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II Encontro

Escravidão e Liberdade
no Brasil Meridional

CADERNO DE RESUMOS

2,26
(',725$

2005
1
Comissão Organizadora: Beatriz Galotti Mamigonian (UFSC), Henrique Espada Lima
(UFSC), Lúcia Helena Silva (UEL), José Augusto Leandro (UEPG) e Regina Célia
Lima Xavier (UFRGS)
Comissão Executora: Ana Carla Bastos (UFSC), Cristiane Bahy (UFRGS), Edson José
Neves Júnior (UFRGS), Fabiana Souza Bumbel (UFRGS), Gabrielle Werenicz Alves
(UFRGS), Maria Aparecida Anacleto Clemência (UFSC), Mariana Selister Gomes
(UFRGS) e Ricardo De Lorenzo (UFRGS)

Patrocinadores: CAPES, FAPERGS, UFRGS, Departamento e pós-graduação em


História da UFRGS e Anpuh núcleo do Rio Grande do Sul

Apoiadores: UFSC, UEL, UEPG e Anpuh núcleos de Santa Catarina e do Paraná

Imagem da capa: designer Michelle Chagas de Farias


Revisão: Regina Célia Lima Xavier

Artefinalização e impressão: Con-Texto Gráfica e Editora

Editora Oikos Ltda.


Rua Paraná, 240 – Cx. P. 1081
93120-020 São Leopoldo/RS
Tel.: (51) 3568.2848
www.oikoseditora.com.br

E56c Encontro Escravidão e Liberdade no Brasil Meridional (2. : 2005 :


Porto Alegre, RS)
Caderno de Resumo [do] 20 Encontro Escravidão e Liberdade
no Brasil Meridional.: Porto Alegre, 26 a 27 de outubro de 2005. –
São Leopoldo: Oikos, 2005.
80 p.
ISBN 85-89732-30-4
1. Escravidão – Região Sul. 2. História – Escravidão. 3. Tráfico
de escravos. 4. Comércio de escravos. 5. Identidade Negra. I. Títu-
lo. II. Associação Nacional de História.
CDU 326(816)
Catalogação na Publicação:
Bibliotecária responsável: Eliete Mari Doncato Brasil – CRB 10/1184

2
Sumário

Apresentação .................................................................................... 5
Local das atividades .......................................................................... 7
Conferências ..................................................................................... 8
Programa das sessões de comunicações ......................................... 9
Resumo das comunicações .............................................................. 18
Índice dos autores ............................................................................. 79

3
4
Apresentação

É com uma enorme satisfação que apresentamos o II Encontro


Escravidão e Liberdade no Brasil Meridional. Esta iniciativa surge da
necessidade de se abrir um fórum de discussões: para que novas pes-
quisas possam ser reveladas, para que se promova um maior conheci-
mento sobre documentos e acervos, para que se incentive trabalhos
comparativos, para que se dialogue com maior profundidade com pes-
quisadores que enfocam experiências vividas em outras regiões do país.
Se o sul do Brasil já foi retratado como uma região de forte imigra-
ção européia onde a presença escrava havia sido menor do que em
outros lugares, restrita a produção de charque no Rio Grande do Sul ou
ao serviço doméstico nas demais Províncias, este quadro vem se modi-
ficando rapidamente com investigações que exploram novas fontes pri-
márias, que interrogam sob outro ângulo aqueles documentos mais tra-
dicionais, que utilizam metodologias variadas.
Contudo, contrariamente a outras localidades, que possuem uma
tradição historiográfica consolidada na investigação sobre as experiên-
cias de escravidão e de liberdade, no sul a bibliografia ainda se encontra
relativamente dispersa. Faz-se, portanto, cada vez mais necessário di-
vulgar e integrar os importantes trabalhos já desenvolvidos ou em anda-
mento, principalmente, no âmbito das pós-graduações. Esta tem sido
uma de nossas principais motivações, presentes desde o I Encontro,
organizado em Castro, no Paraná, em 2003.
Naquela ocasião, reuniram-se cerca de 38 participantes nas co-
municações entre doutores, mestres e graduados, oriundos das princi-
pais instituições públicas e privadas do Rio Grande do Sul, Paraná, San-
ta Catarina, assim como de São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo.
Aos professores da rede municipal de ensino de Castro, foi oferecido um
curso que buscou abrir outras perspectivas para o ensino da África aten-

5
dendo a demandas da LDB. Tivemos, por fim, o privilégio de contar com
a presença dos professores Robert Slenes (UNICAMP) e Ilka Boaventu-
ra Leite (UFSC) que ministraram palestras de grande excelência acadê-
mica.
A repercussão deste I Encontro foi muito positiva e nos motivou a
transformá-lo em um Encontro periódico. Nós, da comissão organizado-
ra, queremos aproveitar para agradecer, em primeiro lugar, a oportuni-
dade oferecida pela Prefeitura, pela Secretaria de Educação e Cultura
de Castro pelo patrocínio e incentivo para a organização daquele I En-
contro em 2003. Nosso agradecimento especial a Roni Cardoso Filho e
aos funcionários da Secretaria de Educação, principalmente aqueles da
Casa de Cultura. Agradecemos, por fim, a Jó Klanovicz da Universidade
Federal de Santa Catarina.
Desta vez, reunimo-nos em Porto Alegre para a edição do II En-
contro. Ele foi possível graças ao patrocínio da CAPES, da FAPERGS e
da UFRGS que, neste ano de 2005, sedia nossos trabalhos. Um agrade-
cimento especial ao apoio prestado pela direção do Instituto de Filosofia
e Ciências Humanas e pelo departamento e pós-graduação em História
desta universidade. Agradecemos também o apoio da Universidade Fe-
deral de Santa Catarina, da Universidade Estadual de Londrina e de
Ponta Grossa. Recebemos ainda um apoio muito especial do núcleo da
Anpuh do Rio Grande do Sul. Apoiaram-nos também os núcleos de San-
ta Catarina e do Paraná. Não podemos deixar de mencionar, ainda, o
empenho da comissão executora a quem somos muito gratos.
Por fim, queremos agradecer a todos aqueles que se inscreveram
neste evento. Que ele seja o momento de muitos encontros. Desejamos
a todos uma boa estadia em Porto Alegre e uma ótima participação no II
Encontro Escravidão e Liberdade no Brasil Meridional.

Comissão Organizadora

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Local das atividades
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Campus do Vale
Av. Bento Gonçalves 9 500

ILEA – Instituto Latino-Americano de Estudos Avançados


Prédio 43322
Auditório
Fone: 3316-6941 e 3316-6942

IFCH – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas


Prédio 43 322
Sala de Multimeios 203
Sala do Pantheon 202
Fone: 3316-6648

Livraria Universitária
Prédio comercial 43 606
Fone: 3316 6557

Entrega de material
26 e 27 de outubro de 2005
08:00 as 10:00 hs
Prédio 43 322

7
Conferências
Auditório do ILEA

Conferência de Abertura
Quarta-feira, 26/10/2005
10h-12h
Arquitetura e paisagem das plantations escravistas das Américas,
século XIX
Prof. Rafael de Bivar Marquese, USP

Conferência e exibição de documentário em vídeo


Quinta-feira, 27/10/2005
19h
Memórias do Cativeiro: trabalho, identidade e cidadania
no pós-abolição
Profa. Ana Lugão Rios (UFRJ)

8
Programação das Sessões de Comunicações
Sala do Pantheon Sessão 1 Helen Osório, UFRGS
26/10/2005 quarta-feira Campeiros e domadores: escravos da pecuária
14h-15h45 sulista, séc. XVIII

Luis A. Ebling Farinatti, UFRJ


Nos rodeios, nas roças e em tudo o mais:
trabalhadores escravos na Campanha
Rio-grandense, (1831-1870)

Cesar A. B. Guazzelli, UFRGS


Libertos e liberdade: os soldados negros da
República Rio-Grandense

Regina C. Lima Xavier, UFRGS


Deslindando a história sobre a escravidão no
Rio Grande do Sul

Sala do Pantheon Sessão 2 Ivone C. D’ Ávila Gallo, PUC/Campinas


26/10/2005 quarta-feira Socialismo e escravidão: paradoxos do século XIX
16h – 18h00
Carlos Engemann, UFRJ
Reflexões acerca de alguns elementos
constitutivos da sociedade escravista no Brasil

Luiz Paulo F. Nogueról, UFRGS e Leonardo


Monastério, UFPel
Encruzilhada: contribuições da cliometria para
responder a algumas indagações da
historiografia nacional

9
Sala de Multimeios Sessão 3 Júlio César Cóssio Rodriguez, UFRGS
27/10/2005 quinta-feira Por uma História da África Pré-Colonial:
8h-9h45 algumas considerações
Gabrielle Werenicz Alves, UFRGS
A participação escrava na Revolução
Farroupilha: análise historiográfica
Maximiliano Mazewski Monteiro de Almeida,
PUC RS
Escravos e Afro-descendentes na Historiografia
oficial do castilhismo
Mariana Selister Gomes, UFRGS
As representações em torno dos negros e o
Primeiro Congresso de História Nacional do IHGB:
uma análise do trabalho apresentado por
Affonso Cláudio

Sala do Pantheon Sessão 4 Tathianni Cristini da Silva (Msc),


27/10/2005 quinta-feira UNIVEST/ FACVEST
8h-9h45 Do edifício à cidadania: o patrimônio material e
sua relevância para a conquista da cidadania
pelos afro-descendentes de Lages/SC
Diego Rodrigues, Ezequiel Giacomelli e Marcos
Smith Dias, UFRGS
Elementos comuns e diferenças entre os
patrimônios registrados na pecuária gaúcha e
na pernambucana no início do século XIX
Jardel Gores, UNIVEST/FACVEST
A edificação da cidadania pela memória na
cidade de Lages/SC
Marcos Rafael da Silva, UNIVEST/ FACVEST
A formação patrimonial e a conquista da
cidadania pelos afrodescendentes
Jean Carlos Antonio, UFSC
Fortuna e cultura material na Ilha de Santa
Catarina: Freguesia de Nossa Senhora da Lapa
do Ribeirão na segunda metade do século XIX

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Sala do Pantheon Sessão 5 José Bento Rosa da Silva, UNIVALI
27/10/2005 quinta-feira Em águas do Atlântico Sul: escravos-marinheros
10h – 12h00 no cais do porto de Itajaí no século XIX

Beatriz Ana Loner, UFPel


Antônio: de Oliveira a Baobad
Henrique Espada Lima, UFSC
“As várias faces da precariedade: para uma
história comparativa da escravidão e da
liberdade no século XIX”
Adhemar L. da Silva, UFPel
Escravidão, liberdade e cor nas sociedades de
socorros mútuos (Rio Grande do Sul, 1856-1914)

Sala de Multimeios Sessão 6 Marcia Naomi Kuniochi, FURG


27/10/2005 quinta-feira O perfil social dos escravos em Rio Grande no
10h – 12h00 século XIX
Albertina Lima Vasconcelos, USP
Tráfico interno, liberdade e cotidiano de escravos
em Rio Grande –RS, no século XIX

Ricardo De Lorenzo, UFRGS


Sobre a insanidade mental entre cativos e
libertos (Porto Alegre, século XIX)
Nikelen Acosta Witter, UFF
Negociando cuidados e liberdades: as práticas
de saúde, doença e cura entre senhores e
escravos (RS, Século XIX)

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Sala do Pantheon Sessão 7 Roger Elias, UFRGS
27/10/2005 quinta-feira Famílias escravas em Porto Alegre (1810-1835).
14h-15h45 Uma História de suas Formações
Edson José Neves Júnior, UFRGS
Reprodução natural e famílias escravas em
Porto Alegre – 1840 – 1865.
Denize Aparecida da Silva, UFPR
Arranjos e laços familiares na comunidade
escrava da Freguesia de Nossa Senhora da
Graça de São Francisco do Sul/SC (1845/1888)

Sala de Multimeios Sessão 8 Gabriel Santos Berute, UFRGS


27/10/2005 quinta-feira A concentração do comércio de escravos na
14h-15h45 capitania do Rio Grande de São Pedro do Sul,
c. 1790 – c. 1825
Rafael da Cunha Scheffer, UFSC
Tráfico interprovincial e comerciantes de
escravos em Desterro/SC (1849-1888)
Ana Flávia Cicchelli Pires, UFF
Subterfúgios e novos padrões de organização no
tráfico ilegal de escravos: o caso do brigue
Asseiceira
Beatriz Gallotti Mamigonian (UFSC)
O litoral sul do Brasil na rota do abolicionismo
britânico, décadas de 1840 e 1850

Sala do Pantheon Sessão 9 Martha Daisson Hameister, UFRJ


27/10/2005 quinta-feira Famílias riograndinas livres e seus escravos
16h-18h00 através dos registros batismais: unidades
oiconômicas (Rio Grande c. 1738-c.1763)
Maísa Faleiros da Cunha, Unicamp
Uma tentativa de reconstituição de famílias
escravas. Franca (SP) – Século XIX
Fernando Franco Netto, UFPR
Compadrio e Escravidão em Guarapuava no
século XIX

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Sala de multimeios Sessão 10 Maria Angélica Zubaran, ULBRA
27/10/2005 quinta-feira Os escravos e a lei de 7 de novembro de 1831
16h-18h00 no Rio Grande do Sul (1865-1888)
Ricardo Tadeu Caíres Silva, UFPR
Memórias da travessia: aspectos do tráfico
internacional de escravos para o Brasil nas falas
dos cativos que disputavam suas liberdades na
Justiça. Bahia (1884-1888)

Vinicius Pereira de Oliveira, IPHAN/RS


O estudo de trajetórias escravas como possibi-
lidade historiográfica: o caso do africano Manoel
Congo (Rio Grande do Sul/Brasil, século XIX)

Sala do Pantheon Sessão 11 Luana Teixeira, UFSC


28/10/2005 sexta-feira Entre a serra e o litoral: fugas e quilombos na
8h-9h45 fronteira leste do Rio Grande do Sul e Santa
Catarina

Thiago Leitão de Araújo, UFRGS


Santa Misericórdia: caridade crist㠖 instituição
escravista

Sherol dos Santos, UFRGS


A comunidade escrava no litoral norte do Rio
Grande do Sul (a freguesia de Santo Antônio da
Patrulha – 1773/1810)

Fábio Odair Gomes Goulart, FURG


Entre a resistência e a coerção: a vivência dos
escravos na cidade de Rio Grande

13
Sala de multimeios Sessão 12 Carina Santos de Almeida e Shana Rech, UNISC
28/10/2005 sexta-feira A pimenta malagueta no Brasil colonial:
8h-9h45 interação entre africanos e indígenas

Marilene Ribeiro Solano, UNIVEST/ FACVEST


Na primeira metade do século XX: as
associações de afrodescendentes e a busca pela
cidadania

Maria Aparecida Anacleto Clemencia, UFSC


“No nosso tempo que era bom?” Tensão,
trabalho e conflito na Sociedade Recreativa
3 de Maio (1930-1950)

Elci Deloss Tolomini, Carla Regina Wegner


Copetti e Sandra Beatriz Essenberg, Secretaria
Municipal da Educação – Giruá, RS; Savio
Antônio Reginatto e Denise M. dos Santos Mello,
URI – Sto Ângelo
Aspectos constituintes da história da comunida-
de quilombola presente no interior de Giruá, RS

Luciane P. Corá Molin, UEPG


Serra do Apon: História e Hanseníase

Sala de multimeios Sessão 13 Gabriel Aladren, UFRGS


28/10/2005 sexta-feira Atividades econômicas dos forros no Rio Grande
10h-12h00 de São Pedro, c. 1780 – c. 1835

Ana Paula Dornelles Schantz, UFRGS


E depois da liberdade? Família e sobrevivência
econômica de libertos em Porto Alegre e Viamão
no final do século XVIII

Jovani de Souza Scherer, UFRGS


O Preço da Liberdade: o processo da compra da
alforria, Rio Grande (1810-1825)

14
Sala do Pantheon Sessão 14 Juliana Aparecida Lemos Lacet, UFBA
28/10/2005 sexta-feira Nações africanas nas irmandades negras
10h-12h00 mineiras do século XVIII

Cristiane Pinto Bahy, UFRGS


Rosário de contas negras: a Irmandade de
Nossa Senhora do Rosário dos pretos do Arraial
de Viamão (1780-1820).

Lígia Conceição Santana, UFBA


Territórios e itinerários negros em Salvador
(moradia, trabalho e divertimento, 1855-1887)

Liane Susan Muller, SMED Gravataí/SECRS


O negro e suas devoções: a importância da
Irmandade do Rosário e da Festa dos
Navegantes para a formação de uma elite
negra porto-alegrense

Sala de multimeios Sessão 15 Márcio de Sousa Soares, UFF


28/10/2005 sexta-feira A dádiva da alforria: uma proposta de
14h-15h45 interpretação sobre a natureza das manumissões
antes da promulgação da Lei do Ventre Livre

Nilsen C. Oliveira Borges, UFSC


Meio livre, meio liberto: a conquista da alforria em
Lages, século XIX

Fabiano Dauwe, UFF


Os múltiplos sentidos da liberdade: a viabilidade
e as expectativas da libertação pelo fundo de
emancipação de escravos

Alvaro de Souza Gomes Neto, UNIVEST/


FACVEST
Algumas considerações sobre o Fundo de
Emancipação de Escravos no Termo de Lages,
1871-1888

15
Sala do Pantheon Sessão 16 Adelmir Fiabani, UNISINOS
28/10/2005 sexta-feira Quilombo: africanos, índios e seus
14h-15h45 descendentes lutaram pela liberdade

Eliege Moura Alves, UNISINOS


Uma presença invisível – escravos em terras
alemãs

Antônio César Sprícigo, Colégio Murialdo e


Colégio Castro Alves – Araranguá, SC
Os caminhos da escravidão na Freguesia do
Araranguá – 1840/1888

Sala do Pantheon Sessão 17 Caiuá Cardoso Al-Alam, UNISINOS


28/10/2005 sexta-feira Questões acerca dos enforcamentos de
16h-18h00 escravos em Pelotas-RS

Martha Rebelatto, UFSC


A bordo do Higkland Mary of Sag Harbor: uma
tentativa de fuga escrava (Desterro, 1868)

Daniela Vallandro de Carvalho, UNISINOS


Experiências de cativeiro e liberdade nos fins do
século XIX (interior do RS)

Rodrigo de Azevedo Weimer, UNISINOS


Nominação e identificação de ex-escravos
através de processos criminais: São Francisco
de Paula, RS, 1880-1900

16
Sala de multimeios Sessão 18 Aristeu E. Machão Lopes, UFRGS
28/10/2005 sexta-feira Representações da Escravidão e da Abolição nas
16h-18h00 caricaturas da imprensa ilustrada e humorística
pelotense do século XIX

Lucia Helena Oliveira Silva, UEL


Vivências negras no pós-abolição: libertos e
afro-descendentes no Paraná.

Frank Nilton Marcon, UFSC


Identidade e diferença: “homens de cor” e o
“Centro Cívico Cruz e Sousa”

Arilson dos Santos Gomes, FAPA-RS


A Frente Negra Brasileira e as suas idéias no Rio
Grande do Sul na década de 1930

Mirian Adriana Branco, UNIVEST/ FACVEST


Em Santa Catarina, os afro-descendentes e o
condicionamento da cidadania

17
Resumos das comunicações

Sessão 1:

Helen Osório, UFRGS


Campeiros e domadores: escravos da pecuária sulista, séc. XVIII
Por muito tempo julgou-se que a atividade pecuária fosse incom-
patível com a escravidão. Por um lado, pela mobilidade e grau de liber-
dade que concederia ao escravo; de outro, pelo fato da criação de gado
ser uma atividade de abastecimento das áreas exportadoras que não
geraria uma acumulação suficiente para a aquisição contínua de cati-
vos. No entanto, recentes investigações têm comprovado o contrário,
tanto para diversas regiões do Brasil quanto do Rio da Prata. Propõe-se
uma discussão sobre as formas concretas e peculiares da escravidão
em zonas fronteiriças, centrada na capitania do Rio Grande. A principal
fonte utilizada são os inventários post-mortem, através da qual são defi-
nidos os tipos de unidades produtivas e verificado o uso da mão-de-obra
cativa. Partiremos de uma caracterização demográfica da população
escrava da capitania entre 1765-1825 para, em seguida, analisar os es-
cravos especializados na pecuária: os campeiros e domadores. Será
traçado um perfil demográfico destes escravos, analisando-se idade,
nação, tipos de plantéis em que são encontrados (grandes ou peque-
nos, com presença de famílias ou não).

Luis Augusto Ebling Farinatti, UFRJ


Nos rodeios, nas roças e em tudo o mais: trabalhadores escravos
na Campanha Rio-grandense, (1831-1870)
A investigação sobre a escravidão nas zonas onde preponderou a
pecuária extensiva não participou vivamente do grande avanço da pro-
dução historiográfica sobre escravidão no Brasil, ocorrido nas últimas

18
décadas. Esse fato pode ter se devido a razões diversas. De um lado, a
influência de uma tradição historiográfica que acreditava que essas regi-
ões, pouco capitalizadas, não teriam condições de prover um incremen-
to contínuo de cativos. De outro, esse pouco interesse pelo estudo da
escravidão na pecuária pode ter se devido à verificação de uma presen-
ça relativamente baixa de população cativa nas regiões de criação de
gado, se tomadas em relação a muitas das regiões agrícolas brasileiras.
Por fim, a pecuária também foi vista, tradicionalmente, como palco por
excelência de diversas formas de trabalho livre, tanto no período colonial
como no século XIX. Contudo, novas pesquisas têm demonstrado a pre-
sença constante de cativos nas unidades produtivas de predominância
pecuária e, mais do que isso, sua importância central para o funciona-
mento dessas unidades. Esta comunicação busca unir-se a esses esfor-
ços, analisando a presença dos cativos na Campanha Rio-grandense,
localizada na fronteira com as repúblicas platinas, principal zona de cria-
ção de gado da província do Rio Grande do Sul. Aqui, investigamos al-
gumas das características demográficas da população cativa da região,
além de aspectos relacionados às atividades desempenhadas por aque-
les trabalhadores. Nesse último quesito, malgrado a conhecida visão
que desacredita a importância do emprego de cativos na pecuária, o
envolvimento direto no costeio do gado foi a principal atividade desen-
volvida por aqueles trabalhadores. Nessas e em outras atividades, os
escravos eram empregados, em geral, em associação com o trabalho
livre nas maiores estâncias, e com o trabalho familiar nas unidades pro-
dutivas de menor vulto. As principais fontes empregadas aqui são os
inventários post mortem e um censo agrário realizado em 1858.

Cesar Augusto Barcellos Guazzelli, UFRGS


Libertos e liberdade: os soldados negros da República Rio-Gran-
dense
São poucos os trabalhos sobre a participação dos escravos na
Revolução Farroupilha. Por outro lado, não há referências à importância
que os libertos representaram para as relações externas estabelecidas
entre os republicanos e seus vizinhos do Rio da Prata, nem quanto a sua

19
presença perturbou as diplomacias do Império e da Confederação. Con-
tribuir para uma melhor compreensão desta questão é o objetivo deste
texto.
Em relação aos soldados que formaram as fileiras da República
Rio-Grandense, pode-se constatar que, ao contrário dos peões campei-
ros, para os quais seguir os patrões-comandantes era quase uma conti-
nuidade das atividades cotidianas, os escravos alforriados pagavam com
o serviço militar a liberdade do cativeiro. Outra diferença dizia respeito
ao lugar ocupado no exército rebelde: os peões livres eram destinados à
cavalaria, a arma por excelência das guerras platinas; aos escravos –
salvo aqueles que já detinham o estatuto de “campeiros” – destinava-se
o serviço na infantaria, onde os riscos eram mais acentuados.
Já no que diz respeito às relações externas dos farroupilhas, a
presença de libertos no exército farroupilha imbricou-se com as ques-
tões platinas em pelo menos três situações: a transferência de escravos
para o Estado Oriental como uma estratégia de preservação da proprie-
dade, quando a República solicitava aos seus cidadãos a cessão de
cativos para suas hostes; o Tratado de San Fructuoso, que disponibili-
zou libertos para as tropas de Rivera, que preparava sua investida contra
Rosas invadindo a província litoraleña de Entre Ríos; a pacificação e rein-
tegração da província rebelde ao Império, com as temíveis conseqüências
de uma eventual manutenção da liberdade dos cativos que haviam lutado
pela causa republicana.

Regina Célia Lima Xavier, UFRGS


Deslindando a história sobre a escravidão no Rio Grande do Sul
O trabalho que eu pretendo discutir neste II Encontro resulta de
uma reflexão sobre a forma como a historiografia rio-grandense, na vira-
da do século XIX e nas primeiras décadas do século XX percebeu o
africano e seus descendentes e como avaliou sua importância na cons-
tituição do Rio Grande do Sul. Qual o peso atribuído a escravidão, por
exemplo, nos primeiros estudos científicos elaborados no interior do Ins-
tituto Histórico e Geográfico da Província de São Pedro? Qual a influên-
cia do debate sobre as raças, veiculado nos congressos nacionais orga-

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nizados pelo IHGB no Rio Grande do Sul? São questões como estas
que meu trabalho pretende debater.

Sessão 2:

Ivone Cecília D’ Ávila Gallo, PUC/Campinas


Socialismo e escravidão: paradoxos do século XIX
O século XIX pode ser interpretado como o século em que as
questões sociais ganham expressão e vulto. Este século de antagonis-
mos produziu as misérias sociais e paralelamente um conjunto de idéias
que objetivaram saná-las. Entre os pensadores que operaram uma refle-
xão crítica sobre este momento histórico encontra-se Charles Fourier,
preocupado, em plena época da Restauração, com a questão da liber-
dade, do livre arbítrio, da escravidão.
A obra deste pensador teria influenciado significativamente o mo-
vimento operário na Europa até os anos 50 do século XIX e as suas
reflexões serviram de inspiração para um grupo de operários franceses
que dirigiram-se ao Brasil em 1840 e fundaram em Santa Catarina uma
comunidade de tipo fourierista.
O texto que apresentaremos visa discutir a teoria e a prática fouri-
erista, o contexto europeu de desenvolvimento industrial e a sociedade
brasileira escravista, ou melhor, a relação possível entre socialismo e
escravidão (Brasil e América do Norte). Enfim, trata-se de um assunto
complexo, pouco explorado, porém pertinente.

Carlos Engemann, UFRJ


Reflexões acerca de alguns elementos constitutivos da sociedade
escravista no Brasil
Neste trabalho apresentamos uma reflexão de cunho histórico-
sociológico a cerca da constituição da escravidão colonial. Para tanto,
buscou-se inicialmente apontar o elevado grau de aceitação da escravi-
dão no espaço ideológico colonial, confrontando-a com o surgimento de
novas idéias pautadas na concepção iluminista de liberdade. Interessa-

21
nos mostrar que no caso das sociedades chamadas de Antigo Regime,
os laços de solidariedade e de submissão desempenham um papel deci-
sivo no posicionamento dos indivíduos na sociedade.
Trata-se, nesse caso, muito mais de grupos relacionados do que
de indivíduos propriamente ditos. Levando isso às últimas conseqüênci-
as, podemos começar a entender por que a rebelião e o aquilombamen-
to não foram as únicas posturas tomadas pelos escravos. Mais ainda, se
torna factível, afastado o juízo de valor, os inúmeros casos de cativos
que, saindo da sua desafortunada condição jurídica, tornaram-se tam-
bém senhores de escravos ou mesmo se ligaram ao tráfico.
Com vistas a reconstruir o espaço desta hegemonia, examinamos
a instituição escravista sob a perspectiva identitária, desde a África até
sua chegada à América. Objetivou-se, ainda, demonstrar que a escravi-
dão estava imbricada em um sistema hierárquico que açambarcava a
sociedade colonial como um todo, não sendo dela uma apêndice, mas
sendo apenas uma das faces de uma hierarquização fundamental. É,
pois, necessário considerar que os indivíduos alcançados pelo infortúnio
do cativeiro – e seguidamente do tráfico transatlântico – atravessaram
todo um escopo de situações relacionais até chegarem à América e en-
tão se tornarem, em seus descendentes, crioulos.
Por fim, examina-se duas escravarias de grande porte em regiões
distintas e com trajetórias semelhantes: Real Fazenda de Santa Cruz
(1791) e San Miguel de Tucumán (1768). Nestas fazendas pretende-se
observar, via padrões demográficos, similitudes e diferenças na consti-
tuição social de ambas. Trata-se de duas propriedades marcadas pelo
trato religioso jesuíta e que na segunda metade do século XVIII apresen-
tavam traços de crescimento endógeno.

Luiz Paulo F. Nogueról, UFRGS e Leonardo Monastério (UFPel)


Encruzilhada: contribuições da cliometria para responder a algu-
mas indagações da historiografia nacional
A historigrafia norte-americana a respeito da escravidão sofreu
uma revolução em meados da década de 70 quando dois acadêmicos,
Robert Fogel e Stanley Engerman, publicaram o livro Time on The Cross.

22
Nesta obra, foram lançados novos olhares por meio de um instrumental
estatístico e econômico sofisticado sobre a história dos Estados Unidos
a respeito de duas questões espinhosas: a Guerra de Secessão e a
Abolição da Escravidão. Os resultados que encontraram foram perturba-
dores, isto é, verificou-se que os cativos daquele país não se encontra-
vam na situação materialmente miserável que a historiografia normal-
mente lhe atribuiu; que a escravidão era economicamente eficiente e
racional; que havia uma grande variabilidade do uso dos cativos; que a
economia do Sul dos EUA não era tão ineficiente e pobre quanto se
imaginava; etc. O impacto de tais conclusões e argumentos no momento
da publicação do livro foi enorme, pois vivia-se um dos mais explícitos
conflitos raciais da história norte-americana e ambos os autores foram
acusados, dentre outras coisas, de racismo.
No Brasil, a influência de tal obra, assim como do programa de
pesquisa desenvolvido por Robert Fogel, dentre outros acadêmicos, foi
mínimo, para não dizer nulo. Desta forma, ainda que o debate historio-
gráfico tenha sofrido transformações desde os anos 70, saindo de cena
a história econômica e ganhando maior espaço outras linhas de pesqui-
sa e abordagens, as contribuições da cliometria tal como desenvolvida
nos EUA foram poucas.
Em um congresso como este, cremos que pode ser do interesse
da comunidade acadêmica conhecer alguns dos resultados da historio-
grafia norte-americana a partir da cliometria, assim como conhecer al-
guns dos resultados já alcançados pelo uso de métodos estatísticos e
econômicos para a compreensão da História do Brasil e, em particular,
para a História do Rio Grande do Sul.

Sessão 3:

Júlio César Cóssio Rodriguez, UFRGS


Por uma História da África Pré-Colonial: algumas considerações
A História da África, anterior ao mercantilismo e após o período
pré-histórico, encontra-se em um momento de “redescoberta”, no Brasil,
devido a uma imposição legal, a partir da obrigatoriedade de inserção da
23
História da África nos currículos escolares. Esta situação remete a um
problema historiográfico, o qual o artigo pretende tecer algumas consi-
derações. A História da África foi nitidamente construída a partir de sua
relação à outrem – desta forma questões racistas podem ser considera-
das dificuldades para um estudo da África Pré-Colonial. Outra dificulda-
de historiográfica é o acesso a fontes, devido a problemas climáticos de
conservação de vestígios arqueológicos e a dificuldade de encontrar
documentos escritos, tanto de viajantes árabes como de viajantes de
outras regiões, como da China. E, ainda, o atual conflito entre as diferen-
tes correntes teóricas, torna-se uma dificuldade, mas ao mesmo tempo
uma possibilidade, para a História africana do período em questão –
devido à importância de relatos orais e da tradição oral dos griots africa-
nos. Além do problema teórico da imposição de conceitos (normalmente
construídos para a Europa) realizada por muitos estudiosos, os quais
não percebem a historicidade dos próprios conceitos e a necessidade
de problematizá-los (e não impô-los) para a História da África.
A necessidade de estudo deste período histórico é notável, mas a
precariedade das pesquisas, das publicações, das fontes, além das ques-
tões teóricas que permeiam este estudo, conferem uma dificuldade úni-
ca ao estudo da História da África, que pode ser chamada de Pré-Colo-
nial. A importância do artigo é levantar o debate em torno da necessida-
de de pesquisas mais efetivas sobre este período da História africana,
para que este possa ser um campo de estudo próprio e único. Há no
Brasil um interesse, de extrema importância, de alguns centros de estu-
do a respeito da História da África, porém, estas pesquisas (em sua grande
maioria) se referem ao período colonial deste continente, devido ao es-
tudo da escravidão africana no Brasil. No entanto, a relação entre o Bra-
sil e a África está além da escravidão (apesar da inquestionável relevân-
cia dos estudos referentes à escravidão), devido às origens (resignifica-
das) étnicas e culturais do povo brasileiro, eminentemente, ligadas à
África. Também, a importância do conhecimento da História da África
Pré-Colonial está na necessidade de visibilidade desta por uma História
Geral.

24
Gabrielle Werenicz Alves, UFRGS
A participação escrava na Revolução Farroupilha: análise historio-
gráfica
O trabalho visa fazer uma análise do que foi escrito sobre a parti-
cipação dos escravos negros na Revolução Farroupilha. A partir de um
levantamento historiográfico, pretendo mostrar como os intelectuais de
diversos períodos do século XX interpretaram questões como: qual foi o
papel do negro na guerra, como estes foram recrutados, por que alguns
lutaram ao lado dos farrapos e outros se renderam ao Império, quais as
negociações feitas com os escravos e qual o fim destes ao término da
guerra.

Maximiliano Mazewski Monteiro de Almeida, PUCRS


Escravos e Afro-descendentes na Historiografia oficial do castilhismo
Como prática historiográfica, entende-se o ato de escrita da histó-
ria, determinado por seu lugar no tempo e no local do qual deriva. Para
tal, há fatores que exercem o controle sobre aquilo que deve ou não ser
escrito. Com o fim da Revolução Federalista (1893-95) e a vitória do
Partido Republicano Rio-grandense tornou-se possível reorganizar o
ensino público no Rio Grande do Sul (1897). O objetivo desse ensino era
a aculturação cívica, que pretendia produzir uma versão definitiva do
passado, através da historiografia destinada às escolas primárias. Uma
série de livros de História e Geografia foram adotados oficialmente para
o ensino público. Entre eles estão História do Rio Grande do Sul para o
ensino cívico (1898), de João Cândido Maia e Historia do Brazil, escripta
para meninos, de João von FRANKENBERG (1898). Contudo, esses
autores estão marcados por uma forte tendência depreciativa do papel
dos africanos como agentes do processo histórico. Justificando, assim,
o imperialismo europeu sobre a África e a escravidão nas Américas. Os
indígenas do sul também foram descritos como uma “riqueza” ambicio-
nada pelos “aventureiros” que os buscavam unicamente para o trabalho
escravo. Ao excluir do seu projeto progressista a africanos e indígenas,
a historiografia oficial dos castilhistas instaurou o privilégio do pertenci-
mento étnico, juntamente com a religiosidade e a organização estatal,

25
como um dos fatores determinantes do grau de civilização da sociedade.
Quando são comparadas essas práticas historiográficas mencionadas
com documentos e relatos da Revolução Farroupilha (1835-45), faz-se
evidente que a participação do escravo era imprescindível para a sus-
tentar o esforço de guerra.

Mariana Selister Gomes, UFRGS


As representações em torno dos negros e o Primeiro Congresso de
História Nacional do IHGB: uma análise do trabalho apresentado
por Affonso Cláudio
O IHGB (Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro), fundado em
1838, pode ser considerado o marco da institucionalização da História
no Brasil – anterior a História propriamente acadêmica das universida-
des. O Primeiro Congresso de História Nacional do IHGB, realizado em
1914, reunindo 96 trabalhos voltados à História do Brasil, é de extrema
importância para a escrita da História deste país, por apresentar este
objetivo, ter uma legitimidade científica e construir representações que
se repetem na historiografia. Neste estudo analisar-se-á as representa-
ções em torno dos Negros construídas pelo trabalho apresentado por
Affonso Cláudio “As tribos negras importadas; estudo etnográfico e sua
distribuição regional no Brasil; os grandes mercados de escravos”, na
3ª. Secção “História das Explorações Arqueológicas e Etnográficas” do
Congresso em questão. A partir da recepção deste trabalho e suas re-
presentações1, percebe-se a importância do Congresso e do IHGB na
construção da História do Brasil. Isto justifica a análise detalhada de um
dos trabalhos apresentados (o primeiro a tratar de algo relacionado aos
Negros), na qual busca-se compreender quais as representações em
torno dos Negros que envolvem a História do Brasil produzida. Nesta
análise do trabalho apresentado por Affonso Cláudio buscar-se-á enten-
der a recepção (entendida como ressignificação a partir do contexto bra-

1 Recepção esta, observada através da análise historiográfica construída no levantamento biblio-


gráfico de todos os artigos publicados no Rio Grande do Sul até 1960, realizado no Projeto “Es-
cravidão no Rio Grande do Sul: percepções historiográficas e guia bibliográfico”, do qual partici-
pa-se como bolsista PIBIC/FAPERGS da Prof. Dra. Regina Xavier.

26
sileiro) das Teorias Racistas Européias do século XIX, as quais o autor
faz referência. Compreender-se-á, também, o lugar do autor, para anali-
sar sua obra. Partir-se-á do questionado e interpretação do Brasil do
Primeiro Congresso de História Nacional (com as discussões do Código
Civil, com a construção de uma História Pátria – a partir do branquea-
mento da sociedade brasileira, possível pela imigração), a fim de com-
preender quais os motivos, objetivos e conseqüências das representa-
ções construídas pelo trabalho em questão.

Sessão 4:

Tathianni Cristini da Silva (Msc), UNIVEST/ FACVEST


Do edifício à cidadania: o patrimônio material e sua relevância para
a conquista da cidadania pelos afro-descendentes de Lages/SC
Esta pesquisa visa discutir as implicações da construção de um
espaço próprio para os enlaces sociais entre a população afro-descen-
dente lageana e os demais segmentos sociais da região no decorrer do
século XX, e seu esquecimento ou quase desaparecimento no século
XXI. Nosso desejo está em perceber como um edifício destinado ao Centro
Cívico Cruz e Souza, clube que se auto-intitulava dos “morenos” e que
adquiriu notoriedade na região após sua fundação em 1918, pôde ter
seu patrimônio em ruínas após uma história de importante colaboração
para a inserção da população afro-descendente lageana nos diversos
projetos de inclusão social vigentes em diferentes governos nacionais.
Estamos relacionando neste trabalho, que a pouco teve seu início, uma
discussão entre o patrimônio cultural material perpassando a educação
patrimonial e sua importância para a inclusão e afirmação da cidadania,
enquanto elemento básico a cada individuo. Para tanto, partimos da de-
finição que muitos autores tem a respeito do que se entende por patri-
mônio: como conjunto de bens materiais e não materiais que são rele-
vantes para uma determinada comunidade, cidade, estado ou nação
quanto a sua história, geografia, etc.; logo, é observável a relação que o
patrimônio detém com a busca da cidadania que perpassa um reconhe-

27
cimento do individuo conquanto cidadão que se vê na história, portanto
em artefatos que o remetem a se perceber enquanto agente histórico.

Diego Rodrigues, Ezequiel Giacomelli e Marcos Smith Dias, UFRGS


Elementos comuns e diferenças entre os patrimônios registrados
na pecuária gaúcha e na pernambucana no início do século XIX
Este artigo procura apresentar algumas comparações entre a pe-
cuária escravista gaúcha e a pernambucana para a primeira metade do
século XIX, assim como evidenciar as diferenças e semelhanças entre
as composições dos patrimônios segundo inventários post-mortem en-
tre as comarcas de Porto Alegre, Rio Pardo, Rio Grande e Pelotas. Veri-
ficou-se que a maior proporção da riqueza inventariada, tanto no Agres-
te e no Sertão pernambucano, como no Rio Grande do Sul, estava alo-
cada em escravos, em animais e em propriedades fundiárias, indicando
uma forte semelhança social e econômica, apesar da diversidade entre
os pampas e a caatinga .

Jardel Gores, UNIVEST/FACVEST


A edificação da cidadania pela memória na cidade de Lages/SC
Inicia-se o século XX, é um período de transformações políticas,
indagações sociais e busca de auto afirmação e conhecimento na for-
mação de uma identidade no contexto nacional. Assim, a cidade que
hoje conhecemos por Lages foi elevada a esta categoria em 1820; o que
posteriormente trará como conceito e palavra chave a modernização.
Sendo o cidadão negro e mestiço, foco deste estudo; evidenciamos a
construção do Centro Cívico Cruz & Souza, que tem sua fundação no
dia 22 de setembro de 1918. É este novo espaço que proporcionará a
estes cidadãos uma maior legitimação e organização perante esse perí-
odo de identificações e de várias transformações sociais. É também esta
edificação que buscará revitalizar o patrimônio cultural do povo negro e o
impulsionará a criação mais efetiva de uma identidade local, através da
rememoração de cultos, músicas, artefatos, e ainda de documentos e reu-
niões tanto de âmbito social como festivas. Desta maneira fica a reflexão;
do fortalecimento da memória pela construção de um bem material.

28
Marcos Rafael da Silva, UNIVEST/ FACVEST
A formação patrimonial e a conquista da cidadania pelos afrodes-
cendentes
A abolição da escravidão no Brasil e a proclamação da república
mudaram drasticamente os rumos pelos quais o país vinha norteando
seus caminhos. Precisou-se criar um novo imaginário sobre Brasil, so-
bre o brasileiro, e sobre nação afim de se dar conta da nova conjuntura
política, social e econômica que então se instaurava. E é em meio a
essas tantas mudanças e necessidades, que o Centro Cívico Cruz e
Souza, objeto desta pesquisa, foi criado. A entidade nasce em 1918, em
Lages (SC). A convite do então prefeito Caetano Vieira da Costa, um
grupo de afro-brasileiros inicia um movimento pelo qual objetiva-se orga-
nizar a comunidade negra lageana em uma associação. Tendo iniciado
seu funcionamento em sala cedida por uma associação de músicos, logo
se constrói o prédio-sede da entidade, revertendo em prática o imaginá-
rio daqueles que a idealizaram. Se é importante perceber quais foram os
possíveis interesses das elites lageanas, representantes do poder esta-
tal, na criação de uma associação destina aos afro-brasileiros recém
incorporados à esta nação, não é menos importante verificar de que
maneira, a construção do prédio, a organização da documentação, a
criação de uma biblioteca etc., ou seja, a formação de um patrimônio,não
só material, mas sobretudo cultural, serviu como instrumento de visibili-
dade e agente de legitimação do Centro, ao mesmo tempo em que pro-
porcionou a ligação direta entre o imaginário cheio de ideais de pertenci-
mento e cidadania que embalou os sonhos dos seus idealizadores e a
sua efetivação prática.

Jean Carlos Antonio, UFSC


Fortuna e cultura material na Ilha de Santa Catarina: Freguesia de
Nossa Senhora da Lapa do Ribeirão na segunda metade do século XIX
O objetivo desta comunicação é apresentar o resultado parcial do
trabalho de conclusão de curso da graduação em história. Através do
inventário de um grande proprietário de terras, imóveis e escravos da
Freguesia de Nossa Senhora da Lapa do Ribeirão na segunda metade

29
do século XIX, procuro fazer uma análise de sua fortuna e do conjunto
de seus bens materiais. Esta pesquisa em torno da fortuna e cultura
material através da análise do inventário possibilitará também perceber
alguns mecanismos existentes nessa Freguesia. Um deles é o funciona-
mento do mercado de abastecimento local e a contribuição da produção
agrícola da Freguesia para as exportações de Santa Catarina. Nesse
intuito, poderemos verificar o emprego da mão de obra escrava princi-
palmente na área rural. Sendo assim, pretendemos desmistificar a idéia
que na ilha só havia o trabalho doméstico e que o mercado de alimentos
era essencialmente voltado para o abastecimento local.

Sessão 5:

José Bento Rosa da Silva (UNIVALI)


Em águas do Atlântico sul: escravos-marinheiros no cais do porto
de Itajaí(SC) no século XIX
A comunicação investiga a presença de escravos marinheiros no
cais do porto de Itajaí em diversas situações.Em 20 de maio de 1878,
por exemplo, Joaquim José dos Santos, capitão do Brigue Nacional Si-
queira; procedente da corte, com carga para Itajaí, requereu do juiz mu-
nicipal, Nicolau Malburg, da então Vila, o auto de interrogação de toda
tripulação, por ter constatado roubo de mercadorias. Entre a tripulação
composta de dez marinheiros, estavam quatro escravos, todos perten-
centes a Vicente Haendchen. Eram o africano Manoel, os crioulos Sér-
gio, Silvério e Pedro, todos da província de Santa Catarina.
O capitão, no auto de perguntas, afirmou que “ o fato criminoso se
deu pela tripulação do navio do seu comando e na viagem do Rio de
Janeiro para este porto, não podendo declarar em que dia teve começo
o arrombamento dos volumes roubados, porque só depois de chegar a
este porto é que teve conhecimento de ter havido esse crime por parte
de seus marinheiros”
Outros processos crimes estão envolvidos escravos e libertos, to-

30
dos marinheiros, em brigas à beira do cais, por razões diversas, inclusi-
ve disputando o prazer das mulheres da beira do cais.
Seguindo as sugestões metodológicas de Ginzburg, os proces-
sos serão analisados à luz do paradigma indiciário, visando conhecer os
meandros do cotidiano destes marinheiros negros.

Beatriz Ana Loner, UFPel


Antônio: de Oliveira a Baobad
A comunicação descreverá a trajetória de Antonio Baobad e de
seus amigos, na Pelotas de final do século XIX. Ex-escravo que com-
prou sua liberdade e foi liderança operária e étnica, fazendo parte do
grupo fundador do jornal A Alvorada, sua biografia nos permite perceber
as perspectivas possíveis para o grupo negro da região após a abolição.
Sendo incomum, sua trajetória explora ao máximo as potencialidades
abertas com a libertação dos trabalhadores em 1888, ao mesmo tempo
que configura algumas das limitações que enfrentaram, em sua tentativa
de integração a sociedade branca e capitalista. Segue abaixo um breve
resumo de sua biografia, que servira como guia da comunicação, embo-
ra a mesma seja suficientemente ampla para permitir caracterizar outros
integrantes do(s) grupo(s) de que Baobad participou.
Antonio Baobad (de Oliveira) membro da União e Fraternidade dos
Operários Chapeleiros de 1886, vice-presidente da mesma em 1887, se-
cretário da Feliz Esperança, em 1884/1885. Participa da chapa Reforma-
dora (socialista) da Liga Operária em 1893. Membro da 1ª direção da União
Operária Internacional de Pelotas, como seu presidente. Foi orador da
direção provisória do Centro Operário 1º de Maio, de Pelotas, fundado em
agosto de 1898. Nascido escravo, comprou sua liberdade, e estudou na
escola da Biblioteca Pública, assinando-se como Antonio de Oliveira. Apro-
ximou-se de grupos republicanos, depois os seguiu em seu desencanto
pela república e na descoberta da ideologia socialista, mas, desiludido com
as pessoas em geral, terminou sua vida reivindicando uma identidade étnica
como Antonio Baobad, forte árvore de grossas raízes africanas. Presumível
irmão de Rodolpho Xavier, foi redator do jornal Alvorada, preceptor dos ir-
mãos Penny e morreu em 1907, com idade aproximada de 49 anos.

31
Henrique Espada Lima (UFSC)
As várias faces da precariedade: para uma história comparativa da
escravidão e da liberdade no século XIX
A universalidade do tema “trabalho” sugere fortemente uma abor-
dagem comparativa em vários planos. Tomando as sociedades escravis-
tas das Américas, a escravidão e o trabalho escravo foram, não por aca-
so, objeto de importantes estudos desse gênero. De fato, abordagens
comparativas estão na origem de alguns dos principais debates sobre a
escravidão nas Américas, seja tratando das diferenças de caráter eco-
nômico ou religioso, ou as diversas tradições jurídicas no que diz respei-
to à escravidão (com o conseqüente acesso desigual a alforrias e manu-
missões, etc). A partir daí há todo um campo de estudos que vai desde
as formas distintas de escravidão até o tema das relações “raciais” e do
lugar dos ex-escravos e seus descendentes nas sociedades pós-aboli-
ção.
Se tomarmos o século XIX, o último século da escravidão nas
Américas, a oposição entre “trabalho escravo” e “trabalho livre” articula
um campo de estudos comparativos definido e importante. Recentemente,
o estudo das sociedades no pós-emancipação vem ganhando ainda mais
relevo, na medida em que articulam questões centrais como: relações
raciais, cidadania e direitos políticos, etc. O tema da experiência do “tra-
balho” sob o regime da escravidão e da liberdade parece ter, entretanto,
um espaço menor. Não por acaso, há ainda uma lacuna a ser preenchi-
da no que diz respeito aos diálogos entre a historiografia da escravidão
e a historiografia sobre o trabalho no século XIX. O tema desta apresen-
tação é precisamente abordar esse hiato, explorando-o sob dois pontos
de vista complementares: O primeiro, historiográfico, tentando mapear
as questões que aproximam e separam os dois campos de estudo. O
segundo, fundamentado na pesquisa, tenta discutir um terreno comum
para uma discussão comparada, tomando a vivência da “precariedade”
como o solo comum que permite abordar a diversidade de experiências
que escravidão e liberdade comportavam neste período.

32
Adhemar Lourenço da Silva, UFPel
Escravidão, liberdade e cor nas sociedades de socorros mútuos
(Rio Grande do Sul, 1856-1914)
As sociedades de socorros mútuos são “associações formadas
voluntariamente com o objetivo de prover auxílio financeiro a seus mem-
bros em caso de necessidade” (Linden) e se disseminaram no Rio Gran-
de do Sul desde pelo menos 1854. A comunicação pretende exibir as
interfaces dessas associações com os demais conteúdos em epígrafe.
Argumento que, por padrão, os escravos estão tendencialmente excluí-
dos de se associarem por duas razões: por não terem uma expectativa
de descenso social contra o qual precisariam se securitizar; e por não
operarem no mercado. Para o Rio Grande do Sul, especificamente, não
foi encontrado nenhum caso em que escravos estivessem mutualiza-
dos. Contudo, esse não era um tema de pouca importância para esse
tipo de associação, porque, uma vez libertados, as duas razões que os
excluiriam evanescem. Com efeito, várias associações no Rio Grande
do Sul refletem sobre a capacidade dos ex-escravos gerirem associa-
ções, comprometem-se com emancipações, participam ou sofrem os
efeitos da campanha abolicionista, e se interrogam sobre os efeitos da
cor da pele na “dignidade” pretendida daqueles que se associavam.
Não se deve pensar que as sociedades de socorros mútuos se-
jam apenas mais um tipo de associação afetada pela escravidão, por-
que a sobra de caixa do Centro Abolicionista em Porto Alegre foi distribu-
ída, em maio de 1888, à Santa Casa de Misericórdia, Hospício São Pe-
dro, Asilo de Mendicidade e outras 5 mutuais. Os marcos inicial e final da
comunicação referem-se à primeira entidade fundada na qual se reco-
nhece a participação de negros (a Sociedade de Beneficência Porto-
Alegrense) e a dois casos envolvendo divergências sobre a participação
de negros em mutuais (Bürgerklub e Vittorio Emanuele, em Porto Ale-
gre).

33
Sessão 6:

Márcia Naomi Kuniochi (FURG)


O perfil social dos escravos em Rio Grande, século XIX
A Cúria Metropolitana do Município de Rio Grande preservou os
livros de batismo e óbito dos escravos da região, desde a fundação da
cidade, em meados do século XVIII, que estão, inclusive, microfilmados.
O livro de batismo apresenta dados sobre: data do batismo, filiação, na-
ção dos pais e padrinhos; por sua vez, o livro de óbitos fornecem infor-
mações sobre: data da morte, idade, nação e causa. As informações de
nascimento e morte estão vinculadas ao nome do respectivo proprietário.
A quantificação das informações coletadas fornece indicadores
relevantes para se construir um perfil dos escravos registrados nas paró-
quias da região. Por meio da sistematização e cruzamento dos dados é
possível avaliar as características da população escrava da região, cu-
jos plantéis estavam dispersos, seja nas mãos de proprietários ligados
tanto ao meio rural seja no setor urbano, para atender às necessidades
da vila fronteiriça e portuária: como sede militar do extremo sul do Brasil
e última base mercantil do país para intermediar o comércio com o Rio
da Prata.
Para caracterizar melhor a população escrava, uma outra fonte
vai retratar com mais clareza as atividades do cativo: os anúncios de
compra e venda, coletados de jornal local, de meados do século XIX,
que traz, além da nação e idade do escravo, as profissões exercidas
tanto pelo homem como pela mulher cativa.
O estudo operacionaliza uma metodologia de exploração de tais
fontes primárias que nos permitem leituras transversais sobre as rela-
ções entre senhores e escravos e contribui desse modo para a historio-
grafia da escravidão no Brasil Meridional, de inúmeras experiências his-
tóricas e necessitam de maior visibilidade na historiografia brasileira, ainda
focada nos grandes centros econômicos agro-exportadores e de “ plan-
tation”.
Esses dados nos permitem traçar um perfil ainda preliminar do
escravo em Rio Grande, no século XIX, identificando características das

34
relações entre senhores e escravos, as condições de vida e trabalho,
assim como doenças que mais os acometiam e o o nível de opressão e
de violência dessas relações. Também leituras sócio-culturais pela re-
produção de práticas culturais de seus senhores como o batismo e in-
corporação de nomes cristãos.

Albertina Lima Vasconcelos, USP


Tráfico interno, liberdade e cotidiano de escravos em Rio Grande –
RS, no século XIX
A comunicação tem como objetivo apresentar resultados de pes-
quisas sobre aspectos do tráfico interno de escravos, ou tráfico interpro-
vincial, especificamente dos que tiveram como rota de chegada o Rio
Grande do Sul, no século XIX, e algumas experiências de luta e resistên-
cia contra a escravidão e de práticas sócio-culturais cotidianas.
Essa comunicação traz como contribuição ao debate sobre escra-
vidão uma reflexão sobre aspectos do tráfico e ressalta a importância de
estudos que revejam as análises que identificam o tráfico na sua verten-
te interna como conseqüência da Lei de abolição do Tráfico 1850. Os
dados das pesquisas demonstram que esse processo interno existiu antes
dessa data, mesmo que com menor dinâmica. O Rio Grande do Sul, mais
precisamente a cidade de Rio Grande foi um desses destinos de escravos
que vinham do nordeste, no caso da Bahia e de outras Províncias.
A abordagem referenciada na História Social e na História Econô-
mica se baseou na exploração de fontes primárias como livros de Passa-
portes, e Jornais. Também permitiu realizar leituras que identificam a ne-
cessidade de debate em torno dessa questão, pois como está consagrado
nos livros didáticos uma certa idéia de fixação permanente de escravos
desembarcados nos portos de Salvador, Recife e Rio de Janeiro conduz a
uma interpretação de uma fixação natural desses escravos que teriam
permanecidos “ para sempre”, nessas regiões. Torna assim, também obs-
cura a percepção de outra dinâmica interna do tráfico; minimiza o impacto
sócio-cultural das relações interétnicas; os contatos e interferências nas
relações cotidianas pela movimentação continua de entrada e saída de
escravos tanto por terra e por mar e em várias direções geográficas em
todo o Brasil.
35
O tráfico interno possibilitou esse movimento itinerante de mão-
de-obra escrava, num processo de migração involuntária e simultanea-
mente a essas levas cotidianas de gente em movimento, levas também
de recriação de formas de viver e sobreviver, também se mesclavam
valores, cultura e suas práticas. Os dados apurados desse processo de
transferência de mão-de-obra escrava da Bahia para o Sul, do século
XIX, ao coligirmos informações sobre nome, origem, por vezes idade,
sexo, etnia, assim como os procuradores e os proprietários,essas infor-
mações permitem traçar um perfil de escravos oriundos da Bahia para o
Rio Grande do Sul entre 1800 e 1850. Podemos afirmar que a experiên-
cia escravista no Brasil foi responsável pela constituição de uma socie-
dade estratificada, hierarquizada e construída com base na exploração
de mão-de-obra escrava e, em maior ou menor grau marcada pela he-
rança africana.

Ricardo De Lorenzo (UFRGS)


Sobre a insanidade mental entre cativos e libertos (Porto Alegre,
século XIX)
Partindo da leitura sobre a discussão política e sobre as fontes
médico-institucionais, policiais, judiciárias e jornalísticas, procuro cercar
o universo de alienados, decreptos e suicidas que circularam pelas ruas
e pelas instituições de acolhimento de Porto Alegre durante a segunda
metade do século XIX. Meu objeto de estudo se recorta sobre os escra-
vos, africanos ou crioulos, e sobre os negros livres ou libertos nestas
condições, ou seja, identificados como insanos pelas diversas autorida-
des públicas ou pela incipiente medicina.
O problema central que apresento refere-se à seguinte indaga-
ção: qual a lógica inerente aos comportamentos de cativos e libertos dito
insanos e, por contrapartida, quais as situações e critérios que levavam
à classificação desses indivíduos como insanos?
Essencialmente, importa-me saber qual era o perfil social e com-
portamental dos escravos e libertos em questão: qual a sua origem (afri-
cana ou crioula), a quem pertenciam ou sob quais condições foram alfor-
riados, quais as suas idades, sexo, situação familiar e laboral? Qual a

36
sua representatividade no universo dos “insanos”? Qual a trajetória des-
ses negros cativos, livres e libertos, anteriormente e já dentro dos meca-
nismos de exclusão que se acionavam como resposta às suas manifes-
tações mentais? A perspectiva de análise das formas de controle / trata-
mento que sofriam sugere indagações sobre como os negros reagiam
ou se articulavam em estratégias que lhes permitissem amenizar ou su-
perar esse enquadramento. Há sempre uma nova estratégia ou se re-
produz ou potencializa uma prática costumeira criada ou herdada? Pode-
se compreender o comportamento considerado anormal dentro de uma
lógica própria que se explica pela experiência sócio-cultural dos negros,
extrapolando o diagnóstico circunstancial da autoridade, seja pública ou
médica, ou mesmo em contraposição a outros grupos sociais que tam-
bém sofriam o apartamento social por alguma manifestação de insani-
dade? O que dá especificidade aos negros nesse processo? Há varia-
ção de seu comportamento ao longo do tempo?
Além disso, um contraponto complementar aos ditos insanos pa-
rece-me pertinente, pois se verificamos um modelo de controle social
baseado na prevenção ou resposta ao comportamento considerado anô-
malo – passível de afastamento da relação social cotidiana a partir de
uma classificação, geral, de “insanidade” –, interessa saber em que grau
esse controle prendia-se ao arbítrio da autoridade “de plantão” ou adota-
vam-se os preceitos médicos que no decorrer do século XIX passaram a
ser considerados “científicos”. Na análise de quem cabia recolher esses
indivíduos percebidos como fator de perturbação, qual sua visão própria
em relação ao problema específico dos cativos e dos libertos e como ela
se altera ao longo do período? O quanto isso influi na trajetória dos “en-
quadrados”?

Nikelen Acosta Witter (UFF/RJ e UNIFRA/RS)


Negociando cuidados e liberdades: as práticas de saúde, doença e
cura entre senhores e escravos (RS, Século XIX)
Esta comunicação tem como objetivo propor um debate acerca
do estudo das práticas de saúde, doença e cura como um espaço de
interessante valor histórico para a observação das tensões, conflitos e

37
negociações entre senhores e escravos no século XIX. Nas pesquisas
que têm sido realizadas sobre o cotidiano dos habitantes da província do
Rio Grande do Sul, as referências aos embates em torno das questões
de saúde são bastante comuns. Um olhar mais atento à documentação
levantada por diferentes historiadores, no entanto, tem revelado um uni-
verso de tensões que extrapola as perspectivas que até agora se debru-
çaram apenas sobre os conflitos e solidariedades estabelecidos entre os
curandeiros negros (escravos ou não) e suas clientelas. Nesse sentido,
uma análise da experiência da enfermidade tanto de escravos quanto de
senhores e das relações que a partir daí estes estabeleciam entre si
pode revelar um outro aspecto da experiência dos cativos. De fato, o
cuidado das moléstias era um ponto importante de negociação entre
senhores e escravos nesta sociedade. Processos-crimes, artigos de jor-
nais, cartas particulares, inventários e testamentos dão conta das com-
plexas interações sociais que se estabeleciam quando saúde era um
dos fatores em jogo. Dentro deste quadro, é também importante que se
perceba que a doença, por vezes, podia representar algo além do sofri-
mento. Numa sociedade desigual, hierarquizada e violenta como a do
Brasil do século XIX, adoecer ou simular uma doença poderia angariar
para seu portador/ simulador ganhos secundários que iam desde simpa-
tias por sua condição até o alcance de certas liberdades ou pelo menos
de “zonas de respiro” ou espaços para a negociação dentro do afã dos
afazeres diários.

Sessão 7:

Roger Elias (UFRGS)


Famílias escravas em Porto Alegre (1810-1835). Uma história de suas
formações
A escravidão é um dos traços mais determinantes da história naci-
onal, e também um dos mais discutidos pelos historiadores. A historio-
grafia dedicada à escravidão no Brasil Imperial tem, há muito, debatido
intensamente a condição social do escravo. Porém, esta é uma discus-

38
são que está longe de ser encerrada. Desde as afirmações em prol do
que se chamou de “democracia racial” nos anos 1930, até as pesquisas
sobre as famílias escravas a partir da década de 1980, passando pela
idéia de “reificação do escravo”, defendida pela chamada Escola Paulis-
ta de Sociologia, a dianteira dos debates já oscilou entre extremos opos-
tos. Referindo-se mais diretamente à temática da formação das famílias
escravas (foco da presente pesquisa), trabalhos que tiveram por objeto
áreas do centro do país dedicadas às plantation de cana-de-açúcar e
café revelaram, com base numa extensa base documental, que para tais
áreas era recorrente a presença de famílias escravas nos plantéis. Tal
constatação ensejou questionamentos diversos, tendo destaque especi-
al o debate sobre o significado dessas famílias para escravos e senho-
res, ou seja, a existência dessas famílias enquanto estratégia de eman-
cipação dos escravos ou de dominação por parte dos senhores. A pre-
sente pesquisa em andamento tem por mote investigar a formação das
famílias escravas em Porto Alegre no período de 1810 a 1835. O marco
temporal pretende permitir a análise da condição das famílias escravas
num período dinâmico do município, desde quando este ascende à con-
dição de vila até o cerco farroupilha de 1835. Além disso, estão já pre-
sentes no período duas realidades distintas: além da grande zona rural,
um pequeno núcleo urbano, limitado à península correspondente à zona
central do município, configura um contexto com cenários diversos, de
forma a tornar possível, esperamos, conclusões sobre as peculiaridades
das famílias escravas nesses dois ambientes. Finalmente, pretende-se
chegar a resultados que possibilitem fazer comparações pertinentes com
os resultados de pesquisas levadas a cabo no sudeste do país.

Edson José Neves Júnior (UFRGS)


Reprodução natural e famílias escravas em Porto Alegre – 1840-
1865
A presente comunicação tem por objetivo apresentar pesquisa em
desenvolvimento tratando da reprodução natural da escravaria porto-
alegrense em meados do século XIX, portanto, trabalho no campo da
história demográfica. Procurarei averiguar se a reprodução vegetativa

39
da população escrava desta cidade conseguiu supriu devidamente a de-
manda exigida pelo mercado e manter o contingente populacional man-
cípio proporcionalmente idêntico nos períodos pré e pós-tráfico.
Tenho também por meta desvendar como essa reprodução se deu,
ou seja, quais arranjos familiares foram possíveis dentro da lógica do
cativeiro desta região e que tipo de laços de solidariedade esses cativos
criaram, através da reprodução de sua família.
No período recortado observa-se no Brasil o fim do tráfico, tornan-
do possível averiguar o seu impacto na população cativa porto-alegren-
se. Bem como, aborda um período anterior à Guerra do Paraguai, o que
implica em um período de relativa paz para a população, tornando as
análises demográficas que pretendo realizar mais confiáveis, pois ho-
mens, principalmente escravos, não foram convocados para a guerra.
As fontes com que trabalho são basicamente duas: registros pa-
roquiais de batismo, casamento e óbitos e inventários post-mortem.

Denize Aparecida da Silva (UFPR)


Arranjos e laços familiares na comunidade escrava da Freguesia de
Nossa Senhora da Graça de São Francisco do Sul/SC (1845/1888)
As pesquisas sobre a família escrava apontam para a idéia de
que nos grandes cativeiros havia maior possibilidade de constituição dos
laços familiares, principalmente nos que diz respeito às famílias legíti-
mas. E ainda que pela manutenção da família escrava era possível esta-
belecer uma situação de paz no cativeiro. Por outro lado é colocado que
a família escrava poderia significar uma forma de desestabilizar as rela-
ções comunitárias, pois na busca de negociar com o senhor, o escravo
acabava colocando seus interesses pessoais em detrimento do grupo.
Porém se pensarmos em laços familiares mais amplos, aqueles que en-
volviam parentesco consangüíneo e espiritual, então pode-se pensar que
a comunidade escrava possivelmente tinha vantagens com esta organi-
zação.
O estudo sobre a freguesia Nossa Senhora da Graça buscou ana-
lisar as relações sociais nos plantéis para responder sobre a organiza-
ção, manutenção e estratégias da família escrava, no período de 1845 a

40
1888. As características da escravidão na referida freguesia apontam
para plantéis relativamente pequenos e com escravos na sua maioria
crioulos.
Para a realização do trabalho foram lidos Registros de Batismo e
Processos de Inventários, foram analisadas as informações e também
foi feito cruzamento dos dados apresentados na respectiva documenta-
ção. Ao longo do tempo com o qual é trabalhado na pesquisa foi obser-
vada a trajetória de determinadas famílias. Outra preocupação foi co-
nhecer a organização de grandes famílias, (casais e mulheres que bati-
zaram cinco ou mais filhos), bem como as estratégias para continuidade
das famílias diante de situações de perigo como nos processos de in-
ventários.
Pede-se pensar que os arranjos de parentesco provavelmente am-
pliavam as redes de solidariedade e conseqüentemente minimizavam
os percalços da vida em cativeiro na freguesia estudada. Muito embora
constituir uma família e mantê-la ao que parece não foi uma tarefa fácil
para os cativos. Portanto os escravos precisavam construir mecanismos
para burlar os obstáculos que a condição no cativeiro lhes impunha. Daí
prefere-se acreditar que a organização da família escrava tinha um sen-
tido que envolvia interesses e desejos tanto dos escravos como dos se-
nhores.

Sessão 8:

Gabriel Santos Berute (UFRGS)


A concentração do comércio de escravos na capitania do Rio Gran-
de de São Pedro do Sul, c. 1790 – c. 1825
O Brasil foi o maior importador de escravos africanos nas Améri-
cas e o porto fluminense o principal responsável pela redistribuição dos
cativos na Colônia. Neste contexto, o Rio Grande do Sul colonial partici-
pava somente do tráfico interno de escravos, sendo tributário do tráfico
atlântico. Tendo em vista a falta de estudos relativos à importação de
cativos para o extremo sul da América portuguesa, o presente trabalho

41
propõe-se a iniciar a caracterização de tal comércio. Para tanto, procu-
rou-se definir as características principais de funcionamento do circuito
mercantil do tráfico de escravos sul-riograndense: tamanho dos envios,
número de traficantes que atuaram no período estudado, concentração
do tráfico de escravos (total de escravos transportados por cada trafi-
cante e em cada envio), a freqüência com que atuavam e o tempo de
permanência dos comerciantes na atividade. As fontes utilizadas foram
as “guias de transporte de escravos”, pertencentes ao Arquivo Histórico
do Rio Grande do Sul e os “despachos de escravos”, que se encontram
sob a guarda do Arquivo Nacional do Rio de Janeiro. A partir do trata-
mento quantitativo das informações contidas nas fontes verificou-se que,
embora participando apenas de sua etapa interna, o tráfico de escravos
do Rio Grande do Sul apresenta características semelhantes àquelas
observadas no tráfico atlântico de escravos: era um comércio composto
por um grande número de comerciantes não-especializados, “traficantes
eventuais”, sujeitos às flutuações conjunturais que determinavam a sua
permanência ou não em tal atividade comercial. Estes traficantes não-
especializados eram responsáveis pela comercialização de uma parcela
importante do total de escravos. Por outro lado, um pequeno número de
grandes comerciantes controlavam o mercado negreiro ao transporta-
rem a maioria dos escravos importados para a Capitania em questão.

Rafael da Cunha Scheffer (UFSC)


Tráfico interprovincial e comerciantes de escravos em Desterro/SC
(1849-1888)
Em outubro de 1884 desapareceu em Campinas um comerciante
que havia saído de Desterro, em Santa Catarina, para cobrar dívidas
nesta cidade paulista. Seu nome era Manoel Antonio Victorino de Mene-
zes, um negociante de escravos que, descobriu-se depois, foi assassi-
nado nesta viagem. Nossa análise de suas atividades em vida e de sua
morte nos ajuda a entender melhor como se deu a dinâmica do tráfico
interno de escravos na capital da província catarinense.
Na pesquisa sobre o tráfico interno de escravos em Santa Catari-
na após 1850, são questões importantes o volume de saída de escra-

42
vos, o funcionamento deste comércio e seus agentes. Desterro, porto de
escoamento da produção de uma região voltada para a economia de
abastecimento, viu um certo número de escravos exportados para áreas
cafeicultoras. O volume deste tráfico, a partir da pesquisa até agora em-
preendida, é relativamente pequeno. De toda forma a questão de como
se realizava este comércio ainda precisava ser esclarecida. E é aí que
encontramos a figura do senhor Victorino de Menezes.
Considerado por autores tradicionais de Santa Catarina (Walter F.
Piazza e Oswaldo Cabral) como o maior comerciante de escravos da
província, Victorino se torna um excelente ponto de referência para ana-
lisarmos a participação de Santa Catarina no tráfico interno. A própria
chegada de Victorino parece ter estado ligada a este comércio, desde
seu estabelecimento na cidade em 1868. O objetivo desta comunicação,
é analisar o funcionamento do tráfico em Desterro através da vida de
Victorino, da construção de seus laços e relações comerciais como ne-
gociante de escravos em Desterro e a forma como se davam seus negó-
cios, circunstâncias que podem estar associadas a sua morte.

Ana Flávia Cicchelli Pires (UFF)


Subterfúgios e novos padrões de organização no tráfico ilegal de
escravos: o caso do brigue Asseiceira
Diversas medidas foram sendo estipuladas gradativamente aqui
no Brasil, desde 1810, com o objetivo de abolir o comércio atlântico de
escravos. Contudo, este continuou em atividade após 13 de março de
1830, data marcada para o seu fim segundo Convenção de 23 de no-
vembro de 1826, acordada entre o Brasil e a Grã-Bretanha. Os esforços
para conter o tráfico de africanos foram poucos e insuficientes, encon-
trando apoio nas populações locais e fácil mercado. Os traficantes con-
tinuaram em ação através de um sistema de contrabando, com a coni-
vência do governo e das autoridades brasileiras, cabendo à Inglaterra o
papel de vigiar, reprimir e exigir o cumprimento dos tratados e conven-
ções firmados. Do total de africanos trazidos para o Brasil em trezentos
anos de tráfico atlântico, aproximadamente 20% chegou entre 1831 e
1855. Tal percentagem demonstra quanto o tráfico ilegal foi importante,

43
principalmente se comparado ao período total de tráfico atlântico para o
Brasil.
Sendo assim, esta comunicação tem por objetivo analisar o perío-
do da ilegalidade do comércio de escravos para o Brasil através do Atlân-
tico, ressaltando uma característica em especial, que diz respeito ao re-
direcionamento dos embarques na costa Centro-Ocidental africana. Atra-
vés desta análise poderemos perceber a flexibilidade do tráfico ilegal,
em função da necessidade de estar sempre adotando novas estratégias
para contrabalançar a intervenção britânica e as leis que foram sendo
acordadas visando seu fim. O contrabando de africanos constituiu-se
enquanto um negócio lucrativo e capaz de mobilizar importantes interes-
ses, desenvolvendo uma lógica de funcionamento e organização.

Beatriz Gallotti Mamigonian (UFSC)


O litoral sul do Brasil na rota do abolicionismo britânico, décadas
de 1840 e 1850
Este trabalho procura colocar o litoral catarinense no mapa da
repressão ao tráfico atlântico de escravos na primeira metade do século
XIX e revelar alguns contornos da pouco conhecida “conexão brasileira”
da política de recrutamento de trabalhadores para as colônias britâni-
cas. A partir de episódios de apreensão de barcos aparentemente envol-
vidos na navegação de cabotagem por um cruzeiro britânico no litoral de
Santa Catarina em julho de 1851, a comunicação aborda as evidências
da ocorrência de tráfico ilegal nesta região, a forma da repressão britânica
ao tráfico atlântico nas décadas de 1840 e 1850, e o contexto ao qual
estava associada, o de recrutamento de trabalhadores para as colônias
britânicas do Caribe. Nestes casos em estudo, ao oferecer liberdade para
os tripulantes escravos da embarcação apreendida, o capitão do cruzeiro
da Marinha Real Inglesa abriu mais uma rota de fuga para os escravos
descontentes, que por vezes já fugiam em navios mercantes ou baleeiros.
Em inúmeros outros casos registrados na década de 1840, as apreensões
de navios engajados no tráfico de escravos “desviavam” os escravos que
estavam a bordo para as colônias britânicas. Esta política britânica de re-
crutamento de trabalhadores a serem emancipados e engajados por con-

44
trato no Caribe esteve associada à da repressão ao tráfico de escravos a
partir do fim da década de 1830 e atingiu Cuba, Brasil e Serra Leoa.

Sessão 9:

Martha Daisson Hameister, UFRJ


Famílias riograndinas livres e seus escravos através dos registros
batismais: unidades oiconômicas (Rio Grande c. 1738-c.1763)
Através do estudo intensivo dos registros batismais, vêm-se tra-
balhando as relações entre os agentes históricos através do compadrio.
Isso possibilitou identificar as relações de compadrio de algumas famíli-
as livres e suas escravarias. Diferente do que é encontrado em estudos
sobre compadrio, os analisam os estratos sociais em separado, este
trabalho pretende, através de alguns casos específicos, apontar as rela-
ções tanto da família proprietária de escravos como das famílias de seus
escravos, comparando a malha de compadrio desses dois setores soci-
ais que coexistem em uma unidade doméstica. Os resultados apontam,
ainda que os compadrios de cada setor tenha características peculiares,
padrões coincidentes nos dois estratos. Com isso, buscam-se elemen-
tos para repensar o funcionamento destas unidades domésticas que são
complexas unidades econômicas hierarquizadas, como toda a socieda-
de o era, e que contém em seu interior gente de diferentes estatutos
sociais. Talvez modifique-se a idéia da abrangência da família setecen-
tista nesta região, incluindo nela um setor muitas vezes dito como “exclu-
ído” socialmente. Como decorrência dessa reflexão, há a sugestão para
que se repense a própria “economia” da localidade, indo ao encontro da
idéia de uma oiconomia, conforme conceituado por Bartolomé Clavero.

Maísa Faleiros da Cunha, Unicamp


Uma tentativa de reconstituição de famílias escravas. Franca (SP) –
Século XIX
Os estudos de cunho histórico-demográfico, especialmente a par-
tir dos anos 1980, trouxeram à tona vivências insuspeitadas, tais como o

45
estabelecimento de laços de parentesco consangüíneo e fictício entre
os cativos. Após o reconhecimento da presença da família escrava no
passado brasileiro, atualmente, a questão que se tenta responder reme-
te ao maior entendimento das dificuldades e possibilidades de constitui-
ção e manutenção destas famílias.
A fim de ampliar o conhecimento sobre este tema, nosso estudo
focaliza a população escrava em um município no norte paulista (Fran-
ca) que se caracteriza por apresentar uma economia voltada para o abas-
tecimento interno em um momento de expansão da agricultura de expor-
tação na Província de São Paulo (século XIX). Procuramos destacar as
possibilidades para a reconstituição de famílias escravas a partir de duas
fontes documentais: a Lista Nominativa de Habitantes de 1835-1836 e
os registros paroquiais (de batismo e casamento relativos a escravos).
Ao realizarmos o cruzamento dos registros de batismo ocorridos próxi-
mo à data da Lista Nominativa de Habitantes (1835) encontramos o fogo
de Francisco Barboza Sandoval, que levou ao batismo Raimundo, Rei-
naldo, Roza filhos de um casal de escravos de sua posse. De acordo
com a Lista Nominativa, este senhor era proprietário de 12 escravos,
dentre eles Francisco e Eufrazia, pais dos três escravinhos. Esta família
escrava estava presente no fogo de Francisco Sandoval, mas não hou-
ve qualquer menção ao parentesco destes cativos por parte do recense-
ador. Esperamos apresentar um quadro mais claro sobre a família es-
crava em um contexto econômico ainda pouco analisado pela historio-
grafia.

Fernando Franco Netto, (UNICENTRO/ PR).


Compadrio e Escravidão em Guarapuava no século XIX
O presente trabalho tem como objetivo conhecer as relações de
compadrio dos escravos na região de Guarapuava no período 1810 a
1888. Área esta de recente povoamento e com características bastante
específicas quanto ao processo de ocupação e de desenvolvimento de
sua economia, haja vista que sua formação esteve ligada à criação e
comercialização de gado e a lavoura de alimentos. As especificidades
locais determinaram uma população cativa muito pequena e na sua gran-

46
de maioria crioulos. Provavelmente, Guarapuava não esteve na rota do
tráfico internacional de escravos, como também no pesado tráfico inter-
no. A sociabilidade dos escravos será tema desta pesquisa a partir dos
registros de batismos de cativos e de ingênuos, bem como do cruza-
mento dos dados com os inventários de alguns proprietários. Apesar de
uma população pequena é forte a presença da família escrava em Gua-
rapuava. Os arranjos e laços promovidos pelos escravos demonstram
que o compadrio serviu como estratégia para fortalecer as relações da
comunidade. O número de padrinhos livres foi predominante em Guara-
puava, e mais, com forte participação dos senhores e seus familiares
nessa rede de relações.

Sessão 10:

Maria Angélica Zubaran, ULBRA


Os escravos e a lei de 7 de novembro de 1831 no Rio Grande do Sul
(1865-1888)
O trabalho que se segue propõe-se a examinar as Ações de Liber-
dade no Rio Grande do Sul que tiveram como referência legal a Lei de 7
de novembro de 1831. Trata-se de investigar como os curadores rio-
grandenses e os escravos, seus curatelados, apropriaram-se de um dis-
curso legal considerado “letra morta”, uma lei que jamais fora cumprida
mas tampouco fora revogada e a utilizaram em defesa da liberdade. Por
outro lado, interessa-nos explorar as diversas interpretações da Lei de
1831 pelos curadores riograndenses, tanto no caso dos escravos africa-
nos entrados no Brasil após aquela data, como no caso de saída de
escravos do Império para países onde a escravidão já fora abolida, o
que constituiu uma especificidade das Ações de Liberdade no Rio Gran-
de do Sul. Na verdade, a localização fronteiriça da província do Rio Grande
do Sul com países do Prata facilitou aos escravos gaúchos, residentes
nessas cidades, pleitear sua liberdade quando retornassem ao Brasil
após ter residido temporariamente no Estado Oriental do Uruguai ou na
Argentina, acompanhando seus senhores. Também o contexto da Guer-

47
ra do Paraguai (1865-1870), na qual muitos escravos gaúchos participa-
ram como substitutos ou como voluntários, revelou a resposta rápida de
escravos e curadores riograndenses atentos às brechas da jurisprudên-
cia e às novas possibilidades de defesa da liberdade para escravos que
temporariamente residiram no Paraguai. Nosso objetivo é, por um lado,
enfatizar o aspecto político dessas iniciativas legais do(a)s escravos(as)
no processo de emancipação gradual no Rio Grande do Sul e, por outro
lado, destacar que o acesso dos escravos à justiça possibilitou-lhes o
desenvolvimento de novas táticas de luta que resultaram em uma cres-
cente capacidade de defesa de seus interesses e, particularmente, da
sua liberdade. Ao utilizarem-se da Lei de 1831 contra seus senhores, os
escravos desafiaram o “direito” de propriedade dos senhores e as rela-
ções de dominação escravista.

Ricardo Tadeu Caíres Silva, UFPR


Memórias da travessia: aspectos do tráfico internacional de escra-
vos para o Brasil nas falas dos cativos que disputavam suas liber-
dades na Justiça. Bahia (1884-1888)
Neste texto procuro discutir as “memórias” descritas pelos africa-
nos e seus descendentes acerca do tráfico de escravos para o Brasil,
quando da disputa de suas liberdades na justiça nos últimos anos da
escravidão no Brasil. Tendo por base o argumento contido no artigo pri-
meiro da lei de 07 de novembro de 1831, que declarava livres todos os
africanos que entrassem no país após aquela data, muitos cativos impe-
traram ações de liberdade contra seus senhores visando obter suas li-
berdades independentemente da vontade destes últimos. Auxiliados por
abolicionistas e simpatizantes do movimento, os escravos procuravam
apresentar provas que pautassem suas reivindicações, tais como os re-
gistros da matrícula geral de escravos em que suas idades eram anota-
das e, sobretudo, a apresentação de testemunhas que certificassem que
haviam sido ilegalmente importados para o Brasil.
Neste último caso, evidenciam-se preciosos relatos acerca do
tráfico negreiro para o Brasil, tais como as estratégias para driblar o
policiamento britânico e as autoridades locais, as táticas de desembar-

48
que e adaptação à nova realidade, etc. Com base nestes depoimentos
e na bibliografia pertinente ao tema, problematizo alguns aspectos e
estratégias pertinentes a esta importante engrenagem do sistema es-
cravista.

Vinicius Pereira de Oliveira, IPHAN/RS


O estudo de trajetórias escravas como possibilidade historiográfi-
ca: o caso do africano Manoel Congo (Rio Grande do Sul/Brasil,
século XIX)
Neste trabalho procuraremos, a partir da trajetória individual de
Manoel Congo, sugerir a possibilidade da abordagem micro-analítica para
o estudo de grupos subalternos. Este africano, reduzido ao cativeiro após
a proibição do tráfico internacional de escravos, chega ao Brasil Meridi-
onal como carga do último desembarque ilegal registrado na Província
do Rio Grande do Sul, em 1852. A descoberta deste fato, anos depois,
gerou uma documentação judicial riquíssima em informações sobre mais
de dez anos da experiência de Manoel Congo no cativeiro, reveladora
de diversos aspectos da instituição escravista no sul do Brasil. Dessa
forma, sua trajetória pode ser utilizada como porta de entrada para a
sociedade de uma época, fio narrativo que possibilitou abordar uma di-
versidade de aspectos sobre a vivência escrava, tais como a organiza-
ção local do tráfico negreiro, a dimensão atlântica do mundo colonial
escravista luso-brasileiro, a diversidade dos mecanismo de controle se-
nhorial e das configurações da resistência escrava, bem como a multipli-
cidade das experiências cativas. Partindo de uma perspectiva que valo-
riza os escravos enquanto sujeitos de sua própria história, e fazendo uso
intensivo de fontes documentais, buscaremos articular experiência indi-
vidual e condicionamentos estruturais, como forma de tentar se aproxi-
mar da complexidade das vivências negras na sociedade escravista.

49
Sessão 11:

Luana Teixeira, UFSC


Entre a serra e o litoral: fugas e quilombos na fronteira leste do Rio
Grande do Sul e Santa Catarina
A partir do processo de titulação do território remanescente de
quilombo da comunidade de São Roque iniciou-se a pesquisa histórica
apresentada nessa comunicação.
São Roque localiza-se na fronteira entre os estados de Santa
Catarina e Rio Grande do Sul e têm a história de um passado escravista
ligado à região serrana do nordeste rio-grandense. Para a compreensão
da formação de um quilombo nessa região pesquisamos a sociedade
escravista na antiga cidade de São Francisco de Paula de Cima da Ser-
ra focando dois eixos de análise: relações de domínio senhorial e resis-
tência escrava. Trabalho escravo, vigilância e família, bem como fugas
reivindicatórias e definitivas são temas tratados nessa comunicação.
A pesquisa acerca de um quilombo específico levou-nos à ampli-
ação da questão, remetendo-nos ao contexto da resistência escrava atra-
vés de fugas e formação de quilombos na região entre a serra e o litoral.
Fundamental para esta etapa da pesquisa foi o diálogo com o trabalho
realizado sobre a comunidade remanescente de quilombos de Morro
Alto (BARCELLOS, Daisy M. et. AL. Comunidade negra de Morro Alto:
historicidade, identidade e territorialidade.  Porto Alegre: Ed. da UFRGS,
2004). A partir da idéia de “sistemas ou redes de pequenos ranchos”
característico da organização quilombola dessa região do país, busca-
mos nos aproximar das experiências que marcaram a trajetória dos ho-
mens e mulheres que se negaram a aceitar o papel a eles legados pelo
Estado escravista. Questões como mobilidade, comunicação e etnicida-
de são fundamentais para se compreender a organização dos grupos
marginalizados (não apenas escravos) que existiam no nordeste do Rio
Grande e sudeste de Santa Catarina na segunda metade do século XIX.
Para a realização dessa pesquisa trabalhamos a documentação
qualitativamente, utilizando principalmente correspondência policial, pro-
cessos-crime, o recenseamento de 1872 e documentação paroquial. Muito

50
importante foi conjugar essa pesquisa à prática de campo desenvolvida
pela antropologia. A metodologia foi, portanto, pautada pela utilização tan-
to as narrativas da comunidade quanto o discurso dos documentos para a
compreensão das relações humanas invisíveis á história institucional.

Thiago Leitão de Araújo, UFRGS


Santa Misericórdia: caridade crist㠖 instituição escravista
Tendo como base a chamada Lei do Ventre Livre de 1871, pesqui-
samos 397 crianças enjeitadas na Roda dos Expostos de Porto Alegre
entre 1867 a 1875. Nosso objetivo era fazer um estudo comparativo com
o Rio de Janeiro, onde após 1871, houve um aumento significativo de
crianças “negras” e “pardas” enjeitadas. Embora não encontrando o
mesmo aumento para o caso de Porto Alegre, o que mais nos chamou
atenção na pesquisa, foi a “racialização” encontrada na divisão do espa-
ço hospitalar, assim como, a discriminação com relação à “negros” e
“pardos”. Tendo feito um levantamento dos principais membros da Ir-
mandade, identificamos que esses correspondem à elite política e econô-
mica da Província; o mesmo sendo verificado para o caso da Bahia e do
Rio de Janeiro. Portanto, em nossa comunicação, além da apresentação
dos resultados parciais da pesquisa, “caridade crist㔠será compreendida
e relacionada a questões como prestígio, subordinação e controle social.

Sherol dos Santos, UFRGS


A comunidade escrava no litoral norte do Rio Grande do Sul (a fre-
guesia de Santo Antônio da Patrulha – 1773/1810)
As relações escravo-senhor sempre geraram controvérsias na his-
toriografia. Mais “conservadores” ou não todos admitem que por mais
“severo” que o sistema escravista possa parecer, não podemos excluir o
movimento de seus agentes. Nenhuma trajetória, seja ela individual ou
de grupo, pode ser analisada a partir de suas normas. Normatizar as
atitudes dos indivíduos, fazendo com que eles percam seu caráter de
destino individual e passem a ter comportamentos típicos de um deter-
minado grupo, nos impede a tentativa de reconstruir contextos históricos
e sociais. Com base nestes pensamentos iniciei este trabalho de pesqui-

51
sa. Minha intenção era perceber como os primeiros povoadores do Rio
Grande estabelecidos na região de Santo Antônio da Patrulha se relaci-
onavam com seus escravos. Este trabalho pretende analisar a comuni-
dade negra (cativa ou não) da região que abrangia a freguesia de Santo
Antônio da Patrulha, no período de 1773 a 1810, enfocando o estabele-
cimento de laços familiares e a constituição de redes de parentesco.
Trataremos com destaque as relações que afirmavam através do com-
padrio, acreditando ser esta uma das principais estratégias utilizadas
por estes agentes para se movimentar entre o universo cativo e livre e
sedimentar relações de solidariedade, principalmente étnicas. Utilizare-
mos como fonte primária os registros de batismos desta comunidade,
com base nos preceitos teórico-metodológicos da história social, que a
nosso ver permite o cruzamento de variáveis qualitativas e uma aborda-
gem do universo cultural dos agentes enfocados.

Fábio Odair Gomes Goulart, FURG


Entre a resistência e a coerção: a vivência dos escravos na cidade
de Rio Grande
O tema da pesquisa é a resistência dos escravos, o cenário onde
se dá a resistência é a cidade de Rio Grande do século XIX. Mais preci-
samente dos anos de 1846 a 1853. A cidade de Rio Grande do século
XIX é marcada por um processo de desenvolvimento urbano, modifican-
do as relações sociais. O escravo urbano passou a circula pelas ruas e
becos da cidade, oferecendo seus serviços e misturando-se à comuni-
dade, ora na beira do cais, carregando mercadorias que chegavam dos
navios, ou trabalhando como pedreiros.Este contexto urbano proporcio-
nou uma nova dimensão ao sistema escravista, e abriu brechas para os
escravos, que estreitavam laços com a sociedade, aproveitando a mobi-
lidade que lhes era dada pelo próprio caráter de suas ocupações. Essa
flexibilidade na relação entre senhores e escravos de ganho não limitou
o anseio por liberdade e luta contra o ctiveiro. O enfoque na resistência
ao sistema escravista, assegurou ao escravo papel de protagonista na
construção de sua liberdade. É portanto pela fuga individual que se infla-
mou os ânimos dos demais escravos, assim as fugas individuais aca-

52
bam se desdobrando em fugas coletivas, aumentando a tensão da elite,
que se via assustada com a ousadia dos escravos, e na possível forma-
ção de quilombos. È portanto pela fuga individual que se inflamou os
ânimos dos demais escravos , que vendo um escravo bem sucedido em
sua fuga, se arriscavam também na evasão. Assim as fugas individuais,
acabam se desdobrando em fugas coletivas, aumentando a tensão da
elite , que se via assustada com a ousadia dos escravos, e na possível
formação de quilombos. São essas resistências individuais e coletivas
que “contaminaram” o regime escravista, lhe enfraquecendo as bases
de sua sustentação, daí a importância de pesquisarmos essas “peque-
nas” ações de resistência, que na maioria das vezes passam desaperce-
bidas pelo nosso olhar “viciado” em quilombos e grandes insurreições
escravas, não vendo nessa ação sistemática, embora individuais, como
uma autentica oposição ao escravismo.

Sessão 12:

Carina Santos de Almeida e Shana Rech, UNISC


A pimenta malagueta no Brasil colonial: interação entre africanos e
indígenas
As culturas africana e indígena estão inseridas na sociedade bra-
sileira de forma tão profunda que se torna impossível delimitar suas in-
fluências. Assim, a interação entre africanos e indígenas no uso dos tem-
peros na cozinha, como a Pimenta Malagueta, pode ser compreendida
como um dos muitos pontos de aproximação e assimilação entre as duas
culturas. A pimenta malagueta fora difundida no mundo desde a época
clássica até meados do século XVII na região sul da Europa, sendo que a
região norte continuou utilizando este condimento alimentar. O Novo Mun-
do Americano usufruía a pimenta malagueta capsicum a partir do índio, da
mesma forma a malagueta africana passou a ser comercializada nos por-
tos brasileiros a partir do século XV. A malagueta, no Brasil, deixa de ser
apenas preparada pelas mãos indígenas para fazer parte da alimentação
da família brasileira, recebendo também o conhecimento milenar africano.

53
Marilene Ribeiro Solano, UNIVEST/ FACVEST
Na primeira metade do século XX: as associações de afrodescen-
dentes e a busca pela cidadania
Em sua dissertação de mestrado intitulada Corpos Nefastos: O
Centro Cívico Cruz e Souza e a invenção da Nação, a historiadora Miri-
an Adriana Branco defende que na cidade de Lages, importante reduto
político de Santa Catarina no ínicio do século XX, a exemplo de outros
municípios brasileiros em meio às ações de efetivação modernizadora
mais condizentes com o novo momento político criado pela República,
surgiu uma associação cívica fundada por negros, com apoio da elite
municipal a que se chamou Centro Cívico Cruz e Souza. Com uma po-
pulação negra nada desprezível, tal associação tinha por objetivo o le-
vantamento e o aperfeiçoamento moral e social dessa população, assim
garantido sua inserção social. A pesquisa empreendida pela professora
Mirian A. Branco em sua dissertação contemplando um período que vai
desde 1918 (data de fundação da associação) até 1930 (momento de
alterações políticas importantes no cenário nacional), demonstra que a
perseguição da cidadania foi uma constante em todas as práticas dos
membros do Centro Cívico desde o seu primeiro momento. Foram mui-
tas as ações nas quais se pode perceber a vontade de participar das
ingerências municipais, das ações sociais etc, ou seja, são muitas as
ações que denotam por parte dos associados, além de uma grande ne-
cessidade e vontade de superação de pré-conceitos, também a de se
sentir cidadão lageano e brasileiro. Dessa forma, no âmbito dessa pes-
quisa, pretendo dar continuidade à este trabalho para bem verificar se
nas décadas posteriores, os mesmos ideais permaneceram, ou se foram
substituídos por outros. Levando em conta que o Centro Cívico agora
um velhinho de 87 anos ainda existe e permanece em funcionamento
mesmo que precário, creio ser muito importante desvelar questões refe-
rentes à sua trajetória e assim contribuir para com as discussões que se
referem à questão afro-descendente em Santa Catarina.

54
Maria Aparecida Anacleto Clemencia, UFSC
“No Nosso Tempo Que era Bom”? Tensão, Trabalho e Conflito na
Sociedade Recreativa 3 de Maio (1930-1950)
Aos 3 dias do mês de maio de 1932 é fundada a Sociedade /
recreativa 3 de maio. Um clube social localizado atualmente no municí-
pio de Capivari de Baixo, no Sul do Estado de Santa Catarina. Nesta
época o atual bairro Três de Maio, do município de Capivari Bairo era
uma pequena localidade do bairro Baixo Capivari, pertencente à cidade
de Tubarão. Era um bairro formado predominantemente por afro-des-
cendentes. Até 1941 a região era predominantemente agrícola. Com a
criação da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), em 1945, há um
considerável aumento populacional, resultando o crescimento de uma
classe operária. Através de entrevistas, leituras de livros, de atas e esta-
tutos, utilizando as perspectivas da história social do trabalho, que dá
visibilidade a classes anteriormente excluídas da historiografia e respei-
tando o recorte de tempo delimitado pelas fontes, o objetivo desta pes-
quisa é verificar, através das experiências das pessoas que faziam parte
desta rede de sociabilidade, os conflitos sociais. Tendo estas, o clube
como espaço de socialização e território para o desenvolvimento destas
tensões.

Elci Deloss Tolomini, Carla Regina Wegner Copetti e Sandra Beatriz


Essenberg, Secretaria Municipal da Educação – Giruá, RS; Savio
Antônio Reginatto e Denise M. dos Santos Mello, URI – Sto Ângelo
Aspectos constituintes da história da comunidade quilombola pre-
sente no interior de Giruá, RS
Este relato parte de um trabalho de pesquisa que se preocupou
em resgatar a história local de Giruá-RS, em especial da comunidade
Quilombola, do Distrito de São Paulo das Tunas no Município de Giruá-
RS. Ao completar seu cinquentenário, o município em questão vem res-
gatando suas origens, e nesse sentido é urgente a necessidade de iden-
tificar a presença da Cultura Afro em nosso meio. O processo de pesqui-
sa, vem se dando de forma a coletar dados históricos no campo empíri-
co através da coleta de documentos, tais como certidões e escrituras,

55
questionários com a comunidade local remanescente, e coleta de infor-
mações através de histórias de vida – via história oral, gravada e poste-
riormesnte transcrita. A análise da história e fatos desta decorridos no
local, permite-nos visitar a comunidade onde residem os Afros, possibili-
tando-nos ainda a pesquisa através da pesquisa bibliográfica refletir so-
bre a composição deste povo e seu percurso histórico. Durante o perío-
do de realização desta pesquisa, que encontra-se em fase inicial, desta-
cam-se alguns resultados preliminares, tais como: – a integração entre
os Afros e pesquisadores; – resgate histórico da fundação do local; –
resgate de contos e causos locais; – descrição de aspectos do padrão
de vida social, econômica, política, religiosa, cultural e artística do grupo
de descendentes de escravos desta comunidade. Neste sentido vale
ressaltar que as questões ligada a identidade tem se tornado um tema
de dimensões cada vez mais abrangentes, uma vez que Giruá se for-
mou através de um extenso processo migratório. Dentro desta perspec-
tiva, a identidade local mostra que desempenhou papel relevante na for-
mação da cidadania giruaense, mas que a muito tempo está esquecida
na memória de nosso povo. Pensa-se, no entanto que esta pesquisa e o
projeto local intitulado “Os traços histórico-raciais e a comunidade Qui-
lombola do interior de Giruá-RS”, darão novo sentido aos fatos que vem
sendo resgatados e articulará a história local e seu papel na história de
Giruá. Acredita-se também, que esta forma de trabalho provocará uma
renovação na concepção de história local e de formas de pesquisa histó-
rica na região, bem como possibilitará diagnose para processos especí-
ficos de desenvolvimento local à comunidade.

Luciane P. Corá Molin, UEPG


Serra do Apon: História e Hanseníase
Esta pesquisa concentrou-se basicamente nas experiências e
modos de vida dos moradores da Serra do Apon, comunidade remanes-
cente de quilombo, localizada próxima ao Vale do Ribeira, no município
de Castro no estado do Paraná. Ao verificarmos os registros de comuni-
dades quilombolas no país, verificamos a inexistência de relatos sobre
essas comunidades em solo paranaense, contudo a realidade é outra. O

56
grupo da Serra do Apon, composto por cerca de 6 famílias, basicamente
de negros, com ascendentes em comum, vive em condições que nos
remetem a associar seus costumes com os de outras comunidades qui-
lombolas espalhadas pelo Brasil. Dessa forma, é possível conceituar
quilombo contemporâneo, como comunidades negras rurais habitadas
por descendentes de escravos que mantêm laços de parentesco e vi-
vem, em sua maioria, de culturas de subsistência. Essas pessoas pos-
suem mais do que laços de parentesco em comum. A grande maioria foi
ou é portador de hanseníase, sofrendo todas as conseqüências da falta
de tratamento ou do uso inadequado dos medicamentos, convivendo
com o alcoolismo. Essa é uma pesquisa farta de dados, com grande
responsabilidade histórico-cultural.

Sessão 13:

Gabriel Aladren (UFRGS)


Atividades econômicas dos forros no Rio Grande de São Pedro, c.
1780 – c. 1835
Os estudos relacionados à escravidão no Brasil inserem-se no
centro de uma renovação teórica e metodológica da historiografia brasi-
leira que ocorreu a partir da década de 1980. A pesquisa sobre os liber-
tos constitui-se em uma das novas temáticas abordadas por esta “nova”
historiografia. Nesse sentido, o presente trabalho propõe-se a analisar a
inserção econômica dos forros no Rio Grande de São Pedro, no período
de 1780 a 1835. Apesar da grande quantidade de trabalhos recentes
dedicados aos libertos na historiografia brasileira, o conhecimento sobre
as atividades econômicas por eles exercidas na região e período enfo-
cados, ainda é lacunar. Assim, pretende-se avaliar as possibilidades de
ocupação e acumulação de patrimônio deste grupo de forros riogran-
denses. Para tanto, propõe-se a utilização de inventários e testamentos
de libertos, depositados no Arquivo Público do Estado do Rio Grande do
Sul (APERS), das comarcas de Porto Alegre, Rio Grande e Rio Pardo,
que compreendiam a maior parte da população riograndense no perío-

57
do. A partir da análise qualitativa das informações fornecidas pelos in-
ventários e testamentos, é possível verificar as ocupações dos libertos,
a composição de seu patrimônio e fortuna. Pretende-se também quanti-
ficar os dados obtidos, de modo a indicar formas tendenciais de inserção
econômica do conjunto da população liberta do Rio Grande de São Pe-
dro no período estudado. Na análise inicial das fontes, pôde-se perceber
que grande parte dos forros eram produtores rurais, sendo proprietários
ou tendo acesso a uma porção de terra. Entre estes, a maioria era com-
posta de lavradores e, entre os libertos urbanos, predominavam os que
exerciam algum tipo de ofício. Também constatou-se a presença de es-
cravos entre os bens dos forros, sejam esses rurais ou urbanos.

Ana Paula Dornelles Schantz (UFRGS).


E depois da liberdade? Família e sobrevivência econômica de liber-
tos em Porto Alegre e Viamão no final do século XVIII
Esta pesquisa nasceu da necessidade de se entender o que acon-
teceu com a população alforriada após sua manumissão, particularmen-
te no que tange à família e à sobrevivência econômica de libertos. Para
compreender como os forros se inseriam economicamente na socieda-
de e como suas famílias eram constituídas, foram estabelecidos os se-
guintes questionamentos: a) como se davam as relações sociais no inte-
rior de suas famílias? b) como sobreviviam? c) com o quê e com quem
trabalhavam? d) continuavam atrelados aos seus antigos senhores ou
conseguiam estabelecer relações sociais com outros indivíduos, ou tal-
vez com outros setores da sociedade? A pesquisa qualitativa, realizada
através de consulta a inventários, testamentos e fontes eclesiásticas,
permitiu que fossem obtidas algumas respostas às questões propostas.
Entre elas está a constatação de que os laços familiares não são inter-
rompidos com a manumissão e se prolongam além da liberdade; a cons-
tatação de que a autonomia jurídica advinda da alforria corresponde a
uma frágil autonomia econômica, que muitas vezes provoca o agrega-
mento de libertos em casas de homens brancos; e a constatação de que
os poucos alforriados que dispunham de recursos possuíam escravos.
Os resultados da pesquisa indicam que a maioria dos libertos de Viamão

58
e Porto Alegre vivia em condições econômicas limítrofes – entre a auto-
nomia desejada e a realidade econômica vivida, que os atrelava, muitas
vezes a outros indivíduos. A vida após a liberdade parece ter sido bas-
tante difícil para esses indivíduos, que encontravam na família não ape-
nas refúgio sentimental mas também proteção econômica e social.

Jovani Scherer (UFRGS)


O Preço da Liberdade: o processo da compra da alforria, Rio Gran-
de (1810-1825)
Esta pesquisa procura definir o processo da compra da liberdade
no Município de Rio Grande, entre 1810-1825, relacionando as transfor-
mações estruturais ocorridas no princípio do século XIX, período do cres-
cimento do tráfico atlântico, com as ações dos escravos em busca da
aquisição da carta de alforria através de indenização. Foram utilizadas
massivamente as cartas de liberdade do período, cruzando com infor-
mações provenientes de inventários, medições de terra e documentos
notariais diversos. A análise tem como enfoque as relações entre senho-
res e escravos, e as estratégias destes em busca da liberdade, discutin-
do seus significados e objetivos.

Sessão 14:

Juliana Aparecida Lemos Lacet, UFBA


Nações Africanas nas Irmandades Negras Mineiras do Século XVIII
Os projetos de conquista da África e do Novo Mundo, arquiteta-
dos pelos portugueses a partir do século XV, estavam estreitamente li-
gados à formulação de uma cultura moderna que incluía um conjunto de
situações ligadas ao tráfico de escravos, ao comércio de mercadorias e
à colonização. O tráfico de escravos entre a África e a América, estraté-
gia essencial dos projetos lusitanos, foi, sem dúvida, um dos circuitos
comerciais mais importantes da história da humanidade. Estudos recen-
tes dão conta de que algo em torno de doze milhões de africanos foram
negociados entre os séculos XVI e XIX. Desse total, cerca de quatro

59
milhões apenas para o Brasil. Mas se os números dimensionam a popu-
lação africana introduzida no cativeiro, nossa pesquisa vem discutindo
as formas de reorganização e diferenciação étnica desses diversos gru-
pos de escravos. Formas estas que tiveram como base os “nomes-na-
ção”, (Angola, Mina, Benguela, Nagô, entre outros), atribuídos aos es-
cravos pelo tráfico e por eles re-significados, principalmente os grupos
de escravos e escravas que foram para as irmandades. .
Surgidas na Europa medieval, as irmandades difundiram-se no
contexto da reforma tridentina. De feição predominantemente leiga, eram
associações que tinham como fim o culto a um santo de devoção e se
dedicavam a obras de caridade voltadas para seus próprios membros,
ou em alguns casos, para pessoas carentes não associadas. As irman-
dades obtiveram grande representatividade na sociedade colonial, prin-
cipalmente as chamadas “irmandades de cor”, erguidas por escravos e
escravas, forros e forras, visto que foram um dos únicos ou talvez o
único meio de associação legal permitido a eles. Em torno e no seio
dessas associações, cativos das mais diversas nações desenvolveriam
uma de suas formas de construção de identidade e solidariedade no
processo de reorganização social no Novo Mundo. Neste trabalho esta-
mos mapeando os grupos étnicos, ou as nações, dos irmãos e irmãs,
escravos e ex-escravos, presentes na Irmandade de Nossa Senhora do
Rosário dos Pretos do Alto da Cruz, em Vila Rica, Minas Gerais, no sé-
culo XVIII, no intuito de perceber as formas de comunicação, conflito,
negociação cultural e, as alianças intra e interétnicas que se estabelece-
ram naquela confraria.

Cristiane Bahy (UFRGS)


Rosário de contas negras: a Irmandade de Nossa Senhora do Rosá-
rio dos pretos do Arraial de Viamão (1780-1820)
Ao longo do processo de colonização Portugal trouxe para o Bra-
sil diversas de suas instituições, dentre elas as irmandades religiosas.
Espaços de sociabilidade, as confrarias erigidas por leigos, tinham como
princípios básicos a devoção a um santo e a caridade para com os ir-

60
mãos pertencentes à confraria. Dentro destas associações, os leigos se
responsabilizavam pela sua devoção, mantendo a irmandade em torno
do santo devocional (orago), organizando para este uma vez por ano
uma grande festa em sua homenagem, onde mostravam toda a sua de-
voção em procissões. Estas festas eram importantes momentos de soci-
alização tanto para os membros da irmandade quanto para a população
próxima a confraria, pois os eventos eram públicos, onde se aproxima-
vam os irmãos da confraria daqueles que não participavam dela direta-
mente.
Ao virem para a Colônia as irmandades erigidas seguiram um
padrão comum herdado das confrarias portuguesas, principalmente das
Irmandades de Misericórdia de Lisboa, sendo moldados conforme a lo-
calidade e aqueles que a elas pertenciam. No Brasil, por exemplo, houve
a formação de inúmeras confrarias de escravos tendo como oragos mais
comuns Nossa Senhora do Rosário e São Benedito. No Rio Grande do
Sul, entre outras confrarias foi erigida no ano de 1754 “Irmandade de
Nossa Senhora do Rosário dos pretos de Viamão”.
O objetivo desta comunicação será de apresentar a confraria do
Rosário como espaço de sociabilização entre escravos, libertos e livres,
tanto homens quanto mulheres, já que a irmandade aparentemente não
fazia distinção ao receber seus irmãos apesar de ser uma irmandade de
escravos. O livro de “Entrada dos Irmãos” – onde eram registrados os
novos integrantes da associação – mostra a entrada de irmãos bastante
diferentes entre si dentro desta sociedade colonial.
Tratando-se de uma pesquisa de mestrado em andamento a par-
tir das fontes primárias da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário –
Livro de Despesas de Festas (1755 a 1767), Livro de Entrada de Irmãos
(1773 a 1816) e Compromisso da Irmandade de Nossa Senhora do Ro-
sário (1756) – se procurará fazer considerações acerca da convivência
entre escravos, libertos e livres dentro desta confraria.

61
Lígia Conceição Santana, UFBA
Territórios e itinerários negros em Salvador (moradia, trabalho e
divertimento, 1855-1887)
A tentativa de controle dos negros, escravos, livres ou libertos, na
rua, mesmo no fim da escravidão, compreende diversos aspectos e situ-
ações do cotidiano para organizar circulação, locais e momentos de não-
trabalho. A documentação policial disponível dá a tônica do zelo pelo
estabelecimento da ordem na cidade e dos fundamentos ideológicos que
justificavam sua implementação, ao mesmo tempo em que também apon-
ta para constantes descumprimentos destas tentativas de controle. Esta
pesquisa busca entender a constituição de territórios negros; para isso,
procura compreender práticas e valores culturais que se tornaram pró-
prios às populações negras e contrários às expectativas de controle de
diversas autoridades e grupos letrados. A intenção é delinear a localiza-
ção destes territórios negros, acompanhando enfrentamentos cotidianos,
significados sociais e construção de identidades entre os diversos sujei-
tos que ocupavam a cidade, negros ou não. Locais de moradia, trabalho
e divertimento podem refletir espaços comuns de troca e conflito impor-
tantes para o entendimento das estratégias de sobrevivência e das for-
mas como esta heterogênea população negra singularizou o espaço físi-
co e social da cidade.

Liane Susan Muller, SMED Gravataí/SECRS


O negro e suas devoções: a importância da Irmandade do Rosário e
da Festa dos Navegantes para a formação de uma elite negra porto-
alegrense
No ano de 1871, quando da primeira festa dos Navegantes em
Porto Alegre, a Irmandade do Rosário já havia se transformado em Ar-
quiconfraria. O luxo, o poder, e a influência dos irmãos negros do Rosá-
rio eram bem conhecidos, tanto no meio religioso quanto entre os leigos
da cidade. Isso por certo favoreceu a escolha de sua igreja para o que se
tornaria uma tradição: a visita anual da imagem dos Navegantes. Em
dezembro do ano anterior, enquanto o símbolo da devoção viajava de
Portugal para o Brasil, mais especificamente para Porto Alegre, o 2 de

62
fevereiro foi fixado como o dia da festa da santa das águas. Esse dia, na
liturgia católica, sempre foi muito especial, pois representava o Dia da
Purificação de Nossa Senhora ou de Apresentação do Senhor Jesus
Cristo.
Entre 1871, ano da festa inaugural, e 1881, quando aconteceu a
primeira procissão por terra do Arraial dos Navegantes (e da capelinha
de mesmo nome) para a igreja do Rosário, a imagem da santa dos ma-
rinheiros viveu na Capela do Menino Deus. Era de lá que, primeiramente
no dia 1º de fevereiro e, mais tarde, no domingo anterior à festa, a ima-
gem partia em procissão fluvial para uma igreja localizada no centro de
Porto Alegre. Ali ela deveria ser “conhecida, admirada e venerada”.
Da mesma forma que a igreja sede foi escolhida no Arraial do
Menino Deus por conta da numerosa colônia portuguesa que em 1871
ali habitava, a igreja de N. Sra. da Conceição foi a escolhida para rece-
ber a visita da imagem dos Navegantes. Tanto quanto hoje, na Av. Inde-
pendência, a igreja da Conceição avizinhava com a antiga Sociedade
Portuguesa de Beneficência, atual Beneficência Portuguesa. Os homens
que haviam encomendado a imagem eram todos portugueses e preten-
diam manter fortalecida sua devoção dentro da comunidade. Não se
sabe bem o porquê, mas o fato é que no ano seguinte a santa, em sua
visita ao centro, pousou na igreja do Rosário. A adoração e o respeito
dos negros já havia se manifestado em janeiro de 1871, quando os iates
Porto Alegre; Rio Grande e Promptidão aportaram na capital gaúcha
trazendo a primeira imagem dos Navegantes. Naquele dia, a Arquicon-
fraria do Rosário foi às ruas ostentando seu maior esplendor. A partir de
então, os negros fizeram apenas estreitar os laços com a protetora das
águas. É essa relação que pretendo explicitar com este trabalho.

63
Sessão 15:

Márcio de Sousa Soares, UFF


A dádiva da alforria: uma proposta de interpretação sobre a nature-
za das manumissões antes da promulgação da Lei do Ventre Livre
Este trabalho examina a incidência e os padrões das alforrias tes-
tamentárias em Campos dos Goitacases durante o processo de monta-
gem e expansão da produção açucareira entre 1750-1830. Dialoga, por-
tanto, com aquele segmento da historiografia brasileira que sustenta a
raridade das manumissões em áreas rurais. Além disso, verifica se e até
que ponto as últimas vontades dos testadores eram, de fato, cumpridas
no que se refere à liberdade conferida aos escravos.
Estudos clássicos sobre as alforrias estão calcados, sobretudo,
na análise serial das Cartas de Alforria, visto terem sido o instrumento
preferencial para o registro das manumissões. Contudo, parte delas fi-
cou registradas apenas nas cédulas testamentárias, servindo suas ver-
bas como instrumento de sua legalidade, como também foi o caso das
alforrias passadas na pia batismal. Portanto, isso significa dizer que as
estimativas das taxas anuais de manumissão calculadas por alguns his-
toriadores estão subestimadas. Ou seja, alforriava-se muito mais do que
até bem pouco tempo se pensava.
Destaca-se ainda a importância do papel desempenhado pela cren-
ça na salvação da alma e no Purgatório na concessão das alforrias tes-
tamentárias, visto que, nesse contexto, elas eram entendidas como uma
obra pia capaz de interferir no destino post-mortem dos testadores, so-
bretudo quando envolviam a libertação de parentes ilegítimos do jugo do
cativeiro.

Nilsen Christiani Oliveira Borges, UFSC


Meio livre, meio liberto: a conquista da alforria em Lages, século XIX
Na memória lageana ainda hoje existe a figura de Adão Antunes,
ou tio Adãozinho, que nasceu em Lages no final da década de 1860.
Mesmo tendo nascido antes da lei do “ventre livre”(1871) teria sido alfor-
riado muito cedo. Exalta-se ao fato de que com uma postura humilde, foi

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carregador mor da água da cacimba da Santa Cruz, “juntador” de lenha
e varredor de pátios, sempre sem cobrar nada. Conquistando a simpatia
dos demais moradores, ficava em constante prontidão, esperando poder
prestar algum favor a quem precisasse. Além de suas obrigações regu-
lares, acompanhava a banda de música “Harmonia Lageana”, sendo res-
ponsável por carregar as partituras. O dia mais feliz de sua vida teria
sido quando, já em 1933, tirou uma fotografia com um instrumento da
banda no colo. Após sua morte, em uma última homenagem, o seu nome
foi dado a uma praça próxima à rua Rui Barbosa. Um cartaz contando
essa história, fixado atualmente na entrada do museu Thiago de Casto,
em Lages, reforça esta memória, que não é muito diferente da forma
pela qual as relações entre senhores, escravos e ex-escravos foram
abordadas pela historiografia catarinense. Muitos autores defendem que
houve um tratamento humano e benigno dispensado pelos proprietários
aos seus escravos, ao ponto que, mesmo com a possibilidade de con-
quista de alforria, o cativo, por não ter para onde ir, ainda teria preferido
continuar servindo ao seu senhor, mesmo sem remuneração.
Com o objetivo de rever esta interpretação, o presente artigo, ba-
seado na leitura dos Mapas de População, Escrituras de Liberdade e
Inventários Post-mortem, visa abordar as formas de acesso a alforria em
Lages, Santa Catarina, no período de 1840 a 1865, destacando os cami-
nhos e estratégias percorridos pelos escravos para alcançar a tão alme-
jada liberdade.

Fabiano Dauwe, UFF


Os múltiplos sentidos da liberdade: a viabilidade e as expectativas
da libertação pelo fundo de emancipação de escravos
O fundo de emancipação de escravos foi criado pela lei n.o 2040,
de 28 de setembro de 1871 (conhecida como Lei do Ventre Livre ou Lei
Rio Branco), que previa a destinação de recursos pecuniários a cada
província do país para a libertação de tantos escravos quantos possível.
A parte do fundo distribuída pelo governo imperial era dividida entre as
províncias, proporcionalmente ao número de escravos matriculados em
cada uma. Adicionando-se a este valor o destinado pela província ou por

65
particulares para uso interno, se houvesse, cada província disporia de
um valor a ser distribuído, segundo a mesma proporção, entre seus
municípios e freguesias.
O fundo de emancipação tem sido pouco observado como objeto
de investigação historiográfica nos estudos sobre escravidão no Brasil,
em vista da pequena quantidade de escravos que libertou em compara-
ção ao total da população escrava, dos avultados recursos despendidos
para isso e das diversas fraudes a que sua aplicação foi sujeita. Ao ana-
lisar com cuidado os valores envolvidos, pretendemos observar as pos-
sibilidades que o fundo de emancipação abria para a liberdade de al-
guns escravos, e como a sua existência interferia na sociedade escra-
vista do final do século XIX.
Durante o período de sua atuação, o fundo libertou mais de 32 mil
escravos em todo o país, ao custo de mais de vinte e sete mil contos de
réis. O baixo percentual de libertados e, talvez principalmente, as críti-
cas ao fundo em meados da década de 1880, ajudaram a criar uma
interpretação historiográfica que considerou o fundo de emancipação
uma forma pouco importante de libertação de cativos. Parece-nos, con-
tudo, que essa avaliação sobre o “fracasso” em promover as libertações
decorre em grande medida do contraste entre as expectativas que foram
criadas em torno desse dispositivo e os resultados que ele pôde efetiva-
mente proporcionar. Ao avaliarem o fundo de emancipação dessa forma,
os estudos dessa linha argumentativa mais fazem expressar uma frus-
tração com os resultados obtidos, talvez comparando-os a um ideal ina-
tingível naquelas circunstâncias, do que buscar uma avaliação das ra-
zões pelas quais isso se deu – ou, mesmo questionar se, em uma pers-
pectiva mais ampla, o fundo de emancipação não permitiria uma leitura
distinta.
Estudos mais atuais consideram que avaliar o fundo de emanci-
pação apenas a partir de sua “eficiência” seria encará-lo apenas como
uma concessão do Estado. Por outro lado, analisar o fundo sob o prisma
da diminuição do poder dos senhores sobre os cativos permitiria perce-
ber a atuação de outros grupos, escravos inclusive, na luta pela obten-
ção da liberdade.

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Álvaro de Souza Gomes Neto (Faculdades Integradas Univest, La-
ges, SC)
Algumas considerações sobre o Fundo de Emancipação de Escra-
vos no Termo de Lages, 1871-1888
Este artigo provém de um amplo projeto, envolvendo também ou-
tros pesquisadores, sobre a escravidão no Termo de Lages, região ser-
rana de Santa Catarina, coordenado pelo autor e desenvolvido junto ao
Curso de História das Faculdades Integradas Univest, de Lages.
Pretende formular algumas considerações sobre o funcionamen-
to do Fundo de Emancipação de Escravos no Termo de Lages, a partir
de um olhar sobre a Lei do Ventre Livre. Criado em 1871, o Fundo pas-
sou a funcionar efetivamente em Lages somente em 1875, quando rece-
beu a primeira cota disponibilizada para a compra de escravos na região
serrana. O modo como agia o Fundo e sua conexão com o Governo
Provincial torna-se importante no entendimento do processo de liberta-
ção dos cativos entre 1871 (Lei do Ventre Livre) e 1888 (Abolição da
Escravatura).
Embora trabalhando com registros escassos, pudemos obter al-
gumas informações valiosas sobre os mecanismos de libertação de ca-
tivos em Lages, a partir da ação do fundo de emancipação. As conclu-
sões a que chegamos com a pesquisa nos levaram a perceber ratifica-
ções a respeito da manipulação de fundos públicos tanto no governo
provincial quanto no municipal, o que corrobora para a ineficácia dos
resultados obtidos por esses fundos de emancipação.
Somado a isso, foi-nos possível contribuir para os estudos que
alguns historiadores estão realizando sobre a escravidão na região ser-
rana catarinense, área muito pouco explorada pela pesquisa. As lacunas
que estão sendo fechadas a partir dessas investigações, ajudam a dimi-
nuir as dificuldades enfrentadas ao pensarmos a escravidão longe de
Desterro, capital da Província na época.

67
Sessão 16:

Adelmir Fiabani, UNISINOS


Quilombo: africanos, índios e seus descendentes lutaram pela li-
berdade
Estudos recentes apontaram para a possibilidade de que os pri-
meiros quilombos tenham sido obra de nativo destribalizados que, re-
sistindo à apreensão para exploração de sua força de trabalho, fugiam
para o sertão e se aquilombavam. Gaspar Barleu referiu-se a “saltedo-
res” que procuravam abrigo nos quilombos; Rocha Pita identificou a
presença de nativos nos mesmos,. Edison Carneiro referiu-se a pre-
sença de indígenas e brancos em Palmares. Recentemente, Pedro
Paulo Funari apontou para a possibilidade da presença significativa de
indígenas na Confederação de Palmares. A documentação produzida
pelos escravizadores atestam a presença de nativos, caburés, criou-
los, desertores, etc. nos quilombos, assinalando que o fenômeno foi,
sobretudo, produto do trabalhador escravizado, e não resultado exclu-
sivo do africano escravizado. Essa heterogeneidade cultural invalida a
tese ‘restauracionista’ tradicional de um quilombo como fenômeno con-
tra-aculturativo da população africana no Brasil. Segundo Genovese
“a cultura que surgiu nessas bases combinava elementos africanos,
europeus, ameríndios e provenientes da senzala, de maneira comple-
xa, inovadora e variada”. O quilombo foi parte da resistência à escravi-
dão que, em 1888, pôs fim à instituição, ensejando que afro-descen-
dentes e ex-quilombolas formassem campesinato negro que passou a
lutar pela conquista da terra. Atribuir às comunidades negras rurais
características próprias de preservação da cultura africana nega o ca-
ráter cultural multifacetado do quilombo, uma das origem dessas co-
munidades, e recupera, de forma ainda mais arbitrária, as teses do
“restauracionismo cultural”.

68
Eliege Moura Alves, UNISINOS
Uma Presença Invisível – Escravos em Terras Alemãs
O objetivo desta comunicação será o de identificar e analisar a
presença escrava em São Leopoldo, Rio Grande do Sul, no período de-
limitado entre os anos de 1850 a 1870.
A partir de 1850, com o término do tráfico internacional de escra-
vos observa-se que a movimentação de cativos entre as províncias do
Império ainda é bastante significativa inserindo-se o Sul do país neste
contexto, apesar da historiografia tradicionalmente afirmar o contrário.
Pesquisas sobre a escravidão em zonas de colonização alemã
estiveram sempre presos a certas problemáticas. A primeira dizia respei-
to a importância da mão-de-obra escrava e a sua posterior substituição
pelo trabalho livre dos imigrantes estrangeiros, a partir do século XIX,
especialmente nas áreas destinadas à cafeicultura. A segunda questão
refere-se à idéia tradicionalmente difundida pela historiografia sulina, de
que os imigrantes não possuíam escravos visto que eram portadores de
uma mentalidade moralizadora distinta da idéia de trabalho desmorali-
zada por uma mentalidade lusa – colonialista e escravista. Muitos ideó-
logos da identidade étnica dos imigrantes no Sul do Brasil, argumenta-
vam que a própria legislação teria sido um obstáculo para a inserção de
escravos entre os alemães e seus descendentes.
Partindo de fontes primárias como Inventários post-mortem, car-
tas de alforria, assentos de batismo, casamento e óbitos, nesta comuni-
cação pretendo também mostrar a existência de laços familiares entre
os cativos, bem como as suas lutas pela liberdade através das cartas de
alforria e a significativa parcela de escravos que desde o período anteri-
or a chegada dos imigrantes, portanto ainda no século XVIII, contribuí-
ram para a construção da antiga colônia alemã de São Leopoldo.
Os resultados que ora serão apresentados nesta comunicação
fazem parte da dissertação desenvolvida junto ao Programa de Pós-
Graduação em História da UNISINOS, intitulada “Presentes e Invisíveis:
Escravos em Terras de Alemães: São Leopoldo 1850 – 1870”, sob a
orientação do Prof. Dr. Paulo Roberto Staudt Moreira no ano de 2004.

69
Antônio César Sprícigo, Colégio Murialdo e Colégio Castro Alves –
Araranguá, SC
Os caminhos da escravidão na Freguesia do Araranguá – 1840/1888
É sabido que Santa Catarina vende uma imagem tipicamente eu-
ropéia para o resto do Brasil. O discurso produzido ao longo do século
XX, por historiadores amadores ou não, relegou a história da escravidão
em terras catarinenses a um segundo plano. Germanidade e italianida-
de soavam melhor para um certo tipo de discurso e historiografia, do que
termos como: escravidão, negros, etc. Na antiga Freguesia Nossa Se-
nhora Mãe dos Homens do Araranguá, criada em 1848, (território per-
tencente no passado a Laguna), o discurso produzido por descendentes
de imigrantes italianos, entre eles: Pe. João Dall’Alba, Pe. Paulo Hobold,
Pe. Raulino Reitz, criaram uma imagem de um território notadamente
branco. Atualmente o território da antiga Freguesia, constitui-se em duas
microrregiões: Amesc e Amrec, onde se destacam municípios como Cri-
ciúma, Nova Veneza, Araranguá e Turvo além de outros menores que
tem como característica marcante a presença de imigrantes italianos.
Entretanto, toda a área da Freguesia do Araranguá fora um ponto impor-
tante de passagem entre Laguna e Porto Alegre, aparecendo no século
XVIII como caminho para as tropas de gado vindas do Rio Grande do
Sul. Posteriormente, no século XIX, em função da movimentação de tro-
peiros e da expansão de açorianos e seus descendentes, a região foi
sendo gradativamente ocupada, tendo a população desenvolvido uma
economia ligada a produção de farinha de mandioca. As populações que
para cá se deslocaram não eram abastadas, porém possuíam escravos
para o auxílio nas mais diversas lidas. A análise de inventários post mor-
tem, alforrias, processos de arbitramento, casamentos e registros de
batismo de escravos, me permitiram discutir a presença escrava nas
terras da antiga Freguesia do Araranguá, contrapondo essa análise, a
de uma terra reconhecida como “terra de italianos.”

70
Sessão 17:

Caiuá Cardoso Al-Alam, UNISINOS


Questões acerca dos enforcamentos de escravos em Pelotas-RS
A cidade de Pelotas, no estado do Rio Grande do Sul, Brasil, for-
mou-se, principalmente, através da indústria do charque, que usufruía
de uma ampla mão-de-obra escrava. Eram sujeitos diversos, oriundos
de diversas partes da África os quais, amontoados em senzalas e po-
rões, reinventavam as suas formas de viver e resistir.
Os senhores, donos de escravos, utilizavam-se de diversos méto-
dos para forçar o trabalho escravo ao máximo, bem como sua disciplina.
Esse disciplinamento, muitas vezes, levava à morte esses trabalhado-
res, e sabe-se que os donos estavam muito preocupados com a perda
de sua mão-de-obra, pois acarretava uma despesa considerável. A re-
sistência escrava foi constante e envolveu ações que transgrediam os
códigos de posturas da época, levando muitos sujeitos a serem perse-
guidos e julgados pelo Estado. Assim, muitos desses trabalhadores fo-
ram chicoteados, castigados e, inclusive, condenados à morte.
Em Pelotas, os locais das execuções públicas, através da forca,
foram diversos, sempre localizados em terrenos de antigas praças da
cidade. Neste trabalho pretendo dialogar acerca das características do
ritual de enforcamento que envolvia todo um roteiro onde o condenado
era obrigado a caminhar pelas principais ruas, acompanhados de pa-
dres, da polícia, e de populares curiosos com a situação.

Martha Rebelatto, UFSC


A bordo do Higkland Mary of Sag Harbor: uma tentativa de fuga
escrava (Desterro, 1868)
As fugas de escravos foram comuns durante quase todo o século
XIX em Desterro. Em minha pesquisa de mestrado pretendo esboçar um
panorama das fugas de cativos, mostrando um perfil dos escravos fugi-
tivos, algumas expectativas em relação à fuga, tentando comparar este
quadro com o do restante do país. Para isso, utilizo jornais de época
(principalmente anúncios de escravos fugitivos), relatórios do Presiden-

71
te da Província, ofícios e correspondência de Chefe de Policia e de Juí-
zes, censos, entre outras fontes. A análise já efetuada de grande parte
destas fontes trouxe à tona algumas tentativas de fuga peculiares. Algu-
mas destas tentativas envolveram a fuga para barcos de passagem pelo
litoral – fossem eles sumacas nacionais, baleeiros, canoas, etc. – como
estratégia para escapar do cativeiro. Este tipo de fuga, possibilitado, em
Desterro, pela localização no litoral e proximidade do Porto, pretendia
ser geralmente definitiva, pois os escravos partiam com os barcos. O
descontentamento das autoridades locais, devido à recorrência destes
acontecimentos, levou a inquéritos policiais de investigação e, em al-
guns casos, de captura dos capitães destes navios. Meu objetivo neste
artigo é seguir algumas pistas que dêem luz às articulações feitas entre
os próprios escravos, entre escravos e marinheiros ou com a comunida-
de local para viabilizar a fuga. Para isso, vou seguir os rastros de um
caso mal-sucedido, que acabou resultando em inquérito policial. O fato
ocorreu no ano de 1868, quando sete escravos foram capturados já den-
tro do Brigue Baleeiro Norte Americano denominado Hegkland Mary of
Sag Harbor, que estava ancorado defronte à ilha das Aranhas. A investi-
gação seguiu para se averiguar a culpa do Capitão do respectivo baleei-
ro, por permitir que escravos fugitivos fizessem parte de sua tripulação.
Para isso a polícia contou com o depoimento do português João Cardo-
so Jaques, marinheiro desertor do dito Brigue Americano. Este, além de
relatar o crime de aliciamento de escravos, ainda nos falou do excesso
de castigos sofridos pela tripulação do navio por ordem do Capitão, mo-
tivo que o teria feito desertar.

Daniela Vallandro de Carvalho, UNISINOS


Experiências de cativeiro e liberdade nos fins do século XIX (interi-
or do RS)
Esta comunicação pretende abordar a(s) experiência(s) de escra-
vidão e liberdade em fins do século XIX, privilegiando o olhar sobre as
relações conflituosas travadas entre senhores, escravos e libertos, bem
como sobre as diferentes concepções empregadas por estes atores so-
ciais a noções de liberdade, lealdade, trabalho, violência e justiça. Tendo

72
como eixo central o estudo de um caso individual e usando como fonte
primária um processo criminal pretendemos lançar luz sobre experiênci-
as semelhantes compartilhadas por outros indivíduos e exercitar a vali-
dade deste tipo de estudo na análise das experiências negras, buscan-
do um jogo dialético entre individual e coletivo. Buscamos ainda, seguir
pistas de casos individuais como forma de pensarmos a experiência ne-
gra pós-abolição, campo historiográfico bastante fértil, porém pouco co-
nhecido/explorado nos estudos derivados da escravidão.

Rodrigo de Azevedo Weimer, UNISINOS


Nominação e identificação de ex-escravos através de processos
criminais: São Francisco de Paula, RS, 1880-1900
Durante os anos finais da escravidão e o imediato pós-abolição,
ocorreu um processo de redefinição das categorias étnico-sociais até
então utilizadas. As mesmas foram objeto de disputa em um momento
de reformulação das relações de trabalho. Nesse sentido, no presente
estudo busco perceber esses aspectos através das formas pelas quais
diferentes indivíduos egressos do cativeiro foram nomeados e identifica-
dos em processos criminais e inquéritos policiais de São Francisco de
Paula de Cima da Serra. Esses autos foram pesquisados no Arquivo Públi-
co do Estado do Rio Grande do Sul. Optou-se por esta localidade por ter
sido região de economia pecuária baseada na mão-de-obra escrava que
até o momento pouco interesse despertou na historiografia regional.
Percebe-se a existência de diferentes formas de composição e uti-
lização do nome de presumíveis ex-escravos (presença ou não de sobre-
nomes, utilização da partícula “de Tal”, apelidos, alcunhas profissionais ou
outras, o acúmulo de diversos nomes próprios, a referência a algum fami-
liar, utilização de qualificativos de cor). Em alguns casos, a condição de
antigos cativos era explicitada, eventualmente junto ao nome do antigo
senhor, e em outros não. Além disso, diversos modos de identificação eram
freqüentemente utilizados de forma simultânea em um mesmo processo.
Procura-se entender tal fluidez a partir de diversos elementos. Era
um momento em que algumas categorias sociais até então existentes
subitamente perdiam o sentido ou mesmo validade jurídica, o que torna

73
compreensível a confusão de diferentes qualificativos utilizados (que,
por outro lado, já vinham sofrendo transformações desde meados do
século XIX – Mattos, 1998). Além disso, de maneira alguma estava fora
da lógica daquela sociedade a utilização simultânea de mais de um nome.
Finalmente, atribui-se tais variantes à situacionalidade do emprego de
cada denominação no andamento processual. O sujeito da fala (repre-
sentantes do poder judiciário ou da polícia, testemunhas de estatuto so-
cial semelhante ou superior ao do referido, a auto-identificação da pes-
soa em questão) e o contexto de enunciação (antagonismo ou solidarie-
dade entre o depoente e o referido, a tentativa de caracterizar alguém
como suspeito, culpado ou inocente, ou de passar uma imagem melhor
ou pior) certamente dizem muito a respeito dessas variações.

Sessão 18:

Aristeu Elisandro Machão Lopes, UFRGS


Representações da Escravidão e da Abolição nas caricaturas da
imprensa ilustrada e humorística pelotense do século XIX
A cidade de Pelotas foi um dos centros urbanos mais desenvolvi-
dos da Província do Rio Grande do Sul no 2º Império. A riqueza propor-
cionada pela indústria e comércio do charque e a utilização da mão-de-
obra escrava possibilitou não só o crescimento econômico, como tam-
bém favoreceu a urbanização e o aparecimento de uma intensa ativida-
de cultural. Assim a imprensa também prosperou, tendo o livro e o jornal
como os principais atrativos. Ao encerrar do século XIX, Pelotas contabi-
lizava 116 jornais, entre eles, três periódicos ilustrados e humorísticos:
Cabrion (1879-1881), Zé-Povinho (1883) e A Ventarola (1887-1889). O
presente trabalho propõe investigar através das caricaturas, desenhos e
textos humorísticos veiculados nessa imprensa, as representações rela-
cionadas à escravidão, à campanha abolicionista e as repercussões da
Lei Áurea. Averiguando como a sátira era empregada nos periódicos
para criticar a sociedade escravista pelotense, especialmente nas cari-
caturas veiculadas em A Ventarola após o dia 13 de Maio de 1888.

74
Lucia Helena Oliveira Silva, UEL
Vivências negras no pós-abolição: libertos e afro-descendentes no
Paraná
Esta comunicação busca trabalhar as primeiras reflexões sobre a
vida de libertos, negros livres e afro-descendentes em geral no período
pós-abolição no estado do Paraná. Partindo da bibliografia que discute a
escravidão nessa província e os trabalhos que analisaram a escravidão
sob a ótica da história social e demográfica, tentamos compreender al-
guns aspectos da escravidão paranaense e os reflexos sobre a vida dos
emancipados que ali viviam. Nossa fonte primária para a pesquisa são
processos criminais que envolvem libertos e afro-descendentes em Cu-
ritiba e região no período de 1888 a 1920. Além de refletir sobre a cons-
tituição das vivências, tentamos compreender as formas de sociabilida-
de e conflito com os imigrantes e demais segmentos da população.

Frank Nilton Marcon, UFSC


Identidade e diferença: “homens de cor” e o “Centro Cívico Cruz e
Sousa”
O “Centro Cívico Cruz e Sousa”, existente até os dias de hoje na
cidade Lages, estado de Santa Catarina, foi fundado no ano de 1918. Nas
notícias da época e no seu estatuto de fundação os sócios o proclamavam
como clube ou sociedade dos “homens de cor”. Segundo alguns docu-
mentos e entrevistas o “Centro Cívico” foi idealizado por alguns negros
ligados a uma escola noturna para adultos e no primeiro ano de fundação
já contava com mais de sessenta sócios. Na sede do clube se organiza-
vam festas, bailes, solenidades e sessões comemorativas. Os eventos
anuais mais badalados eram as comemorações do “13 de Maio” e do “22
de Setembro”(data da fundação do clube). A agremiação social editava um
jornal, tinha banda musical e um hino cívico executado nas principais sole-
nidades. Fundado num contexto de três décadas após a Abolição, numa
cidade como Lages (de considerada projeção política e econômica em
Santa Catarina), marcada pela economia pastoril e pelo coronelismo mas
sintonizada com o civismo e o nacionalismo do pós-primeira guerra, a or-
ganização destes “homens de cor” sugere que a articulação coletiva dos

75
afrodescendentes na região utilizou-se de estratégias políticas e institucio-
nais de visibilidade e inclusão “na nação”, pautando-se por princípios de
“cor” e nacionalismo agregados aos seus significados de civilidade e civis-
mo. Neste trabalho, procuro pensar questões ligadas às estratégias de
identificação e diferença do afrodescendentes na cidade, através da insti-
tucionalização do “Centro Cívico”, bem como os possíveis sentidos de re-
sistência política, por um lado, e de cooptação dos ideais de civilidade e
civismo burgueses, por outro – característicos do projeto republicano das
primeiras décadas do século vinte no Brasil. É importante ressaltar que
venho estudando os percursos do “Centro Cívico” desde os fatos precur-
sores de sua fundação até os dias atuais e a partir daí traço comparações
com outras formas de organização política e social pós-escravidão no Bra-
sil, sempre levando em consideração as especificidades e os contextos
sociais e políticos em que os mesmos estiveram pautados.

Arilson dos Santos Gomes, FAPA-RS


A Frente Negra Brasileira e as suas idéias no Rio Grande do Sul na
década de 1930
A Frente Negra Brasileira surgiu em São Paulo, no ano de 1931. A
sua principal reivindicação era a inserção do negro na sociedade, princi-
palmente através da educação. Para os seus líderes a condição do negro
somente seria modificada, se houvesse uma entidade capaz de possibili-
tar a ele condições favoráveis para o seu esclarecimento e uma possível
ascensão social. Em uma sociedade, na época, historicamente escravo-
crata e racista, porém diversa, a principal forma de se organizar frente a
esses problemas seria, segundo os seus fundadores, reunir pessoas ne-
gras em busca de uma afirmação social e que os conscientizasse das
condições enfrentadas pelos negros, educando-os quatro décadas após a
Abolição da Escravidão. A educação era primordial nas suas diretrizes. Os
bailes e as festividades eram constantes e se consolidavam como impor-
tantes elementos para a identificação coletiva e fonte de recursos financei-
ros. A Frente Negra Brasileira se constituiu em um movimento altamente
centralizado, tornando-se capaz de estruturar-se em núcleos e células por
quase todo o Brasil. Em vários municípios do Estado de São Paulo, nos

76
Estados de Minas Gerias, Bahia, Sergipe e Pernambuco, também existi-
ram núcleos dessa organização. No Rio Grande do Sul, dados apontam
1933 como o ano da vinda das idéias desse pensamento para o nosso
Estado. Pelotas, principal cidade charqueadora do século XIX, impulsiona-
da pela mão de obra escrava se constituiu, no Pós-Abolição, numa cidade
com grande número de população negra, possuindo ao longo de sua his-
tória diversas irmandades, associações e organizações que atuaram cons-
tantemente na causa dessas pessoas como meio de melhorar as suas
condições de vida. A Frente Negra Pelotense, baseada no pensamento da
Frente Negra Brasileira, em 1933, foi a principal ligação gaúcha do movi-
mento “frentenegrino”. Este trabalho tem como principal função mostrar,
através de dados e pesquisas, como a Frente Negra, através de sua orga-
nização e coesão, conseguiu atingir tamanho sucesso, entre a população
negra e respeito por parte da sociedade, inclusive tornando-se partido po-
lítico, integrando outras organizações do movimento negro, espalhadas
pelo Brasil incluindo um núcleo em Pelotas. O movimento “frentenegrino”
deve ser lembrado para que as novas demandas sociais exigidas pelo
movimento negro, coloquem a causa negra em primeiro plano frente à
fragmentação causada principalmente pela competitividade e individuali-
dade dos tempos atuais.
Mirian Adriana Branco, UNIVEST/ FACVEST
Em Santa Catarina, os afro-descendentes e o condicionamento da
cidadania
Enquanto que ao regime monárquico ligaram-se fortemente as
práticas escravocratas, o início de nossa experiência republicana é per-
meado pelos reflexos da abolição da escravatura, ato que além de lan-
çar no meio social, centenas de indivíduos sem moradia, sem recursos
ou perspectivas, ainda emoldurava todo um ideário que sugeria exclu-
são. As relações que se estabeleceram em meio a projetos de constru-
ção nacional, por conta do deslocamento do trabalho servil para o livre
fizeram com que teorias raciais fossem reelaboradas, nacionalismos fos-
sem adaptados, saberes importados, e principalmente os indivíduos cha-
mados a compor a nacionalidade brasileira fossem selecionados.
Dessa forma, fazer parte da nação no século XIX, não era um

77
privilégio de todos. Alguns como os negros africanos e seus descenden-
tes, não se conformavam a um modelo de cidadão em construção du-
rante a nossa primeira experiência republicana. Tempo em que pode-
mos perceber, em detrimento da integração social dos recém-libertos, o
esvaziamento da sua individualidade, e a inclusão destes num grupo
racial. Uma amostra dos muitos desdobramentos de um saber essenci-
almente biológico que assolava o Brasil, e que propagando a crença na
sua incapacidade física, social e moral, afetava diretamente a vida dos
muitos negros, outrora escravos ou não, que buscavam a sua inserção
nos diversos setores da sociedade brasileira.
Quando chega o século XX, a situação não é muito diferente, ain-
da com poucas possibilidades de ascensão social devido a fatores como
alto índice de analfabetismo, os afro-descendentes percebem que mos-
trar-se apto a cidadania, significava a transposição de discursos que pro-
fessavam sua não civilidade, através de ações que demonstrassem uma
outra versão, escrita nas suas muitas ingerências no meio social, nas
suas intervenções na vida pública, nos seus aprendizados na vida priva-
da, no seu comportamento, seu modo de falar, de andar, de movimentar
o próprio corpo. Era preciso branquear.
O surgimento de associações negras que espalharam-se pelo país
se deu neste contexto, tornando-se importante veículo de discussão e
participação no espaço urbano. Um território de construção, onde seus
membros esforçavam-se para serem reavaliados e re-significados. Na
escalada rumo à cidadania estas associações serviram para que seus
membros continuassem reivindicando benfeitorias para os municípios
no qual se estabelecem; comemorando datas cívicas; organizando bibli-
otecas; instruindo-se, e inserindo-se, através da permanente tentativa
de superação de discursos que colocavam as suas incapacidades ora
sob o peso racial, ora de cunho cultural.
Por isso, pretendo apresentar os resultados da análise dos proce-
dimentos e práticas implementadas pelos membros do Centro Cívico
Cruz e Souza, uma das primeiras associações cívicas fundadas por ne-
gros no Estado de Santa Catarina, afim de perceber os vestígios da luta
pela construção da sua cidadania empreendida por tais indivíduos, num
estado considerado majoritariamente branco.
78
Índice de autores

Adelmir Fiabani ......................................................................................... 68


Adhemar Lourenço da Silva ..................................................................... 33
Albertina Lima Vasconcelos ...................................................................... 35
Álvaro de Souza Gomes Neto .................................................................. 67
Ana Flávia Cicchelli Pires ......................................................................... 43
Ana Paula Dornelles Schantz ................................................................... 58
Antônio César Sprícigo ............................................................................. 70
Arilson dos Santos Gomes ....................................................................... 76
Aristeu Elisandro Machão Lopes .............................................................. 74
Beatriz Ana Loner ..................................................................................... 31
Beatriz Gallotti Mamigonian ...................................................................... 44
Caiuá Cardoso Al-Alam ............................................................................ 71
Carina Santos de Almeida ........................................................................ 53
Carla Regina Wegner Copetti ................................................................... 55
Carlos Engemann ..................................................................................... 21
Cesar Augusto Barcellos Guazzelli .......................................................... 19
Cristiane Pinto Bahy ................................................................................. 60
Daniela Vallandro de Carvalho ................................................................. 72
Denise M. dos Santos Mello ..................................................................... 55
Denize Aparecida da Silva ........................................................................ 40
Diego Rodrigues ....................................................................................... 28
Edson José Neves Júnior ......................................................................... 39
Elci Deloss Tolomini .................................................................................. 55
Eliege Moura Alves ................................................................................... 69
Ezequiel Giacomelli .................................................................................. 28
Fabiano Dauwe ......................................................................................... 65
Fábio Odair Gomes Goulart ..................................................................... 52
Fernando Franco Netto ............................................................................. 46
Frank Nilton Marcon ................................................................................. 75
Gabriel Aladren ......................................................................................... 57
Gabriel Santos Berute .............................................................................. 41
Gabrielle Werenicz Alves .......................................................................... 25
Helen Osório ............................................................................................. 18
Henrique Espada Lima ............................................................................. 32
Ivone Cecília D’ Ávila Gallo ...................................................................... 21
Jardel Gores ............................................................................................. 28
Jean Carlos Antonio .................................................................................. 29

79
José Bento Rosa da Silva ......................................................................... 30
Jovani de Souza Scherer .......................................................................... 59
Juliana Aparecida Lemos Lacet ................................................................ 59
Júlio César Cóssio Rodriguez .................................................................. 23
Leonardo Monasterio ................................................................................ 22
Liane Susan Muller ................................................................................... 62
Lígia Conceição Santana .......................................................................... 62
Luana Teixeira........................................................................................... 50
Lucia Helena Oliveira Silva ....................................................................... 75
Luciane P. Corá Molin ............................................................................... 56
Luis Augusto Ebling Farinatti .................................................................... 18
Luiz Paulo F. Nogueról .............................................................................. 22
Maísa Faleiros da Cunha .......................................................................... 45
Marcia Naomi Kuniochi ............................................................................. 34
Márcio de Sousa Soares .......................................................................... 64
Marcos Rafael da Silva ............................................................................. 29
Marcos Smith Dias .................................................................................... 28
Maria Angélica Zubaran ............................................................................ 47
Maria Aparecida Anacleto Clemencia ....................................................... 55
Mariana Selister Gomes ........................................................................... 26
Marilene Ribeiro Solano ........................................................................... 54
Martha Daisson Hameister ....................................................................... 45
Martha Rebelatto ...................................................................................... 71
Maximiliano Mazewski Monteiro de Almeida ............................................ 25
Mirian Adriana Branco .............................................................................. 77
Nikelen Acosta Witter ................................................................................ 37
Nilsen Christiani Oliveira Borges .............................................................. 64
Rafael da Cunha Scheffer ........................................................................ 42
Regina Célia Lima Xavier ......................................................................... 20
Ricardo De Lorenzo .................................................................................. 36
Ricardo Tadeu Caíres Silva ...................................................................... 48
Rodrigo de Azevedo Weimer .................................................................... 73
Roger Elias ............................................................................................... 38
Sandra Beatriz Essenberg ........................................................................ 55
Savio Antônio Reginatto ........................................................................... 55
Shana Rech .............................................................................................. 53
Sherol dos Santos .................................................................................... 51
Tathianni Cristini da Silva .......................................................................... 27
Thiago Leitão de Araújo ............................................................................ 51
Vinicius Pereira de Oliveira....................................................................... 49

80

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