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Antologia Grega: apêndice de Planudes (livro XVI)

Autor(es): Jesus, Carlos A. Martins de


Publicado por: Imprensa da Universidade de Coimbra
URL URI:http://hdl.handle.net/10316.2/41181
persistente:
DOI: DOI:https://doi.org/10.14195/978-989-26-1332-1

Accessed : 23-Jan-2018 23:17:26

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Série Autores Gregos e Latinos

Antologia Grega

Apêndice de
Planudes
(livro XVI)

Tradução do grego, introdução e comentário


Carlos A. Martins de Jesus

IMPRENSA DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA


COIMBRA UNIVERSITY PRESS
ANNABLUME
Série “Autores Gregos e Latinos –
Tradução, introdução e comentário”
ISSN: 2183-220X
Apresentação: Esta série procura apresentar em língua
portuguesa obras de autores gregos, latinos e neolatinos,
em tradução feita diretamente a partir da língua original.
Além da tradução, todos os volumes são também carate-
rizados por conterem estudos introdutórios, bibliografia
crítica e notas. Reforça-se, assim, a originalidade cientí-
fica e o alcance da série, cumprindo o duplo objetivo de
tornar acessíveis textos clássicos, medievais e renascen-
tistas a leitores que não dominam as línguas antigas em
que foram escritos. Também do ponto de vista da reflexão
académica, a coleção se reveste no panorama lusófono
de particular importância, pois proporciona contributos
originais numa área de investigação científica fundamen-
tal no universo geral do conhecimento e divulgação do
património literário da Humanidade.

Breve nota curricular sobre o autor da tradução


Carlos A. Martins de Jesus é doutorado em Estudos
Clássicos (especialidade de Literatura Grega) pela
Universidade de Coimbra, desenvolvendo à data uma
investigação de Pós-doutoramento financiada pela
Fundação para a Ciência e Tecnologia sobre a Antologia
Grega (transmissão e tradução). Tem publicado um
conjunto amplo de trabalhos, entre livros e artigos
em revistas da especialidade, a maior parte dos quais
dedicados à poesia grega e à sua tradução para Português.
Assinou a tradução das obras de diversos autores gregos
(Arquíloco, Baquílides, Ésquilo, Aristófanes, Plutarco,
entre outros), além de trabalhar continuamente na
direção de teatro de tema clássico, em Portugal e Espanha.
Série Autores Gregos e Latinos
Estruturas Editoriais
Série Autores Gregos e Latinos

ISSN: 2183-220X

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Universidade de Coimbra
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UNESP, Campus de Araraquara Universidade do País Basco

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Universitat de les Illes Balears Universidade de Coimbra

Todos os volumes desta série são submetidos


a arbitragem científica independente.
Série Autores Gregos e Latinos

antologia grega

Apêndice de
Planudes

(livro XVI)

Tradução, introdução e comentário


Carlos A. Martins de Jesus
Universidade de Coimbra

IMPRENSA DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA


COIMBRA UNIVERSITY PRESS
ANNABLUME
Série Autores Gregos e Latinos
Título Title
Antologia Grega. Apêndice de Planudes (livro XVI)
Greek Anthology. The Planudean (Book XVI)

Tradução do Grego, Introdução e comentário


Translation from the Greek, Introduction and Commentary
Carlos A. Martins de Jesus

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Imprensa da Universidade de Coimbra Annablume Editora * Comunicação
Coimbra University Press
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978-989-26-1331-4
© Abril 2017
ISBN Digital
978-989-26-1332-1 Annablume Editora * São Paulo
Imprensa da Universidade de Coimbra
DOI Classica Digitalia Vniversitatis
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Humanísticos da Universidade de
Coimbra
Trabalho publicado ao abrigo da Licença This work is licensed under
Creative Commons CC-BY (http://creativecommons.org/licenses/by/3.0/pt/legalcode)
Antologia Grega. Apêndice de Planudes
(livro XVI)
Greek Anthology. The Planudean (Book XVI)
Tradução, Introdução e Comentário por
Translation, Introduction and Commentary by
Carlos A. Martins de Jesus

Filiação Affiliation
Universidade de Coimbra University of Coimbra

Resumo
A Antologia de Planudes, conservada no autógrafo Marcianus gr. 481 do século
XIV, foi durante os séculos XVI-XVIII a única recensão do epigrama grego
conhecida e divulgada e exerceu, por isso mesmo, uma influência notável na
poesia e na cultura moderna em geral. Texto pedagógico nuclear para alunos
renascentistas de grego e latim, com frequência constituía o seu primeiro contato
com a literatura grega. Poetas e escritores de todos os tempos dela se serviram.
Erasmo, que copia e comenta nos Adagia cerca de cinquenta componentes, mas
também os Emblemmata de Alciato, pela primeira vez publicados em 1492, que
ilustram, traduzem para latim e comentam um muito maior número de epigramas.
O presente volume oferece em tradução os epigramas transmitidos por Planudes
que estão ausentes do Palatinus, nas edições modernas publicados como Livro
XVI da Antologia Grega. A grande maioria destes textos (356 de um total de
392) provêm do capítulo IV do Marcianus, recolha de epigramas descritivos
ou ecfrásticos. Destes, realçam os componentes dedicados aos aurigas de
Constantinopla (núms. 335-386), textos que a arqueologia demonstrou terem
conhecido a forma inscrita.

Palavras-chave
Antologia Grega, Antologia de Planudes, epigrama

Abstract
The Planudean, copied in the fourteenth-century autograph Marcianus gr. 481,
was between the sixteenth and the eighteenth centuries the single known garland
of Greek epigram, having had, therefore, a huge influence in modern poetry and
culture in general. As a didactic text it was for Renaissance students of Greek
and Latin, it was frequently their first contact with Greek literature. Poets and
other writers made a large use of it. Erasmus is an example, he who copies and
comments in his Adagia about 50 components, alongside Alciato’s Emblemmata,
first published in 1492, where a much larger number of epigrams are illustrated,
translated into Latin and commented. This volume offers in translation the epigrams
transmitted by Planudes that are absent from the Palatinus, nowadays published as
Book XVI of the Greek Antholoy. The larger part of them (356 out of 392) comes
from chapter IV of the Marcianus, a collection of ecphrastic poems. Among them are
the components dedicated to the charioteers of Constantinople (numbers 335-386),
which archaeology proved to have been actually inscribed.

Keywords
Greek Anthology, Planudean, epigram
Autora

Carlos A. Martins de Jesus é doutorado em Estudos Clássicos (especialidade


de Literatura Grega) pela Universidade de Coimbra, desenvolvendo à data
uma investigação de Pós-doutoramento financiada pela Fundação para a
Ciência e Tecnologia sobre a Antologia Grega (transmissão e tradução).
Tem publicado um conjunto amplo de trabalhos, entre livros e artigos
em revistas da especialidade, a maior parte dos quais dedicados à poesia
grega e à sua tradução para Português. Assinou a tradução das obras de
diversos autores gregos (Arquíloco, Baquílides, Ésquilo, Aristófanes,
Plutarco, entre outros), além de trabalhar continuamente na direção de
teatro de tema clássico, em Portugal e Espanha.

Author

Carlos A. Martins de Jesus has a PhD in Classical Studies (speciality of


Greek Literature) by the University of Coimbra, and is currently working
on a postdoctoral research founded by the Fundação para a Ciência e
Tecnologia, on the Greek Anthology (transmission and translation). He
has a large record of published works, both books and papers in perio-
dical publications, mostly devoted to Greek poetry and its translation
into Portuguese. He is the author of the Portuguese translation of several
Greek authors’ works (Archilochus, Bacchylides, Aeschylus, and Plu-
tarch, among others), besides working continuously on classical theatre
direction, both in Portugal and Spain.
Volume editado no âmbito do Pós-doutoramento em Estudos
Literários financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia,
IP e pelo POPH.

8
Sumário

Introdução
1. A Antologia Grega11
2. A recensão de Máximo Planudes 13

Apêndice: Epigramas sobre os aurigas do Hipódromo


de Constantinopla19

Bibliografia 22

Apêndice de Planudes. Antologia Grega XVI


Capítulo I: Epigramas Demonstrativos 27
Capítulo II: Epigramas Satíricos 34
Capítulo III: Epigramas Fúnebres 35
Capítulo IV: Epigramas Ecfrásticos 39
Epigramas sobre as estátuas dos atletas
no Hipódromo de Constantinopla 147
Epigramas Diversos 170

Índice de Epigramatistas173

9
(Página deixada propositadamente em branco)
Introdução

Introdução

1. A A ntologia Grega
Parece remontar ao século IV a.C. o hábito de organizar
antologias poéticas de um só autor – de que são exemplo as
diversas Simonidea de que há notícia, com um conjunto de
inscrições atribuídas ao poeta de Ceos, não necessariamente da
sua lavra, muitas delas sequer suas contemporâneas. A prática
ganharia um desenvolvimento mais evidente durante o século
III a.C., quando os próprios poetas terão passado a organizar
coletâneas das suas composições, que assim conseguiam maior
divulgação – Ânite, Asclepíades, Calímaco ou Posidipo são
disso exemplos. A verdade é que o epigrama deixara, há um
século pelo menos, de ter como funcionalidade exclusiva a sua
inscrição na pedra. Chegados ao século III a.C., a sua vertente
ficcional, com os mais diversos temas e propósitos, tinha já as-
cendido à categoria de género literário, cedo se transformando
na forma poética de eleição para a maioria dos poetas. Tanto
que a reunião antológica de epigramas de diversos autores, como
bem explica Alan Cameron (1993: 4), mais do que uma opção,
terá sido uma consequência inevitável.
A Antologia Grega, vulgarmente conhecida como Antologia
Palatina devido ao principal manuscrito que no-la transmitiu,
consiste nas edições modernas num vasto conjunto de epigramas
em diversos metros, ainda que maioritariamente em dísticos
elegíacos, organizado em dezasseis livros, e que perfaz a
impressionante soma de mais de quatro mil componentes poéticos.
Trata-se, inegavelmente, do maior florilégio poético em língua

11
Carlos A. Martins de Jesus

grega conservado, recolhendo poemas de um vastíssimo lapso


temporal, que na realidade cobre todos os períodos tradicionais
da cultura Grega (arcaico, clássico, helenístico e bizantino).
Transmitida essencialmente por dois códices, o chamado Palatinus
(Palatinus Graecus 23 + Parisinus Graecus Suppl. 384 = P) de finais
do século X e o autógrafo do século XIV de Máximo Planudes
(Marcianus Graecus 481 = Pl), depende maioritariamente de
uma antologia epigramática que não conservamos, organizada
por Constantino Céfalas nos inícios do século X, a qual terá
reproduzido, sem muitas alterações (tal qual uma edição revista e
aumentada), o anónimo copista de P. Céfalas, que provavelmente
foi protopapa de Constantinopla, teria recuperado um conjunto
de florilégios anteriores do epigrama grego, recorrendo sobretudo
aos que organizara Meleagro (inícios do século I a.C.), Filipo
(século I) e Agátias (século VI), aos quais acrescentou epigramas
de outras fontes1, organizados temática e alfabeticamente.
Dizíamos antes que não é por acaso que mais comummen-
te se conhece a Antologia Grega como Antologia Palatina. Se
é certo que, desde o século XVIII, com as edições de Reiske
(1754), Brunck (1772-1776) e Jacobs (1794-1814), é P a princi-
pal fonte de organização e edição da Antologia Grega, durante
mais de três séculos e desde a sua editio princeps, pela mão de
Láscaris (1494), foi a recensão de Planudes a única conhecida
e divulgada. Apenas em 1606 Saumaise, que teria descoberto
uma cópia do Palatinus num códice do séc. XI, começa a copiar
os epigramas que faltavam à já conhecida Antologia de Planudes,

1
Além dos três florilégios principais, que desde logo nos permitem a
transmissão de epigramas de um vastíssimo lapso temporal, tem-se como
muito provável o uso direto de antologias pessoais de poetas com ampla
presença na Antologia, como já referíamos, como sejam Estratão (livro
XII), Páladas, Rufino ou Leónidas, além de recolhas autorais como os
Simonidea, os Anacreontea ou coletâneas sobre Homero, por exemplo.

12
Introdução

não levando no entanto a bom porto o projeto da sua edição


completa. A atual organização em dezasseis livros tematica-
mente organizados de epigramas depende da edição de Dübner
(1846-1877)2, que pela primeira vez incluía num 16º livro os
componentes apenas colacionados por Planudes (os que aqui se
traduzem), ausentes de toda a tradição manuscrita de P.
No que a traduções completas e sistemáticas diz respeito, até
à data contamos com as seguintes edições bilíngues: a francesa
da coleção Budé (Paris, Les Belles Lettres, 13 vols., 1929-1980),
a inglesa de R. Patton (1916-1918, 5 vols., London, William
Heinemann Lda.), a alemã de H. Beckby (1957-1965, 4 vols.,
München) e as duas italianas de F. M. Pontani (1978-1981, 4
vols., Torino, Einaudi) e M. Marzi et alii (2005-2011, 3 vols.,
Torino, UTET). Na medida em que o trabalho de edição tex-
tual da Antologia pode considerar-se satisfatoriamente elaborado
pelas edições da coleção Budé – a mesma que seguimos como
base para a nossa tradução e tem ainda em marcha um processo
de atualização de alguns livros pela inclusão sistemática da
lição de algumas syllogae minores –, é propósito da presente série
lograr, a médio-prazo, uma tradução completa em Português da
Antologia, acompanhada das explicações mínimas necessárias a
um leitor não familiarizado com a língua grega, sob a forma de
introduções e notas de rodapé.

2. A recensão de Máximo Planudes


A propósito de Planudes (c. 1260), cuja obra literária pessoal
é toda ela em prosa, temos o privilégio raro em paleografia de

2
À segunda edição da Anthologia Graeca de Jacobs (21813-1817)
se deve, na realidade, a primeira numeração dos poemas exclusivos da
tradição Planudea, editados em apêndice à referida edição. É sua, em
rigor, a editio princeps dos textos com a ordem em que aqui se traduzem.

13
Carlos A. Martins de Jesus

possuir o autógrafo da sua antologia, conservado no Marcianus


gr. 481. Organizou a sua recolha em sete capítulos, por sua vez
divididos em seções alfabeticamente ordenadas pelos lemas,
nomeadamente:

1. Epigramas exortativos
2. Epigramas báquicos e satíricos
3. Epigramas funerários
4. Epigramas descritivos (ecfrásticos)
5. Écfrase de Cristodoro
6. Epigramas dedicatórios
7. Epigramas eróticos

Os quatro primeiros capítulos apresentam todos eles uma
adenda, em apêndice final ao códice anunciado pelo escriba
como copiado de outro manuscrito. Ora, se parece inegável
que Planudes conheceu, possuiu e trabalhou com a Antologia
de Céfalas, a mesma em que se baseara o anónimo copista do
Palatinus, o certo é que, no que respeita a um total de 3923
componentes ausentes do último, a crítica textual demonstrou
que não terá usado qualquer cópia de P. Como tal, podem os
epigramas que neste volume se traduzem ter sido colhidos nou-
tras fontes manuscritas ou na mesma antologia de Céfalas, as-
sumindo, para o último cenário, que o escriba de P não incluiu,
deliberadamente ou devido a qualquer acidente de transmissão,
os referidos componentes.
É a variedade, a todos os níveis, a característica que melhor
define os epigramas deste conjunto. Os primeiros dezoito

3
Na realidade, copiam-se 403 componentes que, descontadas as
repetições, supressões ou duplicações de numeração, dá o resultado
referido.

14
Introdução

provêm do capítulo I de Planudes (recolha de epigramas exor-


tativos e demonstrativos), seguidos de dois epigramas satíricos
(capítulo II), onze funerários (capítulo III) e a grande maioria
de 356 componentes do capítulo IV do Marcianus, de epigra-
mas descritivos ou ecfrásticos. Nos últimos nos detemos. Se,
por um lado, apenas para um escasso número de poemas temos
confirmação arqueológica de alguma vez haverem conhecido a
forma inscrita, por outro a descoberta de duas bases de estátua
pertencentes ao Hipódromo de Constantinopla, em 1847 e
1959, veio confirmar tal estatuto no que diz respeito aos epigra-
mas sobre os aurigas (núms. 335-386), sobre os quais adiante
nos pronunciamos. Também por isso, é de acreditar que muitos
mais componentes tenham experimentado uma primeira cópia
diretamente do monumento em que estariam inscritos.
Em paralelo, a fama das obras-primas da Antiguidade,
algumas das quais trasladadas de local durante os períodos
Helenístico e Bizantino4, e em breve também dos epigramas
de autores antigos e a estes atribuídos, que começam a circular
em florilégios, esses e outros fatores levaram à proliferação da
écfrase, cujo princípio criador reside na reinvenção poética de
um monumento ou mesmo de um texto anterior, nem sempre
à vista, elaborado em distinto registo semiótico. São assim fre-
quentes as descrições de obras de arte sobre os deuses (mais de

4
Desde Constantino I e a própria reconstrução de Bizâncio, os
sucessivos imperadores foram transformando Constantinopla num ver-
dadeiro museu público de arte antiga, i.e., da Antiguidade Clássica ou
do período alexandrino. Dois casos flagrantes. Um, a verdadeira mostra
escultórica que pululava pelos Balneários de Zêuxipo, as obras de arte na
origem do longo poema de Cristodoro (livro II da Antologia), composto
provavelmente sob os auspícios do imperador Anastásio. Sobre ele, vd.
Martins de Jesus (2015b: 11-19). Outro, a quantidade imensa (e progres-
sivamente acrescentada) de esculturas, algumas dos que ainda hoje são
os mais famosos artistas plásticos clássicos, patentes no Hipódromo de
Constantinopla. Vd. sobre o assunto Bassett (2004: esp. 212-232).

15
Carlos A. Martins de Jesus

cem epigramas), heróis (umas seis dezenas), a par de outras sobre


assuntos e objetos mais corriqueiros. A cada passo, conseguimos
identificar a obra escultórica ou pictórica que está na base da
descrição, quando confrontados os epigramas que dela tratam
com as demais descrições antigas conservadas, ou pelo menos
o modelo iconográfico a que pertenceria, pela análise de outros
objetos arqueológicos como moedas ou, na maioria dos casos,
cópias romanas.
Para dar apenas alguns exemplos, é esse o caso da estátua
criselefantina que Fídias (séc. V a.C.) moldara para a antecâ-
mara do Templo de Zeus em Olímpia, da Ocasião de Lisipo,
escultor do séc. IV a.C. (núm. 275) ou da Afrodite de Cnidos de
Praxíteles (núms. 159-170), original do século III a.C. O último
exemplo mencionado ilustra de resto outro aspeto frequente na
Antologia, a saber, a existência de grupos de poemas dedicados à
mesma obra de arte, em muitos casos já estudados como um ci-
clo, dentro do qual, segundo a prática antológica dos primeiros
compiladores de que dependem P e Pl, um conjunto mais ou
menos extenso de componentes de diferentes épocas e autores
(alguns imitação do anterior) se sucedem. O melhor exemplo é
talvez o do assim designado Ciclo de Medeia (núms. 135-143),
conjunto de epigramas datáveis entre os séculos I a.C. e I da
nossa era que, à exceção do núm. 142, aludem a uma famosa
pintura mural, a Medeia de Timómoco de Bizâncio, que tanto
filólogos como historiadores de arte têm relacionado com o
modelo da conservada Medeia de Herculanum5.
Para encerrar o que pretende ser um brevíssimo resumo
temático destes poemas, haveria ainda que mencionar o número
considerável de epigramas de índole política que, globalmente

5
Vd. Gutzwiller (2004) e o nosso recente estudo (Martins de Jesus
2015a).

16
Introdução

datáveis entre os séculos V e VII – e como tal provenientes


sobretudo do Ciclo de Agátias (século VI) – procedem à écfrase
de uma obra plástica ou fazem a dedicatória de imperadores,
imperatrizes, altos funcionários do Estado ou da Igreja, ou
mesmo artistas e atletas famosos – como é o caso, uma vez mais,
dos epigramas sobre os aurigas, onde, como veremos no que se
segue à presente Introdução, são claras as intenções políticas. E
será ainda de assinalar a variedade métrica deste livro XVI. Com
uma assombrosa e natural maioria de 333 composições em dístico
elegíaco, contam-se outras trinta em hexâmetro dactílico (núms.
27, 29, 43, 44, 45, 48, 64, 65, 69, 70, 73, 74, 76, 79, 92, 115, 116,
122, 155, 187, 210, 217, 297, 298, 301, 302, 303, 329, 330 e 374),
quinze em trímetros iâmbicos (25, 52, 82, 126, 152, 182, 192,
199, 255, 282, 304, 307, 308, 322, 328), oito em dodecassílabo
(núms. 380-387), uma em hemiambos (núm. 388) e uma última
em dímetros trocaicos puros e cataléticos (núm. 323).
A Antologia de Planudes –porquanto, como se disse, foi du-
rante os séculos XVI-XVIII a única recensão do epigrama grego
conhecida e divulgada – exerceu uma influência notável na
poesia e na cultura moderna em geral. Foi um importante texto
pedagógico para os alunos renascentistas de grego e latim, e com
frequência marcava o primeiro contacto destes com a literatura
grega. Era prática comum reescrever epigramas, responder poe-
ticamente a outros, traduzir e comentar outros tantos, exercícios
dos quais alguns poemas da própria Antologia são exemplo e que
terão continuado no tempo. Poetas e escritores serviram-se da
Planudea. Erasmo por exemplo, nos Adagia, copia e comenta
cerca de cinquenta componentes. E os Emblemmata de Alciato,
pela primeira vez publicados em 1492, ilustram, traduzem para
latim e comentam um muito maior número.
Uma palavra necessária para o entendimento desta edição.
Primeiro, sobre as atribuições autorais manuscritas, as quais se

17
Carlos A. Martins de Jesus

recolhem no final deste volume De um total de 392 poemas,


202 são dados por Planudes como anónimos, sendo que, destes,
apenas onze têm a indicação adelon ou adespota. Por outra parte,
Planudes incluiu uma soma assinalável de lemas, muitas vezes
desenvolvidos e que explicam algo sobre o texto. Assim, nesta
edição identifica-se com o termo anónimo qualquer compo-
nente sem indicação autoral manuscrita6 e, quanto aos lemas,
seguimos quase sempre a versão de Planudes, traduzindo por
vezes a lição de outra fonte manuscrita, quando mais correta
ou elucidativa. As notas à tradução, que tentámos que fossem o
mais breves possível, se por um lado dispensam aspetos como a
explicação dos mitos mais conhecidos, por outro procuram do-
tar o leitor da informação histórica, cultural ou política mínima
indispensável para o entendimento dos poemas.
Por razões de economia textual, ao longo do livro as indica-
ções cronológicas são posteriores a Jesus Cristo, sendo seguidas
da indicação a.C. as que o não são.

Carlos Martins de Jesus


Granada, abril de 2016

6
À exceção dos epigramas para os aurigas de Constantinopla (núms.
335-387), nos quais é regra a ausência de atribuição.

18
Introdução

Apêndice

Epigramas sobre os aurigas do Hipódromo de


Constantinopla (núms. 335-386)
Os núms. 335-386 deste Apêndice de Planudes constituem um
caso que há que considerar à parte, seja pelas suas fontes, pelo
tema ou mesmo pela história da sua transmissão textual. Trata-se
de um ainda vasto conjunto de poemas que celebram as vitórias
na corrida de carros de quatro cavalos de alguns dos mais ilustres
aurigas do seu tempo (séculos V e VI) no Hipódromo de Constan-
tinopla – Urânio, Faustino, Constantino e Porfírio os seus nomes,
dados por ordem cronológica da sua carreira, não necessariamente
pela que ocupam na numeração tradicional dos epigramas.
O achamento de duas bases do que seriam as estátuas aí
erguidas para estes (e provavelmente outros) atletas em 1847 e
19597, veio confirmar que pelo menos uma parte considerável
destes componentes tinha conhecido uma primeira versão inscrita
nas referidas bases, de onde, num primeiro momento que não
logramos situar no tempo, teriam sido copiados e reunidos numa
pequena antologia. Esta, se levarmos apenas em conta a fama dessa
modalidade desportiva no Império tardio, facilmente admitimos
que tenha experimentado ampla circulação. As bases descobertas
permitiam de facto ler, entre outros textos em prosa, a totalidade
ou partes dos núms. 340 e 342 (Base 1) e 351-353 e 356 (Base 2).

7
Para um comentário a estas bases, a transcrição crítica, tradução e
comentário das suas inscrições (entre as quais alguns epigramas) e o seu
sentido político e desportivo, o estudo mais detalhado continua a ser o
de Cameron (1973).

19
Carlos A. Martins de Jesus

Fazendo cálculos, Cameron (1973: 118 sqq., 143-146) estimou


que os epigramas conservados que delas proviriam (núms. 335-
378) teriam sido inscritos num total de onze bases, das quais sete
seriam o suporte de estátuas (e em consequência dos respetivos
epigramas comemorativos) de Porfírio, o mais novo e também
o mais laureado dos atletas. Sugeriu também que ditas estátuas
(todas elas, não apenas as de Porfírio) estariam erguidas na spina
do Hipódromo – parte central à volta da qual se localizava a
pista, de frente para as tribunas reservadas a cada uma das duas
maiores fações8, os Verdes e os Azuis – por ordem cronológica da
sua edificação, não necessariamente das vitórias ou atletas que
celebravam. No entanto, notou que um conjunto de epigramas
(núms. 363-378B), por surgirem desordenados no autógrafo de
Planudes, devia provir de um grupo de estátuas situado noutro
ponto, ao final da mesma spina ou noutro local.
Um segundo grupo de poemas (núms. 379-386) deve por
seu turno ter sido copiado já de uma fonte manuscrita não
anterior aos séculos IX-X. Trata-se, como explica o próprio lema
de Planudes ao núm. 380, de écfrases de frescos ou mosaicos9

8
Para um esquema ilustrativo do espaço do Hipódromo e da posição
que nele ocupariam as estátuas dos atletas vd. Cameron (1973: 182).
Muito mais do que claques desportivas organizadas, estas fações – quatro
no total, Verdes, Azuis, Vermelhos e Brancos, todas elas referidas nos
epigramas – organizavam os jogos, patrocinavam as esquipas e os
aurigas, dos quais depois erguiam estátuas no Hipódromo, símbolo (pela
qualidade e quantidade das mesmas) do seu prestígio e poder. Sabemos
do peso político que chegaram a conseguir, entre outras muitas razões,
pelo caso paradigmático da Revolta de Nike. Começando por um
desacordo na arbitragem da corrida de 13 de janeiro de 532, desembocou
num conflito civil armado entre as diferentes fações que fez perigar o
mesmíssimo imperador e destruiu meia-Constantinopla.
9
O lema do núm. 380 apenas fala de eikones (lit. qualquer tipo de
representação pictórica), ao passo que o lema do poema anterior se refere
a stelas, termo que na realidade pode designar os dois registos que men-
cionámos.

20
Introdução

que comemoram as glórias dos mesmos atletas (todos menos


Urânio) mas já elevados à categoria de heróis do passado. A
própria métrica – dodecassílabos bizantinos sem resolução
vocálica – confirma (Cameron 1973: 199) que estas composições
não devem ser anteriores as séculos IX-X, pelo que deviam ser
exercícios ecfrásticos sobre ditas representações murais, elas
sim dos governos de Anastásio ou Justiniano (séculos V-VI). O
lema de Planudes refere que elas estariam no teto da antecâmara
imperial, ou mesmo numa galeria que conduzisse do palácio
ao Hipódromo, onde teriam sido mandadas erguer por um
imperador aquando de uma reconstrução desse espaço.
No global, os temas são recorrentes: a juventude e velhice
ambas triunfantes, a exaltação da arte do auriga, tantas vezes
demonstrada pela sua habilidade mesmo com os corcéis da
equipa adversária, uma constante chuva de grinaldas para os
vencedores, o ouro e o bronze (este último mais frequente) e as
capacidades da arte escultórica para produzir vida, por fim as
aclamações de uma, várias ou todas as fações (a comunidade em
geral) e do mesmíssimo imperador.

21
Carlos A. Martins de Jesus

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22
Introdução

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23
(Página deixada propositadamente em branco)
Introdução

O A pêndice de Planudes
A ntologia Grega XVI

25
(Página deixada propositadamente em branco)
O Apêndice de Planudes

Capítulo I. Epigramas Demonstrativos

1. De Damageto
Não sou lutador nem de Messene, nem de Argos1:
Esparta, a Esparta de ilustres varões é minha pátria.
Ardilosos são todos os outros; quanto a mim, como fica bem
aos filhos dos Lacedemónios, é pela força que triunfo2.

2. [De Simónides]3
Reconhece Teogneto4, o vencedor olímpico,
ao ver este rapaz, experimentado auriga da palestra
– lindo de se ver, atleta não menos esplêndido –
que cobriu de grinaldas a cidade de seus valorosos pais.

1
É histórica a rivalidade política entre Messene e Argos.
2
A ausência do nome do atleta, bem assim do local em que obteve
vitória, faz supor que o epigrama estivesse gravado na base de uma es-
tátua real (dedicada, por exemplo, em Olímpia), na qual haveria outra
inscrição em prosa com a sua identificação.
3
A atribuição a Simónides, deste como dos demais epigramas, não é
segura. Na maioria dos casos, de resto, trata-se de antigas inscrições que
entraram na tradição epigramática sob a autoria de Simónides (a sylloga
Simonidea).
4
Teogneto de Egina, primeiro vencedor olímpico na luta, na faixa
etária dos rapazes. Segundo Pausânias (6.9.1), tinha a sua estátua, da
autoria de Ptólico, na Áltis de Olímpia, e é possível que o epigrama
provenha desta base. Foi referido por Píndaro, na Pítica 8 (datável de 446
a.C.) como tio do atleta aí celebrado, Aristomenes de Egina.

27
Antologia Grega XVI

3. [Do mesmo]
Sobre as provas
No Istmo e em Pito venceu Diofonte, o filho de Fílon,
no salto, na corrida, no disco, no dardo e na luta5.

4. Anónimo
O que terá dito Heitor, ao ser arrastado pelos Gregos
Açoitai ainda agora o meu cadáver; pois mesmo
a carcaça de um leão as larvas profanam.

5. De Alceu de Messene
Xerxes levou da Pérsia a armada contra a terra da Hélade,
e Tito levou-a desde a vasta Itália;
um fê-lo para submeter ao jugo o pescoço da Europa6,
o outro para livrar a Hélade da servidão7.

6. Anónimo
O soberano da Europa8, o que sobre o mar e a seca terra
é senhor dos mortais como Zeus é dos imortais,

5
Este desconhecido – e a ausência do toponímico denuncia que se tra-
taria de uma inscrição na sua cidade natal – era, portanto, um pentatleta.
6
A imagem simbólica d’Os Persas de Ésquilo.
7
Epigrama sobre a Batalha de Cinoscéfalos (197 a.C.), na qual Filipo
de Macedónia foi derrotado pela Liga Etólia. Tito (Q. Famínio) é o
mesmo general cuja vida foi escrita por Plutarco (cf. Flamínio 8-9).
8
Filipo V de Macedónia dedica os despojos capturados aos Odrísios
e ao seu rei Ciroadas. Pode o texto referir-se à campanha que Políbio
(23.8.4) e Tito Lívio (39.53) datam de 183 a.C., ou a outra expedição
anterior, em 204 a.C.

28
O Apêndice de Planudes

dedicou à senhora dos caminhos, a Hécate, os despojos


[tomados
ao violento Ciroadas, aos seus filhos e a toda a terra de
[Odrises,
ele, o filho de forte lança de Demétrio. E a glória de Filipo
uma vez mais se aproximou dos assentos dos deuses.

7. De Alceu de Messene
Ao harmonioso coro acrescentando a doçura das suas flautas,
Doroteu entoou a história dos plangentes Troianos,
o filho de Sémele com o raio9, e também entoou o estratagema
do cavalo, ele, o companheiro das Graças que nunca
[morrem.
Apenas ele, entre os profetas sagrados de Dioniso,
escapou ao hábil bater de asas da Crítica,
esse Tebano de nascimento, filho de Sósicles. E ao templo
de Lieu dedicou a sua boquilha10 e as flautas.

8. Do Mesmo
Sobre a estela de um sátiro
Não mais, pela Frígia que cria pinheiros, destilarás
o som entoado pelas tuas canas cinzeladas,
nem nas tuas mãos o instrumento de Atena Tritónia
como antes florescerá, ó sátiro filho de uma ninfa11!

9
Sémele teria concebido Dioniso após ser atingida pelo raio de Zeus.
10
Instrumento de couro que servia para unir duas flautas, tocadas
em simultâneo.
11
Mársias (que Platão considera um sátiro, e Heródoto um sileno)
teria encontrado a flauta inventada e logo descartada por Atena – porque,
ao tocá-la, se lhe inchavam as bochechas, aspeto que não lhe agradava,

29
Antologia Grega XVI

Tens os braços bem atados com grilhões, porque contra


[Febo,
mortal que eras, te envolveste em contenda de imortais,
e as tuas flautas, que com doçura igual à lira ressoavam,
valeram-te na competição não uma grinalda, mas o Hades.

9. Anónimo
Barriga de carraças! Por tua culpa uns aduladores parasitas
vendem por uma sopa o direito à liberdade.

10 [= AP 9.11812] Anónimo
Ai de mim, desgraçado, a quem a juventude e a velhice
[dominam:
uma porque se aproxima, a outra que já se me escapa.

11. De Hermocreonte
Ao passar, estrangeiro, senta-te à sombra deste plátano,
cujas folhas o Zéfiro sacode com seu suave sopro,
aqui, onde me pôs Nicágoras, a mim, o ilustre Hermes
filho de Maia, para lhe guardar o campo fértil e o gado.

e do qual se apercerbera ao contemplar-se nas água do rio Tritono (daí


o epíteto “Tritónia” do poema). Tão bom músico se cria Mársias, que
desafiou o próprio Apolo para um concurso. Perdendo para o deus, foi
aprisionado e esquartejado por ele.
12
O epigrama corresponde aos versos 527-528 da Teognidea e, na
tradição de P, conserva a atribuição parcial a um autor, coje nome não se
lê, mas dito de Besantinópolis.

30
O Apêndice de Planudes

12. Anónimo
Sobre uma estátua de Pã junto a uma fonte
Vem e senta-te sob o meu pinheiro que tão docemente
murmura, açoitado pelos Zéfiros gentis!
há um fio de água da doçura do mel, e ao som
das minhas flautas solitárias trago o doce sono.

13. [De Platão]13


Sobre o mesmo
Vem deitar-te à sombra deste alto pinheiro sonoro
que dança sob as investidas dos Zéfiros,
e junto às minhas correntes chilreantes a flauta pastoril
trará o sono às tuas pálpebras enfeitiçadas.

14. De Zenódoto
Sobre Eros
Quem talhou e pôs este Eros junto às fontes,
julgando apagar com água um tal fogo?

15. Anónimo
Ei-lo, o que antes se embriagava da fonte de vinho de Brómio,
o habitué dos bacanais, o sátiro de pés de bode,
atado pelos tornozelos com grilhões inquebrantáveis,

13
Como no caso de Simónides, um conjunto de epigramas entrou
na tradição antológica sob a pretensa autoria de Platão, o filósofo, mas
nenhum lhe deve na realidade pertencer.

31
Antologia Grega XVI

forjando no bronze as armas para o filho da deusa Tétis14;


não aplica o sábio esforço de um artista, antes sustém,
entre misérias, uma vida infeliz e laboriosa.

15b. Anónimo
– Onde estão as tuas taças, meu bebedolas? Onde estão as
[tranças
dos tirsos e os belos cortejos, Sátiro de pés saltitantes?
Quem colocou, ao lado do cinzel, uma corrente sonora atada
aos teus pés, tu que antes envolvias Brómio em cueiros15?
– A odiosa pobreza e a necessidade que tudo suporta
me puseram junto a Hefesto comendo pó de carvão.

16. Anónimo
Sobre a justa-medida
O que é de mais é moléstia! Como diz o ditado,
até o mel, quando é demais, se torna fel.

17. Anónimo
Sobre uma estátua de Pã16
Entoa, Pã, a melodia sagrada aos rebanhos que pastam,
com os lábios côncavos colados às canas de ouro,
para que, fartos, abundantes dádivas de branco leite

14
Pode tratar-se de uma representação do atelier de Hefesto, que plas-
ticamente surge auxiliado tanto pelos ciclopes como por sátiros e silenos.
O drama satírico de Eurípides também pode estar implícito.
15
Trata-se de Sileno, o velho sátiro que criou Dioniso.
16
Cf. núms. 226 (Alceu de Messene), 231 (Ânite) e 232 (‘Simónides’).

32
O Apêndice de Planudes

tragam em seus úberes para a casa de Clímeno;


e que o macho cabrio, estendido diante dos teus altares,
do peito peludo verta um sangue vermelho-vivo.

33
Antologia Grega XVI

Capítulo II. Epigramas Satíricos

18. Anónimo
Goza o prazer de dever dinheiro; os credores
que crispem os dedos de tanto contar.

19. Anónimo
“A Paz esteja com todos!” – proclamou o bispo ao chegar.
Como pode ela estar com todos, se a tem só para si?17

20. Anónimo18
Espantei-me ao ver Mauro, o retórico de lábios pesados,
o demónio vestido de branco da arte da retórica.

17
Deve tratar-se de Diodoro, bispo de Alexandria a partir de 444.
deposto pelo Concílio de Calcedónia em 451, de quem se conhecia uma
concubina chamada Irene (em grego, Eirene significa “paz”).
18
Beckby atribui o epigrama a Páladas (Cf. AP 11.204).

34
O Apêndice de Planudes

Capítulo III. Epigramas Fúnebres

21. Anónimo
Sobre Nicolau, patriarca de Alexandria
Aquele que domou reis e pôs cobro à arrogância
dos inimigos em nome da justiça dos nossos pais
aqui repousa, debaixo deste túmulo modesto,
Nicolau19, o que foi supremo sacerdote de Cristo.
Voou a sua virtude abençoada até aos limites do mundo,
e a sua alma habita as mansões dos bem-aventurados.
Era essa a vida a que aspirava quando estava na terra,
mortificando o corpo belo com meritórios trabalhos.

22. Anónimo
Sobre o mesmo
Estela da justiça e ex-voto da temperança,
esta imagem de Nicolau erigiu Gregório20.

23. [De Simónides]


Diz-me quem és, de quem és filho, qual a tua pátria e a tua vitória?
– Casmilo, filho de Evágoras, a luta em Pito21, e sou de
[Rodes.

19
Provavelmente Nicolau I, patriarca de Constantinopla entre 901-
925, embora o lema indique tratar-se de um Nicolau de Alexandria.
20
Deve tratar-se de um bispo de Éfeso.
21
I.e. nos Jogos Píticos, em Delfos.

35
Antologia Grega XVI

24. [Do mesmo]


Eis a bela estátua do belo Mílon22, o que em Pisa
triunfou sete vezes sem sequer23 cair de joelhos.

25. De Filipo
Se ouviste falar de Damóstrato24, o atleta de Sinope
que seis vezes recebeu no Istmo a coroa de pinheiro,
é ele que aqui vês! Jamais, por cair na tortuosa luta,
foram as suas costas marcadas pela areia.
Repara nessa mirada poderosa, como quem
conserva ainda essa antiga ânsia de vitória.
Proclama o bronze: “Liberta-me deste pedestal,
e, como vivo, por sétima vez me cobrirei de pó25.”

26. [De Simónides]


Nas embocaduras de Dírfis fomos subjugados26; a pátria
para nós ergueu este memorial, perto do Euripo27.
É de justiça: perdemos a nossa juventude amável,
apanhados no turbilhão cruel da batalha.

22
Mílon de Crotona, atleta de finais do século VI a.C., que segundo
Pausânias (6.14.5) venceu sete vezes nos Jogos Píticos e seis nos Olímpicos.
A proximidade temporal com Simónides é responsável pela atribuição do
epigrama, certamente a inscrição de uma estátua do atleta.
23
A derrota dava-se apenas quando o atleta caía de costas, mas Mílon
sequer apoiou os joelhos na terra, o que reforça a sua invencibilidade.
24
Atleta desconhecido e, para mais, de nome pouco frequente.
25
Gregos e Romanos cobriam o corpo de pó antes de iniciar a luta.
26
Pode tratar-se de um epitáfio coletivo para os Atenienses mortos na
guerra (que contudo ganharam) contra os Beócios e os Calcídios, em 507
a.C. – o que tornaria mais provável a atribuição a Simónides –, além de
outros conflitos, como as lutas entre Atenas e a Eubeia de 411, 378 e 358 a.C.
27
O estreito que separa a Eubeia da Beócia.

36
O Apêndice de Planudes

27. Anónimo
Epitáfio para Sardanapalo
Sabes que és, por natureza, mortal! Por isso, coragem,
goza uma vida agradável! Ao morrer, finda o prazer!
Também sou cinza, eu que reinei a grande Nínive28.
Tenho apenas quanto comi e bebi, os dons de amor
que conheci; os bens e a prosperidade, esses foram-se.
Esta a conduta de vida mais prudente para os homens.

28. Anónimo
Sobre uma estátua de Pronomo, auleta de Tebas
A Hélade concedeu a Tebas o pódio nas flautas;
e Tebas a Pronomo29, o filho de Oiníades.

29. Anónimo
Se alguma vez ouviste falar do amável filho de Eniálio30,
de força poderosa e corajoso nas batalhas,
sabe que não é outro que Heitor, o filho de Príamo,
esse que em pleno combate matou o amante de Diomeda31
quando combatia os Dânaos em defesa da terra dos Troianos;
esse o cadáver que este túmulo que vês cobre de terra.

28
Sardanapalo (ou Assurbanipal) foi rei dos Assírios entre 669-626
a.C. e morreu num incêndio do seu palácio na Babilónia. Diodoro (2.23)
considera que este epigrama seria o epitáfio composto pelo filho do rei,
ao passo que Estrabão o atribui a um tal Quérilo (poeta trágico do século
VI a.C. ou um autor de Samos do século seguinte).
29
Auleta do final do século V a.C., cuja fama e estátua em Tebas
refere Pausânias (9.12.5-6).
30
Ares.
31
Aquiles. No final do canto IX da Ilíada, o herói dorme com Dio-
meda, filha do rei Forbas de Lesbos.

37
Antologia Grega XVI

30. De Gémino
A mão de Polignoto de Tassos32 me fez. Eu sou aquele
Salmoneu33, o louco rival dos raios de Zeus,
que ainda no Hades me destrói e com os seus raios
me fulmina, odiando até o meu retrato mudo.
Cessa, Zeus, a tempestade! Acalma a cólera! Já não respira
o teu alvo! Não faças guerra a imagens sem vida!

31. De Espeusipo
O corpo de Platão, esta terra o guarda no seu seio,
mas a sua alma é da estirpe divina dos bem-aventurados.

32
Pintor ateniense (c. 500-440 a.C.), autor dos frescos de vários tem-
plos e pórticos da cidade. Planudes escrevera, erroneamente, “Policleito”
(um escultor), erro que parece repetir-se no núm. 150.
33
Mítico rei da Élide que tentou imitar os raios e trovões de
Zeus com tochas e com o ruído do seu carro, respetivamente. Zeus,
naturalmente, fulminou-o com um raio verdadeiro. A história vem
contada em Apolodoro (1.9.7), Virgílio (Eneida 6.585-586) e Valério
Flaco (Argonáuticas 1.659-665).

38
O Apêndice de Planudes

Capítulo IV. Epigramas Ecfrásticos

32. De Leôncio, o Escolasta


Sobre um retrato de Gabriel, Prefeito em Bizâncio
Faetonte34 está representado em pinturas – mas a arte
sempre pinta o Sol35 deixando ocultos os seus raios.
Da mesma forma, Gabriel, sábio prefeito, a arte pinta-te
sem todas as tuas virtudes, sem todas as tuas obras.

32b. De Teeteto, o Escolasta


Este Juliano36, luz do direito, ao vê-lo disseram
Roma e Béroe37: “a natureza tudo pode!”

33. De Leôncio, o Escolasta


Sobre um retrato de Calinico38 , o camareiro
Levas a palma da beleza, de coração e de aparência:
tudo em ti justifica o nome que levas;

34
Filho de Hélios (o Sol) e da oceânide Clímene, Faetonte quis
conduzir o carro de seu pai e, nessa viagem, aproximando-se demasiado
da terra, terminou morto por Zeus para evitar a conflagração universal.
35
O epigrama identifica Faetonte com o próprio Sol.
36
Professor de direito ou jurisconsulto da época de Justiniano e
Justino II (c. 555).
37
Por Roma, entenda-se Constantinopla (a nova Roma) e, por Béroe,
a atual Beirute, desde o século III um importante centro de direito.
38
Por certo um eunuco de Bizâncio da intimidade do Imperador
Justiniano.

39
Antologia Grega XVI

e sempre que em seus aposentos adormeces o imperador,


aos seus ouvidos sussurras toda a doçura do mundo.

34. De Teodoreto, o Gramático


Sobre um retrato de um governador em Esmirna
De Filadélfia39chegam estes presentes para Filipo40.
Vê como a cidade se mantém na boa-ordem!

35. Anónimo
Os Cários, em recordação das suas muitas boas-ações,
a Pálmato41 agradecem a sua imensa justiça.

36. de Agátias
Sobre o retrato de um mestre dedicado em Pérgamo ao cabo de
uma embaixada política
Os retratos que merecem o teus discursos, pela sua fluência
e doçura, perdoa-nos o atraso em oferecer-tos!
Mas hoje, pelos suores e pelo esforço que devotaste à cidade,
por fim te representamos nesta imagem, Heráclamo42.
Se é parca a homenagem, não nos censures: é desta forma
que costumamos homenagear os homens de bem.

39
Cidade da Lídia fundada no século II por uma colónia macedónica
sob o governo de Átalo II.
40
Personagem de identificação impossível.
41
Apenas sabemos que se trata de um governador da província da
Cária, desmantelada no século VII. A identificação de Pálmato e uma
datação mais precisa do epigrama são impossíveis.
42
Professor de retórica e advogado de Pérgamo.

40
O Apêndice de Planudes

37. De Leôncio, o Escolasta Minotauro43


Sobre uma estela
É Pedro44, quem vês nestas vestes douradas; e as honras45
que tem ao lado atestam os seus trabalhos constantes:
do Oriente a primeira, as duas que se lhe seguem
da concha purpúrea46, e outra vez a do Oriente.

38. De João Barbúculo


Sobre um retrato do escolasta Sinésio, dedicado em Beirute após
a vitória numa batalha
Nas margens do Eurotas47 nem todos os homens são guerreiros,
como nas do Ilisso48 tampouco são todos juristas.
Como quem nasceu em Esparta ou é cidadão de Atenas,
Sinésio49 foi um eleito da Vitória e da Justiça.

39. De Arábio, o Escolasta


Sobre um retrato do Prefeito Longino em Bizâncio
O Nilo, a Pérsia e a Ibéria50, os Sólimos51 e o Ocidente, a
[Arménia,
os Indos e os Colcos, vizinhos do Cáucaso escarpado,

43
Cameron (1966: 17) pensa que a alcunha Minotauro, que acompanha
o nome de Leôncio na epígrafe de vários epigramas, seria um patronímico.
44
Duas vezes Prefeito do Oriente (543-546 e 556-562/565) e digni-
tário consular em 542.
45
A representação incluiria figuras femininas alegóricas dos cargos
políticos deste Pedro.
46
Insígnia do posto de Cônsul.
47
Rio de Esparta.
48
Rio da Ática.
49
Desconhecido, professor e general.
50
Atual Geórgia.
51
Viviam em Písida, na região do Termesso.

41
Antologia Grega XVI

e ainda as tórridas planícies dos Agarenos52 que vivem dispersos,


todos testemunham os rápidos trabalhos de Longino53.
Como, em viagem, era o rápido ministro do Imperador,
rápido foi ele em dar-nos a paz que estava oculta.

40. De Crinágoras
Sobre um retrato de Crispo
Três Fortunas54 apenas por vizinhas não é justo que tenhas,
Crispo55, graças ao teu coração de grande riqueza,
antes quantas há neste mundo! Para um indivíduo assim,
o que pagará a sua imensa bondade para com os demais?
Oxalá César56, que é mais poderoso ainda que estas, te eleve
mais alto! Fortuna alguma sem ele se sustém?

41. De Agátias, o Escolasta


Sobre uma estátua erguida nas Placídias57 junto às da nova
corporação
Tomás58, o irrepreensível curador do senhor universal,

52
Filhos de Agar, os Ismaelitas da tradição bíblica. Um códice em
específico prefere a lição “os Sarracenos”, comum a Procópio.
53
Prefeito de Bizâncio no século VI. Vd. infra, núm. 314.
54
Três templos consagrados à deusa Fortuna, por certo os que se
localizavam perto do Horti Sallustiani, como testemunham Vitrúvio
(3.2.2) e Tácito (Histórias 3.82).
55
Pode tratar-se de Gaio Salústio Crispo (morto no ano 20),
sobrinho-neto do historiador Salústio, o mesmo indivíduo referido por
Horácio (Odes 2.2) e Tácito (Histórias 3.30).
56
Octávio César Augusto.
57
Palácio dedicado a Gala Placídia (m. 450), filha de Teodósio I e
imperatriz consorte de Constâncio III (cujo reinado apenas durou sete
meses do ano 421).
58
Um responsável pelo tesouro imperial que não logramos identificar.
Cameron (1966: 9) julga que terá tido a seu cargo a gestão dos opulentes

42
O Apêndice de Planudes

dedicaram-no os membros da nova corporação,


bem ao lado do augusto casal59, de tal forma a sua estátua
merece ter assento bem perto do poder supremo.
Ele próprio levantou as paredes do palácio divino,
aumentando-lhe a riqueza, mas com honestidade.
Obra de gratidão, esta! Que melhor pode fazer o cinzel,
além de garantir a memória aos homens de bem?

42. Anónimo
Sobre uma estátua de Teodósio, prefeito em Esmirna
A Teodósio60, grande pelos seus conselhos, prefeito da Ásia
e procônsul, dedicamos esta estátua de mármore,
pois ressuscitou Esmirna e de novo a conduziu à luz,
e agora a celebramos por seus monumentos admiráveis.

43. Anónimo
Sobre uma estátua de Damócaris em Esmirna
Damócaris61, espírito genial, é para ti, governador, esta glória,
pois Esmirna, passadas as mortais desgraças do terramoto,
trabalhando arduamente de novo e outra vez tu a ergueste.

cofres de Justino II.


59
Justino II e a imperatriz Sofia.
60
Figura desconhecida, além das informações dadas pelo lema. Terá, de
qualquer forma, sido o responsável por uma reconstrução da cidade, poden-
do referir-se o poeta a essa posterior ao terramoto de 551, a mesma que pode
também estar em causa no núm. 43, no qual outro indivíduo é celebrado.
61
Governador do Baixo Império celebrado pelo seu papel na reconstru-
ção de Esmirna (vd. nota anterior), deve tratar-se do poeta homónimo de
Éfeso (m. antes de 575), de quem conservamos quatro epigramas (AP 6.63,
7.206, 9.663, 16.310) e cujo epitáfio compôs Paulo Silenciário (AP 7.588).

43
Antologia Grega XVI

44. Anónimo
A terra inteira, Majestade62, canta para sempre o teu poder,
pois destruíste as fileiras dos inimigos e o brilho da luz
aos homens de bem devolveste, passado o terrível combate,
dissipando as agruras da guerra civil que desatrelara cavalos.

45. Anónimo
Sobre um retrato do cônsul Teodoro
Nós, os oradores, estávamos na disposição de honrar
Teodoro63 com retratos dourados, signo de memória eterna,
não fugisse sempre ele do ouro, mesmo do dos retratos64.

46. Anónimo
Este Nicetas65, audaz lanceiro, o imperador, o exército, as
 [cidades e o povo
o ergueram pelos seus grandes trabalhos na destruição dos
[Persas.

62
Feminino no original (basileia), este vocativo refere-se à imperatriz
Teodora, esposa de Justiniano I, a qual teve de facto um papel determi-
nante na resolução da Revolta de Nike (o “terrível combate” e as suas
consequências dos versos 3-4). Vd. Intr., nota 11.
63
O nome era frequente no Baixo Império. Apenas algumas hipó-
teses de identificação: (1) Teodoro, que mandou construir o oratório do
imperador Justino I (AP 1.97), cônsul em 505 e 525; (2) o chefe dos
funcionários (magister officiorum) do palácio do mesmo imperador, cujo
retrato foi ofertado à Igreja de S. João de Éfeso e, para cuja ocasião, o pre-
sente epigrama poderia ter sido composto – essa a opinião de Cameron
(1966: 22).
64
Nota sobre a incorruptibilidade do homenageado.
65
Um patrício, colaborador do imperador Heráclio, seu tio. A guerra
contra os Persas a que alude o epigrama durou entre 622 e 630, terminan-
do com a derrota dos últimos.

44
O Apêndice de Planudes

47. Anónimo
Ao que foi grande nas batalhas, o impávido general,
Nicetas, pelos seus méritos, os Verdes66.

48. Anónimo
Sou Proclo, o filho de Paulo de Bizâncio que a corte real
arrancou dos palácios da Justiça, onde eu florescera,
para ser porta-voz fiel do imperador todo-poderoso67.
Proclama o bronze o prémio merecido dos meus trabalhos!
Em tudo semelhantes foram as carreiras de pai e filho,
mas nas lides consulares68 este filho superou o pai.

49. De Apolónides
No passado admirava-se Cíniras ou os dois Frígios69;
agora nós, Leão, a tua beleza cantaremos,
afamado filho de Cécafo! A mais afortunada das ilhas
é sem dúvida Rodes, onde brilha um tal sol.

66
Outro epigrama para a mesma ou outra estátua do mesmo indiví-
duo do núm. 46. Os Verdes são uma das quatro fações de Constantinopla,
sobre os quais deve ler-se, na introdução, a secção dedicada aos epigramas
das estátuas dos aurigas do Hipódromo.
67
Proclo, um pretor, foi nomeado questor de Justino I (518-527),
ofício que já ocupara seu pai Paulo.
68
Não há indícios de um consulado de Proclo, pelo que deve ter sido
cônsul honorário.
69
Cíniras foi o primeiro rei mítico de Chipre, a quem se atribui a
introdução do culto de Afrodite na ilha. Os dois frígios são, naturalmente,
Ganimedes e Páris, modelos da beleza masculina.

45
Antologia Grega XVI

50. [Do Mesmo]


Se semelhante Leão Héracles tivesse que haver enfrentado,
não seria esse o décimo segundo trabalho do Alcida70.

51. Do Cônsul Macedónio


Eis a estátua do pequeno Tionico71, não para que vejas
o belo que era no resplendor deste memorial,
mas para que, conhecendo o sucesso que granjeou,
meu caro, desejes emular os seus entusiasmos.
Ele, cujas pernas não se dobraram à fadiga, ele, que os rivais todos
venceu, fossem da sua idade, mais novos ou mais velhos.

52. De Filipo
Pode ser, estrangeiro, que ao ver-me com barriga de touro
e estes robustos músculos, como um segundo Atlas,
te espantes e duvides que sou de natureza mortal!
Sabe que sou Heras de Laodiceia72, atleta do pancrácio,
o que coroaram Esmirna, o carvalho de Pérgamo,
Delfos, Corinto, Élis73, Argos e também o Ácio.
Se buscas contar as vitórias nos demais jogos,
vale mais a pena contar os grãos de areia da Líbia.

70
Nenhuma informação sobre este Leão. A luta com o leão de Nemeia
era, na tradição helenística, o último dos doze trabalhos de Héracles.
O Alcida é Héracles, segundo algumas fontes descendente de Alceu (cf.
Calímaco, Hino a Diana 145).
71
Lutador desconhecido da faixa etária das crianças.
72
Cidade a cerca de 60 km a leste de Éfeso. Originalmente chamada
de Dióspolis, mudou de nome em homenagem a Laodice, esposa de
Antíoco II de Téos, que a reconstruiu.
73
Capital da Élide, aqui como referência aos Jogos Olímpicos.

46
O Apêndice de Planudes

53. Anónimo
Sobre um corredor
Se Ladas74 saltou sobre o estádio, ou passou a voar,
não sei dizer – ó divina velocidade a sua!

54a. Anónimo
Sobre o mesmo
Tal qual eras, inspirado Ladas, correndo sobre as asas do vento
†o teu trilho, e na ponta †do pé exalando o teu alento,†
assim te forjou Míron75 no bronze, em todo o teu corpo
imprimindo a ambição pela grinalda de Pisa.

54b. Anónimo
Cheio de esperança ele está, e à volta dos lábios se lhe nota
a transpiração que vem do profundo das coxas.
Em breve se lançará o bronze à grinalda, e não há de a base
detê-lo – ó arte essa, mais veloz ainda que o vento!

74
Os núms. 53 e 54a-b referem-se ao corredor supostamente Argivo
(Pausânias 2.19.7) de meados do século V a.C. de quem Míron terá feito
uma estátua muito conhecida (núm. 54a), uma autêntica estrela despor-
tiva do tempo, ao ponto de ter rebatizado com o seu nome o estádio de
Mantineia no qual treinava (Pausânias 8.12). O seu túmulo teria sido
erguido nas margens do Eurotas, perto de Esparta, onde falecera no
regresso vitorioso de Olímpia (Pausânias 3.21.1). O presente epigrama
pode ser cópia da inscrição da sua estátua no mesmo estádio de Olímpia.
75
O vocabulário e o estilo do epigrama deixam claro que não se
tratava de uma inscrição da base da estátua original de Míron, antes de
uma écfrase tardia da mesma, porquanto, como tantas outras, também
esta estátua terá tardiamente sido levada de Olímpia para Roma.

47
Antologia Grega XVI

55. De Troilo, o Gramático


– Estátua, quem te dedicou, porquê e para quem, diz-me!
– Pela luta na palestra, a cidade me dedicou a Líron.

56. Anónimo
A Eusébio, a Roma Bizantina76 dedicou esta estátua,
esta e duas outras, pelo seu talento de auriga.
Foi coroado não em consequência de vitória muito disputada,
mas por muito exceder a velocidade e força dos cavalos.
Assim eclipsou a luz dos adversários; e à antiga disputa,
a que dividia o povo, também a essa pôs cobro77.

57. De Paulo Silenciário


Sobre uma bacante em Bizâncio
Esta bacante em fúria78, não foi a natureza, antes a arte
que a construiu, misturando o frenesim e a pedra.

76
Constantinopla. Cameron (1973: 252) chama à atenção para o
facto desta construção, “Roma Bizantina”, não aparecer atestada antes
de 560.
77
Epigrama de origem epigráfica para um auriga de Constantinopla,
provavelmente dos finais do governo de Justiniano (apud Cameron 1973:
252-258), num momento em que a fama das corridas de carros come-
çava já a decair. O facto de a presente composição não constar entre os
núms. 335-387 sugere que a estátua deste Eusébio não estava erguida no
Hipódromo.
78
A insistência, neste epigrama e no seguinte, na animação furiosa
da estátua, levou a sugerir que se tratava da Bacante de Escopas (séc.
IV a.C.), a dada altura transferida para Constantinopla – como parece
indicar o lema do núm. 57. Perdido o original de Escopas, crê-se que a
conhecida como Bacante de Dresden (Dresden Albertinum inv. 133) é
dele uma cópia romana.

48
O Apêndice de Planudes

58. Anónimo
Sobre o mesmo
Parai essa bacante! Não vá ela, mesmo de mármore,
transpor o portal e escapar-se do templo.

59. De Agátias, o Escolasta


Sobre o mesmo
Ignorando ainda como tocar os címbalos79 com as mãos,
uma bacante envergonhada, isso moldou o escultor.
Por isso se inclina para a frente, e parece gritar assim:
“Fora, para tocá-los sem ninguém por perto!”

60. [De Simónides]80


– Quem é esta? – Uma bacante. – Quem a esculpiu? – Escopas.
– E quem a fez delirar, Baco ou Escopas? – Escopas.

61. De Crinágoras
Sobre [uma estátua] de Nero
Oriente e Ocidente, os limites do mundo. As empresas
de Nero81 atingiram os dois extremos da terra.

79
Instrumento musical que, pela iconografia, podemos aproximar
das castanholas.
80
A incongruência da atribuição a Simónides (séc. VI a.C.) de um
epigrama que refere o escultor Escopas (séc. IV a.C.) dispensa qualquer
explicação. Natural de Paros, Escopas exerceu a sua atividade na primeira
metade do século IV a.C. e foi colaborador de Praxíteles (vd. núm. 129
e nota ad loc.). Tal como Lisipo (vd. núm. 120 e nota ad loc.), era um
sucessor do estilo de Policleito (cd. núm. 216 e nota ad loc.).
81
Tibério Cláudio Nero César, imperador romano entre 14-37, o
direto sucessor de Augusto, seu padrasto. As campanhas militares men-
cionadas no poema são anteriores à sua coroação como Imperador.

49
Antologia Grega XVI

O Sol, ao erguer-se, contempla a Arménia82 que o seu braço


subjugou, e também a Germânia83, quando vai deitar-se.
Celebre-se pois um duplo poder na guerra: conhecem-no
[Araxes84
e o Reno, dos quais agora bebem povos escravizados.

62. Anónimo
Sobre uma estela do imperador Justiniano no Hipódromo
Estas oferendas, soberano destruidor dos Persas, te concede
Eustácio85, em simultâneo pai e filho86 desta tua Roma:
um cavalo pela vitória, outra Vitória que te cinge com a grinalda,
e tu próprio, montando um corcel veloz como o vento.
Alto se eleva, Justiniano, o teu poder! E que, sobre a terra,
 [para sempre
estejam agrilhoados os bastiões dos Persas e dos Citas87.

63. Anónimo
Sobre o mesmo88
Um cavalo, o imperador e ainda a Babilónia89 destruída,

82
Submetida numa batalha em 20 a.C.
83
A referência pode ser a uma de várias expedições, seja a do ano 16
a.C., seja as dos anos 9 e 7 a.C., ou mesmo, posterior, a dos anos 4-6 da
nossa era.
84
Rio da Ásia.
85
Prefeito de Constantinopla (c. 530) do governo de Justiniano I (527-565).
86
Na realidade, dois títulos oficiais, respetivamente, os de Prefeito e
cidadão honorífico.
87
Justiniano firmara uma suposta paz perene com os Persas em 530,
a qual não duraria mais que dois anos. Assim, o ano de 532 parece de
aceitar como terminus post quem do epigrama.
88
Erro do lema. Não deve tratar-se da mesma estátua, desde logo
porque é outro o indivíduo que a dedicou.
89
Exagero do poeta. Justiniano I nunca chegou à Babilónia propria-
mente dita.

50
O Apêndice de Planudes

isso moldou o bronze dos despojos dos Assírios.


É Justiniano, e aquele que detém o jugo sobre a Anatólia90,
Juliano91 o ergueu, testemunho da chacina dos Persas

64. Anónimo
Sobre o mesmo
Eu, o Prefeito Teodoro, nas margens deste rio erigi
esta estátua brilhante para o imperador Justino,
para que mesmo no porto difunda serenidade92.

65. Anónimo
Sobre uma estátua do imperador Teodósio
Avanças da Anatólia, Teodósio93, para os mortais um outro sol
que traz a luz, umbigo do mundo, coração cheio de
[bondade,
tu, que a teus pés tens o Oceano e a terra que não tem fim,
resplendor universal, armado de elmo, ágil condutor de
[ilustre
cavalo – ó grande herói – que contudo deseja escapar-se.

90
I.e. o Oriente.
91
Cônsul e Prefeito do Oriente de Justiniano I e Justino II.
92
Justino II (imperador entre 565-578), que tinha o título de
“sereníssimo”, havia reconstruído o porto Juliano em 570. Aí estaria
a estátua mandada erguer por este Teodoro, em cuja base devia estar
inscrito o presente epigrama.
93
Inscrição para a estátua equestre monumental que o imperador
Teodósio mandou erguer no Fórum com o seu nome, em 393.

51
Antologia Grega XVI

66. Anónimo
Calíades, general bizantino, ergueu esta famosa estátua junto
da assim chamada Basílica de Bizâncio, onde se lia assim:
O poderoso Bizas e a amável Fidália94, forjando-os
em memorial único, Calíades os dedicou.

67. Anónimo
Sobre o mesmo
A amável Fidália represento, a esposa de Bizas;
sou oblação por um enfrentamento penoso95.

68. De Asclepíades ou Posidipo


Sobre uma estátua de Berenice
– “Esta estátua é de Cípris?” – “Vejamos se não é de Berenice96.”
Tenho dúvidas com qual das duas mais se parece.

69. Anónimo
A Zenão97, o imperador, dedicatória do Prefeito Juliano98;
a Ariadne, a esposa de Zenão, do mesmo Juliano.

94
Respetivamente, o fundador mítico de Bizâncio e a sua esposa.
95
À letra, “por uma prova digna de touros”. Das muitas interpretações
que sem têm dado à expressão, preferimos a que entende a alusão à mítica
derrota, encabeçada pela esposa de Bizas, dos Citas que atacavam a cidade.
96
Deve referir-se à esposa de Ptolemeu I (Sóter), sátrapa do Egito entre
323-283 a.C. A ela, que terá morrido por volta de 280 a.C., eram dedica-
dos templos nos quais era venerada como associada de Afrodite. Alvo do
mesmo culto foi a homónima esposa de Ptolemeu III Evergeta ou a filha de
Ptolemeu II Filadelfo, também apontadas como hipóteses de identificação.
97
Imperador que sucedeu a Leão I e governou até à data da sua morte,
em 491.
98
Prefeito do governo dos imperadores Anastásio e Justino I, também
o poeta da Antologia conhecido como Juliano do Egito.

52
O Apêndice de Planudes

70. Anónimo
O soberano que viu florescer o palácio do Hélicon,
graças aos trabalhos gloriosos do prefeito Juliano,
fixou-se, todo em ouro, junto às mansões das Piérides99.

71. Anónimo
A glória de Juliano todos a celebram, ele que, tendo honrado
as Piérides, erigiu uma estátua de ouro para Anastásio.

72. [De Agátias, o Escolasta]


Sobre uma estátua do Imperador Justiniano100
Uma estátua carregada de despojos, pela sua vitória, em Susa
há de erguer o insolente Persa para o nosso imperador;
e outra a armada de cabelo desalinhado dos Ábares, para lá
 do Istro101,
arrancando uma madeixa da sua cabeça hirsuta.

99
As expressões “palácio do Hélicon” e “mansões das Piérides” (as
Musas) referem-se à Biblioteca de Constantinopla (também conhecida
como Museu), construída durante o governo de Juliano e destruída pelo
fogo em 477. O epigrama celebra, ao que parece, a sua reconstrução
pelo mesmo Prefeito Juliano do epigrama anterior, durante o governo de
Anastásio I (post 491), de quem se ergueu in situ uma estátua em ouro – a
mesma que é referida no epigrama seguinte.
100
Erro do lema. O imperador celebrado é Justino I (v. 8) e não
Justiniano I, o seu sucessor.
101
Justino I conseguira que, após dez anos de guerra com os Ábares
(tribo dos Citas), estes se mantivessem em paz. Mas a guerra com a Pérsia,
apesar da paz assinada em 540, prolongar-se-ia até 577, com avanços e
recuos de ambas as partes. O epigrama formula então dois desejos, a
destruição da Pérsia e o final das hostilidades com os Citas (o Istro é o
Danúbio), simbolicamente representados na construção de duas estátuas
do imperador pelos inimigos.

53
Antologia Grega XVI

Esta aqui, ao invés, pela prosperidade do seu bom governo


e pela mitra consular102, neste local a ergueu a cidade
[soberana.
Oxalá permaneças firme, intrépida Roma de Bizâncio,
tu que recebeste o poder divino de Justino.

73. Anónimo
O que adornou o assento consular, por três vezes foi Prefeito
e a quem chamavam pai103 os imperadores todo-poderosos,
esse Aureliano104 aqui se ergue em ouro. Encargo do Senado,
a cujos problemas sequer ele próprio foi capaz de dar solução.

74. Anónimo
Para um governante
À doçura do mel mistura um pouco de medo, pois a própria
abelha zumbidora assim apetrecha o seu aguçado aguilhão;
sem o chicote, tampouco um cavalo arrogante segue a direito,
nem um grupo de porcos obedece à vontade do porqueiro
sem que antes ouça o som do bastão que ressoa ao longe.

75. De Antípatro [de Tessalónica]


A Zeus, a Apolo e a Ares, tu, filho de soberanos,
te pareces, feliz rebento desejado de uma mãe,

102
Os primeiros anos do governo de Justino foram económica e
socialmente frutíferos. Em concreto, há aqui referência à restauração do
título de Cônsul, em 566, abolido no governo anterior.
103
Pode aludir à sua posição de Senador ou Prefeito.
104
Flávio Aureliano, Cônsul em 404 e Prefeito de Constantinopla
em 393, 402 e 404.

54
O Apêndice de Planudes

em ti toda a nobreza das Moiras, toda a perfeição


te calhou e és assunto da predileção dos poetas.
A Zeus pertence o cetro régio, a Ares a lança e a beleza
a Febo; mas em ti, Cótis105, tudo se conjuga.

76. [De Sinésio, o Filósofo]


Os três Tindáridas: Castor, Helena e Polideuces106.

77. De Paulo Silenciário


A custo o pincel pintou os olhos da donzela, mas a cabeleira
e o brilho supremo da sua pele, não soube fazê-los.
Apenas quem o sol radiante for capaz de pintar
poderá pintar também a radiante Teodora107.

78. Anónimo [ou do mesmo]


Sobre o mesmo
És invejoso, pincel, e enganas todos os que veem o retrato,

105
Deve tratar-se do rei da Trácia (dos vários com esse nome) referido
por Ovídio (Pônticas 2.9), Cótis V. A isso aponta a coincidência deste
monarca ter falecido em 19, e Antípatro no ano seguinte.
106
Um só hexâmetro, inscrição de um grupo escultórico com os três
filhos de Tíndaro. Planudes colocou o verso depois do núm. 79 (também
este um só hexâmetro), e os críticos têm duvidado da atribuição a Sinésio,
o filósofo neoplatónico de Sirene que seria bispo de Ptolemais por volta
de 412.
107
Este epigrama e o seguinte podem aludir a um retrato da impe-
ratriz Teodora enquanto jovem (“donzela”), a esposa de Justiniano I, ou
simplesmente a outra jovem desconhecida. A última hipótese faria algum
sentido, se pensarmos que Planudes incluiu ambos na secção “sobre re-
tratos de mulheres” e não na anterior, “sobre os soberanos”, onde há duas
composições sobre imperatrizes (núms. 67-68).

55
Antologia Grega XVI

ocultando com as bandas a sua cabeleira dourada.


Se no retrato escondes a graça altiva da sua cabeça altiva,
no resto da sua beleza tampouco se te pode crer.
Qualquer pincel é fiel às formas; mas tu, caso único,
roubaste algo do resplandor de Teodora.

79. De Sinésio, o Filósofo


Sobre a sua irmã
A dourada da estátua é Afrodite, ou Estratonice.

80. De Agátias, o Escolasta


Eu era uma cortesã, dentro da Roma Bizantina,
a todos agraciando com um amor interessado.
E agora sou a talentosa Calírroe, a que, louco
de amor, Tomás108 plasmou nesta pintura,
mostrando quanto desejo tem na alma. Como a cera
derrete, assim derrete também o seu coração.

81. De Filipo
Sobre a estátua [criselefantina de Zeus em Olímpia]
Ou o deus desceu dos céus à terra para te mostrar a sua
[imagem,
Fídias109, ou tu próprio até lá foste para ver o deus.

108
Nem o Curador homónimo do núm. 41 nem o poeta do ciclo de
Agátias do núm. 314 são de admitir.
109
Fídias é o mais famoso escultor grego (ativo sensivelmente entre
465-425 a.C.), da mesma forma que a sua estátua em ouro e marfim
de Zeus, encomendada para o Templo desse deus em Olímpia, foi das

56
O Apêndice de Planudes

82. [De Simónides]


Sobre o Colosso de Rodes
O colosso de Rodes110, de setenta codos,
foi Cares de Lindos quem o fez.

83. Anónimo
Ájax, filho mais de Timómaco111 que de teu pai112, a arte
[capturou
o teu íntimo: o pintor viu como te enfurecias,
enfureceu-se-lhe a mão, e com as lágrimas na paleta
misturou as penas todas do teu sofrimento.

84. Anónimo
Não faltou talento a Címon113 ao pintar este quadro. Mas a crítica
vale para qualquer obra, e nem o lendário Dédalo lhe escapou.

obras mais admiradas ao longo de toda a Antiguidade (cf. Pausânias


5.11). Sabemos que foi levada para Constantinopla no séc. IV, onde
terá sido destruída num incêndio, cerca de um século mais tarde. Dela
conservamos representações, como é o caso da numismática.
110
Estátua Colossal de Hélios, o protetor da ilha, erguida entre 292 e 280
a.C. A tradução é já o resultado de correções textuais, porquanto os manus-
critos referem a autoria de um tal Laques e a altura de 80 codos, informações
contrárias às demais fontes antigas, que falam de Cares de Lindos e 70 codos
de altura (31,5 m.). Não deve o epigrama ter sido uma inscrição.
111
Timómaco de Bizâncio (séc. I a.C.) pintou sobretudo dois retratos
que ficaram famosos na Antiguidade, este Ájax e uma Medeia (infra,
núms. 135-143). Plínio (7.38.1) conta que Júlio César comprou ambos
por 80 talentos e os colocou no Templo de Vénus Generatrix, no Fórum
Juliano, no rescaldo da Batalha de Farsália.
112
Este Ájax é o filho de Télamon, de Egina, e a pintura representaria o
momento em que o herói se lança sobre a própria espada para pôr termo à vida.
113
Címon de Cleonas, pintor de um estilo ainda primitivo, de finais do
séc. VI a.C., para quem conservamos um epitáfio de Simónides (AP 9.758).

57
Antologia Grega XVI

85. Anónimo
Esta obra de arte perdeu o seu referente; nem ela mesma
sabe informar a quem emprestou a sua cabeça114.

86. Anónimo
Do guardião115 deste muro mantém distância segura!
Sou assim como me vês, tu que por mim passas,
de figueira, sem o polir da lima ou a régua vermelha116,
mas talhado pelo cinzel amador de um pastor.
Ri-te de mim à vontade! Mas livra-te de causar dano
aos bens de Eucles, ou amarga será a tua gargalhada.

87. De Juliano do Egito


Sobre um Prometeu de bronze a ser devorado
O fogo que gera a arte é dádiva minha. E agora, pela arte
e pelo fogo garanto a visão de um sofrer sem fim.
Ai, sempre ingrata raça dos mortais, se agora Prometeu
recebe tal recompensa dos que trabalham o bronze117!

114
Uma estátua que perdeu a cabeça ou mesmo a referência ao hábito
mais comercial de esculpir apenas os corpos aos quais, posteriormente, se
acrescentava a cabeça do modelo a representar.
115
Priapo. Vd. núms. 236-243 e 260-261.
116
Com a qual se marcavam no mármore e na madeira os pontos de
excisão.
117
Prometeu, após ter roubado o fogo aos deuses e o ter oferecido aos
mortais, fora condenado a estar eternamente agrilhoado num rochedo,
vendo durante o dia as suas vísceras serem devoradas por uma águia e,
durante a noite, as mesmas renascerem de forma a perpetuar o seu suplí-
cio. A ironia do poema reside na contradição de o sofrimento deste novo
Prometeu em bronze ter origem no mesmo fogo, com o qual a matéria
prima da estátua é modelada.

58
O Apêndice de Planudes

88. Do mesmo
De Juliano, sobre uma estátua de Prometeu
Ao bronze chamava inconsumível o livro de Homero;
mas o escultor demonstrou que se equivocara.
Vede este Prometeu plangente, vede os sofrimentos
do bronze consumido do fundo das vísceras.
Grande vingança, Héracles, pois mesmo após a tua flecha
continua por aplacar a chaga do filho de Jápeto118.

89. De Galo
Sobre Tântalo
O que outrora foi comensal dos bem-aventurados, o homem
que tantas vezes encheu a tripa de vinho dos deuses,
anseia agora pela bebida dos mortais; mas a terrível mistura
sempre está abaixo do alcance dos seus lábios119.
“Bebe” – diz o gravado120 – “e aprende os mistérios do silêncio!”
Assim somos punidos, nós, os que temos a língua solta.

118
Héracles terá matado a águia que a cada dia torturava Prome-
teu, uma libertação que, perante o realismo da estátua, deixa de ter
validade.
119
Convidado para a mesa dos deuses, Tântalo desvendou os segredos
íntimos dos mortais, sendo castigado à carestia eterna: parcialmente
submerso num rio (cujas águas não conseguia alcançar para beber), tinha
sobre si uma árvore cujos frutos tampouco alcançava.
120
Deve tratar-se do baixo-relevo (com inscrição) do castigo de Tân-
talo numa taça.

59
Antologia Grega XVI

90. Anónimo
Sobre uma estátua de Héracles121, menino ainda, segurando
nas mãos duas serpentes
Esmaga, poderoso Héracles, os pescoços longos das serpentes,
estrangula as goelas profundas dessas feras!122
À cólera da zelosa Hera, contra quem é menino ainda,
põe cobro! Embora bebé, aprende o difícil que é a vida!
Krateres de bronze ou caldeirões123, não é esse o teu prémio
natural, antes o acesso direto às mansões de Zeus.

91. Anónimo
Sobre os doze trabalhos de Héracles124
Contempla, Héracles das mil provas, os teus trabalhos,
pelos quais acedeste ao Olimpo, mansão dos Imortais125:
Gérion, os famosos pomos, o grande esforço de Augias,
os cavalos, Hipólita, a hidra de incontáveis cabeças,
o javali, o cão gritante de Caos, a besta de Nemeia,
as aves, o touro e a corça de Ménalo126.

121
Os núms. 90-104 e 123-124 constituem uma secção sobre Héra-
cles, não seguidos nas edições na medida em que provêm de duas fontes
manuscritas distintas usadas por Planudes.
122
Hera, para vingar mais esta infidelidade de Zeus, enviou à alcova
onde dormia Héracles recém-nascido duas serpentes, as quais o pequeno
neutralizou. Essa a história contada, por exemplo, no Anfitrião de Plauto.
123
Alguns dos prémios concedidos aos atletas.
124
Os epigramas 91-93 constituem verdadeiras listas poéticas dos
trabalhos que Euristeu prescrevera a Héracles, obedecendo ao cânone
helenístico de doze aventuras. Sobre eles, vd. Grimal (1999: 207-213).
125
Epigrama inscrito na base de uma estátua de Héracles em Pérga-
mo, na qual estariam gravados, em relevo, os trabalhos do herói.
126
Vulgarmente referida como corça de Cerineia ou de Énoe, é aqui
designada a partir da região de Ménalo, na Arcádia (entre Orcómeno e
Mantineia).

60
O Apêndice de Planudes

Agora que estás no topo da acrópole de Pérgamo,


a invencível, protege os nobres filhos de Télefo.

92. Anónimo
Sobre o mesmo
Primeiro, em Nemeia massacrou o poderoso leão;
segundo, em Lerna matou a hidra de muitas cabeças;
terceiro, assassinou o javali que afligia o Erimanto;
depois, caçou a corça de chifres dourados, o quarto;
quinto, espantou pelos ares as aves Estinfálidas;
sexto, granjeou o cinturão dourado da Amazona;
sétimo, limpou a abundante pocilga de Augias;
oitavo, repeliu de Creta o touro que cuspia-fogo;
nono, resgatou da Trácia os cavalos de Diomedes;
décimo, trouxe atrelados de Eriteia os bois de Gérion;
o cão Cérbero, décimo-primeiro, trouxe do Hades;
décimo-segundo, trouxe para a Hélade os pomos de ouro;
o décimo-terceiro trabalho que teve, esse foi terrível:
numa só noite, deitou-se com cinquenta mulheres127.

93. Anónimo
Sobre o mesmo
Matei a besta imensa de Nemeia, matei a hidra
e o touro, esmaguei o focinho do javali;

127
Este décimo-terceiro trabalho, não canónico, pretende ser um
acrescento cómico do poeta. Segundo Pausânias (9.27.7), enquanto
perseguia o leão do Citéron, e quando estava alojado em casa de Téspio,
rei de Téspias, Héracles pernoitou com as cinquenta filhas desse monarca,
que desejava ter descendência do herói.

61
Antologia Grega XVI

conseguido o cinturão, roubei os cavalos de Diomedes;


e já colhidas as maçãs de ouro, capturei Gérion;
enfrentei Augias; a corça não me escapou; matei as aves;
resgatei Cérbero. E agora vivo no Olimpo.

94. De Árquias
Sobre o mesmo, matando o leão em Nemeia
Não mais vos assusteis, rústicos camponeses de Nemeia,
com o profundo rugido do leão que devora touros!
Caiu já pela força de Héracles, o senhor de vitórias,
de pescoço estrangulado por mãos que matam feras.
Podeis enfim pastar os rebanhos, e que Eco de novo escute
os seus balidos, ela que habita as planícies desertas.
E tu, vestido com a pele do leão, acouraça-te com essa pele
e aplaca a cólera de Hera que odeia bastardos128.

95. De Damageto
Sobre o mesmo
O leão é de Nemeia, mas o estrangeiro de sangue Argivo129;
aquele, a mais potente das feras, este dos semideuses.
Avançam para a luta com olhar retorcido, dispostos a lutar
um contra o outro pelas suas próprias vidas.
Pai Zeus, possa o varão de Argos sagrar-se o vencedor,
e de novo seja possível transitar por Nemeia.

128
Héracles era filho bastardo (um dos muitos) de Zeus, que o
engendrara no ventre de Alcmena.
129
O herói pode apenas ser considerado Argivo por parte da mãe,
Alcmena, descendente de Perseu.

62
O Apêndice de Planudes

96. Anónimo
Sobre o mesmo e a corça
Primeiro, em seguida e por fim, o que admirar com o espírito
e com os olhos nesta obra-prima? O homem ou a corça?
Ele, montado nas costas da besta, o peso do seu joelho lhe aplica,
segurando com as mãos os seus chifres de belas hastes;
ela, de boca muito aberta e respiração ofegante,
com a língua dá sinais do seu coração angustiado.
Alegra-te, Héracles! Resplandece agora a corça inteira,
não apenas nos chifres, mas nesta obra dourada.

97. Anónimo
Sobre o mesmo e Anteu
Este bronze plangente, quem o moldou? Quem, pela sua arte,
assim lhe deu a forma do esforço e da coragem?
A estátua está viva! Lamento o que está em apuros,
e estremeço ante a força e a coragem de Héracles.
É Anteu, vencido de todo, que ele domina com os mãos;
recurvado como está, parece até que solta um gemido.

98. Anónimo
Sobre o mesmo, ébrio
Este aqui, que agora sucumbe ao sono e aos copos,
matou quando sóbrio os Centauros ébrios130.

130
A imagem de Héracles bêbado, que víamos já na Alceste de Eurí-
pides e nas Rãs de Aristófanes, tornou-se tema frequente da estatuária a
partir da época romana. O herói, quando perseguia o javali de Erimanto,
ficou hospedado em casa do centauro Folo. Atraídos pelo cheiro a vinho,
vários centauros se aproximam e assim teve início uma luta na qual o
próprio Folo morreu.

63
Antologia Grega XVI

99. Anónimo
Sobre o mesmo
Este aqui é aquele que a todos venceu, o dos doze trabalhos
que os homens cantaram pela sua força poderosa,
ébrio após o banquete, movendo o pé ao ritmo da bebedeira,
vencido pelo amável Brómio131 que deslaça os membros.

100. Anónimo
Sobre outra estátua do mesmo
Ao ver a cabeleira, a maça, um intrépido fogo nos olhos
e o feroz franzir da sobrancelha desse homem,
procura pela pele do leão na estátua; se a encontrares,
é Héracles, e se não, é um retrato de Lisímaco132.

101. Anónimo
Sobre outra estátua do mesmo
Tal qual Teodamante no passado encontrou Héracles,
assim esculpiu o artista o filho de Zeus,
arrastando o boi do arado e erguendo a maça no alto;
apenas não plasmou a terrível imolação do boi.
Aos lábios de Teodamante acrescentou talvez um gemido
plangente, e, ao ouvi-lo, Héracles poupou o animal133.

131
Dioniso.
132
O epigrama parodia a aparência de herói épico que para si
reclamava Lisímaco, o companheiro de Alexandre que, em 304 a.C., se
tornou rei da Trácia.
133
Exilados de Cálidon, Héracles, Dejanira e o pequeno Hilo atraves-
savam a terra dos Dríopes no Parnaso. Sofrendo de fome, Héracles pediu
ajuda a Teodamante e, perante a recusa deste, imolou um dos seus bois de
arado, cozinhou-o e assim alimentou a família. O último dístico parece

64
O Apêndice de Planudes

102. Anónimo
Sobre outra estátua do mesmo
Como o Crónida nessa noite que conheceu três luas te engendrou,
como Euristeu te viu regressar triunfante dos trabalhos,
mesmo como das chamas ascendeste ao Olimpo, Alcida
de duras penas, assim te contemplamos nesta réplica134.
Neste mármore as dores de Alcmena; e as pretensões de Tebas
não passam agora de fábulas sem qualquer crédito135.

103. De Túlio Gémino


Sobre uma estátua do mesmo
– Héracles, onde está a tua maça imensa, a tua capa
de Nemeia e a aljava transbordante de flechas?
Que é feito da tua força suprema? Porque te moldou assim triste
Lisipo, plasmando no bronze também sofrimento?
Sofres pela perda das tuas armas? Quem assim te destruiu?
– O alado Eros, o único trabalho realmente penoso.

104. De Filipo
Sobre o mesmo
Finalmente, depois de tantos trabalhos, Hera quis um último,
ver o corajoso Héracles despojado das suas armas.

sugerir que o herói poupou o animal, na medida em que a imolação de


um animal submetido ao jugo, por um grego, tendia a ser interpretada
como mostra de barbárie.
134
Não há que supor a existência de três estátuas, apenas que o
poeta recupera, a partir de uma representação única, um episódio do
nascimento, da maturidade e da morte do herói.
135
I.e., o mármore “deu à luz” um novo Héracles, como não mais faz
sentido reclamar a naturalidade desse novo herói, o da escultura.

65
Antologia Grega XVI

Onde está a tua pele de leão, as flechas de estridente som


aos ombros e a maça de ponta pesada que matava feras?
De tudo te privou Eros! Não admira que ele, que de Zeus
fez cisne136, tenha conseguido desarmar Héracles.

105. Anónimo
Sobre uma estátua de Teseu e o touro de Maratona137
Que prodígio a arte deste touro e deste homem!
Ele, com força bruta e corpo inclinado, esmaga a fera;
segurando-lhe os músculos do pescoço, imobiliza-a com as mãos,
com a direita o focinho e com a esquerda os chifres,
deslocando-lhe as vértebras; e a fera, vencida pela força
dos seus braços, revolve a nuca para trás.
Quase se vê, tal a arte que há neste bronze,
a fera a sufocar e o homem banhado em suor.

106. Anónimo
Sobre uma estátua de Capaneu
Assim se tivesse Capaneu138 enfurecido contra as torres de Tebas,

136
Das suas muitas metamorfoses animais para conquistar uma
mortal, aqui o poeta refere-se à transformação do pai dos deuses para
seduzir Leda.
137
O mesmo touro que Héracles expulsara de Creta havia chegado
à Ática e assolava os campos de Maratona. Coube então a Teseu levá-
-lo para Atenas, onde o sacrificou a Apolo. A cena, presente na Métope
do Tesouro dos Atenienses em Delfos e assunto de eleição da cerâmica
ática, parece no entanto não ter tido grande fama poética no período
helenístico, porquanto apenas este epigrama versa sobre um dos trabalhos
de Teseu, contra as dezenas que tratam as aventuras de Héracles.
138
Um dos sete generais que atacou Tebas, caraterizado por Ésquilo
(Sete contra Tebas 421, 446) e Eurípides (Fenícias 117, 1172-1186) como
um blasfemador.

66
O Apêndice de Planudes

quando com a escada planeava a sua subida pelos ares,


e teria tomado a cidade pela força contra o destino. O raio
 [de Zeus,
ele próprio, se envergonharia de matar semelhante guerreiro.

107. De Juliano
Sobre um bronze de Ícaro num balneário
Ícaro, a cera te perdeu! 139 Mas agora, é pela cera
que o escultor te devolve um corpo140.
Não vás tu bater as asas nos ares e, precipitando-te
das alturas, fazer deste o balneário de Ícaro!141

108. Do mesmo
Sobre o mesmo
Lembra-te, Ícaro, que és de bronze! Mas não te iludam
a arte nem esse par de asas que levas aos ombros.
Se, quando vivias, caíste às profundezas do mar,
vais lá tu voar agora, assim feito de bronze?!

109. De Agátias, o Escolasta


Sobre uma pintura de Hipólito, conversando com a ama de Fedra
Hipólito diz ao ouvido da anciã palavras duras;

139
Ícaro despenhara-se dos céus por ousar voar muito próximo do sol
e com isso ter derretido a cera com que colara as suas asas.
140
O molde da estátua de bronze teria sido feito em cera.
141
Da mesma forma que, na lenda, deu o nome ao Mar de Ícaro.

67
Antologia Grega XVI

a nós, porém, não nos é dado escutá-lo.


Pelo que do seu olhar furioso é possível perceber,
diz-lhe que se deixe de ímpios intentos142.

110. De Filóstrato
Sobre um retrato de Télefo ferido
Este é o chefe invencível da Teutrânia143, Télefo, o que outrora
deu um banho de sangue às hostes guerreiras dos Dânaos,
enchendo até transbordar o Mísio Caíco com a matança144,
este é o homem que enfrentou a lança de Peleu145;
oculta agora na coxa uma ferida mortal e terrível, quase
[desfalecendo,
e consome-se, vivo ainda, arrastando-se em carne viva.
Mesmo ferido como está, os Aqueus tremem na sua
[presença,
abandonando desordenados as costas da Teutrânia.

142
O tema da conversa de Hipólito com a ama de Fedra, acusando-a
de inspirar a última com os seus sortilégios, ocorre na Fedra de Eurípides
a partir do verso 601. Sabemos de uma representação plástica desse episó-
dio num sarcófago de Agrigento e num fresco de Herculano.
143
A Teutrânia era a parte costeira da Mísia, correspondente a Pérga-
mo na época helenística.
144
Na primeira expedição a Tróia, os Gregos desembarcaram por
engano na Mísia, onde foram brutalmente vencidos por Télefo, o filho
de Héracles e genro de Teutras, o rei local. A imagem do rio Caíco trans-
bordando com os cadáveres dos Gregos remonta à épica da época arcaica,
sendo já legível num poema elegíaco atribuído a Arquíloco de Paros (séc.
VII a.C.), só recentemente descoberto.
145
A lança que o centauro Quíron oferecera a Peleu, por ocasião das
bodas com Tétis. Com ela Aquiles feriu Télefo, e com ela seria o último
herói curado, oito anos passados.

68
O Apêndice de Planudes

111. De Glauco
Sobre um retrato de Filoctetes
Apenas porque viu o herói de Tráquis146 que muito sofreu
Parrásio147 pôde pintar este Filoctetes148.
Em seus olhos secos mora oculta uma lágrima muda,
e no íntimo guarda uma dor que o consome.
Ó melhor dos pintores, que talento o teu! Mas já é tempo
que descanse das suas dores o homem tão sofrido.

112. Anónimo
Sobre o mesmo
Pior inimigo que os Dânaos é quem me esculpiu, outro Ulisses
que reaviva o meu mal e a minha enfermidade mortal.
Não bastassem a caverna, os farrapos, o pus, a praga e a miséria,
e no bronze teve que forjar ainda o meu sofrimento.

113. De Juliano do Egito


Sobre o mesmo
Reconheci Filoctetes ao vê-lo, pois é evidente a sua dor

146
Cidade da Tessália, onde a tradição pós-homérica situa a natura-
lidade de Filoctetes.
147
Conhecido pintor (fl. c. 397 a.C.) considerado o introdutor da
técnica do claro-escuro. Nenhuma outra referência a esta pintura se
conserva, a qual deve também estar na base do núm. 113.
148
Como se depreende sobretudo da tragédia de Sófocles a que dá
título, Filoctetes fora abandonado em Lemnos na viagem dos Gregos
para Tróia, atormentado pela chaga decorrente da morderdura de uma
serpente. Porque a sua presença – e as armas de Héracles que guardava
consigo – eram indispensáveis para tomar a cidade de Páris, os Helenos
tentaram, sem êxito, que regressasse à luta, terminando Ulisses por
roubar-lhe as armas.

69
Antologia Grega XVI

a todos que o contemplam, mesmo que de longe.


Tem barba longa como um selvagem; sobre a cabeça,
vede a cabeleira eriçada, mistura imunda de cores!
Tem a pele áspera e enrugada quando se olha,
e crespada seria se a tocasses com as mãos;
sob as pálpebras secas há lágrimas que permanecem
imóveis, sinal de uma angústia sem sono.

114. De Cosmo
Sobre Pirro, prestes a degolar Políxena
Sou Pirro, e cumpro a vontade de meu pai149. Mas esta cadela
invoca a Palas, logo ela, que tem a Páris por irmão150.

115. Anónimo
Sobre o centauro Quíron151
Alonga-se o homem em cavalo; do cavalo brota um homem,
um homem sem pés, um cavalo veloz sem cabeça;
o cavalo vomita um homem, e o homem expele um cavalo.

116. De Évodo
Sobre o mesmo
Havia um cavalo sem cabeça e um homem por acabar;
a Natureza, por puro gozo, pô-lo no veloz cavalo.

149
Aquiles.
150
I.e., invoca Atena a irmã daquele que, no passado, lhe negou a
vitória no concurso de beleza no Ida, em favorecimento de Afrodite.
151
O centauro que educou Aquiles.

70
O Apêndice de Planudes

117. De Cornélio
Sobre Cinegiro
Não como Cinegiro152, esse afortunado Cinegiro, te pintou
Fásis153, representando-te com mãos vigorosas.
Mas foi experto este pintor, pois não te amputou
as mãos, as mãos pelas quais te volveste imortal.

118. De Paulo Silenciário


Sobre o mesmo
As mãos que matavam Medos, uns machados as cortaram
sobre a popa recurvada de um navio que partia,
certo dia, Cinegiro, em que essa nave fugidia seguravas
com as mãos, como se fossem uma âncora.
Contudo, aferrando-se firmes ao madeiro do navio,
elas acompanharam os Aqueménios154, terror de morte!
Um bárbaro qualquer então as recolheu; mas a vitória
dessas mãos ficou em casa, entre os filhos de Mopso155.

119. De Posidipo
Sobre uma estátua de Alexandre da Macedónia
Lisipo, escultor Siciónio, mão arrojada,
hábil artista, há fogo na mirada deste bronze

152
Segundo Heródoto (6.114), Cinegiro foi o irmão de Ésquilo que,
tentando reter um navio persa no contexto da batalha de Maratona,
perdeu as duas mãos (cf. núm. 118).
153
Desconhecido.
154
Os Persas, a partir do seu rei ancestral, Arquemenes.
155
Os Atenienses. Mopso era um antigo rei lendário de Atenas.

71
Antologia Grega XVI

com que moldaste Alexandre. Não mais se culpem


os Persas – paz aos bois que fogem do leão.

120. De Arquelau ou Asclepíades


Sobre o mesmo
A bravura de Alexandre e toda a sua beleza Lisipo
a modelou – tal é a força deste bronze!
Parece que o bronze, olhando para Zeus156, lhe diz:
“A terra, submeto-a eu; tu, Zeus, cuida do Olimpo!”

121. Anónimo
Sobre o mesmo
Imagina que vês Alexandre, o próprio: lá estão os seus olhos,
e o bronze que reproduz a sua coragem em vida;
apenas ele subjugou ao trono de Péla157 a terra inteira,
a que os raios de Zeus desde o céu contemplam.

122. Anónimo
Sobre o mesmo
Vê este Alexandre, o filho de grande coração de Filipo
recém-nascido158, herói corajoso que a mãe Olímpia

156
Plutarco (Obras Morais 335A) menciona uma estátua de Lisipo,
escultor do séc. IV a.C. natural de Sícion, na Argólida, que represen-
tava Alexandre olhando o céu. Lisipo era, segundo Horácio (Espístulas
2.1.240), o escultor oficial de Alexandre.
157
Cidade da Macedónia.
158
Plínio (34.19, 63) refere esta estátua do recém-nascido Alexandre,
das primeiras obras de Lisipo, a mesma que Nero terá feito cobrir de ouro.

72
O Apêndice de Planudes

acaba de dar à luz! Desde o berço Ares o instruiu


nas lides guerreiras, e a Fortuna o chamou a reinar.

123. Anónimo
Moços do campo: não mais, por Héracles devorador de bois159,
estarão estas paragens à mercê de lobos famintos,
e os ladrões recusarão trilhar o seu caminho de pilhagem,
mesmo que um sono imprudente domine os camponeses.
Pois Dioniso, não sem o devido voto, neste lugar me fixou
como seu excelente aliado, a mim, Héracles160.

124. Anónimo
Não temas, caminhante, que este arco e estas flechas
recém-afiadas eu tenha tirado e colocado aos pés,
que segure na mão esta maça ou sobre os ombros
envergue esta pele de um leão fulvo!
Sei fazer mal, mas não a todos, apenas aos malvados;
e posso aliviar as penas a quem tem bom coração.

125. Anónimo
É sempre cruel o mar para o filho de Laertes161. As ondas
[inundaram
este retrato e apagaram das tabuinhas a sua imagem.

159
Héracles teria devorado o boi de Teodamas, assunto de eleição da
comédia ática. Vd. núm. 101 e nota ad loc.
160
Havia o costume de erguer estátuas de Héracles (por isso dito
alexikakos) para afugentar os lobos. Cf. AP 9.27.
161
Ulisses.

73
Antologia Grega XVI

E isso que importa, se nos versos de Homero a sua imagem


está gravada em fólios que não podem apagar-se?

126. Anónimo
Sobre o Minotauro
O rapaz, o touro de nenhuma forma completo,
o que traiu a paixão da mãe que o gerou162,
o homem metade besta, a natureza dupla,
o da cabeça de touro, a aberração dos corpos,
o que nem é touro nem homem por inteiro.

127. Anónimo
Este Trácio Licurgo163 de bronze, com uma só sandália,
quem foi que o moldou, o chefe dos Edónios164?
Junto ao cepo de Baco, vede como na sua insolente fúria
mantém acima da cabeça o pesado machado!
O aspeto denuncia a audácia antiga; e a sua raiva insolente,
mesmo no bronze, conserva aquela força de outrora.

128. Anónimo
Sobre Ifigénia
Delira Ifigénia; mas a visão de Orestes devolve-a

162
O Minotauro nascera da união entre Pasífae e o touro que o seu
esposo, Minos, mantinha no labirinto de Creta.
163
Rei mítico da Trácia. Quando Dioniso viajava com o seu cortejo
de Bacantes para a terra dos Indos, Licurgo recusou-lhe passagem pelo
seu país e, enfurecido pelo deus, matou o filho confundindo-o com um
cepo da vinha.
164
Os Trácios.

74
O Apêndice de Planudes

à doce lembrança dos laços fraternais.


Encolerizada como está, ao contemplar o irmão
o olhar se lhe revolve de piedade e furor165.

129. Anónimo
Sobre uma estátua de Níobe166
De ser-vivo os deuses me volveram em pedra; da pedra,
agora, Praxíteles167 de novo me trouxe à vida.

130. De Juliano do Egito


Sobre o mesmo
Da infeliz Níobe contemplas o verdadeiro aspeto,

165
O artista quis representar a confusão de sentimentos que assola
Ifigénia ao reconhecer, na Táurida, o irmão Orestes que acaba de chegar.
É possível que o epigrama se reporte ao quadro de Timómaco de Bizâncio
(séc. I a.C.) que descreve Plínio (34.136), sobretudo pela dualidade de
sentimentos (“piedade e terror”), se aceitarmos essa dúplice expressão
como caraterística do estilo desse pintor, a partir do exemplo da sua
Medeia. Vd. infra, núms. 135-143 e notas ad loc.
166
Níobe, filha de Tântalo, gerara com Anfíon uma numerosa
descendência, ao ponto de se vangloriar de merecer mais honras divinas
do que Leto, que apenas gerara dois filhos, Apolo e Ártemis. Como
castigo da sua insolência, os últimos dois deuses mataram todos os
seus filhos, exceto dois, um rapaz e uma rapariga. Consumida pela dor,
Níobe fugiu para junto do pai e os deuses transformaram-na em pedra.
Os núms. 129-133 podem ter relação com representações escultóricas
próximas do Grupo dos Nióbidas da Galeria dos Uffizi em Florença (séc.
I-II), provenientes da Vila Médicis em Roma, onde Níobe tenta proteger
uma filha enquanto os demais são assassinados.
167
O mais famoso escultor grego do século IV a.C., cujo apego à
figura de Níobe é testemunhado por Plínio (26.4-5). Com ele a escultura
grega evoluiu do classicismo para um certo maneirismo antecipado, so-
bretudo pelo recurso ao nu. A Praxíteles se considera, de resto, o primeiro
autor de um nu feminino integral em tamanho real. Vd. núm. 203 e nota
ad loc.

75
Antologia Grega XVI

como se chorasse ainda a morte dos filhos.


E se não lhe foi dado ter alma, não culpes por isso
o artista: retratou uma mulher já de pedra.

131. De Antípatro [de Sídon]


Sobre o mesmo
Eis a filha de Tântalo, a que duas vezes sete168 filhos gerou
de uma só barriga, vítimas devidas a Febo169 e Ártemis!
A Virgem às virgens deu morte, aos jovens o jovem deus,
e assim mataram, entre os dois, os dois grupos de sete.
Ela, outrora mãe de tão grande linhagem, dos melhores filhos,
nem um só lhe deixaram para conforto da velhice.
A mãe não foi levada pelos filhos à dolorosa tumba, como de lei,
antes foi a própria mãe quem a todos aí levou.
Tântalo, a tua língua foi fatal para ti, e para a tua filha:
ela foi volvida em rocha, e o medo de uma rocha sobre ti
[pesa170.

132. De Teodóridas
Sobre o mesmo
Acerca-te, estrangeiro, e chora ao ver as dores sem fim
de Níobe, a Tantálida que não soube conter a língua,

168
Ovídio também refere 14 filhos (Metamorfoses 6.182-183), ao
passo que, em Homero, eles eram apenas doze (Ilíada 24.602-617).
169
Apolo.
170
Contrariamente à versão tradicional do suplício de Tântalo – pa-
decer eterna fome e eterna sede, ainda que submergido em água até à
cintura e com uma árvore de fruto longe do alcance da sua mão – o poeta
segue aqui uma versão também encontrada em Píndaro (Olímpicas 1.55-
58), Platão (Crátilo 395d), Eurípides (Orestes 4) e Pausânias (10.31.4).

76
O Apêndice de Planudes

cuja prole de doze filhos jaz debaixo da terra, atingidos uns


pelas flechas de Febo, outros pelas de Ártemis.
Ela, com um aspeto que parece misturar pedra e carne,
em rocha se volve171, e chora o Sípilo172 de altos cumes.
Terrível para os mortais o mal que na língua se oculta,
cujo desfreio, muitas vezes, é causa de desgraçada.

133. De Antípatro de Sídon


Sobre o mesmo173
Porquê, mulher, elevas ao Olimpo uma mão impudente,
o cabelo divino174 de uma fronte ímpia deixando cair?
Olhando para a loucura imensa de Leto, ó fecunda mãe,
lamenta agora a tua cólera pungente e irrefletida!
Uma das tuas filhas suspira perto de ti, a outra jaz
sem vida, e contra a outra pende o duro destino.
E não é este o fim das tuas penas, pois a descendência
masculina dos teus filhos jaz igualmente morta.
Lamentando o infeliz dia do teu parto, em pedra
sem vida te volverás, Níobe tão acostumada à dor.

134. De Meleagro
Sobre o mesmo
Filha de Tântalo, Níobe, escuta o que digo, mensagem de dor!

171
Pode o epigrama referir-se a uma pintura do momento em que
Níobe está em plena transformação.
172
No Monte Sípilo, na Lídia, haveria uma rocha talhada por um ma-
nancial de água em cuja forma os locais viam a figura de Níobe plangente.
173
Crê-se que os núms. 131 e 133 devem ter servido de modelo ao
epigrama de Meleagro (núm. 134).
174
Pode referir-se ao aspeto de uma bacante.

77
Antologia Grega XVI

Aceita a mais lamentável história das tuas penas.


Solta a banda do teu cabelo, ai!, tu que para as dolorosas
flechas de Febo filhos varões trouxeste ao mundo.
Filhos já não tens! Mas isto agora o que é? Que vejo eu?
Ai, ai! Uma vaga de sangue atinge agora as tuas filhas.
Uma aperta os joelhos da mãe, outra no seu regaço
se esconde, outra cai sobre a terra, outra se recolhe no
 [teu seio;
outra apavora-se vendo a flecha, outra perante as flechas
se inclina, e a última, de olhos vivos, vê ainda a luz.
E a que antes tanto gostava de uma língua desenfreada, mãe
de carne e osso, apavorada está, dura feito rocha.

135. Anónimo
Sobre um retrato de Medeia em Roma175
A arte de Timómaco mostrou o amor e os ciúmes
de Medeia, arrastados os filhos ao seu destino.
Num momento dizia à espada sim!, em seguida não!,
buscando ora salvar, ora assassinar os filhos.

136. De Antífilo de Bizâncio


Sobre o mesmo
A mão de Timómaco, quando pintou a funesta Medeia,

175
Os núms. 135-143, já designados de “ciclo de Medeia” (K.
Gutzwiller, 2004), datáveis entre os séculos I a.C. e I, estabelecem
relação mais ou menos direta com uma pintura que representaria Medeia
no momento anterior a matar os filhos, obra prima de Timómaco de
Bizâncio que tanto filólogos como historiadores de arte relacionam com
a mais conhecida e conservada Medeia de Herculano. Sobre Timómaco,
vd. supra, núm. 83 e nota ad loc. e, sobre o ciclo de Medeia, além do
estudo de Gutzwiller, o nosso trabalho recente (Martins de Jesus, 2015a).

78
O Apêndice de Planudes

pelos ciúmes e pelos filhos atormentada,


muito se esforçou em plasmar uma dupla vontade176,
inclinada por um lado à cólera, por outro à piedade.
Em ambas teve êxito. Vede o retrato: há ameaças
nessas lágrimas, e a revolta da ira na sua piedade.
O que conta é a intenção – dizia o sábio. O sangue dos filhos
fica bem a Medeia, mas não à mão de Timómaco177.

137. De Filipo
Sobre o mesmo
Quem, Cólquida mulher sem lei, pintou a cólera no teu retrato?
Quem te fez assim bárbara, mesmo numa imagem?
Sempre anseias pelo sangue da tua prole. Desculpas-te,
acaso, com um segundo Jasão, ou outra Glauce178?
Fora, tu que mesmo na cera matas os teus filhos!
Os teus intentos, zelosa, o próprio pincel os entende.

138. Anónimo
Vede a assassina de crianças neste quadro, a da Cólquida,
vede a obra-prima que Timómaco pintou com a sua mão!
De espada em punho, cólera imensa e mirada selvagem,
uma lágrima lhe cai pelos filhos desgraçados.
Tudo ele misturou, unindo o que não pode unir-se,
buscando sempre não manchar as mãos de sangue.

176
Os epigramatistas do ciclo tendem a explorar essa mens dupla de
Medeia, em diferentes casos triunfando ora um, ora o outro lado.
177
São claras nos epigramas deste ciclo as notações estoicas que ditam
a negação de Timómaco em pintar o sangue das crianças.
178
Princesa de Corinto, também conhecida como Creúsa, por quem
Jasão abandonou Medeia.

79
Antologia Grega XVI

139. De Juliano do Egito


Sobre o mesmo
Timómaco, quando pintou Medeia, na imagem
de um corpo sem alma pôs duas almas.
Conciliando o ciúme da amante com o amor pelos filhos,
no seu olhar plasmou uma mulher atormentada.

140. Anónimo
Vê e surpreende-te, como no seu olhar convivem piedade
e cólera, vê o arco afogueado dos seus olhos,
a mão dessa mãe e dessa esposa vilmente ultrajada,
disposta ao crime por um impulso que a tomou.
Fez bem o pintor em ocultar o momento do crime, não
[querendo
manchar de dor a admiração dos que vêm o seu quadro.

141. Anónimo
Sobre o mesmo
À mulher da Cólquida que se vingou nos filhos, tonta andorinha,
como foste tu tomá-la por ama das tuas crias?
É seu o olhar que liberta um fogo assassino, sua a boca
que continuamente destila espuma esbranquiçada.
A espada, ensopou-se há pouco de sangue. Evita esta mãe
[assassina,
que mesmo na cera continua a matar a sua prole.

142. Anónimo
Sobre uma estátua da mesma
Deliras, mesmo no mármore, e a cólera do teu coração

80
O Apêndice de Planudes

se apoderou do teu olhar e te lançou no desvario.


Sequer este pedestal te detém, antes, cheia de raiva,
de novo te lançarás enfurecida contra os teus filhos.
Oh, que artista modelou esta obra, ou que escultor,
cujo talento soube levar o mármore ao delírio?

143. Antípatro [de Tessalónica]


Sobre o mesmo [retrato]
Eis um retrato de Medeia! Vede como um olho exulta de raiva,
e o outro parece amansar, compadecido pelos filhos.

144. De Arábio, o Escolasta


Sobre Atalanta e Hipómenes
É oferta de casamento ou freio à sua velocidade,
este presente que atiraste à rapariga, Hipómenes179?
A maçã vale para ambos, pois frenou o ímpeto da donzela
e era símbolo da Páfia deusa que impõe o jugo.

145. Anónimo
Sobre uma estátua de Ariadne
Não te esculpiu um mortal, antes Baco180, o teu amante,
que tal como te viu reclinada na rocha te moldou.

179
Atalanta prometera desposar apenas o homem que a vencesse na
corrida, na qual se revelara invencível. Por conselho de Afrodite (a Páfia),
Hipómenes lança-lhe em meio da competição uma maçã de ouro, a qual,
para a recolher, faz com que a jovem se atrase e perca a corrida.
180
Ariadne abandonada na ilha de Naxos por Teseu e consolada por
Dioniso, esse o assunto dos núms. 145 e 146.

81
Antologia Grega XVI

146. Anónimo
Sobre o mesmo
Estrangeiros, não toqueis esta Ariadne de mármore,
não vá ela saltar e ir em busca de Teseu.

147. De Antífilo
Sobre [um retrato de] Andrómeda181
O país é o dos Etíopes; o das sandálias aladas é Perseu,
e a que está amarrada ao rochedo Andrómeda;
a cabeça degolada é da Górgona que petrifica os homens; a
 [prova de amor,
o monstro marinho; e Cassiopeia, mulher verborreica de
 [bela prole.
Ela despega do rochedo os pés acostumados à dormência e
 [à morte,
enquanto o pretendente veste com galas de noiva o seu
[troféu.

148. De Arábio, o Escolasta


Sobre o mesmo
Foi Cefeu182 ou o pintor quem expôs Andrómeda sobre rochas?
Em verdade, julgá-lo com os olhos é ambíguo.
E o monstro, foi pintado como aqui se vê, nas côncavas
falésias, ou surgiu acaso do mar vizinho?

181
Cassiopeia era a mãe de Andrómeda. Para vingar a ousadia da pri-
meira, que ousara rivalizar com a beleza das Nereides, a segunda foi atada
a um rochedo em expiação pelo monstro marinho que assolava a Etiópia.
Foi libertada por Perseu, que venceu a besta com o poder petrificador da
cabeça da Górgona.
182
Pai de Andrómeda.

82
O Apêndice de Planudes

Estou a ver: é obra de homem talentoso; verdadeiramente hábil


o autor desta ilusão para os olhos e para os sentidos.

149. Do mesmo
Sobre um retrato de Helena
Admirável retrato da Argiva Helena, a que outrora um pastor183
raptou, desprezando a lei de Zeus Hospitaleiro.

150. [De Gémino ou Poliano]184


Eis a Políxena de Polignoto, e nenhuma mão
além da sua tocou este retrato divino,
obra irmã dessa Hera185. Vede como, rasgado o peplo,
com pudica mão tenta cobrir a sua nudez186.
Suplica a desgraçada pela vida, e em seus olhos
de donzela está toda a guerra dos Frígios.

151. Anónimo
Sobre um retrato de Dido
Vês aqui, estrangeiro, o retrato exato da ilustre Dido,

183
Páris.
184
Planudes menciona a autoria de um desconhecido Pomiano, face
ao que a edição Aldina sugere Poliano. Não obstante, a menção equivo-
cada de Policleito (escultor) por Polignoto (pintor), já notada no núm. 30
(vd. nota ad loc.) parece sugerir a autoria do mesmo Gémino também
para este epigrama.
185
A estátua criselefantina de Hera de Argos, muito famosa, ela sim
de Policleito (c. 420 a.C.).
186
Deve haver relação com a Políxena que figura na Ilioupersis que
Polignoto pintou para a Lesque dos Cnídios em Delfos, também ela
descrita por Pausânias (10.25.10) como “de véus rasgados”.

83
Antologia Grega XVI

resplandecente na sua beleza divina.


Assim era eu, e esse espírito que escutais ser o meu
não o foi jamais, mas obtive glória por obras isentas.
Jamais pus os olhos em Eneias, nem nos tempos
da chacina de Tróia ele aportou à Líbia.
Foi antes para fugir à violência das bodas com Iarbas187
que no peito cravei a espada de dois gumes.
Piérides! Porque armastes contra mim o casto Maro,
para tão falsamente atentar contra a minha virtude?188

152. De Gauradas
Sobre uma estátua de Eco ao lado de Pã
– Querida Eco, concede-me um favor! – ... favor, favor
– Amo uma moça, mas ela não me ama. – ... ama, ama
– A ocasião de agir a ocasião não a traz. – ... traz, traz
– E o quanto a amo, diz-me que lhe direi! – ... direi, direi
– Este penhor em moedas, que tu lhe dês! – ... dês, dês
– E que falta, Eco, para no amor ter sorte? – ... sorte, sorte

153. De Sátiro
Sobre uma estátua de Eco
Pelo prado dos pastores Eco sem língua canta,
imitando com voz atrasada o canto das aves.

187
Rei de um território vizinho que teria cedido a Dido as terras onde
fundar Cartago e que, apaixonado pela rainha, tentara à força desposá-la.
188
O epigrama – imitado pelo Pseudo-Ausónio (epigr. 118) – busca
recuperar a lenda antiga (pré-Virgiliana), recusando os amores com
Eneias e o suicídio por ter sido abandonada por esse troiano.

84
O Apêndice de Planudes

154. De Luciano ou Árquias


Sobre o mesmo
É uma Eco de pedra que vês, amigo, a companheira
de Pã que repetindo um som responde a cantar,
loquaz simulacro de qualquer voz, para os pastores
doce passatempo. Quanto digas, escuta-o e segue!

155. De Évodo
Sobre o mesmo
Eco, mimo das palavras, borra da voz, cauda da palavra.

156. Anónimo
Sobre o mesmo
Deusa da Arcádia eu sou, e habito junto aos portais
de Lieu189, repetindo toda a palavra pronunciada.
Já não odeio, querido Baco, o teu companheiro do thíaso190.
Vamos, Pã! Pronunciemos palavras em uníssono.

157. De Juliano, Prefeito [do Egito]


Sobre uma estátua de Atena armada em Atenas
Porque te armas, Tritogeneia, em meio da cidadela191?

189
Dioniso. Trata-se de uma estátua de Eco à entrada ou no vestíbulo
de um templo desse deus.
190
Na arte tardia, Pã é muitas vezes confundido com os sátiros e
silenos do cortejo de Dioniso.
191
A Atena Promachos, originalmente na acrópole de Atenas, era um
bronze de Fídias com nove metros de altura que, ao tempo do epigrama
(séc. VI), havia já sido transferida para Constantinopla, onde sabemos
que ainda permanecia a começos do séc. XIII.

85
Antologia Grega XVI

Posídon cedeu192 – poupa a cidade de Cécrops!

158. De Diotimo
Sobre uma estátua de Ártemis
Sou uma Ártemis como manda a lei. Se o próprio bronze diz
“Ártemis, a filha de Zeus e de nenhum outro”193,
imagina o valor desta donzela! Com razão dirias:
a terra inteira é para ela pequeno terreno de caça.

159. Anónimo
Sobre a estátua de Afrodite de Cnidos194
Quem dotou a pedra de alma? Quem viu Cípris na terra?
Um tamanho desejo no mármore, quem o plasmou?
É obra da mão de Praxíteles, a menos que, descendo do
[Olimpo,
a Páfia deusa em pessoa tenha vindo a Cnidos.

160. De Platão [o Jovem]195


Sobre a mesma
A Páfia Citereia veio pelo caminho das ondas a Cnidos,

192
Alusão à antiga luta entre Posídon e Atena pela possessão da Ática.
193
O poeta parece comentar a inscrição de uma estátua (v. 2) de
Ártemis.
194
Os núms. 159-170 (com exceção provavelmente do núm. 164) têm
relação mais ou menos direta com a conhecida Afrodite de Cnidos de Pra-
xíteles, escultor Ateniense de c. 375-330 a.C., obra que, de tão famosa, foi
cunhada em moedas e amplamente reproduzida durante a Antiguidade.
195
O tom anedótico deste epigrama (como do núm. 161) sugere mais
a autoria de Platão o Jovem.

86
O Apêndice de Planudes

desejando ver a estátua de si própria:


Examinando-a por inteiro, no altar aberto196 em que estava,
gritou: “Onde pôde Praxíteles ver-me nua?”

160b. Anónimo197
Praxíteles não viu o que não deve ver-se. Foi o cinzel
que forjou a Páfia, como outrora a desejou Ares.

161. De Platão [o Jovem]


Sobre a mesma
Não és obra da técnica de Praxíteles ou do seu cinzel;
antes te perfilas, como outrora, para o concurso198.

162. Anónimo
Sobre a mesma
Cípris, ao ver essa Cípris que está em Cnidos, disse:
“Ai, ai! Onde pôde Praxíteles ver-me nua?”

163. De Luciano
Sobre a mesma
A Páfia, nua, jamais alguém a viu. E se alguém a viu,
esse homem foi quem ergueu esta Páfia nua.

196
Plínio (36.4.21) informa que o edifício onde estava a estátua era
aberto para que todos a pudessem contemplar.
197
Epigrama independente, que Planudes uniu ao núm. 160 e outros
copistas posteriores ao núm. 162.
198
I.e. o concurso de beleza no Ida, para o julgamento de Páris.

87
Antologia Grega XVI

164. Do mesmo
Sobre a mesma
A ti dediquei199 esta imagem da tua beleza esplêndida, Cípris,
e nada mais precioso do que a tua beleza eu possuo!

165. De Eveno
Sobre a mesma
Palas e a consorte do Crónida disseram, quando a de Cnidos
lhes foi dado ver: “Sem razão censuramos esse Frígio200”.

166. [De Leónidas de Tarento]


Ainda sobre a de Cnidos
Outrora, nas montanhas do Ida, aquele pastor apenas
contemplou a que levou a palma da beleza;
Praxíteles agora a ergueu entre os Cnídios, visível a todos,
referendando a sua arte com o voto de Páris.

167. De Antípatro de Sídon


Ainda sobre a de Cnidos [e o Eros de Téspias de Praxíteles]
Dirás, se Afrodite calhares contemplar na rochosa Cnidos,
que ela, mesmo pedra, as próprias pedras inflama;

199
Este epigrama deve ser o único do ciclo (núms. 159-170) que não
se refere à Afrodite de Praxíteles, antes a outra estátua, em cuja base
estaria inscrito.
200
Páris, filho de Príamo, que nos seus tempos de boieiro fora
obrigado a decidir a qual das três deusas dar a maçã de ouro – Hera,
Atena e Afrodite –, optando pela última.

88
O Apêndice de Planudes

e do delicado Eros de Téspias201, que não apenas à pedra


mas até ao diamante inquebrável fogo atearia.
Essas divindades fez Praxíteles, uma para cada continente,
para que um duplo fogo não abrasasse tudo.

168. Anónimo
Sobre a mesma
Nua, Páris, Anquises e Adónis202 me viram; destes três apenas
tenho conhecimento. Já Praxíteles, como é possível?

169. Anónimo
Sobre a mesma, e sobre a Atena de Atenas
Contempla a beleza divina da Páfia nascida da espuma,
e dirás: “Aplaudo o Frígio do julgamento!”
Olhando agora para a Palas de Atenas, assim gritarás:
“Um rústico, esse Páris, que ousou desprezá-la!”

170. De Hermodoro
Sobre o mesmo assunto
Ao ver a Citereia de Cnidos, estrangeiro, dirás talvez:
“Esta governa sobre mortais e imortais!”
E ao ver, entre os Cecrópidas203, a Palas de lança destemida 204,

201
Sobre o Eros de Téspias de Praxíteles, vd. núms. 203-206.
202
Por Anquises, outro pastor do Ida, Afrodite nutriu uma paixão
secreta. Quanto a Adónis, passara com a deusa dois terços do ano, e o
restante com Perséfone.
203
Os Atenienses, a partir do nome do seu primeiro reio mítico, Cécrops.
204
O poeta pode estar a comparar a Afrodite de Praxíteles com a
Atena de Fídias no Parténon (séc. V a.C.).

89
Antologia Grega XVI

exclamarás: “Era sem dúvida um rústico, esse Páris!”

171. De Leónidas
Sobre a Afrodite armada205
Essas armas de Ares, Citereia, por que razão
as ostentas, um peso inútil suportando?
O próprio Ares, mesmo nua o desarmaste! Se um deus
tu venceste, em vão te armas entre os mortais.

172. De Alexandre da Etólia


Sobre a mesma
A própria Palas, creio, foi quem esculpiu esta Cípris,
esquecida já do veredicto de Alexandre206.

173. De Juliano, Prefeito [do Egito]


Sobre a Afrodite armada de Esparta
Desde sempre Citereia soube portar a aljava,
as flechas e a obra do arqueiro que atira ao longe;
mas, em obediência às leis de Licurgo207, firme no combate,
traz filtros de amor para Esparta, armas de combate
[pessoal.
E vós, Lacedemónias, venerando as armas de Cípris
em vossas alcovas, gerai filhos plenos de coragem!

205
Os núms. 171-177 versam sobre o modelo de uma estátua de
Afrodite armada, o qual teria sido famoso. Pausânias refere a existência
de uma em Esparta (3.15.10; cf. núm. 173) e de outra em Citérea (3.23.1).
206
Páris.
207
Legislador semi-lendário de Esparta, cujo encontro com a deusa
narra Plutarco (Moralia 317F).

90
O Apêndice de Planudes

174. Anónimo
Sobre a mesma
Palas, ao ver a Citereia armada, assim lhe disse:
“Assim pretendes, Cípris, ir a concurso?”
E ela, doces sorrisos: “Porquê erguer o escudo contra mim?
Se venço nua, como seria se levasse armas?”208

175. Do mesmo
Sobre a mesma
Ou o mármore se armou como Afrodite, ou foi a Páfia
que, ao ver o mármore, jurou ser igual a si.

176. De Antípatro [de Tessalónica]209


Sobre a mesma
Cípris também é de Esparta; porém, não se ergue aí,
como nas outras cidades, vestida de delicados adornos:
Na cabeça tem um casco, em vez de um véu,
e em vez de galhos dourados210 o cabo de uma lança.
Em verdade, não devia talvez estar desarmada
a amante do Trácio Eniálio211, a Lacedemónia.

208
O epigrama foi imitado por Ausónio (epigr. 647) e Pseudo-
-Ausónio (epigr. 7).
209
A tradição manuscrita atribui o epigrama ao mesmo Antípatro de
Sídon, mas Gow-Page (1968, vol. 2: 90) defenderam a sua atribuição ao
poeta de Tessalónica com o mesmo nome.
210
Alusão poeticamente disfarçada à maçã de ouro, prémio do con-
curso de beleza no Ida.
211
Ares, deus da guerra. Com Afrodite, protagonizam o mais famoso
adultério da mitologia grega: apanhados por Hefesto, o marido traído,
em pleno ato, a sua vergonha foi exposta pelo último aos demais deuses.

91
Antologia Grega XVI

177. De Filipo
Sobre a mesma
Cípris de doce sorriso, senhora do tálamo! Quem te armou,
deusa doce como mel, com essas armas de guerra?
Antes amavas o péan, o himeneu de cabeleira dourada
e os graciosos encantos das flautas de claro som.
Porque te revestes agora de adereços de morte? O intrépido Ares
acaso despojaste, para vangloriar-te do poder de Cípris?

178. [De Antípatro de Sídon]


Sobre a mesma saindo do mar
Contempla essa Cípris que surge da espuma do mar,
sua mãe, obra-prima do pincel de Apeles212;
como, segurando com as mãos o cabelo empapado
da água, escorre a espuma das suas tranças.
Atena e Hera, elas mesmas assim lhe dizem agora:
“Não mais competiremos contigo em beleza!”213

179. De Árquias
Sobre a mesma
A própria, quando saía do mar que a gerou, Cípris,
Apeles viu-a nua, na ocasião do seu nascimento.
E assim a pintou, quando com as mãos robustas escorria ainda
os cachos de cabelo ensopados da espuma do mar.

212
A Afrodite Anadiomene de Apeles, uma pintura descrita entre
outros por Plínio (HN 35.36.79–97) que Apeles teria realizado para o
Templo de Asclépio em Cós, por volta de 330 a.C. Uma anedota antiga
transmitida por Plínio sugere que Apeles teria usado, para modelo da
deusa nua, Campaspe, cortesã de Alexandre Magno.
213
O poema tem sido interpretado como uma imitação do núm. 182.

92
O Apêndice de Planudes

180. De Demócrito
Sobre a mesma
Quando Cípris, com a cabeleira a gotejar de espuma salgada,
emergiu nua de entre as ondas cor de púrpura,
embora segurando os cabelos com as mãos
junto às brancas maçãs do rosto, calcava o mar Egeu,
mostrando os seios e não mais, como é lícito. Se a deusa
é mesmo assim, há de confundir-se a cólera de Eniálio!214

181. De Juliano, Prefeito do Egito


Sobre a mesma
Acaba agora mesmo de nascer a Páfia do ventre do mar,
encontrando em Apeles a mão parteira.
Rápido, afasta-te do quadro, não te encharques na espuma
que goteja dos seus cabelos ao espremê-los!
Se Cípris era assim quando se desnudou pela maçã,
foi sem justiça que Palas devastou Tróia 215.

182. De Leónidas de Tarento


Sobre a mesma
Acabada de sair do ventre da mãe, encharcada
ainda de espuma, a Cípris dos festins nupciais,
vede como Apeles plasmou a sua beleza erótica,
não uma pintura, antes um ser dotado de vida!
Graciosa, com as mãos seca os cachos de cabelo;

Ares, encolerizado pela infidelidade de Afrodite.


214

I.e., não devia Atena ter destruído Tróia para vingar o resultado de
215

um concurso que foi afinal justo, esse das três deusas no Ida.

93
Antologia Grega XVI

graciosa, de seus olhos lampeja um tranquilo desejo;


e os seios, arautos do seu encanto, como marmelos.
E por isso Atena, ela e a própria consorte de Zeus,
hão de dizer: “Zeus, abrimos mão do concurso!”

183. Anónimo
Sobre uma estátua de Dioniso ao lado de Atena
– Diz-me, que tens em comum com Palas? Para ela aljavas
e batalhas, ao passo que tu te deleitas em banquetes.
– Não precipites, estrangeiro, tais perguntas sobre os deuses!
Sabe antes em que medida me assemelho a essa deusa.
Também eu aprecio a glória das batalhas; bem o sabe o Indo216,
por mim subjugado para lá do Oceano da Aurora 217.
A raça dos mortais dotámos ambos, ela com a oliveira,
eu com os cachos de uvas adocicadas da vinha.
E tampouco por mim uma mãe suportou as dores do parto;
eu brotei da coxa de meu pai, ela da sua cabeça 218.

184. De Antípatro [de Tessalónica]


Sobre outra estátua do mesmo
Eu, Dioniso, camarada de armas do Ausónio Pisão219,
Em boa hora aqui estou como sentinela de sua casa.

216
Dioniso e o seu cortejo de báquico penetrara na Ásia, pormenor da
lenda que, após as conquistas de Alexandre, era celebrado como símbolo
da civilização levada a esses povos.
217
O Oceano do Levante, i.e., o Oceano Índico.
218
Após a morte de Sémele, Dioniso foi enxertado na coxa de Zeus,
onde terminaria de gestar. Quanto a Atena, nascera diretamente da
cabeça de Zeus.
219
Pisão tinha fama de gostar de boa pinga (cf. Séneca, Epístulas
83.14; Suetónio, Tibério 42; Plínio 14.145).

94
O Apêndice de Planudes

– Em digna casa entraste, Dioniso! Estão um para o outro,


o palácio para Baco, e Brómio220 para o palácio.

185. Anónimo
Sobre uma estela de Dioniso e outra de Héracles
Ambos de Tebas, ambos dados à guerra e filhos de Zeus;
um terrível com o tirso, o outro com a maça.
Unidas estão as suas estelas; semelhantes as suas armas:
pele de cervo contra a de leão, címbalos221 contra o
[chocalho222.
Hera foi para ambos cruel divindade; e, por meio do fogo223,
ambos ascenderam da terra para junto dos imortais.

186. De Xenócrito224
Sobre uma estátua de Hermes
Hermes, o veloz, assim me chamo! Mas na palestra 225
não me coloqueis amputado de braços e sem pernas226:
como ser veloz, como defender-me com os braços,
fixo sobre um pedestal e amputado de ambos?

220
Baco e Brómio são dois cognomes de Dioniso, ou seja, “uma boa
cabeça para um belo chapéu”.
221
Vd. núm. 59 e nota ad loc.
222
Com que afugentou as aves Estinfálidas.
223
Paralelo imperfeito. No caso de Héracles, há referência à pira na
qual foi cremado no monte Etna; quanto a Dioniso, pode aludir ao raio
de Zeus que fulminou Sémele e, em consequência, uniu literalmente o
deus à coxa de seu pai.
224
Um só poeta com este nome, de Rodes, consta da Antologia (7.291).
225
Escola de luta.
226
As hermae (estátuas de Hermes) tradicionais eram bustos sem
pernas nem braços.

95
Antologia Grega XVI

187. Anónimo
Suplicou alguém a um Hermes de madeira, e de madeira
 [ele ficou.
Depois, ergueu-o e lançou-o ao chão; foi quando, ao partir-se,
derramou ouro. Moral: muitas vezes a insolência gera benefício227.

188. De Nícias
Sobre outra estátua do mesmo
Eu, o senhor do escarpado Cileno de folhagem baloiçante,
aqui estou, guardião deste amável ginásio,
eu, Hermes! Muitas vezes os mancebos sobre mim depositam
manjerona e jacinto, outras frescas grinaldas de violetas.

189. [Anónimo ou do mesmo]


Sobre outra do mesmo228
Como guardião das suas abelhas, para bem de Pisístrato
aqui estou, deixando as encostas do Ménalo229
e vigiando agora os destruidores de enxames. Mas tu, afasta-te
destas mãos, como do ágil pontapé deste pé agreste230.

227
Cf. a fábula 119 de Bábrio.
228
O lema parece indicar, erroneamente, que o poema trata sobre ou-
tra estátua de Hermes (tou autou), quando o texto claramente identifica
a divindade celebrada como Pã. Outra possibilidade é que este tou autou
se refira ao poeta, o mesmo Nícias. A outro nível, a confusão de Planudes
pode dever-se à tradição mítica que, desde o Hino Homérico a Pã, fazia de
Hermes o pai desse deus (cf. n.º 229).
229
Monte da Arcádia.
230
A pata de bode de Pã.

96
O Apêndice de Planudes

190. De Leónidas
Sobre outra do mesmo [Hermes]
O pastor Mórico, para vigiar as suas cabras ergueu
este Hermes, afamado guardião dos rebanhos.
Podeis agora saciar-vos do verde pasto na montanha,
livres de cuidados com o voraz lobo.

191. De Nicéneto
Sobre outra do mesmo
Com a argila local, a mim, um comum Hermes de barro,
moldou-me o girar circundante do torno.
Sou feito de lama – não posso negá-lo! Mas aprecio,
estrangeiro, o ofício ingrato dos oleiros.

192. Anónimo
Sobre outra do mesmo
Caríssimo: não julgues tu que vês um Hermes qualquer,
um de tantos outros – eu sou a obra de Escopas231.

193. De Filipo
Sobre outra do mesmo, num jardim
– Posso tocar um repolho, ó Cilénio232? – Não, viajante!
– Que mal há por uns vegetais? – Mal não, tão só a lei
de afastar dos bens alheios as mãos do ladrão. – Está bonito!
Agora Hermes estabelece como nova lei não roubar!

231
Escultor do séc. IV a.C. Vd. supra, núm. 60 e nota ad loc.
232
Hermes, que teria nascido numa caverna do Monte Cilene, no
Peleponeso.

97
Antologia Grega XVI

194. Anónimo
Sobre uma estátua de Eros
Alguém passou este Eros de bronze de um fogo a outro
[fogo233,
ajustando-o ao tacho, um castigo para outro castigo.

195. De Sátiro
Sobre uma estátua do mesmo, agrilhoado234
O deus alado, quem assim o fez, quem com correntes agrilhoou
o rápido fogo? Quem tocou nessa aljava flamejante?
Os seus braços de rápido disparo, quem os recolheu atrás costas,
acorrentando-os desta forma a uma coluna firme?
Vão conforto para os mortais tudo isto! A alma deste artista,
não a acorrentou antes o que agora é seu prisioneiro?

196. De Alceu235
Sobre o mesmo
Quem – ato ímpio! –, te capturou e aqui te colocou
agrilhoado? Quem te amarrou os braços às costas
e forjou essa mirada pesarosa? As fechas velozes, infeliz,
onde estão? Onde está a aljava amarga e cheia de fogo?

233
O mesmo tema tratado em AP 9.773, de Páladas: Eros na pega de
um tacho ou frigideira.
234
Os núms. 195-199 reportam-se ao modelo gráfico de estátua de
Eros agrilhoado, o mesmo que encontramos em AP 5.179 (de Meleagro).
Conserva-se um conjunto de gemas helenísticas e romanas representando
esse modelo, e também o Eros que adorna a Casa de Cupido em Pompeia
(séc. I), despojado das suas armas e amarrado por Afrodite, pode obede-
cer ao mesmo modelo.
235
Deve haver um erro, porquanto o epigrama será de Alfeu.

98
O Apêndice de Planudes

Inútil foi sem dúvida o labor do escultor, que a ti, cujo ferrão
revolve os deuses, prendeu em semelhante armadilha!

197. De Antípatro [de Tessalónica]


Sobre o mesmo
Quem te amarrou as mãos ao pilar com esses nós impossíveis
de desatar? O fogo pelo fogo, a argúcia pela argúcia,
quem os tomou? Não deixes, meu doido, que as lágrimas te
[inundem
o terno rosto; tu, o que com lágrimas dos moços se compraz.

198. De Mécio
Sobre o mesmo
Chora, divindade incerta, com as mãos bem amarradas,
chora forte, derramando lágrimas que derretem o coração,
ladrão da prudência, charlatão, meu pirata da razão,
meu fogo alado, Eros, ferida invisível da alma minha!
Os teus grilhões são para os mortais alívio de dores, irracional!
Agrilhoado, aos ventos surdos lança agora as tua súplicas.
E a tocha invencível, a que acendias nos corações dos mortais,
vê agora como se apaga por efeito das tuas lágrimas.

199. De Crinágoras
Sobre o mesmo
Chora agora e lamenta, meu manhoso, com os músculos
das mãos bem amarrados – cada qual tem o que merece!
Ninguém te solta, não ponhas essa cara de coitadinho!

99
Antologia Grega XVI

Tu próprio, no passado, já trouxeste lágrimas aos olhos


dos demais, atravessando-lhes o peito com flechas amargas,
e destilaste o veneno de paixões a que não pode resistir-se,
Eros! As penas dos mortais eram para ti um passatempo,
e agora suportas o que antes provocaste – é bem feito!

200. De Mosco
Sobre um Eros com o arado
Livrando-se da tocha e das flechas, o funesto Eros
tomou o cajado de pastor e pôs a sacola às costas!
Ungindo ao jugo o pescoço paciente dos bois,
toca de plantar as sementes do trigo de Deméter.
Olhando o céu, disse ao próprio Zeus: “Fecunda as colheitas,
não vá eu pôr-te, touro de Europa, de animal do arado!”

201. De Mariano, o Escolasta


Sobre um Eros de grinalda
– Onde está o arco que levavas às costas e essas canas
aguçadas que lançavas para o centro do peito?”
Onde estão as asas? A tocha, carrasco de dores, onde está?
Porque levas três grinaldas nas mãos, e outra na cabeça?
– Não sou filho da Cípris das encruzilhadas236, não sou
 [criatura da terra
nem o rebento de um prazer mundano qualquer!
Eu sou aquele que acende no coração puro dos mortais a tocha

236
Platão (Banquete 180 sqq.) distinguira a Afrodite celeste da
Afrodite popular.

100
O Apêndice de Planudes

do conhecimento, o que leva consigo a alma da terra


 [aos céus!237
Teço as grinaldas das quatro virtudes: e posto que aqui as tenho,
uma de cada uma, coroo-me já com a primeira – a da
[Sabedoria 238.

202. Anónimo
Sobre o mesmo
Não julgues que sou do Líbano239, estrangeiro, o que se deleita
com paixões noturnas com os rapazes amantes de festa!
Não sou mais que um simples pastor, filho de uma ninfa local,
um vulgar assistente dos trabalhos do jardim240.
Por isso, e graças a este amigável solo de boa-colheita,
coroam-me quatro grinaldas, uma por cada Estação.

237
A formulação deste dístico sugere alguma assimilação de Eros à
imagem de Cristo, o que pode ter especial significado no contexto das
iniciativas pró-ortodoxas do imperador Justino II (565-574) e da esposa
Sofia.
238
O mesmo Platão (República 6.504a) identificara como quatro
virtudes a justiça, a prudência, a coragem e a sabedoria. No epigrama,
parece no entanto estar em causa as quatro virtudes cardeais dos cristãos
– justiça, temperança, coragem e prudência –, a última delas aqui identi-
ficada com a sabedoria (sophia). Impossível não ver nesta sophia (virtude)
uma alegoria facilmente decifrável da imperatriz Sofia, ela que podia ser
mecenas deste Mariano, como o era de vários outros artistas.
239
Nessa região, mais propriamente em Heliópolis, Eros e Afrodite
tutelavam cultos conhecidos pela sua licenciosidade.
240
I.e., nem o Eros celeste, nem o Eros popular.

101
Antologia Grega XVI

203. De Juliano, Prefeito do Egito


Sobre o Eros de Praxíteles241
Reclinando o pescoço orgulhoso à altura das minhas sandálias,
com as suas mãos cativas Praxíteles me modelou.
A mim, o Amor, deu-me todo o amor que escondia dentro
trabalhando o bronze, presente do seu afeto para Frine242.
E agora ela de novo me devolve ao Amor243 – é de justiça:
que os apaixonados levem o Amor ao próprio Amor.

204. [De Simónides]


Sobre o mesmo
Praxíteles, o Amor que sofreu soube retratar ao detalhe
do original, tirando do fundo do coração o modelo
e dando-me a Frine como penhor de mim mesmo. Já não lanço
os feitiços com dardos, mas com a força do olhar.

241
Praxíteles terá esculpido um Eros monumental para ser exposto
– e ao que parece alvo de culto – na ágora de Téspias. Sabemos que a
estátua foi trazida para Roma por Calígula e devolvida à sua cidade por
Cláudio, para de novo ser trazida por Nero à capital do Império, onde
teria sido destruída pelo incêndio de 80 (cf. Estrabão 9.2.25; Pausânias 9.
27. 3; Plínio 36.22). Acredita-se que o Eros de Farnese, cópia romana em
mármore de Pompeia, seja próximo do modelo do original de Praxíteles.
242
Suposta amante do escultor. Pausânias (1.20.1-2) conta a lenda
segundo a qual Praxíteles havia prometido oferecer a mais bela das suas
obras a Frine. Simulando a jovem um incêndio no atelier do artista, este
pede que se salvem apenas um Sátiro e este Eros, terminando ela por
eleger a última, só mais tarde oferecida à cidade de Téspias. O qualifi-
cativo “de mãos cativas” do verso 2 deve referir-se à prisão de amores do
escultor, escravo da sua amada.
243
I.e., ao santuário de Eros em Téspias.

102
O Apêndice de Planudes

205. De Túlio Gémino


Sobre o mesmo
Em troca de amor, Praxíteles me deu (a mim, o deus Amor)
a Frine, assim conseguindo um penhor e um deus.
Tratou ela de não recusar o artista, receando no íntimo que
 [o deus,
em resposta à arte dele, lhe lançasse flechas aliadas.
Já não teme o rebento de Cípris, mas o que é de ti rebento,
Praxíteles, sabedora de que é tua a arte sua mãe.

206. De Leónidas
Sobre o mesmo
Os de Téspias um só deus no templo de Citereia
veneram, não a cópia de outro modelo qualquer,
mas o que reconheceu Praxíteles como deus, ao vê-lo junto
a Frine, a quem o deu como penhor dos seus amores.

207. De Páladas
Sobre um Eros nu
Eros está desarmado, e é por isso que sorri e é tão doce!
não carrega nem o arco nem as flechas de fogo;
nem sem razão segura nas mãos um golfinho e uma flor:
assim segura numa mão a terra, na outra o mar.

208. Do Prefeito Gabriel


Sobre um Eros adormecido num pimenteiro
Mesmo que esteja a dormir, sem vida, ou em pleno banquete,
Eros nunca está sem a sua mordedura apimentada.

103
Antologia Grega XVI

209. Anónimo
Sobre um Eros
Tu que sopras a tocha para acender a lamparina,
vem acender a minha alma: todo eu ardo!

210. De Platão [o Jovem]


Sobre um Eros adormecido244 num bosque
Penetrando no bosque sombrio, aí vamos encontrar,
da cor que têm os vermelhos pomos, o filho de Cípris.
Não leva a aljava com flechas, nem o côncavo arco,
todos eles estão pendurados na copa das árvores;
ele, vencido pelo sono entre os botões de rosas,
dorme sorridente; sobre a cabeça, as loiras abelhas
dançam, destilando mel em seus lábios delicados.

211. De Estatílio Flaco


Sobre um Eros adormecido
Dormes, tu que provocas insones penas aos mortais;
dormes, rebento da funesta deusa da espuma nascida,
sem brandir a tocha afogueada, sem lançar a flecha
a que se não escapa do teu arco tensionado.
Sejam outros corajosos! Eu cá receio, meu insolente,
que mesmo dormido me envies um sonho amargo.

244
Os epigramas 210-212 (e, pelo lema apenas, também o 208) rela-
cionam-se com o modelo escultórico de Eros adormecido, o mesmo que
pode ter estado na origem do Eros adormecido do Museu Metropolitano
de Nova Iorque, um original (ou réplica muito próxima) de um bronze
helenístico possível de datar entre 250-150 a.C.

104
O Apêndice de Planudes

212. De Alfeu [de Mitilene]


Sobre o mesmo
Essa tocha afogueada, Eros, arrancarei da tua mão,
e dessa aljava que levas aos ombros te despojarei,
se em verdade dormes, filho do fogo, e das tuas flechas
temos, nós os mortais, por fim algum descanso.
Mas tenho medo de ti, manhoso, não vá que escondas alguma
contra mim e, no sono, tenhas por mim um sonho
[amargo.

213. De Estratão [ou de Meleagro]


Sobre Eros
Se te adornam asas velozes sobre as costas
e ao longe lanças as flechas dos arcos dos Citas,
vou esconder-me de ti, Eros, debaixo da terra. De que me serve,
se nem o todo-poderoso Hades245 escapou ao teu poder?

214. De Secundo
Sobre umas estátuas dos Amores246
Vede estes Amores a brincar com despojos, como levam aos
[ombros
robustos, com alegria pueril, as armas dos deuses:
os címbalos247 e o tirso de Brómio, o raio de Zeus,

245
Hades, senhor dos Infernos, ficou também preso de amores, no
seu caso por Deméter.
246
O modelo processional de vários Amores e as insígnias dos deuses,
mais adaptável um friso.
247
Vd. núm. 59 e nota ad loc.

105
Antologia Grega XVI

o escudo de Eniálio248 e o seu elmo de bela crina,


a aljava de belas flechas de Febo, o tridente do deus dos mares
e a poderosa maça das mãos de Héracles.
Aos mortais que nos resta, se Eros conquistou já o céu
e Cípris despojou os imortais das armas de cada um?

215. De Filipo
Sobre o mesmo
Tendo pilhado o Olimpo, vede como estes Amores se adornam
como as armas dos imortais, exultantes com tais despojos!
Levam o arco e as flechas de Febo, o raio de Zeus,
o escudo e o elmo de Ares, a maça de Héracles,
a lança de três pontas do deus dos mares e o tirso de Baco,
as sandálias aladas de Hermes e as tochas de Ártemis.
Não é vergonha que os mortais se dobrem às armas dos Amores,
se os deuses lhes concederam adornar-se com suas armas.

216. De Parménio
Sobre uma estátua de Hera
O Argivo Policleito249, o único que com seus olhos a Hera
contemplou, e tal qual a viu soube representá-la,
aos mortais mostrou a beleza que cabe mostrar; as formas
que sob as pregas se ocultam, essas são só para Zeus.

248
Ares.
249
Policleito de Argos (n. c. 420 a.C.) foi autor de uma famosa estátua
de Hera para o seu templo nessa cidade, como testemunham Pausânias
(2.17.4), Filóstrato (Vida de Apolónio 6.19.2) e Marcial (10.89).

106
O Apêndice de Planudes

217. Anónimo
Sobre uma estátua da Musa [Calíope]
Calíope250 é o meu nome! Ciro251 presenteei com o meu seio,
o que nutriu o divino Homero e do qual bebeu o doce Orfeu.

218. De João Barbúcalo


Sobre um retrato da mesma252 Calíope
Quis o artista pintar um retrato de Melpómene253,
mas, na ausência desta, pintou Calíope.

219. Do mesmo
Sobre um retrato de Polímnia
É teu este retrato, Polímnia 254, e tu própria o és da Musa:
é que partilhais o nome, e também o aspeto.

220. De Antípatro [de Sídon]


Sobre um grupo escultórico das Musas
Nós, as três Musas, aqui estamos! Uma leva a flauta
nas mãos, outra o bárbiton255, a última a lira.

250
Calíope, para os Helenísticos a musa da poesia lírica, aqui identi-
ficada com a poesia em geral.
251
Ciro de Panópolis, no Egito (possivelmente o pai de Paulo Silen-
ciário), fez carreira durante o governo de Teodósio II, tendo sido prefeito
dessa cidade em 439 e cônsul em 441.
252
Erro quase certo do lema de Planudes. Deve tratar-se não da musa
Calíope, mas de uma atriz trágica homónima, para quem conservamos
dois epitáfios de Juliano de Egito (AP 7.597, 598).
253
Musa da tragédia.
254
Patrona da poesia lírica e, mais tarde, da pantomima.
255
Instrumento de várias cordas semelhante à harpa, cuja invenção é

107
Antologia Grega XVI

A que é obra de Aristocles leva a lira, a de Ageladas


o bárbiton, a de Cânaco256 as canas musicais257.
A primeira dá as regras do tom, a segunda as cores
da melodia, e a terceira inventou a harmonia 258.

221. De Teeteto, o Escolasta


Sobre a Némesis259 dos Atenienses
Sou o mármore da cor da neve que, da montanha onde as rochas
sempre crescem, com seus cortantes instrumentos
[arrancou
o escultor Medo260, levando-me através do mar para moldar
[estátuas,
insígnias comemorativas da vitória sobre os Atenienses.
Mas quando Maratona ressoou com a chacina dos Persas
e as embarcações cruzaram as vagas do mar cor de
[sangue,
na forma de uma Adrasteia 261 me moldou Atenas, mãe de
[heróis,

atribuída a Terpandro, poeta lírico da primeira metade do séc. VII a.C.


(cf. Píndaro, fr. 125 M-W).
256
Três escultores do final do século VI a.C.
257
O que vulgarmente designamos de flauta consistia, para os Anti-
gos, em duas canas talhadas unidas por uma ligadura de couro.
258
Referência aos três modos musicais tradicionais da pantomima
helenística e imperial: o diatónico, o cromático e o enarmónico.
259
Os núms. 221 e 222 referem-se a uma estátua colossal de Némesis, obra
de Agoracrito de Paros que, segundo Pausânias (2.33.2), teria sido erguida na
colina de Ramnunte por volta do ano de 430 a.C., em celebração da vitória
sobre os Persas, porém elaborada com mármore que os vencidos, confiantes
numa vitória que acabaria por não ser sua, haviam mandado vir de Paros. A
cabeça dessa estátua conserva-se no British Museum (inv. 1820, 0513:2).
260
Os Medos são os Persas.
261
Originalmente uma divindade Frígia, filha da Necessidade, en-
carna a vingança divina e cedo passou a ser identificada com Némesis.

108
O Apêndice de Planudes

essa deusa sempre hostil para com os mortais orgulhosos.


Contrabalanço as esperanças dos mortais! Sou, numa palavra,
Vitória para os Erectidas262 e Némesis para os Assírios.

222. De Parménio
Sobre a mesma
Eu, o rochedo que os Medos queriam para seu troféu,
em boa hora me foi dada a forma de Némesis,
a deusa justa que tem assento nas costas de Ramnunte,
para a Ática insígnia da vitória e da sua arte.

223. Anónimo
Sobre uma estela de Némesis
Némesis nos adverte, com a sua régua e o seu freio,
a nada fazer sem medida e nada dizer sem freio.

224. Anónimo
Sobre a mesma
Eu, Némesis, seguro uma régua. Perguntarás porquê?
Pois a todos proclamo: “nada além da medida!”

225. De Arábio, o Escolasta


Sobre uma estátua de Pã263
Talvez escutemos claramente a Pã tocando a sua flauta,

262
I.e. os Atenienses, descendentes de Erecteu.
263
Primeiro de um grupo de dez epigramas (núms. 225-226 e 228-
235) sobre Pã.

109
Antologia Grega XVI

pois na estátua o escultor inflou um sopro de vida!


Porém, quando impotente via fugir-lhe a instável Eco,
recusou o deus o som sem propósito264 da flauta.

226. De Alceu [de Messene]


Sobre a mesma
Pã montanhês! Entoa com lábios doces a canção,
entoa, entregue ao deleite, a flauta dos pastores,
derramando a melodia do teu cálamo harmonioso
retumba a canção, afinando palavras e harmonia;
e que ao redor, na cadência do ritmo, possam dançar
os pés inspirados dessas Ninfas dos rios.

227. Anónimo
Sobre o mesmo265
Tombado aqui, caminhante, na relva deste prado verde,
descansa os membros cansados de penosa fadiga,
aqui, onde o pinheiro, agitado pelos sopros do Zéfiro,
te encantará, enquanto escutas a melodia das cigarras
e o pastor que, pelas montanhas, quando o dia vai a meio,
toca flauta junto à fonte, à sombra do plátano frondoso.
Longe do calor da canícula estival266, terás em troca a frescura
deste bosque267. Aceita este conselho de Hermes!

264
Porque Eco, a ninfa por quem se apaixonara, deixara de lhe
replicar a melodia.
265
O lema de Planudes refere uma estátua de Pã, mas o epigrama devia
ser a inscrição de uma estátua de Hermes, como se depreende do verso 8.
266
Constelação do pico do verão, o período de máximo calor.
267
O final do hexâmetro e o início do pentâmetro do último dístico
são muito corruptos, tendo levado a diversas correções textuais. Segui-
mos a leitura de Aubreton.

110
O Apêndice de Planudes

228. De Ânite
Sobre o mesmo268
Caminhante! Sob esta rocha alivia os membros cansados!
Doce ressoa a brisa por entre a verde folhagem;
E bebe água fria desta fonte – para os transeuntes
resulta agradável tal paragem no pico do Verão.

229. Anónimo
Sobre um retrato de Pã
Do mesmíssimo Zeus eis aqui o mais amado rebento:
disso dá testemunho a nuvem que tem em cima.
O soberano Hermes, Zeus que ajunta as nuvens o gerou;
e de Hermes descende este Pã269, o condutor de ovelhas.

230. De Leónidas
Sobre outro Pã
Não bebas, viajante, da água quente desta fonte,
cheia como está do lodo dos pastos!
Sobe um pouco mais a montanha, lá onde pastam
os rebanhos, e junto ao pinheiro dos pastores
acharás o murmúrio da água que brota da rocha,
uma corrente mais fria que a neve boreal.

231. De Ânite
Sobre outro Pã
– Por que razão, solitário Pã dos campos, no bosque sombrio

268
Lema tampouco coincidente com o poema. Como muito, pode
aludir a uma estátua de Pã.
269
Cf. núm. 189 e nota ad loc.

111
Antologia Grega XVI

te sentas e fazes vibrar essa flauta de doce voz?


– Para que nos montes orvalhados os novilhos possam pastar,
alimentando-se dos rebentos da vegetação que dá vida.

232. De Simónides270
Sobre outro Pã
Sou Pã de pés-de-bode, o Arcádio, inimigo dos Medos
e aliado dos Atenienses, e erigiu-me Miltiades.

233. De Teeteto, o Escolasta


Sobre o mesmo
Criatura dos bosques, amante de árvores, esposo de Eco dos
[montes,
o que tudo vê, guardião dos rebanhos de belos chifres,
sou Pã de pernas peludas, deus fecundo que deixou a pátria 271
para enfrentar na batalha a lança dos Assírios,
erigido por Miltiades como aliado na luta contra os Persas
aqui me ergo, em homenagem ao meu auxílio voluntário.
Para outros as cidadelas! Maratona, o carrasco dos Persas,
é coisa minha e dos mesmos veteranos de Maratona.

234. De Filodemo
Sobre outra estátua de Pã
Três imortais alberga este mármore: a cabeça denuncia

270
Planudes atribui este dístico a Simónides, e pode de facto tratar-se
da dedicatória de uma estátua mandada erguer por Miltiades após a
batalha de Maratona. Como sempre ocorre com as atribuições aos poetas
arcaicos e clássicos na Antologia, no entanto, a autoria não é segura.
271
O Parténio da Arcádia.

112
O Apêndice de Planudes

claramente que sou Pã, o dos chifres de bode,


o peito e a barriga que devo ser Héracles; o resto, coxas
e flancos, assentam mais a Hermes de pés alados.
Sacrifica pois sem medo, estrangeiro! Uma só oblação
tua por nós, três divindades, será recebida.

235. De Apolónio de Esmirna


Sobre outra estátua de Pã
Eu sou o deus dos rústicos! Porque me dirigis então libações
em taças de ouro? Porque derramais vinho do Brómio272
[Itálico
e amarrais os pescoços curvos dos touros ao meu pedestal?
Deixai-vos disso! Não me dão prazer esses sacrifícios.
Eu sou Pã, o montanhês feito todo em madeira, o que devora
cordeiros e bebe vinho novo de uma taça de barro.

236. De Leónidas ou Perito


Sobre uma estátua de Priapo
Aqui, junto ao cercado, foi Dinomenes colocar-me,
um Priapo sem sono para guarda dos legumes.
Vê, gatuno, como estou ereto! Dirás tu: “Isso tudo
por um punhado de legumes?” Sim, por um punhado!

237. De Timnes
Sobre o mesmo
A todos priapizo, venha Cronos em pessoa; ladrão algum

272
Cognome de Dioniso.

113
Antologia Grega XVI

distingo de quantos se acercam a esta horta!


“Que exagero falar assim por uns legumes e umas abóboras”,
alguém dirá. Um exagero, sim, mas digo-o na mesma!

238. De Luciano
Sobre outro Priapo
Para nada, nada mais que por ser moda, Eustóquides aqui
me pôs, a mim, Priapo, guardião destas videiras secas;
profundo penhasco tenho à volta. Quem quer que se aproxime,
nada tem para roubar além de mim, o seu guardião.

239. De Apolónides
Sobre outro [Priapo]
Anaxágoras273 me dedicou, um Priapo que não está de pé
mas que com ambos joelhos se apoia sobre a terra;
Firómaco274 me fez. Vendo perto de mim um recinto das
[Graças,
não mais perguntes porque estou assim prostrado.

240. De Filipo
Sobre outro [Priapo]
– Que figos madurinhos vejo eu?! Permites-me que colha
um punhado deles? – É que nem lhes toques!
– Mas que Priapo irritadiço! – Repete lá isso, e nada levarás!

273
Indivíduo desconhecido.
274
Famoso escultor e pintor ateniense (fl. c. 200 a.C.), para os Hele-
nísticos dos melhores retratistas.

114
O Apêndice de Planudes

– Imploro-te, dá-me! – Também eu quero muita coisa!


– Diz-me então que queres de mim! – O ditado diz assim:
“toma lá, dá cá”. – Então tu, um deus, pedes pagamento?
– O que eu quero é outra coisa. – E que coisa? – Podes comer
os meus figos, se a gosto eu te comer o figo traseiro275.

241. De [Marco] Argentário


Sobre o mesmo
Está maduro, bem o sei, viajante; deixa-te lá de elogiar
o figo, nem atentes no galho que tens ao lado!
Eu, Priapo, o de olhar muito penetrante, estou aqui erguido,
e destes figos sou um guardião como manda a lei!
Um só figo que toques, e o teu outro figo terás de dar-me,
pois para tudo a igualdade é a regra mais justa.

242. De Erício
Sobre o mesmo
Que dura e bem apetrechada, Priapo, está a arma
que te brota toda empalmada das virilhas,
pronta para o amor! Tens sede de mulheres,
meu caro, e o coração todo te arde em desejos.
Trata mas é de acalmar esse teu falo inchado,
e oculta-o sob a clâmide florida que levas!
Não habitas um monte deserto, antes guardas, nas costas
do Helesponto, a sagrada Lâmpsaco276.

275
Jogo de palavras com o duplo sentido de ischas, significando tanto
“figo (seco)” como “ânus” (no último caso, como no epigrama seguinte
e AP 12.239).
276
Cidade grega da Ásia Menor, atual Lapsaki, passo marítimo entre

115
Antologia Grega XVI

243. De Antístio
Sobre o mesmo
Aqui me ergo, rústico guardião em prados muito férteis,
guardando a cabana e as sementeiras de Frico277,
e a todos digo o seguinte: “Finda a gargalhada por ver
o meu armamento, segue o teu próprio caminho!
Mas se transgrides o que é lícito, de nada te valerão
os pelos278 – a todos sem distinção eu sei penetrar!

244. De Agátias, o Escolasta


Sobre a pintura de um Sátiro que, com a flauta ao ouvido,
parece escutar algo
“Será que a tua flauta toca por si mesma, pequeno Sátiro,
ou porque inclinas tua a orelha e a encostas à cana?”
Ele sorriu e ficou em silêncio; poderia até ter falado,
não estivesse ausente, presa do encantamento.
Não que a cera o impedisse; era vontade sua esse silêncio,
pois a alma inteira entregara às lides da flauta.

245. De Leôncio, o Escolasta


Sobre outro Sátiro
Dioniso, vendo o Sátiro afligido por dor tamanha 279,

o Egeu e o mar de Mármara, i.e., entre a Ásia e a Europa.


277
Desconhecido. O nome é bastante raro.
278
Os pelos eram, no código homoerótico da poesia grega, sinal de
degredo do corpo masculino e motivo de recusa de um amante. Isso se lê
a cada passo nos epigramas do livro XII da Antologia, a Musa dos Rapazes,
por nós publicada nesta coleção.
279
Provavelmente alude ao modelo plástico do sátiro que espetou um
espinho no pé.

116
O Apêndice de Planudes

dele compadecido transformou-o em pedra.


Mas nem assim pôs fim às suas dores pesadas:
sofre ainda o infeliz, mesmo em pedra volvido.

246. Anónimo
Sobre outro Sátiro
Ou um Sátiro se ocultou dentro do bronze, ou foi o bronze,
forçado pela arte, que se moldou à volta de um Sátiro.

247. De Nilo, o Escolasta


Sobre o retrato de um Sátiro num mosaico de Antioquia
– Todos os Sátiros gostam de galhofa; diz-me então tu,
vendo cada um deles, porque te partes a rir?
– Rio maravilhado, como é que, juntando uma pedra daqui
e outra dali, me fui eu transformar num Sátiro.

248. De Platão280
Sobre outro Sátiro
Este Sátiro, Diodoro adormeceu-o, não o cinzelou!
Espeta-o, e logo o acordarás – a prata tem sono dentro.

280
Não se trata nem do filósofo clássico, nem de Platão o Jovem, antes
de um poeta desconhecido a quem Planudes atribui outro epigrama (AP
9.826) que descreve um grupo escultórico de um Sátiro e um Eros ador-
mecidos. Plínio (33.55.156) alude a esta escultura e atribui o epigrama a
Antípatro.

117
Antologia Grega XVI

249. Anónimo
Tu que contemplas esta bela estátua, meu amigo,
perto dela toma assento e venera Afrodite!
E louva Glícera, a filha de Dioniso, que me dedicou
junto às ondas quietas da praia cor de púrpura.

250. Anónimo
O Eros alado, vede como destrói o alado raio,
prova de um fogo mais forte que o fogo.

251. Anónimo
Em frente de um Eros alado outro alado Eros281 modelou
Némesis282, um arco para combater outro arco,
para que sofra quanto fez sofrer; e o valentão, nunca antes
vencido, chora por provar a violência das flechas;
três vezes cuspiu nas pregas da veste283. Espanto sem fim:
um fogo consome outro fogo, Eros ataca outro Eros.

252. Anónimo
Também eu sou do sangue de Cípris!284 Contra meu irmão
 [minha mãe

281
Pausânias (6.23.3) menciona o culto, em Élis, de Anteros, em cujo
ginásio um dos frisos representava, juntos, Eros e Anteros.
282
Némesis, divindade tutelar da vingança divina, é dita mãe de
Anteros, ou simplesmente a escultora simbólica desta sua representação
plástica. Esse deus, contraponto necessário de Eros, era também ele, na
mitologia, filho de Ares e Afrodite.
283
Gesto comum para evitar o mau-olhado (e.g. Teócrito 6.39, 7.126-
127; Plínio 28.36; AP 12.229).
284
Outro Anteros, aqui dito filho da mesma Afrodite.

118
O Apêndice de Planudes

permitiu que também eu usasse um arco e tivesse asas.

253. Anónimo
– Ártemis, onde está o teu arco, a aljava que levavas às costas,
onde estão as tuas botas de caça de Licasto285,
e o broche cinzelado em oiro que à altura dos joelhos286
te prendia enrolado o vestido da cor da púrpura?
– Esse o meu equipamento de caça; para os sacrifícios
vou tal qual sou, para receber as sagradas oblações.

254. Anónimo
Um monte de pedras consagrado a Hermes287 ergueram
 [neste lugar
os que por mim passam. E eu, em troca de pequena graça,
grande graça tampouco lhes ofereço; digo-lhes que faltam
sete estádios ainda para chegar à Fonte do Bode.

255. Anónimo
Caminhante, não te aproximes das vinhas,
das maçãs nem de onde estão as nêsperas!
Passa antes de largo, junto dessa corda,

285
Cidade no sul de Creta que devia ser especializada no fabrico deste
tipo de calçado.
286
Foi em finais do século IV a.C. que se fixou este modelo de vestido
mais curto da deusa, o mesmo que encontramos na Diana Caçadora (dita
de Versailles) do Museu do Louvre (inv. MR152; Ma589), um mármore
de dois metros de altura da época tardo-imperial (séc. I-II).
287
O Hermaios, consagrado a Hermes, não era mais que um marco
da distância nos caminhos.

119
Antologia Grega XVI

para não perturbar ou estragar nada quanto


a duras penas conseguiu Mídon, o jardineiro
que aqui me pôs. Se não me deres ouvidos,
saberás como Hermes288 castiga os malvados.

256. Anónimo
Um terreno escarpado e deserto ocupo, caminhante;
não sou eu, mas Arquéloco, o responsável de estar aqui.
Hermes não é dado a montanhas nem locais acidentados,
muito mais lhe agradam, meu caro, os caminhos.
Mas Arquéloco, viajante, homem dado à solidão e sem vizinhos,
também a mim teve de erigir-me ao seu lado.

257. Anónimo
Pelo fogo, Dioniso, quando por segunda vez289 nasceste
no bronze, um segundo parto te concedeu Miro.

258. Anónimo
Junto ao santuário em chamas de Dictina 290, um Cretense
me erigiu, assim em bronze, um Pã de pés-de-bode.
Uma pele envergo e dois cajados e daqui, do pedestal
desta gruta, lanço dupla mirada sobre a montanha.

288
Também de Hermes é a função de vigia (cf. núms. 11 e 193), como
de Priapo (cf. núms. 236-243).
289
Vd. núm. 183 (v. 10) e nota ad loc.
290
Divindade Cretense assimilada a Ártemis.

120
O Apêndice de Planudes

259. Anónimo
Do mármore de Paros, junto à cidadela de Palas291
me erigiram os Atenienes, um Pã vitorioso.

260. Anónimo
Se eu, Priapo292, calho ver-te pondo o pé perto dos legumes,
hei de despir-te, ladrão, mesmo aqui ao lado do muro.
Dirás que é vil ofício para um deus. É vil,
bem sei; sabe tu também que para isso aqui me ergueram.

261. De Leónidas
Na encruzilhada de dois caminhos me ergo, eu, Priapo,
guardião de bastão empalmado saindo das virilhas.
Ergueu-me Teócrito como fiel vigia. Por isso fica longe,
ladrão, não vá que chores ao receber o meu membro!

262. Anónimo
O de pés-de-bode que alto ergue a sua pele, as Ninfas
sorridentes e a bela Dânae são obra de Praxíteles293;
todos de mármore e perfeitos – hábeis mãos! A Censura 294

291
Atena. O verso refere-se, metonimicamente, à cidade de Atenas.
292
Este epigrama e o seguinte fazem grupo com os núms. 236-243,
também sobre Priapo.
293
Não é claro se se trata de um grupo escultórico ou de várias estátuas,
mas sabemos da predileção de Praxíteles pela primeira modalidade. Sobre
o artista, vd. nota ao núm. 129.
294
No original, Momos é a filha da Noite e irmã das Hespérides que
personifica a Censura. Vd. núm. 265. A presença desta divindade, igual-
mente em posição final no hexâmetro, num epigrama de Calímaco (fr.
393 Pfeifer), torna possível a autoria desse poeta para o presente poema.

121
Antologia Grega XVI

em pessoa dirá: “Zeus pai, que arte sem mácula!”

263. Anónimo
Os Persas aqui me trouxeram, em tempos, como mármore
para erguer o troféu da vitória; e agora sou Némesis295.
Em honra de ambos me ergo enfim: troféu da vitória
dos Helenos, para os Persas a vingança da guerra.

264. Anónimo
Para Ísis, mãe das colheitas e das espigas, deusa de mil formas,
num cesto de pedra que dispensa as agruras dos arados,
por si próprios avançam os frutos para a mãe que é deles296.

264b. Anónimo
Às Ninfas vai esta estátua dedicada – delas é devota esta terra!
Devota seja, e das fontes emane uma corrente que não seca.

265. Anónimo
A que lamenta todos os sucessos, a três vezes maldita Censura,
quem foi que com mãos incensuráveis a modelou?
Essa velhaca, lançando-se sobre o solo como um ser vivo,
descansa das suas penas, sentindo o peso dos membros.

295
Vd. núm. 221 e nota ad loc.
296
Na época Helenística, Ísis é frequentemente associada a distintas
divindades gregas. No caso, parece clara a imagem de Deméter com a
cornucópia.

122
O Apêndice de Planudes

Denuncia-a a dupla fileira terrível dos seus dentes,


rangendo ante a felicidade dos que lhe estão próximos.
De um lado sustenta o peso esquelético do seu corpo,
apoiando sobre a mão de velha 297 a cabeça careca,
e do outro, rangendo os dentes, planta o cajado na terra,
lutando sem sentido contra uma pedra sem vida.

266. Anónimo
Rói bem essas unhas nefastas, Censura que tudo devora,
rói rangendo os maxilares envenenados.
Denunciam-te os tendões rígidos, as veias das articulações,
a vitalidade desprovida de carne que fica sem vida
e os tufos de cabelo eriçado que te rodeiam a testa enrugada
[...]
Que artista com a sua técnica moldou tal praga animada,
sem deixar espaço para as mordeduras da tua boca?298

267. De Sinésio, o Escolasta


Sobre um retrato de Hipócrates299
– De onde é quem te dedicou? – De Bizâncio. – O seu nome?
– Eusébio300. – E tu quem és? – Hipócrates de Cós301.
– E porque te pintou a ti? – Graças aos seus discursos, a cidade
lhe concedeu a honra de pintar o meu retrato.

297
Em grego, Momos é uma divindade masculina.
298
Mesmo esta estátua da Censura é incensurável.
299
Os núms. 267-274 formam uma série de epigramas sobre médicos
antigos.
300
Um desconhecido, provavelmente autor de obras sobre Hipócrates
e a arte médica.
301
C. 460-372 a.C. Dele conservamos um conjunto de bustos.

123
Antologia Grega XVI

– E porque não pintou o seu próprio retrato? – Pois honrando-me


a mim, e não a si mesmo, maior reputação ele granjeia.

268. Anónimo
As tuas palavras, Hipócrates, ou o Péan302 as escreveu,
ou tu próprio foste testemunha da sua arte de curar.

269. Anónimo
Eis aquele que desvendou os caminhos da medicina,
um Péan entre os mortais, Hipócrates de Cós.

270. De Magno, o médico303


Sobre um retrato de Galeno
Houve um tempo, Galeno304, em que graças a ti a terra,
recebendo homens mortais, imortais os criava,
e esvaziavam-se as mansões do Aqueronte de mil gemidos,
a isso forçadas pela ação da tua mão curativa.

302
Tradicionalmente epíteto de Apolo, passou a designar o filho
deste, Asclépio, deus da medicina.
303
Médico do séc. IV, provável seguidor de Galeno, a quem apenas
este epigrama é atribuído. Dele conservamos um epitáfio composto por
Páladas (AP 11.281), no qual se afirma que “veio ao mundo para devolver
à vida os mortais”.
304
C. 131-203. Exerceu medicina em Pérgamo, de onde era natural,
em Roma e, finalmente, na Ásia, de onde regressou à capital do Império
em 169, às ordens de Marco Aurélio.

124
O Apêndice de Planudes

271. Anónimo
Sobre Sosandro, médico de cavalos
O médico de humanos – Hipócrates –, e tu o dos cavalos,
Sosandro, também instruído nos mistérios da medicina,
a arte ou o nome devem trocar305: não seja um chamado
pela arte da qual era o outro o grande mestre.

272. De Leôncio, o Escolasta


Sobre um retrato do médico Iâmblico
Este é Iâmblico306, de todos o mais doce, o que à velhice
chegou de todo isento das lides de Afrodite!
Nos labores da medicina e no ensino aos outros da sua arte,
sequer aos benefícios justos jamais abriu a mão.

273. De Crinágoras
Sobre um retrato do médico Praxágoras307
O próprio filho de Febo308, ungindo as mãos com panaceia,
Praxágoras, no teu peito aplicou a ciência
da medicina que tudo cura. Por isso, a todos os males
que surgem ao cabo das demoradas febres,
como a todos os cortes na pele sabes aplicar
remédios eficazes, inspirado pela doce Epíone309.

305
Hipócrates significa, à letra, “o que domina os cavalos”, e Sosan-
dro “o que salva os homens”.
306
Médico dos governos de Justiniano I e Justino II (segunda metade
do século VI).
307
Praxágoras de Cós, fl. c. 300 a.C.
308
Asclépio, filho de Apolo.
309
Com culto centralizado em Cós e Epidauro, Epíone era considera-
da ora esposa, ora filha de Asclépio (e.g. Paus. 2.27, 29).

125
Antologia Grega XVI

Dispusessem os mortais de médicos da tua natureza,


e jamais a barca dos mortos faria a sua travessia.

274. Anónimo
Eis aqui o grande médico do imperador Juliano310,
digno de reverência, o divino Oribásio.
Teve, como a abelha, genial ideia – aqui e ali
recolher as flores dos médicos antigos.

275. De Posidipo
Sobre uma estátua da Ocasião311
– De onde é o escultor? – De Sícion. – E chama-se?
– Lisipo. – E tu és? – A Ocasião que tudo domina.
– Porque andas em pontas? – Sempre com pressa! – E porquê
esse par de asas nos pés? – É que voo como o vento.
– E essa navalha na mão direita, para quê? Para os mortais
é sinal que sou mais afiada que qualquer lâmina.
– E esse cabelo nos olhos? – Para que o puxe quem me encontrar.
– Por Zeus, porque és tu careca na parte de trás?
– Para que sempre que os meus pés alados vencem na corrida
ninguém possa, mesmo que queira, agarrar-me por trás.

310
Oribásio de Pérgamo, bibliotecário e médico do imperador Julia-
no, foi enviado à Gália em 355 e nomeado questor de Constantinopla em
361. Morreu em 403.
311
O epigrama constitui a mais completa e antiga referência à Ocasião
(Kairos) de Lisipo de Sícion (séc. IV a.C.; cf. nota ao núm. 120). Temos
testemunho de a estátua não ter estado exposta em Sícion, mas apenas
em Olímpia, onde os atletas lhe prestavam homenagem antes das provas
(Pausânias 5.14.19). Autores bizantinos tardios referem que a estátua terá
sido levada para Constantinopla, onde foi exposta no Palácio de Lausos,
ao lado do Zeus de Olímpia de Fídias.

126
O Apêndice de Planudes

– Porque te moldou, enfim, o artista? – Por vossa causa,


estrangeiro, como lição me ergueu aqui neste átrio.

276. De Bianor
Sobre uma estátua do citaredo Aríon312
Periandro foi quem ergueu esta estátua de Aríon313
e do golfinho que com ele sulcou os mares
quando esteve para morrer. Sobre Aríon, reza o provérbio:
“se os homens nos matam, os peixes nos salvam”.

277. De Paulo Silenciário


Sobre o retrato de uma citarista em Bizâncio
A tua beleza, muito a custo a mostrou o pincel. Não soube
reproduzir o doce som que dos teus lábios emana,
para que os nossos olhos e ouvidos do teu rosto e do tocar
da tua lira um mesmo encanto pudessem receber.

312
Aríon, poeta semi-lendário do tempo de Periandro a quem a tra-
dição atribui a invenção do género ditirâmbico. No momento em que re-
gressava de barco de uma competição poética na qual se sagrara vencedor,
é alvo da tentativa de assassinato dos demais tripulantes. Persuadindo-os
a que escutassem o seu último canto, nesse momento um conjunto de
golfinhos se aproxima do barco para o ouvir e, quando se lança ao mar, é
resgatado por um deles, em cujo dorso completa a viagem.
313
Periandro foi tirano de Corinto entre 625-585 a.C., e era conside-
rado um dos sete sábios da Grécia. Heródoto (1.23-24) testemunha ter
visto, em Ténaro, a sul do Peloponeso, “um pequeno ex-voto em bronze
que representava um homem sobre um golfinho”, a mesma peça que viu
Pausânias (3.25.7) volvidos 700 anos. É por isso possível que estes versos
de Bianor (séc. I a.C.) estivessem gravados na base desse artefacto.

127
Antologia Grega XVI

278. Do mesmo
Sobre um retrato de Maria, citarista e cantora
Ela tem o plectro314 da lira, ela tem o plectro do amor,
e com os dois excita ora o coração, ora a cítara315.
Infelizes aqueles a que é insensível; quantos favorece,
porém, de um faz Anquises, do outro Adónis316.
Se desejas, estrangeiro, aprender o seu tão celebrado
nome e a sua pátria – ela é Maria, a de Faros.

279. Do mesmo
Sobre a pedra de Mégara que toca cítara
Lembra-te de mim, a pedra musical, sempre que passes
por Niseia. Quando Alcatoo construía a muralha
de torres317, Febo, erguendo aos ombros um bloco de pedra,
sobre ela fez descansar a sua cítara licória318.
Desde então toco lira; toca-me tu com uma pedrinha,
e logo comprovarás a melodia que emano319.

280. Anónimo
A expensas de Ágaton, neste lugar construiu um balneário
a gente de Tégea, maravilha também para os vindouros320.

314
Servia para tocar as cordas da lira. Em grego, o termo significa
também “aguilhão”.
315
Os termos gregos para cítara e lira são usados indistintamente,
como no epigrama seguinte.
316
Ambos amados por Afrodite. Cf. núms. 168 (e nota ad loc.), 337 e 357.
317
Quando os Cretenses atacaram Mégara, Alcatoo (filho de Pélops)
reconstruiu a cidadela com o auxílio de Apolo.
318
I.e. délfica, a partir de Licoro, filho de Apolo e um dos fundadores
míticos do Santuário de Delfos (Pausânias 10.6.3).
319
A lenda vem em Pausânias (1.42.2), que a tem por semelhante à do
Tebano Colosso de Mémnon.
320
Destruída por completo em 396, Tégea foi completamente

128
O Apêndice de Planudes

281. Anónimo
Sobre um balneário em Prineto321
Não era antes um balneário o que hoje é um balneário,
antes uma lixeira e depósito de excrementos.
Mas agora, os que todos exaltam como prazerosos e agradáveis,
esses excede em esplendor. Em verdade Alexandre,
o bispo de Niceia322, estrela da sabedoria gloriosa,
construiu-os com os próprios bens e recursos.

282. De Páladas
Sobre as Vitórias
Nós, as Vitórias, aqui estamos, virgens sorridentes,
as que levam vitórias à cidade que ama a justiça323.
Pintaram-nos esses homens que amam a cidade,
dotando-nos com as insígnias que convêm às Vitórias.

283. De Leôncio, o escolasta


Sobre o retrato de uma dançarina324
Rodocleia, das Musas a décima e das Graças a quarta,
és a delícia dos mortais, a glória da tua cidade.
O teu olhar, os teus pés velozes como o vento, talentosos
os dedos das tuas mãos, superiores a Musas e Graças.

reconstruída pelos Bizantinos. O dialeto iónico do epigrama faz pensar


na inscrição de um balneário resultante dessa reconstrução.
321
Na Bitínia.
322
Não identificado.
323
Alexandria.
324
Os núms. 283-288, todos de Leôncio, versam sobre dançarinas (de
pantomima) famosas em Constantinopla no séc. VI.

129
Antologia Grega XVI

284. Do mesmo
Sobre o retrato de outra dançarina exibido no Sosténio325
Sou Heládia326 de Bizâncio, e ergo-me neste lugar
onde, na primavera, o povo organiza coros,
aqui, onde o estreito327 divide a terra em dois. Ambas
as margens celebraram as minhas danças.

285. Do mesmo
Sobre o retrato em ouro de uma dançarina em Bizâncio
Ninguém lançou ouro sobre Antusa; foi o próprio Crónida
que sobre ela o derramou, como outrora sobre Dânae328.
Do corpo dela não se acercou ele, pudico o seu espírito,
não fosse sem querer unir-se a uma das Musas329.

286. Do mesmo
Sobre o mesmo
O género feminino vence na dança – abram alas, rapazes!
A Musa e Heládia impuseram, ambas, essa lei;
a primeira porque inventou os ritmos do movimento,
a outra porque em tal arte alcançou a perfeição.

325
Edifício para a prática de pantomima em Constantinopla.
326
Celebrada também nos núms. 286-287, Heládia de Bizâncio surge
numa inscrição datada entre finais do séc. V e inícios do séc. VI, associa-
da à fação dos Azuis de Constantinopla.
327
O Bósforo, perto do qual se localizaria o Sosténio.
328
Zeus aproximara-se de Dânae transformado em chuva dourada.
329
I.e., não fosse cometer incesto com uma das suas filhas, com as
quais se confunde Antusa.

130
O Apêndice de Planudes

287. Do mesmo
Sobre o mesmo
Alguém cantava uma melodia nova sobre Heitor330; e Heládia,
envergando um manto, dançava ao ritmo da melodia.
Havia um misto de desejo e terror nas danças dessa Énio331,
pois com a força viril misturava a graça feminina.

288. Do mesmo
Sobre um retrato [da dançarina] Libânia
O nome do Líbano332, o corpo das Graças e o génio da Persuasão
tu tens, rapariga, e a cinta da deusa Páfia333 à volta das
[ancas.
Nas danças, porém, tal qual um Eros ligeiro te divertes,
e com tamanha beleza e arte a todos conquistas.

289. Anónimo
Sobre [...]334 Xenofonte de Esmirna
Ióbaco335 em pessoa julgávamos ver, quando as Ménades
esse velho336 dirigia com danças frenéticas de jovens,

330
Os heróis e cenas do ciclo épico eram os prediletos da pantomima
imperial e bizantina.
331
Deusa da guerra, o equivalente feminino a Ares, noutras ocasiões
dito Eniálio.
332
O nome artístico da dançarina parece provir da sua terra de origem.
333
Afrodite.
334
A lacuna no lema não permite saber se se trata da inscrição de uma
estátua ou retrato.
335
Dioniso.
336
Xenofonte interpreta primeiro o papel de Tirésias, logo de Cadmo,
do Mensageiro e de Agave, no que deve ser uma versão em pantomima
das Bacantes de Eurípides (ou de outro autor).

131
Antologia Grega XVI

fazia as danças de ancião de Cadmo, o mensageiro vindo


da floresta na pista dos cortejos báquicos,
ou Agave furiosa, gritando o seu evoé ante o sangue
do filho. Céus, que divina a atuação do fulano!

290. De Antípatro [de Tessalónica]


Sobre uma estela do dançarino Pílades
O mesmíssimo deus báquico incorporava, ao dirigir
as Bacantes desde Tebas num palco italiano
esse Pílades, prazeroso temor para os homens, pois a dançar
a cidade inteira enchia do deus do vinho puro.
Tebas conhece o que nasceu do fogo; mas divino
é este outro, que com mãos expressivas cobra vida337.

291. De Ânite
Ao hirsuto Pã e às Ninfas que habitam as grutas dedicou
este presente Teodoto, no topo da montanha,
pois às duras penas do calor estival puseram fim,
oferecendo-lhe das suas mãos a doce água.

292. Anónimo
Sobre um retrato de Homero338
Filho de Meleto, Homero, sobre a Hélade inteira

337
Esse “outro” Dioniso é o resultado do engenho de Pílades na mímica.
338
Os núms. 292-304 constituem uma série sobre Homero e os seus
dois poemas. Quanto ao presente epigrama, o lema de Planudes apenas
refere “um retrato” de Homero, mas é tentador aceitar a sugestão de
Dübner, para quem o epigrama estaria inscrito à cabeça de uma edição
dos dois poemas, após uma gravura do poeta – o que, de resto, concordaria
com o lema de alguns manuscritos, “sobre os dois livros de Homero”. De
ser assim, seria este o único epigrama da série que teria sido uma inscrição.

132
O Apêndice de Planudes

e Cólofon, tua pátria, derramas a glória eterna,


e estas as duas filhas que com alma divina geraste,
escrevendo desde o coração as colunas gémeas.
Uma celebra o regresso de Ulisses que tanto errou,
a outra Ílion e a guerra dos Dardânidas339.

293. Anónimo
Sobre Homero
Quem foi que a guerra de Tróia gravou nestas colunas,
quem contou a demorada errância do filho de Laertes?
Não acabo de acertar no seu nome ou cidade. Zeus Urânio,
acaso Homero retira a glória dos teus próprios versos?

294. Anónimo
Sobre o mesmo
Em que cidade devemos inscrever como cidadão
a Homero340, a quem todas as cidades lançam mão?
Eis um mistério, mas esse herói semelhante aos imortais
às Musas deixou uma pátria e uma família.

295. Anónimo
Sobre o mesmo
Não foi a planície de Esmirna que deu à luz o divino Homero,
nem Cólofon, não, a estrela da Iónia luxuriante,

339
Ílion é outro nome para Tróia, e os Dardânidas são os Troianos.
340
Na Antiguidade, diversas cidades – cedo organizadas num grupo
mais ou menos estável de sete (cf. núms. 297-298) – disputavam a natu-
ralidade de Homero, mostra simbólica de poder.

133
Antologia Grega XVI

nem Quios, o fértil Egito, a pura Chipre,


a ilha rochosa que foi pátria do filho de Laertes,
a Argos de Dânao, a Micenas dos Ciclopes
ou a cidade dos ancestrais filhos de Cécrops341.
Homero não é sequer fruto da terra! Foi do céu que o enviaram
as Musas, para aos mortais conceder os dons desejados.

296. De Antípatro [de Tessalónica]


Sobre o mesmo
Dizem uns, Homero, que Cólofon foi quem te criou,
outros que foi a bela Esmirna, outros Quios,
outros Ios, outros proclamam a afortunada Salamina,
outros a Tessália, mãe dos Lápitas.
Uns referem uma terra, outros outra. Mas se é necessário
publicamente revelar os vaticínios de Febo,
a tua pátria vem a ser o imenso céu, e não te gerou
mulher mortal, antes é Calíope342 a tua mãe.

297. Anónimo
Sobre o mesmo
Sete cidades se enfrentam pela ascendência de Homero:
Cime, Esmirna, Quios, Cólofon, Pilos, Argos e Atenas.

341
Atenas.
342
Das nove Musas, filhas de Zeus e Mnemósine, Calíope tutelava
a poesia épica.

134
O Apêndice de Planudes

298. Anónimo
Sobre o mesmo
Sete cidades afiançam ser a douta ascendência de Homero:
Esmirna, Quios, Cólofon, Ítaca, Pilos, Argos e Atenas.

299. Anónimo

Sobre o mesmo
– Natural de Quios? – Não digo! Então, de Esmirna? – Nego!
– Cime ou Cólofon, alguma delas é a tua pátria, Homero?
– Nenhuma delas. – É Salamina a tua cidade? Tampouco nessa
eu nasci. – Diz-nos então tu próprio onde nascente!
– Não direi. – E porquê? – Bem sei que se indicar uma
sobre as costas sentirei o peso do ódio das demais.

300. Anónimo

Sobre o mesmo
Pelos séculos dos séculos, Homero, se te há de cantar,
tu que elevas a glória da Musa celeste!
Tu cantaste a cólera de Aquiles, a confusão das naus
dos Aqueus que rodopiavam aqui e ali no mar
e a vítima de longa errância, Ulisses de espírito fértil,
o esposo que Penélope com júbilo viu regressar.

301. Anónimo

Sobre o mesmo
Se Homero é um deus, à maneira dos imortais seja venerado;
e se não é um deus, como deus há que considerá-lo.

135
Antologia Grega XVI

302. Anónimo
Sobre o mesmo
A natureza o criou, a custo o criou! E ao gerá-lo descansou,
centrando em Homero, nele apenas, todo o seu pensamento.

303. Anónimo
Sobre o mesmo
Alguém haverá que não conheça a imensa voz de Homero?
Que terra, que mar ignora a guerra dos Aqueus?
As gentes Cimérias, que jamais contemplam os raios de Hélios
que tudo vê, mesmo elas ouviram o nome de Tróia; ouviu-o Atlas,
o que aos ombros suporta o peso do céu de amplo dorso.

304. Anónimo
Sobre o mesmo
Ao contar, Homero, a saga daquela que foi incinerada,
atraíste a inveja de outras cidades nunca sitiadas.

305. De Antípatro [de Tessalónica]


Sobre um retrato de Píndaro
Como a trompeta supera as flautas de osso de corça,
assim a tua lira ressoa sobre todas as outras.
Não foi em vão que um loiro enxame em teus lábios
veio fazer o seu favo de mel343, Píndaro.
É testemunha o chifrudo deus do Ménalo, que teus hinos

343
Lenda recolhida, entre outros, por Pausânias (9.23.2) e Filóstrato
(Caracteres 12). Cf. AP 7.34 (de Antípatro de Sídon).

136
O Apêndice de Planudes

quis cantar sem levar em conta as flautas pastoris344.

306. De Leónidas de Tarento


Sobre [uma estátua de] Anacreonte345
Vê o velho Anacreonte, bem carregado de vinho
e a cambalear em cima da base bem talhada.
Contempla o velho, de húmidos olhos lascivos,
como atira o manto até aos tornozelos.
Tal qual um bêbado, perdeu já um dos sapatos,
mas no outro ajusta ainda o pé apertado.
E canta, ora o desejado Bátilo, ora Megistes346,
erguendo na mão a lira de tristes amores.
Tu, pai Dioniso, cuida dele – não parece nada justo
um servidor de Baco cair por efeito de Baco.

307. [Do mesmo]


Sobre o mesmo
Vê como pelo vinho o velho Anacreonte
cambaleia, como o manto ele arrasta

344
Plutarco (Obras Morais 1103B) supõe que Píndaro sentiria um
prazer estranho ao ouvir as canções pastoris de Pã.
345
Os núms. 306-309 devem ter relação com uma ou várias re-
presentações do velho poeta de finais do século VI e inícios do V a.C.,
mais conformes com a imagem de ancião ébrio perdido de amores que
lemos nos Anacreontea que nos seus fragmentos autênticos. Por exemplo
Pausânias (1.25.1) descreve uma estátua do poeta que vira na Acrópole de
Atenas, referindo a sua postura “semelhante à de um homem que canta
embriagado”, a mesma que se vê em várias peças de cerâmica do séc. IV
a.C.
346
Dois efebos celebrados nos fragmentos autênticos do poeta e nos
Anacreontea.

137
Antologia Grega XVI

aos pés; das sandálias, uma ainda


conserva, mas a outra já a perdeu.
Dedilhando a lira, doce celebra a cantar
ora o seu Bátilo, ora o belo Megistes.
Cuida, Baco, que o velhote não caia!

308. De Êugenes
O irmão dos Desejos doces como o mel,
ó Lieu347, esse cisne de Teos, Anacreonte,
com o encanto líquido do néctar o traíste.
O seu olhar lascivo, a franja do manto
à altura do tornozelo e a única sandália
que leva denunciam a sua bebedeira. A lira,
porém, toca sem cessar um hino aos Amores.
Cuida que o velho não caia, deus do Evoé!

309. Anónimo
Aqui me vês, a mim, o velho de Teos insaciável
de amores, o que celebra moços e moças.
De mirada carregada de Brómio, passados os cortejos,
revelo os indícios doces da pândega insone.

310. De Damócaris
Sobre um retrato de Safo
A própria natureza criadora, pintor, te fez

347
Epíteto de Dioniso.

138
O Apêndice de Planudes

retratar a Piéride348 de Mitilene349.


Iluminam-se-lhe de luz os olhos, claro indício
da uma imaginação plena de talento.
A tez, naturalmente suave e não colorada demais,
revela a simplicidade da sua pessoa.
E esse olhar, ora sorridente ora pensativo,
denuncia a união íntima de Cípris com a Musa.

311. Anónimo
Opiano350, reunindo nestas páginas as espécies dos mares,
a todos os jovens ofereceu um prato cheio.

312. Anónimo
A soberana Calíope351 assim falou ao ver Jorge352:
“É este o meu verdadeiro pai, não o Crónida!”

348
I.e. a Musa. Os antigos deviam a Platão a identificação de Safo
como a décima Musa, a partir de um epigrama a ele atribuído na Anto-
logia (9.506).
349
Cidade de Lesbos, de onde era natural Safo.
350
O dístico pode ter servido de epígrafe a uma edição das Haliêuticas
de Opiano, obra naturalista composta entre 177-180 e muito admirada
no período bizantino.
351
Considerada a primeira das Musas, era como as irmãs filha de
Zeus e Mnemósine (a Memória).
352
Provavelmente Jorge de Pisídia, poeta do século VII muito aprecia-
do pelos Bizantinos. Entre outras obras, maiormente de caráter religioso,
compôs uma Heracliada, onde celebra a vitória de Heráclio (imperador
entre 610-641) sobre os Persas.

139
Antologia Grega XVI

313. Anónimo
Sobre uma estátua [do orador] Ptolemeu em Antioquia
– Estátua, quem te dedicou?353 – a Eloquência. – Para quem?
 [– Ptolemeu.
– Qual deles? – O de Creta . – E porquê? – Pelo seu
354

[mérito.
– Que tipo de mérito? – Todos. – E contra quem? – Contra
 [os advogados.
– E basta uma estátua de madeira? – Sim, ele não aceita
[ouro355.

314. De Arábio o Escolasta


Uma estátua de ouro para Longino356 a cidade suportaria,
não fosse a soberana Justiça tão avessa ao ouro.

315. De Tomás, o Escolasta


Três astros da retórica eu amo, pois apenas eles
entre todos os oradores são os melhores.
Amo as tuas obras, Demóstenes; e do mesmo modo
sou apaixonado por Aristides357 e Tucídides.

353
O mesmo início do núm. 55, de Troilo.
354
Na realidade, deve tratar-se de Ptolemeu de Náucratis, orador da
época de Trajano e Hadriano.
355
A mesma ideia da incorruptibilidade de um personagem (cf.
epigrama seguinte) pela não aceitação do ouro como matéria-prima da
homenagem. Cf. ainda o núm. 45, sobre um retrato em talha dourada.
356
Cf. o núm. 39, onde o mesmo Longino, prefeito de Justiniano ou
Justino II, é celebrado por Arábio.
357
Aos clássicos Tucídides (séc. V a.C.) e Demóstenes (séc. IV a.C.),
Tomás acrescenta o nome de Aristides (n. 117), o discípulo de Herodes
Ático que, ao falecer (c. 181-187), deixou vasta obra e foi muito admirado
nos séculos seguintes e ao longo de toda a Idade Média.

140
O Apêndice de Planudes

316. Anónimo
A cidade executou este Agátias358, orador e poeta,
admirando o ritmo duplo da sua eloquência,
qual mãe para com um filho, e ofereceu-lhe esta
estátua, testemunho de afeto e do seu talento.
E a seu lado fez erguer o pai Memnónio e o irmão359,
símbolos de uma raça muito respeitável.

317. De Páladas
Ao ver este Géssio360 surdo-mudo, profetiza tu, senhor de Delos,
se ele é de mármore, ou quem é o mármore de quem361.

318. Anónimo
Sobre o retrato de um orador sem talento
Tu, incapaz de falar, quem te pintou à imagem de um orador?
Calas-te? Não dizes nada? Nada mais conveniente!

358
Natural de Mirina na Eólida (536-579/82), Agátias (dito o Esco-
lasta) foi advogado em Constantinopla durante o governo de Justiniano
e, claro, o responsável pela recolha epigramática que integraria a Antolo-
gia, além de autor de uma centena de poemas, nesse florilégio incluídos.
359
O epigrama poderia ser a inscrição da base de um grupo escultó-
rico erguido na cidade natal de Agátias. Os pais do poeta vêm referidos
também em AP 7.552.
360
Páladas compôs oito outros epigramas sobre Géssio (AP 7.681-
688), um cônsul coxo que terminou mal a carreira graças a um conselho
do oráculo de Ámon . Não é certo se se trata da mesma personagem – que,
além de coxo, seria também surdo-mudo – ou de outra, possivelmente o
seu filho.
361
O tópico frequente do orador mais mudo que a própria estátua
(e.g. AP 9.145, 149, 151; núm. 318).

141
Antologia Grega XVI

319. Anónimo
Sobre o retrato do orador Marino
Os retratos, para os homens, são coisa honrosa; mas para
[Marino362
são um insulto, pois evidenciam como é feia a sua forma.

320. Anónimo
Sobre uma estátua do orador Aristides
Aristides363 pôs fim à disputa que as cidade da Iónia
tinham no passado pela paternidade de Homero364.
E agora dizem todas: “Esmirna gerou o divino Homero,
ela que também produziu o orador Aristides.”

321. Anónimo
Sobre uma estátua do orador Calisto
A estátua é de Calisto365, o orador; os que perto dela passem,
a Hermes, patrono da eloquência366, façam libações.

322. Anónimo
Sobre um busto do retor Calisto
Firmo para mim Firmo, o porta-fogo para o porta-fogo367,

362
A Antologia conserva epigramas para dois indivíduos com este
nome: o autor de um tratado de retórica (AP 1.23, 28) e um discípulo de
Proclo do século VI (AP 9.196-197).
363
Vd. núm. 315 e nota ad loc.
364
Cf. núms. 293-299.
365
Desconhecido.
366
Depois de Platão (Crátilo 407e-408a-b), os Estóicos fizeram de
Hermes deus da linguagem e do discurso.
367
Deve tratar-se de duas gerações de sacerdotes de Héstia que, na

142
O Apêndice de Planudes

o orador filho para o orador que foi seu pai.

323. De Mesomedes
Sobre o vidro
O artesão trouxe o vidro
que antes tinha extraído;
e ao fogo lançou o bloco
tão duro como o ferro.
E o vidro, como a cera,
consumido pelas chamas
que tudo devoram, derretia.
Prodígio para os mortais ver
a serpente escorrendo do fogo
e o artesão que todo ele tremia,
não fosse cair e fazer estilhaços;
nas pontas das suas pinças
duplas pousa então o bloco,368

324. Anónimo
Um estilete369 de prata eu era quando calhei sair do fogo,
mas nas tuas mãos num de ouro me transformei.

Acrópole de Atenas, transportavam o fogo sagrado para determinados


sacrifícios.
368
Entendemos, com a maior parte dos comentadores, que os 13 ver-
sos trocaicos conservados são apenas parte de uma mais longa descrição,
da qual não possuímos nem o início e nem o final.
369
O termo grego graphis, que correntemente traduzimos por pincel
(vd. núms. 77, 78, 137, 178 e 277), consistia na realidade numa espécie de
estilete de metal usado para gravar sobre a cera, o método mais frequente
da pintura na Antiguidade tardia.

143
Antologia Grega XVI

O caso, bela Leôncio370, é que Atena te concedeu a honra


do talento, como o da beleza to concedeu Cípris.

325. De Juliano, antigo Prefeito


Sobre uma estátua de Pitágoras
O que explica a natureza toda-poderosa dos números,
não foi esse Pitágoras que o escultor quis plasmar,
mas um outro, meditando silencioso. Dentro escondeu,
talvez, a sua voz, que teria incluído se quisesse.

326. Anónimo
Sobre [um retrato] do mesmo
Autêntico é o Pitágoras deste pintor, e com voz
o verias mesmo, quisesse Pitágoras falar.

327. De João Barbúculo


Sobre um retrato de Sócrates
Que habilidade a deste pintor! Se não deu vida à cera,
foi apenas para agradar à alma de Sócrates371.

328. Anónimo
Sobre um retrato de Platão
Platão, ao explicar que o espírito se eleva no éter,
pronuncia palavras muito além do entendimento.

370
Trata-se da dedicatória de um estilete de prata a uma mulher
(provavelmente uma artista) desconhecida.
371
I.e., para não a aprisionar dentro do corpo, na acepção Socrática
a verdadeira morte.

144
O Apêndice de Planudes

329. Anónimo
Sobre um retrato de Aristóteles
Eis Aristóteles, medindo a terra e a esfera dos astros.

330. Anónimo
Sobre um retrato de Aristóteles
O espírito e a alma de Aristóteles, um dois-em-um neste retrato.

331. De Agátias o Escolasta


Sobre um busto de Plutarco
A tua muito celebrada imagem, Plutarco de Queroneia,
os filhos dos poderosos Ausónios a ergueram,
pois que nas tuas Vidas Paralelas os mais ilustres Gregos
comparaste aos cidadãos belicosos de Roma.
Uma vida paralela à tua, essa nem tu
lograrias escrevê-la, já que não tens comparação.

332. Do mesmo
Sobre uma estátua de Esopo
Bem fizeste, velho Lisipo372, escultor de Sícion,
em colocar a estátua de Esopo de Samos
frente à dos Sete Sábios, pois estes imprimiam
necessidade, e não persuasão, às suas palavras.
Ele, dizendo o conveniente nas suas fábulas e argumentos,
brincando com o sério ensina a ser prudente.

372
Escultor de Sícion. Vd. núms. 120 e 275 e notas.

145
Antologia Grega XVI

Cuidado com severos conselhos! A doçura da fábula


do Sâmio constitui por si mesma um belo isco.

333. De Antífilo de Bizâncio


Sobre Diógenes
Um alforge, um manto, um naco de pão amassado
com água, um bastão junto aos pés para se apoiar
e um vaso de barro são para o cínico373 quanto basta
para viver; e mesmo entre isto algo sobeja:
vendo um pastor com sede beber dos buracos das suas mãos374,
disse um dia: “Porque te carrego, taça, em vão?”375

334. [De Antífilo de Bizâncio]


Sobre o mesmo
Envelhece até o bronze com o tempo, mas a tua glória,
Diógenes, não a destruirá sequer todo o porvir;
só tu ensinaste aos mortais a bastarem-se a si mesmos,
além do trilho mais fácil a percorrer na vida.

373
O epigrama apoia-se na lendária austeridade de Diógenes de
Sínope (c. 412/404 – 323 a.C.).
374
I.e. das mãos da sua estátua. A mesma anedota é contada, em anos
próximos aos da composição do epigrama, por Séneca (Epístulas 90.14).
375
O epigrama deve ser o modelo de Ausónio (epigr. 53).

146
O Apêndice de Planudes

Epigramas sobre as estátuas dos atletas no


hipódromo de Constantinopla

335.
Sobre Porfírio
Este Porfírio, filho de Calcas, o Imperador e a fação376 o
[ergueram,
carregado de muitas coroas obtidas por nobres esforços,
ele, o mais novo e o melhor de quantos aurigas há.
Ora, por tanta superioridade que sempre levou na vitória,
melhor fora que a estátua deste homem se erguesse em ouro,
e não em bronze377, como são as de todos os outros.

336.
Sobre o mesmo
Das quatro bandas378 efusivamente gritou no passado o povo,
tal era o apreço por Porfírio, o filho de Calcas;
então ele, posicionado à direita da tribuna imperial,
eleva no ar as rédeas e o seu cinto de jóquei
e daí conduz o carro, enfurecido. Quando competia 379 este
[bronze

376
Os Azuis. Sobre estas fações, vd. nota 8 da Introdução.
377
Dos aurigas celebrados no Hipódromo, apenas Urânio parece ter
recebido a honra de uma estátua em ouro (núm. 378), o que sabemos que
era um privilégio tradicionalmente reservado à família imperial (cf. núm.
354). O mesmo privilégio é reclamado para Porfírio.
378
I.e., Porfírio mereceu o apoio das quatro fações, cujas tribunas
estariam uma de cada lado da pista.
379
O normal seria receber a honra de uma estátua ao cabo da carreira
ou mesmo após a morte de um atleta, regra a que apenas Porfírio e Urânio
(núm. 376) são exceção. Cf. núms. 338, 340, 341.

147
Antologia Grega XVI

se lhe erigiu, quando a primeira barba lhe crescia ainda.


Se mais rápido que os anos lhe chegou esta recompensa, foi
 [já tarde
e após outras vitórias, após muitas grinaldas a custo
[obtidas.

337.
Sobre o mesmo
Citereia por Anquises380, e Selene por Endímion381
se enamoraram, e agora a Vitória por Porfírio,
ele que, trocando sempre de cavalos com um auriga
da sua equipa, ou por outros de aurigas adversários382,
muitas vezes e sem grande esforço coroou a cabeça nos jogos
que duram todo o dia, limitando-se o adversário a
[segui-lo.

338.
Sobre o mesmo
Concedeu-te a Vitória, jovem ainda, este prémio, que o
[Tempo
a outros granjeou muito mais tarde e já grisalhos,
[Porfírio!
É que, contabilizando os esforços que te valeram tantas coroas,
teve-os por superiores aos desses aurigas mais velhos.

380
Vd. núm. 168 e nota ad loc.
381
Pastor da Eólia com quem Selene (a Lua) teve 50 filhos.
382
Pode tratar-se de uma mostra individual de valor, iniciativa do
auriga, ou de uma prática oficializada. A última hipótese é de aceitar,
tendo em conta a frequência com que esse detalhe é mencionado. Cf.
núms. 339, 340, 341.

148
O Apêndice de Planudes

Acaso não te aplaudiu, enquanto proclamava a tua glória,


a mesmíssima fação rival, contigo maravilhada?
Bem-aventurada é a geração sempre livre dos Azuis,
pela qual o grande Imperador anuiu conceder-te este
[prémio.

339.
Sobre o mesmo
Ao corajoso os corajosos, ao sábio os sábios, e ao filho da
[Vitória,
Porfírio, os Azuis, filhos da vitória também eles, esta
[estátua
ergueram; de ambas as vitórias com corcéis intercambiados
se orgulha, com os que forneceu e com os que recebeu.

340.
Sobre o mesmo
A outros uma vez retirados, mas a meio da carreira
só a Porfírio, concedeu o Imperador tal honra.
Muitas vezes, após o triunfo, emprestou os cavalos velozes,
colheu os da equipa adversária e de novo foi coroado.
Entre os Verdes surgiu uma raiva indizível, tal como o aplauso.
Como ele soube alegrar, Soberano, Azuis e Verdes!

341.
Sobre o mesmo
O voto de todos me erigiu, quando conduzia ainda o carro,
junto à estátua da Vitória, a mim, Porfírio!

149
Antologia Grega XVI

A minha fação exigiu tal honra, enquanto os adversários


de novo requeriam o meu serviço, renunciando à querela.
Em talento venço os demais aurigas; mesmo dando-lhes
os melhores corcéis, deixei clara a sua inferioridade.

342.
Sobre o mesmo
O mesmíssimo Porfírio com rigor moldou no bronze
o escultor, como se esculpisse um ser-vivo.
Mas o seu charme, as corridas, a inspiração divina da sua arte,
quem os moldará, isso e a vitória que nunca o abandona?

343.
Sobre o mesmo
Numa estátua de bronze este brônzeo auriga vencedor
mandou erguer o soberano dos Ausónios,
tão talentoso e querido dos Azuis! Mas pelas suas vitórias,
muitas outras estátuas de Porfírio veremos ainda.

343b. [AP 15.46]


Sobre o mesmo
Este é Porfírio, o Líbio! Ele apenas, sobre os carros triunfantes,
enfeitou a cabeça com todo o tipo de grinaldas.
A soberana Vitória, dividida entre as fações do povo,
mudou as sortes de acordo com as cores das casacas383;

383
I.e., Porfírio venceu em nome de distintas fações, as quais ditavam
a cor do uniforme do auriga em competição. Traduzimos por “casacas”

150
O Apêndice de Planudes

mas fez com que desse mais aos Azuis, e por isso se lhe ergueu
dourado pela sua virtude, mas em bronze pelas suas penas.

344.
Sobre o mesmo
– Tu quem és, querido rapaz, em cujo queixo a barba desponta?
– Porfírio, estrangeiro! – A tua pátria? – A Líbia.
– Quem agora te honrou? – O Imperador, pelo meu talento
 [de auriga.
– E quem pode testemunhá-lo? – A fação dos Azuis.
Melhor te convinha dispor de Lisipo384, esse hábil escultor,
para testemunhar tão grande vitória, Porfírio!

344b. [AP 15.47]


Sobre o mesmo
A Líbia gerou este Porfírio, mas foi Roma385 quem o criou,
e a Vitória quem o coroou, quando, mudando entre
 [uma cor
e outra, na cabeça ostentava os símbolos máximos do triunfo.
Muitas vezes mudou de fação, outras tantas de corcéis;
Estivesse em posição interior, exterior ou bem ao centro386,
a todos vencia de igual modo, adversários e companheiros.

em observância à expressão portuguesa “virar a casaca”.


384
Vd. núms. 119, 120 e 275 e notas. No mesmo Hipódromo estaria
exposta uma estátua de Alexandre do mesmo Lisipo (cf. núm. 345),
motivo para reclamar a sua autoria também para a estátua de Porfírio,
igualmente meritório herói.
385
Constantinopla.
386
Alusão às três posições possíveis de partida, que naturalmente
implicavam diferentes técnicas, sobretudo nas curvas.

151
Antologia Grega XVI

345.
Sobre o mesmo
Junto à Vitória e ao Imperador Alexandre387 te perfilas,
tu, que a glória de ambos lograste obter.

346.
Sobre o mesmo
O olho da Fortuna tudo perscruta! Mas agora, sobre as
[façanhas
de Porfírio, e não mais, lança a Fortuna o seu olhar.

346b. [AP 15.44]


Sobre o mesmo
Porfírio, já retirado de competição e deposta a bandolete388,
ele que por mérito próprio já389 se erguia em bronze,
neste lugar de novo o representaram em bronze e prata.
Ó meu velho! Estranhas recompensas tu recebeste,
e repuxas ainda o chicote ante os clamores do público;
como quem volta a ser jovem te enfureces no estádio390.

387
A estátua de Porfírio não poderia ter posição mais destacada, entre
a da Vitória (núm. 341) e a de Alexandre Magno, a última da autoria de
Lisipo, como já indiciado no núm. 344 (vd. nota ad loc.).
388
Com a qual se prendiam os cabelos do auriga.
389
O primeiro epigrama sobre uma estátua dedicada a Porfírio após
o final da sua carreira.
390
Porfírio regressa, já maduro, à competição. Embora o epigrama
não especifique qual a fação que agora o patrocina, sabemos tratar-se dos
Verdes, a única que podia dedicar-lhe uma estátua menos valiosa, depois
de outras em ouro e bronze.

152
O Apêndice de Planudes

347.
Sobre o mesmo
Em homenagem ao teu chicote furioso e ao teu escudo,
quis a tua fação, como convém, erguer-te dupla estátua,
de poderoso auriga e guerreiro391. Mas o bronze não soube
derreter em dois, moldando-se enfim à tua alma.

348.
Sobre o mesmo
Este Porfírio, o auriga, por que razão em pleno estádio
o ergueu a fação dos Verdes que leva a palma?
O próprio Imperador o ordenou. Como senão honrá-lo,
pela sua lealdade e pelo seu talento de auriga?

349.
Sobre o mesmo
A Porfírio, ao cabo das suas corridas, o Soberano concedeu
honra digna dos seus trabalhos, em favor dos Verdes.
Muitas vezes o povo, atendendo a esforços extraordinários,
tinha já ovacionado este Calíopas392, e de novo Porfírio;
esse o duplo nome que conseguiu este herói de bronze,
o que na quadriga obteve o galardão do seu talento.

349b. [AP 15.50]


Sobre o mesmo
Mais te convinha levar armas, e não ostentar esse manto,

391
Vd. núm. 349b e nota ad loc.
392
O mesmo Porfírio, i.e., o filho da Musa. Pelos núms. 358-362, é
possível depreender que o atleta tenha adotado este nome na maturidade.

153
Antologia Grega XVI

sendo tu auriga e vencedor na guerra como és.


Pois em face da espada do príncipe, fatal ao Imperador393,
também tu, lutando ao seu lado, integraste a batalha naval;
e uma dupla vitória, homem de mil talentos, habilmente
[lograste,
a da corrida de cavalos e a outra, contra o tiranicídio.

350.
Sobre o mesmo
Não só no estádio te coroou a soberana Vitória,
mas também na guerra te mostrou vencedor,
quando o Imperador se bateu, com o auxílio dos Verdes,
contra a insânia furiosa do inimigo do Império.
Caiu o selvagem tirano, com Roma ainda agonizante,
e para os Ausónios despontou o dia da liberdade.
Por isso lhes deu o Imperador os privilégios de outrora,
e a tua estátua, Porfírio, o talento a esculpiu.

351.
Sobre o mesmo
Inevitáveis arautos das tuas façanhas, Porfírio,
são também as grinaldas dos teus rivais.
Pois no estádio, um depois do outro, sempre vences todos
os adversários, brinquedo para a tua arte de condução.
Por isso, a ti apenas foi concedida uma honra inédita,
uma estátua de bronze por cada uma das fações.

393
Alusão à revolta de Vitaliano de 515, na qual Porfírio
participara como soldado, entrando triunfante ao cabo da batalha no
Hipódromo.

154
O Apêndice de Planudes

352.
Sobre o mesmo
O escultor moldou o bronze à imagem do auriga!
Tivesse ele representado a grandeza do seu talento,
a grandeza e o encanto sobre os quais a Natureza, ao gerá-los
já tarde, afiançou “Não mais poderei gerar!”
Isso afiançou com lábios dignos de fé; pois a Porfírio,
caso primeiro e único, toda a graça ela concedeu.

353.
Sobre o mesmo
Se a inveja descansasse e desejasse julgar as competições,
todos testemunhariam os esforços de Porfírio.
Diriam por certo, fazendo o reconto das suas corridas:
“Pouca recompensa esta para tantos esforços.”
Com o adorno de quantas qualidades partilham os aurigas,
reunidas num só ser, assim ele se mostrou grandioso.

354.
Sobre o mesmo
Rendida, com bronze te honra a cidade, ó três vezes desejado,
e queria fazê-lo com ouro, não espreitasse Némesis394!
Porém, se a benevolente fação dos Verdes não se cansa,
Porfírio, de celebrar uma vitória que te é conhecida,
todos eles são para ti estátuas vivas; tudo o resto sobra,

394
A inveja. Apenas Urânio terá recebido uma estátua de ouro (núm.
378), pelo que o verso constitui uma explicação poética para uma prática
real, a de apenas dedicar estátuas de ouro à família imperial. Cf. núm. 335.

155
Antologia Grega XVI

mesmo o ouro, comparado com tais homenagens.

355.
Sobre o mesmo
A Sorte não te recompensou ainda pelo esforço da tua vitória;
as tuas vitórias excedem a recompensa que te calhou.
Permanece pois na fação vitoriosa, a constante e a melhor,
consumindo o coração invejoso dos teus oponentes,
eles que, à vista do teu chicote que sempre sai triunfante,
a toda a hora maldizem a própria imprudência.

356.
Sobre o mesmo
Para outros, é o tempo motivo de honras; os que julgamos
pelas suas vitórias, esses, não sentem a falta das brancas,
antes do talento que acompanha a glória. Por isso Porfírio
duas vezes obteve o esplendor de tais recompensas,
contando não dezenas de anos, mas um sem fim de vitórias,
todas e cada uma delas aparentadas com as Graças.

357. De Leôncio, o Escolasta


Sobre o mesmo
Citereia por Anquises, e Selene por Endémion
se enamoraram395 - assim rezam os antigos.

395
Leôncio, que A. Cameron (1973) considera contemporâneo de
Justiniano, não terá conhecido pessoalmente o atleta, antes imitado
um epigrama inscrito na primeira base (núm. 337), datada de c. 500.
Ou bem Planudes introduziu o epigrama neste ponto, ou bem outro

156
O Apêndice de Planudes

Outra história se canta agora, como num ápice a Vitória


dos olhos e dos carros de Porfírio se enamorou.

358.
Sobre o mesmo
Quando eras jovem venceste os mais velhos, e agora, já velho,
vences os jovens condutores de quadrigas vitoriosas.
Completando seis décadas, uma estátua pelas tuas vitórias
recebes, Calíopas, com a anuência do Imperador,
para que viva no futuro a tua glória. Imortal pudesse ser,
como o é a tua glória, também o teu corpo!

359.
Sobre o mesmo
A vitória condutora de carros te dedicou este bronze,
Calíopas, imagem fiel da tua aparência divina,
pois, já velho, pela força de domar cavalos a flor da juventude
tu venceste, como em jovem os mais velhos pela técnica.
Por isso a fação dos Azuis, filhos da liberdade, duplo prémio
te dedicou, um pela tua técnica, outro pela tua força.

360.
Sobre o mesmo
A tua velhice levou a melhor sobre a juventude em vitórias,

poeta-compilador (o próprio Leôncio?), que teria organizado uma peque-


na antologia com os epigramas do Hipódromo de Constantinopla, à qual
Planudes teria recorrido.

157
Antologia Grega XVI

e sempre sobre todos tu triunfas, Calíopas.


Por isso o Imperador e a fação livre uma vez mais te erguem
este prémio, memorial do teu talento e do teu valor.

361.
Sobre o mesmo
Calíopas, tu que ergues em aplausos o teatro, eis a tua estátua,
a que te ergue um enxame de grinaldas invejáveis.
Nenhum auriga te ludibriou, nem o maxilar duro de roer
de nenhum cavalo pôde resistir às tuas rédeas;
tu apenas ostentas o prémio da vitória! E entre todos tens fama
de, na competição, aos outros deixar os prémios menores396.

362.
Sobre o mesmo
Calíopas, ilustre por teus feitos, que mais se te pode oferecer,
se com brônzea estátua te honrou já o Imperador,
o povo de mil vozes, a cidade inteira, se mesmo as mãos
da fação inimiga aplaudiram os teus esforços?

363.
Sobre Faustino397
A vontade é mãe das honras dos vencedores, não a força da
[juventude,

396
O sentido do último dístico não é claro, podendo no entanto haver
uma referência ao segundo (e terceiro) lugares, que, esses sim, sempre
ficariam para outros aurigas que não Porfírio.
397
Outro auriga, da fação dos Verdes (cf. núm. 382).

158
O Apêndice de Planudes

não a rapidez da condução nem a ocasião mais favorável!


Seja propício o teu espírito, Faustino, ele que a todas as coisas
precede e tem por companheira a imortal Vitória!

364.
Sobre o mesmo
Quando eras jovem, Faustino, o espírito dos velhos te assustava,
mas agora que és velho a força dos jovens treme ante ti.
Todos os esforços garantiram duplo fruto: velho, ser honrado
entre os jovens, como dantes, jovem, entre os velhos.

364b. [AP 15.41]


Epigramas do Hipódromo de Constantinopla para as estátuas do
auriga Constantino
Em vida não te ergueste em bronze, Constantino398,
pois a inveja eclipsou a tua boa-reputação!
Agora que morreste, em uníssono te honra toda a cidade
como pode. Que honra é digna de tal auriga?

364c. [AP 15.42]


Sobre o mesmo
Desde que Constantino entrou na mansão do Hades,
com ele desapareceu toda a glória dos aurigas!

398
Deve tratar-se do filho do Faustino dos epigramas anteriores,
elogiado em onze epigramas.

159
Antologia Grega XVI

365.
Sobre o mesmo
Desde que Constantino entrou na mansão do Hades,
cheio de desânimo ficou o estádio de corridas;
o prazer abandonou os espectadores, e já nem nas ruas
se veem essas disputas amigáveis399 de outrora.

365b. [AP 15.43]


Sobre o mesmo
Constantino mereceu a recompensa do ouro400 pelo seu talento,
pois nenhum outro como ele produziu a sua arte.
Jovem ainda, triunfou sobre os mais celebrados condutores,
e já velho mostrou a inferioridade dos mais jovens.
Celebrando-o após a morte, o povo e o Imperador esta estátua
lhe ergueram, por decreto que sempre será lembrado.

366.
Sobre o mesmo
Uma estátua, Constantino, te dedicaram os cidadãos
entre lágrimas, oblação à tua alma que partira.
Quando, pela tua morte, o povo confirmou a tua reputação,
mesmo o Imperador postumamente recordou os teus
[esforços;

399
As corridas de carros eram assunto das conversas de rua e ocupa-
vam o espírito de toda a cidade. Não obstante, o adjetivo “amigáveis” soa
a eufemismo, porquanto sabemos de disputas acesas motivadas por estas
competições. O exemplo mais extremos parece ser o da Revolta de Nike
em 532 (vd. Introdução, nota 8).
400
A mesma ideia do merecimento de uma estátua em ouro que
acabou por ser em bronze, como nos núms. 335 e 354.

160
O Apêndice de Planudes

pois perecera essa arte dada à invetiva401 da condução de carros,


terminando contigo tudo quanto contigo tivera início.

367.
Sobre o mesmo
Quando Constantino ainda vivia, considerava a cidade
que uma estátua de bronze era prémio pequeno;
o povo inteiro sabia, enfim, quantas grinaldas ostentara,
sempre competindo pela honra que traz a vitória.
Quando morreu, para recordá-lo lhe dedicou esta estátua
[amável,
para que também os vindouros recordem os seus feitos.

368.
Sobre o mesmo
Os Azuis, eternos adversários dos Verdes,
proclamaram unânimes uma só decisão,
que tu, Constantino, recebas esta homenagem no além,
por todos celebrada, por todos estimada.

369.
Sobre o mesmo
A tua corrida que brilha alto alcançou as fronteiras
do Levante e do Poente, como do Sul e do Norte,
imortal Constantino. E ninguém diga que estás morto!
Nem Hades ousa pôr a mão sobre os invencíveis.

401
Alusão à linguagem destravada do público durante a competição.

161
Antologia Grega XVI

370.
Sobre o mesmo
Nas imediações das da sua família recebeu ele esta estátua,
pois convinha reunir os três402 num mesmo local,
os que pelo talento nos estádios obtiveram semelhante glória,
conseguindo igual enxame de incontáveis grinaldas.

371.
Sobre o mesmo
A cidade ergueu aqui este Constantino, filho de Faustino,
perto da sua família, o melhor de quantos aurigas há.
Em tanto tempo de competição jamais perdeu, antes terminou
vitorioso, como vitorioso havia começado,
ele que, quando não passava de um jovem, os aurigas mais velhos
e coroados designaram como presidente403 dos estádios.

372.
Sobre o mesmo
É para ti, Constantino, este presente da Vitória, tua mãe,
que desde menino te acompanhou a vida inteira.
Pois ao cabo de cinco décadas passadas nos estádios
não encontraste ninguém igual ou sequer pouco inferior.
Adolescente e imberbe ainda, venceste os homens maduros,
em jovem os da tua idade e, já velho, até os jovens.

402
Lido a par do epigrama seguinte e do núm. 377B, percebe-se que
os três atletas da família e da mesma equipa de Constantino (os Verdes)
são Faustino pai, Faustino filho e Urânio.
403
Competia-lhe, entre outras tarefas, a organização das corridas.

162
O Apêndice de Planudes

373.
Sobre o mesmo
Desejaria a cidade que Constantino fosse sempre o seu auriga,
desejaria!, mas não consentiu a Natureza no seu desejo.
Por isso encontrou nesta estátua consolo para as suas saudades,
para que nem o olvido nem o tempo o arrebatassem,
antes o amor permanecesse nos que o choram, a inveja nos
[aurigas,
a elegância nos estádios e a sua reputação para os vindouros.
E que alguém, no futuro, quando contar com aurigas inferiores,
elogie a geração anterior à qual foi dado contemplá-lo.

374.
Sobre o mesmo
Constantino, vinte e cinco corridas vencendo
numa mesma manhã, com os rivais trocou
de cavalos e com eles, os que antes vencera,
com eles de novo obteve vinte e uma vitórias.
Muitas vezes discutiu o povo qual das duas fações
ficaria com ele, e teve de escolher entre duas casacas404.

375.
Sobre o mesmo
Desperta, Constantino! Porque dormes um brônzeo sono405?
O povo reclama pelo teu carro nos estádios,

404
Vd. núm. 343B e nota ad loc.
405
Inspirado em Ilíada 11.241.

163
Antologia Grega XVI

e os aurigas, necessitados dos teus conselhos,


estão sentados como se fossem órfãos.

375b. [AP 15.49]


[Sobre Urânio]
Apenas a ti, quando competias e após abandonar as corridas,
por duas vezes a Vitória te concedeu este prémio, Urânio,
de uma como da outra fação; tu que antes, entre os Azuis,
por vinte anos de glórias ostentaste a grinalda.
Renunciaste então à corrida, e a fação dos Verdes te chamou;
foi quando lhes deste a vitória, e eles a ti esta honra.

376.
Sobre o mesmo
Urânio, tendo triunfado por ambas as fações,
foi o único que de ambas obteve glória,
quando dirigia ainda o carro. A primeira estátua obteve-a
da parte dos Verdes, essa que está perto deles406.
E eles, quando abandonou o estádio, devolveram-no
às quadrigas407 em lembrança do primeiro triunfo.

377.
Sobre o mesmo
Quando deixou os estádios, após conseguir brilhantes vitórias,
o Imperador devolveu Urânio às quadrigas triunfantes,

406
I.e. perto da sua tribuna no Hipódromo.
407
Por via da recolocação da sua estátua ou pela edificação de outra,
um grupo escultórico no caso.

164
O Apêndice de Planudes

para agrado de ambas fações; a cidade já não quer saber


de corridas, desde que Urânio está ausente.
Por isso, por segunda vez o erigiu aos mandos da quadriga,
honrando a primeira e a última das suas vitórias.

377b. [AP 15.48]


Sobre o mesmo
Junto desses famosos, o filho de Faustino e Faustino
ele próprio, o Imperador ergueu, junto a ambos,
Urânio, a quem o povo, pelas suas incontáveis vitórias,
passou a designar pelo nome divino de Pélops408.
Sempre o deus aproxima o semelhante do seu semelhante,
isso dirá, por certo, quem no futuro os contemplar.

378.
Sobre o mesmo
Urânio está próximo de Niceia e da Nova Roma409,
tendo numa nascido e na outra obtido glória.
De onde quer que ele seja vencia sempre, hábil que era
ora no pelotão da corrida, ora na ultrapassagem.
Por isso o representaram no metal dourado,
no mais precioso metal, a esse precioso auriga.

408
Pélops, que tinha em Olímpia o seu túmulo, vencera na corrida a
Enómao, pai da sua futura esposa, Hipodamia. No estádio de Olímpia,
na linha da meta havia uma estátua de Hipodamia prestes a coroar o
seu prometido, e é de supor que o mesmo se passasse no Hipódromo de
Constantinopla, o que pode explicar o cognome dado a Urânio.
409
Constantinopla.

165
Antologia Grega XVI

378b. [AP 15.45]


Sobre o auriga Juliano
Este Juliano410, descendente de uma mãe de Tiro,
um auriga que tantas grinaldas recebeu,
o próprio Imperador, o povo e o Senado soberano
o ergueram, decretando unânimes em seu favor.
Abandonara, na velhice, os estádios; mas enfeitiçara já
os que antes nutriam afeto pelos seus adversários.

379. De Tomás, o Patrício411


Ainda sobre as estelas dos aurigas no Hipódromo; sobre
Anastásio
O valente auriga Anastásio, retirado das competições
de carros, uma vez morto neste lugar a terra o detém,
ele que, no passado, cingiu a testa com tantas grinaldas
quantos dias de corrida viram os demais aurigas.

380.
Sobre Porfírio, da fação dos Azuis. Estas imagens estavam
gravadas no teto da antecâmara imperial412; trata-se de aurigas
antigos.

410
Além desta estátua, Juliano inspirou os frescos ou mosaicos de que
os núms. 386-387 constituem écfrases.
411
Os núms. 379-387 constituem adições de Planudes a partir de
outra fonte manuscrita. Trata-se de epigramas tardios que procuram
imitar os anteriores.
412
As oito composições finais da série, um conjunto de peças iâmbicas
com cinco versos cada uma, já não são epigramas dedicatórios, antes epi-
díticos, compostos – segundo o lema de Planudes – a partir das imagens
dos mosaicos (ou frescos) do teto de uma câmara imperial. Também a sua
proximidade com o epigrama de Tomás Anastásio sugere uma datação
entre os séculos IX-X. Vd. Introdução.

166
O Apêndice de Planudes

Tendo na terra superado todo o condutor de carros,


em boa hora se eleva e traslada para o céu
Porfírio, o prodígio da fação dos Azuis.
Triunfando sobre todo o auriga cá na terra,
sobe agora ao céu para competir com o próprio Sol.

381.
Sobre o mesmo
Ao despontar da primeira barba primeiro segurou
as rédeas este Porfírio, filho de Calcas, um Azul.
Que maravilha, como uma mão pôde assim pintar
os seus cavalos cheios de vida! Basta que de novo os açoite,
estou em crer, e de novo os conduzirá à vitória.

382.
Sobre Faustino, da fação dos Verdes
Contempla o labor do arquiteto deste edifício!
Não o tivesse ele coberto com resistente telhado,
e aos céus se elevaria Faustino na corrida,
como em vida com os cavalos, ele, antiga glória dos Verdes.
Retire-se o telhado, e ele alcançará o céu.

383.
Sobre o mesmo
Este é Faustino, o condutor de carros de outrora,
graças a quem a gente da fação dos Verdes
por completo desconhecia a derrota na corrida.
Era um velho, como vês! Mas o seu vigor

167
Antologia Grega XVI

era próprio de um jovem, e jamais foi vencido.

384.
Sobre Constantino, o auriga dos Brancos
Constantino, segurando as rédeas da fação Branca
como se a solidez do edifício não pudesse retê-lo,
venceu os outros três, e elevando-se primeiro aos céus
podes agora vê-lo, já sem vida, competir nas alturas.
Mas arte convence-me que tem vida esse ser que vejo.

385.
Sobre o mesmo
Este era Constantino, o que nos tempos de outrora
engenhosamente conduzia a quadriga de cor branca.
Desde que Caronte o arrebatou, com ele se foi
o brilho da competição das corridas de cavalos,
além de todo o prazer e toda a arte do teatro.

386.
Sobre Juliano, auriga dos Vermelhos
Uma mão sabe dar vida aos que há muito morreram.
Pois Juliano recupera agora o vigor de antanho,
puxando e repuxando as rédeas dos Vermelhos.
Perfila-se aqui, pintado no alto com o seu carro;
a sua mão espera o sinal – abri-lhe pois a barreira!

168
O Apêndice de Planudes

387.
Sobre o mesmo
Este Juliano, com o carro dos Vermelhos,
venceu na corrida os seus adversários.
Concedesse-lhe o pintor também o dom da vida,
e de novo estaria pronto a conduzir o carro
e chegar primeiro, pronto até para receber a grinalda.

169
Antologia Grega XVI

Epigramas Diversos413

387b.
Terminada a competição, saltei de um potro e aqui estou.
Terminada a colheita, fiz um celeiro que ostenta um teto.
Escapando à estação dos ventos plantei as minhas árvores.

387c. [De Leão, o Filósofo]


Eis aí, perto de ti, Diomedes, uma fonte de Zeus.
Estou doente! Tu que és fármaco, Jesus, salva-me!
Diversões para o espírito, sábia loucura os teus pensamentos
 [inúteis, Leão!
Junto aos teus lábios sagrados, Hélios, toda a graça
[transcorre.
Purifica os teus pecados, não só o teu rosto.
A lei, que nos é comum, toma-a para tua casa.

387d.
Sábio que sou, e vivendo já nas alturas, na graça das alturas,
 [do que existe
cá em baixo me rio e digo: “Se estou acima dos tumultos,
 [é por ser sábio”.

413
Planudes agrupou estes epigramas (387b-d), que ele mesmo de-
signou de “versos caranguejo”, na secção VI (epigramas votivos). Resulta
difícil extrair-lhes grande sentido, além da reunião de versos soltos.

170
O Apêndice de Planudes

388. De Juliano, Prefeito [do Egito]


Hemiambos sobre Eros414
Uma coroa urdia em tempos,
e encontrei, entre as rosas, Eros.
Logo o peguei pelas asas,
mergulhei-o no vinho
e de um trago o bebi.
E agora, dentro de mim,
com as asas me faz cócegas.

414
O poema, normalmente editado como número 6 dos Anacreontea,
foi apenas transmitido por Planudes na secção VII (epigramas de amor).

171
(Página deixada propositadamente em branco)
Índice de epigramatistas

Índice de epigramatistas

Um ponto de interrogação assinala as atribuições duvidosas


ou dúplices nos códices, bem como aqueles epigramatistas
desconhecidos. Esta lista não contempla a maior parte das
discussões de autoria dos epigramas, antes, preferencialmente,
a sua atribuição manuscrita.

Agátias, o Escolasta (c. 536-582) 36, 41, 59, 72, 80, 109, 244, 331, 332
Alexandre da Etólia (séc. IV-III a.C.) 172
Alceu de Messene (séc. II a.C.) 5, 7, 8, 196, 226
Alfeu de Mitilene (séc. I) 212
Ânite de Tégea (séc. III a.C.) 228, 231, 291
Antípatro de Sídon (séc. II a.C.) 131?, 133, 167, 176?, 178, 220
Antífilo de Bizâncio (séc. I) 136, 147, 333, 334?
Antípatro de Tessalónica (séc. I a.C.) 75, 143, 176?, 184, 197, 290, 296?,
305
Antístio (séc. I a.C.) 243
Apolónides (séc. I a.C.) 49, 50, 239
Apolónio de Esmirna (ante séc. I) 235
Arábio, o Escolasta (séc. VI) 39, 144, 148, 149, 225, 314
Arquelau do Egito (séc. IV a.C.) 120?
Árquias de Antioquia (séc. II-I a.C.) 94, 154?, 179?
Asclepíades de Samos (séc. III a.C.) 68?, 120?
Bianor, o Gramático (séc. I) 276
Cosmo (séc. VI) 114
Cornélio (séc. I a.C.?) 117
Crinágoras de Mitilene (séc. I a.C.) 40, 61, 199, 273

173
Índice de epigramatistas

Damageto da Acaia (séc. III a.C.) 1, 95


Damócaris de Cós (séc. VI) 310
Demócrito (séc. II a.C.) 180
Diotimo (séc. III a.C.) 158
Erício de Cízico (séc. I a.C.) 242
Espeusipo de Atenas (séc. IV a.C.) 31
Estatílio Flaco (séc. I a.C.?) 211
Estratão de Sardes (séc. II) 213?
Êugenes (post séc. III a.C.) 308?
Eveno (séc. II-I a.C.) 165, 308?
Évodo (?) 116, 155
Filipo de Tessalónica (séc. I) 25, 52, 81, 93, 104, 137, 141, 177, 193, 215,
240
Filodemo de Gádara (séc. I a.C.) 234
Filóstrato de Lemnos (séc. II-III) 110
Gabriel, Pref. de Constantinopla (séc. VI) 208
Galo (séc. I a.C.) 89
Gauradas (?) 152
Gémino (séc. I) 30, 103, 150?, 205
Glauco (séc. III-II a.C.) 111
Hermocreonte (séc. II a.C.?) 11
Hermodoro (séc. II a.C.?) 170
João Barbúculo, o Gramático (séc. VI) 38, 218, 219, 327
Juliano, Prefeito do Egito (séc. V-VI) 87, 88, 107, 108, 113, 130, 139, 157,
173, 181, 203, 325, 388
Leão, o Filósofo (séc. X) 387C?
Leónidas de Tarento (séc. III a.C.) 166, 171, 182, 190, 206, 230, 236?,
261, 306, 307?
Leôncio, o Escolasta Minotauro (séc. VI) 32, 33, 37, 245, 272, 283-288,
357
Luciano de Samosata (séc. II) 154?, 163, 164, 238
Macedónio de Tessalónica (séc. VI) 51
Magno (séc. IV) 270
Marco Argentiário (séc. I) 241

174
Índice de epigramatistas

Mariano, o Escolasta (séc. VI) 201


Mécio (séc. I) 198
Meleagro de Gádara (séc. I a.C.) 134, 213?
Mesomedes de Creta (séc. II) 323
Miguel, o Gramático (séc. VI) 316
Mosco de Siracusa (séc. II a.C.) 200
Nilo, o Escolasta (séc. V) 247
Nicéneto de Samos (séc. III a.C.) 191
Nícias de Mileto (séc. III a.C.) 188, 189?
Páladas de Alexandria (séc. III/IV) 20, 194, 207, 282, 317
Parménio de Macedónia (séc. I) 216, 222
Paulo Silenciário (séc. VI) 57, 77, 118, 277, 278
Perito (?) 236?
Platão (séc. IV a.C.) 13?, 160?, 161?, 248?
Platão o Jovem (séc. V-IV a.C.) 160, 161, 210
Posidipo de Pela (séc. III a.C.) 68, 119, 275
Sátiro de Olinte (?) (séc. II a.C.) 153, 195
Secundo de Tarento (séc. I?) 214
Simónides de Céos (séc. VI-V a.C.) 2?, 3?, 23-24?, 26?, 60?, 82?, 204?,
232?
Sinésio de Cirene, o Filósofo (séc. IV-V) 76, 79
Sinésio, o Escolasta (séc. VI) 267
Teeteto, o Escolasta (séc. VI) 32B, 221, 233
Teodoreto (séc. IV-V) 34
Teodóridas de Siracusa (séc. III a.C.) 132
Tomás, o Patrício (séc. VI) 379
Tomás, o Escolasta (post. séc. VI) 315
Troilo, o Gramático (séc. IV) 55
Timnes de Eleuterna (séc. III a.C.) 237
Xenócrito de Rodes (?) 186
Zenódoto de Éfeso (séc. IV-III a.C.) 14

175
(Página deixada propositadamente em branco)
Índice de epigramatistas

Volumes publicados na Colecção Autores


Gregos e Latinos – Série Textos Gregos

1. Delfim F. Leão e Maria do Céu Fialho: Plutarco. Vidas Paralelas – Teseu


e Rómulo. Tradução do grego, introdução e notas (Coimbra,
CECH, 2008).
2. Delfim F. Leão: Plutarco. Obras Morais – O banquete dos Sete Sábios.
Tradução do grego, introdução e notas (Coimbra, CECH, 2008).
3. Ana Elias Pinheiro: Xenofonte. Banquete, Apologia de Sócrates. Tradução
do grego, introdução e notas (Coimbra, CECH, 2008).
4. Carlos de Jesus, José Luís Brandão, Martinho Soares, Rodolfo Lopes:
Plutarco. Obras Morais – No Banquete I – Livros I-IV. Tradução do
grego, introdução e notas. Coordenação de José Ribeiro Ferreira
(Coimbra, CECH, 2008).
5. Ália Rodrigues, Ana Elias Pinheiro, Ândrea Seiça, Carlos de Jesus, José
Ribeiro Ferreira: Plutarco. Obras Morais – No Banquete II – Livros
V-IX. Tradução do grego, introdução e notas. Coordenação de
José Ribeiro Ferreira (Coimbra, CECH, 2008).
6. Joaquim Pinheiro: Plutarco. Obras Morais – Da Educação das Crianças.
Tradução do grego, introdução e notas (Coimbra, CECH, 2008).
7. Ana Elias Pinheiro: Xenofonte. Memoráveis. Tradução do grego,
introdução e notas (Coimbra, CECH, 2009).
8. Carlos de Jesus: Plutarco. Obras Morais – Diálogo sobre o Amor, Relatos
de Amor. Tradução do grego, introdução e notas (Coimbra,
CECH, 2009).
9. Ana Maria Guedes Ferreira e Ália Rosa Conceição Rodrigues: Plutarco.
Vidas Paralelas – Péricles e Fábio Máximo. Tradução do grego,
introdução e notas (Coimbra, CECH, 2010).

177
10. Paula Barata Dias: Plutarco. Obras Morais - Como Distinguir um
Adulador de um Amigo, Como Retirar Benefício dos Inimigos, Acerca
do Número Excessivo de Amigos. Tradução do grego, introdução e
notas (Coimbra, CECH, 2010).
11. Bernardo Mota: Plutarco. Obras Morais - Sobre a Face Visível no
Orbe da Lua. Tradução do grego, introdução e notas (Coimbra,
CECH, 2010).
12. J. A. Segurado e Campos: Licurgo. Oração Contra Leócrates. Tradução
do grego, introdução e notas (Coimbra, CECH /CEC, 2010).
13. Carmen Soares e Roosevelt Rocha: Plutarco. Obras Morais - Sobre o
Afecto aos Filhos, Sobre a Música. Tradução do grego, introdução e
notas (Coimbra, CECH, 2010).
14. José Luís Lopes Brandão: Plutarco. Vidas de Galba e Otão. Tradução
do grego, introdução e notas (Coimbra, CECH, 2010).
15. Marta Várzeas: Plutarco. Vidas de Demóstenes e Cícero. Tradução do
grego, introdução e notas (Coimbra, CECH, 2010).
16. Maria do Céu Fialho e Nuno Simões Rodrigues: Plutarco.
Vidas de Alcibíades e Coriolano. Tradução do grego, introdução
e notas (Coimbra, CECH, 2010).

17. Glória Onelley e Ana Lúcia Curado: Apolodoro. Contra Neera.


[Demóstenes] 59. Tradução do grego, introdução e notas
(Coimbra, CECH, 2011).

18. Rodolfo Lopes: Platão. Timeu-Critías. Tradução do grego,


introdução e notas (Coimbra, CECH, 2011).

19. Pedro Ribeiro Martins: Pseudo-Xenofonte. A Constituição dos


Atenienses. Tradução do grego, introdução, notas e índices
(Coimbra, CECH, 2011).

20. Delfim F. Leão e José Luís L. Brandão: Plutarco.Vidas de Sólon


e Publícola. Tradução do grego, introdução, notas e índices
(Coimbra, CECH, 2012).
178
21. Custódio Magueijo: Luciano de Samósata I. Tradução do grego,
introdução e notas (Coimbra, CECH/IUC, 2012).

22. Custódio Magueijo: Luciano de Samósata II. Tradução do gre-


go, introdução e notas (Coimbra, CECH/IUC, 2012).

23. Custódio Magueijo: Luciano de Samósata III. Tradução do


grego, introdução e notas (Coimbra, CECH/IUC, 2012).

24. Custódio Magueijo: Luciano de Samósata IV. Tradução do


grego, introdução e notas (Coimbra, CECH/IUC, 2013).

25. Custódio Magueijo: Luciano de Samósata V. Tradução do grego,


introdução e notas (Coimbra, CECH/IUC, 2013).

26. Custódio Magueijo: Luciano de Samósata VI. Tradução do


grego, introdução e notas (Coimbra, CECH/IUC, 2013).

27. Custódio Magueijo: Luciano de Samósata VII. Tradução do


grego, introdução e notas (Coimbra, CECH/IUC, 2013).

28. Custódio Magueijo: Luciano de Samósata VIII. Tradução do


grego, introdução e notas (Coimbra, CECH/IUC, 2013).

29. Custódio Magueijo: Luciano de Samósata IX. Tradução do


grego, introdução e notas (Coimbra, CECH/IUC, 2013).

30. Reina Marisol Troca Pereira: Hiérocles e Filágrio. Philogelos (O


Gracejador). Tradução do grego, introdução e notas (Coimbra,
CECH/IUC, 2013).

31. J. A. Segurado e Campos: Iseu. Discursos. VI. A herança de


Filoctémon. Tradução do grego, introdução e notas (Coimbra,
CECH/IUC, 2013).

32. Nelson Henrique da Silva Ferreira: Aesopica: a fábula esópica


e a tradição fabular grega. Estudo, tradução do grego e notas.
(Coimbra, CECH/IUC, 2013).
179
33. Carlos A. Martins de Jesus: Baquílides. Odes e Fragmentos
Tradução do grego, introdução e notas (Coimbra e São Paulo,
IUC e Annablume, 2014).

34. Alessandra Jonas Neves de Oliveira: Eurípides. Helena.


Tradução do grego, introdução e notas (Coimbra e São Paulo,
IUC e Annablume, 2014).

35. Maria de Fátima Silva: Aristófanes. Rãs. Tradução do grego,


introdução e notas (Coimbra e São Paulo, IUC e Annablume,
2014).

36. Nuno Simões Rodrigues: Eurípides. Ifigénia entre os tauros.


Tradução do grego, introdução e notas (Coimbra e São Paulo,
IUC e Annablume, 2014).

37. Aldo Dinucci & Alfredo Julien: Epicteto. Encheiridion.


Tradução do grego, introdução e notas (Coimbra e São Paulo,
IUC e Annablume, 2014).

38. Maria de Fátima Silva: Teofrasto. Caracteres. Tradução do


grego, introdução e comentário (Coimbra e São Paulo, IUC e
Annablume, 2014).

39. Maria de Fátima Silva: Aristófanes. O Dinheiro. Tradução do


grego, introdução e comentário (Coimbra e São Paulo, IUC e
Annablume, 2015).

40. Carlos A. Martins de Jesus: Antologia Grega, Epigramas


Ecfrásticos (Livros II e III). Tradução do grego, introdução e
comentário (Coimbra e São Paulo, IUC e Annablume, 2015).

41. Reina Marisol Troca Pereira: Parténio. Sofrimentos de Amor.


Tradução do grego, introdução e comentário (Coimbra e São
Paulo, IUC e Annablume, 2015).

180
42. Marta Várzeas: Dionísio Longino. Do Sublime. Tradução do
grego, introdução e comentário (Coimbra e São Paulo, IUC e
Annablume, 2015).

43. Carlos A. Martins de Jesus: Antologia Grega. A Musa dos Rapazes


(livro XII). Tradução do grego, introdução e comentário
(Coimbra e São Paulo, IUC e Annablume, 2017).

44. Carlos A. Martins de Jesus: Antologia Grega. Apêndice de Planudes


(livro XVI). Tradução do grego, introdução e comentário
(Coimbra e São Paulo, IUC e Annablume, 2017).

181
(Página deixada propositadamente em branco)
A Antologia de Planudes, conservada no autógrafo
Marcianus gr. 481 do século XIV, foi durante os séculos
XVI-XVIII a única recensão do epigrama grego conhecida
e divulgada e exerceu, por isso mesmo, uma influência
notável na poesia e na cultura moderna em geral. Texto
pedagógico nuclear para alunos renascentistas de grego e
latim, com frequência constituía o seu primeiro contacto
com a literatura grega. Poetas e escritores de todos os
tempos dela se serviram. Erasmo, que copia e comenta nos
Adagia cerca de cinquenta componentes, mas também os
Emblemmata de Alciato, pela primeira vez publicados em
1492, que ilustram, traduzem para latim e comentam um
muito maior número de epigramas. O presente volume
oferece em tradução os epigramas transmitidos por
Planudes que estão ausentes do Palatinus, nas edições
modernas publicados como Livro XVI da Antologia
Grega. A grande maioria destes textos (356 de um total
de 392) provém do capítulo IV do Marcianus, recolha de
epigramas descritivos ou ecfrásticos. Destes, realçam os
componentes dedicados aos aurigas de Constantinopla
(núms. 335-386), textos que a arqueologia demonstrou
terem conhecido a forma inscrita.
OBRA PUBLICADA
COM A COORDENAÇÃO
CIENTÍFICA

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