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Sumário
ComuniCação

DiverSiDaDe e eDuCação De JovenS e aDultoS 15


A AbordAgem dA mAtemáticA finAnceirA nAs escolAs:
UmA propostA didáticA pArA ejA 16
VAnessA de AlbUqUerqUe lAport

A edUcAção de joVens e AdUltos no conjUnto penAl de eUnápolis-bA:


do princípio do direito à sUA efetiVAção 22
mAriA nAtiVidAde AlmeidA de jesUs soUzA

A imAgem do índio brAsileiro: UmA noVA perspectiVA em edUcAção


de joVens e AdUltos 28
shimene cesário de AbreU | priscillA gUimArães | AnA cArolinA de ArAUjo nonAto

A leitUrA nA edUcAção de joVens e AdUltos: reflexões/Análise AcercA


do projeto extensionistA bibliotecA itinerAnte 35
cAmillA eloy e silVA | AnA pAUlA de AbreU costA de moUrA | gUmercindA nAscimento gondA

A permAnênciA escolAr nA edUcAção de joVens e AdUltos:


nArrAtiVAs biográficAs 42
Aline gimenes soAres | cleidy nicodemos

A releVânciA dA pesqUisA-Ação como metodologiA AdeqUAdA pArA


o ensino de língUA mAternA nA ejA 51
mAriA teresA gonçAlVes pereirA

AgricUltUrA fAmiliAr em contexto, UmA AlternAtiVA de constrUção do


conhecimento nA edUcAção de joVens e AdUltos do cAmpo 57
Almir frAncisco de soUsA | Wbimári régiA ribeiro sAntAnA

como desenVolVer Um trAbAlho qUe reAlmente fAçA diferençA? 66


AmAndA pinto rodrigUes dA costA silVA

conflito intergerAcionAl nA ejA: AdUlto trAbAlhAdor e AlUno Adolescente 73


helAine bArroso dos reis | VidomiriA diAs de poncem

considerAndo diferentes trAjetóriAs: AlterAções cUrricUlAres nA


disciplinA de geogrAfiA, no centro de edUcAção de joVens e AdUltos 83
mArcelo André de soUzA

conViVênciA cUltUrAl: UmA Ação qUe fidelizA A permAnênciA


dos joVens e AdUltos no sesc ler, de AcAUã-pi 90
Wbimári régiA ribeiro sAntAnA | Almir frAncisco de soUsA

diVersidAde em cenA nA ejA – leitUrAs possíVeis 97


ricArdo de freitAs jUnior

5
do ensino fUndAmentAl Ao médio nA ejA: múltiplos cAminhos pArA
o direito à esperAnçA 102
lUís fernAndo monteiro mileto

é mAis interessAnte fAlAr o desconto em porcentAgem: fAzeres e sAberes


mAtemáticos no progrAmA nAcionAl mUlheres mill 109
AnA ligiAoliVeirA teixeirA

edUcAção nAs institUições de priVAção de liberdAde: diVersidAde


dos sUjeitos dA ejA 117
Aline menezes de bArros | ViViAn de oliVeirA

edUcAção popUlAr e edUcAção de joVens e AdUltos: memóriA e históriA 123


osmAr fAVero | elisA mottA de soUzA siqUeirA

edUcAção, religiosidAde e democrAciA em comUnidAdes cArentes 131


renAtA moreirA brUno dos sAntos | renAto ferreirA dos sAntos

ejA, diVersidAde e criAtiVidAde: A experiênciA dos núcleos de diálogos


intercUltUrAis 138
WAnderley dA silVA | simone bAtistA dA silVA

entre grAdes e rAmpAs: diferençAs em diálogo dos presídios


pArA A UniVersidAde 146
lUciAnA Velloso

inclUsão digitAl: experiênciAs midiáticAs nA formAção de AdUltos 152


cUstódio joVêncio bArbosA filho

interseções entre A edUcAção de negros e A edUcAção de joVens e AdUltos 158


sirlene ribeiro AlVes

nAVio negreiro 168


KAtiA reginA dAs chAgAs moUrA

o centenário de ViníciUs: opotUnidAde de diálogos e reflexões AcercA do


protAgonismo jUVenil nA ejA 176
dAniel cAstiAjo | thAmirez blAz | pAUlA cAroline mArini pereirA | ingrid oliVeirA dA costA

o cUrrícUlo de edUcAção de joVens e AdUltos: Análise dA


experiênciA do mUnicípio de itAborAí 182
AdriAnA bArbosA dA silVA | elionAldo fernAndes jUlião

o fAcebooK como ponto de encontro e AprendigAgem de conteúdos


de geogrAfiA dA edUcAção de joVens e AdUltos 189
frAnciscA joelinA xAVier | Aline rozenthAl de soUzA crUz | nAdjA rinelle oliVeirA de AlmeidA

os sAberes qUe orientAm A AtUAção dos (As) edUcAdores (As) de ejA:


dA práticA nA teoriA A teoriA nA práticA 194
mAriA lUizA ferreirA dUqUes

os sUjeitos edUcAndos dA edUcAção de joVens e AdUltos de cAriAcicA-es:


desAfios e perspectiVAs 201
júlio de soUzA sAntos | tAtiAnA silVA mAchAdo de oliVeirA | jUliAnA rohsner ViAnnA

6
os tipos de sUjeito dA ejA e dA grAmáticA: reflexões sobre o ensino
de língUA mAternA 209
dAnielA porte

qUAl é A cor dA edUAção de joVens e AdUltos? 221


WAldinéiA teles pereirA | liliAm teresA mArtins freitAs

reflexões sobre o recorte cUrricUlAr nA edUcAção de joVens e AdUltos 230


mArisA beAtriz bezerrA leAl | ceciliA Amorim moreirA de AzeVedo lUciAnA getirAnA de sAntAnA

reflexões, desAfios e propostAs pArA edUcAção físicA nA ejA: como


gArAntir o Acesso de irenes, frAnciscos, mAriAs e seVerinos Aos
conteúdos dA cUltUrA corporAl de moVimentos. 235
mArcelo lUiz de soUzA

relAto de experiênciA: inclUsão escolAr de estUdAntes público-AlVo


dA edUcAção especiAl em tUrmAs de ejA 242
pAtríciA ferreirA de AndrAde | liliAne sAnchez | eric henriqUe ferreirA jordão

VAriAção lingUísticA nA edUcAção de joVens e AdUltos: sUjeitos,


Vozes e identidAdes 248
pAtríciA fortUnA WAnderley prAzeres | AndreA berenblUm

Vencendo As drogAs, VAlorizAndo à VidA. 256


simôniA mAriA AlexAndre dA costA

‘pro diA nAscer feliz’: A edUcAção escolAr nA perspectiVA de


AlUnos em priVAção de liberdAde 261
Aline cAmpos

linguagenS ContemporâneaS 268

AlfAbetizAção de joVens e AdUltos ArticUlAdA Aos letrAmentos 269


silVAnA oliVeirA biondi | frAnciscA izAbel pereirA mAciel

constrUção de hipóteses sobre A escritA AlfAbéticA por


AlUnos joVens e AdUltos 276
AlcicléA rAmos dos sAntos | AnA pAUlA de AbreU costA de moUrA

edUcAção de joVens e AdUltos: Um direito sociAl 283


dAnthAlA mAriA do nAscimento | pAtríciA pAUlino dA silVA

florestA fAz A diferençA 288


AriAdne colAtto ViAnA | iVAnice lopes dA silVA bArbosA

históriA e memóriA do projeto de AlfAbetizAção de joVens e AdUltos


nA pAróqUiA sAntA mônicA: reflexões sobre o sentido dA
AlfAbetizAção em experiênciAs comUnitáriAs 296
soniA mAriA VieirA dA silVA | rosAUrA doriA mAiA

impActos dA tecnoogiA no cotidiAno do AUno dA ejA. 303


deborA de oliVeirA sAnt’AnnA | AnA lídiA gonçAlVes medeiros

7
inVestigAções sobre o ensino de prodUção textUAl nA AlfAbetizAção
de joVens e AdUltos 307
jUliA rodrigUes chAgAs

jornAl: UmA lição de cidAdAniA 312


márciA cristiAne dos sAntos limA

mUlheres poUco escolArizAdAs: o qUe fAzem com A leitUrA?


o qUe A leitUrA fAz com elAs? 319
mArtA limA de soUzA

o direito à edUcAção nAs nArrAtiVAs e escritAs de Um


sUjeito Anônimo dA históriA 324
WilliAm rodrigUes bArbosA

o letrAmento digitAl e A internet nA edUcAção de joVens e AdUltos 332


jUlio cezAr mAtos pereirA

o Uso dA tecnologiA AssistiVA nA AlfAbetizAção de joVens e AdUltos


com deficiênciA intelectUAl 339
robertA pires corrêA

os diVersos Ambientes de AlfAbetizAção do cidAdão notA dez:


espAços de (im) permAnênciA 345
cláUdiA reginA dos Anjos | chrisley soAres felix | AnAlise de jesUs dA silVA

projeto leitUrA nA prAçA 352


nilzA ferreirA dA silVA | mAriA do socorro mAiA rUfino

redescobrindo o espAço UrbAno AtrAVés dA leitUrA de mApAs em tUrmAs de


AlfAbetizAção de joVens e AdUltos em espAços popUlAres 356
diego d. p. moreirAo | AnA lídiA g. medeiros | VAldemir A. do nAscimento | AnA pAUlA de A.c. de moUrA

reflexões sobre AlfAbetizAção e escolA nA ejA: percepções dos


sUjeitos sobre o processo de AprendizAgem 360
jAqUeline lUziA dA silVA

Um pAsseio pelA formAção de UmA práticA leitorA 368


silVAnA pimentel dA silVA

polítiCaS públiCaS 377


entre o dito e o feito: Um estUdo de cAso sobre As políticAs públicAs
pArA A edUcAção de joVens e AdUltos 378
eric henriqUe ferreirA jordão | liliAne bArreirA sAnchez | pAtríciA ferreirA de AndrAde

A noVA ejA: por UmA óticA diferenciAdA 385


cristiAnA bArcelos dA silVA

centros de edUcAção de joVens e AdUltos (cejA) no rio de jAneiro:


UmA noVA reAlidAde 393
mAriAnnA AUgUstA ferrAri do oUteiro bernstein

edUcAção A distânciA de segUndA gerAção: Aporte pArA se


entender o projeto minerVA. 401
rAphAel do espírito sAnto mello e pires

8
edUcAção pArA priVAdos de liberdAde: direito oU priVilégio? 406
jUliAnA mArqUes dA silVA | isAbelA meirelles mArtins VAsconcellos

escolA cAbAnA: históriA, limites e AVAnços contAdos por profissionAis dA ejA 411
Vitor soUsA cUnhA nery | Alder de soUsA diAs

fórUm ejA de mAto grosso: co - pArticipAção nA efetiVAção


dAs políticAs públicAs pArA modAlidAde no estAdo. 422
KeilA AlVes de soUzA | iVAnA bognAr

o processo de criAção do fórUm de ejA em mAto grosso (1990 A 2001) 429


jefferson bento de moUrA | márciA dos sAntos ferreirA

pedAgogiA dA AlternânciA no contexto dA edUcAção de joVens


e AdUltos pescAdores 438
Kelly mAiA cordeiro | simone oliVeirA do VAl | mArcio plAstinA cArdoso | lUís clAUdio dA silVA

políticA edUcAcionAl e proejA: Um bAlAnço dAs prodUções


AcAdêmicAs entre os Anos de 2009 Até 2013 446
clArissA menezes de soUzA poUbel | leAndro gArciA pinho

políticAs públicAs de edUcAção pArA joVens e AdUltos: Análise


dA experiênciA de AngrA dos reis. 454
KAtyUchA rAmos bArreto

qUAtro mUndos entrelAçAdos nA ofertA e nA procUrA dA ejA:


diAlogAndo com KosiK 461
mAriA de nAzAré corrêA dA silVA

reVendo os cAminhos dA edUcAção de joVens e AdUltos 468


rAchel reginA bolgAr dos sAntos pimentel | jonAs sAles dos sAntos | jUliAnA ferreirA do nAscimento

sAtisfAção e importânciA do cUrso de eletrotécnicA/proejA-cAmpUs


cAmpos-centro, nA percepção discente 476
jorge lUíz clemente gomes | AnA cAbrAl sá de pAiVA

Um olhAr geográfico sobre A feirA de trAdições nordestinAs:


o proejA no colégio pedro ii / mec 486
ArnAldo bArbosA de melo filho

Um olhAr sobre o cotidiAno de Um centro de estUdos sUpletiVos nA cidAde


do rio de jAneiro: o qUe é qUAlidAde nA edUcAção de joVens e AdUltos? 492
lUciAnA bAndeirA bArcelos

formação De profeSSoreS 499

...e disciplinAs de ejA pArA os licenciAndos, tem? 500


rAfAel henriqUe de AlbUqUerqUe | mArcelo silVA de AlmeidA

A edUcAção de idosos de clAsses popUlAres: oportUnidAde enriqUecedorA


nA formAção do professor. 505
igor pereirA gonçAlVes

A formAção de professores do proejA fic do ifbAiAno cAmpUs


cAtU e sUAs relAções com A pedAgogiA freiriAnA. 512
neylA reis dos sAntos silVA

9
A memóriA é A nArrAtiVA dA AlmA: A escritA de si como elemento de
formAção com professores. 519
renAtA dA silVA mAssenA | mArgAreth dA conceição AlmeidA de ArAújo

A releVânciA dos conhecimentos sociolingUísticos pArA


formAção docente dA ejA 523
mAriA dA conceição ferreirA de soUzA | crizeide mirAndA freire

edUcAção de joVens e AdUltos: inflUênciA de pAUlo freire nA formAção


de professores dA escolA cAbAnA 531
Alder de soUsA diAs | iVAnilde ApolUceno de oliVeirA

expectAtiVAs e interrogAções de UmA práticA docente em formAção 539


jéssicA lAmberti pAes leme dA costA | silVAnA pimentel dA silVA | éricA conceição

experiênciAs oriUndAs de obserVAções nA ejA: A jUVenilizAção e A


formAção de professores em perspectiVA 546
jUliAne de oliVeirA nAlesso | lUiz felipe dA silVA ViAnA

fichA de AcompAnhAmento: A AVAliAção nUmA perspectiVA processUAl 553


KArine oliVeirA bAstos

formAção continUAdA Aos docente qUe AtUAm nA edUcAção de joVens e


AdUltos nAs escolAs do cAmpo no estAdo de mAto grosso. 563
eUzemAr fátimA lopes siqUeirA

formAção de edUcAdores: reflexos de momentos de discUssão


coletiVA nUmA perspectiVA interdisciplinAr 571
iVAnA bognAr | KeilA AlVes de soUzA

formAção de professores pArA o proejA


no institUto federAl bAiAno. 579
sArA soAres costA mAmonA

formAção de professores pArA o proejA: possibilidAdes,


tensões e o desAfio dA qUAlidAde 585
jUpter mArtins de AbreU júnior

percepções sobre A formAção docente e seU desenVolVimento profissionAl 593


edmilson dos sAntos ferreirA

reflexões sobre inclUsão sociAl, ensino e AprendizAgem de língUA estrAngeirA


e edUcAção de joVens e AdUltos: A importânciA dA formAção do professor. 599
josé

regrinhAs, continhAs e probleminhAs: desAfios nA formAção de


professores de mAtemáticA dA ejA 608
AndréA thees

munDoS e CulturaS Do trabalho 616

o estAdo democrático e o AUtoritArismo no Ambiente escolAr 617


renAto ferreirA dos sAntos | jUliAnA AlVes de ArAújo bottechiA

10
o reAproVeitAmento de retAlhos de tecidos com foco nA gerAção
de rendA: UmA experiênciA com edUcAção de joVens e AdUltos 625
WAshington ferreirA de moUrA | rozenildA mAriA de cAstro silVA

poSter

DiverSiDaDe e eDuCação De JovenS e aDultoS 631

AlUnos especiAis nA edUcAção de joVens e AdUltos 632


AdonAi bArbosA dA costA | Aline silVA dos sAntos | André lUis de moUrA pessoA

AtiVidAde físicA em espAços nAtUrAis: UmA possibilidAde


de AprendizAgem nA edUcAção de joVens e AdUltos 641
silVAnA dA silVA morAes | nAtáliA moUrA diAs de lUcenA

dA edUcAção pArA A diVersidAde nA sAlA de AUlA à


gestão democráticA escolAr 648
nAtháliA corrêA de pAUlA

docentes de ejA e A inclUsão escolAr de estUdAntes


público-AlVo dA edUcAção especiAl 653
pAtríciA ferreirA de AndrAde | eric henriqUe ferreirA jordão | liliAne sAnchez

edUcAção de joVens e AdUltos em moçAmbiqUe: Um estUdo sobre A


sitUAção de joVens e AdUltos nos centros de edUcAção do distrito
de chibAbAVA proVínciA de sofAlA 661
cátiA torres Abú

edUcAção físicA, UmA noVA AbordAgem. 668


rosA mAriA gArciA monAco pAiVA

ejA: espAço de ArticUlAção e compArtilhAmento de sAberes 676


AnA pAUlA mAchAdo gUimArães de pAiVA | celinA emíliA fernAndes | sUely soAres dA fonsecA

ensino médio de joVens e AdUltos (ejA). UmA propostA edUcAtiVA


e Um desAfio de VidA. 684
selmA lúciA limA sAntos

entre nós e encrUzilhAdAs: As trAjetóriAs dos joVens de 15 A 17


Anos nA ejA em AngrA dos reis 697
leilA mAttos hAddAd de monteiro mArinho

mArcAs nA históriA 704


mArciA mArmelo de cAstro brAz

pAneirotecA – projeto de incentiVo A leitUrA à neoleitores nA AmAzôniA 709


mAriA de nAzAré corrêA dA silVA | líViA AmAndA de AndrAde AgUiAr

pedAgogiA dA AlternânciA: Um olhAr sobre o proejA 717


glAúciA mAriA ferrAri | elionAldo fernAndes jUlião

pessoAs com deficiênciA: os desAfios dA inclUsão nA


edUcAção de joVens e AdUltos 724
edileUzA cAVAlcAnte cArdoso rodrigUes | nAtáliA moUrA diAs de lUcenA

11
proejA: emAncipAção oU certificAção? 732
AngelicA lino pAcheco pAiVA

representAções sobre energiA por pArte dos AlUnos dA edUcAção


de joVens e AdUltos 740
fernAndA tonetto sUrmAs | mAriA AUxiliAdorA delgAdo mAchAdo

trAjetóriAs edUcAcionAis de pessoAs com deficiênciAs no sesc ler pArAíbA:


tensões, limites e possibilidAdes. 751
KeziA cortez dA silVA

linguagenS ContemporâneaS 758

A AlfAbetizAção e o letrAmento de AdUltos como formA de inclUsão sociAl 759


cUstódio joVêncio bArbosA filho | AndréA AlmeidA brUnelli mArtins

A ArticUlAção de tecnologiAs edUcAcionAis à lUz dA inclUsão digitAl


nA edUcAção de joVens e AdUltos 769
AnA ligiA oliVeirA teixeirA

propostA metodológicA pArA AlfAbetizAção de AdUltos em mAto grosso:


UmA estrAtégiA de continUidAde Aos estUdos pArA A popUlAção do cAmpo. 777
AnA lUciA cAmpos dA silVeirA | eUzemAr fátimA lopes siqUeirA

VAle dos dinossAUros: de soUsA pArA o mUndo. UmA experiênciA do


sesc ler no sertão pArAibAno. 782
frAnciscA emidiA dA costA oliVeirA

politiCaS públiCaS 788


AVAliAção dA qUAlidAde de ensino no proejA em institUições federAis
do estAdo do rio de jAneiro 789
jUpter mArtins de AbreU júnior

controle sociAl do finAnciAmento nA ejA: pArticipAção políticA de


AssociAções de Apoio à escolA em centros de estUdos de joVens e AdUltos 794
lUciAnA bAndeirA bArcelos

edUcAr em institUições de priVAção de liberdAde: limites e possibilidAdes 801


Aline menezes de bArros | ViViAn de oliVeirA

o proejA fic como políticA de edUcAção profissionAl nA ejA:


A experiênciA no if bAiAno e no if bAhiA. 805
neylA reis dos sAntos silVA | sUelen goncAlVes pAixAo dA silVA

formação De profeSSoreS 811

A cUltUrA Afro-brAsileirA nA escolA – práticAs pedAgógicAs 812


michelA de nAzAré qUemel pires | nAtáliA moUrA diAs de lUcenA

debAtes AcercA dAs lUtAs pelos direitos hUmAnos 820


shirley dA silVA | rAqUel do sAcrAmento VentUrA | tAynArA pinheiro de oliVeirA

12
experiênciA de ArticUlAção entre ensino, pesqUisA e extensão
nA formAção de edUcAdores dA ejA 825
mAgdAlâniA cAUby frAnçA

o pibid/Uff de históriA nA edUcAção de joVens e AdUltos: A experiênciA


no colégio estAdUAl cizínio soAres pinto 830
jAqUeline pereirA VentUrA | rômUlo dos sAntos morgAdo | thAtiAne | mArconi bAzilio costA cAbo

práticAs pedAgógicAs em ejA: legAdo dA escolA cAbAnA,


presençA e AtUAlidAde freireAnA 836
Alder de soUsA diAs | iVAnilde ApolUceno de oliVeirA

psicogênese dA língUA escritA e sUjeitos dA AlfAbetizAção:


conseqUênciAs pArA práticA AlfAbetizAdorA 845
cArmel cArdoso jorge

munDoS e CulturaS Do trabalho 851

históriA de plAntAr e colher 852


AriAdne colAtto ViAnA | iVAnice lopes dA silVA bArbosA

13
14
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
cAtegoriA 1

comUnicAção

sUbtemA 1

DiverSiDaDe e eDuCação
De JovenS e aDultoS
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
A AbordAgem dA mAtemáticA finAnceirA nAs escolAs:
UmA propostA didáticA pArA ejA
VAnessA de AlbUqUerqUe lAport

A pesquisa “A abordagem da Matemática Financeira nas escolas: uma proposta didática para EJA”
consiste na elaboração de uma sequência de atividades envolvendo conteúdos de Educação Finan-
ceira para alunos do Ensino Fundamental da Educação de Jovens e Adultos, tomando por base a
matriz curricular do Estado do Rio de Janeiro proposta para esta modalidade de ensino. Parte-se
da hipótese de que o material didático adequado promove a aproximação do aluno ao conteúdo
a ser explorado e auxilia na aquisição de saberes que poderão estruturar novos conhecimentos.
Desse modo, procura-se também atender à demanda de recursos didáticos para esta modalida-
de. A pesquisa vem sendo desenvolvida com alunos da EJA do município de Duque de Caxias, RJ.
O Material que vem sendo produzido, conta com noções de Educação Financeira que funcionam
como motivadores para aprendizagem de alguns conteúdos de Matemática, assim como atividades
que resgatam alguns conceitos considerados pré-requisitos, muitas vezes pouco trabalhados ou ne-
gligenciados entre os estudantes jovens e adultos. Com esta proposta pretendemos aliar o papel
formativo da aprendizagem matemática, voltado ao desenvolvimento de capacidades intelectuais
para a estruturação do pensamento, ao papel funcional, dirigido à aplicação dessas capacidades na
vida prática e à resolução de problemas na diferentes áreas de conhecimento, conforme previsto na
lei brasileira para esta modalidade de ensino.

Palavras-chave: Educação de Jovens e Adultos, Sequência de Atividades, Educação Fi-


nanceira.

considerAções iniciAis
A prática da Educação de Jovens e Adultos (EJA) surgiu paralelamente ao desenvolvimento do
processo educacional descrito em episódios da História do Brasil. Na sequência destes acontecimen-
tos foi possível notar que o histórico educacional brasileiro é marcado por algumas ações desastro-
sas e alguns retrocessos, que significam processos de ganhos e perdas na EJA.
Sabe-se, por exemplo, que, no período Colônia, os jesuítas dominavam a ação educacional e, em-
bora priorizassem o trabalho com crianças, também submetiam indígenas adultos ao mesmo pro-
cesso. Este foi apenas o início da EJA. No período do Império, a EJA, mesmo prevista na Constituição,
era um ato de solidariedade. Pessoas letradas se dispunham a dar aulas noturnas de graça para “‘ilu-
minar’ as mentes que viviam nas trevas da ignorância para que houvesse progresso” (STHEPHANOU;
BASTOS (orgs), 2005, p. 261, apud STRELHOW, 2010, p. 51). Durante muito tempo a mentalidade de
que o letramento de jovens e adultos tinha como objetivo, apenas, aumentar a população eleitoral
ou alimentar o sistema de trabalho capitalista, foi dominante (STEPHANOU, 2005).Estes episódios, e
muitos outros, contribuíram para criar uma concepção de que o ensino para jovens e adultos resu-
mia-se na transmissão de alguns poucos conhecimentos, de escrita e leitura, sem grandes planeja-
mentos, o que também favoreceria a manutenção da ordem social, do ponto de vista político- social.
De acordo com a Lei de diretrizes e bases da Educação (LDB nº 9.394/96)

A educação de jovens e adultos será destinada àqueles que não tiveram acesso ou
continuidade de estudos no ensino fundamental e médio na idade própria. (...) Os
sistemas de ensino assegurarão gratuitamente aos jovens e aosadultos, que não

16
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
puderam efetuar os estudos na idade regular, oportunidades educacionais apro-
priadas, consideradas as características do alunado, seus interesses, condições
de vida e de trabalho, mediante cursos e exames (Seção V, art. 37º, 1º parágrafo).

Observa-se, portanto na lei e na perspectiva dos atores da Educação atual, um caráter compensa-
tório: a EJA caracteriza-se pela escolarização de pessoas que não tiveram a oportunidade de acesso
à escolarização regular prevista na legislação.
Ainda nesta perspectiva, por mais que a designação “Jovens e Adultos” nos remeta a relacionar
esta modalidade à idade de seus alunos, o que define de fato a EJA é a caracterização sociocultural
de seu público (OLIVEIRA, 1999).
OLIVEIRA destaca três campos que contribuem para a definição do lugar social dos alunos da EJA:
“a condição de não-crianças, a condição de excluídos da escola e a condição de membros de deter-
minados grupos culturais”. Entretanto, observamos que existem sérios entraves para a concepção de
uma proposta pedagógica que considere estas condições. Observamos estes fatores nas diversas
disciplinas e áreas de conhecimento, mas direcionamos o nosso olhar para o Ensino de Matemática.
O ensino de Matemática na EJA é comumente caracterizado como um campo disperso, de práti-
cas fortemente pautadas no ensino regular, muitas vezes infantilizado, traduzido pela adaptação de
materiais, com estruturas e conteúdos não adequados às especificidades desse segmento.
Neste conflito de adequação curricular e de materiais didáticos, observamos o fato de algumas
práticas pedagógicas negligenciarem por completo os conhecimentos prévios dos alunos e a apli-
cação destes conceitos na vida prática. Desta forma, o presente trabalho descreve a elaboração de
uma sequência de atividades de Educação Financeira para o Ensino Fundamental da EJA, organiza-
do coerentemente a partir das especificidades metodológicas deste segmento, tomando como base
os conceitos matemáticos que constituem pré-requisitos na fundamentação deste eixo temático.

percUrso de nossA pesqUisA


Na Educação de Jovens e Adultos é importante que se adotem estratégias que favoreçam o en-
sino contextualizado na realidade e necessidade do aluno, como a utilização de recursos didáticos
que atendam às especificidades da modalidade.
A Educação Financeira, além de ser um fator motivador e integrador da aprendizagem de Mate-
mática, poderá contribuir para a melhor tomada de decisões financeiras por parte dos alunos.
Tendo por base essas considerações, traçamos para nossa pesquisa os seguintes objetivos:
• Objetivo geral: elaborar uma sequência de atividades de Educação Financeira orientada
para as especificidades dos estudantes da EJA do Ensino Fundamental.
• Objetivos específicos: realizar pesquisa exploratória com o intuito de se aprofundar nas indi-
cações provenientes das legislações da EJA do Estado do Rio de Janeiro, analisar atividades
propostas em livros didáticos elaborados para EJA assim como as atividades comumente
desenvolvidas nas aulas de Matemática desta modalidade de ensino e aplicar a sequência
de atividades de Educação Financeira com alunos da EJA, do Ensino Fundamental II.

jUstificAtiVAs
Aprender matemática é um direito básico de todos e uma necessidade individual e social de ho-
mens e mulheres. Saber calcular, medir, raciocinar, argumentar, tratar informações estatisticamente
etc. são requisitos necessários para exercer a cidadania, o que demonstra a importância da matemá-
tica na formação de jovens e adultos (BRASIL, 2002, p. 11).

17
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
O aluno da EJA tem o perfil marcado pela exclusão. De acordo com as palavras de Fonseca (apud.
SANTOS, 2008, p. 5)

estes sujeitos apostam na escolarização como uma ação de cuidado consigo


mesmas, como um direito a um investimento pessoal adiado pelas condições adver-
sas em suas vidas (trabalho infantil, casamentos, não acesso à escola, cuidado com
os filhos).

O retorno à escola é uma tentativa de minimizar os prejuízos que impediram, por tanto tempo, o
pleno exercício da cidadania, provocado pela escassez de conhecimentos matemáticos essenciais
que lhe permitissem a compreensão e a intervenção em situações cotidianas.
Tendo em vista este aluno, a Proposta Curricular (BRASIL, 2002, p.12) recomenda que a atividade
Matemática integre, de forma equilibrada, dois papéis indissociáveis: o papel formativo, voltado ao
desenvolvimento de capacidades intelectuais para a estruturação do pensamento e o papel funcio-
nal, dirigido à aplicação dessas capacidades na vida prática e à resolução de problemas nas diferen-
tes áreas de conhecimento. Dessa forma, espera-se que o aluno, ao concluir o Ensino Básico, tenha
adquirido conhecimentos que lhe assegurem uma postura mais autônoma e crítica nas situações
impostas pelo cotidiano. Acreditamos que esta construção não se limita aos conteúdos trabalhados
no Ensino Médio e que se estabelecem como alicerce no Ensino Fundamental.
Apesar destas orientações, a organização dos conteúdos curriculares não evoluiu e, portanto,
não atende às recomendações de unir os papéis formativo e funcional da Matemática. Dessa forma,
o que temos é uma organização linear e hierárquica dos conteúdos, com um conteúdo assumindo
o papel de pré-requisito do outro e traçando assim, um percurso de estudo (GUEDES, 2007). Nesta
lógica, alguns conteúdos, como os que envolvem a Educação Financeira, são deixados para trás ou
tratados superficialmente, no fim do período, por falta de tempo.
Outro fator que promove a má abordagem de determinados conteúdos é a ausência de material
apropriado. A ausência de publicações específicas faz com que o professor se veja obrigado a “adap-
tar” material destinado ao Ensino Fundamental, que se dirige a estudantes de 7 a 14 anos. Essa adap-
tação às vezes implica a exclusão de parte dos conteúdos apresentados nas publicações; em outros
casos, quando tenta utilizar um livro “inteiro”, o professor pode acabar dedicando todo o período da
escolarização de seus alunos aos conteúdos de uma só série escolar (BRASIL, 2002, p.13).
Diante do exposto, percebe-se a necessidade de materiais didáticos que atendam às necessi-
dades dos alunos da EJA, que auxiliem na abordagem dos conteúdos em contextos significativos,
integrando diversos assuntos, permitindo a otimização do tempo disponível e o tratamento equi-
librado dos diversos campos matemáticos. Esta demanda justifica a proposta desta pesquisa que
estará focada na elaboração de uma sequência de atividades de Educação Financeira para o Ensino
Fundamental da EJA.

métodos
Esta pesquisa caracteriza-se pelo planejamento e elaboração de uma sequência de atividades
sobre Educação Financeira no nível Fundamental da EJA e terá, como metodologia de trabalho, a
abordagem qualitativa.
Pelo termo abordagem qualitativa cabe “referir-se a conjuntos de metodologias, envolvendo,
eventualmente, diversas referências epistemológicas” (SEVERINO, 2008).
Definido o caráter de nossa pesquisa, julgamos necessário desmembrar o processo em etapas e,
para este fim, selecionamos as seguintes modalidades: a) Revisão de Literatura; b) Pesquisa explora-
tória; e c) Desenvolvimento e aplicação do produto.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
De acordo com Noronha e Ferreira, as revisões da literatura são estudos que:

analisam a produção bibliográfica em determinada área temática, dentro de um


recorte de tempo, fornecendo uma visão geral ou um relatório do estado-da-arte
sobre um tópico específico, evidenciando novas ideias, métodos, subtemas que têm
recebido maior ou menor ênfase na literatura selecionada (2000, p. 191)

Nesta etapa tomamos conhecimento do que vem sendo feito por outros pesquisadores, não só
para reconhecê-los como também para interagir com eles, a fim de alcançar uma ideia clara do pro-
blema levantado.
A proposta de trabalho da pesquisa aborda a Matemática Financeira nos anos finais do Ensino
Fundamental, que consideramos um tema ainda pouco explorado no campo da elaboração de se-
quência de atividades. Tendo em vista este aspecto relevante, entendemos a pesquisa exploratória
como uma etapa importante do processo. De acordo com Severino:

a pesquisa exploratória busca apenas levantar informações sobre um determi-


nado objeto, delimitando assim um campo de trabalho, mapeando as condições de
manifestação desse objeto (2008, p. 123).

Nesta fase, exploramos as indicações provenientes das legislações da EJA, além de verificar as ati-
vidades comumente propostas nos livros didáticos e nas salas de aula da EJA referentes ao assunto.
Percebemos então o grande movimento para inserção da Educação Financeira na escola, motiva-
do em parte pela Estratégia Nacional da Educação Financeira (ENEF) criada através do Decreto Fe-
deral 7.397/2010, cujo objetivo é contribuir para o fortalecimento da cidadania ao fornecer e apoiar
ações que ajudem a população a tomar decisões financeiras mais autônomas e conscientes (BRASIL,
2010).
A estratégia foi criada através da articulação de 08 órgãos e entidades governamentais e quatro
organizações da sociedade civil, que juntos integram o Comitê Nacional de Educação Financeira –
CONEF. Dentre estes órgãos está o Ministério da Educação, o que nos garantiu a fidedignidade das
orientações fornecidas para o campo pedagógico.
Nessa linha, articulamos a prática de ensino com a prática de investigação, de modo a estruturar
um referencial para o desenvolvimento do produto, em nosso caso a sequência de atividades, gera-
da na junção do conhecimento prático com o conhecimento teórico. O produto desenvolvido está
sendo aplicado em turma da etapa V (8º e 9º anos) da EJA do município de Duque de Caxias, no 4º
turno (noturno). Durante o período de aplicação utilizamos também as técnicas de observação e
entrevistas não-diretivas como procedimentos operacionais que servirão de mediação prática para
a realização da pesquisa. O produto final será ofertado na forma de fascículo impresso.

oUtrAs considerAções:
A escassez de pesquisas sobre o ensino-aprendizagem de matemática financeira e o fato deste
assunto ainda ser novo na grade curricular da EJA foram fatores relevantes na escolha do tema desta
proposta de trabalho.
É preciso enfrentar o desafio de superar o processo de linearização dos conteúdos e tentar reduzir
os processos mecânicos de aprendizagem.
Ao pensar a ação do professor no processo de ensino, na junção da ação com a investigação,
estamos na teoria dos professores reflexivos, aqueles que investigam e refletem sobre sua própria

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
prática. Nesta ótica, o que precisamos é de projetos que enriqueçam o ensino da Matemática na EJA
e que promovam ao indivíduo um espaço na sociedade, onde ele é capaz de exercitar sua cidadania
através do que aprendeu na escola.
Como já dizia FREIRE (2007),

educação é elemento essencial para emancipação do ser humano que, ao ser


transformado pelo processo educativo, contribui, por sua mudança de comporta-
mento, para transformações em sua realidade.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
A edUcAção de joVens e AdUltos no conjUnto penAl
de eUnápolis-bA: do princípio do direito à sUA
efetiVAção
mAriA nAtiVidAde AlmeidA de jesUs soUzA

Este artigo visa apresentar o resultado parcial de uma pesquisa de Mestrado, cujo objetivo é com-
preender o processo de escolarização da EJA no Conjunto Penal de Eunápolis (BA), a partir dessas
informações será proposta a construção de princípios curriculares da EJA voltados para as especifi-
cidades e as necessidades de aprendizagens dos internos. Para tanto, questiona-se em que medida
a escolarização, nesse Conjunto Penal, tem possibilitado o desenvolvimento humano, com vistas à
ressocialização e reinserção social dos internos. Sob essa perspectiva, buscou-se, na fase explorató-
ria da investigação, averiguar por meio de observação e diálogo com a equipe gestora as condições
de oferta da educação escolar nessa unidade prisional, na qual constatou-se que parte dos internos
dessa instituição participam atividade de caráter educativo, no entanto são ações isoladas e pon-
tuais, que não correspondem com as políticas educacionais oficiais da EJA. Esse resultado mostra
que embora a educação seja um direito subjetivo público e social, assegurado a todo cidadão pela
Constituição da República Federativa do Brasil, quando se trata dos sujeitos privados de liberdade,
tal direito ainda não é efetivamente garantido. A fundamentação teórica baseia-se em documen-
tos legais instituem a EJA e a educação prisional no Brasil, autores que discutem sobre a educação
em unidades prisionais e educação para emancipação e libertação, dentre eles destacam-se: Freire
(2011); Ireland (2010); Julião (2003); Onofre (2011); Paiva (2009. Espera-se que esse estudo fortaleça
a implementação da EJA nos conjuntos penais, pois embora jovens e adultos encontrem-se privados
da liberdade, eles permanecem com o direito à educação como qualquer cidadão.

palavras-chave: EJA, Educação Prisional, Direito à Educação

introdUção
A Educação de Jovens e Adultos – EJA tem como principal objetivo possibilitar a construção de
novas formas de participação e de exercícios pleno e consciente dos direitos da cidadania. E por ser
a educação, direito público subjetivo dos cidadãos, consagrado na Constituição Federal e leis com-
plementares, é dever do Estado garantir o acesso, a efetivação e a qualidade do ensino público para
todos independente, da idade, gênero, etnia, condição
econômica, concepção religiosa, política e cultural. Inclusive, essa modalidade de ensino deve es-
tar a serviço dos jovens e adultos que se encontram internos nas unidades prisionais, afinal “desfru-
tá-la forma parte constitutiva da dignidade humana, elemento fundamental dos direitos humanos,
que deve ser garantido para todas as pessoas, estejam elas presas ou não” (PENNA, 2011, p. 153).
Nesse sentido, atentando-se especificamente para a educação como direito de todos, cumpre-
-se levantar debates acerca do processo de normatização e oferta da EJA – Educação de Jovens e
Adultos em unidades prisionais. Com esse intuito, buscou-se na fase exploratória da pesquisa “A
Educação de Jovens e Adultos no Conjunto Penal de Eunápolis (BA): Implantação, Controvérsias e
Caminhos de Enfrentamento”, compreender o processo de escolarização da EJA nessa Unidade Pri-
sional. Atentando-se para as normas educacionais instituídas e atividades educativas desenvolvidas
no Conjunto Penal. A fim de detectar se essas atividades valorizavam os conhecimentos, as experi-
ências, tendo como premissa o princípio da educação ao longo da vida, movida por políticas que
facilitem a continuidade e o acompanhamento dos processos educativos após liberdade (IRELAND,

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
2010).
Nessa etapa da pesquisa primou-se pela observação participante e diálogo com os internos, equi-
pe gestora e com a coordenadora pedagógica do Conjunto Penal de Eunápolis, instituição adminis-
trada pela empresa Reviver Administração Prisional Privada Ltda. Situada no Extremo Sul da Bahia,
na Fazenda Maria Maria, S/N, Bairro Alecrim II, no município de Eunápolis.
Entendeu-se por meio da análise das informações coletadas nessa fase inicial, que os internos des-
sa unidade prisional participam de atividades educativas, sendo artes laborais e leitura, no entanto
não é assegurada a regularidade dessas atividades. Esse resultado mostra que o direito à educação
ainda não é garantido aos jovens e adultos privados de liberdade conforme preconiza as determi-
nações legais, sendo, portanto, uma questão fundamental que deve ser enfrentada pela sociedade
civil organizada e pelo poder público, visto que “[...] o homem privado de liberdade é um sujeito de
direito, e como tal precisa ser contemplado pelas políticas de educação [...] (TEIXEIRA, 2010, p. 15).
Todavia, demanda-se que a prática educativa no contexto prisional fundamente-se nos valores
da democracia, da participação, da equidade e solidariedade social, de maneira que permita aos
jovens e adultos a construção de novas formas de participação e de exercício pleno e consciente
dos direitos de cidadania. Sem esquecer de que embora não seja possível hierarquizar os direitos
fundamentais, não há dúvida de que o direito à educação cumpre um papel essencial no sentido
de operar como direito-chave que abre o conhecimento de outros direitos (IRELAND, 2010, p. 25). O
que reforça o entendimento de que o acesso a uma educação de qualidade constitui como um dos
mais promissores caminhos para o crescimento pessoal, sendo fundamental para que os jovens e
adultos internos alcancem os seus objetivos e exerçam a cidadania, quando em liberdade.
Espera-se que este estudo colabore para o “[...] reconhecimento de que o homem privado de li-
berdade é um sujeito de direito, e como tal precisa ser contemplado pelas políticas de educação [...]
(TEIXEIRA, 2010, p. 15), e assim favoreça novas discussões que deem “[...] maior visibilidade à reali-
dade das prisões (ou estabelecimentos carcerários) no sentido de proporcionar a sua transformação
por meio da participação cidadã” (IRELAND, 2010, p. 33).
E, principalmente, colabore para fortalecer a implantação da Educação de Jovens e Adultos inte-
grada à formação humana e voltada para as necessidades de aprendizagens dos internos do Con-
junto Penal de Eunápolis, mas que essa oferta seja planejada e sistematizada, aberta a mudanças e
retomadas de ações, comprometida com o desenvolvimento dos sujeitos atendidos e da sociedade,
pois embora os jovens e adultos dessa localidade encontrem-se privados de liberdade, eles perma-
necem com o direito à educação como qualquer outro cidadão.

reAfirmAndo o direito à edUcAção dos joVens e AdUltos priVAdos


de liberdAde: ágUA mole em pedrA dUrA, tAnto bAte Até qUe fUrA
A Educação de Jovens e Adultos – EJA é legalmente amparada pela Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional 9.394/96, que em consonância com a Constituição da República Federativa do
Brasil, concebe a educação como direito de todos. E, por ser entendida como direito, deve ser exigi-
da dos órgãos competentes quando esse direito for violado ou desrespeitado (BRASIL, 2011). Esses
documentos preservam os princípios da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) que es-
tabelece no seu Artigo 26 que “toda pessoa tem direito à educação”, tal afirmação favorece a com-
preensão de que a educação é um direito do ser humano em qualquer etapa de sua vida, e por isso
constitui-se como dever do Estado e dos parceiros sociais, a oferta gratuita da educação, de maneira
que esse direito abranja a todas as pessoas. Para Gadotti,

A conquista desse direito depende do acesso generalizado à educação básica,


mas o direito à educação não se esgota com o acesso, a permanência e a conclusão

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
desse nível de ensino: ele pressupõe as condições para continuar os estudos em ou-
tros níveis. [...] O direito à educação não pode ser desvinculado dos direitos sociais.
Os direitos humanos são todos interdependentes. Não podemos defender o direito à
educação sem associá-lo aos outros direitos (GADOTTI, 2013, p. 22-23).

Nesse sentido, por mais que a educação para jovens e adultos em privação de liberdade seja
considerada pela sociedade como desperdício de recursos públicos, e muitos não acreditem na res-
socialização dos internos, cumpre-se investigar a normatização, o acesso e as condições de oferta da
EJA em unidades prisionais. A defesa pela efetivação desse direito está respaldada no Decreto 7.626,
de 24 de dezembro de 2011, que instituiu o Plano Estratégico de Educação no âmbito do Sistema
Prisional, no qual determina em seu Art. 1º “a finalidade de ampliar e qualificar a oferta de educação
nos estabelecimentos penais” e no Art. 2º que educação em unidades prisionais deve contemplar
a Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos, a Educação Profissional e Tec-
nológica, e a Educação Superior (BRASIL, 2011). Assim como, na compreensão de que a educação
é indispensável para o desenvolvimento humano, a sua garantia, não se ancora apenas nas possi-
bilidades de ressocialização e reintegração social, mas, sobretudo, no sentido de construir com os
jovens e adultos privados de liberdade um projeto de vida que lhes permitam dar continuidade ao
processo de socialização e educação ao longo da vida (JULIÃO; ONOFRE, 2013).
Além do direito ao acesso à educação, de acordo com o Conselho Nacional de Política Criminal
e Penitenciária – CNPCP, a proposta curricular deve ser elaborada a partir de um Grupo de Trabalho
que ouça os sujeitos do processo educativo nas prisões [...] (BRASIL, 2009). Sob o reconhecimento
de que o direito de aprender é uma condição prévia do desenvolvimento humano, que possibilita
maior interação e participação em comunidade. E de fato, conforme Parecer nº 11/2000, do Conse-
lho Nacional de Educação da Câmara de Educação Básica, “a efetivação deste ‘direito de todos’ exis-
tirá se e somente se houver escolas em número bastante para acolher todos os cidadãos brasileiros
e se desta acessibilidade ninguém for excluído” (BRASIL, 2000).
Ademais, conforme Onofre (2011), não se pode desconsiderar a eficácia da educação escolar no
resgate do sujeito privado de liberdade, porque a partir dela assegura-se a condição do ser humano,
constroem-se laço de pertencimento à sociedade, à palavra, à tradição, à linguagem e à recriação da
cultura, essenciais para a condição humana e, consequentemente, para a vida em sociedade.
Nesse processo, o direito à educação integra-se, assim, no conjunto mais amplo dos direitos con-
signados como direito à dignidade, ao desenvolvimento da personalidade ou mesmo o direito à
liberdade (PIRES, 2011). De maneira que, mesmo reconhecendo que os jovens e adultos privados de
liberdade, em sua maioria, além de serem rejeitados pela sociedade, sujeitos discriminados, que não
possuem qualificação profissional e nem escolaridade para disputar uma vaga de emprego, o que
dificulta ainda mais a sua inclusão social e aumenta os riscos de reincidência criminal, mantém-se
nesse estudo a crença da importância da educação como instrumento indispensável para o desen-
volvimento humano.
A garantia da educação significa dar às pessoas, independentemente da idade, a oportunidade
de desenvolver seu potencial, coletiva ou individualmente. Sobretudo, é fundamental que o reco-
nhecimento do direito à educação durante toda a vida seja acompanhado de medidas que garan-
tam as condições necessárias para o exercício pleno desse direito (UNESCO, 1999). Isso implica que
mais investigações e fóruns de debates estejam voltados para o campo da EJA nos mais diferentes
espaços, porque embora seja responsabilidade do Estado garantir acesso e qualidade da educação,
vê-se que muitas dificuldades ainda permeiam a efetivação da EJA no Brasil. E, quando se trata da
implementação dessa modalidade de ensino em unidades prisionais, o problema ainda é maior por-
que como se observa, além desses sujeitos estarem à margem, enfrentando a privação da liberdade,
gera-se sob a guarda do Estado uma nova exclusão: a do direito a acessar a escolarização, por não
ser ela ofertada para sujeitos apenados, na maioria dos estabelecimentos prisionais, como dever

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
do Estado (PAIVA, 2009). É tanto que no Brasil ainda são raras as ações educativas voltadas para a
reinserção social das pessoas privadas da liberdade em estabelecimentos penais e socioeducativos,
talvez por isso persista o alto índice de reincidência criminal.
Portanto, demanda-se maior empenho da sociedade civil e do poder público para que educação
escolar seja garantida para todos, com o fortalecimento da EJA em unidades prisionais, e assim pos-
sibilite retorno com mais dignidade do jovem e adulto privado de liberdade à sociedade.

o contexto edUcAcionAl do conjUnto penAl de eUnápolis


É certo que “a prática educacional não é o único caminho à transformação social necessária à
conquista dos direitos humanos, contudo acredito que, sem ela, jamais haverá transformação social
(FREIRE, 2014, p. 50). Pensar assim é acreditar que a educação por si só não resolve os problemas
pertinentes às diferenças sociais, à ressocialização e à reinserção dos internos. Todavia, sem ela os
caminhos para a efetiva participação social é mais complexo, pois quanto mais o sujeito se instru-
mentaliza, mais crítico e consciente se torna, o que muito fortalece o exercício pleno da cidadania e
convivência social.
Voltando-se especificamente para a realidade educacional do Conjunto Penal de Eunápolis, detec-
tou-se na fase inicial da pesquisa, que nessa unidade prisional há salas disponíveis para a realização
de práticas educativas, uma biblioteca com pequeno acervo resultante de doações da comunidade
local, bem como uma coordenadora pedagógica, responsável pelo processo educacional. Entretan-
to, ainda não se efetiva a Educação de Jovens e Adultos – EJA, de maneira que as ações educativas
ocorrem por meio de atividades laborais, momento em que os internos confeccionam bonecas de
lã, cestos de papel, esculturas de sabonete, essas produções são orientadas por uma terapeuta ocu-
pacional. E também, por meio de atividades de leitura realizadas pela coordenadora pedagógica e
líderes religiosos da comunidade. Conforme informações da coordenadora pedagógica, as leituras
ocorrem de forma individual, ela apresenta nas celas uma lista com o título das obras disponíveis, o
interno solicita o livro. O interno tem um período para realizar a leitura, depois desse processo, de-
volve o livro com o questionário de leitura respondido, e se quiser pode solicitar outra obra.
O problema é que essas atividades ocorrem descontextualizadas, isoladas, sem a mediação de
educadores, tempo em que podia ser aproveitado para viver a riqueza do âmbito literário, numa
interação alunos-internos e professor. Além disso, essas atividades não são garantidas regularmen-
te, os recursos pedagógicos são escassos, atende-se a uma minoria, e também não há uma regula-
mentação e institucionalização na rede de ensino, não favorecendo o acesso e a continuidade dos
estudos dos internos.
Sem contar que há aproximadamente 700 internos nessa Instituição, com faixa etária entre 18
a 55 anos, a maior parte deles tem um baixo de nível de escolaridade. Desses, muitos não são alfa-
betizados ou ainda não completaram o Ensino Fundamental ou tem uma formação profissional, de
maneira que há uma demanda para formação escolar.
Isso mostra que o Sistema Prisional e Socioeducativo brasileiros ainda estão muito distantes de
cumprirem as determinações legais e serem considerados sistemas que realmente acreditam na ca-
pacidade de ressocialização das pessoas que tiveram a privação de sua liberdade, essa compreensão
se fortalece porque é perceptível a carência de medidas educacionais que realmente sejam promo-
toras da reinserção social dessas pessoas nos mais diferentes conjuntos penais.
Embora se reconheça o valor das atividades informais e não-formais, porque elas favorecem as
interações, o desenvolvimento da criatividade, e outros; é importante ater-se à base legal que am-
para a educação em unidades prisionais. Inclusive, a Resolução nº 03, de 11 de março de 2009, que
dispõe sobre as Diretrizes Nacionais para a Oferta de Educação nos estabelecimento penais, prevê
no Art. 3º que a oferta da educação no contexto prisional deve “estar associada às ações de fomento

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
à leitura e a implementação ou recuperação de bibliotecas para atender à população carcerária [...]”,
no anexo I desse mesmo documento recomenda-se que “o trabalho prisional seja tomado como
elemento de formação [...], garantida a sua oferta em horário e condições compatíveis com as da
oferta de estudo” (BRASIL, 2009).
Como se vê, não se pode limitar a oferta da educação dentro das unidades prisionais a atividades
não-formais e informais, o interessante é que elas estejam associadas à oferta do ensino regular,
educação para a liberdade, educação ligada aos direitos humanos, abrangente, totalizante, movida
pelo conhecimento crítico do real (FREIRE, 2014). Do contrário, é isentar o Estado e a sociedade em
relação às suas responsabilidades históricas e estruturais na sociedade brasileira no que diz respeito
à efetiva garantia da educação como direito de todos.

considerAções
O processo educacional do Conjunto Penal de Eunápolis não é diferente da situação de diversas
unidades prisionais, porque são poucas as instituições no Brasil que desenvolvem ações educativas
que respeitem os direitos e as especificidades dos jovens e adultos privados de liberdade no Brasil.
Por isso, é necessário dar mais visibilidade à educação no contexto das unidades prisionais, por-
que ela favorece o conhecimento de outros direitos (IRELAND, 2010), o que muito fortalecerá a ca-
pacidade de interação, convivência e diálogo com o contexto social e, principalmente, o respeito à
garantia da educação para os jovens e adultos privados de liberdade.
Contudo, demanda-se que as atividades educacionais correspondam com as especificidades
e reais necessidades de aprendizagem dos jovens e adultos internos, contribuindo para novas pers-
pectivas de vida e de liberdade. De maneira que não seja assegurado apenas o acesso à educação,
mas possibilite que os jovens e adultos internos exercitem a criticidade, exponham seus entendi-
mentos sobre a vida, sobre da importância da participação política tanto no interior da unidade
prisional, quanto fora dos muros e grades.
Portanto, as práticas educativas neste sentido devem ser entendidas como uma formação, que
aproxime o sujeito do seu potencial enquanto ser humano. Educação que não vise a apenas disci-
plinar ou a combater a ociosidade nas unidades prisionais, mas efetivamente estejam voltadas para
a promoção da autonomia dos jovens e adultos privados de liberdade, e assim não seja garantido
apenas o direito à educação, mas o acesso à efetiva humanização no ambiente prisional.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
A imAgem do índio brAsileiro: UmA noVA perspectiVA
em edUcAção de joVens e AdUltos
shimene cesário de AbreU | priscillA gUimArães
AnA cArolinA de ArAUjo nonAto

Este documento tem como objetivo relatar o trabalho sobre a quebra dos estereótipos da cultura
indígena no Brasil desenvolvido em uma turma de letramento da terceira idade pelo programa de
alfabetização, informação e documentação, PROALFA, um projeto de extensão da Universidade do
Estado do Rio de Janeiro – UERJ. A partir do tema anual do programa, “Heranças, culturas, identi-
dades: A boniteza de estar no mundo!” a turma desenvolveu um projeto intitulado “ Aprendendo
a respeitar a cultura indígena brasileira para construir uma sociedade plurietnica e pluricultural”. A
prática pedagógica é desenvolvida na articulação entre professor regente e oficinas de produção
textual e de leitura, utilizando recursos como: músicas, objetos artesanais, palestras proferidas por
alunos indígenas, vídeos, mapas, jornais, entre outros artifícios que auxiliaram a mediação do pro-
fessor sobre o conteúdo exposto. Considerou-se como finalidade a necessidade de ressignificar e
ampliar o conhecimento do grupo a cerca da cultura indígena brasileira, tendo em vista a estimula-
ção do senso crítico dos alunos, o poder de reflexão sobre os conteúdos que envolvem a cidadania
e o debate sobre assuntos etnorraciais, tópico que deveria ser inserido em sala de aula para desmis-
tificar os erros do discurso de uma sociedade etnocêntrica, assim valorizando a base das matrizes da
cultura do povo brasileiro.

palavras-chave: cultura indígena brasileira, estereótipo, práticas pedagógicas

introdUção
Com a tardia democratização da educação pública no Brasil boa parte da população não pôde ter
acesso à escola formal por diversos motivos. Entre eles os mais comuns são: não existir escolas perto
de suas residências quando eram crianças, ou dedicar – se ao trabalho no tempo que seria destinado
ao ensino, ou ter se afastado da instituição escolar por não se sentirem pertencentes, pois esta não
proporcionou uma inserção duradoura e não reconhecia suas culturas e saberes. Ainda para muitas
mulheres, ter acesso ao estudo dependia de uma concessão da família e/ou cônjuge. Assim, com
esse afastamento da escola muitos não puderam se inserir no mundo da leitura e escrita.
A Educação de Jovens e Adultos (EJA) tenta recuperar essa falta que o poder público se ne-
gou a proporcionar por muitos anos, porém nos indagamos por quais motivos os idosos buscam
estudar, já que os mesmos conseguiram inserir - se na sociedade trabalhando, criando seus filhos e
sendo independentes.
E a escola formal atenderia suas necessidades? O ensino regular estaria preparado para receber
estes idosos? As práticas escolares tradicionais em torno da leitura e da escrita atenderiam a deman-
da desse grupo?
Com isso, o Programa de Alfabetização, Documentação e Informação – PROALFA1 - sendo um
espaço acadêmico- extensionista - educativo, comprometido com o aprofundamento de reflexões,
discussões, práticas e produção de conhecimento em Alfabetização e Letramento,busca colaborar
para ressignificação dos usos da leitura e escrita, principalmente em camadas sociais às quais foi
negado acesso a escola em seu tempo regular e na formação do futuro professor.
O PROALFA foi reconhecido em 1995 pelo ato administrativo do reitor Hésio Cordeiro. A equipe
1 O PROALFA é um programa do Centro de Educação e Humanidades-CEH, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – URJ

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
do programa é composta de um funcionário administrativo (pedagogo), dois especialistas em edu-
cação que fazem o acompanhamento pedagógico dos bolsistas, um voluntário (professor aposen-
tado) e os bolsistas graduandos em Pedagogia, Letras e Matemática que atuam como professores
das Classes.
• Enquanto programa, sua composição apresenta os seguintes projetos:
• Classes de Alfabetização e Letramento
• Ciclos de Estudos em Alfabetização
• Acervo Especializado em Alfabetização “Emília Férreo”
• Oficinas de Letramento em Leitura, Produção de Texto e Matemática.
Este artigo como finalidade relatar uma experiência de um projeto de trabalho desenvolvido em
uma das turmas do projeto Classe de Alfabetização e Letramento cujo tema foi a cultura indígena.
Para tanto, encontra-se organizado em duas partes: inicialmente, apresentamos o projeto Classes de
Alfabetização e Letramento; em seguida descrevemos o desenvolvimento de um projeto de traba-
lho desde sua idealização até a culminância.

1. descrição dAs clAsses de AlfAbetizAção e letrAmento


As Classes de Alfabetização e Letramento são compostas, aproximadamente, por um total de 70
alunos da terceira idade com baixa escolaridade, oriundos de diversos bairros do município. Essas
quatro Classes2 de Alfabetização e Letramento trabalham com a metodologia de projetos de traba-
lho. Segundo Hernandéz (1998), é entende – se como projeto de trabalho a possibilidade dos alunos
perceberem que o conhecimento não é exclusivo em uma determinada disciplina, pois rompe com
a forma engessada de enquadrar conteúdos das metodologias tradicionais, articulando assim, os
diferentes saberes.
Anualmente é selecionada uma temática pela equipe do programa, que será desenvolvida pelos
alunos do projeto. Ao final, as turmas apresentam, em forma de culminância, materiais elaborados
durante os semestres de acordo com seus subtemas escolhidos. Como a modalidade caracteriza-se
como Educação Não Formal3 apresenta produtos finais como amostras dos conteúdos trabalhados
em sala de aula, não havendo reprovações. Desse modo, os alunos não trocam de turma e o conte-
údo acompanha o desenvolvimento dos mesmos.
As aulas são ministradas por um professor Regente que permanece tempo integral com os alu-
nos, enriquecendo, ampliando e sistematizando os conteúdos relativos à temática que está sendo
estudada. Complementando o trabalho da regência, são oferecidas três Oficinas: Leitura, Produção
Textual e Matemática, com a duração de uma hora e meia semanal.
Neste artigo será focalizada a Turma Unati I, que é composta de aproximadamente vinte alunos,
com idades entre 60 e 85 anos. É um público majoritariamente feminino, com baixa escolaridade.
São alunos que devido à precoce inserção no mercado de trabalho ou por motivos particulares não
fazem um uso frequente da leitura e da escrita, demonstrando dificuldades.
É interessante ressaltar o comprometimento das alunas com o estudo. Todas elas, até as que
possuem dificuldades em relação à acessibilidade, ou seja, fazem o uso de bengalas, muletas entre
outros, dão o melhor de si para frequentar as aulas.
A professora regente da turma é aluna de Pedagogia da UERJ do oitavo período e as professoras
2 As das Classes de Alfabetização e Letramento têm quatro turmas e são denominadas Mangueira I, Mangueira II, Unati I e
Unati II.
3 “Toda atividade educacional organizada, sistemática, executada fora do sistema formal para oferecer tipos selecionados de
ensino a determinados  subgrupos  da  população” ( la belle, 1982 p.2)  

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
das oficinas de Produção Textual e Leitura são do curso Letras da universidade e estão no sétimo e
quinto períodos respectivamente e, por fim, a professora da oficina de Matemática que cursa Mate-
mática na mesma instituição e está em processo de conclusão de curso.

2.“Aprendendo A respeitAr A cUltUrA indígenA brAsileirA pArA


constrUir UmA cidAdAniA plUrietnicA e plUricUltUrAl”: relAto de Um
projeto de trAbAlho.
Em Março, a equipe do programa se reuniu para discutir e criar o tema anual, levando em consi-
deração as expectativas de cada turma. Discutimos o surgimento do Homem e os possíveis conte-
údos que abordaríamos com este tema. Daí nasce a necessidade de tematizar a diferença entre as
culturas e a formação humana. Levando em consideração este tema, nos indagamos: quais são as
heranças desse multiculturalismo na formação brasileira? Qual é a identidade do brasileiro? Afinal,
quais são as culturas do Brasil? Diante de tantas perguntas e inquietações formulamos o tema: He-
ranças, culturas e identidades: a boniteza de estar no mundo!
No primeiro módulo, de Abril à Julho, “Abrindo o relicário do mundo” abordamos quais as etnias
influentes na formação do brasileiro. Cada turma escolheu uma etnia que iria estudar ao longo do
semestre para identificar sua herança na cultura brasileira. No segundo módulo, Agosto à Novem-
bro, “Entrelaçando passado e presente me transformo no agora!” estamos estudando nossa identi-
dade diante dessas heranças e transformações cotidianas.
A partir desse grande tema comum às quatro turmas, a escolha do tema da turma Unati I foi feita
com a participação dos alunos e com a justificativa dos mesmos de conseguirmos conviver melhor
com a sociedade indígena, aceitando suas particularidades, diferenças e seus direitos. O título esco-
lhido foi “Aprendendo a respeitar a cultura indígena brasileira para construir uma cidadania plurie-
tnica e pluricultural.” O projeto foi desenvolvido segundo as etapas abaixo.
Em Abril, no início do semestre letivo, tivemos uma aula inaugural com a professora Antropólo-
ga Nancy Viera, do Instituto de Antropologia da UERJ, com a questão da “A origem do Homem”. A
mesma enfatizou o surgimento do ser humano desde a era primitiva até desconstruir o mito das três
raças: branca, amarela e negra, concluindo que na atualidade existe uma única raça: a raça humana.
Ao final, os bolsistas fizeram uma pequena apresentação para a plateia. Os mesmos estavam tra-
jando roupas típicas das etnias: Portuguesa, Espanhola, Grega, Indígena, Mexicana, Japonesa, Ára-
be e Africana, na qual cada uma destas trazia elementos significativos para humanidade que eram
depositados (simbolicamente) dentro de um globo que representava o “relicário do mundo”. Assim,
essa apresentação auxiliaria na escolha de qual etnia estudar em sala de aula.
Para averiguar o desejo e afinidade que os alunos da turma demonstrariam, uma das atividades
selecionadas foi o questionário de sondagem, que teve como resultado o interesse da turma em
aprender mais sobre a cultura indígena brasileira, já que alguns alunos manifestaram tal descendên-
cia. Portanto, elegemos o estudo desse grupo cultural durante o semestre.
Em seguida, pensamos em quais conhecimentos eles já traziam sobre a cultura e assim levanta-
mos os seus conhecimentos prévios. Descobrimos que a maior parte da turma mantinha a visão dos
índios de 1500 como descritos na carta de Pero Vaz Caminha “Pardos, nus, sem coisa alguma que
lhes cobrisse suas vergonhas. Traziam arcos nas mãos, e suas setas” (p. 30), ou seja, nu na floresta
usando arco e flecha.
Para organização do trabalho didático pedagógico, nos baseamos no pensamento das “Cinco
ideias equivocadas sobre os índios” do professor José Ribamar Bessa Freire, (2002). Nele o autor evi-
dencia a falta de conhecimento sobre a cultura indígena do brasileiro e apresenta cinco erros mais
cometidos pela população em relação a este grupo: o índio genérico, culturas atrasadas, culturas
congeladas, os índios pertencem ao passado e o brasileiro não é índio.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Para desfazer o discurso do poder hegemônico etnocêntrico e com a finalidade de estimular a
reflexão e a crítica diante dos conteúdos expostos, utilizamos como procedimentos pedagógicos
recursos e atividades que auxiliariam na ruptura desse engano. Segue abaixo uma breve resenha
dos erros e as práticas pedagógicas para ressignificação de cada equívoco pautado.
Índio genérico: não existe uma única cultura indígena. Cada grupo indígena tem religião, língua e
cultura particulares, assim como a arte que também apresenta certas especificidades. Dessa forma,
pode-se afirmar que o “índio genérico” é um equivoco, pois, ainda hoje, vivem no Brasil mais de 200
etnias, que falam mais de 180 línguas, fato desconhecido por muitos dos nossos conterrâneos.
Para dar esta dimensão de população indígena e sua localização no território brasileiro (muitas
alunas acreditavam que os índios só viviam na Amazônia) confeccionamos um mapa do Brasil, onde
localizamos cinco etnias indígenas “TIKUNA”, “GUARANI KAIOWÁ”, “KAINGANG”, “GUARANI MBYÁ”,
“TENETEHARA” e em sua legenda dispomos seu número populacional e região. Essa atividade nos
permitiu escrever um texto coletivo sobre mapa do Brasil, auxiliando assim uma leitura mais apro-
fundada de mapas. Foi discutido também em quais regiões existem índios urbanos e rurais, frisando
sempre que, geralmente, cada etnia tem sua cultura e língua específica. A partir dessa atividade
também pudemos apresentar a estrutura de um mapa, em que conhecemos desde a legenda até
sua orientação espacial, abordando a temática dos estados brasileiros (nomenclatura, localização e
abreviações).
Culturas atrasadas: Outro fato desconhecido relativo aos povos indígenas é que suas culturas são
amplas e muito ricas. Quando nossos colonizadores tiveram contato com os índios, as línguas fala-
das por eles foram consideradas inferiores; suas religiões foram interpretadas como simples conjun-
to de superstições; as ciências foram encaradas de forma preconceituosas assim como a literatura,
que ainda hoje não é levada em consideração.
As religiões indígenas eram consideradas como simples amontoados de superstições, esse pon-
to de vista é completamente etnocêntrico, já que só leva em conta a cultura e os valores de quem
observa esses ritos religiosos.
As ciências indígenas, diferente do que acredita grande parte da nossa sociedade, não é uma
negação da ciência e da objetividade. Segundo Darrel Posey , apud Bessa (2002) em alguns grupos
indígenas, assim como em nossas sociedades “modernas” existem índios especialistas, por exemplo,
em solos, plantas e remédios.
Ainda mais desconhecida é a literatura. Embora muito vasta e sofisticada, foi extremamente me-
nosprezada, porque eram ágrafas, passadas de geração a geração pela tradição oral, fato que não
exclui sua grandeza e riqueza cultural, porém, fez com que durante séculos ela não recebesse o
respeito devido.
Nessa etapa, trouxemos curiosidades como influências na língua portuguesa e suas definições.
Para reforçar a atividade descrita no primeiro equívoco, produzimos um mapa do município do Rio
de Janeiro apontando em sua legenda os 24 bairros cariocas (carioca = casa do acari) com nomes
indígenas e seus significados. Assim, os alunos reconheceram que as palavras indígenas trazem em
seu sentido informações importantes sobre o local, valorizando os saberes indígenas. Essa atividade
nos deu abertura de trabalhar formação e significação de palavras indígenas e nos trouxe a opor-
tunidade de debater a importância da valorização e conservação da influência língua indígena no
vocabulário português, visto que houve a perda da língua materna de alguns grupos indígenas a
partir o processo de colonização imposta.
Neste momento do projeto foi fundamental a articulação com o trabalho desenvolvido pela Ofi-
cina de leitura que consistiu em construir uma compreensão coletiva dos mitos e lendas indígenas.
Para isso, foi necessário trabalhar com o contexto histórico e entender o modo como eram explica-
dos todos os fenômenos naturais e universais daquela época. Com isso, os alunos concluíram que,
de fato, em uma época na qual não se usufruía do uso de tecnologias e afins, era preciso explicar

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
qualquer eventualidade a partir do mito que se projetava em alguma ideia e/ou fé.
Por fim, trazendo os alunos à contemporaneidade foi exposto a eles, a partir de alguns contos e
crônicas, o posicionamento da cultura indígena atual. Assim, os alunos puderam perceber que ela
não se encontra presa ao passado, sendo rica e dinâmica como qualquer cultura.
Culturas congeladas: Se perguntarmos, nos dias de hoje, qual a primeira imagem que nos vem a
mente quando pensamos em um índio, é fato que a maioria o descreverá com as seguintes caracte-
rísticas: moreno, nu ou de sunga, no meio da floresta, com arco e flecha e outras peculiaridades que
tendem estereotipar o indígena, que para muitos continua parado no tempo como aquele que foi
descrito pelos portugueses.
O fato é que esses grupos não têm culturas congeladas, eles acompanham a evolução continua
na qual se insere o resto do mundo. Aderir a tecnologia ou uma novidade oriunda de uma socieda-
de diferente não nos exclui da nossa cultura de origem, afinal, nós brasileiros, nos apropriamos do
jeans, de tal forma, que nem nos recordamos que ele não é uma invenção nacional e nem por isso,
deixamos de ser brasileiros.
Trabalhamos a desconstrução desse “verdadeiro índio” focando na interpretação de duas músicas
relacionadas a esse tema. A primeira delas foi Um índio do Caetano Veloso. Nessa canção discutimos
a visão do índio herói já que o imaginário da sociedade brasileira oscila entre “índio vilão” x “índio
herói”, “puro” x “atrasado”, “admirar” x “desprezar”, pois segundo Gomes (2013), O império cultivou
uma imagem heróica e romântica do passado indígena enquanto sustentava o discurso favorável a
destruição do “incivilizável”. Sendo assim ao mesmo tempo que a população diz aceitar sua herança
indígena não luta pelos direitos indigenistas e ainda se rebela pois não se sente pertencente a essa
cultura.
A outra música foi Índios, de Renato Russo. Essa música nos deu abertura para levantar os conhe-
cimentos dos alunos em relação ao descobrimento do Brasil. Tópicos como a exploração do índio, o
escambo e a apropriação das riquezas naturais foram abordados e como esse extermínio social “não
civilizado” é ainda atual. Outro ponto que a música nos permitiu tratar foi a imposição do catolicis-
mo pelos europeus.
Além das reflexões levantadas a partir das interpretações das músicas, outra atividade impor-
tante para quebra desse estereótipo foi a entrevista com Michael Oliveira, primeiro aluno indígena
da UERJ: Na ocasião, os alunos tiveram a possibilidade de ver concretamente um índio utilizando
artifícios tecnológicos, vestindo roupas, morando em uma zona urbana, se apoderando dessa troca
cultural. As perguntas feitas para o entrevistado foram formuladas pelos próprios alunos, dando ori-
gem a um jornal, disponibilizado, posteriormente, para todos os alunos do PROALFA.
Os índios pertencem ao passado: Não se pode negar a relevância da cultura indígena na história
do nosso país, afinal os índios são personagens insubstituíveis na biografia do Brasil, já que povoa-
vam nossas terras mesmo antes da chegada dos portugueses. Embora os grupos indígenas estejam
presentes no nosso passado, é fato, também, que elas não permaneceram lá. Segundo Bessa (2002),
é impossível pensar no futuro do Brasil sem levar em conta a riqueza das culturas indígenas, que ao
contrario do que muitas pessoas acreditam, não é obsoleta, outrossim mantêm-se constantemente
atualizada, inovando em suas artes.
Um exemplo de que essas culturas acompanham as tendências é que no tempo em que muito
se fala de sustentabilidade e preservação do meio ambiente, algumas sociedades deixaram de fazer
cocar com penas, passando a confeccioná-lo de materiais recicláveis, como canudos plásticos, utili-
zados para bebidas.
O assunto debatido referente a esse tópico foi a modernização da cultura indígena com o passar
do tempo. Para essa temática foi trabalhada em sala de aula a arte indígena. Com o auxílio da oficina
de matemática, o conteúdo abordado foi a simetria com figuras geométricas concretas e abstratas.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Nessa atividade buscou-se reproduzir a arte corporal indígena, trabalhando algumas significações
dessas figuras, como por exemplo, polígonos representando as virtudes da flora e da fauna. Outra
prática realizada foi a reprodução de um vaso do povo Kadiweu, grupo famoso por sua arte refina-
da de grafias abstratas. A partir da pintura do vaso, a Oficina trabalhou figuras como semicírculos,
retângulos e retas. Desse modo os alunos concluíram que a arte indígena é vasta e requintada, com-
provando a constante renovação da arte indígena, a seu enriquecimento na cultura brasileira.
Brasileiro não é índio: Percebe-se que os brasileiros, mesmo sabendo que nosso passado está
extremamente ligado ao povo indígena, não reconhecem ou não consideram sua importância na
formação de sua identidade. É comum o brasileiro identificar suas matrizes como europeia, afinal,
esse foi o lado vencedor, desprezando as culturas exploradas: indígenas e africanas. Embora não te-
nhamos o hábito de reconhecer que o índio está vivo dentro de nós, esse é um fato que não se pode
negar. É uma questão cultural, faz parte de nossas origens, queiramos ou não assentir. Exemplo
disso é que talvez até inconscientemente, ao fazermos escolhas relacionadas a culinária, música e
dança, afloram então, nossas heranças culturais: samba, feijoada, uso de medicina alternativa, aces-
sórios entre outros aspectos deixados pelos legados indígena e africano.
Na primeira aula do semestre, disponibilizamos imagens de famosos brasileiros e estrangeiros
como: Fernanda Lima, Preta Gil, Cauã Reymond, Vanessa da Mata, Mário Juruna, Dira Paes, Xuxa
entre outros, com o intuito dos alunos apontarem quais dos famosos teriam identidade indígena.
Foi unânime na turma escolher personalidades como Dira Paes, Mário Juruna, Cauã Reymond, Bruce
Lee... por causa dos seus traços físicos: em sua maioria moreno de cabelos lisos e olhos “puxados”.
Após todos os procedimentos pedagógicos, os três meses de aula, na última aula como avaliação
pessoal retornamos com a mesma atividade das celebridades e como resultado do trabalho de-
senvolvido, a maioria dos alunos identificaram todas as personalidades brasileiras como parte da
etnia indígena. E também, percebemos uma diferença no olhar dos alunos em relação aos cinco
equívocos, esse novo olhar dos estudantes permitiu que eles se enxergassem pertencentes a cultura
indígena e valorizassem-na como umas das bases da matriz brasileira, concluindo que o índio é uma
forte essência cultural na construção da identidade do brasileiro.
Como o objetivo da proposta pedagógica foi de desconstruir os erros mais comuns sobre a os
grupos indígenas foram trabalhados concomitantemente a leitura do artigo em versão resumida4,
que embasou esse projeto e atividades de associação do mesmo com vídeos disponibilizados em
sites e reportagens de jornal.
Na culminância do projeto foram expostos em murais todos os trabalhos realizados em sala: os
mapas, cartazes de curiosidades, o jornal com a entrevista, reprodução das pinturas corporais e o
vaso. Nesse momento as quatro turmas apresentaram seus trabalhos numa espécie de feira cultural
em que todos os alunos tinham contato com os trabalhos produzidos pelas outras turmas. Para com-
plementar esse evento houve apresentações culturais que remetiam aos temas de todas as classes.

considerAções finAis
Neste artigo, relatamos uma experiência em projeto de trabalho que teve como tema as culturas
indígenas. Conforme descrito, o projeto foi desenvolvido em uma turma de educação de jovens e
adultos que faz parte do PROALFA.
Como resultado do trabalho pedagógico foi possível observar que de fato houve uma mudança
no olhar dos alunos em relação às culturas indígenas. Outro destaque foi a possibilidade de traba-
lhar com a metodologia de projeto de trabalho, que permitiu ampliar e articular os conhecimentos
de diferentes disciplinas que comumente, na escola formal, são tratados de forma estanque. Por últi-
mo, destacamos que, como professoras – aprendizes, compreendemos que o processo pedagógico
4 BESSA, José Ribamar. Cinco ideias equivocadas sobre os índios. Disponível em: http://www.conexaoaluno.rj.gov.br/especiais-19f.
asp. Acesso 15 de Abril de 2014.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
é dinâmico e exige reflexão e constante atualização e estudo. Sendo assim, certamente se fossemos
desenvolver esse projeto novamente, ele não seria o mesmo, pois o distanciamento que agora to-
mamos permite-nos reavaliar algumas atividades propostas e reformulá-las de modo a torná-las
mais significativas para os alunos.

referênciA bibliográficA
BESSA, José Ribamar. Cinco ideias equivocadas sobre os índios. Disponível em http://www.taqui-
prati.com.br/arquivos/pdf/Cinco_ideias_equivocadas_sobre_indios_palestraCENESCH.pdf. Acesso 21
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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
A leitUrA nA edUcAção de joVens e AdUltos:
reflexões/Análise AcercA do projeto extensionistA
bibliotecA itinerAnte
cAmillA eloy e silVA | AnA pAUlA de AbreU costA de moUrA
gUmercindA nAscimento gondA

O presente trabalho intitulado A leitura na Educação de Jovens e Adultos: reflexões/análise acer-


ca do projeto extensionista biblioteca itinerante, tem como finalidade apresentar os resultados da
investigação sobre as práticas leitoras na Educação de jovens e Adultos. As atividades do projeto
de extensão compõem o Programa Integrado da UFRJ para Educação de Jovens e Adultos (EJA-
UFRJ), que busca, investigar suas ações para qualificar suas praticas. Para tanto buscou-se identificar
de que maneira as atividades do Projeto interferem no processo de alfabetização e na vida desses
sujeitos. A idéia central do Projeto é estimular e desenvolver o hábito da leitura junto àqueles que
não possuem acesso aos livros. A leitura proposta pela equipe do projeto foge de um olhar instru-
mentalizado e busca uma leitura que sirva como ponte entre o sujeito e a liberdade do pensamento
crítico e que seja também um instrumento que proporcione lazer. Com uma metodologia baseada
na pesquisa-ação pautada na participação das intervenções do Projeto nas turmas de alfabetização,
o que auxiliou de maneira ímpar na análise das atividades e na reflexão em relação às vivencias. Para
desenvolver esse trabalho contamos com a contribuição de Freire (1987, 1992 e 1996), Barbie (2002),
Ferreiro (2002), entre outros referenciais. O trabalho, que ultrapassa os muros da universidade, está
no segundo ano consecutivo e tem propiciado um contato maior dos alunos com o universo da
leitura, aproximando-os de diferentes gêneros textuais e discussões culturais.

palavras-chave: Leitura, EJA, Extensão Universitária

O presente trabalho tem como finalidade analisar se as atividades do Projeto Biblioteca Itine-
rante, pertencente ao Programa Integrado da UFRJ para Educação de Jovens e Adultos (EJA- UFRJ)
atingem os objetivos a que se propõe, buscando identificar de que maneira as atividades do Projeto
interferem no processo de alfabetização e na vida desses sujeitos. Essa análise é feita respaldando-
-se nas atividades realizadas no período letivo de 2013.
A complexidade do trabalho pode ser entendida conceitualmente como um método de pesqui-
sa-ação (Barbier, 2002), onde o pesquisador intervém no meio/objeto pesquisado, além de não cum-
prir o papel tão somente de pesquisador, pois este passa a ser também um interventor, um agente
de mudança do quadro real com o intuito de obter efeitos, que serão por ele analisados. Pude, então,
participar ativamente das intervenções do Projeto nas turmas de alfabetização, o que me auxiliou de
maneira ímpar na análise das atividades e na reflexão em relação às vivencias.
A idéia central do Projeto é estimular e desenvolver o hábito da leitura junto àqueles que não
possuem acesso aos livros. Pretende-se ainda despertar a visão crítica do alfabetizando em relação
à leitura numa perspectiva totalizante. A leitura que propomos foge de um olhar instrumentalizado,
buscamos uma leitura que sirva como ponte entre o sujeito e a liberdade do pensamento crítico e
que seja também um instrumento que proporcione lazer.
Em 2013, ano base dessa análise, debruçamos nossas reflexões sobre o tema cultura. A fim de
estimular o crescimento e o desenvolvimento dos nossos educandos no que tange aos aspectos
cognitivos, buscando imprimir um processo emancipatório, no qual o sujeito se sente livre para
refletir e expressar verbalmente suas impressões, libertando o espírito aprisionado ao estigma do
não alfabetizado emudecido, a cultura do silêncio (Freire,1987), mostrando que podem e sabem se

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
colocar, expondo suas vivências e seus olhares sobre elas. Desenvolvendo a avidez de quem pode
pensar, agir e falar em prol de si mesmo, sem que para isso precise receber instruções de outrem
para fazê-lo e quando fazer.

momentos de constrUções coletiVAs


O tema escolhido para este ano, cultura, passou por um processo de seleção consciente. Partimos
da premissa de que somos sujeitos libertos, quando temos plena ciência de quem somos, de onde
viemos e para onde vamos, quando temos ciência da interferência das nossas escolhas no meio e
como o meio interfere nas nossas escolhas. Essa ciência de si só existe através do autoconhecimen-
to. Na tentativa de aproximar os alfabetizandos dos livros, ou de qualquer outro tipo de portador
textual, percebemos a necessidade de aproximá-los de si próprios. O reconhecimento de quem são,
de quem não são e, portanto, de quem o outro é ou não, se descobrindo, se aceitando e por conse-
quência se respeitando mais e assim respeitando também o outro.
A ideia inicial do Projeto era trabalhar o tema escolhido a fim de enaltecer a cultura brasileira,
construir uma noção crítica da história da nação, valorizando a mesticidade do nosso povo. Para
entendermos nossa cultura e suas origens optamos por trabalhar com três eixos subtemáticos: a
cultura indígena, a cultura europeia e a cultura africana, por se caracterizarem como as culturas que
mais nos influenciaram desde o fato histórico “Descobrimento do Brasil”.
Contudo, ao entrarmos nas salas e começarmos uma aproximação com a cultura indígena e ex-
pormos nossas intenções de atividades subsequentes para as próximas visitas com as demais cul-
turas, percebemos a necessidade de introduzir uma discussão sobre a cultura nordestina em nosso
planejamento, dada sua presença massiva e muitos questionamentos que foram borbulhando entre
os educandos. Como não dispúnhamos de muito tempo no calendário das turmas, devido aos ou-
tros projetos, e até mesmo ao tempo necessário para a preparação desta aula, decidimos por bem
postergar as atividades da aula sobre a cultura Europeia para o próximo ano letivo (2014), caso real-
mente fosse inviável sua realização ainda em 2013, o que acabou por acontecer.
Partimos então do conceito etimológico da palavra, expressado por Bosi (1992), para trabalhar-
mos o entendimento de tal conceito, de como ele foi construído e como ele se apresenta atualmen-
te, de maneira bem geral.

Começar pelas palavras talvez não seja coisa vã. As relações entre os fenômenos
deixam marcas no corpo da linguagem. As palavras cultura, culto e colonização de-
rivam do mesmo verbo latino colo, cujo particípio passado é cultus [...] Colo signifi-
cou, na língua de Roma eu moro, eu ocupo a terra, e por extensão, eu trabalho, eu
cultivo o campo [...] Cultus(1) o que foi trabalho sobre a terra, cultivado; (2) o que se
trabalha sob a terra, culto, enterro dos mortos[...](1992, p.11)

Fazendo uma analogia à etimologia da palavra, explicamos que, de certa maneira, a cultura eu-
ropeia que foi imposta pelo português, quando aqui chegou, foi o que ficou sobre a nossa terra. A
cultura indígena que foi reprimida foi enterrada e está sob a terra, desvalorizada. E nossa proposta
seria, então, de uma maneira muito simbólica desencavar, resgatar e desenterrar a cultura indígena
enraizada em nós.
Através de outro viés, buscávamos desconstruir a visão quase que “divina” e frágil, onde o con-
ceito de cultura assume um caráter erudito, distanciado das práticas cotidianas. Quando indagados
sobre esse conceito, todas as respostas eram de ordem de aquisição pessoal, como que se pudesse
medir a cultura de alguém pelo que se tem. Dentre as respostas, as que mais me chamaram a aten-
ção foram: “tem mais cultura quem sabe ler e escrever”, “cultura é ouvir ópera” “ah, professora, pode

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
ser de milho, de arroz...” e “quem viaja mais tem mais cultura”.
Tentando aproximá-los de um conceito mais social e menos individualizado, direcionamos as ex-
posições para nossos hábitos, nossas crenças, nosso modo social de organização, nosso comporta-
mento diante de alguns acontecimentos. As variações culturais que herdamos o que assimilamos
e o que descartamos. Com a amplitude desse conceito e a ciência de seus múltiplos significados
buscamos um pensamento um pouco mais aprofundado sobre o que consideramos cultura e o que,
por sua vez, menosprezamos. Questionamos ainda se existem culturas melhores ou piores,com o
intuito de estimular o pensamento critico.
Com base na explicação etimológica adotada pelo Projeto para conduzir nossas discussões sobre
o conceito de cultura, associamos as relações de poder que existira neste recorte histórico. A cultu-
ra européia se impôs sobre a cultura local, indígena, por meio da catequese (imposição religiosa),
apropriação dos bens naturais (extração do Pau-Brasil), exploração do trabalho escravo e ocupação
territorial. Fatos que contribuem para ratificar a interpretação adotada da palavra cultura, baseada
na sua gênese. De maneira que para os alunos ficasse bem esclarecido que em detrimento da cultu-
ra indígena, que foi “soterrada”, a cultura européia construiu uma história de ascensão e o que ficou
sobre a terra foram os traços dos nossos colonizadores.
Todos os eixos temáticos foram trabalhados com a mesma premissa: o conhecimento prévio dos
alunos em relação cultura que seria abordada, e para dar continuidade ao debate utilizamos sempre
um disparador, que variou entre músicas, lenda, poema, entre outros.
Na visita em que discutimos a cultura indígena fizemos a leitura de uma lenda que é um ins-
trumento muito usado pelos Índios de todas as tribos para transmitirem suas histórias para outras
gerações, visto que não utilizavam o registro escrito. Utilizamos a Lenda do Tambatajá, que conta de
maneira mítica e romântica o surgimento da planta, e aborda ainda a rivalidade entre duas tribos.
Temática que foi facilmente desenvolvida, devido à rivalidade existente entre países, em um âmbito
macro, e entre as facções das comunidades em que vivem, no âmbito micro. A lenda também nos re-
mete à historia teatral Romeu e Julieta, escrita por Willian Shakespear, um amor proibido vivido por
dois jovens de famílias rivais que acaba com a morte do casal. No entanto, em Tambatajá, os corpos
desfalecidos misticamente dão origem a uma planta, que motiva o surgimento da lenda.
Através da leitura e análise conseguimos aproximá-los de um gênero literário que foi de grande
aceitação em todas as turmas, sempre fazendo o movimento detecer um elo entre a cultura indí-
gena, considerada tão distante, e a cultural contemporânea. Promovendo a intertextualidade entre
os gêneros trabalhamos com a música Tambatajá, inspirada na lenda, interpretando, analisando e
buscando aspectos concomitantes entre ambas. Culminando com a escuta e o canto da música, que
foi de grande surpresa para as turmas.
Como encerramento, a proposta de atividade foi a confecção do que se tornará as primeiras pá-
ginas do Tecido Vivo, projeto que será explicado posteriormente, na qual os alfabetizandos expres-
sariam de maneira livre suas impressões sobre a cultura discutida e a aula de uma maneira geral,
colocando no papel por meio de desenhos, palavras e frases de sua própria autoria ou retiradas da
lenda ou da música, que foram impressas e entregues a eles.
Esta aula, sobre cultura nordestina, como exposto anteriormente, não estava no planejamento
inicial, a introdução desta ocorreu devido o receio apresentado por alguns alunos de revelar seu es-
tado de origem. Percebemos isso a partir da recusa em nos passar essa informação, nas brincadeiras
de cunho ofensivo entre os alunos em sala de aula, que de maneira direta estimulam a negação das
origens. Notamos também que ora os alunos se valiam da nacionalidade para ocultar sua naturali-
dade, ora confundiam por desconhecimento das diferenças.
Para tal entendimento fizemos junto à turma a leitura do mapa do Brasil, com o intuito de cola-
borar para que eles construíssem uma noção de espaço territorial nacional de pertencimento e par-
tindo dessa noção, a consciência de fragmentação desse espaço em territórios estaduais, que vão

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
designar nossa naturalidade que, por sua vez, está condicionada a nossa naturalidade.
Como o intuito maior dessa aula era valorizar as origens, principalmente a origem nordestina,
partimos para a exaltação dos aspectos positivos da região, enquanto os alunos em seus relatos
lembravam apenas de características negativas, o que é perfeitamente compreensível. Sabedores
de suas histórias de luta para viver, só expressaram saudades quando falavam de familiares ou de
amigos deixados e em relação ao ritmo de vida menos acelerado.
Como ponto de partida para a reflexão sobre o processo migratório utilizamos a música Para
Todos, de Chico Buarque, especialmente no trecho em que exemplifica o grande deslocamento in-
terno que acontece no país, formando famílias cada vez mais plurais.
Seguimos a mesma linha de exposição da aula anterior, por meio da recordação dos hábitos cul-
turais, contemplando a música, os ritmos, a culinária e a literatura. Mais uma vez utilizamos a música
como instrumento para encorpar o debate e exercitar a leitura, visto que a estratégia adotada foi
satisfatória e recebida pelos alunos de forma estimulante e dinâmica, segundo seus próprios relatos.
Escolhemos levar desta vez para as salas de aula a música “Último pau de arara”, de Luiz Gonzaga e
Guio de Moraes. A história cantada de um homem que tem muito orgulho e não quer sair de sua
terra, mesmo com toda seca e dificuldade, nos auxiliou a finalizar a discussão. Bem como da primeira
vez, levamos o áudio e a letra impressa, para que tentassem acompanhar, porém, como a música já
era do conhecimento dos alfabetizandos, a atividade se tornou ainda mais divertida e lúdica.
Para finalizar e produzir um segundo material para compor o Tecido Vivo propomos a utilização
de fragmentos de músicas e poesias que tratavam dos temas discutidos. Cada um escolheu alea-
toriamente um cartão, no qual continha um desses fragmentos, que serviria de inspiração para a
elaboração de outro registro que ilustrasse o sentimento que remetia a cada trecho escolhido, no-
vamente de maneira livre.
Dando seguimento ao planejamento pedagógico anual do projeto, trabalhamos a cultura africa-
na, esta foi a última aula, com a qual encerramos nossas atividades nas classes de alfabetização do
programa no ano de 2013.
Para dar início às atividades desta aula, declamamos o poema “Irene do Céu”, de Manoel de Ban-
deira. Após essa leitura os alunos foram instigados a apontar suas impressões sobre o mesmo. Em
uma leitura superficial, os alunos citaram o fato da “preta” pedir licença ao “branco” (para os alfabe-
tizandos, São Pedro é de cor branca) para entrar no céu e a alegria de Irene (segundo eles, os negros
constituem uma raça muito alegre e fizeram uma ligação com o samba). Apenas alguns alunos se
atentaram ao fato de que São Pedro, “o branco”, diz a Irene que ela não precisava pedir licença.
Embora tivéssemos considerado e comentado todas as explanações, direcionamos a discussão
para a primeira observação citada pelos alunos - a submissão do negro em relação ao branco - de
maneira que eles chegassem ao questionamento sobre a necessidade de um negro pedir licença a
um branco e o porquê. Questionamos ainda se essa cultura de submissão pode ser extensiva a ou-
tras situações.
Como ponto de partida para criar um elo da Cultura Africana com a nossa cultura atual, retorna-
mos ao fato histórico “descobrimento do Brasil”, bem como abordado na aula sobre a Cultura Indíge-
na, desta vez com a perspectiva do regime escravocrata, uma das grandes lutas desse povo. Como
instrumento de motivação para esse debate exibimos um vídeo da coletânea Heróis de Todo Mun-
do, que conta a história de Zumbi dos Palmares, narrado por Martinho da Vila. O vídeo nos auxiliou
a dialogar, seguindo uma ordem cronológica sobre os seguintes temas: o período de escravidão e as
lutas em prol da libertação, os percalços enfrentados após a promulgação da Lei Áurea e a luta pelo
reconhecimento da igualdade racial.
A abordagem pautada numa análise sócio-histórica sobre o povo negro levou os alfabetizandos
a chegar à conclusão de que, apesar de libertos, os negros permanecem presos ao preconceito e a

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
uma história de luta em busca de igualdade. Este contexto nos deu o gancho que precisávamos para
citarmos líderes negros de extrema importância para a causa negra: Nelson Mandela – lutou contra
o Apartheid; Martin Luter King – combatia a desigualdade racial e lutava pela garantia dos direitos
civis, pautado na não violência; e personalidades brasileiras como Martinho da Vila, que também
preconizam a igualdade racial.
A fim de ratificar a miscigenação na nossa identidade cultural, levamos para a sala de aula a músi-
ca “O Canto das Três Raças”, que exalta as três raças trabalhadas no projeto anual.
Explorando mais uma característica cultural desse povo, mostramos imagens das máscaras africa-
nas que carregavam consigo diversas significações. O que atualmente utilizamos no carnaval, apa-
rentemente sem nenhuma representação simbólica para os africanos era um objeto cheio de signi-
ficados. Retomando a ideia original das máscaras, propusemos que todos os alunos desenhassem
a sua máscara de maneira que esta representasse o que estivessem sentindo naquele momento ou
algum momento especial em suas vidas. Estes desenhos, como as produções anteriores, também
farão parte do Tecido Vivo.
O Projeto Tecido Vivo, que consiste na confecção de um livro feito pelos alunos, existe ainda uma
aula a ser dada, para então fecharmos os diálogos sobre o tema cultura e encerrarmos as atividades
de criação do nosso livro. Contudo, não é apenas a junção dos trabalhos realizados em sala de aula,
de maneira pura e simples, não é apenas um portfólio, vai mais além. É a representação de senti-
mentos, a libertação de estigmas e tem como objetivo maior mostrar uma obra feita por autores que
desconhecem seus potenciais.
A ideia da confecção de um livro por pessoas que nunca possuíram, leram ou sequer se aproxi-
mavam desse objeto pode parecer assustadora, ou utópica, dependendo da ótica. Porém, nas pá-
ginas deste livro, a ser construído coletivamente, estarão retratados inconscientemente por seus
autores, a luta diária do processo de alfabetização, estímulos ao crescimento da auto-estima dos
alfabetizandos, o reconhecimento das suas produções e a exposição de trabalhos que não podem
ficar restritos às turmas de alfabetização.
Para entender a importância da concretização deste projeto pedagógico é preciso compreender
a leveza de um bordado. Onde, a bordadeira vai lenta e cuidadosamente tecendo com sua linha
cada ponto de sua criação, assim se constrói nosso trabalho dentro do Programa. Cada um, alfabe-
tizador, alfabetizando, os outros integrantes dos demais projetos, nós, mediadores, vamos todos
tecendo, diariamente, a mesma linha, cada um dá um ponto, a fim de chegarmos ao fim do bordado,
o conhecimento. E bem como a bordadeira quando termina um trabalho inicia outro, nós também
o fazemos, é um trabalho interminável, como nossa incompletude, nosso inacabamento, como nos
ensina Paulo Freire (1996). Assim, nossa rede de conhecimento bordada lenta e calmamente, obede-
cendo ao ritmo dos alfabetizados, vai se multiplicando e consolidando nossos saberes.

considerAções finAis
Este trabalho é produto de uma construção coletiva, no que diz respeito às ações aqui expostas,
exceto minhas reflexões e considerações sobre o mesmo. É o relato de um Projeto que de maneira
alguma abandonou suas convicções educacionais e políticas de que por intermédio de uma prática
de leitura crítica e consciente o sujeito pode se reconhecer, conhecer o meio, refletir sobre o que
está lendo e fazer deste portador textual um instrumento de conhecimento libertador ou até mes-
mo de um instrumento de prazer. E que ela, a leitura, não está presa somente à decodificação de
símbolos. Ler é mais que isso, ler pode despertar nossa consciência para uma dimensão que antes
nunca pensamos em alcançar, a dimensão crítica. Nada mais subversivo que uma leitura que nos
deixa com “uma pulga atrás da orelha”, que nos faz questionar e nos faz buscar outras informações,
seja para nos aprofundarmos no assunto ou para aferir a veracidade do que foi lido.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
O Projeto Biblioteca Itinerante e suas atividades se estruturaram de tal maneira que suas crenças
e anseios chegassem aos alfabetizandos do Programa Integrado da UFRJ. Após dois anos de atuação
nessas turmas podemos constatar por resultados obtidos por uma pesquisa realizada pelo próprio
Projeto, indícios e sinais presentes no cotidiano das salas de aula que os alunos se mostram mais
desinibidos, no momento que se posicionarem, utilizam dos seus conhecimentos extracurriculares
para embasarem seus argumentos.
Não necessariamente as atividades da Biblioteca Itinerante auxiliaram diretamente no proces-
so de alfabetização ao longo deste período, como questionado no início deste trabalho, contudo
julgo que esse fato não desmerece todo trabalho da equipe, afinal este era apenas um dos nossos
questionamentos e vale ressaltar que a maioria dos educandos está, ainda, em um processo inicial
da construção da escrita e da leitura, e que nosso trabalho não se encerra, portanto ainda podemos
atingir essa meta.
Julgo então que para o questionamento sobre a contribuição do Projeto para o processo de alfa-
betização, em especial, nossas ações funcionaram como um agente motivador e como um agente
facilitador no aspecto intersubjetivo desse aluno para com o conhecimento, ao passo que todas as
atividades tinham como objetivo, além da aproximação com a prática da leitura, a valorização do
capital cultural de cada um e a maneira como essas formam um sujeito e, por consequência, como
esse sujeito atua no mundo.
Se ao iniciar as visitas do Projeto pude notar uma instrumentalização da leitura também por parte
dos alfabetizadores, hoje percebo que houve a aceitação do Projeto por parte deles, o que é muito
importante. A maioria tenta de alguma maneira trabalhar o material que deixamos com alfabetizan-
dos. Isso é bom para nós, enquanto equipe do Programa, e para os alunos que entendem que são
trabalhos que se complementam.
Ao passo que nossos alfabetizandos vão galgando degraus no processo de alfabetização per-
cebemos que se tornam mais questionadores, mais participativos e inquietos perante os aconteci-
mentos cotidianos. Os educandos que estão inseridos há mais tempo no processo de construção
da escrita e da leitura são mais ativos e confiantes, por consequência mais autônomos, são leitores
assim que desejamos. A equipe da Biblioteca Itinerante se orgulha ao saber que pôde contribuir
para o crescimento de cada sujeito e para cada leitor em potencial.
Ao iniciarmos esse Projeto, não tínhamos, e não temos, o intuito de formar um número determi-
nado de leitores periodicamente, nosso objetivo, metaforicamente, é de regar e adubar com nossas
visitas a semente do leitor que existe em cada um dos nossos alfabetizandos, para que eles possam
colher os frutos de bons livros, boas interpretações sobre os fatos e notícias. Repito, o Projeto não
se esgota com este relato, nosso trabalho é contínuo, por isso trago conclusões inconclusas de dois
anos de observação que tentei resumir nestas páginas. Pretendo, porém, aprofundar essas discus-
sões em outro momento.
Acredito que a “grande sacada” da Biblioteca Itinerante foi atuar na contramão do esperado, não
iniciamos com empréstimos de livros, contação de histórias ou debates sobre livros. Partimos dos
debates sobre temas cotidianos entrelaçando esses temas com contos, músicas, lendas e textos,
para só então chegarmos aos livros. Em nossas atividades, antes de mais nada, ouvimos as falas dos
alunos, antes de falarmos algo ou utilizarmos até mesmo a fala de algum referencial teórico. Com
todos cientes da temática a ser discutida, a primeira fala sempre é do aluno. Primeiro ele fala do que
sabe sobre o tema, somente depois ampliamos o debate com nossas contribuições e depois canta-
mos, lemos e/ou contamos histórias com ganchos nos assuntos em debate de maneira a expor de
forma poética assuntos cotidianos. Isso faz com que os alfabetizandos percebam as redes invisíveis
que os cercam.
A experiência que se vive nas classes de alfabetização do Programa, dentro das comunidades,
e as reuniões do Projeto de planejamento e avaliação das quais participei serviram para ratificar a

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
máxima que prega que a teoria sem a prática se esvazia, por sua vez a prática confirma, atualiza e
imprime sentido à teoria. Minha formação acadêmica, por si só, se mostrou incapaz de abarcar a
complexidade do cotidiano escolar que infelizmente se distancia, e muito, dos assentos e paredes
universitárias.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
A permAnênciA escolAr nA edUcAção de joVens e
AdUltos: nArrAtiVAs biográficAs
Aline gimenes soAres | cleidy nicodemos

Sabendo que a questão da evasão na Educação de Jovens e Adultos é admitida como um fenô-
meno presente no universo escolar, este trabalho desejou refletir sobre a permanência do aluno
nesta modalidade de ensino, objetivando, portanto, analisar através de relatos de vivências o que
motivou os alunos a prosseguir com seus estudos diante das várias intempéries que acometem a
vida adulta. Para tanto, realizou-se uma análise das narrativas biográficas de alunos da EJA, voltadas
para a relação de permanência/exclusão no âmbito escolar, apresentando como eixo referencial a
experiência do ingresso/permanência no Colégio AIACOM, situado na zona norte da cidade do Rio
de Janeiro, que atende a jovens e adultos no turno da noite, com turmas de Ensino Fundamen-
tal ao Ensino Médio. Logo, analisamos os elementos mais significativos que contribuíram para a
permanência destes alunos na escola, observando, portanto, o papel fundamental das relações de
convivência e partilha de saberes estabelecida pela instituição de ensino citada acima. Assim, em-
basados pela pedagogia dialógica de Paulo Freire na qual o “ensinar não é transferir conhecimen-
to”, mas um processo de construção e troca de saberes, verificou-se que valorizar as experiências e
visões de mundo dos alunos, bem como investir no sentimento de pertencimento do espaço e no
fortalecimento dos laços de convivência, permitiu aos alunos da EJA não somente se apropriarem
das aprendizagens escolares de modo crítico e original, mas também a se sentirem encorajados a
dar continuidade aos seus estudos numa perspectiva de ampliar sua compreensão e interação com
o mundo. Deste modo percebemos que grande parte da ininterrupção dos estudos do aluno de
EJA está diretamente associada à relação diferenciada entre toda a equipe pedagógica com o saber
construído no ambiente escolar.

palavras-chave: EJA, permanência, evasão, convivência, relações

dedicAtóriA
Aos alunos da Educação de Jovens e Adultos do Colégio AIACOM que me ensinam e me inspiram
a cada dia ser uma educadora melhor.

introdUção:
Este trabalho pretende refletir e analisar através de relatos de vivências, os motivos que impul-
sionaram os alunos da Educação de Jovens e Adultos do Colégio AIACOM, situado na zona norte
da cidade do Rio de Janeiro, a prosseguir com seus estudos, mesmo diante das várias intempéries
que acometem a vida adulta. Sabemos que muitos estudos e pesquisas investigaram os diferentes
processos de evasão nesta modalidade de ensino, sendo inclusive admitido como um fenômeno
presente no universo escolar. De acordo com Pedralli e Rizzatti (2013) a evasão nos contextos de
EJA é um tema recorrente como comprovado também em outras cidades brasileiras, a exemplo de
Florianópolis:

[...] São trabalhadores e trabalhadoras que, geralmente, precisam conseguir


pessoas para cuidar dos filhos e parentes, lidam com ciúmes do companheiro ou
companheira, muda[m] de endereço com frequência, são em sua maioria de outras
cidades, mudam de emprego ou conseguem um em horário noturno, chegam aos

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
núcleos cansados, com fome, são tímidos, muitos não têm pais, a família está se-
parada, os pais não têm ensino fundamental completo, têm dificuldades de falar
em público, a autoestima é baixa, quando percebe[m] que o curso é muito diferente
do que esperava[m], pensa[m] em desistir imediatamente, vivem muito próximo da
violência urbana, do tráfico de drogas etc. (PMF; SME; DEC, 2008, p. 7 apud RBLA.
2013, p. 775).

Tais situações elencadas acima evidenciam a realidade de muitos alunos jovens e adultos brasi-
leiros que, diante do sentimento de baixa autoestima causado pelo legado de exclusão e dos con-
dicionantes histórico-sociais, evadem, não concluindo ou protelando a conclusão de seus estudos.
A evasão no colégio AIACOM também é um fato presente, por ser uma realidade histórica brasi-
leira conforme cita porém não com um número alarmante. De acordo com o levantamento realizado
no último Conselho de Classe da escola em 2014, num total de 185 alunos, houve uma média de
20% de evasão, a saber os motivos abaixo:
• 5,9% por motivo de trabalho
• 4,3% por causa dos filhos
• 2,7% por motivos de ordem pessoal (casamento, questões financeiras, mudança de planos,
etc).
• 2,1% por problemas com a escola (problemas relacionados à intergeracionalidade e adap-
tação).
• 1,9% por mudança de bairro
• 1,7% por problemas de saúde
Foi constatado também, por dados referentes ao ano de 2013, que de 100% dos alunos que eva-
diram 80% retornaram no 1º semestre de 2014 ao Colégio AIACOM.
A questão da baixa evasão escolar e do regresso dos alunos evadidos motivaram a realização
desta análise das narrativas biográficas dos alunos da EJA, voltadas para a relação de permanência/
exclusão no âmbito escolar, apresentando como eixo referencial a experiência do ingresso/perma-
nência no Colégio AIACOM, que atende a jovens e adultos no turno da noite, com turmas do Ensino
Fundamental ao Ensino Médio.

ii) os sUjeitos dA pesqUisA: A permAnênciA escolAr e sUAs nArrAti-


VAs
Para este trabalho foram selecionados 05 alunos, com idade, gênero e grau de escolaridade dife-
renciados, com o intuito de mapear o sentido e significado simbólico que a escola representa a este
grupo escolar, composto pela diversidade de interesses e comportamentos. Porém, sendo todos os
alunos de origem popular, advindos das favelas do bairro do Engenho Novo e adjacências, e com
histórico de evasão e experiências anteriores fracassadas ou não concluídas devido às dificuldades
na infância. Abaixo, os sujeitos da pesquisa e suas narrativas biográficas, ancoradas com os referen-
ciais epistemológicos que embasam este trabalho.

2.1 ednAlVA: o mUndo do trAbAlho e o contexto escolAr


“O adulto está inserido no mundo do trabalho e das relações interpessoais de um modo diferente
daquele da criança e do adolescente. Traz consigo uma história mais longa (e provavelmente mais
complexa) de experiências, conhecimentos

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
acumulados e reflexões sobre o mundo externo, sobre si mesmo e sobre as outras pessoas” (OLI-
VEIRA, 1999, p.16).

Moradora da comunidade do São João, Engenho Novo, Ednalva que hoje tem 48
anos, não pôde concluir seus estudos ainda em idade regular porque precisou traba-
lhar desde muito cedo, aos oito anos de idade quando morava no estado da Bahia.
Para ajudar seu pai e seus irmãos após o falecimento de sua mãe, Ednalva começou a
trabalhar em casas de família e foi a partir desta necessidade que a mesma precisou
adiar os estudos. Em busca de condições melhores de trabalho e sobrevivência, aos
dezoito anos Ednalva mudou-se para a cidade do Rio de Janeiro. Em seu novo porto
Ednalva envolveu-se emocionalmente com um jovem rapaz e do fruto deste relacio-
namento engravidou, porém, assumiu seu filho sozinha, precisando mais uma vez
adiar o desejo de voltar a estudar para trabalhar e sustentar seu filho. Somente com
o filho criado, 23 anos após ter chegado ao Rio de Janeiro, Ednalva pôde voltar para
a escola, se matriculando no Colégio AIACOM em 2012 cursando a antiga 4ª série,
atual 5º Ano. Hoje finaliza o 8º Ano e pretende prosseguir com seus estudos. Ednalva
utiliza a expressão “eu quero chegar lá” como auto incentivo, mesmo sabendo da
difícil tarefa de conciliar o trabalho com os estudos.

Trabalho, pego de 07h00 as 15h00 da tarde, venho pra casa correndo, venho pro
AIACOM correndo, chego assim desesperada, esbaforida mas “tô” aqui. E uma das
coisas que eu gosto muito daqui, desse colégio são os profissionais, desde a cantina
até a diretora. Todo mundo tem um carinho muito grande com a gente, o respeito, o
compromisso... Os professores são ótimos. (Ednalva, 48 anos).

Percebemos que o fato de trabalhar e ter que estudar é superado porque Ednalva encontrou um
espaço escolar acolhedor, que respeita suas condições sociais a nível de deslocamento de trabalho e
do próprio cansaço físico e mental. Esta declaração nos possibilita compreender que a escola precisa
estar atenta aos anseios dos alunos, respeitando a história pregressa do seu alunado e a sua ocupa-
ção na sociedade, para que o mesmo se sinta parte integrante do grupo que frequenta. Sobre este
olhar sensível ante ao aluno trabalhador de EJA, Gadotti salienta que:

A educação de adultos está condicionada às possibilidades de uma transforma-


ção real das condições de vida do aluno-trabalhador. Os programas de educação de
jovens e adultos estarão a meio caminho do fracasso se não levarem em conta essas
premissas, sobretudo na formação do educador. (GADOTTI, 2005, p. 31-32).

A experiência positiva com a escola fez ressurgir também o sonho de Ednalva conquistar o Ensino
Superior, superando seus medos e enfrentando suas dificuldades:

Eu tenho um sonho de conseguir fazer faculdade de Direito, ser advogada um dia


né, quem sabe? Eu acho que eu aprendi muito sim! E eu tinha medo, aquela preo-
cupação com o Português... Em falar, em escrever alguma coisa. Eu tinha medo de
escrever errado. Então agora eu me sinto segura. De vez em quando eu fico assim na
dúvida, mas ai o professor vai lá chama a gente e fala “aí não tá legal, falta alguma

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
coisa”. (...) (Ednalva, 48 anos)

Ednalva continua seu relato dizendo que tirou 10 na última redação, mostrando a superação e
orgulho com a sua nota, se sentido encorajada e motivada. Esta motivação está associada a um ele-
mento mediador, que neste caso é o professor, visto que a aprendizagem é provocada por uma situ-
ação externa. Neste sentido, Paulo Freire (2002) sinaliza que “ensinar não é transferir conhecimento,
mas criar possibilidades para a sua própria produção ou sua própria construção”. Logo, o professor
assume papel de mediador do conhecimento, aquele que cria possibilidades para o aprendizado
e não como detentor do conhecimento, que transfere para o seu interlocutor (no caso o aluno) o
ensino de forma pacífica.

2.2 cArlos henriqUe: UmA escolA sem preconceito

“Se discrimino o menino ou a menina pobre, a menina ou o menino negro, o me-


nino índio, a menina rica; se discrimino a mulher, a camponesa, a operária, não pos-
so evidentemente escutá-las e se não as escuto, não posso falar com eles...” (PAULO
FREIRE, 2002, p. 136)

Carlos Henrique é um jovem de 17 anos que cursa o 9º Ano do Ensino Fundamental no colégio
AIACOM. Oriundo de uma base familiar desestruturada, Carlos abandonou os estudos em função
dos muitos problemas nas antigas escolas, o que legitimou a sua não identificação com as mesmas.
Devido aos percalços familiares, o tio de Carlos tornou-se seu responsável legal e no início de 2014
matriculou o sobrinho no colégio AIACOM.
Sobre sua experiência no Colégio AIACOM Carlos Henrique salienta:

As pessoas que estão aqui são que nem eu, que não estudaram lá atrás. Aqui a
gente encontra pessoas que estão no mesmo nível, no mesmo patamar. Aqui a gente
sabe que as pessoas não vão implicar com o rosto, como a pessoa é, por sua raça,
sem ter preconceito... E ninguém julga o outro, entende? (Carlos Henrique, 17 anos).

Sobre este relato, percebemos que a questão da identificação com o colégio AIACOM está na
forma como o mesmo estabelece as relações de respeito e principalmente do combate à discrimina-
ção, fazendo com que Carlos permanecesse na escola, motivado e feliz. Logo, podemos afirmar que
as instituições de ensino se constituem, por excelência, em espaços de socialização, propiciando
ao aluno experiências positivas ou negativas quanto a sua autoimagem e autoestima. Neste senti-
do, a escola exerce uma função essencial, por ser uma das principais instituições responsáveis pela
formação do sujeito, possibilitando a este a (re)construção de valores e condutas na afirmação de
identidades. De acordo com Stuart Hall (2005 apud CAMPOS - LIMA 2010, p178), a identidade é
algo que se constrói ao logo do tempo, de forma inconsciente e não inata existente na consciência
do momento em que nasce. “Ela permanece sempre incompleta, está sempre em processo, sempre
sendo formada”.
Carlos continua seu relato afirmando que:

No AIACOM é sempre parceria, um ajudando o outro. A gente procura obedecer


aos professores e a diretora principalmente. A gente tenta aproveitar a oportunida-
de que o colégio está dando pra gente por ser um colégio particular. Por mim eu fi-
cava aqui, trabalhava aqui... Eu gosto daqui porque eu sei que aqui ninguém vai me

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
discriminar. Aqui eu me sinto bem. É como se fosse uma família essa escola. (Carlos
Henrique - 17 anos)

O sentimento de pertencimento expresso a partir da fala de Carlos Henrique se estabelece por-


que a instituição citada se configura a partir de um ambiente afetivo e fraterno, no qual todos são
tratados de forma igual num processo mútuo de solidariedade e respeito. Quando Carlos salienta
que gosta da escola e que se sente bem nela porque sabe que não vai ser discriminado, percebemos
que a instituição coíbe qualquer tipo de atitude preconceituosa e de racismo. Por este prisma, vale
ressaltar a importância de se trabalhar de forma consistente, em todas as instituições de ensino a
Lei 10.639/03 que propõe uma educação para a diversidade e que traga para o currículo a discussão
sobre o trato democrático das diferenças. A lei exige por parte das escolas, mudanças de postura
pedagógica: na superação de preconceitos, no desafio do diálogo cultural em âmbitos nacionais e
internacionais, com os referenciais de nossa ancestralidade africana e uma postura aberta frente ao
diverso.

 Altera a Lei nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996 que estabelece as diretrizes e ba-


ses da educação nacional, para incluir no currículo oficial a Rede de Ensino a obriga-
toriedade da temática “Histórias e Cultura Afro-brasileira” e dá outras providências.
(BRASIL, LDB, 2003)

Aos “olhos” da Lei o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva decretou:

“Art. 26-A. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e parti-


culares, torna-se obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira”.

§ 1o O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o estu-


do da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra
brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição
do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA


Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque

2.3 eliAne: UmA escolA AcolhedorA


Eliane, 25 anos, estuda no AIACOM desde 2013, estando atualmente matriculada na turma do 1º
Ano do Ensino Médio. Eliane retomou os estudos após sua filha conquistar um pouco mais de in-
dependência e autonomia. Mulher, mãe, empregada doméstica e estudante, a aluna fala sobre sua
experiência no contexto escolar:

Aqui a noite é bom, porque os professores, tanto os novos quanto os antigos são
excelentes. Se prontificam em ajudar. Nas outras escolas não tinha esse empenho
todo de ajudar de se preocupar... De ligar pra você pra perguntar por que faltou, qual
o problema... De se por em nosso lugar, entende? Como se fosse todo mundo um só!
(Eliane, 25 anos).

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Eliane continua seu relato mencionando que a relação com os profissionais da escola é um fator
que a faz gostar ainda mais da instituição, inclusive com a profissional responsável pela cantina, a
qual Eliane tem um carinho especial.
A partir desta experiência vivida por Eliane podemos constatar que a afetividade e o acolhimento
são fatores que fazem a diferença para os alunos que precisam lidar com a vida pessoal e profissional
no contexto da EJA, onde as dificuldades da vida adulta se configuram como grande fator da evasão
escolar. Nesta perspectiva percebemos que a preocupação, carinho e afeto ampliam as relações de
convivência na escola e consequentemente corroboram para a permanência do aluno na escola,
através da construção e manutenção de vínculos positivos.
A questão do afeto é percebida por Vygotsky (1994) numa perspectiva interacionista onde o
aprendizado é adquirido a partir das trocas de experiências vividas pelas pessoas. Tais experiências
são vividas em primeiro lugar pelo plano externo (interpessoal) através dos indivíduos envolvidos
afetivamente a nível social, e posteriormente, pela internalização (intrapessoal) através do seu pró-
prio interior, a nível individual. Vygotsky defendia que a afetividade e o cognitivo caminham juntos
sendo indissociáveis. Portanto, podemos afirmar que o papel do outro no processo de aprendiza-
gem torna-se fundamental para a sua qualidade, sucesso e continuidade.

2.4 lUiz Anderson: comprometimento docente e regrAs fAzem bem A


práticA edUcAtiVA

“O clima de respeito que nasce das relações justas, sérias, humildes, generosas,
em que a autoridade docente as liberdades dos alunos se assumem eticamente, au-
tentica o caráter formador do espaço pedagógico”. (PAULO FREIRE. 2002. p.103)

Aluno cursando pela segunda vez a série do 6º Ano, Luiz Anderson de 19 anos, é um jovem como
tantos outros: alegre, criativo, inquieto e ansioso. Sua repetência se deve em especial às faltas ex-
cessivas (o aluno atualmente trabalha na Zona Sul da cidade do Rio de Janeiro e encontra muitas
dificuldades para chegar à escola). Apesar deste contexto, Luiz não abandona a escola porque para
ele a sua escola é uma escola de “verdade”:

Os professores aqui sabem a dificuldade do aluno. Já lá não tinha (se referindo a


antiga escola). O professor falava uma vez só, turma cheia e o professor não tinha
essa paciência. O ensino que tem aqui, na minha opinião, lá não tem não. (Luiz An-
derson, 19 anos)

Percebemos com o discurso crítico do aluno que o comprometimento docente é um fator de


relevância. Tal comprometimento evidencia o respeito à dificuldade e necessidade do aluno res-
guardando o seu direito ao saber científico. De acordo com Freire (2002) a prática docente não pode
acontecer sem a generosidade, caracterizada também pela bondade, pois não há mais nada que
inferiorize a tarefa formadora do educador do que assumir em seu exercício pedagógico posturas
desrespeitosas e de avareza para com o seu educando.
Luiz Anderson pontua também outro fator de extrema importância no fazer pedagógico:

Lá (se referindo a antiga escola) certas turmas tem tempo vago e pode sair 09h30
(da noite) e libera. Aqui não, o horário é certo... A gente não tem nem tempo vago pra
ir embora. Depois das 9h00 (da noite) sempre tem alguma coisa, tem aula pra gente
ficar dentro da escola. Aqui é bom, porque como eu já falei, tem os professores que

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
são prestativos com os alunos e o colégio tem suas regras. Aqui o aluno tem que cair
na real que o que é regra é regra e tem que seguir. (Luiz Anderson, 19 anos).

A questão da regra, podendo ser interpretada também como limite, é algo aprovado e aceito por
Luiz dentro do universo escolar, visto como positivo para a prática pedagógica e para o seu aprendi-
zado. De acordo com Freire (2002) a indisciplina desequilibra o contexto pedagógico, prejudicando
assim o seu funcionamento. Observamos, portanto, que até os alunos mais jovens anseiam por uma
escola comprometida com a organização e disciplina, pois, conforme Freire (p.118) “a liberdade sem
limite é tão negada quanto a liberdade asfixiada ou castrada”.

2.5 AnAstáciA: A bUscA pelo desenVolVimento pessoAl


Nascida na Bahia, Anastácia, 58 anos, estudou no seu estado natal até o 5º Ano quando ainda era
criança. Veio para o Rio de Janeiro tentar uma nova vida, mas a gravidez precoce também a impos-
sibilitou de prosseguir com seus estudos na adolescência. Precisou trabalhar para sustentar sua filha
e somente no ano passado encontrou no AIACOM a oportunidade de retomar os estudos. Porém, os
muitos anos sem estudar e também com a falta de documentação comprovando sua real escolari-
dade, Anastácia se matriculou em 2013 na turma do 2º Ano. Atualmente a aluna está concluindo o
4º Ano do Ensino Fundamental com muito orgulho.

O que me motivou a estudar foi me profissionalizar. Saber escrever bem, a falar


direito, a pronunciar as palavras corretas e saber conversar com outras pessoas.
(Anastácia, 58 anos).

Percebemos que a motivação de Anastácia ao retomar os estudos está diretamente relacionada


a busca pelo aumento de seu capital cultural e social. Segundo Araújo (2003) Capital Social é a ca-
pacidade das pessoas estabelecerem laços de confiança interpessoal e redes de cooperação a partir
de instituições visando sempre o bem comum. E de acordo com Bourdieu (1979) Capital Cultural é
justamente a compreensão que o aluno tem da sua desigualdade de desempenho escolar oriundo
da classe social que ocupa. Logo, percebemos a ânsia de Anastácia em querer se desenvolver a par-
tir do contexto escolar, isto acontece porque para Bourdieu “a escola é um espaço de reprodução
de estruturas sociais e de transferência de capitais de uma geração para outra. É nela que o legado
econômico da família transforma-se em capital cultural.” (Revista Nova Escola, p. 03).
Percebemos, portanto, que a escola como instituição de ensino deve promover o aumento do
capital cultural dos seus educandos, como deseja à aluna Anastácia. Esta ampliação favorece uma
maior compreensão de mundo do aluno resignificando sua relação com o conhecimento, numa
perspectiva de inserção mais crítica e autônoma na sociedade. Conforme Freire (2002) a formação
intelectual do cidadão corrobora para a sua intervenção e compreensão da sua realidade. Neste
sentido, nenhuma prática educativa é neutra, a educação é sempre um ato politico e deve ser cons-
ciente e questionadora, promovendo mudança de pensamento e realidade dos alunos.
Anastácia continua seu relato destacando o que mais gosta da escola fazendo-a permanecer na
mesma:

E o que eu mais gosto do AIACOM são os professores, eles são muito educados,
são legais. A coordenação também é muito legal e são pessoas ótimas para tratar
com a gente de uma idade mais avançada que voltou a estudar. O carinho, o amor,
a dedicação e o respeito, tudo isso é muito bom e eu estou muito feliz de estudar aqui
e já estar no 4º Ano. Eu pretendo terminar meus estudos aqui! (Anastácia, 58 anos).

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Neste último relato compreendemos que a questão do afeto e do respeito à pessoa humana
prevalece como um forte oponente da evasão escolar, assim como destacado pela aluna Eliane. Os
alunos permanecem na escola muitas vezes pelas relações que são construídas ao longo do proces-
so. Relações de amizade, respeito e confiança que de acordo com Araújo (2003) em uma sociedade
cuja cultura valoriza e pratica a confiança interpessoal tende a prosperar de forma mais satisfatória.
Portanto, instituições que primem pela construção do capital social baseado na confiança tendem a
progredir para o bem comum de todos.

considerAções finAis
A pesquisa realizada analisou a narrativa de cinco alunos oriundos de classes populares do Colé-
gio AIACOM com vivências escolares pregressas até o presente momento. O objetivo foi observar e
perceber os elementos mais significativos que contribuíram para a permanência destes alunos na
escola compreendendo, portanto, o sentimento e as relações instituídas no interior da escola que
favorecerem para a baixa evasão desta realidade institucional.
A partir das narrativas individuais dos alunos em relação aos seus espaços de convivência no âm-
bito educacional, pudemos verificar que a escola como ambiente socializador e formador necessita
também repensar e valorizar as experiências dos alunos de EJA para manter sua função educativa:

A EJA como espaço formador terá de se configurar reconhecendo que esses jo-
vens e adultos vêm de múltiplos espaços deformadores e formadores onde partici-
pam. Ocupam espaços de lazer, de trabalho, cultura, sociabilidade, fazem parte de
movimentos de luta pela terra, pelo teto e pelo trabalho, pela cultura e pela dignida-
de (ARROYO, 2007, p. 25).

Assim, ao analisarmos os elementos mais significativos que contribuíram para a permanência


dos alunos na escola, percebemos que as relações de convivência e partilha de saberes foram de
suma importância para consolidar o sentimento de pertencimento e vinculo positivo com o saber
escolar e consequentemente com a instituição de ensino. Dentre as falas e observações dos alunos
em relação ao que lhes foram de mais expressivo para a continuidade da trajetória escolar, podemos
elencar o respeito, a confiança, equipe capacitada e comprometida, necessidade de regras e limites,
bom, rendimento, aumento do capital cultural e social.
Logo, investir nos laços de convivência, onde o respeito, a afetividade e o incentivo se fazem pre-
sentes, permitiu aos alunos da EJA não somente a se apropriarem das aprendizagens escolares de
modo crítico e original, mas também a se sentirem encorajados a dar continuidade aos seus estudos
numa perspectiva de ampliar sua compreensão e interação com o mundo. Deste modo percebemos
que grande parte da ininterrupção dos estudos do aluno de EJA está diretamente associada à rela-
ção diferenciada estabelecida entre os agentes do processo educativo com o saber construído no
ambiente escolar.

referênciAs bibliográficAs
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BRASIL, Lei nº 10.639, de 09 de janeiro de 2003. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/
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pecial p. 03 Outubro, 2008. Disponível em: http://revistaescola.abril.com.br/formacao/pierre-bour-
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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
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GADOTTI, Moacir. Educação de Jovens e Adultos: correntes e tendências. In: GADOTTI, Moacir; RO-
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VYGOTSKY, L. S. (1994) A formação Social da Mente. São Paulo: Martins Fontes.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
A releVânciA dA pesqUisA-Ação como metodologiA
AdeqUAdA pArA o ensino de língUA mAternA nA ejA
mAriA teresA gonçAlVes pereirA

O texto em questão é um recorte da pesquisa Ler, refletir, expressar: uma proposta de ensino da
Língua Portuguesa para a educação de jovens e adultos - EJA (PROCIÊNCIA/UERJ/ FAPERJ). Servimo-
-nos, para a pesquisa de campo, dos pressupostos da pesquisa-ação. Justifica-se tal metodologia em
virtude de facilitar, segundo Thiollent (2000, 8), “(...) a busca de soluções aos reais problemas para os
quais os procedimentos convencionais têm pouco contribuído”. Assim, desenvolveu-se um estudo
para tornar o saber linguístico um portal de entrada que garanta o êxito do indivíduo em seus proje-
tos de comunicação e, consequentemente, em outras práticas da vida quotidiana em que lance mão
da sua experiência com o texto. Numa pesquisa-ação crítica, a transformação se sustenta por uma
reflexão coletiva que paulatinamente vai assumindo ares de criticidade. A reflexão contínua sobre a
ação é essencial e instiga transformações. Os atos de reconstruir e reestruturar permanentemente
imprimem à pesquisa-ação um caráter pedagógico e, por conseguinte, político. Se o objetivo maior
é a melhoria das condições de comunicação, a pesquisa-ação surge como uma eficaz estratégia para
a resolução de questões nas aulas de Língua Portuguesa (Gramática, Leitura e Produção Textual) em
que as formas convencionais de intervenção mostram resultados pouco satisfatórios. O foco dessa
metodologia não está apenas no produto final da mudança, mas também nas mudanças que ocor-
rem durante o processo. Há uma flexibilidade metodológica imbuída de rigor científico vinculada
mais à coerência epistemológica do processo do que propriamente ao produto final. Os pesquisa-
dos têm de estar cientes de seu papel de pesquisados e consentir explicitamente em tal situação,
sendo participantes, colaboradores, comprometidos, indagadores, conscientes e lúcidos da dinâmi-
ca, dispostos a agir e envolvidos com o processo.

palavras-chave: EJA, Pesquisa-ação, Ensino da língua materna

comUnicAção - diVersidAde e edUcAção de joVens e AdUltos


Este texto é um recorte do Projeto de Pesquisa (UERJ/PROCIÊNCIA/FAPERJ) Ler, Refletir, Expressar:
uma proposta de ensino da Língua Portuguesa para a Educação de Jovens e Adultos (EJA), desen-
volvido na UERJ e no curso noturno do Colégio Santo Inácio, Botafogo, RJ. Dele participam 2 (duas)
bolsistas PIBIC (UERJ/CNPq).
Toda pesquisa ou diálogo do pesquisador com dados empíricos pressupõe um método, uma ma-
neira pela qual ele encaminha a investigação do seu tema de interesse. De acordo com Moita Lopes
(1994), a escolha de tal método ou metodologia se relaciona com a visão do pesquisador sobre a
realidade estudada. Entendo tal realidade como um processo dinâmico, que não pode prescindir
dos participantes. Ainda segundo Moita Lopes, o Projeto se inclui no paradigma da pesquisa inter-
pretativista, a que considera a realidade não independente do indivíduo porque é construída por
ele. Os fatos sociais são vistos como indissociáveis da figura do pesquisador. Ele é parte do processo
de conhecimento e interpreta os fatos, atribuindo-lhes um significado. Mesmo que sua visão seja
parcial, não se pode excluí-la do processo. À visão do pesquisador devem-se acrescentar outras para
que a intersubjetividade se realize através da triangulação das muitas vozes envolvidas na pesquisa.
Servi-me, para a pesquisa de campo, dos pressupostos da pesquisa-ação. Justifica-se tal metodo-
logia em virtude de facilitar, segundo Thiollent (2000, 8), “(...) a busca de soluções aos reais proble-
mas para os quais os procedimentos convencionais têm pouco contribuído”.

51
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Assim, desenvolveu-se um estudo para tornar o saber linguístico um portal de entrada que garan-
ta o êxito do indivíduo em seus projetos de comunicação e, consequentemente, em outras práticas
da vida quotidiana em que lance mão da sua experiência com o texto.
A pesquisa-ação é uma metodologia eminentemente pedagógica, de caráter formativo, que parte
de uma situação social concreta que precisa de transformação; por isso, pesquisa e ação caminham
imbricadas. Numa pesquisa-ação crítica, a transformação se sustenta por uma reflexão coletiva que
paulatinamente vai assumindo ares de criticidade.
Nesse sentido, ela não se afina com princípios positivistas de racionalidade, mas ultrapassa a com-
preensão e a descrição do objeto de estudo para transformá-lo. Não se limita às inferências lógicas
e estatísticas; é permeada de raciocínio do tipo inferencial com a presença da argumentação e do
diálogo entre interlocutores.
Franco (2005, 495) sintetiza a pesquisa-ação:
• pesquisa na ação;
• pesquisa para a ação;
• pesquisa com ação;
• pesquisa da ação;
• ação com pesquisa;
• ação para a pesquisa;
• ação na pesquisa.
Como há simultaneidade entre pesquisa e ação, Franco (2005, 496) sugere que a palavra “(...) de-
veria ser expressa em forma de dupla seta, ao invés de hífen: pesquisa«ação, de modo a caracterizar
a concomitância, a intercomunicação e a interfecundidade”.
A reflexão contínua sobre a ação é essencial e instiga transformações. Os atos de reconstruir e re-
estruturar permanentemente imprimem à pesquisa-ação um caráter pedagógico e, por conseguin-
te, político. A Pedagogia, como ciência da Educação, objetiva reflexão e transformação da práxis que
tenha como eixo saberes, frutos de indagações, diálogos, intencionalidades. Para uma metodologia
de caráter formativo e emancipativo como a pesquisa-ação, Franco (2005, 489) apresenta princípios
fundantes a serem contemplados no decorrer do Projeto:
• a ação conjunta entre pesquisador e pesquisados;
• a realização da pesquisa em ambientes onde acontecem as próprias práticas;
• a organização de condições de autoformação e emancipação aos sujeitos da ação;
• a criação de compromissos com a formação e o desenvolvimento de procedimentos críti-
co-reflexivos sobre a realidade;
• o desenvolvimento de uma dinâmica coletiva que permita o estabelecimento de referên-
cias contínuas e evolutivas com o coletivo, no sentido de apreensão dos significados cons-
truídos e em construção;
• reflexões que atuem na perspectiva de superação das condições de opressão, alienação e
de massacre da rotina;
• ressignificações coletivas das compreensões do grupo, articuladas com as condições sócio-
-históricas;
• o desenvolvimento cultural dos sujeitos da ação.
Desde que não se conceba ciência como sinônimo de positivismo, a pesquisa-ação é considera-

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
da uma investigação científica da prática educativa que se encaixa no paradigma qualitativo, apre-
sentando, segundo Franco (2005, 489-491), três dimensões: ontológica (conhecimento da realidade
social, do objeto de estudo); epistemológica (conhecimento da metodologia para intervenção na
realidade pesquisada e melhor pesquisar e formar os sujeitos num movimento dialético de pensa-
mento e ação, interpretando os dados num contexto real); e metodológica (conhecimento de pro-
cedimentos articuladores, dialógicos e transformadores).
Minayo (2002, 11) alerta que “(...) a cientificidade não pode ser reduzida a uma forma determinada
de conhecer; ela pré-contém, por assim dizer, diversas maneiras concretas e potenciais de realiza-
ção”. Thiollent (2000, 23) ainda acrescenta que “(...) todas as características qualitativas da pesquisa-
-ação não fogem ao espírito científico. O qualitativo e o diálogo não são anticientíficos”.
Como não se pode observar tudo ao mesmo tempo, é preciso limitar e definir o foco da pesquisa.
Trata-se de uma observação científica, sistemática, que possibilita à pesquisa validade, fidedignida-
de e eficácia; uma observação participante, na qual o pesquisador desempenha uma função que, no
caso desta pesquisa, é a de professor. Nas atividades do Projeto, ocupo-me de observações diretas e
indiretas, dependendo do papel na atividade.
Conforme sustenta Franco (2005, 491): o método “(...) deve contemplar o exercício contínuo de
espirais cíclicas: planejamento; ação; reflexão; pesquisa; ressignificação; replanejamento; ações cada
vez mais ajustadas às necessidades coletivas, reflexões e assim por diante...”.
Thiollent (2000, 22) observa que “(...) a pesquisa-ação não é constituída apenas pela ação ou pela
participação. É necessário produzir conhecimentos, adquirir experiência, contribuir para a discussão
ou fazer avançar o debate das questões abordadas”. Por tal razão, essa metodologia não se restringe
tão somente ao âmbito da Educação, sendo perfeitamente aplicável ao entendimento de outras
áreas do conhecimento, como o caso da proposta inserida no Projeto. Aliás, se o objetivo maior é a
melhoria das condições de comunicação, a pesquisa-ação surge como uma eficaz estratégia para a
resolução de questões pontuais nas aulas de Língua Portuguesa em que as formas padronizadas de
intervenção mostram resultados pouco satisfatórios.
A fase preliminar da pesquisa-ação é muito importante. É o momento da dinâmica de aqueci-
mento coletivo (inserindo-se aí o pesquisador) e do diagnóstico da situação para o planejamento.
Procura-se “quebrar o gelo” inicial, fazendo os elementos do grupo se conhecerem e esclarecerem
dúvidas sobre o “contrato” da pesquisa.
O foco dessa metodologia não está apenas no produto final da mudança, mas também nas mu-
danças que ocorrem durante o processo. Há uma flexibilidade metodológica imbuída de rigor cien-
tífico vinculada mais à coerência epistemológica do processo do que propriamente ao produto final.
Franco (2005, 488) pressupõe “(...) uma integração dialética entre sujeito e sua existência; entre fatos
e valores; entre pensamento e ação; e entre pesquisador e pesquisados”.
Embora haja um plano de ações a desenvolver, ocorre, em todo o processo, certa imprevisibili-
dade no tocante às estratégias porque o pesquisador é aquele que ouve os sujeitos e considera as
situações emergentes para, se preciso, redirecionar o planejamento.
Na realização das tarefas, o pesquisador só intervém quando necessário. Se o grupo não conse-
gue solucionar problemas, o pesquisador facilita o caminho para a descoberta de respostas. Ele tem
de conviver com a incerteza de situações dinâmicas, as quais estimulam a busca de soluções. Não se
pode dizer que há certezas absolutas, um saber total. Os saberes vão sendo r(e)construídos, tecidos,
num processo sem fim.
Para Philippe Perrenoud (1999, apud Franco, 2005, 497), o pesquisador deve “(...) agir na urgência
e decidir na incerteza”. Nessa mesma linha de pensamento está Morin (1999, 30-33) quando escla-
rece: “(...) o problema não é a substituição da incerteza pela certeza”. Afinal, adquirir conhecimentos
é andar por caminhos certos e incertos, ora separando, ora juntando fragmentos. Para este autor, o

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
pensamento não é linear nem simplificador. “Quando a simplicidade não funciona mais, é preciso
passar ao elo, à espiral, a outros princípios do pensamento.” Ademais, “(...) o problema não é reduzir
nem separar, mas diferenciar e juntar”. As ideias morinianas se ajustam aos estudos de Língua Portu-
guesa, que não funcionam quando se desvinculam os conteúdos de seu todo e também quando se
aplicam métodos homogêneos, desconsiderando a individualidade dos alunos.
Os pesquisados não são objetos inertes, não são cobaias, mas sujeitos ativos e conscientes das
transformações que ocorrem em prol de sua autonomia, detectadas desde os primeiros contatos
com o grupo e que se sustentam por uma reflexão coletiva que favorece a oportunidade de liberta-
ção do instituído, cristalizado, impossibilitando o sujeito de se emancipar. Em primeiro lugar, ocorre
uma mudança no olhar, instala-se uma vontade de superar os obstáculos que impedem a produção
do conhecimento e, em seguida, vêm as ações.
Esse enfoque vai ao encontro das propostas do pensamento de Edgar Morin (1999), que leva o
pesquisador à imersão na complexidade dos fenômenos, na visão de ordem e de desordem e na
não fragmentação do saber. Tais características se ajustam à escrita em busca da autonomização do
sujeito e de transformações que ocorrem, primeiro, dentro de cada um de nós, para depois haver
a mudança do mundo. Para Morin (1999, 34), “a reforma do pensamento tem uma consequência
direta no ensino e na pedagogia (...): é preciso reformar as instituições, mas se as reformarmos sem
reformar os espíritos, a reforma não serve para nada (...)”.
Um último comentário sobre a pesquisa-ação: os pesquisados têm de estar cientes de seu papel
de pesquisados e consentirem explicitamente em tal situação, sendo participantes, colaboradores,
comprometidos, indagadores, conscientes e lúcidos da dinâmica, dispostos a agir e envolvidos com
o processo. Ampliando o campo de conhecimento, são capazes de elaborar hipóteses sobre as suas
práticas, motivos de reflexão, para que não sejam específicas de sala de aula, mas transcendam os
muros da escola e se incorporem à vida desses sujeitos.
Certa ocasião, um professor levou para os alunos um texto de Raquel de Queiroz (2001) sobre
uma “casa de farinha”. Imediatamente muitos se manifestaram ao se lembrarem das próprias experi-
ências. Um rapaz até a desenhou no quadro, ajudado por outros. Surpreendi-me com a exatidão dos
detalhes e com o conhecimento demonstrado de sua funcionalidade.
Refleti (com os bolsistas PIBIC) mais tarde sobre aquela situação: quantos alunos dos cursos regu-
lares haviam visto “ao vivo” uma casa de farinha? Quantos sabiam para que servia ou como operá-la?
Quantos percebiam a sua importância cultural? Quantos ignoravam sua existência? Nós aprende-
mos, nos instruímos. Fomos aprendizes.
Muitos alunos da EJA são nordestinos, vindos para o Rio de Janeiro, na esperança de uma vida
melhor, de um futuro mais tranquilo. Trazem experiências arraigadas e se orgulham delas. Poucos,
querendo “ascender socialmente”, renegam as origens.
É fundamental, então, que um programa para a EJA considere as especificidades desses alunos,
adequando-o aos seus interesses. Naturalmente isso não pressupõe que lhes ofereçamos apenas o
que faz parte da sua realidade, mas também o que ainda não conhecem, acrescentando outras ex-
periências e situações, enriquecendo-os. Ao aproveitar o que trazem e dominam, cabe ao professor
administrar tal conhecimento, ampliando os horizontes num limite compatível com o contexto em
que se situam. A autoestima se ressignifica, ao se (re)conhecerem no que lhes é mostrado. A intera-
ção professor e aluno torna-se essencial porque, lembrando Guimarães Rosa, “professor é quem de
repente aprende”. Nada satisfaz tanto ao aluno como “ensinar” o saber que detém ao professor e ao
colega.
Tal “filosofia” deve acompanhar qualquer proposta metodológica que vise à EJA.
No início, tencionava entrevistar os professores, elaborando um questionário (com opção de ano-
nimato) que possibilitasse respostas no campo pessoal e profissional. Nos primeiros contatos com

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
os professores, percebi que tal expediente não lograria êxito. Escreveriam sucintamente ou se “es-
conderiam”; então, apostei no tête-a-tête, mesmo considerando as possíveis restrições a um “papo”
sincero. Na verdade, houve certa tensão. Existem muitas crenças em relação à dificuldade de expo-
sição dos professores – pelo receio do julgamento e da crítica – para seus pares e, principalmente,
para pessoas “de fora” do contexto de trabalho. O “pé atrás”, entretanto, durou pouco. Atualmente
mantenho boas relações com todos, uns mais, outros menos, pela própria personalidade de cada
um. Os resultados dessas conversas contribuem para selecionar teorias e para formular práticas. Não
tenho somente a pretensão de mostrar-lhes caminhos. Estimulados, me ouvem e apresentam suges-
tões relevantes para o trabalho, geradas por ações bem sucedidas. As dificuldades de abordagem
dos conteúdos gramaticais, da leitura e da produção textual devem ser enfrentadas em conjunto.
As conversas iniciais se mostraram muito proveitosas para me inteirar a respeito de como se apli-
cava e se desenvolvia o currículo de Língua Portuguesa no Curso Noturno do Santo Inácio, ajudando
a deflagrar concretamente o processo.
Importa, em relação à EJA, fundamentalmente, saber se o professor: 1) tem noção da especifi-
cidade do seu alunado; 2) comporta-se no seu ofício de acordo com tal percepção; 3) regula suas
ações teóricas e práticas no sentido de viabilizar o aprendizado com eficiência; 4) respeita o aluno
suficientemente, sem atitudes paternalistas, mas avaliando sempre seu esforço e limites individuais;
5) acredita que a Língua Portuguesa pode, por meio de pressupostos teóricos e práticas afins, relati-
vos à gramática, à leitura e à escrita, auxiliar na difícil, porém possível, escalada com vistas à inclusão
social do aluno; 6) tem consciência da magnitude de sua atividade docente.
A atuação do professor é determinante para o sucesso da proposta. A construção efetiva da prá-
xis é pessoal, mesmo que os fundamentos sejam passados, entendidos e incorporados, mesmo que
sugestões de atividades os acompanhem, que a esvolha da metodologia se revele adequada. É ne-
cessário que, em seu saber-fazer (Certeau, 1994), produza algo diferente, criando a partir das trocas,
forjando novas práticas, constituindo-se como sujeito educador, superando as adversidades do con-
texto, assumindo também a própria palavra. Não pode haver descontinuidade no trabalho, apesar
de conflitos e de dilemas.
António Nóvoa (1995, 36) ressalta uma questão central na discussão sobre a “formação” do pro-
fessor, oportuna em relação à EJA. Recomenda que “os professores se apropriem dos saberes de que
são portadores e os trabalhem do ponto de vista teórico e conceptual”. Do mesmo modo que a prá-
tica se enriquece com a produção teórica e metodológica que a informa, as práticas, em sua riqueza
e diversidade, também produzem teorias e metodologias em constante movimento.
Em pesquisas sobre a análise da conversação, Gumperz (1982) concluiu que o movimento con-
versacional é a base de todos os entendimentos linguísticos na conversação. Para ele, este é um
conceito que resulta da habilidade de se inferir o que é a interação e qual a participação esperada do
interlocutor. Tannen (1989) se aproxima dessa perspectiva ao afirmar que o envolvimento está liga-
do aos laços emocionais que os indivíduos estabelecem uns com os outros, bem como com coisas,
lugares, ideias, memórias e palavras.
Apostando no respeito e na sutileza de atitudes de ambas as partes, continuam (re)vendo práti-
cas estabelecidas e introduzindo novas, mesmo com mais trabalho a despender.
Conversas com os alunos sempre estiveram previstas, não só no grupo-turma, mas individual-
mente. Para obter resultados satisfatórios, o Projeto deve estar de acordo com todos os que dele
participam, refletindo anseios e objetivos (pesquisa-ação). Os alunos são mais expansivos, mais
abertos, se revelando, na maioria das vezes, por inteiro. Recebem-nos com entusiasmo e simpatia; a
frequência e a continuidade impedem que nos vejam como estranhos ou visitas. Conhecer suas ex-
periências e suas expectativas em relação à língua materna (Gramática, Leitura e Produção Textual)
colabora substancialmente para a elaboração do Programa.
Para uma mudança significativa, é fundamental registrar que se podem (e devem) reavaliar ou-

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
tras ideias e metodologias para acréscimos, substituições ou até eliminações, segundo observações,
conversas e/ou atividades com as turmas.

referênciAs bibliográficAs
CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano: artes de fazer. Petrópolis, Vozes, 1994
FRANCO, Maria Amélia Santoro. “Pedagogia da pesquisa-ação”. In: Educação e pesquisa, São Paulo,
v. 31, n.3, set./dez. 2005.
GUMPERZ, John. Discourse Strategies. New York. Cambridge University Press, 1982
LOPES, Luiz Paulo Moita. Pesquisa interpretativista em linguística aplicada: a linguagem como con-
dição e solução. Delta, vol. 110, n° 2, 1994
MINAYO, Cecília de Souza. “Ciência, técnica e arte: o desafio da pesquisa social”. In: MINAYO, Cecília
de Souza (org).; DESLANDES, Suely Ferreira; GOMES, Romeu. Pesquisa social: teoria, método e criativi-
dade. 21ª. ed. Petrópolis: Vozes, 2002.
MORIN, Edgar. “Por uma reforma do pensamento”. In: PENA-VEGA, Alfredo; NASCIMENTO, Elimar Pi-
nheiro (orgs). O pensar complexo: Edgar Morin e a crise da modernidade. 2ª ed. Rio de Janeiro: Gara-
mond, 1999
NÓVOA, António. “Formação de professores e formação docente”. In: Os professores e a sua forma-
ção. Lisboa. Dom Quixote, 1995
QUEIROZ, Raquel de. A casa de farinha In O caçador de tatu. São Paulo. Editora Siciliano, 1994
TANNEN, Deborah. Talking voices: repetition, dialogue and imagery in conversational discourse.
New York. Cambridge University Press, 1989
THIOLLENT, Michel Jean Marie. Metodologia da pesquisa-ação. 10ª ed. São Paulo. Cortez, 2000

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
AgricUltUrA fAmiliAr em contexto, UmA AlternAtiVA
de constrUção do conhecimento nA edUcAção de
joVens e AdUltos do cAmpo
Almir frAncisco de soUsA | Wbimári régiA ribeiro sAntAnA

A sala de aula do Sesc Ler de Acauã – PI, no que tange a EJA, é composta por homens e mulheres
provenientes do campo, que tem parte do seu tempo ocupado por serviços agropecuários realiza-
dos de forma rudimentar, numa região localizada no semiárido piauiense. Pensando no perfil dos
alunos, propôs-se um trabalho pedagógico que rompesse as paredes da sala de aula, fazendo um
paralelo entre o saber comum, construído através das vivencias dos alunos e o conhecimento cien-
tífico. O presente artigo propõe-se apresentar como se configurou o Projeto Pedagógico Irrigação
alternativa - sistema de irrigação com garrafa pet e equipo1 (novidade para região) usado como
experiência numa plantação de melancia na horta do Centro Educacional, a qual consideramos
um laboratório de experimentos agrários, de docentes e discentes, servindo como referência no
cotidiano dos alunos. O projeto foi realizado num longo período de escassez de água e trouxe à
tona discussões sobre o uso consciente da água e apresentou uma alternativa viável e sustentável
de produção de melancias para o período de estiagem. Esta ação teve como referencia um Projeto
realizado anteriormente, denominado Um pé de fruta no quintal, cujas ações foram norteadas pela
proposta Pedagógica do Sesc Ler e fundamentadas nos autores Gimonet (2007) e Caldart (2008)
que pensam na formação do educando a partir do meio em que vivem.

palavras-chave: Educação de Jovens e Adultos, Agricultura Familiar, Sustentabilidade

O Centro Educacional do Sesc Ler de Acauã – PI trabalha com Educação de Jovens e Adultos aten-
dendo a um grupo composto por homens e mulheres provenientes do campo, que tem parte do seu
tempo ocupado com serviços agropecuários realizados de forma rudimentar, numa região localiza-
da no semiárido piauiense. Pensando no perfil deste alunado, propôs-se um trabalho pedagógico
que rompesse as paredes da sala de aula, fazendo um paralelo entre o saber comum, construído
através das vivências dos alunos, no dizer freireano “o saber da experiência” e o conhecimento cien-
tífico.
Neste texto propõe-se apresentar como se configurou o Projeto Pedagógico Irrigação Alternativa
- sistema de irrigação com garrafa pet e equipo5, uma técnica nova para a região que foi usada como
experiência numa plantação de melancias na horta do Centro Educacional a qual é considerada um
laboratório de experimentos agrários, dos docentes e discentes da Unidade, servindo como referên-
cia de aprendizado no cotidiano dos alunos.
O projeto foi realizado num longo período de escassez de água, especificamente de setembro a
novembro de 2013 e trouxe à tona discussões sobre o uso consciente deste elemento indispensável
à vida, apresentando uma alternativa viável e sustentável de produção de melancias para o período
de estiagem.
A referida ação teve como referência um projeto realizado anteriormente, denominado Um pé
de fruta no quintal, cujas ações foram norteadas pela Proposta Pedagógica do Sesc Ler (2000) e
fundamentadas nas ideias dos autores Gimonet (2007) e Caldart (2008) que abordam a formação do
educando a partir do meio em que vivem, voltada para os próprios sujeitos.
Estes discentes contemplados na experiência moram em Acauã, um município que pertence à
região do semiárido piauiense que passa por um período de seca durante oito meses no ano e se-
5 O PROALFA é um programa do Centro de Educação e Humanidades-CEH, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – URJ

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
gundo o IBGE, censo de 2010, (IBGE, 2010) conta com uma população total de 6.749 habitantes,
destes 901 moram dentro do perímetro urbano, onde está instalado o Centro Educacional Sesc Ler.
Dentro desta perspectiva a Proposta Pedagógica do Sesc Ler (2000, p. 07) traz como um dos seus
objetivos “contribuir para a melhoria das condições de vida da população e facilitar seus meios de
aprimoramento cultural e profissional”. O que se entende que não basta trazer o aluno para dentro
de um espaço escolar, ambiente caracterizado, de maneira muito formal pela concepção tradicional
de Educação, por quatro paredes, um quadro de acrílico, pincel atômico e carteiras. É necessário
adotar situações metodologias que atendam as necessidades dos sujeitos, o essencial para se intera-
gir em práticas sociais reais que vivencia no dia a dias com o mundo formal e real em que ele habita.
Nesta visão, o presente relato busca discorrer sobre as práticas metodológicas que tiveram êxito
no decorrer do desenvolvimento do projeto Irrigação Alternativa, pensado para uma população que
apesar de estar morando em um perímetro urbano possui características do meio rural. Conforme
aponta o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais:

Se considerarmos como critérios de ruralidade a localização dos municípios, o ta-


manho da sua população e a sua densidade demográfica, conforme propõe Veiga
(2001), entre os 5.560 municípios brasileiros, 4.490 deveriam ser classificados como
rurais. Ainda de acordo com esse critério, a população essencialmente urbana se-
ria de 58% e não de 81,2%, e a população rural corresponderia a, praticamente, o
dobro da oficialmente divulgada pelo IBGE, atingindo 42% da população do país.
Dessa forma, focando o universo essencialmente rural sugerido pela proposta do
pesquisador, é possível identificar em torno de 72 milhões de habitantes na área ru-
ral. (BRASIL, 2007, p. 18)

Acauã é um destes municípios que aparece nas estatísticas como espaço urbano, mas se pensar-
mos em consonância com Veiga (2011) podemos chegar à conclusão que é uma cidade que poderia
ser vista, de acordo com suas características, como rural. O que justifica a relação dos alunos com a
agricultura familiar. Sendo assim, este trabalho tem como premissa norteadora relatar como se deu
a experiência do projeto Irrigação Alternativa desde a sua origem no contexto em que foi pensado
e desenvolvido.

breVe trAçAdo do perfil socioeconômico dos AlUnos mAtricUlA-


dos nA ejA no sesc ler de AcAUã
Os alunos da Educação de Jovens e Adultos matriculados no Centro Educacional Sesc Ler de
Acauã têm um traço de vida, origens, idade, vivências profissionais, históricos escolares, ritmos de
aprendizagem e estruturas de pensamentos muito diferentes, entretanto, tem um denominador
comum, perfis que são comuns. São pessoas que vivem em um mundo de trabalho voltado para a
agricultura familiar, vivem em sociedade, com responsabilidades sociais e familiares, com valores
éticos e morais formados a partir da experiência, do ambiente e da realidade cultural em que estão
inseridos e isso é levado em consideração neste processo educacional.
Oliveira (2004) diz que de acordo com a faixa etária do aluno da Educação de Jovens e Adultos se
configura uma diferença de interesses, a depender da idade.

O jovem tem um olhar para o futuro. Na transição da infância para a fase adulta
está ligado às inovações tecnológicas, aos modismos dos meios de comunicação,
ou seja, às mudanças que ocorrem no mundo. O adulto está interessado na vida

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
profissional, na sua inserção no mercado de trabalho, olhando para a sua situação
de vida presente. O idoso busca ser cidadão, viver a sua vida em sociedade, sendo
respeitado como pessoa e pelo seu passado, pela sua história de vida. Almeja viver
na sociedade com dignidade. (OLIVEIRA, 2004, p. 59-60).

A gama de interesses colocados acima, defendido por Oliveira vai ao encontro com
o perfil dos alunos do Sesc Ler de Acauã e seus anseios. É uma turma composta na sua maioria por
pessoas do grupo da segunda e terceira idade, como mostra o gráfico A, que tem urgência em um
aprendizado que faça sentido. Para este público, a escola não deverá ser feita de conteúdos que
possam auxiliá-los só no futuro, mas necessariamente, no seu presente.

GRÁFICO A
Dados embasados nas fichas de matrículas 2013

Os alunos que frequentam esta modalidade de ensino pertencem a uma classe social de baixa
renda, a maioria vive com menos de um salário mínimo, um total de 80% dos alunos. Os que rece-
bem em torno de um salário ou mais estão no grupo dos aposentados, estes estão na escola em
busca de respeito e prestígio social, alcançados através do uso e apropriação da leitura e escrita,
como é o caso do Sr. Joaquim, 74 anos, aluno do Ciclo II que questionado sobre o porquê de ainda
estar estudando, nos emocionou dizendo:

Professor, eu estudo para mostrar as pessoas que sou capaz de ler uma carta, con-
tar um dinheiro, identificar o nome de uma rua, que apesar de não ter tido oportu-
nidade de estudar quando criança pois tinha que trabalhar para ajudar meus pais,
ainda posso fazer parte desse mudo letrado. (Depoimento, 17 de junho de 2014).

Os demais que vivem com renda inferior a um salário são serventes, trabalhadoras domésticas,
diaristas, lavadeiras de roupa, ajudante de pedreiro e todos além das atividades citadas se dedicam
à roça, à agricultura familiar de subsistência, que serve para o sustento da própria família. Vale lem-
brar que o pico destas atividades agrárias é desenvolvido no inverno, período em que corresponde
a um terço do ano, o que não houve nestes últimos, deixando esta região localizada no semiárido
piauiense em estado crítico por falta de água.
Assim se percebe um elemento fundante para o pensar, planejar, elaborar e desenvolver o projeto
Irrigação Alternativa que teve como objetivo central estudar em cunho de pesquisa a aplicação de
um sistema de irrigação alternativa utilizando garrafa pet e equipo, novidade para a região, refletin-
do sobre possibilidades de convivência com o semiárido e desenvolvendo atividades relacionadas
à agricultura no período de escassez de água.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
configUrAção do projeto irrigAção AlternAtiVA
Uma das principais características do êxito desta ação de vinculação dos processos de ensino-
-aprendizagem com a realidade social refere-se à construção de estratégias pedagógicas que sejam
capazes de superar os limites de sala de aula, construindo espaços de aprendizagem que extrapo-
lem esta limitação. Neste sentido a Proposta pedagógica do Sesc Ler (2000) sinaliza que:

Nessa perspectiva, os conteúdos deixam de ser um fim em se mesmo, ganham


significados diversos a partir das experiências sociais do grupo e passam a ser meios
para ampliação do universo do aluno, mediando o seu contato com a realidade de
forma crítica e dinâmica. Além disso, são estudados de maneira flexível e abrangen-
te, libertos de uma concepção rígida de sequenciação e hierarquização, o que permi-
te um tratamento diferenciado, de acordo com o perfil dos alunos. (Sesc, 200 p. 24)

As orientações expressas na proposta pedagógica do Sesc fazem ponte com o pensamento de


Caldart (2009), quando defende uma proposta de educação dos sujeitos do campo, onde seja vista:

Uma educação que seja no e do campo. No: o povo tem direito a ser educado no
lugar onde vive; Do: o povo tem direito a uma educação pensada desde o seu lugar
e com a sua participação, vinculada à sua cultura e às suas necessidades humanas e
sociais (CALDART, 2009, p. 149).

Esta fala de Roseli Caldart lembra o nascimento do projeto esmiuçado neste relato que aconteceu
da seguinte forma: em uma de nossas aulas conversando sobre o problema da falta de água em que
o município atravessava naquele momento, Dona Maria Vitalina, 58 anos e aluna da Alfabetização,
pediu a fala e expôs uma preocupação: “professor estou preocupada com os pés de fruta plantado
em nosso quintal, eles ainda estão novinho, precisam de água e nesse tempo seco, sei não.” Ela fala-
va de um pé de caju enxertado plantado no quintal dela e de outras variedades frutíferas regionais
plantadas nos muros dos outros colegas, resultado de um projeto pedagógico sobre agricultura
denominado Um pé de fruta no quintal, desenvolvido anteriormente pelo Centro Educacional do
Sesc Ler de Acauã.
Neste momento, impactado com a preocupação de Dona Maria Vitalina, seu Irenio, 44 anos, alu-
no do Ciclo I, relata o que fez em um ano de inverno fraco para salvar uma rama de abóbora e con-
seguir colher frutos: “ano passado salvei uma rama de abóbora porque furei uma lata e coloquei ela
fixada próximo ao tronco. Todos os dias enchia a lata e deixava derramando”. Esta conversa colocou
a possibilidade de entender que o aprendizado flui quando deixamos de lado o individualismo. O
conhecimento é construído a partir do momento em que saímos do isolamento e damos possibi-
lidade para a troca, a interação com o outro, quando levamos em consideração a bagagem que o
aluno traz abarrotada com suas vivências, neste caso conhecimentos extraídas do meio rural, do dia
a dia, do cotidiano do aluno.
Foi neste clima de conversa e de diálogos de experiência que nasceu a ideia de construirmos um
sistema de irrigação que pudesse ser eficaz, sustentável e atendesse às preocupações da Dona Maria
Vitalina a partir da reformulação da ideia de seu Irenio, colocando-a em confronto com o conhe-
cimento científico, formal, onde ambos pudessem se somar e se complementarem. Dessa forma o
sistema de irrigação foi testado em uma plantação de melancia na horta do Centro Educacional a
qual consideramos um laboratório de experimentos agrários.
As questões citadas impulsionaram o pensar, o planejar, o preparar e o executar do projeto, pois
estas situações vivenciadas pelos alunos estão em conformidade com a opinião do educador Paulo

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Freire, citado por Gimonet, quando diz que a boa formação deve “conceber um método que seja
também o instrumento do aluno e não somente do educador e que identifique o conteúdo da
aprendizagem com o processo mesmo da aprendizagem” (FREIRE, 1999, apud GIMONET, 2007, p.28).
Inicialmente elaboramos o Projeto Pedagógico com a participação dos alunos e partimos dos
conhecimentos já trazidos por eles para a elaboração do nosso experimento - sistema de irrigação
com garrafa pet e equipo. Para a construção de tal engenhoca havia ao nosso dispor vasilhames
descartáveis com capacidade de volume para 5 litros, e equipo, vale ressaltar que neste caso o equi-
po é novo, não era reutilizado.
Nossa missão no primeiro momento foi descobrir qual a vazão do gotejamento para fazer com
que o recipiente de 5 litros mantivesse a cova de melancia regada por dois dias. Nossos dias de rea-
bastecimento dos recipientes eram segunda, quarta e sexta feira, para isso fomos descobrir quantas
gotas continham em um litro de água e quantas gotas por hora tinha que cair da mangueirinha do
equipo na cova de melancia. Descobrimos usando como base para cálculo um recipiente de 10 ml
que um litro tem aproximadamente 10.000 gotas e que com essa estrutura de sistema de irrigação
por gotejamento, a vazão tinha que ser em média 1.040 gotas por hora para que a melancia fosse
saciada por 48 horas. Esta etapa provocou muitas inquietações e dialogou com o espaço da sala de
aula e da horta do Centro Educacional, conforme fotos abaixo.

Foto 1 – Construção do sistema de irrigação. Fon- Foto 2 – Sistema de Irrigação implantado.


te: Arquivo do Centro Educacional Fonte: Arquivo do Centro Educacional

Em seguida fomos discutir o espaçamento entre uma cova e outra de melancia. Nesse momen-
to o Sr. Antonio Filho, 50 anos, aluno da Alfabetização colaborou com a sua experiência dizendo
que: “de uma cova de melancia para outra mede dois passos”. Então questionamos com os alunos
e alunas: qual a relação entre passo e metro? Quem tem a razão? O Sr. Antonio Filho pautado em
sua experiência que diz que o espaçamento é de dois passos ou os pesquisadores da Embrapa - Em-
presa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, que afirmam que o ideal é que esse espaçamento seja de
2 metros? Para responder esta problemática fomos verificamos que um passo do Sr. Antonio Filho
equivale a um metro, conferindo, portanto, que as duas orientações: a da experiência do aluno e a
dos pesquisadores da Embrapa falavam da mesma proporção, situação em que discutimos as diver-
sas origens do conhecimento.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Foto 3 – Estudo comparativo do espaço para a plantação.
Fonte: Arquivo do Centro Educacional
Mais uma experiência discutida entre o grupo durante nossos aprendizados foi o de dona Isabel
Perpetua, 48 anos e aluna do Ciclo II, destacando a quantidade de sementes para cada cova. Se-
gundo ela o número ideal são quatro sementes. A partir daí fomos buscar respostas. Por que esse
número e não outro? Todos pensam dessa forma? E por esta linha de raciocínio fomos seguindo na
nossa tarefa de pesquisar.
Outras contribuições referenciadas no cotidiano dos alunos surgiram, dando suporte à troca de
experiências, possibilitando a construção do conhecimento sistematizado. Como é o caso da expla-
nação de dona Raimunda, 59 anos, aluna da Alfabetização, ao se referir sobre a adubação da planta-
ção de melancia: “o bom para os pés de melancia crescer rápido e produzir é colocar ciscalhadas que
ficam após as enchentes”. Outros colocaram a opção do esterco.
Já falando sobre inseticidas naturais Maria Antonia, 47 anos, Ciclo I, disse: “podemos plantar co-
entro próximo aos pés de melancia, o cheiro forte dessa erva é um repelente natural de insetos”. Uma
discussão ia puxando outra, evitando a entrada no estado de inércia e cumprindo com a real finali-
dade de aplicação do projeto apoiada na visão de
Paulo Freire que diz:

Uma visão de alfabetização que vai além


do ba, be, bi, bo, bu. Porque implica uma com-
preensão crítica da realidade social, política e
econômica na qual está o alfabetizando [...] a
alfabetização é mais, muito mais que ler e es-
crever. É a habilidade de ler e escrever o mun-
do, é a habilidade de continuar aprendendo e
é a chave da porta do conhecimento (FREIRE,
1992 apud BARRETO, 2013, p. 01).

A horta do Centro Educacional, espaço


utilizado para pesquisas de cunho agrário tem o
Foto 4 – Plantio de melancias.
equivalente a 400 metros quadrados de área des-
Fonte: Arquivo do Centro Educacional tinada ao plantio de hortaliças, árvores frutíferas
e plantas medicinais. Deste espaço foi utilizada

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
uma área de 25 metros quadrados para o plantio de melancias e teste do sistema de irrigação. Em
diálogo em sala de aula baseando-se na experiência de Antonio Filho e no que dizem os pesquisa-
dores da Embrapa em relação ao espaçamento das covas de melancias, descobrimos que tínhamos
espaço suficiente para plantar três covas de melancia. Para esta descoberta os alunos se apoiaram,
mediante a situação problema lançada para resolução através do cálculo mental, escrito e o uso da
calculadora. Para suprir a necessidade das plantações de melancias foram construídas três unidades
do sistema de irrigação caracterizado por gotejamento.
Todo o processo de construção, trato, cultivo, colheita e monitoramento foram feitos pelos pró-
prios alunos, através do diálogo entre a sala de aula e o espaço da horta, situações em que a prática
social da leitura e da escrita foram fundamentais para a pesquisa enquanto busca do conhecimento
e registro das observações feitas. A reposição da água era feita a noite no momento das aulas. O
experimento nos proporcionou a colheita de seis melancias pesando em média 5 quilos cada uma,
conforme fotos a seguir.

Foto 5 – Colheita das melancias. Foto 6 – Momento de degustação dos frutos. Fon-
Fonte: Arquivo do Centro Educacional te: Arquivo do Centro Educacional

O trabalho com Educação de Jovens e Adultos é uma atividade complexa, pois se trata de sujeitos
que já possuem uma formação prática, como é o caso do agricultor (a), enfatizado ao longo desta
escrita. São pessoas possuidoras de saberes construídos ao longo da vida que têm condições de tor-
nar esta complexidade, chamada de processo educativo, em uma atividade pedagógica produtiva
e significativa.
As práticas pedagógicas se sustentam quando rompem as paredes de sala de aula e se torna algo
significativo, útil e com sentido para o aluno, se configurando em uma prática educativa, onde o pro-
cesso de construção do conhecimento está integrado à vida social do aluno, assimilando o que a te-
oria diz sobre o saber adquirido ao longo de suas vivências, fazendo conexão à sua prática, sua vida.
Inspirados na Pedagogia da Alternância e apoiados em um de seus principais defensores teóricos,
Gimonet é possível perceber que a aplicação deste projeto significou, sobretudo

Uma outra maneira de aprender, de se formar, associando teoria e prática, ação


e reflexão, o empreender e o aprender dentro de um mesmo processo. Ou seja, sig-
nifica uma maneira de aprender pela vida, partindo da própria vida cotidiana, dos
momentos experienciais, colocando assim a experiência antes do conceito. (GIMO-
NET 1999, p. 44).

Dentro desta perspectiva colocada por Gimonet, de aprender pela vida, partindo da própria vida

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
cotidiana e defendida pelos protagonistas deste trabalho é possível identificar elementos que in-
dicam e conduzem a um pensamento positivo acerca da aplicação do projeto. Estes indícios estão
presentes na fala de Maria Filha, 46 anos, Ciclo II quando diz: “tinha que ir para a roça todos os dias
aguar uns pés de pimentão que tenho na minha horta, mas agora vou colocar um negócio desses”,
referindo-se ao sistema de irrigação em suas plantas. Em outro momento entra Dona Maria Vitalina
demonstrando novas aprendizagens em relação ao início de aplicação do projeto, ela diz: “vou colo-
car esse sistema lá no meu pé de caju, agora não faz perigo dele morrer. E é bom que não desperdiça
água”.
Outro depoimento importante que marca como resultado deste processo e reforça a importância
do entrelaçar dos conhecimentos formal, informal e não formal é o de seu Irénio, que agora diz: “se
eu tivesse conhecido esse sistema antes teria salvo mais pés de abóboras”.
A colheita das melancias foi o principal indicador do resultado positivo do experimento, com-
provando que o funcionamento do sistema de Irrigação foi de fato funcional. As melancias foram
servidas num lanche para a turma, considerado um momento de culminância do projeto.

considerAções finAis
A nossa intenção pedagógica tem se fortalecido no sentido da apropriação e produção do co-
nhecimento, reconhecendo a escola como lugar de formação humana, respeitando os princípios e
traços culturais dos nossos alunos, abrindo espaço para o desenvolvimento de projetos como esse
que visualiza o aluno a partir do lugar de suas vivências, um dos eixos do trabalho pedagógico. O
projeto Irrigação Alternativa, foco deste trabalho, apresentou em nosso modo próprio de entender
o desafio de conceber suas ações e reflexões voltadas para o lugar em que os sujeitos estão inseri-
dos, pensando onde os pés pisam com vistas em uma prática original e includente.
Esta experiência nos chamou a atenção para a nossa condição de aprendente enquanto profes-
sor em sala de aula. A fala dos alunos contribuiu para nos apontar significativas pistas ao aprimora-
mento dos projetos. É na escuta dos alunos que precisamos focar o nosso saber ouvir e enxergá-los
como fundamental no processo de definição de conteúdo e currículo a partir de suas necessidades
de aprendizagens.

referênciAs
BARRETO, Vera Lúcia de Queiros. Paulo Freire e a Educação. Disponível em http://www.itd.org.br/
img/capacitacao/3a_capacitacao_itd_2011:_bases_epistemologicas_freireanas_para_a_alfabetiza-
cao_de_jovens_e_adultos_19/CAPACITACAO_19_2013-04-11_17-16-16.pdf
BRASIL, Ministério da Educação. Caderno Secad. Educação do Campo: diferenças mudando
paradigmas/A educação no meio rural brasileiro: diagnóstico. Brasília 2007. Disponível em: http://www.
red-ler.org/educacaocampo.pdf
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Média e Tecnológica. PCN + Ensino Médio:
Orientações Educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais - Ciências da nature-
za, matemática e suas tecnologias. Brasília, 2002.
CALDART, Roseli. Por uma educação do campo: traços de uma identidade em construção. In: AR-
ROYO, Miguel, CALDART, Roseli, MOLINA, Mônica C. (Orgs). Por uma educação do campo. Vozes: Petró-
polis/RJ, 2009.
GIMONET, Jean-Claude. Praticar e compreender a Pedagogia da Alternância dos CEFFAS. Petrópolis,
RJ: Vozes, 2007.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e
Terra, 1996 (Coleção Leitura)
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo 2010 - disponível em: http://www.ibge.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010/tabelas_pdf/total_populacao_piaui.pdf
OLIVEIRA, Ivanilde Apoluceno. Princípios pedagógicos na educação de jovens e adultos. Revista da
Alfabetização Solidária, v.4, n.4, São Paulo: Unimarco, 2004.
SESC, Serviço Social do Comércio. Proposta Pedagógica do Sesc Ler, Rio de Janeiro, 2000;
SESC, Diretrizes para a Orientação Pedagógica do Projeto Sesc Ler, Rio Janeiro, 2003.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
como desenVolVer Um trAbAlho qUe reAlmente fAçA
diferençA?
AmAndA pinto rodrigUes dA costA silVA

Como desenvolver um trabalho que realmente faça diferença? Como “atingir” de forma eficaz
o aluno? O que utilizar na prática de sala de aula? A teoria tão difundida nos centros acadêmicos
ajuda? Este artigo propõe uma reflexão acerca destas questões. Através de algumas experiências
de trabalhos realizados por mim, nestes anos a frente de uma turma de PEJA I, com uma diversida-
de inegável: alunos com baixa autoestima, com dificuldades extremas, com medo do novo e sem
perspectiva de um dia ter sua vida renovada, tiveram um bom desempenho através de atividades
de acolhimento, dinâmicas e outros. É inegável que não existe uma fórmula pronta para todos.
Mas com certeza um bom embasamento teórico integrado a um desenvolvimento de práticas dife-
renciadas e um envolvimento profissional atrelado a uma ‘alegria natural’ ao realizar o trabalho faz
toda a diferença. A motivação, a mudança necessária em qualquer atividade não pode faltar, assim
como a cooperação e a elaboração de uma meta principal comum a todos, pois juntos somos mais
fortes. Pretendo fazer uma ponte entre alguns autores e as práticas por mim adotadas, que por
muitas vezes foram executadas devido à sensibilidade de perceber o outro e a sua necessidade real
em cada momento. Para o aluno do PEJA/EJA a escola aparece como a solução de seus problemas
e nem sempre essa solução imediata é possível. No entanto um direcionamento, um novo horizon-
te realmente é possível se instituir. Há alguns anos um aluno escreveu uma frase pra mim assim:
“Obrigado por ter aberto meus olhos e me ensinado a enxergar as letras e ler”. O professor tem uma
grande influência, um poder em relação aos seus alunos e por isso o cuidado deve ser redobrado.
Uma fala errônea para quem já se sente desvalorizado pode tornar-se uma sentença de desistência
sem retorno.

palavras-chave: sensibilidade, práticas diferenciadas, embasamento profissional

Pensando na estrutura educacional e nos tempos atuais onde há um dinamismo, nas quais os
alunos do Peja sentem extrema dificuldade de se inserir, busco neste artigo relacionar algumas das
atividades nas quais obtive sucesso. Meus objetivos são:
• Contribuir de forma clara e objetiva com o trabalho de alfabetização de profissionais da
EJA;
• Gerar uma reflexão acerca da importância do relacionamento professor aluno principal-
mente com os alunos do Peja;
• Evidenciar a necessidade real não só de se trabalhar o conteúdo em si, mas sim a autoesti-
ma de cada aluno para que o mesmo tenha possibilidade de prosseguir a sua caminhada
rumo ao crescimento do conhecimento.
Selecionei algumas atividades vinculadas ao meu propósito.

AUtoestimA em foco
Uma das dificuldades encontradas nos alunos é a autoestima. O importante é criar um espaço
acolhedor onde ele perceba que faz parte de um grupo, que também está com os mesmos anseios.
Logo é necessário dinâmicas variadas para manter a coesão do grupo.
A primeira é a “TEIA” na qual os alunos são colocados em círculo e em pé. Com um rolo de bar-
bante, deverão segurá-lo na ponta e entregá-lo a outro, que fará o mesmo, sem soltar até formar a

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
teia .Então se conclui que somos um grupo e como tal todos são importantes. Em seguida a teia tem
que ser desfeita sem perder a ponta do barbante, superando as dificuldades que aparecem.
A segunda é a dinâmica das mãos “Minhas mãos, suas mãos, nossas mãos”, na qual deverão for-
mar grupos de 3 ou 4 alunos, tomando como base o tamanho das mãos dos mesmos. Os grupos
devem conversar descobrindo quais as metas em comum para o ano ou período que se inicia. Cada
grupo receberá uma letra ou cor e deverá expor as três metas comuns, fazendo registro para futuras
consultas.
Complementando essas atividades, pode-se atrelar a ideia de mudança, lançando o desafio “Tem-
pestade de ideias” no qual o aluno cita o que ele quer que mude em sua vida.
Outra atividade é a apresentação de vídeos de incentivo como, por exemplo, “corrente do bem”,
no qual a gentileza é atribuída a cada pessoa que aparece, sem cobranças. No final aquele que inicia
a corrente é contemplado com a gentileza a que ele começou.
Outro recurso é fazer círculos onde no centro conste a turma em questão se for de forma coletiva
ou a palavra EU se for individualmente. Devem-se colocar as prioridades para aquele período, se-
guindo da mais próxima a ser alcançada até a mais distante.
Para o aluno do Peja, há uma linha tênue entre o conseguir e o fracassar. Qualquer motivo pode
ser considerado como razão para deixar a escola. Logo o profissional precisa ter todo um preparo
para direcionar, contornando as dificuldades deixando claro que tudo é fruto de um processo.
A mudança de condição do individuo dentro da sociedade está atrelada a mudança interna so-
frida a partir de novas experiências. Por isso é incontestável a valorização da autoestima no ser hu-
mano.

Valorizar o que o aluno já sabe é de suma importância, além de incentivar cada trabalho realizado,
aguçar o debate e a expressão oral.
Certa vez, um aluno apresentava resistência para ler e escrever. Depois de trabalhos e conversas,
começou a tentar e me deu um bilhete. Estava: “Obrigado por ter aberto meus olhos e me ensinado
a enxergar as letras e ler”. Fiquei sem palavras. O aluno falou de sua experiência, compartilhando
com os outros suas angústias e conquistas e disse: “Eu estava cego e agora consigo ver”. O fato re-
forçou mais ainda a ideia do poder de persuasão, mesmo que de forma involuntária do profissional
de educação.
Casarini (2006) diz que:

“Para a construção da auto-estima é necessário buscar (...) criar um cli-


ma de confiança que faça com que a pessoa sinta-se aceita, compreendida e
respeitada(...).”(p.13)

Percebe-se a importância de se propiciar um ambiente agradável e acolhedor. Sugiro então a


leitura de Militão, Albigenor & Rose (2006) que dão várias sugestões com mais de 90 técnicas que
ajudam a conduzir encontros em grupo. Com as devidas adaptações à nossa realidade, é uma exce-
lente contribuição.

mUitAs letrAs: e o AlfAbeto entrA onde?


Pequenos textos em que as letras e palavras, possam ser lidas de forma completa devem ser tra-
balhados. Pensando assim, utilizei-me deste recurso, abordando questões de interesse coletivo.
Percebi que não dominavam a noção do alfabeto e falavam sobre saúde e frutas. Resolvi fazer

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
fichas nas quais constavam as frutas e seus respectivos nomes. A tarefa era ler o nome da fruta que
estava na carteira e achá-la na mesa, fixando-a no quadro. Então pude explorar a primeira letra das
palavras, a última, quantas vogais, quantas consoantes, quais palavras começavam com a mesma
letra, entre outros, sendo confeccionada a caixa das frutas. E aí surgiu a ideia de trazer uma poesia
intitulada SALADA DE FRUTAS, de Alba de Castro Toledo, no qual trabalhei diversos conceitos que se
desdobraram em várias aulas. Veja o texto apresentado:
SALADA DE FRUTAS
Já comeu a salada de frutas da Clarissa?
Não?/Você não sabe o que é delícia!
Tem manga rosa/ Amarelinha...
Tem maçã verde,/ Mas madurinha.
Banana prata,/ Mas bem molinha.
Laranja-lima/ Doce de mel.
Abacate maciinho/ E morango bem fresquinho!
Hum...é uma delícia./ A salada de Clarissa!
Com sorvete então/ Que coisa louca!
Já estou com água na boca./ Você não?

Assim pude localizar os nomes das frutas, explorar a diversidade de suas espécies, o gênero tex-
tual, as letras que fazem parte da palavra salada, bingo de frutas, quantidades, gráficos, tabelas e
pesquisa das frutas prediletas dos alunos, as suas safras, as vitaminas encontradas, receitas e outros.
O retorno, ou seja, o feedback foi rápido. Os alunos passaram a fazer compras relacionando as
noções na prática. Neste momento é possível utilizar-se da Arte, com o quadro de Tarsila do Amaral,
A feira II, pedindo que façam a lista de compras, inclusive colocando os preços.
Freire cita:

“Precisamos contribuir para criar a escola que é aventura, que marcha, que não
tem medo do risco, por isso recusa o imobilismo. A escola tem em que se pense, em
que se cria, em que se fala, em que se adivinha, a escola que apaixonadamente diz
sim à vida” (Paulo Freire. 1997,p.42)

Construir o alfabeto com a turma também é uma ótima atividade. Pesquisa de letras e/ou pa-
lavras em jornais e revistas assim como encartes de supermercado, frases enigmáticas, leitura de
avisos, propagandas, anúncios, cardápio entre outros dão resultado.

o qUe tem A Ver portUgUês, ciênciAs, geogrAfiA, históriA e mAtemá-


ticA com A AlfAbetizAção?
Tudo. Quando se fala, em questões ambientais, percebe-se a amplitude deste tema havendo
uma integração praticamente perfeita entre todas.
A princípio apresentar o globo terrestre, mapas para visualizar o planeta, falando da questão da
água, remetendo-nos a sustentabilidade do mesmo, fazendo com que o aluno perceba através da
imagem cartográfica a quantidade maior de água apresentada na Terra e levá-los a um debate. Víde-
os como o da “Carta 2070”, filmes como o dia depois de amanhã, entre outros para reflexão.
Com todas essas ideias abordei o texto “Se essa rua fosse minha” de Eduardo Amos (2002). Ele
segue assim:

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Se essa rua fosse minha/Se essa rua fosse minha,
não teria poluição./Não teria barulho demais,
nem lixo jogado no chão./Carro soltando fumaça
não passaria por lá./Ônibus, moto e caminhão
Barulhento, nem pensar./Papel de bala e palito
De sorvete, a gente jogaria no lixo./Um cesto perto da cada poste.
Seria uma rua limpinha,/se essa rua fosse minha.
Com ele pode-se trabalhar em Português: poema, ortografia e gênero textual. Em Ciências: a
questão da poluição, lei que multa quem joga o lixo no chão e os maus tratos à natureza. Em Geo-
grafia: a rua, seus nomes e mapas. Em História: o seu bairro e o da escola. Em Matemática: sequência
numérica e medidas.
E ainda pode-se realizar uma produção textual colocando em pauta: O que eu gostaria que a rua
onde moro tivesse? As respostas que apareceram com este exercício foram: uma rua com parquinho,
um campo de futebol, mais segurança, uma padaria entre outras, passíveis de serem realizadas.
Certa vez, em uma atividade no centro da cidade, junto com minha coordenadora pedagógica le-
vamos duas senhoras. Uma delas não sabia pegar ônibus e nunca havia andado no metrô. Veio para
a escola porque estava com depressão. E hoje? Está no processo de alfabetização, mas como mudou!
Passou a fazer artesanato, ginástica, dançar e está procurando um emprego de meio período.
Há algum tempo visualizamos algumas telas como Operários, de Tarsila do Amaral, Relativity de
Escher, entre outros, nos quais houve a leitura das imagens e a interpretação das mesmas, com de-
bates e visita ao museu numa exposição de Maurício de Souza, acerca de como ficariam os heróis
daqui a alguns anos. Foi muito interessante, pois se observou a questão dos pontos de vista de cada
um. CDEF cita R. Tal. O Globo (2007):

“O propósito da arte não é mudar o mundo ou desafiar a política. Se inutilidade


significa que não há resultado mensurável e positivo, a arte é certamente sem uti-
lidade. Ela deve desafiar as crenças das pessoas e seus hábitos estéticos. Ela pode
fazer você questionar a si próprio e o modo pelo qual vê o mundo. Individualmente,
a arte tem um poder mágico e encantador” (p.123)

A arte fez parte integrante de atividades propostas e realizadas por mim. Devido o lançamento
do filme O mágico de Oz, li a história e trouxe a primeira versão do filme. Houve debate acerca dos
personagens. Muitas vezes procuramos algo que já temos, mas não conseguimos enxergar isso. En-
tão a mensagem foi valorizarmos o que somos e acreditarmos em nós mesmos. Era época de Natal
e propus que fizéssemos uma apresentação teatral. As colegas das outras turmas também abraça-
ram a ideia. Foi um sucesso. Então se pergunta o que O mágico de Oz tem a ver com o Natal? Tudo
depende mais uma vez do olhar sensível que se tem das situações. O que se pretendia era passar
de forma prazerosa a mensagem de que podemos buscar dentro de nós mesmos o que precisamos
em vez de tentar procurar a vida inteira algo achando que não somos capazes. No Natal geralmente
as pessoas param e refletem sobre sua conduta diante da vida, portanto não havia momento mais
propício de se desenvolver esta atividade. Então se pode questionar: O mágico de Oz é uma história
para criança sendo usada com adultos? Como assim? A ideia principal trabalhada encaixa-se para
qualquer faixa etária, além de ser um clássico. Foi uma oportunidade que contribuiu grandemente
para a formação desses cidadãos.
Em outra ocasião falando sobre a questão da escravidão e suas consequências, onde foi passada
parte do primeiro e do último capítulo da primeira versão de Escrava Isaura além da abertura, apre-
ciando os quadros de Debret.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Ainda falando de cultura, tanto dos africanos quanto dos indígenas vários trabalhos podem ser
sugeridos. Cartazes com as palavras, suas origens e significados, os costumes de cada cultura, os
hábitos que adquirimos de cada cultura, entre outros, além de leitura de contos das culturas em
questão.

o profissionAlismo
Em minha monografia da pós-graduação em Administração e Supervisão Escolar, realizada entre
2013/2014 falo sobre A importância da liderança consciente na Supervisão escolar nos dias atuais. E
em algumas falas minhas, os assuntos se entrelaçam, como no trecho abaixo:

“Não se constrói nada sozinho e sem preparo. Fica evidente que para se alcan-
çar algo efetivo, é preciso pessoas preparadas e dispostas a realizar em coletividade
mudanças estruturais visando o redirecionamento das metas a serem conquistadas.
Essas metas precisam estar ligadas de forma coerente ao pensamento do que real-
mente é prioridade, do que verdadeiramente é essencial para aquela comunidade
escolar. O preparo dos profissionais se faz então indispensável, devido justamente à
continuidade da formação dos mesmos, disponibilizar essa clareza do que é útil e do
que não é, para que sejam selecionados e difundidos fatores preponderantes dentro
da realidade vivida.” (p. 37)

A avaliação do trabalho realizado deve ser uma constante, buscando sempre redirecionar as
ações se for necessário para alcançar o que se é pretendido. O feedback é essencial. Silva; Ferreira
(2004) cita:

“Feedback, ou retroalimentação, é o processo de comunicação que se estabele-


ce com o objetivo de oferecer a uma pessoa ou grupo informações sobre o grau de
adequação de suas ações às expectativas de quem emite esse retorno. O estímulo à
prática do feedback é muito importante para o desenvolvimento individual e orga-
nizacional. Quando não sabemos a opinião dos outros sobre nossos atos, ficamos
muito propensos ao erro, a não alcançar nossos objetivos.”(p.165)

Ter um olhar do outro é muito importante para qualquer atividade e entender que cada pessoa
tem sua individualidade. Cada ser é único e acima de tudo o respeito ao meu espaço e ao espaço do
outro precisa existir.
Para que seja possível toda essa estrutura é necessária a constante formação dos profissionais,
devido às mudanças inerentes na formação de nossa sociedade que acontece a todo tempo. Para
Vogt (2012), deve-se: “... compreender a escola como espaço de formação continuada e quais as im-
plicações desta formação, desenvolvida na reunião pedagógica, no cotidiano escolar.”.
É evidente a necessidade de se atrelar o que se ensina com o que é significativo para o aluno.
Relaciona-se ao interesse disponibilizado para a efetuação da aprendizagem. E o professor deve
estar atento a isso. Santos (2009) diz que:

“O interesse é importante para a aprendizagem a partir do momento em que ele


facilita o pensamento e a atenção (...). O interesse garante que estaremos focados
naquilo que temos que aprender (...) aprendizagens ocorrem toda vez que ocorrem
pensamentos significativos (...)” (p.36)

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Segundo Senna (1999):

“Durante muito tempo, as práticas de ensino adotadas na escola de certo modo


perpetuaram um conceito externo de cultura, (...) através de práticas de raciocínio
baseadas na tradição cartesiana” (p.29)

No rodapé, Senna explica que “A expressão “práticas de raciocínio cartesiano” é inspirada em es-
tudos relacionados aos modos de funcionamento da mente humana, como DONALDSON (1993), o
qual apresenta críticas à forma como se impõem à criança modelos de pensamento.”.

A trocA com o oUtro


Com o mundo de hoje está cada vez mais difícil prestar atenção no outro. Como me referi em
minha monografia, acerca da supervisão, a fala abaixo se encaixa no assunto:

“Muitas vezes o outro tem um olhar diferenciado diante de uma questão e isso
pode contribuir para a tentativa de resolução da mesma. Ninguém tem a verdade
absoluta. Todos têm suas verdades que num grupo devem ser agregadas numa
grande verdade que seja comum a todos. Se acaso isso não acontecer será um gran-
de grupo, mas com anseios distintos e trabalhando em sentidos opostos, sem foco e
não chegando a destino algum.” (p. 42)

Quando se fala de teoria e prática, essa premissa de considerar o outro é essencial. Não é coerente
exigir uma homogeneidade de uma turma se há uma heterogeneidade em questão.
Percebe-se que a aprendizagem para ser de fato adquirida é preciso que haja uma relação signi-
ficativa entre o que se ensina e o que se aprende. Segundo Santos (2009):

“Para haver aprendizagem significativa (...) o aluno precisa ter disposição para
aprender (...) o conteúdo escolar a ser aprendido tem que ser potencialmente signi-
ficativo (...) é essencial, não somente fazer uma seleção de conteúdos logicamente
significativos (...), mas sondar os interesses e experiências dos alunos, para que os
conteúdos sejam psicologicamente significativos.” (p.54)

A troca entre os seres da humanidade é constante. Mas para que tudo isso seja possível é neces-
sário que conheçamos o nosso aluno. Socorro (2008) cita:

“Trata-se, portanto, da necessidade de traçar, neste estudo, um perfil que dê con-


ta de compreender quem é esse sujeito social que, nas escolas de EJA, vive o papel de
“aluno”. Faz-se necessário desenvolver um estudo que permita compreender melhor
esses alunos.” (p.15)

conclUsões:
É inquestionável: não existe uma fórmula pronta no que se refere à educação de jovens e adultos.
Cada turma e cada momento são determinantes para a escolha e execução da ação devida dentro
das possibilidades cabíveis. Um bom relacionamento sempre ajuda, pois a empatia contribui para
a eficácia de qualquer produção. Todos precisam de grupos, pois o ser humano é um ser sociável.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Todos são dependentes no sentido de que ninguém faz nada sozinho, mas podem ser independen-
tes dentro de suas ações para que as mesmas se juntem ao coletivo. Então o profissional fica como
um mediador que percebe o que é necessário e busca os meios para a efetuação do que é preciso.
O envolvimento traz motivação, propiciando a mudança, através de cooperação dos participantes
da atividade elaborada. Então ao incluir práticas diferenciadas o processo tonar-se mais prazeroso
e realmente eficaz. Com isso a prática social de elaboração de metas comuns ao grupo, se fixa de
forma clara e objetiva dentro dos parâmetros escolares.
Eu tive um aluno que não expressava nenhum tipo de sentimento em sua face, não ria em ne-
nhum momento, mantendo-se calado e sisudo. Aquilo me intrigou! Aos poucos com dinâmicas e
elogios, sua conduta mudou. Isso é muito mais do que simplesmente alcançar um objetivo. Então
regue suas aulas com alegria de forma espontânea, temperando com práticas diferenciadas. Ali-
mente seu furor pedagógico com fundamentação teórica, busque o novo, esteja sempre disposto
a recomeçar e acima de tudo eleve sua autoestima, pois é através dela que tudo irá fluir. Não fique
frustrado quando com todo esse caminho traçado e seguido, não obtiver êxito, pois a tentativa foi
feita, o que não pode é não tentar. Ficam aqui as reflexões acerca de toda a temática e espero ter
contribuído de alguma forma com os profissionais envolvidos para que possam acrescentar algo
significativo em suas práticas docentes.

referênciAs bibliográficAs:
AMOS, Eduardo. Se essa rua fosse minha. São Paulo: Moderna, 2002.
CASARINI, Lucieli Lopes Rodrigues Alves. Afetividade: o caminho mais fácil de se chegar ao aluno :
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PUCRS CAPES

72
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
conflito intergerAcionAl nA ejA: AdUlto
trAbAlhAdor e AlUno Adolescente
helAine bArroso dos reis | VidomiriA diAs de poncem

Este estudo analisa a situação de conflito Intergeracional em turmas juvenilizadas da Educação


de Jovens e Adultos e possíveis medidas a serem tomadas para garantir o direito de acesso e perma-
nência na escola, tanto do adulto trabalhador como do adolescente. Para tanto buscou-se: (1) a visão
do corpo docente diante do problema em sala de aula; (2) a visão disciplinar do pedagogo para o
aluno adolescente remanejado a turmas de adultos; (3) o entendimento dos gestores sob o ponto
de vista da direção escolar e (4) da coordenação escolar; (5) o suporte legal (nacional e regional)
dos procedimentos no Conselho Tutelar regional para a promoção do aluno menor para a EJA; (6)
os pressupostos teóricos para o entendimento do problema; e, (7) as considerações que alinhavam
o problema da Juvenilização na EJA deste município com vistas a ações que possam amenizar as
dificuldades valorizando a diversidade. Trata-se de um estudo de caso de natureza qualitativa e des-
critivo-interpretativa do problema em Escolas Municipais de Ensino Fundamental de Iúna, situadas
no interior do estado do Espírito Santo, Brasil, que contou com a aplicação de multi-instrumentos,
como questionário aos professores e pedagogos; entrevista aos coordenadores e diretores escola-
res; e, levantamento documental e procedimental no Conselho Tutelar do município. Sugerem-se
soluções baseadas na gestão escolar, flexibilidade curricular e em sistematizações pedagógicas por
projetos interdisciplinares voltados para valores sociais, culturais e financeiros. Fundamenta-se na
legislação educacional brasileira, estatuto da criança e do adolescente e leis municipais, dialogando
com teóricos como Arroyo, Bourdieu, Di Pierro, Freire, Dayrell , Silva, dentre outros.

palavras-chave: juvenilização, diversidade, conflito intergeracional, educação de jo-


vens e adultos, evasão

remAnejAmento de Adolescentes: reflexões e percepções


A modalidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA) objetiva atender cidadãos jovens e adultos
que não tiveram acesso à escola na faixa etária regular e visa à aquisição de informações à trans-
formação do conhecimento prático vivenciado em conhecimento teórico, por meio de trocas de
experiências norteadas pelas práticas pedagógicas, de modo a preparar o sujeito para a vida em
sociedade e para o mercado de trabalho.
Nessa modalidade de ensino, um dos grandes problemas que desafiam as escolas brasileiras é a
alta evasão escolar de seus alunos, cuja média nacional é cerca de 40% e pode ser ocasionada por
várias questões como, por exemplo, pela multiplicidade de adolescentes no curso, que na maioria
das vezes, igualmente, não o concluem. Genuinamente a nível nacional, observa-se que cada vez
mais, alunos adolescentes são encaminhados à EJA – e esse fenômeno tem-se denominado de “ju-
venilização na EJA” (SILVA, 2010).
A pesquisa foi realizada no município de Iúna, interior do estado do Espírito Santo - Brasil, cuja
maior fonte de renda provém da cultura agrícola do café. Nesse local, o movimento de remaneja-
mento de alunos do ensino regular diurno para a EJA, no turno noturno, acontece por motivos diver-
sos: (1) o aluno adolescente que precisa trabalhar para ajudar no sustento familiar; (2) situações em
que o aluno, por motivos de indisciplina, não adquire o aprendizado e torna-se repetente em vários
anos; (3) e, ainda, há outros casos em que envolvidos em subversões disciplinares põem em risco a
integridade física e moral dos alunos mais jovens. Nesses dois últimos casos, as ações de remaneja-
mento do aluno são, então, mediadas pelo Conselho Tutelar, com aconselhamentos, como medida

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
preventiva ao tráfico e à violência.
Os adolescentes transferidos para a modalidade EJA deparam com problemas geracionais causa-
dos por diferenças de valores, de interesses, de vestimentas, comunicacionais etc. no relacionamen-
to com os alunos adultos, que somados às questões comportamentais, culminam com a dificuldade
de aprendizagem e geram desinteresses que podem resultar em sua evasão. E, com a sala de aula
juvenilizada por adolescentes indisciplinados, descomedidos, barulhentos, os adultos mais velhos
da turma, que não se adaptam à nova situação, também acabam por evadir da escola.
Este estudo objetiva, então, analisar junto aos gestores e atores educacionais das instituições a si-
tuação de conflito Intergeracional em turmas juvenilizadas na EJA e levantar quais medidas podem
ser tomadas a fim de garantir o direito de acesso e a permanência, na escola, do adulto trabalhador
e do adolescente remanejado do ensino regular para EJA nas Unidades Municipais de Ensino Funda-
mental de Iúna no estado do Espírito Santo.

mUltiplicidAde de Adolescentes nA ejA


O Censo Escolar de 2000 já indicava em seus resultados que 79% dos alunos da EJA eram jovens
e adolescentes, o que de certa forma tem preocupado professores e pesquisadores sobre o tema
(FERRARI; AMARAL, 2005). De fato, “Um elemento que vem complicar a construção de uma identi-
dade pedagógica [da EJA] [...] e de sua adequação às características específicas da população a que
destina é o processo notado em todas as regiões do país, assim como em outros países da América
Latina, de juvenilização da clientela” (DI PIERRO; JOIA; RIBEIRO, 2001, p. 64).
Esse fenômeno tem lugar no cenário brasileiro a partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB), Lei Nº 9.394/96, que no Art. 38, § 1º reduz a idade de realização de exames no Ensino
Fundamental de 18 para 15 anos e no Ensino Médio de 21 para 18 anos, o que requer um novo olhar
sobre esse público e sobre a leitura de novos espaços, formação e metodologias, em resposta às
novas demandas de diversidade (BRASIL, 1996).
A juvenilização da EJA é um fato que merece atenção e cuidado, pois essa camada social “[...] ga-
nha contornos próprios em contextos históricos, sociais e culturais distintos, marcada pela diversi-
dade nas condições sociais (origem de classe, por exemplo), culturais (etnias, identidades religiosas,
valores, etc.), de gênero e, até mesmo geográficas, dentre outros aspectos” (DAYRELL; NOGUEIRA;
MIRANDA, 2011, p.16).
No contexto sócio-histórico-cultural de inserção desses sujeitos em cada sociedade, entretanto,
se delineia os tempos e espaços que justificam suas leis, suas necessidades e suas deficiências, o
que ressalta o mote político-ideológico perverso de ser a idade um “[...] dado biológico socialmente
manipulado e manipulável; e que o fato de se falar dos jovens como de uma unidade social, de um
grupo constituído, dotado de interesses comuns, e de se referir esses interesses a uma idade defini-
da biologicamente, constitui já uma evidente manipulação” (BOURDIEU, 2003, p. 153).
Posto isso, para a EJA, o que a identificou em termos de especificidade etária sucumbe hoje a
novas questões ainda mais complexas, com diversidade de faixas etárias compartilhando espaços
e tempos, estratégias educativas e currículos, o que traz diferenciadas demandas, experiências de
vida, singularidades físicas, afetivas, psíquicas e biológicas, que exigem um repensar da escola. De
qualquer forma, há um desafio central e comum a esse público que é o atendimento integral dos
sujeitos sob “[...] a difusão dos valores de justiça social e dos pressupostos da democracia, do respei-
to à pluralidade fundados na crença e na capacidade de cada cidadão ler e interpretar a realidade,
conforme sua própria experiência [...]” (FERRARI; AMARAL, 2005, p.1).
Assim, a inserção do adolescente como aluno da EJA torna o público ali atendido ainda mais pre-
ocupante, pois essa facção é duplamente excluída, ou seja, é afastada do seu grupo de amigos da
mesma idade e eliminada do ensino regular.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Para o aluno adolescente trabalhador em Iúna, a realidade do trabalho rural o submete as sazo-
nalidades das colheitas e outras idiossincrasias locais, atropelando seus sonhos pelas exigências do
quadro social que se insere. Não se pode negar que as ideologias da educação do campo no meio
rural ainda não foram aplicadas a toda extensão territorial brasileira, conforme regulamenta o Art.
28 da LDB 9.394/96 (BRASIL, 1996) que imprime diferenças e exige adequações para conteúdos cur-
riculares, metodologias e calendários.
Por outro lado, no caso do aluno com baixo aproveitamento escolar e seguidas reprovações, pro-
vavelmente, devido ao seu deslocamento em salas do ensino regular a cada período letivo, com
alunos em faixas etárias cada vez menores a sua, sente-se completamente desmotivado e torna-se
causador de problemas. Alguns são indisciplinados, e, amiúde, envolvem-se em conflitos com os
mais jovens, em atitudes muitas vezes perversas, que podem ocasionar situações de vulnerabilidade
e risco, o que os levam ao remanejamento para o noturno e para a modalidade EJA, por intervenção
do Conselho Tutelar Regional.
“É como se o jovem não mais se adequasse à escola por ser ‘rebelde, indisciplinado e bagunceiro’.
Mas, essa leitura permanece na lógica que situa o aluno como o problema, como se ele fosse inade-
quado à escola e não a escola fosse inadequada a ele” (DAYRELL; NOGUEIRA; MIRANDA, 2011, p.27).
Então, o que a princípio parece solução para a escola no período diurno, se revela devastador no
período noturno.
Em ambos os grupos – aquele dos adolescentes trabalhadores e o dos que apenas estudam, so-
bretudo para os últimos, há dificuldades de adaptação. Aliás, acrescentam DAYRELL, NOGUEIRA e
MIRANDA (2011, p.17), que “[...] Projeto de futuro e trajetória diferenciam-se para jovens que moram
no campo ou na cidade, pertencem a classes sociais distintas, possuem vivências culturais próprias e
escolarizações desiguais”. Para alguns a realidade social imprime a exigência de serem adultos diante
da necessidade de participação na renda familiar, por meio do trabalho, ou assumindo outras cargas
sociais de grande responsabilidade; no outro lado, há possibilidade de ser criança.
De qualquer forma, esses adolescentes não tendo discernimento dos seus espaços e tempos des-
continuados, sentem-se deslocados, por não se adequarem ao novo meio social em que esses foram
inseridos, e, os adultos, por sua vez, sentem-se incomodados com o ritmo que os primeiros impõem
à sala de aula, o que leva ambos evadirem da escola, como atitude irrefutável de lucidez diante da
omissão, descaso ou inoperância escolar. As diferenças envolvem sua natureza social, já que “Du-
rante a maior parte do tempo, o obstáculo que impede os conceitos, os métodos ou as técnicas de
comunicar não é o lógico, mas o sociológico” (BOURDIEU, 2003, p.30).
A escola precisa avançar na direção da realidade da juvenilização da EJA para responder aos com-
promissos regulamentados pela Constituição Federal de promover educação como direito de todos,
inclusiva, ética, integral. É importante (re)pensar o acolhimento desses sujeitos com vistas à sua so-
cialização, participação e ativação do sentimento de pertencimento aos espaços escolares.

o perfil do edUcAndo como ponto de pArtidA nA (re)configUrAção


dA ejA
A preparação dos professores para lidar com essa diversidade na EJA exige capacitação, discussão
coletiva de conteúdos para a sistematização de metodologias e de estratégias nas práxis pedagógi-
ca, assim como debates sobre atitudes, valores, aspirações e sentimentos que ousem redarguir aos
desafios originados pela presença de adolescentes na EJA. “É nesse sentido que se pode afirmar ser
tão errado separar prática de teoria, pensamento de ação, linguagem de ideologia, quanto separar
ensino de conteúdos de chamamento ao educando para que se vá fazendo sujeito do processo de
aprendê-los” (FREIRE, 2009, p.125).
Por isso, ao analisarmos as turmas de EJA em sua diversidade com alunos com faixa etária tão di-

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
versificada (de 15 a 70 anos), diferentes interesses (mercado de trabalho, ingresso em universidades)
e diferentes marcas de exclusão social, vêm os questionamentos: Como sistematizar a prática e a
teoria, o pensamento e a ação, para essa demanda educacional, em que ora o ensino será significa-
tivo para o adulto trabalhador, com suas vivências; ora será significativo para os adolescentes? Seria
necessária a flexibilidade curricular? Seria o aprendizado mediado pela questão cultural e transver-
salizado pelos conhecimentos científicos? Seria contundente a divisão de turmas de acordo com
certas especificidades de objetivos, que tornasse possível a adequação curricular necessária?
Sobre o pressuposto de que a EJA precisa atender à diversidade, deve-se, antes de tudo, alavancar
um processo de (re)configuração a partir do perfil de seus sujeitos no processo de atendimento a
seus intentos e especificidades, com modelos dinâmicos, idiossincráticos, regionais, grupais. A esco-
la não pode se omitir em fazer as adaptações e o acolhimento adequado e o permanente acompa-
nhamento pedagógico, de preferência individualmente.
Logo, a reconfiguração da EJA deve ter como ponto de partida quem são esses sujeitos, conforme
reflete Arroyo (2005). No entanto, Haddad, 1987, apud DI PIERRO, 2005, p.1120 expõe que no Brasil
até 1990 tendeu-se “[...] a homogeneizar os sujeitos de aprendizagem, abstraindo sua diversidade e
diluindo suas identidades singulares – de classe, geracionais, de gênero, étnicas, culturais ou territo-
riais – sob a condição e o rótulo genérico de ‘alunos’”.
Então, o revés da história para a evasão na EJA, provavelmente, está na sua (re)configuração pela
elaboração de um currículo partindo de quem são os seus sujeitos e nas decisões do processo edu-
cativo como resultado de negociações com os mesmos: “[...] os dias e horários de aula, as formas de
composição das turmas, a elaboração de material, a continuidade ou não de cada atividade propos-
ta, as formas de envolvimento de cada participante, a avaliação dos processos de aprendizagem [...]”
(DAYRELL; NOGUEIRA; MIRANDA, 2011, p.57).

Ações do conselho tUtelAr


O Conselho Tutelar exerce, nos casos de remanejamento do adolescente do ensino regular para
a EJA, uma ação mediadora entre escola e família, aconselhando aos pais que envolvam os filhos
em programas de menores aprendizes, oferecendo-lhes oportunidade de trabalho e intervindo em
situações onde o adolescente põe em risco a integridade física e moral de crianças menores na
escola. Suas ações baseiam-se na Lei Nº 8.069/1990, que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do
Adolescente (BRASIL, 2006).
Além disso, a escola, juntamente com o Conselho Tutelar, está devidamente amparada no proces-
so de remanejamento do adolescente para a EJA pela própria lei que define as Diretrizes Curriculares
Nacionais Gerais para a Educação Básica, a saber, a Resolução nº 4 de 2010, que em seu Art. 28 es-
tabelece que a EJA “[...] destina-se aos que se situam na faixa etária superior à considerada própria,
no nível de conclusão do Ensino Fundamental e do Ensino Médio” (BRASIL, 2010, p.10). Visto que
em idade regular o adolescente conclui o ensino fundamental aos 14 anos e o ensino médio aos
17 anos, terá a matrícula por direito na EJA a partir dos 15 no segundo seguimento e 18 no ensino
médio.

metodologiA, estrAtégiA de Ação e AnAlise dos resUltAdos


A investigação é qualitativa, descritiva e interpretativa do problema, e o conjunto de procedi-
mentos intelectuais e técnicos adotados fundamentam-se no estudo de caso que incide na proble-
mática dos conflitos intergeracionais na EJA no Município de Iúna, Espírito Santo.
As duas Unidades Municipais de Ensino Fundamental da região situam-se em áreas consideradas
urbanas: a Escola Municipal de Ensino Fundamental (EMEF) “Elza de Castro”, no distrito de Santíssima
Trindade, e a EMEF “Dr. Nargem Abikair”, na sede do município. Porém, vale ressaltar, que o principal

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
meio de subsistência da comunidade em Santíssima Trindade é o trabalho rural.
As escolas atendem tanto ao ensino regular, 1º ao 9º ano, no horário diurno, quanto à EJA, 1ª a 8ª
série, no noturno, sendo que no distrito de Santíssima Trindade, também se atende ao ensino médio
regular no turno noturno sobre a responsabilidade do Estado. Possuem prédios deficitários, mas em
condições razoáveis ao número de alunos atendidos na modalidade EJA, porém não adequados ao
número de alunos do ensino regular, o que pode dificultar o controle disciplinar, oportunizando o
remanejamento de adolescentes para a modalidade EJA.
A EMEF Elza de Castro conta com uma equipe pedagógica e administrativa de sete docentes e um
pedagogo para quatro turmas; e a EMEF Dr. Nargem Abikair conta com 12 docentes e um pedagogo,
para cinco turmas. Nesse cenário, escolhemos como sujeitos da pesquisa os professores, os peda-
gogos e os coordenadores da EJA, responsáveis pelo currículo e elaboração de projetos que visam
à melhoria da qualidade do ensino e alcance de objetivos do educando, juntamente aos gestores,
responsáveis pela direção das escolas e coordenadores de turmas, e ao conselheiro, representante
do Conselho Tutelar municipal, corresponsável pelo remanejamento de adolescentes do ensino re-
gular para a EJA.
Os instrumentos da pesquisa escolhidos para a coleta de dados objetivaram informar e refletir
sobre as situações de conflitos e questionar os profissionais responsáveis pelo ensino da EJA so-
bre as possíveis medidas a serem tomadas. Dentro dessas finalidades, aplicamos questionários aos
professores e pedagogos, e entrevistas aos diretores, coordenadores de turno e conselheiro tutelar
municipal.
Das duas escolas, apenas a EMEF Dr. Nargem Abikair apresentou remanejamento de adolescen-
tes para EJA por indisciplina, apesar de sua equipe não perceber nisso a solução para o problema.
A direção escolar esclareceu que esse não é fator principal da evasão, mas que contribui na decisão
dos adultos evadirem devido aos problemas geracionais. E, admitiu que o currículo não é flexível
para estratégias de aplicação atraentes ao adolescente desmotivado, o qual também evade. A coor-
denação da escola acrescentou que tais remanejamentos apenas transferem o problema de turno, e
esses alunos chegam ao turno noturno agressivos em palavras e ações com o corpo docente.
Quando esses jovens adolescentes chegam à EJA encontram um ambiente diferente do que fre-
quentavam e precisam aprender a lidar com pessoas de diferentes idades, inclusive idosas, as quais
se distinguem de seus grupos de convivência. “Essas mudanças, que não são desprezíveis, geram
sofrimento. Por conta disso, muitas vezes esses ‘jovenzinhos’ voltam a abandonar o espaço da es-
cola, criando-se, então, um novo ciclo de idas e vindas” (FERNANDES, 2008 apud SILVA, 2010, p.12).
Ao questionar a coordenação escolar sobre quais ações poderiam minimizar os problemas ge-
racionais, comunicacionais, culturais e conflito de interesses, diminuindo a evasão na EJA, ela ex-
plicitou a necessidade de reformulação dos conteúdos com projetos que visem ao aprendizado e
envolvam família e escola.
Percebe-se, ainda, que os alunos da EJA são vistos sob o enfoque de carência escolar, da idade
avançada e sob o estigma da busca cega de um certificado de conclusão. Mas é preciso entendê-los
como há seu tempo, conhecimento, necessidades e limites, e, por outro lado, valorizá-los e capacitá-
-los, dando-lhes condições para adentrar no mercado de trabalho. Já o adolescente remanejado tem
sido equiparado ao trabalhador, visão mais uma vez equivocada, pois esse se encontra visivelmen-
te perdido dentre os seus pares: se vê infantilizado pelo meio social; percebido no âmbito escolar
como um adulto, biologicamente falando; ainda sendo (na verdade) um aluno do ensino regular,
submetido ao mesmo currículo e procedimento de ensino aplicado aos adultos.
Portanto, são muitas as dificuldades das escolas públicas: acesso, permanência, currículos sem a
adequação necessária. “Isso implica em dizer que as escolas têm se apresentado como instituições
pouco abertas para a criação de espaços e situações que favoreçam experiências de sociabilidade,
solidariedade, debates públicos e atividades culturais e formativas de natureza curricular ou extra-

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
escolar [sic]” (CARRARO, 2007, p.60 apud SILVA, 2010, p.11).
Também foram aplicados questionários aos professores e pedagogos efetivos nas duas escolas;
dos 19 professores, 12 colaboraram com a pesquisa. Os professores entrevistados possuíam licen-
ciatura plena na área de sua regência, e oito possuíam especialização em educação, o que reflete
um bom nível de formação. Além disso, observamos dois professores como regentes do primeiro
segmento da EJA (1ª a 4ª série) e 10 do segundo segmento (de 5ª a 8ª série), e constatamos que nove
professores, assim como todos os pedagogos, atuam na EJA há mais de dois anos, sendo apenas três
pouco experientes na modalidade (Gráfico 1).

Gráfico 1: Tempo de atuação na Educação


de Jovens e Adultos

Mesmo com experiência na modalidade EJA, esses professores possuem uma sobrecarga de tra-
balho de sessenta horas semanais, o que os esgotam e os impossibilitam de realizar um trabalho
diferenciado na EJA, com planejamentos diversificados por faixas etárias para atender à diversidade
que essa modalidade agora impõe, sobretudo quando se trata de alunos remanejados por indisci-
plina e repetência. Medida essa na gestão escolar que a maioria desses docentes entende ocasionar
baixo desempenho no desenvolvimento cognitivo do adulto trabalhador e o seu abandono da es-
cola (Gráfico 2).

Gráfico 2: Remanejamento de adolescentes sobre


o abandono e desempenho do adulto

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Os pedagogos, por outro lado, se dividem nas opiniões: um entende que o remanejamento do
adolescente pode ser negativo para o desempenho do adulto e afirma que esses adolescentes “[...]
não respeitam, são desinteressados, desistem no meio do bimestre”; já o outro acredita que a medi-
da pode ser positiva, pois os jovens remanejados possuem muitas informações e tempo de apren-
dizagem mais rápido, “[...] o que acaba influenciando os demais da classe, sem dizer que a reunião
de conhecimentos teóricos dos mais novos e a prática/experiência dos mais velhos contribuem para
uma aprendizagem de fato”.
Realmente, tal convivência pode ser construtiva, desde que atendidas as necessidades do aluno
adolescente de circulação em sala de aula, ritmo de aprendizagem, além de oferecer “[...] atividades
que estimulem parcerias, em lugar da competição com os mais velhos, organizando atividade que
promovam a reflexão sobre os valores e as condutas e que propiciem a formação de vínculos positi-
vos e respeito à forma de pensar, agir e sentir do outro” (FERRARI; AMARAL, 2005, p. 13).
Os docentes entrevistados justificam o baixo desempenho e abandono do adulto trabalhador
pela falta de respeito dos adolescentes para com colegas e professores; suas infantilidades e inti-
midações; assim como a dificuldade de concentração em meio à desordem, falta de compromisso,
indisciplina e desinteresse dos mais jovens; o que configura um grave problema geracional.
Ainda, refletiu-se, junto aos pedagogos, sobre as frequentes vulnerabilidades sociais no turno
noturno como drogas, alcoolismo, prostituição e outras, o que fragiliza o remanejamento do adoles-
cente para EJA como solução para o problema da indisciplina na escola. Essa problemática dividiu
opiniões, e enquanto um pedagogo afirmou que “no noturno não é lugar de despejar alunos pro-
blema do regular”, sendo a EJA uma modalidade para atender a adultos, o outro colocou que o aluno
remanejado “terá oportunidades de trabalho e de adquirir hábitos e valores benéficos ao conviver
com uma clientela mais madura”.
Analisando, então, várias situações-problema da juvenilização na EJA discutidas no meio acadê-
mico (SILVA, 2010; DI PIERRO, 2005; ARROYO, 2006), os pedagogos e professores assinalam como
pontos capitais da EJA na rede municipal de Iúna a evasão por desinteresse do adolescente remane-
jado, a desistência do adulto por indisciplina do adolescente, as vulnerabilidades sociais no noturno
e a multiplicidade de adolescentes em salas de adultos trabalhadores (Gráfico 3).

Gráfico 3 - Situações Problema

Diante dos problemas assinalados, os entrevistados apontaram possíveis soluções (Gráfico 4),
sendo uma das mais votadas a ideia de se fazer uma avaliação, no instante da matrícula, para iden-

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
tificar os alunos com objetivos em comum e possibilitar a formação de turmas, o planejamento de
currículos diferenciados com padrões que atendam às aspirações individuais, a fim de diminuir a
evasão e garantir uma melhor qualidade no ensino e aprendizagem. Isso porque “Permite o respeito
à cultura do aluno, à valorização do conhecimento que o educando traz, enfim, um trabalho a partir
da visão de mundo do educando é sem dúvida um dos eixos fundamentais sobre os quais deve se
apoiar a prática pedagógica de professores e professoras” (FREIRE, 1991, p. 82).
Para Bourdieu (2003) não seria a idade o determinante em interesses e comportamentos, mas os
fatores sociológicos. Assim, a formação de turmas por objetivos, com currículo e metodologia orien-
tados pela diversidade, heterogeneidade e flexibilidade com a participação dos jovens remanejados
para a EJA, tanto o que trabalha, quanto o da mesma idade que tão somente estuda, poderá motivar
e favorecer a sua permanência na escola (DAYRELL; NOGUEIRA; MIRANDA, 2011).

Gráfico 4: Possíveis soluções


Outra solução apresentada foi a abertura de turmas de EJA em horário especial diurno para o
atendimento de alunos adolescentes com reprovação por indisciplina, que somada a de (re)pensar
a proposta pedagógica sistematizada em projetos interdisciplinares, voltados para valores sociais,
culturais e financeiros, demonstra uma preocupação em incluir esses alunos e motivá-los ao apren-
dizado.
Da mesma forma, pedagogos e professores recomendaram maior participação da família na es-
cola; urge, então, construir essa escola com uso “[...] das possibilidades existentes na legislação, das
políticas sociais de inclusão em curso, do acúmulo do movimento de educação popular, das ex-
periências educativas inovadoras conduzidas pelos mais diferentes agentes” (DAYRELL; NOGUEIRA;
MIRANDA, 2011, p.50).
Finalmente, alguns professores entendem que a criação de programas com atividades extracurri-
culares de interesse juvenil implica na inclusão desses jovens pela formação do aluno cidadão parti-
cipativo na sociedade, cuja perspectiva de direitos sociais vem “[...] conferir importância às relações
sociais na escola; promover a apropriação do espaço e reelaboração do espaço físico, das regras
escolares, dos tempos, dos conteúdos” (DAYRELL; NOGUEIRA; MIRANDA, 2011, p.56).

considerAções finAis
É irrefutável que a matrícula e frequência na EJA sejam um direito tanto dos adolescentes, como
dos jovens e dos adultos, no entanto, tornou-se evidente a necessidade de uma (re)configuração

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
na EJA de forma a tornar o ensino e os conteúdos ministrados significativos ao seu público, que se
adentra a cada dia mais na diversidade, sendo necessário para tal imperativo repensar o projeto
político e pedagógico da escola, de maneira que possibilite a reformulação na divisão de turmas, na
proposta pedagógica e na adequação curricular.
Quanto à remoção de alunos adolescentes do ensino regular para a modalidade EJA, como solu-
ção para a indisciplina, concluímos que tal fator não atinge os objetivos propostos, pois esses alunos
continuam a ser excluídos do processo educacional ao sentirem-se deslocados na turma de adultos
ou ainda desprotegidos diante do desinteresse, da falta de acompanhamento e da participação fa-
miliar na escola; e, sem alcançar um lugar de pertencimento na escola.
Reiteramos, ainda, que se a divisão de turmas e a reformulação do currículo forem realizadas em
moldes mais significativos, abalizados nos valores do educando, podem colaborar para a perma-
nência desse público na escola e desenvolver o interesse pelo aprendizado. Logo, para o município
de Iúna no Espírito Santo, confirmam-se as hipóteses de que como medida a ser tomada em caso
de urgência para a EJA tem lugar a divisão de turmas baseadas em objetivos comuns e formação de
turmas em horários diurno para alunos remanejados do ensino regular.
No desafio de garantir a todos os sujeitos o direito à educação, acreditamos ser necessário capa-
citar profissionais para atuar com a diversidade dessa modalidade e atribuir um valor maior às rela-
ções sociais e familiares na escola, de forma a promover a consciência do que se faz, e compartilhar
a apropriação dos espaços e tempos escolares, com ações para discussão dos conteúdos em uma
perspectiva social, cidadã e inclusiva.

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81
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
SILVA, L. S. G. da. Juvenilização na EJA: Experiências e desafios. 2010. 108 p. Trabalho de Conclusão
de curso (Graduação do Curso de Pedagogia) – Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, Porto Alegre.

82
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
considerAndo diferentes trAjetóriAs: AlterAções
cUrricUlAres nA disciplinA de geogrAfiA, no centro
de edUcAção de joVens e AdUltos
mArcelo André de soUzA

Esta comunicação consiste no compartilhamento das reflexões iniciadas na pós-graduação Latto


Sensu da Faculdade de Educação da UFRJ em 2013. O objeto de estudo desta pesquisa é o ensino
de Geografia na modalidade semipresencial de nível médio, nos Centros de Educação de Jovens e
Adultos do Rio de Janeiro (CEJA), atualmente inseridos no Sistema de Educação de Jovens e Adultos
(SEJA Profissional), da rede estadual de ensino do Rio de Janeiro. Desde o segundo semestre de
2011, por iniciativa do governo estadual, estão sendo implementadas algumas mudanças de cará-
ter pedagógico e administrativo nesta rede. Sendo assim, o objetivo geral foi investigar o processo
de transição pedagógica do CEJA, a partir das alterações curriculares do ensino de Geografia para
sinalizar possíveis dilemas e desafios dessa nova proposta curricular, considerando as diferentes tra-
jetórias dos sujeitos envolvidos na rede CEJA. Constituído como estudo de caso, este trabalho ele-
geu a unidade Madureira do CEJA como lócus de pesquisa, devido a complexidade das demandas
sociais dos alunos matriculados. A pesquisa documental coletará os dados para análise nos módulos
de Geografia do Ensino Médio e na Ficha de Identificação e Controle de Avaliação (FICA). Uma das
observação é que apesar das mudanças ocorridas corresponderem a uma tentativa de atender aos
anseios da classe trabalhadora historicamente excluída da escolarização regular, ainda existem res-
quícios de um modelo de educação voltado somente para atender aos interesses do grande capital
e de formação de mão de obra acrítica para o mercado de trabalho. Urge avançar em direção ao
respeito às diversidades para a construção de um mundo mais solidário.

palavras-chave: Ensino semipresencial, Ensino de Geografia, Educação de Jovens e


Adultos

introdUção
O objeto de estudo desta pesquisa é o ensino de Geografia na modalidade semipresencial de
nível Médio, nos Centros de Educação de Jovens e Adultos (CEJA), atualmente inseridos no Sistema
de Educação de Jovens e Adultos (SEJA Profissional), da rede estadual de ensino do Rio de Janeiro.
A intenção deste trabalho é compartilhar reflexões iniciadas e que estão ancoradas nas discus-
sões teóricas realizadas no Programa de Pós-graduação intitulado Saberes e Práticas na Educação
Básica (CESPEB), da Faculdade de Educação, do Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Universida-
de Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). A finalidade é aprofundar essas reflexões numa futura pesquisa
de dissertação de mestrado.
A rede CEJA é composta por sessenta e uma unidades de ensino, distribuídas pelo estado do Rio
de Janeiro. Desde o segundo semestre de 2011, por iniciativa do governo estadual, estão sendo
empregadas algumas mudanças de caráter pedagógico e administrativo nesta rede. Uma dessas,
diz respeito à transferência de todos os CEJA da Secretaria de Estado de Educação (SEEDUC) para a
Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia (SECT), que passou a geri-los pedagógica e administra-
tivamente.
A justificativa oficial dessas mudanças é que a partir de então, o CEJA passa ter um novo papel
dentro do projeto maior, denominado SEJA Profissional, ao oferecer modalidades diferenciadas de
atendimento aos jovens e adultos do Ensino Fundamental e do Ensino Médio, em caráter presencial,

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
semipresencial, individualizado e em grupos. Nesta pesquisa, o foco é o modelo de atendimento
semipresencial que por apresentar certa especificidade merece ser estudado.
Tradicionalmente, existe nas escolas brasileiras, assim como nas políticas públicas, uma forte tra-
dição de homogeneização e padronização das ações educativas, apesar de existirem diferentes re-
alidades nas aulas de Geografia, imprimindo-lhe distintas marcas e sentido ao processo de ensino
aprendizagem. Por isso é imprescindível a contextualização das ações educativas na escola, e em
especial no ensino de Geografia no CEJA, escopo deste trabalho, destacando essencialmente a es-
colarização do jovem trabalhador.
Acresce ainda que a Educação de Jovens e Adultos (EJA) só foi reconhecida como modalidade
da Educação Básica recentemente, a partir da LDB 9394/96 e por isso carece de pesquisas e estudos
mais aprofundados, o que por si só justifica o presente estudo.
O suporte teórico é buscado no diálogo com textos como o de Santos (2011, p. 97) na medida
em que “o processo de escolarização de jovens e adultos trabalhadores, ocorre majoritariamente na
modalidade EJA e apresenta especificidades político-pedagógicas em relação à educação de crian-
ças e adolescentes”.
Sendo assim, o objetivo geral é investigar o processo de transição pedagógica do CEJA, a partir
das mudanças ocorridas na composição curricular do ensino de Geografia, na modalidade semipre-
sencial, do Ensino Médio.
Como objetivos específicos, estão elencados: contextualizar historicamente o CEJA; articular as
mudanças curriculares do ensino de Geografia com as demandas do jovem trabalhador; sinalizar
possíveis dilemas e desafios do ensino relativos a nova proposta curricular da rede CEJA, conside-
rando as diferentes trajetórias dos sujeitos envolvidos na rede CEJA.
O presente trabalho constitui-se como estudo de caso e elege a Unidade Madureira do CEJA
como lócus de pesquisa. Para isso, busca-se realizar uma pesquisa documental que coletará dados
nos módulos de Geografia do Ensino Médio, elaborados por Costa (2006) e pelo SEJA Profissional
(2011) que foram impressos com as atividades pedagógicas, e disponibilizados aos alunos, oficial-
mente matriculados na rede CEJA. Outro documento a ser consultado é a chamada Ficha de Identifi-
cação e Controle de Avaliação (FICA), existente desde 2001, que orienta aluno o sobre os conteúdos
elencados em cada prova.
Neste sentido, a estrutura de apresentação aqui privilegiada ocorre em três partes: inicialmente,
expõe aspectos históricos da rede CEJA explicitando o projeto SEJA Profissional; logo depois, carac-
teriza o CEJA Madureira; finalmente, apresenta as propostas curriculares para o ensino de Geografia
no CEJA Madureira. Encerrando, sugere questões sobre os possíveis dilemas e desafios do ensino de
Geografia, relativos a essa nova proposta curricular de adequação da rede CEJA.

dos centros de estUdos sUpletiVos (ces) Aos centros de edUcAção


de joVens e AdUltos (cejA)
Os Centros de Ensinos Supletivos destinavam-se à modalidade de atendimento semipresencial,
do ensino Fundamental e Médio, ao público jovem e adulto, que dentro da classe trabalhadora ca-
reciam de tempo para integrar-se aos cursos presenciais.
A implementação destes centros está relacionada a uma serie de atividades desenvolvidas e in-
centivadas para EJA, através da Lei nº 5692/71 (oriunda da Lei nº 4024/61) que fixava as diretrizes e
bases para o ensino de 1º e 2º graus, incluindo o Ensino Supletivo com as “funções de suplência, do
suprimento, Aperfeiçoamento e da qualificação (prevista no parecer 699/72)” (SOUZA, 2005, p. 10).
Embora esta Lei estivesse voltada para os interesses dos jovens estudantes trabalhadores, apenas
contemplou a flexibilidade e a duração dos cursos, a partir de modalidades específicas.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Nos termos da lei, os cursos de Ensino Supletivo já traziam a perspectiva de uma
educação voltada aos interesses dos estudantes trabalhadores, sendo expressa,
contudo, apenas no que diz respeito à flexibilidade em relação à sua duração e à sua
oferta em diferentes modalidades, a saber: os cursos supletivos, os centros de estu-
dos supletivos (CES) e o ensino à distância. (SANTOS, 2008, p. 68)

Neste sentido, a partir da aprovação do Conselho Estadual de Educação foi criado em 1976, como
experiência pioneira na cidade de Niterói, no estado do Rio de Janeiro, o Centro de Estudos Suple-
tivos. Nele, foi instituído um plano de estrutura e funcionamento que deveriam ser aplicados para
todos os CES que viessem a ser implantados. Entretanto, somente a partir do parecer nº 97/91 que
determinou-se um padrão de estrutura e funcionamento para todos os CES do estado.
O plano seguido basicamente por todas as unidades seria: o aluno adquirir o módulo de ensino
da disciplina oferecida ou escolhida por ele, no espaço organizado para entrega e devolução de mó-
dulos instrucionais (tráfego), estudando-o em casa ou na sala de estudos. Encontrando dificuldades
em compreender o conteúdo, poderia o discente, recorrer ao professor da disciplina em questão,
na sala dos professores, para orientação individual. Sentindo-se apto, realizaria então, a sua prova e
sendo aprovado, poderia dedicar-se a outro módulo de ensino.6
Além do ensino, denominado individualizado, o aluno poderia concluir seus estudos atra-
vés dos exames supletivos. Segundo Santos (2008, p. 68) “os exames são organizados por módulos
disciplinares, podendo o aluno “eliminar” as disciplinas conforme sua aprovação nos respectivos
exames”.
Após a promulgação da Constituição de 1988, a EJA vem adquirindo considerável relevância
no cenário educacional brasileiro. A forma com que a lei maior do país passou a tratar a escolari-
zação de jovens e adultos trabalhadores, propiciou significativa mudança em seu caráter, em seu
conceito.
A promulgação da LDB (Lei 9394/1996) determinou que “a educação de jovens e adultos será
destinada àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e
médio na idade própria”. Posteriormente, com o parecer CEB/CNE Nº 11/2000, criou-se as Diretrizes
Curriculares Nacionais da Educação de Jovens e Adultos (DCNEJA), reconhecendo assim as espe-
cificidades do aluno jovem e adulto. A partir desse documento, os Cursos Supletivos passam a ser
chamados de Cursos de Educação de Jovens e Adultos.
Reconhecendo a necessidade de revisão da ideia de suplência, o governo do estado do Rio
de Janeiro, através da Resolução SEEDUC nº 4.673 de 23 de fevereiro de 2011, altera oficialmente a
nomenclatura dos CES para Centro de Estudos de Jovens e Adultos (CEJA). E, a partir do segundo
semestre de 2011, desenvolve ações públicas não só relacionadas à EJA presencial, como também
na modalidade semipresencial.
Foi instituído então, o Sistema de Educação para Jovens e Adultos (SEJA Profissional), o qual
busca oferecer um leque de oportunidades educacionais aos jovens e adultos, desde a Educação
Básica ofertada na rede CEJA à Graduação, respeitando os caminhos pré-estabelecidos pelos alunos,
considerando diferentes trajetórias7
Desta maneira, para os CEJA, o projeto prevê diferentes possibilidades de acesso tecnológico
dos alunos, com a ampliação das modalidades de atendimento: o atual atendimento individuali-
zado; pelo ambiente virtual de aprendizagem (AVA) denominado CEJA virtual e aulas em grupo. A
justificativa dessa proposta “é que o aluno escolha a(s) modalidade(s) de atendimento de que deseja
6 Há quatro oportunidades de aprovação em formatos distintos de prova sobre o mesmo módulo. Podendo também, o pro-
fessor da disciplina decidir por outra forma de avaliação.
7 Participam dessa parceria a Fundação Centro de Ciências e Educação Superior a Distância do Estado do Rio de Janeiro (CE-
CIERJ) e a Fundação de Apoio à Escola Técnica (FAETEC), ambas as instituições vinculadas à SECT.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
dispor, de forma a adequar e personalizar sua aprendizagem.” (RIO DE JANEIRO, 2011, p. 6). O aluno
poderá optar por uma ou transitar por todas elas.
Nesse quadro de atendimento diferenciado, solidifica-se o semipresencial, e uma das explica-
ções possíveis, pode estar relacionada à questão estatística. De acordo com o Censo escolar (INEP/
SEEDUCRJ, 2012), estão matriculados na EJA, no estado do Rio de Janeiro, 176.665 alunos. Destes,
87.474 inscritos na modalidade semipresencial, sendo 43.834 matriculados no Ensino Médio.
Aproximando a escala, verifica-se que no município do Rio de Janeiro, na rede estadual de
ensino, estão matriculados, na EJA modalidade semipresencial 26.006 alunos, destes 14.653 no Ensi-
no Médio. O CEJA Madureira possui 6.491 alunos matriculados, e dentre eles, cerca de 4.800 no Ensi-
no Médio. Anualmente, na disciplina de Geografia, três professores realizam algo em torno de 3600
atendimentos (correção de provas e atendimento individual) aos alunos. Esta amplitude numérica
deste centro de estudos é um dado significativo para elegê-lo como estudo de caso desta pesquisa8.

o ensino de geogrAfiA no cejA mAdUreirA


Desde a sua inauguração, duas propostas de conteúdos programáticos para o ensino de Geo-
grafia foram aplicadas no CEJA Madureira. A primeira proposta programática, utilizada até o ano de
2006 foi confeccionada pelo Centro de Ensino Tecnológico de Brasília (CETEB). A segunda foi elabo-
rada por Costa, e posta em prática a partir de 2006 e ainda em uso. Atualmente, tem-se uma terceira
proposta, desenvolvida por uma equipe vinculada ao SEJA Profissional.
De acordo com Santos (2012, p. 7) concepções de currículo que vêm permeando as propostas
pedagógicas da EJA são: o currículo supletivo, pautada na redução de conteúdos pré-estabeleci-
dos para a escolarização de crianças e adolescentes; o currículo crítico, cujo pressuposto básico é a
educação como ação social que contribui para a emancipação dos sujeitos, como possibilidade de
transformação social e de construção de um projeto societário contra hegemônico; o currículo por
competências, que tem marcado as políticas curriculares nacionais recentes e é caracterizada pela
forte relação com o processo de acumulação flexível do capital. Uma análise mais profunda permite
refletir sobre a presença dessas concepções nas propostas pedagógicas implementadas no CEJA
Madureira.
Nos módulos confeccionados pelo CETEB, a disciplina de Geografia, constituiu-se de conte-
údos programáticos distribuídos nos Módulos: I) O Universo e a Terra; II) Relevo, Clima, Hidrografia
e Vegetação; III) A População; IV) A agricultura e a Pecuária; V) A Atividade Industrial; VI) Recursos
Naturais e Fontes de Energia; VII) Transporte; VIII) Comércio e Mercado.
De acordo com Souza (2005) os módulos eram praticamente os mesmos desde a origem dos CES
(1980), havendo algumas atualizações nas disciplinas de Geografia e História, devido às modifica-
ções geopolíticas ocorridas ao longo do século XX. A autora afirma que “os módulos são de feição
totalmente conteudista, não há referência em nenhum deles que sejam materiais para a educação
de jovens e adultos. Não existem também referências culturais, identitárias e geracionais” (SOUZA,
2005, p. 107)
A segunda proposta de conteúdo programático, para Geografia e ainda presente nas práticas pe-
dagógicas do CEJA Madureira, proveio da intenção de atualização dos primeiros módulos, somente
deste centro. Entretanto, outros conteúdos foram acrescentados, tendo como fonte diversos livros
didáticos utilizados no Ensino Médio9.
Esta nova proposta ficou dividida em doze módulos, sendo: I) Cartografia: o Espaço e suas repre-
sentações; II) O espaço Natural: Evolução da Terra, estrutura Geológica, relevo e solo; III) O espaço
8 Fonte: INEP/CEJA MADUREIRA. Disponível em: http://download.rj.gov.br/documentos/10112/447710/DLFE-58242.pdf/To-
tal_de_Matriculas_2012.pdf
9 Fontes consultadas por Costa (2006): Almeida & Rigolin (2004); Antunes (1998); Bochicchio (1999) Boligian & Boligian (2004);
Coelho & Terra (2003); Costa (2001 e 2005); Moreira (2000); Sene & Moreira (2005); Tamdjian & Mendes (2004);Vesentini (1996 e 2001).

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Natural II: Clima, vegetação e hidrografia; IV) A formação do Capitalismo e dos Estados Nacionais; V)
A formação do espaço geográfico brasileiro; VI) Agropecuária no mundo e no Brasil; VII) Atividade
industrial no mundo e no Brasil; Módulo; VIII) População no mundo e no Brasil; IX) Urbanização no
mundo e no Brasil; X) Comércio, blocos econômicos, transportes e telecomunicações; XI) Recursos
minerais e energia no mundo e no Brasil; XII) Meio ambiente. Costa (2006) reafirma na apresentação
de cada módulo que esta divisão tem apenas natureza didática, ou seja, tem por objetivo delimitar
os estudos para a realização das provas. A sequência dos assuntos desenvolvidos em cada módulo
visa conduzir os estudos como se fosse uma cadeia.
Refletindo sobre as propostas pedagógicas, acima detalhadas, a partir das concepções de currí-
culos discutidas por Santos (2012) podemos verificar que, mesmo havendo significativas diferenças
quanto à abordagem, ambas enquadram-se num currículo supletivo. Ou seja, prevalece um currícu-
lo “prescritivo, pautado em uma listagem de conteúdos escolares com abordagem disciplinar, além
de seriado e com padrões de avaliação classificatórios, revelando concepções de currículo estreita-
mente vinculadas à educação bancária e, muitas vezes, acrítica.” (Idem, 2008, p. 70)
A partir de 2011, o projeto SEJA Profissional desenvolveu uma nova proposta pedagógica curri-
cular, para toda a rede CEJA. O projeto considera que “a atual proposta curricular e seus desdobra-
mentos em recursos didáticos e processos de avaliação está pautada, essencialmente, na aquisição
de conteúdos, sem a preocupação com o desenvolvimento de habilidades e competências.” (RIO DE
JANEIRO, 2011, p. 4).
A atual Matriz Curricular concebida para a rede CEJA busca integrar as áreas pertinentes ao En-
sino Médio, seguindo a resolução CNE/CEB nº 01/00, e a interação entre as diferentes disciplinas de
cada área. A disciplina de Geografia estaria inserida na área denominada, Ciências Humanas e suas
Tecnologias.
Sendo assim elegeu-se um eixo integrador (Cidadania e Trabalho) que busca aglutinar os quatro
módulos, nas diferentes áreas. Esse eixo integrador desdobra-se em quatro temas, também integra-
dores, que motivam os recortes dos conteúdos dos quatro módulos que compõem o curso: Módulo
1 - Identidade cultural e Diversidade; Módulo 2 - Qualidade de vida; Módulo 3 - Ciência e Tecnologia
e Módulo 4 - Sustentabilidade.

Entendendo que o sucesso individual e da sociedade requerem competências


tanto individuais quanto institucionais, a construção deste currículo deve levar em
consideração aspectos, tais como o perfil dos alunos de EJA que em sua maioria,
estão afastados do ensino formal e que, de uma maneira geral possuem um tempo
limitado para dedicar-se aos estudos. Deve contemplar também os exames de ava-
liação que são pautados em um currículo por competências, como o ENEM, aumen-
tando assim as oportunidades de inserção aos estudantes que almejam o ensino
Universitário. (RIO DE JANEIRO, 2011, p. 05)

Deste modo, a composição curricular proposta pelo SEJA Profissional ficou distribuída em Uni-
dades: I) Seu lugar no mundo; II) Lugar no território; III) Espaços e fronteiras; IV) Representações
do espaço geográfico) a Cartografia; V) Espacialização das desigualdades sociais; indicadores de
qualidade de vida; a distribuição desigual dos indicadores de qualidade de vida no espaço brasi-
leiro e mundial; o espaço desigual) campo x cidade; VI) Mobilidade Humana – As motivações da
mobilidade humana, tipos de migrações. A busca por melhores condições de vida; VII) As Desigual-
dades Espaciais nas Cidades; VIII) Sociedade de consumo e questão ambiental; IX) Sociedade em
Redes: modelos, atores e lugares no mundo globalizado; X) A Indústria e seus diferentes processos
de organização espacial; XI) Fontes de Energia no Mundo Contemporâneo; XII) A crise ambiental, o
consumo e o ser humano; XIII) Dinâmica da Paisagem) as Transformações do Relevo e os Desastres

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Naturais; XIV) Recursos Hídricos; XV) Mudanças climáticas globais e gestão de riscos; XVI) Domínios
Morfoclimáticos do Brasil.
Explicitada como uma proposta assentada nas concepções de currículo por competência e tradu-
zida por forte relação com o capital, poderá distanciar-se das necessidades do aluno trabalhador. É
o que futuros estudos poderão esclarecer.

considerAções finAis
Este trabalho propôs-se estudar o ensino de Geografia na modalidade semipresencial de nível
Médio, nos Centros de Educação de Jovens e Adultos (CEJA). Nele observaram-se o processo de
transição pedagógica do CEJA, a partir das mudanças ocorridas na composição curricular da disci-
plina de Geografia.
Neste sentido, foram desenvolvidas no discorrer, reflexões sobre aspectos históricos da rede CEJA
e do projeto SEJA Profissional; as características do CEJA Madureira e as propostas curriculares para
o ensino de Geografia desenvolvidas ao longo do tempo, neste Centro de Estudos. Sendo assim,
após a análise dos três capítulos apresentados, é possível pormenorizar algumas considerações so-
bre as mudanças ocorridas nos módulos de Geografia ao longo de sua história.
A principal delas está em constatar ser inegável que as alterações curriculares para a Geografia
desenvolvidas no CEJA, representam tentativas de modificações que atendam as demandas do Jo-
vem trabalhador. Porém, é necessário compreender mais profundamente o cotidiano desse aluno
e as intenções efetivadas, através dessas propostas, para a formação de um cidadão consciente e
atuante socialmente, pensando sobre tudo em benefício do bem estar coletivo.
Apesar das mudanças ocorridas corresponderem a uma busca em acatar os anseios da classe
trabalhadora, ainda existe uma forte pressão, em manter um modelo de educação voltado somente
para atender aos interesses do grande capital. Ou seja, formar mão de obra, não crítica para o mer-
cado de trabalho.
Várias indagações surgiram ao longo dessa pesquisa que não “cabem” nas limitações deste tra-
balho. Devem, porém, ser consideradas em outros trabalhos e em outros momentos para que a Ge-
ografia escolar praticada em cursos de EJA, seja permanentemente problematizadas. São elas: a ex-
pressividade numérica do CEJA Madureira possui outros fatores explicativos além da acessibilidade
do aluno? Será que a modalidade semipresencial é a que melhor atende ao jovem trabalhador, no
sentido da formação de um cidadão crítico e reflexivo? Até que ponto, os conteúdos programáticos
selecionados na nova proposta representam uma geografia cotidiana do aluno trabalhador?

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Jovens e Adultos: saberes e fazeres. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2007. pp. 204-232.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
conViVênciA cUltUrAl: UmA Ação qUe fidelizA A
permAnênciA dos joVens e AdUltos no sesc ler, de
AcAUã-pi
Wbimári régiA ribeiro sAntAnA | Almir frAncisco de soUsA

O Projeto Convivência Cultural é um trabalho que pretendemos socializar através de um diálogo


escrito sobre as experiências de cunho sócio cultural vivenciadas pelos alunos Jovens e Adultos e o
fator permanência do Projeto Sesc Ler na cidade de Acauã Piauí, apresentando assim as ações em
desenvolvimento que proporcionam a fidelidade destes na EJA. O mesmo surgiu a partir da per-
cepção dos professores e orientadora pedagógica sobre os desejos manifestados em salas de aula
integrando-os com as áreas do conhecimento da Proposta Pedagógica do Sesc Ler. Para apresenta-
ção de múltiplas linguagens, valorizou-se os alunos como portadores de um rico acervo sócio cultu-
ral com uma programação diferenciada na integração dos valores, contextualizando as habilidades
dos discentes, como por exemplo: quem é poeta, quem dança, quem são os tocadores de sanfona,
triângulo, pandeiro e zabumba e os que contam piada, resgatando assim as manifestações culturais
locais que embora estivessem adormecidas, mas sabe-se que são riquíssimas e fazem parte da iden-
tidade dos alunos, pois os mesmos são na sua maioria, adultos e idosos que não tem lazer e a única
ocupação é o trabalho na roça e os a fazeres domésticos. Nos resultados obtidos percebe-se uma
clientela satisfeita e comprometida, na participação das novas possibilidades de aprendizagem,
compreensão de mundo, lazer, relacionamento com as pessoas e crescimento humano, resgatando
assim a autoestima, assiduidade e a melhoria da qualidade de vida.

palavras-chave: EJA, Permanência, Inclusão Social, Aprendizagem Significativa

O presente relato tem como enfoque principal discutir os desdobramentos experienciados atra-
vés da aplicação do Projeto de Convivência Cultural, por meio de um diálogo escrito que fora sis-
tematizado das experiências de cunho sociocultural, vivenciadas pelos alunos Jovens e Adultos da
Alfabetização, Ciclos I e II do Projeto Sesc Ler10 na cidade de Acauã no Piauí. Apresentando as múlti-
plas linguagens artísticas que permeiam o ambiente escolar, muitas vezes passado por despercebi-
do, valorizando assim, os alunos que são munidos de um rico acervo cultural.
Os momentos de convivência surgiram a partir de inquietações da equipe pedagógica do Sesc
Ler de Acauã em relação a frequência da EJA, preocupação que está presente em 100% da literatura
escrita pesquisada para este público. Para se ter uma ideia, a turma de Educação de Jovens e Adultos
no referido Centro Educacional em 2012, ano em que nasce o projeto, era composta por 25 alunos
matriculados, mas em meados do primeiro semestre tínhamos uma fidelização de apenas 45% des-
tes discentes/dia letivo, ou seja, deste todo de matrículas, estavam presentes em sala de aula apenas
11 jovens, adultos e trabalhadores. Vários são os fatores que contribuem para oscilação da frequên-
cia deste aluno, entre eles o que mais impera é o cansaço físico e mental do trabalho pesado.
Não satisfeitos com as respostas encontradas nos acervos teóricos, a equipe pedagógica passou a
buscar uma solução que pudessse melhorar a situação/problema encontrada no momento com um
olhar clínico voltado para o próprio sujeito da EJA, seus potenciais e a cultura local, bem como suas
motivações pessoais. Mediante observações feitas durante as aulas foi notado um peculiar interesse
por parte dos alunos em participar de eventos animados que aliviasse o fardo pesado do dia a dia,
proveniente na sua maioria do trabalho na roça e dos afazeres domésticos. Outra observação feita
diz respeito à variedade de talentos presentes na sala de aula.
10 Projeto de escolarização de Jovens e Adultos desenvolvido pelo Serviço Social do Comércio – Sesc em mais de setenta mu-
nicípios brasileiros, através de Centros Educacionais.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Agora, certos de que a solução estava nos próprios alunos, o desafio posto, foi de criar situações
metodológicas em que eles fossem instigados a desenvolverem suas habilidades resgatando assim
as manifestações locais que embora estivessem adormecidas, são riquíssimas e fazem parte da iden-
tidade de cada sujeito, através de um planejamento organizado e colocado em prática.
Para concretização da ação os alunos escreveram suas memórias para socialização em momentos
futuros, como portadores de um rico acervo histórico e cultural numa programação diferenciada
na integração dos valores, resgate histórico e contextualização das habilidades, como por exemplo:
• Quem é poeta faz as suas poesias com rimas e versos;
• Os cantores e tocadores planejam o repertório, resgatando o forró e o repente cantado e
tocado;
• Os que contam piadas se organizam para posteriores apresentações;
• Os que fazem os dramas escrevem-nos a partir do resgate das memórias e apresentam
numa encenação teatral em forma de humor na caracterização dos personagens envolven-
do toda a escola, familiares e pessoas da comunidade;
Estes talentos oportunizam a socialização das habilidades a partir dos desdobramentos envol-
vendo as diversas áreas de conhecimento.

projeto de conViVênciA cUltUrAl: Um olhAr sobre A reAlidAde do


sesc ler de AcAUã
Em sala de aula, uma vez por semana, às sextas-feiras, nos horários destinados a Área de Conheci-
mento de Arte, os alunos se reúnem para transcreverem suas memórias que variam de acordo com
cada protagonista, que opta por enveredar por um caminho que lhe identifique de acordo com o
gênero textual que mais se identifica e o agrade constituindo-se como veia pulsante de sua história,
como é o caso do Sr. Bento, ciclo I, que conta piadas com naturalidade, tem até bordão “O bicho da
goiaba”, ele usa sempre essa frase em situações complicadas e adversas.
As produções textuais contribuem no trabalho com outras áreas do conhecimento, por exemplo,
Língua Portuguesa, onde o fazer e refazer a escrita, a revisão e o estudo gramatical e ortográfico
envolvem os diferentes gêneros textuais justificando a afirmativa.

Foto 1 – No centro da imagem o Sr. Bento, Foto 2 – Tocadores colocando seus talentos em
contador de piada e sua esposa, Dona Cristi- prática, animando os presentes em um momento
na sua principal admiradora e aluna do Sesc. de convivência. Fonte: Arquivo do Centro Educa-
Fonte: Arquivo do Centro Educacional cional

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Na última sexta-feira de cada mês chega o momento da socialização das escritas, das memórias e os
alunos aproveitam a oportunidade dada para reviver momentos: declamando, contagiando a todos
com emoções, encenando, cantando e encantando. Os familiares são convidados a participarem e
prestigiarem em clima de festa e os tocadores se manifestam: Antonio Filho no zabumba, Marceone
tocando triângulo, Pedro na sanfona, o Sr. Bento faz soar o pandeiro e o Sr. Luis solta o som da voz
com as músicas de Luiz Gonzaga.
Dentro do leque de manifestações artísticas e culturais presentes no espaço escolar aqui
referenciado, está o forró de raiz, mais um gênero que corre nas veias dos alunos e que integra os
momentos de convivência cultural.

Foto 3 – Alunos dançando forró. Fonte: Arquivo Foto 4 – Momento de declamação de poemas e
do Centro Educacional poesias. Fonte: Arquivo do Centro Educacional

Cada mês um gênero artístico fica em evidencia. Num outro momento os que têm facilidade com
poesia declamam suas obras emocionando e arrepiando a todos. Os piadistas levam a plateia ao
riso e os que gostam da dança soltam o passo convidando os demais a acompanhar. São momentos
onde as diferenças se misturam sem a pretensão de achar que um dom artístico é melhor do que
outro. Daí surgiu o nome do projeto Convivência Cultural, pois fala das diversas manifestações cul-
turais socializadas num só lugar.
Para tal, a nossa prática pedagógica ganhou maior significado a partir dos momentos vividos
durante a juventude pelos alunos desencadeando as áreas do conhecimento de forma crítica e dinâ-
mica, ampliando assim o universo educacional para recordar, reviver e representar. A nossa Proposta
se fundamenta no que diz na Lei de Diretrizes e Bases da Educação em seu Art.3º:

O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: I. Igualdade de con-
dições para o acesso e permanência na escola; [...] III. Pluralismo de ideias e de con-
cepções pedagógicas; [...] X. Valorização da experiência extraescolar; XI. Vinculação
entre educação escolar, o trabalho e as práticas sociais;[...] (BRASIL, 1996)

Os princípios citados anteriormente fortalecem o que vem sendo pesquisado na EJA, no tocante
à oferta de uma educação democrática e participativa, onde as várias ideias são discutidas e con-
frontadas enaltecendo a experiência de vida do educando, suas relações de trabalho e o seu modo
de vida.
De acordo também com os conteúdos e objetivos do eixo temático, Cultura e Diversidade Cultu-
ral da Proposta Pedagógica do Sesc Ler (2000, p. 45), é necessário “Reconhecer a própria cultura e da
sua comunidade como parte do patrimônio cultural da sociedade brasileira.” Ainda dentro dos parâ-
metros e orientações colocadas pela Proposta Pedagógica do Sesc Ler relacionada ao eixo temático,

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Cultura e Diversidade Cultural se observa que:

As manifestações artísticas são um aspecto importante na formação da identi-


dade cultural dos grupos sociais, expressando suas formas de ver o mundo. Todas as
formas de expressão artística devem merecer atenção e constituem excelente mate-
rial de estudo. (SESC, 2000, p. 45)

As atividades desenvolvidas durante os momentos de convivência cultural se configuram em di-


ferentes modalidades, como poema, poesia, parlenda, adivinhação, repente, piada, drama, forró,
dança, música, na manifestação de seus potenciais revivendo momentos prazerosos e resgatando
as memórias.
O drama, por exemplo, é uma das expressões artísticas de relevância em que os alunos repre-
sentam suas tristezas, alegrias e angústias através da encenação, numa espécie de musical rústico e
de raiz, de forma que estas manifestações culturais se consolidam como uma arte que faz parte da
expressão humana.
Os dramas surgem da memória de Dona Sebastiana, 73 anos, aluna do Ciclo II, tia Tiana, como é
carinhosamente conhecida. Ela conta que se lembra dessas apresentações encenadas na Praça da
Igreja e organizadas pelo professor Orlando, primeiro mestre a trabalhar lecionando no município
de Acauã. Ela diz ainda do seu forte desejo em estudar, porém suas limitações financeiras a impedi-
ram, mas não perdia uma só apresentação pública feita pelos alunos deste então saudoso professor
e a imaginava naquele grupo, o que a incentivava a aprender a letra das rimas, as quais lembra até
hoje.
Questionada sobre a autoria dos textos, ela não soube dizer quem seriam os autores, acha que era
do próprio professor e seus alunos, mas não se intimida em citar e escrever vários dramas assistidos.
Os dramas em seu enredo contam histórias de divórcios, casamentos frustrados, traição, situações
adversas como é o caso da “Matuta”, título de um dos textos em que a personagem sai da cidade pela
primeira vez e compra um picolé e sem saber dos procedimentos para degustar, coloca no fogo para
esquentar.
Entre os textos está “A Velha Assanhada”, como pode ser acompanhado abaixo na escrita de me-
mória da Dona Tiana:

A velha assanhada
Pirão bem mole, pirão bem mole, pirão bem mole pro mode nós jantar
Pirão bem mole, pirão bem mole, pirão bem mole pro mode nós jantar
Eu já tenho duzentos anos e ainda me acho tão novinha
Ó filha caça um noivo pra casar tua mãezinha
Ó filha caça um noivo pra casar tua mãezinha
Pirão bem mole, pirão bem mole, pirão bem mole pro mode nós jantar
Pirão bem mole, pirão bem mole, pirão bem mole pro mode nós jantar
Que velha enjoada que só fala em se casar
Ó velha pega um terço e vai pro quarto rezar
Ó velha pega um terço e vai pro quarto rezar
Pirão bem mole, pirão bem mole, pirão bem mole pro mode nós jantar
Pirão bem mole, pirão bem mole, pirão bem mole pro mode nós jantar
Que filha desaforada, não faça isso com tua mãezinha
Ó filha caça um noivo pra casar essa florzinha

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Pirão bem mole, pirão bem mole, pirão bem mole pro mode nós jantar
Pirão bem mole, pirão bem mole, pirão bem mole pro mode nós jantar

Quem trouxe à tona a tendência do drama na sala de aula foi tia Tiana, mas crente no que diz
Raul Seixas (1974) em uma de suas músicas –
“Sonho que se sonha só, é só um sonho que se
sonha só, mas sonho que se sonha junto é reali-
dade” –, ela compartilha com Dona Belita, sua
vizinha e aluna do Sesc Ler e parceira durante as
apresentações as suas encenações. Belita além
dos momentos oportunizados em sala de aula
passa tardes ensaiando os textos do drama na
casa de tia Tiana, segundo ela, e com modéstia
do seu potencial, “para não fazer feio”, demons-
trando a parceria e companheirismo gerado
pela amizade das alunas, estendendo-se para
Foto 6 – Momento de apresentação do Drama. além do espaço escolar.
Em cena Dona Tiana e sua filha Maria da Paixão. Os textos de memórias dos alunos são instru-
Fonte: Arquivo do Centro Educacional mentos utilizados para aprender a ler, escrever,
a compreender e organizar a estrutura textual,
observando regras gramaticais e aspectos orto-
gráficos, onde dentro do espaço de sala de aula são estudados.
As ações de convivência cultural foram ganhando corpo na unidade e hoje, além dos momentos
de socializações, estas estão presentes nos eventos promovidos pelo Centro Educacional, como por
exemplo, comemoração dos aniversariantes dos trimestres, culminância de projetos didáticos e en-
cerramento do ano letivo, entre outros.
Este trabalho além de enriquecer o cotidiano da sala de aula da EJA, é possível desenvolver ações
de convivência, descobrindo os talentos e potencialidades de cada um numa programação diferen-
ciada na integração dos valores e linguagens culturais, contextualizando as habilidades dos alunos
possibilitando a valorização dos saberes dos educandos - princípio de trabalho da EJA no Sesc. É
como dizia Herbert Souza (o Betinho):

“A cultura está entre nós, sempre. É o campo da consciência que o mundo se faz
ou se desfaz, é nesse universo da imagem, do som, da ação, da ideia. Tudo se resolve
na criação. É na invenção que o tempo volta atrás e atrás vai para frente. É onde
o homem vira bicho, bicho conversa com gente. É onde eu sou Guimarães, você é
Rosa. É onde fica como dantes ou tudo muda num átimo. É onde você se entrega de
mãos amarradas ou se rebela de faca no dente. É onde o silêncio vira pedra ou o grito
rompe tudo e esparrama a vida por todos os poros. E onde o riso chora e o choro é o
começo da cura (...). E gente é, antes de tudo, CULTURA.” (SOUZA, 1994 apud SESC,
2000 p. 44).

As experiências além do resgate das memórias contribuem com a prática pedagógica da turma,
conforme relatou a Orientadora Pedagógica Maria Doralice:

O Projeto de Convivência cultural é um grande elo entre a teoria e a prática, pois

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
com ele todos os alunos se interessam nas aulas para produzirem e apresentarem
suas habilidades, (por meio das diversas expressões artísticas, como drama, poemas,
piadas, repente etc.). É muito gratificante vê-los interessados em colocar no papel as
suas memórias. (depoimento, 22 de maio de 2014).

No engajamento e formação dos educadores de Acauã e na valorização da Proposta Pedagógica


do Projeto, analisamos os conteúdos no que diz respeito ao modo, como tais são aprendidos, pro-
porcionando a reflexão contínua sobre a prática pedagógica que é condição essencial para que os
educadores possam aperfeiçoar sua ação. Percebe-se que os educadores estão incluindo além dos
aspectos pedagógicos, a vivência contínua de atividades culturais diversificadas que atualizam e
ampliam a visão de mundo dos alunos, como nos ensinou Paulo Freire:

A capacidade que têm os educandos de conhecer os termos críticos - de ir mais


além da mera opinião - se vai estimulando no processo de desvelamento de suas
relações com o mundo histórico cultural. Mundo de que os seres humanos são os
criadores. (FREIRE, 1994 apud SESC, 2000 p. 36)

Nessa perspectiva, os conteúdos deixam de ser um fim em si mesmo, ganhando significados di-
versos a partir das experiências sociais do grupo e passando a ser meios para a ampliação do univer-
so do aluno, mediando o seu contato com a realidade de forma crítica e dinâmica.
Através da prática das múltiplas linguagens, garantiu-se o acesso das pessoas jovens e adultas,
nos momentos de socialização assegurando e concretizando assim o desenvolvimento da oralidade,
o resgate e registro das memórias e principalmente a participação nos eventos artísticos protagoni-
zados pelos próprios alunos.
Nos resultados obtidos percebeu-se uma clientela satisfeita e comprometida, na participação das
novas possibilidades de aprendizagem, compreensão de mundo, lazer, relacionamento com as pes-
soas e crescimento humano, resgatando assim a autoestima, assiduidade e a melhoria da qualidade
de vida.
Tem se observado como fruto deste trabalho, alunos com autoestima elevada, não temos mais
em sala sujeitos fadigados tentando cumprir com uma exigência da sociedade, a de ler e escrever,
mas seres humanos que encaram a leitura e escrita como consequência de um trabalho pedagógico,
fluindo de forma natural.
O prazer em estar num ambiente onde ele é enxergado com potencial não só de aprender, mas
também de ensinar, de contribuir com o processo que deixou este aluno mais presente, algo notado
na frequência que antes era de 45%, atualmente temos diariamente em sala de aula uma média de
18 alunos satisfeitos, o que corresponde um percentual de 75%. Vale destacar que nos momentos de
socialização a turma aparece em peso para mostrar seu talento ou prestigiar o do colega.
Sabe-se que este percentual de frequência não é o ideal, mas sinaliza para o resultado de um
trabalho que vem dando certo, contribuindo assim nos estudos desenvolvidos sobre a EJA, diante
de reflexões com um olhar desafiador, capaz de instigar inquietações com relação à aprendizagem,
sugerindo sempre novas propostas e ampliando as condições de permanências dos alunos.
Partindo do pressuposto de que a aprendizagem está ligada à permanência, outro ponto que se
destaca em decorrência desta ação é o maior rendimento escolar, com os alunos mais presentes e
entusiasmados, nota-se o aprendizado acontecendo de forma significativa.
Dessa maneira, o Projeto Convivência Cultural tem contribuído como forma de ressignificar a
realidade da EJA, acreditando que ainda há muito a se aperfeiçoar tendo a consciência de que ne-
cessitamos estar na busca constante da permanência dos alunos, norteando-se sempre na constru-

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
ção de saberes a partir da prática, e orientados pela proposta pedagógica do Sesc, que considera a
valorização da realidade do educando, trazendo as vivencias para a sala de aula na construção de
um conhecimento diversificado, rico e multicultural.
Outro aspecto relevante é a importância dada pelo Sesc a formação de seus profissionais em
serviço, na perspectiva de que os processos de ensinar e de aprender precisam estar em constante
diálogo para a abertura de novos modos de fazer e ser no meio educacional.

referênciAs bibliográficAs
BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional,
nº9394, de dezembro de 1996.
BRASIL. Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação de Jovens e Adultos. Brasília, 2000. (Parecer
nº 04/98. CNE).
SEIXAS, Raul. Prelúdio. Rock. Site Vagalume – disponível em: http://www.vagalume.com.br/raul-sei-
xas/preludio.html. Acessado em 27/05/2014 as 19:00 horas
SESC, Diretrizes para Orientação Pedagógica do Projeto Sesc Ler, Rio de Janeiro, 2003.
SESC, Proposta Pedagógica do Sesc Ler, Rio de Janeiro, 2000.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
diVersidAde em cenA nA ejA – leitUrAs possíVeis
ricArdo de freitAs jUnior

A todos deve ser dado o direito do contato com a literatura e com a arte em suas mais diversas
representações. Não apenas como currículo, mas como forma de leitura polissêmica das próprias
vidas, pois trabalhar com textos poéticos favorece a formação do indivíduo e cria outras possibilida-
des e utilizações da escrita e da leitura em nossa sociedade; novas formas de ver e estar no mundo.
Na Educação de Jovens e Adultos (EJA) verifica-se a necessidade de um trabalho de leitura mais
intenso que viabilize a compreensão dos textos e sua leitura crítica – assim como o aprimoramen-
to da gramática, mas sobretudo a percepção das relações entre os textos e o contexto, entre si e o
mundo. Além disso, a EJA apresenta outras características marcantes, como a diversidade e o desafio
que o aluno tem de “ter tempo” para ler diante dos compromissos do dia a dia – usadas em favor da
construção do projeto feito em um processo colaborativo com o Ensino Fundamental da EJA do Co-
légio Sagrado Coração de Maria do Rio de Janeiro: a montagem de uma representação teatral sobre
músicas de Dorival Caymmi em comemoração ao centenário de seu nascimento. O trabalho visou
à interpretação de textos de diferentes gêneros e à reorganização dos saberes de acordo com múl-
tiplas vivências, desenvolvendo outras capacidades que ultrapassam o conhecimento do código,
partes de um complexo processo cognitivo de apropriação pelo aluno enquanto se torna “sujeito do
olhar”. Para isso, além das pesquisas, ouviram/leram e reinterpretaram músicas/poesias em forma de
dramatização, explorando o poder narrativo e o elemento mar, tão presentes nas canções de Dorival
Caymmi. Dessa forma, conseguimos fazer duas apresentações que foram documentadas (gravadas
e fotografadas) pelos próprios alunos para exibições posteriores.

palavras-chave: Diversidade, Leitura, Teatro, EJA

A interpretação de textos e a representação fazem parte de um complexo processo cognitivo


e são fundamentais na construção da relação entre o leitor e seu imaginário, sua identidade e seu
universo. Especialmente na Educação de Jovens e Adultos (EJA), quanto mais o sujeito adentra no
mundo das letras (escritas, trechos lidos em voz alta) e das diversas formas de arte – pois toda arte é
necessariamente produto da subjetividade –, tanto mais ele se habilita a ler criticamente o mundo.
A leitura e a interpretação, portanto, instrumentalizam os sujeitos para uma intervenção cada vez
mais significativa na realidade.
Por isso surgiu o projeto que culminou com a peça “É doce morrer no mar”: por conta da neces-
sidade marcante na EJA de um trabalho de leitura mais intenso que viabilize a compreensão dos
textos e sua leitura crítica – assim como o aprimoramento da gramática, mas sobretudo a percepção
das relações entre os textos e o contexto, entre si e o mundo. Paulo Freire, em discurso de 1981,
sabiamente alertou para a importância da compreensão crítica do ato de ler e da leitura em si, “que
não se esgota na decodificação pura da palavra escrita ou da linguagem escrita, mas que se antecipa
e se alonga na inteligência do mundo” (FREIRE, 2011). A interpretação e a reelaboração de textos de
diversos gêneros no projeto visaram, dessa maneira, ao desenvolvimento de habilidades para além
do conhecimento do código.
O projeto procurou levar em consideração que a leitura estimula o diálogo, não se trata de uma
atividade egocêntrica. Ao montarmos a peça colaborativamente, dando sentido às nossas leituras
em sala, procuramos valorizar discursos e interações que nasciam de experiências múltiplas para
promover a incorporação crítica do saber, a diversidade cultural, a intersubjetividade, a experiência
cotidiana, a autonomia de pensamento, a ação conjunta de professores e alunos e, enfim, a apro-
priação do conhecimento.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Assim, para a Feira Literária de 2014 os alunos de 6º e 7º Ano do Ensino Fundamental Anos Finais
da EJA do Colégio Sagrado Coração de Maria do Rio de Janeiro (CSCM-RJ), em um processo colabo-
rativo, montaram uma representação teatral com base em três músicas de Dorival Caymmi, em co-
memoração ao centenário de seu nascimento. Para isso, além da pesquisa sobre a biografia e a arte
do compositor, poeta e artista plástico e de assistirem a um documentário (“Só pra lembrar”, 1978)
sobre ele, ouviram/leram e reinterpretaram as músicas/poesias “O mar”, “Marina” e “É doce morrer
no mar” em forma de dramatização, explorando o poder narrativo e o elemento mar, tão presentes
nas canções de Dorival Caymmi.

ejA e diVersidAde
Tal modalidade da educação tem uma característica marcante: a diversidade. O público da EJA é
bastante heterogêneo, existem interesses diversos, múltiplas identidades, diferentes necessidades,
expectativas, habilidades, vivências – e tudo isso precisa ser usado em favor da construção de uma
proposta pedagógica que respeite as particularidades desse público.
As turmas da EJA do CSCM-RJ são compostas por homens e mulheres de várias faixas etárias que
buscam, no turno da noite, o aprimoramento e a conclusão dos estudos. Eles utilizam satisfatoria-
mente o sistema alfabético, mas a maioria tem grandes dificuldades para ler e escrever. Enfrentam
ainda o desafio de “ter tempo” para ler diante de trabalho, família, estudos e tantos outros compro-
missos – sintoma do novo paradigma contemporâneo e sua crise de valores, no qual a diferença ain-
da é considerada inferioridade, o consumismo é desenfreado, as massas humanas são descartáveis,
os modelos, preestabelecidos e há alienação. Um mundo no qual todos são vítimas de alguma forma
de preconceito e exclusão, impedidos de fazer escolhas, mas sem consciência delas.
Precisamos estar atentos a esse cenário e combatê-lo por meio da valorização do ser e não do ter,
de nossas histórias, de nossa cultura nacional tão diversificada e de nosso próprio tempo. A diversi-
dade é uma das características mais visíveis do mundo que nos cerca, onde tudo interexiste e coe-
xiste. Por isso, durante a realização do projeto, procuramos sempre promover a troca de vivências, a
diversidade e a complexidade das relações entre os alunos.
Durante as leituras a diversidade de pontos de vista e experiências criava um ambiente em que
todos os caminhos eram possíveis. Os alunos compreenderam que deveriam evitar a postura de
arrogância de quem sabe mais e que o texto não serve para ser simplesmente esmiuçado, definitivo
em sua leitura, esquecido. A palavra pode ser sempre reinventada: “As palavras são coisas para o
corpo. ‘Não só de pão vive o homem, mas de toda a palavra...’ (...) As palavras fazem crescer o nosso
corpo, crescer os nossos olhos, os ouvidos, o nariz, a boca... Tudo fica mais sensível!”11
A experiência da leitura incorpora a particularidade da literatura e da arte de construir um mundo
coerente e compreensível, logo, racional; esse universo, contudo, se alimenta da fantasia do autor,
que elabora suas imagens interiores para se comunicar com o leitor. O texto concilia a racionalidade
da linguagem, de que é testemunha sua estrutura gramatical, com a invenção nascida na intimidade
de um indivíduo. Assim, ler enquanto possibilidade de fazer interagir imaginação e raciocínio, fanta-
sia e razão, emoção e inteligência constitui uma atividade sintetizadora, na medida em que permite
ao indivíduo penetrar no âmbito da alteridade sem perder de vista sua subjetividade e sua história.
O leitor expande as fronteiras do conhecido sem perder sua própria dimensão, pois a literatura sus-
cita no indivíduo um posicionamento intelectual, acionando a fantasia, além de uma vivência inte-
rior diversa e a capacidade de abstração, essenciais no percurso da aprendizagem.

em cenA: “é doce morrer no mAr”


Em fevereiro deste ano os alunos foram apresentados à ideia e toparam o desafio de montar uma
11 Sobre o tema ler os artigos de Rubem Alves (2013), especialmente “Sobre os perigos da leitura”, “Cabeça vazia”, “Quero-
-quero” e “Magia”.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
peça teatral. O projeto da peça “É doce morrer no mar” foi composto pelas seguintes etapas a seguir
resumidas:
1. Apresentação do projeto: no início do ano as turmas conheceram a ideia do projeto
e fizeram sugestões e perguntas; orientações para a pesquisa e a organização das
aulas dedicadas ao projeto, que aconteceram uma vez por semana.
2. Pesquisas sobre Dorival Caymmi: os alunos foram orientados a pesquisar qualquer
tipo de material ou texto sobre o compositor, poeta e artista plástico brasileiro.
3. Leituras: todos lemos e demos sentido aos textos que foram pesquisados; momento
em que assistimos ao documentário sobre Dorival Caymmi e também realizamos
produções textuais coletivas (listas e roteiro, por exemplo) e individuais (em sua
maioria textos de opinião); escolha das músicas da peça.
4. Ensaios: durante os ensaios adaptamos as ideias do grupo à nossa realidade e cria-
mos novas situações; relacionamos o que mais seria necessário para a montagem e
dividimos as tarefas.
5. Montagem: período de ensaios finais e últimos ajustes.
6. Estreia da peça: houve duas apresentações no mesmo dia para dois grupos de alu-
nos da EJA.
7. Apresentação do vídeo da peça na Feira Literária do colégio.
É importante ressaltar que durante o processo as leituras se transformavam e novas situações
eram criadas a todo o momento. Isso exigia dos alunos constantes adaptações às possibilidades e
consequentemente capacidade de solucionar problemas, movimento que se manteve do início ao
final do projeto.
Durante esses momentos de colaboração e reelaboração visamos, entre outros objetivos, a co-
nhecer diferentes materiais e possibilidades de leitura, saber para que servem para recorrer a eles;
acompanhar leituras orais feitas pelo professor e por outros alunos; confrontar as próprias opiniões
sobre os textos e a montagem da peça com as dos colegas; comentar recursos linguísticos utilizados
principalmente nas músicas; ler por gostar de ler, compreendendo por conta própria o que foi lido;
ler em voz alta para compartilhar os textos; produzir textos de acordo com sua função social, ou seja,
dirigidos a diversos destinatários, com vários propósitos.
Com as pesquisas os alunos se surpreenderam com a quantidade de músicas de Dorival Caym-
mi que conheciam, como no caso de “O que é que a baiana tem?” e “Maracangalha”. Optamos pela
temática do mar, presente nas canções “O mar” e “É doce morrer do mar”, e em “Marina”, que fala de
desentendimento amoroso. Devido às histórias que contam, as músicas puderam ser reinterpreta-
das para tecer a narrativa a ser encenada, aqui brevemente relatada em cenas: o pescador passeia
na praia com sua amada, dança com ela, vai para a lida no mar e não volta; depois, a mulher recorda
o amado e enfrenta a solidão; o pescador ressurge nos braços de Iemanjá e ambos são engolidos
pelo mar.
Dois alunos realizavam uma coreografia com uma lona escura que simbolizou o mar, elemento
fundamental na montagem, enquanto eram os responsáveis pelo truque de “desaparecimento” e
“surgimento” de Iemanjá e do pescador, encobrindo-os ou revelando-os com auxílio da lona. Com
outros alunos balançando lanternas (relâmpagos), sons de trovões, a escuridão e o “marulhar” da
lona, de repente estávamos todos à beira do mar, ouvindo “O mar” e vendo o pescador com sua
namorada, logo depois levado pelas ondas em um terrível acidente. Assim conseguimos transmitir
de imediato ao público a força narrativa das músicas de Dorival Caymmi, o fascínio e o medo que o

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
mar provoca nos homens e seu poder no imaginário da nossa cultura.
Quando logo em seguida toca “Marina” mais alunos entram em cena fazendo bolhas de sabão e
materializam o delírio e a saudade, o desespero da mulher do pescador, que se maquia e perambula
pelo palco. Ele reaparece, ela não o vê, mas sente seu conforto e vai embora. Na última música, “É
doce morrer no mar”, quem surge das águas é Iemanjá, outro elemento presente no imaginário do
nosso povo, para levar o pescador para o fundo do mar – da lona, que continua seu vaivém até as
luzes se apagarem.
Os alunos dedicaram-se ao projeto uma aula por semana e durante as leituras utilizaram-se de
todo conhecimento de mundo e habilidades que já possuem para reelaborar poemas, músicas, re-
portagens, biografias, vídeos, entre outros gêneros textuais ou não. Desde o começo cada aluno
sentiu-se à vontade para realizar a função que mais lhe agradasse, ou atuar no papel que quisesse.
Presenciamos em grupo histórias de superação (de quem tinha medo de público, por exemplo) e
também exemplos de aprendizado: filmar, fotografar, receber o público, organizar uma peça, cuidar
da luz, do som, ajudar o outro...
Como o trabalho foi colaborativo e feito com duas turmas, constatamos que todos têm o seu
papel no mundo e uma importante bagagem. Os alunos tiveram de argumentar e ceder em favor
do coletivo, o que deu outro ritmo e significado às aulas e permitiu que se reforçasse a amizade, a
solidariedade, a criatividade e a diversidade de opiniões.
Conforme as ideias foram surgindo, cada um levou para o projeto um pouco do próprio mundo
por meio das releituras fez, da dança, do capricho ao arrumar o cenário, da fotografia, do interesse
por maquiagem, tecnologias, entre outros assuntos e habilidades que já tinha ou gostaria de desen-
volver. Dessa forma, conseguimos fazer duas apresentações para dois grupos (Ensino Fundamental
e Médio da EJA) no auditório multimídia do Colégio, que foram gravadas e fotografadas pelos pró-
prios alunos. Na mesma semana, no dia da Feira Literária, exibimos o vídeo da peça várias vezes para
os visitantes, editado pelo aluno responsável pela filmagem.

conclUsões possíVeis
Durante a montagem e os ensaios muitas foram as colaborações de alunos de outras turmas, de
professores e funcionários do Colégio que se envolveram com o projeto, com o figurino, boas ideias,
sugestões, entre tantas outras coisas. Para a realização do projeto, portanto, a diversidade de pontos
de vista e de vivências foi fundamental. A interpretação de textos de diferentes gêneros e a reorga-
nização dos saberes de acordo com múltiplas vivências visaram, assim, a outras capacidades que
ultrapassam o conhecimento do código, partes de um complexo processo cognitivo de apropriação
pelo aluno enquanto se torna “sujeito do olhar”.
Por fim, é importante ressaltar que persiste a concepção de EJA em termos de educação mera-
mente compensatória, que busca a recuperação de um tempo de escolaridade perdido. Esta é uma
concepção que ainda precisa ser superada, pois parte do pressuposto de que a hora apropriada para
o aprendizado é a da infância e da adolescência. É preciso, assim, ampliar as dimensões de tempo/
espaço de aprendizagem, na qual educadores e educandos possam estabelecer uma relação mais
dinâmica com o entorno social e com suas questões – considerando que a juventude e a vida adulta
também são tempos de aprendizagem. A educação é, assim, um direito que se afirma independen-
temente do limite de idade.
A todos, em qualquer idade, deve ser dado o direito do contato com a literatura e com a arte em
suas mais diversas representações. Não apenas como currículo, mas como forma de leitura polissê-
mica da vida. Das próprias vidas. Não há experiência artística que não constitua experiência formati-
va e trabalhar com textos poéticos favorece a formação do indivíduo, criando outras possibilidades
e utilizações da escrita e da leitura em nossa sociedade; novas formas de ver e estar no mundo,
portanto.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
referênciAs
ALVES, Rubem. “Magia” In: Ao professor, com carinho. 2ª edição. Rio de Janeiro: BestBolso, 2013.
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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
do ensino fUndAmentAl Ao médio nA ejA: múltiplos
cAminhos pArA o direito à esperAnçA
lUís fernAndo monteiro mileto

Apresentar aspectos da pesquisa desenvolvida com jovens e adultos que cursaram o ensino fun-
damental e médio na EJA é a principal finalidade do presente trabalho. Uma das questões de pes-
quisa referiu-se às diferentes percepções dos entrevistados sobre suas experiências nessas etapas
da educação básica, relacionando-as com os objetivos enunciados nas legislações e outros textos
oficiais. A investigação fundamentou-se em princípios teóricos derivados da perspectiva intercul-
tural, valorizando-se tanto a diversidade, expressão da imensurável riqueza planetária, quanto os
processos educativos, concebidos como fios dessa complexa rede, ambos imprescindíveis para a
continuidade da vida planetária. Todavia a valorização da diversidade humana não se confundiu
com a aceitação passiva das diferenças e injustiças que se originam nas desigualdades, a ausência
de uma análise crítica que realize a distinção entre diferenças e desigualdades poderia conduzir
a um conformismo produtor de imobilismos e desesperança. Em sentido inverso, os referenciais
éticos utilizados vincularam-se com princípios e valores alicerçados na perspectiva da equidade,
direcionando os conhecimentos construídos para seu potencial de contribuição nos processos de
mudança social. A negação de perspectivas homogeneizantes dos estudantes da EJA, empiricamen-
te fundamentada na compreensão dos múltiplos percursos biográficos é uma das principais conclu-
sões da pesquisa. As técnicas de coleta (ou construção) de dados utilizadas na investigação foram: a
observação de campo, consultas à documentação escolar dos alunos, análise de textos normativos e
entrevistas com sujeitos representativos da diversidade presente na EJA. Mesmo em contextos edu-
cativos e de pesquisa marcados pela força das diversidades foi possível encontrar simultaneamente
características comuns entre os estudantes entrevistados. A principal confluência evidenciada nos
discursos pode ser sintetizada naquilo que a genialidade criativa de Paulo Freire denominou direito
à esperança, pois a escolarização na EJA foi considerada como um dos caminhos possíveis na luta
contra as desigualdades e para a conquista de transformações individuais e coletivas.

palavras-chave: EJA, Diversidade, Direito, Educação Básica

A diversidade é a expressão pulsante da incomensurável riqueza do nosso planeta, os processos


educativos, um dos fios nessa complexa rede, expressam a relevância das diferenças humanas para
a continuidade da vida na Terra.
Se existem múltiplas diferenciações geradas pela natureza, o mesmo não se pode afirmar sobre
os processos sóciopolíticos de produção e reprodução das hierarquias. Nesses contextos, histori-
camente produzidos, foram instituídas estruturas de dominação que ao estabelecer significados e
classificações para as diferenças, asseguraram continuamente múltiplos benefícios para poucos pri-
vilegiados, impondo-se, em contrapartida, um conjunto de obstáculos ao pleno exercício de direitos
para uma populosa maioria.
O reconhecimento da diversidade cultural, sistematizada como campo de reflexão permite a ca-
racterização de práticas e valores que se contrapõem às forças históricas associadas à consolidação
de lógicas etnocêntricas de imposição cultural (CANDAU, 2008). Tais forças são identificadas nos
interesses de transformar todos os espaços, formas de vida e, até mesmo, as próprias diferenças
culturais em mercadorias, desenvolvendo processos opressivos e homogeneizantes, vinculados ao
controle do patrimônio socialmente produzido.
A importância de evidenciar o valor da diversidade cultural, porém, não significa compactuar
com ideologias e epistemologias que advogam um tipo de relativismo que, ao confundir diversida-

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
de com desigualdades, podem sutilmente conduzir ao conformismo, à desesperança e ao imobilis-
mo (GERALDI, 2003).
É necessário reconhecer que os princípios éticos – considerados na perspectiva do conjunto de
valores que direcionam as pesquisas e os processos educativos – são componentes essenciais de
todos os paradigmas.
As múltiplas formas de produção de conhecimento são inseparáveis do horizonte valorativo ado-
tado. Quando eleitos valores alicerçados na perspectiva da equidade, é factível direcionar os co-
nhecimentos para o seu potencial de contribuição nos processos de mudança social (FERNANDES,
2005). A valorização da diversidade nos processos educativos e nas pesquisas estimula uma neces-
sária sensibilidade para o desenvolvimento de diálogos horizontais entre as diferentes expressões
culturais, afirmando-se a plenitude dos princípios da justiça, do respeito às diferenças e do reconhe-
cimento à dignidade humana como um direito inalienável.
Uma das principais singularidades da nossa espécie é a necessidade das aprendizagens associa-
das com a produção das condições que garantam a perpetuação da vida. Os aspectos fundamentais
que caracterizam a nossa humanidade são formados nas interações com nossos semelhantes que
permanentemente nos constituem como seres imersos em diversos contextos sócioculturais.
Durante um longo período das histórias dos diferentes povos, os processos educativos foram in-
diferenciados do trabalho de produção das condições para a vida. Tais características, com variadas
intensidades continuam presentes nos múltiplos agrupamentos humanos.
A criação de instituições especialmente destinadas à educação ocorreu em processos históricos
que haviam estruturado a divisão das coletividades humanas em camadas sociais marcadas pela
dominação e exploração entre os indivíduos e grupos sociais. A existência de modalidades de edu-
cação destinadas especificamente aos indivíduos pertencentes aos diferentes estratos sociais per-
maneceu como uma realidade histórica durante longos períodos.
As tentativas de superação das modalidades desiguais de educação não significaram, porém,
uma evolução linear de formas explicitamente organizadas para garantir a reprodução das relações
de poder, caracterizadas pelas assimetrias, para formas mais abertas e democráticas. Os processos
históricos, interessando-nos particularmente as contradições relativas ao direito à educação, podem
apresentar algumas permanências, mas, simultaneamente, são caracterizados pelas descontinuida-
des e rupturas.
No Brasil, a ampliação da escolarização é um processo relativamente recente. A análise, em nú-
meros absolutos, expressa a grande extensão dessas transformações, mas os percentuais12 são mais
favoráveis para realizar um dimensionamento comparativo com maior precisão.
Em pouco mais de cinquenta anos, enquanto a população brasileira teve um crescimento de cer-
ca de 180%, saindo de um patamar de 71 milhões em 1960 para ultrapassar a marca de 200 milhões
de habitantes em 2013, o total de matrículas, no mesmo período, passou de 8,7 milhões para cerca
de 56,7 milhões, representando um expressivo aumento de 550%.
Esse processo encontra-se ainda em fase de consolidação, pois apenas no ano de 2009 a Consti-
tuição brasileira foi alterada pela Emenda Constitucional nº59/2009 assegurando a educação básica
obrigatória e gratuita dos 4 aos 17 anos, garantindo-a legalmente a todos, mesmo àqueles que não
tenham exercido esse direito nas idades socialmente previstas.
Por outro lado, os dados do Censo da Educação Básica 2013 indicaram que 98% das crianças en-
tre 6 e 14 anos estavam matriculadas, muitos analistas consideram que os percentuais atingidos há
alguns anos permitem a afirmação da universalização do ensino fundamental no Brasil.

12 Os dados expostos nos próximos parágrafos foram obtidos a partir de consultas ao portal eletrônico do INEP – Instituto
Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – http://portal.inep.gov.br/ e das estatísticas presentes na obra Retrato
do Brasil (Pereira, 2007).

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Esse quadro de massificação do ensino fundamental, caracterizado mais por imposições insti-
tucionais sobre o fluxo escolar do que propriamente pela criação de condições que garantam me-
lhorias efetivas na qualidade, pressionou também o ensino médio que apresentou um crescimento
acentuado, descrito até mesmo como “explosivo”. De um total de 267 mil estudantes em 1960 che-
gou-se a mais de 8 milhões em 2013, representando o gigantesco aumento de 2.900%.
Os dados de 2013 também revelaram que 15,8% dos jovens entre os jovens de 15 a 17 anos, que
poderiam estar cursando o ensino médio, não estavam matriculados em nenhum nível ou modali-
dade de educação. Se considerarmos que existem cerca de 16 milhões de pessoas nessa faixa etária,
significa dizer que mais de 2,5 milhões de jovens brasileiros estão fora da escola. É necessário, po-
rém, um grande cuidado para compreender esse quadro, pois o diagnóstico superficial e apressado
que culpabiliza os diversos atores envolvidos, pouco considera as relações fundamentais entre uma
sociedade ainda caracterizada pelas desigualdades sociais e o sistema educativo.
Para exemplificar sinteticamente a necessidade de ponderar sobre a perversidade dessas rela-
ções, estudos sobre as desigualdades nos processos escolares indicam que os jovens pertencentes
aos estratos dos 20% mais ricos têm o triplo de chances de cursar o ensino médio em relação aos jo-
vens das camadas sociais dos 20% mais pobres (BRASIL, 2009, p.33). Contudo, a dimensão econômi-
ca precisa, por sua vez, não estar isolada de outros contextos que produzem o que vem sendo deno-
minado como a grave crise do ensino médio. Somente uma perspectiva relacional profundamente
radicada na ética da justiça e equidade poderá construir uma compreensão não comprometida com
as forças de conservação das desigualdades.
No entanto, mesmo persistindo esse expressivo número de jovens fora da escola, a escola pública
é a instituição estatal com maior presença no cotidiano da sociedade brasileira, considerando os
referenciais de tempo e espaço, combinados com a abrangência do atendimento diário a um con-
tingente populacional de 40,3 milhões de habitantes.
A importância da escola pública, além dessa massiva presença na vida social brasileira, adquire
maior relevância se considerarmos que as camadas populares dependem quase exclusivamente do
seu funcionamento para o acesso e a aquisição de bens culturais valorizados nos processos de clas-
sificação social.
Dois tipos de desafios estão associados à ampliação do direito à educação escolar para as cama-
das populares. O primeiro deles refere-se à criação de instituições capazes de efetivar não apenas
o direito ao acesso, mas, também à permanência com o êxito e, sobretudo, aprendizagens signifi-
cativas, criadoras de transformações individuais e coletivas que se direcionem para a ampliação da
solidariedade e da equidade. Todavia, é relevante ressalvar que as políticas públicas direcionadas
para formação humana são um campo de disputas e conflitos. O segundo desafio, no qual se insere
o desenvolvimento da pesquisa que fundamenta o presente texto, direciona-se à necessidade de
produção de conhecimentos sobre a complexidade desses processos.
Partindo da premissa que uma das principais finalidades da escolarização é oferecer condições
que garantam aos estudantes um caminho efetivo para sua formação e para a conclusão das dife-
rentes etapas do processo educativo, torna-se evidente a importância de investigações que identi-
fiquem e compreendam as circunstâncias que aumentem as probabilidades para a concretização
dessas finalidades. Dessa forma, os conhecimentos produzidos no campo da educação podem fun-
damentar a criação de contextos educativos que ampliem efetivamente a permanência dos estu-
dantes e, consequentemente, o direito à educação.
As transformações históricas que possibilitaram o acesso aos níveis mais avançados do sistema
escolar por indivíduos dos estratos menos privilegiados da sociedade podem ser consideradas como
parte de um processo democratização das oportunidades educacionais. No entanto, se considerar-
mos as enormes diferenças nas condições de ofertas de escolarização, que evidenciam a perpetua-
ção das desigualdades, torna-se necessário ponderar sobre os limites, ou até mesmo, em algumas

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
circunstâncias, negar a efetividade dessa democratização.
Quando são propostas reflexões sobre a etapa final da educação básica, existe uma associação
quase imediata entre o ensino médio e o tema juventude. Essa ligação é indubitavelmente legítima,
pois mesmo com os problemas da defasagem idade/série, a maioria dos estudantes dessa etapa da
educação básica está na faixa etária tradicionalmente identificada com os ciclos vitais da juventude.
É relevante, porém, destacar que além dos jovens estudantes do ensino médio regular também
é significativa a presença de adultos no ensino médio na modalidade EJA. Essa modalidade de edu-
cação tem adquirido grande amplitude como oferta de ensino médio, tanto em razão das ques-
tões relativas a interrupção das trajetórias escolares – problema que articula, entre outros aspectos,
as desigualdades educacionais com as perversas estruturas de distribuição de riquezas – quanto
pela defasagem idade/série. Há uma interessante similitude entre uma tradicional representação
da juventude como etapa intermediária situada entre a infância e a idade adulta e o ensino médio
também como uma etapa intermediária situada entre o ensino fundamental e a educação supe-
rior. Possivelmente essa coincidência de representações como posições intermediárias e transitórias
expliquem por um lado a forte associação entre ensino médio e juventude e, por outro, a relativa
escassez de estudos sobre o ensino médio na modalidade EJA.
A educação de jovens e adultos, após um longo percurso direcionado à alfabetização e ao ensino
fundamental, associou a expressão EJA à etapa final da educação básica, sendo estabelecida, no
contexto da educação brasileira, uma original e relativamente recente combinação da EJA com o
ensino médio.
De acordo com dados sobre a matrícula inicial do Censo Escolar 2012 de um total de 8.116.619
matrículas no ensino médio no Brasil, 971.533 matrículas estavam na modalidade EJA, ou seja, 12%
dos estudantes brasileiros cursavam o ensino médio na EJA. Considerando-se apenas a EJA, nas
etapas do ensino fundamental e médio, de um total de 3.237.333 matrículas, as 971.533 matrículas
representavam 30,0% dos estudantes da EJA cursando o ensino médio. Realizando uma desagrega-
ção dos dados, é interessante observar que no chamado ensino regular, o somatório das etapas do
ensino fundamental e médio totalizava 32.090.061 estudantes matriculados, sendo que desse total
7.145.086 ou 22,3% estavam no ensino médio. Comparando-se as modalidades EJA e ensino regular,
o percentual 30% de estudantes da EJA cursando o ensino médio era superior aos 22,3% do ensino
regular.
Uma análise preliminar dessas estatísticas indica a persistência de problemas relativos à questão
da defasagem idade/série, mas alerta, sobretudo, para a importância de uma modalidade escolar
que torne efetivo o exercício do direito à educação para aqueles que necessitam viver simultanea-
mente como estudantes e trabalhadores ou trabalhadoras.
São significativos os desafios apresentados por esse contexto, no qual se produziu um en-
trelaçamento do ensino médio com a EJA. O ensino médio tem sido a etapa da escolarização mais
intensamente caracterizada pelas dificuldades em assegurar o exercício do direito à educação e pela
fragilidade da sua definição identitária, oscilando historicamente entre a tradição de um ensino pro-
pedêutico e tentativas de formação profissional.
A EJA, por sua vez, pode ser caracterizada como uma modalidade de educação que na sua diver-
sidade de práticas e metodologias, vem constituindo-se como espaços educativos que tanto podem
apresentar práticas mais conservadoras quanto experiências pedagógicas com o potencial de influir
sobre as demais modalidades educativas.
Essa ambiguidade das práticas educativas desenvolvidas na EJA permite elaborar a pertinente
questão sobre a criação de estruturas curriculares que parecem “[...] ter caminhado para uma esco-
larização infantilizante do jovem e do adulto, perdendo essa dimensão criativa e crítica que tem a
educação popular” (Lázaro, 2012, p.144). Seria possível considerar que, como também afirma André
Lázaro, definitivamente “[...] a educação de jovens e adultos, curiosamente, perdeu, no Brasil, sua

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
conexão com a educação popular”? Existem incompatibilidades entre as dimensões criativas, críti-
cas e dialógicas que caracterizam a educação popular com práticas educativas desenvolvidas nos
espaços institucionais ocupados pelos estudantes das camadas populares?
A investigação sobre o valor atribuído ao ensino médio por jovens e adultos estudantes dessa
etapa da educação básica na EJA é o problema da pesquisa que venho desenvolvendo, tendo sinte-
tizado alguns aspectos neste artigo.
As categorias aluno ou estudante serão utilizadas a partir do posicionamento dos sujeitos em um
dos polos nas relações pedagógicas que se desenvolvem nos espaços escolares nas suas correspon-
dências com status e papeis sociais instituídos.
Toda categoria de análise inserida em um campo conceitual define os atributos positivos, aquilo
que o ser é, e os atributos negativos, aquilo que o ser não é. Podemos com certa facilidade estabele-
cer tudo que os alunos ou estudantes não são. Todavia o mais significativo, isso vem sendo eviden-
ciado em diversas pesquisas, é considerar o que os sujeitos são para além da condição de aluno13 ou
estudante.
A principal técnica de construção de dados, um dos principais elementos das metodologias de
pesquisa, foi a realização de entrevistas individuais e coletivas com jovens e adultos estudantes de
três escolas que oferecem o ensino médio na modalidade EJA da rede pública estadual, localizadas
na cidade do Rio de Janeiro. Também foram empregadas consultas a documentos escolares e obser-
vações propiciadas pela minha inserção no campo de pesquisa como pesquisador que simultanea-
mente atua como professor.
Para selecionar os entrevistados foram consideradas duas possibilidades em relação ao percurso
escolar: ou estarem cursando o ensino médio ou já o terem concluído. Outro critério estabelecido foi
relativo a um percurso escolar no segundo segmento do ensino fundamental de pelo menos um ano
na EJA, mais especificamente na escola em que trabalho como professor do Programa de Educação
de Jovens e Adultos (PEJA) e que havia sido tomada como campo de pesquisa para a dissertação de
mestrado (MILETO, 2009). Uma importante característica dessa escola do PEJA é a existência de um
contexto institucional que favorece a construção de vínculos de sociabilidade entre os alunos, mais
acentuadamente entre os adultos, como também entre estudantes e professores.
O principal objetivo da investigação é estabelecer relações entre os processos de escolarização
de jovens e adultos com os desdobramentos sociais que caracterizam a educação popular.
A perspectiva adotada considera que os processos educativos se amplificam exponencialmente
para a totalidade dos espaços sociais, influenciando diferentes formações sócioculturais. Postula-se
que o aumento da escolaridade das camadas mais empobrecidas da população incide de forma
significativa nas relações sociais, particularmente no que se refere à aquisição dos conhecimentos
socialmente valorizados e no estabelecimento de vínculos sociais instituidores de novos posicio-
namentos na vida social e particularmente diante da própria escola. Em outras palavras, o exercício
efetivo do direito à educação produz transformações na transmissão familiar de “[...] um certo ethos,
sistema de valores implícitos e profundamente interiorizados, que contribui para definir, entre ou-
tras coisas, as atitudes face ao capital cultural e à instituição escolar” (BOURDIEU, 2013, p.46).
A afirmação dos efeitos multiplicadores da escolarização de jovens e adultos sobre características
culturais das famílias das camadas populares constitui-se em forte argumento que se contrapõe
àqueles que defendem a redução ou até mesmo a não utilização de recursos públicos para a moda-
lidade EJA.
É relevante assinalar que da posição de professor da educação básica observo que ainda convi-
vemos, nas instituições escolares, com a escassez de informações significativas sobre os jovens e
adultos que buscam a escola. As informações prestadas para os registros escolares seguem o mes-
13 Seguindo a mesma perspectiva de Garbin (2009, p.30), reconheço a relevância das questões de gênero, mas para facilitar a
fluência do texto, usarei conforme a tradição, que evidencia aspectos das relações de poder, a flexão de gênero no masculino.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
mo padrão usado para as crianças – são realizadas exatamente no mesmo modelo de formulário
– impossibilitando a obtenção de informações mais pertinentes e específicas sobre características
desses indivíduos – por exemplo, solicitam-se os nomes dos responsáveis nas matrículas de jovens
maiores de idade e adultos, mas não são requeridas informações sobre suas condições de trabalha-
dores ou sobre suas responsabilidades familiares.
Há um significativo campo investigativo sobre os interesses e necessidades dos indivíduos
pertencentes aos setores populares, evidenciando-se algumas questões: Como sujeitos dos setores
populares elaboram formas de resistência aos contextos desfavoráveis à constituição de uma edu-
cação popular, ou seja, que atendam aos seus interesses e necessidades, conseguindo através dessa
resistência manter a educação escolar no horizonte de uma ilusão fecunda (SPOSITO, 1993)? Exis-
tem conexões entre o ensino médio na EJA com princípios que sustentem as práticas da educação
popular?
A realização das entrevistas permitiu conhecer um pouco das singularidades de alguns jovens e
adultos que buscam a conclusão da educação básica na EJA. Foi possível perceber nos entrevista-
dos uma grande capacidade de autotransformação para sobreviver em espaços muitas vezes hostis.
Seus objetivos e sonhos indicam que essa qualidade não se limita a uma adaptação, pois seus dis-
cursos apresentam críticas à instituição escolar e à sociedade, evidenciando um senso de justiça que
se articula com desejos de mudanças na vida pessoal e coletiva.
Algumas expressões recorrentes nos diálogos das entrevistas demonstram grande determinação
em “chegar onde a pessoa quer”, evidenciando uma lúcida compreensão da sua condição “no mo-
mento” de trabalhador pouco qualificado e estudante do ensino médio como etapas de um percur-
so para a almejada realidade de uma vida melhor.
A identificação de semelhanças e diferenças nas trajetórias de vida e nos processos de subjetiva-
ção dos jovens no ensino médio regular e dos adultos (e jovens) na EJA foi outro eixo para o desen-
volvimento deste trabalho de pesquisa.
Os relatos das experiências escolares dos entrevistados sobre como construíram seus processos
de permanência, muitas vezes enfrentando contextos escolares cruelmente adversos, não ocasiona-
ram necessariamente “[...] a sobrevivência imaginária dos desejos que a própria escola não para de
destruir” (BOURDIEU, 2008, p.490). De forma radicalmente diversa, a escolarização na EJA foi valori-
zada como um dos caminhos possíveis na luta contra as desigualdades sociais.
Mesmo em contextos educativos e de pesquisa marcados pela força das diversidades foi possível
encontrar características comuns entre os jovens e adultos entrevistados. A principal confluência
entre os discursos produzidos nos diálogos das entrevistas foi evidenciada pela afirmação que a EJA
continua sendo uma possibilidade real de resistência dos sonhos, constituída por imprescindíveis
espaços educativos nos quais “[...] as maiorias tenham o direito à esperança para que, operando o
presente, tenham futuro” (FREIRE, 2014, p.125).

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108
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
é mAis interessAnte fAlAr o desconto em
porcentAgem: fAzeres e sAberes mAtemáticos no
progrAmA nAcionAl mUlheres mill
AnA ligiAoliVeirA teixeirA

O Programa Mulheres Mill iniciou seus trabalhos em 2007, e sua implantação ficou sob a respon-
sabilidade da Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica. Neste ano foram atendidas mil
mulheres desfavorecidas das regiões Nordeste e Norte. A partir de 2012, foi ampliado para outras
regiões, também sob a coordenação dos Institutos Federais destas respectivas regiões. O estudo
descrito neste trabalho busca refletir a experiência do trabalho docente realizado na disciplina Ma-
temática, no Curso de Qualificação Profissional: Gestão e Relacionamento com o Cliente ofertado
pelo Programa Nacional Mulheres Mil, do Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes) Campus Vitória.
O Programa Nacional Mulheres Mil desenvolvido no Ifes-Vitória propiciou experienciar convivência
pedagógica com mulheres que trabalham fazendo panelas de barro, no espaço denominado Gal-
pão das Paneleiras, em Goiabeiras-Vitória-ES. A intencionalidade deste chamamento a estas mulhe-
res está diretamente ligada ao objetivo maior do Programa Nacional que a promoção da equidade
de gênero, a inclusão social, o acesso à educação de qualidade e ao mundo do trabalho. O trabalho
com estas mulheres visa atender ao âmbito da ação governamental que integra o Plano Brasil Sem
Miséria, Plano reconhecido como Política Pública afirmativa, de inclusão social e de equidade. Bus-
camos contextualizar o referido curso, sua metodologia de trabalho e a dinâmica do planejamento
da disciplina de uma forma que as alunas se sentissem inseridas nas discussões dando voz às suas
experiências de trabalho. A reflexão teórica relaciona políticas públicas, relações de gênero e edu-
cação matemática. Apresentamos uma pesquisa-ação de abordagem qualitativa. Para a construção
dos dados, foram utilizadas as anotações do diário de campo e as entrevistas. Os dados apontam a
aprovação das educandas com relação a dinâmica da disciplina. Com este trabalho consideramos
que a discussões levantadas, possam contribuir para a reflexão da nossa prática docente e das polí-
ticas públicas voltadas para a questão feminina.

Palavras-chave: Relação de Gênero, Educação Matemática, Programa Nacional Mulhe-


res Mill

1. pArA início de conVersA ...


Neste texto apresentamos um relato reflexivo acerca das nossas experiências com os fazeres e
os saberes matemáticos no curso de qualificação profissional ofertado às discentes do Programa
Nacional Mulheres Mil do Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes) Campus Vitória. Orientamo-nos
a partir da defesa que Freire (2002, p.43) faz: “É pensando criticamente a prática de hoje ou de
ontem é que se pode melhorar a próxima prática”.
Foi desenvolvida uma pesquisa de natureza qualitativa com abordagem metodológica na pes-
quisa-ação. Essa estratégia delineia-se quando “[...] os pesquisadores e os participantes envolvem-se
no trabalho de pesquisa de modo participativo ou cooperativo [...]” (SANTOS, 2002, p.78). O uso de
diferentes instrumentos incluindo a análise documental, (LÜDKE; ANDRÉ, 2003) permitiu olhares
específicos sobre os movimentos e as experiências desencadeadas nas aulas de Matemática para as
educandas do Programa.
A produção de dados para a pesquisa com os sujeitos realizou-se neste espaço institucional, entre
janeiro e março de 2013. Registra-se que a pesquisa documental foi realizada de forma concomi-

109
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
tante à produção de dados com os sujeitos. As informações, fornecidas por meio da análise dessas
fontes documentais, permitiram complementar e entrelaçar com as demais, coletadas por meio de
entrevistas e das anotações do diário de campo.
O texto, no primeiro momento, apresenta o contexto da oferta do Programa Mulheres Mil no
Instituto, posteriormente, relatamos as experiências em sala de aula com a disciplina matemática.

2. progrAmA mUlheres mil no ifes cAmpUs VitóriA


O Programa Nacional Mulheres Mil14 tem como objetivo a promoção da equidade de gênero, a
inclusão social, o acesso à educação de qualidade e ao mundo do trabalho. No âmbito da ação go-
vernamental, integra o Plano Brasil Sem Miséria e é reconhecido como Política Pública afirmativa, de
inclusão social e de equidade.
Sua implantação ficou sob a responsabilidade da Rede Federal de Educação Profissional e Tecno-
lógica e em 2007 teve início as primeiras experiências com mil mulheres desfavorecidas das regiões
Nordeste e Norte15. A partir de 2012, empreendeu-se uma política de ampliação do Programa para
os Institutos Federais das outras regiões brasileiras.
Diante dessa proposta, o Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes)16 Campus Vitória aderiu ao Pro-
grama e vem desenvolvendo ações para sua implementação, articulando-a com as demais políticas
de inclusão em curso na Instituição.
Nessa perspectiva, é necessário desvelar a especificidade da história do público feminino no sen-
tido de entender o recorte de gênero feito. É perceptível, no Brasil, a importância cada vez maior da
população feminina no mercado de trabalho e nas instituições educacionais decorrente das alte-
rações culturais e econômicas relacionadas ao desenvolvimento mais recente do capitalismo, que
exigiu maior volume de mão de obra em diversos setores da economia.
Estudos recentes divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2010) e pelo
Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (DIEESE, 2010), apontam que
as mulheres são a maioria da população brasileira e que ainda apresentam níveis de escolarização
mais elevados que a dos homens.
Entretanto, no que se refere à forma de inserção no mercado de trabalho, elas se encontram em
situação menos favorável: apenas 40% das mulheres no mercado de trabalho têm carteira de tra-
balho assinada, já entre os homens está proporção atinge 50%. Observou-se também que os rendi-
mentos das mulheres são cerca de 60% menores que os rendimentos dos homens, indicando que,
mesmo com grau de escolaridade mais elevada, as divergências salariais entre homens e mulheres
seguem elevadas.
Esses indicadores vêm corroborar com essa discussão ao apontar que a inserção feminina no
mercado de trabalho tende a crescer, não só por fatores positivos como o movimento de eman-
cipação feminina e a busca de realização profissional. Mas também por causa do desemprego de
seus parceiros, o que ocasiona a queda do poder aquisitivo da família e devido ao crescimento de
unidades familiares, nas quais ela assume o papel de chefe, o que significa sustentar os filhos traba-
lhando fora. Assim, o salário feminino passa a ter uma importância vital para suprir as necessidades

14 Instituído pela Portaria n° 1.015, de 21 de julho de 2011.


15 A ação foi executada em sistema de cooperação entre os governos brasileiro e canadense e foi implantado pela Secretaria
de Educação Profissional e Tecnológica do Ministério da Educação (SETEC/MEC), Rede Norte Nordeste de Educação Tecnológica (RE-
DENET), Agência Brasileira de Cooperação (ABC), Assessoria Internacional do Gabinete do Ministro (AI/GM), Conselho de Dirigentes
dos Centros Federais de Educação Profissional e Tecnológica (CONCEFET) e os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia
(IFs).
16 O Ifes é composto por 17 Campi e por diversos polos da Educação a Distância, localizados em várias regiões capixabas, e se
caracteriza por atuar com uma oferta que abrange desde a formação inicial de trabalhadores à pós-graduação na modalidade presen-
cial e com cursos a distância.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
financeiras dos domicílios brasileiros (BRUSCHINI, 2000)17.
Os anos 90 e início deste século foram períodos difíceis para todos os trabalhadores, pois foram
marcados pelo desemprego, pela queda de rendimentos e precarização dos postos de trabalho.
Diversos estudos demonstram também a existência de desigualdades entre homens e mulheres no
mercado de trabalho, seja na constituição como força de trabalho, nas dificuldades de se obter uma
ocupação ou nas características dos trabalhos exercidos.
No Espírito Santo, os dados do Pnad/IBGE (2010) apontam que as mulheres são chefes de família
em 23,3% dos domicílios e no município de Vitória, elas formam 40,2% da população economica-
mente ativa, em que um terço (33,8%) ocupa a condição de responsável pelas unidades familiares,
uma proporção bem acima da média nacional, com 24,9% dos imóveis.
Esses índices, ainda que preliminares, são preocupantes, na medida em que as mulheres das ca-
madas populares, que não conseguiram completar sua escolarização estão mais vulneráveis diante
do mercado de trabalho, o que configura sua presença em postos de trabalho cada vez mais preca-
rizados e invisíveis como o trabalho doméstico e as atividades no mercado informal. Essa situação
contribui ainda mais para sua vulnerabilidade perante a sociedade.
Nessa discussão, trazemos o papel social do Ifes, enquanto instituição educativa, que prevê, na
Lei n.º 11.892/200818, em seus diversos artigos, a criação de mecanismos para a promoção do acesso
das populações tradicionalmente afastadas da possibilidade de inclusão ao conhecimento, à tecno-
logia e à inovação gerados nos Institutos Federais.
Para a implementação desse Programa, pioneiro nesse Instituto, foi escolhida a comunidade
onde residem as paneleiras de Goiabeiras19. O ofício das paneleiras é uma atividade econômica cul-
turalmente enraizada na localidade conhecida como Goiabeiras Velha, situada na parte continental
norte do Município de Vitória, à beira do canal que banha o manguezal e circunda a Ilha20.
O processo de fabricação é praticamente o mesmo que os índios usavam quando aqui aportaram
os portugueses na época do descobrimento. Confeccionam, em barro, panelas, potes, travessas, bu-
les, caldeirões, frigideiras etc, de diversas formas e tamanhos. O ensinamento, transmitido de mães
para filhas, permite que a identidade cultural desta atividade seja mantida com muito poucas altera-
ções, há várias gerações. São avós, mães, filhas e netas exercendo o mesmo ofício.
Esse trabalho de cunho familiar continua a ser feitas nos quintais das suas casas. Atualmente, mais
organizadas, estão agrupadas na Associação das Paneleiras de Goiabeiras (APG), criada em 1987.
Trata-se de um galpão onde cada uma, independentemente, produz e comercializa suas próprias
peças. Hoje, 120 membros fazem parte da Associação21, dos quais 80% são mulheres.
A Associação foi uma conquista importante para a valorização do ofício e organização da catego-
ria. Muito mais que um ponto de produção e venda das panelas por um pequeno grupo de artesãs,
visto que o espaço só acomoda cerca de 30 paneleiras em um universo de quase 120. O Galpão pas-

17 Conferir: BRUSCHINI, Cristina. Banco de dados sobre o trabalho das mulheres. Fundação Carlos Chagas. SP: 2000, Disponível
em: < http/ www fcc. br>. Acesso em: julho 2012
18 Institui a Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica e cria os Institutos Federais de Educação, Ciência e
Tecnologia.
19 Esses dados foram extraídos dos seguintes sites: http://www.avm.edu.br/monopdf/24/JOAO%20ALFREDO%20M.STEFANO.
pdf; http://www.ut.com.br/ufes_mes/upload/anexo_Disserta%C3%A7%C3%A3o%20- %20Giovana%20Gava%20Camiletti_174256.
pdf; http://www.ceramicanorio.com/artepopular/paneleirasgoiabeiras/paneleiras.htmt; http://g1.globo.com/espirito-santo/noti-
cia/2011/11/paneleiras-de-goiabeiras-ganham-novo-galpao-em-vitoria.html; http://www.caixamelhorespraticas.com.br/wp-con-
tent/uploads/Paneleiras.pdf. Acesso em 03 de julho de 2012.
20 O projeto de modernização urbana da capital, promovido nos anos 1970, confinou Goiabeiras Velha entre a via expressa de
acesso ao Aeroporto e o mangue, resguardando-a como reduto de ocupação antiga, de configuração familiar, onde reside a maioria
das famílias de paneleiras. Os quintais de pais e avós são hoje repartidos com as novas famílias de filhos e netos, e em grande parte
também ocupados com a fabricação das panelas de barro.
21 A Associação já se tornou um dos pontos turísticos da cidade, sendo visitada, regularmente, por turistas interessados em
adquirir as peças e observar como as mesmas são confeccionadas.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
sou a representar o lugar do ofício, dando visibilidade à categoria profissional de seus executantes22.
Acreditamos que essa ação do Programa Mulheres Mil para com essa comunidade vai agregar va-
lor ao trabalho já realizado por essas artesãs, por meio dos cursos de qualificação. Entendemos que
ao estabelecer essa parceria com a comunidade, com o Ifes e com as demais instituições envolvidas,
cria-se uma rede de agentes sociais, comprometida com a visibilidade no trato da discriminação dos
gêneros, o que pode trazer ganhos significativos para essas questões.

2.1. o cUrso de qUAlificAção profissionAl: gestão e relAcionAmen-


to com o cliente
O curso ofertado tem a duração de 160 horas e funciona com aulas nas terças e nas quintas-feiras.
A matriz curricular consta de disciplinas de Português, Matemática, Informática, Inglês, Espanhol,
Relações no Trabalho e Economia Solidária. Também foram ofertadas oficinas que debateram a res-
peito dos direitos e da saúde da mulher. A equipe de professores atuante no curso é formada por
docentes envolvidos de forma direta ou indireta com a Educação de Jovens e Adultos (EJA). Além
dos professores, o curso ainda conta com uma equipe multidisciplinar: coordenação, técnicas-admi-
nistrativas, assistente social, psicóloga, pedagogas e alunos de iniciação científica da licenciatura de
Português e dos cursos da Pós-graduação ofertada pelo Instituto.
Estão matriculadas no referido curso 100 estudantes, divididas em 03 turmas (uma no vespertino
e duas no período noturno) e de acordo com a tabela abaixo, verificamos que grande parte (61%)
das educandas encontram-se acima dos 40 anos, evidenciando que a oferta do curso contempla as
diretrizes do Programa, uma vez que vem atender a um grupo de mulheres que há muito tempo
estão afastadas dos bancos escolares, devido as diversas atribuições que as mulheres assumem ao
longo de suas vivências.

Tabela 1 - Faixa etária das alunas


De 18 De 31 De 41 De 51 De 61
Turma Total
à 30 à 40 à 50 à 60 à 80
Turma 1 – (Vesp) 7 7 9 4 6 33
Turma 2 – (Not) 6 7 13 5 3 34
Turma 3 – (Not) 5 7 7 7 7 30
Totais 18 21 29 16 16 100
Fonte: Sistema Acadêmico Ifes/2013. - Nota: Tabela organizada pelas autoras.

Depreendemos que 91% das matriculadas autodeclaram-se negras e pardas, o que evidencia
mais uma vez o que os dados estatísticos revelam acerca da interligação entre condições de vida,
associadas as questões étnico-racial e de gênero.

22 As panelas de Goiabeiras são geralmente vendidas diretamente pelas paneleiras, nos próprios locais de produção. Podem
ser adquiridas por atacado ou no varejo, por encomenda ou para pronta entrega, no Galpão ou em suas casas. Há alguns poucos
intermediários em pontos de comercialização fora de Goiabeiras Velha. Os principais estão no mercado da Vila Rubim, localizado
no Centro de Vitória; na rede regional de supermercados e no próprio aeroporto. O mercado consumidor consiste de restaurantes,
hotéis, lojas, feiras, supermercados, turistas e moradores da Grande Vitória. São também vendidos para os mercados regionais e de
outros Estados brasileiros, notadamente do Sul e do Centro-Oeste.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Gráfico 1 – Nível de Escolaridade das Alunas Matriculadas (%)

Fonte: Sistema Acadêmico Ifes/2013. - Nota: Gráfico organizado pelas autoras.


Na questão que identifica o nível de escolaridade das alunas percebemos uma heterogeneidade
enorme, na mesma turma encontramos alunas não alfabetizadas e outras matriculadas em curso
superior. Contudo, todas apresentam muitos saberes da vida e das práticas sociais que se dão no lar,
na rua, na igreja, no mundo do trabalho e nas lutas pela sobrevivência. Saberes que transitam pelas
suas múltiplas identidades, quais sejam, a de mulher, de trabalhadora e de cidadã.

3. A EXPERIÊNCIA COM A DISCIPLINA MATEMÁTICA


A importância da reflexão sobre o trabalho pedagógico nos conduz à afirmação de que existem
alguns princípios fundamentais que devem a nosso ver, orientar a prática docente para o entendi-
mento do fazer pedagógico como práxis e para a compreensão de que o professor é um construtor
de saberes.
A experiência de organizar e ministrar um curso exige de todo profissional uma mudança de prin-
cípios e concepções do que tange às práticas pedagógicas ao longo do processo de planejamento
e execução do trabalho docente. Nesse sentido, ter uma visão geral do curso a ser ministrado, orga-
nizar e produzir o material didático e preparar a aulas semanais são desafios constantes para todo
educador.
Compreendemos que a educação escolar tem um papel fundamental no processo de mudança
social, contribuindo na formação de sujeitos autônomos e conscientes de si. No entanto, sabemos
que esse trabalho não corresponde a uma essência do processo educativo, mas sim é fruto da ação
intencional dos sujeitos envolvidos nos atos de ensinar e de aprender. Dessa maneira, o ensino e a
aprendizagem compreendem atitudes imbricadas de conteúdo político e que são capazes de inter-
ferir nos rumos da sociedade.
Nessa perspectiva, ao afirmarmos a emancipação humana como princípio, renunciamos a visão
que atribui tarefas estanques ao professor e ao aluno, cabendo ao primeiro ensinar, exclusivamen-
te, e, ao segundo, somente aprender. A educação entendida como emancipação humana concebe
os sujeitos como seres inacabados, incompletos, desprovidos de uma essência definidora das suas
ações.

113
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Ao professor, então, esse ideal vem acompanhado da reflexão sobre sua ação, sobre o seu papel
enquanto sujeito social e sobre as relações que constrói nos meios onde vivencia. O fazer do profes-
sor, assim entendido, converte-se em práxis, pois envolve o constante questionamento da prática
docente, a construção e desconstrução de sentidos para essa prática. Como sujeito que reflete sobre
sua ação, o professor abre espaço para refletir também sobre os saberes que ensina e, ao fazê-lo,
pode compreender os saberes que constrói.
Nesse sentido, o curso proposto para a comunidade das paneleiras é permeados por essas con-
cepções e traz um novo olhar ao trabalho pedagógico uma vez que coloca as educandas - jovem e
adulta trabalhadora, como aquelas que têm experiências a socializar e que estas, além de contribuí-
rem para que as alunas contextualizem os conceitos trabalhados, a partir do diálogo e de reflexões,
transformam-se em saberes a serem construídos.
Essas concepções permearam toda a organização da proposta curricular do curso e da disciplina
Matemática. Para a referida disciplina, nossa pretensão foi relacionar os conhecimentos aplicados no
exercício da função exercida pelas paneleiras com os conceitos formais de matemática. Objetivamos
dessa forma, revisar e utilizar as quatro operações; Discutir a aplicação da geometria plana nas suas
atividades cotidianas; Resolver regras de três simples; Efetuar mudanças de unidades de compri-
mento e de volume; e Relacionar as atividades de venda e confecção de produtos com os conceitos
matemáticos formais que serão estudados.
O curso, construído com esses princípios, levou a uma dinâmica na sala de aula, de constante
troca e interação, corroborando o que defende Freire (2002, p. 25) quando afirma que “quem ensina
aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender”. Os saberes matemáticos foram tratados
no sentido de mostrar que a sala de aula é um espaço social de trocas e de acordos, na qual o aluno,
professor e saber se relacionam tendo como objetivo a aprendizagem significativa (PAIVA, 2009).
Foram constantes as interrogações durante nossos encontros de planejamento: Como atuar?
Que metodologia utilizar já que o público é composto por algumas mulheres que não leem e outras
que já frequentam a universidade? Como as alunas poderiam expressar seus pensamentos sem a
escrita? Quais metodologias poderíamos utilizar para promover melhor aproveitamento de um pú-
blico tão diversificado?
No primeiro encontro, após a apresentação inicial entre alunas e professora, foi proposto duas
questões para uma discussão em grupo no sentido de apontarem suas expectativas em relação à
disciplina. Essa discussão ainda deveria ser acompanhada com recortes de revistas e deveriam se
expressar, respondendo a seguinte pergunta: Que figuras ou reportagens representam conceitos
matemáticos? E: Que matemática utilizo no meu dia a dia? Buscava-se fazer com que as discentes
expressassem seus entendimentos do que é a matemática, que discutissem a matemática existente
no seu cotidiano, em especial, aquela que utiliza em seu ambiente de trabalho.
Depois de um amplo debate, as educandas chegaram às seguintes conclusões: a necessidade de
aprender a manusear a máquina de calcular; fazer os cálculos dos custos dos materiais para fabrica-
ção dos produtos artesanais, fazer os cálculos de descontos e lucros e de horas de trabalhos despen-
didos em cada produto e a elaborar orçamento. Essas questões nos induziram a refazer a proposta
curricular da disciplina.
Dentre os diversos depoimentos, trazemos a exposição da aluna Marisa (79 anos) sobre o traba-
lho solicitado: Depois de explorar a reportagem intitulada “Benefícios de modelos atraem compra-
dores”, de acordo com as orientações da atividade, Marisa argumenta ainda: “no meu entendimento,
pelos anos que trabalho como paneleira, todo produto se for bem feito, bem modelado, os clientes
ficam satisfeitos e retornam para comprar mais”. Ao questionar como Marisa lida com os preços, ela
explica: “não sou letrada, mas sei expressar os valores dos produtos e não preciso de máquina de
calcular para fazer as contas, faço contas de cabeça e assim que termino de embalar as mercadorias
vendidas o valor total está na ponta da língua”.

114
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Outro momento interessante em sala de aula foi a discussão acerca de fração e de porcentagem.
Para essa abordagem, utilizamos aula expositiva citando alguns dos exemplos focados nos cartazes
por elas elaborados nas atividades das primeiras aulas. A partir daí, as alunas foram motivadas a re-
latarem suas vivências no trabalho, o que surgiu o debate sobre porcentagem. Diante das reflexões
das alunas, voluntariamente, elaboraram o seguinte problema:

Qual o percentual de desconto que Dona Solange dá ao ven-


der uma panela de 25 reais por 20 reais?

No quadro, traçamos a seguinte solução para a Regra de Três Simples.


25 = 100%
20 X

Obteve-se como resultado : 20% de desconto.

Quadro 1 – Representação da explicação.

Nesse movimento, captamos os seguintes relatos das alunas: “No comércio os descontos não
devem passar de 10%” (DIONÍSIA, 42 anos) e “É mais interessante falar o desconto em porcentagem,
é mais chique e o cliente dá mais valor, pois dessa forma acredita estar tendo um bom desconto”
(SORAYA, 30 anos).
Depois desse exercício, todas as educandos foram convidadas a pensarem sobre as transações
que realizam desde o momento da fase da produção até a fase final – o da comercialização. Diante
das exposições, muitas das paneleiras chegaram à conclusão que:

Quando a gente compra a bola de barro (material utilizado para a confecção das
panelas) perde-se muito, pois ela vem com algumas pedras que são retiradas o que
leva a perda de material. Assim, o custo para produção acaba ficando próximo do
valor de vendas, logo, estamos ganhando pouco (BÁRBARA, 33 anos).

As experiências apreendidas nesse processo têm se constituído em um momento rico nas práticas
docentes que visam uma aprendizagem que consideramos significativa, durante a qual os alunos
e os professores atuam como mediadores e articuladores da construção coletiva do conhecimento,
adquirindo a sensibilidade de reconhecer o potencial presente no campo dos saberes matemáticos.

4. finAlizAndo o texto... não o diálogo


Ressaltamos que este diálogo não se encerra aqui. Entretanto, esperamos contribuir com as dis-
cussões que envolvem os saberes e os fazeres matemáticos para a população que apresenta percur-
sos formativos interrompidos. E, que estes saberes e fazeres potencializem a emancipação política
desse público estudantil. Acreditamos que o fazer docente que leva em consideração o vínculo en-
tre os conhecimentos prévios, oriundos das relações sociais e do mundo do trabalho, com a nova
aprendizagem, por meio de uma relação substantiva e não arbitrária, estabelece uma aprendizagem
significativa conforme defende Paiva (2009).
Para finalizarmos o texto, já que este diálogo ainda não terminou, gostaríamos de ressaltar o que
disseram as protagonistas desta história, para que esta conversa tenha um “gostinho de quero mais”
Matemática, ciência que usa a lógica para obter resultados da somatória de produtos. Assim
como na matemática da sobrevivência, fazendo a somatória da determinação + força de vontade +

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
dedicação, obtemos um resultado exato que é igual a ‘vitória’ (ALUNAS CARMEM, INGRID, IVONEDIE
E SABRINA)23.

5 .referênciAs
BRUSCHINI, Cristina. Banco de dados sobre o trabalho das mulheres. Fundação Carlos Chagas. SP:
2000. Disponível em: < http/ www fcc.br>. Acesso em: julho de 2012.
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SANTOS, Antonio Raimundo dos. Metodologia científica: a construção do conhecimento. 5. ed. Revi-
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23 Resposta das alunas em um trabalho de grupo sobre a importância da Matemática

116
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
edUcAção nAs institUições de priVAção de liberdAde:
diVersidAde dos sUjeitos dA ejA
Aline menezes de bArros | ViViAn de oliVeirA

O presente artigo intenta trazer a reflexão a partir dos debates atuais sobre EJA, o tema da di-
versidade e a urgência de práticas pedagógicas que respeitem e valorizem esta característica fun-
damental da sociedade brasileira, em especial aos jovens que cumprem medidas socioeducativas
de privação de liberdade no estado do Rio de Janeiro, objeto de estudo deste texto. Nesse sentido,
as reflexões aqui apontadas, baseadas também em políticas públicas que favorecem a democrati-
zação do ensino, buscam reafirmar o direito à Educação enquanto direito social e valor subjetivo a
este público privado de liberdade, garantindo qualidade e respeito a suas especificidades em todas
as práticas educativas promovidas no interior das instituições. Tentaremos, no limite deste artigo,
pontuar o que consideramos como características principais da EJA em unidades socioeducativas
de privação de liberdade no estado do Rio de Janeiro, onde a escolarização tem sido evidenciada
como uma das ações de maior relevância no que se refere à garantia do direito fundamental, assim
como refletir sobre os desafios que se impõe ao jovem quando a percebe como uma obrigação,
nem sempre estando conscientes de sua importância. O público de EJA, muitas vezes discriminado,
inferiorizado pela impossibilidade de domínio dos códigos de leitura e escrita, quando evidencia a
possibilidade de retornar aos bancos escolares apresenta resistência, característica essa acentuada
quando se está em uma unidade de privação de liberdade e quando não se evidencia na escolariza-
ção uma utilidade imediata. Consideramos que a educação em espaços de privação e restrição de
liberdade deve partir da realidade dos sujeitos, e lhes garantir o direito de aprendizagem ao longo
da vida, possibilitando a ressignificação destes com a unidade escolar, com os colegas, docentes,
com o ato infracional e principalmente, consigo mesmo.

palavras-chave: educação, diversidade, Socioeducação

Esse artigo trata da educação de jovens e adultos (EJA) e seus debates mais atuais acerca dos
retrocessos e avanços que envolvem essa modalidade educativa. Destinaremos especial atenção ao
tema da diversidade e trataremos da urgência de práticas pedagógicas que respeitem e valorizem
esta característica fundamental da sociedade brasileira e igualmente da EJA. Dedicaremos especial
atenção aos jovens que cumprem medidas socioeducativas24 de privação de liberdade (internação)
no estado do Rio de Janeiro, objeto de estudo deste texto.
Ao apresentar um breve histórico da EJA, Ribeiro (1997) menciona duas concepções antagônicas
de educação presentes nessa modalidade educativa. A primeira, afirma-se como uma construção
homogênea, que coloca todos os indivíduos em situação de “igualdade”, desconsiderando a diversi-
dade característica da população brasileira, mas ao contrário, anulando-a e destinando aos diversos
sujeitos o mesmo modelo educativo.
Esse paradigma apoia-se na concepção educativa que entende a desescolarização como cau-
sa da situação econômica, social e cultural do país, e dessa forma, deposita no sujeito um estigma
(GOFFMAN, 2010) que o impede de desenvolver seu potencial criativo e de aprendizagem.
Para os defensores dessa corrente, um sujeito que não teve acesso ao sistema formal de en-
sino, e por isso não foi escolarizado, é considerado um adulto incapaz, que está ligado psicologica
e socialmente à criança, sendo considerado inferior a ela, por não dominar os códigos de leitura e
escrita e por possuir menor capacidade de aprendizagem.
24 Nomenclatura utilizada a partir da Lei 8.069/90 - Estatuto da Criança e Adolescente (ECA) - para designar o cumprimento de
medidas aplicáveis a adolescentes que praticam atos infracionais análogos ao Código Penal.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Opondo-se a essa explicação, apresentamos a segunda concepção apresentada por Ribeiro
(1997), segundo a qual o sujeito é compreendido, mesmo aquele que não é escolarizado, como um
ser produtivo, capaz de raciocinar, de realizar escolhas e resolver problemas cotidianos, mesmo sem
o apoio escolar.
Compartilhamos da segunda concepção educativa, por acreditarmos que nela o sujeito é enca-
rado como um educando, ou seja, como um ser humano portador de saberes, independentemente
de sua passagem pela rede formal de ensino. Nesse sentido, tais conhecimentos, precisam neces-
sariamente ser reconhecidos pelos educadores, para que, a partir deles, se possa realizar um plano
específico de atendimento ao grupo ou ao sujeito.
Para a autora, essa concepção educativa trata da educação e, simultaneamente, da conscientiza-
ção do educando, pois o leva a superar as práticas superficiais de aprendizado, o curto período da
alfabetização e a inadequação de métodos, assim como a homogeneização da educação para as
diversas regiões do país.
Atuante nessa segunda concepção o educador pernambucano Paulo Freire dedicou-se a al-
fabetização de jovens e adultos na década de 1960, posicionando-se contra a educação bancária,
ou seja, aquela que desconsidera a cultura dos educandos e pauta-se na ideia de que os educadores
possuem o saber, desconsiderando assim as vivências e as culturas trazidas pelos educandos.
Essa reflexão mais crítica, presente na segunda concepção apresentada, contraria também
a ideia defendida anteriormente de que o analfabetismo é a causa da desigualdade social, mas, ao
contrário, compreende-o como efeito da situação de pobreza, gerada pela estrutura social não igua-
litária.
Essa divisão de classes sociais tem implicações em diversas áreas cotidianas da vida, inclusive
na educação. Na EJA, a preocupação com a educação surge com o objetivo central da integração
de trabalhadores ao mercado formal de trabalho, sobretudo a partir do fortalecimento do Estado
Liberal e da expansão do capital, sendo valorizado e ofertado especialmente para a população ati-
va, que poderia se adequar ao mercado de trabalho e atender as necessidades de mão-de-obra.
Infelizmente essa concepção de educação instrumental ainda é presente na EJA atual, uma vez que
ainda se mantêm muitos programas pontuais, que valorizam mais a certificação do que o processo
de ensino-aprendizagem dos educandos.
Machado (2009) evidencia que existe uma aproximação da EJA com a Educação Profissional, o
que em nosso entender é interessante, no sentido de auxiliar na escolha profissional, mas que pode
constituir-se em uma armadilha, pois ao ficar restrita à formação profissional, deixa-se de lado ou-
tros aspectos essenciais da educação, previstos no Art. 205 da Constituição Federal (1988).
Retornando o histórico trazido por Ribeiro (1997), percebemos que com o golpe militar (1964),
aumenta-se a preocupação com a segurança pública, o que tem reflexo também na área da educa-
ção, uma vez que os modelos educativos emancipatórios, presentes nos anos de 1961 a 1964, eram
vistos como ameaça a ordem estabelecida e dessa forma, foram duramente reprimidos. Retrocede-
mos a primeira concepção apresentada pela autora com ações focadas no conservadorismo e em
programas assistencialistas.
Com base no exposto acima, percebemos que a EJA tem se constituído para nós educadores
um grande desafio. Porém, avanços têm sido alcançados ao longo dos anos. Ao analisar as políticas
públicas e marcos legais, operacionais e políticos ocorridos na EJA, Machado (2009) nos apresenta
os avanços, retrocessos e lutas presentes nessa modalidade educativa, ocorridos após a implemen-
tação da lei 9.394 - (LDBEN, 1996).
Sabemos que com o movimento de redemocratização do país, ocorrido a partir da década de
1980, ampliou-se o bojo dos direitos, sejam eles, civis, políticos ou sociais (CARVALHO, 2011). Ribeiro
(1997) nos aponta que a Constituição Federal – (C.F. 1988) estendeu o direito ao Ensino Fundamental

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
aos cidadãos de todas as faixas etárias, ampliando as oportunidades educacionais, inclusive para os
que já haviam ultrapassado a idade da escolarização regular.
No texto de Machado (2009) é possível perceber uma preocupação em diagnosticar os avanços
entre o proposto e o efetivado, assim como em identificar se a ampliação da oferta da EJA garante
aos seus usuários uma escolarização apenas instrumental básica, necessária apenas para a inserção
no mundo do trabalho, e amplamente utilizada para esse público, especialmente após a expansão
do capitalismo; ou se, ao contrário, representa a concepção mais abrangente, que considera os jo-
vens, adultos e idosos em sua plenitude, buscando uma escolarização que ocorra conectada a uma
visão crítica do mundo, que começa a ter maior expressão após a década de 1960, conforme apon-
tado por Ribeiro (1997).
Para Machado (2009), a concepção utilitarista da EJA foi gradativamente sendo enxertada de pre-
ocupações presentes em um contexto histórico após a segunda Guerra Mundial. Sobre isso, chama
nos a atenção para o discurso de uma cultura da paz, amparada em uma ideologia da tolerância mú-
tua, que, acompanhada de campanhas de alfabetização, foram gradativamente contribuindo para a
reordenação dos princípios da EJA.
Machado (2009) reafirma o posicionamento previsto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional – LDBEN (1996, Art. 2º) e na CF (1988, Art. 205) de que a educação não está restrita a esco-
larização, mas ao contrário, está para além da escola, possibilitando aos sujeitos jovens e adultos: “a
produção do conhecimento que se dá no mundo da cultura e do trabalho e nos diversos espaços de
convívio social, em que jovens e adultos seguem constituindo-se como sujeitos” (p.18).
A autora retrata também a importância de esforços conjugados entre o poder público e a socie-
dade civil, na tentativa de amenizar a distância entre a previsão legal e a oferta real. Para a autora,
existe um arcabouço legal que orienta a política educacional, mas esse ainda convive com práticas
personalistas e tradicionais na implementação das políticas, o que contribui para a manutenção de
velhas práticas, herdadas de um país que iniciou sua história como colônia de Portugal.
Espera-se que através dos movimentos instituídos e instituíntes amplie-se a concepção da EJA
como política pública, tal fato depende continuamente de cada um de nós, gestores, estudantes,
cidadãos, professores e etc., pois é necessária e urgente a continua parceria entre o Estado e a socie-
dade civil, para que as ações governamentais se materializem em marcos legais e operacionais que
têm traduções efetivas nas práticas.
A educação é um direito de todos e por isso devemos lutar para amenizar as desigualdades do
sistema dual de ensino, no qual a população pobre está inserida precariamente, pois como apon-
tado por Algebaile (2004) a escola pública tem se ampliado para menos, ocasionando mais vagas e
diminuindo a qualidade.
A luta para efetivar as políticas públicas e tornar a EJA uma modalidade da educação é tão com-
plexa quanto à de fornecer um sistema de ensino que garanta os diversos sujeitos uma educação
que reconheça a diversidade.
O público da EJA está na cidade, mas também nos campos, alguns alunos possuem culturas sin-
gulares, como os indígenas ou quilombolas, outros vivenciam a dinâmica de uma colônia de pes-
cadores ou de um acampamento de sem terras, e outros, ainda, têm acesso à escolarização em am-
bientes de privação de liberdade, como é o caso dos presidiários (as) ou dos (as) adolescentes em
conflito com a lei.
Nesse texto nos deteremos nos processos de escolarização vivenciados por adolescentes em
cumprimento de medida socioeducativa de privação de liberdade, embora reconheçamos que a
diversidade da EJA entre eles também existe.
Para Machado (2009), o reconhecimento da diversidade dos sujeitos da EJA ganha força com a

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
criação Secad25, que colabora também para a ampliação do entendimento da EJA como uma políti-
ca para a diversidade. Nesse sentido, este artigo faz um recorte da educação em espaços de privação
de liberdade, destinados a receber adolescentes em conflito com a lei para execução da medida
socioeducativa – (MSE).
Os adolescentes que são privados de liberdade para cumprir uma MSE continuam titulares dos
demais direitos previstos em lei. A MSE é prevista no Art. 112, do ECA, podendo ser caracterizada
como uma sanção pelo caráter impositivo, porém, necessitando ser simultaneamente, de natureza
pedagógica, ou seja, com caráter predominantemente educativo.
Sobre isso, Andrade e Paiva (2013), defendem que a MSE deve estar focada no aprendizado e nas
práticas consagradas pela Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), portanto, as autoras
mencionam que a internação deve ser uma experiência educativa.
Essa é a proposta defendida pelo Departamento Geral de Ações Socioeducativas do Estado do
Rio de Janeiro – (Novo DEGASE). No site da instituição, é possível ter acesso a um compêndio elabo-
rado a partir da publicação do PASE (2010) que reafirma a preocupação do órgão em manter uma
gestão direcionada pelos instrumentos legais internacionais nos quais o Brasil é signatário.
Para Andrade e Paiva (2013), a execução de um projeto político pedagógico que oriente as ações
e garanta um conjunto de ações articuladas nas instituições colaboram para que a experiência da
internação agregue valor formativo à vida dos adolescentes, como previsto no SINASE (2006, p.54).
O público de EJA é muitas vezes discriminado, inferiorizado pela impossibilidade de domínio dos
códigos de leitura e escrita, e dessa forma, quando evidencia a possibilidade de retornar aos bancos
escolares apresenta resistência, característica essa acentuada quando se está em uma unidade de
privação de liberdade e quando não se evidencia na escolarização uma utilidade imediata.
Por essa razão, a educação em espaços de privação e restrição de liberdade deve partir da realida-
de dos sujeitos e lhes garantir o direito de aprendizagem ao longo da vida, possibilitando a ressig-
nificação destes com a unidade escolar, com os colegas, docentes, com o ato infracional e principal-
mente, consigo mesmo. Nesse sentido fica evidenciada a necessidade de elaboração de uma Diretriz
Curricular específica para o sistema socioeducativo, tal como a que existe para o sistema penal.
O DEGASE atende vários sujeitos e com várias especificidades. Nas unidades de internação femi-
ninas, temos os bebês que são filhos das adolescentes internas, que permanecem com suas mães
geralmente pelo período de seis meses, embora esse prazo, pela lei, possa ser maior, essas crianças,
por lei, devem ter acesso à creche e educação infantil (Lei nº 11942/2009)26.
Outra realidade pode ser evidenciada no caso dos adolescentes com faixa etária entre 12 e 18
anos, sendo que os que possuem idade inferior a 15 anos devem frequentar exclusivamente o en-
sino regular, no caso dos demais, existe a possibilidade também da educação de jovens e adultos,
conforme Art. 38 da LDBEN (1996).
Outra situação presente no sistema socioeducativo é a dos sujeitos adultos, maiores de 18 anos,
mas que podem ficar excepcionalmente no DEGASE até os 21 anos, nas situações previstas em lei,
mas que, mesmo sendo adultos, não possuem a prerrogativa de optar ou não pela escolarização.
Acreditamos que como afirmado por Ribeiro (1997): “a qualificação pedagógica de programas de
educação de jovens e adultos é uma exigência de justiça social, para que a ampliação das oportuni-
dades educacionais não se reduza a uma ilusão e a escolarização tardia de milhares de cidadãos não
se configure como mais uma experiência de fracasso e exclusão” (RIBEIRO, 1997, p.14).
A escolarização constitui um dos grandes pilares da ação socioeducativa e por isso são urgentes
25 Atualmente denominada de SECADI – Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão. Criada em
julho de 2004.
26 A lei relaciona-se as mães presas que cumprem penas no sistema penal porém, entendemos que pode ser aplicada também
para as gestantes do sistema socioeducativo.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
ações específicas para os adolescentes que são obrigados a retornar ao espaço formal da escola nas
unidades socioeducativas. Sabemos que muitos adolescentes tiveram passagens fracassadas pela
escola ou foram recentemente expulsos dela, em um processo de ampliação quantitativa da escola,
porém não qualitativa (PEREGRINO, 2006), nesse sentido, a escola da unidade socioeducativa deve
estar preparada para lidar com essas situações e para que isso ocorra é necessário investir em políti-
cas públicas específicas para a área.
Entendemos que nossos jovens vêm sendo atingidos por um modelo educativo dualizado, logo,
é urgente que a educação ofertada nesses espaços contribua para uma participação mais ativa des-
ses sujeitos no mundo do trabalho, da política e da cultura (RIBEIRO, 1997, p.34)
Face ao exposto, entendemos que a política educativa deve fazer valer os princípios legais da
socioeducação e investir em um atendimento que possibilite aos adolescentes reais oportunidades
de reflexão crítica sobre os conteúdos curriculares, mas também sobre o mundo de forma mais
abrangente. As escolas devem investir não apenas em uma educação que instrumentalize e que
prepare para o mercado de trabalho, mas ao contrário deve desenvolver as potencialidades dos jo-
vens e adultos e investir em práticas que estimulem o aprendizado como uma perspectiva ao longo
da vida.

referênciAs:
ALGEBAILE, Eveline Bertino. Escola Pública e pobreza: expansão escolar e formação da escola dos
pobres no Brasil. Universidade Federal Fluminense (Tese de Doutorado), UFF, Niterói, 2004.
ANDRADE, Eliane Ribeiro e PAIVA, Jane. Medidas socioeducativas e projeto político-pedagógico: de-
safios para o atendimento de adolescentes e jovens em privação de liberdade. In: JULIÃO, Elionaldo Fer-
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Avanços e Perspectivas, Jundiaí, Paco Editorial: 2013. p.221 – 241.
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revista, atualizada e ampliada com a lei 12.010, de 03 de agosto de 2009, Declaração dos Direitos da
Criança, Convenção sobre os Direitos da Criança, Diretrizes de Riad, Regras de Beijing, Decreto nº 5.007,
de 08 de março de 2004, Súmulas do STJ (383/342/338/265) – Rio de Janeiro: Defensoria Pública do
Estado, 2010. 244p. CDD 342.17.
______. Lei 11.942/2009. Disponível em http://www.leidireto.com.br/lei-11942.html, acesso em
01/10/2013.
______. Plano de Ações Sócioeducativas e de Cooperação Técnica UERJ/DEGASE _ Pesquisa Meta-
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tiva do jovem infrator no Estado do Rio de Janeiro, 1998-2003.

121
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
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2012. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12594.htm>.
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sistema socioeducativo do Rio de Janeiro, 2009, 161 p. Mestrado (Dissertação em Educação), Faculdade
de Educação, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2009.

122
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
edUcAção popUlAr e edUcAção de joVens e AdUltos:
memóriA e históriA
osmAr fAVero | elisA mottA de soUzA siqUeirA

Historia brevemente a criação do Nedeja – Núcleo de Estudos e Documentação de Educação


de Jovens e Adultos, da Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense, criado em
2000 catalogar o acervo bibliográfico disponível, reunido ao longo dos últimos cinquenta anos, e
organizar um banco de fontes documentais sobre a Educação Popular e sobre a EJA no Brasil e
disponibilizar esse acervo para consulta dos estudiosos sobre o tema. Articula-se com os progra-
mas de pós-graduação em educação do Rio de Janeiro e constitui-se em espaço de interlocução
entre professores e pesquisadores da área, por intermédio do GT Educação de Jovens e Adultos da
ANPEd. Produziu um primeiro DVD com material das campanhas de alfabetização e educação de
base, promovidas pelo Ministério da Educação e Saúde a partir de 1947, e os movimentos de cul-
tura e educação popular, de 1961 a 1967, cujo conteúdo está disponível em www.forumeja.org.br.
Atualmente prepara dois outros DVDs, cobrindo uma segunda fase da Educação Popular, nos anos
1970/1980, e experiências de EJA do período 1970/1980 e dos dias atuais. A relação das campanhas
e os movimentos e as experiências trabalhadas no primeiro DVD e as que estão sendo processadas
atualmente estão listadas no trabalho a ser apresentado, com indicação de numero de páginas ta-
manho . Em termos teóricos, aborda a relação memória e história, na medida em que a recuperação
e a divulgação do material selecionado contribuem para completar e aprofundar a história da edu-
cação popular e da educação de jovens e adultos no país.

palavras-chave: educação popular, educação de jovens e adultos, memória e história

ApresentAção
O NEDEJA – Núcleo de Estudos e Documentação sobre Educação de Jovens e Adultos da Facul-
dade de Educação da UFF - Universidade Federal Fluminense, foi criado em meados de 2000. O prin-
cipal objetivo do NEDEJA, quando de sua criação, era catalogar o acervo bibliográfico disponível,
reunido ao longo dos últimos cinquenta anos, e organizar um banco de fontes documentais sobre
a EP - Educação Popular e sobre a EJA –Educação de Jovens e Adultos no Brasil, disponibilizando tal
acervo para consulta dos estudiosos sobre o tema, especialmente professores e alunos dos cursos
de graduação, especialização, mestrado e doutorado da UFF, bem como pesquisadores de outras
entidades.

O NEDEJA foi concebido como espaço de interlocução entre os diferentes campos


de confluência do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFF, em especial
Trabalho e Educação, e Diversidade, Desigualdades Sociais e Educação. Esta aber-
tura à reflexão interdisciplinar decorre do fato da EP e da EJA alimentarem-se dos e,
simultaneamente alimentar os conhecimentos básicos construídos no âmbito das
Ciências Humanas – Antropologia, Ciência Política, Economia, Filosofia, Psicologia,
Sociologia e da própria Pedagogia.

A documentação relativa à memória dos movimentos de cultura e educação popular e, mais re-
centemente, da educação de jovens e adultos, especialmente das atividades governamentais nessa
área, representa o maior volume do acervo organizado pelo NEDEJA, com mais de duas mil fontes

123
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
documentais. Compreende projetos, programas e propostas, documentos instituidores de campa-
nhas e movimentos, relatórios de experiências, depoimentos, entrevistas, livros, artigos, números
especiais de periódicos sobre a temática e especialmente material didático, entendido em sentido
amplo: cartilhas, livros de leitura, vídeos, filmes, fotos, slides, folhetos de cordel.

Muitos desses materiais são exemplares raros, originais ou únicos, recolhidos em


arquivos particulares, documentos salvos do pouco apreço à preservação de nossa
memória ou que sobreviveram à desestruturação dos movimentos populares ocor-
rida no país após o golpe de 1964, guardados em situações adversas: embaixo de
caixas d’água, no teto de igrejas ou mesmo enterrados.

Este acervo é permanentemente enriquecido pela incorporação de outros documentos e livros


relativos à história e às experiências de educação popular e educação de jovens e adultos, materiais
que estão sendo produzidos atualmente por diversas instituições, assim como teses e dissertações
defendidas em programas de pós-graduação na área de Ciências Humanas.
A equipe de pesquisa é formada, atualmente, por professores, mestrandos e doutorandos do Pro-
grama de Pós-Graduação em Educação da UFF que se interessam pela área de EJA, uma assistente
de pesquisa com dedicação parcial, dois bolsistas de extensão da UFF e dois da UNIRIO. Conta-se
também com a colaboração de colegas da Faculdade de Educação, à qual o Programa de Pós-Gra-
duação em Educação é vinculado, e com a assessoria de colegas de outras universidades, especial-
mente da UERJ, da UENF e da UNIRIO. E articula-se com colegas de todo o país, pela participação no
Grupo de Trabalho Educação de Jovens e Adultos da ANPEd.
O acervo documental trabalhado está sendo organizado em quatro módulos, cada um deles a
ser salvo em DVD e reunidos em um e-book, inclusive com um folheto explicativo sobre o conjunto.

1º módUlo: memóriA dA edUcAção popUlAr i (1947/1967 )


O primeiro módulo, cobrindo o período 1947-1967, já concluído, compreende: a) o acervo relati-
vo às grandes campanhas de alfabetização e educação de adultos promovidas pelo Governo Fede-
ral, por meio do então Ministério da Educação e Saúde e pelo Ministério da Agricultura, de meados
dos anos de 1940 até meados dos anos de 1950: CEAA – Campanha de Educação de Adolescentes e
Adultos, CNER – Campanha de Educação Rural, MNCA – Mobilização Nacional contra o Analfabetis-
mo e SIRENA – Sistema Rádio Educativo Nacional; b) o acervo dos movimentos de cultura e educa-
ção popular, criados no início dos anos de 1960 e extremamente ativos até março de 1964, quando
praticamente todos foram extintos imediatamente após o golpe civil-militar: MCP – Movimento de
Cultura Popular, do Recife; Campanha “De Pé no Chão também se Aprender a Ler”, de Natal; CEPLAR
– Campanha de Educação Popular da Paraíba; CPC – Centro Popular de Cultura, da UNE – União
Nacional dos Estudantes, que se desdobrou em muitos estados; e as primeiras experiências do Siste-
ma Paulo Freire de Alfabetização, realizada inicialmente no MCP, depois em Angicos, no Rio Grande
do Norte, imediatamente ampliadas no PNA – Programa Nacional de Alfabetização, que pretendia
alfabetizar cinco milhões de jovens e adultos em dois anos, proposta também abortada em abril de
1964. Apenas o MEB – Movimento de Educação de Base, com atuação no meio rural do Nordeste,
Centro-Oeste e Norte, por ser ligado à Igreja Católica, conseguiu sobreviver, embora sacrificando
muito da orientação anterior.
Este primeiro módulo exigiu demorado trabalho de higienização dos materiais, elaboração de
breves históricos de cada campanha ou movimento e reunião de livros, revistas contendo artigos,
ensaios e depoimentos sobre os mesmos. Os livros foram resenhados e os artigos, ensaios e depoi-
mentos, devidamente referenciados, foram reproduzidos junto a outros materiais originais: arquivos
de áudio e vídeo contendo músicas, entrevistas, fotografias e fotos.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Como o acesso a essas fontes é restrito, pelas dificuldades normais do manuseio e por não se
dispor no NEDEJA de pessoal para o atendimento aos interessados, a fim de facilitar sua utilização
organizou-se um primeiro DVD-Rom, contendo a parte mais importante do acervo. Com o apoio
financeiro da SECADI – Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão,
do MEC, em 2004 foram produzidas 300 cópias desse DVD-Rom, distribuídas gratuitamente para
os centros de pesquisa e pesquisadores interessados. Em 2013, com uma pequena verba recebida
ainda da SECADI foram feitos 100 exemplares de uma segunda edição, com o conteúdo bastante en-
riquecido com novos documentos, outros filmes e vídeos, e a reprodução integral de alguns livros,
autorizada pelos autores. Esses exemplares também foram distribuídos gratuitamente e esta edição
está inteiramente disponibilizada na internet, no portal www.forumeja.org.br/edupopular. Sabe-se
que este material tem sido frequentemente utilizado em pesquisas e no apoio a cursos e seminários.
O Quadro 1 apresenta o quantitativo das fontes documentais digitalizadas de cada campanha ou
movimento do período 1947-1967, indicando o número de páginas e o tamanho dos arquivos.

quadro 1
fontes documentais digitalizadas para o dVd educação popular i
Nº de Tamanho
Campanhas ou Movimentos
páginas (MB)
Campanhas promovidas pelo MES (1947-1955) 1.252 464
CEPLAR - Campanha de Educação Popular da Paraíba (1962-1964) 297 179
CPC - Centro Popular de Cultura da UNE (1962-1964) 683 112
De Pé no Chão Também se aprende a Ler (1961-1964) 421 347
MCP - Movimento de Cultura Popular (1961-1964) 898 825
MEB - Movimento de Educação de Base (1961-1967) 2.686 418
Sistema de Alfabetização de Adultos Paulo Freire (1963-1964) 840 123
totAl 7.077 2.468

125
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
2º módUlo: memóriA dA edUcAção popUlAr ii (1972/...)
Compreende materiais produzidos por instituições, universidades, movimentos sociais e parti-
cularmente por agências (hoje organizações não governamentais), que assumiram e assumem, em
suas ações e nos materiais elaborados, a perspectiva política e modos de ação da educação popular,
constantes do Quadro 2.

quadro 2
fontes documentais digitalizadas para o dVd educação popular ii
Nº de Tamanho
Experiências
páginas (MB)
CUT – Central Única dos Trabalhadores Programas Integrar e Inte-
2.760 1 GB
gração (1996/2002)
CET – Conselho de Escolas de Trabalhadores (1989/2004?) 633 133 MB
CTC – Centro de Trabalho e Cultura (1966/...) 444 60,8 MB
CEPIS – Centro de Educação Popular do Instituto Sedes Sapientae
262 89,1 MB
(PUC/SP, 1977/1998)
URPLAN – Instituto de Planejamento Regional e Urbano
158 79,5 MB
(PUC/SP 1974/1982?)
Projeto Zé Peão (Paraíba, 1990/....) 554 1,38 GB
CEDI - Centro Ecumênico de Documentação e Informação
920 415 MB
(1974/1994)
NOVA - Pesquisa e Assessoria em Educação (1972/...) 1.412 551 MB
SAPÉ - Serviço de Apoio à Pesquisa em Educação (1985?/...) 651 481 MB
VEREDA - Centro de Estudos em Educação (1982/...) 271 83,7 MB
MEB – Movimento de Educação de Base (1968/1984) 974 188 MB
UFSCar – Universidade Federal de São Carlos Projeto de Alfabetiza-
138 162 MB
ção de Funcionários (1981/1984)
MST – Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (1984/...) 3.492 1.999
totAl 12.669 4.0 gb

126
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
3º módUlo: edUcAção de joVens e AdUltos i (1962/1992)
Compreende dois blocos: a) uma ação, organizada ainda desde o início dos anos de 1960, mas
com orientações diversas dos movimentos de cultura e educação popular (Cruzada ABC), com forte
apoio da Aliança para o Progresso e que pretendeu substituir aqueles movimentos e se contrapor à
organização dos sindicatos rurais; e b) amplas iniciativas governamentais, durante o período autori-
tário, de 1970 a 1986 (Mobral, Ensino Supletivo, Fundação Educar Projeto Minerva).

quadro 3
fontes documentais digitalizadas para o dVd educação de jovens e Adultos i
Nº de Tamanho
Experiências e Movimentos
páginas (MB)
Cruzada ABC – Movimento de Ação Básica Cristã (1962/1968) 1.697 440 MB
Ensino Supletivo (MEC, 1972-1980) 4.787 862 MB
Projeto Minerva (1970/1984?) 204 50 MB
MOBRAL – Movimento Brasileiro de Alfabetização (1968/1985) 23.723 2,56 GB
Fundação Educar (1985/1992) 1.956 664 MB
totAl 32.367 3 gb

4º módUlo: edUcAção de joVens e AdUltos ii (1967/...)


Compreende também dois blocos: a) iniciativas mais limitadas do final dos anos de 1960 e início
de 1970, em parte influenciadas pelos movimentos anteriores (Projeto João de Barro) ou pela UNES-
CO (Alfabetização Funcional); b) experiências renovadoras, basicamente promovidas por prefeituras
municipais, quando dirigidas, no período, por partidos de oposição, particularmente o PT (MOVA,
SEJA e PEJ/PEJA).

quadro 4
fontes documentais digitalizadas para o dVd educação de jovens e Adultos ii
Nº de Tamanho
Experiências e Movimentos
páginas (MB)
Alfabetização Funcional (Incra/Ancarpe, 1968-1970) 472 66,6 MB
Projeto João Barro (Maranhão, 1967-1968) 313 96,5 MB
MOVA - Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos - Prefeitu-
649 200 MB
ra Municipal de São Paulo (1989/...)
SEJA/MOVA Prefeitura Municipal de Porto Alegre
2.051 432 MB
Palavras de Trabalhador (1997-2003)
PEJ/PEJA - Programa de Educação de Jovens e Adultos (Rio de Ja-
2.140 215 MB
neiro, 1985/...)
TOTAL 5.625 1 GB

127
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Embora produzidos em período mais recente, o acesso aos materiais destes dois últimos módulos
também é difícil e a bibliografia sobre essas experiências é relativamente pouca e dispersa.
Pelo grande volume do material digitalizado, expresso nos quadros 2. 3 e 4, estão programados
três novos DVDs. E como anteriormente, o conteúdo trabalhado será também disponibilizado pela
internet, ainda pelo www.forumeja.org.br e pelo site www.nedeja.uff.br, recentemente criado. Essas
ações são bastante oportunas, pois, com o apoio da SECADI, trabalha-se atualmente na implantação
de Centros de Memória da Educação de Jovens e Adultos, em três polos regionais: Sudeste (inicial-
mente no Rio de Janeiro) Nordeste (João Pessoa, Aracaju, Natal e Recife), Centro-Oeste (Goiânia,
Brasília, Cuiabá e Campo Grande). Estes centros têm como objetivos mapear, processar e disponi-
bilizar em rede a documentação histórica e recente sobre EJA, assim como colher depoimentos de
pessoas-chave nas experiências antigas e atuais.
Para a formação do pessoal encarregado da implantação dos Centros de Memória, em 2012 foi
proporcionado às equipes dos polos regionais curso de formação realizado pelo Arquivo Nacional,
fundamental para planejar uma organização lógica e a catalogação do acervo documental desses
centros. A catalogação dos documentos impressos, segundo a Nobrade - Norma Brasileira de Des-
crição Arquivística, é tarefa complexa e, no caso do NEDEJA, deverá ser realizada oportunamente,
com recursos específicos.
O trabalho com o acervo documental do NEDEJA está sendo complementado com a organização
de um acervo bibliográfico, composto de livros, coleções, teses, dissertações, monografias e relató-
rios, com o total de 442 referências, até o momento. Parte importante desta coleção, composta de
165 livros, obras de referência e relatórios de movimentos sociais e educativos populares de vários
países da América Latina e África, foram recebidos por doação, em 2010, do CEDAL – Centre d’Etude
du Développement en Amérique Latine, com sede em Paris.
Não se pretende organizar uma biblioteca especializada, mas um centro de documentação, reu-
nindo principalmente livros e coleções de periódicos que normalmente não são encontrados em
bibliotecas.
A catalogação dos livros é feita por um programa de computador chamado Book Collector e cada
ficha catalográfica contém as seguintes informações: nome e sobrenome do autor, ano de publica-
ção, editora, categoria, gênero, formato do impresso, número de páginas, país e língua. Este acervo
é disponibilizado para os estudantes de pós-graduação em forma de empréstimo, e para os demais
interessados em forma de consulta. Alguns livros digitalizados na íntegra podem ser reproduzidos
por download.

quadro 5
Composição atual do acervo bibliográfico
Livros Coleções Teses Dissertações Monografias Relatórios

227 176 6 25 2 6

Além do trabalho de digitalização do acervo documental, da organização do acervo bibliográfi-


co, da produção do DVD em duas edições e de sua disponibilização no forumeja.org.br, no período
foram orientadas ou coorientadas várias dissertações e teses sobre a temática, tanto na UFF como
em outras universidades.
Foi também produzido, por Leôncio Soares e Osmar Fávero, o livro I Seminário Nacional de Alfa-
betização e Cultura Popular, reunindo a documentação disponível sobre este encontro, realizado
em setembro de 1963, no Recife. Publicado em 2009, com 352 páginas, pelo MEC e pela Unesco, na

128
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Coleção Educação para Todos, em uma edição de 5.000 exemplares, encontra-se também disponí-
vel para consulta online.
O trabalho realizado desdobrou-se ainda, na forma de colaboração, na produção de dois núme-
ros da revista Em Aberto, do MEC/INEP: o n. 32, Educação de Jovens e Adultos, organizado por Maria
Margarida Machado, e o n. 90, Sobre os 50 anos das 40 horas de Angicos, organizado por Marcos
Guerra e Célio da Cunha. Essa revista tem uma edição de 3.000 exemplares, distribuída gratuitamen-
te para todas as Faculdades e Centros de Educação e pessoas interessadas de todo o país. É também
disponibilizada online no site do MEC/INEP. O primeiro número foi publicado em novembro de 2009,
aproveitando a realização da VI Confintea, em Belém do Pará, durante a qual 250 exemplares em CD
foram distribuídos para os participantes nas comissões realizadas sobre o tema. O segundo, cuja
edição é do final de 2013, inseriu-se no conjunto de eventos e publicações comemorativas dos 50
anos de realização da primeira experiência exitosa do Sistema de Alfabetização de Adultos proposto
por Paulo Freire, realizada em Angicos, no Rio Grande do Norte, no início dos anos de 1963. E tem-se
o projeto de publicar, em futuro próximo, os anais da II Congresso Nacional de Educação de Adultos,
realizado no Rio de Janeiro, em 1958.

UmA reflexão sobre memóriA e históriA


Ao longo do trabalho, colocaram-se fortemente duas questões, que valem ser retomadas: a) até
que ponto esse processo pode ser considerado fazer pesquisa? b) a obtenção e o processamento
dos documentos consistem evidentemente na recuperação da memória das campanhas, movimen-
tos e experiências; mas até que ponto isto significa fazer história? Estes dois pontos são abordados
a seguir.

o processo de pesqUisA
A busca intencional e orientada da documentação teve início nos anos de 1980 e seu aprovei-
tamento na produção das teses e dissertações constituíram-se, sem dúvida, em um movimento de
pesquisa. Seu tratamento arquivístico e sua digitalização, tendo em vista a disponibilização do ma-
terial, envolve basicamente um trabalho técnico, mas não se limita a ele. Há uma busca intencionada
de outros documentos que se sabe ou que se supõe existir; procura, seleção e análise de livros, arti-
gos e reportagens existentes, nem sempre disponíveis; contextualiza-se a produção das campanhas
e movimentos, comparando criticamente sua apresentação, informando sobre sua repercussão e
a censura sofrida após o golpe civil-militar de 1964; complementam-se essas informações com en-
trevistas e depoimentos. Embora não se tenha conseguido trabalhar o grande número de teses e
dissertações produzidas nos programas de pós-graduação sobre as campanhas e os movimentos
de cultura e educação popular e a educação de jovens e adultos, foram consideradas as publicadas
como livros e as mais significativas, a maioria na forma mimeografa.
Por sua vez, o próprio modo de apresentar o material selecionado e processado valeu-se de um
formato técnico, mas ultrapassou-o, pelo objetivo decididamente acadêmico: colocar na mão de
pesquisadores, iniciais ou experimentados, com toda a autenticidade, os materiais disponíveis, com
informações tão precisas quanto possível sobre as experiências. Isto tem sido particularmente difícil
no caso das experiências mais antigas, como das escolas radiofônicas criadas a partir dos anos de
1930 e mesmo das campanhas de alfabetização e educação de base dos anos de 1940 e das ativi-
dades de educação rural, nos anos de 1950. Os arquivos dessas últimas campanhas no Ministério
da Educação e Cultura foram inutilizados; são encontrados apenas algumas publicações e alguns
relatórios no Espaço Cultural Anísio Teixeira, da UFRJ, que preserva a antiga biblioteca do Centro
Brasileiro de Pesquisas Educacionais, do MEC/INEP.
Se entendermos fazer pesquisa como um processo contínuo e sempre inacabado, a recuperação
e a divulgação da memória das campanhas de alfabetização e dos movimentos de cultura e edu-

129
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
cação popular e atualmente da educação de jovens e adultos não são apenas subsídios para isto,
mas se inscrevem nesse processo. E, em nosso caso, o trabalho tem-se desdobrado em duas fren-
tes: a) mestrandos e doutorandos da área de História têm estudado experiências importantes de
escolarização e educação de adultos em séculos passados, muitas delas promovidas por empresas
ou sociedades beneficentes, assim como movimentos político-sociais importantes, quase sempre
financiadas pelos poderes públicos; b) mestrandos e doutorandos da área de educação de jovens
e adultos documentam e analisam iniciativas mais recentes, tanto da educação popular como de
programas oficiais (Projovem, Pronera etc.). A perspectiva de trabalho com as juventudes tem enri-
quecido enormemente a produção de teses e dissertações.

recUperAr A memóriA e fAzer A históriA


A história da educação de adultos e a história da educação popular não aparecem nos livros de
história da educação brasileira. Com exceção dos dois livros clássicos, de Vanilda Paiva e Celso de Rui
Beisiegel,27 a produção sobre essas experiências e modalidades educativas consta de livros especí-
ficos, a maioria proveniente de trabalhos de teses e dissertações. Além disso, o difícil acesso a esses
livros, encontrados apenas em bibliotecas universitárias e em sebos, assim como o pouco empenho
no estudo aprofundado das campanhas e movimentos, inseridos nos respectivos contextos históri-
cos, têm levado a interpretações parciais e não raro incorretas.
Um exemplo pode ajudar a entender em que termos a memória assim recuperada e disponibili-
zada ajuda fazer a história. Desde a I Conferência Brasileira de Educação, realizada em 1980, tem-se
como senso comum que as campanhas de alfabetização e os movimentos de cultura e educação
popular, entre eles o Sistema de Alfabetização Paulo Freire, destinaram-se exclusivamente a adul-
tos, ignorando a importância da escola pública para crianças.28 Na verdade, a ênfase na educação
de adultos, qualquer que fosse sua motivação político-ideológica, não se restringia aos adultos; a
ausência de escolas, tanto nas periferias urbanas quanto no meio rural, encaminhava para essas
“classes de emergência”, além dos adultos, crianças, adolescentes, jovens e também idosos, o que se
pode comprovar nas fotos encontradas. Mais que isto, uma das importantes ações do Movimento de
Cultura Popular era a oferta da escola primária para as crianças da periferia da cidade do Recife29 e a
Campanha “De Pé no Chão se Aprende a Ler” originariamente foi uma inteligente e inovadora oferta
de escolas primárias para crianças nas áreas pobres da cidade de Natal, abrindo-se só no segundo
momento para uma ação mais ampla de alfabetização e cultura popular.30
No que diz respeito aos materiais, os primeiros manuais e cadernos específicos para a educação
de adultos datam dos anos de 1940/1950. Foram muito criticados e rejeitados pelos movimentos de
cultura e educação popular, no início dos anos de 1960, responsáveis pelo inovador Livro de Leitura
para Adultos, do Movimento de Cultura Popular do Recife; pelo Viver é Lutar, do Movimento de Edu-
cação de Base; e, sobretudo, pelo Sistema de Alfabetização, criado por Paulo Freire e experimentado
em Angicos, há cinquenta anos. Neste mesmo período, há também vários exemplos de materiais
inovadores e de experiências de formação de professores que se valiam do modo de trabalhar da
educação popular, retomadas por várias agências e movimentos, a partir de meados dos anos de
1970.
27 Vanilda Paiva, Educação popular e educação de adultos;contribuição à história da educação brasileira (1ª ed. São
Paulo:Loyola, 1973) ou História da educação popular no Brasil; educação popular e educação de adultos (6ª. ed. revista e ampliada,
São Paulo:Loyola, 2003) e Celso de Rui Beisiegel, Estado e educação popular. 1ª. ed. São Paulo: Pioneira, 1974; 4ª. ed., Brasília: Liber
Livro, 2004)
28 Ver Vanilda Paiva, “Estado e educação popular: recolocando o problema”, no livro A questão política da educação popular,
organizado por Carlos Rodrigues Brandão e publicado pela Editora Brasiliense, em 1980; e Celso de Rui Beisiegel, Ensino público e
educação popular, em Perspectivas e dilemas da educação popular, organizado por Vanilda Paiva e publicado pela Graal, em 1984.
29 O MCP chegou a instalar 200 escolas primárias no Recife, no período 1961-1964. Dispõe-se de farto material jornalístico
sobre sua instalação.
30 Como é demonstrado nos livros de Moacyr de Góes De pé no chão também se arrende a ler (Rio de Janeiro, Civilização
Brasileira, 1980), José Willington Germano , Ledo e aprendendo; a campanha de pé no chão (São Paulo, Cortez & Autores Associados,
1982), e Margarida de Jesus Cortez, Memórias da Campanha “De pé no chão também se aprende a ler” (Natal: Ed. UFRN, 2005), assim
como nas fotos e no vídeo sobre a Campanha.

130
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
edUcAção, religiosidAde e democrAciA em
comUnidAdes cArentes
renAtA moreirA brUno dos sAntos | renAto ferreirA dos sAntos

Na última semana de dezembro de 2011 a grande imprensa brasileira noticiou que o Brasil pas-
sou a ser a 6ª Economia Mundial, desalojando a Inglaterra que ocupava antes esse lugar no ranking
mundial. Nesse mesmo ano a Organização das Nações Unidas (ONU) classificou o Brasil em 84ª lugar
segundo o índice de desenvolvimento humano (IDH) e a 3ª pior distribuição de renda do mundo.
A abissal discrepância entre desenvolvimento econômico e desenvolvimento humano tem estabe-
lecido um cenário de vulnerabilidade social em comunidades pobres. Verifica-se em tal contexto a
ausência do Estado na prestação de serviços, não obstante a sua forte presença como órgão arre-
cadador de impostos e taxas e como agente repressor. Em um cenário de carências múltiplas e de
extrema violência impostas pelo aparato policial repressivo do Estado e pelo tráfico de drogas, veri-
fica-se o crescimento vertiginoso de templos religiosos “evangélicos”. Para o perímetro urbano exa-
minado há 87 “igrejas” e 03 escolas públicas, sendo uma de Educação de Jovens e Adultos. Infere-se
que a instituição escola, cuja missão é disseminar a educação formal e que teria muito a contribuir
para o resgate da cidadania, está sendo substituída por outro tipo de instituição de caráter religioso
de determinado credo. Dado que todo ambiente de convívio humano é informalmente educativo
e que, para além da fé religiosa, instituições religiosas ofertam a educação não formal, qual o papel
desempenhado pelos templos religiosos para a disseminação de conhecimentos e construção de
valores com referência na democracia? Que motivações seriam fundantes da opção religiosa em
detrimento da educação formal escolar?

palavras-chave: Desigualdade social, Educação, Religiosidade, Democracia

“O senhor... Mire veja: o mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pesso-
as não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas– mas que elas vão sempre
mudando. Afinam ou desafinam [...] É o que a vida me ensinou.”
Guimarães Rosa

Esse é um trabalho de pesquisa que transita por várias disciplinas. Ao abordar os temas da edu-
cação, da democracia e religiosidade, pretende fazê-lo na perspectiva da transdisciplinaridade. Para
tanto vários autores foram trazidos para uma roda de conversas no sentido de referenciá-lo com
suas percepções acerca desses temas. Assim Marx, Durkeim, Weber, Gohn, Vigotski e outros foram
convidados a contribuir com a nossa prosa. Para Marx, “[...] os indivíduos fazem-se uns aos outros,
tanto física quanto espiritualmente, mas não se fazem a si mesmos[...] MARX, 1986, p.55
A partir desta afirmação pode-se concluir que o ser humano é um construto social e como tal
adquire valores, emoções e conhecimentos dados pelo seu meio cultural.
Por outro lado, esse autor nos adverte “As idéias da classe dominante são, em cada época, as
idéias dominantes; isto é, a classe que é a força material dominante da sociedade é, ao mesmo tem-
po, a sua força espiritual dominante” (ibdem, p. 72)
Vigotski, que advogava uma perspectiva interacionista para o desenvolvimento psicológico, va-
lorizava os processos educativos no desenvolvimento do psiquismo humano. Através das suas pes-
quisas, ele descobriu que o ser humano é entre os animais o menos pronto ao nascer, isto é, seu cé-
rebro possui uma plasticidade tamanha que pode ser moldado pela cultura. Para ele, o ser humano
se desenvolve psicologicamente ao internalizar conhecimentos e valores da cultura em que está

131
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
inserido. E esse desenvolvimento é mediado por outros sujeitos, por instrumentos e por símbolos,
ou seja, a internalização de conhecimentos e valores da cultura não acontece de forma direta, mas
intermediada por instrumentos, numa relação concreta e por símbolos, numa relação especifica-
mente abstrata. Vigotski descobriu que o ser humano não nasce psicologicamente pronto, isto é,
seus recursos psicológicos não são natos; por outro lado, esse desenvolvimento psicológico não é
forjado pelo meio cultural de forma passiva. Assim, esse autor nos fala de quatro planos genéticos
que, juntos, explicam como acontece o desenvolvimento psicológico humano. Esses quatro planos
genéticos apontam as possibilidades e os limites de desenvolvimento psicológico do indivíduo. São:
a filogênese, a ontogênese, a sociogênese e microgênese. A primeira delas vincula as possibilida-
des do desenvolvimento do indivíduo à sua espécie. Possui característica determinista porquanto o
indivíduo fica submetido às possibilidades e limitações da sua espécie, no caso a espécie humana,
que é bípede, possui visão binocular, respira por pulmões. Na ontogênese, as possibilidades de de-
senvolvimento estão circunscritas ao indivíduo da espécie, aos estágios necessários e sequenciais
do indivíduo no plano biológico. Na sociogênese as possibilidades e limites para o desenvolvimento
psicológico do indivíduo estão demarcadas pela cultura em que este está inserido e por último, a
microgênese em que as possibilidades de desenvolvimento psicológico são dadas pela experiência
própria individual. Os dois primeiros planos genéticos possuem caráter determinista ao delimitar
de maneira categórica o desenvolvimento ao plano biológico. Na sociogênese percebe-se ainda um
traço de determinismo porquanto o indivíduo é forjado na e de acordo com a sua cultura. Porém,
na microgênese, o indivíduo está liberto de todas as amarras, biológica e cultural, para, a partir das
experiências e interações sociais próprias desenvolver o seu psiquismo. Esses quatro planos juntos
configuram o que para Vigostski representam as possibilidades para o desenvolvimento do psiquis-
mo humano.
Conforme nos alerta Gohn, a educação pode ocorrer em diversos ambientes e com intencionali-
dades e finalidades diversas. Ela compreende a educação em três níveis: a formal, a não-formal e a
informal.
A educação formal sendo aquela que é praticada na escola obedece a um plano educacional pré-
-estabelecido, com currículo e certificação. A educação informal é aquela que acontece no ambiente
de convívio familiar ou de amigos, sem intencionalidade. E a educação não-formal sendo aquela
que não obedece a qualquer plano educacional ou currículo e nem tem o propósito de certificação,
porém possui intencionalidade de ensinar e aprender e trocar saberes.
“Usualmente a participação dos indivíduos é optativa, mas ela também poderá ocorrer por forças
de certas circunstâncias da vivência histórica de cada um.”(GOHN, 2006, p. 29)
A educação não-formal não é organizada por idade, séries, forma a cultura política de um grupo
e desenvolve laços de pertencimento. Pode apoiar na construção da identidade coletiva do grupo e
permitir o resgate da autoestima. Fundamenta-se no critério da solidariedade e do interesse comum
ao grupo. Pode colaborar para a construção e reconstrução da concepção de mundo e de sociedade.
Para Gohn, o fato de existir a intencionalidade na educação não-formal impõe a esta o estabe-
lecimento de objetivos estratégicos, metas a serem atingidas, percursos. Geralmente está ligada a
projetos societários, visões de mundo.
Durkheim vai às formas elementares da religião, para descobrir a causa da sua existência. Para ele,
a religião é uma instituição, formada por crenças (opinião) e ritos (ações), ela seria a primeira forma
lógica de sociabilidade, e nela, a crença seria a responsável por estabelecer a dicotomia do sagrado
e do profano, bem como a moral estabelece entre o certo e o errado.
Sobre esse tema, para Marx, a religião tem um teor alienador, Deus tira do homem características
como a “verdadeira razão”, a religião é alienadora no sentido de tirar do indivíduo sua própria capa-
cidade, e fazer com que ele a enxergue em outro ser, em uma divindade.
Sobre a democracia, Marx a concebia na perspectiva classista, isto é, sob o ponto de vista das

132
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
classes sociais existentes na sociedade capitalista. Para ele, a democracia é uma ditadura para as
classes sociais subalternas na sociedade do capital, ou seja, para os proletários. Esse autor abordou
a questão da democracia em associação com o Estado. Assim, na sociedade de classes o Estado é
um aparato composto por várias instituições cujo objetivo é subjugar os grupos sociais subalter-
nos ou dominados. Qualquer sociedade que almeje a democracia para as classes subalternas não
pode prescindir da imposição, através do Estado proletário, do subjugo ao grupo social dominante,
que então, seria subjugado. Para esse autor, portanto, não há como conceber a democracia numa
sociedade de classes, pois nesta, todas as classes subalternas estão subjugadas pela classe social
dominante.

imergindo no Ambiente dA pesqUisA.


Nosso percurso observador tem início numa comunidade da periferia localizada na cidade de
Duque de Caxias- RJ. De nome Corte-Oito, é densamente povoada e localizada no primeiro distrito
da citada cidade. Estima-se que o número de habitantes esteja na casa de 30 mil pessoas. Constata-
-se a existência de um contingente populacional expressivo de jovens em idade produtiva envolvi-
do no subemprego e outro de mesma monta de desempregados. Presume-se que o desemprego
seja crônico dado o elevado número de jovens perambulando pelas ruas em expediente normal de
trabalho. Caracteriza-se essa comunidade pelo alto índice de violência urbana e pelo domínio das
facções criminosas que controlam o tráfico de drogas e pelas milícias. É comum o envolvimento de
jovens adolescentes com o crime e não raro alguma família que tenha tido algum de seus membros
assassinados ainda na tenra idade. O recrutamento para o mundo do crime se dá em ambos os se-
xos, mas se a morte chega para os homens, as mulheres não escapam do mesmo destino cruel ao se
tornarem mães-solteiras ainda na adolescência.
O que nos chamou a atenção foi o completo abandono institucional com relação à infraestrutura
social. Essa comunidade é carente das condições mais básicas necessárias à vida humana digna.
Não possui Hospital ou posto de saúde, inexiste qualquer área de lazer ou praça pública, não conta
com bancas de jornal e revista, sala de cinema, teatro. Possui apenas três escolas públicas e umas
poucas escolas particulares de primeiras séries. Por outro lado, e isto causou curiosidade, possui 87
templos religiosos que se autodenominam evangélicos, sendo que estão organizados em diversas
tendências. Alguns desses templos possuem estrutura nacional e internacional e outros, os me-
nores, possuem somente representação local. Cabe salientar, nessa comunidade não há qualquer
templo da religião católica ou de outra fé religiosa, o que caracteriza o domínio exclusivo de uma
única confissão religiosa.
Constatou-se, pela observação in loco, que esses templos funcionam em horários diversos, sendo
que foram encontrados templos cujo funcionamento transcorre durante todo o dia para atendimen-
to espiritual dos fiéis. No entanto, observou-se que a maioria dessas casas religiosas funciona duran-
te a noite em todos os dias da semana; todos funcionam nos finais de semana, principalmente no
domingo, quando é comum encontrar legiões de fiéis pelas ruas retornando dos cultos. Para além
dos cultos, os templos com maior estrutura, ofertam reuniões de louvor, momento em que os fiéis
são convocados a passarem seguidas noites em oração. Nessas ocasiões os fiéis contam com apoio
de creche, alimentação.
Verificou-se também que os fiéis denominam a si mesmos de “irmãos” e conformam vários agru-
pamentos que se apoiam uns aos outros no enfrentamento da violência, de alguma enfermidade ou
qualquer outra fatalidade. É comum que um grupo de “irmãos em cristo” seja convidado a compa-
recer em alguma residência para orar pela recuperação da saúde de algum irmão enfermo. Percebe-
-se a conformação de uma identidade coletiva, um espírito de grupo e, dado que a comunidade é
carente em todos os seus aspectos e extremamente violenta, a irmandade religiosa funciona como
uma proteção contra o que SENNETT chama de a corrosão do caráter. Para SENNETT, 2009, p.10 “ca-
ráter: é o valor ético que atribuímos aos nossos próprios desejos e às nossas relações com os outros.”

133
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Constata-se que, neste caso, a religiosidade cumpre um papel relevante ao proporcionar as con-
dições para o enfrentamento aos obstáculos da vida material permitindo a construção do amálgama
social necessário em um contexto de vulnerabilidade social. Talvez se apresente então o que Weber
nos apresenta na sua concepção de religião, “uma resposta racional à indagações que surgem devi-
do aos problemas gerais do destino, do sofrimento.”
Percebem-se as dimensões ideológica e alienadora da religião ao atribuir a um ente divino a ca-
pacidade de resolução de problemas pessoais e sociais. Mas também, verifica-se uma forma de so-
ciabilidade para a proteção contra a violência.

o modelo de cApitAlismo AtUAl.


Coube a nós viver no período histórico de decadência da sociedade capitalista e conforme
MESZAROS, 2005, p. 73 “de crise crônica do capitalismo”, momento em que é cada vez mais difícil a
valorização do capital, isto é, da concretização da mais-valia.
Conforme salienta FATTORELLI, 2013, p. 35 “a sociedade está submetida ao capital financeiro, re-
presentado pelos grandes Bancos”. Para reduzir o tempo de retorno do capital valorizado, os grandes
capitalistas priorizam os investimentos na especulação financeira em detrimento da produção. O
problema, segundo essa autora, é que a especulação financeira concentra o capital, mas não gera
riqueza. Esse modelo simplesmente transfere a riqueza dos mais pobres para os mais ricos.

o modelo de cApitAlismo brAsileiro.


Na esfera capitalista o Brasil ocupa uma posição periférica. Subordinado e dependente, parte da
mais-valia expropriada da força de trabalho é transferida para os países centrais através de um me-
canismo financeiro, o Sistema da Dívida, conforme FATTORELLI, 2013. Segundo informe da Auditoria
Cidadã da Dívida aproximadamente 50% do orçamento anual da União é destinada ao pagamento
de juros e amortizações da Dívida Pública. Ainda segundo essa fonte, a maior parte dessa dívida é
oriunda de empréstimos privados feitos por Bancos e empresas privadas e transformadas em dívi-
da pública. E que o mecanismo consiste na elevação do passivo da dívida ainda que o valor pago
ultrapasse o valor da própria dívida. Trata, pois, de um mecanismo de transferência de riqueza dos
pobres para os ricos.
Acrescente-se a isso o fato de que, por herança histórica, o Brasil constituiu-se como um país cuja
riqueza e a renda sempre foram altamente concentradas nas mãos de poucos proprietários.
Saliente-se que entre os mais de 180 países que compõem a Assembléia Geral da Organização
das Nações Unidas (ONU) o Brasil está entre os 10 países cuja concentração da renda é a maior do
planeta.

As conseqUênciAs do modelo concentrAdor de riqUezA sobre As


institUições do estAdo
Utilizar-se-á neste trabalho a concepção de Estado marxista, segundo a qual o Estado é imanente
à sociedade de classes. Constitui-se enquanto um aparelho institucional a serviço da classe social
dominante no objetivo de viabilizar a submissão e a exploração das classes subalternas. Enquanto
houver Estado haverá ditadura da classe social dominante sobre as demais.
Decorre desta concepção que a democracia parlamentar praticada nas nações capitalistas enco-
bre a verdadeira face da exploração e da opressão.
Visto nesta perspectiva, um Estado é tanto mais repressor na medida em que a sociedade é exclu-
dente à participação da população na renda socialmente produzida. Ou seja, a sociedade brasileira

134
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
demanda um perfil extremamente opressor para as classes subalternas obedecendo a uma confi-
guração hierárquica, isto é, os setores mais pauperizados e excluídos necessitam ser mais controla-
dos socialmente. Acrescente-se a isso o fato de que na perspectiva do capital, constitui excedente
populacional o setor que não pode ser incorporado na valorização deste, isto é, na obtenção de
mais-valia. Tanto pela produção quanto pelo consumo um imenso contingente populacional que se
aglomera nas periferias das grandes cidades constitui excedente populacional.
Para além da dominação, da opressão e da exploração de classe possibilitada pelo aparelho de
Estado, constata-se que essas populações se encontram submetidas a um governo paralelo que
conta com a permissão dos governos, os traficantes de drogas ilícitas e as milícias paramilitares. Es-
ses grupos têm como método de ação política o terror. Trata-se de um governo paralelo de cunho
totalitário e que foge ao padrão de Estado institucional. As populações dessas comunidades estão
submetidas aos desmandos de grupos armados como se vivessem em um campo de concentração
onde a brutalidade, a rudeza o isolamento e a falta de relações sociais normais são elementos cons-
tituintes da base psicológica dessas populações. Para Arendt, 1990, p. 129, “Somente onde há gran-
des massas supérfluas que podem ser sacrificadas sem resultados desastrosos de despovoamento é
que se torna viável o governo totalitário[...]”

o pApel dA religiosidAde e dA edUcAção pArA o controle sociAl


O prejuízos psicológicos decorrentes do convívio humano sob o domínio do terror são imensos:
a fragmentação social, a dispersão, a falta de referência em valores humanitários, a intolerância, a
consciência autoritária, o medo, a insegurança. A necessidade de superar esse estado psicológico
de múltiplas carências é suprida pela única instituição que pode suprir essas demandas, os templos
religiosos chamados de evangélicos. Por outro lado as demandas do setor da população supérflua
e descartável concentrada nas periferias constituem uma imensa ameaça às instituições do Estado,
na medida em que as suas demandas por renda, saúde, transporte, habitação, educação não podem
ser abstraídas e não atendidas. Somente a repressão não é suficiente para estabelecer o controle
social destas camadas populacionais. Verifica-se então uma conjunção de necessidade e interesses.
Se por um lado a população dispersa e desprotegida se apega à salvação terrena pela via da salva-
ção dos céus, o controle ideológico pode ser feito através da religiosidade. As instituições religiosas
cumprem um papel importante como auxiliar do aparato repressor do Estado na medida em que
alimenta a alienação imanente da sociedade capitalista consubstanciada na forma mercadoria. Para
Marx, a religião é uma das formas alienadas de conceber a realidade, pela inversão que se dá na
subjetivação ou personificação do objeto e objetivação do sujeito. Na alienação religiosa, a criatura
domina o criador e a resolução dos problemas terrenos é elevada aos céus.
Na comunidade do Corte-Oito a cultura religiosa da população é incentivada pelos templos reli-
giosos que representam a panaceia para todos os males do espírito e do corpo. Para além da refe-
rência religiosa, percebe-se na comunidade do Corte-Oito que os templos religiosos cumprem um
importante papel educacional. Não a educação formal escolar tendo em vista que esta apresenta
uma lacuna importante nesta comunidade. Mas na educação não formal conforme posta por Gohn.
Encontram-se presentes no arcabouço evangelizador ou conversor dos templos religiosos a in-
tencionalidade, os projetos societários e as visões de mundo, a identidade coletiva de grupo, a cons-
trução de valores.
Em entrevista com moradores da comunidade, destacamos a de Celinha, uma adolescente que é
mãe solteira. Para esta moradora, adepta e frequentadora de um templo evangélico há alguns anos
as religiões tipificadas como de matriz africana (candomblé, umbanda etc) professam a subservi-
ência ao demônio, considerado um espírito decaído, um espírito mal. Perguntada se o demônio
também entrava no templo evangélico, ela respondeu que sim. Mas, se no templo umbandista o
demônio se sentia bem e era bem tratado, pois ali era a sua casa, no templo evangélico, o demônio

135
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
entrava de joelhos, pois ali não era a sua casa.
Percebe-se claramente nessa fala o preconceito religioso e a construção de valores sociais que
excluem a diversidade de credo religioso. Na esteira do preconceito religioso estão a homofobia e o
racismo. É sabido que a bancada evangélica no Congresso Nacional é defensora de pautas que ali-
mentam a homofobia, o racismo, o sexismo. Verificou-se recentemente, pela imprensa, que templos
que professam as religiões de matrizes africanas estavam sendo atacados e destruídos na Baixada
Fluminense do Estado do Rio.
Verifica-se que a educação não formal emanada dos templos evangélicos cumpre um importante
papel ao conformar a identidade coletiva de grupo e o resgate do caráter tão necessários à sobre-
vivência em um ambiente socialmente inóspito, mas ao fazê-lo constrói valores sociais que negam
o respeito à diversidade humana e mais, negam a Constituição Federal, a Declaração dos Direitos
humanos da ONU (Organização das Nações Unidas) e o paradigma da cidadania que referenciou a
construção da sociedade capitalista.
Necessário se torna, pois, uma reflexão sobre a possibilidade retrocesso social no atual quadro de
decadência da sociedade do capital potencializada por uma formação social como a brasileira de
extremo antagonismo social.
Dado que o ser humano é um construto social e levando em conta os planos genéticos de Vi-
gotski, infere-se que o perfil de indivíduo que pode emergir dessa comunidade tende a ser violento,
preconceituoso, racista, sexista, homofóbico. Note-se que esse perfil social costuma ser recrutado
para as organizações de cunho fascista. E o que é o fascismo se não um retrocesso no paradigma de
sociedade construído pela revolução francesa de 1789.
Porém, o quarto plano genético de Vigotski abre a possibilidade para a emersão do indivíduo
cujo perfil social diverge do quadro geral apresentado. O papel que a educação pode cumprir é de
tamanha relevância que constitui uma aberração o desleixo e o abandono imposto à comunidade
em tela.

o pApel qUe A edUcAção escolAr formAl pode cUmprir no resgAte


dA cidAdAniA
Do que foi exposto, constata-se que os templos evangélicos cumprem papel de aglutinador e
protetor social em simultaneidade com o papel ideológico alimentador da alienação e da intolerân-
cia. Nesse contexto, a escola pública laica pode desempenhar um importante papel no resgate da
cidadania de indivíduos em estado de vulnerabilidade social como o constatado na comunidade em
tela. E dado que se trata de uma comunidade de baixa renda e com carências múltiplas, a educação
básica na modalidade de Educação de Jovens e Adultos emerge enquanto possibilidade de inclusão
social e de construção da cidadania. Cidadania esta, referenciada nos parâmetros civilizatórios da
Declaração dos Direitos Humanos da ONU (Organização das Nações Unidas) que prescreve o respei-
to à diversidade humana em todas as suas dimensões, religiosa, de orientação sexual, de gênero, de
opção política de etnia e com direito à educação escolar formal.

considerAções finAis
Infere-se que o recrutamento religioso cujo crescimento é exponencial alimenta-se das misérias
social e psicológica dos indivíduos da comunidade em estudo. Ao mesmo tempo os templos se
mantêm ao disseminar o preconceito e a intolerância.
Avalia-se que o contraponto a esta realidade castradora da condição humana pode ser feito pela
educação escolar formal. Assim, um importante ato de cidadania é reivindicar do Estado a implanta-
ção de uma escola de Educação de Jovens e Adultos, mais compatível com o perfil da comunidade.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Partindo-se do pressuposto de que a educação formal constitui um instrumento importante para
a compreensão da realidade em sua diversidade, aventa-se a possibilidade de que indivíduos que
se apropriam dos conhecimentos sistematizados nos currículos escolares se desenvolvam psicolo-
gicamente e adquiram uma postura de tolerância e não preconceituosa em relação à diversidade
humana. Para além da evolução do psiquismo humano a escola pode propiciar a preparação para o
mercado de trabalho, condição fundante numa comunidade com este perfil. Uma escola em que o
Proeja (Programa Nacional de Integração da Educação profissional com a Educação Básica na Moda-
lidade de Educação de Jovens e Adultos) fosse implantado seria de imensa valia.

referênciAs:
DURKEIM, Emile. As formas elementares da vida religiosa: o sistema totêmico na Austrália. São Paulo,
Editora Paulus, 2008.
FATTORELLI, Maria Lucia. Auditoria cidadã da Dívida Pública, Experiências e Métodos. Brasília, Edito-
ra Inove, 2013.
GOHN, Maria da Glória. Ensaio: avaliativo de políticas públicas de Educação. Rio de Janeiro, v.14,
n.50, p. 27-38, jan./mar. 2006.
HANNAH, Arendt. Origens do Tatalitarismo. São Paulo, Editora Schwarcz, 1990.
MARX, Karl. A Ideologia Alemã. São Paulo, Editora Hucitec, 1986.
MESZAROS, Istvan. A Educação para além do Capital. São Paulo, Editora Boitempo, 2005.
SENNETT, Richard. A corrosão do caráter. Rio de Janeiro, Editora Record, 2009.
VIGOTSKI, L. S., A Construção do Pensamento e da Linguagem. São Paulo, Editora Martins Fontes,
2001.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
ejA, diVersidAde e criAtiVidAde: A experiênciA dos
núcleos de diálogos intercUltUrAis
WAnderley dA silVA | simone bAtistA dA silVA

A história da educação brasileira está marcada pela ausência das camadas populares nos bancos
escolares e pela falta de estrutura e investimentos adequados na escola pública. Todavia, pode-se
ver nas últimas décadas esse quadro sendo alterado positivamente, e a Educação de Jovens e Adul-
tos – EJA é um exemplo no âmbito das políticas de ação afirmativas, de uma modalidade com poten-
cial para atender a uma camada da população que teve seu percurso escolar interrompido e precisa
dar continuidade ao processo de letramento. Atento à importância da diversidade de olhares no
processo do letramento, e à necessidade de práticas educativas que enfoquem a diversidade cultu-
ral que caracteriza nossa sociedade, o projeto dos Núcleos de Diálogos Interculturais (PROEXT-2013)
foi uma iniciativa que teve como propósito compartilhar um ambiente escolar capaz de oferecer
as dimensões filosóficas, artísticas e culturais em uma dinâmica inter e transdisciplinar. O objetivo
deste trabalho é apresentar a proposta e os resultados parciais da implantação dos Núcleos de Diá-
logos Interculturais (NDI) na modalidade EJA em duas escolas públicas municipais de Seropédica-RJ,
envolvendo professores de Ensino de Artes, Língua Materna, Língua Estrangeira e Filosofia da UFRRJ
em práticas colaborativas com professores regentes dessas escolas. Um dos principais intuitos da
equipe executora do projeto foi promover nos espaços escolares o espaço para a construção da per-
gunta, isto é, um ambiente criativo, sem o qual a intenção de uma formação crítica e cidadã pode se
perder em mera retórica, e mesmo ser reduzida ao treinamento aligeirado para o labor.

palavras-chave: Eja, Diversidade, Criatividade

introdUção
Diante da situação histórica da educação brasileira, sobretudo da escola pública, pode-se ter cla-
reza da relação direta do letramento com a distribuição do poder em uma sociedade, ao obser-
varmos que o iletrismo está diretamente relacionado à vulnerabilidade econômica e social, pois
os sujeitos mais marginalizados socialmente são os que apresentam maior índice de iletrismo. A
amenização desse complexo problema pode ter maior alcance se contar com o esforço de equipes
inter e transdisciplinares em uma empreitada de ampliar seus próprios horizontes, os dos alunos e
dos docentes na construção de sentidos, já que o professor, solitário e muitas vezes acusado como
único responsável pelo fracasso, pode ter sua atividade fortalecida com os múltiplos olhares e as
novas contribuições e reflexões sobre e com a sua prática.
Nesse sentido, a Educação de Jovens e Adultos – EJA pode ser incluída no âmbito das políticas
de ação afirmativa para amenizar o problema, pois atende a uma camada da população que, por
várias razões, teve o seu percurso escolar interrompido, mas, ainda assim, deseja dar continuidade
ao processo de letramento. Sem dúvida, cada um de nossos concidadãos é capaz de ler o mundo.
Assim como Freire, acreditamos que a “leitura do mundo precede a leitura da palavra” (FREIRE, 1997,
p.11). Por isso defendemos que o letramento, capaz de incluir esse nosso concidadão no mundo dos
registros concretos das produções de sentido, é uma das principais tarefas da escola pública funda-
mental. Entendemos letramento como prática de produção de sentidos reconhecida localmente, e,
por isso, percebemos a necessidade de múltiplos letramentos na sociedade contemporânea, não
somente pela multiplicidade de tecnologias disponíveis para a produção de sentidos, mas também
pelos diversos discursos que povoam os cenários sociais da era sócio-histórica em que vivemos.
Mais ainda, comungamos com os estudiosos dos Letramentos Críticos, que procuram incluir “não

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
apenas os contextos comunicativos imediatos em que a língua se insere, mas também e principal-
mente o lócus de enunciação como um todo (...) os contextos em que a própria leitura se realiza”
(JORDÃO et al, 2013, p. 41).
O objetivo deste artigo é apresentar a proposta e os desdobramentos do trabalho que foi desen-
volvido com professores e alunos da EJA em duas escolas do município de Seropédica, RJ, e cuja
intenção foi compartilhar um ambiente escolar capaz de oferecer as dimensões filosóficas, artísticas
e culturais em uma dinâmica colaborativa com os professores regentes das escolas. Esse trabalho
recebeu o nome de Núcleo de Diálogos Interculturais – NDI, tendo como característica um espaço
de criação entre a Universidade e a Escola, no qual os professores envolvidos, de ambos os espaços,
pudessem redimensionar suas práticas a partir de uma escuta mais apurada dos alunos e de seus
pares, como também da comunidade local.

A edUcAção de joVens e AdUltos no mUnicípio de seropédicA


O município de Seropédica localiza-se na região metropolitana do Rio de Janeiro, a 73 Km da ca-
pital do estado. Seropédica emancipou-se do município de Itaguaí em 1995, e guarda da sua origem
as práticas das atividades rurais, que ainda caracterizam significativamente o seu espaço territorial.
Na última década, todavia, as áreas de serviços, sobretudo o comércio, vêm criando outro cenário
de atividades produtivas, já que as leis de incentivo fiscal e as obras do Programa de Aceleração do
Crescimento – PAC, do Governo Federal atingem direta e indiretamente o município.
Desde a década de 1940 a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro – UFRRJ, com sede em
Seropédica, tem sido importante para a economia da cidade, possuindo forte influência em várias
atividades na região, muito particularmente na Educação. Além das atividades de ensino, pesquisa e
extensão, a instituição possuiu um Colégio Técnico - CTUR e dirige o CAIC Paulo Dacorso Filho, que
funciona dentro dos limites da UFRRJ.
No ano de 2013, a modalidade Educação de Jovens e Adultos foi oferecida por 12 escolas no mu-
nicípio de Seropédica com um total aproximado de 700 alunos matriculados, segundo informações
da coordenação da modalidade da SMECE31. No mesmo ano, foi possível constatar algumas ativida-
des extracurriculares promovidas pela SMECE que procuravam apoiar a EJA no município, entre elas
o “FESTEJA”, evento semestral que possuía como objetivo divulgar as atividades realizadas nas ofici-
nas escolares por professores e alunos. A SMECE também oferece uma brinquedoteca para facilitar
a permanência dos alunos com filhos pequenos durante o horário das aulas.
Foi possível constatar que a EJA em Seropédica sofreu o fenômeno do processo de juvenilização,
derivado da diminuição da idade mínima de ingresso na modalidade a partir do Parecer CNE/CEB
nº 11/2000 (BRASIL, 2014), que fixou as idades mínimas de 15 anos para o ensino fundamental e
18 para o ensino médio. A partir dessa constatação, apoiada pelos dados oferecidos pelas escolas
parceiras do projeto, cresceu a convicção da equipe de que a estratégia interdisciplinar seria a mais
adequada para o desenvolvimento das atividades.
A equipe dos NDI considerou que dadas as condições objetivas que levaram os adolescentes,
jovens e adultos a buscar a alternativa da EJA para dar prosseguimento às suas formações escolares,
havia a necessidade de oferecer espaços de formação que ajudassem a criação de ambientes propí-
cios à criatividade que levasse à “construção da pergunta” (modo como a equipe passou a se referir
às dinâmicas dialógicas na escola), como parte de uma estratégia interdisciplinar.

A constrUção dA pergUntA e o Ambiente criAtiVo


Fundamentamos a nossa argumentação sob a orientação de alguns conceitos que consideramos
31 Cf. http://www.seropedicaonline.com/prefeitura/smece/educacao-de-jovens-e-adultos-de-seropedica-eja-lanca-seu-livro.
Acesso em janeiro de 2014.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
centrais para a compreensão do processo criativo, que compõe o que Winnicott (2005) chama de
“ambiente suficientemente bom”. Em um ambiente suficientemente bom, o sujeito pode exercer a
sua ilusão de onipotência e lançar-se ao mundo, criando seu “verdadeiro self”. O self verdadeiro não
é uma potência a ser atualizada em ato, como se cada sujeito possuísse uma predeterminação a ser
cumprida. O autor inglês afirma que o sujeito constrói o seu verdadeiro self quando se sente agente
da ação; esse sentimento – a ilusão de onipotência – só é possível em um ambiente que garanta a
espontaneidade do sujeito, sem o risco da sua destruição. Dessa forma, as relações ambientais são
fundamentais para a emergência de uma singularidade criativa ou para o desenvolvimento do su-
jeito a partir da ‘casca’ [reativa], uma vez que, “adaptando-se ao ambiente, ao invés de fazê-lo desde
seu ‘cerne’, ou seja, atualizando as tendências espontâneas que fazem dele um ser singular” (PLAS-
TINO, 2006, p.392).
É importante enfatizar que o processo de constituição de uma singularidade criativa, conforme
estamos descrevendo, está situado em uma zona de amorfia (WINNICOTT, 1975), isto é, em uma
região anterior à cognição. O processo criativo, caracterizado pela “apercepção criativa”, tal como
descrito pelo autor, está relacionado com a preservação da onipotência do sujeito; mas, ao mesmo
tempo, com a possibilidade de “ressignificação do objeto de investimento” (Ibid., p. 126): para que
o sujeito realize a sua criatividade, é necessária a destruição do objeto interno. Esse objeto é carac-
terístico de um isolamento [inicial], que deve ser ultrapassado e colocado sob o crivo das relações
coletivas, para ser reconstruído como objeto, “objetivamente percebido” (WINNICOTT, 1975, p.77).
Em outras palavras, o investimento pulsional – isto é, a energia ou impulso vital que já se dirige para
fora da área de ilusão (do isolamento individual) - só pode ser efetivado de modo autônomo quan-
do o sujeito é capaz de destruir os objetos inicialmente visados, reconstruindo-os em sua dimensão
coletiva, cultural; isso requer o exercício da imaginação (fantasia).
É possível entender que a apercepção é uma instância não cognitiva, que permite que cada sujei-
to possa, ao criar os objetos, significar o mundo para si mesmo, sem com isso isolar-se da realidade
coletivamente construída. Os objetos que o sujeito irá significar, por serem singulares, estão sempre
relacionados com a experiência cultural; em outras palavras, essas significações são frutos da parti-
cipação social. A experiência cultural, que Winnicott define “como uma ampliação dos fenômenos
transacionais e da brincadeira” (Ibid., p. 137), é constitutiva do humano, em suas possibilidades de
viver criativamente; a interdição dessa experiência cria um tipo de isolamento que enfraquece os
traços de humanidade em cada um.
As experiências descritas por Winnicott têm em comum a ênfase na intensa relação entre huma-
nos; todavia, as referidas experiências não são garantia para o desenvolvimento de uma singularida-
de criativa. Os ambientes invasivos atuam como inibidores da criatividade, dificultando o processo
de identificação dos indivíduos e projetando apenas as determinações que sobre eles pesam, e ja-
mais os seus desejos.
Do ponto de vista da formação humana, a educação que privilegia as respostas, em detrimento
da construção da pergunta, funda-se nesses princípios de interdição da singularidade, contribuindo
para a formação de um self adaptativo e tornando-se um obstáculo para o exercício da criatividade.
Sem espaço para criação, a formação crítica e cidadã corre o risco de fragmentação, e a educação
escolar pode se restringir à mera técnica.
A formação comum, que Castoriadis (1986) chama “fabricação do indivíduo social” depende do
código, de um processo de interiorização das significações imaginárias da sociedade. Retirando par-
te da sua ilusão de onipotência, o processo de socialização joga o sujeito em uma realidade preexis-
tente que limita o desejo de realização plena de suas pulsões. Em troca, a sociedade pode dar outro
sentido e um novo espaço para o exercício criativo do sujeito. Mas essa criatividade só é possível no
campo social-histórico, que rompe com o isolamento dos objetos privados de investimentos.
Uma formação comum que vise a um sujeito e a uma sociedade autônoma compõe-se necessa-

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
riamente de uma dimensão política e crítica: trata-se de instituir, para o indivíduo, a possibilidade
de deliberação, entendida como “(...) atividade lúcida, cujo objetivo é a instituição de uma socieda-
de autônoma e [a tomada de] decisões referentes às empresas coletivas” (ibid., 159). Mas trata-se,
concomitantemente, de fazer do autoquestionamento e da autolimitação práticas correntes, já que
“a democracia é o regime de autorreflexibilidade” (ibid., p. 159). Entendida de maneira ampla como
fabricação do indivíduo social, a formação comum é obviamente intrínseca à vida social, pois para
se manter, toda sociedade deve conservar uma unidade que garanta o significado das estruturas
simbólicas criadas. Tanto as sociedades heterônomas quanto as autônomas devem estabelecer uma
unidade de significados para o instituído; mas, fundamentalmente, elas divergem em relação aos
seus objetivos.
Um dos grandes problemas da formação comum em uma sociedade como a nossa é o enfraque-
cimento do sentido dos valores coletivos; pois se o processo de socialização violenta a nossa singu-
laridade, ele em troca contribui para a criação de um campo em que a realização da nossa criativida-
de é possível. A recusa dos modelos comuns de formação é, também, responsável pelo fracasso das
práticas que visam à formação de sujeitos autônomos e democráticos, já que se torna um paradoxo
imaginar a democracia sem um espaço de relações públicas. Um segundo obstáculo refere-se à mí-
dia, que multiplica a apresentação de modelos de subjetividade idealizados sob a égide de valores
individualistas e mercantis, que pouco oferecem para a criação dos valores comuns, já que são mo-
delos de sucesso individual: “pilares de novos modelos de alienação, orientados para o gozo e para o
consumo” (KEHL, 2002, p. 13). Não sendo possível internalizar e realizar os feitos fantásticos dos mo-
delos circulantes, criados pela hipertrofia do narcisismo atual, os estímulos da propaganda lançam
os indivíduos no isolamento: no melhor dos casos, sob a forma de delírio, em que a identificação
com os personagens longínquos inacessíveis permite uma felicidade alucinada, sem compromisso
com o real e sem responsabilidade; mais correntemente, como uma intensa frustração e violência
sem limites. Nos dois casos, o outro só existe como um impedimento para felicidade do indivíduo.
A crise de autorrepresentação da sociedade é, portanto, o estado de uma sociedade que não tem
como prioridade manter projetos coletivos. A formação escolar, inclusive, tem exacerbado seu cará-
ter individualista e competitivo, sem atentar devidamente aos objetivos da construção coletiva de
uma sociedade. Trata-se de uma crise ética, mas igualmente de uma crise política, porquanto arran-
ca dos sujeitos a possibilidade de criação. Trata-se, também, de uma crise da Educação, no sentido
mais próprio, visto que nega aos recém-chegados a possibilidade de receber um mundo novo onde
sejam possíveis novas criações, colocando em risco a formação comum (ARENDT, 2005).
Voltando a Winnicott (op. cit.), a criação de um ambiente de confiança, que disponibilize o outro
como diferente, e não como um modelo que impede a minha presença no mundo, é fundamental
para o processo de construção da pergunta, fundamental para a construção do conhecimento esco-
lar. Assim, o processo criativo do aluno, em qualquer idade, exige uma relação com o outro que seja
capaz da escuta generosa, tanto de si quanto do outro, e do respeito ao seu universo cultural, já que
é algo que pertence “ao fundo comum da humanidade” (WINNICOTT, 1975, p. 138).
Consideramos que os alunos da EJA, mais do que em qualquer outra modalidade de educação
escolar, devam encontrar um ambiente capaz de garantir a emergência da sua criatividade, um am-
biente capaz de potencializar as suas experiências culturais. Julgamos que para conseguir esse ob-
jetivo, será necessário aprender com esses alunos, sem subestimar os saberes trazidos à escola, e
juntos, encontrarmos o sentido da formação comum, construindo coletivamente um “lugar” para
guardar e fruir desses conhecimentos, construindo um saber coletivo que seja maior e mais eficaz
que a soma dos saberes individuais.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
núcleos de diálogos intercUltUrAis – ndi: UmA propostA pArA
“constrUção dA pergUntA”.
A partir do referencial teórico escolhido, propusemos a criação, nas escolas públicas de Seropé-
dica-RJ que ofereçam a EJA, dos Núcleos de Diálogos Interculturais – NDI, que seriam constituídos
por atividades entre os professores regentes das escolas e os professores da UFRRJ. Este projeto foi
financiado pelo edital nº 2 PROEXT 2013 – MEC/SESu, que objetivou o fortalecimentos das ações de
inclusão social e o fortalecimentos das atividades de extensão universitária, tendo sido desenvolvi-
do durante todo o ano de 2013.
As atividades teriam caráter formativo e com conteúdo atualizado, visando à construção de ofici-
nas com os alunos e com a comunidade. O principal objetivo dos Núcleos seria partir de temáticas
locais, comuns aos discentes, e, em seguida problematizar e universalizar os conceitos apresentados
nos diálogos, objetivando o aprimoramento do processo de letramentos.
Para tanto, tornava-se imprescindível que a equipe proponente dos NDI tivesse muito claro em
mente a necessidade do exercício da escuta atenta aos professores regentes da EJA, de forma que
as atividades dos Núcleos viessem realmente ao encontro de suas demandas locais caracterizando
o aspecto dialógico da proposta. Por ser espaço de criação, entendemos necessária a ampliação dos
olhares e dos referenciais, expondo-os à crítica, à problematização, à desconstrução; assim, susten-
tamos a presente proposta em uma dinâmica envolvendo a relação dialógica entre o eu e o outro,
em uma construção coletiva, de modo que o conhecimento construído conjuntamente fosse maior
que cada um isoladamente. Para a construção desse diálogo, convocamos as reflexões filosóficas e
artísticas como interlocutoras entre a dimensão cultural da língua inglesa e da língua materna.
Justificamos a criação dos Núcleos de Diálogos Interculturais – NDI como uma dinâmica de for-
mação continuada, fundamentada nas potencialidades criativas de professores e alunos envolvidos
no processo dos letramentos. Defendemos fortemente a ideia de que a partir de um diálogo coleti-
vo, inter, trans e multidisciplinar, é possível favorecer a construção de leituras múltiplas de mundo,
crítica e legitimação dessas leituras, resultando em um conhecimento mais profícuo, significativo e
plural para todos os envolvidos. Sustentamos, ainda, que a língua materna, foco prioritário do pro-
cesso de letramento escolar, pode ter seu sentido e significado robustecido a partir das reflexões
culturais que envolvem a língua inglesa em nosso país, concebendo-a para além da instrumentali-
dade mercantil. Essas mesmas reflexões culturais podem e devem ser alimentadas pelas reflexões
éticas e estéticas que a Filosofia e as Artes Plásticas tão fecundamente nos oferecem.
Usando as novas tecnologias da informação e da comunicação – TICs, em conjunto com a reflexão
sobre os objetos culturais apropriados pela nossa sociedade, pretendíamos um efetivo diálogo en-
tre o local e o global, convidando a comunidade de Seropédica-RJ, assim como a Escola e a Univer-
sidade, a participarem de práticas que contribuam para uma formação significativa, sustentada na
criatividade e na autonomia, procurando o desenvolvimento de “cidadãos críticos, criativos, éticos e
conectados” (TAKAKI, 2012, p. 7) também no âmbito da EJA, povoada por cidadãos mais propensos
a estarem à margem das propostas inclusivas.
O projeto, contando, inicialmente, com cinco professores da UFRRJ e dois bolsistas, teve seu início
em março de 2013, com reuniões de planejamento e de estudos na UFRRJ. Durante essas reuniões,
debatiam-se textos que compunham o referencial teórico norteador da proposta, assim como cons-
truíamos coletivamente os rumos do projeto. Por problemas operacionais da Universidade associa-
dos a problemas de calendário e de mudança de status dos professores da Prefeitura Municipal de
Seropédica, nossa efetiva participação junto às escolas, só aconteceu no mês de junho.
O projeto previa dois eventos acadêmicos: um de abertura do projeto, chamado Encontros com
a EJA: espaço para a (re) construção da pergunta; outro de fechamento, chamado Encontros com a
EJA: identidades e autorias. Esses eventos tiveram lugar em junho/2013 e dezembro/2013, respec-
tivamente. O principal objetivo dos eventos era criar um espaço de reflexão e diálogo entre os pro-

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
fessores da rede pública e os docentes da UFRRJ em benefício das atividades escolares. Com o apoio
da Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Seropédica (SMECE), os eventos fizeram parte do
calendário oficial de formação continuada dos docentes.
No primeiro evento, os cinco professores da UFRRJ participantes do projeto participaram, em Me-
sa-Redonda, ressaltando a importância do desenvolvimento de professores como “agentes sociais
participativos” (JORDÃO et al, 2013, p. 17), fazendo de suas salas de aula o espaço para a construção
de perguntas, e não simplesmente, um local para encontrar as respostas. No segundo evento, foram
convidados professores externos ao projeto e com investigação em EJA para compartilharem suas
experiências. Como já previsto, os eventos acadêmicos agendados foram extensivos a todos os pro-
fessores de EJA do município, e as atividades sistematizadas do projeto inteiro foram restritas a duas
escolas escolhidas pela Secretaria Municipal de Educação, de acordo com a melhor logística.
Atentos à importância da diversidade de olhares no processo do letramento, visitamos as duas
escolas parceiras por algumas vezes para conhecer sua realidade, seus professores e administração
e seus alunos, e para promover a troca produtiva de conhecimento entre os participantes do pro-
jeto. As escolas parceiras, com 180 alunos de EJA no total, foram acolhedoras quanto à equipe de
trabalho, e seus professores e administração se mostraram bastante receptivos às nossas propostas.
Durante a execução do projeto, pudemos perceber que parece haver uma forte cisão entre as ati-
vidades da Universidade e o cotidiano da rede pública municipal. Em vários momentos do nosso tra-
balho de campo, durante as oficinas, foi evidenciado, pelas declarações dos atores que participaram
do projeto NDI, que a UFRRJ era, apesar da proximidade geográfica, muito distante das perspectivas
dos estudantes e professores. Essa percepção ajudou a equipe do projeto a criar um conjunto de
ações para incentivar a aproximação entre as escolas da rede pública e a UFRRJ não somente naque-
les momentos, mas na tentativa de tornar a parceria uma prática corrente.
Após visitas oficiais às escolas, tomando conhecimento da rotina das escolas e dos trabalhos re-
alizados, tivemos um encontro formal com os professores para trocar ideias quanto ao que seria
realizado com os alunos. Pudemos perceber que os professores se mostraram muito interessados no
trabalho desde o início e começaram a projetar atividades, paralelas e preparatórias, com os alunos
com a temática da oficina.
Após acordarmos com os professores regentes da EJA o formato final, realizamos as oficinas com
os alunos, cujo título foi O mito de Cronos: tempo, identidade e autoria. Nessas oficinas, houve exibi-
ção do curta-metragem Cemitério da Memória (PIMENTEL, 2003) seguida da exibição da imagem do
quadro Cronos, de Goya (1819-1823), e da execução da canção Oração ao Tempo, de Caetano Veloso
(1979). Logo após, foram solicitadas as manifestações dos alunos sobre suas produções de sentido a
partir desses estímulos multimodais oferecidos. Seguindo, realizamos breve narrativa sobre o mito
de Cronos e a contextualização da produção do quadro Cronos. Após esses momentos, exibimos,
por meio de projetor multimídia, as imagens de vários símbolos da vida quotidiana – logomarcas,
utensílios domésticos, e demais objetos de uso corrente – da década de 1950 até os dias de hoje, e
pedimos que os participantes se manifestassem quando alguns dos símbolos fossem significativos
pessoalmente, discorrendo sobre o motivo dessa lembrança/memória. Por fim, abríamos um espaço
para que cada estudante pudesse manifestar as suas considerações sobre a oficina.
A proposta das oficinas era um esforço de construção coletiva, entre os professores e os licencian-
dos da UFRRJ, representados pela equipe do NDI, e os maiores especialistas na EJA, a saber, os pro-
fessores regentes da rede pública da modalidade, representados na ocasião, pelo grupo de profes-
sores da escola que nos acolhia. Já durante a apresentação do vídeo os participantes manifestaram
o reconhecimento de algumas cenas e a dinâmica da apresentação foi muito enriquecida com várias
intervenções. As oficinas foram todas gravadas em vídeo e, posteriormente editadas, foram exibidas
aos próprios alunos para que eles mesmos se reconhecessem como sujeitos.
Os estudantes, de modo geral, fizeram uma autocrítica à falta de ordem, argumentando que “to-

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
dos falavam ao mesmo tempo” durante as gravações, dificultando o entendimento dos registros.
Interessante é ressaltar que alguns lamentaram essa desorganização no sentido de não deixar um
bom material para a posterioridade, “quando no futuro forem ver esse vídeo, não vão aproveitar
muita coisa sobre o tempo”, fazendo alusão ao tema principal da oficina. Ainda assim, no geral, esses
estudantes puderam se reconhecer como sujeitos em um mundo referenciado pelas coordenadas
de tempo e espaço, e com possibilidades de remir o tempo em favor de suas demandas contextuais,
tendo propósitos para sua vida social.
A última etapa da oficina, que ainda não foi totalmente efetivada em função de discrepâncias
entre os calendários da rede das escolas e da universidade, é a da produção de vídeos sob o roteiro
dos estudantes e da comunidade. Na referida etapa, cada participante criaria um roteiro de cenas do
cotidiano, envolvendo o “tempo vivido”, o “tempo do trabalho” e o “tempo do lazer”. Como sugestão
dos docentes das escolas, essas imagens seriam capturadas por aparelhos celulares, acessíveis à
maioria dos estudantes e exibidas em grupos, editadas e divulgadas para uma nova etapa de refle-
xões e produções.
A partir do desenvolvimento da oficina, um universo de personagens tomou visibilidade para
equipe do NDI: os trabalhadores informais, as mães que exercem múltiplas funções, os professores
e professoras que possuem outras atividades e atributos na comunidade, revelavam um ambiente
muito mais complexo do que supúnhamos e do qual só temos uma pequena cena, e exige muito
mais atenção e cuidado para uma melhor compreensão do significado da EJA naquelas comunida-
des.

considerAções finAis
Acreditando que a sala de aula possa vir a ser um espaço privilegiado na educação formal para a
construção de perguntas, e com a intenção de colaborar para que alunos matriculados nos progra-
mas de EJA tenham uma educação preocupada com a formação crítica dos sujeitos, apresentamos a
proposta dos Núcleos de Diálogos Interculturais. Por isso, investimos na parceria escola-universida-
de focando a troca de saberes, a produção contínua e autoral por parte professores e alunos, a partir
do espaço aberto para a construção da pergunta.
Entendendo que a criatividade discente é influenciada fortemente pelo ambiente escolar, as
ideias aqui expostas defendem uma dinâmica de ensino pautada no diálogo, porém, que vai além
da construção das respostas. Não se pretende que professores e alunos deixem de assumir uma
postura de sujeitos “epistemologicamente curiosos” (FREIRE, 2000, p. 96), mas que tomem como
principal objetivo a construção da pergunta, que definimos aqui como um movimento de criação
que exige uma concepção mais ampla do humano do que aquela consagrada pela modernidade. A
construção da pergunta exige sujeitos implicados na construção do espaço comum, requisita uma
relação constitutiva com o outro para além da relação sujeito-objeto.
Por fim, partimos da suposição de que a modalidade da EJA seja um espaço escolar privilegiado
para compreensão dos sentidos correntes dispensados à Educação em nosso país e, por isso mes-
mo, um ambiente que exige práticas educativas e não professorais. Assim, a nossa proposta é a de
ajudar na construção e/ou fortalecimento de um ambiente que amplie as possibilidades de escuta
e valorize a produção dos vários discursos no ambiente escolar, abrindo espaço para que todos nós
possamos aprender nesse processo.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
entre grAdes e rAmpAs: diferençAs em diálogo dos
presídios pArA A UniVersidAde
lUciAnA Velloso

O presente trabalho apresentará algumas de minhas percepções e experiências, vivenciadas en-


quanto integrante do Projeto de Pesquisa e Extensão “Do Cárcere à Universidade”, que surgiu com o
intuito de que a Universidade se mobilizasse, a partir da constatação de que alguns universitários da
UERJ e de outras Universidades são apenados(as), do regime aberto ou semiaberto, que consegui-
ram concluir a Educação Básica dentro do sistema carcerário. Iniciei minha participação no Projeto
pelo interesse em conhecer de forma mais aprofundada a realidade com a qual estava lidando, que
é a de alunos e alunas do Curso de Graduação em Pedagogia da Faculdade de Educação da UERJ,
Curso no qual lecionei durante cinco anos, tendo em minhas salas de aula as mais diversas realida-
des. Dentre elas, a de ter discentes que fizeram todo o seu Ensino Médio na modalidade Educação
de Jovens e Adultos (EJA), dentro do sistema penitenciário. Nesse sentido, alguns dos referenciais
que têm contribuído para (re)pensar minhas práticas docentes e as formas como compreendo es-
tas vidas já tão marcadas por um caminho tão sinuoso do presídio até a Universidade são Bauman
((2013), Becker (2008), Bentham (2008), Goffman (2008), Foucault (2007, 2009), Freire (2014, 2011),
dentre outros. Tenho aprendido muito com as reuniões do Projeto e convivendo com os discentes
dentro e fora de sala de aula. Por compartilhar com o grupo da crença na educação como um direito,
creio que a EJA no sistema prisional ainda é algo que precisa ser por nós (re)conhecido, através de
estudos e da troca de experiências com estes nossos alunos e alunas que transitam cotidianamente
entre grades e rampas.

palavras-chave: Universidade, Sistema Prisional, Diversidade

AlgUmAs conVersAs
Este trabalho1 busca apresentar algumas de minhas percepções e experiências, vivenciadas en-
quanto integrante do Projeto de Pesquisa e Extensão “Do Cárcere à Universidade”. O Projeto surgiu
com o intuito de que a Universidade se mobilizasse, a partir da constatação de que alguns univer-
sitários da UERJ e de outras Universidades são apenados/as, do regime aberto ou semiaberto, que
conseguiram concluir a Educação Básica dentro do sistema carcerário.
Atuei enquanto docente contratada na Faculdade de Educação da Universidade de Educação
do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) de 2009 até 2014, quando findou meu contrato. Neste período,
vinculada ao Departamento de Ciências Sociais e Educação, ministrei diversas disciplinas, tanto na
Licenciatura quanto na Pedagogia, geralmente para turmas com cerca de quarenta alunos/as e em
períodos ainda bem iniciais (geralmente primeiro e segundo). Eram disciplinas como: Antropologia
e Educação, Sociologia da Educação e Diversidade Cultural: tanto se fala na relação entre “Eu” e “Ou-
tro”, como se este Outro estivesse “do lado de fora”. Destaco a importância de olhar para estes tantos
“Outros” que estão ao nosso lado.
Por serem turmas bastante grandes e com público muito heterogêneo, em termos de faixa etá-
ria, condições socioeconômicas, relações profissionais ou a inexperiência com as mesmas, distintos
graus de interesse pelo curso de Pedagogia que estavam cursando, não era tarefa das mais simples
estar atenta a tantas demandas que me chegavam.
Só vim a saber que lidava com este público de alunos/as em situação de privação de liberdade no
primeiro semestre do ano de 2011, quando fiquei sabendo da trajetória de um de meus ex-alunos.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Eu já havia sido professora deste jovem no segundo semestre de 2010, e em classe, destacava-se por
suas capacidades de liderança, carisma e empenho. Recordo-me que muitas vezes, por lecionar no
último tempo da noite, era interpelada por ele, alegando ter de sair na hora certa e sem atrasos, sem
saber ainda que seu trajeto era das rampas da UERJ de volta às grades do presídio e ele tinha de estar
de volta no horário exato.
Enquanto fui sua professora, não imaginava que sua vida era tão complexa, pois reconhecendo
minha incapacidade para lidar com demandas de turmas tão grandes, nem sempre conseguia ouvir
a todos/as, por mais que me esforçasse. Quando meu aluno, o mesmo estava no seu primeiro perí-
odo, ainda dando seus primeiros passos naquele Universo tão complexo que é a vida universitária.
Ele não queria expor sua situação e preferia manter o sigilo, buscando ser tratado da mesma forma
que seus colegas, mesmo que isso lhe custasse os maiores sacrifícios2. Esta tentativa de se preservar
corrobora com o que indica Goffman (2008), quando explicita que as pessoas íntimas podem vir a
desempenhar algum tipo de manipulação de situações sociais por parte daquele de quem a socie-
dade não confia mais, algo que nos faz compreender a atitude desse aluno por conta de sua situação
de portador de um estigma bastante forte.
Com o tempo, foi fazendo amizades e se unindo a um grupo de alunos e alunas onde partilhava
sua condição. Era muito estimado e bem aceito. O grupo o acompanhava e auxiliava nas tarefas ex-
tras. Somente este grupo mais próximo, neste primeiro momento, sabia de sua outra vida.
Por estas ironias da vida, já em 2011, fui procurada por uma das alunas que fazia parte deste gru-
po, por ser considerada, nos dizeres da mesma, uma das poucas professoras em quem sabiam que
podiam confiar. Ela me colocou em contato com outra professora para quem haviam relatado a situ-
ação de que este aluno teve o seu direito de estudos extramuros retirado. Foi ali o momento em que
me dei conta de que nem sequer sabia da situação do agora meu ex-aluno, aquele jovem que tinha
tantos sonhos e que dizia sempre nas aulas que trabalhava com um grupo de teatro e que sonhava
em cursar Pedagogia para levar alegria para crianças de rua, tentando evitar que estas crianças en-
trassem para uma vida de crimes (isto tudo faria muito sentido para mim mais tarde).
Foi um baque tanto saber que ele era um aluno presidiário quanto saber que ele havia retornado
a tal condição. Pensei em tantas coisas naquele momento e uma delas, minha total impotência e
desconhecimento de tantas coisas que ocorrem ao nosso lado. A partir daí, contando com a con-
fiança do grupo de colegas deste aluno que estava arrasado com sua situação e com o contato que
estabeleci com outra professora e hoje coordenadora do Projeto “Do Cárcere à Universidade”, inicia-
mos uma verdadeira jornada rumo a um mundo totalmente desconhecido para mim. Vim a saber
que o aluno estudara seu Ensino Médio dentro de um presídio e com muito custo conseguiu prestar
o vestibular.
O que inicialmente era uma luta para retirar nosso aluno daquela situação e reverter o quadro, fez
com que a coordenadora do projeto e eu fôssemos aprendendo mais sobre questões jurídicas, leis e
pareceres, acreditando que era possível a mudança de mentalidades e a desconstrução de estereó-
tipos que já estava em curso quando o aluno estava estudando e já perfeitamente integrado à vida
universitária, cheio de planos e sonhos. E estes sonhos não queríamos deixar morrer.
Começamos a compreender que o fato de haver algumas escolas, dentro dos presídios, não ga-
rantia o direito à educação, pois nesses espaços o processo de escolarização é visto e tratado como
um benefício ou privilégio. Os agentes penitenciários acreditam que qualquer ação positiva para os
presos significa premiar o comportamento “criminoso” (Parecer 4/2010).
Nessa dinâmica de reconhecer e cumprir o direito à educação pode-se observar duas lógicas
opostas: “a da educação que busca a emancipação e a promoção da pessoa e a da segurança que
visa a manter a ordem e a disciplina por meio de um controle totalitário e violento subjugando os
presos” (Parecer 4/2010:5). Os/as universitários/as da UERJ, que são apenados/as, demonstram que é
possível reverter esse quadro, pois conseguiram vencer essa barreira e ingressar no Ensino Superior.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Entendia que falar tanto sobre respeito às diferenças em minhas turmas e não me aproximar de
algo que estava próximo a mim, atendendo o chamado de meus ex-alunos e a expectativa dos/as
mesmos/as de que fizesse algo no sentido de intervir no processo de retorno de seu colega era in-
compatível com o que eu acreditava.
Após muitas idas e vindas, sob a égide da professora Socorro Calhau, me inseri no projeto “Do
Cárcere à Universidade” como pesquisadora, além de professora de muitos discentes que eu preten-
dia conhecer para saber como melhor agir. Queria conhecer de forma mais aprofundada a realidade
com a qual estava lidando, que é a de alunos e alunas do Curso de Graduação em Pedagogia da
Faculdade de Educação da UERJ, Curso no qual lecionei durante cinco anos, convivendo nas salas de
aula as mais diversas realidades. Dentre elas, a de ter discentes que fizeram todo o seu Ensino Médio
na modalidade Educação de Jovens e Adultos (EJA), dentro do sistema penitenciário.
Conhecer as vivências destes alunos em privação de liberdade me despertou para ter um olhar
mais atento e cuidadoso para com as diferenças em minhas aulas e fora da sala de aula. São alunos
que transitam entre rampas e grades, na tentativa de criar pontes entre estes dois universos.
Aprovado para se iniciar em 2012, o Projeto de Pesquisa e Extensão “Do Cárcere à Universidade”
foi se construindo com o objetivo de apoiar os discentes privados de liberdade em sua trajetória
pela Universidade, buscando subsídios que permitam que eles possam permanecer e concluir os
estudo, além de iniciar a construção de uma Política Pública de Inclusão desses alunos na UERJ, essa
última, sabemos, será um árduo trabalho, assim como foi a implementação da política de cotas, hoje
tão bem avaliada pelas pesquisas. A dinâmica de trabalho de realizar reuniões quinzenais de estudo
e reuniões de planejamento de atividades práticas, com membros com diferentes trajetórias (uma
bolsista, um advogado, que também é conselheiro Penitenciário, uma professora que dá aulas em
uma escola do sistema prisional e é Mestra em Educação pela PUC/RJ, uma historiadora aposentada
da UERJ, pesquisadora do IHGB3, mas que foi uma das pessoas que mais apoiou a produção do pro-
jeto, e com grande experiência em Política de Inclusão, além de universitários privados de liberdade,
estudantes da Faculdade de Educação e um egresso do sistema prisional, também do nosso Curso
de Pedagogia) tem sido para mim experiências riquíssimas de aprendizados e formas de rever mi-
nhas práticas, além de defender cada vez mais que a modalidade de Educação de Jovens e Adultos
no Sistema Prisional e a possibilidade de chegarem até a Universidade não seja um privilégio de
poucos, mas sim um direito assegurado por lei.
Alguns dos referenciais que têm contribuído para (re)pensar minhas práticas docentes e as for-
mas como compreendo estas vidas já tão marcadas por um caminho tão sinuoso do presídio até a
Universidade são Bauman (2013), Becker (2008), Bentham (2008), Goffman (2008, 2010), Foucault
(2009), Freire (2011), dentre outros.
Michel Foucault e seus textos muito contribuíram e ainda fornecem subsídios para pensar o con-
texto em que se inserem estes/as alunos e alunas, que encontram-se reféns de instituições forjadas
no bojo da Modernidade, com o intuito de docilizar corpos e “escamotear” as diferenças, estipulan-
do padrões de normalidade nos quais as pessoas deveriam se enquadrar.
Em sua obra “Vigiar e Punir”, Foucault (2009) analisa os processos de punição que foram se pro-
duzindo historicamente, Foucault (2009) indica que até mesmo o papel do julgamento pode ser
hoje matizado. Não é mais um ato solitário que se dá culpabilizando ou não outro indivíduo. Para
Foucault, o juiz de nossos dias faz algo bem diferente de “julgar”, pois ao longo de todo o processo
penal, gravitam diversas instâncias anexas, tais como: peritos psiquiátricos ou psicológicos, magis-
trados da aplicação das penas, educadores, funcionários da administração penitenciária fracionam
o poder legal de punir.
E embora se diga que ao juiz é quem cabe unicamente o exercício de julgar, desde que as penas
e as medidas de segurança definidas pelo tribunal não são determinadas de uma maneira absoluta,
a partir do momento em que elas podem ser modificadas no caminho, a partir do momento em que

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
se deixa a pessoas que não são os juízes da infração o cuidado de decidir se o condenado “merece”
ser posto em semiliberdade ou em liberdade condicional, se eles podem pôr um termo à sua tutela
penal, são sem dúvida mecanismos de punição legal que lhes são colocados entre as mãos e deixa-
dos à sua apreciação; juízes anexos, mas juízes de todo modo.
Todo este processo de criminalizar, de atribuir penas e sentenças era para mim algo deveras com-
plexo. Eu nunca havia lidado com a situação de ter que decifrar códigos e símbolos muito particula-
res daquele grupo, pois como alguém de fora daquele universo de significados partilhados, confor-
me os termos de Geertz (2008), eu era alguém que me esforçava por decifrá-los.
Neste processo de decifrar tais códigos, destaco o auxílio que tive através da leitura das obras do
escritor e ex-presidiário Luiz Alberto Mendes, que relata em seus escritos as formas através das quais
a educação foi fundamental para modificar sua visão de mundo, militando em prol da leitura como
forma de empoderamento. Conforme destaca Mendes (2014) em entrevista:

“[...] tenho me envolvido com diversas situações em que todas elas são vinculadas
aos livros. O problema de nosso país é a deseducação. É o individualismo total, isso é
que acaba conosco. O individualismo é produto da não educação”4

O caso de Luiz Alberto Mendes, que em sua biografia “Memórias de um sobrevivente” (2009)
muito me auxiliou a melhor entender as tantas dificuldades pelas quais nossos alunos e alunas pri-
vados de liberdade precisam passar para conseguir se livrar de tantas marcas deixadas por viverem
naquilo que Goffman (2010) denomina como “instituições sociais totais”. Além disso, traziam tam-
bém muitos traumas gerados por estarem ainda inseridos no que o próprio Goffman (2010) define
como “instituições totais”, nas quais seu caráter total é simbolizado pela barreira à relação social com
o mundo externo e por proibições à saída que muitas vezes estão incluídas no esquema físico – por
exemplo, portas fechadas, paredes altas, dentre outros elementos.
Assim como Mendes (2009), os discentes que chegam em nossas salas de aula, tendo na baga-
gem uma trajetória tão atribulada, temem por aquele Universo tão distinto do que conhecem. Do
mesmo modo, eu também fui me acostumando a lidar com suas singularidades.
Em um primeiro momento, admito que agia na defensiva, aguardando que os/as alunos/as que
eu já sabia através do Projeto que eram presidiários do semiaberto se apresentassem para mim.
Já em um segundo momento, ia diretamente buscar maior aproximação com aqueles/as alu-
nos/as, que traziam consigo dúvidas sobre revelar ou não seu outro pertencimento ou o que eles
denominavam “identidade de presidiário”. Era de fato uma questão controversa para alunos que já
traziam consigo todo um estigma (GOFFMAN, 2008) imputado pela sociedade.
Pelo fato de já estarem em contato direto com o Projeto e saberem da existência do mesmo na
UERJ, em 2013, os novos universitários privados de liberdade que chegaram para iniciarem o Curso
de Pedagogia já assumiram sua condição de apenados frente aos colegas e professores e a aceitação
de todos foi muito inspiradora para nós. Sendo alunos da mesma turma, os dois alunos que inte-
gravam a mesma Unidade Prisional concordaram deixar esta questão clara desde o início do curso,
alegando que “já viviam presos, ali seria o espaço de ficarem livres, não adiantava se esconder” (de-
poimento de um dos alunos em conversa informal).
Concomitantemente à minha inserção no Projeto, fui professora de ambos no primeiro e no se-
gundo período, ministrando as disciplinas de Antropologia e Educação e Diversidade Cultural, res-
pectivamente. A professora coordenadora do Projeto foi também docente da turma no segundo
período, e ministrávamos aulas nos mesmos dias. Era impressionante a habilidade de ambos para
resolver problemas que para a maioria da turma pareciam insolúveis. Um deles logo assumiu a posi-
ção de representante, sempre tomando a frente para dialogar com algum professor quando surgisse

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
alguma demanda da turma. Além disso, talvez pelo fato de viverem em um espaço tão opressivo,
estavam sempre propondo atividades lúdicas, que eu prontamente topava.
Não foram poucas as vezes em que saímos do ambiente fechado da sala para ter “aulas” (uso as-
pas justamente por estas fugirem totalmente do modelo padrão de aula: professor/a na frente fala
e alunos/as do outro lado ouvem) no Hall, no pátio da Universidade, na Biblioteca que eles queriam
conhecer, enfim... eu me deixava levar por esta vontade que tinham de ganhar o espaço e a turma
toda se contagiava também. Estes retornos positivos tanto por parte dos alunos que iam bem nas
aulas e da turma que os aceitava e recebia nosso incentivo para que continuasse cada vez mais in-
tegrados.

UmA inconclUsão, pois o AprendizAdo continUA...


Hoje em 2014, já não mais lecionando na UERJ, mas ainda fazendo parte do Projeto, observo que
muitas ações já têm sido executadas, como produção de materiais, matrícula de outros/as alunos/
as, parcerias com instituições que possuem interfaces com o nosso trabalho e das quais já nos apro-
ximamos de alguma forma. Dentre elas a mais fundamental é a Secretaria de Administração Peni-
tenciária (SEAP), além disso, com o TJ, Tribunal de Justiça e com o CEPERJ – Conselho Penitenciário
do Estado do Rio de Janeiro. Também temos organizado encontros para conversas e estimulado que
os/as alunos/as que se encontram na situação de privação de liberdade e estudando na UERJ sejam
também autores de trabalhos que possam lhes conferir visibilidade, dentro da perspectiva de Fou-
cault que discute as relações de saber e poder (1979).
Afinal, é no cotidiano que eles/as podem se reafirmar enquanto sujeitos de direitos e que trazem
consigo um legado que nossa sociedade cada vez mais necessita ouvir, conhecer e desse modo, ir
rompendo com estereótipos que os categorizam como “outsiders” (Becker, 2008) ou desviantes de
uma suposta norma. E o saber vai gradualmente lhes conferindo poder sobre si mesmos/as e sobre
suas vidas.
Entendo que de fato, nas grandes cidades em que vivemos, o medo e a insegurança acabam do-
minando a vida urbana e alterando as relações entre as pessoas, de modo a torna-las mais próximas
em termos de conexões tecnológicas, mas mais distantes em termos de contatos presenciais (BAU-
MAN, 2009). Somando-se a isto, entendemos que dados os preconceitos que nos envolvem, uma
trajetória destes alunos e alunas apenados/as, por mais que este se esforcem, não se apagam, não se
esquecem, e sabemos que na prática traz sim seus desafios. Contudo, acredito que a aquisição desta
identidade de alunos universitários, é algo que vai contribuindo para o empoderamento destes su-
jeitos, que reside também em suas possibilidades de fazerem escolhas.
Tenho aprendido muito com as reuniões, palestras e encontros promovidos que fazem parte do
Projeto “Do Cárcere à Universidade” e convivendo com os discentes dentro e fora de sala de aula. Mi-
nha postura enquanto docente tem sido diretamente afetada positivamente neste sentido, reiteran-
do que, para além de nossa igualdade, há que reconhecermos nossas diferenças e as valorizarmos.
Nesse sentido, compartilho com Freire (2011) a indagação:

“Que educador seria eu se não me sentisse movido por forte impulso que me faz
buscar, sem mentir, argumentos convincentes na defesa dos sonhos por que luto?
Na defesa da razão de ser da esperança com que atuo como educador.” (p.117)

Por compartilhar com o grupo da crença na educação como um direito, creio que a EJA no sis-
tema prisional ainda é algo que precisa ser por nós (re)conhecido, através de estudos e da troca de
experiências com estes nossos alunos e alunas que transitam cotidianamente entre grades e ram-
pas. E que esta busca por uma educação de fato libertadora possa nos mover a seguir em frente,
acreditando que um outro mundo é possível...

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
referênciAs
BAUMAN, Zygmunt. Vigilância Líquida: diálogos com David Lyon/ Zygmunt Bauman. Rio de Janeiro:
Zahar, 2013.
BECKER, Howard. Outsiders: estudos de sociologia do desvio. 1.ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2008.
DIRETRIZES Nacionais para a oferta de Educação para jovens e adultos em situação de privação de
liberdade nos estabelecimentos penais. Parecer 4/2010 – 2010.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: nascimento da prisão. 37. Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2009.
FOUCAULT, Michel. Microfísica do Poder. Rio de Janeiro: Editora Graal, 1979.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Esperança: um reencontro com a pedagogia do oprimido. 17. ed. São
Paulo: Paz e Terra, 2011.
GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. 1.ed., 13.reimpr. Rio de Janeiro: LTC, 2008.
GOFFMAN. Erving. Estigma: a manipulação da identidade deteriorada. 4.ed. Rio de Janeiro: LTC, 2008.
_____. Manicômios, prisões e conventos. São Paulo: Perspectiva, 2010.
MENDES, Luiz Alberto. Memórias de um sobrevivente. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
inclUsão digitAl: experiênciAs midiáticAs nA
formAção de AdUltos
cUstódio joVêncio bArbosA filho

Este artigo se detém a refletir sobre os interesses de adultos em buscar uma sala de aula de um
projeto de extensão que visa à formação e inclusão digital. Tomando como experiência de escrita
o projeto de extensão “Inclusão Digital para a Idade do Ouro” da Escola Superior Aberta do Bra-
sil – ESAB, buscamos a partir do estudo de caso respostas às inquietações presentes neste espaço
formativo, pois entendíamos que havia um fenômeno sócio formativo que precisava ser analisado
de forma mais sistematizada. Diante disso, utilizamos como estratégias metodológicas um questio-
nário com perguntas fechadas e abertas. Na análise dos dados chegamos às seguintes conclusões:
cada vez mais as educandas adultas estão buscando estratégias de inserção nas redes sociais para
se comunicarem e informarem sobre diversos assuntos. Mostrou ainda que não se pode mensurar
de forma objetiva o percurso formativo quando se tratar de ampliação de formação dos sujeitos
adultos, comprovado pela produção dos dados em campo. Os sujeitos da pesquisa demonstraram
que suas intenções são muito mais amplas do que os objetivos aos quais o projeto se propõe, pois
estes sujeitos desejam, também, desde a divulgação de produtos nas redes sociais até a utilização
de espaços investigativos para reencontrarem pessoas que a muito não viam.

palavras-chave: Inclusão digital., experiências, formação de adultos

introdUção
A escrita deste artigo se deu a partir das experiências vivenciadas no projeto de extensão “In-
clusão Digital para a Idade do Ouro” da Escola Superior Aberta do Brasil – ESAB, que teve início no
segundo semestre de 2012 com a participação de adultos, que não detinham o domínio sobre as
novas tecnologias em especial o computador, e residiam nas proximidades desta instituição, locali-
zada no município de Vila Velha no estado do Espírito Santo. Diante desse contexto, este estudo tem
como objetivo refletir sobre os interesses de adultos em buscar uma sala de aula de um projeto de
extensão que visa à formação e inclusão digital.
A dinâmica da vida sociocultural na atualidade tem requerido dos sujeitos experimentar as di-
versas formas que os possibilitam se inserirem no mundo cada vez mais tecnológico. Ao vivenciar
processos formativos de adultos na inclusão digital a partir das experiências midiáticas, buscaremos
apresentar resultados desta experiência por meio dos dados produzidos in loco na interlocução
com algumas literaturas que toma as questões da mídia para pensar as relações sociais e formativas
dos sujeitos em especial adultos.
No intuito de responder a problemática sobre quais os interesses de adultos em buscar uma sala
de aula de um projeto de extensão que visa a formação e inclusão digital que emergiu no percurso
do projeto de extensão? Buscamos trabalhar com o estudo de caso enquanto apropriação meto-
dológica. Neste sentido, a pesquisa nos fez mergulhar um pouco mais na dinâmica do projeto de
extensão, para compreender os reais interesses desses sujeitos e o que os levou a buscar esta forma-
ção. Utilizamos como estratégias metodológicas um questionário com perguntas abertas e fecha-
das direcionadas aos sujeitos da pesquisa.
Na análise dos dados chegamos às seguintes conclusões: cada vez mais as educandas adultas
estão buscando estratégias de inserção nas redes sociais para se comunicarem e informarem so-
bre diversos assuntos. Outra conclusão importante é que não se pode mensurar de forma objetiva

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
o percurso formativo quando se tratar de ampliação de formação dos sujeitos adultos, o que foi
comprovado a partir dos dados produzidos em campo. Os sujeitos da pesquisa demonstraram que
suas intenções são muito mais amplas do que os objetivos aos quais o projeto se propõe, pois estes
sujeitos desejam, também, desde a divulgação de produtos de artesanato nas redes sociais até a
utilização de espaços investigativos para reencontrarem pessoas que há muito tempo veem.

A edUcAção de AdUltos e A inclUsão digitAl


A educação de jovens e adultos tem vivido desafios constantes para superar os altos índices de
analfabetismo no Brasil, os dados quais indicam mais de 8% da população nesta situação. (PNAD/
IBGE, 2012), sem falar os altos percentuais que ainda se apresentam de analfabetos funcionais. Estes
dados apontam para um problema de reorganização e investimento nas políticas públicas de EJA,
principalmente, em relação à dificuldade que o MEC/SECADI tem em pensar políticas que articulem
a alfabetização com a escolarização destes sujeitos.32
Se ainda há um grande desafio na perspectiva de avançar para a redução dos índices do analfa-
betismo de jovens e adultos, no que tange a ampliação da pauta por políticas públicas para o anal-
fabetismo digital, este desafio se torna ainda maior, pois há um número elevado de pessoas jovens
e adultas nunca sequer tiveram a oportunidade de conhecer uma sala com equipamentos de mídias
eletrônicas33, em especial, pela comunicação digital por meio do computador.
Em um relatório sobre o mapa da inclusão digital coordenado por Neri (2012), e desenvolvido
pela Fundação Getúlio Vargas, podemos inferir que apesar do Brasil estar na média mundial no que
diz respeito a acesso à internet, sabendo que o uso da internet faz parte de um dos indicadores das
Metas do Milênio da ONU (MDGs)34, temos visto um grupo muito grande de jovens e, em especial
adultos, que nunca tiveram a oportunidade de acessar a internet.35
Ao compreender que o conceito de mídia eletrônica traz diversos elementos para pensar o uso
do computar como ferramenta de acesso às redes digitais de informação e comunicação, nos reme-
teu à questão problema postos pela pesquisa: quais os interesses de adultos em buscar uma sala de
aula de um projeto de extensão que visa a formação e inclusão digital?
Na produção de vivências entre os sujeitos adultos e o uso do computador percebeu ainda al-
guns “tabus” a serem vencidos no que tange à relação destes sujeitos com a máquina “computador”.
Entretanto, com a expansão das redes de informação e comunicação, este equipamento tem sido
um dos principais instrumentos para pensar as relações sociais de comunicação e transferência de
dados entre jovens, adultos e idosos. Mas, para que se trate desta nova perspectiva formativa de
sujeitos adultos, nas interações sociais, Castells (2005, p. 17) destaca que

[...] a tecnologia é condição necessária, mas não suficiente para a emergência de


uma nova forma de organização social baseada em redes, ou seja, na difusão de
redes em todos os aspectos da actividade na base das redes de comunicação digital.

Essa preocupação de Castell tem sido uma das que trabalhamos no projeto. Sendo assim, a expe-
riência do projeto de extensão “Inclusão Digital para a Idade do Ouro” da Escola Superior Aberta do
Brasil – ESAB tem proporcionado um exercício para compreender até que ponto estes sujeitos têm
buscado conhecer mecanismos de aproximação com os equipamentos midiáticos - computador,
tablet e celular - para dar conta de pensar suas relações com o processo comunicativo em sociedade.
32 Ver política do Programa Brasil Alfabetizado – PBA que não articula os tempos de formação da alfabetização com o processo
de escolarização dos sujeitos jovens e adultos.
33 Mídia eletrônica: utiliza redes digitais de telecomunicações (celulares, tabletes e conexões de internet) e a TV digital com
acesso à internet.
34 Entretanto há que se questionar os interesses da ONU em tratar o acesso à internet como metas para o milênio.
35 Devido aos limites deste artigo não iremos nos ater sobre esta questão da análise das metas do milênio.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Com isso, compactuamos com Álvaro Vieira Pinto (2003, p. 27), ao destacar que “[...] a educação
de adultos visa a atuar sobre as massas para que estas, pela elevação de seu padrão de cultura, pro-
duzam representantes mais capacitados para influir socialmente.” Entretanto, muito ainda está por
fazer para que possamos entender esta nova dinâmica de produção da vida relacionada às novas
tecnologias da informação e comunicação (TICs). Dentre elas está a universalização por meio de po-
líticas públicas do acesso ao computador e em especial às redes mundiais de comunicação.
Na interação entre as necessidades, circunstâncias, meios e vontades destes sujeitos no uso das
novas tecnologias. Nelson Pretto (2008, p. 81) chama a atenção para a importância de qualificação
no uso desses “novos” equipamentos tecnológicos:

A presença de tecnologias mais simples, como os livros impressos, ou de outras


mais avançadas, como os computadores em rede, produzindo novas realidades,
exige o estabelecimento de novas conexões que as situem diante dos complexos
problemas enfrentados pela educação, sob o risco de que os investimentos não se
traduzam em alterações significativas das questões estruturais da educação [e for-
mação].

Neste sentido, a pesquisa desenvolvida no primeiro semestre de 2014 nos trouxe alguns elemen-
tos para pensarmos as relações produzidas pelos sujeitos, em que a necessidade, as circunstâncias,
os meios e a vontade (RANCIERE, 2002) de se inserir neste mundo das redes sociais para se comu-
nicarem, tem sido um fator preponderante identificado nos participantes que se interessaram em
fazer um curso de informática.

os sUjeitos AdUltos e sUAs ViVênciAs com A As mídiAs digitAis


Os dados nos revelaram que de um universo total de 14 educandos matriculados no curso de
extensão no ano de 2012/2. Em 2014/1, frequentam o curso 9 educandas. Desse total 8 responde-
ram ao questionário semiestruturado com perguntas fechadas e abertas. Todas as participantes do
curso são mulheres com a média de idade de 60 anos, sendo que duas educandas possuem mais
de 70 anos. Sobre a escolaridade, duas concluíram o ensino fundamental, uma tem o ensino médio
incompleto, três possuem ensino médio completo e duas o nível superior.
Quanto à localidade, cinco educandas residem nas proximidades da instituição, uma em bairro
mais distante e duas moram em Vitória, capital do estado do Espírito Santo. No que diz respeito ao
contato diário com a máquina, sete educandas disseram possuir computador em suas residências
com acesso à internet e apenas uma educanda não disponibiliza de computador e nem acesso à
internet diariamente.
Somente estes dados quantitativos já nos demonstraram que para lidar com os sujeitos da edu-
cação de jovens e adultos (eja)36 exige cuidados e dedicação especiais, devido ao público oriundo
de camadas diversificadas da sociedade e serem detentores de grande conhecimento de vida. Neste
caso, entendemos a necessidade de profissionais qualificados, atentos às mudanças globais e pre-
parados para lidar com situações que exigem muita dedicação e responsabilidade principalmente
sob os aspectos destacados por Freire (1996) no que tange a rigorosidade metódica, a pesquisa, o
respeito aos saberes dos educandos, dentre outras exigências.37
O movimento que o projeto de extensão proporcionou a estes sujeitos tem trazido retornos in-
teressantes entre as condições formativas dos mesmos na relação com o uso do computador, em
especial, das redes mundiais de comunicação e informação.
36 Tratamos a eja em letra minúscula para indicar que não estamos apenas destacando os sujeitos que estão sendo assistidos
pela modalidade institucional, mas algo mais amplo no ambiente societário.
37 Ver Freire (1996, p. 23-51)

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Ao se apoderar deste instrumento de comunicação percebemos que os sujeitos produzem as-
pectos emancipatórios na interação com a máquina. Dentre eles a autonomia de buscar dados e in-
formações sobre “n” assuntos que lhes interessam no cotidiano da vida a partir de suas experiências
formativas.
Sob a ótica das vivências pela qual as educandas adultas estão passando no processo de intera-
ção com o computador, nos levaram a refletir sobre a ação da experiência neste processo formativo.
Ao entendermos que a experiência é algo que nos toca, poderemos compreender como esse pro-
cesso pode ter tocado as educandas que as fizeram sair de uma condição cristalizada da produção
do saber e entrar em um espaço movediço de profundas mudanças na condução da ideia de produ-
ção do conhecimento e nas interações de comunicação e pesquisas. Sendo assim, compactuamos
com o conceito de experiência exposto por Jorge Larrosa (2002, p. 21) ao destacar que,
A experiência é o que nos passa, o que nos acontece, o que nos toca. Não o que se passa, não o
que acontece, ou o que toca. A cada dia se passam muitas coisas, porém, ao mesmo tempo, quase
nada nos acontece. Dir-se-ia que tudo o que se passa está organizado para que nada nos aconteça.
Vivenciar a experiência na produção de uma nova forma de interagir por meio dos aspectos co-
municativos e de transmissão de dados e informações nos colocou em uma posição de compreen-
der que essa

[...] experiência, [é] a possibilidade de que algo nos aconteça ou nos toque, requer
um gesto de interrupção, um gesto que é quase impossível nos tempos que correm:
requer parar para pensar, parar para olhar, parar para escutar, pensar mais devagar,
olhar mais devagar, e escutar mais devagar; parar para sentir, sentir mais devagar,
demorar-se nos detalhes, suspender a opinião, suspender o juízo, suspender a von-
tade, suspender o automatismo da ação, cultivar a atenção e a delicadeza, abrir os
olhos e os ouvidos, falar sobre o que nos acontece, aprender a lentidão, escutar aos
outros, cultivar a arte do encontro, calar muito, ter paciência e dar-se tempo e espa-
ço. (LARROSA, 2002, p. 24)

Nesse sentido, os relatos feitos pelas educandas são de grande importância para analisar o que as
passou, o que as aconteceu, o que as tocou enquanto percurso formativo nas experiências de lidar
com o equipamento e pensar nas diversas possibilidades que o mesmo pode trazer na interação
com a sociedade.
Dentre os assuntos de interesse, uma educanda destaca a importância de apreender a lidar com
a máquina “computador” para “buscar nas redes sociais amigas que não tinha mais contato”. A po-
tencialidade proporcionada pelo movimento formativo dos sujeitos tende a ampliar os objetivos
do projeto de extensão que não havia sido pensado a amplitude das relações que os equipamentos
midiáticos neste percurso.

Aspectos dAs condições formAtiVAs dos sUjeitos AdUltos nAs


sUAs relAções com o compUtAdor
No primeiro momento da pesquisa a hipótese levantada seria de que as educandas pudessem
apenas se interessar em ter acesso à internet e aos programas de computador para se comunicarem
e/ou trocar dados e informações. Entretanto, no percurso da pesquisa percebeu-se que para além
de se comunicarem as educandas também buscavam fazer parte das redes sociais e se inserir neste
ambiente virtuais das mais variadas maneiras.
A educanda “Claudia”38 faz o seguinte relato “busquei o curso para aprender a lidar com o compu-
38 Nome fictício das pesquisadas.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
tador, mas depois percebi que poderia divulgar os produtos de artesanato que faço no facebook e
com isso alcançar um número maior de pessoas e amigos que possivelmente pudessem se interes-
sar em comprar meus produtos”.
Este relato nos chama a atenção pelo fato de que o objetivo do projeto de extensão não havia
pensado nas diversas possibilidades de ampliação do processo formativo destes sujeitos. Apesar de
não ser obra do acaso, mas nos remete a refletir sobre as experiências vividas por Joseph Jacotot, re-
latada por Jacques Ranciere (2002) no livro “O mestre ignorante”, em que o autor destaca o processo
de emancipação intelectual dos alunos de Jacotot que mesmo sem saber falar e escrever em língua
francesa conseguiram se expressar de forma esplendida por meio da emancipação intelectual.
Com relação ao espaço educacional, as educandas relataram se sentir muito bem, pois o ambien-
te tem lhes proporcionado momentos de descontração e alegria, tanto nas relações afetivas cons-
truídas através das aulas como também nas orientações dadas pela monitoria. O que demostram
uma aproximação com a fala de Castell (2005) no inicio do texto de que a tecnologia por si só não
organiza a sociedade em rede.
Ao se inserir nestes ambientes virtuais as educandas passaram a buscar possibilidades diversas
na interação com a máquina “computador”. A educanda “Beatriz” destaca que conseguiu fazer con-
tato com uma amiga nas redes sociais que não conversava a mais de dez anos. Estas questões apesar
de aproximar as pessoas, que se encontram em lugares geograficamente distantes, podem trazer
problemas que ainda não conseguimos dimensionar. Para Bauman é preciso considerar sempre os
dois lados da moeda no que tange ao distanciamento e à proximidade das redes virtuais,

[...] a proximidade virtual é a distância virtual: a suspensão, talvez até a anulação,


de qualquer coisa que transforme a contiguidade topográfica em proximidade. A
proximidade não exige mais contiguidade física; e a contiguidade física não deter-
mina mais a proximidade. (BAUMAN, 2004, 38)

Esta preocupação tem sido, de certa forma, a busca pelo sentido stricto sensu da utilização das
novas tecnologias no processo de formação de sujeitos, em especial adultos. O que aproxima uns
pode distanciar outros. Isto passa a ser notório quando observamos nas nossas residências cada vez
mais o distanciamento das pessoas que se enclausuram em função da busca por uma comunicação
mais virtualizada. Neste sentido, a crítica feita por Einstein mesmo antes da popularização do uso do
computador e em especial da internet é algo que precisamos ficar atentos. Einstein faz o seguinte
destaque “tenho medo do dia que a tecnologia vai se sobrepor à interação humana. O mundo terá
uma geração de idiotas.” (EINSTEIN)39
Esta preocupação, de certa forma, precisa permear nossos debates e cursos que versam as ques-
tões do uso das novas tecnologias. Entretanto, as relações produzidas entre o uso do computador
e a comunicação virtual na formação de adultos, a partir das experiências vivenciadas neste curso
de extensão aponta que ainda há muito a se pensar. Mas não se pode abrir mão da potencialidade
que estas relações podem proporcionar na formação de adultos, principalmente na produção de
sujeitos emancipados para buscar outras possibilidades de interações sociais na rede mundial de
computadores.

conclUsão
O percurso da pesquisa nos permitiu experimentar um ambiente interessante de ampliação dos
aspectos formativos de adultos na relação com o computador e, em especial, com a comunicação
virtual. Sendo assim, nesta guisa de conclusão não poderíamos deixar de fora as expressividades
39 Frase retirada deste endereço eletrônico http://ooutroladodamoeda.com.br/2013/06/a-tecnologia-ja-se-sobrepoe-a-inte-
racao-humana/ acesso em 07/04/2014.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
dos sujeitos impactados por esta formação.
Os dados nos apresentaram processos de ampliação dos percursos formativos destes sujeitos o
que nos remeteu a refletir sobre a expansão que uma formação pode proporcionar quando se tem
abertura para experimentar outras possibilidades de produção da vida. Isto se dá pelo fato de que
mesmo o projeto de extensão tendo objetivos dos quais destacamos o de “democratizar o acesso
aos meios de comunicação, incentivando o desenvolvimento dos processos cognitivos, sociais e
afetivos” e o de “contribuir para a melhoria da qualidade de vida e da atuação dos alunos da idade
do ouro em seus relacionamentos sociais”, os sujeitos participantes em formação puderam vivenciar
ambientes diferenciados na perspectiva de ampliar esta formação sob os diversos aspectos no pro-
cesso da autonomia formativa e da emancipação intelectual.

referênciAs
BAUMAN, Zygmunt. Amor líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar, ed., 2004.
CASTELLS, Manuel. Redes de indignação e esperança: movimentos sociais na era da internet. Trad.
Carlos Alberto Medeiros. 1. Ed. - Rio de Janeiro: Zahar, 2013.
CASTELLS, Manuel; CARDOSO, Gustavo. A sociedade em rede: do conhecimento à acção política.
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ments/Sociedade_em_Rede_CC.pdf
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e
Terra, 1996.
LARROSA, Jorge Bondía. Notas sobre a experiência e o saber de experiência. Conferência proferida
no I Seminário Internacional de Educação de Campinas, traduzida e publicada, em julho de 2001, por
Leituras SME; Textos-subsídios ao trabalho pedagógico das unidades da Rede Municipal de Educação
de Campinas/FUMEC. A Comissão Editorial agradece Corinta Grisolia Geraldi, responsável por Leituras
SME, a autorização para sua publicação na Revista Brasileira de Educação.
NERI, Marcelo Cortes (coord.). Mapa da inclusão digital. Rio de Janeiro: FGV, CPS, 2012.
PINTO, Álvaro Vieira. Sete Lições sobre Educação de Adultos. Editora Cortez, 13ª edição, SP, 2003.
PRETTO, Nelson de Luca. Cultura digital e educação: redes já! In PRETO, N e SILVEIRA, S. A. (org). Além
das redes de colaboração: internet, diversidade
cultural e tecnologias do poder. Salvador, Edufba, 2008. Disponível em: http://rn.softwarelivre.org/
alemdasredes/2008/08/26/lancado-e-disponibilizado-olivro- do-alem-das-redes-de-colaboracao/.
Acessado em 31/03/2014.
RANCIÈRE, Jacques. O mestre ignorante: cinco lições sobre a emancipação intelectual. Belo Horizon-
te: Autêntica, 2002.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
interseções entre A edUcAção de negros e A
edUcAção de joVens e AdUltos
sirlene ribeiro AlVes

O presente estudo tem como objetivo destacar alguns pontos de interseção entre a educação
de negros e seus descendentes e a trajetória da educação de jovens e adultos no Brasil. Através da
pesquisa bibliográfica, com base em legislação nacional e autores que tratam a questão racial na
educação e a EJA em sua totalidade. O Conselho Nacional de Educação, através do parecer CEB no.
11/2000, que institui as Diretrizes Curriculares para Educação de Jovens e Adultos, destaca que o
público da EJA se constitui, em maior parte, de pessoas de regiões interioranas descendentes de es-
cravos, indígenas ou trabalhadores rurais. Grupos marginalizados socialmente e dentro do processo
de escolarização em nosso país. De acordo com o pensamento de Gonçalves (2000), esses aspec-
tos são frutos de um percurso histórico, evidenciado quando observamos as estratégias das elites
dominantes para solucionar o problema do sistema de ensino para as camadas populares. Esse é o
primeiro ponto de encontro entre a educação de negros e a EJA, quando ambas estão associadas
às classes subalternas da nossa sociedade. Assim, será apresentado um pequeno histórico sobre a
proibição educacional dos escravos; os cursos noturnos destinados a adultos, frequentada por um
grande número de negros; as iniciativas e incentivos da imprensa negra para educação de adultos e
crianças; as experiências do movimento negro na Frente Negra Brasileira e no Teatro Experimental
Negro; e as associações e ong´s na atualidade. Destacando as tanto as políticas públicas quanto as
estratégias desenvolvidas pela população negra para a educação de jovens e adultos. Estes levanta-
mentos poderão auxiliar na compreensão da atual realidade educacional brasileira seu histórico de
exclusão de determinados grupos e de implementação de políticas públicas.

palavras-chave: Educação étnico-racial, Educação de negros, Educação de Jovens e


adultos

O Conselho Nacional de Educação, através do parecer CEB no. 11/2000, que institui as Diretrizes
Curriculares para Educação de Jovens e Adultos, destaca que o público da EJA se constitui, em maior
parte, de pessoas de regiões interioranas descendentes de escravos, indígenas ou trabalhadores
rurais. Grupos marginalizados socialmente e dentro do processo de escolarização em nosso país,
que tiveram sua titularidade de cidadania renegada e que ainda nos dias atuais lutam para alcançar
plenamente seus direitos.
Quando relemos as críticas lançadas à atual situação educacional dos negros brasileiros, encon-
tramos dois eixos sobre os quais elas foram estruturadas: exclusão e abandono. Tanto uma quanto a
outra tem origem longínqua em nossa história. De acordo com o pensamento de Gonçalves (2000),
esses aspectos são frutos de um percurso histórico, evidenciado quando observamos as estratégias
das elites dominantes para solucionar o problema do sistema de ensino para as camadas populares. 
Esse é o primeiro ponto de encontro entre a educação de negros e a EJA, quando ambas estão asso-
ciadas às classes subalternas da nossa sociedade.
De igual forma, é preciso ressaltar que esse estudo abole a historiografia tradicional que associa o
negro a condição de escravo, cuja principal característica foi a negação dos negros como sujeitos e
sua redução à condição jurídica dos escravos. Compreendemos o negro como sujeito histórico, com
capacidades de ação e reação dentro da sociedade nos diferentes períodos da história brasileira.
Não se deseja abolir o período escravista, pois ele teve extrema importância na configuração da nos-
sa atual realidade, mas desejamos ultrapassar a visão passiva do negro escravizado, apresentando
modos e meios de resistência e luta, principalmente dentro processo educacional.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Com vistas nesses aspectos, será apresentado um pequeno histórico sobre a proibição educa-
cional dos escravos; os cursos noturnos destinados a adultos, frequentada por um grande número
de negros; as iniciativas e incentivos da imprensa negra para educação de adultos e crianças; as
experiências do movimento negro na Frente Negra Brasileira e no Teatro Experimental Negro; e as
associações e ong´s na atualidade. Destacando tanto as políticas públicas quanto as estratégias de-
senvolvidas pela população negra para a educação de jovens e adultos.
Tendo como foco principal a percepção da Educação de Jovens e Adultos como um local privile-
giado de lutas e conquistas da população negra em prol de sua educação. Apesar de, em momentos
excluídos, outras vezes esquecidos, se fizerem presente, com uma postura proativa, buscando meios
de ultrapassar as barreiras impostas.

Um olhAr sobre o tempo


Nos primórdios da colonização, a questão educacional não era vista como prioridade. “Nessa
época, pode-se constatar uma fragilidade da educação, por não ser esta responsável pela produti-
vidade, o que acabava por acarretar descaso por parte dos dirigentes do país” (Porcaro, 2009, p. 4).
Dessa forma, foi através dos religiosos, especificamente dos jesuítas, que se efetivou uma estrutura
educacional de suma importância para a consolidação do sistema colonial, com aspectos políticos,
econômicos e culturais. Conforme o estudo de Ferreira & Bittar (2000), a educação jesuítica abran-
geu uma parcela da população negra. No estudo dos autores, várias fontes de pesquisa, como as
Cartas dos primeiros jesuítas e os tombos da Companhia de Jesus, revelaram que nos colégios dos
jesuítas crianças negras eram absorvidas.
De acordo com esse trabalho, o foco dos jesuítas nos inícios do século XVI era centrado na conver-
são dos indígenas. Usando as palavras de Serafim Leite, esclarece que “a Catequese dos Índios, nesta
matéria de instrução, não se entende só a do ensino religioso do catecismo, a não ser com os adultos
incapazes de mais, com os meninos inclusive também o de ler, escrever, ou elementos [matemática]
(2000, p.9). Desde princípio a preocupação com a alfabetização, além do ensino doutrinário, fica
evidente, que pode ser compreendida como uma forma de transmissão cultural. Nos séculos XVII e
XVIII, esse princípio se estende aos negros escravizados nas fazendas da Companhia, conforme as
palavras de Serafim Leite:

É o que ela [Companhia de Jesus] fez pela catequese e elevação moral dos Escra-
vos, além do proverbial bom trato que lhes dava, afere-se por este tríplice fato: foi um
jesuíta o P. Pero Dias, Apóstolo dos Negros no Brasil, que escreveu a Arte da Língua
de Angola com o propósito deliberado de melhor amparar e servir, fundou-se nos
Colégios o apostolado do mar à chegada dos navios da África; e multiplicaram-se, a
favor dos Negros dos Engenhos e Fazendas, as missões discurrentes, saídas dos Colé-
gios de cada região, em toda a extensão do Brasil. (2000, p. 9 e 10)

A educação destinada a esse grupo tinha um papel doutrinário, segundo a Gonçalves & Gonçal-
ves e Silva, ligado “à necessidade de submetê-los a um rígido controle de seus senhores missionários
do que a um projeto com vistas a mudar o destino dos cativos”. (2005, p.135)
A pesquisa de Ferreira & Bittar teve como alvo principal a educação de crianças negras. Nos dois
séculos de educação jesuítica é possível que os adultos também fossem contemplados. Alguns es-
tudos sobre a EJA, Porcaro (2011) e Paiva (2009), citam esse período destacando a doutrinação reli-
giosa:

É o que ocorre no Brasil Colônia: como os alunos adultos são pertencentes às clas-

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
ses pobres, a estes era oferecida apenas uma educação de caráter religioso, de fundo
moralizador; e para as classes ricas, a educação buscava o oferecimento de instru-
ção. (PORCARO, 2009, p. 02)

É preciso destacar que nesse período uma parcela da população escravizada teve acesso às letras,
apesar do aspecto extremamente religioso de subjugação.
No século XIX, inicia-se um processo de modernização do Império, e para isso a instrução pública
entre em debate. Segundo Beisiegel (1979, p. 84), a discussão e as iniciativas para uma educação
para toda população surge em 1823, nos trabalhos dos constituintes:

A partir da Constituição de 1824, que declarava a todos os cidadãos o direito


à instrução primária gratuita, foi crescente a necessidade de “instruir e civilizar” o
povo. Isso colocou a aprendizagem da leitura, da escrita e das contas, bem como
a frequência à escola como um aspecto de suma importância para a edificação de
uma nova sociedade. Três fatores vão influenciar essa necessidade do letramento na
sociedade imperial brasileira: o discurso da missão civilizadora da escola por parte
das elites governantes, as precárias condições das escolas públicas e o alto índice de
analfabetismo. (PASSOS, p. 2)

Apesar da Carta Magna e de outros documentos legislativos voltados a essa implementação, di-
versos fatores dificultavam a efetivação legal. Beisiegel (1979, p. 85) chama atenção à falta da neces-
sidade educacional numa sociedade agrária, baseada no trabalho escravo. De igual forma Passos,
traz o questionamento sobre quem possui o direito da cidadania nesse momento, restrita a livres
e libertos, excluindo indígenas e escravos. Na lei número 1, de 14 de janeiro de 1837, declara: “São
proibidos de frequentar as escolas públicas: Primeiro: Todas as pessoas que padecem de moléstias
contagiosas. Segundo: os escravos e os pretos africanos, ainda que sejam livres ou libertos” (FONSE-
CA, 2007, p. 12).
O debate em torno da educação dos negros se inicia antes da libertação dos escravos. Segundo
Fonseca (2007), alguns personagens do governo imperial como José de Alencar e Perdigão Maga-
lhães defendiam que a educação dos negros era uma medida necessária à própria Abolição. A edu-
cação seria compreendida como um modo de retirá-los dos vícios e da miséria, com caráter moral
e religioso, mas que também pudesse habilitá-los para o trabalho (Fonseca, 2007, p. 36). Seria uma
forma de emancipá-los para o trabalho livre.
Essa discussão ganha amplitude com a Lei do Ventre Livre. A lei previa que as crianças nascidas
após sua publicação poderiam ser entregues ao Estado, mediante indenização, para que fossem
educadas, ou poderiam ser mantidas como escravas até completar os 21 anos. Mas, entre 1871 e
1885, de acordo com o Ministério da Agricultura, apenas 113 foram entregues para serem educadas,
de um total de 403.827 matrículas nas 19 províncias (Fonseca, 2007, p.77).
O fato é que a Lei do Ventre Livre foi um importante instrumento legal que trata da educação
de negros, um dos primeiros documentos oficiais que apresenta a educação paralelamente ao pro-
cesso de libertação. Apesar de não estar diretamente relacionada a educação de jovens e adultos,
poderia ter modificado o cenário educacional dessa modalidade. De acordo com Gonçalves e Silva
(2005, p. 137), “por parte do Estado, houve, na segunda metade do século XIX, uma iniciativa con-
creta que, se correspondida à altura, poderia ter mudado a condição educacional na qual os negros
ingressaram no século XX”.
Voltando o olhar para a realidade educacional nesse período, segundo os estudos de Fonseca,
mesmo para essas crianças, a educação empregada deveria estar voltada para doutrinação e para o

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
mercado de trabalho:

as práticas educativas não buscavam uma transformação no status dos negros


na sociedade livre, mas sua manutenção na condição que foi tradicionalmente cons-
truída ao longo de mais de três séculos de contato entre negros e brancos: deveriam
permanecer como a parcela de mão-de-obra do estrato mais baixo do processo pro-
dutivo e ter suas influências sociais controladas ou minimizadas para que a popula-
ção brasileira não sofresse um súbito processo de africanização junto à abolição do
trabalho escravo. (FONSECA, 2007 p. 142)

Nesse contexto surge a preocupação não somente com a educação das crianças, mas também
com os adultos. Os cursos noturnos de alfabetização de jovens e adultos surgem como uma forma
estratégica de preparação ao mercado de trabalho, onde adultos e jovens trabalhadores que eram
impedidos de cursar a escola diurna. De acordo com Porcaro, “em 1876 é feito um relatório pelo mi-
nistro José Bento da Cunha Figueiredo, apontando a existência de 200 mil alunos frequentes às au-
las noturnas” (2009, p.1). Mesmo sendo frequentado por uma grande quantidade de negros, alguns
decretos, em diversas províncias, proibiam a permanência de escravos. Como podemos verificar no
Decreto de Leôncio de Carvalho em 1978, que criou os cursos noturnos para livres e libertos no
município da Corte, estabelecendo parâmetros com validade nacional (GONÇALVES e SILVA, 2005,
p. 136).
Em 1879, com a Reforma do Ensino Primário e Secundário, o veto de proibição é suspenso e algu-
mas províncias passam a admitir escravos. Uma exceção é o caso de São Pedro do Rio Grande do Sul,
onde vetava-se completamente a presença de pretos, fossem eles cativos, livres ou libertos (Fonse-
ca, 2007, p. 22). Esses cursos se expandiram por todo o país como política educacional, para alcançar
os objetivos da civilidade, do progresso e da modernidade, amparados por uma lógica trabalhista.
Instrução e trabalho seriam os alicerces dessa educação popular, projetada para grande massa, para
baixar os índices de analfabetismo e auxiliar no processo de desenvolvimento.
Esse tipo de ensino não foi exclusividade do Estado, algumas organizações abolicionistas adota-
ram essa modalidade para disseminar seus ideais. Trabalhar os conceitos antiescravistas através da
educação era o objetivo de alguns abolicionistas. “Associações particulares, de caráter literário e/ou
político, mantiveram suas próprias escolas. Por vezes, serviram de espaço de propaganda política,
buscando aliciar os negros em prol da causa abolicionista e republicana” (GONÇALVES e SILVA, 2005,
p. 136).
A República não traz significativas transformações nesse panorama. Pelo contrário, a manutenção
das velhas elites agrárias e o ideário republicano de nação brasileira marginalizou cada vez mais a
população negra do sistema educacional. Segundo Passos:

As instituições educacionais foram sendo criadas sob influência do pensamento


racial, que guiava as políticas públicas da época. Intelectuais, médicos e cientistas
sociais acreditavam que a criação de uma escola universal poderia embranquecer a
nação, liberando o Brasil do que eles imaginavam ser a degeneração de sua popu-
lação. A intenção era “transformar uma população geralmente não-branca e pobre
em pessoas embranquecidas em sua cultura, higiene, comportamento e até, even-
tualmente, na cor da pele” (DÁVILA, 2006, p. 13). Não obstante o acesso à educação
tenha sido ampliado nesse período a alguns segmentos socialmente marginaliza-
dos. (2000, p. 13)

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
O pensamento eugenista, difundido nessa época, as políticas de incentivo à imigração, são fa-
tores relevantes que só contribuíram para exclusão dessa população no processo de escolarização
nacional, pois desprezavam os indivíduos negros, sua história e cultura. Com relação a EJA, as ini-
ciativas, tanto por parte do governo quanto das organizações privadas, se mantiveram quase que
inalteradas na República.
No início do século XX, com os processos de industrialização e os efeitos do pós-guerra, o cenário
da educação dos negros e os rumos da educação de jovens e adultos começam a se modificar. O
pouco investimento governamental permanece, mas o que começa a alterar-se é o posicionamento
político da população negra em relação à educação. O regime escravista que marca nossa socieda-
de de uma forma ampla, é ainda mais cruel com os negros, que tiveram o direito à educação negado,
sendo encaminhados para o mercado de trabalho desde crianças, para o auxílio do sustento familiar.
Assim, por grande parte da população negra, a escola não era compreendida como prioridade para
seu desenvolvimento, já que “sua formação para o trabalho era feita sob a orientação dos patrões no
desempenho das mais diversas funções” (Idem, 2005, 139). Por isso um grande número de negros,
nascidos no início do século XX, quando alfabetizado, foi na fase adulta.
A transformação na estrutura econômica brasileira, de ciclo cafeeiro para a emergência de bur-
guesia industrial, trouxe aspirações sociais e solicitou transformações educacionais. Cresce a preo-
cupação com a preparação de mão de obra, visando as técnicas de produção, tanto por parte dos
trabalhadores, como forma de ascensão profissional e social, como por parte do Estado, apontando
como meio de progresso do país. (PORCARO, 2009, p. 06)
Nesse processo, que também é marcado pela modernização das cidades, começam a surgir algu-
mas organizações negras, que protestaram e lutaram em favor de estratégias de mobilidade social.
“Emergiram os primeiros movimentos de protestos dos negros com o formato de um ator coletivo
moderno, que se constrói na cena política, lutando contra as formas de dominação social” (GONÇAL-
VES e SILVA, 2005, p. 138). Essas associações passam a ter reconhecimento e visibilidade principal-
mente no cenário urbano, nas grandes cidades brasileiras, através de clubes recreativos, culturais ou
políticos.
Os negros desejavam ser assimilados na nova lógica do mercado de trabalho, e para isso o direi-
to à educação era necessária. Assim algumas dessas entidades passaram a oferecer alguma forma
escolarização.
Mesmo estando direcionada a uma pequena parcela da população negra, onde o acesso às letras,
de alguma maneira, já era disponível, os jornais da época tiveram um papel relevante, convocando
o povo negro, divulgando escolas e pregando a importância da educação para uma verdadeira mu-
dança social. Alguns militantes chegaram a admitir que a lei de 1888 só iria se concretizar através da
educação, quando todos fossem alfabetizados (Idem, p. 140).
Muitas vezes a imprensa negra utilizava de duras palavras para atribuir à família e a própria comu-
nidade a responsabilidade da precária situação educacional, isentando o poder público:

Em um dos seus artigos, publicado em 1926, O Clarim d’Alvorada não via justifi-
cativa para os negros não estudarem. Para o redator, “escolas há em todos os bair-
ros, nocturnas, diurnas, gratuitas, mantidas pelo nosso governo, por associações
diversas”. Só que nessas escolas encontram-se alunos de todas as nacionalidades,
“mas de côr, não sei qual a razão de se contar as dezenas” (O Clarim d´Alvorada,
24/10/1926, p.2).

Ainda no mesmo artigo, fala-se de associações negras que “para facilitar criaram

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
cursos elementares para os filhos dos seus associados e de todos que desejassem re-
ceber os primeiros conhecimentos de instrução” (idem). Entretanto, essas iniciativas
não eram bem sucedidas, ou seja, os pais tanto não iam como não encaminhavam
seus filhos às aulas. (Idem, p. 141)

Como afirmado, dentro do processo histórico, na sociedade agrária e escravista, a educação não
era vista como prioridade, além da necessidade de sobrevivência que inseriu diretamente os negros
no mercado de trabalho, teve como consequência uma cultura de afastamento da escola. O que nos
permite compreender a insistência da imprensa negra em convocá-los a responsabilidade, fazendo
até comparações com os imigrantes, mostrando como esses prosseguiam nos estudos e melhora-
vam suas condições de vida (Idem, p. 141).
Nesse contexto,

“a alfabetização dos adultos era preocupação constante. Já em 1924, o periódico


Getulino divulgava longo artigo do estudioso negro, prof. Noberto de Souza Pinto,
que discorria sobre “a desanalfabetização”, destacando a conveniência de políticas
públicas e tentando convencer seus leitores da importância do domínio das letras”.
(Ibidem, p.142)

Pela imprensa negra temos acesso a diversas entidades que mantinham cursos diurnos e notur-
nos oferecidos aos seus associados e demais setores da população, sem auxílio do poder estatal.
Aulas eram oferecidas pela Irmandade de Nossa Senhora do Rosário e pelo Clube 13 de Maio dos
Homens Pretos, ambos em São Paulo, dando prova de como a comunidade negra tomou para si a
responsabilidade educacional de seus irmãos, nunca se esquecendo de possibilitar educação para
quem não teve acesso na infância.
De acordo com Gonçalves e Silva (2005, p. 142), em seus artigos educação e cultura eram vistas
como sinônimos, com uma ampla área de atuação: biblioteca, teatro, conferências, apresentações
musicais... Talvez por isso a divulgação de organizações educacionais específicas, na qual a cultura
negra seria preservada e valorizada. Ao contrário dos estabelecimentos públicos de ensino, que po-
deriam estar contaminados pela ideologia do embranquecimento:

Havia, da parte da imprensa, um movimento de incentivo à educação. Mas ti-


nha-se a consciência de que, com a educação fornecida pelos estabelecimentos de
ensino, os estudantes negros não deveriam afastar-se da educação de tradição afri-
cana, tampouco deixar-se aprisionar por ideologias que pretensamente os levassem
à aceitação pelas classes poderosas da sociedade e, assim, afastar-se de seu grupo
racial. Aos pais chamava-se lhes a atenção em termos como os militantes Alcides
Costa: “o que lhes importa fazer imediatamente, é incutir em seus filhos o respeito
aos antepassados, a convicção de que são livres no corpo e no espírito, o desejo em
fazer algo em prol da cor” (O Clarim d´Alvorada, 1930, p.4). (Ibidem, p. 143)

Os jornais divulgavam biografias e bibliografias de intelectuais negros, para estimular a educação


e elevar a autoestima da população. Mencionavam a escolarização feminina e traziam informações
sobre personalidades negras estrangeiras que lutavam pela Abolição. Dessa forma, o conceito edu-
cacional empregado pela imprensa negra, nas primeiras décadas do século XX era ampla, não se res-
tringindo à alfabetização e escolarização, mas englobando aspectos culturais e políticos. E essas ini-
ciativas tinham como foco principal a educação dos jovens e adultos, pois esses seriam seus leitores.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
O mesmo fato acontece com o projeto de educação desenvolvido pela Frente Negra Brasileira
(FNB). Essa instituição, criada na década de 30, tinha o propósito de articulação política, criou jornal
“A Voz da Raça”, uma escola e fundou um partido político. Sua experiência educacional foi impres-
sionante, “seu curso de alfabetização chegou a receber 4.000 alunos” (Ibidem, p. 144), tendo como
princípios: agrupar, educar e orientar. Uma das suas primeiras iniciativas foi a criação de uma classe
para alfabetização de adultos no período noturno, que atendia menores e adultos, negros e não ne-
gros. Mas sua atuação não se restringiu a alfabetização, conjuntamente a escolarização havia uma
formação política, incorporando uma história do negro brasileiro, diferentemente da história oficial
que era difundida nas escolas governamentais. Em Recife, a Frente Negra Pernambucana, onde par-
ticipava o poeta negro Solano Trindade, foi criado o Teatro Popular Brasileiro, e os jovens e adultos
pesquisavam a cultura afro-brasileira e realizavam apresentações ( Ibidem, p.145).
A Constituição Federal de 1934 declara, pela primeira vez, a educação como um direito de todos,
a ser provido pela família e pelos poderes públicos (art. 149). Já em seu artigo 150, estabelece como
obrigação do Estado o ensino primário gratuito extensivo aos adultos. Assim, as políticas para edu-
cação de adultos começam a ganhar visibilidade nesse momento.
No Rio de Janeiro, na década seguinte (de 1940) outro projeto educacional com um cunho cul-
tural surgiu. O Teatro Experimental do Negro (TEN), liderado por Abdias do Nascimento, apesar de
estar baseado na linguagem teatral, tinha a educação como seu principal objetivo:

Quando fundamos o Teatro Experimental do Negro, ficou desde logo estabeleci-


do que o espetáculo, a pura representação, seria coisa secundária. O principal, para
nós, era a educação, e o esclarecimento do povo. Pretendíamos dar ocasião aos ne-
gros de alfabetizar-se com conhecimentos gerais sobre a história, geografia, mate-
mática, línguas, literatura, etc. por isso, enquanto a União Nacional dos Estudantes
nos cedeu algumas de suas inúmeras salas, pudemos executar, em parte, esse pro-
grama. (Diário de Notícias, Rio de Janeiro, 11 de dezembro de 1946. In: CEVA, 2006,
p. 56)

A experiência com operários, empregadas domésticas, e trabalhadores em geral, mobilizou uma


classe para alfabetização de adultos, que mesclava as matérias tradicionais com ensinamentos sobre
o folclore e sobre personalidades negras, além da luta contra o preconceito social. “Em termos con-
cretos, o TEN acreditava que seria possível combater o racismo por meio de procedimentos culturais
e educativos, restituindo a verdadeira imagem do negro” (GONÇALVES e SILVA, 2006, p. 148).
A principal diferenciação entre a proposta educacional da Frente Negra e a experiência de edu-
cação do TEN se estabeleceu em relação ao dever do Estado. Tendo um papel importante na Cons-
tituição de 1946, através da figura de Abdias, passaram a reivindicar a ação estatal para o ensino
fundamental para todos negros e brancos. Também solicitavam subsídios para negros no ensino
médio e superior, entendendo os critérios de seleção excluíam diretamente na população negra.
Mas acreditavam que o analfabetismo e a baixa escolarização, não era apenas um problema da po-
pulação negra, era um problema nacional, e tinha Guerreiro Ramos como o principal articulador
dessas ideais.
Além de ter um olhar mais crítico em relação aos deveres governamentais, acreditavam que era
necessário mudar a visão das raízes culturais negras no processo de formação nacional, “seria preci-
so produzir uma radical revisão dos mapas culturais, que as elites e, por consequência, os currículos
escolares, elaboraram sobre o povo brasileiro.” (Idem, p. 149)
Outro aspecto período de destaque na luta pelo sistema educacional se deu através do Movi-
mento Negro Unificado (MNU) a partir de 1978. As contribuições e levantamentos da FNB e do TEN
se apresentam também nas solicitações do MNU. Passaram propor uma mudança racial no currículo

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
escolar para eliminação de visões inferiorizadas e estereotipadas da população negra e de sua cultu-
ra. Fazendo com os livros didáticos e a própria formação do educador fosse repensada. Instituíram o
dia da Consciência Negra e tomaram como base a escola como um local estratégico para combater
o racismo.
Toda mobilização gerada a partir de 1978 que adentrou nos anos oitentas, através de encontros
e conferências (em 1984 e 1885 foram realizados o I e II Encontros Nacionais sobre a Realidade do
Negro na Educação), e em vários segmentos do Movimento Negro, teve como resultado a promul-
gação da lei 10.639/2003. Nesta lei efetiva a obrigatoriedade do ensino de história e cultura africana
e afro-brasileira no currículo escolar. Apesar de ser uma pequena resolução, esta lei, fruto das reivin-
dicações históricas da população negra, gerou diversos desdobramentos: sendo criada as Diretrizes
Curriculares para Educação Étnico-Racial, um plano de implementação, revisão de grades curricula-
res e cursos de formação continuada para educadores.
Em todo esse intervalo de tempo, diferentes experiências com educação de jovens e adultos fo-
ram desenvolvidas. “As chamadas experiências comunitárias ou educação comunitária foram larga-
mente utilizadas no período em consideração. Seria impossível querer fazer um balanço completo
dessas práticas pedagógicas, até porque, na maioria não sofreram nenhum tipo de registro.” (Ibi-
dem, p. 151) Experiências em escolas de samba no Rio de Janeiro, em comunidades de terreiro e os
blocos afros na Bahia, as experiências nos canteiros de empresas, os pré-vestibulares para negros e
carentes, entre outros que se expandiram pelo país, e outras experiências espalhadas por diversos
estados brasileiros nos dão conta disso.
Nos dias atuais, alguns autores como Montanõ (2007) e Gohn (2010), analisam as novas formas de
mobilização social, estabelecendo ligações com a ideologia neoliberal, e comparando com os anti-
gos movimentos sociais, na qual podemos incluir o movimento negro. As chamadas organizações
não governamentais (Ong´s), ou o terceiro setor, pode ser compreendido como uma nova forma de
agregar e mobilizar socialmente grupos de indivíduos.
Dentro dessa perspectiva, as ONG´s passaram a desempenhar papéis importantíssimos na cons-
cientização, preservação e divulgação da cultura negra. Apesar das ressalvas por parte de alguns
pesquisadores do assunto, não podemos desprezar as diversas experiências que essas instituições
realizam dentro das favelas (local historicamente configurado de convivência de negros) e nas pe-
riferias. Muitas ainda preservam algum tipo de cursos de alfabetização ou modos diferenciados de
estímulos ou propostas educacionais.

considerAções finAis
Essas declarações tiveram a intenção de demonstrar como a população negra teve o acesso à
educação negado e negligenciado. O processo histórico teve como consequência um índice enor-
me de desigualdade educacional e social entre negros e brancos. Muitos negros adentraram o sé-
culo XX e XXI sem acesso às letras, e ainda hoje, parte dos alunos negros abandona à sala de aula.
Sendo as turmas da EJA constituídas por uma grande maioria de alunos pretos e pardos.
Para além dessa realidade, esse trabalho teve a pretensão de mostrar as formas de luta das orga-
nizações negras em prol da educação, e suas realizações dentro da Educação de Jovens e Adultos.
Mesmo escravizados, muitos negros buscaram meios de alcançar à leitura e a escrita. A educa-
ção foi compreendida como uma forma necessária à Abolição, e apesar das proibições, se fizeram
presentes nos cursos para alfabetização de adultos. A imprensa negra teve um papel primordial
no estímulo e no reconhecimento da educação como necessária para o processo de emancipação
dessa população, convocando, cobrando responsabilidade dos adultos, mas também divulgando
escolas, personalidades e setores da cultura negra. Através da Frente Negra Brasileira, cursos para
alfabetização e escolarização de adultos foram disponibilizados, e questões e princípios foram le-

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
vantados. No Teatro Experimental do Negro, além da construção de classes de alfabetização, e a
inserção de princípios educacionais amplos, inicia uma reivindicação de políticas públicas com o
objetivo de garantir os direitos à educação. Pelo Movimento Negro Unificado, e demais seguimen-
tos do movimento, tivemos um prosseguimento dessa luta política, que resultou na lei 10.639 e em
seus desdobramentos. Não se pode esquecer dos diversos tipos experiências pedagógicas que se
desenvolveram em espaços religiosos e culturais, além das Ong´s, que ainda trabalham a conscien-
tização educacional e política.
A exclusão e o abandono dispensados à educação de negros e seus descendentes, por parte
dos dirigentes desse país, contrasta com a busca incessante dessa população em buscar espaços
e meios diferenciados para sua educação. A figura passiva do negro que sofreu calado as injustiças
sociais é questionada nessa perspectiva. A população negra criou alternativas e reivindicou políticas
para transformação de sua realidade educacional. E a Educação de Jovens e Adultos foi, e ainda, é
um local estratégico dessa luta.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
nAVio negreiro
KAtiA reginA dAs chAgAs moUrA

Do índio ao negro a falta de respeito pelo ser humano vem sendo apontada desde a época do
descobrimento. A EJA traz esse quadro de forma marcante e reflexiva. Os alunos da Educação de
Jovens e Adultos, na maioria negros e pardos, passam a ser os protagonistas dessa história quando
trazem consigo uma variedade cultural e social marcada, desde a época da colonização até os dias
de hoje, e ainda encontram-se na faixa dos excluídos, quando pouco é oferecido a eles. A falta de
projetos específicos para atender as necessidades desses sujeitos, mostra que ainda estamos presos
ao colonialismo que tenta colocar todos num grande “pacote”, desrespeitando as individualidades.
As salas de aula da EJA apresentam um grande mosaico étnico racial que precisa ser encarado, res-
peitado e valorizado pela comunidade escolar. A EJA do município do Rio de Janeiro vem investindo
na formação continuada de seus professores ampliando as discussões acerca da Lei 11645, subsi-
diando o trabalho pedagógico através de encontros, cursos e materiais que favoreçam esse saber.
Segundo dados do Sistema Único de Saúde os jovens negros são as maiores vítimas da violência. As
taxas de mortalidade entre jovens brancos do sexo masculino são bem menores do que as taxas dos
jovens pretos e pardos, quase a metade. As dificuldades de acesso e permanência dos jovens negros
e pardos no sistema escolar também é um grande desafio. O que queremos para nossos alunos da
EJA? O que temos feito para mudar o quadro pintado na época da colonização e está pendurado nas
paredes das nossas escolas como o modelo a ser seguido? Muito se tem a fazer e é pensando nesse
fazer que a valorização da composição do nosso povo, deve ser apresentada e tratada com respeito
nas nossas escolas.

palavras-chave: Variedade Cultural, EJA e Formação

No navio negreiro o negro veio pro cativeiro. Finalmente uma lei o tráfico aboliu,
vieram outras leis, e a escravidão extinguiu, a liberdade surgiu como o poeta previu.
Djalma Sabiá e Armando Régis40

Na letra do samba enredo do Grêmio Recreativo Acadêmicos do Salgueiro do ano de 1957, os


compositores entoam o término da escravidão, através da doce poesia que emana a felicidade da-
queles que a conquistaram, mas será que ela acabou realmente?
Com essa indagação inicio esse texto que tem o objetivo de contribuir para promover uma refle-
xão acerca da escravidão que ainda impera no nosso país e quiçá no mundo, e seus reflexos nas salas
de aula da Educação de Jovens e Adultos (EJA) do município do Rio de Janeiro!
Para tal, convido você, leitor, a fazer uma breve viagem no tempo, ancorado nas emoções do
Navio Negreiro e nas palavras de Darcy Ribeiro, que no seu exílio no Uruguai, em 1964, refletiu sobre
o Brasil que não deu certo, apontando através de um estudo antropológico-histórico, como se deu
a formação do povo brasileiro.
Citando Darcy Ribeiro (2010), “mais que uma simples etnia, porém, o Brasil é uma etnia nacional,
um povo-nação, assentado num território próprio e enquadrado dentro de um mesmo Estado para
nele viver o seu destino. ” (RIBEIRO, 2010: 19). Ao apresentar-nos essa etnia nacional Darcy nos dá
pistas de que o Brasil tem na sua história de formação diferentes raças, diferentes etnias, diferentes
povos. É um Brasil que cresce ancorado no povo que aqui estava na época do descobrimento e nos
que vieram dos diferentes cantos do mundo para trabalhar na nova terra. Para muitos, esse trabalho

40 Samba enredo do Grêmio Recreativo Acadêmicos do Salgueiro do ano de 1957

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
se traduziu em trabalho escravo. Aí começa a nossa história! E mais uma vez vale lembrar o Sabiá e
Regis, que no samba nos diz:

Castro Alves, que também se inspirou em versos retratou o navio onde os negros
amontoados e acorrentados em cativeiro no porão da embarcação, com a alma em
farrapo de tanto mau-trato, vinham para a escravidão.

djAlmA sAbiá e ArmAndo régis


A história dos navios negreiros, trabalhada em nossas escolas ainda não reflete a verdadeira odis-
séia que foi para aqueles que viviam em suas tribos no continente africano, com dignidade e respei-
to, a falta de moralidade com que foram tratados ao chegarem a nossas terras. Havia nos navios reis
e rainhas, príncipes e princesas que foram arrancados de suas terras e enviados para o Brasil como
objetos de compra e venda.
Aqui, no Brasil, já estavam também os índios, verdadeiros “donos” da terra, se assim podemos
dizer, que habitavam essa parte do continente e desconheciam o poder da chibata, das correntes e
das doenças trazidas pelo europeu.
O europeu com a sua “catequese branca” tentou impor sua crença, desrespeitando todo o acú-
mulo de religiosidade dos que aqui já se encontravam e dos escravizados. Pode-se dizer que surge
então o primeiro conflito entre os povos europeus, indígena e africano.
Os jesuítas portugueses tiveram o papel de diplomatas-pacificadores, tentando dissuadir os ín-
dios de entrarem em conflitos com os portugueses, uma vez que estavam mais dispostos a servir à
Coroa do que aos índios, mas essa ideia não durou muito tempo, como cita Ribeiro (2010), “essas
utopias se opunham tão cruelmente ao projeto colonial que a guerra se instalou prontamente entre
colonos e sacerdotes”. Nesse tempo, as coroas européias optaram por atender aos colonos, enfra-
quecendo o poder da igreja e das missões jesuíticas (Ribeiro, 2010:56).
Diante de toda tentativa de se escravizar os índios e a não realização desta, surge a necessidade
de se trazer os navios negreiros. Nesse momento, novo impasse está posto. A diversidade linguística
e a relutância dos negros africanos dificultaram muito a ideia de unificação, proposta inicialmente
pelos europeus. Somente após um bom período de oposição aos costumes impostos, os negros
foram aprendendo a língua dos capatazes, o português, e assim comunicarem entre si. Esse período
foi rico culturalmente, apesar de não valorizarmos o suficiente. Graças a essa diversidade cultural,
hoje temos muito do que nos orgulhar, seja na música, na dança, na culinária, na literatura, etc.
Porém, “nem tudo que reluz é ouro” e juntamente com toda essa riqueza cultural, aparecem outras
facetas. A nação brasileira negou ao negro seu lugar, seu pedaço de chão, para dispensar-lhe discri-
minação e repressão.
O desejo do negro, desde que chegou ao Brasil, foi sua liberdade, mas mesmo com a abolição, a
queda do período colonial e o descompasso que o Brasil viveu, não lhe deram a tão sonhada liberda-
de. O negro, que vivia longe da cidade, passou à condição de miserável, sem terras para viver e sem
trabalho. Esse fato levou a grande maioria à cidade, que oferecia um ambiente menos hostil, mas
não menos agradável nas condições de vida. Surgem então as favelas, guetos que ofereciam uma
maneira de se manter as raízes desse povo, que já não era mais o mesmo vindo da África, passava a
partir daí a ser um povo miscigenado. Essa mistura das raças apareceu na figura predominante do
mulato, que trouxe uma contribuição grande para a nossa cultura, o Carnaval é um belo exemplo.
Do índio ao negro a falta de respeito pelo ser humano vem sendo apontada desde a época do des-
cobrimento.
Voltando ao ponto principal dessa reflexão, temos inicialmente dois povos escravizados, na con-

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
cepção real da palavra: índios e negros. No navio negreiro só os negros, mas nas colônias, nossos ín-
dios. Muito ainda se tem a falar sobre esse período, sobre essa luta que ainda não terminou e muito
se tem a saber.
Nossas escolas públicas carregam a face da escravidão na figura de seus alunos, professores e
demais funcionários e a Educação de Jovens e Adultos – EJA traz esse quadro de forma marcante e
reflexiva. Os alunos da Educação de Jovens e Adultos, na maioria negros e pardos, passam a ser os
protagonistas dessa história quando trazem consigo uma variedade cultural e social marcada, desde
a época da colonização até os dias de hoje, e ainda encontram-se na faixa dos excluídos, quando
pouco é oferecido a eles. A falta de projetos específicos para atender as necessidades educacionais
desses sujeitos, mostra que ainda estamos presos ao colonialismo que tenta colocar todos num
grande “pacote”, desrespeitando a diversidade cultural.
A citação de Filice (2011) mostra claramente o quanto se tem a refletir e o pouco que avançamos
nesses anos:

Várias visões sobre raça, desconectadas da estrutura social, inscrevem-se nos


atos cotidianos, por meio do racismo, do preconceito e da discriminação racial e des-
merecem a dimensão que Malffesoli chamou de “forma”. Forma é uma metáfora que
remete a “uma vida social aliando os contrários, as continuidades e as descontinui-
dades, a ordem e a desordem, a efervescência e a banalidade” (MALFFESOLI, 2004,
p. 191), e que ao mesmo tempo, acumula em longo prazo as informações da espécie
humana e as entrega ao presente. É arcaica e atual, ao mesmo tempo, estável e di-
nâmica (Filice, 2011:66).

As salas de aula da EJA apresentam um grande mosaico étnico racial que precisa ser encarado,
respeitado e valorizado pela comunidade escolar. Segundo dados do Sistema Único de Saúde os
jovens negros são as maiores vítimas da violência. As taxas de mortalidade entre jovens brancos do
sexo masculino são bem menores do que as taxas dos jovens pretos e pardos, quase a metade. As
dificuldades de acesso e permanência dos jovens negros e pardos no sistema escolar também é um
grande desafio.
Meyer (2008) ressalta que vivemos em uma sociedade complexa, diversa e desigual, mas que
mesmo assim devemos encontrar a igualdade na diversidade. Tudo que envolve o tema educação é
muito complexo e quando falamos de educação nos diversos âmbitos se torna mais complexo ain-
da, um desafio. Educar para a diversidade é formarmos pessoas que veem a diferença no próximo,
porém a respeita e sabe reconhecer que uma boa relação com o outro, pode significar uma troca de
experiências, crescimento social e político.
Existe um grupo enorme de brasileiros com pouca ou nenhuma escolarização, resultado de fa-
tores sociais, econômicos ou culturais que impedem o acesso de crianças e adolescentes à escola,
diante disso, surgem problemas de distorção de idade/série e que comprometem o ensino aprendi-
zagem, conduzindo o aluno a retenção, repetência ou até mesmo a evasão (MEYER, 2008).
O que queremos para nossos alunos da EJA? O que temos feito para mudar o quadro pintado na
época da colonização e está pendurado nas paredes das nossas escolas como o modelo a ser segui-
do?
Muito se tem a fazer e é pensando nesse fazer que a valorização da composição do nosso povo,
deve ser apresentada e tratada com respeito nas nossas escolas.
A EJA do município do Rio de Janeiro - GEJA41 vem investindo na formação continuada de seus
professores ampliando as discussões acerca da Lei 11645, subsidiando o trabalho pedagógico atra-
41 GEJA – Gerência de Educação de Jovens e Adultos

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
vés de encontros, cursos e materiais que favoreçam esse saber.
Um exemplo de trabalho sobre a diversidade é o Encontro de alunos do PEJA42.
Ao longo dos anos de funcionamento do PEJA, vimos desenvolvendo avaliações do Programa e
exercitando a capacidade de escuta e diálogo entre o Nível Central, Coordenadorias Regionais de
Educação - CRE, diretores de escolas, coordenadores pedagógicos, professores orientadores, pro-
fessores regentes e alunos. Esse processo culmina com a realização de um evento anual do qual
participam representantes de alunos e professores de todas as CRE, do Centro de Referência de Edu-
cação de Jovens e adultos - CREJA e do Projovem Urbano. Esse evento é denominado “Encontro de
Alunos da EJA - Rio” e funciona como espaço de trocas de experiências, celebração das conquistas
e de apresentação de uma exposição representativa dos trabalhos realizados no Programa sobre a
temática proposta para o exercício.
O I Encontro de Alunos foi realizado em agosto de 2005 com o objetivo de ampliar as discussões
sobre o desenvolvimento da EJA nas Unidades Escolares.
Em 2009, o V Encontro / II Congresso de Alunos do PEJA abordou a Lei 11.645 de 10 de março de
2008 que estabelece a inclusão, no currículo oficial das redes de ensino, da temática “HISTÓRIA E
CULTURA AFRO-BRASILEIRA E INDÍGENA”.
Com a realização deste encontro a Gerência de Educação de Jovens e Adultos passou a desenvol-
ver ações no sentido de subsidiar as escolas quanto a inclusão no currículo da temática através de
Seminários, Ciclos de Estudos, Palestras para os professores e alunos, além da compra de livros para
as salas ambientes do PEJA.
Na perspectiva de conquista e consolidação da cidadania dos nossos alunos, esta relevante temá-
tica continua a fazer parte da formação dos professores até os dias atuais.
Consta do planejamento anual da GEJA, o oferecimento de palestras e ciclos de debates sobre a
Lei 11645/2008 que são sempre avaliados de forma positiva.
As escolas são motivadas a trabalharem com o tema de diversas formas e encontra na Gerência
de EJA subsídios e motivação para que o trabalho flua da melhor forma possível.

A história da educação brasileira é a história da educação do colonizador. A pe-


dagogia do colonizador forma gente submissa, obediente ao autoritarismo do colo-
nizador. (Gadotti, 1980, p:53 ) 

A prática educacional é muito anterior ao pensamento pedagógico. O pensamento pedagógico


surge com a reflexão sobre a prática da educação e necessidade de esquematizá-la em função de
determinados fins e objetos. O educador deve dedicar-se a formação de uma humanidade melhor,
trabalhando cidadania, e estabelecendo ensino de qualidade social.
O homem é um ser de raízes espaço-temporais, de forma que ele é, na expressão feliz de Marcel,
um ser “situado e temporalizado”. A instrumentação da educação - algo mais que a simples prepara-
ção de quadros técnicos para responder às necessidades de desenvolvimento de uma área - depen-
de da harmonia que se consiga entre a vocação ontológica deste “ser situado e temporalizado”, e as
condições especiais desta temporalidade e desta situacionalidade. (FREIRE, 2001, 61).
A cada instante há na vida um novo conhecimento a encontrar, uma nova lição despertando uma
situação nova, que se deve resolver. Quanto mais criticamente se exerça a capacidade de aprender
tanto mais se constrói e se desenvolve a chamada curiosidade epistemológica. (FREIRE, 2000) É tare-
fa do educador, não apenas ensinar conteúdos, mas também pensar certo.
A escola não pode tomar o papel do feitor ou do senhor das terras que trata o escravo com a
42 PEJA –Programa de Educação de Jovens e Adultos

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
chibata forçando-o a fazer apenas o que acha que tem que fazer. Cabe a escola desenvolver o papel
libertador. Quando reunimos os educandos e perguntamos o esperam da educação: estudar pra
que, estudar por quê? (tema do 1º Encontro de Alunos da EJA Rio), estamos mostrando que eles têm
voz e direitos que merecem ser respeitados.
Entender como esse processo se dá em cada aluno da EJA respeitando-se as variantes linguísti-
cas, as diversidades culturais e étnicas, dão o rumo do navio que só assim deixa de ser negreiro, que
escraviza, e passar a ser o negreiro que traz uma riqueza plural tamanha que merece todo respeito.
Um exemplo dessa transformação pode ser visto no trecho do texto coletivo do VII Encontro de
Alunos que tratou do tema: “Educar para as diversidades contra as desigualdades.”
É na diversidade que se constrói a unidade.

Somos diferentes. Diferentes mas iguais. Iguais no ciclo da vida. Somos iguais nas
nossas dores. Iguais nas nossas alegrias. Somos cidadãos, temos direitos e deveres
iguais. No entanto há intolerância para aqueles que fogem de um padrão que o
mundo estabelece. Vivemos num mundo desigual. Nós somos um saquinho de reta-
lhos que vem de todo o país, formando uma colcha linda, de diversas cores e formas.
Por isso é que somos iguais, retalhos do mesmo saco.

Essa citação revela que os frutos de um trabalho educacional comprometido com a construção
coletiva, valorizando a voz dos alunos é enriquecedor para todos os sujeitos que vivenciam este
processo.
Ao se definir como “retalhos do mesmo saco” esses alunos se referem ao fato deles pertencerem
a uma mesma classe social. Desta forma, observamos nesse trecho do texto coletivo, como os alu-
nos foram capazes de relacionar de forma poética, altamente significativa e sintética, a diversidade
cultural com a desigualdade social.
Cumprindo assim brilhantemente a tarefa de construírem coletivamente um texto a partir do
tema “Educar para as diversidades contra as desigualdades.”

referênciAs bibliográficAs
BRASIL, Reflexões sobre a Política Nacional de Juventude, Secretaria-Geral da
Presidência da República. CONJUVE, 2011
FILICE, Renísia Cristina Garcia. Raça e classe na gestão da educação básica brasileira: a cultura na
implementação de políticas públicas. Autores Associados, 2011.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários à prática educativa, Rio de Janeiro: Paz
e Terra, 2000.
______, Paulo. Educação e Mudança, Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2001
REGIS, Armando e Djalma Sabiá – Navio Negreiro – Samba Enredo do Grêmio Recreativo Acadêmi-
cos do Salgueiro, 1975
RIBEIRO, Darcy. O povo brasileiro. Companhia de Bolso, 2010.
Secretaria Nacional de Juventude- POLÍTICAS PÚBLICAS DE JUVENTUDE, 2013
MEYER, C. Educar para a diversidade e cidadania. Construindo a Educação. São Paulo, 2008.
http://professorqueviroupapel.spaceblog.com.br/1418773/DIVERSIDADE-CULTURAL-E-LINGUISTI-
CA/

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Anexo 1:

projeto: áfricA – berço dA hUmAnidAde


Objetivo: Refletir sobre a influência da cultura africana no povo brasileiro
Atividades desenvolvidas:
Pesquisa: nomes afrodescendentes, brasileiros ou não (destaque nas diversas áreas)
com exposição
Aulão: A Geografia e História do continente africano
Filmes: “Amistad” (primeira parte que mostra a captura e a travessia pelo Atlântico) e “África Bra-
sil, Semente, Raiz e Tempo” (youtube, em duas partes). Ao término, os alunos expressaram de várias
formas o que mais lhes chamou a atenção.
Aulão: Inglês (viagem aos EUA: pontos turísticos relacionados ao preconceito e segregação)
Oficina: Linguagens Artísticas: “Vivenciando um Navio Negreiro”
Palestra: “Questão das cotas nas universidades” ( Profissional da Faculdade de Direito da UFRJ)
Oficinas: oferecidas por todos os professores (cada aluno pode participar de duas a cada dia)
*Palavras de origem africana;
*Doenças mais frequentes em afrodescendentes;
*Adinkras (formas geométricas encontradas em diversas culturas africanas);
*Bijuteria com influência africana;
*Aprendendo a fazer Abayomis (bonecas africanas);
*Onde você esconde seus preconceitos?”
*Sambras-enredo (“Kizomba”, “Festa da Raça” e “Cem Anos de Liberdade, Realidade ou Ilusão?”)
*Influência Africana no Brasil.
Encerramento: Depoimentos dos alunos sobre a “Semana Africana”. Após, Roda de Capoeira e
Feijoada

Anexo 2:
VII Encontro de Alunos daEducação de Jovens e Adultos 29/09/12
Primavera de 2012
Esse texto foi produzido juntando fragmentos dos textos coletivos que cada escola com PEJA
escreveu explicando como elas educam para as diversidades contra as desigualdades.
“É na diversidade que se constrói a unidade.”
Somos diferentes. Diferentes mas iguais. Iguais no ciclo da vida. Somos iguais nas nossas dores.
Iguais nas nossas alegrias. Somos cidadãos, temos direitos e deveres iguais. No entanto há intolerân-
cia para aqueles que fogem de um padrão que o mundo estabelece. Vivemos num mundo desigual.
Nós somos um saquinho de retalhos que vem de todo o país, formando uma colcha linda, de di-
versas cores e formas. Por isso é que somos iguais, retalhos do mesmo saco.
Quando a gente pensa nesse lance de diversidade, logo pensamos no povo lá do Norte. A favela
está cheia de gente de lá. Aqui mesmo na escola temos muitos. Viemos para trabalhar e ganhar mais

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
dinheiro, porque a vida lá no Norte é muito dura, mas aqui não é diferente. Dizemos que queremos
voltar, mas o dinheiro nunca dá.
E ainda temos que ouvir as piadas do pessoal na favela e até aqui na escola, que nos chamam de
cabeça chata.
Na verdade homens e mulheres, jovens ou idosos estão expostos a todo tipo de violência física,
mental e econômica sendo que esta última agrava todos os outros problemas, pois sem dinheiro a
alimentação é ruim, a saúde é prejudicada e a vida fica em preto e branco.
Para nós, alunos do PEJA (...) discutir a desigualdade e o preconceito é discutir nossas histórias,
é discutir o acesso à Educação porque nossas histórias são de abandono e afastamento. A neces-
sidade de trabalhar para ajudar a família, a falta de apoio da própria família que coloca empecilho
quando obriga os filhos maiores a ficarem em casa para cuidar dos menores e a repetência escolar
acabam afastando as pessoas da escola.
Estamos em busca de uma chance que nos foi tirada pois precisávamos trabalhar para ajudar a
família.
Horário de trabalho, violência, comodismo, cansaço físico e mental em decorrência de um dia de
labuta, preconceito, desigualdade são algumas das adversidades pelas quais passam os alunos do
PEJA.
As desigualdades sociais e econômicas não devem ser vistas como normais, mas possíveis de
mudar. No mundo de hoje, há pessoas sofrendo com a desigualdade social, gente passando fome e
outras estragando comida. Pessoas que moram de baixo de viadutos, nas ruas, em locais não apro-
priados para moradia, crianças chorando pedindo esmola, etc.
Desigualdade é um mal do capitalismo. Diferenças sociais onde muitos trabalham vendendo seu
tempo, esforço físico, criatividade e conhecimento para poucos terem lucro real.
Lembro-me da minha difícil infância onde meu pai saía bem cedo para trabalhar e só voltava à
noitinha. Naquele tempo não entendia direito tudo isso. Ele dedicava tantas horas de seu dia, todos
os dias da sua vida e sua situação não mudava. E muitas vezes até faltava. Enquanto isso, ele ouvia
dizer que a cada dia a empresa crescia e o dono dela acumulava cada vez mais riquezas e poder.
Como pode muitos trabalharem para um só enriquecer? – perguntava eu. (...) E hoje pouco mudou.
As diferenças ainda podem ser vistas, mas agora quem trabalha sou eu.
Mas cruel mesmo é a violência que mantém na miséria, grande parte da população do País que
vivem sem as mínimas condições de sobrevivência, acarretando com isso muitas doenças e óbitos.
Uma boa educação possibilita a mudança de destino de um indivíduo, de um grupo, de uma clas-
se, e deve ser feito a partir de um compromisso político, ético e profissional do professor e da escola.
A responsabilidade é coletiva. Juntos em um só pensamento, unindo forças, vamos ultrapassando
barreiras, rejeitando o que nos impede de sermos melhores uns para os outros.
Praticar a cidadania ativa é criar novos espaços de participação comunitária, de participação cul-
tural, social e política que dão “voz e vez” a quem nunca teve. As eleições estão próximas e é hora
de participar para transformar a nossa sociedade. Em nosso país o exercício da democracia é algo
relativamente recente, devemos por isso tomar posse desse direito demonstrado no voto e fazê-lo
de modo consciente.
No início tínhamos dúvidas e aflições. Não é fácil uma pessoa cansada, cheia de problemas, se-
parar quatro horas da sua rotina diária para algo que um dia ficou tão distante dos seus planos por
alguma fatalidade da vida. Mas foi então que chegou o primeiro dia: várias pessoas diferentes se
reuniam em uma sala de aula. Logo os professores, com toda atenção, nos fizeram nos comunicar e
dialogar. E assim foi dado o primeiro passo.
As aulas, com muitos debates e diálogos, nos fizeram perder o medo de errar e tivemos a liberda-

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
de de consertar esses erros. Hoje, certamente sabemos mais do que sabíamos há alguns meses atrás,
não só em relação à disciplina, mas como pessoas, pois é muito importante trabalhar em grupo e se
relacionar com os outros, pois as experiências de cada um nos faz crescer.
Aprendemos que (...) nada é imutável. A ignorância nos leva a praticar atos horrorosos de iniqui-
dade, atos que jamais repetiremos após tantas informações sobre violência, diversidades e desigual-
dades. Podemos, com estes dados, nos tornar pessoas melhores e aprimorar a nossa condição de
cidadão, de pai e de aluno. Também entendemos que somente conscientes do nosso papel como
agentes de mudanças poderemos lutar corretamente contra a exploração que nos é imputada por
esta sociedade injusta que dá privilégios para alguns e chicoteia e abusa de outros.
Nos jogos cooperativos, percebemos que não existe um único vencedor, essa vitória é compar-
tilhada com todo o grupo e os objetivos acabam sendo comuns a todos os integrantes.
Não vamos pensar no ganhar do outro e sim no ganhar com o outro.
Quando trabalhamos em conjunto, notamos que incluímos os demais colegas da classe, não tra-
balhando com exclusão,
Nós concluímos que o trabalho coletivo é importante, porque assim, aquele que sabe menos
não fica com vergonha e todos ficam incluídos na sala de aula, na turma e no grupo que está reali-
zando aquele trabalho, “unidos com o mesmo objetivo de aprender”.
Devemos acreditar na escola como instituição atuante e de qualidade, realizando o sonho da
maioria dos brasileiros, o de ter sustentabilidade em suas vidas.
Não podemos permitir é que as adversidades gerem a intolerância e a cultura da violência. É hora
de dar um basta!
É maravilhoso ter a certeza que construir o saber é possível a todos.
Lutemos por um mundo mais justo!!!

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
o centenário de ViníciUs: opotUnidAde de diálogos e
reflexões AcercA do protAgonismo jUVenil nA ejA
dAniel cAstiAjo | thAmirez blAz
pAUlA cAroline mArini pereirA | ingrid oliVeirA dA costA

O presente trabalho tem como objetivo publicizar as reflexões em torno das experiências viven-
ciadas pelo grupo de bolsistas do PIBID/EJA – UERJ no projeto “No centenário de Vinícius, a escola
vai à Ipanema”. Os trabalhos de campo foram executados entre agosto de 2012 até julho de 2013 na
Escola Municipal Pires e Albuquerque, situada no bairro de Irajá, utilizamos observações sistemáti-
cas do cotidiano do PEJA na escola, bem como o acompanhamento das práticas docentes em sala
de aula. A percepção do grupo para a transformação do perfil – devido ao aumento do quantitativo
de jovens na escola –, e ainda o alinhamento ao tema gerador do município do Rio, fizeram com que
o centenário de Vinícius de Morais se apresentasse como uma oportunidade de provocação de diá-
logos acerca da juventude, visando estabelecer a interação dos saberes entre as distintas gerações
dos agentes no processo de ensino/aprendizagem. Construímos coletivamente os objetivos a serem
alcançados nas reuniões de planejamento, para que o público alvo fosse motivado, nesse sentido
utilizamos elementos provocativos no espaço escolar em consonância com a obra do artista. Como
procedimento metodológico, utilizamos os registros fotográficos e filmagens de todo o processo
como fonte secundária (imagética e oral), bem como a sistematização do projeto com o um todo
para as devidas interpretações por via do embasamento teórico referente à pesquisa bibliográfica
no campo da EJA. O resultado foi positivo, já que conseguimos perceber o quanto todas as etapas
do projeto foram significativas e propiciaram novas atitudes, reflexões e a criticidade, não só dos alu-
nos, como também dos docentes, evidenciados em seus relatos acerca da efetividade do trabalho.
Enfim, despertamos reflexões em torno da visão do aluno da EJA, visto que alguns professores, no
início, se mostraram desacreditados da capacidade dos alunos, e assim tiveram o prazer de descobrir
suas potencialidades e virtudes.

palavras-chave: PIBID, PEJA, Diversidade, Juventudes, Protagonismo juvenil

introdUção
A Educação de Jovens e Adultos (EJA) passa por momentos de revisão de suas concepções. Uma
delas se baseia nas questões históricas de marginalização dos sujeitos demandantes dessa atual
modalidade do ensino, principalmente os excluídos da condição de possuidores de direito à educa-
ção. A sociedade brasileira avançou no que diz respeito a assegurar o acesso à educação para todos,
independentemente da idade, mediante a promulgação da Constituição Federal de 1988 (BEISIE-
GEL, 1997).
Sendo assim, a demanda social excluída do direito à educação pública teve que se contentar
como as leis ordinárias e, dessa forma, a camada jovem e adulta da sociedade passou a ter seus direi-
tos assegurados. Embora a lei tenha sido constituída, a distância entre a formulação legal e a prática
tem se mantido em condição desigual – quase um terço da população brasileira continua sem ser
assistida, em consonância a essa condição pouco inovadora da Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDBEN de 1996).
Reconhecendo que a formação de professores qualificados é uma das mais relevantes funções
sociais da universidade, e sendo ela locus de formação docente, entende-se que esta se deve dar
na escola. Para tanto a UERJ/Faculdade de Educação, por via do PIBID, atuou nas escolas parceiras
do projeto contribuindo para o estreitamento dos vínculos que a Faculdade de Educação vem man-

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
tendo com a escola básica, tanto pela via das disciplinas curriculares, em que se destaca o estágio
docente, quanto pela pesquisa, pelas práticas pedagógicas e, ainda, através da extensão.

metodologiA
Na escola situada em Irajá - Rio de Janeiro, a pesquisa se deu por observação participante, pes-
quisa documental devidamente orientada pela supervisora da Unidade Escolar (UE), reuniões de
planejamento e centros de estudo com a coordenadora do projeto na Faculdade de Educação da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
Depois das reuniões de planejamento começamos a realizar as atividades propostas pelo gru-
po, nas quais emergiram questões que foram trabalhadas durante o transcurso do projeto. Nesse
sentido, atuamos em parceria com a comunidade escolar a fim de viabilizar instrumentos facilita-
dores que alcançassem os objetivos traçados. Também foram elaboradas entrevistas com docentes
e discentes, ambas registradas e arquivadas. Através das entrevistas e outras atividades realizadas
pelos bolsistas ID (iniciação à docência), elencamos os temas geradores dos debates juntamente da
coordenação do projeto. Dessa forma, as questões foram discutidas e estudadas com embasamento
teórico no campo da EJA.

qUestões emergentes
Os encontros aconteceram de maneira sistemática com toda a comunidade escolar. Foram orga-
nizados por bolsistas, supervisora e coordenação, a fim de planejar coletivamente, debater, formar
e informar sobre o projeto e questões da política de EJA que afetam o fazer da escola, ao longo de
todo o processo de estágio docente. Planejamos e realizamos as atividades previstas no subprojeto
e delas surgiram algumas questões. Dentre estas destacamos a falta de formação docente espe-
cífica para a atuação na EJA, relações interpessoais em conflito, juvenilização da EJA, a atuação do
grupo de bolsistas contribuindo para transformação do pensamento crítico do aluno e a harmonia
da comunidade escolar.
Nas observações iniciais, em diferentes turmas na escola, os bolsistas faziam rodízios de forma
a colocar os relatos de suas impressões, opiniões e sugestões distintas, fruto da multiplicidade de
olhares oriundos das trajetórias, vivências acadêmicas e pessoais. Tais contribuições alimentaram
intensos debates entre os bolsistas, os quais foram mediados pela supervisora, favorecendo o es-
clarecimento e entendimento das questões que emergiram do cotidiano escolar, já que buscamos
a efetividade do trabalho pautado em profunda pesquisa investigativa da realidade local, que se
enquadre na metodologia assinalada por Paulo Freire, no que tange ao pensar certo e à pesquisa do
professor e da escola de maneira mais ampla. Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino.
Esses que-fazeres se encontram um no corpo do outro (FREIRE, 1997).

problemAtizAção dA formAção docente


A partir da observação em sala, relatamos e comprovamos que parte do corpo docente não tinha
formação docente especializada e, por conseguinte, não estava efetivamente preparado para enca-
rar a realidade da EJA. Assim sendo, a falta de entendimento quanto aos cuidados necessários acerca
da dinâmica de ensino-aprendizagem ficou visível em entrevista realizada com os educadores ainda
no ano de 2012 no primeiro semestre da pesquisa nesta escola. Apenas um professor tinha experi-
ência com a EJA e mesmo assim era notável que a falta de formação para esta modalidade de ensino
acarretava problemas em sua prática docente.
Em 2013 a situação se agravou com a mudança do público atendido por esta escola. Houve uma
entrada maciça de jovens e adolescentes em sua maioria com idade entre 15 e 18 anos. Esse acon-
tecimento acarretou em um aumento da violência e consequentemente uma revolta por parte dos

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
professores, que ficaram assustados e não estavam preparados para essa nova realidade. Para tanto,
(PAIVA, 2009) assinala que o direito à educação está fundamentado na condição de necessidade
fundamental, em conformidade ao pensamento de um modelo democrático de sociedade. Ressal-
tando, ainda, que o Estado deve garantir a plenitude desse direito.
Diante do caráter inédito desse movimento para esta escola, podemos constatar de fato, que os
professores não estavam preparados para o novo e a especificidade que essa modalidade requer.
Até chegaram a falar que estavam descaracterizando a EJA. Isto se deve em parte pela não qualifica-
ção específica para EJA. É provável que um profissional qualificado tivesse a sensibilidade de tentar
se adequar sem se apavorar ou repudiar a mudança. Pois, é próprio do pensar certo a disponibili-
dade ao risco, a aceitação do novo que não pode ser negado ou acolhido só porque é novo, assim
como o critério de recusa ao velho não é apenas o cronológico (FREIRE, 1997).

processo de jUVenilizAção dA escolA


Quando retomamos as atividades em 2013, o perfil dos alunos sofreu transformações, devido
à entrada de muitos jovens, e até adolescentes de aproximadamente 15 anos, como citado acima.
Com isso houve mudança na configuração da escola, que até o ano de 2012 atendia a um público
composto por jovens, adultos e idosos. Este fato exigiu de nós bolsistas um abandono do que haví-
amos planejado para o ano de 2013, dando início a outro período de observação, começando prati-
camente do zero em algumas ações.
O cenário de juventude tão presente em textos sobre a educação de jovens e adultos; e viven-
ciada pelo outro grupo do nosso projeto, em Mesquita; estava finalmente tornando-se realidade
na escola parceira de Irajá. E, mais uma vez, a falta de formação voltada para este campo bastante
específico de atuação do professor mostrou ser um problema revelando um olhar superficial, pouco
sensível e até preconceituoso sobre o processo de juvenilização pelo qual a escola estava passando,
com posturas por vezes declaradas, por outras veladas, a respeito de uma descaracterização da EJA
com a entrada dessa multidão jovem que parecia ser algo inédito, não especialmente dessa escola,
quando na verdade é uma temática recorrente na área - além de associarem violência e desordem
à juventude.
Segundo (PAIVA, 2009), as políticas públicas educacionais estão alinhadas para a universalização
do atendimento, dando enfoque maior ao público das classes populares. No entanto, a autora res-
salta que fatores relacionados a insuficiência deste atendimento e ações, por vezes equivocadas do
Estado, acabam produzindo o fracasso escolar. Para ela, este fator potencializa a chegada de jovens
na EJA sem o domínio da leitura e da escrita. Por esse motivo, a presença de jovens vem sendo mar-
cante, principalmente nas áreas metropolitanas, desafiando educadores no sentido de condicioná-
-los a novas reflexões em torno de novas metodologias e intervenções pedagógicas.

relAções interpessoAis em conflito


Desde o início do projeto em 2012 constatou-se que nesta escola havia conflito de relação entre
toda a comunidade escolar, especialmente entre alunos pela diferença de idade entre eles. Em con-
versas informais nos diversos espaços dentro da escola e até fora dela, percebemos também uma
baixa autoestima dos discentes, mesmo havendo afetividade no relacionamento entre os alunos e
alguns professores.
Para atendermos a esta questão, estudamos, planejamos e desenvolvemos atividades como en-
trevistas com professores e filme e debate com os alunos, porém estes conflitos se davam por moti-
vos diversos tais como: concepção equivocada dos alunos da EJA e desta modalidade de ensino por
parte da maioria dos professores, espaço inadequado da escola para o ensino de pessoas jovens e
adultas, falta de recursos material didático e o não entendimento dos alunos quanto ao PEJA, pois os

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
alunos não entendiam em que série estavam e isso os deixavam angustiados, entre outros.
Em 2013, as relações conflituosas ainda tinham resquícios destes problemas, porém a maior cau-
sa foi a juvenilização, o aumento da violência, a inquietação dos professores e a diferença de idade
entre os alunos, que acarretou em uma ebulição de emoções e ações não positivas e inapropriadas
para uma instituição escolar, bem como a convivência pacífica entre os sujeitos na sociedade.
Aproveitando que o tema gerador da Secretaria Municipal de Educação em 2013 era Vinícius de
Moraes, decidimos, então, trazer este tema para discutir a juventude e o olhar da sociedade sobre
ela ontem e hoje, com o projeto “No Centenário de Vinicius a escola vai a Ipanema”, propondo que se
pensasse sobre o ser jovem e tudo o que esta fase traz com ela. Acreditou-se que esta dialética traria
uma melhor compreensão do cenário que se tinha agora com a entrada dos jovens, e como estava à
relação entre eles e os alunos mais velhos, incluindo também professores e funcionários.
A ideia era mostrar aos professores e alunos mais adultos que violência não é próprio dos ado-
lescentes, que jovens eles também já foram e que mesmo na época de Vinícius, agiam de maneira
semelhante aos de hoje. Também era nossa intenção mostrar que o conceito de juventude estigma-
tizada pela própria sociedade e reproduzido pela escola, sempre foi visto pela ótica do caráter sub-
versivo, de busca por liberdade. Contudo, um papel social definido de mudança se contrapondo aos
padrões definidos pela sociedade adulta. Nesse sentido, a cultura tem um espaço privilegiado na
construção da identidade juvenil, pois o jovem é destituído por experiências sociais que lhe impõe
uma identidade inferiorizada, no entanto os grupos culturais possibilitam um espaço de construção
coletiva da autoestima juvenil (DAYRELL, 2006).

o projeto “no centenário de ViniciUs A escolA VAi A ipAnemA”


Como este bairro do Rio de Janeiro foi um cenário bastante representativo na vida desta perso-
nalidade, pensamos inicialmente em nomear o projeto de “No centenário de Vinicius, Ipanema vai
à escola!”, com a ideia de que “trazer Ipanema” estaria representando o esforço que faríamos para
apresentar um pouco do universo de Vinicius, seu cotidiano, os lugares que frequentava, seus ami-
gos, sua personalidade e principalmente o que ele produziu. No entanto, a partir da orientação da
nossa coordenadora, mudamos para o nome citado inicialmente, acreditando que o principal obje-
tivo era propiciar uma atividade que “rompesse com os muros da escola”, e, então, de alguma forma
ajudasse para que todos os atores da escola, mas principalmente os alunos, ampliassem a visão das
possibilidades que possuem, de todo o conhecimento que produzem e podem produzir e com ele
transformar realidades, começando pela da escola.
O projeto foi apresentado aos professores. Justificamos a escolha e elaboração ao apresentar
pontos de crítica e benefícios possíveis. Pedimos a colaboração de todos. Espalhamos o material
provocativo na escola. Estes elementos faziam referência às obras e temáticas de Vinicius de Moraes,
com o objetivo de chamar a atenção para o tema e instigar a curiosidade.
Em seguida distribuímos convites em todas as turmas convidando os alunos para assistirem ao
“Cine Vinícius”, que seria seguido de debate. Mostrando aos alunos o quanto gostaríamos que par-
ticipassem, além de buscarmos perceber nessa conversa o quanto conheciam Vinicius de Moraes,
e a imagem que possuíam dele. Fizemos convites com as datas das sessões, pois elas tiveram que
acontecer a cada duas turmas devido ao limite de espaço da sala de leitura, local onde foram elas
realizadas.
Exibição de documentários sobre a vida de Vinicius: um vídeo sobre a biografia do cantor conta-
da por ele mesmo, mostrando o lado deste artista que pouquíssimas vezes foi revelado, seus vícios,
suas inconstâncias, orgias, moralidades, etc., e outro falando de sua vida artística, de sua genialidade
inquestionável e contribuição para a cultura brasileira. Após as sessões aconteceram debates que
tinham o objetivo de confrontar as juventudes da época de Vinícius e a atual, as questões sociais e

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
as temáticas que emergiam da trajetória de vida e das obras deste artista. A sala de leitura foi prepa-
rada e decorada, especialmente para esta atividade, além da pipoca que tem tudo a ver com cinema.
Fizemos ficha de inscrição não para termos um controle rígido das inscrições, mas para perceber
as impressões iniciais que os alunos tinham das oficinas de música, teatro, poesia, dança, pintura e
gastronomia, se já haviam participado de atividades assim, o que pensavam dos saberes e habilida-
des que possuíam para além dos conteúdos curriculares e junto com eles, nós bolsistas idealizamos
como seria a apresentação de tudo o que produziriam. Sabíamos que seria de extrema importância
a participação dos professores para encorajá-los a pelo menos conhecerem melhor seus alunos fora
de suas atividades cotidianas.
O projeto “Vinícius de Moraes” seria finalizado com um passeio à Ipanema que por diversos moti-
vos não pôde acontecer, então esta foi à culminância do projeto. Nesta etapa, os alunos da oficina de
gastronomia organizaram que tipo de comida combinava com a atmosfera que a vida de Vinicius de
Moraes passava, controlando quem e o que cada aluno traria como colaboração para ser comparti-
lhado entre todos, e os alunos de todas as outras oficinas, música, teatro, poesia, dança e pintura, se
apresentaram à comunidade escolar, mostrando o resultado de tudo o que prepararam nas oficinas
durante o projeto e produzindo arte.

resUltAdos
No fechamento do PIBID/EJA 2013, fizemos avaliação e confraternização com docentes e discen-
tes na Unidade Escolar e constatamos o resultado deste trabalho no projeto Vinícius. Os professores
relataram a nítida mudança na postura dos alunos quanto às tomadas de decisões, participação nas
atividades e debates em sala de aula. Acrescentaram que os alunos ficaram mais “maduros” e agora
se sentiam parte fundamental no processo de ensino/aprendizagem.
O diferencial na prática pedagógica do grupo de pesquisa foi o estabelecimento de uma ponte
afetiva entre a comunidade escolar e principalmente ente os alunos. Acreditamos na capacidade
dos discentes, nos colocamos como semelhantes, ouvimos e dialogamos em sala, nos corredores, no
refeitório e até no ponto de ônibus. Foi extremamente prazeroso e emocionante ver quase 90% dos
alunos participarem tanto das oficinas quanto da culminância, se colocando no centro da educação
e produzindo arte. Percebemos esta adesão como uma retribuição ao uso da afetividade e constata-
mos a transformação na criticidade ao respeitarmos os saberes dos educandos.

considerAções finAis
A participação neste projeto de pesquisa foi fundamental para a formação docente de todo o
grupo de estagiários. Evidenciamos a importância da EJA como modalidade educacional promotora
da redução das desigualdades. A iniciação à docência contribuiu de uma maneira efetiva, visto que
fizemos pesquisa teórica (historicidade e políticas públicas) e prática (pesquisa de campo), além de
investigação de temas relativos à EJA e desenvolvimento de atividades com docentes e discentes vi-
sando à melhora no ensino dessa modalidade. Fator primordial na qualificação de profissionais que
pretendem exercer a profissão de educador, especialmente nesta modalidade de ensino.
Vale ressaltar a “contribuição social” do PIBID para vida dos envolvidos, direta e indiretamente,
sobretudo na Escola Pires e Albuquerque. Para os bolsistas, fica o aprendizado acadêmico e a ex-
periência em poder lançar mão de um olhar diferenciado para a Instituição escolar, no caso da EJA.
Um olhar docente investigativo, desconstruindo paradigmas e se reconstruindo em diálogo com a
prática do outro. Que nos fez vivenciar a realidade assinalada por (ANDRADE, 2009) quando retra-
ta a característica do perfil do jovem da EJA, que circula no espaço escolar inúmeras vezes. Para a
autora, essa realidade provoca incomodo no sistema educacional, por contada da dificuldade de
implementação de uma ação mais abrangente; que, sobretudo, dê conta em atender esse público

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
com maior abrangência e qualidade.
Para a escola e a comunidade escolar, também observamos contribuições contundentes no que
se refere à interferência positiva no relacionamento entre os sujeitos, bem como na mudança de po-
sicionamento dos alunos quanto ao seu papel dentro da escola, visto que uma parcela considerável
dos discentes passaram a produzir pensamento crítico e de inquietação sobre a política de ensino
do PEJA. Outros pontos abordados nas atividades realizadas, as quais já estavam previstas no sub-
projeto do PIBID e foram elaboradas, com bastante empenho e dedicação por todos os bolsistas,
foram de suma importância para as mudanças mencionadas. Colhemos os frutos de um trabalho
prazeroso que nos deixou orgulhosos por fomentar novas perspectivas de ensino, debates e, prin-
cipalmente, colocar em prática a ideologia emancipadora e libertadora adquirida em diálogos com
mestres e autores no âmbito acadêmico.

referênciAs bibliográficAs
ANDRADE, Eliane Ribeiro. Os jovens da EJA e a EJA dos jovens. In. PAIVA, J; OLIVEIRA, L.B. (org). Edu-
cação de Jovens e Adultos. Petrópolis, RJ: DP et Alii, 2009.
BEISIEGEL, Celso de Rui. A política de educação de jovens e adultos analfabetos no Brasil. In: OLIVEI-
RA, Dalila Andrade. (org.). Gestão Democrática da Educação: desafios contemporâneos. Petrópolis, RJ:
Vozes, 1997.
BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996: Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Na-
cional. Brasília, 1996.
_______ Conselho Nacional de Educação. Parecer CEB n°.11/2000. Diretrizes Curriculares para a Edu-
cação de Jovens e Adultos. Brasília: MEC, 2000.
DAYRELL, Juarez. A Escola “faz” as juventudes? Reflexões em torno da socialização juvenil. Texto
apresentado no Simpósio Internacional “Ciutat.edu: nuevos retos, nuevos compromissos”. Barcelona,
2006.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. 17ª ed. Rio de Ja-
neiro: Paz e Terra, 1996.
HADDAD, Sérgio; DI PIERRO, Maria Clara. Escolarização de jovens e adultos. Revista Brasileira de Edu-
cação. São Paulo, 2000.
PAIVA, Jane. A Construção Coletiva da Política de Educação de Jovens e Adultos no Brasil. Revista
Brasileira de Estudos Pedagógicos. Brasília, 2009.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
o cUrrícUlo de edUcAção de joVens e AdUltos:
Análise dA experiênciA do mUnicípio de itAborAí
AdriAnA bArbosA dA silVA | elionAldo fernAndes jUlião

Este artigo é fruto da pesquisa de mestrado em educação na Universidade Federal Fluminense


(UFF), no campo de confluência: Diversidade, Desigualdades Sociais e Educação. A pesquisa tem
como objetivo principal analisar o currículo de educação de jovens e adultos através da experiên-
cia do município de Itaboraí. A partir desse objetivo, debruçamo-nos sobre o campo do currículo,
identificando suas principais concepções teóricas. Trata-se de uma pesquisa ainda em andamento,
mas os resultados preliminares apontam para o fato de que um currículo inadequado para a EJA não
dialoga com as expectativas do público alvo e trazem implicações políticas e epistemológicas para
essa modalidade de ensino. Portanto, é fundamental a criação de propostas curriculares que aten-
dam as especificidades da EJA. Desta forma, tornou-se importante compreender como as instâncias
públicas do município estão assumindo como currículo no cotidiano escolar, através do movimento
denominado “reorientação curricular” iniciado em 2012. Deste modo, analisamos a importância da
construção de referenciais curriculares para esta modalidade de ensino que considerem a diversida-
de e as especificidades dos sujeitos como princípios norteadores do processo, como preconizado no
parecer CNE/CEB 11/2000. Mergulhar no universo específico desta modalidade de ensino e analisar
suas particularidades e o que há de diferente nela é função primordial.

palavras-chave: EJA, Currículo, Diversidade, Município de itaboraí

introdução

A Educação de Jovens e Adultos no Brasil, a partir da promulgação da Constituição Brasileira em


1988, que reconhece a Educação como um “direito do cidadão e dever do Estado” e, notadamente,
na Lei 9394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional- LDBEN), ganhou uma importância
histórica bem maior do que aquela existente em momentos anteriores, onde tínhamos essa modali-
dade de ensino, como o preconizado na Lei 5692/71 (Lei de Diretrizes e Bases do Ensino de Primeiro
e Segundo Graus), vista apenas como algo que daria “suprimento ou suplência de ensino” àqueles
que não o haviam concluído em idade adequada.
Nos últimos anos, até 2007, crescia o número de matrículas para esta modalidade da educação
básica. Posteriormente, decaiu 14.9% no período de 2007 a 2010. Infelizmente, o Ministério da Edu-
cação – MEC afirma ainda desconhecer os motivos.
Como professora de Educação de Jovens e Adultos do Município de Itaboraí desde 2009 e atu-
almente como Coordenadora de Educação de Jovens e Adultos (EJA) da Secretaria Municipal de
Educação de Itaboraí (SEMEC), observo outro fator: os alunos se matriculam e acabam deixando a
escola antes mesmo de concluir o período letivo.
Ao longo destes anos, venho me indagando sobre as possíveis explicações para essa evasão.
Dentre as minhas hipóteses, destacam-se o fato dos currículos estarem inadequados, não contem-
plando as necessidades dos alunos da EJA, que acabam por não ver na escola uma possibilidade de
perspectiva. Particularmente, considero o currículo como importante elemento que pode vir expli-
car esta evasão.
O município, no ano de 2012, iniciou um movimento denominado reorientação curricular no
qual todos os segmentos e modalidades precisavam participar e repensar o seu “currículo”. Esse mo-

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
vimento deu origem a construção de um documento chamado de versão preliminar e que está
sendo revisado no ano de 2014. Trata-se de um processo complexo que implica no embate de dife-
rentes instâncias e concepções teóricas.
Não existem dados sistematizados sobre a história da Educação de Jovens e Adultos na cidade de
Itaboraí. Até o ano de 2009 existiam apenas 5 unidades escolares que ofertavam a modalidade no
município, com um total de 700 alunos matriculados. Ao contrário do divulgado nacionalmente so-
bre a redução de matrículas na EJA, observa-se, desde então, um aumento crescente nas matrículas
em Itaboraí. Atualmente existem 17 escolas, totalizando 3.000 alunos matriculados.
Uma das possíveis razões para o aumento das matrículas de EJA na cidade pode estar ligado ao
fato da Petrobras ter escolhido o município de Itaboraí para sediar o Complexo Petroquímico do Rio
de Janeiro (COMPERJ). Previsto para entrar em operação em 2016, o empreendimento prevê a gera-
ção de mais de 200 mil empregos diretos e indiretos.
Apesar do aumento de matrículas na EJA, o número de evasões ainda é muito alto, atingindo
uma média de 40%, de acordo com os dados do último senso escolar. Levando em consideração
essa questão, faz-se necessário investigar se uma das possíveis causas da evasão está ligada ao cur-
rículo da EJA. Precisamos identificar se a falta de representação dos alunos no currículo se deve ao
fato deste não dialogar com os sujeitos envolvidos no processo educacional.
A pesquisa não possui o intuito de reduzir a EJA à escolarização, ressaltando que é fundamental
que se reconheça que existem outros espaços de formação e acesso de conhecimento, tais como o
mundo da cultura, do trabalho e nos diversos espaços de convívio social que circulam os sujeitos da
EJA. Porém, a opção por priorizar a escolarização de jovens e adultos se dá pela escassez de pesqui-
sas nessa direção. Apesar da crescente atuação e da maior visibilidade da EJA nos espaços formais
da educação, ainda são poucos os trabalhos que se propõem a discutir as tensões e os desafios exis-
tentes na construção de um currículo que atenda as especificidades da EJA nesses espaços.
Portanto, identifico a necessidade de pesquisar as diversas esferas que produzem currículo em
Itaboraí, principalmente não só analisando o documento oficial, mas sim dialogando com os diver-
sos sujeitos da comunidade escolar do município, procurando perceber as suas percepções sobre o
tema.
Para uma análise mais ampla, torna-se necessário discutir como os marcos legais, a partir da LD-
BEN de 1996 e as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos (CNE/SEB
1/2000), influenciaram os municípios na construção de um currículo específico para essa modalida-
de de ensino, principalmente a experiência do município de Itaboraí.
Desta forma, é importante compreender como as instâncias públicas do município estão assu-
mindo como currículo no cotidiano escolar, através do movimento denominado “reorientação cur-
ricular” iniciado em 2012. Em síntese, analisar o posicionamento político e epistemológico que está
gestando esse processo e como ele está sendo percebido pelos sujeitos da EJA.
Em linhas gerais, pretendo analisar as trajetórias e os sentidos produzidos pelos profissionais e
alunos da EJA durante este processo, refletindo sobre os discursos que circulam em diversos con-
textos.
A compreensão de como o currículo é construído e percebido pelos sujeitos da EJA, identificando
as tensões existentes na sua construção e implementação em um espaço formal de educação po-
dem permitir o acesso ao objeto de pesquisa de forma mais ampla e profunda.
Após uma pesquisa exploratória, onde pretendo levantar as principais obras, autores e pesquisas
que vem sendo produzidas sobre currículo na EJA, seguirei investindo em um trabalho mais direcio-
nado sobre a análise do currículo do município de Itaboraí.
A abordagem desse estudo será qualitativa, através de coletas de dados em uma pesquisa de

183
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
campo com entrevistas semi-estruturadas com a comunidade escolar do município de Itaboraí, des-
tacando-se professores e alunos das dezessete escolas da EJA.

AlgUmAs pAlAVrAs sobre ejA e cUrrícUlo.


A Educação de Jovens e Adultos (EJA), enquanto modalidade de ensino da educação básica apre-
senta uma trajetória de desafios. A EJA, por muito tempo, não se apresentou como prioridade edu-
cacional, sendo entendida e tratada apenas como política compensatória para os sujeitos que nunca
tiveram a oportunidade de frequentar a escola, que desistiram do processo de escolarização em um
dado momento da vida, ou foram impedidos de seguirem os estudos por circunstâncias diversas.
Com a implementação da LDBEN de 1996 aparece pela primeira vez na história da legislação bra-
sileira a preocupação em garantir o acesso e a continuidade dos estudos àqueles que não os tiveram
na idade própria, sendo regulamentada pelas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de
Jovens e Adultos (CNE/CEB 1/2000).
Segundo esta resolução, em seu artigo 6º, “cabe a cada sistema de ensino definir a estrutura e
a duração dos cursos da Educação de Jovens e Adultos, respeitadas as diretrizes curriculares nacio-
nais, a identidade desta modalidade de educação e o regime de colaboração entre os entes fede-
rados”. A partir dessa premissa, considerando que o perfil do aluno desta modalidade de ensino é
diferente do perfil do aluno do ensino regular, os municípios foram também responsabilizados pela
elaboração de currículos específicos para a EJA.
Na tentativa de situar a existência de teorias do currículo, iniciamos com a discussão que Silva
(1999) faz sobre o que seria a teoria do currículo. Para o autor, a teoria está comumente ligada ao
fato de possibilidade de desvendamento da realidade, como se o papel da teoria fosse o de apenas
revelar, descobrir o que já existe. A teoria, segundo o autor, apenas teria o papel de desvendar o cur-
rículo que já seria existente, este dado por sua vez como algo pronto e acabado, bastando apenas
descrevê-lo.
Essa visão de teoria está centrada, epistemologicamente, no pressuposto de uma relação entre o
sujeito e o objeto na qual o sujeito teria a possibilidade de apreender o objeto em sua realidade, tal
como é, ou em sua processualidade histórica, tal como está sendo.
Essas duas possibilidades epistemológicas (a realidade como fato objetivo ou a realidade como
processo histórico) foram assumidas por dois diferentes grupos de teoria: a tradicional e a crítica.
Assim, a teoria tradicional estaria baseada na primeira vertente, que acredita na possibilidade de
captação do real como fato, e a crítica, na segunda, vendo o real como construção sócio histórica e
política.
Politicamente, a primeira vertente estaria comprometida como uma visão conservadora da so-
ciedade e a segunda com uma visão crítica, acreditando na possibilidade de lutas políticas em prol
dos oprimidos, como na visão de Paulo Freire. No entanto, apesar de bastante diferentes em seus
pressupostos epistemológicos e políticos, ambas conjugam uma visão de teoria baseada no que
chamamos de epistemologia do sujeito ou filosofia da consciência que supõe a capacidade de des-
velamento de um real, factual ou histórico.
Segundo Cunha (1998), esse quadro conceitual de teoria que a categoriza em tradicional e crí-
tica, e que foi inicialmente sistematizado por Horkheimer (1983), foi abalado pela chamada virada
linguística que aponta o real como sendo não apenas uma construção social, histórica e política,
mas também discursiva. Em suma, não existe uma relação direta entre o sujeito e o objeto, mas uma
relação mediada pelo discurso. Desse modo, a realidade é também construída discursivamente.
Essa nova visão do real, e sua possibilidade de conhecimento, trouxeram complexas implicações
políticas e epistemológicas que afetaram o campo das teorias em geral e o campo das teorias curri-
culares em particular, criando uma nova categoria de teoria: as chamadas pós-críticas.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Desse modo, uma teoria pós-crítica é aquela que busca compreender e transformar o real, par-
tindo do pressuposto que o sujeito é um ser que se constitui e é constituído pela linguagem e o
objeto também. As implicações epistemológicas e políticas dessa guinada linguística para o campo
do currículo são imensas. Em primeiro lugar, o conhecimento escolar não pode mais ser visto como
neutro, como queria a teoria tradicional, mas também não pode ser visto apenas como engajado em
lutas que problematizavam apenas as questões relativas às classes sociais, denunciadas pela crítica
à sociedade capitalista.
Em segundo lugar, a noção de discurso como constituído e sendo constituinte do sujeito e da
sociedade trouxe o problema de compreendermos que os oprimidos não são apenas aqueles ex-
plorados economicamente pelo sistema capitalista. Oprimidos são todos aqueles que tiveram suas
vozes, seus discursos não aceitos como legítimos.
Em suma, a teoria pós-crítica ampliou a noção da relação conhecimento/poder apresentada pela
teoria crítica, mas colocando que o poder que esse conhecimento escolar tem é principalmente o de
constituir nos educando que vivenciam o currículo identidades de gênero, sexualidade, etnia, raça e
todas as demais identidades culturais que se possam constituir historicamente.
Cunha (2006) acrescenta que a teoria pós-critica do currículo vai para além das questões de clas-
ses sociais, considerando que a classe social dos sujeitos não define por si só suas identidades, abar-
cando visões multiculturais e da diferença que estão relacionadas com questões ligadas ao gênero,
sexualidade, etnia e raça que interferem nas produções e reproduções de suas práticas discursivas
e não discursivas.
Contextualizando a discussão sobre currículo no cenário brasileiro atual, podemos afirmar que
a partir da década de 1980, os estudos em torno do currículo ampliaram-se consideravelmente. No
Brasil, esse aumento de pesquisas em torno do campo do currículo proporcionou uma maior inde-
pendência em relação às literaturas estrangeiras, dentre elas a norte-americana e a inglesa. Mas a
ampliação do campo também trouxe discussões específicas para a realidade brasileira.
Para entender as atuais discussões sobre o currículo no cenário educativo brasileiro. Moreira
(2001) e Macedo (2006) fazem um panorama da discussão teórica sobre currículo no Brasil e apre-
sentam diferentes críticas sobre essa produção e, justamente por focarem em temas diferentes, aju-
dam na compreensão da complexidade existente no campo.
Moreira (op. cit.), em sua análise, confirma como o campo do currículo hoje ostenta mais prestígio
e visibilidade que em décadas anteriores no Brasil, mas faz uma crítica sobre a dicotomia que cos-
tuma prevalecer: as discussões terminam por priorizar uma disputa teórico-conceitual, em lugar de
propor um diálogo mais frutífero com a prática cotidiana vivenciada por professores e alunos.
O autor reconhece que essa crescente produção do campo trouxe um salto quantitativo em rela-
ção às produções de períodos anteriores, mas insiste que hoje há uma demanda urgente para que
esses estudos sejam capazes de dialogar com as experiências e os sujeitos que estão construindo
currículo na escola.
Desta forma, o autor acredita que só conseguiremos respostas que provoquem alguma mudança
significativa na rotina escolar quando as investigações sobre o campo deixarem de ser abrangentes
e focalizarem um determinado alvo, sem haver dicotomias entre teoria e prática. Para isso é preciso
haver um maior diálogo entre os pesquisadores e a escola propriamente dita.
Macedo (2006) procura responder à crítica de Moreira ao fazer uma análise sobre dissertações e
teses produzidas entre os anos de 1996 e 2002, que tinham como foco o currículo da educação bási-
ca. A autora nos chama a atenção para o grande número de trabalhos com essa temática, e chaman-
do atenção para a qualidade desses trabalhos. Diferente de Moreira, Macedo destaca a qualidade
dos trabalhos realizados, mas aponta outro tipo de ausência. Para ela, o problema não é a suprema-
cia de pesquisas estritamente teóricas, mas a fragmentação das análises sobre currículo.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Segundo a autora, a maior parte das pesquisas sobre o currículo, realizadas atualmente no Brasil,
foca a divisão entre o currículo praticado e o currículo formal, e, uma minoria (apenas 12,6% dos tra-
balhos), analisa este campo de modo mais integrado às práticas e às propostas formais.
O currículo praticado é aquele que se difere na prática do que está nos documentos oficiais, é
aquele que é transformado no cotidiano das salas de aulas.
Segundo Macedo, essas pesquisas não contemplam toda a complexidade envolvida no campo
porque, ao analisar apenas um destes aspectos, não leva em consideração toda a sua completude.
A autora propõe a desconstrução desta dualidade – currículo formal e praticado. O currículo não
pode ser dissociado da cultura, ele não pode ser visto como algo estanque. As pesquisas devem se
aprofundar em situações que vão para além da sua produção e implementação, abordando todas as
situações que se refletem nele, buscando relações menos desiguais de poder.
As análises recentes demonstram como nessa diferenciação entre currículo como fato e currículo
vivido, por mais que se levem em consideração a dimensão ativa deste último, ainda existe a super
valorização do primeiro, o currículo como fato, pois a esse é destinado um espaço mais importante,
perpetuando o controle por parte daqueles que definem o que deve ou não ser estudado.
Dessa maneira, quando os resultados são contrários ao proposto, é porque estes não foram bem
aplicados. Nesse caso, limita-se a ação do professor, a escola não é vista como espaço de produção
cultural, e os que estão na base não são considerados na sua elaboração. Ou seja, ordens que vêm
de fora do seu contexto sociocultural devem ser seguidas por determinações superiores.
Para a autora, o currículo é mais do que um espaço em que as culturas lutam por legitimidade, é
um espaço de negociações de resistências e controle, uma prática cultural. Ao afirmar esse ponto de
vista, a autora critica os trabalhos que procuram “incluir” ou “distinguir” o modo como as diferentes
culturas estão ou não presentes no currículo.
Deste modo, a construção de referenciais curriculares para a EJA deve considerar a heterogenei-
dade e as especificidades dos sujeitos como princípios norteadores do processo, como preconizado
no parecer CNE/CEB 11/2000. Mergulhar no universo específico desta modalidade de ensino e ana-
lisar suas particularidades e o que há de diferente nela é função primordial.

cUrrícUlo e ejA: UmA tomAdA de posição.


O fracasso e a ausência são ideias frequentemente associadas à EJA. Em sua grande maioria, as
políticas públicas não fomentam uma cultura de tratar da EJA especificamente, levando-se em conta
a provisoriedade, o imediatismo e a contenção dos gastos.
A falta de recursos e incessante busca por eles fazem com que em muitos momentos as institui-
ções modifiquem o foco de suas ações. Tais mudanças atingem diretamente os seus objetivos e o
público alvo, impactando diretamente o currículo desses espaços de ensino.
Desta forma, precisamos investir recursos financeiros e em um currículo que tenha como objetivo
criar “propostas pedagógicas específicas” para tal modalidade de ensino e que dialogue com a vida
do aluno e com todos os espaços que ele circula.
O currículo deve proporcionar que o aluno da EJA tenha a consciência de ser sujeito do seu tem-
po, comprometido com a transformação da sociedade e que respeite as singularidades/ diversida-
des dos sujeitos que compõem as turmas de EJA no Brasil, sendo estes princípios fundamentais para
uma educação de jovens e adultos de qualidade.
A negação da função de “suplência” a qual ainda é difundida em sua prática, é condição fun-
damental para que tal proposta se concretize. Nesse sentido, faz-se necessária discutir o conceito de
currículo para a modalidade em questão. Por isso, ao tratarmos especificamente da escolarização
básica, esta deve eliminar as “práticas aligeiradas de ensino” e aquelas que ainda preservam a lógica

186
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
do ensino supletivo.
No entanto, não se deve olhar a EJA como política momentânea, frágil, efêmera, como apenas
um projeto, mas como política pública de Estado, desnaturalizando, assim, a visão hegemônica da
EJA.
Outra questão importante é o fato de que as práticas dos professores devem ser desenvolvidas
com objetivo de construir ações de ruptura com a lógica de uma educação bancária, produzindo
práticas educativas emancipatórias para além da regulação curricular prescrita, constituindo uma
rede de saberes/fazeres e poderes, que se proponha ao diálogo e à participação coletiva.
Desta maneira, estabeleceremos uma política educacional organizada de forma colegiada e par-
ticipativa que dialogue com as práticas socioculturais, articulando escola, currículo formal e alunos.
Tenho interesse em pesquisar o currículo do ensino fundamental, a partir de uma proposta con-
creta de reformulação curricular da EJA em um município que está passando por inúmeras transfor-
mações socioeconômicas no estado do Rio de Janeiro. Contudo, vale ressaltar que a elaboração do
parecer CNE/CEB 11/2000 trouxe um avanço para esta modalidade de ensino. Com isso, as diretrizes
do parecer trouxeram a possibilidade dos municípios criarem seus documentos norteadores sem
estar à mercê do ensino regular.
Levando em consideração a especificidade do tema e dos poucos estudos nesta direção, esta
pesquisa encontra-se em fase inicial de desenvolvimento, sendo esta apresentação, portanto, ape-
nas uma reflexão das possíveis discussões que auxiliarão no aprofundamento da temática exposta.

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188
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
o fAcebooK como ponto de encontro e
AprendigAgem de conteúdos de geogrAfiA dA
edUcAção de joVens e AdUltos
frAnciscA joelinA xAVier | Aline rozenthAl de soUzA crUz
nAdjA rinelle oliVeirA de AlmeidA

As novas configurações do mundo globalizado e seu acelerado processo de modernização cien-


tífica e tecnológica vêm demandando novas formas de construção do conhecimento. Outras formas
de organizar e promover a educação com o uso de mídias e Tecnologias da Informação e Comuni-
cação (TIC’s) tem sido um desafio, sobretudo quando se tem como foco o ensino e o aprendizado
de jovens. O objetivo da pesquisa é apresentar a utilização do Facebook como estratégia didáti-
co-pedagógica, vislumbrando o processo de ensino-aprendizagem na disciplina de geografia na
Educação de Jovens e Adultos-EJA. A pesquisa participante de abordagem qualitativa foi mediada
pelo método circulo de cultura. Utilizou-se como instrumento de coleta de dados a observação
participante na sala de aula, diário de campo e os registros do facebook. A investigação foi realizada
na turma de EJA Fundamental do turno da manhã no primeiro semestre de 2014. Os sujeitos da
pesquisa são todos os alunos da turma e a professora da disciplina de geografia. A investigação esta
embasada em FREIRE (2005), BRANDÃO (2006), PAIS (2003), LEVY (1999) CASTELLS (2005) KENSKI
(2007) entre outros. Destacamos como resultados a criação do grupo GEOGRAFIA-EJA Fundamental
na rede social facebook; disponibilização e discussão dos conteúdos de geografia na pagina do
grupo, interação entre os participantes nas discussões via facebook; participação ativa dos (as) es-
tudantes nas discussões realizadas via grupo no facebook, evidencia o interesse dos (as) estudantes
pelo conteúdo de geografia nas aulas presenciais e nas interações via rede social. Neste aspecto
consideramos que a investigação aponta para a desconstrução da turma “indisciplinada” a partir da
introdução das culturas juvenis nas aulas de geografia no espaço escolar; introdução de novas lin-
guagens, novas formas de sociabilidade e interação entre alunos e docente e introdução de mídias
e TIC’s enquanto estratégia didático - pedagógica na ambiência escolar.

palavras-chave: Educação de Jovens e Adultos;, Ensino de Geografia;, Tecnologia;

introdUção
As novas configurações do mundo globalizado e seu acelerado processo de modernização cien-
tífica e tecnológica vêm demandando novas formas de construção do conhecimento. Outras formas
de organizar e promover a educação com o uso de mídias e Tecnologias da Informação e Comuni-
cação (TIC’s) tem sido um desafio, sobretudo quando se tem como foco o ensino e o aprendizado
de jovens.
No Brasil, a introdução do uso das tecnologias na educação deu-se a partir da utilização do rádio,
no final dos anos de 1930, com o objetivo de desenvolver educação à distância. Destacam-se as ex-
periências do Instituto Rádio-Monitor, em 1939; o Instituto Universal Brasileiro, em 1941; as “Escolas
Radiofônicas” do Movimento de Educação de Base (MEB), que visava alfabetizar e apoiar a educação
de jovens e adultos, principalmente nas regiões Norte e Nordeste do País; e, o Projeto Minerva vei-
culado pela rádio MEC no final dos anos 60.
A televisão e a Internet se mostraram nos últimos anos, como veículos importantes de promoção
da educação no Brasil. Essas transformações criam uma nova sociabilidade contemporânea, e a es-
cola, por sua vez, não pode perder de vista a preparação do aluno para que ele possa compreender

189
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
todo este fenômeno da comunicação e seu uso.
Sales (2010), em estudos recentes sobre juventude e internet realizada em escolas públicas do
campo e da cidade no estado do Ceará, aponta esta como elemento importante para promover o
acesso às Tecnologias de Informação e Comunicação, particularmente às novas tecnologias, como
computador e internet.
A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - PNAD 2011, ao abordar sobre o uso das TIC’s no
Brasil, traz informações importantes sobre o acesso ao computador e a internet. Os dados apontam
um crescimento do número de microcomputadores domiciliares, passando de 14,6%, em 2005, para
39,4%, em 2011. Concomitantemente, houve um aumento também, no número de domicílios com
acesso à Internet. Mas, sem dúvida, a estatística mais notável dessa pesquisa se relaciona diretamen-
te com o crescimento da classe média no Brasil nos últimos anos. Isso se comprova ao compararmos
os dados de 2005 e 2011, que evidenciam uma redução na porcentagem de estudantes de escola
pública, associada a um aumento de alunos que tem acesso a Internet (MINISTÉRIO DO PLANEJA-
MENTO, ORÇAMENTO E GESTÃO/IBGE, 2013).
Para Sales (2010), o uso da internet gera novas oportunidades, modifica o modo de agir, o com-
portamento e a comunicação, torna-se, portanto, ferramenta tecnológica importante para interati-
vidade e sociabilidade dos jovens.
Nesta perspectiva acredita-se que o uso das TIC’s na educação é uma possibilidade a mais para
gerar atração, sobretudo para os jovens as utilizam, com grande frequência, a internet com o intuito
de facilitar e tornar mais agradáveis a aquisição de conhecimento.
Segundo Almeida (2003), na comunicação mediada pelos computadores, a interatividade se refe-
re à condição do sujeito, isto é, quando este ultrapassa o papel de expectador passivo para operati-
vo. A interatividade é uma ação dialógica entre o homem e a técnica (LEMOS, 1997).
As TIC’s constituem-se em ferramentas pedagógicas que podem ser colocadas a serviço do indi-
víduo, quando este se propõe a utilizá-las como recursos para sua capacitação. É nesse campo que
as redes sociais adentram o espaço escolar. O acesso a esse meio de comunicação se constitui, não
somente como uma forma de inclusão digital, mas, sobretudo como uma maneira do jovem se inse-
rir na sociedade e ser capaz de criar uma ressignificação social para a sua existência, desde que seja
analisado sob o ponto de vista deum mundo globalizado e informacional.
Assim, a escola tem como papel fundamental compreender e estimular a introdução do uso de
TIC’s ou de redes sociais nas demandas didático-pedagógicas enquanto estratégias que promovam
o conhecimento pra além do espaço da sala de aula.

o sUjeito joVem
Da antiguidade até os tempos atuais, em cada tempo e lugar, a humanidade instituiu o seu signi-
ficado de juventude. São acepções que se juntaram a outros significados, reformulando-se e incor-
porando-se à mente dos sujeitos sociais de cada geração (PEREIRA, 2006, p. 36).
Não é possível encontrar uma única definição de juventude em cada época histórica, pois a “ju-
ventude é ritmada pela sucessão de uma série de ritos de saída e entrada que dão a imagem de um
processo de consolidação de etapas, o qual vai garantindo uma progressiva definição dos papéis da
idade adulta” (LEVI e SCHMITT, 1996).
De um contexto a outro, de uma época a outra, os jovens desenvolvem funções e logram seu
estatuto definidor de fontes diferentes: sob tal ponto de vista, o século XII europeu apresenta, por
exemplo, analogias significativas com os países do Terceiro Mundo de hoje, em que mais da meta-
de dos habitantes têm menos de vinte anos, o que impõe à sociedade um dinamismo e um “estilo”
incomparáveis com os das sociedades feudais, que envelhecem ostensivamente (LEVI e SCHMITT,

190
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
1996).
Portanto, falar de juventude implica dialogarmos não somente com a história social clássica, mas
acima de tudo, conectarmos esse contexto com o presente, identificando essa época da vida como
um período carregado de significações, diversidades e pluralidades. Embora,

ainda seja pequena a incidência dos estudos dedicados a perceber como os jo-
vens vivem e elaboram suas situações de vida. Só recentemente vem ganhando cer-
to volume o número de estudos voltados para a consideração dos próprios jovens e
suas experiências, suas percepções, formas de sociabilidade e atuação (CARRANO,
2003, p. 129).

De fato, não há como pensar a juventude de maneira linear, reducionista. Tampouco desconsi-
derar as novas realidades que os jovens vivenciam a partir dos novos cenários da atualidade, que
oferece uma sociedade complexa, múltipla, onde as possibilidades estão relacionadas com mudan-
ças rápidas, em permanente significação e (re) significação. Nesta perspectiva é possível perceber os
jovens como sujeitos de novos tempos.

o percUrso qUe se fez Ao cAminhAr: dA criAção do grUpo geogrA-


fiA - ejA fUndAmentAl no fAcebooK Aos seUs desdobrAmentos
Nos últimos anos a tecnologia digital tem proporcionado transformações nos meios de comuni-
cação que possibilitam mudanças no âmbito cultural, social, econômico e político, numa dinâmica
que oportuniza nova sociabilidade contemporânea e arranjos afetivos.
A rápida troca de informações e relações ocorridas cotidianamente por meio da Internet eviden-
cia o papel desta na vida das pessoas, especialmente dos jovens. A rede penetra diferentes campos
da vida social, interfere e modifica experiências que envolvem corpo, atitudes, valores, comporta-
mentos, ideias, pensamento e sociabilidade (SALES, 2010).
Reconhecendo esse atual contexto de inclusão tecnológica nos espaços pedagógicos e o papel
relevante da juventude nesse processo, visualizou-se a importância de incorporar novas práticas de
construção do conhecimento, no caso, os conteúdos pertencentes à ciência geográfica.
Entender as culturas juvenis e as novas formas de sociabilidade dos estudantes no mundo glo-
balizado se configura como uma estratégia de interatividade, bem como uma forma de inovar na
dialética ensino-aprendizagem para além das paredes da sala de aula. A criação do grupo Geogra-
fia- EJA Fundamental na rede social Facebook deu-se justamente nesse ínterim. Todos os estudantes
tinham acesso à Internet e também possuíam uma conta na referida rede social, o que possibilitou
a realização desse projeto.
A pesquisa participante de abordagem qualitativa foi mediada pelo método círculo de cultura,
que visa à participação dos sujeitos na análise e mudança de sua realidade. Esse método permitiu
visualizar o sujeito de forma subjetiva, favorecendo a compreensão dos fatores intrínsecos ao mes-
mo, tanto em seu ambiente social, quanto em seu modo de vida em geral (BRUGGEMANN, 2008).
O relato de experiência em questão deu-se em uma escola privada localizada na cidade de Nite-
rói, Rio de Janeiro. Optou-se por preservar o anonimato da mesma por questões éticas. A investiga-
ção foi realizada na turma de EJA- Fundamental, do turno da manhã, durante o primeiro semestre
de 2014. Os sujeitos envolvidos na pesquisa são os alunos e a professora da disciplina de Geografia.
Para as conclusões do estudo, utilizou-se como instrumento de coleta de dados a observação parti-
cipante na sala de aula e os registros do Facebook.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
os círcUlos de cUltUrAs e As AUlAs de geogrAfiA
Para se entender a escolha pelo método didático de ensino Círculo de Culturas, deve-se primeira-
mente compreender o perfil dos alunos da turma de EJA-Fundamental, bem como compreender os
fatores históricos e sociais que os levaram a optar pelo ensino na sua forma condensada.
Os estudantes possuem em média entre 15 e 20 anos, e em nenhum momento de sua trajetória
escolar tiveram o seu direito ao estudo negado, tendo sido, na maior parte das vezes, uma escolha
pessoal se afastar do ensino regular. Assim, os sujeitos pesquisados viram no EJA, uma possibilidade
de se reinserirem no mundo competitivo, de maneira mais rápida. Mas, diante desses fatores cabe
ressaltar que, independentemente dos problemas pessoais que esses atravessaram, a educação re-
gular se mostrou incapaz de mantê-los.
Mesmo com a popularização da EJA por todo o país, principalmente a partir dos anos 90, esse
segmento da educação básica ainda carrega consigo um forte estigma social, no qual muitos julgam
os alunos dessa modalidade, como sendo incapazes, por exemplo, de adentrar ao ensino superior.
Fato esse que acaba por provocar nos alunos um sentimento de revolta.
Entretanto, um bom professor é capaz de estimular positivamente os educandos, conseguindo
resultados satisfatórios no aprendizado geral, mas sobremaneira, despertando interesse pelo estu-
do no aluno. O educador é capaz, não só de ensinar a sua matéria, mas formar cidadãos pensantes,
ao estimular o desenvolvimento do espírito crítico e posicionamento político dos alunos. E, a ciência
geográfica se mostra como uma disciplina que possibilita isso, pois se propõe a depreender a reali-
dade.
A partir do momento em que o aluno reconhece a sua realidade em sala de aula, ou seja, percebe
que o seu cotidiano pode dialogar com o saber teórico, cria-se um laço de identificação e afinida-
de. Um dos vieses que podem ser utilizados pelo educador para inserir o cotidiano no processo de
ensino-aprendizagem são as Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC’s), com destaque para
as redes sociais. Essas no decorrer dos anos, tem se firmado enquanto ferramentas relevantes de
aprendizagem que conduzem à expansão das oportunidades de combinação de recursos tecnoló-
gicos e humanos.
A inserção do cotidiano na didática pedagógica se faz fundamental para o aluno se reconhe-
cer enquanto sujeito-ativo na sociedade real. E, somente após isso, se introduz o método freiriano
Círculo de Cultura, que possibilita aos envolvidos a construção de um conhecimento, o qual alie o
saber teórico com a sua vivência. Para tanto, propôs-se debates em sala de aula com temáticas que
instigassem o estudante e ao mesmo tempo fossem essenciais para a sua formação cidadã. Dentre
os exemplos, pode-se citar a Copa do Mundo, as Jornadas de Junho e a atuação das UPP’s (Unidades
de Polícia Pacificadora) na cidade do Rio de Janeiro. Essa dinâmica fica mais bem compreendida no
trecho a seguir extraído do livro “Educação como prática da Liberdade” (1983), de autoria de Paulo
Freire, criador da chamada Pedagogia Libertária.

Em lugar de escola, que nos parece um conceito, entre nós, demasiado carregado
de passividade, em face de nossa própria formação (mesmo quando se lhe dá o atri-
buto de ativa), contradizendo a dinâmica fase de transição, lançamos o Círculo de
Cultura. Em lugar do professor, com tradições fortemente doadoras, o Coordenador
de Debates. Em lugar de aula discursiva, o diálogo. Em lugar de aluno, com tradições
passivas, o participante de grupo. Em lugar dos pontos e de programas alienados,
programação compacta, reduzida e codificada em unidades de aprendizado (Freire,
1983:103).

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
considerAções
A busca por práticas pedagógicas que não se restrinjam a utilização do livro didático se mostram
fundamentais no processo de ensino-aprendizagem atualmente. A associação do conhecimento
cotidiano, utilizando, por exemplo, as redes sociais, com os saberes teóricos.
O Facebook se mostrou como uma importante ferramenta nas práticas pedagógicas, principal-
mente ao reforçar que o processo educacional não se restringe à sala de aula, bem como evidenciou
que as informações contidas na rede estão constantemente entrelaçadas com as práticas escolares.
Entretanto, deve-se salientar que esse trabalho se trata basicamente de um relato de experiência
em um dado colégio, cabendo a cada professor identificar qual a melhor maneira de agir no seu
contexto escolar.

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193
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
os sAberes qUe orientAm A AtUAção dos (As)
edUcAdores (As) de ejA: dA práticA nA teoriA A teoriA
nA práticA
mAriA lUizA ferreirA dUqUes

Pensar sobre os saberes necessários à prática pedagógica em EJA significa reconhecer que tais
saberes podem contribuir tanto para a construção de uma identidade profissional, quanto para a
libertação social dos educandos. Nesse contexto, a prática docente é um espaço de formação e pro-
dução de saberes. Em sua relação com a prática e com as exigências reais da profissão, o docente
continuamente produz saberes específicos, conhecimentos sistematizados e também não sistema-
tizados, que, relacionados a outras formas de conhecer, integram e legitimam a identidade do pro-
fessor, constituindo-se fatores de suma relevância nas práticas educativas. Este estudo que se fun-
damentou essencialmente em Freire (1996, 2005), Pimenta (1999) e Tardif (2002), teve o objetivo de
conhecer os saberes que orientam a prática docente dos(as) educadores(as) da EJA do município de
Matina-BA, para identificar as influências desses saberes no exercício da profissão. A investigação se
pautou na abordagem qualitativa através do estudo de caso. Para coleta de dados lançamos mão da
entrevista semiestruturada e da observação com registro em diário. Os dados revelaram que, há, no
trabalho dos docentes de EJA, uma junção de teoria com empiria e a produção de saberes é condi-
cionada pelo contexto onde os professores estão inseridos, bem como pela experiência acumulada.
A dimensão político pedagógica adotada se configura na base da educação freireana. A formação
recebida pelos(as) educadores(as) pautou-se em um processo lacunar, o que por vezes, implica em
deficiência quanto a produção de saberes sistematizados. Contudo, os docentes conseguem pro-
duzir saberes e fazeres plurais e baseados não apenas na experiência individual, por vezes limitada,
mas acima de tudo, na construção coletiva.

palavras-chave: Saberes., Práticas docentes, Educadores (as) de EJA

introdUção
A atuação docente constitui-se uma construção histórica e social, cuja configuração é entrecru-
zada por interesses e perspectivas de cunho político, ideológico, econômico e cultural, por vezes
conflitantes. Na contemporaneidade, a proliferação das políticas neoliberais, a reestruturação dos
meios de produção e os processos de globalização crescentes, têm cobrado da escola uma atuação
que se paute na perspectiva de formação de sujeitos com condições de assunção de distintas tarefas
e com capacidades bem delimitadas para o mundo atual.
Agregadas a essas exigências dos novos tempos, estão todas as demais que são presenças no
cotidiano escolar e que a escola, no desempenho de sua função social, não pode se furtar em aten-
der: os problemas socioeconômicos. Mediante o agravamento das questões de ordem sociais e eco-
nômicas, o professor se vê obrigado a atuar na perspectiva de acolhimento, ajuda e libertação dos
alunos, buscando incutir neles a capacidade de olhar crítico, de enfrentamento e de autoafirmação
enquanto sujeitos sociais.
A prática docente nesse contexto se configura como um espaço de formação e produção de
saberes. Em sua relação com a prática e com as exigências reais da profissão, o docente continua-
mente produz saberes específicos, conhecimentos sistematizados e também não sistematizados,
que, relacionados a outras formas de conhecer, integram e legitimam a identidade do professor,

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
constituindo-se fatores de suma relevância nas práticas educativas. Nessa tentativa de estabelecer
as primeiras aproximações com nosso intento investigativo, encontramos em Tardif (2002, p.36),
uma forma de dar sequência a nossa procura pelos saberes que constroem a prática. Para este autor,
o saber constitui numa “amálgama, mais ou menos coerente, de saberes oriundos da formação pro-
fissional, dos saberes das disciplinas, dos currículos e da experiência”. Nessa mesma linha discursiva,
o objetivo desta investigação repousa sobre conhecer os saberes que orientam a prática docente
dos professores da EJA do município de Matina-BA43, identificando as influências desses saberes no
exercício da profissão.
A partir do entendimento de que o professor de EJA tem um papel primordial a desempenhar na
educação, competem aqui algumas perguntas, sendo uma delas de caráter mais amplo: que saberes
devem ser aprendidos pelos educadores de EJA em seu processo de formação? E a outra, de caráter
mais específico: que saberes orientam a prática docente dos professores de EJA do município de
Matina? São perguntas que orientam a discussão sobre o saber docente e suas implicações na prá-
tica educativa dos professores da EJA.
Buscando respostas às interrogações levantadas, partimos para o percurso metodológico. Este
estudo se fundamenta nos pressupostos da pesquisa qualitativa por entender, conforme Bogdan e
Biklen (1994, p.49), que “a abordagem qualitativa exige que o mundo seja examinado com a ideia
de que nada é trivial, que tudo tem potencial para construir uma pista que nos permita estabelecer
uma compreensão mais esclarecedora do nosso objeto de estudo”.
Para realizar esta investigação, nos apoiamos no estudo de caso que, na posição de Yin (2001),
representa uma investigação empírica e compreende um método abrangente, com a lógica do pla-
nejamento, da coleta e da análise de dados. Os sujeitos envolvidos consistiram em educadores de
três escolas do município de Matina-BA que ofertam a modalidade de EJA. Para isso, fizemos uso da
observação com registro em diário e entrevistas semiestruturadas.
Após este momento introdutório em que fazemos um breve panorama do estudo, partimos para
o percurso que se desenvolve em momentos complementares: relacionando os estudos teóricos
com os dados emanados do campo, discutimos os saberes que orientam a prática educativa em EJA
no tópico que se segue e, logo após, tratamos dos fazeres pedagógicos dos professores. Por fim,
trazemos os resultados e considerações, não como fechamento definitivo, posto que somos inaca-
bados, mas como ponto de chegada e de partida para novas reflexões.

1. sAberes: dAs experiênciAs de escolArizAção à constrUção dA


práticA docente
Os saberes docentes têm sido foco de discussão por muitos autores, tanto no âmbito nacional,
como as contribuições de Freire (1996), Pimenta (1999), dentre outros, quanto internacional, como
é o caso de Tardif, Lessard (1991), Gauthier (1996), que mostram a relevância dos saberes para a for-
mação, prática docente e desenvolvimento dos professores. Freire (1996) presta uma valiosa contri-
buição ao elencar em sua pedagogia da autonomia, os saberes necessários à ação educativa.
O saber do professor no exercício de sua profissão se constitui por várias matizes, pois, em suas
ações pedagógicas cotidianas, os docentes lançam mão do planejamento, adotam metodologias,
preparam as tarefas para os discentes, administram a sala de aula, instituem mecanismos de avalia-
ção. Com isso e por isso, é importante que os professores recorram a diversos ‘saberes’ necessários à
consecução da prática. A esse respeito, Tardif (1996, p. 11), pontua que “o saber docente é um saber
composto de vários saberes oriundos de fontes diferentes e produzidos em contextos institucionais
e profissionais variados”. Esses saberes não limitam-se ao ambiente escolar, mas ampliam-se para ou-
43 Matina, localiza-se na Região Centro Sul Baiano, na micro região de Guanambi, a aproximadamente 810 km da capital Sal-
vador. Sua população é de11.145 habitantes. Sua economia é baseada na agricultura e pecuária. Possui 08 escolas municipais e 01
estadual.

195
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
tros espaços extra-escolares. As influências religiosas, familiares, midiáticas, dos movimentos sociais
e outros, completam o saber docente.
Para tentar colocar em evidência esses e outros saberes que norteiam a atividade pedagógica na
EJA é que propomos um diálogo sobre as origens dos saberes aplicados cotidianamente. Tomando
como princípio a ideia de que esses se ampliam constantemente e que novas formas de pensar e
ver o conhecimento são construídas a cada instante, tem-se consciência do caráter limitado dessa
investigação.
No caso desta investigação, em função dos saberes da experiência terem sido os mais recorrentes
nas práticas docentes, abre-se uma rápida análise desses saberes, a fim mesmo de especificar duas
formas distintas de aparecimento dos mesmos, podendo ser, segundo Pimenta (1999), através das
experiências dos alunos e, através dos saberes da experiência, saberes produzidos pelos professores
no trabalho pedagógico cotidiano.
A atuação dos docentes, amparada em muitos aspectos por saberes da experiência, mostrou-se
centrada no ser humano como ser gnosiológico, que como aponta Freire (2005), se sabe inacabado
e por isso busca o conhecimento. A constatação de que educador e educando atuam como sujeitos
cognoscentes, mediatizados pelo mundo, demonstrou que a postura assumida pela maioria dos
educadores se baseia nos princípios freireanos, na perspectiva de valorização do conhecimento do
aluno e do saber popular.
Os saberes necessários à prática educativa são re-significados e produzidos pelos professores
“em confronto com suas experiências práticas, cotidianamente vivenciadas nos contextos escola-
res” (PIMENTA, 1999, p. 29) e, mediante esse movimento interativo instaura-se um processo coletivo
mediatizado pela troca de experiências. É daí que deve surgir, entre os professores, as reflexões na
prática e sobre a prática, para assim constituir os saberes do ensino.
Com isso, através do confronto com práticas diferenciadas, percebeu-se que a atuação docente
destina grande crédito às construções coletivas e os saberes produzidos socialmente. A esse con-
fronto agrega-se a personalidade profissional de cada um, como confirma Tardif (2002, p.11),

[...] o saber dos professores é o saber deles e está relacionado com a pessoa e a
identidade deles, com a sua experiência de vida e com a sua história profissional,
com as suas relações com os alunos em sala de aula e com os outros atores escolares
na escola, etc. [...] um professor nunca define sozinho e em si mesmo o seu próprio
saber profissional.

Ao relacionar saberes docentes com identidade e experiências, Tardif (2002), abre espaço para
outra discussão necessária – a tessitura familiar e a relação desta com a construção dos saberes do-
centes. Na tentativa de investigar mais a fundo a origem dos conhecimentos que mais interferem
na prática docente, foram mantidos diálogos sobre os princípios, valores, conhecimentos – fatores
estruturantes do convívio familiar - e sua influência na configuração da conduta pedagógica.
A dimensão familiar aparece como via de mão dupla para a construção das experiências edu-
cativas. Ao destacar a importância dos princípios norteadores do convívio familiar na construção do
perfil profissional, o professor A44 lembrou que essa troca é mútua e que também a prática profissio-
nal pode contribuir com a formação de condutas familiares. “Tem coisa que a agente pega da escola
e leva para a família e, dos filhos, as experiências que deram certo, a gente traz e compartilha com os
colegas também”.
Embora os relatos tenham evidenciado notória relevância dos saberes da experiência nas
práticas cotidianas dos sujeitos em estudo, é necessário reconhecer que a maioria destas posturas
44 A fim de preservar a identidade dos informantes, os identificamos por letras.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
advém de teorias que vão se disseminado entre colegas de trabalho, amigos, companheiros. Verifi-
ca-se com isso, a urgência de práticas coletivas de formação continuada que deem conta de discutir
a origem de tais saberes, conferir-lhes validade, significados, objetivos e propostas contextualizadas
de aplicação.
A construção dos saberes deve se entrelaçar a um movimento perene de formação. Os saberes
abarcados durante a formação inicial (saberes das disciplinas e saberes da formação), serão a base
primeira de onde nascerão as reformulações. Mediante o estabelecimento de contato com os sabe-
res oriundos dos primeiros processos formativos, o professor irá se reconstruindo e se reinventando
no cotidiano da sala de aula mediante os saberes curriculares, pedagógicos, do conhecimento, da
experiência e de todos os outros saberes científicos da formação continuada e do desenvolvimento
profissional.
Saber lidar com o processo formativo dos alunos de EJA em suas várias dimensões: (cognitiva,
psicológica, afetiva, ética e dos valores universais) constitui habilidade a ser construída durante o
processo de formação contínua do docente. Essa formação possibilita também o avanço a outras
formas de atuação, que incentiva o trabalho coletivo e interdisciplinar, rompendo com a fragmenta-
ção do saber e motivando a participação ativa nos processos decisórios da escola como a constru-
ção do Projeto Político Pedagógico. Esses processos coletivos devem reforçar a solidariedade com
os colegas e com os alunos, conferindo significado social às práticas e contribuindo para a emanci-
pação social dos sujeitos.
Esses saberes tão necessários à prática docente contemporânea devem ser construídos coletiva-
mente utilizando-se os espaços e tempos a que a escola dispõe e as condições a ela oferecidas pelas
suas entidades mantenedoras. Verificou-se que os profissionais passam por processos de desestru-
turação do status consolidado, admitindo a necessidade de atualização e maiores oportunidades de
estudo para confrontar teorias e práticas que venham a dinamizar o seu trabalho em EJA.
As discussões expostas no decurso do trabalho evidenciam o precário cenário sobre o qual se
apresenta a formação continuada dos docentes e que também se configura como realidade de
muitas das instituições de Ensino Público no Brasil. A incipiência de políticas públicas formativas
voltadas para EJA foi aventada, pelos próprios educadores (as) como um grande empecilho para a
qualidade da educação ofertada na modalidade. De acordo Dantas (2010, p. 128), “é de suma impor-
tância assegurar uma política de formação de educadores de jovens e adultos visando atender às
demandas do sistema de ensino, sobretudo do sistema público, tanto na esfera estadual quanto na
municipal”. Cabe aos gestores da educação, e no caso deste estudo, aos gestores do município em
análise, zelar pelo cumprimento das leis que garantem os direitos da categoria.
Tendo adentrado na constituição dos saberes dos docentes em estudo, observou-se que mui-
tas são as interfaces que ajudam a construir o fazer pedagógico cotidiano. Esta multiplicidade de
fatores tornam a prática educativa complexa e merecedora de análises e reflexões, não apenas de
sujeitos externos ao processo, mas principalmente, por parte dos atores diretamente envolvidos,
num permanente exercício de re(construção) dos saberes e, por consequência, de re (significação)
da prática pedagógica. É exatamente sobre as implicações que esses saberes trazem para a atuação
na docência em EJA que apresenta-se o tópico subsequente.

o fAzer pedAgógico dos (As) edUcAdores (As): do texto Ao contex-


to
No entendimento do fazer pedagógico do professor, procura-se saber como esse profissional
integra seus saberes às suas práticas, como os (re) produzem e os re-significam no âmago do seu
trabalho educativo.
Ainda que a prática seja afetada por condições e fatores que transcendem a vontade do profes-

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
sor, não há como negar que ele é sujeito ativo, agente das decisões sobre suas práticas, inclusive
influenciando a organização dos conteúdos e a maneira como os conhecimentos são distribuídos
na sociedade (CUNHA, 1992).
A capacidade do professor refletir sobre sua prática nos momentos de buscas de caminhos que
melhor direcionem o trabalho pedagógico, desencadeia um movimento de trabalho coletivo que é
pensado e operacionalizado no município. Durante as trocas estabelecidas pelos educadores, eles
acabam atribuindo e buscando sentidos para a atuação.
A reflexão sobre a prática, numa perspectiva coletiva, reforça a necessidade do educador desen-
volver a capacidade de trabalhar em grupo, para a partir das interações grupais, construir sua ação
individual.
No limiar da prática e da formação como exigência para melhoria da atuação, a ideia de tentar
compreender a formação e a prática dos professores nos colocou numa espécie de encruzilhada já
que, de um lado, todos os entrevistados, de modo mais estreito, e observados, de modo mais geral,
apresentam formação superior, de outro, essas formações passam por uma multidimensionalidade
de significados e condições, não sendo necessariamente tomadas como garantia de práticas efe-
tivas. Revela-se ai a necessidade de entender os vários fios que tecem a complexidade do ser pro-
fessor, e como tudo isso interage no seu fazer cotidiano, construindo o tecido de sua existência na
docência.
No contexto do fazer pedagógico, evidenciou-se que os professores são vítimas de um proces-
so de aprendizagem com lacunas, o que desencadeia algumas implicações na sua prática em EJA.
Grande parte dos professores recebeu formação em classes multisseriadas e passaram por sistemas
de castigos físicos e emocionais. O estudo revelou estarem ainda, os professores, a procura de suas
identidades e, ao rememorarem as ocorrências do seu passado enquanto estudantes, em certos
pontos se percebem reproduzindo as práticas pelas quais lhes submeteram durante a trajetória de
formação. Arroyo (2008, p. 17), assevera que “guardamos em nós o mestre que tantos foram”, repeti-
mos traços do mesmo ofício, como todo mestre repete saberes e fazeres de sua maestria.
Percebemos que a atuação incorpora perícia e saberes aprendidos pelos educadores ao longo de
sua formação, e dar sequência ao trabalho docente significa dar vazão a esses saberes em constante
transformação e buscar artifícios para pô-los em prática em estreita associação com o mundo social.
O profissional da educação, antes de ser professor, é um ser humano que possui sua especificida-
de e, por isso, sofre influência de suas relações sociais. Sua atuação docente depende, pois, do con-
texto histórico, cultural e social em que ele vive. Sobre esse assunto, a pesquisa revela que as práticas
docentes que permeiam o município de Matina-BA, carrega em suas bases, traços do contexto em
que professores e alunos se inserem. O ser humano como ser histórico e cultural, tanto herda quanto
recebe do contexto social que cria e recria, logo, é um ser “que para ser tem de estar sendo” (FREIRE,
2001, p. 34) e que não poderia ser puramente individual sem ser marcado pelo social.
A trajetória do educador carrega marcas significativas do contexto no qual ele atua e dos aportes
teóricos que o orientam, desse modo, para compreender as posturas e práticas adotadas nas classes
da EJA, faz-se preciso, identificar no seu percurso, os saberes, os valores, as crenças que se solidifica-
ram e que serviram de guia para a sua prática educativa. É por esse viés dos muitos outros presentes
em nós que Boff (2002, p.09) relata que “para entender como alguém lê, é necessário saber como são
seus olhos e qual é a sua visão de mundo [...] a cabeça pensa a partir de onde os pés pisam”.
Mediante o olhar do lugar em que os professores pisam e constroem seus fazeres e estabelecen-
do as necessárias correlações com o universo investigativo, pode-se dizer que para que uma prática
seja educativa é preciso, como nos ensina Freire (1996), a presença de sujeito que, ensinando, apren-
de e, aprendendo ensina (educador e educando). Além disso, são necessários objetivos mediatos e
imediatos a que se destina ou se orienta a prática educativa, oriundos da necessidade de ir além de
seu momento atuante, e por fim, é preciso haver clareza quanto aos métodos, processos e materiais

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
didáticos que devem estar em consonância com os objetivos propostos.
Segundo Tardif (2002, p. 36), a associação dos professores com os fazeres e saberes “não se reduz
a uma função de transmissão dos conhecimentos já construídos”. No exercício da ação docente, o
professor integra distintos saberes sobre os quais estabelece relações também diversas. Os saberes
profissionais, devem ser pois, saberes da ação. Essa premissa reforça a ideia de que os saberes pro-
fissionais são criados e recriados no contexto da própria atuação.

3. resUltAdos e considerAções
Os dados produzidos durante o processo investigativo serão aqui apresentados estabelecendo
uma estreita relação com os objetivos propostos. A inquietação primeira da pesquisa recaiu sobre os
saberes que orientam a prática docente dos professores da EJA do município de Matina-BA. Median-
te essa premissa, o estudo desdobrou-se em descobertas que revelaram o fazer pedagógico, ele-
mento importante e necessário de ser discutido com a mesma ênfase dada à discussão dos saberes.
No contexto de educação evidenciada pelos educadores de EJA do município percebe-se que há
uma junção de um pouco de teoria com empiria, objetividade com subjetividade, saber sistematiza-
do com saberes populares advindos da experiência que dialogam no desenho do processo educati-
vo. Mediante o convívio constante com os sujeitos sociais que a escola se abre a receber, os docentes
constroem suas metodologias e ações pautadas, muitas vezes, nos dados da realidade social trazida
pelos estudantes de EJA.
Aliado aos saberes da experiência, deve-se primar por outros saberes igualmente relevantes que
vem da teoria, da sistematização e formalização do conhecimento. Constatamos, que a maioria dos
educadores possuem uma limitada relação com a leitura, o que implica em certa deficiência quanto
à produção de saberes sistematizados. Buscando uma justificativa possível para o pouco ou nenhum
hábito de leitura, alguns dos professores trouxeram à tona a sobrecarga de atividades pessoais e
profissionais, como empecilhos para ampliação do arcabouço teórico, mas mesmo com isso, reco-
nhecem que leem pouco e que necessitam alargar seu campo teórico-conceitual.
Dos aspectos evidenciados, e talvez como uma possível resposta a alguns percalços encontrados
na trajetória dos professores, está a formação. Evidenciamos que a formação dos professores se deu
num processo lacunar, o que ainda hoje, repercute na constituição dos seus saberes e fazeres.
Sem emitir um posicionamento fechado e conclusivo sobre o estudo, mas já fazendo algumas
inferências necessárias, constatamos não ser possível classificar rigidamente os saberes e fazeres
que referendam a prática educativa dos educadores da EJA, contudo, foi possível constatar que,
a dimensão político pedagógica adotada se configura na base da educação freireana. Através da
postura educativa horizontalizada defendida, evidencia-se além do caráter de humanização, um cui-
dado com a construção de conhecimentos sistematizados que rompam com as barreiras que impõe
saberes limítrofes, restritos e estáticos.
Os saberes e fazeres aqui ventilados apresentam-se como potencialidades para o trabalho do
educador de EJA, não só para a re-significação de práticas, como para construção de um vir a ser
novo e condizente com as necessárias mudanças sociais. Destarte, é imperioso que os saberes sis-
tematizados no dia a dia das salas de aulas sejam socializados entre os docentes a fim de viabilizar
a busca de referenciais que lhes possibilitem dialogar reflexivamente, construindo saberes e fazeres
plurais e baseados não apenas na experiência individual, por vezes limitada, mas acima de tudo, na
construção coletiva.

referênciAs
ARROYO, Miguel G. Ofício de mestre: imagens e auto-imagens. 10.ed. Petrópoles, RJ: Vozes, 2008.
BOFF, Leonardo. A Águia e a Galinha: Uma Metáfora da Condição Humana. Petrópolis, RJ: Vozes,

199
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
1997.
BOGDAN, Robert.; BIKLEN, Knopp Sari. Investigação qualitativa em educação: uma introdução à teo-
ria e aos métodos. Portugal: Porto, 1994.
CUNHA, Maria Isabel. O bom professor e sua prática. Campinas, Papirus, 1992.
DANTAS, Tânia Regina. Formação especializada em Educação de Jovens e Adultos e Identidade Pro-
fissional. In: NUNES, Eduardo José Fernandes. Saberes e patrimônio material e imaterial: uma aborda-
gem. Salvador: EDUNEB, 2010.
FREIRE, Paulo. Educação e Política: Ensaios. 5ed. São Paulo: Cortez, 2001.
______. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra,
1996.
______. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 2005.
TARDIF, Maurice. Saberes docentes e formação profissional. 2 ed. Petrópolis: Vozes, 2002.
YIN, R. Estudo de caso: planejamento e métodos. 2a ed. Porto Alegre: Bookman; 2001.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
os sUjeitos edUcAndos dA edUcAção de joVens e
AdUltos de cAriAcicA-es: desAfios e perspectiVAs
júlio de soUzA sAntos | tAtiAnA silVA mAchAdo de oliVeirA
jUliAnA rohsner ViAnnA

Este artigo integra as ações da Equipe de Educação de Jovens e Adultos (EJA) da Secretaria Mu-
nicipal de Educação (SEME) de Cariacica-ES, que tem atuado em parceria com profissionais de EJA
das escolas municipais, na perspectiva de implementação das Diretrizes Curriculares, bem como da
construção da formação continuada com educadores de jovens e adultos e da reestruturação da or-
ganização dessa modalidade neste município. Desse modo, o presente trabalho objetiva identificar
o perfil dos sujeitos educandos da EJA da rede municipal de Cariacica, por meio de uma abordagem
metodológica quali-quantitativa na tentativa de apreender a dinâmica da realidade, tendo como
referência principal, dados primários produzidos a partir de um diagnóstico preliminar realizado em
2014 pela Equipe da EJA e o Coletivo de profissionais da EJA deste município. Além disso, o texto
se ocupa de referências conceituais da educação de jovens e adultos e de estudos voltados para
a juventude, buscando fundamentar algumas reflexões sobre a inserção de sujeitos adolescentes
nesta modalidade. A pesquisa revelou as contradições existentes nas escolas de EJA, compostas
de forma geral por dois grupos que apresentam significativas diferenças: a) um grupo significati-
vo de adolescentes e jovens, remanejados recentemente do ensino regular e que, em sua grande
maioria, não está trabalhando; b) e um grupo composto predominantemente por adultos, que pos-
suem histórico de descontinuidade escolar e estão em sua maior parcela trabalhando, neste grupo
encontram-se idosos concentrados nas classes de alfabetização. A constatação dessa diversidade
na EJA requer políticas educacionais diferenciadas, de acordo com as particularidades, anseios e
necessidades desses sujeitos.

palavras-chave: EJA, Adolescentes, Juventudes, Diversidade

introdUção
Este estudo integra as ações da Equipe de Educação de Jovens e Adultos (EJA)45 da Secretaria
Municipal de Educação (SEME) de Cariacica-ES46 e tem como objetivo identificar o perfil dos sujeitos
educandos da EJA dessa rede municipal.
Dando continuidade às ações desenvolvidas anteriormente na rede municipal, a Equipe da EJA
tem atuado, neste ano de 2014, em parceria com profissionais47 da EJA das escolas municipais, na
perspectiva de implementação das Diretrizes Curriculares, bem como da construção da formação
continuada com educadores de jovens e adultos e da reestruturação da organização e funciona-
mento dessa modalidade neste município.
Nessa perspectiva, a Equipe da EJA em articulação com os profissionais dessa modalidade reali-
zou nos meses de março, abril e maio de 2014, um diagnóstico preliminar dos sujeitos educandos
das escolas municipais que ofertam a EJA, na intenção de subsidiar o trabalho pedagógico centrado
nos princípios da educação popular, conforme apontam as Diretrizes Curriculares desse município.
Nesse sentido, o texto se ocupa num primeiro momento com a problematização das concepções
da Educação de Jovens e Adultos na atualidade; e os enfoques teóricos voltados para a diversidade
45 Além do autor e das coautoras desse artigo, Antonieta Schimith, técnico da Educação de Jovens e Adultos da Secretaria
Municipal de Educação de Cariacica, também colaborou na construção do Diagnóstico.
46 Município que integra a Região Metropolitana da Grande Vitória, Estado do Espírito Santo.
47 Pedagogos, Professores e Coordenadores.

201
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
na EJA. Por fim, realizamos a abordagem do perfil dos sujeitos educandos.

1. As concepções e A diVersidAde nA edUcAção de joVens e AdUltos


Na perspectiva de abordagem do perfil dos sujeitos educandos, sentimos a necessidade de ex-
plorar inicialmente dois aspectos fundamentais nesta pesquisa: o primeiro refere-se às concepções
da Educação de Jovens e Adultos na atualidade; o segundo consiste na diversidade da EJA. Mais do
que responder ao rigor acadêmico-científico exigido nesse texto, essa aproximação com as concep-
ções da EJA tem se tornado uma demanda no trabalho de nossa equipe na Secretaria, diante dos
desafios na construção de uma EJA que atenda aos sujeitos de forma apropriada.

1.1 concepções AntAgônicAs dA edUcAção de joVens e AdUltos


Ao adentrar na literatura que trata sobre esse assunto, encontramos em Jane Paiva (2006) uma
contextualização histórica que sintetiza as concepções presentes e reproduzidas sobre EJA no con-
texto brasileiro:

Da visão ainda muito corrente de que a educação de jovens e adultos se faz para
recuperar o tempo perdido daqueles que não aprenderam a ler e a escrever; passan-
do
pelo resgate da dívida social; até chegar à concepção de direito à educação para
todos e do aprender por toda a vida, as enunciações variaram, deixando, no ima-
ginário social, a sua marca mais forte, ligada à volta à escola, para fazer, no tempo
presente, o que não foi feito no tempo da infância (PAIVA, 2006, p.3).

A primeira concepção, apontada por Paiva (2006), da Educação de Jovens e Adultos de caráter
compensatório e de suplência atrelada a outras concepções como a da idade certa ou própria, obje-
tiva preencher lacunas da escolarização perdida na infância ou na adolescência sem nenhuma pre-
ocupação com as demandas, anseios e necessidades formativas dos sujeitos jovens e adultos. Essa
concepção ainda continua presente e sendo reproduzida no meio político-educacional, por meios
de discursos e práticas que se voltam para a aceleração, construção de currículo mínimo, infantili-
zação, entre outras ações que configuram a EJA como uma espécie de arremedo do ensino regular.
A partir de nossas experiências com princípios e práticas da educação popular, passamos a com-
partilhar da concepção de direito à educação para todos e do aprender por toda a vida, ou seja, in-
dependente da idade, conforme destaca Paiva (2006). A identificação com essa concepção de “edu-
cação para todos ao longo da vida”, estabelecida a partir da V Conferência Internacional de Educação
de Adultos (CONFINTEA)48, tem fundamentado as nossas práticas no âmbito do sistema, inclusive no
que se refere às políticas educacionais voltadas para os sujeitos educandos dessa modalidade no
município.
Atrelada a essa concepção da EJA, não restrita à escolarização, compartilhamos também da ideia
de que os sujeitos não são apenas os educandos, mas também os educadores que atuam nessa mo-
dalidade, conforme destaca Oliveira (2004):

[...] Com suas histórias de vida, que reúnem marcas identitárias semelhantes e ao
mesmo tempo singulares, é como se esses sujeitos educandos e educadores compar-
tilhassem, na relação pedagógica, o encontro de diversas experiências: o encontro
da desigualdade de oportunidades; da negação do direito à educação e à formação;
48 Essa Conferência, realizada em 1997 na cidade de Hamburgo (Alemanha), foi promovida pela Organização das Nações Uni-
das para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO).

202
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
o encontro das jornadas duplas ou triplas de trabalho; o encontro do desemprego
ou do subemprego; das lutas na cidade e no campo por uma educação de qualida-
de; e, consequentemente, o encontro da luta pela afirmação do direito na busca de
construção de um projeto apropriado aos diferentes segmentos marginalizados a
quem a EJA se destina (p.1).

Ao reconhecermos essas marcas identitárias dos sujeitos educandos, semelhantes aos educado-
res, compreendemos que a EJA é uma educação que não se restringe aos espaços e tempos tradicio-
nalmente exercitados nos instituições escolares. Ela é caracterizada por constituir-se, especialmente
em uma relação íntima com o mundo do trabalho, com a cultura, com a sexualidade, com a religio-
sidade e com outras dimensões de formação dos adultos, dos idosos e das juventudes.

1.2 mArcAs sociocUltUrAis dos sUjeitos edUcAndos dA ejA


É imprescindível refletir, historicamente, quem são os sujeitos que adentram na EJA? O que bus-
cam retornando à escola? Quais os saberes que trazem? Diante dessas indagações, encontramos na
reflexão a seguir, possíveis caminhos no atendimento aos sujeitos dessa modalidade:

Pensar sujeitos da EJA é trabalhar com e na diversidade. A diversidade se cons-


titui das diferenças que distinguem os sujeitos uns dos outros – mulheres, homens,
crianças, adolescentes, jovens, adultos, idosos, pessoas com necessidades especiais,
indígenas, afrodescendentes, descendentes de portugueses e de outros europeus, de
asiáticos, entre outros. A diversidade que constitui a sociedade brasileira abrange
jeitos de ser, viver, pensar — que se enfrentam. Entre tensões, entre modos distintos
de construir identidades sociais e étnico-raciais e cidadania, os sujeitos da diversida-
de tentam dialogar entre si, ou pelo menos buscam negociar, a partir de suas dife-
renças, propostas políticas. Propostas que incluam a todos nas suas especificidades
sem, contudo, comprometer a coesão nacional, tampouco o direito garantido pela
Constituição de ser diferente (BRASIL, 2008, p. 1).

Ao refletir sobre a diversidade na EJA, precisamos levar em consideração as particularidades dos


sujeitos educandos dessa modalidade, sejam adultos, idosos, adolescentes ou jovens. Os sujeitos
adultos, geralmente, trabalhadores, apresentam tempos, motivações, anseios e dificuldades que se
diferenciam em relação aos demais sujeitos. Segundo Oliveira (1999), os adultos da EJA são, geral-
mente, os migrantes que chegam às metrópoles provenientes de áreas rurais empobrecidas, filhos
de trabalhadores rurais não qualificados e com baixo nível de instrução escolar (muito frequente-
mente analfabetos), eles próprios com uma passagem curta e não sistemática pela escola e traba-
lhando em ocupações urbanas não qualificadas, após experiência no trabalho rural na infância e na
adolescência, que buscam a escola tardiamente para alfabetizar-se.
Ao olhar para os idosos da EJA, precisamos levar em consideração que na sociedade atual existem
formas distintas de viver a velhice, de ser “velho”, pois essa terminologia independe da idade crono-
lógica, é uma questão de identidade, de como se vê dentro do processo de envelhecimento, nesse
sentido existe um modo de viver a velhice onde os sujeitos encarnam as limitações físicas, biológi-
cas, psicológicas, emocionais e afetivas de forma a intensificar e acelerar esse processo. Desse modo,
passam a incorporar sentimentos de abandono, depressão, exclusão, incapacidade, inutilidade e
carência, não tendo mais expectativas na vida. De acordo com Ecléa Bosi (1994):

[...] na velhice, a função da pessoa idosa na sociedade é a de lembrar, tornando-se

203
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
a memória viva da família, do grupo, da instituição, da sociedade e quando a socie-
dade a impede de exercer essa função de agente social pode promover um adoeci-
mento psíquico, resultando um contexto social perverso [...] (p.19).

O outro modo de viver a velhice que vem crescendo gradativamente nas últimas décadas é cons-
tituído por sujeitos totalmente ativos, ou seja, que não deixam que as limitações citadas anterior-
mente os impeçam de viver. Dessa forma, passam a minimizar os adoecimentos, na medida em
que se inserem em atividades esportivas e culturais, que se relacionam com outras gerações, que
retornam, mesmo depois de aposentados, ao mercado de trabalho, tendo assim como se sustentar
e muitas vezes colaborar com as despesas de casa, como também resolvem realizar o sonho de es-
tar em uma sala de aula. São sujeitos produtivos, críticos e que lutam para que sejam respeitados
os seus direitos. Portanto, há uma nova geração de idosos, que não se consideram velhos, mas sim
“jovens experientes”, que são independentes, que se permitem experienciar, que vivem no sentindo
mais amplo, em sua plenitude, a vida que possuem.
Ao nos voltarmos para o contexto da EJA, podemos perceber que os estudos vêm se constituindo
como uma prática significativa para esses sujeitos, visto que buscam a realização desse sonho nessa
etapa da vida, sendo que aprender nessa fase não é a mesma coisa que na juventude, mas existe o
aprendizado de outra forma, com outro ritmo e com outros interesses. Dessa forma, estar na escola
significa a oportunidade de aprimorar seus conhecimentos, aprender coisas novas, alargar seus rela-
cionamentos, melhorar a qualidade de vida, a autonomia, a autoestima e o resgate da sua identida-
de, pois ser velho é apenas uma fase diferente da vida, talvez a última, mas ainda há vida, e é isso que
deve ser respeitado, portanto, ser velho “[...] é lutar para continuar sendo homem [...]” (BOSI, 1994, p.
18). Nesse sentido, a educação para e com a velhice é aquela que valoriza as experiências vividas na
construção de identidades e da ocupação de papéis sociais ao longo da vida desses sujeitos.
Nessa nova forma de viver a velhice, esses idosos vivenciam essa fase da vida de forma diferente
da de seus pares ou daquela velhice de pouco tempo atrás, na qual a escola era um espaço onde
jamais poderiam pensar em estar. A escolarização está ligada à nova concepção que esses sujeitos
têm da velhice, dessa forma, buscam os direitos que foram negados desde a infância, portanto vol-
tar a estudar significa conquistar uma imagem de estudante que antes só pertencia à criança e ao
jovem. Ao explorar a concepção dos direitos, Bobbio (1992) afirma:

[...] que os direitos do homem, por mais fundamentais que sejam, são direitos
históricos, ou seja, nascidos em certas circunstâncias, caracterizadas por lutas em
defesa de novas liberdades contra velhos poderes, e nascidos de modo gradual, não
todos de uma vez e nem de uma vez por todas [...] (p.4).

Nesse sentido, o Parecer CNE/CEB 11/2000 destaca que a EJA é uma educação para todas as
idades, a partir do princípio da educação permanente. Sendo assim, o processo de alfabetização,
no sentido de ler e escrever com autonomia é um direito constitucional, que de acordo com Paiva
(2006), representa:

[...] ter domínio suficiente para em processo de aprendizado continuado, manter-


-se em condições de acompanhar a velocidade e a complexidade do mundo contem-
porâneo, que exige aprender continuadamente, por toda a vida, ante os avanços do
conhecimento e a permanente criação de códigos, linguagens, símbolos e de sua
recriação diária. Exige não só o domínio da linguagem escrita, mas também compe-
tência como leitor e escritor de seu próprio texto, de sua história, de sua passagem
pelo mundo. Exige reinventar os modos de sobreviver, transformando o mundo [...]

204
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
(p.3).

Apesar de terem consciência de suas limitações e do tempo diminuído em função da idade, os


adultos e idosos têm procurado viver suas vidas sem deixar que isso seja uma barreira para a reali-
zação de seus projetos. E estar na escola é um deles. Ser educandos da EJA, carregando as marcas
da exclusão precoce que sofreram na escola regular, é motivo de orgulho, resgate e alegria. Não é
recuperar o tempo perdido e voltar a ser jovens. É experimentar a escola, como estudantes, nessa
fase da vida, considerando as renúncias e os abandonos do passado, superando as dificuldades e os
preconceitos.
Nessa reflexão sobre a diversidade na EJA, precisamos considerar que essa modalidade tem re-
cebido recentemente uma parcela maior de adolescentes e jovens, oriundos, principalmente, do
ensino regular, num processo denominado de juvenilização da Educação de Jovens e Adultos (CAR-
RANO, 2008). Dessa forma, a EJA tem se voltado para a compreensão e estudo dessas juventudes,
tendo em vista que a dinâmica das salas de aula tem se tornado complexa, passando a reunir novas
subjetividades, como a presença de educandos em situação de liberdade assistida e/ou remaneja-
dos do ensino regular por serem considerados “indisciplinados”.
No Brasil, existe um uso concomitante dos termos adolescência e juventude. Dependendo da
corrente e do campo de estudo, os termos podem ser usados como sinônimos ou podem trazer dife-
rentes abordagens. É Interessante ressaltar que a divisão etária não é igual em todos os países e que,
apesar desse recorte, a adolescência e a juventude são fases determinadas para além desse parâme-
tro. O conceito mais amplo de juventude está relacionado às experiências vividas pelo jovem em sua
trajetória de vida. Dessa forma, utilizamos o termo Juventudes, entendendo que nas construções
sócio-históricas, os sujeitos não se constituem de forma homogênea, diante disso, não podemos
determinar uma única adolescência ou juventude. Segundo Marília Sposito (2003), é importante
esclarecer sobre a diferença de alguns termos, para ela juventude refere-se à fase da vida, jovens aos
sujeitos concretos, condição é o modo que uma sociedade atribui significado a esse momento e, por
último, a situação juvenil diz respeito às experiências que serão vividas por esse jovem, de acordo
com a sua etnia, gênero, classe etc.
Nessa aproximação com os estudos voltados para as juventudes, encontramos em Margulis (apud
CAMACHO, 2004), que explora os conceitos de moratória social e moratória vital, uma referência ini-
cial na compreensão das particularidades das juventudes da EJA. Para este autor, a moratória social
é definida como sendo o prolongamento do tempo de preparação para a vida adulta, um tempo
para estudo, tempo livre, havendo diferenciações entre classe social, gênero, memória social, ou
seja, cada grupo viveria sua moratória de forma específica. Em contraposição, a moratória vital inde-
pende de classe social, sendo comum a todos os grupos de jovens e se constitui o crédito temporal,
um algo a mais e que tem vinculações com o aspecto energético do corpo, ou seja, a energia vital,
identificada com a sensação de imortalidade, característica dos jovens.
Lançando mão desses conceitos, Camacho (2004) afirma que, de um lado há os jovens das classes
populares, que gozam de tempo livre, que significa tempo de espera, de vazio, de falta de trabalho,
de estudos e de ócio criativo e enriquecedor. Trata-se de um tempo desvalorizado e não legitimado
socialmente que “empurra” o jovem para a marginalidade e para a exclusão. De outro lado, há os jo-
vens de classes sociais mais favorecidas com possibilidades de atraso legitimado nas responsabilida-
des da vida adulta, pois o período de formação tende a alongar-se por dois motivos: pela exigência
de conhecimentos cada vez mais complexos para a inserção social ou pela falta de garantia de ab-
sorção no mundo do trabalho. Assim, esse longo período de capacitação permite o prolongamento
de uma vida, sem maiores exigências produtivas de renda.
Partindo dessas concepções conectadas às nossas experiências, somos provocados a (re) pensar:
quais juventudes estão inseridas na modalidade de jovens e adultos de Cariacica, embora tenham
características semelhantes entre si?

205
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
2 .o percUrso metodológico dA pesqUisA
O estudo vem adotando uma metodologia de caráter quali-quantitativo, uma vez que, em face
de sua complexidade, demanda a complementaridade de metodologias para captação da dinâmica
dessa realidade, onde “[...] tudo está em movimento, tudo tem “duas faces” (quantitativa e qualitati-
va, positiva e negativa, velha e nova), uma se transformando na outra; a luta desses contraditórios é
o conteúdo do processo de desenvolvimento.” (PRODANOV; FREITAS, 2013, p.35).
O diagnóstico dos educandos da EJA mobilizou a Equipe e os profissionais dessa modalidade em
vários momentos: a) elaboração do questionário socioeconômico e étnico-cultural; b) aplicação do
questionário diretamente com 1398 educandos49; c) posteriormente, os dados produzidos foram
submetidos à sistematização e análise preliminar; d) por fim, realizamos um aprofundamento da
análise de alguns dados obtidos, a partir do cruzamento de determinados aspectos elencados no
Diagnóstico.

3 os edUcAndos dA ejA de cAriAcicA


A partir dos dados produzidos na pesquisa, constatamos a presença de dois grupos que apre-
sentam significativas diferenças: a) um grupo de adolescentes e jovens, remanejados recentemen-
te do ensino regular e que, em sua grande maioria, não está trabalhando; b) um grupo composto
predominantemente por adultos, que possuem histórico de descontinuidade escolar e estão em
sua maior parcela trabalhando, neste grupo encontram-se idosos concentrados nas classes de alfa-
betização. Neste sentido, apesar das limitações do texto, estaremos fazendo uma análise do perfil
desses sujeitos.

3.1 os Adolescentes e joVens


Do ponto de vista demográfico, os jovens constituem um grupo populacional que corresponde a
uma determinada faixa etária que varia segundo contextos particulares, mas que, geralmente, está
localizada entre os 15 e os 24 anos de idade, conforme definição da Assembleia Geral da ONU em
1985 (UNESCO, 2004).
Em Cariacica, a juvenilização se apresenta de maneira marcante na EJA, uma vez que do total de
educandos pesquisados (1398), 662 sujeitos (47,4%) possuem entre 15 e 17 anos, enquanto 283 su-
jeitos (20,2%) possuem entre 18 e 25 anos. Percebe-se o predomínio de adolescentes e jovens, pois
67,6% dos educandos envolvidos nesta pesquisa estão na faixa etária de 15 a 25 anos.
Em relação ao total de adolescentes (15 a 17 anos), podemos afirmar que 293 educandos (44,3%)
foram remanejados diretamente do ensino regular para a EJA, pois esses sujeitos sempre frequenta-
ram a escola. Esses dados reforçam o que vem sendo evidenciado no contexto escolar e no diálogo
com educadores.
Ao considerar a inserção no mundo do trabalho, constatamos que 383 educandos (57,9%) nessa
faixa etária de 15 a 17 anos não estão trabalhando. Evidenciamos também que 233 adolescentes
(35,2%) estão trabalhando e apenas 17 (2,6%) estão realizando alguma forma de estágio. No que
tange à totalidade dos educandos dessa faixa etária que estão trabalhando, apenas 38 estudantes
(16,3%) possuem carteira assinada, evidenciando uma inserção precarizada.
Em relação aos jovens (18 a 25 anos), constatamos que 123 (43,5%) não estão trabalhando, en-
quanto 150 (53%) estão trabalhando e somente 5 (1,8%) realizam algum tipo de estágio. Percebe-
mos que, diferentemente dos adolescentes, os jovens dessa faixa etária apresentam uma inserção
maior no mundo do trabalho. Entretanto, ao reunirmos os dados dessas duas faixas etárias, consta-
mos que a maior parcela não está trabalhando atualmente.
49 O Diagnóstico não contemplou o universo estatístico ou população dos educandos da EJA, uma vez que uma parcela de
estudantes não esteve presente nas escolas, durante o período da aplicação dos questionários.

206
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Os resultados apresentados apontam para o desafio da oferta de Educação Profissional integrada
à Educação de Jovens e Adultos, bem como a inserção das juventudes no mundo do trabalho.

3.2 os AdUltos e idosos


Na análise do segundo grupo, constatamos que, do total de educandos pesquisados, 364 sujeitos
adultos (26%) estão na faixa etária de 26 a 49 anos; e apenas 89 adultos e idosos (6,4%) possuem 50
anos ou mais. Portanto, somente 32,4% dos educandos participantes dessa pesquisa possuem 26
anos ou mais, constituindo-se atualmente como um grupo minoritário de uma educação voltada
historicamente para jovens e adultos trabalhadores.
Na abordagem do aspecto relacionado à inserção no mundo do trabalho, constatamos que 224
adultos (61,5%) estão trabalhando, enquanto 124 (34,1%) estão desempregados. No que tange aos
educandos dessa faixa que estão trabalhando, 140 (62,5%) possuem carteira assinada. Em relação
aos adultos e idosos com 50 anos ou mais, a pesquisa revelou que 54% desses sujeitos estão inseri-
dos no mundo do trabalho.
Além da Educação Profissional Integrada à EJA, constitui-se também como desafio a garantia de
condições para permanência e continuidade dos estudos para esses sujeitos, por meio da reestru-
turação da organização da oferta dessa modalidade, tendo em vista que os tempos do trabalho, da
família e outras responsabilidades da vida adulta se configuram como possíveis causas da evasão.

considerAções finAis
As reflexões e os resultados abordados nesse texto, apesar do caráter preliminar, começam a pro-
duzir movimentos na Secretaria de Educação e nas escolas, materializados na construção de políti-
cas e práticas pedagógicas voltadas para o atendimento às particularidades, anseios e necessidades
desses sujeitos, bem como a oferta de formação continuada de educadores.

referênciAs bibliográficAs
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207
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
PRODANOV, K.C.; FREITAS, Ernani César de. Metodologia do trabalho científico: métodos e técnicas
da pesquisa e do trabalho acadêmico. 2. ed. Novo Hamburgo: Feevale, 2013. Disponível em: <www.
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208
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
os tipos de sUjeito dA ejA e dA grAmáticA: reflexões
sobre o ensino de língUA mAternA
dAnielA porte

O ensino de língua materna, apesar de muito discutido pelos teóricos da área, ainda representa
grande desafio no cotidiano escolar, sobretudo ao professor de língua portuguesa. Alguns concei-
tos, antes, distantes da aplicação em sala de aula, assumiram caráter primordial e não mais se reflete
sobre a língua, nos dias atuais, sem a consideração de aspectos como a oralidade, a variação e a
correção idiomática. Entretanto, o efetivo êxito em atividades que visam ao desenvolvimento das
competências e habilidades envolvidas em tais aspectos da língua ainda é uma angústia para o
professor de português. Em outras palavras, a troca de experiências, que de fato contribuem para
a construção da competência linguístico-discursiva do alunado, ainda é irregular e deficiente tanto
no espaço escolar quanto na universidade. Tratando-se do ensino de língua materna para Educa-
ção de Jovens e Adultos, essa discussão toma valor extremamente significativo, porque o público
representante do segmento suscita especificidades de aprendizagem que exigem do professor um
cuidado particular. É nosso intuito expor algumas incipientes reflexões acerca do conteúdo de
sintaxe, desenvolvido junto às turmas do Ensino Médio da EJA, a partir da nossa experiência como
docente do Curso Noturno do Colégio Santo Inácio (RJ). Para tanto, tomaremos os ensinamentos
de diferentes estudiosos do ensino de língua e de sintaxe, sobretudo José Carlos Azeredo (2007),
Carlos Eduardo Falcão Uchôa (2007), Irandé Antunes (2007), Luiz Carlos Travaglia (2004) e Eugenio
Coseriu (1980).

palavras-chave: Ensino, EJA, Gramática

sobre importânciAs
Uma rã se achava importante
porque o rio passava nas suas margens.
O rio não teria grande importância para a rã
porque era o rio que estava ao pé dela.
Pois pois.
Para um artista aquele ramo de luz sobre uma lata
desterrada no canto de uma rua, talvez para um
fotógrafo, aquele pingo de sol na lata seja mais
importante do que o esplendor do sol nos oceanos.
Pois pois.
Em Roma, o que mais me chamou atenção foi um
prédio que ficava em frente das pombas.
O prédio era de estilo bizantino do século IX.
Colosso!
Mas eu achei as pombas mais importantes do que o
prédio.
Agora, hoje, eu vi um sabiá pousado na Cordilheira
dos Andes.
Achei o sabiá mais importante do que a Cordilheira

209
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
dos Andes.
O pessoal falou: seu olhar é distorcido.
Eu, por certo, não saberei medir a importância das
coisas: alguém sabe?
Eu só queria construir nadadeiras para botar nas
minhas palavras.
Manoel de Barros50

1. dA edUcAção de joVens e AdUltos no brAsil


A educação, voltada especificamente para um público jovem e adulto, privado de frequentar os
bancos escolares na infância, demorou longa data para se firmar no país. Após o contato entre índios
nativos e jesuítas, durante o período de descoberta das terras brasileiras, como trabalho pioneiro na
educação de adultos, podemos afirmar que até meados do século XX não houve nenhuma preocu-
pação com a formação de uma escola que atendesse as necessidades desse grupo.
A julgar pelos acontecimentos históricos que contextualizaram a formação da nação brasileira,
desde o próprio processo de colonização até os moldes da abolição da escravatura, era grande a
parcela de cidadãos excluídos de qualquer tipo de iniciativa educacional. Embora a Constituição
Imperial (1824) garantisse a todos a educação primária gratuita, a cena infame e vil, outrora descrita
por Castro Alves em seu “Navio Negreiro”, não se perderia na memória de um povo sem deixar fu-
nestas consequências:

Mesmo no último ano da monarquia, em 1889, para uma população em idade


escolar de cerca de dois milhões, tínhamos apenas 250 mil alunos nas escolas primá-
rias. Em termos percentuais, isso significa que somente 12,5% dos jovens estavam
nos bancos escolares, ou 87,5% dos jovens brasileiros, em 1889, não tinham acesso
à educação. (SILVA, 2006)

Durante grande parte do período imperial, a educação brasileira esteve coadunada à Igreja Cató-
lica e restrita àqueles que podiam por ela pagar. Somente em 1879, deu-se o primeiro passo rumo
à inclusão da grande parcela populacional anteriormente segregada. O Decreto lei nº 7.247 previa
uma reforma de ensino voltada para a educação de jovens e adultos do sexo masculino analfabetos,
livres ou libertos, com duas horas de duração no verão e três horas no inverno, com as mesmas ma-
térias do diurno. A Reforma também previa o auxílio a entidades privadas que criassem tais cursos
(BEZERRA, 2009. p.36).
Apesar de a função da educação institucionalizada no Brasil ter sido, desde seus primórdios, pla-
nejada para além do ensino doutrinário – daí as escolas se preocuparem em oferecer disciplinas di-
recionadas à construção de valores morais – podemos resumir a dois aspectos principais a educação
imperial: a necessidade de adequação dos escravos à vida livre e a formação de mão de obra. Era
necessário manter a população minimamente alfabetizada para alcançar os interesses econômicos
da cafeicultura.
O período republicano foi um momento de estagnação nos investimentos da educação para jo-
vens e adultos no país. Somente na década de 20, a luta contra o analfabetismo ganhou força uma
vez que ele representava uma das causas para o impedimento do crescimento geral do país. Passou-
-se a ver o analfabetismo como um “mal nacional” ou verdadeira “chaga social”, nas palavras de Rui
Barbosa.
Os movimentos civis e a pressão diante do grande crescimento urbanístico, no período de surgi-
50 BARROS, M. Poesia Completa. Tratado geral das grandezas do ínfimo [2001]. São Paulo: Leya, 2010.

210
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
mento da indústria nacional, impuseram a necessidade de formação de mão-de-obra, despertando,
com isso, a consciência da ordem social nas cidades. Assim, em 1925, o Decreto lei conhecido como
Reforma João Alves estabeleceu a criação de escolas noturnas para adultos (BRASIL, 2002). Apenas
na década de 40, no entanto, a educação de jovens e adultos tornou-se efetivamente questão de
política nacional.
Na década de 60, quando foi instituída a primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(lei 4.024/61), houve o reconhecimento da educação como direito de todos e a menção às chama-
das “classes especiais”, que se aproximavam do que hoje conhecemos como classe de aceleração. Na
época, também se determinou que jovens, maiores de 16 anos, poderiam obter certificado de con-
clusão do antigo curso ginasial mediante a prestação de exames, enquanto os maiores de 19 anos
obteriam o certificado de conclusão do curso colegial (BRASIL, 2002).
Ainda nos idos da década de 60, difundiram-se as ideias de educação popular, reflexo da demo-
cratização da escolarização básica. Também à época, a EJA foi estendida ao curso ginasial, deixando
de se voltar apenas para a alfabetização. Surgiu um novo paradigma teórico e pedagógico a partir
do pensamento do educador Paulo Freire cujo trabalho exerceu grande influência no desenvolvi-
mento da educação de jovens e adultos no Brasil, sobretudo pela concepção inovadora do papel do
aluno e do professor no processo educativo e na vida social.
Entretanto, o período da ditadura militar impôs sérias restrições ao princípio crítico e político ao
qual se prendia a educação popular: para enfrentar o analfabetismo que persistia como um desafio,
o governo militar promoveu, entre 1965 e 1971, a expansão da Cruzada de Ação Básica Cristã (ABC),
entidade educacional dirigida por evangélicos, surgida no Recife, para ensinar analfabetos (BRASIL,
2002).
Muitos educadores envolvidos no processo da educação “libertadora” foram exilados do país. Em
67, o Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral) iniciou uma campanha nacional de alfabetiza-
ção de adultos. Em 1971, com a LDB, implantou-se o ensino supletivo. A década de 70 foi marcada
pelo crescimento dos cursos supletivos que assumiam a função primordial de recuperar o atraso dos
que não haviam usufruído da escolarização na idade própria (BRASIL, 2002). A LDBEN nº 5.692/71
determinava que o supletivo pudesse ser ministrado a distância, por correspondência ou por outros
meios adequados.
Em 1985, com o fim da ditadura militar, foi extinto o Mobral. Criou-se a Fundação Nacional para
Educação de Jovens e Adultos - conhecida como Fundação Educar - cujas principais funções eram
estimular o atendimento às séries iniciais do antigo 1º grau, a produção de material e a avaliação de
atividades. Quando a fundação acabou, em 1990, os órgãos públicos e as entidades civis passaram a
se responsabilizar sozinhos pela EJA.
Depois da LDBN nº 9394/96, poucas mudanças públicas foram feitas em prol da EJA. Esta lei defi-
niu o segmento como direito de todo cidadão, já que ele se inclui na Educação Básica. Outra altera-
ção trazida pela lei foi da idade mínima para realização de exames supletivos: 15 anos para o Ensino
Fundamental e 18 para Ensino Médio.
O panorama atual da EJA em nosso país é marcado pela sensível perda da capacidade de coor-
denação do MEC que, historicamente, sempre esteve à frente das políticas públicas de alfabetização
e da educação básica de adultos. Em 1997, depois da Conferência Internacional sobre Educação de
Adultos, em Hamburgo, uma série de compromissos foram assumidos pelos países participantes,
dentre eles o Brasil. Isso trouxe outras instâncias do governo, além de organizações da sociedade
civil, para a organização de programas de alfabetização e de capacitação profissional para o público
da EJA.
Hoje, podemos destacar duas iniciativas federais diretamente ligadas ao segmento de jovens e
adultos: a SECADI (Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão) e o
ENCCEJA (Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos). Este último é

211
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
uma avaliação voluntária e gratuita oferecida às pessoas que não tiveram a oportunidade de con-
cluir os estudos em idade apropriada. O principal objetivo do ENCCEJA é aferir competências, habi-
lidades e saberes adquiridos tanto no processo escolar quanto no extraescolar (BRASIL, 2002). Trata-
-se de uma iniciativa muito pouco conhecida pelo público-alvo da EJA e aqueles que dela tomam
ciência concordam que o caráter autodidata exigido dos candidatos é totalmente alheio às necessi-
dades peculiares ao perfil dos alunos.

2. o perfil AtUAl do AlUno joVem e AdUlto no colégio sAnto inácio


Ao longo do tempo, ocorreram grandes mudanças no perfil do aluno que procurava os cursos
para educação de jovens e adultos. Se, no início da formação deste segmento em nosso país, o inte-
resse maior centrava-se na grande parcela de cidadãos analfabetos, hoje em dia, a busca pelo curso
do Ensino Médio tem aumentado cada vez mais. Com o passar dos anos, a inclusão da classe popu-
lar nos bancos escolares fez com que o índice de analfabetismo caísse51. Por outro lado, contribuiu
também para que os problemas que a escola pública vem enfrentando se apresentassem como uma
barreira para a continuidade dos estudos daqueles alunos provenientes de meios mais pobres.
Este panorama é indicativo de dois fatores. Primeiro, a EJA passou a atender, em grande quantida-
de, alunos que iniciaram seus estudos quando crianças, mas que, por não se adequarem ao sistema
escolar vigente ou por motivos pessoais, desistiram dos estudos em meados do segundo segmento
do ensino fundamental; segundo, a iniciativa civil – igrejas, ONGs e associações de moradores –
consegue oferecer cursos de alfabetização que já satisfazem o anseio de aprender a ler e a escrever
daquele adulto sem condições de voltar à rotina escolar.
Assim, o público jovem, de garotos e garotas entre dezesseis e dezenove anos, cresce vertigino-
samente nas salas de aula dos cursos noturnos. Muitos desses adolescentes iniciaram suas carreiras
escolares em instituições públicas que não conseguiram sanar dificuldades emocionais, cognitivas
e pessoais que os acompanhavam desde tenra idade. A consequência disso é que, alcançando de-
terminada fase, os alunos desistem da escola regular para procurar trabalho. No entanto, não conse-
guem absorção no mercado justamente pela baixa escolaridade. Então, voltam aos bancos escolares
através da EJA.
A outra parcela de alunos é representada especialmente por pessoas adultas que migraram de
outras regiões do país para o Rio de Janeiro em busca de uma vida mais promissora. Há um grande
número de empregadas domésticas, porteiros, vendedores ambulantes, cozinheiras e auxiliares de
serviços gerais. É um público que também pretende resgatar seus estudos pelas exigências do mer-
cado de trabalho.
Normalmente, alfabetizaram-se nas cidades onde nasceram (grande parte no Nordeste brasileiro)
com toda sorte de deficiência. Muitos não contaram com a escola para isso ou nem sequer apren-
deram a ler e a escrever com professores. Ademais, passaram longos anos fora de uma sala de aula.
Em geral, desenvolveram um mecanismo próprio de aprendizagem que se pauta, sobretudo, em
operações concretas: não aprendem a fazer determinado prato, na cozinha, porque refletem sobre
a receita ou a leram em algum lugar; fazem por ensaio e erro, por observação.
Temos, por fim, em número reduzido, alunos idosos – em geral, entre 70 a 80 anos – que buscam
a escola por uma questão de motivação emocional. São pessoas com certos comprometimentos de
locomoção, de audição e de visão e que, em geral, desenvolveram um quadro depressivo determi-
nado pela perda de entes queridos ou pela aposentadoria. Esses alunos encontram no ambiente
escolar uma chance de socialização, de prazer e de retomada da vida.
51 De acordo com dados do INAF (Indicador de Analfabetismo Funcional no Brasil), o índice de analfabetos completos em
nosso país diminuiu pela metade de 2001 (12%) para 2011 (6%). O maior problema atualmente é se o acesso e a frequência à escola
são suficientes para garantir a aquisição de habilidades necessárias a vida pessoal e profissional de um aluno.
(http://www.ibope.com.br/ipm/relatorios/relatorio_inaf_2009.pdf Em 16/07/12)

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
3. A relAção entre leitUrA, escritA e grAmáticA nA bUscA dA compe-
tênciA textUAl
Uma importante distinção para o trabalho com a língua portuguesa em sala de aula são as di-
ferenças entre o saber linguístico e o saber metalinguístico. O saber linguístico é um tipo de saber
técnico, construído de modo prático. Trata-se do conhecimento das regras de uma língua, o que
possibilita a comunicação entre falantes. Assim o define Herculano de Carvalho:

O saber linguístico é (...) uma técnica (...) que permite realizar esse agir produtivo a
que chamamos linguagem; que permite, em suma, falar. É este um saber prático por
excelência, porque o é quanto ao seu objeto, que é o operar, quanto ao seu método,
que é sintético, e quanto à finalidade, que é o produto tanto externo (o texto) como
interno (o ato cognitivo). (CARVALHO,1979. p.251)

A aquisição do saber linguístico é dada pela prática contínua da atividade linguística. Desse modo,
trata-se de um saber adquirido mediante a interação entre sujeitos falantes, elaborado de maneira
não-reflexiva. Já o saber metalinguístico constitui um tipo de saber embasado num corpo de doutri-
na ou num sistema cientificamente organizado, ou seja, um saber sobre o qual “procura-se justificar
o próprio objeto do conhecimento, fundamentando-o com razões, teses, princípios, consistindo, por
conseguinte, num conhecimento de caráter reflexivo, especulativo” (BITTENCOURT, 2002. p.5).
Para o professor de língua materna, sobretudo da EJA, é importante a tomada de consciência
do nível de desenvolvimento linguístico em que seu aluno se encontra. Grande parte deles chega
ao Ensino Médio com profunda dificuldade de decodificação dos textos escritos, gaguejam no ato
da leitura e se sentem exaustos quando se trata de gêneros como editoriais ou dissertações argu-
mentativas, porque são textos de dimensões maiores. E ainda, nas ocasiões em que são trabalhados
textos que misturam os tipos narrativos e dissertativos - como as crônicas modernas, por exemplo
– retêm prioritariamente as nuances da história, do enredo e pouco alcançam das opiniões e/ou
argumentos utilizados na construção do texto.
A exposição oral, a concretização dos pensamentos que formulou a partir de alguma leitura, é
o que, normalmente, mais se destaca em uma parcela do aluno da EJA. A vivência como líderes
comunitários, chefes de família ou ainda a experiência em certos tipos de emprego garante uma
desenvoltura oral que em muito destoa do texto escrito. Pode-se dizer que a dificuldade central do
aluno jovem e adulto do EM é transmitir ao papel, de forma coerente e lógica, as suas reflexões, as
suas opiniões e as conclusões a que chegam diante de um conjunto temático discutido.
O que se nota, na verdade, é que mesmo nas séries finais do ensino básico, os alunos ainda não
dominam completamente a técnica da linguagem: muitos ainda se expressam oralmente de manei-
ra confusa, contam com um restrito vocabulário, não compreendem o que leem e não apresentam
autonomia para transpor para o papel os pensamentos que lhe vão à cabeça. A mera reflexão sobre
a linguagem, nesse momento de aprendizagem, assim, configura-se um caminho frustrante para as
aulas da língua materna.
Irandé Antunes (2007) também pontua a importância da distinção entre língua e gramática, que
é de certo modo o que colocamos aqui, quando tomamos a diferença entre saber linguístico e saber
metalinguístico. A ideia de mera reflexão sobre a língua, executada a partir de exercícios que fixem
as regras da gramática normativa, é condenada pela autora e apontada como um insuficiente para
o alcance do que chamamos competência linguística:

Para ser eficaz comunicativamente, não basta, portanto, saber apenas as regras

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
específicas da gramática, das diferentes classes de palavras, suas flexões, suas com-
binações possíveis, a ordem de sua colocação nas frases, seus casos de concordân-
cia, entre outras. Tudo isso é necessário, mas não é suficiente. (Antunes, 2007. p.41)

Uma boa analogia para os saberes linguístico e o metalinguístico está na metáfora da direção.
Um motorista não aprende a dirigir lendo todo o manual de seu novo carro, mas sim observando
outra pessoa dirigindo e acatando as orientações dadas por ela. Aprendemos a dirigir, dirigindo. O
instrutor executa as tarefas que devemos efetuar também e a partir da observação, e extenuantes
tentativas, vamos, pouco a pouco, dominando a técnica com destreza. Até que em certo momento
fazemos todo o ritual de modo automático, mecânico, sem que nenhum tipo de reflexão seja neces-
sário. No entanto, é certo que, depois de apreendida a técnica da direção, com a leitura do manual
do nosso carro podemos conhecê-lo melhor. Temos maiores chances de conservá-lo mais, entender
de suas potencialidades e suas restrições, usufruir de seus benefícios e desfrutar amplamente de
seus serviços. Motorista e carro passam a se entender muito bem.
Assim também ocorre com os falantes de modo geral. A aquisição da linguagem não se dá na
escola, pois os alunos já chegam até nós com a técnica aprendida. O problema é que esse domínio,
normalmente, não lhe é suficiente, não garante a expressão plena nos distintos registros da língua,
nem o permite se manifestar em qualquer situação de comunicação. Com o aluno da EJA essa pers-
pectiva gera consequências sociais nefastas, porque muitos se percebem inferiores, uma vez que
falam “diferente”. E por isso se calam. Deixam de se posicionar, de expressar suas emoções e opini-
ões, evitam situações que exijam a tomada de decisões e esclarecimentos que lhe são de direitos.
Acabam, por fim, marginalizados.
A escola, na angústia de proporcionar essa liberdade “linguística”, precipita-se no ensino das nor-
mas gramaticais sem notar que assim afasta o aluno das situações reais de uso da língua. A expo-
sição aos diversos gêneros textuais, as diversas formas de leitura (oral, silenciosa, compartilhada,
divida...), a análise detalhada desses textos sob a orientação do professor, constituem boa dinâmica
para o domínio completo da linguagem. É necessário que, antes de apresentarmos as regras da
gramática – mais uma vez, antes do saber metalinguístico -, desenvolva-se o saber linguístico. Reco-
nhecer as diferentes características dos textos que são lidos, a estrutura formal que compete a cada
um deles, observar as diferenças particulares ao discurso oral e ao discurso escrito e compreender
com que intenção cada texto foi construído também são tarefas que devem ser levadas a cabo pelo
professor de língua materna como forma de alcançar êxito orientações gramaticais.
É importante ressaltar que não se deve confundir a necessidade de ampliar o domínio da lingua-
gem (para depois se refletir sobre linguagem) com o fato de não se ensinar gramática na escola. Já
há algum tempo, estudiosos da área vêm se debruçando em antigas querelas do ensino de língua
materna que, vez ou outra, fazem pipocar entre professores das demais áreas, jornalistas e os pró-
prios falantes a ideia de que não se deve mais ensinar a gramática normativa em sala de aula. Mais
uma vez, na angústia de resolver os problemas que vimos crescendo vertiginosamente nos textos
de nossos alunos, acabamos levando para aulas assuntos que deveriam ser discutidos e dominados
pelos especialistas e não pelos docentes. Não é difícil encontrar livros didáticos que tratam inade-
quadamente de conceitos complexos da área da Letras como signo linguístico, dialeto e variação lin-
guística. Por vezes, até nas provas oficiais aplicadas no Brasil temos a sensação de que o aluno/can-
didato não deve apenas ser um falante que bem emprega sua língua nas diversas situações de uso,
mas sim, deve ser um teórico, capaz de refletir sobre conceitos modernos da Linguística enquanto
ciência. Os textos compilados no Exame de Qualificação Nacional bem atestam isso se observarmos
seus autores.
Insistimos: o ensino da gramática deve ocorrer à medida que ele seja funcional e agregue valor à
produção escrita do aluno. Aqui, voltamos à discussão inicial de que é, portanto, crucial a percepção,
por parte do professor, do nível de competência linguísticas em que seus alunos se encontram. No

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caso da EJA, também cabe ressaltar a mal fadada ideia de que o ensino da gramática é estéril e que
a norma não padrão – a verdadeira expressão do aluno – seria sinônimo de liberdade e de manifes-
tação cultural. Parece-nos que é mesmo nessa defesa que se esconde o verdadeiro preconceito, já
que insistir na “aceitação” da expressão não padrão, sem levar em conta as questões da adequação
discursiva, é uma forma de dizer que o aluno é incapaz de aprender quantas normas ele quiser e
delas se servir nas diversas situações de comunicação de sua vida.
O problema não é a língua, fruto de uma abstração e parte do conjunto cultural de um povo; não
é o aluno, que, ciente das sanções negativas sociais, sofre quando sua competência linguística não
lhe permite usufruir daquilo que almeja profissional ou pessoalmente; ou ainda, o problema não é a
gramática, que contém regras anacrônicas e subservientes ao pensamento colonialista. O problema
é de fato o homem (na figura do professor, do diretor de escola, do secretário de educação, de go-
vernador, de presidente da república...) que usa suas próprias frustrações e limitações para negar o
que não é capaz de fazer. Se o uso da norma não padrão fosse tão pacificamente aceito nos distintos
meios de comunicação, os próprios defensores do seu emprego deveriam fazê-lo em seus textos
acadêmicos. Mas, não é bem isso que notamos em artigos científicos, explanações em congressos
ou em palestras. Nessas situações, aqueles que defendem para o aluno da EJA o emprego não pa-
drão da língua sabem muito bem lançar mão das regras que conferem clareza e idoneidade aos seus
textos.
Como dissemos anteriormente, são muitos alunos da EJA trabalhadores domésticos. As mulheres,
em especial, dominam com muita destreza as técnicas da limpeza, organização e arrumação de uma
casa assim como possuem vasta experiência na cozinha. Sabem produzir verdadeiros manás culiná-
rios. Entretanto, não dominam a estrutura do gênero “receita culinária” e, por isso, apresentam gran-
de dificuldade de registrar os pratos que elas mesmas criam. É papel da escola fornecer às alunas
condições de reconhecer, caracterizar e produzir esse gênero textual tão corriqueiro. E, neste con-
texto específico, tal atividade passa a contribuir para ampliação da competência linguística e toma
proporções práticas, isto é, a língua portuguesa passa a ser vista como um instrumento presente na
realidade cotidiana do alunado. No entanto, pela própria singeleza da natureza do gênero em si, a
receita culinária constituiria apenas o primeiro passo para o trabalho significativo com a língua por-
tuguesa. O professor deve procurar criar novas estratégias que levem o aluno a avançar na escala de
compreensão e produção dos diversos gêneros textuais.
Sob esse aspecto não podemos deixar de mencionar o gênero literário que, sendo bem trabalha-
do em sala de aula, será o grande responsável pela relação de prazer com a leitura. A poesia, o conto,
as crônicas e os romances são gêneros textuais, à primeira vista, distantes da realidade do aluno da
EJA. Na verdade, às pessoas desse segmento o exercício da privação é bastante particular desde
tenra idade, a exemplo da própria escolarização, um direito que lhes foi negado nas fases apropria-
das. O texto literário - uma manifestação artística de extremo valor para a construção da criticidade,
da apuração do vocabulário e para aquisição de conhecimento de mundo – também entra para o
rol das restrições a que os alunos da EJA são submetidos. A escola é praticamente o único caminho
de contato não só com a Literatura, mas com as Artes de modo geral, já que a sociedade e as forças
políticas organizacionais do país não garantem às crianças, aos jovens e aos adultos o acesso ao
patrimônio artístico.
Não se trata apenas da oferta acessível de espetáculos teatrais, exposições de artes visuais, cine-
mas, shows musicais e recitais de poesia. Isso, para um morador de cidade grande, como o Rio de
Janeiro, de certo modo não é o maior dos empecilhos. O grande problema é que as classes popula-
res não são estimuladas a conhecer o prazer que as manifestações artísticas são capazes de causar. E
isso ocorre justamente porque a minoria que desfruta desse tipo de conhecimento - e, normalmen-
te, detém o poder econômico e político- sabe que, além da fruição, a Arte proporcionará mudança
de comportamento, o que pode ser muito perigoso para uma sociedade que vive o abismo social
da nossa.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Nessa perspectiva, o texto literário na sala de aula transborda as proporções linguísticas e passa
a ocupar um espaço de desenvolvimento integral do aluno, proporcionando-lhe um modo seguro
de lidar com seus sentimentos e suas angústias. Ainda sobre o papel do texto literário no desen-
volvimento da competência linguística, não podemos deixar de citar a tese pouco difundida, mas
extremamente pertinente, do linguista romeno Eugenio Coseriu:

O emprego da linguagem na vida prática é, efetivamente, um uso. Também po-


demos dizer que o emprego da linguagem nas ciências é um uso. Porém, não o em-
prego da linguagem na literatura que não é um uso particular, mas sim representa
a plena funcionalidade da linguagem ou realização de suas possibilidades, de suas
virtualidades. Portanto, longe de ser a linguagem da literatura uma forma especial
que se afasta de uma norma, coincide com estas possibilidades virtuais da lingua-
gem, e qualquer outro uso, sendo precisamente uso, é uma redução das possibilida-
des da linguagem, é uma redução da linguagem como se apresenta na literatura
com o desdobramento de suas possibilidades. Ou, dito de uma maneira mais sim-
ples, longe de ser a linguagem da literatura e, em particular a da poesia, um desvio
em relação à linguagem considerada objetiva são estes tipos de linguagens objeti-
vas, inclusive o emprego na vida prática e também o emprego nas ciências, os que
emergem de uma drástica redução da plenitude funcional da linguagem. (Coseriu,
1993. p. 39)

O aluno deve ser capaz de ler e compreender qualquer texto que lhe caia em mãos. Assim,
ele também estará pronto para o trabalho de reflexão sobre a linguagem, quer dizer, para analisar os
mecanismos linguísticos que estão a serviço das distintas produções de sentido. A leitura é, portan-
to, uma atividade extremamente associada ao ensino da gramática normativa, uma vez que o aluno/
falante autônomo está pronto para perceber as regras de organização de uma língua.

4. os tipos de sUjeito dA ejA e dA grAmáticA: práticAs dA prodUção


escritA e dA reflexão metAlingUísticA
A atividade que passamos a descrever foi executada com uma turma de 3ª fase do EM da
EJA, no Curso Noturno do Colégio Santo Inácio (RJ). Nosso objetivo aqui é expor como o processo
metalinguístico pode também ser associado ao conhecimento linguístico que o aluno traz à escola.
Trata-se de uma produção de texto a partir das aulas cujo conteúdo gramatical era “tipos de sujeito”.
Com as explanações sobre os tipos de sujeito da gramática normativa, surgiu o momento em que os
próprios alunos começaram a “brincar” com o sentido dos termos gramaticais. Um se dizia, naquele
dia, um “sujeito composto”; ao que o outro logo respondeu: “eu estou oculto, elíptico ou desinen-
cial”. Diante do fato descompromissado e até banal, pudemos observar que o mecanismo utilizado
pelo aluno da EJA (ou de qualquer outro segmento...) para reter as nomenclaturas gramaticais era
associá-las ao seu próprio conhecimento de mundo.
Aqui, é interessante observar que as nomenclaturas gramaticais, no ensino de língua ma-
terna, compõem duas faces de uma só moeda: ao mesmo tempo em que podem funcionar como
elemento facilitador podem cair no campo estéril dos rótulos que povoam inutilmente a cabeça dos
alunos. Dizendo de outro modo, o trabalho da correção textual é mais rápido e eficaz se o seu autor
entende, por exemplo, que em determinada construção há certa inadequação justamente porque
falta o “sujeito da oração” ou o “complemento de um verbo”. Ou ainda, se o aluno domina as regras
de concordância verbal, pode notar alguma incorreção em casos de uma construção oracional na
ordem indireta. Enfim, as nomenclaturas gramaticais são úteis nas aulas de língua materna se ser-

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
vem como facilitadores para a ampliação da competência linguística. Mas, ao contrário, se funcio-
nam apenas como mero conteúdo a ser ensinado, fica evidente a sua falta de serventia e a confusão
que os alunos tratam logo de fazer, misturando alhos com bugalhos.
Pensando nessa funcionalidade das nomenclaturas gramaticais, a proposta de produção
textual que fizemos à turma era de que cada aluno escrevesse um pouco sobre si, contando sua
trajetória de vida. Inicialmente, conversamos com a turma sobre os múltiplos sentidos da palavra
“sujeito”, demos exemplos como: “um sujeito foi baleado lá no morro”, “o sujeito se acha melhor do
que os outros”, “era um sujeitinho exibido” e colhemos também outros exemplos que eles mesmos
produziram. Em seguida, indagamos se esses sentidos eram parecidos e se representavam a mesma
realidade de quando estudamos os tipos de sujeitos gramaticais. Por fim, veio a proposta de reda-
ção: “fale sobre você e sua personalidade, diga que tipo de sujeito você é na vida”.
Tomemos dois exemplos do resultado obtido com a atividade:

texto 1 – Aluna Lucileide

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
texto 2 – Aluna Stephanie

Como podemos observar diante da leitura dos textos confeccionados pelos alunos, a prioridade
da atividade foi, de fato, o próprio exercício da linguagem. O que, a princípio, começou a partir da
mera reflexão sobre a linguagem alcançou seu fim mais produtivo: a prática da escrita. É importan-
te destacar que, nesse caso, tratamos de alunos com um nível linguístico mais avançado do que o
comum na EJA. É um grupo de alunos que iniciou a escolarização na infância, deu continuidade na
adolescência e por razões variadas se afastou dos bancos escolares antes da conclusão do ensino
básico. Porém, são alunos que trilharam caminhos que lhes permitiram alcançar uma boa bagagem
de conhecimento de mundo.
No caso da atividade descrita aqui, a “confusão” entre o elemento metalinguístico (tipos de
sujeito) com o extralinguístico (a pessoa ou coisa do real a que o sujeito se refere) foi proposital.
Na verdade, a correlação foi levada à sala de aula pelos próprios alunos e passou a representar um
singelo jogo entre a reflexão metalinguística e o exercício efetivo da linguagem. O que propusemos
foi um modo mais criativo e prático de levar aos alunos da EJA um conteúdo que, à primeira vista,
parece-lhes tão distante.
Também é necessário mencionar que os conteúdos programáticos seguidos pelas escolas,
com bases nas orientações oficiais, geralmente, optam pelo ensino das regras da gramática norma-
tiva. Em se tratando da EJA, consideramos que a possibilidade mais profícua desse trabalho é a partir
da seleção de matérias que propiciem ao aluno o reconhecimento dos desvios mais estigmatizados.
Assim, o reconhecimento do sujeito da oração tem o objetivo de nos levar à reflexão sobre os meca-
nismos de concordância verbal simples na nossa língua.
A ideia é que o aluno possa empregar com propriedade a norma padrão, reconhecendo a
sua variante como o ponto de partida para ampliação do conhecimento linguístico. Para tanto, os

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
exercícios de repetição das nomenclaturas gramaticais acabam sendo estéreis e criam apenas “no-
mes” soltos sem nenhum sentido para a prática da compreensão e da produção textual. No entanto,
se o aluno já está em um nível mais aprofundado da competência linguística – isto é, decodifica e
compreende o que lê com tranquilidade, interpreta bem as mensagens dos mais diversos gêneros
textuais, escreve com o mínimo de clareza acerca de sua opinião sobre os fatos, etc. - as reflexões
metalinguísticas funcionarão como uma ferramenta a mais para a percepção dos mecanismos utili-
zados para elaboração de textos autorais ou não.

5. considerAções finAis
Nossa intenção neste trabalho foi refletir sobre o modo como podemos verdadeiramente con-
tribuir para emancipação linguística de nossos alunos. Especificamente, tratamos de alunos que
representam uma parcela da população profundamente excluída, têm grande parte de seus direi-
tos negados e contam praticamente apenas com a escola como instituição capaz de lhes fornecer
subsídios para mudanças cognitivas e financeiras. Daí notarmos a grande responsabilidade que o
segmento educacional para jovens e adultos exige daquele colégio que desejar oferecê-la.
Buscamos contemplar a prática do ensino de língua materna para as séries mais avançadas do
ensino básico na EJA, sobretudo no que diz respeito ao modo de alcançar o reconhecimento e apro-
priação da norma padrão. Acreditamos ser a exposição aos mais diversos gêneros textuais, especial-
mente o texto literário, o principal caminho a ser percorrido. Ressaltamos a importância do texto
literário, porque, como mencionamos em nosso trabalho, além de despertar o gosto pela leitura - já
que provoca imenso prazer, quando bem exercitado- será o meio mais eficaz de contribuir para o
amplo desenvolvimento da competência linguística. E isso é condição sine qua non para o trabalho
funcional com a gramática normativa. O texto literário será sempre o gênero da excelência, como
bem nos atesta Coseriu, já que proporcionará ao aluno o exercício da busca infinita dos sentidos.
Por fim, com a descrição da atividade, tentamos exemplificar como a mera reflexão metalinguís-
tica não é suficiente para fornecer as condições necessárias da almejada emancipação linguística.
Mas, reconhecendo os mecanismos de aprendizagem que seus alunos criam durante as aulas, o
professor será sempre capaz de traçar novas estratégias. Nesse sentido, é extremamente necessário
evidenciar que a turma em questão demonstrou maior habilidade para o reconhecimento e a com-
preensão da função do “sujeito” ao produzir seu próprio texto do que nos exercícios isolados de fi-
xação do conteúdo. Assim, sobre a importância das coisas, só podemos finalizar retomando o poeta
pantaneiro: quando o que realmente tem valor é trabalhado, a mudança chega.

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Ensino Fundamental.Volume 1. Brasília, 2002.
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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
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www.seer.furg.br/index.php/biblos/article/view/256/69 (acesso em: 28 fevereiro 2012)

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
qUAl é A cor dA edUAção de joVens e AdUltos?
WAldinéiA teles pereirA | liliAm teresA mArtins freitAs

O presente artigo traz como discussão a identidade étnico-racial dos estudantes jovens e adultos,
modalidade na qual o quantitativo é expressivo de estudantes negros e negras que não concluí-
ram a educação básica em idade prevista que pela LDB 9394/96, regulamenta, a educação básica
obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, lei 12.796/2013, percebe-se
um grande número deste grupo racial que não concluiu em tempo devido os tais estudos obriga-
tórios. Buscamos problematizar invisibilidade e silêncio das relações raciais na Educação de Jovens
e Adultos no campo de pesquisa e, com efeitos nas políticas públicas. Dialogaremos os dados esta-
tísticos a partir de uma linha do tempo da EJA, que destacará, historicamente, alguns marcos legais
que interferem na conjuntura da modalidade nos dias atuais, principalmente na perspectiva racial,
assim como discutiremos a Educação de Jovens e Adultos como campo de pesquisa. Abordar a EJA
visibilizando das relações raciais na Educação de Jovens e Adultos Negros nas pesquisas significa
possibilitar espaço reflexivo a um segmento social para uma modalidade que historicamente tem
se traduzido em política pública compensatória no combate às situações de pobreza extrema, po-
rém o caráter provisório da EJA se apresenta imensuravelmente distante de se concretizar. Autores
como: Kabenguele Munanga (2006), Paulo Freire (1996,1997), Maria Lúcia R. Mülier (2006), Ricardo
Henriques (2002), Joana Célia dos Passos( 2005) e Iolanda de Oliveira (2010) embasaram nosso olhar,
assim como os dados fornecidos pelo IPEA- Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, com o rela-
tório das desigualdades raciais ( 2009-2010) e IBGE- Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
Neste sentido, entendemos que prestigiar a cor dos estudantes da EJA permitirá ampliar a discussão
da problemática racial no Brasil, saindo do senso comum e do silêncio racial, em busca do fortaleci-
mento de histórias e políticas públicas eficazes e eficientes para este público.

palavras-chave: Educação de Jovens e adultos, Relações raciais, Identidade, Negritude

introdUção
Este artigo discorre sobre a pouca produção de trabalhos no campo científico que trata da Edu-
cação de Jovens e Adultos (EJA) e as relações étnicorraciais, num país em que a presença negra é
maioria, inclusive nesta modalidade de ensino, como também, pensar os imbricamentos desta cons-
tatação nas políticas públicas educacionais e a identidade de estudantes negros da EJA.
As questões ora colocadas são frutos das nossas docências, principalmente na Educação de Jo-
vens e Adultos na escola pública, onde percebemos a expressiva presença de alunas negras e alunos
negros e de uma de pesquisa em desenvolvimento no mestrado na Universidade Federal Fluminen-
se, no Programa de Pós- Graduação em Educação.
Como mulheres negras e professoras, nós nos aprofundaremos no recorte étnicorracial, desta-
cando a população negra, mas ressaltamos que a diversidade de sujeitos na EJA engloba outras
especificidades que não serão discutidas neste momento, tais como: gênero, classe social, religião,
localização histórico-geográfica, de diferentes níveis de deficiência, de orientação sexual, situações
intergeracionais. Tais diversidades expressam também elementos que produzem significativas de-
sigualdades sociais, sendo assim, as identidades que se cruzam no sujeito e geram diversas formas
de exclusão e discriminação não só na EJA. Neste contexto, optamos por trabalhar a dimensão etni-
corracial, porque entendemos que, muito embora esses processos de discriminação se combinem, a
condição do negro possui mecanismos e sutilezas próprias em nossa sociedade.
Sabemos que o racismo, na sociedade brasileira, é o elemento mais contundente de estrati-

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
ficação social que se materializou em nossa cultura, valores, comportamentos e organização social.
E esse racismo permeia as relações no espaço escolar, produz e reproduz desigualdades sociais e
são responsáveis pela grande parte dessas disparidades que a população negra vem acumulando
ao longo da história nos diferentes aspectos das suas trajetórias de vida. Como pesquisadoras consi-
deramos importante discutir as causas da prevalência deste grupo racial na modalidade EJA e, uma
das formas de problematizar esse tema acontece através de pesquisas.
Usamos a palavra “cor” no título que dialoga com a classificação de cor/raça do Instituto Brasilei-
ro de Geografia e Estatística (IBGE), que utiliza as categorias “branco”, “amarelo”, “indígena”, “preto”
e “pardo”, formando a categoria “negro” a partir da junção das duas últimas. A palavra negro aqui
designa todos os sujeitos comumente chamados de pretos, pardos, morenos, mestiços, mulatos e
outras tantas variantes atribuídas aos sujeitos descendentes da linhagem afro-brasileira.

2. breVe histórico dA edUcAção de joVens e AdUltos no contexto


dAs relAções rAciAis no brAsil
No final do século XIX, período de transição do Império para a República, a crise do escravis-
mo repercute na dinâmica social da época, a partir da proibição do tráfico, com o advento da Lei
do Ventre Livre, em 1871 e, mais adiante, com a Lei Áurea, em 1888, surgiria para a elite uma nova
preocupação: enquadrar todo contingente de escravizados. Tal questão, anteriormente ignorada
pelas relações sociais do meio de produção escravocrata, que até então aplicavam a “lei do chicote”,
passou a preocupar as elites.
Neste sentido, o Estado preocupa-se com a instrução para o povo e define um plano nacional de
educação, a partir da Constituição de 1824, pois até então a responsabilidade do ensino primário era
de cada província e o governo central cabia o ensino em seus vários graus, no município da Corte, e
o ensino superior em todo o Império.
A Constituição de 1824 define os cidadãos brasileiros como aqueles que tivessem nascidos no
Brasil, ingênuos ou libertos, ou seja, há a inclusão, em nossa sociedade, dos filhos das escravizadas
aqui nascidos e dos ex-escravizados. Nesta mesma legislação, estabelece-se o direito de receber
instrução primária e gratuita para todos os cidadãos, no entanto, havia um impedimento legal aos
negros que viviam no regime da escravidão, visto que estes não eram considerados cidadãos.
Porém, algumas províncias, a partir de suas leis, podiam selecionar o seu público de acesso ao
ensino primário, como por exemplo, em 1837, o presidente da Província do Rio de Janeiro, Paulino
José de Souza, sancionou a Lei – n° 1, de 4 de janeiro que proibia escravizados e pretos Africanos,
mesmo que fossem livres ou libertos a frequentarem as escolas públicas.
O nascimento do Estado Brasileiro em 7 de setembro de 1822 preservou traços de sua herança
colonial: ideias europeias eram assumidas pelos intelectuais brasileiros, que tentavam acompanhar
o processo de modernização, sem, no entanto, modificar o quadro de desigualdades sociais.
Tais práticas se evidenciam desde o período colonial, como o Decreto nº 1.331, de 17 de feve-
reiro de 1854: estabelecia que nas escolas públicas do país não fossem admitidos escravizados e a
previsão de instrução para adultos negros dependia da disponibilidade de professores. Já o Decreto
nº 7.031-A, de 6 de setembro de 1878: estabelecia que os negros só podiam estudar no período no-
turno e diversas estratégias foram montadas no sentido de impedir o acesso pleno dessa população
aos bancos escolares.
Neste sentido, a professora Maria Lúcia R. Mülier, no seu artigo Relações Raciais nas escolas de
Mato Grosso (MÜLLER, 2006, pág.: 104), resgata a história e analisa a escola como uma das agências
promotoras de uma hegemonia cultural referente à construção do imaginário social brasileiro nas
relações raciais, que atribui aos negros imagens negativas. A autora descreve que em meados do
século XIX as elites brasileiras começaram a se preocupar com a heterogeneidade racial e cultural

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
presente na população brasileira e o futuro do país era discutido a partir do quadro teórico de pro-
dução europeia e estadunidense que acreditavam na divisão da espécie humana em raças e sua
hierarquização: superioridade dos brancos e a inferioridade dos negros. Tais teorias disseminaram
ideias de degeneração das populações miscigenadas, cujos filhos desses relacionamentos entre ra-
ças diferentes seriam herdeiros das piores qualidades das raças de seus progenitores.
No final do século XIX e nas primeiras décadas do século XX, há a preconização da “Teoria do
Branqueamento” e seus defensores acreditavam na grande necessidade de injetar no povo brasilei-
ro sangue europeu branco com o objetivo de branquear e embelezar a população local. Consequen-
temente, os genes desses grupos, por serem superiores, predominariam e tornariam a população
brasileira mais branca, fortalecida e intelectualizada. Acreditava-se que a população negra desapa-
receria, uma vez que era vitimizada por doenças degenerativas da raça. Porém, tal fato não aconte-
cia por hereditariedade, mas sim por omissão do Poder Público.
Já no início do século XX, a teoria do branqueamento popularizou-se e na Primeira República a
discussão permeava na institucionalização deste projeto para legitimar um lugar social inferiorizado
para as populações negras e indígenas.
A partir da Revolução de 1930, há uma construção intelectual que legitima o Estado brasileiro
como autoridade, a partir de atuações estatais há uma condução da construção da nacionalidade e
da modernização quando legitima-se e operacionaliza-se a “fábula das três raças”, tal ideário já esta-
va sendo sistematizado nos sistemas de ensino público criado, aproximadamente, nos anos 10 e 20
do século XX, com o objetivo de construir uma identidade nacional através da escola como difusora
de uma história oficial, programas de ensino, livros didáticos com teorias racistas e a formação da
professora primária, predominantemente, branca, como construtora da nação.
No final do século XIX e início do século XX, ocorrem inúmeras políticas de incentivo a imigração
europeia com o objetivo de branquear a nação. Acreditava-se que a partir da miscigenação seletiva
com estas imigrações a marca da negritude seria extinta e teríamos um povo liberto da africanida-
de, livre da negritude. Pode-se, citar como exemplo a participação do antropólogo João Batista de
Lacerda, na ocasião diretor do Museu Nacional que defendeu a tese da miscigenação seletiva e da
imigração europeia para redenção étnica do Brasil, em julho de 1911, no I Congresso Internacional
sobre Raças Humanas, ocorrido em Londres.
No período de 1930 até, aproximadamente 1950, há a consolidação do mito da Democracia
Racial, que, baseado no mito das três raças, veicula na inexistência de racismo no Brasil e afirma a
existência de uma harmonia na convivência entre as raças.
Todavia, entre as décadas de 50 e 70 do século XX, alguns significativos estudos promovidos
pela UNESCO com importantes intelectuais brasileiros, dentre eles: Florestan Fernandes, Otávio Iani
e Fernando Henrique Cardoso, sobre relações raciais e desigualdades sociais apresentaram resulta-
dos que desconstruíram a ideia da existência do paraíso racial que se afirmava existir, no entanto,
considerava-se que a situação de desigualdade do negro seria ajustada através do desenvolvimento
econômico e social do país.
Na década de 70 através do Movimento Negro discute-se a ideologia inculcada nas pessoas e
instituições, percebendo-se indícios da discriminação salarial que tinham como consequência uma
transmissão intergeracional de status e prejuízo nos processos educacional do negro, sendo a cor
um fator determinante de destinos.
A partir da década de 80, há um esforço em compreender o papel desempenhado pela edu-
cação no processo de mobilidade social de negros e não-negros, a qualidade do ensino oferecido,
a construção da auto-imagem dos estudantes negros, o preconceito racial nas escolas contra estes
estudantes, tanto por parte dos colegas estudantes como por parte dos professores.
Em estudos na década de 90, Regina Pahim Pinto, apresenta conclusões de análises estatísticas,

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
das quais foram selecionadas as que se seguem: Crianças negras estão em maior proporção sujeita
à defasagem série/idade, tanto por motivo do ingresso tardio na escola, quanto por motivo de repe-
tência; Aos 14 anos crianças negras e mestiças estão em situação inferior às brancas em relação ao
número de séries completadas; Negros e mestiços têm menos escolaridade do que brancos,
maior número não tem acesso à escola, atinge em menor proporção 9 e 11 anos de estudos, ingres-
sam tardiamente na escola em maior número e também em maior número não consegue concluir o
1º grau (Pahim, 1992).
Neste sentido, a situação descrita acima mostra como os brasileiros de cor “preta” ou “pardas”
são excluídos maciçamente do sistema de ensino, já nos anos iniciais da escola básica, tais usuários
da instituição ficam desprovidos do domínio de conteúdos que comprovam a injustiça que a socie-
dade pratica contra os mesmos.
Para compreender a EJA, é importante lembrar que a Constituição de 1988, que é o mais impor-
tante instrumento jurídico e político do país, reconheceu, pela primeira vez, o Ensino Fundamental
como direito público subjetivo (Art. 208, inciso VII, § 1º), inclusive para aqueles que não tiveram
acesso a ele na infância ou na adolescência. Esse reconhecimento vem acompanhado de um plano
nacional que tem como objetivos a erradicação do analfabetismo, universalização do atendimento
escolar e a melhoria da qualidade do ensino (art. 214). Essa Constituição Federal trata a educação
pública e gratuita como direito para todos os cidadãos, com princípios de igualdade de condições
de acesso e permanência na escola, princípios que ao longo da história do Brasil foram negados para
a população, principalmente a negra (capítulo III, artigos 206, 207 e 208).
Em 1996, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/96) estabeleceu no capítulo II,
seção V a Educação de Jovens e Adultos52, uma modalidade de ensino e componente constitutivo
da Educação Básica. No artigo 37 define os sujeitos da EJA: “A Educação de Jovens e Adultos será
destinada àqueles que não tiveram acesso ou oportunidade de estudos no ensino fundamental e
médio na idade própria”. A questão que colocamos relaciona a EJA e a educação básica regular, visto
a primeira como fruto da segunda, enquanto não for democratizada a educação básica regular com
qualidade a EJA continuará a existir com bastante demanda. Na LDB, inexiste essa problematização,
assim como meta para democratizar o direito a educação e pensar a provisoriedade da EJA, pois a
existência dela explicita nossa fratura de classe e raça (a maioria são pobres e negros) em não opor-
tunizar acesso, permanência e sucesso escolar.
As leis federais 10.639/200353 e lei 11.645/2008 são alterações da lei 9.394/1996 , a primeira
determina a obrigatoriedade da inclusão no currículo oficial de todas as redes de ensino, da temáti-
ca “História e Cultura Afro-Brasileira e Africana”, isto é, o estudo da África e dos Africanos, a luta dos
negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando
a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil.
A segunda lei acrescenta a obrigatoriedade dos estudos da História e Cultura Indígena, passando
portanto a contemplar aspectos da cultura dos dois grupos raciais historicamente excluídos no Bra-
sil e na escola brasileira devido à herança colonizadora e a fatores contemporâneos, com sua visão
eurocêntrica e branca ganha importância negada numa sociedade racista em que a História Oficial
é contada a partir da perspectiva branca europeia, menosprezando a participação dos negros e dos
índios.
Essas leis são recentes para a sociedade brasileira e principalmente para transformações engen-
dradas a partir delas que são morosas na amplitude social no qual o racismo incide. Como esclarece
Souza, (2006, p.144) “as relações sociais construídas ao longo de trezentos anos não são alteradas de
uma hora para outra. Preconceitos profundamente arraigados não são derrubados só com doses de
52 Apesar disso, quando foi aprovada a lei do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valori-
zação do Magistério – FUNDEF pelo Congresso Nacional, o então Presidente da República Fernando Henrique Cardoso vetou o finan-
ciamento para a modalidade de EJA, alegando se tratar de uma modalidade sobre a qual o poder público não tinha controle sobre as
matrícula.
53 A promulgação dessa lei é uma conquista dos movimentos sociais negros.

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boa vontade” . Essa autora ainda trata das leis que trazem a obrigatoriedade do ensino das culturas
negras e indígenas, afirma que é espantoso que tenha de ser estabelecido por lei, tendo em vista a
importância desses temas para a compreensão da nossa sociedade. De acordo ela, essa constatação
é mais um sinal da intensidade do preconceito contra os negros e os índios no Brasil.

3- A PRESENÇA NEGRA NA EJA  E A SUA INVISIBILIDADE COMO CAMPO DE


pesqUisA
No Brasil é crescente o número de trabalhos e publicações com o enfoque na relação entre a
questão racial e o processo educacional, que buscam favorecer a abertura de espaços para discus-
sões e a busca de alternativas para minimizar a discriminação racial e o preconceito nas escolas.
Em geral, estes trabalhos, salvo suas especificidades, trazem em comum o diagnóstico de como os
negros estão submetidos a processos de exclusão no sistema de educação formal, apresentando
dados e exemplos de como isto tem ocorrido por meio de práticas e ainda do currículo explícito e do
currículo oculto 54(CAVALLEIRO, 2012; GOMES, 2001; MUNANGA 2001; Rosemberg, 2012).
No que tange a pesquisa sobre as relações raciais, no caso especifico a população negra e a Edu-
cação de Jovens e Adultos, percebe-se que há pouca produção (Correia, 2011; Kawakami, 2014, PAS-
SOS, 2005). É um campo recente de estudos e a produção não tem sido articulada à questão racial.
No entanto, de acordo com Miguel Arroyo (apud Silva, 2013) desde a sua constituição como campo
educacional os estudantes presentes na EJA são os mesmos, ou seja, em quantidade expressiva, no
decorrer da história da educação brasileira, foram os jovens e adultos que tiveram os seus direitos
à educação básica negligenciada, na sua maioria, negros que vivem processos de exclusão social e
racial (Gomes apud Oliveira e Ferreira 2012, p. 79).
Comprova-se pelo Relatório das Desigualdades Raciais no Brasil (LAESER/ IPEA – Laboratório de
Análises Econômicas, Históricas, Sociais e Estatísticas das Relações Raciais2009/10/ Instituto de Pes-
quisa Econômica Aplicada) que elevado percentual de negros são eliminados da Educação Básica
a partir das últimas séries do Ensino Fundamental, estendendo-se no Ensino Médio com prováveis
consequências, agravando-se no Ensino Superior. Por outro lado, supõe-se, que no 1º segmento da
Educação de Jovens e Adultos, que corresponde às séries iniciais do Ensino Fundamental, a presença
negra seja extremamente expressiva. Dados sobre o percentual de negros que concluíram o ensino
médio em idade regular, em taxa líquida, comprovam a sua condição de inferioridade, como eviden-
cia o Relatório das Desigualdades Raciais no Brasil (2009-10):

No ano de 2008, a taxa líquida de escolaridade no ensino médio dos homens pre-
tos & pardos foi de 35,9%, ao passo que o mesmo indicador, entre os homens bran-
cos, foi de 55,7%. Em relação ao ano de 1988, houve uma elevação no indicador de
29,9 pontos percentuais, entre os pretos & pardos, e de 35,7 pontos percentuais entre
os brancos. Em relação às mulheres, a taxa líquida de escolaridade no ensino mé-
dio foi de 49,1%, entre as pretas & pardas, e de 66,5% entre as brancas. No intervalo
1988-2008, o indicador elevou-se em 39,6 pontos percentuais entre as pretas & par-
das, e em 42,2 pontos percentuais entre as brancas. Enfim, postas estas respectivas
evoluções, as assimetrias de cor ou raça no indicador aumentaram. ( p. 222-223).
54 Considera-se neste texto o conceito de currículo oculto, apresentado e problematizado por Tomaz Tadeu da Silva no Livro
Documentos de Identidades (2009), no capítulo: “Quem escondeu o currículo oculto?” (p.77), onde o autor define o currículo oculto
como uma constituição de todos os aspectos do ambiente escolar que não faz parte do currículo oficial, mas que operacionaliza ati-
tudes, comportamentos, valores e orientações convenientes às estruturas e pautas de funcionamento “harmonioso” da escola, como
as questões de injustiças e antidemocráticas, assim como as dimensões da raça, sexualidade e do gênero. Esse autor também ressalta
que a noção de currículo oculto exerceu forte influência nas teorias em quase todas as perspectivas críticas iniciais e, com efeito, o
conceito tornou-se desgastado. Segundo ele, numa sociedade neoliberal não existe mais muita coisa oculta no currículo visto que
ele é assumidamente capitalista.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Joana Célia Passos (2005) aponta em seu artigo “Escolarização de jovens negros e negras” que pes-
quisas que analisam o estado da arte sobre a juventude e a EJA no Brasil têm indicado a inexpressiva
presença da temática racial. Érika Kawakami (2014) realizou uma pesquisa bibliográfica nas reuniões
anuais da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd), sobre traba-
lhos que articulassem as relações étnicorraciais e o campo da educação de jovens e adultos (EJA),
nos últimos 10 anos. Nesse período, encontrou apenas cinco trabalhos, e três desses publicados de
2011 a 2013. Correia (2011) realizou pesquisa no banco de teses e dissertações da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) sobre a EJA com recorte temporal de 2003 a
2010. Nela, de 2003 a 2009 encontrou 434 dissertações e apenas 9 que tematizam as questões étni-
corraciais. De 2003 a 2008 foram defendidas 39 teses e nenhuma e abordam o entrecruzamento das
relações étnicorraciais com a EJA. Ambas as pesquisadoras fazem a investigação considerando-se
o ano da promulgação da lei 10.639/03 e a constatação é a “cor” dos sujeitos da EJA ainda é pouco
pesquisada em uma década da aplicação dessa lei, assim como outras especificidades:

As pessoas jovens e adultas são sujeitos que possuem lugares sociais, identitários,
geracionais, de raça, de gênero e de orientação sexual diversos. Juventude e vida
adulta na EJA apresentam especificidades e são marcadas pela diversidade. Estas
questões não são discutidas nos textos legais e encontram-se abordadas de forma
ainda muito incipiente pelos próprios teóricos do campo (SILVA, 2013, p. 7).

Jerry Adriani da Silva (2010) lembra que ausência de uma reflexão séria sobre o racismo existente
na escola sempre foi apontada pelos grupos do movimento negro brasileiro como um dos fatores
que contribuem para que a sua (re)produção continue condicionando a trajetória escolar de milha-
res de estudantes negros e negras. Este pesquisador ressalta que além das demandas, o movimento
negro produziu propostas alternativas para a educação, bem como denunciou os mecanismos de
discriminação racial existentes na escola (p.92)
Pesquisar ou fazer a escolha de não pesquisar sobre os negros estudantes da EJA é uma questão
política imbricada a de dimensão epistemológica (BORDIEU, 1983). A produção cientifica sobre os
negros que se configuram com a maioria dos alunos dessa modalidade de ensino permite ampliar a
discussão da problemática racial no Brasil, em busca do fortalecimento de políticas públicas eficazes
e eficientes para este público. Não discutir a forte presença da população negra na EJA e o quanto
o racismo compromete de maneira contundente as história de vida e trajetórias escolares dos estu-
dantes negros e negras (MUNANGA 2001; Cavalleiro, 2012, ROSEMBERG, 2012) que se materializa
na produção de mais desigualdades sociais (Hasenbalg, 1996, 1979) favorece a perpetuação dessa
realidade.
Quando procuramos e encontramos poucas pesquisas sobre a EJA que abordam as relações ra-
ciais, buscamos “explicações” para compreender esse quadro, esse campo. A primeira questão a
colocar é a crença na Democracia Racial que segundo Hansebalg elaborou o dogma mais forte da
democracia racial. Nos outros países há uma versão fraca do mito racial brasileiro (1996, p. 237). E
lembrar que até metade do século XX, o Brasil figurava mundialmente como país que não tinha
problema do preconceito racial. Essa imagem aparente de democracia racial foi rechaçada por pes-
quisas patrocinadas pela UNESCO (Organização das nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura) que constaram a forte associação entre cor e raça e status econômico. (HANSEBALG, 1996,
1979). Esse mito ainda está enraizado na sociedade e que propaga a não existência do racismo, mas
no cotidiano vai referendar a tese da inferioridade do negro que molda as estratégias de luta (SILVA,
2010, p.96). Nessa a visão, o fracasso ou o sucesso no percurso escolar é visto, segundo a lógica da
responsabilidade individual entre supostamente iguais, uma vez que dentro da escola todos são
iguais e compartilham de um mesmo conhecimento universal e nega o racismo como um elemento
importante na produção de mais injustiça.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Outro caminho para compreender essa invisibilidade é questão de classe e raça. Munanga (2013)
traz uma frase que as pessoas usam muito no Brasil para negarem o racismo ou subordinar raça à
classe: “ o problema do negro é social”, o sentido colocado no social é o de classe na argumentação
que a condição das desigualdades e racismo é em razão do negro ser pobre e não pela cor/raça. E
Munanga descontrói ao mostrar que a questão racial é social, pois, foi construída, consolidada pós-
-abolição e faz parte da nossa vida. E pensar a classe como uma identidade mestra para compreen-
der a sociedade (Hall, 1999) é um paradigma bem presente na academia. Os estudos que têm sido
feito no Brasil, desde os anos 1970, têm mostrado que a condição econômica não é a única explica-
ção para a desigualdade que observamos no Brasil entre brancos e negros. Hall também faz a crítica
a classe social que não comporta inúmeras outras questões, e muito menos uma identidade mestra.
Quando se trata de alunas negras e alunos negros da EJA há uma dupla discriminação: por serem
analfabetos numa sociedade que valoriza a cultura letrada, e por ser negro. Historicamente, os sujei-
tos que fazem parte da EJA têm sido estigmatizados por sua condição de não alfabetizados, sofrem
preconceito por essa condição que é fruto da negação de um direito de cidadania à educação. Esse
estigma percebido de maneira contundente nesta modalidade de ensino em que a maioria dos alu-
nos é negra revela uma sociedade excludente e racista que se expressa em sua cor a lógica precon-
ceituosa de nossa escola. “E a identidade do negro está intrinsecamente relacionada à exclusão da
participação política e econômica e do pelo exercício da cidadania.”( MUNANGA, 2009, p.16). Nesse
contexto, as identidades que se cruzam Hall (1999) são alvo de mais esses processos de discrimina-
ção exclusão.

4- considerAções finAis
Na produção deste texto, percebemos que há pouca produção academia que aborde a Educação
de Jovens e Adultos articulada às questões raciais nos recortes temporal e espacial (Anped e Capes),
contraditoriamente a população negra é a maioria nesta modalidade, como comprovam as estatísti-
cas. Nesta constatação, é importante pensar que a temática EJA é recente, a imagem de Democracia
Racial do Brasil, além de outros fatores que não foram discutidos aqui tendo em vista a limitação do
trabalho.
Sinalizamos a importância de haver mais pesquisadores que investiguem essa realidade onde
cor/raça aparece como característica preponderante. Para sairmos da invisibilidade e da naturali-
zação no campo da construção do conhecimento que refletem o lugar que tem sido destinado so-
cialmente à população negra e termos subsídios para construção de políticas públicas educacionais
que modifiquem as condições e oportunidades, principalmente para os jovens e adultos negros.

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de joVens e AdUltos
mArisA beAtriz bezerrA leAl | ceciliA Amorim moreirA de AzeVedo
lUciAnA getirAnA de sAntAnA

A evasão na Educação de Jovens e Adultos (EJA) sempre foi preocupante. A necessidade de tra-
balhar, o horário ofertado pela escola e problemas familiares são fatores informados pelos alunos
da EJA como causa do abandono. Entretanto percebemos que além destes, outros fatores também
contribuem. Neste sentido, o trabalho de Pedralli (2013) contribui para lançar um novo olhar uma
vez que a autora nos apresenta possíveis relações do fenômeno com as questões e práticas de letra-
mento, bem como nos leva a refletir sobre a aproximação entre as condições de insider ou outsider.
Alguns autores nos lançam mão da questão curricular, nos demonstrando que a simples redução de
conteúdos escolares trabalhados em turmas de ensino regular nas turmas da EJA pode também ser
um fator preponderante no processo de abandono da escola por parte dos alunos. Esta pesquisa
tem como objetivo reconhecer as diferenças existentes na estrutura curricular da escola básica de
currículo comum e da EJA, com o intuito de verificar se os conteúdos trabalhados nas salas de aula
da EJA refletem os interesses de aprendizagem dos estudantes desta modalidade de ensino. Outro
ponto de observação é se a organização curricular do Ensino Médio para jovens e adultos é pensada
a partir da estrutura vista no Ensino Fundamental ou se é feita de forma isolada, desconsiderando
os pontos antes destacados e evidenciando outros que foram eliminados para a EJA. Com esse le-
vantamento pretende-se repensar essa estrutura e com isso identificar possíveis causas da evasão.

palavras-chave: Educação de Jovens e Adultos, evasão escolar, currículo

A evasão na Educação de Jovens e Adultos (EJA) sempre foi preocupante. A necessidade de tra-
balhar, o horário ofertado pela escola e problemas familiares são fatores informados pelos alunos
da EJA como causa do abandono. Entretanto percebemos que além destes, outros fatores também
contribuem. Neste sentido, o trabalho de Pedralli (2013) contribui para lançar um novo olhar uma
vez que a autora nos apresenta possíveis relações do fenômeno com as questões e práticas de le-
tramento, bem como nos leva a refletir sobre a aproximação entre as condições de insider ou outsi-
der. Alguns autores como ROSÂNGELA PEDRALLI, MARY E. CERUTTI-RIZZATTI, INÊS B. DE OLIVEIRA e
SANDRA MÁRQUEZ preocupados com a estrutura curricular com forma de abandono da escola por
parte dos alunos nos levam a refletir sobre a questão curricular da EJA que não deve ser uma simples
redução de conteúdos escolares trabalhados em turmas de ensino regular. Por outro lado VARGAS
e SANTOS (2013) nos alertam sobre sentimentos contraditórios que a Matemática suscita entre as
pessoas.

A percepção da matemática como uma disciplina “difícil” e “inacessível” é gene-


ralizada no meio social. É possível perceber todo um imaginário social e especifica-
mente discente sobre “gênios que enfrentam desafios sobre-humanos para vencer a
matemática”, reforçando a compreensão de que é necessário “talento e dom” para
aventurar-se por este campo do conhecimento. Neste cenário a disciplina e os ma-
temáticos são em geral tratados numa representação alegórica e mítica. (VARGAS;
SANTOS, 2013, p. 72)

Para os alunos de EJA esses sentimentos contraditórios são mais marcados, pois grande parte
deles foram levados a abandonar os bancos escolares devido, não só, as dificuldades encontradas

230
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
na relação ensino-aprendizagem da matemática, como também pela falta de preparo das escolas de
trabalhar com essas dificuldades, em seu trabalho MOLLICA & LEAL tratam desse tema e acreditam
que: “A conquista da escrita matemática , assim como a escrita da língua materna, pressupõe percur-
so longo que exige vários anos de esforços escolares para que sua aprendizagem seja significativa”.
(MOLLICA & LEAL, 2006, p.41). Para STREET, apud PEDRALLI; RIZZATTI, reafirma que a constância do
aluno nas aulas e consequente término dos estudos depende de ações didático- pedagógicas por
parte da escola.

A compreensão de que é da alçada dos alunos a responsabilidade pela perma-


nência e por seu êxito na escolarização, compreensão essa flagrantemente pautada
no modelo autônomo de letramento (STREET, 1984), é o que carreia o entendimento
de que, sendo assim, cabe à escola, e por consequência aos seus atores sociais, em-
preender as ações didático-pedagógicas tal qual se desenham ao longo da história
e, como componente adicional, resultante dessa realidade de evasão, proceder a um
sem número de movimentos no espaço escolar que visem à “motivação” constante
desses sujeitos à permanência na escola. (STREET, 1984, apud PEDRALLI; RIZZATTI,
2013, p.772)

Em seu trabalho MOLLICA & LEAL permeiam ainda o tema da adaptação do ensino a realidade
e necesidade do aluno da EJA fora da sala de aula, defendendo que esse aluno já traz com ele uma
bagagem intelectual que não deve ser desconsiderada e que as práticas pedagógicas devem ser
pensadas levando em consideração as necessidades desses alunos fora de sala de aula.

A aquisição do conhecimento matemático não se inicia quando o indivíduo in-


gressa num sistema educacional. Grande parte dos cálculos realizados fora da esco-
la verifica-se a partir de situações práticas, nas quais nem sempre é possível se dispor
de lápis e papel e cujas respostas não precisam ser necessariamente exatas. (MOLLI-
CA & LEAL, 2006, p.42)

A preocupação com a permanência dos alunos da Educação de Jovens e Adultos no ambiente


escolar e na continuação dos seus estudos é comum nas ações governamentais como podemos
constatar na citação a seguir de (KLEIMAN, 2001) acerca do relatório encomendado pela Unesco ao
Instituto Internacional de Alfabetização/Letramento para apresentação no Fórum sobre Educação
Mundial realizado em Dacar em 2000.

Assim, uma outra importante conclusão do documento é a de que um grande


desafio para programas de Educação Básica de Jovens e Adultos para a próxima dé-
cada é o desenvolvimento profissional. Seria esse desenvolvimento o que permitiria
chegar a soluções locais para os problemas globais, como o absenteímos e o aban-
dono generalizado dos cursos pelos alunos. Uma outra inovação é a recomendação
de implementaçãode programas adaptados às condições e contextos particulares
das comunidades envolvidas. (KLEIMAN, 2001, p. 272)

Esta pesquisa tem como objetivo reconhecer as diferenças existentes na estrutura curricular da
escola básica de currículo comum e da EJA, com o intuito de verificar se os conteúdos trabalhados
nas salas de aula da EJA refletem os interesses de aprendizagem dos estudantes desta modalidade
de ensino. Outro ponto de observação é se a organização curricular do Ensino Médio para jovens e

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
adultos é pensada a partir da estrutura vista no Ensino Fundamental ou se é feita de forma isolada,
desconsiderando os pontos antes destacados e evidenciando outros que foram eliminados para a
EJA. Com esse levantamento pretende-se repensar essa estrutura e com isso identificar possíveis
causas da evasão.
A Educação de Jovens e Adultos (EJA) é um modelo de ensino que serve a pessoas que por di-
versos motivos não começaram ou concluíram, na idade correta, a formação na Escola Básica. Gran-
de parte do público ao qual se destina a EJA é da classe popular que procurar dar continuidade aos
estudos em busca de melhores oportunidades de emprego. No entanto ao chegarem à escola, estes
se deparam com diversos entraves que culminam com o abandono dos estudos.
Os altos índices de evasão na EJA sempre foram pontos preocupantes, a vida profissional já
iniciada requer uma flexibilização de horários, nem sempre ofertada pelas escolas. A falta de apoio
entre os familiares e não adaptação dos conteúdos a realidade por eles vividas também são causas
freqüentes para afastar-se da escola, e é nesse último que vamos dedicar nossa atenção.
Diversos autores discutem a questão curricular, da forma como é pensada em diversas esco-
las não favorecem, pelo contrário afastam o interesse desse aluno, que já precisa lidar com vários ou-
tros obstáculos fora da sala de aula. A simples redução dos conteúdos praticados no Ensino Regular,
para que eles simplesmente se adaptem à grade horária reduzida não incentiva o aluno a continuar
em sala de aula.
Nesse trabalho, que se encontra em andamento, visando tentar compreender a evasão es-
colar nessa modalidade de ensino (EJA), tomamos como objeto de pesquisa a análise de parte das
estruturas curriculares do Ensino Regular e da Educação de Jovens e Adultos das redes municipal e
estadual do Rio de Janeiro. A partir da comparação entre as orientações curriculares de ambos com
seus objetivos, conteúdos e habilidades que devem ser desenvolvidas com os alunos.
A escolha dos blocos Números e Operações e Espaço e Forma se deu pelo fato dos mesmos con-
ter uma maior quantidade de conteúdos a serem desenvolvidos ao longo de todos os ciclos da EJA
do Ensino Fundamental.
Ao comparar essas estruturas curriculares percebemos que há uma despreocupação com os cri-
térios norteadores dos cortes de conteúdos do ensino regular para a EJA. De uma forma geral, a
parte suprimida é sempre a de apresentação dos conteúdos, enquanto o currículo comum se preo-
cupa em reservar o momento de apresentação dos itens, com o uso recorrente de material concreto,
remetendo a situações cotidianas. Na EJA muitas vezes essa apresentação é feita de forma exclusi-
vamente teórica, e quando se preserva esse tempo de apresentação sempre se juntam vários ou-
tros itens. Isso faz com que ideias tidas como simples como as quatro operações básicas não façam
sentido se problematizadas.

(Orientações Curricu-
lares para a Educação
de Jovens e Adultos
de Matemática, Rio
de Janeiro, Secretaria
Municipal de Educa-
ção 2010)

232
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Outro ponto importante foi à percepção de que no desenvolvimento de habilidades para reso-
lução de operações da estrutura curricular regular existe um momento reservado para utilização de
ferramentas concretas como, por exemplo, o uso de calculadora visando o uso dessa tecnologia e
oportunizando aos alunos a verificação dos resultados das operações realizadas através do uso de
algoritmos.

(Orientações Curriculares do 1º ao 9º ano de Matemática, Rio de Janeiro, Secretaria Municipal de


Educação 2013)
Em relação à EJA esse momento não é previsto na sua estrutura curricular, levando muitos pro-
fessores a desconsiderar as dificuldades desses alunos de abrirem mão do cálculo mental e dos seus
registros próprios para trabalharem com os algoritmos trabalhados na escola.

É preciso que o professor experimente um novo olhar sobre seu aluno, que reco-
nheça os conhecimentos construídos fora do ambiente escolar, que compreenda a
complexidade que acompanha a diversidade cultural. É necessárioque respeite esses
alunos jovens e adultos, que se viram forçados de forma prematura a se retirarem da
escola e que a ela retornam por acreditarem ser um espaço democrático, que opor-
tuniza a melhoria de vida. Esperam também, através deste retorno, garantir o seu
direito de aprender. (SANTANA, L. G & VERGETTI, N., p. 62)

Pelo exposto podemos concluir que seleção de conteúdos e forma como eles são trabalhados na
EJA poderiam ser resignificados de forma a atender e a gerar um fio condutor capaz de ligar a mate-
mática escolar com a matemática da vida e dessa forma melhor atender as expectativas dos alunos
da EJA com o objetivo de incentivar sua permanência na escola.

referênciAs
KLEIMAN, A. B. Programas de educação de jovens e adultos e pesquisa acadêmica: a contribuição
dos estudos do letramento. Educação e Pesquisa, São Paulo, v.27, n.2, jul.-dez. 2001. Disponível em:
< http://www.scielo.br/pdf/ep/v27n2/a06v27n2.pdf .> Acesso em: 10 de outubro de 2014
MOLLICA, C. & LEAL, M. , Lingüística: práticas Pedagógicas, organizadores Camilo Rosa Silva, Derme-
val da Hora, Camilo, Maria Elizabeth A. Christiano, Português e Matemática: Parceria indispensável em
Política Educacional, Santa Maria, Palotina, 2006.

OLIVEIRA, I. B. Reflexões acerca da organização curricular e das práticas pedagógicas na EJA. Educ.

233
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
rev.    no.29  Curitiba    2007. Disponível em: < http://dx.doi.org/10.1590/S0104-40602007000100007>
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VARGAS, H. M. Represando e distribuindo distinção: o ensino superior no Brasil. Tese de Doutorado.
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SANTANA, L. G. & VERGETTI, N. Refletindo sobre a formação de professores de matemática que tra-
balham com alunos jovens e adultos in MOLLICA. M. C. & LEAL, M. Construindo o capital formal das
linguagens, Curitiba, Editora CRV, 2010.
MARQUEZ, S. Currículo e metodologia da EJA: Uma questão de reconstrução. São Leopoldo, Rio
Grande do Sul, 2010.
SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DO RIO DE JANEIRO, Orientações Curriculares Para Jovens
e Adultos, 2010, disponível em: http://www.rio.rj.gov.br/dlstatic/10112/4246634/4104948/Matematica-
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VARGAS, H. M. & SANTOS, F. L. M. Formação e Carreira Docente em Matemática: Algumas Antinomias
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rói, Rio de Janeiro.
STREET, B. Literacy in theory and practice 1984. In PEDRALLI R; RIZZATTI M. E. C. Evasão escolar na
educação de jovens e adultos: problematizando o fenômeno com enfoque na cultura escrita. RBLA,
Belo Horizonte, v. 13, n.3, p. 771-778, 2013.
SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DO RIO DE JANEIRO, Orientações Curriculares do 1º ao 9º
ano , 2013, disponível em: http://www.rio.rj.gov.br/dlstatic/10112/4246635/4104937/MAT_Orientaco-
es_2013.pdf Acesso dia 10 de maio de 2014.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
reflexões, desAfios e propostAs pArA edUcAção físicA
nA ejA: como gArAntir o Acesso de irenes, frAnciscos,
mAriAs e seVerinos Aos conteúdos dA cUltUrA
corporAl de moVimentos.
mArcelo lUiz de soUzA

A Educação Física foi incluída como componente curricular obrigatório na educação básica a par-
tir da promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - Lei 9.394 de 1996. Desde
então, a Educação Física passou a ser obrigatória pelos níveis e modalidades de ensino, entretanto
abria exceções aos estudantes do ensino noturno, deixando sua pratica facultativa Mais tarde em
2003, a Lei nº 10.793, alterou a redação do artigo 26, parágrafo 3º, da Lei nº 9.394/96 e incluiu a
Educação Física como sendo obrigatória em toda a educação básica, inclusive no ensino noturno,
porém, deixando a prática facultativa nos seguintes casos: I – que cumpra jornada de trabalho igual
ou superior a seis horas; II – maior de trinta anos de idade; III – que estiver prestando serviço militar
inicial ou que, em situação similar, estiver obrigado à prática da educação física; IV – amparado pelo
Decreto-Lei nº 1.044, de 21 de outubro de 1969; V – (VETADO); VI – que tenha prole. Como fazer com
que os alunos desenvolvam competências e habilidades e construam novas aprendizagens através
das aulas de Educação Física no ensino noturno (EJA), se a lei limita sua prática. Nota-se que maioria
dos alunos estará dispensada da participação nas aulas de Educação Física. Esse foi um entrave, con-
tudo, um grande desafio. O que fazer? Os alunos na sua maioria são trabalhadores, tendo que dividir
atenção e disposição entre os estudos, o trabalho e muitas vezes a família. Desta forma, acredita-se
que a Educação Física possa representar um espaço de ruptura do tempo de trabalho assalariado e
do tempo de “não trabalho”, através do conhecimento da cultura corporal de movimento. Propus
uma mudança de paradigma conceitual que se traduz não por alcançar metas de aprendizagem a
partir de modelos motores pré-concebidos, mas sim, um olhar sobre a “experiência” do aluno.

palavras-chave: Educação Física, Cultura corporal, Experimentação

*Este projeto de pesquisa acadêmica vem sendo realizado no Colégio Santo Inácio – RJ, na educação
de jovens e adultos. O Colégio Santo Inácio, no início de 2012 lançou edital para propostas de pesquisa
acadêmica em várias linhas. A linha de estudo que está articulada esta pesquisa é a de currículo.
* Foi premiado no Prêmio Victor Civita Educador Nota Dez, como os melhores vinte (20) trabalhos
no ano de 2013.

histórico/introdUção
No segundo semestre de 2011 fui contratado para atuar como professor de Educação Física na
EJA no Colégio Santo Inácio-RJ (colégio católico jesuíta). No ensino diurno tem aulas regulares da
educação infantil ao ensino médio. Presente no ensino noturno-EJA há quarenta e cinco anos, ofe-
rece o curso de jovens e adultos para população mais empobrecida através de bolsas de estudos,
atendendo aproximadamente 800 alunos.
Inicialmente, nas aulas de Educação Física, atendia-se todos os alunos das 18h e 20min às 19h,
onde a grande maioria não frequentava devido ao horário de trabalho, mobilidade urbana (muitos
não conseguiam combinar saída de trabalho com chegada ao colégio) e pelo fato de “menospre-

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
zarem” à disciplina de Educação Física, achando que não tinham valor para sua formação, por puro
desconhecimento e pelas vivências com as aulas que nunca tiveram. Amparados pela questão legal
(legislação que prevê a dispensa das aulas práticas), muitos não frequentavam, mas fui aos poucos
quebrando essas barreiras e trazendo os alunos para as aulas.
Outro momento de “encontro” com a Educação Física era no conselho de classe, dias nos quais
todos os alunos eram “obrigados” a comparecerem, pois a lei refere-se apenas como facultativa as
aulas práticas, nas aulas teóricas teriam que frequentar. Essa foi a solução encontrada para reunir
todos os alunos em torno da aula de Educação Física. Enquanto os outros professores estavam reu-
nidos no conselho de classe, os alunos dessas turmas eram dirigidos para o auditório onde teriam
aula teórica de Educação Física. Nessas aulas (aproximadamente 1h e 20min) tratava de vários as-
suntos relacionados à saúde e a qualidade de vida: Higiene, funcionamento do corpo, nutrição, en-
velhecimento, cérebro e aprendizagem, treinamento, drogas e anabolizantes, composição corporal,
frequência cardíaca, respiratória, alongamentos, conhecimento e cuidados com o corpo, o corpo
e seus limites, autoestima e atividade física, ergonomia, atividade física como caráter permanente,
sedentarismo, lazer, aptidão física, doenças crônicas não transmissíveis, “academias de saúde”. Usava
como estratégia pedagógica o power point e vídeos para tratar dos temas abordados, depois os alu-
nos faziam a avaliação que era sobre o conteúdo apresentado na aula. Era um momento único, pois
todos os alunos estavam presentes. Nos anos de 2012 e 2013 ainda trabalhava-se com Educação
Física no Colégio Santo Inácio com esta perspectiva.
Hoje, valorizados pelos trabalhos realizados e conscientes da importância da Educação Física na
EJA, o Colégio Santo Inácio-noturno aprovou que a partir de fevereiro 2014 (início do ano letivo)
cada turma tivesse 1(um) tempo semanal para aulas de Educação Física. Uma grande conquista para
os alunos e para Educação Física que passou efetivamente a ser valorizada como componente cur-
ricular obrigatório.

jUstificAtiVA
A Educação Física foi incluída como componente curricular obrigatório na educação básica a par-
tir da promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - Lei 9.394 de 1996. Desde
então, a Educação Física passou a ser obrigatória pelos níveis e modalidades de ensino, entretanto
Mais tarde em 2003, a Lei nº 10.793, alterou a redação do artigo 26, parágrafo 3º, da Lei nº 9.394/96
e incluiu a Educação Física como sendo obrigatória em toda a educação básica, inclusive no ensi-
no noturno, porém, deixando a prática facultativa nos seguintes casos: I – que cumpra jornada de
trabalho igual ou superior a seis horas; II – maior de trinta anos de idade; III – que estiver prestando
serviço militar inicial ou que, em situação similar, estiver obrigado à prática da educação física; IV –
amparado pelo Decreto-Lei nº 1.044, de 21 de outubro de 1969; V – (VETADO); VI – que tenha prole.
Como fazer com que os alunos desenvolvam competências e habilidades e construam novas
aprendizagens através das aulas de Educação Física no ensino noturno (EJA), se a lei limita sua prá-
tica. Nota-se que maioria dos alunos estará dispensada da participação nas aulas de Educação Fí-
sica. Esse foi um entrave, contudo, um grande desafio. O que fazer? Os alunos na sua maioria são
trabalhadores, tendo que dividir atenção e disposição entre os estudos, o trabalho e muitas vezes a
família.
Desta forma, acredita-se que a Educação Física possa representar um espaço de ruptura do tem-
po de trabalho assalariado e do tempo de “não trabalho”, através do conhecimento da cultura cor-
poral de movimento. Assim, este trabalho, justifica-se não só para atender as necessidades legais
(inclusão da Educação Física na estrutura curricular), mas também, construir uma proposta pedagó-
gica adequada às características dos alunos da educação de jovens e adultos, garantindo a eles um
espaço de apropriação de saberes e construção de conhecimentos, estimulando-os para adoção de
um estilo de vida mais ativo, que garanta não só mais saúde e qualidade de vida, mas melhore sua

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
autoestima e amplie suas relações.
Portanto, entende-se a Educação Física escolar na EJA, como uma disciplina que introduz e inte-
gra o aluno na cultura corporal de movimento, a partir de suas experiências nesse contexto, mas cla-
ro, sempre tentando ampliar suas possibilidades corporais a partir de vivências motoras específicas.
Os alunos jovens e adultos caracterizam-se como um grupo heterogêneo, do ponto de vista da
faixa etária, da cultura, da visão de mundo, dos conhecimentos prévios e dos aspectos neurológicos
relacionados ao aprendizado. A escola representa para eles um espaço ao mesmo tempo de recolo-
cação social, de sociabilidade, de formalização do saber e de desenvolvimento pessoal. Nesse senti-
do, os alunos jovens e adultos diferem em muitos aspectos das crianças, e isso deve ser considerado
quando da seleção de conteúdos e da metodologia das aulas. A valorização do desempenho, com
pouca ênfase no prazer, a abordagem técnica com referência em modelos muito avançados e, prin-
cipalmente, uma concepção de ensino que deixa como única alternativa ao aluno adaptar-se ou não
a modelos motores predeterminados, pode resultar em exclusão.

objetiVos gerAis
• Construir uma prática pedagógica sistematizada para Educação Física na educação de jo-
vens e adultos (EJA) que valorize e respeite as “experiências” do aluno e sobre ela, recons-
truir e continuar construindo seus significados sobre a cultura corporal de movimento.
• Identificar dentro do campo curricular quais as teorizações que podem ser analisadas e
consideradas para o ensino da Educação Física na EJA.
• Considerar a “construção” de uma tendência pedagógica específica para Educação Física
EJA, analisando as tendências pedagógicas históricas da Educação Física escolar e suas re-
lações com as teorias curriculares.

objetiVos específicos
• Conscientizar o aluno a partir de suas “experiências” para a adoção de um estilo de vida
mais ativo, fundamentado em uma prática pedagógica corporal específica para EJA.
• Estimular o gosto e o prazer pelas atividades físicas através das aulas de Educação Física e,
com isso, desenvolver competências e habilidades para o gerenciamento de suas ativida-
des corporais fora da escola.
• Estimular a construção de valores pessoais e sociais a partir das atividades de movimento,
melhorando sua autoestima, sua relação com o “outro” ampliando sua visão de mundo
para além de suas experiências.

conteúdos cUrricUlAres
Alguns questionamentos apareceram quando iniciei o planejamento e a seleção de conteúdos
para este projeto. - Como organizar os conteúdos da Educação Física para EJA se não temos práticas
sistematizadas que possam servir como referência. - Como trabalhar e atender a “heterogeneidade”
do grupo. - Como resolver a questão da dispensa nas aulas. - Como valorizar as experiências, inte-
grando e fazendo os alunos usufruírem dos conteúdos da cultura corporal de movimento.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais colocam os conteúdos da Educação Física em três blocos:
(a) esportes, jogos, lutas e ginásticas; (b) atividades rítmicas e expressivas e (c) conhecimento sobre
o corpo.
Para o desenvolvimento deste projeto trabalhei os conteúdos em outro paradigma. Analisei as
contribuições de diversos autores e trouxe para este projeto, uma proposta pedagógica com con-

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
teúdos e metodologia específica para as aulas de Educação Física na EJA. Foram consideradas as
condições das instalações, materiais e meios auxiliares disponíveis no Colégio. Reitero, contudo, que
esta prática pode ser adaptada em qualquer outro lugar, considerando as intervenientes de cada
processo, bem como a realidade de cada local.
Os conteúdos foram trabalhados em quatro (4) “núcleos de movimentos” observando as ques-
tões desenvolvidas por Oliveira (1997, 1999, 2001).
Núcleo 1 - Movimentos em descoberta do corpo: Habilidades motoras de base: locomotoras
(andar, correr, saltar, saltitar, galopar, rolar, rastejar, subir, etc); não locomotoras (flexionar, estender,
torcer, girar, levantar, etc); manipulativas(lançar, receber, arremessar, bater, rebater, volear, chutar,
quicar, amassar e etc); coordenação motora; esquema corporal; percepção corporal.
Núcleo 2 - Movimentos nas manifestações lúdicas e esportivas: Jogos (motores, sensoriais, cria-
tivos, intelectivos e pré-desportivos); circuitos psicomotores; esporte institucionalizado adaptado;
atividades alternativas.
Núcleo 3 - Ginásticas, lutas, atividades aquáticas (hidroginástica e natação) exercício de Pilates,
danças, brinquedos cantados, cantigas de roda, outros. : Ginásticas, lutas, atividades aquáticas (hi-
droginástica e natação) exercício de Pilates, danças, brinquedos cantados, cantigas de roda, outros.
Núcleo 4 - Movimentos e a saúde: Higiene, funcionamento do corpo, nutrição, envelhecimen-
to, cérebro e aprendizagem, treinamento, drogas e anabolizantes, composição corporal, frequência
cardíaca, respiratória, alongamentos, conhecimento e cuidados com o corpo, o corpo e seus limites,
autoestima e atividade física, ergonomia, atividade física como caráter permanente, sedentarismo,
lazer, aptidão física, doenças crônicas não transmissíveis, “academias de saúde”.

sistemAtizAção dAs AUlAs.


Como são realizadas as aulas de Educação Física no Colégio Santo Inácio – curso noturno? A dis-
pensa para as aulas de Educação Física prevista na lei 10.793/03 quer dizer que o aluno não precisa
frequentar as aulas? Algumas escolas dispensam o aluno e fazem com que ele não compareça as
aulas e nem realize avaliações, tendo como referência a lei 10.793. No Colégio Santo Inácio – RJ, a
referência foi estimular a participação acreditando que esta é uma oportunidade real dos alunos a
partir das suas “experiências corporais” sentir e perceber o seu corpo, desenvolver sua corporeidade,
ter consciência das suas ações e cuidados com sua saúde e qualidade de vida.
As aulas oferecem uma oportunidade para os alunos ampliarem os conhecimentos sobre as prá-
ticas corporais existentes, em atividades teóricas e práticas usando recursos diversos. Não temos
alunos “dispensados”, usamos o bom senso e critérios específicos para avaliar cada caso. De alguma
maneira, os alunos devem realizar uma atividade dentro de suas possibilidades corporais (trabalho
respiratório, alongamentos, massagens) facilitado pela presença de mais um profissional e estagiá-
rio.

releVânciA e fUndAmentAção
As discussões no âmbito da Educação Física para EJA, com práticas expressas na cultura corporal,
devem considerar que os alunos já possuem uma representação da escola, da atividade física e da
Educação Física escolar (se em algum momento frequentaram a escola e se tiveram aulas de edu-
cação física), formada a partir das vivências que compõem a história pessoal de cada um, por isso, é
importante incluir na perspectiva do ensino, como um dos eixos norteadores das ações educativas
para jovens e adultos, possibilidades que resgatem as memórias que foram ancoradas a partir das
vivências das diferentes práticas da cultura corporal. Isto representa valorizar e respeitar a história
pessoal do aluno e, sobre esta, reconstruir e continuar construindo os significados do movimento e
da cultura corporal (BRASIL, 1998; COLETIVO DE AUTORES, 1992; BRACHT, 1991; BETTI, 1991 e KUNS,

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
1991).
É importante entendermos também, dentro de uma perspectiva crítica, que os conteúdos devem
ser ampliados em suas experimentações a partir das condições específicas que cada local oferece
aos alunos. Como disse Saviani (1983), os conteúdos não pertencem a um grupo social específico,
eles pertencem a humanidade.
A questão fundamental sobre “o quê ensinar” na Educação Física na EJA, não é uma tarefa simples
pelas questões históricas travadas pela disciplina, além da pouca produção científica nessa área.
Devemos compreender que a questão curricular da Educação Física na EJA deve se configurar a
partir dos contornos políticos, culturais, sociais e epistemológicos que envolvem o conhecimento e
a educação. Desvendar as relações que envolvem o currículo escolar, é condição necessária para a
atuação pedagógica na Educação Física na EJA.
É preciso deixar claro que a sistematização dos conteúdos é apenas um aspecto, o ponto crucial,
anterior à questão da sistematização, é definir o que é absolutamente necessário ensinar nas aulas
de Educação Física na EJA. Ao tomarmos contato com a história das teorias do currículo, principal-
mente a partir da obra de Silva (2011), podemos analisar o currículo escolar a partir de três grandes
eixos: as teorias tradicionais ou conservadoras, as teorias críticas e as teorias pós-críticas.
Para Silva (2011) as teorias do currículo se caracterizam pelos seguintes conceitos:
Teorias Tradicionais: se caracterizam pelo ensino, aprendizagem, avaliação, metodologia, didáti-
ca, organização, planejamento, eficiência e objetivos.
Teorias Críticas: se caracterizam pela ideologia, reprodução cultural e social, poder, classe social,
capitalismo, relações sociais de produção, conscientização, emancipação, currículo oculto, resistên-
cia.
Teorias pós-críticas: se caracterizam pela identidade, alteridade, diferença, subjetividade, signi-
ficação, discurso, saber e poder, representação, cultura, gênero, raça, etnia, sexualidade, multicul-
turalismo. Para este autor as teorias tradicionais são teorias de aceitação, ajuste e adaptação, ao
contrário, as teorias críticas, são teorias de desconfiança, questionamento e transformação radical.
A discussão sobre o currículo escolar vai além de uma seleção de conhecimento, envolve uma
relação de poder que se estabelece como um “documento de identidade”, como disse Tomaz Tadeu
da Silva em seu livro (Documentos de Identidade: Uma introdução às teorias do currículo).
Assim, o currículo não é um elemento neutro de transmissão do conhecimento social. Ele está
imbricado em relações de poder e é expressão do equilíbrio de interesses e forças que atuam no sis-
tema educativo em um dado momento, tendo em seu conteúdo e formas, a opção historicamente
configurada de um determinado meio cultural, social, político e econômico (SILVA, 2011). O currícu-
lo passou a preocupar menos com o “como” o conhecimento deve ser organizado e passou refletir
sobre o porquê tal conhecimento é organizado, assumindo uma visão crítica de que o currículo não
é neutro e está imerso em relações de poder (MOREIRA e SILVA, 2002; SILVA, 2011).
Não só as questões de poder, mas as questões culturais, também são relevantes para compre-
ensão da prática curricular. Neste sentido, Souza (2008) questiona o porquê a escola ensinar deter-
minados conhecimentos e não outros. Por que alguns saberes são considerados mais relevantes e
legítimos e outros são deixados de fora e relegados ao esquecimento? Vários autores colocaram a
questão cultural e de poder para analisarem suas implicações no currículo: Baudelot, Althusser, Bor-
dieu, Passeron, Establet, Bernstein, Young, Witthy, Gramsci, Bowles, Gintis e Aplle, têm demonstrado
que o sistema educacional e cultural é elemento importante na manutenção e reprodução das rela-
ções de exploração e dominação da sociedade capitalista.
E como devemos entender o currículo a partir do mundo moderno e contemporâneo e suas
práticas? O currículo, a partir da teoria pós–crítica, deve ser visto como um complemento, como

239
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
uma forma de aprofundamento e ampliação às teorias críticas. Segundo Silva (2011), o currículo
deve ser visto como espaço de poder e lutas e como uma construção social. Deve-se priorizar a pro-
blematização, a contextualização, o discurso, o diálogo, instigando o aluno na sua fala com a realida-
de. O professor deve se preocupar não com os saberes prontos, mas caminhar junto com os alunos
numa experiência vivenciada. Os conteúdos devem ter comunicação com a vida, com a realidade
dos alunos e sua aplicabilidade na prática (FREIRE, 1983, 2011).
Outra questão que é observada nesta pesquisa são as tendências pedagógicas no campo da
Educação Física escolar. Castellani Filho (1999) menciona que as teorias pedagógicas na Educação
Física escolar estão organizadas em dois grupos: teorias propositivas (sistematizadas e não-sistema-
tizadas) e as não-propositivas.
As teorias propositivas – sistematizadas abordam a Educação Física indicando metodologias
para o ensino, com ou sem sistematização do currículo. As teorias propositivas não-sistematizadas
apontam para uma configuração de Educação Física escolar, sem sistematização metodológica. Já
as teorias não-propositivas abordam a Educação Física sem estabelecer metodologias para seu en-
sino e, por isso, são apontadas como abordagens, não como tendências pedagógicas.
Segundo Darido (2001) as tendên-
cias pedagógicas no âmbito da Edu-
cação Física Escolar podem ser defini-
das como movimentos engajados de
renovação teórico-prática com o ob-
jetivo de estruturação do campo de
seus conhecimentos que são específi-
cos da Educação Física. Neste sentido,
Melo e Martinez (2012), nos mostram
as tendências ou abordagens pedagó-
gicas relacionadas ao contexto históri-
co, político e social da Educação Física
em cada época: Higienista, esportivi-
zação, escola nova, psicomotricidade,
construtivista, desenvolvimentista,
crítico-superadora, crítico - emanci-
patória, ensino aberto, motricidade
humana, sistêmica, jogos cooperativos, saúde renovada, Educação Física plural(abordagem cultu-
ral), os PCn’s. A Educação Física humanista, a abordagem fenomenológica e a abordagem da apti-
dão física.
Nossa questão principal é analisar todas essas contribuições e trabalhar na perspectiva de
construir práticas sistematizadas específicas para EJA na Educação Física escolar

conclUsão.
Com o desenvolvimento desta pesquisa, esta sendo possível ver IRENES, FRANCISCOS, MARIAS
E SEVERINOS e tantos outros, usufruindo criticamente dos conteúdos da cultura corporal de movi-
mentos, construindo suas “identidades corporais”, realizando práticas, sendo felizes se movimen-
tando, melhorando sua autoestima, seu rendimento escolar, suas relações sociais, possibilitando
também aos alunos a adoção de um estilo de vida mais ativo.

bibliogrAfiA
BETTI, M. Educação Física e Sociedade. São Paulo: Movimento, 1991.

240
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
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241
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
relAto de experiênciA: inclUsão escolAr de
estUdAntes público-AlVo dA edUcAção especiAl em
tUrmAs de ejA
pAtríciA ferreirA de AndrAde | liliAne sAnchez
eric henriqUe ferreirA jordão

Este estudo visa descrever uma das ações educativas realizadas num projeto de acompanhamen-
to pedagógico no âmbito do PIBID (Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência) Peda-
gogia/UFRRJ em turmas de educação de jovens e adultos numa escola da rede pública estadual,
no município de Seropédica-RJ, no período de setembro à outubro de 2012. Assim, destacamos o
evento denominado “O Brasil como a gente conhece”. Na culminância deste evento, tínhamos que
apresentar junto com um grupo de estudantes jovens e adultos trabalhos escolares que abordas-
sem as “regionalidades” e o nosso tema foi “expressões populares que se fazem presentes em nos-
sas regiões brasileiras”. Nesse grupo de estudantes de EJA estavam inseridos dois estudantes com
necessidades educacionais especiais: um estudante com surdez e outra estudante com deficiência
auditiva, o que nos levou a um questionamento: como elaborar atividades que de fato promoves-
sem a educação desses estudantes? Decidimos em acordo com a professora da turma, desenvolver
com esses estudantes cartazescom fotos deles mesmos mostrando os diferentes gestos para falar
das mesmas expressões populares que existem em Libras (Língua Brasileira de Sinais). Com os ou-
tros estudantes de EJA criamos cartazes com figuras e fotos relacionando-as com as expressões re-
gionais que mais chamaram atenção dos estudantes e um dicionário denominado “Dicionário das
Regiões Brasileiras”, no qual abordamos também expressões populares das cinco regiões brasileiras,
através de figuras interligadas a essas expressões populares e suas traduções. Este estudo tem como
referencial teórico-metodológico o pensamento de Theodor Adorno, entre outros comentadores
da Teoria Crítica da Sociedade, o que nos permitiu refletir sobre educação, escola e democratização.
Esta atividade escolar sobre expressões populares trouxeram conhecimentos inovadores para os
estudantes jovens e adultos considerando que, a partir da pesquisa que realizaram, puderam estar
mais próximos de outras realidades, compreendendo assim culturas distintas das suas.

palavras-chave: EJA, regionalidade, libras

introdUção
Este estudo visa descrever uma das ações educativas realizadas no Programa Institucional de
Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID) do curso de Pedagogia da Universidade Federal Rural do Rio
de Janeiro (UFRRJ) em turmas de educação de jovens e adultos numa escola da rede pública esta-
dual, no município de Seropédica-RJ, no período de setembro à outubro de 2011. Tal ação ocorreu
durante a preparação de um evento denominado “O Brasil como a gente conhece”. Na culminância
deste evento, tínhamos que apresentar junto com um grupo de estudantes jovens e adultos traba-
lhos escolares que abordassem as “regionalidades” e o nosso tema foi “expressões populares que se
fazem presentes em nossas regiões brasileiras”.
Nesse grupo de estudantes de EJA estavam inseridos dois estudantes do Público-Alvo da Educa-
ção Especial: um estudante surdo e outra estudante com deficiência auditiva, o que nos levou a um
questionamento: como elaborar atividades que de fato promovessem a educação desses estudan-
tes? Decidimos em acordo com a professora da turma, desenvolver com esses estudantes cartazes
com fotos deles mesmos mostrando os diferentes gestos para falar das mesmas expressões popula-

242
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
res que existem em Libras (Língua Brasileira de Sinais).
A Educação Inclusiva considera que a todos os estudantes deve se oportunizar condições ade-
quadas no processo de ensino-aprendizagem. Glat e Blanco (2007, p.16) explicam que “A proposta
de educação inclusiva implica, portanto, um processo de reestruturação de todos os aspectos cons-
titutivos da escola, envolvendo a gestão de cada unidade e dos próprios sistemas educacionais”.
Logo, a concepção de Educação Inclusiva fundamenta-se na ressignificação da concepção de edu-
cação até então possível no atual estágio civilizatório. Assim, Adorno (1995, p.143-144) destaca que:

A educação seria impotente e ideológica se ignorasse o objetivo de adaptação


e não preparasse os homens para se orientarem no mundo. Porém ela seria igual-
mente questionável se ficasse nisso, produzindo nada além de well adjusted peo-
ple, pessoas bem ajustadas, em consequência do que a situação existente se impõe
precisamente no que tem de pior. Nestes termos, desde o início existe no conceito de
educação para a consciência e para racionalidade uma ambiguidade. Talvez não
seja possível superá-la no existente, mas certamente não podemos nos desviar dela.

A Educação de Jovens e Adultos (EJA) se destina àquelas pessoas que estão fora do padrão de ida-
de escolar, comumente visto como adequado. A EJA é reconhecida como uma modalidade de ensi-
no amparada por lei, conforme se verifica na LDB, seção V, artigo 37: “A educação de jovens e adultos
será destinada àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental
e médio na idade própria”, inclusive as pessoas que possuem alguma necessidade educacional es-
pecial. Em geral, a EJA é composta por indivíduos trabalhadores, que desde muito cedo tiveram a
necessidade de ajudar na renda familiar e que por este ou outro motivo acabavam abandonando a
escola. Comumente, encontram-se na EJA pessoas analfabetas, que possuem idade mais avançada,
e que nunca foram matriculadas em uma escola, mas, que ao se inserirem nessa modalidade de
ensino, dão os seus primeiros passos escolares, aprendendo a ler, a escrever, a contar... Enfim, apren-
dendo a ter uma melhor participação na vida em sociedade.
Nesse contexto, é comum também nas classes de EJA, a presença de um público bastante diverso
dos alunos das classes ditas regulares, como é o caso da escola pesquisada, que tem alunos surdos,
deficientes auditivos e deficientes intelectuais nas turmas de EJA. A educação de jovens e adultos
oferece para seus estudantes um ensino com maior rapidez (este é um dos motivos principais que
faz muitos estudantes optarem por esta modalidade).
Geralmente, muitos dos estudantes de EJA assumem a culpa por seu atraso escolar, não reconhe-
cendo, assim, as causas políticas que o fundamentam. É indubitável o valor que tem a educação es-
colar na vida de todos os indivíduos, seja nas questões pessoais ou na vida em sociedade. Portanto,
a continuidade dos estudos é de suma importância, pois, desta forma o indivíduo torna-se cada vez
mais autônomo.
Em abril de 2010, a VI CONFITEA (Conferência Internacional de Educação de Adultos) reafirmou o
conceito de continuidade dos estudos, em relação á educação de jovens e adultos:

Estamos convencidos e inspirados pelo papel fundamental da aprendizagem ao


longo da vida na abordagem de questões e desafios globais e educacionais. Além
disso, estamos convictos de que a aprendizagem e educação de adultos preparam
as pessoas com conhecimentos, capacidades, habilidades, competências e valores
necessários para que exerçam e ampliem seus direitos e assumam o controle de seus
destinos. Aprendizagem e educação de jovens e adultos são também imperativos
para o alcance da equidade e da inclusão social, para a redução da pobreza e para a

243
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
construção de sociedades justas, solidária, sustentáveis, e baseadas no conhecimen-
to.” (Marco de Ação de Belém, 2010,p.7)

Desse modo, a democratização da escola contemporânea pela orientação inclusiva é concebida


como um progresso no sistema educacional, pois considera a singularidade de cada estudante pre-
sente no contexto escolar. O que nos permite afirmar que “A educação inclusiva, movimento cultural
inserido no âmbito social contemporâneo, tem por pressuposto a democratização tanto da educa-
ção quanto na sociedade” (COSTA, DAMASCENO, 2012, p.19).

2. objetiVo
Considerando a relevância da inclusão escolar para a democratização do ensino, este trabalho
tem como objetivo descrever uma das ações educativas realizadas no âmbito do PIBID Pedagogia/
UFRRJ, na qual adaptamos um trabalho escolar para dois estudantes do Público- Alvo da Educação
Especial. Proporcionamos, assim, condições apropriadas de aprendizagem, considerando a hetero-
geneidade e pluralidade desses estudantes.

3. metodologiA
Este estudo teve como referencial teórico-metodológico o pensamento de Theodor Adorno, en-
tre outros comentadores da Teoria Crítica da Sociedade, o que nos permitiu refletir sobre educação,
escola e democratização. Dessa maneira, para a realização da atividade escolar com os estudantes
da educação de jovens e adultos utilizamos uma câmera digital para tirar as fotos dos estudantes
Público-Alvo da Educação Especial, expressando frases e/ou palavras de expressões populares das
diferenciadas regiões brasileiras em Libras (Língua Brasileira de Sinais), além de cartazes, pilotos,
canetinhas e cola. Utilizamos também folhas de papel ofício para elaborar os dicionários que abor-
davam as expressões populares das regiões brasileiras. Para a construção do “Dicionário das Regiões
Brasileiras” foi utilizada a internet para o encontro de imagens que fossem interligadas as variadas
expressões populares.

4. resUltAdos
Na culminância do evento denominado “O Brasil como a gente conhece”, nós do PIBID Pedago-
gia, tínhamos que apresentar junto com um grupo de estudantes jovens e adultos trabalhos esco-
lares que abordassem as “regionalidades” e o nosso tema foi “expressões populares que se fazem
presentes em nossas regiões brasileiras”. Nesse grupo de estudantes de EJA estavam inseridos dois
estudantes do Público-Alvo da Educação Especial: um estudante surdo e outra estudante com de-
ficiência auditiva, o que nos levou a um questionamento: como elaborar atividades que de fato
promovessem a educação desses estudantes? Considerando que o sistema de ensino precisa criar
estratégias que atendam seus estudantes dentro de suas especificidades, pois, o PNE (Plano Nacio-
nal de Educação), Lei nº 10.172/2001, menciona que “o grande avanço que a década da educação
deveria produzir seria a construção de uma escola inclusiva que garanta o atendimento à diversida-
de humana”, decidimos, em acordo com a professora da turma, desenvolver com esses estudantes
Público-Alvo da Educação Especial cartazes com fotos deles mesmos mostrando os diferentes ges-
tos para falar das mesmas expressões populares que existem em Libras (Língua Brasileira de Sinais),
demonstrando que também em Libras existe a marcante diferença regional.
Consideramos que é através de uma adaptação no sistema de ensino por inteiro, que a inclusão
escolar desses estudantes se realiza. Segundo Mendes (2002), a instituição escolar inclusiva precisa
de currículos adequados que sejam modificados ou adaptados quando necessário, e um fazer peda-
gógico com flexibilidade que oportunizem tanto o bom aproveitamento quanto o ajuste sócio-edu-

244
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
cacional do estudante Público-Alvo da Educação Especial. Assim, dispositivos legais fundamentam:

Art. 59. Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com necessidades es-
peciais:

I- Currículos, métodos, técnicas, recursos educativos, e organização específicos,


para atender às suas necessidades.(BRASIL,9394/96)

Nesta perspectiva, é indispensável que todos os integrantes da ação educativa busquem conhe-
cer e compreender direitos constitucionais dos estudantes Público-Alvo da Educação Especial, como
uma forma de favorecer a educação. Os profissionais da educação precisam respeitar esses estu-
dantes, reconhecendo-os como indivíduos que possuem os mesmos direitos de estarem no âmbito
escolar como qualquer outro estudante, pois desta forma estaremos contribuindo para constituição
de uma sociedade de/para todos. Sendo assim, torna-se urgente o fato de unir-se teoria e prática.
Quanto a isso Adorno (1995, pp. 203-204) aponta que:

O que, desde então, vale como o problema da práxis, e hoje novamente se agra-
va na questão da relação entre teoria e práxis, coincide com a perda de experiência
causada pela racionalidade do sempre-igual. Onde a experiência é bloqueada ou
simplesmente já não existe, a práxis é danificada e, por isso, ansiada, desfigurada,
desesperadamente supervalorizada. Assim, o chamado problema da práxis está en-
trelaçado com o do conhecimento.

Realizamos também a construção de dicionários e cartazes sobre expressões populares, es-


ses trouxeram conhecimentos inovadores para os estudantes jovens e adultos, considerando que, a
partir da pesquisa que realizaram frente ao tema “regionalidade”, puderam estar mais próximos de
outras realidades, compreendendo assim culturas distintas das suas.
A partir da informação dada pela intérprete dos estudantes de que havia em Libras expressões
populares de diferentes regiões brasileiras, optamos por uma atividade na qual o estudante surdo
e a estudante com deficiência auditiva expressariam esses ditos populares através de suas fotos
nos cartazes, demonstrando frases e/ou palavras de expressões populares em Libras. A partir desta
iniciativa, os outros estudantes jovens e adultos, como também os próprios estudantes com sur-
dez e deficiência auditiva, puderam ficar cientes de novos saberes acerca da Língua Brasileira de
Sinais. Nesta perspectiva, torna-se relevante e significativo influenciar os estudantes a lidar com a
diferença, pois, a mesma, segundo Costa (2007, p.20): “(...) deveria ser considerada como sendo a
essência humana.” Neste sentido, tanto na elaboração dos trabalhos escolares expondo as variadas
expressões populares em Libras, como na apresentação dos mesmos no dia do evento, era explícita
a curiosidade e o interesse dos estudantes em compreender o conteúdo daquela atividade escolar.
É válido relatar que além dos estudantes, outros integrantes da ação educativa eram atraídos para
observar a proposta educativa. Para Costa (2005, p.91):

A urgência por uma educação democrática e emancipadora parece se constituir


como alternativa para a superação da diferença significativa como obstáculo para
o acesso e permanência na escola pública dos alunos com necessidades especiais e
na possibilidade de se pensar em uma sociedade justa e humana.

Com os outros estudantes de educação de jovens e adultos criamos cartazes com figuras e

245
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
fotos relacionando-as com as expressões regionais que mais chamaram atenção dos estudantes
e um dicionário denominado “Dicionário das Regiões Brasileiras”, no qual abordamos também ex-
pressões populares das cinco regiões brasileiras, através de figuras interligadas a essas expressões
populares e suas traduções. É cabível mencionar que não houve nenhum impedimento para que os
estudantes Público-Alvo da Educação Especial participassem da elaboração dos outros trabalhos
realizados em classe e vice-versa.

5. considerAções finAis
A suma importância de realizar adaptações nas atividades escolares, como também no siste-
ma de ensino, é imprescindível para a promoção da educação dos estudantes, pois, desta forma, os
mesmos são visualizados a partir de sua singularidade no contexto escolar, favorecendo assim o seu
atendimento educacional. Neste sentido Becker (In: Adorno, 1995, p.144) afirma que:

Evidentemente a aptidão para se orientar no mundo é impensável sem adapta-


ções. A adaptação não deve conduzir à perda da individualidade em um conformis-
mo uniformizador. Mas, por outro lado, não devemos permitir uma educação sus-
tentada na crença de poder eliminar o indivíduo.

Dessa maneira, para a implementação de uma instituição escolar democrática de/e para todos os
estudantes, torna-se indispensável modificações acerca de seu processo educacional, na concepção
de acolher a diversidade presente no ambiente educativo.
Nesta perspectiva, é indispensável que todos os integrantes da ação educativa busquem conhe-
cer e compreender direitos constitucionais dos estudantes com necessidades especiais, como uma
forma de favorecer a educação. Torna-se urgente o fato de unir-se teoria e prática. Mediante isso,
Adorno (1995, pp. 203-204) aponta que:

O que, desde então, vale como o problema da práxis, e hoje novamente se agra-
va na questão da relação entre teoria e práxis, coincide com a perda de experiência
causada pela racionalidade do sempre-igual. Onde a experiência é bloqueada ou
simplesmente já não existe, a práxis é danificada e, por isso, ansiada, desfigurada,
desesperadamente supervalorizada. Assim, o chamado problema da práxis está en-
trelaçado com o do conhecimento.

Com isso os profissionais da educação precisam respeitar os estudantes com necessidades espe-
ciais, reconhecendo-os como indivíduos que possuem os mesmos direitos de estarem no âmbito
escolar como qualquer outro estudante, pois desta forma estaremos contribuindo para constituição
de uma sociedade de/para todos, tendo a diferença somente como um aspecto da essência huma-
na.

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247
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
VAriAção lingUísticA nA edUcAção de joVens e
AdUltos: sUjeitos, Vozes e identidAdes
pAtríciA fortUnA WAnderley prAzeres | AndreA berenblUm

O artigo visa divulgar alguns resultados obtidos a partir de uma pesquisa realizada no contex-
to de um programa de Pós-Graduação em Educação, cujo objetivo principal foi investigar diversas
formas como professores do primeiro segmento do Ensino Fundamental de educação de jovens
e adultos consideram, em suas práticas cotidianas, as variedades linguísticas faladas pelos alunos.
Ao mesmo tempo, procuramos compreender as diversas formas como desenvolvem suas práticas
educativas em relação ao fenômeno da variação linguística. Pretendemos, também, caracterizar os
sujeitos da educação de jovens e adultos e refletir acerca da visão dos alunos em relação ao trabalho
pedagógico com a linguagem desenvolvido pelas professoras que participaram do estudo. Foram
realizadas entrevistas a duas professoras que atuam na EJA na rede pública do município do Rio de
Janeiro e a onze alunos das turmas dessas professoras. A pesquisa evidenciou concepções sobre a
língua falada que se sustentam numa noção de língua única e homogênea e a desvalorização das
variedades linguísticas faladas pelos educandos, principalmente das variedades regionais. Os resul-
tados sugerem a relevância de refletir sobre as práticas pedagógicas, analisando as concepções de
língua que circulam no âmbito da escola, como uma forma de contribuir para o estudo da proble-
mática da diversidade linguística e social no contexto educacional.

palavras-chave: linguagem, variação linguística, Educação

introdUção

O meu discurso em favor do sonho, da utopia, da liberdade, da democracia é o


discurso de quem recusa a acomodação e não deixa morrer em si o gosto de ser gen-
te, que o fatalismo deteriora. Paulo Freire

Este texto surgiu a partir do diálogo entre orientanda e orientadora de uma Dissertação de Mes-
trado iniciado em 2005. Nas sessões de orientação compartilhávamos nossas angustias e vivências
como professoras de jovens e adultos em contextos diversos –e adversos-, refletíamos sobre as vidas
dos nossos alunos, líamos e discutíamos textos. O objeto da Dissertação foi sendo construído a par-
tir dessa interação, das vivências da autora como educadora de jovens e adultos, de algumas falas
de educadores ligados a movimentos sociais e organizações não governamentais, de professores
da rede pública e trocas de experiências com os próprios alunos. Falas de professores que demons-
travam compartilhar as mesmas angustias e inquietações e buscavam, também, possíveis caminhos
para melhorar o trabalho na EJA.
A posição assumida pelos diversos profissionais envolvidos com a educação de jovens e adul-
tos revelava, em sua maioria, uma grande insatisfação devido às dificuldades para desenvolver um
trabalho de qualidade, dificuldades essas que diziam respeito tanto à falta de material didático es-
pecífico como a ausência de um acompanhamento pedagógico sério por parte das instituições de
que faziam parte.
Alguns profissionais tendem a se culpabilizar e/ou aos seus próprios alunos pelas dificuldades
presentes no dia-a-dia, como a evasão, a baixa frequência e a falta de motivação dos alunos. Outros,
porém, relataram que, apesar das dificuldades citadas acima, sentiam-se recompensados com o tra-
balho realizado na EJA, pois percebiam a alegria desses alunos no retorno aos “bancos escolares”,

248
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
buscando recuperar, dessa forma, a sua condição de cidadãos na sociedade letrada.
O processo de reflexão que deu origem a nossa caminhada inicia-se com essas falas, confron-
tando nossas práticas com outras práticas educativas observadas na educação de jovens e adultos,
visando problematizar o modelo de escola tradicional presente na memória, pois vivenciamos du-
rante muito tempo uma concepção de ensino como repasse de conhecimento, e a aprendizagem
como um ato receptivo e mecânico.
Muitas vezes, é difícil nos desligarmos desse modelo tradicional de educação formal, modelo este
que também está presente no imaginário dos alunos que chegam à instituição escolar com o desejo
de recuperar o tempo em que ficaram longe das instituições educacionais.
A fala instigante de uma aluna recém-chegada à escola pode elucidar esse fato:

Professora, quando a senhora vai ensinar as coisas pra gente? Até agora a gente
só conversou. Eu quero usar o lápis e o caderno. Demorei muito para voltar a estudar
e não quero perder nem um tempinho.55

Esse depoimento demonstra o quanto o fazer pedagógico do modelo tradicional de educação


está presente nas formas como os sujeitos concebem a escola.
Outro problema enfrentado nos programas de EJA refere-se à falta de formação adequada dos
educadores que atuam nessa modalidade, pois são geralmente oriundos de cursos de formação de
professores e orientados somente para trabalhar com crianças. Sendo assim, muitas vezes planejam
suas aulas e utilizam materiais didáticos inadequados ao ensino de jovens e adultos, desconsideran-
do as reais condições e necessidades desses sujeitos.
As práticas pedagógicas que vêm sendo desenvolvidas, na maioria das vezes, desconsideram a
cultura, os saberes, os valores e as experiências dos alunos, impedindo que eles estabeleçam rela-
ções entre o conteúdo trabalhado na escola e seu meio social e cultural.
O presente texto visa sintetizar alguns resultados obtidos a partir da referida pesquisa, que teve
como objetivo principal investigar as diversas formas como professores de educação de jovens e
adultos, em suas práticas educativas cotidianas, consideram as variedades linguísticas faladas pelos
alunos. Compreender como os professores da educação de jovens e adultos do primeiro segmento
do Ensino Fundamental desenvolvem suas práticas educativas diárias em relação ao fenômeno da
variação linguística. Pretendemos, também, caracterizar os sujeitos da educação de jovens e adultos
e refletir acerca da visão dos alunos em relação ao trabalho pedagógico com a linguagem, desenvol-
vido pelas professoras que participaram do estudo.
A pesquisa empírica foi realizada através de entrevistas a duas professoras que atuam na EJA na
rede pública do Município do Rio de Janeiro e a onze alunos das turmas dessas professoras. Foram
observadas, também, oitenta horas de sala de aula. A pesquisa evidenciou algumas concepções
das professoras e dos alunos sobre a língua falada que se sustentam numa noção de língua única
e homogênea – e a desvalorização das variedades linguísticas faladas pelos educandos, principal-
mente das variedades regionais. Os seus resultados sugerem a relevância de refletir sobre as práticas
pedagógicas, analisando as concepções de língua que circulam no âmbito da escola, como uma
forma de contribuir para o estudo da problemática da diversidade linguística e social no contexto
educacional.

os sUjeitos dA ejA
Aqui no Rio de Janeiro
55 Fala de uma aluna da EJA da 3ª fase do Ciclo de Alfabetização, em 01/03/2005.

249
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Quando nordestino fala
Carioca fala também
Vocês não sabem falar
A língua que a gente tem
Acham que não temos cultura
Por não falar tão bem.56

Ao caracterizar a modalidade EJA da educação básica nos deparamos com uma pluralidade de
sujeitos que dela fazem parte. Cada um com uma história de vida e suas marcas de identidade,
constituídas por memórias ímpares. Essas experiências singulares se somam às do grupo, criando
espaços de saberes e não saberes, na busca de um reconhecimento na sociedade.
Como sabemos, estes sujeitos de classes populares vivem em situação socioeconômica desfa-
vorável e a necessidade de trabalhar os afastou muito cedo dos seus estados e cidades de origem.
Provenientes principalmente do norte e nordeste do país, trazem em sua bagagem uma história
de desesperança e de esperança que os encoraja a tentar “mudar de vida”, procurando melhores
condições. Nessa trajetória até a “cidade grande” carregam o desejo de um futuro diferente daquele
deixado para trás.

A vida é melhor de se viver lá, mas aqui é para trabalhar, ganhar dinheiro, cons-
truir alguma coisa. Se lá tivesse condições não ia vir tudo para cá.57

Esses jovens e adultos se caracterizam como um grupo heterogêneo quanto as suas atividades:
são pedreiros, donas de casa, porteiros, faxineiras, cozinheiros. São homens e mulheres, trabalha-
dores, empregados, desempregados ou pessoas em busca do primeiro emprego; filhos, pais, mães
e avós. Muitos nunca foram à escola ou dela tiveram que se afastar, quando crianças, em função da
entrada precoce no mercado de trabalho, ou mesmo por falta de escolas na região onde moravam.
Alguns dos que retornaram à escola permaneceram nela por períodos de tempo muito curtos: dias,
semanas ou, no máximo, alguns meses.
O maior tempo de escolarização nem sempre significa mais conhecimento ou facilidade para a
aprendizagem. São sujeitos marginalizados, expulsos da escola ou privados do acesso à escolariza-
ção, que carregam a marca da exclusão social. Neste sentido, é fundamental entender a educação
de jovens e adultos como direito e não apenas como compensação que possibilitaria o resgate do
tempo perdido, pois o aluno muitas vezes se sente culpado por não ter sido capaz de aprender na
“época própria”.
A heterogeneidade presente na sala de aula da EJA se configura a partir de aprendizagens e expe-
riências que e os alunos adquirem ao longo de sua vida em diferentes contextos sociais, pois as suas
crenças, valores, atitudes e práticas vão constituindo processos diferenciados de aprendizagem e
diferentes formas de acesso ao conhecimento. Será a partir do reconhecimento de suas experiências
de vida e visões de mundo que cada aluno, jovem ou adulto, se apropriará das aprendizagens esco-
lares de modo crítico e original, na perspectiva de ampliar sua compreensão, seus meios de ação e
interação no mundo.
Segundo Oliveira e Paiva (2004, p. 8), “a concepção de aprendizagem para esses sujeitos jovens e
adultos, de qualquer nível de escolaridade, é a base de estar no mundo”.
O jovem ou adulto não volta apenas à escola para recuperar o tempo perdido, mas em busca de
experiências de aprendizagem que lhes possibilitem dar resposta para as suas necessidades presen-
56 Extraído do texto “Intriga do nordestino e carioca”. In: Caminhos de Vida. Coletânea de textos das alunas da EJA do Colégio
Sagrado Coração de Maria. Rio de Janeiro, 2005.
57 Depoimento de um aluno do PEJA, bloco I.

250
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
tes. Por isso, essa modalidade deve ser pensada e planejada em relação a suas especificidades, pro-
curando desenvolver um trabalho diferente do realizado nas escolas regulares. Esses alunos espe-
ram encontrar na escola um espaço para falar de suas vidas, seus desejos, suas dores e suas alegrias,
daquilo que os aflige no cotidiano, das dificuldades de conciliar família, casa, trabalho. Precisam se
sentir acolhidos, ouvidos, incluídos e construir um âmbito para compartilhar todos esses sentimen-
tos. São guiados pelos seus sonhos há muito esquecidos, pelo desejo de “melhorar de vida”, pelo
esforço de compreender melhor o mundo que os rodeia, pela vontade de ser reconhecidos como
sujeitos e olhar para os outros, como eles afirmam, “de cabeça erguida”.

o trAbAlho pedAgógico com A lingUAgem e VAriAção lingUísticA nA


ejA: A Visão dos AlUnos
No discurso dos alunos escutamos diversas vezes que o tempo perdido precisa ser recuperado,
pois quando crianças não puderam estudar e precisam acelerar os estudos.
Eles também valorizam muito a escola e o trabalho das professoras, são unânimes em afirmar que
geralmente não aprendem o conteúdo ensinado devido às próprias dificuldades de aprendizagem.

As professoras são pacientes e atenciosas. Se nós não aprendemos a culpa não é


delas, é nossa. (A9)

Esperam que seu conhecimento prévio seja valorizado e quando isso não acontece se sentem
frustrados. Esses sujeitos querem ser escutados; a satisfação de ser ouvido fica expressa no rosto
de cada um deles. A oportunidade de opinar e expor suas ideias cria um ambiente propício para
o grupo refletir sobre suas experiências de vida. Para o aluno, o professor é visto como aquele que
vai fiscalizar o conhecimento adquirido. Essa idéia de controle atrapalha a autonomia dos alunos,
deixando-os cada vez mais inseguros ao realizarem as atividades propostas. Pudemos constatar, a
partir da nossa pesquisa, que o modelo de escola presente na memória dos alunos é o da pedagogia
tradicional, manifesta na fala dos alunos:
Após a leitura das transcrições das entrevistas, é possível inferir que para os alunos é função da
escola “ensinar a falar certo”, ensinando as pronúncias certas das palavras, tendo como base a norma
padrão da língua. Para eles, as pessoas que tiveram oportunidade de estudar falam bem, falam cer-
to, “sem errar”, e por isso eles se espelham nesses modelos e buscam uma “perfeição” que é exigida
pela escola.
Alguns caracterizam a escola como lugar de ensino, de realização pessoal, de certificação do sa-
ber, de ascensão social. Para os alunos, quem sabe ler e escrever tem melhores oportunidades de
emprego, consegue se desenvolver dentro da sua função, aprimora seus conhecimentos, é valoriza-
do socialmente e dessa forma consegue “melhorar na vida”, o que significa ter um emprego formal,
com uma melhor remuneração e melhores condições de trabalho 58.
Para os sujeitos entrevistados, quem teve oportunidade de estudar “fala melhor”. Que sentidos
esses alunos atribuem À expressão “falar melhor”? Qual a importância da leitura e da escrita para
esses grupos?

a gente vê que as pessoas que tem...é acesso a outras pessoas importantes (com
estudo) que sabem falar melhor, conversa melhor do que a gente que não sabe. En-
tão, a gente tem que estudar pra isso. (A4)

58 Essas funções atribuídas à escola se evidenciam em vários trabalhos que abordam os sujeitos da EJA. Entre eles, o trabalho:
Jovens e Adultos em Processo de Alfabetização: voz e vida. Garcia, I. H. M. Niterói: Universidade Federal Fluminense. Dissertação Mes-
trado, 2004.

251
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
sempre quis aprender a ler. [...] passei muita vergonha quando eu ia assinar meu
nome, andava com um papelzinho dentro da bolsa. (A4)

Na opinião dos alunos, “falar melhor” significa ter escolarização, ou seja, ter aprendido a norma
culta da língua na escola. Quem está inserido nesse contexto aprende a “falar corretamente” e por
isso não erra, conseguindo assim se “expressar bem”, com desenvoltura diante do público e com se-
gurança no que está falando.
O aluno considera a escola como uma instituição capaz de lhe assegurar uma melhor posição no
mercado de trabalho. Através dela, ele pode sonhar com um trabalho menos pesado, com melhor
remuneração, como um negócio próprio ou até em frequentar uma faculdade. A escola tem um va-
lor muito importante porque ela o instrumentaliza, dando-lhe condições materiais para realizar seus
planos, e assim utilizar os conhecimentos adquiridos na prática, pois as exigências do mercado de
trabalho pressionam cada vez mais e a concorrência é muito grande. Estes jovens e adultos perten-
cem ao mundo do trabalho, ou do desemprego, como é mais comum, e assim ingressam no curso da
EJA com o objetivo de concluir etapas de sua escolaridade para buscar melhores oportunidades de
emprego e sua inserção no mundo letrado, pois esses conhecimentos que os alunos tanto valorizam
estão sempre associados à leitura e à escrita.
A fala desses alunos sobre a escola revela a centralidade que ela tem na vida de cada um:

pra mim entender muitos pratos59, tenho que estudar senão não vou conseguir
chegar lá. (A2)
eu quis voltar a estudar porque o estudo é importante pra gente melhorar na
vida. Ir pra frente. Saber mais. (A6)

A possibilidade de ser valorizado socialmente é um dos sentidos atribuídos à escola para esses
alunos, porque eles desejam o reconhecimento da sociedade. Um grupo que já foi tão excluído
espera que a escola possa lhe fornecer uma oportunidade para participar de forma efetiva na socie-
dade, conquistando assim sua cidadania. A cidadania é entendida por eles como sinônimo de “ser
alguém na vida”.

eu sempre quis ser alguém. Eu sempre achei bonito quem fala bem, quem lê direi-
to, quem sabe se expressar, quem sabe falar. (A9)
antes de eu morrer...eu ainda quero ser gente na vida, porque a gente com um
pouquinho de estudo já melhora. (A10)

A realização pessoal também é um fator importante para esses sujeitos, assim como a certifica-
ção, o prestígio de ter um diploma e estar inserido no mundo letrado.
Em relação ao ensino da variedade padrão da língua, afirmam que em algumas situações gostam
de ser corrigidos para aprenderem essa norma, que é muito valorizada por eles, mas alegam que
existe uma maneira certa dessa intervenção ser feita, pois se sentem desconfortáveis quando são
corrigidos diante de uma platéia. Esse sentimento de vergonha, porém, muitas vezes se transforma
em agradecimento, pois em determinadas situações, quando são corrigidos e o interlocutor explica
o porquê da correção, quer seja em relação à pronúncia ou à grafia da palavra, eles se sentem satis-
feitos em aprender a “forma correta” para falar sem constrangimentos:

o caderno os professores levavam pra casa, levavam pra casa pra corrigir. Ela ia
ver o que estava errado pra consertar (...) e o modo de falar algumas palavras...que
59 Esse aluno é ajudante de cozinha em um restaurante.

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
você falasse...assim errado os professores corrigiam. Eles ensinavam a falar certo.
(A5)

considerAções finAis: A importânciA do debAte sobre A VAriAção


lingUísticA no contexto edUcAcionAl
Compreender as formas como os professores da educação de jovens e adultos, do 1º segmento
do ensino fundamental, desenvolvem suas práticas educativas diárias em relação ao fenômeno da
variação linguística, foi a nossa inquietação e a partir dela o trabalho foi se configurando.
O contato com a realidade da sala de aula, as observações e as entrevistas realizadas nos levaram
a considerar aspectos que não havíamos considerado previamente.
Muito do que foi falado nas entrevistas gerou controvérsia, porque o discurso das professoras
muitas vezes era contraditório com as suas práticas pedagógicas. Quanto às atitudes demonstradas
pelas professoras em sala de aula frente às variedades linguísticas utilizadas por seus alunos, foi pos-
sível perceber ações diferenciadas dentro do universo pesquisado: algumas professoras corrigiam
claramente a fala dos alunos demonstrando uma ação de pouco respeito à variedade linguística usa-
da pelos mesmos; outras não interferiam na fala deles, porém corrigiam os textos escritos segundo
a norma culta. É importante salientar que o intuito aqui não é culpabilizar os atores desse processo
e sim entender suas ações e motivações.
Essas ações demonstram a intensa valorização da norma culta em detrimento das outras varie-
dades linguísticas, pois, como dissemos anteriormente, apesar de todos os avanços das pesquisas
linguísticas contemporâneas ainda prevalece um enorme autoritarismo que leva a considerar como
exclusivamente “certa” a variedade padrão.
Percebemos que para as professoras que fizeram parte da pesquisa a variedade de prestígio de-
veria ser ensinada por motivos pragmáticos, já que os alunos farão uso dela em contextos reais,
como em concursos, entrevistas de emprego, vestibular e outras situações em que o uso da norma
padrão é exigido. Não questionamos essa visão, mas nos interessa compreender como essa concep-
ção vem sendo materializada na escola, pois se partirmos da dicotomia “certo” e “errado” estaremos
desconsiderando a cultura própria do aluno. A partir dessa concepção do erro, o aluno se sente in-
seguro e tem medo de “errar”; a consequência é que ou ele escreve pouco para ter menos “erros” ou
se silencia, para não errar na fala.
Quando ouvíamos os alunos na entrevista nos enxergávamos no discurso deles, pois quantas ve-
zes na escola víamos pessoas deixando de escrever com medo de “errar”, porque o “bom” aluno para
o professor deveria escrever com a ortografia “correta” das palavras. Não era raro ouvir da professora:
“português é difícil, quem não se esforçar não vai aprender”; “copie as palavras certas para não errar
nunca mais”; “quem não sabe o ‘bom’ português não vai a lugar algum”. Essa pressão que o professor
muitas vezes exerce sobre o aluno, ou seja, que ele deve escrever sem “errar”, gera o medo do “erro”
e assim esses sujeitos não desenvolvem suas potencialidades e acabam restringindo cada vez mais a
língua falada e escrita. Percebemos na fala dos alunos pesquisados que eles criaram uma imagem do
professor como aquele que não “erra”, aquele que sempre utiliza as palavras “corretamente”. Como
afirmou uma aluna: ”ele é 100% de perfeição”. E dessa forma cria-se um mito em torno do professor,
como aquele que fala “bem”, que utiliza a norma padrão da língua em qualquer situação.
Os alunos querem ser ouvidos e legitimados e quando isso não acontece a sua baixa auto-estima
é abalada e se sentem cada vez mais inferiorizados e desprestigiados. Essa atitude dos alunos ex-
plicaria em parte o porquê de muitos se calarem e não se sentirem à vontade em usar a variedade
popular, utilizada no seu contexto social.
Uma questão reveladora apareceu nas entrevistas da maioria dos alunos. Quando abordamos

253
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
a falas regionais, os nordestinos desprestigiaram a sua forma de falar, pois para eles o seu sotaque
é “feio” e “errado”, sendo desvalorizado e discriminado até por eles mesmos. Em oposição a ele, o
sotaque carioca é valorizado, pois tem prestígio social em relação a outros estados do Brasil. Esses
sujeitos são unânimes em afirmar que aprenderam a falar corretamente no Rio de Janeiro e que aos
poucos vão se “aperfeiçoando”. Na fala de uma aluna esta certeza fica muito clara: “agora que che-
quei no Rio estou ‘melhorzinha’ de sotaque, aprendi a falar bonito”. Esse preconceito em relação à
fala do nordestino é alimentado diariamente e podemos percebê-lo em vários discursos de pessoas
diferentes e em lugares distintos. Uma professora, em seu discurso, revelou: ”eu tenho uns proble-
minhas de sotaque porque eu morei no nordeste”. A partir da fala desses alunos e professores, com-
preendemos a necessidade de questionar o preconceito lingístico existente em nossa sociedade,
compartilhado, inclusive, pelos próprios sujeitos falantes de variedades linguísticas desprestigiadas.
Ficou evidente também o conflito que os alunos vivem diariamente: aprender a norma culta apre-
sentada pela escola para serem incluídos e valorizados socialmente os leva muitas vezes a serem
excluídos pelo seu grupo social, pois são questionados quando começam a se apropriar de uma
variedade que não é reconhecida pelos seus pares. Como, então, a escola pode lidar com essa situa-
ção? Como trabalhar com esse conflito? De que forma ensinar a norma padrão, problematizando-a
e promover a reflexão sobre as situações de uso de outras variedades?
Percebemos que a linguagem tem um papel fundador no processo educacional, não só do ponto
de vista da construção da singularidade dos sujeitos, mas também da construção das suas marcas
de pertencimento a determinado(s) grupo(s). Muitas vezes as concepções de professores e alunos
acerca da variação linguística dialogam, pois questões como preconceito, da discriminação, o papel
da escola, o poder que a linguagem desempenha e o entendimento sobre língua falada e escrita
aparecem na fala de ambos.
Tanto as professoras quanto os alunos evidenciaram que a função da escola é “ensinar a falar
corretamente” e que a gramática normativa tem um papel muito importante nesse processo. Mas os
alunos às vezes se questionam: para que aprender a “falar certo?” Será que falando certo consegui-
remos um emprego melhor?
Diante das observações em sala de aula, é possível afirmar que raras foram as atividades didáticas
que focaram o fenômeno da variação linguística como conteúdo a ser trabalhado e sobre o que é
preciso refletir. Quando ele é tangencialmente focado, a valorização exclusiva da norma culta acaba
prevalecendo.
Acreditamos que a afirmação dos direitos linguísticos dos alunos é parte essencial do fortaleci-
mento de identidades sociais e da formação de cidadania em uma sociedade democrática. Perce-
bemos que o preconceito linguístico está ainda muito presente na sala de aula, às vezes de uma
forma sutil, outras de forma explícita, sendo as variedades populares e regionais desprestigiadas e
discriminadas. Na concepção de muitos professores a língua é vista como estática e imutável, e a
gramática normativa assume uma posição de destaque, pois descreve a chamada norma culta que
deve ser usada e aplicada nas atividades em sala de aula, servindo de modelo para avaliar as práticas
linguísticas do grupo.
Como sabemos, a língua apresenta variações, mas muitos professores não trabalham essas di-
ferenças em sala de aula, pois para eles a língua portuguesa é única e homogênea. A fala de uma
professora representa bem o preconceito em relação à fala dos alunos:

eles falam tudo errado e escrevem tudo errado. Tipo...eu tava dando p, b e n, m e
então eles faziam logo uma misturada e não conseguiam escrever “direito” P2

A representante da turma é uma ótima aluna, mas fala muito errado. Ela veio do

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
nordeste. P2

Apesar de algumas professoras procurarem não desprestigiar ou discriminar a fala do aluno, o


falar “certo” e “errado”, está arraigado na concepção do trabalho com a linguagem na sala de aula, já
que muitas vezes elas consideraram um uso como “errado” e não como uma marca social ou regio-
nal, julgando a fala do aluno sob a ótica do erro.
Observamos também que no trabalho didático com a linguagem na sala de aula o professor ge-
ralmente solicita que os alunos transformem “o errado” em “certo”. Ao longo do nosso estudo, não
observamos a proposta de uma discussão sobre os diversos fatores extralinguísticos que interferem
na linguagem falada, nem foi proposta nas aulas a reflexão sobre os usos linguísticos mais adequa-
dos em determinadas situações e contextos.
Neste trabalho, partimos do pressuposto de a escola valoriza e transmite quase com exclusivida-
de a variedade oficial da língua e que o mito da exclusiva legitimidade desta variedade é produto,
em parte, do desconhecimento dos processos histórico-políticos de instalação da mesma. Busca-
mos, também, enfatizar a importância de refletir a respeito das condições de produção e imposição
da norma padrão de uma determinada língua em contextos específicos. A partir daí, poderemos
questionar a legitimidade exclusiva dessa variedade. Assim, propomos um trabalho com a língua
na sala de aula que permita o debate, a discussão e a comparação de formas de uso em contextos
específicos, como uma forma de romper com a crença fortemente arraigada de que o professor deve
ensinar e impor a norma padrão, evitando “interferências” dos usos populares da língua. O reconhe-
cimento das diferenças e a reflexão acerca dessa problemática, tanto no contexto escolar quanto
nos âmbitos de formação docente, poderá permitir-nos avançar na construção de uma escola mais
democrática.

referênciAs bibliográficAs
BAGNO, M. Lingüística da norma. São Paulo: Loyola, 2002.
GNERRE, M. Linguagem, escrita e poder. São Paulo: Martins Fontes, 1991.
OLIVEIRA, I. Barbosa de; PAIVA, J. (orgs.). Educação de Jovens e Adultos. Rio de Janeiro: DP&A, 2004.
WANDERLEY PRAZERES, Patrícia. Variação lingüística na Educação de Jovens e Adultos. Niterói, RJ:
UFF, 2007. Dissertação de Mestrado – Programa Pós-Graduação em Educação.

255
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Vencendo As drogAs, VAlorizAndo à VidA.
simôniA mAriA AlexAndre dA costA

O presente projeto que pretendemos socializar tem como tema: vencendo as drogas, valorizando
à vida, desenvolvido no Centro Educacional José Hamilton Saraiva Barbosa Sesc Ler Aracati/CE, que
atua com a Modalidade da Educação de Jovens e Adultos. O referido projeto: vencendo as drogas,
valorizando à vida, tem como objetivo promover a formação da comunidade escolar, por meio de
ações preventivas de atenção à saúde, com vistas ao enfrentamento ao uso indevido de álcool e
outras drogas.O trabalho propõe o desenvolvimento de ações de prevenção ao uso de drogas en-
volvendo a participação de todos os educandos garantindo a inclusão social, bem como de todos
os agentes envolvidos no processo educativo: educadores, funcionários e familiares, adaptando de
acordo com o contexto sociocultural da realidade local. Sabedores da importância do planejamen-
to, desenvolvimento e resultados pretendidos, o trabalho promove o fortalecimento das relações
sociais, buscando a participação dos agentes envolvidos, garantindo a participação efetiva, espaços
para reflexão, troca de experiências, busca de soluções, vinculando os fatores de proteção na famí-
lia, escola e sociedade. Contribuir para que o aluno faça escolhas saudáveis significa, para além da
oferta de informações e conhecimentos, o estabelecimento de relações vinculares saudáveis entre
todos da comunidade escolar. A autonomia implica a possibilidade de reconstrução dos sentidos da
vida pelos sujeitos e essa (re) significação assume importância no seu modo de viver.

palavras-chave: escola, drogas, prevenção

1. ApresentAção
O Centro Educacional José Hamilton Saraiva Barbosa Sesc Ler Aracati\CE, caracteriza-se como
uma instituição de ensino que tem como modalidade a Educação de Jovens e Adultos, ofertando o
Ensino Fundamental do 1º ao 7º ano.
Localizado no bairro do Pedregal, zona urbana da cidade de Aracati Ceará, o Centro Educacional
desenvolve importante papel na modalidade da EJA, sendo referência no município. O trabalho
realizado oferece a clientela uma prática pedagógica inovadora, buscando a aquisição de novos
conhecimentos, desenvolvendo nos educandos o senso crítico, a tomada de consciência enquanto
cidadãos com direitos e deveres, favorecendo condições para que possam atribuir significados as
informações, aprendendo a participar da vida social, contribuindo com as mudanças de comporta-
mentos e atitudes que favoreçam a atuação no contexto social no qual encontra- se inseridos.
O bairro do Pedregal é o segundo mais populoso do município, apresentando fortes caracterís-
ticas de vulnerabilidade social, o que consiste em inúmeros problemas como: roubo, violência do-
méstica, prostituição, desemprego, desestrutura familiar, uso indevido de drogas, etc.
Um fator marcante para a aproximação do uso de drogas ser elevado, estão os aspectos geográ-
ficos, por ser localizado às margens da BR 304, sendo de fácil acesso e envolvimento dos moradores

256
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
com visitantes, caminhoneiros, que transitam diariamente, aumentando o números de casos de trá-
fico e uso abusivo de drogas e a eles relacionados à prostituição, doenças sexualmente transmissí-
veis, gravidez na adolescência, violência doméstica, aspectos esses que causam danos a vida familiar
e social do bairro.
Analisando os fatores sociais, econômicos e culturais, considerando a importante intermediação
da escola com a vida social de nossos educandos, percebemos o quanto o uso abusivo de drogas,
interferir no processo de ensino aprendizagem. Através de um diagnóstico realizado com os edu-
candos, em relação ao contato direto ou indireto com algum tipo de droga, constatamos que existe
incidência de elevado uso de bebidas alcoólicas, calmantes, tabaco, com índice entre os familiares
do uso de crack, álcool, maconha e cocaína, etc.Segundo pesquisa realizada pelo Conselho Munici-
pal de Políticas sobre Drogas (COMPAD), o bairro do Pedregal é um dos bairros do nosso município
considerado com maior número de usuários de drogas.
Como instituição educativa, pensamos no desenvolvimento do Projeto: vencendo as drogas, va-
lorizando a vida, tendo como objetivo promover a formação da comunidade escolar, por meio de
ações preventivas de atenção à saúde, visando o enfrentamento ao uso indevido de álcool e outras
drogas, introduzindo essa questão dentro de um contexto amplo, visando à responsabilidade do
indivíduo em relação à sua vida e saúde.
O envolvimento e a valorização dos agentes envolvidos, permitirão o conhecimento do poten-
cial da realidade local e suas características, articulando saberes diferentes para chegar a um saber
abrangente, promovendo parcerias e ações de fortalecimento dos fatores de proteção em relação
ao uso de drogas.

2. jUstificAtiVA
O referido projeto: vencendo as drogas, valorizando à vida, tem como objetivo promover a forma-
ção da comunidade escolar, por meio de ações preventivas de atenção à saúde, visando o enfren-
tamento ao uso abusivo de álcool e outras drogas. O trabalho propõe o desenvolvimento de ações
de prevenção ao uso abusivo de drogas envolvendo a participação dos educandos, garantindo a
inclusão social, bem como de todos os agentes envolvidos no processo educativo: educadores, fun-
cionários e familiares, adaptando de acordo com o contexto sociocultural da realidade local.
Sabedores da importância do planejamento, desenvolvimento e resultados pretendidos, o tra-
balho promove o fortalecimento das relações sociais, buscando a participação efetiva, espaços para
reflexão, troca de experiências, busca de soluções, vinculando os fatores de proteção na família,
escola e sociedade.
Contribuir para que o aluno faça escolhas saudáveis significa, para além da oferta de informações
e conhecimentos, o estabelecimento de relações vinculares saudáveis entre todos da comunidade
escolar. A autonomia implica a possibilidade de reconstrução dos sentidos da vida pelos sujeitos e
essa ressignificação assume importância no seu modo de viver.

3. objetiVos

3.1 objetiVo gerAl


Promover a formação da comunidade escolar, por meio de ações preventivas de atenção à saúde,
com vistas ao enfrentamento do uso indevido de álcool e outras drogas, relacionando a diversidade
de fatores contextuais e pessoais que constituem risco ou proteção para o uso de drogas.

257
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
3.2 objetiVos específicos
• Apresentar o projeto de prevenção de uso indevido de drogas na comunidade escolar;
• Promover ações, envolvendo a comunidade escolar, voltadas a prevenção e redução de
danos causados pelo uso indevido de drogas;
• Ampliar os conhecimentos dos estudantes da Educação de Jovens e Adultos sobre o álcool
e outras drogas;
• Reforçar os fatores de proteção relacionados com os estilos de vida na família, escola e so-
ciedade;
• Integrar a prevenção do uso de drogas no currículo escolar;
• Desenvolver ações preventivas com participação dos educandos e familiares;
• Articular parcerias com as redes externas para efetivação das ações de prevenção, no com-
bate ao uso abusivo de drogas.

3.3 metodologiA
• Reuniões para apresentação do projeto a comunidade escolar;
• Emissão de vídeos e rodas de conversas com temáticas relacionadas às drogas;
• Dramatização com os educandos;
• Aula de campo com visita a casa de recuperação;
• Oficina com os educandosvoltadas a temática das drogas;
• Gincana da saúde;
• Depoimentos e relatos de ex-usuários;
• Elaboração de panfletos educativos;
• Campanha educativa na comunidade;
• Produções textuais;
• Leituras e pesquisas relacionadas ao tema;
• Palestras com educandos e familiares;
• Peça teatral relacionada ao tema.

3.4 recUrsos hUmAnos


• Gestores;
• Educadores;
• Educandos;
• Familiares;
• Parcerias com profissionais de diferentes instituições;
• Comunidade.

258
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
3.5 recUrsos mAteriAis

Livros; Revistas; Internet, CD;

Data show; Cartolina; Vídeos; Slides;

Materiais gráficos; Pinceis; Sala polivalente; Biblioteca;

Computadores; Jornais.

AVAliAção
Durante as etapas realizadas do projeto serão registrados os avanços, as dificuldades encontradas
com as atividades desenvolvidas, sendo analisada a participação dos agentes envolvidos, alunos,
familiares e comunidade, observando os resultados quanto aos objetivos planejados e atingidos,
buscando o redirecionamento das ações planejadas de acordo com os dados e registroscoletados.

referenciAis bibliográficAs
Anjos caídos – como prevenir e eliminar as drogas na vida do adolescente. TIBA, Içami: São Paulo:
Gente, 1999.
AQUINO, Júlio Groppa (Org). Drogas na escola. São Paulo:Summus Editorial, 1998.
CASTRO, Mary Garcia: ABRAMOVAY, Miriam. Drogas na escola. Brasília: UNESCO, 2002.
CAVALIERI, Ana Lúcia: EGYPTO, Antônio Carlos. Drogas e prevenção São Paulo: Saraiva 2002.
Cartilhas SérieFique por Dentro do Assunto.
JACOBINA, Ronaldo Ribeiro; NERY FILHO,Antônio.Conversando sobre drogas. Salvador: Edufa, 1999.
SHINYASHIKI, Roberto. Pais e Filhos-Companheiros de viagem.São Paulo: Gente, 1992.
SILVEIRA FILHO, Dartiu Xavier. Panorama atual de drogas e dependências. São Paulo: Casa do Psicó-
logo, 1995.
Respostas sobre drogas. TIBA. Içami. São Paulo: Scipione, 2003.
Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas, 2013

Anexo

Anexo A: cronogrAmA dAs Ações reAlizAdAs


PLANO DE AÇÃO
JANEIRO- Início do ano letivo e apresentação do projeto aos educandos novatos;
Objetivo: Apresentar os objetivos do projeto, etapas que serão trabalhadas, visando a participa-
ção e envolvimento dos educandos no trabalho realizado.
Público alvo: Alunos do Projeto Sesc Ler
FEVEREIRO-Apresentação do projeto para os familiares;
Objetivo: Apresentar o projeto às famílias, sensibilizando da importância do envolvimento e par-
ticipação de todos no trabalho desenvolvido.
Público alvo: Famílias atendidas pelo Sesc

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Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
MARÇO-Realização de palestra com o tema: efeitos e consequências das drogas;
Objetivo: Oportunizar o conhecimento sobre os efeitos, causas e consequências das drogas no
organismo.
Público alvo: Alunos do Projeto Sesc Ler
ABRIL-Realização de oficina com profissional de saúde trabalhando a temática da auto estima;
Objetivo: Promover o fortalecimento da auto estima, percebendo-se como agentes importantes
no processo de transformação e afirmação.
Público alvo: Alunos do Projeto Sesc Ler
MAIO-Pesquisa e produção textual em sala de aula sobre o tema drogas;
Objetivo: oportunizar aos educandos a busca de conhecimentos, através da pesquisa, leitura e
produção textual sobre osobre o tema drogas.
Público alvo: Alunos do Projeto Sesc Ler
JUNHO-Realização de campanha educativa com o tema nas famílias e comunidade;
Objetivo: Sensibilizar as famílias e comunidade da necessidade de realização de ações de preven-
ção contra as drogas e inserir-se como agentes de mudanças no trabalho da prevenção.
Público alvo: Famílias e comunidade
JULHO-Férias
AGOSTO-Palestra sobre o tema tabagismo;
Objetivo: Conhecer sobre o tabagismo, as causas, efeitos e consequências do fumo no organismo.
Público alvo: Alunos do Projeto Sesc Ler
SETEMBRO-Exibição de vídeos voltados a temática central do projeto;
Objetivo: Refletir e discutir sobre temáticas pertinentes, relacionadas ao uso abusivo de álcoole
outras drogas.
Público alvo: Alunos do Projeto Sesc Ler
OUTUBRO-Momento de integração com ex- usuários, falando sobre o assunto drogas;
Objetivo: Oportunizar os educandos de conhecerem as experiências de pessoas que tiveram con-
tato direto com as drogas e conseguiram reabilitar-se.
Público alvo: Alunos do Projeto Sesc Ler.
NOVEMBRO-Elaboração de murais na escola com os educandos sobre a temática;
Objetivo: Desenvolver o potencial criativo e conhecimentos dos educandos sobre a temática tra-
balhada.
Público alvo: Alunos do Projeto Sesc Ler
DEZEMBRO-Visita a casa de recuperação com ação de educação, saúde, cidadaniacom realização
de palestra, doação de gêneros alimentícios, arrecadados em campanha com os alunos, finalizando
com a confraternização.
Objetivo: Realizar um momento de convivência e troca de experiências de como acontece esse
processo de reabilitação dos dependentes químicos.
Público alvo: Alunos do Projeto Sesc Ler

260
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
‘pro diA nAscer feliz’: A edUcAção escolAr nA
perspectiVA de AlUnos em priVAção de liberdAde
Aline cAmpos

Este trabalho é um recorte da pesquisa de mestrado desenvolvida com reeducandos de uma


unidade prisional do interior do estado de São Paulo. A investigação teve como objetivo ampliar
compreensões sobre a Educação Escolar de Jovens e Adultos em situação de privação de liberdade,
a partir dos olhares e vozes de 11 alunos que frequentam a escola. Um dos recursos de coleta de da-
dos foi a apresentação e discussão do filme “Pro dia Nascer Feliz” utilizando a metodologia de Rodas
de Conversa, que nos permitiu a obtenção dos dados apresentados neste trabalho. Os reeducandos
sinalizaram na discussão do filme a distinção entre as escolas pública e privada e destacaram a simi-
laridade da estrutura das escolas públicas com as prisões e o desejo de desfrutar das melhores es-
truturas da escola particular. Problematizaram a importância da motivação para o desenvolvimento
produtivo da aula, tanto para o aluno quanto para o professor, evidenciando que a responsabilidade
por essa motivação cabe a diferentes agentes. Na prisão, entretanto, essa responsabilidade se con-
centra na figura do professor, posto que neste espaço consideram que não há quem os motivem.
Enfatizam a dificuldade no estabelecimento de uma relação de diálogo entre professores e alunos
nas prisões, devido às questões disciplinares características desses espaços. Recordam dos professo-
res por suas formas de ser e agir e defendem que o fundamental no professor é o respeito ao aluno,
e que ele deve assumir, com amor, a atividade docente e os desafios da educação. Reconhecem, no
entanto, que há limites para a atuação da escola, em quaisquer espaços, e que existem outros fato-
res, como influências do bairro, que interferem nas aprendizagens dos estudantes.

palavras-chave: Educação na prisão, Educação de Jovens e Adultos, A figura do profes-


sor na prisão

breVe contexto dA edUcAção em prisões


Este trabalho é um recorte da pesquisa de mestrado desenvolvida no ano de 2014 com reeducan-
dos60 de uma unidade prisional do interior do estado de São Paulo/Brasil.
A educação escolar em espaços prisionais se insere na Educação de Jovens e Adultos (EJA), cons-
tituindo-se como um dos eixos mais invisíveis dessa modalidade de ensino já pouco considerada
nas políticas governamentais. Trata-se de uma educação voltada para um público extremamente
heterogêneo, advindos de processos de exclusão ao longo da vida.

Ela atende os excluídos dos excluídos: indígenas, quilombolas, populações do


campo, ciganos, pessoas portadoras de deficiências, pessoas em situação de priva-
ção de liberdade, catadores de materiais recicláveis, população em situação de rua...
(GADOTTI, 2014, p.21).

Nesse sentido, a educação em prisões é tomada na perspectiva da pedagogia social e educação


popular por “ser uma educação que trabalha com pessoas marginalizadas, buscando a reconstrução
de uma cidadania possível” (PEREIRA, 2011, p.49). No dizer de Gadotti:

60 Termo utilizado para se referir às pessoas em situação de privação ou restrição de liberdade nas Unidades Prisionais Paulis-
tas

261
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
O termo “popular” pode ser entendido como tudo aquilo que atende às necessi-
dades populares, às demandas dos excluídos. Tem a ver com o quantitativo – que
atende a todos – e com o qualitativo, uma certa concepção de Educação. Entende-
mos o “popular” da Educação na perspectiva da emancipação, da transformação.
Seria, então, tudo o que se realiza na perspectiva da transformação, da libertação,
da conscientização (2014, p. 26).

Portanto, se o intuito é a busca por uma real transformação da realidade de espaços marcados
pela opressão - como são as prisões – as práticas educativas devem estar inserida na perspectiva da
educação “popular”.
Para que essa educação seja de fato popular, contribuindo assim no processo de emancipação
das pessoas, é fundamental, portanto, que os (re)educandos sejam mais ouvidos e participem do
processo de construção dessa educação para que esta seja coerente com a formação permanente
de cidadãos. Nesse sentido, há que se considerar que:

O detento é uma pessoa que tem uma experiência de aprendizagem; quer tenha
um diploma (o que é raro), quer seja totalmente analfabeto, ele tem alguma experi-
ência de aprendizagem; algumas incluem a aprendizagem do ensino formal, outras
cursos de alfabetização ou aprendizados profissionais no próprio trabalho, ou ainda
outras competências condenáveis... mas todos têm alguma experiência de aprendi-
zagem positiva ou negativa, vivida conscientemente ou não (MAEYER, 2011, p.50).

Portanto, como ensina Freire (2011), os (re)educandos possuem diversos saberes da experiência,
os quais devem subsidiar o processo de ensino e aprendizagem. Esses conhecimentos obtidos na
vida não podem, e não devem, ser anulados no intuito de (re)socializar a pessoa, como se todo o
seu passado fosse um grande erro que precisa ser esquecido para dar lugar a um novo ser (re)so-
cializado. Nas prisões, aprender ao longo da vida significa “deixar momentaneamente seu estatuto
provisório de detento para se inscrever em uma perspectiva mais a longo prazo sem acrescentar um
julgamento social ao julgamento penal” (MAEYER, 2013, p. 47).
Se partirmos da compreensão que a educação acontece em qualquer espaço ao longo de toda a
vida da pessoa, o aprendizado não cessa nunca. A educação no cárcere é apenas uma etapa, um mo-
mento particular (MAEYER, 2009, p.26), ou seja, a prisão é mais um espaço-tempo na vida da pessoa
onde a educação pode se manifestar.
Com base nesses apontamentos, a investigação teve como objetivo ampliar compreensões sobre
a Educação Escolar de Jovens e Adultos em situação de privação de liberdade, a partir dos olhares e
vozes de onze alunos que frequentam a escola.

do filme à rodA: A coletA de dAdos


O recursos de coleta de dados que nos permitiu a obtenção dos dados apresentados neste traba-
lho foi a exibição do filme “Pro dia Nascer Feliz” e posterior discussão utilizando o recurso metodo-
lógico de Rodas de Conversa, que se constitui como:

um meio profícuo de coletar informações, esclarecer ideias e posições, discutir te-


mas emergentes e/ou polêmicos. Caracteriza-se como uma oportunidade de apren-
dizagem e de exploração de argumentos, sem a exigência de elaborações conclusi-
vas. A conversa desenvolve-se num clima de informalidade, criando possibilidades

262
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
de elaborações provocadas por falas e indagações (SILVA e BERNARDES, 2007, p. 54).

Configura-se, desse modo, como um recurso que incentiva a participação e reflexão na qual “bus-
camos construir condições para um diálogo entre os participantes através de uma postura de escuta
e circulação da palavra bem como com o uso de técnicas de dinamização de grupo” (AFONSO e
ABADE, 2008, p.19). Trata-se, portanto, de um metodologia participativa que pode ser utilizada em
diferentes contextos com o objetivo de promover a reflexão sobre os mais diversos temas.
Os estudos realizados sobre esse recurso metodológico sinalizam que nem sempre a participação
em Rodas de Conversa é fácil, sendo necessário que se estabeleçam “condições dialógicas para que
a reflexão aconteça” (AFONSO e ABADE, 2008, p.23).

É preciso oferecer algumas condições para incentivá-la bem como buscar supe-
rar algumas de suas dificuldades. Às vezes, as pessoas se sentem intimidadas pelo
fato de terem um vocabulário diferente, de não terem educação formal, de abordar
determinados temas, de revelar experiências sofridas, de expressarem opiniões e as-
sim por diante. Nem sempre a reflexão faz parte do nosso cotidiano. Muitas pesso-
as vivem em contextos que não cultivam e mesmo reprimem ou não incentivam a
reflexão. Em nossa sociedade, a desigualdade social traz impactos também sobre
as oportunidades de expressão, comunicação e reflexão. Também são diferentes as
condições que as pessoas têm de participar e refletir em seus diferentes contextos
de vida. É claro que, sendo a capacidade de pensar própria do ser humano, não po-
demos falar em uma incapacidade, generalizada, de pensar em dados contextos.
Porém, alguns contextos impõem dificuldades à reflexão, as situações de sofrimento
ou de exclusão social são exemplos. Quando alguém consegue, apesar de tudo, re-
fletir nestes contextos, via de regra traz ótimas contribuições para a compreensão do
próprio ser humano (AFONSO e ABADE, 2008, p.24).

No contexto prisional, a prática da reflexão é na maioria das vezes reprimida, uma vez que estes
espaços prezam pela obediência cega às regras estabelecidas pela instituição. Aprisionados que
assumem postura questionadora e reflexiva acabam enfrentando dificuldade em sobreviver nestes
espaços. Nesse sentido, tínhamos consciência de que esta seria uma proposta desafiadora de ser
estabelecida no interior de uma unidade prisional, uma vez que “a roda de conversa deve se dar
em um contexto onde as pessoas podem se expressar sem medo de punição social ou institucio-
nal” (AFONSO e ABADE, 2008, p.24) e não possuíamos mecanismos que garantissem tal premissa.
Tínhamos o sigilo assegurado pelo Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e o vínculo estabe-
lecido entre a pesquisadora e os colaboradores em decorrência de sua relação professora-alunos,
mas tínhamos consciência que isso talvez não fosse o suficiente para fazê-los se sentir seguros em
participar das rodas de conversa.
Entretanto, nossas ponderações nos levaram a optar por esse recurso metodológico, pois “o que
se busca na roda não é uma disputa sobre ‘quem tem razão’, mas a apreciação das diversas razões,
o alargamento da visão de cada um, a ampliação dos horizontes e a possibilidade de melhor refletir
sobre a questão abordada” (AFONSO e ABADE, 2008, p.24). Acreditávamos que, em diálogo com
diversos colaboradores, poderíamos construir com eles alguns entendimentos sobre a educação
escolar, que não pertencessem a um ou outro especificamente, mas que fosse fruto de uma reflexão
com base em diversas razões. É nessa perspectiva que os dados serão analisados neste estudo, sem-
pre como a voz do coletivo.
Nesse contexto, e com o intuito de promover atividades de reflexão sobre a educação escolar a

263
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
partir da exibição do filme “Pro dia nascer feliz”, o grupo de colaboradores da pesquisa se reuniu em
dois encontros semanais de aproximadamente duas horas cada, para dialogar em Rodas de Conver-
sa. O primeiro encontro foi ocupado quase que totalmente pela exibição do filme, restando apenas
alguns poucos minutos finais para o diálogo das impressões e opiniões. O segundo encontro, por
sua vez, foi destinado totalmente para a discussão do filme, sendo para tanto retomados alguns
trechos, que eram novamente exibidos de acordo com as demandas dos colaboradores. As vozes
pronunciadas nestes dois momentos trazem à tona algumas das concepções e opiniões dos colabo-
radores no que tange a educação escolar brasileira, que compartilhamos e analisamos neste texto.

reflexões A pArtir do filme: Vozes sobre A edUcAção escolAr


Durante a exibição do filme foram feitos alguns comentários pelo grupo. Entretanto, foi no di-
álogo posterior, em roda, que os colaboradores da pesquisa expuseram com mais tranquilidade e
clareza suas opiniões e reflexões sobre a educação escolar, desencadeadas pelos temas abordados
no filme.
Os reeducandos sinalizaram na discussão a distinção entre as escolas pública e privada, evi-
denciando a similaridade da escola pública com os espaços prisionais. A comparação estabeleci-
da pautou-se principalmente na estrutura física destas duas instituições por eles bem conhecidas.
Apontaram como semelhança os corredores, as cores das paredes, a presença de grades e muros
e por ambas se constituírem como espaços considerados “feios” e pouco ou nada acolhedores. Tal
percepção corrobora a clássica comparação de Foucault (2009) entre instituições como escola, pri-
são, hospital e quartéis, caracterizadas como “instituições de sequestro”, que são locais onde os in-
divíduos permanecem determinado período de tempo, separados do espaço social maior para que
suas posturas, comportamentos e condutas sejam modeladas e disciplinadas, promovendo a “doci-
lização dos corpos”.
Apesar da maioria dos reeducandos ter apresentado durante a exibição do filme identificação
com os alunos das escolas públicas e aversão aos alunos da escola particular, na roda de conversa
eles manifestaram o desejo de terem tido a oportunidade de desfrutar das melhores estruturas da
escola particular e de conseguirem garantir tais oportunidades a seus filhos futuramente.
Problematizaram a importância da motivação para o desenvolvimento produtivo da aula, tanto
para o aluno quanto para o professor, evidenciando que a responsabilidade por essa motivação
cabe a diferentes agentes, o que vai ao encontro de Tapia e Fita que afirmam que:

a motivação é algo complexo, processual e contextual, mas alguma coisa pode


se fazer para que os alunos recuperem ou mantenham seu interesse em aprender. À
sociedade, aos órgãos públicos e outras instituições cabe encontrar as soluções. Aos
professores e equipes docentes cabe a reflexão (2006, p.09 e 10).

Na prisão, entretanto, os reeducandos evidenciam que essa responsabilidade se concentra na


figura do professor, posto que neste espaço consideram que não há quem os motivem. Segundo
Santos (2011), a dinâmica dessas instituições não tem como foco a formação do indivíduo, apenas
sua adaptação, ou seja, a anulação de sua identidade. Nesse sentido, ao professor é atribuída uma
responsabilidade maior pela motivação do desejo de aprendizagem nos alunos.
Dentre as dimensões fundamentais para conseguir motivar a aprendizagem escolar Tapia e Fita
defendem que seja considerado o contexto, pois segundo estes autores:

Saber motivar implica ter presentes tantos os contextos de aprendizagem mais


próximos como os mais distantes, desde o espaço físico até a família, passando pe-

264
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
los ambientes informais e legais. Apenas considerando esses contextos, poder-se-ão
entender alguns comportamentos não motivados para aprender (2006, p.09).

Fica evidente, portanto, que o docente no espaço prisional não pode perder de vista as especi-
ficidades do contexto em que está inserido e das histórias de vida de seus alunos, em sua maioria,
marcados por processos históricos de marginalização e de “fracasso” escolar. Nesse sentido, há que
se considerar que:

Sendo os homens seres em “situação”, se encontram enraizados em condições


tempo-espaciais que os marcam e que eles igualmente marcam. Sua tendência é
refletir sobre sua própria situacionalidade, na medida em que, desafiados por ela,
agem sobre ela. Esta reflexão implica, por isto mesmo, algo mais que querer estar em
situcionalidade, que é a sua posição fundamental. Os homens são porque estão em
situação. E serão tanto mais quanto não só pensem criticamente sobre sua forma de
estar, mas criticamente atuem sobre a situação em que estão (FREIRE, 2011, p.141).

Desse modo, ainda que a situação de privação e restrição de liberdade não deva ser o foco para
a construção da educação escolar nas prisões, ela não pode ser completamente ignorada, pois con-
figura-se como parte da situcionalidade dos sujeitos dessa educação e terá impactos sobre suas
posturas, condutas e disposição em relação à aprendizagem. Cabe à educação nas prisões o desafio
de buscar a reflexão crítica dessa situação a fim de contribuir no processo de tomada de atitudes
que visem a sua superação.
Apesar de depositarem nos professores a principal responsabilidade por sua motivação, enfa-
tizam a dificuldade no estabelecimento de uma relação de diálogo entre professores e alunos nas
prisões, devido às questões disciplinares características desse espaço. Essa situação dificulta o esta-
belecimento de proximidade e consequente desenvolvimento de trabalho conjunto para a constru-
ção de mecanismos que retroalimentem suas motivações no processo de ensino e aprendizagem.
Para Freire:

qualquer que seja a situação que alguns homens proíbam aos outros que sejam
sujeitos de suas buscas, se instaura como situação de violência. Não importa os
meios usados para essa proibição. Fazê-los objetos é aliená-los de suas decisões, que
são transferidas a outro ou outros (2011, p.104).

Essa violência, que nega à pessoa aprisionada o direito de poder dizer, sem medo de sanções
disciplinares, a sua palavra ainda é uma constante nos espaços prisionais. Essa cultura de opressão,
que caracteriza as prisões, é, sem dúvida, um dos maiores desafios postos para a construção de uma
educação emancipadora e libertadora dentro destes espaços. Porém, um desafio que precisa ser
assumido pelos diferentes agentes envolvidos com a educação escolar nas prisões.
Em suas incursões pelas memórias escolares, os reeducandos recordam dos professores por suas
formas de ser e agir, evidenciando o papel destes como exemplos em suas formações. Nesse sentido,
sinalizam que o fundamental no professor é o respeito ao aluno, e que ele deve assumir, com amor,
a atividade docente e os desafios da educação. Trata-se de um amor que pode ser entendido como
“a emoção que constitui o domínio de condutas em que se dá a operacionalidade da aceitação do
outro como legítimo outro na convivência, e é esse modo de convivência que conotamos quando
falamos do social” (MATURANA, 1998, p. 23). Portanto, é um amor que insere o outro no seu campo
de aceitação mútuo e lhe faz desejar ao outro o bem que espera para si próprio. Corroborando a
concepção de amor defendida por Maturana (1998), Freire (2011, p.58) afirma que:

265
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Inauguram a violência os que oprimem, os que exploram, os que não se reconhe-
cem nos outros; não os oprimidos, os explorados, os que não são reconhecidos pelos
que os oprimem como outro. Inauguram o desamor, não os desamados, mas os que
não amam, porque apenas se amam.

Por fim, mesmo atribuindo à educação responsabilidades com relação à formação do indivíduo,
os colaboradores reconhecem que há limites para a atuação da escola, em quaisquer espaços, e que
existem outros fatores, como influências do bairro, que interferem nas aprendizagens dos estudan-
tes.

AlgUmAs considerAções
Mesmo sem acesso a referenciais acadêmicos sobre as diferentes temáticas discutidas na
roda de conversa, os reeducandos apresentam opiniões e reflexões críticas e condizentes com estu-
dos e concepções que vem sendo desenvolvidas no campo da educação. Isso revela a importância
da escuta de suas vozes e considerá-las no processo permanente de construção da educação em
espaços de privação e restrição de liberdade. Reforça-se assim, a importância do rompimento com
as dicotomias professor – aluno e saber popular – saber acadêmico, bem como a necessidade da
construção do conhecimento como um fazer com e não para as pessoas em situação de privação e
restrição de liberdade. Trazer os conhecimentos que eles possuem do cotidiano e as necessidades
que vivenciam para o processo permanente de construção da educação propiciará que os espaços
educativos contribuam na elaboração de seus projetos de vida, pois “com a palavra, o homem se faz.
Ao dizer a sua palavra, pois, o homem assume conscientemente sua essencial condição humana”
(FIORI, 2011.p.17) e somente nessa consciência as pessoas podem se transformar em sujeitos autô-
nomos e livres.
A situação atual posta das prisões como instituições de controle e opressão, marcadas por
processos de desumanização das pessoas aprisionadas, é uma cultura e um desafio a serem supera-
dos e não uma condição para a imobilização.

Na verdade, se admitíssemos que a desumanização é a vocação histórica dos


homens, nada mais teríamos a fazer, a não ser adotar uma atitude cínica ou de to-
tal desespero. A luta pela humanização, pelo trabalho livre, pela desalienação, pela
afirmação dos homens como pessoas, como “seres para si”, não teria significação.
Esta somente é possível porque a desumanização, mesmo que um fato concreto na
história, não é, porém, destino dado, mas resultado de uma “ordem” injusta que gera
a violência dos opressores e esta, o ser menos (FREIRE, 2011, p. 40 e 41).

Alterar esse quadro não se constitui em tarefa simples, tampouco realizável a partir de lógica
verticalizada. Não seremos nós, pessoas alheias e externas à realidade prisional, que com nossas
convicções e ideais libertaremos as pessoas aprisionadas de sua condição de oprimidas. É pouco
provável que elas, sozinhas, também o façam. Se existe possibilidade de transformação da socieda-
de dos cativos, ela se apoia na educação e tem como agentes transformadores pessoas lutando em
comunhão. Nesse sentido, “é preciso que creiamos nos homens oprimidos. Que os vejamos como
capazes de pensar certo também” (FREIRE, 2011, p. 73) e que junto com eles, busquemos sair da
utopia em direção ao “inédito viável” no interior das prisões.

266
Categoria: Comunicação | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
REFERÊNCIAS
AFONSO, Maria Lúcia M.; ABADE, Flávia Leme. Para reinventar as rodas. Belo Horizonte: Rede de Ci-
dadania Mateus Afonso Medeiros (RECIMAM), 2008.
FIORI, Ernani Maria. Prefácio, Aprender a dizer a sua palavra. In: FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimi-
do. 50ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2011.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 50ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2011.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: nascimento da prisão. Raquel Ramalhete (tradução). 36ª ed. Rio de
Janeiro: Vozes, 2009.
GADOTTI, Moacir. Por uma política nacional de educação de jovens e adultos. 1ª ed. São Paulo: Mo-
derna, Fundação Santillana, 2014.
MAEYER, Marc De. A educação na prisão não é uma mera atividade. Educação & Realidade, Porto
Alegre, v.38, n.1, p.33-49, jan./mar. 2013.
______. Ter tempo não basta para que alguém se decida aprender. In: IRLEND, Timothy D (Org.) Edu-
cação em prisões. Em Aberto, Brasília, v.24, n.86, p. 43 – 55, nov/2011.
______. O desafio da educação nas prisões. Revista Escrevendo Juntos, n.40, p.23-27, jul/dez 2009.
Entrevista concedida à Regina Scomparim.
MATURANA, Humberto. Emoções e linguagem na educação e na política. Belo Horizonte: UFMG,
1998.
PEREIRA, Antonio. A educação-pedagogia no cárcere, no contexto da pedagogia social: definições
conceituais e epistemológicas. Revista Educação Popular, Uberlândia, v.10, p.38-55, jan./dez. 2011.
SANTOS, Silvio dos. O espaço administrado da prisão e a escola como locus de resistência. In: LOU-
RENÇO, A. S.; ONOFRE, E. M. C. (Orgs.). O Espaço da prisão e suas práticas educativas: enfoques e pers-
pectivas contemporâneas. São Carlos: EdUFSCar, 2011. p. 119 – 129.
SILVA, Petronilha Beatriz Gonçalves; BERNARDES, Nara Maria Guazzelli. Rodas de Conversas – Exce-
lência acadêmica é a diversidade. Educação, Porto Alegre/RS, ano XXX, n. 1 (61), p. 53-92, jan./abr. 2007.
TAPIA, Jesús Alonso; FITA, Enrique Caturla. A motivação em sala de aula: o que é, como se faz. 7ª ed.
São Paulo: Edições Loyola, 2006.

(Endnotes)
1 Notas
Uso a expressão “trabalho” por pura convenção acadêmica, mas prefiro ser lida de modo a propor uma conversa e algumas de minhas
tantas reflexões, dúvidas, questionamentos...
2 Muitas vezes solicitávamos que os discentes fizessem tarefas em casa ou em outros espaços que não fossem os das salas de
aula. Mal sabia eu que este meu aluno não tinha bem uma “casa” para fazer seus afazeres. Até desenvolver estratégias muito peculia-
res para lidar com isto, suas tarefas e leituras extras dificilmente eram feitas.
3 IHGB – Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro
4 Fonte: http://livreopiniao.com/2014/08/14/entrevista-com-o-escritor-luiz-alberto-mendes-os-livros-me-salvaram/ (Acessa-
do em 31/08/2014)

267
cAtegoriA 1

comUnicAção

sUbtemA 2

alfabetização, letramento e
linguagenS ContemporâneaS
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
AlfAbetizAção de joVens e AdUltos ArticUlAdA Aos
letrAmentos
silVAnA oliVeirA biondi | frAnciscA izAbel pereirA mAciel

O objetivo deste trabalho é o de abordar alguns pontos de reflexão teórico-metodológica para


alfabetização na área de Educação de Jovens e Adultos, que creio poderem contribuir para as dis-
cussões entre os que atuam na área. Inicialmente, faz-se necessário abordar um pouco da EJA como
categoria histórica de amplas dimensões que procura atender a um grande e diversificado contin-
gente de pessoas no país. Segue-se uma reflexão teórica acerca da alfabetização como processo
pedagógico que possui também um caráter de natureza político e, por fim, à proposição de um
desenho pedagógico de alfabetização que possa ser mais adequado aos alunos da EJA e às deman-
das da atualidade. Na abordagem sobre alfabetização evidencia-se uma dimensão da prática peda-
gógica, integrante de uma prática social maior, fazendo emergir o analfabetismo, este reconhecido,
ainda hoje, como um grave problema social que atinge muitos países e que não tem sido diferente
no Brasil, onde o problema tem se mostrado de forma perversa junto à população excluída social-
mente da garantia dos seus direitos, impossibilitando ser a alfabetização o instrumento que amplia
a capacidade de jovens e adultos reconhecerem-se na realidade e exercerem participação social e
política. Alfabetização que não pode ser encarada como simplesmente o desenvolvimento de ha-
bilidades da língua padrão, e sim para além dessa aprendizagem básica, que se apresenta como o
exercício efetivo e competente de uso da tecnologia da escrita. E considerando a ação alfabetiza-
dora imbuída da condição de letramentos, implicações pedagógicas e sociais ocorrem no processo
ensino-aprendizagem. Coloca-se, portanto, na ação alfabetizadora o desafio da articulação entre o
ler, o escrever e os usos sociais desses dois artefatos culturais.

palavras-chave: educação de jovens e adultos, alfabetização, letramentos

1 introdUção
A Educação de Jovens e Adultos1 no Brasil tem sido discutida de forma controversa e polêmica
desde os primórdios quando começou a ser pensada em relação ao ensino regular com a inobservân-
cia das especificidades dessa modalidade de ensino. Na trajetória da EJA2 já no início da colonização
portuguesa no Brasil, quando os índios, primeiros habitantes, eram doutrinados somente para uma
educação restrita à conversão para a fé católica pela catequese e pela instrução, vê-se a alfabetiza-
ção e a transmissão do idioma português apenas para servir como instrumento de cristianização e
aculturação dos nativos. Essa intencionalidade no sentido de educar adultos para servirem aos inte-
resses das classes hegemônicas está evidenciada ao longo da história da Educação Brasileira.

A leitura, a escrita e o cálculo eram, de fato, os conteúdos próprios da instrução,


que davam a base para a compreensão das Sagradas Escrituras. Ter acesso aos ca-
tecismos, livros e cantos religiosos, [...] entender e acompanhar ativamente os ritos e
os sacramentos era tudo o que se esperava da instrução do gentio. Isso os civilizava,
pacificava, transformando-os em súditos da Coroa e “filhos de Deus” (XAVIER, 1994,
p.43).

Fica evidente, a partir do exposto, que nos espaços-tempo em que a referência à educação de
adultos no Brasil é feita, os aspectos políticos e econômicos apresentam-se como elementos princi-
pais para justificar a ampliação da instrução pública para essa demanda de sujeitos.

269
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
Com um olhar retrospectivo sobre o percurso e a implantação de políticas públicas frente à meta
de superação do analfabetismo, as iniciativas demonstram que a EJA esteve sempre atrelada a pro-
jetos assistencialistas e compensatórios. Nas palavras de Arroyo (2007, p.19), a característica mais
marcante da EJA na atualidade é exatamente a busca pela configuração de sua especificidade. O
fato de a EJA não possuir esse contorno definido gera “um campo aberto a qualquer cultivo e seme-
adura. [...] um campo desprofissionalizado. De amadores. De campanhas e de apelos à boa vontade
e à improvisação.”
Para Paiva (2003), a ausência dessa configuração traduz-se em se ver que as experiências nessa
modalidade têm-se dado muito na perspectiva de cursos noturnos, em horários ociosos de escolas
públicas do Ensino Fundamental ou privadas, com estrutura insuficiente para garantir a qualidade
educacional necessária, além de não dar conta da demanda existente no país, o que afeta o cumpri-
mento ao direito preconizado na Constituição Federal de 1988.
Como direito humano, ainda segundo Paiva, busca-se legitimar, para a educação, a ontologia do
ser social, entendendo-se que, mais do que uma construção da história, ela significa um atributo da
própria humanidade dos sujeitos, sem a qual homens e mulheres não se humanizam completamen-
te. Colocando, portanto, o direito como elemento primordial à condição de ser no mundo,

É por meio dos direitos humanos que o valor da liberdade passa a ser posto no
horizonte como fundamento essencial da vida, cuja realização exige regras e formas
de convivência capazes de garantir a igualdade para todos os sujeitos. (PAIVA, 2003,
p.31)

No texto A importância do Ato de Ler, Paulo Freire deixa clara a sua concepção de educação como
aquela que não permite a nenhum individuo viver imerso na inconsciência ou sob o jugo da domi-
nação, sendo, portanto, um ato de libertação. Nas palavras do próprio Freire “reafirmar que sempre
vi a alfabetização de adultos como um ato político e um ato de conhecimento, por isso mesmo,
como um ato criador” (Freire, 1989, p.13). Ou mais ainda,

[...] A leitura crítica da realidade, dando-se num processo de alfabetização ou não


e associada, sobretudo a certas práticas claramente políticas de mobilização e orga-
nização, pode constituir-se num instrumento para o que Gramsci chamaria de ação
contra-hegemônica. (FREIRE, 1989, p.14).

Acreditamos na validade desse pressuposto para o acontecer do processo de alfabetização por


também pensarmos a educação como parte do existir do ser humano e por acreditarmos serem os
homens e as mulheres seres inconclusos, em permanente processo de construção de conhecimen-
tos e de formação humana. “O inacabamento do ser ou sua inconclusão é próprio da experiência
vital. Onde há vida, há inacabamento” (Freire,1997, p. 55).
Ao que se deve, então, essa desatenção a um dos direitos sociais mais importantes para qualquer
país, ainda persista no Brasil?
Muitas podem ser as respostas e as explicações para essa violação de um direito humano funda-
mental, mas sejam elas quais forem o que se pode ver ao longo da história da educação brasileira é
a demarcação de que as políticas públicas da EJA não acompanharam as políticas públicas educa-
cionais.
Pensar a educação com o sentido do direito coloca a alfabetização da educação de jovens e adul-
tos no cerne do debate sobre a exclusão social e sobre o reconhecimento dos excluídos, por fatores
de idade e de classe, de gênero, do direito de acesso à escola pública, do direito de “ler e de escrever;

270
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
de questionar e de analisar; de ter acesso a recursos e de desenvolver e praticar habilidades e com-
petências individuais e coletivas” (UNESCO, 1997, p. 3).
Podemos dizer que nesse ponto tensionam os limites da política de gestão com a política edu-
cacional e, mesmo os grandes embates sendo travados em outra esfera, optamos nesse trabalho
por analisar algumas questões conceituais acerca da alfabetização de adultos, concentrando o foco
na dinâmica interna da prática pedagógica, quando esperamos perceber através dela os alcances
e limites que ainda temos a enfrentar para alcançarmos o patamar de país livre do analfabetismo.

2. AlfAbetizAção no contexto dA ejA


Falar de alfabetização significa trazer à tona uma dimensão da prática pedagógica, dirigida aos
muitos excluídos que compreendem os sujeitos da EJA e, simultaneamente, falar sobre o que lhe é
correlato: o analfabetismo.
O discurso do analfabetismo da população adulta vem de longa data, estando presente em dife-
rentes momentos históricos vividos por nossa sociedade e, mesmo com tanto tempo de existência,
ainda apresentamos no país uma alta taxa de analfabetismo3, o que mostra ser essa questão um
desafio para os profissionais da educação e áreas correlatas.
E mesmo que não vejamos alterações substantivas no âmbito da educação no Brasil, considera-
mos que ela seja uma das condições para participar com relativa independência e autonomia de
uma sociedade que se mostra fortemente vinculada à cultura letrada, marcada por avanços tecno-
lógicos, mudanças no trabalho e nas habilidades requeridas pelos trabalhadores. Ainda segundo
Kleiman,

[...] EJA é apontada como processo fundamental para a construção de um projeto


de sociedade inclusiva e democrática. E a alfabetização é tomada como etapa fun-
damental para dar início e continuidade à escolarização, processo que deve prover
o acesso a bens culturais construídos ao longo da história e a modelos culturais de
ação, fundados em saberes, valores e práticas socialmente prestigiados (VÓVIO E
KLEIMAN, 2013, p.3).

E esse é o sentido que na atualidade, a educação de jovens e adultos toma fôlego e ganha es-
paço nos debates que dessacralizam a forma de dominação dos conhecimentos ditos acadêmicos,
trazendo-os à tona ressignificados pelos saberes experienciais. São saberes de homens e mulheres
que, à margem dos saberes formais, organizam e vivem a vida, enfrentando as adversidades, produ-
zindo culturas e afirmando identidades. Portanto, é imprescindível garantir as condições necessárias
para que o processo de alfabetização se efetive, permitindo aos que não tiveram acesso à educação
regular na infância e na adolescência uma oportunidade de iniciação dos estudos.
Esse é, propriamente, o amplo contexto no qual se situam os alunos da educação de jovens e
adultos. E pensando nas pessoas que se apresentam com tais características, é importante reco-
nhecer quão representativa na sociedade da informação é a língua escrita para permitir-lhes ter
acesso ao universo das tecnologias da informação e da comunicação presentes no mais simples dos
cotidianos.
E partindo da realidade na qual esses adultos (com)vivem, podemos dizer que não existam anal-
fabetos no sentido estrito do termo. O que temos encontrado na EJA são sujeitos mergulhados nas
variadas situações de letramentos, mas que não possuem domínio da tecnologia da escritura e da
leitura. Falamos de homens e mulheres sem nenhuma ou repetidas histórias de fracasso escolar,
imposto pelas próprias condições de vida que, apesar dessas contingências, vivem e enfrentam de-
safios diários.

271
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
(Re)construir esse retorno ou a iniciação no espaço escolar com esses sujeitos pela via do proces-
so da alfabetização é uma tarefa complexa que exige do professor, além de uma compreensão do
quadro sócio-político da EJA, o planejamento e a execução de uma proposta pedagógica que esta-
beleça interlocução com os saberes e as memórias inscritas naqueles a quem almejamos inserir no
universo da leitura e da escrita.
Uma proposta que apresente a escrita como além de um sistema simbólico, onde nela os alunos
entrem em contato com a escrita real, presente no ambiente social. É preciso, sim, um trabalho que
tenha como base um conjunto de concepções teóricas que vê a construção dos conhecimentos a
partir da relação que se estabelece entre o sujeito e objeto.
O próprio entendimento de Freire sobre o processo de alfabetização estava além do domínio da
leitura e da escrita. A apropriação dos instrumentos de leitura e escrita não poderia dar-se sem a
leitura do mundo, uma vez que a alfabetização fazia parte de um projeto maior, de emancipação e
superação de desigualdades. Com suas propostas e práticas, podemos dizer que Freire introduziu,
na área, material pedagógico que propiciava o letramento4 dos adultos trabalhadores. Pois segun-
do Gadotti,

a prática ensinou a Paulo Freire que seria totalmente inconsequente levar o ope-
rário, depois de um dia cansativo de trabalho, uma cartilha que o obrigasse a ficar
repetindo, por exemplo: ‘Eva viu a uva, A ave é de Ivo, A uva é do Ivo’. (GADOTTI apud
MOURA, 2010, p.160)

Partimos, portanto, da ideia de que é importante saber ler e escrever, porém mais que isso, é
importante saber movimentar-se nesse universo simbólico produzido pelo mundo das linguagens.
Isto quer dizer que, se é necessário aprender a ler e a escrever, a qualidade dessa aprendizagem
relaciona-se diretamente com a capacidade de (re)construí-la a partir (dos) e em relação aos saberes
da tradição oral e das experiências desses alfabetizandos.
Alimentar essa perspectiva de educação é deparar-se sim, com Paulo Freire, para quem essa mo-
dalidade de educação tem uma séria preocupação com a leitura crítica do mundo, mesmo que as
pessoas ainda não façam a leitura da palavra; nela não se descuida da preparação técnico-profis-
sional, mas também não se aceita posição de neutralidade política, pois a dimensão global dela é
contribuir “para a compreensão geral do ser humano em torno de si como ser social, seja menos
monolítica e mais pluralista, seja menos unidirecionada e mais aberta à discussão democrática de
pressuposições básicas da existência” (FREIRE, 2010, p.16).
A proposta de Paulo Freire baseia-se na realidade do educando, levando-se em conta suas ex-
periências, suas opiniões e sua história de vida. Esses dados devem ser organizados pelo educador,
a fim de que as informações fornecidas por ele, o conteúdo preparado para as aulas, a metodologia
e o material utilizados sejam compatíveis e adequados às realidades presentes.

O que acontece, no meio popular, nas periferias das cidades, nos campos-tra-
balhadores urbanos e rurais reunindo-se para rezar ou discutir seus direitos-, nada
pode escapar à curiosidade arguta dos educadores envolvidos na Educação popular
(FREIRE, 2010, p.16).

É Freire também quem nos referencia sobre a perspectiva que deve assumir o processo de
alfabetização e nele qual o papel da linguagem, ao dizer que,

[...] nesta perspectiva, portanto, os alfabetizandos assumem, desde o começo

272
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
mesmo da ação, o papel de sujeitos criadores. Aprender a ler e escrever já não é, pois,
memorizar sílabas, palavras ou frases, mas refletir criticamente sobre o próprio pro-
cesso de ler e escrever e sobre o profundo significado da linguagem (FREIRE, 1989,
p.40).

3. AlfAbetizAção e letrAmentos nA ejA


Em se tratando especificamente do processo de alfabetização para jovens e adultos, podemos
relacionar a posição de Freire com uma proposta na qual se compreenda a língua como lugar de
interação que possibilita aos alfabetizandos a prática dos mais diversos tipos de atos, fazendo-os
interagir com o mundo que os rodeia. É considerar que a linguagem é um trabalho social e histórico
através do qual as pessoas se constituem, não sendo apenas uma estrutura, um sistema abstrato.
Desse modo, pensar e agir para a alfabetização é um ato criador, como disse Freire (2010), porque
nele o alfabetizando apreende a necessidade de aprender a ler e a escrever, preparando-se para ser
agente da própria aprendizagem; o que consegue, na medida em que a alfabetização deixa de ser
um simples processo mecânico de apreensão do código e passa a ser o entendimento de tudo que
se lê e se escreve no universo existencial.
O processo da alfabetização, por conseguinte, não pode ser proporcionado sozinho, como sendo
simplesmente “o desenvolvimento de habilidades da língua padrão dominante”, uma apropriação
do sistema alfabético e ortográfico de escrita. Uma função que tradicionalmente, segundo Soares
(2003, p.91) está ligada à escola: “consideramos que é à escola e à escolarização que cabem à apren-
dizagem de domínio do sistema de escrita, ou seja, a alfabetização”.
É preciso mais, é preciso atuar com esses alfabetizandos numa perspectiva de letramento, o que
para Soares ocorre com “o desenvolvimento para além dessa aprendizagem básica, que se apresenta
como o exercício efetivo e competente de uso da tecnologia da escrita, que é o letramento”. É a
marca da desenvoltura no desempenho das variadas atividades do dia-a-dia. Coloca-se na ação
alfabetizadora o desafio da articulação entre o ler, o escrever e os usos sociais desses dois artefatos
culturais. E ainda tendo que levar em conta de que não se trata de uma reprodução da alfabetização
para crianças, pois a educação de jovens e adultos é uma modalidade de ensino que tem suas
especificidades.
E nesse cenário, vemos os estudos do letramento se difundirem com finalidade de compreender
a distância dos diferentes usos da leitura e da escrita e as práticas de ensino de língua desenvolvidas,
incluindo aqui a alfabetização. E embora, a universalização do ensino tenha alcançado um alto nível
no nosso país, convivemos com a realidade de que o aprendizado da leitura e da escrita não tem
sido considerado como suficientes para garantir a plena inserção social daqueles que se constituem
alunos da educação de jovens e adultos.
Portanto, é preciso compreender as práticas de letramentos em diferentes contextos sócio-histó-
ricos, buscando entender o que realmente acontece com o objetivo de “[...] expandir práticas comu-
nitárias na área do letramento [...] e não apenas para melhorar índices em testes de alfabetização”
(STREET, 2003,p.02).
Ainda precisamos considerar que, sob a ótica de uma teoria social, o letramento apresenta-se
como um fenômeno complexo porque revela marcas identitárias de orientação e de constituição
das pessoas nos aspectos sócio, político, econômico, cultural e de gênero. Tais revelações consti-
tuem-se nas práticas sociais realizadas, a partir das quais podemos identificar as muitas vozes desses
sujeitos.
Desse modo, podemos estabelecer vínculo entre as estruturas sociais e as atividades de leitura
e escrita que se estabelecem com o processo de escolarização ou com a ausência dele. Street (Ib-

273
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
dem) define as práticas de letramentos como práticas culturais discursivas, que determinam a pro-
dução e interpretação de textos orais e escritos, em contextos específicos. E nessas práticas sociais
o letramento exerce o seu principal papel. Isso representa dizer que, os sentidos se constroem nos
contextos e deles são dependentes, pois as práticas estão imersas numa ideologia e não podem ser
tratadas como neutras. É importante ressaltar que, para Street o letramento é compreendido como
práticas, no plural, por estar relacionado às interações cotidianas, e não como um conjunto de com-
petências cognitivas individuais (Ibdem).
Termos clareza das práticas de letramentos desenvolvidas pelos alunos da EJA possibilitará que
as atividades alfabetizadoras sejam desenvolvidas articuladamente com as experiências deles, isto
é, partindo dessas vivências para proporcionar outras também socialmente valorizadas. Adotar a
perspectiva interacional da linguagem é reconhecer que há no estatuto das línguas uma produ-
ção social de novos significados emergentes, mesmo que nunca inteiramente livres das relações de
poder, mas também não totalmente regidas por elas. Em outras palavras, é possível, na interação,
construir realidades sociais, papéis e identidades, não apenas reproduzir o já dado (KLEIMAN, 2012,
p. 27).
Essa proposição alimenta a possibilidade da criação de um processo pedagógico com identidade,
que corresponda às expectativas de formação dos alunos a uma demanda do mundo contempo-
râneo. Um movimento que traduz o reconhecimento de que a língua deve ser tratada como um
objeto de estudos de uma ciência aplicada que dialoga com teorias do campo das ciências sociais e
das humanidades.
Geraldi diz que, para o ensino de língua, vale ressaltar, “no caso específico do ensino de portu-
guês, nada será resolvido se não mudar a concepção de língua e de ensino de língua na escola”
(1999, p. 32). A apreensão dessas orientações ajuda-nos a conceber a aprendizagem como um fe-
nômeno que se realiza na interação com o outro, numa dimensão coletiva; entender a natureza
da linguagem, bem como suas relações com a sociedade vislumbrando que “a língua vive e evolui
historicamente na comunicação verbal concreta, não no sistema linguístico abstrato das formas da
língua nem no psiquismo individual dos falantes” (BAKHTIN, 1986,p.124).

considerAções finAis
Da necessidade de se ter uma proposta alfabetizadora mais eficiente para a EJA não há o que
argumentar, pois os índices que temos apresentados por si só falam. Juntamente a este fato, temos
ainda que pensar na necessidade de transformar o cotidiano escolar para que o trabalho com a EJA
se efetive não apenas como iniciação pela alfabetização, mas pela continuidade do processo de
escolarização; isso porque a permanência desses alunos no espaço educacional é outro desafio que
temos enfrentado.
Quanto ao desenho pedagógico para atuar no processo de alfabetização, precisamos concretizar
a proposição de alfabetizar letrando, onde o papel da linguagem deve ser visto como a possibilida-
de de desconstrução de uma realidade excludente, eliminando o exercício da autoridade visto no
processo de aprendizagem de uma língua apenas normatizada, fora da realidade do aprendiz. Para
tanto, é necessário, nessa prática, centralizar o papel da linguagem verbal, tanto no plano do conte-
údo como no plano da expressão.
Reconhecer a linguagem como imprescindível para o desenvolvimento do homem, como pontua
Franchi (1992, p.11) ao situá-la como sendo uma atividade constitutiva, considerando-a a partir de
noções correlacionadas com as funções de comunicação, mas não como simples transmissão de in-
formações e sim, com o uso social que ela tem; um espaço aberto de criação e também de subversão
das significações.
É importante que o aprendiz perceba que a língua é um instrumento vivo, dinâmico, facilitador,

274
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
com a qual é possível participar ativamente e essencialmente da construção da mensagem de
qualquer texto.
Precisamos instituir um processo pedagógico iniciado com a alfabetização que se paute no dia-
logismo, que os conhecimentos desses sujeitos sejam relacionados com os conhecimentos histori-
camente construídos, fazendo-os problematizar, refletir, (re)criar e (re)elaborar as próprias experiên-
cias cotidianas.
Dessa forma, haverá uma democratização do saber, a superação do senso comum e esses sujeitos
irão interagir num constante processo de criação e recriação.

referênciAs
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XAVIER, Maria Elizabete Sampaio Prado. História da Educação: a escola no Brasil. São Paulo: FTD,
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275
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
constrUção de hipóteses sobre A escritA AlfAbéticA
por AlUnos joVens e AdUltos
AlcicléA rAmos dos sAntos | AnA pAUlA de AbreU costA de moUrA

O presente trabalho tem o intuito de apresentar os resultados obtidos no processo de investiga-


ção do modo como alunos jovens e adultos constroem sua escrita, verificando quais tipos de conhe-
cimentos trazem para se alfabetizarem. Os resultados aqui presentes se deram a partir das ações de
extensão e pesquisa realizadas por pesquisadores do Núcleo de Pesquisa e Extensão em Educação
de Jovens e Adultos, um dos projetos que compõem o Programa Integrado da UFRJ para EJA. O tra-
balho teve sua origem no incômodo de toda equipe do programa, que percebia a dificuldade tanto
dos alfabetizadores em alfabetizar e dos alunos em compreender a construção do sistema de escrita
alfabética. Sendo assim, a metodologia foi encaminhada pelo pressuposto teórico, que é preciso ler
a sala de aula como um texto (Freire, 1994), onde cabe ao alfabetizador refinar seu olhar sobre cada
aluno, não naturalizando as situações vivenciadas em sua sala, mas investigando na perspectiva
de atuar como um alfabetizador-pesquisador. Desta forma, o caminho trilhado para o desenvolvi-
mento de tal investigação foi através de uma abordagem qualitativa, sendo dividida em três etapas.
Inicialmente foi permeada com uma revisão de literatura trazendo autores que abordassem o tema
apresentado, em seguida, houve a elaboração de materiais didáticos em conjunto com alfabetiza-
dores sendo construídos de forma contextualizada privilegiando o uso e o trabalho com textos e, ao
final, o acompanhamento sistemático dos alunos e retorno dos resultados aos alfabetizadores das
turmas participantes da pesquisa. Por fim, os resultados inaugurais se encaminham para contribuir
para a compreensão do processo de alfabetização dos alunos da EJA, apontando para a criação de
hipóteses que são construídas, a partir de situações cotidianas vivenciadas em sua trajetória de vida
a fim de solucionar questões apresentadas pela escrita, fazendo a indissociabilidade entre a leitura
de mundo e a leitura da palavra.

palavras-chave: Alfabetização, Alfabetizador, Jovem e Adulto, Sistema de Escrita Alfa-


bética

O processo de construção do conhecimento acerca do sistema de escrita alfabética, quando tem


como referência a infância, é um tema que recebe contribuições de diferentes autores (Ferreiro &
Teberosky, 1986; Smolka, 1988, Cagliari, 2006, Abaurre, 2001). Contudo, quando fazemos referência
a alunos jovens e adultos, identificamos o quanto esse tema, ainda precisa de investigação.
O discurso da importância de “partir da realidade do aluno” preconizado desde a década de 60,
por Paulo Freire, já foi incorporado nos meios educacionais, mas ainda precisa ser materializado,
pois partir da realidade do aluno, quando falamos de jovens e adultos, pressupõe partir também dos
conhecimentos sobre a escrita que eles construíram ao longo da vida. Que conhecimentos os alunos
jovens e adultos têm do sistema de escrita alfabética? Que conhecimentos trazem dos processos de
escolarização vividos anteriormente? Que táticas construíram para utilizar a leitura e a escrita nas
práticas sociais?
Na maioria das vezes, os conhecimentos da leitura e da escrita, trazidos pelos alunos não são con-
siderados, quando se constrói uma proposta de alfabetização, o que vai incidir diretamente sobre
a prática a ser trabalhada e no desenvolvimento da aprendizagem dos educandos. Se partimos da
premissa que o aluno traz conhecimento sobre o que está sendo trabalhado, temos uma aborda-
gem didática, caso contrário, a abordagem é outra. Nesse contexto é que surge este trabalho de
investigação.
A pesquisa aqui apresentada está vinculada ao Programa Integrado da UFRJ para Educação de

276
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
Jovens e Adultos, a criação da pesquisa surgiu da necessidade de encontrarmos respostas para os
dilemas práticos, que encontrávamos nas salas de aulas do Projeto de Alfabetização de Jovens e
Adultos de Espaços Populares que compõe o Programa Integrado. Nas reuniões do Curso de For-
mação Continuada, as situações trazidas da prática alfabetizadora, nos mostravam a importância
de investigarmos os conhecimentos linguísticos trazidos pelos alunos e, como eles constroem os
conhecimentos do sistema de escrita alfabética.

progrAmA integrAdo dA Ufrj pArA edUcAção de joVens e AdUltos:


lócUs de nossA pesqUisA
No fim do ano de 2003, o Programa Integrado é criado a partir de uma iniciativa da Pró-Reitoria de
Extensão, articulada com quatro unidades acadêmicas. Esta iniciativa veio atender a uma solicitação
de representantes do bairro Maré, que buscavam apoio da universidade, para reduzir o alto índice
de analfabetismo presente neste bairro, constatado pelo Censo Maré 20001. Na ocasião, o Censo
identificou um índice de 7,9% de analfabetismo entre a população maior de 15 anos.
Estimulados pela reivindicação de representantes dos moradores do bairro, professores e téc-
nicos elaboraram a organização do programa de extensão universitária, a partir de dois projetos:
Formação de Alfabetizadores, através de cursos de extensão e a Alfabetização de Jovens e Adultos
de Espaços Populares, com aulas em diferentes comunidades. No início de 2004, o Programa iniciou
suas atividades nas dezesseis comunidades do bairro Maré. Ao longo do tempo as ações foram am-
pliadas e mais uma unidade acadêmica foi integrada.
Atualmente, o programa conta com seis projetos: 1) Formação de Alfabetizadores; 2) Alfabeti-
zação de Jovens e Adultos de Espaços Populares; 3) Novos Experimentos no Campo da Cultura; 4)
Incentivo à Leitura: Biblioteca Itinerante; 5) Educação Física e Saúde e 6) Núcleo de Pesquisa e Exten-
são em Educação de Jovens e Adultos. Num movimento de ultrapassar os muros da universidade,
todos os projetos são desenvolvidos dentro das comunidades e, para isso contamos com a parceria
de entidades locais, como Associação de Moradores, Escolas Públicas, Igrejas e ONG.
No âmbito da universidade, o Programa conta com a participação da Pró-Reitoria de Extensão
– PR5 - e cinco unidades acadêmicas: Escola de Serviço Social, Faculdade de Letras, Faculdade de
Educação Física e Desportos, Instituto de Matemática e Faculdade de Educação. Esta última unidade
realiza a coordenação geral do Programa. O Programa traz como objetivos: oportunizar aos alunos
de graduação e pós-graduação da UFRJ atividades extensionistas, auxiliando numa formação aca-
dêmica de qualidade, contribuir para a qualidade da Educação de Jovens e Adultos, desta maneira,
cooperando para o avanço das aprendizagens dos alunos.

edUcAção de joVens e AdUltos: A bUscA pelA efetiVAção do direito


O trabalho com a Educação de Jovens e Adultos coloca o Programa Integrado frente ao desafio de
atuar em uma modalidade de ensino, que ainda luta para ser garantida como um direito e ter suas
especificidades atendidas. Os sujeitos aprendizes da EJA, tiveram o direito à educação negado na
infância, pois não puderam acessá-la ou permanecer no processo de escolarização. Todavia, estes
sujeitos trazem consigo uma série de saberes construídos em outros espaços/tempos que não o
escolar. Saberes que são, na maioria das vezes, desprestigiados e tidos como inferior pela sociedade.
Ao retornar para o espaço escolar, algumas pistas e sinais vão levando o aluno a perceber que
está no tempo errado, no espaço errado. Não raro as bibliotecas e/ou laboratórios, quando existem
não estão disponíveis para os alunos da EJA. Os murais também são prioridade das turmas infantis.
Assim como o mobiliário que, fabricado para comportar o corpo de crianças e adolescentes, mos-
tra ao adulto e ao idoso, que eles não deveriam estar naquele espaço. Aparentemente o que pode
1 O Censo Maré foi realizado pela organização não governamental Centro de Estudos e Ações Solidárias da Maré – CEASM.

277
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
ser considerado um detalhe pode acabar por contribuir para que o aluno não se sinta pertencente
aquele espaço.
Assim como aos sujeitos aprendizes da EJA são reservados os lugares marginais, subalternos, de
oprimidos, no sistema educacional, a modalidade de EJA não recebe tratamento diferente. Apesar
de ser garantida pela Constituição Federal de 1988 e ter sido incorporada na LDB nº 9.394/96 como
uma modalidade de ensino da Educação Básica, à EJA é dado o mesmo tratamento que os seus
sujeitos recebem, quando da elaboração do conjunto das políticas oficiais (ARROYO, 2001), seja na
disponibilização de recursos ou na formação de profissionais.
Contudo, cresce o movimento de professores/militantes organizados seja nas escolas, universida-
des ou nos fóruns estaduais e regionais de discussão. Nas discussões a necessidade de atendimento
às especificidades da EJA está sempre presente e, perpassa, pela garantia da formação de profissio-
nais, a elaboração de material didático específico e a pesquisa sobre a construção do conhecimento
por parte do aluno jovem e adulto.

A pesqUisA e bUscA de constrUção de noVos conhecimentos e práti-


cAs pArA A AlfAbetizAção de joVens e AdUltos
Nesse movimento, a pesquisa, que ora apresentamos, objetiva potencializar as ações de EJA no
processo de alfabetização, buscando se debruçar em questões com: a investigação sobre os conhe-
cimentos por parte do aluno sobre o sistema de escrita alfabética (SEA), destacando suas hipóteses
e, como estas dialogam com sua vida; um segundo objetivo é a produção de materiais de forma
contextualizada, privilegiando o uso e o trabalho com textos, trazendo a questão da intencionalida-
de como forte aliado para dar suporte à investigação dessas construções feitas pelos educandos, já
que, muitas vezes, o que vemos é a transposição de atividades infantis para o trabalho com jovens
e adultos.
Cabe destacar que a origem desse trabalho de pesquisa, surgiu no incômodo de toda equipe
do programa, que percebia a dificuldade tanto dos alfabetizadores em alfabetizar e dos alunos em
compreender a construção do sistema de escrita alfabética. Para tanto, a metodologia foi encami-
nhada pelo pressuposto teórico, que é preciso ler a sala de aula como um texto (FREIRE, 1994), onde
cabe ao alfabetizador refinar seu olhar sobre cada aluno, não naturalizando as situações vivenciadas
em sua sala, mas investigando na perspectiva de atuar como um alfabetizador-pesquisador, que
reflete sobre sua prática e busca, a partir dessa reflexão desenvolver novas ações.
Temos ciência que estamos diante de um enorme desafio, pois “Alfabetizar não é apenas apren-
der sobre o código, mas é também compreender um objeto de conhecimento complexo, que exige
um trabalho pedagógico voltado para tal fim” (LEMLE, 2004, p. 115). Nesse movimento de investigar
as hipóteses trazidas pelos alunos, destaca-se a presença dos alfabetizadores nas discussões articu-
ladas pelo grupo de pesquisa, de maneira a permitir a criação de materiais pedagógicos de forma
contextualizada e intencional. Além de facilitar também o retorno para a sala de aula, a partir da
socialização dos resultados.
Desta forma, o caminho trilhado para alcançar os objetivos e o desenvolvimento de tal investiga-
ção foi através de uma abordagem qualitativa, sendo dividida em três etapas. Inicialmente foi rea-
lizada uma revisão de literatura, trazendo autores que abordam o tema apresentado, já que como
dito anteriormente os estudos sobre o processo de construção da leitura e escrita estiveram sempre
voltados para a criança e não para os adultos. Assim como no campo da psicologia, a idade adulta é
encarada como um período de estabilidade e ausência de mudança, que faz com que muitos dos es-
tudos sejam direcionados para a fase da infância e adolescência. Porém, com o avanço dos estudos,
a psicologia começou a indicar que “o desenvolvimento psicológico é um processo que dura toda
a vida e que a idade adulta é rica em transformações. Os adultos possuem mais experiência que os
adolescentes e podem ter acumulado uma maior quantidade de conhecimentos”. (Cadernos de EJA;

278
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
Alunos e alunas, p.5).
A afirmativa presente nos Cadernos de EJA nos levam a reforçar que os conhecimentos e sabe-
res do cotidiano, assim como os saberes linguísticos trazidos pelos alunos, devem ser considerados
numa proposta para a EJA. No que tange ao processo de alfabetização, Leal (2010, p. 79) destaca
que, para a aprendizagem da escrita, o aluno deve compreender alguns princípios básicos do siste-
ma de escrita alfabética. Dentre os princípios podemos destacar: a utilização de símbolos conven-
cionais que, no caso do Brasil, são as 26 letras para a escrita de textos verbais; a relação com a pauta
sonora e a escrita; a direção da escrita, da esquerda para direita e, predominantemente, horizontal; a
presença de, pelo menos, uma vogal em toda sílaba e, as diferentes estruturas silábicas.
Com Lemle (2009) vemos que, diante da complexidade do sistema de escrita alfabética, não basta
apreender a ideia de que os símbolos gráficos representam determinados sons, o processo de alfa-
betização requer outros tipos de conhecimentos. A autora destaca ainda a necessidade do alfabeti-
zando fazer uma ligação simbólica entre sons da fala e letras do alfabeto, levando em consideração
as complicadas relações entre sons e letras e seus valores posicionais. Ou seja, assim como na lin-
guagem matemática, a posição da letra vai alterar seu valor sonoro, pois em determinados momen-
tos podemos ter uma letra representando diferentes sons ou um som representado por diferentes
letras, ou ainda letras que representam sons idênticos em contextos idênticos. Diante de tamanha
complexidade, as atividades voltadas para alfabetização devem possibilitar que o aluno reflita e
apreenda que as letras não são símbolos estáveis e é preciso que estejam contextualizadas para que
possamos compreendê-la.
Freire (1994), assim como Leal (2010), Lemle (2009), são autores que estiveram presentes nessa
primeira etapa do trabalho, que consistiu na revisão de literatura, e nos ajudaram a compreender
um pouco mais a complexidade do processo de alfabetização.
A segunda etapa da pesquisa consistiu na elaboração de material didático para o trabalho nas
classes de alfabetização. Assim, escolhemos o tema “Mulher” para nortear a elaboração das ativi-
dades, abordando mais especificamente, os subtemas Cotidiano e Identidade Feminina para dar
suporte à investigação de forma contextualizada, priorizando o uso e o trabalho com textos em
sala de aula. Neste momento, os alfabetizadores foram convidados a participarem da elaboração e
reflexão do material a ser utilizado em sala, cabendo a estes a função de desenvolver com os alunos
o primeiro material elaborado com questões de interpretação e atividades de escrita.
Desse modo, a contextualização da atividade de pesquisa além de atender ao intuito de tornar
o ensino sedutor, possibilitou ainda que os alunos refletissem a sua realidade, contribuindo assim,
para que a turma se apropriasse melhor de seu processo de aprendizado. É importante ressaltar que
as atividades foram pensadas para serem lúdicas e interdisciplinares, potencializando assim a sua
produtividade, pois o tema foi escolhido a partir de aulas anteriores dos alfabetizadores que dialo-
garam com seus alunos e pesquisaram sua sala de aula, investigando que tema poderia contemplar
o mundo de seus educandos.
Ainda na segunda etapa da pesquisa, houve o desenvolvimento das atividades elaboradas junto
com os alfabetizadores, que as trabalharam através de leituras e interpretações de textos, em tor-
no do tema selecionado. Após a contextualização por parte dos alfabetizadores, os alunos fizeram
atividades do segundo material elaborado e tiveram o acompanhamento da equipe de pesquisa,
direcionados a investigar as respostas dadas pelos alunos nas atividades, que focavam o Sistema de
Escrita Alfabética (SEA). No total 36 alunos participaram da pesquisa, sendo eles das turmas Vila Re-
sidencial, da comunidade do bairro Maré, Parada de Lucas, Vila do João, Timbau, Ilha do Governador
e do bairro de Ramos.
Neste momento, as ações se voltaram no mergulho no dia-a-dia da sala de aula e nas hipóteses
dos alunos jovens e adultos sobre a escrita. Verificou-se a importância de aceitar o convite de Freire
(1994) de ler a sala de aula como um texto e buscar perceber como os alunos estavam recebendo as

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
atividades, as expressões de dúvidas, entendimentos, contentamento ou indiferença. Vimos a rele-
vância de ler os sinais e os indícios que os alunos trazem para sala de aula e as ações que o professor
faz, pois como assinala Garcia (2003, p. 26), no cotidiano escolar, “as leituras realizadas a partir dos
indícios são as leituras possíveis”.
A terceira etapa da pesquisa consistiu na avaliação dos dados coletados e o retorno deles aos alfa-
betizadores, visando o aprimoramento das práticas pedagógicas desenvolvidas no Programa, num
movimento que se pretende de retroalimentação. Muitos foram os aspectos observados na pesqui-
sa e selecionamos três para constar neste artigo: estabelecimento de relações semânticas entre as
palavras, ao invés de associações baseadas na relação palavra/pauta sonora; dificuldade em perce-
ber as diferentes estruturas silábicas e dificuldade em identificar que toda sílaba tem uma vogal.
A seguir apresentamos alguns resultados. Na atividade 4, destacada abaixo, após o trabalho com
o texto e sua interpretação, o alfabetizador-pesquisador explicava aos alfabetizandos, que eles de-
veriam separar as sílabas e depois circular as vogais. O objetivo era observar se os alunos atentavam
para as diferentes estruturas silábicas e que toda sílaba contém pelo menos uma vogal. Segue abai-
xo a atividade desenvolvida com os alunos.

A partir da atividade acima observou-se a dificuldade dos alunos em identificar as diferentes es-
truturas silábicas, visto que quando solicitado a separar sílabas em que se encontrava padrões di-
ferentes do padrão universal consoante-vogal – CV -, o aluno criava suas próprias táticas, que em
alguns exemplos remetem ao padrão CV. Percebemos que no processo de alfabetização, os profes-
sores, de um modo geral, trabalham exaustivamente, o padrão CV no início da alfabetização, dificul-
tando a apropriação de outras estruturas silábica. Nota-se esta constatação em tais exemplos:

ESPERANDO ES-PE-RA-N-DO

NÃO N-ÃO

MULHER MU-LH-ER

Dentre as táticas utilizadas pelos alunos encontramos; a separação de sílabas por pares: MU- LH-
ER; que aponta para a não aceitação de uma sílaba com três letras: N-ÃO; e o não reconhecimento
de que toda sílaba é composta por pelo menos uma vogal: ES-PE-RA-N-DO. Todos estes indícios
mostram a importância do professor ter conhecimentos a respeito do sistema de escrita alfabético,
a fim de possibilitar ao educando refletir e construir conhecimentos sólidos a respeito do SEA. O que
requer do alfabetizador conhecimentos específicos voltados a área, e logo, não basta ser alfabetiza-
do para saber alfabetizar.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
A atividade abaixo, tinha como objetivo verificar se o alfabetizando percebia a semelhança so-
nora nas partes finais das palavras, ou seja, que configuravam rima. O alfabetizador-pesquisador
explicava ao aluno o que é rima e lia para ele um trecho do texto “Cotidiano”, exemplificando com
pares de palavras como igual/pontual, parar/levar e feijão/não. Após as exemplificações, lia-se para
o educando o enunciado e pedia que o aluno atentasse ao som, rimando uma palavra com outra.
Considerando que um dos princípios básicos do sistema de escrita é que a relação do SEA é com a
pauta sonora e não com propriedades dos conceitos dos objetos apresentados, o objetivo da ativi-
dade é perceber qual a relação que o aluno da EJA estabelece no sistema de escrita. Abaixo, seguem
as atividades desenvolvidas com os alunos durante a pesquisa e os resultados obtidos, a partir de
cada uma delas.

Um dos aspectos observados é que o aluno ao ser solicitado a encontrar palavras que rimam,
realizaram uma associação semântica em não sonora. Para confirmar tal afirmativa, utilizamos as
explicações dadas pelos alunos nos exemplos abaixo:
correr e não: “Para não correr muito. Ninguém aguenta correr o dia todo sem parar, ou senão, a
noite está estourando”.
calo com ralo: “Se tiver muito tempo de joelho, faz um calo. Se ralo muito faz calo”.
Nestes exemplos, podemos observar que os alunos não se atentam para a pauta sonora, mas
estabelecem relações semânticas, o que nos leva a pontuar a indissociabilidade entre a leitura de
mundo e a leitura, já que tais exemplos mostram que eles recorrem as suas experiências de vida,
acessando as palavras globalmente e buscando seu significado, antes de focar a atenção nos consti-
tuintes sonoros da palavra. Assim, percebemos que a tarefa de despertar os alunos para a consciên-
cia dos constituintes sonoros é fundamental.

considerAções finAis
Como dito anteriormente, a pesquisa que foi tema deste trabalho busca contribuir para o proces-
so de alfabetização de jovens e adultos, a partir da investigação de como estes sujeitos aprendizes
constroem seus conhecimentos, elaboram hipóteses, selecionam, ordenam e criam mecanismos
para solucionar diversas situações de insegurança, com a leitura e a escrita vividas no cotidiano.
Todas as reflexões acima nos remetem, inevitavelmente para a importância da formação do alfa-
betizador, a fim de que este possa melhor auxiliar o alfabetizando em seu aprendizado, tendo em
vista que, a clareza acerca do processo pedagógico pode aperfeiçoar o trabalho a ser realizado e
orientar a elaboração de materiais didáticos com intencionalidade e qualidade. Isso reforça, pra nós,
o erro presente ao longo de nossa história nas campanhas de alfabetização, que convidava qualquer
pessoa alfabetiza para alfabetizar. Não basta estar alfabetizado para saber alfabetizar, é necessário
conhecimentos específicos voltados à área. Todavia, o que costuma ocorrer em sala de aula é que o
aluno vai construindo o processo de construção de escrita e leitura na movimento de erro e acerto,
visto que muitos profissionais que atuam neste processo não têm clareza e intencionalidade no fa-
zer pedagógico.

281
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
As reflexões remetem também à necessidade de promover o desenvolvimento de uma postura
ativa frente às adversidades, tornando-os capazes de concebê-las não como obstáculos, mas sim
como desafios, fazendo, como nos ensina Sabino, do “sonho uma ponte”.
Finalizando, relembramos as ideias defendidas por Paulo Freire quando o autor coloca que a prá-
tica educativa deve ser compreendida criticamente, esteja ela relacionada a uma pós-graduação de
uma universidade ou a uma classe de alfabetização. Tal processo é ainda reforçado pela consciência
de nossa “inconclusão”, capaz de nos lançar, como nas palavras do renomado educador, em um “per-
manente movimento de busca”.

referênciAs bibliográficAs
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282
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
edUcAção de joVens e AdUltos: Um direito sociAl2
dAnthAlA mAriA do nAscimento | pAtríciA pAUlino dA silVA

Este artigo tem como objetivo relatar um pouco a constituição do povo brasileiro, a partir da
obra do autor Darcy Ribeiro. Entendendo que os índios e negros foram os que mais sofreram com a
exploração da mão-de-obra, pois os dominantes não lhes davam oportunidade de crescerem pro-
fissionalmente e sim os direcionavam unicamente para o trabalho escravista, deixando de lado o
seus direitos de exercerem seu papel de cidadãos. Com o passar dos anos, a taxa de analfabetismo
se perpetua, muitas pessoas apesar da existência da EJA, não a reconhece como uma modalidade
que pode ajuda-los a crescer socialmente, sendo rigorosos consigo porque necessitam abrir mão
dos estudos para se dedicar a família que necessita de sua ajuda. A EJA surgiu justamente para
atender os alunos que trabalham e que desejam dar prosseguimento ao seu processo escolar. A
educação não pode ser secundária, ela é um direito que deve ser reconhecido e como tal deve ser
direcionado a todos, sem nenhuma forma de preconceito, já que desde o princípio o povo brasileiro,
foi explorado, humilhado e agora precisa como todo e qualquer povo ter os seus direitos garantidos
que já são estabelecidos por leis, precisando ser ainda mais executados atingindo principalmente
as classes populares. Podemos perceber que a educação se tornou um problema que atinge grande
parte da população brasileira, pois apesar dos direitos serem garantidos a todos de forma igualitária,
esta assim como outros fatores não se direciona de forma correta, já que muitos sujeitos das classes
populares devem trabalhar, deixando de lado o processo educacional. Trata-se de um relato parcial
de pesquisa do Grupo GAPA/UERJ. O trabalho tem como referencial teórico as pesquisas de Darcy
Ribeiro, Jerome Bruner, Luiz Antonio Gomes Senna, entre os principais.

palavras-chave: alfabetização, letramento, eja

A gente não quer só comida


A gente quer comida
Diversão e arte
A gente não quer só comida
A gente quer saída
Para qualquer parte3

No trecho destacado da música “Comida”, interpretada pelo grupo Titãs, que fez grande su-
cesso na década de 80, podemos observar o desejo da sociedade civil, como um todo, em efetivar
os direitos sociais. Neste momento histórico a sociedade brasileira passava por uma reconfiguração
social, pois os indivíduos buscavam a garantia dos seus direitos básicos como a saúde, alimentação,
habitação, educação e lazer.
Temos nessa mesma década a Constituição Federal que foi sancionada em 1988 e em seu art.
205 diz que

A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e


incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento
da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o tra-
balho. (BRASIL, 2013:42)

2 Artigo escrito no âmbito do Projeto GAPA - Grupo de Pesquisa e Acompanhamento em Alfabetização de Jovens e Adultos
3 Arnaldo Antunes, Sérgio Brito, Marcelo Fromer

283
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
Sendo a educação um direito subjetivo e inalienável de todos os sujeitos da sociedade, como
podemos explicar termos mais de aproximadamente 13 milhões de jovens e adultos analfabetos?
Desta forma podemos inferir que a educação ainda não é um direito que comtempla todos os brasi-
leiros principalmente aqueles que são originários das classes populares, no entanto carregamos este
estigma desde a formação do povo brasileiro.
Segundo Ribeiro (2008) em sua obra intitulada de O Povo Brasileiro, foi possível perceber que
os índios, negros e brancos lutavam por sua própria cultura, ou melhor, para a manutenção da sua
identidade, mas em decorrência disso, aconteceram vários conflitos, por exemplo, as constantes
guerras entre eles, pois os índios não queriam deixar de ser quem eram, de viver conforme suas
crenças, para assim se constituir a cultura alheia, onde já imaginavam que seriam submetidos aos
interesses de quem predominava.
Durante a tentativa de se constituir um povo brasileiro formado por várias etnias, podemos verifi-
car, por meio de relatos, os grupos que mais sofreram hostilizações, que a princípio foram os índios e
negros, eles eram importados dos seus lugares de origem para exercer trabalho escravo, aumentan-
do deste modo a mão – de- obra, a fim de atender aos interesses, benefícios e lucros da metrópole.
Aos índios e negros, não eram lhes permitido exercer papel de cidadãos, pois não podiam ter
suas mínimas vontades realizadas, nem mesmo a condição de viver com dignidade, tendo todos os
seus direitos negados, complicando a situação ainda mais de se formar um povo unido. Para Darcy
Ribeiro:

Nunca houve aqui um conceito de povo, englobando todos os trabalhadores e


atribuindo-lhes direitos. Nem mesmo o direito elementar de trabalhar para nutrir-se,
vestir-se e morar. (RIBEIRO, 2002: 447)

Esta diferença podia ser verificada entre os direitos destinados a uns e a outros não, por exemplo,
apesar da abolição da escravatura, os negros ainda tinham que lutar para sobreviver a humilhações
que a eles eram destinadas, sendo vítimas de situações preconceituosas, onde possuíam grandes
dificuldades de conseguirem um trabalho menos sacrificado, em que pudessem possuir melhores
condições de vida.
Durante a constituição do que hoje chamamos de população brasileira, era possível perceber ni-
tidamente o distanciamento entre brancos e negros, pois aos primeiros eram destinados trabalhos
nas áreas industriais com possibilidade de ascensão social, enquanto aos negros, por não terem tido
oportunidade de uma preparação para exercerem funções mais significativas, sofrendo com os tra-
balhos mais árduos, tornou-se mais difíceis suas condições de ascenderem socialmente.
Dessa forma podemos observar que a taxa de analfabetismo do negro era visivelmente mais sig-
nificativa em relação a do branco, já que os negros foram destinados desde sempre a exercerem
na sociedade funções onde utilizavam como instrumento de trabalho a força braçal, os tornando
cada vez mais distantes da educação, onde consequentemente perderam grandes oportunidades,
sofrendo com as várias tentativas de violência.
O acesso à educação era um direito quase que impossível ao negro, que eram tratados com des-
prezo, sendo esquecidos pela maioria das pessoas e essa questão só seria minimizada, se na socie-
dade brasileira tivesse sido instalado a democracia racial onde, o negro seria reconhecido como um
cidadão capaz de exercer e exigir seus direitos, mas, sabemos que isso não aconteceu e ele conti-
nuou sofrendo, até os dias atuais o preconceito da sociedade.
Durante os vários conflitos gerados na formação do povo brasileiro, a população lutou muito para
que seus direitos pudessem ser ouvidos e hoje a nossa realidade apesar das dificuldades, possui
condições melhores. Para nós Povo Brasileiro, é assegurado através de documentos e leis o direito

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
de exercermos o nosso papel de cidadãos diante da sociedade, não importando a nossa raça ou cor,
e um dos nossos principais direitos é o acesso de todos à educação.
Gerando vários questionamentos na sociedade, sabemos que por mais que o seu acesso a escola-
rização seja para todos, muitas pessoas não conseguem, sendo impedidos de terminar seus estudos
por vários motivos, por isso a função reparadora, preconizada pelas Diretrizes Nacionais para a EJA4

significa não só a entrada no circuito dos direitos civis pela restauração de um


direito negado: o direito a uma escola de qualidade, mas também o reconhecimen-
to daquela igualdade ontológica de todo e qualquer ser humano. Desta negação,
evidente na história brasileira, resulta uma perda: o acesso a um bem real, social e
simbolicamente importante. (CURY, 2000:7)

A Educação de Jovens e Adultos possui como objetivo atender aqueles alunos e alunas que não
tiveram a oportunidade de terminar ou iniciar seus estudos, na chamada “idade apropriada” en-
contrando-se, muitas vezes, desmotivados, não possuindo na maioria das vezes o apoio de alguém
que o fortaleça, não tendo o direito de ter suas próprias identidades, sendo estas marcas da nossa
história.
A maioria dos alunos inseridos nas turmas de EJA tiveram que optar por trabalhar para sustentar
a família, deixando a educação em segundo plano. Esta modalidade surgiu para cumprir um direito
que durante muito tempo foi negado, e também, para dar oportunidade de aprender por toda a
vida, conforme podemos ver como meta na Carta de Cuiabá. A esses alunos, mostrando que inde-
pendente da idade, motivo principal de vergonha para muitos, é possível ter um ensino de qualida-
de, a fim de exercer suas práticas sociais, como verdadeiros cidadãos.
Os sujeitos que frequentam a EJA buscam-na porque esta tende a possibilitar um grande proces-
so de aprendizagem, que se determina pela busca de se tornarem realmente reconhecidos através
da ação adquirida da leitura e da escrita. Os sujeitos que adquirem esses mecanismos essências
para construção de pessoas civilizadas e não invisíveis e alienadas, são marcados por participarem
a partir de então ativamente de uma sociedade que infelizmente ainda carrega consigo um grande
volume de preconceitos, já que apenas se valoriza o que constituído dentro de uma instituição de
ensino.

Há muito vivemos num mundo onde: só vale o escrito!! Não é segregado para nin-
guém que a leitura de mundo é totalmente necessária quando percussora da leitura
da palavra, como sempre nos ensinou Paulo Freire. Infelizmente, para a escola, essa
leitura de mundo só tem valor se tiver sido feita em um livro. (CALHÁU, 2014: 182)

Tanto a escola como os professores devem valorizar sempre todo o conhecimento tido como in-
formal, mais precisamente como determinava o educador Paulo Freire o conhecimento de mundo,
que é transmitido cotidianamente por seus alunos, pois embora seja complicado aceitar, será este
que irá fazer realmente sentido para o sujeito que fará parte daquele processo.
Entre outros fatos o que também chama atenção, trazendo questões reflexivas a seu respeito é o
currículo da escola, que deve ser planejado em consideração as possibilidades que devem ser cada
vez mais facilitadoras para os seus alunos, pois pensar em sua construção sendo realizada com uma
metodologia fechada, apenas permitirá que os sujeitos sejam prejudicados, já que nada terá senti-
do, pois não adianta levar questões que estejam longe de suas realidades.
Embora grande parte tenham histórias marcadas por sofrimentos, se como educadores abrirmos
espaço para um diálogo o aprendizado ganhará mais significativa, levando essa forma às metodolo-
4 EJA – Educação de Jovens e Adultos

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
gias que geram grandes resultados como a participação ativa naquele ambiente escolar, formando
assim um grande espaço onde deve priorizar a igualdade. O conhecimento formado em conjunto
gerará resultados mais eficazes e capazes de se tornarem possíveis.
O diálogo sempre foi reforçado por Paulo Freire, por ser ele uma possibilidade de garantir o pro-
cesso de aprendizagem, pois a partir da fala apoderada que será direcionada a mecanização da es-
crita, tornando o diálogo e a escrita são grandes responsáveis e resultantes de uma aprendizagem,
que deverá ocorrer de forma igualitária para todos.
O ensino deve ser transmitido da melhor forma, sem os possibilitar por meio de hierarquias, este
se tornou um mecanismo que deve ser transmitido a todos, pois é um direito garantido por lei, en-
tão deve ser um facilitador entre os sujeitos na sociedade.

.... uma pedagogia baseada no diálogo, nesse sentido, vai além da análise das
formas de funcionamento da ideologia e da hegemonia, defendendo a possibilida-
de de a educação se contrapor a reprodução. Para tanto, é preciso repensá-la para
além da transmissão hierárquica e organizada de conhecimentos: como a interação
entre os sujeitos que se dá no mundo. (LOPES; MACEDO, 2011: 34)

A partir desse panorama a educação de jovens e adultos exige de nós como sociedade e do esta-
do, o principal responsável pela garantia da educação desses sujeitos, políticas públicas que aten-
dam a todo esse público que desde o inicio da nossa história vem construindo esse país, sendo
sempre explorados e desqualificados quando na verdade merecem nossa admiração e respeito por
tudo o que viveram e continuam vivendo.
Quando falamos nos sujeitos da EJA, muitas vezes não paramos para pensar em suas realidades
difíceis, com histórias carregadas de situações literalmente complicadas, em algumas ocasiões che-
gando até mesmo ao grau de precariedade. Estes são oriundos de famílias e lugares humildes de
nosso país, muitas vezes saem dos seus estados para lutar a cada dia por uma condição mais favorá-
vel, para que se tenha um reconhecimento na sociedade em que são constituintes e como cidadãos
desejam por em prática suas ações, onde prevaleça sempre os seus direitos.
Os alunos geralmente compõem as características centrais da parte da população mais carente,
sendo pobres, negros, nordestinos, de um modo geral submissos a uma realidade a qual são colo-
cados cotidianamente, principalmente por que as classes dominantes só aceitam indiscutivelmente
pessoas que sejam letradas, pois estas estarão aptas a resolver qualquer questão que a elas forem
destinadas, pois acreditam que as pessoas devem possuir os pensamentos formatados, engessados,
não levando em consideração nada para além do ensino formal.
A sociedade ainda permanece abastecida de preconceitos, que deveriam ser modificados o mais
rápido possível, já que o aluno apesar de não ser letrado não obtendo uma aprendizagem significa-
tiva a partir de um conhecimento científico, deve ser valorizado por seu conhecimento de mundo,
através, muitas vezes de suas ricas experiências de vida. Empobrecidos de consciência, ainda vive-
mos num mundo muito atrasado para valorização do conhecimento.
A sociedade letrada deve buscar lutar por um bem comum, que sejam meios facilitadores da edu-
cação para os alunos que chegam muitas vezes nas instituições de ensino abastecidos de desânimo,
com uma baixa autoestima, em busca de obter sua própria identidade que deve ser reconhecida
e valorizada por todos, porém, isso só terá a chance de acontecer se houver meios que colaborem
com inserção social, estando aptos para o acesso de todos.
Desde muito tempo, a aprendizagem da leitura e da escrita, ocupa um lugar realmente valorativo
e enriquecedor na sociedade, pois com estes os sujeitos são capazes de exporem realmente suas
opiniões, que poderão ser ouvidas, questionadas e assim validadas pela sociedade.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
Os alunos da EJA sabem de suas obrigações em meio ao mundo ao qual fazem parte, conse-
quentemente, buscam dia após dia pela obtenção de seus direitos a serem realmente aceitos e não
apenas deixando que questões de direito se destinem unicamente através de leis que não saem do
papel, pois deveriam ser executadas de imediato, mesmo assim muitas vezes demoram. Mais uma
vez reforçamos que o meio social ainda está carregado de preconceitos, que devem ser revistos, es-
tes são sujeitos que merecem o reconhecimento de todos, pois são componentes de um grupo que
luta por questões a serem solucionadas em busca de uma sociedade plena.
Não podemos deixar de abordar o papel importante do professor, que como um mediador desse
processo de ensino, deve sempre manter um espaço aberto para um bom diálogo com seus alunos,
a fim de possibilitarem maiores condições e possibilidades aos sujeitos de ação, para que colaborem
tornando-as reais, já que possuem seus méritos garantidos pela sociedade, pois como figura impor-
tante, deve busca sempre estar integrado facilitando os caminhos de inserirem seus alunos em uma
cultura letrada.
Os alunos e educadores ao realizarem um trabalho devem prezar pela coletividade, pois se o pro-
fessor não permitir o que o aluno traga sua contribuição para as aulas com suas experiências, estes
acabaram se sentindo coagidos, com vergonha de suas realidades, o caminho se tornará cada vez
mais difícil, deixando que o processo de aprendizagem não aconteça significativamente para ambos
os lados.
De um modo geral, a sociedade deve buscar sempre estar em unidade e permitir que todos par-
ticipem ativamente do grupo existente, os sujeitos da EJA, devem ser aceitos, garantindo uma edu-
cação de qualidade, onde sejam reconhecidos por sua identidade e como sujeitos de direitos subje-
tivos e inalienáveis garantidos por lei.

referênciAs bibliográficAs
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, Senado, 2013.
BRASIL. Ministério de Educação e Cultura. Parecer CEB 11/2000. Diretrizes curriculares nacionais para
a educação de jovens e adultos. Brasília: MEC, 2000.
RIBEIRO, Darcy. O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras,
3ª edição, 2ª reimpressão, 2008.
IRELAND, Timothy; MACHADO, Margarida M.; PAIVA, Jane (org.). Carta de Cuiabá in: Educação de jo-
vens e adultos: uma memória contemporânea 1996-2004. Brasília: Secretaria de Educação Continuada,
Alfabetização e Diversidade do Ministério da Educação : Organização das Nações Unidas para a Educa-
ção, a Ciência e a Cultura, 2007.
LOPES, Alice C.; MACEDO, Elizabeth. Teorias de Currículo. São Paulo: Cortez, 2011.
COSTA, Renato P.; VIANNA, Valeria M. (org.). Entrelaçando olhares por uma educação planetária. Rio
de Janeiro: Caetés. 1ª edição, 2014.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
florestA fAz A diferençA
AriAdne colAtto ViAnA | iVAnice lopes dA silVA bArbosA

Este trabalho relata uma experiência de letramento com alunos da EJA em Vilhena – RO a partir
de um Projeto de Formação de Professores que pretende oferecer subsídios teóricos e práticos para
os educadores dessa modalidade. O projeto de formação envolve a produção de cadernos de estu-
do, projetos didáticos e audiovisuais, sobre o processo de aprendizagem de Língua Portuguesa nos
anos iniciais do Ensino Fundamental da EJA. A segunda produção do Projeto de Formação envolveu
o tema Leitura e Compreensão: a formação leitora de jovens e adultos, tendo como proposta o de-
senvolvimento do projeto didático Floresta Faz a Diferença. A campanha nacional de mesmo nome,
em prol do veto presidencial ao Código Florestal foi a referência para as atividades de leitura que,
além de tematizar a problemática do desmatamento e consequências, mostravam ações voltadas à
conscientização e mobilização popular. Os educandos participaram de práticas de leitura e compre-
ensão de diferentes gêneros textuais: informativos, literários, instrucionais, jornalísticos, artísticos e
multimodais (videoclipes, hipertexto, mapas). A grande novidade foi o uso da internet pelos alunos,
com a mediação dos educadores, na busca de mais informações e de imagens para criarem cartazes
objetivando engajar a comunidade escolar na campanha. A variedade de gêneros e as práticas de
leitura vivenciadas favoreceram a aprendizagem da leitura, a ampliação de repertórios de lingua-
gens contemporâneas, do patrimônio de saberes, de atuação cidadã e de consciência ambiental.
O processo abordou experiências para falar, escutar e escrever, utilizando a leitura em várias áreas
do conhecimento como Geografia, História, Sociologia, Biologia e o Meio Ambiente. A culminância
do projeto foi a exposição dos cartazes produzidos pelos alunos, além dos relatos de mudança de
posicionamento sobre questões ambientais que afligem o estado de Rondônia e o mundo. Nessa
exposição eles disseminaram os novos conhecimentos adquiridos e usaram a linguagem escrita de
forma significativa.

palavras-chave: EJA, Meio Ambiente, Leitura e Compreensão

florestA fAz A diferençA?


O presente trabalho relata uma experiência de letramento com alunos da Educação de Jovens e
Adultos em Vilhena – RO a partir de um Projeto de Formação de Professores do Sesc Nacional que
pretende oferecer subsídios teóricos e práticos para os educadores dessa modalidade.
Esse projeto de formação envolve a produção de cadernos de estudo, projetos didáticos e ma-
teriais audiovisuais, sobre o processo de aprendizagem de Língua Portuguesa nos anos iniciais do
Ensino Fundamental da Educação de Jovens e Adultos.
O projeto didático denominado Floresta Faz a Diferença faz parte do Projeto de Formação, em
seu segundo caderno, que traz como tema ‘Leitura e Compreensão: a formação leitora de jovens e
adultos’.
O projeto didático foi desenvolvido pelas professoras regentes de sala do Centro Educacional
Sesc Ler Vilhena: Fabiana de Cássia Gonçalves, Elza Maria Ramos, Tatiane Maria de Oliveira, Carmeli-
na Barbosa de Lima, Rosilene Luz Sobreira Rabasco e Vanessa Repessold do Santos, no ano de 2012,
abrangendo cinco classes da 1ª fase do Ensino Fundamental da Educação de Jovens e Adultos.
Para as filmagens que compõem o material audiovisual do segundo Caderno de Formação foram
coletadas imagens apenas das classes do período noturno. As salas eram compostas na sua maioria
por homens, adultos, trabalhadores rurais ou mesmo urbanos, mas exercendo atividades ligadas à

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
vida no campo ou atividades econômicas que afetam o meio ambiente (jardineiros, podadores de
árvores, funcionários do polo de plasticultura, madeireiras, frigoríficos e aviários da cidade).
Após consulta feita aos alunos sobre qual assunto tinham interesse em estudar, foi eleito o tema
“meio ambiente” e a partir daí realizado um levantamento dos problemas ambientais da região, des-
tacando-se entre eles o desmatamento (Rondônia é um dos estados brasileiros que mais desmata).
Diante disso a campanha nacional de nome Floresta Faz a Diferença, em prol do veto presidencial ao
Código Florestal virou referência para as atividades de leitura que, além de tematizar a problemáti-
ca do desmatamento e consequências, mostravam ações voltadas à conscientização e mobilização
popular.
A Campanha foi criada em 07 de junho de 2011, pelo Comitê Brasil em Defesa das Florestas e
do Desenvolvimento Sustentável, que reuniu 200 organizações da sociedade civil brasileira que se
opunham ao código de lei aprovado pela Câmara dos Deputados e visava influenciar a população
brasileira, políticos e a presidenta Dilma Roussef para revisão e veto ao Código Florestal Brasileiro
(PCL 30/2011).

e lendo se descobriU... qUe A florestA fAz A diferençA


A riqueza do tema permitiu a seleção de variados gêneros do discurso com foco não só na apren-
dizagem da leitura, mas também na ampliação de repertórios e do patrimônio de saberes dos es-
tudantes possibilitando-lhes tirar proveito de bens da cultura escrita. Nas atividades propostas os
educandos participaram de práticas de leitura e compreensão de diferentes tipos e gêneros textu-
ais, práticas inseridas em seu meio social, mesmo que não as dominem completamente:
• Informativos: Almanaques, Códigos e Estatutos Diversos; textos didático-expositivos; carta-
zes e Cartilha da Campanha Floresta Faz a Diferença;
• Artísticos / Literários: Canção Floresta Faz a Diferença; conto O Homem que Espalhou o
Deserto de Ignácio Loyola Brandão; Poema Os Estatutos do Homem de Thiago de Mello;
Poema Mata Atlântica de Carlos Drummond de Andrade; diversos Haicais de diferentes au-
tores;
• Jornalísticos: notícias de jornais locais sobre meio ambiente, desmatamento e animais em
extinção;
• Humorísticos e críticos: Charges com temática ambiental;
• Multimodais: Videoclipe E a Floresta? da Campanha Floresta Faz a Diferença; Mapas sobre
desmatamento no Brasil e especificamente na Amazônia e Rondônia; hipertextos presen-
tes nos materiais pesquisados na internet;
• Instrucionais: orientações para a utilização do computador e internet; orientações para a
produção de cartazes e para a organização da exposição.

A respeito da reprodução das práticas sociais de leitura e escrita na escola LERNER (2002, p. 98)
adverte:

“(...) a escola não pode limitar-se a reproduzir as práticas tal como são fora dela.
Ao mesmo tempo em que velará pela preservação do sentido daquelas práticas que
são valiosas para o desenvolvimento dos alunos, evitará aspectos não-éticos que as
práticas sociais lamentavelmente incluem (...)”.

Isso quer dizer que um dos propósitos didáticos ao letrar um aluno jovem e adulto, é auxiliar sua

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
visão crítica, ampliar sua interpretação do que está escrito e das mensagens implícitas em cada tipo
de linguagem. Mais do que ter contato com a diversidade textual, é preciso conhecer a especificida-
de de cada gênero, sua função, seu local e tempo de uso na sociedade constituída por aqueles que
dominam e os que não dominam a cultura escrita.
E aos propósitos didáticos é preciso vincular os propósitos comunicativos. Se ao planejar um pro-
jeto didático ou selecionar um texto leva-se em conta apenas os conteúdos que são necessários
aprender naquele ano letivo, perde-se a possibilidade, na maioria das vezes, de exploração do senti-
do comunicativo da leitura e da escrita, o que é fundamental. Por outro lado, se o que move a esco-
lha do texto é seu uso nas práticas sociais, as finalidades didáticas surgem naturalmente.
Assim, além dos objetivos gerais do projeto didático Floresta faz a Diferença que tratavam da
preservação ambiental e o engajamento na Campanha Nacional, de quem se emprestou o nome,
foram delineados diversos objetivos específicos da formação leitora distribuídos nos eixos: lingua-
gem, apropriação do sistema de escrita, leitura e compreensão.
No eixo oralidade os alunos participaram de interações na sala de aula, escutando e respondendo
às questões propostas pelo professor, dando sugestões e expondo opiniões; acompanharam leitu-
ras em voz alta feitas pelo professor; explicaram e exemplificaram temas e conceitos; posicionaram-
-se e recontaram textos trabalhados.
Objetivando a apropriação do sistema de escrita foram planejadas atividades para a compreen-
são da natureza alfabética e o domínio das relações entre letras/grafemas; a identificação de letras,
sílabas, palavras e partes em textos lidos; a decodificação e compreensão global das palavras, além
da inferência de conteúdos e significados.
A leitura e a compreensão dos textos foi eixo norteador, pois tratou desde a identificação da fun-
ção social da leitura e o contexto de cada gênero, até a capacidade de ler nas entrelinhas, perpassan-
do pelas diferentes estratégias de leitura e de comportamento leitor propiciadas pela diversidade
textual.
A produção escrita foi trabalhada na tentativa de adequar os textos dos alunos, fossem eles indi-
viduais ou coletivos, aos objetivos, aos destinatários e ao contexto de circulação de cada produção.
No caso específico dos cartazes, que seriam o produto final do projeto visando a mobilização da
comunidade para engajamento na Campanha Nacional, também se evidenciou a necessidade de
elaborar a própria escrita emitindo opiniões de forma convincente, revisando-a e associando-a a
imagens (característica fundamental do gênero cartaz).
Percebe-se que quando o educador traz para dentro da sala de aula aquela mesma escrita que o
aluno encontra fora dela, está indo muito além de possibilitar que o aluno apenas aprenda os no-
mes das letras e seus sons, suas combinações e variações, ele está proporcionando um estímulo ao
aprendizado da comunicação através da língua escrita.
Esse domínio da língua escrita só é possível de ser aprendido e apreendido com o uso. Ou seja, o
professor não pode ‘ensinar’ o contexto da cultura escrita, mas o aluno pode e deve aprender este
contexto fazendo uso dele dentro da escola, porque também fará fora da escola.
A escola tradicionalmente ensina a ler escrever como objetivo didático final com um fim em si
mesmo. No entanto, os propósitos naturais do domínio da leitura e da escrita são diferentes no coti-
diano, lemos e escrevemos com diversas finalidades: ora para recordar, ora para buscar ou registrar
informações, ora para se distrair, ora para se comunicar com um interlocutor distante.
À escola cabe reformular seus objetivos, pois apenas alfabetizar os alunos, sem instrumentalizá-
los para o uso e o entendimento das diferentes funções da leitura e da escrita não formará cidadãos
letrados. O entendimento do código, a aquisição da hipótese alfabética (SOARES, 1999) são
extremamente importantes, mas podem e devem ser feitos a partir de textos reais, proporcionando
alfabetizar letrando e letrar alfabetizando.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
Os alunos das classes de alfabetização da Educação de Jovens e Adultos vivem em uma comu-
nidade cercada por textos, cercados por outros adultos e até mesmo crianças que dominam per-
feitamente esse universo e a escola tem insistido em tentar ensiná-los distantes da sua realidade,
desprezando a diversidade dos textos com função sociocultural real. Segundo LERNER (2002, p.87)
a necessidade de mudança está na escola:

“O necessário é, em suma, preservar o sentido do objeto de ensino para o sujei-


to da aprendizagem, o necessário é preservar na escola o sentido que a leitura e a
escrita têm como práticas sociais, para conseguir que os alunos se apropriem delas
possibilitando que se incorporem à comunidade de leitores e escritores, a fim de que
consigam ser cidadão da cultura escrita”.

A dinâmica desse projeto propiciou aos estudantes participarem de diferentes práticas de leitura
nas quais estavam implicadas diversas finalidades, textos, comportamentos, recursos e formas de
ação. Os diversos gêneros do discurso selecionados, bem como as práticas de leitura a eles relacio-
nadas, abordavam o tema central, servindo para que refletissem sobre questões do seu cotidiano, à
sua atuação cidadã, às suas comunidades e ao Estado onde vivem.
O percurso de aprendizagem englobou experiências para falar, escutar, refletir e escrever, envol-
vendo não apenas a Língua Portuguesa, mas também outras áreas do conhecimento como Geogra-
fia, Sociologia, Biologia, História, Matemática e Arte.

AtrAVés do letrAmento e dAs lingUAgens contemporâneAs se des-


cobriU... qUe todos podem fAzer A diferençA
A grande novidade foi o uso da Internet pelos alunos, para a finalização dos cartazes concebidos
por eles em sala de aula com esquemas e rascunhos produzidos inicialmente em cartolinas. Como
o Centro Educacional não dispõem de laboratório de informática, estabeleceu-se parceria com uma
escola municipal próxima, que gentilmente emprestou seu espaço informatizado.
Com o esboço do cartaz em mãos, tendo em mente quais imagens queriam e qual seria o slogan,
cada grupo de alunos, sob a mediação dos educadores, buscou imagens para criarem os cartazes no
formato digitalizado. Muitos nunca tinham se aproximado de um computador e foram seguindo as
instruções desde a escolha do navegador, sites de busca, digitação da palavra-chave e salvamento
de imagens, para depois serem formatados os cartazes.
Após este primeiro trabalho de acesso à rede mundial de computadores, cada grupo, com apoio
dos professores, fez a arte final do cartaz. Apesar da pouca autonomia da maioria dos educandos
frente aos computadores, o trabalho foi altamente produtivo e autoral, uma vez que os educadores
mostravam as possibilidades e recursos disponíveis e eram os alunos que definiam como queriam a
letra, a escolha das cores, formato e posicionamento das imagens, etc.
A culminância do projeto foi a exposição dos cartazes produzidos por todas as turmas envolvidas.
Durante a exposição dos cartazes aos colegas do Centro Educacional, aos familiares e convidados da
comunidade, os alunos estavam orgulhosos e disseminaram os novos conhecimentos adquiridos,
usando a linguagem escrita de forma altamente significativa.
O engajamento foi enorme a ponto de um grupo de alunos propor divulgar a Campanha Na-
cional “Floresta faz a Diferença” para todo o município de Vilhena. Por iniciativa própria os alunos
procuraram um Vereador da cidade e apresentaram a proposta de transformar suas produções es-
colares em outdoors para serem distribuídos por toda cidade, solicitando para tanto o patrocínio da
Câmara Municipal.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
Infelizmente não conseguiram estabelecer essa parceria, mas os objetivos do projeto didático,
tanto no que se refere à formação leitora, quanto à conscientização ambiental, foram atingidos.
Os alunos adotaram mudanças de posicionamento referente às questões estudadas, desde o
abandono da prática cotidiana da queima do lixo doméstico, até o hábito da caça comercial, do
desmatamento e queimadas ilegais para o cultivo da terra. FREIRE (1982) situa a educação como
instrumento capaz de conduzir o homem à mudança de sua situação pessoal e social, implicando na
mudança e (re)evolução da realidade a que ele pertence.
Foi o que ocorreu com este projeto, por questões culturais e históricas, os alunos não percebiam
os prejuízos causados por essas ações até que o conhecimento despertou-lhes a consciência crítica
e cidadã de que o cuidado com o meio ambiente é responsabilidade de todos.

AlgUmAs considerAções finAis


Certamente o material teórico e os documentários produzidos a partir deste projeto didático se
tornarão importantes na história da formação docente da EJA. O objetivo do material não é se tornar
um modelo, mas proporcionar a visualização na prática de um caminho coerente, possível, pautado
na realidade e extremamente consistente, uma vez que está referenciado em princípios e concep-
ções teóricas voltadas à Educação de Jovens e Adultos e à aquisição e domínio da cultura escrita de
forma significativa.
Os capítulos do Caderno de Formação transformar-se-ão em excelentes textos para estudo e re-
flexão, auxiliando os professores nos trabalhos de pesquisa, planejamento individual ou coletivo e
subsídios para a formação continuada.
Enriquecendo o Caderno e construindo uma tessitura entre o que está escrito, o que é visto e
o que é ouvido, temos o material audiovisual que apresenta o cenário em que o projeto se desen-
volveu de maneira prática, com dicas, sugestões e pontos que farão qualquer ‘leitor’ perceber os
elementos essenciais para o desenvolvimento de aulas significativas, com ênfase nos propósitos da
leitura. O conteúdo traz reflexões e aportes teóricos de maneira clara, parafraseada (ou mediada)
por quem sabe a linguagem que seduz tanto os educadores mais experientes, quanto os iniciantes.

frUtos do projeto obserVAdos nos edUcAdores enVolVidos e ex-


pectAtiVAs pArA o fUtUro
• A crença de que o aluno da EJA pode vivenciar práticas de leitura mesmo antes de ser con-
siderado plenamente alfabetizado;
• A importância da participação dos alunos no planejamento das aulas, considerando suas
expectativas e saberes;
• A diversidade textual entendida como instrumento de emancipação, socialização e amplia-
ção de repertórios de linguagens e saberes.
Com este trabalho, comprovou-se que a aprendizagem acontece estabelecendo relações entre
o que se sabe e o que não se sabe. É testando, comparando o que já é sabido que se verifica a ne-
cessidade de modificar, aprimorar ou substituir os conhecimentos. E o melhor caminho para este
confronto / relação é a utilização do cotidiano do aluno em sala de aula.
A escolha dos textos a serem utilizados na ação pedagógica faz toda a diferença na alfabetização
/ letramento. Porque partindo de textos reais, com significado e uso social os educandos se sentem
seguros e vêm maior aplicabilidade nos estudos, visualizam a utilidade dos conhecimentos, ao mes-
mo tempo em que vão melhorando ações simples do seu dia a dia.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
frUtos do projeto obserVAdos nos AlUnos
• A variedade de gêneros e as práticas de leitura vivenciadas favoreceram:
• A aprendizagem da leitura e da escrita;
• O entendimento de que existem diferentes textos, com diferentes propósitos;
• A ampliação de repertórios de linguagens, com destaque para as mídias contemporâneas;
• A diversificação do patrimônio de saberes e vivências;
• O exercício da atuação cidadã;
• As mudanças na consciência ambiental e nas atitudes cotidianas.
Enfim, à medida que os jovens e adultos se defrontam na escola com situações de leitura e escrita
que enfrentam fora dela e quando a diversidade textual é considerada pelos educadores como re-
curso por excelência, a aprendizagem ocorre de forma significativa e funcional.

bibliogrAfiA
CAFIERO, D. Letramento e leitura: formando leitores críticos. In: ROJO, R. H. R.; RANGEL, E. de O. (Co-
ords.) Língua Portuguesa: ensino fundamental Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação
Básica, 2010. p. 85-106.
COLOMER, T.; CAMPS, A. Ensinar a ler, ensinar a compreender. Porto Alegre: Artmed, 2002.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 24a edição. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982.
KLEIMAN, A. Texto e leitor: aspectos cognitivos da leitura. São Paulo: Pontes, 2008.
LERNER, Délia. Ler e escrever na escola: o real, o possível e o necessário. Porto Alegre: Artmed, 2002.
NOBREGA, M. J. da Como se realiza a mediação entre texto o estudante leitor? In: NOBREGA, M. da
(Org.) Ler e escrever: ciclo II. São Paulo: Secretaria Municipal de Educação/DOT, 2006, p. 12-41.
ROJO, R. Letramento e capacidades de leitura para a cidadania. São Paulo: Cenpec/SMESP, 2004 (mi-
meo)
SOARES, M. Letramento: um tema em três gêneros. 2. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 1999.

Anexos
BIBLIOGRAFIA DO PROJETO DIDÁTICO FLORESTA FAZ A DIFERENÇA
ANDRADE, Carlos Drummond. Mata Atlântica. Rio de Janeiro: AC&M Ed.; Sette Letras, 1997.
BRANDÃO, Ignácio de Loyola. O homem que espalhou o deserto. In: Para Gostar de Ler, São Paulo:
Ática, 1983, v.8, p. 42-44MELLO, T. Os estatutos do homem.
FREIRE, Paulo. A Importância do Ato de Ler: em três artigos que se completam. 22 ed. São Paulo:
Cortez, 1988. 80 p.
_____________ Pedagogia do oprimido. 24a edição. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982.
Hoje Rondônia 2004-2012 web site jornalístico – todos os direitos reservados Editor responsável:
Tonni Geovanni MSN/e-mail: tonnigeovanni@gmail.com Acesso em 30 de julho de 2012.
INSTITUTO SOCIOAMBIENTAL. Almanaque socioambiental. São Paulo : ISA, 2008.
MELLO, Thiago de. Os estatutos do homem. Editora Vergara & Riba, 2001.
RABAÇA, C.,BARBOSA, G. Dicionário de Comunicação, 2 edição, São Paulo, Ática,1987.
SOLÉ, I. Estratégias de leitura. Porto Alegre : Artmed, 1998.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
LETRA DO HINO DA CAMPANHA #florestafazadiferença
Floresta Faz a Diferença
(Letra e música de TXAI - Francisco Maciel)
Floresta faz a Diferença
Faz parte de toda crença 
De toda cultura de toda a ciência
Faz de toda ciência arte
Faz parte de respirar

Não dá pra fazer de conta que não tem nada no ar


Que o ar vem do nada e que nada pode fazer este ar acabar
Não dá para fazer de conta que o rio é infinito e eterno
Que um ipê a menos nem conta 
que o futuro sabes se virá

Já tá na hora de gritar ao vento


De não calar o que tem pra falar
De joga verde mas jogar atento
Plantar a ideia para germinar

Floresta faz a Diferença


Faz parte de toda crença 
De toda cultura de toda a ciência
Faz de toda ciência arte
Faz parte de respirar

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295
ALGUNS DOS CARTAZES PRODUZIDOS PELOS GRUPOS

Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas


Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
históriA e memóriA do projeto de AlfAbetizAção de
joVens e AdUltos nA pAróqUiA sAntA mônicA:
reflexões sobre o sentido dA AlfAbetizAção em
experiênciAs comUnitáriAs
soniA mAriA VieirA dA silVA | rosAUrA doriA mAiA

O objetivo desta comunicação é, em primeiro lugar, fazer o resgate histórico de um trabalho de


Alfabetização de Jovens e Adultos que existe há 40 anos na Paróquia Santa Mônica, localizada no
Leblon - Rio de Janeiro. Juntamente com esse registro histórico que atravessa quatro décadas, a
comunicação pretende fazer uma reflexão sobre o sentido da alfabetização de jovens e adultos em
cada momento histórico e apresentar, ao final, uma discussão sobre a ideia da alfabetização como
direito e a questão do trabalho comunitário e voluntário na Educação de Jovens e Adultos, afas-
tando-se da ideia de “caridade”. A história da educação de jovens e adultos no Brasil revela que a
superação do analfabetismo se constitui como um dos grandes desafios para a política educacional
brasileira. Embora a EJA, esteja legalmente garantida e regulamentada pela Constituição de 1988,
pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação – LDB nº 9.394/96 e pela Resolução CNE/CEB No1, de 05
de julho de 2000, no Brasil, muitas iniciativas de alfabetização e escolarização de jovens e adultos,
ainda resultam da auto-organização das comunidades, entre elas a Igreja, na intenção de satisfazer
as necessidades formativas aonde, as políticas governamentais não chegam ou o fazem de modo
insatisfatório. A conclusão desta comunicação nos mostra que a experiências nãogovernamentais,
comunitárias e/ou voluntárias podem ser muito válidas e positivas, dependendo de cada contexto,
porém é necessário que elas estejam dentro dos âmbitos dos processos educacionais vigentes e
que existam parcerias relacionadas com a formação dos professores (voluntários ou não). As refle-
xões apresentadas mostram ainda a necessidade de ampliação do tema Alfabetização de Jovens e
Adultos, por parte do governo, pois isso representa para os alunos uma perspectiva de mudança, de
conscientização, de formação crítica e ética.

palavras-chave: Alfabetização de jovens e adultos;, Serviço comunitário;, Serviço vo-


luntário, Igreja

introdUção
As pesquisas demonstram que as iniciativas voltadas para a alfabetização de jovens e adultos,
no Brasil, não se apresentam somente no âmbito governamental, elas também se produzem em
outros espaços, fora da educação formal e podem ser concebidas como resultado de ações de auto-
-organização das comunidades, entre elas a Igreja, com a finalidade de satisfazer as necessidades
formativas aonde, as políticas governamentais não chegam ou são concebidas como insatisfatórias,
como a exemplo do curso de Alfabetização de Jovens e Adultos, da Paróquia Santa Mônica, no Le-
blon, zona sul do Rio de Janeiro.
É a partir do registro histórico, das memórias, dos relatos das professoras alfabetizadoras voluntárias
do curso é que pretendemos refletir sobre o sentido da alfabetização de jovens e adultos em cada
momento histórico, especificamente, a partir da década de 70 e discutir a ideia da alfabetização
como direito e a questão do trabalho comunitário e voluntário na Educação de Jovens e Adultos,
onde a ideia de “caridade” na maioria das vezes se faz presente.

296
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
o resgAte histórico
O curso de alfabetização de jovens e adultos da Paróquia Santa Mônica foi criado na década de
70, a partir da iniciativa das professoras A5, do lar, e B, professora primária formada, participantes do
cursilho6 da Igreja Católica. A iniciativa teve o apoio do Frei Valeriano Fernandes, então Vigário da
Paróquia Santa Mônica, e dos fieis da congregação. A professora A relata que o curso surge funda-
mentado no “[...] espírito cristão mesmo, de fazer um bem a pessoas carentes. Prestar um serviço a
pessoas carentes[...]”, visando principalmente as empregadas domésticas e pessoas analfabetas da
região e do entorno, caracterizando-se como uma obra social, de caridade.
As professoras A e B relatam que, apesar do convite ter sido direcionado para o público já men-
cionado, a procura pelo curso se deu na maioria por idosos, com média de idade de 65 anos. Com
o passar do tempo houve um aumento da demanda de alunos e a quantidade de professores vo-
luntários já não era suficiente. A solução foi reunir todos os alunos em uma única turma, no horário
da tarde, das 14h às 15h7, de segunda à sexta feira. Com o tempo, a demanda do curso passou a ser
de jovens e adultos, ampliando a oferta também para o turno da noite, para atender profissionais,
porteiros e empregadas domésticas, impossibilitados de frequentar o curso à tarde.
No início, foi adotado o livro didático dos Maristas8, cuja educação se funda na reunião de educa-
dores, “[...] no processo socioeducativo das crianças e jovens e suas comunidades [...]” (CAVALCANTI,
2010, p. 5).
Logo após a criação do curso de alfabetização de jovens e adultos da Paróquia Santa Mônica,
um grupo de funcionários públicos, do Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL)9 propõe
ao colégio Santo Agostinho10 com a ideia de instalação de um curso de alfabetização de adultos,
fornecendo orientações sobre o funcionamento do curso e material didático. Assim, a cartilha dos
Maristas foi substituída pelo material do MOBRAL.
Com a entrada do MOBRAL, assume a coordenação do curso a professora B, que esclarece que
na época a equipe do MOBRAL não teve participação efetiva no curso, somente forneceu instruções
para o funcionamento do curso e o material didático. O relato da professora B é confirmado pela
professora A:

“[...] O MOBRAL se infiltrou nas Paróquias. Aí, não precisa [...] alugar sala. Eu es-
tava sabendo que o programa do MOBRAL era para eles alugarem as salas e as fun-
cionárias federais é que iam assumir o início, treinar pessoal. [...] Não fizeram nada
disso!”

Para a professora A, era comum o governo militar entrar em contato com as paróquias e/ou co-
légios Católicos com o intuito de criarem cursos de alfabetização para as classes populares com a
chancela do MOBRAL, configurando as paróquias como polos do MOBRAL.

5 Por questões éticas e metodológicas, os nomes das professoras entrevistadas e citadas neste trabalho serão representados
pelas letras A, B, C, D e E.
6 Cursilho, palavra de origem espanhola, seu significado é pequeno curso, onde a Igreja Católica, através de comunidades
eclesiais e as pessoas vivenciam ali os aspectos sociais, políticos, religiosos, profissionais praticando e testemunhando os valores cris-
tãos. 
7 Para que os(as) empregados(as) domésticas pudessem frequentar o curso, sem prejudicar o horário de trabalho.
8 Movimento educacional criado na França, em 1817 por São Marcelino Champagnat, dentro de um contexto de crise do
sistema educacional Frances, com o objetivo de educar crianças e jovens de 15 a 18 anos. A educação Marista chega ao Brasil em 15
de outubro de 1897, como ação social, com a fundação em Minas Gerais da Província Marista do Brasil Central e a construção de uma
escola em Congonhas do Campo, oferecendo educação integral.
9 O Movimento Brasileiro de Alfabetização – MOBRAL considerou prioritárias a “[...] alfabetização funcional e, principalmente,
a educação continuada de adolescentes e adultos”.
10 O Colégio Santo Agostinho faz parte de uma rede de colégios católicos, administrada pelos padres agostinianos recoletos.
A paróquia Santa Monica é administrada e residência dos padres agostinianos recoletos.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
Em 1985, o MOBRAL é instinto e no seu lugar entra a Fundação Educar, cujo programa de
alfabetização e educação básica objetivava atender pessoas adultas. Ao mesmo tempo, ingressa no
curso de alfabetização de jovens e adultos da Paróquia Santa Mônica a professora C11, que sem expe-
riência na área, aprendeu na prática, no cotidiano do curso e a partir das interações com as demais
professoras voluntárias mais antigas se fez educadora de jovens e adultos. Em seu relato explicita a
sua motivação para ingresso no curso de alfabetização de jovens e adultos: “[...] acho que como bra-
sileiros, nós temos que ajudar o nosso país a sair do lamaçal dos analfabetos. Eu acho que o trabalho
nosso aqui é muito bom, é reconhecido no Colégio Santo Agostinho”!
A professora C relata que outro objetivo do curso, desde o início, foi preparar os alunos e alunas
para ingressarem no curso supletivo do Colégio Santo Agostinho, pois segundo ela, os alunos não
querem ir para a rede pública. Ao ser questionada sobre o motivo pelo qual os alunos não querem ir
para a rede pública, a resposta da professora C foi:

“Porque eles acham que lá na escola municipal ou estadual, os professores fal-


tam muito, eles não aprendem nada, eles mesmos dizem [...] as professoras lá faltam
muito e nós não aprendemos nada. Então, nós viemos para cá. Então, eles não que-
rem ir para a escola estadual e municipal. Só querem ir para o supletivo do Colégio
Santo Agostinho”.

Nesta época, a coordenadora do curso era a professora D, nos relata C, e o curso já contava com
três turmas, com duração de um ano e a utilização do livro didático doado pela Fundação Educar. A
professora C nos conta que a professora D dividiu o livro da Fundação Educar em três partes criando
três apostilas, para três níveis distintos de aprendizado assim configurados: nível 1 – Turma C, nível
2 – Turma B e nível 3 – Turma A. Esta reestruturação perdura até os dias de hoje. Com a saída da pro-
fessora D, C assume a coordenação do curso e implanta as aulas de Matemática, que acontecem 01
(uma) vez por semana, sempre às sexta feiras, até os dias atuais.
O curso de alfabetização da Igreja Santa Mônica, faz parte da pastoral da Igreja Católica, o
que indica uma ação de alfabetização de jovens e adultos junto à de evangelização, que teve início
na época em que a Professora C ingressou como professora voluntária. A informante justifica as
aulas de religião: [...] porque aqui é uma Igreja, né? No princípio, quem dava aula de religião era frei
Benjamin. Depois, frei Benjamin foi transferido para São Paulo. Aí, duas professoras leigas, [...] passa-
ram a dar aula de religião. Atualmente as aulas de religião permanecem.

os sentidos dA AlfAbetizAção de joVens e AdUltos


As narrativas das professoras apontam para uma relação entre os sentidos de caridade e o de
cooptação das massas populares ao projeto político do regime militar, na década de 70. O fato de
o curso de alfabetização da Paróquia Santa Mônica ter como objetivo o atendimento às pessoas
carentes nos traz a compreensão de que esta iniciativa pode ser incluída na categoria de educação
não-formal, que entre outras definições pode ser entendida como a aquela “[...] vinculada, prin-
cipalmente, a organizações não-governamentais, movimentos sociais, partidos políticos, igrejas,
sindicatos etc, [...] (GADOTTI, 2013, p. 14).
Salientamos que, na época da criação do curso, o Brasil vivia em pleno regime militar que agia
reprimindo e censurando os “[...] movimentos de educação e culturas populares [...]” (HADDAD e DI
PIERO, 2000, p. 113). No entanto, o clima de repressão não interferiu no andamento do curso de al-
fabetização de jovens e adultos da Paróquia Santa Mônica. Em certa medida, a interferência do MO-
BRAL no curso de educação de jovens e adultos da Paróquia Santa Mônica pode ser entendida como
uma forma do regime militar, através do MOBRAL, difundir a imagem de “[...] atestar às classes po-
11 Por questões éticas e metodológicas, o nome da professora entrevistada será representado pela letra C

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
pulares o interesse do governo pela educação do povo” (PAIVA, 2013, p. 337), conferindo à educação
de jovens e adultos o sentido político de defesa dos interesses do regime militar. Esta concepção fica
evidente quando Paiva (2013, p. 336) nos revela que o grande investimento de recurso no MOBRAL.
Assim, vemos a possibilidade de que o sentido da educação para jovens e adultos estar atrelado,
no período, à legitimação da ordem vigente na medida em que a ideia a ser difundida era a de apro-
ximação entre o regime militar e as camadas populares, a partir de um projeto de alfabetização em
massa, ao mesmo tempo em que se configura como uma ação social da Igreja Católica, voltada para
o exercício da caridade, com o objetivo de ampliar o acesso da população analfabeta do entorno a
novos conhecimentos, a partir do domínio da leitura e da escrita.
A redemocratização do Brasil, na década de 80, leva à extinção do MOBRAL e a sua substituição
pela Fundação Educar, que tinha entre as suas responsabilidades destinar recursos para a efetivação
de programas de alfabetização e educação básica, divulgar, incentivar a criação de metodologia se
ensino, bem como “[...] estimular a valorização e capacitação dos professores responsáveis pelas
ações educativas” (SOUZA JUNIRO, 2012, p. 49). No entanto, a diferença entre o MOBRAL e a Funda-
ção Educar se materializou na redução do aporte financeiro.
O Parecer CNE nº11/2000, que trata das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jo-
vens e Adultos (EJA), nos possibilita refletir sobre esta modalidade educacional e diversos sentidos,
a partir da definição das suas funções fundamentais: reparadora, equalizadora e qualificadora.
A função reparadora evidencia o sentido corretivo da EJA, pois trata da restauração do direito a
uma escola de qualidade a todas as pessoas que tiveram esse direito de alguma forma negado. Já a
função equalizadora implica em uma proposta de educação de jovens e adultos em bases igualitá-
rias de oportunidades, acesso e permanência na escola, assegurando a reentrada no sistema edu-
cacional de trabalhadores, trabalhadoras e outros segmentos da sociedade, que não tiveram acesso
à escola na idade adequada, visando a inserção desses indivíduos no mundo de trabalho e na vida
social. A função qualificadora se funda na concepção da incompletude humana e na possibilidade
de atualização permanente e aprendizagens contínuas. Ela é o apelo a uma educação voltada para
a igualdade, à diversidade e a solidariedade.
No curso de alfabetização da Paróquia Santa Mônica identificamos uma possibilidade que neste
curso a função equalizadora possa ser evidenciada, guardada as devidas proporções, porque obser-
vamos o desejo e o estímulo para que os alunos e alunas que ali estão prossigam os seus estudos
no curso supletivo do Santo Agostinho, por exemplo, quando a professora B relata as conversas que
tem com alguns egressos do curso:

“[...] quando começaram a entrar os jovens, a gente via que eles tinham condições
de aprender, só que não tinham chance, né? De vez em quando a gente encontra no
mercado [...] e contam como já estão, depois que fizeram aqui [...] já fizeram curso
técnico [...]”

Percebemos outra aproximação com a função equalizadora, na medida em que para alguns es-
tudantes do curso de alfabetização de adultos da Paróquia Santa Mônica, este representa possibili-
dades de acesso à educação.
Ao mesmo tempo, observamos a partir dos relatos das professoras alfabetizadoras voluntárias
que o curso prima pelo sentido de caridade e de evangelização. No entanto, isso não significa des-
considerar a importância do projeto de alfabetização em questão, uma vez que os relatos das en-
trevistadas apontam que muitos dos(as) estudantes recorrem ao curso por não acreditarem que as
suas necessidades formativas serão atendidas pelas escolas públicas ou pelas políticas governamen-
tais de modo satisfatório.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
AlfAbetizAr: os sentidos direito oU cAridAde
Muitas são as correntes de pensamento que tentam explicar as crises pelas quais passam as socie-
dades contemporâneas e as transformações políticas, sociais e econômicas subjacentes às tensões
provocadas pelos movimentos de afirmação das diferenças dos grupos marginalizados, subalterni-
zados. Estes embates emergem a partir das

“[...] problemáticas [...] múltiplas, visibilizadas especialmente pelos movimentos


sociais que denunciam injustiças, desigualdades e discriminações, reivindicando
igualdade de acesso a bens e serviços e reconhecimento político e cultural” (CAN-
DAU, 2012, p. 236).

Desse modo, novas percepções sobre direitos, diferença e diversidade cultural apontam para de-
safios a serem enfrentados em todos os setores das sociedades contemporâneas, entre eles a edu-
cação. Nesse contexto, a educação formal, no sentido de aquela que acontece no “[...] território das
escolas, [que] são instituições regulamentadas por lei, certificadoras, organizadas segundo diretrizes
nacionais” (GOHN, 2006, p. 29), se apresenta insuficiente para atender todo um contingente de indi-
víduos que se veem invisibilizados, alijados dos espaços de poder e, como consequência do acesso
a direitos, entre eles a educação.
Nesse sentido, uma massa de indivíduos que tiveram acesso aos espaços escolares somente na
fase adulta e a partir de iniciativas não formais oferecidas pela a Igreja, veem em cursos alternati-
vos possibilidades de ampliar os conhecimentos historicamente construídos, pela característica de
acolhimento das comunidades religiosas. Assim, observamos que o curso em questão acena para
a oportunidade de trocas e acesso a novos conhecimentos, na medida em que os(as) estudantes
que recorrem a ele vislumbram a oportunidade de desenvolvimento escolar, com expectativas de
transformar suas vidas.
No entanto, a opção por estes espaços escolares auto-organizados não elimina a possibilidade do
surgimento de questões relativas ao não enfrentamento e reivindicações do direito ao acesso a uma
escola formal, como das práticas educativas ali desenvolvidas.

serViço VolUntário oU comUnitário: o professor VolUntário e As


especificidAdes dA ejA
De acordo com a Lei nº 9.608/98, o serviço voluntário é aquele exercido sem contrapartida mo-
netária, prestado por pessoa física – sem vínculo empregatício ou quaisquer outras obrigações tra-
balhistas - à instituição privada ou públicas sem fins lucrativos e com objetivos culturais, recreativos,
educacionais, científicos, de assistência social, recreativos cívicos, culturais, educacionais, científicos.
Já o serviço comunitário abrange a prestação de serviços, baseados na solidariedade, entre grupos
e pessoas “[...] ou qualquer tipo de atividade cooperativa, onde se possam buscar soluções em nome
de todos os participantes dessa sociedade”(SOUZA, 2006, p. 39). Envolve a participação de todos no
sentido de, em grupo, de forma cooperativa, alcançar o bem comum.
A partir da compreensão da ideia de serviço voluntário e de serviço comunitário, e supondo que
a oferta destes serviços se dá por opção, por desejo de realizar um trabalho voltado para ajudar, as-
sistir, auxiliar pessoas ou instituições, isso não implica em ações improvisadas.
Ao abordar a questão da formação de educadores de jovens e adultos, Moura (2009, p. 46), à
título de provocar uma reflexão sobre o tema, afirma que a maioria dos professores que atuam na
educação de jovens e adultos não têm formação especifica, “e são quase sempre improvisados”. A
autora, afirma ainda que os professores sem formação específica “vão contra o princípio de Emília
Ferreiro [...] e Vygotsky [...] de que alfabetizar, [...] é um ato de conhecimento [...], uma tarefa comple-

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
xa, demorada e exige competência, habilidades, saberes e, acima de tudo, compromisso de profis-
sionais preparados para tal” (MOURA, 2009, p. 46).
De acordo com o levantamento realizado, dos 11 professores voluntários que atuam no curso de
alfabetização de jovens e adultos da Paróquia Santa Mônica 05 (cinco) tem formação específica na
área.
Segundo Moura (2009, p. 46), a falta de qualificação implica em práticas pedagógicas que des-
consideram as especificidades dos sujeitos da EJA, ao fazerem uso de recursos, técnicas e atividades
descontextualizadas e sem significado para os estudantes. A autora destaca, também que, em mui-
tos casos a não formação específica leva o professor ou professora a reproduzir em sala o seu pro-
cesso de escolarização e propõe - na falta de referenciais teóricos-metodológicos que fundamentem
a EJA - explorar as contribuições de Emília Ferreiro e Vygotsky, a sociolinguística e a linguística apli-
cada.
É nossa concepção que a autora nos diz que a não formação específica produz professores
que improvisam na prática educativa voltada para jovens e adultos. Esta improvisação provoca
além de angústias, podem implicar em práticas educativas equivocadas que, no lugar de ampliar
o conhecimento dos(as) estudantes, os mantêm aprisionados, subalternizados. No entanto, não
podemos desconsiderar os aprendizados construídos e compartilhados no cotidiano, no fazer
educação. Mas, estes sem a teoria como alicerce podem dar margem à improvisação.
Ribas e Soares (2012, p. 2) citam Pedro Demo para afirmar que o professor deve estar aberto para
o movimento permanente de “[...] aprender a aprender, [...], aprender a pensar, aprender a fazer para
aprender a ser professor”. Por isso, defendemos que os professores voluntários ou não, atuantes na
EJA ou não, em quaisquer espaços educativos, formais não formais, exerçam o seu papel de investi-
gadores, a partir de uma ação dialógica, como nos propõe Freire, no sentido de ampliarem os seus
conhecimentos, inserindo-se nos debates educacionais sobre a EJA.

considerAções finAis
As narrativas apresentadas pelas professoras entrevistadas mostram que houve uma tentativa do
governo militar em se aproximar do curso de alfabetização de jovens e adultos da Paróquia Santa
Mônica, através da oferta de orientações e material didático, provavelmente com o intento de, atra-
vés da alfabetização, legitimar o regime, enquanto a criação do referido curso surge com o sentido
de caridade.
Consideramos que os sentidos de caridade e direito se entrelaçam quando abordamos o curso
de alfabetização de jovens e adultos da Paróquia Santa Mônica na medida em que uma massa de
indivíduos subalternizados que não tiveram acesso aos espaços escolares e aos processos de escola-
rização na idade certa ou abandonaram a escola por diferentes motivos, recorrem ao curso na busca
de realizar o desejo da alfabetização. Provavelmente, isso não significa dizer que não estão tomando
posse de um direito, mas que têm críticas à educação pública e/ou acreditam ser necessário uma
preparação inicial, no sentido de se ambientar ou de se readaptar aos espaços escolares, para dar o
próximo passo, qual seja, ingressar ou retornar à escola formal.
Ao mesmo tempo, ponderamos sobre a necessidade da formação específica de professores(as)
que atuam em espaços educacionais, alternativos, formais, públicos ou privados de educação de
jovens e adultos, no sentido de ampliar os conhecimentos necessários para o atendimentos às es-
pecificidades educacionais da EJA.

referênciAs bibliográficAs
BRASIL. Lei nº 5.379, de 15 de dezembro de 1967. Provê sobre a alfabetização funcional e a educação
continuada de adolescentes e adultos, instituindo o MOBRAL – Movimento Brasileiro de Alfabetização.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
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Entrevistas
Professoras A, B e C: entrevistas [jul. 2014]. Entrevistadoras: SILVA, Sonia Maria Vieira da. MAIA, Ro-
saura Doria. Rio de Janeiro

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
impActos dA tecnoogiA no cotidiAno do AUno dA ejA.
deborA de oliVeirA sAnt’AnnA | AnA lídiA gonçAlVes medeiros

O projeto pedagógico-cultural do Programa da UFRJ de Educação de Jovens e Adultos, teve como


objetivos, através do tema TECNOLOGIA: Suscitar a reflexão por parte dos alunos a respeito dos im-
pactos da tecnologia no seu cotidiano: nas atividades domésticas, no trabalho, no lazer, no manejo
de recursos informacionais, de modo a explicitar a centralidade que ela ocupa nas referidas relações/
atividades. Problematizar as dificuldades que enfrentam no que se refere ao acompanhamento das
transformações que hoje se processam. Partindo do pressuposto de que não há como analisarmos a
história da humanidade sem que façamos referência ao desenvolvimento das tecnologias e de que,
elas invadiram nosso cotidiano, propusemos atividades que tinham em vista proporcionar o debate
a respeito de seus impactos sobre o meio ambiente, as formas de sociabilidade, a maneira de fazer
política, as práticas identitárias, as ações cotidianas, a relação espaço-tempo. Embora conscientes de
que, para a grande maioria, é inimaginável pensar num mundo sem tecnologia no atual estágio da
civilização, consideramos fundamental analisar a questão de forma crítica, através de discussão do
que pode se utilizada para “facilitar a vida”, também pode criar barreiras, segregar, excluir, controlar,
substituir culturas e valores tradicionais por outros. Como metodologia, priorizamos as atividades
coletivas – dinâmicas de grupo, produção textual, debates, fotografias, vídeos - onde os alunos fo-
ram, a todo o momento, estimulados a estabelecer uma relação de indissociabilidade entre memó-
ria-história-identidade, de modo que, ao resgatar suas atividades cotidianas através de suas falas,
pudessem expressar e, a exemplo do sugerido por Freire, re-criar e re-viver “a experiência vivida no
momento em que ainda não lia a palavra”. Ficou evidenciado, que ainda que não consigam acom-
panhar todas as transformações tecnológicas, não se tornam, por isso, menos criativos, capazes de
inventar instrumentos e técnicas que respondam às suas necessidades cotidianas.

palavras-chave: CUTURA, TECNOOGIA, EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADUTOS

O presente trabalho tem como objetivo apresentar o relato de experiências vividas nas turmas do
Programa Integrado da Universidade Federal do Rio de Janeiro para Educação de Jovens e Adultos
– EJA. Este programa de extensão universitária foi criado pela Pró-Reitoria de Extensão, em parceria
com quatro unidades acadêmicas – Escola de Serviço Social, Faculdade de Educação, Faculdade de
Letras e Instituto de Matemática - nos últimos meses do ano de 2003, para atender a uma solicitação
de representantes do bairro Maré, que buscaram o apoio da universidade para responder ao alto
índice de analfabetismo identificado na área, através do Censo Maré, realizado em 2000.
A partir das primeiras ações com alfabetização, a equipe do programa percebeu a necessidade de
maior aprofundamento da discussão em torno dos aspectos culturais. Assim foi criado o Projeto de
Pesquisa e Extensão “Novos Experimentos no Campo da Cultura: Ampliando Outros Sentidos para a
Vida Social.”, vinculado ao referido programa, atua na área de integração social, obedecendo aos pa-
râmetros curriculares da EJA-UFRJ e voltando-se ao despertar da criticidade entre os alfabetizandos.
O projeto trabalha com um duplo movimento: valorização da cultura local e ampliação do universo
cultural dos alfabetizandos.
As dez turmas de alfabetização do Programa estão localizadas em favelas do bairro Maré, Parada
de Lucas, Ramos e Ilha do Governador e são bem heterogêneas em relação à leitura e escrita, com
alunos em diferentes níveis de aprendizagem, o que sabemos ser uma característica das turmas de
EJA. A faixa etária dos alunos varia entre 18 e 80 anos, sendo estes predominantemente do sexo fe-
minino e de maioria migrante do Nordeste ou de outros estados do Sudeste, principalmente Minas
Gerais. Os alunos não necessitam realizar grandes deslocamentos pelo bairro para chegar às salas de
aula, que faz com que compartilhem as mesmas situações cotidianas.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
No ano de 2013, desenvolvemos um trabalho intitulado “Impactos da tecnologia no cotidiano
do aluno da EJA”. O projeto pedagógico-cultural teve como objetivo, através do tema TECNOLOGIA,
suscitar a reflexão por parte dos alunos a respeito dos impactos da tecnologia no seu cotidiano. Para
realização deste trabalho partimos do pressuposto que “A leitura do mundo precede a leitura da
palavra, daí que a posterior leitura desta não possa prescindir da continuidade da leitura daquela,
linguagem e realidade se prendem dinamicamente.” (Paulo Freire, 2000). (faltou incluir a página)
Tendo este pressuposto inicial, buscamos integrar Ensino/Pesquisa/Extensão, utilizando como
procedimentos metodológicos os seguintes instrumentos e técnicas: Observações, entrevistas, pro-
dução textual, dinâmicas de grupo, coleta de dados, exibição e debate de vídeos. Como metodolo-
gia, priorizamos as atividades coletivas – dinâmicas de grupo, produção textual, debates, fotogra-
fias, vídeos - onde os alunos foram, a todo o momento, estimulados a estabelecer uma relação de
indissociabilidade entre memória – história – identidade, de modo que, ao resgatar suas atividades
cotidianas através de suas falas, pudessem se expressar, a exemplo do sugerido por Freire (2000,
página?), re-criar e re-viver “a experiência vivida no momento em que ainda não lia a palavra.”
O desenvolvimento do trabalho também contou com a realização de dinâmicas com os alfabeti-
zandos, dentre elas: Dinâmica com a água de coco, Vídeo, Roda de debates, Produção textual, Jogo
de tabuleiro, Linha do tempo, Teia do Desenvolvimento. Estas dinâmicas de trabalho tinham como
objetivo analisar de forma crítica a presença da tecnologia no cotidiano dos alunos, visando apreen-
der suas representações em relação a esta, em diferentes campos da vida cotidiana, nas atividades
domésticas, no trabalho, no lazer, no manejo de recursos informacionais, (de) modo a explicitar a
centralidade que ela ocupa nas referidas relações /atividades.
Outro objetivo do trabalho foi problematizar as dificuldades que os alunos enfrentam no que se
refere ao acompanhamento das transformações que hoje se processam. Partindo do pressuposto
de que não há como analisarmos a história da humanidade sem que façamos referência ao desen-
volvimento das tecnologias e de que elas invadiram nosso cotidiano, propusemos atividades que ti-
nham em vista proporcionar o debate a respeito de seus impactos sobre o meio ambiente, as formas
de sociabilidade, a maneira de fazer política, as práticas identitárias, as ações cotidianas, a relação
espaço-tempo.

conhecendo Um poUco o trAbAlho reAlizAdo.


Foi levado para a sala de aula um coco verde no qual eles tinham que abrir para tirar a água sem
utilizar nenhum tipo de instrumento, sobre a dinâmica com coco, conseguimos atrair a atenção de-
les, no qual se mostraram participativos e assim iniciamos a discussão sobre a importância dos ins-
trumentos e a facilidade que eles dão as nossas vidas. Eles deram vários exemplos de como se abriria
o coco, uns furariam com uma pedra pontuda, alguns ainda falaram de pedaço de pau, ou como
uma aluna disse: “No Nordeste tendo o dente bom, as pessoas abriam mesmo era com o dente.”
Eles deram vários exemplos, e todos disseram que hoje em dia está mais fácil, chega-se no merca-
do e encontram vários tipos de ferramentas e abridores de coco, mas alguns homens ainda preferem
o bom e velho facão.
Com a linha do tempo, explicamos a contagem do tempo (antes e depois de Cristo), além das
histórias das invenções, o que chamou muita atenção foi o computador antigo que ocupava uma
sala inteira, que os intrigou muito, pois como alguns disseram: “hoje em dia, se pode ter um na mão.”
No desenvolvimento das atividades, apresentamos também imagens de telefone e de avião e
estimulando-os a falarem sobre como estes estão ou não inseridos em suas vidas. Em quase todas as
turmas foi citada a facilidade de acesso ao parente mais próximo, “a ligação que funciona como se
estivesse do lado da gente” e também a ida a cidade de origem (Natal) em um curto espaço de tem-
po, mostrando nesse momento um saudosismo pela falta dos parentes, já que a maioria dos sujeitos

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
da EJA, que estão no Programa é oriunda da região do Nordeste. Esse encurtamento de tempo e da
distância ficou evidenciado para todos os alunos. Alguns comentaram que o parente comprou na
internet a passagem de avião, mostrando- se surpresos por essa “façanha”, ficando claro que esses
aparelhos fazem parte de uma maneira ou de outra de seu cotidiano, mesmo que estes estejam ex-
cluídos, pelo fato de não serem alfabetizados.
Na teia do Desenvolvimento foram exibidos vídeos do ultra book e do Comercial da máquina de
lavar Brastemp, foi uma aula bem interessante. Quase todos os alunos fizeram como última compra
um celular ou a TV de LCD, mas sempre comentam da dificuldade em mexer, ou falam que o celular
só serve para atender, mesmo o aparelho tendo acesso à internet, jogos, entre outras novidades do
mundo tecnológico. Com a mostra dos vídeos, entramos no assunto da pouca durabilidade dos apa-
relhos e a percepção foi unânime, as pessoas de mais idade e até mesmo os mais jovens, reclamam
da pouca durabilidade dos produtos eletrônicos. A seguir apresentamos algumas falas:

Isso é pra gente trocar de TV, geladeira, fogão, igual se troca de roupa, mas a gen-
te é pobre não podemos com isso não. (Alfabetizando de Parada de Lucas)

O tempo passa minha filha, e como eles não tem mais o que inventar, acaba repe-
tindo as coisas, tinha uma geladeira vermelha e não era cara igual essa aí deve ser.
(referindo- se Brastemp cereja do comercial). (Alfabetizando do bairro Maré)

Os alfabetizandos costumam encarar a tecnologia como algo ligado principalmente a produtos


de informática e eletrodomésticos, que facilita as tarefas diárias. Destacam também a positividade
dela em várias áreas, como na medicina e nos transportes; e altera nossa relação com o espaço/
tempo.
No desenvolvimento do projeto pedagógico, realizamos também debate sobre questões que re-
metem a serviços básicos como: Saúde, destacando o desenvolvimento tecnológico e o aumento
da expectativa de vida, além da prevenção de doenças; Transporte, destacando o desenvolvimento
ao longo do tempo e a análise de seus impactos no cotidiano dos alfabetizandos: encurtamento de
distância, qualidade dos transportes, preços das passagens, etc. Destacamos, abaixo, algumas falas
de alunos presentes no debate:

Não adianta fazer estradas, colocar mais ônibus, se a qualidade dos transportes
não muda. O motorista, o trocador devia atender melhor as pessoas. (Alfabetizan-
do do bairro Maré)

Pra mim andar de Kombi preciso ter dinheiro. O cartão Passe Livre (cartão do ido-
so) não serve. (Alfabetizando do bairro Maré)

Pela internet, ela faz compra internet. Que isso gente? Pra quem já conhece do
programa é, não estranha. Como é que minha neta compra e chega no portão? Se-
mana passada minha bichinha comprou um monte de coisa só pelo botãozinho,
daqui a pouco entregando no portão, eu perguntei assim pra ela: chegou é o prêmio
é? (Alfabetizando de Parada de Lucas)

Na minha casa tem televisão em todos os cômodos, só falta no banheiro. (Alfa-


betizando do bairro Maré)

Comprei um carro porque achei bonito, porém não tenho carteira. (Alfabetizan-
do do bairro Maré)

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
Antigamente as coisas eram diferentes do que é hoje né? Hoje é tudo menor, mais
avançado... (Alfabetizanda de Parada de Lucas)

A partir das falas dos alfabetizandos vimos que as crescentes inovações tecnológicas suscitam en-
tre os alfabetizandos uma série de questões, sobretudo quanto à dificuldade de acompanhamento
de tantas novidades, e a real necessidade de muitos produtos colocados no mercado, aos campos
que têm sido marcados por essas inovações e, principalmente, quanto aos ganhos ou prejuízos que
a sociedade vem tendo em função de tantas transformações. Destacamos durante o debate com
os alunos os elementos mediadores e potencializadores do trabalho, visando o atendimento às di-
ferentes necessidades humanas; a habilidade humana de fabricar, construir e utilizar instrumentos.
Qualidade atribuída ao instrumento para sua melhor utilização e adequação à realidade.
Identificamos que os alfabetizandos percebem os impactos da tecnologia em algumas esferas do
seu cotidiano: na sociabilidade - o acesso à informação e a comunicação (telefone, televisão, com-
putador); nos padrões de consumo - A rapidez do lançamento de aparelhos, o valor simbólico dos
produtos, pouca durabilidade; na mobilidade - O maior acesso dos alunos a viagens de avião; nas
relações econômicas e de trabalho.

considerAções finAis
Podemos destacar que as atividades do projeto pedagógico O Impacto da Tecnologia no Coti-
diano do Aluno da EJA, possibilitou aprender como esses alunos percebem a tecnologia em seu
contexto e como se dá essa relação, além de ampliar o universo cultural dos educandos, criando
condições de reflexão por parte dos alunos a respeito da influência da tecnologia no cotidiano. A
atividade possibilitou também valorizar os relatos orais e as histórias de vida dos educandos, a fim
de desenvolver os conceitos propostos inicialmente.
Embora conscientes de que, para a grande maioria, é inimaginável pensar num mundo sem tec-
nologia no atual estágio da civilização, consideramos fundamental analisar a questão de forma críti-
ca, através de discussão do que pode ser utilizado para facilitar a vida, também pode criar barreiras,
segregar, excluir, controlar, substituir culturas e valores tradicionais por outros. Ficou evidenciado,
que ainda que não consigam acompanhar todas as transformações tecnológicas, não se tornam, por
isso, menos criativos, capazes de inventar instrumentos e técnicas que respondam às suas necessi-
dades cotidianas.
As atividades desenvolvidas possibilitam que possamos perceber a forma de ser e estar no mun-
do destes alfabetizandos e nos indicam caminhos para o desenvolvimento do trabalho pedagógico.
Além disso, o trabalho realizado a partir da Extensão Universitária traz grande contribuição para a
formação de nossa identidade docente.

bibliogrAfiA
COLOMBO, Ciliana R., Bazzo, Walter A. Educação Tecnológica Contextualizada, ferramenta essencial
para o Desenvolvimento Social Brasileiro (faltou complementar)
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia – Saberes necessários à prática educativa. 35ª ed. São Paulo:
Paz e Terra, 1996.
__ A Importância do Ato de ler. Em três artigos que se completam. 23ª ed. São Paulo: Autores Asso-
ciados: Cortez, 2000.
RANGEL, Mônica. Desenvolvimento científico contemporâneo e algumas conseqüências para a hu-
manidade. (faltou complementar)
SILVA, Elizabeth Bortolaia. Tecnologia e vida doméstica nos lares. (faltou complementar)
TAVARES, Marília Matias Kestering. SOUZA, Samara Tomé Correa de. Os idosos e as barreiras de aces-
so às novas tecnologias da informação e comunicação. (faltou complementar)

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
inVestigAções sobre o ensino de prodUção textUAl
nA AlfAbetizAção de joVens e AdUltos
jUliA rodrigUes chAgAs

O processo de alfabetização continua sendo uma questão central quando se fala em Educação e
muitos são os questionamentos e conflitos que cercam essa discussão. Aprender a ler lendo e a es-
crever escrevendo é o que defendem algumas pesquisas sobre a alfabetização de jovens e adultos.
Porém como trabalhar textos com alunos em pleno processo de alfabetização? Na perspectiva da
construção de minha identidade como professora-pesquisadora (Zaccur & Esteban, 2002), (Alves &
Garcia 2002), esta pergunta se resultou de questionamentos sobre uma prática pedagógica que não
possuía em sua base o texto escrito e que, consequentemente, não tinha como resultado a leitura
e a produção de textos pelos alunos. Em face de tais observações, este trabalho, vinculado ao Nú-
cleo de Pesquisa e Extensão do Programa Integrado da UFRJ para a Educação de Jovens e Adultos,
apresenta reflexões e resultados de uma experiência de trabalho com gêneros textuais, realizada
em uma das turmas do programa, localizada no bairro de Parada de Lucas. A metodologia utilizada
consistiu na seleção dos gêneros textuais: bilhete e anúncio comercial; na observação das caracte-
rísticas desses gêneros em sala de aula; na produção escrita pelos educandos desses gêneros; na
análise dessas produções. A proposta alfabetizadora a partir de gêneros textuais se mostrou extre-
mamente rica e dinâmica, pois possibilitou o ensino de princípios do sistema de escrita alfabética,
através de práticas de leitura e escrita e, sobretudo, porque os alunos responderam positivamente
ao trabalho, realizando produções escritas adequadas aos gêneros abordados e trazendo reflexões
reais que envolviam questões pessoais, em um movimento de repensar o contexto em que vivem.
Tais resultados apontam para a necessidade de se trabalhar com textos, abordando a realidade dos
alunos, desde o início do processo de alfabetização, conforme a proposta de Paulo Freire (2002) e
Carvalho (2001).

palavras-chave: Alfabetização, Educação de Jovens e Adultos, Gêneros Textuais

Quero dizer que ensinar e aprender se vão dando de tal maneira que quem ensi-
na aprende, de um lado, porque reconhece um conhecimento antes aprendido e, de
outro, porque, observando a maneira como a curiosidade do aluno aprendiz, traba-
lha para apreender o ensinando-se, (...) o ensinante se ajuda a descobrir incertezas,
acertos, equívocos. Paulo Freire

A experiência aqui relatada fez parte de minhas atividades como bolsista de extensão do Progra-
ma Integrado da UFRJ para Educação de Jovens e Adultos, na posição de alfabetizadora, durante o
ano de 2012, em uma das turmas do Programa, na comunidade de Parada de Lucas, Rio de Janeiro.
O Programa foi criado em 2003 pela Pró-Reitoria de extensão a pedido de moradores do bairro
Maré, após a realização de um censo em que foram verificados altos níveis de analfabetismo no
bairro. Atualmente, o Programa está presente não só no bairro Maré, mas também em comunidades
situadas nos bairros de Ramos, Parada de Lucas, Ilha do Governador e Vila Residencial. Além disso,
atua em parceria com 4 centros (CFCH, CCS, CCMN e CLA) e cinco unidades acadêmicas: Escola de
Serviço Social, Faculdade de Educação, Faculdade de Letras, Faculdade de Educação Física e Despor-
tos e Instituto de Matemática.
Além do projeto de alfabetização, há dentro do Programa outros cinco projetos que buscam
qualificar as ações desenvolvidas em nossas turmas de EJA. São eles Biblioteca Itinerante, Cultural,

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
Matemática, Educação Física, Apoio, encarregado da parte administrativa do Programa, e o Núcleo
de Pesquisa e Extensão em Educação de Jovens e Adultos (NUPEEJA).
Este trabalho que nasceu em sala de aula é também vinculado ao Núcleo cuja linha de pesquisa é
o processo de construção da escrita pelo aluno adulto, assunto ainda com poucas produções cientí-
ficas, mas cercado por muitas indagações.
As ações realizadas pelo NUPEEJA buscam promover a articulação entre prática alfabetizadora
e a investigação científica. Assim sendo, procuramos em nossas salas de aula as perguntas que
movem nossa pesquisa e também as respostas para elas e, num movimento que pretende ser de
retroalimentação, buscamos também socializar os resultados encontrados com os alfabetizadores
do Programa a fim de aprimorar suas ações pedagógicas.
O desejo de trabalhar gêneros textuais na EJA nasceu de minhas inquietações como alfa-
betizadora, frente ao desafio de ajudar meus alunos a avançarem no processo de construção da
escrita. Alguns deles, já se encontravam num estágio intermediário no processo de alfabetização.
Liam textos simples com autonomia, dominavam diferentes padrões silábicos, mas apresentavam
dificuldades quando a proposta de escrita ultrapassava o nível da palavra ou da frase. Um trabalho
com textos na perspectiva dos gêneros revelou-se, então, como um caminho possível para tal avan-
ço e para o aperfeiçoamento das práticas pedagógicas realizadas no Programa.
Para Bakhtin, os gêneros “são tipos de enunciados relativamente estáveis, situados sócio-his-
toricamente, com intencionalidade bem definida e relevante para um determinado grupo social.”
(Bakhtin1932, citado por SANTOS, RICHE & TEIXEIRA, 2012). Logo, trabalhar textos em sala de aula na
perceptiva dos gêneros é focalizar o contexto comunicativo no qual ele se insere e sua função social:
que tipo de informação é veiculada naquele gênero, seu suporte, suas características linguísticas,
sua estrutura e organização, os sujeitos envolvidos naquela situação comunicativa.
Essa série de conhecimentos sobre os gêneros possibilitam a melhor compreensão dos tex-
tos lidos e facilita a produção textual. Selecionado o gênero a ser produzido, o aluno saberá atuar na
proposta de produção em que é inserido.
A experiência teve, portanto, como ponto de partida o estudo de gêneros textuais em sala
e em seguida, a produções escrita pelos educandos de textos nos gêneros abordados, a fim de ve-
rificar se havia e quais eram os efeitos dessa proposta nos textos produzidos pelos alunos e no seu
processo de alfabetização.
Os gêneros escolhidos para o desenvolvimento da investigação foram bilhete e anúncio pu-
blicitário. Tal escolha ocorreu em função da heterogeneidade da turma em que atuava como alfabe-
tizadora. Para que todos os alunos participassem da experiência, optei por esses gêneros, por serem
mais curtos e não tão complexos.
Então, foram selecionados três textos de cada gênero e em sala de aula, foi realizado um es-
tudo minucioso de cada texto, de forma os alunos
pudessem analisar o que era diferente e sobretudo as
características comuns aos três exemplares de cada
gênero.
Assim, para o gênero textual bilhete, foram obser-
vados os seguintes elementos:
• intencionalidade ( fazer algum pedido, dar
algum aviso)
• data (indica quando o bilhete foi escrito e se
ainda tem validade ou não)
• destinatário (indica para quem o bilhete foi

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
escrito)
• mensagem (curta, sobre assuntos cotidianos)
• linguagem (pode ser formal ou informal, dependendo da relação entre enunciador e inter-
locutor)
• despedida ( pode não ocorrer e quando ocorre também varia de acordo com a relação en-
tre enunciador e interlocutor)
• assinatura ( indica quem escreveu o bilhete)
Para o gênero anúncio publicitário, além do produto ou serviço anunciado, foram analisados os
seguintes elementos:
• intencionalidade (divulgar, fazer com que pessoas tomem conhecimento e desejem adqui-
rir um produto ou serviço)
• anunciante (pode ser uma pessoa ou uma
empresa)
• destinatário (não é uma pessoa específica,
mas um público amplo e variado)
• presença de imagens e descrição( importan-
te para despertar o interesse de possíveis
compradores),
• contato ou meio de localização do anuncian-
te ( pode não ocorrer no caso de uma gran-
de empresa com vários estabelecimentos ou
pode ocorrer e é importante para que os in-
teressados encontrem quem disponibiliza o produto ou serviço)
• linguagem ( objetiva e direta).
Vale ressaltar que as análises em sala também se constituíram como um grande exercício de lei-
tura desses textos e de como cada um dos elementos observados colaborava para a construção do
sentido global desses enunciados.
Após esse momento de análise detalhada das características dos gêneros escolhidos, era hora de
os alunos produzirem seus próprios textos a partir do
que tinham aprendido. Não houve uma proposta de pro-
dução fixa. Apenas foi pedido aos alunos que pensassem
em uma situação em que poderiam utilizar esses gêne-
ros e então, escrevessem seus textos.
A partir dos textos dos alunos, foram feitas duas aná-
lises. A primeira centrou-se apenas nas produções dos
alunos, a fim de observarmos se eles compreenderam os
gêneros trabalhados e tudo o que envolve sua produção,
passando por suas características estruturais, pela inten-
cionalidade e pelos contextos comunicativos típicos de
cada um. A segunda foi uma análise comparativa, entre
essas produções e outras, descontextualizadas, para que
pudéssemos averiguar a relevância da proposta de um
trabalho na perspectiva dos gêneros textuais.
O bilhete acima, escrito por uma das alunas do pro-
grama indica que ela compreendeu claramente a estrutura do gênero, uma vez que o seu texto

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
apresenta todas as características estruturais trabalhadas em sala. A aluna também fez um uso ade-
quado do gênero frente a situação comunicativa que escolheu para produzi-lo e, finalmente, a aluna
utilizou uma linguagem e um vocabulário adequados ao seu interlocutor, que era sua filha. Não ig-
noramos o fato de que o texto também apresenta problemas de pontuação e ortografia. Entretanto,
problemas dessa natureza são corrigidos com a reescrita dos textos após a correção pelo professor
e também com própria prática de escrever.
Além disso, mesmo que o educando não domine todas as regras e padrões silábicos e que produ-
za um texto com erros de ortografia, o domínio do gênero possibilitará a ele uma escrita coerente e
no próprio ato de escrever ele estará utilizando os conhecimentos do Sistema de Escrita Alfabética já
consolidados e levantando hipóteses para a construção de novos conhecimentos, refletindo sobre
a grafia correta das palavras, sobre a relação entre sons e seus significantes, realizando portanto, um
movimento de reflexão linguística.
Ainda assim como parte do processo de produção textual, devo ressaltar a importância da rees-
crita dos textos produzidos pelos alunos a partir de observações feitas pelo alfabetizador, que sem-
pre deve considerar em que estágio do processo de alfabeti-
zação se encontra o aluno bem como as suas limitações e as
suas potencialidades.
Vale dizer ainda que é importante trabalhar com o maior
número de gêneros textuais possível, mas que devemos
priorizar as necessidades dos nossos alunos e que o trabalho
com alguns gêneros será apenas de leitura.
Para a análise comparativa, foram selecionados produções
de frases feitas pelos alunos com a palavra maçã retirada de
um texto trabalhado em sala no mesmo dia das produções.

A comparação entre produções descontextualizadas, e as realizadas após o trabalho com gêne-


ros textuais pelos mesmos alunos, evidencia que o trabalho desenvolvido favoreceu a produção de
textos autênticos e diversificados, e possíveis no cotidiano dos alunos. A escrita nasce do desejo e
da necessidade, e desenvolver um trabalho de produção textual contextualizado, a partir de textos
reais, é aproximar o espaço escolar da vida cotidiana e instrumentalizar os alunos para interagirem
nas situações que exigem a escrita, que vivenciam diariamente.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
Além de demonstrar a eficiência do trabalho com gêneros na Alfabetização de Jovens e Adultos,
a investigação revelou ser plenamente possível o trabalho com produção de textos com alunos
ainda em alfabetização, uma vez que os alunos participantes, em diversos estágios desse processo,
produziram textos reais e completos, conforme os gêneros trabalhados.
Vale ressaltar que a produção de frases e outras atividades normalmente utilizadas para alfabe-
tizar têm o seu lugar no desenvolvimento da leitura e da escrita e que a proposta do presente tra-
balho é apenas apontar mais uma possibilidade pedagógica que auxilie alunos e professores. Além
disso, a correção e a reescrita dos textos são fundamentais para que a reflexão linguística iniciada
anteriormente tenha continuidade e o aluno possa dominar todas as nuances do Sistema de Escrita
Alfabético da língua portuguesa.
A experiência relatada contribuiu para minha formação uma vez que as reflexões nela desenvolvi-
das incidiram diretamente sobre a construção de minhas práticas docentes no âmbito da Educação
de Jovens e Adultos e do ensino de Língua Portuguesa de maneira geral.
O trabalho realizado também demonstrou a necessidade de, enquanto professora, indagar mi-
nhas práticas pedagógicas e, como nos convida Freire (1994), aprender a ler a sala de aula como um
texto e encontrar soluções para os desafios do processo de ensino e aprendizagem.

referênciAs bibliográficAs
FIORIN, José Luíz. Teoria do discurso e ensino da leitura e da redação In Revista Gragoatá, n.2 p.7 -27,
1. Sem. 1997.
KLEIMAN, Angela. Oficina de leitura: teoria e prática. São Paulo: Contexto, 1998.
SANTOS, Leonor Werneck dos; RICHE, Rosa Cuba; TEIXEIRA, Claudia Souza. Análises e produções de
textos. São Paulo: Contexto, 2012, p.15- 37 e 41-66.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
jornAl: UmA lição de cidAdAniA
márciA cristiAne dos sAntos limA

Este artigo tem por objetivo descrever e analisar o projeto “Criando um jornal e aprimorando o
saber”, desenvolvido pelos alunos do Colégio Estadual Jornalista Barbosa Lima, adolescentes em
conflito com a lei que cumprem medida socioeducativa de privação de liberdade no Centro de Aten-
dimento Intensivo (CAI) Belford Roxo. O projeto em questão tem a finalidade de despertar o inte-
resse dos alunos pela leitura e dar oportunidade para que eles se expressem e vejam seus textos
publicados e lidos, promovendo assim o protagonismo juvenil. Em geral, os alunos apresentam
baixa autoestima e desinteresse pela produção textual. Eles já trazem uma predisposição negativa
para as atividades escolares, fruto de reprovações anteriores. O fato de os alunos estarem privados
de liberdade é um agravante dessa situação e aumenta a responsabilidade da escola na tentativa de
socialização desses jovens. Por isso, as questões nascidas na oficina de criação do jornal escolar
Barbosão são importantes não apenas para a produção das matérias, mas também para a formação
intelectual e moral dos adolescentes. Dessa forma, os alunos criam um vínculo positivo com a esco-
la, sentem-se valorizados e motivados a buscar novos saberes. O aprimoramento da escrita e
o desenvolvimento da leitura crítica são a base do conhecimento que procuramos construir com os
alunos, o que favorece o exercício da cidadania.

palavras-chave: Adolescentes, Escrita, Jornal

introdUção
Este artigo tem por objetivo descrever e analisar o projeto “Criando um jornal e aprimorando o
saber”, desenvolvido pelos alunos do Colégio Estadual Jornalista Barbosa Lima, no Centro de Aten-
dimento Intensivo (CAI) Belford Roxo, integrado ao Departamento Geral de Ações Socioeducativas
(Novo Degase) do Estado do Rio de Janeiro. Esse projeto tem a finalidade de despertar o interesse
dos alunos pela leitura e dar oportunidade para que eles se expressem e vejam seus textos publica-
dos e lidos, promovendo assim o protagonismo juvenil.
Em geral, os alunos apresentam baixa autoestima e desinteresse pela produção textual. Eles já
trazem uma predisposição negativa para as atividades escolares, fruto de reprovações anteriores ao
ingresso no sistema siocioeducativo, entre outros fatores. O fato de os alunos estarem privados de
liberdade, já que a escola atende a adolescentes em conflito com a lei que cumprem medida socio-
educativa de internação, é um agravante dessa situação e aumenta a responsabilidade da escola na
tentativa de socialização desses jovens.
Para além do aspecto punitivo, correcional da medida socioeducativa, existe um trabalho socioe-
ducativo que busca destituir os estereótipos criados em torno do adolescente infrator, levando-o a
descobrir e valorizar o que guarda de positivo. Nesse sentido, a criação de um jornal escolar, em que
os alunos, efetivamente, se veem como produtores de conhecimento e são valorizados por isso, tem
reflexo direto no aumento da autoestima desses adolescentes.

ApresentAção dA temáticA
No que diz respeito à escolaridade, dos 108 alunos matriculados no C. E. Jornalista Barbosa Lima
Sobrinho, no 1º semestre de 2010, a maioria (64) cursava do primeiro ao quinto ano. O restante (41)
concentrava-se no segundo segmento do ensino fundamental, com exceção de três alunos matricu-
lados no ensino médio. Vale ressaltar que o quinto e o sexto são os anos de escolaridade que agru-

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
pam o maior número de alunos (60).
Esse retrato demonstra que, na história de vida desses adolescentes, escola não combina com os
caminhos que eles vêm trilhando para sobreviver, adquirir poder e, de alguma forma, respeito da
comunidade em que vivem. A defasagem idade/ano de escolaridade é significativa e aponta para a
importância de se acreditar num real desenvolvimento dos alunos-internos, face ao histórico de fra-
casso escolar que já vivenciaram. Eles precisam modificar a percepção que possuem de si mesmos
para que se reintegrem a um sistema de educação formal.
Nesse sentido, o papel da escola no sistema socioeducativo é fundamental para que, a partir
de um trabalho pedagógico com enfoque reflexivo e dialógico, tenham consciência da extensão e
gravidade dos seus atos, assumindo de forma responsável suas consequências. Os professores do
Sistema Socioeducativo devem ter uma atitude acolhedora e despida de preconceitos para apren-
der a lidar com alunos que têm diferentes histórias de vida, mas possuem, em comum, as marcas da
violência e da desigualdade social.
O projeto “Criando um jornal e aprimorando o saber”, vinculado ao C. E. Jornalista Lima Sobrinho,
surge, no contexto de escolarização dos adolescentes, com o objetivo de construir um veículo de
comunicação e expressão – o jornal Barbosão – que promova uma intervenção socioeducativa, pos-
sibilitando dar visibilidade social às ações positivas
realizadas pelos alunos. Esse projeto encontra-se em conformidade com a Lei 8.069/90 – o Esta-
tuto da Criança e do Adolescente (ECA), pois privilegia, em suas ações, a melhoria da qualidade da
educação oferecida aos adolescentes que, mesmo em privação de liberdade, têm direito à escolari-
zação, à cultura e ao lazer.
O jornal Barbosão é criado pelos alunos que participam de oficinas de leitura e escrita na Sala de
Leitura, sendo a participação de livre escolha. Essas atividades são desenvolvidas no contraturno do
horário escolar, duas vezes por semana, com duração de uma hora e meia. As turmas têm, no máxi-
mo, 10 alunos (do sétimo ano do ensino fundamental ao ensino médio), que se renovam durante o
ano para a criação de quatro edições (uma a cada bimestre) do Barbosão, que, nos anos 2009 e 2010,
contou com os recursos do Programa de Desenvolvimento da Educação (PDE).
Além da escrita das matérias para o jornal (segundo uma pauta decidida coletivamente) e revisão
dos textos, os alunos participam da digitação, pesquisa na internet, seleção de fotos e edição das
páginas. Antes dessas etapas, ainda integram grupos para leitura e discussão de matérias de jornais
publicados no Rio de Janeiro, entrando em contato com diferentes tipos de textos e compreenden-
do um pouco da estrutura e organização de um jornal.

problemAtizAção
Como referencial teórico para o desenvolvimento dessa experiência pedagógica, adotamos a Pe-
dagogia Freinet, no que tange à elaboração do jornal. A prática do jornal escolar, de acordo com a
concepção defendida por Celestin Freinet, cria uma situação de autêntica comunicação por meio da
escrita. O aluno é levado a expressar-se não só para si próprio ou para atender à exigência do pro-
fessor, mas para seus leitores.
O adolescente sabe que seu texto será lido por diferentes pessoas. Isso o leva a compreender e
se preocupar com a necessidade da eficiência na transmissão da mensagem, e também a assumir a
responsabilidade pelo conteúdo delas. Ele acaba percebendo que o texto contido no jornal precisa
ter clareza e objetividade, ser bem apresentado para ser atraente à leitura.
Assim, o jornal escolar permite ao aluno participar de um trabalho social produtivo, ao mesmo
tempo individual e coletivo, intelectual e manual. Por outro lado, favorece a descoberta de que
o jornal impresso traduz um posicionamento do autor da notícia e de que um mesmo texto pode
suscitar diferentes leituras. Isso é fundamental para o desenvolvimento da leitura crítica.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
Quando os cidadãos souberem que o jornal pode mentir ou, pelo menos, que ele
pode apresentar como definitivas soluções que não passam de aspectos parciais dos
problemas impostos pela vida; quando estiverem aptos a discutir com prudência,
mas também com ousadia, quando tiverem uma formação baseada na investiga-
ção experimental e na criatividade (...), haverá então qualquer coisa de diferente nas
nossas democracias. (SANTOS, 1996: 65)

O aprimoramento da escrita e o desenvolvimento da leitura crítica são a base do conhecimento


que procuramos construir com os alunos, o que favorece o exercício da cidadania. Dessa forma, as
questões trazidas para o grupo de discussão são importantes não apenas para o desenvolvimento
das atividades de criação do Barbosão, mas também para a formação intelectual e moral dos adoles-
centes, tais como: o respeito à opinião do outro, a importância de saber se expressar, a necessidade
de revisão do trabalho realizado, a avaliação do seu desempenho, o trabalho coletivo, o respeito às
diferenças.
Muitas vezes os alunos chegam à Sala de Leitura apenas para conversar, para folhear o jornal à
procura de um rosto bonito ou da tabela do Campeonato Brasileiro. Nesse momento, a flexibilida-
de do professor é fundamental para incentivá-los a produzir, mas respeitando o seu momento de
ociosidade, de não criação, e observando em que situações isso ocorre. É necessário oferecer-lhes
alternativas compatíveis com o desenvolvimento de suas habilidades individuais e mostrar que to-
dos podem colaborar de alguma forma. Eles podem trabalhar de forma independente, naquelas
atividades com as quais mais se identificam, e, em duplas, nas tarefas em que encontram maior
dificuldade. A busca pelos pares ou isolamento, em algumas turmas, também está relacionada com
a fidelidade a uma determinada facção criminosa.
A teoria proposta por Vygotsky nos faz compreender melhor a maneira como os alunos apren-
dem. Seus estudos referem-se à exploração da mente com relação à interação social no desenvolvi-
mento cognitivo. Para ele, as funções cognitivas se originam das relações sociais, e, reciprocamente,
a quantidade e qualidade das interações sociais afetam diretamente o desenvolvimento cognitivo.
O esquema do pensamento, o raciocínio em si, pode ser entendido como uma interiorização do di-
álogo social. Daí porque Vygotsky aponta a existência de um outro nível de desenvolvimento - o
proximal ou potencial - que, tanto quanto o nível real, deve ser considerado na prática pedagógica.
Quando alguém não consegue realizar, sozinho, determinada tarefa, mas o faz com a ajuda de
outros parceiros mais experientes ou com a mediação do professor, está nos revelando o seu
nível de desenvolvimento proximal, que já contém aspectos e partes mais ou menos desenvolvi-
das de instituições, noções e conceitos.
Através de experiências de aprendizagem compartilhadas, como a que estabelecemos
nas oficinas de criação do Barbosão, atua-se na zona de desenvolvimento proximal, de modo que
funções ainda não consolidadas venham a amadurecer. Dessa forma, verificamos o quanto a
aprendizagem interativa permite que o desenvolvimento avance.
Os alunos se deparam, principalmente, com dificuldades de organização textual, coesão e orto-
grafia que precisam ser superadas para o aprimoramento do texto. Por isso, há um trabalho constan-
te de revisão e reescrita dos textos produzidos. Os participantes da oficina desenvolvem uma preo-
cupação com o outro (o leitor), aqui visto como alguém que poderá enxergá-lo de forma diferente,
como um adolescente criativo, inteligente, participativo. A escrita passa a ter sentido na medida em
que não fica confinada no ambiente escolar, tem liberdade de circulação. Liberdade essa que os alu-
nos também desejam conquistar.
A importância das trocas interpessoais, na constituição do conhecimento e do sujeito, também
são ressaltadas por Paulo Freire. “Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os ho-
mens se educam entre si, mediatizados pelo mundo” (FREIRE, 1979: 68). Segundo o pensamento

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
freiriano, o diálogo é a base para a constituição de uma escola mais inclusiva, pois “não é no silêncio
que os homens se fazem, mas na palavra, no trabalho , na ação-reflexão” (FREIRE, 1987: 78). Essa
ação comunicativa não é um direito de alguns homens, mas de todos os homens. Como edu-
cadores, não podemos abrir mão do nosso papel de sujeitos da história nem tampouco podemos
impedir que nossos alunos deem voz aos seus anseios e sonhos.
Em razão de uma grande carência afetiva, seja por motivos decorrentes da infância, seja pelo
afastamento de suas famílias, os alunos requisitam muita atenção. Eles valorizam o professor que
dialoga e os respeita, principalmente porque a maioria não cultivou um bom relacionamento com
os professores anteriores, fora do Sistema Socioeducativo. É nessa linha da Pedagogia da Presença
que Antônio Carlos Gomes da Costa afirma a importância do educador como apoio de relevância
decisiva para que o jovem possa trilhar um novo caminho.

Do início ao fim, a vida de cada um de nós se traduz num desejo constante de


presença. Quando estes vínculos não existem, ou são demasiado frágeis, todo dina-
mismo se esvai. A vida torna-se absurda e vazia de sentido e a conduta se deteriora e
degrada cada vez mais. (Costa, 1991:42)

A chamada Pedagogia da Presença, idealizada por Costa, estabelece um novo paradigma, para a
execução da Medida Socioeducativa, pautado na priorização do aspecto pedagógico e na garantia
de que o adolescente institucionalizado está privado apenas do seu direito de ir e vir, sendo-lhe ga-
rantidos os demais direitos de identidade, privacidade e dignidade.
O educador, diante de tal proposta pedagógica, possui a tarefa primordial de fazer-se presença
construtiva na vida dos jovens em questão, no intuito de resgatar o que há de positivo na conduta
deles, sem rotulá-los nem classificá-los em categorias baseadas apenas em suas deficiências. Ele
deve assumir o compromisso de torná-los fonte de iniciativa, de liberdade e de compromisso consi-
go mesmo e com o outro.

etApAs do projeto
1a etapa: Pesquisa e compra do material necessário para realização do projeto
Com os recursos oriundos do PDE, foi possível adquirir  equipamentos e materiais  necessários à
produção do jornal: scanner scanjet HP, câmera fotográfica digital Sony, impressora jato de tinta co-
lorida modelo Pro K oito mil e seiscentos HP, folha de papel sulfite A3, no break net winner, folha de
papel ofício, caneta, CD regravável, quadro para mural, pilha recarregável, recarregador de pilhas,
pasta de plástico com elástico, CD gravável, bloco pautado, envelopes para guardar CD, lápis preto,
álbum flipshart, caneta pilot, borracha branca, apontador, lápis de cor, aquecedor de papel Dry Pa-
per Plus, cartucho preto, cartucho ciano, cartucho magenta, cartucho amarelo. Como o CAI-Belford
Roxo, em parceria com a ONG RioSolidário, já dispunha de um computador  e  Sala de Leitura equi-
pada com mesas, cadeiras, livros e ar condicionado, não foi necessário o investimento nesse campo.
2a etapa: Divulgação do projeto e sensibilização dos alunos
O projeto foi amplamente divulgado nas salas de aula, através de cartazes e do diálogo com os
alunos, mostrando a importância do projeto no cumprimento da Medida Socioeducativa e na divul-
gação das atividades positivas realizadas pelos alunos. Além disso, possibilitar a construção de um
veículo de comunicação com as famílias.
3a etapa: Inscrição dos alunos nas oficinas e organização das turmas e horários
As inscrições foram abertas inicialmente para alunos do oitavo e do nono ano. Mas o número de
alunos por turmas muda constantemente na instituição, em face do tempo de cumprimento da Me-

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
dida Socioeducativa ser variável (de três meses a 3 anos). Desse modo, tivemos  também alunos do
sétimo ano inscritos, e a participação especial de alunos do ensino médio.
4a etapa: Planejamento das oficinas
O planejamento foi realizado com base na experiência da professora responsável pelo projeto,
no referencial teórico aqui explicitado e na consulta de bibliografia específica. Vale ressaltar que a
avaliação diagnóstica é fundamental para ajustes no planejamento. A partir dessa, buscamos desen-
volver atividades mais significativas para os alunos.
5a etapa: Realização das oficinas de leitura e produção de texto
As oficinas inicialmente foram divididas em dez aulas, mas algumas atividades se estenderam por
mais de uma aula em razão do interesse ou dificuldade apresentada pelos alunos. Algumas vezes, a
ordem de realização das oficinas também foi alterada em função da mudança na rotina da Unidade
Socioeducativa ou da necessidade percebida pela professora. Geralmente, os 20 minutos iniciais das
oficinas são dedicados à leitura do jornal do dia,  atividade de grande interesse para os alunos, por
se tratar do único momento em que têm essa oportunidade na instituição, salvo os momentos de
leitura livre na Sala de Leitura, que nem sempre ocorrem.
• primeira aula: avaliação diagnóstica para conhecer os interesses e habilidades dos alunos.
Contato com diferentes jornais e análise da primeira página.
• segunda aula: leitura e compreensão de uma notícia atual selecionada pela professora.
• terceira aula: a estrutura da notícia. Relacionar o lead (resumo) ao título da notícia. Confec-
ção de um lead a partir de uma notícia selecionada pelo aluno.
• quarta aula: Diferença entre fato e opinião.
As demais aulas referem-se às etapas seguintes:
6a etapa: Divisão dos alunos em equipes e produção de matérias para o jornal
Primeiramente é feita uma reunião para definição da pauta do jornal. A divisão dos alunos para a
escrita das matérias é organizada de forma democrática, de acordo com a afinidade dos alunos pelo
assunto. Em geral, eles escrevem os textos em duplas.
7a etapa: Correção e digitação dos textos
Essa etapa foi muito importante, porque os alunos perceberam que podem errar e que o erro
faz parte do processo de construção de conhecimento. A correção dos textos foi facilitada pela dis-
ponibilidade dos alunos em aperfeiçoar o trabalho e pelos recursos disponibilizados pelo progra-
ma computacional. Como muitos possuíam dificuldade de escrita, houve intervenção constante da
orientadora do projeto para que os alunos pudessem desenvolver seu potencial e avançar na cons-
trução de conhecimento.
A digitação dos textos ficou a cargo dos alunos que tinham essa habilidade e também participa-
vam da oficina de informática no CAI-Belford Roxo.
8a etapa: Seleção de fotos e confecção da capa do jornal
A dupla encarregada da redação de determinada notícia fica responsável também pela escolha
da foto que pode ser submetida à opinião do grupo. As legendas são escritas coletivamente. Lem-
bramos que essas fotos são tiradas por professores, funcionários e alunos, durante os eventos reali-
zados na escola e na Unidade Socioeducativa.
9a etapa: Impressão em papel A3 para revisão dos textos e edição final do jornal
A edição do jornal foi muito trabalhosa pela limitação do programa word. Como nem todos pos-
suíam o domínio necessário do programa, geralmente um aluno com habilidade em informática,
orientado pela orientadora do projeto e mediado pelas opiniões do grupo, ficava encarregado da

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
edição: o melhor lugar para os textos, o tipo  e o tamanho da letra, as cores, o tamanho das fotos etc.
10a etapa: Reprodução do jornal
Algumas edições do Barbosão foram impressas na própria escola,  em papel A-3. O fato de os pró-
prios alunos se responsabilizarem pela impressão do jornal foi bastante positivo e gratificante para
eles. Desse modo, também contemplamos a participação dos alunos que não conseguiram desen-
volver a habilidade de escrita, a ponto de terem seus textos escolhidos para o jornal, mas queriam
muito colaborar de outra forma. Eles se sentiram integrados ao processo de produção do jornal.
Em 2010, houve uma parceria da escola com uma gráfica para reprodução dos jornais, com uma
tiragem de 300 exemplares por edição, garantindo economia de tempo e melhor qualidade de im-
pressão. A partir de 2011, o jornal passou a ser impresso pelo Novo Degase.
11a etapa: Avaliação
No decorrer das oficinas, os textos produzidos foram revisados e reescritos (avaliação continu-
ada). Ao final de cada edição do jornal, os alunos realizam uma autoavaliação, escrevendo sobre a
participação deles no projeto. Em seguida avaliam o desenvolvimento da oficina como um todo.
Oralmente, realizamos uma avaliação coletiva do jornal produzido, considerando os aspectos gráfi-
cos e o conteúdo.
12a etapa: Distribuição do jornal
Os jornais  são distribuídos aos familiares por um dos alunos do projeto, nos dias de visita, que
aconteciam as quintas e sextas-feiras. A partir de 2013, as visitas passaram para o sábado. A distri-
buição para os alunos da escola é feita pelos professores. Para os funcionários e outras instituições,
encarregam-se da distribuição a diretora, a professora coordenadora do projeto e um pedagogo do
CAI-Belford Roxo.

considerAções finAis
É um enorme desafio que se impõe a nós, educadores – tornar esses adolescentes, sobretudo,
aprendizes da esperança – e compartilhar com eles a crença de que é possível mudar. Para
tanto, é necessário o estreitamento dos vínculos afetivos na relação professor-aluno. Essa prática
pedagógica, durante a oficina “Criando um jornal e aprimorando o saber”, contribuiu para que os
alunos valorizassem a escola como espaço de liberdade de criação, percebendo a sua importância
no cotidiano da internação.
Como a Medida Socioeducativa de Internação pode variar de seis meses a três anos e, no caso
de mandado de busca e apreensão, até três meses, não é possível fazer uma relação direta entre o
desempenho dos alunos no projeto “Criando um jornal e aprimorando o saber” e a melhoria do de-
sempenho ao final do período letivo, na maioria dos casos. Desse modo, nossa preocupação maior
é com o desenvolvimento do aluno em cada atividade, considerando, em primeiro lugar, os aspec-
tos socioafetivos, em seguida, os aspectos cognitivos.
O fato de os alunos decidirem a pauta do jornal coletivamente e trabalharem em duplas fazendo
entrevistas, colhendo depoimentos e escrevendo as matérias, torna-os mais colaboradores, mais
solidários, uma verdadeira lição de cidadania. O Barbosão – que já está no número 22 - também tem
um efeito positivo na autoestima dos demais alunos da escola, dos professores, dos responsáveis
e dos funcionários.
Como reconhecimento da importância do jornal Barbosão, o Colégio Estadual Jornalista Barbosa
Lima Sobrinho recebeu do Instituto Faça Parte (Organização da Sociedade Civil, fundada em
2001, voltada à participação da juventude como parte ativa da construção de um meio social mais
justo) o Selo Escola Solidária 2009.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
Portanto, ao construir o jornal Barbosão, que promove uma intervenção socioeducativa e produz
visibilidade social às ações positivas desenvolvidas pelos alunos, contribuímos para a desconstrução
de práticas que reforçam a exclusão social e o preconceito.

referênciAs bibliográficAs
COSTA, Antônio Carlos Gomes da. Por uma pedagogia da presença. Brasília: Ministério da Ação So-
cial, 1991.
Estatuto da Criança e do Adolescente/Secretaria Especial dos Direitos Humanos; Ministério da Edu-
cação – Assessoria de Comunicação Social – Brasília: MEC, ACS, 2005.
FARIA, Maria Alice de Oliveira. O jornal na sala de aula. São Paulo: Contexto.
FREIRE, P. Educação e mudança. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.
FREIRE, Paulo. Educação com prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz  Terra, 1996.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
KAUFMAN, Ana Maria. Escola, leitura e produção de textos. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.
PERRENOUD, Philippe. Construir competências desde a escola. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1999.
SANTOS, Maria Lúcia dos. A expressão livre no aprendizado de língua portuguesa: Pedagogia Frei-
net. São Paulo: Scipione, 1996.
SINASE (Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo). Brasília: Secretaria de Direitos Huma-
nos, 2006. Disponível em www.promenino.org.br.
SOARES, Magda. Letramento: um tema em três gêneros. Belo Horizonte: Autêntica, 2004.
VYGOTSKY, Lev Semenovitch. Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins fontes, 1998.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
mUlheres poUco escolArizAdAs: o qUe fAzem com A
leitUrA? o qUe A leitUrA fAz com elAs?
mArtA limA de soUzA

A proposta articula-se ao subtema “Alfabetização, Letramentos e Linguagens Contemporâneas”,


sendo oriunda de pesquisa em que se apresentaram e discutiram-se conhecimentos e processos
relativos às práticas de leitura de pessoas adultas pouco escolarizadas em espaços não escolares. O
ponto de partida é a teoria da enunciação de Bakhtin (2003) inter-relacionada à sociedade, história e
cultura, em que o homem só pode ser compreendido dentro do texto, pois todo ato humano é um
texto em potencial que deve ser lido no contexto dialógico de seu tempo e espaço (Bakhtin, 2000).
Nesse sentido, ler é argumentar (Goulart, 2011) e as leituras produzidas pelas mulheres são textos
criados e recriados por elas. As questões buscaram compreender como pessoas pouco escolariza-
das lidam com demandas de leitura no trabalho, na igreja, na família e como se definem leitoras.
Entender o que fazem com a leitura e vice-versa nos espaços socioculturais de que participam pode
contribuir para o processo de ensino e aprendizagem da linguagem escrita na escola e em outros es-
paços educativos que buscam a formação de sujeitos autônomos. Os resultados indicaram a neces-
sidade de revisão de propostas escolares e programas de alfabetização que desconsideram o que
pessoas adultas pouco escolarizadas fazem com a leitura e o que a leitura faz com elas. Palavras-
-chave: mulheres pouco escolarizadas, leitura e práticas de leitura em espaços não escolares.

palavras-chave: mulheres, leitura, espaços não escolares

introdUção
O artigo apresenta um recorte da pesquisa (SOUZA, 2011) sobre práticas de leitura e escrita de
sujeitos pouco escolarizados imersos em culturas orais e contextos letrados que buscou compreen-
der como davam conta de demandas de leitura e de escrita no trabalho, na igreja, na família. Nesse
texto, priorizamos aspectos relativos à leitura na família.
O pressuposto do estudo era de que pessoas pouco ou não escolarizadas que vivem em socie-
dades letradas interagem com a leitura, possuem conhecimentos sobre a leitura, participam de prá-
ticas de leitura, independentemente da escola. O objetivo geral consistiu em investigar e compre-
ender práticas de leitura de adultas, para entender o lugar que a leitura ocupa em suas vidas e os
objetivos específicos foram identificar e caracterizar práticas de leitura das mulheres pesquisadas na
sociedade letrada.
As questões foram: de que modo a leitura está presente na vida das mulheres? Que efeitos a leitu-
ra produz em suas vidas? Que sentidos atribuem à leitura no processo de aprendizagem da lingua-
gem escrita? Como a leitura atravessa e se atravessa em suas vidas? Para respondê-las, a pesquisa
fundamentou-se teórico e metodologicamente nos estudos de BAKHTIN (2003; 2005), de LAHIRE
(2002), de GINZBURG (2002) entre outros.
Segundo Bakhtin (2003), a língua e seu uso só se realizam na comunicação discursiva, em enun-
ciados, que são formas típicas relativamente estáveis, por meio das quais os sujeitos do discurso
autores-destinatários ativos e responsivos determinam o gênero do discurso, os procedimentos e
o estilo de dizer. Nessa ótica, compreendemos a leitura como prática social, imersa em relações so-
ciais, nas atividades de linguagem verbal (oral ou escrita), nas quais os falantes/escritores produzem
enunciados (orais ou escritos) mediados pelo outro, pela intenção do dito/lido (oral ou escrito) e
pelo contexto de produção do dito/lido.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
O diálogo foi uma categoria de análise, por conseguinte, pois é na relação dialógica com o ou-
tro que “[...] revela-se o homem no homem para outros ou para si mesmo”. (BAKHTIN, 2005, p. 256).
Sendo assim, o diálogo foi a própria ação, não foi o meio, mas o fim: “[...] uma só voz nada termina
e nada resolve. Duas vozes são o mínimo de vida, o mínimo de existência”. (BAKHTIN, 2005, p. 257).
A perspectiva bakhtiniana alia-se a de Lahire quando afirma que o “[...] entrevistado sempre diz sua
‘vida’ (suas práticas, suas opiniões, seus gostos, suas emoções...) através de uma estrutura de uma
interação pesquisador/pesquisado”. (LAHIRE, 2002, p.78).
Esse princípio dialógico constituiu-se como o fio condutor para investigar como a leitura atraves-
sa o dia a dia de adultas pouco escolarizadas, o que implicou a definição de opções teórico-meto-
dológicas nas quais o referencial teórico expressasse um modo de fazer, isto é, em que o teorizar se
manifestasse também na forma de olhar o material de pesquisa e de analisá-lo (LAHIRE, 2004). Con-
siderando que a leitura é condicionada pelos contextos específicos em que é produzida, investigá-la
implicou olhar aspectos comuns às situações e aos processos de produção de discurso para também
olhar o heterogêneo e, portanto, o singular, o diferente, na perspectiva de um olhar que escutasse
ou, nas palavras de Amorim, de uma “escuta da alteridade” (AMORIM, 2001, p. 26).
A “escuta da alteridade” (AMORIM, 2001, p.26), de um outro diferente da pesquisadora, tomou o
objeto de pesquisa como estranho como condição de possibilidade desse objeto, ou seja, mais do
reconhecer a diferença do objeto, exigiu distanciar-se dele, colocá-lo sob perplexidade, sob interro-
gação, sob suspeição. A familiaridade com um determinado cotidiano poderia embotar a comple-
xidade do dia a dia, no sentido de que nem a realidade nem a linguagem eram translúcidas, daí a
importância do estranhamento, do distanciamento para investigar o singular sem excluir o aspecto
sócio-histórico nem ignorar a existência de elementos comuns relativos à vida humana.
A opção metodológica pelo “paradigma indiciário” (GINZBURG, 2002) visou capturar saberes rela-
cionados à experiência cotidiana e à leitura fora da escola, de modo a desvelar indícios de uma leitu-
ra marginal que contribuíssem para romper com a dicotomia racionalismo e irracionalismo. É nesse
sentido que a pesquisa coaduna-se com os objetivos de “pensar nas histórias de leitor e de leitura,
na contemporaneidade” (PUC – RIO, 2º SEEJA, 2014), na apresentação e discussão de conhecimentos
e processos de práticas de leitura de adultas pouco escolarizadas em espaços não escolares.
Os sujeitos da pesquisa foram três mulheres que tinham de três a cinco anos de escolaridade,
com idade entre 60 e 65 anos, eram irmãs biológicas e residentes em Duque de Caxias, município
do Rio de Janeiro. Em virtude da “natureza qualitativa” (BRANDÃO, 2010), foram definidas as “esfe-
ras” (BAKHTIN, 2003) pesquisadas a partir do material de estudo e os procedimentos que incluíram
entrevistas; “questionários” (VÓVIO, 2007); observações e visitas às residências das mulheres, foto-
grafias das esferas em que circulavam, como participavam do mundo da leitura e como a leitura
participava do mundo delas, ou seja, o que faziam com a leitura e o que a leitura fazia com elas.
Na próxima seção, apresentamos a leitura na ótica das mulheres pesquisadas e com base nos
fragmentos de entrevistas delas.

práticAs sociAis de leitUrA nA esferA fAmiliAr: o qUê, pArA qUem,


pArA qUê e como liAm?
Fizemos um inventário de práticas de leitura das mulheres construídas na relação com o mundo
da leitura e escrita na esfera familiar (doméstica) delimitada pelo interior e pelo em torno da casa, do
lugar em que moravam as mulheres entrevistadas, caracterizando os modos como eram vivenciadas
as atividades de escrita e a interação das pesquisadas com práticas de escrita. Os materiais escritos
mais presentes nas residências das mulheres entrevistadas mediavam as relações entre os membros
das famílias das mulheres, isto é, as relações sociais com os filhos, os irmãos e os sobrinhos.
Observamos práticas de leitura em diversas atividades realizadas pelas mulheres, relacionadas ao

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
que faziam com a leitura, mas também àquilo que pensavam sobre o que faziam, incluindo os valo-
res e as ideologias que permeavam as atividades. Quanto ao quê liam, os materiais em maior abun-
dância nas residências foram os álbuns de fotografia, a bíblia, os livros religiosos, os calendários, os
livros didáticos, os dicionários, os livros de receita, os jornais e as revistas, além de correspondências
e boletos de pagamentos de serviços essenciais como luz e água.
Quanto ao para quem liam, elas liam para e com filhos, irmãos e sobrinhos, sendo a leitura me-
diadora de relações entre as mulheres e os membros da família. As práticas de leitura foram reve-
ladoras da interação com diversos materiais escritos, mas também com os integrantes do cotidia-
no doméstico, de modo que possibilitaram a compreensão de funções que a leitura assumia, visto
que o para quê liam tinha objetivos de: apresentar um familiar do passado e recordar momentos
vividos (álbuns de fotografia); estudar sobre uma religião (bíblia e livretos religiosos); informar-se
sobre questões variadas (jornais e revistas); aprender sobre a língua escrita e conhecimentos gerais
(cartilhas, dicionários, livros didáticos, escolares, especializados); fazer pratos culinários (receitas);
ler histórias em quadrinhos para crianças, ainda que a posse de materiais escritos não implicasse,
necessariamente, a leitura dos mesmos, a não posse não poderia ser considerada como sinônimo de
não leitura (GALVÃO ET AL, 2007).
Para elas, a forma como liam ajudava muito nas atividades domésticas, por exemplo, quando liam
o jornal para encontrar anúncios de emprego para os filhos ou a bíblia que, segundo elas, havia con-
tribuído para a melhoria de seus processos de aprendizagem da leitura. Sobre os livros que costu-
mavam ler, afirmavam que somente os relativos à religião como a bíblia, pois não tinham o hábito de
ler livros na concepção delas, mas iam “[...] passar a ler, porque era/é preciso” (SOUZA, 2011). Reco-
nheciam a leitura como importante para o desenvolvimento da pessoa, mas confessavam que não
ficavam horas lendo, na perspectiva de que o leitor fosse alguém solitário que lê por muito tempo e
isolado do mundo. Avaliavam suas práticas de leitura, reiterando que o pouco que liam possibilitava
entender alguma coisa, mesmo que não tivessem muita leitura.
No dia a dia, as mulheres do estudo costumavam fazer listas de compras, procurar ofertas ou
promoções em folhetos e jornais, verificavam datas de vencimento de produtos que compravam,
comparavam preços entre os produtos antes de comprar, faziam compra a prazo com crediário (com
cartão de crédito), pagavam conta em banco ou casa lotérica, faziam depósito ou saque em caixas
eletrônicos, reclamavam por escrito sobre produtos ou serviços adquiridos, liam bulas de remédio,
vendiam produtos de beleza e roupas por meio de catálogos de empresas revendedoras – exerciam
muitas atividades em que a leitura se fazia necessária. Entretanto, percebemos que elas não faziam
referência às revistas de venda de cosméticos e vestuário, principalmente aquela que revendia esses
produtos, e levantamos como hipótese o fato de não se enquadrarem em textos legitimados, auto-
rizados, o que pode/deve ser lido, em especial, aos que circulavam na escola: livros literários, poesia,
contos, entre outros.
Contudo, a análise de materiais de leitura presentes nas relações das mulheres com a escrita e
com outros desvelou as inserções delas no mundo da escrita, evidenciando que o contato com a
leitura e escrita não era exclusivo de pessoas com maior número de anos escolares. As relações com
a leitura e escrita estavam vinculadas às exigências da vida cotidiana, às demandas de relação com
o outro, às necessidades de ler e escrever em situações reais e sociais, mas com objetivos determi-
nados.
Nesse sentido, a partir dos estudos de Bakhtin (2003), foi possível observar que os materiais de
leitura e de escrita não podiam ser compreendidos fora da situação comunicativa discursiva na qual
o texto fora constituído, já que todo ato humano foi/é um texto em potencial, no contexto dialógico
de seu tempo e espaço. Era a situação discursiva que se efetuava como ponto de partida, por meio
dos gêneros do discurso, de acordo com a forma e o conteúdo exigidos pelo contexto, pelos parti-
cipantes da enunciação e pelas intenções do falante que configuravam a interação verbal entre os
sujeitos do diálogo.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
considerAções finAis: o qUe fAzem com A leitUrA? o qUe A leitUrA
fAz com elAs?
As práticas de leitura analisadas evidenciaram inserções das mulheres no mundo da escrita, des-
velando que o contato com a leitura não é exclusivo de pessoas com maior número de anos escola-
res. As relações com a leitura vinculavam-se às exigências da vida cotidiana, às demandas de relação
com o outro, às necessidades de ler em situações reais/sociais e com objetivos determinados. Com
base em Bakhtin (2003), observamos que práticas de leitura não podiam ser compreendidas fora da
situação comunicativa discursiva na qual o texto fora constituído, já que todo ato humano era/é um
texto em potencial, no contexto dialógico de seu tempo e espaço. Portanto, foi a situação discursiva
tomada como ponto de partida que determinava os gêneros do discurso, conforme a forma e o con-
teúdo exigidos pelo contexto, pelos participantes da enunciação e pelas intenções do falante, con-
figurando a interação verbal entre os sujeitos do diálogo. As leituras que faziam possibilitavam uma
organização da vida doméstico-familiar como programar, planejar, organizar, estudar, compartilhar,
cooperar e rezar, ainda que fossem invisibilizadas pelos discursos hegemônicos sobre a leitura, so-
bre o que é ler, sobre quem lê e sobre o que se pode/deve ler.
A visão de que não liam na vida doméstica relacionava-se à avaliação que faziam de si mesmas,
às ideias sobre o modo como um leitor deve se comportar, sobre o que se lê e foram construídas nas
experiências compartilhadas com leitores ou nas imagens veiculadas pelos meios de comunicação,
influenciando no processo de aprendizagem da leitura delas. Suas práticas de leitura nos deram
pistas, rastros singulares de usos sociais da leitura, nos quais a condição delimitou o uso e definiu os
limites desse uso.
Elas liam para dar conta de atribuições cotidianas e para agirem no mundo, mas sempre em rela-
ções mediadas pelo outro: elas mesmas, os filhos, os familiares, os integrantes da igreja. Práticas que
são exigências da vida cotidiana, das esferas da atividade humana, da necessidade de comunicação
ativa com o outro, em que a palavra é sempre dirigida à “alteridade” (BAKHTIN, 2003). Os resulta-
dos indicaram a importância e a necessidade de se revisarem propostas escolares e programas de
alfabetização que desconsiderem o que pessoas pouco escolarizadas fazem com a leitura e o que a
leitura faz com elas.

referênciAs
AMORIM, Marília. O pesquisador e seu outro: Bakhtin nas ciências humanas. São Paulo: Musa Editora,
2001.
BAKHTIN, M. O discurso em Dostoiévski. In: ______. Problemas da poética em Dostoiévski. Tradução
Paulo Bezerra. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2005. p.181-272.
______. Os gêneros do discurso. In: ______. Estética da criação verbal. Tradução Paulo Bezerra. 4. ed.
São Paulo: Martins Fontes, 2003. p.261-306.
______. BRANDÃO, Z. Entre questionários e entrevistas. In: NOGUEIRA, M. A.; ROMANELLI, G.; ZAGO,
N. (Orgs.). Família e escola: trajetórias de escolarização em camadas médias e populares. 5. ed. Petrópo-
lis-RJ: Vozes, 2010.
GALVÃO, Ana Maria O. et al (Orgs.). História da cultura escrita: séculos XIX e XX. Belo Horizonte: Au-
têntica Editora, 2007.
GINZBURG, C. Sinais: raízes de um paradigma indiciário. In: ______. Mitos, emblemas, sinais: morfolo-
gia e história. Tradução Federico Carotti. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. p.143-180.
LAHIRE, B. Homem Plural: os determinantes da ação. Tradução: Jaime A. Clasen. Petrópolis-RJ: Vozes,
2002.
______. Sucesso escolar nos meios populares: as razões do improvável. Tradução Ramon Américo
Vasques e Sonia Goldfeder. São Paulo: Ática, 2004.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
PUC- RIO. 2º Seminário de Educação de Jovens e Adultos - SEEJA: Entrelaçando olhares por uma edu-
cação planetária. Rio de Janeiro: PUC-Rio, Núcleo de Educação de Adultos – NEAD, 3 a 6 de setembro de
2014. Disponível em www.seeja.com.br Acesso em 29 de setembro de 2014.
SOUZA, M. L. de. Os sentidos da escrita para mulheres adultas: família, religião e trabalho. Niterói:
Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal Fluminense, (Tese de Doutorado),
2011.
VÓVIO, C. L. Entre discursos: sentidos, práticas e identidades leitoras de alfabetizadores de jovens e
adultos. 2007. Tese (Doutorado) – Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Cam-
pinas, Campinas-SP, 2007.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
o direito à edUcAção nAs nArrAtiVAs e escritAs de Um
sUjeito Anônimo dA históriA
WilliAm rodrigUes bArbosA

O texto apresenta um estudo (auto)biográfico que privilegia o trabalho com dois tipos de fontes
diferentes – relatos orais de vida (LANG, 1996) e escritas ordinárias (FABRE, 1993) — comuns em pes-
quisas que exercitam o estudo da história em um movimento a contrapelo (BENJAMIN, 1987), visan-
do a analisar fatos a partir da perspectiva de baixo. O objetivo da pesquisa é pensar de outro lugar
a história da educação brasileira, traçando um paralelo entre modelos praticados e políticas educa-
cionais, tecidas pelas narrativas de história de vida de um sujeito comum. Combinando duas fontes
possíveis em estudo que envolve um protagonista anônimo da História (VAINFAS, 2002), (re)visita
períodos complexos da República - décadas de 1930/40 e finais da década de 1960 - reconstruídos a
partir das experiências do sujeito da pesquisa - José Luiz da Silva, ararunense (PB), nascido em 1929
- , que privado do direito à educação escolar, alfabetizou-se em outros espaços, e por meio desse
fundamento indispensável para o desenvolvimento de aprendizagens (UNESCO, 2009) aventura-se
à construção de conhecimentos de forma autodidata, sobretudo, por meio da leitura. Essas narra-
tivas e (re)construções históricas possibilitam perceber momentos que se assemelham a histórias
de vida de outros sujeitos adultos que recorrem à EJA: o momento em que o direito à educação na
idade considerada “certa” lhe é negado e o momento em que estes sujeitos recorrem a instituição de
ensino em busca da formação escolar. PALAVRAS CHAVE: Direito à Educação – Narrativas – Escritas
ordinárias – Alfabetização - Anônimos

palavras-chave: Direito à educação, Narrativas, Escritas ordinárias, Alfabetização, Anô-


nimos

i. introdUção
Na sociedade encontramos pessoas adultas que chamam a atenção pelo acúmulo de saberes
constituído sem ou com pouca vivência escolar. Sujeitos alfabetizados, muitas vezes, fora do espa-
ço escolar, que desenvolveram um anseio pelo aprender, buscando-o por conta própria a partir da
fase inicial e fundamental da aprendizagem letrada12, e apreenderam conhecimentos considerados
eruditos por meio de leituras diversas, mesmo estando fora da instituição escolar. São pessoas que
construíram a habilidade do aprender a aprender e que, por meio dessa habilidade, ousaram cami-
nhar por conta própria à aventura dos saberes de uma cultura historicamente produzida, dando-
-lhes condições de produção de discursos que não os deixam tão distantes daqueles que tiveram
oportunidade de alcançar níveis mais altos de escolarização.
Sujeitos vítimas geralmente de preconceitos, pois nossa sociedade herdeira da tradição eurocên-
trica é marcada por aquilo que Santos (2007) designa de “pensamento abissal”, que discrimina sa-
beres populares e aqueles constituídos por lógicas destoantes dos padrões científicos ou filosóficos
ocidentais. Junto a esse desapreço aos conhecimentos populares, inclui-se uma supervalorização
dos títulos, como afirmam Cruz e Martins (2006, p. 3):

No que diz respeito ao bacharelismo, percebe-se que a importância de um título


12 La alfabetización es un cimiento indispensable que permite a los jóvenes y adultos aprovechar oportunidades de aprendi-
zaje en todas las etapas del continuum educativo. El derecho a la alfabetización es inherente al derecho a la educación. Es un requisito
previo del desarrollo de la autonomía personal, social, económica y política. La alfabetización es un medio esencial de capacitación
de los individuos para afrontar los cambiantes problemas y complejidades de la vida, la cultura, la economía y la sociedad. (UNESCO,
2009, p. 3).

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
(diploma acadêmico) não está relacionada somente com as mudanças inerentes ao
ambiente competitivo no qual as organizações estão inseridas, tampouco, com o
recente fenômeno da globalização de economias, sociedades ou culturas. No caso
das organizações brasileiras, a importância de um título se explica, também, pela
supervalorização de tal atributo herdada de nossos colonizadores portugueses que
legitimavam o poder através dos títulos nobiliárquicos de barão, visconde, conde,
marquês e duque e, na falta destes, dos acadêmicos de bacharel e de doutor.

Esses sujeitos-intelectuais sem escolarização e titulação acadêmica são discriminados, quando


não incompreendidos, mesmo quando reproduzem conhecimentos pautados nas ciências moder-
nas. Tornam-se uma espécie de Policarpo Quaresma, personagem de Lima Barreto, embora este não
fosse totalmente não escolarizado, apenas ousava buscar conhecimentos e falar de assuntos que
não correspondiam ao seu grau de formação13.
As produções intelectuais continuam privilegiando o saber científico em detrimento do conhe-
cimento empírico. No entanto, acredito que na análise das práticas dos sujeitos podemos encontrar
respostas que podem ajudar na construção de propostas para superar alguns entraves na educação
de jovens e adultos. Como professor regente e coordenador itinerante de um projeto diferenciado
de EJA, tive a oportunidade de refletir mais sobre minhas práticas e buscar caminhos para tentar
atender as especificidades da educação de jovens e adultos, a fim de garantir a qualidade de ensino,
permitir a permanência e o sucesso desses que voltam aos bancos escolares ou que neles permane-
cem além do tempo previsto para sua formação.
Têm sido grandes inquietações em relação à EJA, nos últimos anos, a relativa “evasão” — os que
se evadem em um período letivo voltam em outro — e, consequentemente, o número reduzido de
promovidos e de concluintes do ensino fundamental, nesta modalidade, comparados ao número
de matrículas. São questões que comprometem o dever do Estado brasileiro quanto à garantia do
direito a educação, preconizado na Constituição Federal de 1988, que determina a educação básica
como direito de todo cidadão, independente da idade, em seu artigo 208 inciso I: “educação básica
obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua ofer-
ta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria”.
Situação que distancia ainda mais a possibilidade de efetivação do objetivo de universalização
do ensino médio, expresso no inciso II do mesmo artigo: “progressiva universalização do ensino
médio”. Desafio que deveria mover ações em caráter de urgência na sociedade brasileira, onde cerca
de 50% da população acima de 25 anos não possuem nem mesmo o ensino fundamental completo,
segundo o censo 2010 do IBGE.
Carmo (2010) faz revelações sobre o fenômeno da evasão na EJA, à luz da teoria do reconhe-
cimento social, ajudando a superar a visão estereotipada e reducionista com relação aos motivos
desse comportamento. Aponta, entre as diversas causas, os entraves criados pela própria escola que
apresenta currículos desconexos com a realidade do público jovem e adulto: “[...] o que os amedron-
ta é a distância que os conteúdos ministrados têm de sua realidade, fazendo alguns bater na cabeça
e dizer: ‘não entra, tenho a cabeça fraca’”. (CARMO, 2010, p. 251).
Segundo Carmo (2010, p. 252), um dos motivos que mais contribuíram para a evasão escolar em
EJA é a “falta de interesse”, confirmando outras pesquisas como a de Néri (2009). No entanto, ao
contrário de Néri que relacionou essa falta de interesse à ignorância do jovem e adulto da relação
entre a escolaridade e a possibilidade de avanços socioeconômicos, o autor aponta que a falta de
interesse está associada aos entraves encontrados pelos alunos na própria escola: currículos que se
distanciam de sua realidade; avaliações que os desclassificam fazendo-os se sentirem incapazes de
13 “[...] Se não tinha amigos na redondeza, não tinha inimigos, e a única desafeição que merecera, fora a do doutor Segadas,
um clínico afamado no lugar, que não podia admitir que Quaresma tivesse livros: - se não era formado, para quê? Pedantismo” (LIMA
BARRETO, 1989, p. 19).

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
aprender.
Percebe-se que pesquisas como a de Néri, que tomam como matriz de interpretação a Teoria do
Capital Humano, acabam atribuindo culpa ao próprio sujeito-aluno pelo seu insucesso ou desistên-
cia. Para Carmo (2010, p. 213), esse trabalho (e outros como esse) “expõe uma curiosa correlação en-
tre senso comum e verificação científica – a imagem do jovem da classe popular que não frequenta a
escola por ‘falta de interesse’, por ser irresponsável, preguiçoso, sem objetivo na vida, etc.” Contudo,
é indiscutível que práticas pedagógicas equivocadas e práticas de currículos distanciados da reali-
dade do público jovem e adulto também afetam a permanência e o sucesso escolar desses sujeitos.
Em minha pesquisa, procurei, na voz e experiência de quem construiu saberes longe dos bancos
escolares, práticas (pedagógicas) conscientes e/ou inconscientes que tornaram possível a autoa-
prendizagem do sujeito adulto. Seus processos de aprendizagem podem contribuir de alguma ma-
neira para discutir a elaboração de currículos flexíveis e práticas pedagógicas dialógicas mais iden-
tificadas a outros tantos processos de aprendizagem do público da EJA. Segundo Freire (1996, p.
111), “é escutando que aprendemos a falar com eles. Somente quem escuta paciente e criticamente
o outro, fala com ele, mesmo que, em certas condições, precise de falar a ele”.

2. Um protAgonistA Anônimo dA históriA


O texto faz parte de um projeto de pesquisa de mestrado que, por meio das narrativas orais e
escritas ordinárias14 de um sujeito comum, busca reconstruir episódios da história da educação, (re)
visitando períodos complexos da república brasileira, e identificar as marcas da escolarização pro-
duzidas pelos modelos praticados nesses contextos; assim como, as dificuldades enfrentadas por
alguém privado do direito à educação escolar, que se alfabetizou em outros espaços e que através
desse fundamento indispensável para o desenvolvimento de aprendizagem (UNESCO, 2009, p. 3),
aventura-se a construção de conhecimentos de forma autodidata.
A pesquisa baseia-se nos relatos orais de vida do Sr. José Luiz, um sujeito nascido na cidade de
Araruna, no estado da Paraíba, em 1929, que migra para o Rio de Janeiro, na década de 1950, em
busca de melhores condições de vida para si e sua família, composta na época por mãe e irmãos
abandonados pelo progenitor quando ele possuía 12 anos de idade.
Percebemos em seus discursos certa erudição que não condiz com a falta de escolarização da
qual foi vítima desde a infância, embora tenha frequentado, aos dez anos de idade, uma classe pro-
movida por instrutores particulares sem formação acadêmica, durante alguns meses, onde adquiriu
a habilidade da leitura e rudimentos da escrita. Os folhetos de cordel foram os textos escritos que
dispôs, durante sua juventude, para manter e desenvolver a leitura. Sua formação educacional for-
mal15 só veio a acontecer aos 39 anos de idade quando frequentou um curso supletivo para tirar a
certificação de ensino primário, por obrigatoriedade da empresa em que trabalhava, a fim de garantir
o emprego, e em cumprimento da lei federal16. Assim, após uma formação aligeirada de apenas seis
meses de curso, foi aprovado, adquirindo a titulação máxima garantida pela LDB 4.024/61, já que
14 Segundo FABRE (apud CUNHA, 2007, p. 60), “As escritas ordinárias ou sem qualidade são aquelas realizadas pelas pessoas
comuns e que se opõem aos escritos prestigiados, elaborados com vontade específica de ‘fazer uma obra’ para ser impressa”.
15 Para Libâneo (1999, p. 23): “A educação formal compreenderia instâncias de formação, escolares ou não, onde há objetivos
educativos explícitos [...]. A educação não formal seria a realizada em instituições educativas fora dos marcos institucionais, mas com
certo grau de sistematização e estruturação. A educação informal corresponderia a ações e influências exercidas pelo meio, pelo am-
biente sociocultural, e que se desenvolve por meio das relações com os indivíduos”.
16 LDB 4.024/61 – “Art. 27. O ensino primário é obrigatório a partir dos sete anos e só será ministrado na língua nacional. Para
os que o iniciarem depois dessa idade poderão ser formadas classes especiais ou cursos supletivos correspondentes ao seu nível de
desenvolvimento. 
Art. 31. As empresas industriais, comerciais e agrícolas, em que trabalhem mais de 100 pessoas, são obrigadas a manter ensino primá-
rio gratuito para os seus servidores e os filhos desses.
§ 1º Quando os trabalhadores não residirem próximo ao local de sua atividade, esta obrigação poderá ser substituída por instituição
de bolsas, na forma que a lei estadual estabelecer.”
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4024.htm. Acessado em 02.09.2014

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
esta facultava o Ensino Médio exclusivamente a adolescentes17.
Na empresa onde trabalhara, teve contato com literaturas que permitiram o desenvolvimento de
uma formação autodidata. Embora, a Bíblia fosse sua fonte primeira de inspiração à leitura mais sis-
temática, Sr. José Luiz lê o que lhe vem às mãos, e algumas de suas primeiras leituras não se apagam
da memória, como as obras de Hérodoto, por meio das quais teve contato com pensadores gregos
antigos, e O Papa e o Concílio, de Rui Barbosa.
Por meio do acesso a textos escritos pelo Sr. José Luiz e literaturas de seu acervo pessoal, iniciei a
busca de vestígios que indicassem as marcas da escolarização18 na formação desse sujeito, cruzan-
do-as ao modelo da educação brasileira no período principalmente da ditadura do Estado Novo,
correspondente à infância e juventude do entrevistado, buscando conhecer as influências e contra-
dições entre os currículos prescritos nas reformas educacionais e aqueles praticados, sobretudo no
espaço rural19.
A pesquisa apoia-se em fontes orais, baseando-se, portanto, em memórias. As memórias são re-
construções, requerendo cuidados em seu tratamento, segundo Lang (1996, p. 35) trata-se da evo-
cação “de um passado visto pela perspectiva do presente e marcado pelo social, presente a ques-
tão da memória individual e da memória coletiva”. Trabalho com o conceito de relato oral de vida
proposto pela socióloga, isto é, de uma narração mais restrita e direcionada por uma temática; por
isso na condução da entrevista narrador e o pesquisador envolvem-se no processo seletivo dessas
memórias.
O livro de Ecléa Bosi, Memória e Sociedade: lembrança de velhos orientou-me na construção me-
todológica, auxiliando no resgate da memória tão impregnada em idosos, para quem as limitações
da constituição corpórea podem até restringir certas ações, mas com uma consciência impregnada
de representações unindo o tempo passado e o presente: “Quando a memória amadurece e se ex-
travasa lúcida, é através de um corpo alquebrado...” (BOSI, 1994, p. 39).
Os conceitos de memória com os quais a autora trabalhou nesta obra - urdidos a partir do diálo-
go com as teorias de Bergson, Halbwachs e Barllett - consideram o como as lembranças do passado
tornam-se características nos sujeitos de mais idade, e como essas memórias são construídas não
apenas de fatos reais vividos, mas conforme foram apreendidas pelos sentidos e moldadas pela ex-
periência de vida de cada sujeito. Estas são concepções que me apropriei na pesquisa.
Adotei o modelo de entrevista semi-estruturada20 na apreensão dos relatos de experiência, para
que em meio a conversas informais e a possível interação entre os sujeitos da comunicação não
incorresse no desvio dos objetivos propostos; além do fato desse procedimento não fechar possibi-
lidades de outras explorações durante a dinâmica da entrevista. Desta forma, o uso do roteiro para
o encaminhamento da entrevista teve a função de exercer o que Ouzouf (apud BECKER, 2006, p. 28)
denominou de “arquivos provocados”.
A opção pela abordagem qualitativa na pesquisa deu-se pela possibilidade que abre para a apre-
ensão do significado que as pessoas atribuem às coisas e à sua vida, e pelo entendimento de que
esta se adéqua melhor à proposta do trabalho com as narrativas de histórias de vida, permitindo-me
apreender singularidades e percursos de formação do sujeito participante, assim como o reconheci-
17 LDB 4.025/61 – “Art. 33: “A educação de grau médio, em prosseguimento à ministrada na escola primária, destina-se à for-
mação do adolescente.”
18 Mesmo não passando pela escola, há um conhecimento tácito dos sujeitos sobre conhecimentos da escrita e da leitura,
disseminados na sociedade grafocêntrica, que também considero marcas de escolarização.
19 No estudo de Diana Vidal (2006) sobre os grupos escolares a autora mostra, que em diferentes momentos os estados bra-
sileiros buscaram implantar o modelo da escola primária, durante a Primeira República, e aponta que essas reformas começam a ser
abraçadas no estado da Paraíba a partir de 1916, ou seja, bem antes da iniciação do Sr. José Luiz no processo de aquisição da escrita
e leitura. Constatando-se divergências entre o discurso oficial e a ação efetiva para sua implementação na sociedade, sobretudo, nas
áreas rurais.
20 Segundo Manzini, “Esse tipo de entrevista pode fazer emergir informações de forma mais livre e as respostas não estão
condicionadas a uma padronização de alternativas.” (MANZINI, 2004, p.2)

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
mento dos atores sociais como sujeitos que produzem conhecimentos e práticas (CHIZZOTTI, 2003,
p. 221-222).
O trabalho configura-se como uma pesquisa autobiográfica, adotando o método morelliano pro-
posto por Ginzburg (1990, p. 144), ou seja, examina os pormenores mais negligenciáveis. Propondo-
-se a perceber a história da educação brasileira em um movimento a contrapelo (BENJAMIM, 1987,
p. 225). Trata-se de um estudo que visa analisar os fatos a partir da perspectiva daqueles que prota-
gonizam a história não ao lado dos grupos hegemônicos. Sujeitos a quem Vainfas (2002) denomina
de protagonistas anônimos da História.
Bourdieu (1983, p. 124), quando analisa a legitimação no campo científico do intelectual, explica
que “os julgamentos sobre a capacidade científica de um estudante ou de um pesquisador estão
sempre contaminados, no transcurso de sua carreira, pelo conhecimento da posição que ele ocupa
nas hierarquias instituídas”. Compreendendo que o indivíduo é marcado pelas instituições a que
pertenceu, intento identificar aquelas que teriam influenciado o processo de formação do Sr. José
Luiz. Assim, julgo que poderiam ser o lugar onde iniciou o contato com a escrita; o curso onde tirou
seu diploma primário; o local em que trabalhou e conviveu com sindicalistas, advogados e juízes,
onde discretamente assistia parte das aulas de cursos preparatórios na área jurídica e em que teve
acesso a literaturas que contribuíram para sua formação autodidata; a comunidade religiosa que
frequenta; além de outros espaços informais de cultura que ajudaram a formar as teias que constru-
íram sua identidade e sua capacidade intelectual movida pelo desejo de saberes através do mundo
da leitura.

3. reflexões iniciAis A pArtir dAs nArrAtiVAs e escritAs do sUjeito


Cada objeto produzido para conter um texto influencia também o modo como é utilizado, prin-
cipalmente no que concerne à construção do sentido do texto que este objeto contém. Segundo
Chartier (2002, p. 44-45): “cada forma, cada suporte, cada estrutura da transmissão e da recepção do
escrito afeta profundamente seus possíveis usos e interpretações”. A consideração da materialidade
dos suportes de escrita do Sr. José Luiz revelam as marcas de sua escolaridade.

Figura 1 Figura 2
A figura 1 apresenta algumas poesias, em papéis avulsos, folhas pautadas e sem pauta com apa-
rência que demonstra diferentes tempos de uso. A figura 2 apresenta os cadernos e agenda dispo-
nibilizados pelo Sr. José Luiz. Trata-se de materiais de encadernações diferentes: cadernos de mola
e grampeados e uma agenda costurada do ano de 2009. Nesses materiais encontram-se registros
sobre a leitura e estudo realizados nos volumes da Teologia Sistemática, acompanhadas de textos
bíblicos. Há uma catalogação de temas abordados nas leituras, cópia de trechos dos textos, refle-
xões suscitadas pela leitura e cálculos com armação de contas, que demonstram o uso de saberes
matemáticos no exercício de compreensão do texto. Na capa de alguns cadernos, há títulos para
identificar a parte do estudo a que se referem.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
Os apontamentos de Anabela A. Costa e Santos ajudam a entender o processo de apropriação da
habilidade do uso dos cadernos durante a formação escolar:

“No caso dos cadernos, é nos primeiros anos de escolarização que os alunos têm
acesso às aprendizagens necessárias para o uso que se estenderá ao longo da per-
manência nos espaços de ensino. Inicialmente, predomina a tentativa de apropria-
ção do modo escolar de uso desses suportes de escrita. À medida que estão garanti-
das tais aprendizagens basilares, surge a possibilidade de que os alunos façam dos
cadernos espaços mais pessoais e autorais.” (2009, p. 146)

A constatação da autora confirma a tese de que a falta do treinamento da escrita nesse tipo de
suporte tenha provocado as dificuldades no seu uso, como pude verificar ao folhear os cadernos de
José Luiz, uma vez que não teve contato com este tipo de material na fase de alfabetização, tendo
esta sido realizada em papéis avulsos; somando-se ainda o fato de que essa formação foi interrom-
pida prematuramente.
Verificam-se mudanças na grafia das palavras ao analisar os suportes. O autor escreve ora com
letra cursiva ora com letra de forma. Além disso, há mudanças na caligrafia o que pode ser também
influência da idade e das circunstâncias em que o texto foi produzido. Porém, não podemos descon-
siderar o método utilizado durante o seu processo de iniciação à escrita. Sua primeira cartilha foi o
Abecedário ou ABC. Segundo relato de Ananias Pereira de Sousa, que se alfabetizou em uma “esco-
linha na roça” do interior da Bahia, por volta de 1951, primeiro se aprendia as letras do abecedário
para depois aprender a soletrá-las formando sílabas, isso através do uso de letras de imprensa mai-
úsculas, mas essas etapas eram desenvolvidas sem nenhuma prática de escrita. Dominada essa téc-
nica, passavam-se as letras minúsculas, e em seguida as letras manuscritas (RAZZINI, 2009, p. 104).
Percebemos que essa prática não foi muito diferente da usada na alfabetização do Sr. José Luiz, e
pode ter influenciado a mistura na grafia de quem não teve continuidade no processo de escolariza-
ção, que passa a ter mais contato com textos impressos do que manuscritos.
Nas memórias do Sr. José estão outras práticas comuns de quando estudava em Araruna, como o
uso da palmatória como meio de repreender os alunos que cometiam atos considerados indiscipli-
nares ou por não saberem a lição no dia da argumentação. Em suas lembranças ainda permanecem
o respeito que tinham pelos professores. Era costume os educandos pedirem a benção ao chegarem
e saírem da aula, fato que aparece em experiências de outros sujeitos:

A escola da mestra Silvina/ [...] Não se usava quadro-negro,/ As contas se faziam


em pequenas lousas/ Individuais. / Não havia chamada e sim o ritual / De entradas,
compassadas. /”-Bença, Mestra...”/ Banco dos meninos / Banco das meninas. / Tudo
muito sério. (CORALINA, apud RAZZINI, 2009, p. 104)

Cora Coralina denuncia, no poema, a prática de tomar benção a professores, experiência que vi-
veu durante sua formação primária no final do século XIX. Ainda no mesmo poema, Cora versa sobre
a presença dos castigos corporais: “Tinha dia certo da argumentação/ com a palmatória/ em cena.”
(apud RAZZINI, 2009, p. 105). A República implantada em 1889 e que prometia diversas mudanças
no país, manteve estruturas educacionais dos tempos coloniais que se arrastaram por longas déca-
das do século XX21, mesmo diante dos movimentos sociais a favor de uma educação mais popular e
de reformas educacionais que se firmavam em discursos em prol do avanço da educação, alegando
serem necessárias para o desenvolvimento do país, como o movimento dos Pioneiros.
21 Nagle (1974, p. 283), ao analisar os marcos de 1889 e 1930, correspondentes à Primeira República, inferiu: “essas duas datas
de forma alguma significam mudanças profundas no sistema escolar brasileiro”.

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Ao estudar as marginálias (ESTIBEIRA, 2008, p. 8), encontradas em alguns livros do acervo pessoal
do Sr. José Luiz, ajudou-me a conhecê-lo não somente como leitor, mas também como interlocutor
literário, já que desenvolve escritas paralelas a algumas de suas leituras em cadernos e agendas. Por
meio de seus escritos nas margens dos livros e em outros suportes, mas relacionados à leitura feita
no momento, pude perceber a forma como interage com o texto, suas reflexões, inserções, críticas
e apropriações. Revelando também um leitor atento, que busca entender o que lê, ultrapassando
os limites da alfabetização22 constatados pelas estatísticas que avaliam a qualidade da educação
realizada com sujeitos escolarizados23, demonstrando que o letramento constitui-se através de inte-
rações sócio-históricas (TFOUNI, 2010, p. 22), o que envolve as práticas sociais, sobretudo nas socie-
dades contemporâneas, dando-se em espaços que extrapolam o escolar, embora não se despreze a
escolarização como forma de democratizar o processo de aquisição da leitura e da escrita.
Considero também as marginálias paralelas, isto é, as notas escritas em folhas de papel soltas,
em cadernos de leitura ou ainda em pequenos papéis deixados dentro dos livros, que se referem ao
texto lido. Foi possível encontrar outras formas de anotação feitas pelo entrevistado, que podemos
chamar de sub-marginália (ESTIBEIRA, 2008, p.77). Trata-se de marcas ou sinais que demonstram
uma intervenção do leitor direta no texto original constituindo-se em observações importantes
para revelar a interação do sujeito com os textos; aproximando leitor e escritor, em que esse escritor
distante pode vir assumir a figura do professor presente, que ensina, corrige e até aconselha, na ex-
periência de alguém onde esse personagem faltou no seu processo de formação intelectual por não
ter acesso à instituição escolar, como é o caso do Sr. José Luiz.

4. AlgUmAs considerAções
Penso que procurar perceber os aspectos que influenciaram o processo formativo de um sujeito
e dos mecanismos os quais desenvolveu para a construção dos seus saberes, pode fazer emergir
possibilidades inusitadas que ajudem na construção de currículos mais flexíveis e adequados a este
público, que respeitem os saberes, experiências e anseios dos jovens e adultos da EJA, contribuin-
do para o desenvolvimento de uma educação de qualidade garantindo a permanência e o sucesso
escolar.
Baseado na concepção de Benjamin sobre a história como “um tempo saturado de ‘agoras’” (BEN-
JAMIN, 1987, p. 229), penso que o trabalho, em sua proposta de estudar recortes da história da
educação a partir de um outro lugar, pode contribuir para incitar reflexões e apontar possibilidades
novas, que transformem os “agoras” de nosso tempo presente, renitentes na construção histórica da
sociedade brasileira, principalmente no campo da educação de jovens e adultos.

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22 Adoto conceito de alfabetização empregado por Judith Kalman (2009, p. 73): “[...] a alfabetização (literacy) como algo a mais
do que a aprendizagem dos aspectos rudimentares da leitura e da escrita, assim como também sustenta que ser alfabetizado refere-
-se à pessoa que utiliza a língua escrita para participar do mundo social. [...] utilizar a linguagem escrita – gêneros textuais, discursos,
significados, palavras, letras – de maneira deliberada e intencional para poder participar de eventos culturalmente valorizados e
relacionar-se com os outros”.
23 “[...] pesquisas que vêm identificando problemas nos processos e resultados da alfabetização de crianças no contexto es-
colar, insatisfações e inseguranças entre alfabetizadores, perplexidade do poder público e da população diante da persistência do
fracasso da escola em alfabetizar, evidenciada por avaliações nacionais e estaduais, vêm provocando críticas e motivando propostas
de reexame das teorias e práticas atuais de alfabetização.” (SOARES, 2004, p. 96 ).

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
o letrAmento digitAl e A internet nA edUcAção de
joVens e AdUltos
jUlio cezAr mAtos pereirA

O trabalho foi escrito a partir da dissertação de mestrado “Os impactos na vida dos educandos da
Educação de Jovens e Adultos a partir do acesso à informática na escola”, defendida em 2011 na Fa-
culdade de Educação da UFMG. A investigação foi realizada com educandos da Educação de Jovens
e Adultos (EJA) de uma escola pública da Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte, em que
procuramos observá-los e entrevistá-los para se tentar saber se essas aulas de Informática trazem
alguma mudança em relação ao seu convívio social, às amizades, à família, à cultura, às questões
profissionais ou educacionais etc. O principal objetivo da pesquisa foi o de investigar se houve im-
pactos positivos e negativos à vida dos educandos da EJA depois que passaram a ter acesso às Tec-
nologias da Informação e Comunicação (TIC) por meio da prática pedagógica na escola. Houve uma
revisão bibliográfica sobre temas como EJA, alfabetização e letramento, inclusão digital, TIC, ética e
diversidade na escola. Na pesquisa procuramos estabelecer diálogos com as contribuições de Paulo
Freire, Pierre Lévy, Marc Prensky dentre outros. Os procedimentos metodológicos foram de cunho
qualitativo, com a triangulação de dados, através da revisão bibliográfica, análise de documentos,
questionário, entrevista e observação livre. Encontramos impactos positivos na vida dos educandos
pesquisados. A partir da investigação realizada, pretendemos dialogar neste trabalho com o uso da
Internet na EJA, enquanto linguagem contemporânea, e temas como: EJA, TIC, letramento e inclu-
são digital na EJA, além trazer algumas entrevistas realizada com os pesquisados sobre esses temas,
com suas respectivas análises.

palavras-chave: EJA, TIC, Inclusão digital, Letramento digital

Este trabalho foi elaborado a partir da minha dissertação de Mestrado, intitulada “Os impactos
na vida dos educandos da Educação de Jovens e Adultos a partir do acesso à informática na escola”
(PEREIRA, 2011), e a pesquisa de Doutorado que iniciei em 2014, ambas através do “Programa de
Pós-graduação em Educação: Conhecimento e Inclusão Social”, da Faculdade de Educação (FaE) da
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), na Linha de pesquisa “Educação, Cultura, Movimen-
tos Sociais e Ações Coletivas”. Não contei com financiamento. A pesquisa também resultou em um
livro publicado em 2014: “O acesso à informática na escola: Os impactos na vida dos educandos da
Educação de Jovens e Adultos” (PEREIRA, 2014), que traz estudos no campo da Educação sobre a
utilização da informática na escola por educandos da Educação de Jovens e Adultos (EJA), que foi
realizada a partir de uma literatura voltada principalmente à EJA e às Tecnologias da Informação e
Comunicação (TIC24).
Alguns autores adotam o termo “Novas Tecnologias da Informação e Comunicação”, abreviado
pela sigla NTIC, ou “Novas Tecnologias”, ao invés de “Tecnologia da Informação e Comunicação”, ou
apenas TIC. Eu optei pela última forma por entender que as inovações tecnológicas sempre se reno-
vam.
A pesquisa que apresento foi feita em uma escola e traz a interpretação que os educandos fazem
em relação ao uso da informática, a partir da sala de aula, com procedimentos de cunho qualitativo.
Podemos encontrar uma investigação feita a partir dos trabalhos apresentados na ANPED, entre
1998 e 2008, sobre o tema escolarização em EJA – que o tema tecnologia foi investigado em 2 traba-

24 Adotarei a sigla TIC, pois a letra “T” já representa o plural da palavra “Tecnologias”. Autores adotam os
termos TIC, TICs ou TIC`s, mas há controvérsias de se colocar uma sigla no plural com a letra “s” no final, ainda
mais estando no plural apenas a primeira das três palavras do termo representado.

332
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
lhos e também citado em um terceiro artigo, de 2001, intitulado “As aprendizagens escolares como
objeto do desejo dos trabalhadores e trabalhadoras rurais sem-terra”, pesquisado em Santa Catarina,
em que a autora Rita de Cássia Curvelo da Silva conclui que os trabalhadores rurais, mesmo tendo
acumulado conhecimentos úteis, ficavam excluídos do acesso às novas tecnologias (PEREIRA, BAS-
TOS e FERREIRA, 2011, p. 159).
A pesquisa foi realizada em uma escola pública de Ensino Fundamental da Rede Municipal de
Educação de Belo Horizonte (RME-BH), que atende à modalidade de EJA e faz o uso da informática
com esses educandos em seu processo de escolarização. Realizei pesquisa documental, entrevistas
semiestruturadas e observações livres. Todos os entrevistados eram alfabetizados, sendo dois do
sexo masculino e sete do sexo feminino, com idade entre 18 e 52 anos.
Haddad (2002) apresenta um estado do conhecimento no campo da EJA no Brasil sobre os temas
emergentes pesquisados por cursos de pós-graduação em educação no período 1986 a 1998 e as-
pectos inexplorados pela pesquisa, a partir de teses e dissertações dos programas nacionais de pós-
-graduação stricto sensu em Educação. Esse trabalho traz algumas lacunas e aspectos inexplorados
pela pesquisa, mas o tema tecnologia fica completamente de fora, inclusive das lacunas apresenta-
das. As pesquisas em EJA relacionadas às tecnologias eram escassas até 1998. Em suas 140 páginas,
o termo “TIC” não aparece uma única vez e a palavra “tecnologia” aparece por seis vezes (duas delas
no plural).
A humanidade vem evoluindo no modo de pensar e de agir ao longo de sua existência. A cada
tempo e em diferentes lugares o homem e a mulher desenvolveram tecnologias a partir da reali-
dade e da necessidade de cada um, ou de um coletivo. Muitas vezes, foi pensando diferente que o
homem e a mulher criaram, inventaram, foram além e produziram o fogo, o sal, a roda, a escrita, o
papel, a eletricidade, o rádio, a televisão, o telefone, o computador etc. A a invenção da escrita foi um
divisor em sua evolução e trouxe grandes contribuições para a comunicação humana, inclusive para
a propagação e a criação de outras novas tecnologias. Mas a escrita ainda não é dominada por uma
parcela da sociedade, onde se insere grande parte dos educandos da EJA. Temos que pensar cada
vez mais em vencer a barreira da comunicação escrita.
Ao longo da historia, o homem e a mulher criaram diversos sistemas que facilitaram esse pro-
cesso comunicativo, como o uso do próprio corpo a partir do som produzido pelas pregas vocais
e o uso da voz humana, dialetos, sinais de fumaça e os sons produzidos por troncos de árvores e
tambores. Começam aí as primeiras Tecnologias da Informação e Comunicação, hoje TIC. Não são
novas, apenas o termo foi criado no século passado, com a informática e dos meios de comunicação
eletrônicos. Chegamos, então, à Internet, uma infraestrutura formada por uma imensa rede que en-
globa uma variedade de outras redes, que se interligam por meio de protocolos de comunicação. A
escrita, o tempo e o espaço ganham novas dimensões.
As comunidades virtuais têm conseguido mobilizar pessoas e possibilitado uma maior partici-
pação democrática da população mais conectada. Surgem manifestações ciberpolíticas25 em todo
o mundo, o que me remete às reflexões sobre Paulo Freire, que vê o ser humano como um “ser de
relações e não só de contatos, não apenas está no mundo, mas com o mundo. Estar com o mundo
resulta de sua abertura à realidade, que o faz ser o ente de relações que é” (FREIRE, 2008, p. 47).
O direito ao acesso à educação, à alfabetização e ao letramento é ampliado. Surge o letramento
digital, que vai além da leitura e do simples uso dos equipamentos da TIC.
Hoje, “é possível participar de atividades e práticas letradas sendo analfabeto: analfabetos to-
mam ônibus, olham os jornais afixados nas bancas e retiram o Bolsa Família com cartão magnético”
(ROJO, 2010, p. 81). Contudo, ressalta a autora, a participação dos indivíduos em determinadas es-
25 Ciberpolítica foi o termo mais apropriado que pensei, em 2011, para as manifestações com algum
cunho político, divulgadas nesse emaranhado que é a cibercultura. Realizei na época uma pesquisa sobre
esse termo na Internet e encontrei pouquíssimos textos brasileiros sobre esse termo, mas era utilizado em
maior número em textos da língua de origem espanhola e em outros países latinos.

333
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
feras em que se exige uma prática letrada mais avançada, como na escola, na imprensa jornalística
impressa, na literatura e na burocracia, exige que se tenha uma maior desenvoltura em seu nível de
alfabetismo. Por isso, “é tão importante que a escola se torne uma agência de democratização de le-
tramentos” (ROJO, 2010, p. 81). São tantas as práticas e os eventos de letramento em nosso cotidiano
que a autora passa a usar o termo letramentos ao invés de letramento.
Dentre os sujeitos selecionados para as entrevistas, 13 deles responderam um questionário, qua-
tro abandonaram a escola, antes do início das entrevistas semiestruturadas e, portanto, estas foram
feitas com os 9 educandos restantes. Todos alfabetizados, dois do sexo masculino e sete do femini-
no, com idade de 18 a 52 anos.
Aparecida26 tinha 50 anos e o seu maior interesse no uso do computador era ver e mandar e-mails
e fazer pesquisa. Apolônia tinha 25 anos e dizia que “é na escola que muitas pessoas aprendem a
utilizar um computador. Foi aqui que eu tive a primeira noção de como usar um computador”. João
Batista tinha 46 anos e achava “aqueles alunos que não têm condições de pagar um curso, podem
começar a aprender dentro da própria escola”. Letícia tinha 50 anos e dava importância ao uso do
computador na escola, pois achava que “ajuda a aprender. Tenho mais facilidade porque os pro-
fessores têm paciência e competência com as pessoas de idade” e dizia que era porque trabalhava
“com Orçamento Participativo, sou delegada titular e recebo muitos convites de reunião por e-mail e
aprendi a fazer pela escola”. Maria Candelária tinha 46 anos e dizia que “a importância é que as pesso-
as que não tem ainda computador em casa está tendo oportunidade de aprender a manusear este
aparelho”. Maria dos Anjos tinha 52 anos e dizia que “podemos fazer pesquisa e outros trabalhos”.
Maria Helena tinha 46 anos achava que “o uso do computador é muito importante porque podemos
fazer várias pesquisas escolares fazer trabalhos criar textos e textos com imagem”. Mônica tinha 18
anos dizia que o seu maior interesse no uso do computador era “de poder fazer pesquisas. Poder
pesquisar sobre as coisas que eu não sei. Ou seja poder ampliar os meus conhecimentos [...] Inclusi-
ve me incentivado a me interessar mais”. Pedro tinha 33 anos dizia que o seu maior interesse no uso
do computador era “para pesquisas e comunicar com pessoas e aprender cada vez mais a lidar com
ele” (DADOS DOS QUESTIONÁRIOS).
As entrevistas foram semiestruturadas, para que fosse possível analisá-las através das perguntas
comuns e de indícios que poderiam surgir em suas respostas, as questões abordadas nas entrevistas
poderiam contribuir na elucidação dos dados coletados a partir dos questionários e das observa-
ções livres. Na transcrição das falas, as mantive na forma original que foi pronunciada. Retirei apenas
as pausas, para facilitar a leitura.
Em sua entrevista, Aparecida, falou que tinha um computador em casa há muito tempo, os
filhos usavam e ela não. Isso é muito fato comum, como pode ser encontrado em outras entrevistas
adiante. O que essas mães, esses pais, avós e avôs contam, na maioria das vezes, é que os mais novos
falam a eles é que podem estragar o computador e, por isso, eles ficam com receio em usá-lo em
casa, mesmo sendo eles os mais velhos e que compraram e pagaram pelos computadores, na maio-
ria das vezes. Eles compram e colocam o computador dentro de casa, mas são convencidos pelos
seus descendentes a não usá-los. Há exceções, como a de Pedro, que não usava o computador do
pai, pelo mesmo receio: danificá-lo. Porém, depois que começam a usar o equipamento na escola
e descobrem que não há nada de tão difícil que não possa aprendido, mudam o comportamento e
começam a usá-lo em casa, mesmo sem a ajuda dos filhos, filhas, netos e netas, na maioria das vezes.
Apolônia fala: “olha, eu utilizo muito... é... poder olhar um site pra poder comprar, sabe? Na...
n’alguma loja, alguma coisa. Mas pra Orkut, e-mail, esses negócios, eu não utilizo não. Eu nem tenho.
É mais é pra compra... aí... pra utilizar mesmo”; acha que passou a usar melhor outras tecnologias de-
pois que teve aulas de Informática na escola e ressalta “até comprei meu MP14”. Em seu questionário,
Apolônia havia escrito que “foi aqui que eu tive a primeira noção de como usar um computador”.
26 Para preservar suas identidades e manter o anonimato dos sujeitos entrevistados, eu não utilizei seus nomes verdadeiros.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
Então, pedi que ela me falasse um pouco mais sobre isso e ela relata: “eu não sabia nem ligar um
computador. Entendeu? [...] eu não tinha noção de nada, de nada mesmo. Aí, no ano passado, foi...
meu namorado me deu um note book, comecei a ter as aulas aqui, então eu tô mexendo lá...”.
João Batista, ao ser perguntado se acha que as aulas de Informática trouxeram algum impacto
na sua vida, responde “sem dúvida!” e que a “comunicação com as outras pessoas, é... ficou melhor
através dos e-mails” se recorda de um fato que reforça isso, diz que foi a melhora no “relacionamento
com família e pessoas”. Sobre sua experiência com o computador, antes e depois da escola, o entre-
vistado relata: “eu passei assim a aprender mais a como digitar um texto. Eu não tinha uma experi-
ência assim, né, é... digitava assim de forma diferente, porém melhorei [...] na parte de... comunicação
através de um bilhete também, né, melhorou muito.”
Letícia diz: “Foi na escola o primeiro contato. Eu não tinha computador. Eu comprei o computa-
dor, a partir do momento que eu entrei na escola e comecei a ter as primeiras aulas, daí eu comprei
o computador e comecei a me interessar por ele, né.” O uso e utilidade do computador que mais lhe
despertam o interesse são o e-mail e o site de relacionamento Orkut: “Eu desperto o interesse no
e-mail, porque eu recebo convite pro Orçamento Participativo, pra várias coisas pelo e-mail. E... tam-
bém recados de amigo, né... às vezes... outro dia... todo dia eu vou e olho. [...] Aí, depois vem o Orkut.
Tem muitos amigos que a gente faz.” Perguntei se ela achava que as aulas de Informática haviam
causado algum impacto na sua vida e ela disse:

“Acho. Social, nas mensagens, [...] a Internet ajuda muito,[...] eu posso mandar
convite para as pessoas, [...] procuro saber mais [...] das temáticas, [...] Eu pretendo
até comprar um note book pra tá levando para as reuniões, né, tá trazendo infor-
mação pro povo, né, é tudo gravado bonitinho. Então, quero aprender muito mais
ainda.”

Maria Candelária gosta de escrever poemas e já teve um texto seu publicado anos atrás em um
jornal de uma cidade do interior, onde vivia. Ela tem facilidade em decorar e declamar poesia nas
atividades coletivas da escola. Durante o mês de junho de 2011, ela compôs um poema inspirado
na poesia de Vinícius de Morais, estudado por sua turma. Na quadra da escola, perante os demais
educandos da EJA da escola, ela declamou de cor seu poema, além de outro de Vinícius de Morais.
Maria Candelária acha que a aula de Informática na escola lhe “ajuda bastante” a desenvolver o seu
interesse pela escrita, foi depois das aulas de Informática na escola que se sentiu mais estimulada e
encorajada a usar computador porque “começou a usar e perdeu o medo” e ressalta que melhorou
o uso “Até com celular, porque eu não também não tinha, assim, interesse. Tenho celular em casa,
mas não dou a mínima importância. Sei que é uma coisa útil [...] Aprendi também assim... outras coi-
sas, né? [...] É... tirar foto nele, né, que eu não sabia, né?”
Isso fez com que ela elevasse sua autoestima e se sentisse interessada. Recorda, com certa alegria
e autoestima elevada, ao falar sobre suas relações com as outras funcionárias da área administrativa
da empresa em que trabalha como auxiliar de serviços gerais e limpeza:

“que até lá mesmo no meu serviço. [...] eu não tenho... é... acesso no computador,
porque é só as meninas [...] no escritório, que tem, né? [...] É, eu trabalho fazendo... na
limpeza. [...] lá tem quatro computadores, né. Só que eu não tenho acesso. [...] Então,
eu não tenho aquela... aquela vergonha, né. Agora eu já tenho o que falar.”

Maria dos Anjos disse que “não sabia nem mexer no... no mouse” e diz que “Hoje eu uso meu
celular mais, para mandar uma mensagem, que eu não usava. Entendeu? E. Mesmo quando eu vejo
lá em casa, com esse negócio de trabalhar fora, então meu filho pra me ensinar [...] Hoje, não, eu sei

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
mandar uma mensagem, tudo eu mando.” . Ela fica satisfeita por não se sentir mais discriminada já
que agora isso mudou por “não sofrer com brincadeiras dos colegas o uso do computador e melho-
rou no uso do celular”, o que a faz se sentir incluída no grupo e fala sobre isso: “aquilo ali me ajuda
muito. Porque, como um encarna, um com o outro na... na fala. Ajuda bastante”.
Maria Helena, mesmo tendo um equipamento em casa, ela não usava antes e relata que “lá
em casa tem, mas nunca... mexi [...] agora já mexo”. É como um ritual, que acontece principalmente
com as mulheres mais velhas; nos primeiros contatos, normalmente elas apresentam certo receio e
preferem sentar-se em dupla, ficando mais na observação de algum colega mais experiente27; nas
aulas seguintes, começa a arriscar-se em dupla, vai perdendo o “medo” da máquina ou de estragar
algo, começa então a utilizá-la, dividindo o tempo e o mouse com outra pessoa mais experiente; o
passo seguinte é a busca pela autonomia, pois descobre que não danifica o equipamento ao usá-
-lo; começa, então, a usar a máquina individualmente, passa a escolher aquilo que quer, pede ajuda
em alguns momentos e arrisca-se em outros; depois dessa fase, passa a usar com mais autonomia, a
criar e a se integrar com a cibercultura, incluindo-se.
Maria Helena acha que passou a usar melhor o computador e outras tecnologias depois que teve
aulas de Informática na escola, “principalmente o celular”, inclusive comenta que “eu já posso me-
xer, pra ligar um computador [...] mexer com alguma coisa”, considera “que melhorou bastante, né,
porque também não sabia usar o celular [...] mal, mal eu sabia atender” ao telefone. Para explicar
melhor sobre essas duas TIC, ela fez uma relação entre o computador e o celular: “você pode ligar e
conversar com outras pessoas longe ou mesmo do lugar onde está. E o computador também. Você
pode fazer uma pesquisa, pode [...] Não sabia... [risos]... nem chegar perto [risos]... me dava uma tre-
medeira dele, sei lá...”.
Mônica considera que passou a usar melhor outras tecnologias depois que teve aulas de Informá-
tica na escola, “principalmente a câmera digital”, porque avalia que “é quase igual ao computador.”
E também se lembra que “Minhas primas que moram no Rio, eu não conversava com elas. Aí, agora,
através da Internet, eu converso com elas pelo MSN e pelo Orkut. Eu aprendi... na escola”. Perguntei
o que mais mudou, então ela comentou:

“agora eu sei... é... eu sei navegar na Internet, sei entrar em Orkut, eu sei fazer
pesquisa, se tem uma palavra que eu não... eu não sei o significado, às vezes eu não
acho no dicionário, eu vou na Internet, igual minha professora de cursinho outro dia
perguntou por que a avenida Afonso Pena tem esse nome. Eu tive que ir na Internet
procurar saber.”

Pedro comenta: “lá em casa não tem, tem computador [...] Lá no meu pai sempre teve. [...] eu fui
aprender, com o apoio, foi aqui mesmo”. Utiliza para “pesquisa, trabalho, mando e-mail, ver meus
e-mails [...] estudo para concurso. [...] Ah, eu sempre tô entrando em site de concurso, agora, né.
Sempre eu dou uma estudada pra ver algum concurso público, e tudo. Sempre quero fazer o da Pre-
feitura”. Em relação à escola, Pedro diz: “no Inglês, mesmo, eu sempre vou no Google, lá, prá mim ver
uma tradução”. Acha que passou a usar melhor outras tecnologias depois das aulas de Informática na
escola, como a “máquina digital, é... pen drive28, essas coisas, né. [...] Eu levo o pen drive no computa-
dor pra colocar música”, porque “depois que eu ponho a máquina digital e conecto no computador
e passo pro Orkut [...] eu nem imaginava que ia fazer isso”. Pedro considera que a aula de Informática
trouxe impacto em sua vida, “principalmente profissional”, e recorda:

27 Essa escolha fica opcional ao educando, o professor não o força em ficar só ou acompanhado.
28 O pen drive é um dispositivo de armazenamento de dados fácil de ser transportado, devido ao seu
pequeno tamanho, que pode ser conectado rapidamente como entrada ou saída de dados do computador e
retirado depois.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
“Porque antes tinha, né, dois níveis de pessoas, dois níveis de funcionários, lá:
aqueles que conseguem lidar com o computador, porque, né... precisa dentro da
empresa, e aqueles que não... não conseguem. Eu já tava naquela parte lá. Como eu
não tinha condição de pagar, né, um curso bom de computação e tudo, eu ficava por
ali mesmo. Mas depois que eu comecei a aula aqui, aí a coisa começou a evoluir e
eu já passei para a outra turma, entendeu? Eu já tô na parte [...] Eu cheguei a mudar
de função por isso. [...] Eu mexo com... com portaria. [...] Que hoje nada é na ponta
da caneta mais. Hoje é tudo no computador. Entra e sai, portaria, é tudo no com-
putador. Pelo menos o básico eu tenho que saber, porque senão você fica pra trás.
Entendeu? [...] É, consegui uma colocação melhor”

considerAções finAis
As tecnologias carregam consigo toda uma história e cumprem determinados objetivos, que
nem sempre promovem justiça social. Porém, as tecnologias podem ser de grande ajuda aos seres
humanos, pelas possibilidades que elas conseguem proporcionar, seja nas comunicações, na educa-
ção, na agricultura, na saúde, na vida urbana ou em tantas outras aplicações que facilitam e trazem
qualidade à vida de cada um.
Para se alcançar a inclusão digital, as políticas públicas prometem grandes avanços. O que se
espera é que as metas não fiquem somente nas promessas, no papel e na tela do computador e co-
mecem a passar do virtual para o real.
A escola carrega consigo a tradição que lhe é exigida. Ao mesmo tempo, lhe é cobrada que acom-
panhe as mudanças na sociedade. Encontrar o meio termo é o que se espera.
A informática na escola causa impactos positivos na vida educandos da EJA. Muitos passaram a
usar o computador a partir da escola, mesmo já tendo o equipamento em casa. Vários deles relata-
ram que, após terem tido contato com o computador na escola, através das aulas de Informática,
passaram a utilizar e dominar outras tecnologias, compraram computador ou outros equipamentos
digitais, como a máquina fotográfica e, principalmente, o celular, com recursos mais avançados. Eles
gostam de praticar em casa o que aprendem nas aulas de Informática da escola. O uso do compu-
tador os ajuda na busca da aprendizagem com mais autonomia e na sua socialização. A relação
interpessoal é muito presente, tanto no interesse pelos sites de relacionamento, quando pelas men-
sagens de celular e por meio de correio eletrônico.
A relação das TIC o trabalho é grande para o educando da EJA. O uso da informática na escola
da EJA pode trazer impactos positivos para eles no mundo do trabalho. Por serem jovens e adultos,
o mundo do trabalho faz parte do seu cotidiano, seja trabalhando ou à procura de uma colocação
para o seu sustento ou de sua família. Como as TIC conseguem trazer melhoras em suas condições
de trabalho, eles demonstram grande interesse no uso e no domínio dessas tecnologias. É quase
unânime a avaliação dos educandos entrevistados de que o uso dessas tecnologias poderá ajudá-
-los a conseguir um trabalho melhor. Um dos entrevistados revelou que fazia parte do “grupo que
não aprendia”, antes das aulas de Informática na escola e depois passou para o outro grupo, formado
pelos que “conseguem aprender” e, com isso, foi promovido em seu serviço e passou a ter melhores
condições de trabalho.
Outras vantagens que a informática traz à escola são as novas formas de se trabalhar com a alfa-
betização e o letramento. Observei que a possibilidade do alfabetizando utilizar o computador no
seu processo inicial de alfabetização traz muitos benefícios, por não exigir tanto dele a coordenação
motora fina para construir uma palavra ou um texto. O processo de busca pela imagem através da
internet também contribui no seu processo de letramento e propicia exercitar a sua oralidade sobre

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
determinados assuntos. Os educandos investigados falam que os usos do computador lhes ajudam
a escrever mais corretamente, citando as pontuações e as acentuações, o corretor ortográfico do
editor de texto, a correção sugerida pelos sites de busca e a procura online dos significados de uso
das palavras, como alternativa ao dicionário de papel.
Espero que essa investigação consiga trazer contribuições ao campo da Educação, ajude a com-
preender melhor a escola e a refletir como ela poderia colaborar na inclusão digital dos seus edu-
candos de EJA.

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tem?”. Rio de Janeiro: Editora Caetés, 2010, p. 75-90.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
o Uso dA tecnologiA AssistiVA nA AlfAbetizAção de
joVens e AdUltos com deficiênciA intelectUAl
robertA pires corrêA

A educação Inclusiva é atualmente um dos maiores desafios da sociedade. É um processo amplo,


no qual a escola precisa reestruturar o seu projeto político-pedagógico, suas práticas e organizações
internas para garantir condições estruturais, acessibilidade e materiais humanos qualificados. E,
desta maneira, promover condições democráticas de efetiva participação dos alunos com necessi-
dades educacionais especiais e, em particular, os alunos com deficiência intelectual. Este alunado
abrange um grupo muito heterogêneo de indivíduos, com diferentes níveis de comprometimento
e etilogias, e ao serem alfabetizados, apresentam um ritmo mais lento de aprendizagem em rela-
ção a seus pares, o que implica em uma distorção série-idade. A tecnologia assistiva como área de
conhecimento interdisciplinar, tem sido utilizada para melhorar a funcionalidade do indivíduo com
deficiência, criando condições para a aprendizagem dos alunos com necessidades educacionais es-
peciais. Na alfabetização de jovens e adultos com deficiência intelectual, a tecnologia assistiva, tem
se mostrado fundamental para aumentar as habilidades da leitura e da escrita, bem como a comu-
nicação com o mundo, proporcionando autonomia e qualidade de vida com inclusão social. O pre-
sente trabalho tem por objetivo discutir a importância da tecnologia assistiva para a alfabetização
de jovens e adultos com deficiência intelectual no contexto da educação inclusiva no Brasil.

palavras-chave: Tecnologia assistiva, alfabetização de jovens e adultos, educação in-


clusiva, deficiência intelectual

introdUção
A tecnologia assistiva tem sido utilizada como recurso de acessibilidade na inclusão de pessoas
com deficiência promovendo a participação nas atividades escolares e nas tarefas da vida diária. Se-
gundo o Comitê de Ajudas Técnicas da Coordenadoria Nacional da pessoa com deficiência (CORDE):

Tecnologia Assistiva é uma área do conhecimento, de característica interdiscipli-


nar, que engloba produtos, recursos, metodologias, estratégias, práticas e serviços
que objetivam promover a funcionalidade, relacionada à atividade e participação,
de pessoas com deficiência, incapacidades ou mobilidade reduzida, visando sua
autonomia, independência, qualidade de vida e inclusão social. (Comitê de Ajuda
Técnica, 2007)

A inclusão social é de responsabilidade da sociedade e no espaço escolar dos gestores e pro-


fessores que precisam garantir um ambiente inclusivo que eliminem as barreiras arquitetônicas e
atitudinais. Para que haja acesso, permanência e, mais importante, aprendizagem desses alunos,
a escola precisa adotar uma perspectiva de uma educação democrática, que esteja equipada com
os recursos pedagógicos específicos para atender às distintas necessidades especiais dos alunos e
tenha professores capacitados para lidar com as diferenças de aprendizagens. A Lei de Diretrizes
e Bases (LDB) prevê que os sistemas de ensino assegurarão currículos, métodos, técnicas, recur-
sos educativos e organização específicos, para atender às necessidades dos alunos com deficiência.
(BRASIL,1996)
As escolas inclusivas precisam oferecem a todos os alunos oportunidades educacionais adequa-

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
das e desafiadoras que lhes promovam efetiva escolarização com promoção acadêmica. A Decla-
ração de Salamanca (UNESCO, 1994) teve o objetivo de conscientizar os países de que existe a ne-
cessidade de se discutir e lançar ações que concretizem os princípios da educação inclusiva. Para
Mantoan (2008), a inclusão escolar é a capacidade de compreender e reconhecer o outro e, assim,
ter o privilégio de aceitar e conviver com pessoas diferentes, compartilhando experiências que pos-
sibilitem seu desenvolvimento social e educacional.
Na alfabetização de jovens e adultos com deficiência intelectual a tecnologia assistiva é uma fer-
ramenta que aumenta a funcionalidade desses indivíduos que, dependendo do comprometimento,
apresentam dificuldades na leitura e na escrita bem como na comunicação com o mundo. Dessa
maneira iremos discutir o uso da tecnologia assistiva como ferramenta na inclusão social de jovens e
adultos com deficiência intelectual. Entretanto, faz-se necessário compreender quem é o aluno com
deficiência intelectual e o papel da tecnologia assistiva.

A deficiênciA intelectUAl
A deficiência intelectual engloba em uma mesma categoria de analise um grupo heterogêneo
de indivíduos com distintos níveis de comprometimentos. A Política Nacional de Educação Especial
baseia-se na concepção adotada, pela até então Associação Americana de Deficiência Mental, que
atualmente passou a designar: American Association on Intellectual and Developmental Disabili-
ties- AAIDD, que, na tradução para o português significa, Associação Americana de Deficiências In-
telectual e de Desenvolvimento- AADID (SASSAKI, 2007). Segundo a Política Nacional de Educação
Especial a deficiência intelectual caracteriza-se:

Por registrar um funcionamento intelectual significativamente abaixo da média,


oriundo do período de desenvolvimento, concomitante com limitações associadas a
duas ou mais áreas da conduta adaptativa ou da capacidade do indivíduo em res-
ponder adequadamente às demandas da sociedade, nos seguintes aspectos: comu-
nicação, cuidados pessoais, habilidades sociais, desempenho na família e comuni-
dade, independência na locomoção, saúde e segurança, desempenho escolar, lazer
e trabalho. (BRASIL, 1994, p. 15)

Os alunos com deficiência intelectual apresentam dificuldades de aprendizagem por causa do


funcionamento intelectual limitado podendo estar associada a duas ou mais áreas da conduta adap-
tativa. O comportamento adaptativo é definido como o conjunto de habilidades conceituais, so-
ciais e práticas adquiridas pela pessoa para corresponder as demandas da vida diária. (LUCKASSON,
2002) Tais aspectos não podem ser negligenciados nas decisões acerca do planejamento escolar.
Por muito tempo a escolarização deste alunado foi negada porque os deficientes intelectuais eram
rotulados como incapazes e estereotipados com o mito da “eterna criança”, assim, as decisões edu-
cacionais e intervenções pedagógicas acerca das competências sociais eram postergadas em suas
propostas educacionais voltadas para este público educativo. (FERNANDES, 2010).
Este cenário vem mudando com um novo paradigma proposto pela American Association on In-
tellectual and Developmental Disabilities- AAIDD- Associação Americana de Deficiência Intelectual
que avalia os deficientes intelectuais de maneira multidimensional pois considera o ambiente, as
atitudes sociais e não somente o quociente intelectual. Entende que os fatores externos são deci-
sivos para o nível de funcionalidade e competências sociais dos deficientes intelectuais. Esse novo
olhar trouxe para o campo da educação a palavra de ordem que o deficiente intelectual é capaz de
aprender e suas limitações não são apenas de caraterísticas intrínsecas, mas o resultado de um de-
sajustamento entre as funcionalidades do indivíduo e as interações sociais estabelecidas (SANCHES
ET AL, 2012).

340
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
Segundo o Instituto Helena Antipoff (SME/IHA/RJ)29 a deficiência intelectual se manifesta:

Alunos com deficiência mental apresentam um padrão diferenciado de desen-


volvimento cognitivo, afetivo e motor; possuem uma diferença nos processos evo-
lutivos de personalidade; têm dificuldades na capacidade de aprender, na constitui-
ção de sua autonomia e nos processos de relação com o mundo, pois sua forma de
organização apresenta-se de maneira qualitativamente diferente de seus pares da
mesma idade, o que lhe faz peculiar em sua forma de perceber o estar no mundo.
(Apud MAGALÂES, 2000, p.3)

Embora consideremos que os deficientes intelectuais englobam um grupo muito heterogêneo


de indivíduos eles apresentam características que os especificam: apresentam um ritmo de apren-
dizagem mais lento do que seus pares da mesma faixa etária o que implica na interação social e no
tempo para a realização das atividades que deve ser maior. Apresenta capacidade limitada na for-
mação de conceitos, generalizações, abstração e memória. Atrasos no desenvolvimento psicomotor,
na percepção sensorial, linguagem e comunicação (GLAT, 2011). Contudo, as limitações que os de-
ficientes intelectuais apresentam não são, de maneiro nenhuma, um entrave na sua escolarização a
medida em que são expostos a um ambiente que lhes ofereçam os suportes necessários para o seu
desenvolvimento. A tecnologia assistiva aparece neste cenário como recurso utilizado na alfabeti-
zação de jovens e adultos com deficiência intelectual bem como na melhoria da qualidade de vida
e inclusão social.

A tecnologiA AssistiVA no contexto dA AlfAbetizAção de joVens e


AdUltos com deficiênciA intelectUAl
A aquisição da leitura e da escrita é o processo mais almejado pelas famílias dos alunos com
deficiência intelectual, sobretudo para os jovens e adultos. Sabemos que as limitações impostas
pela deficiência podem se tornar entraves para a escolarização. O acesso aos recursos oferecidos
pela escola é determinante para o desenvolvimento do indivíduo. Desenvolver recursos de aces-
sibilidade com a tecnologia assistiva, apresenta-se como forma concreta de minimizar as barreiras
causadas pela deficiência e inserir esse indivíduo em ambientes letrados, ricos para a aprendizagem
e desenvolvimento, proporcionados pela cultura. (GALVÃO FILHO e DAMASCENO, 2003)
A escola tem a herança do modelo médico que centra-se na patologia do aluno e não em suas
capacidades que são desenvolvidas a partir da interação entre o indivíduo e o meio social. Para os
jovens e adultos com deficiência intelectual que já apresentam uma disparidade série/idade em
virtude da deficiência, a aquisição da leitura e da escrita, bem como a formação de conceitos, mos-
tra-se prejudicada devido ao ensino ofertado nas escolas. Atividades elementares nas suas formas
tradicionais de preparação para a alfabetização com metodologias que privilegiam a repetição em
detrimento a construção de significados para o desenvolvimento das funções psicológicas superio-
res. Ide (1992) critica as formas tradicionais de ensino que consiste no treino mecânico de exercícios
gafro-motores descontextualizados. A memorização e o treino mecânico não possibilitam os usos
socais da linguagem. Dessa maneira, a escola acaba deixando o deficiente intelectual a mercê do
seu comprometimento orgânico.
SHIMAZAKI, MORI (1998); BOCHNET ET AL (2001), MONI; JOBBING (2001) apontam que os indi-
víduos jovens e adultos com deficiência intelectual, apesar do comprometimento orgânico apren-
deram a ler, mas não se apropriaram do uso social da linguagem, não internalizaram os conceitos.
Evidenciaram que o planejamento individualizado contribui para o aprendizado desse grupo.
A mediação da leitura e da escrita deve ser feita de maneira prospectiva à medida em que o aluno
29 Órgão da Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro responsável pela Educação Especial.

341
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
com deficiência intelectual for se apropriando do conhecimento. Daí a importância de planejar as
atividades para atender as necessidades educacionais de cada indivíduo que apresente deficiência
intelectual, pois embora tenham a mesma etiologia, necessitam de recursos e estratégias diferencia-
das. Pletsch nos atenta para o fato da “aprendizagem não ocorrer de maneira espontânea, mas sim
a partir da interação e do desenvolvimento de práticas curriculares planejadas e sistematizadas de
forma intencional”. (2010, p.187)
As intervenções planejadas são cruciais para a alfabetização. A aquisição da leitura e da es-
crita é construída numa parceria interativa entre professor/aluno, aluno/professor e aluno/aluno. Vi-
gotski (1998) e Freire (1985) ao analisarem este processo pontuaram a necessidade dessa construção
ser desenvolvida a partir da realidade vivida pelo educando, explorando-se suas leituras de mundo,
ou seja, do seu meio histórico-cultural. Para Vigotski (1996) da mesma maneira que aprende-se a
falar, aprende-se a ler e a escrever. A alfabetização deve possibilitar uma nova leitura de mundo
funcionando como ferramenta para o desenvolvimento cognitivo, assim como para a promoção e
inserção social.

A alfabetização é a principal tarefa capaz de trazer para si mesmo e para os ou-


tros, um novo significado: Possivelmente seja este o sentido mais exato da alfabeti-
zação: Aprender a escrever sua vida, como autor e como testemunha de sua história,
isto é, biografar-se, existenciar-se, historizar-se. (Freire, 2005)

A tecnologia assistiva é o instrumento que viabiliza a alfabetização dos jovens e adultos com defi-
ciência intelectual. Ela pode ser usada na sala de aula regular ou em salas multifuncionais no contra
-turno. É um recurso de acessibilidade que rompe com as barreiras atitudinais de preconceitos na
medida em que lhes são ofertadas condições de aprendizado e interação com seus pares deficientes
e não deficientes. O estigma da incapacidade vai se diluindo com a convivência e o preconceito vai
perdendo espaço para o respeito. A interação é importante para a construção da auto-estima do
aluno de EJA com deficiência intelectual que, historicamente, foi excluído e rotulado como incapaz.
A alfabetização viabiliza a sua autonomia para com o mundo.
A construção da linguagem e a aquisição da escrita passa por diversos estágios de desenvolvi-
mento até chegar em seu uso social nos diferentes contextos. Ide (1990, p.43)
discute essa construção da linguagem em um trabalho realizado junto a crianças com deficiência
intelectual e observou que:

Na construção da linguagem aceita-se os diversos modos pelos quais os alunos


tentam exprimir suas ideias. Considera-se inclusive, a forma pelas quais os indivídu-
os demostram estar elaborando um sistema próprio de regras de linguagem. Hipó-
teses sadias de construção do sistema da escrita.

Inicialmente o aluno constrói diversas hipóteses da escrita que inicia com o desenho em um es-
tágio em que a linguagem falada já avançou (LURIA, 1994a). É pelo simbolismo e pela interação
que o indivíduo formula seu pensamento até que os desenhos vão se tornando escrita. O uso da
tecnologia assistiva também trabalha com o simbólico na medida em que utiliza desde jogos, como
recursos de alfabetização, até softwares que trabalham com recursos de imagem no auxílio da cons-
trução da escrita.
O software para a alfabetização e comunicação alternativa de jovens e adultos com deficiência
intelectual desenvolvido pela Universidade de Brasília (UNB), o projeto Participar 30 é pioneiro e ino-
30 http://www.projetoparticipar.unb.br/images/material/descricao_do_Software_Participar.
pdf

342
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
vador no Brasil, no campo de alfabetização social, inclusão digital e cidadania, já que o foco é neste
público-alvo. Utiliza a tecnologia da informação (TIC) é o principal recurso da tecnologia assistiva
aplicada a escolarização dos alunos com deficiência intelectual.

A importância que assumem essas tecnologias no âmbito da Educação Especial


já vem sendo destacada como a parte da educação que mais está e estará sendo
afetada pelos avanços e aplicações que vêm ocorrendo nessa área para atender ne-
cessidades específicas, face às limitações de pessoas no âmbito mental, físico-senso-
rial e motoras com repercussão nas dimensões sócio-afetivas. (SANTAROSA, 1997)

A tecnologias assistiva apresenta-se assim nas mais variadas formas, ajudando seus usuários até
mesmo em construção de textos, facilitando a “codificação do sonoro para a escrita, leitura e com-
preensão”, bem como variados recursos para as
pessoas que apresentam dificuldades com a es-
crita. (RASKIND & STANBERRY, 2001). Para o públi-
co de jovens e adultos com deficiência intelectual
estes recursos permitem, historicizar-se, na medi-
da em que são alfabetizados eles vão se tornando
autores da sua própria história.
Assim, a visão prospectiva sobre a alfabeti-
zação e letramento do aluno especial em EJA é,
segundo Vygotsky (1989), indispensável. É preci-
so criar alternativas pedagógicas para descobrir
possibilidades. Para Vigotski, as crianças defi-
cientes, quando deixadas por sua própria conta,
nunca desenvolverão as funções psicológicas
superiores. Neste sentido, a escola deve - buscar
adequar-se às disposições sugeridas para uma
escola inclusiva pontuada na Declaração de Sala-
manca e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação - para escolarizar estes jovens e adultos com defi-
ciência intelectual de modo que se apropriam da leitura e da escrita em seus usos sociais da língua.

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344
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
os diVersos Ambientes de AlfAbetizAção do cidAdão
notA dez: espAços de (im) permAnênciA
cláUdiA reginA dos Anjos | chrisley soAres felix
AnAlise de jesUs dA silVA

Este artigo configura-se numa reflexão a partir da atuação de uma equipe que assessorou o Pro-
grama Cidadão Nota Dez, pela Universidade Federal de Minas Gerais, especificamente as autoras
deste, com o olhar particular aos ambientes alfabetizadores do Programa Brasil Alfabetizado, em ci-
dades do estado de Minas Gerais/Brasil, evidenciando o norte e nordeste do referido Estado, abran-
gendo o Norte de Minas, Vale do Jequitinhonha e Vale do Mucuri. Considerando que A Alfabetização
de Jovens e Adultos do Programa Brasil Alfabetizado tem como objetivo, entre vários, atender os su-
jeitos próximo de sua casa/residência. Isso porque são trabalhadores, pais, mães, avôs, avós, enfim,
todos aqueles que não puderam concluir seus estudos nas idades indicadas pela atual legislação.
Para efetivação do direito a escolarização, o Programa se desenvolve em diversos espaços da cidade
com associações comunitárias, escolas infantis, igrejas, galpões de fazendas, quartos de despejos
das casas etc. O objetivo da assessoria foi promover a formação e acompanhamento dos articu-
lares, coordenadores e educadores, viabilizando e subsidiando sua condição para o trabalho com
os alfabetizandos. A abordagem metodológica foi socioculturalista, em especial, a freireana, para a
realização de uma alfabetização libertadora e dialógica, a partir das culturas dos sujeitos/alunos. Os
resultados foram sistematizados em cada acompanhamento em formato de relatório.

palavras-chave: EJA, Ambientes Alfabetizadores, Direito a escolarização

O presente texto apresentará além de alguns dados, os diversos ambientes de alfabetização do


Programa Cidadão Nota Dez/CDN31. Este, era um programa do Governo de Minas Gerais em parceria
com os governos federal e com prefeituras, sendo o primeiro responsável por subsidiar essa ação,
direcionada pelo Programa Brasil Alfabetizado (PBA). O mesmo acontecia nos municípios por meio
de parcerias com o Ministério da Educação/MEC, com o financiamento do Fundo Nacional Desen-
volvimento da Educação/FNDE. Ele tinha como princípio a alfabetização de jovens e adultos que
não concluíram o ensino fundamental por razões diversas. Em Minas Gerais, o governo estadual
aderiu ao PBA por meio da Secretaria de Estado Extraordinária para o Desenvolvimento dos Vales
do Jequitinhonha e do Mucuri, e do Norte de Minas (Sedvan) e do Instituto de Desenvolvimento do
Norte e Nordeste de Minas Gerais (Idene).
Em 2009, o Núcleo de Educação de Jovens e adultos/NEJA, da Faculdade de Educação/FAE, da
Universidade federal de Minas Gerais/UFMG que, entre várias ações, tem o Fórum Metropolitano
e Mineiro de Educação de Jovens e Adultos, foi convidado, por meio da professora Dra. Analise da
Silva, uma das autoras deste texto, a coordenar a formação dos educadores e formadores do CDN.
O CND teve, dentre suas diversas características, a peculiaridade de funcionar em espaços diversi-
ficados. Para além dos muros escolares, era comum, classes funcionarem em igrejas, salas, cozinhas
e varandas de casas, espaços abertos como os quilombos e aldeias indígenas, associações comuni-
tárias, dentre outros. Havia ainda aquelas que, por algum motivo, funcionavam em espaços improvi-
sados, por exemplo, na cidade de Buritizeiro/MG onde uma das turmas, inicialmente, funcionava em
um salão de uma igreja evangélica e, por motivo de reforma, passou a funcionar em seu pátio lateral,
inclusive, sem proteção dos fenômenos da natureza.

31 O CND encerrou suas atividades no final de 2009 e passou a ser oferecido, nos mesmos moldes,
com outro nome: Programa “Travessia Nota Dez”.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
Esse espaço funcionava no segundo pavimento e percebia a preocupação do responsável pelo
espaço em melhorar as condições a fim de favorecer o processo ensino aprendizagem, entretanto as
necessidades ainda são muitas.
Neste texto, são apresentados alguns aspectos que
nos fazem refletir sobre a importância desses espaços,
e de que forma eles contribuem para a permanência ou
evasão dos educandos. Como o depoimento da educa-
dora Marinês nos indica, o ambiente alfabetizador não
é somente o espaço físico é, também, por exemplo, um
espaço de acessibilidade. Tal concepção de ambiente
alfabetizador vai ao encontro da concepção apresen-
tada por Ferronatto (2005), que afirma que

o ambiente alfabetizador vai além


de um único ambiente (sala de aula) e
além da concepção física do ambiente,
ou seja, refere-se também às interações
físicas e sociais que o sujeito desenca-
deia ao estar nele inserido (FERRONATO,
2005, p 72).

Sendo assim, o educador assume a responsabilidade de mediar essas relações e interações. Du-
rante o trabalho de visita aos lugares onde o CDN acontece nos deparamos com situações variadas,
que demandavam versatilidade e preparação para ajudar nas dificuldades. Dentre essas, a que mais
nos chamou a atenção foi a diversidade de espaços e suas característica peculiares. É importante
destacar que nesse Programa o responsável por buscar o espaço é o educador, que nem sempre,
conta com a ajuda do poder público local; por isso, a variedade de espaços e de condições de tra-
balho.
Em Taiobeiras/MG, por exemplo, na comunidade do lajeado, há uma sala que funcionava no sa-
lão comunitário, que é habitada por famílias parentas ou pessoas não-parentes. Sendo que só era
permitido ao segundo grupo fazer parte e morar na comunidade após o cumprimento das regras e
a decisão de assembleia.
Esse salão era da Associação Comunitária do Lajeado e funcionava como lugar das orações, do
sagrado, e, também, escola e festejos. Nesse ambiente da sala de aula a educadora e os educandos
conviviam diariamente com os objetos e símbolos de suas culturas e crenças religiosas. Nesse sen-
tido, percebia-se que o ambiente favorecia um entrelaçamento de conhecimentos e manifestações
culturais. A escola junto à igreja, às regras, estruturação e resistência da comunidade, junto aos fes-
tejos, momentos de encontros, a sala de visita, portanto, um ambiente plural.
Esse espaço era marcado pelo conservadorismo. Havia ainda o uso do lampião para iluminar o
espaço, uma vez que a comunidade não possuía energia elétrica.
Em depoimento, o líder comunitário disse que a comunidade não aceita favores de políticos, sen-
do favoráveis e engajados em lutas por políticas públicas de direito. Não aceitavam, por exemplo,
que nas campanhas eleitorais políticos usassem as faltas existentes na comunidade como bandeira
“politiqueira”, uma vez que a luta para eles era algo constante, presente não apenas em momentos
específicos e de interesses pessoais.
O líder enfatizava ainda que tudo que a comunidade tinha e almejava seria conquistado por meio
de luta coletiva. Esses fatores contribuíam para a permanência dos educandos na saca de aula, além

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
da possibilidade de construir outros conhecimentos a partir do lugar que ocupavam e da luta que
travavam coletivamente.
Segundo a educadora essa turma era bastante participativa e assídua, pois só faltavam quando
estavam doentes, nem mesmo em dias de trabalho pesado.

Pudemos perceber que entre objetos do sagrado, bancos de madeira a mesa improvisada para o
educando apoiar seu material, havia também, materiais de alfabetização expostos nas paredes. No
mesmo espaço onde se reuniam para rezar, também, reuniam-se para construir e sistematizar os
conhecimentos, especialmente, na leitura e escrita. Por ser local de convívio social e religioso, na
comunidade em que moravam, portanto, próximo de suas moradias, o ambiente contribuiu de for-
ma significativa em suas aprendizagens, porque, entre vários, são ambientes onde se sentiam mais
seguros e pertencentes. Estes foram fatores preponderantes no processo de construção do conhe-
cimento, sobretudo, para sujeitos que, simbolicamente, sentem que escola não é seu lugar.
Dessa forma, constituir um ambiente em que simboliza as culturas, manifestações, apresenta-
ções, representações e crenças dos educandos é, no mínimo, fundamental para que esses sintam
sujeitos da construção de seu conhecimento. Pois, o ambiente plural permite ao sujeito a apropria-
ção de suas culturas por meio de reconhecimento de suas diferenças e suas igualdades. Embora o
ambiente seja por si educador, ele pode ser potencializado por meio da reflexão e do diálogo. Essa
concepção nos possibilita a entender o ambiente alfabetizador como uma construção contínua das
relações e entrelaçamentos de culturas.
Outro exemplo dessa pluralidade é a turma do CND da cidade
de Santo Antonio do Jacinto/MG que funcionava em uma igreja
católica. Segundo a educadora a turma era frequente. Embora
sejam espaços, aparentemente, não apropriados para a escolari-
zação, especialmente a alfabetização de jovens e adultos, este, a
partir da dimensionalidade, passa a compor o processo de apren-
dizagem. Ressaltamos que, ao falarmos de espaço apropriado, es-
tamos nos referindo aos modelos das escolas da cidade em que
tem salas somente para aulas, banheiros, cantina etc.
Na sequência da apresentação dessa diversidade dentro dos
espaços de funcionamento das turmas CND, apresentamos tam-
bém, a sala de aula de uma comunidade indígena na cidade de
Januária/MG como outro exemplo de possíveis intrelaçamentos

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
de contextos de sala de aula.
Segundo Fonseca (2002) esses sujeitos da EJA apostam na escolarização como uma ação de cui-
dado consigo mesmos, como um direito a um investimento pessoal adiado pelas condições adver-
sas em suas vidas (trabalho infantil, casamentos, não acesso à es-
cola, cuidado com os filhos e até proibição de estudar por ser
mulher). Por isso, destacamos a importância do espaço apropria-
do à aprendizagem e à troca de experiências. Apropriado no sen-
tido de se sentirem seguros e pertencentes ao ambiente.
Oliveira (1999) apresenta os jovens e adultos da EJA como um
grupo de pessoas com a sua origem e modo de vida comuns, pro-
venientes de áreas rurais empobrecidas, filhos de trabalhadores
rurais não qualificados, com baixo nível de instrução escolar. Se
levarmos em consideração que grande parte desses sujeitos são
trabalhadores, que chegam à “sala de aula” após um dia cansativo
de trabalho, faz-se importante um ambiente acolhedor e que lhes
dêem condições mínimas de conforto e bem estar.
Entretanto, o que nosso trabalho permitiu perceber foi que
grande parte das turmas do CND se localizavam em espaços não propícios, sem condições mínimas
de infraestrutura. Muitas turmas funcionavam com educandos sentados em caixotes, escrevendo
com o caderno apoiado nas pernas, o professor improvisando cartolinas ou escrevendo de caderno
em caderno, a fim de suprir a falta do quadro, além da pouca claridade, que dificulta a leitura para
muitos. Segundo Ezpeleta & Rockwell (1986) a realidade escolar aparece mediada, no cotidiano, pela
apropriação, elaboração, reelaboração ou repulsa expressas pelos sujeitos sociais.
Temos clareza que na educação de jovens e adultos o ambiente não significa fator único para a
permanência dos sujeitos educandos, entretanto, exerce grande influência na motivação dos sujei-
tos. Ou seja, garantir a presença concreta de jovens e adultos na escola não significa simplesmente
oferecer uma estrutura igual à estrutura pensada para o ensino de crianças (salas de aula, grade cur-
ricular, horários de aulas, professores, material didático). O planejamento das aulas deve ser ancora-
do em situações que façam da aula prazerosa e significativa, que aproxime o educando ao objeto de
estudo. Por isso, o ambiente alfabetizador não é somente o espaço físico, implica na organização e
planejamento do espaço. É um espaço construído nas inter-relações com o outro, com o lugar que
habita, com o contexto em que se está inserido, com as culturas etc.
Encontramos em uma comunidade rural em Rio Pardo de Minas, um espaço físico que comporta-
va aproximadamente trinta pessoas, mas tinha em maio de 2010, doze freqüentes. O espaço era
bem ventilado e iluminado, possuía imobiliário mais
aproximado para o jovem e adulto. Funcionava somente
a turma do CND à noite, podemos considerar que é um
espaço exclusivo para a turma de alfabetização de jovens
e adultos. Porém, a organização da turma ainda era de
uma cadeira atrás da outra, impossibilitando aos educan-
dos uma relação mais direta, próxima e, sobretudo, mais
aconchegante com o outro. Essa proximidade poderá
acontecer se potencializada pela organização espacial,
ou seja, se a organização for em roda.
A organização em roda é bem adequada em educação
de jovens e adultos, primeiro porque todos se enxergam,
segundo, a o movimento de troca é circular, menos hie-
rárquico. Por isso, as rodas de culturas criadas por Paulo

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
Freire. Segundo Trindade,

com o círculo, o começo e o fim se imbricam, as hierarquias, em algumas dimen-


sões, podem circular ou mudar de lugar, a energia transita num circulo de poder e
saber que não se fecha nem se cristaliza, mas gira, circula, transfere-se (...) (Cadernos
de Textos: A cor da Cultura, p 32).

Nesse sentido, é preciso que o educador tenha clareza dos objetivos e das intencionalidades para
que possa promover em sala de aula um ambiente de fato alfabetizador. Outra questão é o diálogo
promovido em um ambiente alfabetizador, sem a troca do que pensam e o que sabem, os educan-
dos aprendem pouco. É nesse diálogo que uns conhecem os outros, sobretudo o educador, que
identifica o que sabem e precisam refletir e construir (MEC, 2006-a).
Seria importante também é organizar um ambiente informador, pois quanto mais informações os
educandos tiverem, melhor refletirão. Dessa forma,

ampliar estes horizontes deve ser preocupação dos educadores de EJA. Um cami-
nho para isto é aproveitar o espaço da sala de aula para comentar os assuntos dos
educandos e o que se passa no país e no mundo. Para isso é preciso trazer notícias,
discussões, comentários e informações para a sala de aula, mas tudo com a parti-
cipação dos educados para criar um ambiente de geração de conhecimento (MEC,
2006, p 48-b).

Esse ambiente provavelmente será mais dinâmico, portanto mais próximo do educando. Outras
maneiras também de se efetivar um ambiente alfabetizador, entre outras, registros de atividades
expostas nos painéis da sala (parede) de forma equilibrada e com letras legíveis, de preferência caixa
alta.
O Parecer CNE/CEB 11/2000, salienta que a EJA deve ter uma função reparadora, que oportunize
concretamente

(...) a presença de jovens e adultos na escola é uma alternativa viável em função


das especificidades sócio-culturais destes segmentos para os quais se espera uma
efetiva atuação das políticas sociais. (CNE/CEB, 2000, p.07)

Nossa experiência permitiu-nos perceber que as turmas que funcionam em escolas ou espaços
com claridade, carteiras e quadro negro, eram as turmas com maior número de educando. Já as tur-
mas que funcionavam em espaços alternativos que apresentavam poucas condições de trabalho e
estudo, eram exatamente as que os educadores mais sofriam com a evasão. Presenciamos turmas
funcionando em salas de aulas de escolas em que o ambiente é estruturado apenas para as crianças.
Os educadores, se quer, podiam fixar o alfabeto nas paredes ou as cadeiras e mesas não são apro-
priadas para adultos. Como foi o caso de três turmas na cidade de Taiobeiras/MG que funcionam
em uma escola infantil. Ao problematizarmos com a coordenadora do município e, posteriormente,
com uma das três educadoras que trabalhavam neste espaço, reconheciam a inadequação do mobi-
liário, mas que isso não era motivo pela baixa freqüência porque as educandas não importavam por
ficarem apenas duas horas sentadas. Diante disso, indagamos: será que esses educandos de fato não
se importavam em sentir dores na coluna por causa das mesas e cadeiras baixas?
Muitas vezes a sala é ornamentada com pinturas estereotipadas, que além de não acrescentar
ainda limita a possibilidade imagética do educando, e muitas também apresentam cunho religioso,

349
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
embora a escola pública deva ser laica. Como podemos verificar na sala em que funciona uma turma
do CND em Várzea da Palma/MG.
O que percebemos é uma contradição entre políticas que visam dar oportunidade a esses sujei-
tos antes marginalizados, excluídos e que, ao mesmo tempo e contraditoriamente, investem pouco
(ou nada) em condições de permanência desses sujeitos nos espaços escolares. Ou seja, cria-se a
política para trazer esses sujeitos aos estudos e, ao mesmo tempo, não se investe em condições de
permanência.
Criar projetos que estimulem a formação desses jovens
e adultos que não tiveram acesso na infância à educação
escolarizada se apresenta como fundamental para ga-
rantir os direitos daqueles que por muito tempo ficaram
marginalizados, à mercê de sua própria sorte. Por isso, re-
conhecemos a importância de projetos como o CND, mas
chamamos a atenção para o fato de que é necessário ga-
rantir uma educação de qualidade. E para tal, são neces-
sárias ações que visem à inclusão desses sujeitos no uni-
verso escolar. Entendemos a EJA como uma modalidade
de ensino que deve ser diferenciada em função do perfil
do público que atende, entretanto, esse diferencial deve
estar presente nas práticas educativas. Os espaços devem
garantir o mínimo de qualidade (tanto para educandos
quanto para educadores), a fim de que os mesmos sintam
sujeitos desse espaço e desfrutem dos conhecimentos
que a educação pode oferecer.

referênciAs
BRASIL, Ministério da Educação. Avaliação e planejamento. Brasília: MEC, 2006. (Coleção Trabalhan-
do com a Educação de Jovens e Adultos)-a.
BRASIL, Ministério da Educação. O processo de aprendizagem dos alunos e professores. Brasília:
MEC, 2006. (Coleção Trabalhando com a Educação de Jovens e Adultos)-b.
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cionais para a Educação de Jovens e Adultos. Brasília:CNE, Parecer 11/2000.
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lar. Tradução de Guacira Lopes Louro. Porto alegre: Artes Médicas, 1993.
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350
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
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TRINDADE, Azoilda Loretto. In: Cadernos de Textos: A cor da Cultura, p 32.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
projeto leitUrA nA prAçA
nilzA ferreirA dA silVA | mAriA do socorro mAiA rUfino

O Projeto Leitura na Praça é um trabalho desenvolvido desde 2003 pelos centros educacionais do
Projeto Sesc Ler nos Municípios de Iracema, Rorainópolis e São João da Baliza no estado de Rorai-
ma, com a parceria de diversas Instituições tendo como propósito incentivar e sensibilizar crianças,
jovens adultos e idosos acerca da importância do gosto pela leitura visando a formação de leitores,
contribuindo para o estabelecimento de elo entre escola e comunidade. A proposta desse projeto
é de que os alunos jovens e adultos sejam os mediadores desse processo de formação de leitores.
Um dos principais objetivos é de despertar, incentivar e valorizar nos alunos da EJA a participação
na realização de diversas atividades de leitura com a comunidade. O trabalho é desenvolvido se-
mestralmente com o envolvimento de toda a comunidade escolar em que uma mostra do acervo
da biblioteca da Instituição, com variedades de títulos e temas, é deslocada para a praça principal
dos municípios com atividades diversas como: rodas de leitura, dramatizações, inscrições para em-
préstimos de livros na biblioteca da escola. Uma das referências dessa proposta está respaldada em
Freire (1998) quando ressaltou a importância de ler, manusear, descobrir o contexto de cada livro
e não deixá-los armazenados e empoeirados nas bibliotecas. Com a execução desse projeto temos
como retorno, um público mais frequente à biblioteca, o aumento no atendimento e procura por
consultas e empréstimos, sabendo-se que antes a mesma atendia apenas os estudantes da escola.
Contamos com um grande aumento no público acadêmico, devido à carência no município por bi-
blioteca pública, e obras acadêmicas para trabalhos científicos. Um fator que também contribuiu, foi
o interesse dos estudantes da própria escola aos empréstimos de livros e participação nas atividades
de leitura.

palavras-chave: Formação de leitores, Mediadores, Integração escola e comunidade

introdUção
Quando pensamos em desenvolver um projeto, procuramos antes de tudo descobrir o público
alvo, os objetivos que buscamos através desse trabalho e acima de tudo manter a persistência e
inovação, sabendo que a cada execução a mudança e a criatividade são essenciais na melhoria e
envolvimento dos vários públicos que buscamos.
O Projeto Leitura na Praça é um trabalho desenvolvido desde 2003 pelos Centros Educacionais
do Projeto Sesc Ler nos Municípios de Iracema, Rorainópolis e São João da Baliza no estado de Rorai-
ma, com a parceria de diversas instituições tendo como propósito incentivar e sensibilizar crianças,
jovens, adultos e idosos acerca da importância do gosto pela leitura visando à formação de leitores,
contribuindo para o estabelecimento de elo entre escola e comunidade. A proposta desse projeto
é que os alunos jovens e adultos sejam os mediadores desse processo de formação de leitores. Um
dos principais objetivos é de despertar, incentivar e valorizar nos alunos da EJA a participação na
realização de diversas atividades de leitura com a comunidade.
O trabalho é desenvolvido semestralmente com o envolvimento de toda a comunidade escolar
em que uma mostra do acervo da biblioteca da Instituição, com variedades de títulos e temas, é
deslocada para a praça principal dos municípios com atividades diversas como: rodas de leitura,
dramatizações, inscrições para empréstimos de livros na biblioteca da escola.
Uma das referências dessa proposta está respaldada em Freire (1998) quando ressaltou a impor-
tância de ler, manusear, descobrir o contexto de cada livro e não deixá-los armazenados e empoei-
rados nas bibliotecas.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
Com a execução desse projeto, temos como retorno um público mais frequente na biblioteca, o
atendimento e a procura por consultas e empréstimos aumentaram significativamente, sabendo
que antes a mesma atendia apenas os estudantes da escola, percebemos também que através da
divulgação em meios de comunicação o projeto torna-se uma opção para as famílias e assim, uma
oportunidade para incentivar o gosto pela leitura, assim como também a cada exposição o aumento
do público, até mesmo pelas crianças, que ao sair das escolas gostam de apreciar as rodas de leitura,
histórias infantis e os livros.
Contamos com um grande aumento no público acadêmico, devido à carência no município por
biblioteca pública, e obras acadêmicas para trabalhos científicos. Outro retorno positivo desse pro-
jeto foi o interesse dos estudantes dos centros educacionais ao empréstimo de livros e participação
nas atividades de leitura.
Os municípios onde o projeto se realiza não possuem bibliotecas públicas. Pensando nesses pro-
blemas que os municípios enfrentam com relação a essa situação é que percebemos o quanto esse
projeto seria bem aceito pela comunidade, buscando através dele, parcerias das escolas públicas
que inovariam com a melhoria para o hábito da leitura com os estudantes.
No dia da ação, levamos convites e cartazes para as escolas, buscando envolver o público estu-
dantil, também no intuito de que os professores da rede municipal e estadual realizem uma ativi-
dade diferenciada com os estudantes, no entanto alguns não veem o projeto com esses olhos, mas
os próprios alunos, ao saírem das escolas, param encantados com a exposição dos livros e isso se
torna algumas vezes até mais satisfatório para o desenvolvimento do projeto, pois percebemos que
a comunidade realmente aceita a proposta da leitura.

Os livros que em nossa vida entraram, são como a radiação de um corpo negro,
apontando pra expansão do Universo, porque a frase, o conceito, o enredo, o verso
(e, sem dúvida, sobretudo o verso) é o que pode lançar mundos no mundo. (Almeida,
2009)

Para a comunidade, sempre colocamos anúncios na rádio da cidade, carro de som e cartazes
nos pontos comerciais, algumas vezes a chuva chega a atrapalhar, pois a praça ondee realizamos o
projeto não tem espaço coberto e imprevistos sempre acontecem há todo momento em tudo que
fazemos. O que não podemos é desistir.
Dentre as atividades que realizamos, as histórias com fantoche são um grande atrativo para as
crianças, contamos também com dinâmicas, em que, no final, sorteamos pirulitos e picolés. É uma
festa, tanto para nós que conseguimos envolver os visitantes presentes como para eles que se di-
vertem e ao mesmo tempo se apaixonam pelo mundo da leitura que sabemos é uma viagem mara-
vilhosa onde muitos se recusam embarcar.“Ler significa aproximar-se de algo que acaba de ganhar
existência.” (Calvino, p. 39).
A cada execução do projeto, percebemos que nosso atendimento melhora, em especial na biblio-
teca, onde muitos apesar da cidade ser pequena não sabem que dispomos de um acervo com mais
de três mil títulos, que é aberto ao público, e não é por falta de divulgação. Percebemos que a huma-
nidade está a cada vez mais envolvida com as tecnologias, não se atentando para os livros. O hábito
da leitura hoje em dia torna-se um grande privilégio para quem tem, sabendo que são poucos que
se interessam pelo mundo da leitura.

Ler em voz alta, ler em silêncio, ser capaz de carregar na mente bibliotecas íntimas
de palavras lembradas são aptidões espantosas que adquirimos por meios incertos.
(Manguel, 2009)

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
O Projeto Leitura na Praça proporciona a muitas pessoas dos municípios onde é executado pegar
e ver de perto pela primeira vez um livro, uma criança ficar encantada ao folhear um livro infantil,
observando as figuras como se estivesse embarcando em um conto de fadas, um adulto que por
não saber ler nunca teve o interesse de folhear um livro nem mesmo para observar as ilustrações, ao
se deparar com uma biblioteca em plena praça pública a disposição, e possibilitando que todos que
passem possam pegar e até mesmo emprestar um livro por uns dias, nos deixa plenamente satisfei-
tos em saber que tanta dedicação é reconhecida por quem tem o desejo de mergulhar no mundo
encantado da leitura.

fUndAmentAção teóricA
A leitura, além de uma exigência da sociedade moderna, é uma das maiores necessidades dentro
do desenvolvimento cognitivo do ser humano, pois abre caminhos para novos pensamentos, novas
ideias e com isso o desenvolvimento cultural e social da humanidade. “[...] A leitura do mundo pre-
cede a leitura da palavra, daí que a posterior leitura desta não possa prescindir da continuidade da
leitura daquele”. (Freire).
Na escola, a leitura deve ser tomada como uma prioridade, com incentivos, algo prazeroso e não
como imposição para o aprendizado. Diante de tantas tecnologias percebemos que o hábito pela
leitura a cada dia diminui, jovens e crianças optam por histórias mais fáceis de visualizar como nas
telas de um computador ou televisão, devido às famílias viverem em uma correria do dia a dia, torna-
-se incontrolável para alguns pais criar em seus filhos o hábito pela leitura e não pela tecnologia.
Para isso, necessitamos que a escola priorize a leitura, que não deve ser vista como inacessível, é
necessário oferecer diversos tipos de textos literários como crônicas, contos, humor, fotonovelas,
histórias em quadrinhos, dentre outros. “(…) a disponibilidade de livros, representa um papel deci-
sivo no despertar do interesse pela leitura”. (BAMBERGER, 2000, p.50).
O educador deve ter a função de orientar o aluno a uma boa leitura, o acesso à biblioteca, a faci-
lidade em manusear um livro, uma escolha pela obra, deixando-o crescer sozinho, realizar leituras
individuais, fazendo com que o mesmo perceba que ao lê, conseguirá refletir e ter novas ideias.“a
leitura é um dos meios mais eficazes de desenvolvimento sistemático da linguagem e da personali-
dade” (BAMBERGER, 2000, p.10).
O desenvolvimento de um bom leitor dá-se em boa parte na escola, no entanto sabemos que, se
uma criança cresce em um ambiente onde esteja presente o gosto pela leitura, tende a ser um bom
leitor no futuro, principalmente se tiver o incentivo da família, com certeza seu interesseserá bem
maior do que de uma criança que não tem acesso a nenhum tipo de portadores de texto. Esse incen-
tivo fará com que o mesmo veja o quanto é fundamental a leitura na vida das pessoas.

Fui alfabetizado no chão do quintal de minha casa, à sombra das mangueiras,


com palavras do meu mundo e não do mundo maior, dos meus pais. O chão foi o
meu quadro-negro; gravetos, o meu giz. (FREIRE, 2001, p.15). 

O aprendizado através da leitura não se dá apenas dentro de uma escola, com móveis bonitos e
estrutura boa, e sim, com um bom incentivador pela leitura. Isso quer dizer que não adianta uma
criança ter em seu convívio, uma estrutura de vida boa, com muitos brinquedos, aparelhos tecnoló-
gicos se não tem um incentivo a leitura, a convivência com pessoas que pratiquem a leitura, ou até
mesmo ganhar livros, revistas em quadrinhos entre outros incentivos para que adquira o hábito de
ler.
A prática da leitura é um habito que deveríamos ter desde pequenos, pois desenvolve gestos e
habilidades, sabendo que a leitura é primordial para a formação intelectual do individuo, ouvindo
histórias, crianças e adultos podem apresentar reações, manifestar interesses revelados ou incons-

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
cientes e até amenizar tensões e ansiedades. “Não se ensina a gostar de ler por decreto, ou por im-
posição, nem se forma letrados por meio de exercícios de leitura e gramática (...)”. (Carvalho, 2014,
p. 67). No entanto, necessitamos do incentivo a leitura para que através da prática possamos gostar
de ler.
A leitura nos mostra caminhos, nos faz viajar por lugares que jamais imaginamos, e por estarmos
em um país onde é castigado pelo analfabetismo o incentivo a leitura é algo acolhedor significativo
para sociedade. Para isso não devemos esperar apenas que as escolas mostrem a importância da
leitura para formadores de opiniões, para odesenvolvimento de aprendizagem e sim nós pais e res-
ponsáveis devemos envolver, mostrar a leitura como melhoria de nossos hábitos e continuação de
nosso aprendizado.

considerAções finAis
Ao longo desses 11 anos desenvolvendo esse projeto nos municípios onde o Sesc atua com a
Educação de Jovens e Adultos, muito se contribuiu para o incentivo ao hábito da leitura, não somen-
te entre os educandos de EJA, mas principalmente entre a comunidade estudantil e acadêmica que
pode frequentar nossas bibliotecas e ampliar seus conhecimentos com pesquisas e leituras diversas.
É um trabalho gratificante poder levar um pouco de cultura a uma população tão carente de
saberes é algo que nos enobrece, pois sabemos das nossas responsabilidades enquanto educadores
e formadores de opinião. Desta forma, temos o intuito de dar continuidade na execução do
projeto e contribuir cada vez mais na formação de leitores proporcionando a comunidade local o
desenvolvimento intelectual das pessoas.
O Projeto Leitura na Praça é um trabalho que busca desenvolver a prática da leitura, a busca por
novos conhecimentos, e percebemos que são projetos desse tipo que a população local necessita
para que possa melhorar a aprendizagem e reconhecer que é através da leitura que as possibilida-
des de novos horizontes e crescimento profissional se traduzem em realidade.
É um trabalho de grande aceitação pela comunidade e, para melhorarmos, estamos sempre
buscando parcerias com as escolas municipais e estaduais e da própria comunidade local, pois
sabemos que o projeto traz benefícios para o desenvolvimento e melhorias significativas no
aprendizado dos estudantes.
Sendo assim, concluímos que a realização desse trabalho é de suma importância não apenas para
a comunidade estudantil, mas para todos que atuam na área de educação e que buscam a cada
dia novas formas de melhorar e incentivar seus alunos na prática da leitura, pois sabemos que essa
prática é necessária por possibilitar a vivencia de emoções e o exercício das fantasias. Temos um
tesouro em nossa escola e resolvemos colocá-lo a disposição da comunidade para que possam ter
os livros ao alcance das mãos, pois um bom livro lido é o melhor adubo para formar novos leitores.

referênciAs
Almeida, Inajá Martins de. O ato de ler. Amigos do Livro, ago. 2009. Disponível em:
http://www.mscamp.wordpress.com/biblionline
http://www.amigosdolivro.com.br/lermais.
Manguel, Alberto. Uma Historia da Leitura, p 85 4ª edição, editora Schwarcz LTDA, 1999.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
redescobrindo o espAço UrbAno AtrAVés dA leitUrA
de mApAs em tUrmAs de AlfAbetizAção de joVens e
AdUltos em espAços popUlAres
diego domingUes peçAnhA moreirAo | AnA lídiA gonçAlVes medeiros |
VAldemir AlVes do nAscimento | AnA pAUlA de AbreU costA de moUrA

A atividade nomeada “Trabalhando com mapas” é vinculada ao Programa Integrado da UFRJ para
a Educação de Jovens e Adultos e foi realizada em duas turmas localizadas no bairro Maré. Os obje-
tivos foram: propiciar a reflexão dos alunos sobre o local onde residem e a locomoção por esse es-
paço, através de uma proposta interdisciplinar que uniu o conhecimento geográfico e a alfabetiza-
ção. Para trabalhar esses conceitos partiu-se do cotidiano dos alunos para que fossem introduzidos
conteúdos como reconhecimento espacial, contato com o suporte mapa, alfabetização através da
leitura e escrita dos logradouros. A etapa final do trabalho consistiu em buscar, a partir da linguagem
cartográfica, explorar as áreas de atuação dos ônibus municipais e as mudanças ocorridas na Maré
por meio de relatos dos alunos e fontes documentais. Aos poucos, a discussão sobre a utilidade dos
mapas foi expandida para que os alunos desenvolvessem uma visão mais ampla sobre sua cidade
como uma organização espacial e sociopolítica. Como resultado, os alunos redescobriam o bairro e
conheceram pontos de cultura como a biblioteca e o centro de arte local. Além de identificarem as
divisões das áreas de atuação dos ônibus e a apropriação de espaços antes inacessíveis. Concluímos
que o trabalho possibilitou ao aluno refletir sobre a importância histórica e cultural do seu bairro,
assim como a valorização de sua própria experiência como integrantes dessa história, desenvolveu
também uma nova visão sobre as mudanças ocorridas na cidade do Rio de Janeiro e como essas
mudanças interferem em seu cotidiano.

palavras-chave: alfabetização, EJA, espaços populares, mapas

introdUção
A presente atividade foi desenvolvida com base em uma demanda observada por alunos da gra-
duação da Faculdade de Letras que atuam como alfabetizadores no Bairro Maré através do Progra-
ma Integrado da UFRJ para a Educação de Jovens e Adultos.
Na prática cotidiana, percebemos que, embora muitos de nossos alunos tivessem idade avançada
e morassem na Maré há mais de cinquenta anos, a maioria desconhecia esse espaço quanto as suas
divisões territoriais, dimensões e distâncias. Percebemos também que poucos sabiam sobre as pos-
sibilidades que a cidade do Rio de Janeiro oferecia.
Em conversas com os alunos, ficamos sabendo que, com relação ao deslocamento pela cidade, a
rotina da maioria deles era restrita apenas ao trajeto de casa para o trabalho, muitos nunca tinham
ido a algum ponto turístico, espaço cultural ou apenas dado uma volta de ônibus pelo Rio, desco-
nhecendo totalmente sua própria cidade. Eram estrangeiros da própria terra.
Instigados por essa questão e entendendo que um processo reflexivo de educação deve sempre
partir da realidade do aluno para desenvolver e ampliar suas capacidades, buscamos desenvolver
um trabalho interdisciplinar que despertasse o interesse dos alunos pelo conhecimento do espa-
ço urbano a sua volta, aliando esse interesse ao processo de alfabetização. Nesse processo, nossos
principais objetivos foram: propiciar a reflexão por parte dos alunos sobre o local onde residem e a
locomoção nesse espaço, valorizar a história local do bairro através do relato dos alunos, apresentar
o formato da cidade do Rio de Janeiro e do bairro Maré e identificar as divisões das áreas de atuação

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
dos ônibus municipais e a apropriação de lugares antes inacessíveis.
Ao mesmo tempo em que propúnhamos essa interdisciplinaridade no trabalho com os alunos,
nós, enquanto também alunos, buscávamos aprimorar nossa prática pedagógica através da pesqui-
sa consistente e do embasamento teórico de nossas ações em uma área diferente da nossa como é
a geografia.

mAteriAl e metodologiA
O complexo da Maré compreende 17 subdivisões ou microbairros. Embora este local tenha sido
incorporado na cidade do Rio de Janeiro como um bairro em 1994, ainda possui o estigma de ser
tratado com um dos maiores conjuntos de favelas do estado com uma média de 150 mil moradores.
O trabalho desenvolvido foi feito em duas turmas de diferentes microbairros, uma em Nova Ho-
landa e outra no Parque União. Para desenvolver o trabalho de estudo e redescoberta do bairro, fize-
mos uma divisão em três etapas: em um primeiro momento levantamos dados sobre o local, como:
número total de moradores, território, divisões e história da formação, levando em seguida esses
dados em forma de questionamentos para os alunos.
Após uma aula introdutória, na qual os alunos expunham o que sabiam e nós mediávamos a con-
versa com os dados reunidos, decidimos apresentar o conceito do suporte mapa, falando sobre o
uso e importância desse meio de registro através do mapa da Maré. Embora possa parecer um con-
ceito simples de ser assimilado, a noção cartográfica para alguns foi difícil de compreender, por isso
a todo momento decidimos intercalar o conteúdo geográfico trabalhado com a produção escrita de
textos sobre o bairro. Dessa maneira, os alunos avançavam no desenvolvimento do conteúdo sem
nenhum tipo de pressão conteudista.
Na segunda parte do projeto, após semanas trabalhando sobre o contexto físico e histórico do
bairro Maré, levamos um mapa da cidade do Rio de Janeiro, indicando a localização no bairro, dos
principais pontos turísticos e identificando as divisões das áreas de atuação dos ônibus municipais.
Na cidade do Rio de Janeiro há uma relação entre as cores dos ônibus e os locais por onde eles
passam, ou seja, cada cor identifica um ônibus e uma determinada região atendida. Nós aproveita-
mos essa informação para, de maneira lúdica, abordar a divisão da cidade e como os alunos pode-
riam acessá-las através do transporte público, trabalhando a escrita de destinos, percursos e a leitura
de alguns itinerários. Ao mesmo tempo em que íamos percorrendo o território por meio do mapa,
íamos conhecendo as impressões dos alunos a respeito desses espaços. Isso evidencia o quanto unir
o conteúdo e os materiais levados pelos alfabetizadores com o conhecimento dos alunos a sala de
aula é enriquecedor.
Por último, concluímos o trabalho com uma visita ao Centro de Artes da Maré (CAM). Esse espa-
ço tem entre suas atrações a produção artística tanto de moradores mais antigos quanto dos mais
jovens, como por exemplo, o trabalho de registro da história do bairro feito em pirogravura, isto é, o
desenho feito com fogo em madeira. Neste Centro de Artes também ocorrem oficinas culturais, ses-
sões de cinema e espetáculos de variadas manifestações artísticas. Essa visita possibilitou explorar o
trajeto da sala de aula ao CAM levando em consideração o que tínhamos discutido.

resUltAdos e discUssões
Partimos de um objetivo bem claro que foi o trabalho com os mapas do bairro e da cidade de
nossos alunos para, através desse ponto inicial, desenvolver o sentimento de pertencimento e va-
lorização deles enquanto cidadãos plenos e conscientes do espaço urbano que os rodeia, nunca
deixando de lado, nesse processo de reflexão e compreensão, o objetivo maior que é a alfabetização
desses jovens e adultos.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
O trabalho em turmas da EJA sempre exige uma sensibilidade ainda maior para entender o ritmo,
os anseios, as questões, desejos e visões de um corpo discente bem particular. O aluno jovem e adul-
to chega à aula, muitas vezes, ansioso por um modelo pedagógico conservador, tendo frequentado
a escola em algum momento da sua vida ou não. Ele traz uma projeção bem clara do que encontrará
no ambiente estudantil, desde a organização dos móveis da sala de aula até a postura do professor,
que espera que seja rígido e exigente.
Desconstruir essa visão, propondo um trabalho contextualizado, reflexivo, livre de métodos e
exercícios pré-moldados nem sempre é visto com bons olhos por todos os alunos. Muitos acreditam
que devem ser instruídos constantemente sobre o que e como fazer, consideram que sua voz não
tem importância e por isso apenas as ordens do professor é que constituem uma “boa” aula.
Em nosso trabalho com mapas, alfabetizando alunos de diversos níveis de compreensão da es-
crita e da leitura, ao mesmo tempo em que trabalhávamos a geografia local, mostrou-se um desafio
desde o primeiro dia. Levando em conta ainda que trabalhamos em turmas diferentes, ou seja, rit-
mos e espaços diferentes.
Entretanto, ao mesmo tempo que um desafio nos foi apresentado, entendemos que era um tra-
balho que merecia e precisava ser feito. Na alfabetização de adultos, invariavelmente, dedicamos
uma carga horária muito maior apenas para leitura e escrita, porém a alfabetização não é um pro-
cesso limitado de ensino de leitura e escrita da língua materna, é um processo educativo que deve
compreender também o conhecimento numérico, histórico, social, político e geográfico. Guardada
as devidas proporções, uma alfabetização integral se faz com um desenvolvimento pleno de conhe-
cimentos das mais diferentes áreas, integrando-as em um objetivo maior que é o fortalecimento e
aprimoramento das capacidades intelectuais do aluno e o aumento de sua segurança em interagir
com o mundo através da leitura e da escrita.

conclUsão
Os resultados alcançados no decorrer desse trabalho superaram nossas expectativas. Podemos
destacar que a atividade “Trabalhando com mapas” possibilitou que o aluno refletisse a respeito do
espaço ocupado por ele, se conscientizando sobre a importância histórica e cultural do seu bairro.
Além dessa possibilidade a familiarização da imagem do mapa, utilizada muitas vezes em reporta-
gens ou propagandas.
Além disso, possibilitou que ele desenvolvesse uma nova visão sobre as divisões e mudanças
ocorridas na cidade do Rio de Janeiro, assim como as mudanças ocorridas em seu bairro desde seu
surgimento. Essas reflexões foram feitas através da leitura e interpretação do suporte mapa e textos
que auxiliaram nesse trabalho.
Deste modo, fica claro que independente dos suportes trabalhados, o principal objetivo sempre
deve ser utilizá-los como uma forma de conscientização e desenvolvimento do processo de escrita,
leitura, como algo “realmente comprometido com o contexto sócio - histórico vivido pelo alfabeti-
zando” (Cf. Marcuschi, 2002).
Academicamente percebemos que nosso trabalho como professores deve sempre ser pautado
por um planejamento sério e objetivo, ao mesmo tempo que flexível e adaptável. Um bom profissio-
nal que lida com a formação educativa deve estar amparado por suportes teóricos que legitimem
suas ações e indiquem um norte claro que pretende alcançar. Por outro lado, sempre devemos ter
atenção à resposta dos alunos sobre nossas ações, atentos às suas solicitações e intervenções para
que, na busca de nossos objetivos pedagógicos, possamos encaminhar um trabalho que alie uma
pesquisa constante e uma prática consistente com a realidade que nos cerca.

358
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
bibliogrAfiA
ALMEIDA, R. D. Podemos estabelecer Paralelos entre o Ensino da Leitura e Escrita e o Ensino de Ma-
pas? In: Boletim de Geografia, Departamento de Geografia. Universidade Estadual de Maringá, ano 17,
n.1. Maringá, 1999, p.128-133.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia – Saberes necessários à prática educativa. 35ª ed. São Paulo:
Paz e Terra , 1996.
MARCUSCHI, L. A. (2002). “Gêneros textuais: definição e funcionalidade” In DIONÍSIO, Â. et al. Gêne-
ros textuais e ensino. Rio de Janeiro: Lucerna.

359
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
reflexões sobre AlfAbetizAção e escolA nA ejA:
percepções dos sUjeitos sobre o processo de
AprendizAgem
jAqUeline lUziA dA silVA

Este trabalho tem origem em uma pesquisa sobre permanência e desempenho na Educação de
Jovens e Adultos (EJA) realizada com alunos alfabetizandos do Programa de Educação de Jovens
e Adultos (PEJA) da Rede Municipal do Rio de Janeiro. A pesquisa teve como objetivo compreen-
der as características de escolas de EJA e sua capacidade de incidir positivamente, através do uso
de seus recursos materiais e de suas políticas e práticas pedagógicas e de gestão, no processo de
alfabetização e na redução dos índices de evasão dos alunos. Para isso, foram ouvidos 43 alunos
de seis turmas de alfabetização, por meio da técnica de pesquisa denominada grupo focal (GATTI,
2005; BONI e QUARESMA, 2005). As questões levantadas nas entrevistas com os seis grupos focais
realizados foram planejadas a partir do roteiro de entrevista das professoras, coordenadores e di-
retores, para que se conhecesse a percepção dos alunos a respeito dos temas pesquisados junto a
esses agentes, visando complementar as outras técnicas utilizadas na pesquisa. O roteiro do grupo
focal compreendeu tanto aspectos escolares quanto sociais de apropriação da leitura e da escrita e
da relação com a aprendizagem, como a frequência à escola, as trajetórias escolares, as perspectivas
pessoais e as principais dificuldades enfrentadas, por exemplo. Quando se trabalha com a EJA, é im-
prescindível reconhecer os educandos como sujeitos da educação (FREIRE, 1982). Assim, buscou-se
captar a prática educativa destes sujeitos a partir de sua fala e entendê-los em seu contexto, com
suas expectativas e anseios com relação à escola e ao processo de alfabetização. Os resultados do
estudo mostram como as percepções desses sujeitos podem auxiliar a prática pedagógica da EJA no
sentido de melhorar o trabalho realizado e garantir a aprendizagem dos mesmos.

palavras-chave: Alfabetização, Educação de Jovens e Adultos, Programa de Educação


de Jovens e Adultos do município do Rio de Janeiro (PEJA).

introdUção
Este trabalho tem origem em uma pesquisa sobre permanência e desempenho na Educação de
Jovens e Adultos (EJA) realizada com alunos alfabetizandos do Programa de Educação de Jovens e
Adultos (PEJA) da Rede Municipal do Rio de Janeiro (SILVA, 2010). A pesquisa teve como objetivo
compreender as características de escolas de EJA e sua capacidade de incidir positivamente, através
do uso de seus recursos materiais e de suas políticas e práticas pedagógicas e de gestão, no proces-
so de alfabetização e na redução dos índices de evasão dos alunos.
Aqui, faz-se um recorte da pesquisa trazendo para o debate a fala dos alunos, suas narrativas so-
bre suas trajetórias escolares e sobre seu processo de aprendizagem. A importância desta etapa da
pesquisa recai sobre a atenção dada aos alunos e alunas do PEJA, como sujeitos de conhecimento
e aprendizagem (OLIVEIRA, 1999), como sujeitos do processo de ensino, como sujeitos de direitos
que são (ARROYO, 2006).
Para isso, foram ouvidos 43 alunos de seis turmas de alfabetização32, de três escolas com PEJA, por
meio da técnica de pesquisa denominada grupo focal (GATTI, 2005; BONI e QUARESMA, 2005). As
questões levantadas nas entrevistas com os seis grupos focais realizados foram planejadas a partir
do roteiro de entrevista das professoras, coordenadores e diretores, para que se conhecesse a per-
32 Matriculados no PEJA I, que corresponde ao primeiro segmento do Ensino Fundamental.

360
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
cepção dos alunos a respeito dos temas pesquisados junto a esses agentes, visando complementar
as outras técnicas utilizadas na pesquisa. O roteiro do grupo focal compreendeu tanto aspectos es-
colares quanto sociais de apropriação da leitura e da escrita e da relação com a aprendizagem, como
a frequência à escola, as trajetórias escolares, as perspectivas pessoais e as principais dificuldades
enfrentadas, por exemplo.
A análise dos dados levantados na pesquisa baseia-se nos recentes estudos de Marcia Alvarenga
(2014), que ajudam a pensar sobre a linguagem dos jovens e adultos como fonte de pesquisa. Ela
traz as bases teóricas de Mikhail Bakhtin alicerçando as ideias que apontam a importância do diá-
logo com os sujeitos da Educação de Jovens e Adultos, bem como de suas experiências na relação
com os outros e com a realidade em que vivem.
Quando se trabalha com a EJA, é imprescindível reconhecer os educandos como sujeitos da edu-
cação (FREIRE, 1982). Assim, buscou-se captar a prática educativa destes sujeitos a partir de sua fala
e entendê-los em seu contexto, com suas expectativas e anseios com relação à escola e ao proces-
so de alfabetização. Os resultados do estudo mostram como as percepções desses sujeitos podem
auxiliar a prática pedagógica da Educação de Jovens e Adultos no sentido de melhorar o trabalho
realizado e garantir a aprendizagem dos mesmos.

A pesqUisA com grUpos focAis


Os alunos envolvidos na pesquisa responderam a um questionário socioeconômico e, posterior-
mente, foram entrevistados através da técnica do grupo focal. Foram realizados seis grupos focais
– um com cada turma pesquisada –, cinco deles compostos por sete alunos e um formado por oito
alunos, correspondendo a um total de 43 pesquisados.
Segundo Bernadete Gatti (2005), o grupo focal é um bom instrumento de coleta de dados, pois
permite a interação entre o grupo e as trocas efetivadas podem ser estudadas pelo pesquisador em
função de seus objetivos. Além disso, o interesse recai não só no que as pessoas pensam e expres-
sam, mas em como elas pensam e porque pensam o que pensam.

A pesquisa com grupos focais, além de ajudar na obtenção de perspectivas dife-


rentes sobre uma mesma questão, permite também a compreensão de ideias parti-
lhadas por pessoas no dia a dia e dos modos pelos quais os indivíduos são influen-
ciados pelos outros. (GATTI, 2005, p. 11)

As questões levantadas nas entrevistas com os grupos focais foram planejadas a partir do roteiro
de entrevista das professoras, coordenadores e diretores, para que se conhecesse a percepção dos
alunos a respeito dos temas pesquisados junto a esses agentes, visando complementar as outras
técnicas utilizadas na pesquisa. O roteiro do grupo focal da pesquisa compreende tanto aspectos
escolares quanto sociais de apropriação da leitura e da escrita e da relação com a aprendizagem.

As entrevistas com grupos focais é uma técnica de coleta de dados cujo objetivo
principal é estimular os participantes a discutir sobre um assunto de interesse co-
mum, ela se apresenta como um debate aberto sobre um tema. Os participantes são
escolhidos a partir de um determinado grupo cujas ideias e opiniões são do interesse
da pesquisa (BONI e QUARESMA, 2005, p. 73)

AlfAbetizAção e escolA nA edUcAção de joVens e AdUltos


Perfil socioeconômico, cultural e escolar dos alunos

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
O perfil dos alunos é muito semelhante nas três escolas pesquisadas. Boa parte destes alunos teve
uma escolaridade anterior, enquanto outros nunca estudaram. As equipes das escolas afirmam que
os que tiveram uma escolaridade anterior tiveram também uma história de fracasso escolar, caracte-
rizada pela evasão, que culmina sempre na baixa autoestima apresentada pelos alunos da EJA.
Os alunos do PEJA I são mais idosos nas três escolas. Boa parte dos adolescentes egressos do
ensino regular encontram-se matriculados no PEJA II. Esses alunos idosos, segundo professoras e
coordenadoras pedagógicas, têm mais dificuldades para aprender. Estas dificuldades decorrem não
só da idade avançada, mas também das preocupações e das responsabilidades cotidianas, porque
trabalham muito durante o dia e chegam cansados à escola.
A maioria dos alunos do PEJA I é composta por mulheres; pertencem às classes populares; alguns
são pais dos alunos que estudam durante o dia nas escolas; possuem baixa renda e muitos dizem
que procuraram o PEJA também para melhorar no trabalho, seja para conseguir um emprego me-
lhor ou para mudar de função no próprio emprego, ainda que o principal motivo seja aprender a
ler e escrever. Alguns vêm para a escola para aprender a ler a Bíblia, porque são evangélicos. Há, in-
clusive, casos em que os alunos procuram a escola por recomendação médica, porque apresentam
quadro de depressão e problemas neurológicos ou psicológicos.
As escolas têm procurado traçar o perfil dos alunos do PEJA. Esta é uma prática muito comum en-
tre as escolas, incentivada nos cursos de formação continuada. E este perfil é atualizado a cada dois
ou três anos, para que as escolas conheçam os alunos com quem trabalham.
A aprendizagem na educação de jovens e Adultos
No PEJA I, a aprendizagem principal é a da leitura e da escrita, principais indicadores previstos
para esta etapa. Entretanto, ainda é necessário que as escolas pensem como estes alunos alcançarão
uma aprendizagem eficaz, no que eles precisam aprender, no que querem e no que lhes é necessá-
rio.
A fala dos entrevistados revela a ênfase não só sobre os conteúdos curriculares considerados rele-
vantes para a aprendizagem dos alunos do PEJA, mas também sobre o fato de a escola da EJA ser um
local de formação de sujeitos críticos e conscientes de seu papel na sociedade. Assim, os conteúdos
necessitam contemplar a realidade destes educandos, pois caso isso não aconteça poderá acarretar
até no abandono escolar dos alunos. O relato do grupo focal da Escola A33 é muito interessante, pois
mostra como os alunos estão se desenvolvendo a partir dos estudos:

A27 – Eu lia “porcamente”. Agora estou bem melhor! [...]


A24 – Eu já sabia ler, mas tinha dificuldade em alguma coisa, como acento, agora
eu sei bastante.
A29 – Eu aprendi a lidar com os outros. Eu não sabia conversar direito. Hoje eu sou
madame. A Aline ensina a gente a falar melhor, a viver melhor, a se amar.
A27 – Eu era muito ignorante. Tudo eu queria brigar. Depois que eu vim pra cá, eu
fui maneirando. Eu era muito nervosinha.
A26 – Eu ajudo meus filhos nos trabalhos da escola, ensino, ajudo. Eu aprendi isso,
porque eu não tinha paciência. Eu aprendi a conviver melhor com os meus filhos.
A25 – A professora ensinou a gente a ir no mercado, fazer as compras de casa. No
trabalho, eu leio os cardápios, já sei o que vai ser hoje. Antes eu tinha dificuldade.
A24 – Eu aprendi aqui a ser paciente, porque eu não tinha paciência nenhuma.

É interessante ouvir os relatos dos alunos, pois para eles a aprendizagem vai além da apreensão
33 Os nomes das escolas e dos alunos foram substituídos por letras e letras e números, respectivamente, para que se
preservasse o anonimato e a integridade moral dos participantes da pesquisa. As professoras receberam nomes fictícios.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
dos conteúdos escolares. Muito mais do que melhorar a leitura e a escrita, estes alunos alcançaram
uma mudança de vida. Eles lidam com a realidade de outra maneira e atribuem a isso a contribuição
da escola. Falar melhor, ter mais paciência, ajudar os filhos, aprimorar o trabalho, não são conteúdos
da escola de EJA, mas para estes alunos, foi na escola que aprenderam tais atitudes.
Segundo Marta Kohl de Oliveira (1999), é necessário levar em consideração as culturas apresenta-
das pelos alunos da EJA e reconhecê-los como sujeitos de conhecimento e aprendizagem. O trecho
da entrevista apresentado anteriormente mostra claramente o que Oliveira quer dizer com o reco-
nhecimento de que os alunos são sujeitos de seu próprio conhecimento e de sua aprendizagem.
Ainda que a escola trabalhe os conteúdos curriculares necessários, existem inúmeros outros conhe-
cimentos aprendidos na escola que não estão explicitados nos currículos e que os jovens e adultos,
enquanto sujeitos, vão construindo ao longo de suas trajetórias escolares.
Entre os conhecimentos que os alunos relatam que estão aprendendo – além da leitura e da
escrita escolares – estão a melhoria das condições para fazer transações bancárias; fazer compras;
produzir listas; pegar ônibus lendo o letreiro; ler placas de rua; assinar o próprio nome; se expressar
melhor oralmente; ler a Bíblia; escrever e ler bilhetes; ler o jornal; ler livros; fazer palavras cruzadas;
fazer cálculos; ler cardápios; ter mais paciência com os filhos; passar trocos; cuidar do lixo, da água e
dos alimentos; conviver melhor com os outros e, inclusive, para a melhoria da memória. O relato de
uma aluna da Escola B mostra a primeira palavra que leu com autonomia, na rua, após sua entrada
na escola:

Quando eu comecei a estudar com a Dona Bia eu não sabia. Ela disse que eu já sei
ler. Eu conhecia as letras, mas não sabia ler. Eu passava na rua e lia uma placa, todo
dia eu lia uma letra. Eu tinha que passar todo dia lá pra acabar de ler aquilo. Eu me
invoquei, parei de frente com a casa de material de construção e li “Ah! É Cimento
Mauá”, no meio da rua, eu sozinha, batendo palmas. Ah! Isso é muito bom! (Risos)
Foi a primeira vez que eu li alguma coisa. Agora eu vou a pé pela Intendente34 e fico
lendo tudo na rua. Agora eu já leio “automóvel” [...]

Esta aluna ainda deixa claro que se motivou a ler as coisas na rua a partir do momento em que a
professora a estimulou a ler tudo o que via. É uma prática da professora pedir que os alunos procu-
rem ler tudo o que há na rua, em casa, no trabalho. E foi o que a aluna do relato fez, passou a ler as
coisas que achava importantes que fossem lidas.
Os alunos mostram-se muito entusiasmados com a escola, gostam do que estão aprendendo,
das mudanças decorrentes de sua entrada na escola, dos amigos que fizeram, das professoras e de
como fazem uso do que aprendem na escola em sua vida cotidiana. E dizem que muitas vezes se
surpreendem com seu próprio avanço na escola, quando conseguem realizar sozinhos as atividades
propostas. A fala de uma aluna do Bloco 135 da Escola C, abaixo, confirma como os alunos veem sua
aprendizagem:

Eu acho que eu estou lendo mais correto. Ainda não estou como gostaria. Mas eu
lia muito mal. Sabia as letras, os nomes, mas na hora de falar parece que dava um
branco. Hoje já leio mais correto, se a professora pedir na frente dos outros, eu leio.
Eu tinha medo de ler errado. Aí o medo fazia eu ler errado. Hoje, mesmo que eu leia
errado, mas eu estou tentando.

34 Intendente Magalhães é uma rua situada num bairro próximo à escola, com muitas concessionárias de automó-
veis.
35 O PEJA I é dividido em dois blocos (Blocos 1 e 2). O Bloco 1 corresponde à fase inicial da alfabetização.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
trAjetóriA escolAr
Para compreender a trajetória escolar dos alunos é interessante verificar a escolaridade anterior
e as experiências escolares destes alunos. Os alunos que não tiveram escolaridade anterior ao PEJA,
afirmam que não puderam estudar na infância porque tiveram que trabalhar desde muito cedo. Já
os alunos com escolaridade anterior afirmam que quando tiveram oportunidade de estudar, não ha-
via recursos materiais suficientes para manter os estudos. Por outro lado, não havia muito interesse
por parte destes nos estudos, pois não davam o valor que hoje dão à escola.
Os alunos da Escola A, bem como das outras escolas pesquisadas, falam da escola com muita
satisfação e gratidão ao que ela representa na vida deles, dizem que se reencontraram no PEJA, que
agora estão aprendendo realmente e que devem ao trabalho realizado no PEJA o aprendizado que
estão adquirindo neste momento.
A maior parte dos alunos da Escola B tem escolaridade prévia ao PEJA. São alunos que estudaram
quando crianças ou já na fase adulta. Estes alunos avaliam a escola de uma maneira muito positiva,
comparando-a com as outras escolas pelas quais passaram. Dizem que agora estão aprendendo
mais e melhor e que, muitas vezes, relembram o que já estudaram e fazem relações entre os conhe-
cimentos que estão construindo.
Conversando com os alunos da Escola C é possível perceber que alguns alunos nunca estudaram,
enquanto outros estudaram há muito tempo. Também alguns já entraram na escola com alguns
conhecimentos relacionados à leitura e à escrita e outros aprenderam a ler e a escrever nesta escola.
Eles comparam a escola atual com a escola de antigamente. Dizem que os recursos de hoje (mate-
rial, uniforme, Riocard) são muito melhores e ajudam na aprendizagem; falam sobre o respeito com
que são tratados nesta escola e que hoje é mais fácil estudar. O relato abaixo, de uma aluna da escola
C, confirma esta informação:

Lá no passado a borracha tinha que ser o dedo. Hoje a gente tem material, tem
caderno, tem lápis, tem caneta. Hoje a gente é tratado com mais respeito. Tem união
dentro da sala. A gente faz amigos. No sábado e domingo ficamos esperando a se-
gunda-feira chegar, pra gente ver nossos amigos, porque a escola trata bem a gente.
Eu estou aqui até hoje e estão me tratando super bem. Não crio confusão com nin-
guém. A nossa sala é a melhor daqui da escola. A professora é uma bênção.

perspectiVAs pessoAis
As perspectivas dos alunos em relação a sua própria aprendizagem e ao futuro também foram
verificadas pela pesquisa. Boa parte delas está no desejo de continuar estudando e trabalhando, já
verificado no questionário socioeconômico por eles. Nas entrevistas, os alunos deixam claro que,
entre as principais perspectivas, está a mudança de profissão ou aquisição de uma melhor posição
no trabalho; o desejo de adquirir competências para a vida social, como tirar carteira de habilitação;
deixar de sentir vergonha, ocasionada pelo fato de não ser alfabetizado(a); cursar o Ensino Médio,
fazer um curso superior e ler com mais fluência. O relato abaixo apresenta a perspectiva pessoal de
um aluno da Escola C:

Pra mim o estudo na minha vida é um sonho! Eu fiz o primário e queria ser pro-
fessor de matemática. Aí veio o filho, o casamento, aquela coisa toda e o sonho foi
por água abaixo. Mas o sonho continuava. Eu sempre lutava pra conseguir atingir
esse objetivo. Só que não sobrava tempo pra estudar. Chegou o momento em que
os filhos cresceram e chegou a minha vez de estudar. Chegou essa oportunidade e

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
eu não quero parar. Eu quero avançar e chegar a ser professor de matemática. Mas
não é fácil trabalhar e estudar, tem que ter força de vontade. Às vezes eu falto, por-
que trabalho longe, pego engarrafamento e nem sempre dá tempo de chegar. Mas
sempre que eu posso, eu venho. Estou aqui com meus colegas e vou estudar aqui até
quando Deus quiser.

Uma das maiores expectativas dos alunos entrevistados, em todas as escolas, é o desejo de serem
aprovados para os blocos (“séries”) seguintes. Nas falas dos alunos aparece sempre a preocupação
demasiada com o fato de não conseguir aprender algo trabalhado pela professora em sala de aula e
isto ocasionar a reprovação e permanência no bloco. Alguns alunos afirmam que não irão ser apro-
vados e, ao mesmo tempo, justificam este fato dizendo que não estão preparados e por isso querem
continuar no bloco em que estão. Ser aprovado significa avançar na escola e na vida, caminhar para
frente, evoluir. Ainda que não tenham esta certeza, os alunos orgulham-se de estar estudando e do
que estão aprendendo. Se sentem mais capazes e mais felizes por estarem estudando.

principAis dificUldAdes enfrentAdAs


As principais dificuldades encontradas na escola, tanto com relação à aprendizagem quanto com
relação à vida cotidiana foram trazidas pelos alunos nos grupos focais. Os alunos apresentam como
principais dificuldades a idade – sempre relacionando-as aos problemas de aprendizagem –, o can-
saço, a falta de tempo para estudar em casa, a dependência de outras pessoas para ler correspon-
dências e documentos pessoais e o preconceito social sofrido por estar estudando em uma idade
avançada.
Nos relatos aparecem a dificuldade em escrever, para a maioria dos alunos; em realizar as ativida-
des de matemática: contas de divisão, problemas e cálculos; a vergonha de usar o uniforme escolar36;
a distância entre a escola e seu local de trabalho ou sua casa; a vergonha de não compreender o que
as pessoas com mais estudo falam; problemas de memória; não ter com quem deixar os filhos pe-
quenos; não ter o apoio da família para retornar aos estudos; o cansaço físico à noite; a longa carga
horária de trabalho; a vergonha em pedir para que outras pessoas leiam correspondências e docu-
mentos; serem enganados nas compras e em trocos de dinheiro e quantidade de responsabilidades
diárias. O relato da aluna, descrito abaixo, mostra claramente as dificuldades enfrentadas por ela:

Gosto de estudar. Eu quero mais é aprender porque sem estudo não somos nada.
Quando a gente vai comprar alguma coisa, a pessoa até enrola em algumas coisas.
Eu chego em casa e o troco está errado, a gente pensa que está certo e não está. Ah!
A pessoa sem saber ler é cego. Agora já estou sabendo um pouquinho. Eu vendo ca-
fezinho e passava sempre o troco errado, agora já passo o troco certo.

As principais dificuldades estão relacionadas aos problemas de aprendizagem escolar. O diálogo


abaixo ilustra bem os problemas enfrentados pelos alunos da Escola C:

A20 – Eu tenho a mente fechada, mas Cássia explica muito bem! Ela tem muita
paciência.

36 Os alunos do PEJA utilizam o mesmo uniforme usado pelos alunos do Ensino Regu-
lar. A maioria dos alunos reclama porque se sente envergonhada de ter que entrar no ônibus e na
escola com o uniforme. Muitos motoristas não param nos pontos para os adultos uniformizados.
Também criticam o uniforme porque é branco e laranja, mesmas cores dos uniformes utilizados
pelos garis da cidade, vítimas de preconceitos por grande parte da população.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
A19 – Quando eu passei de ano, eu achei que não deveria ter passado de ano, mas
eu passei. [...]
A20 – A minha cabeça é que não dá, eu tenho muitos problemas e nunca estudei
na minha vida. Minha família era toda analfabeta. Eu sou uma pessoa muito calma,
sou carente e às vezes eu choro. Mas pelo menos eu estou aprendendo alguma coisa.
Às vezes gaguejo, às vezes confundo letras. Mas está tudo bem, graças a Deus. [...]
A19 – O PEJA eu acho legal. É só uma pena que tem tão poucas escolas. Perto da
minha casa não tem. [...]
A19 – Eu estou lendo direitinho, de “correntinha”... Mas depois eu não sei de nada...
Deve ser por causa da idade.
A22 – Quando a gente está de uniforme e vai pegar o ônibus, o motorista humilha
muito as pessoas. [...]
A19 – Uma vez o cobrador me perguntou se eu estava indo pra escola mesmo. [...]
A22 – Porque, às vezes, a professora Cássia passa um ditado pra gente. Aí a gen-
te escreve, mas sempre falta alguma letra. Eu não vou conseguir passar desse jeito!
Faltando uma letra, e quando eu chegar do outro lado?37 Eu me acho uma incompe-
tente! Às vezes, eu troco as letras. Se der pra esperar mais um pouco, pra passar mais
forte, vamos ver... Cássia diz que só vai passar de ano quem está preparado e eu acho
que ela está certa, né?

Este trecho do grupo focal, mostra as diversas dificuldades enfrentadas pelos alunos da EJA e
como estes se culpabilizam por terem dificuldade em aprender. Nestas falas pode-se notar clara-
mente que os alunos apontam para si mesmos os obstáculos na trajetória escolar. Esses depoimen-
tos podem auxiliar os educadores a elaborarem estratégias pedagógicas para que os alunos con-
sigam superar esses obstáculos, os preconceitos e a baixa autoestima e alcancem a aprendizagem
que tanto almejam e que lhes fez buscar a escola da Educação de Jovens e Adultos.

percepções dos sUjeitos sobre o processo de AprendizAgem: con-


tribUições dA pesqUisA
A análise das falas dos alunos do PEJA nos remete aos estudos de Miguel Arroyo (2006), segundo
o qual entre os elementos necessários para se configurar a especificidade da Educação de Jovens e
Adultos estão: assumir uma visão realista dos jovens e adultos; dialogar com os saberes dos jovens e
adultos; perceber a especificidades das trajetórias dos jovens e adultos; recuperar o foco na educa-
ção; travar um diálogo entre o conhecimento escolar e os saberes populares e fazer uma interpreta-
ção política das trajetórias escolares.
A pesquisa buscou valorizar esses elementos trazidos por Arroyo, principalmente quando se pro-
pôs a ouvir os alunos e alunas e compreender seu processo de aprendizagem. Seria mais simples
ouvir somente os gestores e professores, contudo, ouvir os próprios sujeitos garantiu a qualidade
necessária à pesquisa, pois estes alunos, em seu contexto, trazem em suas falas as percepções sobre
a escola e a alfabetização. Muitas vezes, durante a realização do grupo focal, estes sujeitos foram de-
safiados a questionar a prática pedagógica na qual estavam envolvidos diretamente e se colocaram,
por meio de sua linguagem, mostrando suas impressões, limites e anseios com relação à escola e ao
seu saber.
Os resultados da pesquisa apontam para a importância da compreensão da linguagem dos sujei-
tos da EJA que, de acordo com Paulo Freire (1982) se prende dinamicamente à realidade destes. As-
37 Na Escola C, as salas de aula do PEJA II ficam do lado oposto das salas do PEJA I. Por isso, os alunos mudam “de lado”
quando mudam de segmento. Neste caso, a mudança é também espacial.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
sim, quando a fala desses sujeitos é investigada atentamente, sua realidade vem à tona, denotando
suas percepções sobre o processo de aprendizagem em que estão envolvidos.
Dessa maneira, é impossível negar que a aprendizagem passa pela linguagem e pela experiência
desses sujeitos (ALVARENGA, 2014). A fala trazida pelos alunos e alunas da EJA favorece a compreen-
são de sua aprendizagem no sentido de que demonstra suas trajetórias de vida, suas experiências
e sua leitura de mundo. Por isso, a compreensão dessas falas pode indicar aos educadores pistas e
caminhos para um trabalho pedagógico que garanta aprendizagens significativas e proporcione
um diálogo ativo com os sujeitos dessa educação.

referênciAs bibliográficAs
ALVARENGA, Marcia Soares de. Linguagens e Experiência em Educação de Jovens e Adultos. Arqui-
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FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler em três artigos que se completam. São Paulo: Cortez,
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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
Um pAsseio pelA formAção de UmA práticA leitorA
silVAnA pimentel dA silVA

Compreendendo-se a leitura como uma prática onde agregam-se valores que vão muito além
de uma simples correspondência grafo-fonêmica e, ainda, percebendo-se que essa prática prece-
de a alfabetização - enquanto aquisição da linguagem escrita - é possível conhecer, desbravar e
aventurar-se na existência de um universo, muitas vezes oculto, de valores significativos e caminhos
prazerosos no ensino-aprendizagem da prática leitora. Nesse contexto, o presente artigo almeja
desvendar a construção de uma prática leitora bivalente e dialógica, buscando-se um aprendizado
contextualizado, significativo e prazeroso: o professor que ensina o que sabe e, ao mesmo tempo,
aprende com os seus alunos, assim como os alunos aprendem com o seu professor e ensinam o que
sabem; partindo-se sempre de um universo familiar ao grupo. Tal processo é abordado no relato de
experiência de uma graduanda em Pedagogia, aluna da Universidade Estadual do Rio de Janeiro/
UERJ - na modalidade EAD, pelo consórcio CEDERJ - como estagiária bolsista do Programa de Alfa-
betização, Documentação e Informação-PROALFA, inserido nesta mesma universidade, através do
projeto Oficina de Matemática, Leitura e Produção de Texto, onde focaliza-se a alfabetização e o
letramento de idosos que, em sua maioria, não tiveram a oportunidade de frequentar a escola no
tempo devido . Observando-se e respeitando-se as peculiaridades e necessidades desse grupo, tal
experiência desenvolveu-se não somente em ambiente de sala de aula como, também, extrapolan-
do os muros da escola (a própria universidade) e com a utilização de linguagens variadas e contem-
porâneas, proporcionando, dessa forma, uma maior fruição da prática leitora.

palavras-chave: pratica leitora, Alfabetização e Letramento, Fruição

introdUção

“... a leitura de mundo precede à leitura da palavra...” (FREIRE, 1988)

Nenhuma outra afirmação anteriormente dita sobre a leitura parece mais verdadeira do que essa
proferida por Paulo Freire, tornando-se patente ao reconhecermos que é dentre o mundo em que
vivemos que entramos em contato com as diversas formas de produzir, representar e grafar conhe-
cimentos e valores. O fato é que são muitas as formas de se ler o mundo e tudo que nele cabe. A
leitura alfabética é apenas uma dessas formas, e, segundo Ferreiro (1988), vai muito além de uma
simples correspondência grafo-fonêmica.
Esse reconhecimento faz da prática da leitura um processo rico e prazeroso, porque a torna in-
clusiva e abrangente, agregando em seu processo a percepção e apreensão das outras formas de
linguagem, além da alfabética escrita, presentes em um discurso.
Assim o presente trabalho almeja investigar a construção de uma prática leitora que seja biva-
lente, no sentido de se desenvolver como uma ferramenta hábil ao conhecimento, assim como for-
madora, reformadora e ampliadora de conceitos, tanto para a o aluno como para o educador, sendo
esses os sujeitos centrais no processo educacional, que “...embora diferentes entre si, quem forma se
forma ao formar e quem é formado forma-se e forma ao ser formado.” (FREIRE, 1996)
Tal processo é abordado no relato de experiência da autora deste trabalho enquanto graduanda
em Pedagogia, aluna da Universidade Estadual do Rio de Janeiro/UERJ - na modalidade EAD, pelo
consórcio CEDERJ - como estagiária bolsista de um Programa de Extensão, desenvolvido nessa mes-
ma universidade, o PROALFA – Programa de Alfabetização, Documentação e Informação, através de

368
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
um de seus projetos: Projeto de Oficinas de Leitura, Produção de Texto e Matemática.
O PROALFA tem como foco a formação docente inicial complementar, assim como a alfabeti-
zação e o letramento de idosos; desenvolvendo suas atividades, semanalmente, de 2ª a 6ª feira da
seguinte forma: às 2ª feiras ocorrem as reuniões de supervisão e planejamento pedagógico; às 6ªs
feiras acontecem os grupos de estudos teóricos dirigidos pelas coordenadoras pedagógicas; às 3ª,
4ª e 5ª feiras ocorrem as práticas de ensino-aprendizagem que podem ser realizadas em sala de aula
assim como em outros espaços - extrapolando-se os muros da escola e utilizando-se de linguagens
variadas e contemporâneas para a consecução dessas práticas.
Assim, o desenvolvimento deste artigo traz, inicialmente, uma breve reflexão sobre a experiência
da autora como aluna de graduação na modalidade EAD; na sequência, apresenta o PROALFA como
elemento formador e a EJA como campo de trabalho; em seguida tece um curto padrão comparati-
vo entre a EAD, a EJA e a construção de sua prática docente inicial no PROALFA. Por fim, apresenta o
relato de experiência dos trabalhos educativos desenvolvidos como mediadora na Oficina de Leitu-
ra no decorrer do estágio nesse Projeto; e suas considerações finais.

A eAd e A leitUrA.
Por se tratar de uma modalidade diferenciada de ensino-aprendizagem e, segundo Lucila Pesce
(2011), embora não seja uma metodologia recente, pouca coisa se fala, ainda nos dias de hoje, so-
bre a Educação à Distância – EAD. No entanto muitas dessas falas são carregadas de estereótipos e
preconceitos. Questiona-se sobre a funcionalidade, efetividade e qualidade desta modalidade de
ensino-aprendizagem, mas pouco se propõe ou incentiva em relação à sua implementação.
Ser aluno de EAD não é fácil, assim como também não é todo o alunado que se adéqua ao perfil
requerido por essa modalidade. Realmente não é fácil, e muitos desistem no meio do caminho.
A EAD exige um compromisso irrevogável e intransferível com a busca deliberada pelo conheci-
mento, ainda que direcionada e assistida pelos gestores e professores de curso. Propõe o desenvol-
vimento de uma autodisciplina que leve a selecionar o tempo, o espaço e a estabelecer regularidade
para a dedicação ao estudo dos conteúdos curriculares. Na verdade, são múltiplas as possibilidades
para o desenvolvimento de competências pessoais e sócio-educacionais mediadas pela EAD. Como
exemplos, podemos citar o desenvolvimento das práticas de reflexão crítica, de autoavaliação, de
argumentação e contra-argumentação nas formas escrita e/ou oral, da não passividade diante de
um conhecimento ainda não alcançado assim como da deliberação na busca pela sua apreensão.
Ao contrário do que se pode pensar, em vez de ser uma atividade solitária, fadada ao isolamento,
a EAD impulsiona ao aprendizado colaborativo (SILVA,2000) – seja usando os suportes disponibiliza-
dos pela estrutura do curso, seja formando pequenos ou médios grupos de estudos em encontros
presenciais ou realizados através de redes sociais, na internet.
Todo esse processo é mediado e desenvolvido através de muita leitura.

o proAlfA e seUs AlUnos


Tenho o privilégio de atuar junto a um grupo de alunos de terceira idade com o objetivo de
ajudá-los a construir uma prática leitora significativa, letrada e prazerosa. Essa oportunidade foi-me
disponibilizada na qualidade de estagiária bolsista no contexto de um Programa de Extensão ligado
ao Centro de Educação e Humanidades da Universidade Estadual do Rio de Janeiro – CEH/PROALFA/
UERJ, durante o período compreendido entre os anos de 2012 até 2014. O PROALFA – Programa de
Alfabetização, Documentação e Informação – tem como objetivo discutir a alfabetização e o letra-
mento nos contextos teórico, prático educativo e reflexivo da formação docente, proporcionando
espaços e material humano que instrumentalize essa formação complementar, almejando a que
essas discussões se reflitam de forma benéfica e profícua na prática docente inicial do graduando de

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
licenciatura em Pedagogia, Letras e Matemática.
Tal formação se faz diferenciada, pois se desenvolve de forma contextualizada e dialógica, sen-
do estruturada, semanalmente, da seguinte forma: às segundas-feiras são realizadas reuniões de
supervisão e planejamento pedagógico das coordenadoras do Programa com os bolsistas, a fim de
relatar, discutir, analisar e refletir sobre as práticas educativas realizadas em sala de aula, assim como
planejar e direcionar o desenvolvimento de novas práticas didático-pedagógicas. Nesse momento
ocorrem, de forma interdisciplinar, as trocas de conhecimentos, conceitos e novas ideias sobre a
prática docente; assim como é, também, um espaço para se apresentar dúvidas. Às sextas-feiras
são realizados os grupos de estudos teóricos ministrados pelas coordenadoras do Programa e/ou
professores convidados, através de palestras, leituras dirigidas e oficinas – esses estudos são deli-
mitados pela demanda apresentada nas salas de aula do PROALFA, assim como de dúvidas trazidas
pelos bolsistas ou as que forem suscitadas nas reuniões de supervisão e planejamento pedagógico.
Nas terças, quartas e quintas-feiras são realizadas as práticas de ensino-aprendizagem em sala de
aula – quer seja na própria universidade, como em outros espaços - com a utilização de linguagens
variadas e contemporâneas, buscando-se uma maior contextualização do trabalho desenvolvido.
A proposta de formação docente adotada por esse Programa inclui a renovação da prática lan-
çando mão das teorias defendidas por autores como Piaget, Ferreiro, Vygotsky, Paulo Freire e algu-
mas das práticas de Freinet.
O PROALFA abriga em seu corpo, além da equipe gestora e dos estagiários bolsistas, quatro tur-
mas de EJA, com um público de aproximadamente 60 alunos idosos. Os alunos são 90% mulheres,
na faixa etária compreendida entre os 60 e 85 anos de idade, viúvas e/ou aposentadas, em sua
maioria, e oriundas de diversas localidades da cidade. O nível de instrução dos alunos oscila entre
os níveis iniciais de alfabetização até o nível médio do ensino fundamental; com um contingente
médio de assiduidade entre 12 a 16 alunos por turma. Os motivos pelos quais os alunos chegaram
até o PROALFA são variados e vão desde a impossibilidade de terem estudado no tempo devido até
a busca por companhia e pertencimento a um grupo social.

A eAd, o proAlfA e A ejA


Na verdade haveria ainda muito mais que se falar sobre a EAD, a EJA e o PROALFA, porém destaco
apenas mais dois paralelos comuns: o jovem e, principalmente, o adulto, apresentando-se como
público para essas modalidades educacionais, que encontram nesses espaços uma oportunidade
de inserção e prosseguimento nos estudos; e a leitura, como prática/competência a ser construída
e/ou ampliada, se apresentando como ponto de intercessão a tocar esses três espaços formadores.
Sendo assim, a autora transita entre instâncias e espaços diferenciados de ensino-aprendizagem:
em sua educação formal regular (nível fundamental I, II e médio), na graduação EAD em Licenciatu-
ra em Pedagogia e como educadora, direcionada para a mediação na Oficina de Leitura, enquanto
estagiária bolsista no PROALFA, junto a alunos de EJA.
Assim, a graduação EAD, proporcionada através do Consórcio CEDERJ/UERJ, tanto quanto o
PROALFA, impulsionam à interatividade, à pesquisa, à observação com olhos críticos, à investigação,
à reflexão sobre nossas condutas e práticas; desafia ao conhecimento dos sujeitos da interlocução
docente – os alunos, a teoria, os contextos situacionais, os gestores em que se pode buscar apoio e
os colegas de estágio. E mais, desafiam o professor em formação a conhecer a si mesmo e a estender
seus limites enquanto educador e ser humano.

relAto de experiênciA nA oficinA de leitUrA


Assim como, efetivamente, só se aprende a ler, lendo, e a escrever, escrevendo (FREIRE, 1997), o
PROALFA acredita que a proficiência da prática docente se constrói enquanto a mesma se realiza.

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
Dessa forma, na primeira reunião de supervisão e planejamento pedagógico da qual participei, fui
informada que seria professora em exercício assistido desde o primeiro momento do estágio e que a
metodologia utilizada com as turmas é a mediação com projetos de trabalho – uma proposta muito
diferente da realidade que experimentei enquanto aluna no ensino fundamental e médio - um en-
sino totalmente cartesiano e tecnicista.
Entendi que não me diriam o que eu deveria ensinar sobre leitura, e tampouco me apresenta-
riam conteúdos. Recebi, porém, o primeiro conselho “Conheça os alunos e sinta o que esperam da
Oficina de Leitura, busque saber quais conhecimentos os alunos já possuem e o que você percebe
ser importante que eles aprendam, compare com as diretrizes curriculares para cada nível de apren-
dizagem”. A partir daí comecei a perceber como poderia montar uma grade de possíveis conteúdos
didáticos para trabalhar com os alunos. No entanto, ainda não tinha a menor ideia de como eu po-
deria trabalhar conteúdos didáticos com projetos de trabalho.
É curioso perceber o quanto nos espelhamos em experiências que vivemos anteriormente para
construir algo novo - nesse caso, a minha prática docente. Busquei me lembrar de como meus
antigos professores se conduziam em sala de aula, mas essa estratégia não foi promissora, pois
não encontrei em minhas lembranças nada que eu pudesse comparar à ideia de “ensino através de
projetos de trabalho”. Lembro-me de ter perguntado, a uma colega que estava ao meu lado, em um
tom de voz quase imperceptível, “Como é que se dá aula através de projetos temáticos?”, e ela, tão
insegura quanto eu, me respondeu “Eu também não sei!” Passado o susto inicial, percebemos que
não estaríamos sozinhas nessa empreitada, que seríamos preparadas e tutoradas para desenvolver
a docência lançando mão dessa metodologia de trabalho. Entretanto, me senti lançada ao desafio
e à pesquisa.

o começo
Tive uma ideia: porque não iniciar o trabalho com poesia? É uma linguagem suave e acessível a
quase todos os tipos de personalidade, em maior ou menor grau. Seria um bom começo para co-
nhecer as turmas, pensei.
E assim foi: apresentei-me às turmas falando um pouco de mim, da minha experiência como alu-
na e dessa nova experiência docente; busquei ser bastante sincera nas minhas explanações e me
coloquei acessível a qualquer esclarecimento ou pergunta que quisessem fazer, ressalvando, po-
rém, que também eu, assim como eles, estava aprendendo. Hoje, refletindo sobre essa experiência,
penso que essa postura dialógica que escolhi tomar desde o início fez toda a diferença.
O passo seguinte, adotado por mim, foi escrever no quadro, em letras bem grandes, a palavra
“OUSADIA!” - ainda me pergunto se naquele momento escrevi aquela palavra para os alunos ou
para mim mesma - e falei exatamente o que transcrevo abaixo:
“Tenho dois desafios para esta turma e não quero escutar coisas do tipo “...mas , tia, eu não sei!”
ou “eu não consigo!”. Saibam que para aprender coisas novas, ou coisas que consideramos difíceis é
preciso ter OUSADIA, ousadia para tentar até conseguir!”
Esta fala gerou muitas risadas e criou um clima descontraído. Falei então de Paulo Freire (1988)
e sua célebre sentença “A leitura de mundo precede à leitura da palavra”, com a intenção de que
tomassem consciência que todos nós possuímos conhecimentos valiosíssimos e formas de enten-
der o mundo que é somente nossa. Essa discussão gerou uma dimensão valorativa dos “mundos”
representados por cada aluno.
Trabalhei, inicialmente, com duas poesias de Mario Quintana e outras duas de Manoel de Barros,
disse-lhes que entre os dois poetas havia uma semelhança – os dois eram advogados. Pedi, então,
que buscassem perceber as diferenças entre eles na forma de escrever, que pudesse fornecer pistas
de como seria a leitura de mundo de cada um.

371
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
Ainda com a temática de “leitura de mundo”, pedi aos alunos que trouxessem de casa duas ou
três fotografias de épocas diferentes - queria que elas falassem sobre como enxergavam o mundo
que as cercava, o que sonhavam e o que faziam em épocas distintas de suas vidas. Queria que per-
cebessem que a imagem - no caso, as fotografias que trouxeram - também pode ser vista como um
texto e contar uma história, se estiver dentro de um contexto. Percebi um interesse por parte dos
alunos sobre esse novo conceito - de que podemos ler imagens também. Estávamos começando a
construir uma aprendizagem significativa.
Em seguida, levei uma imagem veiculada em uma campanha publicitária, mas antes separei to-
dos os elementos de seu discurso, e pedi que observassem as figuras que eu lhes mostraria. “Cada
uma delas tem o seu próprio significado”, disse, “vamos tentar descobrir o que cada uma delas diz se-
paradamente?”. Assim, fiz algumas perguntas provocadoras para que as alunas buscassem perceber
e apreender as informações contidas nas imagens – “o que há na primeira figura; as pessoas estão
tristes, alegres, zangadas...? Que tipo de relação essas pessoas podem ter?”. Dessa forma, apresentei
os elementos do discurso de forma sequencial, do primeiro até o último, sempre anotando em um
papel pardo, afixado na lousa, as respostas que eram dadas pelos alunos. “Mas, se unirmos as figuras
em uma só imagem, o que acontece?”, perguntei, e logo juntei todas as partes do folheto de pro-
paganda; “vira uma propaganda!”, responderam surpresos. Então apontei para as anotações feitas
no papel pardo, enquanto discutíamos sobre as possíveis informações contidas nas imagens, e per-
guntei qual era a história que a união de todas aquelas informações contidas nas imagens produzia,
e os alunos não tiveram a menor dúvida em responder: “o pai e o filho se gostam muito, são muito
amigos, então, no dia dos pais, o pai merece ganhar do filho um sapato novo, mas não de qualquer
marca, só da marca X que é a melhor e mais bonita!”.

Para completar o trabalho desenvolvido com as quatro turmas do PROALFA no primeiro semes-
tre do meu estágio, lancei mão do livro “A Caligrafia de Dona Sofia”, do autor André Neves, com o
qual pude trabalhar as lindas imagens que o livro possui, as poesias e a narrativa ao mesmo tempo,
culminando na produção de um painel coletivo, que denominamos “Parede Poética”, onde os alunos
das quatro turmas afixaram cartões com poesias, decorados com flores e folhas secas, produzidos
com base nas leituras das poesias, textos e imagens que realizamos ao longo do semestre.

372
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
A partir deste trabalho, desenvolvido igualmente em
todas as turmas nesta primeira fase do meu estágio, bus-
quei incluir nos semestres seguintes, além da leitura lite-
rária, outras possibilidades de leituras e releituras, em que
busquei pertencimento dentro do tema desenvolvido por
cada uma das turmas. Assim, fizemos visitas pedagógicas
com as turmas do PROALFA em espaços diversificados
Vamos ler o mundo!
Apresento a seguir o resumo de alguns dos trabalhos
desenvolvidos com as turmas do PROALFA.
- turma mangueira ii:
Esta turma estava trabalhando com o tema “Pelo traço
que me faço – a construção da identidade da gente cario-
ca.”
O trabalho com essa turma foi realizado aproveitando-se o perfil crítico-social aflorado na turma,
conjugando-se leituras e discussão de notícias de jornal e visitas pedagógicas - à casa de Rui Barbo-
sa e ao Centro Cultural da Justiça Federal - em que buscamos um perfil histórico crítico da cidade
do Rio de Janeiro. Como produto final, foi construída uma escultura com pequenas caixas de papel,
jornal e papel de presente para representar uma comunidade dentro da “Cidade Partida”, a qual foi
intitulada de “Favela Maravilha”.

- turma mangueira i:
O tema que estava sendo trabalhando nessa turma era “Liberdade, superação de limites e que-
bra de estereótipos”.

373
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
O trabalho foi realizado conjugando-se a leitura dramatizada do livro “Fernão Capelo Gaivota”, de
Richard Bach, a apreciação de um filme de desenho animado de nome “Como Treinar o Seu Dragão”,
e, como produto final, construiu-se a resenha do livro e a construção de um painel visual-narrativo
feito com pintura a lápis de cera e colagens com origami e barbante.
- turma UnAti iO
Tema para a Oficina de Leitura com essa turma era
Criatividade à Flor da Pele.
O trabalho envolveu a leitura, discussão e apreensão
dos sentidos de cada capítulo do livro “O Pequeno Prínci-
pe”, de Antoine de Saint-Exupéry; como produto final foi
produzida uma releitura de suas imagens em uma colcha
de retalhos.
Um fato ocorrido logo após a conclusão deste traba-
lho, que me marcou profundamente, foi o comentário
emocionado de uma das alunas “ O que mais me deixa
feliz, professora, é que a “senhora” não aceitou quando
eu disse que não ia conseguir... você acreditou na gente
e nos ajudou a conseguir!” (ALDA).

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Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
- Conhecendo, experimentando e nos apropriando de espaços construídos para produzir a práti-
ca leitora e a fruição literária – Bibliotecas.
Tão ou mais importante quanto o capital econômico, é o capital cultural de um povo. Uma das
formas de nos apropriarmos desse bem é através do desenvolvimento da prática leitora, assim como
conhecendo e desfrutando de espaços construídos para essa finalidade.

conclUsão
Todo esse processo de mediação objetivando à formação de uma prática leitora junto aos alunos
de EJA mostrou-se, para a minha surpresa, bivalente, em um sentido que explico a seguir:
Enquanto educadores, sabemos que em um discurso oral fazemos a leitura não somente da lin-
guagem verbalizada, mas também das outras linguagens que estiverem associadas a esse discurso
- como a gestual, a linguagem imagética, a sonora, a olfativa, ou tantas outras. No entanto o que
realmente proporciona avanço cognitivo, e agrega qualidade de vida ao sujeito que lê, é ter possibi-
lidade de reconhecer a presença dessas multilinguagens “nas entrelinhas” da escrita, ou da imagem,
ou de algum contexto que se apresente, etc - um texto dentro do texto - e assim, poder imaginar e
fruir as sensações sugeridas por um texto, seja literário ou não. Também, em muitas das linguagens
o discurso real é impalpável, precisa ser “sentido” – como nas artes plásticas ou música instrumental,
por exemplo. É certo que, como nos explica Rojo (2010), os níveis de letramento desempenhados
pelos sujeitos são diretamente proporcionais aos níveis de alfabetismo que esses possuem, por isso
a importância de se desenvolver uma prática docente responsável, crítica, contextualizada e, princi-
palmente, que tenha em alta consideração o sujeito que aprende - levando-se em conta sua especi-
ficidade, sua cultura, seus modos de aprender - tendo uma visão prospectiva desse sujeito.
Confesso que essa consciência - de uma forma clara, reconhecível e que se transforma em instru-
mento de apreensão, ampliação de conceitos, possibilidade de inferência e/ou transformação de
mundo - foi, também para mim, uma conquista recente, mais precisamente durante a graduação,
mais precisamente ainda, durante o meu estágio no PROALFA - sendo professora de um grupo de
idosos.
Antes de passar por essa experiência, eu tinha absoluta certeza de que sabia ler e escrever muito
bem. No entanto, precisei rever meus conceitos sobre leitura.
O fato é que, como nos instrui Ferreiro (1988), ler é realmente muito mais do que decodificar, vem
muito antes e vai muito além de se aprender a identificar as letras e associá-las a fonemas; porém
a grande maioria das pessoas acha que ler é decodificar símbolos grafados em alguma superfície e
que escrever é transcrever o que se ouve – infalivelmente e sem erros!
Eu antes também pensava assim, e me orgulhava dos parágrafos que lia sem embaraço, porém
descobri, com um senhor lá de Pernambuco, que “a Leitura de mundo precede a leitura da palavra”!
E, sobre tudo o que foi abordado nesse relato de experiência, há apenas mais um fato que pre-
ciso confessar: enquanto aprendo a ser professora no PROALFA, enquanto ensino a meus alunos,
também eu aprendo a ler.

referenciAs bibliográficAs:
FERREIRO, Emília. Reflexões sobre Alfabetização.São Paulo: Corez. 1988.
FREIRE, Paulo. A Importância do Ato de Ler: em três artigos que se completam. 22 ed. São Paulo:
Cortez, 1988.  
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997.
PESCE,Lucila. Cibercultura:Oque muda na Educação? Texto 1: EAD: antes e depois da cibercultura. p.
10. Programa Salto para o futuro, 2011.

375
Categoria: Comunicação | Subtema 2: Alfabetização, Letramento e Linguagens Contemporâneas
ROJO, Roxane. E uma educação pro povo,tem? Rio de Janeiro: Caetés,2010.
SILVA, Marcos. Sala de Aula Interativa. Rio de janeiro: Quartet, 2000.
notas:
1. Somente na metade dos anos de 1980, aparece a denominação Educação de Jovens e Adultos (EJA), provocada pela juveni-
lização dos sujeitos que a demandam, até então se fazia referência à Educação de Adultos (EDA). (MOURA, 1999,p.62).
2. Educação de Jovens e Adultos, doravante EJA.
3. Em 2013, a taxa de analfabetismo das pessoas de 15 anos ou mais de idade foi estimada em 8,5%, o que corresponde a 13,0
milhões de pessoas. Dados da última PNAD, divulgada pelo IBGE. Disponível: http://saladeimprensa.ibge.gov.br/noticias?view=notic
ia&id=1&busca=1&idnoticia=2722.Acesso 18/09/2014
4. Freire não fazia referência ao termo letramento, mas sua proposta metodológica e a prática de alfabetização que desenvol-
via podem ser consideradas como “letramento social radical”. (SOARES, 1998)

376
cAtegoriA 1

comUnicAção

sUbtemA 3

polítiCaS públiCaS
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
entre o dito e o feito: Um estUdo de cAso sobre As
políticAs públicAs pArA A edUcAção de joVens e
AdUltos
eric henriqUe ferreirA jordão | liliAne bArreirA sAnchez | pAtríciA
ferreirA de AndrAde

introdUção
A proposta deste trabalho de pesquisa surgiu a partir da participação no grupo de Pedagogia do
Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência - (PIBID) da Universidade Federal Rural do
Rio de Janeiro (UFRRJ), por ocasião da observação das turmas de oitavo e nono anos do ensino fun-
damental e turmas do primeiro ao terceiro anos do ensino médio da Educação de Jovens e Adultos
- (EJA) de uma escola pública do município de Seropédica.
Durante a vivência desta experiência, que durou dois anos e três meses, pudemos perceber al-
gumas situações que traziam um incômodo muito grande, bem como algumas práticas comuns no
dia-a-dia da escola que se contrapunham às nossas ideias e às teorias aprendidas na academia. A
experiência na escola serviu para nos mostrar a necessidade de melhor compreensão das políticas
públicas da EJA, sobre as quais muito se ouve falar, mas, na maioria dos casos, seu entendimento
não é tão simples.
Pensamos no tema das políticas públicas por conta de algumas situações vividas na escola, que
nos levaram a pesquisar sobre as políticas educacionais específicas para a Educação de Jovens e
Adultos – EJA. Como a escola faz parte da Secretaria de Educação do Estado do Rio de Janeiro – (SEE-
DUC – RJ), a intenção foi pesquisar a existência destas políticas, se elas são implementadas na escola
e de que forma isto acontece.
De acordo com uma das pesquisas desenvolvidas pelos bolsistas do PIBID e supervisionada pela
professora Liliane Sanchez, os professores que atuavam na EJA não tiveram em sua formação uma
disciplina específica de EJA na graduação, nem mesmo uma disciplina optativa. Preferencialmente,
os professores novos que chegavam à escola eram escalados para trabalhar na EJA, pois, os antigos
não se interessavam em trabalhar com esta modalidade. A pesquisa demonstrou que a maioria dos
professores que atuavam nesta modalidade não estava satisfeita, e não tinha prazer em trabalhar
com estes alunos.

releVânciA do temA e orgAnizAção do estUdo


A avaliação do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica – IDEB da escola investigada se
manteve abaixo da média projetada nos anos de 2007, 2009 e 2011, como pode ser observado na
tabela abaixo.

Observa-se que a escola apresentou crescimento do ano de 2009 para 2011, mas, ainda assim fi-

378
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
cou abaixo da meta projetada. Por conta deste desempenho, a escola passou a receber uma atenção
especial da GIDE – Gestão Integrada da Escola, que em conformidade com a definição da SEEDUC
- RJ, “... é um sistema de gestão que contempla aspectos estratégicos, políticos e gerenciais da área
educacional com foco em resultados”.
Observa-se que a escola em análise apresentou queda no resultado do IDEB de 2005 para 2007,
manteve o resultado em 2009, e em 2011 apresentou melhora. Esta pesquisa não se propõe a verifi-
car os aspectos que levaram a esta melhora, mas, ainda assim, cabe o questionamento: teria sido por
causa das atividades ou do gerenciamento que a matriz GIDE permite verificar em relação à gestão
dos diversos setores da escola?
O quadro fornecido pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
– INEP, não informa se o resultado é do ensino fundamental regular, ou do ensino fundamental da
modalidade de EJA. Consideramos que a pesquisa realizada pelo INEP deve contemplar este aspec-
to: o resultado separado em relação às duas modalidades, para que se tenha uma visão mais clara
em relação ao desempenho de ambas. Em conversa informal com uma professora da instituição foi
possível verificar que a EJA não obteve resultado satisfatório na avaliação de 2011 nem foi possível
estabelecer parâmetro em relação ao ano de 2009. Estas informações não foram ratificadas durante
a pesquisa na qual busquei verificar a existência de políticas específicas para EJA por parte da SEE-
DUC – RJ e se elas estão sendo trabalhadas no CIEP 155.
Para desenvolvermos o tema proposto neste trabalho, faz-se necessário apresentar, antes de tudo,
uma contextualização histórica da EJA para melhor compreensão do atual quadro do Ensino de Jo-
vens e Adultos, que compreende o início da junta provisória formada por Vargas, que mostra que o
índice de analfabetismo brasileiro era de 65%, até o ano de 1947, quando o Brasil cria a 1ª Campanha
de Educação de Adultos, em atendimento à solicitação da Organização das Nações Unidas para a
Educação, Ciência e Cultura – UNESCO.
Também consideramos relevante abordar o momento do encerramento da 1ª Campanha de al-
fabetização, em 1963, e a importância da escolha do educador Paulo Freire para a organização e o
desenvolvimento do Programa Nacional de Alfabetização de Adultos. Destacamos, ainda, a extinção
de projetos de caráter emancipatório, após o golpe militar de 1964 e a ação ocorrida em 1967, quan-
do o Governo assumiu a alfabetização de adultos e criou o Movimento Brasileiro de Alfabetização
(MOBRAL).
Encerramos a contextualização histórica, fazendo um apanhado da criação da modalidade EJA e
suas ramificações como o PROEJA, até os dias atuais. Acreditamos que este levantamento histórico
foi necessário para caracterizar a importância desta modalidade de ensino tão discriminada pela
sociedade civil, seja pela vertente da cidadania ou pelo aspecto cultural e econômico.
A pesquisa em relação às políticas educacionais específicas para a EJA existentes na SEEDUC - RJ
serviram para auxiliar a compreensão sobre como esta modalidade de ensino é vista pelo Governo
do Estado do Rio de Janeiro e quais as propostas governamentais para a Educação de Jovens e Adul-
tos. Para melhor compreensão e entendimento desta pesquisa, foi necessária uma contextualização
em relação às políticas públicas educacionais.
Por fim, o estudo aqui apresentado pretende servir para verificar se as políticas educacionais es-
pecíficas elaboradas para a EJA estão sendo implementadas na escola investigada. Em caso positivo,
saber como estão sendo trabalhadas e quais os resultados obtidos; em caso negativo, identificar
porque não estão sendo trabalhadas.
Em um contexto contemporâneo, o Neoliberalismo se configura por uma série de medidas e pro-
postas com o intuito de promover menor intervenção por parte do Estado nas políticas econômicas,
permitindo assim que a economia fique a cargo da livre concorrência de mercado, é a “política do
Estado mínimo”. Para promover melhor entendimento dos impactos do Neoliberalismo na socieda-
de, Otranto (1999, p.12) explica que:

379
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
A proposta neoliberal passa a ser vista como o “remédio” para a nova crise do
capitalismo que se configura, então, como: a) a crise do financiamento das necessi-
dades básicas da sociedade pelo Estado; b) a crise da produção e da reprodução das
condições gerais do capital e financiamento dos ganhos das classes trabalhadoras;
c) a crise do capital e de suas taxas de lucro; d) a crise fiscal e a perda do contro-
le monetário das economias dos países, principalmente os do chamado, na época,
“Terceiro Mundo”. É a crise do fundo público que traz, com ela, a tendência de perda
dos direitos sociais e o consequente aumento da exclusão.

Neste sentido, percebemos que a perda dos direitos sociais e a exclusão dos indivíduos perten-
centes às camadas mais pobres da sociedade, são consequências do efeito da globalização. As ideias
neoliberais são então apresentadas como a única alternativa possível.

A idéia mais trabalhada no plano da ideologia neoliberal é de que não há ne-


nhuma outra alternativa para o mundo a não ser a de ajustar-se à reestruturação
produtiva promovida pela globalização. A receita para este ajuste passa pela des-
regulamentação, pela descentralização e pela privatização.” (OTRANTO, 1999, p.13)

Outro aspecto do Neoliberalismo está relacionado às políticas de castigo e premiação que esti-
mulam a competitividade entre os colaboradores de uma empresa, no caso da educação, estamos
falando de uma competição entre os professores, uma verdadeira corrida para saber quem é o pro-
fessor mais competente. Se uma política como esta fosse instituída nas redes de ensino, estaríamos
testemunhando uma diminuição dos direitos destes profissionais. Gentili (2004) mostra como os
neoliberais explicam a incapacidade de gestão do Estado e, consequentemente, a ineficiência e bai-
xa produtividade da escola.

Segundo os neoliberais, esta crise se explica, em grande medida, pelo caráter es-
truturalmente ineficiente do Estado para gerenciar as políticas públicas. O clientelis-
mo, a obsessão planificadora e os improdutivos, labirintos do burocratismo estatal
explicam, sob a perspectiva neoliberal, a incapacidade que tiveram os governos para
garantir a democratização da educação e, ao mesmo tempo”, a eficiência produtiva
da escola. A educação funciona mal porque foi malcriadamente peneirada pela po-
lítica, porque foi profundamente estatizada.

Nesse sentido, consideramos o neoliberalismo como a promessa de uma exclusão mais severa do
que a que já está instituída em nossa sociedade.
Encerramos a contextualização histórica, fazendo um apanhado da criação da modalidade EJA e
suas ramificações, como o PROEJA, até os dias atuais.
A pesquisa em relação às políticas educacionais específicas para a EJA existentes na SEEDUC - RJ
serviram para auxiliar a compreensão sobre como esta modalidade de ensino é vista pelo Governo
do Estado do Rio de Janeiro e quais as propostas governamentais para a Educação de Jovens e Adul-
tos.
Por fim, o estudo aqui apresentado pretende verificar se as políticas educacionais específicas ela-
boradas para a EJA estão sendo implementadas na escola investigada. Em caso positivo, saber como
estão sendo trabalhadas e quais os resultados obtidos.

380
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
Metodologia da pesquisa
Trata-se de uma pesquisa básica, qualitativa, com foco na política educacional de EJA.
Para a realização deste projeto de pesquisa, foi feita, inicialmente, uma pesquisa bibliográfica
em livros, revistas e artigos científicos disponíveis em páginas da internet, com a finalidade de fazer
uma contextualização histórica em relação à evolução da EJA no Brasil. De acordo com os objetivos,
consideramos que a pesquisa é descritiva.
Posteriormente, partimos para uma pesquisa no “portal” da Secretaria Estadual de Educação do
Rio de Janeiro com o objetivo de identificar a existência de políticas educacionais específicas para a
EJA e saber qual o objetivo destas para a comunidade beneficiada por estas políticas.
Na sequência, aplicamos um questionário estruturado composto de perguntas abertas e fecha-
das aos gestores da escola e também aos professores da EJA, com o objetivo de identificar se exis-
tem e quais são as políticas educacionais específicas para a EJA trabalhadas na escola, evidenciando
seus acertos e desacertos em relação à aprendizagem dos alunos atendidos.
A análise dos dados permitiu entender como foram criadas as políticas educacionais, compre-
ender a relação destas políticas no nível estadual com a escola em questão e o impacto que estas
podem provocar na mesma. Foi possível entender como uma política educacional pode influenciar
positivamente ou negativamente no processo ensino-aprendizagem da EJA na referida escola.

políticAs públicAs edUcAcionAis específicAs dA ejA existentes nA


seedUc - rj
Neste capítulo, a intenção é fazer um levantamento das políticas públicas específicas para a EJA
existentes na SEEDUC – RJ. Este trabalho de busca foi realizado diretamente no portal da SEEDUC –
RJ, no qual não foi possível perceber quais políticas estão ou não em vigor, salvo aquelas que foram
implementadas recentemente, como é o caso da Nova EJA que entrou em vigor no ano letivo de
2013. Na pesquisa realizada no portal SEEDUC – RJ encontramos onze programas relativos à EJA,
que são: CES – Centro de Estudos Supletivos; EJA semipresencial; EJA Educação a Distância; Proeja;
Programa Brasil Alfabetizado (Convênio com o Governo Federal); Programa Autonomia; NACES –
Núcleos Avançados de Estudos Supletivos; NACEJA – Núcleo Avançado do Centro de Estudos de
Jovens e Adultos; Nova EJA – Ensino de Jovens e Adultos; EJA – Programa Educação para Jovens e
Adultos (presencial) e EJA – Modalidade semi-indireta.
No caso do NACES – Núcleos Avançados de Estudos Supletivos e do NACEJA – Núcleo Avançado
do Centro de Estudos de Jovens e Adultos, não encontramos no portal da SEEDUC – RJ uma informa-
ção que confirmasse que o NACEJA substituiu o NACES, mas constatamos no blog do Núcleo Avan-
çado do Centro de Estudos de Jovens e Adultos de Paciência que o NACEJA é o antigo NACES. Já no
portal da SEEDUC – RJ existe um documento de 2006 (relação dos centros de estudos no Estado do
Rio de Janeiro) que faz menção aos programas, Centro de Estudos Supletivos, Modalidades e NACES.
Em relação à EJA – Modalidade semi-indireta, só encontramos menções ao nome desta política.
Como não foi possível identificar o funcionamento da referida modalidade, a alternativa possível foi
buscar uma política que se aproximasse desta, como foi o caso da modalidade indireta.
Já o Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Moda-
lidade de Educação de Jovens e Adultos – PROEJA, é um projeto do Governo Federal que está sob a
administração da Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica do Ministério da Educação (Se-
tec/Mec) e funciona em duas unidades de ensino da Fundação de Apoio à Escola Técnica – (Faetec),
para cursos com matriz integrada da Educação Profissional Técnica de Nível Médio, caracterizado
pela matrícula única, que determina a integração dos currículos da educação profissional com o
Ensino Médio. O objetivo é dar qualificação profissional a estes estudantes, que não concluíram o
Ensino Médio na época certa.

381
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
O  MEC realiza, desde 2003, o Programa Brasil Alfabetizado (PBA), voltado para a alfabetização de
jovens, adultos e idosos. O programa é uma porta de acesso à cidadania  e o despertar do interesse
pela elevação da escolaridade. O Brasil Alfabetizado  é desenvolvido em todo o território nacional,
com o atendimento prioritário a 1.928 municípios  que apresentam taxa de analfabetismo igual ou
superior a 25%. Desse total,  90%  localizam-se na região Nordeste. Esses municípios recebem apoio
técnico na implementação das ações do programa, visando garantir a continuidade dos estudos
aos alfabetizandos. Podem aderir ao programa, por meio das resoluções específicas publicadas no
Diário Oficial da União, estados, municípios e o Distrito Federal.
Programa Autonomia – uma iniciativa do Governo do Estado do Rio de Janeiro em parceria com
a Fundação Roberto Marinho. Atualmente, 48% dos alunos da rede pública estadual de ensino têm
idade incompatível com o ano que cursam. Como alternativa, o programa Autonomia, que adota a
metodologia do Telecurso, propõe um aprendizagem contextualizada e colaborativa. Sua concep-
ção pedagógica utiliza a cultura popular e explora as peculiaridades e regionalismos para dentro de
sala de aula. Além do Programa Autonomia, a Secretaria adota outras ações para reduzir os indica-
dores de defasagem idade-série na rede pública estadual e permitir a obtenção de um fluxo escolar
compatível com os seus objetivos e metas, como a nova EJA (Educação de Jovens e Adultos), a Recu-
peração Paralela e o Reforço Escolar.
O ensino, diferentemente do da escola regular, realiza-se por meio do estudo de módulos (ins-
trumentos didáticos de autoinstrução) e do acompanhamento individualizado realizado pelos pro-
fessores, orientadores da aprendizagem, nos plantões tira-dúvidas. Após o estudo dos conteúdos
referentes a cada módulo o aluno presta avaliação, cujo percentual de acerto deve ser de 80%. O
curso é semipresencial. O aluno estuda em casa e deve comparecer no mínimo quatro vezes por mês
para tirar suas dúvidas nas sessões de estudo ou para fazer as avaliações.
O NACEJA é uma escola pública estadual de Ensino Médio e Fundamental para jovens e adultos.
Oferece ensino semipresencial através de módulos, com acompanhamento e avaliações individua-
lizadas. É uma alternativa eficiente para quem precisa concluir ou regulamentar a sua vida escolar.
A Nova EJA surge, como uma nova proposta de educação e substituirá aos poucos a EJA presen-
cial, esta nova política está direcionada para ser trabalhada apenas no ensino médio, pois a EJA do
ensino fundamental está migrando para as prefeituras. A SEEDUC – RJ tem um plano bastante arro-
jado para a Nova EJA. Identificamos esta proposta divulgada no portal da própria instituição:

O que é a Nova EJA?


É a nova política de Educação de Jovens e Adultos (EJA) do Governo do Estado do
Rio de Janeiro. Ela foi elaborada pela Secretaria de Estado de Educação, em parceira
com a Fundação Centro de Ciências e Educação Superior à Distância do Estado do
Rio de Janeiro (Cecierj), e será implantada a partir de 2013 em todas as escolas que
ofertam EJA no Ensino Médio.

A Nova EJA é a melhor opção para quem tem 18 anos ou mais e quer concluir o Ensino Médio com
qualidade e em menos tempo.(RIO DE JANEIRO, 2012)
A Nova EJA foi implementada na escola pesquisada no ano de 2013 para substituir a EJA presen-
cial no ensino médio, e a SEEDUC – RJ coloca esta modalidade como a melhor alternativa para quem
tem mais de 18 anos e quer concluir o ensino médio em menos tempo e com qualidade. A diferença
entre esta modalidade e a EJA presencial está relacionada ao tempo de aula que foi reduzido para
três horas e vinte minutos por dia (menos tempo que a EJA presencial) e a conclusão se dá em dois
anos divididos em quatro módulos (a EJA presencial era concluída em um ano e seis meses com três
módulos).

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
ejA – progrAmA edUcAção pArA joVens e AdUltos (presenciAl)

O curso presencial de EJA está organizado da seguinte forma:


1º segmento/ Ensino Fundamental – Anos Iniciais: duração de quatro semestres, com carga horá-
ria de 1.600 (mil e seiscentas) horas.
2º segmento/ Ensino Fundamental – Anos Finais: duração de quatro semestres, com carga horária
de 1.600 (mil e seiscentas) horas.
3º segmento/ Ensino Médio: duração de três semestres, com carga horária de 1.200 (mil e duzen-
tas) horas. (RIO DE JANEIRO, 2012)

Em relação às políticas pesquisadas no portal da SEEDUC – RJ, algumas dificuldades foram en-
contradas por conta da falta de informações importantes, como por exemplo, a data de criação das
políticas, público alvo, se estão vigentes ou não e qual a metodologia usada em cada política.
Como a Nova EJA tem muito pouco tempo de implantação, qualquer tipo de avaliação é muito
precoce, mas alguns cuidados na implementação deste programa foram tomados, entre eles temos:
currículo e metodologia específicos da EJA, material didático apropriado, professores recebem for-
mação adequada à modalidade e a promessa de recursos multimídia com aulas dinâmicas. Essas
mudanças agradaram os professores momentaneamente, resta saber se os resultados em relação ao
processo ensino-aprendizagem dos alunos serão obtidos, mas esta informação só será possível após
a formatura das primeiras turmas.
Pelo que foi pesquisado no site da SEEDUC – RJ, estas são as políticas públicas educacionais espe-
cíficas da EJA, algumas estão em processo de descontinuidade como é o caso da EJA presencial, que
está sendo substituída pela Nova EJA.

A escolA pesqUisAdA
Nesta parte do trabalho, iniciamos com uma apresentação da escola investigada, que apresenta
uma boa infraestrutura, por tratar-se de um “brizolão”. Em relação à organização da escola, observa-
mos que a equipe de gestão é bastante cuidadosa. O CIEP 155 funciona em três turnos com turmas
de EJA no ensino fundamental e no ensino médio e turmas regulares também do ensino fundamen-
tal e médio. Destacamos que a escola está passando por um processo de transição, que consiste na
migração para a prefeitura de todo o ensino fundamental, fato pelo qual a escola só tem uma turma
de nono ano da EJA, ou seja, a escola só atenderá o ensino médio regular e EJA.
No turno da manhã a escola tem uma turma da Nova EJA no módulo quatro, na parte da tarde
uma turma do nono ano, duas turmas do ensino médio da EJA (uma turma do segundo ano e outra
de terceiro ano) e também uma turma da Nova EJA no primeiro módulo. No turno da noite são cinco
turmas, três da EJA, sendo uma turma do segundo ano e duas do terceiro ano do ensino médio e
duas turmas da Nova EJA, sendo uma do segundo módulo e a outra do terceiro módulo. O Projeto
Autonomia só tem uma turma que funciona na parte da manhã.
O questionário foi aplicado com três gestoras da escola, incluindo a diretora geral e quatro pro-
fessores que atuam na EJA. Foram entregues oito questionários e só uma professora não respondeu.
Desta forma, consideramos satisfatório o retorno conseguido em relação às respostas.
O questionário estruturado foi organizado com três perguntas, sendo uma objetiva e duas subje-
tivas. Com relação à primeira questão que estava relacionada à quais políticas da SEEDUC – RJ estão
implementadas na escola, os professores foram unânimes e marcaram três políticas das onze exis-
tentes na SEEDUC – RJ, que são: Programa Autonomia, EJA Presencial e Nova EJA.

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
considerAções finAis
Com relação ao objetivo principal da pesquisa (existência de políticas específicas para a EJA),
verificamos que elas existem e não são poucas. No levantamento feito, identificamos 11 políticas
instituídas na SEEDUC – RJ. Verificamos que existem três políticas públicas educacionais específicas
da EJA instituídas na escola e os profissionais envolvidos no processo de educação estão bastante
conscientes destes programas. Ficou claro que a SEEDUC – RJ está com um novo programa para esta
modalidade que é a Nova EJA e, pelo que os professores comentaram, é uma proposta mais atraente
para os alunos, pois o tempo em sala de aula foi reduzido e os módulos de estudo foram aumenta-
dos. Anteriormente, o ensino médio era concluído em um ano e meio; com a Nova EJA, os alunos vão
estudar três horas e vinte minutos por dia e irão completar o ensino médio em dois anos, que agora
ficou dividido em quatro módulos. Mas, ainda é muito cedo para tecer maiores comentários, pois a
nova política entrou em vigor no ano letivo de 2013.
Os professores pesquisados só reclamaram em relação à organização dos tempos de aula, que
agora passam a ter a hora aula com cinquenta minutos, e alguns professores que iam para a escola
dois dias por semana antes desta nova política, agora podem ser obrigados a trabalhar mais um dia
da semana, pois antes a hora aula era de quarenta e cinco minutos.
A escola, por ser pertencente à SEEDUC – RJ está encerrando a EJA presencial, que passará a ser
responsabilidade dos municípios. Não foi possível pesquisar como as prefeituras vão trabalhar com
este segmento de ensino, ficando esta informação para uma próxima oportunidade de estudo.
Outro programa da SEEDUC – RJ que está sendo trabalhado na escola é o Projeto Autonomia que
conta com uma turma no turno da manhã.
Foi possível perceber neste trabalho, que os profissionais pesquisados são bastante comprome-
tidos com as turmas da EJA, mas ainda existem diversos aspectos, como: currículo específico, carga
horária e preparação para o mercado de trabalho que precisam ser melhorados, para que a EJA pos-
sa se tornar uma modalidade de ensino que atenda melhor a sua clientela.

referênciAs bibliográficAs
ANDRADE, P. F. ; JORDAO, E. H. F. ; SANCHEZ, L. B. . Os Professores da EJA e o Processo de Inclusão de
Estudantes com Necessidades Especiais: Um Estudo de Caso. 2011. (Trabalho apresentado na Associa-
ção Educacional Dom Bosco – AEDB, em setembro de 2011, durante o VI Simpósio Pedagógico – SIM-
PED.
DISTRITO FEDERAL. Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal. Secretaria Estadual de
Educação. educação de jovens e Adultos. 2014. Disponível em: <http://www.se.df.gov.br/compo-
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GENTILI, Pablo. neoliberalismo e educação: manual do usuário. 2004. Disponível em: <http://fir-
goa.usc.es/drupal/node/3036>. Acesso em: 23 mar. 2014.
INEP-INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA. IDEB – Re-
sultados e Metas. Disponível em: <http://ideb.inep.gov.br/resultado/> Acesso em: 30 de abril de 2014.
OTRANTO, Célia Regina. O neoliberalismo como proposta hegemônica. In CPDA, Nº 10, Setem-
bro/1999, p. 11-18.
RIO DE JANEIRO. Secretaria Estadual de Educação. Secretaria Estadual de Educação. ejA – educação
de jovens e Adultos. 2012. Disponível em: <http://www.rj.gov.br/web/seeduc/exibeConteudo?article-
-id=1218574>. Acesso em: 24 mar. 2014.

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
A noVA ejA: por UmA óticA diferenciAdA
cristiAnA bArcelos dA silVA

Este trabalho é fruto de uma pesquisa realizada no primeiro semestre do ano 2014, em uma ins-
tituição estadual de educação do Rio de Janeiro. A pesquisa objetivou compreender as opiniões
dos discentes de uma escola pública, localizada no interior norte do estado, sobre uma proposta de
programa denominada “Nova Eja”, implementada pela Secretaria de Estado de Educação do Estado
do Rio de Janeiro (SEEDUC) a partir do ano de 2013. Utilizou-se como referencial teórico-metodoló-
gico a produção oral dos alunos, enquanto aporte teórico e constructo metodológico utilizado na
pesquisa de fenômenos sociais no sentido de contribuir para uma proposição de discussões que
relacione significação e realidade. Optou-se pela pesquisa empírica qualitativa tendo como foco
de análise os alunos matriculados no programa no primeiro semestre do ano letivo de 2014. Em
um primeiro momento, foi feita uma reflexão histórica sobre a Educação de Jovens e Adultos (EJA)
no Brasil, bem como as políticas para essa modalidade de ensino pós Lei de Diretrizes e Bases da
Educação 9394/96. Posteriormente, foram analisados os dados obtidos por meio da aplicação de
um instrumento de geração de dados, a fim de alcançar o objetivo da pesquisa. Assim, a pesquisa
buscou explorar as produções orais expressas pelos sujeitos sociais, a respeito de uma nova política
de Educação para jovens e adultos, com metodologia e currículo específicos, material didático pró-
prio, recurso multimídia para serem trabalhados com alunos em defasagem idade/série e formação
continuada de professores para atuarem no programa. Os resultados revelaram, que as ideias que os
alunos têm sobre essa nova estrutura de educação para jovens e adultos, nos parece estar ancorada
na superficialidade e no “achismo”.

palavras-chave: Educação de Jovens e Adultos, EJA, Políticas Públicas

1. introdUção
Este trabalho, realizado no 1º semestre do ano de 2014, procurou analisar e discutir o Programa
Nova Eja, no contexto das recentes mudanças propostas para a modalidade de Educação para Jo-
vens e Adultos (EJA), inclusive após a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases (LBD) 9.394/96.
Para tanto, inicialmente se fez necessário conhecer um pouco da história da Educação de Jovens
e Adultos no Brasil. Em seguida, analisou-se previamente, aspectos ligados a elaboração teórica da
Nova Política de EJA proposta pela Secretaria Estadual de Educação do Rio de Janeiro (SEEDUC). Em
outro momento, a partir da análise de dados coletados junto a alunos de uma escola pública esta-
dual de Educação Básica, localizada no interior do estado do Rio de Janeiro, procuramos situar nesse
contexto particular, a questão do Programa “Nova Eja”, a fim de verificar o nível de conhecimento do
programa por parte dos alunos e conhecer a opinião do grupo participante da pesquisa a respeito
de algumas de suas características.

2. dA históriA dA edUcAção de joVens e AdUltos no brAsil


Um dos pressupostos para refletir sobre o homem é a questão da temporalidade e, portanto, da
história. Por isso, podemos afirmar, que a trajetória EJA no Brasil, apresentou inúmeras variações do
ponto de vista humano, demonstrando estar estreitamente ligada às transformações sociais, eco-
nômicas e políticas que acabaram por caracterizar os diferentes momentos dessa modalidade de
ensino.
No período colonial a ausência de políticas públicas resultou em ações elaboradas pelos jesuítas,

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
voltadas para a alfabetização de cunho catequista e mais tarde, para que trabalhadores realizassem
algumas tarefas exigidas pelo Estado. Com a expulsão da Companhia de Jesus no século XVIII, o sis-
tema de ensino se desorganiza e novas iniciativas só resurgem no período imperial.
No Império, a vinda da família real permitiu a consolidação de um sistema público de educação
elementar, quando a Constituição Federal de 1824 previa a oferta de curso primário gratuito para
os não-escravos. O índice de analfabetismo era tão grande que, ações filantrópicas se ocuparam em
oferecer por meio da educação, uma espécie de regeneração da disciplina aos pobres brancos e
negros libertos.
Em 1930, foi criado o Ministério da Educação, quando o seu primeiro ministro Francisco Campos,
criou o Conselho Nacional de Educação, período em que instituiu o ensino comercial e reformou o
secundário. Desse modo, foram que as primeiras iniciativas sistemáticas em relação à EJA surgiram a
partir da década de 1930, ocasião em que a Constituição de 1934 estabeleceu a criação de um Plano
Nacional de Educação, que indicou pela primeira vez no país a educação de adultos como dever do
Estado e que a oferta de ensino público primário gratuito e obrigatório tornou-se direito de todo o
cidadão, extensivo aos jovens e adultos.
Segundo Ventura (2001) a revolução de 30 foi um marco na reformulação do papel do Estado no
Brasil. Nesse momento, as políticas públicas se efetivavam a partir da necessidade de qualificação e
diversificação da mão de obra trabalhadora. Assim, a questão da EJA ganhou expressão, como en-
godou de maneira geral o professor Frigotto:

A Educação e a formação humana terão como sujeito definidor as necessidades,


as demandas do processo de acumulação do capital sob diferentes formas histó-
ricas de sociabilidade que assumir. Ou seja, reguladas e subordinadas pela esfera
privada, e a sua reprodução. (p.30)

As décadas posteriores aos anos de 1940 foram de efervescência do ponto de vista das políticas
públicas na área da EJA, pois foram marcadas por algumas iniciativas políticas e pedagógicas que
ampliaram ainda mais as discussões em torna dela, como: a regulamentação do Fundo Nacional do
Ensino Primário (FNEP) que previa o repasse de 25% de recursos da União aos Estados para serem
aplicados na educação supletiva dos adultos, a criação do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
(INEP) que dedicou-se a fomentar e publicar obras ligadas ao ensino supletivo, o lançamento da
Campanha de Educação de Adolescente e Adultos (CEAA) que somada a Campanha Nacional de
Educação Rural (CNER), visavam alfabetizar e aprofundar o trabalho educativo e a Campanha Na-
cional de Erradicação do Analfabetismo (CNEA) que marcou uma nova etapa nas discussões sobre a
educação de adultos. (Beisiegel, 1982).
Vale destacar que após década de 40 o analfabetismo passa a ser visto como grande problema
nacional, uma vez, que era em torno de 55% de toda a população brasileira. O pesquisador Osmar
Fávero interpreta o lançamento das campanhas emergências para a diminuição do analfabetismo
da seguinte maneira:

(...) mesmo partindo de um conceito extremamente limitado de analfabeto e tra-


balhando com um conceito restrito de analfabetismo/alfabetização, as campanhas
significaram um movimento positivo do Estado e da sociedade brasileira, no aten-
dimento às necessidades educacionais da população adolescente, jovem e adulta
mais pobre (Fávero, 2004, p.17).

Ainda na década de 40, a educação passa a ser uma questão de segurança nacional, uma vez que
a pouca instrução do povo brasileiro, significara um grande atraso sócio-cultural do país, tanto que

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
o governo criou o sistema “S”, inaugurando em 1942 o SENAI (Serviço Nacional de Aprendizagem In-
dustrial) com a missão de treinar e qualificar mão de obra para a produção fabril e em 1946, o SENAC
(Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial). Ainda em 47, o I Congresso Nacional de Educação
de Adultos refletiu o desejo de expansão da escolarização dos jovens e adultos, lançando o slogan
“Ser brasileiro é ser alfabetizado”.
Em 1958, ocorreu o II Congresso Nacional de Educação de Adultos, com destaque na filosofia
do educador Paulo Freire, que defendia as ideias progressivas de uma educação igualitária e com
intensa mobilização popular.
A partir da década de 60, movimentos populares se organizaram no Norte e Nordeste do Brasil,
em prol da alfabetização de jovens e adultos. Em Recife, nasceu, o Movimento de Cultura Popular, os
Centros de Cultura Popular da União Nacional dos Estudantes e o Movimento de Educação de Base.
Em Natal a Campanha “De pé no chão também se aprende a ler” e a Campanha de Educação Popular
da Paraíba. Os representantes destes grupos se organizaram e pressionaram o governo federal a fim
de que este oferecesse apoio e coordenasse tais iniciativas a nível nacional, o que fora feito no ano
de 1963, ano em que se cria o Plano Nacional de Alfabetização, como reforça Guadêncio Frigotto:

Na década de 50 e início
da década de 60, esboçou-se, na sociedade brasileira, em
todos os âmbitos, um movimento que apontava para reformas de base e para a im-
plantação de uma sociedade menos submissa ao grande capital transnacional, às
oligarquias e, portanto, mais democrática. Este movimento envolveu grupos impor-
tantes da sociedade: movimentos de cultura popular, de erradicação do analfabe-
tismo, de educação popular, cinema novo, teatro popular, movimento estudantil e,
no plano político- econômico, um projeto que procurava romper com a relação de
submissão unilateral ao capital transnacional (Frigotto, 2003, p.38).

Com Golpe Militar de 1964, a ações e iniciativas ligadas a EJA são extintas, mas devido aos altos
índices de analfabetismo ainda em alta no país, o governo no ano seguinte ao golpe, lançou a Cru-
zada ABC, com a pretensão de - subordinada ao capital internacional-, desenvolver programas de
alfabetização e formação continuada de jovens e adultos.
Em 1967 foi criado o MOBRAL (Movimento Brasileiro de Alfabetização), cujo objetivo era erradi-
car o analfabetismo, que até os anos 80 atingia o território nacional. Quase duas décadas após sua
criação, em 1985 foi substituído pela Fundação Educar que tinha como meta, assessorar municípios
e instituição que ofereciam o ensino supletivo. Na ocasião, a Lei de Diretrizes e Bases 5692/71 regu-
lamentava o ensino supletivo, diferenciando-o do ensino regular e do ensino secundário, separando
um capítulo próprio (o de número IV) composto de cinco artigos e apontando as seguintes funções:
suplência, suprimento e aprendizagem e qualificação.
No ano de 1974, a fim de organizar o ensino supletivo, as Secretarias Estaduais de Educação criam
os Centros de Estudos Supletivos. Em 1988, a Constituição Federal faz também alusão a EJA, quando
no Artigo 208 estabeleceu algumas garantias para a educação, como o Ensino Fundamental, obriga-
tório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria.

3. A noVA políticA de edUcAção de joVens e AdUltos no estAdo do


rio de jAneiro
A trajetória da educação no Brasil relacionada à EJA acabou muitas das vezes, por atenuar ainda
mais os processos de exclusão e marginalização social que sofriam os jovens e adultos que se encon-
travam excluídos das instituições sociais escolares, contudo presentes nos alarmantes dados oficiais
relacionados ao analfabetismo.

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
Emerge assim, a EJA, na Constituição Federal de 1988, com redação dada pela Emenda Constitu-
cional n° 59/2009 ao apresentar a Educação Básica como obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos
17 (dezessete) anos, “assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram
acesso na idade própria” (art. 208, inciso I), evidenciando a responsabilidade do Estado para com os
jovens e adultos cujo acesso ao Ensino Fundamental e Médio, não foi possibilitado na idade regular.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9.394/96, complementou a Constituição Federal
(C.F) ao determinar que:

“Os sistemas de ensino assegurarão gratuitamente aos jovens e aos adultos,


que não puderam efetuar os estudos na idade regular, oportunidades educacionais
apropriadas, consideradas as características do alunado, seus interesses, condições
de vida e de trabalho, mediante cursos e exames” (Brasil, 1996).

Avanços em relação à Eja, também foram notados, pós V Conferência Internacional de Educação
de Adultos (V CONFITEA), ocorrida em julho de 1997, na cidade Hamburgo, na Alemanha, quando
afirmou-se que somente o desenvolvimento centrado no indivíduo e a existência de uma sociedade
participativa, baseada no respeito dos direitos humanos, levariam a um desenvolvimento justo e
sustentável, fundamental para a sobrevivência das futuras gerações. Tanto, que na declaração en-
contramos o seguinte:

É de fundamental importância à contribuição da educação de adultos e da edu-


cação continuada para a criação de uma sociedade tolerante e instruída, para o
desenvolvimento socioeconômico, para a erradicação do analfabetismo, para a di-
minuição da pobreza e para a preservação do meio ambiente.” (Unesco, 1997,p.1).

Afirma-se, portanto, que na década de 90 e no início dos anos 2000, vários movimentos dentro e
fora do Brasil ocorreram em defesa da democracia e dos direitos sociais, bem como acordos inter-
nacionais que buscavam contribuir para que a EJA fosse considerada uma modalidade específica da
educação.
Em termos específicos, fundamentado na legislação brasileira e em alguns dados apresentados
no Plano Estadual de Educação do Rio de Janeiro que apontam para um número expressivo no per-
centual de analfabetos e na evidência de que a rede estadual se constitui na principal mantenedora
da oferta de matrículas na EJA para o Ensino Fundamental e, sobretudo no Ensino Médio, é que o go-
verno do estado, através da SEEDUC, implementou em 2013, um Programa chamado Nova EJA, na
perspectiva de consolidar uma escola de qualidade, contextualizada e capaz de preparar os jovens
e adultos para o mercado de trabalho, estimulando o desenvolvimento de suas habilidades, cons-
tituindo no espaço escolar as condições necessárias para a conquista de sua autonomia e inserção
nos diferentes e diversos espaços da vida em sociedade. Quanto ao papel do poder público, a De-
claração de Hamburgo, pareceu corroborar com as ações do governo do estado do Rio de Janeiro,
quando disse o seguinte:

O Estado ainda é o principal veículo para assegurar o direito de educação para


todos, particularmente, para os grupos menos privilegiados da sociedade, tais como
as minorias e os povos indígenas. No contexto das novas parcerias entre o setor pú-
blico, o setor privado e a comunidade, o papel do Estado está em transformação.
Ele não é apenas um mero provedor de educação para adultos, mas também um
consultor, um agente financiador, que monitora e avalia ao mesmo tempo. Gover-
nos e parceiros sociais devem tomar medidas necessárias para garantir o acesso,

388
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
durante toda a vida dos indivíduos, às Estado garantir aos cidadãos a possibilidade
de expressar suas necessidades e suas aspirações em termos educacionais. No que
tange ao governo, a educação de adultos não deve estar confinada a gabinetes de
Ministérios de Educação: todos os Ministérios devem estar envolvidos na promoção
da educação de adultos e, para tanto, a cooperação interministerial é imprescindí-
vel. (Unesco, 1997, p.2-3)

Desse modo, é que a partir do ano de 2013, diante do desafio de promover a reinserção de jovens
e adultos, com baixa escolaridade, através e a partir da educação, no mundo do trabalho com esco-
larização adequada, o governo do Rio de Janeiro, em parceria com a Fundação Centro de Ciências
e Educação Superior a Distância do Estado do Rio de Janeiro – CONSÓRCIO CEDERJ, lança a Nova
Política de EJA.
A proposta, é fruto da Resolução SEEDUC de nº 4951 de 04 de Outubro de 2013, quando na oca-
sião, o Secretário de Estado de Educação, Vossa Excelência, o Sr. Wilson Risolia Rodrigues no uso de
suas atribuições legais e tendo em vista o processo nº E.03/001/5612/13, fixou diretrizes de para im-
plantação das matrizes curriculares para a Educação Básica nas unidades escolares da rede pública,
que no Capítulo VI, destinado a EJA nos artigos 31 e 32, que disseram o seguinte:

Art. 31 - O Projeto Nova EJA Ensino Médio estrutura-se em 04 (quatro) módulos


semestrais, totalizando 02 (dois) anos para a conclusão do Ensino Médio nesta mo-
dalidade, conforme previsto no Anexo VI.
Art. 32 - No Projeto Nova EJA Ensino Médio, cada tempo será constituído por 50
(cinquenta) minutos, garantindo-se, assim, a duração mínima de 1.200 (mil e duzen-
tas) horas para esta etapa de ensino.

Analisando essa nova proposta de EJA, percebemos que do ponto de vista teórico-metodológico,
que ela traz novidades, tanto para os discentes, quanto para os docentes pois vem

Apresentando matriz de referência alinhada com essa modalidade educacional,


bem como estratégias de aprendizagens compatíveis com as mídias e exigências do
século XXI, e assegurando na Rede Estadual de Ensino a continuidade do percurso de
escolaridade obrigatória, para permitir que jovens e adultos, que por algum motivo
estavam privados do saber básico, concluam em menor tempo esta etapa de ensino,
com resultados de aprendizagem e qualidade adequados para a continuidade dos
estudos.(Manual do Projeto Nova Eja,2013, p.5).

Além de contar com fundamentos teórico-metodológicos diferenciado, oferece materiais didáti-


cos próprios para alunos e professores, trazendo também uma mudança estrutural, uma vez que o
tempo diário de aula foi reorganizando para o Ensino Médio, conforme Manual do Projeto.

4. resUltAdos dA pesqUisA.

Os falantes/escritores da língua, ao produzirem (...) estão enunciando conteúdos


e sugerindo sentidos que devem ser construídos, inferidos e determinados mutua-
mente. (Marcuschi, 2009, p.77).

A fim de obter a opinião dos alunos que estão matriculados no 1º Ano do Ensino Médio na Mo-

389
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
dalidade “Nova Eja”, a respeito desta modalidade de ensino, foi aplicado um instrumento de geração
de dados constituído por uma entrevista aberta, divididas em duas partes:
• 1ª Parte - Identificação: Composta por quatro perguntas relacionadas a nome, idade, série,
sexo.
• 2ª Parte - Composta por basicamente por três perguntas, que de acordo com as respostas
dos entrevistados, geraram (ou não) outras, a fim de arguir no maior grau possível o nível
de conhecimento dos entrevistados. As perguntas bases eram:1) Tempos sem estudar; 2)
No próximo ano, se fosse possível escolher entre se matricular na Eja e Nova Eja, qual esco-
lheria? 3)Sabe a diferença entre Eja e Nova Eja?
Com o objetivo de centrar o foco da análise no posicionamento dos discentes frente a esse novo
programa, foi necessário fazer um recorte das informações fornecidas. Assim, neste trabalho, foram
abordados apenas os tópicos referentes ao perfil dos alunos e o nível de conhecimento deles a res-
peito da Nova Eja.
A escola selecionada para a pesquisa faz parte da rede estadual de ensino do estado do Rio de
Janeiro e se chama Colégio Estadual Dom Otaviano de Albuquerque. A unidade escolar fica locali-
zada na área urbana da cidade de Campos dos Goytazaces, município do Norte Noroeste do estado.
A instituição oferece vagas para alunos egressos do Ensino Fundamental I e II. Oferecendo tam-
bém, vagas para os que queiram se ma-
tricular na EJA no Fundamental II e no
Ensino Médio.
Por determinação da SEEDUC a esco-
la iniciou no ano letivo de 2013 com va-
gas para a “Nova Eja”. E, na ocasião da co-
leta de dados, a unidade escolar formou
uma única turma de alunos para o 1º
módulo da Nova Eja, composta por 17
alunos, dentre os quais 11 participaram
da pesquisa, o que corresponde a apro-
ximadamente 65 % do total de matricu-
lados na turma (conforme gráfico 1).
Com base nas respostas fornecidas
na primeira parte da entrevista, foi pos-
sível identificar um traço muito peculiar
na EJA: o processo de juvenilização, uma
vez que os dados mostraram que do to-
tal de entrevistados, 66% têm menos de
20 anos de idade (conforme gráfico 2).
Nota-se, por meio deste dado, o que
algumas secretarias de educação já
constataram, quando afirmaram que,
os adolescentes ainda são presença
marcante nas escolas de EJA. A grande
maioria é oriunda de um processo edu-
cacional fragmentado, marcado por fre-
quente evasão e reprovação no Ensino
Fundamental e Médio regulares (PARA-
NÁ, 2006, p.30).

390
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
Os dados retratam o processo de juvenilização da Eja, quando torna-se alternativa de estudos
não apenas para a população adulta, mas também, e com expressiva procura, para jovens, das mais
diferentes classes sociais.
Quanto ao sexo predominante no universo da pesquisa,
constatou-se que 55% são do sexo feminino (conforme gráfico
3).
Esses dados confirmam que o público da Nova Eja é fruto de
um processo de juvenilização da Eja e que talvez o percentual
de mulheres que abandonam os estudos pode ser menor que
o dos homens.

4.1. A noVA ejA no discUrso orAl dos dis-


centes.
Na segunda parte do instrumento de pesquisa, a partir das
respostas dadas, percebe-se que 82% ficou 2 ou mais anos fora
dos bancos escolares.
Dentre os participantes, somente 9%
dos entrevistados demonstrou saber
um pouco a respeito das diferenças en-
tre EJA e “Nova Eja”, como se pode ver
nos seguintes depoimentos, quando se
perguntou se sabiam a diferença entre
Eja e “Nova Eja”:
P3 - “Sei não qual a diferença(...)”
P5 - “Não é a mesma coisa não?”
P9 -“Teria que saber o que é Nova
Eja (...)”
P10 - “Qual a diferença entre os
dois?
P11 - A Nova Eja é está em que eu
estou agora?
Pode-se contatar também que o nível de conhecimento por parte dos alunos da rede estadual de
ensino a repeito das mudanças ocorridas na estruturação da rede estadual de ensino no que diz res-
peito a Eja, mesmo daqueles que buscam matrícula nessa modalidade de ensino é muito aquém, do
ponto de vista social e político, como afirma Gadotti (1997), quando disse que a escola não distribui
poder, mas constrói saber que é poder que não se muda a história sem conhecimentos, mas tem-
-se que educar o conhecimento para que se possa interferir no mercado como sujeitos, não como
objeto. Para o autor, o papel da escola consiste em colocar o conhecimento nas mãos dos excluídos
de forma crítica, porque, a pobreza política produz pobreza econômica (GADOTTI, 1997).

5. considerAções finAis
A pesquisa desenvolvida teve como objetivo compreender o discurso dos alunos do Programa
“Nova Eja” a respeito dessa inovadora proposta, tendo em vista seus depoimentos orais. Com base
nos momentos de vivencia do processo de entrevista, percebeu-se a “impaciência” dos alunos a res-
peito do não conhecimento das especificidades da Eja, uma vez que em outros momentos, pergun-
tavam o por quê da entrevista e comentavam sobre a falta de informação a respeito do programa.

391
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
Assim, com base na análise dos depoimentos dos discentes da “Nova Eja” , verificou-se que suas falas
apresentaram uma aspecto comum: o do não conhecimento.No decorrer da entrevista, os discursos
demonstraram que os alunos matriculados na “Nova Eja” não têm conhecimento de informações
básicas a respeito do cursos em que estão matriculados, tanto que alguns deles se auto declaram
não conhecedores e outros, demonstram dúvida quanto a natureza de sua matrícula na Eja ou na
“Nova Eja” .
Conclui-se portanto que os resultados desta pesquisa revelaram à reflexão de que as representa-
ções que os alunos têm sobre a “Nova Eja” parecem estar ancorada na superficialidade e no “achis-
mo”. Isso indica, a necessidade de se lançar um novo olhar sobre a literatura referente às analises dos
discursos dos alunos no sentido de ampliar os conhecimentos sobre o núcleo estruturante da rea-
lidade vivida por esses sujeitos, assim como até que ponto gestores, docentes e sociedade devem
pensar toda estrutura, contexto e diálogo no que concerne a implementação de projetos e progra-
ma sociais, sobretudo na área da educação.

6. referênciAs:
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1988.
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392
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
centros de edUcAção de joVens e AdUltos (cejA) no
rio de jAneiro: UmA noVA reAlidAde
mAriAnnA AUgUstA ferrAri do oUteiro bernstein

Os Centros de Educação de Jovens e Adultos (CEJA) do Estado do Rio de Janeiro oferecem aos
alunos de EJA a modalidade semipresencial de ensino. O aluno vai à escola, recebe material didá-
tico, e retorna para sanar dúvidas e fazer avaliações. Atualmente, são 61 CEJAS em todo o Estado.
A metodologia de Educação a Distância utilizada pela rede estava estagnada e o material didático,
ultrapassado. Atualmente, a Fundação CECIERJ, que detém a gestão pedagógica e administrativa,
vem promovendo ações que visam a uma reestruturação, desde a elaboração do material didáti-
co até novas estratégias de aprendizagem e de avaliação. O novo material didático apresenta um
recorte de conteúdo programático privilegiando desenvolver as competências e habilidades pre-
vistas no Currículo Mínimo do Estado do Rio, além de apresentar uma linguagem própria da EAD.
Paralelamente ao atendimento presencial, o aluno conta com Ambiente Virtual de Aprendizagem,
com diferentes recursos que permitem um enriquecimento curricular. Ainda, o aluno pode sanar
suas dúvidas através de fóruns nas salas das disciplinas. Também estão sendo propostas oficinas em
grupo de modo a garantir a interação social entre os alunos e a vivência dos conteúdos estudados
no material didático. Outra ação é a construção de um banco de itens, utilizando a técnica da teoria
de resposta ao item, que visa a proporcionar uma melhor avaliação dos alunos no que diz respeito
às competências e habilidades desenvolvidas. Para que todas essas ações sejam possíveis, a CECIERJ
está promovendo diferentes cursos para os professores através de um Programa de Formação Con-
tinuada para os Professores da Rede CEJA.

palavras-chave: EJA, EAD, tecnologias educacionais

os centros de estUdos sUpletiVos no rio de jAneiro, breVe históri-


co.
No Estado do Rio de Janeiro, as experiências com Centros de Estudos Supletivos (CES), atualmen-
te denominados Centros de Educação de Jovens e Adultos (CEJAs), iniciaram em 1976, com a cria-
ção do CES Niterói. Nessa época, estes centros não eram regulados ainda pela Secretaria Estadual
de Educação e Cultura do Estado (SEEC-RJ), tendo em vista que os procedimentos pedagógicos se
diferenciavam muito daqueles utilizados pelas escolas regulares.
Somente em 1978, por meio do Parecer 201/78 do Conselho Estadual de Educação, foi aprovado
o funcionamento dessas escolas, em número de treze, contemplando entre elas o CES de Niterói, o
de Duque de Caxias e o CES Instituto de Educação, que funcionam até hoje, sendo este último, atual-
mente denominado CEJA Copacabana. No entanto, cada CES tinha o seu próprio plano operacional,
dificultando, desta forma, a certificação dos alunos. Por isso, houve uma necessidade de adequação
para que fosse possível atender às exigências da legislação vigente.
Durante uma década, os Centros de Estudos Supletivos limitavam-se a empréstimo de material
aos alunos que retornavam à escola para tirar dúvidas e fazer suas avaliações. Somente no início da
década de 80 é que esses centros foram autorizados a aproveitar os resultados obtidos pelos alunos
nos exames supletivos ao longo de sua vida escolar. Até então, mesmo que habilitados para algu-
mas disciplinas, o aluno se via obrigado a cursar toda a grade curricular prevista para o seu nível de
ensino (Barcelos, 2012).
Em 1991, o Conselho Estadual de Educação do Rio de Janeiro, por meio do Parecer nº97, aprovou

393
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
o Plano de Estrutura e Funcionamento dos Centros de Estudos Supletivos do Estado do Rio de Janei-
ro, definindo sua organização pedagógica e administrativa. Este parecer foi posteriormente comple-
mentado pela Resolução nº3007/2006 em função da defasagem relativa às mudanças geradas pela
promulgação da LDB 9.394/96. Por meio desta Resolução, as escolas poderiam realizar outras ativi-
dades além do modelo instituído até então de modo a contribuir para o processo de aprendizagem
do aluno. No entanto, a partir de meados de 2009 até o final de 2010, as atividades diversificadas nos
CES foram suspensas por orientação da Coordenação de Ensino de Jovens e Adultos da SEEDUC-RJ,
tendo em vista que uma nova Resolução que seria publicada alterando o modo de funcionamento
das escolas.
Em 25 de fevereiro de 2011, a SEEDUC-RJ publicou a Resolução nº4673/2011 que alterou a nomen-
clatura “Centro de Estudos Supletivos (CES)” para “Centro de Estudos de Jovens e Adultos (CEJA)” e
“Núcleos Avançados dos Centros de Estudos Supletivos (NACES)” para “Núcleos Avançados dos Cen-
tros de Estudos de Jovens e Adultos (NACEJA)”. Promoveu também alterações na matriz curricular e
também no modo de atendimento nas referidas escolas. Essa resolução traz ainda determinações
administrativas e revoga todas as Resoluções anteriores que visavam à alteração do modelo de aten-
dimento tradicional pautado no estudo de módulos sequenciados autoinstrucionais, com apoio pe-
dagógico de professores que atendiam os estudantes em horários pré-determinados e avaliações
presenciais ao final de cada um dos módulos estudados.
Ainda em 2011, em dezembro, a SEEDUC-RJ publica o Decreto nº 43.349, que transfere a gestão
pedagógica do CEJA para a Secretaria de Ciência e Tecnologia do Estado do Rio de Janeiro (SECT),
por intermédio da Fundação Centro de Ciências e Educação Superior a Distância do Estado do Rio
de Janeiro (CECIERJ), permanecendo compartilhada entre as secretarias apenas a gestão adminis-
trativa.
Com base no que rege o Decreto nº 43.349/2011, em 18 de junho de 2012, é publicada a Resolu-
ção Conjunta entre SEEDUC, SECT e Fundação CECIERJ nº 787 que estabelece as normas, rotinas e
procedimentos relativos à gestão dos CEJAS em suas unidades escolares e também em outras uni-
dades escolares que também oferecem essa metodologia de ensino semipresencial (anteriormente
denominadas Modalidades CEJA). Esta Resolução foi revogada com a publicação da Resolução con-
junta entre SEEDUC, SECT e Fundação CECIERJ nº 1224 em 15 de maio de 2014. A nova Resolução
apresenta maior detalhamento dos aspectos relacionados à gestão da Rede CEJA, bem como altera
o nome de “Centro de Estudos de Jovens e Adultos” para “Centro de Educação de Jovens e Adultos”.
Por esta resolução, as antigas modalidades CEJA passam a funcionar não mais vinculadas a uma es-
cola regular da SEEDUC, mas a outra unidade CEJA.

reconstrUindo Um noVo cejA


Ao receber a Rede CEJA da SEEDUC, a Fundação CECIERJ encontrou 60 escolas (entre 36 uni-
dades e 24 modalidades) funcionando segundo as normas estabelecidas na Resolução SEEDUC nº
4673/2011. No entanto, não havia um padrão quanto ao recorte de conteúdo, material didático uti-
lizado e número de avaliações por disciplinas para conclusão de ensino fundamental e médio. Essa
falta de uniformidade em termos de material e currículo dificultava, muitas vezes, o trânsito dos
alunos entre as escolas CEJA, bem como a uniformidade da certificação dos alunos.
As escolas encontravam-se estagnadas no tempo e no espaço, adotando uma metodologia de
Educação a Distância semipresencial ultrapassada, pautada apenas no material impresso, atendi-
mento individualizado presencial e provas.
No segundo semestre de 2011, a Fundação CECIERJ visitou cerca de 20 unidades escolares CEJA,
realizando reuniões com professores e servidores técnico-administrativos, conhecendo as instala-
ções físicas que davam suporte ao desenvolvimento das atividades nas escolas. Era claro o orgulho
que os servidores sentiam da Rede. No entanto, também era nítida a impressão de que era neces-

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
sário modernizar, sem perder as características que conferem o alcance social do projeto como um
todo.
Uma versão preliminar de um projeto de modernização foi submetida, em fevereiro de 2012, às
escolas da Rede CEJA para discussão e críticas. Os frutos da discussão foram incorporados ao projeto
que, neste momento, encontra-se em fase de implementação.
O alcance social, que já era almejado pela SEEDUC, também é a principal motivação da Secretaria
de Ciência e Tecnologia e da Fundação CECIERJ. Sendo assim, das discussões, emergiu a convicção
de que a modernização do CEJA deveria alargar os horizontes sociais da oferta atual.
Percebeu-se que a Rede CEJA não dispunha de um currículo que atendesse plenamente às parti-
cularidades da EJA. Além disso, a proposta curricular utilizada estava pautada apenas na aquisição
de conteúdo, sem a preocupação com o desenvolvimento das competências e habilidades, tão dis-
cutidas nas reformas curriculares atuais. As competências não se referem a um conteúdo em si, mas
regulam e traduzem conteúdos em habilidades necessárias à formação de um indivíduo capaz de
atingir suas potencialidades, ao mesmo tempo em que contribui para uma sociedade equânime.
Sendo assim, a construção do currículo precisava levar em consideração aspectos como o perfil
do aluno EJA, que, em sua maioria, está afastado do ensino formal e, de uma maneira geral, possuem
um tempo limitado para dedicar-se aos estudos. Também precisaria levar em consideração os exa-
mes de avaliação pautados em currículo por competências de forma a aumentar as oportunidades
de inserção aos estudantes que almejarem o Ensino Universitário.
Um outro ponto importante diz respeito a como o currículo se expressa na oferta de educação a
distância. Seriam três as instâncias consideradas em nosso projeto: atendimento ao estudante, ma-
terial didático e avaliação do estudante.

o Atendimento Ao estUdAnte

o Ato dA mAtrícUlA e o Acolhimento


O atendimento ao estudante inicia-se no ato da matrícula, quando ele é acolhido pela unidade
escolar que lhe dará todas as orientações necessárias para que seja possível a sua progressão nos
estudos. É o momento onde o aluno é orientado quanto às formas de atendimento, dinâmica de
utilização de material didático e avaliações (que serão discutidas ao longo deste texto).
Nas escolas da Rede CEJA, não há prazo e nem período de matrícula. O aluno pode matricular-se
quando desejar, desde que esteja com a sua documentação de escolaridade em mãos. No entanto,
não havia um padrão de matrícula. Algumas escolas matriculavam alunos diariamente, outras se-
manalmente, outras quinzenalmente. Muitas vezes, o aluno acabava não voltando para se inscrever.
Hoje, as matrículas nas escolas ocorrem diariamente. Os alunos podem, inclusive, fazer uma pré-
-matrícula no site da instituição – http://cederj.edu.br/ceja - de modo a tornar mais rápido e eficaz a
burocracia da matrícula em si.
Algumas escolas possuíam um controle de matrícula informatizado. Outras, o faziam manual-
mente em arquivos de papel. Hoje, a Rede CEJA dispõe de um sistema de controle acadêmico único,
informatizado, que permite, inclusive, a transição de alunos de uma escola para outra quando há
necessidade de transferência. Esse sistema não somente controla a matrícula como toda a vida do
estudante, sendo registrados seus atendimentos, suas provas e notas.
Para o acolhimento do aluno, também não havia padrão. Algumas escolas o faziam na própria
matrícula, com as informações básicas. Outras marcavam encontros em datas posteriores à matrícu-
la para passarem as informações. Algumas limitavam-se a entregar um folheto no ato da matrícula.
O que pudemos perceber ao longo do tempo é que algumas formas de acolhimento não estavam

395
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
funcionando bem, pois o aluno se matriculava, mas não retornava. Atualmente, estamos fazendo
um trabalho junto às escolas de modo a melhor desenhar o acolhimento de forma a manter matri-
culado na instituição.

o Atendimento pedAgógico
No que diz respeito ao atendimento pedagógico do aluno, na metodologia original utilizada nas
escolas da Rede CEJA, os alunos obtinham por empréstimo o material didático na forma de fascí-
culos por disciplina, estudavam o fascículo, no seu tempo, retornavam à escola para atendimento
presencial individual com seus professores para esclarecimento de dúvidas e realizavam a avaliação
referente ao conteúdo do fascículo estudado.
Nas discussões ocorridas ao longo do desenho do projeto, houve um grande consenso de que o
atendimento individual presencial para orientação de estudos tem grande importância e precisava
ser mantido. No entanto, também ficou claro que esse atendimento não atende a todos os perfis dos
alunos que procuram o CEJA. Ficavam de fora dois importantes grupos: os alunos menos autôno-
mos e aqueles com maior autonomia e maior acesso à tecnologia.
Os menos autônomos, que são geralmente desfavorecidos pela metodologia original, poderiam
ser beneficiados por atendimentos em grupo, temporal, pautados em dinâmicas, à semelhança de
oficinas largamente realizadas, no passado, na Rede CEJA.
Aqueles com maior acesso à tecnologia poderiam se beneficiar de um sistema de atendimento
atemporal, utilizando ambientes virtuais de aprendizagem, com múltiplos recursos educacionais
multimídia, atividades complementares e fóruns de dúvida para tutoria a distância com os próprios
professores que fazem o atendimento presencial nas escolas.
Desta forma, no projeto de modernização foi de consenso que seriam ofertadas as três opções de
atendimento ao aluno: a atual, a virtual e em grupo. A proposta é que o aluno escolha a(s)
modalidade(s) de atendimento de que deseja dispor, de forma a adequar e personalizar a sua apren-
dizagem. O atual Atendimento Individual Presencial no CEJA e a proposta do Ambiente Virtual de
Aprendizagem (CEJA Virtual) são atemporais, pois o aluno percorre os diferentes fascículos das dife-
rentes disciplinas, segundo sua dinâmica pessoal, como é feito atualmente. O Atendimento em Gru-
po, destinado principalmente a alunos com menor autonomia, cria o conceito de turma. Logo, impli-
ca a existência de uma dinâmica para percorrer os conteúdos com calendário temporal. Fica a cargo
da unidade escolar a elaboração desses atendimentos em consonância com as necessidades do

396
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
público-alvo de sua unidade escolar.

mAteriAl didático

mAteriAl didático impresso


A partir de nossas discussões e análise dos materiais
didáticos adotados em algumas das unidades CEJA, foi
consenso que os recursos didáticos utilizados pela rede
não eram consonantes com as expectativas de desenvolvi-
mento de um currículo para a Educação de Jovens e Adul-
tos, baseado em habilidades e competências, ou com as
especificidades de um sistema semipresencial de ensino
e aprendizagem. Fazia-se necessária a elaboração de um
material didático próprio para a Rede CEJA considerando
estas questões.
Iniciamos a elaboração do material didático pelo con-
teúdo do Ensino Médio, tendo em vista que já existia um
conjunto de módulos impressos desenvolvidos como par-
te de um programa pelo Ministério da Educação (Secreta-
ria de Educação a Distância e Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade) para
EJA semipresencial. Este material foi disponibilizado para os professores da Rede que fizeram suas
críticas e sugestões.
A partir dessa discussão, elaboramos o material didático do CEJA, organizado por disciplinas, divi-
didos em fascículos que corresponderiam, cada um, a uma prova que o aluno precisaria fazer.
O material ainda não foi estabilizado. À medida que as novas versões são disponibilizadas, os
professores fazem suas considerações que são avaliadas pela equipe de material didático para que
sejam implementadas na versão seguinte.
Todo o material segue um recorte baseado no currículo mínimo do Estado do Rio de Janeiro, de
modo que possa ser feita a equivalência de anos escolares para aproveitamento de estudos dos
alunos. Como recorte, buscamos um conjunto de conteúdos e processos que possibilitassem ao es-
tudante aproveitar oportunidades sociais e profissionais, além de contribuir para provocar reflexões,
ações e reações concretas na vida dos jovens e adultos. Todos os materiais foram desenvolvidos,
desejando, ainda, possibilitar ao estudante o acesso e desenvolvimento de habilidades relativas às
Tecnologias de Informação e Comunicação – TIC, incluindo ambientes virtuais multimídia de con-
vergência digital.
No que diz respeito à linguagem do material, a mesma apresenta-se dialógica, procurando con-
versar com o aluno. É uma linguagem leve que entremeia apresentação de conteúdo contextuali-
zado e atividades que servem, não só para fixar os conceitos, como também para introduzi-los ou
sistematizá-los.
Atualmente, o material é composto por 10 fascículos de Língua Portuguesa, 4 de Literatura, 12
de Matemática, 8 de História, Geografia, Física, Química e Biologia, 4 de Filosofia e Sociologia, 7 de
Língua Inglesa, 2 de Artes e Educação Física. O material de Língua Espanhola está em elaboração,
devendo ser lançado no ano de 2015.

mAteriAl online
Frente à importância do uso das Tecnologias da Informação e da Comunicação (TICs) na edu-

397
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
cação e também da necessidade das mesmas no mercado de trabalho, os alunos do CEJA contam,
além do material impresso, com um ambiente virtual de aprendizagem desenvolvido a partir do
conteúdo dos fascículos.
Nosso ambiente é desenvolvido em plataforma Moodle e teve o seu design adaptado para faci-
litar o acesso e a navegação do público EJA. O material lá apresentado foi elaborado por um grupo
de professores da Rede CEJA que atuam, na Fundação CECIERJ, como coordenadores de disciplina.
Cada escola CEJA tem o seu próprio conjunto de salas de disciplina. Todo o material é estrutu-
rado de forma que o aluno possa ter acesso online ao conteúdo do fascículo impresso, a recursos
didáticos para auxiliá-lo no processo de aprendizagem e também atividades complementares às
constantes do fascículo impresso. Em cada unidade de conteúdo, há fóruns de dúvida por onde o
aluno pode contactar diretamente o professor que trabalha na sua escola e um espaço onde este
professor pode adicionar seus próprios conteúdos, exercícios ou outros materiais que deseje com-
partilhar. Desta forma, o professor pode aproximar o CEJA Virtual da realidade e da necessidade do
aluno de sua escola.
É importante ressaltar que cada professor possui, em sua mesa de atendimento, um computador
por onde ele pode interagir com os alunos pela plataforma e também fazer as suas inserções de
conteúdo que desejar.
As escolas também dispõem de laboratórios de informática para possibilitar o acesso do aluno às
salas virtuais.

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
AVAliAção dos estUdAntes e certificAção
A questão da avaliação é crucial para o sucesso deste projeto e foi amplamente ressaltada no
conjunto de reuniões realizadas para discuti-lo.
Inicialmente, a avaliação dos estudantes do CEJA era realizada por fascículo de conteúdo de cada
disciplina, refletindo um modelo conteudista. As questões das avaliações eram elaboradas em cada
escola.
Hoje, buscamos uma avaliação que reflita o desenvolvimento das competências e habilidades e
não somente o conteúdo. Neste momento, as escolas continuam, ainda, elaborando suas próprias
provas, adaptando-as à nova metodologia que está sendo implementada. No entanto, no futuro, a
ideia é que os itens de avaliação elaborados pelos professores da Rede, e revistos por uma equipe de
especialistas em avaliação que atuam na Fundação CECIERJ, sejam alocados em um banco de itens
de onde possam ser geradas, por sorteio, as provas que o aluno fará. Quando esse banco estiver
pronto, ele será testado em várias escolas da Rede, até que este seja considerado seguro para avaliar
os alunos de maneira uniforme em toda a Rede CEJA.

A formAção dos professores


De forma a conseguir implementar todas as mudanças e propostas anteriormente mencionadas,
a Fundação CECIERJ está oferecendo aos professores da Rede CEJA um conjunto de cursos de for-
mação de docentes que visam à aquisição das habilidades e competências necessárias para o desen-
volvimento das atividades no novo paradigma que está sendo implementado na Rede. As principais
formações são:

1. Utilização e edição da plataforma Moodle, com o intuito de que todos estejam aptos
a trabalhar com seus alunos via plataforma.
2. Filosofia e Metodologia do Material Didático, objetivando o reconhecimento da es-
trutura, linguagem, recorte de conteúdo do material didático que está sendo utili-
zado na rede.
3. A utilização do CEJA Virtual como Ferramenta Pedagógica
4. Elaboração de itens de avaliação por técnica semelhante à utilizada atualmente pelo
INEP nos exames externos.
5. Uso da tecnologia na Educação – ferramentas e práticas
Além dessas formações, a Equipe de professores da Rede CEJA que atua na Fundação CECIERJ
também dá todo o aporte necessário às escolas, promovendo oficinas a partir de problemas que a
própria escola identifica na adequação à nova metodologia, através de visitas de escuta, cujo objeti-
vo é a identificação de problemas, e o compartilhamento de experiências em espaço desenvolvido
na plataforma com o objetivo de promover a integração de todos os docentes da Rede CEJA.

considerAções finAis:
Estamos apenas no começo de um projeto que tende a ser bastante promissor. Há muito ca-
minho a percorrer. O uso da tecnologia na educação ainda assusta parte dos docentes que estão
alocados nas escolas da Rede CEJA, mas, frente às necessidades do mundo atual, faz-se necessário
oportunizar o acesso dos alunos ao mundo digital.
Vivenciamos hoje um processo de construção colaborativa dos planos de ação das escolas para

399
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
o ano de 2015. Alguns encontros com os diretores e professores da Rede ocorreram na Fundação
CECIERJ nos últimos meses, buscando nortear a construção desse planejamento. No momento, esta-
mos em fase de análise desses planos e buscando um diálogo com as escolas a fim de que estes pos-
sam, efetivamente, atender às necessidades dos diferentes perfis de alunos que a Rede CEJA recebe.

referênciAs:
BARCELOS, Luciana Bandeira. O CEJA e a qualidade na EJA. Uma utopia possível?. In: I Seminário
Internacional e I Fórum de Educação do Campo da Região Sul do RS: Campo e cidade em busca de ca-
minhos comuns, 2012, Pelotas - Rio Grande do Sul. I Seminário Internacional e I Fórum de Educação do
Campo da Região Sul do RS: Campo e cidade em busca de caminhos comuns, 2012.
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vil_03/LEIS/L9394.htm#art80>. Acesso em 18 de ago 2014
RIO DE JANEIRO. Decreto n° 43.349, de 12 de dezembro de 2011. Transfere a gestão pedagógica
dos Centros de Estudos de Jovens e Adultos – CEJA e suas modalidades da Secretaria de Estado de
Educação, localizados no âmbito do Estado do Rio de Janeiro, para a Secretaria de Ciência e Tecnologia
e compartilha a gestão administrativa das referidas unidades/modalidades e dá outras providências.
Disponível em: <http://www.educacao.rj.gov.br> Acesso em: 13 ago 2014
RIO DE JANEIRO. Resolução SEEDUC n° 4673/2011, de 25 de fevereiro de 2011.
Altera a nomenclatura dos Centros de Estudos Supletivos – CES, dos Núcleos Avançados dos Centros
de Estudos Supletivos – NACES, estabelece critérios de classificação, para fins de fixação de quantitati-
vos de pessoal e dá outras providências. Disponível em: <http://www.imprensaoficial.rj.gov.br>. Acesso
em:
13 ago 2014
RIO DE JANEIRO. Resolução Conjunta entre SEEDUC, SECT e Fundação CECIERJ nº 787 /2012, de 18
de junho de 2012. Estabelece normas, rotinas e procedimentos relativos à gestão administrativa da mo-
dalidade de educação de jovens e adultos na forma semipresencial nas unidades CEJA e nas unidades
escolares que também oferecem essa modalidade de ensino. Disponível em <http://www.imprensaofi-
cial.rj.gov.br/portal/modules/conteudoonline/view_pdf.php?ie=MTQ5NjI=&ip=MTg=&s=OTFkMGI0Nj
RlODliMTk0ODU5NmE0MWUwMTJhMmMwNzA> Acesso em 22 ago 14
RIO DE JANEIRO. Resolução Conjunta SEEDUC, SECT e Fundação CECIERJ nº 1224/2014, de 15 de
maio de 2014. Estabelece normas, rotinas e procedimentos relativos à gestão administrativa da mo-
dalidade de educação de jovens e adultos na forma semipresencial nas unidades CEJA e nas unidades
escolares que também oferecem essa modalidade de ensino. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.
br/diarios/70996373/doerj-poder-executivo-16-05-2014-pg-16> Acesso em 22 ago 20104.

400
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
edUcAção A distânciA de segUndA gerAção: Aporte
pArA se entender o projeto minerVA.
rAphAel do espírito sAnto mello e pires

A comunicação aqui apresentada é o resultado do subprojeto da pesquisa A Educação Brasileira


de 1964 a 1985: impactos da ditadura militar, coordenada pela Professora Doutora. Jane Santos da
Silva, que tem como objetivo analisar as políticas educacionais desenvolvidas pelo regime empresa-
rial militar brasileiro de 1964 a 1985 (GERMANO, 1990; CARVALHO, 2007). O nosso objeto são os des-
dobramentos na educação por radiodifusão, tida como educação a distância de segunda geração.
Nesse sentido, faz-se mister dialogar tanto com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação de número
5.692 de 71, quanto com o Instituto de Políticas e Estudos Sociais (IPES), responsável por condu-
zir um amplo debate sobre as propostas pedagógicas que norteariam a elaboração da referida lei
através do fórum “A Educação que nos convém” (1968), realizado na PUC do Estado da Guanabara.
Dentro dessa perspectiva salientamos o Projeto Minerva, criado em 1970 e veiculado pela Rádio
do Ministério da Educação. O programa objetivava complementar a formação, especialmente de
jovens e adultos. Além disso contribuía para a educação continuada dos professores, inclusive subs-
tituindo os encontros presenciais, atuando através de encontros guiados por um tutor/ monitor ou
individuais. Nesse trabalho demonstraremos como o Minerva é elaborado não para uma educação
plena, mas para a promoção do Estado Militar e de suas relações com o Mercado, que precisava de
profissionais cada vez mais especializados.

palavras-chave: Educação a distância, Projeto Minerva, Ditadura Empresarial Militar

introdUção
Este texto é fruto de discussões iniciais para o trabalho de conclusão de curso em História (CE-
DERJ/ Unirio) e um subprojeto do grupo de pesquisa “A Educação Brasileira de 1964 a 1985: impac-
tos da Ditadura Militar”, coordenada pela professora doutora Jane Santos (Faculdade de Educação,
Unirio).
Com o crescimento de cursos à distância (EAD) e o uso rotineiro da Internet como tecnologia
base, o senso comum adota a existência desses cursos como amalgamada a esta nova tecnologia
da informação (NTIC). Contudo, faz-se mister superar a percepção da doxa e problematizarmos essa
única possibilidade de NTIC para a EAD. Em nossas considerações, entendemos que existem ao me-
nos três gerações de educação à distância, a saber:
a. Primeira Geração: cursos por correspondência. Tais cursos eram normalmente divul-
gados através das agências de correios e até hoje eles existem;
b. Segunda Geração: EAD através da radiofonia. Neste segmento destacamos o uso da
televisão (e podemos citar o Telecurso 2000) ou através do uso do rádio – como pre-
tendia Roquette-Pinto na década de 20;
c. Terceira Geração: uma EAD que apropria-se cada vez mais da Internet como veículo.
Porém, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no censo de 2010, nos trás dados
interessantes: 81% dos domicílios, rurais e urbanos, possuem pelo menos um aparelho de rádio,
enquanto apenas 19% dos lares tem computadores com acesso a rede mundial (IBGE, 2014). Nem
mesmo os smartphones dispensam o rádio. Não podemos ignorar esse meio de comunicação como
forma de democratização da educação. Tendo isso em vista, não poderíamos ignorar sua História no

401
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
Brasil.
Assim sendo, optamos por destacar o Projeto Minerva e seu uso na década de 1970. Como sabe-
mos, a Educação como um todo sofreu impactos significativos nesse período, voltando-se para sus-
tentar o projeto econômico do Regime Empresarial- Militar. Nossa discussão se situará nos debates
conduzidos pelo Instituto de Estudos Econômicos e Sociais (IPES), instituição civil-empresarial res-
ponsável pela propaganda anti-comunista da década de 1960 e que, através do Fórum da Educação,
mais tarde compilado em livro com o título “A Educação que nos convém” de 1968, promoverá um
debate sobre essa educação voltada para o Mercado (RAMIREZ, 2005).

“A edUcAção qUe nos conVém”: A AtUAção do ipes.


Há uma mudança significativa na historiografia que trata sobre o período 1964-1985. A partir de
novos estudos e reflexões e com a revisão historiográfica sobre o período a partir do ano 2000, o uso
simples do conceito “Ditadura Militar” não é mais possível, já que ele assume que apenas os militares
foram responsáveis por 1964. Daniel Aarão Reis (2014, p. 85), em publicação recente, afirma que o
Golpe “(...) exprimiu uma heterogênea aliança, reunindo lideres políticos, empresariais e religiosos,
civis e militares, elites sociais e segmentos populares”. Sendo assim, nos parece mais apropriado
chamarmos o período de Ditadura civil-militar ou mesmo militar-empresarial, dado a presença cons-
tante do aspecto econômico no discurso governamental.
O setor empresarial organizou-se antes do Golpe e durante o período Militar-empresarial. Apesar
de destacarmos a influencia do IPES, outros fóruns foram organizados, como por exemplo o seminá-
rio Universidade-Indústria de Janeiro de 1964, pré-Golpe (LIRA, 2014). Apesar de outras articulações,
o simpósio mais importante e talvez o maior da época é o Fórum da Educação. Antes de falarmos
efetivamente sobre esse evento, cabe uma breve explicação da estrutura e do funcionamento do
IPES.
Este instituto será criado em São Paulo em 1961 e o Rio de Janeiro ganhará uma célula – com
escritório no Edifício Rio Branco – em 1962 e terminará suas atividades em 1971. Ele será composto
por empresários civis, apesar de ter em sua estrutura dois militares da Escola Superior de Guerra: os
generais Heitor de Almeida Herrera e Golbery do Couto e Silva, este último principal formulador da
doutrina de interdependência na ESG (SAVIANI, 2008; HERMAN, 2005; LAMARÃO; 2014).
Essa articulação empresarial é entendida como necessária pela classe, tendo em vista seu receio
do governo Goulart. Aqui destacamos tanto as reformas de base, quanto a relação próxima do pre-
sidente com os movimentos sindicais. Essa relação saltava aos olhos dos membros do IPES como o
“perigo comunista”. O IPES tem uma atuação significativa: material propagandístico, documentários,
livros e folhetos, e o financiamento de outras entidades contrárias ao governo eram ações comuns.
Em alguns casos, como o agronegócio, a educação, a inflação e a participação de empresas no PIB,
o IPES elaborava uma série de estudos e relatório direcionados a classe política (LAMARÃO, 2014;
RAMIREZ, 2005).
O grupo que formava o IPES tinha, para Celso Carvalho (2007), três pontos de interseção que su-
peravam suas agendas específicas e davam coesão as ações do Instituto: “relações econômicas, dis-
curso anticomunista e a intenção de edificar o Estado, de acordo com suas conveniências” (CARVA-
LHO, 2007, p. 371-372). Porém, nem sempre esses pontos produziam essa coesão: o agronegócio em
especial era tema de intenso debate entre as células do Rio de Janeiro e São Paulo (RAMIREZ, 2005).
É no bojo dos estudos e relatórios que o Fórum da Educação será elaborado. Cabe ainda notar que
esse encontro, que teve como instituição sede a PUC do Estado da Guanabara e suporte financeiro
do Jockey Clube Brasileiro e da firma Klabin Irmãos SA, acontecerá entre 10 de Outubro de 1968 e 11
de Novembro do mesmo ano – apesar de já estarmos inseridos em um governo de exceção, o Ato
Institucional número 5 (AI-5) não havia sido baixado – ele data de 13 de Dezembro de 1968. Esse é

402
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
um detalhe importante, já que o AI-5 representará – ou institucionalizará – a política de segurança,
isto é, a censura, a cassação de adversários políticos e etc. Portanto, algumas falas são contrárias à
proposta do evento, que era (a) a construção de um projeto educacional que atendesse ao Mercado
de Trabalho e ao empresariado e (b) a ação do movimento estudantil nacional e internacional (CAR-
VALHO, 2007; RAMIREZ, 2005).
Ao colocarmos empresários a frente das discussões sobre qual seria a Educação necessária para
o desenvolvimento econômico do país, pensamos que não podemos esperar nada muito similar a
um discurso de educação para emancipação. A proposta básica era de que a Educação deveria estar
voltada para a produtividade e para a formação de mão de obra especializada, que favorecesse o
crescimento econômico – tanto é que o Ministério do Planejamento era superior ao da Educação e
para Saviani (2008, p. 302) essa “(...) nova estrutura permanece em vigor atualmente, não tendo sido
modificada pela nova Lei de Diretrizes e Bases”.
Mas nem todos os convidados eram empresários. O professor da Universidade Federal do Rio de
Janeiro (UFRJ), Theophilo de Azeredo Santos – sócio do IPES e banqueiro, inclusive tendo ocupado
a presidência do Sindicado dos Bancos do Rio de Janeiro – é defensor da bandeira de uma Educação
voltada para o Mercado. O fato de um professor universitário discursar a favor do IPES, por assim di-
zer, dá legitimidade ao projeto. Transcrevemos algumas palavras, citadas por Celso Carvalho (2007),
do professor:

O objetivo do simpósio, naquele momento, era “[...] fornecer um subsídio às insti-


tuições e autoridades [...]” em busca de “[...] soluções para a educação brasileira [...]”
por meio de sugestão de “[...] medidas a serem adotadas [...]”. (CARVALHO, 2007, p.
384).

Houve, também, uma clara segmentação entre o ensino universitário e o de primeiro e segundo
grau. Para Ricardo Campos, um dos conferencistas, a Universidade deveria preocupar-se mais com a
solução de problemas, isto é, com a ordem prática e menos com questões culturais. De acordo com
a sua fala:

(...) A educação secundária, num país subdesenvolvido, deve tender à educação


de massa, enquanto o ensino universitário, fatalmente, terá que continuar um en-
sino de elite [grifo nosso]. Donde a necessidade de se reformular toda a estrutura
financeira do sistema educacional médio, que entre nós, paradoxalmente, é quase
totalmente pago, quando deveria ser, pelo menos, objeto de bolsas generosas e gra-
tuitas, a fim de se disseminar, muito mais um instrumental de educação secundária,
que para a grande massa da população deve ser o valor terminal (CARVALHO, 2007,
p. 76).

Inserida nesta perspectiva, o governo, constitui o Projeto Minerva com o propósito de auxiliar na
demanda escolar, principalmente nas regiões mais distantes dos grandes centros.

o projeto minerVA: edUcAção terminAl?


O Projeto Minerva terá inicio em Setembro de 1970 através da Portaria Interministerial 408/1970,
que obrigava todas as rádios a transmitirem o programa de trinta minutos de duração, sempre com
caráter cultural. Essa obrigatoriedade será fundamentada na Lei 5692/71, no Capítulo IV, artigos 24
a 28, com ênfase em educação de adultos (SOUZA, n/d; ROLDÃO, 2006; ANDRELO, 2014). Para além
das questões legais, o custo da educação por rádio era baixo e o público estava familiarizado com a

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
tecnologia (ROLDÃO, 2006).
Grosso modo, a proposta do Projeto Minerva era dar suporte para alunos interessados em pres-
tar exames ginasiais. Segundo Mathias Gonzalez de Souza (n/d, p. 4) haviam outras propostas, por
exemplo:

(a) complementação do trabalho desenvolvido pelo sistema regular de ensino;


(b) possibilidade de promoção da educação continuada; (c) divulgação de progra-
mação cultural de acordo com o interesse da audiência; (d) elaboração de textos
didáticos de apoio aos programas instrutivos; (e) avaliação dos resultados da utili-
zação dos horários da Portaria 408/70 pela emissora de rádio.

As turmas eram organizadas em três momentos: (a) recepção organizada, que consistia em locais
predeterminados para que turmas de 30 a 50 alunos ouvissem o programa acompanhados por um
monitor; (b) recepção controlada, no qual os alunos escutavam a transmissão e reuniam-se sema-
nalmente ou quinzenalmente, sobre a tutela de um monitor e (c) os alunos que escutavam as aulas
em suas casas (SOUZA, n/d).
O Projeto Minerva, porém, tinha singulares pontos fracos. Em primeiro lugar, havia uma flutuação
das matrículas muito grande – no primeiro ano foram computados 174.246 alunos e no segundo
ano 93.776. Além disso, a proposta do Regime Militar-Empresarial não era uma educação crítica
e por isso não motivadora. De acordo com a bibliografia do tema, o Projeto Minerva surgirá junto
com o MOBRAL na expectativa de fazer frente a iniciativas como o Movimento de Educação de Base
(MEB), coordenado pela Igreja Católica, visando alfabetização e uma educação que desse ao aluno
mais senso crítico, além de outras propostas que dialogavam com o método Paulo Freire (SOUZA,
n/d; ROLDÃO, 2006; ANDRELO, 2014).
Outra questão que fica latente ao debruçarmos no Projeto era que os programas difundiam a
cultura do eixo Sul- Sudeste, com horários pouco flexíveis e com aulas orientadas para o Mercado
de Trabalho – dialogando, aqui, com a proposta do IPES para o ensino de primeiro e segundo grau.
A falta de compromisso com essa modalidade está, por exemplo, na ausência de elementos avalia-
tivos que comprovassem (ou não) a eficácia do Projeto Minerva: a única avaliação disponível era o
Madureza, prova de admissão para o ensino supletivo (SOUZA, n/d; ROLDÃO, 2006; ANDRELO, 2014;
MENEZES, SANTOS, 2014).

conclUsão
A passagem dos anos 1960 para os anos 1970 conectará a Educação ao discurso do “milagre
econômico” do Regime Militar-empresarial. Uma educação voltada para problemas acadêmicos, tal
qual o entendemos hoje, não era interessante para o processo de modernização nas relações de
trabalho e, em especial, não atendia a necessidade dos empresários (JUNIOR, BITTAR, 2006; GERMA-
NO, 1990). O tipo de formação dos professores e alunos, a reforma universitária, a modificação do
currículo e o ensino técnico foram implantados.
Nas palavras do professor José Germano, os movimentos de primeiro e segundo graus não tinha
outra intenção que “(...) manter intocável o mecanismo responsável pela manutenção e ampliação
das desigualdades” (GERMANO, 1990, p. 240). Os estudantes com uma renda familiar menor do que
dois salários mínimos participam de forma decrescente nos três níveis de ensino: 37% no primeiro
grau; 11,6% no segundo grau e apenas 4,5% no ensino superior. Estudantes com renda familiar de
cinco até mais do que dez salários mínimos correspondiam a 77,9% no nível superior. A afirmação
de Ricardo Campos estava correta.
Entender a perspectiva constituída no Projeto Minerva nos auxília a entender que o ensino à dis-

404
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
tância deve estar solidificado e consolidado em estruturas para além da tecnologia. Se o currículo
não for bem construído, os professores preparados e os alunos motivados para tal modelagem ela
será mais um momento improdutivo do nosso sistema educacional

bibliogrAfiA.
MAZZANTE, Fernanda Pinheiro. O currículo escolar nas leis 5692/71 e 9394/96: questões teóricas e
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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
edUcAção pArA priVAdos de liberdAde: direito oU
priVilégio?
jUliAnA mArqUes dA silVA | isAbelA meirelles mArtins VAsconcellos

Este trabalho é um relato de experiência de nossa participação no Grupo de Pesquisa e Extensão


‘’Do Cárcere à Universidade’’, da Faculdade de Educação, da Universidade do Estado do Rio de Janei-
ro (UERJ), que tem por objetivo garantir o Direito à Educação às pessoas privadas de liberdade que
forem aprovadas no vestibular da UERJ, e de outras universidades, incluindo SISU/ProUni. Observa-
-se que alguns internos do Sistema Prisional têm obtido aprovação no vestibular, ainda que não seja
simples, obtêm o acesso à universidade. Esse acesso anima a todos que acreditam que outra reali-
dade possa ser construída na vida desses sujeitos. Sabe-se, também, que ainda de forma precária
e insuficiente, a Educação tem sida oferecida nos presídios na modalidade de EJA, propiciando ao
interno a possibilidade de fazer o vestibular, ou em alguns casos, atua como estímulo à continuidade
dos estudos, após o Ensino Médio. Ocorre que, estar matriculado, por si só, não resolve as diversas
dificuldades que irão enfrentar ao longo do curso. O projeto “Do Cárcere à Universidade” também
objetiva, se tornar uma Política Pública permanente de inclusão desses sujeitos, desde o vestibular,
assim como o Sistema de Cotas, apoiando-os no sentido da obtenção do sucesso e permanência,
proporcionando apoio burocrático, jurídico e econômico. As atividades do Grupo de Pesquisa in-
cluem reuniões de planejamento, estudo e pesquisa, além de apoio as necessidades burocráticas,
jurídicas e acadêmicas dos alunos assistidos no âmbito desse trabalho. Atuamos junto aos presídios,
À SEAP (Secretaria de Administração Penitenciária), Conselho Penitenciário, Comissão de Direito à
Educação da OAB e Defensorias Públicas. Nossos estudos têm como referencial teórico as pesquisas
de Erving Goffman, Howard Becker, Michel Foucault. Além dos textos oficiais sobre o assunto pro-
duzido pelo Ministério da Justiça, MEC e instituições ligadas, acadêmica ou juridicamente à temática
do Direito à Educação e Sistema Penal.

palavras-chave: direito à educação, EJA, presidiários na universidade

O direito a educação é inerente a cada um de nós seres humanos, mas existem lugares onde até
mesmo esse direito se torna difícil de ser exercido, um deles, o cárcere. Em 19 de maio de 2009, o
então secretário de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, do Ministério da Educação,
encaminhou pedido para que houvesse uma elaboração e aprovação de Diretrizes Nacionais para
a oferta de educação para jovens e adultos em situação de privação de liberdade nos estabeleci-
mentos penais brasileiros. Em sessão ordinária de 11 de novembro de 2009, a Câmara de Educação
Básica (CEB) do CNE deliberou favoravelmente sobre o pedido e, em 8 de fevereiro de 2010, uma
audiência pública, em Brasília, com a participação de representantes governamentais e da socieda-
de civil, com o objetivo de aprofundar a discussão em torno do Parecer e das diversas sugestões de
Resolução apresentadas, pelas entidades envolvidas no assunto, para aprovação do CNE.
A própria história da Educação de Jovens e Adultos é marcada por lutas dos movimentos popu-
lares de educação, tanto Anísio Teixeira quanto Paulo Freire foram responsáveis por muitas batalhas
em prol de uma educação que não visasse igualar a todos e sim enxergá-los em sua diferença. Tendo
em vista que a Educação de Jovens e Adultos é uma modalidade de Educação e, assim sendo, tem
suas características próprias, e a principal delas é o fato de que seus autores, os sujeitos dessa educa-
ção, escreveram muitos capítulos de suas vidas antes de encontrarem ‘’aquela’’ sala de aula, e como
tais suas vivências e suas diferenças tem que ser respeitadas. A esse respeito, Freire (1992) nos diz:

O que sobretudo me move a ser ético é saber que, sendo a educação, por sua pró-

406
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
pria natureza, diretiva e política eu devo sem jamais negar meu sonho ou minha
utopia ao educandos, respeitá-los. Defender com seriedade, rigorosamente, mas
também apaixonadamente, uma tese, uma posição, uma preferência, estimulando
e respeitando, ao mesmo tempo, o direito ao discurso contrário, é a melhor forma
de ensinar, de um lado, o direito de termos o dever de ‘’brigar’’ por nossas ideias, por
nossos sonhos e não apenas de aprender a sintaxe do verbo haver, de outro, o respei-
to mútuo. (FREIRE, 1992: 108)

De acordo com Streck (2010) em seu texto “Entre emancipação e regulação: (dês)encontros
entre educação popular e movimentos sociais’’, a educação popular tem como uma de suas marcas
acompanhar o movimento de classes, grupos e setores da sociedade, reencontrando práticas sociais
que podem levar a transformação. Assim um movimento social é a busca de um outro lugar social,
rompendo a inércia, assim, esses sujeitos passam a se negar a continuar vivendo no lugar que histo-
ricamente lhes é designado.
Esse artigo surge no âmbito do Projeto de Pesquisa e Extensão “Do Cárcere à Universidade”, cria-
do pela Coordenação de Extensão da Faculdade de Educação, da UERJ. O projeto foi criado a partir
da percepção de que alguns universitários da UERJ, são apenados(as), oriundos do sistema prisional
em regimes aberto ou semiaberto, que concluíram a Educação Básica no sistema carcerário, o que
demonstra que é possível voltar às ruas mudado. O Projeto “Do cárcere à universidade” fará um es-
tudo e um mapeamento desses universitários, pois sabe-se que eles não têm logrado sucesso na sua
empreitada de dar um novo rumo pessoal e profissional às suas vidas, pois vivenciam a vergonha
de um estigma que limita sua atuação enquanto universitários ativos, dificultando sua inserção nos
movimentos acadêmicos e sociais; e nas diversas redes de subjetividade.
Dependentes da liberação judicial, não conseguem se engajar nos estágios obrigatórios, tam-
pouco realizam as atividades culturais obrigatórias. Dessa forma, evadem-se e retornam aos muros
do sistema carcerário, frustrados pelo insucesso. Face a essa realidade entende-se que uma Faculda-
de de Educação precisa tomar para si a tarefa de compreender e buscar meios para que essa questão
entre nos seus debates, pesquisas, políticas e constitua-se numa de suas bandeiras na busca de uma
educação onde todos realmente estejam incluídos. Assim, se caracteriza por identificar quem são
esses alunos(as) para que se possa induzir Políticas Públicas de Inclusão que deem conta de apoiá-
-los, facilitando a sua permanência e sucesso nos cursos de graduação, onde estão regularmente
matriculados. Com as ações propostas, pretende-se reverter a evasão, possibilitando permanência
e sucesso dos alunos privados de liberdade, através da criação de uma linha de estudos na temática
Universidade e Sistema Carcerário e, principalmente, criando uma Política Pública de Inclusão des-
ses sujeitos sociais.
Assim, não como não relacionar os movimentos sociais ao Projeto “Do cárcere a universidade”,
onde esse se torna a busca para que os sujeitos que dele participam possam mudar suas realidades
e lutar contra essa desigualdade instaurada no seio do sistema, não só de ensino, mas do sistema
em geral. O projeto se torna quase um sonho pela humanização não dos privados de liberdade, não
deles, mas sim de todos os que os subjugam, transcrevo aqui as palavras de Freire (1992), quando
nos fala em sonho,

o sonho pela humanização, cuja concretização é sempre processo, e sempre de-


vir, passa pela ruptura das amarras reais, concretas, de ordem econômica, política,
social, ideológica etc., que nos estão condenando à desumanização. O sonho é as-
sim uma exigência ou uma condição que se vem fazendo permanente na história
que fazemos e que nos faz e refaz.(Freire, 1992: 137)

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
A escola, da formo como foi pensada, ou seja, esse modelo francês de escola, no qual o Brasil se
espelhou, de certa forma é tratada como uma espécie de prisão para seus alunos domesticando-os
e incentivando-os a se adequarem às regras que a sociedade impõe. Se é assim que acontece numa
escola comum, o que se dirá numa escola prisional; os corpos e as mentes desses que já se encon-
tram privados de liberdade tanto física quanto a espacial. O quê, para eles, significa a escola dentro
do presídio? Seria ela só mais um mecanismo para mantê-los doces e castos, para domesticar suas
mentes e vigiá-los? Afinal é assim que esse sistema penitenciário tem sido tratado, como algo que
castra a liberdade de uma pessoa que se encontra presa e o mantém retido em um pequeno espaço
submetido a aparatos de segurança que não permitem sua fuga, como se sua permanência em tal
espaço fosse garantir sua redenção.
A Educação, e não a escola, em si, pode permitir a muitos alcançar sua liberdade, mesmo que essa
esteja restrita pelas grades de ferro, afinal qual sentido teria para essas pessoas buscarem por algo,
se isso de certa forma não os ajudasse a fugir não fisicamente daquele espaço mas sim mentalmen-
te, assim podemos fazer uso das palavras de Freire (1992): ‘’brigar por nossos ideias’’, é isso que se faz
a cada instante quando acreditamos que essa Educação vai muito além daqueles muros de concreto
que os cercam.
Em relação à escola nos espaços prisionais sabe-se que não são todos que são liberados para es-
tudar; há aqueles com dificuldade de convívio com os demais. Com a escola, viajamos pelo mundo
através das aulas de história, geografia, matemática e português e outros disciplinas, os professores
também contam as novidades de revistas e jornais e o que está acontecendo fora da cadeia quanto
às questões políticas e sociais.
O projeto “Do Cárcere a Universidade” contribui para que esses sujeitos, privados de liberdade,
continuem a sonhar longe das grandes muralhas de concreto, o projeto que nasceu do sonho de um
aluno egresso que tinha o sonho de se tornar professor, hoje move-se quase que por vontade pró-
pria ajudando não só aos estudantes da própria UERJ, mas também os de outras universidades, que
se encontram nessa mesma situação, e lá se vão quase três anos de trabalho. O objetivo do projeto
não é ressocializar, com o sentido de domesticar o ser humano. Em seus estudos sobre instituições
totais, Foucault (2004) nos adverte sobre ressocialização dizendo

não se destina a sancionar a infração, mas a controlar o indivíduo, a neutralizar a


sua periculosidade, a modificar suas disposições criminosas, a cessar somente após
obtenção de tais modificações (Foucault, 2004: 20)

Esse conceito é utilizado no interior do sistema penitenciário, que implica a ideia de que o interno
volte à sociedade disposto a aceitar e seguir as normas destas. Diante disso, é importante entender,
em primeiro lugar, o que vem a ser socializar/socialização para depois refletir sobre o (re)socializar,
que segundo o dicionário Aurélio socialização significa: “[...] ato de pôr em sociedade; extensão de
vantagens particulares, por meio de leis e decretos, à sociedade inteira; desenvolvimento do sentido
coletivo, da solidariedade social e do espírito de cooperação nos indivíduos associados; processo de
integração mais intensa dos indivíduos no grupo.” O Projeto “Do Cárcere à Universidade” trabalha
no sentido de que ocorra essa verdadeira (re)socialização do individuo, sem que este se sinta opri-
mido dentro da sociedade.
Os estudantes assistidos pelo Projeto do “Do Cárcere à Universidade” têm conseguido superar
grande parte dos estigmas, como por exemplo, de que para essas pessoas só lhes resta apenas o re-
torno ao crime ou o trabalho, braçal pesado e mal remunerado, sendo que até esses muitas vezes é
lhes negado por preconceito. Sabe-se que, muitas vezes, esses estigmas fazem com que esses alunos
não obtenham o sucesso e, não os deixam concluir seus estudos. Por se encontrarem privados de
liberdade, vivenciam uma realidade limitada na Universidade, tendo hora marcada para sair e entrar,
necessitam de uma liberação judicial para deixarem suas unidades, muitas vezes não conseguem se

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
engajar nos estágios obrigatórios, há indícios de que, por este fato, muitos não conseguem concluir
seus estudos, realizando o trancamento (permanente de sua matricula), e tampouco realizam as
atividades culturais que precisam ter atestadas em currículo. A inflexibilidade do sistema (como um
todo) acaba por prejudicar muitas vezes esses alunos.
E, dessa forma, a questão sobre direito ou privilégio, começa-se a ser respondida, afinal com todas
essas dificuldades, o direito a educação transforma-se em privilégio, um privilégio muito cruel, que
só é alcançado pelas mãos de terceiros, pelas mãos daqueles que nas palavras de Freire (1992), não
deixaram de ‘’brigar’’ por suas ideias, brigar contra um sistema que te exclui por você ser diferente,
por ser marcado por esse estigma. Goffman (1998 ) nos adverte dizendo que quando esses sujeitos
adentram nessas situações sociais, novas e mistas, as relações começam a não caminhar suavemen-
te, inicia-se os olhares de indiferença, olhares que, por vezes, cercaram esse projeto, como se o que
se faz, no âmbito desse trabalho, não fizesse diferença, já que no fim do dia eles retornariam obriga-
toriamente as ‘’suas casas’’.
De acordo com os documentos oficiais sabe-se que 11,8% das pessoas privadas de liberdade são
analfabetas e 66% não chegaram a concluir o Ensino Fundamental. Pior do que isso é o fato de que a
maioria desses detentos, ou seja, 73,83%, são jovens com idades entre 18 e 34 anos (Parecer 4/2010).
A situação realmente se torna crítica quando percebemos aquilo que não é segredo pra ninguém,
que o número de pessoas privadas de liberdades, que são oriundas das classes baixas, se não são
analfabetos, possuem uma baixa escolaridade.
O Artigo 205 da Constituição Federal do Brasil de 1988 refere-se à educação como direito de
todos e dever do Estado. É graças a esse direito que, por vezes, se encontra em dicotomia com os
números expostos, que esses alunos que fazem parte desta universidade, puderam participar das
aulas no presídio e foram incentivados a não desistirem de continuar estudando, e é por ele que os
membros do projeto lutam, para que possa ser exercido e garantido. Assim, esses sujeitos privados
de liberdade podem continuar estudando, envoltos por outros muros de concreto que não os do
presídio e assim incentivar outros colegas a entrarem nessa luta, assim como eles entraram.
De acordo com o Parecer 4/2010: 5, a educação não pode ser apenas para alguns, nem reprodu-
tora de um sistema que visa a exclusão de boa parte da maioria, disseminando uma ideologia não
só em quem vivencia esse sistema, mas em toda uma sociedade da qual esses alunos fazem parte.
A educação deveria ser a ponte de apoio desses alunos, algo que atendesse a todos e, através dela,
eles conseguissem mudar suas realidades.
Quando se fala em “direito” ou “privilégio”, no título desse artigo, pretende-se refletir para muito
além daquelas grades que cercam a educação para privados de liberdade, porque se eles ainda não
concluíram a Educação Básica, significa que o sistema falhou com eles antes deles falharem com o
sistema, os fazendo ingressarem na EJA.
Nogueira & Nogueira (2002) veem nesse sistema que o papel de caráter transformador e demo-
cratizador impostos a esta instituição (a escola) passa agora a ser de um aparato que legitima a de-
sigualdade e os privilégios sociais, onde até mesmo na escola há uma demarcação social, de ‘’quem
é você’’. Nesse sentido, Maeyer ( 2006) nos lembra que

dez milhões de internos do sistema penitenciário em todo o mundo não são as


únicas pessoas afetadas pelo problema da educação na prisão. Normalmente, os
pais, amigos familiares dessas pessoas também são “categorias” que se encontram
excluídas da educação formal. E muito provavelmente seus filhos deixaram de fazer
parte do sistema escolar formal. Além disso, as prisões quase sempre carecem das
possibilidades de processos de educação ao longo da vida. Assim, o problema diz
respeito a muito mais do que dez milhões de internos; na realidade, setenta milhões

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
de pessoas são diretamente impactadas pela educação na prisão. (Maeyer, 2006: 17)

Finalizando essas reflexões, entende-se que, infelizmente, a educação para pessoas privadas de
liberdade tem sido compreendida como se fosse um privilégio, e não um direito público, subjetivo
e inalienável. E nesse sentido, as ações do Projeto “Do Cárcere à Universidade”, se justificam, por
trazer à tona essa discussão tão importante para esses sujeitos e tão pouco cara à sociedade como
um todo. Entende-se que uma Faculdade de Educação precisa tomar para si a tarefa de fazer valer o
Direito à Educação a quem quer que seja.
Somente assim poderemos garantir a todas as pessoas o que, historicamente, tem sido negado
àqueles que são invisíveis para a sociedade e atuar no sentido de se construir uma sociedade onde
todos os direitos sejam garantidos.

bibliogrAfiA e referênciAs bibliográficAs


CONSTITUIÇÃO da República Federativa do Brasil. 35ª Edição, 2012.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. Petrópolis: Editora Vozes, 2004
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Esperança – Um Reencontro com a Pedagogia do Oprimido, Paz e Terra,
1992
GOFFMAN, Irving. Estigma – notas sobre a manipulação de Identidade Deteriorada. Rio de Janeiro:
Editora Guanabara S.A., 1988
MAEYER, Marc. Na prisão existe a perspectiva da Educação ao longo da vida? São Paulo: Revista Edu-
cação e Cidadania, nº 19, Jul 2006
MEC - Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior, MEC – Resolução de 17/06 de 2010.
NOGUEIRA, Claudio Marques Martins & Nogueira, Maria Alice. A sociologia da Educação de Pierre
Bourdieu: Limites e contribuições. São Paulo: Revista Educação e Sociedade, ano XXIII, nº 78, 2002
STRECK, .Entre emancipação e regulação: (dês)encontros entre educação popular e movimentos
sociais, Estado: editora, 2010.

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
escolA cAbAnA: históriA, limites e AVAnços contAdos
por profissionAis dA ejA
Vitor soUsA cUnhA nery | Alder de soUsA diAs

Este trabalho aborda resultados de uma pesquisa que tem como objetivo sistematizar a histó-
ria da Escola Cabana (proposta político-educacional implantada na Rede Municipal de Ensino de
Belém-PA, no período de 1997 a 2004), tendo por base memórias de profissionais que atuaram com
a Educação de Jovens e Adultos (EJA) naquele contexto histórico. Seus objetivos específicos, são: (a)
registrar as percepções das profissionais entrevistadas acerca desta proposta educativa, (b) apontar
limites e avanços e (c) indicar características que possam contribuir com a construção de sistemas
públicos de educação democráticos, populares e inclusivos. Metodologicamente, constitui-se em
um estudo de abordagem qualitativa, do tipo estudo de caso, com características etnossociológicas.
Realizou-se levantamentos bibliográfico e documental e quatro entrevistas narrativas (BERTAUX,
2010) com a então gestora municipal da EJA, uma diretora de escola, uma coordenadora pedagó-
gica e uma professora de EJA. Estas foram sistematizadas e analisadas por meio de procedimentos
da Análise de Conteúdo. Dentre os resultados, as falas dos sujeitos da pesquisa revelam limites e
avanços em relação à gestão, currículo, avaliação e valorização do profissional da educação. Conclui-
-se que apesar das adversidades explicitadas no corpus do trabalho, os levantamentos bibliográfico,
documental e principalmente as falas dos sujeitos da pesquisa apontam que a experiência da Escola
Cabana indica vetores democráticos, populares e inclusivos à futuras políticas educacionais de sis-
temas públicos de ensino.

palavras-chave: História., Escola Cabana., Memórias., Profissionais da educação., EJA.

introdUção
O artigo objetiva sistematizar uma versão da história da Escola Cabana – proposta educacional
efetivada no âmbito da Secretaria Municipal de Educação de Belém (SEMEC/BEL) no período de
1997 a 2004 – tendo por base narrativas de profissionais da educação que naquele contexto atua-
ram com a Educação de Jovens e Adultos (EJA).
Os dados deste artigo constam em uma dissertação de mestrado vinculada ao Programa de Pós-
-Graduação em Educação da Universidade do Estado do Pará, concluída no ano de 2012, que em
termos de objetivo geral analisa a presença do pensamento-prática educacional de Paulo Freire em
memórias e práticas de profissionais da EJA durante a Escola Cabana.
A vereda metodológica da dissertação se constitui da confluência da pesquisa de campo, o estu-
do de caso e a narrativa de vida, desenvolvidos a partir da abordagem qualitativa de pesquisa em
educação, apoiando-se em autores como Minayo (2010), Bertaux (2010) e Chizzotti (2009) e Lüdke
e André (1986).
Os sujeitos da pesquisa, para este trabalho denominadas de narradoras, foram quatro profissio-
nais da educação vinculadas à SEMEC/BEL que no período da Escola Cabana atuaram com a EJA nas
funções de gestora municipal da EJA, diretora de escola, coordenadora pedagógica escolar de EJA
e professora de EJA.
Em termos de espaço também atuaram em diferentes ambientes: a gestora municipal de EJA
teve como espaço de referência profissional o prédio administrativo da SEMEC/BEL. A diretora de
unidade educacional atuou em uma escola que neste trabalho será chamada de Escola 1. Por fim, a
coordenadora pedagógica e a professora atuaram em espaço escolar que para fins de identificação

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
será denominado de Escola 2.
Assim, levando em conta o princípio ético de preservação da identidade, apresentam-se as se-
guintes nomenclaturas, para compreensão dos dados posteriormente analisados: gestora municipal
de EJA (Gestora-SEMEC/BEL), diretora da Escola 1 (Diretora-E1), coordenadora pedagógica de EJA
da Escola 2 (Coordenadora-E2) e professora de EJA da Escola 2 (Professora-E2)
Ressalta-se que o principal critério para a seleção das narradoras da pesquisa foi considerar o
maior tempo possível em atuação na EJA da Escola Cabana. Assim, tem-se os seguintes dados: Ges-
tora-SEMEC/BEL (7 anos); Diretora-E1(5 anos e meio); Coordenadora-E2 (8 anos) e Professora-E2 (6
anos).
Os dados explicitados neste artigo foram coletados por meio da técnica entrevista narrativa (BER-
TAUX, 2010) no espaço de trabalho das narradoras.
As narrativas foram organizadas em quadros elaborados no formato “doc.” for windows. A análise
dos dados se deu a partir de categorias analíticas e temáticas, conforme Bardin (2002).
Para além da Introdução e Considerações Finais, o texto possui três seções. A primeira seção “Da
compreensão sobre memória” destaca o marco teórico adotado e como este se faz pertinente para
compreensão e análise dos dados.
A segunda seção: “Escola Cabana: uma caracterização crítica”, conforme o nome indica, descreve
a Escola Cabana, situando seu contexto de origem e principais marcos político-pedagógicos. Esta
seção baseia-se em levantamento de teses, dissertações e documentos da SEMEC/BEL elaborados
no contexto desta proposta educacional.
A terceira seção, “Escola Cabana: o que contam os profissionais da educação?”, explicita uma aná-
lise das entrevistas narrativas coletadas por ocasião da pesquisa de campo. Evidencia alguns limites
e avanços da Escola Cabana, pontuados profissionais da EJA.

dA compreensão sobre memóriA


Nesta seção, visa-se explicitar a memória enquanto principal categoria analítica a fundamentar
este trabalho. Adota-se o ponto de vista Maurice Halbwachs (1877-1945) para quem não se pode fa-
lar apenas em memória, mas em memória individual e memória coletiva no contexto da consciência
social.
A memória individual organiza lembranças envolvendo o contexto da vida pessoal de um sujeito.
Por esse motivo, é erroneamente compreendida como uma faculdade isolada da sociedade e que
subsiste em torno de um corpo e um cérebro (HALBWACHS, 2006).
Por vez, a memória coletiva é compreendida como uma maneira de organizar lembranças em
torno de um grupo grande ou pequeno e que contribui para que o sujeito se reconheça enquanto
membro do grupo. Esta memória: “não retém do passado senão o que ainda está vivo ou é capaz de
viver na consciência do grupo que a mantém” (HALBWACHS, 2006, p. 102).
Halbwachs (2006, p. 106), parte do pressuposto de que “toda memória coletiva tem como supor-
te um grupo limitado no tempo e no espaço”. Portanto, não pode ser confundida com uma represen-
tação esquemática de acontecimentos.
Ao contrário, enquanto meio de reconhecimento grupal, a memória coletiva dá ênfase para as
lembranças semelhantes entre os sujeitos. Assim:

as mudanças, ou seja, os acontecimentos que ocorrem no grupo, se desenvolvem


em semelhanças, pois parecem ter como papel desenvolver sob diversos aspectos
um conteúdo idêntico, os diversos traços essenciais do próprio grupo (HALBWACHS,

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
2006, p. 109).

Também cabe destacar que as memórias individual e coletiva, embora se distingam também se
relacionam. A memória individual pode recorrer à memória coletiva e assimilar suas contribuições
que lhes são externas. “Isto acontece porque jamais estamos sós” (HALBWACHS, 2006, p. 30).
Revela-se, assim, a função cognoscente da memória na medida em que reforça, enfraquece ou
complementa algo sobre o objeto cognoscível.

Recorremos a testemunhos para reforçar ou enfraquecer e também para comple-


tar o que sabemos de um evento sobre o qual já temos alguma informação, embora
muitas circunstâncias a ele relativas permaneçam obscuras para nós (HALBWACHS,
2006, p. 29).

No caso da memória coletiva, sua interconexão com a memória individual se dá na medida em


que esta mantém uma relação de pertença com aquela, em que, muitas vezes, o que antes era tido
como individual passa a ser ressignificado em um quadro consciencial de grupo e não mais indivi-
dual.

Por outro lado, a memória coletiva, contém as memórias individuais, mas não se
confunde com elas – evolui segundo suas leis e, se às vezes determinadas lembran-
ças individuais também a invadem, estas mudam de aparência a partir do momen-
to em que são substituídas em um conjunto que não é mais uma consciência pessoal
(HALBWACHS, 2006, p.71-72).

Explicitou-se anteriormente que a memória coletiva em contato com a memória individual ajuda
a ressignificar uma dada experiência, mas também é importante destacar um aspecto central a este
trabalho: a presença não material de outro(s) neste processo de rememoração.A este respeito, Hal-
bwachs (2006, p. 72) aponta que:

Ela [a memória individual] não está inteiramente isolada, fechada. Para evocar
seu próprio passado, em geral a pessoa precisa recorrer à lembranças de outras e se
transporta a pontos de referência que existem fora de si, determinados pela socie-
dade.

Nesse sentido, o que se experiencia mediado por outras pessoas pode servir de subsídio para a
rememoração, pois por meio desta, evoca-se a influência de uma pessoa ou de um ou vários grupos
sociais, podendo-se, ainda assim, falar em memória coletiva.

Talvez seja possível admitir que um número enorme de lembranças reapareça


porque os outros nos fazem recordá-las; também se há de convir que, mesmo não
estando esses outros materialmente presentes, se pode falar de memória coletiva
quando evocamos um fato que tivesse um lugar na vida de nosso grupo e que vía-
mos, que vemos ainda agora no momento em que os recordamos, do ponto de vista
desse grupo. Temos o direito de pedir que este segundo aspecto seja admitido, pois
esse tipo de atitude mental só existe em alguém que faça ou tenha feito parte de um
grupo e porque, pelo menos à distância, essa pessoa recebe sua influência (HALBWA-
CHS, 2006, p. 41-42).

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
Neste caso, em se tratando da pesquisa em tela, tem-se narradoras que fazem parte de um grupo
(profissionais que atuaram com a EJA da Escola Cabana), situados no tempo (1997-2004) e no espa-
ço (atuaram no interior de ambientes educativos SEMEC/BEL). Narradoras que não necessariamente
se conheciam ou conviviam no mesmo ambiente escolar, mas que compartilham lembranças de
acontecimentos em comum, de tal maneira que se reconheçam dentro de um quadro grupal.
Assim, além de ser uma das categorias analíticas que compõem este trabalho, a compreensão
que Halbwachs (2006) evidencia sobre a memória corrobora a vereda metodológica da dissertação
da qual este trabalho resulta, mais precisamente ao uso das narrativas de vida como meio de obten-
ção de elementos sócio-históricos para análise de um fato ocorrido em passado recente. No caso, a
Escola Cabana.

escolA cAbAnA: UmA cArActerizAção críticA


A Escola Cabana ocorreu no período de 1997 a 2004 em Belém, capital do Pará, Estado geografi-
camente localizado na região da Amazônia Brasileira.
Documentos apontam que no período anterior a esta proposta educacional as principais forças
político-partidárias revezavam-se no espaço governamental do Pará pouco direcionando políticas
públicas à população materialmente mais carente de Belém, haja vista estarem mais interessadas
em trocas de favores e apadrinhamentos políticos (OLIVEIRA, 2000). Esse revezamento de grupos
políticos também foi destacado por Santos (2003, p. 66):

A cidade de Belém, politicamente, não se diferencia dos demais municípios do Es-


tado do Pará, no que tange ao revezamento de grupos políticos no poder local. É um
fato constante. Esses grupos políticos apresentam um certo equilíbrio de forças no
Estado e encontram-se ora à frente do governo estadual ora no governo municipal,
sem que essa alternância representa mudanças significativas na forma de condução
política.

Portanto, o pleito eleitoral de 1996 para a prefeitura de Belém foi histórico na medida em que
quebra a alternância de grupos políticos interessados em práticas elitistas e de apadrinhamento,
colocando o poder municipal uma coligação partidária denominada de Frente Belém Popular (FBP)
liderada pelo Partido dos Trabalhadores (PT), que em tese, estava comprometida com as classes po-
pulares, inclusive do ponto de vista das políticas educacionais.
Assim, a população belenense começa a experienciar outra força política no poder local, de es-
querda, que teve como um de seus compromissos a universalização do ensino (LIMA, 2000) e que se
propôs a uma reforma educacional tendo como referência a política educacional do PT, que, confor-
me Dias (2013a; 2013b), têm sua gênese no pensamento-prática educacional de Paulo Freire.
Nesse sentido, desde janeiro de 1997, a SEMEC/BEL começou a implantar a Escola Cabana, tendo
como princípios orientadores a inclusão social e a construção da cidadania e como diretrizes básicas:
• A democratização do acesso e permanência [do educando] com sucesso;
• A gestão democrática no sistema municipal de educação.
• A valorização profissional dos educadores.
• A qualidade social da educação (BELÉM, 1999, p. 01).
• Entretanto, em face da escolha dos princípios orientadores da Escola Cabana, Santos (2003,
p. 67) aponta para uma crença exacerbada sobre o papel deste projeto de educação:

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
Nos princípios da proposta pedagógica da rede encontrava-se presente uma
crença exacerbada no poder transformador da educação, como instrumento capaz
de, por si só, salvaguardar das desigualdades sociais os que a ela têm acesso, promo-
vendo mudanças no nível estrutural da sociedade.

Tal crítica também é explicitada por Bertolo (2004, p. 163): “fica [...] evidenciado que, na definição
dos princípios e diretrizes do projeto, há uma crença demasiada no potencial da educação no pro-
cesso de transformação social”.
Estas críticas se coadunam com as políticas educacionais do passado brasileiro, principalmente
no que toca aos primeiros grandes projetos de alfabetização de adultos, quando se pensava que por
meio deles, se erradicaria o analfabetismo no Brasil (PAIVA, 2003).
Cabe destacar que, conforme Fonseca (2009, p. 59), esta proposta educacional: “teve o início de
sua construção ainda no período da campanha e desde as primeiras discussões adotou para si a
identidade cabana”, pois buscou estabelecer relações com as raízes históricas e culturais do povo
local: “um povo que tem uma forte tradição de resistência, organização e luta pela conquista de seus
ideais” (BELÉM, 1999, p. 01).
Portanto, a identidade da Escola Cabana evoca a força do passado, mais precisamente, da Re-
volução Cabana, enquanto movimento revolucionário genuinamente amazônico, de participação
maciça dos despossuídos e que teve na autonomia, na igualdade política, no aceite e respeito às
diferenças culturais – quando a cidadania esboçava seus primeiros passos – seus princípios orienta-
dores (RODRIGUES, 2009).
Assim, identificar esta proposta educacional para Belém-PA com a Cabanagem: “significou pensar
em uma escola que correspondesse aos interesses da classe trabalhadora, e de segmentos margina-
lizados da sociedade, colocando-a como principal protagonista” (FONSECA, 2009, p. 59).
Esta projeção de um movimento do passado paraense a uma política contemporânea se faz pre-
sente em diversos documentos oficiais elaborados pela SEMEC/BEL, conforme analisa Bertolo (2004,
p. 155):

À semelhança dos demais textos analisados, este também se ocupa, em suas


páginas introdutórias, em criar elos da Cabanagem com o projeto Escola Cabana.
Como se vê, um dos fios que articulam a trama discursiva que origina o projeto Esco-
la Cabana, presente nos três documentos analisados, pode ser identificado no vín-
culo que se tenta estabelecer entre o projeto e a Cabanagem – que nos documentos
oficiais da Escola Cabana é descrito como um dos mais legítimos, revolucionários e
populares movimentos que marcaram a história política de nosso país.

Tal projeção discursiva pode estar relacionada a um dos modus operandi da ideologia (THOMP-
SON, 2002), a gerar alguns parcos frutos, tal como aponta Rodrigues (2009, p. 11-12):

Hoje, existem tentativas de apropriação do ‘espírito cabano’ uma entidade de ela-


boração tão frágil que salta aos olhos a sua mera utilização como recurso político.
De qualquer modo, há nessa tentativa um esforço educativo, que rende alguns par-
cos frutos, no sentido de incentivar a participação popular no processo de tomada
de decisões administrativas no plano local.

Além destes princípios e diretrizes, a Escola Cabana elegeu alguns eixos orientadores de suas

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
ações, quais sejam:
• O trabalho com o conhecimento, na perspectiva interdisciplinar, como meio de superar a
fragmentação e a alienação entre os diferentes saberes culturais que fazem parte da vida
cotidiana dos educandos;
• A organização do processo escolar em ciclos de formação, como estratégia de superação
da estrutura seletiva do regime seriado e de construção de uma escola inclusiva;
• A avaliação na perspectiva emancipatória, rompendo com o caráter burocrático e com a
função classificatória que tem contribuído para a exclusão do direito à continuidade dos
estudos de uma enorme parcela de crianças e adolescentes, oriundos das classes populares
(BELÉM, 1999, p. 7).
Entretanto, a respeito da factibilidade destes eixos no cotidiano das escolas, percebeu-se certa
dificuldade em articular tais eixos ao fazer pedagógico dos professores, bem como ao conjunto de
ações desenvolvidas pela Rede (SANTOS, 2003).
De acordo com Oliveira (2007, p. 59), liderada pelo PT: “a FBP acreditava que representava o poder
popular na prefeitura, daí a definição do governo como ‘Governo do Povo’. Nesse sentido, no que
toca às políticas educacionais, opta por um projeto de educação anticapitalista e antineoliberal:

O Projeto Político-Pedagógico da Escola Cabana expressa uma concepção que


tenta romper com o projeto neoliberal de educação, no sentido de alterar a lógica
de subordinar a educação apenas aos interesses do modelo econômico [...] (BELÉM,
1999, p. 64).

Ressalta-se que a Escola Cabana procurou intervir na Rede de maneira efetiva com o intuito de
conter o avanço da proposta neoliberal de educação a partir de ações inclusivas junto aos alunos,
“garantindo o acesso à escola com quantidade e qualidade de aprendizagem, respeitando suas ex-
periências socioculturais, características e ritmos próprios (SANTOS, 2003, p. 70)”.
No que concerne à formação de educadores, a luta contra a educação de orientação neoliberal
se deu em: “contribuir para a formação da consciência crítica dos profissionais como trabalhadores
da educação, na perspectiva de compreender a apreender a contradição da prática pedagógica”
(p. 70). Prática formativa que significou: “construir uma prática que responda aos desafios [...] que
levam à exclusão dos seus alunos pela falta de acesso ao conhecimento sistematizado, que geram
a expulsão tanto da escola como do mercado de trabalho” (p. 70), que se traduz na: “possibilidade
de uma ação/prática pedagógica que compreenda a escola em sua condição histórica contribuindo
com os interesses do coletivo e da produção social, na direção de um projeto de sociedade oposto
ao existente” (p. 70).
Assim, Santos (2003) adverte para o distanciamento entre o discurso idealizado, que prevê a opo-
sição ao projeto de educação neoliberal, da prática da SEMEC/BEL. Considera-se este distanciamen-
to entre o discurso e a prática como “nós complexos”, que apontam de maneira consciente para os
limites e as possibilidades de um projeto de educação pensado e elaborado por mãos humanas,
portanto, passível de falhas, mas que visou construir práticas educativas democráticas e orientadas
aos interesses povo belenense.

escolA cAbAnA: o qUe contAm os profissionAis dA edUcAção?


A Escola Cabana é vista como a realização de um projeto de educação que é anterior ao PT che-
gar à prefeitura de Belém: “A Escola Cabana não nasce no Governo do Povo. Ela nasce na utopia dos
petistas do Pará de se ter uma escola de qualidade para as classes populares” (Gestora-SEMEC/BEL).

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
Este registro encontra coerência com o estudo de Fonseca (2009) ao apontar que esta proposta
educacional adquire maior consistência durante a campanha eleitoral para a Prefeitura de Belém,
em 1996, momento que adota para si a identidade da Cabanagem, entendida, neste trabalho, como
um movimento revolucionário genuinamente amazônico (RODRIGUES, 2009).
A partir de 1997, o “Governo do Povo” começa o processo de implantação da Escola Cabana e,
sob pena de cair em contradição, adota como uma de suas diretrizes a qualidade social da educação
(BELÉM, 1999), mas não a qualidade com enfoque neoliberal, fortemente difundida naquele contex-
to. Assim: “Não se lutava pela qualidade total como a SEMEC/BEL da gestão municipal anterior, mas
como qualidade social: que desse acesso, mas que garantisse a permanência [do educando] com
sucesso” (Gestora-SEMEC/BEL).
No âmbito escolar, esta política educacional foi estabelecida a partir do referencial da gestão
democrática, o que possibilitou a eleição direta para Direção escolar e Conselho Escolar, além da
construção do projeto político-pedagógico das escolas municipais:

A implantação da Escola Cabana se deu de maneira democrática, onde tivemos


a oportunidade de discutir uma proposta de escola democrática no município de
Belém e isso mexeu com três eixos principais, que a eleição direta do Conselho Esco-
lar, do diretor de escola e também a construção do projeto político-pedagógico das
escolas (Diretora-E1).

Sem deixar de lado os três eixos da gestão democrática da Escola Cabana, contou-se também
com a efetiva participação da comunidade escolar: pais e alunos, professores, funcionários, técnicos
e diretores:

A escola se organizou e realizou, a partir do Projeto Escola Cabana, as eleições


diretas, a constituição dos Conselhos, que contava com diversas formações para
conselheiros. Antes as escolas tinham o plano global, mas na visão democrática,
política, de compromisso com o social da Escola Cabana foi possível construir o pro-
jeto político-pedagógico da escola que respeitasse as diversidades e que fosse fruto
da necessidade do coletivo e isso se dava pelas assembleias com pais, funcionários,
professores e técnicos, contado com acertos e erros. Esses foram os primeiros passos
da Escola Cabana (Coordenadora Pedagógica-E2).

As narrativas também evidenciam avanços engendrados na educação belenense, a partir da im-


plantação da Escola Cabana.
De acordo com a Coordenadora Pedagógica-E2: “A Escola Cabana foi um marco histórico para
a educação no Pará”, principalmente porque esta proposta de educação via no povo belenense o
princípio e o fim de suas ações democráticas, além de colocá-lo na condição de sujeito ativo do
devir histórico local. “Por meio da Escola Cabana os atores que fazem a escola estavam intervindo,
sugerindo” (Diretora-E1).
A este respeito, uma das narradoras nos diz: “a Escola Cabana foi um projeto de educação para
o povo. Na verdade, o povo era o sujeito da ação. Era uma escola em que a criança, mesmo na pré-
-escola, estava desenvolvendo sua cidadania” (Gestora-SEMEC/BEL).
Cidadania, um dos princípios orientadores da Escola Cabana (BELÉM, 1999), também caracteri-
zada como concretização de direitos sociais às classes populares. “A Escola Cabana foi a garantia de
alguns direitos à população que vinha sendo deixada de lado: direito a esporte, educação, cultura e
lazer” (Diretora-E1).

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
Para além desta dimensão ampla de política educacional democrática e de orientação aos inte-
resses das classes populares, a Escola Cabana também foi marcada por mudanças na concepção de
educação: “A Escola Cabana foi um momento de ruptura com uma educação tradicional e os primei-
ros passos de uma educação progressista” (Coordenadora Pedagógica-E2).
Educação progressista que traz em seu bojo suas próprias práticas. “Com a Escola Cabana houve
mudanças na forma de avaliação, foi implantado o currículo por meio de ciclos e se deu um trabalho
mais orientado à qualificação do professor” (Diretora-E1).
Ao comparar as memórias das narradoras quanto à educação anterior à proposta da Escola Caba-
na, nota-se que as escolas municipais contavam com um documento denominado de Plano Global,
que servia para direcionar suas ações, mas não abrangia em sentido democrático e participativo o
Projeto Político-Pedagógico implantado no contexto do “Governo do Povo”:

Antes as escolas tinham o plano global, que servia para orientar suas ações, mas
na visão democrática, política e de compromisso com o social da Escola Cabana foi
possível construir o Projeto Político-Pedagógico da escola que respeitasse as diversi-
dades e que fosse fruto da necessidade do coletivo e isso se dava pelas assembleias
com pais, funcionários, professores e técnicos, contado com acertos e erros (Coorde-
nadora Pedagógica-E2).

Na escola onde trabalhou a Diretora-E1, houve uma mudança radical na maneira de gerir este
espaço escolar, a partir da implantação da Escola Cabana.
A escola, que possui cinco Anexos pelos bairros da Terra Firme e Curió-Utinga, contava com o
seguinte quadro, antes da posse do “Governo do Povo”:
• Os professores dos Anexos, apesar de serem da mesma escola, não se conheciam.
• Eram Anexos em termos de documentação e para percepção de recursos, mas a parte pe-
dagógica não era integrada. Cada Anexo fazia sua Jornada Pedagógica, sua confraterniza-
ção, etc.
• Antigamente os Anexos serviam até de ‘curral eleitoral’. Os políticos colocavam quem que-
riam para trabalhar nos Anexos.
• Os pagamentos não eram feitos pela Prefeitura, mas pela associação de moradores.
• Nos Anexos, podiam interromper aula e se faziam festas de padroeiro a qualquer dia. Se
precisavam velar um defunto era para lá que levavam e se encontravam as portas fechadas
as arrombavam (Diretora-E1).
A partir de 1997, com a Escola Cabana, houve as seguintes modificações:
• Delegaram um coordenador para cada Anexo. Este coordenador era vinculado à escola,
mas visitando os Anexos.
• Os recursos materiais passaram a ser divididos e houve mais assistências aos Anexos.
• Vincularam os Anexos a uma Escola-sede e os profissionais passaram a ser profissionais da
Rede, não mais qualquer um (Diretora-E1).
Esse contexto corrobora com o que uma das narradoras vem a dizer sobre a política educacional
antes do “Governo do Povo”: “Naquele momento se tinha uma escola preparada para o fracasso
escolar. O nível de retenção era altíssimo”. (Gestora-SEMEC/BEL). Era um sistema escolar que ofere-
cia uma educação de baixa qualidade: “as pessoas quando saiam da escola não conseguiam fazer
uma ‘leitura de mundo’, mal conseguiam fazer a leitura dos códigos da linguagem escrita” (Gestora-
-SEMEC/BEL).

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
A análise destas narrativas aponta para a inferência de que a Escola Cabana foi uma proposta
de educação democrática, construída a partir de: “seminários, congressos, ciclos de estudos, fóruns
para se discutir abertamente a proposta pedagógica democrática voltada para a classe popular”
(Coordenadora Pedagógica-E2). Iniciativas estas realizadas por meio de princípios e diretrizes orien-
tados, dentre outros aspectos, ao sucesso escolar do educando. Em geral, oriundo das camadas po-
pulares. “Tudo isso para se fazer uma educação comprometida com o sucesso da aprendizagem dos
alunos” (Coordenadora Pedagógica-E2).
Nesse sentido, aponta-se que as prescrições dos documentos orientadores da Escola Cabana fo-
ram materializadas, pelo menos se se considerar as memórias das narradoras, pois tanto os docu-
mentos quanto as narrativas apontam para a valorização do educador e da educadora, quer seja por
meio dos processos de formação, pelo melhoramento do piso salarial ou mesmo pela melhoria de
condições de trabalho, a partir da implantação da Hora Pedagógica (HP).
Ao comparar a gestão da SEMEC/BEL anterior à da Escola Cabana, a Diretora-E1 afirma que: “antes
nada disso havia. Não nesse sentido, com todo esse aparato, esse leque de oportunidades, discus-
sões em todas as instâncias, com essa dimensão mais democrática”.
A implantação de um projeto de educação com estas abrangências territorial (o município de
Belém e seus distritos) e temporal (oito anos) não poderia se dar sem dificuldades e incoerências.
Não obstante as discussões em torno desta nova proposta de se fazer educação, muitos profis-
sionais da SEMEC/BEL, principalmente os professores, não se sentiam contemplados. Isto aconteceu
porque o processo de elaboração dos documentos orientadores da Escola Cabana, sem perder de
vista o princípio da democracia, deu-se a partir da eleição de delegados que representavam as esco-
las. “Construímos a Escola Cabana, mas por representatividade democrática” (Gestora-SEMEC/BEL).
Contudo, esta dificuldade de implantação da Escola Cabana não residiu na representatividade
democrática, mas no fato de muitos delegados não darem o devido retorno do que se estava a se
discutir e a se decidir nas plenárias, dificultando que os sujeitos a quem esta proposta de educação
se direcionou se reconhecessem nela:

O problema é que nem toda a rede se reconhecia porque era eleito apenas um de-
legado por escola e nem sempre esse delegado discutia com a comunidade escolar
sobre as decisões que estavam sendo tomadas (Gestora-SEMEC/BEL).

Por isso, “embora a proposta da Escola Cabana tenha sido largamente discutida, nem todas as
escolas seguiam essa filosofia de qualidade social” (Professora-E2).
Essa situação levou os técnicos da SEMEC/BEL a inaugurar uma nova fase de implantação da Es-
cola Cabana, a do convencimento, que se deu porque havia professores resistentes a trabalhar com
os referenciais cabanos, devido não se sentirem seus construtores.

Nós tínhamos uma equipe de técnicos que iam até às escolas disputar a propos-
ta da Escola Cabana, pois nem todos os professores não estavam trabalhando de
acordo com a proposta da Escola Cabana e não estavam porque não se sentiam
construtores dela. Esse foi um nó da Escola Cabana. Nessa fase, já partíamos para o
convencimento com alguns professores (Gestora-SEMEC/BEL).

Outro “nó” na implantação da Escola Cabana foi a efetivação da avaliação emancipatória, de cará-
ter qualitativo, haja vista que: “os professores tinham dificuldade de avaliar o aluno fora da avaliação
quantitativa” (Diretora-E1). Por outro lado, este “nó” transcendia a mera dificuldade dos professores,
pois: “a própria família também tinha dificuldade de compreender esta nova forma de avaliação. O

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
filho não chegava mais com o cronograma de provas e nem com as provas e notas” (Diretora-E1).
Por outro lado, a valorização do educador nem sempre foi o que se esperava, por exemplo: “o piso
pago pela HP não foi o que a categoria almejou. Nesse sentido, vejo uma incoerência, uma vez que
se falava tanto de valorização do educador. Isso desvalorizou o magistério, a classe dos professores”
(Coordenadora Pedagógica-E2). Esta incoerência talvez ajude a explicar, pelo menos em parte, o
porquê da HP não ter contado com o senso de compromisso de muitos professores. “A Hora Peda-
gógica, apesar de ser uma conquista, não foi levada a sério por muitos professores” (Diretora-E1).
Outra incoerência entre o prescrito e o feito na Escola Cabana foi a resistência da SEMEC/BEL à
mobilização crítica e possibilidade de greve pelos profissionais da Rede. “Se dizia que tínhamos o
direito de instigar, mas na hora da greve a SEMEC/BEL criava resistência. Era como se dissessem: ‘Fa-
çam a greve, vocês têm direito, mas não façam no meu Governo’” (Coordenadora Pedagógica-E2).
Ainda em relação aos professores, particularmente no que toca à prática pedagógica, uma das
narradoras fez menção a uma distância entre o discurso e a prática. Em outras palavras, faltou a al-
guns professores a coerência entre o dito e o feito, em relação aos pressupostos da educação liber-
tadora. “Havia muitos professores que se diziam progressistas e discursavam sobre Freire, mas suas
práticas eram extremamente tradicionais” (Coordenadora Pedagógica-E2).
Também havia profissionais que realizavam uma prática educativa com menor ênfase nos proces-
sos de alfabetização, de leitura e de escrita, sobrevalorizando a criticidade e o diálogo:

Outro problema é que os alunos foram construindo o conhecimento crítico deles,


mas a questão da estrutura de alfabetização foi deixada a desejar, com a produção
da leitura e da escrita. Havia uma criticidade muito boa, mas se empacava no pro-
cesso da construção da leitura e da escrita (Professora-E2).

Nesse sentido, a narradora indica que esta tenha sido uma falha do processo de formação de
educadores com os professores da Rede: “faltou nas formações continuadas, um trabalho mais efe-
tivo quanto a essa questão” (Professora-E2).
Por fim, entende-se que estas incoerências e dificuldades de implantação da Escola Cabana não
devem ser tomadas por uma postura maniqueísta no sentido de compreender que esta proposta de
educação não tenha dado certo. Pelo contrário, auxilia-nos a compreendê-la enquanto experiência
historicamente situada, por isso condicionada, pois a Escola Cabana também representou alguns
avanços na política educacional de Belém.

considerAções finAis
A Escola Cabana foi uma proposta de educação à cidade de Belém, implementada pelas gestões
municipais do Partido dos Trabalhadores, durante os anos de 1997 a 2004. Esta proposta educacio-
nal, ao evocar a Cabanagem enquanto revolução genuinamente amazônica como marca central de
sua identidade, intencionou se constituir em uma política educacional de identificação e luta pelos
interesses das camadas populares e excluídas dos processos sociais, além de visar à participação
popular nos processos decisórios locais.
As narradoras compreendem que a Escola Cabana foi um projeto de educação que teve, de fato,
como uma de suas referências de ação a qualidade social da educação.
Constitui-se em marca factual desta proposta educacional a gestão democrática, concretizada
por instâncias de democratização do poder, as eleições diretas para direção escolar e conselho es-
colar (estes, operando em caráter consultivo e deliberativo), além da viabilidade da construção dos
projetos político-pedagógicos das escolas públicas municipais.

420
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
É compreensível que as narradoras tenham em suas memórias uma Escola Cabana que represen-
tou um marco na história da educação paraense, dada sua referência de ação democrático-partici-
pativa, de ordem inclusiva, de promoção da cidadania e por representar um projeto de educação
progressista, humanizado e humanizante, orientado aos interesses das classes sociais menos favore-
cidas pela sociedade local, que ainda hoje, tem seus fundamentos relacionais centrados em predo-
minância, no individualismo e na reificação do ser humano, próprias do Neoliberalismo.
Entretanto, esta materialização das prescrições não ocorreu sem dificuldades e contradições. No
caso, aponta-se: profissionais da educação que não se sentiram construtores da Escola Cabana; di-
ficuldades na operacionalização da avaliação emancipatória; dificuldades e incoerência relaciona-
das aos professores e professoras, com destaque para (1) a valorização do profissional da educação
aquém do esperado e (2) práticas antidemocráticas da gestão da SEMEC/BEL; (3) incoerência entre
o dito e o feito quanto à prática educativa; (4) descompasso entre a promoção da criticidade e o tra-
balho com os processos alfabetizadores.
referênciAs
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421
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
fórUm ejA de mAto grosso: co - pArticipAção nA
efetiVAção dAs políticAs públicAs pArA modAlidAde
no estAdo.
KeilA AlVes de soUzA | iVAnA bognAr

A Educação no Brasil é direito público subjetivo constitucional, portanto, dever do Estado (con-
forme art. 205/CF/1988), independente da localização dos sujeitos. Entretanto, a modalidade EJA
- Educação de Jovens e Adultos foi por um longo período, tratada como apêndice nas escolas. Só
vem sendo discutida, debatida e estudada a partir dos processos de lutas sociais organizadas, prin-
cipalmente pelos movimentos sociais, em especial os Fóruns de EJA do Brasil que defendem uma
prática pedagógica libertadora e emancipatória para os sujeitos da educação de jovens e adultos.
O objetivo central deste é discorrer sobre a participação da sociedade organizada na construção de
políticas públicas para a modalidade EJA a partir da institucionalização do Fórum Permanente de
Debates de Educação de Jovens e Adultos de Mato Grosso, FPDEJA/MT. O texto tece considerações
sobre o período histórico e as circunstâncias em que surge a proposta de criação dos Fóruns de EJA
a partir da necessidade de mapeamento da modalidade no país com a realização da IV CONFINTEA
no Brasil em 2009. Em Mato Grosso esse processo de implantação aconteceu em 2001, foi intenso,
porém aconteceu de forma colaborativa entre sociedade civil, universidades, secretarias de Estado
de Educação e demais movimentos sociais. Nesse contexto o que nos difere dos demais estados é a
nossa distribuição geográfica em 18 polos que compõem o FPDEJA/MT, dada a extensão do nosso
estado. Para tal nossa pesquisa é pautada na constituição desses polos estados afora, ao longo de 13
anos de história e como essa organização contribuiu para efetivação e fortalecimento das políticas
púbicas para EJA em Mato Grosso, uma vez que o Fórum é um organismo social com responsabili-
dade de controle social e a garantia de direitos universais, iguais a todos.

palavras-chave: Fórum de EJA, controle social, políticas públicas

A edUcAção de joVens e AdUltos: premissAs do processo histórico


e A orgAnizAção sociAl pArA A efetiVAção de políticAs públicAs pArA
A modAlidAde
A premissa mais significativa na direção do aprofundamento da educação de jovens e adultos, mo-
tivado pela preparação para a V Conferência Internacional de Educação de Adultos (Confintea),em
1997, inaugurou fóruns de EJA que, em menos de dez anos, ocuparam todas as unidades da Fede-
ração. Esse processo iniciou – se com o I Seminário de Educação de jovens e adultos realizado em
Natal, Rio Grande do Norte em 1996, o Ministério de Educação se viu na obrigatoriedade de realizar
um raio X da modalidade no país uma vez que receberíamos a VI CONFINTEA em 2009. E receber
uma conferência dessa magnitude com o compromisso de debater e propor encaminhamentos que
qualificassem a EJA no Brasil e no mundo, precisava antes demais nada que soubéssemos o que
tínhamos de atendimento, oferta, formação profissional, currículo e programas de governo que cir-
cundassem a modalidade.
Os movimentos sociais tiveram participação primordial nesse processo de mapeamento da EJA
no país, desde que foi ofertada em sua mais prematura forma até o reconhecimento como modali-
dade em 1996 pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação - LDB em seus artigos 37 e 38, bem como
seus desdobramentos pós Declaração de Hamburgo.
Diante do exposto, em 2001, no Rio de Janeiro aconteceria o I Encontro Nacional da Educação de

422
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
Jovens e Adultos - I ENEJA organizado pelos Fóruns de EJA do Brasil que começava a tomar corpo
dando o primeiro passo para que todos os estados implantassem seus fóruns estaduais, pautados
na Declaração de Hamburgo que em seu item 9 frisa:

“Educação básica para todos significa dar as pessoas independentemente da ida-


de, a oportunidade de desenvolver seu potencial, coletiva ou individualmente para
com os outros e com todaa sociedade. É fundamental que o reconhecimento do di-
reito à educação continuada durante a vida seja acompanhado de medidas que
garantam as condições necessárias para o exercício desse direito” (página 22)

Em sendo, os Fóruns de EJA do Brasil ao longo de uma década se responsabilizaram em formatar


discussões e manter o debate em torno das políticas públicas de EJA que garanta a esses sujeitos o
direito de aprender ao longo da vida e por toda vida em todos os espaços sociais que ocupar.
Em meio a esse contexto de organização dos Fóruns Estaduais, Mato Grosso realizou em 2001
seu I Encontro Estadual que instituiria o Fórum Permanente de Debates sobre Educação de Jovens
e Adultos de Mato Grosso – FPDEJA/MT, em parceria com instituições públicas, sindicatos e mo-
vimentos sociais que direta ou indiretamente “faziam” a EJA acontecer no estado.As instituições
representadas naquele 08/06 foram consideradas membros fundadores do FPEDEJA/MT e aquelas
que somaram depois são membros integrantes do Fórum.

o fpdejA/mt sUA constitUição e A ArticUlAção políticA pArA A mo-


dAlidAde
Neste momento, com a finalidade de formatar as discussões e manter vivo o debate em torno
da elaboração das políticas públicas os representantes presentes ao fim da reunião ampliada que
aprovaram a “Carta da Cidadania” na qual elucida a responsabilidade do Fórum de EJA para com a
modalidade no Estado. Na carta temos:
• Resgate histórico da Educação de Jovens e Adultos em Mato Grosso.
• Articulação da política entre os Estados que possuem o Fórum /EJA. Papel do Fórum: con-
sultoria e assessoramento.
• Instância de discussão coletiva permanente da escola de EJA.
• Espaço de formação continuada de professores de EJA.
• Espaço de troca de experiências.
• Construção da identidade da EJA.
• Mapeamento da Educação de Jovens e Adultos no Estado de Mato Grosso.
• Envolvimento das agências formadoras – universidades.
Cumprindo o que fora acordado na Carta da Cidadania e pautado na Lei N.° 9394/96 que prevê a
Educação de Jovens e Adultos como modalidade, o estado de Mato Grosso, regulamenta a Lei Com-
plementar N.° 49/98, amparada pelo Parecer N.° 11/2000 CNE/CEB. A partir dessas referências le-
gais, o Conselho Estadual de Educação normatiza a modalidade, através da Resolução N.° 180/2000.
Cumprindo as disposições dessa Resolução, a Secretaria de Estado de Educação, institui através da
Portaria N.° 204/2000, uma Comissão Interinstitucional para elaborar um Programa de Educação de
Jovens e Adultos para o Sistema Estadual de Ensino. Com o compromisso de exercer práticas que
buscassem construir uma educação de qualidade resultando em políticas públicas que valorizem o
sujeito da EJA, respeitando sua sabedoria e reconhecendo-o como protagonista de seu processo de
aprendizagem ao longo da vida.

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
Em 2002 uma Comissão Provisória foi formada com a incumbência dos encaminhamentos iniciais
do Fórum, elaborando, inclusive a Minuta do Regimento. Só então que em fevereiro de 2002 foi
eleita a primeira Coordenação Estadual do Fórum Permanente de Debates de Educação de Jovens e
Adultos de Mato Grosso.
Esta coordenação teve com primeiro desafio iniciar o processo de articulação para implementa-
ção dos fóruns regionais, objetivando ampliar os debates considerando as especificidades de cada
região do vasto território matogrossense. Essa divisão deu – se ao longo de 08 (oito) anos, distribuí-
dos com mostra o Quadro 1:

dA implAntAção AlterAções nos últimos cinco Anos


01 Água Boa Em funcionamento
02 Alta Floresta Em funcionamento
03 Baixada Cuiabana Fórum Metropolitano do Vale do Rio Cuiabá e seu Entorno
04 Barra do Garças Em funcionamento
05 Cáceres Necessita ser fortalecido
06 Comodoro Polo se reestruturando
07 Confresa Em funcionamento
08 Jaciara Em funcionamento
09 Juara Em funcionamento
10 Juina Em funcionamento
11 Matupá Em funcionamento
12 Nova Mutum Polo mudou para município de Diamantino
13 Nova Olímpia Polo mudou para município de Tangará da Serra
14 Pontes de Lacerda Necessita ser fortalecido
15 Primavera do Leste Em funcionamento
16 Rondonópolis Em funcionamento
17 São Felix do Araguaia Necessita ser reestabelecido
18 Sinop Em funcionamento

Quadro1: Fóruns Regionais de Educação de Jovens e Adultos instituídos em Mato Grosso.

Organizador: SOUZA K. A. 2014


Essas experiências vêm inscrevendo outras razões e lógicas que tensionam os poderes, porque
coletivamente fundamentam e fortalecem pequenos e indispensáveis atores sociais em cena, os
quais ocupam cada vez mais o lugar de interlocutores dos governos federal e estaduais. Atendendo
a essa premissa a divisão geográfica dos fóruns regionais tem por compromisso,

“convocar a todos os profissionais envolvidos a buscar novos caminhos, novas possibilidades.


Portanto,remete à superação do “então” ensino supletivo, segundo aperspectiva de reposição – com-
pensação do que não foi conseguido“na idade própria”. Como direito, não há idade própria para
aprender.”Carta da Cidadania, 2001

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
O Fórum de EJA de Mato Grosso, nesse ano 2014, completou 13 anos de história e luta pela moda-
lidade sempre buscando aproximar as instituições envolvendo-as com educação de jovens e adul-
tos, mobilizando novos parceiros que estejam interessados em compor os polos e agregar represen-
tantes de municípios próximos para estudos, discussões que possam apoiar os diferentes setores
do Governo em suas ações educativas e formativas para que, dentro de seus contextos, mandatos e
abrangências, possam alcançar o máximo de resultados, avançando para uma concepção de educa-
ção em sintonia com as diferentes realidades e com a perspectiva da valorização dos saberes popu-
lares, da humanização e da emancipação popular.
Para enriquecer esse processo de diálogo o FPDEJA/MT realiza anualmente o encontro de Coor-
denadores para elaborar a agenda e discutir as demandas que os Fóruns Regionais terão para o ano
em suas regiões, sempre considerando os debates Regionais/CO e Nacional.

dA co-pArticipAção nA efetiVAção dAs políticAs públicAs pArA mo-


dAlidAde no estAdo
Para detalhar as ações do FPDEJA/MT como co-participante na elaboração das políticas públicas
do estado de Mato Grosso para a modalidade EJA, pautemos - nos em GADOTTI:

“É certo que a participação social na formulação, implementação, monitoramen-


to e avaliação de políticas públicas vem sendo fortalecida, como prevista e reconhe-
cida pela Constituição Cidadã de 1988. Num país com uma estrutura social injusta e
tantas desigualdades, ela é absolutamente necessária. Mas ela não é só um instru-
mento de gestão: ela aprimora a democracia e qualifica as políticas públicas.” 2013,
página 01

Em 2006 em meio às discussões do Plano Estadual de Educação, a Secretaria de Estado de Edu-


cação convoca o Fórum de EJA para colaborar na produção do documento base e na coordenação
da Conferência que aprovou o referido plano, respeitando as Diretrizes Nacionais para EJA do Mi-
nistério da Educação, bem como as deliberações dos relatórios finais dos ENEJA’s. Isso significou um
passo importante, também, dentro da institucionalização da educação da educação de jovens e
adultos na estrutura do Estado, pois foram levantadas linhas teóricas e políticas que fundamentaram
as ações para a modalidade no PEE, plano este, que após diálogo propositivo também nas confe-
rências escolares, regionais, culminando com a etapa estadual, foi encaminhado para a Assembléia
Legislativa, que por sua vez abriu uma série de debates públicos que antecederam a aprovação em
plenário, tendo sido transformado na Lei do Plano Estadual de Educação - PEE. Nº 8.806/2008.
Com a aprovação do Plano e a efetiva contribuição do Fórum de EJA, este passa a ser reconhecido
como organismo social, com metas definidas dentro do Plano Estadual de Educação, que segue:
• Meta 4 - Apoiar o Fórum Estadual Permanente de Debates de Educação Jovens e Adultos
para que realize, anualmente, em todos os sistemas de ensino a partir da aprovação deste
plano, levantamento e avaliação de experiências em alfabetização e demais etapas da edu-
cação de jovens e adultos, buscando o contínuo aperfeiçoamento dos programas públicos
oferecidos.
• Meta 5 - Garantir imediatamente após a aprovação deste plano, a participação contínua do
Fórum Permanente de Debates de Educação Jovens e Adultos, nas discussões de propostas
e diretrizes para EJA bem como nos processos de avaliação e acompanhamento de progra-
mas, assegurando o cumprimento das metas deste Plano.
• Meta 6 - Publicar anualmente 02 trabalhos realizados na EJA, indicados pelo Fórum Estadu-
al Permanente de Debates de Educação Jovens e Adultos. (PEE. Nº 8.806/2008.)

425
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
Atingir tais metas requer do FPDEJA/MT uma organização coletiva para discutir, propor, acompa-
nhar e avaliar as políticas públicas da Educação de Jovens e Adultos do Estado de Mato Grosso em
seus encontros Estaduais onde os delegados eleitos em seus diversos segmentos nos polos regio-
nais comprometem-se a levar as discussões para seus regionais e irradiar as discussões em suas res-
pectivas instituições. Afim de que a sociedade se conscientize da necessidade de uma escola voltada
para este público, observando o cumprimento das Diretrizes Operacionais para a Educação Básica
conforme preceitua a legislação federal e estadual.
Nesse ínterim de conjuntura política, hoje, o Fórum Permanente de Debates sobre Educação de
Jovens e Adultos de Mato Grosso - FPDEJA/MT é composto pelas seguintes instituições SEDUC, SIN-
TEP, UFMT, UNEMAT, CEE/MT, SINTEP, SESI/MT CEFAPRO e o Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia de Mato Grosso –IFMT.
Essa articulação com as instituições agiliza e referenda as ações do FPDEJA/MT ao mesmo tempo
em que o torna um parceiro nas principais decisões que estas tomam em relação à EJA. Como em
2008, a Secretaria de Estado de Educação organizou uma comissão interinstitucional composta pela
Superintendência de Educação Básica, Superintendência de Recursos Humanos, Sintep, Conselho
Estadual de Educação, Assessorias pedagógicas e Secretarias Municipais, o Fórum foi convidado a
compor a referida comissão, esta se responsabilizaria pelo redimensionamento da oferta de EJA no
Estado com o objetivo de implantação dos Centros de Educação de Jovens e Adultos, os CEJAs em
Mato Grosso.
A implantação dos Centros de Educação de Jovens e Adultos teve e continua tendo por finalidade
reconhecer as especificidades dos sujeitos EJA e dos diferentes tempos e espaços formativos. Os CE-
JAs oferecem formas diferenciadas de atendimento que compreenda a educação formal e informal
ao longo da vida. Nessa perspectiva vimos em OLIVEIRA:

“Esse entendimento coloca novas exigências àqueles que pretendem formular


propostas curriculares que possam dialogar com os saberes, valores, crenças e expe-
riências dos educandos, considerando-os como fios presentes nas redes dos grupos
sociais, das escolas/classes, dos professores e dos alunos e, portanto, relevantes para
a ação pedagógica. O formalismo e a fragmentação dos saberes que vêm carac-
terizando a grande maioria das propostas curriculares que conhecemos poderiam,
assim, ser superados.” (2007:99).

É considerando a necessidade dessa superação que a forma de atendimento nos CEJAs é orga-
nizada, sendo: 1. Matrícula por áreas de conhecimentos distribuídas em trimestres, 2. Matrícula por
disciplina, 3. Plantões pedagógicos, 4. Oficinas pedagógicas. Hoje temos 26 CEJAs distribuídos nas
principais cidades de Mato Grosso com vistas que esse número aumente.
Para garantir esse atendimento diferenciado e colocar o ser humano no centro de desenvolvimen-
to exige uma abordagem multidimensional para dar conta da natureza multifacetada do bem-estar
individual e social, contudo a elaboração das Orientações Curriculares para Educação de Jovens e
Adultos do Estado veio ao encontro dessa necessidade de um currículo sedimentado, rico e que
atenda a expectativa do educando adulto em todas as suas dimensões: humana, social, trabalhistas,
dimensão de vida e para a vida.
Este documento foi pensado e discutido com todos os profissionais da educação de jovens e
adultos do Estado, que utilizaram o espaço da “Sala do Educador” para realizar estudos do texto
base das OCs como é chamado o documento. E os integrantes do Fórum foram mediadores desse
estudo em muitos momentos, a convite da SEDUC e dos formadores do Centro de Formação Profis-
sional do Estado de Mato Grosso _ CEFAPROs.

426
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
Para avaliar esse processo de co-participação do FPDEJA/MT na construção das políticas pú-
blicas para EJA no Estado temos em POEL (2007:74) “os fins pedagógicos de qualquer atividade edu-
cacional são políticos, pois neles estão embutidasatitudes, ideias e valores que indicam uma tomada
de posição diante da sociedadeque se pretende manter ou construir.” Entretanto,os avanços gesta-
dos pelo Fórum de EJA do Estado de Mato Grosso, advêm do esforço coletivo e da dedicação de seus
membros contribuindocom sugestões, avaliações, cobrando posicionamento das instituições frente
as proposições aprovadas nas plenárias dos encontros organizados pelo Fórum em busca efetivação
das políticas públicas voltadas à Educação de Jovens e Adultos, bem como na instauração de novas
ações.
Em 13 anos de história uma das grandes intervenções que o Fórum efetivou ao encontro
das ações para a EJA foi o levantamento analítico dos programas, dos projetos e das ações desenca-
deados pelos governos municipais, estadual e federal para a EJA, dialogando entre o proposto e o
efetivado por essas ações de governo, principalmente no que concerne a seus impactos no âmbito
das políticas de EJA municipais e estaduais e na relação com as demandas postas para essa modali-
dade de ensino, a Agenda Territorial de Desenvolvimento Integrado de Alfabetização e Educação de
Jovens e Adultos – EJA. Em Mato Grosso o fórum foi o principal parceiro da Comissão instituída pela
portaria189/209/GS/SEDUC/MT, publicada no Diário Oficial do dia 14 de maio de 2009 nomeando os
responsáveis pela elaboração da Agenda Territorial no Estado.
Em 2011, o Fórum convocou seus 18 coordenadores regionais para uma oficina na qual nos
co-responsabilizamos em auxiliar a Comissão na elaboração da Agenda Territorial. Os dezoito polos
regionais se comprometeram em realizar oficinas em seus encontros regionais e enviar um relatório
à Comissão. A própria extensão territorial do Estado de Mato Grosso, é uma limitação natural que
dificulta o acompanhamento próximo da realidade local.Nesse sentido o auxílio dos Fóruns Regio-
nais foi de suma importância. Igualmente, foi à participação do FPDEJA na organização I Encontro
da Agenda Territorial realizado em parceria com as instituições representadas na comissão da AT e
os membros do fórum.
Há de se ressaltar que embora esforços múltiplos tenham sido dispensados para que o levan-
tamento da Agenda acontecesse e por conseqüência a elaboração do plano de ação que amenizaria
as possíveis falhas encontradas na oferta, permanência e no currículo da EJA no Estado, todo esse
processo está estagnado por questões de alçada política e financeira. Observa-se a urgência de uma
nova organicidade a este processo, propondo a realização de um encontro para reflexão e elabora-
ção de estratégias de ação.
Desta forma, poderá cumprir a suas atribuições e atingir o seu objetivo maior que é o de acompa-
nhar, propor políticas públicas para a modalidade EJA, abrindo espaço para uma maior contribuição
da população local.
É mister salientar que a formação continuada dos membros do FPDEJA tem por objetivo o
sentido de desenvolver o poder da militância, buscando refletir,reivindicar, protagonizar, avaliar e
propor política, programas, projetos e ações, como co-operadores da luta por uma Educação de
Jovens e Adultos com qualidade social para realizar a co- gestão da política para a modalidade no
estado de Mato Grosso.

pArA continUAr o diálogo...


A Educação de Jovens e Adultos, constituída a partir do compromisso, do reconhecimento dos
(as) sujeitos que a compõe, no processo de reconquistar a sua identidade seja do/no campo, nas
prisões, nas salas de alfabetização, que tenham a escola como espaço de vida, do exercício da cria-
tividade, capaz de gerar outro tipo de conhecimento e/ou conhecimentos por meio de uma práxis
emancipatória.

427
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
Entretanto, esta não se realiza apenas pelo Estado, se reorganiza na inter-relação com o mesmo.
Nesse ínterim, os movimentos sociais têm como responsabilidade promover um campo comum de
reflexão e orientação de práticas coerentes com a perspectiva metodológica proposta pela Educa-
ção Popular para o conjunto de programas, projetos e políticas com origem, principalmente, na ação
pública, que contemplem os diversos setores vinculados a processos educativos e formativos das
políticas públicas do Governo Federal.
Isto tem sido um aprendizado para os movimentos sociais e para as Secretarias Estaduais e Mu-
nicipais de Educação. Claramente, a complexidade da conjuntura política coloca imensos desafios
para a EJA, nesse momento de balanço desses 13 anos de militância do FPDEJA/MT, o que se espera
é que “... seja um novo processo de síntese em que resgatemos o sentido integrador da educação
e do desenvolvimento centrado no ser humano e a sua capacidade de ir além do instrumental e do
remedial, recuperando a sua vocação para facilitar transformações.” (IRELAND:55)
De acordo com Arroyo (2004), é preciso que o Estado reconheça e assuma politicamente o con-
junto de práticas educativas que vem acontecendo na EJA, impulsionadas pelos movimentos so-
ciais, sendo responsabilidade das administrações públicas. Ao longo da história da educação encon-
tramos uma diversidade de movimentos que por vezes se adiantaram ao público e pressionaram
para que os governos reconheçam o sentido público de suas ações e as incorporem como políticas
públicas.Cabe ao Estado assegurar o direito de todos enquanto dever que exige mais do que ofertas
de programas e projetos, mas que expresse sentidos para uma política pública permanente, saben-
do que a educação escolar é indispensável à condição cidadã.

referênciAs
ARROYO, Miguel G. Por um tratamento público da Educação do Campo. In: MOLINA, Mônica Cas-
tanha e DE JESUS, Sonia Meire S. Azevedo (Orgs.). Por uma Educação do Campo: Contribuições para a
construção de um projeto de Educação do Campo. Articulação Nacional por uma Educação do Campo:
Brasília – DF, 2004.
BRASIL. Parecer nº. 36/2001 CNE/CEB, Brasília – DF, 2001.
______. Resolução nº. 01/2002 CNE/CEB, Brasília - DF, 2002.
______. Panorama da Educação do Campo. Brasília: INEP, 2006.
______. Resolução nº. 02/2008 CNE/CEB, Brasília - DF, 2008.
______. Parecer nº. 03/2008 CNE/CEB, Brasília – DF, 2008
______.Decreto Presidencial nº 7532 Brasília – DF, 2011
OLIVEIRA, I. B. de. Currículos praticados: entre a regulação e a emancipação. Rio de
Janeiro: DP&A, 2003.
OLIVEIRA, I. B. de; PAIVA, J. Educação de jovens e adultos. Rio de Janeiro: DP&A,
2004.
SANTOS, B. de S. Um discurso sobre as ciências. Porto: Afrontamento, 1989.
GADOTTI, Moacir e José Eustáquio Romão, ogs., 1997. Autonomia da escola: princípios e propostas.
São Paulo: Cortez, pp. 75-89.
POEL, Cornelis Joannes van der e Maria Salete. Trajetória de uma militância educacional: do sistema
freireano ao letramento sócio histórico.Saõ Leopoldo: OIkos João Pessoa: Ed Universitária UFPB, 2007.
UNESCO. Educação: um tesouro a descobrir. São Paulo: Cortez; Brasília: MEC;
Unesco, 2001.
PAIVA, Jane; MACHADO, Maria Margarida; IRELAND, Timothy (Orgs.). Educação de jovens e adultos:
uma memória contemporânea, 1996-2004. Brasília: Unesco, MEC, 2004. Disponível em: <unesdoc.unes-
co.org/images/0013/001368/136859POR.pdf>.

428
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
o processo de criAção do fórUm de ejA em mAto
grosso (1990 A 2001)
jefferson bento de moUrA | márciA dos sAntos ferreirA

Este trabalho tem por objetivo compreender o processo de criação do Fórum de Educação de
Jovens e Adultos de Mato Grosso, a partir da análise de seu percurso de implementação durante a
década de 1990 até o ano de 2001. A década de 90 foi escolhida como recorte temporal pelo fato
de ter sido o período em que havia necessidade de reunir as lideranças de EJA para pensar encami-
nhamentos a serem levados para V CONFITEA, que aconteceria no ano de 1997. Esta mobilização fez
com que surgisse a necessidade de criar espaços de articulação entre os diferentes segmentos que
atuam na modalidade. O ano de 2001, por sua vez, foi selecionado por ter sido o ano de criação do
Fórum EJA em Mato Grosso. A interpretação sobre política de EJA concordou com Beisigel (2004),
que afirma a importância dos movimentos e organizações não-governamentais para a história da
popular neste período. Utilizou-se a abordagem de Di Pierro (2000) para compreender os concei-
tos de EJA e de sua historicidade. Os dados parciais do estudo da constituição do Fórum em Mato
Grosso permitiram estabelecer a trajetória desse movimento e o seu papel na definição da política
pública para o setor, bem como a sua participação na busca da melhoria da prática dos professores,
ao oportunizar espaços para intercâmbio de experiências, com o intuito de fortalecer a oferta nesse
estado. O desenvolvimento desta pesquisa favorece a identificação das características do Fórum,
no momento em que se afirma como tal, com o propósito de garantir a pluralidade de ideias, não
perdendo de vista as referências históricas e paradigmáticas que foram fundamentais nos avanços e
recuos da política de EJA. As conclusões indicam que os fóruns foram construídos tendo por base o
protagonismo dos movimentos sociais e sua importância na proposição de políticas públicas.

palavras-chave: Fórum de EJA, Mato Grosso, Política Pública

introdUção
A Educação de Jovens e Adultos (EJA) se constitui em uma luta para o acesso ao conhecimento
formal e informal em uma educação escolar pautada na emancipação do sujeito. De acordo com
Chilante e Noma (2009, p. 229) a “EJA é tratada como uma dívida social a ser reparada, devendo, por-
tanto, assumir a tarefa de estender a todos o acesso e o domínio da escrita e da leitura como bens
sociais, seja na escola, seja fora dela”.
A história da EJA é marcada pela luta dos movimentos sociais em prol ao direito à educação,
direito este que fora negado por muitos anos aos sujeitos desta modalidade. Com a garantia deste
direito pela constituição de 1988, os anos iniciais da década de 1990 foram marcados por intensas
mobilizações da sociedade civil para o fortalecimento da modalidade. No citado período “efetivou-
-se sobretudo por meio de cursos aligeirados ou exames de suplência conformados com a questão
da qualidade e eficiência, que passaram a ser entendidas como a apresentação de dados estatísticos
com altos índices de conclusão” (CHILANTE e NOMA, 2009, p. 234).
Para efetivação de espaços de debates sobre a EJA foram organizados fóruns em todo o país. O
movimento dos Fóruns de EJA no Brasil, conforme explica Duarte (2013, p. 3), nasce a partir da “[...]
preparação da V Conferência Internacional de Educação de Adultos – V CONFINTEA. Surge marcado
por dois princípios básicos. O primeiro é o da educação como direito de todos, que se encontra asse-
gurado no art. 205, da Constituição de 1988”. Após a V CONFINTEA outro princípio passa a ser defen-
dido, o do direito à educação ao longo da vida. Sobre a CONFINTEA, a mesma autora esclarece que,
desde 1949, essa conferência vem sendo realizadas em vários países, sendo a de 1949 em Elsinore

429
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
(Dinamarca), 1960 em Montreal (Canadá), 1972 em Tóquio (Japão), 1985 em Paris (França), 1997 em
Hamburgo (Alemanha). O Brasil sediou a CONFINTEA somente no ano de 2009, em Belém (Brasil).
Atualmente, existem no Brasil vinte e seis fóruns estaduais e um fórum distrital de EJA. O fórum
de Mato Grosso foi criado em 2001, a partir de encontros regionais e da aprovação do Programa de
Educação de Jovens e Adultos do estado. O objetivo deste estudo é compreender o processo de
criação do Fórum Permanente de Debates em Educação de Jovens e Adultos no Estado de Mato
Grosso, tendo por base a análise de seu percurso de implementação e quais suas implicações na
definição de politicas públicas educacionais para a modalidade durante a década de 1990, até o ano
de 2001.

1 fórUm de edUcAção de joVens e AdUltos no brAsil


A história da Educação de Jovens e Adultos no Brasil é marcada pela luta dos movimentos sociais
em prol ao direito à educação, direito este que fora negado por muitos anos aos sujeitos desta mo-
dalidade. Conforme Paiva (2005), somente a “Constituição Federal de 1988 que fecha o círculo com
relação ao direito da obrigatoriedade escolar”.
O Parecer nº 11 do Conselho Nacional de Educação, elaborado por Jamil Cury, aponta que é no
processo de redemocratização dos anos 1980 que a Constituição efetivou um passo significativo
em direção a uma nova concepção da educação de jovens e de adultos. Para efetivação de tal prer-
rogativa, foi significativa a presença de segmentos sociais identificados com a EJA, no sentido de
recuperar e ampliar a noção de direito ao ensino fundamental extensivo aos adultos, já posta na
Constituição de 1934 (BRASIL, 2000, p. 21).
Os movimentos sociais podem ser compreendidos não apenas como legado de luta, da reivindi-
cação, mas como princípio educativo diante da dinâmica relação entre os seus sujeitos. Como nos
ensina Arroyo (1999, p.17):

[...] o que vocês estão fazendo em suas escolas, nos assentamentos, na educa-
ção de adultos, na educação indígena, faz parte de um movimento da renovação
pedagógica de raízes populares e democráticas como nunca houve neste país. [...]
acreditamos que o próprio movimento social e educativo, forma novos valores, nova
cultura, provoca processos em que desde as crianças aos adultos novos seres huma-
nos vão se constituindo.

Nesse sentido, os movimentos sociais não podem ser chamados apenas como um mecanismo de
mobilização, mas sim de interação, de fomentação do debate, socializando as concepções de edu-
cação e contribuindo nas decisões e encaminhamentos. Sobre os movimentos sociais e a educação,
Gohn (2011) esclarece que não só o espaço escolar promove saberes, mas há diferentes espaços que
possibilitam o aprendizado e apreensão de conhecimentos, que a autora denomina como educação
não formal. A mesma autora acrescenta que:
Um dos exemplos de outros espaços educativos é a participação social em movimentos e ações
coletivas, o que gera aprendizagens e saberes. Há um caráter educativo nas práticas que se desen-
rolam no ato de participar, tanto para os membros da sociedade civil, como para a sociedade mais
geral, e também para os órgãos públicos envolvidos – quando há negociações, diálogos ou confron-
tos (GOHN, 2011, p. 333).
Sobre os movimentos sociais, uma das características marcantes sobre essa mobilização social é
que as mesmas são fontes de inovação e matrizes geradoras de saberes. Entretanto, não se trata de
um processo isolado, mas de caráter político-social. Dessa forma, conforme Gohn (2011, p. 333-334):

430
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
Por isso, para analisar esses saberes, deve-se buscar as redes de articulações que os movimentos
estabelecem na prática cotidiana e indagar sobre a conjuntura política, econômica e sociocultural
do país quando as articulações acontecem. Essas redes são essenciais para compreender os fatores
que geram as aprendizagens e os valores da cultura política que vão sendo construídos no processo
interativo.

Assim, a relação movimento social e educação, de acordo com Gohn (2011, p.


334) é estabelecida “a partir das ações práticas de movimentos e grupos sociais.
Ocorre de duas formas: na interação dos movimentos em contato com instituições
educacionais, e no interior do próprio movimento social, dado o caráter educativo
de suas ações”. Esta relação foi se construindo ao logo do tempo.

Nessa perspectiva, acredita-se que os Fóruns de Educação de Jovens e Adultos sejam espaços
promotores de saberes. A história do surgimento e da difusão dos Fóruns de EJA no país toma cor-
po a partir de 1996, que foi o ano preparatório para a V Conferência Internacional de Educação de
Adultos (V CONFINTEA).
Conforme Feitosa (2012), as Conferências Internacionais de Educação de Adultos foram impor-
tantes espaços de discussões e encaminhamentos de recomendações, pareceres e procedimentos
para EJA, contribuindo significativamente para o fortalecimento desta modalidade. As CONFITEAS
têm, em geral, um caráter mais político e comprometimento nacional com os seguintes fatos (BRA-
SIL, 2009, p. 10):
• O ainda insuficiente nível de oportunidades e de condições oferecidos a jovens e adultos
dos setores populares para garantir seu direito à educação básica
• A persistência de desigualdades sócio-étnico-raciais, de gênero, do campo, das periferias
urbanas, entre outros, no processo histórico-estrutural na sociedade;
• A precariedade e vulnerabilidade dos direitos humanos básicos, o que condiciona o direito
à educação de jovens e adultos populares;
• O avanço da consciência dos direitos humanos básicos e especificamente do direito à edu-
cação, assim como as pressões pela igualdade do direito à cidadania em nossa sociedade;
• As crescentes pressões de coletivos populares e da diversidade de movimentos sociais para
que políticas públicas atendam a especificidade de comunidades indígenas, quilombolas,
negras, do campo, de periferias urbanas, de idosos e de pessoas privadas de liberdade que
lutam por direitos coletivos e por políticas diferenciadas que revertam a negação histórica
de seus direitos como coletivos;
• Os avanços que vêm acontecendo nas políticas públicas socioeducativas, de qualificação,
de geração de emprego e renda etc. articuladas especificamente para a juventude e vida
adulta populares, inaugurando formas compartilhadas de gestão colegiada, notadamente
com a participação dos Fóruns de Educação de Jovens e Adultos em instâncias de represen-
tação nacional e na CNAEJA;
• Os avanços havidos nas políticas de financiamento da educação básica e particularmente
da educação de jovens e adultos.

Em resposta a convocação da UNESCO, o poder público federal no ano de 1996 instaurou uma
metodologia de trabalho envolvendo representantes do setor público da educação, universidades,
organizações não governamentais, sistema S e outros com o objetivo de elaborar um documento
que retratasse a realidade da EJA naquele contexto histórico. Para tanto, foram realizados vários en-

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
contros estaduais, três regionais e um Seminário Nacional, em Natal.
Durante a realização do Seminário Nacional de Educação de Jovens e Adultos, em Natal, RN, entre
8 e 10/09/1996,foram apresentados elementos para um diagnóstico da EJA no Brasil. O diagnóstico
foi aprovado pelos delegados reunidos no plenário do seminário e resultou da consolidação dos
relatórios dos encontros preparatórios realizados nas regiões Nordeste, Sul, Sudeste, Norte e Centro
Oeste. O diagnóstico da EJA revela vários desafios, dentre os quais se destaca:
• O Brasil apresentava um quadro com 19.233.239 de analfabetos absolutos, 20% da popula-
ção total com 15 anos ou mais, que totalizava 95.837.043 de habitantes.
• Falta de dados atualizados e consistentes sobre a demanda e a oferta de EJA
• Ausência de políticas públicas mais efetivas de médio e longo prazo, conduzindo à frag-
mentação dispersão e descontinuidade dos programas de EJA (BRASÍLIA, 2004).
Paiva, Machado e Ireland (2004, p. 12) entendem que “a chegada de representantes em Natal era
fruto de uma mobilização parceira do Estado e da sociedade civil que resultou em um movimento
até hoje presente no país – o surgimento de Fóruns de EJA”.
O primeiro Fórum de EJA foi criado no estado do Rio Janeiro no ano de 1996, em meio à série de
encontros preparatórios que antecederam a V CONFINTEA, ocorrida em Hamburgo (Alemanha) em
1997. Paiva (2004, p.12), “ao rememorar as mobilizações do período, conclui que a experiência mais
rica, todavia, na tessitura dessa teia, tem sido vivida nos movimentos internos do Brasil, de 1996 para
cá, com a constituição de Fóruns de EJA”.
A experiência do Fórum do Rio de Janeiro fez surgir muitas outras. Por intermediação, essen-
cialmente, de seus representantes, o crescimento dos demais fóruns contou com a organização e
articulação de pessoas atuantes em instituições envolvidas com essa modalidade educacional em
cada estado. Para Di Pierro (2005), estes fóruns iniciaram uma mobilização social que pretendia es-
tabelecer resistência a negação do direito à educação conquistada na Carta Constitucional de 1988.
No ano de 1998 foi a vez de Minas Gerais, Paraíba e Espírito Santo constituírem seus Fóruns. Im-
pulsionado por esses movimentos no ano de 1999 foi criado o Encontro Nacional de Educação de
Jovens e Adultos – ENEJA. Conforme Paiva, Machadoe Ireland (2004, p. 12).

A energia solidária que se instaurou entre os Fóruns possibilitou a organização


anual de encontros nacionais que, desde 1999, vêm acontecendo e que, em2004,
efetiva a sexta edição. Os Encontros Nacionais de Educação de Jovens e Adultos
(ENEJAs) mantêm a preocupação com o registro das reflexões produzidas nesses
eventos, além de um trabalho cuidadoso de síntese dessas reflexões, sistematizadas
em relatório final, em cada encontro. Construídos a muitas mãos, publicá-los é tam-
bém reconhecer o importante trabalho de cada equipe de relatoria, como guardiã
do pensamento contemporâneo da EJA.

O ENEJA é um espaço a mais em que se exercita a convivência com as diferenças e com modos de
pensar a EJA. É um espaço para “criar instrumentos de pressão política, que influenciem nas políticas
públicas da educação de jovens e adultos nos âmbitos municipal, estadual e federal” (ENEJA. II, 2000,
p. 03). Desde o primeiro, em 1999, foram realizados 13 encontros, conforme indicado abaixo:

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
encontros locAl dAtA/mês Ano

I ENEJA Rio de Janeiro/RJ 08 a 10 de setembro 1999


II ENEJA Campina Grande/PB 07 a 09 de setembro 2000
III ENEJA São Paulo/SP 05 a 06 de setembro 2001
IV ENEJA Belo Horizonte/MG 21 a 24 de agosto 2002
V ENEJA Cuiabá/MT 03 a 05 de setembro 2003
VI ENEJA Porto Alegre/RS 08 a 11 de setembro 2004
VII ENEJA Luziânia/GO 31 de agosto a 03 de setembro 2005
VIII ENEJA Recife/PE 30 de agosto a 02 de setembro 2006
IX ENEJA Faxinal do Céu/PR 18 a 22 de setembro 2007
X ENEJA Rio das Ostras/RJ 27 a 30 de agosto 2008
XI ENEJA Belém/PA 17 a 20 de setembro 2009
XII ENEJA Salvador/BA 20 a 23 de setembro 2011
XIII ENEJA Natal/RN 10 a 13 de setembro 2013

Quadro 01: Encontros Nacionais de Educação de Jovens e Adultos


Fonte: FPDEJA, 2014.
Atualmente os encontros adquiriram uma visibilidade nacional e, a partir de 2009, os ENEJAS co-
meçaram a ocorrer bianualmente, devido à necessidade da realização de encontros regionais, crian-
do assim nos intervalos dos anos os EREJA (Encontros Regionais de Educação de Jovens e Adultos) e
alternando com os Seminários Nacionais de Formação1:

O XI ENEJA é o último encontro que é realizado no formato de encontros anuais


dos Fóruns, já que, a partir de agora, os ENEJA’s serão realizados a cada dois anos,
e nos interstícios, já em 2010, acontecerá, em cada uma das cinco regiões do Brasil,
o Encontro Regional de EJA - EREJA, cuja proposta é a de congregar, em encontros
menores, os estados membros de cada região, possibilitando que eles discutam as
especificidades regionais da Educação de Jovens e Adultos, tendo como ponto de
partida a realidade de cada lugar e as propostas aprovadas nos encontros nacio-
nais. (BRASIL, 2009, p. 01).

Quanto a Mato Grosso, o ENEJA foi realizado no período de 03 a 05 de setembro de 2004, no


município de Cuiabá. O tema do encontro foi “Educação de Jovens e Adultos: comprometimento e
continuidade”. Em Cuiabá, no período do evento foi elaborado um documento denominado “Carta
de Cuiabá” tornando público a posição dos Fóruns de EJA “em relação prioridade política do atual
Governo Federal dada à alfabetização de jovens e adultos no país — saber ler e escrever como cum-
primento de um direito humano fundamental” (AÇÃO EDUCATIVA, s/p. 2003).

1 O I Seminário Nacional sobre a Formação do Educador de Jovens e Adultos, aconteceu na UFMG, em maio de 2006. A rea-
lização do encontro por meio de um esforço coletivo, que envolveu o Ministério da Educação, seis universidades públicas mineiras –
cinco federais e uma estadual – e a UNESCO, representa a vontade de todos de iniciar uma profunda mudança nesse quadro, tomando
como ponto de partida a formação do educador.

433
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
2. A implAntAção do fórUm de edUcAção de joVens e AdUltos em
mAto grosso
No estado de Mato Grosso, em 2000, o Conselho Estadual de Educação normatizou a EJA, através
da Resolução n.° 180. Cumprindo as disposições dessa Resolução, a Secretaria de Estado de Educa-
ção, instituiu, através da Portaria n.° 204/2000, uma Comissão Interinstitucional para elaborar um
Programa de Educação de Jovens e Adultos para o Sistema Estadual de Ensino.
A Comissão Interinstitucional, composta por representantes de vários segmentos governamen-
tais e não governamentais, estabeleceu um cronograma de ações norteadoras de todo o processo
de difusão, discussão e sistematização de contribuições, para fundamentar o novo paradigma da
Educação de Jovens e Adultos no estado. Sob orientação dessa comissão, foram realizados, em abril
de 2001, seminários regionais, congregando representações dos municípios e unidades escolares
que ofereciam essa modalidade de ensino. Os seminários regionais culminaram na realização do I
Seminário Estadual de Educação de Jovens e Adultos.

O Seminário Estadual de Educação de Jovens e Adultos foi realizado, no perío-


do de 06 a 08 de junho de 2001, com cerca de seiscentos participantes, sendo cento
e noventa delegados da Rede Estadual de Ensino, eleitos em Seminários Regionais
e representantes de instituições: Secretaria de Estado de Educação de Mato Gros-
so – SEDUC, Universidade Estadual de Mato Grosso – UNEMAT, Pastoral da Criança,
Serviço Social da Indústria – SESI, Serviço Nacional do Comércio – SENAC DR/MT,
Sindicato dos Trabalhadores no Ensino Público de Mato Grosso – SINTEP, Conselho
Estadual de Educação – CEE/MT, Central Única dos Trabalhadores – CUT, União dos
Dirigentes Municipais de Educação – UNDIME/MT e Organização das Nações Unidas
para a Educação, a Ciência e a Cultura – UNESCO. (MATO GROSSO, 2009, p. 01).

O Seminário contou com a participação de palestrantes de destaque no cenário nacional da Edu-


cação de Jovens e Adultos, incluiu nesse Seminário, a aprovação do Programa de Educação de Jo-
vens e Adultos para o Estado de Mato Grosso “contendo as diretrizes e critérios de oferta da modali-
dade de EJA, através de cursos e exames de ensino fundamental e médio, para as escolas integrantes
do Sistema Estadual de Ensino” (MATO GROSSO. s/p, 2001).
Foi apresentada no seminário a “Carta da Cidadania I”, elaborada pelos participantes da 2º reunião
pró-fórum, grupo de militantes que buscavam “estabelecer de um diálogo entre as instituições e
organismos educacionais que atuam na Educação de Jovens e Adultos, para Constituição do Fórum
Estadual Permanente de Debates de Educação de Jovens e Adultos” (MATO GROSSO, 2009, p. 21).
A primeira coordenação do Fórum de EJA-MT era composta por membros da Secretaria de Esta-
do de Educação – SEDUC / MT; Conselho Estadual de Educação – CEE / MT; Universidade Estadual
de Mato Grosso – UNEMAT; Pastoral da Criança; Serviço Social da Indústria – SESI / DR / MT; Serviço
Nacional do Comércio – SENAC / DR / MT; Sindicato dos Trabalhadores no Ensino Público de Mato
Grosso – SINTEP / MT; Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura – UNES-
CO; Central Única dos Trabalhadores – CUT / MT; Pólos Regionais das Escolas Públicas Estaduais de
EJA; União dos Dirigentes Municipais de Educação – UNDIME.
O Fórum Estadual Permanente de Debates de Educação de Jovens e Adultos é uma importante
conquista dos educadores mato-grossense, que estimula às discussões sobre temas pertinentes à
Educação de Jovens e Adultos, servindo para aproximar e cooperar com as diversas Instituições e
organismos que oferecem e são beneficiários da EJA.
Em relatório de 2009, a SEDUC explicita que dos 16 Fóruns Regionais constituídos em todo esta-

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
do de Mato Grosso, “14 (quatorze) realizaram Encontros Regionais, e dos 2 (dois) Fóruns Regionais
constituídos e não instalados houve a permissão da participação de representantes do Fórum Re-
gional” dos municípios de Jaciara e Rondonópolis. O quadro abaixo mostra o número de participan-
tes efetivado nestes campos de debate:

fórUm regionAl pArticipAção


Água Boa 50
Baixada Cuiabana 206
Barra do Garças 112
Confresa 56
Comodoro 40
Jaciara 07
Juina 73
Juara 110
Matupá 15
Nova Mutum 200
Pontes e Lacerda 106
Rondonópolis 102
Sinop 100
São Felix do Araguaia 50
Tangara da Serra 40

Quadro 02: número de participantes nos fóruns regionais em Mato Grosso

Fonte: SEDUC, 2009.


Em um total de 1.321 participantes, o estado contou com representantes dos principais municí-
pios mato-grossenses. A Baixada Cuiabana contou com a maior representatividade, 206 participan-
tes, seguida do município de Nova Mutum com 200 e o número menor de delegados foi de Jaciara,
07 participantes.
Em Mato Grosso, o Fórum vem conquistando novos adeptos e já se consolidou como entidade
que não tem poupado esforços na busca da melhoria da qualidade, construção e fortalecimento da
identidade da escola de Educação de Jovens e Adultos, definindo encaminhamentos e propiciando
intervenções necessárias à consecução de seus objetivos.

considerAções finAis
O Fórum Estadual Permanente de Debates de Educação de Jovens e Adultos vem conquistan-
do novos adeptos e já se consolidou como entidade que não tem poupado esforços na busca da
melhoria da qualidade, construção e fortalecimento da identidade da escola de Educação de Jovens
e Adultos, definindo encaminhamentos e propiciando intervenções necessárias à consecução de
seus objetivos. O propósito do Fórum consiste em apresentar sugestões que auxiliem os interessa-
dos a envidar esforços para alcance de uma de suas metas e para o fortalecimento dos acordos do
Fórum Mundial, bem como, no âmbito do Estado, revitalizar a troca de experiências de EJA.

435
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
O desafio posto para os Fóruns estaduais e regionais é de socializar todas as concepções de EJA
proposta e vivenciada pelos movimentos sociais, para que a partir daí desencadeie mobilizações rei-
vindicando a erradicação do analfabetismo. Para isso é necessário que concentre todas as informa-
ções em termos de dados, projetos e valores, propondo parceria com o Programa Brasil Alfabetizado
do MEC para que torne mais acessível, com metas mais ousadas, com a contrapartida do Estado de
Mato Grosso.

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437
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
pedAgogiA dA AlternânciA no contexto dA edUcAção
de joVens e AdUltos pescAdores
Kelly mAiA cordeiro | simone oliVeirA do VAl | mArcio plAstinA cArdoso |
lUís clAUdio dA silVA

O projeto da Educação de Jovens e Adultos Pescadores (EJA Pescadores) foi criado pensando nos
educandos das comunidades pesqueiras do Município de Angra dos Reis, que não podem abando-
nar suas atividades de trabalho para frequentarem a escola durante a vigência do calendário da EJA
presencial. O artigo se inicia pelo contexto histórico do município para a compreensão da formação
das comunidades tradicionais, em seguida, apresenta na metodologia o trabalho como princípio
educativo, a proposta pedagógica da Pedagogia da Alternância, pois a EJA Pescadores reconhece os
educandos como agentes do seu aprendizado, tem no professor o mediador do fazer pedagógico
e considera como tempos letivos tanto o Tempo-escola como o Tempo-comunidade; assim “os pos-
síveis dias de aulas presenciais” foram estabelecidos em conformidade com os períodos de defeso
de pescados e das fases da lua cheia. Apresenta o Diário de Bordo como instrumento pedagógico e
reflexivo, trazendo nas escritas dos educandos relações como: memória e história dos sujeitos, ques-
tões ambientais, geográficas e do trabalho. O artigo busca dialogo com autores que refletem sobre
o currículo escolar, a partir da cultura e identidade, como Antônio Flávio Moreira e Tomaz Tadeu da
Silva, no campo da discussão do trabalho e educação Gaudêncio Frigotto e pela temática da Educa-
ção do Campo e Pedagogia da Alternância, os documentos do Ministério da Educação, através da
Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (Secadi), pela Resolução
CNE/CEB nº 01, de 3 de abril de 2002, que estabelece as Diretrizes Operacionais para a educação bá-
sica nas escolas do campo e, em 2012, com o documento “Educação do Campo: marcos normativos”.

palavras-chave: EJA Pescadores, Diário de Bordo, Pedagogia da Alternância

introdUção
Este artigo traz um recorte da proposta de trabalho da EJA Pescadores, inicia pelo contexto his-
tórico do município de Angra dos Reis, apresenta a Pedagogia da Alternância como metodologia
de trabalho e princípio educativo, além de o Diário de Bordo como uma ação planejada de escrita e
leitura do Tempo-comunidade (atividade laboral).
De um dos primeiros palcos dos encontros entre os colonizadores europeus e populações indíge-
nas, ainda no século XVI, à sede de uma central nuclear, Angra dos Reis, localizada no sul do estado
do Rio de Janeiro, viveu durante toda sua história uma relação conflituosa entre a implantação de
projetos econômicos externos e a vida de suas comunidades tradicionais.
Um dos portos escoadores do ouro mineiro, até o século XVIII, quando já era importante área
produtora de açúcar e cachaça, com grandes propriedades escravistas, Angra dos Reis torna-se, no
século XIX, importante área produtora de café, com grandes propriedades e mão-de-obra escrava.
Com a decadência da produção cafeeira, no final deste mesmo século, Angra passa por um período
de desconexão com o mercado nacional e mundial; durante este período de isolamento, as princi-
pais atividades produtivas do município foram a agricultura de subsistência, desenvolvida em pe-
quenas propriedades e voltada para o mercado local, e para a pesca, o que levou a um processo de
enraizamento e fortalecimento das comunidades tradicionais de pequenos agricultores e caiçaras.
Isso se arrastou até a década de 1930, quando a reconstrução e modernização do porto e, posterior-
mente, seu uso no recebimento do carvão mineral proveniente de Santa Catarina, para a produção
de aço em Volta Redonda, reintegrou a cidade à economia nacional e internacional.

438
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
Essa reintegração a tais economias foi aprofundada com a instalação, em 1959, no município, de
um grande estaleiro de capital internacional e, na década seguinte, do Terminal petrolífero da Ilha
Grande. A partir da década de 1970, houve a construção da BR 101, que liga o Rio de janeiro a Santos,
passando pelo município, articulada à instalação do projeto nuclear brasileiro e, contraditoriamente,
de inúmeros grandes projetos hoteleiros e turísticos.
Esse processo contribuiu progressivamente à perda de espaço das comunidades tradicionais de
agricultores e pescadores nas relações econômicas do município e ajudou a atenuar as manifesta-
ções culturais e comunitárias. Atualmente as comunidades caiçaras, em especial, as da Ilha Grande,
voltadas à pesca artesanal, dividem espaço com embarcações de grande porte, por conseguinte,
buscaram no turismo mais uma opção de atividade econômica (em maior evidência na Praia do
Abraão); esse gerou outras oportunidades de sobrevivência, contudo muitas famílias ainda sobrevi-
vem da pesca, principalmente quando a atividade turística é secundária. É nesse contexto de dife-
rentes realidades das comunidades da ILHA Grande que a EJA Pescadores se desenvolve na Praia da
Longa, como mencionaremos.

ejA pescAdores: comUnidAde dA prAiA dA longA


A EJA Pescadores tem a sua origem a partir de demandas das comunidades da Ilha Grande, apre-
sentadas pela Secretaria de Pesca e Aquicultura à Secretaria Municipal de Educação Ciência e Tec-
nologia (SECT) e ao Núcleo da Educação de Jovens e Adultos (EJA) para atender a um grupo espe-
cífico de cidadãos que percebeu a necessidade de continuar a escolarização, por conta da oferta
de qualificação profissional- Curso POP (Pescador Profissional), oferecida pela Capitania dos Portos
para 2014. Entretanto, consideramos para essa escolarização, para além da certificação, envolvendo,
também, as expectativas e saberes dos sujeitos; promovendo o acesso aos diferentes conhecimen-
tos; entre eles o científico, permitindo não apenas uma maior qualificação profissional dos sujeitos,
mas também um posicionamento crítico-social em sua vida. Nesse sentido, a modalidade de ensino
EJA Pescadores se amplia para toda a comunidade, independente de o sujeito ser ou não pescador,
pois os jovens e mulheres desempenham papel fundamental na comunidade (alguns exercendo a
pesca artesanal).
Em conversa com tais educandos, com objetivo de compreender melhor o “ser pescador”, foi-
-nos relado que eles aprenderam seus ofícios através da prática desenvolvida no núcleo familiar e
nas suas comunidades, trabalhando com a pesca de modo artesanal ou profissional. Ambas exigem
qualificação e habilitação do pescador, porém a pesca profissional, por exigir maior produtividade,
requer o manejo de instrumentos de navegação, o uso de embarcações adequadas e grandes perí-
odos no mar.
A comunidade da Praia da Longa é formada quase que exclusivamente por famílias voltadas para
a pesca, tendo pouca ligação com as atividades turísticas, por conseguinte, a partir das demandas
trazidas à SECT por uma educação voltada às especificidades das comunidades caiçaras e, também,
levando em consideração as possibilidades de logística e operacionalização, decidimos iniciar a im-
plantação da EJA Pescadores na praia da Longa, tendo em vista, a proximidade com o continente,
para que pudéssemos deslocar os docentes e desenvolvermos o acompanhamento pedagógico. As-
sim, atribui-se tal trabalho pedagógico no contexto da educação do campo, cabendo a articulação
com a Pedagogia da Alternância e o trabalho como princípio educativo.

pedAgogiA dA AlternânciA e o trAbAlho como princípio edUcAtiVo


Para a materialidade da proposta de trabalho EJA Pescadores, partimos da Resolução nº 2 de 28
de abril de 2008, que estabelece Diretrizes Complementares, Normas e Princípios para o desenvolvi-
mento de Políticas Públicas de atendimento da Educação Básica do Campo; a Resolução Municipal
nº 5 de 21 de dezembro de 2012, que dispõe das Diretrizes da Educação do Campo na Rede Munici-

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
pal de Ensino de Angra dos Reis; a Pedagogia da Alternância e o calendário laboral dos pescadores.
Considerando que os educandos da EJA pescadores não podem abandonar suas atividades de
trabalho para frequentarem a escola durante a vigência do calendário da EJA presencial, pois, em
maioria, são pescadores ou familiares destes e necessitam de flexibilidade pela especificidade da
pesca; planejamos um calendário com base na pedagogia da alternância, nele foram considerados
os períodos de defeso da sardinha e das fases da lua cheia para estabelecer “os possíveis dias de
aulas presenciais”.
A pedagogia da alternância surgiu na década de 1930, como demanda das associações de
agricultores franceses, foi introduzida no Brasil por missionários jesuítas na década de 1970, poste-
riormente, essa metodologia foi assumida pelos movimentos sociais, como o Movimento dos Traba-
lhadores sem Terra (MST) e, atualmente, é referendada pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC),
como estruturadora da educação do campo.
A pedagogia da alternância estabelece como tempos letivos tanto o tempo-escola, quanto o
tempo-comunidade, entendendo como:

(...) um processo contínuo de aprendizagem e formação na descontinuidade de


atividades e na sucessão integrada de espaços e tempos. A formação inclui e trans-
cende o espaço escolar, e, portanto, a experiência torna-se um lugar com estatuto
de aprendizagem e produção de saberes em que o sujeito assume seu papel de ator
protagonista, apropriando-se individual e coletivamente do seu processo de trans-
formação” (CORDEIRO; HAGE, REIS. 2011, p. 06)

Incorporando a matriz da pedagogia da alternância à EJA Pescadores, propusemos uma organi-


zação pedagógica e metodológica que não se limite à flexibilização desse tempo, mas que se utilize
do trabalho como princípio educativo. Neste sentido, a EJA Pescadores:

Enfatiza a construção coletiva do conhecimento a partir da socialização dos di-


versos saberes e da realização de um trabalho integrado entre educadores, incorpo-
rando os acúmulos advindos das diversas experiências formativas trazidas, individu-
almente, pelos diferentes sujeitos educadores. A organização de conteúdos, por sua
vez, visa superar a fragmentação e a abstração de currículos lineares e prescritivos,
possibilitando a reflexão sobre a origem social, histórica e dialética do conhecimen-
to científico. Nessa concepção está implícito o pressuposto de que os trabalhadores
jovens e adultos são sujeitos de conhecimento, para os quais a experiência formati-
va é um meio pelo qual seus saberes – construídos na vida cotidiana para enfrentar
inúmeros desafios – são confrontados com saberes de outro tipo. Sem anular seus
saberes prévios, o avanço cultural representa uma superação dialética dos primeiros
e a ampliação de sua capacidade de compreender o mundo. (CIAVATTA; FRIGOTTO;
RAMOS. 2011, P.57)

Essa modalidade de ensino busca romper com a estrutura linear e segmentada de concepção
educacional demarcada pela historiografia, sendo prevista a participação e a função plural dos pro-
fessores e dos envolvidos em defesa da diversidade dos modos de pensar e na formação totalizante
dos sujeitos. Portanto, a organização da escola do campo, reconhece os sujeitos como agentes do
seu fazer e tem no professor o mediador do fazer pedagógico.
O trabalho está expresso na realidade concreta dos educandos adultos e na projeção de vida nos

440
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
educandos jovens, a proposta que trazemos para as aulas é discutir sobre o trabalho como princípio
educativo na escola, buca provocar reflexões diante das intervenções que o homem realiza na natu-
reza, modificando a sociedade e os processos culturais.

diário de bordo: cUltUrA e edUcAção


Na Pedagogia da Alternância, um dos instrumentos pedagógicos é o Caderno de Acompanha-
mento, que se trata do diário de registro de atividades realizadas no tempo-comunidade com o
objetivo de dinamizar o currículo. Na EJA Pescadores, nomeamos esse instrumento como Diário de
Bordo, entretanto o gênero textual diário não será único nem suficiente em tal caderno; a escrita,
nesse, poderá ser feita pela linguagem verbal ou não verbal, por um tema livre com gêneros varia-
dos e, também, por temas sugeridos pelos professores, estes sempre em conformidade com a “rede
temática” selecionada para o período.
No retorno dos diários de bordo, variados objetivos pedagógicos do projeto são efetivados; acon-
tece a socialização entre os professores, isso gera debate e aprofundamento de alguns temas envol-
vidos, os desvios quanto ao uso da norma culta da língua são sinalizados, contudo o maior enfoque
é a reflexão da prática pedagógica, o retorno ao educando e a análise da eficácia do projeto.
Freire (2003) afirma que: “a educação em que educadores e educandos se fazem sujeitos de seu
processo, essa educação supera o intelectualismo alienante, supera o autoritarismo do educador
‘bancário’ supera ainda a falsa consciência de mundo”. Valorizar as experiências culturais dos edu-
candos e, a partir delas, construir o currículo, não significa nos limitarmos a esse universo, mas bus-
car estabelecer tensões com o conhecimento escolar, objetivando a sua relevância, transcendência
e, em um contexto mais amplo, a qualidade no processo educativo, como aponta Moreira (2008).
Ao buscarmos o diálogo entre as áreas do conhecimento, propomos o planejamento interdisci-
plinar tanto para o Diário de Bordo, quanto para as aulas do Tempo-Escola. Essa dinâmica tem nos
permitido interagir melhor entre os saberes trazidos pelos educandos e entre os conteúdos propos-
tos para as aulas. Numa análise geral sobre os registros nos Diários de Bordo, encontramos escritas
sobre as histórias de vida, cantigas de roda, poesias, músicas, relato do cotidiano, ilustrações da
comunidade, fotografias e quanto ao número de páginas, não encontramos uma constância, perce-
bemos que depende da relação do educando com a escrita.
O educando João Paulo, pescador, que interrompeu seus estudos no 9º ano de escolaridade, trou-
xe no seu primeiro Diário de Bordo 54 páginas escritas de fatos ocorridos no cotidiano do seu tra-
balho, com possibilidades de retorno pelos professores, articulando reflexões e desdobrando em
outros conhecimentos. Além disso, o educando realiza registros audiovisuais em seu celular. Portan-
to, o princípio da alternância no tempo-comunidade e no tempo-escola, visa a tempos formativos
para o sujeito, como construção de saberes possíveis de serem articulados em diferentes momentos
através dos diálogos sobre essas escritas.

diário de bordo: temA liVre


A pedagogia da alternância tem na sua base a ação de desafiar o educando, provocando
nele a partir da escrita no caderno reflexivo (Diário de Bordo) a ponderação, isto é, o repensar a sua
comunidade, o seu trabalho, o seu fazer local. O Educando expressa seu modo de ver, de viver e de
produzir cultura. Nesse sentido, apresentaremos dois pares de recortes das produções de quatro
educandos da EJA pescadores, no diálogo entre os escritos deles e processos de análise realizados
por nós.
No primeiro Diário de Bordo, selecionamos o recorte que reporta a memória história local:

Meu pai, como a maioria dos moradores da nossa comunidade, era pescador, também

441
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
tínhamos um pequeno bananal e alguns pés de café. Na época, minha mãe vendia muita
banana, o barco encostava na nossa praia e o barqueiro enchia sua embarcação com os ca-
chos de bananas, minha mãe também vendia café torrado para um comerciante de Angra.
(Trecho do Diário de Bordo do Educando Carlos José).

A memória presente nesse relato nos fornece algumas pistas em direção a nossa proposta, ela
nos possibilita um gancho com a intertextualidade de conceitos e concepções do local ao global.
O envolvimento da família na atividade econômica de agricultura e pesca, como relata o educando
Carlos, pode não ser nos dias de hoje a realidade que marca a comunidade da Praia da Longa, mas
permite o estabelecimento de relações pelos professores em todas as áreas.
A relação entre memória e história, as questões ambientais, geográficas, as operações matemá-
ticas e a escrita codificada são algumas das intervenções possíveis para estabelecermos aprofunda-
mentos a partir do texto construído pelo educando. Assim, um texto de memória individual, ao ser
socializado e desenvolvido pedagogicamente, conecta saberes populares com áreas de conheci-
mentos científicos, na construção de novos saberes.
No segundo recorte do Diário de Bordo: tema livre, selecionamos uma escrita irreverente e con-
textualizada à cultura local.

Já pensava em dar umas paqueradas, foi bom, tinha lindas colegas cobiçadas.
Papai falava: quer namorar tem que pescar!
Foi ai que comecei essa linda profissão de pescador. Comecei lavando prato no
barco e hoje tenho orgulho de ser pescador. (Trecho do Diário de Bordo do Educando
Ozeias)

Esse relato nos permite refletir sobre o percurso do educando sobre a profissão de pescador.
Através dele consideramos que a técnica da pescaria, até chegar ao profissional pescador, é constru-
ída na relação com a família e no exercício da alteridade; num espaço de convívio no barco, a relação
com o aprender, passa pelo aprendizado com o outro, o percurso se constrói entre a observação e a
prática. O grifo explicita que lavar pratos, ainda não é ser pescador; pois, para sê-lo, é necessário um
processo de execução de tarefas e conhecimentos necessários do fazer específico da pesca.
Portanto, o aprendizado com e a partir do outro, faz-se presente nas relações de trabalho e
cultura. E destas fazem parte o movimento a que se propõe a leitura do Diário de Bordo, quando dia-
loga com o outro, sobre suas leituras e a partir da sua visão de mundo. Não como aporte de superior,
mas com ressalta Freire (2010), assumir que somos seres inacabados e se reconhecer no processo
social e histórico da nossa cultura.

diário de bordo: temA dirigido


Ao trazermos o tema dirigido para o Diário de Bordo, incorporamos a este uma indagação, uma
pergunta; evitamos afirmações, sendo necessário por parte do educando um tempo para reflexão e
construção.
Para Chaves (2000) a pergunta abre para a possibilidade de se questionar as respostas que
fomos construindo inconscientemente ao longo de nossas vidas. [...] Ela também demanda uma
mudança de postura imediata, porque exige que, ao responder a elas, seja adotada uma postura
pesquisadora. [...]
A seguir mostramos uma questão do tema dirigido e as produções de duas educandas com
as ilustrações realizadas após o texto. Indagamos: “Há algum momento desses dias que a comunida-
de se reúne?” “Para quê?” “Como isso acontece?” “Qual seu sentimento nesses encontros coletivos?”

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
Recorte e figura 1:
Também nos reunimos no “toco” que fica na praia, é muito legal, nos reunimos com amigos para con-
versar, distrair a cabeça vendo o movimento da praia. De vez enquanto sai uma “fofoquinha”, que se chama
“babado”. (Trecho do Diário de Bordo do Educanda Elizete)

Figura 1: O toco

Recorte e figura 2:
[...] E também nos encontramos na praia,
num famoso “toco da fofoca” esse é o nome
dele. Lá vemos todo o movimento da praia e
batemos aquele papo, é muito divertido! (Tre-
cho do Diário de Bordo do Educanda Kátia)
Nosso objetivo não é analisar as ilustrações
em si, porém as incorporamos aos recortes es-
critos, por entendermos que faz parte do tex-
to e contexto que as educandas fornecem ao
exibi-las ao leitor, situando o lugar ao qual elas
se referem como ponto complementar da es-
crita e como elemento decorativo do Diário de Figura 2: O toco da fofoca
Bordo.
No grifo dado às frases, buscamos a análise do “toco” como elemento da cultura; nele os morado-
res se encontram, conversam, observam o entorno da comunidade e as pessoas transitando. Nesse
movimento, percebemos a cultura local, que como aponta García Canclini (2009, p. 41) é concebida
por um conjunto de práticas sociais, econômicas e políticas, “abarca o conjunto de processos sociais
de produção, circulação e consumo da significação na vida social”. Sendo um processo de signifi-
cação social, faz sentido não se fechar sobre um aspecto e pensar a cultura como forma híbrida,
entrelaçando-se com elementos do local e do global, que muitas vezes resultam de um ponto de
tensão entre as sociedades.
O grupo se forma pelas afinidades de seus sujeitos, para Varela (1999) os sujeitos se agrupam
para compartilhar regras e estratégias de leitura que fixam numa aceitabilidade comum, permitindo
a fluência na comunicação, o intercâmbio e a coincidência de interpretações. O grupo se faz pelo
sentido e pela ideologia comum que estrutura a recepção e o desejo de estar junto.
Portanto, no conjunto que apresentamos percebemos com mais evidência os escritos dos edu-

443
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
candos em torno da memória, como diz Nora (1993, p.09).

“ (...) A memória é a vida, sempre carregada por grupos vivos e, nesse sentido, ela
está em permanente evolução, aberta a dialética da lembrança e do esquecimento,
inconsciente de suas deformações sucessivas, vulnerável a todos os usos e manipu-
lações, suscetível de longas latências e de repentinas revitalizações.

A memória está sendo registrada no Diário de Bordo, e a partir desse ponto podemos dialogar
com a história, que para Nora (1993) é uma representação do passado, é tecer outros encontros en-
tre memória e história no contexto da praia da Longa.

considerAções finAis
Esse artigo procurou trazer as questões centrais sobre o processo que caminha a EJA Pescadores,
que não se encerra nessa escrita, mas nos provoca reflexões contínuas a respeito das práticas peda-
gógicas e políticas públicas em Educação do Campo.
São muitos os desafios que nos traz a EJA. No campo das políticas públicas percebemos avanços
e retrocessos nas últimas décadas. Poder atender a demanda da comunidade da Longa, na sua di-
versidade, com uma proposta diferenciada, é o cumprimento de um dever garantido constitucional-
mente ao Direito à Educação.
A EJA Pescadores se desdobra em atividades planejadas e de valorização a cultura e saberes po-
pulares, tal escola propiciou aos sujeitos um encontro regular, de convívio social e intelectual.
O Diário de Bordo tem se propagado na Rede de Ensino Municipal, como prática pedagógica dia-
lógica e autoral, oportunizando vários desdobramentos na relação ensino-aprendizagem.
A flexibilidade de organização dos tempos formativos, Tempo-Comunidade e Tempo-Escola, faci-
lita o acesso e a permanência dos educandos, estabelecendo maior integração entre as relações do
trabalho e escola.
O Diário de Bordo é um documento reflexivo, de interação de conhecimento, mas também, é
lúdico, é visualmente decorado por alguns educandos; é pessoal, cabendo em outro momento, se
desejarmos, a análise das ilustrações.
Em 11 de julho de 2014 foi publicada, no Boletim Oficial do Município de Angra dos Reis, a Reso-
lução SECT nº 006/2014 que regulamenta a Educação de Jovens e Adultos Pescadores; um ganho
efetivo para as comunidades caiçaras da região.

referênciAs bibliográficAs
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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
políticA edUcAcionAl e proejA: Um bAlAnço dAs
prodUções AcAdêmicAs entre os Anos de 2009 Até 2013
clArissA menezes de soUzA poUbel | leAndro gArciA pinho

Esse artigo tem por objetivo apresentar o levantamento da produção acadêmica sobre a escola-
rização de jovens e adultos no Brasil, no âmbito das discussões sobre a política de integração dessa
modalidade de ensino (EJA) com a Educação Profissional (EP), tendo como principal experiência o
PROEJA (Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Mo-
dalidade de Educação de Jovens e Adultos). Para tanto, metodologicamente, realizou-se pesquisa
nos bancos de dados do Google Acadêmico, da CAPES, do SCIELO e do SCIRUS, com a finalidade de
mapear os artigos que apresentavam a palavra PROEJA no título, nas palavras-chaves e/ou nos resu-
mos, entre os anos de 2009 até 2013. Em seguida, foram impressos os resumos de todos os artigos
mapeados e na sequência, organizados em pastas por ano de publicação e temática. Dessa forma,
esse texto focaliza as principais temáticas abordadas nos artigos, entre elas: currículo integrado;
relação educação e trabalho; perfil dos alunos PROEJA; formação de professores para atuar no PRO-
EJA; processo de ensino-aprendizagem; avaliação da aprendizagem e evasão escolar, bem como
apresenta uma breve discussão sobre cada uma delas, a partir de sua perspectiva crítica. Através do
levantamento e das análises realizadas foi possível constatar uma crescente produção a respeito do
tema PROEJA, revelando os desafios que ainda permeiam o “programa”.

palavras-chave: proeja, produção acadêmica, politica educacional

1- introdUção
Constata-se que a escolarização de jovens e adultos foi se consolidando ao longo do tempo como
um importante campo de discussão de práticas e teorias dentro do âmbito do conhecimento cientí-
fico. Dessa forma, é uma arena de pesquisa fortalecida e que apresenta um significativo quantitativo
de produções acadêmicas.
Diante dessa afirmativa, vale acrescentar a essa discussão o posicionamento crítico de autores
que ao longo dos anos refletiram e problematizaram o tema da escolarização dos jovens e adultos
no Brasil.
Como lembram Oliveira e Pinto (2012, p.13-14):

[...] dados do Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de


2010, indicam que o Brasil possui uma taxa de 9,7% de pessoas analfabetas, o que
corresponde a mais de 14 milhões de pessoas em idade acima de 15anos. Somando
esse número ao do contingente de quase 40 milhões de trabalhadores que possuem
escolarização até a 4ª série primária, constata-se o descaso com as políticas públicas
de educação em uma perspectiva de inclusão social e garantia do direito à escolari-
zação para essa parte da população.

Pode-se perceber que a educação de jovens e adultos apesar de não ter deixado de ser uma pre-
ocupação de momentos históricos de nossa história educacional, os dados acima evidenciam que
ela não se fez eficaz.
A história da Educação de Jovens e Adultos no Brasil é marcada por uma relação de domínio

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
estabelecida historicamente entre a elite e as classes populares. Uma concepção que nasce da rela-
ção entre conquistador e conquistado e manifesta-se em muitos documentos oficiais que parecem
tratar a EJA como um favor e não como institucionalização de um direito. Assim, reproduz-se a visão
de que a escolarização de jovens e adultos é algo inferior, destinado a cidadãos inferiores. Essa con-
cepção fomenta o preconceito contra seu público, considerado: adulto analfabeto, “incompetente,
marginal, culturalmente inferior” (FÁVERO, 2004, p.15). Concepção esta que tem sido profundamen-
te internalizada por estas pessoas que se julgam sem direito à educação.
Percebe-se que a Educação de Jovens e Adultos se desenvolveu ao longo da história atrelada
a políticas educacionais desarticuladas e que, portanto, nunca permitiram um avanço qualitativo
dessa modalidade de ensino. Em acordo com esse argumento Paiva (2006) afirma que o histórico
da Educação de Jovens e Adultos no Brasil aponta a descontinuidade e a insuficiência das políticas
públicas. No entanto, afirma que os projetos e as políticas públicas têm um importante papel peda-
gógico e que, se dispostas, são instrumentos de transformação da sociedade.

Como política pública, pensar a educação nessa modalidade implica não apenas
tomar o sistema educativo formal nas mãos, mas assumir o concurso da socieda-
de em todas as iniciativas que vem fazendo, para manter viva a chama do direito,
que ainda não se constitui uma prática para todos. Implica, também, assumir que
a sociedade educa em todas as práticas que realiza, que as cidades educam, e que
projetos de nação e políticas de governo têm um vigoroso papel pedagógico, se in-
tencionalmente dispostos a transformar a realidade. Educar jovens e adultos, em úl-
tima instância, não se restringe a tratar de conteúdos intelectuais, mas implica lidar
com valores, com formas de respeitar e reconhecer as diferenças e os iguais. E isto
se faz desde o lugar que passam a ocupar nas políticas públicas, como sujeitos de
direitos. Nenhuma aprendizagem, portanto, pode-se fazer destituída do sentido éti-
co, humano e solidário que justifica a condição de seres humanizados, providos de
inteligência, senhores de direitos inalienáveis (PAIVA, 2006, p.34-5).

Rummert e Ventura (2007) apontam ainda que o Governo de Lula trouxe maior destaque para a
Educação de Jovens e Adultos do que os governos anteriores. No entanto, o discurso de valorização
não foi acompanhado por ações concretas para a superação das dificuldades vinculadas a essa mo-
dalidade de ensino.

Ao buscar a origem e os pressupostos dos “novos” programas para a educação de


jovens e adultos desenvolvidos pelo MEC, [...] o estudo evidencia que estes progra-
mas caracterizam-se por ser mais um rearranjo do mesmo pensamento hegemônico
que tem gerado, ao longo da história, um conjunto de propostas com vistas a aten-
der, prioritariamente, às necessidades do capital nos países periféricos ou semiperi-
féricos (RUMMERT; VENTURA, 2007, p.40).

Assim, dada à integração dessa modalidade de ensino (EJA) e a Educação Profissional (EP), na
experiência do PROEJA, as discussões não cessam. Ao contrário, as tensões tornaram-se ainda mais
aparentes devido a pouca experiência das instituições de ensino no oferecimento de cursos com
essa integração.
Segundo a educadora Jane Paiva (2012, p.45):

A construção de um campo de conhecimentos de interseção da educação pro-

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
fissional e da educação de jovens e adultos traz para o terreno da educação certo
“abalo” no estabelecido até então. Quando propomos um programa que integra a
educação profissional à educação de jovens e adultos (EJA), a exemplo o Programa
Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Moda-
lidade de Educação de Jovens e Adultos (PROEJA), detona-se uma onda sísmica, que
produz em nós, educadores, a necessidade de repensar o conhecimento até então
instituído para, de novo, aventurar-nos pelas possibilidades e potências da criação
científica.

Dessa forma, faz necessário refletir sobre os novos desafios que permeiam essa experiência edu-
cacional – PROEJA- evidenciando a importância dessa reflexão para o melhor desenvolvimento da
pratica educacional.

2- prodUções AcAdêmicAs sobre o proejA


Diante do exposto, realizou-se levantamento a respeito do Programa Nacional de Integração da
Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos –
PROEJA, nos últimos 5 (cinco) anos (2009-2013), verificando-se que as produções a respeito do tema
cresceram de maneira quantitativa e qualitativa, expressando uma necessidade de reflexão sobre o
programa. Assim muitos artigos, livros, seminários, congressos e entre outros, foram produzidos na
busca de contribuir criticamente ao debate do tema.
De acordo com os dados levantados no banco de produções acadêmicas do Google Acadêmico,
da CAPES, do SCIELO e do SCIRUS, verificou-se que entre as principais questões abordadas nos arti-
gos produzidos estão as temáticas: implantação do PROEJA; currículo integrado; relação educação
e trabalho; perfil dos alunos PROEJA; formação de professores para atuar no PROEJA; processo de
ensino-aprendizagem; avaliação da aprendizagem e evasão escolar.
No que tange a implantação de cursos de PROEJA, podemos citar as pesquisas de: Nascimento
(2009); Cardoso (2010), Silva (2010), Barbosa (2010); Losso Filho (2011); Schmitz (2012), Scopel, Oli-
veira e Ferreira(2012); Ramos e Garcia (2013); e demais autores, que apontam que a implantação de
cursos de PROEJA exigiu um esforço das instituições de ensino em adaptar-se a uma nova realidade
de integração, o que gerou acertos e desacertos do ponto de vista do que previa o Discurso Oficial.
Mas apesar dos desajustes, cursos de PROEJA significaram um avanço qualitativo com relação a qua-
lificação profissional dos jovens e adultos.
De acordo com Ramos e Garcia (2013, p. 123):

É possível dizer que a implantação do PROEJA representou e ainda representa um


grande avanço para a educação principalmente no que se refere ao público para o
qual o Programa é destinado.

Com relação ao currículo integrado entre educação profissional e educação básica na modali-
dade de EJA, autores como Lopes (2009), Gotardo e Viriato (2009); Silva (2010), Castro, Machado e
Vitorette (2010), Ferreira e Oliveira (2010); Ivo e Hypólito (2011); Fartes e Bentes (2011); Yukizaki e
Cristiano (2012), Sydow (2012); Pizzi e Limeira (2013), Sales (2013); entre outros, abordam especial-
mente que embora o PROEJA, programa instituído no âmbito federal, preveja uma articulação entre
o ensino técnico e ensino médio de forma integrada, o currículo integrado representa, de fato, um
desafio. Esse desafio implica a adesão de gestores e de professores responsáveis pela formação geral
e pela formação específica.
A expressão que identifica o posicionamento crítico desses autores com relação à temática fica

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
claro nos ditos de Pizzi e Limeira:

A integração curricular não acontece “espontaneamente”. Há uma deliberada


criação de espaços, momentos e disciplinas no currículo que favorecem a integra-
ção de saberes, provocando a confluência entre níveis e modalidades da educação
básica, profissional e de EJA. E ainda porque se propôs a superar a dualidade clássica
entre o ensino profissional e o ensino médio. A integração curricular entre os saberes
é processual e necessita de um “lugar” no currículo para que possa se desenvolver
(PIZZI e LIMEIRA, 2013, p. 108).

Dessa forma, é possível perceber que esse modelo de currículo integrado é de fato inovador,
uma vez que chama à cena o reconhecimento das pluralidades dos saberes além dos científicos e
tecnológicos, visando dialogar com outras formas de conhecimento, porém é um desafio aos siste-
mas de ensino e seus agentes, para fazer com que a proposta do discurso oficial se consolide nas
práticas estabelecidas nas Instituições de Ensino.
Sob a ótica do tema Educação e Trabalho destacam-se autores como: Vieira (2009); Rismann
(2011), Oliveira e Machado (2011); Yamanoe e Viriato (2012); Xavier (2013), Machado e Rodrigues
(2013), entre outros.
A partir do estudo dos autores citados percebe-se que o discurso que alia trabalho com educação
é algo que desponta novamente, o que pode ser comprovado pelas políticas públicas voltadas para
educação em prol do mundo do trabalho e que continuam gerando discussões na comunidade
científica.
De acordo com Xavier (2013, p. 09):

[...] para gerarmos emancipação através do trabalho, é preciso aliarmos a edu-


cação a este processo, ou seja, tendo o trabalho como princípio educativo, poderá
haver uma ruptura da alienação. Assim, ocorrerá o desenvolvimento de consciên-
cia crítica e não apenas uma formação para o mercado de trabalho. Isso significa,
educar tendo como base um fortalecimento do homem em todos os seus sentidos,
onde o mesmo tenha conhecimento do processo histórico em que está inserido, bem
como conhecimentos específicos capazes de articular as atividades educativas com
as lutas sociais.

A respeito do tema perfil dos alunos, tem-se como fonte os trabalhos de: Baggio (2009), Silva
e Farias (2009); Angelo, Moura e Gomes (2010), Moura e Melo (2010); Santos (2012), Souza e Silva
(2012); Barros (2012) e outros.
Sob essa discussão a problemática aponta uma visão de que os alunos de PROEJA buscam
uma formação de qualidade e gratuita, com a finalidade de conseguir (re) inserção no mercado de
trabalho. Além disso, os textos apontam um desafio que é a viabilização do acesso pleno ao direito
dos trabalhadores jovens e adultos à educação de qualidade. Qualidade essa que, segundo Silva e
Souza (2012, p. 13):

[...] assegure a elevação da escolaridade, integrada com a formação profissional,


numa perspectiva ampla, e que está sendo prejudicado pela necessidade de os alu-
nos conciliar as atividades de sobrevivência, muitas vezes em condições precárias
com os tempos de estudo. Sabe-se que o curso PROEJA é destinado a trabalhadores

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
jovens e adultos, mas fica a dúvida se o curso é pensado realmente para esse público
como deveria ser.

No que diz respeito à produção sobre os profissionais que atuam com o PROEJA, os artigos apon-
tam principalmente sobre questões como: formação inicial, formação continuada e perfil dos pro-
fessores, entre os autores temos: Vargas (2009), Silva(2009), Lira (2010), Leal e Holanda (2010); Coan
e Viseu (2011), Jacinto e Cedro (2011); Viriato, Favoreto e Klein (2012), Ventura e Cavalcante (2012),
Gonçalves (2012), Paiva (2012); Freitas (2013), Maron (2013).
De acordo com Paiva (2012, p.63):

Compreender os sentidos possíveis da condição de educador parece ser indispen-


sável na formação continuada que sustenta o PROEJA. Essa compreensão põe-se
para além da formação inicial como professor e alcança funções exercidas por pro-
fissionais que vivem da e na escola – instrutores, técnicos e servidores administrati-
vos de nível fundamental, médio e superior, ou seja, muitos agentes escolares não
docentes. As práticas profissionais de todos esses ultrapassam a categoria profissio-
nal professor, e são requeridas como constitutivas de um fazer pedagógico – com
diferentes significados, mas essencialmente mediadoras de aprendizagens (o que
passa por concepções do que é aprender).

Além disso, os artigos produzidos sob essa temática apontam, de um modo geral, que o professor
é também sujeito no processo educativo escolar. Dessa forma, enquanto sujeito, possui uma história
de vida, aprende e reconstrói seus saberes pela experiência e no cotidiano de suas atividades. Dian-
te disto, faz-se necessário analisar a formação docente para atuar no PROEJA discutindo os limites
neste campo de pesquisa. Propiciando uma reflexão sobre a (re) construção dos saberes docentes
de professores do PROEJA, trazendo ao debate a relevância da formação continuada.

A formação de Educadores de Jovens e Adultos requer, portanto, a reflexão con-


tínua da práxis pedagógica, favorecendo assim a constituição do educador-pesqui-
sador. Há de se fortalecer ainda a formação de educadores de Jovens e Adultos que
parta da diversidade de sujeitos, espaços e tempo, ambientes e contextos. E não se
trata de qualquer formação, trata-se de formação inicial e continuada (GONÇALVES,
2012, p. 94).

Diante dessa perspectiva Gonçalves (2012, p.88) afirma ainda que:

De forma geral e em particular a formação do Educador de Jovens e Adultos, en-


quanto ação permanente, construída ao longo da vida, através de percepções diá-
rias da realidade onde o educador está inserido e da percepção das mudanças pelas
quais o mundo está passando, é uma das exigências para essa modalidade de ensi-
no. A formação continuada é necessidade intrínseca para os profissionais da educa-
ção escolar e faz parte de um processo permanente de desenvolvimento profissional
que deve ser assegurado a todos.

No que diz respeito ao processo de ensino-aprendizagem em cursos de PROEJA, encontra-se um


grande contingente de produções que afirmam a necessidade do uso de estratégias pedagógicas
diversas com a finalidade de que o processo de construção do conhecimento torne-se dinâmico,

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
criativo e crítico. Entre essas produções estão os estudos de: Amaral (2009), Vargas (2009); Mendon-
ça (2010), Júnior, Sales, Dantas, Oliveira, Silva, Figueiredo e Freitas (2010); Coan e Viseu (2011), Jacin-
to e Cedro (2011); Augustinho, Silva e Rôças (2012), Souza e Linhares (2012); Fernandes (2013), Reis,
Borges e Blissari (2013); Martins e Neto (2013).
Nesse sentido, Fernandes (2013) afirma que utilização do ambiente colaborativo de aprendiza-
gem moodle é uma importante ferramenta de apoio ao ensino presencial, em especial, para o ensi-
no de Matemática na Educação de Jovens e Adultos de acordo com pesquisa realizada.

O moodle permite, assim, o acompanhamento de dados, auxiliando na aprendi-


zagem do aluno e oportunizando aos professores a visualização do desempenho de
cada participante no ambiente virtual. O professor pode, assim, auxiliar o aluno na
construção do conhecimento com base em suas próprias habilidades e conhecimen-
tos. Cabe, ainda, ressaltar, que os recursos disponíveis permitem que se valorize a
relações entre pares, potencializam as conexões linguísticas, graças à produção por
parte do aluno de resenhas, fóruns, wikis, narrativas; e pode desenvolver a apren-
dizagem cooperativa, a pesquisa em grupo, troca de resultados, etc. (FERNANDES,
2013, p. 184).

Além dos ambientes virtuais de aprendizagens, autores apontam que vários são os instrumen-
tos de apoio ao processo de construção do conhecimento. De acordo com Martins e Neto (2013),
o turismo pedagógico constitui-se como elemento dinamizador do processo de aprendizagem no
PROEJA, além disso, Augustinho, Viana e Rôças (2012) apontam que o cinema pode ser importante
recurso pedagógico de ensino em cursos como o PROEJA.
A avaliação da aprendizagem em PROEJA é outro tema discutido sob uma perspectiva que valo-
riza a constante busca da construção do conhecimento. Autores como: Maffasioli (2009); Leal e Ho-
landa (2010), Blum e Zanardine (2010); Blum (2011); Rodrigues e Pretes (2013), entre outros abordam
essa temática.
Segundo Maffasioli (2009, p.4):

[...] a avaliação da aprendizagem escolar na Educação Básica vem sendo con-


cebida como um processo contínuo e sistemático que, por sua vez integra uma
metodologia mais complexa – a de ensino e de aprendizagem. Da etapa final do
planejamento didático, forma de punição, com vistas à classificação e totalmente
mensurável, sob a ótica tradicional, o processo avaliativo pretende deixar de lado,
aos poucos, essas características, ainda culturalmente enraizadas em algumas es-
colas, para se fazer instrumento pedagógico, ato de estudo, reflexão e inclusão, que
prima pela aprendizagem dos educandos e pela melhoria das práticas docentes.

Diante do exposto, percebe-se que existe uma tendência crítica a pensar a avaliação na busca de
um novo sentido, em que a classificação dê lugar a aprendizagem. Assim, Maffasioli (2009, p. 4/5)
afirma que:

[...] a avaliação como um dos momentos mais significativos do processo de ensino


e de aprendizagem, deve levar em conta o tipo de educando que atende. Para tanto
precisa acontecer de forma contínua e privilegiar os saberes dos alunos, vinculando-
-os as práticas pedagógicas e aos conteúdos. É através dela que o professor percebe

451
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
o processo de construção de seus alunos e consegue interferir de forma a ajudá-los
na (re) construção do conhecimento, bem como na sistematização dos mesmos. O
aluno precisa ser sujeito da avaliação e perceber, por sua vez, que a avaliação não
é um julgamento e sim uma forma de levá-lo a desconstrução, reconstrução e cons-
trução do conhecimento e consequentemente a superar suas dificuldades.

De acordo com os autores estudados, há que se refletir sobre maneiras de romper com a lógica
avaliativa classificatória, em especial em cursos como os de PROEJA, na busca da construção de uma
avaliação que priorize os aspectos qualitativos do processo construção do conhecimento.
No que tange ao tema evasão no PROEJA, destacaram-se os estudos de: Almeida e Silva (2009);
Cavalcante (2010), Debiasio (2010); Martins e Brito (2011); Monteiro, Oliveira e Oliveira (2012);
Os estudos nessa temática buscam investigar as causas da evasão levando em consideração a efi-
ciência política e social do Programa de integração da Educação Profissional com a Educação Básica
na modalidade da EJA – PROEJA.
De acordo com Almeida e Silva (2009, p. 20), muitos fatores contribuem para a evasão no PROEJA,
entre os principais estão:

[...] a restrição orçamentária, a falta de condições infra-estruturais das escolas, a


falta de efetivação dos quadros docentes, a pouca efetividade da formação continu-
ada. Outra questão, [...] é a especificidade da EJA como uma das principais dificulda-
des para a implantação de uma política de integração.

Vale ressaltar que visando à permanência do aluno, é necessário que se busque novas metodo-
logias de ensinar e aprender, considerando os interesses e o histórico dos jovens e adultos. Dessa
forma, a educação para jovens e adultos precisa ser pensada de forma articulada com o mundo do
trabalho, numa perspectiva criadora e não alienante.
Segundo Stoco (2010, p.7/8):

[...]além de garantir o acesso, é preciso que as políticas públicas destinadas a essa


modalidade de ensino possibilitem e garantam a permanência desses estudantes
trabalhadores nos cursos que iniciam e, mais ainda, que satisfaçam a necessidade
que tem esse público de uma educação qualitativamente rica, já que os programas
voltados exclusivamente para a certificação de graus não alcançados no “tempo
certo”, nos quais os currículos e conteúdos são condensados, adaptados para acele-
rarem a escolarização, apenas têm sido válidos para a alteração das estatísticas, a
despeito da oferta de uma educação verdadeira.

Diante das perspectivas expostas, entende-se que o PROEJA, de acordo com os aportes legais,
nasceu de uma proposta oficialmente inovadora no âmbito da modalidade de ensino da educação
de jovens e adultos. Paiva (2012, p.48) afirma que o PROEJA do ponto de vista da concepção/formu-
lação é “uma das mais bem tecidas políticas públicas que já se teve no país”. No entanto, a perspec-
tiva crítica nos aponta que, apesar do PROEJA nascer de uma proposta inovadora, que requer novos
olhares e mudanças o sentido de fazer e pensar a escolarização dos jovens e adultos, o programa
ainda reflete um desencontro entre a sua concepção e a implementação prática o que tem causado
essa “arena de tensões” no interior das instituições de ensino, que diante do novo, sentem-se inse-
guras e sem suporte.

452
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
3- considerAções finAis
A partir do levantamento e abordagens feitas, percebe-se que as pesquisas realizadas e aponta-
das nesse trabalho, estão bem articuladas e assinalam um crescimento constante de produção cien-
tífica a respeito do tema. Vale ressaltar que, essas pesquisas traduzem os desafios que permeiam a
prática, o “fazer”, das políticas educacionais, mais especificamente, da política educacional em ques-
tão – PROEJA. Constatou-se ainda a necessidade das instituições se sensibilizem para a efetivação de
uma educação e profissionalização de fato, para o público do PROEJA.
Ao longo deste artigo, com base nos apontamentos das produções acadêmicas pesquisadas, per-
cebeu-se que ainda existem alguns limites para a superação da histórica dicotomia entre formação
profissional e educação básica, apesar da notável intencionalidade em alterar os rumos da educação
no país.

referênciAs bibliográficAs
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453
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
políticAs públicAs de edUcAção pArA joVens e
AdUltos: Análise dA experiênciA de AngrA dos reis.
KAtyUchA rAmos bArreto

Com o objetivo de discutir as políticas públicas de educação para jovens e adultos no município de
Angra dos Reis, é realizado um recorte histórico temporal analisando as políticas implementadas em
âmbito nacional, relacionando-as com as políticas para a educação de jovens e adultos em âmbito
municipal. A Educação de Jovens e Adultos em Angra dos Reis, como uma modalidade do Ensino
Fundamental, foi criada apenas em 2007, mas a cidade possui um histórico de atuação neste campo
desde o início dos anos de 1990, momento em que a política local, através da educação de adultos,
procurou incluir seus moradores em um processo de participação popular e democratização da ges-
tão no município, com a implantação do Curso Regular Noturno e do Movimento de Alfabetização
(MOVA- Angra). Levando em consideração tais discussões, o trabalho procurará dialogar refletindo
com os problemas históricos relacionados à EJA em nível nacional, assim como, na esfera municipal,
com as legislações que organizam a EJA, dando destaque para a Lei 2.582/2010 que aprovou o Pla-
no Municipal de Educação e traçou as diretrizes e as metas desta modalidade na cidade. Enfim este
trabalho pretende apontar a maneira como a cidade de Angra dos Reis vem interagindo com estas
políticas federais para atender a 8,6% de sua população analfabeta, levando em conta a especificida-
de de seus sujeitos, tendo em vista que a cidade possui ainda grupos claramente identificados como
remanescentes de quilombo, comunidades caiçaras, povos indígenas, etc.

palavras-chave: Políticas públicas, Educação de Jovens e Adultos, Angra dos Reis

introdUção
Considerando a importância da educação de jovens e adultos (EJA) para o desenvolvimento da
região, este trabalho visa, em linhas gerais, evidenciar como as políticas públicas para essa modali-
dade vêm sendo desenvolvidas em Angra dos Reis, município da Costa Verde do Rio de Janeiro.
Nesta pesquisa, foram consultadas leis federais e municipais que tratam da EJA; dados da pes-
quisa “Diagnóstico da Educação de Adultos na Região Costa Verde do Estado do Rio de Janeiro”,
coordenada pelo Prof. Dr. Elionaldo Julião, em 2012, entre outros; e realizada uma entrevista com a
coordenadora da Educação de Jovens e Adultos da Secretaria Municipal de Educação (2010).
Este trabalho inicialmente tratará da implantação, na cidade, do Ensino Regular Noturno e do Mo-
vimento de Alfabetização (MOVA), no começo dos anos de 1990, devido à sua forte influência para
a organização dessa modalidade em Angra dos Reis.

regUlAr notUrno e moVA-AngrA


No final da década de 1980, em Angra dos Reis, foram formados Conselhos Municipais, que fun-
cionavam como um canal de comunicação direta da população com a prefeitura, e implementado
o Orçamento Participativo.
Com o intuito de atender à classe trabalhadora e à demanda constitucional de “garantia do
ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para aqueles que não tiveram acesso em idade
própria” (BRASIL, 1988), foi criado, em 1989, o Ensino Regular Noturno, no município.
Nesse mesmo período, uma experiência de alfabetização de adultos realizada pela Prefeitura

454
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
de São Paulo, denominada de Movimento de Alfabetização – MOVA-SP2 – chamou a atenção dos
dirigentes de Angra do Reis por seu viés político e crítico.
Esse projeto tinha como base teórico-metodológica a Pedagogia do Oprimido, de Paulo Freire, e,
após intercâmbio entre os dirigentes dessas cidades, foi criado o projeto MOVA-Angra
Há uma grande diferença entre o processo de surgimento do MOVA-SP e do MOVA-Angra.
O primeiro surgiu para atender as demandas dos movimentos sociais organizados, que buscaram
apoio do governo municipal devido ao abandono da educação de adultos pelas políticas federais.
Já o projeto MOVA-Angra surgiu por iniciativa do governo, como uma política pública em âmbito
municipal.
Assim, a alfabetização de adultos, através do MOVA, pautada na educação popular, trabalhava
com a “necessidade de encontrar atalhos, queimar etapas e, urgentemente, incluir os excluídos num
processo não só educativo, mas, também, político, econômico, social e cultural.” (GÓES apud SAN-
TOS, 2003, p. 49).
Mas, para a realização desse projeto, era fundamental a participação e o comprometimento
dos movimentos sociais. Então, a Prefeitura Municipal de Angra dos Reis (PMAR) firmou parceria
com o Conselho Municipal das Associações de Moradores.
Santos (2003) diz que

O MOVA-Angra tinha um claro viés político, fazia parte da intenção do governo


em formar uma população até então sem, ou com muito pouco, sentimento de per-
tencimento ao município e carente, a despeito do saber acumulado nas vivências de
trabalhador, dos dispositivos para se organizar e lutar pelos seus direitos (ler, escre-
ver e ter consciência de classe). Servia também para legitimar um poder que, além
da possibilidade de ser efêmero localmente, se contrapunha, em seus pressupostos
básicos, ao poder político de nível nacional. E, quanto a esses objetivos, já em seus
primeiros anos, logrou conquistas. Não foram poucas as intervenções no mundo
real vindas de discussões e conclusões originadas nas suas turmas: questionamen-
tos em relação à atuação de diretorias de Associações de Moradores, formação de
chapas para disputá-las, reivindicações feitas diretamente à Prefeitura. Ou seja, en-
gajamento e organização política de fato foram produzidos. (SANTOS, 2003 p. 50).

Já o curso Regular Noturno reproduzia as práticas do ensino diurno, sem um projeto político
pedagógico específico para o público a que se destinava. E os professores notaram, através dos de-
safios encontrados nas salas de aula, que era necessário modificar a escola noturna para atender às
especificidades dos jovens e adultos.
A Prefeitura compreendeu esta necessidade e firmou, em 1991, uma parceria com a Universidade
Federal Fluminense (UFF), que possibilitou a criação de encontros formativos para os profissionais
da educação atuantes no Regular Noturno.
Experiências concebidas nos encontros foram colocadas em prática: alteração de horário das au-
las; pesquisa na comunidade, com o objetivo de identificar os motivos da evasão escolar; e diversifi-
cação no formato das aulas, com sessões de vídeo, palestras e oficinas.
Em 1992, foi realizado o Seminário de Reformulação do Regular Noturno, onde as escolas apre-
sentaram suas propostas apoiadas em três elementos norteadores: conhecimento da clientela do
2 O MOVA-SP teve por princípio uma educação libertadora, emancipatória, em que a ação educativa objetivava a construção
da identidade de sujeitos/educandos como cidadãos de direito, incentivando a participação popular, através do fortalecimento dos
movimentos sociais, contribuindo para a organização da comunidade, o fortalecimento de grupos já organizados e incentivo a novas
participações.

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
curso noturno e suas expectativas para a vida e para a escola; procura de modificações metodoló-
gicas na apresentação dos conteúdos curriculares e busca de alternativas que pudessem tornar a
escola mais agradável para o aluno trabalhador.
É importante perceber que essas questões também estavam sendo tratadas, em âmbito nacional,
pelos fóruns formativos e preparatórios para a elaboração da nova LDB.
Em 1994, com a realização do I Congresso de Educação de Angra dos Reis, que se passou a utilizar
a nomenclatura Educação de Jovens e Adultos para se referir ao MOVA-Angra e ao Regular Noturno.
No entanto, deve-se ressaltar que essas duas ações possuíam concepções diferentes de educação
de adultos. Conforme Santos (2003):

Enquanto o MOVA tinha claro suas diretrizes e objetivos, o Regular Noturno co-
meçava a repensar sua prática, imerso que estava nas amarras do ensino regular.
O MOVA criticava justamente esse engessamento da formalidade, seus educadores
populares baseavam-se em um arcabouço mais aberto à realidade de seus alunos.
O RN, na busca de suas trilhas, não compreendia o caráter eminentemente político e
includente do projeto da Educação Popular. (SANTOS, 2003, p. 52)

Esse conflito de concepções impossibilitou uma política educacional que integrasse os dois pro-
jetos e colaborasse, de forma mais organizada, para elevação da escolaridade dos alunos que se
alfabetizavam no MOVA.
Esse quadro só foi revertido a partir de 1996, quando as lideranças das Secretarias a que es-
tavam ligados os projetos uniram esforços para criar o I Encontro de EJA de Angra dos Reis. Onde foi
criada uma comissão permanente de representantes para dar continuidade às discussões referentes
ao Regular Noturno e ao MOVA.
A partir de então, houve a criação e a ampliação das instâncias e fóruns coletivos de discussão,
como as reuniões da Comissão do Regular Noturno/ MOVA, reuniões de Pólo do Noturno, os Encon-
tros de EJA, os cursos e oficinas que passaram a fazer parte da política de formação permanente da
Secretaria Municipal de Educação e as reuniões pedagógicas das escolas.
As discussões principais tratavam da necessidade de rever a temporalidade do Regular Noturno,
pois o período de oito anos era incompatível com a emergência do seu público em concluir o ensino
fundamental; da criação de um currículo próprio, que contribuísse para a formação de alunos traba-
lhadores, e, a partir do ano 2000, da preocupação com um processo de juvenilização na EJA.
É importante destacar o comprometimento dos profissionais de educação que trabalhavam na
EJA, pois a pressão desse grupo sobre o governo local possibilitou a reflexão sobre como criar e
avançar no processo de construção de uma educação de qualidade. E esse processo trouxe uma
experiência significativa para a consolidação das políticas realizadas atualmente.

A ejA em AngrA hoje


No início dos anos 2000, a Educação de Jovens e Adultos voltou a ser pauta nas ações do
governo federal e, a partir da publicação da Resolução CNE 01/2000, que instituiu as Diretrizes Curri-
culares Nacionais para EJA, os estados e municípios começaram a criar legislações complementares
para organizar essa modalidade de ensino.
Até o ano de 2006, o Regular Noturno era a única opção para jovens e adultos concluírem o ensi-
no fundamental na rede municipal de Angra dos Reis.
Mas, com a necessidade de rever a temporalidade dedicada à conclusão desse nível de ensino,

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
e, com base na Deliberação CEE nº 285 de 26/08/03, que possibilita a conclusão das séries finais do
ensino fundamental, na EJA, em 24 meses e com organização curricular em fases, etapas, períodos
ou módulos, uma nova proposta de EJA em que o ensino fundamental poderia ser concluído em
quatro anos foi implantada na cidade.
Essa mudança também pode estar relacionada à criação do FUNDEB, que, nesse mesmo ano, pas-
sou a garantir parte do financiamento da EJA pelo governo federal.
Durante o período de implantação da EJA como uma modalidade do ensino fundamental, os
professores identificaram a necessidade de dedicar mais um ano para a alfabetização.
Assim, a partir de 2010, a conclusão do ensino fundamental na EJA deveria acontecer em, no mí-
nimo, cinco anos.
Essa modalidade é ofertada de modo presencial e somente no horário noturno. E cada escola
conta com uma equipe de gestão específica para a EJA, composta por um auxiliar de direção, um
funcionário na secretaria e um pedagogo.
A rede municipal de ensino possui 14 escolas autorizadas a ministrarem a EJA e atende a
1.738 alunos (INEP, 2013).
O Censo de 2010 apontou que, na cidade, existem 7.260 pessoas analfabetas, ou seja, 8,6% da
população com 15 anos ou mais. Nesse mesmo ano, a rede municipal contava com 19 turmas de al-
fabetização na EJA (JULIÃO, 2012), o que demonstra que há uma demanda expressiva para justificar
maiores investimento na ampliação dessa oferta.
O Plano Municipal de Educação estabelece os objetivos e as diretrizes da Educação de Jovens
e Adultos e traz a necessidade de “contabilizar os jovens e adultos não-alfabetizados e/ou pouco
escolarizados em todas as comunidades, objetivando a expansão ordenada do atendimento nesta
modalidade.” (PMAR, 2010, p. 11).
Ainda não há uma ação efetiva para o cumprimento dessa meta. Mas, internamente, a SECT man-
tém uma pesquisa que aponta os dados sobre a idade, ano que está cursando e quantidade de
retenções dos alunos do ensino fundamental regular. E, considerando a expressiva quantidade de
retenções, identifica os casos como possíveis demandas futuras.
A data de matrícula inicial “fica estabelecida com um prazo de até uma semana a partir do iní-
cio das aulas.” (JULIÃO, 2012). O período de pré-matrícula foi abolido dessa modalidade, porque,
segundo a coordenadora de EJA do município3, as demandas apresentadas no fim do ano não se
confirmavam no período letivo, e isto gerava um problema burocrático para as escolas, pois turmas
eram desfeitas e professores tinham de ser realocados.
A frequência mínima para promoção na EJA, em Angra dos Reis, é de 50%, conforme expresso
abaixo:

Art. 37 - São considerados automaticamente retidos, observando-se a legislação


em vigor, os educandos que não obtiverem o mínimo de 75% de frequência no En-
sino Fundamental e 50% de frequência no período letivo na Educação de Jovens e
Adultos, sobre a carga horária total trabalhada. (PMAR, 2011)

Essa resolução municipal contraria a legislação federal, que diz ser “exigida a frequência mínima
de setenta e cinco por cento do total de horas letivas para aprovação.” (BRASIL, 1996).
Essa alteração, que precisa de reflexões mais profundas, provavelmente visa reduzir os elevados
índices de retenção e evasão, pois, tomando por amostra a 4ª fase da II Etapa, que corresponde à
fase de conclusão do Ensino Fundamental, no ano de 2011, houve 52,5% de evasão, 21,5% de reten-
3 Em entrevista para a autora em 18/10/2012.

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
ção e apenas 26% de alunos promovidos (JULIÃO, 2012).
Concomitante com a reorganização temporal da EJA, foi implantada uma nova proposta curricu-
lar, inspirada na reforma curricular que já vinha sendo desenvolvida, em caráter experimental, desde
a década de 1990, no Regular Noturno.
Essa proposta concebe o jovem e o adulto como sujeitos do processo educativo e preza pelo
respeito à diversidade.
Assim, com a intenção de investigar quem é o seu público, no ano de 2010, a SECT realizou a
primeira pesquisa “Perfil dos Alunos da Educação de Jovens e Adultos”. Essa pesquisa (PMAR, 2010)
apontou que há um equilíbrio entre os gêneros (52% de homens), 48% dos alunos estão solteiros, a
média de filhos é de 2,3 e de 4,1 moradores por residência
O tempo médio de moradia na cidade é 14,2 anos, ou seja, a grande maioria não é angrense. Com
relação à faixa etária, a EJA, no município, assim como em âmbito nacional, está passando por um
processo de juvenilização, pois 44% do seu público têm entre 15 e 29 anos. Outro dado importante
é que 78% dos alunos afirmam já terem deixado de estudar por algum período, sendo que 44% do
público ficaram 20 anos ou mais sem frequentar a escola.
Essa pesquisa aponta uma série de fatores sociais, históricos e culturais que se apresentam como
desafios e devem ser levados em conta para elaboração das políticas educacionais na cidade.
Destaca-se que há grupos culturais claramente particularizados, como os indígenas da Aldeia
Sapukai, os remanescentes quilombolas do Bracuí e os caiçaras moradores das ilhas. Para atender
a essas especificidades, foi realizada uma parceria entre o Instituto de Educação de Angra dos Reis
(IEAR)-UFF4 e o grupo de diversidade da SECT, que oferecem assessoria para construção de um pro-
jeto pedagógico que vise à divulgação, valorização e resgate dessas culturas.
Nas escolas localizadas nas praias da Ilha Grande, foi realizada uma adequação curricular e mu-
dança no calendário escolar, na tentativa de possibilitar o acesso, a permanência e a progressão dos
alunos pescadores.
No campo da Educação Especial, a EJA conta com dois serviços específicos: a Escola Municipal
de Educação de Surdos e o Centro de Apoio Pedagógico para Deficientes. E possui 81 alunos com
necessidades educacionais especiais matriculados (INEP, 2013).
Em cumprimento ao Art. 4º da LDBEN 9.394/96 (BRASIL, 1996), que trata dos programas suple-
mentares da educação, o PME pretende “assegurar a oferta de transporte gratuito, inclusive em ati-
vidades extra-escolares, merenda escolar de qualidade e materiais de apoio específicos aos educan-
dos da EJA na rede pública.” (PMAR, 2010, p. 11).
Dessa forma, os alunos têm assegurado, no horário escolar, o transporte gratuito nas linhas de
ônibus coletivo. E para atender aos moradores do Sertão do Bracuí, localidade rural, é disponibiliza-
do transporte escolar através do programa do governo federal Caminhos da Escola.
Todas as escolas possuem e disponibilizam área de convivência, refeitório e cozinha, onde são
preparados o lanche e a merenda.
Sobre o material didático, as escolas têm autonomia para utilizar e elaborar materiais diversifica-
dos que sejam mais adequados às suas necessidades. Mas, no ano de 2010, a SECT aderiu ao Progra-
ma Nacional do Livro Didático para Educação de Jovens e Adultos do governo federal. Porém, é im-
portante destacar que essa escolha se deu em janeiro de 2010, no período de férias dos professores,
de forma esvaziada, e sem a possibilidade de se conhecerem todas as coleções aprovadas pelo MEC.
A coordenadora da EJA do município narrou a insatisfação dos professores da II Etapa no proces-
so de escolha e avaliação do livro didático:
4 O Instituto de Educação de Angra dos Reis-UFF foi criado em 2008, e está historicamente
relacionado ao curso de Pedagogia da UFF, criado em 1992 no município.

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
“[Os professores afirmavam] Não gostamos desta [coleção], mas é a única que
tem, eu não posso escolher a outra que eu nem sequer vi. Então assim, a coleção
escolhida não foi aprovada pelos professores, [...] em termos de qualidade, do conte-
údo trabalhado, em termos de aprofundamento [...]. Uma das nossas coordenações
deste ano foi para avaliar o livro didático e hoje foi levantado isto: -- Olha, nós esco-
lhemos o livro, reprovamos o livro e continuamos com este livro.

Os livros paradidáticos para a EJA são comprados pela própria unidade escolar, com a verba do
projeto federal Dinheiro Direto na Escola.
No campo da assistência à saúde na educação, o município aderiu ao “Projeto Olhar Brasil”, finan-
ciado pela União, que visa diagnosticar e corrigir problemas visuais relacionados à refração, com
intuito de diminuir a evasão causada por problemas visuais.
A pesquisa de Perfil (PMAR, 2010) também aponta que 62% dos alunos da EJA são trabalhadores,
e 69% recebem até um salário mínimo, sendo que, dos alunos trabalhadores, 58% não possuem
carteira assinada.
A partir do respaldo legal do Decreto 5.154/04, que incentiva uma aproximação da EJA com a
Educação Profissional, e da meta que visa “associar ao processo de escolaridade básica, cursos volta-
dos para a formação profissional e alternativas para a geração de renda” (PME, 2010, p.11), mostra-se
imperativa a construção de uma política que garanta formação profissional aos sujeitos da EJA, com
o objetivo de promover melhores oportunidades de emprego e renda.
Apesar desses indicativos, a SECT não possui nenhuma ação quanto à formação profissional. Mas
pode-se citar, dentre outras ações, a atuação da Secretaria de Ação Social, que, em parceria com o
SENAC, aderiu ao Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego e ao Programa Nacio-
nal de Inclusão de Jovens.
Deve-se, ainda, destacar que o município possui uma política de formação dos docentes que atu-
am na EJA, estipulando normas para garantir que esses profissionais tenham alguma familiaridade
prévia com essa modalidade de ensino.
A Resolução SECT 4/2011 determina que os docentes sejam professores efetivos, prioritariamen-
te, com experiência de trabalho nessa modalidade na rede municipal de Angra dos Reis; mas tam-
bém são aceitos professores com experiência na EJA de outras redes ou professores sem experiên-
cia comprovada nessa modalidade, porém com formação específica para atuar na EJA. Também
preconiza que a complementação de carga-horária deve ser, prioritariamente, nessa modalidade de
ensino, só sendo possível atuar no diurno quando a demanda na EJA da escola já estiver totalmente
atendida.
Segundo Julião (2012), do total de 1.143 docentes efetivos da rede municipal, 197 atuavam na
EJA, sendo que, destes, 52 dedicavam-se exclusivamente a esse segmento.
Desta maneira, pode-se perceber que, a partir de 2007, a Educação de Jovens e Adultos vem
conseguindo se colocar, de uma maneira mais organizada, nas políticas educacionais do município
e, através da relação dialógica entre a prática docente e as instancias de discussões e estudos, a EJA
vem passando por modificações com o intuito de se adequar às especificidades dos sujeitos, procu-
rando oferecer para estes uma educação de qualidade e mais condizente com as necessidades das
classes populares.

conclUsão
Com relação à educação de jovens e adultos, a partir do início dos anos 2000, quando essa mo-
dalidade volta a ter atenção do governo federal, Angra dos Reis passa a dialogar com as políticas

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
nacionais para melhorar a oferta dessa modalidade na cidade.
É possível perceber algumas similaridades entre os desafios na EJA em âmbito nacional e munici-
pal, como o processo de juvenilização, apontado pelos professores dessa modalidade, no município,
há mais de uma década, e reafirmado pela pesquisa realizada em 2010.
Esse processo foi motivo de orientações no Parecer CNE nº 06/2010, que preconiza a possibili-
dade de se abrirem turmas específicas para o público adolescente da EJA, atrelada a práticas peda-
gógicas específicas e à oferta de turmas nos três turnos (manhã/tarde/noite). O Plano Municipal de
Educação prevê “a ampliação do atendimento da EJA para o diurno [...].” (PMAR, 2010, p. 11), mas
esta ainda não é uma realidade na rede municipal de educação.
No entanto, mesmo com avanços consideráveis nas políticas para a EJA, ainda existem, no mu-
nicípio, muitos problemas que precisam de melhor investigação e que não foram abordadas neste
trabalho. Dentre eles, está a queda no número de matrículas. Outro exemplo é a não oferta dessa
modalidade em todas as escolas autorizadas a ministrá-la.
Dessa forma, traçando um panorama dos caminhos que a política para a educação de jovens e
adultos vem percorrendo em Angra dos Reis, este trabalho deseja inspirar outros pesquisadores a
ter, como objeto de pesquisa, essa modalidade de ensino.

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______. Resolução, nº 03/2011, de 12 de setembro de 2011. Dispõe sobre o processo de Avaliação na
Aprendizagem na Rede Municipal de Educação de Angra dos Reis e dá outras providências. Angra dos
Reis, RJ, 2011.
______. Resolução, nº 04/2011, de 29 de setembro de 2011. Dispõe sobre a lotação de professores da
Rede Municipal de Ensino e sobre as normas a serem implementadas para a atuação de Docentes I e II
na Educação de Jovens e Adultos (EJA). Angra dos Reis, RJ, 2011.
SANTOS, Ênio José Serra. Repensando o ensino Regular Noturno como escola pública para trabalha-
dores: o caminho de Angra dos Reis. 2003. Dissertação (Mestrado em Educação) – Centro de Estudos
Sociais Aplicados, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2003.

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
qUAtro mUndos entrelAçAdos nA ofertA e nA
procUrA dA ejA: diAlogAndo com KosiK
mAriA de nAzAré corrêA dA silVA

A pretensão em investigar financiamento para a Educação de Jovens e Adultos como projeto de


tese partiu da inquietação provocada nos debates dos fóruns de discussão desta problemática e as
diversas matizes desenvolvidas para seu atendimento. A ação dos organismos internacionais, os
acordos e pactos assinados pelos chefes de estado, as políticas de governo e a naturalização das
análises e indicadores da Educação de Jovens e Adultos se constitui no olhar desta pesquisa ao
mundo da pseudoconcreticidade explicadas a partir dos quatro mundos de Kosík assim postos; a)
mundo dos fenômenos externos; b) mundo do tráfico e da manipulação; c) mundo das representa-
ções comuns; d) mundo dos objetos fixados. As impressões trocadas neste diálogo teórico denotam
o complexo quebra-cabeça em discorrer sobre a analogia eleita. A princípio pelo desafio na compre-
ensão das categorias expostas, em segundo pelo desacreditado tema no contexto acadêmico onde
reaparece a tese fenomenológica dos diferentes em detrimento aos desiguais. Tal decisão, justifica
a pulverização das atenções com discriminação das políticas ofertadas às distintas regiões do país,
entre o campo e a cidade, entre o urbano e o rural onde subjas se cristalizam do dizer de Louis Not a
pedagogia heteroestrutural como predominante entre as facetas das pedagogias do conhecimen-
tos. Este trabalho pretende ser desenvolvido em uma linha dialética buscando a materialidade dos
fenômenos acreditando que estes serão possíveis de conhecer.

palavras-chave: Financiamento, EJA, Amazõnia

O tema em foco, se constitui em um recorte do projeto de tese em desenvolvimento na Pontifícia


Universidade Católica de São Paulo/PUCSP e, é reflexo de uma realidade pouco valorizada que é a
Educação de Jovens e Adultos. O contexto eleito para a pesquisa é o Alto Solimões na Tríplice Fron-
teira Amazônica onde o Brasil faz Fronteira com o Peru e a Colômbia. A pretensão em investigar esta
temática partiu da inquietação provocada nos debates dos fóruns de discussão desta problemática
e as diversas matizes desenvolvidas para seu atendimento.
Uma dessas inquietações diz respeito ao currículo gestão e financiamento da EJA onde a luta em
sua defesa diz que toda política pública deve garantir condições materiais e pedagógicas para sua
sustentabilidade, a partir de momentos formativos de geração de trabalho e renda, respeitando a
potencialidade social, econômica e cultural dos sujeitos e de cada território, o que exige uma es-
tratégia coerente de gestão, de recursos financeiros públicos e reformas educacionais compatíveis
com as necessidades demandadas pelos desafios da EJA, incluindo-os na política de desenvolvi-
mento regional e em programas de assistência ao educando. No que se refere a recursos humanos,
destaca-se a importância de reconhecer a necessidade de profissionais concursados, de imediato,
nos sistemas de ensino, garantindo formação específica para atuar na modalidade EJA, de modo a
garantir a continuidade e a qualidade do ensino ofertado.
Considera-se ainda, imprescindível, a intensificação de políticas de formação continuada para es-
ses profissionais, além de efetivo acompanhamento pedagógico, assim como, a garantia de receita
financeira da União, de estados, do Distrito Federal e de municípios para Educação e Aprendizagens
de Jovens e Adultos ao Longo da Vida. ( Documento Base Nacional, 2009). A ação dos organismos
internacionais, os acordos e pactos assinados pelos chefes de estado e desconhecidas para muitos
gestores locais, as políticas de governo em constantes metamorfoses e a naturalização das análises
e indicadores da Educação de Jovens e Adultos se constitui no olhar desta pesquisa ao mundo da
pseudoconcreticidade explicadas a partir dos quatro mundos de Kosík assim postos;

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
a) mundo dos fenômenos externos;
b) mundo do tráfico e da manipulação;
c) mundo das representações comuns;
d) mundo dos objetos fixados.

As impressões trocadas neste diálogo teórico denotam o complexo quebra-cabeça em discorrer


sobre a analogia eleita. A princípio pelo desafio na compreensão das categorias expostas, em se-
gundo pelo desacreditado tema no contexto acadêmico onde reaparece a tese dos diferentes em
detrimento aos desiguais. Tal decisão, justifica a pulverização das atenções com discriminação das
políticas ofertadas às distintas regiões do país e do mundo, entre o campo e a cidade, entre o urba-
no e o rural onde subjaz se cristalizam do dizer de Louis Not (1981) a pedagogia hetero-estrutural
como predominante entre as facetas das pedagogias do conhecimento. Este trabalho pretende ser
desenvolvido buscando a materialidade dos fenômenos acreditando que estes serão possíveis de
conhecer.
a) O primeiro mundo, mundo dos fenômenos externos, se desenvolve à superfície dos processos
realmente essenciais. Neste trabalho é estabelecida uma relação deste mundo com os orga-
nismos internacionais que atuam e ditam as políticas educacionais a despeito das reais neces-
sidades dos sujeitos e das condições dos estados-nação em administrá-las e praticarem. Caso
contrário, o quadro traçado da educação de adultos em nível mundial, publicado pelo Ministé-
rio da Educação/MEC e UNESCO em 2009, com o objetivo de subsidiar as discussões na CON-
FINTEA VI seria outro. Vejamos o estado da arte nos cinco continentes nesta obra detalhada.
• América Latina e Caribe – formado por 41 países, com uma população de 577 milhões, com
uma rica diversidade étnica apresentando 400 diferentes grupos indígenas. Se constitui
em uma região extremamente heterogênea o que dificulta a generalização de diagnósti-
cos, exigindo portanto, políticas e programas diversificados que levem em conta os contex-
tos locais. Este continente, segundo o relatório em estudo, exibe taxas relativamente altas
de alfabetização de adultos. De 1985 a 1994 chegaram a 87%, de 200 a 2006 aumentou 4
pontos ficando em 91% e há uma projeção para 2015 de 93%. O Brasil é o maior país da
região e possui o maior número de analfabetos, 13 milhões, se constituindo em um poço
de críticas considerando que sua economia é uma das maiores do mundo. No Haiti, 50%
da população adulta é analfabeta. No outro extremo Cuba, Argentina e Uruguai atingiram
97% de alfabetismo adulto. Venezuela e Bolívia foram respectivamente incluídas em 2005
e 2008.
• Ásia e Pacífico – Este continente elaborou o que ficou conhecida como Declaração Asiática.
O documento apresenta diretrizes para a construção de sociedades igualitárias e sustentá-
veis. Prevê celeridade nas mudanças e surgimento do mundo globalizado. As sociedades
reafirmam a importância de garantir o acesso a educação de todos os adultos. Os pro-
blemas socioeconômicos não foram resolvidos como a extrema pobreza, o desemprego
e a exclusão. Os desafios criados pela migração interna e externa mais a degradação do
meio ambiente depõem contra esta região. Ressalta o relatório, que tudo isso seria bem
resolvido com uma matriz de educação holística baseada em uma abordagem de direitos
humanos. A aprendizagem da educação de adultos (AEA), é essencial para a construção
de sociedades igualitárias e sustentáveis. Rica culturalmente com 3.500 línguas dentre os
4 bilhões de pessoas que a habitam correspondendo a 60% da população mundial. Essas
ocupam apenas 29% do território. Disparidades e diferenças entre e dentro dos países são
as características mais evidentes. A região concentra os cinco países mais populosos China,
Bangladeshe, Índia, Indonésia e Paquistão. Mais da metade da população mundial e 75%
dos adultos são analfabetos. Concentra acima de tudo, o maior número de pessoas pobres,

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
ou seja, 2 bilhões vivendo com menos de U$ 2/dia. As exceções são: Japão, Austrália, Nova
Zelândia e a República da Coréia que quase atingiram a universalização primária e secundá-
ria. Agora, priorizam o aprimoramento da força de trabalho por meio do ensino profissional
após a conclusão do Ensino Médio.
• África - O documento afirma que os indicadores internacionais do continente africano pin-
tam um triste cenário: extrema pobreza, recorrentes conflitos armados, instabilidade polí-
tica, pandemia de HIV/ AIDS e várias formas de exclusão, violência e migração. Se constitui
na segunda maior e uma das mais diversas regiões do mundo. O pronunciamento africano
sobre o poder da educação de jovens e adultos/EJA para o desenvolvimento da África ocor-
reu em Nairobi/ Quênia no período de 5 a 7 de novembro de 2008 com o discurso:

“Nós representantes dos 46 países africanos desta conferência regional prepa-


ratória para a CONFINTEA VI, declaramos o compromisso em tornar a Educação de
jovens e Adultos um direito e uma realidade para o nosso povo. Novos desafios e de-
mandas acontecem na África para controlar situações novas e velhas e chamamos
a África para a CONFINTEA VI: junte-se a nós e no apoie nessa luta para a aprendiza-
gem ao longo da vida, desenvolvimento sustentável, e uma cultura de paz. Tal mu-
dança social evolui como um produto da cidadania consciente e melhores condições
de vida. A educação e aprendizagem de jovens e adultos constituem o veículo para
tal mudança, uma vez que capacitam os jovens e adultos a participar ativamente no
desenvolvimento desse processo”.(MEC/UNESCO, 2010:21)

• Onde estão as famosas intervenções dos organismos internacionais para intervir nessa
penúria? Parecem mais, preocupados em agravar a situação. Sinais de denúncia têm apa-
recidos diante da crise econômica e social em que vivem atualmente. Estas crises, têm esti-
mulado pessoas cujas vozes haviam sido silenciadas e ignoradas como é o caso de líderes
africanos que estão denunciando as crises artificialmente induzidas sobre a diminuição de
recursos naturais e escassez de alimentos. Comunidades internacionais e organizações da
sociedade civil de outros países, têm, mesmo que e inexpressivamente, atendido aos ape-
los e firmados parcerias para campanhas de alfabetização e educação de adultos.
• Europa e América do Norte – Ricamente diversa geográfica e economicamente reúne 1.164
bilhão, cento e sessenta milhões de habitantes. A população está diminuindo e possui 85
milhões de idosos representando 17,1%. Nos EUA, aumenta para 21%. As mulheres, apesar
de mais escolarizadas tem salários muito mais baixos que os homens.
• Estados Árabes – 18 países afirmaram que a educação é fundamental. Declaração baseada
na aprendizagem e no conhecimento (Tunísia 2009). Com uma população de 320 milhões
de pessoas distribuídas em dois continentes, África e Ásia. Partilham o mesmo idioma, cul-
tura e história. Além dos países ricos, a região inclui 23% da população na extrema pobreza,
vivendo com menos de U$ 2/dia. A guerra desencadeou instabilidade econômica, social
e política em alguns países, além da perda de recursos humanos e materiais. Entre 1999
– 2004 houve melhora de 6% na educação primária, aumentando em 14 pontos a taxa de
alfabetização atingindo 72%, porém inferior ao observado na África Subsaariana e no su-
deste asiático.
Esta realidade exposta para Kosik, não se apresenta aos homens, à primeira vista, sob o aspecto
de um objeto que cumpre intuir, analisar e compreender criticamente. No trato prático-utilitário
com as coisas, em que a realidade se revela como mundo dos meios, fins instrumentos, exigências e
esforços para satisfazer estas. O indivíduo em “situação” cria suas próprias representações das coisas
e elabora todo um sistema correlativo de noções que capta e fixa o aspecto fenomênico da realida-

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
de. Ressalta que os homens usam o dinheiro e com ele fazem transações mais complicadas, sem ao
menos saber nem ser obrigado a saber, o que é o dinheiro. Por isso segundo o autor, a práxis utilitá-
ria imediata e o senso comum a ela correspondente colocam o homem em condições de orientar-se
no mundo, de familiarizar-se com as coisas e manejá-las, mas não proporcionam a compreensão das
coisas e da realidade. Afirma que a práxis fragmentaria dos indivíduos é baseada na divisão do tra-
balho, na divisão da sociedade em classes e na hierarquia de posições sociais que sobre ela se ergue.
Isso tudo poder ser traduzido no relatório mundial publicado.
Observe-se que para Kosik (1976), captar o fenômeno de determinada coisa significa indagar e
descrever como a “coisa em si” se manifesta àquele fenômeno, e como ao mesmo tempo dele se
esconde. Prossegue o teórico, compreender o fenômeno é atingir a essência. Sem o fenômeno, sem
sua manifestação e revelação a essência seria inatingível. No mundo da pseudoconcreticidade o
aspecto fenomênico da coisa, em que a coisa se manifesta e se esconde, é considerado como a es-
sência mesma, e a diferença entre o fenômeno e a essência desaparece.
b) O segundo mundo, Kosik denominou de mundo do tráfico e da manipulação, isto é, da práxis
fetichizada dos homens, a qual, chama atenção, não coincide com a práxis crítica revolucio-
nária da humanidade. Nesse mundo a oferta e a procura da EJA se expõem e se desnudam
no mais folclórico dos encontros com gastos vultuosos e manipulação de diversas ordens e
naturezas através dos pactos e acordos firmados nas diversas esferas do poder, entre chefes de
estado, entre chefes de estado e governadores, entre governadores e prefeitos e, finalmente,
entre esses e as organizações da sociedade civil. Esses fenômenos que representam os acordos
e pactos, e as formas fenomênicas das coisas se reproduzem espontaneamente no pensamen-
to comum como realidade. Não porque sejam os mais superficiais e mais próximos do conhe-
cimento sensorial, mas porque o aspecto fenomênico da coisa é produto natural da práxis
cotidiana. Salienta o autor desses mundos, que a práxis utilitária cotidiana cria o pensamento
comum em que são captados tanto a familiaridade com as coisas e o aspecto superficial das
coisas quanto a técnica de tratamento das coisas como forma de seu movimento e de sua
existência. Para ele o pensamento comum é a forma ideológica do agir humano de todos os
dias. Todavia, o mundo que se manifesta ao homem na práxis fetichizada, no tráfico e na ma-
nipulação, não é o mundo real, embora tenha a “consistência” e a “validez” do mundo real, é o
“mundo da aparência”, tomando pra si uma categoria de Marx. Aponta que a representação da
coisa não constitui uma qualidade natural da coisa e da realidade: é a projeção, na consciência
do sujeito, de determinadas condições históricas petrificadas.
c) O terceiro mundo deste diálogo entrelaçado é mundo das representações comuns. À este Ko-
sik diz ser projeções dos fenômenos externos na consciência dos homens produto da práxis
fetichizada, formas ideológicas de seu movimento. A analogia posta neste diálogo fixa as polí-
ticas de governo em detrimento as políticas de estado para minimizar e ou ocultar o real pro-
blema. O documento base nacional preparatório a IV CONFINTEA (2009:27) reforça que tratar
a EJA como direito significa reafirmar a Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948,
para a qual a educação constitui direito fundamental da pessoa, do cidadão; mais do que isto,
significa criar, oferecer condições para que esses direitos sejam, de fato, exercidos. Desde o
final da primeira metade do século XX, os sistemas nacionais de educação vêm decidindo seus
rumos e filosofia a partir da prioridade política assumida por todos os Estados-nação que assi-
naram a referida Declaração. Entre nós, brasileiros, só em 1988 o direito à educação para todos
voltou à Constituição Federal, devendo-se abandonar, por- tanto, qualquer lógica de oferta de
atendimento como “oportunidade” e “chance” outorgadas à população. Como direito, a EJA
é inquestionável e, por isso, tem de estar disponível para todos, em cumprimento ao dever
do Estado, como modalidade no âmbito da educação básica preceituada na legislação nacio-
nal, bem como na perspectiva da educação ao longo da vida. EJA, como direito, pressupõe
em sua práxis que o trabalho realizado garanta acesso, elaboração e reconstrução de saberes

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
que contribuam para a humanização e emancipação do ser humano. A EJA é também espa-
ço de tensionamento e aprendizagem em diferentes ambientes de vivências que contribuem
para a formação de jovens e adultos como sujeitos da história. Nesses espaços, a EJA volta- se
para um conjunto amplo e heterogêneo de jovens e adultos oriundos de diferentes frações
da classe trabalhadora. Por isso, é compreendido na diversidade e multiplicidade de situações
relativas às questões étnico-racial, de gênero, geracionais; de aspectos culturais e regionais e
geográficos; de orientação sexual; de privação da liberdade; e de condições mentais, físicas
e psíquicas — entendida, portanto, nas diferentes formas de produção da existência, sob os
aspectos econômico e cultural. Toda essa diversidade institui distintas formas de ser brasileiro,
que precisam incidir no planejamento e na execução de diferentes propostas e encaminha-
mentos na EJA. A consciência do direito à educação e a mobilização em sua defesa crescem
entre a população jovem e adulta excluída do e no sistema escolar e fazem com que suas de-
mandas sejam consideradas na conformação de projetos político-pedagógicos e de políticas
públicas a ela destinadas. Indaga o documento: Quem são esses sujeitos? Como se expressam
no mundo? Onde estão no território brasileiro? O que fazem? Como produzem a existência?
Quais são seus desejos e expectativas? Que projetos de vida manifestam? Como aprendem?
Esses sujeitos participam da elaboração das políticas públicas?
Analogamente, Karel Kosik formula os seguintes questionamentos para entender “a coisa
em si”, a estrutura da coisa, não se manifesta imediata e diretamente? Por que são necessários
um esforço e um desvio para compreendê-la? Por que a “coisa em si” se oculta, foge à percep-
ção imediata? De que gênero de ocultação se trata? E responde, tal ocultação não pode ser
absoluta: se quiser pesquisar a estrutura da coisa e quiser perscrutar “a coisa em si” se apenas
quiser ter a possibilidade de descobrir a essência oculta ou a estrutura da realidade, o homem
já antes de iniciar qualquer investigação, deve necessariamente possuir uma segura consciên-
cia do fato de que existe algo suscetível de ser definido como estrutura da coisa, essência da
coisa, “coisa em si”, e de que existe uma oculta verdade da coisa, distinta dos fenômenos que
se manifestam imediatamente. A distinção entre representação e conceito, entre o mundo da
aparência e o mundo da realidade, entre a práxis utilitária dos homens e a práxis revolucionária
da humanidade ou, numa palavra, a “cisão do único”, é o modo pelo qual o pensamento capta
“a coisa em si”. Reforça o autor, que por isso, é o oposto da sistematização doutrinária ou da ro-
mantização das representações comuns. O pensamento que quer conhecer adequadamente
a realidade, que não se contenta com os esquemas abstratos da própria realidade, nem com
suas simples e também abstratas representações, tem de destruir a aparente independência
do mundo dos conceitos imediatos de cada dia.
d) Finalmente o quarto entrelaçamento dos mundos de Kosik, o mundo dos objetos fixados, que,
para ele dão a impressão de ser coisas naturais e não são imediatamente reconhecíveis como
resultados da atividade social dos homens. Neste diálogo a referência correspondente é a na-
turalização dos indicadores da EJA e a exclusão desta, das políticas de estado historicamente
posta em diversos e diferentes documentos. O contexto do continente africano já destacado,
dar conta de parte deste cenário. O analfabetismo no Brasil é uma questão histórica, fruto das
desigualdades sociais, onde a população mais pobre, residente nas periferias dos centros ur-
banos, comunidades indígenas e ribeirinhos é excluída do direito de acesso e permanência na
escola. Estados gigantescos como o estado do Amazonas que é composto por 62 municípios
com uma população estimada de 3.311.046 habitantes (IBGE, 2010) e devido à sua imensidão,
as cidades são situadas em regiões geográficas denominadas calhas de rios ou hidrovias, as
cidades apresentam algumas características específica, como o distanciamento das comuni-
dades localizadas na zona rural para a sede dos municípios, distâncias estas, que levam de 1 a
8 dias. Este aspecto distância, também está presente no deslocamento das sedes para a capital
do Estado, que levam de barco de 1 a 40 dia e de avião de 1 a 4 horas. Em determinados cida-
des, há necessidade de se deslocar inclusive para outro estado, a exemplo de Pauini, Ipixuna e

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
Guajará. A naturalização da não oferta e da pouca procura são assim amparadas.
No olhar desse exótico teórico, a dialética não considera os produtos fixados, as configu-
rações e os objetos, todo o conjunto do mundo material reificado, como algo originário e in-
dependente. Submete-o a exemplo dos demais, a um exame em que as formas reificadas do
mundo objeto e ideal se diluem, perdem a sua fixidez, naturalidade e pretensa originalidade
para se mostrarem como fenômenos derivados e mediatos, como sedimentos e produtos da
práxis social da humanidade.
Referencia que o pensamento acriticamente reflexivo coloca imediatamente e portanto sem
uma análise dialética em relação causal as representações fixadas e as condições igualmente
fixadas, fazendo passar tal forma do que chamou de “pensamento bárbaro” por uma análise
“materialista” das ideias.
Kosik conclui que para a destruição da pseudoconcreticidade há de se efetuar:

crítica revolucionária da práxis da humanidade; 2) pensamento dialético que dis-


solve o mundo fetichizado da aparência para atingir a realidade e “a coisa em si”; 3)
realizações da verdade e criação da realidade humana em um processo ontogenéti-
co, visto que para cada indivíduo humano o mundo da verdade é, ao mesmo tempo,
uma sua criação própria, espiritual, como indivíduo social-histórico. Cada indivíduo
pessoalmente e sem que ninguém possa substitui-lo, tem de se formar uma cultura
e viver a sua vida. (1976:19)

Acrescentamos nessa discussão um debate feito por Chizzotti & Branca (2012) que nos alertam
quanto a ausência de organicidade nas propostas curriculares. Segundo os autores, no caso brasilei-
ro, estados e municípios de grande porte contratam na maioria, universidades que elaboram mate-
rial padronizado apostilado produzido pela própria rede pública, com instrumentos específicos para
gestores, professores e alunos. Já os municípios de pequeno porte, as políticas se apresentam por
meio da compra, por redes públicas de propostas padronizadas de ensino de empresas privadas de
educação ou de organizações não governamentais. Afirmam também que para esses municípios o
material é produzido totalmente fora da rede pública de educação e também é implantado vertical-
mente desde a empresa até os professores e alunos, avalizado pelas secretarias de educação. Acon-
tece uma forma de loteamento desses pequenos municípios se constituindo marca visível do capital
privado na rede pública. Por isso, entendemos que muitos currículos propostos estão totalmente
desarticulados dos interesses e saberes dos educandos e educadores.
Enquanto fenômeno de massa podemos dizer que, o que Sacristán (2013) ressalta, se aplica na
realidade brasileira, pois esta, também sofreu o impacto da “educação para todos” onde exige do-
sagem e organização dos conteúdos aos quais os aspectos estruturantes se sobrepõem aos estru-
turados, a exemplo “sobre quando se aprende, que conhecimentos são adquiridos, que atividades
são possíveis, que processos são desencadeados e que valor eles tem” são alguns destaques desses
aspectos. O discurso universal, torna esses conceitos obscuros. Porém a história diz que nada é para
sempre, portanto mutável. Nessa direção continuamos nosso debate encarando o desafio de unir
as possibilidades de construção curricular onde as dimensões e relações entre aos aspectos estrutu-
rantes e estruturados sejam considerados.
O currículo enquanto essência não se dá imediatamente. Esta essência é mediata ao fenômeno
e, portanto, se manifesta em algo diferente daquilo que é. As propostas pensadas, elaboradas para
países, estados, municípios e territórios não terão os efeitos desejados por não terem sido geradas a
partir dos sujeitos envolvidos. Para Cassimiro (2014, web currículo pucsp), a abordagem vai pensar
a abordagem curricular descentrada. Em seus estudos, diz que é uma arena de políticas públicas e
privadas contextualizadas e hibridas. Ela não terá o mesmo texto na prática, pois esta prática está

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
em outro contexto onde a abordagem será hibridizada, ou seja o contexto não é fixo. Neste caso,
Kosik afirma que a essência se manifesta no fenômeno e que o fato de se manifestar no fenômeno
revela seu movimento e demonstra que a essência não é inerte nem passiva.
Encerro, com o compromisso de desvelar os questionamentos postos resgatando quatro temas
considerados conceitos-chave do pensamento do educador latino-americano Paulo Freire e que re-
sumem as preocupações abordadas neste texto para reflexão: Em que medida a construção da cons-
ciência é uma possibilidade para a educação? Em que sentido o conhecimento crítico do mundo é
um ato de mudança material do mesmo? Não será através da comunicação dialógica que nos damos
conta da materialidade física e temporal do conhecimento e da transformação do mundo? E por fim,
como a pedagogia crítica se vincula com a libertação do homem?

referênciAs.
CHIZZOTTI, Antonio & PONCE, Branca Jurema. O Currículo e os Sistemas de Ensino no Brasil. Ponti-
fícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP) São Paulo, São Paulo. Currículo sem Fronteiras, v 12,
n. 3, p. 25-36. ISSN 1645-1384 (online) www.curriculosemfronteiras.org.
KOSIK. Karel. Dialética do Concreto. 2. Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976
MINSITÉRIO DA EDUCAÇÃO, UNESCO. Documento Base Nacional Preparatótio a IV CONFINTEA. Bra-
sília, 2009.
_____________ Educação e Aprendizagem para Todos: Olhares dos Cinco Continentes. Brasília, 2010.
NOT, Louis. As Pedagogias do Conhecimento. Traduzido do Original “Les Pédagogies de la Connais-
sancede” por Américo E. Bandeira. São Paulo: ADIFEL, 1981.
PÁTIO. Pedagogia Radical: O Legado de Paulo Freire.Revista Pegagógica. Ano I N. 2, ago, 1997.
SACRISTÁN. José Gimeno. Saberes e Incertezas sobre o Currículo.Porto Alegre: Penso, 2013.

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
reVendo os cAminhos dA edUcAção de joVens e
AdUltos
rAchel reginA bolgAr dos sAntos pimentel | jonAs sAles dos sAntos |
jUliAnA ferreirA do nAscimento

Este trabalho intenta refletir sobre os jovens da atualidade e sua efetiva relação com a escola.
Para tanto, analisando a escola como espaço de disputas políticas, julga-se oportuno conceituar a
direção e administração das aplicações práticas e teóricas. Nessa perspectiva, utiliza-se o respaldo
teórico das considerações sobre as análises de Maria das Graças Rua, que evidencia a política como
consenso das partes disputantes. Para a autora, toda política pública compreende inúmeras ações
estratégicas. Do mesmo modo, que toda ação política, envolve uma escolha entre diversas alter-
nativas e, isso expressa determinada adequação entre o que se pretende e o que está disponível.
No bojo dessas reflexões, a proposta desse trabalho está nas perspectivas juvenis que envolvem os
jovens da EJA, principalmente no que tange as suas angústias, anseios, preocupações e escolhas
com relação ao futuro. Percorrer os caminhos da EJA significa compreender as múltiplas questões
que dizem respeito à valorização do jovem, o respeito à sua autonomia e o incentivo à participação
cidadã. Pensar os distintos significados atribuídos à participação social e cidadã pode ser um dos
grandes desafios dos jovens que estão nessa modalidade de ensino. O presente estudo objetiva as
discussões que perpassam as “juventudes” na sociedade contemporânea e os objetivos políticos
para a modalidade. Desse modo, nos remetemos brevemente à participação social e cidadã, como
sendo as que mais refletem sobre o futuro da democracia.

palavras-chave: Jovens, Educação de Jovens e Adultos, Escolarização

introdUção
O presente texto consiste na apresentação e análise da pesquisa de mestrado que está sendo
desenvolvida no campo da juventude. O interesse em pesquisar os Jovens alunos da EJA, surgiu a
partir da nossa experiência enquanto professores da Educação Básica e no trabalho que desenvol-
víamos enquanto supervisores do PROJOVEM URBANO/UNIRIO e, atualmente, como mestrandos da
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro - UNIRIO.
A proposta que apresentamos se insere na linha de Políticas em educação, na pesquisa Políticas
públicas nas áreas de Educação de Jovens e Adultos (EJA) e Juventude, que analisa perspectivas
educacionais contemporâneas que, certamente, representam subsídio importante para analisar os
jovens que estão cursando a EJA no ensino médio.
As questões da pesquisa refletem bem mais que uma investigação, mas refletem, também, sobre
a nossa trajetória profissional na tentativa de perceber: Quem são os jovens que estão no Ensino
Médio da EJA? Qual a importância dessa etapa de estudo na vida desses jovens?
Por meio de estudos no campo da juventude e das inter-relações com a educação escolar, objeti-
vamos compreender como os jovens, oriundos de uma ação pública, veem esse “novo espaço” que
envolve: saber, conhecimento, socialização e demais eixos da educação.

breVe reflexão
Os estudos analíticos de história ou sociologia da educação mostram o quanto o campo é per-
meado por disputas de concepções societárias. Ao longo dos séculos, a educação determinou as

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
relações sociais, aliás, ela não só constitui as intenções da sociedade como é constituída por elas.
Isto é, numa perspectiva ampla a função social do processo educativo encontra-se com a produção
e reprodução das relações sociais. A educação é um dos campos responsáveis pela perpetuação
ou modificação de valores. Enquanto não levarmos a sério a intensidade dos impactos do processo
educativo com o mundo real das alternantes e desiguais relações de poder, estaremos vivendo um
mundo divorciado da realidade.
Assim das vastas características diferenciadoras- território, gênero, classe, idade, etnia, forma-
ção, região, etc.- presentes nas interações societárias, advém consequências, posições conceituais,
aspirações e ideologias diversificadas. Nessa linha, as inserções na sociedade se fazem de maneira
distintas, proporcionando complexos e frequentes conflitos. Para harmonizar e progredir, os confli-
tos precisam de mediações que possibilitem administrações, para isto, existem apenas dois meios:
a coerção pura e simples e a política. (RUA, 2009). Nessa perspectiva podemos dizer que política é a
resolução pacífica dos conflitos originados da multiplicidade de posicionamentos oriundos dos pro-
cedimentos formais e informais que expressam relações de poder. Para tanto, é necessário estraté-
gias para programar, efetivar e avaliar as decisões tomadas.
Ou seja, política é uma equalização entre os fins pretendidos e os meios disponíveis para atingi-
-lo. Cada grupo social possui demandas e reivindicações de bens e serviços - saúde, educação, lazer,
circulação pela cidade, previdência social, etc.- Por esse via, poderemos perceber com esse artigo,
que os atores sociais presentes na Educação de Jovens e Adultos, realizam um ato político ao retor-
narem aos espaços formativos, interferindo, mesmo não de forma objetiva, nas relações de poder e
efetivando as estratégias políticas ao acessarem e permanecerem na escola. O gráfico I põe à vista o
significativo número de jovens e adultos que constituem a modalidade EJA.
1.241.368

1.238.840

1.166.110

1.172.541
1.139.636

1.056.861

1.056.061

EJA Semi Presencial


EJA Presencial
359.362
329.182

278.056

264.505
321.481

258.119

236.524
2007

2008

2009

2010

2011

2012

2013

Gráfico 1: Matrículas na Educação de Jovens e adultos presencial e semipresencial.


Fonte: INEP (Elaboração própria)
Subjetivamente, o gráfico possibilita refletir sobre lutas por direitos e deveres. Novos atores so-
ciais, ainda marginalizados no que tange a investimentos públicos, disputam posições na socieda-
de e apresentam demandas específicas da categoria. Por consequência novas questões chegam ao
jogo, debate e luta política.
É importante dizer que a filosofia norteadora desse trabalho, entende os processos educativos
como orientador dos alunos para se posicionarem no mundo. Esse ato precisa preocupar-se com
desenvolvimento global do educando, isto é, ajudar a aumentar as potencialidades físicas, morais e

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
intelectuais, deixando-o livre para construir suas ideologias, reflexões e conclusões. Baseado nesse
modelo de educação, o trabalho apresenta análise das perspectivas juvenis que envolvem os jovens
da EJA, principalmente no que tange as suas angústias, anseios, preocupações e escolhas com rela-
ção ao futuro.

o histórico dA edUcAção de joVens e AdUltos


As lacunas existentes na EJA surgem desde o século XIX, com resquícios de uma história de de-
sencontros, principalmente no diz respeito ao entendimento da EJA, enquanto uma educação com-
pensatória para aqueles que não tiveram acesso à escola na idade própria.
Os documentos históricos revelam que as aulas noturnas para adultos, têm início em algumas
províncias do Brasil entre os anos de 1866 a 1880 e estava direcionada aos jovens de origem social
popular, que eram considerados adultos por serem impedidos de frequentar as escolas elementares
que eram restritas aos grupos sociais da alta sociedade.
Recorremos às leituras de Haddad e Di Pierro (2000) para analisar o processo de escolarização
da EJA, na tentativa de verificar os avanços e os retrocessos dessa modalidade de ensino. No de-
senvolvimento de seus argumentos, os autores expressam que apesar da lenta preocupação com a
educação de jovens e adultos foi apenas em 1940, que realmente iniciaram-se as mudanças com a
preocupação geral para a educação das camadas populares.
Em 1920 houve uma movimentação por parte dos educadores, no intuito de ampliar as escolas e
melhorar a qualidade do ensino popular, principalmente no estabelecimento de condições favorá-
veis à implementação de políticas direcionadas à educação de adultos.
Sob a gestão de Getúlio Vargas, com a Revolução de 1930, as novas exigências no campo educa-
cional brasileiro tiveram início. Nesse período, a educação de adultos é liderada pelo Estado através
da Constituição de 1934, que institui a implementação do primeiro Plano Nacional de Educação -
PNE, com oferta do ensino primário integral, frequência obrigatória e gratuita, estendendo-se aos
adultos.
Na década de 40, o Estado instituiu o fundo para alfabetização de adultos, devido aos elevados
índices de analfabetismo por conta da má estruturação política educacional das décadas passadas.
Cabe ressaltar que a “extensão das oportunidades educacionais por parte do Estado a um conjunto
cada vez maior da população, servia como um mecanismo”, que pudesse fortalecer a democratiza-
ção do país, com a valorização da educação escolar (HADDAD, DI PIERRO, 2000, p.111).
O final dos anos 50 e o início dos anos 60 foram períodos de grande mobilização dos educado-
res brasileiros a respeito das reformas da educação, como, por exemplo, o II Congresso Nacional de
Educação de Adultos que aconteceu no ano de 1958, na cidade do Rio de Janeiro. Com esse novo
olhar para se pensar a estrutura pedagógica da alfabetização de adultos, no congresso realizado em
Recife, com a presença marcante do educador Paulo Freire, as discussões direcionavam-se para o
entrelaçamento entre os problemas educacionais vigentes e a problemática social. O trabalho de-
senvolvido por Freire com a educação de adultos possibilitou a organização do Programa Nacional
de Alfabetização de adultos.
Outros elementos consideráveis foram à criação do MOBRAL, em 1968 e à expansão do Ensino
Supletivo (CES), criado em 1972. Os documentos expressam que a oferta do Mobral e do Supleti-
vo foram tentativas utilizadas como estratégias do Estado para saber lidar com a tensão arraigada
desde os primórdios da educação popular, como também para atender as orientações da UNESCO
(VENTURA, 2011).
Refletindo sobre a lógica burocrática que ainda perpassa as ações da EJA, verifica-se que todo o
avanço da educação para a classe trabalhadora foi conduzida por lutas e por concepção democrá-
tica da sociedade, na busca por igualdade de oportunidades e igualdade de condições sociais. A

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
importância para tal reconhecimento deve-se ao engajamento de educadores que, de uma forma
geral, deram conta, do direito à educação permanente para todos. É na luta que as condições são
criadas e afirmadas, não só para democratização da educação, mas para a participação social que
inclui a “socialização das gerações mais iguais e menos injustas” (CURY, 2002, p. 247).
Os desdobramentos que merecem nossa atenção referem-se às normas oficiais que evidenciam
as finalidades da EJA e estão pautadas no aperfeiçoamento e na qualidade, atribuindo significado
ao conhecimento educativo e, sobretudo, na formação geral do jovem e do adulto estudante.
Inegável os desafios que ainda são enfrentados no cotidiano de nossas escolas, de como ainda
estamos à margem dos sistemas educacionais; essas ideias não são acabadas, são decorrentes das
observações enquanto professora da EJA no sistema estadual de ensino. De acordo com Machado
(2009, p.19) vemos que:

No Brasil, a denúncia de descaso para com a EJA aparece em estudos e pronuncia-


mentos de vários educadores. Em 1938, Paschoal Lemme5 (2004, p. 65) já destacava
que “mesmo entre as pessoas que têm certo trato com os problemas de educação e
de ensino é comum verificar-se um completo desconhecimento da importância e da
significação hoje emprestadas ao problema da educação de adultos”. Passados 71
anos dessa afirmação, o que podemos dizer sobre a Educação de Jovens e Adultos
no Brasil? (...).

Impossível não destacar que a EJA sempre foi tratada pelo Estado como uma segunda opção
quer pelo baixo rendimento do sistema educacional, que acaba por se tornar seletivo, excludente e
muitas vezes marginalizado, ou então, com um expressivo quantitativo da população que consegue
ingressar na escola. Além disso, é visível que tanto a oferta, como também o rendimento dos alunos
são diferentes, à medida que a localização dificulta o acesso. Deve-se aqui atentar para os desdobra-
mentos expressos da educação de jovens e adultos como sendo uma educação escolar que certifica
e prepara para o trabalho; há também a desqualificação do ensino da EJA, caracterizado como fraco
e de má-rendimento.
A respeito da democratização da educação e da superação do analfabetismo, o que contribuiu
para refletirmos sobre a qualidade da educação e suas interfaces é que apesar da universalização e
a possibilidade de vagas ao ensino público, ainda há uma defasagem e, isso vem afetando substan-
cialmente aos jovens e aos adultos, pois em suas trajetórias escolares não estão conseguindo dar
conta do sistema de ensino.
Na realidade, o que nos resta entender, em termos sociais, quem é mais atingido pela qualidade
da oferta e da seletividade do sistema? As interrogações valem como um alerta para a necessidade
de um exercício de reflexão para compreender porque a EJA é menos estruturada do que os demais
sistemas de ensino? E porque seus objetivos não são claros como os demais? Talvez, por não incluir
só a educação da segunda chance, como também a educação continuada. Este processo interroga-
tivo leva-nos a entender os discursos recentes que envolvem a EJA, no que se refere à precariedade
de seus valores e da sua organização, estando sempre vulneráveis as estratégias governamentais.

os joVens “desconhecidos” dA ejA


Buscar explicações para compreender os desafios vivenciados pelos jovens na sua relação com o
processo de escolarização é a principal tarefa dos educadores da contemporaneidade. A discussão
a respeito da condição social dos jovens no cenário escolar, como também, os processos de indivi-
duação de suas trajetórias marcam um universo cheio de prerrogativas e uma delas é: como lidar
5 Em 1938 concorreu ao concurso para técnico de educação do então Ministério de Educação e Saúde, apresentando como
tese um trabalho exatamente sobre educação de adultos.

471
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
com os jovens que estão adentrando as salas da EJA? Para tanto, a possibilidade de estabelecer a
socialização dos sujeitos juvenis ao grupo dos adultos e idosos da EJA está se tornando um grande
desafio para todos que estão envolvidos no processo educacional.
Na sociedade contemporânea, os jovens são vistos como um “problema social” e essa visão ne-
gativa sobre a juventude contribui para o esboço de políticas sociais recheadas de estigmas, uma
vez que os jovens são caracterizados como inabilitados para serem plenamente reconhecidos so-
cialmente. Não deixa de ser uma ideia paradoxal, pois se no cenário político brasileiro, esse mesmo
jovem, é reconhecido socialmente pelo direito de voto e passa ser “protagonista” de suas ações,
como que a escola não está conseguindo reconhecê-lo? Por que no cotidiano da EJA, os jovens,
são apontados como “problemas”, tanto no diz respeito a sua relação entre os pares, como com os
professores? E na categoria da indisciplina, porque tantas queixas? Talvez, seja, por essas e outras
questões, que a preocupação com os jovens alunos da EJA venha crescendo cotidianamente e, tam-
bém pela dicotomia das ideias, que de um lado reconhece esse sujeito juvenil e, do outro, nega suas
expectativas.
Carrano e Peregrino (2004), alertam que o pré-requisito central é reconhecer os jovens que estão
chegando às turmas da EJA e, no segundo momento, reconhecer as suas experiências na tentativa
de lidar com esta “nova” categoria de juventudes. A grande questão é que, no campo educacional,
o jovem, refere-se à escola como uma instituição que sempre está pautada numa dinâmica de con-
teúdos, de disciplinas, provas e avaliações, que não oferece uma dimensão maior no processo de
socialização, principalmente na troca de ideias e de produção de conhecimentos.
Neste sentido, Pais (2005), fortalece essa discussão no entendimento de que os jovens não con-
seguem identificar o espaço escolar como interessante, porque eles não se reconhecem numa ins-
tituição onde suas culturas não são realizadas, pela ausência de uma ligação direta entre o jovem e
a escola.
Entrelaçando os argumentos supracitados com as ideias sociológicas de Pierre Bourdieu (1983),
verifica-se em uma de suas análises sobre “juventude”, que a grande questão é de um exercício fren-
te outras formas de se pensar a juventude.

Encontramos coisas muito semelhantes nos ditados e provérbios ou, mais sim-
plesmente nos estereótipos sobre a juventude, ou ainda na filosofia, de Platão e
Alain que designava a cada idade uma paixão específica: à adolescência o amor,
à idade madura a ambição. A representação ideológica da divisão entre jovens e
velhos concede aos mais jovens coisas que fazem com que, em contrapartida, eles
deixem muitas outras coisas aos mais velhos ( p.1).

A reflexão do sociólogo amplia para a necessidade de um exercício frente outras formas de se


pensar a juventude. É sob esta perspectiva do estabelecimento de uma relação compreensiva que
tentamos conhecer os jovens alunos da EJA. Até pela compreensão do conceito de transitoriedade
analisado por Bourdieu sobre a existência de uma nova condição juvenil; isto porque ainda há o
entendimento de que o jovem não consegue produzir um pensamento formado sobre as coisas,
além de não conseguir estabelecer perspectivas para o futuro, pela ausência de maturidade que lhe
permita compreender a seriedade da vida. Esse posicionamento leva a crer que o jovem nunca sabe
de nada, que os conhecimentos adquiridos estão em processo de formação e, que na realidade, ele
só consegue produzir opinião.
O estranhamento a essas e outras questões deterministas evidenciadas pelos adultos chega ao
jovem, como um “aniquilamento”, como se eles fossem incapazes de decidir pela própria vida. Esses
contrapontos, entre erros e acertos, dúvidas e certezas evidenciam que a categoria juventude pre-
cisa ser compreendida como um momento da vida que possui características específicas e não mais

472
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
como um momento transitório, mas que possui importância e peculiaridade própria.

professor e AlUno: UmA relAção de conqUistA?


Atentamos quanto à relação professor-aluno por se tratar de um dos focos que se refere aos jo-
vens alunos da EJA. Acreditar que a escola enquanto uma instituição social pode se conceber sem
essa relação é algo quase que utópico, uma vez que esses dois protagonistas (professor e aluno) da
história do saber, se apresentam coletivamente, onde cada um desempenha uma tarefa importante
ao interagir com o outro. Sendo, portanto, uma relação recíproca; não há relação sem troca, sem
conquistas e sem diálogo.
Para exercer sua real função, é necessário que o professor combine: afetividade, respeito e au-
toridade. Com essa junção será mais fácil estabelecer as normas, não impondo à sua opinião, mas
deixando claro o que espera de seus alunos e, principalmente respeitando a individualidade e a
liberdade de cada um.
De acordo com Freire (1996):

[...] o bom professor é o que consegue, enquanto fala, trazer o aluno até a intimi-
dade do movimento do seu pensamento. Sua aula é assim um desafio e não uma
“cantiga de ninar”. Seus alunos cansam não dormem. Cansam porque acompanham
as idas e vindas de seu pensamento, surpreendem suas pausas, suas dúvidas, suas
incertezas ( p.86).

Freire (1996) é mencionado, por ser um dos maiores autores que verdadeiramente consolida
a relação dialética entre professor e aluno e, também, por tratar da educação como algo de mais
prazeroso na vida dos educadores, como seres que participam ativamente do processo de ensino-
-aprendizagem. Sempre expondo sua prática e, ainda, desafiando professores que amam a profis-
são, comprometidos com a produção do conhecimento e, sobretudo com os que estão preocupa-
dos com o desenvolvimento de seus alunos, no que diz respeito aos conteúdos de ensino.
Dialogar, para os jovens alunos da EJA, significa tratar de assuntos que despertem o interesse
deles. O diálogo é o fator preponderante para atrair a atenção dos jovens; é necessário articular as
conversas informais, os risos, as piadas que percorrem a sala de aula, com os conteúdos abordados.
Esses são os pressupostos essenciais para tornar o cotidiano da sala de aula agradável e prazeroso.
Percebe-se que a falta de comunicação causa um mal estar nos jovens, independente da idade ou
série que eles se encontram, eles têm a necessidade de serem ouvidos e percebidos. Atos de indife-
rença, exclusão e menosprezo afetam a autoestima dos jovens, que não aceitam serem ignorados e,
por isso, resistem e relutam contra o poder disciplinar determinado. De acordo com Dayrell (2007,
p. 1121):

A sala de aula também torna-se um espaço onde é visível a tensão entre o ser
jovem e o ser aluno. Nela ocorre uma complexa trama de relações de alianças e con-
flitos entre alunos e entre estes e os professores, com imposições de normas e estraté-
gias individuais e coletivas de transgressão. Nesse cotidiano, o jovem aluno vivencia
a ambiguidade entre seguir regras escolares e cumprir as demandas exigidas pelos
docentes, orientadas pela visão do “bom aluno”, e, ao mesmo tempo, afirmar a sub-
jetividade juvenil por meio de interações, posturas e valores que orientam a ação do
seu grupo.

No espaço institucional escolar existem comportamentos que são sancionados mediante puni-

473
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
ção específica, caso as transgressões disciplinares sejam burladas. Na medida em que as punições
são, em sua maioria, estipulada de forma arbitrária cabe à escola transformá-las em um exercício
de uma violência simbólica, ou seja, essa violência é exercida pelo uso de símbolos de poder que
não necessitam do recurso da força física, muito menos de armas, escândalos ou gritos, mas que
silenciam protestos desconsiderando todo e qualquer tipo de argumentação entre aos atores desse
processo.
Neste contexto, as regras a serem cumpridas devem ser postuladas por ideais democráticos de
igualdade, de maneira que os jovens consigam perceber que é preciso agir com base no respeito e
nos princípios estabelecidos pelo grupo e não sobre forma de obediência.

pArA finAlizAr
Repensar a história da EJA nos remete compreender a sua identidade, tanto pela característica
de sua diferenciação etária, quanto por sua especificidade tão diversa e excludente. A construção
de novos sujeitos tem trazido para a EJA a modificação de sua metodologia, principalmente no que
se refere às dinâmicas de ensino; o aluno não é mais um receptor, ele passa a ser o sujeito de suas
ações, ele cria e recria seus próprios pensamentos e constrói suas indagações sobre o que aprende
a partir de sua experiência de vida.
Outro aspecto refere-se à condição do jovem e sua relação com o mundo do trabalho. Inicialmen-
te para o jovem da camada popular, oriundo da escola pública, o que vai determinar, em partes, sua
inserção na sociedade é ser um jovem trabalhador, principalmente na comunidade a qual reside;
ter um vínculo trabalhista, com enquadramento formal, modifica a condição do jovem e de sua tra-
jetória de vida, nas possibilidades de vivência juvenil. Dayrell (2007) apresenta claramente como se
estabelece a condição juvenil no Brasil:

A juventude não pode ser caracterizada pela moratória em relação ao trabalho,


como é comum nos países europeus. Ao contrário, para grande parcela de jovens, a
condição juvenil só é vivenciada porque trabalham, garantindo o mínimo de recur-
sos para o lazer, o namoro ou o consumo6 (p. 1109).

Isto significa que, mesmo com todas as dificuldades no entrelaçamento entre as atividades esco-
lares e o cotidiano do trabalho, a priori, o jovem não abandona a escola. Talvez, pelo reconhecimen-
to de esperança para um futuro melhor e pela construção de novas formas de saberes e, também
porque trabalho e escola são projetos que se cruzam.
Em suma, esses e outros problemas que estão engendrados na EJA e que são direcionados aos
jovens, têm sido objeto de grandes reflexões em diversas instâncias. Essa análise permite perceber o
quanto é necessário, políticas públicas voltadas para a EJA, como também para os jovens estudantes
brasileiros.

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lhavam e 40% estavam desempregados, sendo que 76% deles estavam envolvidos, com o mundo do trabalho (Sposito, 2005).

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
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475
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
sAtisfAção e importânciA do cUrso de eletrotécnicA/
proejA-cAmpUs cAmpos-centro, nA percepção
discente7
jorge lUíz clemente gomes | AnA cAbrAl sá de pAiVA

Neste trabalho é apresentada uma pesquisa em que, fazendo uso de uma ferramenta estatística, o
software Sistemas de Análises Estatístico e Genético (SAEG), se buscou ordernar itens pré-definidos
que interferem na análise de satisfação e de importância, com vistas a subsidiar as políticas públicas
de uma instituição federal de ensino. A pesquisa foi realizada no período de outubro/2011 a dezem-
bro/2012, através de questionários e teve como lócus o Instituto Federal Fluminense (IFF). O público
alvo desta pesquisa foram os discentes das turmas do 1º ao 6º período do Curso de Eletrotécnica do
Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade
de Educação de Jovens e Adultos (PROEJA). Após a fase de trabalho de campo, os dados obtidos fo-
ram tabulados e analisados e verificou-se que, considerando a análise dos discentes, os itens “Visitas
Técnicas” e “Estágios” apresentaram uma importância alta e uma satisfação baixa, sendo necessárias
melhorias. Enquanto os itens “Realização Pessoal” e “Realização Profissional” apresentaram impor-
tância e satisfação altas, devendo ser mantidos pela direção escolar a política de fomentação desses
tópicos. A pesquisa também apresentou na análise do item “Localização” um grau de importância
e de satisfação elevados, demonstrando, portanto, através dos dados, que “Localização”, não é um
item definidor, segundo a percepção discente, na avaliação da qualidade do curso.

palavras-chave: PROEJA, DISCENTES, IMPORTÂNCIA, SATISFAÇÃO

1. introdUção
Segundo o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2010), o número
de brasileiros com mais de 15 anos de idade que não sabem ler e nem escrever é de 12,9 milhões.
Isto significa que 9,6% da população do país se encontram em uma condição de analfabeto ou anal-
fabeto funcional. Neste cenário, o número de matrículas em curso do PROEJA em 2010 ficou em
27 milhões segundo dados da Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica – SETEC (BRASIL,
2010), onde o total de investimentos disponibilizados pelo governo federal nessa modalidade de
ensino ficou em 37 milhões de reais.
O Programa de Integração da Educação Profissional ao Ensino Médio na Modalidade de Jovens
e Adultos (PROEJA) traz em seu arcabouço a junção das disciplinas técnicas com as propedêuticas,
assim como afirma a SETEC (2007, p. 12):

Assim, essas experiênciais, em diálogo com os pressupostos referenciais do pro-


grama, indicaram a necessidade de ampliar seus limites, tendo como horizonte a
universalização da educação básica, aliada à formação para o mundo do trabalho,
com acolhimento específico a jovens e adultos com trajetórias escolares descontínu-
as.

Com o advento do Decreto nº. 5840, de 13/07/2006, o PROEJA, agora denominado Programa Na-
cional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educação
7 O presente trabalho foi realizado com apoio do Programa Observatório da Educação, da Coordenação de Aperfeiçoamento-
de Pessoal de Nível Superior – CAPES/Brasil.

476
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
de Jovens e Adultos, pois fim ao limitador teórico que proibia a integração do ensino médio regular
com o ensino médio técnico nessa modalidade e a trouxe para dentro das instituições federais man-
tenedoras de cursos profissionalizantes.
Nessa perspectiva, este artigo objetiva apontar os itens de maior influência, por meio da análise
de questionários aplicados a alunos do curso de Eletrotécnica na modalidade PROEJA, cujas respos-
tas influenciam na avaliação da satisfação e são importantes, na visão dos discentes para a qualidade
do curso no Campus Campos-Centro do IFF.
De forma mais específica, busca-se apresentar um material de suporte técnico-administrativo
para os gestores da rede pública. Assim, no âmbito do objetivo geral, três objetivos específicos são
apontados: a) Identificar o grau de satisfação dos discentes em relação a itens disponibilizados; b)
Avaliar o grau de importância de itens apresentados na visão discente; e c) Avaliar o grau de satisfa-
ção de itens apresentados na visão discente.

1.1 estAtísticAs nA edUcAção de joVens e AdUltos


Segundo Di Pierro (2008) com promulgação da Constituição Federal de 1988, fixa-se através
dos documentos legais e a reafirma como um direito e fator primordial para a construção de uma
plena cidadania, a Educação de Jovens e Adultos (EJA). O Plano Nacional de Educação (PNE) – 2001-
2010 – demonstra a urgência, baseado em dados estatísticos de analfabetismo na erradicação do
mesmo no País (Tabela 1).
Tabela 1 – Analfabetismo no Brasil (Biênio 2000/2010)

Conforme o IBGE/Censo 2010, o maior número de analfabetos localiza-se na Região Nordeste,


onde o percentual se encontra em 52,7%. Ainda, 12,9 milhões de brasileiros com mais de 15 anos de
idade não sabem ler nem escrever; no Nordeste o número de pessoas nessa situação corresponde a
6,8 milhões. Essa região possui uma taxa de analfabetismo (16,9%), maior de que a média nacional,
que é de 8,6%.

477
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
O Censo 2010 constatou que 9,6% da população é analfabeta. Entretanto, a representatividade
desse número é de uma queda de 4 pontos percentuais em relação a 2000. Em todas as regiões caiu
o percentual de pessoas de 15 a 17
anos que não frequentavam a escola.
A Figura 2 mostra o decréscimo
apresentado pelo índice de analfabe-
tismo em um período de 1940 a 2010,
demonstrando que ocorre nesse espa-
ço temporal, uma redução gradativa
nos valores (IBGE, 2010).
A Lei nº 11741, de 16/07/2008 redi-
mensiona, institucionaliza e integra as
ações do PROEJA, considerando a pos-
sibilidade para além de um Decreto,
como afirma Ramos (2010):

Conteúdo e forma
não se dissociam, o
que nos remete a re-
fletir sobre as possibili-
dades e desafios de construir uma proposta curricular de ensino médio que integre
trabalho, ciência e cultura e que possa cumprir, simultaneamente, as finalidades de
garantir aos estudantes a base unitária de formação geral e a preparação para o
exercício de profissões técnicas. (p. 52).

2. reVisão dA literAtUrA
Criado pelo Decreto nº. 5. 478, de 24 de junho de 2005, o Programa de Integração de Educação
Profissional Técnica de Nível Médio ao Ensino Médio na modalidade de jovens surge como conse-
quência das demandas concretas da sociedade, bem como das dificuldades referentes à universali-
zação da Escola Básica.
Desta maneira, uma formação integral, capaz de articular a formação geral à educação técnica,
unindo em um só currículo o Ensino Médio e o Ensino Técnico Profissional, torna-se possível através
do Decreto nº 5.478, de 24 de junho de 2005, que cria o PROEJA:

Art. 1º Fica instituído, no âmbito dos Centros Federais de Educação Tecnológica,


Escolas Técnicas Federais, Escolas Agrotécnicas Federais e Escolas Técnicas Vincula-
das às Universidades Federais, o Programa de Integração da Educação Profissional
ao Ensino Médio na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos – PROEJA.

Como afirma Frigotto et al. (2005) o Decreto nº 5.478/2005, através de seus artigos 3º e 4º, legiti-
ma a união da formação profissional integrada ao ensino médio na modalidade de Educação de Jo-
vens e Adultos e deve ser ofertada como formação inicial e continuada ou como habilitação técnica.
Em 13 de julho de 2006 é promulgado o Decreto 5.840/2006, o qual regulamenta o Programa Na-
cional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na modalidade de Educação
de Jovens e Adultos (PROEJA) , em conformidade e compatibilidade com a Lei 9394 de 1996, e que
oferece as diretrizes legais da Educação Nacional. Conforme afirma Campos (2011):

478
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
Que avança na sua abrangência para além das instituições federais de educação
tecnológica e passa a ser um programa federal, que poderá ser adotado ainda pelos
sistemas de ensino estaduais e municipais, nos níveis fundamental e médio.(p.1)

Com a promulgação da Lei nº 11. 741, de 16 de julho de 2008 alteram-se os dispositivos da Lei nº
9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para
redimensionar, institucionalizar e integrar as ações da educação profissional técnica de nível médio,
da educação de jovens e adultos e da educação profissional e tecnológica (BRASIL, 2008). De acor-
do com Frigotto (2011) a Lei nº 11.741/2008, busca incorporar o Decreto nº 5154/2004, que em seu
texto separou o ensino médio da educação profissional, corrigindo-o no momento que reintroduz
o ensino médio integrado à educação profissional, visando inter-relacionar conhecimento, cultura
e trabalho.

3. metodologiA
O espaço geográfico do estudo limitou-se ao campus da cidade de Campos dos Goytacazes, loca-
lizado na região norte do Estado do Rio de Janeiro.
Nos Campi Campos-Centro, o curso técnico em eletrotécnica na modalidade PROEJA, funciona
em horário noturno (18h: 20min. às 22h: 40min.). O curso tem duração de, em ambos os campi, três
(3) anos, ou seja, seis (6) semestres e apresenta como exigência de requisito para ingresso a obriga-
toriedade de o candidato ter idade mínima de 18 anos e possuir, no mínimo, o Ensino Fundamental
concluído. No momento da pesquisa nos campi, as turmas estavam disponibilizadas em três módu-
los semestrais (1º, 2º e 3º módulos).

3.1. AplicAção do qUestionário


A pesquisa foi realizada com os alunos do curso de Eletrotécnica da modalidade PROEJA no Cam-
pus Campos-Centro do Instituto Federal Fluminense com aplicação de questionários nos módulos
noturnos I, II, III, IV, V e VI.
As turmas, divididas em módulos, receberam das mãos de professores escolhidos de forma alea-
tória, os questionários para que pudessem levá-los para suas residências e respondê-los sem inter-
ferência de docentes, coordenadores ou até mesmos de outros alunos, no momento do preenchi-
mento.

3.2. descrição dA Análise


A análise foi desenvolvida através de coleta de dados do questionário e inserida na planilha de
Excel com os seguintes passos: formulação e análise do problema; planejamento da metodologia;
formulação do modelo para cálculo estatístico no Sistema de Análises Estatístico e Genético (SAEG);
verificação e validação; experimentação; interpretação e análise estatística dos resultados; compa-
ração e identificação das melhores soluções; documentação e apresentação dos resultados. Em fun-
ção dos dados obtidos foram apresentados os itens de maior importância e maior satisfação entre
os alunos do curso de Eletrotécnica.

3.3. UniVerso de coletA de dAdos


Para se construir a fundamentação teórica deste trabalho, o primeiro passo foi à realização de
uma pesquisa que, segundo Tull e Hawkins (1976), objetiva dar embasamento ao pesquisador so-
bre o tema ou problema relativo aos questionamentos levantados. Busca-se, desta forma, definir os
itens a serem avaliados e realiza-se um levantamento através de questionário aberto (Apêndice),

479
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
respondidos por discentes do curso de eletrotécnica na modalidade PROEJA. As variáveis definidas
são expostas no quadro abaixo com suas respectivas definições:
Quadro 1 – Definição das variáveis constantes da pesquisa Fonte: Elaborada pelo autor, 2012.

No Campus Campos-Centro a distribuição dos questionários (71 no total) e o recolhimento dos


mesmos nas turmas, ocorreram nos meses de abril e maio (1º semestre) de 2012, constituído por 20
itens de perguntas referentes a duas vertentes: o Grau de Importância dos tópicos em relação à ava-
liação da qualidade do curso para os discentes, e o Grau de Satisfação dos discentes com os tópicos
analisados. Na avaliação para Importância foram listadas as seguintes opções:
[1] Nada Importante;
[2] Pouco Importante;
[3] Importância Média;
[4] Importante;
[5] Muito Importante, e

480
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
[N] Não Sei/ Prefiro Não Opinar.
Enquanto que para Satisfação foram avaliadas as seguintes opções:
[1] Totalmente Insatisfeito;
[2] Parcialmente Insatisfeito;
[3] Nem Satisfeito/Nem Insatisfeito;
[4] Parcialmente Satisfeito;
[5] Totalmente Satisfeito e
[N] Não Sei/Prefiro Não Opinar.
Posteriormente, os resultados são apresentados estatisticamente de forma descritiva e é realiza-
da a comparação entre a satisfação e a importância de cada item. Para tal análise, segundo Matsuku-
ma (2007, p. 89):

Será usado o método de importância vs satisfação, que consiste em plotar os da-


dos de satisfação e importância em um gráfico com quatro (4) quadrantes para se
identificar áreas de melhoria pela comparação do índice de satisfação e a importân-
cia dos atributos.

A satisfação e a importância serão consideradas acima da média quando localizadas no quadran-


te superior direito, para os itens que encontrarem nesta região, deve-se MANTER a política de gestão
que os norteiam. Para os itens que se localizarem no quadrante inferior direito, deve ser providencia-
das políticas de gestão para MELHORAR os mesmos, pois, estão com a importância acima da média e
a satisfação abaixo da média. Mas, se os itens ficarem no quadrante superior esquerdo, será conside-
rado pertencente a uma faixa de EXCEDENTE, significando que a importância está abaixo da média
e a satisfação acima da média, não precisando, no momento, de um prioridade por parte da gestão.
Por fim, os itens posicionados no quadrante inferior esquerdo são aqueles que apresentam, tanto a
satisfação como a importância, valores abaixo da média, sugerindo ATENÇÃO especial nesses itens.
Conforme demonstra a Figura 5:

Figura 5 – Gráfico de dispersão.


Fonte: Elaborada pelo autor, 2012.
A representação do gráfico simples de dispersão se baseia em 2 eixos principais, vertical e hori-

481
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
zontal, onde se encontram as respectivas escalas de valores e suas variáveis correspondentes.

4. estUdo de cAso no cAmpUs cAmpo-centro


Com este estudo buscou-se identificar, por meio da percepção do discente, os itens que influen-
ciam, tanto para mais quanto para menos, na avaliação do discente quando se tratar da qualidade
do curso.

4.1. gráficos de dispersão (cAmpUs cAmpos-centro)


Na Figura 6, observa-se a disposição dos itens em relação aos tópicos atenção, melhorar, manter
e excedente quando os mesmos foram avaliados pelos discentes do Campus Campos-Centro.

Figura 6 – Quadrantes no gráfico de dispersão.


Fonte: Elaborada pelo autor, 2012.
Observa-se que, em uma análise geral, os itens apresentaram um posicionamento no quadrante
“MANTER”, em uma escala de 1 a 5, todos os itens ficaram acima do valor de média (3).
Na Figura 7, nota-se que alguns itens apresentam satisfação alta e importância alta.
4,4
Realização pessoal

Localização Realização profissional

Pontualidade dos professores


Infra-estrutura

Oportunidade de emprego
Corpo docente
Novas tecnologias
4,0
Didática
Conteúdo ministrado
Satisfação

Conciliar curso e emprego Horário

Coordenação do curso

3,6

Visitas técnicas
Estágios

3,2
3,9 4,1 4,3 4,5 4,7
Importância

Figura 7 – Dispersão com posição de cada item em relação às médias de satisfação e importância
Fonte: Elaborada pelo autor, 2012.

482
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
Os itens Realização pessoal e Realização profissional apresentaram satisfação e importância altas,
em situação que inspira atenção estão os itens Visitas técnicas e Estágios, ambos com índices de
satisfação e importância muito próximos do quadrante “MELHORAR”. Outro ponto a destacar é a
posição do item Localização, com índices de satisfação e importância elevados.

4.2. pAnorAmA dAs VAriáVeis significAtiVAs concernentes Ao grAU


de importânciA
Na Figura 8 expõe-se a sequência das variáveis considerando a importância das mesmas segundo
a percepção dos alunos do Campus Campos-Centro.
Grau de Importância (médias e erros padrão)

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Figura 8 – Percepção dos discentes em relação ao Grau de Importância-Campus Campos-Centro.


Fonte: Elaborada pelo autor, 2012.
Em relação ao grau de importância, como demonstra a Figura 8, o item de melhor avaliação é
conteúdo ministrado, seguido de oportunidade de emprego e logo depois corpo docente. Na sequ-
ência, com uma avaliação de importância baixa em relação aos demais itens, estão: didática, conci-
liar curso e emprego, e localização.

4.3. pAnorAmA dAs VAriáVeis significAtiVAs concernentes Ao grAU


de sAtisfAção
Na Figura 9 expõem-se a sequência das variáveis considerando a satisfação dos discentes do
Campus Campos-Centro.

483
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
Grau de Satisfação (médias e erros padrão)
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Figura 9 – Percepção dos discentes em relação ao Grau de Satisfação - Campus Campos-Centro


Fonte: Elaborada pelo autor, 2012.
As variáveis melhor avaliadas em relação à satisfação na percepção dos discentes foram: realiza-
ção pessoal, realização profissional e localização. As que demonstraram pior avaliação na percepção
discente foram: coordenação do curso, visitas técnicas e estágios.

5. considerAções finAis
Em relação aos dados obtidos após a pesquisa no campus Campos-Centro, conclui-se que, de
forma pontual, os itens mais bem avaliados pelos discentes, em relação à importância e a satisfação,
foram “Realização Pessoal” e “Realização Profissional”. Todos os itens analisados ficaram posiciona-
dos no quadrante “MANTER”. Considerando esses resultados, sugere-se aos gestores uma manuten-
ção das políticas públicas que visam a continuidade dos resultados da avaliação apresentados pelos
discentes.
Uma segunda análise reflete as “Visitas Técnicas” e os “Estágios” como os itens de pior avaliação.
Apesar de estarem posicionados no quadrante “MANTER”, na prática há necessidade de um olhar
diferenciado por parte da equipe gestora no momento de planejar suas ações, priorizando a ne-
cessidade de se elevar a satisfação dos discentes em pesquisas futuras com referências às políticas
educacionais mantenedoras desses itens.
Na análise do item “Localização” identificou-se um grau de importância e de satisfação elevados,
confirmando-se, portanto, através dos dados, que “Localização”, não é um item definidor na avalia-
ção da qualidade do curso, pois o prédio se encontra em uma região central e com várias vias de
acesso, facilitando o trânsito de veículos.
Conforme os resultados apresentados nesse trabalho foram possíveis à identificação de alguns
aspectos que poderão subsidiar novas pesquisas, em que se destacam: a) Fazer uma análise global
envolvendo os outros cursos nesta mesma modalidade; b) Realizar pesquisa semelhante junto aos

484
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
docentes do curso; c) Realizar uma comparação dos dados obtidos pelas visões dos discentes e do-
centes; e d) Fazer a comparação dos resultados obtidos entre os softwares estatísticos SAEG e SPSS
(Statistical Package for the Social Sciences).

referênciAs
BRASIL. Decreto n° 5.840. 13 de julho 2006. Institui, no âmbito federal, o Programa Nacional de In-
tegração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e
Adultos – PROEJA, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em:
11 ago. 2012.
_______. Decreto nº 5.478. 24 de junho 2005. Institui, no âmbito das instituições federais de educa-
ção tecnológica, o Programa de Integração da Educação Profissional ao Ensino Médio na Modalidade
de Educação de Jovens e Adultos – PROEJA. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em:
11 nov. 2012.
_______. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica. Sinopse das
ações do ministério da educação. Brasília: DF Ministério da Educação, 2010. Disponível em: <http://
portal.mec.gov.br/index. php>. Acesso em: 16 out. 2012.
_______. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica. Ações PROEJA
2007. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/index.php> . Acesso em: 10 out. 2012.
______. Lei nº 9.394, de 20/12/1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário
Oficial da União. Brasília: Gráfica do Senado, ano CXXXIV, n. 248, 23/12/96, p. 27833-27841.
______. PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. Lei 11.741, de 16 de julho de 2008. Altera dispositivos da Lei
no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para
redimensionar, institucionalizar e integrar as ações da educação profissional técnica de nível médio, da
educação de jovens e adultos e da educação profissional e tecnológica.
DI PIERRO, M. C. Educação de Jovens e Adultos na América Latina e Caribe: trajetória recente. Educa-
ção e Sociedade, v. 38, n. 134, p. 367-391, maio/ago. 2008.
FRIGOTTO, G.; CIAVATTA, M.; RAMOS, M. A gênese do Decreto n. 5.154/2004: um debate no contexto
controverso da democracia restrita. In: ______. Ensino médio integrado: concepção e contradições. São
Paulo: Cortez, 2005. Revista Educ. &Soc, Campinas, v. 26, n. 92, out. 2005. Disponível em: http://dx.doi.or
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MATSUKUMA, C. M. O; HERNANDEZ, J. M. C. Escalas e métodos de análise em pesquisa de satisfação
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TULL, D. S.; HAWKINS, D. I. Marketing Research, Meaning, Measurement and Method. London: Mac-
milian Pubhishing, 1976.

485
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
Um olhAr geográfico sobre A feirA de trAdições
nordestinAs: o proejA no colégio pedro ii / mec
ArnAldo bArbosA de melo filho

O Colégio Pedro II, fundado em dois de dezembro de 1837, é um órgão vinculado ao MEC, cuja
missão é ministrar ensino público e gratuito na Educação Básica. Com a implantação do Ensino Mé-
dio Integrado na modalidade Jovens e Adultos a instituição está vivendo um momento de inquie-
tação, já que o currículo tradicional não atende ao novo grupo de discentes formado por jovens e
adultos trabalhadores oriundos das classes populares e com um histórico de abandono do espaço
escolar ao longo da sua trajetória de vida. Portanto é necessário construir um currículo vivo e vivido
com uma organização dialógica, com base na práxis-teoria-práxis, num processo indutivo que torna
nossos educandos sujeitos do processo ensino-aprendizagem. O presente trabalho é fruto dessa
inquietação, a necessidade de não reproduzir no Proeja o currículo do Ensino Médio Regular. Os
alunos do PROEJA elaboraram durante as aulas de Geografia o material para ser utilizado no traba-
lho de campo, que foi planejado para o Centro Municipal Luiz Gonzaga de Tradições Nordestinas,
atendendo a proposta de introdução à pesquisa na modalidade da Educação de Jovens e Adultos.
O material coletado no campo promoveu a análise e a construção de gráficos. Os dados coletados,
o estudo da realidade social e a interpretação dos gráficos realizada pelos discentes indicaram o
perfil do trabalhador do Centro Municipal Luiz Gonzaga de Tradições Nordestinas, marcado pela
luta por melhores condições de vida e valorização do trabalho e sua identidade cultural. A pesquisa
na modalidade de ensino PROEJA abre possibilidades para uma pratica educativa interdisciplinar
e contextualizada em sintonia com o projeto politico pedagógico da instituição, a ação docente e
o espaço vivido pelos alunos resgatando o compromisso com uma educação transformadora e a
construção de currículo baseado na realidade social e no cotidiano escolar.

palavras-chave: Espaço geográfico, Identidade cultural, Trabalho, População

peqUeno histórico do colégio pedro ii:


A história do Colégio Pedro II confunde-se com a própria história da Educação brasileira, espe-
cialmente no que diz respeito ao ensino público. Suas raízes remontam ao século XVIII. O Professor
Aluísio Jorge do Rio Barbosa, em sua “Nótula Histórica” sobre o Colégio Pedro II, relata: “Em 1739, há
250 anos, fundava-se o Colégio dos Órfãos de São Pedro por inspiração de D. Antonio de Guadalupe,
4º Bispo do Rio de Janeiro. Em 1766, ganhou novas instalações na Capela de São Joaquim, aproxi-
madamente no local onde se encontra o Colégio Pedro II – Unidade Centro. Transformou-se, então,
no Seminário de São Joaquim, dando continuidade à atividade moral, religiosa e intelectual ante-
riormente iniciada. Por ato de D. João VI, foi arbitrariamente extinto, em 1818. O Príncipe Regente, o
futuro D. Pedro II, em 1821, o restabeleceu. Dez anos depois, em 1831, foi remodelado e passou a ser
administrado pelo Governo Imperial.
Em 1837, Bernardo Pereira de Vasconcelos, grande ministro do Império, apresentou à assinatura
do Regente Pedro de Araújo Lima o decreto que reorganizava completamente o Seminário de São
Joaquim que recebeu o nome de COLÉGIO PEDRO II, em homenagem ao Imperador-menino, no dia
de seu aniversário – 2 de dezembro.”
Inaugurado com a presença do Imperador, das Princesas, suas irmãs, de todo o Ministério, do
Regente e de outros dignitários do Império, o Colégio foi organizado segundo os padrões educacio-
nais europeus, espelhando-se do Collège Henri IV, de

486
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
Paris. O Imperial Colégio Pedro II foi criado para servir de modelo às “aulas avulsas” e a outros
estabelecimentos de ensino do Município da Corte e das Províncias.
O Colégio foi dividido, em 1857, em duas seções: Externato e Internato. A criação do Internato
teve como objetivo ampliar o número de vagas do Colégio, contribuindo para a necessária formação
cultural dos representantes das elites regionais. E acrescenta o Professor Aluísio Jorge do Rio Barbo-
sa: “Em 1858, o Internato começou a funcionar na Chácara do Engenho Velho, na rua São Francisco
Xavier, próximo ao Largo da Segunda-Feira, na Tijuca. De lá, em 1888, transferiu-se para o Campo
de São Cristóvão, onde se encontram, hoje, as Modernas instalações da Direção-Geral e as Unidades
Escolares de São Cristóvão. As antigas instalações de Internato foram destruídas por um incêndio
em 1961.
Com a Proclamação da República, em 1889, o Colégio teve seu nome mudado. Passou a deno-
minar-se Instituto Nacional de Instrução Secundária, e, posteriormente, Ginásio Nacional. Em 1911,
voltou a ter seu glorioso nome de origem - COLÉGIO PEDRO II.”

introdUção
O Colégio Pedro II, fundado em 2 de dezembro de 1837, localizado no Rio de Janeiro, constitui-
-se hoje é um órgão vinculado ao Ministério da Educação, cuja missão é ministrar ensino público
e gratuito na educação infantil, no ensino fundamental anos iniciais, no ensino fundamental anos
finais, no ensino médio regular, no ensino médio integrado regular, no ensino médio integrado na
modalidade jovens e adultos(Proeja) e recentemente com a pós-graduação orientando programas
de mestrado profissional em educação.
Ao longo do tempo, contudo, o Colégio Pedro II sempre ocupou lugar de destaque no cenário
educacional brasileiro.
A Lei 9394/96 de Diretrizes e Bases da Educação ao ser promulgada não encontrou o Colégio Pe-
dro II estagnado ou vivendo da sua importância na história da educação brasileira. Muitas das suas
inovações, há mais de uma década, já estavam incorporadas à Estrutura Curricular e à dinâmica do
processo ensino aprendizagem, como resultantes do amplo debate realizado pelos seus departa-
mentos pedagógicos.
Ao longo das últimas duas décadas estão sendo realizadas as adaptações curriculares no ensino
e na aprendizagem através dos colegiados realizados pelos diferentes departamentos que são os
responsáveis pela sistematização da discussão política e pedagógica com ampla participação dos
docentes. Essas mudanças são percebidas, em nível de organização de conteúdos relacionados com
as transformações do mundo da técnica, da ciência da informação e de orientações teóricas e me-
todológicas, que permitem identificar essas adaptações e de outros indicadores acadêmicos que
continuam influenciando na construção da Geografia Escolar da instituição.
Com a incorporação do Ensino Médio Integrado na modalidade ensino de jovens e adultos (Pro-
eja) as mudanças no mundo do trabalho e a identidade cultural ganharam um destaque no planeja-
mento docente e na reconstrução coletiva do currículo, em função das lacunas relativas à explicita-
ção de diretrizes e princípios que devem nortear o trabalho pedagógico com alunos trabalhadores.
A análise histórica de construção de um currículo revela os caminhos seguidos por um grupo so-
cial ou uma instituição na formação ou intenção formadora de seus sujeitos/atores no campo social.
Conhecendo os caminhos percorridos pelas instituições podemos traçar o perfil esperado por elas
e suas pretensões de intervenção na sociedade. Nessa linha, delineia-se a importância de conhe-
cermos as tensões geradas nessa passagem de tempo, dentro das Unidades Escolares do Colégio
Pedro II, precisamente no ensino de Geografia escolar numa instituição da rede de ensino federal,
objetivando que essa análise possa contribuir para uma generalização no trato com as situações de
conflito que estão presentes no cotidiano. A ação docente na sala de aula é um elemento de análise

487
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
para se pensar o currículo. E utilizando as palavras de Arroio para ampliar e aprofundar o debate, “é
dever dos docentes abrir os currículos para enriquecê-los com novos conhecimentos e garantir o
seu próprio direito e dos alunos à rica, atualizada e diversa produção de conhecimentos e de leituras
e significados.” (Arroyo, 2011, p.37).
Com a implantação do Ensino Médio Integrado na modalidade Jovens e adultos a instituição
está vivendo um momento de inquietação, já que o currículo tradicional não atende ao novo grupo
de discentes formado por jovens e adultos trabalhadores oriundos das casses populares e com um
histórico de abandono do espaço escolar ao longo da sua trajetória de vida. Penso que é necessário
garantir o direito à escolarização de jovens e adultos e de tomar como função social da instituição a
garantia desse direito. Portanto é necessário construir um currículo vivo e vivido com uma organiza-
ção dialógica, com base na práxis-teoria-práxis, num processo indutivo que torna nossos educandos
sujeitos do processo ensino-aprendizagem.
Acredito que é necessário investigar o saber geográfico pré-escolar do aluno trabalhador, com
vistas a seu aproveitamento pelo ensino sistemático da Geografia destacando o caráter político des-
sa percepção geográfica extra-escolar, o que revela minha posição política de rejeição pelo ensino
tradicional da Geografia escolar desvinculado da realidade social.
Para Arroyo (2011) estamos vivendo uma retomada conservadora que reafirma a missão docente
de transmitir conteúdos sem significados, tornando a Geografia escolar distante da realidade social,
além de desvalorizar ou ignorar o saber do aluno trabalhador. Considerando que a prática docente
no chão da sala deve ser alvo do debate na política do currículo, uma vez que revela todo o processo
de construção de uma educação baseada na problematização, além de deixar evidente os conflitos
que se materializam na estrutura de poder formada pelos diferentes sistemas de ensino. No caso
do Sistema de Ensino Federal percebemos contradições e ambiguidades que se materializam na
implantação de um novo projeto de EJA, que na sua essência mostra a necessidade de um amplo
debate sobre um currículo que atenda os reais anseios e desejos do aluno trabalhador.
No caso do Colégio Pedro II o Proeja foi implantado no ano de 2006 atendendo a novas diretri-
zes estabelecidas pelo Ministério da Educação que equiparou a instituição aos Institutos Federais.
Vale ressaltar que a incorporação dessa modalidade não foi discutida amplamente com os depar-
tamentos pedagógicos e principalmente com os docentes que seriam os responsáveis diretos pela
implantação do projeto nos seus diferentes campus espalhados pelos diferentes bairros da cidade
do Rio de Janeiro.
A gestão colegiada propicia a construção de um ambiente organizacional que incentiva os do-
centes a agirem pedagogicamente criando alternativas inovadoras, visando à qualidade da educa-
ção básica melhorando o atendimento na modalidade jovens e adultos, além de criar um espaço
de discussão e pactuação para elaborar uma agenda de trabalho que articule o Projeto Político Pe-
dagógico da instituição e as diretrizes que norteiam uma educação problematizadora, uma apren-
dizagem contextualizada e significativa. Essa compreensão permite que a autonomia docente se
materialize na prática curricular, a seleção de conteúdos a partir de eixos temáticos e de elementos
do cotidiano dos discentes que possam trazer uma Geografia escolar articulada com uma educação
emancipatória.
O presente trabalho é fruto dessa inquietação, a necessidade de não reproduzir no Proeja o cur-
rículo do Ensino Médio Regular. Fazer da prática pedagógica uma ação política na defesa do direito
da escolarização de jovens e adultos com qualidade social, garantindo a permanência e a articula-
ção dos conteúdos com a realidade social. O centenário de Luiz Gonzaga abriu um caminho para
sistematizar os conteúdos da Geografia Escolar com a introdução à pesquisa. Tornar o aluno (a) pro-
tagonista do processo ensino-aprendizagem, relacionando o cotidiano da sala de aula com outras
linguagens: filme, música e poesia. Delimitar o espaço geográfico da feira de tradições nordestinas
como campo de pesquisa, o trabalho de campo como uma ferramenta de trabalho que permite

488
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
estabelecer novas conexões entre o conteúdo teórico e a prática são indicadores de um currículo
comprometido com a autonomia docente e pela luta para se construir uma educação geográfica
comprometida com prática da liberdade e da emancipação política.

desenVolVimento:
A Feira de tradições nordestinas é um evento, ou melhor dizendo, uma manifestação da cultura
brasileira com sua riqueza e diversidade. Movimenta recursos materiais e humanos que estão pre-
sentes no cotidiano da cidade do Rio de Janeiro.
Por ser um tema atual e mobilizador, é fácil conseguir dados e informações que podem ser apro-
veitados por professores e alunos como fontes de pesquisa e projetos que ajudam a ampliar o re-
pertório dos estudantes por meio de atividades que contam, de saída, com o envolvimento e o
interesse dos alunos do Proeja pelo centenário de Luiz Gonzaga.
A realização do trabalho de campo é uma boa oportunidade para envolver os alunos num traba-
lho que abrange várias áreas e disciplinas do currículo, garantindo a interdisciplinaridade e a contex-
tualização com um enfoque diferenciado e atual.
As competências e habilidades a serem desenvolvidas pelo ensino de Geografia, tal como carac-
terizadas pelos PCNs, podem ser sintetizadas como a capacidade de “ler” o espaço geográfico. Essa
síntese envolve três elementos: a linguagem da geografia, o conceito de espaço geográfico, socie-
dade, cultura e natureza. (BRASIL/MEC, 1998)
O trabalho desenvolvido com os alunos do Projeto de educação de jovens e adultos (PROEJA)
do Colégio Pedro II foi norteado pelos seguintes objetivos através do trabalho de campo realizado:
Identificar e comparar as diferentes formas de regionalização do território brasileiro (Complexos
Regionais e as Regiões do IBGE); Identificar os elementos físicos, sociais, culturais, econômicos e
políticos que conferem identidade às regiões brasileiras e identificar as principais concentrações
populacionais no território brasileiro, associando a distribuição populacional aos ciclos econômicos
e à presença de vias de transportes. E por fim identificar as principais características étnico-culturais
da população brasileira, relacionando-as às matrizes de referência étnica e cultural.
Para atingir os objetivos propostos na pesquisa foram planejadas atividades a fim de desenvolver
as seguintes habilidades e competências: Leitura de diferentes gêneros de texto; pesquisa e formu-
lação de conceitos; raciocínio lógico, problematização e resolução de problemas e formulação de
conceitos, organização de dados. (BRASIL/MEC, 1998).

metodologiA:
Os alunos do Proeja/Ensino Médio do Colégio Pedro II Campus Engenho Novo II elaboraram du-
rante as aulas de Geografia um questionário para ser utilizado no Centro Municipal Luiz Gonzaga
de Tradições Nordestinas, conhecido como feira de São Cristovão, no Rio de Janeiro. Para a elabo-
ração do questionário e para o planejamento do trabalho de campo foram realizadas as atividades
de identificação e localização dos estados nordestinos no mapa e reconhecimento das bandeiras e
informações básicas de cada estado da região nordeste, no contexto do estudo da divisão regional
do Brasil e suas disparidades naturais, econômicas, históricas e sociais.
No dia 24 de setembro de 2013 foram realizadas 28 entrevistas com pessoas que trabalham no
Centro Municipal Luiz Gonzaga de Tradições Nordestinas, sendo 22 homens e 6 mulheres. As en-
trevistas foram realizadas pelos alunos das três turmas do PROEJA/ensino médio integrado, sobre a
orientação do Professor regente.
Dentro do contexto da comemoração do centenário de Luiz Gonzaga e da necessidade de imer-

489
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
são na cultura nordestina, no dia 12 de setembro os alunos foram ao cinema (do shopping Iguatemi,
localizado no bairro de Vila Isabel) assistir ao filme “Gonzaga, de pai pra filho.”.

resUltAdos:
Com base nas informações obtidas nas entrevistas realizadas pelos alunos foi feito um levanta-
mento de dados, tais como relações de porcentagem e organização em tabelas e/ou gráficos apre-
sentados abaixo:

considerAções finAis:
Os dados coletados indicaram o perfil do trabalhador do Centro Municipal Luiz Gonzaga de Tra-
dições Nordestinas, marcado pela luta por melhores condições de vida e valorização do trabalho e

490
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
sua identidade cultural.
O trabalho foi apresentado pelos alunos e pelo professor Arnaldo de Melo na Feira da Cultura
realizada nos dias 18 e 19 de Dezembro de 2013 no campus para toda a comunidade escolar.
A experiência com a introdução da pesquisa no Proeja provocou uma inquietação nos alunos so-
bre o processo de migração interna, a obra do Luiz Gonzaga, a luta por melhores condições de vida
e a sua identidade cultural.
A pesquisa na modalidade de ensino PROEJA abre possibilidades para uma pratica educativa
interdisciplinar e contextualizada em sintonia com o projeto politico pedagógico da instituição, a
ação docente e o espaço vivido pelos alunos resgatando o compromisso com uma educação trans-
formadora.

bibliogrAfiA:

SANTOS, Milton. Por uma Geografia Nova. São Paulo: Hucitec, 1981.
OLIVEIRA, Ariovaldo Umbelino de. Para onde vai o ensino da Geografia? São Paulo: Contexto, 1995.
RESENDE, Márcia M. Spyer. A Geografia do Aluno Trabalhador. São Paulo: Loyola, 1986.
BRASIL, Ministério da Educação. Parâmetros Curriculares Nacionais. Geografia. Brasília: Secretaria
Nacional de Educação Básica, 1998.
BRASIL, Ministério da Educação. Projeto Político Pedagógico do Colégio Pedro II: MEC/SEB/Colégio
Pedro II, 2000.
ARROYO, Miguel. Currículo, territórios em disputa. 2. ed. Petrópolis:
Vozes, 2011.
SERRA, Enio. Educação Geográfica de jovens e adultos trabalhadores:
Concepções, políticas e propostas curriculares. Tese (Doutorado em
Educação). Niterói: Universidade Federal Fluminense, 2008.

491
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
Um olhAr sobre o cotidiAno de Um centro de estUdos
sUpletiVos nA cidAde do rio de jAneiro: o qUe é
qUAlidAde nA edUcAção de joVens e AdUltos?
lUciAnA bAndeirA bArcelos

O presente trabalho é um recorte de minha dissertação de Mestrado, que objetivou — refletindo


sobre concepções de educação de jovens e adultos (EJA) vigentes e analisando práticas diversifica-
das de atendimento a esse público, desenvolvidas em um Centro de Estudos Supletivos (CES), ex-
pressão de política pública estadual existente há quase 40 anos — avaliar qualidade de ensino nessa
modalidade, em instituição escolar na cidade do Rio de Janeiro, tomada como estudo de caso. A pes-
quisa, de caráter quantiqualitativo, buscou formular traduções dos sentidos de qualidade, conforme
concebidos por sujeitos alunos, professores e gestores. Qualidade foi assumida teoricamente com
sentido quantitativo — referente ao atendimento à demanda por vagas e aumento de certificação;
e qualitativo — verificando como práticas de atendimento eram compreendidas e apreendidas por
professores e alunos, e como recursos e dispositivos escolares se punham a serviço do atendimento.
Considerando a diversidade da população demandante de EJA, a oferta da modalidade deve in-
corporar flexibilidade ao currículo, aos espaços e tempos escolares, permitindo percursos variados,
mais adequados às realidades dos participantes. Nesse contexto, o CES trava embates em seu coti-
diano escolar, pela permanência de movimentos de superação, de reinvenção da escola e de busca
de identidade, reconhecida e valorizada como política pública adequada a necessidades presentes
de jovens e adultos, sujeitos de direito à educação. O entrelaçamento observado no fazer desse CES
estudado pode ter ampliado os resultados e a certificação de alunos, constituindo um indicativo de
que o CES pode, também, ser um espaço de possibilidades ainda não desenvolvidas ou subutiliza-
das, à medida que atenda necessidades e interesses dos sujeitos.

palavras-chave: EJA, CES, Qualidade na EJA

1-introdUção
Diante das mudanças decorrentes do processo de redemocratização do país, que se refletiram na
legislação nacional de um modo geral e na legislação específica da EJA, a partir do reconhecimento
do direito de todos à educação, antes negado a jovens e adultos, torna-se necessário indagar se
a concepção de Estado democrático, em que a participação popular é considerada essencial, tem
de fato se efetivado nos diferentes espaços de experimentação da democracia, em especial nos
espaços escolares em que as ofertas de atendimento a sujeitos jovens e adultos se desenvolvem,
considerando-se as especificidades dessa clientela e as diversas possibilidades daí advindas.
Nesse contexto, o exercício do controle social pela AAE no CEJA, poderia representar, para sujeitos
jovens e adultos, a perspectiva de um novo espaço de formação política e cidadã, considerando-se
que o público envolvido, com diversos saberes construídos ao longo da vida, pode representar um
diferencial na busca pela qualidade da gestão pública escolar e consequentemente, da qualidade de
ensino. Peroni, referindo-se aos diversos conselhos instaurados no país, aponta que esses espaços
“tem papel importante para a construção da democracia no país, assim como podem ser uma forma
de aprendizado da participação, das escolhas coletivas e das consequências destas escolhas”. (2008a,
p.191).
A relevância do estudo proposto pode ser explicada pelo entendimento do controle social como
prática de cidadania, para além de ações fiscalizatórias e de legitimação das ações da equipe gesto-

492
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
ra, constituindo-se espaço de formação política e cidadã, implicando reconhecimento de direitos,
respeito às especificidades dos sujeitos da EJA, e efetiva participação, preceitos legalmente estabe-
lecidos, mas pouco observados no país.
A relevância de minha pesquisa, ao investigar a atuação da AAE, explica-se também pela neces-
sidade de se discutir o controle social a partir da redefinição do papel do Estado, com o enfraqueci-
mento dos limites Estado-sociedade, que possibilitaram a inversão do sentido original desse concei-
to, definido no campo da Sociologia como controle exercido pelo Estado sobre a sociedade, para um
controle exercido pela sociedade sobre as ações do Estado.
Neste cenário, cabe destacar a situação singular do Brasil, em que o avanço da democracia, após
anos de ditadura militar, sofreu os impactos das estratégias do capital para superação de sua crise,
com o “neoliberalismo, a globalização, a reestuturação produtiva, que já estavam em curso no resto
do mundo e vinham sem sentido contrário à esse movimento”. (PERONI, 2008a, p.195). Essas estra-
tégias viriam, de certa maneira, a direcionar as políticas então em curso, impactando diretamente
na formulação e atuação dos conselhos e similares, alterando seus objetivos e formulações e muitas
vezes reduzindo seu papel ao de meros executores técnicos.
O trabalho em referência, intenciona apresentar algumas reflexões nascidas nas discussões ini-
ciais de um projeto de doutorado em curso, que tem por objeto o controle social do financiamento,
exercido pelas Associações de Apoio à Escola (AAE), existentes em Centros de Estudos de Jovens e
Adultos (CEJA) — unidades escolares que atendem a EJA nos níveis fundamental (EF), anos finais e
médio (EM), por meio de ensino semipresencial, por módulos, e preveem avanços sequenciados de
módulos, sem caráter de seriação — na região metropolitana da cidade do Rio de Janeiro.
Trata-se de um estudo de casos, cujo objetivo é verificar se a participação política dos sujeitos,
nesses espaços, contribui para a melhoria da gestão pública escolar. O universo da pesquisa se cons-
titui nas AAE dos CEJA da região metropolitana do estado do Rio de Janeiro dos quais serão selecio-
nados seis para realizar os estudos de casos, utilizando como critério inicial de seleção, os dados do
IBGE referentes à concentração populacional potencial de EJA para cada município e o número de
escolas que atendem à EJA na região.
Entendendo ser a escola pública brasileira um espaço privilegiado de formação cidadã, de expe-
rimentação da democracia, conforme destacado na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional,
Lei n.9394/96, e considerando o controle social como exercício de cidadania, proponho refletir sobre
a contribuição que as AAE existentes nos CEJA e destinadas à efetivação desse direito — compreen-
didas como espaços possíveis para experimentação da democracia, ao envolverem a comunidade
escolar na gestão da escola e oportunizarem meios para que a comunidade seja/faça parte do co-
tidiano dessa escola — podem oferecer ao processo de democratização do país, na efetivação de
princípios democráticos e no desenvolvimento da consciência política dos estudantes. Nas palavras
de Freire (2009, p.1), “a escola que viabiliza a cidadania de quem está nela e de quem vem a ela”.

2. sitUAndo o horizonte de Análise: A descentrAlizAção de recUr-


sos e o controle sociAl
O processo de descentralização de recursos financeiros para a educação iniciou-se no Brasil como
resultado de diretrizes neoliberais, ditadas por organismos internacionais, que alegavam a neces-
sidade de modernizar a gestão pública como forma de superar o déficit econômico e retomar o
crescimento. Como consequência, redefine-se papel do Estado — apontado como responsável pela
crise — assumindo-se como parâmetro o mercado, delimitando-se suas funções, dividindo respon-
sabilidades e descentralizando serviços, a fim de otimizar recursos.
Na contramão desse movimento, o país vivia a retomada do processo de democratização, e a
sociedade dava os primeiros passos para dialogar com o Estado. Conforme destaca Peroni, “a socie-

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
dade queria outra relação com o Estado, com controle social, transparência, participação do público,
inclusive querendo definir o que queria em termos de direitos” (2008b,p.112).
Mas, estavámos em pleno movimento de crise do capitalismo, em que os “direitos sociais eram
minimizados e a democracia criticada” (PERONI, 2013, p.245), e as estratégias utilizadas para enfren-
tar essa crise redesenhariam o papel do Estado e contribuíriam para o quadro que temos hoje, em
que “apesar de termos avançado na materialização de direitos, temos a dificuldade de implementá-
-los”. (PERONI, 2013, p. 245).
A autora aponta ainda que parte dessa dificuldade advém da “ofensiva neoliberal, mas também
porque a nossa cultura democrática é ainda muito embrionária, o que facilita o consenso em torno
da lógica de mercado e de produto em detrimento da lógica democrática” (PERONI, 2013, p.245).
Parafraseando a autora, vivemos em um período democrático em que parece ter se naturalizado o
consenso acerca de não ser possível a universalização de direitos sociais, e que elegeu como parâ-
metro de qualidade o mercado.
Tambem facilita esse “falso consenso”, a apropriação, por parte de grupos conservadores, de con-
ceitos utilizados por grupos progressistas e movimentos populares, ressignificando seus sentidos e
significados, descaracterizando-os do que epistemologicamente sugeriam.
Em meio à esse embate, e por ele impactado, toma impulso a ideia de autonomia da escola, com
o incentivo à parcerias com instituições não governamentais, empresas privadas e comunidade e a
implementação de política de autonomia gerencial escolar, que prevê o compartilhamento da ges-
tão da escola como um todo e especialmente da gestão financeira, considerada fator fundamental
para o sucesso escolar dos estudantes e a melhoria da qualidade da educação. A busca de parcerias
atendia ao requerimento neoliberal de Estado mínimo, que propunha retirar do Estado atribuições
afeitas, sob a justificativa de desoneração, independente de esta ser ou não dever do Estado — por-
que respondendo constitucionalmente a um direito.
O processo de descentralização financeira é considerado um meio para atingir maior eficiência e
eficácia nas ações educativas e passa a ser implementado por meio de diversos programas, ensejan-
do a criação de órgãos de acompanhamento e controle que requerem participação social, previstos
na legislação brasileira como instâncias de participação da população.
São criados diversos conselhos e associações, tanto com abrangência nacional quanto local, no
âmbito de estados e municípios, e nos espaços escolares, como mecanismos de auxílio à democra-
tização do processo de gestão escolar, em função do processo de descentralização de recursos e
de implementação do princípio da gestão democrática nos espaços escolares públicos, previsto no
artigo 206, parágrafo IV, da CF/1988 e no artigo 14° da LDBEN, Lei 9394/96.
Em síntese, devem exercer o controle social, entendido como a “participação do cidadão na ges-
tão pública, na fiscalização, no monitoramento e no controle das ações da Administração Públi-
ca” (BRASIL, 2006, p. 16), conforme previsto na Carta Constitucional. A consolidação dessa prática
tornar-se-ia uma necessidade inerente ao processo de redemocratização do país e seu exercício,
exigiria, portanto, mobilização e orientação aos cidadãos.
Nos CEJA, esse controle é exercido pelas AAE, sociedades civis sem fins lucrativos, com Estatuto
próprio, que recebem recursos públicos do orçamento estadual e federal, consignados anualmente
para esse fim, e tem o compromisso de destinar os benefícios de suas atividades à unidade escolar
a que estiverem vinculadas, devendo prestar contas regularmente dos recursos recebidos e de suas
ações.
As associações trazem em si grandes contradições, pois são entidades destinadas especificamen-
te à administração financeira, fruto de uma política neoliberal então em curso, que em tese, preten-
dem situar-se no campo operacional, técnico, dissociando-se das questões políticas que envolvem
tal administração, como se tal fosse possível. A esse respeito, Pinto(2008), afirma que “as questões

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
centrais que devem ser decididas […] não são técnicas, mas de natureza política (no sentido de go-
verno da pólis) e dizem respeito à vida concreta das pessoas, que por isto tem o direito de opinar e
deliberar”. (2008, p.163).
As AAE foram criadas pelo governo do estado do Rio de Janeiro, no bojo das determinações cons-
titucionais e da LDBEN, Lei n. 9394/96, através de Resoluções da Secretaria de Estado de Educação
(SEEDUC/RJ), que culminaram na promulgação da Lei 3067, de 25 de setembro de 1998, definindo
que a autonomia das unidades escolares seria feita “através de um conjunto de práticas integradas,
nas esferas administrativa, financeira e pedagógica, com a participação de diversos segmentos da
comunidade escolar, através das Associações de Apoio à Escola-AAE”. (RIO DE JANEIRO, 2007, p. 6).
Conforme documento da rede estadual do Rio de Janeiro, “a ideia das Associações veio ao encontro
dos dispositivos que criaram os Conselhos que executam o controle social”. (2007, p.4).
Apesar de sua origem contraditória, as AAE representam um avanço na política brasileira, ao
possibilitar a participação do cidadão na gestão pública, em ações de planejamento, execução e
fiscalização das políticas públicas implementadas pelo Estado a fim de atender as demandas da
população, uma forma de compartilhamento de poder de decisão sobre as políticas, instrumento
e expressão da democracia e da cidadania. Nesse sentido, precisam encontrar formas de superar a
dualidade de sua origem para se tornarem a “materialização da legítima luta de vários pelo governo,
ainda que representativo, de todos”.(RAMOS, FERNANDES, 2010, p.56).

3- pArticipAção políticA em AssociAções de Apoio à escolA: UmA


UtopiA possíVel?
O direito à participação popular na formulação das políticas públicas e no controle das ações
do Estado foi estabelecido no Artigo 1° da CF 1988 que, ao reconhecer/estabelecer direitos e criar
diversos mecanismos que possibilitassem o exercício da cidadania, tornou a participação popular
“essência do Estado Democrático de Direito” (SCUASSANTE, 2009), e ampliou a atuação da socieda-
de, anteriormente restrita à eleição de governantes.8
Movimento difícil, principalmente em país com pouca experiência democrática, pelos anos de
arbítrio vividos em vários momentos da história, em que a democracia participativa ainda é um
fenômeno recente e sobrevivem ranços de um passado autoritário. À pouca experiência democrá-
tica, alia-se o enorme descompasso entre o processo de abertura democrática do país, após um
longo período de ditadura, e a “crise da democracia, no chamado capitalismo metropolitano, onde
as estratégias do capital para superação da crise estavam em curso e minimizavam direitos sociais “.
(PERONI, 2013, p.245).
Enquanto no resto do mundo a democracia e a participação eram questionadas como as respon-
sáveis pela crise do Estado, que para atender as demandas da sociedade, teria investido em políticas
sociais, gastado demais e gerado a crise fiscal, no Brasil, a sociedade dava os primeiros passos no
sentido de promover a participação efetiva da população na luta por direitos sociais materializados
em políticas públicas. Essa contradição pode ajudar a compreender a grande dificuldade que en-
frentamos em materializar políticas aprovadas no plano legal, além de outros fatores que também
merecem destaque.
Para Scuassante (2009, p. 2) “a atuação das instituições da democracia brasileira, muitas vezes, é
prejudicada pelas condições sob as quais operam, tendo em vista a existência do padrão de desi-
gualdades sociais, econômicas e culturais que permeiam toda a sociedade”.

8 Esta questão, em processo de regulamentação em junho de 2014, pela Presidência da República, por meio do
Decreto n.8284/2014, tem sido alvo de fortes críticas da mídia, que atribui ao referido documento regulamentador legal,
a alteração do preceito constitucional de que a democracia no país se faz apenas por atos legislativos, excluindo a parti-
cipação popular. O parágrafo único do Art. 1 da Constituição claramente enuncia: “Todo o poder emana do povo, que o
exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
A LDBEN, Lei n. 9394/96, considerando que a ação educativa pode auxiliar o processo de consoli-
dação da democracia no país, ao promover a ocupação de forma consciente dos espaços destinados
à participação social, garantidos desde a CF 1988, reafirma esse direito, ao estabelecer no Art. 22 as
finalidades da Educação Básica, destacando a necessidade da formação do educando para o exer-
cício da cidadania, consequentemente, estimulando a criação nos espaços escolares, de espaços de
experimentação democrática, por se tratar de uma forma de contribuir para o desenvolvimento, no
educando, de uma cultura política, que lhe permita atuar na sociedade de forma plena, participando
efetivamente do processo de democratização do país.
O controle social — traduzido na pesquisa como participação do cidadão na gestão pública, uma
forma de compartilhamento de poder de decisão sobre as políticas, instrumento e expressão da de-
mocracia e da cidadania — estabelecido legalmente em nosso país, ainda que com proposições, por
vezes, controversas, dada a polissemia que caracteriza o termo, e de difícil efetivação, encontrando
diversos entraves e resistências em sua efetivação, se constitui condição sine qua non para a vida em
uma sociedade que se pretende democrática.
As escolas encontram muita dificuldade em exercitar o conteúdo da democracia na prática peda-
gógica, pela promoção da participação da comunidade escolar. Essas dificuldades decorrem de di-
versos fatores: questões burocráticas; de compreensão sobre o que significa exercício de cidadania;
de compreensão sobre o sentido de público, quando a instituição é a escola, entre muitas outras.
O CEJA, como uma escola que atende sujeitos jovens e adultos, enfrenta o desafio de criar e man-
ter espaços de experimentação democrática, diante das especificidades de seu público e também
da singularidade de seu modo de oferta — semipresencial, por módulos — em que a presença do
aluno é mais pontual, não havendo frequência diária de um mesmo aluno, salvo poucas exceções,
mas sim um fluxo constante de diferentes alunos, situação que amplia o leque de possibilidades de
atendimento e envolvimento, mas que pode inviabilizar a criação de vínculos, tão necessária a um
trabalho pedagógico que tenha por objetivo o desenvolvimento de práticas cidadãs.
Conforme destaca Oliveira, referindo-se a contribuição das escolas à efetivação de princípios de-
mocráticos:

A ação política de democratização da escola contribuiria, deste modo, para a de-


mocratização da própria sociedade, na medida em que representaria a ampliação
das possibilidades individuais e coletivas de desenvolvimento de uma ação compa-
tível com liberdade de agir e de pensar, com o respeito da pluralidade e o reconhe-
cimento do direito à diferença, equalizando as possibilidades de participação nas
decisões de interesse coletivo. (2005, p.32).

Nesse contexto, a participação na AAE dos CEJA, poderia representar, para sujeitos jovens e adul-
tos, a perspectiva de um novo espaço de formação política e cidadã, implicando reconhecimento de
direitos, respeito às especificidades dos sujeitos, e efetiva participação, preceitos legalmente estabe-
lecidos, mas pouco observados no país, especialmente se considerarmos que o público envolvido,
com diversos saberes construídos ao longo da vida, pode representar um diferencial na busca pelo
desenvolvimento da democracia no país. Para Freire, pensar a educação de jovens e adultos com os
sujeitos jovens e adultos, é exercício de cidadania, que implica viabilizar e visibilizar espaços de par-
ticipação dos sujeitos no interior das unidades escolares. Tarefa difícil, especialmente em país com
pouca tradição democrática, em que a participação ainda é tênue, mais restrita ao voto.
A participação popular, conquista requerida para a efetivação de direitos, implica por um lado
vencer “os medos” do poder horizontalizado, nas mãos dos interessados; e, por outro, desenvolver
nos cidadãos “consciência política e principalmente uma cultura de fiscalização e controle por parte
da sociedade sobre os atos do poder público”. (OLIVEIRA, 2006, p. 223).

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
Os fatores restritivos — em especial a desmobilização e o desconhecimento — representam obs-
táculos ao processo democrático, e parecem indicar a necessidade urgente de se repensarem os
espaços de participação, o modo como vêm sendo apropriados e utilizados, a começar pelo signifi-
cado do termo participação, entendendo que “a construção de uma sociedade democrática implica
o desenvolvimento de uma ação democrática concreta em todos os espaços de interação social,
inclusive na escola”.(OLIVEIRA, 2005, p.32). Mesmo que saibamos que não é a escola que vai transfor-
mar a sociedade, “podemos dizer que as mudanças que podemos produzir dentro da própria escola
já modificam a sociedade”.(p.30).

4- pArA não conclUir...


Considerando que as pessoas somente se comprometem com aquilo em que acreditam, Con-
selhos e Associações existentes no interior das escolas conformam um espaço de experimentação
democrática, de formação política e cidadã, especialmente naquelas que atendem a jovens e adul-
tos. Nelas, a necessidade de promover participação social é ainda mais urgente, para que as pessoas
possam “[...] querer exercer seu poder, participar das decisões, porque adquiriram a consciência de
que estas afetam suas vidas” (BRASIL, 2004, p. 39).
Entende-se que “pertencendo ao público, à cidadania, estamos tratando da concepção demo-
crática, que leva ao jogo do projeto coletivo de vida” (BRASIL, 2004, p. 39), e por essa concepção,
participação deixa de ser “mera colaboração, para tornar-se exercício de poder sobre aquilo que nos
pertence, que pertence à cidadania, ao público, que diz respeito aos objetivos coletivos”. (BRASIL,
2004, p. 39). O exercício do controle social, exigiria, portanto, mobilização e orientação aos cidadãos,
ou seja, pressupõe exercício de cidadania.
Nas palavras de Oliveira,

As condições de realização de uma democracia efetiva são dadas em função das


possibilidades de participação autônoma dos diversos segmentos da sociedade nos
processos decisórios e interativos. Entretanto, para interagir de modo autônomo, é
preciso que os membros desses diversos grupos sociais possam ter desenvolvido al-
guma autonomia como indivíduos. (2005, p.27).

Muitos obstáculos parecem contribuir para dificultar a participação nos espaços de interação so-
cial e promover maior envolvimento democrático dos sujeitos. Mesmo os espaços de exercício de-
mocrático que a escola brasileira conquistou, pouco ultrapassam o caráter simbólico, como ratifica-
dores de ações da equipe gestora, e baixíssima autonomia e poder de crítica. A consciência política
que esse exercício pode desenvolver fica subsumida pela experiência da subalternidade ao poder
institucional verticalizado, o que de certa maneira evidencia os desafios, dilemas e contradições que
envolvem a atuação da escola em relação ao desenvolvimento de práticas de participação cidadã, o
que parece indicar, mais uma vez, a necessidade de se repensarem esses espaços, o modo como são
apropriados e gestionados.
Nesse cenário, destaco a validade da investigação proposta, de verificar se as AAE ocupam espaço
de exercício democrático, especificamente nos CEJA, em função da singularidade de seu modo de
oferta, conformando práticas de formação cidadã em uma instituição organizada para o exercício
do controle social e contribuindo para o processo de democratização do país, no exercício de princí-
pios democráticos e no desenvolvimento da consciência política dos sujeitos alunos. Como destaca
Peroni, “o processo democrático dá-se como parte da correlação de forças políticas. O fortalecimen-
to de espaços democráticos de participação[...], torna-se estratégico para a construção de uma so-
ciedade mais justa, igualitária e democrática”. (2008, p.208).

497
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
Promover uma melhor utilização dos espaços de formação cidadã existentes e o envolvimento
dos sujeitos nas ações da escola, pode vir a produzir múltiplos aprendizados, tanto para gestores,
quanto para os demais sujeitos envolvidos e desdobrar-se em intervenções em espaços diversos e
mais amplos. Nesse processo, aprende-se a dialogar com as diferentes necessidades e concepções
de mundo, e a buscar soluções conjuntas para os problemas, tensionando argumentos, posições a
priori estabelecidas e promovendo participação ativa. A responsabilização compartilhada das ações
que se desenvolvem na escola considera que “só há efetiva participação, quando se estabelece a
cultura do querer fazer, no lugar do dever fazer”. (BRASIL, 2004, p. 39).

5-referênciAs
BRASIL. Conselho Escolar e o financiamento da educação no Brasil. Disponível em http://www.mec.
gov.br. Acesso em 10 ago. 2013.
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PINTO, José Marcelino de Rezende. O potencial de controle social dos conselhos do Fundef e o que
se pode esperar dos conselhos do Fundeb. p.153-168. In: SOUZA, Donaldo Bello de (org.), Conselhos
municipais e controle social da educação: descentralização, participação e cidadania. São Paulo: Xamã,
2008.
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trução histórica do conselho escolar no Brasil. In: LUIZ, Maria Cecília (org.) Conselho Escolar, algumas
concepções e propostas de ação. São Paulo: Xamã, 2010.
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rante efetivamente a realização do Estado Democrático de Direito? Disponível em http://www. Âmbito-
-juridico.com.br. Acesso em 03 ago. 2013.

498
cAtegoriA 1

comUnicAção

sUbtemA 4

formação De profeSSoreS
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
...e disciplinAs de ejA pArA os licenciAndos, tem?
rAfAel henriqUe de AlbUqUerqUe | mArcelo silVA de AlmeidA

O presente trabalho tem como objetivo discutir a temática da formação inicial de professores
para atuação no campo da Educação de Jovens e Adultos - EJA, situando um panorama de quase
inexistência de disciplinas direcionadas para o ensino de EJA nos currículos de graduação, tanto
na Pedagogia, quanto (e especialmente) nos cursos de Licenciatura, nas universidades do país. A
presente reflexão sobre a formação inicial de professores para atuação no campo da EJA se ancora
numa experiência vivida por um grupo de alunos do curso de geografia da Pontifícia Universidade
Católica do Rio de Janeiro que, por iniciativa própria, no período 2014.1, matricularam-se na discipli-
na EDU 1794 - Educação de Jovens e Adultos, oferecida pelo Departamento de Educação da univer-
sidade. Ao cursarem a referida disciplina, esse mesmo grupo de alunos descobriu não só a área da
EJA, como todo um possível campo de atuação, depois de concluírem a formação. Como conclusão
dessa reflexão, o trabalho pretende relacionar o conteúdo adquirido nesta disciplina e a produção
de trabalhos feitos durante todo o semestre 2014.1, com uma reflexão sobre futuras práticas peda-
gógicas de geografia, direcionadas para os alunos de EJA e a necessidade de pensar uma formação
em Ensino para Jovens e Adultos nos cursos de Licenciatura.

palavras-chave: EJA, Licenciatura, Formação de professores, Geografia

A formAção iniciAl do corpo docente de ejA


As discussões sobre a formação inicial de educadores para atuação no campo da Educação de Jo-
vens e Adultos – EJA são de extrema importância, pois podem contribuir para o atendimento de me-
lhor qualidade ao corpo discente que compõem o universo de EJA. Tais discussões não são novas,
pois desde 1947, na Campanha Nacional de Educação de Adultos, este tema já fazia parte da pau-
ta de discussão. Mas, sobretudo nas últimas décadas a questão ganha cada vez mais importância.
Principalmente após a inserção da modalidade de ensino para jovens e adultos na Lei de Diretrizes
e Bases – LDB 9.394/96. Esse foi um passo importantíssimo, assim como Arroyo (2006, p.17), afirma
que, “... não vínhamos tendo políticas de educação de jovens e adultos.” Mas a partir de agora, com o
estabelecimento na referida lei, a EJA passa a ganhar mais força. Destarte, obtém o reconhecimento
de uma modalidade educacional, com características próprias reconhecidas legalmente. Necessi-
tando, portanto de políticas de Estado e ações que levem em conta as especificidades dos jovens e
adultos, que integram o público de EJA.
A Lei que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, em seu 37º artigo, assegura opor-
tunidades educacionais que considerem as características, interesse condições de vida e de trabalho
do corpo de alunos da educação de jovens e adultos. E de fato, de uma maneira geral, os alunos de
EJA têm características similares. São pais e mães de família, ou jovens que já estão inseridos no
mercado trabalho, isto é, são estudantes trabalhadores. Dessa maneira, as pesquisas, as práticas de
aula, ou seja, a formação como um todo, que é oferecida aos professores de EJA, deve contemplar o
universo específico destes alunos, que é totalmente oposto ao dos alunos do ensino regular.
A formação, que de maneira geral é recebida pelos professores, é passada através de cursos ali-
geirados, culminando no atendimento precário das demandas da educação para jovens e adultos.
Assim sendo, a melhoria da formação dos professores de EJA, necessariamente passa por uma for-
mação inicial consistente e de maneira continuada. Esta formação deve, portanto não deixar de
abarcar as especificidades dos alunos de EJA. Estas ações são importantíssimas para que consiga-
mos avançar na qualidade da escolarização deste público.

500
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
como As UniVersidAdes podem contribUir pArA A melhoriA dA for-
mAção iniciAl dos professores de ejA?
Quando o assunto é a formação dos professores de jovens e adultos, as universidades brasilei-
ras ainda atuam de maneira muito incipiente. Principalmente se levarmos em consideração, assim
como Soares e Simões (2004) destacam, o papel relevante que a EJA tem ocupado nos debates edu-
cacionais, além do potencial das instituições de ensino superior como agentes formadores.
Ainda segundo Soares e Simões (2004), dados do INEP apontam para um quadro de quase ine-
xistência de habilitações e ou disciplinas de EJA nas universidades do país. De 519 Instituições de
Ensino Superior (IES) brasileiras, que oferecem o curso de Pedagogia, apenas nove ou (2%) dispo-
nibilizam a habilitação em EJA. Dados um pouco mais recentes, de 2005, mostram que houve um
aumento, porém de maneira bem ínfima. De 619 (IES) apuradas, dezesseis ou (2,6%) oferecem a ha-
bilitação. Estes dados acabam gerando tal reflexão: se a EJA quase inexiste nos cursos de pedagogia,
imagine nas licenciaturas. Pode-se deduzir que tal quadro de quase inexistência de disciplinas e ou
habilitações de EJA nos cursos de pedagogia, deve se apresentar de maneira ainda mais crítica nos
cursos de licenciatura.
Diante deste panorama, verificamos que há muito que se fazer para que as discussões sobre o
Ensino de Jovens e Adultos entrem de fato nas agendas das universidades brasileiras. Segundo So-
ares e Simões (2001 apud MACHADO, 2004, p, 27), “há um desafio crescente para as universidades
no sentido de garantir/ampliar os espaços para discussão de EJA, seja nos curso de graduação, pós-
-graduação e extensão.”

A ejA como Um possíVel cAmpo de AtUAção pArA os fUtUros licen-


ciAdos
Como ficou constatado pelos dados apresentados neste trabalho, a Educação de Jovens e Adul-
tos é pouco discutida nas universidades do país. Com isso, um número bem reduzido de estudantes
de licenciatura fica sabendo que essa pode ser mais uma modalidade de ensino na qual podem
atuar após o término da graduação. Para ilustrar essa quase invisibilidade de EJA nas universidades,
ainda neste trabalho, contaremos como ficamos sabendo da disciplina de EJA no Departamento
de Educação da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, na qual somos graduandos do
curso de Geografia. De como é pouco divulgada e consequentemente, quase ninguém fica sabendo
da existência da referente disciplina. Por conta disso, este trabalho visa contribuir para fomentar as
discussões e a visibilidade de EJA no ambiente universitário brasileiro. Esse é um dos requisitos pri-
mordiais para o avanço na qualidade do ensino de jovens e adultos, que a EJA entre de uma vez por
todas, nas pautas de formação de professores nas universidades. Além de contribuir com a formação
direcionada para o público de jovens e adultos, é apresentada mais um campo de trabalho para os
graduados.

experiênciAs pessoAis com A disciplinA de edUcAção de joVens e


AdUltos nA pUc do rio de jAneiro
O nosso contato com a disciplina de Educação de Jovens e Adultos na Pontifícia Universidade
Católica do Rio de Janeiro deu-se da seguinte maneira. O co-autor deste trabalho, Marcelo Silva de
Almeida, sempre foi indignado com o fato de seus pais terem tido escolarização deficitária.
Ter dois exemplos em casa de como o sistema educacional brasileiro é injusto e cheio de falhas,
fazendo com que seja “produzido” um número imenso de jovens e adultos com pouca ou nenhuma
escolarização, foi a centelha para que o Marcelo desejasse obter mais informações sobre o Ensino de
Jovens e Adultos. E assim ele o fez. Iniciou sua busca dentro da própria grade do curso de Geografia,
porém não obteve sucesso. Em seguida sua busca direcionou-se para o Departamento de Educa-

501
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
ção, pois neste departamento, estava certo de que encontraria. Mas para sua surpresa, e posterior-
mente para a minha também, ele não conseguiu encontrar de primeira. Depois de algum tempo de
busca, conseguiu encontrar a disciplina EDU 1794 – Educação de Jovens e Adultos, mas tal disciplina
é apenas eletiva, ou seja, não faz parte da grade obrigatória de nenhum curso da PUC-Rio, seja de
Pedagogia e ou Licenciaturas. Após encontrar a disciplina, o Marcelo divulgou entre outros alunos
do curso de Geografia. Após a divulgação, mais três alunos, sendo eu um deles, também fizeram a
matrícula na referida disciplina, no período 2014.1.
Durante o período de estudos da disciplina, ficamos conhecendo o que é de fato o Ensino de
Jovens e Adultos. Tivemos contato, através das leituras e das aulas com o professor Renato Pontes,
com a história da EJA no Brasil, passando por diferentes períodos e governos, chegando até os dias
atuais. O professor convidou algumas pessoas envolvidas com a temática de ensino para jovens e
adultos, para que tivéssemos contato com diferentes propostas e experiências em EJA. Destacan-
do o projeto de EJA gerido pelo SESC, além da visita de uma professora que leciona para detentos
do sistema penitenciário do Rio de Janeiro. Confesso que não sabia que existia ensino dentro de
cadeias para pessoas privadas de liberdade. Portanto, foram experiências inéditas, essas que tive-
mos durante o processo de construção do conhecimento estudando EJA na PUC-Rio. Mas toda essa
bagagem sobre Ensino de Jovens e Adultos ficaria incompleta se não tivéssemos a oportunidade
de acompanhar de perto pelo menos uma aula de EJA. Mas para nossa felicidade, esta visita nos foi
concedida.
Tivemos a oportunidade de conhecer o projeto de EJA de um dos mais tradicionais colégios do
Rio de Janeiro, o Colégio Santo Inácio, na zona sul da cidade do Rio de Janeiro, mas precisamente
no bairro de Botafogo. Acompanhamos dois tempos de aula, um de matemática e outro de portu-
guês. Era uma turma que estava no segundo segmento do ensino fundamental. Bem heterogenia
quanto ás idades. Mais mulheres do que homens. As dinâmicas das aulas foram muito interessantes.
Os alunos demonstraram bastante interesse e assimilaram bem o conteúdo. Conversei com alguns
professores, e todos estes com os quais falei, quando perguntei se tinham formação específica para
EJA, a resposta foi negativa em todos os casos. E todos acrescentaram que se tivessem tido formação
específica para este público, a construção do conhecimento teria se dado de maneira muito mais
rápida. Esse fato somente corrobora a necessidade em se fomentar uma melhor formação inicial dos
professores que irão atuar com alunos de EJA. A grande maioria dos alunos com os quais conversei,
eram de fato, trabalhadores, com exceção de algumas senhoras aposentadas que resolveram ocu-
par o tempo, retomando a pouca escolarização que tinham.
Depois de um semestre inteiro vivenciando e discutindo os assuntos referentes ao Ensino de jo-
vens e adultos, a possibilidade de assistir in loco, aulas de EJA, foi uma experiência sem igual. Foram
meses de muito aprendizado e trocas de conhecimentos. Foi possível conhecer com mais profundi-
dade o Ensino de Jovens e Adultos, que mesmo previsto em lei, mesmo tendo um alto grau de im-
portância para um público ainda muito grande de pessoas com pouca e ou nenhuma escolarização,
não aparece na pauta de discussão da academia como deveria. Além de todas estas experiências e
conteúdos, nós também produzimos materiais. No próximo sub-título, traremos uma proposta de
atividade para aula de geografia destinada ao público de EJA, que foi apresentada em sala de aula.

propostAs de AtiVidAdes de AUlA de geogrAfiA VoltAdAs pArA o pú-


blico de ejA
As propostas a seguir foram pensadas para aproximar o conteúdo curricular, do cotidiano dos alu-
nos. Por isso foram abordados temas como: impactos ambientais urbanos e transporte público, ou
seja, temas que fazem parte do dia a dia dos alunos. Que realmente fazem sentido para os mesmos.
01° Proposta:
• tema da aula: Impactos ambientais urbanos

502
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
• objetivos: Construir com a turma o entendimento do que sejam impactos ambientais; Pro-
blematizar o tema e ir além dos assuntos relacionados aos aspectos físicos. Inserindo os
aspectos sociais e políticos e suas implicações.
• dinâmica da aula: O tema será abordado em duas aulas. Na primeira, será introduzido o
tema, além da proposição de uma atividade para a aula seguinte. Na segunda aula, serão
retomadas as discussões, desta vez à partir das atividades propostas.
• Atividade: A turma será dividida em duplas. E cada dupla deverá trazer uma foto, de prefe-
rência tirada pela dupla, que mostre algum impacto ambiental urbano de seu cotidiano. Na
sala de aula cada dupla irá apresentar a sua foto e explicar o motivo da escolha de tal foto.
• objetivos da atividade: Reforçar o entendimento sobre o tema; fazer com que os alunos
identifiquem em seu próprio cotidiano, problemas ambientais que causam tantos danos à
vida de moradores das cidades; desmistificar a idéia de que o Brasil está livre de desastres
ambientais.

02° Proposta:
• primeiro momento: Á partir da música my brother da banda carioca O Rappa, os alunos
deverão ler a letra e ouvir a música.
• segundo momento: A turma será dividida em trios para responder a sete questões refe-
rentes à música.
• terceiro momento: Arrumar as carteiras em círculo, para que favoreça o debate sobre as
questões abordadas na música. Como por exemplo: será que o transporte público é igual
para todos no território nacional? Será que a vida imita a arte, no caso da música? Quem é
o responsável pela administração dos transportes públicos na cidade?
• quarto momento: Propor que os trios pensem em uma possível solução para a questão do
transporte público. Estas propostas deverão ser apresentadas e os mesmos deverão votar
na melhor proposta.

considerAções finAis:
Para que consigamos avançar na qualidade do ensino para Jovens e Adultos, é necessária a profis-
sionalização do corpo docente de EJA. Diante da crescente importância e visibilidade que a EJA tem
alcançado, é inaceitável que ainda tratemos o ensino para jovens e adultos como filantrópico. Os
alunos têm garantido por lei, que devem ter ensino de qualidade, e que leve em consideração suas
especificidade de alunos – trabalhadores. Estes pontos devem ser abarcados pela formação inicial
dos professores de EJA.
Além da urgência da melhoria do ensino para o público de EJA, já está mais do que na hora, de as
universidades darem a devida atenção ao tema, pois é um segmento de ensino como qualquer ou-
tro, além de ser um campo de trabalho para os graduados. Se as discussões trazidas neste trabalho
fizerem com que você identifique a importância do Ensino de Jovens de Adultos, e entenda também
a importância de se aumentar a visibilidade da EJA nas universidades, fazendo com que o debate
seja fomentado, este trabalho terá alcançado seu objetivo

referênciAs bibliográficAs:
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dade, Campinas, n. 68, 1999, p. 143-162.
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503
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
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belece as diretrizes e bases da Educação Nacional. Brasília: MEC, 1996.

504
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
A edUcAção de idosos de clAsses popUlAres:
oportUnidAde enriqUecedorA nA formAção do
professor.
igor pereirA gonçAlVes

Esta comunicação tem como objetivo relatar a experiência como professor regente em uma tur-
ma de terceira idade de Alfabetização e Letramento do PROALFA – Programa de Alfabetização, Do-
cumentação e Informação - da UERJ. Este programa tem a finalidade de formar bolsistas graduandos
da área de Educação e Humanidades para que estes atuem na alfabetização e letramento de idosos
de classes populares. Abordando anualmente um tema os professores, supervisionados e orientados
pela equipe de coordenação do projeto, promovem discussões e atividades ao longo do ano, com o
intuito de construir um produto final, como forma de avaliação do trabalho realizado. Pretende-se,
dessa forma, relatar a importância do projeto na formação docente, visto que este oferece encontros
para o planejamento pedagógico das aulas, nos quais os bolsistas são levados a refletir sobre sua
atuação enquanto professores. Além disso, os professores participam de grupos de estudos sema-
nais, promovidos pela coordenação, nos quais realizam atividades teóricas e dinâmicas, tendo em
vista aperfeiçoar a prática pedagógica. A partir do tema anual “Heranças, Culturas e Identidades: A
Boniteza de Estar no Mundo” e do módulo semestral “Abrindo o Relicário do Mundo”, os professores
juntamente com os alunos decidiram abordar assuntos relacionados à cultura grega, culminando
em uma exposição de vasos inspirados em tal cultura. Por se tratar de um projeto que atende a alu-
nos idosos, a experiência em sala de aula torna-se desafiadora e ao mesmo tempo enriquecedora.
Desafiadora pelo fato dos bolsistas ainda não estarem formados. Isso os ajuda e conhecer o quão
complexo é estar em sala de aula. Já o enriquecimento ocorre porque a relação intergeracional pos-
sibilita trocas de experiências. Percebe-se, então, que, não só a teoria recebida nos encontros, mas
também a prática em sala de aula contribui de maneira significativa para a preparação docente.

palavras-chave: terceira idade, Alfabetização e letramento, Classes Populares, Forma-


ção de professores

Me movo como educador porque,


primeiro, me movo como gente 1

Sabemos que a Educação de Jovens e Adultos é uma modalidade de ensino voltada para as pes-
soas que por diversos motivos não puderam frequentar o ensino regular. São pessoas que tiveram
de abdicar dos estudos para trabalhar e ajudar a sustentar a família; outras que moravam em lugares
distantes e não tinham condições financeiras para se transportar até a escola mais próxima; outras,
ainda, pelo fato de não se identificarem com o sistema de ensino, que, muitas vezes, não condiz com
as diferentes realidades dos alunos.
Dessa forma, a Educação de Jovens e Adultos surge para pagar uma divida social. Os alunos, em
sua maioria proveniente das classes populares, quando procuram a EJA o fazem com o desejo de
encontrar uma proposta de ensino com a qual não tenham medo de se relacionar. O que acontece,
porém, é que a educação formal parece ainda não estar “adaptada” aos seus alunos. O aluno da EJA
acaba sendo tratado como se fosse um aluno do ensino regular, pois, usa-se a mesma proposta pe-
dagógica e a mesma abordagem dos assuntos.
1 FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. 47° Ed – Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2013.

505
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
Com isso, o aluno acaba novamente “fugindo” da escola, dessa vez, frustrado por não “saber
aprender”, sentindo-se um incapaz e desacreditado do seu potencial. Entre esse grupo encontra-se
uma grande quantidade de idosos, que frustra-se com a escola e desiste de fazer parte do “mundo
letrado”.
Sabemos que não só o sistema de ensino, mas o próprio professor ainda não tem a preparação
adequada para lidar com esse grupo que possui particularidades bem diferenciadas do ensino re-
gular. O que fazer, então, com esse grupo? A educação não formal acaba acolhendo essas pessoas,
propondo-lhes o que Gohn (2006) defende: uma capacitação para que eles se tornem cidadão do
mundo, no mundo.
Assim, este trabalho tem em vista propor uma reflexão acerca da formação do professor a partir
da prática docente em uma turma de Ensino de Jovens e Adultos e está dividido em três partes.
Primeiramente apresentaremos o PROALFA - Programa de Alfabetização, Documentação e Informa-
ção-, local onde foi desenvolvida a prática docente que teve como resultado esta reflexão, fruto de
nossas inquietações enquanto alunos-professores. Em seguida, relataremos nossa experiência nas
aulas ministradas no programa bem como seus resultados. Por último, buscaremos levantar algu-
mas considerações a partir dessa experiência, que contribuiu significativamente para a nossa cons-
tituição enquanto professores em formação.

proAlfA- Um espAço de formAção de professores


O PROALFA- Programa de Alfabetização, Documentação e Informação- é um programa de exten-
são da Universidade do Estado do Rio de Janeiro que, desde 1997, entre outros projetos, desenvolve
Classes de Alfabetização e Letramento e Jovens e Adultos. Essa é uma proposta de educação não
formal em leitura, escrita e matemática direcionada a pessoas que possuam ou não escolarização.
Os professores que atuam no programa são bolsistas selecionados nos cursos de licenciaturas em
Pedagogia, Letras e Matemática. Esses bolsistas são preparados para atuarem como professores nas
classes de alfabetização e letramento. A formação é feita em três momentos: as reuniões pedagógi-
cas, os grupos de estudo e a prática docente em sala de aula.
A reunião pedagógica acontece todas as segundas-feiras. Seu objetivo é levar os bolsistas a re-
fletirem sobre a sua atuação em sala de aula e a partir dessa reflexão, preparem o planejamento da
semana seguinte.
Esse momento tem duração de quatro horas e nela os professores apresentam o registro de suas
aulas ministradas durante a semana. Relatam seus procedimentos didáticos e como os alunos lida-
ram com as atividades.
Enquanto um professor relata, os outros podem intervir com perguntas e propostas de ações
que poderiam ter sido utilizadas nessas aulas. Essa discussão é sempre orientada pela coordenação
pedagógica do programa e visa direcionar o bolsista a um confronto entre seus saberes teóricos e
sua prática.
Vemos, assim, que a reunião é um espaço no qual os bolsistas podem trocar experiências, repen-
sar sua prática docente, construindo uma reflexão acerca de sua atuação enquanto professor.
O grupo de estudos ocorre todas as sextas feiras e tem a duração de quatro horas. É conduzido
pela coordenação do programa e tem o objetivo de fazer com que os professores, por meio de ati-
vidades teóricas e práticas, confrontem os saberes teóricos com sua prática em sala de aula. Para
esse momento são utilizados diversos materiais, como livros, vídeos, textos. Os temas debatidos nos
encontros são selecionados de acordo com a demanda da sala de aula. O estudo parte de uma pers-
pectiva dialógica entre teoria e prática; assim, a prática é uma possibilidade de revisitação do saber
teórico, bem como a teoria é um instrumento de revisão do saber da prática.

506
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
Nos outros dias da semana- terça, quarta e quinta-feira – acorrem as aulas nas Classes de Alfabe-
tização e Letramento. Esse projeto conta com quatro turmas, nas quais os alunos são alocados de
acordo com seu perfil. Não falamos aqui de nível de saber, mas sim de nível no processo de alfabe-
tização.
Apesar de as classes serem direcionadas a jovens e adultos, os alunos são, em sua maioria, idosos
provenientes de classes populares, que nunca frequentaram a escola ou que, não tendo se identifi-
cado com esta, optaram pela educação não formal, onde encontraram uma proposta que atendesse
as suas expectativas. Há ainda aqueles que, mesmo tendo certo nível de escolaridade, frequentam
as classes a fim aperfeiçoarem a leitura e a escrita.
BRANDÃO (2008) declara que a educação popular:

Assume como tarefa sua a formação integral, crítica e criativa de seus educandos.
Ela revisita sem cessar uma ideia dada por Paulo Freire: ensinar a pessoa a ler pala-
vras é apenas o primeiro passo de um ensino-sem-fim do ‘ler o seu mundo’. Habilitar
atores produtivos em termos de trabalho é apenas uma primeira ou segunda esta-
ção de uma viajem que deságua na formação do sujeito político, do cotidiano do
bairro à história do seu tempo. (p.44)

Ao procurar o PROALFA, é isso que os alunos buscam. Desejam não apenas ser coadjuvantes,
mas protagonistas de suas próprias histórias, buscando uma educação que pergunte quem eles são,
aberta a ouvir o que eles têm a dizer, o que aspiram, o que desejam.
A possibilidade de atuar nas classes de alfabetização e letramento contribui de maneira signifi-
cativa para a formação do professor/bolsista, visto que este atua num espaço de interação interge-
racional, lidando com pessoas que não estão ali por uma obrigação, para “passar de ano”; mas sim
pelo fato de terem “sede de aprender para ser independente dos filhos e netos”, como disse uma das
nossas alunas em certa ocasião.
Grande parte dos nossos alunos tem mais de setenta anos. Isso já configura um dado para que
não os tratemos como alunos do fundamental do ensino regular. Eles não são pessoas sem conhe-
cimento de mundo e da realidade que o cerca. Muito pelo contrário. São sujeitos determinados,
com grande carga de experiência, com muito conhecimento para compartilhar em sala de aula. O
trabalho com idosos nos ajuda a vê-los como pessoas adultas e responsáveis e não como “pobres
velhinhos”.
Assim, entrar em uma sala de aula para trabalhar com idosos desperta-nos as seguintes inda-
gações: Qual o real papel do professor? Como levar uma educação de qualidade e motivadora a
pessoas que já viveram tanto, já tiveram tantas experiências e estão ali buscando algo novo? Essa
indagação nos faz chegar a mesma conclusão a que chegou FREIRE (2005): os homens, sejam alunos
ou professores, são seres inconclusos e conscientes de sua inconclusão.
Os alunos conscientizam-se da sua inconclusão pelo fato de procurar a sala de aula, de buscar
aprender coisas novas para não “enferrujar”. Os professores veem-se como seres inconclusos a partir
da observação de que, apesar de todas as teorias estudadas na universidade, nunca estarão de fato
“formados”; a educação sempre exigirá deles algo mais, maior preparação e capacitação, mais tem-
po de planejamento.
Vemos, portanto, que, se a prática docente na EJA é um desafio ao professor, lidar especificamen-
te com os idosos torna-se um desafio maior ainda, visto que eles são cidadãos em busca da cidada-
nia e nós professores/bolsistas somos estudantes em busca de nossa constituição como professores.
Podemos dizer que ambos os lados estão em busca de uma auto-formação. Talvez seja essa uma das
riquezas da educação popular: conferir não só ao educando, mas também ao educador uma “forma-

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
ção integral, critica e criativa” (BRANDÃO, 2008, p.44)

ii. o relAto dAs AUlAs ministrAdAs


O PROALFA organiza os conteúdos por meio de uma metodologia de projeto de trabalho. A partir
da escolha de um tema anual geral, tomando como ponto de partida as expectativas dos alunos,
cada uma das turmas desenvolve seu trabalho didático-pedagógico a partir de um subtema.
O tema geral do ano de 2014 foi “Heranças, Culturas e Identidades: A Boniteza de Estar no Mundo”,
cujo objetivo era abordar o formação das culturas e etnias, além de como seus indivíduos vivem e
se relacionam. A partir desse tema, foram escolhidos dois módulos, que seriam trabalhados durante
o ano.
O módulo do primeiro semestre foi “Abrindo o relicário do mundo”, e foi iniciado com uma aula
inaugural para todos os alunos do programa. Nela, a Professora Dra. Nanci Vieira, do Instituto de
Antropologia da UERJ, apresentou uma palestra sobre a origem do homem. Em seguida, os bolsistas
fizeram uma encenação, na qual cada um caracterizando uma cultura se apresentou para os alunos.
Após esse primeiro momento, cada turma, sob a orientação de seus professores, escolheu uma
cultura a ser abordada. A Turma Unati II, uma turma de letramento, na qual somos professores re-
gentes, escolheu a cultura grega, priorizando sua arte (mais especificamente a cerâmica) e as Olim-
píadas.
Para ambientarmos, então, o tema, iniciamos a primeira aula com um vídeo no qual era contada
a Teogonia. Esse texto clássico, escrito pelo poeta grego Hesíodo no séc. VIII a.C, relata de maneira
mitológica como o homem teria surgido. Os alunos ficaram muito interessados, pois era um relato
muito próximo da narrativa judaico-cristã acerca da criação do ser humano.
Com isso, a turma pôde conhecer que, muito antes das ciências biológicas terem surgido, os gre-
gos, assim como vários outros povos da antiguidade, já possuíam suas explicações a respeito do
surgimento do homem na terra.
Demos continuidade às aulas com uma visão panorâmica da localização geográfica da região
grega, seu aspecto topográfico, econômico e climático. Também estudamos sobre como o homem
grego antigo se organizava, quais eram suas formas de governo, até chegarmos aos aspectos que
eram o que iríamos focar no semestre.
Em um das aulas posteriores, levamos o poema Vaso Grego, do poeta Alberto de Oliveira. Esse
poema foi escrito em 1857 e pertencia ao período literário brasileiro chamado de Parnasianismo,
no qual a linguagem era rebuscada e o poeta era visto como um “escultor” da palavra. A escolha
do poema se deu por dois motivos. O primeiro foi devido justamente ao seu título e conteúdo, que
abordam o vaso grego. O segundo foi o fato de o Parnasianismo retornar aos valores clássicos gre-
gos e latinos.
Como conduzir a leitura de um texto aparentemente distante daquele grupo de leitores? Apenas
decodificar as palavras não levaria os alunos a uma compreensão total do texto. É o que nos aponta
Rojo (2004, p. 03):

A leitura passa, primeiro, a ser enfocada não apenas como um ato de decodifi-
cação, de transposição de um código (escrito) a outro (oral), mas como um ato de
cognição, de compreensão, que envolve conhecimento de mundo, conhecimento de
práticas sociais e conhecimentos linguísticos muito além dos fonemas.

A primeira reação foi de estranhamento, pois, além da linguagem ser rebuscada, contava com
jogo de palavras, outra característica do Parnasianismo. Demos uma breve explicação sobre essa

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
escola literária, para que os alunos conseguissem se situar na leitura. Oferecemos também o signifi-
cado de alguns vocábulos para que facilitasse a leitura do poema.
Isso fez com que os alunos criassem uma interação com o texto. Assim, fomos interpretando o
poema verso por verso, prestando atenção nos jogos de palavras e na seleção dos vocábulos que o
autor fez. Em seguida, buscamos interpretar as estrofes, procurando inferir qual era o sentido geral
de cada uma. Por último, juntando o que entendemos de cada uma das estrofes, criamos uma inter-
pretação do poema inteiro, chegando ao que Rojo (idem) chama de réplica, ou seja, um novo texto
gerado a partir da leitura do poema.
Percebe-se, assim, que para que haja uma leitura de qualidade, que desenvolva as capacidades
leitoras dos alunos, é necessário que os professores não se conformem apenas com que o aluno leia
as palavras, as frases e os períodos. Faz-se necessário, acima de tudo, que o professor, como media-
dor entre o texto e o aluno, faça com que este desenvolva capacidades de reflexão, entendimento e
réplicas a partir de suas leituras.
As aulas que se seguiram foram dedicadas à pintura de vasos inspirados nos vasos gregos. Cada
aluno recebeu um vaso de cerâmica para pintar. Levamos várias fotografias de vasos gregos origi-
nais. Nelas os alunos puderam ver as tonalidades de cor que eram utilizadas e o que era comumente
desenhado nas cerâmicas. Foi nesse momento que percebemos que não podemos fazer do plane-
jamento uma “camisa de força”, pois os alunos não funcionam de forma padrão. Cada um tem seu
tempo e foi necessário mais do que os três dias previstos para a atividade.
Tivemos que levar em conta também que alguns alunos, não tinham habilidade com artes e ti-
veram de receber uma atenção especial. Apesar de várias vezes serem orientados a utilizar cores
próximas das que se usavam na Grécia Antiga, como era mostrado nas fotografias, houve alunos que
acabaram utilizando outras cores. Coube- nos explicar novamente a esses alunos que tal cor não era
utilizada na época dos vasos gregos e que ele deveria procurar pintar seu vaso seguindo o estilo das
fotografias.
Acreditamos que o professor deve estar atento a esses fatores. Muitas vezes achamos que fomos
claros nos nossos comandos, mas, mesmo assim, há aqueles alunos que só conseguem compreen-
der o que foi pedido se estivermos ao seu lado, orientando o que deve ser feito passo a passo.
Gradativamente, os vasos foram ganhando vida e assemelhando-se aos modelos gregos. Todos
estavam entusiasmados para terminarem suas obras e mostrarem para amigos e familiares. Marcou-
-nos a fala de um aluno de 71 anos:

“Eu nunca tive paciência para mexer com tinta, nem para ajudar minhas filhas
nos trabalho de casa que exigiam recorte e colagem. Mas hoje estou vendo que perdi
grandes oportunidades de exercitar minha paciência. Estou pintando meu vaso e
vejo que está ficando lindo. Em casa, minha esposa e minhas filhas não acreditaram
quando disse que estou pintando um vaso grego.”

Durante as aulas de pintura, algumas alunas que eram artesãs levaram seus materiais para dividir
com os colegas, como tinta acrílica e pincéis mais finos. Todos conseguiram pintar seus vasos. Os
que tinham mais facilidade ajudaram os mais lentos, deram sugestões de desenhos e diziam se o
vaso estava ficando “bonito”. Esse foi um momento no qual os alunos exercitaram muita paciência e
cooperação.
Ao final, percebemos o quão a turma estava admirada com suas produções, principalmente aque-
les que nunca haviam trabalhado com artesanato. Uma das alunas que mais gosta de fazer piadas
disse: “Fui eu mesma que fiz isso?”
Posteriormente às aulas dedicadas à pintura dos vasos, iniciamos os estudos sobre as Olimpíadas.

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
Os alunos em geral sabiam vagamente sobre o tema. Relataram apenas que eram jogos praticados
de quatro em quatro anos em países diferentes, que na abertura havia sempre uma festa com uma
tocha.
Levamos um texto que contava resumidamente a história das Olimpíadas. Este se dividia em qua-
tro partes, com os principais momentos das Olimpíadas da Era Antiga: O início das festividades em
aproximadamente 2500 a.C, em homenagem ao deus Zeus; o termo “olimpíada” que só foi dado aos
jogos em 776 a.C, quando um acordo foi selado no templo de Hera em Olímpia; a decadência dos
jogos em 465 a.C devido ao domínio romano; a última olimpíada da Era Antiga, disputada em 393
a.C, quando o Imperador Teodósio I proibiu a adoração aos deuses e cancelou os jogos.
As aulas seguintes foram destinadas à abordagem desses marcos. Foram lidos textos sobre as
modalidades dos jogos, como eles ocorriam, quem podia participar, como os vencedores eram pre-
miados. O objetivo era fazer com que os alunos soubessem o quanto a prática do esporte era impor-
tante na vida do homem grego.
Demos prosseguimento ao tema, abordando, dessa vez, o resgate das Olimpíadas em 1896 pelo
francês Pierre de Frédy, o Barão de Coubertin. Levamos para leitura e discussão um texto que rela-
tava a incansável campanha do francês em prol de financiamento para a retomada dos jogos olím-
picos agora na Era Moderna.
Antes, porém levantamos algumas hipóteses: perguntando quem seria o Barão de Coubertin,
quando teria surgido a primeira olimpíada moderna, onde esses jogos teriam ocorrido. Isso auxiliou
a leitura, pois ao começarem a leitura eles ficaram mais atentos ao texto.
Nessa mesma aula, foram sorteadas as olimpíadas da Era Moderna, para que cada aluno pesqui-
sasse a respeito e trouxesse um texto sobre sua pesquisa. Grande maioria conseguiu pesquisar na
internet com ou sem o auxílio de familiares. Aqueles que não conseguiram pesquisar em casa pude-
ram utilizar o computador do programa.
Houve textos muito interessantes e ricos em conteúdo, sobretudo, porque o idoso tem uma tre-
menda capacidade de reflexão. Dois textos que podem ser comentados brevemente são um sobre
as Olimpíadas de 1932 e outro que relatava os jogos 1972.
O primeiro texto foi um texto carregado de indignação, pois nos jogos de 1932, sediados nos Es-
tados Unidos, o Brasil não teve condições para financiar a viagem de grande parte dos atletas e estes
tiveram que ir “de carona” em um navio cargueiro, vendendo café de porto em porto para pagarem
a viagem.
O segundo texto, por sua vez, foi de conteúdo apreensivo. A aluna que o escreveu foi sorteada
para pesquisar sobre as Olimpíadas sediadas na Alemanha em 1972. Ela ficou muito preocupada em
descobrir que nessa ocasião 18 pessoas foram mortas devido a um ataque terrorista. Sua apreensão
era devido a, na época, estarmos próximos da Copa do Mundo, sediada no Rio de Janeiro, além das
constantes manifestações ocorridas em âmbito nacional.
O que observamos nessa atividade foi que o aluno idoso geralmente não gosta de imprimir as
suas pesquisas da internet. Ele prefere copiar à mão, talvez como uma forma de exercitar a escrita. O
que também nos chamou atenção foi que dentro de suas pesquisas eles não se limitaram a apenas
copiar as informações encontradas, mas também acrescentaram suas observações e opiniões aos
textos, revelando uma grande capacidade de reflexão acerca das suas leituras.
A partir dessas leituras e pesquisas, a turma construiu uma linha do tempo sobre a história das
Olimpíadas, desde sua origem até a Era Moderna. A linha do tempo, construída com cartolinas aca-
bou tendo quatro metros e meio de comprimento na sua confecção, além de ter sido ilustrada com
figuras relacionadas aos marcos históricos.
Ao final ocorreu uma culminância, que é o momento do módulo no qual encerramos o semes-

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
tre apresentando a produção de todas as turmas. É um evento no qual os familiares dos alunos e a
comunidade interna e externa da UERJ são convidados para apreciar os trabalhos confeccionados
pelos alunos. Nossa turma expôs seus vasos, a linha do tempo e um cartaz com a interpretação do
poema Vaso Grego e, para avivarem ainda mais o tema, os alunos participaram caracterizados de
gregos.

iii. considerAções finAis


A partir de toda a explanação feita anteriormente, procuramos, agora, tecer algumas considera-
ções acerca da formação docente. A regência em uma classe de idosos contribuiu e vem contribuin-
do consideravelmente em nossa formação. O aluno idoso é um aluno diferente de todos os outros.
Ele geralmente não busca a educação para uma ferramenta de trabalho. Ele vai para a sala de aula
porque viu o valor da educação e deseja adquirir conhecimento.
Vale lembrar que essa experiência só pôde ser vivida pelo fato do PROALFA oferecer essa oportu-
nidade aos graduandos da Universidade. O bolsista é a todo momento levado a confrontar a teoria
com a realidade da prática docente. Essa tomada de consciência faz com que os graduandos sempre
reflitam e se questionem sobre o que de fato é tornar-se professor. Talvez nunca se chegue a uma
resposta fechada sobre o que é “ser professor”. FREIRE (1991) já chamava atenção para essa reflexão:

Ninguém começa a ser educador numa certa terça-feira às quatro horas da tarde.
Ninguém nasce educador ou marcado para ser educador. A gente se faz educador, a
gente se forma, como educador, permanentemente, na prática e na reflexão sobre a
prática (p. 32)

É, portanto, dever do professor tomar consciência de que tornar-se educador não é algo que se
esgota nos conhecimento adquiridos na universidade. Estamos a todo o momento nos constituin-
do, ou seja, nos refazendo a partir da nossa reflexão acerca das situações prático/pedagógicas.
A experiência no projeto de Classes de Alfabetização e Letramento incita-nos a nos conscienti-
zarmos de que no futuro, quando chegarmos às escolas, teremos de procurar levar uma educação
que garanta a permanência do aluno na instituição. Para isso teremos de respeitar os saberes que o
aluno tem e buscar conhecer sua realidade. Só assim garantiremos, não só a permanência do aluno
na escola, mas uma permanência com êxito.
Desse modo, concluimos este trabalho com a fala de uma aluna das Classes de Alfabetização e
Letramento. Segundo ela, “a escola boa é aquela que faz o aluno não querer sair dela”. Acreditamos
que seja possível construir essa escola, mas para isso é preciso, primeiramente, que os professores
tomem consciência de que são fundamentais nesse processo, buscando a todo instante um diálogo
entre teoria e prática.

referênciAs
BRANDÃO, Carlos Rodrigues. A educação popular e a educação de jovens e adultos: antes e agora. In:
Formação de Educadores de Jovens e Adultos. Org. Maria Margarida Machado. Brasília. Secad/MEC,
2008.
FREIRE, Paulo. A educação na cidade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2013.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 2005.
GOHN, Maria da Glória. Educação não-formal, participação da sociedade civil e estruturas colegiadas
nas escolas. In: Ensaio: Aval. Pol. Públ. Educ., Rio de Janeiro, jan/mar. 2006.
ROJO, Roxane. Letramento e Capacidades de Leitura para a Cidadania. www.sistemas.ufrn.br.

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
A formAção de professores do proejA fic do ifbAiAno
cAmpUs cAtU e sUAs relAções com A pedAgogiA
freiriAnA.
neylA reis dos sAntos silVA

Este trabalho faz parte dos estudos que fundamentam uma investigação em andamento que tem
como objetivo refletir sobre a formação de professores em EJA, prioritariamente em sua relação com
a educação profissional e a proposta de currículo integrado. De natureza exploratória e interpreta-
tiva, foi realizado um levantamento temático nas obras de Paulo Freire acerca do tema Formação
de Professores e traçada uma aproximação teórica com as ideias de Alarcão, Imbernón e Paiva na
tentativa de compreender a formação de professores como um momento de reflexão e tomada
de decisão. A experiencia de formação continuada junto aos professores envolvidos do IF Baiano
Campus Catu e da Secretaria de Educação de Catu , na implantação do curso Proeja FIC Serviço de
Restaurante e Bar se fundamenta na perspectiva do professor reflexivo, capaz de intervir sobre sua
realidade. Extrapola uma concepção de aprendizagens de técnicas e métodos para uma profunda
análise de si e de seu cotidiano, tematizando a ação docente e seu papel transformador na socieda-
de. Essa atuação socialmente responsável e comprometida com as classes populares está no cerne
da ideia do currículo integrado na educação profissional. É necessário desvelar que os professores
também são sujeitos, adultos, trabalhadores que, como seus educandos, enfrentam o desgaste das
jornadas duplas de trabalho e são desafiados a construir aprendizagens a partir de suas experiência
e saberes. Foi possível perceber que o processo de formação continuada traçado pelo programa é
fundamental para o envolvimento e comprometimento dos professores, além de favorecer a am-
pliação de conhecimentos técnicos necessários a uma prática emancipatória na formação de jovens
e adultos, tão necessária a esta modalidade de ensino.

palavras-chave: Formação de professores, Professor reflexivo, Educação de Jovens e


Adultos, Educação Profissional

introdUção
A Educação de Jovens e Adultos (EJA) em nosso país tem uma trajetória marcada pelo descom-
passo, desafios e descontinuidades. Sua presença na educação básica como modalidade é resultado
de muitos esforços e lutas de educadores que reconhecem na EJA a consolidação da formação do
trabalhador enquanto classe. Prioritariamente, da educação popular germina uma nova forma de
fazer educação que busca sentido nas práticas sociais e de trabalho, além de refletir sobre as condi-
ções objetivas de sobrevivência em um cenário de exploração da classe trabalhadora e da domina-
ção do capital sobre o ser humano.
A consolidação da EJA enquanto uma modalidade de educação, portanto, uma nova forma de
fazer educação desafia os professores que, entre tantas incertezas em sua formação e seu escopo
como profissional necessita identificar as principais características, saberes e conhecimentos ne-
cessários para uma atuação competente com os jovens e adultos. Paiva (2006) nos alerta sobre os
sujeitos docentes da EJA que, em muitos casos, são ora professores de crianças que necessitam atuar
em outro turno e assim acabam na EJA, ora são educadores populares que estão a busca de resgatar
um discurso e um tempo histórico que já não existem mais.
Essa realidade torna ainda mais urgente a discussão de uma formação plena e específica para EJA,
que favoreça este novo pensar, compreendendo nesta nova forma de fazer uma nova oportunidade

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
para uma aprendizagem. Assim, este trabalho é resultado da investigação e reflexão a partir das
ações de coordenação do Proeja FIC do IF Baiano Campus Catu em parceria com a Secretaria de Edu-
cação do Município de Catu – BA (SMEC Catu) no curso Proeja FIC em Serviços de Restaurante e Bar,
buscando desvelar a formação continuada de professores e sua relação com a educação profissional
e o currículo integrado. O currículo integrado na educação profissional de jovens e adultos está no
cerne da proposta do programa.2 desde a criação do curso e em sua sua fundamentação legal, ten-
do em vista o processo de elevação da escolaridade estar articulado a formação profissional.
Neste caminhar, é importante destacar o desafio de uma formação continuada de professores
que rompa com os modelos de exploração e subalternação dos sujeitos, educação bancária, assim
como nos diz Freire (1987, p.36)

Não é de estranhar, pois, que nesta visão “bancária” da educação, os homens se-
jam vistos como seres da adaptação, do ajustamento. Quanto mais se exercitem os
educandos no arquivamento dos depósitos que lhes são feitos, tanto menos desen-
volverão em si a consciência critica de que resultaria a sua inserção no mundo, como
transformadores dele. Como sujeitos.

De fato, não é possível pensar na formação dos formadores sem contextualizar porque a EJA
é uma modalidade, portanto, com educandos com características específicas, mas não homogêne-
as. De fato, podemos constatar que os alunos da EJA são sujeitos com experiências entrecortadas
com o ambiente escolar, em sua maioria empobrecidos e em busca da escolarização para melhorar
suas condições de vida (OLIVEIRA, 1999). Apesar disso, as relações dos sujeitos com a escola não
estão ligados apenas pela processo de profissionalização mas também por fatores emocionais e afe-
tivos. Assim, a EJA se consolida como uma modalidade na medida em que congrega a experiência,
a diversidade e a perspectiva da aprendizagem ao longo da vida, reconhecendo os sujeitos e suas
necessidades de formação.
No intento de realizar uma reflexão sobre a formação continuada de professores, foi realizada uma
investigação de natureza exploratória e interpretativa, partindo dos estudos de Paiva (2006,2012)
acerca da EJA, através do levantamento temático nas obras de Freire (1987,1996) e traçada uma
aproximação teórica com as ideias de Alarcão (1996,2011) e Imbernón (2010), na tentativa de com-
preender a formação de professores como um momento de reflexão e tomada de decisão.

cAminhos pArA UmA formAção de professores em ejA


Os caminhos possíveis de ser traçados na formação de professores para EJA pode nos levar a
lugares, sujeitos e realidades distintas. Neste sentido, cabe-nos fazer uma opção, uma escolha do
percurso a ser seguido nesta investigação. Em uma sociedade fragmentada, com desigualdades es-
truturais e sociais tão abissais, a EJA tem um papel fundamental nos processos de inclusão social.
Não se trata de uma crença ingênua e neutra, mas uma crença comprometida e motivadora.

O mito da neutralidade da educação, que leva à negação da natureza política do


processo educativo e a tomá-lo como um quefazer puro, em que nos engajamos a
serviço da humanidade entendida como uma abstração, é o ponto de partida para
compreendermos as diferenças fundamentais entre uma prática ingênua, uma prá-
tica “astuta” e outra critica. (FREIRE, 1989, p.15)

De fato, Freire nos impulsiona a pensar, em sua pedagogia, em uma educação libertadora, com
2 A oferta do curso se tornou possível, a partir do Decreto nº 5.840, de 13 de julho do 2006, que instituiu o Programa
Nacional de Educação Profissional Integrada a Educação Básica na modalidade de Educação de Jovens e Adultos (Proeja).

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
perspectiva emancipatória, na qual o educador e o educando são sujeitos, isto entendido que “nas
condições de verdadeira aprendizagem os educandos vão se transformando em reais sujeitos
da construção e da reconstrução do saber ensinado, ao lado do educador, igualmente sujeito do
processo”(FREIRE, 1996, p.13).
Quando tratamos da formação de professores temos diversas opções teórico-metodológica que
nos apontam caminhos possíveis e viáveis. No entanto, ao falarmos dessa formação para professores
de EJA, é necessário refletir que estamos refletindo sobre sujeitos, homens e mulheres, que também
são adultos em formação, com seus saberes e crenças, que atuaram com outros adultos em seu pro-
cesso de conquista da escolarização. A opção clara, crítica e emancipadora de Freire nos fez optar
por pautarmos essa proposta em suas teorizações. Estas também se tornam pertinentes por sua
opção por uma perspectiva e crença de mudança através da educação. Não uma mudança mágica,
mas dialógica e histórica . Extrapola uma concepção de aprendizagens de técnicas e métodos para
uma profunda análise de si e de seu cotidiano, tematizando a ação docente e seu papel transforma-
dor na sociedade.
Estando isso posto, é necessário peregrinar na pedagogia freiriana na tentativa de traçar um ca-
minho que nos auxilie a pensar uma formação continuada de professores que favoreça uma postura
crítica e emancipatória dos sujeitos. Não queremos traçar aqui um modelo de formação, mas pensar
em elementos importantes que são necessários para a prática docente. O autor denomina saberes
necessários a uma prática libertadora e que, portanto devem fazer parte de sua formação. Elegemos
os saberes a seguir para esta reflexão: a rigorosidade metódica, a postura investigativa e a curiosida-
de; criticidade e a reflexão crítica sobre a prática; respeito a autonomia dos educandos e o respeito
aos saberes dos educandos; a alegria, esperança e o querer bem aos educandos; a disponibilidade
para o diálogo e; a convicção da possibilidade de mudança (Freire, 1996).
Ao se referir a rigorosidade metódica, Freire nos aponta a necessidade do conhecimento técnico
docente, capaz de intervir no processo interativo do aluno,como sujeito cognoscente e o conheci-
mento, objeto cognoscível, o que torna a educação um processo de intervenção na realidade. Em
um contínuo, a postura investigativa do docente não apenas é uma necessidade, mas uma prática
contundente e cotidiana, que se interliga com a curiosidade inventiva, possibilitando a superação
da ingenuidade do educador-educando.
Neste sentido, Alarcão (1996) nos aponta a perspectiva do professor reflexivo como aquele que
questiona, para o qual nenhuma estratégia formativa será produtiva se não houver a curiosidade in-
vestigativa. O que Freire aponta como rigorosidade metódica está intimamente ligado a criticidade
e ao que Alarcão aponta como modalidade de formação, a exemplo da autoscopia (observação e
análise de suas próprias aulas), não apenas como um processo mecânico, mas vigilante e investiga-
tivo, imbuídas de uma curiosidade prescrutadora que possibilite um olhar crítico sobre sua prática.
Um outro elemento presente na pedagogia freiriana é a relação com o saber do educador-edu-
cando e do educando-educador. Barcelos (2010, p.23) referenda a necessidade de reconhecer a ex-
periência como categoria importante na formação, quando nos diz que “é tomando a experiência
como um processo que acontece num espaço-tempo vivido, como uma forma de dizer de si e do
mundo, que acredito na sua grande potência criativa para a a construção de saberes em relação a
formação de professores”. Pensar a formação de docentes é perceber uma trajetória de saberes e
práticas, a qual cabe ao educador a escuta sensível, a dialogicidade em sua prática e em sua for-
mação. É necessário desvelar que os professores também são sujeitos, adultos, trabalhadores que,
como seus educandos, enfrentam o desgaste das jornadas duplas de trabalho e são desafiados a
construir aprendizagens a partir de suas experiência e saberes.
Para Nóvoa (1999), os processos de formação docente devem ter como referencial o saber docen-
te e o reconhecimento desse saber. De fato, desenvolver formação continuada sem levar em consi-
deração as etapas de desenvolvimento profissional do docente, ou seja, seus aspectos psicossociais

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
pode levar a pouca aprendizagem ou participação. Existem grandes diferenças de anseios e neces-
sidades entre o docente em fase inicial, o que já adquiriu uma considerável experiência pedagógica.
Um terceiro elemento destacado necessário ao professor é a capacidade de querer bem. Não um
sentimento piegas ou amolecido, que desestabiliza as relações, mas uma disposição em entender
e colocar-se no lugar do outro. Aqui, a afetividade torna-se elemento fundamental no processo de
conhecer. No entanto, Freire (1996, p.53) nos alerta “mas é preciso, sublinho, que, permanecendo e
amorosamente cumprindo o seu dever, não deixe de lutar politicamente, por seus direitos e pelo
respeito à dignidade de sua tarefa, assim como pelo zelo devido ao espaço pedagógico em que atua
com seus alunos”, o que nos ajuda a compreender também a categoria Felicidade eleita por Barcelos
(2010, p.86) ao nos rememorar a importância da afetividade na EJA.

Na EJA sabemos que boa parte dos(as) educandos(as) estão procurando a es-
cola para melhorar sua condição no mundo do trabalho ou mesmo para acessar a
ele. Contudo, isto não nos deve fazer esquecer que a relação com o conhecimento,
quando mediada pelos aspectos afetivos e lúdicos, tem maiores possibilidades de
acontecer.

O quarto elemento aqui eleito, reflete-se ao longo de toda a pedagogia freiriana. A postura
dialógica e a disposição para o diálogo é um elemento fundante para uma prática pedagógica liber-
tadora. Freire (1987, p.45) evoca sujeitos atuantes que compartilham, divergem ou constroem sua
relação com o mundo mediada pela palavra e esta se conecta com o outro através do diálogo.

O diálogo é uma exigência existencial. E, se ele é o encontro em que se solidariza o


refletir e o agir de seus sujeitos endereçados ao mundo a ser transformado e humani-
zado, não pode reduzir-se a um ato de depositar ideias de um sujeito no outro, nem
tampouco tornar-se simples troca de ideias a serem consumidas pelos permutantes.

Revela-nos o importante e desafiador papel do professor, que necessita lutar contra a possibilida-
de de impor sua voz, suas posições sobre o mundo aos educandos. Um processo de humanização
e formação pessoal e social. Alarcão (2011) reflete sobre a importância do diálogo na formação do
professor reflexivo, ressaltando que nos contextos formativos e com base na experiência, a expres-
são e o diálogo assumem posições centrais. Afirma ainda a autora que este é um triplo diálogo:
consigo, com os outros e com a própria situação, que não pode limitar-se em seus aspectos descri-
tivos mas ampliar-se para um nível crítico e explicativo, que permita aos professores agir e falar com
segurança.
O quinto elemento destacado nesta discussão diz respeito a convicção da possibilidade de mu-
dança. Este é o diferencial e o maior ponto de crítica a pedagogia freiriana: a crença renovada na
possibilidade de mudança da realidade sócio educacional dos sujeitos, a partir do reconhecimento
da condição de oprimidos, refutando-a e criticando a estruturação da sociedade.

Quem, melhor que os oprimidos, se encontrará preparado para entender o signifi-


cado terrível de uma sociedade opressora? Quem sentirá, melhor que eles, os efeitos
da opressão? Quem, mais que eles, para ir compreendendo a necessidade da liberta-
ção? Libertação a que não chegarão pelo acaso, mas pela práxis de sua busca; pelo
conhecimento e reconhecimento da necessidade de lutar por ela. Luta que, pela fi-
nalidade que lhe derem os oprimidos, será um ato de amor, com o qual se oporão ao
desamor contido na violência dos opressores, até mesmo quando esta se revista da

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
falsa generosidade referida. (…) Pedagogia que faça da opressão e de suas causas
objeto da reflexão dos oprimidos, de que resultará o seu engajamento necessário na
luta por sua libertação, em que esta pedagogia se fará e refará. (FREIRE, 1987, p.17)

Como elemento formativo, esse saber é fundamental, no sentido de definir as opções teóri-
co-metodológicas que embasarão a prática, seus métodos e conhecimentos a ser trabalhados em
sala de aula. A busca da desocultação da situação de oprimidos por educandos e educadores na
educação pública brasileira revelar-se-á como um fundamento necessário a profundas mudanças
sociais.
Desse modo, a pedagogia freiriana aponta diversos fundamentos a uma formação docente que
contemple a formação do trabalhador, reconhecendo nesta seu caráter eminentemente popular e
seu potencial revolucionário para uma profunda mudança na sociedade brasileira.

propostA de formAção docente continUAdA no proejA fic


Antes de iniciarmos a discussão acerca das realidades empíricas das atividades de formação con-
tinuada dos docentes que lecionam no curso Proeja FIC Serviço de Restaurante e Bar, é essencial
estar posta a reflexão acerca da concepção deste. O curso ora analisado faz parte de um programa
em nível nacional que prevê a oferta de ensino fundamental integrado a educação profissional.
Como tal, é importante destacar que a formação profissional foi implementada no século XX com a
preocupação da formação de trabalhadores pobres, não que a estes fosse garantido o direito, mas
para evitar a mendicância e a ociosidade. (OLIVEIRA e MACHADO, 2012). Isto porque a concepção
acerca da educação profissional esteve calcada na perspectiva da especialização e na construção de
conhecimentos operacionais e limitantes.
Em contraposição a esta concepção, Gramsci (apud CIAVATTA e RUMMERT, 2010, p.466), nos au-
xilia a refletir sobre “o ideário da educação politécnica, tecnológica ou integrada entre a formação
geral e a educação profissional, no sentido de superar o ser humano cindido, historicamente, pela
divisão social do trabalho entre a ação de executar e a ação de pensar, dirigir ou planejar”. O que sig-
nifica superar uma perspectiva da formação profissional que abarque apenas a especialização, que
supere a visão do ser humano fragmentado e que sua formação auxilie na compreensão de si e do
outro como transformadores da realidade.
O desafio que se põe a educação profissional integrada a educação básica reside, como nos sina-
liza Frigoto (2010), na qualidade da educação básica ofertada aos nossos jovens (e porque não, adul-
tos) que articule-se com as mudanças científico-tecnológicas do processo produtivo imediato, sem
necessariamente ser confundida com um imediatismo falacioso da empregabilidade e do mercado
de trabalho, sob pena de continuarmos reproduzindo na escola os modelos de desenvolvimento
capitalistas de exploração do trabalhador.
Dentre as diversas necessidades para uma educação profissional que atenda a essa realidade dos
jovens e adultos brasileiros, educação esta em consonância com os princípios freirianos, está uma
formação continuada dos docentes, que contemple a experiência como categoria fundante, tendo
em vista o perfil diverso dos educadores de EJA. Partindo disso, na implantação e continuidade de
oferta do curso Proeja FIC Serviços de Restaurante e Bar, foi proposto o curso de aperfeiçoamento
em Educação Profissional Integrado a Educação Básica, na Modalidade Educação de Jovens e Adul-
tos, buscando atuar em situações específicas que contemplem as peculiaridades dos docentes de
duas modalidade (Educação Profissional e EJA), com o propósito de desenvolver uma formação sig-
nificativa para os educandos que frequentam o curso Proeja FIC.
O curso de formação está assim organizado: o Eixo I, que tem como temática Políticas Públicas do
Proeja e a Gestão Democrática, objetivando discutir com os docentes sobre as intencionalidades go-
vernamentais, as bases legais e históricas que fundamentam o Proeja e a concepção de ação demo-

516
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
crática, através da gestão e das ações colaborativas; o Eixo II, que apresenta a temática Os Sujeitos,
Saberes e Práticas Pedagógicas no PROEJA, objetivando discutir com os docentes sobre quem são
os alunos que frequentam o curso, suas trajetórias de vida, anseios e desejos, a didática, avaliação e
o currículo integrado no Proeja, além de revelar uma categoria fundamental na EJA que é a diversi-
dade e pluralidade cultural; o Eixo III, que tematiza as Bases para a Formação Técnica no Proeja FIC,
oportunizando os docentes conhecer as técnicas, conhecimentos e saberes que fundamentam a
profissão, possibilitando aos docentes experienciar os fazeres dos educandos, ampliando seu olhar
sobre o fazer técnico e; as atividades diversificadas que são os Seminários Temáticos e a Oficina de
Elaboração de Material Pedagógico.
Uma proposta pedagógica nascida da necessidade dos docentes e profissionais envolvidos tem a
possibilidade de superação de uma formação docente reprodutivista e que permite um processo de
conscientização a luz da pedagogia freiriana. Além disso, busca-se nesta formação, a perspectiva do
professor reflexivo, que segundo Alarcão (2011) apoia-se na ideia da capacidade de pensamento e
reflexão que caracteriza o ser humano como criativo, inventivo e transformador e não apenas como
reprodutor ou transmissor de conhecimento, rompendo assim com a perspectiva da educação ban-
cária.
Como uma investigação preliminar, percebe-se que há uma intencionalidade na implementação
desses cursos, atentando-se para aspectos relevantes de uma proposta de EJA que seja diferente e
que contemplem ações que favoreçam uma formação que atendam as necessidades dos educan-
dos.
Freire (1996, p. 24) nos ajuda e refletir e tensionar estas práticas de formação quando nos diz que
“seria uma contradição se, inacabado e consciente do inacabamento o ser humano não se inserisse
em tal movimento. É neste sentido que, para mulheres e homens, estar no mundo necessariamente
significa estar com o mundo e com os outros”, o que nos desafia a entender esse processo de ir e vir,
de intenso construir de si e do outro como algo inerente ao inacabamento do humano, portanto,
fundamental em seu processo de formação.

considerAções finAis
A formação continuada de professores torna-se um desafio para um repensar e refletir sobre os
processos de ensinar e aprender. Esse desafio é ainda maior quando pensamos nos docentes da EJA.
Sem uma formação inicial clara e densa, o docente atua intensamente agindo na incerteza e cons-
truindo no caminhar sua formação e a formação de jovens e adultos trabalhadores.
Freire (1987, 1996) nos aponta caminhos para uma educação com inspirações emancipatórias,
que percebe o jovem e adulto como sujeitos e os educadores como parte responsável, integrante e
fundante da constituição da sociedade. Foi possível perceber que o processo de formação continu-
ada é fundamental para o envolvimento e comprometimento dos professores, além de favorecer a
ampliação de conhecimentos técnicos necessários a uma prática libertadora, tão necessária a esta
modalidade de ensino.
Os elementos e reflexões traçadas neste texto são base para uma possibilidade de pensar a for-
mação continuada como um caminhar, que possibilidade o diálogo, a partilha e a construção cole-
tiva dos saberes. Estes são basilares, como fruto da experiência e das relações estabelecidas com os
sujeitos.

referênciAs
ALARCÃO. Isabel. Ser professor reflexivo. IN:_________. Isabel (org.) Formação reflexiva de professo-
res: estratégias de supervisão. Ed. Porto: Porto-Portugal, 1996.
__________. Isabel. Professores reflexivos em uma escola reflexiva. 8ª ed., Cortez: São Paulo-SP, 2011.

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
BARCELOS. Valdo. Formação de professore para Educação de Jovens e Adultos. 4ª ed., Vozes: Petró-
polis – RJ, 2010.
CIAVATTA, Maria, RUMMERT, Sônia Maria. As implicações políticas e pedagógicas do currículo na
educação de jovens e adultos integrada à formação profissional. IN: Revista Educação e Sociedade.
Campinas, v. 31, n. 111, p. 461-480, Abril-Junho, 2010.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 17ª ed., Paz e Terra: Rio de Janeiro, 1987.
_______. Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. Cortez: São Paulo.
1989.
_______. Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários a prática educativa. Paz e Terra: São
Paulo-SP, 1996.
FRIGOTTO, Gaudêncio. Concepções e mudanças no mundo do trabalho e no ensino médio. In.: FRI-
GOTTO, Gaudêncio; CIVATTA, Maria; RAMOS, Marise (org.). Ensino Médio integrado: concepções e con-
tradições. São Paulo: Cortez, 2010.
NÓVOA, Antonio. Os Professores na Virada do Milênio: do excesso dos discursos à pobreza das prá-
ticas. IN: Revista Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 25, n. 1, p. 11-20, jan./jun. 1999.
OLIVEIRA. Martha Kohl. Jovens e Adultos como sujeitos de conhecimento e aprendizagem. Revista
Brasileira de Educação, nº 12, set/out/nov/dez, 1999.
OLIVEIRA, Edna Castro de Oliveira. MACHADO. Maria Margarida. O desafio do Proeja como estratégia
de formação dos trabalhadores. IN: _____________. PINTO Antonio Henrique. FERREIRA, Maria José de
Resende.(Orgs) EJA e Educação Profissional: desafios da pesquisa e da formação no Proeja. Liber Livros:
Brasília-DF, 2012.
PAIVA. Jane. Histórico da EJA no Brasil: Descontinuidades e Políticas Públicas Insuficientes. IN: EJA:
Formação técnica integrada ao Ensino Médio. Boletim 16, SEED/MEC, 2006.

518
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
A memóriA é A nArrAtiVA dA AlmA: A escritA de si como
elemento de formAção com professores.
renAtA dA silVA mAssenA | mArgAreth dA conceição AlmeidA de ArAújo

Esta pesquisa está fundamentada em princípios teóricos-epistemológicos-metodológicos de


abordagem qualitativa subsidiada pelo método (auto) biográfico pautada na escrita de si como
percurso formativo com inspiração etnográfica na condução das nossas ações. A todo o momento
imbricado em compreender e interpretar para elucidar e intervir de maneira colaborativa e com
responsabilização. Elegemos as narrativas como artefato de coleta das memórias desses atores
sociais, os professores, que compartilham desta pesquisa. Assim, os que eles pensam, buscam e
dialogam cada vez mais de forma diferente com possibilidades de produção de conhecimento e,
principalmente do conhecimento de si para (re)ssignificar a sua prática. Ao customizar memórias
embutidas nessas narrativas temos possibilidades de entrelaçamento para um modo de formação
que tem como elementos a experiências de vida com critérios pessoais bem marcados que podem
servir como elementos de trocas nos espaços de formação propiciados pelo encontro de pesso-
as com objetivos comuns: a formação pela pesquisa; uma formação valorada. Nesta proposta, as
narrativas (auto) biográficas para formação e a pesquisa, despontam questionamentos, tais como:
Quais buscas formativas os sujeitos fazem a partir das narrativas de si? Como a abordagem (auto)
biográfica poderá se tornar um movimento de investigação-formação, considerando as itinerâncias
e aprendizagens dos professores ao longo da vida como atos de formação e de pesquisa? A partir
dessas indagações a priori iniciais começamos um mergulho teórico-epistemológico tentando forjar
um conceito de formação tendo as experiências de vida como um dispositivo. Para tanto, os atores
sociais implicados nessa busca formativa vivenciada reflete sobre ela e estabelece transformação e
mudança. Validando assim, os resultados da pesquisa que são alcançados por meio de processos
colaborativos de geração e experimentação de saberes.

palavras-chave: Narrativas, Formação, Memória, Experiências de vida

considerAções introdUtóriAs
O ato de (re) memorar como processo formativo que contemple a subjetividade do sujeito e a
inter-subjetividade do grupo na perspectiva da (auto) biografia visando o processo de formação. O
sujeito como próprio objeto de reflexão e formação para constante transformação da sua prática.
Aponta o que define Brandão (2008) “a memória é constitutiva do ser humano e dos grupos e, por-
tanto, é uma das questões fundamentais a respeito da qual devemos refletir”.
Dessa forma, decidimos discutir sobre a escrita de si para assim, evidenciar a pesquisa (auto) bio-
gráfica ou história de vida apontando conceitos, perspectiva e caminhos que essa abordagem se
apresenta como modo de refletir sobre a formação de professores. Assim, esta pesquisa pretende
trazer a tona discussões de ordem metodológica e conceitual tendo a bibliográfica disponível sobre
o assunto como base de investigação colocando no cerne do texto a pesquisa (auto) biográfica des-
vendando conceitos e descobrindo as contribuições pertinentes a formação de professores nesta
prática da escrita de si tendo a memória como mola mestre dessa incursão muito pessoal.
Os professores ao longo de sua vida têm um modo próprio de realizar o trabalho na docência
com particularidades, habilidades e conhecimentos utilizados no cenário que atuam e refletem
como profissionais e trazem a vida pessoal para esse cenário. É nessa lógica de ações reflexivas que
nos fazemos sujeitos que fazem, pensam, sentem, executam, refletem e transformam-se em uma
perspectiva de formar e formar-se Macedo, 2000.

519
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
Para desenvolver o trabalho contamos com referências teóricas e conceituais fundamentadas nos
autores que abordam a temática em jogo e que validam está pesquisa a partir de concepções pri-
mordiais no sentido de construir uma teoria de formação que se sustente através da perspectiva
(auto) biográfica e das histórias de vida. Para tanto bebemos das concepções de (auto) biografia
em Josso (2004), Nóvoa (2013), Souza(2008). Concepção de formação: Josso (2004), Nóvoa (2013),
Macedo (2010).

2.A memóriA o bAú dA escritA


A priori em se tratando do titulo sugestivo deste texto: A memória é a narrativa da alma: A escrita
de si como elemento de formação com Professores. Escolhemos como modo subsidia de investiga-
ção as narrativas, as escritas de si que transformam em documento (auto) biográfico definimos como
documento por se tratar de algo muito particular de cada ser, de um material que carrega a história
de alguém, sua subjetividade embutida nesses artefatos nele se apresenta a vida, as experiências,
as histórias de vida e formação, as histórias pessoais entrelaçadas na vida profissional, entendemos
que elas não são dicotômicas se cruzam, entrelaçam-se. Parafraseando (NOVOA, 2013).
Souza (2008) quando trata sobre a perspectiva de formação pautada na metodologia aqui defen-
dida nos acalma no sentido de que estamos no caminho certo quando elegemos a pesquisa através
do método (auto) biográfico como um dos elementos de formação e define que:

A revalorização das histórias de vida situa-se na virada hermenêutica em que se


compreendem os fenômenos sociais como textos e a interpretação como atribuição
de sentidos e significados às experiências individuais e coletivas. (SOUZA, 2008, p.
42-43).

Ainda pautada em Souza (2008),

Através da abordagem biográfica o sujeito produz um conhecimento sobre si, so-


bre os outros e o cotidiano, revelando-se através da subjetividade, da singularidade,
das experiências e dos saberes. A centralidade do sujeito no processo de pesquisa e
formação sublinha a importância da abordagem compreensiva e das apropriações
da experiência vivida, das relações entre subjetividade e narrativa como princípios,
que concede ao sujeito o papel de ator e autor de sua própria história. (SOUZA, 2008,
p.45).

Quais buscas formativas os sujeitos fazem a partir da escrita de si? Como a abordagem (auto)
biográfica poderá se tornar um movimento de investigação-formação, considerando as itinerâncias
e aprendizagens dos professores ao longo da vida como atos de formação e de pesquisa? A partir
dessas indagações defendemos que a abordagem de pesquisa através da (auto) biografia, da escrita
de si tem como elemento/objeto central o sujeito/a pessoa/o indivíduo com suas formar de ser, sua
identidade, sua particularidade, sua essência. Superando a racionalidade técnica
Portanto, a escolha pela abordagem (auto) biográfica como “um caminhar para si” (JOSSO, 1999),
através da meta-reflexão do ato de narra-se, dizer-se de si para si mesmo como uma evocação dos
conhecimentos construídos nas suas experiências formadoras, enquanto prática de pesquisa, arti-
culando-se aos campos de conhecimento e às ações mediantes as diferentes buscas empreendidas
pelos sujeitos é o sentido dado a este modo de pesquisa em contraponto a pesquisa centrada na
objetividade. Aqui, neste texto apresentamos um estudo, uma pesquisa que “abra”, desvende as cor-
tinas da subjetividade do sujeito e suas formas particulares, singulares de ser professor e ser sujeito

520
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
de sua prática; levando consigo suas experiências de vida (JOSSO, 2004) suas experiências de for-
mação.

3. A escritA de si entrelAçAdAs A formAção


É, sobretudo, mágico saber, que somos constituídos de lembranças que carregamos história,
cultura, vida. Somos como acervos humanos capazes de colaborar com o outro através da nossa
memória, tendo como objeto de veiculação, de apresentação, de propagação a nossa própria exis-
tência. O processo de formação através da escrita de si tendo a memória como espaço de resgate
leva o sujeito a compreender que a sua profissão não pode se separar do ser sujeito (NÓVOA, 2013).
O registro ocorreu mediante anotações no diário de campo e os desvelamentos das histórias de
vida alcançados a partir de entrevistas narrativas individuais e da realização de oficinas biográficas
como recurso metodológico. Essa modalidade nos permitiu uma melhor compreensão da formação
através da escrita de si. O campo de inserção e atores sociais O curso de Pedagogia do Departamen-
to de Educação- DEDC Ida Universidade do Estado da Bahia-UNEB.
Os atores sociais que colaboram com a pesquisa são alunos do referido curso da turma do 4º se-
mestre da instituição. Bueno (2002) esclare e situa sobre a pesquisa (auto) biografica:

No contexto do desenvolvimento atual das pesquisas educacionais, é inegável a


presença e a importância cada vez mais crescente que estudos com e sobre histórias
de vida de professores vêm adquirindo. (BUENO, 2002, p.21).

Ocorre um redirecionamento a pessoa do professor a sua subjetividade torna-se valorada no sen-


tido de compreender a sua atuação profissional recheada pelo modo de ser pessoa. A formação
continuada dos professores saem das prescrições e se volta para uma atividade de formação com
eles juntamente com as demandas de atuação profissional. Para tanto, a centralidade na subjetivida
dá uma nova ordem as pesquisas voltadas para o método (auto) biográfico.
Através das narrativas fundamentada em princípios teóricos-epistemológicos-metodológicos da
abordagem (auto) biográfica com caráter hermenêutico para interpretação das narrativas dos ato-
res sociais participantes da nossa busca para uma política de formação. Um recorte que comparti-
lhamos no propósito de dialogar, apreender e interpretar as narrativas como processo de formação
tendo-as como elemento de discussão para a formação com os professores.
Desejamos empreender o movimento de formação individual e coletiva pontuando/desvelando
nesse contexto de trajetória que se cruzam como marco de experiência de sua vida imbricado ao
processo formativo que contempla os sujeitos e valorizam a subjetividade como algo importante,
necessário, como aparato de reflexão desses professores em busca de uma formação contínua e
completa. Compreendendo e no processo de formação e (auto) formação sendo mediada pelo pro-
cesso de aprender através da experiência pautada no método(auto) biográfico.

considerAções finAis
Consideramos o texto como uma contribuição sobre a perspectiva (auto) biografica como me-
todologia de formação com professores, com eles e não para eles, afinal a história de nossas vidas
somente nós podemos contar, escrever, refletir e se necessário modificar. O papel do formado neste
contexto é de viabilizar possibilidade de formação onde o outro seja o protagonista da sua vida e
do seu contexto profissional.
As narrativas fomentadas pelas memórias (re) visitadas indicam uma investigação que não se en-
cerra em si mesmas, pois na elaboração de tudo isso estamos imbuídos de uma latente necessidade

521
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
de formação o pesquisador propõe caminhos metodológicos para que seus atores sociais provisó-
rios possam, também, formar e formar-se. Esta pesquisa evidência o papel do sujeito na sua forma-
ção, mediante a apropriação de seu percurso de vida, visando mobilizar, através das historias de vida
fomentado pelo método (auto) biográfico coletando, armazenando histórias de vida, construindo
saberes críticos, reflexivos, históricos, num movimento emancipador para si. Consiste, também, em
recuperar, reorganizar, e (res) significar as trilhas de/para a formação.
Para guardar, reorganizar e (res) significar. É um processo que não se encerra em dada formação.
Nada somos além daquilo que recordamos” como afirma (Bobbio, 1997). O recurso (auto) biográfico
nao se encerra em si mesmo é uma possibilidade de trazer discussoes no sentido da formação edu-
cativa dos sujeitos, mas o primordial é a discussão trazida por discussões aponta como novas possi-
bilidades, métodos de formação do adulto nesta busca de criar uma teoria de formação de adultos
alertadas por Josso (2004) Nóvoa (2010, 2013).
As contribuições das pesquisas com a perspectiva da (auto) biográfica coloca os professores em
evidência no que diz respeito a sua prática em conssonância com suas possibilidades de ser, sentir,
agir, refletir e condicionar as suas escolhas de ser no mundo de modo respónsavel consigo dinami-
zando a sua atuação no sentido de sentir-se realizado e feliz com seu percurso de vida e formação.

referênciAs bibliogrAficAs
BOBBIO, Norberto. O tempo da memória- de senectude e outros escritos autobiográficos. Rio de
Janeiro: Campus, 1997.
BRANDÃO, Vera Maria Antonieta Tordino. Labirintos da memória: Quem sou?. São Paulo: Paulus,
2008.
BUENO.Belmira Oliveira. O método autobiográfico e os estudos com histórias de vida de professores:
a questão da subjetividade. Educação e Pesquisa, São Paulo, vol 28, n.1,p.11-30,jan/jun. 2002.
JOSSO, Marie-Christine. Experiência de vida e formação. São Paulo: Cortez, 2004.
_________História de vida e projeto: a história de vida como projeto e as “histórias de vida” a serviço
de projetos. Educação e Pesquisa. São Paulo, jul/dez. ano/vol 25, n.2, p.11-23.
MACEDO, Roberto Sidnei. Etnopesquisa crítica, etnopesquisa-formação. Brasília: Liber Livro Editora,
2006.179p.(série pesquisa v.15).
__________Compreender/mediar à formação o fundante da educação. Brasília: Liber Livro Editora,
2010
NÓVOA. Antônio. Vida de Professores. Porto: Porto Editora, 2013.
_________O método (auto) biográfico e a formação. São Paulo: Paulus, 2010.

522
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
A releVânciA dos conhecimentos sociolingUísticos
pArA formAção docente dA ejA
mAriA dA conceição ferreirA de soUzA | crizeide mirAndA freire

Com a propagação dos estudos sociolinguísticos no Brasil, a discussão em torno das variantes
linguísticas ganhou grande espaço na academia e, mais recentemente, nas instituições escolares. A
temática se torna ainda mais relevante para os docentes da Educação de Jovens e Adultos (EJA) que
trabalha com um público discente específico, que traz consigo uma história de vida e um capital
linguístico que deve ser considerado no processo de ensino e aprendizagem. Partindo desse pres-
suposto, pretende-se fazer uma concisa análise de como é tratada a questão das variantes linguís-
ticas, tendo como campo empírico a formação de educadores da Educação de Jovens e Adultos. O
trabalho pauta-se na necessidade de compreender a relevância dos estudos sociolinguísticos nos
espaços de formação docente, de forma a valorizar e respeitar a diversidade linguística dos edu-
candos da EJA. Acreditamos que os conhecimentos sociolinguísticos poderão subsidiar a práxis
pedagógica dos professores da EJA, que precisam conhecer a realidade linguística dos alunos, pois,
espera-se que a compreensão e respeito dos educadores pela forma como os alunos expressam-se,
podem melhorar a relação desses com a linguagem, minimizando assim, preconceitos sociais. E as-
sim, os discentes desenvolvam habilidades cognitivas necessárias a ampliação de sua competência
comunicativa oral, e escrita, tornando-os mais proficientes em sua língua materna e habilitando-os
a exercerem conscientemente e criticamente. Nesse trabalho tivemos como aporte teórico os auto-
res: Bagno (2004; 2007), Bortoni-Ricardo (2004; 2005), Camacho ( 2011), Freire (1997), Mollica (2003),
Nóvoa (1992), Soares,(2003; 2007), Tardif (2008).

palavras-chave: sociolinguistica, formação, EJA

introdUção
Com a propagação dos estudos sociolinguísticos no Brasil, a discussão em torno das variantes
linguísticas ganhou grande espaço na academia e, mais recentemente, nas instituições escolares. A
temática se torna ainda mais relevante para os docentes da Educação de Jovens e Adultos (EJA) que
trabalha com um público discente específico, traz consigo uma história de vida e um capital linguís-
tico que deve ser considerado no processo de ensino/aprendizagem. Partindo desse pressuposto,
pretende-se fazer uma concisa análise de como é tratada a questão das variantes linguísticas, tendo
como campo empírico a formação de educadores da Educação de Jovens e Adultos. O trabalho
pauta-se na necessidade de compreender a relevância dos estudos sociolinguísticos nos espaços de
formação docente, de forma a valorizar e respeitar a diversidade linguística dos educandos da EJA.
Acreditamos que os conhecimentos sociolinguísticos poderão subsidiar a práxis pedagógica dos
professores da EJA, que precisam conhecer a realidade linguística dos alunos, pois, espera-se que
a compreensão e respeito dos educadores pela forma como os alunos se expressam, podem me-
lhorar a relação desses com a linguagem, minimizando assim, preconceitos sociais. E, deste modo,
os discentes desenvolverão habilidades cognitivas necessárias à ampliação de sua competência
comunicativa oral e escrita, tornando-os mais proficientes em sua língua materna e habilitando-os
a exercerem-na de forma consciente e crítica.Para tanto, utilizamos como embasamento teórico os
estudos de pesquisadores como Bagno (2004; 2007), Bortoni-Ricardo (2004; 2005), Camacho ( 2011),
Freire (1997), Mollica (2003), Nóvoa (1992), Soares,(2003; 2007), Tardif (2008), dentre outros.
Este trabalho está organizado em três seções. Na primeira, trazemos um breve histórico da so-
ciolinguística, focalizando o contexto das pesquisas que influenciaram o surgimento desta subárea

523
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
dentro da linguística.Na segunda seção, discutimos as implicações da sociolinguística em sua inter-
face com o ensino de língua materna na EJA. Na terceira, tratamos da relevância dos conhecimentos
sociolinguísticos na formação da EJA e, por fim, as considerações finais.

breVe histórico dA sociolingUísticA


Sabe-se que, durante longos anos as pesquisas linguísticas estiveram fortemente inspiradas pela
abordagem formalista. Dentro desta perspectiva, desenvolveram-se importantes correntes teóricas
como o estruturalismo de Saussure e, mais tarde, o gerativismo de Chomsky, cujos esforços volta-
ram-se para os estudos imanentes da língua, tomando-a enquanto sistema abstrato, homogêneo e
estável, não levando em consideração as relações entre linguagem e sociedade. A partir dessa abor-
dagem, o foco recai sobre a observação das características estruturais de uma língua, ignorando-se
nas análises os aspectos relacionados ao uso.
Na segunda metade do século XX, no entanto, um novo paradigma passa a influenciar a ciência
da linguagem, uma vez que as teorias formalistas não davam conta de explicar toda a complexida-
de dos fenômenos linguísticos. Assim, com o funcionalismo, os usos linguísticos ganham um lugar
especial na análise, provocando o surgimento de novas subáreas dentro da linguística que se ocu-
passem em observar, descrever e analisar a língua em seu contexto social.
Deste modo, as teorias linguísticas formalistas, compreendidas especialmente no estruturalismo
e no gerativismo que tomavam como objeto de análise apenas a estrutura da língua, foram aos
poucos perdendo espaço para as teorias funcionalistas que reconhecem a importância dos usos e
de suas condições de produção, tomando-os como objeto de estudo. Marcuschi(2008) nos lembra
de que entre as décadas de 1950-1960, surgem novas tendências de caráter eminentemente inter-
disciplinar, a saber, linguística de texto, análise do discurso, análise da conversação, sociolinguística,
psicolinguística, etnografia da comunicação, etnometodologia e assim por diante.
Sobre essa natureza interdisciplinar que marca as pesquisas linguísticas a partir da segunda me-
tade do século XX, consideramos relevante destacar as palavras de Alkmin (2011), ao refletir acerca
da fixação da Sociolinguística como um campo de estudos dentro da ciência da linguagem.

Nessa vertente, em que linguagem, cultura e sociedade são considerados fenô-


menos inseparáveis, linguistas e antropólogos trabalham lado a lado e, mesmo de
modo integrado. Nesse sentido, o que há de novo é a definição de uma área explici-
tamente voltada para o tratamento do fenômeno linguístico no contexto social no
interior da Lingüística, animada pela atuação de lingüístas e, particularmente, de
estudiosos formados em campos das ciências sociais. A Sociolinguística nasce mar-
cada por uma origem interdisciplinar. (ALKMIN, 2011, p. 29).

É nesse contexto de ebulição de novas pesquisas científicas que nasce a Sociolinguística, dedica-
da necessariamente ao estudo da relação entre linguagem e sociedade que já era reconhecida, in-
clusive pelos estruturalistas, mas não era assumida como objeto de investigação e análise. Um mar-
co do surgimento da chamada Sociolinguística Variacionista é a divulgação dos trabalhos de William
Labov (1963; 1966), em que o linguista consegue mostrar o papel determinante de fatores sociais
como idade, sexo, origem, ocupação, entre outros, para explicar o fenômeno da variação linguística.
No entanto, é a partir da publicação do texto Empiricalfoudations for atheoryoflinguisticchange, de
Uriel Weinreich, William Labov e Marvin Herzog (1968), que se estabelece o novo modelo teórico-
-metodológico de descrição e interpretação do fenômeno linguístico, reconhecendo o caráter hete-
rogêneo das línguas e, tendo como objetivo entender como os fatores linguísticos e também sociais
podem motivar a diversidade linguística.

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
Mollica (2003, p. 10) salienta que “A sociolingüística considera em especial como objeto de estudo
exatamente a variação, entendendo-a como um princípio geral e universal, passível de ser descrita e
analisada cientificamente”. Conclui-se, então, a partir dos pressupostos teóricos da Sociolinguística,
que a variação é inerente a todas as línguas humanas e que essa variação é motivada, ora por fatores
de natureza linguística, ora por fatores relacionados à sociedade em que uma determinada língua é
falada.
Este pequeno e breve histórico acerca do surgimento e fixação da Sociolinguística apresentado
neste tópico é bastante reduzido e não pretende dar conta de forma satisfatória de uma revisão te-
órica ampla que contemple todas as relevantes pesquisas e pesquisadores que tornaram possível o
estabelecimento desse campo de estudos tão importante dentro da Linguística. Por outro lado, nos
parece suficiente para nortear as discussões que objetivamos empreender neste texto.
Assim, tendo compreendido que o objeto da Sociolinguística é a diversidade linguística e sua ine-
gável relação com os fatores de natureza social, e entendendo que os estudos da língua não podem
estar desvinculados do contexto social dos falantes, queremos fazer uma breve reflexão sobre as
implicações dos estudos sociolinguísticos para o ensino de língua portuguesa no Brasil.

2 A sociolingUísticA e sUA interfAce com o ensino de língUA mA-


ternA nA ejA
É notório que muitos esforços têm sido empreendidos no meio acadêmico por diversos linguistas
brasileiros, (cf. BORTONI-RICARDO, 2004; 2005; BAGNO 1999; 2007, só para citar alguns deles),com o
propósito de incentivar novas pesquisas na Sociolinguística e também de divulgar os princípios des-
ta área de estudos nos cursos de formação inicial e continuada de professores, a fim de que se tenha
um ensino de língua mais democrático, que apresente como princípios, o respeito e a aceitação das
variedades linguísticas trazidas pelos alunos da EJA.
A publicação em 1998 dos Parâmetros Curriculares Nacionais para o ensino de Língua Portugue-
sa (5ª a 8ª séries) foi fruto de amplos debates e discussões que vinham sendo travados nas univer-
sidades brasileira em torno das concepções de língua e de ensino de língua, cerca de vinte anos
antes. Como resultado do empenho de muitos estudiosos, o documento representou um avanço na
política educacional no país, refletindo em seu texto a influência das pesquisas linguísticas de seu
tempo, levando em conta, inclusive, as contribuições da Sociolinguística, como é possível perceber
no excerto que transcrevemos a seguir

A variação é constitutiva das línguas humanas, ocorrendo em todos os níveis. Ela


sempre existiu e sempre existirá, independentemente de qualquer ação normativa.
Assim, quando se fala em “Língua Portuguesa” está se falando de uma unidade que
se constitui de muitas variedades. [...] Não existem, portanto, variedades fixas: em
um mesmo espaço social convivem mescladas diferentes variedades lingüísticas,
geralmente associadas a diferentes valores sociais. Mais ainda, em uma sociedade
como a brasileira, marcada por intensa movimentação de pessoas e intercâmbio
cultural constante, o que se identifica é um intenso fenômeno de mescla lingüística,
isto é, em um mesmo espaço social convivem mescladas diferentes variedades lin-
güísticas, geralmente associadas a diferentes valores sociais. (BRASIL, 1997, p. 29).

Esse trecho dos PCN é suficiente para visualizarmos alguns termos, tais como, variação e varieda-
des linguísticas, já sendo tomadas como constitutivas das línguas, reconhecendo, portanto, a hete-
rogeneidade da Língua Portuguesa. A partir da publicação desse documento, vários conceitos da
Sociolinguística ganham notoriedade, passando a fazer parte, anos mais tarde, dos currículos das

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
universidades nos cursos de formação inicial e também de formação continuada de professores. Isso
representou um avanço significativo para o início de uma mudança no ensino de língua, no entanto
é necessário reconhecer que os impactos da sociolinguística nas práticas de sala de aula são ainda
incipientes. Como Bortoni-Ricardo (1999) chama a atenção:

[...] concordamos, que não é o simples fato de sido incluída nos PCN que a varia-
ção lingüística estará ao alcance dos professores do ensino fundamental. É preciso
que esse conhecimento que vem sendo acumulado ao longo de mais de vinte anos
sobre a variação lingüística saia dos muros das Universidades e seja, de fato, sociali-
zado entre os professores de Língua Portuguesa, para que estes utilizem tal conheci-
mento em benefício dos alunos e até de si próprio.

Cremos que uma das maiores contribuições da Sociolinguística para o ensino de língua materna
é a premissa de que a variação é inerente a qualquer sistema linguístico humano. Essa premissa
faz cair por terra à noção de erro, construída ao longo de muitos anos, sendo responsável por uma
concepção equivocada da língua, e pela disseminação de uma das formas mais discriminatórias de
exclusão social, o preconceito linguístico.
Os estudos sociolinguísticos foram de grande valia e contribuição, segundo Mollica(2003, p.
13)“no sentido de destruir preconceitos lingüísticos e de relativizar a noção de erro, ao buscar des-
crever o padrão real que a escola, por exemplo, procura desqualificar e banir como expressão lin-
guística natural e legítima”.
Assim, cabe à escola repensar o erro, romper com os preconceitos que criam barreiras entre o
indivíduo e o aprendizado, além de tornar o discente refém de sua própria fala, contribuindo para
inibir seu desenvolvimento linguístico frente às situações cotidianas.
A manutenção de uma postura tradicional da escola frente aos usos reais da língua, nos leva a
outra reflexão importante de Camacho (2011) quando enfatiza que:

Contrariando a Linguística em seus princípios, a pedagogia da língua elege o cor-


reto e o incorreto, sua dicotomia predileta para discriminar e, ao mesmo tempo, se-
lecionar. Sem nenhum respaldo nos fatos linguísticos, mas baseada solidamente em
motivações sociais, que a rubrica do incorreto mal encobre, a tradição pedagógica
acaba por liquidar o último reduto das camadas marginais – justamente o que lhe é
peculiar e identificador – sua própria variedade de linguagem [...] Esse procedimento
estigmatiza indelevelmente formas discursivas complexas e eficazes do quotidiano
e nada repõe. As marcas são, no entanto, certamente fortes e profundas. (CAMA-
CHO, 2011, p. 68).

Ao refletir sobre este aspecto, entendemos quão perverso pode ser esse posicionamento da
escola diante dos alunos da EJA que trazem consigo as variedades linguísticas desprestigiadas na
sociedade. Antes de tudo, é necessário lembrar que a elevação de uma variedade à condição de
padrão não é ingênua, pelo contrário, constitui um processo de natureza discriminatória, pois pres-
supõe a existência de uma única variedade correta e digna de aceitação. Enquanto as demais varie-
dades, que representam desvios em relação a este modelo padrão, passam a ser vistas como feias e
erradas, resultando numa visão preconceituosa do fenômeno linguístico da variação. Para Cagliari
(1991), os modos diferentes de falar acontecem porque a língua portuguesa, como qualquer outra
língua, é um fenômeno dinâmico, isto é, está sempre em evolução. Para o autor, o uso da variedade
linguística não constitui um erro, e sim uma diferença pelo uso de um ou outro dialeto. Os dialetos

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
de uma língua, apesar de serem semelhantes entre si, apresentam-se como línguas específicas, com
sua gramática e usos próprios.
Portanto, os alunos da EJA fazem parte de uma diversidade complexa. Ao chegarem à escola
trazem consigo toda uma marca social, inclusive linguística.O que deve ser levado em consideração
nesse caso, é que ninguém fala errado, simplesmente fala de maneira diferente.
Vale lembrar que os linguistas não defendem o uso deu ma linguagem informal em todas as si-
tuações de interação, nem negam a necessidade do aprendizado das formas prestigiadas na escola,
pelo contrário, como defende Bortoni-Ricardo (2004, p. 9),

[...] cabe à escola levar os alunos a se apoderar também das regras linguísticas
que gozam de prestígio, a enriquecer o seu repertório linguístico, de modo a permitir
a eles o acesso pleno à maior gama possível de recursos para que possam adquirir
uma competência comunicativa cada vez mais ampla e diversificada – sem que ain-
da a desvalorização de sua própria variedade linguística, adquirida nas relações
sociais dentro de sua comunidade.

Entendemos com isso que, a apropriação dos conhecimentos sociolinguísticos por parte dos
professores que trabalham com a EJA seja de fundamental importância para que o seu trabalho em
sala de aula não dê sustento a uma visão preconceituosa em torno dos diferentes usos da língua.
Daí, a necessidade cada vez mais premente dos cursos de formação de professores abordarem as
questões relativas à variação linguística.

releVânciA dos conhecimentos sociolingüísticos nA formAção


do professor dA ejA
De acordo com as Diretrizes Curriculares da EJA (2006, p.27), a Educação de Jovens e Adultos é
uma modalidade de ensino que atende aos alunos-trabalhadores que não tiveram acesso ou con-
tinuidade da escolarização na idade própria, e que tem como função social o compromisso com a
formação humana e com o acesso à cultura geral, de maneira que os educandos aprimorem sua
consciência crítica e se firmem como sujeitos ativos, críticos, de atitudes éticas e comprometidos
com o aprendizado e desenvolvimento de sua autonomia intelectual.
É característica dessa modalidade de ensino a diversidade do perfil dos educandos, com relação
à idade, ao nível de escolarização, à situação socioeconômica e cultural, às ocupações e a motivação
pela qual procuram a escola. É pertinente entender que cada sujeito-aluno tem um tempo próprio
de formação, apropriando-se de saberes locais e universais, partindo de sua perspectiva, ressignifi-
cação de mundo e de si mesmo (DCE-EJA, p.27) A EJA (Educação de Jovens e Adultos) tem suas es-
pecificidades; para tanto, deve ter uma estrutura flexível a fim de contemplar inovações que tenham
conteúdos significativos. Deve respeitar os limites, o tempo de cada educando, pois há diferenças
de aprendizagem e não um tempo único para todos. Ao reconhecer-se como sujeito, o educando
poderá ressignificar suas experiências socioculturais para a construção e apropriação de conheci-
mentos para o mundo de trabalho e para o exercício da cidadania.
A Educação de Jovens e Adultos deve atender às expectativas e às necessidades do aluno adulto,
inserido em uma sociedade que está em constante transformação. Segundo Gadotti e Romão (2001,
p.55): “Neste sentido, há que se destacar a qualidade de que deve se revestir a educação de jovens e
adultos”. Ela não pode ser colocada paralelamente ao sistema, nem como forma compensatória, nem
como forma complementar, mas como modalidade de ensino voltado para uma clientela específica.
Para Leôncio Soares (2002, p. 32): “A educação de jovens e adultos representa uma dívida social
não reparada para com os que não tiveram acesso a educação escolar e nem domínio da escrita e

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
leitura como bens sociais”.
Sob essa perspectiva, o processo de formação de professores de EJA não pode prescindir de um
direcionamento político que recobre a própria dimensão da educação como bem comum, como
direito humano. Com essa inspiração, Paulo Freire (2000, p. 84-85) afirma que

É importante ter sempre claro que faz parte do poder ideológico dominante a
inculcação dos dominados da responsabilidade por sua situação [...] A atuação do
professor em grupos populares ganha sentido na sua dimensão humana quando se
consegue uma espécie de psico-análise histórico-político-social de que vá resultan-
do a extrojeção da culpa indevida.

Compreende-se que a formação do professor que atua na educação de jovens e adultos requer
uma formação cada vez mais adequada. O Parecer CNE 11/2000, do Ministério da Educação, texto
que regulamenta as Diretrizes Curriculares Nacionais para a EJA, afirma que essa modalidade de en-
sino é uma categoria organizacional com finalidades e funções específicas. O reconhecimento dessa
especificidade encontra respaldo na atual LDBEN, Lei nº 9.394/96, que estabelece a necessidade de
uma formação adequada para se trabalhar com o jovem e o adulto.
Ainda do ponto de vista da legalidade, as Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação de Jo-
vens e Adultos, estabelecem, no item VIII, referente à formação docente, que o preparo desse pro-
fissional deve incluir exigências formativas, tendo em vista a complexidade dessa modalidade de
ensino. Nesse documento, ressaltam-se as especificidades dos sujeitos da EJA, recomendando que
“[...] os docentes deverão se preparar e se qualificar para a constituição de projetos pedagógicos que
considerem modelos apropriados a essas características e expectativas”.
Assim sendo, verifica-se a relevância de pensar sobre a educação de jovens e adultos, no contexto
da formação geral do professor devido à urgência de construção de saberes para o profissional que
age nessa forma de ensino. O educador precisa ocupar o papel de ator da própria ação e o de autor
do próprio discurso (TARDIF, 2002).
Neste enfoque, para que haja um bom desempenho no ensino é essencial que o educador esteja
qualificado. Mas, será que as academias preparam o suficiente este profissional ? Será que a partir
de uma pós-graduação um professor pode se considerar apto? Imbuído das leituras de Paulo Frei-
re, Gadotti aponta que, “a formação do educador deve ser permanente e sistematizada, porque a
prática se faz e refaz” (GADOTTI, 2006, p.59). Mediante este princípio, percebe-se que a formação
deve ser contínua, visto que nada é permanente. Trabalhar na EJA, assim como em qualquer outra
modalidade de ensino, requer preparação. O professor precisa refletir sobre sua prática educativa e
buscar novas perspectivas de ensino/aprendizagens.
Partindo desse pressuposto é que se faz necessário a inserção dos estudos sociolinguísticos nas
formações dos professores, para que eles compreendam que, quando os educandos chegam à es-
cola, abrem-se novas possibilidades de interação verbal. A interlocução nessa nova instância implica
o uso de uma variedade linguística diferente daquela utilizada em seu grupo social. A inserção do
educando nessa nova instância implica em um profundo respeito pelas formas de expressão que ele
trouxe de sua comunidade.
Para isso, os professores devem respeitara diferença e a diversidade. Não se trata de substituir a
variedade que o educando utiliza por outra, mas sim de construir novas possibilidades de interação
em sala de aula, promover atividades para o educando da EJA tornar-se um falante cada vez mais
ativo e capaz de compreender e realizar os diversos discursos.
Considerar a variedade linguística nesta perspectiva significa entender que, do ponto de vista
exclusivamente linguístico, as variedades se equivalem e não há como diferenciá-las em termos de

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
melhor ou pior, de certo ou errado; todas as variedades têm uma organização própria e todas são
eficientes para articular as experiências do grupo que as utiliza e estabelecer as interações nas múl-
tiplas relações sociais.
Mediante este aspecto, faz-se necessário que a formação do docente da EJA busque uma maior
compreensão dos estudos sociolinguísticos, pois sabemos que é difícil para alguns os professores
reconhecerem e respeitarem a diversidade linguística, utilizando muitas vezes em sala de aula ati-
vidades e metodologias que desencadeiam o preconceito linguístico. Diferente de outros precon-
ceitos, (étnicos, de gênero, etc.) o preconceito linguístico é difundido sem muitas restrições. Saber
lidar com essa variedade demanda um exercício processual de leituras, releituras e reflexões sobre a
temática. Os professores, mesmo adotando o discurso do respeito à fala do educando, não sabe, em
alguns casos, como intervir quando o aluno usa uma variante diferente da utilizada pela escola; fato
este que reforça a necessidade de uma formação na área.
Percebemos que o trabalho com a variedade linguística não é tão fácil e rápido como a divulga-
ção dessas questões. O que é possível fazer quando os educandos falam (e algumas vezes trans-
põem para a escrita) a palavra “oio”, “barrê”, “pobrema”, entre tantas outras, comuns ao grupo e que,
na maioria das vezes, só soa diferente ao professor? Sabemos que a nossa responsabilidade é inter-
vir nessas construções, mas como podemos fazer isso?
Essas são apenas algumas de tantas outras questões que surgem em relação a temática; é neces-
sário reconhecermos que elas são complexas e, o fato de dizer que respeitamos as variantes faladas
pelos alunos não resolve a questão do preconceito linguístico.Ele ainda continua presente em vários
âmbitos sociais, inclusive na escola. Desse modo, reforçamos a necessidade do envolvimento do
professor, também nas discussões em torno dessa temática, mais que pertinente na formação dos
docentes da EJA.

4. considerAções finAis
A discussão em torno das questões sociolinguísticas é ampla e complexa. Neste trabalho, tece-
mos algumas reflexões acerca da incipiência da formação docente da EJA sobre a forma de lidar
com questões linguísticas dos educandos. Esse estudo deve servir para que os espaços de formação
docente promovam momentos de reflexão sobre a diversidade de usos linguísticos em seu espaço
de aula com os alunos. Pois, o papel da formação docente é fundamental para isso; visto que, sem
os conhecimentos teóricos suficientes acerca da sociolinguística, o professor não contribuirá para a
valorização da pluralidade e heterogeneidade linguística de seus alunos da EJA.
Nesta perspectiva, concordamos com Bagno (2007) ao afirmar que

À professora e ao professor de língua portuguesa cabe o trabalho de reeduca-


ção sociolinguística de seus alunos e de suas alunas. O que significa isso? Significa
valer-se do espaço e do tempo escolares para formar cidadãs e cidadãos conscientes
da complexidade da dinâmica social, conscientes das múltiplas escalas de valores
que empregamos a todo momento em nossas relações com as outras pessoas por
meio da linguagem. (BAGNO, 2007, p.82, grifos do autor).

Para isso, entendemos que só, através de uma formação (sócio)linguística consistente, será possí-
vel um trabalho pedagógico sensível à diversidade linguística do nosso país, que dê conta de toda
essa complexidade envolta em nossas práticas de linguagem, principalmente no que tange a edu-
cação de jovens e adultos.
Depreendemos disso que, permanece latente a necessidade de cursos de formação mais espe-
cíficos acerca da abordagem pedagógica da Sociolinguística para professores da EJA, para que seja

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
possível um ensino reflexivo de língua materna que, ao mesmo tempo, não discrimine as variantes
utilizadas pelos alunos, ofereça também a eles, a possibilidade de apropriação da norma de pres-
tígio, afinal é um dos objetivos da escola, a fim de transitarem livremente nas diversas situações
sociais de uso da linguagem.

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
edUcAção de joVens e AdUltos: inflUênciA de pAUlo
freire nA formAção de professores dA escolA
cAbAnA
Alder de soUsA diAs | iVAnilde ApolUceno de oliVeirA

O trabalho analisa a influência de Paulo Freire na formação de professores da Educação de Jovens


e Adultos (EJA) na Escola Cabana – proposta educacional implantada em Belém-PA, no período de
1997 a 2004. Tem por base uma dissertação de mestrado concluída em 2012, no âmbito do Progra-
ma de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado do Pará e vinculada a um projeto
de pesquisa interinstitucional liderado pela Cátedra Paulo Freire da PUC/SP. A pesquisa consiste em
uma investigação qualitativa. Os sujeitos são quatro profissionais da educação, que no período da
Escola Cabana atuaram com a EJA. Entre as estratégias metodológicas estão o levantamento biblio-
gráfico e documental e a aplicação de entrevistas narrativas com os sujeitos da pesquisa. A sistema-
tização e análise dos dados foram construídas com base em técnicas da Análise de Conteúdo. Den-
tre os resultados, aponta-se que o sistema de formação de professores da Escola Cabana constitui-se
como base da atual prática de formação continuada da SEMEC/BEL; a Hora Pedagógica figura como
principal conquista na prática da formação de educadores; o pensamento educacional freireano foi
referência teórica presente a partir de categorias como libertação, humanização, conscientização e
temas geradores. Ocorreram algumas dificuldades durante a operacionalização deste processo for-
mativo, por exemplo: a valorização do profissional da educação aquém do esperado; a incoerência
entre o dito e o feito quanto à prática educativa; e o descompasso entre a promoção da criticidade e
o trabalho de alfabetização e de letramento. Conclui-se que a experiência de Paulo Freire como Se-
cretário de Educação de São Paulo-SP (1989-1991) constituiu-se na principal referência da proposta
de formação de professores da EJA da Escola Cabana, mas com algumas incoerências e dificuldades
operacionais, próprias de seu condicionamento histórico, que devem ser analisadas criticamente
para fins de se vislumbrar propostas e práticas de educação como prática de liberdade.

palavras-chave: Paulo Freire, Formação de Professores, EJA, Escola Cabana

introdUção
Este artigo tem como base uma dissertação de mestrado em Educação defendida no ano de
2012 no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado do Pará.
A dissertação constituiu-se parte de uma pesquisa interinstitucional que envolveu oito Programas
de Pós-Graduação em Educação, seis estados brasileiros e dentre seus objetivos visou identificar e
analisar a influência de Paulo Freire nos sistemas públicos de ensino do Brasil.
O marco material desta pesquisa situa-se nas ações decorrentes do aceite de Paulo Freire em se
tornar Secretário Educação de São Paulo-SP, durante o mandato do Partido dos Trabalhadores (PT),
durante o período de 1989 a 1992. Destaca-se que Paulo Freire esteve como Secretário de Educação
até 27 de maio de 1991, após esse período assume a Secretaria Municipal de Educação de São Paulo
(SME/SP), um de seus colaboradores que manteve as mesmas diretrizes de trabalho: Mario Sérgio
Cortella, permanecendo no cargo até o final do mandato. Por isso, falar-se ao longo do texto em
Gestão Freire.
As ações de Paulo Freire à frente da SME/SP permitiu a instauração de uma política educacional
de orientação democrática e popular, que a partir de 1993 se irradiou para outros estados e municí-
pios (SAUL; SILVA, 2009).

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
Dentre essas irradiações políticas tem-se a Escola Cabana, proposta de educação ao município
de Belém, implantada pelas gestões municipais do PT, durante os anos de 1997 a 2004. Ao evocar a
Cabanagem enquanto revolução genuinamente amazônica como marca central de sua identidade,
a Escola Cabana intencionou se constituir em uma política educacional de identificação e luta pelos
interesses das camadas populares e excluídas dos processos sociais, além de visar à participação
popular em processos decisórios locais.
A Escola Cabana se materializou por meio de algumas ações estruturantes: a gestão democrática,
a reorientação curricular, a política de formação de educadores e a avaliação emancipatória.
Para fins de recorte epistemológico, o foco deste artigo é para a formação de educadores que
atuaram com a modalidade Educação de Jovens e Adultos (EJA) da Escola Cabana.
Nesse sentido, o objetivo deste trabalho é analisar a presença de Paulo Freire nos documentos e
nas falas das narradoras da pesquisa em relação à formação de educadores da EJA da Escola Cabana.
A dissertação da qual resulta este artigo ancora-se na abordagem qualitativa e consiste em uma
pesquisa de campo do tipo estudo de caso, na medida em que visa coletar e registrar dados de um
caso particular a fim construir um relatório ordenado e crítico sobre o objeto pesquisado (CHIZZOT-
TI, 2009).
Apresenta também características da pesquisa etnossociológica que faz uso do método da narra-
tiva de vida, que se: “constitui [em] uma descrição próxima da história ‘realmente vivida’ (objetiva e
subjetivamente)” (BERTAUX, 2010, p. 15).
As narradoras da pesquisa são quatro profissionais da educação vinculadas à Secretaria Muni-
cipal de Educação de Belém (SEMEC/BEL), que no período da Escola Cabana atuaram com a EJA.
Seguem-se os cargos que ocupavam, bem como os códigos utilizados no corpo do texto com o fim
de preservar suas identidades: gestora municipal da EJA (N1-GMEJA); diretora de escola A (N2-DE-A);
coordenadora pedagógica de EJA da escola B (N3-CP-B); e professora de EJA das Totalidades I e II da
escola B (N4-PEJA-B).
Realizou-se levantamento bibliográfico sobre obras de Paulo Freire, de dissertações e teses sobre
a Escola Cabana, obras sobre a gestão de Paulo Freire na Secretaria Municipal de São Paulo, entre
outras. Houve também levantamento de documentos da SEMEC/BEL e a realização de entrevistas
com as narradoras da pesquisa, por meio de entrevistas narrativas, que consiste em uma técnica
oral, espontânea e dialógica, que dá ênfase ao contar, ao narrar (BERTAUX, 2010). A sistematização
e análise dos dados foram construídas tendo por base categorizações da Análise de Conteúdo de
Bardin (2002).
Por estes meios, o artigo apresenta contribuições do pensamento de Paulo Freire ao processo
formativo de educadores da EJA da Escola Cabana.

pAUlo freire e A formAção de edUcAdores em são pAUlo-sp


Na gestão de Paulo Freire, na Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, identificamos
seis princípios que orientaram o programa de formação permanente de educadores.
• O educador é o sujeito de sua prática, cumprindo a ele criá-la e recriá-la.
• A formação do educador deve instrumentalizá-lo para que ele crie e recrie a sua prática
através da reflexão sobre o seu cotidiano.
• A formação do educador deve ser constante, sistematizada, porque a prática se faz e se
refaz.
• A prática pedagógica requer a compreensão da própria gênese do conhecimento, ou seja,
de como se dá o processo de conhecer.

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
• O programa de formação de educadores é condição para o processo de reorientação cur-
ricular da escola.
• O programa de formação de educadores terá como eixos básicos:
• a fisionomia da escola que se quer, enquanto horizonte da nova proposta pedagógica;
• a necessidade de suprir elementos de formação básica aos educadores nas diferentes áreas
do conhecimento;
• a apropriação, pelos educadores, dos avanços científicos do conhecimento humano que
possam contribuir para a qualidade da escola que se quer. (FREIRE, 2005a, p. 80).
Ante a esses princípios a práxis acaba por ser considerada como possibilidade de ressignificação
das práticas educativas dos educadores, tendo como objeto da reflexão o cotidiano pedagógico:

Investir na formação permanente seria garantir ao educador, ator indispensável


da construção da escola pública popular e democrática, as condições objetivas e
subjetivas necessárias ao exercício da sua autonomia na elaboração de programas
e métodos de ensino – aprendizagem capazes de inserir a sua escola na comunidade
(ALBUQUERQUE, 2010, p. 181).

Em linhas gerais, no corpo desses princípios, o conhecimento deveria ser compreendido em sua
dinamicidade. Por isso, foi fundamental o entendimento de que para aprender, é preciso, antes de
tudo, apreender gnosiologicamente o objeto cognoscível que mediatiza educadores e educandos.
Esse foi o motivo pelo qual a formação de educadores se constituiu em um dos alicerces do projeto
de escola pensado na Gestão Freire.
A esse projeto, Freire denominou de tentativa de mudar a cara da escola, significando o trabalho
para a realização de um inédito-viável em termos de escola: “sonhamos com uma escola que, por
que séria, se dedique ao ensino de forma competente, mas, dedicada, séria e competentemente ao
ensino, seja uma escola geradora de alegria” (FREIRE, 2005a, p. 37).
No contexto da gestão Freire privilegiou-se a formação de educadores, por meio do engendra-
mento de pequenos grupos docentes, consistindo-se: (1) no acompanhamento da ação-reflexão-
-ação dos educadores que atuam nas escolas; (2) na explicação e análise prática pedagógica; (3) no
levantamento de temas de análise da prática pedagógica considerando a reflexão sobre a prática
e a reflexão da teoria, pois a partir dessa tríade ter-se-ia maior possibilidade de buscar a necessária
coerência entre o pensar e o agir não apenas dos professores, mas da administração educacional
rumo ao projeto de escola a se construir.
Com sete meses à frente da Secretaria Municipal de Educação, Paulo Freire já havia realizado di-
versas ações de formação de educadores:

Destaco o trabalho sistemático dos grupos de formação com educadores da edu-


cação infantil e com coordenadores, diretores e professores que trabalham com al-
fabetização. Já foram desenvolvidas ações de formação com coordenadores peda-
gógicos no sistema. Tive o empenho de me encontrar pessoalmente com educadores
(diretores, coordenadores pedagógicos) e com todas as professoras de grandes áre-
as da cidade (Zona Sul e Zona Norte) para a explicitação da política pedagógica
desta gestão (FREIRE, 2005a, p. 81).

As ações da gestão Freire também ensejaram a valorização dos profissionais da educação e o ofe-
recimento de condições materiais condignas de trabalho, o que envolveu uma engenhosa maneira

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de pagar salários, em geral, acima da taxa da inflação nacional.
Para se efetivar uma “mudança da cara da escola” pública no contexto de São Paulo, exigiu-se
clareza dos princípios orientadores da política educacional proposta, considerar a dimensão partici-
pativa da gestão, a devida valorização e formação do educador da SME/SP e sua participação efetiva
no projeto de escola pretendido.
Ao fim dos primeiros doze meses de trabalho, a Gestão Freire havia conseguido o melhor de-
sempenho da década no que toca ao índice de reprovação de educandos do ensino fundamental:
“Diminuímos os índices de reprovação das crianças entre a 1ª e a 2ª, e entre a 3ª e a 4ª séries básicas”
(FREIRE, 2005a, p. 132).

presençA freireAnA nA formAção de edUcAdores dA ejA dA escolA


cAbAnA
Em consonância com as lutas sociais e as vitórias legais datadas desde 1985, com o processo de
redemocratização do Brasil, a educação de adultos na Escola Cabana foi concebida como direito
social e apresentada como Educação de Jovens e Adultos, modalidade de ensino da educação bá-
sica, tendo por fim: “proporcionar o acesso dos trabalhadores ao saber sistematizado, articulado ao
compromisso da formação de novos homens e mulheres para a construção de uma nova sociedade”
(BELÉM, 1999a, p. 07).
Aponta-se que a concepção orientadora da EJA da Escola Cabana, bem como seus objetivos, ti-
veram como uma de suas referências praxiológicas o pensamento educacional de Paulo Freire. Até
porque este não apenas formulou um pensamento e prática em educação popular, mas também
contribuiu significativamente para uma política educacional orientada aos anseios dos oprimidos,
personificados nas camadas populares – primeiramente, do município de São Paulo e, mais tarde, de
outros estados e municípios brasileiros.
Os próprios documentos orientadores da Escola Cabana e de sua proposta de EJA apontam para
a presença de Paulo Freire. Observe-se as concepções de educação escolar e de escola a seguir:

A educação escolar [...] passa a ser um ato criador que, integrado ao nosso tempo
e espaço, leva os homens e mulheres a refletirem sobre sua ‘ontológica vocação de
se mais’.
A escola deve ser o espaço que possibilite aos educandos instrumentalizar-se
para atuar como sujeitos históricos (BELÉM, 1999b, p. 39).

Concepções que remetem à educação como situação gnosiológica, por isso criadora (FREIRE,
1985), vistas como práticas de liberdade na medida em que possibilitam o desenvolvimento da hu-
manização de homens e mulheres enquanto qualidade ontológica e possibilidade concreta na his-
tória (FREIRE, 2005b).
Corrobora também esta assertiva o estudo de Oliveira (2010, p. 51) para o qual a educação escolar
da década de 60/XX era criticada por Freire “por não ser democrática e não estar integrada aos espa-
ços culturais e tempo histórico de sua sociedade”. De acordo com a autora, esperava-se que a escola
em perspectiva freireana fosse o espaço que: “envolvesse a participação e a criatividade dos educa-
dores e educandos, pressupondo não apenas o acesso das classes populares à escola, mas também
a sua participação efetiva na vida cotidiana escolar” (p. 52). Portanto, as concepções de educação
escolar e de escola presentes nos documentos orientadores da Escola Cabana têm influência do ide-
ário educacional de Freire (construído desde a década de 60/XX) e de sua ação enquanto Secretário
de Educação de São Paulo-SP (a partir do ano de 1989).

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
Referencial político-educacional freireano que se fez presente no processo de formação de edu-
cadores que se ocuparam com a EJA da SEMEC/BEL: característica da educação bancária, da educa-
ção libertadora, além de outras categorias do referencial teórico freireano, como universo vocabular,
palavra geradora, tema gerador, investigação temática (BELÉM, 2002).
Tal como na gestão Freire, a formação de educadores das escolas da SEMEC/BEL foi considerada
dimensão importante para a concretização da Escola Cabana. Esta política de formação de educa-
dores pressupôs que professoras e professores eram fundamentais ao processo de mudança das
estruturas da educação praticada em Belém, além de serem compreendidos como os principais ar-
ticuladores culturais da discussão nas escolas “sobre os significados da produção de conhecimento,
as experiências e identidades sociais, analisando-se em seu sentido político-cultural mais amplo [...]”
(BELÉM, 1999b, p. 71).
De acordo com os documentos da Escola Cabana, a formação de educadores deveria ser reali-
zada processualmente, a partir de objetivos e eixos temáticos construídos coletivamente com os
sujeitos da ação e que tivesse como lócus a própria escola. Esta proposta formativa pressupõe cri-
ticidade, transformação da sociedade e opção pelos interesses das camadas populares, a partir da
compreensão da escola em sua historicidade (BELÉM, 1999b).
No contexto da EJA da Escola Cabana, visou-se acompanhar e assessorar as atividades de sala de
aula, através da pesquisa etnográfica e da observação, que por vez, constituíam-se em meios para a
diagnose de limitações teóricas, entraves práticos e ao mesmo tempo, serviam como subsídios para
intervenções pedagógicas.
No caso da Escola Cabana, o processo de formação de educadores se deu principalmente por
meio da instituição da Hora Pedagógica (HP), compreendida em uma concepção de formação de
educadores em serviço: “investimos na Formação de educadores em serviço – Hora Pedagógica –
HP, que é um espaço permanente de discussão da prática docente” (BELÉM, 2003, p. 75).
É importante mencionar que pela HP, os docentes são dispensados das atividades de regência de
classe com o fim de possibilitar o estudo de questões relacionadas à prática educativa.
Tais práticas da Escola Cabana evidenciam uma aproximação com as ações realizadas pela Gestão
Freire em São Paulo.
A qualificação da educadora e educador da EJA se deu por meio de um processo de formação
permanente, com base no referencial teórico freireano.

Na EJA, compramos um livro Pedagogia do Oprimido para cada professor. Passa-


mos seis meses lendo. Depois aprofundamos o tema gerador, tema epocal, etc. Este
livro foi um dos principais porque a partir dele se buscou outros autores (N1-GMEJA).

Esta foi a experiência do primeiro ano de formação de educadores da EJA. Em seguida, a gestão
municipal da EJA montou uma biblioteca com todas as obras de Paulo Freire, além de bibliotecas
descentralizadas e salas de leitura também com obras deste educador. “Compramos toda a biblio-
grafia que conseguimos de Paulo Freire. Colocamos em bibliotecas e salas de leitura. Havia uma
biblioteca da EJA com toda a obra de Paulo Freire” (N1-GMEJA).
Em conformidade com a experiência da gestão Freire e com os documentos orientadores da Es-
cola Cabana, a sistemática das formações se deu por meio de partilhas de experiências entre escolas
municipais. “Era proporcionada a partilha de experiências entre escolas da Rede com base no diálo-
go” (N2-DE-A).
Nessas partilhas de experiências: “tinha-se como referência o olhar do aluno como trabalhador,
oriundo da classe popular, sujeito merecedor de respeito” (N3-CP-B). Estas discussões abordaram
temáticas como a transformação social, a melhoria da qualidade de vida da comunidade e a cons-

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
trução do conhecimento:

As formações tinham presente a valorização do educando dentro de sala de aula,


não só no que se refere à construção do conhecimento, mas na própria atuação de-
les na sociedade, visando uma mudança social, a melhoria da qualidade de vida do
coletivo. Sempre era mostrado isso nos materiais e nas discussões das formações
(N4-PEJA-B).

A sistemática das formações de educadores enfatizou a criticidade da leitura da realidade social, a


visão de construção do conhecimento entre sujeitos mediados pelo mundo, o diálogo e o respeito à
cultura do educando. “Na Escola Cabana, havia toda uma formação do educador para ele ver a reali-
dade de maneira crítica e sendo capaz de construir o conhecimento junto com o aluno, respeitando
a fala do outro” (N3-CP-B).
Não é sem motivo que a Escola Cabana, no tocante às práticas pedagógicas, também represen-
tou um projeto de humanização, com base no respeito, na construção do conhecimento entre os
sujeitos do processo educativo, na escuta e no diálogo, conforme nos diz uma das narradoras, pro-
fessora de EJA:

A Escola Cabana foi um projeto de educação que me tornou mais humana em


termos de minha interação com os alunos, uma pessoa mais aberta ao diálogo e a
ouvi-los mais e me fez entender que eles estavam aqui para aprimorar os conheci-
mentos que eles já tinham e eu também. Me fez perceber que o conhecimento deles
é muito importante (N4-PEJA-B).

Portanto, no concernente à Escola Cabana e sua proposta de EJA, acreditamos ter havido uma
tentativa historicamente condicionada, mas ainda assim, tentativa, de promover em Belém uma
educação de qualidade social, de participação popular e com base na humanização do ser humano,
independentemente de sua origem étnico-racial ou de classe social, por isso mesmo: dialógica, crí-
tica e de promoção à cidadania.
Apesar dos esforços em desenvolver uma formação humanista, consistente teoricamente e críti-
ca na Escola Cabana, foram apontadas algumas limitações na operacionalização da HP, como parte
do processo de formação de educadores, dentre elas destacam-se: “Não se consegue estabelecer
encontro com o coletivo no geral; professores que faltam muito prejudicam a organização das HP’s;
por agrupar poucos educadores, eles mostram desinteresse” (BELÉM, 2003, p. 75).
Uma das narradoras da pesquisa aponta outra limitação operacional da HP: a realização de prá-
ticas educativas que sobrevalorizam a dialogicidade e a crítica em detrimento dos processos de
alfabetização e letramento:

Outro problema é que os alunos foram construindo o conhecimento crítico deles,


mas a questão da estrutura de alfabetização foi deixada a desejar, com a produção
da leitura e da escrita. Havia uma criticidade muito boa, mas se empacava no pro-
cesso da construção da leitura e da escrita (N4-EB).

Nesse sentido, a narradora indica que esta tenha sido uma falha do processo de formação de
educadores com os professores da Rede: “faltou nas formações continuadas, um trabalho mais efe-
tivo quanto a essa questão” (N4-PEJA-B).
Por outro lado, a valorização do educador nem sempre foi o que se esperava, por exemplo: “o piso

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pago pela HP não foi o que a categoria almejou (N3-CP-B).
Nesse sentido, observa-se uma incoerência no projeto Escola Cabana, uma vez que se falava tan-
to de valorização do educador, mas o piso pago pela HP desvalorizou o magistério e a classe dos
professores Esta incoerência talvez ajude a explicar, pelo menos em parte, o porquê da HP não ter
contado com o senso de compromisso de muitos professores. “A Hora Pedagógica, apesar de ser
uma conquista, não foi levada a sério por muitos professores” (N2-DE-A).
Ainda em relação aos professores, particularmente no que toca à prática pedagógica, uma das
narradoras fez menção a uma distância entre o discurso e a prática. Em outras palavras, faltou a al-
guns professores a coerência entre o dito e o feito, em relação aos pressupostos da educação liber-
tadora. “Havia muitos professores que se diziam progressistas e discursavam sobre Freire, mas suas
práticas eram extremamente tradicionais” (N3-CP-B).
Assim, a política de formação de educadores no Projeto Escola Cabana, não obstante ter sido um
avanço para uma prática pedagógica mais significativa aos educandos e a possibilidade de qua-
lificação processual para os educadores da Rede, teve suas limitações de operacionalização, que
precisam ser analisadas criticamente e consideradas em caso de possibilidade de implantação de
propostas político-educacionais que valorizem a ação qualificada da educadora em relação aos tra-
balhos de sala de aula e ao projeto de educação pública que se pretenda construir.

considerAções finAis
O objetivo deste trabalho foi analisar a presença de Paulo Freire nos documentos e nas falas das
narradoras da pesquisa em relação à formação de educadores da EJA da Escola Cabana.
Nesta análise, aponta-se referência teórica e prática das experiências da gestão Freire aos docu-
mentos orientadores da Escola Cabana e às memórias das narradoras da pesquisa.
Por esse motivo é compreensível que a política de formação de educadores da SEMEC/BEL tenha
apresentado os professores como os principais responsáveis pela concretização dos princípios e
diretrizes da Escola Cabana. Afinal, a gestão Freire procedeu da mesma maneira em São Paulo.
Tal como na gestão Freire, em São Paulo-SP, as formações tinham como objeto de estudo central
a própria prática educativa e aconteciam preferencialmente nas escolas, por meio de eixos de dis-
cussão previamente selecionados pelos professores.
O principal mecanismo deste processo formativo foi a Hora Pedagógica, pela qual os docentes
eram dispensados das atividades de regência de classe a fim de participar de momentos formativos.
Conforme fala das narradoras, o processo formativo dos educadores da EJA contribuiu para tor-
na-los mais humanizados, o que se depreende que possam ter inclinado suas práticas educativas
com os alunos à direcionamentos mais humanizantes.
Ocorreram algumas dificuldades durante a operacionalização deste processo formativo: valori-
zação do profissional da educação aquém do esperado; incoerência entre o dito e o feito quanto à
prática educativa; e descompasso entre a promoção da criticidade e o trabalho com os processos
educativos.
Conclui-se que as incoerências e dificuldades de implantação da política de formação de educa-
dores da EJA da Escola Cabana não devem ser compreendidas como fracasso político-educacional.
Pelo contrário, auxilia-nos a compreendê-la enquanto experiência historicamente situada, por isso
condicionada, mas que representou avanços na política educacional de Belém.
Referências
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cidade” de São Paulo (1989 - 1991). In: SOUZA, Ana Inês (Org.). Paulo Freire: vida e obra. 2ª ed. São Paulo:

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
expectAtiVAs e interrogAções de UmA práticA
docente em formAção
jéssicA lAmberti pAes leme dA costA | silVAnA pimentel dA silVA | éricA conceição

Reconhecendo-se o quanto é imprescindível a alfabetização ser imbuída do letramento para uma


aprendizagem significativa, principalmente em se tratando do ensino de Jovens e adultos, o PROAL-
FA desenvolve projetos onde existe a oportunidade de experienciar a educação de uma forma quali-
tativa e diferenciada para ambas as pontas do binômio educativo: tanto para quem aprende quanto
para quem ensina. Assim, o objetivo deste trabalho é apresentar a formação docente proporcionada
pelo Programa de Alfabetização, Documentação e Informação-PROALFA, inserido na Universidade
Estadual do Rio de Janeiro/UERJ, através dos projetos: Classes de Alfabetização e Letramento, e, Ofi-
cina de Matemática, Leitura e Produção de Texto, focalizando a alfabetização de idosos que, em sua
maioria, possuem alguma formação escolar e outros, sem terem tido a oportunidade de frequentar
a escola no tempo devido. Pretende-se mostrar as experiências adquiridas por um grupo de gra-
duandos em Pedagogia e Matemática – como estagiárias bolsistas deste programa – abordando-se
suas expectativas e interrogações sobre a prática docente, embasadas no contexto deste projeto
formador. Tal formação docente se dá de forma complementar onde discute-se a teoria, a prática
educativa e a prática reflexiva; sendo estruturada, semanalmente, da seguinte forma: às segundas-
-feiras são realizadas reuniões de supervisão pedagógica com as coordenadoras do programa a fim
de discutir, analisar e refletir as práticas educativas realizadas na semana anterior, assim como, no
momento seguinte, planejar e direcionar o desenvolvimento da próxima semana; às sextas-feiras
acontece outro momento da formação que são os grupos de estudos teóricos, através de leituras e
oficinas. Nas terças, quartas e quintas-feiras ocorrem as práticas de ensino-aprendizagem em sala de
aula, na própria universidade, tendo as bolsistas como professoras.
Palavras-chave: Formação e Prática docente, Alfabetização e Letramento de Idosos, PROALFA-
-UERJ

introdUção
Muito se tem falado sobre formação continuada de professores, no entanto percebemos ser tão
importante quanto, um olhar particularizado para o graduando em licenciatura na construção de
sua prática docente. Buscamos, então, um aporte para os questionamentos que emergem sobre
esse assunto. Perguntas como: O que a prática docente requer? Como vou aplicar a teoria que te-
nho estudado? Quais competências preciso desenvolver para capacitar e instrumentalizar a minha
prática? Quais os conteúdos que vou ensinar? Como vou dar conta de tantos alunos? ... Essas são
algumas das interrogações que se formam nos graduandos de licenciatura à medida que o curso
avança, gerando angústia e insegurança quanto à qualidade e competência da prática educativa
que desenvolverá.
Neste sentido, este trabalho apresenta o caminho percorrido por duas graduandas, em Pedago-
gia e Matemática, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, bolsistas do PROALFA – Programa de
Alfabetização, Documentação e Informação - que buscam algumas dessas respostas.
Ao ingressarmos em uma graduação de licenciatura, acreditamos ter a consciência de que existe
um conjunto precioso de conhecimentos do qual deveríamos nos apropriar e sem o qual jamais
poderíamos ser professores. Esperávamos que a formulação e a seleção desse “saber escolar” nos
fossem transmitidos durante a graduação. No entanto, conforme os períodos se sucedem essa pos-
sibilidade não ocorre.
Pensando dessa forma, o graduando em Pedagogia e Matemática tem sua esperança de resposta

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
nos períodos que contemplam os estágios obrigatórios, mas ao nos depararmos com as práticas de
observação no ambiente escolar, além de percebermos ser o tempo destinado a estes muito pe-
queno para refletir e apreender sobre a prática em sala de aula, encontramos uma realidade quase
sempre muito diversa das teorias que aprendemos.

refletindo sobre A mAtemáticA e A pedAgogiA em Um progrAmA de


AlfAbetizAção e letrAmento
Ao nos incluirmos em um programa que trata das questões relacionadas à alfabetização e letra-
mento, uma dúvida surge: “o que a Matemática tem a ver com alfabetização?”. Ao mesmo tempo nos
vem aquela pré-concepção clichê de a alfabetização ser o ensino da codificação/decodificação dos
fonemas/grafemas da língua portuguesa. Mas logo percebemos que não se trata disso
Então, o que vem a ser, de fato, “alfabetização”? Quais são os códigos linguísticos dos quais faze-
mos uso em nosso cotidiano? Usamos apenas a Língua Portuguesa escrita?
Roxane Rojo (2010) fala sobre alfabetização e níveis de alfabetismo assim como funciona a sua
influência na qualidade do letramento desempenhado pelos sujeitos. Letramento poderia, então,
ser entendido como um uso, um desfrute, uma ação intencional e consciente mediada pelo código
linguístico em uso. Dessa forma podemos pensar em alfabetizações: em Língua Portuguesa; Mate-
mática; Artes; Música; Literatura; Política; etc.
No entanto, faremos um recorte em apenas duas linguagens a da Matemática e da Língua Portu-
guesa, focando a produção de leitura e a produção de textos por considerarmos que estas podem
servir como ferramenta para o desenvolvimento de outras tantas.
A Linguagem Matemática transita entre o concreto e o abstrato, entre o quantificável lógico e o
quantificável subjetivo; enquanto isso a linguagem narrativa nomeia e descreve tais elementos em
seus processos. Vygotsky (2005) relata que as funções superiores do pensamento são acessadas e
desenvolvidas fazendo uso das linguagens – pensamos narrativamente. Assim como na linguagem
alfabética escrita, o sujeito seleciona, quantifica, ordena e mensura os elementos da mensagem que
deseja comunicar. Em um pensamento complementar a este Renita Klüsener (2007) e D’Ambrosio
(1990) nos diz que:

“...é fundamental ver a educação matemática de uma forma que personifique o


valor e a cultura da criança, isto é sua etnomatemática. A passagem da etnomate-
mática para a matemática pode ser vista como a passagem da linguagem oral para
a escrita. A linguagem escrita (ler e escrever) repousa no conhecimento da expressão
oral que a criança já possui, e a introdução da linguagem escrita não deve suprimir
a oral. Nesta direção, qualquer ação pedagógica deve levar em conta a etnomate-
mática do seu aluno: o comportamento de cada indivíduo para explicar, entender e
desempenhar-se na sua realidade, comportamento esse desenvolvido ao longo de
sua história de vida.”

proAlfA – Um espAço de entrelAçAmento entre extensão, grAdUA-


ção e pesqUisA
Após sermos selecionadas como bolsistas do referido programa, participamos de uma capacita-
ção, orientado-nos sobre a estrutura e o funcionamento do PROALFA e de seus cinco projetos; em
nosso caso, a participação seria para as Classes de Alfabetização e Letramento.
Os fundamentos que embasam prática pedagógica são as teorias de Piaget, Ferreiro, Paulo Freire,

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
Magda Soares, entre outros.
Conhecendo a estrutura e o funcionamento do programa, percebemos que não estávamos sozi-
nhas, e, sim, instrumentalizadas, semanalmente, por uma equipe de supervisores pedagógicos.
As principais atividades realizadas pela equipe gestora é fomentar a capacitação dos graduan-
dos bolsistas – promovendo discussão sobre a prática e trazendo estudos específicos mediante a
demanda da prática docente desenvolvida pelos bolsistas como regentes de turma e/ou oficineiros
– buscando desenvolver uma prática crítica reflexiva e pesquisadora; assim como provendo os re-
cursos necessários para que tais atividades aconteçam e sejam implementadas.
O ambiente institucional proporcionado aos graduandos é igualitário, onde todos podem expor
suas ideias, ao mesmo tempo em que os chama à responsabilidade da função de educadores ativos,
pesquisadores, reflexivos e comprometidos com a prática docente.
As Classes desenvolvem uma metodologia através de projetos de trabalho; esses projetos são
construídos coletivamente e colaborativamente pelo corpo gestor-pedagógico junto com os bolsis-
tas e alunos, levando-se em consideração os temas da atualidade e as especificidades e expectativas
dos alunos das classes.
A formação docente dos bolsistas é oferecida em três momentos distintos: a reunião pedagógica,
o grupo de estudos, e a prática em sala de aula.

A reUnião pedAgógicA
Os planos de aula são construídos semanalmente, em reuniões pedagógicas em que todos os
bolsistas e as coordenadoras do projeto se reúnem para discutir as ações realizadas na semana an-
terior pelas turmas, as ideias e possibilidades de ações e implementações para a semana seguinte;
assim como buscar soluções para dificuldades ou problemas que eventualmente venham a se ma-
nifestar no decurso das aulas. Acontecem às segundas-feiras, das 14:00h às 18:00h.
Apesar de os três pilares de ação pedagógica nos quais o PROALFA se apoia para exercer a sua
funcionalidade serem igualmente importantes, entendemos ser esse o disparador dos outros. Nesta
reunião pensam-se as turmas e seus alunos (os conhecimentos que eles requerem e os conhecimen-
tos dos quais necessitam, as peculiaridades e necessidades de cada grupo e de seus sujeitos), assim
como os bolsistas em exercício docente ( as habilidades que possuem, o modo como conduzem
suas aulas, a desenvoltura ou os embaraços que apresentam, as didáticas das quais fazem uso para
atingirem os objetivos que estabelecem), e também, os conteúdos didáticos selecionados para se-
rem trabalhados.
Aqui cabe mencionar mais algumas de nossas descobertas nesse espaço a cerca de trabalhos
com a base teórica construtivista: conceitos como interatividade, inferências pedagógicas, constru-
ção de conhecimentos, níveis de alfabetismo e letramento, interculturalidade e leitura de mundo,
são olhados de uma forma didática, como conceitos instrumentais e técnicos dos quais podemos
lançar mão para provocar um avanço cognitivo nos alunos.
Donald Shön (1992) nos fala de refletir sobre o que estamos fazendo em nossa prática no mo-
mento em que ela acontece para, dessa forma, podermos aproveitar as demandas inesperadas que
flui dos alunos, nos colocando na posição de quem media e facilita o conhecimento.
O professor deve assumir essa postura de mediador, facilitador e provocador da produção de
conhecimento e do desenvolvimento cognitivo do aluno, no entanto é necessário que busque estar
realmente muito bem preparado, pesquisando sobre os temas que serão abordados em sua aula
- sobre o que achamos relevante mas, também, o que interessa ao nosso aluno, para que possamos
auxiliá-lo em suas descobertas; por isso entendemos que a pesquisa é fundamental neste trabalho,
assim como a paciência e a responsabilidade. Como diz Paulo Freire (1997) “ensinar exige pesquisa”

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
e “ensinar exige paciência”.
Nesta reunião relatamos, refletimos, avaliamos e estabelecemos pontos a serem pesquisa-
dos/aprimorados e/ou instrumentalizados para a renovação e implementação da prática docente.

o grUpo de estUdos teóricos


A reunião de estudos teóricos em muitas das vezes nos pareceu como uma luz finalmente chega-
da à uma penumbra de dúvidas. Se nas reuniões pedagógicas nos confrontávamos com o relato e a
reflexão sobre as nossas práticas já desenvolvidas em sala de aula, estas mesmas reflexões eviden-
ciavam, além das inabilidades patentes e das dúvidas oralizadas, também as dúvidas que ainda não
haviam sido formuladas, assim como a necessidade de buscar as respostas a esses questionamen-
tos. A reunião de estudos teóricos se coloca na contrapartida dessa demanda. As coordenadoras
pedagógicas, percebendo as necessidades que emergem dos relatos, selecionam material teórico
relacionado a estes, assim como elaboram estudos dirigidos ou oficinas de trabalho onde provocam
a reformulação de nossas reflexões sobre os problemas enfrentados.

A práticA de sAlA AUlA


Entendemos que se a mente compreende o dilema, raciocina e busca soluções, é necessário que
delibere e se coloque em ação e que continuamente apreenda as necessidades do outro, o nosso
aluno.
Sendo assim tutoradas, novamente estaremos imersas na prática de sala de aula. As aulas com os
alunos acontecem três vezes por semana (3ª, 4ª e 5ª feiras), das 14:00h às 17:00h, seja em sala de aula
ou em espaços extra-classe – como em aulas externas ou em visitas pedagógicas.
Aprendemos que investigar é a palavra chave. Se por um lado trabalhamos com um sistema de
ensino não-formal que proporciona flexibilidade quanto aos conteúdos que devem ser trabalhados,
por outro, não podemos abrir mão desses mesmos conteúdos como capital cultural ao qual os alu-
nos têm direito.
Entendemos ser necessário que - ainda que não sigamos a ordem estabelecida no sistema formal
para a “dispensação dos saberes escolares” - o quanto é importante conhecer e considerar os Parâ-
metros Curriculares Nacionais para desenvolver uma prática pedagógica eficiente. Precisamos saber
o que a lei apresenta como conteúdos recomendáveis a cada nível de desenvolvimento cognitivo,
para que dentre as demandas apresentadas nas turmas possamos selecionar as mais apropriadas
aos contextos que se apresentem e que façam sentido para o aluno provocando, assim, uma apren-
dizagem significativa.
Assim, os conteúdos didáticos a serem trabalhados durante o semestre são selecionados pela du-
pla graduanda regente de cada turma, interagindo com as oficinas e em consonância com os eixos
temáticos anual e semestral, as demandas e os interesses expressos em cada turma. Esses conteúdos
são trabalhados na mediação com os projetos de trabalho.
Essas construções acontecem da seguinte forma: no início de cada ano a equipe e os bolsistas
se reúnem e discutem quais os acontecimentos, notícias ou temas atuais, têm relevância social e se
reflitam no cotidiano dos alunos. A partir dessas discussões cria-se um tema gerador que norteará
os trabalhos durante todo o ano. O passo seguinte é discutir esse tema gerador de modo a desmem-
brá-lo em dois outros subtemas que moldarão os 1º e 2º semestres. Levam-se essas discussões e
conclusões para cada uma das turmas que devem refletir sobre os temas e perceber as suas próprias
particularidades, inclinações e desejos de conhecimentos pertinentes aos mesmos, dialogando e
elegendo um tema particular a ser trabalhado e desenvolvido, de modo que o trabalho gere um pro-
duto a ser exposto e compartilhado com as outras turmas ao final do semestre, em uma culminância
de congraçamento de saberes.

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
o AlUno do proAlfA
Os alunos são 90% mulheres, na faixa etária compreendida entre os 60 e 85 anos, viúvas e/ou
aposentadas, em sua maioria, e oriundas de diversas localidades da cidade. Dos motivos pelos quais
os alunos chegaram ao PROALFA, predomina a falta de oportunidade de estudar na época apropria-
da, a fuga da solidão e ociosidade. A rotatividade e evasão dos alunos é baixa e a divulgação é feita
basicamente por indicação, o que acaba formando um ambiente, intra e entre as turmas, íntimo e
aconchegante.
Com o passar do tempo, o perfil desse alunado ganhou uma diversificação com relação aos níveis
de alfabetização e letramento: temos alunos que ganharam nesse espaço a oportunidade de adqui-
rir a leitura e a escrita - muitas inclusive aprenderam as suas primeiras letras no programa – mas te-
mos também alunos graduados. Apesar dessa variação nos níveis de conhecimentos institucionais
parecer, em um primeiro momento, um complicador para o trabalho das turmas, na verdade não o
é. Ao contrário, a interatividade estimula e amplia a leitura de mundo das turmas, elevando tanto os
níveis de alfabetização como os níveis de letramento.
Os alunos são bastante participativos e demonstram que gostam de estar nesse espaço.

o trAbAlho qUe reAlizAmos


Neste ambiente buscamos desconstruir o estereotipo da matemática tida apenas como algo abs-
trato, de difícil entendimento e que somente alguns poderiam deter o privilégio de compreensão.
Exploramos temas que estivessem relacionados ao cotidiano dos próprios alunos ou então contex-
tualizávamos com a história da matemática de forma a atraí-los e também para que pudéssemos
trabalhar com estes os conteúdos matemáticos que se fizessem necessários, transformando todos
esses conceitos em um produto palpável, concreto do qual se pudesse fazer uso.
Abordando o tema 2014/1 “ O que é que o Árabe tem – O que temos nós com eles ? ”; pensamos
em como poderíamos desenvolver a nossa prática docente em sala de aula; trazendo conteúdos
tanto de matemática quanto de alfabetização e letramento de uma forma interdisciplinar.
Na matemática a resposta encontrada para o trabalho com a turma MANGUEIRA II, em que traba-
lhamos a cultura árabe e suas influências no cotidiano brasileiro, procuramos observar quais foram
às contribuições dos árabes na matemática. Começamos a trabalhar a história dos números indo-
-arábicos cujo objetivo era que as alunas pudessem conhecer a representação e a transformação
desse sistema de numeração que se faz presente nos tempos atuais, mas que nem sempre se sabe
como surgiu.
Sendo assim, estudamos a evolução do número e suas diferentes formas - mais especificamente,
a associação do algarismo em relação à quantidade de traços e também, aos ângulos.
Instigamos as alunas a refletirem na sequência posta no quadro quanto a relação à quantidade de
traços que iam sendo utilizados à medida que apresentávamos os outros símbolos numéricos. Em
outra aula, explicamos o conceito de ângulo para que houvesse maior clareza em uma nova ativida-
de que se sucederia com outra sequência que surgiria novamente no quadro e que dependeria da
observação da quantidade de ângulos.
Em seguida, trabalhamos com o ábaco - muito embora seja uma criação chinesa os árabes utili-
zavam este instrumento em suas relações comerciais - então decidimos por confeccionar tais instru-
mentos que não só seriam utilizados em sala de aula com a finalidade de realizar algumas operações
e explicar de forma concreta o nosso sistema decimal, mas que também seria exposto na culminân-
cia.
Os resultados obtidos neste primeiro módulo foram satisfatórios visto que as alunas compre-
enderam, participaram ativamente da proposta, trabalharam o raciocínio lógico e dedutivo, assim

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
como puderam romper com o paradigma de que a matemática seja difícil.
Para as questões de alfabetização e letramento, entendemos que seria bastante interessante co-
nhecermos um pouco mais sobre a cultura árabe nos aspectos familiar e culinária. Tomando como
ponto de partida para desenvolver o trabalho as influências advindas dos povos árabes que pode-
mos perceber em nosso cotidiano e como essas chegaram até nós. Esse trabalho culminou na pro-
dução de uma mesa ao estilo e à moda culinária árabe, com pratos variados doces e salgado.
Enquanto desenvolvíamos o nosso trabalho percebíamos, cada vez mais, que cabe a nós uma
responsabilidade investigativa, através da qual teremos sempre a oportunidade de aprimorar a nos-
sa prática e que essa postura gera em nós a autonomia da qual precisamos para nos construirmos
educadores pesquisadores.
Percebíamos que o papel do professor não é apenas o de transmissor do conhecimento e que o
aluno não é apenas receptor desse conhecimento, mas sim os dois são atores principais do processo
de ensino-aprendizagem (FREIRE, 1989).
Essa forma de trabalhar o ensino-aprendizagem promove uma dimensão valorativa tanto dos
conhecimentos que são produzidos quanto das relações que acontecem.

conclUsão
Tendo em vista as observações e participações experimentadas durante o tempo de estágio
nesta instituição, concluímos que programas como esse podem ser uma ferramenta ímpar para o
graduando em docência, proporcionando oportunidades de prática em diálogo com a teoria es-
tudada na graduação, por propiciar a criação de uma consciência docente crítica de suas práticas
investigativas no sentido de impulsionar o docente à pesquisa contínua e, assim, à elevação de seus
conhecimentos e aperfeiçoamento constante. É um exemplo importante de espaço de formação e
desenvolvimento didático-pedagógico.
Pudemos perceber que as reuniões pedagógicas e de estudos vêm fomentando a consciência
crítica dos bolsistas em relação à formação de sua prática, instigando-os a conhecer as necessidades
do seu alunado e a buscar soluções para auxiliá-los em suas dificuldades, provocando os alunos a
um desenvolvimento cognitivo progressivo. Finalmente compreendemos que são as interrogações
que nos levam a refletir, pesquisar, buscar e experimentar hipóteses de possíveis soluções.
Constatamos que é possível sim, aliar a teoria à prática. Não é nada fácil, mas quando se busca
a preparação, enfrentam-se os receios com coragem e boa vontade então a renovação da prática
se torna possível. Não podemos valorizar a teoria em detrimento da prática nem fazer o inverso. A
teoria será a orientadora da prática, é claro, que muitas vezes o professor terá que fazer adaptações,
mas até mesmo para fazer essas adaptações ele precisará da teoria.

“A teoria sem a prática vira ‘verbalismo’, assim como a prática sem teoria, vira
ativismo. No entanto, quando se une a prática com a teoria tem-se a práxis, a ação
criadora e modificadora da realidade. ” Paulo Freire (1997).

Entendemos que a competência e a qualidade do professor se desenvolvem na prática conscien-


te, reflexiva e crítica de si mesmo. A pesquisa e a humildade são as molas mestras da renovação da
prática docente e também de conceitos epistemológicos e que é na escola e em diálogo com os
outros professores que se aprende a profissão. O registro das práticas, a reflexão sobre o trabalho e
o exercício da avaliação e da auto-avaliação são elementos fundamentais para a construção de um
bom professor (NÓVOA, 2009).

Assim, concordamos plenamente com Socorro Calháu quando afirma que:

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
“A educação não tem receita, pois a “vida” não cabe em normas ou regras, o vivo
não se permite aprisionar em fórmulas mágicas. Apesar disso, tem princípios e pres-
supostos, que, do lugar de onde formulo ressalto: o respeito, o resgate e a valorização
das múltiplas identidades, a negociação e a honestidade.” (CALHÁU, Eu e o Outro)

Acreditamos que as experiências adquiridas neste projeto contribuíram substancialmente para


a nossa formação enquanto professoras: os sujeitos, a teoria, a reflexão e a prática – caminhando
juntos em diálogo por uma prática docente proficiente e mais feliz.

referênciAs bibliográficAs
CALHÁU, Socorro. Eu e o outro. In: PAIVA, J (org.); OLIVEIRA, Inês Barbosa de (org.). Educação de Jo-
vens e Adultos e Imagens. 1ª Ed. Petrópolis/RJ:DP ET alii e Faperj, 2011. V.1. 486 p.
FERREIRO, Emília. Reflexões sobre Alfabetização. São Paulo: Cortez, 1988.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1989.
KLÜSENER, Renita. Ler, escrever e compreender a matemática, ao invés de tropeçar nos símbolos. In:
NEVES, Iara C.B., SOUZA, Jusamara V., SCHÄFFER, Neiva O., GUEDES, Paulo C. & KLÜSENER, Renita (orgs.).
Ler e escrever: compromisso de todas as áreas. Porto Alegre: Editora da Universidade/UFRGS, 2000.
p.175-189.
ROJO, Roxane. “... e uma EDUCAÇÃO pro povo, tem?”. Rio de Janeiro: Editora Caetés, 2010.
SCHÖN, Donald A. In: NÓVOA, Antônio. Os professores e sua formação. Dom Guixote, Lisboa, 1992.
VYGOTSKY, Lev S. Pensamentos e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 2005.

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
experiênciAs oriUndAs de obserVAções nA ejA: A
jUVenilizAção e A formAção de professores em
perspectiVA
jUliAne de oliVeirA nAlesso | lUiz felipe dA silVA ViAnA

O presente trabalho é estruturado e apoiado nas experiências vivenciadas durante um ano e


meio como bolsistas do Programa Institucional de Iniciação à Docência - PIBID, em Educação de
Jovens e Adultos - EJA, na Escola Municipal Governador Roberto Silveira, localizada no município
de Mesquita – RJ. Queremos compartilhar as análises que fizemos e as atividades que realizamos
dentro da escola destacando, dessas análises e atividades, o que consideramos mais relevante. As-
pectos como a juvenilização que está presente na EJA e a importância do PIBID na nossa formação
acadêmica foram os mais relevantes em nossas discussões e na sintetização das nossas experiências.
As reflexões propostas foram feitas através das observações do grupo e contaram com a colabora-
ção do corpo docente da escola e dos próprios alunos, o que nos permitiu expor um olhar empírico
sobre as questões destacadas. Queremos relatar também algumas atividades realizadas na escola,
de caráter extracurricular, e a repercussão das mesmas. Nossa perspectiva é de que a leitura deste
trabalho, juntamente com parte do material empírico que conseguimos sistematizar no período
em que ficamos inseridos na escola, possa mostrar a importância do PIBID na nossa formação e a
relevância que teve dentro da escola. Com isso esperamos motivar educadores a refletir sobre suas
práticas, e contribuir para que alunos graduandos como nós possam entender melhor o programa
do qual participamos e a importância de pesquisas e estudos que favoreçam a qualificação do ensi-
no da EJA. Esperamos assim, entender melhor essa modalidade e buscar a consolidação de uma EJA
com base nas vivências e experiências dos sujeitos que a compõem.

palavras-chave: PIBID, EJA, formação de professores, juvenilização

introdUção
Este trabalho é estruturado com base nas nossas experiências como bolsistas do Programa Insti-
tucional de Iniciação à Docência – PIBID, na modalidade de Educação de Jovens e Adultos - EJA. O
programa nos permitiu vivenciar o cotidiano noturno de uma escola no município de Mesquita/RJ,
a escola Municipal Governador Roberto Silveira. Permanecemos na escola no período de um ano e
meio.
As nossas reflexões foram baseadas acerca das observações e das atividades realizadas na escola.
Uma das primeiras observações que conseguiu nos alcançar foi a juvenilização presente nas salas de
aula de toda a escola, notamos este fato logo assim que chegamos à escola. O campo da educação
de jovens e adultos vive férteis momentos de revisão de suas concepções e esse novo estereótipo
nos despertou para isso. Os fatos que mais tiveram destaque em nossa sintetização estão ligados
a essa juvenilização e suas necessidades, assim como a importância e influência do PIBID em nossa
formação acadêmica.
O PIBID tem como objetivo incentivar a formação docente para a primeira etapa da educação
básica e do ensino fundamental para crianças, jovens e adultos; elevar a qualidade do curso de Pe-
dagogia buscando melhorias na formação inicial e continuada de professores; diminuir a dicotomia
entre as abordagens teóricas e práticas docentes tratadas nos diferentes componentes curriculares
da licenciatura em Pedagogia e valorizar professores em exercício na rede pública de educação bá-
sica.

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
desenVolVimento
No texto que aqui apresentamos buscamos discutir e refletir acerca das ações previstas e rea-
lizadas no subprojeto do PIBID, no ano de 2012, nas quais destacamos a inter-relação de saberes
que estão presentes em jovens, adultos e idosos, nos docentes da Educação de Jovens e Adultos,
nos demais profissionais das instituições educativas, nos bolsistas graduandos em Pedagogia e nos
docentes da Universidade.
A juvenilização, como já foi apresentada na introdução, permeia pelo trabalho, pois foi um dos as-
suntos que mais dominou nossos estudos ao analisarmos nossas observações e relatórios, e na hora
da elaboração de nossas atividades dentro da escola. Nosso objetivo principal é trazer um pouco de
tudo que conseguimos realizar na escola, em parceria de nossos supervisores, e com a colaboração
de alunos e professores. Queremos expor o que para nós foi mais relevante como a importância do
programa para a nossa formação e esse novo estereótipo da Educação de Jovens e Adultos.
Nossa pesquisa na Escola Municipal Governador Roberto Silveira se deu a partir de agosto de
2012. Nosso grupo, que na época era composto por seis pessoas, se encontrava muito ansioso. To-
dos estavam na expectativa de conhecer a escola da Baixada Fluminense e seus atores. Para nossa
surpresa tais personagens, até então desconhecidos por nós, nos receberam bem. É lógico que não
estavam entendendo nossa presença ali e, para sermos bem sinceros, em nosso primeiro dia com
todo nosso entusiasmo só queríamos conhecer a escola e toda a comunidade que fazia parte dela.
Logo, algo nos surpreendeu e chamou a nossa atenção: quantos jovens adolescentes aparen-
tando ter entre 15 e 16 anos faziam parte da EJA da Roberto Silveira! Não esperávamos encontrar
tamanho contingente de adolescentes, pois não é um assunto muito abordado na graduação. Ques-
tionávamos: onde estariam os adultos e idosos que tiveram seu processo de aprendizado interrom-
pido e resolveram retornar aos estudos? Após conhecer o espaço físico da escola e todas as turmas,
voltamos para casa com esse questionamento e com a convicção de que a única certeza que tínha-
mos, não era mais certeza. Essas reflexões levaram-nos a procurar em nossas leituras e estudos as
ideias e o pensamento de Paulo Freire, em especial quando ele afirma que, em nossa formação de
educadores: “[...] uma das condições necessárias a pensar certo é não estarmos demasiados certos
de nossas certezas” (Freire, 1996, p.15).

jUVenilizAção.
É fato concreto que a EJA desde os anos 1990 passa por um processo de juvenilização, ou seja, in-
gresso de jovens como sujeitos dessa modalidade de ensino. Na escola onde realizamos a pesquisa
não foi diferente, as salas de aula estavam recheadas de jovens e de toda uma condição de vivência
dos mesmos, e como ela é vista pela sociedade em geral. Segundo Dayrel (2007, p. 1108) esse modo
de ser e sua interpretação por terceiros é chamada de “condição juvenil” e essa questão difere as
juventudes atuais de juventudes passadas, questões como a precarização do trabalho e a criminali-
zação de grupos sociais implicam diretamente nessa juventude.
Para compreender melhor essa juvenilizazção temos que analisar esse processo nas politicas pú-
blicas da década de 1990, nesta época ocorreu à promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Edu-
cação (LDB) de 1996, onde se pode encontrar uma das causas da juvenilização, pois ocorreu o rebai-
xamento da “idade mínima para o acesso a essa forma de certificação de 18 para 15 anos no ensino
fundamental e de 21 para 18 no ensino médio (...)” (PIERRO, JOIA, RIBEIRO, 2011, p. 67).
Tal fato não pode ser pensando de maneira isolada, pois a EJA já foi pensada para os jovens desde
1940, quando a União lança a primeira Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos (CEAA).
Essa Campanha é criada porque o analfabetismo “passa a ser visto como um problema social.” (FÁ-
VERO, 2004, p.9) O que queremos alertar com essas duas comparações é que em 1996 quando a
LDB rebaixa a idade para o ingresso na EJA não era uma novidade, pois na primeira campanha de

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
alfabetização os adolescentes já estavam sendo vistos como sujeitos da EJA, mesmo que não tivesse
um caráter único e exclusivamente escolar à campanha já pensava neste sujeito.
Como já ficou explicito na escola onde se deu a pesquisa nos deparamos com diversos alunos e
alunas jovens. O que nos indagou foi o porquê desses jovens se apresentarem nas classes de EJA e
como eles se relacionavam entre si, com a escola e com o corpo docente. Essas perguntas tinham
respostas. O porquê ficou claro nas leituras e na compreensão de nossa sociedade onde se soma
a baixa idade para o ingresso na EJA e a necessidade que alguns alunos encontram de trabalhar e
estudar, logo o turno da noite é o mais indicado. Somando-se a isto temos a expulsão que ocorre
do diurno, pois alunos com defasagem série idade e alunos “problemáticos” são migrados para o
noturno. Na segunda questão sobre o relacionamento dos alunos podemos constatar de maneira
empírica que eles adotam uma relação amistosa entre si e com a escola, os casos de agressões e
brigas entre jovens nesta escola não são expressivos, em nossa passagem presenciamos apenas um
conflito. Os problemas entre aluno e escola são raros, mesmo alguns professores não aceitando os
jovens nessa modalidade, eles não criam muitos conflitos.
Outro ponto central que esteve presente nos estudos era a questão do direito à educação desses
jovens. Na escola os jovens e todos os outros alunos tinham esse direito de certo modo restrito, pois
espaços dentro da escola mesmo que educativos eram pouco explorados por professores junto com
suas turmas, logo os alunos ficavam restritos à sala de aula, quadra e refeitório. A escola contava com
salas de: biblioteca, informática, matemática, ciências e sala de artes, entretanto o público da EJA
não frequentava esses espaços, a salvo com uma enorme raridade a sala de informática, porém isso
ocorria quando a turma não tinha aula, logo a maioria dos alunos preferia ir embora. É importante
lembrar que este fato não é exclusivo da escola Governador Roberto da Silveira e sim de uma ótica
geral da EJA, no texto “os jovens da EJA e a EJA dos jovens” de Eliane Ribeiro Andrade pode-se notar
casos semelhantes a este, logo compreendemos essa falta de espaço que o aluno do noturno con-
vive.
Essa questão de espaço é um reflexo da falta de reconhecimento do jovem como um ser de di-
reito à educação, esta caminhada, segundo Andrade, “não tem permitido encontrar um mínimo
de glamour e da vibração necessários para mover a esperança, como ocorre, por exemplo, quando
observamos os jovens a partir de outros olhares (...)” (ANDRADE,2009,p.35). Esses outros olhares é
onde encontramos o jovem expressando sua condição juvenil e seu modo de agir, seja ele no traba-
lho ou em momento de lazer embora este nem sempre seja reconhecido como lazer, pois a cultura
do jovem em muitos casos acaba sendo reprimida e não incentivada, principalmente do jovem da
EJA que em sua maioria é negro, pobre e morador de favela. De fato uma prática pedagógica que
visualize os jovens perpassa a sala de aula. Na escola a sala de aula e a parte da coordenação não dei-
xavam a desejar, o que mais causava repulsa era a questão do espaço negado aos jovens e a negação
do reconhecimento desses jovens como sujeitos de direito por parte de alguns atores escolares
(professores e/ou coordenadores).

A formAção de professores.
O programa teve um significado relevante e agregou muito para nossa formação como futuros
professores e profissionais da educação. Permitiu-nos vivenciar a prática que, até então, ficava dis-
tante de nós e só tínhamos contato com a teoria. Com relação mais especificamente à EJA, percebe-
mos um grande distanciamento, pois na Universidade, ficamos muito limitados dentro dos estudos
e análises da educação de jovens e adultos. Antes de entrarmos para o PIBID, não tínhamos dimen-
são da quantidade de adolescentes e jovens que fazem parte da EJA, e a pesquisa nos proporcionou
um encontro com essa nova realidade.
O PIBID nos permite conhecer melhor e de maneira prática o campo escolar, principalmente a
Educação Básica. Permite-nos também vivenciar todo aquele universo escolar, professores, coorde-

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
nadores e alunos. O contato direto que tivemos com todos os atores da escola pôde fazer com que
vivenciássemos o real cotidiano da EJA, com todas as suas problemáticas, possiblidades e instigou
nossos anseios e curiosidades.
Reconhecendo que a formação de professores qualificados é uma das mais relevantes funções
sociais da Universidade, e sendo ela locus de formação docente, entende-se que esta se deve dar na
escola. Para tanto a UERJ/Faculdade de Educação, por via do PIBID, vem corroborar com a formação
de professores. A escola escolhida para a realização das atividades do subprojeto, na EJA, no muni-
cípio de Mesquita reforçou os vínculos que a Faculdade de Educação vem mantendo com a escola
básica, tanto pela via das disciplinas curriculares, em que se destaca o estágio docente, quanto pela
pesquisa, práticas pedagógicas e pela extensão.
Diferente do estágio regular supervisionado, comum a todos os alunos da graduação em Pe-
dagogia da UERJ, no PIBID, podemos não só vivenciar a prática, mas também analisávamos com
seriedade todos os aspectos que nós observávamos. Levávamos para nosso grupo de estudos e es-
tudávamos tudo aquilo, unindo a prática com a teoria e, a partir daí, elaborávamos atividades junto
à nossa coordenadora para colocarmos em prática na escola, pois o projeto também nos permite
isso. E tudo isso agregou muito no conhecimento acadêmico dos bolsistas do projeto, e nos permi-
tiu olhar a EJA com outras perspectivas, não só agora, como alunos de pedagogia, mas futuramente
quando estivermos atuando de fato no meio da educação de jovens e adultos.
A importância de qualificação para a EJA foi também observada nos docentes da escola, pois
muitos eram formados na graduação, mas não tinham uma especificação direta para a EJA. Os con-
cursos para professores não colocam essa característica como obrigatória, mas de fato quanto mais
conhecimento os docentes da EJA tiverem sobre as especificidades desta modalidade, pode-se criar
uma forma de melhorar a EJA, tanto nos índices, como para a própria vivência dos alunos.

AtiVidAdes reAlizAdAs nA escolA.


Nesse período que ficamos na escola, dividimos nossas atividades em: observação do cotidiano;
conversa, entrevista e momentos de formação com professores; entrevistas com os alunos, partici-
pação em festas e atividades extracurriculares na escola e por fim a construção de um fanzine e um
mural. Neste tópico vamos falar em especial dessas duas últimas atividades. Isso porque compreen-
demos esses dois trabalhos como uma tentativa para dar mais espaço e voz para os alunos e alunas
da EJA.
O fanzine foi elaborado, a partir, da necessidade de levar informações, notícias territoriais e abor-
dar temas diversos, como por exemplo, questões de religiosidade, problemas de transporte público,
dentre outras. Após identificarmos essa demanda, pensamos que o fanzine seria uma boa maneira
de dialogar com os educandos, pois além dessas necessidades, identificamos que o fanzine poderia
auxiliar no processo de leitura e de criar um hábito para ler e buscar notícias em outros meios.
Depois de confeccionado, passamos em todas as salas para divulgar o Fanzine. Na primeira edi-
ção os alunos não participaram, porém, a partir, desta primeira edição colocamos um espaço onde
o aluno poderia escrever e entregar para alguém da escola, novas sugestões, indagações e o que
eles mais gostariam de ver publicado. Em turmas que estavam no processo de alfabetização fize-
mos uma leitura do material e conversamos para saber a respeito das indagações dos educandos.
Recebemos um quantitativo de respostas e sugestões razoáveis, a partir disso, começamos a pensar
nas próximas publicações. Recebemos respostas que pediam desde letras maiores até publicações
sobre emprego e trabalho na região. Conseguimos realizar mais duas publicações, totalizando três
fanzines, todos foram entregues nas salas e posteriormente nos corredores.
O mural foi pensado como um apoio ao Fanzine, pois este não poderia ser confeccionado toda
semana e nem todo mês, devido às dificuldades de elaboração gráfica e material, por isso o mural

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
se tornaria um meio de comunicação modificado com mais frequência. Na construção desse mural,
levamos em consideração aspectos culturais juvenis, como por exemplo, abordar a história do Funk
com uma linguagem jovem e divulgar cursos e empregos pela região e por todo o RJ. Além disto,
levantamos temas como: violência contra a mulher e doméstica, direitos e deveres dos alunos se-
gundo normas da escola, dicas do novo acordo ortográfico e informações diversas.
Apesar da justificativa de levar informações e dialogar com os alunos através do mural, também
compreendemos essa iniciativa como um meio para dar mais espaço e representatividade aos estu-
dantes da escola. As salas de aula que eram compartilhadas com o diurno (educação básica sem EJA)
não continham a cara da EJA, ou seja, a representatividade dos alunos noturnos. O mural no meio
do corredor de acesso as salas de aula, poderia vir a causar um sentimento de pertencimento a es-
ses alunos. Estes poderiam sempre sugerir novas publicações para o mural, inclusive alguns alunos
levavam noticias, dicas culturais, oportunidades de emprego e cursos para serem fixados no mural,
também recebíamos pedidos de cursos, um que era bastante solicitado era o curso de informática.
Outro ponto importante foi a escolha do nome do mural, pois conversamos com os alunos e
numa votação eles escolheram o nome “Face do Betão”. Este nome foi sugerido pelos bolsistas e ob-
teve o maior numero de votos dentre outros nomes. Durante a construção do mural alguns alunos
participaram e juntos conseguimos deixar o mural com um aspecto visual do Facebook. Colocamos
caracteres, letras e uma fisionomia bem familiar com esta rede social, para chamar atenção dos jo-
vens e da escola no geral, tendo em vista que essa é uma rede bem utilizada pelos jovens.
Nossas atividades não se limitaram a estas duas criações, mas acreditamos que com esses meios
criamos um vínculo maior com a escola e, a partir, dessa abertura conseguimos realizar novas ati-
vidades que demandariam de uma intimidade maior, principalmente com a figura do aluno. Uma
atividade que conseguimos realizar foi a entrevista filmada com os alunos, além desta, outras ativi-
dades foram realizadas com professores, antes e depois da construção do mural e do fanzine.

conclUsão.
Queremos com esse artigo, expor em palavras as nossas experiências como bolsistas, todos os
aspectos que foram observados e que demos ênfase, como a juvenilização, atual realidade de gran-
de parte da EJA, e a formação de professores, formação essa que precisa se atentar para os novos
caminhos que a educação de jovens e adultos tem percorrido. Essa experiência única nos permitiu
vivenciar de perto toda a prática da escola em que ficamos inseridos e nos trouxe para uma realida-
de até então pouco explorada.
Com as nossas atividades na escola, podemos destacar não só a aproximação com os alunos, mas
também com o corpo docente. Alguns dos professores utilizavam o fanzine e passavam algumas
atividades em sala de aula. Isso despertava em nós, os bolsistas, um grande incentivo para continu-
armos com nossos estudos e trazermos mais renovações para o ambiente escolar. Os professores
de certa forma, assim como os bolsistas, acabavam sendo beneficiados por esta troca mútua, pois
criávamos espaços de reflexão, levando vídeos para estes docentes refletirem sobre uma nova abor-
dagem para a EJA e pensar num novo currículo específico para a modalidade.
Concluímos que as atividades propostas foram executadas como o planejado para, assim, criar-
mos um sentimento de pertencimento à escola por parte daqueles alunos. Não estamos querendo
dizer que o fanzine junto com o mural foram as peças fundamentais na construção desta identidade,
mas foi um aparato importante. Para alcançar um nível de pertencimento e de sentir-se parte da
escola o aluno deve ser respeitado nas diversas esferas, sobretudo, na questão de sua (s) cultura (s),
pois esta ainda não entra na escola como uma proposta pedagógica.
PIBID nos proporcionou toda essa vivência de maneira lúcida e coerente, pois não fazíamos um
estágio puramente técnico e assim sempre estávamos estudando, refletindo e debatendo sobre os

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
problemas, anseios, metodologias e propostas para a construção de um novo pensamento demo-
crático que vise o respeito e a garantia de uma EJA pautada nas condições da juventude e dos adul-
tos. De uma forma geral uma EJA que seja de direito e não mais de suplência. E toda essa busca por
tudo que acabamos de expor, não agregou apenas para alguns novos aspectos dentro da escola,
mas, como já citamos no decorrer do artigo, na nossa formação como futuros professores e profis-
sionais da educação. Essa via de mão dupla nos proporcionou grandes aprendizados e satisfação
por termos contribuído não só na nossa carreira acadêmica, mas também no âmbito escolar onde
ficamos inseridos nesse longo e rico projeto.
Por fim achamos necessário dar um destaque aos teóricos que estudamos, pois estes serviram de
apoio e luz para compreender as diversas tensões educacionais que surgiam na escola e no cenário
amplo da Educação de Jovens e Adultos. Dentre os autores estudados os que mais tiveram impacto
em nossa formação foram: Eliane Ribeiro Andrade, Juarez Dayrell, Paulo Freire e Oscar Jara. Nosso
embasamento teórico ocorreu, durante as reuniões com a coordenadora geral do projeto, nesses
dias realizamos um cruzamento das observações na escola com os teóricos estudados.
Cada teórico reflete um paradigma próprio de educação, cada um nos remete a seguinte noção
dos estudos e conhecimento de novas estratégias. Com Eliane Ribeiro Andrade, observamos o gran-
de número de jovens na EJA e toda a especificidade dessa juventude; Juarez Dayrell mostra uma li-
nha parecida de atuação, porém imprime uma forte marca da escola que não faz espaços educativos
que considerem a condição juvenil própria de jovens da atualidade; Paulo Freire, sobre este educa-
dor, podemos destacar sua obra, “Pedagogia da Autonomia”, onde o autor mostra diversificações do
modo de ensinar e nos mostra um caminho da educação popular, tal autor influência nosso projeto,
pela sua trajetória na educação brasileira e por seu ideal voltado para a educação das classes popu-
lares, fato que em nossa escola é fortemente visível.
Para finalizar um processo do projeto, estudamos Oscar Jara. Este em sua obra, “Para sistematizar
experiências”, nos levou a compreender o que é sistematizar, e a partir disso, começamos a nossa
própria sistematização das experiências e vivências da escola onde se dá o projeto, Jara é um autor
que nos faz refletir sobre nossas futuras práticas como docentes e também nossa prática atual como
bolsistas. Com ele pode-se refletir sobre o que estamos fazendo na escola e assim criar um senso
critico sobre o projeto e nossa atuação.
De certo modo acreditamos que estes autores, pouco estudados na graduação, acrescentaram
de maneira significativa em nossa formação docente. Para criar uma EJA que valorize seus sujeitos
e que deixe o espaço escolar se impregnar de sentido e cultura juvenil, precisamos compreender
não só os autores, mas todo o espaço escolar e seus anseios. As políticas públicas quem permeiam
o campo da Educação de Jovens e Adultos não possibilitam a seus docentes espaços de formação
continuada, ou seja, não podemos culpar o professor por ignorar determinadas concepções e ide-
ologias pedagógicas. Principalmente, numa realidade onde o professor da EJA, como observado na
escola pesquisada, onde o docente noturno cumpre sua carga horária em outros turnos e em alguns
casos em outros municípios. O que queremos dizer é que o estado de uma forma geral é ausente
tanto nas politicas para a juventude (alunos) quanto para a formação de seus docentes. E esses
professores devido a sua rotina não podem ser culpados pelo não investimento em sua própria for-
mação, pois eles não são motivados para tal atitude e ainda são prejudicados pela falta de politicas
públicas formativas.

referênciAs bibliográficAs
ANDRADE, Eliane Ribeiro de. Os jovens da EJA e a EJA dos jovens. In: OLIVEIRA, Inês Barbosa de; PAI-
VA, Jane (Orgs.). Educação de jovens e adultos. Rio de Janeiro: DP&A, 2004. P. 43-51.
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dade, Campinas, v. 28, n. 100, p. 1105-1128, out. 2007.

551
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
DI PIERRO, Maria Clara; JOIA, Orlando; RIBEIRO, Vera Masagão. Visões da educação de jovens e adul-
tos no Brasil. Cadernos do Cedes. Campinas, n. 55, p. 58-76, novembro. 2011.
FÁVERO, Osmar. Lições da história: avanços de sessenta anos e a relação com as políticas de negação
de direitos que alimentam as condições de analfabetismo no Brasil. In: OLIVEIRA, I.B.; PAIVA J. (orgs.)
Educação de Jovens e Adultos. Rio de Janeiro: DP&A, 2004. P. 9-21.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e
Terra, 1996.
HOLLYDAY, Oscar Jara. Para sistematizar experiências. San José: ALFORJA, 1991
VENTURA, Jaqueline. Educação ao longo da vida e organismos internacionais: apontamentos para
problematizar a função qualificadora da Educação de Jovens e Adultos. Revista Brasileira de Educação
de Jovens e Adultos. v. 1. Nº 1. 2013.
http://www.capes.gov.br/educacao-basica/capespibid, acessado em 20/09/2014 às 20h40min.

552
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
fichA de AcompAnhAmento: A AVAliAção nUmA
perspectiVA processUAl
KArine oliVeirA bAstos

Este trabalho busca discutir, no âmbito da modalidade de Educação de Jovens e Adultos (dora-
vante EJA), como as práticas de avaliação adotadas configuram as próprias concepções de ensino e
aprendizagem. Segundo Luckesi (2008, p. 93), “a avaliação, diferentemente da verificação, envolve
um ato que ultrapassa a obtenção da configuração do objeto, exigindo decisão do que fazer ante ou
com ele. A verificação é uma ação que ‘congela’ o objeto; a avaliação, por sua vez, direciona o objeto
numa trilha dinâmica de ação”. Com base nessa reflexão e coerente com uma concepção de EJA que
se pretenda, de fato, emancipatória, pretende-se apresentar um relato de experiência de formação
de professores inserida na EJA-Manguinhos, curso desenvolvido pela Fundação Oswaldo Cruz, sob a
orientação da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, localizada na cidade do Rio de Janeiro.
Após longas discussões que apontavam para o descontentamento dos professores em classificar,
nos momentos de conselho de classe, cada estudante a partir de uma nota, o grupo docente optou,
como primeiro passo, por abolir o recurso da nota, para que, no lugar desta, fosse possível exercitar
atos de avaliar cada vezmais complexos e condizentes como uma proposta de educaçãoque não
tivesse como seu maior objetivo classificar sujeitos, senão ‘acolhê-los’ – nos termos de Luckesi (2000)
– em primeiro lugar. Em outras palavras, o grupo docente tem buscado, com base numa perspectiva
processual de avaliação, utilizar como recurso uma ficha de acompanhamento de todo o processo
de ensino-aprendizagem. Certamente, tal escolha configura um grande desafio, sobretudo porque
rompe com uma prática enraizada no âmbito escolar – a da classificação por meio da nota – e impli-
ca, a todo momento, a avaliação do própriotrabalho docente. Para ilustrar construção e prática da
ficha de acompanhamento, este trabalho apresenta, como um recorte, talexperiência nas aulas de
Língua Portuguesa.

palavras-chave: Avaliação, Ficha de acompanhamento, Língua Portuguesa

introdUção
É comum notarmos que o ato de avaliar assume, muitas vezes, um lugar de destaque no contexto
de ensino-aprendizagem. Isso se deve ao fato de, no âmbito da educação, nos atermos às categorias
“aprovação” e “reprovação”, típicas de um ensino que se fragmenta em etapas escolares. Assim, no
papel de professores, aprendemos e reproduzimos na cultura escolar o ato de medir o aluno por
meio de notas ou conceitos, que o definem como “aprovado” ou “reprovado” em um momento
pontual.
Diante disso, trazemos alguns questionamentos: Se o ato de avaliar se mostra fundamental no
processo de ensino-aprendizagem, por que este costuma se dar numa perspectiva de pontualida-
de? Qual a função de medir o aproveitamento do aluno no ato de avaliação? De que modo notas e
conceitos refletem um “resultado” desse aproveitamento? Avaliar significa, necessariamente, definir
um resultado? Nossa intenção, certamente, não é responder objetivamente a tais questões, mas
usá-las, de certo modo, como elementos disparadores da inquietação docente diante da tarefa de
avaliar um aluno.
Assim, o presente trabalho busca discutir, no âmbito da modalidade de Educação de Jovens e
Adultos (doravante EJA), como as metodologias de avaliação refletem as próprias concepções de
educação, do processo de ensino-aprendizagem. Para tanto, com base nessas reflexões e coerente
com uma concepção de EJA que se pretenda, de fato, emancipatória, pretendemos apresentar um

553
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
relato de experiência de formação de professores inserida na EJA-Manguinhos, curso desenvolvido
pela Fundação Oswaldo Cruz, sob a orientação da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio,
localizada na cidade do Rio de Janeiro.

relAto de experiênciA
As reuniões de Conselho de Classe da EJA-Manguinhos representavam, em certa medida, um
marco da incoerência pedagógica à qual o grupo docente estava submetido. Afinal de contas, havia
uma inquietação dos professores cada vez maior diante de sua função de classificar o estudante a
partir de uma nota no final de cada semestre letivo.
Assim, reconhecendo que as metodologias de avaliação adotadas traduzem nossa própria con-
cepção de educação, percebemos que nossas práticas avaliativas deveriam ser mais coerentes com
a proposta político-pedagógica até então construída pelo grupo.
A concepção de educação e de ensino adotada pela EJA-Manguinhos, por sua vez, está ligada à
perspectiva da cidadania ativa e da territorialização como metodologia de trabalho, isto é, uma edu-
cação comprometida pedagogicamente com reivindicações do território, que estimula a participa-
ção comunitária na reivindicação de direitos e territórios saudáveis. Em outras palavras, trata-se de
uma proposta de educação, de EJA, que entende o retorno dos estudantes para a sala de aula para
além da ideia de recuperar um “tempo perdido”, mas como o reconhecimento de suas potencialida-
des como um ser cognitivo, histórico e cultural, capaz de promover transformações na estrutura so-
cial. Assim, torna-se um compromisso discutir sobre o sistema público de educação, inclusive, sobre
o ensino regular e as circunstâncias da evasão escolar.
Com base nesses princípios apresentados, fica claro que não faria mais sentido assumirmos uma
prática de avaliação que se preocupasse apenas com a classificação do estudante por meio de uma
nota, porque, de fato, essa prática não reflete uma proposta emancipatória de educação. O próprio
Projeto Político-Pedagógico (doravante PPP) da EJA-Manguinhos, ao traçar seus objetivos, faz crítica
ao modelo classificatório de avaliação:

Podemos dizer que vivemos o modismo da sociedade dos privilégios em substi-


tuição ao Estado de Direitos. Em um contexto de violações de direitos, bem avaliado
é o cidadão que consegue ultrapassar o gargalo das iniquidades sociais através do
‘esforço pessoal’ e da culpabilização dos excluídos. No que tange ao trabalho, traba-
lhador eficiente é o sujeito alienado que produz demasiadamente sem questionar
as violações dos direitos trabalhistas. No que se refere ao contexto escolar, convi-
vemos com diferentes experiências que materializam tais ideologias, e, sobretudo,
reforçam tal modelo de sociedade. Nessa perspectiva, podemos citar o formato de
ingresso dos vestibulares, as olimpíadas de componentes curriculares e dos inúme-
ros incentivos de governo às escolas que alcançam o melhor índice de aprovação,
sem o debruçar das propostas pedagógicas para o alcance desses índices.

Nesse sentido, em meados de 2011, o grupo de professores estabeleceu que, como primeiro pas-
so na busca por uma metodologia de avaliação mais coerente com o seu PPP, seria eliminada a
classificação por meio da nota, a fim de que pudéssemos exercitar outros tipos de registro que abar-
cassem um olhar mais complexo e processual para o ensino-aprendizagem.
É importante ressaltar, nesse caso, que a experiência aqui relatada configura, de fato, um exercí-
cio constante e contínuo de novas práticas de avaliação, que, de algum modo, ainda trazem em si
marcas das contradições da cultura escolar. Não há uma pretensão de nossa parte em considerar tais
práticas como exemplos ideais para o processo educativo, justamente porque, além de ainda nos

554
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
depararmos com muitos desafios nesse exercício, tecemos também nossas críticas a ele. De qual-
quer modo, entendemos que o que mais nos motiva a compartilhar nossa experiência nessa área é
compartilhar questionamentos acerca do processo avaliativo classificatório e reduzido a uma nota
ou a um conceito – claramente excludente e incoerente com uma proposta de educação que se diz
emancipatória.

AlgUmAs reflexões sobre o Ato de AVAliAr


Para que chegássemos à decisão de abolir o recurso da nota, o grupo docente passou por longas
discussões acerca do ato de avaliar, de modo que se apontava o descontentamento diante de uma
metodologia de classificação por meio de um grau, de uma nota. Assim, no âmbito da educação,
pudemos encontrar alguns estudos que discutissem a avaliação da aprendizagem escolar. Luckesi
(2000, p. 15), estudioso do tema, defende que

o ato de avaliar, devido a estar a serviço da obtenção do melhor resultado pos-


sível, antes de mais nada, implica a disposição de acolher. Isso significa a possibili-
dade de tomar uma situação da forma como se apresenta, seja ela satisfatória ou
insatisfatória, agradável ou desagradável, bonita ou feia. Ela é assim, nada mais.
Acolhê-la como está é o ponto de partida para se fazer qualquer coisa que possa ser
feita com ela. Avaliar um educando implica, antes de mais nada, acolhê-lo no seu ser
e no seu modo de ser, como está, para, a partir daí, decidir o que fazer.

O autor distingue dois processos articulados e indissociáveis no ato de avaliar: o diagnóstico e a


decisão. Em outras palavras, considerando a perspectiva dialógica que envolve o acolhimento no
ato de avaliar, entendemos que, a princípio, é preciso qualificar um objeto, uma ação ou uma pessoa
para que se possa, então, tomar uma decisão sobre eles.
Nesse sentido, o autor traça outra distinção importante no âmbito da prática escolar: a verificação
e a avaliação. Segundo Luckesi (2008, p. 93),

a avaliação, diferentemente da verificação, envolve um ato que ultrapassa a ob-


tenção da configuração do objeto, exigindo decisão do que fazer ante ou com ele. A
verificação é uma ação que “congela” o objeto; a avaliação, por sua vez, direciona o
objeto numa trilha dinâmica de ação.

Desse modo, tece críticas à escola brasileira, uma vez que esta tem se dedicado mais à verificação
do que à avaliação da aprendizagem. De fato, é possível notarmos no processo de ensino-aprendi-
zagem a intenção de se classificar um educando – por meio da atribuição de notas e do resultado
‘aprovação’ ou ‘reprovação’ – em detrimento de um trabalho que busque compreender seus avan-
ços, seus limites e suas dificuldades em todo o processo.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (1998, p. 93), apesar disso, defendem um conceito mais
amplo de avaliação, uma vez que destacam:

A avaliação deve ser compreendida como conjunto de ações organizadas com


a finalidade de obter informações sobre o que o aluno aprendeu, de que forma e
em quais condições. Para tanto, é preciso elaborar um conjunto de procedimentos
investigativos que possibilitem o ajuste e a orientação da intervenção pedagógica
para tornar possível o ensino e a aprendizagem de melhor qualidade.

555
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
Assim, com base numa perspectiva processual de avaliação, o grupo de professores da EJA-Man-
guinhos tem buscado utilizar como recurso uma ficha de acompanhamento de todo o processo
de ensino-aprendizagem. Certamente, tal escolha configura um grande desafio, sobretudo porque
rompe com uma prática enraizada no âmbito escolar – a da classificação por meio da nota – e pres-
supõe, a todo momento, a avaliação do próprio trabalho docente. Entender a avaliação como um
ato de “acolhimento” implica reconhecer que o foco não é exclusivamente dado à aprendizagem do
aluno, mas também à “ensinagem”, a partir da relação dialógica que envolve esse processo.
As discussões sobre a temática da avaliação, portanto, permanecem desde 2011. Em um primeiro
momento, cada professor produziu – de forma livre e autônoma – uma ficha de acompanhamento,
levando em conta as especificidades da disciplina com que trabalhava, bem como as especificidades
de uma turma, de um segmento de ensino. Em seguida, nas reuniões de formação, pudemos discutir
sobre os aspectos que estavam presentes em um número significativo de fichas, de modo que acor-
damos que, na reelaboração destas, seria fundamental que todas abarcassem em comum o registro
dos objetivos específicos de cada componente curricular e também do que decidimos chamar de “o
que avaliar”. Nossa maior preocupação era que o registro posterior do processo de ensino-aprendi-
zagem, relativo a cada aluno, fosse coerente com uma proposta prévia e, para além disso, pudesse
facilitar a compreensão do leitor-estudante.
Muito embora o grupo de professores ainda precise adequar melhor a linguagem do seu registro
para o entendimento do aluno – leitor a quem mais interessa esse acompanhamento –, entendemos
que faz parte, inclusive, do processo de formação das turmas da EJA-Manguinhos um exercício em
que os estudantes possam, além de tomar ciência, intervir no trabalho que envolve “planejar”, “traçar
objetivos” e “avaliar”. Em outras palavras, mesmo que ainda façamos várias críticas à linguagem e a
demais aspectos das fichas, acreditamos que estamos seguindo um caminho de registro da avalia-
ção mais condizente com uma proposta de educação emancipatória do que a perspectiva de uma
nota – que, a nosso ver, reduz uma riqueza de informações sobre o processo de ensino-aprendiza-
gem a um número de 0 a 100.
Outro ponto que vale ressaltar é que existe, por parte do grupo docente, um cuidado em distin-
guir o registro de uma ficha de acompanhamento do próprio processo de avaliação em si. Queremos
dizer, em outras palavras, que a elaboração de uma ficha de acompanhamento não significa, neces-
sariamente, que o olhar do professor esteja voltado para uma perspectiva processual da avaliação.
No início das discussões, por exemplo, notamos que muitas fichas, muito embora ocupassem o lu-
gar de uma nota, mantinham um caráter pontual. Ao mesmo tempo, acreditamos que, mesmo que
a maioria das instituições de ensino exija o registro de uma nota para lançar no sistema, é possível
que o professor, ao longo do semestre ou ano letivo, mantenha seu olhar, de fato, para o processo de
ensino-aprendizagem. Nesse caso, cumpre esclarecer que a discussão proposta neste trabalho está
mais ligada a uma postura do professor diante do seu processo de trabalho do que às possibilidades
de registro que uma instituição de ensino possa oferecer ou exigir de seus profissionais.

UmA fichA de AcompAnhAmento de portUgUês


Para ilustrar construção e prática de uma ficha de acompanhamento, na perspectiva das discus-
sões travadas no grupo docente da EJA-Manguinhos, este trabalho apresenta, como um recorte, a
versão de uma ficha de acompanhamento da disciplina de Português para uma turma de Séries Fi-
nais do Fundamental, do segundo semestre de 2014. Para isso, destacaremos alguns pontos do pro-
cesso de elaboração desse material, que poderão ser conferidos, a seguir, na própria ficha em anexo.
Em primeiro lugar, consideramos como questões gerais da avaliação: frequência, pontualidade,
participação, envolvimento com o processo de ensino-aprendizagem e cooperação. Nesse caso, lan-
çamos tópicos ligados à relação de solidariedade entre os colegas da turma observada nas aulas,

556
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
bem como à relação de respeito aos diferentes posicionamentos das pessoas envolvidas no proces-
so.
Já, na segunda parte da ficha, destinada às questões específicas da avaliação, estão registrados
os objetivos específicos da disciplina de Português, que estão, de certo modo, atrelados ao que
chamamos de “tópicos específicos da avaliação”. Além dos objetivos, estão registrados também os
instrumentos utilizados: leitura e interpretação de diferentes gêneros textuais (cf. Marcuschi, 2008),
produções escritas e orais dos diferentes gêneros textuais, atividades de análise linguística e ativi-
dades de auto-avaliação.
Nesse caso, torna-se importante esclarecer que nossa metodologia avaliativa não considera pro-
cessual a soma de diversos instrumentos de avaliação, como observamos muitas vezes no trabalho
com a nota: somatório de pontos de cada atividade realizada até se alcançar uma nota final. Por
outro lado, reunindo todos os momentos de participação dos estudantes, isto é, todas as atividades
em que estiveram envolvidos de algum modo, é possível nos debruçarmos sobre o que, de fato,
pretendemos avaliar no decorrer do processo.
No caso da disciplina de Português, muito embora enxerguemos estes tópicos de uma forma im-
bricada, traçamos a seguinte subdivisão do que nos interessa avaliar: a) articulação de saberes por
meio das produções orais e escritas; b) apropriação textual em atividades de leitura e produção oral
e escrita; c) aproximação da norma padrão da língua. Assim, se observarmos o detalhamento que
envolve esses três tópicos, na ficha de acompanhamento em anexo, é possível compreendermos
como uma proposta de avaliação processual pode ultrapassar o somatório de pontuações referen-
tes a cada instrumento.

considerAções finAis
O presente artigo teve como objetivo apresentar, de modo bastante breve, um relato de experi-
ência, no âmbito da formação de professores, que diz respeito à discussão sobre metodologias de
avaliação na EJA-Manguinhos. Nesse sentido, convém reforçar que tal relato configura um compar-
tilhar de questionamentos em torno do processo avaliativo classificatório – muitas vezes, reduzido
a uma nota ou a um conceito –, que se ocupa em definir que uns estudantes estão além ou aquém
de outros.
Assim, justamente por se tratar de um relato de experiência, no âmbito da formação de profes-
sores, julgamos necessário levantar algumas questões finais que possam dar outros movimentos às
discussões entre professores interessados pela temática da avaliação. Trata-se, portanto, de algumas
críticas ao próprio exemplo apresentado de ficha de acompanhamento.
Em primeiro lugar, ainda é preciso rever a noção de avaliação classificatória, porque, muito em-
bora seja nosso interesse manter distância desta, de algum modo, ela ainda se faz presente na cul-
tura escolar, no processo de ensino-aprendizagem e na própria ficha em anexo. Podemos dizer que,
como nossa intenção foi reduzir o tempo de preenchimento individual de uma ficha com alto grau
de detalhamento como esta, optamos por registrar previamente possíveis respostas para as ques-
tões levantadas, a fim de que pudéssemos fazer uma escolha entre as opções oferecidas. Esta prática
ainda reflete, de certo modo, um tipo de classificação do estudante.
O exercício da auto-avaliação, por sua vez, muito embora esteja presente no processo de traba-
lho da EJA-Manguinhos de outros modos, não está satisfatoriamente registrado na ficha em anexo.
Nesse caso, pretendemos dar maior atenção a esse aspecto em um momento posterior de reelabo-
ração da ficha de acompanhamento, de modo que a participação dos estudantes nesse processo
seja ainda mais ativa.
Por fim, vale dizer que a nossa experiência de elaboração de uma ficha de acompanhamento,
bem como a prática de preenchimento desta, mostrou que não estamos tratando de um material,

557
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
simplesmente, a serviço da burocracia escolar, mas de um material didático fundamental no pro-
cesso de formação de professores e estudantes, sobretudo, porque compreendemos que o registro,
nesse caso, pressupõe reflexão: e esta não pode faltar na educação.

referênciAs bibliográficAs
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BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. parâmetros
curriculares nacionais: ensino médio. Brasília, 2000.
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Cortez, 2008.
MARCUSCHI, L. A. Produção textual: análise de gêneros e compreensão. São Paulo: Parábola Edi-
torial, 2008.
MORAIS, A. G. de & FERREIRA, A. T. B. Avaliação do texto escrito: uma questão de concepção de ensi-
no e aprendizagem. In: LEAL, T. F. & BRANDÃO, A. C. P. (orgs.). Produção de textos na escola: reflexões
e práticas no ensino fundamental. 1ª ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2007.
Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (Org). projeto político pedagógico da ejA-mangui-
nhos. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2011.

558
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
Anexos

ejA-mAngUinhos - fichA de AcompAnhAmento do estUdAnte

Nome: Componente Curricular: Ano/semestre:


Português 2014-2
Turma: Professores: Eixo do semestre:
Movimentos Sociais
Fundamental VII
na luta por DH

período: até período: até


qUestões gerAis dA AVAliAção
coc parcial COC final
[ ] total de aulas dadas [ ] total de aulas dadas
freqUênciA Justificativas:
[ ] aulas frequentadas [ ] aulas frequentadas
( ) quase sempre é pontual ( ) quase sempre é pontual
pontUAlidAde Justificativas: ( ) às vezes é pontual ( ) às vezes é pontual
( ) quase nunca é pontual ( ) quase nunca é pontual
Respeita a complexidade do
processo de ensino-aprendiza- ( ) respeita plenamente ( ) respeita plenamente
gem que envolve as diversida- ( ) em desenvolvimento ( ) em desenvolvimento
des socioculturais, de geração, ( ) com dificuldades ( ) com dificuldades
de etnia e de gênero da turma?
( ) respeita plenamente ( ) respeita plenamente
Respeita os diferentes po-
sicionamentos das pessoas ( ) em desenvolvimento ( ) em desenvolvimento
pArticipAção
envolvidas no processo de ( ) com dificuldades ( ) com dificuldades
ensino-aprendizagem?

enVolVimento Estabelece uma relação so- ( ) respeita plenamente ( ) respeita plenamente


com o proces- lidária com os colegas da ( ) em desenvolvimento ( ) em desenvolvimento
so de ensino- turma, no sentido de contri-
buir nas diversas atividades ( ) com dificuldades ( ) com dificuldades
-AprendizAgem
que envolvem o coletivo?
( ) realiza sempre ( ) realiza sempre
Realiza as atividades pro- ( ) realiza parcialmente ( ) realiza parcialmente
cooperAção
postas nas aulas? ( ) realiza raramente ( ) realiza raramente

Busca enfrentar suas dificul-


( ) busca sempre ( ) busca sempre
dades, solicitando ajuda e/ou
mantendo contato próximo ( ) busca parcialmente ( ) busca parcialmente
com os colegas da turma, com ( ) busca raramente ( ) busca raramente
a professora e com os demais
profissionais da escola?

Outras observações até o COC parcial:


Outras observações até o COC final:

559
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
qUestões específicAs dA AVAliAção
objetiVos específicos dA disciplinA
1) Levar o estudante a refletir sobre a função comunicativa da língua, problematizando os papéis assumidos
pelos diferentes interlocutores (produtor e receptor) do processo de comunicação, de modo a tomar ciência
de como sua identidade é construída no discurso. Pretende-se discutir como o uso da língua reflete as rela-
ções de poder construídas na sociedade. 2) Propor o reconhecimento da variação linguística, uma vez que
se entende a língua – mais do que um dado cultural – como a representação de toda a cultura de um povo.
Assim, por meio dos diferentes usos da língua, buscar conhecer e compreender outras realidades, os dife-
rentes contextos históricos, sociais e culturais, para que seja possível compreender melhor nosso próprio
contexto social. 3) Discutir sobre as marcas ideológicas explícitas e implícitas nos textos, uma vez que se con-
sidera a impossibilidade de haver um texto neutro. Assim, busca-se problematizar – especialmente, neste
semestre – os discursos da mídia brasileira sobre os movimentos sociais. 4) Ampliar o conhecimento linguís-
tico, textual e de mundo do estudante, por meio do trabalho de leitura, produção e análise linguística de di-
versos gêneros textuais, explorando suas várias possibilidades de uso objetivo e subjetivo da linguagem.
instrUmentos de AVAliAção
Leitura e interpre- Produções escritas
Atividades de aná- Atividades de auto-
tação de diferentes e orais de diferentes
lise linguística -avaliação
gêneros textuais gêneros textuais

qUestões
gerAis dA período: até coc parcial período: até COC final
AVAliAção
ArticUlAção de sAberes por meio dAs prodUções orAis e escritAs

Faz associações a partir ( ) faz associações com facilidade


[ ] total de aulas dadas
de experiências vivi- ( ) faz associações com dificuldades
[ ] aulas frequentadas
das no cotidiano? ( ) não faz associações pertinentes
( ) sustenta a argumentação para além ( ) sustenta a argumentação para além
de exemplos ligados à vida pessoal de exemplos ligados à vida pessoal
Faz associações a partir
( ) sustenta a argumentação apenas com ( ) sustenta a argumentação apenas com
de experiências vivi-
exemplos ligados à vida pessoal exemplos ligados à vida pessoal
das no cotidiano?
( ) apresenta dificuldades de se ( ) apresenta dificuldades de se
posicionar criticamente posicionar criticamente

constrói argumen- ( ) relaciona de forma complexa as ideias ( ) relaciona de forma complexa as ideias
tações a partir das relativas ao eixo do semestre relativas ao eixo do semestre
questões referentes ( ) relaciona de forma simples as ideias ( ) relaciona de forma simples as ideias
ao eixo moVimentos relativas ao eixo do semestre relativas ao eixo do semestre
sociAis nA lUtA por ( ) não relaciona as ideias relativas ao ( ) não relaciona as ideias relativas ao
direitos hUmAnos? eixo do semestre eixo do semestre

Outras observações até o COC parcial:

Outras observações até o COC final:

560
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
qUestões
gerAis dA período: até coc parcial período: até COC final
AVAliAção
ApropriAção textUAl em AtiVidAdes de leitUrA, prodUção orAl e escritA
( ) Relaciona informações (explícitas ou ( ) Relaciona informações (explícitas ou
No que se refere ao implícitas) do texto, formula hipóteses implícitas) do texto, formula hipóteses
processamento da e avalia criticamente com base em e avalia criticamente com base em
leitura e interpreta- estratégias inéditas, demonstrando estratégias inéditas, demonstrando
ção, apresenta qual assim a sua autonomia leitora. assim a sua autonomia leitora.
grau de letramento? ( ) Localiza e, mais do que isso, recombina ( ) Localiza e, mais do que isso, recombina
as informações no texto, elaborando as informações no texto, elaborando
hipóteses e inferências de alta hipóteses e inferências de alta
complexidade. complexidade.
( ) Compreende amplamente o texto, ( ) Compreende amplamente o texto,
relacionando informações por meio relacionando informações por meio
como aproveita os de comparação, contraposição ou de comparação, contraposição ou
elementos textuais categorização. categorização.
(explícitos e implícitos) ( ) Constrói uma compreensão global do ( ) Constrói uma compreensão global do
na atividade de leitu- texto, fazendo inferências de baixa texto, fazendo inferências de baixa
ra e interpretação? complexidade. complexidade.
( ) Localiza apenas informações explícitas ( ) Localiza apenas informações explícitas
no texto, estabelecendo relações com no texto, estabelecendo relações com
conhecimentos do seu cotidiano. conhecimentos do seu cotidiano.
( ) busca sempre
( ) lê com desenvoltura e fluidez
( ) busca parcialmente
Como lê em voz alta? ( ) em desenvolvimento
( ) busca raramente
( ) lê com dificuldades

reconhece as carac-
terísticas formais e ( ) reconhece com facilidade ( ) reconhece com facilidade
funcionais dos dife-
( ) em desenvolvimento ( ) em desenvolvimento
rentes gêneros textu-
ais em atividades de ( ) não reconhece ( ) não reconhece
leitura e de escrita?
compreende a orga-
nização geral do texto ( ) compreende e organiza bem ( ) compreende e organiza bem
(introdução, desenvol- ( ) em desenvolvimento ( ) em desenvolvimento
vimento e conclusão) ( ) com dificuldades ( ) com dificuldades
na leitura e na escrita?
compreende a unidade ( ) compreende e organiza bem ( ) compreende e organiza bem
do parágrafo no texto
( ) em desenvolvimento ( ) em desenvolvimento
em prosa escrito (princi-
palmente na produção)? ( ) com dificuldades ( ) com dificuldades

Outras observações até o COC parcial:

Outras observações até o COC final:

561
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
qUestões
gerAis dA período: até coc parcial período: até COC final
AVAliAção

AproximAção dA normA pAdrão dA língUA

( ) adequado ( ) adequado
Uso do vocabulário ( ) em desenvolvimento ( ) em desenvolvimento
( ) com dificuldades ( ) com dificuldades
processos de articulação ( ) adequado ( ) adequado
(referenciação e
( ) em desenvolvimento ( ) em desenvolvimento
sequenciação)
( ) com dificuldades ( ) com dificuldades

organização das ( ) organiza com facilidade ( ) organiza com facilidade


construções sintá- ( ) em desenvolvimento ( ) em desenvolvimento
ticas; pontuação
( ) com dificuldades ( ) com dificuldades
( ) atende à norma padrão ( ) atende à norma padrão
concordâncias no-
( ) em desenvolvimento ( ) em desenvolvimento
minal e verbal
( ) com dificuldades ( ) com dificuldades
( ) atende à norma padrão ( ) atende à norma padrão
Relação fonema-grafema ( ) em desenvolvimento ( ) em desenvolvimento
( ) com dificuldades ( ) com dificuldades
Outras observações até o COC parcial:

Outras observações até o COC final:

562
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
formAção continUAdA Aos docente qUe AtUAm nA
edUcAção de joVens e AdUltos nAs escolAs do cAmpo
no estAdo de mAto grosso.
eUzemAr fátimA lopes siqUeirA

O objetivo deste artigo é relatar a experiência do Curso de Aperfeiçoamento da Educação de


Jovens e Adultos ofertado aos professores e professoras das escolas do campo pela Universidade
Federal de Mato Grosso (UFMT) em parceria com Secretaria de Estado de Educação de Mato Grosso
(Seduc/MT). A proposta de formação se deu em detrimento dos indicadores negativos expressivos,
como alto índice de analfabetismos e baixa escolarização na EJA no campo, nos municípios da bai-
xada cuiabana que distam menos de 200 Km da capital do estado. A metodologia da pedagogia da
alternância foi utilizada no processo de formação dos cursistas com períodos intercalados em tem-
pos presenciais e tempo uma vez que esta enfatiza o respeito à cultura do sujeito do campo, assim
como, a organização do espaço de aprendizagem. Na estrutura curricular do curso foi abordado as
seguintes temáticas: Bases legais da Educação de Jovens e Adultos e da Educação do campo, análise
do Projeto Político Pedagógico, Metodologias, Avaliação e Práticas Pedagógicas. O resultado foi a
formação de 120 docentes que atuam na educação de jovens e adultos nas escolas do campo dis-
tribuídas nos municípios de Acorizal, Jangada, Chapada dos Guimarães, Santo Antônio do Leverger,
Barrão de Melgaço, localizados ao entrono de Cuiabá-MT.

palavras-chave: Formação Continuada, Pedagogia da Alternancia, Educação do campo

introdução
O presente trabalho abordará o Curso de aperfeiçoamento ofertado pela Universidade Federal de
Mato Grosso, em parceria com a Secretaria de Estado de Educação de Mato Grosso, entre os meses
de janeiro a agosto de 2014, destinado aos docentes que atuam na modalidade da Educação de
Jovens e Adultos, nas salas anexas da educação do campo.
O objetivo deste artigo é relatar a experiência vivenciada neste Curso destinado aos municípios
localizados no entorno de Cuiabá-MT, os quais foram escolhidos por apresentarem indicadores ne-
gativos expressivos, como alto índice de analfabetismo e baixa escolarização.
Este artigo está organizado em tópicos que abordam a temática da Educação do Campo, como
afirmação de direito e a sua contextualização no estado de Mato Grosso, como forma de demonstrar
o processo de sua constituição no espaço nacional e estadual, assim como, sua articulação com a
modalidade da Educação de Jovens e Adultos, sendo esta uma modalidade de Ensino destinada aos
que não tiveram acesso a educação, formação na idade própria determinada pelas leis regentes no
país, portanto, um direito público subjetivo garantido pela Constituição Federal de 1988, com meto-
dologia própria de desenvolvimento.
Apresentaremos o Curso de Aperfeiçoamento da Educação de Jovens e Adultos para as escolas
de campo, utilizando a metodologia da Pedagogia da Alternância, por ser uma das formas que en-
globa princípios e elementos pertinentes à educação do campo, como organização de comitês Bem
Viver, Cultura, Memória e Comunicação Social, e instrumentos, como: Plano de Estudo, Caderno da
Realidade, Visitas às famílias, aulas de campo.
Na estrutura curricular do curso foram abordadas as seguintes temáticas: Bases legais da Educa-
ção de Jovens e Adultos e da Educação do campo, análise do Projeto Político Pedagógico, Metodo-
logias, Avaliação e Práticas Pedagógicas. Elucidar-se-á sobre o diálogo necessário sobre as práticas

563
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
pedagógicas e as teorias vivenciadas pelos professorados que atuam nesta modalidade, proporcio-
nando a troca de experiências entre seus pares.
Para o desenvolvimento desta pesquisa utilizou-se, como proposta metodológica, a pesquisa so-
cial participante, quando o(a) pesquisador(a) se torna parte intrínseca da pesquisa, superando o
método tradicional, onde se tem sujeito e objeto de pesquisa como parte distinta do processo.
Neste tipo de pesquisa há a relação inseparável do sujeito-sujeito a partir do suposto de que
todas as culturas e situações são fontes originais de saberes e, nesta pesquisa, os pesquisadores
estavam inerentemente envolvidos, pois eram os professores pesquisadores e proponentes a pro-
posta formativa do curso de aperfeiçoamento para a docentes que atuam na EJA nas escolas do
campo. Desta forma, é pelo exercício de uma pesquisa e da influência mútua entre os diferentes
conhecimentos que uma forma partilhável de compreensão da realidade social pode ser elaborada
(BRANDÃO e BORGES, 2007).

A edUcAção do cAmpo como AfirmAção de direito e sUA contextUA-


lizAção no estAdo de mAto grosso
Para a Educação do Campo, no âmbito nacional, é um direito social apoderar-se pelos movimen-
tos sociais, com a finalidade de fortalecer a permanência dos sujeitos no campo. Estes movimentos
resultaram na realização de duas Conferências Nacionais para discutir uma educação que atendesse
à especificidade da realidade do campo, efetivando-se, em diversas ações, como a aprovação do
Parecer nº 36/02, que trata das Diretrizes Operacionais para a Educação do Campo, homologada
pela Resolução nº 001/2002, do Conselho Nacional de Educação/Câmara da Educação Básica; pois,
as políticas públicas no Brasil, destinadas à população que vive no campo, apesar de já estarem pre-
sentes na Constituição Federal de 1988, na LDB/1996 estas sempre foram, de alguma forma, renega-
das diante dos espaços de conflitos de interesses e classes, políticos e culturais, além da dicotomia
existente entre campo e cidade. Diante destes fatos estão os sujeitos que ocupam e vivenciam essa
realidade.
Segundo Molina (2004), a realidade do campo é extremamente contraditória: nesta há a exis-
tência de lutas históricas pelo direito e permanência na terra, assim como, o conflito permanente
e a disputa de poder. Os sujeitos da educação do campo, os mesmos da resistência deste espaço
de uma política, cultural e pedagógica, que alinhem na dimensão da inclusão social, com geração
de renda, justiça social e garantia de uma cidadania digna, inclusão social, de geração de renda, de
cidadania, têm que trabalhar, junto à Educação do Campo, as lutas sociais da população do campo.
Segundo Fernandes (2004), a educação tem um sentido peculiar para os povos do campo, pois
o território camponês deve manter as suas características; assim, deve-se compreender o território
camponês na sua totalidade, de forma que o desenvolvimento não venha aniquilar a sua estrutura.
As realizações das duas Conferências Nacionais para a Educação do Campo (1998 e 2004) provo-
caram um olhar diferenciado para esta, desencadeando diversas ações, com a criação de um grupo
permanente para subsidiar a implantação e implementação das políticas voltadas à aprovação de
leis e decretos, tratando das suas especificidades, assim como a criação de setores em secretarias
estaduais e municipais para tratar destas temáticas.
Desta forma, o Ministério de Educação lança o Programa Projovem Campo, direcionado para o
Ensino Fundamental da Educação de Jovens e Adultos, cuja formação continuada fosse desenvolvi-
da pelas Universidades Federais, como estratégia de articular esta formação continuada e a aproxi-
mação do diálogo entre as instituições proponentes, na maioria das vezes as Secretarias Estaduais
e as Instituições Formadoras.

A formAção continUAdA como estrAtégiA nA consolidAção dA po-

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
líticA públicA pArA A edUcAção do cAmpo
A Educação para os povos do Campo, como já dito anteriormente, que, apesar de já estar garan-
tida e possuir instrumentos legais para sua efetivação desde a Constituição Federal de 1988, somen-
te é recolocada em pauta com as lutas dos movimentos sociais do campo. Além de já possuir um
acúmulo de aportes teóricos construídos a partir destes sujeitos, pelas Conferências da Educação
do Campo (1998 e 2004), Seminário Nacional sobre Educação Básica nas áreas de Reforma Agrária
(2006), Encontro Unitário dos Trabalhadores e Trabalhadoras dos Povos do Campo da Água e da Flo-
resta (2012); mesmo tratando da Educação do Campo e suas propostas de afirmação da valorização
da cultura, identidade e lutas, esta só se concretiza pela formação, seja para a construção de políticas
públicas ou para a construção de currículos e práticas pedagógicas.
Segundo Arroyo (2007), o nosso sistema escolar é estruturado para atender nos moldes do perí-
metro urbano; afirma que a formulação de políticas educativas e públicas é ajuizada para atender a
especificidade da cidade como arquétipo de sujeitos de direitos, considerando apenas uma verten-
te da diversidade de um espaço, de um lugar. E este espaço é considerado pelo ideário como ideal,
pois é civilizado, social e sociável, de expressão política cultural e educativa; dentro esta visão, o
campo se apresenta como sendo um lugar de atraso, de cultura tradicional. O paradigma da cidade
sempre esteve “à luz” na elaboração das políticas públicas educacionais.
No documento síntese, resultado do Seminário “O MST e a Escola”, do Coletivo Nacional do MST
realizado em 2008, se coloca, como desafio para a educação, transformar a intencionalidade forma-
tiva que traga como resultado a dinâmica da ação social e a organicidade coletiva em um projeto
de educação das famílias e das comunidades, por constituírem a base social, procurando superar a
visão de mundo e a maneira de vida baseada na lógica do princípio capitalista e sua reprodução, até
mesmo nas áreas de reforma agrária.
Segundo Caldart (2010), a Pedagogia do Movimento nos traz uma reflexão específica a propósito
das Matrizes pedagógicas apresentadas pelo Movimento na formação dos Sem Terra; ao apontar
essa formação como um processo educativo, promulga com a concepção de educação, de forma-
ção humana, afirmando uma concepção de base histórico-materialista-dialética, cuja centralidade
está nas condições de existência social em que o ser humano se forma.
Neste sentido, a política de formação voltada para jovens e adultos corrobora com a concepção
de formação humana, utilizando-se dos princípios da Educação popular. Afirmando que o aprender
é ao longo da vida, conforme explicitado na Declaração de Hamburgo (1997), reafirmada na Carta
de Belém (2009), da qual o Brasil é signatário.
Esta Modalidade de ensino possui princípios e formas de se trabalhar e, por meio do movimento
social, hoje existem, no país, os fóruns EJA Brasil, presentes em todas as unidades federativas do país,
cuja organização se inicia na ocasião da realização da V CONFINTEA, que provocou a organização
de coletivos da sociedade civil, para a discussão e elaboração de documentos de estudos a serem
apresentados nesta conferência. Os Fóruns se formam constituídos nos estados e distrito federal, e,
como maneira de não perder a unidade, optou-se pela realização dos ENEJA, anualmente, até o ano
de 2008, quando este movimento completou 10 anos. E, após este ano, os encontros são realizados
bianualmente, intercalados com os Encontros das Regiões, existentes no país, denominados EREJA,
cuja finalidade é discutir a realidade da EJA nas regiões. E, para discutir especificamente a formação
inicial e continuada para a modalidade da Educação de Jovens e Adultos, surge dentro dos Fóruns
o Seminário Nacional de Educação de Jovens e Adultos, onde, a princípio, reuniam-se somente as
instituições de Ensino Superior, especificamente as universidades; atualmente participam, além das
universidades, os representantes da Secretaria de Educação, educadores, educandos, movimentos
sociais populares e representação dos fóruns EJA, tendo, como resultado, a produção de relatórios
que apresentam propostas para a formação para a Educação de Jovem e Adulto, esta na sua quinta
edição.

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
formAção de edUcAdores e edUcAdorAs do cAmpo no contexto de
mAto grosso
A Formação dos docentes, para atuarem nas escolas do campo no Estado de Mato Grosso, no sis-
tema estadual de ensino, é atendida principalmente pelas Instituições de Ensino Superior, públicas e
particulares, e, para a especificidade do campo, a Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT),
no ano de 2010, assumiu o curso de licenciatura para Educação do Campo, ofertado pela plataforma
Paulo Freire. Quanto às demandas da formação continuada, estas são atendidas pelas Universidade
Públicas e, mais especificamente, no estado de Mato Grosso, pelo Centro de Formação e Atualização
de Professores (CEFAPRO), que é o órgão responsável pela política de formação, sistematização e
execução de projetos, vinculado à Secretaria de Estado de Mato Grosso, que, desde 2009, possui um
formador destinado a atender a Educação do Campo e a Educação de Jovens e Adultos.
A partir de 2012 a Universidade Federal de Mato Grosso vem ofertando especializações e cursos
de aperfeiçoamento voltados para a educação de jovens e adultos, onde podemos citar alguns,
como EJA e a diversidade Étnico-Racial, EJA e a proposta da Economia Solidária, EJA e Juventude.
Da mesma forma, ofertando curso para a especificidade do Campo, como o Curso de Práticas Peda-
gógicas para a Educação do Campo, assim como cursos de aperfeiçoamento voltados para a espe-
cificidade do campo, como: Curso de aperfeiçoamento para as salas multi, contemplando o público
que atende o Ensino Fundamental- apesar desta realidade estar presente no Ensino Médio e na
modalidade de jovens e adultos- e um curso de aperfeiçoamento voltado para docentes que atuam
na modalidade de Educação de Jovens e Adultos, que atuam no campo.

o cUrso de AperfeiçoAmento reAfirmAndo As práticAs pedAgógi-


cAs do cAmpo nA modAlidAde dA ejA
O Curso de Aperfeiçoamento para docentes que atuam na modalidade de Educação de Jovens
e Adultos no campo, ofertado pela Universidade Federal de Mato Grosso, em parceria com a Secre-
taria de Estado de Mato Grosso, foi destinado aos docentes que atuassem em salas anexas. Após
levantamento, definiu-se pelos municípios que apresentassem um número considerável de salas
anexas na modalidade de EJA, dentro destas condições. Decidiu-se por trabalhar com os municípios
em torno da Capital de Mato Grosso e da cidade de Cuiabá, pois estes apresentavam um alto índice
de analfabetismo, por possuir muitas localidades isoladas.
Desta maneira, foram definidos quatros polos, agregando os municípios circunvizinhos, sendo
denominados: Polo de Chapada dos Guimarães; Polo de Jangada, agregando Acorizal; Polo de Po-
coné, agregando Nossa Senhora do Livramento; Polo de Santo Antônio do Leverger, agregando
Barão de Melgaço - com um público de 120 (cento e vinte) cursistas. Escolheu-se trabalhar com a
metodologia da Pedagogia da Alternância, para oportunizar aos cursistas a percepção desta, e a
possibilidade da implementação desta proposta nas unidades escolares.

pedAgogiA dA AlternânciA - espAço de AprendizAgem possíVel


A Pedagogia da Alternância surgiu na França, nos anos 1930, como forma de atender a necessida-
de da população camponesa. Buscou-se uma configuração de referência, para trazer os jovens que,
naquela época, se encontravam desinteressados das escolas, sobretudo, a valorização do meio rural
onde viviam. Desta forma, buscavam-se desenvolver alternativas que possibilitassem a permanên-
cia desses jovens, correlacionando os saberes do cotidiano aos saberes científicos. No Brasil, a pri-
meira experiência acontece no Estado do Espírito Santo e, atualmente, já existe em diversos Estados
do país, com características próprias.
Na legislação brasileira a Alternância está assegurada pela LDBN nº 9.394/96 – detalhada pelo Pa-
recer nº 36/2006, emitido pelo Conselho Nacional de Educação - Câmara de Educação Básica (CNE/

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
CEB).
A organização dos ciclos da Alternância, como os tempos (presenciais), tempo (comunidade) foi o
ponto alto do curso, no tempo (presencial); denominado assim, este curso é o momento. Em outros
documentos que tratam da Pedagogia da Alternância, é denominado de tempo com tempo escola,
é o momento em que há a presença direta dos cursistas, para o desenvolvimento do conjunto das
atividades (aulas expositivas, reflexões, leituras, oficinas atividades culturais); sendo organizado em
tempos menores, conforme pré-definição no projeto, é neste momento em que se trabalha com os
subsídios teóricos para serem aplicados no tempo Comunidade, é o tempo de retorno ou de presen-
ça dos cursistas na comunidade, praticando as atividades da organização social que foram indicadas
no curso, desenvolvendo as atividades propostas no tempo presencial.
No tempo presencial ficou definida a aplicação de alguns elementos da Alternância, como o Pla-
no de Estudo, Caderno da realidade, visitas às famílias e aulas de campo, fundamentais para a com-
preensão da vivência com a interlocução das teorias aplicadas.
As organizações dos comitês, neste movimento, são pela constituição dos comitês que, para este
curso, foram definidos como os seguintes: Bem Viver, Cultura, Memória e Comunicação Social, pois
esta organização é uma forma de trabalhar no coletivo; a intencionalidade era que os professores
deste curso levassem esta prática para a realidade da escola.
Em todos os encontros presenciais foram realizadas as místicas que traziam as manifestações de
reflexão para o momento, tais como: das sementes crioulas, o repensar do papel no mundo, o povo
do campo, entre outras.
Segundo Bogo (2012), a mística pode ser compreendida nas religiões como mistério relacionado
com a própria vivência espiritual; entretanto, em estudos das ciências da religião e na filosofia da
linguagem as manifestações ultrapassam o espectro do segredo e adentram na vida social e na luta
política.
As reflexões dos cursitas nos revelam a compreensão dos mesmos sobre a Pedagogia da Alter-
nância.

Nos tempos presenciais podemos participar juntos da construção de novos co-


nhecimentos, teorias auxiliam na relação com nossos colegas e educandos nos pos-
sibilitam refletir sobre a nossa ação pedagógica, o que precisamos melhorar no de-
senvolvimento de nossa metodologia. No tempo comunidade podemos participar
mais de perto das conquistas, valores, lutas, conflitos morais, costumes da cultura
vivida pela comunidade. (Cursista A).

O reconhecimento, por parte dos cursistas, demonstra que foi acertada a escolha desta proposta,
uma vez que a sua vivência demonstra, na prática, a possibilidade de sua implementação na moda-
lidade da Educação.
Nesta perspectiva, a ementa do curso foi favorável para o direcionamento a esta ação, como dis-
cutiremos a seguir.

o diálogo possíVel entre A teoriA e A práticA


A dinâmica do curso foi toda construída para o fortalecimento da prática da educação de campo,
sendo orientada pelos princípios da Educação do Campo presente nas bases legais nacionais e es-
taduais, e nos documentos oficiais da Secretaria de Estado. Dentre estes destacamos as Orientações
Curriculares publicadas em 2012, principalmente do Caderno das diversidades, que trata das duas
modalidades trabalhadas neste curso da Educação de Jovens e Adultos e o da Educação do Campo;

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
fazendo a interlocução de ambas as temáticas e as Orientações Curriculares para as diversidades
educacionais.
A construção de uma ementa que proporcionasse a reflexão das escolas envolvidas foi funda-
mentalmente importante para o desenho de uma ementa curricular que despertasse o interesse
pela metodologia proposta e sua percepção para a sua realidade.
Assim, a proposta pedagógica trouxe, em sua ementa, as bases legais para a Educação de Jovens
e Adultos do Campo, no sentido de investigar, analisar e problematizar os aspectos relevantes desta
e sua articulação com os saberes populares e científicos propostos nas diretrizes da Educação do
Campo.
Realizou-se o estudo do Projeto Político Pedagógico (PPP) de cada unidade escolar em que os
docentes estivessem vinculados, para averiguar a correlação entre as orientações curriculares do
estado de Mato Grosso e sua aplicabilidade no Tempo Comunidade.
A importância desta temática foi a percepção demonstrada pelos professores com a organização
política pedagógica de sua escola, e o acréscimo do conhecimento do PPP da escola através do es-
tudo no tempo comunidade; desta forma, o cursista nos revelou que: “quanto ao currículo da EJA
voltado para as escolas do campo, há uma necessidade de reformular o PPP, inserindo as práticas
pedagógicas de acordo com a especificidade do campo”.
A metodologia Roda de Vida e/ou vivência foi o ponto forte do curso, com objetivo de discutir,
explorar juntos uma forma de fortalecer e transferir as práticas docentes, como práxis criadora, re-
veladas pelos seus relatos:
cursita A: “Experiências de troca de conhecimento de cada comunidade, onde cada uma é dife-
rente cultura”.
cursita b: “Troca de experiências adquiridas com os profissionais de Jangada, relatos da realida-
de culturas vivenciadas em cada unidade escolar”.
cursita c: “Notamos que a cada encontro tiramos proveito de uma série de conhecimentos dife-
renciados, pois cada um tem uma forma de pensar e agir; assim enriquecemos cada vez mais o nosso
aprendizado”.
Segundo Novoa (1999), a “refundação da escola” possui muitas trajetórias, mas, é inegável que
todas passam pelos professores; desta forma, no passado esta profissão foi fundamental na cons-
trução da ideia da escola e, atualmente, é essencial que o espaço escolar recrie o papel de formação
individual, cidadã e de democracia; mas, para tanto, se torna necessário que o professorado reflita
sobre a sua profissão, encontrando modelos de formação de trabalho que admitam se capacitar, não
só se organizar individualmente na profissão, mas em uma dimensão coletiva.
A temática da Avaliação, na EJA para as escolas do campo, teve por finalidade problematizar e
diagnosticar processualmente o aprendizado teórico-prático dos estudantes e a responsabilidade
do professor na condução deste aprendizado; neste momento refletiu-se sobre a flexibilidade pre-
sente nesta modalidade.
A finalização do curso ocorreu na culminância com a apresentação das experiências em forma
de banner, com temáticas voltadas para as práticas, totalizando 39 (trinta e nove), como forma de
constatar a compreensão dos educadores relativa aos conteúdos trabalhados no curso de extensão.
Iniciou-se com uma mística, como oferta de símbolos de representação do campo, e cartazes
com as temáticas trabalhadas no decorrer do curso - esta foi organizada pela Escola Estadual “Dom
Francisco Correia”, pertencente ao polo de Poconé.
Foi proferida uma palestra com a temática “Formação Continuada para docentes que atuam na
Educação de Jovens e Adultos nas escolas do campo”, por um especialista da área, o qual realizou
a correlação existente entre a teoria e a prática existente no campo, como: o resgaste por parte da

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
escola na recuperação da semente nativa da região, conhecida como crioula; a importância de se
trabalhar estes elementos para ir despertando nos estudantes do campo, assim como as ervas me-
dicinais, a organização coletiva entre outras temáticas.
Ressaltou a importância da Pedagogia da Alternância para a modalidade da Educação de Jovens
e Adultos no campo.
Destacou a importância da realização deste curso com a metodologia da Pedagogia da Alternân-
cia e recomendou a continuidade do curso, no desdobramento em especialização, por atender à
demanda do campo.

considerAções finAis
O curso de aperfeiçoamento ofertado aos docentes que trabalham nas escolas do campo, onde
muitos estavam lotados nas salas anexas, localizadas em lugares de difícil acesso, proporcionou a cir-
cunspecção sobre a modalidades de Educação de Jovens e Adultos, na especificidade da Educação
do Campo, pelo viés de suas práticas norteadas por suportes teóricos voltados para estas práticas.
Outro fator que se deve considerar foi a aproximação da universidade com a educação básica do
campo e o reconhecimento da existência da especificidade- inclusive no formato de curso- quando
se optou pela Pedagogia da Alternância; Outra questão foi o fato de os professores formadores e
pesquisadores irem para “in loco” nas escolas sedes, e, em alguns casos a itinerantes do curso. Isso
oportunizou o conhecimento das salas anexas e proporcionou a participação dos estudantes, pois
houve momentos em que os estudantes da EJA Campo compareceram ao encontro e fizeram apre-
sentações culturais de músicas, paródias, poesias.
Na EE Damião Mamedes, os estudantes apresentaram Feira de Economia Solidária, contendo: fari-
nha de mandioca, milho verde, beiju, bolo de arroz assado na palha de bananeira, broinhas de fubá,
queijo, ovo de galinha caipira e frango caipira para consumo, sabão caseiro em barra, entre outros.
Em todo esse trabalho, percebia-se que havia envolvimento do(a) docente e da disciplina em que
atua.
Notoriamente, este tipo de formação de educadores e educadoras do campo proporciona o en-
raizamento nas lutas e identidades de seu povo e a formação, nas especificidades, da possibilidade
de se conhecer a dinâmica social e cultural de seus sujeitos.
O fortalecimento da formação continuada contribui para a concretização e efetivação das polí-
ticas públicas na especificidade do campo. E o reconhecimento, por parte dos docentes, que esta é
proporcional à aproximação entre seus pares e a troca de experiência pelas suas práticas.
Este deveria ser referência para as ofertas de cursos de extensão, aperfeiçoamento e especializa-
ção para os docentes que atuam na Educação do Campo, pois atende melhor a especificidade deste
segmento.

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570
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
formAção de edUcAdores: reflexos de momentos de
discUssão coletiVA nUmA perspectiVA
interdisciplinAr
iVAnA bognAr | KeilA AlVes de soUzA

O presente trabalho objetiva dialogar com as propostas de formação de educadores desen-


volvido no Centro de Educação de Jovens e Adultos - CEJA “Cleonice Miranda da Silva” de Colíder
em Mato Grosso. O PSE – Projeto Sala do Educador, como é chamado esse momento de formação
acontece uma vez por semana,num período de três horas, com mínimo de 80 h anuais, o qual tem
acompanhamento pelo CEFAPRO – Centro de Formação dos Profissionais da Educação/Seduc/MT.
As temáticas abordadas são pesquisadas e ajustadas teoricamente aos anseios e necessidades dos
educandos de acordo com o relato dos educadores que estão em sala com esses sujeitos. Para isso,
considera o diagnóstico elaborado pelo coletivo da escola, articulado com o Projeto Político Pe-
dagógico. O estado de Mato Grosso possui 25 unidades dos CEJAs distribuídos pelos municípios
com um trabalho pedagógico que acontece por áreas do conhecimento, tendo como base as OCs –
Orientações Curriculares para a Educação Básicado Estado. Este documento norteador está dividido
em cinco livros contemplando as áreas do conhecimento, orientações aos professores,e também as
diversidades educacionais entre elas a Educação de Jovens e Adultos. É neste contexto que o PSE
está inseridocomo política de formação dos educadores que atendem a modalidade nestes espa-
ços. Fato esse que propiciou a alguns educadores do CEJA “Cleonice Miranda da Silva” a aprovação
em concursos e também em seletivas de mestrado e doutorado, porque aponta para um processo
de formação que preconiza partilhar, discutir, refletir sobre as ações educativas com o objetivo de
fortalecer a escola como espaço formativo, com comprometimento coletivo na busca da superação
das fragilidades e consequente construção das aprendizagens aos sujeitos da EJA.

palavras-chave: CEJA, trabalho coletivo, interdisciplinaridade

projeto de formAção continUAdA dos edUcAdores de mAto gros-


so: UmA sAídA possíVel
Ao rever o histórico do CEJA-Centro de Educação de Jovens e Adultos -“Cleonice Miranda da Sil-
va”, percebe-se que esta escola busca desde sua criação, atender ao educando em suas várias formas
de oferta, como tentativa de oferecer a educação escolar a todos os que não puderam ingressar
numa escola ou não puderam concluir a escolarização de alguma forma. Esse é o papel da escola:
pensar formas de atendimento ao educando da EJA, sujeito de direito, que precisa ser respeitado,
em função das condições de estudos e da sua vida. Dessa maneira, a escola ao oferecer essa moda-
lidade, cumpre um dever de cidadania, apesar de que há muito para fazer, ao favorecer a educação
continuada ao longo de toda a vida.
O currículo escolar deve ser adequado aos sujeitos da EJA, baseado nas necessidades destes que
buscam superar os desafios encontrados, como idas e voltas no processo escolar. No entanto, a
escola precisa ter profissionais comprometidos e qualificados. Para tal, não se pode pautar apenas
na formação inicial do professor, é preciso que a formação continuada em serviço ocorra, a fim de
contribuir com a prática pedagógica, para construção de novas pedagogias e métodos de trabalho
apropriados aos educandos.Este é um desafio colocado ao docente que precisa lidar com a diver-
sidade existente nesta modalidade. Nessa perspectiva, nasce o Projeto de Formação Continuada, o
PSE - Projeto Sala de Educador, como política de formação proposto pela Seduc-Secretaria de Estado

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
de Educação com o acompanhamento doCefapro-Centro de Formação e Atualização dos Profissio-
nais da Educação de Mato Grosso.
Assim, este Projeto tem o objetivo de proporcionaraos educadores a formação continuada atra-
vés de instrumentos teórico-metodológicos, tornando-os intelectuais reflexivos que considerem
suas experiências profissionais, bem como as experiências de vida dos educandos. Sabendo que o
conhecimento é um instrumento mutável e inacabado e que a escola é um processo de constante
aperfeiçoamento, torna-se imprescindível que o educador estude e se atualize, buscando aprimorar
seus conhecimentos e práticas educativas. Desse modo, o educador não é mais aquele que domina
o conhecimento absoluto, mas o constrói em sua própria prática, coletivamente, envolvendo edu-
candose comunidade escolar.
Ao promover o Projeto de Formação Continuada, visando à continuidade dosestudos e reflexões,
é necessário pensar na participação de todos os profissionais da educação, numa conquista pro-
gressiva de autonomia e descoberta de potencialidades. As temáticas desenvolvidas neste projeto
surgem nos debates coletivos, bem como na avaliação coletivarealizadano final de cada semestre,
revelando as necessidades do contexto de trabalho. Refletir em equipe proporciona entrosamento
profissional, criando condições para que os problemas sejam solucionados na certeza de melhor
qualidade em cada encaminhamento. O trabalho em equipe também possibilita que todos possam
refletir sobre os objetivos a serem alcançados, definindo critérios, metas e princípios a serem desen-
volvidos.
Conforme Parecer Orientativo nº 01/2014, referente ao desenvolvimento do Projeto Sala de Edu-
cador, de acordo com a Superintendência de Formação dos Profissionais da Educação Básica do
Estado de Mato Grosso, através da Coordenadoria de Formação e Avaliação da Seduc:

O Projeto Sala de Educador deve promover discussões, para que por meio delas,
os profissionais se tornem sujeitos agentes, que busquem dentro do espaço escolar
entendimento sobre questões relativas à sua prática. Com isto, novas possibilidades
de interação surgem a partir de este fazer e se descobre o verdadeiro sentido da par-
ceria, da coletividade, do trabalho colaborativo em que se fortalece a presença do
outro em busca de um desenvolvimento mútuo.

Ressalta-se que este projeto promove estudos e debates para refletir sobre a função da escola pú-
blica e sua proposta curricular. A coordenação deste projeto incentiva os profissionais a repensarem
suas práticas, no contexto escolar, identificando os desafios a serem superados no trabalho, tendo
como foco principal o PPP - Projeto Político Pedagógico da escola.Para a execução do Projeto conta-
-se com a colaboração e intervenção dos professores formadores do Cefapro, órgão responsável por
acompanhar o projeto, a fim de que os objetivos propostos sejam alcançados com êxito e assim os
profissionais da educação possam ressignificar suas práticas. Sabendo que a escola não é a única
responsável pelas transformações necessárias à educação de qualidade, uma vez que isso depende
de um conjunto de relações, mas a formação continuada é um elemento de grande contribuição,
visto como uma reflexão imprescindível e permanente na contemporaneidade.
Para Marcondes Filho,

É então no diálogo e na troca com seus pares, parceiros com os quaispartilha o


interesse de pesquisa sobre os mesmos objetos - com todas as angústias,inquietações
e possibilidades de encaminhamentos teóricos satisfatórios e atuais,que o
professor como pesquisador reflexivo vai encontrar espaço para construir
umsaber ágil, consensual, operacionalmente aceito e possível de ser atualizado a

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
qualquermomento. (apudRevista EducereetEducare,1995, p.93)

A LDBEN - Lei nº 9.394/96através dos artigos 61 e 67 destaca importância do aprimoramento


profissional.Assim, em Mato Grosso a formação continuada dos educadores culmina no PSE, a fim
de contribuir na prática pedagógica do professor, ao propor ações de melhoria nesse processo de
aperfeiçoamento na qualidade do ensino por meio dasdiretrizes educacionais do Estado, através da
Lei complementar nº 50/1998, que dispõe sobre a carreira dos profissionais da Educação Básica e as-
segura no artigo nº 38 desta lei, o percentual de 33,33% da jornada semanal para atividades relacio-
nadas ao processo didático-pedagógico, esclarecendo em seu parágrafo 1ºque a Hora-Atividade é
aquela destinada à preparação e avaliação do trabalho didático, à colaboração com a administração
da escola, às reuniões pedagógicas, à articulação com a comunidade e o aperfeiçoamento profissio-
nal de acordo com a proposta pedagógica da escola.
Ainda a Lei Complementar nº 206/04de Mato Grossoque dispõe sobre alterações na Lei com-
plementar nº 50/98, destaca as atividades específicas do professor que constam no parágrafo 4°,
do artigo 5°, no inciso X:“buscar formação continuada no sentido de enfocar a perspectiva da ação
reflexiva e investigativa”.
Contudo,o projeto visa promover discussões entre os participantes, a fim de que busque no es-
paço escolar, a formação em serviço, tornando sujeitos agentes reflexivos de sua própria prática
pedagógica, possibilitando novas possibilidades de interação a partir do fazer, através do trabalho
coletivo. Nesse sentido, imbuídos pelo desejo transformador e num modo colaborativo de agir, os
educadores podem tornar a escola um espaço para o desenvolvimento de metodologias para ação
questionadora, fortalecendo o seu fazer educativo.
Paulo Freire assim destaca:

Por isso é que, na formação permanente dos professores, o momento fundamen-


tal é o da reflexão crítica sobre a prática. É pensando criticamente a prática de hoje
ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática. O próprio discurso teórico,
necessário à reflexão crítica, tem de ser tal modo concreto que quase se confunde
com a prática. (1996, p.22)

orgAnizAção, fUncionAmento e AVAliAção do projeto sAlA de edU-


cAdor no cejA “cleonice mirAndA dA silVA”
Oprojeto de formação continuada denominado PSE, do CEJA “Cleonice Miranda da Silva”, mu-
nicípio de Colider, em Mato Grosso, tem a participação de quase todos os profissionais da escola.
Esteprojetocompreende uma carga horária de 81 horas,com três horas de estudos semanais, coor-
denado pela coordenação pedagógica da escola.Todas as temáticas debatidas nos encontros estão
articuladas ao PPP da Escola, conforme a proposta pedagógica e projeto de formação continuada
deste Centro de EJA.
Este trabalho irá detalhar apenas as temáticas abordadas em 2013,elencando as contribuições
propiciadas à prática docente, bem como nas aprendizagens dos alunos.Neste ano,de acordo com
o relatório produzido pela coordenação do PSE,iniciou com uma temática voltada para a reflexão
da gestão em sala de aula, com o objetivo de refletir sobre como conduzir a relação entre os alunos,
interagir com eles e propor atividades que interfiram na aprendizagem, analisando propostas de
como atuar em diversas situações. Os temas são voltados para a ação-reflexão da prática pedagógi-
ca do professor, aprofundando os conhecimentos na busca de soluções para necessidades específi-
cas que os profissionais enfrentam no dia-a-dia. Assim, o PSE é desenvolvido na expectativa de que
as temáticas sejam significativas para os profissionais da educação na busca de uma escola cidadã,

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
democrática e participativa, que atenda às necessidades dos educandos jovens, adultos e idosos.

O perfil do professor para o século XXI solicita a construção de uma identidade


profissional que não seja imutável, mas capaz de leituras aprofundadas sobre o fe-
nômeno educacional[...] Ora, muito mais do que se pretender ler os desafios desta
sociedade de uma maneira linear cabe ao professor refletir sobre sua realidade, so-
bre as múltiplas determinações que condicionam a reprodução ou transformação
da sociedade, mobilizando-a por meio de interlocutores o objeto histórico de sua
adesão ou contestação. Ser professor então, passa a ter um caráter dinâmico, re-
flexivo, transdisciplinar e solicitando que o professor saiba articular os saberes de
forma significativa desdobrando uma visão de totalidade e não fragmentação, de
completude e não de dimensão lacunar, de participação e não de isolacionismos de
ações. (Revista EducereetEducare, 2007, p. 94)

Umas das temáticas desenvolvidas no PSEem 2013, dando continuidade também em 2014, foi o
“Planejamento de Ensino por Complexo Temático”.Uma metodologia de trabalhoque tem como ob-
jetivo realizar o planejamento de aula após análise de uma pesquisa sócio antropológica,conforme
propõe as OCs – Orientações Curriculares para a Educação Básica de Mato Grosso. Este procedi-
mento didático estabelece um planejamento interdisciplinar, a partir do trabalho coletivo por Área
de Conhecimento, relacionando-o com os eixos fundantes propostos nas OCspara a EJA: trabalho
como princípio educativo, direito de aprender por toda a vida, ampliando práticas de cidadania e
educação dialógica,tendo como base o princípio da transdisciplinaridade e os processos pedagógi-
cosdesejáveis para a modalidade.

Os Centros de EJA tem como cunho pedagógico a coletividade. Destacam-se, en-


tão, os momentos dessa construção: Elaboração de caminhos comuns do Projeto
Político-Pedagógico, as Matrizes Curriculares, as atividades a serem desenvolvidas
(plantões, aulas culturais e oficinas), o calendário escolar, a distribuição das ativida-
des docentes, enfim, toda a proposta dos CEJAs deve ser construída gradativamen-
te na coletividade...(Orientações Curriculares das Diversidades Educacionais, 2010,
p.214)

Os CEJAs em Mato Grosso são organizados metodologicamente nas três Áreas de Conhecimento,
a fim de possibilitar a articulação e a interação dos saberes. Com isso, a formação continuada dos
educadores,através do PSE,proporciona uma reflexão-ação baseada na teoria através da ferramenta
de trabalho que é o Planejamento de Ensino por Complexo Temático, conforme Rocha (1996:2), as-
sim se expressa:

[...] o complexo temático provoca a percepção e a compreensão da realidade, ex-


plicita a visão de mundo em que se encontram todos os envolvidos em torno de um
objeto de estudo e evidencia as relações existentes entre o saber e o pensar, o agir e o
refletir, a teoria e a prática. (apud OCs Educação Básica, 2010, p. 55)

As práticas pedagógicas do CEJA “Cleonice Miranda da Silva” têm como base constantes refle-
xões no sentido de estar aprimorando-se o trabalho que está sendo desenvolvido através das Áreas
de Conhecimento.A interdisciplinaridade torna a escola inovadora, rompendo com a ideia de conte-
údos em “gavetas”, facilitando a aprendizagem dos alunos através da metodologia de trabalho por

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
Complexo Temático. Dessa maneira, a organização do ensino e a construção do conhecimento pas-
sa pela investigação socioantropológica realizada na comunidade escolar pelos professores, sendo,
portanto, uma ação metodológica que é transformada na reflexão-ação, com o objetivo de buscar
o conteúdo curricular significativo, a partir da identificação dos conceitos extraídos das falas dos
educandos.
Ao definir o complexo temático, cada área do conhecimento inter-relaciona os conteúdos que
possibilitam a compreensão dos conceitos (campo conceitual) que são trabalhados a partir do fenô-
meno, foco do complexo, que oportuniza as aprendizagens significativas na construção do conhe-
cimento interdisciplinar. O desafio do Complexo Temático é estudar conteúdos com base na vida
social. O campo conceitual definido pela pesquisa socioantropológica corresponde aos conceitos
que são antes de tudo, respostas oriundas de situações-problemas concretas, que os alunos trazem
para o contexto da aprendizagem escolar e que ali são problematizados.
Com isso, os educadores do CEJA “Cleonice Miranda da Silva” realizaram um planejamento a par-
tir do Campo Conceitual do Complexo Temático, sendo o “Trabalho” o fenômeno encontrado, pois
todas as falas dos educandos tinham como foco esse conceito. Já no campo conceitual destacou
os seguintes conceitos a serem abordados: Saúde, Educação, Cultura, Família, Relações Humanas
e Cidadania com o objetivo de inferir relações entre conhecimento científico e condições de vida
a partir das situações problematizadoras. Assim, através do complexo temático formado, se define
as capacidades de cada Área do Conhecimento a serem alcançadas pelos educandos, bem como
os procedimentos metodológicos necessários, a fim de atingir o objetivo planejado, considerando
a realidade social captada na investigação realizada e a valorização do conhecimento empírico do
educando.
No 2º semestre de 2013, os participantes reuniram-se para estudar sobre as “Diretrizes Curricula-
res Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino da história e cultura afro-
-brasileira e africana” através do Parecer nº 03/2004, bem como a importância da Lei nº 10.639/2003.
Este trabalho suscitou na tarefa dos educadores de incluir as questões raciais no contexto escolar,
bem como numa oficina pedagógica interdisciplinar das Áreas de Conhecimento, com o objetivo de
promover a reflexão dos educandos numa abordagem baseada na desconstrução do racismo.
Outro tema abordado no encontro foi uma reflexão sobre a Educação Inclusiva na Educação de
Jovens e Adultos, o qual mereceu atenção no processo de formação, pois noCEJAo número de alu-
nos com necessidades especiais cresce consideravelmente,sendo necessário incluir esse aluno na
escola e atendê-lo de acordo com a sua necessidade. A reflexão foi muito provocativa, no sentido
de elaborar um Projeto de implantação de uma Sala de Recurso Multifuncional, para atender essa
especificidade, a qual tem contribuído muito com esses educandos que buscam neste espaço um
reforço ao processo ensino-aprendizagem.
A avaliação do PSE é realizada semestralmente, e também a cada final de encontro, quando os
participantes destacam os pontos positivos e negativos, a fim de melhorar constantemente a for-
mação. Assim, pode-se observar no relatório da coordenação do PSE que a formação continuada
na escola contempla as necessidades do coletivo de profissionais e que o contribui para o processo
ensino-aprendizagem, pois todos fazem uma reflexão constante de sua prática. E a expectativa é
continuar valorizando isso, buscando atender os interesses dos educadores.O Projeto é julgado pe-
los participantesde suma importância para a formação continuada dos profissionais, tendo em vista
que na EJA todos os profissionais que atuam nessa modalidade precisam de instrução para adquirir
o perfil de um profissional adequado a essa especificidade.
Dessa forma,a continuidade desse projeto é considerada necessária, a fim de contribuir na me-
lhoria da qualidade do ensino-aprendizagem dos educandos, bem como na prática profissional de
cada um que participa, garantindo a formação continuada na busca de uma escola que tem como
papel ofertar a EJA a todos aqueles que acreditam que ela é capaz de atender suas expectativas e

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
seu projeto de vida.

medidAs necessáriAs à formAção dos edUcAdores


Sabe-se que, de acordo com Nóvoa(2009):

o excesso dos discursos esconde, frequentemente, uma grande pobreza de práti-


cas. Temos um discurso coerente, em muitos aspectos consensual, mas raramente
temos conseguido fazer aquilo que dizemos que é preciso fazer.(p.17)

Ainda destaca a necessidade de construção de políticas que reforcem os saberes dos professores
e os seus campos de atuação, que valorizem as culturas docentes, e que não os transformem numa
profissão dominada pelos universitários, pelos peritos ou pela “indústria do ensino”. Nóvoa afirma
que uma primeira medida para fazer aquilo que dizemos que é preciso fazer é passar a formação de
professores para dentro da profissão.

Não haverá nenhuma mudança significativa se a “comunidade dos formadores


de professores” e a “comunidade dos professores” não se tornarem mais permeáveis
e imbricadas. O exemplo dos médicos e dos hospitais escolares e o modo como a sua
preparação está concebida nas fases de formação inicial, de indução e de formação
em serviço talvez nos possa servir de inspiração. (2009, p. 17)

Dessa forma, constata-se que há necessidadeda instituição escolar refletir coletivamente sobre o
seu trabalho esobre a problemática da ação docente, mobilizando conhecimentos, vontades e com-
petências.Nóvoa(2009) defende ainda que as propostas teóricas só fazem sentido se forem constru-
ídas dentro da profissão, se forem apropriadas a partir de uma reflexão dos professores sobre o seu
próprio trabalho. Assim, acredita-se, ainda, no envolvimento de todos na melhoria e na mudança da
práxisnecessária ao sucesso escolar dos educandos.
A segunda medida que Nóvoa destaca é que é preciso promover novos modos de organização da
profissão quando destaca que:

grande parte dos discursos torna-se irrealizável se a profissão continuar marcada


por forte tradições individualistas ou por rígidas regulações externas, designada-
mente burocráticas, que se têm acentuado nos últimos anos. Quanto mais se fala da
autonomia dos professores mais a sua ação surge controlada, por instâncias diver-
sas, conduzindo a uma diminuição das suas margens de liberdade e de independên-
cia. (2009,p.20)

No entanto, sabe-se que nada será diferente se não houver alterações nas condições de trabalho
existentes nas escolas, bem como nas políticas públicas em relação aos professores e à educação de
jovens e adultos. A escola precisa estar organizada para facilitar esse momento de formação conti-
nuada em serviço. Por outro lado, não é preciso apenas reivindicar a formação, é preciso também
que os profissionais participem com empenho e dedicação neste espaço de discussão com compro-
misso profissional, social e político.
A terceira medida que Nóvoa(2009) defende é que é preciso reforçar a dimensão pessoal e a
presença pública dos professores. Trata-se de construir um conhecimento pessoal no interior do co-
nhecimento profissional e de captar o sentido de uma profissão que não cabe apenas numa matriz
técnica ou científica. Ou seja, a profissão docente necessita de percursos significativos de aprendi-

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
zagem ao longo da vida, e não somente o educando. No entanto, hoje, a aprendizagem justifica-se
como direito da pessoa e como necessidade da profissão, não como obrigação ou constrangimento.
Existem inúmeros cursos ou programas de formação continuada que não são considerados úteis
ao professor. É preciso que haja recusa ao consumismo de cursos e seminários que caracteriza o
“mercado de formação” sempre alimentado pela afirmação de que o professor é desatualizado na
sua formação. Conforme Nóvoa(2009) pondera que a única saída possível é o investimento na cons-
trução de redes de trabalho coletivo que sejam o suporte de práticas de formação baseadas na
partilha e no diálogo profissional. Dessa forma, é preciso, com urgência, que os professores tenham
tempo e as condições necessárias para ir mais longe, com trabalho de formação próximo de sua
realidade escolar e dos problemas sentidos e vivenciados por eles. Ressalta-se que temos as dificul-
dades, mas é preciso investir nessa formação capaz de contribuir com o desempenho profissional
docente e com a formação do educando.

considerAções finAis
Finalmente, é necessário considerar mais um aspecto na formação de educadores capazes de
promover uma educação de jovense adultos mais eficaz e acessível ao público que a ela tem direito.
Trata-se da necessidade de desenvolver competências para atuar comnovas formas de organização
do espaço-tempo escolar, buscando alternativas
ao ensino tradicional baseado exclusivamente na exposição deconteúdos por parte do professor
e avaliação somativa do aluno. Os professoresda EJA devem estar aptos a repensar a organização
curricular, no sentido de abrir possibilidades para queos educandos realizem percursos formativos
mais diversificados, maisapropriados às suas condições de vida. Eles merecemexperimentar novos
meios de aprendizagem e progressão nos estudos,que não aqueles que provavelmente os impedi-
ram de prosseguir com suaescolarização.
Criar novas formas de promover aprendizagens fora dos limites daorganização escolar tradicio-
nal é uma tarefa, portanto, que impõe antesde mais nada, um enorme desafio para os educadores.
Na verdade,romper este modelo implica um alto grau decompetência pedagógica, considerando a
diversidade que inevitavelmente caracteriza o público da EJA.Cabe, portanto, pensar emformas de
prover essa formação aos educadores que por ela seinteressem, qualquer que seja a instância for-
mativa, na mesma medidaem que isso seria apropriado para outras modalidades de ensino em prol
de uma educação de qualidade.

referênciAs
BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Básica. Carlos R.J.Cury (relator). Pare-
cer CEB 11/2000 – Diretrizes CurricularesNacionais para Educação de Jovens e Adultos.
_______. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília/DF: Senado,1988.
_______. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei nº 9.394/1996. Brasília/ DF, 1996.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: Saberes Necessários à Prática Educativa. Paz e Terra. Rio de
Janeiro,1996.
LIMA, Paulo Gomes.Elvira Maria Gomes Barreto eRubens Rodrigues Lima. Formação docente: uma
reflexão necessária. Revista EducereetEducare. Vol. 2 nº 4 jul./dez. 2007
MATO GROSSO.Constituição Estadual de Mato Grosso, 1989.
_______. Lei complementar nº 206,2004.
_______. Lei complementar nº 50,1998.
_______. Parecer Orientativo nº 01/2014. Superintendência de Formação dos Profissionais da Educa-
ção Básica do Estado de Mato Grosso, 2014.
_______. Secretaria de Estado de Educação. Orientações Curriculares: Concepções para a Educação

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
Básica./ Secretaria de Estado de Educaçãode Mato Grosso. Cuiabá: Defanti, 2010.
_______. Secretaria de Estado de Educação. Orientações Curriculares: Diversidades Educacionais/ Se-
cretaria de Estado de Educação de Mato Grosso. Cuiabá: Defanti, 2010.
NÓVOA, Antônio. Professores: Imagens do futuro presente.Educa. Lisboa, 2009.
PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO. Educação de Jovens e Adultos. CEJA “Cleonice Miranda da Silva”.
Colider – MT, 2014.

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
formAção de professores pArA o proejA
no institUto federAl bAiAno.
sArA soAres costA mAmonA

Os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia foram criados no ano de 2008 através
da Lei Federal 11.892. Com esta criação, a rede federal de Educação Profissional se expandiu e, para
atuação nesses novos postos de trabalho, muitos professores foram efetivados no serviço público.
Grande parte deles com formação inicial em nível de bacharelado, para atuação nas áreas técnicas,
e outros licenciados. Em 2005 o Decreto Federal 5.478 criou o Programa Nacional de Integração da
Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos –
PROEJA, posteriormente revogado pelo decreto 5.840/06 que deu novas diretrizes para o Programa
e obrigou as Instituições Federais de Educação Profissional a implantarem, até 2007, cursos do PRO-
EJA e, neste sentido, ofertar a Educação de Jovens e Adultos – EJA articulada com a Educação Profis-
sional nos moldes preconizados pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB 9.394/96.
Considerando o contexto acima descrito, esse trabalho pretende refletir sobre o processo de entra-
da desses professores no Instituto Federal Baiano, buscando assim registrar os caminhos percorridos
por essa instituição para formar os professores para atuação no PROEJA. O trabalho também preten-
de em sua conclusão pensar, a partir da experiência do IF Baiano, propostas para enfrentamento do
desafio de promover processos de formação continuada de professores nos Institutos Federais de
Educação que considerem o exercício do magistério, a EJA e a Educação Profissional. Acreditando
que a articulação dessas três instâncias é condição necessária para construção de uma educação pú-
blica de qualidade para os alunos e alunas, Jovens e Adultos, que se beneficiam da educação pública
profissional ofertada por este Instituto.

palavras-chave: Proeja, Formação de Professor, Educação Profissional e Eja

1 contextUAlizAndo
O Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Moda-
lidade de Educação de Jovens e Adultos – PROEJA foi instituído através do Decreto 5.840/2006,
abrangendo os cursos de Ensino Fundamental e Médio. Um de seus principais fundamentos é a
integração de diversas áreas da vida humana necessárias ao pleno exercício da cidadania, conforme
explicitado em documentos oficiais do Governo Federal:

[...] a integração entre trabalho, ciência, técnica, tecnologia, humanismo e cul-


tura geral com a finalidade de contribuir para o enriquecimento científico, cultural,
político e profissional como condições necessárias para o efetivo exercício da cida-
dania. (BRASIL, 2006)

O Programa apresenta a possibilidade de implantação de cursos de Ensino Fundamental e Médio


objetivando a elevação da escolaridade ou a qualificação para o trabalho. O que se pretende com o
PROEJA é que os alunos jovens e adultos possam dar continuidade ao seu processo de escolarização
ao mesmo tempo em que se confere maior significado à modalidade, na medida em que inclui a
qualificação profissional em seu mote.
O PROEJA foi criado, neste sentido, para atender ao novo modelo de Educação Básica inte-
grada com a Educação Profissional, conforme explicitado no Decreto 5.154/2004 que estabelece as

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
novas regras para funcionamento desta modalidade de Ensino no país:

Art. 1º A educação profissional, prevista no art. 39 da Lei no 9.394, de 20 de de-


zembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), observadas as di-
retrizes curriculares nacionais definidas pelo Conselho Nacional de Educação, será
desenvolvida por meio de cursos e programas de: I - qualificação profissional, in-
clusive formação inicial e continuada de trabalhadores; II - educação profissional
técnica de nível médio; e III - educação profissional tecnológica de graduação e de
pós-graduação. (BRASIL, 2004)

De acordo com que está estabelecido no decreto 5.154/2004 que Regulamenta o § 2º do art.
36 e os arts. 39 a 41 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, os cursos e programas oferecidos
deverão, preferencialmente, ser articulados com a Educação de Jovens e Adultos - EJA […] “objeti-
vando a qualificação para o trabalho e a elevação do nível de escolaridade do trabalhador, o qual,
após a conclusão com aproveitamento dos referidos cursos, fará jus a certificados...” (BRASIL, 2004).
Assim, a EJA está contemplada, pela legislação vigente, para articular-se com a Educação Profissio-
nal.
Conforme o decreto 5.840/06 a Rede Federal de Educação Profissional precisava implantar o
PROEJA até o ano de 2007, reservando pelo menos 10% de sua matrícula total para o referido Pro-
grama, o que vem acontecendo desde então. Antes porém, de continuar falando sobre o PROEJA no
IF Baiano, julgo ser importante contextualizar esta Instituição.
Os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia foram criados no ano de 2008 através
da Lei Federal 11.892. E o IF Baiano nasce com a Federalização das Escolas Médias de Agropecuária
Regional da Ceplac3 – EMARC´s de Itapetinga, Teixeira de Freitas, Uruçuca e Valença; e as Escolas
Agrotécnicas Federais de Catu, Guanambi, Santa Inês e Senhor do Bonfim, mediante a Lei Federal nº
11.892/2008. Os demais Campi integram o Plano de Expansão da Rede Federal de Educação Profis-
sional e Tecnológica e fazem parte do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). São os Campi
de Governador Mangabeira e Bom Jesus da Lapa.
Voltando ao PROEJA no IF Baiano, cumpre lembrar que os Campi de Catu, Guanambi, Santa
Inês e Senhor do Bonfim iniciaram suas atividades de ensino no PROEJA imediatamente após o sur-
gimento deste Programa e, junto com ele, o processo de formação de professores. Os cursos atual-
mente oferecidos nessas unidades são Técnico em Cozinha (Campus Catu); Técnico em Informática
(Campus Guanambi); Técnico em Agropecuária (Campus de Santa Inês); Técnico em Processamento
Básico de Leite, Carnes e Vegetais (Campus Senhor do Bonfim), este último temporariamente sus-
penso. Tais cursos visam atender a vocação da região e as demandas de professores, técnicos e equi-
pamentos disponíveis em cada um dos Campi.
A Educação Profissional cresceu de maneira exponencial no Brasil. Para se ter uma ideia, do ano
de 1909 a 2002 havia no País 140 Escolas Federais de Educação Profissional. Com a implementação
do Plano de Expansão da Rede Federal iniciado em 2005 até 2010 foram então construídas novas
unidades, perfazendo um total de 562 unidades de Educação Profissional Técnica e Tecnológica
em funcionamento no território brasileiro até o ano de 20144. Isto representa um crescimento de
39,54% em número de unidades. Novos Campi inaugurados; muitos técnicos e professores5 concur-
sados para atender as novas demandas; ampliação do número de matrículas. Muitos desses pro-
3 CEPLAC – Comissão Executiva da Lavoura Cacaueira
4 Fonte: Ministério da Educação in: http://portal.mec.gov.br/setec/arquivos/centenario/historico_educacao_profissional.pdf
Último acesso em 24.08.2014 e Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica
(Conif ) in: http://105anos.conif.org.br/
5 O IF Baiano, informou através da Diretoria de Gestão de Pessoas que não possui dados de quantos profissionais integraram
a Rede em 2008 e os novos concursados a partir desta data para se estabelecer este comparativo da expansão localmente.

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
fissionais, recém contratados no serviço público federal, eram professores para as áreas técnicas
profissionalizantes, com formação em bacharelado6. Para efeito de ilustração será tomado por base
a realidade do Campus Governador Mangabeira que conta atualmente com 29 profissionais pro-
fessores, destes, 15 são licenciados e 14 são bacharéis atuando nas áreas técnicas, o que significa
dizer que cerca de 48% dos professores deste Campus são bacharéis, por tanto, sem formação inicial
específica para o exercício do magistério. Esta formação inicial em bacharelado pressupõe uma falta
de formação especifica para atuação no ensino, uma vez que não é este o objetivo dos bacharela-
dos e sim das licenciaturas, e por conseguinte, também não há formação específica para atuação na
Educação de Jovens e Adultos.
Nos processos de seleção para professor temporário ou substituto das áreas técnicas7 é possível
notar a dificuldade que alguns profissionais apresentam para organizar uma sequência didática,
fazer um plano de aula ou levantar conhecimentos prévios, por exemplo.

Também precisamos compreender que essa formação continuada é necessária


tanto para os profissionais provenientes dos bacharelados como para os licencia-
dos, embora suas necessidades formativas sejam distintas. Enquanto os bacharéis
carecem de formação didático-político-pedagógica que lhes qualifique para o exer-
cício da docência, aos licenciados falta a apropriação das discussões e conhecimen-
tos relativos ao mundo do trabalho e suas relações com os processos educacionais
(MOURA, 2012).

A carência de formação continuada apresentada por Moura (2012), logo acima, traz luz sobre
uma especificidade relacionada ao exercício da docência na Educação Profissional nos Institutos
Federais, e se amplia ao se tratar daquela na Educação de Jovens e Adultos, modalidade que carrega
consigo uma série de particularidades.
Nesse sentido, observa-se que a instituição precisa selecionar os profissionais para a docência, em
função das áreas técnicas profissionalizantes, e os aprova, mas não oferece para eles as condições
objetivas para exercer a profissão, no que se refere a capacitação continuada para o magistério em
geral, nem para atuação na Educação Profissional e muito menos para atuação em uma modalidade
histórica e socialmente tão peculiar quanto a EJA.
Há então uma realidade instaurada: professores que tiveram uma formação inicial técnica (bacha-
réis), com alta titulação acadêmica (mestres, doutores e pós-doutores) e outros licenciados8; muitos
deles sem experiência na docência em geral, na Educação Profissional e muito menos na Educação
de Jovens e Adultos - EJA. E por outro lado, havia também um desafio para o IF Baiano: a necessida-
de de formar professores para o exercício do magistério; para atuação na Educação Profissional e na
EJA articulada com Educação Profissional no PROEJA.
A necessidade de estudar currículo, metodologias, tempos, espaços, acesso e permanência, sujei-
tos da EJA e outras tantas peculiaridades desta modalidade, reforça e amplia a necessidade de for-
mação dos professores para uma atuação mais efetiva no PROEJA. Não se pode perder de vista que a
EJA atende a sujeitos muito peculiares, conforme demonstra documento do Ministério da Educação:

A EJA, em síntese, trabalha com sujeitos marginais ao sistema, com atributos


6 Atualmente o IFBaiano conta com 572 docentes em seu quadro de pessoal, entre efetivos e substitutos. Não
sendo possível, segundo informações da Diretoria de Pessoas, fornecer especificamente a formação de cada um desses
profissionais. Fonte: Matriz de Ocupação – EBTT em Julho de 2014.
7 Participei de três bancas de seleção para professores temporários no Campus onde atuo, tendo a oportunidade de fazer as
observações descritas neste documento.
8 Na caracterização da amostra pesquisada pela professora Helena Coura para sua dissertação de mestrado é possível notar
a qualificação profissional dos professores do curso de nível médio no IF Baiano. Vejam: “Quanto à qualificação profissional, 6,25%
possuem pós-doutorado, 25% possuem doutorado, 37, 5% mestrado, e 31, 25% especialização” (COURA, 2012. p. 102).

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
sempre acentuados em consequência de alguns fatores adicionais como raça/etnia,
cor, gênero, entre outros. Negros, quilombolas, mulheres, indígenas, camponeses,
ribeirinhos, pescadores, jovens, idosos, subempregados, desempregados, trabalha-
dores informais são emblemáticos representantes das múltiplas apartações que a
sociedade brasileira, excludente, promove para grande parte da população desfa-
vorecida. (BRASIL, 2007).

Torna-se cada vez mais necessário que se reconheçam as especificidades desta população
historicamente excluída dos espaços educativos formais. Há de se levar em conta a importância da
elevação da escolaridade e profissionalização como forma de inserção sociolaboral para cidadãos
cerceados do direito à educação básica e educação profissional de qualidade.
No que se refere aos programas de formação de professores estes devem favorecer o envol-
vimento desses profissionais com um projeto de sociedade e de homem que se pretende formar.
Neste sentido, deve-se corroborar com as ideias de Paiva (2006) ao afirmar que tais programas pre-
cisam qualificar os professores para uma atuação mais efetiva em sua realidade, veja:

O desafio de construir processos de formação continuada para professores tem


significado a possibilidade de concretizar ideias forjadas durante anos de trajetória
na educação de jovens e adultos e de estimular a luta por espaços legais, institu-
cionais, em que os projetos políticos de atendimento pela escola e da educação de
jovens e adultos se façam como direito, fortalecendo os professores para intervir na
realidade social, educacional e pedagógica, de forma qualificada, consciente e sig-
nificativa (PAIVA, 2006)

Nunca é demais lembrar que o professor, como sujeito integrante do processo de construção do
conhecimento, deve assumir compromissos sociais e que, a formação de professores deve então,
contribuir para esse posicionamento na medida em que discute a Educação, as teorias e práticas que
a fundamenta.

2 formAção pArA o proejA no ifbAiAno: primeiros leVAntAmentos


Não se tem notícias de qualquer proposta de formação de professores institucionalizada para
enfrentar aquela situação apontada inicialmente no que se refere ao exercício da docência em geral,
para os professores (bacharéis) e uma formação que contemple a Educação Profissional e a Educa-
ção de Jovens e Adultos para os demais professores. Conforme dito anteriormente, no âmbito da rei-
toria deste Instituto, não foi possível identificar uma ação de enfrentamento proposto pela alta ad-
ministração para uma política de formação local. No entanto, esforços para formação de professores
para atuação no PROEJA foram empreendidas nos Campi. Há notícias de cursos de especialização
em Educação de Jovens e Adultos realizados pelo Campus Catu; a I Jornada de Formação para atu-
ação na Educação de Jovens e Adultos e Rede CERTIFIC do IF Baiano com profissionais de diversos
Campi do Instituto (2013) realizado pela Pro Reitoria de Ensino. E há informações, ainda preliminares,
sobre ações nos Campi, mas, não foi possível identificar até o momento, na reitoria, a sistematização
dessas ações realizadas.
É pensando a necessidade de formação de professores e sua execução no âmbito do Instituto
Federal Baiano que surgem inquietudes que podem iniciar o debate e fomentar novas construções
nesta área, conforme descrito a seguir: Existem experiências sistematizadas na área de formação
de professores do PROEJA no Instituto Federal Baiano? É possível mapear estas experiências e as
necessidades de formação dos professores que atuam no PROEJA com vistas à construção de um

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
percurso formativo possível para enfrentar a situação ora apresentada? Há vontade política para que
a situação atual seja revertida?. Cumpre destacar que estas são investigações preliminares sobre a
temática e que tais indagações precisam ser sistematizadas para uma coleta de informações mais
ampliada.

3 cAminhos possíVeis
Um caminho possível para enfrentamento desta situação está, em primeiro lugar, conhecer me-
lhor a realidade ora apresentada. Nesta perspectiva, é imprescindível a coleta de informações a
respeito da formação de professores para atuação no PROEJA/IF BAIANO construindo um perfil, ain-
da que amostral desta realidade. Compreender, nesta coleta e análise, as necessidades específicas
levantadas por professores e coordenadores pedagógicos (processo atual, dificuldades, facilidades,
expectativas) para atuação na EJA.
Posteriormente, é importante perceber e assumir no coletivo a situação ora posta: falta de for-
mação continuada para atuação no PROEJA; as limitações, inerentes a formação dos bacharéis, para
atuação no exercício do magistério em geral e mais especificamente na educação profissional e na
EJA. As dificuldades e expectativas apontadas pelos sujeitos que atuam no Programa Nacional de
Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens
e Adultos – PROEJA/IFBAIANO. Compreendendo como um desafio a ser enfrentado por todos e es-
pecificamente pela Alta Administração, que precisa assumir um compromisso e responsabilidade
por intervir nesta realidade, demonstrando vontade política, através de ações concretas para enfre-
tamento desta situação.
Em última instância, pensar um percurso formativo ou mesmo um desenho didático que conside-
rem o exercício do magistério, a EJA e a Educação Profissional. Acreditando que a articulação dessas
três instâncias é condição necessária para construção de um ensino de qualidade. Uma formação
que possa ser executada em serviço, favorecendo ação-reflexão-ação e que seja possível o proposto
por FAZENDA, 2006. [...]“a articulação dialética das duas polaridades não excludentes – prática e te-
oria”, no lócus da escola e no efetivo serviço.
Neste sentido, para se executar um percurso formativo, conforme dito anteriormente, uma pos-
sibilidade seria a oferta de cursos presenciais; semipresenciais ou na modalidade EAD - Educação à
Distância, com ou sem tutorias. Ou ainda, pensar em uma formação em Rede, composta de servido-
res da própria Rede Federal de Educação Profissional que, no Brasil, conta com cerca de 60 mil servi-
dores9 (entre técnicos e docentes) e que tem, somente no IF Baiano mais de 1.200 desses servidores
ativos.
Para além das inquietações, frente aos desafios impostos, fica a expectativa de que a ampliação
dos estudos desta realidade; a construção e execução de uma proposta de formação para os profes-
sores do IF Baiano, possa se constituir numa política pública executada no lócus da escola, que favo-
reça o exercício do magistério, valorize os professores e, prioritariamente, promova a construção de
uma educação pública de qualidade para os alunos e alunas, Jovens e Adultos, que se beneficiam da
educação pública profissionalizante ofertada por este Instituto de Educação.

referênciAs bibliográficAs
BARBIER, René. A pesquisa-ação. Brasília: Liber Livro, 2004.
BRASIL. MEC. DOCUMENTO BASE. Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com
a Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos – ENSINO MÉDIO. Ministério da
Educação. Brasília, 2007.
_________. Presidência da República. Decreto 5.154 de 2004.
9 Dados do Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica
(Conif ) acessado em: http://105anos.conif.org.br/

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
_________. Presidência da República. Decreto 5.840 de 2006.
_________. Presidência da República. Lei 11.892 de 2008.
_________. Histórico da Educação Profissional – Centenário. Ministério da Educação in: http://por-
tal.mec.gov.br/setec/arquivos/centenario/historico_educacao_profissional.pdf Último acesso em
24.08.2014
COURA, Helena. A POSSÍVEL INTEGRAÇÃO CURRICULAR NO INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO,
CIÊNCIA E TECNOLOGIA BAIANO: ANÁLISE DO CURSO TÉCNICO EM AGROPECUÁRIA. Salvador. 2012.
Dissertação de Mestrado para obtenção do título de mestre pela UFBA.
FAZENDA, Ivani Catarina Arantes. A formação do professor pesquisador – 30 anos de pesquisa. Re-
vista E-Curriculum, São Paulo, v. 1, n. 1, dez. - jul. 2005-2006.
LUDKE, Menga & ANDRÉ, Marli E.D.A. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo,
Editora Pedagógica e Universitária, 1986.
MOURA, Dante Henrique. A organização curricular do ensino médio integrado a partir do eixo estru-
turante: trabalho, ciência, tecnologia e cultura. Revista LABOR.. nº7, v.1, 2012.
PAIVA, Jane. Tramando concepções e sentidos para redizer o direito à educação de jovens e adultos.
Revista Brasileira de Educação v. 11 n. 33 set./dez. 2006.

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
formAção de professores pArA o proejA:
possibilidAdes, tensões e o desAfio dA qUAlidAde
jUpter mArtins de AbreU júnior

A educação como direito de todos instituída pela Constituição Federal (1988), e a existência da
Educação de Jovens e Adultos (EJA) como modalidade para atender sujeitos de direito com carac-
terísticas específicas, não são suficientes para promover mudanças no histórico de acesso desse
público à educação de qualidade. A partir desse contexto, utilizando-se de revisão bibliográfica e
análise documental, o presente trabalho pretende refletir sobre a qualidade no ensino de cursos
médio técnico integrados, inseridos no programa PROEJA, tendo como foco principal a formação
de professores da rede federal que atuam no Programa, tanto no que respeita à formação inicial
quanto às possibilidades de formação continuada para os docentes. São apresentados alguns as-
pectos relativos à atual política de expansão da rede federal e possíveis consequências dessa ação
para a Educação Profissional e, consequentemente, para o PROEJA, e especificamente no tocante à
formação dos novos profissionais. O referencial teórico utilizado abarca autores que estudam a EJA,
como Di Pierro, outros que têm foco no PROEJA, como Moura, e na Educação Profissional, como Ma-
chado. Além destes, também são utilizados autores que abordam a temática da qualidade em seus
trabalhos, como Dourado e Oliveira. A presente proposta espera contribuir para uma percepção
mais adequada do processo de ensino-aprendizagem, assim como possibilitar um diagnóstico acu-
rado do significado de qualidade de ensino num Programa como o PROEJA, apresentando-se, dessa
forma, alternativas para professores que atuam no Programa, dos quais se espera sensibilidade para
reconhecer o potencial presente no campo de saberes da modalidade EJA e para relacioná-los com
o mundo do trabalho.

palavras-chave: PROEJA, qualidade, formação de professores

introdUção
A Educação de Jovens e Adultos (EJA) no Brasil vem de uma trajetória histórica em que predomi-
nam iniciativas da sociedade ou de grupos isolados, poucas vezes com o Estado assumindo a área
como política pública, fato que vem acarretando uma série de descontinuidades, contradições e
descaso dos órgãos responsáveis, mesmo quando a educação passa a ser direito constitucional para
todos. Ao longo de décadas, várias propostas foram realizadas tendo como meta a elevação do nível
de escolaridade de grande parcela da população, considerada excluída do direito. Porém, estas pro-
postas nunca conseguiram atingir as metas estabelecidas.
De outra parte, também podem ser verificados a necessidade e o anseio do público dessa moda-
lidade às questões relativas ao trabalho e à qualificação profissional. É nesse contexto que se insere
o Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade
de Educação de Jovens e Adultos (PROEJA), instituído no ano de 2006, em âmbito federal, pelo De-
creto n. 5.840/06.
O PROEJA tem como diretriz a formação inicial e continuada de trabalhadores jovens e adultos,
por meio da oferta de cursos e programas de educação profissional, em parceria de instituições pú-
blicas federais e sistemas de ensino municipais e estaduais, além de entidades de formação profis-
sional do “Sistema S” (SESC, SESI, SENAI e SENAC), integrando a educação básica na modalidade EJA
e a formação profissional técnica, contribuindo assim para a melhoria das condições desse público,
a quem se destina o programa, de participação social, política, cultural e no mundo do trabalho.

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
Inserido nesse contexto, o presente trabalho visa a refletir sobre a questão da qualidade do ensi-
no de cursos médios técnicos integrados, inseridos no PROEJA, com foco na formação dos profes-
sores da rede federal que atuam no Programa. Para atingir tais objetivos, foram realizadas revisão
bibliográfica e análise documental acerca das temáticas propostas.
Embora o PROEJA abarque em suas possibilidades a educação básica como um todo, e por conse-
quência o ensino fundamental, por meio dos Programas de Formação Inicial e Continuada (PROEJA
FIC), o presente trabalho foca qualidade de ensino mediatizada pela formação de professores que
atuam na educação profissional técnica integrada ao ensino médio, ofertada nas instituições fede-
rais.

o proejA e A rede federAl: cAminhos entrecrUzAdos


A rede federal de ensino conquistou certa autonomia que a diferencia das redes municipais e es-
taduais, tanto em aspectos estruturais e, principalmente, pela existência de um processo de seleção
que colabora para que haja nessa rede um público diferenciado. Esse público, composto de alunos
aprovados em processos seletivos criteriosos e árduos, ajudou a construir a imagem de uma escola
técnica federal considerada de qualidade, embora excludente.
Essa imagem foi construída ao longo de mais de um século de existência, constituindo uma rede
de escolas técnicas federais em que a inclusão de determinados grupos sociais ainda é realizada
com restrições. Dessa forma, a condição ainda permanente do caráter restritivo de acesso a essas
escolas encontra-se em oposição à proposta de Gentili (1995, p. 177) que, discutindo a democra-
tização do ensino, aponta que “qualidade para poucos não é qualidade, é privilégio”, e apresenta
um tipo de direcionamento ainda necessário à educação brasileira, principalmente no contexto das
instituições federais de ensino.
O histórico das escolas técnicas brasileiras tem seu núcleo idealizador na primeira década do
século XX, em 1909, com a criação das Escolas de Aprendizes e Artífices e, hoje, tem nos Institutos
Federais de Educação, Ciência e Tecnologia (Institutos Federais, IF), o seu símbolo mais relevante. Os
Institutos foram assim transformados pela Lei n. 11.892, de 20081, dando início às comemorações
do centenário da criação das escolas técnicas brasileiras. Entretanto, mesmo antes da criação dos
Institutos Federais, a proposta do PROEJA já se encontrava em processo de implantação em algumas
escolas técnicas federais existentes à época. Nesse período, a visão de alguns educadores com rela-
ção ao PROEJA demonstrava uma retórica otimista sobre o Programa, apontando que as instituições
federais, por terem um histórico de qualidade e resultados satisfatórios, poderiam realmente alcan-
çar metas previstas na legislação.
Em Moura (2006), observa-se apontamentos sobre possíveis fragilidades que poderiam ameaçar
o estabelecimento e a viabilidade do PROEJA enquanto proposta que visava a um resultado de qua-
lidade no contexto de ensino-aprendizagem, principalmente considerando-se especificidades da
modalidade de Educação de Jovens e Adultos. Sobre essas fragilidades, ainda afirma que “é pouca
ou quase nenhuma a experiência da mencionada rede no que se refere ao trabalho com a modali-
dade Educação de Jovens e Adultos, o que resulta em limitações a esse processo” (MOURA, 2006, p.
117).
Dessa forma, observa-se que preexistiam diversas questões que limitavam a priori a eficiência do
PROEJA como uma nova proposta educacional para a rede. Em contrapartida, o discurso apresenta-
do pela Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica do Ministério da Educação (SETEC/MEC),
definia da seguinte forma o PROEJA: “mais do que um projeto educacional, será um instrumento de
resgate da cidadania de grande parcela dos brasileiros expulsos do sistema escolar por problemas
encontrados dentro e fora da escola” (BRASIL, 2007, p. 14).
Por conseguinte, na medida em que vão acontecendo articulações, que resultam numa maior

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
aproximação entre a Educação Profissional e a EJA, os discursos — que têm como foco principal
o grande contingente de “cidadãos que foram cerceados do direito de concluir a educação básica
e de ter acesso a uma formação profissional de qualidade” (BRASIL, 2007, p. 11) — esbarram numa
realidade que apresenta deficiências de infraestrutura física, de questões relativas à formação de
professores que atuam no PROEJA, entre outros aspectos.

proejA e qUAlidAde: desAfios em qUestão


O Decreto n. 5.840/06 que instituiu o PROEJA apontou que a Rede Federal de Ensino tinha como
meta oferecer cursos do Programa a partir do ano de 2007, além de estabelecer um limite mínimo de
vagas a serem oferecidas por essas instituições. O texto do Decreto (BRASIL, 2006) assim se expressa:

Art. 2o - As instituições federais de educação profissional deverão implantar cur-


sos e programas regulares do PROEJA até o ano de 2007.
§ 1o - As instituições referidas no caput disponibilizarão ao PROEJA, em 2006, no
mínimo dez por cento do total das vagas de ingresso da instituição, tomando como
referência o quantitativo de matrículas do ano anterior, ampliando essa oferta a
partir do ano de 2007.

De acordo com o Art. 2º e § 1º pode ser observado que as instituições federais receberam o PRO-
EJA como uma proposta que chegou de forma obrigatória e sem possibilidade de opções de adesão
ou não ao Programa. Essa característica, inicialmente, teve impactos entre gestores, demais recursos
humanos, estrutura física, material didático, entre outros, causando reflexões pessimistas acerca do
futuro do Programa. No ano de lançamento do PROEJA, em 2006, já se observavam críticas relacio-
nadas ao fato de as instituições não terem sido consultadas, o que feria a autonomia relativa con-
quistada, além de uma expectativa negativa à recepção do público da EJA, por parte da rede federal.
Nesse sentido, Moura (2006, p. 121) faz considerações à “[...] forma impositiva como esse Programa
entrou em vigor e [a] uma visão elitista de parte dos profissionais que integram a rede federal, os
quais vinculam a entrada do público da EJA nessas instituições a uma ameaça à qualidade do ensino
ali existente”.
Nesse sentido, cabem aqui alguns apontamentos acerca do termo ensino de qualidade. Embora
o propósito principal desse trabalho não seja o aprofundamento em questões relativas a conceitos
e definições existentes sobre qualidade na educação, é relevante que sejam sinalizados alguns ca-
minhos que direcionem uma reflexão mais objetiva sobre o tema.
O trabalho de Dourado e Oliveira (2009) apresenta arcabouço teórico que pode servir como su-
porte para um estudo mais sistemático sobre o que é qualidade de ensino. Inicialmente, os autores
traçam um cenário para a análise dos ambientes extra e intraescolares, em que o primeiro é apresen-
tado numa dimensão que envolve dois níveis: o espaço social e as obrigações do Estado.
O espaço social se refere a questões de cunho socioeconômico e cultural dos sujeitos envolvidos
no processo, além de focar na necessidade do estabelecimento de políticas públicas e projetos que
contribuam para o enfrentamento de problemas sociais (drogas, fome, violência, entre outros). Essas
propostas, segundo os autores, devem ter impacto tanto no contexto de permanência de alunos
quanto na idealização de ações que tenham por finalidade o engajamento da comunidade escolar
em atividades que visem a um processo de ensino-aprendizagem exitoso. No contexto das obriga-
ções do Estado, estas se referem a direitos dos cidadãos e a obrigações de autarquias públicas, tanto
no que tange à oferta de vagas e igualdade de condições entre indivíduos, quanto a questões rela-
tivas a direitos estabelecidos nas últimas décadas na área da educação, como merenda e transporte
escolar, livro didático, recursos tecnológicos etc.

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
Entre as dimensões intraescolares, os autores as situam em quatro planos, orientados a partir: i)
de condições de oferta de ensino; ii) de gestão e organização do trabalho escolar; iii) de formação,
profissionalização e ação pedagógica do professor, iv) de permanência e desempenho escolar de
alunos.
Como sugestão, os autores ainda apontam para que as dimensões intra e extraescolares sejam
consideradas de maneira articulada, e que os aspectos anteriormente citados devem envolver um
movimento visando à garantia da construção da qualidade da educação.
Dessa forma, uma proposta que tenha como objetivo a avaliação da qualidade de ensino em pro-
gramas como o PROEJA levará em conta, como recomendado, a articulação entre essas dimensões e
planos apresentados, tanto no contexto da pesquisa de campo quanto na análise de dados concer-
nentes ao trabalho realizado.

formAção de professores e expAnsão dA rede: qUAlidAde e cresci-


mento?
Refletindo sobre questões relacionadas à formação de professores que atuam na EJA/PROEJA,
alguns autores, como Di Pierro (2005), vão além do foco existente na formação de docentes atuantes
na modalidade, apontando responsabilidades desde o desvelamento do “senso comum” existente
em algumas autarquias e instituições — que por vezes tratam a EJA como modalidade provisória —
até mesmo à forma como a EJA é abordada em instituições de ensino superior. Desse modo, a partir
de Di Pierro (2005, p. 1132) observamos que:

As dificuldades de instituição e consolidação de espaços de formação decorrem


de múltiplos fatores, como a persistência da visão equivocada que concebe a educa-
ção de jovens e adultos como território provisório sempre aberto à improvisação; a
precariedade do mercado de trabalho, que não proporciona a construção de carrei-
ras profissionais; e o escasso envolvimento das instituições de ensino superior com
um campo educativo de pouco prestígio e baixo grau de formalização.

Outro aspecto que deve ser considerado e que tem influência sobre a qualidade de ensino e a for-
mação dos professores é a atual política de expansão da rede federal. Em 2005, contava-se com 140
escolas; entre 2006 e 2010, inauguraram-se 214 novas unidades com previsão de 562 unidades ao
final de 2014, ou seja, 422 escolas a mais do que as existentes em 2005. Em termos de matrículas, em
2005 eram 173 mil; passam para 420 mil em 2011; e previsão de 600 mil no final de 2014. Em termos
de docentes, em 2005 eram cerca de 7 mil; passam para cerca de 20 mil em 2011; com crescimento
contínuo, para tentar atingir a meta estabelecida para 2014, que ultrapassa os 25 mil, segundo infor-
mações do Ministério da Educação2.
Entretanto, a expansão da rede federal passa por questões delicadas, que apontam para um pos-
sível despreparo de alguns desses novos docentes com relação à formação para atuar na modalida-
de Educação Profissional. Ao citar a fala do Diretor Geral de um CEFET, que posteriormente tornou-
-se reitor de um IF, em uma reunião sobre formação de professores para a Educação Profissional
ocorrida em 2006, em Brasília, Machado (2011, p.693) apresenta certa preocupação expressa pelo
dirigente com o que vinha se desenhando perante a expansão da rede, que então se iniciava:

Hoje está entrando uma leva enorme de professores que têm mestrado e dou-
torado, mas, por outro lado, muitos deles nunca tiveram uma atuação profissional
anterior. Para muitos, essa é a primeira vez que estão atuando profissionalmente e,
vejam a contradição, eles vêm para o CEFET para dar aula de educação profissional.

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
Temos encontrado problemas bastante sérios e não apenas de natureza pedagógi-
ca. Recentemente, depois de uma longa discussão, um desses nossos novos profes-
sores diz: realmente a gente não está sabendo formar técnicos. Se você pedir para
ele formar um graduado, ele sabe, agora se você pedir para formar um técnico, ele
não sabe.

Esse comentário mostra uma situação que, conforme a expansão foi ocorrendo, pode ter se am-
pliado professores que chegam às instituições para ministrarem aulas de conhecimentos específicos
de áreas técnicas que não têm vivência profissional em suas áreas, estando restritos ao conhecimen-
to acadêmico. O impacto desses casos nas instituições federais carece de pesquisas mais aprofun-
dadas.
No caso específico do PROEJA, por serem cursos técnicos integrados ao ensino médio, os pro-
fessores que atuam no Programa têm como formação inicial a licenciatura e/ou bacharelado. Entre-
tanto, diversas contradições surgem a partir de questões relacionadas à formação e atuação desses
profissionais, considerando-se que estes professores, a partir do momento em que integram o corpo
docente da Rede Federal de Educação Profissional, irão atuar nos diversos cursos e níveis existentes
nessa Rede, tendo então possibilidade, também, de atuar no PROEJA. Sobre a atuação dos professo-
res da Rede federal no PROEJA, em comparação com a atuação desses mesmos docentes em outros
cursos dessas instituições, Machado (2011, p. 694) aponta que:

No caso do PROEJA, a complexidade do desenho curricular e da prática didático-


-pedagógica é ainda maior, pois envolve a educação geral do ensino médio e fun-
damental, conteúdos especiais da EPT [Educação Profissional e Tecnológica] e da
FIC [Formação Inicial e Continuada] e abordagens da educação de jovens e adultos.

Ainda na questão da formação de professores nos cursos de licenciatura, também podem ser vi-
sualizadas lacunas em termos de formação que abarquem tópicos relacionados à modalidade Edu-
cação Profissional.
Esse fato colabora para que professores, durante a formação inicial, sejam desprovidos de refle-
xões a respeito das temáticas trabalho e educação, assim como também pode ser observada nesses
cursos a ausência de abordagens pedagógicas que tenham como foco ações voltadas para estu-
dantes da Educação Profissional, sua relação com o mundo do trabalho, além de possibilidades e
restrições da modalidade.
Dessa forma, apesar de formados para serem professores, a concepção que se vê nos cursos de li-
cenciatura de grande parte das universidades brasileiras é quase integralmente voltada para o ensi-
no médio de caráter propedêutico, o que tem sido utilizado como objetivo principal para o ingresso
em cursos de nível superior (MOURA, 2006).
A partir dessa realidade, surgem diversas questões no contexto da formação desses professores
que atuam na EJA e, consequentemente, no PROEJA, considerando-se a relevância das especificida-
des que a modalidade apresenta. Os professores que não tiveram acesso aos fundamentos da EJA
na formação inicial levam essa lacuna para a atuação na modalidade, com forte impacto na relação
com os estudantes e com suas características específicas, deixando claro, por vezes, que a falta de
formação no campo da EJA colabora para que as abordagens pedagógicas propostas reforcem as-
pectos que se remetem ao ensino compensatório e supletivo, distante da perspectiva do direito.
Como efeito, professores que vêm trabalhando com a EJA, sem formação, têm menores possibili-
dades de estar sensíveis a propostas que minimizem possíveis problemas decorrentes das caracte-
rísticas próprias da modalidade, entre as quais podem ser destacadas: turmas com estudantes que
ficaram longo período sem contato com o ensino formal; com diferenças de idade bastante acentu-

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
adas; além da necessidade de conciliar estudo e trabalho, diariamente.
No caso de profissionais que possuem como única formação o bacharelado, e que atuam no PRO-
EJA, ou mesmo na educação profissional de maneira geral, pode ser observado que a situação é
ainda mais complexa que a descrita no caso de professores com formação em licenciatura. Nesses
casos, os profissionais vão atuar em disciplinas específicas da formação profissional dos cursos como
professores, mas com domínio apenas do campo científico relativo à área de atuação, sem formação
pedagógica, embora atuando na docência de cursos técnicos de nível médio. Este aspecto torna
ainda mais complexo, por parte desses professores, as possibilidades de entendimento da proposta
da EJA, assim como o trato com as especificidades da modalidade.
A partir desse contexto, deve ser mencionado que, desde 2008, vêm sendo realizadas audiências
públicas, com a finalidade de discutir propostas de licenciatura para docentes da Educação Profis-
sional. Os interessados, como o Ministério Público Federal, instituições de ensino, secretarias esta-
duais e municipais de educação, entidades ligadas ao Sistema “S” e outros têm sido convidados a
participar e um documento já foi produzido nesses encontros e entregue ao Conselho Nacional de
Educação (CNE), que estuda possibilidade de adoção das propostas defendidas pelo documento
(MACHADO, 2011).

especiAlizAções em proejA: formAção continUAdA nA rede federAl


Com relação à questão do oferecimento de cursos para complementar a formação inicial que os
profissionais tiveram durante a graduação, seja em cursos de bacharelado ou licenciatura, é relevan-
te apontar que a partir das diretrizes do Documento Base do PROEJA (BRASIL, 2007, p. 08), vieram
sendo ofertados cursos de especialização voltados para profissionais que atuem no PROEJA, tanto
da própria Rede federal, quanto das redes públicas (municipais e estaduais) de ensino.
Com a finalidade de alcançar os objetivos propostos, os currículos desses cursos de especializa-
ção, de maneira geral, eram voltados para a necessidade de integração entre os três campos edu-
cacionais: ensino médio, educação profissional e educação de jovens e adultos. Segundo dados da
SETEC, esses cursos foram responsáveis pela formação de mais de 3000 profissionais em polos exis-
tentes pelo país, desde 2006. No entanto, em momento posterior, houve mudanças nesse quadro
(MOURA, 2012).
A partir desses fatos, é relevante apontar que, inicialmente, essas ações tiveram continuidade,
quando havia recursos especificamente repassados e destinados a subsidiar o Programa. A oferta,
entretanto, vem sendo interrompida, na medida em que o MEC cessou o financiamento direto de
novas turmas, pela previsão de incorporação orçamentária, em cada IF, dos custos da oferta obri-
gatória de PROEJA, como definido por Decreto federal. Assim, observa-se que nessas unidades de
ensino o incentivo inicial do MEC não foi suficiente nem para a institucionalização da oferta do Pro-
grama — sempre contestado por muitos IFs — nem para que os cursos de especialização fossem
mantidos, continuadamente.
Sobre esse aspecto, vemos em Moura (2012) o apontamento de que no Instituto Federal do Rio
Grande do Norte (IFRN) foram abertas 14 turmas entre os anos de 2006 e 2009, todas com finan-
ciamento do MEC. Entretanto, no ano de 2010 a instituição não criou novas vagas para o curso de
especialização.
Também foi observado nessas especializações em PROEJA que, embora a maioria dos cursistas
fossem professores, estes não eram da Rede federal, e que as propostas, de modo geral, não tinham
uma orientação para a formação específica de professores nos diversos componentes curriculares
que compõem a educação profissional, a EJA e seus possíveis direcionamentos. Nesse caso, o dese-
jável é que se avance, no campo das pesquisas, para melhor compreensão e intervenção nas ações
que ainda se encontram ativas nesse campo.

590
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
A partir desse quadro apresentado, vê-se que uma das questões mais complexas no contexto do
PROEJA é a da formação docente. Essa questão se complexifica, por exemplo, nos IFs que abrigam
grande quantidade de mestres e doutores em seus quadros. Observa-se que mesmo quando existe
oferta de cursos de formação continuada ou de outros cursos específicos visando à qualificação dos
que atuam no PROEJA encontra-se resistência por parte dos profissionais, principalmente daqueles
que já possuem titulação. Esse fato pode ser observado no trabalho de Maschio (2011, p. 77) que as-
sim descreve essa situação: “Destaca-se que docentes com título de Mestre e Doutor, que atuariam
no PROEJA, julgaram desnecessário cursar uma especialização em PROEJA”.
Esses aspectos, com certeza, corroboram o fato de alguns dos cursos de especialização em PROE-
JA não alcançarem seus objetivos da maneira esperada, tendo como consequência a dificuldade de
institucionalização desses cursos por parte de seus ofertantes.

considerAções finAis
A partir dos apontamentos apresentados, observa-se que as contradições e/ou lacunas existen-
tes no significado de qualidade de ensino no PROEJA e na formação de professores que atuam no
Programa requerem estudos e intervenções bastante específicas, os quais podem contribuir para
que haja percepção mais adequada do processo de ensino-aprendizagem instalado nas instituições
federais que desenvolvem o Programa.
No tocante à questão da qualidade desses processos de aprendizado/formação profissional in-
tegrados com o ensino médio, uma proposta que analise a qualidade de ensino pode possibilitar
um diagnóstico acurado do significado de uma política como a do PROEJA, que tem como público
jovens e adultos interditados do direito em trajetórias escolares contínuas.
Entretanto, é relevante ressaltar que, nesse contexto, devem ser analisados tanto o PROEJA, como
programa educacional de elevação de escolaridade e qualificação profissional, quanto a Rede fede-
ral, formada por instituições cujo histórico de oferta de ensino de qualidade se fez reservadamente
para um público restrito. Dessa análise, devem fazer parte as contradições entre o que vem sen-
do vivenciado e os direcionamentos existentes no Documento Base do Programa, que orientam “a
construção de uma nova sociedade fundada na igualdade política, econômica e social; em um pro-
jeto de nação que vise uma escola vinculada ao mundo do trabalho numa perspectiva radicalmente
democrática e de justiça social”, direcionamentos esses que ficam, assim, enfraquecidos, diante de
uma realidade sem muitas perspectivas de inclusão cidadã (BRASIL, p. 17, 2007).
Porém, independentemente dessas condições adversas, é indispensável ressaltar a importância e
a possibilidade de alcance econômico que pode ter o PROEJA, caso venha a ser executado adequa-
damente como política pública, nas diferentes esferas educacionais. Dessa forma, uma possível con-
solidação e expansão do PROEJA pode ser considerada uma resposta às concepções conservadoras
e elitistas que ainda permeiam a Rede federal, constituindo contrapartida à expectativa de grupos
sociais que almejam ter acesso a uma educação de qualidade.
Assim, como alternativa prática, professores que atuam no PROEJA devem ter a sensibilidade de
reconhecer o potencial presente no campo de saberes da modalidade EJA e relacioná-los com o
mundo do trabalho. Portanto, a formação continuada para os docentes que atuam nesse Programa,
ao contemplar interação, diálogo, produção e discussão sobre questões docentes, põem em relação
e problematizam formas de conhecimento construídos na prática social e pedagógica, exercitando
uma das características mais marcantes dos jovens e adultos inseridos no contexto do PROEJA.

referênciAs
BRASIL. Decreto n. 5.840, de 23 de julho de 2006. Institui, no âmbito federal, o Programa de Integração
da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos –

591
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
PROEJA. Brasília, DF: 24 de junho de 2006.
BRASIL. PROEJA: Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica
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Científica e Tecnológica, cria os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, e dá outras pro-
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Técnica de Nível Médio. Boletim Salto para o Futuro. v. 07, 2006. p. 68-83,

592
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
percepções sobre A formAção docente e seU
desenVolVimento profissionAl
edmilson dos sAntos ferreirA

Este trabalho pretende ampliar a discussão sobre a formação de professores, partindo da forma-
ção inicial do professor de Ciências, buscando ainda contemplar a especificidade da modalidade
de Educação de Jovens e Adultos. Focalizamos nesse estudo, a formação docente enquanto uma
dimensão significativa que emergiu da observação e análise da pesquisa desenvolvida a partir das
representações iniciais dos professores de Ciências entrevistados sobre a concepção de formação
docente como processo reflexivo do desenvolvimento profissional. A esse estudo, associamos a ca-
tegoria saberes docentes (SELLES, 2000; MONTEIRO, 2001; TARDIF, 2002), que busca apropriar ele-
mentos específicos elaborados pelo saber constituído pela experiência. A ação docente valoriza as
relações que os professores têm com os seus saberes, explorando o ensino de Ciência, com ênfase
na Educação de Jovens e Adultos, como um campo de pesquisa pouco explorado pelos educadores.
Ressaltamos a ação pedagógica, relacionando o conhecimento científico e o conhecimento escolar
pautado na contextualização e nos saberes docentes. A abordagem qualitativa do processo meto-
dológico privilegiou o contato com professores de Ciências enquanto sujeitos envolvidos na Educa-
ção de Jovens e Adultos, interessados em expressar sua cultura e seus saberes docentes. A pesquisa
aponta para a valorização das concepções prévias no ensino de Ciências na Educação de Jovens e
Adultos e uma demanda por um processo de formação continuada que privilegie a articulação entre
teoria e prática.

palavras-chave: formação de professores, saberes docentes, ensino de Ciências, Edu-


cação de Jovens e Adultos

pArA inicio de conVersA...


Atualmente, o pensamento do professor vai além da sala de aula ao enfocar questões como tra-
balho, formação profissional, história de vida, relações entre cultura escolar e cultura dos professo-
res, ao tecer a profissionalização como elementos da subjetividade, estabelecendo relações com os
saberes e as práticas docentes. Os professores possuem saberes que são mobilizados e produzidos
a cada aula, através da mediação da cultura e dos saberes escolares.
Esse estudo pretende registrar a percepção dos professores, ou seja, a subjetividade de atores em
ação assim como suas práticas cotidianas, buscando um diálogo com os professores como sujeitos
competentes que possuem saberes específicos que contribuem para a Educação de Jovens e Adul-
tos.
Segundo Tardif (2002), a subjetividade dos professores é desenvolvida a partir de três orientações
inspiradas em pesquisas desenvolvidas na América do Norte e na Europa. A primeira orientação é
uma visão cognitiva da subjetividade e faz parte da corrente das ciências cognitivas que colocam
em evidência os processos mentais que regem o pensamento do professor em diversas situações:
na gestão de classe, durante a transposição didática e na interação com jovens e adultos. Na concep-
ção americana, são utilizados os saberes procedimentais e instrumentais. Assim, o professor elabora
as suas representações. Na percepção dos europeus, valoriza-se o processo de negociação em rela-
ção ao contexto de ensino.
A segunda orientação é uma visão existencial que caracteriza a “vida dos professores”, isto é, a
história de vida pessoal e profissional com enfoques narrativos que engloba suas experiências fami-

593
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
liares, crenças, valores pessoais e a trajetória do professor. O trabalho assume uma dimensão afetiva,
normativa e existencial, suas ações são marcadas pela sua própria experiência no trabalho. A sua
autoridade é mediada pela sua relação pessoal com o grupo.
A terceira orientação é uma visão social, está pautada no interacionismo, etnometodologia, o
estudo da linguagem comum ou cotidiana. Nesse sentido, o professor emite um juízo de valor e
normativo que definem as competências do professor dentro e fora da escola.
Na Educação de Jovens e Adultos, o reconhecimento da história de vida do professor é relevan-
te, pois poderá permitir uma maior aproximação com os alunos de suas próprias experiências e,
quando associadas a uma etnometodologia, explora as questões do cotidiano como estímulo para
a construção de seus saberes.
A reflexão sobre a formação de professores nos remete à prática pedagógica como condição es-
sencial para que os educadores possam aperfeiçoar-se em conjunto com a sociedade. A formação
de professores é um procedimento complexo que envolve saberes e uma preparação baseada na
autoformação, enquanto um movimento em que o conhecimento é apreendido, consolidado e in-
ternalizado para que haja uma troca de experiências, visando à função de educar jovens e adultos.

O educador deve compreender que a fonte de sua aprendizagem, de sua forma-


ção, é sempre a sociedade. Mas esta atua de dois modos: um, indiretamente, mas
que aparece ao educando (futuro educador) como direito (pois é aquele que sente
como ação imediata): é o educador, do qual recebe ordenadamente os conhecimen-
tos. E outro, diretamente, ainda que apareça ao educando (futuro educador) como
indireto, pois não o sente como pressão imediatamente perceptível: é a consciência,
em geral com o meio natural e humano no qual se encontra o homem e do qual
recebe os estímulos, os desafios, os problemas que o educam em sua consciência de
educador (VIEIRA PINTO, 1984, p. 109 - 110).

Nesse contexto social, podemos ampliar a discussão sobre a formação de professores, par-
tindo da formação inicial do professor de Ciências, buscando ainda contemplar a especificidade da
modalidade de Educação de Jovens e Adultos.

formAção iniciAl de professores de ciênciAs


A formação inicial dos professores para o Ensino Fundamental, de acordo com a antiga Lei nº
5692/71, levou em consideração a necessidade de habilitar o profissional para lecionar até a 6ª série
(7º ano do Ensino Fundamental). Esses estudos duravam quatro anos. Já os estudos com duração
de três anos garantiam a habilitação para lecionar até a 4ª série (5º ano do Ensino Fundamental). E
ao mesmo tempo, ambos garantiam a continuidade dos estudos no Ensino Superior (BRASIL, 1972).
A formação dos profissionais da Educação, no contexto da LDB nº 9394/96, em vigor, estabelece
no artigo 62, que se dará em nível superior, admitindo, entretanto, a formação mínima em nível mé-
dio na modalidade Normal. O curso de Licenciatura em Ciências Biológicas é um pré-requisito para
o ensino de Ciências no segundo segmento do Ensino Fundamental e Médio.
O artigo 63, inciso II, regulamenta a formação pedagógica para os diplomados no ensino superior
que queiram dedicar-se à educação básica. Já o inciso III destaca o papel da formação continuada
para os profissionais da Educação, o que confere maior organização ao processo de formação de
educadores.
Os estudos de habilitação para o Magistério já pretendiam, entre seus objetivos, promover a cor-
relação e a convergência das disciplinas, o que indicava um olhar mais atento com vistas à interdis-

594
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
ciplinaridade, mesmo em face das divisões de conhecimento entre as disciplinas; e despertava o
interesse pelo autoaperfeiçoamento, o que apontava para um processo de formação continuada.

Quanto aos professores, não ignoramos o quadro atual de dispersão que a Lei
procurou corrigir, num dos seus capítulos mais ricos, visando ao aumento da eficiên-
cia, à redução dos custos e, sobretudo, à valorização da classe como causa e efeito
da nova política. Os currículos em execução até agora, de nítida inspiração intelectu-
alista, tendiam cada vez mais a dividir o reconhecimento em disciplinas muito espe-
cíficas, já na própria escola primária, exigindo um número sempre maior de mestres
cujos salários decresciam na mesma proporção e cuja “oferta”, em termos de pessoal
qualificado, não acompanhava o ritmo crescente da procura (BRASIL, 1972, p. 67).

A especialização do profissional docente constituía-se uma exceção à escassez do quadro de pro-


fissionais habilitados. Expressava-se pelo professor único no início da escolarização e logo no come-
ço do ciclo ginasial (segundo segmento do Ensino fundamental) havia a divisão em disciplinas. A
partir daí, o aluno passava de um para nove ou mais professores, numa sucessão de orientações, às
vezes contraditórias, que iam além da sua percepção e discernimento.
Concordamos com Tardif (2002) ao compreendermos que atualmente “a formação inicial visa ha-
bilitar os alunos – os futuros professores – à prática profissional dos professores de profissão e a fazer
deles práticos ‘reflexivos’” (p. 288). Entretanto, o locus dessa formação é a sala de aula e a pesquisa,
desde os encontros de práticas de ensino ao longo da graduação e principalmente pelos saberes
docentes. Essa relação entre teoria e prática dá significado ao conhecimento acumulado da univer-
sidade, que passa por um processo de acomodação ao longo dos anos de trabalho.
Esse tipo de relação entre teoria e prática é decisivo para o professor. O aluno da licenciatura
em Ciências Biológicas precisa adquirir o conhecimento da matéria, mas há outra relação que é es-
pecífica do professor: a transposição didática dos conteúdos teóricos ou práticos. O futuro professor
de Ciências precisa ser hábil em dialogar com seus alunos, propor a contextualização a partir de
questões significativas, sobretudo na Educação de Jovens e Adultos, porque eles trazem consigo os
saberes do cotidiano.
Mello (2002) nos orienta que a:

Integração permanente e contínua entre teoria e prática desde o início do curso


de graduação, em todas as disciplinas do currículo de formação profissional, inclusi-
ve naquelas tradicionalmente consideradas “alheias” à formação docente. Essa inte-
gração deve ser trabalhada como contextualização dos conhecimentos no mundo
social e natural de modo a propiciar situações de aprendizagem significativa aos
futuros professores, tanto nas áreas de conteúdo específico como nas áreas de fun-
damentos educacionais (p. 106).

A ação docente valoriza as relações que os professores têm com os seus saberes, explorando
o ensino de Ciência, com ênfase na Educação de Jovens e Adultos, como um campo de pesquisa
pouco explorado pelos educadores. Ressaltamos a ação pedagógica, relacionando o conhecimento
científico e o conhecimento escolar pautado na contextualização e nos saberes docentes.

percepções sobre A formAção docente em ciênciAs e seU desenVol-


Vimento profissionAl

595
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
A importância da troca de experiências e das reflexões que ocorrem entre os professores e seus
pares ao longo da elaboração de um projeto político pedagógico construído coletivamente e que
articule com os movimentos populares organizados e comprometidos com a preservação da vida.
O projeto pedagógico requer uma articulação entre a realidade atual, formalizando a discussão e
dando unidade ao pluralismo de ideias existente na escola.
A formação do educador da EJA precisa partir de um trabalho pedagógico que tenha três níveis
de enfoque: informacional, que englobe o conhecimento racional e cultural acumulado; reflexivo
crítico, que valorize o autoconhecimento com capacidade de compreender as questões ambientais
e saúde; ação individual e coletiva, que consiste na demonstração de responsabilidade e de consci-
ência dos efeitos provocados na sociedade.
O enfoque informacional valoriza a dimensão cultural a partir dos saberes acumulados e mobi-
lizados pelo educador ao longo de sua formação, como um processo contínuo obtido como rendi-
mento de um capital, seja ele econômico ou cultural - garantido pelo lucro que o pertencimento a
um grupo proporciona, através das trocas que se instituem o inter-relacionamento, em encontros
de formação de professores, exercendo um efeito multiplicador sobre o capital possuído (BOUR-
DIEU, 1998).
O enfoque reflexivo crítico estimula uma formação que valorize os três registros ecológicos defi-
nidos por Guattari (1990): o meio ambiente, as relações sociais e a subjetividade humana. A subjeti-
vidade preserva o caráter da autonomia que envolve a discordância a respeito dos processos de ela-
boração de propostas pedagógicas que precisam ser amplamente planejadas através dos centros
de estudos. Para Freire (1992), uma proposta se constitui pelo diálogo, buscando uma condição de
horizontalidade ou igualdade de poder na relação. Trata-se de respeito pelos saberes da experiência
resultante de uma compreensão de mundo.
A ação individual e coletiva consiste em desenvolver práticas e posturas que modifiquem as
maneiras de se relacionar com a sua própria família, com a escola, com o seu grupo social e com o
meio ambiente.
O professor de Ciências é um profissional que compreende que a sua formação se dá num
processo contínuo, visando contribuir para a integração das dimensões ambiental e saúde, com
uma reflexão crítica associada a uma proposta e intervenção social.
Nesse sentido, o principal papel do Educador de Jovens e Adultos é constituir instâncias de
diálogo, sobretudo no espaço escolar, para articular os conceitos de democracia, cidadania e quali-
dade de vida, resgatando valores como solidariedade, respeito, responsabilidade individual e coleti-
va, diante da sociedade (LOUREIRO, 2003).
As ações coletivas, organizadas através de movimentos sociais podem estabelecer estraté-
gias importantes como denúncia, protesto, cooperação, parceria e solidariedade. Diferentes instru-
mentos coletivos podem ser construídos diante das carências e necessidades, a partir das condições
de vida do grupo social. Para Loureiro (2003):

É fundamental associarmos processos educativos formais às demais atividades


sociais de luta pela qualidade de vida e sustentabilidade. São prioritários projetos
que articulem o trabalho escolar ao trabalho comunitário, buscando-se o conheci-
mento, a reflexão e a ação concreta sobre o ambiente em que se vive. A Educação
Ambiental, por seus princípios integradores e de promoção da qualidade de vida,
pode construir o elo entre o entendimento do ambiente escolar como totalidade que
inclui a comunidade em que a escola se insere e luta dos profissionais do ensino pela
democratização das relações de poder na instituição educativa. (p. 93).

596
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
A escola que se propõe a dialogar com a comunidade e tecer reflexões sobre o cotidiano estimula
a mudança de comportamento. E “não é somente com conteúdos que uma educação conscientiza-
dora se realiza, o educador deve se apropriar de diferentes conteúdos pedagógicos, (...), para colocar
significados da vida em situações de diálogo” (BRANDÃO, 2002, p. 21).

formAção docente em ciênciAs como processo reflexiVo do desen-


VolVimento profissionAl
O trabalho docente em equipe multidisciplinar surge da análise e interpretação das falas dos pro-
fessores. A esse estudo, associamos a categoria saberes docentes (SELLES, 2000; MONTEIRO, 2001;
TARDIF, 2002), que busca apropriar elementos específicos elaborados pelo saber constituído pela
experiência. Dessa maneira, professores que atuam num mesmo nível de interesses, com discipli-
nas distintas, utilizam elementos característicos do conceito de multidisciplinaridade em relação
à aprendizagem do grupo com o qual atuam diretamente (LOUREIRO, 2003). Monteiro (2001) nos
chama a atenção ao considerarmos que “os saberes da experiência são os constituídos no exercício
da prática cotidiana da profissão, fundados no trabalho e no conhecimento do meio” (p. 130).
Este estudo pretende nos levar a refletir sobre as práticas pedagógicas dos professores de Ciên-
cias ao considerarem a relação com o contexto em que as vivências concretas de jovens e adultos
podem ser valorizadas no dia-a-dia da escola. O que se lê nas entrelinhas dos discursos que anali-
samos sobre as práticas pedagógicas das escolas observadas é que a escola para jovens e adultos
representa um espaço de convivência e oportunidades de experiências que conquista através do
diálogo, na busca de soluções educativas adequadas e diante dos conflitos culturais que afloram no
ambiente escolar. Como nos orienta De Vargas (2003):

O desenvolvimento de programas de formação de professores, que privilegiem


a compreensão da realidade plural, afim que eles possam, na atuação pedagógica,
servir de mediadores entre educandos e entre estes e os conhecimentos escolares,
visando a melhoria da aprendizagem (DE VARGAS, 2003, p.115).

Aliás, ações do PEJA privilegiam e oportunizam as trocas de experiências num diálogo constan-
te entre o discurso da escola e seus saberes específicos, buscando uma sintonia com os saberes
docentes e os saberes populares de forma que “o conhecimento produzido pela área de ensino de
Ciências passe a permear as ações docentes e se tornem objeto de estudo e discussão no currículo”
(DELIZOICOV, ANGOTTI & PERNAMBUCO, 2002, p. 41).

e pArA conclUir...
Os programas de formação docente em Ciências têm avançado lentamente, considerando a falta
de profissionais formados para elaborar e executar projetos ambientais e saúde para a Educação
de Jovens e Adultos. O desenvolvimento do saber ambiental e a dimensão da saúde aparecem em
várias temáticas do ensino de Ciências. Os eixos temáticos dos programas de EJA sinalizaram para a
importância de se trabalhar com os temas transversais. Observa-se que ainda são limitadas as estra-
tégias de ação de formação em serviço que estimulem o desenvolvimento de abordagens teórico-
-metodológicas que articulem os saberes dos alunos e os conhecimentos historicamente acumula-
dos nas várias disciplinas que integram os programas do Ensino Fundamental. Por isso, podemos
questionar o grau de interdisciplinaridade, pois ainda existe uma grande demanda por uma forma-
ção que permita aos professores em exercício promover uma prática num processo participativo
reflexivo.

597
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
referênciAs:
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BOURDIEU, Pierre. O capital social – Notas Provisórias. In: Escritos de educação. Petrópolis, Vozes,
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TARDIF, M. Saberes docentes e formação profissional. 2.ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.
VIEIRA PINTO, Álvaro. Sete lições sobre educação de adultos. 2ª ed. São Paulo: Autores Associados/
Cortez, 1984

598
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
reflexões sobre inclUsão sociAl, ensino e
AprendizAgem de língUA estrAngeirA e edUcAção de
joVens e AdUltos: A importânciA dA formAção do
professor.
josé

Nesse trabalho buscamos traçar algumas reflexões sobre a inclusão social, ensino e aprendiza-
gem de língua estrangeira e Educação de Jovens e Adultos. Levantamos algumas discussões per-
tinentes sobre a necessidade do acesso e oferta do ensino de língua estrangeira para o público da
EJA reiterando seu uso como uma ferramenta para a cidadania e inclusão social. Assim também, nos
debruçamos por entender algumas ações que se apresentam como entraves para o efetivo respeito
e entendimento da contribuição da aprendizagem da língua estrangeira para o alunado específico
da EJA. Além desses elementos nos debruçamos também em entender a importância da formação
do professor de línguas levando em conta seu entendimento, contato e desenvolvimento de meto-
dologias e estratégias específicas para se trabalhar a língua estrangeira junto ao público específico
da EJA. Esse trabalho nasce da experiência do trabalho de investigação que estamos desenvolven-
do no Mestrado Profissional em Educação de Jovens e Adultos pela Universidade do Estado da Bahia
junto aos cursos de licenciatura em língua estrangeira dessa mesma instituição. Buscamos através
dessas reflexões chamar a atenção para a importância do ensino de línguas para o público da EJA.
Respeitando suas necessidades e especificidades no processo de aquisição de uma segunda lín-
gua. Entendendo o acesso ao ensino e aprendizagem de línguas como uma ferramenta necessária a
qualquer cidadão do mundo contemporâneo e globalizado.

palavras-chave: Ensino de línguas, EJA, Inclusão Social, Formação do Professor

introdUção/contextUAlizAção
As reflexões apresentadas nesse trabalho são frutos de uma pesquisa que estamos desenvol-
vendo no Mestrado Profissional em Educação de Jovens e Adultos da Universidade do Estado da
Bahia (2013 a 2015) na qual buscamos entender a não contemplação dos estudos pertinentes à EJA
no projeto dos cursos de licenciatura em língua estrangeira da UNEB, traçando um olhar específi-
co sobre a disciplina de estágio, visando também investigar a formação do professor e buscando
sensibilizar para a importância do ensino de língua como uma ferramenta de inclusão social para o
público da EJA. Nesse processo, nos valemos de uma abordagem pautada na pesquisa qualitativa,
mais especificamente sob a pesquisa-intervenção defendida por Chizzotti (1991); os sujeitos da pes-
quisa envolvem os cursos de licenciatura em língua estrangeira da UNEB, com foco nos professores
de estágio e o principal objetivo da pesquisa é a inclusão da EJA nos projetos de curso de língua
estrangeira da UNEB.

reflexões necessáriAs sobre inclUsão sociAl e ensino de língUAs


estrAngeirAs pArA o público dA ejA
No contexto atual podemos perceber que cada vez mais as economias mundiais tendem a man-
ter entre si uma relação de interdependência. É imprescindível dentro dessa conjuntura socioeco-
nômica possuir um conhecimento de línguas estrangeiras para que os diferentes indivíduos possam
desenvolver e ampliar as condições necessárias e possibilidades de acesso ao conhecimento cientí-

599
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
fico e tecnológico produzido. Se pensarmos nesses aspectos podemos entender que para exercer a
cidadania é preciso se comunicar, conseguir encontrar informações, entender, interpretá-las e con-
sequentemente argumentar.
Podemos considerar o acesso à aprendizagem de línguas estrangeiras como um direito básico
de todas as pessoas e uma imprescindível ferramenta que responde às necessidades individuais e
sociais do homem contemporâneo. Este acesso não é somente uma forma de inserção no mundo
do trabalho, mas, sobretudo, uma forma de possibilitar a promoção da participação social, neste
contexto tem papel fundamental na e para a formação dos jovens e adultos.
É entendido que a língua estrangeira permite o acesso a uma variada gama de redes de comu-
nicação e a uma elevada quantidade de informações que estão presentes nos mais variados con-
textos da sociedade contemporânea. Dentro desse panorama, podemos perceber que a Língua Es-
trangeira (LE) torna-se um efetivo auxilio na compreensão de informações relativas principalmente
a questões políticas e sociais que deveras dependem de certa leitura crítica e interpretação das
informações veiculadas pelos diferentes meios de comunicação. Sendo assim, a LE possibilita a am-
pliação da compreensão das culturas estrangeiras e certamente da própria cultura, promovendo de
certa maneira o entendimento das diferenças, tais como as de expressão, de comportamento etc. Se
pensarmos em relação ao currículo, o ensino e aprendizagem de LE pode auxiliar no desempenho
de uma função interdisciplinar, tal acesso pode ajudar portanto no processo de reflexão sobre a re-
alidade social, política e econômica, em outras palavras, corrobora para a construção da cidadania.
Se tomamos como ponto de partida as afirmações citadas acima, dessa maneira, o ensino e
aprendizagem de LE deve valer para o aluno como a possibilidade de utilizar-se da língua para obter
acesso ao conhecimento no que concerne às diversas áreas da ciência, nos meios de comunicação,
no manejo e uso das novas tecnologias e efetivamente nas relações entre pessoas de culturas e
nacionalidades diferentes. As Diretrizes Curriculares da Educação Básica de Língua Estrangeira do
Estado do Paraná afirmam que:

Ao conceber a língua como discurso, conhecer e ser capaz de usar uma língua
estrangeira, permite-se aos sujeitos perceberem-se como integrantes da sociedade e
participantes ativos do mundo. [...] o aluno/sujeito aprende também como atribuir
significados para entender melhor a realidade. A partir do confronto para a própria
identidade. Assim, atuará sobre os sentidos possíveis e reconstruirá sua identidade
como agente social. (2008, p. 57)

Podemos então, diante dos fatos expostos, afirmar que o ensino de LE possui um papel impor-
tante na formação global dos alunos jovens e adultos, já que contribui para o desenvolvimento
da cidadania e participação social e consequentemente gera inclusão social. O estudo de uma LE
oportuniza a ampliação de possibilidade de conhecimento de outras culturas e, dessa maneira, tam-
bém, o desenvolvimento de um olhar crítico a respeito da cultura brasileira, reconhecendo nela seus
valores e diversidade.
Além dessas contribuições, podemos citar as de contexto linguístico que comprovadamente
através de diferentes estudos atestam que o contato com o ensino e aprendizagem de uma língua
estrangeira ajuda no desenvolvimento da leitura e da escrita como também no entendimento de
estruturas linguísticas e discursivas na própria língua materna do aprendiz. Se pensarmos especifi-
camente no público da EJA podemos perceber que o contato com o ensino e aprendizagem de uma
LE poderá de fato contribuir para o acesso a variadas formas de ascensão profissional, de opções de
lazer, de interesse pela leitura e escrita; ademais de construir-se como uma ferramenta que auxilia
para o desenvolvimento do entendimento da escola como um local no qual esse aluno da EJA terá
percepção da constituição de sua própria identidade. Isso é construir uma educação pensada para

600
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
a necessidade de um público específico e entender sua dimensão social e política. Para Gonçalves
(2009) a educação popular deve ser

[...] impulsionada pela investigação em torno do universo de vida e de pensamen-


to dos educandos, e pela construção de uma sociedade fundada no diálogo e visua-
lização da dimensão política implicada na educação. (p. 20)

No contexto da contribuição profissional, a LE servirá como um instrumento de auxilio tanto no


que se refere ao alcance de conhecimentos disponibilizados somente em outras línguas como tam-
bém no desenvolvimento de instrumentos linguísticos que os permitirão atuar de maneira satisfa-
tória e com independência podendo interpretar e expressar-se em língua estrangeira em situações
tais como: entrevistas para um emprego, leituras científicas específicas, classificados, escrita de cur-
rículos, cartas de apresentação, provas de exame como os do ENEM, provas de vestibular, sites varia-
dos de países estrangeiros, intercâmbios entre outros tantos que poderíamos citar aqui. Além de ser
uma ferramenta que auxiliará na compreensão e domínio de seu próprio idioma e cultura.
Se fizermos uma reflexão no que se relaciona ao mundo das novas oportunidades e de questões
relacionadas ao lazer e cultura, podemos afirmar que o ensino e aprendizagem de línguas estrangei-
ras para o público da EJA pode de fato contribuir para uma conquista palpável nessas distintas áreas
mencionadas. Nesse contexto, proporcionará ao alunado da EJA uma possibilidade de leituras mais
críticas de jornais, diferentes tipos de periódicos, revistas, ademais de poder contribuir para uma
compreensão maior de filmes, documentários, seriados, novelas, entre tantos outros.
Tendo assim, seu interesse pela leitura e escrita bem desenvolvidos e oportunizando esse contato
com tais textos em LE o alunado da EJA poderá desenvolver dessa maneira base para leituras críticas
da realidade e consequentemente tudo isso lhe servirá como um insumo para a criação e desenvol-
vimento de novos textos. Dessa maneira, tais procedimentos podem também ajudar na feitura de
textos dirigidos a necessidades específicas como por exemplo relatórios de atividades, mensagens,
currículo vitae, dentre outros. Em relação a essa questão da importância da leitura, Gonçalves afirma
que:

As estatísticas sobre o acesso à leitura e à escrita dos brasileiros, ao longo do sécu-


lo XX, fortalecem as inquietações dos historiadores, sociólogos e educadores, entre
outros, interessados em pensar um país democrático, um país capaz de integrar os
grandes contingentes de brasileiros, de imigrantes, frente às oportunidades de mu-
dança social. (2009, p.21)

Outra questão relevante é o trabalho na aula de LE para a construção da percepção da escola


como espaço constituinte da formação da identidade desse alunado uma vez que o mesmo através
dessas aulas pode-se sentir integrante de uma comunidade de linguagem. Para Filho (2000), a edu-
cação de jovens e adultos deveria valorizar as competências sociais dos adultos. Para o autor, esse
procedimento cobra do professor um diálogo aberto com o adulto, permitindo que assuntos de seu
interesse imediato, de sua experiência de vida, de sua oralidade e suas aspirações apareçam em sala
de aula. Consequentemente, os textos em língua estrangeira trabalhados devem de alguma manei-
ra tentar sempre possibilitar esse diálogo aberto com o adulto e temáticas pertinentes a seu mundo.
É fundamental que percebamos que as ações que implicam a maneira como esse alunado en-
tende os textos, sejam eles lidos ou ouvidos ou na produção de novos textos poderão gerar ações
e práticas de sua participação em um contexto social e crítico mais amplo que estarão imbricadas
intimamente na e para a formação dos mesmos como cidadãos atuantes em sua sociedade promo-
vendo assim processos de inclusão social.

601
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
Dentro desse contexto, de maneira muito parecida quando se trabalha com temas transversais
nas práticas de sala de aula, pode-se dar a esse alunado a possibilidade de ter um espaço onde per-
ceberão as formas de agir no mundo e sua relação quanto à participação efetiva como cidadãos. Em
outras palavras, esse ensino de línguas deve ser trabalhado de maneira natural e contextualizada
com o mundo do público da EJA. Para Figueiredo (1997, p.30) “a aquisição de uma segunda língua
requer uma comunicação natural, pois os falantes não estão preocupados com forma de suas sen-
tenças, mas sim com as mensagens que estão exprimindo e entendendo”.
Sendo assim, o alunado da EJA terá a oportunidade de participar da construção do conhecimen-
to em conjunto, utilizando-se de sua própria história como uma fonte de e para a aprendizagem.
Nesse contexto, o ensino e aprendizagem de línguas colabora para uma educação permanente e ao
longo da vida. (FREIRE 1993), (BRANDÃO 2002).
A preferência pelo ensino de formas gramaticais, funcionais ou lexicais descontextualizados do
mundo do público da EJA só implicará, quando conseguir implicar, na formação de um alunado
que repete formulações aprendidas mas não entende a relação destas com as necessidades de seu
cotidiano. Em outras palavras, não são capazes de executar uma voz crítica diante de sua sociedade
uma vez que mais parecem ‘imitadores’ do que cidadãos preparados para uma sociedade contem-
porânea, competitiva e globalizada na qual se exige um trabalhador que saiba envolver-se nas ne-
cessidades do mundo do trabalho e poder impor-se, mostrando sua voz e a vez.
O professor e a escola, mesmo que de uma maneira não proposital, acabam promovendo uma fu-
tura exclusão social em um público que já enfrenta tantos outros processos que por fatores sociais,
históricos ou culturais os colocam em posição de exclusão, tais como a idade avançada, dificuldades
no domínio da norma culta da língua, pertencimento a famílias numerosas, pobres e em sua maioria
afrodescendentes. Em relação a essa questão específica, Nilza Gomes defende que:

Os negros e as negras são, na maioria das vezes, os principais sujeitos da EJA no


Brasil. No entanto, essa forte presença negra não tem sido suficiente para garantir a
realização de um trabalho pedagógico e de uma discussão séria e competente sobre
a questão racial na educação de jovens e adultos. (2005, p.93)

É triste perceber quando o próprio professor de LE tende a ter um olhar ‘preconceituoso’ so-
bre seu alunado de EJA, interpretando que por esse ser um público cujo alunado já tem uma ida-
de maior, muitos são trabalhadores, alguns aposentados, alguns por variados motivos não tiveram
acesso ao ensino na idade regular não teriam condições ou capacidade para enfrentar estruturas
mais complexas e contextualizadas em sala de aula. Dentro de todo esse processo, some também a
auto exclusão do alunado da EJA que muitas vezes vê como desnecessário a aprendizagem de uma
segunda língua baseando essa ideia em sua idade ‘avançada’. Nesse contexto, Mosiana Silva 10afir-
ma que:

Outro fator preocupante para os alunos da EJA é que eles se sentem incapazes
de aprender esta língua por terem idade avançada. Muitos reclamam que não tem
mais paciência para aprender “isso” e que não conseguem pronunciar as palavras. É
preciso motivar esses estudantes e levantar a autoestima deles, mostrando que são
capazes sim, pois a idade não é fator tão relevante quando a pessoa sente-se moti-
vada a aprender determinado assunto. A idade pode determinar o modo pelo qual
o indivíduo aprende uma segunda língua. Mas as oportunidades para a aprendiza-
gem, a motivação para aprender, e as diferenças individuais são também fatores
determinantes para o sucesso na aprendizagem. (2010, p.44)
10 Disponível em http://rioverde.ifgoiano.edu.br/periodicos/index.php/vidadeensino/article/view/374/187

602
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
Em outras palavras, um ensino sem desafio, aprendizagem sem desafio e vida sem desafio. Sendo
assim, ‘criam-se’ alunos que aplicam regrais gramaticais de maneira mecânica, contudo, sem ferra-
mentas necessárias para desenvolver procedimentos ou estratégias de compreensão ou produção
de textos, e, além do mais, alunos que não serão capazes de entender a relação e importância da
aprendizagem da língua estrangeira para a formação de um cidadão pós-moderno, preparado para
o mundo do trabalho, engajado crítica e politicamente, entendedor das mais variadas culturas em
geral.
Diante de todos esses benefícios conseguidos através do ensino de língua estrangeira, acredita-
mos inclusive que este ensino possa ajudar no processo para a diminuição do analfabetismo e do
analfabetismo funcional, problemática que segundo as últimas pesquisas do IBGE estima-se que
atinge um (1) em cada cinco (5) brasileiros atualmente. Para Oliveira (2009), o analfabetismo se cons-
titui como um indicador cultural que nomeia formas de diferenças de capacidades individuais e de
classes sociais. Sendo uma ferramenta que contribui para o desenvolvimento linguístico e comuni-
cacional defendemos que o estudo de uma segunda língua possa somar-se a outras ferramentas da
erradicação e diminuição do analfabetismo em suas mais variadas acepções.
Para que consigamos de fato contribuir para o processo de inclusão social do público de jovens
e adultos é necessário que as aulas de língua estrangeira sejam planificadas sob o prisma de uma
abordagem sociointeracional de linguagem, esse procedimento dará condições que a LE seja um
meio de interação entre os sujeitos de uma comunidade e seus mais variados contextos. Ou seja,
essa abordagem de ensino primeiramente respeita o indivíduo e lhe dá condições de participar de
uma visão dialógica podendo dessa maneira situá-los histórica, social e culturalmente. (ARROYO,
2005)
Se inclusive tomarmos teorias como a do letramento baseados em estudos como os de Street
(1984); Kleiman, (1995); Soares (2004, 2006) e as de educação linguística como as de Bagno e Ran-
gel, (2005); Brito, (1997, 2003, 2007) poderemos observar que o ensino e aprendizagem de língua
estrangeira sob uma perspectiva de letramento pode de fato gerar inclusão social principalmente se
partimos do pressuposto que esse processo lhe dará acesso à língua e consequentemente às formas
cultas da língua e ter acesso à língua é ter acesso às oportunidades, é ter acesso ao poder. (BARTHES,
1997), (FOUCAULT, 1996, 2006, 1979 )
Segundo os PCNs de Língua Estrangeira (1998), um dos objetivos gerais do ensino de LE é a orien-
tação para a sensibilização do aluno para o mundo multilíngue e multicultural, desenvolvendo a
compreensão global (escrita e oral). Se tomarmos o caso específico da língua espanhola, as Orien-
tações Curriculares para o Ensino Médio, Conhecimento de Espanhol (Linguagens, códigos e suas
tecnologias), nos chamam a atenção sobre “[...] o papel educativo que pode ou deve ter o ensino de
línguas, em especial do Espanhol, na formação do estudante, naquilo que este lhe proporciona em
termos de inclusão social e étnica, na constituição de sua cidadania” (p. 129). Sendo assim, o ensino
e aprendizagem de língua estrangeira viabiliza processos de inclusão social uma vez que promove a
prática social através da possibilidade de compreender/expressar, oralmente e por escrito: opiniões,
sentimentos, valores e informações. Lopes (2003, p.43) nos diz que:

A aula de língua estrangeira deve ser um espaço de acesso a diversos discursos


que circulam globalmente, para construir outros discursos alternativos que possam
colaborar na luta política contra a hegemonia, pela diversidade, pela multiplicidade
da experiência humana, e ao mesmo tempo, ela colaborar na inclusão, de muitos
brasileiros que estão excluídos de conhecimentos indispensáveis ao convívio con-
temporâneo.

Também, resulta que oferece oportunidades de perceber, experenciar a comunicação como troca

603
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
de ideais, de valores culturais, e também consegue estimular o aluno na continuidade de seus es-
tudos e possibilita-os comparar suas experiências de vida com as de outros povos. Partindo desses
pressupostos, podemos afirmar que o ensino de línguas estaria intimamente ligado às questões da
cidadania. Esse processo de entender a cidadania como um processo de e para a inclusão é defendi-
da por Blanco11 quando nos leva a refletir sobre a relação entre educação e cidadania.

Além dos atuais desafios de garantir direitos e uma inclusão pelo viés da cidada-
nia a uma população historicamente marginalizada, compreender as expectativas
de mobilidade e integração social dos atores envolvidos, bem como seu imaginário
sobre os limites e possibilidades das políticas de inclusão a eles destinadas, também
torna-se urgente e relevante para a efetividade de programas que tem como finali-
dade a diminuição das desigualdades sociais oferecendo oportunidades de acesso
à educação, trabalho e cidadania para populações em situação de pobreza. (p.11)

Nesse mesmo contexto, Jordão explica que:

Aprender e ensinar uma língua estrangeira, portanto, aparece nessa perspectiva


como elemento extremamente importante na formação dos cidadãos. É na língua
que as pessoas se inserem nas relações políticas locais e mundiais, e é nela também
que são promovidos nossos entendimentos dos outros e de nós mesmos, bem como
do que há ou não há de nós em outros e de outros em nós. É na língua, particu-
larmente na língua estrangeira, que nos deparamos mais abertamente com nossa
alteridade, que encontramos e confrontamos o diferente, que podemos ampliar sig-
nificativamente nossa percepção das formações discursivas que nos permeiam, e a
partir do confronto promovido entre elas, construir sempre novos procedimentos
interpretativos. (2007, p.28)

formAção do professor de língUAs e A ejA


Diante de todo esse contexto e da importância no âmbito social e econômico do ensino e apren-
dizagem da língua estrangeira para o público da EJA, urge uma discussão sobre a formação do pro-
fessor de língua estrangeira. Se dermos uma olhada, ainda que parcial sobre o currículo dos cursos
de língua estrangeira, mais especificamente seus programas de disciplina, poderemos perceber que
a educação de jovens e adultos pouco aparece, é discutida ou faz parte desse ementário.
Se tomarmos como exemplo a disciplina de estágio que normalmente é oferecida nas etapas fi-
nais dos cursos de licenciatura em línguas, que em algumas universidades é dividida em estágio I, II,
III e IV e dermos uma olhada específica sobre seu programa de disciplina poderemos perceber que
em muitas universidades não se dá esse contato e reconhecimento junto ao público da EJA.
Essas reflexões aqui apontadas sobre a formação do professor de língua estrangeira parte de
pressupostos baseado em uma pesquisa que estamos desenvolvendo no Mestrado em Educação de
Jovens e Adultos da Universidade do Estado da Bahia na qual buscamos entender os porquês da não
contemplação dos estudos concernentes à EJA no programa dos cursos de licenciatura em língua
estrangeira da UNEB, observando principalmente as disciplinas de estágio.
Podemos perceber que não somente na universidade citada mas em muitas outras universidades
brasileiras o graduando em língua estrangeira muitas vezes sai da universidade sem nenhum conta-
11 Disponível em http://www.rbhcs.com/index_arquivos/Artigo.O%20ProJovem%20na%20trajet%C3%B3ria%20das%20
pol%C3%ADticas%20para%20juventude.pdf

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
to e entendimento do que é a EJA. Não sabem sobre o público que a compõe, suas especificidades e
necessidades, além de não ter possibilidade de acessar ferramentas específicas do trabalho em sala
de aula junto ao público da EJA.
Em resumo, a universidade forma professores em língua estrangeira que tiveram contato e enten-
dem o público do ensino fundamental e do ensino médio em geral, mas não possuem nenhuma ou
pouquíssima noção da EJA.
Esse mecanismo é ainda mais complexo e profundo se tomarmos como premissa que muitos dos
professores que lecionam a disciplina de estágio, por exemplo, em sua formação não tiveram acesso
e entendimento sobre a EJA, dessa maneira essa falta de um conhecimento específico é refletido em
sus própria disciplina, isso dá-se por não terem habilidades específicas para compartilhar junto aos
graduandos às especificidades e necessidades da EJA no processo de ensino de aprendizagem de
uma língua estrangeira e sua preparação prática, teórica e metodológica para a sala de aula junto ao
público da educação de jovens e adultos.

AlgUmAs considerAções finAis e resUltAdos obtidos


Os resultados observados a partir da pesquisa citada ainda são preliminares, mas podemos levan-
tar e apresentar algumas questões importantes que logramos durante essa fase de nosso trabalho.
Tivemos o depoimento de alguns professores que afirmaram passar a incluir os estudos pertinentes
à EJA dentro de seus programas de disciplina. Como escolhemos trabalhar especificamente com os
professores de estágio pudemos perceber na prática de aula de alguns deles o desenvolvimento de
discussões pertinentes à educação de jovens e adultos. Foi-nos relatado também a experiência de
alguns professores de estágio, especificamente nas disciplinas de estágio III e IV, que pela primeira
vez encaminharam alunos no período de estágio para que lecionassem em turmas da EJA.
Alguns professores de estágio se utilizaram das oficinas de formação que foram oferecidas den-
tro do processo dessa pesquisa e desenvolveram questionamentos apreendidos com seus alunos
durante suas aulas. Em relação às questões aprendidas nas oficinas teóricas, os professores nos re-
lataram que puderam falar com maior propriedade em sala de aula sobre as necessidades e espe-
cificidades do público da EJA e em relação ao aprendido nas oficinas metodológicas alguns desses
professores relataram poder com segurança debater técnicas, instrumentos e métodos mais ade-
quados para se trabalhar a língua estrangeira junto ao público específico da EJA.
Também, nos foi relatado por esses professores que as discussões, reflexões e atividades desen-
volvidas através das oficinas conseguiram desenvolver uma maior consciência crítica sobre a função
social do ensino de línguas para o público da EJA.
Um dos resultados pretendidos por essa pesquisa que é a inclusão permanente da EJA no projeto
dos cursos de L.E da UNEB ainda está em processo de efetivação. Pretendemos que com a experiên-
cia dessa pesquisa tal resultado possa ser alcançado com a maior brevidade.
O ensino de línguas estrangeiras no contexto do ensino da educação de jovens e adultos pode
promover a inclusão social desde o momento em que professores considerem as representações
que este alunado tem da escola, da aprendizagem e de si mesmos. Nesse processo os alunos da
EJA podem tornar-se capazes de ampliar suas fronteiras e se sentirem instigados a buscar novos co-
nhecimentos. Em outras palavras o acesso ao ensino e aprendizagem de línguas estrangeiras pode
ser uma ferramenta de inclusão possibilitando estratégias de acesso a esse alunado à autonomia, à
interação comunicacional em um mundo globalizado, leituras diversificadas em outro idioma, am-
pliação cultural a partir do entendimento da existência, complexidade e riqueza de outros povos e
culturas.
Por outro lado também é necessário a contribuição de políticas públicas que viabilizem o acesso,
contato e oferta do ensino de línguas estrangeiras ao alunado da EJA. Este processo envolve os pro-

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Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
fessores formadores distribuídos nas mais diversas universidades e faculdades que tem o curso de
língua estrangeira, as Universidades, envolve os futuros licenciados que precisam entender a impor-
tância social do ensino de línguas para esse público, diretoras de escolas, secretários de educação e
porque não o próprio alunado da EJA que precisa ter acesso aos seus direitos assegurados e baliza-
dos pelos documentos oficiais como LDB, PCNS, OCEM que afirmam e asseguram a necessidade do
acesso ao ensino e aprendizagem de língua estrangeira como um direito do cidadão inserido em um
mundo globalizado, multicultural e competitivo.
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607
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
regrinhAs, continhAs e probleminhAs: desAfios nA
formAção de professores de mAtemáticA dA ejA
AndréA thees

Este trabalho apresenta um recorte da pesquisa de mestrado “Estudo com professores de mate-
mática de jovens e adultos sobre suas práticas profissionais”, orientada por Maria Cecilia Fantinato e
defendida no Programa de Pós-Graduação em Educação da UFF no ano de 2012. De natureza quali-
tativa, a investigação utilizou-se de um estudo de caso como metodologia, apoiando-se nos referen-
ciais teóricos de Lüdke e André (1986), Bogdan e Biklen (1994) e Becker (2007), além de aproximar-se
do método de pesquisa “com” o cotidiano, como nos falam Garcia (2003), Ferraço (2007) e Ribetto
(2009). Procurou-se, então, vivenciar as práticas letivas de gestão curricular de três professores de
matemática que lecionavam em turmas de educação de pessoas jovens e adultas. A interação com
este cotidiano permitiu constatar a predominância de uma prática de gestão curricular marcada
pelo ensino direto e expositivo, com a transmissão do conhecimento unidirecional do professor
para o aluno, voltado à condução do discurso e à realização de exercícios pouco desafiantes, um
possível reflexo das lacunas deixadas pela formação inicial e da ausência de formação continuada.
Neste contexto, os professores participantes tornaram-se reféns de um sistema perverso e exclu-
dente, que continua garantindo a “pasteurização” dos educandos (D’AMBROSIO, 2002) fazendo com
que a gestão do currículo de matemática naquele cotidiano esteja longe de ser inovadora, dificul-
tando ainda mais a tão esperada reconfiguração da EJA (ARROYO, 2007).

palavras-chave: gestão curricular, educação matemática, práticas cotidianas

introdUção Ao problemA
Considerando que a Educação Básica, incluindo a modalidade de Educação de Jovens e Adultos
– EJA deve preparar o indivíduo para que ele seja um cidadão pleno e crítico em relação ao mundo
que o cerca (SKOVSMOSE, 2007), torna-se fundamental que a formação de professores contemple
discussões para que o ensinoaprendizagem de matemática não se prenda a um currículo mínimo
imposto, mas que contemple concepções de conhecimento menos fechadas, mais abertas às dúvi-
das e indagações.
Ponte e Serrazina (2004) sustentam que as práticas letivas são um dos fatores que mais influen-
ciam no ensinoaprendizagem dos alunos. Vale dizer, que no caso da educação de pessoas jovens e
adultas, existem ainda outras particularidades que devem ser levadas em consideração. Por exem-
plo, para atender à redução do período letivo, os conteúdos na EJA passam por uma seleção com-
pactada e realizada aleatoriamente. Em aulas infantilizadas (FANTINATO, 2006) estes conteúdos são
ensinados de maneira inadequada, acarretando com isto desconfortos e constrangimentos, perda
de referência ou desinteresse dos alunos. Daí decorre e redunda uma série de problemas relevantes,
como o fracasso na escolarização tardia e o afastamento do aluno, ou seja, sua exclusão do sistema
escolar, como apontado por Fonseca (2005, p. 34). Esta inadequação é agravada pelas precarização
do trabalho docente, seja através das lacunas deixadas pela formação inicial, sejam pelas políticas
públicas que não conseguem suprir a demanda pela formação continuada. Além disso, restrições
de ordem material e ligadas à estrutura escolar, limitam e condicionam as práticas profissionais dos
professores de EJA.
Este pode ser um indício promissor para a reconfiguração da EJA: as universidades em suas fun-
ções de ensino, pesquisas e extensão se voltam para a educação de jovens e adultos (ARROYO, 2007).
Políticas públicas, que vão desde a disponibilização de material didático até os cursos de formação

608
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
continuada para professores, têm sido elaboradas e implementadas. Mas, como será que estas ações
estão sendo concretizadas?

UmA formAção qUe considere UmA edUcAção mAtemáticA VoltAdA


pArA ejA
Ensinar matemática para adultos tem um significado bastante distinto de ensinar matemática
para outra faixa etária. A maturidade do educando faz diferença, pois, fundamentada na experiên-
cia, os saberes e as aplicações da matemática são a extensão do seu próprio viver. De Vargas (2003,
p. 123) aponta que “os professores de EJA devem estar permanentemente atentos ao desafio de
compreender os processos pelos quais seus alunos (...) construíram seus saberes fora dos ‘muros’ da
escola”. Para isto, torna-se fundamental compreender esta pluralidade visando uma intervenção me-
diadora, por parte dos professores, e que permita aos alunos da EJA uma ação crítica e participativa
no mundo contemporâneo.
Buscar melhores maneiras de trabalhar com seus educandos, tendo como meta desenvolver ci-
dadãos capazes de integrar a sociedade atual e gerir suas decisões, é tão ou mais importante para
a formação dos grupos populares do que o ensino de determinados conteúdos. Ao fortalecer uma
prática em educação matemática, que considera incluir como conteúdo curricular as questões so-
cioculturais, efetiva-se um processo educativo humanista e emancipatório pautado na sociedade e
na cultura (D´AMBROSIO, 2011), o qual compreende, igualmente, uma dialogicidade para uma edu-
cação “intencionalmente” libertadora (FREIRE, 1996).
Uma prática em educação matemática voltada para perceber o caráter ativo, indagador e pesqui-
sador do educando, assumindo sua consciência reflexiva, desdobra-se no ato educativo “de reco-
nhecer ou de refazer o conhecimento existente ou de desvelar e de conhecer o ainda não conheci-
do” (FREIRE, 2011, p. 160). Abrange ainda, legitimar a participação dos alunos da EJA, aproveitando
para aprofundar situações surgidas espontaneamente durante as aulas, originadas ou não no coti-
diano de educandos e educadores. Segundo Skovsmose (2007, 67), uma educação matemática é
crítica se pode “desempenhar um papel importante na interação com muitos outros fatores e atores
sociopolíticos”. Nesta mediação, a educação matemática pode convergir para uma educação socia-
lista ao ser realizada pensando-se em, segundo Mészáros (2009, p. 83) “fazer os indivíduos viverem
positivamente à altura dos desafios das condições sociais historicamente em transformação”.
Este movimento de ser mais transparente, de lidar com o lado político dos temas da realidade, de
provocar a discussão de outras questões na educação matemática, exige dos professores a certeza
de que podem interferir nos conteúdos curriculares oficiais. Como nos diz Paulo Freire (1996, p. 30),
tratando, porém, de estabelecer uma “intimidade” entre os saberes curriculares fundamentais aos
alunos e a experiência social que eles têm como indivíduo. Através de interrogações, o autor nos
leva a refletir:

Por que não discutir com os alunos a realidade concreta a que se deva associar
a disciplina cujo conteúdo se ensina, a realidade agressiva em que a violência é a
constante e a convivência das pessoas é muito maior com a morte do que com a
vida? Por que não discutir as implicações políticas e ideológicas de um tal descaso
dos dominantes pelas áreas pobres da cidade? A ética de classe embutida neste des-
caso? (ibdem)

A prática letiva entendida como transferência do saber, com foco no ensino dos conteúdos, ne-
gligencia o caráter socializante da escola. Sem a admissão de uma concepção sociopolítica desti-
nada às camadas populares, os sistemas de educação orientados à “preservação acrítica da ordem
estabelecida a todo custo” continuarão compatíveis “com os mais pervertidos ideais e valores edu-

609
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
cacionais12” (MÉSZÁROS, 2009, p. 83). A educação matemática crítica pode potencializar o desenvol-
vimento dos “temas sociais” em apoio aos ideais democráticos. Todavia, “como ela pode operar em
relação aos ideais democráticos dependerá do contexto, da maneira como o currículo é organizado,
do modo como as expectativas dos estudantes são reconhecidas, etc.” (SKOVSMOSE, 2007, p. 72).

métodos e cAminhos percorridos nA pesqUisA


O recorte que aqui apresento, acerca da gestão curricular de matemática na EJA, originou-se
numa pesquisa de mestrado que procurou investigar, em profundidade, como os professores de
matemática desenvolvem suas práticas profissionais no trabalho com essa disciplina, em turmas de
pessoas jovens e adultas. Para tal, considerei o estudo de caso como a abordagem qualitativa mais
adequada, tal como foi definido por Bogdan e Biklen (1994) e Lüdke e André (1986), na medida em
que facilitaria o acesso às especificidades, ações e decisões dos professores pesquisados. Adotei
também a postura de Becker (2007, p. 132), a qual insiste em “que os pesquisadores devem aprender
a questionar, a não aceitar cegamente o que pensam e acreditam as pessoas cujo mundo estudam”,
e complementa revelando que “ao mesmo tempo, devem prestar atenção apenas a isso. Afinal, as
pessoas sabem muito sobre o mundo em que vivem e trabalham.”
Além dos aportes metodológicos escolhidos, percebi que a investigação a qual eu estava reali-
zando apresentava também algumas características de pesquisas com o cotidiano (GARCIA, 2003;
RIBETTO, 2009). Estando atenta às situações do dia a dia, foi possível selecionar ocasiões mais reve-
ladoras do que questionamentos teóricos e ir além, pois

na sala de aula a teoria se atualiza, confirmada ou negada, na busca de soluções


para o que enfrentam sujeitos empenhados em ensinar e aprender. Nenhuma teoria
dá conta da totalidade de tão complexo processo. Explica alguma coisa, mas não
explica outras, exatamente porque cada sujeito e cada situação são únicos, diferen-
tes do já conhecido e teorizado. (GARCIA e ALVES, 2006, p. 16)

Desde o início desta investigação, no primeiro dia de entrada no campo, percebi a impossibili-
dade de manter-me neutra como pesquisadora, dissociada das relações das redes do cotidiano. E
foi após meses de idas e vindas ao campo, que as dimensões “do praticado”, “do vivido”, “do usado”
(FERRAÇO, 2003, p. 163) e do habitual começaram a ser parte fundamental da pesquisa “com” aquele
cotidiano.
Investigar o cotidiano escolar parece ser uma tendência que indica a necessidade de pesquisar
para indagar, constatar, intervir e comunicar do professor. Este cotidiano está repleto de situações
ou momentos carregados de aspectos que merecem ser analisados detalhadamente. Assumindo a
educação matemática como uma prática social, segui a abordagem destes autores, lembrando que
a importância do trabalho de campo está no momento em que este fornece elementos que nos
permitam compreendê-la.

recorrendo às regrinhAs, continhAs e probleminhAs


Durante a investigação, ficou evidente que os professores participantes desconheciam a Propos-
ta Curricular para a Educação de Jovens e Adultos do Segundo Segmento do Ensino Fundamental
(BRASIL, 2002). Um deles lembrou que, no início de 2011, ouviu falar numa tentativa de estruturação
curricular para a EJA, mas que não havia se concretizado.

Na EJA eles estão estruturando, mas... Foi até complicado fazer um planejamento
12 Grifos do autor.

610
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
pra esse ano. Falaram que iam impor (o currículo mínimo) na EJA, mas não... Ficou a
coisa meio mal-ajambrada, né? Eu até pesquisei no site da Secretaria de Educação o
que eles sugeriam, mas achei nada pra EJA...

Por esta razão, o planejamento de matemática para a EJA era elaborado priorizando os conteú-
dos considerados “absolutamente indispensáveis e básicos para o período seguinte”. Os professores
alertavam para a redução do período letivo na EJA, que impede a adoção de um currículo mais
completo e afirmavam ainda que “a falta de material didático adequado para apoiar o professor nas
aulas, restringe ainda mais o currículo em si”.
Apesar do discurso recorrente em relação à autonomia do professor que atua na EJA, as propos-
tas curriculares nacionais foram elaboradas, segundo Ventura (2008, p. 125), como sugestão13 para
os sistemas de ensino. Contudo, a Proposta Curricular para a Educação de Jovens e Adultos, para o
Primeiro Segmento, publicada em 1996, e para o Segundo Segmento do Ensino Fundamental, publi-
cada em 2001, são, na verdade, mecanismos criados com funções meramente regulatórias. A autora
confirma a situação afirmando que

Não devemos deixar de considerar o fato de que, em virtude dos diferentes graus
e dificuldades enfrentadas pelos sistemas de ensino no que se refere ao financiamen-
to, material didático, formação de professores e, particularmente, à própria visão
supletiva sobre a EJA, qualquer documento elaborado e distribuído pelo MEC torna-
-se, via de regra, quase a única referência. (VENTURA, 2008, p. 125)

Ao oferecer o mesmo currículo num mesmo segmento, chegando ao absurdo de se propor currí-
culos nacionais, tem-se contribuído para “a marginalização de saberes não hegemônicos” (DUARTE,
2004, p. 188) e garantido a tentativa de “pasteurizar as novas gerações” (D´AMBROSIO, 2002, p. 11).
Daí a importância do professor realizar uma gestão curricular que implique na (re)construção do
currículo oficial, tendo em conta os seus alunos e as suas condições de trabalho.
Considerei, conforme descrito por Ponte (2005, p. 11-12 e 24), que as práticas letivas de gestão
curricular se manifestam em três níveis: o nível “macro”, o “intermediário” e o “micro”. Segundo o au-
tor, “a gestão curricular começa no planejamento da unidade”, que ele entende como nível macro,
passa ao nível intermediário “da preparação da aula ou da semana de trabalho”, e culmina com “a
gestão de ensinoaprendizagem em tempo real, feita no decorrer da própria aula”, considerado por
ele como nível micro.
Em nível macro, identifiquei que os objetivos curriculares mais valorizados pelos professores pes-
quisados são ajudar os alunos jovens e adultos no seu dia-a-dia e possibilitar a continuidade dos
seus estudos. Para alcançá-los, esses professores elaboram o planejamento da unidade mesclando
sua própria autonomia com o trabalho em equipe, selecionando conteúdos com os quais os alunos
tenham identificação. Ou seja, temas que ancoram as vivências dos alunos e a experiência dos pro-
fessores, conforme dito por um professor, “para eles poderem se sentir não tão longe da realidade”,
pois “não adianta você colocar um assunto que eles não vivenciam”.
A organização da gestão curricular em nível intermediário é coerente com o modo de organi-
zar a gestão curricular em nível macro, levando em conta os objetivos de relacionar os conteúdos
matemáticos com a vida cotidiana dos alunos e viabilizar a continuação dos estudos. Todavia, me
chamou atenção a constante preferência pelo ensino direto14, uma estratégia que está pautada
na pedagogia tradicional e valoriza a transmissão e preservação dos conteúdos. Neste enfoque, o
professor introduz um novo conteúdo, um novo conceito, um novo procedimento, através de uma
13 Grifo da autora.
14 Segundo Ponte (2005, p. 12), “uso o termo ‘ensino direto’ por ser aquele que, a meu ver, melhor representa esta perspectiva
de ensino, que pressupõe uma transmissão unidirecional do conhecimento do professor para o aluno”.

611
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
apresentação oral, priorizando a abordagem verbalista e expositiva, dando exemplos e, normalmen-
te, colocando questões para os alunos resolverem.
A aula narrada a seguir pode ilustrar a preferência pelo ensino direto aconteceu numa turma do
8º ano da EJA. O professor da turma havia ensinado anteriormente o conteúdo de expressões algé-
bricas e a aula era uma espécie de revisão. Estavam presentes sete alunos e aos poucos chegaram
mais três, totalizando dez alunos. Na figura a seguir, estão os exercícios colocados no quadro de giz
para serem copiados por eles.
Resolva:
(– 7x) + (+ 4x) =
(– 10x) + (– 8x) =
(– 5x) . (– 2x) + ( + 3x) =
(– 7x) . (– 5x) =
(+ 3x) . (– 2y) =
(+ 4x) . (+ 2x) + (+ 5x) =
(– 2x) . (– 3y) – 5xy =
Os alunos foram resolvendo os exercícios e tirando suas dúvidas. O professor foi corrigindo en-
quanto explicava. Pedia para os alunos estudarem, em suas próprias palavras, “as regrinhas que fo-
ram ensinadas antes” e, ao acabar a correção dos exercícios, apagou o quadro, recomeçando a es-
crever outros exercícios muito semelhantes aos anteriores. Durante minhas idas ao campo observei,
excetuando um detalhe ou outro, aulas com características muito semelhantes às desta aula.
Constatei assim, a predominância de um estilo de gestão curricular voltado à condução do dis-
curso e à realização de exercícios pouco desafiantes. Respaldada por estas justificativas, considerei
que a escolha desta estratégia de ensino pode ter sido motivada pelo tempo reduzido de aula, ou
ainda, pela falta de formação para lecionar matemática na educação de jovens e adultos. De um
modo geral, isto poderia levar esse professor a recorrer ao ensino direto como metodologia, por lhe
trazer mais segurança e controle.
A gestão curricular no nível micro se baseia numa avaliação feita e atualizada a cada momento
no decorrer na aula, num processo de monitoração do trabalho. Neste nível de interação professor-
-aluno, a gestão curricular pode ser tratada como “o modo como o professor concretiza a estratégia
definida, tanto para a unidade como para a aula (...) e a adapta às condições concretas e à resposta
que vai obtendo dos seus alunos” (PONTE, 2005, p. 22). A atuação do professor nesta instância pode
promover a inserção de temas, que foram originados espontaneamente durante a aula, no currículo
original.
Voltando à aula observada, a turma estava silenciosa e o professor esperava os alunos termina-
rem de copiar os exercícios resolvidos quando um aluno iniciou o seguinte diálogo:
Aluno A: – Professor, outro dia eu vi um negócio numa placa. Tinha uns números
e uma letra. Tava escrito sete zero zero eme elevado a dois, assim mesmo tudo junto.
Professor: – Numa placa? Onde? Tinha mais alguma coisa escrita?
Aluno A: – Tinha escrito “aluga-se”, tava numa loja lá no shopping.
Professor: – Ah! Então era a medida da área da loja, setecentos metros quadrados,
entendeu?
Aluno A: – Sei lá, professor?!?
E escreveu no quadro: 700 m2

Deste momento em diante, o diálogo se transformou numa conversa animada com


vários interlocutores participando ativamente:

612
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
Aluno A: – Deve ser quanto o aluguel desse troço?
Aluna B: – No shopping? Deve ser uma nota!
Aluno A: – Lá perto de casa, uma casinha com quarto, banheiro e cozinha tá uns
quinhentos reais.
Aluno C: – Essa casinha aí... É maior ou menor que a loja do shopping?
Aluna D: – Claro que uma casa é muito maior que uma loja, né?
Aluno C: – Por quê? Vai depender da casa e da loja, né, professor? Pode ser uma
casinha, um casão, uma lojinha, um lojão...
Aluno E: – Esse aluguel de quinhentos é porque é lá embaixo. Lá pra cima é mais
barato, sai por uns duzentos e cinquenta reais.
Professor: – É que lá em cima é mais perigoso!
E faz um gesto como se estivesse atirando.
Professor: – Vamos, gente! E as expressões? Já terminaram?

Talvez a pessoa mais indicada para acabar com a dúvida sobre o aluguel seja o aluno já que “não
posso ensinar o que não sei” (FREIRE, 1996, p. 95). Com uma postura não dialógica, tantas falas trazi-
das à tona espontaneamente pelos alunos deixaram de ser ditas, de ser desvendadas, foram silencia-
das e a turma manteve-se distante, indiferente, passiva, silenciada, até tocar o sinal avisando que a
aula tinha acabado. Ao garantir15 a voz do aluno, o professor estaria legitimando seus saberes numa
via de mão dupla, como nos fala Fantinato e Santos (2007).
Em outra ocasião, durante uma aula na turma de 9º ano da EJA, o assunto abordado era porcenta-
gem. O professor utilizava a abordagem verbalista e expositiva, característica do ensino direto, para
conduzir a aula explicando que estava montando umas “continhas” para recapitular a matéria e que
logo depois ia passar uns “probleminhas”. Ele colocou no quadro o exercício abaixo, que chamou de
problema.
Com a inflação o preço de uma blusa que custava R$ 47,00 subiu 23%.
Quanto foi o aumento?
Qual o preço final da blusa?

Enquanto escrevia, perguntava:


Professor: – Onde tem número decimal no dia-a-dia?

Como nenhum aluno respondeu, o professor continuou:

Professor: – No posto de gasolina. Por que será que o preço da gasolina no posto é,
por exemplo, R$ 7,199, com três casas decimais?
Aluno: – Pra enganar a gente?
Professora: – Como eles vendem muito combustível, o preço faz diferença, porque
é muita quantidade. Para o dono do posto, cada centavo vale muito.

Um aluno questionou se o preço da gasolina era esse mesmo, porque estava achando muito
caro16. Também a taxa da inflação17 de 23%, no problema da blusa, causou espanto e incompreensão
em outros alunos. Alguns não perceberam nem uma coisa nem outra, ou não entenderam ambas.
15 Mais que “dar a voz ao aluno”, o professor deve “garantir a voz do aluno”, conforme nos diz Carmen Sanchez Sampaio.
16 Naquela época, em março de 2011, o preço do litro de gasolina estava em torno de R$ 2,90.
17 A inflação mensal, em março de 2011, foi de 0,12%.

613
Categoria: Comunicação | Subtema 4 : Formação de Professores
A influência do preço do petróleo no custo de vida da população ficou esquecida e, consequente-
mente, fora da aula.
Este pode ser considerado um exemplo de situação originada espontaneamente durante a aula
que poderia promover a inclusão de novos temas no currículo original, de forma que a educação
seja, inquestionavelmente, uma forma de intervenção no mundo. Para Freire (1996, p. 98), uma

intervenção que além do conhecimento dos conteúdos bem ou mal ensinados e/


ou aprendidos implica tanto o esforço de reprodução da ideologia dominante quan-
to o seu desmascaramento. Dialética e contraditória, não poderia ser a educação só
uma ou só a outra dessas coisas. Nem apenas reprodutora nem apenas desmasca-
radora da ideologia dominante.

Mas para isto, a postura docente deveria ser mais consciente “da impossibilidade de desunir o en-
sino dos conteúdos da formação ética dos educandos” (FREIRE, 1996, p. 95). No nível micro, o modo
como o professor realiza a gestão curricular na sala de aula, mesmo tendo um conteúdo programáti-
co a cumprir, é decisivo na construção da cidadania e no aprendizado da autonomia dos seus alunos.

AlgUmAs poUcAs considerAções...


Em todos os níveis de gestão curricular analisados, os modos como os professores realizaram esta
prática letiva demonstraram que eles não estão atingindo os objetivos que mais valorizam: ajudar os
alunos jovens e adultos no seu dia-a-dia e possibilitar a continuidade dos seus estudos. Além disso,
também detectei que algumas situações espontâneas, que poderiam estar sendo utilizadas na cons-
trução de um currículo mais interessante e próximo da realidade dos educandos, são desperdiçadas
e abandonadas.
Ao que me parece, a educação matemática deveria estar associada à compreensão do mundo,
principalmente para aquelas pessoas jovens e adultas cujo acesso à educação básica lhes foi nega-
do na idade adequada. Mas, para isto, os professores precisam estar preparados para lidar com o
imprevisível, preferencialmente embasados, de maneira coerente, pelo projeto político pedagógico
existente. Percebo, na formação continuada comprometida em dialogar com os autores da etnoma-
temática, da educação crítica, da educação socialista e das ciências sociais, uma possível mudança
na direção de uma proposta curricular inovadora, para que a educação seja, definitivamente, uma
forma de intervenção no mundo.
Uma postura diferenciada, que valorizasse a espontaneidade como alternativa em relação à situa-
ção existente, certamente traria mais componentes aos estudos relativos a experiências de inovação
curricular. Os professores da educação de pessoas jovens e adultas, mais do que quaisquer outros,
precisam estar conscientes do seu papel na construção da autonomia dos seus alunos. Estudar suas
práticas letivas pode dar indícios de como encaminhá-los nesta direção.

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2008.

(Endnotes)
1 Não apresento aqui todo o processo pelo qual passaram as escolas originais, por questões de espaço no texto, o que pode
ser encontrado no portal do MEC e nos sites dos Institutos, do mesmo modo que acompanhar a expansão de matrículas, unidades e
campi que a rede sofre nos últimos anos.
2 Informação disponível no site <www.mec.gov.br>. Acesso em 18 de abril de 2014.

615
cAtegoriA 1

comUnicAção

sUbtemA 5

munDoS e CulturaS
Do trabalho
Categoria: Comunicação | Subtema 5 : Mundos e Culturas do Trabalho
o estAdo democrático e o AUtoritArismo
no Ambiente escolAr
renAto ferreirA dos sAntos | jUliAnA AlVes de ArAújo bottechiA

Este trabalho aborda a questão relacional autoritária existente na escola pública, a partir da ob-
servação participativa, do diário de bordo e de entrevistas com estudantes e professores e objetiva
compreender porque, a quem interessa e quais são os prejuízos pedagógicos decorrentes desse
tipo de relação. Esta pesquisa foi realizada em uma escola de Educação de Jovens e Adultos no turno
noturno da cidade de Taguatinga, no Distrito Federal, ao longo do ano de 2013. Presume-se que a
relação docente-discente nessa modalidade de ensino, cujo público é composto majoritariamente
pelo setor economicamente mais carente das classes trabalhadoras, tende a ser autoritária impondo
o prejuízo da aprendizagem. Pretende-se verificar se o ensino é ofertado na concepção pedagógica
produtivista que prioriza a formação tecnicista em detrimento da formação humanística integral.
Investigar-se-á se os desempenhos atitudinais estão relacionados com a obediência e a docilidade
em prejuízo dos desempenhos cognitivos ao se ofertar uma formação rasa e aligeirada destinada a
suprir as demandas do mercado de trabalho de baixa qualificação. Em que medida a relação auto-
ritária no ambiente escolar acrescido de uma formação aligeirada conforma um contexto de valo-
rização do capital em sua atual fase. Como referencial teórico para essa pesquisa foram chamados
os autores: Engels(1986), Freire(1980), Ponce(2005), Meszaros (2003), Vygotsky (2001) entre outros.

palavras-chave: Autoritarismo, Estado, Valorização do capital

introdUção
Essa pesquisa foi realizada em uma escola da Rede Pública de Ensino do Distrito Federal, que ofer-
ta a Educação de Jovens e Adultos (EJA) para o segundo segmento, no horário noturno, na cidade de
Taguatinga, Distrito Federal, entre os meses de junho e dezembro de 2013. Essa escola fica localiza-
da em área urbana, no centro comercial da cidade e o público que frequenta a EJA é composto por
comerciários, servidores terceirizados de órgãos públicos, trabalhadores domésticos, trabalhadores
sem vínculo empregatício formal, prestadores de serviços avulsos, trabalhadores da pequena indús-
tria local.
No ano da pesquisa o público frequente oscilou entre 300 e 400 estudantes distribuídos em dez
turmas. A observação da relação docente-discente nessa escola em que pesquisa foi realizada nos
remete às práticas paternalistas ossificadas que permearam o ambiente escolar e que conforma-
ram a característica da escola dualista, isto é, a escola destinada à elite social e a escola destinada
aos pobres. Em meados do século passado essa escola prescrevia trajetórias distintas para sujeitos
distintos e em que ficava explícita a polaridade conforme a fala do ministro Gustavo Capanema, em
1942, durante a Exposição de Motivos que levaria à reforma educacional e à Lei Orgânica do Ensino
Secundário “O ensino secundário, propedêutico, destina-se à formação das elites condutoras” (apud
SILVA, 1991, p. 38).
Passados mais de setenta anos, verifica-se que as autoridades responsáveis pelas políticas educa-
cionais do Estado não tornam públicas suas orientações com tanta sinceridade. Contudo as decisões
de ordem prática no contexto da escola continuam a refletir aquelas intenções.
A escola pesquisada é uma dessas escolas destinadas aos pobres. Nessa escola as instâncias de
compartilhamento de poderes não funcionam, isto é, são instâncias de decisão unilaterais, a saber: o
Conselho Escolar (CE) é encabeçado por um professor da escola e os demais segmentos - servidores,

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Categoria: Comunicação | Subtema 5 : Mundos e Culturas do Trabalho
estudantes, pais - não participam efetivamente. O desestímulo provém, segundo um estudante en-
trevistado, da burocratização do CE cuja atribuição se restringe a referendar as decisões da direção
da escola. Todas as decisões, tanto as de caráter administrativos quanto as de caráter pedagógico,
são definidas pela direção escolar.
O Projeto Político Pedagógico (PPP) é desconhecido da ampla maioria da comunidade escolar.
Sequer a maioria dos (as) professores (as) conhece ou sabe para que serve esse instrumento político
pedagógico.
As reuniões do Conselho de Classe que atribuem notas e conceitos aos estudantes são compos-
tas somente por docentes, pois a atribuição de notas e conceitos é uma prerrogativa que cabe ape-
nas a eles. Essa prática contraria a lei da Gestão Democrática estabelecida na Constituição Federal de
1988 e também contraria a atual Lei de Diretrizes e Bases, LDB 9394 de 1996, que juntas estabelecem
a gestão compartilhada nas decisões administrativas e pedagógicas.
Observou-se no expediente da sala de reunião dos professores que há resistência em comparti-
lhar com os estudantes as avaliações bimestrais. A justificativa é de que não há maturidade do corpo
discente para a coparticipação, mesmo sendo estudantes jovens e adultos. Essa justificativa acarreta
outra, a de apresentação de conteúdos disciplinares rasteiros em função da incompetência dos es-
tudantes em leitura e compreensão e conhecimentos matemáticos básicos. No entanto, mantém-se
o rigor das avaliações classificatórias em forma de provas escritas ao final do bimestre, o que tem
acarretado a reprovação massiva.
Uma aluna entrevistada alegou que ao perceber, após a primeira prova, que a reprovação pode
acontecer, abandona a escola para prosseguir no semestre seguinte. Já abandonou a escola cinco
vezes. Ao ser perguntada sobre a razão dessa decisão, retomou: “para não perder tempo, pois traba-
lha e tem filhos, e para não sujar o boletim.” Sobre esse tema da avaliação, uma professora entrevis-
tada, disse: “os alunos devem sair da escola com competências para entrar no mercado de trabalho”.
No entanto, nas reuniões do Conselho de Classe, os (as) estudantes com “melhor comportamen-
to” recebem melhores pontuações. Premiam-se as relações atitudinais em detrimento das habilida-
des cognitivas. Esse procedimento nos remete à seguinte questão: ensinar quem, o quê e para quê?
Não há dúvida de que a preocupação docente é com a preparação para o trabalho. Mas que traba-
lho? A pesquisa indica que preparam para o mercado de trabalho de baixa qualificação.
Percebe-se aqui o preconceito de classe, pois uma vez considerados incompetentes para a leitura
e para as contas, justifica-se uma formação aligeirada e destinada a suprir o mercado de baixa qua-
lificação. Constata-se a perpetuação da lógica perversa que prescreve a escola de baixa qualidade
pedagógica aos pobres impondo o modelo social excludente. Esse tipo de escola tem propiciado a
criação um estamento social cujo propósito tem sido o de perpetuar a hierarquia social injusta.
Infere-se que haja um pacto espúrio e não declarado entre os docentes e o mercado de trabalho
de baixa qualificação cuja demanda requer pessoas dóceis com formações aligeiradas e cuja com-
plementação seria feita pelo próprio mercado. A falta de formação inicial mais aprofundada delimita
o campo de atuação e as perspectivas de uma pessoa. Além do fato de que castra a sua capacidade
crítica.
Esse trabalho pretende refletir sobre essas questões e como elas influenciam no contexto educa-
cional escolar do ensino e da aprendizagem.

o estAdo A serViço dA AcUmUlAção do cApitAl


Engels (1986) concebe o Estado como um instrumento de opressão a serviço do grupo social
dominante. Para este autor, o simples fato de existir o Estado já demonstra o “caráter irreconciliável
entre os interesses dos diversos estamentos sociais e a impossibilidade da convivência pacífica e
democrática em escala territorial de uma cidade ou país” (p.153).

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Categoria: Comunicação | Subtema 5 : Mundos e Culturas do Trabalho
Embora convivendo no mesmo espaço escolar e, supostamente compartilhando interesses co-
muns de ensino e aprendizagem, foi observado que estudantes e professores são partícipes da luta
entre si e não declarada pelo protagonismo no ambiente escolar. Por ocasião da eleição do grêmio
estudantil a direção da escola conduziu todo o processo desde a conformação das chapas até a
posse da vencedora sob a alegação de que os estudantes não possuem maturidade para tal empre-
endimento.
Os estudantes perceberam a ingerência, mas se resignaram por não terem força para garantir a
autonomia política. O estudante Carlos (nome fictício), 23 anos, do 2ª segmento da EJA, alegou em
entrevista “o diretor da escola não quer um grêmio estudantil que ele não controle”. Nessa escola,
estudantes e professores pertencem a classes sociais diferentes e a direção aproveita da autoridade
fornecida pelo Estado para fazer o controle político de membros de uma classe social subalterna.
Para Meszaros (2008), a norma é a existência do Estado democrático porquanto essa condição
se adequa melhor à acumulação do capital. Vivemos em um período histórico que conforme esse
autor é “de crise estrutural global do capital” (p.75) e cabe ao Estado assumir cada vez mais o papel
de solucionar as crises conjunturais.

o AUtoritArismo do estAdo democrático


O autoritarismo que perpassa a sociedade brasileira também está presente na escola na medida
direitos são negados ou de maneira velada, quando se culpam as próprias vítimas (professores e
estudantes) pelo fracasso escolar. Na sala destinada aos professores durante o intervalo longo das
aulas é comum se ouvir que os estudantes “não querem nada”, que “são fracos”que “não possuem
pré-requisitos” para estarem na série que cursam. A professora Tânia (nome fictício) foi enfática em
seu discurso na sala dos professores “os alunos querem nota, mas querem estudar para conseguí-la”.
Assim, explicita-se essa situação quando os governos culpam pelo fracasso da escola pública os
docentes, que, por sua vez, transferem essa culpa aos discentes.Dessa forma, verifica-se no ambiente
escolar o que Freire ensina acerca dos “oprimidos, que introjetam a ‘sombra’ dos opressores, seguem
suas pautas e temem a liberdade, na medida em que esta, implicando na expulsão desta sombra,
exigiria deles que ‘preenchessem’ o ‘vazio’ deixado pela expulsão, com outro ‘conteúdo’: o de sua
autonomia.” (1980, p. 52).
A concentração da renda beira o absurdo, o Brasil compõe a lista das dez nações mais injustas do
planeta.
Conforme Mészaros (2008) “(...) vivemos numa ordem social na qual mesmo os resquícios míni-
mos para a satisfação humana são insensivelmente negados a esmagadora maioria da humanida-
de...” (p.73). Uma sociedade tão arrojada economicamente e ao mesmo tempo, frágil socialmente,
necessita de instrumentos ideológicos, muito eficazes a fim de manter submissas as camadas sociais
subalternas. A desintegração social poderia ocorrer caso somente a repressão policial tivesse que
ser utilizada cotidianamente para garantir a submissão da imensa maioria da população.

A qUe interesses serVe UmA escolA AUtoritáriA?


Para Ponce (2007), nas

sociedades capitalistas as classes sociais dominantes sempre administraram com


parcimônia a educação escolar às classes sociais subalternas. Sempre oscilaram en-
tre a necessidade de instruir para atender suas necessidades de mão-de-obra e a
obediência servil. (PONCE, 2007, p.153)

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Categoria: Comunicação | Subtema 5 : Mundos e Culturas do Trabalho
Pelos dados da pesquisa, interpreta-se que quando a práxis dos professores está afastada das
práticas sociais pouco contribui para interposição producente dos estudantes, jovens e adultos, tra-
balhadores ou não, na sociedade democrática. Consequentemente, reduz qualquer possibilidade
de enfrentamento dos fatores de aleijamento escolar em que essa população menos privilegiada
está inserida.
No entanto, esses estudantes, convivem ou poderão conviver com exigências do trabalho, que
ao procurar suprir suas necessidades e procurar estudar, se deparam com métodos de ensino, por
vezes inadequados desde a alfabetização, identificados como métodos apropriados para as classes
regulares de ensino, com quantidade ideal de estudantes homogêneos e padronizados.

Ações do estAdo
Neste sentido Mészaros discutiu em Goiânia (2013) que “em um contexto de crise estrutural do
modo de produção dominante, o Estado está direcionado para o atendimento da valorização do
capital.”
Para Haddad, “No Brasil, o grupo Banco Mundial atua desde 1970 e tem tido forte influência na
definição das políticas educacionais nas últimas décadas” (2008, p. 33). Para esse Banco a extrema
pobreza existente em larga escala e num contexto de alta concentração da renda, pode ensejar
conflitos sociais, em consequência do desemprego causado pela desregulamentação econômica
de caráter neoliberal, que ponham em risco as Instituições do Estado e o lucro das empresas. Para o
Banco a educação deve cumprir o papel de amortecedor dos conflitos sociais (HADDAD, 2008).
Então, a quem serve o autoritarismo docente? Sem consciência do jogo de poder em que está
inserida a educação pública, os oprimidos aderem ao opressor e conforme afirma Freire “em certo
momento de sua experiência existencial, os oprimidos assumam uma postura que chamamos de
aderência ao opressor” (1980, p. 33). A culpa imposta pelo Estado e pelos governos aos professores
pelo fracasso da escola é transferida por estes aos estudantes gerando a manutenção do status quo
e preservando a ordem injusta em que estão inseridas as sociedades capitalistas e, em especial a
brasileira, pela sua profunda desigualdade social.
Então, é preciso refletir sobre o fracasso da escola pública num contexto de autoritarismo docen-
te e do Estado democrático.

relAção discente-docente
Nas relações humanas o autoritarismo pode se manifestar da vida nacional onde um déspota ou
ditador age sobre milhões de cidadãos, até a vida familiar, onde existe a dominação de uma pessoa
sobre outra através do poder financeiro, econômico ou pelo terror e coação. Nesse sentido, o autori-
tarismo também pode ser definido como um comportamento em que uma instituição ou pessoa se
excede no exercício da autoridade de que lhe foi investida, o que é caracterizado pelo uso do abuso
de poder e da autoridade confundindo-se com o despotismo.
Com os estudantes, Lapassade (1968) traz ainda evidências sobre um conflito com a autoridade
docente, uma revolta adolescente. O autor considera que existe no operário jovem uma rebeldia
diferente da que acontece no jovem burguês, uma vez que aquele se revolta contra a autoridade
patronal e este último contra a da família. De qualquer forma, seja na escola ou no trabalho, o jovem
trabalhador sofre influência das condições trabalhistas, em que a presença e a pressão do adulto é
muito intensa e, pressionado, ele desenvolve uma revolta interna, portanto, ele não se revela nessa
instituição, mas o fará na escola.
Diferentemente, esse autor explica que o jovem que se revolta com a autoridade da instituição
familiar se organiza e evidencia seu modo de sentir e viver a sociedade no ambiente de estudo, sem
considerar as funções precípuas da escola (BOTTECHIA, 2014). Lapassade então pondera se a crise

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Categoria: Comunicação | Subtema 5 : Mundos e Culturas do Trabalho
da juventude, que é objeto de seu estudo, é uma marca da sociedade moderna em contraposição à
ordem social estabelecida na época. Todavia,

as variações na estrutura das situações psicossociais se encontram ao nível de


variações, marcando as manifestações da crise, sem, todavia, por em questão a sua
existência mesma (...) a crise serviria de pretexto para a revolta (...) o que era apenas
uma perturbação momentânea da adaptação se torna uma revolta generalizada
contra todas as formas de existência social; o desvio mudou de sentido e diversifi-
cou-se. O conflito entre os jovens e a sociedade não tem em todo lugar o mesmo
significado (LAPASSADE, 1968, p. 117).

Manifestações de “crise da juventude” são um fenômeno social em suas expressões, significações


e consequências, portanto tem caráter questionador, destruidor de instituições, da ordem estabele-
cida, porque ela se “institui” em um mundo que não significa a vida para o jovem. Lapassade (1968)
recomenda que não se entenda esse movimento como sendo de uma minoria, isolado ou restrito
a alguns jovens, mas sim que questionem os objetivos de teses definitivas sobre o comportamento
dos jovens.
Enfim, como indica o autor, a contestação dos jovens à sua maneira, na sociedade moderna se dá
porque lhe é exigido subserviência ao mundo adulto e, de certa forma, o mesmo ocorre nas salas de
aula. Ali eles também não aceitam ser submissos para construir realidades amorfas, sem significados
em que terão que viver ou que terão que se apropriar (BOTTECHIA, 2014).
Por isso mesmo e por tudo isso, defendemos uma revitalização, a fim de se recuperar, renovar, are-
jar, valorizar os movimentos para respirar o oxigênio da novidade. Um sopro de renovação é capaz
de oferecer novos espaços de criação, de liberdade, até de valorização profissional da própria carrei-
ra como um todo para o futuro. Quando o dogmatismo, a rigidez do pensamento, o conformismo
intolerante nos assolam; quando juntos eles nos condicionam à resignação, demissão e alienação
- torna-se necessário que os encaremos “de frente”, por meio de uma dúvida ativa, e/ou ousada, de
questionamentos provocativos para derrotá-los.
Trata-se de um ato de liberdade e responsabilidade pelo qual retomamos uma situação pedagó-
gica que vivemos, colocando-nos como sujeitos dela. Significa, portanto, uma atitude existencial,
uma maneira corajosa de ser diante da realidade com a qual nos defrontamos a cada momento.
Conquanto seja um ato de coragem, a dúvida pode nos angustiar. Porém, isto é inevitável porque
questionar, interrogar, procurar captar “o sentido de”, elucidar, desvelar, buscar as razões, todos es-
ses atos de liberdade, decisão e responsabilidade trazem a marca da nossa existência e exprimem a
vertigem que existe entre a nossa liberdade e nossa finitude.
Assim, não podemos evitar ou liquidar a angústia que nos causa a dúvida, mas aceitá-la, aven-
turando-nos a viver longe da terra firme, da zona de conforto e, ao mesmo tempo, rompendo com
o fatalismo, o dogmatismo, a demissão e a alienação (BOTTECHIA, 2014). Neste sentido, Stenhou-
se (1998) defendia que todo docente deveria trabalhar como um investigador, um pesquisador do
dia-a-dia. E, nesta defesa, importava a necessidade de utilizá-la como recurso didático do saber e,
consequentemente, da pesquisa. Para tanto, sugere que todo docente, na qualidade de educador,
deve assumir seu lado experimentador no cotidiano e transformar a sala de aula a fim de contribuir
efetivamente com a relação discente.
O docente deveria lançar mão de práticas variadas até obter as melhores soluções para garantir a
aprendizagem dos estudantes, com qualidade social, ou seja, como defende Stenhouse (1998), que
ele desenvolva a postura reflexiva e a capacidade de analisar sua própria prática docente. Defini-
ções recentes sobre as competências para ensinar incluem que a partir dessa análise de Stenhouse
(1998), o docente seja capaz de aperfeiçoar o trabalho de sala de aula; de criar o próprio currículo,

621
Categoria: Comunicação | Subtema 5 : Mundos e Culturas do Trabalho
adequado à realidade e com respeito às necessidades de seus estudantes.
Aquilo que vale para a nossa existência em geral, vale também e muito particularmente para as
questões pertinentes à Educação no que se refere à relação docente-discente.Essa instituição é, em
verdade, profundamente, espaço gerador de angústia. Por um lado, toda relação pedagógica é, por
natureza, fonte de tensão e conflitos para os profissionais que a vivem, na medida em que ela os en-
volve naquilo que são, os interroga, coloca em questão seus desejos, valores, atos, maneiras de ser,
horizontes culturais, esquemas mentais, entre outros (BOTTECHIA, 2014).
Por outro lado, esta tensão e interpelação os ultrapassam enquanto atores particulares e indivi-
duais, pois o que importa pedagogicamente é o impacto em uma sociedade no interior da qual a
Educação desempenha um papel fundamental, uma vez que participa inevitavelmente do debate
no qual a nossa sociedade capitalista se encontra envolvida e da dúvida que ela suscita. A Educação
é atualmente um lugar onde toda a sociedade capitalista brasileira pode se interrogar a respeito
dela mesma, se debate e se busca.

edUcAção, pArA qUe e pArA qUem?


Os relatos históricos confirmam que a educação escolar sempre teve caráter elitista. Os jesuítas
exerceram o monopólio da educação, de caráter público. A educação jesuítica era guiada pelo Ra-
tioStudiorum que tinha um caráter universalista e elitista.
Coerente com essa concepção foram criados dois padrões de escola. A escola destinada aos ín-
dios e a seus filhos - tinha o caráter de simples catequização e preparo para o trabalho prático, en-
quanto a escola destinada aos filhos dos colonos visava prepará-los para os altos estudos vinculados
a uma existência contemplativa, geralmente feitos em Coimbra, Portugal.
A reforma educacional foi empreendida no Brasil sob a orientação do Marques de Pombal, pri-
meiro-ministro do reino português e déspota esclarecido. “Através do Alvará de 28 de junho de 1759
foram fechados os colégios jesuítas e estes foram expulsos do Brasil e foram introduzidas as aulas
régias mantidas pela Coroa, através do subsídio literário” (SAVIANI, 2006, p.17).
A primeira República manteve o caráter elitista da educação, uma escola dualista, em que havia
uma escola destinada aos pobres e outra destinada às elites sociais. O ensino para o povo era consti-
tuído pelas escolas primárias e as poucas escolas de preparação profissional. As camadas populares
não tinham acesso ao ensino secundário.

Durante toda a primeira República, portanto, houve uma nítida separação entre
o ensino popular, constituído pelas escolas primárias, pelo ensino normal e pelo pro-
fissional, e a educação das elites, com as melhores escolas primárias, os ginásios e as
escolas superiores. (CADERNOS MEC, 2014, p.10)

Através de um processo seletivo e de controle social a educação secundária e a educação supe-


rior eram privilégios das elites sociais. Mantinha-se o conceito dualista de escola: uma escola para
o povo e outra para as elites e apenas na década de 1920 surge uma característica de rompimento
com este paradigma.
Surgia em 1932 um movimento que questionava os padrões educacionais até então vigentes:
era o Movimento Escolanovista que lançou o Manifesto pela Educação. Esse movimento defendia a
estruturação do ensino público em um sistema com a organização de diretrizes curriculares educa-
cionais de base nacional.
As décadas de 1950 e 1960 foram emblemáticas por conta das mudanças surgidas no mundo. A
reconstrução da Europa, a instituição do Estado de bem-estar social preventivo, contra as revoluções

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Categoria: Comunicação | Subtema 5 : Mundos e Culturas do Trabalho
socialistas e o início da Guerra Fria remodelaram o perfil da sociedade capitalista.O acesso ao ensino
público e gratuito a todas as camadas da população passou a ser uma realidade.
No Brasil, os movimentos sociais romperam com o status quo educacional e exigiram mudanças
e houve ampliação das oportunidades educacionais com a criação da Lei de Diretrizes e Bases de
1961. Na esteira das mudanças, surgiram novas propostas pedagógicas que propunham novos mé-
todos de ensino focados na aprendizagem com o intuito de alfabetizar as camadas populares que
até então haviam estado à margem do acesso à educação escolar. O educador Paulo Freire este à
frente desse processo.
O golpe militar de 1964 representou um retrocesso nesse viés educacional. A crise da economia
capitalista da década de 1970 atingiu o governo militar que entrou em crise. Os movimentos multi-
tudinários da década de 1980 derrubaram o Regime e exigiu reformas na educação. A Constituição
de 1988 estabeleceu a universalização do ensino escolar e a vinculação orçamentária, bem como a
gestão democrática para garantir o acesso universal. A Lei de Diretrizes e Bases 9394 de 1996 consa-
grou algumas dessas conquistas.
O percurso da educação escolar no Brasil tem perpassado por muitas lutas e conquistas, mas tam-
bém por retrocessos. Em sua trajetória para atingir amplamente as camadas populares em situação
de exclusão social tem carecido da qualificação necessária para garantir a emancipação humana. Em
conjunturas adversas, isto é, de restrição da democracia, tem prevalecido uma concepção produti-
vista de educação, necessária à valorização do capital.
A pesquisa apontou que, no contexto de uma sociedade social e economicamente tão desigual
como a brasileira, impõe-se que a dominação sobre os extratos sociais mais pauperizados da popu-
lação seja viabilizada. A Educação que se desvela como plenamente autoritária, é induzida a cumprir
esse papel de modo a produzir indivíduos dóceis e obedientes necessários à valorização do capital.

referênciAs
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Inovação Pedagógica para o Ensino de Química. Tese deDoutoramento. Universidade da Madeira: Por-
tugal, Funchal, 2014.
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bal, 1986.
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Professores do Ensino Médio. Curitiba, Setor de Educação da UFPR, 2013.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1980.
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Editora Cortez, 2008.
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LUXEMBURG, Rosa. A Acumulação do Capital. São Paulo, Editora Nova Cultural, 1985.
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Discurso Psicopedagógico Hegemônico na Prática Docente:olhares da psicanálise. In CERQUEIRA, Te-
resa Cristina Siqueira, Formação de Professores: Psicologia, reflexões e pesquisas. Curitiba: Editora CRV,
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MARX, Karl. Das Kapital, a critique of political economy. Washington, DC, USA, Gateway Editions,
2009.
MÉSZAROS, Istvan. Educação para além do capital. São Paulo: Editora Boitempo, 2008.

623
Categoria: Comunicação | Subtema 5 : Mundos e Culturas do Trabalho
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PONCE, Aníbal. Educação e luta de classes. São Paulo: Editora Cortez, 2007.
SAVIANI, Dermeval (Org.). O Legado Educacional do Século XX no Brasil. Campinas, São Paulo: Ed.
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VIGOTSKI, L. S. A Construção do Pensamento e da Linguagem. São Paulo, Editora Martins Fontes,
2001.

624
Categoria: Comunicação | Subtema 5 : Mundos e Culturas do Trabalho
o reAproVeitAmento de retAlhos de tecidos com foco
nA gerAção de rendA: UmA experiênciA com edUcAção
de joVens e AdUltos
WAshington ferreirA de moUrA | rozenildA mAriA de cAstro silVA

A presente comunicação relata uma experiência em andamento que teve início em 2010 no
Centro Educacional do Sesc Ler de Piripiri/PI, sobre o conjunto de cursos oferecidos aos alunos da
Educação de Jovens e Adultos e comunidade em torno do retalho de tecidos com foco na geração
de renda, cujas ações estão inseridas no Projeto Partindo da Matéria Prima, que conta com a par-
ceria do Sebrae/PI e já foi premiado com a Medalha Paulo Freire do MEC, em 2010. Apresenta-se
no relato como se dá o processo de organização dos cursos, os seus objetivos, os incentivos aos
participantes e o resultado produtivo de cada ação. No curso de reaproveitamento de tecidos, por
exemplo, os participantes aprendem a criar as peças, como: tapetes, bolsas, peças decorativas, aces-
sórios femininos, brinquedos, chaveiros de diversos formados, peças para cozinha, sala e banheiro,
etc. É incentivada a criação de novas peças, considerando as necessidades humanas despendidas
por esses objetos e também a criatividade de cada um na hora da produção. Nota-se ainda que
os materiais usados nos cursos vão além do retalho de tecidos e outros materiais são reutilizados,
como: botões, fivelas, restos de bicos de renda, restos de linha, o próprio tubo da linha, tecido de
guarda-chuva quebrado, enfim, tudo que é possível ser reutilizado. O relato apresenta ainda 03
experiências de participantes da ação afirmando as melhorias que aconteceram em suas vidas após
terem participado dos cursos oferecidos pelo Sesc Ler Piripiri. A experiência vem se fundamentan-
do na perspectiva empreendedora de Gutierrez (2006) e buscando outras referências na literatura
sobre a(s) temática(s) da ação.

palavras-chave: Educação, Jovem, Adulto, Geração de renda

O texto a seguir relata uma experiência em andamento que teve início em 2010 no Centro Edu-
cacional do Sesc Ler1 de Piripiri/PI, sobre o conjunto de cursos oferecidos aos alunos da Educação
de Jovens e Adultos e comunidade, tendo como matéria prima o retalho de tecidos como fonte de
geração de renda, cujas ações estão inseridas no Projeto Partindo da Matéria Prima, desenvolvido
pelo Sesc Piauí. Apresenta-se neste relato como se dá o processo de organização dos cursos, os seus
objetivos e os resultados já alcançados até o momento. No curso de reaproveitamento de tecidos
os participantes aprendem a confeccionar peças, como: tapetes, bolsas, acessórios femininos e para
cozinha, sala e banheiro, brinquedos, chaveiros de diversos formatos, etc. É incentivada a criação
de novas peças, considerando as necessidades humanas despendidas por esses objetos e também
a criatividade de cada um nos momentos da produção. Nota-se ainda que os materiais usados nos
cursos vão além dos retalhos de tecidos, incorporando nas respectivas peças acessórios tais como:
botões, fivelas, a base do próprio tubo da linha e o que é possível ser reutilizado. O texto apresenta
ainda depoimentos de quatro participantes testemunhando o impacto inicial destas ações em
suas vidas. A experiência vem se fundamentando na proposta pedagógica do Sesc Ler, na pers-
pectiva empreendedora de Gutierrez (2006) e buscando outras referências na literatura sobre a(s)
temática(s) em desenvolvimento.

sobre o projeto pArtindo dA mAtériA primA


O Projeto Partindo da Matéria Prima tem como objetivo investir na geração de renda dos alunos
1 Projeto de escolarização de Jovens e Adultos desenvolvido pelo Serviço Social do Comércio –Sesc em mais de setenta mu-
nicípios brasileiros, através de Centros Educacionais.

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Categoria: Comunicação | Subtema 5 : Mundos e Culturas do Trabalho
da Educação de Jovens e Adultos, dos Centros Educacionais do Sesc Ler Piauí onde ele é desenvol-
vido, através da matéria prima local e acessível. Teve a sua gênese no projeto didático Tratamento
da Água desenvolvido no final do segundo semestre de 2005 no Centro Educacional do Sesc Ler de
Guaribas/PI, cidade situada no sudoeste piauiense à 660 km da capital, Teresina. A oficina de cons-
trução de filtros pensada para ser a última etapa deste projeto, tal como aconteceu, com a confecção
de filtros pelos próprios alunos para o uso em suas residências, provocou novos olhares para o traba-
lho com a Educação de Jovens e Adultos. Observando o interesse dos alunos por peças decorativas
em cerâmica durante o processo de construção do filtro e com o objetivo de promover a geração de
renda da comunidade de forma autônoma, por falta de emprego no município, integrando a educa-
ção de Jovens e Adultos ao mercado de trabalho, buscou-se parceria com o Sebrae/PI e a partir de
fevereiro de 2006 foi desenvolvido no Sesc Ler Piauí o Projeto Partindo da Matéria Prima. No Centro
Educacional deste município foram realizadas para os alunos e a comunidade de uma forma geral
oficinas de peças decorativas em cerâmica, biojóias em cerâmica, designer em biojóias e cultura da
cooperação com foco no empreendedorismo. O Grupo Pérola Negra de produção de biojóias em
cerâmica em Guaribas é resultado deste Projeto.
Considerando a realidade e a matéria prima de cada município, em 2009 o projeto se expan-
diu para o Centro Educacional de São Raimundo Nonato para os alunos da Educação de Jovens e
Adultos, com cursos de produção de doces caseiros, incluindo cocadas, utilizando frutas tropicais
colhidas nos quintais das residências dos próprios alunos. As ações eram iniciadas em sala de aula
com a construção de cadernos de receitas, noções de higienização, valores e estratégias de comer-
cialização dos produtos, integrando a alfabetização e a escolarização de jovens e adultos ao mundo
do trabalho.
Foi em 2009 que o Centro Educacional do Piripiri começou a desenvolver o Projeto focado no
retalho, matéria prima local, considerando que a cidade se destaca no ramo da confecção de roupas
e acessórios femininos. A inauguração da Unidade do Sesc Ler foi um convite a esta proposta com a
realização do primeiro curso de reaproveitamento de retalhos que produziu várias peças funcionais
para uma exposição desenvolvida neste evento juntamente com as biojóias de Guaribas. Portanto,
a partir da inauguração da Unidade e olhando as possibilidades de geração de renda que a cidade
de Piripiri poderia oferecer focada na matéria prima local e na preservação do ambiente, conside-
rando que a cidade possui mais de 37 fábricas no ramo da confecção de artigo têxtil resolveu-se
desenvolver o Projeto Partindo da Matéria Prima com a realização de cursos focados na reutilização
de retalhos de tecidos.
Pela relevância deste trabalho com jovens e adultos de baixa renda o Projeto Partindo da Matéria
Prima foi considerado, em 2010, uma das cinco melhores experiências exitosas do país que asso-
ciava a Educação de Jovens e Adultos ao mundo trabalho, sendo agraciado com o prêmio Medalha
Paulo Freire concedida pelo Ministério da Educação – MEC.

o trAbAlho com reAproVeitAmento de retAlhos no sesc ler de piri-


piri
As primeiras ações dos cursos voltadas para a geração de renda no Centro Educacional do Sesc
Ler de Piripiri iniciaram com o curso de Reaproveitamento de Retalhos de Tecidos, posteriormente
implantou-se o curso de Corte e Costura como atividade anual inicial considerando que os alunos
necessariamente precisavam ter domínio do corte e da costura como pré-requisito para a participa-
ção nos cursos de reaproveitamento do retalho.
Dessa forma, anualmente são oferecidos para um mesmo grupo de participantes, em média 25
pessoas, quatro cursos anuais, em parceria com o Sebrae/PI:
• primeiro um curso de Corte e Costura, de 40h, que tem como objetivo a preparação dos
participantes à iniciação ou melhoramento das práticas de costura;

626
Categoria: Comunicação | Subtema 5 : Mundos e Culturas do Trabalho
• em seguida são realizados dois cursos de Reaproveitamento de Retalhos de Tecidos, cada
um com 40h, com a intenção de estimular a capacidade de criação a partir do uso da ma-
téria prima local - o retalho de tecidos que excedem das fábricas ou dos ateliês da cidade.
Nestes cursos são confeccionados objetos decorativos e funcionais como: tapetes, colchas
de cama, fronhas, chaveiros, panos de prato, bolsas, acessórios femininos e para cama,
mesa e banho, etc. É incentivada a criação de novas peças, considerando as necessidades
humanas despendidas por esses objetos e também a criatividade de cada um na hora da
produção. Observa-se ainda que os materiais usados nos cursos vão além do retalho de
tecidos e outros são reutilizados, como: botões, fivelas, restos de bicos de renda, restos de
linha, a própria base do tubo de linha, tecido de guarda-chuva quebrado, enfim, tudo que
é possível ser reutilizado.
• O quarto curso é o de Aprender a Empreender – têxtil e confecção, com a intenção de pro-
vocar nos participantes um pensamento empreendedor, com visão de mercado e gestão
financeira, dentro de uma linguagem clara e acessível. Neste curso é incentivada a comer-
cialização dos produtos contribuindo de fato para a geração de renda dos alunos.
Para incentivo aos participantes à negociação dos seus produtos são criadas estratégias de visibi-
lidade pelo mercado consumidor. Ao término de cada curso de Reaproveitamento de Retalhos de
Tecidos é realizada uma exposição das produções no Centro Educacional para a qual toda a comu-
nidade é convidada, essa ação coloca os participantes numa vitrine como incentivo à continuidade
deste fazer e a realização de futuros desdobramentos.
Outro ponto de incentivo ao empreendedorismo é a participação dos cursistas em eventos cul-
turais da cidade, nos quais o Sesc é convidado como o Festival de Humor e Arte, realizado pelo Se-
brae e Prefeitura Municipal de Piripiri, com a exposição e comercialização dos produtos pelos seus
respectivos produtores . Além do Sesc, os próprios participantes dos cursos vem garantindo na
comunidade a conquista de novos espaços para a divulgação de suas produções.
Como resultado em processo a caminho de uma sistematização deste trabalho apresenta-se os
depoimentos de algumas participantes dos cursos com destaque na comunidade pelas suas produ-
ções. Dona Raimunda dos Remédios Silva, foi uma participante da comunidade que já fazia fronhas
para travesseiros e almofadas de maneira personalizada e ela afirma que:

Com os cursos oferecidos pelo Sesc melhorei a minha costura e acabamento das
peças e ainda levei pra lá a ideia de produzir fronhas para travesseiros e almofa-
das personalizadas e agora consigo enxergar que o meu trabalho pode render mais
dinheiro, pois posso agregar mais valores aos produtos, aprendi isso no curso de
aprender a empreender. Hoje eu trabalho fazendo encomendas de batedores de
porta e também continuo com as fronhas personalizadas. Minha renda melhorou
entre 15% a 30%, varia a cada mês (Depoimento, 10 de setembro de 2014).

Nota-se na fala de Dona Raimunda que sua participação nos cursos possibilitou uma preocupa-
ção com a qualidade da feitura do seu produto, melhor acabamento e percepção de mercado. Está
focada na produção de apenas dois produtos o que eleva a qualidade de acabamento por conta da
dedicação quase exclusiva.
Dona Teresinha, ex-aluna da Educação de Jovens e Adultos do Centro Educacional, nos dar um
retorno do impacto desta experiência em sua vida:

Minha vida melhorou muito. Antes do curso de Corte e Costura, que me ensinou
como produzir peças a partir de materiais baratos e até mesmo sem nenhum custo,

627
Categoria: Comunicação | Subtema 5 : Mundos e Culturas do Trabalho
tinha uma vida muito parada. Agora aperfeiçoei a técnica de produção de tapetes
em mosaico para banheiros e cozinha e vendo por encomenda, porém sempre tenho
estoque produzido em casa, caso apareça clientes. Além de me senti útil, me sinto
mais mulher no sentido de que o trabalho me deu mais poder, principalmente, na
minha renda. Acho que sou mais livre (Depoimento, dia 22 de novembro de 2013).

Os resultados deste trabalho vão além da geração de renda, ajuda a melhorar na autoestima.
Dona Teresinha demonstra um estado de felicidade. Já trabalha com encomenda para clientes até
de outros estados. Com o aumento de sua renda já conseguiu realizar melhorais em sua residência
e ainda adquiriu uma moto para dar maior rapidez à logística de venda à domicílio das peças que
produz.
Dona Francisca Araújo, aluna do Ciclo II do Sesc Ler, ingressou no curso de auxiliar de costura do
IFPI – Instituto Federal do Piauí, Campus Piripiri, e faz parte do Programa Mulheres Mil, do Governo
Federal, que visa capacitar mulheres de baixa renda para o mercado de trabalho e tem planos para
o futuro:

Não sabia nem costurar e me interessei tanto que estou me especializando no


Mulheres Mil no IFPI. Ainda não estou atuando como profissional, mas o Sesc me
abriu os olhos para me aperfeiçoar, por isso faço o curso de auxiliar de costura e logo
que sair daqui acredito que estarei empregada em uma fábrica de lingerie que é o
meu sonho (Depoimento, dia 22 de novembro de 2013).

Os resultados da ação são múltiplos, o significativo é que melhoram a vida das pessoas. Dona
Francisca Araújo é um exemplo de que a partir da intenção do Projeto de trabalhar com o reapro-
veitamento de retalhos ela se encaminha na busca de realizar o seu sonho, ser costureira de uma
fábrica de lingerie, destaque da produção industrial local.
Dona Francisca Oliveira, aluna concludente do 1º segmento da Educação de Jovens e Adultos,
especializou-se após participar dos Cursos do Sesc, em cursos do SENAI. Atualmente tem um Ateliê
e trabalha com a sua família focada na criação de produtos com padrões diferenciados, conforme
relata:

Eu tinha uma máquina de costura simples e já havia trabalhado em fábricas de


roupas, mas o meu sonho era fazer algo diferente e que desse renda e trabalho para
a minha família. Os cursos do Sesc me deram várias ideias e hoje tenho um Ateliê
com 03 máquinas semi-industriais, adquiridas com recursos próprios. Produzimos
presentes para aniversário e casamento como toalhas de mesa, banho e fronhas di-
ferentes e únicas. Além de realizar costuras de roupas em geral (Depoimento, 22 de
novembro de 2013).

Em cada participante o despertar de uma possibilidade de fazer. A partir dos retalhos Dona Fran-
cisca Oliveira customiza suas peças para diferentes ocasiões fazendo a sua diferença no mercado,
além de incluir os familiares no seu negócio.
Os alunos da Educação de Jovens e Adultos do Centro Educacional do Sesc Ler de Piripiri tem
prioridades nas vagas dos cursos. E há uma inserção dos cursos com o trabalho de sala de aula nas
turmas de Educação de Jovens e Adultos. Geralmente o aluno que participa dos cursos ainda não
tem a capacidade de ler e compreender textos e alguns conteúdos matemáticos como a geometria
e o sistema de medidas, além de as ações dos cursos estarem voltadas para o mercado que exige

628
Categoria: Comunicação | Subtema 5 : Mundos e Culturas do Trabalho
uma análise de problemáticas financeiras. Então o professor da EJA a partir dos problemas enfrenta-
dos pelos alunos e levados por eles para a sala de aula, na capacidade de leitura, escrita e conteúdos
matemáticos já especificados elabora-se atividades e provocações especificamente para o avanço
de suas aprendizagens. Como pontua a Proposta Pedagógica do Projeto Sesc Ler, afirmando que:

Nessa perspectiva, os conteúdos deixam de ser um fim em si mesmos, ganham


significados diversos a partir das experiências sociais do grupo e passam a ser meios
para a ampliação do universo do aluno, mediando o seu contato com a realidade
de forma crítica e dinâmica. Além disso, são estudados de maneira flexível e abran-
gente, libertos de uma concepção rígida de sequênciação e hierarquização, o que
permite um tratamento diferenciado, de acordo com o perfil dos alunos. (Sesc, 2000,
pág. 24).

Ao analisar este trabalho focado na geração de renda numa experiência de Educação de Jovens e
Adultos observa-se uma relação do mesmo com o que já é garantido aos discentes da EJA rumo ao
mercado de trabalho como é apresentado na LDB 9394/96, Art. 37. § 3º, com a proposição da articu-
lação da educação de jovens e adultos com a educação profissional. Este trabalho tem apresentado
resultados significativos nos diferentes participantes, conforme relatos acima, mantendo a essência
da sua proposição que é a autonomia na geração de renda independentemente dos caminhos que
os participantes vão trilhando, seja como costureira numa fábrica de lingerie, seja na fabricação de
tapetes ou fronhas, após o término dos cursos novos horizontes surgem e esse é apenas um dos
caminhos que o fomento das ações de formação pode levar.
Destaca-se ainda que as ações dos cursos apresentam características da sustentabilidade social
e ambiental, quando se trata, no caso do reaproveitando dos retalhos de tecidos e demais resíduos
que excedem do processo de costura, que são vistos por outro ponto de vista colaborativo para a
redução da exploração de recursos naturais. Para dialogar sobre isso JR e Pecilione (2013) apontam
que os consumos dos recursos dos ambientes estão claramente se esgotando, sem que se faça hoje
algo que os poupe para amanhã. Então reaproveitar a matéria prima já explorada é uma das possi-
bilidades de minimizar o problema ambiental e social que se enfrenta atualmente.
Outro ponto que se pode refletir neste trabalho em andamento de cursos é o fato de se formar
novos empreendedores que segundo Gutierrez (2006), são indivíduos capazes de acreditar e tra-
balhar incansavelmente para concretizar um sonho e que eles tem basicamente três características
fundamentais, são elas: planejar, acompanhar e avaliar os resultados, é isso que o Curso Aprender a
Empreender – têxtil e confecção vem difundindo com uma população de baixa renda.
Ao longo dos últimos cinco anos os alunos da Educação de Jovens e Adultos do Sesc Ler e a co-
munidade de Piripiri tem participado de um processo educativo construtivo e formativo focado no
incentivo à geração de renda, a partir do reaproveitamento do que poderia ser descartável, o retalho
de tecidos, fruto da vocação de trabalho da cidade que é a confecção, com incentivo a novos empre-
endedores. Além disso, contribuindo para uma relação desejada do ser humano com o ambiente de
uma maneira sustentável.

referênciAs
BRASIL. Lei de Diretrizes de Bases da Educação. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/cci-
vil_03/Leis/L9394.htm>. Acesso em: 11 de set. 2014.
GUTIERREZ, Patrícia Liz. Aprender a Empreender: têxtil e confecção. Brasília: Sebrae, 2006.
JR, Alindo Philippi & Pelicione, Maria Cecília Foncesi. Educação Ambiental e Sustentabilidade. 2 ed.
Barueri/SP: Manole, 2013

629
Categoria: Comunicação | Subtema 5 : Mundos e Culturas do Trabalho
SEBRAE – PI. Relação das Indústrias de Confecção da Cidade de Piripiri – PI. 2013;
SEBRAE – PI. Diagnóstico da Indústria de Confecção da Cidade de Piripiri – PI. 2013;
SESC, Serviço Social do Comércio. Proposta Pedagógica do Sesc Ler, Rio de Janeiro, 2000;

630
cAtegoriA 2

poster

sUbtemA 1

DiverSiDaDe e eDuCação
De JovenS e aDultoS
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
AlUnos especiAis nA edUcAção de joVens e AdUltos
AdonAi bArbosA dA costA | Aline silVA dos sAntos
André lUis de moUrA pessoA

A pesquisa ligada ao subprojeto Pedagogia UERJ/Maracanã na Educação de Jovens e Adultos, ini-


ciada no mês de julho do ano corrente, em uma Escola Municipal do Rio de Janeiro observa que a
questão da educação inclusiva é uma inquietação constante dos professores do PEJA. Este trabalho
pretende apresentar a inserção de bolsistas de Iniciação à Docência PIBID/CAPES-UERJ nesta Escola
Municipal do Rio de Janeiro na qual existe a modalidade PEJA. Desde a primeira visita o tema em
foco apresentado pelos professores da escola é a inclusão e a forma como este processo se dá; as
turmas têm grande quantidade de estudantes especiais. Como bolsistas pretendemos compreen-
der a complexidade da inclusão, em especial a dificuldade apresentada pelo corpo docente em re-
alizar a inclusão dos alunos com necessidades educacionais especiais por conta de suas condições
de trabalho. Baseando-nos sempre na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional-LDB (Lei n°
9394/96) 20 de dezembro de 1996, na Constituição Federal Brasileira de 1988, Política Nacional de
Educação Especial de 1994 e Márcia Denise Pletsch Doutora em Educação UERJ. A metodologia ado-
tada é a pesquisa qualitativa, consistindo em duas visitas semanais nesta Escola Municipal, na qual
elaboramos relatórios supervisionados e assim analisaremos os recursos que os alunos especiais
têm na Educação de Jovens e Adultos (EJA) buscando uma reflexão direta entre teorias e práticas.

palavras-chave: iclusão, jovens, adultos, peja

introdUção
O presente trabalho apresenta a pesquisa de bolsistas de iniciação à docência PIBID/CAPES-UERJ
ligada ao subprojeto Pedagogia UERJ/Maracanã na Educação de Jovens e Adultos, iniciada no mês
de julho do ano de 2014 em uma escola municipal da zona norte do Rio de Janeiro.
Em um diagnóstico inicial realizado no encontro de apresentação do corpo docente aos bolsistas,
observamos que a questão da Educação Inclusiva é uma inquietação constante dos professores do
PEJA – Programa de Educação de Jovens e Adultos.
Desde a nossa primeira visita à escola, o tema em foco apresentado pelos professores é a inclusão
e a forma como esse processo se dá com a formação de turmas com grande quantidade de estudan-
tes com necessidades educacionais especiais, com e sem laudo médico, e as tensões resultantes da
falta de recursos adequados para atender as demandas destes estudantes.
Como bolsistas de iniciação à docência, pretendemos apresentar como esse processo de inclusão
– que já possui um elevado grau de complexidade no cotidiano da escola, requerendo capacitação
específica, recursos e instalações adequadas – vem sendo precarizado na prática docente, ficando
a cargo dos professores e direção escolar receber alunos com necessidades educacionais especiais
sem laudo médico, portanto sem o direto a um currículo adaptado, mediador e adequação do es-
paço físico.
Nesta inserção pretendemos, após um período de observação, propor um projeto que reduza o
hiato provocado pelo distanciamento de uma condição ideal para a prática docente e o dia a dia
dos professores envolvidos neste processo, por conta da dificuldade de aprendizado de alguns es-
tudantes que deveriam ter um atendimento educacional especializado, e não o tem também pela
falta de especialização do docente, devido ao currículo, para atendimento aos alunos portadores de

632
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
necessidades educacionais especiais.
Com o iniciar de nossa pesquisa vislumbramos a possibilidade de interagir com estes alunos e
comunidade escolar, com o intuito de aumentar a autoestima deste estudante que não concluiu
seus estudos em idade própria, e agora, por vezes, sente-se inferior devido suas consecutivas repro-
vações. Valorizando o saber destes sujeitos que tem dificuldade de aprendizado, mas tem habilida-
des e competências em diversos ramos da vida prática, estimulando esses múltiplos saberes fora do
espaço escolar, utilizando para isso suas atividades diárias, reconhecendo estas enquanto profissões
e dando visibilidade a suas realidades culturais, lançando mão de técnicas do Teatro do Oprimido
(BOAL, 1991).
objetiVos
• Entender as necessidades dos estudantes e professores envolvidos neste contexto de edu-
cação especial.
• Contextualizar as necessidades dos estudantes no cotidiano escolar.
• Participar do processo ensino/aprendizagem de alunos do PEJA em uma escola da zona
norte do Rio de Janeiro, valorizando seus conhecimentos fora do espaço escolar.
• Compreender as questões de inclusão.
• Elaborar estratégias e atuação.
• Buscar uma reflexão entre teoria e prática. Por que tantos alunos com necessidades educa-
cionais especiais interrompem seus estudos no ensino regular e os retomam na educação
de jovens e adultos?
• Qual formação curricular, o professor do PEJA recebeu para atender estes alunos com ne-
cessidades especiais em sua classe regular?
• Quais os tipos de necessidades que ele apresenta?
• Quais os tipos de suporte que a escola oferece?

jUstificAtiVA
A escola apresenta na sua composição organizacional eventos ligados as artes cênicas, podemos
citar dois exemplos nesse período de observação, uma festa julina com participação massiva dos
estudantes e professores, neste evento podemos observar que a teatralização não é um recurso
estranho a esse meio, pois neste evento contemplamos alguns estudantes com domínio de cena e
presença de palco, refletindo nos demais partícipes a exemplificação da possibilidade da expressão
de sentimentos através dessa arte e a montagem de uma adaptação de “Vidas Secas” de Graciliano
Ramos, lançando mão da mesmo recurso artístico, a arte é uma inquietação e habita todos os seres
humanos e está se expressa de formas diferenciadas.
Vemos que uma forma de integrar os estudantes sem distinção de qualquer natureza dar-se-á
pelo uso das técnicas teatrais.

metodologiA
A metodologia adotada consiste em duas visitas semanais a uma escola municipal do Rio de
Janeiro, na qual realizamos estágio docente através de observação participante e de coleta e elabo-
ração de material empírico objetivando compreender a questão da inclusão nas turmas e elaborar
estratégias de atuação na escola com orientação da supervisora do subprojeto buscando também
uma reflexão direta entre teorias e práticas.

633
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Um poUco dA históriA...
A educação especial tornou-se aparente na Europa a partir do século XVIII, anterior a este período
a evolução das relações na sociedade no que tange as pessoas com necessidades especiais, se deu
de forma lenta e gradual.
Segundo Pessoti (1986), houve tempos em que as pessoas com deficiência eram eliminadas por
motivos religiosos ou por confianças de que estas pessoas possuíam algum tipo de doença conta-
giosa, a eliminação dessas pessoas também se deu pela obsessão vinculada a ideia de sociedade
hegemonia que se tornou alvo durante toda a época nazista.
A educação de pessoas com deficiência foi considerada mediante o surgimento das instituições
especializadas para cegos e surdos que não tinham acesso ao ensino regular por serem classificados
como anormais.
Segundo Marcia Denise Pletsch (2010), a Educação especial iniciou suas atividades no Brasil no
período imperial, a partir de 1854 com a criação do Imperial Instituto dos Meninos Cegos e Impe-
rial Instituto dos Surdos-Mudos, que na atualidade funciona respectivamente, o Instituto Benjamin
Constant (IBC) e Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES). A partir da inauguração destas
instituições que surge o movimento Educacional para pessoas especiais, na época vistas como de-
ficientes.
Marcia Denise Pletsch (2010) lembra, ainda, que no século XIX não havia no Brasil legislação ou
diretrizes que regia a conduta dos sujeitos especiais e estes dois institutos foram atos isolados. É a
partir do século XX que surgem em vários documentos o conceito de sociedade onde todos têm os
mesmos direitos.
Podemos observar na Declaração Universal Dos Direitos Humanos adotada e proclamada pela
resolução 217 A (III) da Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948, que em
seu Artigo II diz:

“Toda pessoa tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos


nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua,
religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza,
nascimento, ou qualquer outra condição.”

Ainda nesta mesma ótica vemos no século XX o nascer do fruto da Conferência de 1994 organiza-
da pelo Governo da Espanha em cooperação com a UNESCO, que reuniu mais de trezentos profissio-
nais da área de educação para tratar da Educação inclusiva resultando na Declaração de Salamanca,
que tem seu principal objetivo pautado em “escolas para todos”.
Assim a preocupação com a Educação para todos se dá visivelmente só a partir do século XX,
onde estes documentos ganham força na implementação de políticas de universalização da educa-
ção básica e de inclusão escolar em nosso país.
Com base na compreensão das interações entre igualdade e de diversidade Lima (2006) segue
explicando:

“No Brasil, foram coletados dados alarmantes que se constituem em elementos


de fundamental importância para compreensão do surgimento da proposta de in-
clusão. São eles: (a) o fracasso escolar, a evasão e a repetência, especificamente das
crianças pobres; (b) o aumento da demanda pela criação de classes e escolas es-
paciais, sobretudo na década de 1980. Tudo isso propiciou o questionamento e as
propostas de reformulação dos sistemas de ensino, como citamos anteriormente. As

634
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
demandas dos movimentos sociais confluíram para elaboração de uma Constitui-
ção Federal que incorporasse os anseios que se desenvolviam em relação à Educa-
ção para todos” (p.29).

Conforme apresenta Lima (2006), organizações da sociedade civil e associações de pessoas com
necessidades especiais iniciam um processo coletivo de reivindicações para políticas educacionais.
A partir dos anos em 1990, a exclusão social vem sendo desmontada pela mídia abrangendo as
pessoas com deficiência, resultando na tomada de medidas a fim de facilitar a vida das pessoas com
necessidades especiais resultando na expansão da determinação de práticas sociais inclusivas em
diversos locais de trabalho. A imprensa de maneira geral mascara ao mostrar pessoas com necessi-
dades especiais que se destacam na sociedade. Um exemplo são os atletas partícipes das Paraolimí-
adas.
Nasce também no século XX, em 1994, a Política Nacional de Educação Especial na perspecti-
va da Educação Inclusiva tem como objetivo garantir a inclusão escolar de alunos com deficiência
assegurando-lhes o acesso ao ensino regular e aos níveis mais elevados do ensino para estes alunos,
ou seja, garantir de fato o processo de inclusão.
A partir destes eventos iniciais a “educação inclusiva” como parte de uma política mais ampla de
inclusão social ganhou destaque, sobretudo a partir da implementação da Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional (LDBEN nº 9.394/96). A partir deste marco inúmeras outras leis foram elabora-
das para garantir os direitos sociais e educacionais dessas pessoas.
A partir do governo de Luiz Inácio Lula da Silva houve grandes investimentos políticos e financei-
ros para promover a inclusão social e educacional, o que resultou em um grande salto para o atendi-
mento educacional especial. Em 2009 foi garantido, por lei, que deverá ser oferecido aos portadores
de necessidades especiais uma sala de recursos multifuncionais na própria escola de ensino regular
ou em outra escola desde que seja no turno inverso, podendo ser realizado também em Centro de
Atendimento Educacional Especializado da rede pública ou de instituições sem fins lucrativos.
A qualificação dos professores está sendo muito precária, o que dificulta o processo de inclusão
de alunos com necessidades especiais na escola regular, pois, muitas das vezes esse profissional
generalista vai para uma sala de aula sem qualificação e recebe um aluno que requer um cuidado
maior, um trabalho diferenciado. Visando modificar o quadro deste profissional despreparado, en-
trou no currículo da pedagogia disciplinas e atividades que preparem este professor a trabalhar com
a diversidade em sua sala de aula.
A Educação Especial iniciou seus programas aqui no Brasil em meados do século XIX. As primeiras
iniciativas ocorreram com a criação de Institutos visando educar cegos e surdos. Somente em 1973
a educação especial foi institucionalizada com a criação do Centro Nacional de Educação Especial
(CENESP), que depois passou a se chamar Secretaria de Educação Especial (SEESP), e hoje é denomi-
nada SECADI Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização Diversidade e Inclusão.
A ideia de educação para todos surge mais forte apenas nos anos noventa, principalmente a
partir de 1996, com a implementação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação nacional (LDBEN n°
9.394/96), que dedicou um capítulo à Educação Especial, aumentando, assim a preocupação com o
oferecimento da educação básica para os portadores de deficiência.

o qUe é edUcAção especiAl?


A Educação Especial apoia alunos com deficiência física, mental, intelectual, visual, auditiva,
transtornos globais do desenvolvimento, inclusive alunos que mostram ter altas habilidades / su-
perdotação.
Para auxiliar um aluno com deficiência que se encontra em uma turma regular o Atendimento

635
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Educacional especializado (AEE) tem como objetivo complementar a educação deste aluno garan-
tindo-lhe sua permanência na escola regular, oferecendo primeiro; boas condições para sua loco-
moção e de mobiliário na escola, por exemplo, e em consequência para o ensino em si. O AEE deve
ser realizado na sala de recursos multifuncionais da própria escola ou em outra escola de ensino
regular no contra turno.
O presente estudo visa compreender como a educação inclusiva é vivida nas escolas de ensino a
jovens e adultos, tendo em foco como estes alunos são conduzidos dentro da sala de aula e como os
gestores trabalham com este tema, haja vista que todas as regras partem destes dentro de uma uni-
dade escolar, precisamos compreender seus pensamentos, atitudes e definitivamente suas ações.
Não há uma única forma de atender as necessidades educacionais de todos os alunos com de-
ficiência, isto é, não há um programa padrão, uma única oferta de serviços, um único local onde a
educação seja oferecida e um currículo único (GLAT & PETSH, 2009, s/p).
Por muito tempo perdurou o entendimento de que a educação especial organizada de forma pa-
ralela à educação comum seria mais apropriada de formar alunos com necessidades especiais, e esta
ideia foi duradoura na área da educação, mas a defesa dos direitos humanos vem desconstruindo
esta falsa realidade.

como se encontrA estA edUcAção inclUsiVA nA práticA dA ejA?


Num primeiro contato com a escola a coordenadora e os professores da unidade nos relataram
as condições dos estudantes do PEJA em relação a concentração de alunos com necessidades edu-
cacionais especiais. Informaram que alguns são matriculados sem laudo médico, entretanto são
visivelmente portadores de necessidades especiais, implicando em alguns problemas, como por
exemplo: não garantir os seus direitos; currículo adaptado; terem um mediador e utilização da sala
de recursos.
Neste primeiro encontro, percebe-se um certo receio por parte de alguns professores da unida-
de com relação a presença dos bolsistas do PIBID propiciada pela falta de conhecimento acerca do
projeto em questão. No decorrer das atividades este mal estar foi se desfazendo, pelo fato de ficar
evidente que a entrada deste projeto na escola visa atuar na melhoria do processo de formação de
docentes e objetiva também somar no que diz respeito a prática docente no enfrentamento desta
problemática, lançando mão de recursos que atuem enquanto catalizadores dos saberes dos alunos
através destes aumentando sua autoestima.
Durante as atividades no subprojeto, encontrou-se um corpo docente muito preocupado no que
diz respeito à educação inclusiva no PEJA, pelo fato destes alunos não acompanharem o desenvolvi-
mento da turma e por muitas vezes não terem se quer o discernimento para procurar ajuda médica,
e a família em alguns casos age da mesma forma, conforme relatos advindos da secretaria/direção
desta escola, o que resulta um aluno cursar por vários e vários anos uma mesma classe de alfabe-
tização. Pois há alunos visivelmente especiais que não possuem laudo e permanecem as vezes por
anos numa mesma classe, sem perspectiva de mudança e sem o apoio da escola que por sua vez
nada pode fazer a respeito de alunos que não tem a comprovação de suas necessidades especiais.
Ficando a cargo da escola; direção e professor, elaborar estratégias de respaldo para justificar a rein-
cidência de um aluno em uma mesma classe.
Mesmo se tratando de uma classe de ensino onde não houvera oportunidade em sua idade pró-
pria, a Educação de Jovens e Adultos deve garantir por lei a flexibilidade curricular tal como as es-
colas de turnos regulares, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n° 9394/96 de 20 de
dezembro de 1996) enfatiza a importância das práticas inclusivas no cotidiano da escola e da inser-
ção, no projeto político pedagógico da mesma, de adaptações curriculares – medidas pedagógicas
que promovam o desenvolvimento e a aprendizagem dos alunos com necessidades educacionais

636
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
especiais.
Pautados nesta lei, em seu Capítulo II, seção V, artigo 37 estabelece a Educação de Jovens e adul-
tos para àqueles que não tiveram acesso aos estudos na idade própria, em seu parágrafo primeiro e
segundo lemos:
§ 1º Os sistemas de ensino assegurarão gratuitamente aos jovens e aos adultos, que não
puderam efetuar os estudos na idade regular, oportunidades educacionais apropriadas,
consideradas as características do alunado, seus interesses, condições de vida e de trabalho,
mediante cursos e exames.
§ 2º O Poder Público viabilizará e estimulará o acesso e a permanência do trabalhador na
escola, mediante ações integradas e complementares entre si.
Lemos ainda em seu Capítulo V da educação especial, artigo 59:
Art. 59. Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com deficiência, trans-
tornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação: (Redação
dada pela Lei nº 12.796, de 2013)
I - currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específicos, para
atender às suas necessidades;
II - terminalidade específica para aqueles que não puderem atingir o nível exigido
para a conclusão do ensino fundamental, em virtude de suas deficiências, e aceleração
para concluir em menor tempo o programa escolar para os superdotados;
III - professores com especialização adequada em nível médio ou superior, para
atendimento especializado, bem como professores do ensino regular capacitados
para a integração desses educandos nas classes comuns;
IV - educação especial para o trabalho, visando a sua efetiva integração na vida em
sociedade, inclusive condições adequadas para os que não revelarem capacidade de
inserção no trabalho competitivo, mediante articulação com os órgãos oficiais afins,
bem como para aqueles que apresentam uma habilidade superior nas áreas artística,
intelectual ou psicomotora;
V - acesso igualitário aos benefícios dos programas sociais suplementares disponí-
veis para o respectivo nível do ensino regular.

Nosso olhar está voltado para a Educação de Jovens e Adultos pautados nestas leis que circundam
o atual cenário da concepção de “Educação para todos”, não perdendo de vista que esta temática é
fruto de uma luta, que deixou marcas durante a história, pois a educação especial teve uma longa
trajetória de exclusão até os dias de hoje, podemos inferir que esta sofreu um processo de “evolu-
ção” desde a barbárie cometida na Antiguidade Clássica na busca de uma “perfeição”, que consistia
na eliminação dos indivíduos que estivessem fora deste padrão, na demonização proclamada na
Idade Média e também na eliminação dos indivíduos no nazismo embasada “numa motivação apa-
rentemente irracional, guiada pelo princípio da eugenia, ou seja, de purificação da raça, a partir do
pressuposto da superioridade ariana” (LIMA, 2006, p.27)

desenVolVimento
Durante o primeiro mês na escola, acompanhamos as aulas - nas oito turmas do PEJA -com o in-
tuito de conhecer a comunidade escolar, onde os professores e estudantes tiveram a oportunidade
de nos reconhecer como parceiros.
Além da nossa presença efetiva em sala de aula tivemos a oportunidade de presenciar a festa

637
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Julina, onde vivenciamos um momento de aprendizado fora da sala de aula.
A partir destas primeiras impressões surgiu o desejo no grupo de estudar com afinco sobre a
questão que é central nesta escola: Alunos Especiais na Educação de Jovens e Adultos.
Tendo em vista o grande número de alunos com necessidades educacionais especiais sem laudo
e os questionamentos dos professores com relação a dificuldade em atendê-los, pensamos em um
projeto que incentive estes alunos a continuar estudando, pois os mesmos sentem-se desmotivados
ao perceberem que estão há anos em uma mesma classe de alfabetização. Neste período de obser-
vação a afinidade da escola com a linguagem do teatro, expressa na festa Julina nos deu a certeza
de que estávamos caminhando na direção certa e que esta ferramenta é imprescindível para o êxito
deste projeto. Agora a arte teatral será utilizada enquanto ferramenta pedagógica. Desenvolvemos
um projeto dentro do projeto PIBID.

projeto identidAde

objetiVos
• Despertar as habilidades e especificidades de cada estudante.
• Compreender os saberes advindos de suas experiências profissionais e pessoais, principal-
mente dos estudantes que apresentam dificuldade de aprendizado, sobre as diversas pro-
fissões existentes neste universo observado (costureira, eletricista, DJ, Cozinheira, escritor,
figurinista, etc.) para aplicá-los através do teatro como elemento facilitador do processo
ensino/aprendizagem.

jUstificAtiVA
Essa proposta visa contribuir para o aumento da autoestima de cada aluno do PEJA corroborando
para o seu pertencimento na sociedade de forma mais ativa. Durante este projeto cada um se iden-
tificará com uma profissão relativa à prática teatral para montagem de um espetáculo e contribuirá
para a realização do evento de culminância.

procedimentos
Essa proposta poderá contribuir para a autoestima de cada aluno do PEJA contribuindo para o
seu pertencimento na sociedade ativa. Durante este projeto cada um se identificará com uma pro-
fissão e contribuirá para a realização do teatro, sentindo-se um ser relevante e indispensável para a
proposta.
cronograma
Agosto: Planejamento e apresentação aos professores.
setembro: Início do projeto (pre produção)
outubro: Ensaios e montagem
novembro: Apresentação do teatro (Culminância).

considerAções finAis
Sendo a Educação Especial um apoio aos alunos com deficiência física, mental, intelectu-
al, visual, auditiva, transtornos globais do desenvolvimento, inclusive alunos que mostram ter altas
habilidades/superdotação para auxiliá-los é necessário um Atendimento Educacional Especializado

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
(AEE) - garantido como lei pela Resolução n.4/2009, no artigo 5º onde aponta que o Atendimento
Educacional Especializado deve ser realizado na sala de recursos multifuncionais da própria escola
ou em outra escola de ensino regular no contra turno- que tem como objetivo complementar a
educação deste aluno garantindo-lhe sua permanência na escola regular, oferecendo primeiro; boas
condições para sua locomoção e de mobiliário na escola, por exemplo.
Como nosso projeto ainda está em andamento, e nossa pesquisa ainda está no nível
inicial, não temos dados finais e sim parciais destes estudos. Podemos dizer que a escola, como nos-
so objeto de pesquisa, não tem capacidade estrutural, em termos de acessibilidade, para receber
alunos com necessidades especiais, se quer a escola tem um espaço propício para oferecer o Aten-
dimento Educacional Especializado, que acontece em uma sala com dimensões reduzidas, funcio-
nando esta com o auxílio de doações de materiais para manter seu funcionamento, já que a escola
é bloqueada a receber verbas por não possuir uma sala adequada.
Após este processo de imersão em uma realidade muito distante da teoria, tínhamos um ho-
rizonte inicial alinhado com o projeto de pesquisa do PIBID, em apresentar proposta de acréscimo
curricular para formação docente na modalidade EJA, neste contato ficamos cientes das demandas
vemos de que forma as relações se estabelecem na escola. No diagrama a seguir, procuramos de-
monstrar de forma esquemática como essas relações acontecem.

Diagrama 1

639
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
referênciAs bibliográficAs
BOAL, Augusto. Teatro do Oprimido e Outras Poéticas Políticas. Rio de Janeiro: Editora Civilização Bra-
sileira, 1991.
BRASIL. Ministério da Educação. Diretrizes Operacionais para o Atendimento Educacional Especiali-
zado na Educação Básica, modalidade Educação Especial. Brasília, 2009.
BRASIL. Declaração de Salamanca e linha de ação sobre necessidades educativas especiais. Brasília:
UNESCO, 1994.
BRASIL. Ministério da Educação. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. LDB 9.394, de 20 de
dezembro de 1996.
BRAUN, Patrícia e VIANNA, Márcia Marin. Atendimento educacional especializado, Sala de recursos
Multifuncional e Plano individualizado: desdobramentos de um fazer pedagógico. In: Educação Especial
e Inclusão Escolar: reflexões sobre o fazer pedagógico. Rio de Janeiro: EDUR,2009. pp.23-34.
MACEDO, Patrícia Cardoso; CARVALHO, Letícia Teixeira e PLETSCH, Márcia Denise. (org.). Atendimen-
to educacional especializado: uma breve análise das atuais políticas de inclusão. In: Educação Especial e
Inclusão Escolar: reflexões sobre o fazer pedagógico. Rio de Janeiro: EDUR,2009. pp.23-34.
LIMA, Priscila Augusta. Educação inclusiva e igualdade social. São Paulo: Avercamp, 2006.

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
AtiVidAde físicA em espAços nAtUrAis: UmA
possibilidAde de AprendizAgem nA edUcAção de
joVene e AdUltos
silVAnA dA silVA morAes | nAtáliA moUrA diAs de lUcenA

A cultura corporal de movimento tem uma relação estreita com a Educação de Jovens e Adultos,
uma vez que considera a lida diária dos alunos, seja no campo, na roça, na colheita, seja na cidade
com o corre-corre do trabalho. Todos os educandos de EJA trazem uma bagagem de conhecimen-
tos de outras instâncias sociais. São experiências de vida significativas e devem ser consideradas na
elaboração do currículo escolar, o qual precisa ter metodologia diferenciada e própria para a pessoa
jovem e adulta. É importante compreender que mesmo havendo experiências acumuladas com o
movimento e muitas vezes, uma rotina exaustiva pelo excesso dele, a Educação Física tem um pa-
pel fundamental no aprendizado com esse público, buscando oportunizar atividades diversas, que
levem em conta seu contexto social, o espaço e o tempo da e na escola, além das idades variadas.
Neste sentido utilizar espaços naturais das cidades onde os Centros Educacionais do Projeto Sesc Ler
estão inseridos, é uma possibilidade de desenvolver práticas corporais, que favoreçam aspectos, não
apenas físicos, mas de integração, de relacionamento interpessoal, de lazer e até ambientais. Neste
trabalho apresentamos experiências de atividades físicas realizadas em igarapés, rios e floresta do
município de Inhangapi, cidade onde o Sesc desenvolve o Projeto Sesc Ler, voltado para alfabetiza-
ção e escolarização de jovens e adultos. A intenção das atividades foi de utilizar espaços externos da
comunidade para as aulas de Educação Física, escolhidos coletivamente, aliando as ações pedagó-
gicas ao incentivo de hábitos saudáveis, compreendendo ambientalmente o entorno, executando
atividades significativas em espaços naturais e desenvolvendo aspectos globais (físico, bio-psiquico
e social) além de articular diferentes gerações de alunos jovens e idosos num mesmo espaço.

palavras-chave: Educação de Jovens e Adultos, Atividade Fisica, Projeto Sesc Ler

introdUção
A cultura corporal de movimento tem uma relação estreita com a Educação de Jovens e Adul-
tos, uma vez que considera a lida diária dos alunos, seja no campo, na roça, na colheita, seja na cida-
de com o corre-corre do trabalho.
Todos os educandos de EJA trazem uma bagagem de conhecimentos de outras instâncias
sociais. São experiências de vida significativas e devem ser consideradas na elaboração do currículo
escolar, o qual precisa ter metodologia diferenciada e própria para a pessoa jovem e adulta.
É importante compreender que mesmo havendo experiências acumuladas com o movimen-
to e muitas vezes, uma rotina exaustiva pelo excesso dele, a Educação Física tem um papel funda-
mental no aprendizado com esse público, buscando oportunizar atividades diversas, que levem em
conta seu contexto social, o espaço e o tempo da e na escola, além das idades variadas.
Neste sentido utilizar espaços naturais das cidades onde os Centros Educacionais do Proje-
to Sesc Ler estão inseridos, é uma possibilidade de desenvolver práticas corporais, que favoreçam
aspectos, não apenas físicos, mas de integração, de relacionamento interpessoal, de lazer e até am-
bientais.
Neste trabalho apresentamos experiências de atividades físicas realizadas em igarapés, rios
e florestas do município de Inhangapi, uma das cidades onde o Sesc desenvolve o Projeto Sesc Ler,
voltado para alfabetização e escolarização de jovens e adultos.

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
A intenção das atividades foi de utilizar espaços externos da comunidade para
as aulas de Educação Física, escolhidos coletivamente, aliando as ações pedagógi-
cas ao incentivo de hábitos saudáveis, compreendendo ambientalmente o entorno,
executando atividades significativas em espaços naturais e desenvolvendo aspectos
globais (físico, bio-psiquico e social) além de articular diferentes gerações de alunos
jovens e idosos num mesmo espaço.

A edUcAção físicA e A cUltUirA corporAl de moVimento nA ejA

(...) Em síntese, a apropriação da cultura corporal de movimento, por meio da


Educação Física na escola, pode e deve se constituir, num instrumento de inserção
social, de exercício da cidadania e de melhoria da qualidade de vida.
(Educação Física na Educação de Jovens e Adultos, vol.3_p.232)

Reportando-nos à citação acima, a atividade escolar com jovens e adultos remete a inúmeras pos-
sibilidades de situações educativas que possibilitam a aquisição da autonomia, bem como, criam
oportunidades de socialização e de lazer para esses alunos, o que muito tem contribuído para o bem
estar coletivo das turmas do Projeto Sesc Ler1.
O trabalho com Educação Física na EJA tem sua importância justificada pelo fato de favorecer o
desenvolvimento de habilidades corporais e a participação em atividades culturais, como danças,
jogos, lutas, esportes, estimulando o convívio social, o autoconhecimento, a autovalorização e a ex-
pressão de sentimentos, afetos e emoções.
Ao contrário do que ocorre em muitas escolas, onde a Educação Física fica à margem de outras
disciplinas, temos avançado, no Projeto Sesc Ler, em Inhangapi –PA, no sentido de garantir a presen-
ça dos alunos nas aulas, promovendo o incentivo das atividades físicas, haja vista, a ênfase dada ao
cultivo de mudança de hábitos que levem à promoção da saúde e garantam o conhecimento sobre
o próprio corpo.
A maior expectativa do trabalho da Educação Física como cultura corporal não é dar ênfase à ap-
tidão física e ao rendimento padronizado, que desconsidera as diferenças individuais. Mas valorizar
e considerar aspectos sócio-históricos de cada atividade trabalhada, como também o contexto no
qual os alunos estão inseridos e as competências motoras individuais, independentemente do nível
de habilidade que apresentem. Logo, o fundamental é dar acesso às práticas corporais, colaborando
para que cada um dos alunos construa o seu estilo pessoal de participação.

As AUlAs de edUcAção físicA e os AlUnos de ejA

“Os alunos da EJA são diferentes dos alunos presentes nos anos adequados à sua
faixa etária. São Jovens e Adultos, muitos deles trabalhadores, maduros, com larga
experiência profissional ou com expectativa de (re)inserção no mercado de trabalho
e com um olhar diferenciado sobre as coisas da existência.
(BRASIL, 2000, p.33. In: O saber da gente, sobre uma educação para o povo. p.
148).

Nossos alunos, não fogem às características dos demais alunos de EJA espalhados pelo Brasil,
1 Projeto de Alfabetização e Escolarização na primeira etapa do Ensino Fundamental, para jovens e adultos, organizado e implantado pelo
Serviço Social do Comércio, em diferentes cidades do interior do Brasil, desde 1999.

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
principalmente os existentes em cidades interioranas. Não se escolarizaram na idade certa; a faixa
etária é bastante variada; trabalham nas lavouras: plantando, cultivando e colhendo, de sol a sol, nas
vilas do interior, na zona rural, ou estão empregados na fábrica de cerâmica da cidade, realizando
atividades laborais pesadas, com significativa carga horária e salários baixos, tendo poucas expecta-
tivas para o futuro.
A heterogeneidade do grupo quanto a faixa etária, talvez seja um dos grandes desafios da Educa-
ção Física na EJA. A partir daí começamos a pensar o que ensinar e como ensinar para esse público
– jovens, adultos e idosos. Evidenciamos a preocupação com as particularidades de cada um, como
isso reflete em seus corpos marcados pelo cansaço, pela exclusão, pela vulnerabilidade, pela idade.
Cabe ao professor de Educação Física, buscar estratégias que facilitem a eficácia do processo de
aprendizagem.

Assim, ao pensarmos na EJA, onde existe um contexto específico, que exige dos
educadores diversas (re)invenções dos diferentes componentes curriculares, enten-
demos que a prática da Educação Física precisa ser repensada e recriada a partir
da diversidade e das especificidade dessa modalidade da educação.( Ferreira, 2010,
p.6.)

Quando os conhecimentos e as experiências de vida dos alunos são considerados, cria-se um elo
de aproximação com eles, o que facilita o desenvolvimento do trabalho em Educação Física, sobre
os conceitos que já possuem acerca de um determinado assunto ou tema. A relação de afeto e res-
peito desenvolvida nesse contato é medida nos resultados obtidos quanto a frequência e a diminui-
ção no número de evasões o que torna as atividades interessantes e significativas.
Repensar a Educação Física e recriá-la considerando a realidade dos alunos e seu contexto, signifi-
ca também adequar horários, lugares e a disponibilidade desse público. Caso contrário, a imposição
por parte do professor poderá afastá-los e muito da escola.
Outro aspecto importante é quanto à avaliação das aulas. Como avaliar um aluno no final de um
processo de aprendizagem? Como saber se o aluno aprendeu, e quanto e como ele aprendeu a res-
peito dos conteúdos apresentados?
São ultrapassadas as avaliações atreladas somente aos aspectos motores e aptidões físicas. É ne-
cessário agregarmos outros conceitos e critérios que levem em consideração aspectos qualitativos,
criando possibilidades para os alunos realizarem suas tarefas em seu tempo, seu modo e à sua ma-
neira. Isso significa dizer que o registro e a observação são instrumentos fundamentais para nosso
fazer pedagógico em Educação Física, observando aspectos como: segurança e espontaneidade
com que os alunos lidam com as situações propostas; como estabelecem e cumprem regras e com-
binados coletivos; se participam de forma solidária com os companheiros; como lidam com a perda
e a frustração; como se relacionam no campo das interações interpessoais, uma vez que os grupos
são compostos de idosos, jovens e adultos; quais valores emergem nos contextos de jogos quanto
ao respeito às diferenças físicas, sociais e de gênero, entre outros aspectos que podem ser elenca-
dos, desde que estejam voltados para a valorização da cultura corporal dos movimentos.

Registrar a produção cultural das práticas corporais desenvolvidas no cotidiano


escolar é um instrumento capaz de viabilizar as transformações da prática educati-
va. O professor deve ser incentivado a registrar seu cotidiano, discutir e avaliar suas
práticas junto aos alunos. Incorporar esse procedimento pode alavancar o desenvol-
vimento do projeto educativo, pois, pelo registro, exercita-se a reflexão. (Educação
Física na EJA v. 3. p.232)

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
As atividades da área de Educação Física, devem incluir jogos, esportes, jogos populares, danças,
brincadeiras, trilhas, caminhadas, atividades aquáticas... A integração da Educação Física com as de-
mais áreas do Conhecimento é plenamente possível.

nossA experiênciA nAs AUlAs de edUcAção físicA no sesc ler inhAn-


gApi
Não é nada fácil lidar com as limitações do corpo. Não é nada fácil mediar atividades esportivas
para jovens junto com idosos, por exemplo. Não é nada fácil promover atividades que envolvam
homens e mulheres adultos. Não é nada fácil propor momentos de Educação Física para alunos que
preferem Língua Portuguesa e Matemática. Todas essas questões são desafios a serem enfrentados
e a motivação deve partir do professor, do que irá ensinar, para que seus alunos participem com
alegria e entusiasmo.
Temos em nosso planejamento semanal, duas aulas de Educação Física com os alunos de EJA.
Resolvemos, então, dividi-las em duas noites seguidas. Realizando na primeira noite uma aula ex-
positiva e teórica que abordasse aspectos da saúde, da qualidade de vida e do conhecimento do
próprio corpo. Nessas aulas tratamos de assuntos como: Saúde, prevenção de doenças, doenças
reumáticas, a postura corporal, esforço repetitivo; alimentação aliada a atividade física; hipertenção;
os prejuízos causados pelo álcool e pelo fumo, sexualidade enfatizando as DSTs, os benefícios das
atividades físicas.
O uso de recursos audiovisuais foi, e é, fundamental, para esses momentos, uma vez que favorece
imagens ilustrativas para o melhor entendimento e clareza dos assuntos abordados.
Os professores de turmas, que trabalham com as demais áreas, trazem conteúdos das aulas te-
óricas articulando os conteúdos com Língua Portuguesa, Matemática e Ciências, o que deu maior
significado às aulas.
A noite seguinte é reservada para as atividades práticas e exercícios físicos, na quadra do Centro
Educacional ou em ambientes externos. Nas aulas práticas, às vezes, os alunos são divididos em gru-
pos, considerando faixas etárias ou limitações físicas. Em outros momentos estão todos juntos. Esse
movimento é para contemplar suas diferenças e especificidades.
São diversas as vivências já realizadas como: jogos..., circuitos, caminhadas e aulas-passeio. Os
alunos também participam com sugestões expressando seus interesses e necessidades.
Foi em um desses momentos que resolvemos explorar o ambiente do município de Inhangapi,
rico em vegetação nativa e igarapés2 (escrever na citação 5 o conceito de igarapé), organizando com
os alunos aulas aos sábados pela manhã para que vivessem experiências aquáticas e atividades com
a natureza.
Levamos então, nossos alunos para um Igarapé na comunidade de Santa Maria do Muraiteua
- Inhangapi, PA. Lá chegando, conversamos em roda sobre a proposta da atividade, o lugar onde
estávamos, quem já o conhecia, quem já o havia explorado em suas matas e os igarapés, o percurso
e as tarefas a serem realizadas. Fizemos, ainda acordos combinando regras para a participação de
todos, deixando clara nossa proposta de aula para aquele dia.

AtiVidAdes
Os alunos vivenciaram atividades hidrorrecreativas com materiais flutuantes, momentos de des-
locamentos, brincadeiras coletivas e cooperativas, além de esportes adaptados como vôlei e bas-
quete aquáticos.
2 Igarapé é o curso de um rio ou canal, e o termo significa “caminho de canoa”, e é um termo oriundo do tupi, uma língua
indígena. Igarapé pode ser um estreito ou pequeno canal entre duas ilhas, ou entre uma ilha e a terra firme.

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Realizamos também, nas matas do mesmo local, atividades de trilha; travessia em tirolesa adap-
tada; travessia em troncos de árvores/equilíbrio sobre o igarapé; circuito de obstáculos naturais.
Caminhar em fileiras, ajudar a quem precisa, chegar até o final do percurso, foram atividades vividas
que favoreceram a aquisição de muitas aprendizagens físicas, além de interativas relacionais.
Concebemos os alunos como sujeitos do seu processo de aprendizagem. Desse modo, suas ex-
periências na escola colaboram para confirmar saberes adquiridos e ressignificar suas experiências
socioculturais já vividas, permitindo a construção e apropriação de novos conhecimentos:
Professora pergunta após a atividade:

- Sebastiana, você já havia feito trilha alguma vez?


- Eu não fessora. Com essa palavra, não. Mas tenho andado por dentro desses
matos aí desde que me entendo por gente. E esse negócio de se preparar, de tá vesti-
do dum jeito... fazer alongamento, é só aqui. Porque quando a gente cai no mato, sai
rasgando tudo e nem acontece nada...

A escola não é o único espaço de produção e socialização dos saberes. Todos os alunos trazem
consigo uma bagagem de conhecimentos de outras instâncias sociais. Portanto, as experiências de
vida de cada aluno são significativas e devem ser consideradas na elaboração das atividades esco-
lares.

Inocência – Professora, isso que eu queria toda semana. Praticar essas coisa na
água. O médico disse que é muito bom pra minha idade, mas aqui não tem. Eu gos-
tei muito. Engraçado que esse material é leve aqui fora, mas lá dentro da água fica
pesado, difícil de movimentar. Cansa muito, mas é bom, porque não dói minhas
juntas. Gostei muito mesmo!

O objeto do conhecimento, o conteúdo a ser ensinado e aprendido, é o principal elemento de


mediação entre educadores e educandos, por isso, pensar atividades significativas geradas na esco-
la, e neste caso, práticas de Educação Física para a Educação de Jovens e Adultos, prevê que deve-
mos estar atentos à dinâmica das relações sociais para democratizar o saber. E ainda, que toda ação
educativa esteja voltada aos alunos. Daí, a organização de planejamentos, currículos, atividades que
considerem aspectos dinâmicos do ensino e da aprendizagem, no sentido de realizar aulas inseridas
no contexto social, ao invés de distanciadas da realidade de referência para os alunos.

Raimunda - Nossa! Foi muito bom tudo isso. Ver nossos colegas aqui, na Vila onde

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
eu moro... todo mundo junto... fazendo tudo que a gente faz aqui todo dia, mas de
outro jeito! Aproveitar nossa colônia, nosso igarapé, nossas árvore... nunca vou es-
quecer. Não imaginava que essas coisas podia ser “física”, aí a senhora (se dirigindo
à professora), falou que era sim. Disse que nós, daqui, somos atletas da natureza
porque temos o corpo assim... porque a gente nada, corre, sobe nas árvore, pesca,
rema, anda muito à pé. Essas coisas, eu não sabia não.

Acreditamos que os alunos de EJA devem apreender conteúdos escolares de forma dinâmica,
fazendo o que gostam e aproveitando o tempo, já que a aula de Educação Física tem sido um dos
momentos mais esperados da semana. Para isso, é importante aproveitar essa espera e preparar o
melhor que podermos para conseguir resultados positivos. Nas aulas de Educação Física há espaço
para diversos assuntos: convivência, respeito, altruísmo, solidariedade... além de incluir os temas
transversais: sexualidade, ética, meio ambiente, pluralidade cultural e saúde.
A Educação Física na escola da EJA é um caminho para assimilar e fazer associações com o
cotidiano e, não meramente jogar bola por jogar ou mostrar o corpo humano como um emaranha-
do de termos científicos os quais, provavelmente os alunos não utilizarão ou esquecerão, mas que
nada os impede de conhecer. É um caminho para, através de uma aula-passeio, por exemplo, obter
novo olhar sobre os lugares corriqueiros e comuns da comunidade em que se vive, por onde passam
todos os dias e assim, descobrir que pouco se conhecia sobre aquele lugar.

resUltAdos e considerAções
A participação plena de nossos alunos da EJA, no Sesc Ler Inhangapi, foi desafiadora. Contudo,
considerada pela equipe de professores como um dos maiores e melhores resultados que temos
obtido nos dois últimos anos, contribuindo significativamente com a melhoria da frequência diária,
e principalmente, nos dias das aulas de Educação Física. Interesse despertado, em parte, através das
aulas teóricas sobre o funcionamento do corpo, saúde e qualidade de vida.
Outro aspecto relevante que vem sendo observado é quanto a participação mais espontânea dos
alunos do sexo masculino, nas dinâmicas de grupo, superando comportamentos machistas que os
distanciavam do grupo. Os alunos estão próximos, participam de atividades coletivas, demonstram
com mais naturalidade que estão disponíveis para uma relação mais harmoniosa, em grupo.
Quebra de paradigmas quanto a concepção de que os exercícios físicos prejudicam o corpo tam-
bém já está vencido. Isso pelo processo de compreensão pelo qual passaram buscando entender a
importância de nos exercitarmos a medida que envelhecemos.
Perceber tais resultados no trabalho que realizamos incansavelmente com alunos jovens, adultos
e idosos, é algo que muito nos engrandece e alegra, renovando nosso compromisso social com a
educação desse público, excluído socialmente.
As aulas em espaços naturais se constituiu em uma motivação valiosa para a participação de
todos. Tanto da equipe do Centro Educacional, quanto dos próprios alunos que residem nas locali-
dades escolhidas para as aulas.
A partir dessa experiência temos alunos mais entusiasmados e alegres, dispostos a aprender con-
tinuamente e de forma coletiva. Especialmente na EJA, onde o público é tolhido de muitos direitos.
Procuramos oferecer aos alunos o melhor que temos: nosso compromisso, nosso fazer docente,
nossa competência, nossa reflexão contínua. Procuramos oportunizá-los a momentos de aprendiza-
gens significativas, incentivá-los à criticidade, contribuindo em sua formação por inteiro.
Não obstante aos desafios que ainda existem, nossa comunidade escolar encontra grandes pos-
sibilidades de realizar um trabalho qualitativo em Educação Física, com vista a mudanças e contri-

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
buições à educação no Brasil. Entendemos que precisamos compreender cada vez mais, o direito do
jovem, do adulto e do idoso de serem sujeitos. E de que ainda, precisamos mudar a maneira como a
Educação de Jovens e Adultos é concebida e praticada.
Em nossos desejos de educadores e propósitos educacionais, queremos que nossos alunos sejam
antes de tudo, pessoas felizes, amantes da vida, capazes de suportar as vicissitudes de sua existência
e olhar para o futuro com fé, com esperança. Pessoas encontradas consigo mesmas, conscientes de
suas limitações e possibilidades: por isso capazes de encontrar seu equilíbrio emocional e espiritual.
Queremos contribuir para a formação de pessoas capazes de autoavaliação e autocrítica, capazes
de dialogar e transformar-se. Pessoas que sejam criativas em todos os aspectos de sua existência,
que saibam driblar e superar situações de infelicidade e de dificuldade material, capazes de inventar
e praticar estratégias e alternativas de trabalho e de vida.
Nossos alunos, principalmente por pertencerem às camadas populares e de baixa renda, neces-
sitam apropriar-se do conhecimento acumulado, porque em nossa sociedade, saber é poder. Poder
de interpretar as relações sociais, poder de conhecer os mecanismos que movimentam a sociedade,
o país, o mundo.
Esperamos, cada vez mais, que os educadores, no trabalho junto a suas turmas, criem projetos,
investiguem a realidade, exercitem o olhar para ver sempre sob vários ângulos, confirmando o que
Paulo Freire (1996, p.43) nos diz:

A prática docente crítica, implicante do pensar certo, envolve o movimento dinâ-


mico, dialético, entre o fazer e o pensar sobre o fazer. O saber que a prática docente
espontânea ou quase espontânea “desarmada”, indiscutivelmente produz é um sa-
ber ingênuo, um saber de experiência feito, a que falta a rigorosidade metódica que
caracteriza a curiosidade epistemológica do sujeito.

É nesse sentido que a ação pedagógica, propositiva e transformadora do Projeto Sesc Ler, através
da área de Educação Física, trilha seu caminho, dando sua parcela de contribuição social para a Edu-
cação de Jovens e Adultos no Brasil.

referenciAs bibliográficAs
EDUCAÇÃO FÍSICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS v.3. p.232 - Disponível em:<http://www.
portal.mec.gov.br/secad/arquivos/pdf/eja.../vol3_Edufisica.pdf>. Acesso em: 24 set.2014).{200?}
Ibid., p. 224.{200?}
IGARAPÉ, SIGNIFICADO DE - O que é, conceito e definição. Disponível em: <http://www.significados.
com.br/igarape/>.Acesso em 26 set.2014>.
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra,
1996.
FERREIRA, LUIZ OLAVO F.( 2010, Rio de Janeiro). No corpo as experiências e memórias dos educan-
dos da EJA: as possibilidades de diálogo da Educação Física com a Educação de Jovens e Adultos.
costA, renato pontes e ribeiro, Ana de Almeida (orgs.) o saber da gente...: sobre ‘uma edu-
cação pro povo, colaboração de Alah cardoso (et al.). 1 ed. - rio de janeiro: editora caetés, 2013.
272 p.; 23 cm (seminário nAed; 2)
SESC. Departamento Nacional. Proposta Pedagógica da Educação de Jovens e Adultos no Sesc. Rio
de Janeiro, 1999.

647
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
dA edUcAção pArA A diVersidAde nA sAlA de AUlA à
gestão democráticA escolAr
nAtháliA corrêA de pAUlA

O trabalho, na modalidade pôster, tem a finalidade de apresentar um recorte da pesquisa que


integrei como bolsista de Iniciação Científica, no âmbito do Observatório da Educação, intitulada
Diagnóstico da Qualidade de Ensino na Educação de Jovens e Adultos: um estudo de caso no Rio de
Janeiro desenvolvida na Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Interpretar e desenvolver o res-
peito à diversidade na educação como direito dos cidadãos e cidadãs é premissa de processos edu-
cacionais nos moldes democráticos, tendo em vista procedimentos de ensino e aprendizagem que
fundamentam a Educação de Jovens e Adultos, adequados ao público plural desta modalidade de
ensino. Campo diverso por excelência, a Educação de Jovens e Adultos, devido à variedade de histó-
rias, culturas, gêneros, etnias, faixas etárias e outros muitos fatores presentes entre sujeitos jovens e
adultos, exige mudança do pensamento frequentemente homogeneizado por parte de professores
e demais atores da escola quanto à incapacidade de aprender do público que atendem, para que se
privilegie o caráter do direito à educação de todos os sujeitos sociais. Alunos e alunas em salas de
aula com ideias generalizantes sobre eles/as, nem sempre se adaptam a currículos oferecidos, que
não os respeitam como sujeitos com saberes e experiências, nem colaboram para que exercitem o
mesmo respeito uns com outros, em meio à diversidade coletiva. Processos de aprendizagem, para
que sejam bem sucedidos, implicam reconhecimento das condições locais e compreensão da ação
de macro estruturas sobre eles, o que traz à tona o peso de tornar democrática e participativa a ges-
tão das escolas, em que a valorização das diferenças e os interesses da coletividade tenham lugar.

palavras-chave: Diversidade, participação, EJA, democracia

Ao longo dos anos, a Educação de Jovens e Adultos tornou-se uma modalidade bastante diversa,
com as mais variadas formas de crenças, faixas etárias, orientações sexuais, etnias e outros fatores
presentes nas salas de aulas, e por este motivo, é imprescindível assegurar que esta pluralidade seja
compreendida e incorporada ao modo como os processos educativos são conduzidos dentro e fora
de sala de aula para que estes indivíduos tenham garantido seu direito a uma educação de qualida-
de.
Neste sentido, é preciso frisar que o que ocorre nas salas não está dissociado da macro es-
trutura escolar, fazendo com que este respeito à diversidade tenha que ser observado não só por
professores e alunos, que geralmente tem relações mais diretas, mas por todos os sujeitos envolvi-
dos no ambiente escolar. Assim, se torna interessante discutir um pouco da necessidade de gestões
democráticas que desempenhem seus papéis de modo a incentivar a participação dos atores da
escola, tornando as decisões mais horizontais e condizentes com as demandas e realidades dos que
frequentam o local, principalmente do corpo discente em sua diversidade. Para tal, este artigo trata-
rá primeiramente sobre o conceito de diversidade com o qual dialogamos, em seguida apresentará
brevemente a pesquisa Diagnóstico da Qualidade de Ensino na Educação de Jovens e Adultos: um
estudo de caso no Rio de Janeiro e seu recorte para discutirmos sobre a gestão democrática e sua
importância, trazendo por fim algumas reflexões acerca da diversidade como direito e condição
para uma educação de qualidade e democrática.

1.sobre A diVersidAde
Assim como a diversidade humana, o próprio conceito de diversidade possui uma gama bas-
tante extensa de significados. As formas como se constituíram as sociedades, as culturas, os modos

648
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
de se entender o mundo, as experiências e muitos outros fatores subjetivos e biológicos contribuem
para esta polissemia, formulando as mais distintas conjecturas.
Portanto, procuramos abordar a diversidade aqui nas suas mais diferentes manifestações na
vida dos indivíduos, seja psicológica, física, econômica ou social, na perspectiva de que cada um de
nós possui suas identidades e peculiaridades, e que isto produz variedades de pessoas e formas de
viver em todos os espaços, possibilitando o diverso. Nos mais variados locais, do menor bairro ao
maior país, culturas que aparentam homogeneidade na verdade estão permeadas de outras cultu-
ras que convivem entre si e também se misturam, produzindo fenômenos de multiculturalidade e
interculturalidade, nos quais as diversidades e as culturas coexistem num mesmo local e também
que muitas vezes ocorram trocas e ajudas no convívio entre estas culturas, o que nos leva a apontar
o respeito como o fator mais importante a se considerar nestas situações.
Diante disto, há de se convir que respeitar o direito à liberdade de opinião e à diferença sem
perder de vista que a noção de coletividade é um dos princípios democráticos e condição fundamen-
tal para a existência da diversidade, pois não seria possível nenhum dos fenômenos referenciados
acima se não houvesse o entendimento por parte dos sujeitos de que os seres humanos são diferen-
tes uns dos outros, da mesma forma, também não haveria esta possibilidade se estas pessoas não
tivessem, em algum local ou momento de suas existências, aprendido a lidar com o que é diverso e a
respeitar isto no outro. Dessa forma, se é a educação um dos principais elementos responsáveis pela
formação e ensino de indivíduos para viver em sociedade com cidadania, esta se torna também uma
ferramenta crucial no aprendizado para conviver com aqueles que são diferentes, já que a falta deste
trabalho pode contribuir para que fatores como preconceitos e exclusão continuem permanecendo
em peso.
Partindo deste raciocínio, podemos afirmar que a diversidade, relativa a quem a vê, sempre
estará presente, e por este motivo é muito interessante utilizar a escola como meio de se trabalhar
e exercitar o respeito à mesma, o que nos leva a apontar a gestão democrática como o melhor meio
para que de fato a educação seja para todos, concretizando para além da sala de aula uma educação
em que todos sejam contemplados de alguma maneira, tenham a possibilidadede exercerem seus
direitos e tenham suas demandas ouvidas e consideradas na administração escolar.

2.A pesqUisA e A gestão democráticA


A pesquisa Diagnóstico da Qualidade de Ensino na Educação de Jovens e Adultos: um estudo de
caso no Rio de Janeiro foi desenvolvida na UERJ pelo Grupo de Pesquisa CNPq intitulado Aprendi-
zados ao longo da vida: sujeitos, políticas e processos educativos, e também em integração com nú-
cleos da UNICAMP e da UFJF, tendo sido concebida no âmbito do edital Observatório da Educação
CAPES/INEP 2010. No intento de se analisar dimensões da vida escolar da EJA, o estudo feito através
do método qualiquantitativo em cerca de 121 escolas do Rio de Janeiro desenvolveu questionários
afim de conhecer melhor o cotidiano de alunos, professores e gestores, considerando também a vi-
são dos pesquisadores sobre suas experiências nas instituições visitadas. Tais questionários tinham
suas perguntas organizadas por blocos temáticos que colaboraram mais tarde para uma averigua-
ção mais aprofundada dos resultados estatísticos obtidos pelo grupo do núcleo carioca.
Debruçando-nos mais detidamente sobre o conjunto de perguntas que fazia parte da dimensão
Relações no Espaço Escolar, observamos que as respostas apontavam para uma preocupação dos
gestores de escolas que atendem a jovens e adultos em realizar uma administração que envolva os
atores da instituição através da divulgação de informações e participação em reuniões e organiza-
ções escolares, mesmo que nem sempre isto seja feito satisfatoriamente. As reflexões sobre os resul-
tados também indicaram que as equipes diretoras procuram seguir o viés da gestão democrática,
nem sempre hierarquizando as decisões e buscando a participação dos interessados, mesmo que
alguns obstáculos muitas vezes impeçam a concretização da democracia institucional pretendida.

649
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
A LDBEN, lei 9.9394/96, em seu artigo nº 14 assegura que as escolas devem decidir como se dará
a gestão democrática em seu âmbito, fazendo adaptações às suas idiossincrasias, o que mostra que
este tipo de gestão não é opcional, mas uma exigência legislativa que pode ser adequada mediante
participação dos funcionários no Projeto Político Pedagógico e em reuniões com a comunidade
escolar e do seu entorno.

Art. 14º. Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do en-


sino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme
os seguintes princípios:
I - participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagó-
gico daescola;
II - participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equi-
valentes.(BRASIL. Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996)

Evidencia-se que por mais que a lei educacional brasileira defina a democracia como guia das
gestões escolares, não é o que geralmente ocorre na realidade. Apesar das estatísticas revelarem
que 96,68% dos professores das escolas municipais e 96,46% dos professores de escolas estaduais
tenham bom relacionamento com os gestores e que eram ouvidos por estes, o que pode incentivar a
socialização de informações e maior envolvimento, uma parte considerável destes dois grupos mos-
tra pouca participação nas reuniões de conselhos escolares, com 41,05% dos professores estaduais
e 46,81% dos professores municipais afirmando que não as frequentam, e ainda, informações nem
sempre suficientes nestes encontros sobre as necessidades e ocorrências na Educação de Jovens e
Adultos, com cerca de 30,77% dos professores alegando que questões da EJA alcançam as reuniões
em parte e 26,07% respondendo que as demandas da modalidade não chegam aos conselhos es-
colares. Os dados denotam que de certa forma, ainda permanecem vestígios do caráter marginal
da modalidade nos assuntos escolares, que tem suas questões menos abordadas em detrimento de
outras situações e níveis de ensino. Assim, mesmo que as respostas revelem índices que mostram
tentativas de se aferir à gestão um tom democrático, muitas vezes são deixadas lacunas que resul-
tam na inexistência ou pouca discussão do que é importante para a EJA e para o público atendido
por ela.
Mesmo com ressalvas, estudantes e professores relatam a vivência num espaço em que reuniões
do conselho escolar ou colegiado são feitas e que diretores buscam boas relações e contato com
estes, trabalhando para acolher quem chega à escola e para manter os que a frequentam atendendo
às solicitações feitas e ajustando o que for preciso, tarefas executadas através de estratégias de re-
solução de conflitos e de prevenção de atitudes preconceituosas no ambiente. Cerca de 75,51% dos
professores estaduais e 82,59% dos municipais afirmaram haver iniciativas que privilegiam o respei-
to à diversidade, com a realização de palestras educativas como principal via de conscientização.
Nota-se que existem esforços para se cumprir o que está descrito na lei, para democratizar o local
e a forma como ele será gerido, mas mesmo que estejam instituídos meios formais nas escolas pú-
blicas municipais e estaduais que visam garantir o direito dos estudantes a ter uma educação que
atenda aos seus anseios e necessidades, bem como os da comunidade escolar e do seu entorno,
vê-se que talvez a questão democrática que passa pela consideração à diversidade ainda precise ser
mais bem desenvolvida e aplicada, para que possa ser de fato exercida e se reflita nos caminhos que
serão seguidos pelas escolas.

3.edUcAção e diVersidAde como direito nA ejA


Na seção V, artigo 37, a Lei 9.394/96 dispõe acerca da Educação de Jovens e Adultos, afirmando
que é dever dos sistemas de ensino ofertar educação gratuita aos sujeitos que precisam cursar a

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
modalidade, em nível de Ensino Fundamental ou Médio, de modo que suas particularidades sejam
levadas em conta.

Os sistemas de ensino assegurarão gratuitamente aosjovens e aos adultos, que


não puderam efetuar os estudos na idade regular, oportunidades educacionais
apropriadas, consideradas as características do alunado, seus interesses, condições
de vida e de trabalho, mediante cursos e exames. (BRASIL. Lei 9.394, de 20 de dezem-
bro de 1996)

Deste modo, a democratização evidenciada pelo trecho acima não se resume apenas à questão de
que é direito do cidadão educar-se, concretizando os estudos que não pôde concluir eventualmente
no ensino regular, mas está presente também no fato de que faz parte deste direito educar-se com
a atenção dos sistemas de ensino às configurações de vida que o estudante que cursa a EJA possui,
com responsabilidades que vem com a vida adulta e com o amadurecimento, como o cuidado com
a família e o trabalho, por exemplo. A partir deste ponto de vista, é preciso flexibilizar o currículo e
também compreender as “características do alunado”, entendendo que os processos educativos tem
a possibilidade de serem mais bem sucedidos se houver a observação e a adequação do trabalho
às realidades de cada estudante, no intento de se ter uma educação democrática e inclusiva, que
possibilite desta maneira o acesso, a permanência e consequente conclusão dos estudos.
Na relação professor-aluno, a diversidade é considerada quando a primeira parte deste relaciona-
mento, de posse de sua autonomia em sala e sem deixar de atender ao que estabelece a legislação
educacional, orienta seu educando conhecendo-o e entendendo suas formas particulares de vida
e realidade, adequando conteúdos e formas de ensinar às necessidades dele. Especificamente no
caso doprofessor de EJA, é interessante que se leve em conta a grande bagagem de conhecimentos
trazidos pelos alunosatravés de suas experiências, adequando o ensino ao ritmo de aprendizagem
da turma, partindo principalmente destes aspectos próprios dos que a frequentam, de suas expec-
tativas e esperanças, tornando o educador um guia que ajuda a conectá-los com o saber historica-
mente acumulado sem descartar oque os alunos e alunas já são ou conhecem, tomando consciência
de que a questão da democracia passa pelo respeito à diversidade e vice-versa. Neste ponto, vale
citarmos algumas das ideias de Paulo Freire, que tanto pregava a importância dos educadores co-
nhecerem o universo de seus educandos, afirmando que a leitura de mundo precede a leitura das
palavras, isto é, sabendo o professor com quem está lidando, há a possibilidade de se fazer com
que sua prática pedagógica seja mais significativa para os estudantes, tornando a aprendizagem
mais rica para ambos os lados, tendo em vista que professores e alunos podem ensinar e aprender
simultaneamente em sala. Mesmo que este educador não tenha tratado de assuntos referentes à
diversidade de maneira direta, a linha de pensamento freireana em muito contribui no que condiz à
observação da realidade dos alunos e à consideração do que as pessoas já conhecem, saberes que
não se dissociam de suas identidades de crença, etnia, classe social e outros fatores que configuram
a diversidade brasileira do gênero humano.
No que condiz à questão numa dimensão mais ampla, mais precisamente nas relações da gestão
com outros presentes no ambiente escolar, temos a concretude do direito quando há uma preocu-
pação da direção em ouvir o que alunos, professores, funcionários e a comunidade como um todo
tem a dizer, realizando uma gestão conjunta, na qual as pessoas tenham voz e suas opiniões possam
se refletir nos rumos dados às inúmeras situações que ocorrem na instituição.
Há de ser uma das preocupações das equipes gestoras não só de democratizar as informações,
discutir dificuldades ou ouvir os envolvidos na EJA, o que favorece a diversidade tão característica
desta modalidade, mas também de se criar meios de se educar para a tolerância e respeito às dife-
renças, fazendo valer estes princípios nas reuniões, nas decisões e nos movimentos diários da escola.

651
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
A gestão democrática tem no respeito à diversidade uma de suas bases, e se desejamos cum-
prir de fato a meta da educação para todos, estabelecida no artigo nº 205 da Constituição Federal
de 1988, com condições reais de conclusão, especialmente pelos alunos da EJA, devemos garantir
que este respeito seja algo concreto e palpável não só no âmbito da sala de aula como nas estruturas
administrativas da escola, para que a educação seja democrática, diversa e assegurada como direito
dos cidadãos, não se constituindo como meio de exclusão da escola, uma vez que o desrespeito à
diversidade pode se tornar um dos motivos para a evasão escolar.

4. referênciAs bibliográficAs
BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é o método Paulo Freire. São Paulo: Brasiliense, 2005.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Fe-
deral: Centro Gráfico, 1988. 292 p.
BRASIL. Ministério de Educação e Cultura. LDBEN -Lei nº 9394/96, de 20 de dezembro de 1996. Esta-
belece as diretrizes e bases da Educação Nacional. Brasília: MEC, 1996.
FREIRE, Paulo. pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa.São Paulo: Paz e
Terra, 37 ed., 2008.
GOMES, Nilma Lino. Desigualdades e diversidade a educação. Educação & Sociedade, vol.
33, nº 120. Campinas: Jul/Set. 2012. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0101-
-73302012000300002&script=sci_arttext. Acesso em 19/08/2014.

652
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
docentes de ejA e A inclUsão escolAr de estUdAntes
público-AlVo dA edUcAção especiAl
pAtríciA ferreirA de AndrAde | eric henriqUe ferreirA jordão | liliAne sAnchez

A Educação de Jovens e Adultos se destina àquelas pessoas que estão fora do padrão de idade
escolar, comumente visto como adequado, ou seja, a EJA (educação de jovens e adultos) se destina
inclusive para as pessoas que possuem alguma necessidade educacional especial. Diante disso, nós
que fomos bolsistas do PIBID – Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (durante o
período de maio de 2010 a julho de 2012) e alunos da graduação de Licenciatura em Pedagogia, atu-
amos num projeto de acompanhamento pedagógico em turmas da EJA de uma escola da rede pú-
blica estadual, no município de Seropédica-RJ, sob a coordenação da professora Liliane Sanchez da
UFRRJ. Nesse sentido desenvolvemos uma pesquisa sobre as ações de inclusão desenvolvidas com
estudantes surdos e deficientes intelectuais em turmas de EJA desta escola. Pretendemos com este
trabalho descobrir quais são as dificuldades encontradas pelos professores, alunos e funcionários
da escola, referentes ao processo de inclusão e como eles lidam com essas dificuldades, bem como
investigar a representação docente sobre o processo de inclusão de estudantes com necessidades
especiais, em turmas de EJA nas quais lecionam. Para tanto, foi aplicado um questionário em forma
de entrevista para cinco professores da modalidade EJA e também para a coordenadora do Núcleo
de Apoio Pedagógico Especializado - NAPES da sala de recursos da referida escola. Cabe ressaltar
que os professores entrevistados oferecem ou já ofereceram aulas para estudantes com necessida-
des especiais.

palavras-chave: EJA, professores, inclusão

1. introdUção
A Educação de Jovens e Adultos (EJA) se destina àquelas pessoas que estão fora do padrão de
idade escolar, comumente visto como adequado. A EJA é reconhecida como uma modalidade de
ensino amparada por lei, conforme se verifica na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(1996), Seção V, artigo 37: “A educação de jovens e adultos será destinada àqueles que não tiveram
acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e médio na idade própria”, ou seja, in-
clusive as pessoas que possuem alguma necessidade educacional especial. Diante disso, nós que
fomos bolsistas do PIBID - Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (durante o perí-
odo de maio de 2010 a julho de 2012) e alunos de graduação do curso de Licenciatura em Pedagogia
da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, atuamos sob a coordenação da professora Liliane
Sanchez em um projeto de acompanhamento pedagógico em turmas de EJA de uma escola da rede
pública estadual no município de Seropédica/RJ.
Pretendemos com este trabalho pesquisar quais são os desafios encontrados pelos professores,
alunos e funcionários da escola, referentes ao processo de inclusão escolar, investigando assim a re-
presentação docente neste processo de inclusão escolar de estudantes com necessidades especiais,
sobretudo em turmas de jovens e adultos.
Neste contexto, podemos afirmar que a busca pelos direitos dos indivíduos com necessidades
especiais não é recente, pois é fato que em diversos países do mundo, e inclusive no Brasil, ocorre-
ram avanços em relação aos direitos da pessoa com deficiência. Uma dessas conquistas se deu no
âmbito educacional, no qual os estudantes com necessidades especiais passaram a ser amparados
por diversos dispositivos legais que garantem sua escolarização em classes e escolas regulares. A
Educação Inclusiva preconiza o acesso e a permanência, bem como o sucesso escolar, não somente

653
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
de estudantes com necessidades especiais, mas de todos os estudantes, independentemente de
suas condições físicas, cognitivas, emocionais, linguísticas, culturais (ou qualquer diferença).
A perspectiva da Educação Inclusiva, segundo a Declaração de Salamanca (1994), é do “reconhe-
cimento da necessidade de se caminhar rumo à ‘escola para todos’ – um lugar que inclua todos os
alunos, celebre a diferença, apóie a aprendizagem e responda as necessidades individuais”. A inclu-
são escolar de estudantes com necessidades especiais em instituições escolares torna-se imprescin-
dível para a democratização do ensino, pois rompe barreiras segregativas que impedem o acesso e
a permanência do estudante que apresenta necessidades especiais. Assim, de acordo com Ainscow
(1995, p.1):

(...) os que são considerados como tendo necessidades especiais passam a ser
reconhecidos como um estímulo que promove estratégias destinadas a criar um
ambiente educativo mais rico para todos. No entanto, o avanço na implementação
desta orientação está longe de ser fácil e, por conseguinte, as provas relativas a um
progresso nessa área são limitadas, na maior parte dos países.

Dessa maneira, como afirma o autor, é bem verdade que ainda se encontram diversos desafios
para a implementação de uma escola de/para todos. Nesta perspectiva, precisamos romper com
modelos existentes não somente nas escolas, mas também na sociedade, que invisibilizam/negam
a diferença.
Pensando sobre o sentido da democracia e da democratização da educação, recorremos a Ador-
no (1995, p.142), que afirma que:

Numa democracia, quem defende ideias contrárias à emancipação, e, portanto,


contrários à decisão consciente independente de cada pessoa em particular, é um
antidemocrata, até mesmo se as ideias que correspondam a seus desígnios são di-
fundidas no plano formal da democracia. As tendências de apresentação de ideais
exteriores que não se originam a partir da própria consciência emancipada, ou me-
lhor, que se legitimam frente a essa consciência, permanecem sendo coletivo-rea-
cionárias.

Os profissionais da educação, bem como todos os interessados/protagonistas da ação educati-


va, precisam se voltar para as demandas de aprendizagem dos estudantes, pois para a construção
de escolas democráticas não podemos negar e/ou inviabilizar a diversidade presente no contexto
educacional.
Para que a inclusão escolar possa ocorrer com êxito, é indispensável que a instituição escolar se
adapte aos seus estudantes, com profissionais especializados, currículos e estrutura escolar adap-
tada, tudo isto a fim de oferecer acesso, permanência e sucesso escolar para todos os estudantes,
evitando assim a evasão escolar (que é uma das problemáticas na educação de jovens e adultos). É
fundamental a presença de profissionais especializados para que o processo de ensino-aprendiza-
gem desses alunos ocorra de forma satisfatória. Pois, segundo Gadotti (2007, p.11):

O aluno adulto não pode ser tratado como uma criança, cuja história de vida
apenas começa. Ele quer ver a aplicação imediata do que está aprendendo. Ao mes-
mo tempo apresenta-se temeroso, sente-se ameaçado, precisa ser estimulado, criar
auto-estima, pois a sua “ignorância“ lhe traz tensão, angústia, complexo de inferio-
ridade. Muitas vezes, tem vergonha de falar de si, de sua moradia, de sua experiência

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
frustrada da infância, principalmente em relação à escola. É preciso que tudo isso
seja verbalizado e analisado.

Além da especialização que os profissionais da educação necessitam ter para lidar com a diversi-
dade presente nas escolas, é necessário também que os mesmos reflitam e considerem a realidade
de seus estudantes. Nesta perspectiva:

É necessário possibilitar ao professor a capacidade de refletir sobre sua atuação


profissional, objetivando entender a forma como se apresentam os problemas da
prática, uma vez que na EJA há uma diversidade de situações problemáticas relacio-
nadas ao contexto social, político e econômico que estão co-relacionados aos pro-
blemas da prática pedagógica em si. (SCORTEGAGNA; OLIVEIRA, 2008, p. 79).

Portanto, cabe ao professor que trabalha com jovens e adultos e com alunos que possuem al-
guma necessidade especial, ser capaz de compreender as dificuldades e especificidades de seus
estudantes.

2. objetiVo
O objetivo deste trabalho consiste em pesquisar quais os desafios encontrados pelos professores,
alunos e funcionários da escola investigada referente ao processo de inclusão escolar de estudantes
público-alvo da educação especial. Pesquisando, sobretudo, qual a representação docente no pro-
cesso de inclusão escolar desses estudantes público-alvo da educação especial e que pertencem a
classes de jovens e adultos.

3. metodologiA
Utilizamos como método para esta pesquisa um questionário que foi aplicado em forma de en-
trevista para cinco professores que atuam na modalidade da EJA e também para a coordenadora
do Núcleo de Apoio Pedagógico Especializado (NAPES) da sala de recursos da referida escola. Cabe
ressaltar que os professores entrevistados ministram ou ministraram aulas para estudantes com ne-
cessidades especiais. Foi utilizado como método em nossa pesquisa, um levantamento bibliográfico
de autores que trataram do assunto em questão.

4. resUltAdos
Para melhor compreensão da pesquisa, e entendimento das respostas, transcrevemos as per-
guntas que nos ajudaram na condução da entrevista, e colocamos as respostas na íntegra, seguindo
a sequência que foi utilizada, e agrupando as respostas que foram dadas por cada professor entre-
vistado.

pergUntAs do qUestionário:
• Questão 1: Existem dificuldades para passar os conteúdos da matéria para os alunos espe-
ciais?
• Questão2: Você possui alguma metodologia diferenciada para utilizar especialmente com
seus alunos com deficiência? Em caso positivo como as utiliza?
• Questão 3: O que você acha do processo de inclusão de alunos deficientes e como está
ocorrendo nas escolas?

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
• Questão 4: Fez alguma especialização ou teve alguma disciplina em EJA ou educação es-
pecial?

respostAs dos professores entreVistAdos:


• Professor C. – Matemática e física.
Questão 1: “ Nenhuma! É até melhor!... Eu prefiro uma turma com 20 deficientes auditivos
do que com normais” “... Os alunos com necessidades especiais são esforçados, porque eles
sabem que já estão prejudicados... Quem tem a deficiência já sabe que está prejudicado ,
então corre na frente!” “ (...) O aluno com Deficiência Mental é tão esforçado ao ponto de
prejudicar os outros alunos, ele aprende bem, o problema é que ele é meio agressivo com
as palavras, para com os outros estudantes”.
Questão 2: “Método não, a diferença é que eu vou na mesa de cada um, corrigir um a um.”
“Eu vejo que não tem problema nenhum, no fato de passar a matéria para esses estudantes,
eles se dedicam muito!”
Questão 3: “Ótimo! Os deficientes auditivos são os melhores alunos.”
Questão 4: Não possui especialização em educação especial ou EJA.

OBS: O PROFESSOR “C” LECIONA NO MOMENTO PARA DOIS ESTUDANTES COM DEFICI-
ÊNCIA AUDITIVA, E PARA UM COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL.

• Professor V. – Biologia
Questão 1: “Dificuldade grande! Difícil!”
Questão 2: “Eu procuro desenhar... Eu possuo uma estratégia bem primitiva mesmo” (res-
ponde sorrindo)
Questão 3: “Difícil! Porque a inclusão para os alunos não tem... primeiro que vai ser para
o aluno, porque eu não sei falar língua de sinais... Acho que dentro da escola o professor
precisa estar especializado”.
Questão 4: “Não possui especialização em educação especial ou EJA.

• Professora S. – ED. Física


Questão 1: “Fica complicado né... Eu consigo oferecer as aulas por causas dos interpretes,
eles que ajudam na hora da comunicação.”
Questão 2: “Não tenho estratégia, somente quando vou oferecer aulas teóricas, então,
utilizo slides”.
Questão 3: “Preferiria na escola especial; Melhor aprovaria!”
Questão 4:“Não fiz especialização, mas tive educação adaptada na graduação e educação
inclusiva na pós que fiz”.

• Professora C. - Português
Questão 1: “Possuo dificuldades, porque a língua portuguesa para eles é diferente, eles
não conjugam verbos, fica difícil de ensinar para os alunos porque eles não têm como ouvir
o som”.
Questão 2:“Utilizo os materiais da sala de recurso, DVDs e em libras”.

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Questão 3:“Acho boa, porém, os professores precisam estar mais preparados, ainda falta
preparo”.
Questão 4:“Só tive no normal onde falavam de EJA e educação especial, somente salien-
tando as leis existentes”.

• Professora T – Português
Questão 1:“É difícil, por que a língua portuguesa é diferente para eles... A parte da foné-
tica, o ensino das preposições, as conjugações verbais tem que adaptar, porque dentro da
conjugação verbal, para eles não tem sentido, então temos que adaptar”.
Questão 2:“Eu dou ênfase na interpretação de texto, significado das palavras... “ Eu procu-
ro adequar...” “Os recursos que tem no NAPES ainda é insuficiente”.
Questão 3:“Para a inclusão é bom, para o aspecto de incluir outras pessoas é... Porém o
currículo ainda não consegue... Ainda faltam recursos, sem esses recursos o aluno não con-
segue aprender”.
Questão 4: “Tenho pós em EJA, e aqui na escola tem o curso do NAPES para a E.E. Na fa-
culdade só citaram E.E. e EJA nas leis...”

Com relação à primeira pergunta, é possível perceber na fala dos professores que, além das difi-
culdades encontradas na modalidade EJA, a maioria dos professores, inclusive o que relatou não ter
dificuldades com alunos com deficiência, encontra algum tipo de dificuldade, seja por conta da falta
de recursos inexistentes na escola, ou pela falta de conhecimento sobre o tema. Nesse sentido, o
fato de não terem em seus currículos de formação alguma disciplina de EJA ou Educação Especial é
um fator agravante, pois, tal disciplina prepararia o docente para poder contornar melhor e resolver
de forma mais adequada os problemas e desafios que a presença de alunos com deficiência acarreta
nas escolas públicas.
Já na segunda pergunta, é possível identificar que, em geral, os professores da referida escola não
possuem algum tipo de metodologia adequada ao trabalho com alunos com necessidades espe-
ciais, mas, a presença do NAPES na escola, mesmo com suas deficiências e faltando alguns recursos
necessários, é um apoio de grande importância para os professores, reforçando a ideia de que um
processo de inclusão mais efetivo necessita atender a algumas prerrogativas, como é orientado pelo
próprio MEC: “inclusão não significa, simplesmente, matricular os educandos com necessidades es-
peciais na classe comum, ignorando suas necessidades especificas, mas significa dar ao professor e
à escola o suporte necessário à sua ação pedagógica” (MEC/SEESP, 1998).

coordenAdorA s. – nApes
Para realizar essa entrevista, tivemos que utilizar um questionário diferente do que foi feito
com os professores, pois nosso interesse consistiu em entender o papel do NAPES na escola e como
se dava a interação entre professor, aluno e NAPES. Também precisávamos entender como este se-
tor poderia contribuir com a inclusão do estudante com deficiência que apresenta algum tipo de
necessidade especial a ser suprida pela escola, bem como este setor poderia ajudar o professor a
resolver os problemas que, por ventura, surgissem com a presença de um aluno com deficiência nas
classes regulares e de EJA.

1. Há uma grande procura por sua orientação, por parte dos professores, em geral?
Quais as disciplinas que tem maior incidência de procura?

657
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
R: “Há uma demanda expressiva à procura do processo de inclusão, há muitos anseios.
Todas as matérias básicas procuram orientação. As matérias de línguas possuem maior di-
ficuldade.”
2. O que os professores mais reclamam?
R: “Ainda há falta de suporte na perspectiva da inclusão” “... Mas aos poucos esse proces-
so de inclusão está acontecendo no programa NAPES”.
3. Quais são as principais dificuldades que os alunos apresentam?
R: “Os alunos cegos não são alfabetizados em braile... O Benjamin Constant é longe, mas
o NAPES está trazendo recursos para a escola”.
“Os deficientes visuais precisam ser alfabetizados em libras, alguns sabem somente os
códigos, eles precisam aprender a língua padrão”.
“Os deficientes intelectuais precisam que os currículos sejam adaptados para eles. O pro-
fessor acha que o aluno deve corresponder da maneira dele, e não é assim. O professor deve
adaptar o seu currículo para ele, oferecendo estímulo para o aluno. É preciso flexibilizar,
aceitar os diferentes e trabalhar suas potencialidades”.
4. O que você pensa em relação ao processo de inclusão que está ocorrendo nesta
instituição escolar?
R: “Um processo onde viabiliza infra estruturas, com adequação curriculares, intérpretes,
acompanhamento pedagógico, sala de recursos... Sinalizando os deficientes e os avanços
em uma conquista onde todos se envolvam”.
Ao término do questionário desta pesquisa, a coordenadora do NAPES (Núcleo de Apoio Peda-
gógico Especializado) nos relatou sobre algumas dificuldades dos estudantes Público-Alvo da Edu-
cação Especial na modalidade EJA. Neste sentido, pensamos ser indispensável descrever seu relato
nesta pesquisa. Denominamos o relato da coordenadora como “fala extra”, devido ao fato de não
fazer parte diretamente das respostas do questionário.
Fala extra: “A dificuldade que existe na EJA para os estudantes com necessidades especiais, é que
o tempo na EJA é compactado, e vejo que em relação aos deficientes intelectuais eles conseguem,
se a EJA for adequada para eles, porque os deficientes intelectuais precisam de um maior cuidado,
agora em relação aos deficientes auditivos e deficientes visuais não vejo o menor problema”.
Para que o processo de inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais ocorra de
forma satisfatória, é necessário que a escola adote algumas práticas inovadoras no processo educa-
cional, fundamentadas em três elementos centrais, como explica Glat (2006):

a) a presença, o que significa estar na escola, superando o isolamento do am-


biente privado excludente e inserindo o aluno num espaço público de socialização e
aprendizagem;
b) a participação, que depende, no entanto, do oferecimento das condições ne-
cessárias para que o aluno realmente possa interagir e participar das atividades es-
colares;
c) a construção de conhecimentos, função primordial da escola, sem a qual pou-
co adianta os outros dois itens anteriores. Em outras palavras, a inclusão escolar só
acontece, de fato, se o aluno estiver inserido na escola, porém participando, apren-
dendo e desenvolvendo-se com base na interação e nos conhecimentos ali constru-
ídos, o que vai muito além da concepção de inclusão que defende apenas as van-

658
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
tagens da socialização deste aluno no espaço escolar. (AINSCOW, 2004a, 2004b;
PLETSCH, 2005; PLETSCH & FONTES, 2006, apud GLAT et all, 2006, p.4).

5. considerAções finAis
Com relação ao que foi exposto pelos professores e pela coordenadora do NAPES, percebemos
que, mesmo com os recursos existentes na escola e a presença do NAPES, as dificuldades encon-
tradas pelos professores e alunos são significativas. Os professores demonstram a necessidade de
uma especialização na educação especial e também na EJA. Apesar de um dos professores relatar
que não tem problemas em lidar com os alunos com necessidades especiais, sua fala explicita uma
possível dificuldade, que poderia indicar a necessidade e importância de uma especialização para
auxiliá-lo: “O aluno com Deficiência Mental é tão esforçado ao ponto de prejudicar os outros alunos,
ele aprende bem, o problema é que ele é meio agressivo com as palavras, para com os outros estu-
dantes”.
A grande maioria dos professores não tem especialização ou não teve nenhuma matéria de EJA
ou educação especial na graduação. A escola conta com a presença do NAPES, que é um apoio
para os professores, pois, coordena dois interpretes de libras que ajudam nas aulas com os alunos
deficientes auditivos. Também é tarefa do NAPES conseguir os recursos necessários para incluir os
alunos que precisam de outros recursos especiais para que possam ser incluídos.
O que podemos concluir com nossa pesquisa é que o aluno com necessidades especiais encon-
tra dificuldades ainda maiores na EJA, por conta da metodologia utilizada nessa modalidade, pois,
alguns estudantes necessitam de um tempo maior para aproveitarem os conteúdos abordados e a
EJA, na escola investigada, possui a característica de aceleração dos estudos, o que não é compatível
com a necessidade que os alunos com necessidades especiais apresentam. Portanto, verificamos
que a instituição escolar necessita criar possibilidades de formação continuada para seus docentes,
além de apresentar condições, para aprimorar o aprendizado desses estudantes, pois segundo o
MEC (Ministério da educação):

A educação inclusiva constitui uma proposta educacional que reconhece e ga-


rante o direito de todos os alunos de compartilhar um mesmo espaço escolar, sem
discriminações de qualquer natureza. Promove a igualdade e valoriza as diferenças
na organização de um currículo que favoreça a aprendizagem de todos os alunos
e que estimule transformações pedagógicas das escolas, visando à atualização de
suas práticas como meio de atender às necessidades dos alunos durante o percurso
educacional. Compreende uma inovação educacional, ao romper com paradigmas
que sustentam a maneira excludente de ensinar e ao propor a emancipação, como
ponto de partida de todo processo educacional. (POLÍTICA NACIONAL DE EDUCA-
ÇÃO ESPECIAL NA PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA, 2008,P.14)

A efetivação da Educação Inclusiva requer mudanças significativas no âmbito educacional, de


modo que possam ser atendidos os estudantes considerando sua pluralidade e heterogeneidade.
Dessa maneira, Damasceno (2010, p.1) afirma que:

Minha experiência como professor do ensino regular, atuando em escolas com


‘propostas inclusivas’, revelou-me que são vários os obstáculos identificados na or-
ganização da escola democrática. No que se refere ao atendimento dos estudantes
com necessidades especiais, dilatam-se os fatores alegados para afirmar a segrega-

659
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
ção, como falta de preparo profissional, carência de cursos de capacitação e aperfei-
çoamento para os professores, inexistência/escassez de adaptações estruturais das
escolas, inexistência/escassez de estrutura organizacional que contemple a diversi-
dade, dentre outros.

Para a implementação da Educação Inclusiva, as escolas regulares precisam se organizar na pers-


pectiva de criar meios/condições que possam superar os diversos desafios apontados. Ou seja, é
imprescindível que ocorra uma ressignificação no sistema educativo.
Sabemos que são inúmeros os desafios que impedem a implementação de uma escola democrá-
tica, pois como afirma Horkheimer e Adorno (1985, p.188) “A falta de consideração pelo sujeito torna
as coisas fáceis para a administração”. Neste sentido, torna-se indispensável superar esta concepção,
pois do contrário será inócuo a tentativa de construir espaços democráticos.

6. referênciAs:
ADORNO, T.W. Educação e emancipação. São Paulo: Paz e Terra, 1995.
AINSCOW, M. Educação para todos: Torná-la uma realidade. In: Education for All: Making it happen –
Comunicação apresentada no Congresso Internacional de Educação Especial, Birmingham. Inglaterra,
Abril de 1995.
BRASIL, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB n.9394/96 de 20 de dezembro de 1996.
_______. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Diretrizes Curriculares Nacionais
para a Educação Especial,1998.
_______. Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da educação inclusiva. Documento
elaborado pelo grupo de Trabalho nomeado pela portaria n° 555/2007, prorrogada pela Portaria n°
948/2007, entregue ao ministro da educação em 7 de janeiro de 2008.
______. & COSTA, V. A. da. A organização da aprendizagem para todos: o projeto pedagógico na
perspectiva da educação inclusiva, (mimeo) 2010.
GADOTTI, M. & ROMÃO, J (orgs). Educação de Jovens e Adultos: Teoria prática e proposta. São Paulo:
Cortez. Instituto Paulo Freire, 2007.
GLAT, Rosana etall. Uma breve reflexão sobre o papel da Educação Especial frente ao processo de
inclusão de pessoas com necessidades educacionais especiais em rede regular de ensino. Publicado
em: Cadernos de Educação 6: Inclusão Social Desafios de uma Educação Cidadã. UNIGRANRIO Editora,
Rio de Janeiro, p. 13-30, nov., 2006. ISSN: 1679-6349.
HORKHEIMER, Max, ADORNO, T. W. Dialética do esclarecimento: Fragmentos filosóficos. Rio de Janei-
ro: Zahar, 1985.
SCORTEGAGNA, Paola Andressa; OLIVEIRA, Rita de Cássia da Silva. A formação do professor da Edu-
cação de Jovens e Adultos: um processo contínuo e reflexivo. Dialogia, São Paulo, v. 7, n. 1, p. 77-84,
2008. Disponível em http://portal.uninove.br/marketing/cope/pdfs_revistas/dialogia/dialogia_v7n1/
dialogia_v7n1_4e13.pdf Acesso em 1º/11/2010.

UNESCO, Declaração de Salamanca e Enquadramento da Acção. Na área das necessidades educati-


vas especiais. Conferência Mundial Sobre Necessidades Educativas Especiais: Acesso e qualidade. Sala-
manca, Espanha, 7-10 de Junho de 1994.

660
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
edUcAção de joVens e AdUltos em moçAmbiqUe: Um
estUdo sobre A sitUAção de joVens e AdUltos nos
centros de edUcAção do distrito de chibAbAVA
proVínciA de sofAlA
cátiA torres Abú

A educação de Jovens e Adultos – EJA nos últimos tempos tem sido alvo de muitos debates e pes-
quisas, demonstrando assim a importância dessa modalidade de ensino para o alcance das metas de
Educação para Todos tão defendidos mundialmente. Moçambique ratificou vários documentos in-
ternacionais comprometendo-se a envidar esforços para que a educação seja preponderante. Den-
tre esses documentos podemos citar a Declaração de Jomtien, o CONFINTEA, a Declaração Mundial
sobre Educação para Todos (Dakar) e a Declaração Mundial sobre População e Desenvolvimento.
Face a estes compromissos, todos eles englobando a componente de educação de adultos como
um objectivo a prosseguir, e na sequência da implementação do primeiro programa quinquenal do
Governo em tempo de paz, estabilidade e reconciliação nacional, verifica-se um ressurgimento, a
nível nacional, da Educação de Adultos, tanto na esfera formal como não-formal. Este ressurgimento
preconiza a intensificação do investimento na alfabetização de adultos e promove uma maior visibi-
lidade deste sector, entre outros aspectos. Levando em consideração os problemas que envolvem a
EJA em Moçambique, principalmente no que concerne ao grande número de jovens e adultos ainda
analfabetos, bem como os altos índices de evasão nos programas governamentais, este estudo visa
apresentar algumas reflexões e encaminhamentos da pesquisa em desenvolvimento sobre a alfabe-
tização de jovens e adultos moçambicanos.

palavras-chave: EJA, Evasão, Permanencia, Trajetórias

introdUção
A República de Moçambique está localizada na faixa sul-oriental do continente Africano, en-
tre os paralelos 10º27’ e 26º52’ de latitude sul e entre 30º12’ e 40º51’ de longitude sudeste. Faz fron-
teira com a Tanzânia, ao Norte; e com o Malawi, Zâmbia, Zimbabwe e África do Sul, na parte sudeste.
O leste é banhado pelo Oceano Índico, em uma extensão de linha de costa de 2.515 quilômetros. A
superfície total do país é de 799,380 km². Fazem parte 11 províncias administrativas distribuídas em
três regiões (Norte, Centro e Sul).
Segundo o Instituto Nacional de Estatística (apud FAO, Governo de Moçambique, 2009), a po-
pulação moçambicana estima-se em cerca de 20 milhões e 854 mil habitantes, sendo destes 48,4%
homens e 51,6% mulheres. A maior parte da população vive nas zonas rurais (68,2%) distante das
principais vias de comunicação. A densidade demográfica é de 26 hab/ km². A taxa de crescimento
natural da população é de 2,4% e de fecundidade é de 5,2 filhos por mulher em idade fértil. A idade
mediana da população é de 18 anos. A esperança de vida é de 47,9 anos e com taxa de mortalidade
infantil de 99,2 (por 1000 nados - vivos).
Os indicadores de desenvolvimento humano, acesso à educação (tanto a nível primário como
secundário), assim como o acesso aos serviços básicos de saúde, particularmente nas áreas rurais,
aumentos na posse de bens duráveis pelas famílias e melhoria na qualidade de habitação, atestam
as tendências positivas importantes do desenvolvimento ao longo prazo, assim como, o sucesso do
alcance de prioridades governamentais estratégicas.

661
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Registam-se variações em termos de gênero (relação homem e mulher), e entre vários grupos
na sociedade, sendo que o segmento populacional constituído pelas mulheres, crianças, pessoas
idosas, portadoras de deficiência e com doenças crônicas, são os que se mostram mais vulneráveis.
(MOÇAMBIQUE, 2011).
Na óptica do consumo, o nível de pobreza alimentar situa-se em pouco menos de 55% da po-
pulação. A linha nacional de pobreza em Moçambique é de 18 meticais ou cerca de 0.5 dólares
norte-americanos. O Coeficiente de Gini3, manteve-se praticamente igual entre 2002-2003 (0,42) e
2008-2009 (0,41) a nível nacional, mantendo um nível de desigualdades ligeiramente mais alta nas
zonas urbanas em relação as zonas rurais (0,48) e (0,37) respectivamente. (MOÇAMBIQUE, 2011, p. 9).
Segundo o Programa Quinquenal do Governo de Moçambique4 (2010, p. 12), a Educação é conce-
bida como um direito fundamental de cada cidadão. Um instrumento para a afirmação e integração
do indivíduo na vida social, econômica e política. Um fator indispensável para a continuação da
construção de uma sociedade moçambicana, baseada nos ideais da liberdade, da democracia e da
justiça social, e também como instrumento principal da formação e preparação da juventude para a
sua participação efetiva na edificação do país.
Em síntese, segundo o documento, a educação é um dos direitos humanos básicos. O seu papel
fundamental para a redução da pobreza é universalmente reconhecido. O acesso à educação con-
tribui diretamente para o desenvolvimento humano, aumentando as capacidades e oportunidades
para os pobres, promovendo maior equidade social, regional e do gênero. Sem dúvida, o conheci-
mento é um meio indispensável para a elevação das condições de vida do homem. A educação é
também essencial para o crescimento rápido, porque expande a quantidade e qualidade de capital
humano no processo de produção, assim como a capacidade da nação em absorver novas tecnolo-
gias.
Na África sub - saariana, na qual Moçambique faz parte, a população de analfabetos ronda os
38% dos quais 61% são do sexo feminino. Enquanto as taxas de analfabetismo da população jovem
(entre 15 e 24 anos) mundial é de 12%, na região sub - saariana, 23% não sabem ler nem escrever.
Destes, 59% são do sexo feminino. ( Mário, Nandja 2005, p. 6).
Moçambique apresenta taxas superiores à média da região sub - saariana, sendo que, a taxa de
analfabetismo da população adulta reduziu de 60,5% em 2001 para 51,9% em 2005 e para 48,1%
em 2008. A taxa relativamente, ao sexo feminino reduziu de 66,7% em 2005 para 64,2% em 2008,
enquanto a dos homens estagnou passando de 34,3% em 2005 para 34,6% em 2008. Em 2007, o
índice de analfabetismo nas zonas rurais era de 65,5% e de 26,3% nas zonas urbanas. (MEC, 2012).
A proporção da população com acesso a escola aumentou de 30% (2002-2003) para 37,3%, em
2008-2009. A percentagem de mulheres analfabetas reduziu significativamente entre 2004 e 2008
de 54% para 40,8%. Igualmente registou-se progresso na redução da disparidade de gênero nos
ingressos no ensino básico (MOÇAMBIQUE, 2011).
De acordo com a Estratégia de Alfabetização e Educação de Adultos em Moçambique5 (2010-
2015), o acesso de jovens e adultos de ambos os sexos aos programas de alfabetização e educação
de adultos aumentou na ordem dos 50%.
3 Mede o grau de desigualdade na distribuição da renda. Quanto mais próximo de zero, maior é a equidade na distribuição
da renda e quanto mais próximo de 1 maior é a desigualdade na distribuição da renda.
4 Programa elaborado pelo governo moçambicano em 2010, com o objetivo de combater a pobreza absoluta
para a melhora das condições de vida do povo moçambicano no campo e na cidade, em ambiente de paz harmonia e
tranquilidade. Desenvolvimento do capital humano, infraestruturas econômicas e sociais, institucional e provisão de
serviços básicos que criem ambiente favorável.
5 É um instrumento de orientação das ações de alfabetização e educação de adultos em Moçambique, que sur-
ge da necessidade de aumentar as oportunidades de aprendizagem das pessoas jovens e adultas de modo a melhorar
a sua participação na consciente e ativa construção das suas condições de vida e das comunidades onde vivem. Esta
estratégia materializa o compromisso do Governo moçambicano na erradicação da pobreza, promovendo o desenvol-
vimento humano, por um lado, e, por outro, a realização das metas do milênio e da Educação para Todos.

662
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Deixar de frequentar a escola na infância ou na adolescência e, anos depois, desejar retornar a
ela; nunca ter estudado e querer estudar na vida adulta; ficar reprovado por seguidos anos de esco-
laridade e, por distorção entre idade-série, não podendo mais cursar o ensino regular, são situações
que, em princípio, caracterizam a experiência de vida dos sujeitos demandantes por Educação de
Jovens e Adultos. Igualmente, essa é a realidade de milhões de pessoas nos países emergentes ou
com economia em desenvolvimento. (Carmo 2010, p. 24).
Mileto (2009, p. 10), afirma que “a educação de jovens e adultos possui como uma das suas carac-
terísticas mais marcantes e negativas o elevado número de alunos que desistem antes de completar
a etapa de escolaridade em que estavam matriculados”. A realidade apresentada pelo autor é notória
em Moçambique em particular no distrito de Chibabava6·, onde muitos jovens e adultos não conse-
guem permanecer até ao fim do ano letivo em que se matricularam. Assim, a desistência dos jovens
e adultos nos centros de alfabetização compromete os objetivos internacionais assumidos pelo go-
verno em “erradicar o analfabetismo” e alcançar uma melhoria de 50% nos níveis de alfabetização de
jovens e adultos até 2015, pois alfabetizando-os espera-se erradicar a pobreza absoluta que é uma
das grandes preocupações do governo moçambicano.
Embora se tenha verificado um aumento gradual do acesso de alfabetizandos aos diferentes pro-
gramas de Alfabetização e Educação de Adultos, a taxa de analfabetismo apenas tem reduzido entre
1,5% a 2% anualmente em todo o país. O baixo índice de sucesso e permanência dos alfabetizandos,
nos programas é preocupante. Os dados indicam altas taxas de evasão, mais de um terço no primei-
ro trimestre e igual número nos dois últimos trimestres do ano letivo por várias razões: fraco conhe-
cimento dos métodos de ensino-aprendizagem e motivação dos alfabetizadores; falta de material
didático e de leitura; grandes distâncias entre os locais de residência e os centros de alfabetização;
horários incompatíveis com as atividades profissionais dos alfabetizandos; casamentos prematuros
das raparigas entre outras.
Para a redução cada vez mais do índice de analfabetismo, o Governo de Moçambique (2004), de-
finiu como um dos seus objetivos, no seu Programa Quinquenal (2005, p. 18) “reduzir em 10% a taxa
de analfabetismo da população jovem e adulta”.
Levando em consideração tais questões, a proposta desta pesquisa é desenvolver um estudo
sobre a situação de jovens e adultos nos centros de educação do distrito de Chibabava província de
Sofala, principalmente sobre o fenômeno da evasão e permanência desses sujeitos demandantes
da EJA.
Assim, a presente pesquisa tem os seguintes objetivos: analisar as reais razões da evasão e per-
manência dos jovens e adultos nos processos de Alfabetização no Centro de Educação de Jovens e
adultos da vila sede do distrito de Chibabava; a partir dos dados de evasão, será possível identificar
os períodos em que a evasão é mais frequente nos referidos centros, igualmente, identificar as ra-
zões da evasão e permanência de alunos no Centro de Educação de Jovens e adultos pesquisado
e, compreender as principais razões apontadas como sendo impulsionadoras das evasões e perma-
nências dos alunos nos centros pesquisados.

compreendendo os sentidos dA ejA


6 O distrito de Chibabava está localizado na parte sul da província de Sofala (segunda maior cidade de Moçambi-
que), confinando a norte com o distrito de Nhamatanda, a sul com o distrito de Machanga, a oeste com os distritos de
Mussorize e Machaze da Província de Manica e a este com o distrito do Búzi. O distrito é atravessado pela Estrada Nacio-
nal número (EN1). Tem uma superfície de 6.977 km² e uma população projetada para 2014 é de 12.8358 habitantes. Tem
uma densidade populacional de 13hab/km². A população é jovem (43%, abaixo dos 15 anos de idade), sendo maiorita-
riamente feminina (apenas 42% são homens) e de matriz marcadamente rural. O clima dominante é do tipo semi-árido,
no interior, a sub-húmido, a medida que se caminha para o litoral. O distrito possui potencialidades agrícolas, pecuária
e florestas, sendo a agricultura e pecuária as principais atividades econômicas das famílias. Por causa do valor comercial
de alguns produtos agrícolas, tem havido movimento de comerciantes de fora do distrito para a sua comercialização
provenientes, sobretudo, das cidades da Beira, Chimoio, Inhambane, Maputo.

663
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Como um dos primeiros encaminhamentos, achamos pertinente definir a EJA de modo a com-
preender melhor a pesquisa. Começamos definindo-a de acordo com Cenário (1999 apud Sousa
2010 p. 4):

É muito difícil definir a Educação de Adultos porque é resultante de processos


sociais em mutações constantes. No entanto, uma definição alargada de educação
de adultos permite associar três pressupostos, o da continuidade e complementa-
ridade da educação, valorizando outros tempos de educação para além da escola,
uma vez que se entende que o envolvimento em processos de educação ao longo
da vida é relevante; a diversidade da educação, prevendo ação de caráter não for-
mal ou informal seja do ponto de vista das instituições promotoras de educação,
escolares ou não, empresas, associações, etc, seja do ponto de vista dos contextos
profissional, social, comunitário, grupal e/ou familiar; e a globalidade da educação
seja no nível da pessoa que se educa, seja da inscrição das práticas educativas nos
níveis locais, nacional e global.

A mesma autora acrescenta ainda que, a educação de adultos é assim importante, na medida
em que oferece uma segunda oportunidade às pessoas que por determinado motivo não puderam
prosseguir a sua formação ou mesmo iniciá-la.
A Educação de Jovens e Adultos, sem sombra de dúvida, constitui um dos meios pelos quais a
sociedade pode satisfazer as necessidades de aprendizagem dos cidadãos, equalizando oportuni-
dades educacionais e resgatando a descida social para com aqueles que foram excluídos ou não
tiveram acesso ao sistema escolar. Compreendida enquanto processo de formação continuada dos
cidadãos, a Educação de Jovens e Adultos deve, pois, configurar-se como dever do Estado e receber
o apoio da sociedade. (Paiva, 2007, p. 27).
Segundo a Estratégia de Alfabetização e Educação de Adultos (2010-1015), a “EJA é definida como
processo de aprendizagem formal, não formal e informal, em que jovens e adultos desenvolvem ha-
bilidades, conhecimentos e atitudes, aperfeiçoando as suas qualificações técnicas e profissionais, na
perspectiva de satisfazer as suas necessidades, da comunicação e da sociedade em geral”.
Segundo Paiva (2007, p. 27):

Fundada nos valores da democracia, da participação, da equidade e solidarie-


dade social, a Educação de Jovens e Adultos deve permitir aos educandos mudar a
qualidade de sua intervenção na realidade. Seu objetivo primeiro é, pois, a constru-
ção de novas formas de participação e de exercício pleno e consciente dos direitos
da cidadania. A formação para o trabalho, entendida como uma das dimensões da
educação continuada de jovens e adultos, deve articular-se à educação geral e aten-
der aos fins da educação nacional.

Para esta autora, as exigências da sociedade contemporânea impõe à Educação de Jovens e Adul-
tos alcançar novas dimensões, propiciando a formação integral do ser humano e a consciência de
suas potencialidades como ser criado, de modo a assegurar o acesso aos bens culturais, aos meios
de preservação do meio ambiente e promoção do desenvolvimento sustentável, aos conhecimen-
tos científicos e tecnológicos necessários à participação social e inserção no mundo do trabalho. O
acesso à leitura e a escrita da língua nacional, a compreensão das diversas linguagens, o domínio
dos símbolos e operações matemáticas, bem como dos fundamentos das ciências sociais e naturais,
constituem as bases para o aperfeiçoamento constante dos indivíduos.

664
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Como a educação básica, a Educação de Jovens e Adultos deve articular-se às ofertas educativas
destinadas às crianças e adolescentes, preservando sua identidade político-pedagógico e especifi-
cidades nos planos conceitual e metodológico. A heterogeneidade sociocultural dos indivíduos, a
diversidade de suas demandas educativas e de suas condições de estudo e aprendizagem requerem
respeito as especificidades das zonas urbanas e rurais e a pluralidade cultural, de gênero, étnica e
religiosa da população.
Neste sentido, os programas de Educação de Jovens e Adultos devem ser flexíveis nas formas
de atendimento, de modo a garantir a pluralidade das concepções pedagógicas e metodológicas e
o respeito às especificidades na seleção dos materiais didáticos e organização do ambiente escolar.

objetiVos e procedimentos preliminAres de pesqUisA


A presente pesquisa tem, dentre outros, os seguintes objetivos: analisar as reais razões da eva-
são e permanência dos jovens e adultos nos processos de Alfabetização no Centro de Educação de
Jovens e adultos do distrito de Chibabava; a partir dos dados de evasão, será possível identificar os
períodos em que a evasão é mais frequente nos referidos centros, igualmente, identificar as razões
da evasão e permanência de alunos no Centro de Educação de Jovens e adultos pesquisado e com-
preender as principais razões apontadas como sendo impulsionadoras das evasões e permanências
dos alunos nos centros pesquisados.
No que se refere a metodologia a ser usada para a materialização da pesquisa, serão priorizados
os aspectos da Educação de Jovens e Adultos, especialmente sobre a evasão e permanência de jo-
vens e adultos no processo de alfabetização no Centro de Educação de jovens e adultos da vila sede
do distrito de Chibabava.
Ultimamente, as pesquisas sociais, têm sido marcadas por estudos que valorizam o emprego de
métodos para descrever e explicar fenômenos. A metodologia comumente utilizada é a da aborda-
gem qualitativa, que não pode ser mensurável, pois a realidade e o sujeito são elementos indisso-
ciáveis. Assim, tratando-se do sujeito, leva-se em consideração seus traços subjetivos e suas parti-
cularidades buscando uma aproximação da realidade do objeto de estudo, neste caso o processo
de ensino-aprendizagem, perseguindo a compreensão desta realidade heterogênea sem cair no
determinismo “sociologizante ou psicologizante” (ZAGO, 2011).
Para Minayo (2010 p. 22) a pesquisa qualitativa:

Trabalha com o universo de significados, motivações, aspirações, crenças, valores


e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos proces-
sos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variável.

A autora, afirma que em um trabalho cientifico a pesquisa qualitativa  divide-se em três etapas:
(1) fase exploratória; (2) trabalho de campo; (3) análise e tratamento do material empírico e docu-
mental. O trabalho de pesquisa de natureza qualitativa, é desenvolvido nessas etapas que apresen-
tam os encaminhamentos previstos para a sua realização.
A primeira etapa, a fase exploratória, pretende englobar a pesquisa bibliográfica e o estado da
arte, que é desenvolvida com o objetivo de compreender o problema através de teorias publicadas
em livros, artigos, revistas, jornais entre outros. As fontes a serem consultadas permitirão construir
fundamentos teóricos que darão suporte na análise do tema. Para esta pesquisa, o foco das leituras
serão as políticas e legislações sobre a EJA em Moçambique, assim como o levantamento de estudos
realizados sobre o tema nos últimos anos.
A segunda etapa, o trabalho de campo, permitirá encontrar respostas ao problema da pesquisa,
através do contacto com a realidade pesquisada (com o objeto de estudo). Para Minayo (2010), o

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
campo da pesquisa social não é transparente, o pesquisador assim como os seus interlocutores e
observadores interferem no conhecimento da realidade. Desta forma, a neutralidade não está pre-
sente, a realidade pode ser modificada quando a observação associada a outros instrumentos de
pesquisa, como, a entrevista complementa e amplia a produção dos dados.
O método de abordagem biográfica (trajetória de vida e estudos biográficos), será usado para o
alcance dos objetivos da pesquisa. Pela natureza do estudo, esse método fará com que os sujeitos
demandantes pela educação de jovens e adultos do distrito de Chibabava possam narrar a sua his-
tória de vida referente aos aspectos ligados a educação, e, principalmente, sobre a evasão e perma-
nência nos centros de alfabetização.
Para a aplicação efetiva desse método, será usada a entrevista compreensiva, que para Zago (
2011, p.295-296) apud kaufmann (1996, p.20):

Define um modo de fazer pesquisa que difere do modelo clássico, estandardiza-


do: definição da problemática na fase inicial, com instrumentos padronizados, to-
talmente na fase que antecede a coleta de dados e voltados para o teste e compro-
vação de hipóteses; amostragem tendendo para a representatividade, com questões
estabilizadas; posição impessoal do pesquisador que, centrado no rigor do método,
trabalha com pouca margem de variação de uma entrevista a outra. Na entrevista
compreensiva, o pesquisador se engaja formalmente; o objetivo da investigação é
a compreensão do social, o que interessa ao pesquisador é a riqueza do material
que descobre. A entrevista compreensiva, inverte as fases de construção do objeto:
a pesquisa de campo não é mais uma instância de verificação de uma problemática
preestabelecida mas o ponto de partida desta problematização.

A entrevista compreensiva, associada ao método biográfico, dará oportunidades para que os al-
fabetizandos possam explicar, segundo a sua percepção todos os aspectos referentes à evasão e
permanência.
A seleção dos sujeitos que vão compor o universo da investigação é algo primordial, pois inter-
fere diretamente na qualidade das informações a partir das quais será possível construir a análise
e chegar a compreensão mais ampla do problema delineado. (DUARTE, 2002). Sendo assim, será
inicialmente aplicado um questionário, para identificar e selecionar os sujeitos que farão parte das
entrevistas. A aplicação do questionário, está inserido na fase da pesquisa de campo, este questio-
nário será sucedido da entrevista. Sendo ele o propulsor do trabalho de campo.
A terceira etapa, a fase de análise e tratamento do material empírico e documental, procurar-se-
-á compreender os fenômenos referentes a evasão e permanência dos jovens e adultos nos centros
de educação de jovens e adultos da vila sede do distrito de Chibabava segundo a perspectiva dos
sujeitos, ou seja, dos participantes da situação em estudo.
Levando em consideração a especificidade do tema e dos poucos estudos nesta direção, este arti-
go encontra-se em fase inicial de desenvolvimento, sendo esta apresentação, portanto, apenas uma
reflexão das possíveis discussões que auxiliarão no aprofundamento da temática exposta.

referênciA bibliográficA
CARMO, Gerson Tavares do. O Enigma da Educação de Jovens e Adultos: um estudo das evasões
e retorno à escola sob a perspectiva da teoria do reconhecimento social. Rio de Janeiro: Dissertação
(mestrado), Programa de Pós-graduação em Sociologia Política da Universidade Estadual do Norte Flu-
minense, 2010.

666
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
DELORS, Jacques. EDUCAÇÃO: um tesouro a descobrir. São Paulo, 1999.
ESPADA, António Salvador Domingos. Análise da Implementação dos Programas de Alfabetização
de Adultos na Perspectiva dos Alfabetizadores no Distrito de Marracuene 2007-2008. Maputo: Disser-
tação (mestrado), Programa de Mestrado da em Educação da Universidade Eduardo Mondlane, 2009.
FAO, GOVERNO DE MOÇAMBIQUE. Formulação de um Programa para a Implementação da Conven-
ção das Nações Unidas de Combate a Desertificação (UNCCD) nos Países da CPLP, Relatório de Moçam-
bique. FAO, CPLP, Ministério de Agricultura. Maputo, 2009.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 17 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
INE. II Recenseamento geral da população e Habitação. Maputo, 1997.
—. III Recenseamento Geral da População e Habitação. Maputo, 2007.
MARÍA, Torres Rosa. Educação para Todos: a tarefa por fazer. Porto Alegre, 2001.
MÁRIO, Mouzinho, Nandja Débora. A Educação de Adultos em Moçambique: Desafios da Educação
para Todos. Maputo, 2006.
MEC. Estratégia de Alfabetização e Educação de Adultos 2010-2015. MEC. Maputo, 2011.
—. Plano Estratégico da Educação 2012-2016. MEC. Maputo, 2012.
MILETO, Luiz Fernando. ‘’No mesmo barco, dando força, um ajuda o outro a não desistir’’- Estratégias
e trajetórias de permanência na Educação de Jovens e Adultos. Rio de Janeiro: Dissertação (mestrado)
Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal Fluminense, 2009.
MOÇAMBIQUE. Perfil do Distrito do Chibabava Província de Sofala. Beira, 2005.
PAIVA, Jane, Maria Margarida Machado, e Thimoty Ireland. Educação de Jovens e Adultos: Uma me-
mória contemporânea1996-2004. Brasília: UNESCO, MEC, 2007.
UNESCO. Educação de Jovens e Adultos nos Países de Língua Portuguesa: novos diálogos para a
cooperação sul- sul. Brasília: UNESCO, MEC, 2007.
—. V CONFINTEA DECLARAÇÃO DE HUMBURGO: Agenda para o Futuro. UNESCO, 1999.

667
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
edUcAção físicA, UmA noVA AbordAgem.
rosA mAriA gArciA monAco pAiVA

O fato de eu ser professora de Educação Física e esta ser uma disciplina obrigatória na Matriz Cur-
ricular da educação básica me levaram a repensá-la em sua promoção e aplicação, quando eu me
deparei com o desafio de construir o material didático impresso e o ambiente virtual de aprendiza-
gem (AVA) para tal disciplina no Projeto CEJA (Centro de Educação de Jovens e Adultos) da Funda-
ção CECIERJ. Este projeto tem como objetivo incorporar à modalidade de ensino semipresencial do
ensino médio da Secretaria de Educação do Rio de Janeiro, no segmento da Educação de Jovens e
Adultos três frentes: - O material didático uniforme; - O AVA na plataforma Moodle (ensino à distân-
cia); - Oficinas interdisciplinares. O número de escolas que são contempladas com o Projeto soma
um total de sessenta escolas e o número de alunos beneficiados alcançam quase quarenta mil. São
cinquenta e oitos cidades representadas pelas escolas CEJAs e mais de mil e seiscentos professores
de todas as disciplinas do currículo mínimo. Especificamente para a Educação Física são sessenta
profissionais alocados um por cada unidade de ensino e a primeira resistência a ser trabalhada, diz
respeito à mudança de paradigmas que a disciplina está sofrendo, já que a educação física sempre
foi estigmatizada por ser unicamente ministrada em aulas práticas nas quadras esportivas! Neste sis-
tema, além de ensinar com o conteúdo através de material didático impresso, ainda há a opção dos
recursos no AVA. Para o enriquecimento curricular, também são propostas oficinas interdisciplinares
que movimentam a disciplina de um lugar segmentado e isolado para um lugar de conexão e par-
ceria com todas as áreas de conhecimento. Este trabalho aponta para o estudo da atual demanda
na educação, ou seja, criar uma nova metodologia a ser trabalhada no ensino público, conectado ao
tema da Diversidade e Educação dos Jovens e Adultos.

palavras-chave: educação física, ambiente virtual, material didático, ensino à distância

introdUção
Os Centros de Educação de Jovens e Adultos (CEJAs) são escolas da Rede Estadual de Ensino do
Estado do Rio de Janeiro, destinadas a jovens e adultos que estão fora da idade escolar e que de-
sejam concluir o Ensino Fundamental e o Ensino Médio. Durante muito tempo, foram conhecidos
como CES (Centros de Estudos Supletivos).
O segundo segmento do Ensino Fundamental (6º ao 9º ano) é voltado àqueles que têm pelo me-
nos 15 anos de idade e concluíram o primeiro segmento (1º ao 5º ano). Já o Ensino Médio é destina-
do a quem possui no mínimo 18 anos e cursou todo o Ensino Fundamental.
Com a inclusão da Matriz Curricular em toda a Rede CEJA, houve uma preocupação em elaborar
um material didático impresso para a Educação Física específico para este público, propondo uma
modificação de abordagem para esta disciplina que sempre foi estigmatizada como disciplina que
somente trabalhava o corpo físico, desconectado do intelecto, investindo apenas nas habilidades
psicomotoras.
Esta proposta de mudança de paradigmas investe em uma discussão entre docentes, discentes
e coordenação da disciplina do Projeto CEJA, propondo conteúdos que estimulem às habilidades
cognitivas dos alunos junto às habilidades afetivas e psicomotoras.
Diante do que foi proposto, construiu-se um material didático impresso para ser utilizado nas 60
unidades escolares da Rede CEJA e a criação de um ambiente virtual de aprendizagem especifico
para a disciplina, além de propiciar a formação continuada para os professores da rede para traba-

668
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
lhar com esta nova modalidade pedagógica.
O pleno entendimento deste trabalho se debruça na possibilidade de uma construção coletiva
de saberes e práticas voltadas para a melhoria do processo de ensino-aprendizagem dos jovens e
adultos, contemplando a inclusão digital e promovendo a Formação Continuada de Professores das
Redes semipresencial e presencial das Redes públicas estaduais.

A estrUtUrA do cejA
Conforme já anunciado na introdução do trabalho, as escolas CEJAs são provenientes dos antigos
CES que foram criados na década de 1970 em plena ditadura militar com a mentalidade impregnada
da época de aquisição de conhecimentos prontos.
Os CEJAs são unidades escolares que oferecem a modalidade EJA, em regime semipresencial, por
empréstimo de módulos, divididos por fascículos. Cada fascículo gera uma avaliação com média
para aprovação de 60%. A Educação Física apresenta uma avaliação para cada ano de ensino, ou
seja, total de três avaliações para o ensino médio.
Nas 60 escolas espalhadas pelo estado do Rio de Janeiro, correspondem cerca de 1600 professo-
res alocados nas diferentes áreas de conhecimento, sendo 60 docentes de Educação Física, absor-
vendo um quantitativo de quase 40.000 alunos.
Curiosamente, a proposta original dos CES era a de buscar uma padronização de seu material
didático para todas as disciplinas. Porém, com o decorrer dos anos, este material sofreu, progressi-
vamente, uma fragmentação.
Com a implantação do projeto da Rede CEJA em 2011, procurou-se implementar:
• A criação de espaços virtuais e presenciais - com cursos de capacitação e de reuniões nas
unidades escolares - onde os professores interagem com as equipes da coordenação do
projeto CEJA, ao mesmo tempo em que trocam experiências com professores de outras
unidades.
• A adoção de um material didático atualizado para a Rede CEJA-RJ, com riqueza plástica e
visual, adequado à linguagem dos alunos.
• A padronização desse material por todos os CEJAs, o que favorece melhor comunicação
entre os profissionais, melhorando o aspecto pedagógico e o administrativo da Rede.
Portanto a Rede CEJA tem como particularidade:
• A uniformidade do material didático impresso que permite um “trânsito” entre os alunos
dentro da própria Rede (semipresencial – CEJA - e presencial – Nova EJA);
• Os conteúdos apresentados no material didático impresso que atendem às novas políticas
curriculares do Ensino Médio.
• O ambiente virtual que propicia à aquisição do conhecimento com o uso de diferentes re-
cursos pedagógicos.
Logo, o sistema semipresencial de ensino prevê:
• Estudo individualizado: estudo do conteúdo no material impresso, atividades propostas e
o estudo da respectiva unidade nas salas de aula virtuais do Ambiente Virtual de Aprendi-
zagem (AVA) da Rede CEJA.
• Estudo presencial e/ou à distância: em uma unidade escolar, junto ao professor, ou através
do AVA para sanar as dúvidas; participação em oficinas propostas inclusive interdisciplina-
res e/ou aulas práticas; realização da avaliação formal.

669
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Especificamente para a educação física, existem possibilidades de aulas práticas a critério do pro-
fessor da unidade de ensino; tudo isso com o objetivo maior de contribuir para a melhoria da quali-
dade de ensino na educação de jovens e adultos.

A edUcAção físicA pArA A rede cejA


O conteúdo de Educação Física neste projeto foi elaborado a partir de uma visão globalizada e
dialógica rumo a uma verdadeira educação, com a intenção de contribuir para o desenvolvimento
das potencialidades cognitivas, afetivas e psicomotoras do aluno. Para a elaboração das unidades,
houve o cuidado de não somente escrever um manual de atividades físicas e nem tão pouco apostar
em conteúdos da área da saúde isolados em seus objetivos. Qualquer dessas formas simplistas de
encarar a disciplina suplantaria a visão holística do aluno dentro da educação.
Com intuito de minimizar tais aspectos unilaterais, as unidades de Educação Física priorizam a
reflexão de temas atuais que contextualizam com áreas afins e paralelas, estimulando uma interação
entre as partes integrantes do processo: o aluno traz suas situações cotidianas à luz da teoria do mó-
dulo ao mesmo tempo em que leva o saber adquirido para a utilização em suas experiências de vida.
A composição curricular concebida para as Redes CEJA e Nova EJA – RJ e, por conseguinte
para o material didático, considerou as novas exigências educacionais, decorrentes da aceleração da
produção de conhecimentos, da criação de novos meios de comunicação, das alterações do mundo
do trabalho e das mudanças de interesse dos adolescentes e jovens. Tudo isso utilizando uma lin-
guagem dialógica para um público específico de EJA.
O recorte de conteúdo proposto para a elaboração do material didático impresso procurou aten-
der também às especificidades contempladas no Currículo Mínimo do Ensino Regular da SEEDUC-
RJ. Como no Brasil não existe um currículo único nacional, os Parâmetros Curriculares Nacionais
(PCNs) trazem, como sugestão, uma forma de definição das disciplinas e da distribuição dos conte-
údos entre os componentes curriculares propostos.
O material didático de Educação Física está dividido em dois fascículos contemplando o conteú-
do dos três anos do Ensino Médio.
Para perseguir os objetivos
de crescimento e desenvol-
vimento das potencialidades
humanas, os temas foram ba-
seados no Currículo Mínimo
da EJA, recheados de temas
atuais e inter-relacionais dis-
postos em quatro diálogos:
A ementa da disci-
plina apresenta o conteúdo
programático, os objetivos de
aprendizagem e as compe-
tências previstas encontra-se
no Anexo A.

670
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
mAteriAl didático impresso
Participei como coautora na elaboração do material didático para a Rede CEJA também utilizado
na Rede Nova EJA, sob a coordenação geral das conteudistas Profas. Doutoras Amparo Villa Cupo-
lillo e Martha Copolillo. Participaram também da equipe as professoras de Educação Física: Claudia
Queiroz, Paula Edila Botelho Barbosa e Patrícia Pinto Xavier.
O material possui uma linguagem adequada que irá promover uma efetiva comunicação entre
professor e aluno e, por conseguinte, um processo de ensino-aprendizagem mais satisfatório. Lem-
brando que levar o fascículo para casa, estudá-lo e voltar à escola apenas para tirar dúvidas e/ou
para fazer a prova, caracteriza-se como EaD, e não somente o estudo através dos recursos multimi-
diáticos. Com isso, entende-se o que quis dizer RODRIGUES (2007):

Uma aula em EAD é produzida por alguém que domina um determinado conte-
údo e deseja que seu leitor/aluno aprenda esse conteúdo. O segredo está, portanto,
em o que selecionar e como combinar os vários itens selecionados para provocar
um efeito de sedução/convencimento que leve o aluno a aprender a partir do que
foi escrito.

Assim, tanto o material didático impresso quanto o virtual apresentam uma linguagem:
• dialógica, para proporcionar maior interação
entre professor e aluno.
• semi-informal, de modo a permitir ao aluno me-
lhor entendimento do conteúdo formal.
• própria de EaD, com ferramentas que favore-
cem a compreensão e a fixação do conteúdo
pelo aluno.
Por serem meios e não fins, os elementos da Educação
Física foram dispostos de forma que os alunos em suas
leituras sejam levados a refletir sobre as diferentes situ-
ações que exercitam a sua criatividade, a capacidade de
abstração, de se comunicar, de se expressar, de resolver
problemas; e a critério do professor de cada escola CEJA,
de trabalhar em equipe e vivenciar experiências práticas
nas quadras e salas, que contribuam no seu processo in-
tegral de humanização e cidadania.

AVA – cejA VirtUAl


Figura 1: Exemplo de material didático de
No século XXI não falar das Novas Tecnologias da Educação Física do CEJA
Informação e Comunicação (NTIC) na área pedagógica
para EJA é estar desconectado do momento. Logo, para a nossa realidade de mundo atual o CEJA
Virtual é mais um atrativo para o público alvo, que podem estar em um dos três estágios do conhe-
cimento digital:
• Analfabeto digital
• Nativos digitais
• Imigrantes digitais.
A utilização do AVA para este público específico possibilita agilizar, digitalizar e veicular em rede

671
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
o conteúdo comunicacional; sem contar que o uso das novas tecnologias gera modificações na edu-
cação. Quanto às contribuições da tecnologia na educação podemos citar:
• Difusão do conhecimento em maior amplitude.
• Possibilidade de atualização “em tempo real”.
• Melhor interatividade = melhor construção do conhecimento.
A ideia de se criar o Ambiente Virtual de Aprendizagem junto às unidades do material impresso
já fazia parte do projeto original para a Rede CEJA, porém esta construção teve que ser elaborada a
partir do material didático impresso, até porque ele foi baseado e também dialoga todo o tempo
com as seções, unidades e conteúdos do material impresso.
Diferentemente do que alguns
acreditam o emprego das tecnolo-
gias da informação e da comunicação
não representam meros instrumentos
educacionais, mas possibilitam ao alu-
no, principalmente de EJA, maior aces-
so à informação. Porém, enquanto eu
construía o CEJA Virtual de Educação
Física, eu entendi que apenas disponi-
bilizar os recursos não era o suficiente,
é preciso repensar a prática pedagógi-
ca. Com isso, para a construção deste
ambiente, foi preciso:
• Conhecer as ferramentas.
• Identificar os objetivos a se-
rem alcançados.
• Escolher as ferramentas ade-
quadas.
• Elaborar as atividades.
O aluno acessa a plataforma com
seu login e senha. Logado à plata-
forma de ensino seleciona a opção
“Educação Física – unidades 1, 2, 3 e
4”. Lá ele encontrará recursos de mul-
timídias que o fará entender melhor
o conteúdo impresso e, além disso, o
ajudará a fazer conexões e aguçar os
conhecimentos através de filmes, mú-
sicas, jogos, imagens, etc. (Figura 2)

noVA ejA
Conforme foi dito anteriormente Figura 2 – Imagem da unidade 3 de Educação Física no CEJA
neste trabalho, a Rede Nova EJA utili- Virtual
za o mesmo livro didático para o alu-
no, acrescido do livro didático para o professor e CD multimídia.
Assim como na Rede CEJA, os professores da Rede Nova EJA também cumprem capacitações,

672
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
mas com um formato um pouco diferente. Como a modalidade de ensino é EJA presencial, é com-
pulsório a qualquer dos professores alocados nas escolas Nova EJA à sua participação nos encontros
presenciais bimestrais, divididos por polos de proximidade
com suas unidades escolares com dia e hora fixados por
calendário único, para todo o estado do Rio de Janeiro.
Enquanto o primeiro bimestre para o aluno vai sendo
ministrado nas salas de aula e nas quadras, o professor
cursista acompanha a parte virtual da mesma formação
continuada pela plataforma Moodle, acompanhados por
uma equipe de tutores à distância. Para tal capacitação lhe
é ofertado uma bolsa-auxílio mensal. Para ambas as ca-
pacitações CEJA e Nova EJA, a carga horária servirá como
parte da carga horária das especializações para 2015/2016
na área de Educação Física que serão oferecidas pela Fun-
dação CECIERJ a serem realizadas pelo Ensino à Distância.

comentários finAis
Para todo o esforço que temos visto na busca de for- Figura 3 – Material do Professor do Nova
necer uma melhoria na oferta da educação para o públi- EJA – Livro do Professor e CD com conteú-
co de jovens e adultos, são importantes e necessárias to- do multimídia que pode ser acessado pelo
das as discussões, reciclagem, capacitação, enfim, toda site do projeto.
sugestão e crítica têm sido a favor de uma educação que
contextualize, reflita e forme cidadãos.
O que garante o projeto é o feedback atual dos professores nas plataformas de ensino apon-
tando seu entusiasmo para a vivência do novo método de ensino da Educação Física. Houve uma
progressão para que a disciplina fosse sendo retomada e construída, e neste trabalho é possível
entender que através de uma construção colaborativa, com muita conversa e capacitação, estamos
atingindo a nossa meta, que é alcançar todos os professores de Educação Física das Redes CEJA e
Nova EJA e seus alunos, para um novo tempo e uma nova abordagem em nossa educação no esta-
do.

referênciAs bibliográficAs
BARRETO, Cristine Costa. Aula 6 – praticando a boa prática. Disponível em <http://teca.cecierj.edu.
br/popUpVisualizar.php?id=51607&urlArquivo>. Acesso em 20/08/2014.
cne/ceb nº 01/00. Disponível em <http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/ CEB012000.pdf>.
Acesso em 20/08/2014.
SANTOS, Edicleia Alves dos, e OLIVEIRA, Rita de Cássia da Silva. caminhos e descaminhos da Al-
fabetização De Jovens E Adultos No Brasil. UEPG. Disponível em <http://www.cereja.org.br/arqui-
vos_upload/edicleia_rita_caminhos_ descaminhos.pdf>. Acesso em 20/08/2014.
RODRIGUES, Sônia. Aula 4 – Linguagem: significado e funções. Disponível em
<xa.yimg.com/kq/groups/22394409/1564901653/name/Aula_4.pdf>. Acesso em 14/08/2014.

673
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Anexo A – ementA dA disciplinA de edUcAção físicA dA rede cejA 2014
Fascículo 1 – Unidade 1: Práticas Esportivas e Relações Humanas
seriação – 1º ano

conteúdo apresentado objetivos de aprendizagem

seção 1: - Reconhecer a importância das práticas


corporais na história do desenvolvimen-
- Atividades físicas na história da hu- to humano, identificando os elementos
manidade (lutas, jogos, ativ. rítmicas da cultura corporal de movimento.
e expressivas, ginásticas, esportes)
- Identificar na prática esportiva cole-
seção 2: tiva possibilidades concretas de esta-
- Práticas esportivas coletivas belecimento de relações humanas.
- Autoridade e autoritarismo - Relacionar a prática de atividade física
com a prevenção ao uso de drogas lícitas e
seção 3: ilícitas no contexto social contemporâneo.
- Prática de atividade física e a questão - Reconhecer a pluralidade da cul-
da saúde ampliada na sociedade con- tura corporal de movimento e suas
temporânea: drogas lícitas e ilícitas. manifestações socioculturais.

fascículo 1 – Unidade 2: educação física e corporeidades


seriação – 1º ano

conteúdo apresentado objetivos de aprendizagem


seção 1:
- Corpo, Cultura e Sociedade. - Reconhecer o corpo como uma cons-
seção 2: trução sociocultural, compreenden-
do a indissociabilidade entre corpo e
- As mídias e os modelos corporais. mente e as múltiplas corporeidades.
- Distorções da imagem corporal. - Analisar criticamente a presença das mídias
seção 3: na construção dos modelos corporais que
circulam na sociedade contemporânea.
- Corpos em movimento: sen-
tidos e significados. - Identificar diferentes sentidos e significados
expressos nas práticas corporais cotidianas.
- A potência do movimen-
to na vida cotidiana.

674
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
fascículo 2 – Unidade 3: educação física: saúde e qualidade de Vida
seriação – 2º ano

conteúdo apresentado objetivos de aprendizagem


Seção 1:
- Conceituar saúde e qualidade de
- O que é qualidade de vida? vida, refletindo acerca das suas in-
seção 2: fluências no corpo (ser) humano.
- Alimentação e exercício físico. - Relacionar a postura, o exercício físico e
a alimentação com benefícios à saúde.
seção 3:
- Analisar criticamente os deter-
- Fatores prejudiciais à saúde e a minantes sociais da saúde.
qualidade de vida (vícios postu-
rais, drogas, distúrbios do sono). - Listar atitudes básicas de primeiros socor-
ros necessários para situações de acidentes.
seção 4:
- Noções básicas de primeiros socorros.
fascículo 2 – Unidade 4: educação física, trabalho e lazer
seriação – 3º ano

conteúdo apresentado objetivos de aprendizagem


- Compreender a contribuição do tem-
Seção 1: po de lazer não apenas como recu-
peração do tempo de trabalho.
- A cigarra e a formiga.
- Conhecer diferentes manifesta-
seção 2: ções culturais de lazer, relacionando-
- Políticas públicas de lazer. -as com as políticas públicas ao lon-
go da história da humanidade.
seção 3:
- Analisar o uso do tempo livre, refletindo
- Lazer ativo ou passivo. sobre as opções de lazer, a influência mi-
diática e seus interesses mercadológicos.

675
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
ejA: espAço de ArticUlAção e compArtilhAmento
de sAberes
AnA pAUlA mAchAdo gUimArães de pAiVA | celinA emíliA fernAndes
sUely soAres dA fonsecA

Vivenciando e acompanhando a trajetória da educação no contexto geral e especificamente, na


Educação de Jovens e Adultos, observam-se as transformações que vem sendo construídas no sen-
tido de promover as possibilidades que apontem para ações de cunho emancipatório acessíveis aos
jovens, adultos e profissionais da Escola SESI GON, tendo como pano de fundo as Tecnologias de
Informação e Comunicação (TIC) que estão cada vez mais presentes, em todos os ambientes, direta
ou indiretamente, o que pode ser comprovado a partir da quantidade de informações que circulam
na sociedade, independente da distância física e da temporalidade, em uma dinâmica e velocidade
que muitas vezes não conseguimos acompanhar. A Educação Básica do SESI RJ nos permite, através
de sua metodologia própria - SESIeduca, compartilhar experiências em um ambiente educativo di-
nâmico, promovendo a articulação dos diferentes saberes, visando a construção do conhecimento,
fazendo com que o educando se torne independente, seguro de suas ações, consciente de suas ati-
tudes, buscando autonomia, criatividade e principalmente, respeitando as diferenças existentes no
ambiente escolar e social, extrapolando os muros da escola. Investimos e incentivamos o trabalho
com projetos pedagógicos, promovendo a articulação dos diferentes saberes e percepções, explo-
rando temas da atualidade e/ou que façam parte da realidade local, num processo de construção
coletiva, com foco na diversidade e compartilhamento. Através da interligação das diferentes áreas
de conhecimento, saímos do individual para o coletivo, onde os docentes buscam parcerias entre
seus pares, procurando ao mesmo tempo envolver os discentes de forma que se sintam autores e/
ou coautores, trabalhando com isso as relações, o respeito, a ética, as experiências e as emoções,
oportunizando o crescimento pessoal e profissional, ultrapassando a sala de aula e, consequente-
mente, os muros da escola, bem como promovendo a mudança de atitude e postura em toda comu-
nidade escolar.

palavras-chave: EJA, projetos, compartilhamento, articulação

introdUção
No atual contexto social globalizado, a informação e a comunicação destacam-se pela velocida-
de de sua propagação, independente da distância física e até mesmo das questões voltadas para
temporalidade, onde todos têm acesso a qualquer fato ocorrido, simultaneamente, independente
do lugar que esteja e isso faz com que as pessoas sintam a necessidade de estar conectados para
acompanhar a evolução da informação e comunicação e, consequentemente, do contexto social,
quer seja local ou global.
Esse movimento faz com que haja uma mudança significativa no meio social, econômico, político,
cultural, institucional e, consequentemente educacional.

de Acordo com márcio bAlbino cAVAlcAnte (2008),


Na era da clonagem, do genoma humano, das inovações tecnológicas, é preciso despertar nos
nossos alunos o gosto pela escola, o prazer de estudar, a importância do conhecimento, do saber X
fazer, das competências e habilidades para que possamos inseri-los neste contexto literário, históri-
co sociocultural que vivemos como cidadãos críticos, reflexivos, participativos e conscientes do seu

676
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
papel na sociedade local e global.
Vivenciando e acompanhando a trajetória da educação no contexto geral e especificamente, na
Educação de Jovens e Adultos, observam-se as transformações que vem sendo construídas no sen-
tido de promover as possibilidades que apontem para ações de cunho emancipatório acessíveis aos
jovens, adultos e profissionais da Escola SESI São Gonçalo, tendo como pano de fundo as Tecnolo-
gias de Informação e Comunicação (TIC).

pAnorAmA sociAl e edUcAcionAl


Vivemos num momento onde a circulação da informação está cada vez mais rápida e acessível a
todos os indivíduos, independentemente de sua localização, promovendo a integração e inter-rela-
ção econômica, cultural, social e política. Todo esse movimento de globalização se tornou realidade
com o desenvolvimento e avanço das TICs.
A partir dessa nova realidade, faz-se necessário repensar a educação de forma contextualiza-
da, visando o processo de construção do conhecimento que atenda à realidade emergente local e
planetária.
Ao repensarmos o contexto educacional, Edgar Morin propõe que se leve em consideração al-
guns pontos importantes, como a relevância do erro no decorrer do processo de construção do
conhecimento e a necessidade de se buscar estratégias para corrigir imprevistos, a contextualização
do conhecimento e conteúdos trabalhados e produzidos na escola e o desenvolvimento, concomi-
tante da ética, autonomia pessoal e participação social.
Segundo Bernard Charlot (2005):

A educação é um triplo processo de humanização (tornar-se um ser humano), de


socialização (tornar-se membro de tal sociedade e de tal cultura) e de singularização
(tornar-se um sujeito original, que existe em um único exemplar – independente de
sua consciência como tal). As três dimensões do processo são indissociáveis: não há
ser humano que não seja social e singular, não há membro de uma sociedade senão
na forma de um sujeito humano, e não há sujeito singular que não seja humano e
socializado.

escolA sesi
A Escola SESI-RJ utiliza uma metodologia própria - Metodologia SESIEduca- , voltada a princípio
para o aluno trabalhador, sendo estruturada a partir dos quatro pilares da aprendizagem, aponta-
dos pela UNESCO para educação do século XXI: Aprender a aprender, Aprender a fazer, Aprender a
conviver e Aprender a ser.
A metodologia SESIEduca tem como principais linhas de pensamento:
a) o aluno constrói seu conhecimento. A aprendizagem é, portanto, um processo
ativo, em que o sujeito aprendente toma iniciativa, define, decide, faz, pensa, elabora.
É importante a realização de uma escola centrada no indivíduo que aprende. Nem
todos constroem conhecimentos do mesmo jeito, nem todos têm os mesmos interes-
ses em relação aos objetos de aprendizagem. A noção de inteligências múltiplas e da
extrema diversidade de aspectos na inteligência de uma mesma pessoa recomenda
que a escola esteja atenta à diversidade num determinado grupo e às tendências de
cada aluno;

677
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
b) essa construção é social, ocorre na interação com o outro. Qualquer conhecimen-
to se dá num contexto em que outras pessoas, presentes fisicamente ou indiretamen-
te atuantes, tomam parte. Discussões em grupo, trabalhos de equipe, troca de idéias,
diálogo em sala, são importantes para a elaboração do conhecimento no interior de
cada indivíduo. Dúvidas, dificuldades, contra-pontos, funcionam como desafios, de-
sequilibradores das certezas precárias, dos conhecimentos incompletos, das visões
parciais;
c) aprendizagem é mediada. Há um espaço entre o conhecido e aquilo a conhecer,
que é mais fácil, segura e rapidamente percorrido, se o sujeito aprendente conta com
um „guia“ ou mediador;
d) o professor é o mediador entre o que o aluno sabe e o que passa a saber; entre
a competência atual e a nova que adquire. O professor não é um mero repassador de
conhecimentos ou transmissor de informações, nem apenas organizador das condi-
ções ambientais, exteriores, como espaço físico, livros, textos, nem somente coorde-
nador das ações dos alunos em situação de aprendizagem. Tendo mais experiência
que o aluno, conhecendo mais a matéria que ele, tendo domínio dos processos de
construção do conhecimento, o professor ajuda o aluno a transitar do conhecido para
o desconhecido;
e) no mesmo processo em que ensina, o professor aprende. Por sua vez, o aluno,
aprendendo, ensina ao professor, agindo como desafiador de novas aprendizagens,
quer referentes ao conteúdo da matéria, quer sobre como os diversos alunos elabo-
ram novos conhecimentos;
f ) o trabalho cooperativo e a comunicação entre os alunos, da mesma forma que
o registro de suas produções, pensamentos e sentimentos, é parte essencial do fazer
pedagógico e, portanto, da realização das aprendizagens;
g) o professor deve ser adequadamente formado para exercer com habilidade o im-
portante e decisivo papel que lhe cabe na passagem do desenvolvimento atual para
o desenvolvimento potencial de seus alunos. Em outras palavras, a qualificação pro-
fissional inclui a formação específica para a metodologia e considera as características
dos alunos jovens e adultos. Requer-se perfil para trabalhar com a metodologia;
h) o antigo postulado de que a educação deve visar à formação integral da pessoa,
envolvendo aspectos físicos (movimento) cognitivos, sociais e afetivos, que se aplicam
também à educação dos jovens e adultos, é reforçado pelas novas pesquisas sobre as
relações entre processos cognitivos e processos vitais. Não é apenas a mente do alu-
no que está operando e constituindo conhecimentos, mas a pessoa inteira, enquanto
indivíduo, ser social e político, agente de transformação material e produção imate-
rial de bens a serviço da sociedade. É a pessoa integral, portanto, que deve estar
se constituindo.
i) a concepção epistemológica de currículo, nesta metodologia, tem um entendi-
mento de um ambiente de aprendizagem, como um território comum de conversão
que resulta em várias possibilidades que poderão expandir para outros níveis e outros
conhecimentos. São novas articulações entre os saberes, tentando-se implementar
maior flexibilidade na trajetória do aluno. O modelo que despreza as possibilidades
afetivas, lúdicas e estéticas do entender o mundo tornou-se hegemônico, submergin-
do no utilitarismo que transforma tudo em mercadoria (Regina Assis, Parecer CNE/CEB

678
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
nº 4/98)
Podemos mencionar como diretrizes pedagógicas da Metodologia SESI Educa:
a) Valorização dos saberes da vida prática. Desde a infância e por meio da diversa
experiência ao longo da vida, o jovem e o adulto construíram saberes. Tais saberes,
que lhes têm servido para fazer sua vida, são riqueza a ser preservada e ampliada. Não
apenas ponto de partida, mas alimento permanente do diálogo, dos debates, das aná-
lises da realidade atual, tais saberes irão se enriquecendo no estudo de novos saberes;
b) Construção e reconstrução de conhecimentos. Sendo construtores de saberes,
os jovens e os adultos que vão pela primeira vez à escola, ou a ela retornam, serão
igualmente os sujeitos ativos da construção dos novos conhecimentos e competên-
cias que pretendem possuir. Para que algo seja aprendido, é preciso que seja constru-
ído ou reconstruído pelo sujeito aprendente. Informações armazenadas na me-
mória não podem ser entendidas como conhecimento; sua importância depende da
capacidade do sujeito de organizá-las, relacioná-las, refletir sobre elas, a fim de chegar
a um conhecimento;
c) Aprender a aprender, a ser, a fazer e a conviver. Mais importante do que os conte-
údos das diversas áreas de conhecimento são as aprendizagens constitutivas do novo
modo de ser e de estar diante do conhecimento: aprender a conhecer, aprender a
fazer, aprender a ser e aprender a conviver;
e) Aprendizagem significativa. Todo conteúdo e processo de aprendizagem pro-
postos ao jovem e ao adulto têm que ser significativos. Por isso, a memorização perde
importância e cede o lugar às aprendizagens significativas e transformadoras do ser,
do conviver e do fazer cotidiano;
f ) Conteúdo e processo num mesmo ato de aprendizagem. Processo de aprendi-
zagem e conteúdo a aprender são imbricados. Não há conflito entre conteúdo e pro-
cesso. O estudo de um conteúdo envolve, simultaneamente e no mesmo movimento,
uma forma de conhecer, ou seja, um caminho para chegar ao conhecimento. Importa
que o aluno aprenda esse caminho (método), para transitar autonomamente por ele
o tempo todo, em todas as circunstâncias de sua vida. Inversamente, não há como
aprender um processo de conhecer senão através de um conteúdo;
g) Aprendizagem prazerosa. Que haja alegria na sala de aula. Os jovens e adultos
que vêm pela primeira vez ou retornam à escola, trazendo, às vezes, uma experiência
escolar traumática, são capazes e têm direito de sentir profunda alegria pela desco-
berta, pelo conhecimento, pela consciência de um novo saber. Dado que os proces-
sos cognitivos estão profundamente articulados com os processos vitais, a afetividade
tem que estar presente nas relações sociais da escola ( ). Se estudar – e ter que apren-
der – pode ser cansativo e exigente – não precisa ser chato nem insosso. A ludicidade
pode estar presente nos textos, nas relações, nos exercícios.

SESI São Gonçalo

A Escola SESI São Gonçalo trabalha com EJA desde 1993, atendendo a princípio alunos do Ensino
Fundamental oriundos da indústria. Atualmente o perfil de atendimento modificou com a implanta-
ção da gratuidade7, passando a atender também a comunidade.

7 Programa da Gratuidade

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Hoje nossa clientela é constituída de alunos a partir de 15 anos completos, em turmas do 2º Seg-
mento do Ensino Fundamental e a partir dos 18 anos no Ensino Médio, em turmas multisseriadas,
com alunos agrupados por fases, proporcionando a troca e o diálogo, onde o o docente assume o
papel de mediador, fazendo com que seu aluno reflita, deduza, sintetize, compreenda e chegue a
um resultado com consciência.
Dentro dessa estrutura, atendemos a realidades diferenciadas, organizados por programas:
• EJA Interno – 2º segmento do Ensino Fundamental e Médio
• EJA Interno EBEP – 2º segmento do Ensino Fundamental e Médio. Essas turmas são articula-
das com cursos de qualificação em parceria com o SENAI São Gonçalo.
• EJA Externo – 1º Segmento do Ensino Fundamental, atendendo a gratuidade e ao SINDUS-
CON8 e ao PDMO9
• EJA Externo – 2º Segmento e Médio
Vale ressaltar que as turmas externas, conhecidas como classes anexas, têm por objetivo levar a
escola até o aluno. São salas de aula implantadas em empresas, nas comunidades ou outras institui-
ções, que segume a mesma estrutura e organização da escola interna.

trAbAlho com projetos


Segundo Fernando Hernández (1998),

A proposta que inspira os projetos de trabalho está vinculada a perspectiva do


conhecimento globalizado e relacional.[...] Essa modalidade de articulação dos co-
nhecimentos escolares é uma forma de organizar a atividade de ensino e aprendiza-
gem, que implica considerar que tais conhecimentos não se ordenam para sua com-
preensão de uma forma rígida, nem em função de algumas referências disciplinares
preestabelecidas ou de uma homogeneização dos alunos. A função do projeto é fa-
vorecer a criação de estratégias de organização dos conhecimentos escolares em
relação a: 1) o tratamento da informação, 2) a relação entre os diferentes conteúdos
em torno de problemas ou hipóteses que facilitem aos alunos a construção de seus
conhecimentos, a transformação da informação procedente dos diferentes saberes
disciplinares em conhecimento próprio.

Iniciamos o trabalho com projetos, buscando uma forma diferenciada para contextualizar os con-
teúdos trabalhados e fazendo com que os alunos pudesse se envolver nas atividades propostas em
sala de aula, buscando respostas e soluções para questões apresentadas, fazendo com que a apren-
dizagem se tornasse significativa para os mesmos.
Paralelo a esse trabalho, foi desenvolvido no EBEP a articulação de currículo, visando maior inte-
ração entre as diferentes áreas trabalhadas no curso – disciplinas da Educação Básica e Unidades
Curriculares da Educação Profissional, trabalho este que chegou a ser referendado pelo MEC.
Com os resultados obtidos naquele momento, sentimos a necessidade de expandirmos o traba-
lho com projetos pedagógicos, promovendo a articulação dos diferentes saberes e percepções, en-
volvendo todas as turmas da escola, internas e externas, procurando explorar temas da atualidade
e/ou que façam parte da realidade local, num processo de construção coletiva, com foco na diver-
sidade e compartilhamento.
8 SINDUSCON – Programa Alfabetizar é Construir, convênio com o Sindicato da Construção Civil do Rio de Janeiro
9 PDMO – Programa de Desenvolvimento de Mão de Obra, convênio com a PETROBRÁS

680
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Esse movimento se deu através da formação continuada, realizada a princípio durante as reuni-
ões pedagógicas e os encontros específicos no início de cada período letivo.
No decorrer desse processo vivemos constantes conflitos envolvendo tanto alunos como docen-
tes, no sentido de incorporar as inovações ao seu cotidiano.
A dificuldade de aceitar o novo causou insegurança para alguns professores, no sentido de ter
que sair de sua zona de conforto para enfrentar a nova proposta, tendo que reestruturar sua forma
de ensinar e compartilhar seus saberes com outros colegas de sua área e mais adiante, de áreas dis-
tintas, procurando trabalhar de forma articulada, precisando ouvir o outro, trocar e aceitar opiniões,
respeitando as diferentes formas de pensar e buscar o consenso para que o trabalho com projetos
atingisse o objetivo proposto, de articulação e construção de conhecimento, fazendo com que hou-
vesse o envolvimento do aluno para que esta novidade entrasse em sua vida de forma prazerosa e
consciente de sua importância, enquanto coautor dessa construção.
A princípio o trabalho começou a se desenhar de forma efetiva com o envolvimento de alguns
professores que aceitaram o desafio e buscaram parcerias com colegas com quem tinham mais afi-
nidades e cujas áreas dialogavam entre si, e com horários compatíveis. Projetos foram construídos,
procurando fazer com que o aluno pudesse estabelecer relação entre as diferentes áreas, construin-
do de forma coerente e contextualizada os conhecimentos processados no decorrer do trabalho.
Através da interligação das diferentes áreas de conhecimento, saímos do individual para o cole-
tivo, onde os docentes passaram a buscar parcerias entre seus pares, procurando ao mesmo tempo
envolver os discentes de forma que se sintam autores e/ou coautores, trabalhando com isso as rela-
ções, o respeito, a ética, as experiências e as emoções, visando o crescimento pessoal e profissional,
ultrapassando a sala de aula e, consequentemente, os muros da escola, buscando promover a mu-
dança de atitude e postura em toda comunidade escolar.

tecnologiAs de informAção e comUnicAção (tic)


Paralelo ao trabalho com projetos, passamos a conviver com o avanço da TIC no contexto educa-
cional e, mais especificamente dentro da escola SESI.As tecnologias foram sendo incorporadas no
universo escolar conforme foram sendo popularizadas e seus recursos identificados como possíveis
de gerar aprendizagem (objeto da educação escolar). Desta forma, vários projetos e iniciativas vi-
nham ocorrendo em paralelo, no universo particular de cada escola ou gerência. Assim, tornou-se
necessária a expansão e melhoria dos recursos, serviços e processos relacionados ao uso de tecnolo-
gias educacionais. Sendo assim, é proposto o programa Conectividade, objetivando reunir e dispo-
nibilizar para as escolas iniciativas voltadas para o uso de tecnologias no processo ensino aprendi-
zagem, viabilizando não só a reunião de diversas ações correlatas, mas também a união de projetos
convergentes e, ainda gestão de projetos emergentes, com vistas à otimização de recursos, redução
dos prazos e também o cumprimento das metas no que diz respeito ao uso das tecnologias no pro-
cesso educacional.
Lançado em 2010, o Programa Conectividade tem como objetivo geral criar condições que favo-
reçam a incorporação de novas tecnologias ao processo educacional, viabilizando conectividade a
professores, equipe técnico-pedagógica e alunos do SES e SENAI.
O SESI, dentro desse contexto investiu no sentido de capacitar os profissionais, equipar as Unida-
des com as TIC, promover o acesso dos alunos e monitorar sua utilização, resultando num trabalho
diversificado, através da interdisciplinaridade e proporcionando o envolvimento do corpo discente
nas atividades, de forma dinâmica, resultando numa aprendizagem diferenciada, motivadora e sig-
nificativa.
A escola atualmente possui 02 Net car(carrinhos com 40 netbooks), Talua instalada em cada sala,
UMA (Unidade Móvel de Aprendizagem) e Datashow disponível. Cada colaborador recebeu um ne-

681
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
tbook.
Apesar disso, vivemos constantes conflitos envolvendo tanto alunos como docentes, no sentido
de incorporar as inovações ao seu cotidiano, temos dificuldade de aceitar o novo, isso traz insegu-
rança para algumas pessoas, que assumem uma postura de resistência frente às propostas apresen-
tadas, principalmente envolvendo o uso das TIC.
Barreiras precisaram ser quebradas nesse sentido, o que só foi possível a partir do trabalho vol-
tado para a articulação e compartilhamento dos diferentes saberes, onde àqueles que não domina-
vam as ferramentas buscaram parcerias com os colegas que já estavam familiarizados, bem como
através de treinamentos internos para auxiliar nesse processo de aprendizagem do docente.
Outro desafio enfrentado é o de levar o trabalho desenvolvido dentro da escola para as turmas
externas, levando em consideração que não disponibilizamos dos recursos tecnológicos para que
os alunos tenham acesso.
Apesar das dificuldades enfrentadas, o trabalho tem sido realizado, procurando seguir a mesma
linha interna, da articulação e compartilhamento de saberes, com as devidas adaptações necessá-
rias com relação às TIC, mas sem deixar que a proposta perca o seu objetivo e qualidade.
Os alunos da Escola SESI GON , quer sejam internos ou externos, estão cada vez mais tecnológicos
e devemos oferecer uma educação diferenciada, proporcionando uma aprendizagem significativa.
E isso tem sido possível através da articulação de saberes, do diálogo entre as disciplinas, fazendo
com que o processo de aprendizagem se torne desafiador, aberto para discussões e significativo.

considerAções finAis
Dentro do que foi exposto, hoje é possível se observar uma mudança no perfil da equipe docente
a partir do trabalho articulado com projetos, procurando o envolvimento dos alunos enquanto su-
jeitos do processo de aprendizagem e tendo as TIC como pano de fundo.
Atualmente o trabalho com projetos de forma articulada já flui com mais facilidade, aceitação e
envolvimento por parte dos professores, alunos e demais membros da comunidade escolar.
Algumas dificuldades e resistências ainda podem ser observadas, mas aos poucos estão sendo
vencidas, pois a grande maioria do professorado já internalizou essa forma de trabalhar e conse-
gue se enxergar enquanto sujeitos ativos, parceiros, inovadores, buscando e acreditando no diálo-
go entre as diferentes áreas de conhecimentos, fazendo com que a escola assuma uma dinâmica
diferenciada na sua prática pedagógica o, que se estende ao alunado, que consegue se vê também
enquanto sujeito dessa ação, extrapolando os muros da escola, através da divulgação pelos próprios
alunos das atividades realizadas.

referênciAs bibliográficAs:
CHARLOT, Bernard. Relação com o saber, formação de professores e globalização: questões para a
educação hoje. Porto alegre: Artes Médicas, 2005.
CAVALCANTE, Márcio Balbino. A Pedagogia de Projetos: um novo olhar sobre a prática pedagógica.
Psicologia Online. Disponível em http://www.psicopedagogia.com.br/artigos/artigo.asp?entrID=1088.
Acesso em 23/08/2014.
HERNÁNDEZ, Fernando; VENTURA, Montserrat. A organização do currículo por projetos de trabalho.
Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.
Nascimento, Patrícia Limaverde & MORIN,Edgar. Pensamento Transdisciplinar e a Educação Planetá-
ria. Revista Online Transdisciplinaridade na Escola. Disponível em
http://transdisciplinaridade.wordpress.com/2012/07/20/edgar-morin-seu-pensamento-transdisci-
plinar-e-a-educacao-planetaria/. Acesso em 15/08/2014

682
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
SESI. RJ. Educação de jovens e adultos: documento de estrutura e funcionamento. Rio de Janeiro:
GEM, GEF, 2001.
SESI. RJ. Passo a Passo da Metodologia SESIeduca: Educação de jovens e adultos. Rio de Janeiro: GEB,
2011.

683
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
ensino médio de joVens e AdUltos (ejA). UmA propostA
edUcAtiVA e Um desAfio de VidA.
selmA lúciA limA sAntos

Instituto Federal de Educação Tecnológica e Profissional do Estado do Espírito Santo (IFES) Profª.
Selma Lúcia Lima Santos – selmalucia@ifes.edu.br RESUMO A educação e a formação devem per-
mitir uma leitura crítica do mundo. O mundo que nos rodeia é um mundo inacabado e isso implica
a denúncia da realidade opressiva, da realidade injusta e, conseqüentemente, de crítica transfor-
madora, portanto, de outra realidade. Essa nova realidade do amanhã é a utopia do educador de
hoje que busca novos paradigmas em sua atuação diária. É conhecida a tese de Paulo Freire de que
“ninguém educa ninguém”, mas ninguém, tampouco, se educa sozinho: nós nos educamos uns aos
outros à medida que interagimos uns com os outros. Em adultos independentes e competentes,
capazes de definir autonomamente um projeto de vida e de transformá-lo em realidade. Entende-
-se que para ser professor de uma disciplina é preciso antes de qualquer coisa ter o domínio de seu
conteúdo, porém não é só isso. Os pensadores da educação defendem um processo educativo con-
textualizado, que se pode dizer que é a derrubada das aulas que não significam muita coisa para os
alunos é a descoberta de que o ser humano só aprende efetivamente aquilo que tiver utilidade para
ele. Melhor ainda aprende tudo que estiver ao seu alcance, desde que tenha aprendido a pensar,
pode-se dizer até que aprender a pensar é um direito à cidadania. Educação é o nome dado a esse
processo de aquisição ou construção de competências através da aprendizagem, com vistas à cres-
cente autonomização do indivíduo. A construção da aprendizagem é algo que só acontece quando
o aluno é ativo, quando está interessado no que está fazendo, quando sua motivação é intrínseca,
não extrínseca. Isso significa, que a aprendizagem, para ser bem sucedida, é auto-gerada ou auto-
-iniciada, e, auto-conduzida e auto-sustentada.

palavras-chave: Educação, Eja, Alunos, Projetos

introdUção
O ser humano não aprende sozinho, e, portanto, não se educa sozinho. Sua aprendizagem, e, por-
tanto, a sua educação, acontece em um contexto social. Mas esse fato não quer dizer que a apren-
dizagem do ser humano é exclusiva e necessariamente produzida pela ação de terceiros, e que,
portanto, outros o educam.
É conhecida a tese de Paulo Freire de que “ninguém educa ninguém, mas ninguém, tampouco, se
educa sozinho: o ser humano se educa em comunhão, no contexto de viver sua vida neste mundo
(Pedagogia do Oprimido)10. Ou seja, ninguém educa ninguém e ninguém se educa sozinho: nós nos
educamos uns aos outros à medida que interagimos uns com os outros, à medida que tentamos nos
transformar, de criaturas incompetentes e dependentes, em adultos independentes e competentes,
capazes de definir autonomamente um projeto de vida e de transformá-lo em realidade.
A aprendizagem humana, portanto, não é produzida exclusiva e necessariamente pela ação de
terceiros, nem, tampouco, se produz exclusivamente por aquele que aprende (o aprendente), sem
a interferência de terceiros. É importante ressaltar que mesmo a ação intencional de terceiros na
aprendizagem, e, portanto, na educação de um indivíduo deve ter como objetivo o desenvolvimen-
to da autonomia e a construção da competência do mesmo.
Se isso não se der, não se está tratando a educação como um processo de desenvolvimento hu-
mano. O Ensino de Jovens e Adultos (EJA) deveria adotar o conceito de educação como desenvol-
10 Paulo Freire, 1979, p.79.

684
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
vimento humano, que tem o foco no indivíduo e no seu desenvolvimento - mesmo que reconheça
que esse desenvolvimento se dá num contexto social e envolva, necessariamente, interação («co-
munhão») com outros seres humanos. Aprender, portanto, é construir competência: é conseguir
fazer o que antes não se conseguia fazer, e, portanto, envolve ampliação da autonomia.
A construção da aprendizagem é algo que só acontece quando o aluno é ativo, quando está inte-
ressado no que está fazendo, quando sua motivação é intrínseca, não extrínseca. Isso significa, que a
aprendizagem, para ser bem sucedida, é auto-gerada ou auto-iniciada, e, não só isso, mas, também,
auto-conduzida e auto-sustentada. Ela decorre daquilo que o aluno faz, não de algo que o professor
faz nele, para ele ou por ele.
Houve mudança significativa nos fins e nos métodos da educação em decorrência dessa nova
tecnologia. A partir do século XV, começou a desgastar-se o ponto de vista de que o fim principal da
educação escolar é transmitir informações, de um-para-um, ou de um-para-poucos, num contexto
presencial. Com a invenção de Gutenberg tornou-se possível transmitir informações de um-para-
-milhares/milhões - e sem que emissor e receptores das informações enviadas estivessem num mes-
mo local. Essa invenção tornou a educação à distância viável - da mesma forma que tornou o auto-
-aprendizado, através de livros, acessível a qualquer leitor (era preciso saber ler para se beneficiar da
novidade.
As mudanças nos fins e nos métodos da educação iniciadas com a invenção do livro tornaram-
-se irreversíveis. A educação escolar vai ter de ser reconceituada: não faz mais sentido imaginar um
professor repassando aos seus alunos (passivos) uma quantidade enorme de informações (em geral
desatualizadas), nas quais eles não têm o menor interesse. Informação, hoje, se busca, no momento
em que ela é necessária (just in time), na dosagem exata (just enough), enquanto estamos ativamen-
te fazendo as coisas que nos são necessárias ou nos interessam (on the job, hands on). Em vez de
ficar repassando informação inútil, a educação escolar deve ajudar a desenvolver as competências e
as habilidades necessárias para se viver bem e com qualidade de vida.

objetiVos

objetiVo gerAl
Melhorar o processo de aprendizagem do Ensino Médio para Jovens e Adultos em detrimento
aos cursos técnicos do CEFETES, mediante Pedagogia de Projetos.

objetiVos específicos
• Analisar a proposta de solução do problema de baixo aproveitamento escolar sobre a apli-
cação da mesma denominada por Pedagogia de Projetos.
• Utilizar métodos produtivos de ensino por problemas e temas geradores, com propósito de
levar os alunos a desenvolverem projetos integradores.
• Estudar os resultados alcançados da proposta anteriormente desenhada.

jUstificAtiVA
A educação de jovens adultos começa com a responsabilidade do profissional de educação pe-
rante a sociedade em cujo contexto desenvolve suas atividades, de seu compromisso em colaborar
com um processo de transformação. Portanto a educação tem com elemento fundamental, o sujeito,
homem que busca, por meio dela, a superação de suas imperfeições, de seu saber relativo. Aqueles
que ensinam não estão se comunicando com um grupo de ignorantes, mas com homens que pos-

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
suem um saber tão relativo quanto o deles. Parafraseando Freire... Faz uma análise no trabalhador
social em um processo de mudança na qual a realidade é distorcida provocando o descobrimento
da verdadeira dimensão na qual está imerso o trabalhador, o que poderá ser conseguido por meio
da percepção crítica da realidade.
Entre a escola que se tem e a escola que se quer, existe um hiato muito grande. O abismo entre
esses dois pólos deve ser diminuído. Reconhece-se que é uma tarefa supra-histórica que deve ser
assumida coletivamente por todos que estão nos mais diferentes âmbitos do sistema educacional,
com a participação efetiva das entidades representativas de classe e da sociedade civil. Não cabe a
nenhum dos atores se esquivar desta tarefa. Cada um tem uma responsabilidade e um compromisso
a realizar nos planos: político, filosófico, ético, teórico e prático que devem ser gestados nos embates
contra-hegemônicos da sociedade capitalista atual.
Acredita-se que utilizando uma pedagogia ativa, que leve o aluno a construir seus conhecimen-
tos, ele terá um melhor aprendizagem.

fUndAmentAção teóricA
A função de integração social da escola
Essa crise está associada ao esgotamento do modelo de organização social baseado no que se
convencionou chamar “modernização”. Nesse processo há dois componentes básicos: a racionalida-
de e a subjetividade. Enquanto a primeira volta-se para a organização da vida social e das atividades
produtivas através da incorporação da ciência e da tecnologia, a segunda aponta para o desenvolvi-
mento integral da personalidade libertado das limitações impostas pelos determinantes sociais ou
culturais (DELUIZ, 1995).
A função de integração social da escola deve, portanto, ser redefinida. A crítica democrática ao
papel tradicional da escola enfatizava seu caráter reprodutor e, assim, evidenciava o caráter con-
servador da integração social por ela promovida. O fato é que esse modelo esgotou suas possibi-
lidades e atualmente as alternativas renovadoras ou conservadoras não giram mais em torno dos
mesmos eixos que no passado.
A mudança mais importante suscita pelas novas demandas à educação é que ela deve incorporar
de forma sistemática a tarefa de formação da personalidade. A atividade produtiva e o exercício da
cidadania, como se vê, requerem o desenvolvimento de uma série de capacidades (pensamento
sistemático, solidariedade, criatividade, capacidade de resolver problemas, capacidade de trabalhar
em equipe, etc.) que não se formam nem espontaneamente, nem através da mera aquisição de in-
formações ou conhecimentos.
A função da escola em relação à formação da personalidade é estabelecer os quadros de referên-
cia que permitirão a cada um escolher e construir sua ou suas múltiplas identidades.
Educação profissional
A Educação Profissional pode atender a múltiplos objetivos através de várias modalidades, das
mais curtas e simples, até a habilitação de nível técnico, que pode ser ofertada de modo concomi-
tante ou seqüencial. No caso de oferta concomitante, a escola deve observar a carga horária desti-
nada à educação básica, e embora o seu conteúdo possa estar articulado à formação profissional,
dever ser assegurada sólida formação geral.
Quanto mais diversificada e flexível for à oferta feita por um conjunto de instituições, de modo a
assegurar entradas e saídas sem rigidez burocrática, e com número de vagas que permita democra-
tização do acesso, maior é a possibilidade de educação profissional continuada.
Abre-se um novo espaço para a escola no que diz respeito ao seu projeto político-pedagógico,
posto que a oferta seletiva e desigual não pode ser abertamente defendida em face do avanço da

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
discussão acerca de uma pretendida sociedade de direito, que a globalização, em princípio viabi-
lizaria. Desse mesmo modo, os organismos internacionais pressionam o terceiro mundo para me-
lhorar seus indicadores educacionais como condição para apoio financeiro e político. Esta resposta
à contradição, agora sobre novas bases, que pode permitir desde que a escola assim o determine,
a elaboração de um projeto político-pedagógico que contemple os interesses da maioria da popu-
lação através de novas formas de seleção, organização e tratamento metodológico dos conteúdos,
de maneira a oportunizar relações verdadeiramente significativas entre o aluno e o conhecimento,
como condição para a sua participação efetiva no trabalho e na sociedade, de modo a ser protago-
nista da construção de uma nova ordem social.
transdisciplinaridade
Do ponto de vista metodológico, a categoria transdisciplinaridade desempenha papel funda-
mental; daí o seu destaque na Resolução no 03/98. A primeira tarefa que se faz necessária diz respei-
to à elucidação dos diferentes significados que têm sido atribuídos aos termos interdisciplinaridade,
multidisciplinaridade e transdisciplinaridade, que invadiram o cenário do debate sobre as possíveis
formas de organização do trabalho escolar.
A transdisciplinaridade implica a construção de um novo objeto, com metodologia peculiar, a
partir da integração de diferentes disciplinas, que se descaracterizam como tais, perdem seus pon-
tos de vista particulares e sua autonomia pra constituir um novo campo de conhecimento.
Como afirma Moreno11 só é possível integrar sem confundir aquilo que foi diferenciado previa-
mente:
A transdisciplinaridade na medida em que significa a construção/apropriação de
um novo objeto a partir de um problema da prática social, que exige a integração de
várias áreas do conhecimento, só é possível através do trabalho coletivo.
A transdisciplinaridade é espaço de aprendizagem coletiva pela construção da uni-
dade a partir da diversidade e sem dissolvê-la; é a síntese dialética através da qual se
fortalece o todo que estimula o crescimento e a organização coletiva, estabelecendo-
-se relações de troca e de solidariedade como condição para o desenvolvimento de
um projeto político-pedagógico que se projete para além das dimensões formais.
Pela sua origem nas indagações de caráter prático que mobilizam os alunos, os pro-
jetos transdisciplinares sempre que possível deve culminar com uma intervenção na
comunidade ou na escola, enquanto prática pedagógica de exercício de pré-cidada-
nia, de modo a articular ciência e política na perspectiva da construção da ética, da
solidariedade e do compromisso com a transformação da sociedade; nessa dimensão,
cria-se um espaço de intervenção prática, fundamental para o desenvolvimento do
sentido de pertencimento à sociedade e da consciência social, bem como da constru-
ção da utopia.
A verdadeira unidade é processo, resultante de síntese provisórias de diferenças,
divergências e desigualdades, que vão sendo construídas através do embate dos con-
traditórios em torno de um projeto comum, residindo aí sua riqueza e sua fecundida-
de.
O que se objetiva com essa discussão acerca do método, é fornecer elementos que
tornem possível a superação do formalismo academicista do Ensino Médio, articulan-
do sujeito e objeto, conhecimento geral e específico, lógica e história, teoria e prática,
escola, trabalho e sociedade, na dimensão de práxis transformadora.

11 1998, p. 25.

687
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Como afirma Moreno12 só é possível integrar sem confundir aquilo que foi diferenciado
previamente:
A transdisciplinaridade na medida em que significa a construção/apropriação de
um novo objeto a partir de um problema da prática social, que exige a integração de
várias áreas do conhecimento, só é possível através do trabalho coletivo.
A transdisciplinaridade é espaço de aprendizagem coletiva pela construção da uni-
dade a partir da diversidade e sem dissolvê-la; é a síntese dialética através da qual se
fortalece o todo que estimula o crescimento e a organização coletiva, estabelecendo-
-se relações de troca e de solidariedade como condição para o desenvolvimento de
um projeto político-pedagógico que se projete para além das dimensões formais.
Pela sua origem nas indagações de caráter prático que mobilizam os alunos, os pro-
jetos transdisciplinares sempre que possível deve culminar com uma intervenção na
comunidade ou na escola, enquanto prática pedagógica de exercício de pré-cidada-
nia, de modo a articular ciência e política na perspectiva da construção da ética, da
solidariedade e do compromisso com a transformação da sociedade; nessa dimensão,
cria-se um espaço de intervenção prática, fundamental para o desenvolvimento do
sentido de pertencimento à sociedade e da consciência social, bem como da constru-
ção da utopia.
A verdadeira unidade é processo, resultante de síntese provisórias de diferenças,
divergências e desigualdades, que vão sendo construídas através do embate dos con-
traditórios em torno de um projeto comum, residindo aí sua riqueza e sua fecundida-
de.
O que se objetiva com essa discussão acerca do método, é fornecer elementos que
tornem possível a superação do formalismo academicista do Ensino Médio, articulan-
do sujeito e objeto, conhecimento geral e específico, lógica e história, teoria e prática,
escola, trabalho e sociedade, na dimensão de práxis transformadora.

pedAgogiA de projetos: fUndAmentos


Na pedagogia de projetos, o aluno aprende no processo de produzir, de levantar dúvidas, de
pesquisar e de criar relações, que incentivam novas buscas, descobertas, compreensões e recons-
truções de conhecimento. E, portanto, o papel do professor deixa de ser aquele que ensina por
meio da transmissão de informações – que tem como centro do processo a atuação do professor –,
para criar situações de aprendizagem cujo foco incide sobre as relações que se estabelecem neste
processo, cabendo ao professor realizar as mediações necessárias para que o aluno possa encontrar
sentido naquilo que está aprendendo, a partir das relações criadas nessas situações. A esse respeito
Valente13 acrescenta:

(...) no desenvolvimento do projeto o professor pode trabalhar com [os alunos]


diferentes tipos de conhecimentos que estão imbricados e representados em termos
de três construções: procedimentos e estratégias de resolução de problemas, concei-
tos disciplinares e estratégias e conceitos sobre aprender.

No entanto, para fazer a mediação pedagógica, o professor precisa acompanhar o processo de


aprendizagem do aluno, ou seja, entender seu caminho, seu universo cognitivo e afetivo, bem como
12 1998, p. 25.
13 2000, p. 4.

688
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
sua cultura, história e contexto de vida. Além disso, é fundamental que o professor tenha clareza da
sua intencionalidade pedagógica para saber intervir no processo de aprendizagem do aluno, garan-
tindo que os conceitos utilizados, intuitivamente ou não, na realização do projeto sejam compreen-
didos, sistematizados e formalizados pelo aluno.
Outro aspecto importante na atuação do professor é o de propiciar o estabelecimento de rela-
ções interpessoais entre os alunos e respectivas dinâmicas sociais, valores e crenças próprias do con-
texto em que vivem. Portanto, existem três aspectos fundamentais que o professor precisa conside-
rar para trabalhar com projetos: as possibilidades de desenvolvimento de seus alunos; as dinâmicas
sociais do contexto em que atua e as possibilidades de sua mediação pedagógica.
O trabalho por projetos requer mudanças na concepção de ensino e aprendizagem e, conse-
qüentemente, na postura do professor. Hernández14 (enfatiza que o trabalho por projeto “não deve
ser visto como uma opção puramente metodológica, mas como uma maneira de repensar a função
da escola”.
Aprendendo e “ensinando”
A pedagogia de projetos deve permitir que o aluno aprenda-fazendo e reconheça a própria auto-
ria naquilo que produz por meio de questões de investigação que lhe impulsionam a contextualizar
conceitos já conhecidos e descobrir outros que emergem durante o desenvolvimento do projeto.
Nesta situação de aprendizagem, o aluno precisa selecionar informações significativas, tomar deci-
sões, trabalhar em grupo, gerenciar confronto de idéias, enfim desenvolver competências interpes-
soais para aprender de forma colaborativa com seus pares.
A mediação do professor é fundamental, pois, ao mesmo tempo em que o aluno precisa reconhe-
cer a sua própria autoria no projeto, ele também precisa sentir a presença do professor que ouve,
questiona e orienta, visando propiciar a construção de conhecimento do aluno.

concepções de pAUlo freire


Paulo Freire (2000) convida o analfabeto a sair da apatia e do conformismo de “demitido da vida”
em que quase sempre se encontra e desafia-o a compreender que ele próprio é também um fazedor
de cultura, fazendo-o apreender o conceito antropológico de cultura. O “ser-menos” das camadas
populares é trabalhado para não ser entendido como desígnio divino ou sina, mas, como determi-
nação do contexto econômico-político-ideológico da sociedade em que vivem.
Quando o homem e a mulher se percebem como fazedores de cultura, está vencido, ou quase
vencido, o primeiro passo para sentirem a importância, a necessidade e a possibilidade de se apro-
priarem da leitura e da escrita, com isso estão alfabetizando-se.

A gestão dA edUcAção – A ejA


Reuniram-se alguns aspectos para discussão que permitam analisar as intrincadas relações entre
o contexto mais amplo das políticas vigentes, o papel do Estado na indução dessas políticas, a prá-
tica social e as determinações que afetam o campo da educação e, conseqüentemente, a educação
de jovens e adultos.
Traz-se, assim, com base em alguns estudos na área e na apreciação das políticas para o setor, al-
guns pontos que contemplam momentos da história das políticas públicas na área. Sem a pretensão
de análise mais exaustiva e sem descuidar do contexto internacional, focaliza-se as políticas do EJA
em nível nacional e estadual, o contexto mais amplo.
Discutir políticas educacionais no atual contexto nacional e, em particular, políticas de educação
de jovens e adultos, requer a consideração de diversos fatores que, no processo de globalização,
14 1988, p. 49.

689
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
articulam, integram e definem metas, propostas e diretrizes que vêm sendo defendidas e impostas
pelos organismos internacionais.

implicAções nA políticA dA ejA


No caso específico da educação de jovens e adultos (EJA), estas políticas repercutem de forma
ainda mais contundente uma vez que, em nossa tradição, a EJA tem sido tratada sempre de forma
marginal em relação às demais modalidades de educação.

políticAs dA ejA
Alguns momentos da educação de jovens e adultos, marcados por suas concepções e suas prá-
ticas, merecem destaque no âmbito das políticas educacionais no Brasil. A tradição da área mostra
como a EJA tem se caracterizado por políticas emergenciais de campanhas, cujos impactos e limites
são bem conhecidos entre nós. As concepções de analfabetismo (erva daninha a ser erradicada),
de analfabeto (alguém inferior, cego, ignorante) e de educação de jovens e adultos (suprimento
da escolarização perdida na infância) de certa forma continuam ainda vigentes no ideário da nossa
educação, embora tenhamos conseguido significativos avanços.

políticAs em níVel locAl


É dentro do contexto mais recente das políticas públicas da EJA, a que se refere acima, que se
trazem alguns elementos para reflexão e discussão sobre as políticas da EJA no Estado do Espírito
Santo. Tomam-se como referência as políticas desenvolvidas nos anos 90, em especial nos últimos
cinco anos. Esse período é marcado pela não prioridade do governo federal para com as políticas
públicas. Observa-se que o Brasil, instado pelos compromissos com os organismos internacionais
de financiamento, passa a adotar medidas de redução do gasto social reduzindo o orçamento da
saúde, da educação e, particularmente, da educação de jovens e adultos.

metodologiA de pesqUisA
A pesquisa foi realizada CEFET de Vitória no Estado do Espírito Santo onde ocorreu o trabalho
de campo – nos anos de 2004 e 2005, logo à documentação foi direta. As pesquisas em sua maioria
caracterizam-se como qualitativas descritivas, tendo algumas a tentativa de intervir na realidade
analisada, sejam elas desenvolvidas por secretarias de educação, universidades ou em movimentos
sociais.
Os dados são obtidos através de observação direta e sistemática das atividades de sala de aula,
assim como, entrevistas com professores, alunos, diretores e outros profissionais da escola. Comple-
mentadas com a análise dos documentos produzidos, planos de ação, relatórios, ofícios, palestras,
programas de governo do Estado e das organizações da sociedade civil, panfletos, atas e materiais
didáticos. Finalmente, busca-se a discussão e articulação das informações coletadas com os respec-
tivos referenciais teóricos.
• Universo
Alunos procedentes da EJA que fazem algum curso técnico no CEFETES.
• População
Alunos procedentes da EJA matriculados no Módulo I dos cursos técnicos do CEFETES no ano de
2004/1; foram quatro turmas da EJA do CEFETES com um total de 90 alunos.
A pesquisa compreendeu trabalhos que abordavam as concepções, metodologias e práticas de
educação de pessoas jovens e adultas, envolvendo questões relativas à psicologia da educação, à

690
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
formação dos educadores, ao currículo e ao ensino e aprendizagem das disciplinas que o compõem.
Como a educação de jovens e adultos freqüentemente reconhece o educando enquanto trabalha-
dor e remete às relações com o mundo do trabalho, foram considerados também estudos relaciona-
dos a essa temática

AVAliAção dA metodologiA de projetos


Aplicação da avaliação processual, a partir do desenvolvimento de competências e habilidades
(PERRENOUD, 1999) pré-definidas pela equipe multidisciplinar.
os instrumentos usados para a avaliação são abaixo descritos:
1. questionário pedagógico de diagnóstico inicial – para traçar o perfil dos alunos.
2. Portifólio – Entregue ao aluno para que eles coloquem todas as descobertas que fizeram e os
conhecimentos adquiridos durante realização dos projetos. Este instrumento será apresentado ao
final de cada projeto, ou durante o processo, quando solicitado pelo professor.
3. ficha de acompanhamento individual - Através deste instrumento os professores acompa-
nharão, individualmente, em todo desenvolvimento dos alunos.
4. Avaliação multidisciplinar: através deste instrumento far-se-a uma avaliação global de todo
semestre, incluindo o desempenho dos professores, dos alunos, da proposta, dos conhecimentos
adquiridos pelos alunos, do apoio ao educando e auto-avaliação.

Análise dA propostA
A proposta dessa pesquisa surgiu em 2001 quando o CEFETES passou a oferecer o Ensino Médio
de Jovens e Adultos. Às vésperas de receber a primeira turma, a única definição que se tinha, em
termos de currículo sobre o curso, era que ele seria oferecido em vinte e quatro meses ou quatro
módulos de seis meses com carga horária de 1440 horas. Foi quando se formou a equipe multidisci-
plinar a fim de formatar o currículo do curso.
Felizmente a equipe era formada por professores dispostos a implementar mudanças e trans-
gressões no ensino, conforme nos coloca Hernandéz (1988). O pedagogo foi o último componen-
te a chegar à equipe e antes de sua chegada já havia pensado em desenvolver o curso dentro da
Pedagogia de Projetos. No início houve certa preocupação, pois esta forma de fazer pedagógica é
extremamente inovadora, e precisa ser desenvolvida em um ambiente de total desprendimento de
padrões tradicionais. Dentro de uma visão dialética, ela seria a antítese educacional.

pArecer dA pesqUisA
A política de educação profissional e formação assim como para a educação básica desenvolvida
para o sistema público brasileiro, foram abarcadas pelos ideais da reestruturação produtiva e globa-
lização, ou seja, seguem o mesmo caminho das políticas educacionais implementadas no Chile e na
Inglaterra, países com características marcadamente neoliberais.
Diante disso, o que se observa com a introdução da política educacional para o ensino médio e
profissional é uma grande tendência em relação ao ensino médio, com vinculação às amarras do
mercado, às políticas de desenvolvimento produtivo, cuja estratégia de ensino é garantir disponibi-
lidade de mão-de-obra flexível e empregável.

considerAções finAis
No decorrer desse estudo observou-se que a Educação de Jovens e Adultos passa atualmente por

691
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
um estágio de transição, saindo de uma etapa em que a modalidade do esforço individual dos pro-
fissionais da área, partindo para uma etapa de estudo e reflexão para futuras mudanças, baseando-
-se nas concepções disponibilizadas pelo MEC.
Também se pôde verificar que toda a teoria sobre a EJA que já ultrapassa décadas, ainda conti-
nua em plano utópico, apesar dos educadores dessa modalidade ter este conhecimento e discurso
embasado teoricamente, há certa dificuldade para a efetivação de uma prática educativa coerente
com a realidade cultural dos educandos, atribuído muitas vezes, à falta de suporte financeiro e ins-
titucional, como a falta de material específico, o apoio devido dos Municípios e cobranças indevida
das instituições.
A partir dos estudos sobre Paulo Freire, ressalta-se que os educandos do EJA estão sujeitos das
transformações sociais, pelas diversas áreas de conhecimento, as quais devem ser reconhecidas
como representações culturais, possibilitando a apropriação da realidade em seu processo de trans-
formação.
Constatou-se que o jovem e o adulto só aprendem quando tem um projeto de vida onde o conhe-
cimento é significativo para eles. É o sujeito que aprende através de sua própria ação transformado-
ra sobre o mundo. É ele que constrói suas próprias categorias de pensamento, organiza e transforma
o mundo. Nesse sentido o educador deve ensinar só que ensinar não é transmitir conhecimento.
Para que o ato de ensinar se constitua como tal, é preciso que o ato de aprender seja precedido do
ato de apreender o conteúdo ou o objeto com que o educando se torna produtor também do co-
nhecimento que lhe foi ensinado.

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692
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
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693
Anexos

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
696
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
entre nós e encrUzilhAdAs: As trAjetóriAs dos joVens
de 15 A 17 Anos nA ejA em AngrA dos reis
leilA mAttos hAddAd de monteiro mArinho

Pautando-se pela presença constante do tema “juvenilização da EJA” nos debates sobre políticas
de educação no Brasil e em vários trabalhos que o consideram tanto do ponto de vista da escola-
rização, como das trajetórias ou das culturas juvenis, e sua importância para a implementação de
políticas públicas consolidadas, o presente estudo busca compreender quem são os jovens de 15
a 17 anos na EJA no município de Angra dos Reis, suas trajetórias de vida, visando empreender os
significados do estudo e da escola de Educação de Jovens e Adultos para esses jovens, analisando
as razões que os levam a essa modalidade da educação básica. Considerada como o lugar para o
adulto ou mesmo idoso há pelo menos cinco anos fora escola, a EJA não é vista como a escola para
o jovem, especialmente os mais novos, entre 15 e 17 anos. Isso o coloca em um não-lugar uma vez
que o regular também já não é mais apropriado para esses sujeitos que vem acumulando reten-
ções, casos de indisciplina e apresentando desinteresse por aquilo que a escola tem a lhes oferecer.
Lembrando que a condição de ser jovem é plural e está referenciado a “um conjunto situacional de
fenômenos que a caracterizam” (Dayrell, 2011, p.15), conhecer esses jovens e suas trajetórias de vida
é ponto de partida para entender o significado da EJA em suas vidas. Para realização do estudo, a
pesquisa se realiza a partir de base documental e de dados produzidos pela Secretaria de Educação
e através da abordagem biográfica.

palavras-chave: jovens, juvenilização, EJA, trajetórias

A presença de um número cada vez maior de jovens na Educação de Jovens e Adultos vem sendo
apontada por diversos autores como uma realidade e uma questão a ser enfrentada pelos governos
federal, estaduais e municipais, além de educadores e demais profissionais envolvidos com a edu-
cação no Brasil.
O processo de “juvenilização da EJA” não é algo novo nos debates sobre políticas de educação no
Brasil. Em sua dissertação de mestrado, “A atuação do departamento de Ensino Supletivo do MEC
no período de 1973-79”, defendida em 1984, Sônia Maria de Vargas já apontava para o aumento no
número de jovens a partir dos 14 anos na Educação de Jovens e Adultos, denominada, na época, de
Ensino Supletivo.
Vários têm sido os trabalhos que consideram a juvenilização da EJA ou a juventude e a escola
como seu objeto de pesquisa, seja do ponto de vista da escolarização, das trajetórias ou das culturas
juvenis.
Em Angra dos Reis, esse processo vem sendo sentido com mais intensidade a partir de 2009.
Nesse período, a entrada de jovens na EJA cresceu e suscitou uma série de questionamentos e po-
sicionamentos do grupo de professores. A presença dos jovens, que até então eram minoria e não
provocava grandes alterações na composição e no trabalho pedagógico da EJA, começava a provo-
car mudanças e até conflitos. Os problemas de indisciplina, acarretados, dentre outras razões, por
baixa autoestima15; as diferenças entre os ritmos de aprendizagem e de realização das atividades
entre os alunos jovens e os mais velhos, especialmente idosos, começaram a provocar desequilíbrio
e perturbações.
Por outro lado, os professores apontaram as dificuldades em trabalhar com turmas formadas por
15 Podemos encontrar referências a esse aspecto, por exemplo, em: Educação de jovens e adultos - Proposta curricular para o1º
segmento do ensino fundamental, organizado por Vera Maria Masagão Ribeiro, publicação da Ação Educativa, MEC (1997); e A escola e
a exclusão de François Dubet; o Projeto da EJA – Angra, por sua vez, usa a expressão “renovar suas expectativas de sucesso”.

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
interesses tão díspares. Muitos professores também apontavam que a EJA não era o lugar para aten-
der o aluno de 15 a 17 anos, muito jovem e na maior parte das vezes, segundo esses professores, fora
do mercado de trabalho. Para grande parte dos professores, esse fato comprovava a inadequação da
presença desses jovens na EJA – no período noturno – e justificava sua permanência no regular, uma
vez que o dia desses alunos estava ocioso.
Procurando atender esse anseio do coletivo, a coordenação realizou, no período de 2009 a 2012,
encontros de educadores, em que a juvenilização foi o foco dos debates no ano de 2010 e nas reu-
niões ao longo de todo o período, além de outros aspectos presentes na Educação de Jovens e
Adultos do município.
A discussão não se encerrou, ao contrário, se fez cada vez mais presente e tem tomado espaço
nas minhas preocupações com os caminhos que a EJA em Angra dos Reis vem trilhando. Por isso, o
presente projeto nasceu do trabalho realizado na rede tanto como professora quanto como coorde-
nadora e busca entender o significado da EJA para os jovens entre 15 e 17 anos.
Os questionamentos sobre o lugar do jovem na Educação de Jovens e Adultos tem adquirido
destaque nas discussões dos docentes da EJA em Angra dos Reis. Contudo, o que nos interessa é
menos o processo de juvenilização da modalidade e seus efeitos pedagógicos e mais a construção
das relações que o objeto mantém com as condições que o determinam.
Tomando por base Dayrell (2011, p.15), não é possível falar no jovem, no singular, uma vez que a
condição de ser jovem é plural e está referenciado a “um conjunto situacional de fenômenos que a
caracterizam”.
Falar no jovem requer a conceituação desse sujeito, objeto da presente pesquisa. A definição
histórica da juventude como uma fase da vida, intermediária para a vida adulta, vem sofrendo mu-
danças, especialmente nas abordagens sociológicas, que levam em consideração variáveis como a
classe social, o gênero, cor, entre outras, cujas articulações resultam nas diversas maneiras de viver
a juventude. Juventude, portanto, ganha contornos e sentidos nas “interações sociais nas quais as
diferentes idades se reconhecem e se distinguem” (Dayrell, Nogueira & Miranda, 2011, p. 13).
Esse mesmo autor nos apresenta a ideia de “condição juvenil” a qual abarcaria melhor a dualida-
de do conceito “juventude” uma vez que remete tanto ao ciclo da vida, reconhecido socialmente
como um determinado momento da existência, em um determinado contexto histórico e de gera-
ção, como também a maneira como esses indivíduos (ou grupos de indivíduos) vivem e sentem em
determinada realidade sociocultural e sua diversidade.
Mannheim (apud Weller, 2007) ao discutir o conceito de gerações, apresenta a juventude como
parte de um contexto sócio histórico, explicitando que fazer parte de uma geração, além da possibi-
lidade de vivenciar experiências semelhantes, é processá-las de formas semelhantes.
Esses jovens, portanto, possuem suas especificidades, suas peculiaridades, mas também pos-
suem traços que os une, que os colocam em posição de pertencimento a um determinado contexto
histórico e espacial.
Neste sentido, conhecer esses jovens e suas trajetórias de vida é ponto de partida para entender
o significado da EJA em suas vidas. Perceber a condição juvenil importa em investigar a realidade
na qual se circunscreve a vida dos jovens que se encontram na Educação de Jovens e Adultos em
Angra dos Reis.
O sujeito, dentro de um contexto histórico, social e cultural se move, em maior ou menor grau,
estabelecendo suas escolhas e desenvolvendo meios de sobrevivência nesses contextos. A indisci-
plina pode ser vista como um suporte do qual os jovens lançam mão para lidar com a inadequação
da realidade escolar as sua expectativas ou interesses. Portanto, se toda escolha se concebe e se
realiza dentro de um contexto, elas também são individuais (Martucelli, 2010).

698
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Para tanto, acreditamos ser necessário conhecer suas trajetórias escolares e de vida. Conhecer e
entender os suportes criados/usados pelos jovens na EJA em Angra dos Reis pode contribuir para
compreender suas trajetórias.
Em seu estudo sobre os processos de escolarização pública de jovens pobres, Mônica Peregrino
(2010, p. 112-113) nos aponta indícios importantes sobre o estudo de trajetórias:

Por outro lado, o estudo das relações entre o pertencimento a algumas turmas
e a condição social do aluno podem nos dar pistas para o esclarecimento sobre as
trajetórias da desigualdade no interior da escola. [...] Nosso objetivo é percorrer a
trajetória desses alunos durante todo o curso ginasial, com destaque para as turmas
formadas em cada série, assim como os turnos em que o processo de escolarização
se deu. Esses dados, que buscam percorrer as diferentes trajetórias de escolarização,
marcadas pelo “pertencimento” a turmas e turnos, acrescentamos outros, relativos
às condições sociais dos alunos “levantados” [Grifos da autora].

Portanto, é fundamental conhecer os caminhos percorridos pelos sujeitos, os obstáculos com os


quais se depararam ao longo de sua história e os suportes aos quais recorreu para chegar ao ponto
em que se encontra, principalmente levando-se em conta os contextos aos quais se circunscrevem
essas experiências.
Levando em consideração as questões até aqui apresentadas, os objetivos centrais dessa pesqui-
sa são: compreender quem são os jovens de 15 a 17 anos da EJA no município de Angra dos Reis;
suas trajetórias de vida, visando empreender o significado dessa modalidade de ensino para esses
sujeitos; e os significados do estudo e da escola de Educação de Jovens e Adultos para esses jovens,
analisando as razões que os levam a procurar essa modalidade da educação básica em Angra dos
Reis.
A juvenilização constitui-se no ponto de partida para o estudo, o caminho inicial que nos leva às
relações entre o jovem e a escola, ou o espaço escolar e a escola enquanto espaço de socialização
para além da escolarização. Nesse sentido, a análise das legislações que tratam do atendimento es-
colar a jovens constitui-se no primeiro material de pesquisa, especialmente a Lei nº 9.394/96 (LDB),
a Resolução CNE/CEB n° 1/2000 e o seu Parecer 11/2000, a Resolução CNE/CEB nº 3/2010, o Parecer
CNE/CEB nº 23/2008 e o Parecer CNE/CEB nº 6/2010; bem como a Lei 8.069/90 (ECA), que dispões
sobre a proteção integral a criança e ao adolescente.
Entretanto, não se pretende tratar de juventude apenas como questão legal, mas de jovens den-
tro da complexidade da sociedade contemporânea e das relações que se estabelecem nos contex-
tos históricos, sociais e culturais aos quais esses jovens pertencem.
Ouvi-los e observá-los em seu espaço escolar, que mais do que lugar de experiência acadêmica é
espaço de socialização desses jovens, é fundamental para a compreensão dessas interações e da no-
ção de pertencimento e de individuação que esse jovem desenvolve com relação ao espaço escolar.
Para isso, é importante saber a forma como esse jovem chegou a EJA.
Nesse estudo, pretendemos entender o(s) significado(s) da EJA para os jovens de 15 a 17 anos.
Portanto, é fundamental conhecer os caminhos percorridos pelos sujeitos, os obstáculos com os
quais se depararam ao longo de sua história e os suportes aos quais recorreram para chegar ao pon-
to em que se encontram, principalmente levando-se em conta os contextos aos quais se circunscre-
vem essas experiências.
Para efetivação desse estudo, o primeiro passo constitui-se do levantamento do estado da arte
sobre o tema juventude e espaço escolar. Segundo o levantamento coordenado por Sposito (2009),
por exemplo, sabemos que entre l999 e 2006 foram produzidos 188 trabalhos nas áreas de Ciências

699
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Sociais, Serviço Social e Educação cujo tema central era juventude e escola.
Segundo o estudo realizado por Sposito, como seria de se esperar pela especificidade do tema,
a educação é a área de maior concentração da produção sobre juventude e escola. As maiores pre-
ocupações (os subtemas) concentram-se na indisciplina e violência e nos significados atribuídos à
escola, bem como aos programas e propostas educativas.
Nesse levantamento, é possível se perceber, por exemplo, a preocupação em estudar e analisar
a juventude ou o jovem como sujeito, demonstrando uma “ampliação da visibilidade do tema ju-
ventude” em que esses jovens deixam de ser apenas alunos e suas vivências reduzidas ao espaço
escolar.
Levando em consideração que o objetivo central desta pesquisa é levantar as trajetórias desses
jovens até a EJA, para sua realização, analisaremos os dados estatísticos do IBGE – Estado e Municí-
pio – e as pesquisas realizadas na rede em 2010 e 2012 (Pesquisa Perfil da EJA). Acreditamos que a
comparação desses dados podem nos dar importantes informações sobre esses sujeitos.
Com esses estudos, além do recorte etário proposto para o trabalho, teremos informações sobre
sua distribuição geográfica, sua condição familiar (se tem filhos, se mora com os pais ou outros fa-
miliares), suas condições de moradia (aluguel ou imóvel próprio), além de informações sobre seus
interesses escolares e extraescolares.
Outro documento, base de dados fundamental para esse trabalho, é o Histórico dos alunos da
EJA16 disponibilizado pela Secretaria de Educação, sobre os alunos com distorção idade/ano de es-
colaridade. Esse documento apresenta a trajetória escolar do aluno da rede municipal em detalhes,
possibilitando uma rica análise da história de vida escolar de cada um desses sujeitos.
Segundo Brandão (2002), as abordagens quantitativas podem trazer informações importantes
para a pesquisa sociológica e seus resultados não devem ser desprezados. Ressalta que, acima de
tudo, devem fundamentar-se no rigor da problematização e reflexão sobre o objeto de pesquisa.
Concordando com Brandão, parto do princípio que mesmo na pesquisa qualitativa, as informa-
ções colhidas em entrevistas “não são dados” se não tiverem como objetivo responder a um conjun-
to de hipóteses levantadas a partir de um estudo teórico, que darão sentido ao material. O mesmo
vale também para os dados quantitativos.
O levantamento e análise acurados dos dados, tanto do Censo 2010 do IBGE, quanto da pesquisa
do Perfil da EJA17 e do levantamento dos alunos com distorção, possibilitarão traçar as trajetórias
desses jovens do ensino regular para a Educação de Jovens e Adultos no município de Angra dos
Reis.
A partir da análise desses dados, foi possível identificar a Unidade Escolar com maior concentra-
ção de jovens de 15 a 17 anos na EJA no município: A Escola Municipal Nova Perequê. Com isso, a
pesquisa restringirá como campo de atuação e levantamento de dados, através de entrevistas, a
referida escola.
Selecionando os alunos com idades entre 15 a 17 anos, os “procedimentos teórico-metodoló-
gicos” (Zago, 2011, 287) adotados serão a realização de entrevistas com esses sujeitos. A fim de
conhecer suas trajetórias, seus movimentos de entrada e saída da escola, delimitando o quanto isso
aconteceu na EJA e no dia, buscando os porquês desses sujeitos. Conhecer também sua história
pessoal, suas vivências fora do espaço escolar e as interações existentes entre esses dois universos
vividos pelo jovem, procurando uma aproximação da realidade desses sujeitos.
16 Levantamento detalhado com todas as informações escolares dos alunos matriculados na EJA da rede, como idade, retenções,
escolas que frequentou, entre outros, produzido pela Gerência de Planejamento e Estudos Estatísticos da Secretaria de Educação, Ciência e
Tecnologia, especialmente para este trabalho.
17 Um vasto questionário abordando, além de questões básicas de identificação dos sujeitos, como idade, sexo e local de moradia,
também levantava diversas outras questões sobre sua vida escolar: se deixou de estudar, por quanto tempo e por que motivo; além de per-
guntas a respeito de prática de atividades: atividades esportivas, artesanais; acesso a internet, entre outras.

700
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Dentro dessa perspectiva, pretendemos seguir os princípios da “entrevista compreensiva”18 pro-
posta por Zago (2011), visto que a trajetória dos jovens entrevistados vai sendo construída e recons-
truída a partir do desenvolvimento do trabalho e das próprias análises do material coletado.
Abordar as trajetórias dos jovens requer conhecer as suas biografias para a compreensão dos nós
e encruzilhadas da vida escolar desses sujeitos. A abordagem biográfica possibilita a observação,
em escala individual, do mundo social e permite a participação dos sujeitos na pesquisa. Segundo
Falcão (2014), esse tipo de pesquisa possibilita ir além do pertencimento de classe ou de categorias
mais gerais como sexo, idade, gênero ou raça e permite a compreensão das singularidades individu-
ais. No entanto, o que nos interessa é a construção do objeto social através das informações sobre as
experiências e práticas individuais.
Em linhas gerais, principalmente porque a pesquisa ainda se encontra em desenvolvimento, o
objetivo deste trabalho é apenas apresentar algumas discussões iniciais que nos ajudam a refletir
sobre o tema. Principalmente apresentando algumas questões que envolvem hoje o jovem de 15 a
17 anos na EJA, sobretudo em Angra dos Reis.

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2008.
18 A entrevista compreensiva, em síntese, constitui-se de questionário semiestruturado, aberto a novas questões a partir das
respostas dos entrevistados, possibilitando abrir o leque para um aprofundamento no conhecimento de suas realidades. Supõe tam-
bém, retornar aos sujeitos, em novas entrevistas, permitindo esse aprofundamento.

701
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
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703
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
mArcAs nA históriA
mArciA mArmelo de cAstro brAz

O objetivo deste trabalho é tratar da importância da memória que desde a antiguidade onde tal-
vez, ainda não pudesse se falar em sociedade, os “homens das cavernas” já deixavam suas marcas na
história com suas pinturas, que até os dias de hoje são visitadas e revisitadas. Talvez essas pinturas
tenham contribuído para o desenvolvimento e preservação da humanidade como a construção dos
conceitos de família, de comunidade e de sociedade, nas figuras de caça e pesca que representava
o conceito de trabalho e sobrevivência. Assim também o Centro de Referência e Memória da Edu-
cação de Jovens e Adultos ao olhar o processo de desenvolvimento da educação, se depara com
situações que, não parecem antigas, mas atuais, são demandas recorrentes da sociedade que reapa-
recem no cenário educacional com seus questionamentos. Com o resgate da história, construímos
uma memória, daí, passamos a vislumbrar um futuro, que pode ser transformado tendo como base,
as experiências da EJA e que funcionam como ponto de partida para o desenvolvimento de proje-
tos. Buscando manter acesa a memória da EJA, uma educação que luta em favor dos que não tem
este direito atendido, poderemos numa visão macro, perceber que respostas podem ser construídas
a partir de uma revisão da história, as demandas da sociedade e numa visão micro, perceber como
isso contribuiu para construção das identidades dos indivíduos. Assim, a memória da educação fun-
ciona como ancora, para fixar um ponto, com interesse de esclarecer outros pontos que surgem no
decorrer da caminhada educacional. Este Centro de Referência tem sua centralidade em organizar,
tratar, conservar e disseminar a memória da EJA por meio de levantamento e catalogação de acer-
vos recuperando a marca deixada na história para também auxiliar a humanidade na construção de
conceitos que ajudem a pensar e transformar o mundo que hoje está fora da caverna.

palavras-chave: Memória, História, Educação

o cremejA
O Centro de Referencia e Memória de Educação Popular e da Educação de Jovens e Adultos –
CReMEJA, busca com ações que consolidam a área da EJA, conservar essa memória por meio do
acervo que possui, obra de doações de documentos, materiais didáticos como livros e jogos, fitas
ULMATIC de programas educacionais extintos que sofreram transformações e hoje estão em dvds,
entre uma gama de acervo com que se propõem a remontar e recontar a trajetória da educação de
jovens e adultos tanto pela educação popular quanto por politicas e programas que se voltaram
para esta área de atuação . Não é apenas o olhar para história, o CReMEJA, recuperando as marcas
feitas na história quer também auxiliar a sociedade na construção de conceitos que ajude a pen-
sar e transformar a trajetória da educação, pelo resgate da história, reconstruindo a memória, que
envolve recuperação de acervos de instituições extintas, de acervos pessoais doados, entre outras
ações voltadas para área de jovens e adultos.
Intervenções existiram e foram extintas na tentativa de desenvolver e consolidar a área de educa-
ção de jovens e adultos no país, esta é a busca do CReMEJA, devolver e endossar a memória passa-
da e recente da EJA, deixando de ser uma vitrine onde apenas se visite a história, tem a proposta de
revisitar a memória para interferir na história através de análises suscitadas a partir da devolução a
sociedade dessa parte da história para defesa dos brasileiros, o que se que se dará através de uma
plataforma virtual que ainda esta em processo de construção com os trabalhos de levantamento,
higienização, organização, catalogação e digitalização do acervo documental. Tem também uma
proposta de formação continuada docente para produção, sistematização e guarda da memória
recente da EJA e outras ações voltadas aos sujeitos da EJA. Do mesmo modo, a memória resgatada e

704
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
organizada em acervo documental poderá subsidiar pesquisas de diversas naturezas realizadas por
universidades e outros centros de pesquisa no campo da história da educação que terá duas desti-
nações: uma física, sob a responsabilidade da Universidade do Estado do Rio de Janeiro-UERJ que o
abriga; outra virtual, disponibilizando online em página web compartilhada por diversos projetos/
programas, de maneira a permitir atualizações a partir de novos materiais coletados.
Ao mesmo tempo, o acervo online e físico existente da memória passada subsidiará ações ex-
tensionistas de pesquisa e de ensino, presentes e futuras no campo, produzindo novos materiais,
documentos e registros da área, de suas experiências e da ação de seus profissionais, por meio de
cursos de extensão de formação continuada. O acervo será de
utilidade para a consulta e oferta de subsídios a professores e alunos da EJA, assim como de cur-
sos de formação de professores na área.
As fases da EJA precisam ser redescobertas para que haja avanços na educação que foi respostas
as necessidades da época e pode vir a ser resposta para demandas da atualidade, observando as
necessidades já sanadas e as que se apresentam diante das novas perspectivas.

A mArcA do mobrAl nA edUcAção.


O Movimento Brasileiro de Alfabetização foi criado em 15 de novembro de 1967; pela lei nº 5.379,
com o objetivo principal na erradicação do analfabetismo e na busca pela educação continuada de
adolescentes e adultos, pois a população brasileira era marcada pela falta de perspectiva no cam-
po educacional regular, onde 33% dessa população, segundo o censo de 1970, eram considerados
analfabetos. Ao iniciar suas atividades o Mobral tinha como prioridade imediata atender a popula-
ção urbana analfabeta, com a faixa etária entre 15 e 35 anos e ênfase no Programa de Alfabetização
sobre a Educação Integrada, isso segundo a reedição do “ Documento Básico do Mobral” Assinado
pelo então presidente do Mobral Arlindo Lopes Correia.
Ainda segundo o mesmo documento, que mostra a vida moderna altamente competitiva, esta
faixa etária poderia ser recrutada mais rapidamente por ser mais fácil de os instalar nos postos de
alfabetização, nas áreas urbanas e mobilizar mais alfabetizadores facilitando o processo, por isso foi
inicialmente instaurado na área urbana, em 1973 o Mobral já estava presente em todos os municí-
pios brasileiros, o que permitiu estender o atendimento também à população rural em igualdade
de condições.
O atendimento prioritário da faixa etária de 15 a 35 anos se justificava por ser um grupo onde o
ajustamento social era mais fácil e por ser um grupo que oferecia menor resistência a mudanças de
vida, outro fator é que essa faixa etária apresentava maior probabilidade em devolver, em termos de
acréscimo de produtividade os recursos investidos em sua formação, e pelo processo de expansão
da filosofia da promoção humana, o Mobral passou a estender o ensino a pessoas acima dos 35 anos
e mais tarde com o Programa de Recuperação de Excedentes atendeu a crianças entre 9 a 14 anos
para correção do fluxo do ensino regular.
Segundo o Documento Básico do Mobral reeditado em 1975 o programa de prioridade do Mo-
bral era o Programa d Alfabetização por atender o maior número de pessoas se fazia o mais demo-
crático, ligando o analfabetismo ao menor numero de renda no quadro populacional do país.
Sempre buscando a participação das comunidades como células bases para atuação, execução
dos seus trabalhos criando as Comissões Municipais para envolvimento comunitário. Descentrali-
zando as ações dando um dinamismo por estarem investidos de autonomia. Com recursos financei-
ros advindos do Ministério da Educação e Cultura, com 24% da renda liquida da loteria esportiva;
e de 1 a 2% do Imposto de Renda devido pelas empresas, são características que garantiram a via-
bilidade dos programas. Assim como colaborações de editoras que produziam produtos como os
conjuntos didáticos em grande tiragem a baixo custo, estabelecimentos que sediam seus espaços

705
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
para utilização dos seus espaços, esses são alguns exemplos de apoios de iniciativa privada que
permeavam o Mobral.

mAis UmA mArcA nA pArede dA históriA dA ejA, A fUndAção edUcAr.


Com uma multiplicidade de iniciativas voltadas para o ensino público de maneiras autônomas e
isoladas, não exercendo um atendimento qualitativo e satisfatório ainda com a falta de uma política
clara para atuação neste âmbito específico que é a educação de jovens e adultos, que vinha sedo
atendida de maneira precária e pedagogicamente inconsistente com reprodução de maneira ina-
dequada e facilitadora; professores sem preparo; precárias condições materiais e de remunerações;
poucos estudos para áreas como pesquisas de agências; das universidades e sendo uma área relega-
da às entidades privadas por ausência de ofertas do serviço publico, forçando a população a pagar
pela sua escolarização se fazia a educação de jovens e adultos no país, e na busca pela construção
e consolidação do regime democrático se buscou a realização efetiva de uma via de educação para
todos, através da Fundação Educar com a redefinição da politica nacional de educação básica de
jovens e adultos, relatos que constam no documento “Diretrizes Político-Pedagógicas para a Funda-
ção Educar” expedido em janeiro de 1986, pela Comissão de Elaboração, são as bases para uma nova
proposta de atuação na educação de jovens e adultos.
Ainda segundo o documento a FundaçãoNacional para Educação de Jovens e Adultos-EDUCAR
criada para substituir o extinto MOBRAL, foi definida como instituição governamental vinculada à
Secretária de 1º e 2º Graus do Ministério de Educação-SEPS/MEC com a responsabilidade especifica
de atuar na área de educação básica de jovens e adultos tem no PEB (Programa de Educação Básica),
que corresponde a alfabetização e ao domínio das 4 primeiras séries do ensino de 1º grau, é uma
resposta do Estado ás aspirações educacionais e as pressões reivindicatórias da coletividade. Estabe-
lecido pelo Decreto nº 92.374, de 6 de fevereiro de 1986, quando então todos os bens do MOBRAL
foram transferidos para a recém criada Fundação EDUCAR, e como herança ela herda também algu-
mas benesses e mazelas da extinta Mobral.
Segundo documento “Diretrizes Politicas e Estratégias de Cooperação Técnica” elaborado pelo
órgão Central e Coordenações Estaduais, nos diz que a Fundação viabilizava o apoio referente ao
aspecto de recursos técnicos, financeiros e materiais a entidades governamentais e não governa-
mentais dos estados e municípios, como um trabalho de articulação com diversos segmentos da
sociedade, responsáveis pela educação básica de jovens e adultos com vista ao aperfeiçoamento de
princípios teórico e da prática educativa, operando com uma prática descentralizada. A participação
da Educar ainda se fazia no planejamento, na supervisão e na avaliação dos projetos em função
compartilhada com as entidades quanto ao desenvolvimento das propostas educacionais e seus re-
sultados. Esta é uma marca na história, especialmente dentro do contexto em que se vivia o começo
do fim do período da ditadura militar no país, em uma busca por resultados que contribuíssem a
redemocratização e para reversão ou melhoria do quadro educacional do país.
Uma das heranças recebida da extinta fundação Mobral foi a emissão de certificação em nível
de conclusão das quatro primeiras series para que seus alunos pudessem dar continuidade a seus
estudos sem necessitar fazer para isso um exame de admissão na entidade que ingressariam, não
amarrando burocraticamente o que tem densidade vital, o aprendizado. Os perigos dessa herança
é que os certificados nem poderiam vir antes do saber ou pior desligados deles, os certificados nem
sempre certificavam conhecimento e habilitação e funcionavam como guia de transferência para
capacitação profissional.Todas estas observações são encontradas no documento de consulta ao
Ministério da Educação / Conselho Federal de Educação no Parecer 871/86

As mArcAs nA sociedAde
Entender as marcas e as histórias por elas contadas representa decifrar ao dar voz a uma grande

706
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
parcela de atores dos processos de educação que vêem suas vidas decididas por outros em telas,
paredes e papeis porem marcam sua pele. Sendo a população quem menos deixa marcas, porém os
que mais sentem essas marcas, são como as paredes onde são inseridas as marcas, não como pintu-
ras rupestres feitas com tintas pena ou dedos em paredes frias, os vejo sendo feitas como tatuagens,
sem anestesias que marcam os corpos quentes e vivos, indivíduos.
São marcas deixadas pelos seus representantes (quer seja escolhido ou imposto à sociedade
como no período da ditadura militar), e que podem ser observadas em um documento do acervo
do CreMEJA, onde podemos encontrar uma carta enviada ao então ministro da Educação, Marcos
Maciel, redigida após uma assembleia realizada em 03 de Janeiro de 1986, ás 19 horas, na Igreja
de Santana no Rio de Janeiro. Estavam presentes nesta reunião membros da diretoria a FAFERJ (Fe-
deração das Associações das Favelas do Rio de Janeiro), funcionários da COMET/RJ, Comissão de
representantes da Associação e Monitores do ex-Mobral, líderes comunitários e líderes religiosos
que queriam tornar público sua mobilização acerca da política voltada para a área de alfabetização
de jovens e adultos aos responsáveis pela politica educacional do Brasil.
Entre as reinvindicações estava uma cobrança sobre se fazer uma melhor avaliação do papel do
ex-Mobral na educação para conhecimento das circunstâncias políticas, sociais, econômicas e cultu-
rais que eram realizados; que discordavam que houvesse a desativação das classes de alfabetização
por tempo indeterminado uma vez que esse trabalho existia pela participação popular; que as mu-
danças deviam ser feitas com propostas do povo e não de cima para baixo; queriam um treinamento
melhor (salário digno e carteira assinada); que se levasse em conta as despesas assumidas pelas
comunidades para que o trabalho fosse realizado, durante o período do ex-Mobral, gastos especifi-
cados como aluguéis, luz, gás, conservação e limpeza, complementos de merenda e materiais, etc.
Outras reinvindicações feitas diziam respeito a não deixar de considerar o problema da criança na
faixa de 9 aos 14 anos que não podiam estudar de dia e a noite não eram aceitas no Supletivo por
não terem completos 15anos, eles acentuavam na carta que esta era a faixa para maior risco de mar-
ginalização. Destacando apenas algumas das pautas da carta enviada vou ao final dela onde destaco
o trecho “...começamos 1986 estudando o novo EDUCAR, sem sermos ouvidos. Queremos dar nossa
contribuição. Somos nós que colocamos e colocaremos em prática as suas teorias. Merecemos ser
respeitados. Houve erros, também erramos houve gastos demasiados por parte do Mobral. A quem
cabe a culpa, a nós? Não cremos, pois as comunidades participaram cobriram o que faltou. Deu o
que pode mesmo assim não é consultada e nem ouvida.”parte da carta na integra onde nos depara-
mos com um desabafo desses envolvidos diretamente no processo de mudanças.
A frase de Karl Marx “... os homens fazem a sua própria história, mas não o fazem como querem...”
expressa bem o contexto de se escrever a vida em uma realidade de imposição e confronto que se
estabeleceu com o passado,no passado, escreve a história e entrou para memória como parte do
acervo que vem sendo tratado no CReMEJA

conclUsão

A atividade política institucional do Estado é um conjunto de respostas à necessi-


dade da vida social desenvolvidas pelos homens em sua história, como a organiza-
ção da vida coletiva e o atendimento de objetivos comuns. (Maar, 1985 p.)

Nas análises feitas, nos permite em linhas gerais perceber que houve propostas e tentativas em
busca de solucionar a questão da alfabetização no Brasil com propostas oriundas dos governos em
voga, esta área da educação não foi abandonada houve a tentativa de se erradicar o analfabetismo
incluindo adolescentes e adultos dos 15 aos 35 anos e que se localizavam na área urbana, não só na
área da educação mas também no mercado de trabalho pois as analises nos mostram a perspectiva

707
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
de acrescer a produtividade do país e pela devolução e expectativa de devolução da aprendizagem
no mercado de trabalho, mais tarde se ampliou para os indivíduos acima de 35 anos e também para
o atendimento de crianças com faixa etária entre 9 a 14 anos também nas áreas rurais com a amplia-
ção para atendimento.
Com o mesmo objetivo de erradicação do analfabetismo, a Fundação Educar se estabelece como
resposta as reivindicações da sociedade que articulada a sociedade viabilizaria recursos técnicos,
financeiros e materiais aos segmentos responsáveis pela educação de jovens e adultos,buscando
a participação social que no Mobral também se fazia como participação comunitária. Como o Mo-
bral a Fundação educar também expedia certificações que garantia a continuidade dos estudos e
transferência para capacitação profissional que como o Mobral também se ligava diretamente a
produtividade.
A sociedade civil não estava inerte aos acontecimentos e na busca por ter sua voz ouvida faz uma
manifestação por meio de uma carta ao então ministro da educação, onde em desabafo expõem
suas criticas a imposição da Fundação Educar e sua identificação com o Mobral, na busca por escre-
ver sua história e intervir no caminho, o que não acontece.
Diante dessas colocações o Centro de Referência e Memória da Educação Popular e da Educação
de Jovens e Adultos demonstra sua relevância pela importância do acervo que dispõem e que con-
tam e recontam a história da EJA, e que podem ser revisitadas como as pinturas rupestres para se
esclarecer questões que se apresentam a sociedade, sendo uma forma democrática de devolução
a sociedade e de contribuição para políticas publicas de uma EJA presente não apenas nas salas de
aula, mas no universo da pesquisa para o desenvolvimento de práticas que se não exemplo do fazer
educativo, exemplo do não fazer, para não se perpetuar uma herança inconsistente para a luta de
uma sociedade consciente.

referênciAs bibliográficAs
Buke, Peter. Abertura: a nova história, seu passado e seu futuro. In: Burke , Peter (org.). A escrita da
história: novas perspectivas. São Paulo: Ed. UNESP, 1992 p. 7-37.
Freire, Paulo Educação como pratica de liberdade. 17. Rio de Janeiro ed Paz e Terra; 2000. 
Maar,Wolfgang Leo.O que é política /Wolfgang Leo Maar- São Paulo:Abril Cultural:Brasiliense, 1985.
(Coleção Primeiros Passos; 17).
Marx, K. O 18 Brumário e Cartas a Kugelmann. 7.ed. Trad. Leandro
Konder. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002
Paiva, Jane. Os sentidos do direito a educação de jovens e adultos. Petrópolis, Rio de Janeiro: DP et
ALii; Rio de Janeiro FAPERJ, 2009.UERJ Faculdade de Educação. Reformulação do Curso de Pedagogia
e criação do campo de atuação em ensino médio na modalidade normal. Rio de Janeiro, maio 2011.
(mimeo).
________ In Linguagens e imagens: educação e politica de subjetivação/organização Maria Ros
Rodrigues Martins de Camargo, César Donizete Pereira Leite, Laura Nomei Chaluh.-1. Ed.- Petrópolis, RJ:
De Petrus ET Alii, 2014.239p. : Il.; 23 cm.
Freire, Paulo Educação como pratica de liberdade. 17. Rio de Janeiro ed Paz e Terra; 2000. 
Obras consultadas Documento Básico do Mobral obra comemorativa.
Esses são documentos que estão sendo tratados no CReMEJA.

708
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
pAneirotecA – projeto de incentiVo A leitUrA à
neoleitores nA AmAzôniA
mAriA de nAzAré corrêA dA silVA | líViA AmAndA de AndrAde AgUiAr

Planejar atividades de incentivo à leitura tem sido um dos objetivos perseguidos de um modo
geral,pelas instituições escolares e educadores.Portanto, são criados clubes de leitura para desper-
tar nos alunos o gosto pelos livros, mostras literárias com pesquisas sobre obras de grandes autores
da literatura brasileira, saraus de poesias, rodas de história com diferentes gêneros textuais, entre
outras. Mas será que essas atividades são suficientes para garantir que nossos neoleitores possam
interpretar e compreender de forma autônoma textos escritos? É o que pretendemos relatar a partir
de uma experiência com diferentes sujeitos, índios kambeba, trabalhadores urbanos e mulheres
artesãs. É certo que esses são alguns dos caminhos que os educadores podem seguir para fomentar
o prazer pela leitura, mas é preciso que ela seja vista como uma atividade cognitiva complexa, capaz
de mobilizar o leitor e o fazer assumir uma posição ativa diante do texto, mesmo antes dos alunos
lerem e escreverem convencionalmente. É preciso conceber a leitura como instrumento de inser-
ção social aos jovens, adultos ou idosos, formando um novo homem, capaz de ler, para além das
palavras, o próprio mundo, como nos ensina o professor Paulo Freire. Os neoleitores, parafraseando
esse grande educador,devem entender o que leem,conseguindo depois escrever o que entendem
. Entender o que está além das palavras contribui para tornar essas pessoas seres no mundo e com
o mundo, resgatando seu papel de sujeitos e não de meros e permanentes objetos (Freire, 1979).

palavras-chave: Leitura, EJA, Diversidade

O Paneiroteca, foi uma experiência desenvolvida pela Universidade do Estado do Amazonas atra-
vés um projeto de extensão universitária nos municípios de Manaus e Manacapuru do estado do
Amazonas entre 2012 e 2013, com o intuito de aproximar a universidade dos recém alfabetizados
do Programa de Letramento Reescrevendo o Futuro vigente de 2003 a 2010. O projeto elegeu dois
grupos, o de “Mulheres Artesãs” e “Indígenas Kambeba”, contando com a participação de 01 (uma)
bolsista, seis voluntários entre discente e docentes da instituição.
Planejar atividades de incentivo à leitura tem sido um dos objetivos perseguidos de um modo
geral, pelas instituições escolares e educadores. Normalmente, são criados clubes de leitura para
despertar nos alunos o gosto pelos livros, mostras literárias com pesquisas sobre obras de grandes
autores da literatura brasileira, saraus de poesias, rodas de história com diferentes gêneros textuais,
entre outras. Mas será que essas atividades são suficientes para garantir que nossos neoleitores pos-
sam interpretar e compreender de forma autônoma textos escritos?
É certo que esses são alguns dos caminhos que os educadores perseguem para fomentar o pra-
zer pela leitura. Mas é preciso que ela seja vista como uma atividade cognitiva complexa, capaz
de mobilizar o leitor e o fazer assumir uma posição ativa diante do texto, mesmo antes dos alunos
lerem e escreverem convencionalmente. Feire chamou isso de “atitude frente ao mundo”. É preciso
conceber a leitura como instrumento de inserção social aos jovens, adultos ou idosos, formando um
novo homem, capaz de ler, para além das palavras, o próprio mundo, como nos ensina Paulo Freire.
Os neoleitores, parafraseando esse grande educador, devem entender o que leem, conseguindo
depois escrever o que entendem. Entender o que está além das palavras, contribui para tornar essas
pessoas seres no mundo e com o mundo, resgatando seu papel de sujeitos e não de meros e perma-
nentes objetos (Freire, 1979).

objetiVo gerAl do projeto:

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Desenvolver ações que garantissem efetivamente a apropriação das ferramentas indispensáveis
ao uso competente de práticas sociais de leitura a partir da literatura regional, contribuindo para a
continuidade do ato educativo e fortalecimento do aprendizado dos neoleitores.

objetiVos específicos
Garantir aos neoleitores espaços de leitura; promover o intercâmbio entre os diversos ambientes
educacionais e culturais; preparar profissionais para realizarem ações de mediação de leitura; reali-
zar formas diversificadas de encontros que priorizassem o tema da leitura; promover aos neoleitores
a utilização de estratégias que lhes permitissem interpretar e compreender autonomamente os tex-
tos escritos; suscitar a necessidade de ler ajudando os sujeitos a descobrirem as diversas utilidades
da leitura em situações que promovam sua aprendizagem significativa; transformar os neoleitores
em leitores ativos para que assumissem responsabilidade ante o ato de ler e, favorecer aos neoleito-
res a construção de uma interpretação sobre os textos, instrumentalizando-os com os mecanismos
necessários para a resolução de problemas que surgiram no decorrer da atividade de leitura.

metodologiA
1ºpasso- Reunião com as lideranças que participaram do projeto.
2º passo- Mobilização e sensibilização através de anúncios em rádios, voz comunitária, informan-
do a implantação do projeto Paneiroteca.
3º Passo- Seleção dos mediadores de leitura (alfabetizadores e alfabetizandos egressos do Pro-
grama de Letramento Reescrevendo o Futuro).
4º Passo - Formação dos mediadores de leitura mediante os seguintes conteúdos:
Sensibilização para a importância da leitura. Concepção de leitura numa perspectiva construti-
vista, humanizadora e transformadora da realidade. Objetivos da leitura. Tipologia textual e suas
características. Estratégias para a compreensão leitora antes, durante e depois da leitura. Oficinas de
leitura.
5º° Passo - Desenvolvimento do projeto
- Duas vezes por semana, os mediadores de leitura realizaram um trabalho itinerante, visitando
as casas dos alfabetizados ou seus pontos de convivência, para desenvolverem as rodas de histórias.
Os neoleitores puderam escolher dentre os livros, sempre dispostos em um paneiro, o tipo de his-
tória a ser contada pelos mediadores que propiciavam situações de interação dos neoleitores com
o texto através das estratégias de leitura. No desenvolvimento da ação, os mediadores ativavam os
conhecimentos prévios dos ouvintes, verificando quais os seus conhecimentos sobre o texto eleito
e quais as relações que seriam capazes de fazer. O passo seguinte foi levá-los a estabelecer previ-
sões, promovendo situações com possibilidades de inferências ou predições sobre o texto. Quando
inqueridos, os neoleitores demonstravam intimidade com suas práticas e, não só sobre o tema lido.
7º passo- Objetivando a integração da comunidade local foi promovido culminância das ativida-
des programadas ao longo do mês. Nesses encontros eram oportunizado aos neoleitores um mo-
mento para a socialização das histórias ouvidas e discutidas, bem como a relação dos textos com
sua leitura de mundo. Pode-se aí perceber, formas diversificadas de apresentações como, danças,
cantorias, teatros e performances poéticas.
8º passo - Registro escrito, oral, fotográfico e audiovisual das atividades realizadas durante o
desenvolvimento do projeto Paneiroteca. Todo o material produzido foi utilizado para exposição de
uma mostra de extensão em cumprimento às exigências da instituição promotora da ação.
9º passo- Relatório final com a sistematização dos resultados, elaboração planejamento da publi-

710
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
cação de um livro com relatos das experiências vivenciadas pelos mediadores e neoleitores parcial-
mente realizado.
Nessa perspectiva, O Projeto de Fomento a Leitura desenvolveu estratégias para compreensão
leitora que permitiram aos sujeitos adquirirem as ferramentas necessárias para viverem no contexto
de uma sociedade letrada. Foi necessário exercitar os movimentos de codificação e decodificação
concomitantemente ao desenvolvimento das habilidades funcionais da leitura, percebendo os usos
e características da linguagem nos diversos contextos comunicativos dos diferentes grupos aten-
didos. Estratégias essas, que possibilitaram ao leitor processar ativamente a informação, extraindo
aspectos relevantes e excluindo o que considerar secundário.
A articulação do projeto de fomento à leitura com o de letramento, justificou-se pela necessidade
de garantir efetivamente que nossos educandos se apropriassem das ferramentas indispensáveis
ao uso competente de práticas sociais de leitura, possibilitando o pleno exercício de sua cidadania
e o acesso aos bens culturais, além de, oportunizar a permanência desses sujeitos no ambiente de
aprendizagem.
Dessa forma, o Paneiroteca, atendeu os municípios de Manaus e Manacapuru, através inicialmen-
te, de um processo de formação de leitores e mediadores de leitura de modo a garantir a continui-
dade do processo de letramento . Os mediadores de leitura foram os alunos e professoras do curso
de Pedagogia da Universidade do Estado do Amazonas e alfabetizadores egressos selecionados e
capacitados, contemplando as estratégias de fomento e compreensão de leitura. Após a formação,
esses mediadores realizaram junto aos alfabetizandos e familiares, um trabalho itinerante de con-
tação de histórias por meio do projeto Paneiroteca.
por que é paneiro?
O tema do projeto argumentou-se pelo fato de ser o paneiro, um instrumento típico da região
amazônica, usado como forma de transportar as mercadorias comercializadas e de necessidades
dos caboclos. No paneiro, que é fixado junto ao corpo do caboclo, mais precisamente preso pela
cabeça e costas são transportadas as mercadorias como farinha, macaxeira, banana e utensílios pes-
soais e de trabalho. Este utensílio é normalmente constituído de tala de palmeiras e por ser um ob-
jeto que compõe a realidade existencial do público a qual se destinou a ação, o mesmo foi escolhido
para servir de transporte e cesto para a guarda dos livros, revistas, jornais e todo material impresso a
ser utilizado no desenvolvimento do projeto e poderia ser lido nos distintos trajetos desses sujeitos.
Há um trecho de uma canção que diz:“Paneiro é coisa comum, que em todo barraco tem, não custa
muito dinheiro, nem custa fazer também...”
A promoção desses conhecimentos à população e sua articulação com a comunidade externa
tem sido uma marca da instituição fazendo com que esta interação resulte em retorno à pesquisa
e ao ensino, bem como em serviços à sociedade. Essas atividades, no entanto, por si só não são su-
ficientes para justificar a existência da academia na sociedade atual. As instituições acadêmicas, es-
pecialmente as universidades públicas, inobstante suas finalidades de ensino, pesquisa e extensão,
que não se confundem com a tarefa de executoras de políticas públicas, devem possuir um compro-
misso político com o seu tempo e, portanto, não podem ficar de fora desse campo.
Assim, o projeto Paneiroteca se constitui num instrumento social capaz de contribuir para a luta
contra as desigualdades sociais. Não se tratou, como dito, de desnaturalizar as funções acadêmico-
-científicas (produção de conhecimentos), reduzindo-os a um papel pragmático de operador de po-
líticas públicas, contudo, cuidou de dar um sentido e uma razão maior às suas existências. Foi plena-
mente compatível, e assim deve ser, a coexistência do binômio competência técnica-compromisso
político. Sobre essa questão pronuncia-se o Professor Rubem Alves ( ALVES,1980, Pp.39)

Não considero que a ciência pela ciência seja um valor que mereça ser persegui-
do. É óbvio que tal afirmação é de caráter ético. Não a derivo (e não posso) de ciência

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
alguma. Penso que a ciência pela ciência é uma ilusão de cientistas que se fecham
em seus laboratórios ou mundos mentais. Querendo ou não, o conhecimento que
produzimos poderá sempre ser usado por alguém, de forma totalmente oposta às
nossas intenções. Poderá ser alegado que o fato de o conhecimento científico poder
ser apropriado por alguém não anula o ideal da ciência pela ciência. É verdade. Mi-
nha posição pessoal, portanto, não se deriva de fatos, mas de valores dos quais não
posso me esquivar.

E cita Brecht” Eu sustento que a única finalidade da ciência está em aliviar a miséria humana”. Nes-
sa perspectiva, o Paneiroteca nasceu com o espírito de compromisso com a sociedade que lhe dá
vida, esse compromisso ético de que nos fala Rubem Alves, fez com que o grupo tenha caminhado
na direção de contribuir com a sociedade para modificá-la. É importante nos reportar às oportuni-
dades educacionais da maioria dos jovens, adultos e idosos que continuam a ser negativamente
afetadas por fatores sócio-econômicos, espaciais, ambientais, geracionais, étnicos e de gênero, que
se combinam entre si para produzir acentuados desníveis educacionais e que, por não exercerem
vários direitos dentre os quais, o domínio da leitura e escrita são desprovidos de elementos críticos
em sua formação, que possam contribuir para a reivindicação de melhores condições de vida. Dian-
te dessa realidade e das condições historicamente constituídas, a participação da UEA tornou-se de
fundamental importância. Vale ressaltar que do ponto de vista da necessidade e do compromisso da
instituição com esta área de atuação, parece-nos indiscutível encampar o desafio de colaborar em
não apenas superar o iletrismo no estado, mas também garantir o processo de letramento, median-
te projetos desta natureza que oportunizem aos sujeitos o desenvolvimento de uma consciência
crítica e reflexiva necessária ao pleno exercício da cidadania.
O analfabetismo no Brasil é uma questão histórica, fruto das desigualdades sociais, onde a popu-
lação mais pobre, residente nas periferias dos centros urbanos, comunidades indígenas e ribeirinhos
é excluída do direito de acesso e permanência na escola. Contudo, não basta superar o analfabetis-
mo, é necessário também o desenvolvimento de ações que garantam à esses neoleitores a possibi-
lidade de ler o mundo de forma reflexiva e crítica, compreendendo seu papel de sujeitos na socie-
dade tendo a dimensão do seu poder de intervenção. O entendimento da realidade, no entanto, só
é possível se esses, sujeitos tiverem condições motivacionais e sociais de darem continuidade a sua
escolarização e ao desenvolverem suas habilidades de leitura e escrita intervindo em seus territórios.
Nesse sentido, a necessidade da implantação de ações de fomento a leitura no estado do Ama-
zonas, tornou-se imperativa, haja vista, a carência de bibliotecas municipais nas sedes de nossos
municípios. O que existe são algumas bibliotecas das redes de escolas municipais e estaduais com
atendimento restrito aos alunos com efetiva matrícula. Essa situação acentua-se ainda mais, quando
se estende, sobretudo, aos residentes na zona rural, aos povos da floresta, iletrados em vulnerabi-
lidade social: ribeirinhos e indígenas, distribuídos em mais de 6.000(seis mil) localidades rurais de
difícil acesso, com distâncias que variam de horas a dias de deslocamento até a sede do município.
Somado aos fatores geográficos, as oportunidades educacionais desse público são reduzidas, por
aspectos socioeconômicos. O ensino fundamental não garante o acesso à todos os que precisam e,
a necessidade de sobrevivência, de provimento de seu sustento, contribui significativamente para
que muitos desses educandos, evadam-se logo nas séries iniciais.
Outro aspecto importante a destacado no projeto, diz respeito ao trabalho com gêneros textuais.
Alguns mediadores achavam que bastava apresentar textos variados para garantir a funcionalidade
da leitura. No entanto, perceberam a necessidade de elaborar situações propícias a reflexões onde,
os educandos, compreendessem as diferenças estruturais e regularidades discursivas que caracte-
rizam cada texto. Para Solé, a leitura é mais eficiente, quando se conhece as convenções do gênero.
Por isso, reportagens, fábulas, poesias, crônicas, dentre outros, são escritos diferentemente. Quanto

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
mais se conhece sobre o texto a ser lido, com mais propriedade o leitor pode dialogar com o autor,
concordando, discordando, fazendo perguntas e buscando respostas para suas indagações.
Foi preciso ainda, que o leitor tivesse claro os objetivos da leitura. Isto posto, o leitor determina
suas estratégias de leitura e o ritmo à imprimir na atividade. Ler por prazer, para localizar uma infor-
mação ou para aprender, determinaram a forma como o leitor se posicionou diante do texto.
As atividades supracitadas apresentaram aos neoleitores um mergulho no mundo da escrita,
possibilitando uma compreensão sobre a ampla variedade de textos existentes, oportunizando a
exploração de inúmeras possibilidades de conhecerem o mundo, mediante a vivência de atividades
de leitura e escrita. Assim sendo, para contribuir efetivamente na formação de sujeitos letrados foi
imprescindível a ampliação de situações de contato com os textos que circulam socialmente. Essa
intimidade com a leitura permitiu aos neoleitores compreenderem como e por que os textos são
produzidos, sendo capazes depois de escrevê-los e reescrevê-los.
A leitura é um processo interno, porém indispensável para que se formem leitores e escritores
reais. Essas atividades possibilitaram o desenvolvimento não só das habilidades de síntese e análise
como, das interpretações e inferências estabelecidas contribuindo assim, para o pensamento crítico,
indispensável ao pleno exercício da cidadania.
Desse modo, o presente projeto considerou a concepção de leitura de Isabel Solé (1998) e partiu
de uma perspectiva construtivista, na qual a leitura foi vista como um processo de interação entre o
leitor e o texto, que envolve necessariamente a presença de um leitor ativo, que processa e examina
o que está lendo, atribuindo significado ao que está escrito nas páginas. O processo inicial da leitura
garantiu essa interação significativa e funcional do aluno com a língua escrita como meio de cons-
trução de significados.
É importante destacar o que chamamos de aprendizagem significativa. Segundo Solé (1998),
aprender significativamente implica em integrar uma nova informação à rede de esquemas de co-
nhecimentos prévios, é a representação da realidade de elementos de nossa cultura, valores, siste-
mas conceituais e ideologia. Representações estas estabelecidas e construídas nas relações com os
outros. Nesse sentido, defende que é preciso que entendamos que ler é muito mais que decodificar,
ler é compreender, é um processo de construção de significados e é justamente essa construção de
significados que os educadores devem buscar, pois quando aprendemos dessa maneira, ocorre a
aprendizagem significativa, pois parte de algo conhecido e vivido.
Solé (op.cit), comunga com vários princípios de Freire dentre os quais o que diz:

A atitude critica no estudo é a mesma que deve ser tomada diante do mundo, da
realidade, da existência. Uma atitude de adentramento com a qual se vá alcançan-
do a razão de ser dos fatos cada vez mais lucidamente. Um texto estará tão melhor
estudado quanto, na medida em que dele se tenha uma visão global, a ele se vol-
te, delimitando suas dimensões parciais. O retorno ao livro para esta delimitação
aclara a significação de sua globalidade. Ao exercitar o ato de delimitar os núcle-
os centrais do texto que, em interação, constituem sua unidade, o leitor crítico irá
surpreendendo todo um conjunto temático, nem sempre explicitado no índice da
obra. A demarcação destes temas deve atender também ao quadro referencial de
interesse do sujeito leitor. Assim é que, diante de um livro, este sujeito leitor pode
ser despertado por um trecho que lhe provoca uma série de reflexões em torno de
uma temática que o preocupa e que não é necessariamente a de que trata o livro em
apreço. (FREIRE, 1981 p.10)

713
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
As atividades voltadas para o desenvolvimento das estratégias de leitura implicaram em um pro-
cesso a ser ensinado e aprendido. Coube ao professor elaborar situações em que os neoleitores
pudessem participar, pensando como a história ou o texto prosseguiu, que pudessem observar o
professor formulando previsões e perguntas para que assim, progressivamente dominassem as es-
tratégias já construídas pelos leitores experientes.
Para que a leitura pudesse ser efetivamente um instrumento de inserção social para o público do
projeto foi indispensável ser trabalhada, explorando-se os diferentes gêneros textuais, compreen-
dendo suas diversas possibilidades. Dessa forma, é relevante comentar que alguns coordenadores
de turmas do Programa Reescrevendo o Futuro, preocupados com esta questão, desenvolveram a
partir de 2008, ações em seus municípios direcionadas para o fomento da leitura. As experiências
foram integradas às ações de alfabetização como o exemplo do Município de Parintins, situado no
Baixo Amazonas com o projeto Tricicloteca : uma viagem de leitura do povo ribeirinho as margens
do Rio Amazonas, que oportunizou a este público, uma biblioteca comunitária por meio da distri-
buição de livros em triciclos, transporte adaptado em uma bicicleta e fixado no porto do local. Este
projeto é desenvolvido em uma balsa que faz o transporte das pessoas de Parintins ao vilarejo de
Vila Amazônia. Durante o trajeto as pessoas tiveram a oportunidade não só de acesso a livros, como
também de interagirem entre si, por meio do relato de “causos”, lendas e mitologia da região. Outra
experiência a ser relatada, refere-se ao Município de Carauari, localizado no Rio Amazonas. A secre-
taria de Educação fez uma articulação com o projeto de leitura denominado Expedição Vaga-lume.
Neste projeto, havia um momento destinado ao intercâmbio entre jovens e idosos que se dava atra-
vés da “contação” de histórias por parte dos mais velhos aos mais jovens e da leitura de livros pelos
jovens já alfabetizados aos mais velhos. Havia também, visitas a casa dos alunos para a realização
de rodas de histórias. Os relatos de experiências exitosas por parte dos coordenadores de turmas fo-
ram determinantes para que as ações não acontecessem isoladamente, mas que fossem integradas
a um projeto maior que pudesse contemplar os demais municípios do Amazonas.
Nessa perspectiva, o projeto Paneiroteca desenvolveu ações direcionadas para a promoção de
acesso a leitura e formação de leitores e mediadores de leitura na cidade de Manaus e Manacapuru
através de intercâmbios entre ambientes educacionais e culturais diversificados, criação, expansão
e dinamização de espaços públicos de fomento à leitura que promoveram formas diversificadas de
encontros, grupos de discussão, saraus, performances poéticas, rodas literárias, murais, oficinas de
produção literária e cantorias. Os exemplos citados foram desenvolvidos mediante a utilização das
estratégias mencionadas, consolidando dessa maneira o processo de letramento necessário aos ne-
oleitores.
A cada leitura, os mediadores davam continuidade às estratégias de forma compartilhada, escla-
recendo possíveis dúvidas e resumindo as ideias do texto. Finalizada a ação de contação de histó-
rias, os neoleitores estabeleciam relações de sua vivência com o tema, ideias principais e detalhes
secundários, aprendendo a resumir e isso implicava em omitir o que consideravam secundário e
redundante. O exercício de selecionar o que era importante se constituiu numa maneira de inte-
grar as novas informações de maneira lógica e coesa. Um exemplo típico dos atores do projeto na
integração da literatura com seu mundo vivido foi o de selecionar destaques que lhes eram familiar,
como este trecho da obra “A Caligrafia de Deus” do autor amazonense Márcio Souza:

“A mala de viagem estava aberta sobre o tombadilho. Fazia pouco tempo que ele
estivera arrumando as roupas ali, cuidadosamente como sempre, porque alguns há-
bitos jamais se perdem. Uma cadeira de plástico, muito feia, estava perto da mala.
Um paneiro de farinha ainda com a boca costurada estava perto do motor do bar-
co. O fogareiro estava aceso e ocupava parte da popa. Duas redes de pano, uma
amarela e outra branca, estavam enroladas em lados opostos, penduradas em suas
escápulas. Pilhas de livro estavam cobertas por uma toalha de plástico transparen-

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
te. Seus livros, usados, rotos, felizes. Além dos livros, outros pertences seus estavam
arrumados em caixas de papelão. Desde o dia anterior ela andara fazendo uma es-
pécie de inventário.” (SOUZA, 2009, p. 23)

mAnifestAções dos sUjeitos:

[...] O que aprendi com esse trabalho de literatura vai servir muito. Foi bom, aju-
dou para aprender a ler e a participar. Parece que vendo o motor atracado no porto.
Eu estou escrevendo um livro da minha vida, pois minha história de vida é sofrida.
Ele já tem oito páginas escritas. Fui incentivada pelo meu irmão Leonardo, ele é es-
critor.

.No final, tudo foi importante e gratificante para a minha vida [...] ( Eurídice,67 an
os)

[...] Com esse trabalho de literatura fiquei emocionado que até chorei. As oficinas
fizeram com que a gente ficasse mais à vontade para falar e mais desinibidos.

Como as professoras ensinaram, ficou mais fácil de aprender [...] (Antônio, 50 an


os)

[...] Fiquei muito empolgada. Esse trabalho de literatura me ajudou a perder a ti-
midez e a falar melhor na frente dos meus colegas de sala de aula [...] (Raimunda, 49
anos)

[...] Essa forma de aprender foi melhor, aprendi a ler e a escrever. Antes eu só de-
corava e era mais difícil. Agora aprender a cada dia é melhor, pois a gente é cego
quando não conhece nenhuma letra.[...](José Cláudio,58 anos)

[...] Com esse tipo de trabalho, aprendi como falar melhor e me comunicar com
todos.
Fiz uma poesia e li para os meus colegas na sala de aula e isso me deixou muito
feliz e emocionada.
Antes eu era cega e agora consigo enxergar, pois com essa oportunidade aprendi
a ler.
Fiz ainda um hino para a minha igreja.
Hoje consigo resolver meus problemas e sei me expressar.
Quando completar 50 anos vou fazer uma festa para dizer pra todo mundo que
agora já sei ler e escrever.[...]( Alaíde,49 anos)

A UEA, com o incentivo à projetos dessa natureza, acolhe as demanda sociais e

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
suas diversidades, aproximando indígenas e superando exclusão. Se dispôs ao deba-
te, para assim, contribuir para a valorização de quem antes nem mesmo conhecia
sua importância cultural para a formação da população brasileira. Os sujeitos do
projeto adquiriram uma nova maneira de interagir com a literatura regional oral e
escrita. Esta iniciativa mobilizou o imaginário dos grupos, incentivando novas expe-
riências e expectativas. É imperativo afirmar que a experiência ampliou sua leitura
de mundo popularizando, de alguma forma, o acesso e troca de saberes que até en-
tão eram restritas a poucos. Acreditamos que o projeto foi um passo a mais na luta,
para que a educação seja, de fato, um direito de todos.

considerAções finAis
Utilizando a literatura no cotidiano, os neoleitores adquiriram uma nova maneira de interagir com
a cultura oral e escrita. Esta iniciativa mobilizou o imaginário dos alunos, incentivando novas expe-
riências e expectativas. O acesso a obras literárias promoveu uma viagem de saberes, exercitando
ainda a leitura, a escrita e o reconhecimento de diversos gêneros literários.
A prática da leitura deve ser trabalhada como uma das ferramentas para diminuição das desi-
gualdades. O acesso aos bens culturais é direito de todos e dever do estado da mesma forma como,
moradia, saúde, trabalho, educação e justiça. Portanto o desenvolvimento dessa experiência com
oficinas em muito contribuiu para ampliar a compreensão desses direitos.
Para concluir, é imperativo afirmar que as oficinas de leitura ampliaram a leitura de mundo dos
sujeito, popularizando, de alguma forma, o acesso a obras que até então eram restritas a poucos.
Acreditamos que o projeto foi um passo a mais na luta, para que a educação seja, de fato, um direito
de todos.

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
pedAgogiA dA AlternânciA: Um olhAr sobre o proejA
glAúciA mAriA ferrAri | elionAldo fernAndes jUlião

Este trabalho discorre sobre a articulação entre a Educação de Jovens e Adultos – EJA e a Pedago-
gia da Alternância, no âmbito das experiências desenvolvidas por instituições federais referentes ao
Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na modalidade
de Educação de Jovens e Adultos – Proeja. O principal objetivo do Proeja é possibilitar a jovens e
adultos o acesso à formação profissional, de forma integrada com a educação básica. O trabalho
pretende analisar a implementação do programa em um campus do Instituto Federal, cujos princí-
pios se baseiem nas concepções da pedagogia da alternância, que se apresenta como uma moda-
lidade pedagógica que tenta aproximar as realidades da comunidade e da escola, alternando tem-
po e espaço diferenciados de formação, possibilitando a flexibilização da organização do trabalho
pedagógico em alternâncias e adequando-o à realidade dos sujeitos educativos. A realização da
pesquisa visa também entender como a Pedagogia da Alternância dialoga com a EJA em uma insti-
tuição que tradicionalmente apresenta traços de rigidez nos aspectos curriculares e no que se refere
aos mecanismos de seleção. Para a realização do trabalho propõe-se a utilização de uma abordagem
metodológica qualitativa que permita compreender a realidade estudada, a partir da perspectiva
dos sujeitos. O percurso metodológico deste trabalho envolverá a pesquisa bibliográfica e explora-
tória, a pesquisa de campo e a análise e interpretação dos dados, tendo como opções metodológi-
cas instrumentais a adoção de questionários, entrevistas e observação.

palavras-chave: EJA, Proeja, Pedagogia da alternância

introdUção
A Educação de Jovens e Adultos - EJA tem atravessado, historicamente, períodos de muitas trans-
formações marcadas por políticas públicas frágeis e descontínuas, que se manifestam como insufi-
cientes ao atendimento às demandas e ao cumprimento dos direitos e garantias estabelecidas nos
instrumentos legais que regem a educação nacional. Ao longo da história da educação brasileira,
muitas ações voltadas à EJA se originaram e se desenvolveram por meio de iniciativas individuais ou
de setores e movimentos da sociedade e se referiam, especialmente, à alfabetização.
A partir da promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN 9394/96, que
concebe a EJA como modalidade da educação básica, estabelecendo sua oferta como obrigatorie-
dade do Estado, urge o consenso de que o desafio de organizar a EJA como política pública seja
assumida pelo poder público, e que as ações não mais se restrinjam somente à alfabetização, e sim
que vise a continuidade de estudos, com acesso ao Ensino Médio e Superior.
Paiva (2006, p. 34) afirma que pensar a EJA como política pública:

Implica não apenas tomar o sistema educativo formal nas mãos, mas assumir o
concurso da sociedade em todas as iniciativas que vem fazendo, para manter viva a
chama do direito, que ainda não se constitui uma prática para todos.

Nesse sentido, destaca-se, a partir do ano de 2004, dentre outras ações, o empenho do Governo
Federal em aproximar a EJA da Educação Profissional, a partir da promulgação do Decreto nº 5154,
de 23 de julho de 2004, quando estabelece a possibilidade desta última ser desenvolvida em cursos
e programas de formação inicial de trabalhadores.

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Machado (2009, p.27) afirma que as modalidades de EJA e Educação Profissional tiveram, ao lon-
go da história da política educacional brasileira, trajetórias bem distintas: enquanto o foco da EJA
seguiu a insistente proposta de campanhas de “erradicação do analfabetismo” e ofertas compen-
satórias, como o ensino supletivo, o campo da Educação Profissional foi sendo redirecionado do
atendimento “aos indigentes” para o treinamento eficiente da mão de obra necessária ao avanço do
capitalismo, principalmente o de base industrial.
Assim, no ano de 2005, o Governo Federal implementou o Programa Nacional de Integração da
Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos – Pro-
eja19 , que surge como uma “experiência inovadora na oferta de EJA no Brasil, integrando a educação
básica à formação profissional, tendo como produto final uma formação essencialmente integral”
(Brasil, 2007, p.29).
Baptista (2014) destaca que o Proeja não possui caráter pioneiro na associação entre a qualifica-
ção profissional e a elevação de escolaridade20 . O autor ressalta, porém, que o programa “tem como
um de seus marcos o fato de ser executado obrigatoriamente pela rede federal de educação profis-
sional e tecnológica”, o que revela a importância do ingresso de um público diferenciado em uma
instituição tida como “de excelência” no contexto nacional.
Sobre essa temática, Oliveira e Machado (2011, p.4) já haviam discutido sobre “o lugar ou não
lugar ocupado pelo Proeja” na rede federal. Segundo as autoras, pensar esse lugar dentro dessas Ins-
tituições é “considerar os sujeitos a quem ele se destina”, que se inserem numa instituição elitizada
e inacessível aos mesmos. As autoras ainda refletem sobre as implicações residentes na justificativa
de se ofertar o programa apenas como cumprimento da lei, afirmando que:

a questão é bem maior: ou a estratégia Proeja contribui para o repensar do pa-


pel social das instituições federais de educação profissional, ou de fato vai apenas
significar mais um programa de governo, que esperando pacientemente, cairá no
esquecimento (2011, p.11).

Em sua essência, o principal objetivo do Proeja é possibilitar a jovens e adultos o acesso à forma-
ção profissional. O programa visa à integração entre a formação profissional e a educação básica e
seus objetivos vão muito além da inclusão de jovens e adultos no mercado de trabalho: a idéia, em
tese, é oferecer a esses jovens a possibilidade de conquista da cidadania, que pressupõe o direito ao
trabalho ser um de seus princípios.
A criação do Proeja surge em um cenário preocupante da educação brasileira indicado pela Pes-
quisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD (2003), o qual apontava para a existência de 68
milhões de jovens e adultos trabalhadores com 15 anos ou mais sem concluírem o ensino funda-
mental, e apenas 6 milhões com matrículas em programas de EJA. Em relação à oferta de EJA pela
esfera federal, o Censo Escolar 2004 indica uma tímida contribuição, responsável por apenas 12,17%
do total de matrículas dos cursos técnicos de nível médio, o que evidencia a necessidade de maior
investimento do poder público federal para romper com os processos de exclusão (Brasil, 2009).
A Lei nº 11.892, de 29/12/2008, que cria os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia –
IF, reforça a função destas Instituições na oferta de programas de educação profissional destinadas
a jovens e adultos21 . Nesse sentido, Moura (2006) destaca o papel relevante da rede federal de edu-
cação tecnológica considerando a presença dessas instituições em todo o território nacional (princi-
palmente após os programas de expansão) e ainda a vasta experiência no ensino médio e educação
19 O Proeja foi criado pelo Decreto Nº 5478/2005 tendo sido ampliado pelo Decreto Nº 5840/2006.
20 Destaca, dentre outros, Projeto Escola de Fábrica; Programa Nacional de Inclusão de Jovens - Projovem (Baptista, 2014, p.31)
21 Art. 7º Observadas as finalidades e características definidas no art. 6º desta Lei, são objetivos dos Institutos Federais: I - mi-
nistrar educação profissional técnica de nível médio, prioritariamente na forma de cursos integrados, para os concluintes do ensino
fundamental e para o público da educação de jovens e adultos (Brasil, 2008).

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
profissional técnica de nível médio. Por outro lado, o autor deixa claro algumas fragilidades como a
pouca experiência dos IF’s com o ensino de jovens e adultos e ainda o despreparo de seus professo-
res para atuarem nessa área, necessitando de implementação de programas de capacitação destes
docentes.
Ao longo de sua implementação e desenvolvimento nos IF’s, o Proeja encontrou dificuldades em-
bora haja exemplos de êxito. O programa tem sido objeto de muitos estudos que destacam, dentre
outros, os índices de evasão nos cursos, o processo de acesso e permanência de seus estudantes,
a qualificação pedagógica dos docentes, a resistência a mudanças, enfim, as tensões e os desafios
enfrentados por professores, estudantes e gestores na implantação de um programa de EJA em um
campus de um Instituto Federal22.
Um fenômeno que atualmente tem se manifestado com frequência, ao contrário do que devia
se esperar, é a diminuição da oferta de Proeja por parte dos campi dos IF’s. Através dos editais de
processo seletivo publicados nas páginas dessas Instituições é possível constatar a redução nessa
oferta. Vale destacar que a partir de 2013, através da Portaria nº 168, de 7 de março de 2013, o Go-
verno transferiu para o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego – Pronatec23 – a
responsabilidade de oferta de programas e cursos voltados à EJA. A natureza dos cursos desenvol-
vidos no âmbito do Pronatec, normalmente, visa o atendimento da lógica do mercado de trabalho e
da empregabilidade, o que compromete a questão da formação integral e cidadã, que nas palavras
de Moura e Pinheiro (2009), representa o principal objetivo do Proeja.
Diante do caminho percorrido pelo Proeja, faz-se necessário um olhar diferenciado para o pro-
grama e sua oferta no âmbito dos IF’s, tendo sempre em mente, a responsabilidade social destas
instituições ante as desigualdades educacionais. Cabe provocar reflexões que compreendam o de-
senvolvimento do Proeja levando em consideração alternativas que perpassem pela participação
efetiva dos estudantes, pela flexibilidade do currículo e do tempo escolar, tendo como princípio
fundamental a valorização das trajetórias de vida e da cotidianidade dos jovens e adultos.
Algumas Instituições têm buscado desenvolver experiências com o Proeja que possibilitem o
diálogo entre as especificidades do público de EJA e as demandas pedagógicas e metodológicas
advindas do contexto político e educacional. Dentre os caminhos trilhados por essas experiências
destaca-se a articulação da EJA com a Pedagogia da Alternância, proposta pedagógica já muito
difundida e adotada pelos movimentos da Educação do Campo em classes regulares dos ensinos
Fundamental e Médio e que tem sido empregada em experiências com o ensino de jovens e adultos.

A ejA e A pedAgogiA dA AlternânciA


Levando em consideração as questões apresentadas, este estudo pretende contextualizar a Pe-
dagogia da Alternância como uma possibilidade pedagógica no desenvolvimento de experiências
de EJA, a partir das interseções encontradas entre elas, como, por exemplo, a questão da valorização
das trajetórias dos estudantes, da concepção de trabalho como princípio educativo e da autonomia
pedagógica de docentes e discentes. O documento preparatório da VI Conferência Internacional
de Educação de Jovens e Adultos – CONFITEA24 , já sinalizara para a necessidade de “estimular a
concepção de projetos que contemplem a pedagogia da alternância, segundo as necessidades dos
educandos” (Brasil, 2009, p.49).
Segundo Ghedin (2012, p.258), a Pedagogia da Alternância25 apresenta-se como uma proposta
22 Ver as dissertações: Debiasio, 2010; Luz, 2011; Oliveira, 2011; Batista, 2011; Silva, 2011; Katrein, 2012; Baptista, 2014.
23 O Pronatec foi criado pela Lei N.º 12.513/2011, com o objetivo de ampliar a oferta de cursos de educação profissional e tec-
nológica (Brasil, 2013).
24 Evento realizado desde 1949, a cada 12 anos, pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
(UNESCO), cujo objetivo é debater e avaliar as políticas implementadas em âmbito internacional para a modalidade de EJA. A VI Con-
fitea foi realizada no Brasil, na cidade de Belém do Pará, no período de 01 a 04 de dezembro de 2009.
25 A Pedagogia da Alternância originou-se na França (1930) com a criação das Casas Familiares Rurais – CFR expandindo-se
para outros países na década de 50 do século XX, tendo sido trazida ao Brasil na década de 60 por meio do Movimento de Educação

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
metodológica para a educação do campo que tenta aproximar as realidades da comunidade e da
escola, alternando tempo e espaço diferenciados de formação como “períodos integrados de forma-
ção na escola e formação na família/comunidade, possibilitando a flexibilização da organização do
trabalho pedagógico em alternâncias e adequando-o à realidade dos sujeitos educativos”. Os conte-
údos instituídos são articulados de forma interdisciplinar com temas profissionalizantes chamados
de “temas geradores”, cuja sistematização se dá por meio de diversas ferramentas ou instrumentos
pedagógicos.
O mesmo autor afirma que a Pedagogia da Alternância “consiste em uma relação de troca e inte-
ração de saberes, tendo como foco central do processo ensino-aprendizagem o educando e a sua
realidade” (p.244). O processo de formação dos jovens parte da história de cada um, de suas famílias,
do saber que historicamente vem sendo construído a partir da herança cultural de seus ancestrais.
Considerando os princípios já mencionados pode-se perceber que a autonomia do aprender
e do ensinar se configura como um dos princípios que norteiam a prática pedagógica das experiên-
cias com a Pedagogia da Alternância. A esse respeito, Paulo Freire (1999) ressalta o necessário res-
peito à autonomia e à identidade do educando, o que exige do docente uma prática coerente com
este saber. Segundo o autor “o respeito à autonomia e à dignidade de cada um é um imperativo
ético e não um favor que podemos conceder uns aos outros” (p. 66).
Um estudo exploratório, ainda em fase de execução, tem tornado possível a identificação de
algumas experiências de Proeja estruturadas sob os princípios da Pedagogia da Alternância, como
alternativa para superar as dificuldades e melhor atender às particularidades do público de EJA.
Dentre as experiências, destacam-se: Instituto Federal do Amazonas, Campus Tabatinga – curso téc-
nico em Agropecuária destinado à população indígena; Instituto Federal Catarinense, Campus Rio
do Sul - curso técnico em Agropecuária; Instituto Federal Baiano, Campus Santa Inês26 - curso técnico
em Agropecuária e o Colégio Técnico Floriano da Universidade Federal do Piauí - curso técnico em
Agropecuária.

procedimentos iniciAis de pesqUisA


Considerando que a Pedagogia da Alternância possui uma concepção pedagógica que visa à
inclusão do homem do campo nos processos educacionais, suas diretrizes pedagógicas condizem
com as da educação do campo, o que, de certa forma, é fator confrontante com as concepções pe-
dagógicas desenvolvidas pelos IF’s, a considerar suas tradicionais características de educação vin-
culadas ao desenvolvimento econômico e tecnológico, de rigidez curricular e ainda a existência de
rigorosos mecanismos de seleção.
Tal abordagem desperta as seguintes reflexões: em que contexto pedagógico e social os jovens
e adultos constroem seus saberes, seus valores e seus conhecimentos? Sobre quais princípios de
Alternância estão estruturadas tais experiências? Quais são as trajetórias escolares e de vida dos jo-
vens e adultos estudantes destes programas e de que maneira a Pedagogia da Alternância contribui
para a valorização dos saberes desses jovens?
A partir dessas indagações, esta pesquisa procurará compreender como se deu o processo
de implementação do Proeja estruturado sob os princípios da Pedagogia da Alternância no contex-
to de um IF. Levando em conta todas as circunstâncias apresentadas anteriormente, pretende-se,
em linhas gerais, entender o significado e o sentido da EJA e da Alternância para os jovens e adultos
estudantes a partir do conhecimento de suas perspectivas e trajetórias escolares.
A experiência selecionada para fins deste estudo será a desenvolvida pelo Instituto Federal Baia-
Promocional do Espírito Santo (Mepes) (Ghedin, 2012, p. 259/260)
26 O campus Santa Inês localiza-se a 290 km da cidade de Salvador. O campus oferece, desde 2012, o curso Técnico em Agro-
pecuária na modalidade de jovens e adultos, estruturado sob os princípios da Pedagogia da Alternância. O curso em questão foi
aprovado pela Resolução do Conselho Superior do IFBaiano, nº 14, de 09 de outubro de 2011, publicado no Diário Oficial da União em
11 de outubro de 2012.

720
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
no, Campus Santa Inês . A opção pelo campo de pesquisa deu-se em função da condição regular
de funcionamento do curso, o que permitirá o efetivo contato com seus estudantes, professores,
instâncias de gestão administrativas e pedagógicas que participaram de sua implementação.
Pretende-se com esta pesquisa, em linhas gerais, compreender o fenômeno específico em pro-
fundidade a partir da perspectiva dos sujeitos, trabalhando com descrições e interpretações de for-
ma a contribuir para a melhor compreensão do mesmo. Desta forma, acredita-se que o estudo as-
suma o caráter de um estudo de caso, não como método específico, mas uma forma particular de
estudo (André, 2008).
Considerando o caráter inicial da pesquisa, as definições teórico-metodológicas ainda necessi-
tam de maior aprofundamento. Após a realização de um estudo exploratório com o objetivo de pro-
duzir o estado da arte do tema, inicia-se o processo de delimitação e problematização do objeto da
pesquisa, organizando principalmente as questões que envolvem os procedimentos para entrada
no campo.
Levando em consideração a especificidade do tema e os poucos estudos nesta direção, dentre os
objetivos da pesquisa, pretende-se também produzir um mapeamento da oferta de PROEJA articu-
lado com a Pedagogia da Alternância em todo o território nacional.
O estudo, em linhas gerais, envolverá o conhecimento e a análise dos instrumentos legais e do-
cumentos oficiais referentes à organização da EJA, do PROEJA, da Educação Profissional e da Peda-
gogia da Alternância, tanto no cenário educacional brasileiro quanto no que se refere à instituição
a ser pesquisada.
No que se refere à integração da EJA com a Educação Profissional, pretende-se, dentre outros,
investir nos estudos de Moura (2006) e Moura e Pinheiro (2009) que discutem os princípios que con-
solidam e fundamentam a política de integração entre a EJA e a Educação Profissional, destacando a
inclusão e a compreensão do trabalho como princípio educativo. Os referidos autores, por exemplo,
reconfiguram o cenário educacional no qual o Proeja foi implementado, destacando as fragilidades
das instituições de educação profissional e o processo histórico e evolutivo do programa.
Em relação à Pedagogia da Alternância, além dos autores já citados ao longo deste trabalho, há
diversos trabalhos de pesquisadores brasileiros no campo da EJA, e mais especificamente, do Proeja
ofertado pela rede federal de educação tecnológica. Marconato (2009), por exemplo, analisa o fe-
nômeno da evasão escolar observado no curso técnico agrícola no âmbito do Proeja, ofertado pelo
IFCatarinense - Campus Rio do Sul, estruturado nos moldes da Pedagogia da Alternância. Segundo
o autor, a forma de oferta do curso foi um dos pontos determinantes para a análise dos indicadores
de evasão entre os estudantes.
Santos (2013), por outro lado, analisa a colaboração da Pedagogia da Alternância para a integra-
ção dos saberes no Proeja Quilombola do IF Pará – Campus Castanhal, indicando aspectos positi-
vos e negativos. Destaca, dentre os aspectos positivos, por exemplo, a valorização dos saberes dos
estudantes e sua articulação com o saber oficial/formal e a autonomia dos estudantes no processo
ensino-aprendizagem. Dentre os negativos, destacam-se a dificuldade de compreensão dos tempos
de alternância, a separação entre teoria e prática e a inexperiência dos docentes com a modalidade.
Já Kuenzer e Lima (2013) apresentam uma análise das possibilidades de diálogo entre a Educação
Profissional integrada ao Ensino Médio e a Pedagogia da Alternância, abordando questões sobre
os seus princípios e a relação teoria/prática, destacando, ainda, aspectos positivos e também pre-
ocupações e limitações. Ribeiro (2008, p.30), por sua vez, propõe uma análise crítica da adoção da
Pedagogia da Alternância como método educativo por movimentos sociais e instituições, alertando
quanto a diminuição do tempo de estudo e a consequente desqualificação da formação oferecida
aos filhos dos trabalhadores rurais do campo.
Para a interlocução com os sujeitos da pesquisa é previsto a utilização de diversos instrumentos

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
de pesquisa, dentre eles, o questionário e a entrevista. O material produzido nessa etapa será crite-
riosamente selecionado, analisado e interpretado, à luz dos referenciais que sustentarão a discussão
teórica da pesquisa.
A guisa de conclusão ressalta-se que a pesquisa a que se refere este artigo encontra-se em fase
inicial de desenvolvimento, sendo esta apresentação, portanto, apenas uma reflexão das possíveis
discussões que auxiliarão no aprofundamento da temática exposta.

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723
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
pessoAs com deficiênciA: os desAfios dA inclUsão nA
edUcAção de joVens e AdUltos
edileUzA cAVAlcAnte cArdoso rodrigUes | nAtáliA moUrA diAs de lUcenA

O Centro Educacional Sesc São Francisco do Pará recebe a cada ano uma diversidade de alunos
para estudar na educação de jovens e adultos, dentre eles pessoas com deficiência que buscam
na escola respeito, atenção, e principalmente reconhecimento enquanto cidadãos de direitos. Com
isso nossos desafios são constantes no processo de aprendizagem, incluindo-os de fato, ao invés de
simplesmente “enturmá-los” ou integrá-los. Assim, no Projeto Sesc Ler, temos exemplos que valem
a pena ser registrados. Quando visitamos as comunidades com a finalidade de realizar matrículas,
somos surpreendidos com pessoas com deficiência. Como o caso de um jovem, de 24 anos, morador
da Comunidade do Cipoal, em São Francisco do Pará, portador de Síndrome de Down, que nunca
havia frequentado uma escola. Diante de sua manifestação em estudar no Projeto Sesc Ler, fo-
mos interpelados quanto a conseguirmos ou não atendê-lo em suas necessidades. Apesar de nossa
apreensão, o matriculamos e qual não foi nossa surpresa, vimos conseguindo avanços consideráveis
quanto aos objetivos propostos, contando ainda com o apoio dos demais servidores da equipe es-
colar. Efetivar uma educação inclusiva não é tarefa fácil. Exige profissionais que tomem para si a
tarefa de pensar essas questões de forma reflexiva e coletiva, sustentada por uma rede de ações in-
terdisciplinares que se entrelacem no trabalho com as necessidades educacionais de cada aluno em
sua deficiência. A realidade desses alunos, suas histórias de vida não podem ser desconsideradas
no momento de ressignificar o conhecimento na escola, o que exige mudanças no percurso. Assim
como o caso deste jovem gostaríamos de contar outras experiências encontradas na educação de
jovens e adultos, no Projeto Sesc Ler, em São Francisco do Pará , na certeza de que estaremos parti-
lhando possibilidades de superação de desafios.

palavras-chave: Inclusão, alfabetização, Educação de Jovens e Adultos

introdUção
O desafio de fazer valer uma política inclusiva nas escolas é enorme. Mais ainda, quando nos
reportamos a alunos jovens, adultos ou idosos, que historicamente já se mantiveram à margem da
educação no Brasil. Repensar a função da escola, da Educação de Jovens e Adultos, propriamente,
implica no enfrentamento desses desafios, buscando-se implantar mudanças necessárias para que,
de fato, todos tenham acesso à educação.
O Centro Educacional Sesc São Francisco do Pará recebe a cada ano uma diversidade de alunos
para estudar na Educação de Jovens e Adultos, dentre eles pessoas com deficiência que buscam na
escola atenção, afeto, respeito e principalmente serem reconhecidos feito pessoas. Com isso nossos
desafios são constantes no processo de incluí-los de fato, ao invés de simplesmente enturmá-los.
“Educar é uma tarefa para pessoas gigantes” - (retirado da internet, do texto de Manuel Alves Fi-
lho - “Maria Teresa Mantoan é laureada com a Ordem Nacional do Mérito”, UNICAMP, de 23/03/2011.
A frase, cujo enunciado dispensa explicações, ganha ainda mais importância na boca da professora
Maria Teresa Eglér Mantoan, da Faculdade de Educação (FE) da Unicamp. Referência no Brasil quan-
do o assunto é a defesa do direito incondicional de todos à educação.
A partir dessa afirmação nos percebemos como “gigantes” dentro deste processo com nossos
alunos, uma vez que não obstante os desafios, não medimos esforços para juntos buscarmos alter-
nativas de superá-los. Vale lembrar que alguns deles são considerados mais simples, porém outros

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
nos remetem à sensação de vencidos, em alguns casos. Mas desistir, nem pensar!
Segundo Freire (2006), não é possível aos educadores pensar apenas em conteúdos e procedi-
mentos didáticos. Os próprios conteúdos que devem ser ministrados não devem ser totalmente
estranhos ao cotidiano dos educandos. Ele acreditava que:

[...] o que acontece, no meio popular, nas periferias das cidades, nos campos –
trabalhadores urbanos e rurais reunindo-se para rezar ou para discutir seus direi-
tos – nada pode escapar à curiosidade arguta dos educadores envolvidos na prática
da Educação Popular. A Educação de Adultos, virando Educação Popular tornou-se
mais abrangente. Certos programas como alfabetização, educação de base em pro-
fissionalização ou em saúde primária são apenas uma parte do trabalho mais am-
plo que se sugere quando se fala em Educação Popular. (FREIRE, 2001 p. 16)

Efetivar uma educação inclusiva não é tarefa fácil. Exige profissionais que tomem para si a tarefa
de pensar essas questões de forma reflexiva e coletiva, sustentada por uma rede de ações interdis-
ciplinares que se entrelacem no trabalho com as necessidades educacionais de cada aluno em sua
deficiência.
A realidade desses alunos, suas histórias de vida não podem ser desconsideradas no momento de
ressignificar o conhecimento na escola, o que exige mudanças no percurso.

mArcos históricos
Historicamente, a escolarização se caracterizou como privilégio de poucos, exclusão que foi legi-
timada nas políticas e práticas educacionais. Com o processo de democratização da escola, e con-
sequentemente a universalização do acesso a ela, evidencia-se o paradoxo inclusão/exclusão, con-
tudo ainda persiste a exclusão de indivíduos considerados fora dos padrões homogeneizadores da
escola.
Há registros, no Brasil, do atendimento à pessoas com deficiência desde a época do Império: o
Imperial Instituto dos Meninos Cegos, em 1854, atual Instituto Benjamin Constant – IBC, e o Instituto
dos Surdos Mudos, em 1857, hoje denominado Instituto Nacional da Educação dos Surdos – INES,
ambos no Rio de Janeiro. No início do século XX é fundado o Instituto Pestalozzi (1926), instituição
especializada no atendimento às pessoas com deficiência mental; em 1954, é fundada a primeira
Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais – APAE; e, em 1945, é criado o primeiro atendimento
educacional especializado às pessoas com superdotação na Sociedade Pestalozzi, por Helena Anti-
poff.
Em 1961, o atendimento educacional às pessoas com deficiência passa a ser fundamentado pelas
disposições da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN, Lei nº 4.024/61, que aponta
o direito dos “excepcionais” à educação, preferencialmente dentro do sistema geral de ensino. Em
1973, o MEC cria o Centro Nacional de Educação Especial – CENESP.
A Constituição Federal de 1988 é um documento que traz alguns itens importantes sobre inclu-
são:
• art.3º, inciso IV “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor,
idade e quaisquer outras formas de discriminação”.
• artigo 205, a educação como um direito de todos, garantindo o pleno desenvolvimento da
pessoa, o exercício da cidadania e a qualificação para o trabalho.
• artigo 206, inciso I, estabelece “igualdade de condições de acesso e permanência na escola”
como um dos princípios para o ensino;

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
• artigo 208, garante, como dever do Estado, a oferta do atendimento educacional especia-
lizado, preferencialmente na rede regular de ensino.
O Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, Lei nº 8.069/90, no artigo 55, reforça a obrigação
dos pais ou responsáveis em matricular seus filhos ou pupilos na rede regular de ensino.
A Declaração Mundial de Educação para Todos (1990) e a Declaração de Salamanca (1994) são
também outros documentos importantes dessa década, que influenciaram formulação das políticas
públicas da educação inclusiva.
Em 1994, é publicada a Política Nacional de Educação Especial, orientando o processo de “inte-
gração instrucional” que condiciona o acesso às classes comuns do ensino regular àqueles que “(...)
possuem condições de acompanhar e desenvolver as atividades curriculares programadas do ensi-
no comum, no mesmo ritmo que os alunos ditos normais” (p.19).
Há ainda, o Decreto nº 3.298, de 1999 que regulamenta a Lei nº 7.853/89, ao dispor sobre a Políti-
ca Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, define a educação especial como
uma modalidade transversal a todos os níveis e modalidades de ensino.
A atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 9.394/96, no artigo 59, assegura aos
alunos currículo, métodos, recursos e organização específicos para atender às suas necessidades; a
terminalidade específica àqueles que não atingiram o nível exigido para a conclusão do ensino fun-
damental, em virtude de suas deficiências e aceleração de estudos aos superdotados para conclusão
do programa escolar. Também define, a “possibilidade de avanço nos cursos e nas séries mediante
verificação do aprendizado” (art. 24, inciso V) e “[...] oportunidades educacionais apropriadas, con-
sideradas as características do alunado, seus interesses, condições de vida e de trabalho, mediante
cursos e exames” (art. 37).
As Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica, Resolução CNE/CEB nº
2/2001, no artigo 2º, determinam que:

“Os sistemas de ensino devem matricular todos os alunos, cabendo às escolas or-
ganizarem-se para o atendimento aos educandos com necessidades educacionais
especiais, assegurando as condições necessárias para uma educação de qualidade
para todos. (MEC/SEESP, 2001).”

Porém, ao admitir a possibilidade de substituir o ensino regular, não potencializam a adoção de


uma política de educação inclusiva na rede pública de ensino, prevista no seu artigo 2º.
O Plano Nacional de Educação – PNE, Lei nº 10.172/2001, destaca que “o grande avanço que a
década da educação deveria produzir seria a construção de uma escola inclusiva que garanta o aten-
dimento à diversidade humana”.
Na perspectiva da educação inclusiva as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de
Professores da Educação Básica, define que as instituições de ensino superior devem prever, em sua
organização curricular, formação docente voltada para a atenção à diversidade e que contemple
conhecimentos sobre as especificidades dos alunos com necessidades educacionais especiais.
A Lei nº 10.436/02 reconhece a Língua Brasileira de Sinais – Libras como meio legal de comuni-
cação e expressão e inclui a disciplina de Libras como parte integrante do currículo nos cursos de
formação de professores e de fonoaudiologia.
A Portaria nº 2.678/02 do MEC aprova normas para o uso, o ensino, a produção e a difusão do
sistema Braille em todas as modalidades de ensino, compreendendo o projeto da Grafia Braille para
a Língua Portuguesa.
Em 2003, é implementado pelo MEC, o Programa Educação Inclusiva visando apoiar a transforma-

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
ção dos sistemas de ensino em sistemas educacionais inclusivos, promovendo um amplo processo
de formação de gestores e educadores para a garantia do direito de acesso de todos à escolarização
e acessibilidade, além da oferta do atendimento educacional especializado.
Em 2004, o Ministério Público Federal publica o documento O Acesso de Alunos com Deficiência
às Escolas e Classes Comuns da Rede Regular, disseminando os conceitos e as diretrizes mundiais
para a inclusão, reafirmando o direito e os benefícios da escolarização de alunos com e sem defici-
ência nas turmas comuns do ensino regular.
O Decreto nº 5.296/04 regulamentou as Leis nº 10.048/00 e nº 10.098/00, estabelecendo normas e
critérios para a promoção da acessibilidade às pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida.
O Decreto nº 5.626/05, que regulamenta a Lei nº 10.436/2002, visa o acesso à escola dos alunos
surdos, dispõe sobre a formação e a certificação de professor, instrutor e tradutor/intérprete de Li-
bras e o ensino da Língua Portuguesa como segunda língua para alunos surdos e a organização da
educação bilíngüe no ensino regular.
Em 2005, são implantados os Núcleos de Atividades de Altas Habilidades/Superdotação – NAAH/S
em todos os estados e no Distrito Federal, para o atendimento educacional especializado, orienta-
ção às famílias e formação continuada dos professores.
A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, aprovada pela ONU em 2006, esta-
belece que os Estados-Partes devem assegurar um sistema de educação inclusiva em todos os níveis
de ensino, adotando medidas para garantir que:
a) as pessoas com deficiência não sejam excluídas do sistema educacional geral sob alegação
de deficiência;
b) as pessoas com deficiência possam ter acesso ao ensino fundamental inclusivo, de qualida-
de e gratuito, em igualdade de condições com as demais pessoas na comunidade em que
vivem (Art.24).
Neste mesmo ano, é lançado o Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos, de forma con-
junta pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos, pelos Ministérios da Educação e da Justiça e
a organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura – UNESCO, com temáticas
relativas às pessoas com deficiência e incentivo a ações afirmativas que possibilitem acesso e per-
manência na educação superior.
Em 2007, é lançado o Plano de Desenvolvimento da Educação – PDE, tendo como eixos a forma-
ção de professores para a educação especial, a implantação de salas de recursos multifuncionais, a
acessibilidade arquitetônica dos prédios escolares, acesso e a permanência das pessoas com defici-
ência na educação superior e o monitoramento do acesso à escola, dos favorecidos pelo Beneficio
de Prestação Continuada – BPC. Para sua implementação é publicado o Decreto nº 6.094/2007, que
estabelece nas diretrizes do Compromisso Todos pela Educação, a garantia do acesso e da perma-
nência no ensino regular e o atendimento às necessidades educacionais.
Observamos, que muitos são os documentos criados para garantir a inclusão de pessoas com
deficiência, documentos estes importantes que nos ajudam a compreender os caminhos pensados
e percorridos até então. Porém, ainda precisamos avançar na efetivação prática e real de todas as
iniciativas legais.
Não é nossa pretensão aqui discutir ou questionar Leis, Decretos ou regulamentações se estão ou
não, de fato, sendo cumpridas. Nossa proposta é citá-las, sabendo que elas existem e que amparam
as iniciativas feitas. Nosso compromisso é o de reconhecer a pessoa com deficiência, compreenden-
do suas necessidades, seus “desejos” educacionais, suas histórias de vida, o que faz de cada um, um
ser humano muito especial. E assim, a compartilhar nossa experiência.

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
qUAis os desAfios qUe encontrAmos no cotidiAno do centro edU-
cAcionAl sesc ler são frAncisco do pArá em relAção Aos AlUnos com
deficiênciA?

A escola não pode tudo, mas pode mais. Pode acolher as diferenças. É possível
fazer uma pedagogia que não tenha medo da estranheza, do diferente, do outro. A
aprendizagem é destoante e heterogênea. Aprendemos coisas diferentes daquelas
que nos ensinam, em tempos distintos, (...) mas a aprendizagem ocorre, sempre. Pre-
cisamos de uma pedagogia que seja uma nova forma de se relacionar com o conhe-
cimento, com os alunos, com seus pais, com a comunidade, com os fracassos (com
o fim deles), e que produza outros tipos humanos, menos dóceis e disciplinados...
(ABRAMOWICZ, 1997).

Todas as noites, quando o transporte escolar chega ao Centro Educacional Sesc Ler São Francisco
do Pará, traz dentro dele muitos sonhos, desejos e vontade de aprender, manifestados por todos
nossos alunos jovens, adultos e idosos. Aumenta em nós, o compromisso e a responsabilidade de
ensinar cada vez melhor, quando nos deparamos com os alunos com deficiência, à medida que o
processo de inclusão nos remete ao compromisso afirmado por nós nas visitas realizadas nas comu-
nidades.
Ficamos surpresos com pessoas que vamos conhecendo e descobrindo, em muitas das ações
de matriculas realizadas por nossa equipe. A.F.S.F. 24 anos possui síndrome de down, ele reside na
comunidade do Cipoal, zona rural do município. Nunca frequentou a escola, mas ao nos receber em
sua residência, nos pediu para estudar.
Confessamos que ele nos afetou de tal forma, manifestando seu desejo, pois enquanto muitos
imaginavam que ele não aprendia, mostrou-nos com seu pedido o quanto é capaz. Chegamos a
imaginar o que estaria passando em sua mente quando nos pediu para estudar no Sesc. Quais expe-
riências possuía para levá-los a nos interpelar daquela maneira? Talvez ele não soubesse como seria
na escola, o que iria fazer, que espaço seria esse. E nem nós também sabíamos. Mas o que importava
naquele instante, era nossa resposta positiva, e que certamente iria fomentar novas experiências
para ele. Essa foi nossa motivação inicial.
Desde o início do Projeto Sesc Ler em São Francisco do Pará, em maio de 2001, assumimos o
compromisso de receber jovens e adultos que precisam ser alfabetizados ou escolarizados nos anos
iniciais do ensino fundamental e isso significar a atender a todos que estejam com essa necessidade.
É óbvio que o medo de não conseguirmos conduzir processos de aprendizagem com pessoas com
deficiências, fazia parte do nosso dia-a-dia, mas nosso desejo de ensinar precisava ser tão grande
quanto o desejo de aprender dos alunos. E o jovem A.F.S.F foi um dos nossos primeiros desafios.
O primeiro embate que tivemos com ele foi o de levá-lo a compreender as regras de convivência
daquele espaço. A.F.S.F agiu, inicialmente da mesma forma que ficava em casa. Recusava-se a cum-
prir qualquer combinado.
Os momentos do lanche, feitos em harmonia, entre alunos e professores, foi um grande desafio
a ser vencido, pois A.F.S.F. esperava todos terminarem para ir, pela janela da cozinha, solicitar sua re-
feição, uma vez que em sua casa sua refeição era guardada no forno do fogão para ele se servir após
todos terem terminado. Segundo sua mãe “ele não gosta de comer junto com a gente”. Sua mãe,
também aluna do Projeto Sesc Ler, trazia uma colher para ele todas as noites, porque ele não comia
com garfo e faca. Também, sua garrafa com água tinha que ser colocada por sua mãe, ao seu lado, à
mesa, para acompanhar sua refeição solitária. Se os outros alunos o olhasse enquanto comia, A.F.S.F.
xingava, dizia palavrões, se aborrecia por pouca coisa e, não queria entrar no ônibus, no retorno para

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
ir embora.
Recordando Paulo Freire,“Não há nem jamais houve prática educativa em espaço-tempo nenhum
de tal maneira neutra, comprometida apenas com ideias preponderantemente abstratas e intocá-
veis”. (2011, p.108). Se tivéssemos permanecido neutros e intocáveis diante das atitudes do jovem
A.S.F.S, não teríamos alcançado avanços tão significativos para nós e certamente para ele. Mas, so-
bretudo nosso papel foi de mediadores dos hábitos trazidos por ele, a medida que incluíamos as
regras e os combinados de convivência, construídos coletivamente na escola. Vale ressaltar que ne-
nhuma mudança aconteceu, sem que ele mesmo se desse conta da real necessidade e da importân-
cia delas para o dia a dia.
De início todos da escola assumiram papel fundamental para que se sentisse incluído no proces-
so de mudança, mostrando, por exemplo como fazer para usar os talheres, lanchando ao lado dele,
compartilhando sabores e saberes. Com isso aprendeu a manuseá-los e hoje, possui autonomia para
isso, sendo capaz de agradecer ao servente ao final da refeição, além de colocar o prato e os talheres
nos devidos recipientes no balcão e voltar com sua cadeira para debaixo da mesa.
A leitura diária dos combinados do refeitório, que ficam afixados em cartazes, fez com que apren-
desse o desenvolvimento das funções. Além, obviamente de participar do grupo com os demais
alunos, no qual todos aprendem juntos.
Hoje, o A.F.S.F. participa das aulas-passeio, aulas de educação física, danças folclóricas, especial-
mente o carimbó; se relaciona com todos da escola e até nos dar recados quando sua mãe não vem
às aulas. Fez amizades e se solidariza ao ver algum amigo com dificuldades. O Sesc é para ele um
ponto de encontro com os amigos, o lugar onde adquiri conhecimentos e que faz questão de fre-
quentar todas as noites.

e os cAminhos qUe forAm trAçAdos?


Várias foram nossas inquietações e ainda nos acompanham. Ao passo que vamos encontrando
respostas, novas perguntas vão surgindo, diante de cada aluno, de cada deficiência que nos depara-
mos, como por exemplo: Quais atividades proporcionar para contribuir com o processo de ensino e
de aprendizagem dos alunos com deficiência na Educação de Jovens e Adultos? Quais as melhores
estratégias de distribuição desses alunos nas turmas, considerando a quantidade e a diversidade de
deficiência?
Ao longo dos anos, promovendo estudos continuados de formação em nosso Regional, junto às
demais escolas do Sesc e no próprio espaço de nosso Centro Educacional, com os professores, sobre
a educação inclusiva, fomos descobrindo maneiras metodológicas, realizando tarefas coletivas e
individuais, adaptando o planejamento diário e promovendo experiências cujo comprometimento
de todos é fundamental para a consecução positiva dos objetivos educacionais. Autores como Maria
Teresa Eglér Mantoan e Jairo Werner, foram e são pessoas que consideramos importantes em nosso
processo de formação continuada no espaço da escola.
Os Centros Educacionais Sesc Ler são considerados, no Brasil, espaços já adaptados em sua es-
trutura física, para pessoas com deficiências, mas mesmo assim, é sempre necessário realizar novas
adaptações na organização da escola e sempre considerar rever e revisitar a metodologia, organi-
zação dos planejamentos, a avaliação e prática diária de sala de aula. E isso nos leva a constatar que
precisamos agir desse modo, não apenas por causa dos alunos com deficiência, mas para garantir a
aprendizagem de todos os alunos que estão em nossa escola.

o qUe mUdoU, então?


Certamente, não possuímos mais medo, da mesma maneira assustadora do começo. O fato de
recebermos na escola alunos com outras deficiências ajudou-nos a buscar novas formas de traba-

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
lho. Atualmente eles são 11 alunos, em meio aos: cadeirante, down, deficientes auditivos e mentais.
Apresentam maior interesse por Música, Artes, Oficinas de Trabalhos Manuais e Culinária. Alguns já
aprenderam a escrever seu nome e todos estão em desenvolvimento da escrita. Cada um em seu
ritmo próprio e suas peculiaridades.
Acima de tudo, nosso compromisso é acompanhá-los nas diversas possibilidades ampliando
oportunidades de interação com o conhecimento, trocando experiências com instituições e outros
profissionais, refletindo sobre o que fazemos, percebendo as lógicas que vamos construindo a partir
do que vivenciamos, propondo sempre novo caminho, se percebermos que é necessário um reco-
meço. Nosso tempo segue o ritmo do universo, assim como cada planeta e cada astro brilhando lá
em cima tem um tempo eterno e um movimento singular.
Observamos alunos com maior autonomia na realização de suas atividades e tarefas. Constata-
mos que se sentem respeitados e seguros quando estão conosco. Seus conhecimentos são valoriza-
dos como os demais e assim, desse modo, vão ampliando seu repertório de aprendizagens.
Nossa escola continua repleta de muitos sonhos, desejos e vontade de aprender, trazidos no ôni-
bus escolar todas as noites, manifestados por cada aluno jovem, adulto ou idoso que participa do
Projeto Sesc Ler. Em nós, educadores e equipe de trabalhadores do Sesc, em São Francisco do Pará,
continua latente o compromisso e a responsabilidade social de garantir qualidade na educação,
fomentando mudanças no cenário da educação local, no convívio familiar e social, da comunidade
onde estamos presentes.
Reconhecemos que ainda temos muito que avançar na busca incansável da educação inclusi-
va, mas entendemos todos os alunos como sujeitos da aprendizagem e não fugimos dos desafios
que ora nos interpelam, porque desejamos que nossa comunidade escolar ofereça oportunidades
a todos e seja um exemplo de como a sociedade pode, possivelmente, tornar-se mais igualitária se
houver respeito às diferenças.

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731
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
proejA: emAncipAção oU certificAção?
AngelicA lino pAcheco pAiVA

Este trabalho monográfico teve como objetivo discutir e refletir a implementação do Programa
Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educa-
ção de Jovens e Adultos - PROEJA no estado do Rio de Janeiro, principalmente no que diz respeito a
sua real concepção de homem e sociedade, muitas das vezes mascarada pelo viés emancipador que
sustentou a base legal de criação do programa. Nessa perspectiva, refletir sobre como a formação
de nossos jovens e adultos matriculados no PROEJA vem se dando atrelada ao ideal capitalista em
contraposição ao ideal emancipatório, postulado e defendido nos discursos oficiais, tornou-se pre-
missa dessa pesquisa, que procurou também considerar os frutos que essa modalidade tem trazido
à sociedade, bem como, analisar se uma possível oferta dessa política na cidade de Angra dos Reis
constitui-se em medida imediata e necessária. Para tanto, uma visita ao campus do Instituto Federal
de Educação Tecnológica - IFRJ/Maracanã, que oferece essa modalidade de ensino desde 2006, bem
como entrevistas com os principais sujeitos do programa constituíram-se em metodologias que
muito contribuíram na reflexão de tal temática. Reflexão essa que buscou analisar como a EJA tem
sido vista e tratada ultimamente e em que proporção o PROEJA tem conseguido sanar as enormes
dívidas sociais com esse público. Dessa forma, esse trabalho não pretendeu defender uma tese so-
bre o tema, mas um novo pensar sobre a questão, capaz de analisar o que hoje temos para melhor
propor e defender o que queremos para o amanhã.

palavras-chave: PROEJA, EDUCAÇÃO, TRABALHO

1.introdUção
No Brasil, durante longos anos, a Educação de Jovens e adultos significou uma oportunidade de
suplência dos conhecimentos negados pelos sistemas educacionais a muitos cidadãos. Seu público
alvo sempre foi constituído por pessoas que interromperam seus estudos ou que nunca chegaram a
iniciá-los. Pessoas, em geral, desprovidas de oportunidades de ascensão social em função do baixo
nível de escolaridade que, vivendo a margem da sociedade, enxergavam na EJA a possibilidade de
obter melhores condições de sobrevivência. Desconsiderada enquanto um direito, essa modalidade
de educação muitas vezes foi vista como um favor prestado pelo sistema público à população mais
desprovida de recursos econômicos. Por tal razão, sua voz foi calada em meio às políticas públicas
de educação sob a alegação de que não havia demanda por tal modalidade ou de que a urgência se
encontrava no ensino regular.

Se o direito à educação pela via de acesso não mais se põe como problema quan-
do trata de crianças – seja pela existência de consenso social, que considera prio-
ritária essa oferta seja pela chamada ‘universalização’ alcançada – novos direitos
emergem, por exemplo, o que resume a ideia de educação pública de “qualidade
social”, que tem sido a tônica dos movimentos organizados em defesa de direitos
emergentes no campo da educação. Mas essa questão encerra a lógica do direito
apenas para um conjunto etário – as crianças – e deixa de problematizar o conjunto
de jovens e adultos, cujo direito primeiro de acesso ao ensino fundamental sequer se
fez prática (PAIVA, 2009 p. 37-38).

Somente nas últimas décadas a EJA vem sendo proclamada como um direito subjetivo garantido

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
na Constituição Federal e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Tal fato constituiu um
enorme avanço no intuito da garantia legal da educação para jovens e adultos, porém, isso não foi
suficiente para permitir sua oferta, de maneira satisfatória, para todos aqueles que dela demandam.
Demanda essa que vem crescendo nos últimos anos – o que de certa forma tem ligação com o fe-
nômeno conhecido por juvenilização da EJA que se caracteriza pelo aumento no número de jovens
ingressos nessa modalidade.
Os históricos de evasão e repetência de muitos jovens fazem com que um grande percentual
deles decidam abandonar a escola após completarem idade suficiente para ingressar no mercado
de trabalho. O contato precoce com esse universo competitivo – onde a escolaridade configura-
-se como condição primordial à ascensão e à mobilidade social –aumentou consideravelmente o
número de adolescentes na EJA, inicialmente destinada à adultos. Assim, a busca pela elevação da
escolaridade – que se finda para muitos com a conquista do certificado do Ensino Médio – passou a
representar um dos principais motivos para a permanência desses jovens nas instituições escolares.
Fato que vêm provocando a demanda por novas formas de atuação metodológica embasadas nas
necessidades formativas desses alunos.

Essa presença marcante de jovens na EJA, principalmente nas áreas metropolita-


nas, vem desafiando os educadores do ponto de vista das metodologias e das inter-
venções pedagógicas, obrigando-os a refletir sobre os sentidos das juventudes – e de
seus direitos – que permeiam as classes de jovens e adultos (PAIVA, 2009 p. 32).

Para tanto, é preciso analisar se os programas propostos nas últimas décadas aos estudantes da
EJA conseguem fixar-se no cenário educacional a ponto de produzir uma significação para seu pú-
blico ou se não passam de medidas paliativas que mascaram cada vez mais a real “face” da Educação
de Jovens e adultos em nosso país.
Embora dados apresentados pelo IBGE 2012 atentem para a queda no número de matrículas na
educação de jovens e adultos (EJA), que apresentou baixa de 3,4% (139.292), totalizando cerca de
3.906.877 matrículas em 2012 ainda existe um número alto de pessoas que precisam ser atendidas
pelo programa, segundo dados da Pnad/IBGE 2011, cerca 56,2 milhões de pessoas com mais de 18
anos no Brasil não frequentam a escola e não possuem o ensino fundamental completo. Dados que
certamente assinalam para a deficiência dessa modalidade de ensino que não está na falta de clien-
tela e sim na má administração.
É por essa razão, que se faz de extrema importância uma análise sobre como vem sendo aplicadas
as políticas públicas pensadas nos últimos dez anos para EJA a fim de verificar se as mesmas estão
produzindo resultados capazes de reverter os dados apresentados acima. Pensar a Educação para
Jovens e adultos é também repensar suas técnicas, é refletir sobre o sentido dessa modalidade na
vida de seus sujeitos.
É pensando nesse atual sujeito da EJA que defendo uma articulação precisa entre educação e tra-
balho nos segmentos educacionais para pessoas que não tiveram oportunidade de escolarização no
tempo “destinado” pela sociedade. Articulação essa capaz de trazer benefícios tanto setoriais quan-
to sociais, pois promoverá uma política de educação com a possibilidade de unificar duas modalida-
des importantíssimas para esse novo público da EJA, a educação básica e a educação profissional.

É, portanto, fundamental que uma política pública estável voltada para a EJA
contemple a elevação da escolaridade com profissionalização no sentido de contri-
buir para a integração sociolaboral desse grande contingente de cidadãos cercea-
dos do direito de concluir a educação básica e de ter acesso a uma formação profis-
sional de qualidade (BRASIL, 2007).

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Neste estudo, dos programas implementados pelo governo com esse fim, terá destaque o Pro-
grama Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de
Educação de Jovens e Adultos - PROEJA27 por ter apresentado em seu documento Base (BRASIL,
2007) a proposta de uma educação inovadora, capaz de garantir a oferta de um ensino básico de
qualidade atrelado à formação profissional que permitirá uma mudança na perspectiva de vida de
seus alunos; a compreensão das relações que se estabelecem no mundo do qual eles fazem parte, a
ampliação de sua leitura de mundo e a participação efetiva nos processos sociais. Enfim, uma forma-
ção ampla, que respeite e dialogue com os saberes do aluno trabalhador e que propicie o acesso a
serviços e bens culturais que até hoje lhe foram negados (BRASIL, 2007).
Sendo assim, busquei refletir a respeito do PROEJA, no sentido de entender se este programa
atua com uma ideia de formação para além das perspectivas de capital humano. Ou seja, atrelado a
noção de ensino integrado que ofereça profissionalização e formação de forma emancipadora. Para
tanto, tomei como referência as experiências que vem sendo implantadas no Instituto Federal do
Rio de Janeiro - IFRJ situado no Maracanã.

2. por UmA escolA prodUtiVA: A edUcAção como meio de libertAção


Se em seus primórdios, década de 1960, a teoria do Capital Humano foi discutida e divulgada de
forma positiva, incumbindo à educação a tarefa de impulsionar o desenvolvimento econômico de
um país, de maneira que os fracos investimentos na mesma eram vistos como causa das disparida-
des econômicas entre as nações e das diferenças individuais entre seus cidadãos, atualmente essa
teoria vem sofrendo severas críticas de estudiosos da economia da educação que buscam evidenciar
que a mesma mascara a subordinação da educação ao desenvolvimento econômico, colocando-a a
serviço do capital.
Tudo isso, tendo em vista que a qualificação da força de trabalho incrementa a produção de mais–
valia, exploração da força de trabalho. Fato que de certa forma, acaba sendo agravado por uma que
foi e continua sendo, a característica mais marcante dos cursos de qualificação profissional: o reforço
à tendência tecnicista que enfatiza conteúdos descontextualizados do social, o que faz com que
muitos trabalhadores não consigam compreender os mecanismos do sistema de produção capita-
lista.
Defendida ainda hoje por inúmeras empresas e setores educacionais de nível técnico e profissio-
nal, essa teoria assinala que um maior investimento social e individual em educação representaria
uma maior ascensão social, atrelada a um potencial desenvolvimento econômico, que por sua vez,
geraria frutos que, posteriormente, seriam compartilhados por todos, mediante uma melhor distri-
buição de renda e benefícios sociais. Esse lema emblemático atingiu seu auge na América Latina por
volta dos anos 1970, quando os governos militares impuseram reformas educacionais que desca-
racterizaram o ensino básico, o que acentuou ainda mais o caráter dual da educação brasileira. Anos
se passaram desde que essa teoria penetrou os principais governos latinos, porém poucos foram os
benefícios observados na esfera social.
Estaria a Teoria do Capital Humano escondendo seu lado mais perverso? Sobre o assunto, Gau-
dêncio Frigotto (1999, p.17), um dos maiores estudiosos do tema, nos diz que “a teoria do Capital
Humano evade e esconde as relações capitalistas efetivas de produção, cuja lógica é, ao mesmo
tempo de acumulação, concentração e exclusão”.

27 Portaria Ministerial n° 2.080 de 13 de julho de 2005, seguida do Decreto n° 5.478 de 24 de junho de 2005, cria um programa
federal dispondo sobre a oferta de cursos de educação profissional com a EJA, o PROEJA. Este é revogado pelo Decreto n° 5.840 de 13
de julho de 2006, que dispõe sobre “a adoção dos cursos em sistemas estaduais, municipais e entidades nacionais de serviço social
(...) possibilitando também a articulação dos cursos de formação inicial e continuada de trabalhadores com ensino fundamental na
modalidade EJA”. Determina também a carga horária mínima para os cursos previstos, obriga as instituições federais de educação
tecnológica a implantarem cursos e programas regulares e à elaboração de um projeto pedagógico para EJA (BRASIL, 2012, p. 24).

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Frigotto defende que os direitos básicos como emprego, renda mínima, saúde e educação, exa-
tamente por serem direitos, não podem estar subordinados à esfera privada do mercado, pois esse
se mostrou historicamente incapaz de regular diretos. É essa postulação de Gaudêncio Frigotto que
deve nos colocar em uma posição de cautela frente às imposições que o mercado de trabalho tem
colocado nos últimos anos.

3. o trAbAlho enqUAnto dimensão hUmAnA


Ao propiciar a transcendência da condição natural do homem, o trabalho o faz diferente de qual-
quer outro animal. E, por isso, histórico, sendo capaz de compreender sua própria condição e supe-
rá-la. Porém, imerso aos ditames do capital, o homem deixou escapar aos poucos a essência do que
permitiu seu potencial crescimento, tornando-se um ser alienado. A competência técnica já não é o
bastante para possuir o objeto final de sua criação. Sem acesso aos meios de produção e instrumen-
tos de trabalho, o homem perdeu sua liberdade vendendo-se ao capitalismo para obter as mínimas
condições de sobrevivência. Vejamos o que pensam as estudiosas Asbahr e Sanches (2013, p. 37)
sobre o assunto:

O trabalhador não participa mais do processo total do trabalho, ficando restrito a


uma minúscula ação que deve ser sempre repetida. Não é mais o homem que dirige
a máquina (os instrumentos de trabalho de forma geral), mas a máquina que dirige
o homem controla suas ações, seu tempo e ritmo de trabalho. O trabalho morto,
incorporado na maquinaria, passa a dirigir o trabalho vivo, desqualifica o trabalha-
dor, faz com ele perca sua condição de sujeito. O assalariado torna-se apenas um
complemento da máquina e pode ser facilmente substituído [...].

Desse modo, a força de trabalho se transforma em mercadoria, de maneira que o trabalhador


acaba produzindo bem mais do que pelo qual recebe28. O operário é, assim, expropriado do tempo
que poderia destinar ao estudo, à família e ao lazer. Seus dias estão entregues ao lucro do capital e
a visão que ele tem de tudo isso é de completa naturalização do sistema. Assim, a culpa por não ter
um bom emprego é individual. Não há a percepção de que a sociedade capitalista utiliza-se de me-
canismos de controle que tornam o homem totalmente dependente dela, fazendo-o acreditar que
vive numa sociedade justa onde o sucesso profissional é uma conquista pessoal.
Daí a importância de se discutir a dinâmica do capital quando o assunto é a busca de uma for-
mação humanizada. Afinal, a escola destinada os trabalhadores e seus filhos não escapa dos meca-
nismos controladores do capital. Pelo contrário, ele a subordina política e ideologicamente. Desse
modo, por ser uma instituição controlada pelo Estado, a escola está fundamentada em uma socie-
dade de classes e, por isso mesmo que involuntariamente contribui para a vigência e reprodução
dessas relações.
Por ser a educação um ato político, como bem disse Paulo Freire, a mesma não é nem poderá
estar fadada a neutralidade. Pelo contrário, as concepções que nós, enquanto educadores temos do
que seja educação, são decisivas para a manutenção ou reversão desse quadro.

4. proejA: Um resgAte Ao cAráter hUmAno dA edUcAção


O PROEJA parece, ao menos legalmente, ter surgido com o objetivo de resgatar o sentido hu-
28 [...] o trabalhador produz além do que é necessário para reproduzir sua força de trabalho,
ou seja, ele produz mais-valia. Essa mais-valia é apropriada pelo capitalista, constituindo sua fonte
de riqueza. Ao comprar a força de trabalho, o capitalista está adquirindo o elemento criador de
valor, que lhe permite ampliar seu capital [...] (ASBAHR, SANCHES, 2013, p.39)

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
mano do ato de educar. Tudo isso com o intuito de oferecer um ensino de base emancipatória a
um público que no interior das relações capitalistas são os mais expropriados das riquezas e bens
materiais e simbólicos.
É por isso que pensar criticamente a relação da educação com o poder econômico, político e
social é tão imprescindível. No intuito de revelar as complexas relações existentes entre as políticas
públicas, o ensino e os discursos que circundam o campo educacional. Sabemos que muitas das
orientações que constituem o documento Base do PROEJA não saíram das páginas impressas, mas
em contrapartida não podemos decretar seu falecimento sem antes investigarmos se é possível
colocá-las em prática.
Pensar EJA é pensar antes de tudo em seu sujeito que vive pelo e para o trabalho. Dessa forma, o
papel dessa modalidade de ensino deve ser o de recuperar a relação entre conhecimento e prática
do trabalho. Vale assim considerar o que disse Frigotto, Ciavatta e Ramos (2012, p. 35-36) sobre a
escola que se espelha no sentido real do trabalho:

Deve ter como horizonte propiciar aos alunos o domínio dos fundamentos das
técnicas diversificadas utilizadas na produção, e não o mero adestramento em téc-
nicas produtivas(...). Portanto, o ideário da politecnia buscava e busca romper com
a dicotomia entre educação básica e técnica, resgatando o princípio da formação
humana em sua totalidade; em termos epistemológicos e pedagógicos, esse ideário
defendia um ensino que integrasse ciência e cultura, humanismo e tecnologia, vi-
sando ao desenvolvimento de todas as potencias humanas. Por essa perspectiva, o
objetivo profissionalizante não teria fim em si mesmo nem se pautaria pelos interes-
ses do mercado, mas constituir-se-ia numa possibilidade a mais para os estudantes
na construção de seus projetos de vida, socialmente determinados, possibilitados
por uma formação ampla e integral.

Partindo dessa concepção - que não vem de hoje, porém, que parece ter voltado aos debates
educacionais com a promulgação do Decreto que instituiu o PROEJA, que reitero a necessidade de
superarmos a oferta fragmentada e em certo ponto descontínua de formação profissional que pre-
senciamos atualmente. Mais do que um diploma nas mãos, o que os trabalhadores merecem é uma
formação profissional que se faça humana em sua essência e emancipadora em seu sentido mais
amplo.
É desumano ainda conceber a EJA desconectada de qualquer movimento que vá de encontro ao
mundo do trabalho, ao contexto social e econômicos para os quais esses sujeitos estarão sendo des-
tinados. É inadmissível traçarmos metas para esse público sem contextualizá-las com o seu universo
particular, sem abrir-se para um ensino mais libertador, comprometido e conscientizador.

5.A experiênciA do proejA no ifrj–mArAcAnã: os relAtos de qUem


ViVencioU o progrAmA.
A metodologia utilizada no presente trabalho procurou coletar relatos dos principais atores en-
volvidos no curso Manutenção e Suporte em informática ofertado na modalidade PROEJA pelo Ins-
tituto Federal do Rio de Janeiro – Maracanã. Para tanto, foi elaborado um questionário que procurou
vivenciar, partindo dos relatos coletados, um pouco da experiência de oito anos dessa instituição
com a oferta de um ensino voltado à EJA. Partiu-se assim, de uma visita à instituição, em que foi
possível conhecer os laboratórios e espaço físico onde o curso é ministrado bem como, dialogar de
perto com alguns sujeitos envolvidos no programa.

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Assim sendo, a parte metodológica desse trabalho baseou-se nas respostas dadas às perguntas
elaboradas, procurando partir das mesmas para suscitar uma reflexão sobre o programa. Foram en-
trevistados: a diretora de ensino do instituto, a coordenadora do curso PROEJA e também professora
de matemática no programa, o professor de informática dessa modalidade, três atuais alunos do
programa e um ex-aluno. Cabe ressaltar, que a procura por ex-alunos foi sem dúvida o ponto mais
difícil dessa pesquisa, onde contei, sobretudo, com a colaboração da coordenadora do curso.
Durante as entrevistas, coletadas em áudio, procurou-se travar um diálogo descontraído onde os
atores envolvidos ficaram à vontade para recusar responder alguma pergunta, bem como acrescen-
tar outras colocações. Procurei para tanto, valer-me do anonimato nas identificações que farei nesse
texto a fim de não expor nenhum dos envolvidos na entrevista, que ressalto mais uma vez, apenas
serviram de embasamento para refletirmos o que vem sendo o PROEJA no discurso e na prática.
Em suma a entrevista com alunos e professores foi muito proveitosa, porém sua descrição na
íntegra não será possível nesse trabalho, haja vista, seu extenso conteúdo. Por essa razão, escolhi
a que em minha opinião melhor representa o conteúdo como um todo, a entrevista com um aluno
recém-formado pelo programa: Ricardo de 25 anos. A turma de Ricardo formou na data de previsão
do término do curso apenas 5 dos 30 alunos que ingressaram com ele. Vejamos o que ele tem a nos
dizer sobre essa experiência.
Perguntei se ele se sente preparado para o mercado de trabalho. Ele me respondeu que sim. O
curso me deu uma boa formação, mas além da boa formação é preciso estudar ter interesse em ler
livros e tentar aprender por fora. Tem que se esforçar’’.
Sobre as maiores contribuições do curso para sua formação profissional, respondeu que “além do
nome da instituição, o IFRJ tem mesmo um nome muito bom. O curso preparou bem os alunos. O
conhecimento técnico na área foi muito bem abordado”. Sobre o acesso aos laboratórios da institui-
ção, disse que tiveram acesso somente após o terceiro período. “Não tinha laboratório no começo
do curso. Não foi aquela maravilha, mas dava pra usar”.
Perguntei ao ex-aluno se ele se considerava consciente de seus direitos e deveres na sociedade, e
disse que o curso lhe ajudou muito. Quando entrou no PROEJA, pensava de uma maneira diferente
e que ao sair mudou sua forma de pensar. Ricardo falou sobre os importantes auxílios que o curso
lhe deu para compreender melhor o mercado e suas oportunidades. Questionado se valeu a pena
ter ingressado no curso, ele me disse que: “valeu a pena na parte técnica e regular. Por ser um curso
de PROEJA, com parte regular e técnica pude relembrar matérias que não via há tempos”.
Ricardo resolveu fazer um outro curso técnico após terminar o curso de PROEJA. “Inicialmente
queria apenas o diploma, mas depois senti a vontade de continuar estudando, pois o mercado preci-
sa de qualificação. Com dois cursos técnicos estarei melhor preparado para conseguir um emprego”.
Sobre como os professores lidavam com os conhecimentos prévios dos alunos, disse que “os
professores não chegavam a pedir ajuda dos alunos que detinham um conhecimento maior em in-
formática, eles próprios ajudavam os alunos que tinham dificuldade se auto- oferecendo”.
Sobre se as questões atuais eram abordadas em sala de aula e se ele se sentiu durante o curso
aluno de uma instituição federal, respondeu: “os professores discutiam mais sobre a matéria em si
e não debatiam muito sobre temas atuais. Raramente discutiam sobre temas do cotidiano. Quando
aconteciam, normalmente eram os alunos que traziam alguma notícia”.
Ricardo assim como uma outra aluna, disse que o conteúdo não era tão forte como o do ensino
regular, mas ressaltou a todo o momento a importância de buscar em outros meios uma melhor
formação. O interessante é perceber como Ricardo atribui em seu discurso o papel do aluno na con-
quista da aprendizagem. Para ele o curso só trará os efeitos esperados se os alunos se dedicarem e
buscarem por outros meios os conhecimentos que, por algum motivo, não foram transmitidos em
sala.

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
considerAções possíVeis Até o momento
As reflexões trazidas neste estudo não pretendem e nem poderiam resultar em uma visão fi-
nal do fenômeno PROEJA. Muito há que ser estudado antes que possamos traçar uma opinião sobre
se é ou não possível, dentro do panorama atual, oferecer um ensino profissional, de fato emancipa-
dor, aos jovens e adultos.
Assim, diante do questionamento proposto no início desse trabalho: será mesmo possível ultra-
passar a teoria do capital humano em educação valendo-se para tanto do PROEJA, como prega o
documento base de tal programa? Acredito ser cedo demais para responder. Diferentemente de ou-
tras políticas públicas, as que dizem respeito à esfera da educação não são passíveis de apreciações
imediatas, o que fazem dos oito anos de experiências vividas no PROEJA do IFRJ – Maracanã – pouco
tempo para concluirmos se esse programa tem resultado em mais pontos positivos ou negativos.
Muitos hão de considerar que um curso que chega ao final de um ciclo com apenas cinco alunos
formados está fadado ao fracasso, porém se levarmos em conta o depoimento de um de seus ex-
-alunos, teremos que convir que mesmo que seja para poucos, esse programa foi capaz de suscitar
expectativas e conhecimentos que antes não faziam parte da vida desses sujeitos.
Dessa forma, antes de tomar partido, defendo ser preciso rever a forma de implementação desse
programa, pois como pude abstrair através dos depoimentos coletados e leituras de artigos sobre o
tema, o PROEJA falha tanto no âmbito da certificação quanto no âmbito da emancipação.
Falha na certificação, pois tem formado menos da metade dos ingressantes no curso, como po-
demos analisar por entrevista dada pela própria reitoria da IFRJ ao jornal O Globo, em março de
2013, em que a mesma afirma que a evasão média do PROEJA no estado é de 50%, admitindo que
a evasão é um dos problemas mais graves enfrentados no PROEJA. Segundo os gestores do curso,
a instituição não coleta os dados sobre as razões dessa evasão. Mas os depoimentos coletados de
professores e alunos direcionam para a seguinte justificativa: dentre os principais fatores estariam
o cansaço, a distância, o longo tempo fora da sala de aula e os problemas familiares.
Tais fatores são vistos pelos gestores escolares como sendo a explicação para a diminuição nas
matrículas na EJA constatada pelo Censo 2012 . Algo controverso, pois como também vimos no
começo desse trabalho no Brasil, 56,2 milhões de  pessoas com mais de 18 anos não frequentam a
escola e não têm o ensino fundamental completo (Pnad/IBGE 2011).
Contingente que configura-se como uma potencial clientela a ser atendida pela EJA. Tanto que a
meta 10 do Plano Nacional de Educação ao contemplar o PROEJA planeja oferecer no mínimo vinte
e cinco por cento das matrículas de Educação de Jovens e Adultos na forma integrada à Educação
Profissional nos anos finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio. Esse acúmulo de 25% das
matrículas representará até 2020 o quantitativo previsto de 950 mil matrículas de PROEJA. Resta
saber, no entanto, caso realmente sejam ofertadas essas vagas, se as mesmas serão ocupadas e,
caso ocupadas, se haverá permanência nos cursos a ponto de gerar um quantitativo louvável de
concluintes.
Na prática, os índices de concorrência aos cursos PROEJA tem se mostrado baixos. Ao anali-
sar os últimos processos seletivos de ingresso aos cursos PROEJA, pude verificar o grande número
de reclassificações na tentativa de completar turmas, informação também passada pela diretora de
ensino do IFRJ- Maracanã. Ao que parece, o fato da EJA ser ofertada de forma atrelada a um curso
profissional, não foi e não será suficiente para que possamos manter nossos jovens e adultos nas
escolas, a menos que essa forma de pensar e ofertar EJA sejam revistas.
Sem dúvida alguma, o PROEJA deve ser considerado uma conquista no plano da EJA, pois depois
de anos fora da escola, os excluídos conseguiram adentrar nas concorridas Instituições Federais. Essa
conquista representa muito para a classe trabalhadora que reconhece o peso dessas instituições na
hora de conseguir um bom emprego. Mas, novamente ressalto, não é suficiente para manter esses

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
jovens e adultos nas salas de aula. Compreender as efetivas razões, além das que a experiência nos
permite atribuir, para o alto número de evasão na EJA e, consequentemente no PROEJA, é condição
primordial para o sucesso da EJA, afinal até quando o governo decidirá manter programas com tão
baixo índice de concluintes.

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739
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
representAções sobre energiA por pArte dos AlUnos
dA edUcAção de joVens e AdUltos
fernAndA tonetto sUrmAs | mAriA AUxiliAdorA delgAdo mAchAdo

Fernanda Tonetto Surmas fernandaconsensotonetto@gmail.com São apresentados, aqui, os


resultados iniciais da pesquisa de mestrado em Educação de Ciências, nomeada “Representações
sobre Energia por parte dos alunos da Educação de Jovens e Adultos - EJA”. De início a investigação
teve por propósito fazer um diagnóstico a respeito das trajetórias de vida de alunos da EJA, do Co-
légio São Vicente de Paulo do Rio de Janeiro, para que a partir destas respostas pudessem ser traça-
das estratégias para a pesquisa, de modo a nomear diferentes representações da realidade destes
alunos diante do conceito de energia. No segundo momento, para conhecer mais sobre o que os
alunos pensam, foi elaborada mais uma atividade. A imagem vem sendo há tempo um recurso de
pesquisa qualitativa, foram recolhidos, desenhos exploratórios, que na qual registraram suas repre-
sentações a respeito de energia. Através destes materiais um questionário será elaborado para as
discussões durante um Grupo Focal. As práticas de ensino não condizem com as representações da
realidade da EJA. Prova disto é uma atividade comum praticada, presente nos livros que consiste na
utilização de uma conta de luz. Como realizar esta prática para uma realidade que se quer tem a rede
regularizada? Que sentido tem o conceito de energia para os alunos da EJA? Quais são os demais
momentos em que a energia tem relevância no cotidiano dos alunos da EJA? As Teorias de Paulo
Freire constituirão o referencial teórico. Os resultados obtidos no Grupo Focal serão investigados
com o software Atlas TI, de acordo com a Análise de Conteúdo. Espera-se desmistificar o conceito
de energia, aproximando o aluno da EJA da ciência.

palavras-chave: Eja, energia, Representação

introdUção
O tema energia é um campo científico trabalhado com grande intensidade nos dias atuais. As
propostas de práticas presentes nos poucos materiais didáticos disponíveis na maioria das vezes
não condizem com as percepções dos mesmos.
Segundo Paulo Freire, o conceito de Educação de Jovens e Adultos vai caminhando na direção da
educação popular no momento em que a realidade começa a fazer algumas exigências ao trabalho
docente.
Os últimos anos de consolidação da EJA vêm acompanhados de um grande avanço e crescimen-
to dos conhecimentos e análise deste segmento, na perspectiva histórica e política no Brasil. A ex-
periência que se vivencia em alguns colégios mostra que as turmas da EJA têm composição muito
mais heterogênea do que as turmas do ensino regular. Os alunos têm em geral histórias de vida
muito mais diversas. Não é raro, além disso, que estes alunos tenham baixa autoestima. A interrup-
ção da educação leva a uma diminuição de oportunidades no mercado de trabalho e uma espécie
de passividade em relação aos acontecimentos do presente e conformidade em relação ao futuro.
Não raro também, o motivo para voltar a estudar está ligado a uma exigência do mercado (e não à
pró-atividade do aluno). A principal motivação para estudar se transforma de uma mera exigência
do mercado a um desafio relacionado à realização pessoal.
Desta forma, mais do que somente uma questão curricular, o ensino na EJA trata da recuperação
da autoestima e do senso crítico dos alunos. A percepção é um dos conhecimentos mais antigos
dos processos cognitivos compreendidos. A percepção do mundo é diferente para cada um de nós,

740
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
verifica-se então, que para cada aluno da EJA tem-se um objeto ou um momento, de acordo com os
aspectos especiais que tem relevância para eles.
Um aporte teórico deste trabalho foi Paulo Freire, que foi um grande educador e maior dissemina-
dor brasileiro da EJA, por acreditar que suas ideias ainda são preponderantes nos dias atuais. Paulo
Freire, mostra em sua obra a sua vontade de uma educação para a mudança e que não é possível
fazer uma reflexão sobre o que é educação sem refletir sobre o próprio homem. Portanto, o objetivo
principal deste trabalho é identificar as percepções sobre energia na EJA, num recorte em especial
do ensino médio do CSVP e investigar como estas percepções estão imbuídas, atreladas ou mistura-
das nas histórias de vida deles.

histórico dA edUcAção de joVens e AdUltos


Segundo a lei Lei n. 9.394/96, conforme regulamenta o Art. 37 da Lei de Diretrizes e Bases da Edu-
cação Nacional (LDB) é direito de todo cidadão adulto ter aprendizagem ao longo da vida, que impli-
ca em uma educação que vá além da educação formal, que proporcione o exercício de cidadania e
autonomia através da leitura e escrita. Faz-se necessário nesta pesquisa buscar elementos históricos
essenciais da educação brasileira de jovens e adultos. Assim, apresenta-se aqui, algumas situações e
ações políticas que tentaram melhorar na história, o que hoje chama-se de EJA.
O direito à educação foi registrado nos artigos 35 e 72 da Constituição de 1891. Antes disto, o
letramento era um ato de caridade às pessoas menos abastadas. Em 1915 foi criada a Liga Contra
o Analfabetismo. Na década de 20, junto com uma grande mudança econômica, foram surgindo,
como por exemplo: a Escola Nova, também chamada como Escola Ativa ou Progressista. Em 1934,
foi criado o Plano Nacional de Educação. Em 1942 foi implementado o supletivo para adolescentes.
Nesta época, o método pedagógico já era discutido, pois preocupava-se com o contexto e a histó-
ria de vida deles. Em 1952 a Campanha Nacional de Educação Rural (CNER). Na tentativa de educar
conforme a realidade de cada município e de acabar com tamanho preconceito sobre as pessoas
analfabetas, o Brasil começou em 1958 a conhecer um dos seus maiores pedagogos, Paulo Freire.
A partir da década de 60, vários movimentos sociais foram criados. Todos esses programas, ti-
veram a influência da pedagogia freiriana que fizeram a diferença no trabalho docente de muitos
educadores da época. Ainda na década de 60, Paulo Freire foi chamado para assumir a coordenação
nacional do Plano Nacional de Alfabetização, mas devido ao golpe militar toda essa iniciativa em tor-
no da cultura popular e da educação popular foi interrompida. Paulo Freire já exilado no Chile con-
clui o seu livro Educação como Prática da Liberdade. Com o Golpe Militar em 1964, o governo criou
o Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL) com o objetivo de promover uma alfabetização
sem contextualização ou o mínimo de criticidade. Logo, surge em 1985, a Fundação Educar, ela foi
vinculada ao Ministério da Educação. Desde então inúmeras práticas de ensino e metodologias para
a EJA foram surgindo. Em 1990, pode-se destacar o Movimento de Alfabetização (MOVA), que procu-
rava alfabetizar a partir da realidade dos alunos. No ano de 1996, surge o Programa de Alfabetização
Solidária (PAS) do Governo Federal, muito similar as campanhas das décadas de 40 e 50. O programa
tinha como slogan, “Adote um Analfabeto”, reforçando a ideia de que pessoas analfabetas eram in-
capazes e de qualquer pessoa poderia lecionar. Para atender as pessoas de áreas de assentamento
criou-se o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA). Com meta de erradicar o
analfabetismo, em 2003, o governo federal elaborou um programa que visava o trabalho voluntário,
conhecido por Programa Brasil Alfabetizado.
Em 2004 foi criada a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD).
Com o Programa Fazendo Escola em 2005, maiores recursos financeiros aos governos estaduais e
municipais foram enviados para ampliação da oferta de vagas no ensino fundamental da EJA insti-
tuindo-se o Programa Nacional de Inclusão de Jovens e o Programa Saberes da Terra (PROJOVEM).
Ainda em 2005, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), viu

741
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
a necessidade da implantação de um Exame de Qualificação para estes alunos, lançou-se então, o
Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (ENCCEJA).
Como o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Pro-
fissionais da Educação (FUNDEB), nasceu o Programa Nacional de Integração da Educação Profis-
sional (PROEJA) com a educação básica na modalidade EJA. Desde 2007, houveram avanços na EJA
através de Fóruns, Conferências Nacionais e Internacionais como a Conferência Internacional de
Educação de Adultos (CONFINTEA). Ela teve como objetivos: manifestar a importância da aprendiza-
gem de jovens e adultos e conceber compromissos regionais numa perspectiva de educação ao lon-
go da vida que visasse facilitar a participação de todos no desenvolvimento sustentável e equitativo,
de promover uma cultura de paz baseada na liberdade, justiça e respeito mútuo e de construir uma
relação sinérgica entre educação formal e não-formal. Os quatro pilares educativos propostos foram
– aprender a ser, aprender a conhecer, aprender a fazer e aprender a conviver – constituem fatores
estratégicos e específicos para a formação dos cidadãos da EJA. Retira-se o maior proveito possível
destes marcos históricos para construir a EJA de maneira reparadora, equalizadora e qualificadora.

conVersAndo sobre energiA


A história da energia inicia-se na pré-história quando os homens descobriram as utilidades do
fogo. Logo, usaria a energia para aquecer-se, cozinhar seus alimentos, utilizaria os animais para re-
alização de trabalho, etc. Entretanto, a grande referência na utilização da energia foi no século XVIII
com a criação da máquina a vapor que deu início a era da Revolução Industrial na Europa. Por volta
da metade do século XIX inicia-se a utilização das outras fontes de energia como petróleo e eletri-
cidade. Historicamente, no ensino de física existe um grande número de pesquisas que analisam
as percepções sobre energia dos alunos de ensino médio regular, pois não é de hoje que leva-se
em consideração o alto grau de abstração deste tema. segundo feynman (2008), é importante
perceber que na física atual, não temos conhecimento do que é a energia, mas a energia tem
muitas formas e para cada uma delas uma fórmula é utilizada. Existe uma lei que governa to-
dos os fenômenos naturais que são conhecidos até hoje. A lei é chamada de conservação da
energia. A física estuda os fenômenos da natureza. O termo energia deriva do grego “ergos” que
significa trabalho.
Sabe-se que trabalhar o tema energia não é nada simples, pois apesar de termos a percepção do
que é energia, este conceito não é unicamente definido. No ensino de ciências a energia é um dos
conceitos científicos mais abstratos a ser trabalhado. Com o passar dos anos, a temática energia ga-
nha maior abrangência e importância. É praticamente o único tema gerador em comum de proble-
matizações e contextualizações entre as disciplinas de física, química e biologia. Neste caso, pode-se
afirmar que a partir deste tema possa-se construir um trabalho verdadeiramente interdisciplinar.
Nosso país tem elevado potencial para obter energia usando a biomassa. A produção do petróleo
e gás natural vem aumentando gradualmente. O que falta para atingir a autossuficiência energéti-
ca? Essas discussões estão cada vez mais presentes em provas ou exames nacionais para alunos do
ensino médio. No período de 2004 até 2008 foram identificadas 45 questões envolvendo o tema
de energia. Tal dado, torna-se evidente a utilização de questões problematizadoras utilizando este
tema.
Numa visão propedêutica do ensino de física para o ensino médio no Brasil, tem-se um enfoque
muito visado ainda na matemática e no tema em busca de resultados imediatos e de alunos bem
capacitados. Isto não condiz com a realidade de nossas escolas públicas. A educação científica é tra-
balhada de maneira engessada. Não prioriza o que cada aluno pensa ou se manifesta por exemplo
ao falar-se de energia. Situações de diálogos, pequenos experimentos, apresentações orais ou
em trabalhos escritos nas salas de aulas mostram os contextos das vidas dos alunos da ejA e
exemplificam como é o diálogo na vida real entre esta tríade tão importante: Ciência, Tecno-

742
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
logia e Sociedade (CTS), prova-se assim, uma educação científica que já existe e não é traba-
lhada diante de suas percepções. No âmbito do CTS tem-se algumas fontes de energia citadas
pelos alunos constantemente e que tem pertinência na prova do ENEM: sol, vento, rios, marés, calor
e ondas. Nota-se visivelmente que somente oferecer a modalidade de EJA não é o suficiente para
os alunos que sonham em ingressar numa universidade. É preciso repensar em políticas públicas e
pedagógicas para que se tenha progresso. Existe a necessidade de discutir currículo para tal êxito,
mas com uma linguagem adulta e instigante, pois a sua história está entrelaçada com a sua infância,
passagem para a vida adulta, busca pela independência e satisfação pessoal. Então, quais são os
seus saberes e fazeres a conhecer, ou melhor, quais são suas percepções?
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) e o ENEM propõem o estudo do tema de ener-
gia praticamente em todo processo educacional. Para os PCNs, o maior objetivo do ensino de
ciências é que o aluno desenvolva a capacidade de aplicar conceitos científicos básicos, associados
a energia.

Aporte teórico-metodológico
A metodologia proporciona o caminho e o instrumental próprios de abordagem da realidade e
segundo Minayo (1992, p.22) “ocupa o lugar central no interior das teorias sociais, pois ela faz parte
intrínseca da visão social do mundo veiculada na teoria.” O trabalho dessa pesquisa está centrado
na plataforma do educador Paulo Freire que entre muitas coisas nos diz que o aprendizado do alu-
nos será intensificado na medida que os alunos participarem do processo educacional de forma a
“construir significados” e isso só será possível quando houver uma interação entre o que está sendo
dito e os conhecimentos anteriormente estruturados, internalizados pelo sujeito, pois “a percepção
da percepção anterior e o conhecimento do conhecimento anterior, a descodificação, desta forma,
promove o surgimento de nova percepção e o desenvolvimento de novo conhecimento” (Freire,
2003, p.110), pois “o saber tem historicidade. Nunca é, está sempre sendo” (Freire, 2003, p.18).

Um poUco sobre o conceito de percepções


A percepção começou a ser estudada no século XIX. O processo da percepção é construtivo e hi-
potético. O léxico de percepção vem do latim perceptio e está relacionado ao efeito de perceber ou
fazer uma nova leitura através de um dos sentidos, de algum desenho, de impressões ou sensações.
A percepção pode fazer referência a um conhecimento, a uma ideia conforme esta pesquisa em an-
damento. Por ela pode-se formar a ideia sobre algo.
Por Paulo Freire entende-se que a humanização do sujeito se dá quando ele ultrapassa a barreira
que o distancia da consciência ingênua para atingir a sua consciência crítica, De acordo com Freire
(1983) a consciência ingênua revela uma certa simplicidade, tendente a um simplismo na interpre-
tação dos problemas, isto é, encara um desafio de maneira simplista ou com simplicidade. Não se
aprofunda na causalidade do próprio fato. Suas conclusões são apressadas, superficiais.
Em resumo, “daí, a necessidade que tem o homem de contínua coexistência do “viver a realidade”
com o “distanciar-se dela para refleti-la”, a fim de que possa, realmente, assumir seu compromisso,
isto é, a consciência crítica” (FREIRE, 1983). Estes alunos a utilizam desenfreadamente e não tem no-
ção alguma de onde a energia vem, para onde vai, o quanto custa, como se produz, como ela chega
até suas casas. Pode-se apresentar através das percepções dos alunos da EJA uma ausência e/ou exi-
bir uma presença, do tema energia em suas vidas. Sempre que se lê, se escreve, fala ou escuta-se, isto
é, produz-se um determinado texto, oral ou escrito. Desperta-se no interior do nosso inconsciente,
algumas percepções sobre a produção de um determinado conhecimento ou tema. As percepções
podem influenciar muitas das características desses conhecimentos.
O conceito de energia, pode contribuir para que o aluno confronte suas percepções com os co-

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
nhecimentos científicos. Verifica-se a necessidade do aluno de compreender que não existe apenas
um tipo de energia, mas que ele está envolto em diversas energias. É importante que os alunos per-
cebam que a energia está presente em vários cenários, como: pessoal, ambiental, nacional, escolar
e residencial. Freire (2002) corrobora:

Há uma incompatibilidade total entre o mundo humano da fala, da percepção,


da inteligibilidade, da comunicabilidade, da ação, da observação, da comparação,
da verificação, da busca, da escolha, da decisão, da ruptura, da ética e da possibili-
dade de sua transgressão e a neutralidade não importa de quê. (p.69)

procedimentos de Análise
O encaminhamento metodológico percorre o campo da análise de conteúdo, tomando por base
referencial a literatura de Bardin (2009). Na interpretação da autora a análise de conteúdo, enquanto
método torna-se um conjunto de técnicas de análise das comunicações que utiliza procedimentos
sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens.
Para uma aplicabilidade coerente do método, de acordo com os pressupostos de uma interpreta-
ção das mensagens e dos enunciados, a Análise de Conteúdo deve ter como ponto de partida uma
organização, que, conforme Bardin (2009) se constitui em três fases fundamentais: a pré-análise,
exploração do material e tratamento dos resultados. Na primeira fase é estabelecido um esquema
de trabalho que deve ser preciso, com procedimentos bem definidos, embora flexíveis. A segunda
fase consiste no cumprimento das decisões tomadas anteriormente, e finalmente na terceira etapa,
o pesquisador apoiado nos resultados brutos procura torná-los significativos e válidos.
Num primeiro momento, segundo o referencial adotado aqui, denominado por pré-análise, foi
realizada uma leitura flutuante das entrevistas realizadas com os sujeitos da pesquisa e uma poste-
rior escolha dos documentos, na busca da constituição de um corpus para pesquisa. Concretizando
essa etapa, se procederá à exploração do material, que no caso é a fala dos alunos.

ApresentAndo os dAdos
A seguir apresenta-se de forma bruta, alguns elementos que emergem das histórias de vida dos
estudantes, bem como suas percepções de energia em um estudo exploratório realizado no iní-
cio dessa pesquisa cujo objetivo era indicar a potencialidade das respostas obtidas via questões
abertas, desenhos sobre energia e explicações sobre os desenhos. Lembrando-se que o curso de
ensino médio do CSVP tem duração de dois anos e possui uma divisão em quatro módulos, na qual
aproximam-se com a estrutura curricular do ensino médio regular, salvo algumas particularidades.
• Primeira Atividade
A primeira atividade foi constituída de cinco perguntas abertas. Para tentar explicitar as respostas
obtidas pelos 29 alunos do ensino médio foi elaborada uma tabela. Na tabela encontram-se duas
colunas. A coluna do lado esquerdo apresenta as questões referente a um breve histórico escolar
destes alunos e a coluna do lado direito traz o número de alunos correspondente as respostas ad-
quiridas.
Na Tabela 1 são apresentadas as respostas referentes aos 29 alunos do primeiro módulo.

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
tAbelA 1 – respostAs referentes Aos AlUnos do primeiro módUlo.

13 - Há poucos anos (Entre 2008 - 2014)


Quando você
13 - Há muitos anos (Mais de 10 anos afastado da escola)
saiu da escola?
03 - Não sai da escola (Está dando continuidade)
02 – Motivos de Saúde
04 – Constituir Família
04 – Trabalhar (Ter renda própria)
02 – Morar no RJ
01 – Família tirou da escola
02 - Não tinha interesse
04 - Ajudar a família
Por que você
saiu da escola? 01 – Vários fatores
02 – Não saiu, deu continuidade em outra escola
02 – Não gostava dos professores / Professo-
res não se importavam com os alunos
01 – Não havia Ensino Médio próximo
01 – Problemas Familiares
02 – Reprovação
01 – Não havia tempo para estudar
01-Com muitos amigos
04 – Muito Bagunçada
04 - Maravilhosa
02 - Faltava o básico / Professores com boa vontade
01 - Bom ensino
05 – Boa
01 – O aluno respondeu o nome da sua última escola
01 – Marginalizada, tráfico de drogas e prostituição.
Que escola
você deixou? 01 - Não saiu, deu continuidade em outra escola
02 – Falta de professores
01 – Ensino Ruim
02 - Professores não se importavam com os alunos
01 – Legal, mas com muitos problemas: gre-
ve falta de professores, ensino fraco
01 – Quente e barulhenta
01 – Muitas regras e professores legais
01 - Com alunos que faltavam com frequência

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
01 – Ler e escrever bem; questão de honra
02 – Realizar um sonho
03 – Para ser alguém
01 – Para ter cidadania / Tentar uma facul-
dade / arrumar trabalho melhor
01 – Para se descobrir/ Para conhecer um mundo novo
11 – Futuro melhor / Faculdade
01 – Ter conhecimento
Por que você 01 – Dar exemplo para meus filhos/ Fazer faculdade
voltou a estudar? 01 – Está dando continuidade aos estudos duran-
te a noite para poder trabalhar durante o dia.
01 – Ser doutor
01 – Recuperar o tempo perdido
01 – Recuperar o tempo perdido e fazer faculdade
01 – Exigência mínima do mercado
01 – Quero um emprego digno
01 – Estava se sentindo excluído da sociedade
01 – Para que portas possam abrir para mim
02 – Não respondeu
05 - CSVP
02 – Ensino de Verdade / Professores que gos-
tam de dar aula e que nos incentivam
01 – Maravilhosa mas não substitui a minha antiga escola(Piauí)
01 – Legal / Professores compreensivos, princi-
palmente com alunos não alfabetizados
11 – Maravilhosa (acolhedora, professores legais, hu-
Que escola você mildes, inteligentes, humanos, ensinam bem...)
encontrou? 03 – Incentiva
01 – Me dará um futuro melhor
01 – Um lugar que nunca tive oportunidade de conhecer
01 – Escola que me faz lutar pelos meus direitos / in-
veste em bons professores que nos ajudam a che-
gar lá na frente para sermos alguém na vida.
01 – Salas limpinhas, ar condicionado geladinho, professores super
de bem com a vida, e não professores que diziam: “é o seguinte ne-
gada, vocês vindo ou não para escola eu recebo do mesmo jeito”

• segunda Atividade
Na segunda atividade foi solicitado aos alunos a elaboração de desenhos exploratórios que na
qual eles pudessem expor o que eles imaginavam sobre o tema energia. Faz-se uso também de
tabela para tentar explicitar da melhor maneira possível os dados coletados. A primeira coluna apre-

746
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
senta uma interpretação do que foi desenhado pelos alunos e na segunda coluna lista-se o que cada
aluno descreveu sobre o tema energia. Na Tabela 2 encontram-se os resultados referentes aos 29
alunos do primeiro módulo. Aqui faz-se necessário informar que no momento da aplicação da ati-
vidade os alunos possuíam como conteúdo curricular da disciplina de física apenas conhecimento
referente ao Sistema Internacional de Unidades.

tAbelA 2 – descrição dos desenhos referentes Aos AlUnos do pri-


meiro módUlo

Desenhe sobre o
que você enten- Descreva com suas palavras o seu desenho
de ser a energia
Elementos naturais /
positividade / ani-
- É tudo o que existe no universo / Que quando se batem de uma
mais / humanidade
forma que se auxiliem uns aos outros de alguma forma positiva.
/ terra / planetas
/ sol / galáxias
Um olho por - Significa fluir / O olho simboliza que por de-
trás dos riscos trás de toda energia há “algo”.
Comer, dormir, ler um bom livro, ver um bom fil-
Cotidiano me. Amar os animais é uma energia. Andar de bici-
cleta, estar apaixonada são formas de energia.
Vários símbolos de
- É tudo que produz ou pode produzir ação.
positivo e negativo
- Amor, porque agrega as pessoas, e isto é mui-
to importante nos dias de hoje.
Coração (03 alunos)
- Porque adoro rir, é felicidade, carinho, amor.
- É o que se sente, quando é verdadeiro e vem do coração.
- É como uma árvore, evolui com o passar dos anos, os fru-
tos são infinitos e nós temos energia em tudo.
- Furacão, forte, distante e ao mesmo tem-
po presente no nosso dia-a-dia.
- Céu nublado, com nuvens negras e relâmpagos. (02 alunos)
Natureza (07 alunos) - Vida, como as plantas, se tem disposição e vontade de viver.
- Sentimentos de olhar para o sol, entrar no mar, dar um
abraço, sentir a forte energia do amor, trocar carinho.
- O amanhecer, ar, floresta. Quando estou triste fico sen-
tada embaixo de uma árvore, saio dela com o pensa-
mento renovado, cheia de força, paz de espírito.
Cerca elétrica - Segurança
Postes com fiação - Está sempre em nossa vida.
Sol (02 alunos) - Energia Solar (02 alunos)

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
Pessoas - Vida
Lâmpadas - Fios interligados criando e transformando energia.
- Vem das usinas.
Iluminação públi- - Não escreveu.
ca (03 alunos) - Luz vem da água por fios e claro que tem um pro-
cesso até chegar em nossas casas.
- Força invisível que está em todo o Universo.
- São pequenos impulsos que podem trans-
portar certos tipos de materiais.
Raios (04 alunos)
- Passa pela corrente elétrica, fazendo os eletrodomésticos fun-
Raios (DNA, lâm- cionarem e o nosso corpo funciona quando temos disposição.
pada, sol)
- Elétrica é um elemento que nos permite realizar tra-
balho sem fazer esforço. É obtida por usinas.
- Não se vê, mas se percebe ou se sente.
- Energia é gerada a partir de uma reação entre o carbono e o oxi-
Exercícios Físicos
gênio. Na queima de carboidratos temos mais energia para gastar.

De forma preliminar verifica-se na primeira atividade que as histórias vêm repetindo-se, alunos
provenientes do fracasso escolar, sem sentir-se como integrante da sociedade, procurando um en-
sino adequado a este grupo de indivíduos que procuram a inclusão não perversa na escola e na
sociedade novamente. A maioria destes alunos quer encontrar na escola uma melhor qualidade de
vida para sua família, oportunidades de trabalho para realizar sonhos que foram postergados por
diversos fatores encontrados nos pequenos relatos das suas histórias de vida.
A segunda atividade realizada com os alunos da EJA consistiu na elaboração de desenhos
que pudessem representar a ideia a respeito da energia. As imagens são percepções que retêm mui-
tas particularidades de determinados fenômenos.
Em alguns dos desenhos é possível perceber que muitos associam as suas percepções de energia
à natureza, alimentação, bens de consumo, atividades do cotidiano e que poucos associam à eletri-
cidade, por exemplo. Nota-se nas Figura 1, 2, 3 e 4 que as percepções de energia destes alunos estão
associadas aos sentimentos, ao bem-estar, satisfação ou felicidade.

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
considerAções finAis

As percepções referentes ao tema energia dos alunos da EJA são frutos das suas histórias de
vida. Estas percepções estão imbuídas, atreladas ou misturadas nas trajetórias destas vidas e são
carregadas de particularidades. Segundo Paulo Freire (2003), ensinar exige apreensão da realidade
e que a experiência pode possibilitar um novo discurso ou uma nova percepção para uma mesma
realidade. Os alunos de EJA são provenientes de zonas rurais ou urbanas e compartilham de trajetó-
rias e histórias de vida comuns como tradições culturais e identidades.
Ao trabalhar com EJA, o que se sobressai, é o fato desta modalidade ser por demais abran-
gente perante o quadro idade/série. São alunos que dentro de seus limites se esforçam para ter
melhores condições no que se diz respeito à cultura e trabalho. Demonstram a vontade constante
de frequentar lugares que na vida de cada um foi boicotado, como por exemplo: museus, cinema,
teatro, espaços de ciências e universitários. Considerou-se nesta pesquisa o histórico de vida social e
as trajetórias comuns destes alunos, preservando a identidade dos mesmos na tentativa de melho-
rar a vida escolar presente, mediante a consciência crítica das percepções do tema de energia.
Independentemente dos diversos perfis e trajetórias dos alunos da EJA, ela deverá apresentar no
decorrer do curso, de acordo com a Proposta Curricular para a Educação de Jovens e Adultos suas
funções específicas: Reparadora, Equalizadora e Reparadora. Os desafios encontrados no cotidiano
escolar de qualidade exigem constante reflexão sobre as práticas, portanto é muito importante bus-
car informações e atualizações constantemente. Leva-se em consideração que as percepções pode-
rão gerar imagens e empecilhos maiores na compreensão do tema de energia. Logo, pretendemos
obter resultados satisfatórios no que se diz entendimento do tema energia e não a utilização deste
conceito como pronto e decorado. Registra-se uma vantagem desse método de análise, já que os
alunos assumem um papel mais ativo no processo de ensino-aprendizagem e respeita-se o processo
de raciocínio de cada um. As diferentes percepções da EJA foram analisadas para que a formação

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Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
não seja apenas compensatória.

referênciAs bibliográficAs
BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977.
FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. São Paulo: Cortez,
2001.
_____________ Educação como prática de liberdade, 23 eds. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1999 e 2007.
______________ Pedagogia da autonomia. 27ª ed. São Paulo: Paz e Terra, 2003 148p.
______________ Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 36ª edição. 2003. 
______________ Educação e Mudança. Paz e Terra. 34th Ed. São Paulo; 2011.
______________ A educação na cidade. São Paulo: Cortez, 1991.
MINAYO, M.C.S., Desafio do conhecimento: Pesquisa Qualitativa em saúde. São Paulo/Rio de Janeiro:
HUCITEC/ABRASCO, 1992.
MINAYO, M. C. S. (Org.); DESLANDES, S. F.; CRUZ NETO, O. GOMES, R. Pesquisa Social: teoria, método
e criatividade. Petrópolis, RJ: Vozes, 1996.

750
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
trAjetóriAs edUcAcionAis de pessoAs com
deficiênciAs no sesc ler pArAíbA: tensões, limites e
possibilidAdes.
KeziA cortez dA silVA

O presente trabalho aborda as trajetórias educacionais de pessoas jovens e adultas com deficiên-
cia, que hoje reintegrados à escola regular, se inserem nas turmas da EJA, sobretudo, nas unidades
do Projeto SESC Ler na Paraíba. Para alcançar esse objetivo, esboça o perfil de três educandos atendi-
dos pelo projeto, para depois analisar as tensões, limites e possibilidades que o contato educacional
fez emergir dessas histórias de vida. O método utilizado para a coleta de dados nesse trabalho foi o
da história oral com o recorte temático, já que se privilegiou a trajetória educacional desses indiví-
duos; tema a ser garimpado nos relatos dos personagens escolhidos, com suas redes de significados,
documentos e laudos complementares disponíveis nos centros educacionais. O contato com as tra-
jetórias educacionais desses educandos faz emergir muitas inquietações que perpassam o currículo,
a formação de educadores, a necessidade de atendimento educacional especializado dentre outros,
tanto na experiência localizada no SESC Paraíba, como numa perspectiva macro da Educação de
Jovens e Adultos no Brasil. As tensões, limites e possibilidades reveladas nas trajetórias dos educan-
dos enfocados, trazem conclusões contributivas para que a EJA possa melhor assegurar o acesso, a
permanência e o sucesso desses sujeitos nos seus quadros; Estes sujeitos antes silenciados podem
hoje ser considerados como protagonistas de suas histórias, figurando como atores principais de
uma EJA numa perspectiva verdadeiramente inclusiva.

palavras-chave: Inclusão, educação de jovens e adultos, deficiência

introdUção
Desde o inicio dos anos 2000, por influência de documentos internacionais, no contexto brasilei-
ro, as discussões acerca de políticas de inclusão se avolumaram; e por determinação das Diretrizes
Nacionais para Educação Especial na Educação Básica (Resolução CNE/CEB nº 2/2001), iniciaram-se
com mais concretude o acesso de alunos com deficiência às escolas e classes comuns.
Esse acesso se evidenciou na Educação de Jovens e Adultos (EJA), com inúmeras matrículas de
pessoas jovens e adultas com deficiência em todo o país; fato também vivenciado nas unidades do
Projeto SESC Ler na Paraíba. O Referido Projeto, de iniciativa do Serviço Social do Comércio (SESC),
tem por finalidade implementar um processo educativo integrado para jovens e adultos não escola-
rizados, indo da alfabetização ao término da primeira fase do Ensino Fundamental (SESC, 1999). Em
solo paraibano, o Projeto atua em três cidades da região do sertão: Cajazeiras, Sousa e Patos.
A presença dos alunos com deficiência no SESC Ler, suas demandas e necessidades, suscitaram
inquietações e buscas para uma melhor formação de toda a equipe educacional do Projeto; afinal,
os jovens e adultos com deficiência integrados à sala de aula demonstravam entusiasmo em parti-
ciparem das inúmeras atividades que o SESC oferece nas áreas de cultura, lazer, saúde e assistência,
mas pareciam não progredir na apropriação do Sistema de Escrita Alfabético (SEA), estando longe
de se apropriarem de forma autônoma da leitura e da escrita.
Essa realidade e as fascinantes histórias de vida desses alunos, reveladas nas rodas de conversa,
os laços de sociabilidade criados nos centros educacionais, foram evidenciando uma riqueza de ca-
minhos que a EJA poderia utilizar para se reconfigurar numa perspectiva mais inclusiva. No entanto,
fazia-se necessário um processo investigativo que desse corpo a esses indícios. Afinal, os caminhos

751
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
para o acesso, permanência e sucesso desses educandos estariam forjados nos meandros dessas
vidas? Poderiam estar nas palavras dos próprios educandos tão pouco ouvidos em suas intenções
de pronunciar o mundo, as estratégias para uma EJA verdadeiramente inclusiva?
Em resposta a estas indagações, começamos a traçar uma pesquisa quanti-quali que evidencias-
se as trajetórias educacionais de pessoas com deficiência no SESC Ler Paraíba, localizando tensões,
limites e possibilidades. Para tanto, utilizamos como método a história oral com o recorte temático
da escolarização e de forma complementar, os documentos e laudos disponibilizados nos Centros
Educacionais.

perfil dos edUcAndos com deficiênciA no sesc ler pArAíbA


O SESC ler na Paraíba em suas três unidades atende nos seus três ciclos de aprendizagem do
primeiro segmento do Ensino Fundamental, a 270 educandos jovens e adultos. Desses educandos
atendidos, temos o seguinte perfil quanto aos educandos com deficiência:

CENTROS EDUCACIONAIS EDUCANDOS COM DEFICIÊNCIA


SESC ler Cajazeiras 11
SESC ler Sousa 04
SESC ler Patos 07

(Fonte: fichas de matrícula dos Centros Educacionais)


Os jovens e adultos com deficiência atendidos pelo Projeto de conformidade com os dados dis-
ponibilizados pelos Centros Educacionais, apresentam três principais deficiências: intelectual, física
e auditiva. Sendo a intelectual a de maior ocorrência, contabilizando 68% dos educandos mapea-
dos, como mostra o quadro abaixo:

centros edU-
tipos de deficiênciAs com lAUdo sem lAUdo
cAcionAis
Deficiência física (04)
SESC ler Cajazeiras Deficiência intelectual (06) 05 EDUCANDOS
06 EDUCANDOS
Deficiência auditiva (01)

SESC ler Sousa Deficiência intelectual (04) 04 EDUCANDOS ___________

Deficiência intelectual (05)


SESC ler Patos 02 EDUCANDOS 05 EDUCANDOS
Deficiência física (02)

(Fonte: fichas de matrícula dos Centros Educacionais)


Outro dado relevante no quadro é que se refere à presença e ausência de laudo médico. Nesse
item, 50% dos educandos constam com o laudo e 50% sem laudo. Fato justificado pela coordenação
dos Centros por dois motivos básicos: a família não procurou na infância/adolescência um acompa-
nhamento médico, e os que hoje têm laudo o fizeram para obter aposentadoria.
Quanto à escolarização propriamente dita, percebemos que os educandos matriculados estão
alocados principalmente no primeiro e segundo Ciclos, como nos mostra a tabela abaixo:

752
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
centros edUcAcionAis ciclos
05 NO 1º CICLO
SESC LER CAJAZEIRAS 05 NO 2º CICLO
01 NO 3º CICLO
03 NO 1º CICLO
SESC LER SOUSA
01 NO 3º CICLO
05 NO 1º CICLO
SESC LER PATOS
02 NO 3º CICLO
(Fonte: fichas de matrícula dos Centros Educacionais)
Dados que atestam que na nossa realidade, se comprova também, o que já foi revelado no
Censo 2010, no qual consta que 61,1 % das pessoas com deficiência são contabilizadas como pesso-
as sem instrução e fundamental incompleto. Dos 22 alunos contabilizados, só 04 estão no terceiro
ciclo, sendo três pessoas com deficiência física e um com deficiência intelectual.
AprofUndAndo A Análise: As históriAs de VidA
No sentido de compreender mais profundamente a trajetória desses educandos deficientes em
suas demandas e necessidades, escolhemos três educandos em cada um dos Ciclos educativos ofer-
tados pelos centros educacionais do SESC Ler: 1º ciclo (alfabetização), 2º ciclo (1ª e 2ª série) e 3º ciclo
(3ª e 4ª série) do primeiro segmento do fundamental; para com eles registrar relatos de suas histórias
de vida com o recorte temático da trajetória educacional.
No primeiro Ciclo, o aluno escolhido foi o que aqui chamamos de Adelson o qual apresenta de-
ficiência intelectual. Este em processo de alfabetização, por iniciativa própria procurou a escola e
convenceu ao pai que não queria o deixar estudar a noite, a permitir sua matrícula. Aos 39 anos já
passou por muitas escolas do município, mas ainda não sabe ler e escrever convencionalmente. Na
escola interage bem com os colegas e com a professora, é amável e cordial com todos.
A professora de “Adelson” diz que ele se esforça para realizar todas as atividades propostas na
sala de aula, e que já escreve o seu nome sem necessitar de modelo. Participa ativamente das rodas
de conversa e utiliza estratégias pessoais para escrever palavras que a professora solicita e resolve
situações matemáticas, principalmente usando o celular, no qual realiza chamadas telefônicas, usa
a calculadora e escuta rádio. O educando também tem responsabilidades domesticas, as quais ele
cumpre com adequação, conforme o relato prestado à professora e registrado em vídeo.
O relato de Adelson revela que há uma relação de intimidade e confiança com esta, construída
ao longo do período letivo. Intimidade que o permite se abrir sobre diversos aspectos de sua vida,
como revelam os fragmentos transcritos abaixo:

(...) Se eu contar minha história eu choro.


(...) Minha vida não é boa não. (...) por causa da minha madrasta, ela me chama
de bandido, de ladrão dentro de casa.
(...) Amo estudar. Sou o primeiro a chegar e o último a sair.
(...) Gosto de fazer atividade sozinho; os que já sabem ler ficam mangando de
mim.
(...) Gostei do São João dancei com você e com Lídia (a gerente).
(...) Em casa eu trabalho, lavo. Quem lava minha roupa sou eu.

No que diz respeito à aprendizagem, Adelson só reconhece o “A” primeira letra do seu nome, pois

753
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
ainda não consegue relacionar som e grafia. Ele também aprendeu a distinguir “o dois” e “o quatro”
a quem chama de “caderete” uma alusão explicita a cadeira, por sua grafia. Apesar das dificuldades
apresentadas, Adelson demonstra capacidade de aprender socialmente e até faz uso da tecnologia.
No segundo Ciclo, selecionamos uma aluna aqui denominada de Paloma, esta tem deficiência
física proveniente de um acidente automobilístico. Tem 45 anos e já estudou no Centro Educacional
no ano de 2006. Já havia estudado noutras escolas antes do acidente, já sabia ler, mas não tem com-
provação escolar. Quando se matriculou em 2006 apresentava muitos problemas de convivência,
tinha um marido ciumento que a impossibilitava às vezes de ir à aula colocando-a em cima do guar-
da roupa, de onde com uma perna só não podia descer. Para terminar esse relacionamento também
teve que abandonar a escola, indo morar numa cidade próxima.
Agora em 2014, retornou a escola e diz que a experiência de estudar no SESC mexeu com a sua
vida de forma decisiva, pois a ajudou a ter forças para abandonar o seu relacionamento e enfrentar
a vida de frente. Agora com novo marido, diz ter nova vida e de volta a escola encanta a todos com
sua vivacidade e vontade de aprender.
A professora de Paloma diz que hoje ela é uma pessoa de fácil convivência, que aceita plenamen-
te sua condição de deficiência, o que antes não era bem resolvido. Na sala de aula se relaciona bem
com todos, e participa ativamente de todas as atividades da escola, até das atividades que requerem
a questão física, como dançar e fazer exercícios de ginástica laboral, sem mostrar constrangimento.
A educanda parece ter adquirido nova vida e é com esse gás que pretende terminar a primeira fase
do fundamental em 2015.
Com relação à aprendizagem Paloma demonstra em suas produções escritas boa caligrafia, orga-
nização textual e poucos erros ortográficos. Superar suas dificuldades na leitura é o seu maior alvo
e desafio, pois diz gostar de ler apesar de não conseguir fazê-lo de forma fluente. Desafio que ela
demonstra enfrentar com o mesmo ímpeto que encarou a violência domestica que a silenciava e a
inferiorizava, sua garra parece ser sua maior arma.
No terceiro Ciclo, o educando selecionado foi o que denominamos de Leonardo, aparentemente
não demonstra ter deficiência, no entanto, seu desenvolvimento intelectual nunca foi normal, e em
decorrência disso a família só o matriculou na escola aos 15 anos. Em 2004, aos 22 anos matriculou-
-se no SESC. Não sabia ler convencionalmente, não reconhecia o próprio nome. Mas não apresenta-
va problemas de socialização, misturado aos demais alunos, parecia não ter deficiência. Sempre fez
parte do time de futebol do centro e de todas as atividades curriculares na sala de aula e extraclasse.
As professoras e a orientadora do Centro Educacional relatam que o progresso de Leonardo ape-
sar de lento, pois conseguiu em 10 anos se alfabetizar e chegar ao último ciclo da primeira fase do
fundamental, foi pontuado de muita persistência, coragem e superação por parte de Leonardo; ao
mesmo tempo em que a escola não desistiu dele, mas que teve a paciência de ir palmilhando com
ele este passo-a-passo da aprendizagem, compreendendo seu tempo e suas demandas.
Seu relato também gravado em vídeo demonstra que Leonardo tem boa memória, faz amizades
duradouras com pessoas que se dizem normais, tem uma profissão na qual trabalha regularmente e
tem consciência de suas dificuldades; fatos comprovados nos fragmentos que socializamos a seguir:

(...) Comecei estudar aos 15 anos;


(...) lá na outra escola eu não ficava muito na sala;
(...) Aqui consegui fazer amizades demais. Não vou mentir não, quando entrei
aqui foi Luizinho o vigia, depois conheci Ismael, outro vigia aqui;
(...) Eu trabalho demais de servente de pedreiro. No meu trabalho tô aprendendo.
Gosto demais do meu trabalho!
(...) Sei usar a calculadora um pouquinho.

754
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
(...) Eu tenho problema de ler quando tem muita gente, eu fico lendo baixinho pra
mim mesmo.
(...) Eu sei ler, eu tenho problema na fala, na língua, aí eu tenho vergonha de ler.

O educando Leonardo, apesar de suas limitações, demonstra ter avançado nos seu processo de
ensino aprendizagem, pois ler com compreensão regular, utiliza os recursos que disponibiliza para
realizar as atividades escolares; exterioriza aprendizagens realizadas no contexto profissional; so-
cializa-se de forma aparentemente normal tendo como amigos funcionários do Centro Educacional
que dizem manter diálogos com ele de forma apropriada, nos quais ele não demonstra nenhuma
anormalidade; tem consciência, no entanto, de suas dificuldades, principalmente na fala, pois pro-
nuncia as palavras de forma incompleta, o que o prejudica na leitura e na escrita, pois sempre tenta
escrever a pauta sonora. A história de Leonardo nos anima a pensar que é possível e que embora o
progresso seja lento, um educando com deficiência intelectual pode ter sucesso em sua escolariza-
ção.
Nessas histórias de vida foram analisadas quatro principais dimensões: Relações simbólicas e afe-
tivas favoráveis; Atitudes pessoais propiciadoras; Políticas sociais e educacionais; Contexto sociopo-
lítico e cultural.

locAlizAndo tensões, limites e possibilidAdes


O contato com essas três histórias surpreendentes, nos permitiu identificar os vínculos afetivos
com a família e os incentivos provenientes dessa relação como motivo propulsor primeiro para o
ingresso na escola. Depois, vem o acolhimento no ambiente escolar, o relacionamento afetivo com
os educadores e com os colegas como determinantes para o acesso e a permanência desses edu-
candos nos Centros Educacionais; todos ressaltam o seu amor pela escola e o quanto se sentem à
vontade para aprender e conviver.
No que diz respeito às atitudes inerentes a esses jovens e adultos com deficiência, identificamos
como relevantes: a proatividade, atitudes de persistência, resiliência, motivação, interesse concreto
pelas atividades escolares e busca por alternativas para melhorar suas vidas; atitudes que formam
o perfil desses educandos, que propiciam seus avanços, mesmo lentos, na construção dos conheci-
mentos. Que motivam os educadores na busca de contribuir mais e melhor na consecução dos seus
objetivos escolares.
Ao observarmos o contexto das políticas públicas de favorecimento a estes educandos, foi possí-
vel identificar as aposentadorias, o atendimento especializado no CAPs e a política de bolsas benefí-
cio. Mas no sentido educacional, só o SESC tem conseguido disponibilizar o acesso e a permanência
desses educandos na sala de aula, através do formato de atuação do SESC ler, que é diferenciado,
destacando-se pelas seguintes atividades: matrículas realizadas de porta em porta na comunidade;
visita as famílias quando o aluno está doente ou faltando aulas de forma recorrente; visita da assis-
tente social à família se o educando reclama da convivência familiar; bem como a inserção dos edu-
candos com deficiência em todas as atividades que o SESC desenvolve nas áreas de cultura, lazer,
saúde e assistência; atividades que vem oferecendo-os oportunidades para inserção social.
No que diz respeito ao contexto sociopolítico e cultural, percebemos que os educandos de forma
geral são de baixa renda e têm pouco acesso aos bens culturais, enxergando a escola como porta
para inserção social. Através das atividades do SESC eles se reintegram a vida comunitária, passam
a frequentar lugares públicos como forma de lazer e enriquecimento cultural, sentindo-se assim
protagonistas e reconhecidos em sua identidade.
Dentro das quatro dimensões analisadas também localizamos algumas tensões, entre elas pode-
mos citar: ocorrência de bulling; omissão familiar para buscar laudos e atendimento especializado.

755
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
No caso do bulling, ainda há muito trabalho a realizar na perspectiva do respeito às diferenças.
Os educandos ditos normais, muitas vezes se esquivam do contato com pessoas que tem deficiên-
cias, principalmente, se for intelectual. Recusam-se a fazer trabalhos em sala de aula e há aqueles
que usam de brincadeiras desrespeitosas, entristecendo ou agitando o aluno deficiente. Para esses
casos, as professoras têm optado por trabalhar com as regras de convivência desde o início do perí-
odo letivo, mas é um trabalho de paciência e de construção lenta, que apresenta muitas resistências
veladas para que a mudança de comportamento ocorra.
Outra tensão localizada é a da omissão familiar para buscar laudos e atendimento especializado;
as orientadoras e professoras das unidades relatam que ao contatarem com a família dos educandos
com deficiência, muitos parentes demonstram não ter conhecimento de qualquer problema dessa
natureza, embora alguns alunos já sejam aposentados por invalidez, tendo um laudo apenas como
um requisito para obtenção do benefício. Essa situação gera tensão, pois não há como a escola en-
caminhar o educando para um tratamento especializado quando não há por parte deste e de sua
família, um maior entendimento acerca da deficiência e da necessidade do seu acompanhamento.
Em se tratando dos limites, conseguimos localizar duas ausências principais: Das Diretrizes espe-
cificas para o trabalho educacional com jovens e adultos com deficiência, e de uma formação mais
especifica para o educador da EJA.
Quando falamos na ausência de Diretrizes especificas, fica claro que a insegurança dos profes-
sores ao receber educandos deficientes, bem como o receio da escola em matricula-los, está no
entendimento de que o currículo praticado não atende as necessidades e demandas desses sujeitos.
Ferreira & Ferreira, chama a nossa atenção para a necessidade de repensarmos a prática pedagógica
de forma geral, na perspectiva desses educandos:

Concepções mecanicistas, lineares, claramente hierarquizadas de ensino e currí-


culo, processos pedagógicos centrados nos docentes, assim como concepções psi-
cométricas ou homogeneizantes de alunos, aliadas a concepções patologizantes de
qualquer dificuldade ou fracasso escolar, não mais contribuem com as ações que
estão sendo requeridas para a inserção escolar dos alunos com deficiência (2007: p.
43).

Há de se adequar a linguagem, a didática, as atividades, a avaliação, o tempo. Que diretrizes a EJA


tem para orientar essas adequações? O trabalho educacional vai se construindo no chão da escola,
guiado pela vontade e sensibilidade da equipe educacional que nem sempre acerta.
Outro limite, bem ligado a este, trata-se da ausente ou pouca formação dos educadores para o
atendimento educacional a esse público. Na formação inicial (graduação) os educadores veem de
forma superficial a educação especial, numa perspectiva do entendimento da criança deficiente,
quando o jovem e adulto nessas condições têm necessidades especificas. Na formação continuada,
as ocasiões formativas são pontuais, seja pela falta de tempo dos educadores, ou pela variedade de
temas que são relevantes para o estudo e reflexão docente, não suprindo assim as demandas que
esses educandos suscitam.
Apesar das tensões e limites revelados, também podemos localizar algumas possibilidades, den-
tre as quais destacamos: Abertura da escola para projetos culturais, de lazer, saúde e assistência;
maior envolvimento escola/família/comunidade; formação continuada para educadores na própria
escola.
Quando nos reportamos à abertura da escola para projetos culturais, de lazer, saúde e assistên-
cia, estamos nos referindo a uma prática usual do SESC, que articula o seu trabalho educacional a
outros que desenvolve nessas outras áreas, fazendo aflorar sensibilidades, aptidões e destrezas nos

756
Categoria: Poster | Subtema 1: Diversidade e Educação de Jovens e Adultos
educandos, bem como o aprimoramento de habilidades atitudinais, motoras e cognitivas. Outros
benefícios são: resgate da memória lúdica da comunidade; combate a inibição e a timidez; maior
entrosamento; aceitação das diferenças: maior atenção à saúde e cuidado pessoal.
Todos os benefícios citados demonstram um fazer inclusivo, através dos quais os Centros rein-
serem esses educandos na prática social, nas comunidades a que pertencem, e não só isso, abrem
os horizontes para que ousem fazer aquilo que nunca fizeram, tenha acesso a ambientes antes não
frequentados, conheçam redutos não imaginados e superem suas dificuldades, assumindo plena-
mente suas identidades e se rendendo ao que Freire (1987), chamou de vocação para ser mais.
Outra possibilidade para o trabalho educacional é envolver mais na escola a família e a comuni-
dade. Nessa perspectiva, os Centros Educacionais do SESC Ler tem como premissa ser polos irradia-
dores de cultura e pontos de encontro das comunidades, possibilitando a estas famílias e comuni-
dades o acesso a bens culturais, ações de assistência, formação profissional, inserção em atividades
econômicas autogestoras, entre outras, atividades que devem contemplar de forma igualitária os
educandos com deficiência.
Por fim, outra possibilidade de aprimoramento efetivo da prática educacional com pessoas jo-
vens e adultas com deficiência, é apostar na formação de educadores na própria escola, onde os
problemas dos educandos são pretexto para reflexão e busca teórica. Só focalizando os problemas
e necessidades dos educandos reais é que a escola conseguirá fazê-los progredir, como nos diz Ar-
royo:

A teoria pedagógica se revitaliza sempre que se reencontra com os sujeitos da


própria ação educativa. Quando está atenta aos processos de sua própria forma-
ção humana. Processos de fecundos encontros que estão se dando entre a peda-
gogia escolar e a outra infância/adolescência, os outros jovens e adultos populares
que ainda que tarde chegam às escolas publicas. Quando a ação educativa escolar
ou extraescolar, de formação da infância, adolescência ou de jovens e adultos ou
de educação popular se esquece deles e de seus processos, movimentos e práticas
sociais, culturais e educativas e se fecha em discussões sobre métodos, conteúdos,
tempos, instituições, calendários, avaliação... se perde e desvirtua. Perde suas virtua-
lidades como teoria e prática educativa emancipatória (2012, p.28).

Só a partir do educando e de sua especificidade seja ela dita normal, ou na perspectiva de sua
deficiência, é que se constrói uma escola comprometida com a aprendizagem dos educandos, e
verdadeiramente inclusiva.

referênciAs
ARROYO, Miguel G. outros sujeitos, outras pedagogias. Petrópolis, RJ: Vozes, 2012.
FERREIRA, M, C; FERREIRA, J.R. Sobre inclusão, políticas públicas e práticas pedagógicas. In GÓES,
Maria Cecília Rafael; LAPLANE, Adriana Lia Friszman. políticas e práticas de educação inclusiva. Cam-
pinas: Autores Associados, 2007 p.21-48.
FREIRE, Paulo. pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
SESC. DEPARTAMENTO NACIONAL. Proposta Pedagógica do Projeto SESC LER. Rio de Janeiro, 1999.

757
cAtegoriA 2

poster

sUbtemA 2

alfabetização, letramento e
linguagenS ContemporâneaS
Categoria: Poster | Subtema 2: Alfabetização, Letramentos e Linguagens Contemp
A AlfAbetizAção e o letrAmento de AdUltos como
formA de inclUsão sociAl
cUstódio joVêncio bArbosA filho | AndréA AlmeidA brUnelli mArtins

A alfabetização e o letramento de adultos tem sido um tema muito explorado nos estudos e tra-
balhos acadêmicos, principalmente a partir da ideia da erradicação do analfabetismo apresentado
na história da Educação Popular e da EJA e explicitado no atual PNE. Como parte de um trabalho de
conclusão de curso, apresentado a Escola Superior Aberta do Brasil (ESAB), buscou-se neste artigo
analisar como o analfabetismo pode limitar o sujeito ao não reconhecimento de suas condições
sociais e dos direitos que possui. Tomamos como aporte teórico-metodológico a pesquisa explo-
ratória e descritiva, tendo por base a utilização de acervo bibliográfico, na busca de aprofundar
diálogos sob as perspectivas do pensamento freiriano, principalmente, ao destacar que a educa-
ção possibilita ao indivíduo a construção da consciência crítica e reflexiva e como consequência o
seu crescimento no processo de humanização. Utilizou-se também na feitura deste trabalho, dados
produzidos por meio de entrevistas com dois sujeitos, sendo um totalmente analfabeto do ponto
de vista dos signos e outro que havia se alfabetizado recentemente nas salas de EJA. Os resultados
alcançados neste estudo reforçam a importância da aquisição da leitura e da escrita para o reconhe-
cimento social dos sujeitos da EJA e dos diretos que eles possuem, bem como, dos desafios vividos
pelas pessoas não alfabetizadas, de se inserirem em um contexto social, em que se enfatizam as
práticas sociais existentes em uma sociedade letrada.

palavras-chave: Alfabetização, letramento, EJA, Inclusão social

introdUção
Sabe-se que no Brasil a realidade de pessoas analfabetas é marcada por práticas de exclusão
social daqueles que não tiveram a oportunidade de frequentar a escola no tempo adequado. Esta
realidade se materializa ao perceber que grande parte dessa população ainda não desfrutou dos
diversos saberes construídos nas distintas áreas do conhecimento científico. Desta forma, a alfabe-
tização e o letramento tornam-se ferramentas relevantes para o desenvolvimento do ser humano
como parte integrante da sociedade.
O presente artigo integra resultados de uma pesquisa que buscou relacionar a alfabetização e
o letramento à prática da cidadania entendendo a importância da aquisição do sistema de escrita
pelo jovem e em especial o adulto para sua inserção social. Neste sentido, esta pesquisa tem como
objetivo geral analisar como o analfabetismo pode limitar o sujeito ao não reconhecimento de suas
condições e direitos sociais. Nas especificidades dos objetivos buscou-se, também, situar as contri-
buições teóricas da alfabetização de jovens e adultos; identificar as contribuições da alfabetização
para a formação social e política de sujeitos, bem como, fator viabilizador do reconhecimento de
suas condições sociais; e avaliar as consequências da ausência da alfabetização para o reconheci-
mento pelo sujeito de suas condições sociais.
É neste contexto que a alfabetização e o letramento na vida dos jovens e adultos se encontram,
no sentido de proporcionar ao sujeito a oportunidade de contribuir para a participação no exercício
da cidadania e o reconhecimento como parte integrante da sociedade por meio do conhecimento
do sistema da escrita. Para tanto, emergiu a seguinte questão problema: Qual a influência do analfa-
betismo de adultos sobre o não reconhecimento de suas condições sociais?
Em função da natureza da pesquisa, o método de investigação assumido é de caráter explora-

759
Categoria: Poster | Subtema 2: Alfabetização, Letramentos e Linguagens Contemp
tório, que proporciona uma maior familiaridade com o problema de pesquisa, descritiva e biblio-
gráfica ao destacar que o propósito da mesma é fornecer fundamentação teórica ao trabalho, bem
como a identificação do estágio atual do conhecimento referente ao tema (GIL, 2010). No caminho
percorrido foi necessária a coleta de dados por meio de roteiro de entrevistas semiestruturadas e,
a aplicação das mesmas com dois sujeitos, sendo um não alfabetizado e outro recém-alfabetizado.
Entendendo que no processo de aquisição da leitura e da escrita o sujeito tem a oportunidade de
obter conhecimentos necessários para “ajustar-se” às práticas da vida em sociedade, no qual a alfa-
betização e o letramento tornam-se o apoio principal para o exercício da cidadania ativa, autônoma
e responsável voltada à conquista de direitos sociais e políticos. A partir deste contexto, o sujeito
pode encontra-se como agente de transformação de sua realidade possibilitando a solidariedade e
o bem coletivo. Entendendo que o exercício da cidadania é crucial na vida pessoal do sujeito, onde
ao exercer este papel, pode levá-lo a outro estado ou condição nos aspectos: cultural, cognitivo e
social.

contribUições do percUrso histórico e teórico nA AlfAbetizAção


de joVens e AdUltos
No limite das análises do percurso histórico da Educação de Jovens e Adultos - EJA, feitas nesta se-
ção no que se refere à interferência das condições sociais sobre a vida dos sujeitos jovens e adultos,
Fávero (2009) destaca que nos guias de história da educação brasileira não há indícios da educação
de jovens e adultos. Nesse sentido, a discussão que permeia o amadurecimento do processo para
pensar a Educação de Jovens e Adultos (EJA) enquanto modalidade emerge a partir dos anos 80 de-
vido aos problemas referentes aos jovens no que tange às questões de cunho social. Esta discussão
ganha força a partir dos estudos das Ciências Sociais ao reconhecer a EJA enquanto categoria, tendo
como consequência muitos estudos sobre esta modalidade. (FÁVERO, 2009)
Para Fávero (2009) a história atual da EJA perpassou por diversos movimentos populares que
trazem seus legados de formação e interferência da Educação Popular. Estas interferências, de certa
forma, têm permitido pensar os sujeitos nas diversas dimensões que o compõem, buscando a partir
das suas experiências a relação de forma sistemática com o processo educativo. Tendo como refe-
rência que a Educação Popular é,

[...] uma prática social, existente dentro de relações sociais históricas, crítica des-
sas relações e atuando no sentido de transformá-las em direção a uma sociedade
democrática. Como essas relações sociais, em última instância, são relações polí-
ticas, trata-se de relações de poder entre as diferentes classes sociais. No conjunto
dessas práticas sociais e nessa perspectiva política, a Educação Popular lida funda-
mentalmente com o conhecimento. Conhecimento que instrumentalize um proces-
so de resistência e de luta na transformação da sociedade, cujo o ponto de partida
é a própria prática da camadas populares: a forma de organização do trabalho em
cada atividade educativa e o processo de conhecimento que se realiza nesta ativida-
de. (FÁVERO, 2009, p. 70)

Infere-se que esta forma de educação poderia atuar sobre a realidade social no Brasil que é mar-
cada pelas desigualdades sociais, sendo um dos principais fatores que contribuem para a elevada
taxa do analfabetismo (IBGE, 2010). Diante disso, Paulo Freire ainda no final da década de 1950 pro-
fere a seguinte afirmação, “[...] a miséria da população era responsável pelo analfabetismo e pelo
atraso das condições de vida em geral e não a vice-versa, como se afirmava inclusive em documen-
tos oficiais.” (FREIRE, apud, FÁVERO, 2009, p. 67)

760
Categoria: Poster | Subtema 2: Alfabetização, Letramentos e Linguagens Contemp
O reflexo das condições sociais na atualidade ainda é presente nos dados oficiais do Estado. Ao
analisar a última Pesquisa Nacional de Amostragem por Domicílio – PNAD, órgão do Instituto Bra-
sileiro de Geografia e Estatística (IBGE) pode-se perceber que a melhoria na perspectiva de superar
o analfabetismo ainda é muito ínfima, pois de 2000 para 2010 houve, aproximadamente, 4% de
avanço.
Ao se comparar os dados nacionais com os do estado do Espírito Santo percebe-se que avançou
ainda menos que a média nacional com apenas 3,5%. Estes dados demonstram o tamanho do desa-
fio que está posto no que se refere ao processo de alfabetização de jovens e adultos e sua inserção
na busca pelo reconhecimento das suas condições sociais e do direito ao direito.
Para o IBGE é considerada analfabeta a pessoa que não sabe ler e escrever um bilhete simples no
idioma que conhece. Por outro lado, o próprio conceito de analfabetismo vem sofrendo alterações
ao longo deste período. Tfouni (2010) salienta que a história da alfabetização no Brasil passa por
sucessivas mudanças conceituais e metodológicas buscando relacionar a alfabetização e o letra-
mento às práticas educativas. Já Romão (2011) destaca a importância de se levar em consideração as
dimensões que compõem as responsabilidades dos profissionais desta área sendo elas: a dimensão
política, a gerencial e a da prática pedagógica.
Apesar de surgirem muitas divergências de ideias quanto ao conceito de alfabetização e letra-
mento, seu objetivo continua sendo levar o indivíduo a inserir-se numa sociedade que se organiza
por meio de uma cultura letrada. Neste sentido, Tfouni (2010, p. 22) destaca que “[...] o letramento
focaliza os aspectos sócio-históricos da aquisição de um sistema escrito por uma sociedade.” Quan-
to à alfabetização também que,

A alfabetização refere-se à aquisição da escrita enquanto aprendizagem de ha-


bilidades para leitura, escrita e às chamadas práticas da linguagem. Isso é levado a
efeito do processo de escolarização e, portanto, da instrução formal. A alfabetização
pertence, assim, ao âmbito individual. (TFOUNI, 2010, p. 1-2)

Partindo destas ideias, percebe-se que a sociedade moderna encontra-se em um contínuo proces-
so de mudanças e consolidação dos campos do saberes científicos na busca de aprimorar conceitos
e práticas de ações didático-pedagógicas. E para acompanhar estas mudanças, enquanto processo
individual, os interesses dos sujeitos seguem determinadas práticas sociais dentro de uma série de
exigências para que o mesmo possa se sentir incluído no processo histórico e contribuir na sua cons-
trução. Para tanto Rosa (2007, p. 72) destaca que, “[...] o uso da linguagem escrita tem implicações
diretas no modo de vida dos indivíduos, ampliando ou limitando as suas possibilidades de ação.”
Essas mudanças conceituais que passam a ser inseridas na sociedade moderna caracterizam-se
por valores que visam o progresso e o desenvolvimento social dos sujeitos que se encontravam à
margem deste processo (SOARES, 2009). Por isso, entende-se ser importante que os sujeitos bus-
quem além da aquisição do código da escrita, adquirir também, habilidades que permitam sua in-
serção social, pois, não basta apenas saber ler e escrever, mas também responder às exigências de
uma sociedade proativa que hoje está centrada na capacidade de resolução de problemas referen-
tes ao cotidiano. Sendo assim, o letramento e a alfabetização buscam focalizar aspectos de âmbito
social que envolvem a condição do sujeito de se reconhecer por meio de um sistema de escrita.
Nesse contexto, Tfouni (2010, p. 22) aborda que,

Entre outros casos, procura estudar e descrever o que ocorre nas sociedades
quando adotam um sistema de escritura de maneira restrita, ou generalizada; pro-
cura ainda saber quais práticas psicossociais substituem as práticas “letradas” em
sociedades ágrafas. Deste modo, o letramento tem por objetivo investigar não so-

761
Categoria: Poster | Subtema 2: Alfabetização, Letramentos e Linguagens Contemp
mente quem é alfabetizado, mas também quem não é alfabetizado, e, neste sentido,
desliga-se de verificar o individual e centraliza-se no social.

Da diferença entre os termos sobre letramento e alfabetização centrou-se em conceitos que


tratam da divisão em: analfabeto e analfabeto funcional referindo-se aos sujeitos que sabem ler e
escrever, mas não conseguem interpretar, segundo IBGE. Ao contrário desta perspectiva, Soares
(2009) destaca que o letramento é o estado, ou condição, no qual o sujeito se assumi como leitor e
escritor relacionando a prática de leitura e escrita com sua realidade social. Neste conceito, está im-
plícito a ideia de que a habilidade de ler, escrever e interpretar tem consequências sobre o sujeito e
a alteração de sua condição social diante de sua inserção numa sociedade grafocêntrica1.
Vale ressaltar neste estudo, que o mais importante não está em ser, ou não, um sujeito alfabetiza-
do, mas, em estar inserido em uma sociedade letrada em que necessita corresponder a tal realidade,
podendo produzir processos de não reconhecimento da sua identidade individual e coletiva no
qual pode desvinculá-lo de sua historicidade e do exercício de cidadania. No que tange à cidadania
Piconez (2002, p.15) aborda que este conceito “[...] traduz, ao mesmo tempo, a concepção de direito
e de exercício desse direito. Sem este, aquele é mero discurso.”
A construção da cidadania é um fator que não pode ser ignorado quando se procura compre-
ender e respeitar o ser humano em todos seus aspectos e que experimenta um contexto no qual
o mesmo não tendo domínio de certas habilidades no que tange à leitura e à escrita, está inserido
em um processo de distribuição do conhecimento no ambiente no qual pode produzir tanto a par-
ticipação quanto à exclusão destes sujeitos. Desta forma, torna-se relevante a aquisição da leitura
e escrita na compreensão da linguagem que norteia a praticabilidade de uma sociedade moderna.
Para tanto Freire (2006, p. 9) afirma que,

Em sociedade que exclui dois terços da sua população e que impõe ainda profun-
das injustiças à grande parte do terço para a qual funciona, é urgente que a questão
da leitura e da escrita seja vista enfaticamente sob o ângulo da luta política a que a
compreensão científica do problema traz sua colaboração.

Sabe-se que não se pode ignorar que no Brasil o problema do analfabetismo e do preconceito
dos que se encontram nesta condição ainda não foi sanado. Mas é fato, a partir das reflexões pro-
postas acima, que a alfabetização e letramento disponibilizam instrumentos para que os sujeitos
enfrentem desafios específicos à demanda da sociedade, como por exemplo: manuseio de docu-
mentos, reconhecimento de direitos e deveres trabalhistas, escreverem abaixo-assinados, identificar
endereços e placas de ônibus, preencher formulários, e outros. Isso é muito mais do que apenas
ter a capacidade de lidar com atividades mais complexas ou de resolver problemas, mas significa a
possibilidade de interagir com exigências do dia-a-dia do mundo letrado, tornando os sujeitos au-
tônomos no âmbito das demandas que emergem do meio em que vive. Diante disso, ressalta-se as
palavras de Freire (2006, p.18) ao citar que,

O caráter mágico emprestado à palavra escrita, vista ou concebida quase como


uma palavra salvadora, é uma delas. O analfabeto, por que não a tem, é um “ho-
mem perdido”, cego, quase fora da realidade. É preciso, pois, salvá-lo, e sua salvação
está em passivamente receber a palavra – uma espécie de amuleto – que a “parte
melhor” do mundo lhe oferece benevolamente. Daí que o papel do analfabeto seja o
de sujeito de sua própria alfabetização, mas o de paciente que se submete docilmen-
te a um processo que não tem ingerência.
1 Estado ou condição na qual se considera a escrita como centro.

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Categoria: Poster | Subtema 2: Alfabetização, Letramentos e Linguagens Contemp
O analfabeto é considerado por muitos aquele que não tem competência para exercer plena-
mente seus direitos de participação cidadã. É aquele marginalizado e que não possui acesso aos
bens culturais de uma sociedade letrada. Por isso, o reconhecimento e potencialização do sujeito
da EJA compreendem na transformação social e na formulação de propostas educacionais que leve
a inclusão social por meio da alfabetização e do letramento, que o permitem refletir as condições
no qual se encontra e compreender que mais do que o analfabetismo o distancia de sua realidade
social, é sua realidade social que o afasta das condições de ser um sujeito alfabetizado e letrado.

estrAtégiAs metodológicAs dA pesqUisA


A metodologia deste artigo teve como base as leituras de Gil (2010) apresentando um caráter
exploratório que proporciona uma maior familiaridade com o problema de pesquisa, trazendo uma
proposta mais explícita diante da construção de hipóteses. Também possui o caráter descritivo no
qual se salienta pesquisas cujo objetivo é estudar as características de um determinado grupo. Uti-
liza também a pesquisa bibliográfica ao destacar que o propósito da mesma é fornecer fundamen-
tação teórica ao trabalho e a identificação do estágio atual do conhecimento referente ao tema,
bem como a pesquisa qualitativa, tendo como objetivo descrever dados mediante contato direto do
pesquisador com a situação do objeto de estudo.
Os procedimentos metodológicos foram por meio de coletas de dados a partir da elaboração e
aplicação de entrevista semiestruturada aberta com questões previamente elaboradas, mas com
ampla liberdade para responder e que descrevem a situação do contexto em que está sendo feita
determinada investigação, levando em consideração os objetivos da pesquisa.
Os sujeitos entrevistados foram duas mulheres, a primeira com 52 anos de idade, viúva, dona de
casa, analfabeta absoluta, assinante apenas com a digital, mãe de dois filhos escolarizados e vive
com a filha mais nova de dezessete anos. A segunda com 45 anos de idade, casada, mãe de um filho
de 15 anos, trabalha no escritório de uma empresa, recém-alfabetizada e que frequenta a primeira
série do primeiro ciclo da EJA. Estas pessoas foram selecionadas, por atenderem aos critérios no
contexto do artigo, bem como, possuírem realidades diferentes.
Para aplicação da entrevista foi utilizado um espaço tranquilo e sem interferências do ambien-
te para não comprometer os resultados da pesquisa e garantir o sigilo pessoal das entrevistadas,
requisitos estes necessários ao comprometimento ético-profissional. Os dados foram gravados e
transcritos com a prévia autorização das pessoas envolvidas na pesquisa.
Foi identificado na primeira entrevistada um pouco de receio após a apresentação do objetivo da
entrevista, pois a mesma pensava que era para ter que escrever algo e sofreria mais algum tipo de
preconceito pela condição de ser analfabeta. Foi percebido também, um sentimento forte de triste-
za e vergonha por parte da mesma, pois a todo tempo respondeu as perguntas com o rosto voltado
para lado e em nenhum momento fixou os olhos na entrevistadora.
Por algumas vezes foi necessário repetir as perguntas e dar exemplos do cotidiano para melhor
compreensão da entrevistada diante dos objetivos das mesmas e para obtenção das respostas. Foi
percebido também, segundo o relato da entrevistada a dificuldade de resolver problemas simples
do cotidiano, como por exemplo: ir ao supermercado ou a uma consulta médica por ser analfabeta.
Isso fica claro na fala que segue: “É isso, é meu sofrer. Quando tenho que comprar alguma coisa eu
mando minha filha, eu tenho vergonha. Não saio, vou a lugar nenhum por conta disso mesmo, fico
mais em casa. Eu acho que eu chego assim e o pessoal fala: ‘nossa ela não sabe lê, aí eu fico com
vergonha, sabe? ’” (JOANA, 52) 2.
A segunda entrevista foi realizada com a pessoa recém-alfabetizada e que ainda frequenta a esco-
la na modalidade EJA. Esta teve como característica um sentimento de mais tranquilidade diante das
perguntas feitas. A todo tempo esteve firme e certa das respostas e satisfeita na opção de buscar um
2 Foram utilizados nomes fictícios para não expor os sujeitos da pesquisa.

763
Categoria: Poster | Subtema 2: Alfabetização, Letramentos e Linguagens Contemp
meio de aprender a ler e escrever. Foi percebido também a partir de suas falas a mudança de vida e
de comportamento depois de ter sido alfabetizada. Relata que este fato mudou a sua vida para me-
lhor e que agora consegue se relacionar com as pessoas. Esboçou a cada momento das perguntas
um sorriso e a satisfação de ter superado a antiga condição de ser analfabeta.
A entrevistada expressa também o desejo de continuar sempre aprendendo e conhecendo mais
do mundo da escrita para busca de crescimento quanto a futuras realizações pessoais: “Agora que-
ro terminar de estudar para quem sabe, ser promovida na empresa” (CLAUDIA, 45). Percebe-se a
espontaneidade nas falas, nos gestos e nas expressões nas narrativas e a compreensão clara das
perguntas feita a mesma.
Após a explicitação dos dados da entrevista pode-se inferir que a alfabetização e o letramento
contribuem para a formação do ser humano no contexto da temática proposta por este artigo no
que tange as dimensões sociais do sujeito.

As conseqUênciAs dA fAltA dA AlfAbetizAção e do letrAmento pArA


o reconhecimento dA condição sociAl
Tomando como referência as abordagens feitas neste artigo, este item irá tratar da análise dos
resultados dos dados coletados na pesquisa a partir dos quais foi possível identificar a relação dos
dados com a vida social dos sujeitos.
As análises sociais apontam a realidade de pessoas que não tiveram a oportunidade do acesso
à escola na idade adequada e que possuem trajetória de vida marcada pela exclusão, por perda da
dignidade e do não reconhecimento social. Souza (2011, p. 18) destaca que “[...] as condições sociais
e a desigualdade social, somadas às frágeis políticas educacionais, integram o rol de fatores que
contribuem para a existência de analfabetos. [...]”
A desigualdade social e a exclusão são aspectos que marcam a sociedade, uma vez que somente
aqueles que possuem acesso ao conhecimento podem experimentar um processo emancipatório.
Por isso, são comuns pessoas não alfabetizadas se sentirem deslocadas e inferiorizadas diante de
um ambiente com pessoas letradas. Esta realidade pode ser percebida a partir da reflexão sobre
relato da primeira entrevistada, ao dizer que sente vergonha diante da sua condição de analfabeta
e que não sai de casa a não ser acompanhada de sua filha (17 anos) para que não seja reconhecida
pelas pessoas. E também, pela segunda entrevistada ao relatar ter perdido muitas oportunidades de
emprego por não saber ler e escrever. Para Pereira (2006, p.19) os sujeitos analfabetos, “[...] ficaram
impedidos de interagir, de forma mais efetiva, em situações da vida cotidiana que envolva conheci-
mentos mais elaborados, tornando-se excluídos de processos mais amplos de participação social.”
A busca de valores sob a prática religiosa também é notória em ambas as entrevistas, pois em
seus discursos relatam o desejo de aprender a ler e a escrever para a obtenção da habilidade de
leitura bíblica. Esta prática também está ligada ao convívio em um espaço público mais frequente,
com fins voltados às crenças e valores buscando uma autonomia individual e a participação ativa
em grupo. Pereira (2006, p. 86) afirma que,

Nos discursos dos sujeitos, a leitura e a escrita assumem um valor positivo que
envolve a busca de maior autonomia ou independência em relação aos contextos
de uso da escrita. Essa pressupõe a ampliação de uma mobilidade social dos sujeitos
em relação à própria inserção nos espaços públicos, nas relações de trabalho, na
participação política, religião, lazer etc. A possibilidade de escolha e de efetiva par-
ticipação em outros espaços sociais, que não só a família, é uma condição buscada
pelos sujeitos a partir de sua gradativa apropriação do código e interação com o

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Categoria: Poster | Subtema 2: Alfabetização, Letramentos e Linguagens Contemp
mundo da cultura escrita.

A maneira como os sujeitos se auto-avaliam apresenta reveladora posição diante da construção


de sua identidade. Quando questionados sobre ser analfabeto se reportaram a imagens negativas
de si. Imagem esta que reflete na construção da identidade do sujeito diante dos conflitos presentes
em diversos contextos da escrita. Como o caso da primeira entrevistada ao se referir que ser analfa-
beto é ser pior do que criança, pois depende do outro para tudo, até para ir ao médico ou fazer uma
simples rematrícula na escola de sua filha, por isso, se sente inútil e incapaz. Nesta perspectiva Souza
(2011, p. 146), diz que os analfabetos “[...] incorporam um sentimento de incapacidade que durante
muito tempo foi incutido a eles.”

Outro aspecto é perceber as formas de exclusão por parte da sociedade grafocêntrica àqueles
que não possuem habilidades de leitura e escrita em suas atividades e práticas sociais. Como o re-
lato da dona Penha, no qual diz que recebe apelidos pela sua condição de analfabeta, quando em
situações do cotidiano precisou se locomover para determinados lugares e não conseguiu chegar,
por isso, foi chamada de “ignorante”. Para tanto Freire (1981, p. 12) declara,

Este modo de tratar os adultos analfabetos implícita uma deformada maneira de


vê-los – como se eles fossem totalmente diferentes dos demais. Não se lhes reconhe-
ce a experiência existencial bem como o acúmulo conhecimentos que esta experiên-
cia lhes deu e continua dando.

Pode-se observar o valor de forma positiva que estes sujeitos atribuem à leitura e a escrita como
instrumento de interação social. Valor este que abarca significados que estão diretamente ligados
a aspectos pessoais e a condição de analfabetos. Diante do relato da segunda entrevistada, no qual
afirma que aprender a ler e escrever melhora a vida, abre caminhos para a inserção no trabalho, no
diálogo com as outras pessoas e que quando dominam este código ocupam um lugar privilegiado
na sociedade letrada e quem não tem este domínio estão em desvantagem. Diante disso, Pereira
(2006, p. 84) traz referências relacionadas a este relato ao dizer que, “[...] ao sistema da escrita e ao
seu domínio é atribuído um valor de superioridade. De modo geral, essa superioridade alimenta o
estigma de ser analfabeto.” E, este mesmo autor, ainda afirma que com relação ao comportamento,
os discursos destes sujeitos expressam certa dificuldade de se comunicarem em público, inibição,
timidez, pouca participação nas decisões do grupo familiar e em situações da vida cotidiana. (PEREI-
RA, 2006)
Pode-se observar que os usos que os sujeitos fazem da leitura e da escrita estão diretamente li-
gados com suas vivências e projetos individuais construídos socialmente, ou seja, garante que eles
se sintam pertencentes à sociedade letrada, enquanto que o oposto é dado ao sujeito analfabeto à
posição de excluídos.
Observou-se também a partir dos dados colhidos que o perfil dos entrevistados aponta questões
ligadas ao preconceito e à exclusão de pessoas analfabetas por pertencerem a uma sociedade em
que todo seu contexto envolve a leitura e escrita como instrumento de inserção social. Uma socie-
dade que exige o conhecimento do código do sistema da escrita para que haja um mínimo de co-
municação e participação social.
Nesta perspectiva, a alfabetização e o letramento começam a ser pensados como um caminho
para uma busca de melhoria de vida e de facilitador do cumprimento do papel de cidadão, como
possibilidade de desenvolver o senso crítico e de interpretação do mundo a sua volta.

As contribUições dA AlfAbetizAção e do letrAmento pArA A formA-

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Categoria: Poster | Subtema 2: Alfabetização, Letramentos e Linguagens Contemp
ção e o reconhecimento político-sociAl do sUjeito
Durante toda história do processo da alfabetização, houve transformações relevantes em seus
conceitos que permitiram a quebra de paradigmas e metodologias tradicionais. Muitas descobertas
por um ensino da língua que ultrapassasse concepções e que trouxesse verdadeiros conhecimentos
ao sujeito nos remete a ideia de que a leitura e a escrita trazem consequências favoráveis nas dimen-
sões sociais, culturais e políticas para aquele que a adquire.
Levando em consideração a perspectiva de Soares (2009), o letramento pode ser considerado, a
condição que o sujeito adquire quando aprende a ler e escrever e utiliza dessas práticas no contexto
social. Ao contrário do sujeito considerado analfabeto, pois vive uma condição de quem não sabe
ler e escrever nem o próprio nome. Sendo assim, é importante reconhecer a maneira como o analfa-
beto tem sido historicamente tratado no contexto da realidade de uma sociedade letrada, onde os
valores e a vasta experiência de vida do sujeito entram em contradição com práticas sociais que não
valorizam o mesmo como ser que aprende, como alguém capaz de ensinar produzindo de forma
autônoma novas relações mediante a prática da cidadania e a partir daí ser capaz de transformar sua
realidade. Neste sentido Gadotti (2010, p. 43) traz um conceito de que:

Os “autonomistas” são pessoas insatisfeitas. Não porque se sintam frustrados,


mas porque a autonomia, como a liberdade, é um processo sempre inacabado, um
horizonte em direção do qual podemos caminhar sempre sem nunca alcançá-lo de-
finitivamente.

Sendo assim, não se pode ignorar que no Brasil ainda existe um problema de base que não foi
sanado, mesmo que diante de grandes avanços e transformações tecnológicas na busca de novos
conhecimentos e de um progresso interno. Pois, ainda hoje se convive com o analfabetismo impe-
dindo interações com perfis sociais e atuais.
Com base nas reflexões geradas pelos dados colhidos, compreende-se então a importância a
respeito do direito do cidadão a educação no que concerne a intervenção e influência na condição
de sujeito analfabeto. Situação esta que se encontra grande parte da população do país que não
experimentou uma transformação em todos os âmbitos: social, econômico, político e cultural, tor-
nando a EJA um desafio representado diante dos altos índices de analfabetismo. Nesta perspectiva
Piconez (2002, p. 97) aponta que: “[...] a educação escolar de jovens e adultos pode contribuir para
a ampliação do exercício da cidadania”. O autor Piconez (2002, p. 98), também, traz a ideia de que:
“Por meio da educação escolar, os indivíduos têm, diante de si, um “mundo” do qual até então não
tinham consciência”.
É impossível pensar na EJA e ignorar as reflexões sugeridas acima. É de grande relevância reco-
nhecer esta modalidade como instrumento de desenvolvimento de um perfil de cidadania, como
forma de qualificação dos sujeitos que se tornam capazes de resolver problemas, interagir com dife-
rentes linguagens e preparados para as possíveis mudanças dentro da sociedade. Há um potencial
humano a ser explorado à espera de apenas uma oportunidade para ser desenvolvido. A prática da
leitura e escrita pode levar o homem à sua condição de sujeito social, capaz de acessar informações
e saber tratá-las conforme as necessidades da vida pessoal e coletiva. Isto muito se deve à Constitui-
ção Federal de 1988, considerada um grande marco para o país, e segundo Soares (2002, p. 11) ela:

[...] estabelece o direito à educação de jovens e adultos, quando expressa no art.


208 que o dever do estado com a educação será efetivado mediante garantia de: I.
ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram
acesso na idade própria.

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Categoria: Poster | Subtema 2: Alfabetização, Letramentos e Linguagens Contemp
A EJA vem assumindo espaço dentro das iniciativas governamentais somando-se a iniciativas de
grupos populares, instituindo o atendimento ao jovem e ao adulto com o reconhecimento da im-
portância da formação dos mesmos para o exercício da cidadania. O que demonstra que o jovem e
o adulto vêm sendo cada vez mais considerados portadores de direitos, reivindicadores do cumpri-
mento do dever do estado para com a educação. Para tanto Soares (2002, p. 61) explicita que:

A lei 9.394/96 no § 3º do art. 5º que qualquer indivíduo que se sentir lesionado


neste direito pode dirigir-se ao Poder Judiciário para efeito de reparação e tal ação é
gratuita e de rito sumário. O uso desta faculdade de agir com vistas a este modo de
direito é reconhecido também para organizações coletivas adequadas. Ao exercício
deste direito corresponde ao dever do estado na oferta desta modalidade que lhes
são concernentes.

A educação como parte indispensável para o exercício da cidadania na sociedade moderna vai
tomando espaço cada vez maior diante dos grandes avanços e mudanças nos processos de cresci-
mento social. Ela representa a possibilidade do sujeito realizar-se, atualizando seus conhecimentos,
explorar seu potencial e desenvolver suas habilidades e competências para elevar sua expectativa
de vida. Por isso, fazer a reparação da realidade do analfabetismo, dívida esta inscrita na história so-
cial brasileira e na vida de muitas pessoas, é um dos propósitos da EJA porque entende o princípio
de igualdade para todos. Sendo assim, segundo o Parecer CNE/CEB nº11/2000, Parágrafo único I,II,III
e dentro das bases legais das Diretrizes Curriculares Nacionais para esta modalidade, Soares (2002,
p. 136) diz que:

[...] quanto à equidade, a distribuição específica dos componentes curriculares a


fim de propiciar um patamar igualitário de formação e restabelecer a igualdade de
direitos e de oportunidades face ao direito à educação; quanto á diferença, a iden-
tificação e o reconhecimento da alteridade própria e inseparável dos jovens e dos
adultos em seu processo formativo, da valorização do mérito de cada qual e do de-
senvolvimento de seus conhecimentos e valores; quanto á proporcionalidade, a dis-
posição e alocação adequadas dos componentes curriculares face às necessidades
próprias da EJA com espaços e tempos nos quais as práticas pedagógicas assegu-
rem aos seus estudantes identidade formativa comum aos demais participantes da
escolarização básica.

Pensar em possíveis soluções para problemas do âmbito da questão da cidadania, ou seja, como
participação ativa do sujeito na vida social, é importante viabilizar ao jovem e adulto o acesso aos
conhecimentos culturalmente acumulados e o desenvolvimento das habilidades cognitivas rela-
cionadas à leitura e a escrita, com o fim de permitir a estes a compreensão crítica das informações
presentes no mundo, de maneira que possibilite ampliar o potencial de participação do exercício da
cidadania. Piconez (2002, p. 16) entende que, “sem consciência crítica, conhecimento e participação
não é viável o desenvolvimento humano, por que a população se quer descobre como oportunida-
de.”
Isso significa dar condições ao sujeito de acompanhar as velozes transformações da sociedade
moderna que exige um aprendizado por toda a vida, sendo protagonista ativo e autônomo da cons-
trução da sua própria história. Desta maneira, o sujeito não estar em condição de igualdade em
uma sociedade grafocêntrica, onde a leitura e escrita é uma posição de privilégio apenas de alguns,
mostra-se como desafio a ser enfrentado. E que estes se tornam bens importantes, de valor prático
para a conquista do direito à cidadania e para o reconhecimento político/social do sujeito.

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Categoria: Poster | Subtema 2: Alfabetização, Letramentos e Linguagens Contemp
considerAções finAis
No percurso da escrita deste artigo nos enveredamos por diversas reflexões na preocupação de
analisar como o analfabetismo limita o sujeito ao não reconhecimento de sua condição social. Este
caminho percorrido revelou a importância e o desafio de uma sociedade que caminha para a inclu-
são, que não nega a identidade do sujeito e nem a sua experiência, numa perspectiva emancipadora
e não excludente na vida de pessoas que não iniciaram seus estudos no tempo adequado. Neste
sentido, entendemos que uma sociedade democrática é aquela que respeita as diferenças, que leva
em consideração o que sujeito é e o que é capaz de fazer, a partir de sua história de vida, contribuin-
do assim na construção da mesma.
As análises nos permitiram observar que diminuir a taxa de analfabetismo no Brasil não deve ser
uma preocupação única, mas da inserção do sujeito ao mundo social e a atuação na formação da
sua identidade, fator este necessário ao exercício da cidadania. E que o sujeito que não possui habi-
lidade de ler e escrever na sociedade letrada pode se tornar alguém esquecido e rejeitado diante das
exigências para a sobrevivência dentro do seu contexto.
É nesta sociedade letrada marcada por avanços científicos e tecnológicos, na qual existem sujei-
tos excluídos por não possuírem a competência necessária para atuarem no seu cotidiano, que a
educação de jovens e adultos, como direito de todos, independente da idade, situação econômica,
raça, cor ou religião tem um relevante papel no sentido, de não apenas, levar o sujeito a conhecer o
sistema da escrita, mas de formar sujeitos capazes de atuarem no mundo em que vivem de forma
crítica e consciente, de conhecerem seus direitos e deveres e até mesmo de buscar melhores de
condições de vida e assim poderem ser chamados de cidadãos, ou seja de serem reconhecido na
sua condição social.

referênciAs
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TFOUNI, Leda Verdiani. 9. ed. São Paulo: Cortez, 2010.

768
Categoria: Poster | Subtema 2: Alfabetização, Letramentos e Linguagens Contemp
A ArticUlAção de tecnologiAs edUcAcionAis à lUz dA
inclUsão digitAl nA edUcAção de joVens e AdUltos
AnA ligiA oliVeirA teixeirA

Este estudo, que considera propostas de trabalho visando a inclusão digital, implica em ensi-
nar uma pessoa a usar um computador para acessar a internet, pesquisar ou elaborar textos, e,
principalmente, ensinar em como melhorar os quadros sociais, utilizando-se dos recursos que um
computador oferece e contribui para a melhoria de vida por meio da qualificação profissional, en-
tre outros benefícios que a tecnologia trás. O problema que moveu essa pesquisa foi a dificuldade
que os alunos apresentam ao iniciarem sua jornada estudantil nos cursos técnicos integrado com
o ensino médio – PROEJA, no IFES – Campus Vitória, localizado na cidade de Vitória, Espírito Santo.
Portanto, há uma clara intencionalidade em mostrar que os alunos dos cursos técnicos integrados
com ensino médio modalidade Eja apresentam dificuldades para executarem pesquisas acadêmicas
por meio do computador, que é uma, dentre outras, ferramenta de apropriação do conhecimento
formal. A pesquisa é fundamentada nas teorias de Vigotsky e Paulo Freire, no que tange às teorias
sócio cultural interacionista e da educação libertadora; e nas teorias de Pierre Levy e Ladislau Do-
wbor relacionadas as novas tecnologias. Esta pesquisa verifica o processo de apropriação do com-
putador como ferramenta pedagógica pelos participantes e sua interação com o ambiente virtual.
Trata-se de uma pesquisa multimodal qualitativa e quantitativa com aplicação de questionários e
entrevistas para a caracterização dos sujeitos e a observação de aulas, para melhor apropriação de
dados e consequente análise. Para responder ou negar a principal hipótese norteadora da pesquisa
foi necessário observar e constatar que os planos de aula das disciplinas que contemplam atividades
realizadas no computador, durante as aulas regulares, contribuem para dirimir esta limitação ainda
nos primeiros semestres do curso. Para atender as expectativas geradas pela pesquisa utilizamos as
variáveis independentes, tais como a aplicação da tecnologia da informação e as comunicações no
processo de ensino-aprendizagem.

palavras-chave: educação de jovens e adultos, inclusão digital, computador, tecnolo-


gia da informação e comunicação

considerAções iniciAis
A história das tecnologias se confunde com a história do homem, que pode ser vista a partir da
descoberta do fogo e da invenção de ferramentas, que facilitou a vida escolar e possibilitou o traba-
lho inicial da pesca e da caça; o caminhar por essa história revela que a cada tecnologia inventada
pelo homem, a escola buscava inserir ferramentas tecnológicas relevantes para educação de cada
época e suas demandas. Vale registrar que o sistema educacional em cada época, foi marcado por
elementos tecnológicos inseridos de acordo com o aspecto histórico do momento.
Quando se fala em tecnologias, o que nos vem imediatamente ao pensamento são os computa-
dores, vídeo, softwares e Internet, isto por que, sem dúvida são as mais visíveis e que mais influen-
ciam os rumos da educação atual. No entanto, é importante lembrar que o conceito de tecnologia é
muito mais abrangente. Ou seja, tecnologias são os meios, os apoios, as ferramentas que utilizamos
em nosso dia a dia para a execução das mais diversas tarefas. Valemo-nos de Lalande (1999) para
dizer que [...] tecnologia é o estudo dos procedimentos técnicos, naquilo que eles têm de geral e nas
suas relações com o desenvolvimento da civilização.
Considerando que a vida de hoje acontece em uma sociedade digitalizada, é preciso atentar para
o fato de que precisamos fazer uso, no nosso cotidiano, de várias ferramentas tecnológicas e, cada

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Categoria: Poster | Subtema 2: Alfabetização, Letramentos e Linguagens Contemp
vez mais, avançadas. A vivência didática e pedagógica e também a atuação como gestora educacio-
nal, possibilitou acompanhar de muito perto estes avanços tecnológicos. Ao constatar a dificuldade
apresentadas pelos alunos ao iniciarem sua jornada estudantil nos cursos técnicos integrado com o
ensino médio – Proeja3, no IFES – Campus Vitória e a forma como os atores da escola4 interpretam
e lidam com estas novas tecnologias inquietou a tal ponto que demandou uma pesquisa em curso,
culminando na seguinte problematização: que práticas pedagógicas e/ou metodológicas poderão
contribuir para a inclusão digital destes alunos?
A pesquisa considera que o aluno do Proeja faz parte de um público que, por motivos vários,
ficaram algum tempo distante dos bancos escolares e agora retornam e se vêm diante de um novo
cenário, um novo currículo de ensino que requerem novas ações pedagógicas. Dito de outra forma,
as atividades, em geral, fazem parte do contexto de conhecimentos que tem sido construído nas
escolas, sem considerar as especificidades desses jovens e adultos que, via de regra, encontram-se
às margens da sociedade.
Diante do acima exposto pode-se dizer que o interesse em estudar a problemática das turmas
dos cursos Técnicos Integrados com o Ensino Médio – Proeja no Ifes5-Campus Vitória-ES/BR diz res-
peito à percepção do (des) conhecimento de informática que eles apresentam ao ingressarem no
Ifes, principalmente, aquelas ligadas à utilização do computador como ferramenta para o processo
ensino-aprendizagem destes alunos.
Considerando que a proposta de inclusão digital implica em ensinar uma pessoa a usar um com-
putador para acessar a internet, pesquisar ou elaborar textos utilizando-se dos recursos que um
computador oferece e contribui para o cotidiano laboral, podendo contribuir para a qualificação
profissional, entre outros benefícios que a tecnologia traz. Sendo assim, a pesquisa propõe como
objetivo: identificar práticas pedagógicas e/ou metodológicas que poderão contribuir para a inclu-
são digital destes alunos.
Assim, a pesquisa tem como intencionalidade desvendar questões inquietantes relacionadas às
dificuldades destes alunos, bem como, encontrar respostas para as mesmas; há também a preocu-
pação de contribuir para a compreensão do que acontece na prática da escolarização destes estu-
dantes que não receberam orientação em sua formação inicial que possibilite o uso das TICs em suas
trajetórias escolares no Proeja.

Um breVe histórico dA edUcAção de joVens e AdUltos no brAsil


Apesar de resguardado o direito de acesso e permanência no sistema escolar, muitos chegam à
adolescência e à idade adulta sem que este direito tenha sido cumprido em relação à sua pessoa.
Neste caso, o artigo 38, da Lei de diretrizes e bases da educação nacional, garante que os sistemas de
ensino manterão cursos e exames supletivos, que compreenderão a base nacional comum do currí-
culo, habilitando ao prosseguimento de estudos em caráter regular. Identifica-se que, atualmente, a
idade mínima para ingresso na educação de jovens e adultos é de 15 anos para o ensino fundamen-
tal e de 18 anos para o ensino médio.
A legislação assegura, também que os jovens e adultos tenham oportunizadas as condições
apropriadas para seus estudos levando-se em conta as características do alunado, seus interesses,
condições de vida e de trabalho. Além disto, a educação de jovens e adultos deverá articular-se,
preferencialmente, com a educação profissional e o aluno trabalhador deve ter garantido estímulo
necessário para que possa permanecer na escola, mediante ações integradas e complementares
entre si.
3 Programa de Educação de Jovens e Adultos – Programa do Governo Federal para atender aos jovens e adultos que se en-
contram em descompasso com a escolarização.
4 Entenda-se como atores escolares a todas as pessoas que, de alguma forma, estejam inseridas neste universo chamado
escola e, em particular no Ifes – campus Vitória que ambienta esta pesquisa.
5 Instituto Federal de Educação Tecnológica do Espírito Santo.

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Categoria: Poster | Subtema 2: Alfabetização, Letramentos e Linguagens Contemp
Segundo Paiva (1983) historicamente, a educação para jovens e adultos - no Brasil - teve início nos
tempos coloniais, quando os religiosos exerciam uma ação educativa missionária junto aos adultos
pobres; foi no período do governo de Getúlio Vargas que houve uma reformulação acerca do papel
do Estado na gerência da educação. Do período colonial até 1930, a educação de jovens adultos não
teve qualquer tipo de consideração específica nas políticas públicas da Educação brasileira. Somen-
te a partir de 1943, com o processo de redemocratização, é que começam as primeiras mobilizações
em torno da educação de adultos
Na década de 30 a educação de adultos começou a delinear seu lugar na história da educação
no Brasil. Nos anos 40 - devido um novo modelo de produção - começou a ser formatado no Brasil
e com ele, foi gerada a demanda da ampliação da educação de jovens e adultos que ganhou a pro-
porção de Campanha Nacional de Massa. Porém, esta Campanha foi extinta antes da década de 50
sendo criticada tanto pelas deficiências administrativas e financeiras, quanto pela (des) orientação
pedagógica.
Nesta década, a educação de jovens e adultos era entendida, principalmente, como educação de
base e desenvolvimento comunitário. No final dos anos 50, Paulo Freire estimula duas das tendên-
cias mais significativas na educação de jovens adultos: 1) a educação de adultos entendida como
educação libertadora e 2) a educação de jovens e adultos entendida como educação funcional –
profissional - ou seja, a formação de mão-de-obra mais produtiva, útil ao projeto de desenvolvimen-
to nacional.
Nos últimos anos governos de vários países evidenciaram necessidades de ações, referente à mo-
dalidade da educação de jovens e adultos, bem como, as dificuldades em se conseguir resultados
satisfatórios, devido à complexidade do tema frente a inserção da Eja na era da informação e suas
consequências. Estes governos entraram na agenda do Banco Mundial que financia os politicas e
programas de educacao, em paises em desenvolvimento.
Desta forma, a UNESCO tem elaborado políticas de Educação para Todos abrangendo aspetos
tais como cultura da paz até a constituição de uma cultura para a formação do homem empreende-
dor enfocando a necessidade de indicar caminhos para o combate do desemprego. Neste sentido,
varias acoes foram realizadas no tempo historico que compreende o ano de 1949 ate o ano de 2009,
conforme demonstrado abaixo.
quadro 1 – histórico confiteA.

Conferência Internacional de Educação de Jovens e Adultos - CONFITEA

Marcada pela catástrofe que representou para a hu-


manidade a Segunda Guerra Mundial, encerrada em
1945, o tema recorrente é a atenção ao jovem e adulto
I 1949 Dinamarca - DEN para que possam ter condições de criar em seu dia a
dia a cultura da paz e recomendações aos governos dos
países denominados na época de subdesenvolvidos
pudessem intensificar as campanhas de alfabetização.
Os debates focalizaram o papel do Estado na edu-
cação de adultos e a educação de jovens e adul-
tos foi tratada como necessária para acertar as
II 1960 Montreal - CAN
falhas da educação regular que permitia que
as crianças se tornassem jovens e adultos sem
se beneficiarem plenamente da educação.
Além do assunto-tema, aconteceram dis-
III 1972 Tóquio - JPN
cussões incluindo mídia e cultura.

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Categoria: Poster | Subtema 2: Alfabetização, Letramentos e Linguagens Contemp
Ressaltou a importância da qualidade da educa-
IV 1985 Paris - FRA ção e, assunto de interesse deste trabalho, foi in-
cluído o tema novas tecnologias na educação.
Os debates ocorridos durante esta Conferência é
tida, até hoje como uma das mais importantes por-
que deu nova forma à educação de jovens e adultos
V 1997 Hamburgo - GER e gerou um Relatório, importante base para a con-
tinuidade da EJA. O relatório reitera que a perspec-
tiva de aprendizagem durante toda a vida exige,
por sua vez,complementaridade e continuidade.
Reafirmou as conclusões de Hamburgo e introduziu
relatórios de avanços na EJA. Relatórios dos traba-
lhos em vários países mencionam que as tecnologias
de informação e comunicação, além da educação à
distância estavam sendo adotadas e gradualmente
VI 2009 Belém - BR
respondendo a necessidades específicas de educan-
dos que até recentemente estavam excluídos. Além
disto,sistemas de informação, documentação, moni-
toramento e avaliação para programas de aprendi-
zagem e educação de adultos foram introduzidos.

Cada um destes encontros contribuiu para o avanço na compreensão do real significado de uma
prática educacional voltado para educação de jovens e adultos tendo como norte a ideia de que
toda pessoa tem direito à escola, à livre escolha de emprego, à condições justas e favoráveis de
trabalho e à proteção contra o desemprego. A educação de jovens e adultos, mais do que qualquer
outra modalidade da educação está relacionada com a capacidade do ser humano de conseguir
autonomia para ter plena participação na vida social e no mercado de trabalho.
Desde 1989, com finalidade de preparar o Ano Internacional da Alfabetização (1990), foi criada
no Brasil, a Comissão Nacional de Alfabetização coordenada, inicialmente, por Paulo Freire e depois
por José Eustáquio Romão. Esta comissão continua até hoje, com o objetivo de elaborar diretrizes
para a formulação de políticas de alfabetização em longo prazo que nem sempre são assumidas
pelo governo federal.
Historicamente, o que se verifica é que a estrutura escolar do Brasil foi modulada de forma grada-
tiva e morosa, contando com escassos recursos de ordem financeira e com políticas públicas incoe-
rentes, e, muitas vezes, equivocadas.
Aguiar (2009, p.72) reforça que:

As chamadas “políticas públicas” da Educação de Jovens e Adultos e de Educação


Profissional, historicamente, nunca estiveram inseridas nas “grandes políticas” edu-
cacionais no Brasil. Sempre estiveram à margem como programas, projetos, campa-
nhas e outras práticas, muitas vezes eleitoreiras e vinculadas a interesses imediatis-
tas das elites dominantes.

Dentre outras coisas, observa-se que nesse período ocorreu a implementação do Plano Nacional
de Educação, proposto pela Constituição de 1934, determinando que educação seria, a partir de
então, direito fundamental do cidadão, e instituindo o ensino primário gratuito e de presença obri-
gatória, extensivo aos adultos.

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Categoria: Poster | Subtema 2: Alfabetização, Letramentos e Linguagens Contemp
AprendizAgem e inclUsão digitAl
De um modo geral, podemos considerar que recursos digitais, utilizados para dar suporte ao
processo ensino-aprendizagem, nem sempre são acessíveis aos estudantes em seu cotidiano, em
de salas de aula e laboratórios tradicionais. Ao se esperar que a inclusão social se promova somente
através do acesso às TICs, pode-se estar também promovendo efeito contrário ao esperado. Os auto-
res Bernardo Sorj e Julie Remold (Boletim Técnico do Senac, xxxx) prelecionam que as novas tecno-
logias da informação aumentam desigualdades sociais existentes e as políticas para inclusão digital
nada mais são que uma luta para reigualar as possibilidades de acesso ao mercado de trabalho e as
condições de vida, caracterizando assim, a inclusão social.
Caracteriza-se que a melhor maneira de compreender a inclusão social é entendê-la no sentido
prático, de fazer da inclusão social a vida real das famílias e das comunidades, como ponto de par-
tida para a melhoria das condições de vida dos excluídos, prevendo a redução das desigualdades
sociais. O termo incluir, segundo o dicionário Aurélio (Ferreira, 2001, p. 380) significa “1. compreen-
der, abranger; 2. conter em si; 3. inserir, introduzir; 4. estar incluído ou compreendido; fazer parte;
inserir-se”.
É neste contexto, de fazer a inclusão social pela “inclusão digital”, que se verifica a necessidade
de aprimoramento da atuação das instituições de ensino, tendo em vista que é papel da educação
subsidiar as autoridades para que criem, políticas públicas baseadas no conhecimento das inúmeras
vantagens da inserção de tecnologias no processo educacional.
De acordo com Brandao (1999, p.27), a informatizacao da escola e utilizacao de recursos multimi-
dia e hipermidia:

[...] permite imaginar que formas múltiplas de expressões e linguagens


transformarão a escola em um ambiente estimulante, interativo e inovador.
O binômio informática e educação implica, portanto, uma rara ocasião pra se
refletir não somente sobre os métodos de trabalho, mas também sobre formas
de linguagem e de expressão didática diante das atuais exigências de comuni-
cação impostas pela presença maciça de computadores na sociedade.

Se o binômio informática e educação servem para estimular o estudante por se dar em ambien-
te interativo e inovador, conforme citação alhures, faz-se necessário encontrar uma solução para
incentivar o ingresso no mercado de trabalho e dar continuidade ao processo de aprendizagem
proporcionado pelos programas, uma vez que as políticas públicas de inclusão devem contemplar
ações que proporcionem não a mera instrumentalização, ensinando o marginalizado à utilizar as
ferramentas tecnológicas, mas também propiciar a geração de emprego e renda, dando pois, conti-
nuidade e eficiência aos fins a que se propõe: a verdadeira inclusão social.
Neste sentido e com base em Saviani (2005) pode-se afirmar que a escola tem o papel fundamen-
tal de possibilitar o acesso das novas gerações ao mundo do saber sistematizado, do saber metódico
e do saber científico; portanto, pode-se dizer ainda que a escola necessita organizar processos, des-
cobrir formas adequadas para essa finalidade.
Essas mudanças sociais exigem grandes transformações na educação que consequentemente,
está ligada diretamente aos educadores, cujas prioridades nesse processo, devem ser a capacitação
profissional dos docentes. Isto por que as novas tecnologias, informatização, sociedade midiática e
demais recursos tecnológicos são recursos didáticos e de aprendizagem muito presentes no espaço
escolar.
Com o intuito de atender às necessidades contemporâneas, a educação e as tecnologias devem
caminhar juntas, o que torna importante a utilização das novas tecnologias nas práticas docentes,

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Categoria: Poster | Subtema 2: Alfabetização, Letramentos e Linguagens Contemp
aliada à percepção da escola e dos docentes de que as mudanças vão além da mera inserção de re-
cursos, que precisam efetivamente passar por uma compreensão profunda sobre o papel das novas
tecnologias e sua apropriação na prática docente.

tecnologiAs dA edUcAção
A Tecnologia Educacional, a partir de 1990, caracterizou-se pela busca de novas maneiras de atuar
no campo educacional. O foco da utilização da informática centrou-se na internet, considerada uma
ferramenta universal de comunicação e de pesquisa. Os educadores concentraram-se na investiga-
ção de estratégia para sua utilização, desenvolvendo atividades sincrônicas e assincrônicas, criando
comunidades virtuais de aprendizagem, cursos à distância e portais com conteúdos educacionais.
No início do século XXI as tecnologias deixam de ser encaradas como meras ferramentas que tor-
nam mais eficazes e eficientes modelos de educação já sedimentados, passando a ser consideradas
como elementos estruturantes de “novas” educações (plural), com o objetivo de expressar a diversi-
dade das culturas e dos processos pedagógicos.
As transformações advindas das tecnologias educacionais demandam novas metodologias de
ensino, que contam com modernos suportes pedagógicos, capazes de criar um novo papel para o
professor e ressignificar o conceito de ensino, a partir de questões colocadas pelos estudos da cog-
nição.
Do mesmo modo, as novas exigências da sociedade atual levam as instituições de formação do
professor a se reposicionar, para atender às diferentes metodologias, ao exercício da pesquisa no
cotidiano da prática pedagógica, com respeito aos distintos saberes dos alunos. Esse processo pos-
sibilita a ambos os atores sociais – docente e aluno – a formação do senso crítico, diante das diversi-
dades da vida contemporânea. Nesse cenário urge uma postura ética inclusiva, capaz de promover
contínuas reflexões sobre a prática pedagógica, em uma atitude de abertura às novas possibilidades
de se ofertar ao aluno, espaços contextualizados de aprendizagem.
De acordo com Dowbor (2001)6, junto com os fins surgem os meios, pois, ao mesmo tempo
em que a educação se torna um instrumento estratégico de reprodução social e de promoção das
populações, surgem as tecnologias que permitem dar um grande salto nas formas, organizações e
conteúdo da educação.
Aliado a isso Dowbor (2001, p. 13) diz que:

Informática, multimídia, telecomunicações, bancos de dados, vídeos e tantos ou-


tros elementos se generalizam rapidamente. A televisão, hoje um agente importante
de formação, pode ser encontrada nos domicílios mais humildes. Os custos destes
instrumentos estão baixando vertiginosamente.

Sendo assim, não resta dúvida de que as instituições passam a ter mais facilidades na aquisição
de ferramentas tecnológicas a serem utilizadas em sala de aula, possibilitando o acesso da comuni-
dade escolar ao mundo do saber digital o que proporciona a descoberta, por parte de professores,
de formas metodológicas mais adequadas de transmissão e recepção de conhecimentos.

metodologiA

6 Ladislau Dowbor, formado em economia política pela Universidade de Lausanne, Suiça. Doutor em Ciências Econômicas
pela Escola Central de Planejamento e Estatística de Varsóvia, Polônia (1976). Atualmente é professor titular no departamento de pós-
-graduação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, nas áreas de economia e administração. Continua com o trabalho de
consultoria para diversas empresas.

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Categoria: Poster | Subtema 2: Alfabetização, Letramentos e Linguagens Contemp
É uma pesquisa de abordagem qualitativa com a utilização de diversos instrumentos de produ-
ção de dados, dentre os quais, a observação, o questionário e a entrevista. As observações consisti-
ram em acompanhar as aulas das disciplinas de conhecimentos gerais e das áreas técnicas. A aplica-
ção do questionário teve como intencionalidade identificar os níveis de conhecimento apresentado
pela população a ser pesquisada.
Para tanto, sua aplicação aconteceu com alunos das turmas ingressantes de 2012 (1º período) e
turmas concluintes do último período - 1º semestre de 2014 - dos cursos técnicos que são abar-
cados pelo Proeja no Ifes campus Vitória-ES. Estes dois momentos tiveram como finalidade realizar
um diagnóstico do nível de conhecimento de informática dos alunos ao iniciarem e ao concluírem o
curso. As entrevistas foram realizadas logo após a aplicação do questionário com aqueles que acei-
taram continuar com a pesquisa.
A pesquisa aplicada permite verificar como as tecnologias educacionais têm sido utilizadas no
desenvolvimento da educação de jovens e adultos. Para fins de observação nesta pesquisa, buscou-
-se apoio na prática da professora de Língua Portuguesa que, em parceria com a professora de Infor-
mática, realizou o Projeto de Aprendizagem Transdisciplinar.
De acordo com Moran (2000) [...] as redes sociais atraem os estudantes. Eles gostam de navegar,
de descobrir endereços novos, de divulgar suas descobertas, de comunicar-se com outros colegas.
Com esta percepção, professores que contribuíram com a pesquisa buscam na internet nova forma
de ensinar e aprender por meio de projetos de pesquisa nos quais os alunos foram desafiados a
buscar e para tanto, deveriam, a partir da exibição de filmes e leituras de texto na internet, construir
novos conhecimentos.
Identifica-se que esta forma de trabalhar contribui para diagnosticar dificuldades enfrentadas
pelos alunos, pois a professora esteve sempre atenta para intervir de acordo com as necessidades
individuais apresentadas, porém, as dúvidas eram sanadas para o coletivo da sala, entendendo que
a dúvida de um poderia ser a dúvidas de outros.
Logo, a educação de Jovens e Adultos no IFES – Campus Vitória, tem contado com a iniciativa
de alguns professores no sentido de promoverem atividades que proporcionem a estes jovens e
adultos acesso às ferramentas tecnológicas mais freqüente,o que podemos considerar como con-
tribuição para a inclusão digital.
Pode-se dizer, ainda, que pela utilização de novas ferramentas da tecnológica da informação e co-
municação, os professores têm conseguido estimular o estudante a trabalhar por ser um ambiente
interativo e inovador.
Esta percepção se confirma quando 45% dos alunos consultados responderam que a Instituição
pode contribuir para minimizar as dificuldades dos mesmos, disponibilizando recursos tecnológicos
em laboratórios de informática, com apoio e acompanhamento por profissionais especializados e
ou alunos monitores.

considerAções finAis
Na sociedade tecnológica, a mídia domina vários aspectos da vida cotidiana. A revolução digital
influencia a escola, viabiliza recursos que dinamizam as metodologias. Entretanto, durante a nossa
pesquisa, percebemos que ainda existem muitos fatores que interferem na plena utilização de re-
cursos tecnológicos como ferramenta de aprendizagem. O momento atual é de informatização e
aberto as mudanças rápidas.
Lembrando que nos dias atuais precisamos do uso continuado das máquinas para trabalhar, a
escola deve atuar como medianeira e acompanhar estas mudanças para propiciar aos alunos o que
o mundo lá fora exige – a informação minuto a minuto. Caracteriza-se que, na atualidade, há uma
expressa necessidade de sair do espaço sala de aula para organizar-se numa visão mais ampla, utili-

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Categoria: Poster | Subtema 2: Alfabetização, Letramentos e Linguagens Contemp
zando-se de novas possibilidades, de oferecer novas ferramentas didático-pedagógicas a professo-
res e alunos.
É preciso dar atenção a algumas necessidades básicas que incluem a implantação de uma política
de capacitação em tecnologias educacionais, incluindo Introdução à Informática Educacional para
os professores do Proeja, a implantação de metodologias para o uso específico de ferramentas usa-
das pelas novas tecnologias educacionais que atendam às especificidades dos alunos do Proeja, a
implantação de um sistema de monitoria para os laboratórios de Informática, onde os alunos sejam
assistidos por um aluno monitor ou um estagiário de informática e a implantação de um projeto de
Laboratórios de Informática Educativa com suporte técnico durante todo o horário das aulas, vincu-
lado à coordenadoria do Proeja num processo interdisciplinar.
No que tange as propostas de ações de inclusão digital, acreditamos que se deva elaborar um
projeto de Laboratórios de Informática Educativa com suporte técnico, durante todo o horário das
aulas.

referenciAs bibliográficAs
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ontem e hoje: quais as perspectivas? Porto Alegre: UFRGS, 2009. 8 p. Disponível: www.pead.faced.ufrgs.
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BRANDÃO, Edemilson Jorge RamosDo livro ao CD-ROM: novas navegações. Passo Fundo-RSIn. 25-
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PAIVA, V. P. Educação Popular e Educação de Adultos. 2. ed. São Paulo : Loyola, 1983.
SAVIANI, D. Pedagogia Histórico-Crítica: Primeiras aproximações. 9. ed. Campinas:
Autores Associados, 2005.

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Categoria: Poster | Subtema 2: Alfabetização, Letramentos e Linguagens Contemp
propostA metodológicA pArA AlfAbetizAção de
AdUltos em mAto grosso: UmA estrAtégiA de
continUidAde Aos estUdos pArA
A popUlAção do cAmpo.
AnA lUciA cAmpos dA silVeirA | eUzemAr fátimA lopes siqUeirA

Este trabalho visa apresentar a proposta metodológica utilizada na alfabetização de Adultos no


Estado de Mato Grosso suas perspectivas e desafios, problemáticas para a garantia da continuidade
dos estudos para a população do campo existente neste estado. O objetivo central, é demonstrar as
ações metodológicas direcionadas para alfabetização de /jovens e adultos no/do Campo no estado,
utilizando a continuidade ao PBA (Programa Brasil Alfabetizado) como ingresso a alfabetização de
adultos. A metodologia utilizada foi a análise documental, pesquisa social realizando entrevistas no
órgão responsável pelo setor do governo, educando e educadores envolvidos neste processo. Como
resultado, observamos a existência de um alto índice de analfabetismos e baixa escolaridade na re-
gião ao entorno da metrópole de Cuiabá, predominando ainda em diversos municípios do estado,
sendo a maior concentração destes na zona rural. Tentaremos descrever alguns métodos viáveis a
alfabetização e seu funcionamento. Houve mudança na forma de pensar a educação de adultos, que
passou ser vista da perspectiva de como o aluno aprende e não como o professor ensina. São mui-
tas as formas de alfabetizar e cada uma delas destaca um aspecto no aprendizado. Desde o método
fônico, adotado na maioria dos países do mundo, que faz associação entre as letras e sons, passando
pelo método da linguagem total, que não utiliza cartilhas e o alfabético, que trabalha com o soletra-
mento, todos contribuem de uma forma ou de outra para o processo de alfabetização de adultos.

palavras-chave: Continuidade, Educação de Adultos, Metodologia

introdUção
Política Pública de Educação de Jovens e Adultosuma vez consolidada, significando muito mais
do que a proposta de um Governo Estadual. Por meio dela, espera-se enraizar no sistema educativo
de Mato Grosso a Educação de Jovens e Adultos, como política pública com permanência, indepen-
dentemente do gestor e das forças sociais de pressão para que ela aconteça. Que expresse, radical-
mente, a conformação de uma política de Estado, para além dos tempos/espaços mais ou menos
favoráveis aos sujeitos jovens e adultos cujo direito à educação, entre outros, vem sendo negado
historicamente, mudando o percurso da exclusão que ainda avassala a sociedade brasileira. Na EJA,
a preocupação não é apenas com a trajetória escolar, mas principalmente com trajetórias pessoais e
humanas: como homens, mulheres, indígenas, negros e negras, trabalhadores que vivem experiên-
cias humanas em todos os espaços da vida social e como interferir para que possam ter consciência
da construção social que realizam e da perspectiva cidadã a que têm direito. Este trabalho visa apre-
sentar a proposta metodológica utilizada na alfabetização de Adultos no Estado de Mato Grosso
suas perspectivas e desafios, problemática para a garantia da continuidade dos estudos para a po-
pulação do campo existente neste estado. O objetivo central é demonstrar as ações metodológicas
direcionadas para alfabetização de /jovens e adultos no/do Campo no estado, dando continuidade
ao PBA(Programa Brasil Alfabetizado).

Um olhAr epistemológico sobre os sUjeitos do cAmpo

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Categoria: Poster | Subtema 2: Alfabetização, Letramentos e Linguagens Contemp
A epistemologia é a área que busca compreender, conhecer a origem da estrutura do conheci-
mento, a ciência que busca perceber como que o sujeito conhece ou como que o conhecimento é
produzido e qual o significado.
Os povos do campo são vistos como: preguiçosos, matutos, ingênuos, pobre coitado, atrasado,
caipira etc. Muitas vezes isso é retratados na própria escola onde o folclore, a festa junina é come-
morado como festa caipira, onde alguém caipira é representado com roupas remendadas, dente
estragado, chapéu rasgados e matutos.
Essas e outras questões dizem respeito aos mecanismos culturais de promoção da discriminação
de classes para, através da negação do outro, impor uma suposta igualdade cultural. Ou seja, relação
de classes – dominante contra dominado- desvalorizando a cultura do campo, o modo camponês
de ser e viver.
De um modo geral é nos passado essa visão do homem e da mulher do campo como algo negati-
vo e ultrapassado. Passando uma idéia de que o campo, da agricultura familiar, da pequena proprie-
dade, das pequenas plantações para sobrevivência é um lugar de atraso. Do outro lado vemos os
grandes fazendeiros, do agronegócio, do seringalista, dos mineradores, usineiros, dos latifundiários.
Nisso causa conflitos, lutas de classes presentes no campo e na cidade também, como exemplos de
lutas e conflitos como nos lembra os canudos, Trombas e Formoso, Ligas Camponesas e a Luta do
Araguaia nos anos 60 e muitos outro em MT.
A Mídia afirma que quem luta é vagabundo, baderneiro; as lutas de classes e movimentos so-
ciais são tratados pela mídia como doenças sociais que comprometem a ordem e o progresso. As
questões sociais, de acordo com este tipo de mídia, são tratadas com exterioridade, coercitividade
e generalidade.
Para tentar reverter à função social da mídia, mais do que nunca a escola precisa trazer para o seu
currículo, para a gestão, o papel que os meios de comunicação desempenham contra os movimen-
tos sociais e populares, a classe trabalhadora e envolver a sociedade na tomada de consciência e
de ações que visem transformar e romper com toda forma de monopólios/impérios, neste caso da
comunicação e sua mãe economia política.

qUe epistemologiA estAmos prodUzindo com nossA práticA pedA-


gógicA?
O que os indicadores de qualidade dizem respeito aos métodos de ensino ou aos processos e pro-
gramas de formação inicial de professores? Mais que culpar métodos de ensino ou formação inicial
de professores, é preciso ficar claro a necessidade de rompermos com as amarras que nos prendem
ao passado, autoritário, ditatorial, que cerceou direitos, promoveu a exclusão, classificatório entre os
que são capazes de aprender e os que não são capazes de aprender. Neste sentido de classificação,
não queremos também qualificar o professor se está apto ou não a ensinar, a dar aulas ou a ministrar
conteúdos. Queremos potencializar processos reflexivos que contribuam no estímulo a constituição
de educadores(as) comprometidos(as) com a vida, com as pessoas, com sujeitos, formando cida-
dãos críticos e preparando-os ao longo da vida para viver em comunidade, desfrutando dos diretos
e deveres de um cidadão de bem.
Não é por acaso que a educação do campo vem para dizer que a educação tem sentido na vida
dos educandos(as), e que todos tem o direito de aprender e a escola é o responsável para propiciar
uma significativa aprendizagem.
Mas do que nunca, é preciso tratar da questão de valores em nossa práxis pedagógica: da solida-
riedade, da cooperação mútua, da fraternura, da significação efetiva e afetiva.
Se de fato nós queremos fazer a diferença com nossa ação, tornando-a significativa, será preciso
educar já no exercício da cidadania plena, da justiça social, do diálogo entre todos, da expressão de

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todos os envolvidos, do espaço público de investigação, de estudos a partir do trabalho socialmente
útil, da construção social onde o econômico seja pautado pela justiça, portanto livre da exploração
e alienação, para ser ecologicamente sustentável. Para dar conta desse projeto de sociedade trans-
formada, a escola não fará isolada dos movimentos de luta, além de mudar a escola, tornando-se
mais crítica, atrativa e democratizar a escola, é preciso também mudar um processo de luta contra
todas as formas inúteis, só assim, a escola se tornará um lugar onde o educando(a) terá o prazer de
aprender.
Temos como objetivo de otimizar as ações metodológicas direcionadas para alfabetização de Jo-
vens e Adultos no/do Campo no Estado de Mato Grosso, dando continuidade aos oriundos do PBA
(Programa Brasil Alfabetizado).
Considerar o número significativo de pessoas com mais idade matriculadas na EJA;
Identificar grupos de jovens e suas características e porque a procura dos cursos de EJA.
Analisar as estratégias dos educadores para trabalhar a heterogeneidade etária nas salas de EJA.
A metodologia utilizada foi a análise documental, pesquisa social realizando entrevistas no órgão
responsável pelo setor do governo, educando e educadores envolvido neste processo
Quase sempre, o estudante tem “uma história pra contar”, uma vivência associada ao conteúdo
que está sendo apresentado. Através do diálogo entre professor e alunos podemos perceber o cres-
cimento de evolução na maneira de pensar e agir no seu cotidiano e a importância da alfabetização
na vida de cada um deles.
Buscamos favorecer um ambiente de troca de experiências entre os professores das turmas, bem
como um diálogo entre os mais idosos e os jovens que com a sua mocidade trazem o novo. Através
das novas tecnologias, os mais idosos aprendem com os mais novos sem fugir da aprendizagem
com a história de vida dos mais experientes. Nosso papel foi apenas um mediador nesse diálogo de
gerações introduzindo sempre que possível a orientação pedagógica necessária nessa pesquisa e
trocas de prosa.
Mato Grosso como signatário da Conferência Internacional de Educação de Adultos (Confitea)
tem o objetivo de zerar o analfabetismo. Os índices de analfabetismo no país entre as pessoas acima
de 15 anos, está em  7,8%. No Estado ela representa pouco mais de 6%, já que segundo o IBGE (2010)
o número de analfabetos é de 191 mil pessoas, numa população de 3.115 milhões de habitantes.
O Brasil Alfabetizado é o primeiro caminho para o resgate das pessoas que por motivos diferen-
ciados nunca freqüentaram a escola. “Atuar com esses estudantes é um desafio, assim como é para
eles retomarem os estudos”.
Uma senhora de 90 anos nos desafiou com a sua coragem e ousadia, aprendeu a ler e escrever
somente aos 90 anos. A felicidade dela era tão grande de estar sentada em uma carteira escolar,
que não sabia esconder o brilho dos seus olhos, entre meios a lágrima, agradecendo a gestora do
Programa Brasil Alfabetizado por dar esta oportunidade de ler escrever e socializar com as pessoas
da sala, da comunidade a altura da sua idade. Ela nos diz exatamente assim: “Se eu fosse morrer aqui
e agora eu morreria feliz, porque agora sei assinar o meu nome completo. Na hora de votar, não irei
mais colocar o meu dedo, porque não sou mais analfabeta. Obrigado e Deus lhe pague por me fazer
feliz antes de eu morrer”. Alfabetizanda 1
O Programa Brasil Alfabetizado tem feito a diferença na vida de muitas pessoas, principalmente
os da zona rural, onde se sentem excluídos na sociedade e esquecidos pelo poder público. Como já
dissemos é o primeiro passo para o ingresso na EJA, pois a partir desse momento o adulto já tomou
gosto pela escola e quer continuar fazendo parte dela, desde que seja uma escola atrativa, cheia de
significados, com práticas metodológicas diferenciadas, próprias para esse tipo de pessoas que já
vem desiludido do mundo lá fora. Quando resolve vir para escola, vem com expectativa, em busca

779
Categoria: Poster | Subtema 2: Alfabetização, Letramentos e Linguagens Contemp
de objetivos e ainda traz consigo sua experiência carregada de medo, frustração e ás vezes de
conquistas, de lutas, traz a sua história de vida, onde o professor utiliza para ensinar e ressignificar
a aprendizagem do aluno. Esta deve ser a nossa proposta de fazer a diferença na vida delas, através
de nosso compromisso como educadores, de dar significado e ajudá-los a construir conhecimento
e reconstruir a sua própria história.
O Programa Brasil Alfabetizado no município de Acorizal localizado há 60 km de Cuiabá é desen-
volvido na comunidade da Chapa da Vacaria,. Aldeias, Baús, e Córrego Fundo, sob a responsabili-
dade da Secretária Municipal de Educação, tendo uma coordenação para acompanhar e orientar na
formação continuada, após a formação inicial, realizada pela Seduc.
A coordenadora nos revela que existe no município, um alto índice de analfabetismo na região,
devido as dificuldades de acesso e a existência de comunidade isolada, que muitos não foram aten-
dida na idade própria e esta situação é preocupante disse ela.
E quando se observa a desistência dos alunos, neste sentido, criou-se um programa de visita as
casas dos mesmos para que este não abandone o processo de alfabetização.
Explica que:
“Pois vamos à casa dos alunos, conversamos com eles e explicamos a importância de se apreen-
der a ler e escrever para melhorar a vida das pessoas, pois tudo hoje na vida exige com a consulta
de caixa eletrônico, leitura de uma receita, pois isso causa independência para realizar sua atividade.
Que não sabe lê deixa seu segredo para o outro”
Em conversa com alguns alunos.
Este aluno mora em frente à escola e foi para a classe da alfabetização a convite do professor que
sabia da situação e sabia que ele tinha o direito de apreender de fato.
O outro, demonstrou a felicidade em estar aprendendo a ler e a escrever e fez questão de ler um
pequeno bilhete para nós quando fizemos a visita “in loco”.
O professor – alfabetizador nos revelou que trabalhar com pessoas adultas é muito gratificante, e
que aprende mais do que ensina, as suas histórias de vidas são envolventes e na verdade o que essas
pessoas precisam é somente a retirada da venda dos olhos para uma garantia dos seus direitos.
Busca-se trabalhar com projetos para incentivar os alfabetizandos e motivar a sua permanência
na escola.
A coordenadora nos apresentou o projeto de sustentabilidade que trabalha com algumas turmas
do PBA, utilizando o reaproveitamento de resíduos sólidos, na comunidade de campo limpo. Expli-
ca que a finalidade é de instruir ou orientar os educandos sobre as necessidades de mudanças de
atitudes referentes a degradação ambiental. Desse modo este projeto contempla a necessidade de
pequenos atos, que serão responsáveis por grandes transformações que devem ser assumidas por
nós, para o resto de nossas vidas e assim estaremos garantindo o futuro de nossas gerações com
fraternidade e sustentabilidade.
Outra situação que a coordenadora e professora nos revelou é que nessas salas de alfabetiza-
ção não existe conflito de gerações, muitas vezes revelado nos grandes centros, como nesta turma
encontram-se entre os alfabetizandos varia de 18 a 77 anos. Considerando que a escola é do campo,
acreditamos que o respeito, a consideração, a amizade, que os une e faz com que a interação seja
satisfatória, consista no fato de se conhecerem desde pequenos e conhecerem os pais e familiares.
No campo, a cultura do respeito, inclui tomar bênção dos parentes e cumprimentar os mais velhos
é uma herança cultural.
O Programa Brasil Alfabetizado no estado de Mato Grosso não termina com a alfabetização dos
alfabetizando, dentro de sua política busca o encaminhamento deste para o ensino formal, com a
realização das matriculas, garantindo a continuidade dos estudos, para as comunidades do campo

780
Categoria: Poster | Subtema 2: Alfabetização, Letramentos e Linguagens Contemp
são ofertada em salas anexas em parceria com a prefeitura aonde existe unidade escolar.
Na escola sede funcionam turmas da EJA, ao qual dialogamos com os alunos que nos revelaram
a alegria de estar em um banco escolar. Nessa sala tem dois alunos especiais, que já estão lendo e
escrevendo pequenos textos.
Pensar em uma metodologia que seja viável para os jovens e adultos, a fim de desenvolver meto-
dologicamente, atividades educacionais que possibilitem a promoção pessoal, social e profissional
dos alunos, a escola introduziu a Pedagogia de Projetos, com objetivos definidos, sempre procuran-
do respostas adequadas aos problemas existenciais e vivenciais dos alunos. Como seres existenciais,
têm que interpretar a si e ao mundo em que vive, atribuindo-lhes significações, a fim de poderem
viver dignamente e humanamente.
Nesta perspectiva de Pedagogia de Projetos, a escola tem encontrado solução para o processo
de ensino aprendizagem, uma vez que, desenvolve em torno das necessidades vitais dos alunos e
também dos professores, aos quais se tornam o objeto próprio da educação. Segundo a coordena-
dora nos diz que é um instrumento didático mais adequado, pois todas as atividades pedagógicas
se orientam por uma conexão de conhecimentos, para um objetivo definido, sem fragmentá-lo e
com a participação de todos os envolvidos: professores, alunos e comunidade, vivendo, revivendo e
reconstruindo a sua própria vivencia no coletivo da escola.

considerAções finAis
Enfrentar a heterogeneidade é um desafio cotidiano necessário e que requer um espírito desa-
fiador na arte da mediação entre o saber humano e o científico e respeitando as suas, visando a
harmonia dos professores com o seu conhecimento científico e sua habilidade de lidar com essa
diversidades de saberes, conduzindo-os ao pleno desenvolvimento ao exercício da cidadania e
aprendizagem.
Evidencia um novo caminho a se trilhar na EJA e que faz-se cada vez mais presente e que para
tanto devemos estar preparados para o diálogo de gerações.

referênciAs
RECK, Jair e CARVALHO, Raquel Alves de. Fundamentos teóricos e práticos da Educação do Cam-
po I e II. EduUFMT, Cuiabá-MT, 2014
NOVAES, José Luís Correa; Filosofia e seu ensino:Desafios emergentes/ José Luís Correa Novaes e
Marco Antonio Oliveira de Azevedo.- Porto Alegre: Sulina,2014. 215p
MATO GROSSO. Orientações Curriculares para a Educação Básica/Secretaria de Estado de Educa-
ção de Mato Grosso. Gráfica Print ,Cuiabá.., 2012.

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Categoria: Poster | Subtema 2: Alfabetização, Letramentos e Linguagens Contemp
VAle dos dinossAUros: de soUsA pArA o mUndo. UmA
experiênciA do sesc ler no sertão pArAibAno.
frAnciscA emidiA dA costA oliVeirA

O presente trabalho trata-se de um relato de experiência de um projeto didático com educandos


jovens e adultos em processo de alfabetização no sertão paraibano. O projeto “Vale dos dinossauros
de Sousa para o mundo”, se inseriu numa proposta de Formação de Professores de Jovens e Adultos
desenvolvido pelo Sesc que tem como propósito oferecer subsídios teóricos e práticos para educa-
dores que atuam na Educação de Jovens e Adultos , em diferentes regiões brasileiras. O projeto de
formação de forma macro envolve a produção de cadernos de estudo, projetos didáticos e audio-
visuais, tratando do processo de aprendizagem de Língua Portuguesa nos anos iniciais do Ensino
Fundamental na modalidade Educação de Jovens e Adultos. A proposta consistiu na 3ª produção
do material voltada para orientações didáticas aos professores, teve como tema as reflexões sobre
a língua em uso, explorando a produção de textos e apropriação do sistema de escrita alfabética de
forma contextualizada. Essa proposta foi desenvolvida e aplicada por meio do Projeto citado, sendo
registrado em vídeo, em uma turma de Alfabetização no Centro Educacional de Sousa, na Paraíba. A
aplicação desta proposta durante uma semana de aulas objetivou fornecer exemplos e modelos de
situações didáticas voltadas à alfabetização de jovens e adultos, indicando caminhos para articula-
ção desse processo às motivações, interesses e necessidades de aprendizagem desse público. Como
metodologia foram utilizados recursos midiáticos como: rádio, TV, site da internet e blog; recursos
estes facilitadores de um processo de alfabetização que não se restringiu a memorização das rela-
ções entre as letras e os sons, mas foi ampliado na perspectiva da vivência da linguagem escrita nas
práticas sociais através da exploração e uso das tecnologias. O estudo investigativo e colaborativo,
a participação efetiva dos alunos nas construções, registros e compartilhamento de seus saberes
constituiu uma experiência marcada pelos multi - letramentos da contemporaneidade

palavras-chave: Educação de Jovens e Adultos, Formação de Professores, Multiletra-


mento.

Os estudos sobre o uso de tecnologias na educação têm se proliferado, dado a exigência da con-
temporaneidade, a qual demanda do educador a busca de maior aproximação a instrumentos de
ensino que façam parte da vivência social dos educandos e assim os motive para uma participação
ativa e protagonizante do processo ensino aprendizagem.
Nessa linha de atuação, o educador que lida com a Educação de Jovens e Adultos (EJA) e tem
contato com educandos com vasto conhecimento de mundo, é desafiado a atuar como mediador
capaz de articular as vastas experiências desse educando ao conhecimento acumulado e produzido
historicamente pela humanidade, bem como possibilita-lo a apropriar--se desse conhecimento para
melhor inserir-se nas práticas sociais do seu tempo, tendo acesso a multiletramentos.
O trabalho que ora se apresenta trata-se de um relato de experiência no desenvolvimento de um
projeto didático com educandos jovens e adultos em processo de alfabetização no sertão paraiba-
no. O projeto intitulado: “Vale dos dinossauros de Sousa para o mundo”, se inseriu numa proposta de
Formação de Professores de Jovens e Adultos desenvolvido pelo Serviço Social do Comércio (SESC)
que tem como propósito oferecer subsídios teóricos e práticos para educadores que atuam na EJA,
em diferentes regiões brasileiras.
O projeto de formação de forma macro envolve a produção de cadernos de estudo, projetos didá-
ticos e audiovisuais, tratando do processo de aprendizagem de Língua Portuguesa nos anos iniciais
do Ensino Fundamental na modalidade EJA. No caso dessa proposta que consistiu na 3ª produção

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Categoria: Poster | Subtema 2: Alfabetização, Letramentos e Linguagens Contemp
do material voltada para orientações didáticas aos professores, e teve como tema as reflexões sobre
a língua em uso, explorando a produção de textos e apropriação do sistema de escrita alfabética
(SEA) de forma contextualizada.

1. sociAlizAndo A experiênciA
O trabalho com sequências didáticas permite a elaboração de contextos de produção de
forma precisa, por meio de atividades e exercícios múltiplos e variados com a finalidade de
oferecer aos alunos noções, técnicas e instrumentos que desenvolvam suas capacidades de
expressão oral e escrita em diversas situações de comunicação (Dolz, 2004).
A proposta a seguir trata-se de uma sequência de atividades desenvolvida na turma de Al-
fabetização – Ciclo I no SESC LER – Sousa-PB. Foi escolhido o eixos de trabalho o SEA (Sistema
de Escrita Alfabética ) por meio da leitura, produção oral, escuta compreensiva e reflexão lin-
guística. Todo material fará parte da coleção Princípios em Prática de Alfabetização de Jovens
e Adultos, módulo 03.
Lembramos que esse material visa auxiliar no trabalho de professores de Jovens e Adultos,
Os registros escritos nos permite refletir e estruturar nossa prática indicando caminhos para
articula o processo de alfabetização por meio da aquisição de conhecimentos amplos dos textos
que circulam na sociedade, de seu funcionamento das práticas sociais. As atividades serão desen-
volvidas de forma estruturadas permitindo a consolidação dos saberes e avançando o processo de
alfabetização e letramento.
Socializando as experiências vividas durante esse projeto didático, é importante destacar algu-
mas vivências que superaram nossa expectativa durante o trabalho desenvolvido.
• Apresentação aos alunos de forma sintética os objetivos do projeto registrando o nome do
projeto no quadro de giz.
• Roda de conversa objetivando fazer um levantamento dos conhecimentos prévios dos alu-
nos e ao mesmo tempo proporcionar uma aproximação inicial do tema ao projeto.
• Registros com dados hipotéticos sobre como eram esses animais, como eles viviam.
• Apresentação do álbum seriado (linguagens verbal e não verbal) com histórico de nosso
município bem como a história do Vale dos Dinossauros.
• Registros no diário de bordo referentes as discussões feitas com base no documentário: o
mundo fantástico dos dinossauros.
• Leitura de imagens do Vale dos Dinossauros, recorte e colagem das palavras que represen-
tam cada imagem.
• Análise das palavras DI- NOS- SAU- RO e SOU- AS.
• Exercícios de leitura com ênfase a oralidade ( som do S ) e a quantidade de sílabas.
• Associação de letras aos nomes dos alunos, bem como, outras palavras ditadas pelos alu-
nos.
• Construção do banco de palavras com a presença da letra ( S ) em sua escrita.
• Apropriação do SEA (sistema de escrita alfabética) som de S conforme posição na palavra.
• Estruturação do banco de palavras conforme o som do (S) em cada palavra.
• Leitura de imagens de outros monumentos naturais da Paraíba.
• Leitura e interpretação oral dos artigos 8 e 12 da Lei 9.985/2000 que institui o Sistema Na-
cional de Unidades de Conservação da Natureza.

783
Categoria: Poster | Subtema 2: Alfabetização, Letramentos e Linguagens Contemp
• Registro no diário de bordo sobre o que os alunos aprenderam sobe os monumentos na-
turais.
2º Dia
• Leitura de mapas com localização dos monumentos naturais da Paraíba.
• Apresentação dos nomes dos municípios onde se encontram os monumentos.
• Exibição e discussão do filme de animação linha do tempo sobre os dinossauros e o planeta
Terra.
• Exploração do uso das diferentes linguagens com a multimodalidade (imagens e textos
verbais).
• Leitura de palavras com (S) e (SS) encontradas nas legendas e enunciados do filme.
• Ampliação do repertório de palavras com (S) e (SS)
• Organização das palavras nas legendas apresentadas: S com som de Z, S com som como
em SAPO e SS.
• Registros no diário de bordo sobre os destaques do dia.
3º Dia
• Leitura exploratória de um site de notícia o qual retratava a história do Vale dos Dinossau-
ros.
• Roda de conversa sobre a temática do gênero (notícia), sua forma de apresentação e as
informações explícitas.
• Registros no diário de bordo das principais informações trazidas através da notícia.
• Exploração do SEA (Sistema de Escrita Alfabética) da sílaba CI identificada na palavra NOTÌ-
CIA.
• Apresentação de uma notícia de rádio. (Programa Sintonia SESC/SENAC) sobre o monu-
mento natural Vale dos Dinossauros
• Roda de conversa fazendo paralelo entre as notícias estudadas, bem como, os recursos uti-
lizados para essa prática.
• Estudo de palavras escritas com C em especial os sons CE e CI.
• Apresentação de fichas com palavras com C como em CAMA e palavras com C como em
CEBOLA E CIDADE.
• Construção da tabela e loteria de palavras com C e S e SS.
• Seleção de registros de frases envolvendo as palavras estudadas no diário de bordo.
• Leitura de imagens no ambiente virtual BLOG.
• Roda de conversa sobre a importância do blog e outras mídias virtuais.
• Leitura das notícias na página do Blog Desembuche de Guria.
• Explanação oral sobre o título do blog.
• Registros no diário de bordo de informações sobre o Vale dos Dinossauros que irão ser pos-
tadas no Blog Desembuche de Guria.
4º Dia
• Introdução ao estudo do meio. Visita ao monumento natural Vale dos Dinossauros.
• Leitura da ficha de avaliação da visita.

784
Categoria: Poster | Subtema 2: Alfabetização, Letramentos e Linguagens Contemp
• Coleta de dados: imagens, material impresso e informações com os guias de turismo.
• Preenchimento da ficha de avaliação após observação das pegadas e museu.
• Socialização dos dados colhidos nas fichas de visitas.
• Exibição do documentário O VELHO DO RIO.
• Rodas de conversa com Robson Marques e Luiz Carlos curiosos que investigam e zelam
pelo monumento natural Vale dos Dinossauros.
• Registro no diário de bordo de conhecimentos construídos acerca do monumento natural
Vale dos Dinossauros.
5º Dia
• Reapresentação dos dados extraídos das fichas de visitas.
• Tabulação dos dados e construção de gráficos.
• Produção de frases para alimentação dos Blogs SESC PARAÍBA e DESEMBUCHE DE GURIA.
• Registros no diário de bordo de palavras chaves trabalhadas durante esse estudo.
• Avaliação oral do trabalho realizado.

2. ArticUlAndo A práticA A UmA teoriA de bAse


A alta modernidade do campo social externa aos alunos de Educação de Jovens e Adultos uma
diversidade de textos o que proporciona a escola oportunidades de ensino aprendizagem sobre
diferentes campos de leitura. No cerne desse desenvolvimento vejamos o que nos diz Moran (2009,
p.27, apud, PEIXOTO, 2006):

As tecnologias nos ajudam a realizar o que já fizemos ou desejamos. Se somos


pessoas abertas, elas nos ajudam a ampliar a nossa comunicação; se somos fecha-
dos, ajudam a nos controlar mais. Se temos propostas inovadoras, facilitam a mu-
dança.

A ideia de uma escola voltada para a realidade trás como responsabilidade o papel de incentivar
no aluno o desejo de alimentar seus conhecimentos com atividades concretas que envolvem teoria
e prática alicerçada numa teoria que enfatize o sujeito como protagonista de sua própria história.
Segundo Freire (1979, p.11):

Na objetivação transparece, pois, a responsabilidade histórica do sujeito: ao re-


produzi-la criticamente, o homem se reconhece como sujeito que elabora o mundo;
nele, no mundo, efetua-se a necessária mediação do auto-reconhecimento que o
personaliza e o conscientiza como autor responsável de sua própria história.

O trabalho com Alfabetização de Jovens e Adultos na EJA traz como fundamental a compreensão
dos processos formais e informais da aprendizagem ao longo da vida. Tal concepção se estende a
partir das orientações didáticas que ampliam os conhecimentos prévios moldados pelos recursos
utilizados, alimentando o processo de escolarização.
Ultimamente com o avanço da globalização as novas tecnologias invadiram o mundo, os sujeitos
passaram a conviver com diferentes meios de comunicação. No ambiente educacional essas novas
tecnologias se fazem cada vez mais presentes nas escolas e isso tem contribuído para o processo de
ensino e aprendizagem

785
Categoria: Poster | Subtema 2: Alfabetização, Letramentos e Linguagens Contemp
Os alunos de Educação de Jovens e Adultos que chegam às escolas não divergem de outras moda-
lidades de ensino, vivem em contato com diversos recursos tecnológicos, telefones, computadores,
internet, televisão entre outros, um dos principais é o celular juntamente com a mídia radiofônica e
a internet faz com que estes mantenham contatos com diferentes recursos que utilizam a internet
como o facebook, skype, blogs. É evidente que o papel da escola papel da escola é usufruir desses
suportes tecnológicos para trabalhar dificuldades de leitura e escrita da clientela.
Socializando as experiências vividas durante esse projeto didático, é importante destacar algu-
mas vivências que superaram nossa expectativa durante o trabalho desenvolvido.
Com o uso de letramentos digitais buscamos investigar o conhecimento prévio frente o monu-
mento natural Vale dos Dinossauros. Era perceptível identificar os alunos como principais agentes
da história que ora acontecia entre os envolvidos. Embora não sendo conhecedores do histórico
cultural daquele ambiente, participavam das discussões demonstrando ter curiosidades sobre a te-
mática.
Considerando o estudo frente ao (SEA) sistema de apropriação da escrita parte fundamental no
processo de multiletramento selecionamento diferente tipologias textuais de forma a garantir o
aprofundamento nos estudos referentes a leitura e escrita de palavras S em início de palavras, S com
som de Z , leitura de SS de CE e CI.
Para dinamizar o ensino e a aprendizagem buscamos trabalhar diariamente com diferentes tipos
de textos (verbais, não verbais e multimodais) sobre diferentes esferas do conhecimento sendo es-
sas jornalísticas, jurídicas, informativas entre outras.
Estudando as relações grafêmica- fonêmica da leitura e da escrita colocamos o alunado em con-
tato com diferentes tipos de linguagens um estudo simultâneo de construção e aproximação entre
alfabetização e letramento que envolvia as relações de apropriação do sistema alfabético, formação
leitora, produção escrita e reflexões sobre a linguagem em uso.
Torna-se evidente apontar a importância das mídias durante a prática das atividades nesse pro-
jeto. Com ajuda dos programas de rádio (linguagem verbal), vídeos da internet, textos jornalísticos,
blogs (gêneros multimodais), tabelas, gráficos entre outros recursos, conseguimos trabalhar uma
sequência pedagógica envolvendo muita produção e aquisição de conhecimentos. As ações de-
senvolvidas no diário de bordo alimentaram a teoria freiriana fundamentada nos conhecimentos
prévios e organização dos saberes. Desta feita os envolvidos percebem que a correspondência entre
a fala e a escrita não é exata. Essas convenções precisam ser descobertas por meio de reflexões, des-
cobertas, inferindo regras e estudo sistemático.
Outro aporte para estudos frente a esse tema nos leva a trabalhar com sequência didática. Para
o desenvolvimento do trabalho utilizamos como instrumentos diferentes gêneros textuais, fichas
de leitura, slides, rodas de conversa, visita ao Vale dos Dinossauros, produção de cartazes, panfletos,
construção de tabelas e gráficos, alimentação do blog Desembuche de Guria entre outras ativida-
des.

conclUsões
Face ao exposto, pudemos compreender a grande importância da sequência didática no pro-
cesso de ensino aprendizagem. Para Zabala (1998, p.18) sequências didáticas são “um conjunto de
atividades ordenadas, estruturadas e articuladas para a realização de certos objetivos educacionais,
que têm um princípio e um fim conhecido tanto pelos professores como pelos alunos”.
Torna-se evidente que um trabalho desenvolvido conforme fora descrito estimula a aprendiza-
gem do aluno e ao mesmo tempo o envolve no processo deixando transparecer nas ações que as
modalidades de leitura e escrita acontecem de maneira reflexiva.

786
Categoria: Poster | Subtema 2: Alfabetização, Letramentos e Linguagens Contemp
Apontar outras relações é pertinente quando se faz acontecer o SEA (Sistema de Escrita Alfabéti-
ca) a partir das atividades trabalhadas na perspectiva de letramento. São esses momentos em que o
aprendizado se constitui por meio de relações de variadas naturezas, aspecto essencial para a com-
preensão do funcionamento da linguagem.
Trabalhando com uma variedade de gêneros e textos multimodais, utilizando-se de recursos mi-
diáticos podemos transpor barreiras e organizar os saberes a partir da vivência dos alunos.
Nesse sentido torna-se claro o desejo que nosso material possa subsidiar formações docentes de
Educadores de Jovens e Adultos que almejam fazer de sua prática um melhor caminho para que a
educação básica a ser desenvolvida com essa clientela seja trabalhada de maneira clara e prazerosa.

referênciAs
, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 6. Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.
, R. J. V. . 2006. 127 f. Dissertação (Mestrado) Universidade Aberta, Lisboa 2006. Disponível em: http://
repositorioaberto.uab.pt/bitstream/10400.2/561/1/LC232.pdf acesso em 02/10/2014 às 12h22min.
, Antoni. Tradução: Ernani F. da F. Rosa. Porto Alegre: ArtMed, 1998.

787
cAtegoriA 2

poster

sUbtemA 3

politiCaS públiCaS
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
AVAliAção dA qUAlidAde de ensino no proejA em
institUições federAis do estAdo do rio de jAneiro
jUpter mArtins de AbreU júnior

A existência da Educação de Jovens e Adultos (EJA) como modalidade designada para atender
sujeitos com características específicas, assim como o estabelecimento da educação como direito
subjetivo na Constituição Brasileira de 1988 não são suficientes para promover mudanças no his-
tórico de acesso desse público ao ensino de qualidade. A partir desse contexto, e utilizando-se de
revisão bibliográfica e análise documental, o presente trabalho pretende refletir acerca da questão
da qualidade de ensino no programa PROEJA, assim como apontar os desafios, tensões e as possi-
bilidades geradas pela implementação do programa em instituições federais. Com a delimitação
do objeto de estudos PROEJA, desenvolvido em instituições federais fluminenses, observado pela
perspectiva do que significa qualidade de ensino nos cursos médio técnico integrados da rede fe-
deral, a proposta também pretende identificar indicadores estabelecidos, além de concepções de
gestores, professores e alunos envolvidos com o Programa, destacando experiências que obtiveram
êxito ao longo de seu tempo de desenvolvimento. Para realizar a investigação proposta, pretende-se
trabalhar a partir da perspectiva quantiqualitativa, tomando-se os “casos” fluminenses como objeto
de estudo sem, entretanto, deixar de estabelecer relações entre eles, assim como com macrorrefe-
rências da política de EJA, que estabelecem fronteiras, limites e possibilidades para refletir sobre
um Programa com tais características. O referencial teórico utilizado abarca autores que estudam a
EJA, como Di Pierro e Haddad, outros que têm o foco no PROEJA, como Moura, além de autores que
abordam a temática da qualidade em seus trabalhos, como Dourado e Oliveira. Também são utiliza-
dos os estudos de Stephen Ball e colaboradores, denominados “abordagem do ciclo de políticas”. A
presente proposta espera contribuir para que haja uma percepção mais adequada do processo de
ensino-aprendizagem, assim como possibilitar um diagnóstico acurado do significado de qualidade
de ensino num programa como o PROEJA.

palavras-chave: PROEJA, qualidade, instituições federais

1. introdUção
O Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modali-
dade de Educação de Jovens e Adultos (PROEJA) foi instituído no ano de 2006, em âmbito federal,
pelo Decreto n. 5.840/06. O PROEJA tem como diretriz a formação inicial e continuada de trabalha-
dores jovens e adultos por meio da oferta de cursos e programas de educação profissional vincula-
dos ao ensino médio. Desde 2006, e de acordo com a legislação vigente, os cursos e programas do
PROEJA vêm sendo adotados, por força legal, por instituições públicas federais, e em parceria destes
com os sistemas de ensino municipais e estaduais, além de entidades de formação profissional do
“Sistema S” (SESC, SESI, SENAI, SENAC, entre outros).
Desde o início se observam críticas relacionadas ao fato de as instituições federais terem obriga-
toriedade de adesão ao Programa, questão abordada por diversos autores, em pesquisas empreen-
didas com financiamento específico para tal. Uma expectativa negativa na recepção do público da
EJA por parte da rede federal incluía a visão elitista de professores, em uma escola até então com
forte caráter de seletividade.
Em pesquisas realizadas por Moura (2006), já se observavam fragilidades que ameaçariam o Pro-
eja na rede federal, enquanto proposta que visava garantir qualidade de ensino-aprendizagem pro-
fissional técnico de nível médio a sujeitos com trajetórias descontínuas de escolarização. Sobre essas

789
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
fragilidades, Moura (2006, p. 117) afirma que “é pouca ou quase nenhuma a experiência da men-
cionada rede no que se refere ao trabalho com a modalidade Educação de Jovens e Adultos, o que
pode resultar em limitações a esse processo”.
Do ponto de vista da proposta educacional, poder-se-ia argumentar que as fragilidades residiam,
ainda, na ausência de material didático específico quanto na formação inadequada de docentes,
apesar do estímulo público concomitante a cursos de especialização nesse campo novo, principal-
mente pelo fato de esses profissionais terem, em muitos casos, formação em nível de mestrado e
doutorado, o que lhes parecia suficiente e conflitante com a oferta de especialização feita para dar
sustentação à nova proposta (MASCHIO, 2011, p. 77).
Nesse contexto, investigar o PROEJA nas instituições fluminenses, que já detêm um tempo de
experiência nesse fazer, observando-se contradições e/ou lacunas existentes no desenvolvimento
das propostas de ensino-aprendizagem que possam aferir qualidade, requer novos estudos e inter-
venções bastante específicas.

2. objeto de estUdo e objetiVos dA pesqUisA


O objeto de estudo da pesquisa em questão é o PROEJA desenvolvido em instituições federais
fluminenses, observado pela perspectiva do que significa qualidade de ensino nos cursos médio
técnico integrados, que será identificada por meio de indicadores estabelecidos e de concepções de
gestores, professores e alunos envolvidos com o Programa, destacando experiências que obtiveram
êxito ao longo de seu tempo de desenvolvimento.
Como objetivo geral pretende-se diagnosticar a qualidade de ensino de cursos médio técnico
integrados do Proeja, oferecidos por instituições federais localizadas no estado do Rio de Janeiro,
selecionadas segundo critérios a serem posteriormente definidos, que tomarão em conta o estabe-
lecimento de características semelhantes aos objetivos do estudo.
Entre os objetivos específicos, os mais relevantes são: identificar indicadores de qualidade esta-
belecidos por gestores educacionais e atores da comunidade educativa envolvida; destacar experi-
ências que obtiveram êxito no âmbito do Proeja em instituições federais.

3. referenciAl teórico metodológico


A educação como direito de todos instituída pela Constituição Federal (1988), e a existência da
Educação de Jovens e Adultos (EJA) como modalidade para atender sujeitos de direito, com carac-
terísticas específicas, não são suficientes para promover mudanças efetivas no histórico de acesso
desse público à educação de qualidade.
Autores que estudam o campo apontam questões pertinentes a respeito da organização e esta-
belecimento da EJA no Brasil, como Di Pierro (2005), Haddad (2007), Machado (2011), entre muitos
outros. Em seus trabalhos, observam-se apontamentos para o estudo e compreensão da EJA, que
devem ser considerados quando se tem por meta contribuir para a produção de conhecimento
nessa modalidade de ensino. O uso/aplicação de recursos financeiros; a abordagem curricular e me-
todológica dos cursos; a formação docente, entre outras são questões que vêm sendo tratadas por
pesquisadores do campo e que podem colaborar com a proposta desta pesquisa, pelo acúmulo
produzido.
No contexto específico de trabalhos que abordam a realidade do PROEJA, Moura (2006; 2012) é
uma das referências, seguido de outros que ampliam o espectro do que já se produziu no campo.
Em estudos sobre o processo de implantação e a realidade do PROEJA, Moura (2006, 2012) trata do
processo de seleção de alunos do Programa; da alta taxa de evasão; de contradições existentes entre
volume de recursos financeiros e resultados, entre outras questões. Em muitas dessas questões vem
sendo seguido por estudos de novos pesquisadores, formados pelo estímulo dado a esta formação,

790
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
no modo como o Programa foi implantado.
Nesse sentido, cabem aqui alguns apontamentos acerca do termo ensino de qualidade. Embora
o propósito principal desse trabalho não seja o aprofundamento em questões relativas a conceitos
e definições existentes sobre qualidade na educação, é relevante que sejam sinalizados alguns ca-
minhos que direcionem uma reflexão mais objetiva sobre o tema.
O trabalho de Dourado e Oliveira (2009) apresenta arcabouço teórico que pode servir como su-
porte para um estudo mais sistemático sobre o que é qualidade de ensino. Inicialmente, os autores
traçam um cenário para a análise dos ambientes extra e intraescolares, em que o primeiro é apresen-
tado numa dimensão que envolve dois níveis: o espaço social e as obrigações do Estado.
O espaço social se refere a questões de cunho socioeconômico e cultural dos sujeitos envolvidos
no processo, além de focar na necessidade do estabelecimento de políticas públicas e projetos que
contribuam para o enfrentamento de problemas sociais (drogas, fome, violência, entre outros). Essas
propostas, segundo os autores, devem ter impacto tanto no contexto de permanência de alunos
quanto na idealização de ações que tenham por finalidade o engajamento da comunidade escolar
em atividades que visem a um processo de ensino-aprendizagem exitoso. No contexto das obriga-
ções do Estado, estas se referem a direitos dos cidadãos e a obrigações de autarquias públicas, tanto
no que tange à oferta de vagas e igualdade de condições entre indivíduos, quanto a questões rela-
tivas a direitos estabelecidos nas últimas décadas na área da educação, como merenda e transporte
escolar, livro didático, recursos tecnológicos etc.
Entre as dimensões intraescolares, os autores as situam em quatro planos, orientados a partir: i)
de condições de oferta de ensino; ii) de gestão e organização do trabalho escolar; iii) de formação,
profissionalização e ação pedagógica do professor, iv) de permanência e desempenho escolar de
alunos.
Como sugestão, os autores ainda apontam para que as dimensões intra e extraescolares sejam
consideradas de maneira articulada, e que os aspectos anteriormente citados devem envolver um
movimento visando à garantia da construção da qualidade da educação.
Dessa forma, uma proposta que tenha como objetivo a avaliação da qualidade de ensino em pro-
gramas como o PROEJA levará em conta, como recomendado, a articulação entre essas dimensões e
planos apresentados, tanto no contexto da pesquisa de campo quanto na análise de dados concer-
nentes ao trabalho realizado.
A avaliação e o diagnóstico propostos sobre uma política pública educacional situam-se, refe-
rencialmente, no que o sociólogo inglês Stephen Ball e seus colaboradores (BOWE; BALL; GOLD,
1992) vêm denominando “abordagem do ciclo de políticas”, que se complementa com autores que
tomam como referência a qualidade como critério de avaliação de processos de ensino aprendiza-
gem no âmbito dessas políticas, como é o caso do PROEJA. Essa abordagem vem sendo utilizada em
diversos países, inclusive no Brasil, como base teórica para analisar a trajetória de políticas sociais e
educacionais.
Sustentado por essas bases teóricas pretende-se observar propostas realizadas, caminhos per-
corridos, contradições existentes entre legislação vigente e programas institucionalizados, além de
posturas enraizadas por longos períodos que, apesar de terem suas práticas contestadas, continuam
tendo continuidade no espaço educacional e na sociedade.
Para realizar a investigação proposta, pretende-se trabalhar a partir da perspectiva quantiquali-
tativa, tomando-se os “casos” fluminenses como objeto de estudo sem, entretanto, deixar de esta-
belecer relações entre eles, assim como com macrorreferências da política de EJA, que estabelecem
fronteiras, limites e possibilidades de ousadias para pensar um Programa dessa monta. Cabe desta-
car que, diferentemente de demais propostas de EJA, esta, em particular, pela abrangência em rede
federal, pode demonstrar a relação entre investimento público e retorno social, muitas vezes difícil

791
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
de equacionar, pela complexidade dos orçamentos públicos.
Para a etapa da pesquisa de campo valer-me-ei de instrumentos para a coleta de dados, como
questionários e entrevistas semiestruturadas, além de realizar levantamento de documentos que
vêm dando sustentação à política em curso, nas unidades de ensino.
No contexto das entrevistas, serão ouvidos sujeitos envolvidos no processo desde um período
anterior à sua implantação, assim como também participantes das instituições de ensino. Segundo
Bogdan & Biklen (1994), a entrevista, quando conjugada a outras técnicas e instrumentos, pode
levar à obtenção de dados mais confiáveis. Em Gaskell (2002) vê-se o apontamento de que as entre-
vistas permitem a compreensão minuciosa das motivações, atitudes, valores e crenças dos sujeitos
pesquisados. Apresentando como foco os envolvidos no universo do PROEJA, as entrevistas serão
realizadas com professores, alunos, coordenadores de curso, coordenadores do setor técnico-peda-
gógico, além de gestores das unidades de ensino.
O referencial de Ball (1992) também será utilizado como ferramenta para analisar o presente ob-
jeto de pesquisa, em busca de maior compreensão sobre como o PROEJA se insere na abordagem
do “ciclo de políticas” estabelecido pelo autor, que prevê instrumentos para coleta de dados conso-
nantes com os demais procedimentos metodológicos relacionados.

4. resUltAdos esperAdos
O estudo e a análise criteriosos dos dados coletados durante a realização da pesquisa preten-
dem contribuir para que haja uma percepção mais adequada do processo de ensino-aprendizagem
instalado nas instituições federais que desenvolvem o Programa, referente à qualidade desses pro-
cessos de aprendizado/formação profissional integrados com o ensino médio, que possibilitem um
diagnóstico acurado do significado de uma política como a do Proeja, em referência, para jovens e
adultos interditados do direito em trajetórias escolares contínuas.

5. referênciAs bibliográficAs
BALL, Stephen; BOWE Richard; GOLD, Anne. Reforming education & changing schools: case studies in
policy sociology. London: Routledge, 1992.
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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
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nica de nível médio. Boletim Salto para o Futuro. v. 7, 2006. p. 68-83.

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
controle sociAl do finAnciAmento nA ejA:
pArticipAção políticA de AssociAções de Apoio à
escolA em centros de estUdos de joVens e AdUltos
lUciAnA bAndeirA bArcelos

O presente trabalho nasce das discussões iniciais de um projeto de doutorado em curso, que bus-
ca investigar o controle social do financiamento, na Educação de Jovens e Adultos (EJA), exercido
pelas Associações de Apoio à Escola (AAE), em Centros de Estudos de Jovens e Adultos (CEJA), na
região metropolitana da cidade do Rio de Janeiro. Trata-se de um estudo de casos, cujo objetivo é
verificar se a participação política dos sujeitos alunos, nesses espaços, contribui para a melhoria da
gestão pública escolar. Entendendo ser a escola pública brasileira um espaço privilegiado de forma-
ção cidadã, de experimentação da democracia, conforme destacado na Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional, Lei n.9394/96, e considerando o controle social como exercício de cidadania,
proponho refletir sobre a contribuição que as AAE, existentes nos CEJA, traduzidas como espaços
de experimentação democrática, podem oferecer ao processo de democratização do país, na efeti-
vação de princípios democráticos e no desenvolvimento da consciência política dos sujeitos alunos.
Ao tempo em que o processo de redemocratização do país se consolida e as políticas nacionais
para a EJA tomam vigor e passam a constituir dever do Estado em defesa do direito à educação,
investigar práticas de exercício democrático, em espaços de oferta da modalidade, considerando-se
a contribuição que tais práticas podem oferecer à qualidade da gestão pública escolar, e a própria
formação cidadã, justifica a investigação ora proposta, na forma como instituições absorvem e rein-
ventam políticas públicas, em práticas cotidianas.

palavras-chave: EJA, CEJA, Controle Social

1-introdUção
Diante das mudanças decorrentes do processo de redemocratização do país, que se refletiram na
legislação nacional de um modo geral e na legislação específica da EJA, a partir do reconhecimento
do direito de todos à educação, antes negado a jovens e adultos, torna-se necessário indagar se
a concepção de Estado democrático, em que a participação popular é considerada essencial, tem
de fato se efetivado nos diferentes espaços de experimentação da democracia, em especial nos
espaços escolares em que as ofertas de atendimento a sujeitos jovens e adultos se desenvolvem,
considerando-se as especificidades dessa clientela e as diversas possibilidades daí advindas.
Nesse contexto, o exercício do controle social pela AAE no CEJA, poderia representar, para sujeitos
jovens e adultos, a perspectiva de um novo espaço de formação política e cidadã, considerando-se
que o público envolvido, com diversos saberes construídos ao longo da vida, pode representar um
diferencial na busca pela qualidade da gestão pública escolar e consequentemente, da qualidade de
ensino. Peroni, referindo-se aos diversos conselhos instaurados no país, aponta que esses espaços
“tem papel importante para a construção da democracia no país, assim como podem ser uma forma
de aprendizado da participação, das escolhas coletivas e das consequências destas escolhas”. (2008a,
p.191).
A relevância do estudo proposto pode ser explicada pelo entendimento do controle social como
prática de cidadania, para além de ações fiscalizatórias e de legitimação das ações da equipe gesto-
ra, constituindo-se espaço de formação política e cidadã, implicando reconhecimento de direitos,
respeito às especificidades dos sujeitos da EJA, e efetiva participação, preceitos legalmente estabe-

794
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
lecidos, mas pouco observados no país.
A relevância de minha pesquisa, ao investigar a atuação da AAE, explica-se também pela neces-
sidade de se discutir o controle social a partir da redefinição do papel do Estado, com o enfraqueci-
mento dos limites Estado-sociedade, que possibilitaram a inversão do sentido original desse concei-
to, definido no campo da Sociologia como controle exercido pelo Estado sobre a sociedade, para um
controle exercido pela sociedade sobre as ações do Estado.
Neste cenário, cabe destacar a situação singular do Brasil, em que o avanço da democracia, após
anos de ditadura militar, sofreu os impactos das estratégias do capital para superação de sua crise,
com o “neoliberalismo, a globalização, a reestuturação produtiva, que já estavam em curso no resto
do mundo e vinham sem sentido contrário à esse movimento”. (PERONI, 2008a, p.195). Essas estra-
tégias viriam, de certa maneira, a direcionar as políticas então em curso, impactando diretamente
na formulação e atuação dos conselhos e similares, alterando seus objetivos e formulações e muitas
vezes reduzindo seu papel ao de meros executores técnicos.
O trabalho em referência, intenciona apresentar algumas reflexões nascidas nas discussões ini-
ciais de um projeto de doutorado em curso, que tem por objeto o controle social do financiamento,
exercido pelas Associações de Apoio à Escola (AAE), existentes em Centros de Estudos de Jovens e
Adultos (CEJA) — unidades escolares que atendem a EJA nos níveis fundamental (EF), anos finais e
médio (EM), por meio de ensino semipresencial, por módulos, e preveem avanços sequenciados de
módulos, sem caráter de seriação — na região metropolitana da cidade do Rio de Janeiro.
Trata-se de um estudo de casos, cujo objetivo é verificar se a participação política dos sujeitos,
nesses espaços, contribui para a melhoria da gestão pública escolar. O universo da pesquisa se cons-
titui nas AAE dos CEJA da região metropolitana do estado do Rio de Janeiro dos quais serão selecio-
nados seis para realizar os estudos de casos, utilizando como critério inicial de seleção, os dados do
IBGE referentes à concentração populacional potencial de EJA para cada município e o número de
escolas que atendem à EJA na região.
Entendendo ser a escola pública brasileira um espaço privilegiado de formação cidadã, de expe-
rimentação da democracia, conforme destacado na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional,
Lei n.9394/96, e considerando o controle social como exercício de cidadania, proponho refletir sobre
a contribuição que as AAE existentes nos CEJA e destinadas à efetivação desse direito — compreen-
didas como espaços possíveis para experimentação da democracia, ao envolverem a comunidade
escolar na gestão da escola e oportunizarem meios para que a comunidade seja/faça parte do co-
tidiano dessa escola — podem oferecer ao processo de democratização do país, na efetivação de
princípios democráticos e no desenvolvimento da consciência política dos estudantes. Nas palavras
de Freire (2009, p.1), “a escola que viabiliza a cidadania de quem está nela e de quem vem a ela”.

2. sitUAndo o horizonte de Análise: A descentrAlizAção de recUr-


sos e o controle sociAl
O processo de descentralização de recursos financeiros para a educação iniciou-se no Brasil como
resultado de diretrizes neoliberais, ditadas por organismos internacionais, que alegavam a neces-
sidade de modernizar a gestão pública como forma de superar o déficit econômico e retomar o
crescimento. Como consequência, redefine-se papel do Estado — apontado como responsável pela
crise — assumindo-se como parâmetro o mercado, delimitando-se suas funções, dividindo respon-
sabilidades e descentralizando serviços, a fim de otimizar recursos.
Na contramão desse movimento, o país vivia a retomada do processo de democratização, e a
sociedade dava os primeiros passos para dialogar com o Estado. Conforme destaca Peroni, “a socie-
dade queria outra relação com o Estado, com controle social, transparência, participação do público,
inclusive querendo definir o que queria em termos de direitos” (2008b,p.112).

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
Mas, estavámos em pleno movimento de crise do capitalismo, em que os “direitos sociais eram
minimizados e a democracia criticada” (PERONI, 2013, p.245), e as estratégias utilizadas para enfren-
tar essa crise redesenhariam o papel do Estado e contribuíriam para o quadro que temos hoje, em
que “apesar de termos avançado na materialização de direitos, temos a dificuldade de implementá-
-los”. (PERONI, 2013, p. 245).
A autora aponta ainda que parte dessa dificuldade advém da “ofensiva neoliberal, mas também
porque a nossa cultura democrática é ainda muito embrionária, o que facilita o consenso em torno
da lógica de mercado e de produto em detrimento da lógica democrática” (PERONI, 2013, p.245).
Parafraseando a autora, vivemos em um período democrático em que parece ter se naturalizado o
consenso acerca de não ser possível a universalização de direitos sociais, e que elegeu como parâ-
metro de qualidade o mercado.
Tambem facilita esse “falso consenso”, a apropriação, por parte de grupos conservadores, de con-
ceitos utilizados por grupos progressistas e movimentos populares, ressignificando seus sentidos e
significados, descaracterizando-os do que epistemologicamente sugeriam.
Em meio à esse embate, e por ele impactado, toma impulso a ideia de autonomia da escola, com
o incentivo à parcerias com instituições não governamentais, empresas privadas e comunidade e a
implementação de política de autonomia gerencial escolar, que prevê o compartilhamento da ges-
tão da escola como um todo e especialmente da gestão financeira, considerada fator fundamental
para o sucesso escolar dos estudantes e a melhoria da qualidade da educação. A busca de parcerias
atendia ao requerimento neoliberal de Estado mínimo, que propunha retirar do Estado atribuições
afeitas, sob a justificativa de desoneração, independente de esta ser ou não dever do Estado — por-
que respondendo constitucionalmente a um direito.
O processo de descentralização financeira é considerado um meio para atingir maior eficiência e
eficácia nas ações educativas e passa a ser implementado por meio de diversos programas, ensejan-
do a criação de órgãos de acompanhamento e controle que requerem participação social, previstos
na legislação brasileira como instâncias de participação da população.
São criados diversos conselhos e associações, tanto com abrangência nacional quanto local, no
âmbito de estados e municípios, e nos espaços escolares, como mecanismos de auxílio à democra-
tização do processo de gestão escolar, em função do processo de descentralização de recursos e
de implementação do princípio da gestão democrática nos espaços escolares públicos, previsto no
artigo 206, parágrafo IV, da CF/1988 e no artigo 14° da LDBEN, Lei 9394/96.
Em síntese, devem exercer o controle social, entendido como a “participação do cidadão na ges-
tão pública, na fiscalização, no monitoramento e no controle das ações da Administração Públi-
ca” (BRASIL, 2006, p. 16), conforme previsto na Carta Constitucional. A consolidação dessa prática
tornar-se-ia uma necessidade inerente ao processo de redemocratização do país e seu exercício,
exigiria, portanto, mobilização e orientação aos cidadãos.
Nos CEJA, esse controle é exercido pelas AAE, sociedades civis sem fins lucrativos, com Estatuto
próprio, que recebem recursos públicos do orçamento estadual e federal, consignados anualmente
para esse fim, e tem o compromisso de destinar os benefícios de suas atividades à unidade escolar
a que estiverem vinculadas, devendo prestar contas regularmente dos recursos recebidos e de suas
ações.
As associações trazem em si grandes contradições, pois são entidades destinadas especificamen-
te à administração financeira, fruto de uma política neoliberal então em curso, que em tese, preten-
dem situar-se no campo operacional, técnico, dissociando-se das questões políticas que envolvem
tal administração, como se tal fosse possível. A esse respeito, Pinto(2008), afirma que “as questões
centrais que devem ser decididas […] não são técnicas, mas de natureza política (no sentido de go-
verno da pólis) e dizem respeito à vida concreta das pessoas, que por isto tem o direito de opinar e
deliberar”. (2008, p.163).

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
As AAE foram criadas pelo governo do estado do Rio de Janeiro, no bojo das determinações cons-
titucionais e da LDBEN, Lei n. 9394/96, através de Resoluções da Secretaria de Estado de Educação
(SEEDUC/RJ), que culminaram na promulgação da Lei 3067, de 25 de setembro de 1998, definindo
que a autonomia das unidades escolares seria feita “através de um conjunto de práticas integradas,
nas esferas administrativa, financeira e pedagógica, com a participação de diversos segmentos da
comunidade escolar, através das Associações de Apoio à Escola-AAE”. (RIO DE JANEIRO, 2007, p. 6).
Conforme documento da rede estadual do Rio de Janeiro, “a ideia das Associações veio ao encontro
dos dispositivos que criaram os Conselhos que executam o controle social”. (2007, p.4).
Apesar de sua origem contraditória, as AAE representam um avanço na política brasileira, ao
possibilitar a participação do cidadão na gestão pública, em ações de planejamento, execução e
fiscalização das políticas públicas implementadas pelo Estado a fim de atender as demandas da
população, uma forma de compartilhamento de poder de decisão sobre as políticas, instrumento
e expressão da democracia e da cidadania. Nesse sentido, precisam encontrar formas de superar a
dualidade de sua origem para se tornarem a “materialização da legítima luta de vários pelo governo,
ainda que representativo, de todos”.(RAMOS, FERNANDES, 2010, p.56).

3- pArticipAção políticA em AssociAções de Apoio à escolA: UmA


UtopiA possíVel?
O direito à participação popular na formulação das políticas públicas e no controle das ações
do Estado foi estabelecido no Artigo 1° da CF 1988 que, ao reconhecer/estabelecer direitos e criar
diversos mecanismos que possibilitassem o exercício da cidadania, tornou a participação popular
“essência do Estado Democrático de Direito” (SCUASSANTE, 2009), e ampliou a atuação da socieda-
de, anteriormente restrita à eleição de governantes.1
Movimento difícil, principalmente em país com pouca experiência democrática, pelos anos de
arbítrio vividos em vários momentos da história, em que a democracia participativa ainda é um
fenômeno recente e sobrevivem ranços de um passado autoritário. À pouca experiência democrá-
tica, alia-se o enorme descompasso entre o processo de abertura democrática do país, após um
longo período de ditadura, e a “crise da democracia, no chamado capitalismo metropolitano, onde
as estratégias do capital para superação da crise estavam em curso e minimizavam direitos sociais “.
(PERONI, 2013, p.245).
Enquanto no resto do mundo a democracia e a participação eram questionadas como as respon-
sáveis pela crise do Estado, que para atender as demandas da sociedade, teria investido em políticas
sociais, gastado demais e gerado a crise fiscal, no Brasil, a sociedade dava os primeiros passos no
sentido de promover a participação efetiva da população na luta por direitos sociais materializados
em políticas públicas. Essa contradição pode ajudar a compreender a grande dificuldade que en-
frentamos em materializar políticas aprovadas no plano legal, além de outros fatores que também
merecem destaque.
Para Scuassante (2009, p. 2) “a atuação das instituições da democracia brasileira, muitas vezes, é
prejudicada pelas condições sob as quais operam, tendo em vista a existência do padrão de desi-
gualdades sociais, econômicas e culturais que permeiam toda a sociedade”.
A LDBEN, Lei n. 9394/96, considerando que a ação educativa pode auxiliar o processo de consoli-
dação da democracia no país, ao promover a ocupação de forma consciente dos espaços destinados
à participação social, garantidos desde a CF 1988, reafirma esse direito, ao estabelecer no Art. 22 as
finalidades da Educação Básica, destacando a necessidade da formação do educando para o exer-
1 Esta questão, em processo de regulamentação em junho de 2014, pela Presidência da República, por meio do
Decreto n.8284/2014, tem sido alvo de fortes críticas da mídia, que atribui ao referido documento regulamentador legal,
a alteração do preceito constitucional de que a democracia no país se faz apenas por atos legislativos, excluindo a parti-
cipação popular. O parágrafo único do Art. 1 da Constituição claramente enuncia: “Todo o poder emana do povo, que o
exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
cício da cidadania, consequentemente, estimulando a criação nos espaços escolares, de espaços de
experimentação democrática, por se tratar de uma forma de contribuir para o desenvolvimento, no
educando, de uma cultura política, que lhe permita atuar na sociedade de forma plena, participando
efetivamente do processo de democratização do país.
O controle social — traduzido na pesquisa como participação do cidadão na gestão pública, uma
forma de compartilhamento de poder de decisão sobre as políticas, instrumento e expressão da de-
mocracia e da cidadania — estabelecido legalmente em nosso país, ainda que com proposições, por
vezes, controversas, dada a polissemia que caracteriza o termo, e de difícil efetivação, encontrando
diversos entraves e resistências em sua efetivação, se constitui condição sine qua non para a vida em
uma sociedade que se pretende democrática.
As escolas encontram muita dificuldade em exercitar o conteúdo da democracia na prática peda-
gógica, pela promoção da participação da comunidade escolar. Essas dificuldades decorrem de di-
versos fatores: questões burocráticas; de compreensão sobre o que significa exercício de cidadania;
de compreensão sobre o sentido de público, quando a instituição é a escola, entre muitas outras.
O CEJA, como uma escola que atende sujeitos jovens e adultos, enfrenta o desafio de criar e man-
ter espaços de experimentação democrática, diante das especificidades de seu público e também
da singularidade de seu modo de oferta — semipresencial, por módulos — em que a presença do
aluno é mais pontual, não havendo frequência diária de um mesmo aluno, salvo poucas exceções,
mas sim um fluxo constante de diferentes alunos, situação que amplia o leque de possibilidades de
atendimento e envolvimento, mas que pode inviabilizar a criação de vínculos, tão necessária a um
trabalho pedagógico que tenha por objetivo o desenvolvimento de práticas cidadãs.
Conforme destaca Oliveira, referindo-se a contribuição das escolas à efetivação de princípios de-
mocráticos:

A ação política de democratização da escola contribuiria, deste modo, para a de-


mocratização da própria sociedade, na medida em que representaria a ampliação
das possibilidades individuais e coletivas de desenvolvimento de uma ação compa-
tível com liberdade de agir e de pensar, com o respeito da pluralidade e o reconhe-
cimento do direito à diferença, equalizando as possibilidades de participação nas
decisões de interesse coletivo. (2005, p.32).

Nesse contexto, a participação na AAE dos CEJA, poderia representar, para sujeitos jovens e adul-
tos, a perspectiva de um novo espaço de formação política e cidadã, implicando reconhecimento de
direitos, respeito às especificidades dos sujeitos, e efetiva participação, preceitos legalmente estabe-
lecidos, mas pouco observados no país, especialmente se considerarmos que o público envolvido,
com diversos saberes construídos ao longo da vida, pode representar um diferencial na busca pelo
desenvolvimento da democracia no país. Para Freire, pensar a educação de jovens e adultos com os
sujeitos jovens e adultos, é exercício de cidadania, que implica viabilizar e visibilizar espaços de par-
ticipação dos sujeitos no interior das unidades escolares. Tarefa difícil, especialmente em país com
pouca tradição democrática, em que a participação ainda é tênue, mais restrita ao voto.
A participação popular, conquista requerida para a efetivação de direitos, implica por um lado
vencer “os medos” do poder horizontalizado, nas mãos dos interessados; e, por outro, desenvolver
nos cidadãos “consciência política e principalmente uma cultura de fiscalização e controle por parte
da sociedade sobre os atos do poder público”. (OLIVEIRA, 2006, p. 223).
Os fatores restritivos — em especial a desmobilização e o desconhecimento — representam obs-
táculos ao processo democrático, e parecem indicar a necessidade urgente de se repensarem os
espaços de participação, o modo como vêm sendo apropriados e utilizados, a começar pelo signifi-

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
cado do termo participação, entendendo que “a construção de uma sociedade democrática implica
o desenvolvimento de uma ação democrática concreta em todos os espaços de interação social,
inclusive na escola”.(OLIVEIRA, 2005, p.32). Mesmo que saibamos que não é a escola que vai transfor-
mar a sociedade, “podemos dizer que as mudanças que podemos produzir dentro da própria escola
já modificam a sociedade”.(p.30).

4- pArA não conclUir...


Considerando que as pessoas somente se comprometem com aquilo em que acreditam, Con-
selhos e Associações existentes no interior das escolas conformam um espaço de experimentação
democrática, de formação política e cidadã, especialmente naquelas que atendem a jovens e adul-
tos. Nelas, a necessidade de promover participação social é ainda mais urgente, para que as pessoas
possam “[...] querer exercer seu poder, participar das decisões, porque adquiriram a consciência de
que estas afetam suas vidas” (BRASIL, 2004, p. 39).
Entende-se que “pertencendo ao público, à cidadania, estamos tratando da concepção demo-
crática, que leva ao jogo do projeto coletivo de vida” (BRASIL, 2004, p. 39), e por essa concepção,
participação deixa de ser “mera colaboração, para tornar-se exercício de poder sobre aquilo que nos
pertence, que pertence à cidadania, ao público, que diz respeito aos objetivos coletivos”. (BRASIL,
2004, p. 39). O exercício do controle social, exigiria, portanto, mobilização e orientação aos cidadãos,
ou seja, pressupõe exercício de cidadania.
Nas palavras de Oliveira,

As condições de realização de uma democracia efetiva são dadas em função das


possibilidades de participação autônoma dos diversos segmentos da sociedade nos
processos decisórios e interativos. Entretanto, para interagir de modo autônomo, é
preciso que os membros desses diversos grupos sociais possam ter desenvolvido al-
guma autonomia como indivíduos. (2005, p.27).

Muitos obstáculos parecem contribuir para dificultar a participação nos espaços de interação so-
cial e promover maior envolvimento democrático dos sujeitos. Mesmo os espaços de exercício de-
mocrático que a escola brasileira conquistou, pouco ultrapassam o caráter simbólico, como ratifica-
dores de ações da equipe gestora, e baixíssima autonomia e poder de crítica. A consciência política
que esse exercício pode desenvolver fica subsumida pela experiência da subalternidade ao poder
institucional verticalizado, o que de certa maneira evidencia os desafios, dilemas e contradições que
envolvem a atuação da escola em relação ao desenvolvimento de práticas de participação cidadã, o
que parece indicar, mais uma vez, a necessidade de se repensarem esses espaços, o modo como são
apropriados e gestionados.
Nesse cenário, destaco a validade da investigação proposta, de verificar se as AAE ocupam espaço
de exercício democrático, especificamente nos CEJA, em função da singularidade de seu modo de
oferta, conformando práticas de formação cidadã em uma instituição organizada para o exercício
do controle social e contribuindo para o processo de democratização do país, no exercício de princí-
pios democráticos e no desenvolvimento da consciência política dos sujeitos alunos. Como destaca
Peroni, “o processo democrático dá-se como parte da correlação de forças políticas. O fortalecimen-
to de espaços democráticos de participação[...], torna-se estratégico para a construção de uma so-
ciedade mais justa, igualitária e democrática”. (2008, p.208).
Promover uma melhor utilização dos espaços de formação cidadã existentes e o envolvimento
dos sujeitos nas ações da escola, pode vir a produzir múltiplos aprendizados, tanto para gestores,
quanto para os demais sujeitos envolvidos e desdobrar-se em intervenções em espaços diversos e

799
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
mais amplos. Nesse processo, aprende-se a dialogar com as diferentes necessidades e concepções
de mundo, e a buscar soluções conjuntas para os problemas, tensionando argumentos, posições a
priori estabelecidas e promovendo participação ativa. A responsabilização compartilhada das ações
que se desenvolvem na escola considera que “só há efetiva participação, quando se estabelece a
cultura do querer fazer, no lugar do dever fazer”. (BRASIL, 2004, p. 39).

5-referênciAs
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800
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
edUcAr em institUições de priVAção de liberdAde:
limites e possibilidAdes
Aline menezes de bArros | ViViAn de oliVeirA

Este artigo pretende discutir as concepções de socioeducação presentes na execução das medidas
socioeducativas de internação para adolescentes em conflito com a lei, levando em conta o preconi-
zado no paradigma da proteção integral que dentre outros aspectos, reconhece que este momento
deva ser de oportunidade, de desenvolvimento e de uma autêntica experiência de reconstrução de
seu projeto de vida, assim como amplia a responsabilidade do Estado na eficiência e eficácia destas
medidas através de políticas públicas que promovam possibilidades reais de escolarização e pro-
fissionalização aos adolescentes. Pautaremos nossas análises nos direitos humanos assegurados
nos instrumentos legais nacionais, como o Estatuto da Criança e do Adolescente - (ECA/1990) e o
Sistema de Atendimento Socioeducativo – (SINASE/2012) e nas legislações internacionais nas quais
o Brasil é signatário, sobretudo as Regras de Beijing (1985) e a Convenção Internacional sobre os Di-
reitos da Criança (1989). Nesse sentido, tentaremos nesse texto refletir sobre as possibilidades e os
limites que se materializam nas ações consideradas educativas que são executadas como parte da
Medida Socioeducativa de internação, considerando que apesar das garantias legais presentes que
regulam a socioeducação, é possível encontrar paradoxos neste atendimento que refletem a não
efetivação dos objetivos desejados, além de, inviabilizar ou dificultar a compreensão deste espaço
por parte dos adolescentes, como um local de formação e reflexão sobre o exercício da cidadania
e a construção de novas oportunidades que lhes confiram possibilidades de novas competências
pessoais e relacionais em suas vidas.

palavras-chave: educação, Sistema Socioeducativo, Garantia de Direitos

Ao analisarmos o histórico das políticas públicas para os adolescentes em conflito com a lei no
Brasil, é possível identificar diversas formas de desigualdade social, existindo clara diferenciação en-
tre pobres e ricos. O fator socioeconômico influenciava diversos aspectos da vida cotidiana, inclusi-
ve o referencial legal que orientava as hipóteses em que os adolescentes seriam institucionalizados,
o período da internação, o tipo de instituição e o tratamento recebido.
Nas duas primeiras legislações para a área infanto-juvenil (Códigos de Menores, 1927; 1979), per-
cebemos claramente uma tendência de punição dos pobres e da utilização da internação como
medida amplamente utilizada em uma política higienista de limpeza das ruas, fortalecendo o para-
digma da situação irregular.
A partir dos movimentos de redemocratização do país e da luta por direitos presentes na década
de 1980, é possível alcançar avanços legais na área infanto-juvenil, especialmente com a promul-
gação da Constituição Federal (C.F., 1988) e do Estatuto da Criança e do Adolescente – (ECA, 1990).
Essas legislações rompem com a lógica anterior da situação irregular e estabelecem uma nova
concepção, baseadas nos princípios dos direitos humanos e da proteção integral. Tais mudanças
são decorrentes das transformações ocorridas em nível internacional que apregoam os direitos hu-
manos aos diversos sujeitos através de um conjunto de princípios e valores, que estabelecem os
pressupostos para a construção de uma vida digna para todos, sem exceção.
Nesse sentido, é possível identificar diversos avanços legais no que concerne aos direitos das
crianças e adolescentes, inclusive no que se refere ao atendimento aos jovens que vivenciam a situ-
ação de privação de liberdade, que a partir do ECA (1990) passa a ser cumprida em estabelecimento
educacional (Art. 112, VI). Essa concepção educativa instala o conceito de socioeducação, que será

801
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
explicitado posteriormente.
Apesar das garantias legais que regulam as ações para a infância e adolescência, previstas no ECA
(1990) e para a execução da política de socioeducação (SINASE, 2006; 2012) é possível encontrar
paradoxos neste atendimento que refletem a não efetivação dos objetivos desejados, inclusive os
relacionados aos direitos à educação e a profissionalização. Nossa legislação é apontada como uma
das mais avançadas do mundo, porém a adoção de novas práticas que elevem a condição deste pú-
blico específico como sujeito de direitos continua a ser um significativo desafio para o Brasil.
Essas dificuldades em cumprir a lei talvez estejam baseadas no fato de que nossa história foi
marcada por relações desiguais, que vão desde a colonização do país, as leis baseadas em critérios
étnicos e socioeconômicos, e a ainda presente, criminalização da pobreza e institucionalização da
juventude pobre e negra.
Os aspectos repressores e punitivos refletem as velhas práticas e colaboram para uma inviabilida-
de (ou dificuldade) para a compreensão deste espaço, por parte dos adolescentes, como um local de
formação e reflexão sobre o exercício da cidadania e a construção de novas oportunidades que lhes
confiram possibilidades de novas competências pessoais e relacionais em suas vidas. Pelo exposto,
cabe o questionamento: A política socioeducativa é educativa?
Tentaremos, nos limites desse artigo, refletir sobre as possibilidades e os limites que se materia-
lizam nas ações consideradas educativas que são executadas pelo Departamento Geral de Ações
Socioeducativas do Estado do Rio de Janeiro – (DEGASE), compreender e analisar as concepções
sobre a socioeducação presentes na execução das medidas socioeducativas.
Para realização desse trabalho foram utilizados os materiais de duas dissertações de abordagens
qualitativas, ambas em andamento (UFF/UERJ), porém em fase conclusiva, sobre a temática da edu-
cação para adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de privação de liberdade.
Assim como, o recurso de entrevistas semiestruturadas com os agentes executores das medidas
socioeducativas no estado do Rio de Janeiro, presentes na pesquisa realizada pela UFF e o relevante
levantamento bibliográfico dos textos que versam sobre educação no sistema socioeducativo, com
a sistematização através dos Mapas Conceituais (NOVAK, 2010) presente na pesquisa realizada pela
UERJ.
Para Andrade e Paiva (2013), o foco da ação socioeducativa deve ser orientado para o aprendiza-
do e prática de valores consagrados na Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), portanto,
concluem que a internação deve ser uma experiência educativa, que possibilite aos sujeitos, conhe-
cer valores e vivenciá-los durante o breve período de privação de liberdade.
Nesse sentido, as autoras defendem a execução de um projeto político pedagógico que oriente
as atividades e garanta um conjunto de ações articuladas que permitam que a experiência da inter-
nação agregue valor formativo à vida dos adolescentes, como previsto no SINASE (2006, p. 54).
A concepção educativa prevista na socioeducação passa por dois grandes pilares, de um lado,
as ações desenvolvidas pelas unidades escolares que funcionam nas instituições de privação de
liberdade e de outro, as ações profissionalizantes que são ofertadas pelo DEGASE aos adolescentes.
Para Costa (2006), “a socioeducação é a modalidade da ação educativa destinada a preparar os
adolescentes para o convívio social no marco da legalidade e da moralidade socialmente aceitas,
como forma de assegurar sua efetiva e plena socialização” (p.10). Isso significa compreender que
apesar da medida de internação ser imposta ao adolescente e, por isso, ter características de sanção,
ela tem conteúdo predominantemente pedagógico, colaborando para a construção da sua identi-
dade pessoal, social e seu projeto de vida.
Receber escolarização e profissionalização é um direito assegurado no Art.124 do ECA (1990) e
deve pautar-se pelos objetivos previstos na LDBEN (1996), Art. 2º, assegurando três objetivos princi-
pais: o pleno desenvolvimento do educando; seu preparo para o exercício da cidadania e sua quali-

802
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
ficação para o trabalho.
Nesse sentido, percebemos em Santos (2009) a contradição presente nos processos educativos
desenvolvidos em uma instituição que preconiza a punição, apesar do discurso educativo.
Entendemos que, avanços significativos têm ocorrido, porém faz-se necessário percorrer ainda
um longo caminho, para a solidificação dessas políticas. Para Teixeira (2013) a educação promovida
pelas escolas que funcionam no sistema socioeducativo não dão conta da dimensão educativa da
internação e funcionam, assim como as instituições, na lógica da punição, exclusão e contenção.
Apontamento semelhante é trazido por Lopes (2006) em sua dissertação, a autora chama a aten-
ção para o fato que práticas punitivas estão presentes inclusive nos ambientes escolares, chegando
à conclusão de que a escola não exerce a função social de contribuir para o cumprimento da medida
socioeducativa, uma vez que as atividades ali executadas não ocorrem sobre a prioridade da educa-
ção escolar, mas ao contrário, da ordem e do controle (LOPES, 2006 Apud SANTOS, 2009 p.21).
Compreendemos que as concepções de socioeducação presentes na execução das medidas so-
cioeducativas de internação para adolescentes em conflito com a lei, levando em conta o preconi-
zado no paradigma da proteção integral que dentre outros aspectos, reconhece que este momento
deva ser de oportunidade, de desenvolvimento e de uma autêntica experiência de reconstrução de
seu projeto de vida, ainda não tem sido executada com êxito. Porém, destacamos que de acordo
com diversos textos lidos, as práticas realizadas constituem verdadeira afronta ao sistema de direi-
tos e condição peculiar de pessoas em desenvolvimento.
Até o momento, não possuímos respostas conclusivas, uma vez que as pesquisas em que se ba-
seiam este estudo estão em andamento. Entretanto, acredita-se que mediante os princípios da so-
cioeducação, o papel da educação no sistema socioeducativo, é o de possibilitar aos adolescentes,
condições de construir um modo de viver que lhes permita o exercício de sua liberdade com respon-
sabilidade, ou seja, vivenciar práticas educativas que promovam a socialização e consequentemente
formação para cidadania, com novas competências pessoais e relacionais para suas vidas.
Aprender a ser, aprender a conviver e se relacionar de modo que possam elaborar seus projetos
de vida de uma forma consciente para o retorno a sociedade com uma nova percepção, um novo ca-
minho a ser trilhado. Cabe observar que essa não é uma responsabilidade exclusiva do adolescente,
mas que recaí sobre todos os sujeitos do Sistema de Garantia de Direitos (ECA, 1990).

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Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
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804
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
o proejA fic como políticA de edUcAção profissionAl
nA ejA: A experiênciA no if bAiAno e no if bAhiA.
neylA reis dos sAntos silVA | sUelen goncAlVes pAixAo dA silVA

Superar uma perspectiva da formação profissional que abarque apenas a especialização, que su-
pere a visão do ser humano fragmentado e que sua formação auxilie na compreensão de si e do
outro como transformadores da realidade, é o desafio da formação profissional na EJA. Este trabalho
trata de um processo de investigação em andamento que destina refletir sobre a educação profis-
sional e a educação de jovens e adultos como política de formação dos trabalhadores, que contem-
ple as necessidades dos sujeitos que estiveram longe da escolarização. Serão objetos de reflexão
os cursos Proeja FIC, ofertados pela Secretaria de Educação do Município de Salvador em convênio
com o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia (IFBA) Campus Salvador e os cur-
sos Proeja FIC ofertados pela Secretaria de Educação do Município de Alagoinhas em convênio com
o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Baiano (IF Baiano) Campus Catu. É importante
salientar que os cursos Proeja FIC foram implantados, trazendo em si o cerne do currículo integra-
do e o desafio de integrar as realidades de redes de ensino distintas. Utilizou-se uma metodologia
que privilegia uma abordagem qualitativa, de orientação etnográfica. Foi possível refletir, a partir da
análise dos projetos pedagógicos e do Documento Base do programa, que existem aspectos duais
na implantação no que concerne a concepção de educação para o trabalho, em uma perspectiva da
educação integrada, ao passo que se reconhece a importância do Proeja FIC pela necessidade de
escolarização e formação profissional como uma estratégia para mudança da condição de trabalho
e nas condições de vida dos sujeitos da EJA.

palavras-chave: Educação Profissional, Educação de Jovens e Adultos, Proeja FIC

introdUção
Mesmo diante da realidade de um mundo complexo e pautado no conhecimento, essencialmen-
te a alfabetização ainda se constitui como um processo de empoderamento, capaz de criar condi-
ções de mudanças na perspectiva de vida profissional e laborativa do sujeito, mesmo que ela não
seja garantia da ocupação de postos de trabalho (PRESTES, 2009).
Os documentos oficiais do SEJA (Segmento de Educação de Jovens e Adultos do Município de
Salvador) apontam que:

As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos apon-


tam a educação como direito público subjetivo, no Ensino Fundamental.(...) A Região
Nordeste congrega o maior número de estados, ocupando uma área geográfica de
18,26% do total do País e cuja população representa 28,9% da população brasileira.
Reúnem, também, os mais altos índices de analfabetismo, pobreza e desemprego,
consequentes de processos históricos de exclusão. (SALVADOR, 2012).

Neste cenário, a consolidação do ensino fundamental para jovens e adultos, que tem como
fundamento “o conhecimento e os elementos da cultura imprescindíveis para o seu desenvolvi-
mento pessoal e para a vida em sociedade, assim como os benefícios de uma formação comum,
independentemente da grande diversidade da população escolar e das demandas sociais” (BRASIL,
2010) é imprescindível para a superação dos altos índices de pobreza e melhoria nas condições de

805
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
vida e emprego dos sujeitos.
No ensino fundamental, a EJA como modalidade da educação básica, compreende os proces-
sos educativos, vivenciados pelos sujeitos em contextos formativos e de trabalho, nos diferentes
espaços e tempos humanos ao longo da vida. Esta modalidade de ensino tem a possibilidade de
se consolidar como espaço que valorize os conhecimentos já trazidos pelo sujeito, privilegiando
o acolhimento e os interesses destes jovens ou adultos, que retornam ao espaço escolar para dar
continuidade a sua formação.
Neste sentido, Freire (2000) nos auxilia a pensar na educação de adultos e no educando desta
modalidade de ensino como um sujeito que não está pronto, acabado, fechado em si, por conta do
tempo de vida ou da experiência. Enquanto ser humano, ser do inacabamento, o adulto também
está em formação.
Em tempo, é importante compreender que os jovens inseridos nos cursos de EJA, também en-
frentam a realidade da incerteza, da imaturidade e da busca pelo trabalho. Os jovens brasileiros
estão ou estiveram inseridos no mundo do trabalho e estão preocupados com o desemprego, a
violência e a droga, nesta ordem de importância. Além disso, são sujeitos excluídos dos processos
de formação escolarizada, do emprego, além das tradicionais formas de exclusão por etnia e sexo
(SPOSITO, 2003).
Diante dessa realidade, são objetos de reflexão neste trabalho os cursos fruto do Programa de
Formação Inicial e Continuada Integrada a Educação Básica na modalidade EJA (Proeja FIC), a saber:
Proeja FIC Manutenção Elétrica Predial e Proeja FIC Solda, ofertados pela Secretaria de Educação do
Município de Salvador (SEC Salvador) em convênio com o Instituto Federal de Educação, Ciência
e Tecnologia da Bahia (IFBA) Campus Salvador e os cursos Proeja FIC Operador de Computador e
Proeja FIC Cozinheiro Geral ofertados pela Secretaria de Educação do Município de Alagoinhas (SE-
DUC Alagoinhas) em convênio com o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Baiano (IF
Baiano) Campus Catu, todos eles intermediados pela Secretaria de Educação Profissional e Tecno-
lógica (SETEC) e pela Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD) do
Ministério da Educação.
Apesar de se tratar de cursos em instituições, municípios e em realidades diferentes, os quatro
cursos foram criados a partir do Ofício Circular nº 40/2009/GAB/SETEC/MEC e tiveram como aspec-
tos em comum a construção de um itinerário pedagógico que contemple a proposta curricular, o
processo de formação docente, a elaboração do material didático e o monitoramento, estudo e pes-
quisa, com vistas a contribuir para a implantação e a consolidação de espaços de integração das
ações desenvolvidas, bem como de investigação das questões pertinentes ao Proeja.
Em termos de educação profissional, mesmo com sua criação recente - Os Institutos Federais
foram criados pela Lei nº 11.892/2008 - , os institutos federais tem tradição. O IFBA foi criado a partir
da unificação dos antigos CEFET’s (Centros Federais de Educação Tecnológica) na Bahia, enquanto o
IF Baiano foi criado a partir da unificação das antigas Escolas Agrotécnicas e das Escolas Médias de
Agropecuária Regional da CEPLAC (Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira).
A Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica está fundamentada numa história de
construção socioeducativa que já conta com mais de um século de existência, tendo iniciado suas
atividades como instrumento de política voltado para aprendizagem de uma profissão para pessoas
pobres e sem recursos. Hoje, configura-se como importante estrutura para que as pessoas tenham
efetivo acesso às conquistas científicas e tecnológicas. Esse é o elemento diferencial que está na
gênese da constituição de uma identidade social particular para os agentes e instituições perten-
centes a este contexto através da vinculação da educação profissional e tecnológica à elevação de
escolaridade do jovem e adulto trabalhador (BRASIL, 2008).
Propusemo-nos realizar uma breve análise dos cursos Proeja FIC, na busca de contribuir com os
estudos sobre EJA no país, prioritariamente por entender que nesta modalidade de ensino é mister

806
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
identificar as experiências exitosas ou não, no intuito de ampliar suas práticas.

Aspectos metodológicos
A fim de atingir os objetivos citados anteriormente e fazer um levantamento compatível com a
finalidade desta investigação, fez-se necessário um aprofundamento através da experiência com o
cotidiano educacional, sem o qual não teria sido possível uma real análise dos fatos ligados a uma
prática de formação na EJA, bem como compreender com profundidade como as práticas se esta-
belecem para a consolidação dos cursos em questão.
Entendemos que para abarcar a complexidade da reflexão que nos auxilie na compreensão des-
tes cursos, um longo caminho de investigação ainda estar por vir. É objeto de análise deste trabalho
o Documento Base dos cursos Proeja FIC nos aspectos inerentes a implantação dos cursos e os pro-
jetos pedagógicos de cada curso enfatizando sua proposta curricular.
Neste percurso investigativo, realizou-se uma análise exploratória no Documento Base do Proeja
FIC, identificando na política pública as intencionalidades e proposições. A seguir, na análise dos
projetos pedagógicos dos cursos foram percebidas as construções curriculares, buscando compre-
ender seus princípios formativos tendo como base a realidade na qual os estudantes, jovens e adul-
tos trabalhadores, estão inseridos.
Com este objeto assim definido, no escopo desta investigação é utilizada uma abordagem quali-
tativa, utilizando como técnica o estudo de caso, com inspirações etnográficas, buscando compreen-
der nas ações e palavras dos sujeitos envolvidos os sentidos e significados. Para tal, é imprescindível
fazer uma descrição para compreender a realidade estudada. As primeiras coletas de informações
se pautam no aprofundamento teórico e na análise documental, favorecendo uma ação reflexiva
e interpretativa, identificando nas duas realidades seus aspectos reveladores e sua relação com as
intencionalidades mencionadas.
Esta modalidade de pesquisa não pode se limitar à descrição de situações, ambientes, pessoas,
ou à reprodução de suas falas ou depoimentos, mas precisa buscar a reconstrução das ações e inte-
rações das pessoas envolvidas segundo seus pontos de vista, suas categorias de pensamento, sua
lógica. Na busca das significações do outro, o pesquisador deve ultrapassar seus próprios métodos
e valores, admitindo outras maneiras de entender, conceber e recriar o mundo (ANDRÉ, 1995). Assim
posto, a busca da informação não se restringe às intenções pessoais, mas ampliam-se para as insti-
tucionais, expressas em seus documentos e registros, referendados ou não em suas práticas, reve-
lando a necessidade de repensar a educação profissional em nosso país, fortalecendo a integração
entre a educação profissional e a EJA, valorizando as experiências de vida e os impactos da política
pública nacional na escolarização dos sujeitos.

refletindo sobre As reAlidAdes


Os cursos ora analisados fazem parte de um programa em nível nacional que prevê a oferta de
ensino fundamental integrado à educação profissional. Como tal, é importante destacar que o con-
ceito de formação “entrou no campo do pensamento educacional bastante tarde e apenas pela por-
ta da formação profissional, gozando de um estatuto débil associado à ideia de se tratar na essência
de uma forma inferior de educação” (BARROS, 2011, p.29). Isto porque a concepção acerca da educa-
ção profissional esteve calcada na perspectiva da especialização e na construção de conhecimentos
operacionais e limitantes.
Para combater esta concepção, Gramsci (apud CIAVATTA e RUMMERT, 2010) nos auxilia a refletir
sobre “o ideário da educação politécnica, tecnológica ou integrada entre a formação geral e a edu-
cação profissional, no sentido de superar o ser humano cindido, historicamente, pela divisão social
do trabalho entre a ação de executar e a ação de pensar, dirigir ou planejar” (p.466). O que significa

807
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
superar uma perspectiva da formação profissional que abarque apenas a especialização, que supere
a visão do ser humano fragmentado e que sua formação auxilie na compreensão de si e do outro
como transformadores da realidade.
O desafio que se põe a educação profissional integrada à educação básica reside, como nos sina-
liza Frigoto (2010), na qualidade da educação básica ofertada aos nossos jovens (e porque não, adul-
tos) que articule-se com as mudanças científico-tecnológicas do processo produtivo imediato, sem
necessariamente ser confundida com um imediatismo falacioso da empregabilidade e do mercado
de trabalho, sob pena de continuarmos reproduzindo na escola os modelos de desenvolvimento
capitalistas de exploração do trabalhador.
Na análise do Documento Base de implantação dos cursos Proeja FIC também encontramos refe-
rências a esta formação integrada. No entanto, de forma mais limitada e simplista, se trata aparente-
mente de uma forma de fazer, que ainda não supera essa dual concepção de formação profissional
e a formação integral do sujeito, a saber:

a integração da formação inicial e continuada de trabalhadores com o ensino


fundamental na modalidade EJA é uma opção que tem possibilidade real de con-
ferir maior significado a essa formação, pois tem o poder de incidir diretamente na
melhoria da qualificação profissional dos sujeitos aos quais se destina. Não se trata,
de maneira alguma, de subsumir o conteúdo propedêutico do ensino fundamental
a uma preparação para o mundo do trabalho, mas sim de garantir a totalidade do
primeiro integrando-o à segunda (BRASIL, 2007, p.19).

O caráter integrador da proposta presente no Documento Base mostra-se, a priori, como uma
forma de reintegrar o jovem e o adulto ao mundo do trabalho e a retomada aos estudos, como uma
forma de fazer, sem com isso aprofundar a concepção do trabalho como princípio educativo. Ao
longo da sessão, vislumbra-se a superação da modalidade de ensino e sua consequente substituição
por um ensino fundamental e médio de qualidade, que possibilite ao jovem a permanência e con-
clusão dos estudos (BRASIL, 2007).
Nessa discussão, inclui-se claramente a intencionalidade de qualificação profissional, presente no
texto como “um processo que se situa prioritariamente na relação social construída pela interação
dos agentes do trabalho em torno da propriedade, significado e uso do conhecimento construído
no e pelo trabalho” (LIMA apud BRASIL, 2007, p.22), buscando superar uma concepção de formação
aligeirada e com o discurso da empregabilidade.
Em se tratando das concepções e princípios presentes no documento, identificamos que as ca-
tegorias elencadas apresentam uma clara intenção de articular a educação básica a educação pro-
fissional, no entanto, os princípios apontados ainda não apontam para uma ressignificação da for-
mação profissional no sentido de aprofundar as reflexões acerca dos processos de produção e da
construção de uma consciência social referenciada na classe trabalhadora.
Acreditamos que esta ampliação será possível, na medida em que as instituições federais de ensi-
no, de posse dessa concepção e dos instrumentos materiais e pedagógicos, tracem um compromis-
so com a classe trabalhadora a qual esse programa se destina e se aproximem de uma perspectiva
de formação politécnica dos trabalhadores.
Diante dessa dualidade, os cursos Proeja FIC foram implantados, trazendo em si o cerne do cur-
rículo integrado. É preciso destacar que as propostas dos cursos Proeja FIC são realizados através
de parceria dos institutos federais (nesse caso, IFBA, Campus Salvador e IF Baiano, Campus Catu) e
das secretarias de educação (SEC Salvador e SEDUC Alagoinhas, respectivamente). Essa realidade
denota em seu processo de execução dificuldades operacionais, uma vez que os cursos são realiza-

808
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
dos em instituições, estruturas e, inclusive propostas pedagógicas diferentes. É importante assim,
reconhecer os desafios que se estabelecem para a consolidação de uma proposta de integração
curricular, buscando compreender em seus projetos pedagógicos as interfaces ou não dessa inte-
gração curricular.
Em termos de proposta curricular, nos cursos Proeja FIC ofertados pelo parceria firmada pelo IFBA
Campus Salvador e a SEC Salvador, destaca-se a proposta de trabalho orientada para a produção
de conhecimentos cujos resultados serão aplicados para fins práticos em situações que visem à
produção de conhecimentos, às experiências laborais dos discentes e a melhoria das comunidades
circunvizinhas a escola em que os sujeitos estão inseridos. Em seus objetivos está clara a intenção da
qualificação profissional e da preparação dos sujeitos para a inserção no mundo do trabalho.
Por outro lado, uma das tentativas de interligar a educação profissional e a educação básica está
expressa em componentes curriculares como Seminários Interdisciplinares (presente em todos os
semestres), no qual tem-se o objetivo de articular as discussões da formação profissional e dos com-
ponentes curriculares do núcleo comum, através de atividades coletivas e comuns a todos os com-
ponentes curriculares.
Nos cursos da parceria do IF Baiano Campus Catu com a SEDUC Alagoinhas, desponta uma tímida
relação da formação dos jovens e trabalhadores com uma perspectiva do trabalho como categoria
sociológica, buscando relacioná-lo com o papel social que a escola possui. Em sua organização cur-
ricular há uma clara intencionalidade em realizar estudos contextuais e em uma perspectiva integra-
dora, contemplando componentes curriculares que favoreçam a discussão interdisciplinar. A estru-
turação dos componentes curriculares apresentam uma clara distinção entre os conhecimentos do
mundo do trabalho e as discussões do núcleo comum, no entanto, descreve-se esta divisão como
ilustrativa, sendo que os conteúdos estariam ligados entre si, transversalmente. O componente cur-
ricular Seminários Temáticos também está presente nos cursos ora analisados, dentro uma subárea
denominada de Diversificada, o que favorece o trânsito de discussões e possibilidades de atividades
interdisciplinares.
Apesar da intenção de uma proposição de integração curricular, o que se revela é que ainda há
um distanciamento deste com a utilização do trabalho como princípio educativo, bem como a ciên-
cia, cultura e tecnologia como eixos norteadores (CIAVATTA e RUMMERT, 2010).
O perfil do egresso em todos os cursos mencionados priorizam um caráter eminentemente prá-
tico e relacionados à formação para o trabalho, contendo poucos elementos que possibilitem a
ampliação da compreensão do trabalhador sobre aquilo que faz.
Nota-se que, sendo fruto de um edital-convite, os projetos pedagógicos se assemelham em for-
mato, no tempo de realização do curso (36 meses), na carga horária (1.410 horas) e nos requisitos de
implantação (formação de docentes, produção de material pedagógico e implantação de grupos de
pesquisa, estudos e monitoramento).
Nesta perspectiva, a análise realizada nos documentos orientadores dos cursos estudados evi-
denciam uma perspectiva diferenciada e inovadora de currículo, também para uma realidade nova
em que aparecem interligados conteúdos e concepções de duas redes distintas, com organização e
princípios também distintos, em que também não se tem muita clareza sobre as possibilidades que
se estabelece na integração entre a educação profissional e a educação básica.
Um outro elemento que se encontra nas instituições é a formação continuada. Os docentes atu-
antes nos cursos tiveram curso de formação específica, já previsto no projeto orçamentário de im-
plantação dos cursos. O curso de formação oportunizou a discussão de questões abrangentes e
específicas. As temáticas abrangentes englobaram a discussão sobre as políticas públicas de EJA
e da Educação Profissional, a questão do currículo integrado, os processos formativos dos jovens
e adultos, a questão da andragogia, entre outros. Enquanto temáticas específicas, cada grupo de
professores teve a oportunidade de pensar sobre o material pedagógico a ser utilizado e conheci-

809
Categoria: Comunicação | Subtema 3: Políticas Públicas
mentos da área profissional específica, buscando assim uma integração entre as duas redes.
Como uma investigação preliminar, percebe-se que há uma intencionalidade na implementação
desses cursos, atentando-se para aspectos relevantes de uma proposta de EJA que seja diferente e
que contemplem ações que favoreçam uma formação que atendam as necessidades dos educan-
dos, para além do mercado de trabalho.

considerAções
Este trabalho faz uma análise preliminar das experiências dos cursos Proeja FIC no IF Baiano e
no IFBA. É imprescindível salientar que as informações aqui expressas tomaram como referência
os documentos norteadores que foram analisados: o Documento Base do Proeja FIC e os projetos
pedagógicos.
Reconhecemos que a prática, o cotidiano, as ações pedagógicas e didáticas ocorrem dentro das
salas de aula e o grupo de docentes pode alterar as práticas prescritas em seus projetos e currículos.
Ao mesmo tempo, destacamos a necessidade de uma política de EJA que amplie a compreensão
sobre a relação trabalho e educação, que contemple as realidades dos adultos e jovens que fre-
quentam ou evadem das escolas. Nos institutos federais essa necessidade é ainda maior, uma vez
que suas finalidades e princípios articulam estes dois eixos, prioritariamente para a formação para o
trabalho.
Podemos encerrar esta reflexão destacando a necessidade de se avaliar e investigar acerca da
implantação de programas como o Proeja FIC, pensando sobre sua relevância para o fortalecimento
da EJA e, prioritariamente, para a mudança na vida dos sujeitos que frequentam estes cursos.

referênciAs
ANDRÉ, Marli. Etnografia. São Paulo: Papirus, 1995.
BARROS, Rosana. genealogia dos conceitos em educação de Adultos. da educação permanente
à aprendizagem ao longo da vida. Um estudo sobre os fundamentos político-pedagógicos da prática
educacional. Lisboa: Editora Chiado, 2011.
BRASIL. Ministério da Educação. Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com
a educação básica na modalidade de educação de jovens e Adultos – proejA, formação inicial e
continuada, ensino fundamental. documento base. Brasília, 2007.
________. Ministério da Educação. instituto federal - concepção e diretrizes. Brasília, 2008.
_______. Ministério da Educação. CNE/CEB. resolução nº 7, de 14 de dezembro de 2010. fixa as
diretrizes curriculares nacionais para o ensino fundamental de 9 (nove) anos. Brasília, 2010.
CIAVATTA, Maria, RUMMERT, Sônia Maria. As implicações políticas e pedagógicas do currículo na
educação de jovens e adultos integrada à formação profissional. IN: revista educação e sociedade.
Campinas, v. 31, n. 111, p. 461-480, Abril-Junho, 2010.
FREIRE, Paulo. Desafios da educação de adultos ante a nova reestruturação tecnológica. In: pedago-
gia da indignação: cartas pedagógicas e outros escritos. São Paulo: Editora UNESP, 2000.
FRIGOTTO, Gaudêncio. Concepções e mudanças no mundo do trabalho e no ensino médio. In.: FRI-
GOTTO, Gaudêncio; CIVATTA, Maria; RAMOS, Marise (org.). Ensino Médio integrado: concepções e
contradições. São Paulo: Cortez, 2010.
PRESTES, Emília Maria da T.. Educação e Trabalho: requisitos do Desenvolvimento e da Sustentabili-
dade. IN: espaço do currículo, v.2, n.1, Março-Setembro,2009.
SALVADOR, Secretaria de Educação. proposta político-pedagógica do segmento de ejA, Salvador,
2012 (digitado).
SPOSITO. Marília Pontes. os jovens no brasil: desigualdades multiplicadas e novas demandas
políticas. Ação Educativa: São Paulo, 2003.

810
cAtegoriA 2

poster

sUbtemA 4

formação De profeSSoreS
Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
A cUltUrA Afro-brAsileirA nA escolA – práticAs
pedAgógicAs
michelA de nAzAré qUemel pires | nAtáliA moUrA diAs de lUcenA

O presente trabalho consiste na apresentação de encontros com professores, durante nove me-
ses de formação, tendo presente a necessidade de aprofundar questões pedagógicas que giram em
torno da Lei 10.639/03, alterada posteriormente, pela Lei 11.645/08, que torna obrigatório o ensino
da história e cultura afro-brasileira e africana em todas as escolas, públicas e particulares, do ensino
fundamental e até o ensino médio. Ressaltamos que o município de Benevides, no Pará, foi a se-
gunda cidade no Brasil a libertar os seus escravos, fato ocorrido no dia 30 de março de 1884, antes
da data oficial, fato histórico que muito representa aquela cidade e seus habitantes até o momento
contemporâneo. A organização da formação de professores favoreceu a troca de saberes e a parti-
lha de práticas pedagógicas adotadas no Projeto Sesc Ler, em Benevides, tendo como foco principal
a formação de profissionais que atuam na Educação de Jovens e Adultos da rede privada e pública
local, suscitando perspectiva de mudança não apenas nas políticas, mas nas práticas educacionais e
na atuação dos professores. O estudo reflexivo da Lei 10.639/03 fomenta pensar em novas diretrizes
curriculares para o estudo da história e da cultura afro-brasileira e africana nas escolas. Desse modo,
os professores foram convidados a cada encontro organizar projetos pedagógicos com e para suas
turmas, realizando ações educativas que levassem ao entendimento de que a cultura afro-brasileira
é constituinte e formadora da sociedade brasileira. E ainda, que os negros são sujeitos históricos, ao
invés de pessoas passivas. Nesse sentido, o papel social da escola é valorizar e ressignificar matrizes
africanas que formam a diversidade cultural brasileira. Ao longo dos encontros coube aos profes-
sores se aproximarem de práticas que não tratassem a cultura negra de forma folclorizada, o que
certamente impossibilita uma postura política diante das questões raciais.

palavras-chave: Formação de Professor, diversidade cultural, história e cultura afro-


-brasileira

1. introdUção
A Lei nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003, reza que nos estabelecimentos de ensino fundamental e
médio, sejam eles oficiais ou particulares, torna-se obrigatório o ensino sobre a História e a Cultura
Afro-Brasileira, visando resgatar a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política
brasileira (BRASIL, 2003).
Diante disso, a escola pode se tornar um espaço privilegiado para o combate à discriminação e
ao preconceito e por isso, a mudança de postura dos educadores tem papel fundamental para o de-
senvolvimento de práticas pedagógicas não excludentes. Entretanto, ainda existem professores que
defendem a ideia de que não existe motivo para se preocupar com questões voltadas ao precon-
ceito e ao racismo na escola brasileira, por entender que em nosso País negros e brancos convivem
pacificamente (PAULA, 2009).
Considerando esses pressupostos, como trabalhar a Formação de Professores de Educação de
Jovens e Adultos, na perspectiva de fortalecer a implementação da Lei nº 10.639/2003 valorizando e
ressignificando raízes africanas que formam a diversidade cultural brasileira?
Foi então, que optamos por organizar quatro encontros de formação de professores, sobre esta
abordagem, fomentando a reflexão da relevância política da cultura afro-brasileira nas práticas pe-
dagógicas dos professores de Educação de Jovens e Adultos – EJA, com base na Lei nº 10.639/2003,

812
Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
tendo como suporte teórico o material do MEC, “A Cor da Cultura”.
Este registro é, portanto, resultado desses encontros com professores ao longo de nove meses de
formação, tendo presente a necessidade de aprofundar questões pedagógicas que giram em torno
da Lei nº 10.639/2003, alterada posteriormente pela Lei nº 11.645/2008.
Outra motivação que nos interpelou para a organização desses encontros foi o fato de, o municí-
pio de Benevides, no , ter sido a segunda cidade no Brasil a libertar os escravos no dia 30 de março
de 1884, antes da data oficial, marco histórico que é muito significativo para o povo desse município.
Local cuja Unidade do Sesc Ler se faz presente há quatorze anos.

2. os Afrodescendentes e A edUcAção no brAsil


Ao longo da história do Brasil, não é difícil constatarmos que o modelo estabelecido para seu de-
senvolvimento se deu de forma excludente impedindo que milhões de brasileiros tivessem acesso à
escola ou que nela permanecessem. (BRASIL, 2004).
O racismo que atinge a população afrodescendente brasileira até os dias atuais sempre se fez
presente nas diferentes formas de governo no Brasil - Colônia, Império e República -, mantendo uma
postura ativa e permissiva diante da discriminação, como observarmos:

O Decreto nº 1.331, de 17 de fevereiro de 1854, estabelecia que nas escolas públi-


cas do país não seriam admitidos escravos, e a previsão de instrução para adultos
negros dependia da disponibilidade de professores. O Decreto nº 7.031-A, de 6 de
setembro de 1878, estabelecia que os negros só podiam estudar no período noturno
e diversas estratégias foram montadas no sentido de impedir o acesso pleno dessa
população aos bancos escolares.

Após a promulgação da Constituição de 1988, o Brasil busca efetivar a condição


de um Estado democrático de direito com ênfase na cidadania e na dignidade da
pessoa humana, contudo, ainda possui uma realidade marcada por posturas sub-
jetivas e objetivas de preconceito, racismo e discriminação aos afro-descendentes,
que, historicamente, enfrentam dificuldades para o acesso e a permanência nas es-
colas (BRASIL, 2004, p.7).

Em 2000, dados apresentados pelo Instituto Brasileiro de Geografia (IBGE) revelam que a popu-
lação negra é a que tem menos acesso à educação. Dos analfabetos de 15 anos, apenas 8,3% são
brancos, enquanto aproximadamente 40,6% são de pessoas negras, sem direito ao exercício pleno
da cidadania (MOURA, 2013).
Evidenciamos, assim que o racismo e a discriminação contra o afrodescendente ainda são persis-
tentes no âmbito escolar. Porém, acreditamos que a educação é um mecanismo de transformação
social, bem como essencial no processo de formação de qualquer sociedade. Por isso, a reflexão so-
bre a relevância política da cultura afro-brasileira nas práticas pedagógicas da EJA pressupõe que os
professores atuem como agentes de mudança, interferindo em sentido amplo, em seus espaços de
atuação profissional e social, à serviço da transformação do mundo, e não à serviço da permanência
de estruturas injustas.

O nosso testemunho, pelo contrário, se somos progressistas, se sonhamos com


uma sociedade menos agressiva, menos injusta, menos violenta, mais humana,

813
Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
deve ser o de quem, dizendo não a qualquer possibilidade em face dos fatos, defen-
de a capacidade do ser humano de avaliar, de comparar, de escolher, de decidir e,
finalmente, de intervir no mundo. (FREIRE, 2000, p.58).

Entendemos ainda que a escola não deve ocupar-se apenas em reduzir números e índices de
analfabetismo, mas voltar-se também para a preparação dos alunos preocupando-se com sua in-
serção no mercado de trabalho. Isso está previsto nas Diretrizes Curriculares da EJA que tem como
função reparar, qualificar e equalizar ensino para que o educando possa exercer plenamente o seu
direito à cidadania. (Diretrizes Curriculares de EJA- MEC, p. 170).
Defendemos a ideia de que cabe à escola contribuir com a formação de pessoas politizadas, capa-
zes de identificar e se posicionar frente às condições e contradições de etnia, classe, gênero, atitudes
discriminatórias, à força alienadora da mídia, da ideologia, do consumo e do desperdício. Que con-
tribua com a formação de cidadãos que mantenham sua identidade de valores e costumes e que, as-
similando a diversidade cultural do mundo, do espaço e do tempo em que vivem, sejam produtoras
de uma nova cultura, compreendendo a democracia participativa como condição necessária para a
construção de uma sociedade em que o respeito às diferenças seja pressuposto.

3. cAminhos metodológicos
De acordo com a Proposta Pedagógica do Sesc Ler:

A reflexão contínua sobre a prática pedagógica é condição essencial para que


os educadores possam aperfeiçoar sua ação. Para viabilizá-la, algumas estratégias
devem fazer parte do cotidiano do trabalho: o planejamento conjunto, o registro
das atividades e a discussão com orientadores, coordenadores e demais professores
(PROPOSTA PEDAGÓGICA DO Sesc LER, 2006, p.12).

Também, nas Diretrizes para a Orientação Pedagógica do Projeto SESC Ler, está sinalizado que:

A tematização da prática está diretamente vinculada à concepção de professor


reflexivo, daquele que toma sua atuação profissional como objeto de reflexão contí-
nua. Ser um professor que pensa e toma decisões é ser um professor que desenvolve
o “saber fazer”, articulando a reflexão sobre “quem”, “o que”, “como” e “para que” vai
aprender (DIRETRIZES PARA A ORIENTAÇÃO PEDAGÓGICA DO PROJETO SESC LER,
2003, p. 19).

Tomando a experiência de realizarmos frequentemente encontros de formação continuada com


os professores do Sesc, em seus espaços de trabalho, oportunizando-os à troca de saberes e refle-
xões permanentes de suas práticas, a abordagem deste trabalho se deu de forma qualitativa, com
a realização de registros após cada um dos encontros realizados. Tendo com base teórica a Lei nº
10.639/2003, a Proposta Pedagógica e as Diretrizes para a Orientação Pedagógica do Projeto SESC
Ler e as Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação de Relações Étnico-Raciais para o Ensino da
História e Cultura Afro-Brasileira e Africana e a Lei nº 10.639/2003 e o material organizado pelo Mi-
nistério da Educação, “A Cor da Cultura, Beleza e Identidade”.
Os encontros de formação foram abertos aos professores de jovens e adultos do Sesc e da rede
pública do município e adjacências.

4. os encontros de formAção

814
Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
O evento foi organizado em quatro encontros descritos abaixo. Cada um com um tema voltado ao
estudo reflexivo, visando favorecer a troca de saberes e a partilha de práticas pedagógicas adotadas
pelos professores no que concerne a questão do ensino sobre a História e a Cultura Afro-Brasileira,
além de fomentar discussões sobre racismo e discrimação na escola.

4.1 - primeiro encontro


Reunimos 35 professores com atuação em escolas públicas e particulares. A perspectiva de novas
descobertas e experiências nesse encontro era notória dos participantes.
Inicialmente, foram convidados a se apresentarem, informando sobre suas raízes negras, o que
acreditavam ou que vivenciavam ou ainda o que associavam à sua herança negra. Fazendo isso por
escrito ou por desenho.
Em roda, cada um apresentou seu nome, falou sobre seu local de trabalho e seu desenho
ou registro, enfatizando suas concepções e experiências relacionadas ao tema. Todos comentaram
claramente, a respeito de suas heranças negras, o que permitiu o avanço das reflexões.
Em outro momento, estudamos os textos Branquitude x Negritude, de Jorge Portugal e Papel
do Aluno e Professor, retirados do livro Programa Nota 10 – MEC.
Cada grupo recebeu uma ficha de trabalho, onde as perguntas foram pertinentes a compre-
ensão e organização de ideias referentes ao nosso caminhar pedagógico, tendo em vista que somos
formadores de opinião, pois precisamos internalizar que o ensinar corresponde ao conhecimento,
enquanto que educar está relacionado ao saber ser, fazendo uso dos conteúdos atitudinais que di-
ferenciam o homem em sociedade. As questões norteadoras foram:
• Por que obrigar a inclusão de temas com a História da África e Cultura Afro brasileira no
currículo escolar?
• Segundo Domingues, “o branqueamento estético não se restringia ao alisamento dos ca-
belos; atingia a principal marca definidora de raça no Brasil: a cor da pele (...). qual a opinião
do grupo sobre isso?
• (...) A linguagem dos professores e dos alunos que se consideram “não negros” foi alimen-
tada muitas vezes com piadas sobre o negro e encobriam os preconceitos latentes, alem de
favorecer interiorização de ideias preconceituosas e atitudes discriminatórias(...). Quais as
sugestões do grupo para lidar com essas situações na escola?

O debate deixou claro que todos os participantes não possuíam dúvidas sobre a existência
do preconceito racial e da discriminação contra pessoas negras no espaço escolar. Mas confirmou
que muitos não sabem como agir para inibir situações corriqueiras, muitas vezes mascaradas por
tons de “brincadeiras” entre alunos, entre professores ou colegas de trabalho, referindo-se aos de-
mais trabalhadores da escola.
Propomos então, aos professores que, pensassem em situações pedagógicas que pudessem
realizar em sala com seus alunos e as planejassem juntos, no mesmo grupo de trabalho anterior.
Com base nos textos já estudados e debatidos e no vídeo assistido, posteriormente - Os heróis de
todo mundo - produzido pelo MEC, da Coleção A Cor da Cultura, os professores formularam seus
planejamentos, para serem desenvolvidos com suas turmas e apresentadas por eles quando da rea-
lização do próximo encontro desta formação.

4.2 - segUndo encontro


Iniciamos o encontro um resgate de memória referente ao primeiro encontro, fazendo registro

815
Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
coletivo em nosso livro de memória, relembrando o que aconteceu, o que conversamos, o que des-
cobrimos, o que constatamos, fazendo finalmente relação com o que iríamos estudar naquela dia:
África e Africanidade Brasil.
Como acordado no encontro anterior, os professores saíram com propostas de trabalho para re-
alizar com seus alunos e turmas. Devendo, apresentar ao grupo, neste segundo encontro. Destaca-
mos as seguintes experiências socializadas:
A sócioeducadora Amália Sílvia1, do Centro de Convivência Núbia Moreira, contou que usou uma
notícia de jornal, da Folha de São Paulo, de 26/03/2014, a qual informa que o numero de negros mor-
tos pela Polícia de São Paulo é três vezes maior do que de brancos. E, perguntou a seus alunos, todos
idosos, por que acham que isso acontece. Os motivos apresentados foram diversos, mas o que mais
surpreendeu a professora foi a constatação de sua turma se perceber negros. Comentaram sobre a
situação de pessoas pobres que deixam suas cidades e vão para São Paulo em busca de melhoria de
vida e se deparam com o crime, relataram sobre fatos conhecidos e acrescentaram que a situação no
Pará, “não deve ser muito diferente, não”.
As Professoras Rosicléa Faro2 e Edna Natividade3 da EJA do turno da tarde do SESC Ler Benevides
relataram sobre um projeto que realizaram, chamado Vivendo a Diversidade da Cultura Afro-Brasi-
leira. Desenvolveram atividades interdisciplinares envolvendo Arte, Língua Portuguesa, Matemática
e Geografia. As atividades desenvolvidos estiveram atreladas ao estudo e apreciação das obras de
Jean Baptist Debret, Lassar Segall e Candido Portinari que retratam o negro em diversos contextos
sociais. Houve discussão em sala sobre a beleza negra, e o que é ser negro no Brasil. Aceitar-se como
negro, não é algo fácil e natural para muitos, uma vez que muitas vezes, ser negro significa dizer, ser
pobre, ser excluído, não ter oportunidades... No entanto, as professoras relataram que em ativida-
des como estas, a reflexão é aspecto relevante tanto do ponto de vista da aprendizagem das áreas,
quanto do ponto de vista da mudança de atitudes a longo ou médio prazo.
Durante o a realização do projeto foi possível ampliar os conhecimento dos discentes sobre a im-
portância da cultura negra na construção história do Brasil, fomentando valores intrínsecos à cons-
trução de uma sociedade mais e justa, humana e igualdade.
Após as apresentações desse dia, levamos o grupo a assistir dois vídeos: o primeiro de Luiz Oli-
veira, Professor de Sociologia da Escola Técnica Estadual da República do Rio de Janeiro, produzido
pela FAETEC (Fundação de Apoio a Escola Técnica do Estado do Rio de janeiro) - África - no qual
destaca o Continente Africano como o berço de muitas civilizações, a começar pelas grandes cons-
truções arquitetônicas.; o segundo, da Coleção Nota 10, do Ministério da Educação, intitulado “Inter-
disciplinaridade” apresentando novas experiências com o estudo da cultura afro brasileira.
Esses vídeos ocasionaram surpresa nos presentes que ainda não conheciam a história da hu-
manidade contada do ponto de vista da África e não da Europa, quando levados a olharem e conhe-
cerem as antigas civilizações. O que possibilitou no grupo a importância de enfatizarmos que nós,
professores, educadores, escolas, somos formadores de opiniões e mediadores de conhecimentos.
Daí, necessário buscarmos estudos, informações que sejam benéficas às aulas, ao planejamento que
fazemos, à nossa atuação docente.
O texto Reflexões sobre o Ensino de História da África e dos africanos no Brasil, de Mônica
Lima – da Coleção A Cor da Cultura, suscitou o debate, ratificando mais uma vez, a importância de
revermos nossos conceitos, nossas atitudes e nossos planejamentos pedagógicos. Até que ponto
somos ou não preconceituosos com as questões sobre etnias? Até que ponto, trazemos para nossa
sala de aula a História dos afrodescendentes contada sob o ponto de vista dos oprimidos? Por que
não falamos de reis e de rainhas africanas? Por que não lemos histórias africanas em nossas aula?
1 Professora de EJA, formada em Biologia pela Universidade da Amazônia e graduanda de Pedagogia, na Faculdade Ypiranga.
2 Professora de EJA, do Projeto Sesc Ler, em Benevides – PA, Pedagoga formada pela UFPA.
3 Professora de EJA, do Projeto Sesc Ler, em Benevides – PA, Pedagoga formada pela UFPA.

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Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
Até que podemos estamos dispostos a mudarmos? O que temos feito para favorecer mudanças no
espaço escolar em que estamos em relação ao racismo? Do que temos preconceito?
Constatamos que nem todos os professores haviam parado para pensarem nessas situações
e o quanto podem fazer em sua sala de aula. Porém, estavam ali, se colocando numa postura de
transformar-se a si próprios, transformando sua rotina didática, sua prática pedagógica. O que para
nós, já era uma feliz constatação, como dito por Beatriz Amaral4.

As apresentações dos trabalhos deixaram claro que é possível sim, falarmos sobre
a história dos negros sem falar somente em tantos sofrimentos. Aprendi hoje, mais
sobre a África. Essas discussões são interessantes para que a gente perceba o quanto
é importante nosso papel para mudar e recontar a nossa história, sem a deixarmos
passá-la em “branco”.

4.3 - terceiro encontro


Com o objetivo de aprofundarmos, nesse dia, a ludicidade africana, aprendendo sobre música,
jogos e brincadeiras, começamos o encontro com uma apresentação musical dos alunos jovens e
adultos do Sesc Ler, que cantaram a canção africana GANAYESU, do grupo Raiz Coral5 e que retrata
a necessidade da unidade entre os povos, as tribos e nações. Durante a apresentação, os alunos
usaram o xequeré, instrumento musical produzido por eles, com cabaças, fio encerado e miçangas,
durante aulas de artes.
Kwakuhi weka mwene Yesu
Kassendo ketu mwene Yesu
Yesu, Yesu, Yesu
Yesu mwene Yetu
Twimbileno , gana Yesu
Yesu, Yesu, Yesu
Twimbileno, gana Yesu
Gana Yesu, Mwene
Yesu, Yesu, Yesu

Tradução
Grande nosso amigo, nosso amigo negro
Não há outro igual ao nosso amigo negro
Negro Negro Negro
Ele é o Rei da África
Exaltai o povo africano
Que soa pessoas como nós.
Toda raça, tribo ou nação
Toda raça, tribo ou nação
Sejam amigas e respeitem o africano.
Ele é forte
Ele é forte
Celebremos a amizade e o respeito
4 Professora de EJA, do Projeto Sesc Ler, no município de Inhangapi - PA
5

817
Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
Negro Negro Negro
Celebremos a amizade, amigo negro
Negro Negro Negro
Nosso amigo africano
Todos celebremos ao nosso negro e a sua força.
Celebremos a amizade e o respeito
O texto de apoio para este dia foi Modos de Interagir, do Caderno de Atividades Saberes e Fazeres
nº 03 - Coletânea A Cor da Cultura - MEC, 2010, o qual retrata valores e referências afro-brasileiras na
ludicidade afro, levando-nos a ‘um resgate de memória e a conhecer nossa ancestralidade.
Logo em seguida, o grupo assistiu ao vídeo produzido pelo grupo LAAB (Ludicidade Africana e
Afro Brasileira, tendo Coordenação da Prof. Doutora da UFPA Débora Alfaia que mostrava diversas
brincadeiras africanas, levando o grupo a conhecer brincadeiras novas e a fazer relações com brin-
cadeiras já conhecidas.
Organizamos ainda, diferentes espaços lúdicos com as seguintes brincadeiras: Mbube Mbube/
Gana (pata cega), Kameshi e Mpukune (gato e rato) e jogos africanos como: Yoté, Jogo da Onça, Ka-
lah, Labirinto e Shisima, além de oficina para a construção de xequeré. Desse modo, os professores,
além de se divertirem, interagiram entre si, fazendo relações com seus conhecimentos, ao mesmo
tempo que construíam novos aprendizados, desmitificando estereótipos e ideias excludentes exis-
tentes. Essa experiência foi bastante significativa havendo envolvimento de todos.
Os professores puderam perceber o quanto espaços de formação são importantes para a me-
lhoria da qualidade do trabalho que realizam, além de fortalecer a importância política da Lei nº
10.639/03, conhecendo e compreendendo a história sob o ponto de vista afrodescente, o que con-
tribui para combate ao racismo e ao preconceito nas escolas.

4.4 – qUArto encontro


Este último encontro consistiu em uma grande socialização de saberes e atividades, realizadas
em praça pública no Centro da Cidade, no município. A programação deste dia consistiu em apre-
sentações culturais, tais como; capoeira, teatro, músicas africanas e a organização de uma exposição
de objetos e fotos do acervo pessoal do Professor e Historiador Leôncio Linhares, além de espaço
lúdico com brincadeiras e jogos africanos.
A programação foi construída com os professores participantes dos encontros anteriores e suas
turmas. Cada turma, de cada escola, usando das linguagens artísticas citadas acima, fez uma apre-
sentação.
Foi uma tarde, não apenas de integração entre as diferentes escolas dos participantes dos en-
contros, mas também de afirmação dos objetivos, já que, pertecendo à equipe do Sesc Ler, no Pará,
também interferimos de maneira positiva na educação local, contribuindo com a formação de pro-
fessores que pouco ou nenhum espaço formativo possuem em suas escolas.

5. conclUsão
Os encontros aqui citados serviram para favorecer o desejo da realização de outros. Assim, vamos
paulatinamente promovendo reflexões que contribuam com novas práticas pedagógicas, principal-
mente na Educação de Jovens e Adultos.
É inegável a contribuição de Paulo Freire nesse processo reflexivo e contínuo. Seus conceitos
centrais como conscientização, libertação e autonomia, devem manter-se como referência para o
debate sobre a Educação de Jovens e Adultos, já que as questões políticas e pedagógicas de seu
pensamento continuam atuais e nos interpelam: Não posso ser professor se não percebo cada vez

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Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
melhor que, por não ser neutra, minha prática exige de mim uma definição. Uma tomada de posição.
Decisão. Ruptura. (FREIRE, 1996, p.106).
Sabemos que há muito a se aprender sobre o continente Africano e os processos de recriação de
suas culturas, presentes em todos os lugares do mundo para os quais as diferentes etnias africanas
foram dispersas. Sabemos também que cabe a nós mediarmos o caminho do processo de ensino e
aprendizagem de nossos educandos, não só no que compete as aquisições de conhecimentos, mas
também ao âmbito social que envolve os conteúdos atitudinais. Sabemos ainda, que grande parte
dos alunos jovens e adultos, espalhados no Brasil, são negros e que com eles e por eles, nos coloca-
mos à serviço da efetivação de valores que se perdem no cotidiano social: respeito, solidariedade e
ética.

referênciAs bibliográficAs
BRASIL. Ministério da Educação. . Brasília, 2004.
__________ . Altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases
da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática
“História e Cultura Afro-Brasileira”. Brasília, 2003.
BRANDÃO, Ana Paula (coord.) . Rio de Janeiro: Fundação Roberto Marinho, 2006
FREIRE, Paulo. São Paulo. UNESP, 2000.
FREIRE, P. ucativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
LAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Marina de Andrade. . 6. ed. – 5. reimpr. São Paulo: Atlas, 2007.
LIMA, Mônica. Reflexõessobre o Ensino de História da África e dos africanos no Brasil. In: SANTIAGO,
Ana et al., Rio de Janeiro, Fundação CECIERJ 2010.
LÜDKE, M.; ANDRÉ, M.E.D.A. : abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 1986.
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Secretaria de Educação Fundamental. : Coletânea de Textos – Módu-
lo I, 2001. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/colet_m1.pdf>. Acesso em: 29
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MOURA, Dayse Cabral de. . Programa de Pós-Graduação em Educação da UFPE. Universidade Fede-
ral de Pernamambuco, 2013.
PAULA, Claudemir da Silva. PORTUGAL, Jorge. : considerações sobre práticas de inclusão em sala de
aula. . Porto Alegre, Ano 25 nº 99 jul/set.2009, p.37.
SERVIÇO SOCIAL DO COMÉRCIO. Departamento Nacional. . Rio de Janeiro, dezembro de 2006, p.
12-13
ÁFRICA.FAETECEscola Técnica Estadual da República do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro. 2005. 25”
A Cor da Cultura. Futura, Rio de Janeiro, 2006.30’’.
– A Cor da Cultura. Futura, Rio de Janeiro. 2010.60’’ DVD 3
LAAB – Ludicidade Africana e Afro-Brasileira. Brincadeira Pulando FeijãoLAAB. UFPA, 2014, 2”40 Dis-
ponível em: < http://www.youtube.com/watch?v=6XO0ZMbPDhA>. Acesso em.01 de Agosto de 2014.
(O Gato e o Rato). LAAB, 2014.3”15. Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=vfqUB4BlB_
A>. Acesso em: 01 de Agosto de 2014.
ANDERY, Maria Amália. Olhar para a história: caminho para a compreensão da ciência
hoje. In: ANDERY, Maria Amália et al. Para compreender a ciência: uma perspectiva
histórica. Rio de Janeiro: Espaço e Tempo; São Paulo: EDUC. 1998. p.11-18 e p.435-
446.

819
Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
debAtes AcercA dAs lUtAs pelos direitos hUmAnos
shirley dA silVA | rAqUel do sAcrAmento VentUrA
tAynArA pinheiro de oliVeirA

O presente trabalho tem por objetivo apresentar o Projeto “Debates Acerca das Lutas Pelos Di-
reitos Humanos” realizado como parte das ações do subprojeto do PIBID ¬- Programa Institucional
de Bolsa de Iniciação a Docência - na modalidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA), do Curso
de Pedagogia da Uerj/Maracanã, que são voltadas para a formação docente na escola, sendo super-
visionadas pelo coordenador Carlos Soares. Elaborado e realizado no primeiro semestre de 2014, a
ideia central do Projeto foi levar para os alunos, alunas e professores da Escola Municipal Professor
Lourenço Filho a discussão acerca dos direitos sociais garantidos pela mobilização da sociedade civil
organizada e pensarmos juntos sobre o papel do Estado na sociedade vigente. A ideia do projeto
surgiu ao refletirmos sobre a atual configuração da nossa sociedade, em que grande parte da po-
pulação reivindica melhorias dos serviços básicos e primordiais dos quais todos nós necessitamos.
Nosso intuito foi despertar uma reflexão crítica sobre essa temática a fim de compreender o que
pensam sobre o quadro atual da sociedade em que vivem, bem como a forma que os gestores/
governantes tratam esses direitos atualmente. Esse projeto teve como relevância despertar os estu-
dantes da escola para um assunto que, devido ao cotidiano corrido, não permeia sua roda de con-
versas. É importante fazer com que esses adolescentes, jovens e adultos tenham a plena consciência
de todos os seus direitos na sociedade. Introduzir essa temática na EJA nos remete à importância
de trabalhar temas que abordam as características de uma nova necessidade formativa dessas gera-
ções juvenis. Pensando nesse paradigma, acreditamos que esses debates sobre direitos estão liga-
dos a contemporaneidade e que devido a isto eles devem estar inseridos na sala de aula como uma
estratégia política para um efetivo exercício da cidadania.

palavras-chave: PIBID, EJA, Projeto, Direitos Sociais

O presente trabalho tem por objetivo apresentar o Projeto “Debates Acerca das Lutas Pelos Di-
reitos Humanos” realizado como parte das ações do subprojeto do PIBID - Programa Institucional
de Bolsa de Iniciação a Docência - na modalidade da Educação de Jovens e Adultos (EJA), do Curso
de Pedagogia da Uerj/Maracanã, que são voltadas para a formação docente na escola, junto com o
supervisor Carlos Soares, no primeiro semestre de 2014. A ideia central do Projeto foi levar para os
alunos, alunas e professores da Escola Municipal Professor Lourenço Filho a discussão acerca dos
direitos sociais garantidos pela mobilização da sociedade civil organizada e pensarmos juntos sobre
o papel do Estado na sociedade vigente. A ideia do projeto surgiu ao refletirmos sobre a atual con-
figuração da nossa sociedade, em que grande parte da população reivindica melhorias dos serviços
básicos e primordiais dos quais todos nós necessitamos.
Nosso intuito é despertar uma reflexão crítica sobre essa temática a fim de compreender o que
pensam sobre o quadro atual da sociedade em que vivem, bem como a forma que os gestores/
governantes tratam esses direitos atualmente. Esse projeto teve como relevância despertar os estu-
dantes da escola para um assunto que, devido ao cotidiano corrido, não permeia sua roda de con-
versas. É importante fazer com que esses adolescentes, jovens e adultos tenham a plena consciência
de todos os seus direitos na sociedade. Introduzir essa temática na EJA nos remete à importância
de trabalhar temas que abordam as características de uma nova necessidade formativa dessas gera-
ções juvenis. Pensando nesse paradigma, acreditamos que esses debates sobre direitos estão liga-
dos a contemporaneidade e que devido a isto eles devem estar inseridos na sala de aula como uma
estratégia política para um efetivo exercício da cidadania.
O presente trabalho é estruturado com base nas nossas experiências e observações realizadas

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Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
na Escola Municipal Professor Lourenço Filho, localizada no bairro do Grajaú, município do Rio de
Janeiro e pretende apresentar o relato sobre o projeto que foi efetuado na escola, através da atua-
ção de bolsistas de Iniciação á Docência do Programa Institucional de Iniciação à Docência - PIBID,
com intuito de realizar um debate acerca das lutas pelos direitos humanos, realizado através de uma
roda de conversa que permitiu que os alunos relatassem suas experiências expondo uma visão mais
crítica sobre a temática.
Abordamos as diversas reflexões e análises obtidas através da observação dos alunos tendo em
vista compreender as perspectivas e os olhares diversos que eles possuem sobre seus direitos. Atra-
vés de nossas observações percebemos que os alunos, alunas e professores da escola pouco conhe-
cimento detinham sobre a temática dos Direitos Institucionais garantidos por Lei que possuíam,
sendo assim, trazer essa temática para uma discussão dentro das salas de aula foi primordial para
que os alunos, alunas e professores, junto com os bolsistas, pudessem interagir e trocar conheci-
mentos sobre o assunto.

A reAlizAção do projeto
O objetivo deste projeto foi ampliar o espaço de discussão entre os alunos e alunas, buscando
identificar o que os jovens e adultos da Escola Municipal Professor Lourenço Filho pensam e sabem
sobre os direitos dos cidadãos. Nosso intuito foi despertar uma reflexão crítica sobre esta temática a
fim de compreender o que pensam sobre o quadro atual da sociedade em que vivem, bem como a
forma que os Gestores/Governantes tratam esses direitos atualmente.
É importante fazer com que esses adolescentes, jovens e adultos tenham a plena consciência de
todos os seus direitos na sociedade, a fim de observar como os alunos e alunas enxergam os seus
direitos e saber o que eles pensam sobre os mesmos. Introduzir essa temática na EJA nos remete a
importância de trabalhar temas que abordam as características de uma nova necessidade formativa
dessas gerações juvenis. Pensando neste paradigma acreditamos que esses debates sobre direitos
estão ligados à contemporaneidade e que devido a isto ele deve estar inserido na sala de aula, como
uma estratégia política para um efetivo exercício da cidadania. É importante que os alunos conhe-
çam seus direitos e percebam também a importância de se reivindicar, tendo em vista que toda a
comunidade escolar discuta e reflita sobre os modos de lidar com essa realidade, já que resulta na
necessidade de mudanças.
Para apoiar nosso projeto utilizamos algumas fontes bibliográficas como textos sobre os movi-
mentos sociais e alguns trabalhos que falam a respeito dos direitos humanos.
Uma das fontes bibliográficas usadas foi um texto da Maria da Glória Gohn que trata dos movi-
mentos sociais no século XXI, no qual a autora afirma que:

Para nós, desde logo é preciso demarcarmos nosso entendimento sobre o que são
movimentos sociais: nós os vemos como ações sociais coletivas de caráter sociopolí-
tico e cultural que viabilizam distintas formas da população se organizar e expressar
suas demandas. Na ação concreta, essas formas adotam diferentes estratégias que
variam da simples denúncia, passando pela pressão direta (mobilizações, marchas,
concentrações, passeatas, distúrbios à ordem constituída, atos de desobediência ci-
vil, negociações, e utilizam-se muito dos novos meios de comunicação e informação,
como a internet) (GOHN, 2007, p.13).

Adotamos, também, em nossos referenciais, um trabalho bem interessante, que aborda o tema
sobre a luta pelos Direitos Humanos, de autoria de Wagner Franceso, estudante da Teologia Marxis-
ta, na Bahia. Seu trabalho está disponível em uma página online.

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Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
As duas fontes são as mais pertinentes e são as que mais se aproximaram da nossa ideia, mas, nos
apoiamos, também, na Constituição Federal de 1988 no que trata dos direitos e garantias funda-
mentais dos cidadãos.
Um outro texto no qual nos apoiamos teoricamente foi: “Visões da Educação de Jovens e Adultos
no Brasil”. Esse artigo, escrito por Maria Clara Di Pierro, Orlando Joia e Vera Massagão Ribeiro, nos
remete a uma história da EJA e, mais do que isso, ele traz uma breve reflexão sobre a Educação por
toda a vida. Outro ponto interessante para nosso projeto é quando o autor e as duas autoras falam
sobre temas relevantes para a EJA, dentre esses temas, podemos destacar o multiculturalismo e as
relações sociais de gênero e direitos da mulher.
Adotamos, também, em nossos estudos, o artigo “Educação ao longo da vida e organismos in-
ternacionais: apontamentos para problematizar a função qualificadora da Educação de Jovens e
Adultos”, de Jaqueline Ventura, que, entre outros aspectos, trata das três funções da Educação de
jovens e adultos e principalmente da função qualificadora que é considerada o próprio sentido da
EJA e tem como base o caráter incompleto do ser humano, cujo potencial de desenvolvimento e de
adequação pode se atualizar em quadros escolares e não escolares.
A compreensão de que o conhecimento está se atualizando permanentemente é um paradigma
importante nesse contexto, isso porque é necessário que o indivíduo seja capaz de desenvolver no-
vos conhecimentos e diversas habilidades, tendo em vista sua realidade social. A educação ao longo
da vida é um conceito amplo que está presente em diversas políticas públicas e documentos da EJA
que passam a abarcar a ideia de educação continuada e não somente o aprendizado de dentro de
sala de aula, isto é, pensar o aluno como um ser incompleto que está aprendendo e se atualizando
a todo momento.

As etApAs do projeto
A Escola Municipal Professor Lourenço Filho, na EJA, possui um total de seis turmas, sendo duas
turmas no Peja I e quatro turmas no Peja II. Para a realização do projeto utilizamos três dias diferen-
tes na semana, cada um com duas turmas diferentes. As etapas do projeto foram simples: iniciamos
com uma problematização, ou melhor, fizemos algumas perguntas aos alunos sobre o tema a fim de
que expusessem suas opiniões para que, a partir daí, fizéssemos algumas intervenções no sentido
de se sentirem capazes de apresentar seus conhecimentos prévios para, a partir daí, construir con-
ceitos/definições que, apesar de simples, conseguissem dar conta do tema sem provocar embara-
ços. Para isso propusemos diferentes etapas:
No primeiro momento nos apresentamos para os alunos, explicamos o objetivo da nossa conver-
sa, o que gostaríamos de fazer na aula e, logo a seguir, ouvimos e acompanhamos a letra da música
“Comida – dos Titãs”. Utilizamos essa música como um momento de descontração, como uma forma
de criar uma abertura para a interação deles conosco, para deixá-los mais à vontade. Alguns já co-
nheciam a canção e para aqueles que não a conheciam distribuímos a letra da canção e cantamos a
música junto com os alunos.
No segundo momento conversamos com eles sobre a letra da música, os seus significados e apro-
veitamos a mesma para a confecção de um painel de desejos com o tema “Você tem sede de quê?”,
baseados na canção pedimos para que os alunos escrevessem dentro de gotas, confeccionadas e
cortadas de folhas de ofício, palavras sobre o que eles tinham sede, o que eles desejavam que tives-
sem a mais em nossa sociedade e logo após fossem até o painel e colassem os seus desejos nele.
No terceiro momento aproveitamos a escrita dos alunos e dialogamos com eles, baseados no
artigo 6º da Constituição Brasileira, a respeito dos direitos fundamentais garantidos por lei como:
Segurança; Transporte; Lazer; Habitação; Educação e Saúde. Cada bolsista envolvido ficou responsá-
vel por um desses direitos. Abordamos cada um desses temas mostrando a eles o que estava na lei e

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Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
a todo o momento os alunos retornavam com depoimentos que conflitavam o que é garantido por
lei e o que de fato acontece, neste terceiro momento começamos a ver um retorno dos alunos que
deram início a roda de conversas demonstrando a indignação deles com os direitos garantidos que
não são cumpridos.

“São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a pre-


vidência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desampa-
rados, na forma desta Constituição.” (Capítulo II – Art. 6° da Constituição Brasileira
– 1988)

No quarto momento passamos um vídeo retirado do youtube sobre movimentos sociais com o
objetivo de falar com eles sobre os direitos que foram garantidos a partir de lutas sociais ocorridas
no decorrer de nossa história e que tiveram um papel fundamental para a garantia de direitos que
não continham na constituição. Esse vídeo possuía uma prévia sobre a história dos movimentos,
exemplificando-os e assim, facilitando o entendimento de todos em sala.
No quinto momento, após a apresentação do vídeo, conversamos sobre as lutas que ocorreram
e ocorrem até hoje, falamos sobre movimentos sociais e aproveitamos o ensejo da discussão para
falar sobre os direitos garantidos pelas lutas sociais nas últimas décadas como: Lei Maria da Penha;
Estatuto do Idoso; Código de Defesa do Consumidor; Estatuto da Criança e do Adolescente; as leis
contra o Racismo e a importância de se ter uma lei contra a Homofobia, já que, infelizmente, tem
crescido o número de pessoas que sofrem agressões por conta de suas escolhas afetivas.
No sexto e penúltimo momento, entregamos a letra de uma música com o intuito de deixarmos
como reflexão para os alunos, a música “Até Quando - Gabriel O Pensador”. Pudemos perceber neste
momento maior empolgação e interação dos alunos jovens e adolescentes e uma inspiração a mais
para que haja as mudanças necessárias para o bem da sociedade.
No sétimo momento pedimos aos alunos para elaborarem um texto, uma carta destinada aos go-
vernantes, em que eles poderiam pedir e dizer tudo o que quisessem. Nas turmas de Alfabetização
produzimos um texto coletivamente, pela dificuldade de escrita e estruturação de uma carta pelos
alunos, onde todos colaboraram.
Enquanto os alunos falavam e faziam suas requisições aos governantes, nós íamos escrevendo o
texto e, no final, com a carta concluída, foi feita a leitura em conjunto para que os alunos se sentis-
sem parte daquela carta, para que percebessem que foram eles que escreveram. Os alunos do peja
2 escreveram suas próprias cartas, alguns assinaram e outros preferiram ficar no anonimato. Acaban-
do assim nossas atividades na sala de aula.

conclUsão
É importante enfatizar que trabalhar com as turmas a temática dos direitos em forma do projeto,
como uma roda de conversa, é uma configuração que permite promover situações em que os alu-
nos se reconhecem como elementos centrais da construção do conhecimento.
Esse projeto possibilitou, ainda, o diálogo com a realidade dos alunos, ampliando os seus e os
nossos conhecimentos, a sistematização de conteúdos necessários para o desenvolvimento do pro-
jeto e da formação desses indivíduos, para que juntos conseguíssemos formar um pensamento crí-
tico sobre seus próprios direitos tendo como eixo fundamental uma aprendizagem significativa que
possibilite articular os conhecimentos escolares e não escolares, tendo em vista que o aluno está
constantemente aprendendo em todas as suas relações cotidianas, confirmando que o conheci-
mento não é estático nem imutável.
Os resultados obtidos foram sendo reconhecidos desde o momento dos debates, com as ques-

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Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
tões que surgiam em sala, como posteriormente, quando os alunos testemunharam sobre as situ-
ações ocorridas em seu dia a dia e como usaram o aprendizado do debate para reivindicar seus di-
reitos, obtendo êxito, o que enriqueceu o projeto e o fez obter resultados positivos, principalmente
ocasionados por essa grande participação dos alunos, isso porque se conseguiu fazer com que eles
percebessem que também possuem um importante papel no processo da luta pelos direitos.
A experiência adquirida através do projeto foi essencial na formação dos bolsistas de iniciação
à docência pois, somente quando nos deparamos com a realidade das salas de aula e suas proble-
máticas podemos ter uma reflexão sobre o ensino ministrado nas classes da educação de jovens e
adultos, e pensar soluções e desafios para tornar essa educação mais prazerosa e eficiente para alu-
nos e professores. A partir das falas dos alunos ficou clara a descrença dos mesmos sobre os órgãos
públicos, porém, com o projeto percebemos que agora eles compreendem seus direitos e se sentem
mais seguros para reivindicá-los. Com isso percebemos, no retorno destes, alunos e professores, a
sensação da satisfação de dever cumprido e de reconhecimento da importância do Projeto.

referênciAs bibliográficAs
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, Senado, 1998.
BRASIL. Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e
dá outras providências. Lex: Estatuto da Criança e do Adolescente. Disponível em: <http://www.planal-
to.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm>. Acesso em 05 de Junho de 2014
BRASIL. Lei n. 8.078, de 11 de Setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do Consumidor e dá
outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8078.htm. Acesso em 02
de Junho de 2014.
DI PIERRO, Maria Clara; JOIA, Orlando; RIBEIRO, Vera Masagão. Visões de educação de jovens e adul-
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GOHN, Maria da Glória (Org.). Movimentos sociais no início do século XXI: antigos e novos atores. Pe-
trópolis, RJ: Vozes, 2007.
VENTURA, Jaqueline. Educação ao longo da vida e organismos internacionais: apontamentos para
problematizar a função qualificadora da Educação de Jovens e Adultos. Revista Brasileira de Educação de
Jovens e Adultos, vol.1, n.1, 2013.

824
Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
experiênciA de ArticUlAção entre ensino, pesqUisA e
extensão nA formAção de edUcAdores dA ejA
mAgdAlâniA cAUby frAnçA

Socializa e analisa as ações desenvolvidas numa experiência de formação de educadores de jo-


vens e adultos (EJA) realizada no campus II da Universidade Estadual da Bahia. Num trabalho articu-
lado entre ensino, pesquisa e extensão, convergiram-se os esforços para planejar e executar projetos
que contribuíssem para a melhoria da prática docente em EJA. A EJA demanda por políticas públi-
cas de formação que contemplem a diversidade desse público na formação inicial e continuada que
devem se orientar por questões que abordem sua condição socioeconômica, sua subjetividade, cor-
poreidade e suas identidades singulares. A partir de pesquisa com os alfabetizadores do Programa
Brasil Alfabetizado, núcleo Alagoinhas-BA, realizou-se levantamento da necessidade de formação
desse público que foi acolhida pelos graduandos dos cursos de Matemática e Letras num processo
de orientação contínua embasada na pesquisa e construção criativa de alternativas de práticas pe-
dagógicas para a EJA. Assim, ocorreram encontros sistematizados de estudo e de planejamento e
execução de oficinas pedagógicas que promoveram a reflexão na ação contribuindo para a ressig-
nificação da compreensão desta área de conhecimento e da prática pedagógica. Os resultados evi-
denciaram uma possibilidade de reflexão sobre a construção do conhecimento nas três dimensões:
ensino, pesquisa e extensão visando melhorias significativas na realidade docente. Desta forma para
atender as demandas realizamos oficinas pedagógicas, cursos de extensão sobre políticas públicas
e alternativas didáticas na EJA, apresentação de artigos científicos, elaboração de vídeos. Com estas
ações a EJA alcançou uma visibilidade no currículo acadêmico e novos significados pelos coletivos
de EJA dos municípios envolvidos nessas ações.

palavras-chave: Formação de educadores, Práticas Pedagógicas, Extensão, EJA nas li-


cenciaturas

formAção de ejA: dA extensão pArA A pesqUisA e o ensino


Considerando que a EJA adentra a universidade via a extensão, o projeto Formação de Profes-
sores da EJA, tomou como ponto de partida as ações de formação do Programa Brasil Alfabetizado
- PBA, como motivação para o ensino na graduação e a pesquisa na monitoria. Assim, os encontros
com o coletivo dos educadores populares foram gestados num contínuo diálogo entre a graduação
e a pesquisa.
Sabendo-se que por princípio a tríade pesquisa ensino e extensão se constituem como a base das
universidades, funcionalmente esta relação apresenta-se como desafio a ser alcançado. A elabora-
ção de um projeto que incorpore essas três dimensões exige uma gestão que contemple toda a sua
complexidade. Essa temática tem se manifestado presente nas agendas dos Fóruns de Pró-Reitores
das áreas acadêmicas, como o ForGRAD – Fórum Brasileiro de Graduação, que no seu Plano Nacional
de Graduação, ressalta a relevância do papel da universidade para a sistematização e produção de
conhecimentos a partir e para as demandas da sociedade.
Conforme pesquisadores da área MACHADO (2008), SOARES (2006), as ações das universidades
para a formação de educadores de Jovens e adultos são incipientes, a EJA demanda por políticas pú-
blicas de formação que contemplem a diversidade desse público na formação inicial e continuada
que devem se orientar por questões que abordem sua condição socioeconômica, sua subjetividade,
corporeidade e suas identidades singulares.

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Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
Visando superar o desafio colocado às universidades brasileiras de inserir a EJA na formação ini-
cial dos graduandos das licenciaturas o referido projeto justificou a temática da EJA como conteúdo
relevante nas disciplinas para atender às demandas dos educandos da educação básica, composta
por um número significativo de jovens e adultos oriundos de classe popular. Assim, no primeiro
semestre letivo do projeto, incluiu-se nos componentes curriculares para a graduação, os conteú-
dos de EJA: estudou-se as concepções históricas, psicológicas, sociais e metodológicas da EJA para
embasar a elaboração de uma proposta pedagógica para a EJA. “A ausência da EJA no currículo dos
cursos de licenciatura cria, freqüentemente, uma demanda por preparação de professores por meio
da formação continuada.” (Soares, 2008)
No semestre seguinte, já ministrando as disciplinas de Didática e Alfabetização e Letramento pos-
sibilitou-se o contato com práticas bem sucedidas na área de EJA, incentivou-se a observação nas
turmas de EJA e PBA para o planejamento de oficinas pedagógicas que assegurassem estratégias
diversificadas para atender a esse público. Os discentes manifestaram indignação em encontrar nas
turmas de EJA espaços educativos precários, alfabetizadores com pouca base pedagógica, porém
entre outras descobertas e constatações que foram discutidas durante as aulas da graduação enxer-
garam pessoas adultas e idosas com vontade de aprender e perceberam o sentido de acreditar na
possibilidade de uma EJA que supere a visão compensatória e caminhe na direção da conquista do
direito básico.
Do grupo de 42 graduandos de Letras e Matemática cinco alunas, por demonstrarem interesses
na temática, foram selecionadas para a monitoria de extensão e participaram da coordenação do
projeto, nas discussões, estudos, pesquisa, gestão junto aos municípios e orientação para os demais
graduandos. Esse trabalho, sistematizado na monitoria de extensão, promoveu o elo entre a univer-
sidade e a comunidade de EJA.
Simultaneamente aconteciam os encontros com os coordenadores de turma, pesquisa sobre as
dificuldades enfrentadas na realidade e qualificação para melhor desempenho de suas competên-
cias na coordenação e contribuir com a melhoria dos planejamentos dos alfabetizadores. O grande
desafio foi mobilizar os educadores para a própria formação, vez que lidamos com um público de
educadores na sua maioria oriundos da classe popular, com pouco poder de acesso aos bens cultu-
rais e materiais produzidos historicamente, com precária base de conhecimento da educação básica
e reduzida atuação nos movimentos sociais.
Ademais, para ampliar as possibilidades de formação, ofereceram-se dois cursos de extensão,
um com carga horária de 60 horas e o outro com 80 horas, para atender os gestores municipais,
inclusive os coordenadores de turma do PBA, com objetivo geral discutir as Políticas educacionais
brasileiras e a formação dos professores a partir da investigação da história da educação de adultos
no contexto internacional e suas implicações nas concepções de educação de adultos no Brasil,
analisando a vinculação dos aspectos sociais, econômicos, políticos às diversas propostas, reconhe-
cendo suas especificidades conceituais e metodológicas. Estes cursos possibilitaram o diálogo entre
gestores municipais de EJA e os coordenadores do PBA visando à continuidade dos alfabetizandos
na rede municipal de educação além de favorecer a troca de experiências.

pesqUisA pArticipAnte : Um cAminho pArA A formAção nA ejA


A pesquisa participante se apresentou como a opção metodológica mais adequada para possi-
bilitar a formação como uma continuidade na qual os educadores assumem o compromisso pela
educação na ação-reflexão das suas práticas, a trajetória pessoal se funde com a profissional e o edu-
cador alcança a consciência da necessidade de uma formação integral ao longo da vida. A pesquisa
participante para Brandão (1984):

Trata-se de um enfoque de investigação social por meio do qual se busca plena

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Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
participação da comunidade na análise de sua própria realidade, com objetivo de
promover a participação social para o benefício dos participantes da investigação.

Assim, para realizar a pesquisa contou-se com o envolvimento, sobretudo, dos 45 coordenadores
de turma do núcleo de Alagoinhas que participavam dos encontros mensais realizados pela coor-
denação da UNEB – campus II. Nesses encontros houve oportunidade de escutar e diagnosticar as
diferentes realidades na EJA, identificar os problemas, discutir e propor coletivamente alternativas.
Os questionários foram necessários, pela incipiência dos coordenadores de turma de expor as re-
ais necessidades de formação dos alfabetizadores. A maioria das críticas e observações se referia às
dificuldades de ordem infraestrutural como: falta de transporte, merenda escolar e material didático.
Questionários foram aplicados aos alfabetizadores durante a segunda parte da formação inicial,
depois que já haviam adquirido experiência com a alfabetização. O objetivo era buscar os conheci-
mentos prévios dos educadores sobre o processo de alfabetização, letramento matemático e edu-
cação para a diversidade. Após aplicação dos questionários possibilitou-se espaço para discussão
e escuta dos alfabetizadores, nesse momento as monitoras registravam as informações relevantes
para planejarmos as intervenções pedagógicas. Esse fazer reflexivo sobre a prática docente no e
com o grupo participante configurou-se num trabalho contínuo de ação-reflexão-ação sobre a prá-
tica pedagógica incidindo, consequentemente, na qualificação docente.

É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a


próxima prática. O próprio discurso teórico, necessário à reflexão crítica, tem de ser
de tal modo concreto que quase se confunda com a prática. O seu “distanciamento”
epistemológico da prática enquanto objeto de sua análise, deve dela “aproximá-lo”
ao máximo. (FREIRE, 1996)

As oficinAs pedAgógicAs como estrAtégiA de interVenção


Diagnosticada a necessidade de embasamento teórico e de modelos didáticos para contribuir
para a melhoria da prática dos alfabetizadores, escolheu-se a oficina pedagógica como estratégia
metodológica de intervenção na prática.
A oficina pedagógica configura-se em espaço de transformação da prática docente. Caracteriza-
-se pela interação entre saberes da prática e saberes acadêmicos em determinado assunto visando
aprofundar uma compreensão.

Entendemos a oficina pedagógica como uma metodologia de trabalho em gru-


po, caracterizada pela construção coletiva de um saber, de análise da realidade, de
confrontação e intercâmbio de experiências. (CANDAU, 1999)

O planejamento das oficinas aconteceu nos encontros de monitoria e nas aulas com os discentes
da graduação onde foram definidos os conteúdos específicos de cada área de conhecimento, por
exemplo: sistema de numeração decimal, frações, estatística, matemática financeira e quatro opera-
ções em Matemática; leitura, gêneros textuais, diversidade linguística em Letras. Após esta seleção
de conteúdos buscou-se elaborar estratégias pedagógicas com ênfase na contextualização e rela-
ção dos conteúdos específicos com a realidade da EJA.
Embora tenham recebido orientações para se trabalhar com os eixos temáticos: trabalho e
diversidade, percebeu-se nos projetos elaborados pelos graduandos, uma dificuldade de discorrer
sobre esses temas evidenciando uma lacuna curricular nas licenciaturas.

827
Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
Ao final de dois semestres letivos, quando os graduandos demonstraram certa segurança
e domínio dos conteúdos da EJA as oficinas foram levadas aos municípios. Houve mobilização por
parte das secretarias de educação, ONGs e sindicatos nos municípios que firmaram a parceria nesse
projeto oferecendo em contrapartida espaço, material de apoio e merenda para os educadores.
A dinâmica de organização das oficinas sempre partia dos conhecimentos prévios dos educado-
res num movimento de construção, desconstrução e reconstrução dos saberes, seguindo as premis-
sas da metodologia dialética de construção do conhecimento. Foi interessante perceber o processo
de construção de conhecimento dos alfabetizadores nas diversas oficinas pedagógicas, partindo
do conhecimento prévio limitado, fragmentado e por meio de diálogos e intervenções entre os
participantes e com referenciais mais sistematizados, ao final observar a ressignificação dos saberes
evidenciados pelo discurso mais embasado.
Nas oficinas, além da discussão sobre fundamentos teóricos que permeiam toda a ação docente,
conseguiu-se também construir materiais didáticos e atividades para serem utilizados nos planeja-
mentos de aulas das turmas da EJA.
Todo o processo de planejamento, execução e avaliação das oficinas evidenciou a força dessa
estratégia pedagógica para a qualificação da formação docente, na medida em que proporcionou a
discussão das práticas, embasamento teórico e a construção de novas estratégias de ação pedagó-
gica.

considerAções finAis
Realizar um projeto de EJA que articule a pesquisa, o ensino e a extensão constituiu-se num desa-
fio que foi sendo contornado a cada etapa na busca de alternativas criativas para atender às deman-
das de (in)formação dos educadores envolvidos na ação.
Partiu-se do pressuposto que a formação de educadores na perspectiva de letramento só poderia
ocorrer inserida num espaço de letramento. Letra na formação seria oportunizar os educadores a
ampliação da sua visão de mundo, possibilitar o acesso aos bens culturais, mobilizar atitudes sociais
e profissionais que colocassem em uso os conhecimentos e práticas abordados na formação. Traba-
lhamos com diferentes tipos de letramento por meio de estratégias que possibilitassem a conexão
dos saberes.
O alcance dos resultados esperados como a realização de mais de 20 oficinas pedagógicas que fo-
ram oferecidas aos educadores do PBA e professores da EJA nos municípios de Aramari, Alagoinhas,
Araçás, Catu e Inhambupe. A sistematização do projeto por meio da escrita de artigos, elaboração
de vídeo e do boletim informativo.
Resultados não esperados, mas surpreendentes, foram a produção, pelas monitoras, de vídeos e
trabalhos sobre a EJA em outras disciplinas dos cursos de licenciatura, escrita e apresentação de ar-
tigos sobre EJA, além do aumento do número solicitações, por parte dos discentes, para orientação
de trabalho de conclusão de curso (TCC) com a temática de EJA nos cursos de Letras e Matemática,
possibilitando uma maior visibilidade e um tratamento acadêmico à EJA.
Todas essas ações, oriundas de uma proposta articulada, evidenciam a importância de se fomen-
tar projetos que contemplem a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão visando a for-
mação integral do docente ao colocar a teoria a serviço da prática demandada pela diversidade da
sociedadeBRANDÃO, Carlos R. Pesquisar-Participar. In: BRANDÃO, Carlos R. (Org.). . São Paulo: Brasi-
liense, 1985.

referênciAs bibliográficAs
CANDAU,V. M., ZENAIDE, M. N. T. João Pessoa: Programa Nacional de Direitos Humanos; Secretaria

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Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
da Segurança Pública do estado da Paraíba; Conselho Estadual da Defesa dos Direitos do Homem e do
Cidadão, 1999.
ForGRAD – Fórum de Pró-Reitores de Graduação das Universidades Brasileiras – (PNG) – versão 1999.
Disponível em http://www.forgrad.org.br/pages/publicacoes.htm
FREIRE, Paulo. . Editora Paz e Terra. Coleção Saberes. 1996.
MACHADO, Maria Margarida. Brasília: SECAD/MEC, UNESCO, 2008.
SOARES, L. (Org.). . Belo Horizonte: Autêntica, 2006.

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Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
o pibid/Uff de históriA nA edUcAção de joVens e
AdUltos: A experiênciA no colégio estAdUAl
cizínio soAres pinto
jAqUeline pereirA VentUrA | rômUlo dos sAntos morgAdo
thAtiAne | mArconi bAzilio costA cAbo

O presente trabalho tem como objetivo apresentar a experiência de iniciação à docência desen-
volvida em turmas do ensino médio na modalidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA) do Co-
légio Estadual Cizínio Soares Pinto, no município de Niterói, no Rio de Janeiro; vinculada ao subpro-
jeto de História do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID) da Universidade
Federal Fluminense (UFF), em 2013. No intuito de contribuir com uma formação de professores que
considere a Educação de Jovens e Adultos, o relato é iniciado por uma breve reflexão sobre a forma
como a EJA é tratada na legislação, como ela está organizada na rede estadual do Rio de Janeiro e al-
gumas notas sobre a potencialidade do fazer pedagógico na EJA na escola pública; seguido de uma
exposição sobre as experiências de prática docente realizadas pelo grupo de licenciandos, especial-
mente, a experiência de produção de um documentário intitulado “EJA, seus atores e histórias”, por
entendermos que o resgate da experiência de vida dos alunos pode ser utilizado como fonte primá-
ria na construção de conhecimento histórico. Nosso desafio foi refletir sobre as especificidades da
prática pedagógica em turmas de Educação de Jovens e Adultos, articulada aos desafios relativos às
especificidades do ensino de História nessa modalidade de ensino. O ensino desta disciplina, per-
mite a discussão de vários temas de relevância social e cultural como: trabalho, cidadania, relações
de poder etc., tais temas possuem na EJA um aspecto significativamente relevante e singular, ao ser
associado a experiência de vida da classe trabalhadora.

palavras-chave: educação, jovens, adultos

introdUção
O presente artigo é um dos produtos do trabalho desenvolvido no subprojeto de História do
Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID) da Universidade Federal Fluminense
(UFF), cujo objetivo, além da iniciação à prática docente na Educação Básica, é o de contribuir com
a construção de atividades diferenciadas de ensino. O texto consiste no relato e análise de algumas
experiências de prática docente elaboradas por uma parte6 do grupo do subprojeto, desenvolvidas
em quatro turmas do ensino médio na modalidade de Educação de Jovens e Adultos – EJA (duas de
3º ano e duas de 1º ano), no turno da noite do Colégio Estadual Cizínio Soares Pinto, localizado na
cidade de Niterói/RJ.
Para tanto, o trabalho está dividido em duas partes. A primeira remete à uma breve reflexão sobre
a forma como a EJA é tratada na LDB, como ela está organizada na rede estadual do RJ e algumas
notas sobre a potencialidade do fazer pedagógico na EJA na escola pública. A segunda é uma ex-
posição sobre as experiências de prática docente realizadas pelo grupo. Seguidos de uma pequena
conclusão.

notAs sobre cArActerísticAs dA ejA nA rede estAdUAl do rj

6 Participaram desta experiência seis bolsistas CAPES/PIBIB: Antonio Felipe da C. Monteiro Machado, Maian Capella Soares,
Marconi Bazilio Costa Cabo, Renato Silva dos Santos, Rômulo dos Santos Morgado e Thatiane Piazza de Mel.

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Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
Como não poderia deixar de ser, o começo do PIBID na EJA do Colégio Estadual Cizínio Soares
Pinto foi um verdadeiro “choque de realidade”7 para os bolsistas. Então, tornou-se necessário, à me-
dida que construímos o plano de trabalho com a escola, situarmos aquela escola e aquela EJA, com
suas características e dificuldades singulares, no contexto mais amplo da política pública educacio-
nal estadual e nacional. Eram muitas as dúvidas: Por onde começar? Como é a docência na prática?
O que é a EJA? O que a rede estadual do Rio de Janeiro propõe para a EJA no nível médio? Etc. Nesta
seção nos debruçaremos, basicamente, sobre os dois últimos questionamentos.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN/96) determina que “Os sistemas de en-
sino assegurarão gratuitamente aos jovens e aos adultos, que não puderam efetuar os estudos na
idade regular, oportunidades educacionais apropriadas, consideradas as características do aluna-
do, seus interesses, condições de vida e de trabalho, mediante cursos e exames” (art. 37, parágrafo
1°); identidade própria que foi ratificada nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a EJA (Parecer
11/2000)8: “trata-se de uma categoria organizacional constante da estrutura da educação nacional,
com finalidades e funções específicas” (BRASIL, 2000). Neste sentido, tais legislações responsabili-
zam os sistemas de ensino pela construção de propostas político-pedagógicas e de currículo pró-
prios para a EJA. Em suma, no plano legal a Educação de Jovens e Adultos, atualmente, supera a
lógica dos cursos supletivos (resumo dos conteúdos do ensino regular) e a lógica dos programas de
aceleração da aprendizagem (correção do fluxo escolar do ensino regular). Todavia, na prática, é re-
lativamente recente e profundamente incipiente o reconhecimento por parte das redes públicas de
ensino da necessidade de elaborar uma proposta político-pedagógica voltada especialmente para
os cursos de EJA. Portanto nas escolas públicas sua existência ainda é um grande desafio político e
pedagógico9.
Esta não tem se constituído como uma tarefa simples, principalmente, na realidade da educação
pública sob a responsabilidade dos entes da Federação, particularmente naquilo que constitucio-
nalmente lhe cabe dar prioridade: o ensino médio. Destinado aos maiores de dezoito anos, a EJA
neste nível de ensino encontra-se no Rio de Janeiro, majoritariamente, na rede estadual de ensino10.
Para atender a demanda por escolarização de jovens e adultos a gestão da Secretaria de Estado de
Educação do Rio de Janeiro (SEEDUC), fragmenta em cinco tipos diferentes de organização burocrá-
tico-pedagógica11: Centro Estudos de Jovens e Adultos (CEJA, antigo CES); EJA; Nova EJA; regular no-
turno e Programa Autonomia12. Esse quadro com variados e independentes padrões de organização
reiteram, ainda mais, para o desprestígio, a desvalorização e o desconhecimento do que é ser uma
modalidade da educação básica, com qualidade social voltada para a classe trabalhadora.
No que se refere à atuação no Colégio Estadual Cizínio Soares Pinto vivenciamos a transição da
nova política estadual para EJA. Desse modo, a partir do primeiro semestre de 2013, as turmas de 1º
ano seguiam a proposta NOVA-EJA enquanto as turmas de 2º e 3º ano permaneciam com a matriz
curricular anterior, denominada Currículo Mínimo EJA. Dentre as diferenças destacam-se a carga
horária reduzida, roteiro de aula para professor, uma formação docente, organização modular. A
NOVA-EJA traz uma forma de abordagem dos conteúdos diferenciada, reorganizando-os através de
material próprio (apostilas temáticas) distribuída a todos os alunos; o que gerou um contraste com

7 Expressão recorrentemente utilizada pelos licenciandos para designar o distanciamento entre o curso de História e a escola
básica.
8 Ver Lei 9394/96, Parecer nº 11/2000 e Resolução nº 1/2000.
9 Análise acerca da questão pode ser encontrada em Ventura; Rummert (2010)
10 Segundo o INEP, em 2012, o número total de matrículas na Educação de Jovens e Adultos do Ensino Médio no estado do
Rio de Janeiro é de 120.800, distribuídos por dependência administrativa em 1.456 na rede federal, 100.344 na rede estadual, 2.059 na
rede municipal e 16.941 nas escolas da rede privada de ensino. Fonte: http://portal.inep.gov.br/basica-censo-escolar-sinopse-sinopse
11 Até o ano letivo de 2013, quando findou a nossa experiência na supracitada rede educacional.
12 O Programa Autonomia é um programa de aceleração de aprendizagem que utiliza a metodologia de telecurso da Funda-
ção Roberto Marinho. Sua proposta é diminuir a distorção idade-série dos alunos da Educação Básica com idade mínima de 15 anos
no Ensino Fundamental e de 17 anos no Ensino Médio. A proposta desse projeto inclui duas disciplinas por módulo no Ensino Fun-
damental, com duração de doze meses, e três no Ensino Médio, com duração de dezoito meses, com aulas ministradas por um único
professor bolsista para todas as disciplinas.

831
Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
a EJA “tradicional” que não oferece material didático específico e, muitas vezes, não oferece material
algum a seus alunos. Tal cenário constituiu-se numa dificuldade significativa adicional, uma vez que
nos vimos obrigados a lidar com duas orientações curriculares distintas ao mesmo tempo; por outro
lado, também constituiu-se em uma aprendizagem político-pedagógica importante, pois, pelo que
tudo indica, presenciamos um processo que tem como um dos seus objetivos a fragilização da posi-
ção do professor e a descaracterização da já combalida identidade docente.
A confusa realidade que testemunhamos no nosso estado, na vivencia de estudo e prática no
âmbito do PIBID, nos mostrou que a EJA, socialmente qualificada, é um direito dos alunos, mas que
para ser efetivada necessita, dentre outros aspectos, de vontade política real e qualificação dos pro-
fissionais da educação para tal13.
A partir destas preocupações, nossa atuação - acompanhada pelos orientadores da FEUFF e o
professor supervisor no colégio14 - constituiu-se na convivência com alunos de faixas etárias e ex-
periências de vidas distintas, em sua maior parte já inseridos no mercado de trabalho, com viven-
cias próprias e valores formados. Estar presente, conhecer e estudar as especificidades da EJA se
constituiu, para nós, no primeiro passo para entender e superar as dificuldades encontradas, com
soluções específicas para a modalidade. Nesse sentido, a EJA apresenta diversas potencialidades ao
proporcionar um rico processo de ensino e aprendizagem quando reconhecemos que o aluno não
é um mero receptor de conhecimentos e potencializamos a participação através da valorização de
sua experiência de vida expressa nos relatos e questionamentos desenvolvidos nas aulas.
Portanto, é de suma importância levar em consideração a realidade do aluno da EJA que está
intimamente ligada ao mundo do trabalho. Somos desafiados, a todo o momento, a lidar com: a des-
motivação dos alunos, a evasão escolar, as dificuldades narradas pelos alunos para voltar a estudar,
a falta de tempo para dedicar-se mais aos estudos, a ausência de uma estrutura escolar flexível e de
um corpo docente preparado para lidar com as especificidades da EJA.
Assim, cientes do lugar pouco significativo desta modalidade nas propostas curriculares das li-
cenciaturas, a particularidade das atividades desta equipe no interior do subprojeto de história foi a
de se deparar com uma realidade pouco explorada na formação inicial docente: a complexidade da
prática pedagógica do professor na Educação de Jovens e Adultos. Portanto, buscamos incluir aos
desafios inerentes ao ensino de História15 os desafios relativos às especificidades do ensino desta
disciplina na EJA.

AlgUmAs AtiVidAdes pedAgógicAs


É nesse contexto histórico e teórico, brevemente delimitado, que realizamos algumas atividades
pedagógicas em conjunto com o professor regente. No início, havia uma postura de indiferença
de alguns alunos em relação aos licenciandos; de algum modo, havia certa desconfiança por parte
deles à presença dos bolsistas em sala, talvez, porque um número significativo de alunos fosse mais
velho do que os bolsistas. Esse obstáculo foi superado com a continuidade do trabalho, com a nos-
sa insistência e com as sistemáticas intervenções nas aulas, construindo uma relação de respeito e
responsabilidade.
Nas atividades desenvolvidas buscou-se dialogar com o que é familiar ao aluno. Por isso, optamos
por utilizar ferramentas que acompanhassem as novas tecnologias de um mundo extremamente
visual. É notório observar uma tendência iniciada na segunda metade do século XX que utiliza ima-
gens no ensino de História, principalmente em livros didáticos. Para além dos livros, segundo Bitten-
13 As Diretrizes Curriculares para a EJA destacam que a complexidade diferencial dessa modalidade de ensi-
no não se realiza satisfatoriamente com um professor motivado apenas “pela boa vontade ou por um voluntariado
idealista”(BRASIL, 2000).
14 São eles: o Prof. Everardo Paiva de Andrade (Coordenador de Área), Profa Jaqueline Pereira Ventura (Colaboradora) e Prof.
Marcos André Rodrigues Mahaut (Supervisor)
15 Sobre o assunto, ver Bittencourt (2011).

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Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
court (2011), evidencia-se também uma constante produção de “imagens tecnológicas”, no qual se
utilizam recursos tecnológicos como: filmes, fotografias, imagens, curtas metragens e outros apara-
tos.
Na tentativa de construção de um ensino de História que possibilite uma aprendizagem mais
significativa por parte dos alunos (BITTENCOURT, 2011). Esses materiais são utilizados como um im-
portante recurso didático. Permitem uma aula diferenciada e mais próxima do aluno, pois a imagem
permite uma melhor apreensão do conteúdo. É necessário atentar ao cuidado com esse material, na
tentativa de não apresentar-se apenas como mera ilustração, portanto a experiência do grupo PIBID
no colégio Cizínio Soares Pinto, procurou desenvolver atividades que fossem interessantes e que
propiciassem um melhor aprendizado para os alunos.
Na perspectiva de dialogar com a cultura dos alunos elaboramos atividades para complementar
o conteúdo trabalhado em sala de aula, tais como: monitoria, a confecção de um blog voltado para
os alunos, cineclube, o mural com notícias e oportunidades de cursos gratuitos, aulas complementa-
res a matéria e de revisão, recolhemos relatos em audiovisual onde os mesmos fossem incentivados
a relatar a sua trajetória de vida com o objetivo de valorizar a experiência dos alunos da EJA.
A monitoria regular no colégio, acompanhando o calendário da disciplina, era desenvolvida atra-
vés do auxílio com exercícios e reforço escolar visando à superação das dúvidas e dificuldades dos
estudantes. Sempre com a orientação do Professor Supervisor, também foram realizadas interven-
ções regulares durante as aulas expositivas, com o objetivo de colaborar com o trabalho desenvol-
vido por ele e poder acrescentar com outros pontos de vista. A partir de um trabalho que consegue
atingir o aluno individualmente e sanar algumas dúvidas que não seriam expostas em público, per-
cebeu-se que o desenvolvimento deste trabalho serviu para estimular a participação dos estudan-
tes e que eles se sentiram progressivamente à vontade para perguntar, pedir ajuda e superar suas
dificuldades.
O blog do projeto (http://pibidejahistoriauff.wordpress.com/) foi amplamente utilizado ao longo
do exercício das atividades desenvolvidas no colégio. O blog surgiu como resultado dos trabalhos
já desenvolvidos e teve como objetivo aglutinar as informações sobre estes, divulgando-os e contri-
buindo para seu fortalecimento. É importante ressaltar que tal ferramenta foi cada vez mais visuali-
zada pelos alunos – atingindo o dobro de acessos no período letivo – que buscavam apresentações
de slides utilizadas em sala, os vídeos apresentados durante os cine debates e as informações que
também constam no mural PIBID, além de exercícios e atividades extra-aula.
Outro aspecto crucial da atuação da equipe foi à utilização de espaços extraclasse do colégio an-
tes não disponibilizados à EJA e que muitos alunos se quer conheciam sua existência. Um exemplo
foi o laboratório de informática, em que os alunos conseguiram ver o blog e fazer pesquisas na inter-
net e também o apoio no período do vestibular com auxílio para a matrícula dos mesmos no ENEM.
O auditório do colégio, é outro espaço que antes era pouco utilizado, principalmente no período
da noite, e que aos poucos tornou-se parte do cotidiano da escola. Nele foram realizadas diversas
apresentações, com exibição de slides, música, e vídeos.
A atividade desenvolvida nesse espaço foi o cineclube durante o período escolar. A prioridade foi
à exibição de curtas didáticos que complementaram a matéria desenvolvida pelo professor. Esses
foram vídeos pequenos, de 10 a 20 minutos, para que após a exibição houvesse tempo de desen-
volver um debate sobre o tema com o estímulo à participação dos alunos. Dentre os filmes exibidos
destacam-se o curta “Maio, Nosso Maio” e os curtas sobre a questão do negro da Prefeitura do RJ,
entre outros.
Foi construído um mural no corredor do colégio com recursos do projeto. Entendendo o perfil
dos estudantes de EJA, o foco das informações foram aquelas consideradas pertinentes ao cotidiano
deles. Assim, diversas notícias referentes à situação no mundo do trabalho, informações referentes
a concursos públicos, projetos de educação do governo, cursos de capacitação profissional, ativi-

833
Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
dades culturais etc., foram expostos no mural. O último mural montado no segundo semestre de
2013 teve o intuito de agradecer a participação dos alunos e apresentar as fotos dessas atividades
desenvolvidas, nos cineclubes, monitoria, no blog, em passeios – como um feito a Fortaleza de Santa
Cruz e etc. Avaliamos a intervenção como bem-sucedida, pois a visualização do mural por parte dos
alunos tornou-se corriqueira na escola. Também é interessante destacar que os próprios alunos pas-
saram a sugerir informações para serem exibidas no mural, tornando sua construção mais coletiva.
Paralelamente, foram desenvolvidas atividades para contribuir com os estudantes que tinham
interesse de se matricular no vestibular de 2014. Entre estas atividades, foi desenvolvido um “Projeto
UERJ” e “Projeto ENEM”, listas de exercícios distribuídas para os alunos com questões de vestibular.
Houve também acompanhamento por parte dos estudantes durante a matrícula no vestibular, re-
alizadas na sala de informática do colégio para auxiliar os alunos na fase de inscrição. Dialogando
com as outras atividades propostas, estes conteúdos foram postados no blog e acompanhados pela
monitoria regular já desenvolvida.
Para finalizar, não poderíamos deixar de registrar a atividade pedagógica que mobilizou a todos:
a produção de um filme media-metragem em CD-ROM intitulado “EJA, seus atores e histórias” (ht-
tps://www.youtube.com/watch?v=W5IYLolNZ4M&feature=youtube_gdata_player)
A partir dos depoimentos em audiovisual teve-se o intuito de construir uma experiência de Histó-
ria Oral. Entendendo que o resgate da experiência de vida dos alunos pode ser utilizado como fonte
primária na construção de conhecimento histórico. Depoimentos foram realizados com o acompa-
nhamento dos estudantes bolsistas e do professor supervisor. Funcionários também foram entre-
vistados, para a contribuição de uma futura pesquisa acerca da história da escola e das práticas pe-
dagógicas ali desenvolvidas. Após editar todo o material, organizamos em conjunto com a direção
duas exibições no auditório com a presença dos entrevistados e demais alunos do colégio. As rodas
de debate que se seguiram ao filme contaram com a contribuição de muitos que não haviam par-
ticipado das filmagens iniciais, mas que futuramente pretendemos, ainda, acrescentá-las. Essa, sem
duvida, foi uma experiência gratificante.

considerAções finAis
O PIBID é uma importante contribuição ao processo de formação de futuros professores, pois é
fundamental para que possamos conhecer e compreender o ambiente escolar, nos diferentes níveis
e modalidades em que poderemos vir a atuar, aproximando os saberes acadêmicos do ambiente
escolar. Dialogando diretamente com esse processo de formação, António Nóvoa destaca a impor-
tância do modelo que une prática e teoria: “É preciso passar a formação de professores para den-
tro da Profissão”. Ao afirmar isso o autor corrobora a tese de que para uma formação qualificada é
necessário à orientação da academia, o embasando teoricamente, atrelada a um atuante trabalho
de campo. E o mais importante, um modelo de formação do professor que aproxime os extremos
integrando a academia, o campo escolar e relação com os alunos.
Além do mais, a experiência vivida pelo grupo no C.E. Cizínio Soares Pinto tem contribuído para
reflexões iniciais sobre o lugar ocupado pela EJA na formação inicial de professores promovida pela
universidade. Tardif em sua obra “Saberes, tempo e aprendizagem do trabalho no magistério” sinali-
za a importância dos saberes que dizem respeito ao acúmulo de experiência de cada professor, seja
na vida pessoal, na vivência escolar, nas instituições religiosas e na sociedade de uma maneira geral.
Trata-se de uma concepção bastante ampla, visto que ele procura relacionar o conhecimento dos
docentes com o processo de construção da identidade de cada um.
Nesse sentido, Tardif e Nóvoa destacam a importância da prática no período de formação do do-
cente posto que, ao iniciar a prática profissional, os professores se deparam com a realidade (ou as
realidades) de sua profissão – com seus problemas e limitações – e passam a adaptar seu pré-conhe-
cimento, que no nosso caso está atrelado a academia, a essa realidade explorando e consolidando

834
Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
seu saber-fazer dentro da própria prática de seu trabalho.
O ensino da disciplina de História através da percepção da “ação do homem no tempo16” permite
a discussão de vários temas de relevância social e cultural como: trabalho, cidadania; economia, re-
lações de poder etc., tais temas possuem na EJA um aspecto significativamente relevante e singular,
ao ser associado a experiência de vida da classe trabalhadora.

referênciAs
BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes. Ensino de História: fundamentos e métodos. Cortez Editora: São
Paulo, 2011.
BLOCH, Marc. Apologia da História ou O Ofício de Historiador. Rio de Janeiro: Zahar Editor, 2001.
BRASIL. CNE/CEB. Parecer 11/2000. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e
Adultos. Relator: Carlos Roberto Jamil Cury, aprovado em 10/05/2000. Diário Oficial da União, MEC/CNE/
CEB, Brasília, 9 jun. 2000, Seção 1e, p. 15.
VENTURA, J; RUMMERT, S. Educação de jovens e adultos: políticas e práticas educativas; SOUZA, J. S. [et
al.] (org). 1aed. Rio de Janeiro: Nau: EDUR, 2010.
TARDIF, Maurice e RAYMOND, Danielle. Saberes, tempo e aprendizagem do trabalho no magistério.
Educação & Sociedade: Revista de Ciência da Educação / Centro de Estudos Educação e Sociedade, ano
XXI, n. 73. SP : Cortez; Campinas : CEDES, 2000, p. 209-244.
NÓVOA, António. O regresso dos professores. Universidade de Lisboa, 2007, p. 1-11.

16 Conceito presente em Bloch (2001).

835
Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
práticAs pedAgógicAs em ejA: legAdo dA escolA
cAbAnA, presençA e AtUAlidAde freireAnA
Alder de soUsA diAs | iVAnilde ApolUceno de oliVeirA

Este trabalho foi elaborado tendo como base uma dissertação de mestrado defendida em 2012,
no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado do Pará, inti-
tulada: “Paulo Freire na Escola Cabana: memórias e práxis de profissionais da Educação de Jovens
e Adultos”. Visa apontar princípios de prática pedagógica na Educação de Jovens e Adultos (EJA)
durante a vigência da Escola Cabana – proposta político-educacional implantada durante os anos
de 1997 a 2004, que teve como principal referência teórica o pensamento educacional freireano e
como modelo de gestão de sistema de ensino a experiência de Paulo Freire como Secretário de Edu-
cação de São Paulo-SP (1989-1991). Metodologicamente, constitui-se em um estudo de abordagem
qualitativa, do tipo estudo de caso, com características etnossociológicas. Realizou-se levantamen-
tos bibliográfico e documental e quatro entrevistas narrativas (BERTAUX, 2010) com a então gestora
municipal de Educação de Jovens e Adultos, uma diretora de escola, uma coordenadora pedagógica
e uma professora de EJA. Foram adotados procedimentos da Análise de Conteúdo para sistematizar
e analisar os dados coletados. Dentre os resultados, apontam-se como princípios de prática pedagó-
gica em EJA: luta por uma sociedade democrática, o cultivo da vocação ontológica do ser humano
em ser mais, a prática da alteridade, a busca em conhecer a realidade sociocultural dos educandos, a
prática do diálogo em sua dimensão epistemológica, ontológica e pedagógica, dentre outros. Con-
clui-se que os princípios educativos explicitados acima, podem se tornar pistas para a construção
de uma política e prática educacional que vise à inclusão social, e a concretização do ideal de escola
pública, democrática, popular, que promova a vida não apenas a humana, mas em contexto de uma
ecologia planetária.

palavras-chave: Prática Pedagógica, EJA, Escola Cabana, Atualidade Freireana, Ecolo-


gia Planetária

introdUção
O trabalho sustenta-se em dados de uma dissertação de mestrado defendida no âmbito do Pro-
grama de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado do Pará, intitulado: “Paulo Freire
na Escola Cabana: memórias e práxis de profissionais da Educação de Jovens e Adultos”. Dissertação
que fez parte de uma pesquisa mais ampla financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico e liderada pela Cátedra Paulo Freire da Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo.
Visa explicitar princípios de prática pedagógica em Educação de Jovens e Adultos (EJA) no con-
texto da Escola Cabana – proposta educacional implantada pelo Partido dos Trabalhadores (PT) e
coligação em Belém-PA, no período de 1997 a 2004.
Metodologicamente, a partir de uma abordagem qualitativa, realizou-se uma pesquisa de campo
do tipo estudo de caso com características etnossociológicas (BERTAUX, 2010).
Dentre os momentos da pesquisa, constam levantamento bibliográfico e documental sobre o
pensamento educacional freireano e a Escola Cabana para fins de compreender o horizonte teórico
e epistemológico da pesquisa, bem como subsidiar a análise dos dados coletados.
Utilizou-se da técnica denominada de entrevista narrativa (BERTAUX, 2010) como meio de coleta
de dados e de procedimentos de Análise de Conteúdo (BARDIN, 2002) para sistematização e análise

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Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
dos dados.
Foram entrevistadas quatro narradoras que no período da Escola Cabana atuaram com a EJA em
funções diferentes: gestora municipal da EJA, diretora de escola, coordenadora pedagógica de EJA,
professora de EJA. Todas identificadas, para este trabalho, por meio dos respectivos pseudônimos:
Ana, Beatriz, Carla e Débora.
Durante a Escola Cabana as narradoras trabalharam em ambientes diferentes. Ana teve como
referência de local de trabalho a Secretaria Municipal de Educação de Belém-PA SEMEC/BEL), Beatriz
foi diretora de uma escola que para efeito de identificação utiliza-se ao longo deste texto pseudôni-
mo de origem indígena, qual seja, Escola Tipití. Carla e Débora trabalharam em outra escola munici-
pal identificada com pseudônimo Escola Tucupí.
Portanto as identificações das narradoras estarão relacionadas no texto da seguinte maneira:
Ana-SEMEC/BEL, Beatriz-Matapí, Carla-Tipití e Débora- Tipití.
Além da presente Introdução e das Considerações Finais, o corpus do trabalho consta de ou-
tras duas seções. Em “Materialidade político-pedagógica e legado da Escola Cabana”, explicita fun-
damentos discursivos e materiais a partir dos quais foi engendrada esta proposta educacional e a
aponta como legado para a EJA na medida em que considerou os anseios das camadas populares
em suas políticas e práticas educativas.
A seção posterior: “Presença e Atualidade Freireana na Prática Pedagógica da EJA da Escola Ca-
bana”, indica princípios de prática pedagógica que explicitam a presença e atualidade do quefazer
freireano no contexto de uma sociedade capitalista, que gera vítimas do sistema-mundo compre-
endido como ampliação da influência cultural de um sistema inter-regional (alta cultura ou sistema
civilizatório) a outras culturas (DUSSEL, 2012).

mAteriAlidAde político-pedAgógicA e legAdo dA escolA cAbAnA


A Escola Cabana constitui-se em nome identitário de uma proposta educacional para Belém-PA,
implantada desde 1997 a 2004 – período em que o município fora governado pelo PT e coligação
partidária.
Traz este nome como uma tentativa de evocar o passado de luta do povo paraense, mais preci-
samente por meio da Revolução Cabana: movimento revolucionário genuinamente amazônico, de
participação maciça dos despossuídos e que teve na autonomia, na igualdade política, no aceite e
respeito às diferenças culturais – quando a cidadania esboçava seus primeiros passos – seus princí-
pios orientadores (RODRIGUES, 2009).
Não é sem motivo que em uma de suas análises, Bertolo (2004, p. 155) aponta:

Como se vê, um dos fios que articulam a trama discursiva que origina o projeto
Escola Cabana, presente nos três documentos analisados, pode ser identificado no
vínculo que se tenta estabelecer entre o projeto e a Cabanagem – que nos documen-
tos oficiais da Escola Cabana é descrito como um dos mais legítimos, revolucioná-
rios e populares movimentos que marcaram a história política de nosso país.

Mas em termos político-pedagógicos, a origem material da Escola Cabana não está apenas rela-
cionada aos pleitos que levaram o PT ao governo de Belém-PA. Sua origem remonta a uma vitória
anterior, a do PT de São Paulo-SP nas eleições de 1988.
Na conjuntura política em que São Paulo-SP foi governada pelo PT (1989-1992), Paulo Freire assu-
me a Secretaria Municipal de Educação de São Paulo-SP (SME-SP). Momento praxiológico no qual o
educador busca orientar a experiência de estar sendo Secretário de Educação da maior metrópole

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Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
sulamericana com fundamentos de seu pensamento educacional, aliados a outras contribuições
teóricas. Esta sim é a experiência primacial que originou a materialidade político-pedagógica da Es-
cola Cabana e de muitas outras experiências educativas surgidas a partir de 1992, conforme aludem
Saul e Silva (2009, p, 228):

A partir de 1992, vários Estados e municípios brasileiros comprometidos com a


administração popular optaram por construir políticas curriculares com os pressu-
postos freireanos do Movimento de Reorientação Curricular ocorrido em São Paulo
(gestão 1989-1992). Dentre eles, destacaram-se: Angra dos Reis-RJ (1994-2000); Por-
to Alegre-RS (1995-2000); Chapecó-SC (1998-2003); Caxias do Sul-RS (1998-2003);
Gravataí-RS (1997-1999); Vitória da Conquista-BA (1998-2000); São Paulo-SP (2001-
2003); Belém-PA [1997-2004]; Maceió-AL (2000-2003); Dourados-MS (2001-2003);
Goiânia-GO (2001-2003); Criciúma-SC (2001-2003); Rio Grande do Sul (1998-2001);
Alagoas (2001-2003).

Assim, aponta-se a experiência da Gestão Freire em São Paulo-SP como a origem material da Es-
cola Cabana no âmbito da SEMEC/BEL. Não é sem motivo que ambas comungam de ações político-
-pedagógicas muito parecidas, conforme quadro a seguir.

quadro 1 – comparativo entre a gestão freire e a escola cabana

projetos da gestão freire (1989-1992) projetos da escola cabana (1997-2004)


Movimento de Reorientação Cur-
“O Movimento para a Reorientação ricular (BELÉM, 2004; 1999a);
Curricular, Grupos de Formação (para Ações de formação de educadores de
professores, coordenadores pedagó- educadores (BELÉM, 2004; 2003; 1999a);
gicos e diretores de escolas), o Projec-
to Génese (um programa de ensino de Projeto de informática educa-
utilização de computadores) e o MOVA (o tiva (BELÉM, 2004; 2003);
Movimento de Alfabetização de Jovens e Movimento de Alfabetização de Jovens
Adultos)” (TORRES, et. al., 2002, p. 100). e Adultos Professor Paulo Freire – MOVA
Belém (MOVA/BEL) (BELÉM, 2004).

Fonte: Dias (2012, p. 92).


A Escola Cabana apresenta como princípios orientadores a inclusão social e a construção da cida-
dania (BELÉM, 1999a, p. 01) e como diretrizes básicas:
• A democratização do acesso e permanência [do educando] com sucesso;
• A gestão democrática no sistema municipal de educação.
• A valorização profissional dos educadores.
• A qualidade social da educação (Destaque nosso).
Em termos da factibilidade da qualidade social da educação, as narradoras apontam coerência
entre o documento e o ato, pois, Conforme Ana-SEMEC/BEL: “Não se lutava pela qualidade total
como a SEMEC/BEL da gestão municipal anterior, mas como qualidade social: que desse acesso, mas
que garantisse a permanência [do educando] com sucesso”.
No âmbito escolar, esta política educacional foi estabelecida a partir do referencial da gestão

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Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
democrática, o que possibilitou a eleição direta para Direção escolar e Conselho Escolar, além da
construção do projeto político-pedagógico das escolas municipais:

A implantação da Escola Cabana se deu de maneira democrática, onde tivemos


a oportunidade de discutir uma proposta de escola democrática no município de
Belém e isso mexeu com três eixos principais, que a eleição direta do Conselho Esco-
lar, do diretor de escola e também a construção do projeto político-pedagógico das
escolas (Beatriz-Matapí).

Sem deixar de lado os três eixos da gestão democrática da Escola Cabana, contou-se também
com a efetiva participação da comunidade escolar: pais e alunos, professores, funcionários, técnicos
e diretores:

A escola se organizou e realizou, a partir do Projeto Escola Cabana, as eleições


diretas, a constituição dos Conselhos, que contava com diversas formações para
conselheiros. Antes as escolas tinham o plano global, mas na visão democrática,
política, de compromisso com o social da Escola Cabana foi possível construir o pro-
jeto político-pedagógico da escola que respeitasse as diversidades e que fosse fruto
da necessidade do coletivo e isso se dava pelas assembleias com pais, funcionários,
professores e técnicos, contado com acertos e erros. Esses foram os primeiros passos
da Escola Cabana (Carla-Tipití).

Percebemos coerência entre o anunciado pelos documentos analisados e as falas das narradoras
em relação à factibilidade da Escola Cabana, principalmente no que concerne à ampla participação
de professores, técnicos, alunos e pais em seu processo de implantação. Esta é a ideia que a quarta
narradora apresenta:

Aconteceram muitas reuniões com a coordenação, direção, alunos, a comunida-


de. Era mostrado o que se queria, os objetivos e tudo era discutido. As falas significa-
tivas dos alunos e comunidades foram registradas e serviram de base para a cons-
trução do projeto político-pedagógico aqui na escola (Débora-Tipití).

Portanto, os registros das narradoras evidenciam avanços engendrados na educação belenense,


a partir da implantação da Escola Cabana.
Demostra-se, a partir destes dados, a positividade na história da educação paraense trazida pela
Escola Cabana. A narradora Carla-Tipití chega a mencionar: “A Escola Cabana foi um marco histórico
para a educação no Pará”, principalmente porque esta proposta de educação via no povo belenense
o princípio e o fim de suas ações democráticas, além de colocá-lo na condição de sujeito ativo do
devir histórico local. “Por meio da Escola Cabana os atores que fazem a escola estavam intervindo,
sugerindo” (Beatriz-Matapí).
Uma das narradoras nos diz: “a Escola Cabana foi um projeto de educação para o povo. Na ver-
dade, o povo era o sujeito da ação. Era uma escola em que a criança, mesmo na pré-escola, estava
desenvolvendo sua cidadania” (Ana-SEMEC/BEL).
Cidadania, um dos princípios orientadores da Escola Cabana (BELÉM, 1999a), também caracteri-
zada como concretização de direitos sociais às classes populares. “A Escola Cabana foi a garantia de
alguns direitos à população que vinha sendo deixada de lado: direito a esporte, educação, cultura e
lazer” (Beatriz-Matapí).

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Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
Para além desta dimensão ampla de política educacional democrática e de orientação aos inte-
resses das classes populares, a Escola Cabana também foi marcada por mudanças na concepção de
educação: “A Escola Cabana foi um momento de ruptura com uma educação tradicional e os primei-
ros passos de uma educação progressista” (Débora-Tipití).
Educação progressista que traz em seu bojo suas próprias práticas. “Com a Escola Cabana houve
mudanças na forma de avaliação, foi implantado o currículo por meio de ciclos e se deu um trabalho
mais orientado à qualificação do professor” (Beatriz-Matapí).
Ao comparar as memórias das narradoras quanto à educação anterior à proposta da Escola Caba-
na, observa-se que as escolas municipais contavam com um documento denominado de Plano Glo-
bal, que servia para direcionar suas ações, mas não abrangia em sentido democrático e participativo
o Projeto Político-Pedagógico implantado no contexto da Escola Cabana:

Antes as escolas tinham o plano global, que servia para orientar suas ações, mas
na visão democrática, política e de compromisso com o social da Escola Cabana foi
possível construir o Projeto Político-Pedagógico da escola que respeitasse as diversi-
dades e que fosse fruto da necessidade do coletivo e isso se dava pelas assembleias
com pais, funcionários, professores e técnicos, contado com acertos e erros (Débora-
-Tipití).

Na Escola Matapí, houve uma mudança radical em sua gestão desde a implantação da Escola Ca-
bana. A escola, que possui cinco Anexos pelos bairros da Terra Firme e Curió-Utinga antes da posse
do governo do PT contava com o seguinte quadro:
• Os professores dos Anexos, apesar de serem da mesma escola, não se conheciam.
• Eram Anexos em termos de documentação e para percepção de recursos, mas a parte pe-
dagógica não era integrada. Cada Anexo fazia sua Jornada Pedagógica, sua confraterniza-
ção, etc.
• Antigamente os Anexos serviam até de ‘curral eleitoral’. Os políticos colocavam quem que-
riam para trabalhar nos Anexos.
• Os pagamentos não eram feitos pela Prefeitura, mas pela associação de moradores.
• Nos Anexos, podiam interromper aula e se faziam festas de padroeiro a qualquer dia. Se
precisavam velar um defunto era para lá que levavam e se encontravam as portas fechadas
as arrombavam (Beatriz-Matapí).
A partir de 1997, com a Escola Cabana, houve as seguintes modificações:
• Delegaram um coordenador para cada Anexo. Este coordenador era vinculado à escola,
mas visitando os Anexos.
• Os recursos materiais passaram a ser divididos e houve mais assistências aos Anexos.
• Vincularam os Anexos a uma Escola-sede e os profissionais passaram a ser profissionais da
Rede, não mais qualquer um (Beatriz-Matapí).
Esse contexto corrobora o que uma das narradoras vem a dizer sobre a política educacional an-
terior à Escola Cabana: “Naquele momento se tinha uma escola preparada para o fracasso escolar. O
nível de retenção era altíssimo”. (Ana-SEMEC/BEL). Era um sistema escolar que oferecia uma educa-
ção de baixa qualidade: “as pessoas quando saiam da escola não conseguiam fazer uma ‘leitura de
mundo’, mal conseguiam fazer a leitura dos códigos da linguagem escrita” (Ana-SEMEC/BEL).
A análise destas narrativas aponta que a Escola Cabana foi uma proposta de educação democrá-
tica, construída a partir de: “seminários, congressos, ciclos de estudos, fóruns para se discutir aberta-

840
Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
mente a proposta pedagógica democrática voltada para a classe popular” (Débora-Tipití). Iniciativas
estas realizadas por meio de princípios e diretrizes orientados, dentre outros aspectos, ao sucesso
escolar do educando. Em geral, oriundo das camadas populares. “Tudo isso para se fazer uma edu-
cação comprometida com o sucesso da aprendizagem dos alunos” (Débora-Tipití).
Nesse sentido, as prescrições dos documentos orientadores da Escola Cabana foram materiali-
zadas, pelo menos se se considerar as memórias das narradoras, pois tanto os documentos quanto
as narrativas apontam para a valorização do educador e da educadora, quer seja por meio dos pro-
cessos de formação e educadores, pelo melhoramento do piso salarial ou mesmo pela melhoria de
condições de trabalho.
Ao comparar a gestão da SEMEC/BEL anterior à da Escola Cabana, a narradora Beatriz-Matapí
afirma: “antes nada disso havia. Não nesse sentido, com todo esse aparato, esse leque de oportuni-
dades, discussões em todas as instâncias, com essa dimensão mais democrática”.
Ante o exposto, depreende-se que a Escola Cabana representou no âmbito da história da edu-
cação de Belém-PA, a possibilidade de instaurar uma educação pública popular, democrática e in-
clusiva. Eis o seu legado: apontar, enquanto realidade passada, que é possível construir políticas e
práticas educativas considerando os anseios das camadas populares.

presençA e AtUAlidAde freireAnA nA práticA pedAgógicA dA ejA dA


escolA cAbAnA
A Educação de Jovens e Adultos no contexto da Escola Cabana tem sua origem em 1997, com o
estabelecimento do Projeto de Alfabetização de Jovens e Adultos Professor Paulo Freire (PROALFA),
tendo como objetivo: “contribuir para a consolidação da participação crítica e consciente dos tra-
balhadores na construção de uma sociedade mais democrática (BELÉM, 1999a, p. 54) ou, em outras
palavras: “influenciar na formação de novos homens e mulheres para a construção de uma nova
sociedade” (BELÉM, 1999b, p. 30).
Portanto, a EJA da Escola Cabana surge desde o PROALFA tendo como meta eliminar o analfabe-
tismo de jovens e adultos em Belém. Desde logo, uma perspectiva de trabalho orientada às camadas
sociais menos favorecidas economicamente. Perspectiva que encontra consonância com o pensa-
mento educacional freireano e com o trabalho desenvolvido pela Gestão Freire em São Paulo-SP,
conforme explicitado a seguir.
Em Belém, o trabalho com a EJA perpassou por uma perspectiva de inclusão social do jovem e
adulto, tendo como principal referência o legado político-pedagógico freireano. “No caso da EJA,
com Paulo Freire houve a quebra do paradigma da ignorância e da marginalidade do adulto” (Dé-
bora-Tipití).
Reconheceu-se o educando-educador da EJA como sujeito histórico, possuidor de cultura, de-
tentor e construtor de conhecimento, com base em uma prática educativa dialógica com vistas à
assunção de sua cidadania:

Trabalhávamos com o adulto cidadão, senhor de conhecimento, que, vindo do


interior, sabia plantar, colher, fazer farinha. A nova concepção que entra na escola,
bebida em Freire, é que ele tem saber, que não é maior ou menor que outros conhe-
cimentos, mas que dialoga com o saber sistematizado para que eles possam se ler
melhor no mundo, para ajudar o aluno adulto a assumir, de maneira mais ampla,
sua cidadania (Ana-SEMEC/BEL).

Prática educativa humanizadora com referência na tolerância como qualidade de conviver, res-

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Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
peitar e aprender com o diferente (FREIRE, 1997). Prática que parte das expectativas e da realidade
material dos educandos para efetivar seu planejamento pedagógico curricular, sem deixar de lado
as referências legais da educação nacional:

O planejamento deveria iniciar com a diagnose inicial da realidade da turma. Le-


vantávamos suas expectativas, o que lhes eram significativos. A partir daí montava-
-se o planejamento, adequando-se o currículo escolar, considerando também os
PCN’s, e a base nacional comum (Carla-Tipití).

Em linhas gerais, antes da Escola Cabana, praticava-se uma ação educativa em EJA de caráter an-
tidialógico e opressor, aos moldes da educação escolar tradicional denominada por Freire (2014) de
“bancária”. Eis o porquê de uma das narradoras afirmar. “Antes diziam: Tu não sabes nada! Tu vieste
para cá ‘zerado’” (Ana-SEMEC/BEL).
A partir das memórias das narradoras, apresentamos no quadro a seguir, as principais “marcas”
do legado de Paulo Freire na prática educativa da EJA da Escola Cabana.
Quadro 02: “Presença” Freireana na Prática Pedagógica da EJA da Escola Cabana

caracterização na prática educa-


“presençA freireAnA”
tiva da ejA da escola cabana
O ousar com competência.
“A Escola Cabana foi espelhada no pensamento
Toda experiência dialógica, baseada em princípios e de Paulo Freire, por exemplo, trabalhamos com a
métodos libertadores precisa ser efetivada com se- questão do ousar com competência” (N3-EB).
riedade e competência (FREIRE; SHOR, 2011).
Os princípios da formação da cidadania, do
respeito ao educando e do diálogo.
“Buscou-se na proposta freireana para se traba-
A organização curricular via tema gerador,
lhar nas escolas o tema gerador e a contextuali-
respeitando-se a cultura do educando.
zação dos conteúdos, os princípios de formação
Princípios e práticas educativas presentes na gestão de da cidadania, do respeito e do diálogo” (N2-EA).
Freire junto à SME/SP (FREIRE, 2005) e fundamentalmente
em seu trabalho na educação popular (FREIRE, 2005).
O avanço crítico da curiosidade ingê-
nua à curiosidade epistemológica. “Também compreendíamos as limitações
dos educandos, mas sabendo que era preci-
Avanço que implica no “compromisso da educadora com a so instigar para que o outro pudesse avançar
consciência crítica do educando cuja ‘promoção’ da inge- e avançar junto no conhecimento” (N3-EB).
nuidade não se faz automaticamente” (FREIRE, 2002, p. 33).
A participação popular nas decisões da Escola.
“A gestão aqui na escola é bem presente com a co-
Como meio para substantivar a democracia e o pla- munidade, (...) nunca vem com nada decidido, mas se
nejamento autogestionado entre a comunidade decide coletivamente, ouvindo até os alunos” (N4-EB).
educativa dos ambientes escolares (FREIRE, 2005).
A adoção das inquietações dos educandos como
desafios gnosiológicos como meio de apro-
fundar o conhecimento criticamente. “As educadoras começam a aprender que po-
“a pergunta que o aluno, livre para fazê-la, faz sobre um dem aprender com as perguntas e críticas
tema, pode colocar ao professor um ângulo diferente, das crianças, jovens e adultos” (N4-EB).
do qual lhe será possível aprofundar mais tarde uma
reflexão mais crítica” (FREIRE; FAUNDEZ, 1985, p. 23).

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Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
A tomada de opção política em face da re-
alidade social excludente.
“Paulo Freire nos ajudou a ter um ou-
É imperioso a educadores/ras progressistas reco- tro olhar para a realidade social excludente
nhecer a politicidade da educação e em face dela que está aí, de maneira crítica” (N3-EB).
se posicionar, tendo em vista o tipo de socieda-
de de que se queira participar (FREIRE, 1997).

Fonte: Dias (p. 126).


Práticas educativas que tiveram suas referências em Paulo Freire na medida em que estimulou:
a dialogicidade de maneira séria e competente, o respeito entre educadores-educandos e educan-
dos-educadores; a utilização de temas geradores no currículo escolar, promovendo a contextualiza-
ção do conhecimento; o desenvolvimento da curiosidade epistemológica do educando-educador; a
participação democrático-popular em relação ao poder escolar; e a opção política definida e orien-
tada aos sujeitos populares e excluídos socialmente.
Considera-se que tais princípios de prática pedagógica em EJA explicitam dialeticamente pre-
sença e atualidade freireana. Presença por que tais princípios estão no cerne de seu pensamento
educacional. Atualidade por entender-se que a o pensamento-prática freireano pode se constituir
em parâmetro de educação humanizante e politizado capaz de empoderar oprimidos e excluídos,
em outras palavras: as vítimas do sistema-mundo, haja vista que a sociedade brasileira está alicerça-
da no modelo econômico capitalista sob a forma do Neoliberalismo e tendo influência do processo
de globalização, que na medida em que alcançam os rincões mais longínquos do planeta desgen-
tificam as vítimas em sua alteridade, ontologia, historicidade e em todas as outras dimensões da
condição humana.

considerAções finAis
A história é orientada pelas mãos humanas. Nesse sentido, a Escola Cabana – que teve sua gê-
nese material na Gestão Freire em São Paulo-SP – exprime de maneira concreta a possibilidade de
se construir políticas e práticas pedagógicas que dizem respeito à humanização e libertação das
vítimas do sistema-mundo.
Em termos de prática pedagógica na EJA, a Escola Cabana explicita a presença de pressupostos
freireanos por meio de categorias como: a dialogicidade; ousadia com competência; respeito para
com os educandos, inclusive em relação à dimensão cultural; avanço crítico da curiosidade ingênua
à curiosidade epistemológica; participação popular nas decisões da gestão da escola; a clareza de
opção política do quefazer docente, dentre outros.
Presença que se aponta para a atualidade premente de seu pensamento educacional humanista
e de libertação, principalmente se se considerar que o processo de globalização por que passam
inúmeras sociedades fere, nega e impossibilita a realização histórica e ontológica da humanização e
da libertação dos seres humanos-vítimas.
Por fim, enquanto atualidade, o quefazer educacional de Paulo Freire permanece importante de
ser refletido e reinventado, pois pode contribuir em tornar ato o sonho de uma escola pública de-
mocrática, popular e inclusiva, que paute suas práticas pedagógicas na humanização e libertação
dos sujeitos que a procuram.

referênciAs
BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa-Portugal: Edições 70, 2002.
BELÉM, Secretaria Municipal de Educação. travessia inclusiva de saberes: o Projeto Político-Peda-

843
Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
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844
Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
psicogênese dA língUA escritA e sUjeitos dA
AlfAbetizAção: conseqUênciAs pArA práticA
AlfAbetizAdorA
cArmel cArdoso jorge

Os educadores brasileiros sentem grande necessidade de uma teoria para se apoiar nas suas
práticas,e assim que a psicogênese de Ferreiro e Teberosky surgiu no cenário educacional, ela se
apresentou como uma teoria objetiva e fácil de como se funciona a aquisição da escrita: “uma te-
oria facilmente explicável e que poderia ser compreendida por um simples resumo ” (Lopes, 2010,
pág.72). Toda essa simplicidade e praticidade que essa teoria coloca aos professores alfabetizadores
levaram a metodização desta, em que o processo descrito no livro é utilizado para guiar as práticas e
avaliações dos alfabetizandos.Nesta trabalho, gostaria de discutir alguns aspectos da obra de Ferrei-
ro. O objetivo deste trabalho não é rejeitar ou apenas criticar o livro da pesquisadora, mas destacar
alguns pontos dela para o debate. Antes de apontar quais são esses pontos, gostaria de ressaltar a
importância da obra de Emilia Ferreiro para a alfabetização. Ela foi a primeira autora a tirar o foco
dos métodos de ensino para como as crianças aprendem a língua escrita. Declarado isto, vou abor-
dar os pontos de discussão deste trabalho:investigarei se o processo de aquisição da língua escrita
demonstrada na Psicogênese têm bases teóricas para confirmar como ocorre tal processo, definirei
quem é o sujeito da alfabetização na pesquisa de Ferreiro, procurando confrontar esse sujeito com
sujeitos alfabetizando presentes na sala de aula brasileira e debaterei as conseqüências para a práti-
ca docente se considerarmos como padrão o sujeito em que se fundamenta os estudos de Ferreiro.
A psicogênese da língua escrita tem pontos positivos que precisam ser louvados , porém devemos
continuar as pesquisas acerca de como funciona a mente humana no processo de aquisição de
escrita e se o modelo de ser humano descrito na teoria beneficia ou prejudica o processo de alfa-
betização.

palavras-chave: Alfabetização, Psicogênese da Língua Escrita, Aquisição da Língua Es-


crita

O livro “A Psicogênese da Língua Escrita” escrito em 1974 por Emilia Ferrero e Ana Teberosky é
uma obra conhecida entre os docentes brasileiros.Tamanha é a popularidade dessa obra que muitos
professores a consideram um método de alfabetização.
O objetivo deste trabalho não é rejeitar ou apenas criticar o livro das pesquisadoras, mas destacar
alguns pontos para o debate.Antes de sinalizar quais são esses pontos, gostaria de ressaltar a impor-
tância da obra de Ferrero e Teberosky para a alfabetização.Elas foram as primeiras autoras a tirarem
o foco dos métodos de ensino para como as crianças aprendem a língua escrita.Elas iniciaram um
processo revolucionário sobre o processo de como se aprende a ler e a escrever.
Declarado isto, abordo os pontos de discussão do trabalho: ( i ) questiono se o processo de aquisi-
ção da língua escrita demonstrada na psicogênese tem bases teóricas para confirmar como ocorre
tal, processo; ( ii ) definirei o sujeito da alfabetização na pesquisa de Ferrero e Teberosky (1999), pro-
curando confrontar esse sujeito com sujeitos alfabetizandos presentes na sala de aula da realidade
brasileira e ( iii) apontarei as conseqüências para a prática docente se considerarmos como padrão o
sujeito que se fundamenta os estudos das pesquisadoras.
O livro a” Psicogênese da Língua Escrita” deveria se inserir no contexto do paradigma da alfabe-
tiação semioticista.Mas ao trabalhar com base na concepção de universais linguísticos de Chomsky
(1965) compromete toda a sua coerência e sua possibilidade de se realizar uma prática alfabetiza-

845
Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
dora semioticista.Antes, entretanto, é importante discutir o que seria uma prática alfabetizadora
semioticista como um processo pedagógico.
A prática alfabetizadora semioticista consiste em desenvolver conhecimentos sobre um determi-
nado código escolhido para se comunicar e depois de selecionado e assegurado esse conhecimento
continua aprimorando e alargando o domínio deste código fazendo com que o indivíduo se aperfei-
çoe cada vez mais e tire o melhor resultado comunicativo possível (Senna,1995).
Um desses códigos para a comunicação pode ser a língua oral, que nossos alunos usam constan-
temente na escola.Calháu (2003) ressalta a importância de se trabalhar com a cultura oral dentro do
processo de alfabetização e não só se restringir a cultura escrita.
Tendo os objetivos da prática alfabetizadora bem delineados, há condições para que esta prática
ocorra na sua totalidade.Senna (1995) pontua três condições principais: motivação para o cumpri-
mento de ambos os objetivos do processo de alfabetização;prontidão cognitiva e motora que é
a habilidade de empregar códigos gráficos ou motores que demanda dos indivíduos a utilização
recursos físicos específicos e perspectivas de inserção social que condicionam a consecução do se-
gundo objetivo.
Apesar dos condicionantes acima serem coerentes não é fácil inseri-los no ambientes escolar.
Isto se deve ao fato da escola trabalhar com padrões de sujeitos pré-estabelecidos e o que dificulta
conhecer realmente os indivíduos que estão em processo de alfabetização.Por isso além de falar
dos condicionantes, Senna (1995) estabelece quem é o sujeito inserido dentro do processo escolar
de alfabetização: dotado de capacidade de linguagem, ao mesmo tempo filogênica e sujeita a con-
dicionamentos cognitivos processados por este indivíduo particular e um ser cultural portador de
uma história e um dado social emergente, ambos singulares e não cosmopolitas.
Logo para Senna (2007)o fim da alfabetização deveria ser “o desenvolvimento de um cidadão
integrado a si mesmo e ao mundo que o cerca” (Senna,1995). Integrar a si mesmo é se reconhecer
como um cidadão possuidor de cultura é tão legítimo como qualquer outra e se aprofundar nela.
Integrar-se ao mundo é estar preparado para interagir com todos os sujeitos existentes na socieda-
de dentro e fora do seu grupo social. A escola devido à diversidade de sujeitos existentes na socie-
dade brasileira e cada um com suas formas e mecanismos de expressão, não pode eleger apenas
um código para trabalhar com os sujeitos alfabetizandos. Sendo assim, trabalhar com alfabetização
implica trabalhar com diferentes códigos que o aluno possa se deparar durante a sua vida.
Podemos perceber que este sujeito é bem diferente do sujeito que vemos descritos na maioria
das teorias de alfabetização.Estes indivíduos aparecem nos livros de alfabetização como indivíduos
revestidos de razão, em total sintonia com a cultura científica, ou como Senna (1995) colocaria: sujei-
tos idealizados, que resumem o perfil sociocultural das classes sociais preservadas ou imitadas pela
escola.Esse modelo de sujeito que a escola pretensamente pretende formar tem sido herdado do
modelo educacional do século XIX.Este modelo vêm mantendo dentro das práticas alfabetizadoras
atuais não por culpa do professor, mas sim por “uma força que emana do próprio aparato antropo-
lógico que sustenta a socieade, ou seja, a principal questão sobre a alfabetização que seria sua ética,
não deve ser discutida somente dentro da escola mas “no conjunto da sociedade, uma vez que a
legitimação da prática pedagógica é obtida em sociedade”.
Podemos discutir a ética na alfabetização a partir de dois objetivos: o primeiro é “o desenvol-
vimento do grafismo e de um conhecimento acerca da memória cultural da sociedade ilustrada”
(Senna,1995), sem o qual o foco estaria em formar um cidadão da cultura dominante.Infelizmente
esse é o fim da maioria das práticas de alfabetização.O outro objetivo diz a respeito a formação de
um sujeito “diferente daquele prescrito pelo perfil de sujeito-escolar no século XIX” (Senna,1995).
Calháu (2010) completa convidando cada professor alfabetizador a fazer uma reflexão sobre pre-
paração do aluno alfabetizando:

846
Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
“Tfouni (1988) nos diz que a pergunta que cada alfabetizador precisa se fazer é:
quais são as práticas sociais que exigirão do sujeito o domínio da escrita, e em que
medida, enquanto alfabetizo, eu o estou preparando para elas?Sem nos fazermos
essa questão, dificilmente estaremos realizando uma alfabetização que seja real-
mente significativa na formação de um sujeito leitor proficiente e usuário compe-
tente dessa tecnologia.”

Ferreiro se baseia nas teorias européias sobre o desenvolvimento da inteligência.Estas teorias


asseguram que inteligência é uma característica inerente ao ser humano, sendo esta comum a to-
dos de nossa espécie.Seu desenvolvimento é “homogêneo entre todos os seres humanos e se pode
observar empiricamente”(Senna,2011). Essa hipótese foi profundamente influenciada pela biologia
e pelo conceito de estrutura.Podemos identificar a influência de Piaget neste trecho de Ferrero &
Teberosky (1999):

Neste sentido, os resultados que apresentamos são surpreendentes, porque indi-


cam uma progressão regular, com ou sem intervenção escolar.Mais ainda, com uma
intervenção escolar que tenta fazer o sujeito entrar de imediato no sistema alfabéti-
co de escrita,vemos as crianças avançarem através de uma série de etapas não pre-
vistas nem pelo método nem pelo docente.

Na teoria de Ferrero & Teberosky(1999), a criança passa por quatros estágios evolutivos no pro-
cesso de aquisição da língua escrita, através “do estabelecimento de hipóteses metacognitivas ba-
seadas em experiências de escrita” (Senna & Portes, 2007).Estes quatros estágios são denominados:
estágio pré- silábico, estágio silábico, estágio silábico- alfabético e estágio alfabético.
Para esclarecer como ocorre a passagem de um estágio da escrita para o outro as autoras recor-
rem aos estudos do teórico Vygotsky.Senna (2011) esclarece que a utilização da teoria de Vygotsky
na Psicogênese da Língua escrita não visa tentar descrever o processo como a mente humana fun-
ciona, visa somente embasar a teoria.Ferrero & Teberosky pouco contribuíram para a diminuição da
complexidade da construção teórica da mente humana no que se refere a objetos que tem influên-
cia de padrões culturais.A autora se utiliza de idéias que não são compatíveis com Vygotsky e não
define quem é o sujeito da alfabetização e qual o papel do professor na mediação no processo de
aquisição da língua escrita.
A grande incongruência que ocorre na teoria de Ferreiro &Teberosky (1999) é no que se relaciona
a passagem do nível alfabético para o nível alfabético ortográfico.No nível alfabético o indivíduo
decodifica o código escrito, porém o nível alfabético ortográfico pressupõe que o indivíduo escreve
de acordo com os padrões ortográficos de sua língua.Este reconhecimento não se dá ao nível bioló-
gico, é algo de ordem da cultura.Como Senna & Portes (2007) discutem a teoria da psicogênese não
consegue dar conta das questões pois trata como fenômeno meramente biológico algo essencial-
mente cultural, como a língua escrita:

A teoria da psicogênese não poderia avançar no estudo ou na descrição do desen-


volvimento do estágio alfabético- ortográfico, na medida em que sua fenomenolo-
gia não se sustenta em dados da experiência imediata e individual dos sujeitos,mas
, sim , em determinações estritamente culturais, na maioria das vezes contraditórias
frente a qualquer hipótese logicamente derivada pelo funcionamento da mente.
Também é fato que isso, por si só, tornaria toda a teoria um arranjo acadêmico sem
adequação alguma, tendo em vista negar a priori a natureza instituinte da escrita

847
Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
da sociedade moderna (Senna & Portes, 2007).

Além de receberem influência de Piaget,Ferrero & Teberosky (1999)trabalham também com


os estudos de Noam Chomsky, que elaborou uma teoria sobre o modo como a criança constrói a
gramática da língua de sua origem.De acordo com o autor, cada pessoa possui instrumentos men-
tais que possibilitam entender como funciona a estrutura gramatical, os universais linguísticos.
Esse autor foi escolhido devido a necessidade de se tratar a aquisição da estrutura gramatical
como um fenômeno de ordem biológica.Apesar dessa hipótese aproximar Chomsky de Piaget, há
uma diferença essencial entre os dois:

De um lado, Piaget defende um modelo de mente com um único centro de inte-


ligência no qual todo conhecimento se produz, seguindo, assim, o modelo clássico
de sujeito cartesiano.Já Chomsky defende um modelo de mente mais fortemente in-
fluenciado pelo estruturalismo, no qual a inteligência é vista como objeto de inúme-
ros módulos independentes, o que lhe permite tratar do fenômeno gramatical como
um objeto singular e desvinculado dos demais tipos de conhecimento produzidos
pelo homem (Senna & Portes, 2007).

Desse modo fica demonstrado mais uma contradição da Psicogênese: a utilização de dois autores
que cujas teorias sobre a origem da escrita entram em choque.Para continuar utilizando dos univer-
sais lingüísticos no corpo de sua teoria, Ferrero & Teberosky tratam destes universais como: “um fato
isolado e topicamente justificado como recurso para dar a língua essencial” (Senna & Portes, 2007).
Tanto Chomsky quanto Piaget ignoram a influências culturais na aqusição da leitura e da escrita.
Uma das críticas que a psicogênese da língua escrita recebe é que enquanto não há essa aproxi-
mação os estudos de Ferrero e Teberosky não darão conta de auxiliar o professor alfabetizador a
selecionar experiências de mediação a oferecer aos seus alunos.
Ferrero necessita dessa abordagem inatista sobre a construção da língua escrita, pois somente
assim conseguiria estabelecer uma teoria sobre o desenvolvimento mental do código escrito: “caso
haja universais inatos relacionados à escrita, este funcionariam como elementos essenciais, como
categorias do pensamento, como fisionomia dos objetos arrolados no modelo de desenvolvimento
e de experiência descrito na teoria de Piaget” (Senna,2011).
Porém todo grande valor da teoria de Chomsky, os universais lingüísticos, está associado ao pro-
cesso de aquisição da fala não da língua escrita:

O valor empírico dos universais lingüísticos está associado à evidência incostes-


tável de que todos os seres humanos desenvolvem a língua oral independentemente
da intervenção de terceiros, bastando para isso que sejam expostos à fala que com-
partilham coma criança em processo de aquisição da língua escrita.Esse processo
homogêneo em aspectos mais significativos entre as crianças situadas nas mais
diversas partes dos planetas e sob mais variadas circunstâncias socioculturais.No
caso da escrita, nada disso se verifica, especialmente a homogeneidade, já que um
número elevadíssimo de pessoas ao redor do mundo não construiu e não pretende
vir a construir nenhum tipo de escrita, sem que isso interfira de algum modo em sua
sobrevivência ou em seus estilos de vida (Senna,2011).

A incorporação de Vygotsky e Piaget não comprometem a adequação teórico-descritiva, apesar


de cada autor falar de um modelo de mente totalmente diferente um do outro.O que compromete a

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Categoria: Poster | Subtema 4: Formação de Professores
teoria da psicogênese da língua escrita é a incorporação dos universais lingüísticos, pois com a utili-
zação da teoria de Chomsky, a escrita fica estabelecida como um fenômeno de origem inata.E como
discutimos em momentos anteriores, a escrita não é um fenômeno biológico.
Como vemos até agora a teoria de Ferrero apresenta várias contradições tanto ao descrever
quem é o sujeito da alfabetização tanto quanto como nós educadores devemos mediar o processo
de aquisição da língua escrita.Estas causam diversas conseqüências à área de alfabetização.È o que
vou tratar daqui para frente.
O destaque de Ferrero no sujeito que se alfabetiza, leva a concepção errônea dos educadores
de que “a aprendizagem independe do ensino” (Lopes,2010).Ferrero & Teberosky (1999) falam da
capacidade do sujeito aprender muito além dos métodos escolares de aprendizagem, porém a in-
terpretação foi que as questões didáticas deveriam ficar em segundo plano.
Soares (2003) alerta que sem preposições claras, os educadores correm o risco de consolidar e
ampliar o fracasso escolar, pois rejeitam métodos considerados tradicionais de alfabetização para
buscar um novo método sem conseguir interpretar corretamente as novas pesquisas e assim gerar
uma prática renovadora ou não conseguem resolver conflitos que geram a nova metodologia e a
tradição da escola e por último podem se prender ao espontaneísmo considerando qualquer ativi-
dade como atividade intelectual e qualquer conflito como conflito cognitivo.
Lopes (2010) explica que para Ferrero & Teberosky a criança de idade pré-escolar constrói hipó-
teses sobre a língua escrita que irá se desestabilizando mediante conflitos e erros construtivo, cons-
truindo uma evolução surpreendentemente regular, através de diversos meios culturais, de diversas
situações educativas e de diversas línguas.
A sala de aula brasileira se caracteriza por se um ambiente plural, heterogêneo na qual diver-
sos sujeitos oriundos de diferentes lugares e com diferentes histórias.Neste sentido os estudos de
Piaget,Chomsky, Fererro & Teberosky seguem na contramão da realidade brasileira.
A psicogênese da língua escrita tem pontos positivos que precisam ser louvados como: tirar o
foco dos métodos de alfabetização para os sujeitos a serem alfabetizados, a substituição do ensino
da escrita para a noção de mediação de práticas alfabetizadoras e a constatação de que todo sujeito
é capaz de estabelecer hipóteses acerca de sua língua escrita, porém devemos continuar as pes-
quisas acerca de como funciona a mente humana no processo de aquisição da língua escrita e se o
modelo de ser humano descrito na teoria beneficia ou prejudica o processo de alfabetização.
Precisamos propor outro modelo de sujeito alfabetizando dentro das escolas e propor teorias
e práticas pedagógicas que visem atingir esse sujeito.É preciso pesquisar quem são estes alunos e
descrever seus estados mentais.Portanto, ainda que embrionariamente, propomos que o futuro do
construtivismo – e do projeto de inclusão social que este inaugurou no século passado – contemple
a valorização da oralidade dos diferentes sujeitos contemporâneos, avivência hipertextual nos múl-
tiplos espaços de educação formal e informal e a pluralidade de formas e desejos da escrita que a
sociedade atualmente faculta ao homem.

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850
cAtegoriA 2

poster

sUbtemA 5

munDoS e CulturaS
Do trabalho
Categoria: Poster | Subtema 5 : Mundos e Culturas do Trabalho
históriA de plAntAr e colher
AriAdne colAtto ViAnA | iVAnice lopes dA silVA bArbosA

Esta experiência foi desenvolvida em um Centro Educacional de Jovens e Adultos em Vilhena,


Rondônia, com alunos de alfabetização. O projeto foi motivado pela relação que têm com a terra,
partindo da pesquisa sobre a história da agricultura e da criação de animais. A maioria da classe é
composta por pessoas que viveram na zona rural e hoje são lavradores, jardineiros, operadores de
máquinas agrícolas, vaqueiros e peões de rodeio. O projeto recebeu o nome Histórias de Plantar e
Colher e foi tecido por meio das experiências e curiosidades da turma, leitura e análise de diferentes
gêneros textuais e pela busca de compreender os avanços tecnológicos e os impactos ambientais
dessas atividades. Estas relações foram estudadas desde o Neolítico até a atualidade, com aprecia-
ção de documentários e da arte rupestre; análise de índices financeiros, cotações de grãos; debates
sobre transgênicos, agrotóxicos, confinamento de animais, fazendas sustentáveis, automatização
de maquinários; leitura de almanaques, jornais e revistas; trabalhos a partir de músicas e poemas,
entre outras ações. Ficou evidente a preocupação dos alunos com as mudanças de rumo que o
mundo vem sofrendo, a importância da educação para o trabalho, a urgência pela capacitação, em
especial, o respeito e orgulho que têm pela vida no campo. O produto final foi apresentado na Fei-
ra do Conhecimento 2014, evento anual do Centro Educacional, em forma de cartazes produzidos
pelos alunos que davam suporte à exposição oral de suas vivências enquanto trabalhadores rurais
e a apresentação de uma canção de Rolando Boldrin tocada e cantada por eles. É importante ainda
frisar a mudança da autoimagem, pois os alunos perceberam que a mesma vida no campo que lhes
trouxe tantas privações, inclusive a falta da escola, é a que possibilitou contribuir, de alguma forma,
para que o Brasil se tornasse hoje o celeiro do mundo.

palavras-chave: EJA, Memória, Trabalho e Educação, Sustentabilidade

A escolhA do temA... conhecendo o terreno


Neste ano de 2014 a classe mista de alfabetização e 1º ciclo noturno da EJA do Centro Educacio-
nal Sesc Ler, localizado no município de Vilhena, Rondônia é conduzida pela professora Elza Maria
Ramos. Está composta porgente simples, a maioria homens e mulheres adultos que viveram sua
infância e adolescência no campo ou que ainda hoje exercem funções ligadas a este universo.
São lavradores, peões que trabalham com gado e montam em rodeios, operadores de máquinas
agrícolas nas lavouras de soja e milho da região (alguns rodam muitos quilômetros de moto vindo
da fazenda até o Sesc todas as noites); também há jardineiros autônomos, funcionários das estufas
de hortifrútis, dos aviários, do polo de piscicultura, do frigorífico, das mecânicas de máquinas pesa-
das e casas agropecuárias.
É relevante dizer que também a professora e a orientadora pedagógica têm vivências da infância,
vínculos e interesses pela vida no campo, algo que as conecta diretamente com a realidade dos alu-
nos e torna a compreensão dos relatos, dos anseios e emoções mais íntima e profícua.
Esses alunos foram motivados a pensar coletivamente em um tema para apresentar na Feira do
Conhecimento, um evento anual do Centro Educacional que envolve servidores, alunos, familiares e
comunidade em geral. Neste ano a Feira do Conhecimento ocorreu em maio e foram apresentados
os produtos finais de projetos didáticos desenvolvidos com as turmas da EJA, de forma que cada
grupo teve seu espaço para mostrar o que estudou, suas criações e pesquisas, valorizando o percur-
so de aprendizagem dos alunos que foram os destaques da Feira.

852
Categoria: Poster | Subtema 5 : Mundos e Culturas do Trabalho
Com a Feira do Conhecimento o Centro Educacional dá oportunidades aos educandos de apren-
der a aprender (pesquisas), aprender a fazer (produções), aprender a ser (atitudes e condutas) e
aprender a conviver (coletividade com harmonia e respeito).Alunos e educadores preparam stands
onde ficam expostos alguns materiais que compõem o produto final dos projetos didáticos desen-
volvidos. Além desses espaços fixos, com painéis, cartazes, maquetes, trabalhos manuais, experiên-
cias, jogos, panfletos, fotos, livros artesanais, etc, há os momentos para a explanação oral de cada
trabalho, assim como apresentações culturais (teatros, sarais de poesias, corais, jograis, músicas ou
danças).
A Feira é o evento de maior importância didático-pedagógica ocorrido ao longo do ano, pois dá
visibilidade aos saberes construídos pelos alunos, torna-os autores e atores de sua história, valoriza
os conhecimentos adquiridos no Sesc Ler e fora dele. Os relatos dos alunos, familiares e educadores
após cada Feira realizada, impulsionam o planejamento da Feira seguinte, trazendo a certeza de que
essas ações, de certa forma, transformam a vida de cada um porque informam, educam, valorizam,
socializam e emocionam.
Sabendo do valor desse evento e da escolha do tema para representar o grupo perante toda co-
munidade escolar, logo surgiu a proposta de estudarem a vida no campo, pois tinham curiosidades
sobre como teria surgido a criação de animais e o plantio de diversas culturas. A professora perce-
beu imensa riqueza no tema, porque além de atender as expectativas do grupo evalorizar o que já
sabiam, vislumbrou a possibilidade de resgatar a memória e a autoestima dos alunos, que muitas ve-
zes relatam sentir vergonha por ‘serem da roça’ ou porexercerem profissões ‘que ninguém dá valor’.
Ficou definido que trabalhariam nessa temáticapor dois meses até a apresentação final na Feira,
mas o Projeto não ganhou um nome de imediato, apenas um mês depois, com muitas pesquisas e
relatos já ocorridos o grupo decidiu que ele se chamariaHistórias de Plantar e Colher, inspirado em
um livro que a equipe pedagógica tomou como uma das principais fontes de referência bibliográ-
fica.
Essa prática de diálogo permanente, de poder ir e vir na construção coletiva da aprendizagem e
do ensino faz com que alunos e educadores se tornem cúmplices e tenham, muitas vezes, seu papel
(aqueleexercido tradicionalmente) alterado, ou seja, o aluno ensina e o professor aprende.
Sobre este aspecto Paulo Freire (1982, p. 78 -79) diz:

O educador já não é o que apenas educa, mas o que, enquanto educa é educado,
em diálogo com o educando que, ao ser educado, também, educa. Ambos, assim, se
tornam sujeitos do processo em que crescem juntos e em que os argumentos de au-
toridade já não valem. Em que, para ser-se, funcionalmente, autoridade, se necessita
de estar sendo com as liberdades e não contra elas.

O papel do professor mediador e aprendente é um dos grandes legados da teoria freireana, dei-
xado não só para a Educação de Jovens e Adultos, mas para a educação como um todo e amplamen-
te vivenciado durante este projeto.

os cAminhos percorridos... lAnçAndo As sementes


Sabe-se que é papel da EJA preparar os alunos para o mercado de trabalho, para as demandas
tecnológicas e de mão de obra, mas também é preciso trabalhar com a formação humana, com a
elevação de sua autoestima, através de uma educação emancipadora, significativa.
A aprendizagem é significativa, segundo Ausubel (1982), quando está relacionada ao conheci-
mento que o aluno já possui sobre o assunto. Se isso não acontecer, a aprendizagem deixa de ser
significativa para ser mecânica, visto que não respeita conceitos relevantes que já existem na estru-

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Categoria: Poster | Subtema 5 : Mundos e Culturas do Trabalho
tura cognitiva do indivíduo. Quando os alunos são convidados a explicitarem o que aprenderam no
cotidiano, interagindo com o conhecimento formal, oferecido pelo professor, ocorre a reorganiza-
ção e a ampliação do conhecimento. Assim o ensino significativo articula a realidade do aluno, os
conteúdos aprendidos na escola da vida com os do currículo escolar.
O tema trabalho é talvez um dos mais importantes assuntos da Educação de Jovens e Adultos,
um tema que paradoxalmente está presente e ausente no cotidiano das escolas que atuam com esta
modalidade. Está presente na medida em que faz parte do cotidiano dos alunos, sendo ao mesmo
tempo motivo para estar na escola e para sair dela. Ausente ao pensarmos no currículo que não o
considera e quando o faz, é de modo superficial ou descontextualizado.
Outra questão importante é a autoestima dos alunos. As histórias de vida, o preconceito que
sentem na pele, a sensação de que não podem mudar são fatores que acabam determinando o
rendimento, o contentamento e até a evasão escolar. Por isso é essencial fazê-los perceber que são
capazes de realizar grandes obras, que já fazem muito por suas famílias, pela sociedade e que têm
ainda mais a contribuir.
Neste Projeto procurou-se focar nestas duas vertentes: o trabalho e a autoestima, através do res-
gate de suas memórias pessoais. O grande desafio foi articular os conhecimentos que os alunos
tinham em seu dia a dia com os sistematizados pela escola; o interesse deles em atualizar-se para a
melhoria de sua capacidade produtiva e, consequentemente, de sua renda. Isso sem falar nas curio-
sidades acerca dos impactos ambientais das atividades do campo.
Acreditar no resgaste dos saberes e experiências dos alunos, demonstra que paraa escola eles
têm credibilidade social e cultural, mostra que os professores valorizam suas vivências e estão aten-
tos às suas necessidades, querendo que sejam protagonistas do ensino e da aprendizagem. Sobre
este protagonismo efetivado pelo diálogo e pelo reconhecimento do que sabem os alunos, Miguel
Arroyo (2005) destaca:

Quando só os interlocutores falam de coisas diferentes, o diálogo é possível.


Quando só os mestres têm o que falar, não passa de um monólogo. Os jovens e adul-
tos carregam as condições de pensar sua educação como um diálogo. Se toda edu-
cação exige uma deferência pelos interlocutores, mestres e alunos(as), quando esses
interlocutores são jovens e adultos carregados de tensas vivências, essa deferência
deverá ter um significado educativo especial.

Após a escolha do tema do projeto, foram se delineado as etapas de diagnóstico (quem são os
alunos, como se veem e o que sabem):
• Quem nasceu na zona rural?
• Suas lembranças da vida rural são boas ou ruins? Por quê?
• Quantos vivem de atividades ligadas ao campo seja diretamente na zona rural ou na cida-
de? Quais são elas?
• O que é agricultura? O que é pecuária?
• Uma cidade se mantém sem ajuda do campo? Explique.
• Quando o homem começou a plantar e criar animais?
• Como é feito o preparo geral da terra para o plantio?
• Quais são os principais alimentos necessários ao homem?
• Quais são os alimentos mais produzidos no Brasil?

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• Quais os alimentos que exportamos? E importamos?
Também investigou-se oque gostariam de pesquisar, quais dúvidas e curiosidades os alunos ti-
nham a respeito do tema sugerido por eles. Surgiram perguntasdos mais diversos assuntos, dentre
as quais:
• Quem inventou o plantio e criação de animais?
• Em que país começou a agricultura e em que ano?
• Como conseguiam as primeiras mudas e sementes?
• Qual a ferramenta mais antiga para preparar a terra?
• Qual animal o homem domesticou primeiro?
• O que é transgênico?
• Existe agrotóxico que não faz mal?
• O que polui mais o meio ambiente, plantar grandes lavouras ou criar gado?
• Quanto custa um saco de soja, um saco de milho e a arroba de gado?
• Quantos anos de estudo tem que ter para ser gerente de fazenda?
• É verdade que em alguns anos todas as máquinas agrícolas terão computador de bordo?
Com o diagnóstico em mãos e com a árdua e prazerosa missão de auxiliar na busca de respostas
a muitas perguntas, traçou-se uma linha de pensamento e uma possibilidade de caminhada, que foi
se modificando conforme o grupo avançava. A equipe pedagógica organizou uma série de objetivos
didáticos e uma lista flexível de etapas a seguir:
• Conhecer como se deu a relação entre os homens, os animais e as plantas em busca da
sobrevivência;
• Perceber que sua história pessoal tem valor, relatando suas vivências de forma oral e por
escrito;
• Valorizar o trabalho do homem do campo através dos debates, leituras, letras de música e
poemas;
• Ler e interpretar informações explícitas dos textos apresentados, relacionando-os com o
tema estudado;
• Ler e interpretar tabelas e construir gráficos a partir de dados coletados sobre a relação do
homem com o campo e a história do grupo;
• Realizar diferentes procedimentos de leitura e comunicação oral e escrita para socialização
das informações.
• Identificar as diferentes formas de produção de alimentos criadas pelo homem desde o
primórdio da humanidade até a atualidade;
• Reconhecer os impactos ambientais causados pela ação do homem com as diferentes ati-
vidades do campo;
• Identificar as principais atividades econômicas do meio rural, assim como as urbanas que se
relacionam com as do campo;
• Refletir sobre as relações de trabalho no campo e na cidade em diferentes épocas, desde a
escravidão até os dias de hoje;
• Diferenciar de forma breve trabalho formal e informal, enfatizando as implicações sociais
que cada forma de trabalho traz;

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Categoria: Poster | Subtema 5 : Mundos e Culturas do Trabalho
• Produzir uma linha do tempo das criações de animais e a origem e plantio de diferentes
culturas; 
• Assistir documentário em vídeo sobre a pré história e o surgimento da agricultura;
• Apreciar e produzir releituras de pintura rupestre que representam o homem caçando e
cultivando plantas;
• Explorar poema cantado de Rolando Boldrin: Ode à Terra e ensaiar para apresentação;
• Confeccionar cartazes com as informações coletadas para mural que ilustrará o projeto a
ser apresentado na Feira do Conhecimento.
Apesar do Projeto Histórias de Plantar e Colher ser interdisciplinar, é possível perceber os conte-
údos escolares relacionados em prol desse trabalho, definidos em cada uma das áreas de conheci-
mento previstas na Proposta Pedagógica do Sesc Ler, conforme se vê a seguir ou ainda de acordo
com a visão de Zabala (1998), explicitada mais adiante.

orgAnizAção cUrricUlAr por áreA de conhecimento:


Estudos da Sociedade e da Natureza:resgate de memória;atividades econômicas e problemas
ambientais dos espaços rurais e urbanos; linha do tempo do homem em relação à vida no campo
(criação de animais e plantio); trabalho formal e informal e suas relações diferentes épocas.
Matemática: tabelas e gráficos; medida de tempo; sistema monetário; cálculos diversos; cotação
agrícola da balança comercial.
Língua Portuguesa:relatos de experiência, argumentação e debates; produção e leitura de listas;
leitura e interpretação de poemas, letras de música e textos informativos; produção de memória
pessoal enquanto trabalhador e morador do campo (oral e escrita).
Arte:apreciação, interpretação e execução de músicas relacionadas ao projeto estudado; récita de
poema; artes visuais - arte rupestre e apreciação de documentários.
A organização curricular proposta por Antoni Zabala (1998) é centrada na tipologia dos conteú-
dos, deixando claro que esta classificação não pretende fragmentá-los, ao contrário, aliados às me-
todologias sócio interacionistas de trabalho, os conteúdos, na prática, acontecem de forma total-
mente integrada.
A classificação proposta por ele é: conteúdos conceituais ou factuais (o que se deve saber), con-
teúdos atitudinais (como se deve ser) e conteúdos procedimentais (como se deve saber fazer). Esta
classificação foi feita para criar uma “construção intelectual para compreender o pensamento e o
comportamento das pessoas” (Zabala, 1998, p.39). Assim a escola amplia, ressignifica, valoriza e res-
peita os saberes e competências dos alunos na medida que aproxima e interliga conhecimento de
mundo com conhecimento científico.
Ao tomar-se esta organização como referência é possível classificar os conteúdos vistos durante
a execução do Projeto. Esta seleção tomou apenas alguns conteúdos como exemplo para melhor
compreensão:
Conteúdos conceituais ou factuais:definição de trabalho formal e informal, zona rural e urbana e
atividades econômicas; conceituar conservacionismo, pré-história, linha do tempo, versos e estrofes
em uma música (...)
Conteúdos procedimentais:falar para pequenos grupos, exposição oral para grande grupo; ler,
interpretar e produzir textos pessoais, poéticos e informativos; diferencias atividades econômicas e
traços culturais da zona rural e urbana; traçar linha do tempo do início da humanidade até a atuali-
dade considerando a necessidade do homem sobreviver; calcular a partir de índices de cotação agrí-
cola para saber a comissão a receber ao final de um período; pesquisar sobre temas relacionados ao

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projeto; produzir cartazes para compor um mural; cantar uma música para ser apresentada; realizar
releitura de obras de arte (...);
Conteúdos atitudinais: valorizar sua história pessoal e dos colegas; perceber a importância da
atualização constante; sensibilizar-se em prol das questões ambientais; trabalhar cooperativamente,
respeitando a opinião dos outros (...)
Independente da forma organizativa adotada, o importante é saber que a seleção de conteúdos
para a Educação de Jovens e Adultos não pode perder de vista que a construção da grade curricular
precisa ser feita no sentido de oferecer aos educadores um mapa,flexível, capaz de integrar às dis-
ciplinas tradicionais, as características culturais, sociais, políticas e científicas necessárias para cada
grupo de alunos. E, além disso, precisa garantir aos educandos o aproveitamento de seus saberes e
a ampliação deles, da forma mais significativa possível.

o prodUto finAl... colhendo os frUtos


Quando chegou o dia da Feira do Conhecimento os alunos estavam tão empolgados e imbuídos
da missão de fazer bem feito que emocionava. Trouxeram ao Centro Educacional ferramentas an-
tigas, objetos pessoais, relíquias de família, elementos físicos que ajudaram a compor o cenário do
Projeto, que como já dito, é montado no pátio da escola em forma de um stand.
Neste stand havia um grande mural com produções deles: cartazes com figuras e cartazes expli-
cativos, desenhos produzidos a partir das memórias pessoais, as releituras da arte rupestre, gráficos
e tabelas que davam a visão do início de diversas culturas, da criação de animais e dados estatísticos
sobre a produção de alimentos a nível nacional e estadual.
Também havia uma mesa repleta de alimentos, objetoantigos e modernos, utensílios domésticos,
tudo relacionado à vida no campo ou à produção de alimentos. Sobre esta mesa a sugestiva pergun-
ta tremulava em uma faixa: “Você já comeu hoje? Agradeça ao homem do campo!”.
Além da exposição oral que realizaram, explicando os cartazes, relataram, de seu modo simples
e verdadeirosuas memórias, como era produzir antes e como se veem frente às tecnologias dispo-
níveis hoje. Também abordaram a necessidade de um cultivo racional, pois a área do planeta será
sempre a mesma, enquanto a população só cresce.
Finalizaram a apresentação tocando violão e cantando a música de Rolando Boldrin ensaiada
durante o Projeto, quase uma oração, que fizeram com embargo na voz.
Para além do produto final apresentado com louvor na Feira do Conhecimento percebe-se a pre-
ocupação dos alunos com seu trabalho e a necessidade de permanecer na escola em busca de me-
lhorias. É relevante citar que a causa ambiental sensibilizou-os de tal forma que após transcorridos
meses desse projeto, o tema vem sempre à tona nas aulas e nos momentos de conversa informal
pelo pátio do Centro Educacional.
Para os educadores, que notaram evoluções já esperadas na capacidade cognitiva em relação à
leitura, escrita e cálculos, além da melhoria na interação crítica, o que ficou mais forte foi a percepção
da mudança na autoimagem desses trabalhadores.
Através do Projeto os alunos resgataram suas memórias, algumas tristes, outras engraçadas, rela-
tando quase sempre que motivo de estarem hoje na EJA é porque a dura lida no campo os afastou
da escola, contudo, percebem-se valiosos pelo quanto contribuíram e ainda contribuem para ali-
mentar tanta gente e elevar o nome de nosso país como grande produtor mundial.

bibliogrAfiA
ARROYO, Miguel González Arroyo. Educação de Jovens e Adultos: um campo de direitos e de res-

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ponsabilidade pública.In SOARES, Leôncio, GIOVANETTI, Maria Amélia, GOMES, Nilma Lino (orgs.). Diá-
logos na Educação de Jovens e Adultos. Belo Horizonte : Autêntica, 2005.
AUSUBEL, D. P. A. Aprendizagem significativa: a teoria de David Ausubel. São Paulo: Moraes, 1982.
BELLINGHINI, Ruth Helena. Pequenas histórias de plantar e de colher. ANDEFedu, 2013. Disponível
em: http://www.andefedu.com.br/publicações/livros (acesso em 10/03/2014).
FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 24a edição. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982.
ZABALA, Antoni. A prática educativa – como ensinar. Porto Alegre: Artmed, 1998.
Revistas utilizadas nas aulas/ edições diversas:Globo Rural, Terra e Ciências Hoje.
Sites consultados:
http://www.revistahistoria.com.br/
http://www.emater.pr.gov.br/
https://www.youtube.com/

ANEXO

letrA dA poesiA ode à terrA


ode à terrA
Depois de Deus é a terra
O ente que eu mais adoro.
Para plantar a semente
Aqui ‘adonde’ eu moro.
Vai criando vida,
Se transformando em raiz,
Pra depois virar comida
Pro povo do meu país.
Rolando Boldrin

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Fotos do projeto:

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