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Federal University of Rio Grande do Sul, Brazil

From the SelectedWorks of Paulo S. Peres

2002

Sistema Partidário e Instabilidade Eleitoral no


Brasil
Paulo S. Peres

Available at: https://works.bepress.com/pauloperes/10/


Sistema Partidário e Instabilidade Eleitoral no Brasil#

Paulo Sérgio Peres

*
I. Introdução

Segundo a literatura especializada em sistemas partidários, uma de suas principais


funções no processo democrático é o estabelecimento de um determinado padrão de
comportamento eleitoral agregado, ou seja, a produção de um certo nível de estabilidade
eleitoral. De acordo com alguns autores, a democracia brasileira seria incipiente devido, entre
outras coisas, à ineficiência dos partidos quanto à agregação padronizada das preferências
eleitorais. Desta forma, a alta e crescente instabilidade eleitoral seria a evidência empírica da
reduzida institucionalização do sistema partidário. Ou seja, a cada nova eleição, os eleitores
votariam em partidos diferentes daqueles em que haviam votado na eleição anterior.

Minha proposta neste texto é testar a consistência desta argumentação. Para isto, o grau
de estruturação das preferências político-eleitorais é analisado em termos dinâmicos pela
mensuração da evolução do grau de instabilidade eleitoral em nível agregado. Em termos
operacionais, a instabilidade eleitoral é analisada por meio do índice de volatilidade eleitoral em
duas dimensões – a volatilidade partidária de Pedersen (1980, 1990) e a volatilidade ideológica
de Bartolini & Mair (1990). A unidade de análise adotada é referente aos resultados das eleições
para a Câmara Federal entre 1982 e 1998. Meu objetivo central é testar em que medida o
sistema partidário seria, conforme afirmam vários autores, um obstáculo ao processo de
consolidação da democracia no Brasil. Como será mostrado, a instabilidade eleitoral brasileira
pode ser considerada elevada em comparação com a existente em países europeus e em alguns
países latino-americanos, contudo, em termos absolutos, o grau de estabilidade das
preferências eleitorais brasileiras permite inferir que o sistema não é caótico, pelo contrário,
este estrutura satisfatoriamente o comportamento eleitoral. Os dados também mostram que a

# Texto Publicado como capítulo do livro “Partidos no Cone Sul: Novos Ângulos de Pesquisa”, organizado
* Esta pesquisa foi desenvolvida com o apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São
Paulo (FAPESP). Versões anteriores deste texto foram apresentadas no II Encontro da Associação Brasileira de
Ciência Política, em Novembro de 2000 e no Congresso dos Sociólogos de São Paulo, em Setembro de 2001.
Gostaria de agradecer a todos os colegas que estiveram presentes a estes encontros e que contribuíram com
críticas e sugestões. Gostaria de agradecer a Fernando Limongi, meu orientador, e Maria D’Álva Kinzo. pelos
comentários críticos ao texto.
2

volatilidade ideológica é bastante reduzida e apresenta uma dinâmica declinante, o que significa
que a clivagem ideológica tem funcionado como delimitador da estruturação da competição
interpartidária.

Para encaminhar esta análise, o texto foi estruturado da seguinte maneira. Na próxima
seção, discuto as relações entre sistema partidário e democracia. Na seção III, faço algumas
considerações acerca dos trabalhos que analisaram a instabilidade eleitoral no recente período
democrático brasileiro. Finalmente, na seção IV, apresento uma análise empírica da
instabilidade eleitoral partidária e ideológica no Brasil.

II. Sistema Partidário e Dinâmica Democrática

Para sua efetividade enquanto sistema de representação política e de resolução


moderada de conflitos, a democracia representativa demanda partidos que atuem de forma
competitiva, disputando apoios em relação aos seus programas e projetos específicos (Mair:
1990; Strom: 1990; Lijphart: 1994; Dahl: 1997; Maor: 1997). Com isto, tanto as eleições quanto
o sistema eleitoral e o sistema partidário assumem relevância fundamental. Devido a isto é que,
como salienta Powell Jr. (1994, 74) “(....) some of the most thoughtful and influential political
theorists of our time have seen the system parties in a society as the key to political
performance”.

Assim, podemos partir da pressuposição de que para que haja coerência e alguma
previsibilidade no processo de competição interpartidária, é necessário que haja uma certa
estabilidade eleitoral; afinal, “where voting support does undergo volatile shifts, it is likely that
voter mobilization will be uneven and uncertain, that governing will be made more difficult by
uncertainties about future support (...)” (Ibid., 80). Consequentemente, sob tais premissas
teóricas, do ponto de vista empírico, “most observers view rapid changes in the pattern of
support for parties as evidence of weakness in party systems.” (Ibid., 96).

Desta forma, é possível concluir que a preocupação quanto à efetividade do sistema


partidário na arena eleitoral se justifica pela relevância desta instituição representativa. Sua
dinâmica e seu formato são indicadores da mais alta importância, na medida em que a
interação competitiva dos partidos nas eleições mostra a funcionalidade do sistema partidário
não apenas na legitimação da democracia representativa, mas também na estruturação das
3

escolhas eleitorais e da participação política, na institucionalização do conflito social e na


estabilização do sistema político como um todo. É por meio da competição eleitoral que o
sistema partidário confere coerência e regularidade à competição política, o que significa dizer
que o sistema, enquanto institucionaliza a participação, institucionaliza-se a si mesmo.

Como podemos perceber, vista deste ângulo, a institucionalização do sistema partidário


aparece como um duplo processo: sociológico e mecânico-institucional. Sociologicamente, a
institucionalização significaria a interiorização de uma prática considerada como sendo legítima
e a estruturação das preferências políticas conectadas a determinados partidos ou blocos de
partidos que a representem. Do ponto de vista da mecânica institucional, significaria a
prevalência de determinadas regras [regime eleitoral] sob as quais determinados atores são
enquadrados e pelas quais traçam suas estratégias de interação [coligações e coalizões]. Isto
significa que, acima de tudo, o sistema partidário é a própria corrente de transmissão das
preferências dos indivíduos na cadeia da representação política e do exercício de governo, que
tem como pólos o Estado e a sociedade civil.

Com relação a isto, Bartolini & Mair (1990), por exemplo, chamam a atenção
justamente para a importância do sistema partidário como instância mediadora dos atores
políticos com as instituições de governo, salientando dois processos de extrema relevância para
a estabilidade do jogo democrático. Por um lado, o sistema partidário legitimaria a disputa
política entre as lideranças partidárias, por outro lado, e, acima de tudo, funcionaria como
moderador das tensões sociais entre grupos ou classes, operando uma mecânica de
“encapsulamento” do conflito social.

De certa forma, Lipset & Rokkan (1990) já salientaram estas funções, ao apresentarem
evidências da estabilização sistêmica em democracias mais antigas, como as européias, baseada
em clivagens sociais. No caso de países recém-democratizados, Mainwaring & Scully (1995) e
Mainwaring (1999) puseram em relevo a importância de se reconsiderar a teoria de sistemas
partidários, de forma a incluir uma outra dimensão analítica, que seria o grau de
institucionalização sistêmica. Para estes autores, nas “novas” democracias, além de ser
importante apreender as características estáticas dos sistemas de partidos, tais como número de
partidos efetivos, fragmentação eleitoral, partidos relevantes, tipo de polarização, etc.; também
seria de extrema importância diagnosticar a dinâmica do sistema no que se refere aos padrões
de preferências eleitorais agregadas que se estabelecem ao longo de uma linha temporal. Neste
4

caso, diferentemente de países de democracias mais antigas, o importante seria o grau de


estabilidade que o sistema produziria nas competições partidárias, induzindo os atores à
manifestação coerente de suas preferências e a atribuírem legitimidade a esta forma moderada
de resolução de conflitos.

Assim sendo, de maneira geral, o sistema partidário é apontado como uma instituição
representativa importante para a legitimação da competição partidária e para a canalização do
conflito social, de forma a produzir uma dinâmica eleitoral estável e padronizada (Bartolini &
Mair: 1990; Mair: 1990, 1993; Maor: 1997). Ou seja, o sistema partidário é uma peça
fundamental na dinâmica democrática, em que a estabilidade de seu funcionamento contribui
para a estabilidade de todo o sistema político. Com relação a isto, Mainwaring & Scully (1995,
28), enfatizam que “there is an interactive effect: democratic stability encourages
institutionalization; such institutionalized party system makes more likely the emergence of a
stable democracy”. Em contrapartida, conforme observa Powell Jr. (1994, 80), “where voting
support does undergo volatile shifts, it is likely that voter mobilization will be uneven and
uncertain, that governing will be made more difficult by uncertainties about future support
(...)”.

Portanto, como se pode notar, é consensual entre aqueles que estudam as instituições
democráticas a perspectiva de que, para que seja efetivo, o sistema partidário deve estruturar
satisfatoriamente as preferências dos atores políticos, dando inteligibilidade e maior
previsibilidade ao comportamento eleitoral. Em sendo efetivo, o sistema partidário contribuiria
para o bom funcionamento da democracia ou, no caso de democracias recentes, para seu
processo de consolidação.

No que se refere ao sistema representativo brasileiro, como veremos na próxima seção,


há várias análises que concluem que este não seria efetivo no desempenho desta função,
dirigindo o foco institucional de suas críticas justamente aos partidos e ao sistema partidário
(Lamounier & Meneguello: 1986; Lamounier: 1992, 1994; Meneguello: 1994; Sartori: 1993;
Mainwaring: 1992, 1995, 1999; Mainwaring & Scully: 1995). No geral, os analistas concluem
que os partidos seriam estruturalmente frágeis e socialmente desenraizados. Quanto ao
primeiro aspecto, o problema seria seu tipo de organização, pragmática e pouco
institucionalizada. Quanto ao segundo aspecto, isto ocorreria devido a sua pouca capacidade de
estabelecer vínculos ideológicos e identificação com os eleitores. A principal conseqüência
5

disto seria a crescente volatilidade das preferências políticas dos atores sociais, objetivada em
um comportamento eleitoral altamente instável. Baseados nestas conclusões Mainwaring &
Scully (1995), por exemplo, afirmam que os partidos brasileiros seriam “weak parties” e, em
decorrência disto, nossa democracia seria uma “feckless democracy”.

III. Análises Empíricas da Instabilidade Eleitoral Brasileira

O recente período democrático brasileiro tem sido apreendido como o resultado da


combinação do pior dos mundos possíveis: partidos pragmáticos e atomizados com
representação proporcional (Lamounier: 1992, 1994, 1999; Lamounier & Meneguello: 1986;
Mainwaring: 1995, 1999). Este tipo de arranjo institucional criaria incentivos ao pluralismo
polarizado (Sartori: 1968, 1970, 1972, 1975) e, assim, à radicalização ideológica e à violência
política (Huntington: 1975; Powel Jr.: 1994), ou a crises crônicas de governabilidade
(Lamounier: 1992, 1994). Desta forma, vários analistas continuam cépticos quanto às
possibilidades da democracia no Brasil, dado que se mantêm convictos de que nossos partidos
continuariam débeis e pouco representativos (Mainwaring & Scully: 1994, 1995; Mainwaring:
1995, 1999; Lamounier: 1991, 1999; Roberts & Wibbels: 1999), ou seja, de que nossos partidos
continuariam incapazes de estruturar minimamente as preferências políticas dos eleitores e de
que estes, por sua vez, seriam idiossincráticos, volúveis. As conseqüências práticas disto seriam
expressas por um comportamento eleitoral inconsistente, errático. Isto significaria que os
eleitores, a cada nova eleição, escolheriam partidos diferentes, sem qualquer coerência
ideológica orientando suas votações.

O problema político decorrente desta percepção é que a instabilidade do sistema


partidário brasileiro, apontada por estes analistas, seria um indicador não apenas da debilidade
partidária, no que se refere à representação política, como seria também um indicador da baixa
institucionalização do próprio sistema de representação, significando um obstáculo à
consolidação democrática. Entretanto, poucas análises abordaram o sistema partidário
brasileiro com base em dados empíricos consistentes. Com relação a sua função de estruturar
preferências e de estabilizar o comportamento eleitoral, as análises são ainda mais escassas. Por
outro lado, mesmo no caso das análises com base empírica, não há consenso acerca da
efetividade do sistema partidário. Dos poucos trabalhos que aplicaram o índice de volatilidade
eleitoral (Mainwaring & Scully: 1994, 1995; Lima Jr.: 1997; Nicolau: 1998; Roberts & Wibbels:
6

1999; Mainwaring: 1999), podemos extrair conclusões opostas quanto à funcionalidade do


sistema representativo brasileiro, passando pela constatação de sua efetividade crescente até à
afirmação de sua total debilidade.1

No trabalho coletivo editado por Lima Jr. (1997), a volatilidade eleitoral, partidária e
ideológica, foi analisada em seis estados brasileiros. Com base nos dados apresentados, o autor
concluiu que haveria um processo de estabilização das preferências eleitorais agregadas,
especialmente das preferências associadas a clivagens ideológicas. Na análise realizada por
Nicolau (1998b), foram abrangidas todas as unidades da Federação e o autor buscou
estabelecer correlações entre a volatilidade eleitoral partidária registrada nas votações para as
Assembléias Legislativas e para a Câmara Federal e entre número de partidos efetivos (Ne) e
volatilidade partidária. Em suas conclusões, o autor indicou que a volatilidade eleitoral
partidária brasileira é elevada em termos relativos, quando comparada à européia, mas não
apresentou nenhum tipo de discussão a respeito dos significados de sua dinâmica no contexto
brasileiro. Roberts & Wibbels (1999) detectaram uma volatilidade tão excessiva que a
admitiram como um fato incontestável, restando apenas buscar as causas de tamanha
instabilidade sistêmica. Mainwaring & Scully (1995) também já haviam feito uma análise
comparativa do mesmo tipo e, a partir disso, classificaram os sistemas de acordo com seu nível
de institucionalização – o Brasil foi classificado como um sistema “subdesenvolvido”. Mais
recentemente, Mainwaring (1999) analisou especificamente o caso brasileiro, chegando à
mesma conclusão a qual já havia chegado nos trabalhos anteriores.

Muito provavelmente, as discrepâncias das conclusões apresentadas devem-se, em


alguns casos, aos critérios analíticos adotados, ou, em outros casos, a problemas
metodológicos. Lima Jr. (1997) e Nicolau (1998b) encontram-se no primeiro caso, pois, o que
ocorre são diferenças quanto à abrangência e quanto à profundidade das análises. Lima Jr.
(1997) apresentou um trabalho com maior profundidade, contemplando tanto a volatilidade

1 Neste trabalho, limitar-me-ei apenas às análises que aplicaram o índice de volatilidade eleitoral ao sistema
partidário brasileiro recente, do período pós-redemocratização. Contudo, há alguns poucos trabalhos que
aplicaram o mesmo índice, ou alguma mensuração com a mesma lógica, ao sistema partidário de 45-64. Estes
trabalhos são os de Lima jr. (1982), Lavareda (1991) e Figueiredo (1995), que analisaram o sistema partidário
daquele período tendo como ponto central a análise de seu grau de instabilidade. Lima Jr. (1982) utilizou a
mensuração proposta por Przeworski (1975), conceituando-a como índice de “desinstitucionalização”. Lavareda
(1991), embora também tenha buscado a mensuração do grau de estabilidade daquele sistema, utilizou uma outra
medida, testando a correlação entre número de partidos efetivos e fragmentação eleitoral. Já Figueiredo (1995),
utilizou o índice de volatilidade eleitoral proposto por Pedersen (1980, 1990), analisando a volatilidade
parlamentar daquele período.
7

eleitoral partidária quanto a volatilidade eleitoral ideológica; contudo, sua análise foi pouco
abrangente, pois, limitou-se a apenas oito estados da Federação.2 Nicolau (1998b), por sua vez,
apresentou uma análise abrangente, incluindo todas as unidades da Federação e testou algumas
correlações entre índices e entre níveis de disputa eleitoral. Entretanto, sua análise não
apresentou muita profundidade, na medida em que apenas o índice de volatilidade eleitoral
partidária foi contemplado, deixando de fora o índice de volatilidade eleitoral ideológica.

Com relação a Mainwaring (1999), Mainwaring & Scully (1994, 1995) e Roberts &
Wibbels (1999), as discrepâncias dos resultados devem-se a problemas de ordem metodológica.
No caso de Mainwaring & Scully (1994, 1995), houve dois equívocos com relação à análise da
volatilidade eleitoral brasileira. O primeiro foi ter calculado a volatilidade das eleições
presidenciais tomando como ponto 1 a eleição de 1960 e, como ponto 2, a primeira eleição
presidencial pós-reabertura democrática. Trata-se de dois sistemas partidários totalmente
diferentes, entremeados por longos anos de autoritarismo e por um sistema bipartidário
compulsório.3 Assim, além de considerarem um único par de eleições, os autores consideraram
dois sistemas distintos, chegando a encontrar uma volatilidade eleitoral ideal-típica de 99
pontos. O segundo problema metodológico foi ter calculado a volatilidade eleitoral partidária
média para o sistema a partir do índice de volatilidade das eleições presidenciais e das eleições
para a Câmara Federal. A questão é que um tipo de eleição segue a fórmula proporcional e, o
outro, a majoritária, tratando-se, portanto, de lógicas distintas de competição e de cálculo por
parte do eleitor. No caso de Robert & Wibbels (1999), o problema se refere a pouca seqüência
eleitoral, uma vez que os autores consideraram apenas dois pares de eleições (1996-1990/1990-
1994), e à discutível volatilidade média do sistema, calculada também a partir da volatilidade
eleitoral para a Câmara e para a Presidência.

Para tentar superar estes problemas metodológicos, a estratégia adotada aqui consiste
em procurar resolver os três pontos de controvérsia que foram apontados. Primeiramente,

2 Sua análise também apresenta dados quanto aos índices de fracionamento eleitoral (fe), de fracionanamento
parlamentar (fp), de número efetivo de partidos eleitorais (ne), de número efetivo de partidos parlamentares (np),
de desproporcionalidade da representação. Estes índices são calculados para a Câmara Federal e para as
Assembléias Legislativas nos seguintes estados: Bahia, Ceará, Goiás, Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo, Rio
Grande do Sul e Santa Catarina.
3 Os autores mesmos percebem esta dificuldade, esclarecendo em uma nota (p. 09, n.l) que havia um hiato

entre as duas eleições e que apenas o PTB, embora fosse um outro partido no segundo período, permanecia
enquanto sigla remanescente. Não obstante, os autores, incorreram no equívoco de propor essa análise. Para uma
discussão mais detalhada dos efeitos que a descontinuidade produziu no sistema político brasileiro, bem como os
mecanismos de adulteração da representação e de manipulação do regime eleitoral, veja-se Kinzo (1990, 1993).
8

procuro apresentar uma análise baseada em dados empíricos, algo que, como já salientado,
nem sempre está presente nos trabalhos que abordam o sistema partidário brasileiro. Em
segundo lugar, utilizo um índice cuja operabilidade é simples e de fácil confrontação externa e
interna, sendo este amplamente aplicado a análises do mesmo tipo tanto na Europa quanto na
América Latina, o que, inclusive, possibilita o exercício comparativo. Por último, procurarei
ultrapassar os problemas metodológicos discutidos anteriormente, adotando uma análise que
tenha abrangência e profundidade.4 Para a consecução deste objetivo, serão abordados todos
os estados da Federação e serão analisadas as volatilidades eleitorais tanto partidárias quanto
ideológicas.5 Tendo sob foco tal perspectiva, adotarei na análise que se segue o índice de
volatilidade eleitoral de Pedersen (1980, 1990), com as variações introduzidas por Bartolini e
Mair (1990).6 Este é um índice já consagrado na literatura internacional, sendo considerado
uma das melhores formas de analisar o grau de instabilidade eleitoral de um sistema partidário.7
Sua proposição foi feita por Pedersen (1980, 1990) e seguiu de perto a lógica de mensuração da
instabilidade dos sistemas partidários formulada por Przeworski (1975). Mais recentemente,
4 Os dados que serão analisados referem-se às votações para Câmara Federal no período de 1982 a 1998. A
escolha destas votações específicas se justifica, primeiramente, pela viabilidade de se aplicar de maneira mais
rigorosa o índice de volatilidade eleitoral a este tipo de eleição (proporcional). Em segundo lugar, pelo seu caráter
nacional, mas com base em distritos estaduais, temos que a unidade federativa, neste caso, acaba se articulando
com elementos de natureza regional. Assim, este recorte pode trazer evidências quanto à dinâmica do sistema
partidário como um todo e, ao mesmo tempo, oferecer uma perspectiva comparativa entre suas unidades
federativas. Com relação à unidade de análise, serão considerados apenas os votos válidos nos partidos, ficando de
fora, portanto, os votos em branco. A justificativa para isto é que no caso da apreensão da instabilidade das
preferências eleitorais com relação ao sistema partidário, o que mais interessa são as mudanças nas preferências
partidárias e não a defecção em relação a alguma eleição ou à decisão de voltar a participar do jogo eleitoral de
maneira efetiva. Meu objeto, neste caso, é estritamente a instabilidade da preferência eleitoral partidária, sendo
que, com isto, minha unidade de análise torna-se, necessariamente, os votos válidos nos partidos.
5 Os critérios para a classificação dos partidos no contínuo ideológico direita/centro/esquerda baseiam-se nos

sugeridos por Figueiredo & Limongi (1999), que consideram a dinâmica dos comportamentos parlamentar e
partidário no Congresso Nacional. Estes dados são relativamente congruentes com outra classificação, feita por
Kinzo (1990, 1993), a partir de metodologia distinta, pela aplicação de questionários e pelo posicionamento
ideológico de cada parlamentar. Estes dados também são congruentes com os apresentados por Rodrigues (2001),
que analisou a posição sócio-ocupacional das bancadas parlamentares.
6 Sobre os critérios para o cálculo do índice, foram seguidas as sugestões de Bartolini & Mair (1990). No caso

do desaparecimento de um partido, seus votos foram computados na eleição subseqüente como sendo zero,
subtraindo-se deste zero o resultado anterior, o que faz com que o mesmo resultado anterior seja considerado
como a volatilidade partidária com sinal negativo, mas sem sinal negativo no cálculo da volatilidade total. No caso
do surgimento de um partido, foi utilizado o mesmo critério, só que de forma inversa. No caso de uma cisão
partidária, o critério foi considerar o novo partido como a soma dos partidos anteriores na eleição subseqüente.
No caso de uma fusão partidária, o procedimento é o mesmo utilizado na cisão, só que de forma inversa.
7 A elaboração do índice de volatilidade eleitoral é o resultado metodológico das preocupações tanto teóricas

quanto empíricas em relação às possíveis transformações pelas quais os sistemas de partidos europeus estariam
passando a partir dos anos 60. Desde então, a instabilidade eleitoral passou a ser fonte de preocupação e objeto de
análise (cf. Mair: 1990, 1992). Para maiores detalhes metodológicos sobre o índice, ver Pedersen (1980, 1990),
Bartolini & Mair (1990), Tavares (1997), Nicolau (1997); para uma discussão histórica de sua formulação, ver
Peres (1999).
9

Bartolini & Mair (1990) agregaram algumas variações ao índice, possibilitando a mensuração
do grau de identificação ideológica dos eleitores em relação aos partidos em competição.

A lógica operacional deste índice é a seguinte: a análise deve ser feita tomando-se
sempre pares de eleições, em que se deve subtrair o resultado da porcentagem da votação que
um partido obteve em uma eleição da imediatamente anterior, e assim por diante. Uma vez que
se fez isto para todos os partidos, os resultados devem ser somados em módulo e divididos por
2. Esta divisão é feita porque é necessário descontar a dupla contagem que se faz das
mudanças de votos quando se realiza esta operação. Este procedimento nos leva à seguinte
expressão algébrica, em que VE é a volatilidade eleitoral partidária total, n é o número de
partidos em competição e Pi é a porcentagem dos votos no partido i nos tempos t e t+1. É
importante salientar que o índice varia de zero a 100, sendo que, conforme ilustra o esquema
abaixo, quanto mais próximo de 100, mais instável é o sistema.

VE = Σn ⏐(Pit - Pi(t+1)⏐/2
n-1

Institucionalização/Estabilidade Sistêmica
Estabilidade Instabilidade
0 25 50 75 100
Institucionalização/Desinstitucionaliação

As operações descritas acima se referem à mecânica do cálculo da volatilidade eleitoral


partidária. Como já foi salientado, também utilizarei nesta análise a variação introduzida neste
índice por Bartolini & Mair (1990), o que possibilita a mensuração da volatilidade eleitoral
ideológica. Neste caso, a formulação algébrica é a mesma e a variação consiste em considerar
como um único partido um bloco de partidos que pertençam à mesma ideologia. Este
procedimento possibilita uma análise mais consistente especialmente no caso de sistemas
multipartidários, como o brasileiro. Isto porque, em havendo mais de três partidos em
determinado sistema, por exemplo, é perfeitamente lógico imaginar que haveria mais de um
partido ocupando o mesmo espaço ideológico. Desta forma, as mudanças de votos entre estes
10

dois partidos não significariam nenhuma incoerência em termos ideológicos por parte do
eleitor.

Posto isto, cumpre-me observar que a instabilidade eleitoral brasileira do recente


período democrático será analisada em duas dimensões: a instabilidade envolvendo a
competição partidária e a instabilidade envolvendo o posicionamento ideológico dos partidos e
dos eleitores. Estes dados serão explorados de forma dinâmica e classificatória.

IV. A Instabilidade Eleitoral Brasileira (1982-1998)

1. Panorama Comparativo

Talvez seja interessante iniciar a análise com um panorama comparativo entre Brasil e
Europa e Brasil e América Latina, especialmente porque os trabalhos que avaliam o sistema
partidário brasileiro o fazem de forma comparada. Os dados apresentados a seguir, de certa
forma, corroboram as afirmações de que a instabilidade eleitoral no Brasil é elevada em termos
relativos, embora a instabilidade encontrada na análise presente seja bem mais reduzida do que
aquela apresentada em estudos deste tipo.8

Conforme mostram os dados do gráfico 1, a taxa de volatilidade eleitoral média


brasileira é relativamente elevada em comparação com as da Europa. Há um grupo de países
cujo índice não ultrapassa os 10 pontos e um grupo pequeno que fica em um ponto
intermediário, variando de 10 a 15 pontos mais ou menos. Quatro países apresentam índices
mais elevados e próximos do brasileiro, que são, pela ordem crescente, Irlanda, Islândia, Itália e
Portugal. Mesmo Portugal, cujo índice é o mais elevado dos países europeus analisados no
período, não se aproxima tanto do Brasil, guardando uma diferença de cerca de 10 pontos.
Portugal, Itália e Irlanda são países politicamente turbulentos, sendo que Portugal e Grécia
também fazem parte, ao lado do Brasil, dos países da “terceira onda” democrática.

8 Conforme já foi discutido anteriormente, estes estudos são, especificamente, os de Mainwaring & Scully

(1995), Mainwaring (1999) e de Robert & Wibbels (1999).


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Gráfico 1. Volatilidade Eleitoral Total Média


Comparação Brasil (1982-1998) Europa (1985-1996)

Brasil 26,5

Portugal 17,4

Itália 16,8

Islândia 16,2

Irlanda 15,4
França 14,8

Holanda 14,7

Noruega 12,4

Luxemburgo 10,5

Suécia 10,2

Finlândia 10

Dinamarca 9,8

Bélgica 8,8

Espanha 8,5

Suíça 7,6

Grécia 7,2

R. Unido 4,5

Áustria 7,2

Alemanha 6,1

Fonte: TSE, DCP/USP, Nicolau (1998a, 1998b).

Em relação à América Latina, a volatilidade eleitoral partidária brasileira também é


elevada. Conforme podemos perceber pelo gráfico 2, o Brasil se encaixaria em um grupo de
volatilidade intermediária, entre os países cujos índices variam de 20 a 30 pontos. Os países de
volatilidade partidária elevada apresentam uma instabilidade que quase ultrapassa, no caso da
Nicarágua, ou que ultrapassa, no caso do Peru e do Panamá, os 50 pontos. O grupo com
instabilidade eleitoral mais baixa [inferior a 20 pontos] inclui Honduras, Colômbia, Costa Rica,
Uruguai, Chile, México, República Dominicana e Argentina. A menor volatilidade partidária da
região é a de Honduras, cuja média é 7,9 pontos, aproximando-se de países como Suíça, Grécia
e Áustria.
12

Grafico 2. Volatilidade Eleitoral Total Média Câmara Federal


Comparação Brasil/América Latina (1980-1996)

Brasil 26,5
Nicaragua 47,7
Peru 53,8
Panamá 58,2
Equador 29,6
Paraguai 23,4
Bolívia 27,6
Venezuela 20,9
Argentina 13,2
Rep. Dominicana 17,5
Mexico 14,8
Chile 10
Uruguai 11,9
Costa Rica 12,3
Colombia 10,2
Honduras 7,9
Fonte: TSE, DCP-USP, Nicolau (1998a, 1999b) Roberts and Wibbels (1999)

Portanto, os dados comparativos nos permitem concluir que a média da volatilidade


eleitoral partidária brasileira é alta em relação à Europa e intermediária em relação à América
Latina. Contudo, também é possível inferir que a instabilidade eleitoral no Brasil não é elevada
o suficiente para que se afirme, como o faz a literatura temática, que o sistema partidário
brasileiro não ordena e não canaliza institucionalmente, de forma alguma, as preferências
políticas. Sua estabilidade média é elevada o suficiente para invalidar a afirmação de que este
seja totalmente inconsistente.

Na verdade, há algumas explicações para a diferença dos níveis de volatilidade eleitoral


entre o Brasil e a Europa. Primeiramente, é importante ressaltar que a instabilidade eleitoral
média atingida pela Europa corresponde a cem anos de democracia e, portanto, a um longo
período de competição eleitoral. No Brasil, além da democracia ser bastante recente, o grau de
competição eleitoral é elevado, devido, entre outras coisas, ao maior portifólio de opções
partidárias à disposição do eleitor. Um segundo fator que atua no incremento da volatilidade
13

eleitoral partidária reside em aspectos como a extensão territorial com diversidades regionais e
desenho federativo. Estas características podem induzir à existência de ritmos diferenciados de
institucionalização do sistema partidário.

Desta maneira, é importante avançar em uma análise que explore em maior detalhes a
evolução da volatilidade eleitoral internamente, que apreenda as nuances de cada estado, que
estabeleça algum padrão regional, que, enfim, avalie os significados da evolução da
instabilidade eleitoral brasileira em seu próprio contexto. No próximo tópico, o foco da análise
será concentrado especificamente no Brasil. Será considerada a dinâmica da instabilidade
eleitoral em cada unidade da Federação, o que permitirá explorar mais detalhadamente e com
mais especificidade a evolução da estruturação de preferências eleitorais no país.

2. Volatilidade Eleitoral Partidária

A tabela a seguir apresenta os dados sobre a instabilidade eleitoral em sua dinâmica a


cada pares de eleição em cada unidade da Federação. A análise dinâmica da tabela 1 pode ser
explorada em dois aspectos. O primeiro é com relação à seqüência eleitoral em cada estado, de
forma a constatarmos se o índice de volatilidade eleitoral está em declínio ou em ascensão.
Como a medida é dinâmica, o mais relevante é considerar se a curva é ascendente ou
declinante. O segundo é em termos agregados, tomando-se as regiões do país para uma análise
comparativa. Comecemos pela análise da variação da volatilidade eleitoral em cada estado.

Como podemos perceber, a evolução histórica dos dados mostra que há queda do
índice na grande maioria dos estados. Em apenas 6 estados [Acre, Amazonas, Tocantins, Rio
Grande do Norte, Sergipe e Espírito Santo] a variação é ascendente. Em 2 das unidades da
Federação [Goiás, Distrito Federal], há estabilidade e, em 3 estados [Pará, Piauí e
Pernambuco], a oscilação é tão pendular que não permite uma avaliação. No restante, 16
estados, há declínio no grau de volatilidade eleitoral. Todas as regiões tiveram estados com
diminuição da instabilidade. Todos os estados do Sul apresentam queda e quase todos do
Sudeste também, com exceção do Espírito Santo, que apresenta aumento. Dos 4 estados do
Centro-Oeste, 2 [Mato Grosso e Mato Grosso do Sul] apresentam dinâmica de queda e os
outros 2 de estabilidade sistêmica. Na região Norte, 3 estados [Rondônia, Roraima e Amapá]
apresentam queda e os outros 3 apresentam aumento no índice de volatilidade eleitoral. Dos
14

estados da região Nordeste, 5 [Maranhão, Ceará, Paraíba, Alagoas e Bahia] apresentam uma
dinâmica descendente e 2 uma dinâmica ascendente.

Tabela 1. Índice de Volatilidade Eleitoral Partidária por Unidade da Federação, de 1982 a 1998
1982-1986 1986-1990 1990-1994 1994-1998 Média
Rondônia 30,6 73,3 62,8 49,4 54
Acre 15,7 31,6 23,6 63 33,4
Amazonas 35,5 37,9 24,3 55 38,1
Roraima 56,4 51,5 30 52,5 47,6
Pará 23,7 39,3 27,3 37,7 32
Amapá 34,2 39,3 29,7 25,8 32,2
Tocantins ---- 50 32,6 40,9 41,1
Maranhão 17,1 37,8 36,5 28 29,8
Piauí 10 26,2 19,2 28,1 20,8
Ceará 37,9 18,3 33,2 15,6 26,5
R.G. do Norte 6,3 21,9 33,2 31,6 23,2
Paraíba 16,5 43,5 26,2 18,4 26,1
Pernamb. 13,2 36,5 20 29,1 24,7
Alagoas 23,3 65 66,3 38,6 48,3
Sergipe 30,1 33,9 37,8 41,9 35,9
Bahia 30,1 32,7 36,1 21,7 30,1
M. G. Sul 24,3 52,1 49 32,8 39,5
M. Grosso 25,6 51,3 29,6 26,7 33,3
Goiás 31,7 27,2 28,5 33,9 30,3
Distrito Federal ---- 50,9 22,6 48,3 40,6
Rio de Janeiro 27,3 35,7 33,8 30,9 31,9
M. Gerais 25,9 41,7 31,4 21 30
Espírito Santo 16,6 23,5 28,5 31,4 25
São Paulo 17,4 29 20,1 24,4 22,7
Paraná 21,8 42,9 41,8 33 34,8
Santa Catarina 7,9 31,3 14,3 12,3 16,4
R. G. Sul 23,6 29,3 17,4 11,7 20,5
Média Nacional* 21,4 36,5 31,2 27,8 29,9
Brasil** 35,4 36,2 19 15,5 26,5
Fonte: Dados Eleitorais TSE, DCP-USP, Nicolau (1999a, 1999,b)
* A média nacional corresponde à média aritmética obtida a partir das respectivas volatilidades eleitorais de cada
estado, desconsiderando-se o peso relativo de cada distrito na composição do eleitorado nacional.
** A média calculada para o Brasil corresponde às respectivas volatilidades eleitorais em cada estado ponderadas
pelo peso proporcional de cada distrito na composição da magnitude do eleitorado nacional.
15

Esta variação não apenas permite como torna interessante sua análise em termos
classificatórios. Tomando a média brasileira (29,9) como parâmetro para classificar estados em
seu entorno com volatilidade eleitoral alta (acima de 35), média (entre 25 e 35) e baixa (abaixo
de 25), podemos observar como se comporta o índice regionalmente. Como mostra o quadro
1, a região Nordeste é a que apresenta uma distribuição mais dispersa, na qual cerca de 22%
dos estados se enquadram no grupo de alta instabilidade, enquanto aproximadamente 44,5% se
incluem entre os de instabilidade média e 33,5% entre os de instabilidade eleitoral baixa. As
regiões Norte e Centro-Oeste, por outro lado, têm maior instabilidade dos estados
individualmente.

Quadro 1. Classificação dos Estados Quanto ao Índice de Volatilidade Eleitoral Partidária, 1982-1998*
Alta (>35) Média (>25<35) Baixa (<25)
Distrito Federal (CO) Paraná (S) R. G. do Sul (S)
M. G. do Sul (CO) Minas Gerais (SE) Santa Catarina (S)
Sergipe (NE) Rio de Janeiro (SE) São Paulo (SE)
Alagoas (NE) Goiás (CO) Espírito Santo (SE)
Tocantins (N) Mato Grosso (CO) Pernambuco (NE)
Roraima (N) Bahia (NE) R. G. do Norte NE)
Amazonas (N) Paraíba (NE) Piauí (NE)
Rondônia (N) Ceará (NE)
Maranhão (NE)
Amapá (N)
Pará (N)
Acre (N)
* Nota explicativa: A classificação é feita com base na média nacional, obtida a partir da média aritmética das
médias de cada estado, sem considerar o peso relativo de cada distrito na magnitude do eleitorado nacional. Isto
se deve ao fato de que a classificação pela média deve ser feita a partir da média nacional e não da média da
volatilidade eleitoral nacional agregada. Dessa forma, o importante é a situação de cada estado em relação aos
outros, na média, e não em relação à volatilidade média brasileira agregada, o que significa uma média ponderada
pelo peso relativo de cada distrito.

A região Norte tem cerca 56% de seus estados no grupo de alta instabilidade, enquanto
44% estão no grupo de média instabilidade. A região Centro-Oeste, por sua vez, tem uma
divisão equilibrada, com metade de seus estados com alta instabilidade e a outra metade com
média instabilidade. Ambas as regiões não têm nenhum de seus estados no grupo de baixa
instabilidade. As regiões cujos estados tomados individualmente apresentam maior estabilidade
são Sul e Sudeste. Cerca de 33% dos estados do Sul apresentam instabilidade média e cerca de
16

67%, instabilidade baixa. No Sudeste, metade se enquadra no grupo de instabilidade média e a


outra metade, no grupo de instabilidade baixa. Portanto, destas duas regiões com menor
instabilidade relativa, a região Sul é a que apresenta instabilidade mais reduzida.

Estes dados, apesar mostrarem uma distribuição em torno da média no Nordeste, mais
instável no Norte/Centro-Oeste e mais estável no Sul/Sudeste, indicam que, pela distribuição
individual dos estados, não é possível estabelecer, de maneira inequívoca, que haveria uma
relação entre instabilidade eleitoral e uma determinada situação sócio-econômica. Estados
como Piauí e Rio Grande do Norte apresentam baixa instabilidade, enquanto Rio de Janeiro e
Paraná apresentam instabilidade média. Contudo, analisados conjuntamente, podemos notar
qual é o padrão regional de instabilidade eleitoral, conforme pode ser ilustrado pelo gráfico
abaixo.

Gráfico 3
Índice de Volatilidade Eleitoral Partidária Média
Agregado por Região Sócio-Econômica, 1982-1998

Média Nacional 29,9

Região Sul 23,9

Região Sudeste 27,4

Região Centro-Oeste 35,1

Região Nordeste 29,4

Região Norte 39,5

0 5 10 15 20 25 30 35 40 45

Fonte: TSE, DCP-USP, Nicolau (1998a, 1998,b)

O gráfico 3 mostra que a média do Nordeste (29,4) é quase idêntica à média nacional
(29,9). A região Sudeste tem sua média (27,4) próxima da média nacional. O Sul é a região com
menor instabilidade (23,9). As regiões mais instáveis eleitoralmente se distanciam
significativamente da média nacional. O Norte apresenta uma média de 39,5 e a região Centro-
17

Oeste, 35,1. Desta forma, as regiões Norte e Centro-Oeste são as mais instáveis, enquanto a
região nordeste tem instabilidade média e as regiões Sudeste e Sul são as menos instáveis.

Conjuntamente, do ponto de vista do agregado nacional, o sistema partidário brasileiro


também apresenta uma dinâmica de declínio da instabilidade eleitoral em termos partidários.9
Conforme pode ser conferido na tabela 1, a volatilidade eleitoral partidária média no Brasil é de
26,5 pontos. Desta forma, embora seja elevada em relação a vários países da Europa e da
América Latina, a instabilidade eleitoral não é tão elevada a ponto de podermos afirmar que o
sistema partidário brasileiro seria incipiente e que as preferências eleitorais não seriam
satisfatoriamente estruturadas. Pelo contrário, a evolução deste indicador aponta para uma
queda gradativa da instabilidade eleitoral na maioria dos estados. A seguir, serão analisados os
dados referentes à volatilidade eleitoral ideológica.

2. Volatilidade Eleitoral Ideológica

Conforme argumentam Bartolini & Mair (1990), a volatilidade eleitoral partidária é


importante porque possibilita a apreensão da instabilidade sistêmica como um todo, mas, no
caso de sistemas multipartidários muito competitivos, ela poderia obscurecer um outro tipo de
estabilidade, que inclusive é mais relevante para a análise da efetividade do sistema. Trata-se da
volatilidade eleitoral ideológica que, ainda segundo os autores, é mais relevante em termos
analíticos, pois, é ela que revela a capacidade do sistema partidário estruturar as preferências de
maneira coerente ou não. Enquanto a volatilidade partidária elevada poderia, por exemplo,
refletir um sistema bastante competitivo, a volatilidade ideológica elevada poderia indicar um
sistema ineficiente na estruturação do comportamento eleitoral agregado.

Para isto, os partidos de uma mesma orientação ideológica devem ser agrupados e
considerados como sendo um único partido e a instabilidade sistêmica passa a ser a volatilidade

9 Até este ponto, a análise explorou a comparação entre os estados e as regiões, tomando como critério de
classificação dos níveis de instabilidade a média nacional. Esta média, especificamente, foi obtida a partir das
médias estaduais. Este critério foi escolhido por ser mais significativo com relação ao conjunto dos estados
tomados individualmente. Contudo, para a análise do nível de instabilidade média do sistema partidário brasileiro,
é necessário considerar outra média, obtida a partir da volatilidade eleitoral de cada estado, ponderada pelo peso
que o respectivo distrito representa na composição do eleitorado nacional. Assim, uma volatilidade elevada no
Sergipe, por exemplo, não deve provocar impacto na volatilidade média nacional além do real peso que aquele
distrito tem na composição do eleitorado global. Fixada esta ponderação, podemos analisar melhor a instabilidade
do sistema brasileiro como um todo.
18

de eleitores que mudam seu voto de um bloco ideológico para outro entre duas eleições
consecutivas. A idéia é que a mudança de voto entre partidos de um mesmo bloco não
significa uma incoerência por parte do eleitor. Neste tópico, analiso a dinâmica do índice de
volatilidade eleitoral ideológica no Brasil, tal como apresentada na tabela 2.

Tabela 2. Índice de Volatilidade Eleitoral Ideológica por Unidade da Federação, de 1982 a 1998*
1982-86 1986-90 1990-94 1994-98 Média
Rondônia 27,8 46,4 30,2 8,4 28,2
Acre 15,7 18,1 2,1 20,3 14
Amazonas 32,7 29 17,1 28,6 26,8
Roraima 10,5 6 2,9 18,2 9,4
Pará 20,4 26,1 6,9 3,7 14,2
Amapá 33,2 25,9 14,4 19,2 23,1
Tocantins 50 1,3 4,3 18,5
Maranhão 16,1 20 27,4 3,5 16,7
Piauí 9,9 6,7 5,7 22,6 11,2
Ceará 35 6,2 20,4 9,4 17,7
R.G. do Norte 6,8 7,3 0,6 8,3 5,7
Paraíba 15,2 25,1 21,4 3,8 16,3
Pernamb. 10,1 33,9 6,3 15 16,3
Alagoas 15,6 40,3 25 22,2 25,7
Sergipe 26,7 21,6 13,9 25,5 21,9
Bahia 26 28,3 4,5 4,4 15,8
M. G. Sul 8,9 25,9 36,6 1,9 18,3
M. Grosso 17,9 46,3 20,2 17,1 25,3
Goiás 4,7 14 7,8 15,1 10,4
Distrito Federal 55,8 3 19 25,9
Rio de Janeiro 2,9 16 16 1,6 9,1
M. Gerais 19,6 29,7 7,8 4 15,2
Espírito Santo 15 12,5 14,2 21,8 15,8
São Paulo 7,2 12 12,7 14,4 11,5
Paraná 19 35,2 11,3 10,5 19
Santa Catarina 7,1 19 11,9 0,9 9,7
R. G. Sul 15,5 18,9 2 3,9 10
Média Nacional 12,6 23,8 13,3 11 15,7
Brasil 11,5 20,6 6,6 1,7 10
Fonte: TSE, DCP-USP, Nicolau (1998 1998b). * Nota explicativa: vide nota tabela 1.
a
19

Uma análise mais detalhada do ponto de vista dinâmico pode ser explorada a partir da
análise da evolução do índice em cada estado, considerando se este aumentou, se diminuiu ou
se permaneceu estável. O que chama a atenção é que, assim como ocorreu com a volatilidade
eleitoral partidária, houve declínio da instabilidade na grande maioria dos estados. Como
mostram os dados da tabela acima, em cerca de 60% dos estados brasileiros, a instabilidade
derivada da variação na taxa de apoio agregado aos partidos agrupados em blocos ideológicos
apresenta uma dinâmica de queda. O índice aumenta em apenas cerca de 20%. Em
aproximadamente 12%, há estabilidade. O restante das unidades da Federação [Ceará,
Pernambuco, Goiás, Distrito Federal] apresenta uma dinâmica oscilante de tal maneira
pendular que é impossível sua avaliação. Todos os estados da região Sul apresentam queda,
enquanto metade dos estados [Rio de Janeiro e Minas Gerais] da região Sudeste apresenta
queda e a outra metade apresenta aumento. Na região Norte, cerca de 57% dos estados
[Rondônia, Pará, Amapá, Tocantins] têm uma dinâmica de declínio, 28% apresentam aumento
e aproximadamente 15%, ou seja, 1 estado, apresenta estabilidade. A região Centro-Oeste
apresenta declínio em metade de seus estados [Mato Grosso e Mato Grosso do Sul] e, na
região Nordeste, 44% dos estados apresentam queda em sua instabilidade [Maranhão, Paraíba,
Alagoas e Bahia], enquanto 11%, ou seja, 1 estado, apresenta aumento e cerca de 22,5% se
mantêm estáveis.

Contudo, é possível explorar um pouco melhor a comparação entre os estados. No


quadro abaixo é apresentada uma classificação em que estes são ordenados de acordo com
níveis de volatilidade ideológica. A classificação toma a média brasileira (15,7) como
parâmetro, ordenando os estados em seu entorno como tendo ou alta (maior que 18), ou
média (entre 12 e 18) ou baixa (menor que 12) volatilidade ideológica. Essa classificação
permite perceber que há uma distribuição mais ou menos uniforme na proporção de estados
nas três categorias analíticas. Contudo, é importante ressaltar que os estados cujos distritos
possuem maior densidade eleitoral, ou seja, possuem maior número de eleitores, encontram-se,
em sua maioria, no grupo de baixa volatilidade ideológica. Rio de Janeiro, Santa Catarina, Rio
Grande do Sul e, especialmente São Paulo, são grandes distritos eleitorais e apresentam uma
instabilidade ideológica relativa baixa. Minas Gerais, que também é um grande distrito eleitoral,
apresenta uma instabilidade média. Cerca de 35% dos estados brasileiros apresentam alta
volatilidade ideológica, mas, com exceção do Paraná, que pode ser considerado um distrito de
tamanho médio, quase todos são distritos de pouca densidade eleitoral, sendo relativamente
20

pequeno o impacto de sua instabilidade na composição da volatilidade ideológica nacional


como um todo.

Quadro 2
Classificação dos Estados Quanto ao Grau de Volatilidade Eleitoral Ideológica* de 1982 a 1998
Alta (>18) Média (>12<18) Baixa (<12)
Rondônia (N) Acre (N) Roraima (N)
Amapá (N) Pará (N) Piauí (NE)
Tocantins (N) Maranhão (NE) R. G. do Norte (NE)
Amazonas (N) Ceará (NE) Goiás (CO)
Sergipe (NE) Paraíba (NE) Rio de Janeiro (SE)
Alagoas (NE) Pernambuco (NE) São Paulo (S)
M. T do Sul (CO) Bahia (NE) Santa Catarina (S)
Mato Grosso (CO) Minas Gerais (SE) R. G. do Sul (S)
Distrito Federal (CO) Espírito Santo (SE)
Paraná (S)
* Nota explicativa: a média nacional utilizada segue o mesmo critério já descrito na nota da tabela 1.

Outro ponto em comum com a volatilidade eleitoral partidária é que parece não haver
uma relação direta entre situação sócio-econômica e volatilidade ideológica, uma vez que
encontramos estados de todas as regiões nas categorias de baixa e alta instabilidade. Com baixa
instabilidade, por exemplo, encontramos Roraima que, apesar de ser o único estado da região
Norte que apresenta uma baixa volatilidade ideológica, é, entretanto, o terceiro estado com
menor instabilidade do país, com 9,4 pontos. O quarto é Santa Catarina, da região Sul, com 9,7
pontos, o segundo é o Rio de Janeiro, da região Sudeste, com 9,1 pontos e, o primeiro, é Rio
Grande do Norte, da região Nordeste, com 5,7 pontos. Com alta instabilidade ideológica, há
estados das regiões Norte, Nordeste, Centro-Oeste e Sul. O Sudeste é a única região que não
tem estado com alta volatilidade ideológica.

A partir destes dados, é possível inferir que, com relação à volatilidade ideológica,
mantém-se o mesmo padrão da volatilidade eleitoral partidária. As regiões Norte [menos] e
Centro-Oeste [mais], conjuntamente, apresentam maior instabilidade, enquanto a Nordeste
apresenta uma instabilidade média e as regiões Sul [menos] e Sudeste [mais], uma instabilidade
baixa. Este padrão regional pode ser observado claramente pela análise comparativa das médias
21

estaduais do índice de volatilidade eleitoral ideológica. Estes dados são apresentados no gráfico
abaixo.

Gráfico 4. Índice de Volatilidade Eleitoral


Ideológica por Região, de 1982 a 1998

Média Nacional 15,7

Sul 12,9

Sudeste 12,9

Centro-Oeste 19

Nordeste 16,4

Norte 19,3

0 5 10 15 20 25
Fonte:TSE, DCP-USP, Nicolau (1998a, 1998b)

Os dados analisados neste tópico mostram que, em relação à volatilidade ideológica,


também há diferenças importantes tanto entre os estados isoladamente, quanto entre as regiões
brasileiras. Há estados de todas as regiões presentes nas três categorias analíticas. Isto mostra
que o sistema é complexo e heterogêneo também com relação ao grau de estruturação
ideológica das preferências político-eletorais. Há padrões regionais que, se por um lado
evidenciam uma certa regularidade, por outro, evidenciam as diferenças existentes no sistema
partidário como um todo. Em termos nacionais, ou seja, quando é calculada a média brasileira
a partir das médias estaduais ponderadas pelo seu peso relativo na magnitude eleitoral nacional,
os resultados mostram que a evolução da instabilidade eleitoral ideológica brasileira, além de
ser significativamente declinante, apresenta valores reduzidos.

Mais uma vez, a comparação do Brasil com a Europa pode ser ilustrativa.
Comparativamente, a volatilidade ideológica brasileira também é mais elevada do que as dos
sistemas europeus e sua média (3,1). Contudo, a curta história eleitoral da democracia recente
do país já produziu, em termos ideológicos, uma estabilidade média de 90 pontos. A
volatilidade ideológica da última eleição foi de 1,7 e é menor do que a média de qualquer país
22

europeu analisado, conforme pode ser observado no gráfico a seguir. Isto significa que a
estabilidade ideológica na última competição eleitoral para a Câmara Federal foi de 98,3
pontos.

Gráfico 5. Índice de Volatilidade Eleitoral Ideológica


Comparação Brasil (1982-1998) com Europa (1885-1985)

Finlândia 1,9

Áustria 2,2

Holanda 2,5

Bélgica 2,5

Itália 2,8

Dinamarca 2,9

R. Unido 3

Suíça 3

Noruega 3,2

Suécia 3,2

França 3,4

Alemanha 3,5

Bra (Última 1,7

Brasil (Média) 10

Fonte: TSE, DCP-USP, Nicolau (1998a, 1998b)

Desta forma, é possível afirmar que, embora o sistema seja recente e, conforme
observam Bartolini & Mair (1990) seja previsível uma instabilidade ideológica maior devido a
isto, a estabilidade encontrada é elevada o suficiente para invalidar a inferência de que não
exista nenhuma ou de que exista pouquíssima consistência na estruturação das preferências
eleitorais em termos ideológicos.
23

V. Conclusão

Meu objetivo neste texto foi testar a consistência empírica da hipótese de que o sistema
partidário brasileiro seria altamente instável. É fato que a instabilidade eleitoral brasileira é
elevada tanto em termos comparativos com a Europa e com alguns países da América Latina,
quanto em termos absolutos, se considerarmos que a variação do índice de volatilidade
eleitoral é de 0 a 100 pontos. Desta forma, os resultados dos dados analisados não permitem
uma conclusão taxativa de que nosso sistema esteja plenamente consolidado. Apesar disto,
estes mesmos dados colocam em evidência que o sistema é muito mais estável do que afirmam
vários autores. Na verdade, os dados mostram uma queda significativa no grau de instabilidade
eleitoral, com uma dinâmica diferenciada quando comparamos estados e regiões entre si, o que
revela a complexidade e a heterogeneidade do sistema brasileiro.

A análise comparativa das unidades da Federação mostrou que há ritmos diferenciados


de estabilização eleitoral, atingindo as regiões indistintamente, tanto com relação à volatilidade
eleitoral quanto à volatilidade ideológica. Em termos regionais, é possível traçar um certo
padrão comum à volatilidade eleitoral e à volatilidade ideológica. As regiões Norte e Centro-
Oeste são as mais instáveis. A região Nordeste é intermediária, enquanto as regiões Sul e
Sudeste são as mais estáveis. Destas duas últimas, o Sul é mais estável. Esta dinâmica
diferenciada revela a complexidade e a heterogeneidade do sistema brasileiro. Apesar das
diferentes variações da instabilidade eleitoral em cada estado e em cada região, em termos
globais, o sistema partidário brasileiro apresenta, tanto na volatilidade eleitoral quanto na
volatilidade ideológica, uma estabilidade média elevada o suficiente para estruturar a
competição e padronizar satisfatoriamente o comportamento eleitoral. Além disto, o índice de
volatilidade eleitoral é declinante tanto em termos partidários quanto em termos ideológicos. A
volatilidade eleitoral partidária vem caindo sistematicamente desde 1986-1990, chegando a ser
cerca da metade do que era naquele período. Além de apresentar uma curva descendente, o
resultado da última seqüência eleitoral, que é de 15,5 pontos, significa uma estabilização
importante. No que se refere à volatilidade eleitoral ideológica, o índice também apresentou
uma queda acentuada desde 1986-1990 até a última eleição, em 1998, chegando a apresentar
uma volatilidade ideológica de apenas 1,7; menor do que a média de países europeus com
democracias bem mais antigas.
24

Diante destes aspectos que evidenciam as especificidades brasileiras, podemos perceber


que o que temos, então, é um sistema político-partidário de dinâmica complexa e heterogênea.
Onde os analistas até o momento viram caos ou desestrutura, justamente porque observaram o
sistema sem apreender suas características específicas, é possível encontrar uma coerência
interna, uma determinada estruturação que é relativamente significativa. Quanto a isto, os
próprios dados com relação à volatilidade eleitoral nada poderiam acrescentar se fossem
analisados de maneira simplista, sem que se buscasse traçar seus significados analíticos de
maneira contextualizada. Esta consideração é importante para estabelecer os significados da
instabilidade eleitoral no caso do Brasil, afinal, é diferente a instabilidade eleitoral em sistemas
partidários antigos e estáveis daquela que possa existir em sistemas recentes e ainda em
processo de estruturação.

Neste caso, um fator importante a ser considerado é que o atual sistema partidário
brasileiro passou por várias alterações institucionais com relação à mecânica de votação e à
limitação ou condicionamento de escolhas eleitorais. Um segundo fator é o sistema eleitoral
proporcional, que atua como incentivo institucional para o aumento do nível de competição e
do número de partidos tanto nominais quanto efetivos, aumentando o universo de
possibilidades de escolha do eleitorado. Um outro fator que deve ser ressaltado é a pequena
seqüência de eleições. O sistema partidário atual é bastante recente, o que significa que
devemos realmente esperar um grau mais elevado de volatilidade eleitoral. Isto se deve não
apenas ao fato de que o sistema, em pleno processo de implantação, está apenas iniciando uma
estruturação das preferências políticas por parte dos eleitores, como também se deve ao fato de
que o ambiente eleitoral é bastante competitivo em seu início (cf. Bartolini & Mair: 1990).

Desta forma, a volatilidade eleitoral total relativamente elevada – mas não a ponto de
ser randômica – não é um indicador de inefetividade do sistema em seu início, mas indica a
competitividade inerente a sua estruturação, o que pode ser positivo quanto a sua função de
legitimação democrática e de “encapsulamento” do conflito (cf. Bartolini & Mair: 1990). O
mais problemático, assim, seria a existência de uma alta e crescente volatilidade ideológica,
pois, em termos analíticos, isto significaria que o sistema partidário não seria efetivo na
estruturação coerente das preferências políticas quanto a projetos alternativos de políticas
públicas, na medida em que estas, de certa forma, expressam visões ideológicas diferenciadas a
respeito da sociedade e das funções do Estado.
25

No caso brasileiro, a coexistência de volatilidade eleitoral partidária relativamente


elevada com volatilidade eleitoral ideológica relativamente baixa, significa que o sistema
partidário estrutura as preferências em termos ideológicos e que existe uma competição
elevada entre os partidos que pertencem a um mesmo bloco. Ou seja, o sistema é competitivo
e a competição maior ocorre entre partidos que pertencem à mesma ideologia. Enquanto isto,
a ideologia atua como fator de estabilização das preferências, conferindo relativa coerência ao
comportamento eleitoral.

Assim sendo, a análise desenvolvida neste texto revelou que o sistema partidário não é
um fator de constrangimento à consolidação democrática brasileira. Com relação a sua função
representativa, o sistema é relativamente eficiente na estruturação de grande parte das
preferências políticas agregadas, especialmente em termos ideológicos.

Referência Bibliográfica
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