sequências textuais
e orientação argumentativa
Sueli Cristina Marquesi
Vanda Maria Elias
Ana Lúcia Tinoco Cabral
As sequências narrativas
A sequência textual narrativa
corresponde à apresentação de acon- Sugestão de leitura:
tecimentos, e envolve os seguintes François, Hudelot e
elementos: situação inicial, nó (con- Sebeau-Jouanet (1984).
flito), re-ação (avaliação), desenlace
(resolução), situação final. Os acontecimentos ocorrem com alguém,
em determinado tempo e normalmente têm uma causa. Esses elementos
constituem condições para a narrativa. Com efeito, os fatos da narrativa
ocorrem em relação a uma referência temporal, do que decorre que o
tempo constitui o eixo de toda sequência narrativa. Além disso, a narra-
tiva envolve intenções, objetivos, ação, causa, consequências, intrigas,
resolução de problemas. Todos esses conceitos estão inseridos num eixo
temporal no qual os fatos se relacionam entre si.
Vale destacar que o nó, ou conflito, isto é, um acontecimento que
desencadeia um “problema” para determinado personagem ou para a
história como um todo, constitui o elemento-chave da sequência nar-
rativa, pois é em função dele que se desenrola a ação no eixo temporal.
A sequência narrativa apresenta-se com a seguinte estrutura:
Limites do processo
Núcleo do processo
Exemplo 1
As sequências descritivas
A sequência textual descritiva está presente na grande diversidade
de textos que lemos diariamente, desde um romance, um poema, até em
notícias de jornal, em publicidades. As sequências descritivas cumprem
funções variadas; é difícil imaginar um texto que não contenha elementos
de descrição.
Como não conseguimos dar conta Cabral, Marquesi e Seara
totalmente do que desejamos descrever, (2015) apresentam a
seja um objeto, seja uma pessoa, seja individuação por relação
de avaliação (que pode
um conceito, fazemos um recorte, re-
ser de caráter positivo ou
correndo a uma série de processos de negativo) e por relação
seleção. Esses processos resultam num de consequência (que
esquema organizador que, conforme diz respeito a como as
ensina Marquesi (2004), define-se por consequências das ações
três categorias: 1) designação, que ou das peculiaridades do
compreende nomear, dar a conhecer; 2) ente descrito permitem
definição, que diz respeito a determinar construir a individuação.
a extensão ou os limites de, enunciar os
atributos essenciais e específicos do ente descrito, para que ele não seja
confundido com outro; 3) individuação, que se destina a especificar,
distinguir, ou seja, particularizar, tornar individual. Essa última categoria
indica o que torna o ente descrito uma existência singular, determinada
no tempo e no espaço. No texto, o fio condutor orienta as escolhas do
produtor para o sentido desejado.
Apresentamos a seguir o esquema do descritivo:
Planos de texto, sequências textuais e orientação argumentativa 19
F
io condutor do texto
“x” “y”
(Condensação) (Expansão)
• a • a • a • a •a
• b • b • b • b •b
• c • c • c • c •c
• d • n • n • n •n
Exemplo 2
As sequências explicativas
A explicação tem por função procurar fazer com que o interlocutor
compreenda algo que seja difícil de compreender. Refere-se, portanto,
a um fenômeno incontestável, mas que precisa ser explicado, como
acontece, por exemplo, com os conceitos teóricos.
Para Bronckart (1999), a explicação parte da constatação de um
fenômeno de difícil compreensão, a partir do qual ocorre uma proble-
matização, com uma questão da ordem do porquê ou do como; esse
questionamento leva a uma explicação, apresentando informações
capazes de responder as questões colocadas; finalmente apresenta-se
uma conclusão-avaliação, que permite reformular e complementar
eventualmente a constatação inicial.
Por sua vez, Adam (2011) defende que as sequências explicativas
podem aparecer em segmentos textuais curtos, em enunciados com ver-
bo no presente que combina se (introdutor de um enunciado que coloca
um problema) com é que ou é porque, introdutores de uma explicação.
Há diferentes possibilidades de combinações para a construção das
sequências explicativas; todas elas apresentam um período hipotético
seguido de uma explicação:
22 Linguística Textual e Ensino
SE p, É PORQUE q;
SE p, É PARA QUE q;
SE p, É EM RAZÃO DE q;
SE p, É QUE.
É PORQUE/PARA q, QUE p.
Exemplo 3
Exposição narcisista
• problematização (por que p?): Por que Sherlock Holmes, em seu tempo,
conseguia solucionar qualquer caso policial?
• explicação (porque q): Porque só ele dominava certas disciplinas úteis
à análise da cena do crime.
• ratificação do núcleo explicativo: Exemplos. Pela cinza no chão, sabia
identificar a marca do charuto que o suspeito estivesse fumando. Pelo
tipo de terra deixado pelos sapatos do criminoso, era capaz de deduzir
de que região de Londres ele saíra. E, pela distância entre as pegadas
do sujeito na lama, podia estabelecer o seu peso, altura, cor dos olhos,
profissão e até preferências literárias – Dickens ou Thackeray?
As sequências argumentativas
A sequência argumentativa se define por ser uma situação textual
na qual um segmento de um texto constitui um argumento a favor de
outro segmento do mesmo texto. Esse segmento pode ser uma oração,
um período ou uma sequência de enunciados.
As sequências argumentativas realizam uma relação do tipo dados
(fatos) → conclusão.
O esquema de base das sequências argumentativas compõe-se
de três elementos: dados ou fatos, sustentação ou princípios de base e
conclusão. Elas podem ser assim expressas:
Dados Conclusão
(Premissas)
Fatos(s)
Apoio
Sustentação
Tese Dados
Anterior + Fatos (F) logo provavelmente Conclusão (C)
Exemplo 4
Frutos do asfalto
O turista que passeia por outras cidades – e que não é escravo do celular –
costuma caminhar de cabeça erguida, apreendendo a paisagem. Conhecendo,
usufruindo. Mas talvez não faça o mesmo por onde mora – embora haja
sempre coisas a descobrir também onde moramos.
Em São Paulo, por exemplo, ao caminhar de cabeça baixa, podem-se per-
der alguns flashes de arquitetura (serão poucos, no entanto, os que vale a
pena admirar), mas principalmente uma outra riqueza urbana: a visão das
árvores, pinceladas verdes e coloridas, de muitos matizes, que são mais
abundantes na cidade do que a caricatura que fazemos dela nos faz crer.
Fonte: Melo, Josimar. Folha de S.Paulo, Caderno Turismo, D10, 3 mar. 2016.
• O turista que passeia por outras cidades explora o local que visita;
• o turista que passeia por outras cidades costuma caminhar de cabeça erguida;
• há sempre coisas a descobrir também onde moramos;
• em São Paulo, por exemplo, ao caminhar de cabeça baixa, podem-se
perder alguns flashes de arquitetura, [...] principalmente a visão das
árvores, pinceladas verdes e coloridas, de muitos matizes, que são mais
abundantes na cidade do que a caricatura que fazemos dela nos faz crer.
• Mas talvez não faça o mesmo por onde mora – embora haja sempre
coisas a descobrir também onde moramos.
• Em São Paulo, por exemplo, ao caminhar de cabeça baixa, podem-se
perder alguns flashes de arquitetura (serão poucos, no entanto, os que
vale a pena admirar), mas principalmente uma outra riqueza urbana.
As sequências textuais
na realização de um plano de texto
argumentativamente orientado:
contribuição para o ensino
Para o trabalho em sala de aula com as sequências textuais vincula-
das ao plano de texto, o professor precisa de um referencial teórico que
permita a elaboração e discussão das atividades. Nas seções anteriores,
oferecemos sinteticamente e de forma exemplificada um referencial
teórico que, centrado na concepção de plano de texto e sequências
textuais, possibilita ao professor perceber como isso pode ajudá-lo no
encaminhamento das atividades em sala de aula.
Uma sequência textual pode circunscrever-se a um segmento do
texto do qual faz parte ou pode, também, na composição do plano de texto
perpassá-lo todo, de forma predominante, como ocorre no Exemplo 1.
Nele, observamos que a sequência narrativa serve para ilustrar o lema
da campanha e, dessa forma, no plano de texto, a sequência funciona
estrategicamente como um expediente que imprime a condução argu-
mentativa pretendida por seu produtor.
Relativamente à sequência descritiva, é importante lembrar que
a escolha de determinados atributos para caracterizar uma situação ou
um participante dela revela uma tomada de posição do produtor, do que
decorre que todo conteúdo descritivo revela a atitude do produtor perante
o objeto descrito, atitude esta que orienta argumentativamente o discurso
produzido. Como demonstrado no Exemplo 2, o plano de texto na com-
posição da reportagem privilegiou a constituição de sequências descritivas
que evidenciam características do lugar descrito com o propósito de
despertar no leitor a vontade de conhecê-lo/visitá-lo. Essas sequên-
cias têm, portanto, um significativo peso na orientação argumentativa e
encontram-se a serviço do produtor do texto como uma estratégia para
alcançar o seu propósito comunicativo.
Podemos também pensar na importância das sequências explica-
tivas no processo argumentativo, visto que não são poucas as vezes em
que nos valemos de explicações para defender um ponto de vista em dis-
cussão. No Exemplo 3, observamos a estrutura da sequência explicativa
28 Linguística Textual e Ensino
Exemplo 5
Considerações finais
Neste trabalho objetivamos discutir como o plano de texto se
constitui em uma importante estratégia para a produção textual e, dessa
forma, pode contribuir para o ensino da escrita. Situadas no interior da
discussão sobre o plano de texto, vimos que as sequências textuais são
importantes sinalizadores do modo de organização textual e, por conse-
guinte, da produção de sentidos.
Apresentando um modo de organização interna que as identifica
como narrativas, descritivas, explicativas ou argumentativas, as sequên-
cias textuais, além de sinalizar o modo de organização do texto, orientam
argumentativamente em um dado sentido, revelando a intenção de quem
produziu o texto e realçando a posição segundo a qual a argumentati-
vidade não apenas se inscreve no uso da língua, mas também no modo
como esse uso se configura em práticas textuais e comunicativas.
32 Linguística Textual e Ensino
Bibliografia
Adam, Jean-Michel. A linguística textual: introdução à análise textual dos discursos. 2. ed. São Paulo:
Cortez, 2011.
Bronckart, J. P. Atividades de linguagem, textos e discurso: por um interacionismo sociodiscursivo. Trad.
Anna Rachel Machado e Péricles da Cunha. São Paulo: Educ, 1999.
Cabral, Ana Lúcia Tinoco. “O conceito de plano de texto: contribuições para o processo de planejamento
da produção escrita”. Revista Linha d’Água. v. 26, n. 2, 2013, pp. 241-59. Disponível em: <http://
www.revistas.usp.br/linhadagua/article/view/64266/71562>. Acesso em: 27 nov. 2016.
______; Marquesi, Sueli Cristina; Seara, Isabel Roboredo. L’Articulation entre le descriptif et les émotions
dans l’argumentation en faveur de Dominique Strauss-Kahn. In: Rabatel, Alain; Monte, Michèle;
Rodrigues, Maria das Graças Soares (dir.) Comment les médias parlent des émotions l’Affaire Nafissatou
Diallo contre Dominique Strauss-Kahn. Limoges: Lambert-Lucas, 2015, pp. 307-23.
François, F.; Hudelot, C.; Sabeau-Jouanet, E. Conduites linguistiques chez le jeune enfant. Paris: puf, 1984.
Marquesi, Sueli Cristina. A organização do texto descritivo em língua portuguesa. 2. ed. Rio de Janeiro:
Lucerna, 2004 [1. ed. 1996].
Van Dijk, Teun A. La ciencia del texto. Barcelona/Buenos Aires: Paidós Comunicación, 1983.