8:30 – Abertura:
Maria José Gontijo Salum (Diretora geral do IPSM-MG)
Lacan, em seu Seminário 23: o sinthoma, afirma que o doente vai mais
longe que um homem saudável no que concerne ao testemunho da incidência do
parasitismo da fala. E se questiona: “Como é que todos nós não sentimos que as
falas das quais dependemos são, de algum modo, impostas?” (LACAN, 1975-76,
p.92) Essa questão surge em seu seminário logo após uma apresentação de
paciente conduzida pelo próprio Lacan no hospital Sainte-Anne, o paciente em
questão ficou conhecido por Gerard Primeau. Ao fim da entrevista, Lacan diz aos
ouvintes que eles acabavam de testemunhar uma “psicose lacaniana” e chama a
atenção para a experiência que o próprio paciente nomeou por falas impostas.
Entretanto, o agravante - que deixa Lacan pessimista em relação ao caso - é o
destino dado a essa imposição da fala: Primeau em um segundo tempo formula
frases reflexivas a partir das falas impostas, mas essas reflexões escapavam de seu
controle e podiam ser registradas por outras pessoas. Primeau não podia ajustar
sua própria mente e seus mais íntimos pensamentos estavam a descoberto, ele se
diz um telepata emissor, e essa construção o leva ao pior.
O Automatismo mental
Gaëtan Gatian De Clérambault, psiquiatra francês a quem Lacan designa
como seu único mestre em psiquiatria, em seu conhecido artigo “Automatismo
mental e cisão do Eu” (1920) desenvolve a noção de Automatismo mental, a partir
do relato de três casos de sua clínica. Na sua concepção, esse fenômeno teria uma
primazia em relação à formação do delírio, ou seja, a construção delirante seria
uma reação (interpretativa ou imaginativa) do paciente ao movimento automático
das palavras. Portanto, para Clérambault, seria fundamental fazer uma distinção
entre “o fato primordial, isto é, o automatismo mental” e “a construção intelectual
secundária, a única a merecer o nome de delírio de perseguição” (CLÉRAMBAULT,
1920, p.166). Nesse sentido, diferentes elaborações ou concatenações podem
surgir como tentativas de explicação desse mesmo “material imposto pelo
inconsciente” (idem, p.167), a depender da constituição de cada sujeito.
Nota-se que essa concepção da primazia do Automatismo mental trabalhada
por Clérambault, parece cara à Lacan em sua forma de conceber as repercussões
das falas impostas presentes no caso de Gerard Primeau, como em suas
elaborações advindas dessa apresentação de paciente e desenvolvidas no
Seminário livro 23, o sinthoma: “A questão é antes saber por que um homem dito
normal não percebe que a fala é um parasita, que a fala é uma excrescência, que a
fala é uma forma de câncer pela qual o ser humano é atingido.” (LACAN, 1975-76,
p.92). Lacan insiste em ressaltar o caráter de parasitismo da fala, colocando ênfase
nessa relação da imposição das palavras, que vindas do campo do Outro, atingem o
ser. Portanto, nessa concepção da fala como parasita, o “falasser” seria “em seu
corpo, hospedeiro do uso da palavra” (LAIA, 2001, p.120).
Gerard Primeau testemunha sua experiência com as falas impostas, e - a
pedido de Lacan - dá exemplos de frases que emergem na sua cabeça
desvinculadas de um significado imediato. Nas palavras de Primeau: “Ele vai me
matar o pássaro azul. É um sistema anárquico. É um assassinato político (...) um
“assastinato” político, que é a contração das palavras “assassinato” e “assistência”,
que evoca a noção de assassinato” (LACAN, 1976, p.6). Durante a entrevista, Lacan
retorna a esse ponto - a essa mistura sonora que se dá por um deslizamento entre
assassinato e assistência - ao que G.P. esclarece que essas palavras “emergem”
“espontaneamente” como “explosões”. Ao evocar essa fala de Primeau em seu
seminário, Lacan dirá que vemos muito bem que “o significante se reduz aí ao que
ele é, ao equívoco, a uma torção de voz”. (LACAN, 1975-76, p.92). Mais adiante
G.P. recorre a outro exemplo, ele diz: “’Eles querem governar meu intelecto’ é uma
emergência. ‘Mas a realeza está derrotada’ é uma reflexão” (LACAN, 1976, p.12).
Desse modo, a partir de uma frase imposta, Primeau acrescenta um “mas” que
introduz sua reflexão, numa tentativa de neutralizar a frase anterior.
Essas reflexões poderiam ser uma defesa contra a experiência perturbadora
com as falas impostas, entretanto, Primeau não conseguia mais ajustar sua própria
mente e seus mais íntimos pensamentos estavam a descoberto: ele se diz um
“telepata emissor”. Essa construção o expunha, causando grande “ansiedade”, a
ponto de provocar uma tentativa de suicídio.
Uma reflexão escrita
A partir da experiência de Gerard Primeau com as falas impostas, Lacan
evoca o escritor James Joyce, ao perceber que a relação do escritor com as
palavras também refletia um caráter de imposição: “é difícil não ver que uma certa
relação com a fala lhe é cada vez mais imposta (...), a ponto de ele acabar por
dissolver a própria linguagem.” (LACAN, 1975-76, p.93). Se, por um lado, a defesa
reflexiva de Primeau fracassa, por outro, Lacan localiza que Joyce, no progresso da
sua obra, opera uma reflexão ao nível da escrita:
O Schizo e as línguas
Depois de recolher algumas pistas sobre a experiência com a imposição da
fala em Primeau e Joyce, passemos a Louis Wolfson, escritor norte-americano,
autor do livro Le Schizo et les langues (1970). Wolfson se nomeia, sempre no
impessoal: “o jovem homem esquizofrênico”, “o doente mental”, ou ainda, “ o
estudante de línguas esquizofrênico”. Trata-se, para o autor, de escrever em livro
exatamente o procedimento no qual ele submete a língua, sendo este quase um
empreendimento científico.
Wolfson opta por escrever em francês pelo fato do inglês, sua língua
materna, lhe causar as maiores perturbações. Deleuze, no prefácio que escreve ao
livro Le Schizo et les langues, descreve bem o “procedimento linguístico de
Wolfson”, que vai além de uma simples tradução do inglês para o francês:
Referências Bibliográficas
Notas:
Sobre o assunto, ver o texto de Eduardo A. Vidal, “Comentários sobre ‘Die Verneinung’.
No texto, são frequentes as referências a uma longa e diversificada tradição literária, como,
por exemplo: Telêmaco (Mitologia grega. Neto de Laerte e filho de Penélope com Odisseu),
Narciso (Mitologia grega, personagem que morre ao se ver fascinado pela própria imagem),
Nietzsche (Friedrich Nietzsche, filósofo prussiano, 1844-1900. A referência é o livro Assim falou
Zaratustra, 1891), Charles Baudelaire (poeta francês, 1821-1867, tradutor das obras de Edgar
Allan Poe para o francês), Fausto, personagem de toda uma tradição germânica. (No texto,
uma alusão ao Fausto de Goethe, escritor do império Romano-Germânico, 1749-1832), Byron
(poeta britânico, 1788-1824. No texto, especificamente, uma referência ao poema dramático
intitulado Manfred, escrito entre 1816-1817. Lê-se: “o herói morre da maldição lançada sobre
ele pela morte do objeto de um incesto fraterno”, p. 567), Heráclito (filósofo pré-socrático, 535
a.C-475 a.C.), Homero (poeta épico da Grécia antiga, séc. IX a.C. e séc. VIII a.C.), Satyricon
(obra do prosador romano Petrônio, 27 d.C. escrita, provavelmente no ano 60 d. C).
DA PSICOSE EXTRAORDINÁRIA À ORDINÁRIA E OS IMPASSES
CLÍNICOS NO CASO JOÃO
Cecília Velloso Gomes Batista
“ É a falta do Nome- do- Pai nesse lugar que, pelo furo que abre no
significado, dá início à cascata de remanejamentos do significante de onde
provem o desastre crescente do imaginário, até que seja alcançado o nível
em que significante e significado se estabilizam na metáfora
delirante.”(LACAN, 1967-1958, pag 584)
CASO JOÃO
João tem 21 anos e procura atendimento porque é “irritado” e tem
problemas de convivência com a família, quem o aconselha a procurar um
tratamento é seu chefe. Nas sessões apresenta um corpo inquieto, ao mesmo
tempo que boceja significantemente e tem um andar arrastado. Viveu dos dois
anos aos quinze nos Estados Unidos, junto com a mãe e uma tia e desde que
retornou ao Brasil, mora com a avó materna. A mãe – a quem descreve como uma
alcoólatra, deprimida e gorda – foi morar com um namorado e passa seus dias
“fumando e bebendo” sendo sustentada pela família. Sente-se invadido pelas
pessoas de sua família, “sou um funcionário que tem que resolver tudo”. As coisas,
no entanto, eram piores no tempo que morou fora, relata que sofreu muito
“bullying” por estar sempre acima do peso e que cuidar da mãe era uma tarefa
difícil, nesse período de sua vida a mãe foi internada algumas vezes, estava sempre
servindo a mãe e ajudando-a, sente que nunca foi olhado por ela.
Acha que nesse momento esteve muito deprimido, não tinha amigos e as
pessoas a sua volta eram “interesseiras” significante que utiliza para descrever a
maioria de suas relações, ele é sempre usado pelo outro. Começou a apresentar
dificuldades no aprendizado, “simplesmente não conseguia aprender a ler e
escrever” e com os colegas “ficava muito irritado e isolado” – frente a essas
questões a escola encaminha João para tratamento psiquiátrico e o transfere para
uma escola “para crianças com problemas de comportamento”, sobre esses
problemas diz pouco, “achava que todo mundo estava me olhando e me tirando,
ficava muito irritado, briguei com alguns colegas, tive uma experiência
homossexual, essas coisas”, mas não fala sobre esses acontecimentos.
Do psiquiatra recebeu em diferentes momentos o diagnóstico de TDAH,
depressão e transtorno bipolar – diagnósticos os quais não questiona, apenas diz
que foi o único momento em que a mãe voltou a atenção para ele.
Ao falar da família da mãe com quem tem maior convivência diz que é mal
tratado e mal visto porque sua mãe sempre foi sustentada e seu pai é pobre e que
por isso ele seria para eles “um saco de pancadas” assim como a mãe o é – “minha
mãe é um saco de pancadas, eu sou um saco de pancadas”.
Na fala de João sobre sua história percebo que há um certo desligamento
daquilo que ele relata e frente a algum questionamento da analista sobre o que ele
diz há uma completa incompreensão frente a qual não consegue produzir nenhum
sentido. Sua fala não faz apelo a uma resposta, não há dialética ou vacilação, como
ele mesmo aponta: “Não acho, tenho certeza”. Apesar dos poucos dados sobre esse
momento significativo na vida de João, poderíamos pensar que houve um
desencadeamento?
Sérgio Laia (2000) em seu texto “Psicose Unplugged” coloca em questão os
casos em que não há uma ruptura catastrófica como vemos na psicose clássica,
mas que talvez poderíamos pensar em certos desligamentos que ocorrem de forma
muito discreta e que dificultam o diagnóstico. Os diagnósticos múltiplos que João
recebe da psiquiatria parecem ser uma marca disso. Outro ponto que gostaria
de isolar para o propósito desse trabalho é a função dos significantes “irritado” e
“funcionário”. João descreve sua infância e adolescência como um momento de
solidão extrema – morando em outro país sentia-se na relação com o outro sempre
o estrangeiro excluído e sem valor, invadido pelo outro frente ao qual passava ao
ato. Para além da localização geográfica, em sua família, é nesse lugar que se
reconhece: o de fora, o “saco de pancadas”.
Referências Bibliográficas
BENNETI, A. (2005) “Do discurso do analista ao nó borromeano: contra a metáfora delirante.”
Opção lacaniana online. Disponível em:
http://www.opcaolacaniana.com.br/antigos/n3/pdf/artigos/ABDiscurso.pdf . Acesso em: agosto
2018.
BORIE, Jacques, RABANEL, Jean-Robert & VIRET, Claude. “Clínica da suspensão”
In. Batista, M. C. D e Laia, S. (Organizadores) (2012). A Psicose Ordinária: Convenção de
Antibes. Belo Horizonte. Scriptum livros.
DRUMMOND, C. (2000) “Formas de desencadeamento”. In: Curinga 14. Belo Horizonte:
Escola Brasileira de psicanálise – seção minas.
KAUFMANNER, H. (2000) “Índices de foraclusão: da fala à escritura”. In: Curinga 14. Belo
Horizonte: Escola Brasileira de psicanálise – seção minas.
LACAN, J. (1959/1998) “De uma questão preliminar a todo tratamento possível da psicose”. In:
Escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.
LACAN, J. (1957-58/ 1999) “A metáfora paterna”. In: O seminário, livro 5: as formações do
inconsciente. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.
LAIA,S. (2000) “Psicose unplugged” In: Curinga 14, Belo Horizonte: Escola Brasileira de
Psicanálise – seção minas
MILLER, J.A. (2010) “Efeito de retorno à psicose ordinária”. Opção Lacaniana online.
Disponível em:
http://www.opcaolacaniana.com.br/pdf/numero_3/efeito_do_retorno_psicose_ordinaria.pdf .
Acesso em: agosto 2018.
“[...] (1) É possível que ele tenha sido despertado durante o dia e, por
motivos externos, não tenha sido satisfeito; nesse caso, um desejo
reconhecido do qual o sujeito não se ocupou fica pendente para a noite.
(2) É possível que tenha surgido durante o dia, mas tenha sido repudiado;
nesse caso, o que fica pendente é um desejo de que a pessoa não se
ocupou, mas que foi suprimido.
(3) Ele pode não ter nenhuma ligação com a vida diurna e ser um daqueles
desejos que só á noite emergem da parte suprimida da psique e se
tornam ativos em nós” (FREUD, 1900/1992b, p.141).
Assim, o que é reconhecido por Freud, como desejo no sonho, não passa de
uma alteração da necessidade, em que é de forma mascarada, posto num material
que o transforma. “O que fornece a lei da expressão do desejo no sonho é
justamente a lei do significante” (LACAN, 1957-58/1999, p.282).
Miller (2013) em entrevista ao Le Point, publicada em 06/06/2013, diz “que
o desejo não é uma função biológica”:
Diante disso, para Lacan, o Outro é lugar do significante, de modo que para
o desejo não há sustentação em algum objeto qualquer, nem tão pouco acesso por
via deste, e sim na dependência do sujeito em relação ao Outro, e descreve que “a
relação do desejo do sujeito como o desejo do Outro é dramática, na medida em
que o desejo do sujeito tem de se situar perante o desejo do Outro, o qual, no
entanto, o aspira literalmente e o deixa sem recursos” (LACAN, 1958-1959/2016,
p.454).
2- A neurose obsessiva
4- Concluindo
Referência Bibliográfica
FREUD, S. (1895[1950]). “Projeto para uma psicologia cientifica”, In: Edição Standard
Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Rio de janeiro:
Imago, vol. 4, 1996. p. 335-454.
LACAN, J. (1998). O estádio do espelho como formador da função do eu. In: Lacan,
Escritos. (V. Ribeiro, trad.; pp.96-103). Rio de Janeiro: Zahar. (original publicado em
1996).
A precariedade do Pai
Vivemos uma mudança de paradigma em todo cenário social, cultural e
consequentemente analítico. A fragilidade simbólica é constatada na fluidez das
relações e na falência das hierarquias. Miller,[2] no seu texto Em direção à
adolescência, aponta que “entre essas mutações da ordem simbólica,
primeiramente a principal, a saber é o declínio do patriarcado.
A precariedade do nome do pai é evidenciada pelas “mutações simbólicas” e
confirmada pela prevalência dos discursos da ciências e do capitalismo. Otoni [3]
nos esclarece que “O mundo hoje não é mais freudiano, ele é lacaniano. E a tarefa
incessante da falsa científica, não é mais lançar um novo objeto, mas fabricar em
série, infinitas réplicas do único objeto que interessa: o objeto a no Zênite
social. Talvez, seja desde essa virada, visando eliminar o impossível e alcançar
o ilimitado infinito, que vimos um desenvolvimento cientifico desenfreado
visando novas tecnologias – tecnologias voltadas para fabricação de toys para
satisfação do imperativo de gozo.”
Campos [4] conclui que a crise do simbólico tem afetado todas as ideologias,
todavia, fez incrementar o discurso cientificista das manipulações genéticas, das
falsas ciências e o discurso das novas tecnologias.
Sabemos que as ideologias políticas se esvaem neste contexto atual e nos
traz um outro indicativo da precariedade paterna. No percurso histórico assistimos
a verdade do totalitarismo, que se encontrava em um único lugar, ser dividida na
democracia. Em Instituições milanesas, Miller[5] esclarece que “o totalitarismo (...)
era a esperança de suprimir a divisão da verdade, de instaurar o reino do Um na
política. E diz que “o triunfo da democracia que vai de vento em popa no
pensamento contemporâneo (...) não gera o mesmo entusiasmo, podendo inclusive
ser avaliado por um efeito depressivo; ele o comporta na medida em que implica a
aceitação da divisão da verdade.”
A divisão abre uma fenda, aponta uma falta que o Um do
totalitarismo parecia preencher. Abre-se então um buraco que a ciência promete
cobrir. Cada vez mais, objetos são produzidos e oferecidos como garantia da
totalidade. Somos levados à consumir desenfreadamente, criando um ciclo de gozo
sem fim.
O que o discurso da ciência em aliança com o capitalismos prometem, na
verdade não se cumpri e a ‘falta” aparece a cada vez que esse objeto fracassa em
sua promessa. A função paterna, nos tempos de hoje, desprovida de sua força
simbólica, faz sintoma e segundo Miller[6], em instituições milanesas, o sintoma
aparece como o regime próprio ao gozo, o sujeito – ou mais precisamente o ser
vivente que fala – experimentando-o necessariamente como tal”.
As consequências analíticas das transformações citadas são vistas também
na clínica da contemporaneidade que nos traz, cada vez menos, sujeitos da
dúvida. Partimos de interpretações que davam um sentido, pautadas na clínica do
Nome do Pai, do complexo de Édipo de Freud, para a clínica do real, de Lacan, do
sem sentido. Lacan[7] afirma que “na atualidade a interpretação ocupa um lugar
ínfimo, e não porque ela tenha perdido o sentido, mas porque a abordagem do
sentido traz sempre um embaraço.
Um confronto neurótico
A fenda que marca o sujeito e dá início a sua vida psíquica irá colocá-lo
diante da castração. Sabemos que a castração nos aponta uma perda simbólica,
uma falha que ocorre na tentativa de traduzir o real em linguagem.
O sujeito neurótico é confrontado com a castração do Outro. Ciente dessa
castração, o recalque desloca esse saber para o inconsciente na tentativa de livra-
se da angústia que o saber da falta produz.
Todas as estruturas neuróticas passam por esse processo e as
particularidades de cada uma, se diferenciam nas posições que os sujeitos têm
diante das tentativas de retorno do que foi recalcado.
Pierre Naveau [11], em O que do encontro se escreve nos diz que “Na
relação do sujeito com a castração, trata-se de sua relação com a castração do
Outro e, mais exatamente, da consequência, no que concerne à sua relação com a
castração do Outro e cita Lacan no seminário A transferência < sem dúvida, existe
algo mais neurotizante que perder o falo, é não querer que o Outro seja castrado
>.
Impasses histéricos
Neste movimento identificatório que é posto a menina – ora com a mãe, ora
com o pai – apresenta-se o enigma, traz questões que dizem da histeria: o que as
mulheres desejam nos homens? o que os homens desejam nas mulheres?
Este ato de tomar para si a castração do Outro, faz com que a histérica
assuma a posição de um não saber. A questão com o saber esta posta para
histérica desde o inicio. “Lacan no seminário 17 [16] irá dizer que há uma relação
primitiva entre o saber e o gozo.” Perde-se alguma coisa e é preciso compensar
essa perda. O movimento compensatório faz gozo. Lacan vai nos mostrando como
as questões que acompanham a histérica, neste contexto de querer saber, faz com
que o seu desejo esteja sempre implicado pela via do Outro, além de modular o seu
modo de gozo.
As questões são pontos fundamentais na estrutura da histeria. As perguntas
sobre “o que desejar, o que é ser mulher , o que o homem deseja, irão funcionar
como um guia na sua busca de respostas para sua vida. [17]“O que a histérica
quer é um mestre” nos disse Lacan,1970. Porém, ainda que a histérica se
apresente querendo saber, na verdade esse saber faz revelar a castração do outro,
o ponto gerador de sua angústia, então há um recuo diante deste saber.
Retomando Lacan [18] , no seminário 17, “para estruturar corretamente um
saber , é preciso renunciar a questão das origens”. A histérica, para suportar a
angústia da castração do outro – um saber ordinário- renuncia e a cada
possibilidade de um retorno do que foi renunciado – recalcado- é elegido um outro
que supostamente saiba responder às suas questões.
Isto se torna um ciclo no movimento da histeria, [19]“ela quer que o outro
seja um mestre, que saiba muitas e muitas coisas, mas, mesmo assim, que não
saiba demais (...)” afirmou Lacan,1970.
Haverá sempre questões que a fará ir em busca de respostas, que serão
insuficientes marcando sua insatisfação, fazendo com que reinicie a busca pelo
saber. A insatisfação funcionaria aí como um recurso para afastá-la da angústia e
colocá-la sempre em movimento.
No contexto vigente onde impera o discurso da ciência que quer garantir
tudo na era do capitalismo, e da pluralização dos nomes do Pai, quando assistimos
um deslocamento do saber organizado pela lógica fálica para tantos outros modos
de organização do saber em sua relação com o furo, perguntaria: como fica o
movimento das histéricas, que segundo Laurent [20], seu sintoma “advém do amor
ao pai” ?
Aqui, não pretendia responder as questões, o trajeto que anunciei, de
fundamentá-las, se cumpre e deixa um desejo enorme de seguir na investigação de
tantas outras questões com as quais me encontro depois desta tentativa de cobrir
um “furo” encontrado nesta jornada dos estudos, não podia ser diferente!
Referências bibliograficas
[1] CAMPOS, Sergio Passos Ribeiro, 2011, Apresentação de uma nova
ordem, CURINGA 32- Confins do Simbólico
[2] MILLER, Jacques-Alain, Em direção à adolescência, 2015
[3] BRISSET, Fernanda Otoni de Barros, 2012, Não basta mais cochichar no
ouvido dos príncipes
[4] idem, 1
[5] MILLER, Jacques-Alain, Instituições milanesas, 2011 – Opção Lacaniana
– ano 2 – número 5
[6] idem, 5
[7] LACAN, J. A direção do tratamento e os princípios do seu poder, 1958
[8] FREUD,S. Sobre tipos neuróticos de adoecimento, 1912 – Neurose,
Psicose, Perversão – Obras incompletas de Freud , ed autentica, 2016
[9] FREUD, S. A cisão do eu no processo de defesa, 1940 – Compêndio de
psicanálise e outros escritos inacabados - – Obras incompletas de Freud, ed
autentica, 2014
[10] LACAN, J. As três formas da falta de objeto, 1956 – Livro quatro – A
relação de objeto, ed Zahar, 1995.
[11] NAVEAU, P. O que do encontro se escreve, estudos lacanianos 2017,
EBP editora
[12] BARROS, Romildo do Rêgo, O desejo da mãe – MÃES , 2015, editora
Subversos, RJ
[13] LACAN, J. A questão histérica (II): “O que é uma Mulher?”, 1956 – livro
3- as psicoses, ed. ZAHAR 1988.
[14] FREUD, S. A feminilidade – Conferência XXXII, 1933 – Amor,
sexualidade, amor – Obras incompletas de Freud, ed. Autentica, 2018
[15] idem, 13
[16] LACAN, J. Produção dos quatros discursos,1969 – Livro 17, o avesso
da psicanálise, ed. ZAHAR 1992.
[17] LACAN, J. Do mito à estrutura, 1970 – livro 17, O avesso da
psicanálise, ed. ZAHAR, 1992.
[18] idem, 17
[19] idem, 18
[20] LAURENT, E. Falar com seu sintoma, falar com seu corpo, 2012, VI
ENAPOL
O saber em psicanálise
A palavra saber deriva do latim sapere que se refere a “ter conhecimento,
ciência, informação ou notícia” e “ter sabor, agradar ao paladar” (CUNHA, 1982, p.
695). No decorrer do ensino de Lacan, esta palavra adquire um sentido diferente,
se afastando dos termos conhecimento, ciência, informação para, então, o saber
flertar com o sabor da verdade.
O saber em psicanálise difere do conhecimento, e é isso que Lacan explicita
“o que descobrimos na experiência de qualquer psicanálise é justamente da ordem
do saber, e não do conhecimento ou da representação”. O saber está relacionado a
um encadeamento significante, “trata-se precisamente de algo que se liga, em uma
relação de razão, um significante S1 a um outro significante S2”, e não ao acúmulo
de conhecimento, informações acerca de uma realidade. (LACAN, 1969-70/1992, p.
30).
Lacan, no seminário 17 explica que “saber é coisa que se diz, que é dita... o
saber fala por conta própria – eis o inconsciente” (LACAN, 1969-70/1992, p. 73).
Neste sentido, saber e inconsciente se parelham, podendo sugerir que o saber é
inconsciente, um saber que não se sabe. É pela surpresa, quando o sujeito se sente
ultrapassado, pelo que Freud denominou fenômenos do inconsciente, é que esse
saber aparece. Nesse tropeço, nessa hiância, produz-se um achado, que para o
sujeito tem um valor único, de verdade (LACAN, 1964/2008).
Também neste seminário 17, Lacan estabelece os quatro discursos,
importantes para a compreensão do que pretendemos neste trabalho, sendo eles o
discurso do mestre, o discurso da universidade, o discurso da histérica e o discurso
do analista. Luiz Henrique Vidigal, em Ensaios sobre os discursos em Lacan (sd),
lança luz a como esses discursos são constituídos. Em cada um desses discursos
observa-se que se delimitam quatro lugares ocupados por quatro letras diferentes.
Essas letras circulam na mesma orientação e ocupam lugares de acordo com o
discurso a que se referem, como pode ser visto abaixo:
A histérica e o saber
Nos quatro discursos elaborados por Lacan, o saber, S 2, ocupa diferentes
lugares em cada um deles, e neste trabalho deterei principalmente nos discursos do
mestre e da histérica, os quais nos ajudarão a compreender de certa forma a
relação da histérica com o saber.
No discurso do mestre, o saber está essencialmente no lugar do Outro, o do
escravo, que possui um saber-fazer referente à produção de gozo. E o mestre por
sua vez busca extorquir o escravo a fim de recuperar o resto de um gozo perdido
(NAVAEAU, 2017).
No discurso histérico o saber está colocado no lugar de gozo e o mestre é
quem trabalha para produzi-lo. A histérica se embaraça, interroga o mestre, S 1,
sobre sua relação com o saber, S 2, como visto no seu discurso essa relação
sugerida, S1/S2. Esse questionamento remete-se ao valor de a, sobre o que ela
mesma seria, uma pergunta lançada no campo do Outro sobre algo que está no seu
próprio campo, $/a, e o que escapa ao saber (NAVAEAU, 2017).
Ela quer que o Outro seja um mestre, daí S1 situado à direita acima no
discurso da histérica. E que este mestre saiba de muitas coisas, mas não tantas a
ponto de acreditar ser ela o prêmio máximo de todo o seu saber. Ela quer um
mestre sobre o qual ela reine e ele não governe (LACAN, 1969-70/1992).
No discurso histérico está instituída a pergunta sobre o que vem a ser a
relação sexual, de como um sujeito pode sustentar ou não esta relação. Colocando
o Outro como lugar deste saber, o sujeito histérico mostra-se estranho ao que de
fato está em jogo no saber sexual, permanecendo assim um saber recalcado
(LACAN, 1969-70/1992).
O sujeito histérico se aliena do significante-mestre o qual efetua a divisão do
sujeito e se recusa a dar-lhe corpo, explicitado por Helenice de Castro (2018) como
“uma recusa do corpo ao efeito de castração determinada pela incidência do S1”. Na
recusa do corpo, o sujeito não se coloca como escravo frente ao significante-
mestre. A histérica faz a seu modo, então, uma espécie de greve, como disse Lacan
no seminário 17, e não entrega o seu saber. Ela desmascara a função do mestre,
mas permanece solidária valorizando o que há de mestre no que é o Um,
esquivando-se assim de ser objeto de desejo (LACAN, 1969-70/1992).
Para a histérica o não saber ser a mulher a coloca em uma posição de
enunciação, onde o gozo do homem é posto como um saber da mulher. E que ela,
por sua vez, acredita não saber como proceder e nem do que é preciso fazer para o
gozo do homem. E ainda, acredita existir a mulher detentora desse saber. O
problema para a histérica não é o gozo feminino, mas sim o gozo masculino. “É
saber se o homem é um homem, se ele sustenta o Um”, se ele não tem medo da
castração, se ele consegue ser um mestre e se é capaz de colocar em jogo o Um da
vida. Então ela se direciona a outra em que ela julga ter esse saber, do gozo do
homem, e a faz seu objeto de admiração e adoração (NAVAEAU, 2017, p. 165).
A hiância entre a histérica e a mulher, a que sabe, instaura um conflito em
que mesmo a histérica não alcançando o gozo todo da mulher, que é impossível,
ela não cansa de desejar esse todo, permanecendo o seu desejo sempre insatisfeito
e recusando os gozos relativos.
Nesse sentido a histérica se vê dividida entre o gozo e o desejo,
caracterizado pela relação que ela estabelece com a mulher. A histérica não é nem
a mulher, a que sabe, nem uma mulher, a única de um homem (NAVAEAU, 2017).
Conclusão
A partir da escrita deste trabalho foi possível verificar que este
questionamento da histérica ao Outro, de buscar o saber no campo do Outro, só a
faz distanciar mais do seu próprio saber sobre o seu gozo. A histérica, então, não
quer saber nada sobre o seu próprio gozo e isso, de certa forma, seria uma defesa.
Ao sustentar um mestre potente, detentor de um saber total, a histérica esquiva-se
de deparar com a impotência, com a castração. Com a possibilidade de um trabalho
em análise, como visto no caso Dora, essa figura de mestre pode se esvair aos
poucos. Com isso, é possível dar lugar a construção de um saber sobre a própria
verdade, sobre o que há de particular no gozo de cada histérica.
Referências Bibliográficas:
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NAVEAU, P. O que do encontro se escreve. Estudos Lacanianos. Belo Horizonte: EBP,
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VIDIGAL, L. H. Ensaios sobre os discursos em Lacan. Belo Horizonte: Editora Tahl, sd.
MESA 3: O discurso analítico
Coordenador: Fernando Casula
Debatedora: Cristiana Pittella
1
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<http://www.ebpsp.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=579:ler-um-sintoma-
jacques-alain-miller&catid=23:textos&Itemid=54>. Acesso em: 19 jun. 2016.
consciência do sujeito” (1998, p. 282). Será em torno desse significante que o
sujeito perguntará: o que quer dizer isso? Isso seria o pedido de deciframento do
analisante de seu sintoma e que remete a algo desconhecido sobre seu modo de
gozo. Ao aproximar a letra do sintoma, Lacan articula o simbólico e o real pelo viés
do significante.
Assim é que se o sintoma pode ser lido, é por já estar inscrito, ele
mesmo, num processo de escrita. Como formação do inconsciente, ele
não é uma significação, mas a relação desta com a estrutura significante
que o determina (LACAN, 1998, p. 446).
O real do sintoma que persiste e que é observado por Freud talvez seja o
que dê o tom pessimista de “Análise terminável e interminável”, mas ao pensarmos
em um ir além, podemos contar, numa saída de análise, com a fecundidade de tais
restos sintomáticos, pois não há sintoma sem resto e este ponto que marca o fora
de sentido do sintoma.
Saber ler o sintoma pelo fora de sentido é a possibilidade de tocar o gozo
no que o sintoma guarda de mais original ao sujeito. A proposta não é de uma
análise infinita, mas de um final em que o sujeito passa a um saber fazer com o
particular de seu sintoma.
Trata-se de um ponto que só pode ser observado a partir de uma análise
levada ao seu final. Não se trata de tentar remodelar esse resíduo, nem para o
analisante ao final da análise, nem para o analista em seu fazer clínico. É de suma
importância para o “sucesso” de uma análise que o analista toque em algo do real,
onde se encontra a singularidade de cada sujeito.
Observamos isso nos testemunhos de Passe, dispositivo criado por Lacan
diante do impasse freudiano sobre o final de análise. Para o analisante que se
propõe analista, o fim de análise vai trazer a possibilidade de um novo saber. Há
um um resíduo ao final de análise, com o qual o sujeito tem que se haver. Bassols
(2009, s. p.) nos diz deste resíduo e sua importância:
Referências Bibliográficas
BASSOLS, Miquel ____O Resto a Demonstrar – Algumas notas para além das formações do
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CONTEMPORÂNEA, CASO G.
Referências Bibliográficas
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A JANELA DA ESCUTA: ATENDIMENTO PSICANALÍTICO DE
ADOLESCENTES EM INSTITUIÇÕES DE SAÚDE
INTRODUÇÃO
A PSICANÁLISE APLICADA
Para Miller (2008), o analista dentro das instituições não irá possibilitar um
lugar de escuta como é nos consultórios isolados e, também ali, o sujeito analisante
não é convidado a falar o que quiser. Nas instituições vemos “[...] um lugar de
respostas, um lugar em que falar à toa assume a forma de questão e a própria
questão, a forma da resposta.” (Miller, 2008, p. 9)
Na psicanálise aplicada, a partir de certo dizer esclarecedor, o analista pode
“[...] separar o sujeito da desordem contra a qual ele se insurge [...]. Disso resulta
frequentemente um efeito de alívio, proporcional ao efeito de liberação de um
destino que acorrenta o sujeito à sua certeza”. (SANTOS, 2005, p. 46)
Os efeitos psicanalíticos alcançados nas instituições
A ADOLESCÊNCIA
Freud (1905) nos relata que com a entrada da puberdade, a vida sexual da
criança se configura decididamente. Antes desta fase, a pulsão sexual era
basicamente auto erótica e as zonas erógenas independiam umas das outras. Com
a entrada na puberdade surge novo alvo sexual: a zona genital.
Segundo o autor, tanto para o menino quanto para a menina “A afeição
infantil pelos pais é sem dúvida o mais importante, embora não o único, dos
vestígios que, reavivados na puberdade, apontam o caminho para a escolha dos
objetos” (FREUD, 1905, p. 215).
Na adolescência, ainda segundo Freud (1914), o sujeito precisa buscar
formas de se separar de seus pais, buscar novas referências, novos ideais.
Para Lacan (1954), os meninos adolescentes não pensariam em fazer amor
com as mocinhas sem o despertar de seus sonhos. Isso não é satisfatório, pelo
contrário, é mal sucedido para todos uma vez que a sexualidade faz furo no real.
Os adolescentes necessitam da fantasia para encontrar formas de lidar com a
sexualidade.
Miller (2015) relata que os adolescentes são quem inicialmente percebem as
consequências do que ele nomeia como declínio do Nome-do-Pai na
contemporaneidade. Para ele, diante de uma vasta gama de objetos ofertados aos
sujeitos, estes passam a buscar o saber não mais no campo do Outro, uma vez
que, supostamente, a voz do pai perde sua importância.
Sendo assim, o que vemos na contemporaneidade são adolescentes que não
encontram tão facilmente novas referências, passando então a serem orientados
pelo gozo e não mais pelo ideal. São sujeitos que estão sempre em busca de um
gozo que se encontra sem limites, sujeitos guiados por um imperativo que manda-
os gozarem sempre mais e mais.
Recorremos novamente a Miller (2015), ao citar Hélène Deltombe, em seu
artigo “Les enjeux de l’adolescence”, para dizer que novos sintomas relacionados ao
laço social se apresentam diante do enfraquecimento do Outro. Esses sintomas
podem se tornar fenômenos de massa ou epidemias, como alcoolismos,
toxicomanias, delinquências, tentativas de autoextermínio ou de suicídio, etc. São
sintomas contemporâneos, todos relacionados ao excesso de gozo.
Guerra (2012) acrescenta que
A JANELA DA ESCUTA
CONCLUSÃO
Referências Bibliográficas
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