.Ontem à noite, mais ou menos às 6 horas, o Peregrino [Clemens Brentano]
sentou-se ao lado da cama dela, e colocou a mão esquerda, sobre o cobertor, cerca de duas polegadas perto do meio
da coxa esquerda dela, e dialogava com ela. De repente, ouviu um som ameaçador, aproximando-se de sua mão, e,
ao mesmo tempo, entrando pelo quadril da enferma, onde ele tinha colocado a mão, e daí passou por sua mão por
baixo da colcha grossa pespontada, e desceu para o pé, sobre o corpo que se sacudia. Ele perguntou à doente o que
seria isso, e ela disse: agora está no calcanhar. Ela sente isso correr, já há alguns dias. Isso estava há pouco em sua
face esquerda, mas quando ela colocou a mão sobre a face, passou para o busto esquerdo, depois para o lado
esquerdo do ventre, a seguir correu para baixo. Freqüentemente anda sobre o corpo. Não dói. É como se fosse um
puxar. Recentemente, andou muito sobre o seu corpo, tanto que pôde então urinar. 0 Peregrino [Clemens Brentano]
molhou sua mão esquerda com água benta, e pegou o calcanhar esquerdo dela, que se achava, então, com um certo
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tremor. Cerca de dois minutos depois, ela disse: "Está de novo no corpo", no qual havia um ruído especial. 0
Peregrino sentiu como se alguém estivesse empurrando um bastão longo e forte, de mais ou menos duas polegadas,
ao longo da coxa"(96).
Nesse texto, Adams nota a preocupação de Brentano em ser objetivo, fazendo um diagnóstico frio, afirmando,
entretanto, que o ponto principal está em outro nível, totalmente diferente: um acontecimento sinistro e misterioso
que evoca uma atmosfera assustadora e demoníaca. Ora,para nós, o fato descrito com tantas minúcias parece
situar-se "totalmente noutro nível": o de um falso misticismo erótico, pois impressiona a sem-cerimônia com que
Brentano diz, que, ao conversar com a freira, pôs a mão sobre o meio de sua coxa esquerda. Não é uma atitude que
normalmente uma senhora qualquer permita, quanto mais uma freira, e ainda mais estigmatizada,o que prova a
incrível intimidade de Brentano com a vidente, assim como a liberdade com que ela permitia que ele a tocasse.
No dia 9 de outubro de 1818, Brentano registra em seu diário, que viu pela primeira vez os estigmas de Katharina
Emmerick:
"Seu confessor tinha desejado que eu visse os estigmas, para dar sobre eles um testemunho verídico. A marca da
lança no lado direito do peito dá uma impressão perturbadora. Ela parece ter duas polegadas e meia de comprimento,
e me causou a impressão de uma boca pura e silenciosa, cujos lábios estão ligeiramente separados. Além da dupla
cruz em forma de forquilha sobre o osso do peito [o esterno], ela tem na região do estômago, uma cruz latina, tendo
uma polegada de largura, que não verte sangue, mas, sim, água" (97).
(97). No Diário [de Brentano] para Luise Hensel, a descrição dos estigmas aparece, em 4-XII-1818:
"Ela me mostrou esses estigmas hoje por ordem de seu confessor, sob obediência espiritual. Descreverei todos esses
estigmas na ocasião em que tiver que relatar a estigmatização. A dupla cruz grega, sobre o osso do peito [o esterno],
cujo comprimento equivale à largura de uma mão, aparecia, hoje, como uma leve irritação da pele, não tendo cor de
sangue sequer no cruzamento das linhas. Porém, em toda a sua volta, aparecia por baixo da pele uma coloração
vermelha de sangue, cujo tom ficava mais claro à medida que se afastava da cruz. Esta cruz se move junto com a
pele. Acontece muitas vezes que essa mancha de sangue passa do vermelho claro ao vermelho mais intenso. 0
derramamento de sangue da própria linha da cruz cessou há alguns anos, porém, exsuda na região dessa linha,
algumas vezes, suor tingido de vermelho. A cruz latina no peito, debaixo da região do coração, que freqüentemente
derrama água, vi-a, hoje, marrom bem claro. A região da chaga sob a quarta costela, contando a partir de baixo, do
lado direito daquele miserável corpo, causa uma impressão tão tocante, que é quase impossível vê-la sem lágrimas.
Já há algum tempo não derrama sangue vermelho forte, porém, muitas vezes, derrama soro, e outras vezes está mais
ou menos avermelhada e dolorida. Não é propriamente uma ferida com lábios separados, mas mostrava-se, hoje,
apenas, tal a cruz do peito, como uma fina fissura na pele, com bordas levemente avermelhadas e puras. Eu vi essa
chaga hoje com um comprimento de 2,5 polegadas, dando a impressão de uma boca silenciosamente pura, com os
lábios quase não separados" (98).
Nos dois textos, a comparação da chaga do peito de Katharina Emmerick com uma boca de lábios entreabertos é
reveladora: isso tem relação com a idéia de Brentano, inspirada em Boehme, de que, primitivamente, antes do
pecado original, em Eva, a geração humana se daria por meio da palavra humana, e não pelo sexo. A criança gerada
sob o coração da mãe, nasceria por meio de uma "boca", que se abriria no peito da mãe, na hora desse estranho parto.
Entre os pietistas, admiradores de Jakob Boehme, isso deu origem a um culto da chaga de Cristo, chaga essa que
Jesus recebera para restabelecer o modo de geração e de nascimento originais do homem, segundo Boehme.
É evidente que todas essas idéias de Boehme e de Brentano são de natureza gnóstica, pois manifestam uma profunda
ojeriza, e mesmo repugnância pela reprodução humana tal qual ela foi estabelecida por Deus, por via sexual.
Logo, Brentano se entusiasmou com as experiências mágico-magnéticas que o confessor fazia com a doente: como
ela chupava o dedo consagrado do padre, como ela atendia às ordens em nome da obediência, quando estava em
êxtase, etc.
Depois, ele pediu ao padre que escrevesse a ordem: "Sê obediente. Levanta-te", num papel e, quando o confessor
colocou o bilhete sobre a cabeça da vidente em êxtase, imediatamente ela se ergueu, perguntando o que se queria
dela. Retirado o bilhete, ela recaiu no êxtase. E Brentano acrescenta: "Eu guardo esse bilhete, e eu quero saber se, na
ausência do confessor, eu poderei, eu também, dele me servir, para despertá-la" (99).
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Alguns dias depois, Brentano conta:
"Esta tarde, como ela se encontrava em êxtase, durante a ausência do seu confessor e como não havia ninguém que
pudesse despertá-la, eu peguei a ordem escrita por ele e, apenas eu a havia colocado sobre o seu peito, ela voltou a si,
como de costume" (100).
0 fato narrado se encaixa perfeitamente nas experiências do magnetismo ou do "catolicismo mágico", porque dele se
pode deduzir que a força para despertar Katharina Emmerick teria passado do Padre para o bilhete, que continha a
ordem escrita. Outro fenômeno, que fascinou Brentano em Katharina Emmerick, foi a sua capacidade de reconhecer
as relíquias dos santos. Brentano colocava relíquias de santos sobre as chagas de Katharina Emmerick, e ela, caindo
em êxtase, tinha visões sobre a vida da pessoa a quem pertencia a relíquia (101).
0 passo seguinte foi colocar sobre as chagas da vidente relíquias falsas, para que ela as identificasse, ou objetos
antigos - um fóssil de um animal, ou um objeto do Império Romano - para que ela tivesse visões do passado. A
seguir, ele começou a colocar, sobre as chagas da freira, cabelos de Luise Hensel, a fim de que a vidente lhe desse
informações sobre a vida, os sentimentos, e o que ocorria com sua bem-amada. Fez o mesmo com cabelos de Sophie
Méreau. Finalmente, ele pôs unhas da própria vidente sobre as chagas, para que ela tivesse visões a respeito de si
mesma, vendo-se como se fosse outra pessoa.
Outro meio usado pelo poeta para provocar visões na freira, fazendo-a cair em êxtase, consistia em ler para ela livros
místicos, especialmente os de Tauler.
"Um meio muito eficiente é a conversa espiritual de todo tipo, e principalmente a leitura espiritual, em que ela
mostrava uma preferência declarada pelos escritos de Tauler: "Eu os leio em êxtase", dizia ela (102).
Afinal, Brentano dominou de tal modo Katharina Emmerick, que o Dr. Wesener queixava-se, dizendo que ela agora
só ficava em êxtase, tendo uma relação físico-magnética com o poeta.
"Até este ponto está tudo bem. Entretanto, preocupa de certa maneira o estranho contato pelo qual o Sr. Brentano se
aproximou da doente, e sua relação físico-magnética através da qual ele - e agora eu também - ele pode produzir por
esse meio reações e a imobilidade do êxtase, já que isto acontecia apenas - embora aconteça ainda - através de visões
interiores, obtidas pela benção da Igreja" (103).
"Alguns dias depois o senhor Brentano descobriu também uma linguagem de pensamentos nela: ele entretinha-se
com ela, em pensamento, e ela respondia normalmente às suas perguntas, feitas em pensamento, quando ele pegava
a sua mão" (104).
Brentano, diz Érica Tunner, encontrou em Katharina Emmerick três elementos essenciais para ele: a mulher
mediadora, com a qual ele sempre sonhara; a mulher inocente, que "dorme em seus braços, como uma criança"; a
mulher maternal, que o compreende e protege, que o guia nos caminhos da perfeição, prometendo-lhe paz, calma e
consolação.
"Eu me tornei seu filho", escreve ele a Luise Hensel, em 1-XI-1818 (105). A esses elementos acrescentaremos nós
um quarto item: ela é também a "médium", que permite ao poeta alcançar o mundo sobrenatural, o mundo do sonho,
e cujas informações alimentarão a sua fantasia, e confirmarão as suas teorias.
Nessas condições, era natural que um homem como Brentano, de pujante e dominadora personalidade, procurasse
ter Katharina Emmerick apenas para si. Tendo chegado a Dülmen em setembro, três meses depois ele já estava em
conflito com todas as pessoas que formavam a "entourage" da vidente. Ele invejava os padres pela intimidade que
Katharina Emmerick tinha com eles, revelando-lhes o interior de sua alma. Além disso, Brentano invejava a atração
que a vidente tinha pelos dedos consagrados dos padres. Logo pensou em tornar-se padre também (106). Mas sua
situação de homem casado (Agustine Busman matar-se-á em 1832) não lhe permitiu realizar esse intento.
Ele criticava todos os circunstantes, porque faziam Katharina Emmerick perder tempo: Wesener, falando-lhe de
seus doentes; os padres e os parentes dela, tratando de ninharias. Mas ele próprio, porém, esgotou a paciência da
freira, por causa de suas exigências insaciáveis de minúcias, a respeito do que ela via em êxtase.
Em Janeiro de 1819, Brentano viajou a Berlim, a pretexto de vender sua biblioteca, mas, na verdade, viajou por estar
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com ciúmes de Luise Hensel. Com efeito, Luise se convertera há pouco ao catolicismo, enquanto Katharina
Emmerick e Brentano continuavam rezando para que essa conversão viesse a se realizar. Luise entregou ao poeta o
seu diário, no qual ele pôde constatar a paixão que ela tinha por Ludwig von Gerlach, e, ao mesmo tempo - e
contraditoriamente -, o seu desejo de entrar num convento. Brentano, então, não descansou até afastar Luise de
Berlim e do seu rival, e a colocou como governanta, em Münster, na casa da princesa da Salm, Amélia Gallitzin.
A seguir, ele vendeu a sua biblioteca, rica em livros raros e manuscritos preciosos, e conservou apenas os livros de
teologia, vidas de santos, e edições raras de Basilide e de Spee, além de livros de exorcismo e de Cabala (107).
Logo que Brentano deixou Dülmen, montou-se ali uma pequena conspiração, para que ele não mais retornasse. 0
padre Lambert implorou a Katharina Emmerick que não permitisse a sua volta, e o Dr. Wesener apoiou o seu
pedido. Eles escreveram cartas a Brentano, dizendo-lhe que não retornasse a Dülmen, pois trazia mais prejuízos do
que vantagens à vidente. Após uma troca de cartas de todos com Overberg, e do arrependimento de Brentano,
consentiu-se que ele voltasse, graças especialmente ao apoio que Overberg lhe deu. É de se notar, porém, que
Hümpfner provou que as cartas de Wesener e Lambert para Brentano, publicadas por Schmoeger, foram forjadas
pelo poeta (108).
Em maio de 1819, Brentano retornou a Dülmen, onde ficara até 1824. Porém, suas relações com Katharina
Emmerick foram, pouco a pouco, se deteriorando. Logo que voltou, Brentano se queixou de que Katharina
Emmerick se esquecia de todas as profundas comunicações que recebia do além, e que quase as abandonava (109).
"Ela é mal humorada", torna-se "impaciente nas perguntas melindrosas, é "facilmente lacônica", "muito complicada
para o convívio", "muitas vezes astuciosa"; "procura causas para desgosto, ela mesma trama acusações infundadas";
"teimosa, impaciente e incompreensiva, e levando tudo a mal, como uma pessoa muito caprichosa" (110). Estas
eram as queixas de Brentano contra a freira.
"Ela é preguiçosa para as conversas espirituais", e, no entanto, conduz "as conversas muito agilmente, quando se
trata de bisbilhotices" (111). Brentano passa a dar-lhe importância apenas como vidente, e só se interessa pelas
informações que ela fornece em estado de êxtase, porque "às suas conversas, quando desperta, pouca importância se
dá". E ela, em geral, nesse estado, é "um ser muito débil, é muito enfadonha e sem sabedoria" (112). Indo mais
longe, acrescenta: "Sua ‘débil’ humanidade, porém, é somente o local de travessia, desinteressado e inconsciente, da
"corrente de graça", "da qual para ela mesma nenhuma sabedoria resulta", e de nenhum modo "consolação ou
entendimento" (113).
Brentano a acusa mesmo de ter pouco interesse pelas suas próprias visões, porque "com indiferença total ela esquece
completamente as mais importantes comunicações, e as põe de lado, sim, ela esquece com gosto (114). Ela parece,
aliás, não entender nada das tais imagens (que vê); pelo menos ela se porta como se fosse assim (115)... eis porque
suas palavras, quando desperta, merecem pouca ou nenhuma confiança" (116).
"São notáveis o seu mau entendimento, e seu costume de dar conselho em tudo, antes que lho peçam. Sem
compreender, ela toma as palavras totalmente às avessas, e teima em sua resposta. Ela raramente sabe o que se diz,
e diz raramente o que sabe".
Não se poderia ser mais cruel e arrasador. É bem o estilo de Brentano (117).
Ele não poupa, também, o ambiente em que ela vive, "suas companhias desesperadamente repugnantes", a
"monstruosa confusão" e "a total confusão e porcaria em torno dela" (118).
Aliás, na própria "Positio", se dá o testemunho de Rensing, de que Katharina Emmerick "usa do vocabulário
popular, palavras que ofendem o ouvido de pessoas educadas" (119).
Isto quer dizer que ela era pouco recatada nas palavras, usando palavras prosaicas e grosseiras.
Como uma pessoa como essa freira poderia ser, um dia, Serva de Deus, com processo de beatificação em Roma?
Foge ao escopo desta tese a discussão sobre a autenticidade das visões de Katharina Emmerick, e sobre a fidelidade
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de Brentano, como divulgador das mesmas. Interessa-nos apenas, como já dissemos, constatar a existência de traços
cabalísticos e esotéricos nessas visões.
Katharina Emmerick tinha visões, sonhos extraordinários e êxtases, já antes da chegada de Brentano;
Katharina Emmerick - nós já o mostramos - compartilhava, já antes da vinda de Brentano, de muitas das idéias que
aparecerão nas anotações das visões de Brentano;
Não discutiremos, nesta tese, a natureza das visões de Katharina Emmerick, nem sua origem.
Quando Brentano chegou a Dülmen, ele ficou entusiasmado com os estranhos fenômenos que se davam na pessoa
da freira, fenômenos esses que eram, para ele, a comprovação de que suas visões do além eram autênticas. Como diz
Adams: "...aos olhos de Brentano, Katharina Emmerick é uma profetiza inspirada e escolhida por Deus, "talvez a
maior vidente alegórica e histórica que viveu, desde Ísis (Sic)" (120). Emmerick se acha também dignamente
incluída, por Brentano, entre os maiores sábios e videntes da humanidade" (121). E o poeta não hesita em
compará-la aos profetas do Antigo Testamento, a São João e a Zoroastro (Sic), dizendo que, como eles, ela recebeu
o seu livro de profecias da misteriosa "Montanha dos Profetas" de que trataremos mais adiante (que seria
identificada até com o Mont Ségur dos cátaros, ou com a Monte Alborz da gnose shiita, como mostra Henry Corbin.
Brentano não para aí, e chega a atribuir a Katharina Emmerick a missão de ser a grande intermediária entre Deus e a
natureza, e como que uma Redentora ou Messias da natureza, como esperavam os autores românticos:
"Assim, a vidente está colocada propriamente como mediadora entre Deus e a Natureza. A ela foi concedido o poder
de elevar as criaturas para Deus, e conduzi-las à sua determinação eterna nEle" (122).
As Revelações e a missão de Katharina Emmerick estariam, por isso, acima dos feitos pelos demais profetas, e
preparariam o Novo Reino de Amor, do qual Brentano seria, por vocação divina, o anunciador, já que Deus o
encarregara de anotar e publicar tais revelações.
A "poesia", que abrange as visões de Emmerick, não é mais apenas "fragmento", mas, sim, é a "totalidade" que Deus
revelou a seus escolhidos, para o restabelecimento da "unidade" perdida, para a salvação do "tempo despedaçado e
totalmente cego", e que teria sido entregue a ele (Brentano), como o porta-voz predestinado, para anunciação,
preparação e fundação de nova idade da fé que ia chegar:
"Eu recebi, foi-me entregue uma parte do Apocalipse para a qual, até agora, os homens ainda não estavam maduros,
e eles não sabiam que tinham recebido esses raios, que são de João, e toda a luz cairá sobre a Igreja. Acontece que a
Igreja não tinha, nos últimos tempos, capacidade nenhuma de receber essa luz" (123).
Como se vê, era uma espécie de novo Pentecostes, de nova revelação, de uma renovação da Igreja, que a faria mais
perfeita como jamais fôra, que inauguraria a nova era do amor.
Com o tempo, e ante a constatação dos inúmeros defeitos de Katharina Emmerick, que, segundo Brentano,
tornavam-na indigna de sua missão, o poeta passou a considerá-la apenas como um veículo de manifestação da
Divindade, que nada compreendia de suas próprias visões. Por isso, só a ele, Brentano, cabia o grande fardo de
comunicar tais revelações ao público. Daí a liberdade com que ele tratou as "visões" da freira de Dülmen.
Quando Brentano retornou a Dülmen, em maio de 1819, ele visitava a freira todas as manhãs, para anotar o que ela
dizia ter visto, em sonhos, à noite. À tarde, ele passava suas notas a limpo e, por fim, à noite, vinha lê-los para a
freira, que corrigia o que fôra mal expresso. Isto, pelo menos, é o que o poeta diz que fazia. Hoje, porém, a polêmica
sobre a autoria dasVisõesde Katharina Emmerick parece já resolvida, e a posição do padre Schmoeger de que
Brentano foi objetivo na anotação do que lhe dizia a vidente, se mostra insustentável, graças aos estudos
realizados,ea publicação dos textos originais do poeta. Bem antes, Diel e Kreiten colocaram em dúvida a fidelidade
de Brentano, na reprodução das visões de Katharina Emmerick, por causa do reconhecido caráter fantasista do
poeta, e os censores dos escritos da "vidente", no processo de canonização instaurado em 1892-1894, chegaram à
conclusão de que Brentano é que devia ser responsabilizado por eles.
0 padre Winfried Hümpfner, no trabaIho que elaborou para a Congregação dos Ritos, tendo em vista o mesmo
processo, chegou à conclusão, como vimos, de que os escritos atribuídos a Katharina Emmerick são "uma
mistificação científica, consciente e premeditada" de Brentano (124).
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Por outro lado, os novos estudos encomendados pela "Sagrada Congregação para a Causa dos Santos" aos
professores Erwin Iserloh e Ildefonz Maria Dietz vieram confirmar a opinião dos censores e a do Padre Hümpfer,
assim como os trabalhos de Hans Stahl, Cardauns e Oehl também contribuíram para a demonstração de que
Brentano não foi um relator fiel.
Para Joseph Adams, enfim, é evidente que Brentano manipulou os dados fornecidos por Katharina Emmerick, o que
se comprova pela fluidez, exatidão e habilidade do estilo (125).
A conclusão geral a que se chegou foi de que os textos das Visões de Anna Katharina Emmerick são de Clemens
Brentano, o que não exclui que ela tenha tido visões, e que algodo que ela disse esteja realmente nos textos de
Brentano, embora adornado e completado por observações desse poeta e redator infiel.
Constata-se, pelo que vimos até agora, que existia uma profunda relação do Romantismo com o esoterismo e a
Cabala.
Verificamos ainda como a vida, a mentalidade, as leituras e idéias de Brentano foram influenciadas pelas doutrinas
esotéricas e cabalistas.
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Registramos, enfim, como Anna Katharina Emmerick, e igualmente as pessoas de seu círculo mais próximo, não
estavam isentas de influências esotéricas, teosóficas, gnósticas e cabalistas.
Veremos, em seguida, como tais doutrinas e idéias, que encharcavam os ambientes religiosos e culturais da
Alemanha do tempo do Romantismo, repercutiram nos textos das Visões de Anna Katharina Emmerick, redigidas
por Clemens Brentano.
NOTAS
(1) K.E. SCHOMOEGER, Das Leben der Gottseligen Anna Kathari Emmerick, Herder, Freiburg im Brisgau, 2 vol.,
1987-1870.
(2) K.E.Scihmoeger, Vie d'Anna Catherine Emmerick, 3 vol., Téquí, Paris, reproduction offset d'après l'édition
originale de 1868 de Bray et Retaux, 1981.
(3) DIEL-KREITEN Clemens Brentano, Ein Lebensbild, 2 vol. Herder'sche Verlage Freiburg im Brísgau, 1877.
(4) T. WEGENER, Das inner und äussere Leben der Gottseligen Dienerin Gottes Anna Katharina Emmerick aus
dem Augustinerordens, Paulttloch Verlag, Aschaffenburg, 1974, 2aedição.
(5) POSITIO, p.2. Documento da SACRA CONGREGATINIS PRO CAUSA SANCTORUM.
(6) WINFRIED HÜMPFNER, Clemens Brentano Glaubewurdigkeit in seínem Emmerick Aufzeichnungen, St.
Ritua Verlag und Druckerei Wurzburg, 1923.
(7) Apud Relatio et Vota, voto V. - "Relatio et vota do Congressus peculiarís" - Roma, 10 de fevereiro de 1982,
documento da Sacra Congregationis Pro Causa Sanctorum, p.n. 1225, assinado pelo Pe. Agostino Amore O.F.M.,
Relator Geral, com o visto de Giuseppe Casoria, secretário; este documento tem por título "An causam eius
íntroducenda sit" ("Se a causa dela pode ser introduzida").
(8) Relatio et vota Voto VI.
(9) J. ADAMS - Clemens Brentanos Emmerick - Erlebnis, Verlag Herder, Freiburg, 1956.
(10) A. BRIEGER - Der Gotteskreiss, Manz Verlag, München1966, Anna Katharina Emmerick Visionem und
Leben, Erich WewelVerlag, München / Freiburg, 1974.
(11) Cfr. CB - Tgb apud "Anton BRIEGER, Anna Katharina Emmerick Visionem und Leben, Erich Wewel Verlag,
München - Freiburg -1974.
(12) Tagebuch de Clemens Brentano-apud e, ADAM S, cit., p. 176.
(13) Apud J. ADAMS, op. cit., p. 176, nota 345)
(14) Clemens BRENTANO apud SCHMOEGER Anne Catherine Emmerick, Tégui - París, 1981, 1º vol. p. 9.
(15) SCHMOEGER - op. cit. vol. 1, pp. 13 e 55.
(16) WESENER., Tagebuch Kurzedrangten Geschichte, p. 254.
(17) Cfr. ERIKA TUNNER, Clemens Brentano (1778-1842), Tese apresentada na Universidade de Paris - 10-
IV-1976, Librairie Honoré Champíon, Paris, 1977, 2 vol.
(18) Cfr. SCHMOEGER, op. Cit. vol. I. p.p. 38-40.
(19) Cfr. M.T. LOUTREL - Anne Catherine Emmerick racontée par elle-même et par ses contemporains - Tequi,
Paris, 1980, p. 28.
(20) Cfr. A. BRIEGER - Anna Katherina Emmerick, Visionen und Leben, ed. cit. p. 20.
464
(21) Cfr. LOUTREL, op. cit. p. 46.
(22) WESENER, Tagebuch, ed. cit., p. 246.
(23) C. B. Tgb. apud. A. BRIEGER, op. cit., L.
(24) Cfr. SCHMOEGER, op. cit., vol. 1, pp. 151-152.
(25) WESENER, op. cit.., p. 245.
(26) C. B.Tgb, apud A. BRIEIGER, op. p. 224.
(27)WESENER, op. cit., p. 248.
(28) Cfr. SCHMOEGER, op. cit., pp. 282-283.
(29) Cfr. C.B., Tgb. apud A. BRIEGER - op. cit., p. 224.
(30) Cfr. WESENER, op.cit., p. 251.
(31) Cfr. SCHMOEGER - op. cit., pp. 265-269.
(32) Cfr. SCHMOEGER - op. cit., p. 268.
(33) Schmoeger, op. cit., pp. 270-271.
(34) Cfr. WESENER, op. cit., p. 2b2.
(35) Cfr. SCHMOEGER - op. cit., vol. I, pp. 272-273
(36) Cfr. SCHMOEGER - op. cit., vol. I, p. 274.
(37) Cfr. SCHMOEGER - op. cit., vol. I, p. 282.
(38) Cfr. SCHMOEGER - Vol. I, PP. 309~316 - desenhos p. 641.
(39) Cfr. SCHMOEGER - op. cit., vol. I, p. 373.
(40) Cfr. SCHMOEGER - op. cít., Vol. I, pp. 382-383.
(41) Cfr. E.TUNNER, op. cit., vol. 11, p. 830.
(42).Cfr. E. TUNNER, op. cit. vol.II, p. 832.
(43) SCHMOEGER, -- op. cit. p. 69
(44) Cfr. WESENER - op. cit. p. 194
(45) POSITIO -- Documento da SACRA CONGREGATIONIS PRO CAUSA SANCTORUM 10/VI/1928.
(46) ADAMS -- op. cit. p. 81.
(47) SCHMOEGER - op. cit. Vol. II, p. 59
(48) SCHMOEGER - ob. cit., vol. II, p. 73
(49) Cfr. POSITIO - Animadversionnes
(50) Cfr. WESENER - Kurzgedrangte Geschichte-, p. 248
(51) WESENER, Tagebuch 23-111-1813 - Paul Pattloch Verlag Aschaffenburg, 1973, pp. 3 e 4
(52) E. TUNNER, op. cit., Vol. II, p. 841
(53) Cfr. WESENER, Tagebuch, pp. 159-160
(54) WESENER,Tagebuch, p. 102.
(55) Cfr. WESENER, op. cit.,256
(56)WESENER,op. cit., p. 170.
(57) Cfr. WESENER, op. cit., p. 176.
(58) WESENER, op. cit., p. 177.
(59) Cfr. J. ADAMS, op. cit., p. 157
(60) ADAMS, OP. cit., p. 158.
(61) Cfr. WESENER, op. cit., p. 286.
(62) WESENER, op. cit., p. 98.
(63) WESENER, op. cit., p. 127.
(64) WESENER, op. cit., p. 1b6.
(65) SCHMOEGER - op. cit., p. 478.
(66) Cf. WESENER - op. cit., pp. 157-158
(67) WESENER - op. cit., p. 158'
(68) WESENER op. cit., p. 159.
(69) WESENER - op. cit., p. 159
(70) WESENER op. cit. p. 161.
(71) Cfr. cap. II, supra.
(72) Cfr. SCHMOEGER, gp. cit ^ voZ. I, pp. 485-486.
(73) WESENER - op. cit., p, 175.
(74) WESENER - pp. cit., p. 173,
(75) WESENER – op. cit. p.178.
(76) J. ADAMS - op. cit. p. 158.
(77) J. ADAMS, op. cit. p. 151.
(78) WESENER, op. cit. pp. 24-25
(79) WESENER op. cit. p. 58.
(80) WESENER, op. cit. 142
465
(81)Positio, Animadversiones
(82) HÜMPFNER, op. cit. p. 122
(83) HÜMPFNER, op. cit. p. 123
(84) Apud JURG MATHES –"Ein Tagebuch Clemens Brentanos für Luise Hensel" – Jahrbuch des Freien
Deutschen Hochstifts –1971- Sonderbuch– Max Niemayer Verlag – Tübingen – pp. 213-214.
(85) J. ADAMS, op. cit. pp. 161-162.
(86) C.B.Tgb. apud ADAMS op. cit. p. 65
(87) TUNNER, op. cit. vol. II, p. 795
(88) ADAMS op. cit. p. 68
(89) CB-Tgb - apud ADAMS op. cit. p. 80
(90) Luise Hensel ao Pe. Sohnoegey, 4 Outubro 1870, apud TUNNER, op..cit. vol. II, p. 808
(91) HUMPFNERGlaubwürdigkeit,p. 55
(92) TUNNER, op. cit. vol. II p. 813
(93) C.B. -Jahrbuch- FDH 1971, p. 249 apud TUNNER op. cit., vol. II. p. 813.
(94) GAJEK,Homo Poetapp. 460-470}
(95) ADAMS, op. cit. p. 24.
(96) CB. Tgb., apud J. ADAMS, op. cit., p. 263
(97) CB – Tgb. apud SCHMOEGER, op. cit. vol. I, p. 517
(98) Apud JURG MATHES" Ein Tagebuch Clemens Brentanos füe Luise Hensel". Jahrbuch des Freien Deutschen
Hoschtifts– 1971 – Sonderdruck, Max niemayer Verlag – Tübingen, pp. 253-254
(99) SCHOEMEGER, op. cit. vol. I, p. 520.; cfr. WESENER, op. cit. pp. 184-185.
(100) SCOEMEGER, op. cit. vol. I, p. 520.
(101) J. ADAMS, op. cit. p. 84.
(102) C. B. – apud |ADAMS, op. cit. p. 90.
(103) WESENER, op. cit. p. 187.
(104)Processo, vol. Ill fol. 189 terg 190 apudPoisitio38.
(105) Cfr. C.B. GS, VIII p. 300.
(106) Cfr. DIEL-KREITEN, op. cit. vol. II, p. 156.
(107) Cfr. TUNNER, op. cit. vol. II, p. 824.
(108) Cfr. HÜMPFNER, op. cit.., p. 103.
(109) Cfr. ADAMS, op. cit. pp. 137-138.
(110) CB. Tgb., apud ADAMS, op. cit. p.139.
(111) CB. Tgb., apud ADAMS, . op. cit. p. 141.
(112) CB. Tgb., apud ADAMS, . op. cit. p. 143.
(113) CB. Tgb., apud ADAMS, . op. cit. p. 144.
(114) CB. Tgb., apud ADAMS, . op. cit. p. 145.
(115) CB. Tgb., apud ADAMS, . op. cit. p. 149.
(116) CB. Tgb., apud ADAMS, . op. cit. p. 150.
(117) CB. Tgb., apud ADAMS, . op. cit. p. 163.
(118) CB. Tgb., apud ADAMS, . op. cit. p. 139
(119)Positio,pp. 48-49..
(120) ADAMS, . op. cit. p. 175
(121) ADAMS, . op. cit. p. 175.
(122) ADAMS, . op. cit. p. 229.
(123) ADAMS, . op. cit. p. 261.
(124) Cfr. HÜMPFNER. op. cit., p. 364.
(125) J. ADAMS, op. cit. pp. 289-290 e 305.
II Parte
466
1. Observações preliminares.
Para a análise das visões de Katharina Emmerick, utilizaremos os textos originais de Clemens Brentano tais quais
foram redigidos por ele e parcialmente publicados, especialmente por Anton Brieger em suas obras:
1. Anna Katharina Emmerick–Der Gotteskreis– Die Urtexte ihrer Visiones aufhezeichnet con Clemens
Brentano – Manz Verlag, Müchen-Freiburg, 1960;
2. Anna Katharina Emmerick–Visionen und LebenNach den Dülmener Aufzeichnungen von Clemens
Brentano – Erich Wewel Verlag, Müchen – Freiburg, 1974.
Utilizaremos ainda citações do Urtexte de Clemens Brentano publicados também por Joseph Adams em sua
obraClemens Brentano Emmerick-Erlebnis–Bindung und Abenteuer, Verlag Herder, Freiburg, 1956.
Somente citaremos os textos publicados pelo Padre Schomoeger quando não tivermos a mesma citação do Urtexte e
sempre quando esses mesmos textos vierem confirmar a doutrina do Urtexte.
A fim de deixar mais claros os traços cabalísticos e esotéricos dessas Visões, e, tendo em vista que Katharina
Emmerick é considerada por muitos como santa, mostraremos:
1°) Como tais elementos de suas Visões não são explicáveis pela doutrina católica;
2°) Como esses dados se encaixam no contexto das doutrinas cabalistas ou esotéricas, e, mais precisamente, naquilo
que se denominou “cabalismo cristão”.
“Eu vi abrir-se primeiramente diante de mim um espaço limitado, cheio de luz, e vi, ainda, dentro do mesmo, uma
espécie de globo luminoso como um sol, e senti, que, no mesmo, estava a Unidade de Três. Eu a denomino para mim
mesma a Harmonia e eu vi sair dali como um efeito (ação), e então formaram-se sob o globo como que círculos
luminosos entrelaçados, anéis, coros de espíritos infindavelmente luminosos, vigorosos e belos”.(1)
A concepção de Deus apresentado nesse texto não se coaduna com a doutrina católica, oficialmente professada por
Katharina Emmerick e por Brentano, mas se aproxima muito dos conceitos cabalistas e esotéricos sobre a divindade.
A freira usa o advérbioprimeiramente. Ela pretendia com isso dar idéia da ordem cronológica de suas visões ou do
que existia desde o princípio? Isso não fica claro e o resultado é que se insinua um processo cronológico não só na
criação – o que é natural – mas na própria divindade. Além disso, ela afirma queprimeiramenteviu a existência de
três coisas;
1) o espaço;
Como ela só depois falara de criação propriamente dita, o espaço, a luz e o globo no qual estaria a Unidade de Três,
pré-existiram à criação? Seriam eles co-eternos com a divindade?
Utilizando a palavraprimeiramente, Katharina Emmerick estabelece uma idéia temporal. Falando em espaço que
contém o globo no qual estava a Unidade de Três ela dá uma clara noção de lugar para Deus. É claro que se poderia
tentar justificar tudo isto dizendo que se trata de uma linguagem mística, a qual, através de imagens materiais,
expõe, em termos humanos, o que, de si, é inefável. Ver-se-á mais adiante que, aquilo que é insinuado por essas
imagens ambíguas, tornar-se-á mais explicito e coerente noutros textos, mas de qualquer modo, objetivamente
falando, o texto em foco não deixa clara a absoluta transcendência de Deus com relação ao tempo e ao espaço.
Com efeito, somente os seres materiais existem ocupando um lugar no espaço (2). Deus, ser espiritual, infinito e
eterno, não ocupa lugar no espaço e nem esta sujeito ao tempo (3) e a vidente, relacionando a divindade com o
467
espaço e o tempo, dá uma idéia material, espacial e temporal de Deus que pode ter conseqüência panteístas ou
gnósticas. Conseqüentemente, a divindade de Khatarina Emmerick não seria ato puro, incapaz de qualquer mudança
(4), mas seria ser contingente, sujeito a transformação. Ora, é exatamente neste ponto que a Gnose, a Cabala e as
doutrinas esotéricas discrepam do conceito católico de Deus que Katharina Emmerick pretende ter.
Para a Gnose, como para a Cabala e o esoterismo, a divindade não é imutável, estando, pelo contrário, sujeita a uma
perpétua evolução dialética, o que implica em sucessão temporal e em localização espacial. Daí, os sistemas
gnósticos exporem o processo divino como uma evolução. Daí também falarem no que ocorre “intra et exta”
divindade, já que ela ocuparia lugar determinado e limitado. No globo luminoso, diz ainda Katharina Emmerick
quesentia– “fuhlte ich” – a Unidade de Três– “die Einheit von Dreien”.
Por que sentia? Sente-se apenas o que é material ou o que se exprime materialmente. Sendo Deus puro espírito não
teria sido melhor utilizar verbos indicativos de intelecção, como, por exemplo, conhecer, entender, compreender?
Como bom romântico que odiava a razão e que colocava acima dela o sentimento, Brentano prefere dizer que
Katharina Emmerick sentia a “Unidade de Três” dentro do globo resplandecente. É curioso, outrossim, que o texto
não emprega a expressão tradicional “Santíssima Trindade”, ou “Deus uno e trino”. Katharina Emmerick sentiu que
lá estava a “Unidade de Três”, o que pode dar a entender a existência de uma pluralidade na divindade. Além disso,
ela denomina a “Unidade de Três” de Harmonia (“Einstimmung”), termo esse deveras estranho na boca de uma
camponesa que muitos apresentam como quase iletrada.
Não seria normal que ela, sendo freira, usasse a expressão tradicional?
A palavra “Einstimmung”, reforça a idéia de pluralidade na divindade já insinuada com a expressão “Einheit von
Dreien”. Isto porque só pode haver harmonia entre coisas diferentes. Por exemplo, pode haver entre notas musicais
diferentes, entre cores, entre classes sociais, entre pessoas etc... Sempre, porém, a harmonia implica uma unificação
de entes de qualidades diversas. Logo, chamar a Santíssima Trindade de Harmonia pode dar a idéia de que há
desigualdades reais entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo, o que não está de acordo com a ortodoxia, pois, segundo
a doutrina católica, as três pessoas divinas, embora distintas, são absolutamente iguais e consubstanciais (5).
S. Tomás, por exemplo, naSuma contra Gentiles, ao discutir a tese dos que chamavam a alma de Harmonia, diz:
“Parecida a la opinión ya expuesta es la de quines dicen que el alma es ‘armonía’. No entendieron, sin embargo, que
el alma fuese armonía de sonidos, sino armonía ‘de contrarios’, pues veían que estos componen los cuerpos
animados.
Esta opinión parece atribuir-se, en el libro ‘Sobre el alma’, a Empédocles. No obstante, Gegorio Neseno atribuyela a
Dinarco. Puede refutarse como la anterior y, además, con razones apropriadas.
Todo cuerpo mixto tiene armonía y complexion. La armonía no puede mover al cuerpo, ni regirlo, ni resistir a las
pasiones; como tampoco la complexión. Además, tanto la armonía como la complexión aumentan y diminuyen.
Todo esto demuenstra que el alma ni es armonía ni complexión.
La razón de armonía conviene más a las cualidades del cuerpo que a las del alma, pues la salud es cierta armonía de
humores; la fortaleza, de nervios y huesos; la belleza, de miembros y colores. Pero no se puede determinar de qué
cosas sea la armonía del sentido y del entendimiento y de cuánto pertenece al alma. Luego, el alma no es armonía.
La armonía tiene un doble significado: o bien es ‘la composición misma’, ‘la razón de tal composición’. Pero el
alma no es composicíon, pues seria necesario que cualquier parte del alma fuese la composicíon de algumas partes
del cuerpo; lo que no cabe decír. Igualmente, tampoco es la razón de la composición, porque, como en las diversas
partes del cuerpo haya diversas razones o proporciones de composición, las distintas partes del cuerpo tendrían
distintas almas; una seria el alma del hueso, otra de la carne, otra la del nervio, porque todos estan compuestas por
diversa porporción. Esto es falso, luego el alma no es armonía” (6).
Ora, se é falso afirmar que a alma é harmonia, com muito mais razão é falso afirmá-lo da Santíssima Trindade, pois
isso implicaria em por nela desigualdade, oposição de contrário, composição e materialidade. Por outro lado, o
termo “Harmonia” era empregado na linguagem romântica como o sentido de síntese dialética de dois princípios
contrários. É o que se verifica em Novalis, que, no ensaioDer Christenthum oder die Europa, apresenta uma filosofia
da História de caráter dialético em que a Idade Média (tese) seria amonotonia; a Reforma (antítese) seria
adesarmonia, enquanto que a terceiraépoca, que estava para vir, seria a síntese dessas duas idades anteriores e por
468
isso seria a idade da “Harmonia” (7).
É interessante agora citar como oZohardescreve o início do processo divino que veio a originar a criação.
“At the outset the decision of the King made a tracing in the supernal effulgence, a lamp of scintilation, and there
issued within the impenetrable recesses of the mysterious limitless a shapelles nucleous enclosed in a ring, neither
white nor black, nor red, nor green, nor of any colour at all. When he took neasurements, he fashioned colours to
show within, and whitin the lamp there issued a certains influence from which colours were imprinted below. The
most mysterious Power enshrouded in the limitless clave, as it were, without cleaving its void, remaining wholly
unknowable until from the force of the strokes these shone forth a supernal and mysterious point. Beyon that point
there is no knowable, and therefore it is called Reshith (beginning), the creative untterance which is the
starting-point of all” (8).
Há vários semelhantes ou paralelos entre esse texto doZohare o exposto pela vidente de Dülmen:
2. OZoharlocaliza e encerra a divindade num anel, enquanto Katharina Emmerick fala em globo de luz.
3. Desse anel, que encerrava a divindade, jorra uma chama que se torna colorida ao crescer. Katharina
Emmercik fala em círculos luminosos entrelaçados.
4. As chamas fluem da divindade para baixo. Katharina Emmerick diz que os círculos luminosos emanados da
divindade se situam abaixo dela.
Entre a divindade inicial e as suas emanações alguns cabalistas diziam existir uma espécie de Trindade. Essa idéia é
atribuída, segundo Scholem, a Hai Gaon:
“There it is stated that, above all emanated powers, there exist in ‘the root of all roots, three hidden lights which have
no beginning’ for they are tha name and essence of the root of all roots and are beyon the grasp of thought. As the
‘primeval, inner light’ spreads throughout the hidden root two other lights are kindled, called ‘or mezuhzah’ and ‘or
zah’ (‘Sparking light’). It is stressed that these three lights constitute one essence and one root which is ‘infinitely
hidden’. He lam ad le-ein Sof, forming a kind of kabbalistic trinity that precedes the emanation of the tenSefirot.
However, it is not suficiently clear whether the reference is to three lights between the Emanator and the first
emanation, or to three lights irradiating one another within the substance of the Emanator itself both possibilites can
be supported. In the terminology of the Kabbalah these three lights are calledZahzahot(‘splendors’), and they are
thought of as the roots of these three upperSefirotwhich emanate from them (see Cordovero, Pardes Rimmonis ch.
11). The need to posit this strange trinity is explained by the urge to make the ten Sefirot conform with the 13
attributes predicated of God. It is hardly suprising that Christian later found an allusion to their own doctrine of the
Trinity in this theory, althought it contains none of the personal hypostases characteristic of the Christian
Trinity”(9).
É muitíssimo provável que Brentano jamais tenha tido conhecimento da teoria dos Zahzahot, ou das três luzes com
uma só essência, pois isto não se encontra nos textos dos cabalistas que ele conhecia.
Entretanto, os cabalistas cristãos, desde o século XVI, procuraram conciliar judaísmo e cristianismo exatamente
através da doutrina trinitária, vendo nas três primeiras Sefirot uma caricatura da Santíssima Trindade (10). Ou então
vendo no nome YHWH um símbolo da trindade porque tem três letras embora escrito com quatro (11). De qualquer
forma, a descrição de Katharina Emmerick da unidade de três não é suficientemente clara para ser tida como
ortodoxa, e poderia enquadrar-se melhor na linha do cabalismo cristãs.
Em Katharina Emmerick, há várias descrições da Trindade utilizando as imagens da luz. Veja-se por exemplo, o
seguinte texto, evidentemente baseado na Visão de Ezequiel (I, 26-28):
“Eu via a Santa Trindade diante de um Trono de infinito brilho. Eu não posso dizer que tenha visto formas, também
não posso dizer que não vi nenhuma. Eu vi ou senti diante da larga superfície do trono três, como três raios, três
chamas, trêsraízesde brilho infindo que se irradiavam para cima para um único, nesse único, eu vi maisforma, e
mesmo algo de forma humana, mas era totalmente brilhante e indizível” (12).
É bastante característica a coincidência do termo “raiz” usado tanto por Katharina Emmerick quanto pelos cabalistas
469
e por Boehme ao falarem da divindade.
Seria preciso lembrar ainda que, Brentano, nosRomanzen von Rosenkranztratou do tema da divindade e da criação,
deixando inteiramente explícitas suas concepções cabalistas.
Para a Cabala, a divindade absolutamente desconhecida devia ser distinguida do Deus revelado do Antigo
Testamento. Essa divindade era chamada Ein-Sof (infinito), termo que apareceu primeiro nos escritos de Isaac, o
Cego e de Azriel de Gerona (século XIII) e só depois, noZohar.
O Ein-Sof é a divindade impessoal, na qual não há distinção nem volição, o que seria o Nada.
“More daring is the concept of the first step in the manifestation of Ein-Sof as ‘ayinorafisah’ (“nothing”,
“nothingness”). Essentialy, this nothingness is the barrier confronting the human intellectual faculty qhen it reaches
the limits of its capacity. In other words, it is a subjective statement affirming that there is a realm which no created
being can intellectualy comprehend, and which, therefore, can only be defined as ‘nothingness’“ (14).
“In all Kabbalistic systems, light-symbolism is very commonly used with regard to Ein-Sof” (15).O Ein-Sof era
chamado pelos cabalistas de Gerona de Vontade Primeva (16). Do Ein-Sof é que teriam emanado os 10Sefiroth, os
quais formariam, conjuntamente, o Deus do Antigo Testamento.
Não convém deixar esquecido que esta distinção entre a Divindade e Deus é típica da gnose (17).
Também na mística alemã, por exemplo em Eckhart: “Dio e Divinita sono differenti quanto cielo e terra, come fare
e non fare – La Divinita è l’oscuro fondo in cui tutte lê cose formano uma unità assoluta, dove nessuna distinzione è
possibile; la Divinità non fa nulla poiché in essa non v’è nulla da fare e di fatto non há mai ricercato nulla: essa abita
in uma luce a cui nessuno giunge, poichè è al di là di ogni alterità e di ogni relazione. Dio invece è attività che si
estrinseca ed opea, si svella nelle sue creature e vive in esse e, atraverso di esse, si riconosce e si ama” (18).
Katharina Emmerick dizendo que “via sair dela (da Harmonia) um efeito (Wirkung) e então formarem-se, sob o
globo, círculos luminosos, anéis entrelaçados, coros de espíritos infindavelmente luminosos, vigorosos e belos”
(19).
Observe-se, ainda, que os tais “coros de espíritos”, não foram criados “ex-nihilo”, mas que saíram da “Enheit von
Dreien”, da “Einstimmung”. Em outras palavras, houve uma emanação.
Ora, tala não é a doutrina católica, oficialmente professada pela vidente e por Brentano.
A idéia de que em Deus houve emanações é típica de todos os sistemas gnósticos e alcançou maior desenvolvimento
em Valentino (20) e na Cabala. Segundo esta, a Divindade teria emanado dez “forças”, espíritos ou éons –
osSefiroths – através dos quais o “Deus onditus” se tornaria cognoscível. Estes dezSefiroths formariam a “árvore”
sefirótica.
Os estudiosos da Cabala divergem a respeito de terem existido emanações substanciais “ad extra” da divindade ou
não.
470
“A. Franck interpreted the Kabalah as a pure emanist system, which he considered indentical with a clearly
pantheistic approach (...) In contrast to Franck, D.H. Joel set out to prove that the Zohar and early Kabbalah in
general contained nothing of the theory of emanation” (21).Para Scholem – o maior conhecedor da Cabala – os dois
autores estariam em erro. Scholem admite as emanações, mas emDeus.“The emanation of theSefirothis a process
within God himself. The hidden God in the aspect of Ein-Sof and the God manifested in the emanation ofSefirothare
one and the same, viewed from two differents angles (…) in Kabbalah, emanation as an intermediate stage between
God and Creation was reasigned to the Divine” (22).
NoBahire noZoharse fala ambiguamente de criação do mundo e de emanação (23) e esta ambigüidade facilitou o
irenismo dos cabalistas cristãos.
Essa mesma ambigüidade se acha no texto de Katharina Emmerick. Ela não usa nem a palavra emanação, nem a
palavra criação para os “anéis espirituais” entrelaçados e luminosos quesaemda divindade.
Scholem lembra que o termo “Sefirah” vem do hebraico “Sappir” (safira) porque o brilho de Deus seria como e de
uma safira. OsSefirothseriam também designados por“’ma’ amarot” e “dibburing” (ditos) ,“shemot”(nomes)
,“orot”(luzes), “kohot”(poderes), “katarins”(coroas), “middot”(qualidades), “madregot”(estágios),
“levushim”(adornos),“ marot”(espelhos), “neti’ot”(impulsos), “mekorot”(fontes), “yamim elyonim” ou “yemei
kedem” (dias primordiais ou supremos), “sitrin”(aspectos), “ hapanin há-penimiyyot”(as faces interiores de Deus)
(24).
Os cabalistas afirmam que osSefirothsão o próprio Deus. Mas eles distinguem a Divindade de Deus. A divindade –
Ein Sof – seria absolutamente incognoscível, enquanto Deus se manifestaria nas emanações sefiróticas e seria
cognoscível por meio delas. OsSefirothse identificariam com Deus.
Embora “TheSefirothemanate from Ein-Sof in sucession – ‘as if one candel were lit from another without the
Emanator being diminished in any way’ – and in a specific order (…) they do not thereby leave the divine domain”
(26)
Além disso, Scholem nota que osSefiroth, individual e coletivamente “subsume the archetype of every created thing
outside the world of emanation. Just as they are contained within the Godhead, so they impregnate every being
outside it” (27).
Com base no primeiro livro das Crônicas (29,11) os cabalistas enumeram os dezSefirothna ordem seguinte:
A compaixão dessas emanações com uma árvore provem doBahir.“All the divine powers of the Holy One, blessed
be he, rest one upon the other, and are like a tree” (28).
“todos os poderes divinos foram uma seqüência de camadas e são como uma árvore” – já lemos no livro de Bahir,
pelo qual, como vimos, os cabalistas do século XIII, tornaram-se herdeiros do simbolismo gnóstico. As
dezSefirothconstituem a mística árvore de Deus ou árvore do poder divino, representando cada uma um ramo cuja
raiz comum é desconhecida e desconhecível. Mas oEin-Sofé não só a oculta Raiz de todas as Raízes, como também
a seiva da árvore: todo ramo que representa um atributo, existe não por si mesmo, mas em virtude do Ein-Sof, o
Deus oculto. E esta árvore de Deus é também, por assim dizer, o esqueleto do universo: ela cresce por toda a criação
471
e espelha seus ramos por todas as suas ramificações. Todas as coisas mundanas e criadas só existem porque algo do
poder dasSefirothvive e atua nelas” (30).
Também se apresentam asSefirothna forma de um homem, o qual seria, esquematicamente, como uma árvore
invertida. Assim, a árvore sefirótica é ela também uma árvore invertida, pois que nasce no alto, em Deus, e lança
seus ramos para baixo.
“The firstSefirothrepresent the head, and in the Zohar, the three cavities of the brain the fourth and the fifth, the
arms; the sixth, the torso; the seventh and eight, the legs; the ninth the sexual organ; and the tenth refers either to the
all-embracing totality of the image, or (as in the Bahir) to the female as companion of the male, since both together
are needed to constitute a perfect man” (31).
Seguindo o modelo neo-platônico, alguns cabalistas, como por exemplo Azriel de Gerona, dividiram asSefirothem
três estágios, correspondendo as três primeiras sefirás ao intelecto, as três seguintes ao psíquico e as três últimas à
natureza (excluindo-se a 10asefirá, resumo ou síntese de todas).
Brentano, como dissemos, só conhecia a Cabala de segunda mão, através de Rosenroth, de Eisenmeger, Van
Helmont e Galatino. Por outro lado, suas tendências irenistas – tão comuns entre os românticos – levam-no a
enquadrar-se no chamado cabalismo cristão. Mais: o temor de uma condenação eclesiástica obrigava-o a camuflar
os empréstimos que fazia à Cabala.
No texto de Katharina Emmerick que estamos analisando, Brentano refere-se a “círculos luminosos entrelaçados(na
Cabala orot ou Ketarin), anéis, cores de espíritos infindavelmente luminosos” e que fazem pensar nas descrições
cabalistas dosSefiroth.
Mas há mais.
Katharina Emmerick teria tido a 20-21 de maio de 1820 uma visão da “árvore de Deus”: “Eu vi na Jerusalém
celestial umaárvore espiritualde luz colorida. Ela não estava abaixo... mas sim em frente ao trono da Santíssima
Trindade. O solo em que ela se enraizava era uma montanha flutuante ou um penhasco de pedra preciosa colorida e
de forma cristalina. O tronco era uma torrente de luz amarela. Os galhos e hastes, até as nervuras das folhas, eram
grossas e finas fibras de luz diferentes cores e formas. As folhas eram de luz verde e amarela de diferentes cores e
formas.
A árvore tinha três coros distintos de galhos, o mais baixo com maior raio, o médio e o topo respectivamente mais
estreitos. Estas três amplitudes eram rodeadas por três coros de anjos, e no alto, acima do cume, estava de pé um
Serafim. Ele a rodeava com vôos circulares e tinha... cetro dos anjos recebia raios, luz, energia completa de Deus
através do Serafim. Havia como o espírito celestial, o espírito do crescimento, etc...
O segundo coro rodeava a coroa do meio da árvore, a qual produzia flores e todos os tipos de frutos, que este coro
governava.
Estes dois coros eram imóveis, isto é, eles agiam e atuavam, sem sair de seu lugar, e comandavam os coros de anjos
inferiores, dos quais o mais baixo rodeava a coroa de frutos da árvore.
Estes dois coros eram imóveis, isto é, eles agiam e atuavam, sem sair de seu lugar, e comandavam os coros de anjos
inferiores, dos quais o mais baixo rodeava a coroa de frutos da árvore.
Estes anjos eram móveis e levavam os frutos espirituais para incontáveis jardins de seu tipo, pois cada fruto tinha
seu jardim nos quais de novo eles se repartiam em seus tipos.
Esta árvore era a árvore geral que procede de Deus. Os jardins eram as espécies das frutas procedentes da árvore que
procedia de Deus. E mais abaixo procedentes da terra estavam os mesmos frutos estragados na natureza decaída e
estavam mais ou menos envenenados, enquanto ela estava subjugada pelo uso pecaminoso do influxo dos espíritos
planetários (...)”(32).
472
Não há dúvida alguma que esta árvore que “war der allgemeine Baum aus Gott” tem relação com a Cabala.
Na doutrina católica não há nada que faça qualquer alusão a uma árvore espiritual que procede de Deus. A única
doutrina que fala de uma “árvore” que procede de Deus é a Cabala.
O conjunto dos dezSefirothé comparado a uma árvore de procedência divina, espiritual, luminosa e colorida. A
própria palavra Sefirá vem da safira, pedra preciosa de forma cristalina.
A árvore Sefirótica tem raiz em Deus e cresce em direção à terra. Para Katharina Emmerick a árvore de Deus não
está fundada na terra e sim numa montanha “flutuantes” ou penhasco que é uma pedra preciosa de forma cristalina.
Finalmente, como na Cabala, a árvore descrita por Katharina Emmerick produz reflexos na criação tal qual existe
hoje, corrompida pela culpa original.
A escola cabalista que mais influenciou o romantismo alemão através de Boehme – foi a de Isaac Luria de Safed.
Isaac Luria (1534-1572), cognominado Há-ari, o leão sagrado, foi um dos autores que maior importância teve no
desenvolvimento da Cabala. Embora tenha escrito um único trabalho – um comentário doSifra di-Zeni’uta, que é
uma das partes doZohar– Luria teve suas doutrinas propagadas por seus discípulos, especialmente Hayyim Vital.
Scholem lembra que “a forma pela qual Luria apresentou suas idéias lembra acentuadamente os mitos gnósticos da
antiguidade. A similiaridade, claro está, não é intencional; simplesmente o fato é que a estrutura de seus
pensamentos se assemelha muito de perto à dos gnósticos” (33).
O autor mostra também as similitudes de Luria com Basílides e com os maniqueus (34). Aliás, ele sublinha que elas
não se devem“às conexões históricas entre os maniqueístas e perspectiva e disposição que em seu desenvolvimento
produziram resultados preciosos” (...) “em minha opinião”, diz Scholem, “o sistema luriânico é um exemplo
perfeito do pensamento gnóstico, tanto em princípios quanto em pormenores” (35).
Lúria é responsável por várias teorias originais em matéria de Cabala. Algumas delas são:
a) A teoria dotzimtzum– ou da contração do espírito divino para produzir, dentro de si mesmo, um espaço onde
se situaria o universo. Assim a criação do espaço precederia a emanação sefirótica e a formação do universo (o que
está inteiramente de acordo com o texto da visão de Katharina Emmerick, analisada no início deste capítulo);
b) No espaço primordial assim formado, teria permanecido uma luz divina –Reshinu. (Katharina Emmerick,
como vimos diz que o espaço primordial estava cheio de luz);
c) Além doReshinu, haveria no espaço primordial o que Luria chama de Klipot, cascas ou resíduos nocivos
que a divindade teria eliminado de si mesma ao se contrair. Estes resíduos seriam essencialmente maus, o que
colocaria a origem do mal na própria essência divina;
OsSefirothsão, às vezes, apresentados a modo de hipóstases, recebendo então o nome de Partzufim ou faces de
Deus. Citam-se cinco Partzufim mais importantes (36). Para que fosse possível a criação de seres e formas finitas,
teria sido preciso conter a luz infinita em vasos ou recipientes.
As primeirasSefirothcontiveram a luz em seus vasos, mas o mesmo não aconteceu com as demais. Os seus vasos se
romperam. É o que Luria chamava de “ruptura dos vasos”. Dizia ele que a causa dessa ruptura havia sido a
necessidade de que também asSefirotheliminassem o que nelas havia de “Klipot”, isto é, do mal.
Com a ruptura dos vasos, porém, parte da luz divina foi capturado pelos Klipot, dando origem ao mundo atual, no
qual bem e mal, luz e trevas estão mesclados.
e) A emissão messiânica consistiria, pois, em libertar toda a luz aprisionada atualmente nas criaturas;
f) Com base no pensamento de seu mestre Moses Cordovero (1522-1570), Luria desenvolveu a teoria dos
quatro mundos situados entre o Ein-Sof e os cosmos atual, doutrina que não aparece no Zohar:
473
1.Olam há-Atzilut: mundo da emanação das dezSefirothe da divindade;
2.Olam há-Beriá: mundo da criação, do Trono de Deus e da Mercabá (carro de Deus, segundo a visão de Exequiel)
e dos anjos superiores;
4.Olam há-Asiá:mundo da produção, arquétipo do mundo dos sentidos. As vezes nele se incluem tanto o mundo das
esferas, quanto o mundo terrestre (37).
Compare-se tudo isso com a Visão de Katharina Emmerick do Trono de Deus e de suas emanações: “Eu vi o trono
da divindade(...)”
“Bem lá em cima, na profundidade infinita do céu, eu vi a Santíssima Trindade rodeada dos coros de Anjos,
Virtudes e Potestades.
Provenientes do trono de Deus, caíam raios de luz em muitas outrasglóriasoucentros de luz, os quais estavam
rodeados de coros santos e formavam, algomais embaixo, um círculo externo do mundo de luz, em torno do Trono
da Divindade. A melhor imagem que se pode fazer é a de uma cúpula de cujo ponto central do Trono de Deus,
rodeado de cores de anjos, fossem emitidos raios de luz para muitos vasos de luz ou pontos centrais, rodeados de
coros de santos que, a partir da cúpula, se aprofundam sempre mais para a terra, em linhas circulares, formando
anéis conforme as dignidades.
Eu quero denominar a Divindade, afonte de luze estes coros santos depoços de luz, os quais são preenchidos pelos
raios dafonte. Mas como os raios dafonte de luzse derramam através dos coros de anjos de Poderes e Dignidades em
diferentes fontes e espécies de luz, nos poços, do mesmo modo ospoçosde novo irradiam luz para baixo, através de
cada coro de luz santa, que rodeia essespoços.
Todos estes derramamentos de luz são legítimos e livres. Legítimos pela ordem e forma de toda a criação e pela
eterna justiça da Divindade. Livres pelo amor, com o qual eles podem ser dados e recebidos, pois cada um não
coloca o seu ponto central em si ou noutra criatura, mas procura o ponto central nafontee não se derrama em si
mesmo pela sua particularidade, mas forma um vaso dos raios à fonte que se derrama diretamente ou pelospoços.
Assim cada um ama correta e inteiramente e se torna umvaso de luzpelas forças que o rodeiam e enche outros vasos
que se formam seguidamente com iluminação, formando sempre novos e novos vasos de luz” (38).
Repare-se, antes de tudo, que não se fala aí de criação e sim de emanação, já que a substância dafonte, isto é, da
divindade é emanada e enche ospoçoouvasos de luz(asSefiroth?). Observe-se ainda que, nesse texto, encontra-se
não apenas uma doutrina paralela ao emanacionismo gnóstico e cabalístico, mas que se utilizam até as mesmas
imagens da Cabala Luriânica: osvasos de luz.
Evidentemente, a prudência ordenava que Brentano fosse bem mais cauteloso ao redigir as visões de Katharina
Emmerick, destinadas a um público católico, do que o fora nosromanzen vom Rosenkranz. Nestes ele explica as
emanações da divindade e a formação dos quatro mundos intermediários:
141“Wie dem Lichte ist entsprungen (141 Assim como emanou da luz
Sich ruckziehend durch das wollen, retraindo-se através do querer,
Dunkler Raum in Mittelpunkte espaço escuro no ponto central
Worin ward die welt geboren. dentro do qual o mundo nasceu”.)
142 Wie sich in des Rückzugs Spuren (142 Assim como a luz se difundiu
Kreisend, dann das Licht ergossen girando nos vestígios da retirada,
Mannigfach dês Raumes Dunkel depois a luz cercou, de modo variado,
Licht erringend hat umschlossen, pela luta, a escuridão do espaço.)
143 Und, vie alles durchfiguret, (143 E como de tudo possuindo figuradamente
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Adam Kadmon ward geboren, Adão Kadmon nasceu
Aus sich sebtsen ausnaturend Ex-naturando fora de si
Die zehn Krafte Sefirote. As dez forças dosSefiroth.)
144 Wie vier Welten sind entsprungen (144 Emanaram os quatro mundos
Da lebending ward das Wollen quando se tornou vivo o querer
Asia, Briath, Aziluthe Asiah, Briah, Atziluth
Und Jezirah, Antliz Gottes. E Jezirah, a face de Deus.)
147 Die Ásia ist die untre (147 Asiah é o mundo ínfimo
Metrialisch schon geformetjá materialmente formado
Drin die bören Geist wurzlen Dentro dele estão enraizados os espíritos malignos
Die in Gottes Zorn Geboren” (39). Que nasceram na ira de Deus”.)
Encontram-se expressas nessas estrofes toda a teoria Luriânica das emanações sefiróticas, a formação do Adão
Kadmon e a dos quatro mundos intermediários. É muito provável que Brentano tenha haurido estas idéias da Cabala
luriânica através da obra de Rosenroth, aKabbala Denudata.
É interessante observar a correspondência entre estas estrofes e as visões de Katharina Emmerick. Há não apenas
um paralelo doutrinário claro, mas até a utilização do mesmo vocabulário – fonte, poços, forças - e a mesma
confusão entre asSefirothe os anjos.
“Este mundo de luz ficou como um sol abaixo do sol mais alto. A princípio todos estes coros moviam-se como
movidos pelo amor proveniente do sol mais alto.
De repente, vi uma parte de todos estes coros ficar em silêncio em si mesma. Eles ficaram em silêncio na própria
beleza, eles sentiram prazer próprio vendo toda a beleza em si mesmos, contemplaram-se, eles estavam em si
mesmos. A princípio, eles todos estavam em movimento em esferas mais altas, como fora de si mesmos. Agora,
uma parte deles ficava fora de si mesmos. Agora, uma parte deles ficava quieta em si e num mesmo relance eu vi
toda esta parte dos coros luminosos precipitar-se e escurecer-se, e os outros coros lançaram-se contra eles e
preencheram os seus espaços abandonados, os quais, agora, eram menores que antes. Mas eu não vi que os outros
anjos saíssem fora do circuito da imagem para perseguir os que haviam caído.
Aqueles que ficaram silenciosos em si, precipitaram-se, e aqueles que não permaneceram em silêncio,
acumularam-se em seus antigos espaços.
Depois da queda, vi formar-se um disco sombrio, como se fosse a morada dos (anjos) caídos e soube que haviam
caído em uma foram impaciente”(40).
Nesta visão, a vidente narra a queda dos anjos e a explica como um pecado de auto-contemplação orgulhosa de sua
beleza. Esta narração é a nosso ver diretamente inspirada em Jacob Boehme. Com efeito, Boehme assim descreve a
queda de Lúcifer e dos anjos que o seguiram:
“Qui la provoqua (a queda) en lui même? Sa grande beauté. Tandie que la libre volonté se contemplait dans le miroir
475
de feu, ce rayonnement le suit en mouvement, en sorte qu’il s’agita vers les propriétés du principe central.
Lesquelles aussitôt commencèrente à produire des qualitès.
Car lê désir rude et dur , la prémière forme ou propriété, s’imprégna et éveilla l’aiguillon et lê désir d’angoisse: cette
belle étoile obscur donc as lumière et rendit son être tout à fait désagréable, rude et dur, et sa douceur et sa propriété
tout angéliques se transformèrent em une manière d’être perfaitement dure, rude et sombre: c’em fut fait de la belle
étoile du matin et come il fit, ainsi firent sés légions: telle est as chute” (41).
Essa descrição da queda de Lúcifer de Jacob Boehme é perfeitamente coincidente com o que diz Katharina
Emmerick, usando os mesmos símbolos de luz e treva, movimento e paralisação.
Convêm ainda notar que Boehme relaciona a queda de Lúcifer e dos anjos com o próprio processo emanativo da
divindade, pois ele fala das três primeiras “qualidades” de Deus: 1°) – desejo rude; 2°) – aguilhão 3°) – angústia –
como estando comprometidas na queda dos anjos. Em outras palavras, a queda de Lúcifer, segundo Boehme, teria
relação com a própria essência divina, o que é uma idéia de Cabala. Tal idéia também não era estranha aos círculos
esotéricos.
“Lúcifer, un grand prince dês anges, fit la même chute que l’homme l’y ayant précedé: se complaisant en sa beauté
dans le temps d’épreuve ou de libre choix que Dieu avait donné aux anges après lês avoir créés, il voulut subsiter par
lui-même dans cette beauté et puissance, qu’il avait reçue de Dieu, et cela causa sa chute” (42).
Voltando a Katharina Emmerick, a causa da queda então foi a fixação silenciosa dos espíritos luminosos
auto-contemplando sua beleza. A fixação representa a auto-contemplação. O silencio significa a omissão do louvor
que eles deviam prestar à divindade.
Há desde então uma esfera luminosa do bem e uma esfera tenebrosa do mal, o que faz pensar no maniqueísmo,
embora se pudesse argumentar que o disco sombrio está abaixo e submetido ao globo de luz, enquanto, no
maniqueísmo, haveria igualdade metafísica entre a luz e as trevas, entre o bem e o mal. Mas esta é a concepção
vulgar e simplificada do maniqueísmo. Com efeito, nos textos maniqueus, a esfera de luz está sempre acima e é mais
poderosa que a das trevas, embora, na aparência, estas tenham vantagem (43). Igualmente estranha é a afirmação de
Katharina Emmerick de que os anjos e demônios seres espirituais – ocupem lugar e espaço, o que, entretanto, é
coerente com o restante do texto, visto que se disse que o próprio Deus estava no globo de luz.
Segundo São Tomás, em contrastes, os seres angélicos, sendo puros espíritos não têm corpo (44) e por isso não
ocupam lugar, isto é, não são contidos em lugar.
Por outro lado, as doutrinas esotéricas formadoras do Romantismo ensinavam que havia uma correlação entre
espírito e matéria, considerando que esta era uma espécie de cristalização do espírito ou aquele a sublimação da
metéria. Os esotéricos diziam então que os seres espirituais superiores possuíam um corpo espiritual e que, por isto,
ocupavam lugar. Aliás, segundo Swedenborg, a queda dos anjos teria tornado necessária a criação do mundo e dos
homens, os quais iriam preencher o vazio debaixo pelos anjos no reino celestial:
“Os anjos, são segundo estes ensinamentos, os primeiros seres espirituais que Deus criou. Também eles são criados
segundo a sua imagem. Seu ser é sem corpo material, mas eles têm um corpo espiritual. Alguns anjos abusaram de
sua liberdade e se rebelaram contra Deus, e foram expulsos do Céu, com seu chefe Lúcifer, o portador da luz, seus
companheiros na revolta contra Deus. A realidade é que a expulsão dos anjos rebeldes, tornou necessária a criação
da terra. Das fileiras dos homens deve-se completar o número dos anjos caídos, que foram precipitados no abismo.
Adão deve ser elevado ao trono do decaído Lúcifer” (45).
476
Ktaharina Emmerick dá muitas informações sobre os anjos que não provém nem da Sagrada Escritura, nem da
Tradição católica. Veja-se, por exemplo, a seguinte citação:
“Os reis e príncipes têm também um anjo da guarda de uma ordem mais elevada. Os quaro anjos alados, os Elohim,
os quais distribuem as graças divinas, chamam-se Rafiel, Etofiel, Selatiel e Emanuel” (46).
Ora, segundo a Cabala, o mundo dos anjos chama-se Jetzirah e sétimo de seus coros é o dos anjos Elohim (47).
Katharina Emmerick coloca, entre os anjos que permaneceram fiéis e os que se tornaram demônios, um terceiro
grupo que não teria pecado totalmente ou que se teria arrependido:
“Eu sempre tenho visto, que quando da queda dos anjos, uma certa quantidade teve um momento de arrependimento
e não caiu tão fundo como os outros que...” (48).
Esse terceiro grupo formado de anjos semi-arrependidos não encontra base na revelação, nem na tradição, nem
está de acordo com a doutrina tomista. Com efeito, S.Tomas demonstra que os anjos, desde que tomam uma decisão,
já não podem mais mudá-la e que, portanto, jamais se podem arrepender (49), enquanto Katharina Emmerick fala
desses anjos arrependidos várias vezes:
“Eu vi já quando criança, e freqüentemente depois, que três coros de anjos, que estavam mais no alto que os
arcanjos, caíram. Vi que nem todos se precipitaram no inferno, mas uma parte, que tinha uma espécie de
arrependimento, permaneceu fora do inferno e que estes são aqueles espíritos que habitam os planetas e vêm à terra
para seduzir os homens. Mas no dia do Juízo final eles devem vir ao julgamento e à condenação. Eu sempre tenho
visto que o diabo não pode sair do inferno” (50).
E ainda:
“Eles são também espíritos caídos mas não são absolutamente demônios: são mais variados, eles sobem e descem
para a Terra. Em alguns dos corpos ’isto é Planetas’ eles são totalmente sombrios e melancólicos, em outros fogosos
e violentos, em outros leves, em outros meticulosos e precavidos. Eles atuam sobre todos os que vivem sobre a Terra
e sobre os homens na hora do nascimento” (51).
Quem ensina a existência de espíritos planetários que exercem influência sobre os homens, especialmente na hora
do nascimento, é a astrologia, da qual Katharina Emmerick – já o vimos – aceitava algumas teorias. Não é aqui o
lugar de fazer um resumo histórico dessa ciência esotérica, bastando lembrar que, desde o Renascimento, a
astrologia foi muito cultivada por círculos esotéricos. Marsílio Ficino e Lazarelli invocavam os espíritos planetários
e o mesmo fazia Agrippa de Nettesheim que recebeu influência da Cabala através de Reuchlin (52). Todos os
esotéricos dos séculos XVII e XVIII aceitaram similarmente, uns mais, outros menos, as teses da astrologia, no que
os românticos foram seus herdeiros, como Brentano o comprova no texto abaixo:
“Eu vi que cada homem, ao nascer, recebe dois espíritos, um bom e outro mau. O bom espírito é de espécie celestial,
porém de ordem inferior: o mau espírito não é ainda um demônio. Ele não está ainda no sofrimento, mas está fora da
visão de Deus. Eu vejo sempre em um certo círculo em torno da Terra, nove corpos ou espaços, esferas como
estrelas distantes e as vejo habilitadas por espíritos de diferentes naturezas e vejo órbitas de raios, nas quais pode-se
prosseguir cada linha até qualquer ponto da Terra saindo deles... Nestes mundos moram os espíritos maus que
acompanham cada homem no seu nascimento através de relação interior. Eles mesmos não produzem nenhum
pecado, nenhuma ação, mas eles separam o homem da influência de Deus (...)” (53).
6. A questão apocatastática
“Logo depois da queda eu vi, que os espíritos dos coros luminosos se humilharam diante do Círculo de Deus,
prestaram submissão e como que imploram igualmente para que o que fora precipitado pudesse de novo ser refeito
e restabelecido. Então eu vi um movimento e um agir no círculo de Deus, que até então tinha ficado imóvel, e , como
que senti, tinha esperado esse pedido. Depois desta súplica dos coros de espíritos eu soube que eles deviam
permanecer firmes e não mais poderiam cair. Deu-se-me a conhecer que a declaração de Deus e eterna sentença
foram contra os que tinha caído. Até que estes coros caídos de novo sejam reerguidos deve haver longa luta e vi essa
duração de tempo tão longa que, para minha alma, parecia infindável, e como impossível. A luta deve ser sobre a
Terra, e lá no alto não mais deve haver luta nenhuma já que Deus o havia fixado.
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Depois deste conhecimento eu não mais pude ter qualquer compaixão pelo diabo, porque eu vi que ele se precipitou
abaixo por sua livre e má vontade com violência. Também soube que Adão não foi tão mau. Eu tenho sempre grande
compaixão dele, pois eu sempre pensei que o que lhe aconteceu estava previsto” (54).
Antes de tudo, note-se que, utilizando a expressão“logo depois”–“gleich nach”– a vidente introduz a noção de
tempo nos fatos celestiais, o que é incorreto, pois os seres angélicos, se se trata deles, não estão no tempo e sim no
evo (55). Mais adiante, insiste ela em ter visto um “movimento” e um “agir” na Divindade que até então
permanecera imóvel. Toda esta formulação pressupõe uma noção evolutiva e teosófica da natureza divina e não se
coaduna absolutamente com a idéia aristotélico-tomista de Deus como o “ato puro”. É interessante notar ainda que
ela repete o verbosentir– “Ich gefüht, mostrando que a relação que ela tem com a Divindade é sentimental e não
intelectiva. Dir-se-ia então que Deus, tornando Ele também romântico, fala ao coração de Katharina Emmerick e
não a seu intelecto, como Ele o fazia aos profetas antigos.
Além disso, convém observar que o pedido dos coros luminosos a favor dos espíritos decaídos, não está de acordo
com a ortodoxia. Segundo S.Tomás, não há, nem pode haver nos anjos ou nos bem-aventurados nenhuma
compaixão pelos demônios ou precitos. Por isso jamais eles pediram a Deus o seu restabelecimento (56) e isto por
várias razões, das quais destacamos duas:
1. os anjos bons assim como os bem–aventurados têm uma só vontade com Deus;
2. os demônios são obstinados no mal, não podem e nem querem mudar de volição (57).
O ponto mais grave, porém, é outro. O texto de Katharina Emmerick afirma que esses coros decaídos serão
restabelecidos. Embora ela afirma que isso se dará depois de um tempo quase infindável, de qualquer modo, em
conseqüência, seja o tempo de condenação tão longo quanto se queira ou se imagine, ela não será eterna.
Como se dará então este restabelecimento? Será por uma restauração dos próprios seres dos coros decaídos? Neste
caso, então, o demônio não estaria eternamente condenado. Essa interpretação parece opor-se à afirmação que ela
faz em seguida, de que sentença da divindade contra os decaídos é eterna, o que torna o texto contraditório.
Outra interpretação seria a de que os “coros dos espíritos decaídos” serão restabelecidos pela substituição dos anjos
que caíram. É esta a interpretação que o Pe. Schomoeger pretende dar, mudando oUrtextecom a seguinte versão:
“devia haver luta e guerra enquanto não sepreenchessem os coros dos anjos caídos” (58).
Esta versão, mais vaga do que ambígua, pode-se interprestar de dois modos:
1. os espíritos decaídos serão restabelecidos em seus primitivos lugares após longuíssima punição;
2. os lugares dos espíritos decaídos é que serão preenchidos por outros seres, isto é, pelos homens.
Se a primeira interpretação for exata, Katharina Emmerick está defendendo a doutrina da apocatástases, isto é, que
no final dos tempos todos os seres, até mesmo os demônios, serão salvos e que o inferno, portanto, não é eterno,
doutrina que, defendida por Origines, foi condenada pela Igreja.
Ainda recentemente Giovanni Papini a expôs no seu livroIl diavolo. Ora, na Cabala, especialmente na escola
luriânica, encontram-se doutrinas parecidas e já Isaac, o cego, ao comentar o Sefer Yetzirá, afirmará:
“Toutes choses se ramènet à la Racine de leur véritable être”, cela veut dire, à cet endroit, que toute chose ne peut
agir que dans ce qu’il est disposé em son príncipe. Mais sés disciples déjà comprenaient dês formules de ce genre
dans lê sens d’un mouvement de retour de toutes choses vers Dieu. “Tout est issu de la causa prémière, et tout
retourne à la cause prémière”. Un pareil retour peut avoir son cote ontologique et son cote eschatologique” ( 59).
Portanto, segundo Isaac, o cego, Samael – nome que os judeus medievais usavam para designar o diabo – será
redimido:
“La position de Sammael sera seulement rétablie sur lê plan messianique, et alors, lê trône de Dieu détérioré
aujourd’hui, retrouvera son état primitif, complet. Il s’ensuit qu’Isaac l’Avengle était un adepte de la doctrine qui
enseigne la“reintégration de Satan”, l’apocatastase”. (60).
478
Segundo oZohar, por outro lado, “uma centelha da vida de Deus arde até em Sammael, a personificação do mal, o
‘outro’, ou ‘lado esquerdo’ “(61). Donde se conclui também que Samael poderá ser salvo. Já vimos outrossim, que a
Cabala luriânica faz um paralelo entre a queda da divindade (quando da ruptura dos vasos) fez Deus exilar-se de si
mesmo na criação enquanto a queda de Adão e o exílio de Israel . A “ruptura dos vasos” fez Deus exilar-se de si
mesmo na criação, enquanto a queda de Adão fez com que ele fosse exilado do paraíso. Similarmente, a queda de
Israel determinou seu exílio (Galut) da Palestina e sua dispersão entre as nações: “All being is in Galut” (62).
O Galut de Deus, o Galut do homem e o Galut de Israel são paralelos e analógicos e, quando Israel retornar à terra
prometida, cessando o seu Galut, então o homem recuperará sua condição edênica e tudo será restaurado na própria
divindade. Nessa ocasião, até mesmo as centelhas das luzes divinas que foram aprisionadas no reino do mal – nas
Klipoth serão liberadas:
“Into the deep abyss of the forces of evil, the forces of darknes and impurity which the Kabbalists call ‘shelles’ or
‘offscourings’, there fell, as a result of the breaking of the vessels, forces of holiness, sparks of divine light.
Hencethere is a Galut of the divine itself, of the ‘sparks of the Shekhinah’. ‘These sparks of holiness are bound in
felters of steel in the dephts of the shells, and yearningly aspire to rise to their source but cannot to do so until they
have support’ – so says Rabbi Hayyim Vital, a disciple of Luria.
Here we have a cosmic picture of Galut, not the Galut of the people of , alone but the Galut of the Shekhinan at the
very inception of its being. All that beffals in the world is only an expression of this primal and fundamental Galut.
All existence, including “as it were”, God, substist in Galut. Such is the state of cration after the breaking of the
vessels” (63).
“The purpose of this mission was to raise the scatered holy sparks and to liberate the divine light and the holy souls
from the realm of thegelippah, represented on the terrestrial and historial plane by tyramny and oppresion” (64).
Como se vê, a teoria da apocatástases não era absolutamente estranha à Cabala, desde Isaac, o cego (século XIII) até
Luria e seus discípulos (século XVI).
Também entre os esotéricos era comum a idéia de que o inferno não teria duração eterna e que, portanto, os próprios
demônios seriam salvos.Para Franz Von Baader, com efeito, “l’enfer represente un châtiement, une peine (Strafe); il
n’est point la conséquence d’une “vengeance” insatiable (IV, 413). Et c’est ainsi que lê príncipe “ex infernis nulla
redemptio” signifie tout simplement que la peine que lê condamné doit purger ne peut être remise; mais lê príncipe
ne comporte pás lê désespoir éternel ni l’imposibilité d’une rédemption finale (IV, 362). Au surplus Baader tire
argument du fait qu’il n’existe pás de dogme l’éternité dês peines infernales (XII, 416)” (65).
“L’idee de l’enfer lui brise le coeur. Il n’ose conclure autrement que par une prière, lês pages qu’il lui consacre.
Plusieurs de sés correspondants – Klein, de Strasbourg ou Kirchberger – mandent leur persuasion qu’an jour Dieu
”soumettra tous les rebelles”, que l’holocauste du Christ profitera non seulement au genre humain, sans exception,
mais aussi aux mauvais anges” (66).
No círculo de quietistas de Lausanne se acreditava ainda que “(...) un jour, tous lês hommes seront heureux, lê
Diable se convertira, et alors arrivera la règne de Mille ans” (67).
“Espère fermement la transfiguration de l’homme; nous pouvons la hater individuellement par notre pitié, par
l’exercice de nos sens intimes. Satan même ne se convertira-t-il pás? Elle demande à Dieu cette redemption finale”
(68).Oberlin espera a mesma coisa e para ele “peut-être un jour satan sera-t-il racheté” (69).
Pierre Simon Ballanche que se abeberou em Joseph de Maistre, Saint Martin e Charles Bonnet (70), julgava que no
final da História:
“Dans le point le plus reculé de l’avenir, sur la limite du dernier horizon de l’humanité” (...) peut-être, enfin, – qui
sait? – Dieu jettera um regard de pitié sur ‘lês intelligences déchues’; il leur accordera d’autres épreuves qui leur
permettent ‘d’accomplir la loi définitive de leur être’; l’Abbadona de klopstock prefigure ce repentir grace au quel
479
l’ange du mal lui-même rentreta dans l’unité divine”
Joseph de Maistre, considerado até hoje pelos chamados “tradicionalistas” como inteiramente ortodoxo – e ele
estava longe de sê-lo – dizia, como Baader, que a eternidade das penas infernais não fora sempre um dogma
incontestado:
“Quant à l’éternité des châtiements infernaux, bien qu’il (de Maistre) en voit des symboles dans toutes les
mythologies, il ne se soumet pás dans quelque peine et sans quelque angoisse aux définitions dogmatiques et
demande surtout qu’on ne leur fasse pás dire plus qu’elles ne signifient réellement. Bien qu’il n’y ait pás d’identité,
il y a néamoins une certaine relation entre ses idées sur l’unite et ‘l’universalisme’ d’un Origène ou d’un Martinez
de Pasqually, qui tous deux l’influencèrent fortement” (72).
Também Saint-Martin tendia a mesma direção, pois, para ele, a missão origina do homem “was to recall tho se to
life who, by na improper use os its liberty had forfeited its essesnce” (73), idéia essa que P.S. Ballanche endossou:
“L’homme avait été primitivement destine à réparer les partes produites dans la milice celeste par la rebélion d’um
certain nombre d’intelligences” (74).
Para o abbé Fournié, Deus enviou o homem para que fizesse o que os demônios haviam recusado fazer, pois, desse
modo, os demônios teriam que confessar seu erro e rogariam então a Deus, por meio do homem, sua criatura fiel,
que os perdoassem e os reunisse de novo céu. O homem também rogaria a Deus que perdoasse os espíritos decaídos
e os demônios, ainda durante o tempo, se reconciliariam com Deus, e, no final do tempo, Deus os reuniria
eternamente a si (75).
O que nos conduz à segunda interpretação citada, qual seja, a de que os vazios deixados nos coros luminosos pelos
espíritos decaídos seriam preenchidos não pela restauração desses espíritos, mas sim pelos homens, criados para
esse fim. Embora esta segunda interpretação não pareça a mais provável, vamos examiná-la, apenas para esgotar
todas as possibilidades de interpretação.
A favor dessa hipótese estaria o fato de que, imediatamente após o pedido dos coros luminosos para que Deus
restabelecesse o que fora precipitado, teriam sido criados o mundo material e o homem. Evidentemente, porém, o
fato de a criação ser “post hoc” não significa necessariamente que ela tenha sido feita “propter hoc” mas, em todo
caso, registre-se a seqüência. É verdade também que Katharina Emmerick diz várias vezes que os espíritos
planetários serão precipitados no inferno no dia do juízo final (76), mas dizer que eles serão precipitados no inferno
não é afirmar que lá ficarão eternamente. Numa nota introdutória a um dos capítulos da versão espanhola da obra do
Pe.Schomoeger “Katharina Emmerick – Visiones y Revelaciones completas”(77) lê-se o seguinte:
“(AKE) entiende que Cristo se hizo Hombre no solo por haber caido Adán: la segunda Persona se hubiera humanado
para elevar el hombre a la condición angelica”.
Do que se conclui que, quem quer que seja o autor dessa nota introdutória, ele se mostra favorável à segunda
interpretação do texto que estamos analisando. Suponhamos então que essa segundo interpretação seja a correta.
Katharina Emmerick não defenderia então a apocatástases, mas a tese de que os homens foram criados para
substituir os espíritos decaídos, ocupando os lugares que eles deixaram vazios. Isso não muda muito as coisas, pois,
como demonstraremos agora, essa tese não só destoa da doutrina católica, mas também, como a outra alternativa,
está de acordo com a Cabala:
Se a criação do universo material se fez a pedido dos coros luminosos para preencher o vazio deixado pelos
decaídos, isto significa que, a princípio, não estava nos planos de Deus a criação do universo material visível. Ora,
S. Tomás ensina doutrina diversa, afirmando que tanto os anjos como as criaturas corporais se reúnem para
constituir um único universo. Por isto, todas as criaturas são feitas umas para as outras, numa ordem sapiencial:
“... (os anjos) fazem parte do universo, não constituindo um, por si, mas concorrendo, com a criatura corpórea, para
a constituição do mesmo universo. O que bem se verá considerando a ordem de uma criatura em relação a outra.
Pois a ordem das coisas entre si é o bem do universo. Ora, nenhuma parte é perfeita separada do todo. Logo, não é
provável que Deus,cujas obras são perfeitas, como diz a Escritura, tivesse criado a criatura Angélica separadamente,
antes das outras criaturas” (78).
Note-se, de passagem, que o ensinamento de S. Tomas, contraria a idéia da vidente de que os coros luminosos foram
criados anteriormente ao mundo material, mas, voltando ao essencial, se a criação dos anjos antes do mundo
material parece improvável ao Doutor Angélico por contrariar o bem da ordem universal, com muito maior razão se
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deve pensar que a criação apenas dos anjos não poderia ser o plano original de Deus, pois se a criação dos homens e
do universo material se deu tão só para reparar o vazio deixado pela queda dos seres dos coros luminosos, então,
caso não tivessem eles caído, os homens provavelmente não teriam sido criados e, nesse caso, a criação se teria
limitado ao mundo espiritual. Ora, se fosse assim, faltaria a essa criação o bem superior da ordem que existe no
universo, visto que embora haja hierarquia entre os anjos, ela não é tão perfeita quanto a hierarquia total do universo
atual, que inclui os seres materiais.
Por outro lado, a doutrina de que o homem foi criado para ocupar o lugar dos anjos, e que, por conseguinte, o homem
deve ser elevado à condição Angélica, não é estranha à Cabala. Na seita cabalista-sabatiana dos Dönmeh, por
exemplo, se ensinava que, quando chegasse o Reino messiânico, aqueles que tivessem conhecimento dos mistérios
mais profundos se tornariam anjos: “The they shall come under the tree of Life and all will become angels” (79).
Essa interpretação da seita sabatiana evidentemente tinha base noZoharque ensina que todos os que estudam a
Cabala, graças a ela, tornam-se iguais aos anjos (80).
Também muitos esotéricos defenderam a tese de que o homem ia ocupar o lugar dos anjos: “D’après Swedenborg,
leurs milices celestes ‘sont composés du gente humain’“ (81). O mesmo Swedenborg defende também a idéia de
que os seres que se amam aqui na terra, após a morte, confundem-se formando um só anjo (82). Em conclusão,
qualquer que seja o modo que se interprete o texto supostamente de Katharina Emmerick, quer como defendendo a
apocatástases – interpretação bem mais provável – quer como preconizando a idéia que os homens foram criados
para ocupar os lugares deixados vazios pelos espíritos decaídos, o que ela diz é de fundo esotérico e cabalístico.
O fato de que ela afirma, nesse texto, que depois de ter tido essa visão já não pode mais ter compaixão do diabo
mostra que antes ela tinha essa compaixão. Aliás, a respeito disso, em texto atribuído por Brentano a Overberg, se
mostra que Katharina Emmerick achava que as penas infernais não seriam eternas e que seus confessores
procuraram corrigi-la quanto a esse ponto. Prudentemente.
“por espacio de mucho tiempo tuvo la costumbre de tratar com Dios de por qué no convierte a los grandes pecadores
y porqué castiga eternamente a los que no se convierten. Decia a Dios, que no sabia como podia ser así, pues esto era
contro su divina naturaleza: que convirtiéndolos ejercitaría su bondad, ya que nada le costaba convertir a los
pecadores los cuales estaban bajo su mano; que debia acordarse que lo que El y su amado Hijo habían hecho por
ellos, pues su Hijo habia derramado su sangre y dando su vida em la cruz; y do que El mismo há dicho en la Sagrada
Escritura acerca de su bondad y misericórdia y de las promesas que ha hecho. Si el Señor no es fiel a su palabra
como puede pedir a los hombres que cumpran la suya?
El abate Lambert, a quien ella dijo estas cosas, le repuso diciendo: ‘Poco a poco, que vas demasiado lejos’. Después
vio ella que eso debia ser así como Dios tiene dispuesto” (83).
Nesse texto se vê Katharina Emmerick tinha dificuldade em aceitar a eternidade do inferno e como ela,
ousadamente, chegava às raias da blasfêmia, acusando Deus de não ser fiel á sua palavra. Vimos, já, no capítulo III
deste trabalho, como ela também não acreditava que no inferno e purgatório houvesse fogo real, mas apenas
simbólico (84).
De outro lado, Katharina Emmerick afirma que tinha pena de Adão, porque o que ocorreu com ele “estava previsto”.
Ter pena de Adão porque “tudo já estava previsto”só faz sentido se se entender “já previsto” como “já determinado”,
o que significaria que Adão não pecou por vontade própria, como fez o demônio. O pecado de Adão teria então sido
uma fatalidade, mas não é isto o que ensina a doutrina católica a respeito (85), enquanto, a Cabala, pelo contrário,
considera que Adão estava destinado a pecar:
“Said the King to the mother: “Did I not tell the that he(Adão)was destined to sin?” (86)
E ainda:
“Rabi, after all, Uzza and Azael were not wrong because man was really destined to sin through woman” (87).
“Why desirest tou to create man who, as thouknowest, will sin, before thee through his wife, who is darknesse to his
light, light being male and darkness female” (88).
Já vimos também que para a Cabala de Issac Luria, que Brentano conhecia através da Kabbala Denudata de Knorr
481
com Rosenroth, Adão necessariamente tinha que pecar, para repetir analogicamente o que ocorrera na “ruptura dos
vasos”. Como Deus, criando, caiu noGalut, assim também Adão tinha que pecar para ser exilado do Paraíso,
passando a viver também ele no Galut.
“Logo depois da súplica do coro dos espíritos que permaneceram fiéis e depois do movimento da Divindade eu vi
aparecer perto do disco sombrio que estava abaixo, para o lado direito, não muito afastado, um globo escuro e
enrugado.
Eu devo ainda notar que o espaço no qual os caídos abaixo estavam era muito menos do que aquele que ocupavam
antes acima, tanto que eles me pareciam muito mais apertados” (89).
Neste último trecho do texto analisado confirmam-se certar idéias a respeito da Divindade e dos espíritos. Assim,
mais uma vez diz-se que hámovimentona divindade, o que, como vimos, só é possível numa conceituação gnóstica
de Deus. Volta-se também a localizar as coisas em relação ao mundo divino e espiritual usando-se expressões como
“abaixo”, “acima” e “à direita”. Confirma-se ainda que os espíritos dos anéis luminosos ocupam lugar e que, depois
que alguns caíram, foram localizados num disco sombrio, num ambiente muito mais estreito do que o anterior, onde
eles estavam apertados. Todas as imagens indicam, pois, que esses espíritos decaídos possuíram corpo.
É curioso, também a apresentação dos três mundos: o divino, o diabólico e o humano. O primeiro está localizado
num globo brilhante como sol. O segundo é um disco sombrio; o humano é um globo escuro, como se nele houvesse
uma mistura de luz e trevas, coisa aliás que será explicitada mais adiante por Katharina Emmerick.
A versão castelhana do Pe. Schomoeger fala em globo de luz (o divino), globo de trevas (o diabólico) e globo escuro
( o humano). Cremos que desta vez a versão castelhana expressou bem a idéia de Brentano. Para ele toda a
cosmogonia estava relacionada – como na cabala – às imagens da luz e das trevas. De modo que, quanto mais
sombrio um ser, tanto mais ele é diabólico, e quanto mais luminoso, mais divino. O mundo que habitamos é, em
decorrência, o mundo da mescla, da mistura, da confusão, no qual bem e mal estão emaranhados e diluídos um no
outro.
Ora, esse esquema geral dos três mundos corresponde ao maniqueísmo. Evidentemente, não concluímos que o
esquema de Katharina Emmerick seja maniqueu, mas este não deixa de ser um início a mais de tendências gnósticas.
A propósito, vimos que vários autores reconhecem o carácter dualista das idéias de toda visão de Brentano. J.
Adams o ressalta e mostra como esse dualismo leva a considerar o próprio mundo físico como o reino do mal e das
trevas, enquanto que o mundo espiritual é identificado com a luz e a divindade:
“Tudo é colocado na simetria do ‘bom e do mau’, piedoso e ímpio, ou melhor, santo e malvado”. Esta estrutura está
na poesia com nitidez exagerada. Deus e diabo, céu e inferno, Maria e Vênus: todas as formas movem-se entre esses
dois poderes. Entre o princípio mau da sensualidade (a “falsa filosofia” está a seu serviço) e o bem do espiritual, do
supra-sensível, da ascece salvadora, o combate inflama-se e deve terminar com a vitória do bem, a solução da culpa
original, herdada” (90).
“Como eu vejo a benção e o abençoado, como luz e mais luminoso, curador, e socorrido, assim eu vejo a maldição e
o amaldiçoado sombrio e obscurecido, causando ruína... Eu vejo a luz, e as trevas atuarem vivamente na luz e nas
trevas” (91).
O dualismo radical de Brentano leva-o a ver a oposição entre o reino do bem e do mal, estendendo-se não só à
História, através da luta entre a Igreja e uma Anti-Igreja diabólica, mas até mesmo ao mundo físico. Assim ele acaba
com a distinção entre sobrenatural e natural, estendendo ainda o reino do mal e do preter-natural até a realidade
material. Alguns exemplos elucidarão estes pontos:
“Entre os dois mundos e suas forças atuantes existe uma simetria exata. À uma “benção” essencialmente física se
opõe igualmente uma “maldição” essencialmente física, a ‘benção contrária’” (92). Adams cita então o texto de
Katharina Emmerick em que fala da ação benéfica e luminosa das relíquias dos santos e das influências más e
sombrias dos ossos dos antigos pagãos (93).
A idéia de “comunidade”, aqui muito acentuada, “a perdição promovida por forças más”, indicam já a existência de
482
uma Anti-Igreja organizada, uma “comunidade dos ímpios”:
“Esta Igreja está cheia de lodo, nulidade, trivialidade e noite. Quase ninguém conhece as trevas em que ela trabalha.
É tudo presunção oca... É tudo mau, formando uma comunidade dos ímpios. Eu não posso dizer como toda a sua
atividade é abominável, perniciosa e fútil, a um ponto que eles próprios desconhecem. Eles querem tornar-se um
corpo em outro, como no Senhor”. Para essa Igreja, Brentano usa diferentes nomes, mas todos provando que ele a vê
como um corpo atuante, como contra-partida para a Igreja Católica: Igreja sombria, Pós-Igreja-negra, Contra-Igreja,
Igreja do diabo, Igreja do horror, Igreja das trevas” (94).
Para Katharina Emmerick similarmente, o mal não tinha apenas natureza moral, mas também existência substancial,
emanando dele eflúvios que afetavam a natureza:
“As emanações de força física-corporal de ‘maldição’ são magicamente ativas e atuantes, e elas deixam uma espécie
de veneno corrosivo ou são manipuladas por espíritos (planetários) arbitrariamente atuantes” (95). Assim, certas
frutas, como as nozes e os pêssegos, teriam influências malignas. (96). Além disso, alguns animais seriam pecados
encarnados, como, por exemplo, o grilo:
“De modo particular muitos animais são agora completamente maus, são pecados encarnados; e com isso não são
capazes de nenhuma salvação. ‘Ela não sabia se era manhã ou noite, e quando o peregrino (Brentano) lhe disse:
‘ogrilocanta, é noite’, ela disse: ‘o animal está caído também, e este animal é um pecado. É tão inquieto e grita
sempre’. Sobretudo pertencem a esta categoria os insetos e pequenos animais em geral” (97).
Cremos que não é necessário dar mais exemplos de que para Katharina Emmerick o mal era ontológico e se estendia
até o mundo físico. Veremos, mais adiante, como o bem e o mal estendiam-se também à esfera humana,
especialmente à reprodução
“Então, eu fixei mais minha vista sobre esse globo escuro à direita do disco sombrio e vi um movimento encrespado
no mesmo. Vi isso crescer cada vez mais, e aparecerem na massa pontos luminosos, que, circulando, formavam
como faixas luminosas que emergiam em largas superfícies claras. Simultaneamente vi a forma das terras emersas e
limitadas pelas águas. Então vi, nos lugares luminosos, um movimento como de alguma coisa viva. E sobre as
superfícies da terra eu vi plantas aparecerem e, entre elas, formarem-se também torvelinhos vivos. Eu pensava,
quando criança, que as plantas se moviam.
Até então era tudo cinzento. Agora, tudo se tornou mais luminosos, e, com isto, vi uma espécie de aurora. Era como
quando é manhã cedo sobre a terra e como quando tudo desperta de sono.
Agora todas as outras coisas da visão dissiparam-se para mim. O céu era azul, o sol movia-se nele. Eu vi só uma
parte da Terra brilhar e ser iluminada por ele, o que era absolutamente magnífico e agradável e pensei: Isso é o
Paraíso!
Mas assim como tudo ia se transformando no globo escuro, eu via igualmente uma emanação sair daquele mais alto
círculo de Deus” (98).
Ou então:
1. Deus ordena que algo seja feito ou produzido por meio de uma criatura já existente;
483
2. a coisa é feita ou produzida.
3. Deus elogia a coisa feita ou produzida.
Deus diz:
1. “Façamos o homem”;
2. Ele faz o homem do limo da terra;
3. Ele louva então o conjunto de toda a criação, já concluída.
Na descrição da criação segundo Katharina Emmerick e Brentano, Deus nunca fala nem age. Ela diz que:
1. há um movimento em Deus;
2. as coisas “entstehen” – “aparecem”, “surgem” – como que magicamente.
Nas visões de Katharina Emmerick, não há o “fiat” bíblico. Assim, a criação não é produto da Palavra de Deus, ou
seja, do Verbo ou Sabedoria de Deus (99).
Segundo a teologia católica, foi na sua sabedoria, isto é, no Verbo, que Deus fez todas as coisas, pois, assim como
um arquiteto tem na mente o que pretende construir, assim também Deus, antes de criar o universo, concebeu-o em
sua sabedoria. E é por isso que S.João diz: “No princípio era o Verbo, e o Verbo estava em Deus, e o Verbo era Deus
(...). Todas as coisas foram feitas por Ele, e nada do que foi feito, foi feito sem Ele” (100). Portanto, Deus fez tudo
“no Princípio” (Bereshit), isto é, no Verbo. Assim também, o Antigo Testamento diz: “NoPrincípio(Bereshit) criou
Deus os Céus e a Terra” (101). E o novo testamente, começa com as mesmas palavras explicando que
essePrincípio(Bereshit) em que Deus fez os céus e a terra, era o Verbo de Deus: “No Princípio era o Verbo”.
Katharina Emmerick, como vimos, não usa a expressão “no Princípio”, mas “primeiramente” o que introduz uma
noção temporal e não sapiencial da divindade e da criação. Essa noção de tempo explica que ela afirme ter visto na
divindade um movimento e umagir. A raiz do processo criativo não estaria no Verbo divino e sim na Vontade, no
“agir”de Deus. Também noZoharse coloca o início de tudo numa decisão de Deus e não em seu Verbo: “At the
outset the decision of the King made a tracing in the supernal effulgence” (102).
“Le Dieu de Jacob Boehme est essentiellement liberte. Ceci explique, croyons-nous, pourquoi il caractérise son
Dieu comme Volunté“ (103).
É por influencia de Boehme que Goethe faz o seu Dr. Fausto traduzir no primeiro versículo do evangelho de S. João
como: “No princípio era a Ação” em lugar “no Princípio era o Verbo” (104).
Dizendo que viu ou sentiu em Deus um movimento e um “agir” Katharina Emmerick se aproxima mais da
concepção cabalista e esotérica da criação, que da concepção cristã. O texto dela é mais próximo doZohar, de
Boehme e de Goethe do que de São João.
Na massa do globo escuro, Katharina Emmerick distinguiu pontos e faixas luminosas. Depois, viu o movimento de
algo vivo nos lugares luminosos. Aparecem as plantas e ela vê o sol brilhando num céu azul. Ao mesmo tempo em
que tudo se transformava no globo escuro, ela via sair uma emanação – “eine Ausströmen– do mais alto círculo de
Deus.
É interessante notar que Katharina Emmerick não concorda com o Gênesis, visto que neste se afirma que, antes de
tudo, Deus fez a luz (105), enquanto as plantas só foram feitas no terceiro dia (106). Katharina Emmerick faz as
plantas surgirem logo no primeiro dia, como se verá a seguir, de modo mais claro, no texto publicado pelo Pe.
Schomoeger, e mais importante ainda, ela volta a falar em emanação na divindade, sem explicitar o que foi
emanado.
Infelizmente, neste ponto, se interrompe oUrtextepublicado por Anton Brieger. Somos obrigados, pois, a fiar-nos no
texto tão pouco fiel publicado pelo Pe. Schomoeger:
484
“A medida que no globo escuro via tudo se mudando, eu vi uma emanação que saía do mais alto círculo de Deus. Era
como quando o sol se eleva mais alto como tudo de manhã ao despertar; mas era a primeira manhã; e entretanto
nenhum ser o sabia. As coisas eram como se sempre tivessem sido assim. Eles estavam na inocência” (107).
A seguir, o texto de Katharina Emmerick publicado pelo padre Schomoeger, faz uma romântica descrição da beleza
das plantas e da natureza no estado original e afirma que:
“As águas eram mais claras e mais santas, todas as cores eram mais puras e mais brilhantes!”(108).
Afirmar que as águas eram mais santas é fazer uma confusão entre o sobrenatural e o natural, procedimento
característico do pensamento esotérico.
8. As rosas do paraíso
“Eu vi ali rosas brancas e vermelhas e pensei comigo, elas significam a paixão de Cristo e a Redenção” (109).
E intrigante essa relação feita por Katharina Emmerick entre as rosas, a paixão de Cristo e a Redenção. Com efeito,
a rosa sempre foi um símbolo muito importante para os esotéricos como também –et pour cause– para Brentano. Ele
a utilizou largamente como símbolo noRomanzen com Rosenkranznos quais três irmãs têm o nome de Rosa –
Rosablanka, Rosarosa e Rosadora– e são filhas de Rosatristis (Schwarze Rose) irmã de Rolata.
“La rose, qui est sans doute lê symbole poétique lê plus fréquenment utilisé em Occident, tient une place
préponderante dans la plupart des écrits de Brentano (...) elle fait partie dês images-clés du romantisme et n’et donc
pás spéciale à notre poète. Fleur sans défaut, elle évoque un petar d’hamonie et de pureté absolue, cette virginité de
l’âme et du corps dont la conservation où la reconquête constitue le problème essential des “Romances” (...)
Cependat la rose est ambivalente et traduit elle aussi, la polarité de l’oeuvre et le dualisme spirituel de l’auteur. De
couleur vive exhalant um parfum voluptueux,la rose incarne aussi l’êros (...) lês roses rouges, noites, blanches,
symbolisent lê péché (...) les remords (...) et la pudeur d’une religieuse (...) Ainsi, lês roses réprèsentent le príncipe
poétique de l’oeuvre, qui traduit la dialétique du bien et du mal dont elles sont a la fois le masque et lê dévoilement”.
(110).
Quanto às cores branca e vermelha, elas têm muito significado na Cabala e na Alquimia.
Na Cabala, ensina-se que a árvore sefirótica de Deus divide-se em dois lados, o direito, de onde vem o bem, e o
esquerdo, raiz do mal:
“The truth is that this grade is indeed the reflection of all the higher grades, and was rendered possible through that
reflection; it reflects all the colours (symbolic of the divine attributes) white at the right, red at the left, and a further
colour compounded of all colours” (111).
A cor branca teria relação com a Sefirá Hesed, enquanto a vermelha teria relação com a Sefirá Din ou Geburah.
“The words “and the Lord God built the side” can also be applied to Moses, in so far as he is from the side
ofHesed(Kindness). “And he vlosed the place of it with flesh” : flesh being red, symvolizesGeburah(Force), and so
in Moses both were combined” (112).
“As the lily among thorns is tinged with red and white, so the Community of Israel is visited now with justice, and
now with mercy” (113).
E ainda:
“Or again, as the lily is red and its juice is white, so does the Holy One, blessed be He, lead his world from the
attribute of Justice to the attribute of Mercy, as it says: “Though your sins be as scarlet, they shall be as white as
snow” (Isa. I, 18). (…)
(…) as the lily has a sweet odour, is red, and yet turns white when pressed, and its aroma never evaporates, so the
Holy One, blessed be He, guides the world. If it were not so, the world would cease to exist because of man’s sin.
485
Sin is red as it says, “though your sins be as scarlet”; (20b) man puts the sacrificial animal on fire, which is also red;
the priest sprinkled the red blood round the altar, but the smoke acending to heaven is white. Thus the red is turned
to white: the attribute of Mercy. Red is indeed the symbol of rigorous justice, and there fore priest of Baal cut then
selves… till the blood gushed out upon them (I Kings, XVIII, 28). R. Isaac said: ‘Red (blood) and white (fat) are
offered for sacrifice, and the odour ascends from both. The spices of incense are in part red and in part
white-frankincense is white, pure myrrh is red – and the odour ascend from red and white. Moreover, it is written,
“To offer unto me the flat and the blood’ (Ezek, XLIV, 15) again white and red. Hence as a substitute for this (since
the destruction of the Temple) man sacrificies his own fat and blood (by fasting) and so obtains atonement. As the
lily, which is red and white, is turned entirely into white by means of fire, so the sacrificial animal is turned entirely
into white (smoke) by means of fire. Also at the present time (when there are no sacrificies) when a man offers in his
fast his fat an his blood, the sacrificie has to go though fire if it is to be turned into white (bring down mercy)…”
(114).
Da mesma forma o rigor e a clemência (as Sefirás Din e Hesed) são relacionadas com o vinho (vermelho) e o leite
(branco).
“Il est écrit: “Venez, achetez, sans argent et sans aucun échange, le vin et le lait”. “Que signifient “vin et lait”? et
quel rapport y a-til entre ces deux liquides? Le vin et l’emblème de la crainte,c’est-à-dire de la rigueur, et le lait celui
de la Clémence” (115).
“Entre las flores del jardin alquimico se distinguen especialmente las rosas rojas y blancas. La rosa blanca, como el
lirio, fué relacionada con la Piedra Blanca, objetivo de la Pequeña Obra, mientras que la rosa se asocío a la Piedra
Roja, cumbre de la Gran Obra. La mayoria de estas rosas tienen siete petalas, cada uno de los cuales evoca un metal
o una operación de la Obra. Conviene saber a este respecto que los alquimistas gustaban, desde Arnau de Vilanova,
titular sus tratados.Rosales de los Filósofos(116).
Nas obras de alquimia diz-se que a seqüência das operações passa sempre, e repetidamente, por umafase brancaa
quese segueumafase vermelha. O famoso alquimista Fulcanelli descreve as operações alquímicas através das figuras
esculpidas nas catedrais góticas. Interessa-nos citar aqui a descrição que ele faz de um relevo do pórtico de Notre
Dame, no qual há (...)“un jardin clos de hayes (...) um vieil creux de chêsne, au pied duquel, à costé il y a un rosier à
feuilles d’or et deroses blanchesetrouges, qui enoure ledit chêsne jus qu’au haut, proche de ces branches. Et au pied
du dit creux de chêsne bouillone une fontaine claire comme argent…”(117).
O mesmo Fulcanelli, em outra de suas obras, torna a falar sobre asrosas brancas e vermelhas:
“Esta substância dupla, este composto perfeitamente amadurecido, aumentado e multiplicado torna-se o agente de
maravilhosa transformações que caracterizam a pedra filosofal,rosa hermética.
Conforme o fermente argentífico ou aurífico, que serve para originar a nossa primeira pedra, arosa ora é branca, ora
vermelha. São as duas flores filosóficas, desabrochadas na mesma roseira, que Flammel nos descreve noLivre dês
Figures Hierogliphiques. Elas embelezam igualmente o frontespício doMutus Líbere vemo-las florir, num cadinho,
na gravura de Gobille que ilustra a décima segunda chave de Basílio Valentim. Sabe se que a Virgem celeste tem
uma coroa derosas brancase também não se desconhece que arosa vermelhaé a assinatura reservado aos iniciados da
ordem superior, ou Rosa-Cruz” (118).
Não há dúvida pois querosas brancas e vermelhas, e postas nesta ordem, são símbolos alquímicos. Teria Katharina
Emmerick ou Brentano, - dá no mesmo – intenção de aludir à alquimia ao falar de rosas brancas e vermelhas como
símbolo dePaixão e Redenção?
Evidentemente só a citação das rosas brancas e vermelhas no primeiro dia da criação não basta para chegar à uma
resposta positiva à essa questão. Todavia, quando Katharina Emmerick fala da gruta em que Cristo nasceu em
Belém, ela dá uma série de pormenores que não constam nem das escrituras, nem da tradição e que tem uma incrível
semelhança com o que Fulcanelli descreveu nos textos que citamos. Ainda conforme Katharina Emmerick, Abrahão
teria sido, como Cristo, perseguido por um rei, escondido e amamentado por sua ama, Maraha, na mesma gruta em
que Cristo nasceu e foi amamentado por Maria sua mãe.
A gruta teria se tornado desde então um local de devoção para mãe e amas de leite. Afirma Katharina Emmerick que
o local tinha algo de profético pois que se venerava em Maraha uma figura profética da Virgem Maria:
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“Maranha tinha cooperado para a chegada do Messias através de seu leite, ao nutrir um antepassado da Virgem
Maria. O mesmo leite que a estirpe de Santa Virgem sugou. Veja, e não posso expressar claramente, mas era como
um poço profundo indo até a fonte da vida universal, e daí se tirou sempre até que Maria subiu daí como água
límpida” (119).
E continua Katharina Emmerick dizendo que havia sobre a gruta uma grande árvore – um Terebentino? – um poço
ou fonte e que tudo estava circundado por uma cerca (120). Ora, essa descrição apresenta os mesmos elementos do
pórtico de “Notre Dame”, descrito por Fulcanelli, faltando apenas a alusão à rosas brancas e vermelhas. Também J.
Van Lennep fala de árvore e de fonte como símbolos alquímicos:
“Otro arbol, este con el tronco hueco un manatial cuyas aguas regeneradoras conceden la inmortalidad a aquel que
haya logrado descubrirlas. Este Arbol Hueco que derrama las fuentes de la vida (...)” (121).
“La mythologie la nomme Lybérthra et nous raconte que c’était une fonte deMagnésie, laquelle avait, dans son
voisinage, une autre source nomméela Roche. Toutes deuzsortaient d’une grosse rochedon’t la figure imitait le sein
d’une femme, de sorte que l’eau semblaitcouler de deux mamelles comme du lait. Or nous savons que les acneies
auteurs appelent la matière de l’Oeuvrenotre Magnesieet que la liqueur extraite de cette magnesie est diteLait de La
Vierge” (122).
Ora, Katharina Emmerick chama a gruta em que nasceu Cristo e em que Abraão foi aumentado deGruta do
LeiteouGruta da Ama:
“... e deram o nome de Gruta do Leite ou Gruta da Ama. Eu vi aqui algo de maravilhoso, que esqueci, e a fonte
surgiu lá”(123).
Katharina Emmerick conta ainda que, quando Herodes tentava se apoderar do menino, S.José o escondeu noutra
gruta. Ocorre que, o menino era levado para junto de sua mãe para ser amamentado, pelo que, angustiada, Nossa
Senhora fez o que costumava fazer as mulheres em tal situação: antes de amamentá-lo, fez cair leite num banco de
rocha da gruta. Um pastor que soube disso, recolheu esse leite e o levou para sua mulher que não tinha leite para
amamentar seu filhinho e logo, a mulher tornou-se capaz de amamentar seu filho. Sempre segundo Katharina
Emmerick, a pedra da gruta adquiriu desde então um poder terapêutico. A isto acrescenta Brentano uma nota
erudita, citando Fr. Quaresmius e sua História Terrae Sanctae elucidatio – Antwerpiae – 1632 – T.II, p. 678.
Segundo esse autor, que transmitiria uma antiga tradição, a terra dessa gruta é naturalmente vermelha, mas reduzida
ao pó, lavada e seca ao sol, ela se torna branca como a neve e misturada à água fica como leite. Os camponeses dão
então esse líquido à mulheres que não têm leite para que o tenham. Diz ainda Quaresimus que as relíquias que têm o
nome de “Lac beatae Virginis” – “Leite da bem-aventurada Virgem” – são a terra dessa gruta (124). Temos então
que essa gruta do Leite ou Gruta de Maraha, pode ser chamada também de Gruta do Leite da Virgem. E “Leite da
Virgem”, como vimos em Fulcanelli, é o licor extraído da Magnésia e que é simbolizada saindo da fonte junto à
gruta do carvalho oco, símbolo do laboratório alquímico.
Haveria mais que dizer sobre o assunto, mas consideramos suficientes estas citações para mostrar que nas visões de
Katharina Emmerick há alusões bastante significativas à alquimia e que uma delas é a citação das rosas – brancas e
vermelhas.
“Eu vi de cada tipo de planta, pelo menos das maiores, apenas um exemplar e via como elas ficavam separadas,
como se pertencessem a um viveiro, plantadas conforme sua espécie.
(...) Os campos, que eu vi, eram suaves e ondulados e inteiramente cobertos de vegetação, no meio havia uma fonte
da qual saiam rios para todos os lados, dos quais alguns fluíam de novo para sua origem” (125).
Katharina Emmerick saliente que isto ocorria antes do pecado original de Adão. Significaria então que todas as
plantas, pelo menos as maiores, antes do pecado eram hermafroditas? Essa idéia vai se confirmar, mais tarde,
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quando ela tratar da criação dos animais e mesmo do homem.
Parece-nos então que existe aí uma primeira insinuação de que antes do pecado original não havia reprodução pela
conjugação de dois seres ou de elementos fornecidos por dois seres distintos. E esta é uma doutrina muito comum
entre os gnósticos, esotéricos e cabalistas. Trataremos dela a seu tempo, quando tivermos que analisar o pecado
original e a reprodução humana no paraíso, conforme descreve Katharina Emmerick
Também a “geografia” anterior ao pecado original, segundo Katharina Emmerick, é surpreendente, pois um rio fluir
e retornar à sua própria origem é contra as leis da natureza, antes ou depois do pecado original. Com efeito,
conforme São Tomás, o pecado de Adão não acarretou mudança na essência das coisas, nem das leis naturais (126).
É evidente que nem Katharina Emmerick nem Brentano consideravam possível um rio, de per si,
retornar á sua própria origem. Isso era um símbolo, e esses rios que fluem e retornam às suas próprias origens
formam um movimento circular de um efeito que realimenta a sua causa, um ciclo eterno. Ora, este movimento de
um feito que realimenta eternamente a sua própria causa é simbolizado na famosa serpente Ourobouros dos
alquimistas e esotéricos: uma serpente que morde e come sua própria causa, alimentando-se e crescendo por si e de
si mesma. A serpente Ourobouros simboliza para os esotéricos o movimento universal, isto é, Deus que gera o
mundo retornar a Deus, realimentando sua Causa, representando o movimento perfeito original que foi rompido
pela queda (127):
“Entre los reptiles la serpiente como uno de los símbolos primordiales de la alquimia. Aparece bajo diversas formas,
de las cuales la principal es si duda alguna, la de uroboro, a la que ya nos hemos referido. La serpiente urobolos – se
lee en un antiguo manuscrito griego – es la composición que es devorada y fundida en su totalidad, disuelta y
transformada por la fermentación (...) sus cuatro pies constituem la tetrasomia (es decir los cuatro metales
imperfectos plomo, cobre, estaño y hierro)” (128).
E ainda:
“La unidad cósmica, base del pensamiento hermético, está simbolizada igualmente por la Serpiente de Uroboros,
imagen del Uno-Todo. Su forma circular, simbolo del mundo, es una alusión al ‘principio de clausura’ o al ‘secreto
hermético’. Por añadidura enuncia la eternidad concebida como ‘eterno retorno’ ho que no tiene princio ni fin”
(129).
“Nessas águas notei eu primeiramente movimento e animais vivos. Depois, vi animais aqui e acolá entre as moitas e
arbustos, como que se levantando do sono e espiando. Eles não eram ariscos e eram totalmente diferentes do que são
agora. Comparados com os animais atuais eles pareciam como homens. Eles eram puros, nobres, rápidos, alegres e
suaves. É impossível exprimir como eles eram. A maioria dos animais me eram estranhos. Eu não vi nenhum como
os de agora. Eu vi elefantes, veados, camelos e especialmente o unicórnio, o qual eu vi também na Arca (de Noé).
Ali ele era particularmente amável e manso. Era mais curto do que um cavalo e tinha uma cabeça mais arredondada.
Eu não vi nenhum macaco, nenhum inseto nem animal algum repelente e feito. Sempre pensei que estes animais são
um castigo do pecado.
Vi muitos pássaros e ouvi seus cantos amáveis como numa manhã. Mas não ouvi bramido de feras nem vi aves de
rapina.
O paraíso terrestre existe ainda. Mas é totalmente impossível ao homem chegar até ele. Eu o vi, no alto acima, como
está ainda em todo o seu esplendor, separado obliquamente da Terra, como os disco escuro dos anjos caídos, está
separado do céu” (130).
Katharina Emmerick, nesse texto procura salientas as diferenças existentes entre os animais, tal qual existem hoje e
antes da queda de Adão. Afirma que, comparados com os atuais, os animais, antes da queda, pareciam-se com os
homens, e que é evidentemente incrível e totalmente contrário à doutrina católica ortodoxa.
Em outra visão Katharina Emmerick, fornece mais informações sobre os animais antes da queda:
“Não havia cães (como os de hoje). Eles eram totalmente amarelos-dourados e tinham longas jubas e com feições
quase humanas (lobos? Pergunta Brentano). Sim, havia lobos, mas eram tão mansos. Eles se agarravam uns aos
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outros pelas jubas e brincavam uns com os outros. Eu também vi ovelhas, camelos, bois e cavalos, todos brancos e
brilhantes como seda e também um maravilhosamente belo asno branco. As feras não faziam mal umas às outras,
elas se entre-ajudavam. Na maioria elas eram brancas ou amarelo-douradadas. Eu quase não vi animais escuros (...)”
(131).
Katharina Emmerick afirma que os animais ajudavam uns aos outros, mas não como alimento. Não se vê então
como poderiam ajudar-se, pois quem recebe ajuda tem alguma necessidade e os animais só necessitam de outros
seres para seu sustento, reprodução ou abrigo.
Em outra visão Anna Katharina Emmerick: “Eu não tenho visto as feras comerem. Eu creio que elas comem capim,
isso eu vi” (132).
Essas descrições de Anna Katharina Emmerick são sem dúvida, românticas, e nada realistas. Não se pode imaginar
águias comendo alpiste.
Na Suma Teológica, respondendo aos argumentos dos que afirmavam que no estado original, não haveria nem
putrefação que gerasse certos animais, nem animais venenosos ou daninhos ao homem, diz S. Tomás:
“Certos dizem que os animais atualmente ferozes e que matam os outros, eram, no primeiro estado, mansos, não só
relativamente ao homem, como também aos outros animais. Mas tal é absolutamente irracional. Pois, pelo pecado
do homem não se mudou a natureza dos animais, de modo que vivessem de ervas os que agora, naturalmente,
comem as carnes dos outros, como os leões e os falcões. Nem a glosa de Beda diz que os vegetais e as ervas fossem
dados como alimento a todos os animais, mas só a alguns; pois, do contrário, haveria discrepância natural entre
alguns deles”. (133).
Quanto á informação de que os mosquitos, insetos e macacos só “apareceram” depois do pecado, ela contraria a
doutrina da Igreja Católica segundo a qual descanso de Deus no sétimo dia significa o fim da criação. É o que diz S.
Tomás na Suma Teológica: “... o repouso pode ser tomado em dupla acepção; como cessação das obras ou como
satisfação do desejo.
Ora, de ambos os modos se diz que Deus descansou no sétimo dia. Do primeiro, por ter cessado, nesse dia de criar
novas criaturas; pois, nada fez a seguir que não estivesse incluído, de algum modo, nas primeiras obras...”(134).
Para Anna Katharina Emmerick não foi assim, pois Deus teria criado os insetos – ela diz que eles “apareceram” –
depois do dilúvio: “Eu não vi mosquitos e insetos (na arca de Noé). Eles apareceram depois para o castigo dos
homens” (135). Tudo isto mostra em Katharina Emmerick uma concepção do paraíso terrestre e do mundo original
muito mais de acordo com os sonhos milenaristas próprios das correntes esotéricas do que com a ortodoxia da
religião a que vidente pertencia.
Anna Katharina Emmerick afirma que esse animal fabuloso teria existido não só no paraíso terrestre, mas também
depois da queda, no lugar que ela chama de Montanha dos Profetas (Prophtenberg):
“Los unicórnios Duran aún y viven siempre juntos. Conozo un disco hecho con el cuerno de uno de ellos, que
produce en los animales enfermos lo que las benditas y consagradas producen en los hombre” (136).
Está aí uma das confusões, típicas do esoterismo e de Brentano, entre o sobrenatural e o natural. Afirmar que um
disco feito de chifre do unicórnio tem, sobre os animais doentes, o mesmo efeito que as coisas consagradas tem
sobre os homens, é atribuir a um objeto natural (se ele existisse realmente) um poder sobrenatural. Isto é pura magia.
Katharina Emmercik faz uma descrição romântica do unicórnio e diz:
“Los machos y las hembras van generalmente separados, y solo se juntan em determinadas épocas. Son muy
reservados y tienen poca prole” (137).
Vê-se que Katharina Emmerick atribui aos unicórnios uma atitude que Brentano atribuirá a muitas pessoas que ele
diz santas, no Antigo e no Novo Testamento. Ela conta ainda outras lendas sobre a força “secreta e maravilhosa” do
unicórnio sobre os demais animais:
“Me parece que se quire significar y simbolizar algo de santo, cuando de dice que el unicórnio reposa su cabeza
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solamente em el regazo de la más pura Virgen. Esto siginifica que la carne (de Jesus) salió pura y santa solamente
del seno de la Santissima Virgem Maria, y que la carne corrompida y contaminada renació pura por ella, o que ella
es la primeira en la cual la carne se purificó, que en ella se venció lo que era invencible, que en ella se ha dominado
toda rebeldia y bestial instinto, que en ella la humanidad rebelde o fue vencida y hecha pura, o que en su regazo se ha
desvanecido el veneno de la tierra” (138).
Contando uma velha lenda sobre o unicórnio e as virgens, Katharina Emmerick faz desse animal símbolo da
encarnação de Cristo no seio de Maria. Ora, segundo oDictionnaire des Symboles, o unicórnio simboliza “a
Revelação divina”, ou então “a penetração do divino na criatura”. Além disso, o unicórnio está ligado à simbologia
sexual e alquímica, representando assim “a fecundação espiritual”, e, concretamente, “a Virgem fecundada pelo
Espírito Santo”. Na alquimia, o unicórnio simboliza o hermafrodita, e sexualmente ele é um símbolo fálico (139):
“El unicórnio, animal fabuloso, fue también uno de los simbolos favoritos de les alquimistas. Es la imagen del
mercurio e igualmente del principio masculino y activo, por elllo le hallamos en la mayoria de las ocasiones
acompañado de una virgem, imagen de la feminilidad pasiva” (140).
Finalmente, o último ponto a observar é a respeito da localização do paraíso terrestre. Katharina Emmerick afirma
que ele existe até hoje, e ela diz que ele está tão separado da Terra quanto a esfera escura dos anjos caídos está longe
do céu. Não se vê então porque esse paraíso seja terrestre. Em outra visão ela diz:
“Eu vejo como um banco sob o sol quando ele se levanta. Quando ele aparece, ele se levanta à direita na
extremidade desse banco Ele está situado a oriente da Montanha dos Profetas, onde o sol se ergue, e parece-me
sempre como um ovo flutuando sobre águas indescritivelmente claras, as quais o separam da Terra”. (141).
Esse paraíso parecido com um ovo flutuando sobre águas claras lembra muito os símbolos do ovo alquímico que
aparece nas pinturas de Jeronimus Bosch e de Bruegel. No âmbito teológico, quanto à existência atual do paraíso
terrestre, S. Tomás se posiciona favoravelmente, à sua existência, situando-o no Oriente (142). Enquanto, os outros
autores, como por exemplo Cornélio a Lapide, opinam que ele foi destruído por Deus (143).
Embora Katharina Emmerick, nesse pormenor, tenha a seu favor – excepcionalmente – a opinião de S.Tomás, os
detalhes que ela dá o Paraíso e sua localização junto da mística e gnóstica Montanha dos Profetas, tornam sua
exposição bem mais próxima do esoterismo do que de tomismo. Trataremos dessa Montanha dos Profetas, quando
analisarmos as tendências milenaristas da vidente, no último capítulo desta tese.
O modo como AKE descreve o "aparecimento" de Adão é completamente diferente do que afirma o Gênesis.
"Eu vi que Adão não foi criado no Paraíso, mas sim na região em que depois existiu Jerusalém. Eu o vi sair,
resplandecente, de uma colina de terra amarela, como saindo de uma forma, o sol brilhava e eu,quando ainda
criança,via isto e pensava que o sol parecia fazer Adão sair da colina. Ele era como que nascido da terra, a qual era
uma virgem. Deus abençoou esta terra e ela se tornou sua mãe. Ele não saiu subitamente da terra, custou algum
tempo, até que aparecesse.
Ele jazia na colina deitado sobre seu lado esquerdo, com o braço estirado sobre a cabeça e estava coberto com uma
névoa leve como fumo...
Eu vi uma figura dentro dele em seu flanco direito, que era Eva, a qual foi tirada por Deus de dentro dele, já no
Paraíso.
Deus o chamou e era como se a colina se abrisse' e Adão saísse lentamente dela. Ao redor não havia arvores, mas
apenas pequenas flores. Vi também os animais saírem da terra em uma só unidade e as fêmeas serem tiradas de
dentro deles.
Eu vi que Adão foi levado para muito longe, num jardim colocado muito alto, o Paraíso terrestre. Deus conduziu os
animais para passarem diante dele no Paraíso. Adão lhes deu nomes e eles o seguiam e brincavam com ele.
Antes do pecado, todos os animais o serviam. Eva não havia ainda sido formada fora de Adão. Todos os animais a
490
que Adão havia dado nome seguiram-no mais tarde quando ele foi para a Terra.
Eu vi Adão no Paraíso, não longe da fonte que existia no meio do jardim, como despertando de um sono entre flores
e plantas. Ele era branco brilhante; seu corpo parecia ser mais de carne do que de espírito. Ele não se admirava de
nada, nem de si mesmo, e caminhava entre as árvores e animais a seu redor como se estivesse acostumado, como
alguém que inspeciona o seu campo" (1).
Nesse texto Katharina Emmerich diz que Adão foi criado na Terra, mas fora do Paraíso. De fato, a Sagrada Escritura
diz que Adão só depois de criado é que foi conduzido ao Paraíso (2).
"Adão não foi criado no Paraíso, mas sim fora da Terra e depois foi nela introduzido" (3)
O texto editado pelo Pe Schmoeger aproxima-se assim mais do que diz a Bíblia do que o Urtexte.Ver-se-á
posteriormente que o Paraíso terrestre, localizado num lugar muito alto, não estaria onde existiu depois Jerusalém e
sim junto à montanha dos profetas, no Himalaia (4).
A afirmação de que Adão foi criado fora da Terra é também completamente estranha ao que diz a Sagrada Escritura.
Ela, porém, não é estranha à Cabala, pois nela se ensina que "Adão era um ser espiritual cujo lugar estava no mundo
da Ásia" (5), que era um reino espiritual.
No Gênesis, Deus impera à Terra que produza erva e árvores (6) e animais (7) e às águas que produzam répteis e
aves (8). Porém, quando se trata de criar o homem, Deus não utiliza nenhum ser criado como instrumento, mas cria
o homem diretamente e por isso diz: "Façamos o homem a nossa imagem e semelhança" (9). Em sua exegese,
criticando a opinião de Avicena de que os animais podiam ser gerados naturalmente, sem sêmen, por alguma
mistura dos quatro elementos, S. Tomás diz:
"(...) na instituição primeira das coisas, o princípio ativo foi o Verbo de Deus, que da matéria elementar produziu os
animais; quer em ato, segundo os outros Santos Padres, quer virtualmente, segundo Agostinho" (10).
Fiel a Escritura, o Aquinate sublinha, portanto, o papel ativo do Verbo de Deus na criação, coisa que Katharina
Emmerick omite. No texto da freira de Dülmen, Deus não impera à terra e as águas que produzam os seres
inferiores, nem reserva diretamente para Si a criação do homem. Repetimos: a criação, segundo a vidente, é sem
"fiat" e por isso, no seu texto, as coisas "aparecem".
Quanto ao homem, S. Tomás ensina que dada a sua dignidade, Deus não utilizou para criá-lo nenhum instrumento,
nem sequer os anjos (11), enquanto Katharina Emmerick dá um relato diferente do Gênesis no qual Deus fez o corpo
do homem do limo da terra e lhe infunde uma alma imortal (12). Conforme a freira, Deus simplesmente chama
Adão. – Ora, só se chama o que já existe, o que ela parece confirmar ao dizer que Adão já saiu formado do seio da
terra. Deus teria ordenado, então, o nascimento e não a criação de Adão. – Diz a vidente que Adão foi gerado pela
Terra que até então era virgem e que ela teria sido como que fecundada pelo Sol. E Adão sai do seio da terra como de
uma forma ou molde. Evidentemente, esse molde é símbolo do útero, por isso se diz que a Terra era "sua mãe". À
chamada de Deus, a terra se abre e Adão, já formado, sai lentamente, e não bruscamente, da terra, num local que é
uma colina de terra amarelada.
O que se descreve não é então a criação de Adão, mas sim o seu nascimento do seio da terra (principio feminino) que
fora fecundada pelo sol (principio masculino). Ora, esta concepção não é estranha ao Zohar que explica do seguinte
modo o insuflar do espírito no homem feito da terra:
"And He breathed into his nostrils the breath of life." The breath of life was enclosed on earth, which was made
pregnant with it like a female impregnated by the male. So the dust and the breath were joined, and the dust became
full of spirits and souls" (13).
"(...) the other is a creation, and therefore it is the earth which brought forth produces (Toldoth) being made pregnant
like a female by a male". R. Eleazar said: "Ali forces were latent in the earth from the first, but it did not bring forth
its products till the sith day, as it is written, "let the earth bring forth living soul" (14).
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Também a consideração da terra como principio feminino e do céu (ou sol) como principio masculino que a fecunda
existe na Cabala.
"When the upper world was filled and became pregnant it brought forth two children together, a male and a female,
these being heaven and earth after the supernal pattern. The earth is fed from the waters of the heaven which are
poured into it. The upper waters, however, are male, whereas the lower are female, and the lower are fed from the
male and the lower waters call to the upper, like a female that receives the male and pour out water to meet the water
of the male to produce seed. Thus the female is fed from the male, as it is written, "and the earth", with the addition
of the vau, as we have explained (...) (Zohar, Bereshit I, 29 b). Thus the heavens and the earth are united and the
earth is fed... For the heavens are male, and the male comes from the side of right, and the female from the side of the
left" (15)
O corpo de Adão antes do pecado é apresentado pela vidente de Dülmen como sendo luminoso, dizendo ainda que o
corpo dele era mais carnal do que espiritual. Ora, não há nenhuma alusão a isto no Gênesis.
A idéia de que o corpo de Adão, antes da queda, era constituído de matéria distinta da nossa é comum à Cabala e ao
esoterismo. Como vimos, conforme a Cabala, "Adão era um ser espiritual, cujo lugar estava no mundo de Ásia"
(16). No Zohar se explica que a carne, na verdade, não faz parte da essência do homem, pois que a Escritura diz que
o homem foi "vestido" por Deus com pele e carne: "De pele e de carne me vestistes" (17).
"Hence we often meet the expression "flesh of man", implying that the real man is within and the flesh which is the
body is only a vestment" (18).
Essas "roupas" de pele e carne teriam sido dadas por Deus ao homem após o pecado. Antes disso o homem, como
diz a freira alemã, seria luminoso, tendo recebido de Deus vestes de luz. Pois bem, é exatamente isto o que diz a
Cabala:
"At first they had had coats of light ("OR"), which procured them the service of the Highest of the high, for the
celestial angels used to come to enjoy that light; so it is written: "For thou hast made him but little e lower than the
angels, and crownest him with glory and honour". (Ps.VIII,6). Now, after sins they had only coats of skin ("or"),
good for the body but not for the soul" (19).
"Then they knew that they were naked , since -they had lost the celestial lustre which had formerly enveloped them,
and of which they were now divested" (20).
"Similarly, when Adam sinned, God took from him the armour of the bright and holy letters with which he had been
encompaned and then he and his wife were a f r a i d , perceiving that they had been stripped; so it says: "And they
knew -that they were naked. "At first they had been -invested with those glorius crowns which gave them protection
and exemption from death. When they sinned, they were stripped of them, and then they knew that death was calling
them, that they had been deprived of their exemption, and that they had brought death on themselves and on all the
world" (21).
Katharina Emmerick diz ainda, de modo muito vago e estranho, que o corpo de Adão não era só de carne, mas que
tinha também algo espiritual. Tal idéia fora exposta por Boehme e por seu seguidor, o pietista OEtinger. Boehme diz
a esse respeito:
"Então [antes do pecado] Adão e todos os homens andariam sobre a terra completamente nus, como ele fazia; sua
vestimenta era a claridade na virtude de Deus" (23).
E no questionário elaborado por Oetinger, com textos de Boehme, consta a seguinte pergunta com o número 41:
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"Que é a imagem de Deus no homem? Resposta: Moisés diz:
"Deus criou o homem a sua imagem, a sua imagem Ele o criou". Isto significa que Ele desde a eternidade o concluiu
na Sabedoria. Neste mesmo conhecimento Deus introduziu o ser e este ser foi criado à imagem de Deus. A imagem
de Deus é um corpo espiritual, uma corporeidade celestial, na qual há fogo, luz e ar. A vida aérea acarreta as demais
e se ela não fosse nada, então as outras seriam nada" (24).
"N'oublions pas qu'Adam, tel qu'il avait été crée par Dieu, ne possédait pas de corps grossièrement matériel (J.
Boehme, De tribus principiis, X, 21; XI, 9 et suiv.; XVII, 12 et suiv.). II avait bien un corps mais tout autre que celui
qui est le notre, un corps tel que nous l’aurons après Ia réssurection, un corps de même nature que celui du Christ
ressuscite et que ceux de Moïse et d'Élie au Thabor. Son corps était fait de l'element pur, qui est Ia substance ou
essence celeste (Wesenheit)" (25).
O texto da vidente dá a entender que a corporeidade de Adão não era só carnal, mas também espiritual, isto é, que a
substância de seu corpo seria de matéria espiritualizada. Para os esotéricos, matéria e espírito são conceitos
reversíveis, e, em Boehme, autor conhecido e estimado por Katharina Emmerick e por Brentano, assim como em
OEtinger, existe a tese de uma matéria espiritual componente do corpo de Adão:
"L'esprit et Ia matière ne se séparent pas. Dieu et Ia mature forment une unité compacte; c'est à cela qui font allusion
les alchimistes du Moyen Age lorsqu'il parlent du ‘monde un’ et l'on peut dire également que Ia psychanalyse et Ia
physique moderne ont decouvert cette unite. Comine le dit C. Jung, Ia matière et le psychisme apparaissent comme
les deux modes de manifestation, se référant l’un a l’autre, de l'aspect unifié transcendant Ia conscience de l'être"
(26).
Para Boehme, Adão era semelhante a Deus, porque tinha algo de espiritual:
"Le corps de l'homme original, vivant au paradis, est dès lors conçu par lui comme etant d'une merveilleuse
transparence vis-à-vis de Ia beauté et de Ia pureté; c'est en cela qui se revele sa ressemblance avec Dieu" (27).
5. Adão andrógino
No texto de Katharina Emraerick editado por Schmoeger, lê-se que Eva estava dentro de Adão e que foi retirada de
dentro dele, já no Paraíso. Logo a seguir a vidente afirma que os animais machos também safam da terra contendo as
fêmeas, que depois eram retiradas de dentro deles. Ora, há ai uma contradição com a Escritura, pois, segundo esta,
os animais foram criados antes do homem (28). Além disso, essas frases insinuam claramente sem dizê-lo
explicitamente que, antes de ser levado ao Paraíso, Adão era andrógino. Poder-se-ia argumentar que, de certo modo,
a própria Escritura afirma que Eva foi tirada de Adão, o que, porém, não é exato, pois o que diz o Gênesis é que Deus
retirou de Adão uma costela e não Eva: "E da costela que tinha tirado de Adão, formou o Senhor Deus uma mulher,
e a levou a Adão". (29).
S. Tomás, explicando esse texto, ensina que Deus, depois de retirar a costela de Adão, acrescentou-lhe matéria para
formar Eva, de modo semelhante ao que fez Cristo na multiplicação dos pães (30). Além disso, como nota
argutamente A. E. Waite, se Eva já existisse em Adão, Deus não poderia ter dito: "Não é bom que o homem esteja
só; façamos-lhe um adjutório semelhante a ele" (Gen. II, 18) (31).
Examinando, contudo, o Urtexte, verifica-se que a freira e seu secretário foram bem mais explícitos nesse ponto.
Mas, o padre Schmoeger, preocupado em apresentar uma Katharina Emmerick o quanto possível ortodoxa,
censurou os trechos mais comprometedores do Diário. De fato diz esse texto:
"Ele (Adão) não era homem como nós. Os sexos nele não estavam separados e também não estavam um ao lado do
outro. Homem e mulher eram um só nele" (32).
Também aqui se poderia tentar argumentar, como fizeram muitos, com o Gênesis onde se lê:
"E criou Deus o homem a sua imagem. Criou-o a imagem de Deus e criou-os varão e fêmea" (33).
Daí, entendem alguns que Deus criou o homem varão e fêmea conjuntamente e que, portanto, num só ser haveria os
dois sexos. Já Platão também registrará o mito do homem duplo, que poderia ser ou não andrógino (34) e o judeu
Filon de Alexandria transmitiu esse mito a Orígenes que no seu comentário ao Gênesis diz:
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"Vejamos também por alegoria de que modo o homem foi feito varão e fêmea, a imagem de Deus" (35).
Na Idade Média, Scoto Erígena repetia essa exegese que ele recebera dos neo-platônicos.
No Renascimento,
"Pico, que había expuesto en el Commento que el hombre fue originariamente de Ia naturaleza de Juno, adoptó de
buena gana Ia interpretación de Orígenes. ‘No deja de ser un misterio (non item vacat mysterio), escribía en el
Heptatus acerca del Genesis I, 27, que El crease al hombre (el Adán celestial) macho y hembra. Porque es una
prerrogativa de Ias almas celestiales el realizar simultaneamente Ias dos funciones de Ia contemplación mental y el
cuidado corporal sin que ninguna de ellas obstruya y dificulte a Ia otra. Y los antiguos en particular, como podemos
observar en los Himnos Órficos, adoptaran Ia costumbre de designar estas dos fuerzas inherentes en Ia misma
sustancia ... con los nombres de macho y hembra" (36) .
Cornélio a Lapide, contudo, mostra que a Escritura diz primeiro que Deus criou o homem, e, depois, que os criou
varão e fêmea, e aí a palavra os designa Adão e Eva e não apenas Adão (37), explicação essa também adotada
por D. Calmet, exegeta muito consultado por Brentano (38).
A Cabala por sua vez explica esse texto do Gênesis de outra maneira: "Male and female He created them: the one
includes in the other" (39). Exatamente como se lê em Katharina Emmerick. Convém observar, entretanto, que na
CabaIa há muitas outras passagens sobre a androginia de Adão, dizendo que ele e Eva foram criados unidos mas um
ao lado do outro:
"When these three letters [o aleph, o dalet e o mim final - as três letras do nome Adão] descended below, together in
their complete form, the name Adam was found to comprise male and female. The female was attached to the side of
the male until God cast him into a deeper slumber, during which he lay on the site of the Temple. God then sawed
her off from him and adorned her like a bride and brought her to him, as it is written” (40).
Outros textos do Zohar insinuam que a separação de Adão e Eva se deu por motivo da união sexual:
"We have stated that Adam and Eve were created side by side. Why were they not created face to face? Because "the
Lord God had not yet caused it to rain upon the earth (Gen. 11,5) and the union of heaven and earth was not firmly
established. When the lower union was perfect and Adam and Eve were turned face to face, then the upper union
was consummated" (41).
E o Zohar pouco mais adiante revela o sentido sexual desse texto ao dizer:
"...Adam and Eve were not created face to face. The order of verses in the Scripture proves -this: for first we read,
"For the Lord God had not caused it to rain upon the earth" and then "there was not a man to till the ground", the
meaning being that man was still defective, and only when Eve was perfected was he also perfected " (42).
Notemos de passagem que a Cabala, como Brentano, simboliza a mulher pela terra e o ato sexual com o cavar da
terra pelo homem.
"Rabbi Abba dit: le premier hotnme etait male et femelle à Ia fois attendu que l'Écriture dit: "Et Elohim dit: 'Faisons
l’homme à notre ressemblance’ " C'est precisement pour que l'homme ressemblat a Dieu qu'il fut cree mâle et
femelle à Ia fois, et ne fut sépareé qu'ulterieurement. Mais, objetera-t-on, l'Ecriture dit pourtant ‘La terre dont il avait
été tire...’ II semble donc qu' Adam seul avait été tire de Ia terre et que, par consequent, il n'etait pas cree
primitivement mâle et femelle à Ia fois? Mais Ia vérite est que le mâle et Ia femelle avaient été unis primitivement
par le Saint, beni soit-il, et en disant que l'homme à été tire de Ia terre, Ia femelle y est comprise également" (43).
Por isso a Cabala considera que todo ser tem que ter a polaridade masculina-feminina:
"Male and female He created them." "From this we learn that every figure which does not comprise male and female
elements is not a true and proper figure, and so we have laid down in the esoteric teaching of our Mischnah" (44).
Como vimos, a idéia de que Adão era andrógino não é exclusiva nem original da Cabala:
"La notion du premier homme androgyne est vieil-le comine le monde. On Ia retrouve partout, en Orient, en Chine
aussi bien qu'en Egypte. tout le monde connait les hommes androgynes de Platon; on connait aussi Ia notion du dieu
Anthropos. - (Cfr. Reitzenstein - "Poimandrès'- Leipzig 1904, et "Die Heilenis tischen Mysterien Religionem"
Leipzig, 1920). M. Oldenberg l'avait retrouve dans les conceptions les plus primitives de l’Inde (Cfr. Oldenberg -
494
"Die Weltenschaung der Brahmanen texte.", Goettingen 1919.) M. Reitzenteins (Studien zum antiken
Syncretismus, Leipzig 1926) en trouve Ia source dans le monde iranien. Plus pres de Boehme, l'androgynit e d'Adam
est enseignée par Jean Scot Eurigène, par Ia Cabbale – (au moins dans ce qui concerne le premier adam, l'Adam
celeste, Adam Cadmon.) et – ce qui est plus important pour nous – par Paracelse" (45).
Ao objetivo de nossa tese interessa muito mais o tema da androginia de Adão em Boehme e Paracelso, na Cabala e
na alquimia do que nas obras da Antiguidade oriental e ocidental. Na Gnose como na alquimia, a androginia de
Adão era símbolo e resultado do principio dialético da igualdade dos contrários constituintes de todo ser.
"El caduceo es el cetro de Hermes dios de la alquimia. Recibido de Apolo en trueque por una lira de su invención, se
compone de una varilla de oro entrelazada por dos serpientes que representan para el alquimista los dos principios
contrarios que han de unificarse, ya sean el azufre y el mercurio, Io fijo y Io volátil, Io humedo y Io seco, Io cálido y
Io frio. Se concilian en el oro unitario de Ia cana del caduceo que aparece, pues, como Ia expresión del dualismo
fundamental que ritma todo Io puramente -hermético y que debe ser reabsorbido en Ia unidad de Ia Piedra Filosofal
.Esta armoniza todos los elementos contrarios. Es a Ia vez macho y hembra, pues puede autogenerarse y por ello fué
re presentada a menudo con Ia apariencia de un andrógino, uno de los símbolos capitales del hermetismo" (46).
"La Piedra Filosofal, objetivo de Ia obra alquimica, no conocía Ia oposición sexual, sino que Ia conciliaba en su
hermafroditismo. Simbolizada frecuentemente por el andrógino, esta petra genitri encontraba en si misma todos los
elementos genitores" (47).
"Very often, since the conflicting opposites we are considered as being male and female, the Stone was called an
Hermaphrodite: "This Salt, says Valentine, is an Hermaphrodite among others salts, it is white and red, even as you
will have it" (48).
"Talvez debiera ser mencionado también que, en Alquimia, el hermafrodita, llamado ‘Rebis’ , representa el vértice
de Ia transmutación; Io de alquimia: en Paracelso, en "Trismosin", o en "Basil Valentine" (49) .
Ora, a Cabala e Paracelso são duas fontes de Boehme. E foi de Boehme, da Cabala e da Alquimia que os românticos
alemães, e entre eles Brentano, receberam a tese da androginia de Adão. Eis um texto de Boehme a respeito desse
tema:
"Adão era homem e também mulher, e entretanto não era nem um nem outro, mas uma virgem cheia castidade,
pudor e pureza como a imagem de Deus; ele tinha ambas as tinturas (princípios) do fogo e da luz nele, e era na sua
conjunção que residia o amor de si mesmo, como seu centrum (princípio) virginal, que era o belo jardim de diversão
plantado de rosas, no qual ele se amava a si mesmo" (50)
"[Cristo] retransformou a propriedade masculina e a propriedade feminina em uma só imagem, tal qual era Adão
antes de sua Eva, quando ele não era nem homem nem mulher, mas sim uma virgem-masculina" (51).
É preciso notar que os românticos distinguiam entre androginia e hermafroditismo. Franz Von Baader explica-nos
essa distinção:
"L'androgynéité, qui est bien l'union des deux puissances, masculine et féminine, en une seule nature, n'est pas
l’absence de sexe (IX, 211)
Elle n'est pas non plus l'hermaphroditisme, c'est-à-dire ‘Ia coexistence de deux puissances séparées en un seul
corps’. (IX, 211). Lingam, le philosophe de l’Inde, et les Grecs quand ils se répresentent une ‘Vénus barbata’, ne
saisissent qu'un hermaphroditisme, nullement l'androgynéit é , laquelle apparait comme une notion parfaitement
chrétienne (IX, 211). La meme incompréhension qui confond ‘androgynéité’ et ‘hermaphroditisme’, confond
‘absence de sexe’ et impuissance (II, 305, note). L'hermaphroditisme apparait des lors comme une caricature de
l'androgynéite" (52).
495
Eckartshausen, que foi muito ligado a Sailer, tem a mesma doutrina
"Eckartshausen, écrit qu'avant Ia chute, homme et femme ne constituaient qu'un seul être; il n'y avait pas encore eu
de séparation en deux parties distinctes; le feu et Ia lumière, Ia force et Ia faiblesse, étaient rassembles en un individu
unique; l'homme ne connaissant pas de plaisir charnel. L'auteur repete Ia meme idée , presque mot pour mot, dans un
autre livre pos-thume, Des forces magiques de Ia Nature, et ajoute que Ia raison de l'homme, ou sa lumière,
constituait l'Ève originelle". (53)
Louis Claude de St. Martin, que foi o tradutor das obras de Boehme para o francês, assim como toda a corrente
esotérica martinesista, defendiam a tese do Adão andrógino.
Para Baader o problema da androginia ultrapassa o da natureza do primeiro homem pois tem um alcance metafísico:
"Sans Ia notion d'androgynéit é, dit-il en 1834, ‘Ia notion centrale de Ia religion, à savoir cele de l'image de Dieu,
reste incomprise (III, 303-304). L'androgynéité est ‘l'union des puissan ces sexuelles en un seul corps’. (IX, 211),
ou, dit encore Baader, ‘l'androgynéité represente Ia synthese du principe actifet réactif, du centre ternaire et de Ia
péripherie en une seule essence, une seule nature, un seul organisme individuel’ (XIV, 141)" (54).
Baader via em toda separação polarizada a fonte do mal. Por isso, a separação dos sexos seria o castigo da culpa
original:
"Toute division de deux polés opposées represente pour Baader une forme de mal. II y avait primitivement une
androgyneité physique qui unissait dans l’homme les deux caracteres masculin et féminin" (55).
Desse modo, para que Adão fosse perfeito e sem mal algum, Baader teria que concebê-lo como andrógino:
"II ne fait ancune espèce de doute que, pour Baader, le premier Adam, l'Adam du premier livre de Ia Genèse,
possédait en lui Ia double possibilité, féminine et masculine.cLe premier Adam était androgyne, c'est-à-dire que Ia
‘vierge celeste’, ‘l’Idée ou l’Ideal de l’humanité’ habitait en lui, et il avait lui, le devoir de rendre cette idée concrète
(wesenhaft) (III, 302). ‘Le premier Adam étant androgyne, c'est-à-dire complet et parfait par lui-même, il était
normal qu'il demeurât tel" (56).
Se a perfeição do homem estava no seu caráter andrógino, se o mal estava na separação dos sexos, era lógico que,
para Baader, a redenção consistisse na restauração da androginia primitiva.
"L'homme , le premier Adam, était primitivement androgyne, c'est-à-dire que Ia ‘Vierge celeste’, ‘l'Idée ou l'Idéal
de l'humanité’ habitait en lui (III, 302). La rédemption pourra donc se definir entre autres comme un retour à
l'androgynéité primitivement , c'est-à-dire un homme intégral, un être androgyne" (57).
Já vimos como esta teoria existiu também em outros românticos e em Bretano (58).
Todas estas citações mostram que a tese da androginia de Adão, posta nas visões de Katharina Emmerick
enquadra-se perfeitamente no "clima" mental reinante na época do romantismo. Fica também claro que as fontes
dessa tese encontram-se na Cabala, na alquimia e nos autores adeptos das teorias esotéricas. E Brentano se abeberara
exatamente nessas fontes e em autores dessa corrente.
6 - A "criação" de Eva
"Eu vi Adão descansando deitado sobre o lado esquerdo, com a mão esquerda sob a face, na colina perto da árvore e
das águas. Deus enviou-lhe um sono e ele estava mergulhado em visões. Então Deus tirou Eva do lado direito dele,
no lugar em que o flanco de Jesus foi aberto pela lança. Eu vi Eva delicada e pequena. Ela rapidamente tornou-se
maior, até que ela se completou tornando-se grande e bela. Sem o pecado original todos os homens nasceriam em
um sono suave. A colina se dividiu separando Adão e Eva e eu vi formar-se do lado de Adão uma rocha como que de
pedras preciosas em formas cristalinas, e do lado de Eva um vale branco coberto com delicado e branco pólen" (59)
.
Como já vimos, há ai uma grave discordância com o Gênesis, pois, segundo este, Deus tirou uma costela de Adão
para fazer o corpo de Eva e no lugar da costela colocou carne (60), enquanto conforme a vidente, Deus tira Eva de
Adão já formada, embora pequena. Esta pequena Eva que sai de Adão e imediatamente cresce se assemelha ao
homúnculo descrito pelos alquimistas, pequeno ser humano criado artificialmente durante a feitura da "Obra" e que,
como Eva, logo se desenvolve (61). Afirma, então, a vidente que se não tivesse havido pecado original, os homens
nasceriam num sono suave. Adiante ela dará outros pormenores a respeito da geração e o nascimento no estado de
496
inocência. Ao mesmo tempo em que retirava a mulher do homem, dividiu-se a colina em que Adão estava, surgindo
uma rocha e um vale. Há nessa divisão um evidente símbolo da separação dos sexos: a rocha representa o princípio
masculino, enquanto o vale significa o princípio feminino.
"Mas logo depois da extração da mulher surgem também já, embora ocultos no simbolismo e envoltos no idílico, os
sinais do sexo, perigosos para o estado paradisíaco
'A uma certa distância ã direita da árvore do conhecimento eu vi agora uma pequena colina oval suavemente
inclinada e graduada e cintilava com formas cristalinas de grãos vermelhos e de todas as outras cores como pedras
preciosas.
A uma certa distancia a esquerda da árvore do conhecimento eu vi uma cavidade, um pequeno vale. Ele era como de
delicada terra branca, ou de névoa, como se fosse coberto de florzinhas brancas ou pó de frutas... Era como se as
duas regiões tivessem relação uma com a outra, como se a colina devesse ser introduzida no vale Eles eram como
sementes e campos, como geradores e concebedores’ ‘(...) o interior do fruto era mole como se da com os figos, da
cor castanha de açúcar derretido, atravessado por veias de sangue’; ‘quando o montezinho, a colina brilhante, sobre
a qual Adão subiu e se elevou e quando o vale de pólens brancos onde eu vi Eva de pé afundou, aproximava-se já a
ruína’ " (62).
A simbologia sexual da colina e do vale são claramente evidenciadas: uma tem poder gerador, outra o de conceber;
são como semente e campo a semear; um deve ser introduzido no outro. É muito importante notar então que era a
Árvore do Conhecimento do Bem e do Mal, isto é, a árvore do pecado original, que separava Adão e Eva, a colina e
o vale. Daí ser interessante que Adams tenha interpolado nesse texto a frase com que a vidente descreve o fruto
proíbido, insinuando assim que esse fruto simboliza a relação sexual, como aliás a freira deixará claro mais adiante.
Finalmente, Katharina Emmerick descreve a separação da colina e do vale, isto é, a separação dos dois sexos, como
algo que aproximou o homem da ruína.
Ora, no Gênesis, logo depois de criar Adão e Eva, Deus lhes dá o mandamento de se reproduzirem:
"E criou Deus o homem a sua imagem, e criou-os varão e fêmea. E Deus os abençoou e disse: 'Crescei e
multiplicai-vos e enchei a terra e submetei-a’ " (63).
Também no capitulo II do Gênesis, após descrever a formação de Eva e antes do pecado original Deus diz:
"Por isto deixara o homem seu pai e sua mãe e se unira a sua mulher, e serão dois numa só carne" (64).
É explícita aí a ordem de que o homem devia se reproduzir e por união carnal, noção que Katharina Emmerick não
só omite como contradiz em seus textos. Para esclarecer o pensamento da vidente a respeito do pecado original e sua
relação com a procriação, convém citar suas descrições dos corpos de Adão e Eva antes da queda:
"Eu vi Adão e Eva antes da queda, rosados e transparentes, muito belos e nobres. Eu não vi neles nem umbigo nem
mamilos. Eles tinham cinco mechas de cabelos, como feixes luminosos que saiam de suas cabeças, dois das fontes,
dois da região dos ouvidos, e um de trás da cabeça. Do peito até a parte inferior do corpo eram cercados de raios de
luz, como uma corola. Eu me lembro vagamente que Adão antes da criação de Eva possuía em si o ser feminino, que
Eva foi tirada de seu lado direito pequena e logo cresceu ao lado dele. Agora eles eram como as palmeiras cujo sexo
e separado em distintos caules" (65).
De novo a freira se refere a Adão e Eva como seres luminosos, tendo os cabelos como feixes de luz. Ela nos informa
ainda que eles não tinham umbigo o que é absolutamente óbvio, pois eles não foram gerados, mas ela diz também
que eles não tinham mamilos, o que leva a conclusão que a geração humana se faria de modo diverso do atual, já que
Eva não teria então meio de amamentar. Como se daria então a geração? A vidente o esclarecera depois. Mas pelo
que foi dito e insinuado é fácil deduzir que Adão e Eva não tinham sexo. Só não fica claro porque a parte inferior do
corpo deles estava envolta e coberta por feixes de luz, como para vesti-los.
497
"Eva estava de pé diante de Adão, e este lhe deu sua mão. Eles eram como duas crianças, inexprimivelmente belas e
nobres, totalmente luminosos vestidos com raios de luz como com uma flor. Da boca de Adão eu vi que saia um
largo fluxo de luz brilhante e na sua testa havia como que uma face severa. Ao redor de sua boca havia como um sol
radioso que não existia na boca de Eva.
Eu vi o coração deles tal qual como agora nos homens, o peito era cercado de raios de luz e no meio do coração eu vi
uma glória luminosa e dentro dela uma pequena imagem com alguma coisa na mão. Eu creio que isto significa a
terceira pessoa da Santíssima Trindade. Também de suas mãos e de seus pés eu vi sair raios de luz" (66).
A descrição de Adão e Eva vestidos de luz é denovo confirmada. Acrescenta-se, porém, um detalhe: na boca de
Adão há uma espécie de sol radiante que não existe na boca de Eva. Esta seria a diferença entre o masculino e o
feminino, antes do pecado. A freira confirma isto no seguinte texto, onde explica a finalidade reprodutiva deste sol
na boca de Adão:
"O sol radiante em torno da boca de Adão tinha relação com a benção de uma santa descendência saída de Deus, a
qual, sem o pecado original, se efetuaria através da palavra" (67).
Assim, a geração humana, originariamente, não se daria por via sexual, mas pela palavra. Seria uma reprodução
espiritual e não material. O Urtexte é mais explícito do que a versão editada pelo padre Schmoeger:
"Eu creio que Adão teria gerado através da palavra. Ao redor de sua boca havia um sol radioso de luz. Em torno da
boca de Eva isso não existia. Eu vi que eles não tinham estômago e que não comiam como nós. Os frutos os nutriam
como nos nutrem o sol e a lua. Eles eram também totalmente brilhantes e luminosos. O fruto da árvore proibida
acarretou o atual modo de comer e de gerar e o totalmente decaído apa relho físico interior dos homens" (68).
O Pe. Schmoeger evitou publicar esse texto tão claro, pelo qual Adão e Eva originalmente não comeriam como nós,
e, por isso não tinham estômago e nem aparelho digestivo, é de supor, com todas as conseqüências prosaicas desse
fato, como aliás a vidente informará mais adiante. Resumindo o que a freira assevera, tudo o que se relaciona com a
manutenção da espécie e sustentação física do indivíduo é conseqüência do pecado original. Portanto, teria sido o
pecado a dar ao homem uma condição animal e então se entende porque a vidente disse antes, tão vagamente, que o
corpo de Adão era algo espiritual: Adão não teria em seu corpo nada de animal.
Como veremos adiante temos aqui o reflexo de uma concepção "espiritualista" do homem, muito afim com a
doutrina da Gnose, para a qual tudo o que é material e animal no homem significa abominação. Ora, Katharina
Emmerick conta que, ainda criança, ficara triste ao saber como se dava a reprodução humana...
"Eu me lembro do tempo em que era criança, como fiquei triste por causa da vergonha da formação dos homens, e vi
uma imagem de Eva, e como, se nasceria se não fosse o pecado original. Vi seu corpo totalmente diverso. Não vi
intestinos e evacuação como agora. Eu me lembro que eu vi um coração e muitos recipientes saindo do mesmo, os
quais mergulhavam numa bolsa arredondada, sob a qual ficava a criança, os braços cruzados diante do peito, com a
cabeça contra o lado direito de Eva sob as costelas do peito, e que a criança crescia Ia formando uma protuberância
exata-mente no lugar onde Eva foi tirada de Adão, e onde Longinus abriu o flanco de Jesus; lá a pele se abria sem
dor e a criança saía como de uma chaga de lábios puros. Eu vi a criança alimentar-se de sua mãe, não através do
cordão umbilical, mas sim de um pequeno tubo que seus lábios protegiam. A criança também não se amamentava na
mãe, na qual eu não vi mamilos. Eu creio que a concepção era através da palavra, inconscientemente, e sem
conjunção carnal" (69).
O texto não podia ser mais explícito e é bem compreensível que o Pe. Schmoeger não o tenha publicado. Percebe-se
também porque a vidente, quando jovem, sentia aversão pelo casamento (70):
"Muito jovem eu vi uma imagem de que, sem o pecado original, a concepção e o nascimento dar-se-iam sem
vergonha e sem dor, e que através do pecado original se deu uma inversão e um rebaixamento da natureza humana,
e – eu creio – de toda a natureza, e que com o pecado e o rebaixamento da natureza humana, o ser sexual exprimiu se
corporalmente e surgiu a vergonha desta transformação como conseqüência do pecado, assim como a dor do
nascimento como castigo da inversão e transformação do homem interior" (71).
Não há, pois, dúvida alguma: o sexo e a reprodução carnal foram conseqüência do pecado original, segundo a
498
vidente. Não é preciso dizer que também essas frases do Urtexte foram censuradas pelo Pe. Schmoeger...
A respeito de outras diferenças entre o corpo atual do homem e o corpo original diz ainda a freira que, mesmo após
a retirada de Eva do corpo de Adão, eles ainda não tinham sexo como agora ("Kein Geschlecht wie jetzt"):
"Eu o vi como um homem, e ela como uma mulher, mas não tão exatamente como agora. Eu não vi seios em Eva
como também não vi nada daquilo que na constituição da mulher mais bela fica feio, como por exemplo, os quadris
largos, as pernas tortas. Não havia neles, ou relaciona do com eles, nada que pudesse significar um fim
pecaminoso". Também não havia vísceras tão desordenadas e sempre contrárias. Estas coisas somente resultaram do
rompimento com Deus e da colocação do centro em si elas são relações decaídas do homem com Deus. Sobretudo os
primeiros homens não possuíam nenhum sangue, pois sangue = sensualidade, o sangue no homem é uma
conseqüência do pecado original. As vergonhosas fraquezas da mulher são um pesado castigo do pecado" (72).
E em nota a esse texto, J. Adams apresenta a seguinte citação do Urtexte: "Nos corpos gloriosos não há nenhum
sexo... Nos homens retos, inocentes, piedosos, não se nota nada de sexo; este apareceu somente nos homens
pecadores e impuros e se tornou um horror" (73).
Não é verdade que os corpos gloriosos não tenham sexo pois o que Cristo diz é que os homens serão no céu como os
anjos de Deus, visto que, não havendo mais necessidade de reprodução, não haverá mais atividade sexual, mas os
corpos gloriosos não serão nem mutilados nem mudados. Os textos acima revelam então uma aversão pelo sexo
como se ele fosse um mal em si mesmo, na qual se pode ver uma posição caracteristicamente gnóstica e cátara.
Katharina Emmerick fornece ainda as seguintes informações sobre a concepção e o nascimento antes do pecado:
"Ao coração iam de novo fios luminosos e terminavam numa coroa brilhante sob a qual eu via a criança pequena
crescendo cada vez mais. A criança crescia na mãe tendo, desde o início, plena posse da consciência e do
entendimento e saia dormindo do flanco da mãe como Eva saiu de Adão" (74).
Como já vimos em citação anterior, a criança nasceria por uma "boca" que se abria, na hora oportuna, no flanco de
Eva, exatamente no local correspondente aquele pelo qual Eva fora retirada do corpo de Adão e àquele que foi
aberto pela lança, quando Cristo estava na cruz. A chaga do flanco de Cristo se configurava como o
restabelecimento da natureza humana como esta era antes do pecado, tornando possível um segundo nascimento.
Convém também recordar que a descrição que Brentano faz da chaga do peito de Katharina Emmerick corresponde
exatamente a descrição que ela faz da "boca" no flanco de Eva. Isso lembra ainda o culto que os pietistas alemães –
tão admirados por Brentano – prestavam a chaga de Cristo, dando-lhe, como fazia Zinzendorf, um significado
sexual (75). Assim, a vidente fala da chaga de Cristo quando explica o nascimento, antes do pecado:
"Eu sempre tive (a idéia) de que através das chagas de Jesus foram abertas as partes do corpo humano que tinham
sido fechadas pelo pecado original. Eu sempre tenho visto que Longinus abriu, no flanco de Jesus, as portas do novo
nascimento para a vida eterna, mas tudo isso é inexprimível (...) Eu sempre vi que as chagas de Jesus eram as portas
do renascimento e que ninguém entraria no céu antes que estas chagas fossem abertas. Elas são as portas do céu"
(76).
Por fim, Katharina Emmerick faz uma comparação entre o corpo de Adão e o corpo atual do homem, que convém
registrar:
"Eu via os cabelos de Adão sempre como raios brilhantes, como sua superabundância, sua gloria, sua relação com
outra irradiação, e esta gloria retornará a existir nas almas transfiguradas e nos corpos ressuscitados. Nossos cabelos
são a gloria manchada e decaída. Os nossos atuais cabelos estão para os raios de luz, assim como nossa carne atual
para a carne de Adão antes da queda" (77).
Em síntese, a vidente apresenta Adão e Eva, antes do pecado, como seres luminosos e com um corpo sé em parte
material. Nesse corpo não haveria nem aparelho digestivo (estômago, intestinos e evacuação), nem aparelho
reprodutor (sexo, útero, seios, sangue, menstruação). Assim, o homem original não comeria e se reproduziria pela
palavra.
Na Sagrada Escritura Deus diz expressamente a Adão e Eva que se reproduzam: "Crescei e multiplicai-vos" (78).
E por união carnal: "Serão dois numa só carne" (79). Além disso, Deus também concede expressamente a Adão,
como alimento , "todas as ervas que dão semente" e "todas as árvores que dão frutos que dêem semente: isso será
vosso alimento" (80). Logo, o que diz a freira contradiz o que está na Escritura.
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S. Tomás, na Suma Teológica, pergunta se, no estado de inocência, o homem necessitava de alimentos, e responde
que, embora eles não sejam necessários no estado glorioso, no estado de inocência a alimentação era necessária ao
homem. Isto porque "o princípio primeiro da vida nos seres inferiores e, como diz Aristóteles, a alma vegetal, cujas
operações são usar de alimento para gerar e crescer. Por onde, tais operações cabiam ao homem no primeiro estado"
(81).
E, na mesma questão, respondendo ao terceiro argumento diz o Aquinate:
"Se o homem não buscasse alimento para si, pecaria; assim como pecou tomando do alimento proibido. Pois,
simultaneamente lhe foi preceituado se abstivesse da arvore da ciência do bem e do mal e se alimentasse de todas as
outras árvores do paraíso" (82).
Pergunta ainda S. Tomás, se no estado de inocência haveria geração e responde que sim, porque:
"Como, pois, das coisas corruptíveis, nada e perpétuo e permanece sempre, salvo a espécie, o bem desta está na
intenção principal da natureza, e para a conservação dele se ordena a geração natural (...). Assim pois o homem, em
relação ao corpo corruptível por natureza, tem a geração (...) Por isso, para a multiplicação do gênero humano ele
(Deus) estabeleceu a geração, mesmo no estado de inocência" (83).
A seguir o Doutor Angélico pergunta se a geração se daria por coito. E no "sed contra" dessa questão ele diz:
"Deus, antes do pecado criou o homem e a mulher, como diz a Escritura. Ora, nada é vão, nas obras de Deus, Logo,
mesmo que o homem não pecasse, haveria coito, para o que se ordena a distinção dos sexos".
A Escritura diz que a mulher foi feita para o auxílio do homem. Ora, esse auxílio não é senão a geração por meio do
coito, pois em qualquer outra obra, melhor seria um homem ajudado, por outro do que pela mulher. Logo, no estado
de inocência haveria a geração por meio do coito".
"Respondeu dicendum: Alguns dos antigos Doutores, considerando a vileza da concupiscência, no coito, no estado
atual, ensinavam que no estado de inocência não se realizava deste modo a geração. Assim, Gregório Nisseno diz
que no paraíso o gênero humano se multiplicaria como se multiplicaram os anjos, sem concúbito, por operação da
divina virtude. E diz mais que Deus, antes do pecado, criou homem e mulher, prevendo o modo de geração que
havia de existir depois do pecado, de que tinha presciência.
Mas tal opinião não é racional. Pois, o pecado não subtrai nem dá ao homem aquilo que lhe é natural. Ora, é
manifesto que ao homem, assim como aos animais perfeitos, e natural gerar, pelo coito, a vida animal, que já tinha
antes do pecado, como já se disse; e isso o indicam os membros naturais para tal fim destinados. Por onde, não se
deve dizer que antes do pecado não eram esses membros naturais usados, como o eram os outros.
Ora, no coito há duas cousas a se considerarem, no estado presente. Primeira, que é natural para a geração a
conjunção do homem e da mulher, pois, em toda geração, requer-se a virtude ativa e a passiva. Donde, em todos os
seres em que há a distinção dos sexos, estando a virtude ativa no macho e a passiva, na fêmea, a ordem da natureza
exige que para gerar unam-se ambos peIo coito. Segunda, a deformidade da imoderada concupiscência, que não
havia no estado de inocência, quando as virtudes inferiores estavam absolutamente sujeitas a razão. E, por isso,
Agostinho diz: 'Longe de nós o pensar que não pudesse gerar-se a prole sem o morbo da libidinosidade; mas, os
membros carnais, como os outros , mover-se-iam pelo império da vontade, sem ardor e estimulo sedutor, com
tranqüilidade da alma e do corpo" (84).
S. Tomás vai ainda mais longe, ao responder a terceira objeção, dizendo que a continência não seria louvável no
estado de inocência:
"Por isso a continência no referido estado não seria louvável, como no tempo atual, em que o é, não por privar da
fecundação, mas pela remoção da libidinosidade desordenada" (85).
Nessa questão, S. Tomás cita o pensamento de Santo Agostinho. Eis o que ensina o bispo de Hipona, na Cidade de
Deus:
"Não temos a menor dúvida de que o crescer, multiplicar-se e povoar a terra, segundo a benção de Deus, e o dom do
matrimônio, instituído por Deus, desde o princípio, antes do pecado, ao criar o homem e a mulher. O sexo,
evidentemente, supõe algo de carnal. E a essa obra de Deus seguiu-se imediatamente sua benção. Em havendo dito
a Escritura: ‘Fê-los homem e mulher’, logo acrescentou: ‘E Deus abençoou-os dizendo: crescei e multiplicai-vos e
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povoai a terra e dominai-a etc’. Embora a tudo isso seja possível dar se interpretação espiritual não incongruente, as
palavras homem e mulher não podem ser entendi das como algo existente em apenas um sujeito, pretextando ser
nele uma coisa a que governa e outra a governada. Como de maneira muito clara se vê nos corpos de seres de sexo
diferente, o homem e a mulher foram criados com o fim de que, pela geração da prole, crescessem, se
multiplicassem e povoassem a terra. Ser refratário a isso constituiria notável absurdo (...). Devem, isto sim,
entender-se do laço conjugal, que une entre si os dois sexos" (86).
E ainda:
"(...) a benção dada ao matrimônio, para crescerem, multiplicarem-se e povoarem a terra, embora seja verdade que
subsistiu nos delinqüentes, o foi antes de delinqüirem, dando-nos a entender com isso que a procriação dos filhos é
glória do matrimônio, não castigo do pecado" (87).
E S. Agostinho explica então que, haveria, no estado de inocência, união carnal, mas sem libido.
As teorias da freira sobre a reprodução pela palavra e a identificação do pecado original com a união carnal
(veremos isso claramente mais adiante) contrariam, portanto, frontalmente não apenas a Escritura mas também a
lógica. Em todo caso, a afirmação de Katharina Emmerick de que Adão se reproduziria por meio da palavra merece
algumas considerações.
Em primeiro lugar, essa idéia não era estranha aos pensadores esotéricos do século XVIII e XIX. A idéia de que
seria possível a reprodução pela palavra – e a concepção pelo ouvido – teve origem numa falsa e pudica
interpretação do texto do Evangelho sobre a encarnação de Cristo. Foi dito que a Virgem Maria concebera pelo
ouvido, ao ouvir a palavra do anjo Gabriel. Essa interpretação entretanto não tem base porque a encarnação não se
deu quando da saudação do anjo e sim depois que a Virgem pronunciou o seu "fiat" e por causa desse "fiat". Logo a
encarnação não se fez pelo ouvido nem pela palavra do anjo.
Nesse sentido, um estudo publicado por F. Remigereau mostra como a expressão "enfants faits par l’oreille" que
aparece na peça "L'école des femmes", de Molière, tem origem numa falsa e pudica interpretação do texto de S.
Lucas (88), acentuada no apócrifo Proto-evangelho de S. Tiago (89), feita inicialmente por S. Justino (90). Tal
interpretação foi continuada e acentuada por Tertuliano, S. Gregório Taumaturgo, S. Pedro Damião, S. André de
Creta, pelo pseudo-Atanásio, por S. João Damasceno, S. Germano de Constantinopla e outros mais. Essa idéia se
refletiu em vários hinos compostos em honra da Santíssima Virgem como, por exemplo, entre outros, no hino "Ut
Virginem foetam loquar" de Ennodius, no século VI, e no hino de Venâncio Fortunato, bispo de Poitiers, cantado
nas vésperas da purificação que dizia: "Quod aure Virgo concipit". Remigereau mostra ainda, em seu trabalho, que
a Igreja procurou depois eliminar tal expressão de seus hinos litúrgicos, visto que ela, devido a sua ambigüidade,
podia levar a erros doutrinários, assim como ao desrespeito pela Virgem Maria (91).
Se a Igreja procurou eliminar essa ambígua expressão que se introduzira, de boa fé, nos hinos em honra da Virgem
Maria, foi porque a idéia da concepção de Cristo em Maria através do ouvido foi adotada por hereges de tendência
gnóstico-maniquéia para os quais a união conjugal era uma abominação e foi deles que os cátaros herdaram essa
idéia:
"Dans Ia ‘Gene Secrète’ on trouve l'expression du même docetisme. Jesus-Christ (en tant qu'il est le Verbe) entre par
l’oreille dans le corps (spirituel) de l’Ange appelé Marie, et il en sort également par l’oreille".
"Marie non fuit mulier sed angelus missus de coelo' (Somme des autorités, p. 125). - C'est l’aspect du Christ, du
Logos, de Ia Parole spirituelle, agissant comine Esprit qu'exprime l' image de son entrée et de sa sortie por l'orellie
de Marie (qui a dans ce cas le sens de Sophia, Ia Sagesse), l’action de l’Esprit Saint s'exerçant dans l'air ainsi que
l’ecrivait Fauste de Mileve (Capitula, ch. XXX). Cette idée de Ia concepcion de Marie por l’oreille, nous dit un
theologien, apparut au IVº siècle, se répandit bientôt partout et trouve meme son expression dans l'art" (Bartman),
mais il n'en est pas question datis Ia 'Vision d'lsaie' (D. Roche, ob. cit., p. 45)" (92).
Arno Borst, em seu livro sobre os cátaros mostra que essa teoria da concepção de Cristo através do ouvido da
Virgem, por meio da palavra do anjo, foi defendida pelos bogomilas e pelos cátaros, e, citando Newman (Jewish
influences in early Christian Reform Movements, p. 176), mostra que essa doutrina tinha relação com o pensamento
judaico. Para os bogomiIas, Cristo não seria então Deus e sim um anjo, um pregador, e não o salvador:
"A Byzance, probablement sous l’influence de Ia théologie ortodoxe, se crée une christologie Les radicaux
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proclamaient que le Christ était un ange qui, contrairement aux anges dechus, n'avait aucun rapport avec le péché, à
savoir le corps charnel. Marie non plus n'est pas sa mère au sens matériel du mot. Elle est un ange par l’oreille
duquel Christ penetra pour se manifester dans ce monde, prendre une apparence de chair denuée de toute matière
terrestre et libre par consequent de toutes les faiblesses humaines" (93).
Para os gnósticos e maniqueus, a matéria foi criada pelo demiurgo para aprisionar as partículas decaídas do pleroma
divino e a geração sexual seria o meio arquitetado peIo deus do mal para perpetuar o aprisionamento das partículas
divinas nos corpos, de onde a repulsa dos maniqueus pelo ato sexual e pelo matrimônio.
"II y a, enfin, puisque Ia Matière a dans Ia ‘concupiscence’, Ia libido son expression extrême et Ia plus redoutable, le
péché capital: Ia fornication, et c'est, en premier chef, de Ia tentation et de Ia jouissance charnelles que doit se garder
qui aspire a recouvrer Ia pureté de son être ou à s'y maintenir. En soi et par ses conséquences, l’acte sexual
represente, en effet, Ia souillure majeure, l'abomination suprême. Ainsi que l'exposent, entre autres, les Acta
Archelai, le désir nait spontanément du corps, plus specialment du corps rassassié et échauffé par les nourritures
carnées; il abolit dans l'âme qu'il envahit, toute conscíence et toute sagesse (...) Les actes qu'il provoquesont abjets,
bestiaux, imitation des accoup lements démoniaques. Surtout, ils ont pour résultat Ia propagation de l'espèce, Ia
transmission du Mal original. Ils font de l'homme le complice et l'instrument de Ia Matière dont le dessein est de
maintenir les parcelles de Ia lumière asserviés dans Ia turpitude des corps et decontinuer a les dominar en en
prolongeant Ia captivité de Ia génération en genération. En bref, Ia sexualité forme le plus grave obstacle à Ia
rédemption de l’humanité qu'elle retarde ou empêche. De Ia pour le manicheen qui tend à Ia perfection ou-ce que est
ici tout un à Ia sainteté, un devoir primordial, impératif, bien resume et explique par Alexandre de Lycopolis:
travailler a cooperer à Ia ruine, à Ia dissolutionde Ia Matière décretee par Dieu (...) et, en consequence, s'abstenir non
seulement de toute nourriture animale, mais aussi, mais surtout, du mariage, de tout commerce sexual, de Ia
procréation d'enfants, afin que Ia Puissance (divine) ne continue pas plus longtemps à demeurer dans Ia Matière
selon Ia propagation du genre humain (...)" (94).
Essa posição radical do maniqueísmo – que era também a posição de algumas seitas gnósticas, assim como a dos
cátaros – é muito próxima de certos trechos já citados da vidente de Dülmen e de Brentano. Em comparação, a
doutrina da Cabala com relação à matéria e a procriação é muito mais matizada e o mesmo se pode dizer também da
posição do Boehme e dos românticos. Com efeito, como vimos, o Zohar e Katharina Emmerick dizem que Adão e
Eva eram seres luminosos e que o pecado os fez perder tal condição e não faltam textos da obra de Moisés de Leão
que apresentam o pecado original como tendo sido a união carnal. Por exemplo:
"After the man had addressed all these words to the woman, the evil inclination awoke, prompting him to seek to
unite with her in carnal desire, and to entice her to things in which the evil inclination takes delight, until at last. The
woman saw that the tree was good for food, and that it was a delight for the eyes and took of the fruit thereof and ate
– giving ready admission to the evil inclination – and gave also unto her husband with her: it was she now who
sought to awaken desire on him, so as to win his love and affection" (95).
Por essa passagem fica bem claro que o Zohar considera que o pecado original foi a união carnal de Adão e Eva e
que esta união sexual teria provocado a queda do homem na materialidade com a perda de suas vestes de luz. Nisto,
o texto da freira não se afasta da Cabala, e esta por sua vez não se opõe ao que dizem gnósticos e maniqueus.
Entretanto, a Cabala tem posição distinta da dos maniqueus e cátaros quanto à questão sexual apôs a queda de Adão,
pois enquanto gnósticos, maniqueus e cátaros condenam absolutamente o casamento e a procriação, a Cabala pelo
contrário diz que eles são necessários:
"The holy name does not rest upon anything defective. Hence a man who departs from life defective through not
having left a son behind him cannot attach himself to the holy name and is not admitted within the curtain, because
he is defective and a tree which has been uprooted must be planted over again: for the holy name is perfect on every
side, and no defect can attach to it" (96).
Ou ainda:
"(It is a sin, it may be asked, if he does not visit his wife? The answer is that it is so because he thereby derogates
from the honour of the celestial partner who was joined with him on account of his wife). The other is, that if his
wife becomes pregnant the celestial partner imports to the child a holy soul, for this convenant is called the
convenant of the Holy One, blessed be He" (97).
Na doutrina cabalista, a união sexual do homem e da mulher no matrimônio é relacionada com a união mística de
alma com a Shekinah, a última das dez sefiroth divinas, que representa a presença ou a morada de Deus e também o
502
elemento feminino da divindade:
"Hence" thou shalt know that thy tent is in peace", since the Shekinah comes with thee and abides in thy house, and
therefore "thou shalt visit thy house and not sin", by performing with gladness the religious duty of conjugal
intercourse in the presence of Shekinah" (98).
De outro lado, a Cabala considera que o corpo de alguma forma é um bem, pois afirma que a maldade dos demônios
vem do fato de que eles são espíritos sem corpo, e portanto incompletos:
"These 'plagues of the childrem of men' are the demons. They were created just at the moment when the Sabbath
was sanctified, and they were left spirit without body, these are the creatures which were not finished (...)" (99).
Quanto ao aparecimento do aparelho reprodutor em Eva, o Zohar faz referência apenas à menstruação, afirmando
que ela foi conseqüência direta do pecado: "This sin (de Eva), too, is the cause of menstruation which keeps woman
apart from her husband" (100).
Como vimos, é bem provável que Brentano conhecesse a Cabala apenas de segunda mão, pelo que julgamos que a
sua fonte mais importante na questão da criação de Adão e Eva tenha sido Boehme, o qual, seguidor da Cabala, tinha
também uma posição ambígua em face da matéria. De um lado, considerava o corpo atual como resultante da queda
de Adão, e, por isso, o desprezava chamando-o de "sac d'asticots" (101). Em contrapartida, julgava a matéria e a
natureza criadas como necessárias para revelar a divindade (102). Todavia, Boehme ensina – assim como Katharina
Emmerick – que a reprodução humana antes do pecado original era espiritual e mágica e não carnal. Adão se
reproduziria pela palavra "fiat":
"Et c'est dans cet ardent desir d'amour que résidaient Ia grossesse et Ia naissance magiques , car le príncipe
fécondant compénetrait les deux essences (de Adão) l’interieure et l’extérieure et suscitait le désir, et le desir était le
Fiat qui s'emparait du plaisir d'amour el l'introduisit en une substance; ainsi Ia similitude du fac-similé qui était dans
cette substance était saisi pour former une image spirituelle selon Ia prémière. De même que le Fiat avait saisi et
forme le prototype, Adam, de même Ia similitude avait été saisi hors du prototype pour le reproduire, et c'est dans ce
raisisse ment que résidaít donc Ia naissance magique, puisque dans Ia naissance le corps spirituel était extérieur.
Entendons par Ia que cela se serait ainsi produit si Adam avait surmonté l’épreuve: Ia naissance magique se serait
ainsi produite non par une émission speciale en provenance du corps d'Adam, comme c'est actuellement le ces, mais
de même que le soleil illumine les profondeurs de l'eau sans Ia déchirer, ainsi le corps spirituel, Ia naissance se serait
émis, et dans cette émission se serait substantialise, sans fatigue et sans peine: c'est dans un grand royaume des
delices et dans un grand agrement que tout cela se serait produit, de Ia maniere dont les deux semences de
l’hommeet de la femme reçoivent un aspect délicieux dans leur conjonction: ainsi meme Ia grossesse et Ia naissance
magiques auraient été une image virginale, tout a fait selon le prototype" (103) .
E continua Boehme:
"Car auparavant, lorsque Adam était homme et femme, il n'avait besoin d'aucun membre puisque se naissance était
magique et se grossesse se serait produite flotante dans le príncipe féminin, par un effet de l'imagination, le
"Verbum Fiat" se manifestant en lui" (104).
Boehme foi também a fonte da freira na idéia que Adão não comia como nós e nem tinha os vários elementos do
aparelho digestivo, pois para ele :
"... il Adam devait manger avec Ia bouche intérieure, non avec le désir terrestre mais avec le désir celeste: car il
poussait pour lui des fruits tels que sa bouche interieure les pouvait savourer. Certes Ia bouche extérieureen
mangeait, mais pas dans le sac d 'asticots" ( 105).
Por "sac d'asticots" Boehme entende os intestinos, os quais só teriam surgido no homem após o pecado e a separação
dos sexos:
"Mais au lieu du principe féminin c’est le sac d'asticots bestial des tripés qui fu attache à Adam, à côte d'autres
formes des membres intérieurs principaux nécessaires pour Ia vie terrestre; mais a Ia femme aussi, au lieu du
principe sacré masculin fut attaché le même sac d'asticots, a fin qu'ils puissent ensachertout un tas de vanitis et vivre
comme les bêtes, puis qu'ils avaient tant d'envie du Bien et du Mal" (106).
Esta ambigüidade da Cabala e de Boehme ante o problema da matéria e da reprodução repercutiu nos autores
românticos que ora consideravam a matéria e o casamento como maus, ora como um meio de conhecer a divindade
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e vimos que a mesma ambigüidade está presente em Brentano.
Recuando um pouco, entre os pensadores e correntes esotéricas do século XVIII e XIX, vários tinham afirmações
bem parecidas às da vidente quanto à materialização do homem depois da queda. A corrente martinesista de que
fizeram parte Louis-Claude de Saint Martin – muito admirado por Brentano e Joseph de Maistre, dizia que:
"Dieu, l'Unité primordiale, donna une volonté propré à des êtres ‘émanés’ de Lui, mais Lucifer, ayant voullu exercer
lui même Ia puissance reatrice tomba victime de sa propre faute en entrainant certains esprits dans sa
chute; il se trouva enfermé avec eux dans une matière destine par Dieu à leur servir de prison. Puis, Ia Divinite
envoya l'homme, androgyne au corps glo rieux, doue de pouvoirs immenses, garder ces rebelles, travailler a leur
resipiscence; c'est même à cette fin que l’homme fut crée. Adam prévariqua à son tour, entraina Ia matière dans sa
chute; il s'y trouve maintenant enfermé; devenu physiquement mortel il n'a plus qu'à essayer de sauver Ia matière et
lui-même" (107).
Fizemos questão de citar esse resumo da doutrina de Martines de Pasqually feito por A. Faivre, porque quase não há
nele afirmação que não apareça nos textos de Katharina Emmerick, como a de que o homem, para se reproduzir,
antes do pecado, usava apenas essências puramente espirituais (108).Também em Joseph de Maistre se acham idéias
bem semelhantes às da freira de Dülmen. Émile Dermenghem publicou textos inéditos de J. de Maistre bem
interessantes. Veja-se, por exemplo, este:
"Saint Augustin (Cite de Dieu XI, 23-24) note Maistre a mal compris Origène quand celui-ci dit que la cause de Ia
matière est, non Ia bonté de Dieu seul, mais que les âmes, ayant péché en s'éloignant de leur créateur, on mérité
d’être enfermes en divers corps comme dans une prison selon Ia diversité de leurs crimes, et que c'est là le monde;
qu'ainsi Ia cause de Ia création n'a pas été pour faire de bonnes chosés, mais pour en empecher de mauvaises.
L'opinion dont il s'agit, ajoute Maistre, n'a rien de commun avec le manichéisme. On put observer qu'elle est encore
aujourd'hui Ia base de toutes les initiations modernes. (Mélanges B)(inédit): p. 302, 2 dec 17/97" (109).
Também a idéia de que a dualidade de sexos tem origem no pecado original é partilhada por Joseph de Maistre:
"La dualité sexuelle serait une consequence de Ia chute. Des textes inédits três curieux nous prouvent que Maistre
s'était rallié á ce point de vue. II cite des écrits patristiques quifont dire au Christ que son royaume viendra; "lorsque
deux choses n'en feront qu'une, et que ce qui est en dehors será comme ce qui est en dedans, que le mâle sere
confundu avec Ia feme lie; et qu'il n'y aura ni homme ni femme (St. Clement, contemporain des Apôtres); -
lorsque vous aurez déposé? le vêtement de honte et d'ignominie, lorsque deux deviendront un, que le mâle et Ia
femelle seront unis, et qu'il n'y aura ni homme ni femme" (Clement d'Alexandrie) - c’est-a-dire, commente Maistre,
"lorsque Ia vie ou Ia génération exterieure será devenue semblable à Ia vie intérieure ou angelique; il n'y aura qu'une
naissance. II n'y aura plus de sexe. Le mâle et Ia femelle ne feront qu'un et le royaume de Dieu arrivera". Et il ajoute:
"On a entendu dire au célébre Hunton, bon matérialiste, dit-on, et qui ne songeait guère à cas textes: "Examinant les
choses attentivement, il me semple que les parties de Ia génération chez les deux sexes sont des pièces placées aprés
coup" (110).
É interessante notar que o texto que De Maistre atribui a Clemente de Alexandria existe, quase palavra por palavra,
no apócrifo Evangelho de S. Tomé, recentemente descoberto, e que Clemente de Alexandria devia conhecer já no
seu tempo:
"Jesus leur dit: Lorsque vous ferez de deux un, et que vous ferez l'interieur comme l’extérieur et l'extérieur comme
l'intérieur, et ce qui est en haut comme ce qui est en bas, et lorsque vous ferez, le mâle avec Ia femme, une seu-le
chose, en sorte que le mâle ne soit pas mâle et que Ia femme ne soit pas femme, lorsque vous ferez des yeux au lieu
d'un oiel, et une main au lieu d'une mainet un pied au lieu d'un pied, une image au lieu d'une imagem alors vous entre
rez (dans le royaume)" (111).
"II montrera comment du péché naquit l'union sexuelle: "Ce qui n'était qu'un seul type a été divise pour en faire
deux: l'homme, le type de l'intelligence, et Ia femme, celui de Ia sensibilite (Dampierre, "Verites divines", I, 88)"
(112).
Zacharias Werner, o famoso maço que se tornou padre redentorista, em seu livro Croix sur Ia Baltique, defende a
mesma doutrina de tantos outros esotéricos e de Katharina Emmerick sobre o pecado original.
"Les hontes du sexe n'avilissaient point l'homme primitif: "Moitie plante, étoile à moitié", l’hôte du Paradis aimait
purement son épous e; mais, cédant à l'attrait charnel, ils déchurent, et Ia mort naquit" (113).
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E em nota, Viatte cita o seguinte texto de Werner:
"L'émmanation Ia plus puré de Ia Divinité, c'est Ia pensée et le sentiment (le Phlogistique) dans l’homme. C'esc es
sentiellement l’homme, d'où le nom phósphoros. La masse élémentaire qui nous en toure (le corps) est seulement
notre cachot..." (114).
"A l’instant même" (que Adão pecou) "tout se matérialisa autour de lui" (115).
"L'homme, expose-t-il, creé à l'image et ressem blance de Dieu est le plus parfait de ses ouvrages; tant qu'il conserva
son innocence, il commandait à tous les êtres vivants, même aux anges. Mais après Ia chute, l'harmonie de l'univers
fut corrompue et l'homme plongé dans Ia matérialité" (116).
Outros teósofos que exprimem idéias do mesmo tipó que Brentano e sua freira vidente são Dutoit-Mambrini e
Saint-Georges de Marsais. O primeiro ensinava que:
"l'homme androgyne portait le pur feu divin en lui; il tomba par les sens,se retrouva habillé de chair, entrainant toute
Ia création dans Ia chute. La matière represente donc ce qu'il y a de plus éloigné de l’être, elle n'est pour ainsi dire
que l’excrement de l’être primitif"(117).
Para St. Georges de Marsais e para os quietistas, o homem andrógino podia conceber em união divina, sem dor e
sem prazer carnal (118).
Todas estas citações comprovam que a idéia do Adão andrógino, de corpo mais espiritual do que material, ou pelo
menos de matéria espiritualizada, que só caíra na corporeidade material atual depois do pecado original, era comum
nos meios esotéricos, quietistas e pietistas do século XVIII e início do século XIX, que a extraíram da Cabala e de
Boehme. Ora, Brentano foi grande leitor de muitos desses autores e dos teósofos ligados as correntes esotéricas e
cabalistas e, desse modo, seria muito de estranhar que tais idéias não surgissem nas visões de Katharina Emmerick
que ele redigiu.
De tudo isso, concluímos que os textos de Katharina Emmerick a respeito de Adão e Eva são de natureza cabalista e
esotérica. Eles se distinguem, porém da posição clássica da Gnose e do maniqueísmo, porque consideram a matéria,
o matrimônio e o ato conjugal ambiguamente, condenando-os como resultado da queda, mas julgando-os como
possíveis fontes de revelação ou de comunicação com a divindade.
Notas
(21) Zohar, I, 53 a.
(22) Gli Apocrifi dei Nuovo Testamento, Vangeli, I/1, a cura di MARIO ERBRTTA Marietti editori,Torino,
1975, texto gnóstíoo sem título, vol. I/1. p. 366.
(23) J. Boehme, Von den drei Principien gottlichen Wesens, X, 11.
(24) F. C. Oetinger, Versuch einem Auflössung der Mithus vom Urmenschen, pp. 165 - 166.
(25) A. Koyré, La philosophie de Jacob Boehme, Vrin, Paris, 1971, p. 224.
(26) G. Weher, Jakob Böhme, in Jacob Böhme, Cahiers de l'Hermétisme, Albin Michel , Paris, 1977, p. 65.
(27) G. Weher. op. cit. p. 79.
(28) Gen. I, 24.
(29) Gen. II, 22
(30) Cfr. S. TOMÁS, Suma Teológica, I., q. 92, a.3 ad 1um.
(31) A. E. WAITE. The holy Kabbalah. University Books, Secaucus, New Jersey, 1975, p. 279.
(32) C.B. Tgb. apud BRIEGER, Der Gotteskreiss , p . 477.
(33) Gen. I, 27
(34) PLATÃO, O Banquete, 189-192
(35) ORIGENES, In Genesim, I, 15. Migne, P. G. XII, 158.
(36) Los misteres paganos del Renascimiento, tradução Espanhola de Pagan mysteries in the Renaissance, Barral
editores, Barcelona, 1971. pp. 212-213.
(37) CORNELIO A LAPIDE, Commentaria in Pentateuchum Mosis-Commentaria – in Genesim, Cap. I, p.
58
(38) D. CALMET, Commentarius litteralis in omnes libros Veteris Testamenti llatinis litteris traditus a
Johanne Dominico Mansi, I.p.65.
(39) Zahar, I, 37b.
(40) Zohar I,34b.
(41) Zohar- I, 35a.
(42) Zohar I, 35a.
(43) Zohar, II, 55 a.
(44) Zohar, I , 55 b.
(45) A.KOYRÉ, op. cit , p. 225, nota 3.
(46) J. VAN LENNEP - Arte y alquimia, p. 28
(47) Idem, p. 35
(48) R. D. GRAY, Goethe, the alchemist, Cambridge University Press, London, 1952, p.34.
(49) E. WIND, op. cit p.' 214.
(50) BOEHME, Mysterium Magnum, XVIII, 2. Texto alemão apud E. BENZ, ADAM der Mythus vom
Urmenschen p. 77.
(51) BOEHME, Mysterium Magnum LVI, 20. Texto alemão apud E. BENZ, op. cit., p. 71.
(52) E. SUSINI, Franz Von Baader et le romantisme mystique, Vrim, Paris, 1942, pp. 358- 359.
(53) A. FAIVRE - Eekartshausen et la théosophie chrétienne , Klincksieak, Paris, 1969 , pp. 279-280
(54) E. SUSINI - op. cit. vol. III, p. 358
(55) E. SUSINI - op. oit. vol. II, p. 355
(56) E.SUSINI - op. cit vol. III p. 361
(57) E.SUSINI - op. oit vol. III p. 373
(58) Cfr. supra cap. I e cap. II.
(59) AKE – Die Geheimnisse des Alten Bundes, Paul Patloch Verog, Aschaffenburg, 1980, pp. 13 e 14; texto
de C.B. publicado pelo Pe. Schmoeger.
(60) Gen. II, 21-22
(61) R. D. GRAY – Goethe, the alchemist, pp. 205 a 220, especialmente p. 211.
(62) C.B., Tgb. , apud J. ADAMS, op. cit . 3 p. 213.
(63) Gen. I, 27-28.
(64) Gen. II, 24.
(73) C.B. Tgb., J. ADAMS, op. cit., p. 212, nota 7.
(74) C.B. Tgb. apud A. BRIEGER, Der Gotteskreiss, p. 475.
(75) Cfr. idem cap. I.
(76) C. B.,Tgb., apud A. BRIEGER, Der Gotteskreiss, pp. 475-476.
(77) C. B., Tgb., apud A. BRIEGER, Der Gotteskreiss, p. 476.
(78) Gen. I, 27.
506
(79) Gen. II, 24.
(80) Gen. I, 29.
(81) S, TOMÁS - Suma Teológica, I, q. 97, a. 3.
(82) S. TOMÁS - idem, I3 q. 97, a. 3 ad 3.
(82) S. TOMÁS - idem, I, q. 92 a. 2.
(84) S. TOMÁS - Suma Teológica, I, q. 98, a.2
(85) S. TOMÁS - Suma Teológica, I, q. 98, a.2 ad 3um.
(86) S. AGOSTINHO - A Cidade de Deus, Livro XIV, Cap. 21.
(87) S. AGOSTINHO – Idem, Livro XIV, cap. 22
(88) Cfr. Luc. I, 26-38 Gli Apocrifi dei Nuovo Testamento a cura ai M. ERBETTA, I/2 Marietti, casale, 1981.
(89) Cfr. Protoev. Tiago, XI., 2-3.
(90) S. JUSTINO, Diálogo com Trifon Migne, P.G. VI, 414.
(91) F. REMIGEREAU, Les enfants faits par l’oreille in Études linguistiques-Mélanges, Nº 108, pp. 115-136.
(92) R. NELLI - Le phénomène cathare, Privat, Toulouse, 1964, p.107.
(93) A. BORST - Les cathares, p. 141, Payot, Paris, 1978.
(94) E. C. PUECH – Sur le manichéisme et autres essais, Flammaicion, Paris, 1979, pp. 66 e 67.
(95) Zohar, I, 49 b. O grifo é da edição.
(96) Zohar, I, 48a.
(97) Zohar, I, 50a.
(98) Zohar, l, 50a.
(99) Zohar, I, 47b.
(100) Zohar, I, 36a.
(101) BOEHME, Mysterium Magnun, XIX, 19.
(102) Cfr. BOEHME, Sex puncta theosophica, V. 14, VI, 8 e 9.
(103) BOEHME, Mysterium Magnum, XVIII, 9-10.
(104) BOEHME., Mysterïum Magnum, XIX , 9-10
(105) BOEHME, Mysterium Magnum, XVII, 13.
(106) BOEHME, Mysterium Magnum, XIX, 19,
(107) A. FAIVRE, L 'ésotérisme au XVIIIéme siele en France et en Allemagne, Seghevs, Pariss, 1973, p. 151.
(108) Cfr. A. VIATTE, Les sources ocoultes du Romantisme Illuminisme et théosophie, Honore Champion,
Paris, 1979, Vol. I, p. 60.
(109) E. DERMENGHEM, Joseph de Maistre mystique, Ed. d'Aujourd’hui, Paris, 1983 p. 1953 nota 12.
(110) E. DERMENCHEM - op. cit. pp. 197-198.
(111) L'Évangile selon Thomas, 22 – in E. C. PUECH – En quête de Ia gnose Vol. II, pp. 14 e 15.
(112) A. VIATTE, op. Cit. Vol. II, p. 114.
(113) Z. WERNER, Croix sur Ia Baitique, OEuvres, III, p. 116, apud VIATTE, op. cit., Vol. II, p. 112.
(114) Z. WERNER a Scheffner, 29 jan. 1805, Blatter für litte rarische Unterhaltung, 9, out. 1924, apud A.
VIATTE, op. cit.. Vol. II, p.122, nota l,
(115) Apud A. VIATTE, op. cit., vol. II, pp. 180-181.
(116) Rituel de Ia maçonnerie hérmétique de Cagliostro, publié par Marc HERVEN, Cagliostro, p. 143 apud. A
VIATTE, op. cit., Vol. I, p. 205.
(117 ) A. FAIVRE L'esoterisme au. XVIIIème siecle en France et en Allemagne, p. 81.
(118) Cfr.. A. VIATTE, op. oit. 3 Vol. p. 125.
CAPÍTULO VI
O PECADO ORIGINAL
507
O romantismo pode ser conceituado como o desejo de
508
Vimos no capítulo anterior, que a imagem de Deus no
divindade (5).
palavra (6).
509
Visto que
não só era uno com a divindade, como também era o elo pelo qual toda
a criação era una com Deus. Por isso diz Katharina Emmerick: "O
primeiro homem era uma imagem de Deus, ele era como o céu" (8). Comenta
J. Adams que assim como o homem era o elo da criação com Deus, todas
as criaturas estavam unidas à divindade, e era isso que fazia o
Paraíso ser como o Reino de Deus (9).
510
Essa unidade, harmonia, ordem, paz e amor divinos
dos animais do paraíso, onde lobos com aspecto humano eram mansos
e as feras comiam capim (12).
(11) "Das Wasser war heller, und heiligeralle Farben waren reiner
und leuchtender", die Tiere waren "unbeschreiblich edel und
leuchtend"; "meistens weiss, oder goldbelb",dieersten Menschen
waren "weissund schimmernd"; ihre Haare,"gelbs" "blond",ja
leuchtend: Die Haare (Adams) sah ich immer als leuchtende
Strahlen, als seinen Überfluss seine Giore...unsre Haare sind die
gefallene verdorrte Glorie.
Wie unser jetziges Haar zum Strahl, so verhält sich unser jetziges
Fleisch zum Fleisch Adams vor dem Fall."
511
As frutas do paraíso seriam tão superiores às atuais,
como os frutos atuais dos países quentes são superiores aos dos
países europeus.
Por isto a vidente afirma que comer um fruto no paraíso era assimilar
(13) "Oft wenn ich in unserem Garten Pflanzen oder Früchte sah, welche
ich in südlichen Ländern ganz anders, gross, edel und
schmackhafter gesehen, wie z.B. Aprikosen, dachte ich, was
diese unsere Früchte gegen die Südfrüchte, das sind die
512
" A s f r u t a s t i n h a m , n e s s e t e m p o , a f o r m a e o s e r de
seu si gn i fi ca do, e o co m er da s m es ma s er a um
apropria r-se de sua idé ia. Nã o h avia tr ituraç ão e
d e c o m p o s i ç ã o q u í m i c a , t r a n s f o r m a ç ã o e e v a c u a ção"
(14).
dos frutos, mas sim uma apropriação mágica da idéia que eles
representavam.
fruto:
(13) ( c o n t . ) S üdf rü c h te u n d n o c h v i e l s c h l e c h t e r g e g e n , d i e F r ü c h t e
des Pradieses."
A.K.E., Die Geheimnisse des Alten Bundes , p. 10.
(14) "Die Früchte war e n damals noch die Form und das We sen
ihrer Bedeutung, und das Essen derselben war ein
In s ic h auf neh me n ih r es Begr if f es. Es war ke in me c h an is c hes
Z e r malmen und chemisches Zerlegen, Verwand eln und
A u s s c h e i den".
C.B., Tgb, apud A. BRIEGER, Der Go tteskre is , p. 475.
513
reprodução em si, e o desejo egoísta na natureza humana.
E, então, através do saborear o fruto proibido, a
natureza humana se apropriou da idéia dessa fruta,
s u r gindo as conseqüências da mesma idéia, a distin ç ão
f í s i c a s ex u a l , a i n v e r sã o d a na t u re z a , a d e g r a d a ç ã o ,
a p r o c r i a ç ã o , o p e c a d o e a m o r t e " (15).
(15) "Die verbotene Frucht aber, welche ich gesehen ais einen B a u m ,
d e r d i e Z w e i g e in d i e E r d e s e n k t u n d i m m e r s o wieder neue
Pflanzen auftreibt, die ebenso tun nach dem Fall, enthielt...den
Begriff eigenmächtiger Fortpflanzung und eines sinnlichen,
von Gott trennenden Einpflanzen(s) in sich, und aus dem Genuss
dieser Frucht ging mit dem Ungehorsam das Trennen der Kreatur
von Gott und das Pflanzen in sich, durch sich, und die
selbstische Begierde in die menschliche Natur, und da sie durch
den verbotenen Genuss den Begriff dieser Frucht in sich aufnahmen,
entstand die Folge desselben Begriffes, der physische
514
O "Urtexte" de Brentano diz o seguinte sobre a árvore
do pecado original:
"Eu tenho visto muito sobre esta fruta, mas tam bém
tenho esquecido. Sobre a árvore sei ainda o seguinte:
no Paraíso, ela era mais larga na base e seu topo era
pontiagudo. Após a queda, ela obteve a capacidade de
enviar seus brotos em direção à terra. Os ramos se
enfiavam na terra e se lançavam para fora em novos
caules, cujos galhos faziam o mesmo, tanto que uma
á r v o r e l o g o f o r m a v a um a f l o r e s ta de g ra n d e fo l h ag e m."
" E u t e n h o v i s t o m u i t a s p e s s o a s v i v e r e m s o b tais á r v o r e s
n o s c h a m a d o s p a í s e s m e r i d i o n a i s . O s g a l h o s d a á r v o r e não tinham ramos.
Ela tinha grandes folhas com forma de escudo. A s f r u t a s e r a m t o t a l m e n t e
e s c o n d i d a s e n t r e a s f o l h a s e g a l h o s e t inh am qu e ser p rocu rad as e en tão
eram en con tra das s empr e c in c o f r u t a s j u n t a s e m u m c a c h o . E l a s e r a m t ã o
grandes como um... Eram agridoces e não muito s a b o r o s a s . E r a m a m a r e l a s
e totalmente atravessadas por veias, como com sangue" (16).
515
É curioso que, nesse texto, Brentano diga que foi só
depois da queda que a árvore do pecado obteve a capacidade de enviar
brotos em direção à terra para se reproduzir. De qualquer modo, o
símbolo é o mesmo: o da reprodução humana.
516
e deles subiam de novo ramificações semelhantes a
peque na s á rvo re s, p ar a o al to . As fol ha s e ra m
d elicadas, os frutos eram amarelos e
situavam-se em uma bainha de folhas, como em
uma rosa que se ab re. A ár vo r e t inh a al gum a
coi sa d o c ed ro . N ão me l em br o d e te r vis to
jam ai s Adã o ou Eva , ou um anim al, na ilha jun to
à árvore, mas eu ou via muitos pássaros belos,
nobres e brancos can tarem em seus ramos. Est a
árvore era a árvore da vida.
" E u v e jo e s ta es p é c i e d e á rv o re a i n d a h o j e nas
517
cha ma das ter ra s de c lim a qu e nte . El a en fi a
b r ot o s d e s e u s r a m o s d e n o v o n a t e r r a , o n de
penet r a v a m a s r a í z e s , e d e l a s b r o t a v a m n o v os
caul e s , o s q u a is d e n o v o v i cej a v a m t a n t o q ue
uma ár v o r e a s s i m c o b r i a m u i t a s v e z e s g r a n d e s
e s p a ços com espessas folhagens, sob as quais
viviam grandes famílias" (17).
(17 ) D e r B au m d e s L e b e n s u n d d e r B au m d e r E r k e n n t n is .
Mitten in dem leuchtenden Garten sah ich ein Wasser und in
demselben eine Insel, die auf einer Seite mit dem Lan de
durch einen Damm zusammenn ing. Diese Insel und auch der
D a m m w a r e n v o l t s c h ö n e r B ä u m e : a b e r i n d e r M i t t e d e r In s e l
s t a n d e in s c h ö n e r B a u m, d e r a l l e a n d e r e n Ü b e r r a g te u n d
gleichsam beschutzte: Seine Wurzel war der Boden der
Insel. Er überdeckte die Insel und nahm von grosser Brei t e
l e i s e b i s z u e i n e r f e i n e n S p i t z e a b . S e i n e Ä s t e s t r e c kten
sich gerade aus, und von diesen stiegen wieder Zwei ge wie
kle ine ähnliche Bäume in d ie Höhe. Die Blätte r wa r e n f e in , d i e
F r ü ch te wa r e n g e lb u n d s a s s e n in e in e r B l ä t ter hü lse wie e ine
auf gehende Rose. Der Baum hatte etwas wie d ie Zedern. Ich
e r i n n e r e m i c h n i c h t , j e m a l s A d a m o d e r E v a o de r e in T i e r auf
d i e s e r I n s e l b e i de m B au me geseh e n z u h ab e n , wo h l a b e r s e h r
s c h ö ne , e d 1e , we is s e Vögel , we lc h e ic h in s e in e n Z we ig e n s in g e n
h ö r t e . D ie s e r Baum warder Baum des Lebens.
Gerada vor dem Damm, der auf die Insel f ührte, stand der
Bau m der Erkenn tn is . Der S tamm war geschupp t wie be i
P a l m e n ; d i e B l ä t t e r wu c h s e n u n m i t t e l b a r v o m S t a m m e a u s ,
warr e n s e h r g r o s s u n d b r e i t u n d v o n d e r F o r m w i e
Schuhsohlen. Vorne in den Blätte rn verborgen hingen die
F r ü c h te z u f ünf in einer Traube beisammen, eine voraus und
vier um ih r e n S tie l . D ie g e l b e Fr u c h t h a t te we n ig e r d ie
G e s ta l t von einem Apf el, sie war mehr b irnen - oder
feigenartig g e bil de t, hatte f ünf R ippe n und ihr Blu tz e n
g l i c h e i n e m Nabe . Das Innere der Frucht war we ich wie be i
den Feigen, von der Farbe braunen Zuckers, mit blu troten
A d e r n d u r c h zo g e n. D er B au m wa r o b e n b r e i t e r a l s u n te n , d ie
Zweige senkte sich tief zur Erde nieder. Ich sehe die
518
A S a g r a d a E s c r i t u r a e b e m m a i s c o n c i s a d o que
K a t h a ri n a E m m er i ck n a de s c ri ç ã o d es t a s ár v o re s :
519
a questão afirmando que o fruto dessa árvore preservaria o homem
da velhice, mas que, por si, não lhe daria a imortalidade absoluta,
o seu fruto.
notar que Katharina Emmerick diz ter visto árvores desse tipo em
(20) S. Agostinho, De Civitate Dei, lib. XIV, cap. XXVI, apud S. TOMÁS,
Suma Teológica, I, Q. 97, a. 4.
(21) 'Es lagen mehrere Gärten umher, und in einem solchen Gartenraum nahe
bei dem Hause stand ein grosser Baum von eigentümlicher Art.
Seine Zweige senkten sich zur Erde
nieder, wurzelten und trieben wieder Bäume empor, die
520
Ora, segundo A. E. Waite, a edição de Cremona do Zohar
bem e do mal pela vidente não tem nenhuma relação com o texto bíblico
humana.
(21) (Cont.) ebenso taten, wodurch ein ganzer Kreis von Lau ben
gebildet ward."
C.B.,A.K.E., Leben der heilige Jungfrau Maria, Paul Pattloch
Verlag, Aschaffenburg, 1980, p. 34.
(22) A.E. WAITE, The holy Kabbalah, p. 279, nota 9.
(23) Cfr. C.B. Werke, Romanzen von Rosenkranz, Carl Hanser
Verlag, München, 1965, vol. I, p. 659; Cfr. cap. II supra.
521
Além desta simbologia, Brentano utiliza palavras e
comparações relacionadas com a reprodução. Assim, por exemplo, a
comparação de uma reentrância da fruta com o umbigo, e a alusão a
veias cor de sangue no interior mole do fruto proibido.
mas com o vértice voltado para baixo. Embora a simbologia seja vaga,
não é absurdo pensar que ele tenha querido relacionar a árvore da
vida com a mulher e a feminilidade, e a árvore do conhecimento com
o homem e a virilidade.
( 2 4 ) C f r. M A T IL A C. G H Y K A , Le n o m br e d ' o r - P a r is - G al l i m a rd , 1959,
p. 54, Planche XVII.
522
o sexo. Todos esses símbolos e alusões mais ou menos velados vão
preparando o leitor das visões de Katharina Emmerick para aceitar
a idéia de que o pecado original foi um ato sexual.
seriam como "saat und Acker, wie Zeugen und Empfangen" (como sementes
523
em seu lugar próprio"(26).
terra" (28).
(26) "Alles dieses, wie überhaupt die ganze Natur, war wie
durchsichtig und von Licht. Diese beiden Orte waren die Aufenthaltsstellen
der ersten Eltern. Der Baum der Erkenntnis war wie eine Absonderung
zwischenihnen. Ich meine, Gott hat nach der Schöpfung Evas ihnen disse
Orte angewiesen Ich sah sie anfangs auch w enig zusammen gehen. Ich
sah sie ganz ohne Begierde, und jedes an seiner Stel le sich ergehent."
AKE - Die Geheimnisse des Alten Bundes, p. 18.
(27) Gen. II, 18.
(28) Gen. I, 28.
524
3 - A PRIMEIRA QUEDA DE ADÃO E A 'CRIAÇÃO' DE EVA
Eva.
(29) "Ich sah, wie Adam und Eva zum erstenmal durch das Parad i e s
w a n d e l t e n . D i e T i e r e t r a t e n i h n e n e n t g e g e n und begleiteten
sie; sie hatten mehr mit Eva zu tun als mit Adam. Eva hatte überhaupt
mehr mit der Erde und den Geschöpfen zu tun, sie schaute mehr
nieder und um sich her und schien neugieriger. Adam war stiller und
mehr zu Gott emporgerichtet".
A.K.E., Die Geheimnisse des Alten Bundes, p. 19.
525
estava tanto em Deus como Adão, mas estava com sua alma mais
na natureza. Penso que eles passearam três vezes pelo
(30).
Paraíso"
poderia ser de Adão. Assim como o pecado original trouxe tantos males
Eva devem ter sido produtos de uma queda de Adão anterior ao pecado
(30) "(...) denn sie fühlten nun Dank; Adam aber mehr als Eva, w e l c h e
mehr an das Glück und die Dinge dachte, als
an den Dank. Sie war nicht so in Gott, wie Adam, sie war mehr
in der Natur mit ihrer Seele. Ich meine, sie sind dreimal durch
das Paradies gewandelt".
526
Isso é tanto mais plausível quando se lembra que conforme Jakob
uma adesão mais forte a seu componente inferior. Imaginando Eva no seu
" D a n s s a p e r f e c t i o n A d a m s ' e s t é p r i s c o m m e un n i a i s
d e l a B ê t e . T a n d i s q u ' i l é t a i t h o m m e et f e m m e e t q u ' i l
p o s s é d a i t e n l u i - m ê m e l a gross e s s e magique, il
s'introduisit dans la concup i s c e n c e b e s t i a l e , à l a
527
f o i s d e l a nourriture e t d e l ' a c c o u c h e m e n t d e s b ê t e s :
c'est ainsi que le Fiat l'a alors saisi dans cette
concupiscence et l'a formé durant son sommeil t el
qu'était c e t t e c o n c u p i s c e n c e ; e t c h a q u e m e m b r e f u t
formé en sa place pour la conjonction de
l'accouplement bestial car tout désir a reçu sa bouche pour
s ' e x p r i m e r . C ' e s t a i n s i q u e l ' i m a g e de Dieu s ' é t a i t
formée dans le "Verbum Fiat" en l'animal que nous sommes
encore actuellement, et ceci s e p a s s a e n s o i - m ê m e ,
e n t a n t q u e p r o p r e Fiat d e l ' h o m m e , q u e p r e m i è r e f o r m e
appartenant à la nature, laquelle est le désir de la
révélation divine et personne n'en est responsable en
d e hors de lui" (34).
" D o n c l o r sq u e A d am s e ré v e il l a d u s o m m e il i l v i t s a
528
femme Ève debout devant lui et l'attira vers lui car
il savait qu'elle était sienne et qu'elle était son
principe féminin; et il introduisit en e ll e sa
p r o p r ié t é d e dé s ir ( . . . )
" A d a m a v a i t d o n c é g a l e m e n t i m p r i m é l e d é s i r m e n s on ge r
en son e sse nce d ont la f em m e éta it is s ue; c ' e s t p o u r q u o i
l a f e m m e e u t a u s s i t ô t e n v i e d e vanité ainsi qu'on peut
trouver encore aujourd' hui dans la plupart d'entre
e l l e s u n exclusif d é s i r d e l a c h a i r e t d e l a t e r r e . D è s
que ce s e x e prend un certain âge, son plaisir
personnel passe en orgueil et en désir de briller
m ê l é s d e d é s i r c h a r n e l e t e l l e s s o n t bientôt a v i d e s d e
l'arbre défendu, à l'encontre de la pudeur et de la
c h a s t e t é v i r g i n a l e s e t de l'humilité angélique.
L a s o u i l l u r e q u ' A d a m i n t r o d u i s i t d a n s s o n p r i n cipe
féminin est si forte en elles qu'elles sont comme
g a u c h e s d e v a n t l ' i m a g e d e D i e u q u e D i e u créa lui même
en Adam" (35).
529
exemplo, admitiu-a plenamente. Para ele, Deus submeteu Adão a uma
530
elle, se laisser posséder par elle" (VII, 228). La tentation de
l'homme avait trait au mode de reproduction et à la nature
bissexuée propre à l'animal.
L a c o r r u p t i o n d u f a i t d e l a p é n é t r a t i o n dans l a n a t u r e
animale et son double aspect, corruption dont Adam
s'est rendu coupable lors de la présentation des
animaux", a été la raison de la création d'Ève
( V I I , 2 2 7 ) . O u , d i t encore B a a d e r u n p e u p l u s l o i n
d'une manière plus ex plicite, "c'est uniquement
parce que l'homme n ' a p a s r e s i s t é à l ' é p r e u v e l o r s
de la première tentation (...) parce que le désir
s ' e s t manif e s t é e n l u i p o u r l a r é p r o d u c t i o n d ' u n e
c o m p a g n e e x t é r i e u r e , c o m m e e n o n t l e s a n i m a u x , et
qu'au contraire le désir de l'aide intérieure ( de l a
femme de sa jeunesse, comme dit Salomon) s'e s t
p e r d u e n l u i , c ' e s t p o u r c e l a q u e l a f e m m e a ét é tir ée
de l ui (VI I, 22 9) " (36).
A m e s ma i dé i a s e a c h a em E ck a r ts h au s e n :
531
lumière, ou encore l'Ève originelle, éga ra Adam; il
désira et s'endormit. La raison et la volonté, Dieu
et l'homme, l'homme et la femme, constituaient
j u s q ' à l o r s u n e u n i t é ; mais m a i s c e t é g a r e m e n t d ' A d a m
provoqua la première division. Feu et lumière, force
et faiblesse, se divisèrent pour former d'un côté
l ' h o m m e , de l ' a u t r e l a f e m m e . C e t t e c h u t e a v a i t é t é
"intérieure"; une autre chute, "extérieure" celle -lá,
devait s'ensuivre, car Adam et Ève étaient maintenant
" o r g a n i s é s " p o u r g o û t e r l e s f r u i t s d e l a perdition"(37).
E ainda:
532
Essas mesmas idéias foram adotadas pelo esoterismo
E l e e s t a v a s e m p r e e m t o r n o d e E v a e e r a t ã o a d u lador e
gracioso, tão ágil indo daqui para lá, q ue Ev a t inh a gr and e
praz er com el e.
(39) E. DERMENGHEM, Joseph de Maistre mystique, Vieux Colombier, Paris, 1946, pp. 197-198,
facsimilada por ed. d’Ajourd’hui, Paris, 1980.
533
P o r é m , e s t e a n i m a l t i n h a p a r a m i m a l g u m a c o i s a de
terrível, e eu o tenho ainda claramente diante dos olhos.
N e s s e t e x to c on v ém f r i sa r do i s p o nt o s :
(40) "Unter allen Tieren aber war eines das sich mehr an Eva anschioss,
als alle; es war ein ungemein freundliches, schmeichelndes,
geschmeidiges Tier; ich kenne keines, mit dem ich es vergleichen
könnte. Es war ganz glatt und dünn und als habe es gar keine
Knochen, seine Hinterfusse waren kurz und es lief aufrecht auf
denselben. Es hatte einen spitzen Schweif an die Erde hängend;
hoch oben nah am Kopfe hatte es kurze kleine Pfoten. Der Kopf war
rund und ungemein klug; es hatte eine feine bewegliche Zunge. Die
Farbe seines Bauchess , der Brust und des Halses war weissgelb,
und den ganzen Rücken hinauf war es braun gewoikt, fast wie ein
Aal. Seine Höhe war etwa die eines zehnjährigen Kindes. Es war immer
um Eva herum so schmeichelnd und zierlich, so beweglich und hin
und her zeigend, dass Eva grosses. Vergnügen an ihm hatte. Dieses
Tier hatte aber für mich doch etwas Schreckliches, und ich
sehe es immer noch deutlich vor Augen. Ich sah nicht, dass es Adam
oder Eva berührten. Es war vor dem Falle zwischen Menschen und Tieren
ein grosser Abstand. Ich sah die ersten Menschen kein Tier
berühren; waren die Tiere auch vertrauter zu den Menschen, so waren
sie doch getrennter."
534
a. o relacionamento amigável de Eva com a serpente
tentadora;
romântico.
" D o n c c e s e r p e n t v e n i m e u x é t a i t d ' a p p a r e n c e un
petit-animal excessivement joli, de belle mine, coquet
e t m i g n o n , b i e n p a r é s e l o n l a v a n i t é d u Diable" (...)
e t c ' e s t p o u r q u o i le s e r p e n t s'approcha d e c e t a r b r e ,
c o m m e d e s o n semblabl e, du sem b l ab e de sa qu ali té
(... )" ( 4 1 ) .
" V i e n t ã o A d ã o a g r a d e c e n d o e a d m i r a n d o d e novo s o b r e
a colina brilhante onde ele caíra em sono
535
quando Deus formou sua esposa, tirando -a de seu
f l a n c o, A dã o es t av a s ó s o b a s ár v or e s .
E u v i E v a a p r o x i m a r - s e d a á r v o r e d o c o n h e c i m e n to
como se qu ise ss e pass ar adi ant e.
A s e r p e n t e s u b i u t ã o a l t o n a á r v o r e q u e a sua c a b e ç a
estava à altura da de Eva. Ela se susten tava com as
p a t a s n o c a u l e , v o l t a v a a cabeça para a ca beç a de Ev a,
fala ndo :
(42) Nuns ah ich Adam dankend und bewundernd wieder auf dem leuchtenden
Hügel, an dem er im Schafe entrückt war, als
536
O texto de Katharina Emmerick não só contraste com
(42) (Cont.) Gott das Weib aus seiner Seite bildete. Adam stand
alliem unter den Bäumen. Eva sah ich dem Baume der Erkenntnis sich
nahen, als wolle sie vorübergehen. Das Tier war wieder bei ihr
und noch schmeichelnder und bewegter, und sie ward ganz eingenommen
von der Schlange und hatte grosse Wohlgefallen an ihr. Die
Schlange stieg nun an dem Baume so hoch dass ihr Kopf dem der Eva
gleich kam, sie hielt mit den Fussen dn dem Stamme, wendete den
Kopf gegen Evas Haupt sprechend: wenn sie von der Frucht das Baumes
essen würden sie frei und keine Sklaven mehr sei n und wissen,
welches dia Art ihrer Vermehrung sei. Sie hatten das Wort ihrer
Vermehrung schon empfangen; aber ich vernahm, dass sie noch nicht
erkannten, wie Gott es wolle, und wenn sie es gewusst hätten und
doch in dia Sünde gefallen wären, dia Erlösung nicht möglich
sein würdei."
A.K.E., Die Geheimnisse das Alten Bundes, pp. 20-21. O sublinhado nosso.
(43) Gen., II, 4 e 5.
537
Com efeito, se o comer antes da queda consistia na
538
Quando Adão veio, Eva agarrou-o pelo braço e
p r i m e i r a v e z ; e l e n ã o t o c o u n e l a , m a s h a v i a o b s curidade
nela" (44).
(44) "Eva ward immer nachdenkender und begieriger nach dem, was das
Tier sagte; es ging in ihr etwas vor, was sie niedriger machte; es
ward mir bange. Nun schaute sie nach Adam, der noch ganz ruhig unter
den Bäumen stand, und rief ihn, und er kam. Eva ging ihm entgegen und
wieder zurück; es war ein Zögern, eine Unruhe in ihr. Sie ging wieder,
als wolle sie an dem Baume vorüber; aber sie näherte sich ihm von
der linken Seite und stand hinter ihm, von seinen langen,
niederhängenden Blättern bedeckt. Der Baum war oben breiter als unten
und die breiten Blattzweige hingen tief gegen die Erde nieder. Es
hing, wo Eva stand, eine besonders schöne Frucht. Als Adam kam, fasste
ihn Eva an dem Arme und zeigte nach dem sprechenden Tiere, und Adam hörte
auch zu. Da sie ihn am Arme fasste, berührte sie ihn zum ersten Male; er
berührte sie nicht, aber es ward finsterer um sie".
A.K.E., Die Geheimnisse des Alten Bundes, pp. 21-22.
539
Esta descrição discrepa fundamentalmente do texto do
serpente.
essa a primeira vez que Eva tocou no braço de Adão. Pouco antes,
que Adão lhe dera a mão (46). Como explicar essa contradição senão
540
lhe ofereceu" (48).
(48) "Ich sah, dass das Tier die Frucht zeigte, aber nicht wagte, sie
der Eva zu brechen. Als aber Eva nach der Frucht gelüstete, brach
sie das Tier und reichte sie ihr.
A.K.E., Die Geheimnisse des Alten Bundes, p. 22.
(49) Gên. III, 6.
(50) Zohar, Bereshit, 36 a. . O sublinhado é nosso.
541
Eva deu o fruto para o seu marido - "viro suo", diz a Vulgata- e não
para o homem. O emprego do termo "viro" e não "homo" indica claramente
que Adão já era esposo de Eva, o que é mais uma prova que, segundo
o Gênesis, o pecado original não foi o ato conjugal.
proibido, nem que ele dava em cachos de cinco frutos. O fruto comido
por Adão e Eva teria sido o do meio do cacho. Já vimos sentido dessa
simbologia.
o fruto, mas que o tomou e o deu a Adão. Ora, vimos que texto do Gênesis
afirma que Eva comeu o fruto, e só depois de comê-lo o deu a seu marido
que também o comeu (52). Ela salienta ainda que sem o consentimento
(51) "Es war die mittelste schönste Frucht von funf zusammen hängenden
F r ü c h t e n . Ich sah, dass Eva nun Adam mit der Frucht nahte und sie
ihm gab, und dass ohne dessen Einwilligung die Sünde nicht
geschehen sein würde".
(52) A.K.E., Die Geheimnisse des Alten Bundes, p. 22.
(53) Cfr. Gên. III, 6.
542
S. Tomás afirma que se apenas Eva tivesse comido o
humanidade (53).
" A f t e r t h e m a n h a d a d d r e s s e d a l l t h e s e w o r d s t o the
woman, the evil inclination awoke, prompting h i m t o s e e k t o
unite with her in carnal desire, and to entice her to
t h i n g s i n w h i c h t h e evil i n c l i n a t i o n t a k e s d e l i g h t ,
until at last " the woman saw that the tree was good
for food, and that it was a delight for the eyes and
s h e t o o k o f t h e f r u i t t h e r e of a n d a t e " - g i v i n g ready
admission to the evil
543
i n c l i n a t i o n - " a n d gave a l s o u n t o h e r h u s b a n d w i t h
her": it was she now who sought to awaken desire in
h i m , s o a s to w i n h i s lo v e a n d a f fe c t i o n" (54).
como ela diz sem dizer, isto é, como ela insinua com arte que o pecado
original tinha algo de impuro, algo relacionado com a união
sexual:
"Eu vi c o m o a f r u t a s e p a r t i a n a m ã o d e A d ã o e c o m o
e l e v i a i m a g e n s d e n t r o d e l a . P a r e c i a que h a v i a d e n t r o
o que eles não deviam saber. O in terior da fruta era
cor de sangue com veias que o atravessavam. Vi que eles
se escureciam e se degradavam em sua forma. Era como
se também o sol se retirasse. O animal desceu da árvore,
e eu vi como ele fugia com suas quatro patas. Eu não
v i c o m e r o f r u t o c o m a b o c a , c o m o ( c o m e m o s ) ag ora , ma s
a fr uta de sap ar ec eu e ntr e e les " ( 5 5 ) .
544
Não há dúvida que o fruto proibido era deveras
convinha que eles ignorassem. Ora, foi dito antes que Adão e Eva
da idéia por ele simbolizada. Qual era essa idéia, Katharina Emmerick
disse:
545
de si, e o desejo egoísta na natureza humana" ( 5 9 ) .
original:
"Eu vi q u e E v a j á h a v i a p e c a d o q u a n d o a s e r p e n t e e s t a v a
sobre a árvore, pois a sua vontade estava com ela. Nessa
ocasião senti algo que ago ra não posso reproduzir
perfeitamente. Era como se a serpente fosse a forma e
a figura da vontade de Eva, como um ser por meio do qual
eles pudessem fazer e alcançar qualquer coisa. Ai
d e n tro entrou Satã" (60).
(60) "Ich sah, dass Eva schon sündigte, indem die Schlange auf dem
Baume sass, denn ihr Wille war bei ihr. Ich erfuhr dabei, was ich nicht
vollkommen wiederzugeben vermag. Es war, als sei die Schlange die
Gestalt und Figur ihres Willens, wie eines Wesens, womit sie alles
machen und erreichen konnten. Hier hinein fuhr der Sa tan".
A.K.E., Die Geheimnisse des Alten Bundes, p. 22.
546
vontade maligna de Eva teria entrado Satã. De certo modo Satã
teria se introduzido na própria vontade de Eva, que de alguma forma,
na ocasião do pecado, estaria possessa.
E prossegue:
( 6 1 ) J . B O E H M E , M y s te r iu m M a g n u m , X X , 2 6 .
547
dans la matière primitive céleste"(62).
" P e l o c o m e r d o f r u t o p r o i b i d o o p e c a d o n ã o e s t a va
consumado" (63).
pecado original com o ato sexual. É o que faz, por exemplo, a Cabala
que Brentano conhecia: 'Of the fruit of the tree (Gen. III, 3) signify
confirmada:
548
"O comer do fruto, que tinha em si o mencionado
significado, teve como conseqüência a inversão, a
degradação da natureza, o pecado e a morte"(65).
original. Com efeito, eis o que diz Joseph Adams quanto a essa
questão:
549
É exatamente nesse sentido que o texto das visões
Eva:
(67) "Als mir einmal die Heilung des Falles in Bildern gezeigt wurde,
da sah ich Eva, aus Adam Seite hervorsteigend schon den Hals
nach der verbotenen Frucht hin verlängern und schnell nach dem
Baume hineilen und ihn umfassen".
550
Adams conclui que
(69) "Der grosse Abfall des Menschen von Gott und sein "experimentum suae
medietatis" besteht also für Brentano nich, wie für der grosse
christlich Tradition, in der Sünde der Superbia, sondern in
der Erfahrung der Geschlechtlichkeit". J. ADAMS, op. cit., p. 213.
(70) "Adam et Eva rapere voluerunt divinitatem et perdierunt
felicitatem". S. AGOSTINHO, Enarratio in Psalmis, Ps. LXVIII,
5, Sermo I, in Migne P. L. XXXVI, 848.
551
pecado consistiu num apetite desordenado de bens espirituais, o que
tais como eles são expostos nas visões da freira de Dülmen (72). Para
cátaro:
552
talvez nascessem inocentemente como as plantas, o u p e l o
m e n o s n ã o t ã o a b o m i n a v e l m e n t e unidos ao pecado como agora"
(75).
(75) "Ich glaubte ohne Evas Sünde würden die Menschen viellei cht
unschüldig wie die Pflanzen entstanden seyen, wenig sten
nicht so abscheulich mit Sünde verbunden wie jetzt".
C.B., Tgb., apud J. ADAMS, op. cit., p. 214.
(76) "Auch die s o befr emdend sc harfen Ausfälle gegen d ie Frauen
kommen aus dieser Richtung. Vor ihren "so unrei nen peinlichen
Träumen und Schmerzen bei ihren Umstünden" habe sie "immer einen
innern Abscheu" gehabt, "wie überhaupt vor Weibern,als
Geschlecht".
C.B., Tgb., apud J. ADAMS, op. cit., p. 214.
553
Para os cátaros, a união carnal era condenável porque
gerava matéria e repetia o ato satânico do casal original.
(77) R E N É N E L L Y , L e p h é n o m è n e c a t h a r e , E d . P r i v a t , T o u l o u s e , 1 9 6 4 , p.
107.
(78) ARNO BORST, Les Cathares, Payot, Paris, 1978, pp. 155.
554
capítulo anterior (79), a vidente tinha "horror ao matrimônio". Cabe
555
instruída de modo espiritual sobre o significa do
interior e as conseqüências do casamento; meu
conhecimento sobre isso era ainda tão imacula do que
eu, já crescida, tive que ser consolada por minha mãe,
devido ao medo inocente de que eu pudesse ter uma
criança.
D e s d e e n t ã o e u m e z a n g a v a s e m p r e c o m D e u s e m e queixava
em minha incompreensão infantil que Ele d e i x a s s e a i n d a
casar-se tal gente dissoluta que no casamento caía tão
diretamente no pecado, v i n do a t er fi lho s tã o
mise ráv eis qu an to ele s" ( 8 0 ) .
(80) Besonders unzufrieden aber war ich mit der Fortpflanzung der
Menschen, von deren traurigem und erniedrigendem Geheimnis ich
durch Gottes Gnade auf eine ubernatürliche, geheimnisvolle und
unverletzende Weise unterrichtet wurde, nicht von Menschen,
nicht durch Neugier, nicht durch unerlaubte Grübelei, sondern
durch die Belehrung Gottes, und zwar so, dab ich es nicht mehr
weiss wie. Diese Sache kannte ich längst, als ich noch gar
keinen Begriff von der Fortpflanzung der Tiere hatte, und ich
lebte doch unter den Tieren, ja in ihrer Nahe im Stall.
Ich flehte auch immer zu Gott, er möge mich doch von die ser
Schmach befrein, und wenn ich manchmall ängstlich füchtete, ich möge dazu
bestimmt sein wie andere meines Geschlechts, tröstete mich die
Erfahrung dass ich doch die Neigung zur Ehe und zu Männern in
anderen Mägden gar nicht verstehen konnte und nie eine
Empfindung hatte, welche sich auf dergleichen beziehen konnte.
556
O texto acima demonstra que Katharina Emmerick possuía
(80) (Cont.)So sehr ich auch von der inneren Bedeutung und
den Folgen der Ehe auf eine geistliche Weise unterrichtet war,
war mein Wissen doch so unbefleckt davon, dass ich, schon
erwachsen, von meiner Mutter über die unschuldige Angst mubte
getröstet werden, ich möchte ein Kind kriegen.
Wenn ich sah, wie Menschen ohne lebendige Andacht und
Gottesfurcht sich verheirateten, wenn ich sah, wie sie mit
Begierde und einer mir unverständlichen Lüsternheit nach dieser
Vorbindung strebten und wie sie ohne geistliche
Vorbereitung mit Fresserei und Rausch und Tanz in diesen Stand
übertraten, den ich als ein Amt schwerer Verantwortung in
natürlicher und sittlicher Hinsicht kannte, wurde ich gar
traurig, und ich musste es bei alle n Ehen werden.
Da zankte ich immer mit Gott und sagte in meinem kindlichen
Unverstand, wie er doch solche wüste Leute könne heiraten
lassen, die so recht in Sünden kommen wollten in der Ehe, und
was das wieder für elende Kinder werden würden!"
557
"Pelo comer da fruta proibida, Adio e Eva ficaram como
q u e e m b r i a g a d o s e , c o m o c o n s e n t i m e n to no pecado, deu-se
neles uma grande mudança. A s e r p e n t e e s t a v a e n t ã o p e r t o
d e l e s , e e l e s e s t a v a m c o mo q u e pe ne t r a d os p o r s e u s er
e s e es t a be leceu então a cizânia entre o trigo" (81).
(81) Durch den Genuss der Fruchte wurden Adam und Eva wie
berauscht, und in der Einwilligung in die Sünde ging eine grosse
Veränderung mit ihnen vor. Es war aber die Schlange bei ihnen, sie
waren von ihren Wesen durchdrungen, und es kam das Unkraut unter den
Weizen.
A.K.E., Die Geheimnisse des Alten Bundes, p. 24.
(82) "Das Essen der verbotenen Frucht war nicht die Vollendung der
Sünde. Sie wurden aber durch die Frucht wie berauscht und
ineinander entzündet und fielen in Sünde. Ich glau b e aber
erkannt zu haben, als sei im Willen zur Sünde eine Veränderung
mit ihnen vorgegangen und sie seien in der Sünde tierische
Menschen geworden, die sich zu schämen haben. Es war aber die
Schlange bei ihnen, und sie waren von dem Wesen der Schlange
durchdrungen, da sie sich verbanden, und es kam Bösartiges und
Unreines in die Fortpflanzung. Es kam Unkraut unter den
Weizenk".
558
Como se vê, os cortes feito pelo Pe. Schmoeger foram
outro", isto é, que ardiam de amor e que este ardor os levou a pecar.
questão: a de que Adão e Eva "se uniram" e que desta união é que
559
conforme salienta A. E. Waite.
" R e c c u r i n g t o t h e s u b s t i t u t i o n o f a mystical w i n e f o r
t h e a p p l e t r e e , a n o t h e r tradition c e r t i f i e s t h a t E v e
pressed grapes and gave the juice to her husband. The
o p e n i n g o f their e y e s w a s t o b e h o l d a l l t h e i l l s o f t h e
world. I s u p p o s e t h a t I n e e d n o t s p e c i f y i n w h a t s e n s e
t h e s e g r a p e s a r e t o b e u n d e r s t o o d a s a sexs y m b o l , a n d
i t f o l l o w s t h a t s h e s h e w e d Adam h o w t h e y m i g h t b e
e n j o i e d . O b v i o u s l y , a c c o r d i n g t o t h i s v er s i on -
T r a d i tu m e st g e ni ta l e s p ar t e s a d a e ex i s t e re , - i n s om e
s e n s e , a s t h at pe ri o d , t h o u g h t n e i t h e r h e n o r h i s w i f e
h a d a s yet b e e n c l o t h e d w i t h s k i n s , w h i c h a r e understood
some tim es as ma te rial bo die s" (84).
(84) A.E. WAIT1, The holy Kabbalah, Secaucus, New Jersey, 1975, p. 281.
560
Evidentemente, consideramos que e moralmente certo
que Brentano é o responsável por esse pormenor de caráter cabalista
do qual ele deve ter tido informação em alguma obra cabalista cristã
ou esotérica, mas não diretamente no Zohar.
Katharina Emmerick.
(85) "Es wurde die Beschneidung als Strafe und Sühne eingesetzt. Wie aus
dem Weinstock der erste Zweig geschnitten wird, auf dass
der Wein nicht wild, sauer und unfruchtbar werde, so musste es
ähnlich am Menschen geschehen, als er wieder veredelt werden
sollte".
A.K.E., Die Geheimnisse des Alten Bundes, p. 24.
561
5 - CONSEQUÊNCIAS DO PECADO ORIGINAL
" O p r i m e i r o h o m e m e r a u m a i m a g e m d e D e u s . Ele e r a c o m o
o c é u , t u d o e s t a v a c o m e l e e n e l e . S u a forma era como uma
cópia da forma divina. (...) O j a r d i m e t u d o o q u e s e
r e l a c i o n a v a c o m ele e r a u m a i m a g e m c o m p l e t a d e u m R e i n o
d e D e u s f i gurado" (86).
" D e p o is d o p e ca d o, e l e s s e t o r na r am d i f er e n te s .
(86) "Der erste Mensch war ein Ebenbild Gottes. Er war der Himmel,
alles war mit ihm und ihm. Seine Form war ein Abdruck göttlicher Form
(...). Der Garten und alles, was ihn umgab, waren eine vollständige
Bildlichkeit eines ebenbildlichen Gottesreiches, (...)".
C.B. Tqb.,apud A. BRIEGER, Anna Katharina Emmerick Visionen
und Leben, p. 46.
562
criad a s e produzidas nele, a unidade de tudo
estava desunida. De um que eram, tornaram -se
muitos, e e l e s n ã o t o m a r a m m a i s ( s u b s t â n c i a ) de
Deus apenas, mas sim apenas de si m e s m o s . Na
v e r d a d e , a g o r a e l e s e r a m d o i s , e s e tornaram t r ê s ,
e finalmente uma multidão. Assim como el es
quiseram to rnar -se c omo Deus, como a un ida d e
tudo, eles se tornaram uma multidão, u ma
separação de Deus. Eles se reproduziram em
infindável separação. Imagem de Deus eles eram
e se torna ram apenas ima gem de si mesmos qu e
geravam imagens de seu pecado" ( 8 7 ) .
(87) "Nach dem Fall waren sie anders. Alle Formendes Schaffens waren
erschaffen und zerstreuend in ihnen, alles Einige war uneins.
Aus Eins ward viel, und sie nahmen nicht mehr aus Gott allein,
sondern nur aus sich. Nun waren sie erst recht Zwei und wurden
Drei und endlich eine Unzahl. Als sie wie Gott werden wollten,
wie alles in Einen, wurden sie eine Unzahl, eine Trennung von
Gott, in unendlicher Trennung sich wiederholend. Ebenbilder
Gottes waren sie, und wurden nun Eigenbilder, welche Ebenbilder
ihrer Sünde hervorbrachten".
563
"Qualquer semelhança, mesmo que seja a expressão
de outra coisa, não basta para realizar a
e s sência da imagem. Pois, se a semelhança for só
g e n é r i c a o u p o r a l g u m a c i d e n t e c o m u m , nem por isso
se dirá que uma coisa é à imagem de outra. A s s i m ,
não se pode dizer que um verme, nascido do homem,
seja a imagem deste, por semelhança g e n é r i c a .
N e m a i n d a s e p o d e d i z e r q u e s e uma c o i s a s e t o r n a
branca, à semelhança de outra, seja por isso à
semelhança desta; porque bran co é um acidente
c o m u m a v á r i a s e s p é c i e s . Por o n d e , a e s s ê n c i a d a
i m a g e m r e q u e r a s e m e l h a n ç a e s pe c i f i c a , c o m o p or
e x e m p l o , a i m a g e m d o r e i , n o fi lho ; ou , p el o m e nos
a s em el h an ça po r a l gu m acidente próprio da esp éci e
e, princ ipalm ent e, pela figur a e, assim, se di z qu e
a imagem do ho m e m e s t á n o c o b r e . P o r i s s o , H i l á r i o
d i z , a s s i naladamente que a imagem é uma espécie não
difer e n t e .
564
(88)
propriamente falando, são à imagem de Deus" .
exemplado é finito.
565
primogênito, assim como a imagem do reino fi lho
q u e l h e é c o n a t u r a l . N o h o m e m , p o r é m , c o m o num a
natureza estra nh a, do mes mo mod o que a im ag e m d o
rei, numa moeda de prata, como está c l a ro em
Agostinho" (90).
pecar, Adão perdeu os traços celestiais que deviam marcar seu rosto,
566
supernal s a c r e d i m p r e s s a n d t h u s w e r e f i l l e d w i t h f e a r
a n d t r e m b l i n g , n o w a f t e r t h e y s i n n e d their a p p e a r a n c e s
w e r e t r a n s f o r m e d , a n d i t w a s man w h o f e a r e d a n d d r e a d e d
t h e r e s t o f t h e animal of the world" (91).
segue-se que Deus também deve ter corpo, senão material pelo menos
567
Já S. Agobardo, bispo de Lion, em uma epístola sobre
568
O Talmud e a Cabala relacionam os órgãos do corpo
humano com os órgãos do demiurgo criador, através dos 613
mandamentos da Torah.
imagem de Deus;
material, do homem;
569
se ter animalizado.
(98) Para Oetinger, por exemplo, “... a imagem de Deus (no ho mem)
é um corpo espiritual, uma corporeidade celeste”. Cfr. Cap.
V supra.
(99) "Ich sah, dass sie senken in ihrer Gestalt und sich verfinsterten.
Es entstand eine Verfinsterung in ihnen. Sie waren tierisch.
Mann und Weib, was sie vorher nicht wa ren".
C.B., Tgb., apud A. BRIEGER, Der Gotteskreis, p. 26.
570
Ela diz ainda:
" A n t e s d o p e c a d o , A d ã o e E v a e r a m constituídos d e m o d o
t o t a l m e n t e d i f e r e n t e d e c o m o n ó s , hom e n s m i s e r á v e i s ,
s o m o s a g o r a . C o m o c o m e r da f r u t a p r o i b i d a , e l e s
adquiriram forma e se tornaram uma coisa concreta, e
o q u e e r a espirit u a l s e t o r n o u c a r n e , c o i s a , i n s t r u m e n t o
e r e c i p i e n t e . A t é e n t ã o e l e s e r a m u m e m D e u s , eles s e
queriam em Deus; agora, eles estavam separa dos por sua
vontade própria, e esta vontade própria é prazer
p r ó p r i o , p r a z e r d e p e c a d o e i m p u reza.
571
m e s m o , e e n t ã o t o d a s a s c o i s a s c om o q u e s e t orn ar am
senh ora s d ele .
572
Ela afirma que, comendo o fruto proibido, Adão e Eva
(100) (Cont.) der Geschopfe und ihres Verkehres miteinander von den
Gestirnen bis zum kleinsten Tierchen. Und alles dieses wirkte in ihm,
von allem diesem hing er ab und hatte damit zu tun und zu kämpfen und
zu leiden. Ich kann es nicht klar sagen, eben weil ich auch ein Glied
der gefallenen Menschheit bin."
A.K.E., Die Geheimnisse des Alten Bundes, pp. 25-26.
(101) Cfr. Cap. II, cupra.
573
Além disso, a natureza substituiu Deus como "centro"
interior do homem tornando-o escravo dela. Desde então, e por causa
deste "centro", o homem ficou relacionado com todos os seres criados
recebendo sua influência. É essa doutrina que justifica as idéias
astrológicas que Anna Katharina Emmerick defendia já mesmo antes
difundidas nos meios esotéricos daquele tempo. Franz von Baader, por
574
elle, et moins encore en luttant contre elle" (IV, 89, note) (102).
"(...) q u a n d A d a m v o u l u t c o n n a î t r e d e s j o u i s s a n c es
matérielles, l'être divin s'éteignit en lui et il fut
r e v ê t u d ' u n c o r p s a n i m a l . ( . . . ) E c k a r t s h a u s e n ( . .. )
é c r i t q u e l ' é lé m en t é t hé r i qu e s' é t a n t c o n c e n t r é ,
devint matériel; il dit aussi que le corps organique
de lumière, celui du pur principe de lumière,
s'assombrit, ce qui obligea la matière
575
à se resserrer en elle même, si bien que le corps de
l u m i è r e s e m a t é r i a l i s a e t dev i n t d i v i s i b l e ( . . . ) . L e
c o r p s c é l e s t e devint u n c o r p s d e c h a i r e t d e s a n g , l a
forte énergie adamique fut remplacée par des os.
L'homme de vint esclave du temps (...). À cette
m a t é r i a l i s a t i o n d e c e q u i e n n o u s é t a i t s p i r i t u e l et
i m m o r t e l E c k a r t s h a u s e n d o n n e l e n o m d e " m a l é d i c tion"
(104).
576
corpos e os suga porque a Lua caiu mais profundamente
q u e o Sol "(107).
577
m o ç a , e n f i m , e d e m a n e i r a m a i s ex at a , o i rmã o e a i rm ã"
(108).
" O s c o m e t a s e s t ã o c h e i o s d e v e n e n o . E l e s s ã o c o mo
578
A Via Láctea é formada por muitos pequenos regatos como cristais.
" E l a a d m i t e q u e a n o z , e m l i n g u a g e m c o m u m , tem r e l a ç ã o
com a luta... O bom segredo da luta que havia nesta fruta
no jardim celestial está tur vado na natureza decaída
por influências más na natureza, e abrange assim a luta
d e c a d a ó d i o , m es mo a té a m ort e" (113).
(111) "Die Kometen sind voll Gift, sie sind wie Zugvögel; wenn nicht
so grosse Stürme und andere Geisterwirkungen da zwischen,
wären, würden sie leicht die Erde sehr verletzen. Es wohnen
Zorngeister darin. Der Schweif, das ist ihre Wirkung, wie
Rauch, der dem Feuer folgt. Die Mil chstrasse sind viela
kleine Wässer, wie Krystall. Es ist als baden guten Geister
darin, als tauchen sie auf und nieder, giessen allerlei Thau und
Segen, wie eine Taufe aus. Die Sonne geht eine eirunden Bahn.
Sie ist ein von heiligen Geistern belebter, wohlthätiger
K ö r per".
C.B., Tgb, apud J. ADAMS, op. cit., p. 246.
(112) Cfr. cap. IV supra.
(113) "Sie erkannte, die Nuss habe in der allgemeinen Sprache einen
Bezug auf Streit... Das im himmlischen Garten gu te Geheimniss
des Streites in dieser Frucht sey in der gefallenen Natur unter
bösen Einflüssen getrübt, und umfasse so den Kampf fedes Hasses
selbst bis zum Morde"
C.B., Tgb, II, 9, 57, apud J. ADAMS, op. cit., p. 243.
579
Todas essas idéias a respeito da degradação da
natural.
CAPÍTULO VII
O GÉRMEN DA BÊNÇÃO
518
A p e r g u n t a : " F o i e s s a m e s m a c o i s a , c o m o mesmo
f o r m a t o , q u e A b r a ã o r e c e b e u d o a n j o , n o l a d o d i r e i t o d e seu c o r p o ?
disse ela: "Sim, mas não tão brilhante. À noite à perg unta: "Era este
c o r p o l u m i n o s o a p e n a s u m ? D i s s e e l a : "Não, e r a m t r ê s " . " P o r t a n t o ,
Abraão também recebeu três? Disse ela: "Não, apenas um. Mas não me
p e r g u n t e m a i s . E u f a l o c o m t ã o p o u ca vont ade d ess as co i sas sa nta s". ( 1 )
O t e x t o p u b l i c a d o p e l o P e . S c h m o e g e r apresent a
p e q u e na s di f e re n ça s c o mo o q u e s e l ê a c im a :
(1) "Als die Eva gebildet war, sah ich, dass Gott Adam etwas gab
oder vielmehr ihm zufliessen liess. Es ist dieses nicht zu
beschreiben, ich kann nicht anders sagen, als es strömten aus Gottes
Stirn, Mund und Brust und aus seinen Händen Lichtströme und
wickelten sich zum Lichtballen etwa von der Gestalt einer
gekrümmten Bohne, und dieses ging in Adams rechte Seite über.
Eva empfing dieses nicht. Ich erinnere mich auch dunkel, dans
dieses ein gottlicher Keim war. (Auf die Frage: War das, was
Abraham von dem Engel in die rechte Seite empfing, auch so
gestaltet? Sagt sie: Ja, aber nicht so leuchtend. Am Abend auf
die Frage: War die ser Lichtkörper nur einer? sagt sie : Nein,
es waren drei; hat denn Abraham auch drei empfangen? sagt sie:
Nein, nur eines. Aber fragen sie mich nicht mehr, ich rede
so ungern von diesen heiligen Dingen)."
C.B. Tgb, apud A. BRIEGER, Der Gotteskreiss, Manz Verlag, München,
1960, p. 25.
519
Deus. Nesta bênção havia uma trindade. A bênção que
A b r a ã o r e c e b e u d o a n j o e r a d e um só el e m e n to de f o r ma
s e m e l ha n t e, m as nã o parecia tão brilhante" (2).
oficialmente professavam.
(2) "Als Eva begildet war, sah ich, dass Gott Adam etwas gab
oderzufsen Es war, als flassen von Gott, in
Menschenform erscheinend, aus Stirne, Mund und Brust und Händen
Lichtströme und einigten sich zu einem Lichtballen, der in die
rechte Seite Adams einging, aus welcher Eva genommen war. Adam
empfing dies allein. Es war dies der Keim des Segens Gottes.
In diesem Segen war eine Dreiheit; der Segen, den Abraham von
dem Engel empfing, war eines, das in gleicher Form, doch nicht
so Leuchtend erschien."
520
(Adiante veremos as citações em que Katharina
Emmerick afirma textualmente que o gérmen da
bênção de Deus é de natureza material).
uma espécie de sol, que Eva não possuía. Vimos ainda que este feixe
(3) " Die Strahlensonne um Adams Mund hatte Beziehung auf den Segen
heiliger Nachkommenschaft aus Gott, welcher ohneden Sündenfall
521
Também o gérmen da bênção tinha relação com um modo
santo de reprodução: "Pareceu-me que (o que saía de Deus) era o
gérmen da bênção divina para uma descendência pura"(4).
e um tanto ridícula.
522
"Uma vez, na festa da Imaculada Conceição, recebi de Deus uma
uma faca encurvada e lhe retirar a bênção antes que ele caísse
continuaria incontaminado.
(5) "Der Segen heiliger und reiner Mehrung aus Gott und durch Gott,
den Adam nach der Bildung Evas empfangen hatte, war wegen dieses
Genusses ihm wieder entzogen worden; denn ich sah, als Adam
seinen Hügel verlieb, um zu Eva au gehen, als greife der Herr
hinter ihm her und als nehme Er ihm etwas hinweg; und es war
mir, als werde das Heil der Welt daraus kommen.
Als ich einmal am Feste der heiligen unbefleckten Empfängnis ein
Bild dieses Geheimnisses von Gott erhielt, sah ich an Adam und
Eva das leibliche und seelische Leben aller Menschen
miteingeschlossen und wie es durch den Fall verderbt und mit Bösem
vermischt wurde, und die gefalle nen Engel darüber Gewalt
bekamen. Ich sah aber die zweite Person der Gottheit wie mit
einer krummen Schneide herabkommen und dem Adam, bevor er in
die Sünde willigte, den Segen nehmen. In demselben Augenblicke sah,
ich aus Adams Seite die Jungfrau wie ein lichtes Wölklein zu Gott
in die Herrlichkeit emporschweben".
523
Que Virgem é essa? Parece, evidentemente, que o texto
da Imaculada Conceição.
místico:
524
judeu o que o pleroma, a "plenitude", a esfera brilhante
da divi ndade com suas po tênci as, eões, a rcon t e s ,
e domínios é para os místicos cristãos e
helenísticos do período, que aparecem na
h i s t ó ria da religião com o nome de Gnósticos e
Hermét i c o s . O m í s t i c o j u d e u , e m b o r a g u i a d o p o r
motivos semelh a ntes, expressa n ão obstante sua
v i são em termo s de seu própri o f undo rel igios o.
O trono preexistente de Deus, que incorpora e
e x e m plifica to d as as forma s da criaç ão, é , ao
mesmo t e m p o , o t e m o r e o o b j e t i v o d e s u a v i s ã o
(6).
e d e s lumbramento místicos"
a noção de Deus como ato puro e faz a vidente resvalar para uma
sexuais (7).
525
Ela vê ainda Maria em Deus, na eternidade, antes de
526
Vi (...) surgir, então, primeiro, uma espécie de ostensório
e n t r e o s c o r o s d o s a n jo s . Todos os a nj os a tu av a m
nel e e o co nst r uía m. E ra co mo uma torre com várias
figuras secretas. Havia lá duas figuras que do
outro lado (da torre) se da v a m a s m ã o s , e u s u p on h o .
A t o r r e c r e s c ia e se tornava cada vez mais magnífic a .
Saiu também de Deus alguma coisa que passou através de todos os coros
dos anjos, uma brilhante e santa nuvenzinha. Ela penetrava no
ostensório e se tornava cada vez mais definida à medida que se
aproximava dele. Isto me parecia que era como uma geração divina e
pura que Adão recebeu de Deus e que lhe foi tomada quando consentiu
no pecado; que Abraão recebeu de novo; que foi tomada de Jacob; que
Moisés recolocou na Arca da Aliança que finalmente Joaquim, o pai de
Maria, recebeu no mesmo local do qual Eva surgiu do flanco do homem.
Entrando no ostensório, essa coisa tinha o aspecto de uma fava. Essse
ostensório foi também para cima da torre..."(8).
527
Não há dúvida nenhuma, pois, que para Katharina
Emmerick e para Brentano o gérmen da bênção era uma coisa que saiu
de Deus, do mesmo modo que a Virgem Maria, e que formava uma só coisa
foi dado a Abraão por ter sido ele escolhido por Deus como fonte da
linhagem messiânica. Tal linhagem, entretanto, não era de origem
humana, porque provinha de uma matéria divina, que saíra de Deus.
(8) (Cont.) verschmolz. Es war nicht Maria in der Zeit, sie war es in
der Ewigkeit, in Gott. Sie ging nicht aus Gott aus, sondern
war wie ein Hauch, der sich erst fern von dem Mund gestaltet.
Ich sah auch aus der heiligen Dreifaltigkeit eine Erscheinung
gegen den Turm ausgehen. (Sie erzählt nicht, was daraus
folgte).
Ich sah zwischen...den Chören der Engel nun
bauten alle daran. Sie war wie ein Turm mit mancherlei
auf der anderen Seite, meine ich, die Hände reichten. Sie
mir als eine göttliche, reine Zeugung, als das, was Gott
Adam, als er in die Sünde eingewilligt, nahm, und als das, was
528
Abraham wieder erhielt, was Jakob wieder genommen, Moses in
der Vater Mariä, erhielt, dasselbe, waraus Eva aus der Seite
529
É i n t e r es s a nt e n ot a r c o m o, n a d e scr i ç ã o d e Ka t h a r i n a
E m m e r i c k , a g r a ç a e o s e l e m e n t o s s o b r e n a t u r a i s s ã o m a t e rializados.
" . . . V i u m e s p l e n d o r v i n d o d o c é u d e s c e r sobre e l e , e
u m a n j o , u m m e n s a g e i r o d o c é u apareceu d i a n t e d e l e ,
falou com ele e lhe entregou um dom celestial
totalmente brilhante, com o forma to de uma pêra, mole
e liso. Dentro dele bril h a v a u ma c oi s a d u p l a , c o mo s e
e s t i v es s e v i v a.
E o a n j o f a l o u c o m e l e , e A b r a ã o r e c e b e u o s e gredo e
a santidade do céu, e, abrindo as suas v e s t e s , c o l o c o u i s s o
s o b r e o s e u p e i t o . ( E u v i u m raio deste mistério ficar sobre
Maria dur a n t e o M a g n i f i c a t ) . F o i - m e d i t o q u e e s t e era
um novo e primeiro gérmen do Redentor, o misté ri o
físico da purificação da humanidade até o nascimento
d e M a r i a , a q u a l e s t a v a p u r a para c o n c e b e r o S a l v a d o r .
Seria o Sacramento do Antig o T es t am e n to e u t in h a u ma
e x p li c aç ã o d a pa la vra testemunha, gerar ("Zeugnis" e
" z e u g e n " , j o go de palavras em alemão).
T i v e t a m b é m a e x p l i c a ç ã o d a c a u s a p o r q u e A b r a ã o recebia
isso agora tão rapidamente. Nessa ocas i ã o , ha v i a um
p e q u e n o d e f e i to n e l e , nã o sei mais qual.
530
Foram dados a ele a santidade e a prova da pro m e t i d a
d e s c e n d ê n c i a . ( O g é r m e n d a bê n ç ã o ) era n e s s e
t e m p o pe q u e n o e c h a t o . M a is t ar d e eu o vi crescer
e finalmente murchar.
Quando Abraão recebeu isso vi que ele retirou de uma caixa cinco
e l e o t e r i a a b an d o n a d o , se Deus n ã o l h o t iv e ss e
(9 ) "sah ich einen Glanz vom Himmel auf ihn kommen und einen Engel, einen
Boten vor ihn treten, der mit ihm sprach und ihm eine himmlische Gabe
überbrachte, durch und durch leuchtend, birnförmig, weich und glatt.
Es schimmerte aber etwas Doppeltes darin, als lebe es, und der
Engel sprach mit ihm, und Abraham empfin g das Geheimnis und
Heiligtum des Himmels und öffnete sein Gewand und legte es auf
seine Brust. (Ich sah von diesem Geheimnis einen Strahl auf
Maria im Magnifikat stehend gehen). Mir wurde aber gesagt, dieses
sei ein neuer erster Keim des Erlösers, das physische Geheimnis der
Läuterung des Menschengeschlechts bis zur Geburt Mariä, welche
rein war, um den Heiland zu empfangen. Es sei das Sakrament des
Alten Bundes, und ich hatte eine Erklärung des Wortes Zeugnis,
zeugen. Ich hatte auch die Ursache, warum Abraham es jetzt und so
schnell erhalte. Es wa rein kleiner Fehler von ihm dabei, ich
weiss es nicht mehr. Abraham wusste nicht, was es war, und wusste
531
nicht seinen Inhalt, und ich hatte auch die Ursache, wa rum er
es nicht wusste und hatte, es sei das Geheimnis, so darin
verschlossen gewesen, wie bei uns im heiligen Sakrament.
532
Katharina Emmerick deixa assim cada vez mais claro que
Abraão a colocou dentro de seu peito; que essa substância era mole,
saído de Deus.
s e r i a c o n c e b i d a s e m p e c a d o e q u e s e m c o n curso
a r e c o n c i l i aç ão . D i s s e - l h e ain d a q u e ele de vi a
Em
Als Abraham dieses empfagen hatte, sah ich, dasser aus einem Kasten
fünf gross. Knochen herausholte und sie auf dem Altar in eine
Feuer brannte wie ein Stern aus den fünf Knochen und war in der
Mitte weiss und auswendig rot. Das Geheimnis ist fort gekommen bis
533
gegeben hätte, usw. Keine aber wuss eigentlich, was es war, nur
war es das Heiligste und hing mit der Ankunft des Messias zusam -
men. Der Umfang war immer derselbe, nur in verschiedener Grösse. Das
496-497.
534
seg ui da vi q ue ele l he de u pa r a c om er um b oc a do
b r i l h a n t e , c o m o q u a l e l e l h e t r a ç o u com a mão um
s i n a l d e s d e o a l t o d a ca b e ç a e desde os
omb ro s at é em b aix o, n o ve nt r e, tr aç an do e s t a s
l i n h a s ( e s b o ç o ) . A s e g u i r e l e ( o a n j o ) tir o u , c o m a m b a s
e a e m p u r r o u p a r a o e s t ô m a g o , o u p a r a a r e g i ão
d o q u a d r i l d e A b r a ã o , e e s s a c o i s a b r i lh a n t e
e n t r o u em A b ra ão , tornou-s e m e n o r e d e u m a f o r m a
536
O terceiro anjo disse a Abraão que Sara daria a luz um
e l e q u a s e n ã o p e n s o u em Isaac..." (10).
(10) Ich sah, dass der erste Engel ihm sagte, Gott wolle aus ihm eine
Jungfrau hervorgehen lassen, weiche ohne Sünde empfangen sei
und ohne Mann empfangen werde und aus der die Versöhnung solle
geboten werden. Auch sagte er ihm, er solle empfangen, was Adam
durch die Sünde verloren. Ich sah hierauf, dass er ihm einen
leuchtenden Bissen zu essen gab und aus einem so gestalteten
Becherchen (Skizze) trinken liess, eine weisse leuchtende
Flüssigkeit, dass er ihn vom Haupt und den beiden Schultern
bis zum Unterleib nieder in diesen Linien (Skizze) mit der
Hand niederfahrend segnete, und dasser hierauf aus seiner Brust
etwas Leuchtendes, wie ein Wö1kchen, herausnahm mit beiden
Händen und in die Magen - oder Hüftgegend Abrahams schob, und dass
das Leuchtende in Abraham übergehend kleiner und bestimmter
geformt, etwa wie eine Lichtbohne erschien.
Ich sah nun, dassder zweite Engel Abraham sagte, dass er dies es
Geheimnis mit seinem Segen auf dieselbe Weise, wie er es
empfangen, auf seinen Erstgeborenen aus Sarah über geben
solle vor seinem Tod. Ich sah, dass er ihm zeigte, wie Jakob
zwölf Söhne, Väter von zwölf Stämmen, zeugen (werde) und dann
ihm dieses Geheimnis solle genommen werden, und da er ein Volk
geworden, wiedergegeben, in die Bundeslade, als ein Segen des
ganzen Volks, der durch Gebet erhalten werde. Wie dann wegen
Gottlosigkeit der Menschen dieses Geheimnis aus der Arche
in den Geist der Propheten übergehen solle und zuletzt
an einen Mann, welcher jene Jungfrau erzeugen werde.
Alles dieses ward Abraham in dem Gesicht
ihm eine Sohn Isaak gebären werde. Ich sah Abraham so erfreut
537
A materialidade do gérmen da bênção vai sendo cada vez
mais confirmada a cada nova revelação de Katharina Emmerick. A
confusão que ela faz entre graça e bênção sobrenatural de um lado,
e substância corpórea, de outro lado, torna evidente que ela possuía
uma concepção mágica da graça e da ação sobrenatural. Ora, essa
confusão é típica dos esotéricos e românticos e toda a mentalidade
de Brentano estava impregnada desta concepção. Esta confusão vai
fazer com que Katharina Emmerick identifique santidade com sangue:
(11) Ich meine, Abraham hat das Geheimnis immer bei sich getragen.
Ich habe Isaaks Bild gesehen, als er noch nicht gezeugt war,
als Sarahs Leib noch verschlossen war. Damals sah ich in einem
Gesicht, das Abraham hatte, einen Strahl von ihm auf Sarah
ausgehen und sah einen Knaben auf ihrem Schoss liegen. Diese
538
Strahlen, welche ich Faden nenne, sind eigentlich mehr wie
539
Nas visões de Katharina Emmerick redigidas por
loiro, e, para ela, essa cor dos cabelos, assim como a pele clara
a pele escura indicava povos de tendência má. Até mesmo nos animais
visava marcar os membros das raças mais nobres e santas, tendo também
540
Os filhos de Abraão eram membros de um povo preferido por razões
541
Da mesma forma que Isaac recebeu a benção material de
"Eu vi co mo Is a ac ( .. .) de u a ben çã o a Ja co b,
aqu el a mes ma b enç ão q ue re ce ber a de A bra ão ,
que a recebera de um anjo. Antes de dar a
benção, I s a a c , j u n t o c o m R e b e c a , h a v i a p r e p a r a d o uma
coisa cheia de mistério que pertencia à bênção.
E r a u m a b e b i d a e m u m p e q u e n o co p o q u e l h e f o ra transmitido
por Abraão e que era entregue agora a Jacob. As crianças nada sabiam
a respeito dist o e a p e n a s r ec e b ia m a b ê n ç ão , se n d o informad a s
do mistério, do mesmo modo que nós sabemos q u e n o s a c r a m e n t o ( da
E u c a r i s t i a ) r e s i d e um mistério.
(14) "Ich sah, wie Isaak (...) und ihm den Segen gab, den er von Abraham
und Abraham von dem Engel empfangen hatte. Er hatte aber vorher
etwas Geheimnisvolles mit Rebekka bereitet, was zum Segen
gehörte. Es war dieses ein Getränk in einem Gläschen, was sie
dazu gebrauchten und von Abraham vererbt war und nun auf
Jakob kam. Die Kinder wussten nichts davon, und nur den
Segen hatte, erfuhr das Geheimnis, das ihm doch wie uns das
Sakrament ein Geheimnis blieb. Das Gefass war von dieser
Gestalt (Skizze)fingerlang und platt an einer Seita, doch
platter als an der anderen. Es war weisschimmernd wie
durchsichtige Perlmutter. Es war mit etwas Rotem
gefúllt, und ich hatte die Empfindung, es sei wie Blut, wie
von seinem Blut, und Rebekka war bei der Bereitung.
Als Isaak ihn segnete, war Jakob allein bei
die Rechte aufs Haupt und die Linke in die Herzgrube. Dann
musse Jakob das Gläschen austrinken, und dann war es, als
und Jakob nach diesem Ort hingab. Ich fühlte, dieses sei
alle seine Kraft und der Segen, der Keim. Bei allem diesem
betete Isaak laute Worte. Als aber der Segen vollendet war
543
durch die Übergabe, sah ich Isaak vor Anstrengung oder
544
A cena descrita parece uma sessão de magnetismo. Ela
repete, embora com outra finalidade, técnicas de magnetização que
o Dr. Wesener, o Pe. Limberg, Christian Brentano e o próprio Clemens
Brentano aplicavam na vidente.
(15) " Abraham, Isaak und Jakob, die Altväter, waren an der rechten
Seite ihres Leibes etwas stärker als an der anderen. Man
merkte es jedoch nicht. Sie trugen ihre Kleider weit und
schützend. Es lag ihnen in dieser Seite eine Fülle wie eine
Geschwulst. Es war ein Heiligtum, ein
545
A descrição raia pelo ridículo: a "santidade" era algo
tão grosseiramente material que produzia um inchaço.
546
(15) (Cont.) Segen, ein Geheimnis darin. Es hatte die Gestalt
einer Bohne mit einem Keime; es war leuchtend".
A.K.E., Die Geheimnisse des Alten Bundes, p. 126.
(16) "Ich habe immer gesehen, dass die h(eiligen) Alväter, die
Patriarchen, Abraham, Isaak, Jakob und alle Erstgeborene
547
Por fim, citemos um texto em que se explicita a
primogenitura:
de luz.
p r i m o g ê n i t o e q u e s o m e n t e p o r i s s o e l e tinha p r i m a z i a
s o b r e t o d o s o s o u t r o s . E s t a f o i a b ê n ç ã o re c e bi d a
p o r J ac o b " (17).
(17) " Ich nun alles mehr in Gestalten sehe als wörtlich höre, sah
ich auch immer das Heiligtum des Segens in den Altvätern, weil
es auf heilige Fruchtbarkeit deutete, in der Gestalt eines
leuchtenden Pflanzenkeims, gestaltet wie eine Bohne von Licht,
mit einem Lichtkeim.
Ich sah dieses Heiligtum bei dem Segen auf den Erstgeborenen
übergehen, und darem allem hatte er solchen Vor zug vor allen
anderen. Diesen Segen nun empfing Jakob.
548
Katharina Emmerick não deixa claro por que Jacob
perdeu essa benção, que lhe foi retirada pelo anjo quando lutou com
ele (18). Nem explica como Jacob continuou a ser protegido por Deus,
LITERATURA APÓCRIFA.
romântica de Brentano.
549
A história de José e de Aseneth é completamente romantizada no
texto das visões da freira de Dülmen. Nelas aparecem
complicadas relações de parentesco muito similares às que
Brentano gostava de colocar em seus romances. Segundo Katharina
Emmerick, Aseneth era a filha que Dina tivera de Sichem. Como
José, ela teria sido vendida para o egípcio Putifar. Portanto,
era neta de Jacob e sobrinha de José. Mas este parentesco - como
nos romances de Brentano - lhes era desconhecido.
Ela cresceu no Egito e era considerada filha de Putifar, sacerdote
de Heliópolis. Katharina Emmerick diz que Aseneth foi autora
de muitos livros e que possuía muita sabedoria. Vivia ela
cercada por sete donzelas, pormenor extraído do apócrifo
citado. Evidentemente - isto era inevitável nos tempos do
romantismo - Katharina Emmerick diz que Aseneth era lindíssima.
Também era inevitável, para uma heroína de Brentano e da freira
de Dülmen, que Aseneth tivesse o dom da profecia e que,
sintomaticamente, como a Emmerick, tivesse um sinal na região
do estômago por meio do qual Jacob, mais tarde, a reconheceu
como sua neta. Aliás, José tinha o mesmo sinal sobre seu
estômago.
Katharina Emmerick relata que um anjo apareceu a Aseneth segurando
na mão uma flor de lótus e lhe pediu o mel que se encontrava
entre as imagens de seus ídolos. Todos estes pormenores se acham
também no apócrifo que a freira secretariada por Brentano não
leu, mas que talvez o poeta-secretário conhecesse.
O anjo abençoou então Aseneth e lhe disse que ela devia ser a noiva
de José e tornar-se um com ele, do mesmo modo que as f l o r e s
de lótus bóiam e se tornam um. A bênção que o anjo deu a
Por sua vez, teria sido José quem introduziu o arado no Egito
(22).
550
identificar Aseneth com Isis e José com Osíris, divindades adoradas
(21) Cfr. C.B. Tgb., apud A. BRIEGER, Der Gotteskreis, pp. 510 a 512.
551
"(...) Isis e Osíris, dois deuses do Egito, como e u
v i , n ã o s ã o o u t r a c o i s a s e n ã o A s e n e t h e J o sé" (23).
(23)"... Isis und Osiris, zwei Götter der Agypter, sind, wie ich
gesehen habe, nichts anderen als Aseneth und Joseph".
C.B., Tgb, apud A. BRIEGER, Der Gotteskreis, p. 512.
(24) "Joseph und Aseneth trugen wie der Götzenpriester Putiphar
ein heilig gehaltenes Zeichen der höchsten Gewalt, wenn sie dem
Volke sich zeigten, in der Hand. Der obere Tell dieses Zeichen
war ein Ring ,der untere ein lateinisches Kreuz, ein T. (...) Wenn
Joseph ein Amtsgeschäft hatte, lag das Zeichen, das Kreuz in den
Ring eingeschlagen, auf einem Teppiche neben ihm. Es schien mir
auch wie ein Abzeichen des noch in Joseph eingeschlossenen
Geheimnisses der Bundeslade".
A.K.E., Die Geheimnisse des Alten Bundes, p. 135.
552
(25) Cfr. FULCANELLI, Le mystère des cathédrales, p. 60.
553
Informa ainda a vidente de Dülmen, que José e Aseneth
foram mumificados e suas múmias sepultadas conservando em seu
interior o gérmen da bênção. Ao sair do Egito, Moisés teria se
apoderado do gérmen da bênção oculto na múmia de José e o teria posto
Testamento.
" J o s é e A s e n e th f o r a m p e s s o as s a n t a s p a r a os
egípcios e para os judeus (...) assim cada relí qu ia d ele s
era pa ra os eg í pci os co isa m u i to s ag ra da. Pa r a os eg íp ci os
ele s era m de u ses , dev i do a sua sabedoria, profecias e
milagres, e,por meio de sua união, foi realmente cumprida uma etapa
de um grande segredo da religião de todos os p o vos do A nt igo
Tes ta men to : a mis sã o d e pr e parar a estirpe do Messias em
carne, na terra.
554
O mistério dos filhos de Israel, no tempo dos Patriar cas,
s e m e n te , e, co m i sso , em Ab ra ão a ge raç ão e se u s
ins tr u mentos se tornaram a base da bênção de
Deus e do futuro Redentor. O que era para todos os
homens, por razões indizíveis, mas por toda
p a r te se mpr e m ais se nt ido co mo u m o bj eto d e
ver go n h a , u m a v i s o c h e i o d e m i s t é r i o de s ua
d e g r a d a ção pelo pecado origina l, tornou - se um
objeto d e t e m o r m a i s sa n t o , c o m o c a s a m en t o d os
P a t r i arcas, pela promessa da bênção e pela circuncisão. E
como não havia ainda nenhum santuário, n e n h u m a A r ca
d a A l i a n ç a , o P a t r i a r c a e ra o s a n tuár io po r
cau sa d a p ro me ssa nel e r ep ou sad a, e Abraão no
juramento de Eliezer deixou-o colocar a mão em seu quadril e
o enfermo Jacob voltou-se no seu leito e adorou o santuário em
José" (26).
(26) Joseph und Assenath waren den Ägyptiern und den, juden heilige Leute
gewesen (...) so waren einzelne Überreste v o n ihnen den
Egyptiern die Grössten Heiligthümer. Sie
waren den Egyptiern Götter durch ihre Weisheit. Weissa -
gung und Wunder, und es war durch ihre Vereinigung wirk -
lich ein Zeitpunkt des einen grossen Religions
Geheimnisses aller Völker des Alten Testamentes erfüllt,
nehmlich die Aufgabe das Geschlecht des Messias nach dem
Fleische auf Erden vorzubereiten. Der an die Patriarchen
von Gott und dann von Glied zu Glied an den Erstgebohrnen (67)
übergebene Segen, der heilige Keim des Saamens des Weibes
welcher der Schlange das Haupt zertreten sollte, war
Jakob, da er mit dem Engel rang genommen worden, und Jo
seph im Kerker in einem Gesichte übergehen. Dieses Geheimniss
war nach ihm, da Israel aus einer Familie ein Volk
555
geworden, nicht mehr. Übergabe von Vater auf Sohn, son -
dern es wurde mit Moses da das Volk eine Religion, eine
Bundeslade erhielt, das Heiligthum in dieser, vom Feuer Gottes
geschültzt, das Ehegeheimniss Patriarchen wurde
Kirchengeheimniss der Israeliten, denn das Volk war schon
mehr ein Leib geworden.
Auf der Zeugung einesheiligen Stammes des
Abraham erhielt von Gott eine heilige Zeugung und sie war
556
Esta longa citação parece-nos capital. Nela Katharina
Emmerick pela pena de Brentano nos diz, entre muitas divagações, que
tenha tido que fazer tantos cortes nos textos redigidos por Brenta-
das teorias cabalistas e que "o Zohar faz uso proeminente de símbolos
557
C.B., Tgb., apud J. ADAMS, Clemens Brentanos Emmerick - Erlebnis,
Bindung und Abenteuer, Verlag Herder, Freiburg, 1956, p.
344.
27) G.G. SCHOLEM, A mística judaica, pp. 228-229 e ss.
558
Outrossim, é típica da Gnose uma atitude ambígua face
o sexo e tudo o que tinha relação com ele. De outro, acabavam por
560
As visões redigidas por Brentano nos informam que:
(31) "In Joseph und Assenath erhob sich das Misterium der Zeu gung
zu einem höheren Grad seiner Würde und trat in der Bundeslade ein,
als Einheit der getrennten Geschlechter, denn dieses Mysterium
war die Wohnung Jehovas unter den Menschen der keines
einzelnen Geschleschtes ist, sondern der Schöpfer selb".
C.B., Tgb., apud J. ADAMS, op. cit., p. 344.
561
"(...) A entrada do monumento era coberta pela água do canal, debaixo
da ponte. Degraus conduziam desde a ponte até o nível da água. Ségola desceu
sozinha co m Mois és. Ela jogou um bilhe te com o nome de Deus na água que retrocedeu
deixando à mostra os degraus da escada até debaixo da ponte. Eles desceram e bateram
na pedra da entrada que se abriu para dentro. Então eles bateram na ponte e vieram
também quatro outros homens para baixo. Nesse momento, Moisés atou-os com a sua estola ,
e, desse modo, el es fizeram um juramento sagrado de manter o segredo (do que vissem).
Após o juramento, ele lhes desatou as mãos e todos foram à cripta para onde eles
levaram luz. Viram-se várias passagens ainda e, dentro delas, várias imagens de mortos.
metalicamente como ouro polido, por causa do facho de luz. Ele tinha uma cabeça
pequena, pequenos chifres, e, entre este s, havia ainda uma h aste peque na so bre
a qual havia uma coroazinha (falo). A vitela tinha sinais em ambos os lados.
de José en volto em vários tecidos e rígidas cordas. Havia uma incisão no lado (como
562
disse ela em outra ocasião). Faltava um par de costelas; o
coração e v ária s veias est avam como que envol tas em fios de
algodão. Mas o m istério s a n t o q u e e s t a v a n o c o r p o e r a o ú t e r o
d e Assen e t h , c u j a c o s t u r a f o i a b e r t a , e n e l e estava i n s e r i d a a
" h e i l i g e Z e u g u n g " - s a n t a procriaç ã o d e J o s é , e t u d o f o i d e i x a d o
a s s i m . A i n t r o dução não estava na direçã o opos t a, mas os vasos
d a b ê n ç ã o d e J o s é j a z i a m n o s o v á r i o s d e Assen e t h ( d e m o d o q u e
p a r e c i a i n d i c a r m a i s u m a u n i dade do que uma associação de dois
sexos).
563
Afinal a questão fica esclarecida. O que era
matéria que saíra de Deus e que era guardada na Arca da Aliança tinha
sexuais.
(32) (Cont.) Hörner und zwischen denselben noch einen kurzen Staab
worauf ein Krönchen (Phallus). Das Kalb hatte Zeichen an
heiden Seiten.
Sie hoben den Rücken dieses Rindes als
St o f f u n d s t e i f e Linnen gehüllt.
Es war ein Einschnitt an der Seite. (wie eine Bauchklappe sagt sie
ein andresmahl es fehlten ein paar Rippen, Herz und allerlei
Geäder waren wie in Baumwollfassern gehüllt. Das heilige Mysterium
aber lag in dem hohlen Leibe, es war der Uterus der Assenath, dessen
Nath geöffnet warden war, und in welchen man die Heilige
Zeugung Josephs eingelegt, und es wurde alles so gelassen.
Die Einlage war nicht in entgegengesetzter Richtung,
sondern die Gefasse des Segens Josephs lagen hei den Ovarien
der Assenath, (so dass es mehr auf eine Einheit als auf eine
Vereinigung zweier Geschlechter zu deuten schien).
Das Mysterium hatte äusserlich eine
564
eingewickelt und Segola erhielt es und trug es vor sich in
ihrem Gewand".
565
falo de José com os testículos não serão tirados de dentro"(33).
como a publicada pelo Pe. Schmoeger, nem no texto das visões de uma
Israel saiu do Egito, Moisés fez construir uma caixa de ouro em forma
566
Aliança feita em forma e medidas estabelecidas por Deus na revelação
do Sinai (34).
tábuas da Lei (36), assim como um livro da Lei (37), um vaso com maná
filisteus alguns objetos de ouro (39). Mas, no tempo dos reis, só havia
não havia senão as duas tábuas de pedra que Moisés tinha metido nela
Sacramento -
(34) Cfr. AKE - Die Geheimnisse des Alten Bundes, pp. 144-145.
(35) Ex., XXV, 10-17; XXXVII, 1-6; XL, 18.
(36) Deut., X, 1-6.
(37) Deut., XXXI, 24-27.
(38) Heb., IX, 4.
(39) I Reis, VI, 4-8.
(40) III Reis, VIII, 9.
567
ou para profetizar (41). O padre Schmoeger não deixou de publicar esses
pouco críticas.
568
(41) Cfr. A.K.E.,Die Geheimnisse des Alten Bundes, p. 146.
569
Vejo o mistério do sacrário como uma espécie de invóluc ro
com um conteúd o, um ser, uma força. Era pão
e vinho, carne e sangue. Era o gérmen da bê nç ão
ant es d o p ec ad o . E ra a ex is tê n cia s ac ra ment al
da reprodução antes do pecado e que foi
guardada para os homens na religião e que devia
tornar-se através da piedade uma estirpe o
quanto possível cada vez mais pura, ate chegar
a Maria, na qual devia completar -se, para
dar-nos o tão esperado Messias concebido pelo
Espírito San to (...).
(42 ) Ich erkannte die Lade des Bundes immer als eine Kirche und das
Heiligtum als den Altar mit dem heiligsten Sakrament, und so sah
ich dann das Gefäss mit Manna als die Lampe vor dem Altar
an.(...)und das Geheimnis in ihr war mir das, was bei uns das
heiligste Sakrament ist; nur war es mir nicht so gnadenvoll,
sondern streng und ernst; es machte mir einen mehr finstern,
schauerlichen Eindruck, aber doch einen sehr heiligen,
geheimnivollen. Es war mir immer als sei in der Bundeslade
alles, was heilig und all unser Heil sei in ihr wie in
einem Kräuel engewic kelt undd wie im Werden; das Heiligtum in
der Lade aber sei das Geheimste. Es schien mir die Grundlage des
heiligsten Altarsakramentes und dieses seine Erfüllung. Ich
kann es nicht aussprechen. Es war das Geheimnis so verborgen wie
Jesus bei uns im heiligsten Sakrament. Ich fühlte, dass
nur wenige Hohepriester wussten was es war, und dass nur die
Frommen aus ihnen auf höhere Erleuchtung es kannten und
gebrauchten. (...)
Ich sah das Geheimnis, das Heiligtum in einer
Form, in
einer Art Hülle als einen Inhalt, ein Wesen, eine
Kraft. Es war Brot und Wein, Fleish und Blut, es
war der Keim des Segens vor dem Sündenfall; es
war das sakramentalische Dasein der vorsündlichen
Fortpflanzung, welches den Menschen in der
Religion bewahrt wurde und ihnen durch
Frömmigkeit eine immer mehr sich reinigende
Stammlinie möglich machte, die in Maria endlich
570
vollendet wurde, um den lang ersehnten Messias
aus dem heiligen, Geiste zu empfangen.(...)
Abraham hatte es empfangen in jenen Segen, den
ich ihm als eine Sache, eine Wesenheit übergeben
sah".
571
Neste texto, os paralelos entre o gérmen da benção e
e para os católicos;
é hoje;
sangue.
Porém:
572
s a c r a m e n t a l d o D e u s v i v o e e r a c o m o a r a i z do
fut ur o sa cr if í cio do Red en to r , fe it a de tr i g o
e v i n ho , de c ar n e e d e s a n gu e " (43).
573
"Diz a Aarão, teu irmão, que ele não entre em
q u a l q u e r m o m e n t o no S a n t u á r i o ( . . . ) a f i m d e q u e
e l e n ã o m o r r a , porque eu a pare cerei n uma nuve m
sobre o Pro picia tó r i o ( L e v . X V I , 2 ) . D e u s f a l o u
c o m M o i s é s e n t r e dois querub in s (Ex. XXV , 22) .
Quando a Arc a foi l e v a d a n o n o v o t e m p l o d e S a l o m ã o ,
Deus aí ent r o u numa nuvem, de modo que os
s a c e r d o t e s n ã o p u d e r a m m a i s f i c a r l á , e Salomão
d i s s e : "O Senhor di sse que habitaria na nuvem" (II
Paralip. V I , 1 III Reis, VIII, 10-13).
C.B.- A.K.E., Leben der heilige Jung frau Maria, p.48, nota 1.
574
Nesses textos há duas coisas a discutir:
Testamento;
b. a questão da Schekhinah.
" N o e s t a d o d e i n o c ê n c i a , a n t e s d o p e c a d o , o s s a cramentos
não eram necessários. E a razão disso po de mos descobri -la
na retidão desse estado, em que o inferior, longe
de reger o superior era governado por este;
assim como a razão estava sujeita a Deus assim
lhe estavam sujeitas as potências inferiores da
alma; e à alma, o corpo. O r a , i r i a c o n t r a e s s a
o r d e m s e a a l m a s e a p e r feiçoasse, quer quanto
a ciência, quer quanto a graça , por algum meio
m a t e r i a l , como é o caso no s s acr am ent os . Po r
ond e, no es ta do de in ocê n cia o homem não
precisava de sacramentos, consi d e r a d o s e s t e s n ã o
s ó c o m o o r d e n a d o s a s e r e m r e mé di o c ont ra o pec ad o,
mas a in da en qu ant o or de nados à perfeição da
alma" (45).
575
Outra consideração a fazer é que, conforme Katharina
salvação são necessários para todos e por isso não podem ser mantidos
em segredo.
576
usarse esta designación de la presencia de Dios? Goldberg
dice no saberlo, y añade que la Misná n u n c a e m p l ea
e l t é r m i n o S eki n á , y q u e e s poco frecuente en
textos halákicos. Añade que el si l e n c i o d e l a
Misná n o p r u eb a q u e n o existiera e l t é r m i n o
antes de ella. Existió antes de la Misná pues los
tannaítas lo utilizaron.
E s p u r a f a n t a s i a a t r i b u i r a R . A q i b a s u i n v e n ción,
577
"Nas especulações gnósticas sobre os eons machos e
fêmeas, isto é, potências divinas, que constituem
o mundo do pleroma, a "plenitude" de Deus, este
pensamento assumiu uma forma nova, em que se tornou
conhecido aos cabalistas mais antigos por meio de
fragmentos dispersos. Os símiles em pregados no
livro Bahir para descrever a Schehiná são
extremamente reveladores neste aspecto.
Para alguns gnósticos a "sofia inferior", o último
eon sobre a orla do pleroma, representa a "filha da
luz" que cai no abismo da matéria. Em estreito
paralelo com esta idéia, a Schehiná, como a última
das Sefirot, torna-se a "filha" que, embora seu lar
seja a "forma da luz", deve vagar em terras
longínquas. Vários outros motivos ajudaram a
completar o quadro da Schehiná tal como esboçado no
Zohar; sobretudo, ela era agora identificada com a
"Comunidade de Israel", uma espécie de Igreja
Invisível, que representa a idéia mística de Israel
em seu vínculo com Deus em sua bem-aventurança, mas
também em seu sofrimento e exílio. Ela é não só a
Rainha, filha e noiva de Deus, mas também a mãe de
todo indivíduo em Israel" (48).
578
Como a Sofia gnóstica, a Schekhinah teria sido
(49) Cfr. G.G. SCHOLEM, A Cabala e seu simbolismo, p. 139. Cfr. ainda:
G.G. SCHOLEM, Kaballah, Keter Publ. House Jerusalem, Jerusalem, 1974,
p. 167.
(50) Cfr. G.G. SCHOLEM, A Cabala e seu simbolismo, pp.126-127.
579
Cabala uma concepção mágica da atuação da graça e dos sacramentos.
assim como das curas efetuadas por Jesus Cristo, como se pode
vida de Cristo.
580
Esse modo de atuação mágica fica bem claro quando se
de uma infusão feita com o gérmen da bênção para ser dada a certas
581
A concepção mágica que Katharina Emmerick tem do
gérmen da bênção torna-se ainda mais patente nas visões a respeito
do orvalho que o profeta Elias teria feito cair do céu, antecipando
a vinda do Messias.
para que não caia mais "nem orvalho, nem chuva", por causa do pecado
provocou não uma grande chuva, mas orvalho, e que nesse orvalho
Patriarcas. Diz ainda que esse orvalho caiu sobre os locais em que
582
Em nota ao pé da página, Brentano cita algumas obras
583
abençoados em que a nuvem tinha deixado cair
branco orvalho, h o u v e realmente cooperação para a
(56)
manifestação da Santa Virgem" . (Sobre Gênesis
XXVII, 28 comparar Zacharias IX, 17). Portanto não
há de que se espantar se, em escritos judaicos
posteriores, o Messias a p a r e ce como orvalho. No
Talmud (Taanith dist, Mainat h i m a s k i r i n ) d i z R a b b i
B e r a c h i a : ( . . . ) (citaçõ es de Os éias VI, 3 e XIV ,
4) (... ). A alu sã o a o M e s s i a s é m a i s c l a r a n o T a l m u d
de Jerusalém (tract. B'rachot c.5) quando ele
r e l a c i o n a c o m essa mesma idéia (do orvalho), o salmo
sobre o sacerdó ci o do Red entor .
(56) Ich sah aber in der Mitte des Sees sich einen weissen Wirbel bilden,
aus welchem ein schwarzes Wölkchen wie eine Faust hervorstieg, welches
sich öffnete und ausbreitete. - In diesem Wölkchen sah ich gleich anfangs
eine kleine leuchtende Gestalt, gleich einer Jungfrau. Ich sah
auch, dass Elias diese Gestalt in der sich ausbreitenden. Wolke
erblickte. Das Haupt dieser Jungfrau war mit Strahlen umgeben, sie
breitete ihre Arme wie ein Kreuz aus und hatte an der einen Hand einen
Siegeskranz hängen. Ihr langes Gewand war wie zugebunden unter
ihren Füssen. Sie erschien in der sich erweiternden Wolke wie über
das ganze gelobte Land ausgestreckt.
Ich sah, wie diese Wolke sich teilte und an bestimmten heiligen und
geheiligten Gegenden, und wo fromme und nach dem Heil flehende Menschen
wohnten, sich in weissen Tauwirbeln niederliess. Ich sah diese Wirbel
regenbogenfarbige Ränder erhalten und sich in deren Mitte den Segen wie
zu einer Perle in der Muschel vereinen. - Ich erhielt eine Erklärung,
dieses sei ein Vorbild, und aus diesen gesegneten Stellen, wo sich die
Wolke in weissen Wirbeln niedergelassen, sei wirklich die Mitwirkung
zur Erscheinung der heiligen Jungfrau hervorgegangen".
A.K.E., Leben der heilige Jungfrau Maria, pp. 59-60.
584
(citações d os salmos CX e CIX, 3) (...).
Lembramo-nos de ter lido num velho escrito
rabínico que o Messias devia s ubir do mar da
G a l i l é i a , m a s n ã o p o d e m o s , n e s s e mom ento, cita r
exatamen te a pas sagem, a qua l re produzir emos em
seu lu gar , qu ando a ti verm os en c o n t r a d o .
Encontramos, entretanto, num velho co mentário
j u d a i c o s o b r e o s s a l m o s ( M i d r a s c h T h i lim, f.4.
Light foot centur. chronogr. c. 70):
"Eu criei sete mares, diz Deus, mas eu escolhi
entre todos o de Genesareth" (57).
(57) "In seiner fortdauernden Gestalt ist dieser Regen die vermehrte
Mitteilung des heiligen Sakramentes, dessen Vorbild das Manna war, daher
bemerkt der alte hebräische Kommentar Breschithrabba zu der Stelle, wo
Isaak dem Jakob Tau vom Himmel als Segen verheisst (Parascha 65 in der
Ausgabe von Konstantinopel unter Soleiman), unter diesem Tau sei das
Manna wie unter dem (durch den Tau genährten) Weizen und Wein eine
Nachkommenschaft von Jünglingen und Jungfrauen zu verstehen (zu Gen.
27,28, Vgl. Zach 9,17). Demnach befremdet es nicht; wenn auch in späteren
judischen Schriften der Messias als Tau erscheint. In Talmud (Taanith.
dist. Maimathi maskirin) sagt R. Berachia:(...) Deutlicher ist die
Beziehung auf den Messias da, wo der Talmud (hierosol), tract.
b'rachoth.c.5) den Psalm von dem Priestertum des Erlösers auf auf diese
Idee hinführt (...) schwebt uns vor, in einer alten rabbinischen Schrift
gelesen zu habben, dass der Messias aus dem Galiläischen Meer
heraussteigen müsse, können aber zur Stunde die Stelle nicht bestimmt
nachweisen, welches wir uns jedoch bei Wiederauffindung an geeignetem
Ort vorbehalten. Gegenwärtig finden wir indessen (Midrasch
Thillim f. 41. Lightfoot centur, chronogr. c. 70) in einem alten
jüdischen Kommentar über die Psalmen: Sieben Meere habe ich geschaffen,
sagt Gott, aber aus allen diesen habe ich keines erwählt als das von
Genesareth".
A.K.E., Leben der heilige Jungfrau Maria, pp. 60-61, nota 1.
585
É curioso que Brentano faça tantas citações de velhos
isso não era preciso exibir tanta erudição rabínica. Tanto mais que
bênção caiu do céu com o orvalho sobre certas regiões habitadas por
586
Tive a percepção distinta que, sem esse orvalho, a v i n d a
da Santa Virgem teria sido adiada pelo menos por
u m s é c u l o , e n q u an t o q u e , c o m o conseqüência da melhora
e da bênção da terra, as raças que viviam do s fruto s
da ter ra fo ram t ambém r e s t a u r a d o s e r e a n i m a d o s , e
(58)
a c a r n e , recebendo a bênção, enobreceu" .
(58) Ich sah durch das Gebet des Elias zuerst den Segen als Tau
herabgerufen. Die Wolke senkte sich in weissen Flächen nieder, se
bildeten Wirbel, hatten regenbogenfarbige Ränder und den sich
endlich in Tropfen niederfallend auf. Ich erkannte darin auch
einen Bezug auf das Manna der Wüste, das lag aber morgens wie
Felle bröcklig und dicht, und sie konnten es aufrollen. Ich
sah diese Tauwirbel längs dem Jordan ziehen und nicht überall,
sondern nur hie und da an bedeutenden Stellen sicht niederlassen.
Besonders zu Ainon, gegenüber von Sallem, und auf den späteren
Taufstellen sah ich deutlich solche glänzende Wirbel
niedersinken. Ich fragte auch, was die bunten Ränder dieser
Tauwirbel bedeuteten, und erhielt eine Erklärung durch das
Beispiel einer Muschel im Meer, welche auch so schimmernde
Farbenränder habe und sich, der Sonne aussetzend, das Licht
an sich sauge und von Farben reinige, bis in ihrer Mitte die
weisse reine Perle entstehe. - Es wurde mir aber gezeigt, dass
dieser Tau und der nachfolgende Regen mehr sei als was man
unter einer Erfrischung der Erde zu verstehen pflegt.
Ich hatte das deutliche Verständnis, dass ohne diesen Tau die
Ankunft der heiligen Jungfrau um wohl hundert Jahre verspätet
worden wäre, indem durch die Besänftigung und Segnung der Erde,
die Geschlechter, von Früchten der Erde lebend, auch genährt und
erquickt wurden, und das Fleisch den Segen empfangend sich auch
veredelte".
C.B.-AKE-Leben der heilige Jungfrau Maria, p. 63.
587
Temos conhecimento de uma concepção semelhante a
588
Resumindo o que vimos neste capítulo temos:
CAPÍTULO VIII
0 GÉRMEN DA BÊNÇÃO, A IMACULADA CONCEIÇÃO DA VIRGEM MARIA E A
ENCARNAÇÃO DO VERBO
577
1. INTRODUÇÃO
concepções esotéricas e com pormenores que infalivelmente tem por fonte obras
de caráter cabalista: toda vez que as visões de Katharina Emmerick divergem das
consistiu num ato sexual, tendo Adão renunciado à concepção pela palavra.
578
Historiamos a seguir o que a freira de Dülmen relata sobre o gérmen
da bênção. Veremos agora que essa lenda tem origem cabalista-cristã, e como, por
Encarnação do Verbo.
guardado na Arca da Aliança durante muito tempo. Sabe-se pela Bíblia que pouco
ocultou a Arca da Aliança numa caverna do monte Nebo (1). Conforme a freira alemã,
regra comum, como se fossem uma ordem religiosa, a partir da época de Isaías
e Jeremias (2).
579
É evidente que essas afirmações carecem de qualquer valor
histórico. No século passado, as fontes históricas sobre os essênios
limitavam-se a Filo de Alexandria, Plínio, o jovem, e principalmente a Flávio
Josefo, que foi "noviço" na comunidade essênia. As descobertas dos chamados
Manuscritos do mar Morto lançou nova luz sobre esse grupo religioso judaico
(3).
à distância" ( 4 ) .
(3) Cfr. MYLLOR BURROWS, The Dead Sea scrells, Viking Press, New York,
1956.
(4) "Ich sah überhaupt, dass sie mit Heilung beschäftigen. Sie
580
Como se vê, os essênios faziam exatamente o mesmo que o Pe.
Limberg com Katharina Emmerick, ao se deitar sobre ela para soprar em sua
boca o hálito da vida. E, como os românticos da época de Brentano, os essênios
também viviam à cata de ervas medicinais. A missão principal dos essênios
consistia então, segundo a vidente, em preparar a linhagem do Messias. Diz
ela ainda que depois que a Arca da Aliança se perdeu nas mãos dos inimigos
de Israel, os essênios tinham ficado de posse do gérmen da bênção, que eles
guardavam num altar junto com outras relíquias.
"Havia a i n d a o u t r a c o i s a s a g r a d a e m p o d e r d o s
essênios do mon te Hor eb, na gr uta de El ias, a
saber, uma parte do próprio santo Mistério da Arca
da Aliança que ficou em poder dos essênios quando,
certa vez, a Arca caiu em poder dos inimigos. (Aqui
ela falou vagamente de uma dispu ta, de uma cisão
entre os levitas). Estes, com temor de Deus,
ocultavam o Mistério sagrado na Arca da Aliança,
mistério que era conhecido
(4) (Cont.) sammelten Kräuter und bereiteten Tränke. Ich sah jetzt
auch, dass jene heiligen Leute, von welchen ich vor einiger Zeit
gesehen habe, dass sie kranke Menschen auf eine Streu von
Heilkräutern betteten, Essener waren. Ich sah auch, dass die Essener
Kranke durch Handauflegung heilten oder auch, indem sie sich mit
ausgebreiteten Armen ganz über sie hinstreckten. Auch sah ich sie in die
Entfernung auf eine wunderbare Weise heilen, indem sie Kranken,
welche nicht selbst kommem konnten, einen Stellvertreter
sendeten, an welchem alles geschah, was man an dem Kranken getan
haben würde. Man merkte sich die Stunde, und der ferne Kranke war zur selben Zeit
genesen".
C.B. - A.K.E. - Leben der heilige Jungfrau Maria, pp. 17-18.
581
apenas pelo mais santo dos sumos sacerdotes e por
alguns profetas. Contudo, penso que havia
conhecimento disso em pelo menos alguns conhecidos,
misteriosos, velhos e profundos livros judeus.
(Aqui Brentano põe uma nota que citaremos mais
adiante).
------------------------
(5) Es war aber auch noch ein anderes Heiligtum im Besitze der Essener auf
Horeb in der Höhle des Elias, and zwar ein Teil des eigentlichen heiligsten
Geheimnisses der Bundeslade, das in den Besitz der Essener gekommen, als
die Lade einmal in die Hände der Feinde fiel. (Sie sprach hierbei
unbestimmt von einem Streit, einer Spaltung unter den Leviten).Dieses mit
dem Schrecken Gottes in der Bundeslade verüllte Heiligtum kannten nur die
Heiligsten der: Hohenprister und einige Propheten. Ich meine jedoch, er-
kannt zu haben, es sei einiges davon in nur wenig bekannten geheimnisvollen
Büchern alter tiefsinniger Juden erwähnt.
582
E, na nota a que nos referimos, Brentano diz:
E cremos que isso é intencional. Brentano não dá o nome do filólogo que lhe
falou do
(5) (Cont.) - Es war nicht mehr vollkommen in der neuen Bundeslade des
von Herodes hergestellten Tempels. Es war kein Werk von
Menschenhänden bereitet, es war ein Mysterium, ein heiligstes
Geheimnis des göttlichen Segens zur Ankunft der heiligen Jungfrau voll
der Gnade, aus welcher durch Überschattung des heiligen Geistes das
Wort Fleich angenommen hat und Gott Mensch geworden ist. – ich sah einen
Teil dieses Heiligtums, das vor der Babylonischen Gefangenschaft ganz
in der Bundeslade gewesen, jetzt hier bei den Essenern in einem braunen
glänzenden Kelch, der mir wie aus einem Edelstein schien, bewahrt.
Auch aus diesem Heiligtume weissagten sie. Es schien manchmal wie
kleine Blüten zu treiben.
C.B. - A.K.E. - Leben der heilige Jungfrau Maria, p. 24.
(6) Im Juli 1840, etwa 20 Jahre nach dieser Mitteilung, als sie zum Druck
geordnet ward, erfuhr der Schreiber von einem Sprechkundigen, das
kabbalistische Buch Sohar enthalte manches hierauf Bezügliche.
C.B. - A.K.E. - Leben der heilige Jungfrau Maria, p. 24, nota 1.
583
Zohar, mas é praticamente certo que tenha sido. Daniel Bonifaz Hanne-
berg, futuro Bispo de Speier, monge beneditino, grande conhecedor de
questões exegéticas e de literatura judaica, a quem Brentano, ao
morrer, confiou seus documentos manuscritos. Com essa informação o
poeta nos informa também que, pelo menos nesse tempo, ele dizia não
conhecer o Zohar. Brentano não dá a indicação do ponto em que o
Zohar trataria do gérmen da bênção, o que é lamentável. Como já
dissemos, não encontramos no Zohar qualquer passagem que direta ou
indiretamente possa se referir ao gérmen da bênção. Outras citações
que serão feitas sobre esse tema serão igualmente imprecisas. Não
existe no rol dos livros da biblioteca de Brentano nenhum exemplar do
Zohar. Mas, considerando a mentalidade do poeta, cremos que, se ele
tivesse conhecimento direto do Zohar, ele não deixaria de dizê-lo,
embora fosse também próprio de seu caráter psicológico o despistamento
das suas fontes. De qualquer modo, pela primeira vez, temos uma
indicação do poeta sobre a origem do mito do gérmen da bênção: a fonte
de Brentano era cabalista, e ele julgava, ou queria que se pensasse,
que essa fonte era o Zohar.
(7) Cfr. C.B.- A.K.E. - Leben der heilige Jungfrau Maria, p. 21.
584
árvore genealógica do Messias - uma árvore de Jessé - não em forma gráfica, mas em
forma viva! Uma árvore genealógica que crescia por ter raízes na terra, e que, como
frutos, produzia pequenas figuras humanas, pelas quais os essênios viam quais eram
as pessoas que deviam se casar para formar a linhagem messiânica.
(8) "In der Mitte zwischen diesen kleinen Kräuterbuschen sah ich etwas
wie ein höheres Bäumchen, die Blätter kamen mir gelblich and wie ein
Schneckenhäuschen gedreht vor. Es erschienen mir auf diesem Bäumchen wie
kleine Figürchen. Ich vermag jetzt nicht gewiss zu sagen, ob dies Bäumchen
lebendig oder ein gemachtes Kunstwerk gleich einer Wurzel Jesse
war. - (Am folgenden Tage sagte sie): An diesem Bäumchen mit den
gedrehten Blättern war gleichwie an einer Wurzel Jesse oder einem
Stammbaume zu sehen, wie weit die Herannahung der heiligen Jungfrau
schon fortgeschriten war. Es erschien mir wie lebendig und doch auch
wie ein Behälter, denn ich sah einen blühenden Zweig, ich glaube, den
Stab Aarons darin bewahrt, der ehemals in der Bundeslade gewesen".
C.B. - A.K.E. - Leben der heilige Jungfrau Maria, ed.cit., p. 23.
585
3. SANT'ANA S. JOAQUIM E O GÉRMEN DA BÊNÇÃO
(9) Cfr. C.B. - A.K.E. - Leben der heilige Jungfrau Maria, p. 29.
(10)Cfr. CB – AKE - Leben der heilige Jungfrau Maria, p. 27.
(11) Cfr. CB - AKE - Leben der heiliqe Jungfrau Maria, p. 30-31.
586
Ora, ocorre que esse relato repete de modo praticamente textual o
que se lê no apócrifo Evangelho do Pseudo Mateus (I , 1-2), no Evangelho da Natividade de
Maria (I-2), no Proto Evangelho de S. Tiago (I-1) (12).
(12) Cfr. Mario Erbett - "Gli apocrifi del Nuovo Testamento" Marietti
Casale, 1981, Vol. I/2.
(13) Cfr. C.B. - AKE - Leben der heilige Jungfrau Maria, p. 34-39.
(14) C.B. - AKE - Leben der heilige Jungfrau Maria, pp.31-32.
(15) C.B. - AKE - Leben der heilige Jungfrau Maria, p. 38.
(16) C.B. - AKE - Leben der heilige Jungfrau Maria, p. 38.
(17) Cfr. M. ERBETTA, o p . c i t . , pp. 20-48.
(18) Cfr. M. ERBETTA, op. cit., p. 73.
(19) Cfr. M . ER BETT A , op. cit. , p. 48.
587
São idênticos também os relatos de como Sta. Ana se vestiu de modo especial e foi
rezar sob a árvore que havia em seu jardim, onde lhe apareceu um anjo ordenando-lhe
que fosse ao Templo encontrar - se com seu marido na porta dourada, avisando-a de
que deles is nascer uma criança(20), e de como o anjo apareceu também a S. Joaquim
dando-lhe a mesma ordem, tudo exatamente como se encontra no Proto Evangelho de S.
Tiago (IV, 2), no Evangelho do Pseudo-Mateus (III, 2), e no livro da Natividade de
Maria (III 1 e 111-4) (21).
"O anjo lhe disse que sua esterilidade não era uma
vergonha para ele, mas uma honra, pois o que sua mulher
ia conceber através dele deveria ser o fruto
imaculado da bênção de Deus, devia ser o coroamento
(23) .
da bênção de Abraão" Então, o anjo retirou da Arca
da Aliança um globo luminoso e ordenou que Joaquim
soprasse e olhasse para dentro dele. Quando ele
(24) :
soprou apareceram imagens no globo
588
"(...) e o anjo lhe disse que do mesmo modo que o globo permaneceu
Viu ainda
"(...) como a bênção passou para José quando ele foi para
o Egito e nele e em sua mulher chegou a um mais alto grau
de dignidade. Depois como por meio de Moisés, o Santuário
da bênção foi levado do Egito com as relíquias de José e
de Aseneth, sua esposa, e se tornou o Santíssimo da Arca
(26)
da Aliança, a sede do Deus vivo em meio a seu povo ;
para o desenvolvimento da santa linhagem, a estirpe da
Santa Virgem e de todos os seus e do Salvador profetizado
e simbolizado na História e nos profetas".
(25) Cfr. C.B. – A.K.E. – Leben der heilige Jungfrau Maria, p. 44-45.
(26) "(...) hierauf wie der segen an Joseph in Ägypten kam und in ihm
und seinem Weibe in einen höheren Grad der Würde trat, dann wie mit
Reliquien Josephs und Asnaths, seines Weibes durch Moses das Heiligtum des
Segens aus Ägypten entführt, das Allerheiligste der Bundeslade, der Sitz des
lebendigen Gottes unter seinem Volke ward; dann den Dienst und Wandel des Volkes
Gottes um das Heiligtum, die Führungen und Verbindungen zur Entwicklung des
heiligen Geschlechtes, des Stammes der heiligen Jungfrau
589
A visão prossegue dando o histórico do gérmen da bênção por meio de
figuras simbólicas e mostrando uma luta entre o bem e o mal, entre anjos e demônios.
Nesse ponto, Katharina Emmerick faz certas afirmações sobre os efeitos do gérmen da
bênção que têm forte conotação gnóstica e racista. Assim, por efeito do gérmen da
bênção, os homens ficavam divididos em dois grupos ou raças, os divinizados e os
impuros, sendo que, pouco a pouco, os elementos dispersos do sangue puro iam se
reunindo até formar a Virgem Maria:
(26) (cont.) und alle ihre und des Heilands orbilder und Sinnbilder in der Geschichte
und den Propheten.
C.B.- A.K.E. - Leben der heilige Jungfrau Maria - p. 45.
(27) "Es war, als sei ein reines Fieisch, ein reinstes Blut durch das Erbarmen
Gottes in die Menschheit wie in einen getrübten Strom gegeben und müsse mit
grosser Mühseligkeit und Arbeit sich aus seinen zerstreuten Elementen
wiederfinden, während der ganze Strom es an sich zu reissen und zu trüben
strebte, und endlich habe es sich durch unzählige Gnaden Gottes und treue
Mitwirkungen der Menschen nach vielen Trübungen und Reinigungen in dem sich
immer neu ergiessenden Strome gefunden und steige nun als die heilige Jungfrau
aus dem Strome hervor, aus welcher das Wort Fleisch geworden ist und unter uns
gewohnt hat". C.B. - AKE - Leben der heilige Jungfrau Maria, pp. 45-46.
590
É impossível não ver nessa citação a prova de uma concepção
naturalista da Graça, que acabaria se manifestando de um modo praticamente biológico.
Racismo e Gnose se deduziriam fácil e diretamente dessa concepção.
(28) "Ich sah nun, dass der Engel die Stirne Joachims mit der Spitze
seines Daumens und Zeigefingers bezeichnete oder salbte, und dass
er ihm einen leuchtenden Bissen zu essen und eine lichte Flüssigkeit
aus einen schimmernden Becherchen zu trinken gab, das er mit zwei
Fingern fasste. Es war von der Gestalt des Abendmahlkelches,
jedoch ohne Fuss. Diese Speisung erschien mir auch, als gebe er ihm
eine kleine lichte Weizenähre und ein Lichtträubchen in den Mund, und ich
erkanntem dass hierauf alle
É preciso notar que Katharina Emmerick, usando os símbolos do trigo
e do vinho, relaciona mais uma vez, o gérmen da bênção com a eucaristia. Além disso,
como já vimos, a espiga luminosa que daria uma fecundidade santa e pura a Joaquim,
isso, segundo Katharina Emmerick, preparava Joaquim para receber o gérmen da bênção,
591
tornando-o capaz de gerar imaculadamente a Virgem Maria. O anjo entrega então a Joaquim
o gérmen da bênção:
(28) (cont.) sündliche Lust und Unreinheit von Joachim verschwunden sei". C.B. AKE -
Leben der heilige Jungfrau Maria, p.47.
(29) Cfr. W. HÜMPFNER, op. cit., p. 245.
(30) "Ich sah hierauf, dass der Engel den Joachim des höchsten Gipfels, der
heiligsten Blüte jenes Segens teilhafting machte, den Gott dem Abraham
gegeben and der endlich aus Joseph das Heiligtum der Bundeslade, der Sitz
Gottes unter seinem Volke geworden war; er gab dem Joachim diesen Segen,
in derselben Weise, wie mir bei anderer Gelegenheit gezeigt ward, dass
Abraham durch einen Engel den Segen empfing, nur mit der Abweichung, dass der segnende
Engel bei Abraham den Segen aus sich selbst, gleichsam aus seiner Brust, bei Joachim aber
aus dem Allerheiligsten zu nehmen schien" .
C.B. - AKE - Leben der heilige Jungfrau Maria, p. 47.
592
Nesse ponto de novo, Katharina Emmerick descreve o gérmen da
bênção como sendo algo material, com nítida simbologia sexual, e que lembra o
conhecido símbolo gnóstico oriental do Ying e Yang, que se movem dentro de um
círculo como que buscando interpenetrar-se:
(31) "In der Bundeslade Moses, die in der Stiftshütte und im Tempel
Salomons gestanden, sah ich dieses Heiligste des Alten Bundes unter der Form
zweier rich durchdringenden, kleineren Lichgestalten innerhalb eines
leuchtenden Umfanges; jetz aber, als der Engel den Joachim dieses Segens
teilhaftig machte, sah ich diesen Segen, als gebe der Engel etwas Leuchtendes,
gleich einem leuchtenden Pflanzenkeim, von der Form einer leuchtenden Bohne
in das vor der Brust geöffnete Gewand Joachims. (...)
Mir ward eröffnet, dass Joachim in diesen Segen die höchste Frucht un die
eigentliche Erfüllung des Segens Abrahams, den Segen zur unbefleckten
Empfängnis der allerseligsten Jungfrau empfing, welche der Schlange das Haupt
zertrat".
C.B - A.K.E. Leben der heilige Jungfrau Maria, p. 49.
593
fosse, imaculada não seria a Virgem, mas o ato gerador de Joaquim e Ana. Vejamos
então como foi esse ato. Aqui, Katharina Emmerick urde toda uma série de episódios
até fazer Joaquim e Ana se encontrarem nos subterrâneos do Templo, junto à Porta
Durada. Joaquim deteve-se junto a uma coluna feita como uma palmeira da qual
594
havido o pecado original" (32).
conceberam Maria por meio de um ato normal. Como Katharina Emmerick diz que essa
concepção se deu como seria senão tivesse havido pecado original, e como ela afirmou
que sem o pecado a concepção seria por meio da palavra, deve-se concluir que a geração
de Maria foi obtida pela palavra. Assim se explica que o anjo tenha dito a Joaquim
que como seu hálito não embaçara o globo de luz, também a concepção da Virgem não
"embaçaria" Sta. Ana.
(32) "Sie umarmten sich in heiliger Freude und teilten sich ihr Glück mit.
Sie waren entzückt und von einer Lichtwolke umgeben. - Ich sah dieses Licht von einer
grossen Schar von Elgeln ausgehen, welche die Erscheinung eines hohen
leuchtenden Turmes tragend, über Anna und Joachim niederschwebten. -
Dieser Turm war, wie ich in Bildern aus der lauretanischen Litanei den
Turm Davide, den elfenbeinernen Turm usw gestaltet sehe.
Ich sah, als verschwinde dieser Turm zwischen Anna und Joachim, und es umgab sie
Ich erkannte hierauf, infolge der hier gegebenen Gnade sei die Empfängnis Maria
so rein geworden, wie alle Empfängnis ohne den Sündenfall gewesen sein würde ".
595
4. UMA NOTA IMPORTANTÍSSIMA
cronológica":
"Foi com esta e por esta bênção que Eva foi tirada
do flanco direito de Adão. Uma bênção que pe la
misericordiosa providência de Deus foi retirada de
Adão na hora em que ele estava para consentir no
pecado.
do Povo".
596
Não fora sem escrúpulo e sem inquietação que redigíramos
estas explicações da serva de Deus, com o fim de imprimí-las,
quando soubemos que no livro Zohar (redigido por Simon Bar
Jochai no segundo século da era cristã mas que contém partes
mais antigas) se acha, quase que palavra por palavra,o que ela
diz aqui e em outras numerosas comunicações sobre este Mistério
da Antiga Aliança. Um leitor familiarizado com a antiga língua
caldaica pode se convencer disso lendo as seguintes
passagens: Zohar Par Told ' oth, p. 340; ibid. 345 (Ausg.
(34)
Salzbach) B'reschit, p.135, T'rumah, p. 251, etc." .
Brentano afirma ter tido escrúpulos de publicar as comunicações
da freira de Dülmen sobre o "gérmen da bênção", pois se o gérmen da bênção tivesse
realmente existido, dele teria se formado o corpo da Virgem assim como o de Cristo, o
que teria gravíssimas conseqüências teológicas. Por exemplo, a matéria dos corpos da
Virgem Maria e de Cristo saíra de Deus, e teria estado na Arca da Aliança. Daí Brentano
afirmar prudentemente que as contemplações de Katharina Emmerick são parcialmente
históricas, parcialmente simbólicas, sem precisar os limites entre o
597
histórico e o simbólico.
Para dar sustentação às afirmações de Katharina Emmerick, Brentano
se socorre então de um texto a que atribui grande antiguidade e autoridade:o
Sefer-ha-Zohar, do qual cita as páginas do volume que tinha à mão, sem mencionar os
capítulos e páginas, como é costume fazer, do Toldot, Bereshit, Trumah. Além disso,
percorremos o Zohar atentamente e nada encontramos que lembre sequer vagamente o que
se diz nas visões de Katharina Emmerick sobre o gérmen da bênção.
Concluímos dai:
598
devia esmagar a cabeça da serpente..."
(35) Cfr. C.B. – A.K.E. – Leben der heilige Jungfrau Maria, p. 83,
nota 1.
(36) Cfr. B. GAJEK "Clemens and Cristian Brentanos Bibliotheken" Carl Winter
Universitäts Verlag, Heidelberg 1974, nº 122.
599
pecado, da qual, levada por geração até Maria,
nasceria Jesus. (Fabrici Cod. Pseudepigr. Vet.
Testans, p. 77).
Brentano tinha porem a própria obra de Galatino em sua biblioteca.
Lá se lê no livro 7, cap. 3:
"Na opinião de certos antigos judeus, a mãe do Messias foi criada desde o início e antes
dos séculos, não apenas na mente de Deus, mas até mesmo a matéria dela foi
produzida na matéria de Adão e, quando o mundo foi criado pelo
amor dele, a pr im itiva mã e do gl o rioso Me ssias já
existia. Pois quando Deus plasmou Adão, fez co mo que
uma massa, de cuja parte mais nobre fez a matéria da
intemerata mãe do Messias, e, de seu resíduo e de sua
superfluidade, formou Adão. Desta matéria, pois, da
imaculada mãe do Messias foi feita uma virtude que foi
conservada num membro corpóreo de Adão, no mais nobre
local. Posteriormente essa virtude foi emanada para
Seth, depois para Enos, e depois em ordem sucessiva para
os outros até S. Joaquim. Finalm e n t e , d e s t a v i r t u d e f o i
f o r m a d a a b e a t í s s i m a mãe do Messias..." Galatino
prossegue: "desta opinião se conclui certa e
claramente que a carne da gloriosa mãe do Messias não
foi infectada pelo pecado original..."
600
Galatino trata em todo o livro VII do De Arcanis da mãe do
Messias. Procura demonstrar que o texto de Isaías que diz: "antes que fosse feito
o tempo eu já existia" (38), prova não só a eternidade da natureza do Messias, como
se afirma normalmente, mas também a eternidade da matéria de que foram formados
os corpos de Cristo e de sua Mãe. Galatino utiliza textos hebraicos antigos para
fundamentar a crença na Imaculada Conceição:
(37) "... Der an die Patriarchen von Gott und dann von zu Glied an den
Erstgeborenen übergebene Segen, der heilige Keim des Samens des
Weibes, welcher der Schlange das Haupt zertreten sollte..." die folgende
Bemerkung: "Seltsam bezieht sich auf ihre Gesichte von Überlieferung eines
körperlichen Segens an die Patriarchen und dessen Niederlegen in
die Bundeslade, was Galatinus I, VII de arcanis Cath. Verit. sagt:
Materiam tes Theotokos ab initio fuisse translatam. Andre sollen
behauptet haben: in Adamo legem Dei transgresso divina sic
dirigente providerstia segregem a contagio massam esse
conservatam, ex qua ad Mariam usque propagine traducta, natus sit
Jesus. Fabrici Cod. Pseudepigr. Vet. Testam. p. 77". Br. hatte a-
ber das Werk des Galatinus selbst in seiner Bibliothek. Da heisst
es lib. 7, cap. 3: "Opinio quorundam veterum Judaeorum fuit matrem
Messiae non solum in mente Dei ab initio et ante saecula creatam
fuisse, verum etiam materiam eius in materia Adae fuisse
productam., ipsam que gloriosae Messiae matrem pricipalem
extitisse cum eius amore mundus creatus sit. Nam cum Deus Adam
plasmaret, fecit quasi massam, ex cuius parte nobibiore accepit
intemeratae matris Messiae materiam, ex residuo vero eius et
superfluitate Adam formavit. Ex materia autem immaculatae matris
Messiae facta est virtus, quae in nobiliore loco et membro
corporeo Adae conservata fuit. Quae postea emanavit ad Seth,
deinde ad Enos, deinde succedaneo ordine ad reliquos usque ad
Sanctum Ichoiakim (Joachim). Ex hac demum virtute beatissima mater
Messiae formata fuit..." Galatinus folgert: "Ex qua quidem
opinione aperte concluditur, carnem gloriosae matris Messiae non
fuisse peccato originali infectam...".
W. HUMPFNER - Glauwürdigkeit, pp. 242-243.
(38) I s . X L V I I I , 1 6 .
601
"Nós, porém, seguindo a verdade hebraica aceitamos
602
Galatino argumenta dizendo que a expressão "factus est" (foi
feito) não se pode referir a divindade de Cristo, que não foi feita nem criada. Também
não se pode referir à humanidade de Cristo, que começou a existir após a de João
Batista. Portanto, diz ele, só pode ser aplicada à Virgem Maria.
E prossegue:
Segundo Galatino, este "primeiro homem" não pode ser Adão, causa da
desgraça de todos, mas ê Maria, que não teve pecado original" (42).
603
Galatino prossegue sua demonstração narrando o comentário de
Rabi Moisés Hadasan sobre o Gênesis:
604
Galatino comenta que o homem, de que fala esse texto, não pode
ser Adão, de fato inferior aos anjos. Segundo ele, trata-se certamente da matéria
que estava em Adão e da qual seriam feitos os corpos de Maria e de Jesus.
Daí, ele buscar uma explicação mais "pura" para a geração dos
santos do Antigo Testamento e, principalmente, para a concepção Imaculada de Maria
e de Cristo.
(43) (Cont.) Domine mundi tu creasti nos ex claritate gloriae tuae, et nunc
imperas nobis ut inclinemur homini quem ex terra formasti? Respondit
et Deus sanctus et benedictus. In hoc homine qui ex pulvere terrae
creatus est, plus sapientiae et intelligentiae est quam in te. Videns autem
Deus sanctus et benedictus sathanam cum sua secta nolle flecti, nec obedire
huic homini, illum et coelo expulit, et effectus est diabolus. Et idcirco
dixit Isaias quarto decimo cap. Quomodo cecidisti lucifer de coelo, quae
mane oriebaris? Haec tradition."
Petrus Galatinus op. cit., VII 4 ff CCI verso CCII verso -CCII
recto, apud Anna MORISI, op. cit., p. 226.
(44) Cfr. cap. II d e st a t e s e .
605
A lenda judaica da matéria preservada em Adão, narrada por Galatino,
com os dogmas católicos mais fundamentais, pois, com efeito, ela os contraria nos
seguintes pontos:
606
série, já que os três primeiros são tão evidentemente contrários à doutrina
607
Ora, Katharina Emmerick já havia dito que, se não fosse o pecado
original, a concepção humana se daria através da palavra e não sexualmente.
Conclui-se, portanto, que a Virgem Maria teria sido concebida através da palavra
"sem impureza”,
(46) "Ich höre oft, wie die heilige Jungfrau den vertrauten Frauen, zum
Beispiel der Johanna Chusa und der Susanna von Jerusalem, allerlei Geheimnisse
von sich und unserem Herrn erzählt, die sie teils aus innerer Erkenntnis, teils
aus den Mitteilungen der heiligen Mutter Anna Weiss (...) Sie erzählte ihn en auch,
dass Joachim und Anna sich in der Halle unter der goldenen Pforte in einer
goldenen Stunde begegnet seien; und hier sei jene Fülle der göttlichen Gnade
zu ihnen gelangt, in deren Folge sie allein durch heiligen Gehorsam und reine
Gottesliebe ohne alle Unlauterkeit ihrer Eltern das Dasein unter dem Herzen
ihrer Mutter empfangen habe. Sie gab ihnen auch zu erkennen, dass ohne den
Sündenfall die Empfägnis aller Menschen ebenso rein gewesen sein würde".
608
isto é, não por via sexual. Para a vidente de Dülmen a união sexual era
intrinsecamente má. E isto a caracteriza como gnóstica.
1. que ela só foi criada por Deus cerca de quatro meses após
a concepção;
2. que essa alma foi mais emanada por Deus de sua própria
substância do que criada por
Ele, confirmando-se assim a concepção gnóstica da vidente
quanto às relações entre o criador e as criaturas:
(47)"... sah ich Joachim und Anna von einer Menge von Engeln mit himmlischem
Lichte umgeben, sie selbst leuchteten und waren rein wie Geister in einem
übernatürlichen Zustande, wie nie vor ihnen ein Menschenpaar gewesen"
609
"Eu tive uma visão da criação da santíssima
alma de Maria e de sua união com o seu puríssimo
corpo.
Vi também que Deus mostrou aos anjos a beleza dessa alma, e que eles
experimentaram uma alegria inexprimível por causa de sua
beleza. Não posso descrever com palavras tudo o que vi e
entendi.
610
Eu vi que foi nesse momento que a criancinha, pela primeira vez, se moveu sob
o coração dela.
Fui informada que a alma da santa Virgem ani mou o seu corpo cinco
dias antes que as outras crianças e que ele nasceu 12
dias antes que o normal".( 4 8 )
-----------------------------
(48) “Ich hatte eine Betrachtung von der Schöpfung der heigsten
Seele Mariä u n d d e r e n V e r e i n i g u n g m i t i h rem
reinsten Leibe.
Ich sah in dem Lichtbilde, unter welchem mir
gewöhnlich die allerheiligste Dreifaltigkeit in
meinen Betrachtungen vorgestellt wird, ein
Bewegung gleich einem grossen leuchtenden Berg und
doch auch wie die Gestalt eines Menschen, und ich
sah etwas aus der Mitte dieser Menschengestalt gegen
d e r e n M u n d a u f s t e i g e n u n d w i e e i n e n Glanz a u s d i e s e m
a u s g e h e n - D i e s e n G l a n z s a h i c h n u n ausges o n d e r t v o r
dem Angesichte Gottes stehen und sich drehen und
bilden oder vielmehr gebildet werden, denn,
611
Não trataremos do que é hoje sabidamente falso nesse
texto, como julgar que o primeiro movimento sensível do feto aos quatro
meses de gestação seja também o seu primeiro movimento real. Ho j e ,
há fotos, comprovando que, já: na oitava semana
612
de gestação, o feto é capaz de segurar um objeto posto na palma de sua mão, e sabe-se
que ele nada livremente no líquido amniótico. Parece-nos bem mais importante a
afirmação de que a criança só recebe a alma quatro meses após a concepção, pelas
Com efeito, os teólogos discutem em que momento a alma criada por Deus se une
concepção, como em geral era admitido pelos Padres da Igreja, mas posteriormente,
infusão da alma se desse aos quarenta dias de gestação para os meninos, e aos
tendência é para afirmar que, sendo o feto um ser vivo capaz de substituir suas
células degeneradas por outras, e totalmente distinto dos pais, tendo bagagem
dá no momento da fecundação.
613
de que alma da Virgem só foi criada quatro meses após sua concepção, é dificilmente
sustentável. Com efeito, o dogma proclamado por Pio IX afirma que "a Bem-aventurada,
Virgem Maria, no primeiro instante de sua concepção, foi preservada de toda mancha
de pecado original..." (51).
geração, que tipo de ser era aquele, matéria humana sem alma? Não tendo alma, aquele
feto era apenas uma matéria vivificada por Sta. Ana, uma excrescência de seu
corpo. Ora, como Sta. Ana tinha pecado original, de alguma forma a matéria
componente da Virgem Maria teria estado sob o efeito do pecado. Isto contraria
o dogma como foi expresso, mais tarde, por Pio IX. É mais uma discordância entre
as visões da estigmatizada de Dülmen e a religião que ela professava oficialmente.
614
Em certo sentido, porém, isso é secundário. Para nossa tese importa mais
o fato de que na concepção de Brentano e de sua vidente o que foi imaculado foi o ato gerador
imaculada do ato gerador de Maria, mãe de Jesus, é conseqüência de sua concepção sexual
do pecado original que o levava a considerar culposa toda relação sexual, mesmo a conjugal
falar de criação, diz que vê um movimento em Deus e que da divindade saía algo que ia
constituir a alma da Virgem Maria. Portanto, essa alma foi emanada e não cria da por Deus.
Isto tornaria divina a alma da Virgem, o que contraria chapadamente a doutrina católica,
do "Peregrine".
(52) "Der Keim, den Gott dem Abraham gegeben, ist bei mir gereifet".
C.B. - A.K.E. - Leben der heilige Jungfrau Maria, p. 89.
615
Conta ela ainda que nessa ocasião, Ana abriu um armário na parede
de seu quarto, onde várias relíquias estavam guardadas - as relíquias, tão ao gosto
de Brentano - cabelos de Sara, mulher de Abraão; ossos de José do Egito; um pedaço
Diz a freira:
do que faria realmente mais tarde Zacarias ao nascer S. João Batista, cantou um
hino no qual proclama que em Maria desabrochou o gérmen da bênção dado a Abraão.
(53)"Ich weiss jetzt, dass dieser Segen Wein and Brot, eine
sakramentalische Nahrung und Stärkung gewesen ist."
C.B. - AKE - Leben der heilige Jungfrau Maria, p. 90.
616
"Então as mulheres chamaram o pai Joaquim. Ele foi até
a cama de Ana, caiu de joelhos e chorou em torrentes
sobre a criança e, então, tomando-a nos braços, disse
um hino de louvor tal como Zacarias no nascimento de
João. Ele citou nesse salmo o santo gérmen que Deus
colocou em Abraão e que, através da circuncisão, selou
a aliança do povo de Deus e que alcançava agora essa
criança o seu mais alto florescimento, e por fim se
(54) .
tornava carne"
(54) "Num riefen die Frauen den Vater Joachim. Er kam zu Annas Lager, kniete
nieder und weinte in Strömen auf das Kind; dann hob er es auf den
Armen empor und sprach einen Lobgesang, gleich Zacharias bei
Johannes Geburt. Er erwähnte in diesem Psalm des heiligen Keimes,
den Gott in Abraham gelegt und der in dem durch die Beschneidung
versiegelten Bunde bei dem Volke Gottes fortgelegt, jetzt aber seine
höchste Blüte in diesem Kinde erreicht habe und nach dem Fleische
vollendet sei."
617
seu coração, numa inefável glória, vi na mesma
visão, o que vira nas visões que tive sobre o
Santíssimo na Arca da Aliança.
(55) "Es ward mir bei dieser Gelegenheit ein wundervoller Blick in das
Innere des heiligen Kindes Maria gewährt. Ich sah sie von dem Segen des
Priesters wie ganz durchleuchtet, und unter ihrem Herzen in einer
unaussprechlichen Glorie hatte ich denselben Anblick, den ich bei
Betrachtung des Heiligsten in der Bundeslade habe. In einem leuchtenden Umfang
von der Form des Kelches Meichisedeks sah ich unaussprechliche Lichtgestalten
des Segens. Es war gleich Weizen und Wein, gleich Fleisch und Blut, die eins
zu werden streben - Ich sah zugleich, wie sich über dieser Erscheinung ihr
Herz gleich der Türe eines Tempels öffnete, und wie das Geheimnis, um
welches sich eine Art Thronhimmel von vierlei bedeutungsvollen Edelsteinen
gebildet hatte, in ihr geöffnetes Herz einzog, und es war, als sehe ich
die Bundeslade in das Allerheiligste des Tempels eingehen."
C.B. - A.K.E. - Leben der heilige Jungfrau Maria , pp. 109-110.
618
de naturalismo mágico e alquímico na descrição do gérmen da bênção que discrepa
totalmente da doutrina sacramental católica que se devia esperar encontrar nos textos
de uma freira em processo da canonização.
Sta. Ana teve apenas uma filha: a Virgem Maria. Conforme vimos,
Katharina Emmerick diz que ela teve antes duas outras filhas. Mais
Cristo a respeito de Sta. Ana. Ele teria dito que com a concepção
que nenhuma mulher fora tão pura como ela e que depois
Ela afirma várias vezes que o gérmen da bênção era transmitido de geração em geração,
Agora, porém, ela diz que Santa Ana teve que se casar duas vezes mais, por ordem
messiânica, se Maria ia ser mãe de Jesus Cristo? Fica-se então com a impressão
de que Sta. Ana teve que se casar outras duas vezes para esgotar a matéria do
gérmen que restava nela. Os seus novos filhos só poderiam pertencer à linhagem
messiânica, não por serem antepassados do Messias, mas por terem participação
(56) "Er erzählte von Joachim und Anna und sprach von Annas Leben und Tod.
Jesus sagte, keine Frau se keuschergewesen als Anna, und dass sie
nach Joachims Tod noch zweimal geheiratet, das sei auf Gottes Befehl
geschehen. Es hätte die bestimmte Zahl der Früchte dieses Stammes
erfüllt werden müssen."
CB - Tgb., apud A. BRIEGER, Der Gotteskreis, p. 51.
620
"Jesus añdió en esta ocasión que ninguna mujer hasta entonces habia
sido más pura que Ana, que después de la muerte de Joaquin casó dos
veces más por voluntad del cielo. Debia cumplir y llenar el número
e establecido de frutos de
la bendición recebida" (57).
de predestinados não por seus méritos ou santidade, mas sim por sua substância. Ora,
Joaquim, quando
621
Como vimos, nessa ocasião saíram de Joaquim "toda a volúpia
pecaminosa e impureza" (59). Agora, com Zacarias, ocorre algo análogo: tira-se-lhe
alguma coisa do flanco e lá se coloca o gérmen da bênção. É como se o pecado
original fosse retirado dele. Como se esse pecado fosse uma substância material.
Confirma-se, pois, a tendência de Brentano de materializar o espiritual, e de
espiritualizar ou sobrenaturalizar a matéria.
6. A Encarnação do Verbo
de modo diferente do Evangelho. Ela apresenta o anjo Gabriel como um moço loiro
e resplandecente que desce dos ares. Quando o anjo falava com Maria, saíam de sua
boca letras de fogo que a vidente lia. Mas ela não cita nenhuma palavra do
(58) Ich sah über Zacharias den Himmel offen und zwei Engel wie, auf einer
Leiter zu ihm auf-und niedersteigen. Sein Gürtel war gelöst und sein Gewand
offen, und ich sah, als nehme einer der Engel etwas von ihm und der andere
gebe ihm wie einen kleinen leuchtenden Körper in seine Seite. - Es war
dieses Ereignis wie bei Joachim, da dieser den Segen des Engels zur
Empfängnis der heiligen Jungfrau erhielt.
CB - AKE - Leben der heilige Jungfrau Maria, p. 146.
622
anjo. Esse modo de comunicação lítero-espiritual, que seria impossível para os
profundo enlevamento e que viu então no alto uma figura da Santíssima Trindade,
como uma luz triangular. Foi então que o Espírito Santo, que lhe aparecia sob uma
forma humana alada, emanou três raios de luz fundidos que penetraram no flanco direito
da Virgem.
(60) Cfr. S. TOMÁS, Suma Teológica, I, Q. 111, a.1, I-IIae, Q. 112, a.1 ad
3.
(61) Die heilige Jungfrau ward nit dem Eindringen die ses Lichtes zu ihrer
Rechtén, von dieser Seite aus gant durchleuchtet und wie durchsichtig, und es
war, ais zSge sich die Undurchsichtigkeit wie Nacht von diesem Lichte zurilck.
Sie, war in diesem Augenblicke so von Licht durchgossen, lass nichts Finsteres,
nichts Verhüllendes mehr in ihr erscllien, sie war leúchtend und dürëhteuchtet
in ihrer ganzen Gestalt".
C.B. - AKE - Leben der heilige Jungfrau Maria, p. 164.
623
relação simbólica apenas. Para ele essa relação era real, metafísica. Assim
como para ele a graça tem algo de corporal, físico, assim como a concupiscência
é uma coisa que pode ser retirada do corpo de S. Joaquim e de Zacarias, assim também a luz
624
Segundo a doutrina oficialmente professada pela vidente,
Cristo, nascendo como um homem comum, santificou o nascimento. Porém, não
a concepção humana, porque ela não se deu por intervenção de homem. Para santificar
totalmente a concepção teria sido preciso que a sua concepção tivesse sido
resultante de união conjugal. Entretanto, analisado à luz do conceito que Brentano
tem do pecado original e da geração, esse texto se esclarece. Muito mais claramente
contra a doutrina que normalmente se atribui a Katharina Emmerick é sua revelação
de que Cristo tomou carne do gérmen da bênção e não de Maria Virgem, conforme diz
o Credo católico: "ex Maria virgine".
Eliud, em imagem, e das quais ouvi parcialmen te as palavras. Porém, não posso
reproduzir isso tudo. Ele disse também que ele tomou carne do gérmen que fora
retirado de Adão e como este gérmen devia se transmitir através de tantas ge rações ... e
como ele tantas vezes de novo foi retirado e os recipientes se tornaram obscuros.
transmitiam essa força a seus primogênitos em uma bênção sacramental, e como o bocado
e a bebida do pequeno cálice que Abraão recebeu do anjo eram uma pré-figura do
e até no de Adão. Ora, é interessante saber que S. Tomás, já no século XIII, havia
discutido a questão de "se o corpo de Cristo existira em forma determinada em Adão
e nos outros Patriarcas" (64). E ele resolve a questão do seguinte modo:
625
carne nem os ossos da Santa Virgem, nem nenhuma parte
Patriarcas
(63) "Ich sah sehr viele Dige, welche Jesus dem Eliud auslegte, in
Bildern, teils hörte ich die Worte. Ich kann aber das alles nicht
wiederbringen. Er sprach auch, wie er aus dem Keime Fleisch angenommen,
der Adam genommen worden, und wie dieses durch so viele Geschlechter habe
laufen müssen und wie er so oft wieder zurückgehalten und die Gefässe verfinstert worden
seien.
Ich sah alles dieses wirklich und sah alle Vorfahren Jesu, und wie die
Alväter bei dem Tode in einem sakramentalischen Segen diese Kraft den
Erst geborenen übergeben, und wie der Bissen und das Getränk aus dem
Becherchen, welches Abraham vom Engel empfangen, ein Vorbild des
Sakraments ..., die Kräftigung zu dem künftigen Fleisch und Blut des Messias
war. Ich sah, wie die Geschlechtslinie Jesu es empfing zu der Menschwerdung
Gottes, und dass Jesus es einsetzte zur Vereinigung der Menschen mit Gott
... " C.B. Tgb, apud A. BRIEGER, Der Gotteskreis, p. 50.
626
de nenhuma determinada maneira, de modo que alguma
parte do corpo de Adão ou de algum outro pudesse ser
designada determinadamente, a ponto de dizer-se que
determinadamente dessa matéria seria formado o corpo
de Cristo; mas aí existiu só pela origem, como o cor-
po dos outros homens. Pois, o corpo de Cristo se
relaciona com o de Adão e dos outros Patriarcas
mediante o corpo de sua mãe. Por onde, de nenhum outro
modo existiu nos Patriarcas o corpo de Cristo, senão
do que pelo qual aí existiu o corpo de sua mãe; e esse
não existiu nos Patriarcas com nenhuma determinada
matéria, como assim não existiram, os corpos dos
outros homens segundo se demonstrou na Primeira
Parte"(64).
Até parece que S. Tomas já conhecia os textos de Katharina Emmerick
texto que citamos na nota 63 deste capítulo e o que ela afirma, de algum modo, também
no seguinte texto:
627
"Vi muitas coisas desde Abraão até Isaias, e, deste
comprovam:
628
a encarnação do Verbo;
saliências dos dogmas católicos que não se adaptavam às lendas cabalistas, como
quais tendiam a realizar uma síntese religiosa universal com base na Cabala
e no esoterismo.
CAPÍTULO IX
1. GNOSE E MILENARISMO
628
problema do mal e o desejo de obter um estado de absoluta felicidade, livre de
qualquer contingência, que geram a mentalidade gnóstica.
629
O princípio do mal seria ser, enquanto o princípio do bem seria puro nada (2).
630
O gnóstico considera que o homem decaiu da divindade - nada absoluto
- no mundo material criado, no ser, onde existe na materialidade, na individuação e na
temporalidade Por isso ele odeia a ordem ontológica.
intrinsecamente mau;
redentor de si mesmo.
631
Essa dicotomia é levada ao paroxismo quando o gnóstico trata
do que tem relação com a existência e com a vida, isto é, com o problema do sexo,
que é visto ora como fonte de todo mal, ora como símbolo da vida eterna e como fonte
de revelação e até de divinização. O problema sexual angustia o gnóstico e ele procura
compensar essa angústia por meio de um orgulho sexual que chega às aberrações
do culto fálico ou do culto espermático como narra S. Epifânio (4).
632
também o gnóstico não crê na ciência e em suas leis. Ele crê na magia.
2. CABALA E MILENARISMO
ainda mais entre os cabalistas após a expulsão dos judeus da Espanha, em 1492. O
na Galiléia, cujo principal mestre foi o famoso Rabi Isaac Luria (8).
633
Segundo a Cabala, a redenção messiânica deve ser coletiva e não
pessoal, deve ser cósmica e não apenas humana. Ela se dará por meio de uma intrusão
A. O messianismo coletivo
pessoal e exige uma cooperação da vontade do redimido para que ele se possa
cooperação da vontade pessoal do redimido (9). É exatamente esse ponto que conduz
o messianismo judaico para a identificação da redenção com a revolução.
B. Messianismo cósmico
(9) Cfr. G.G. SCHOLEM, The messianic idea in Judaism, Schoken Books, New
York, 1971, p. 194.
634
... o próprio conceito de Galut (exílio) adquire aqui novo
C. Retorno ao Paraíso
635
O messianismo cabalista
será angelizado, obtendo uma natureza totalmente espiritual que lhe dará
Algo que tem relação com isso é dito por Katharina Emmerick
636
os racionalistas que sonham com a utopia. A restauração da felicidade não se dará
pela obediência às leis postas pelo demiurgo, e sim por sua superação mágica. Os
milenaristas esperam uma crise apocalíptica que purificará a terra e preparará
o Reino de Deus. Dar-se-ia então uma transformação mágica do homem e do universo.
637
"The Bible and the apocalyptic writers know of no
progress in history leading to the redemption is not
the product of immanent developments such as we find
it in modern Western reinterpretations of Messianism
since the Enlightenment where, secularized as the
belief in progress. Messianism still displayed
unbroken and immense vigor. It is rather
transcendence breaking in upon history, an intrusion
in which history itself perishes, transformed in its
ruin because it is struck by a beam of light shining
into it from an outside source" (16) .
638
spontaneously from attempts to take Messianism
E. Antinomismo
puramente espiritual, como o próprio Adão, e não teria mandamentos nem proibições
materiais. Estas só teriam surgido com o pecado original e com a materialização
essentially and
639
basically spiritual lights, shining forth in
espiritual:
Sabbatai Sevi o Messias prometido, diziam que as leis estabelecendo o puro e o impuro
(Sanhedrin 97 a) Rabi Qatina considerava que a história do mundo duraria 6.000 anos,
640
A expectativa de um período messiânico histórico em que a lei
(Sanhedrin 97 a) Rabi Qatina considerava que a história do mundo duraria 6.000 anos,
641
F. Messianismo revolucionário
pelas diversas Shemitahs tem muita semelhança estrutural com o sistema joaquimita
da Graça; a Idade do Espírito Santo ou do Amor, em que haveria uma pura Igreja
642
É bem conhecida a influência do milenarismo joaqimita nos
movimentos dos Espirituais franciscanos (25) e nas seitas do fim da Idade Média
(26). Scnolem mostra que houve também "paralelos marcantes" entre as idéias dos
643
Com os Espirituais, os Fraticelli, os Irmãos do Livre Espírito,
os Taboritas, os Adamitas do fim da Idade Média e do começo da Idade Moderna,
ainda mais as portas para tais idéias, que se manifestaram em todo o seu fermento
detectadas nas seitas puritanas inglesas do século XVII, algumas das quais, como
radicalismo mais extremo através das seitas esotéricas que giravam em torno de
644
messianismo sabatiano do tipo franquista repercutiu na própria Revolução Francesa
através da ação dos irmãos Frey que ajudaram o partido Dantonista (30). Esse mesmo
autor mostra a influência que elementos da seita Donmeh tiveram na revolução dos
E ESOTÉRICOS ILUMINADOS
Jacob Boehme acreditava que haveria na história uma época superior, um período
de maior perfeição a que chama Tempo dos lírios - Lilienzeit. Em sua obra Mysterium
magnum ele faz correspondência entre os tempos dos primeiros descendentes de Adão
e os vários períodos da História. Acreditava que a época em que ele vivia estava
esse último período da História seria dramática. Deus castigaria os homens de modo
terrível, a fim de purificar a Terra para o tempo do milênio. Aliás essa promessa
645
"Et maintenant que l'époque de Jared touche à sa fin,
(32) JACOB BOEHME, Mysterium magnum, XXXI, 44; traduçao de N. BERDIAEFF, ed.
D'Aujourd'hui, Aubier-Montaigne, Paris, 1978, 4 volumes.
646
"Nous avons un très grand Mystère dans l'Arche de Noé
que le Seigneur ordonna de construire ainsi en lui
indiquant quelle hauteur, quelle longueur et quelle
largeur elle devait avoir, en spécifiant également
trois ponts différents; et il lui indiqua également
les créatures qui devaient y entrer, ce qui
représente un tel Mystère que l'homme pervers est
indigne de le connaître et que nous ne pouvons de
notre côté le ré véler de fond en comble: ar il y a un temps
lequel il devra se révéler, c'est-à-dire le temps des lys,
lorsque le régne de Babel aura pris fin. Cependant, pour donner
une idée et montrer à notre rameau qui surgira et grandi ra de
notre être lilial en son temps quelle rose fleurira
à cette époque liliale, nous voulons lui dessiner ce
(33).
mystère avec un sous-entendu plein de réserves"
dos Lírios, que segundo o "filósofo teutônico" "se manifestera dans les derniers
temps, où la fin sera ramenée dans son commencement, et que le cercle sera fermé"(34).
647
O Tempo dos Lírios seria então um retorno ao paraíso
e outros (36).
(35) Sobre o Tempo dos Lírios ver ainda JACOB BOEHME, De tribus
principiis, XVII, 105 e XIX, 66.
(36) Cfr., A. KOYRÉ, La philosophie de Jacob Boehme, Vrin, Paris, 1971,
p. 458 nota 3.
(37) Cfr. LESZEK KOLAKOWSKI, Chrétiens sans Église, Gallimard, Paris,
1969.
(38) Cfr. KOLAKOWSKI, idem, p. 529.
648
Labadie, que foi jesuíta e jansenista, consideravam-se os iniciadores
do terceiro Reino do Espírito Santo, no qual se daria uma terceira e
derradeira revelação de Deus .
(39)
Joseph de Maistre afirmar que é preciso contar com a realização de "l'époque des
lys (Lilienzeit) comme la nommait, il y a bien des anées, un
illuminé allemand" . Pudicamente, De Maistre se refere a Boehme
(40)
apenas como "un illuminé allemand " sem ousar dizer seu nome: no prefácio
de um livro que se apresentava como ultramontano não era nada conveniente expor
sua admiração por um autor como Boehme. Compreende-se também que efeitos produzia
a expressão "Tempo dos Lírios" entre os emigrados franceses que sonhavam com o
restabelecimento dos Bourbons. Não se pense, porém que Joseph de Maistre dava à
expressão Tempo dos Lírios uma interpretação política apenas. Ele admitia que
haveria uma terceira revelação e estava de acordo com as doutrinas dos iluminados (41).
649
Joseph de Maistre era discípulo de Saint-Martin que adotara
a teoria das Shemitás cabalistas e esperava o advento do Reino messiânico.
o Milênio ia começar em 1.800 e atingiria o seu clímax em 1.832 (44). Seu amigo
650
Eckartshausen se entregou a inúmeros cálculos aritmético-cabalistas para
determinar a data do início do Reino, e concluiu que ele se daria no século XIX
(46).
Para Franz Von Baader também haveria uma futura regeneração que
androginia (47).
ainda que era tese dos meios esotéricos e iluminados que haveria no futuro o
esperavam a realização do Reino de Deus, que, por uma nova efusão do Espírito
Santo, seria o Reino do Amor, a nova Idade de Ouro. Nele haveria igualdade completa
entre os homens pela abolição da propriedade privada. Também não haveria mais
651
mais estruturas e seria totalmente pobre, tornando-se puramente espiritual.
Constatamos ainda que foram as concepções de Oetinger sobre a futura Idade de Ouro
Nesse sentido, o estágio final da História, assim como é previsto por Schelling,
Hegel, e mesmo por Marx, tem raiz nas idéias pietistas (48).
severidade, juízo, isto é, está sob o governo da Lei, mas que a próxima Shemitah
652
Também na obra Heinrich Ofterdingen, tão importante para se
entender o pensamento mágico de Novalis, se fala dessa futura idade de Ouro em que
então:...
Esse texto é bem significativo por suas relações com a Gnose: condenação do tempo, monismo, alusão à
alma do mundo, valorização do sonho acima da razão, antipatia para com o mundo real...
653
de Jesus, a fim de preparar o grande Concílio futuro, que, estabelecendo a união da humanidade, prepararia
Messias nos mil membros dessa nova igreja. Seria a idade de ouro, era do amor e
Terra:
(52) "Aus dem heiligen Schosse eines ehrwürdigen europäischen Konziliums wird
die Christenheit aufstehn, und das Geschäft der Religionserweckung
nach einem allumfassenden, göttlichen Plane betrieben werden".
NOVALIS, Die Christenheit oder Europa, in Novalis, Petits écrits,
Aubies-Montaigne, Paris, ed. Bilingue, s.d. p. 174.
(53) Cfr. NOVALIS, op. cit., pp. 162 a 164.
654
2. A instauração do Reino de Deus na Terra após uma terrível
e purificaria a humanidade.
papel primordial.
Santo.
particular.
655
Veremos como muitas dessas notas existem nos textos de Katharina
a infância ele sonhava com um lugar paradisíaco que ele chamava de Vadutz (54).
Vimos também que mesmo antes de conhecer Katharina Emmerick, Brentano relacionava
de todas as religiões e mitos, com o país de Thulé, com o monte Ida, com o monte
656
(Prophetenberg) que Brentano relaciona, como fizera com o Vadutz, a todas
as montanhas sagradas de todas as religiões.
Examinaremos agora esses textos, que comprovam que há nas visões de Katharina
Emmerick uma idéia romântica e mágica de um lugar na Terra em que não haveria
mal algum. Ora, essa é uma concepção típica de certas Gnoses e que prepara o
espírito para uma outra pergunta e para um outro desejo: se existe Vadutz, por
que toda Terra não é como ele? Não poderia se estender por toda a Terra? Se
a Terra inteira já foi um Vadutz, se pelo menos o primeiro casal viveu em Vadutz,
se houve uma Idade de Ouro inicial, não seria possível o restabelecimento dessa
idade paradisíaca? Não pregou Cristo o Reino de Deus, afirmando que esse Reino
estava próximo? Não se reza no Pai-Nosso: "Venha a nós o vosso Reino?”
(56) C f r . B . G A J E K , C l e m e n s und C h r i s t i a n B r e n t a n o s
B i b l i o t e k e n , Car l W i nt er Un iv er s it ä ts V e rl ag ,
H e id e lb er g , 19 72 .
(57) "Der Garten und alles, was ihn umgab, waren eine vollständige
Bildlichkeit eines ebenbildlichen Gottesreiches,..." - CB - Tgb.,
apud A. BRIEGER - AKE Visionen und Leben, p. 46.
657
Terrestre continua existindo. Mas é totalmente
impossível para os homens chegar até ele. Há cerca
de 40 anos, eu o tenho visto em todo o seu esplendor,
separado obliquamente da Terra, colocado muito alto,
tão afastado como a esfera escura dos anjos caídos está
separada do céu" (58) .
ellos
(58) "Mir ist auch, als bestehe das Paradies noch immer. Es sei aber
den Menschen ganz unmöglich, hinzugelangen. Es sint etwa vierzehn Jahre,
da habe ich es noch in seinem Glanz gesehen, schräg von der Erde ab, hoch
droben erschien es mir abgesondert, wie die finstere Scheibe des
Engelssturzes vom Himmel". C.B. - Tgb, apud A. BRIEGER, Der Gotteskreis,
p. 486.
658
profundos barrancos llenos de água. He visto
gentes subir al Monte de los Profetas, pero no
(59)
llegaron muy alto" .
659
Havia lá ainda torres que serviam de câmaras de tesouro ou então poços de
sabedoria e do conhecimento de diferentes povos da terra. Sob a ilha,
uma fonte de águas santas e conservadoras que, correndo para baixo
em direção à terra, iam dar nascimento ao Ganges(60). Brentano
acrescenta então que lhe foi lembrado por um leitor das comunicações
feitas por Katharina Emmerick que, nos sistemas religiosos de vários
povos asiáticos, há tradições a respeito de um lugar parecido a esse,
onde habitaria uma pessoa como a descrita por Katharina Emmerick:
660
Em primeiro lugar, é preciso registrar que de fato, os muçulmanos chamam
Elias, Chiser, o verdejante(62). Quanto à montanha Qaf, ela é uma montanha mística da tradição shiita.
Ora, o shiismo é a gnose do Islam(63). Segundo a gnose Shiita, a montanha Qaf seria totalmente de
esmeralda e era chamada de outrora de Alborz(64). Ela é o Sinai místico que os "peregrinos do espírito"
como o Mont Serrat, o Mont-Salvat dos cavaleiros do Graal, e até com o Mont Ségur dos
cátaros (66).
(62) "Il convenait éminemment à l'Islam arabe, issu d'Ismael l'exclu, que même le nom propre d'Élie lui soit
rétiré, et c'est sous une simples épithéte "al-Khadir", le Verdoyant, voile coloré d'un Sage anonyme,
que la fonction propre d'Élie dans l'histoire du Monde est manifestée par la Sourate XVIII". LOUIS
MASSIGNON, "Élie et son rôle en Islam", in Elie, le prophête, Les études Carmelitaines, vol. II, p. 270
- Desclée de Brouwer, Paris, 1956.
(63) "La doctrine shiite est par excellence la gnose de l'Islam; le shiisme est lui-même la
succession, la tradition ininterrompue de la gnose". - HENRY CORBIN,
En Islam iranien - Gallimard, Paris, 1971, vol. I, p. 128.
(64) Cfr. H. CORBIN, Corps spirituel et terre céleste - De l'Iran masdéen
à l'Iran shiite - Buchet-Charstel - Paris, 1979, p. 100.
(65) CORBIN - idem, pp. 101 e 128, nota 16 - En Islam iranien, vol. II, p. 189.
(66) Cfr. CORBIN - E n I s l a m I r a n i e n , v o l . II, pp.182 e 154,
vol.IV, p.406.
661
"Alors, l'ultime et septième merveille est bien
sobre toda a terra e sobre os homens através das águas que desciam dessa Montanha e que
provinham da "fonte da vida", das "águas superiores" que Deus tinha separado das
inferiores nos primeiros dias da criação. Diz a vidente de Dülmen que de Prophetenberg
(67) C f r . C O R B I N - E n I s l a m I r a n i e n , v o l . I I , p . 2 3 4 .
(68) C f r . C O R B I N – E n I s l a m I r a n i e n , v o l . I V ,
p. 378.
662
"Aquel rio que de arriba desciende y cujas aguas tanto
Estas gotas das águas superiores que caíam sobre a montanha dos profetas e dela desciam ou se
esparziam pela terra tinham, assim, o poder de tornar certos homens iluminados. - O termo é
bem revelador. - Brentano não hesita em contar entre esses iluminados certos protestantes
de seu tempo, numa evidente
663
alusão aos pietistas protestantes que faziam parte dos grupos esotéricos iluminados
e entre os quais figuravam os grandes líderes do movimento romântico, que se
converteram ou que tendiam ao catolicismo, como por exemplo Stolberg e Novalis.
664
Nesse texto se faz uma confusão entre os fenômenos naturais, como
a chuva e o orvalho, e graças sobrenaturais, evidenciando uma concepção naturalista e
mágica das relações do homem com Deus. A seguir, aprofundando o mesmo veio, Katharina
Emmerick mostra um pensamento totalmente afim com as idéias do romantismo alemão. Este
afirmava que o homem alcançaria a auto redenção caso se mantivesse numa relação
perfeitamente harmoniosa com a Natureza. Fazendo isso o homem não apenas se divinizaria,
mas redimiria a própria natureza, reestabelecendo-se o paraíso terrenal. Katharina
Emmerick diz exatamente isso:
A montanha dos Profetas, tal qual foi imaginada por Brentano como
Vadutz e tal qual foi descrita nas Visões de Katharina Emmerick, é inteiramente
conatural com os paraísos descritos pelas utopias. O conhecido romance "Lost
Horizon" de James Hilton, que narra a vida de um grupo humano segregado num
665
misterioso e edênico vale, no Tibet - o Shangri-lá – inspirou-se se exatamente
no Prophetenberg e no paraíso descritos por Katharina Emmerick (73).
hoje em suas encostas, numa região da Ásia Central não são os únicos traços de
gnóstico a ser realizada com o advento do XII Imam, o qual estaria atualmente
escondido ou oculto num lugar misterioso - o monte Qaf, a terra de Hurqalia- no mundo
imaginal (74).
(73) Cfr. JUAN CARLOS MORENO - Estudio Critico das Visões de AKE in AKE
Visiones, vol. I, p. 73; JAMES HILTON - Horizonte Perdido,
(74) Cfr. as obras já citas de Henry Corbin.
666
6. O PROFETA ELIAS E SUA MISSÃO DE FUNDAR O REINO DE DEUS NOVA REVELAÇÃO.
667
No século XVIII, muitos movimentos de caráter quiliástico
aguardavam a próxima vinda de Elias, desde os jansenistas até os círculos esotéricos
maçônicos (76).
668
Segundo a doutrina esotérica, que nisto seguia a Cabala, Deus teria
concedido a Adão uma revelação perfeita, completa, que ele transmitira
oralmente a seus descendentes. Todas as religiões pagãs conteriam
restos dessa revelação primeva, a qual teria se conservado melhor no
judaísmo. Segundo os cabalistas, martinistas e esotéricos tal
revelação seria a Cabala. Repercussões desta crença se acham nas
doutrinas dos seguidores de Joseph de Maistre no século XIX.
revelações pagãs havia pelo menos restos da revelação primeva, o que deveria
facilitar uma futura reunião ecumênica de todas as crenças numa Igreja espiritual
669
7. A NOVA IGREJA ESPIRITUAL
e possuidora de uma nova revelação e efusão do Espírito Santo, era crença muito difundida
nos círculos esotéricos e entre as seitas dos séculos XVII e XVIII (79). Mais ainda, a formação
dessa igreja pneumática era condição "sine qua non" para a instauração do reino de
670
y en aquellos que con ella están en relación. En esta
círculos iluminados do século XVIII e XIX. Para ele a Igreja não era o conjunto
dos batizados que crêem e obedecem ao Papa. A ortodoxia não era para Brentano
portanto, os hereges.
(80) AKE - Visiones, ed. cit., vol. I, p. 584. O sublinhado é nosso. (81) AKE
- Visiones, vol. I, pp. 113-114.
671
"Entonces vi el campo de las mieses junto a la
mansion de bodas y he visto en ese campo un corpo
levantado y dirigido havia el cielo. Estaba horriblemente
mutilado: ciertas partes de las manos y de los piés
estaban cortadas, y en otros lugares se veían
anchas feridas y aberturas. Algunas de estas
eran recientes y sangraban aún, otras estaban
rellenadas de carne mal crecida y pudrida; otras
como cicatrizadas y osificadas; un lado del cuerpo
aparecia negro y gangrenoso, como consumido.
de Cristo"(82).
672
fé. Ora, isto vai totalmente contra o que a Igreja sempre ensinou sobre a
Pio XII(83). Mais ainda. Ela faz coincidir o corpo místico de Cristo com a
tempos do Romantismo. Com efeito, os românticos não queriam excluir ninguém nem
8. O REINO DE DEUS
A. O REINO DE DEUS
estavam completos e o Reino de Deus estaria em vias de ser alcançado. Antes, porém
haveria uma crise catastrófica que castigaria terrivelmente a humanidade e
673
"Ví a obispos y pastores acercarse y cambiar sus
encuentro (...).
674
segun San Mateo, significa la obra del Mesias, la
"Les dijo que ahora nadie era más que el otro, que
Noutra ocasião Jesus teria ensinado aos samaritanos que todos são
iguais perante Deus!
675
Embora se posa ver nesta afirmação apenas a doutrina ortodoxa
da igualdade fundamental dos homens diante de Deus, em outros textos essa
igualdade chega a um tal ponto que praticamente elimina o direito de propriedade.
Com efeito, conta Katharina Emmerick que um dia um homem se queixou a Cristo de
que um vizinho lhe roubara grande parte de suas terras. Jesus então lhe teria
perguntado se ele poderia manter sua família com o que lhe sobrara. E diante da
resposta afirmativa do queixoso, Jesus lhe teria dito:
"... que nada habia perdido, que nada nos aprovecha, mientres
se tiene para pasar la vida eso basta; que aún diese más a quel
hombre insaciable para que contentase su hambre de bienes
terrenos"(88).
676
"(os Caraitas) ... vivian en mucha sencillez y
pobreza y tenian sus bienes en comun (...) No habia
e n t r e e l l o s n i n g u n o pobre o n e c e s i t a do (...) no
padecian ninguna vanidad ni lujo y se mantenian de
su trabajo (...) Los que hé visto trabajavan en comun
en largas habitaciones " (91).
vestindo-se todos igualmente, e pela amizade e igualdade que reinava entre eles(92).
Por outro lado ela diz que Cristo critica asperamente o chefe de uma cidade que
veio a seu encontro com grande aparato e traje de cerimônia dizendo-lhe que
viesse "como os demais homens"(93). Enfim, Cristo afirma: "que los hombres se
acordasen de que no eram dueños de las cosas de la tierra, sino que solo las
tenian en uso" (94).
677
Como última característica do futuro Reino de Cristo é
preciso indicar o ressurgimento dos carismas. Brentano e Katharina Emmerick
possuíam uma noção mágica ou naturalista dos carismas cristãos. Assim, o poder
taumatúrgico de Cristo, dos Apóstolos e dos primeiros cristãos não seria uma
manifestação de poder sobrenatural e sim um aproveitamento de qualidades naturais
do ser humano, através de uma técnica magnética. No futuro Reino de Deus os sacerdotes
saberiam de novo empregar as técnicas utilizadas por Cristo, que Ele teria transmitido
à Igreja, especialmente o modo correto de impor as mãos. Assim a vidente de
Dülmen afirma que Jesus curava de modo humano:
"Como Hombre-Dios (Cristo) sanaba de modo humano (...) En
estos milagros no quebrantaba las leyes de la
(95).
naturaleza..."
678
"(Cristo) Habló con los discipulos diciendoles que
usasen de estas diversas maneras de sanar" (97) .
Confirmaram esta noção de que o poder de curar era mais uma técnica
do que um carisma sobrenatural os textos em que Katharina Emmerick afirma -
contrariando os Evangelhos - que as curas feitas por Cristo não eram imediatas:
679
Pedro, soprando dentro dele:
solo" (100) .
681
parecia-se bastante com as técnicas magnéticas empregadas pelo padre Limberg para
x. CONCLUSÕES
tão prolixa quanto a pena de Brentano. Mais ainda: tal fonte se mostrou em larga
manuscritos originais, o que foi dado a luz e o que o Pe. Schmoeger deixou passar
bênção para ter os elementos comprovatórios que precisávamos. É claro que os textos
completos das revelações quando editados, devem fornecer muito mais material no
seguinte:
682
Em numerosos pontos, em que as visões se diferenciam do que diz
a Sagrada Escritura a respeito da criação, do pecado original, há
coincidência com o que diz o Zohar. Por outro lado, as idéias
expressas na narrativa da vidente sobre a criação e o pecado
original, coincidem com uma visão gnóstica da divindade, do
universo e do homem, tais como a entenderam a Cabala e o esoterismo.
Redenção.
683
Assim como a Cabala, os sistemas gnósticos e o pensamento
esotérico, os textos das visões de Katharina Emmerick concluiram que o pecado
original foi a conjunção carnal de Adão e Eva. Cremos que o horror doentio que
Katharina Emmerick teve, desde a sua mais terna juventude, pelo ato conjugal e pelo
estado matrimonial levou-a a aceitar de bom grado essa interpretação gnóstica,
cabalista e esotérica do pecado original. É por isto que ela afirma que a reprodução
humana, antes do pecado original, seria espiritual, obtida através da palavra e não
do sexo.
685
Embora não esteja absolutamente no âmbito da nossa tese discutir
a santidade da vidente, do que já pesquisamos parece-nos claro que ela era uma pessoa
com distúrbios neuróticos de natureza sexual.
686
BIBLIOGRAFIA
IFontes primárias
IIFontes secundárias
III Bibliografia geral consultada
687
BIBLIOGRAFIA
FONTES PRIMÁRIAS
tão deturpadas e tão pouco dignas de crédito. Fizemos isso apenas quando os
textos de SCHMOEGER eram harmônicos com os textos de BRIEGER e ADAMS, pois,
1. BRIEGER, Anton
Anna Katharina Emmerick - Der Gotteskreis. Die urtexte ihrer Visionem
aufgezeichnet von Clemens Brentano - Manz Verlag, München, 1960.
2. BRIEGER, Anton
Anna Katharina Emmerick Visionen und Leben. Erich Wewel Verlag -
München, Freiburg im Brisgau, 1974.
3.ADAMS, Joseph
Clemens Brentano Emmerick - Erlebnis Bindung und Abenteuer - Verlag
Herder, Freiburg, 1956.
688
4. B RE N T A N O, C l e me n s
5. BRENTANO, Clemens
Anna Katharina Emmerick - Leben der Heilige Jungfrau Maria.
Nach den Betrachtungen der gottseligen Anna Katharina
Emmerick. Augustinerin des Klosters Agnetenberg zu
Dülmen (+ 9 februar 1824). Aufgeschrieben von Clemens
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