"When the history of our time is written, posterity will know us not by a cathedral or temple, but by a bridge."
Montgomery Schuyler, jornalista e crítico de arquitetura (1877)
I.1 - DEFINIÇÕES
As estruturas típicas de pontes são usualmente classificadas como “Obras de Arte Especiais”, ou
simplesmente OAE, denominação destinada a diferenciá-las das “Obras de Arte Correntes”, que são
constituídas basicamente de pontilhões e bueiros. De acordo com o DNIT [1], tem-se as seguintes
definições:
PONTE: Estrutura, inclusive apoios, construída sobre uma depressão ou uma obstrução, tais como
água, rodovia ou ferrovia, que sustenta uma pista para passagem de veículos e outras cargas móveis,
e que tem um vão livre, medido ao longo do eixo da rodovia, de mais de seis metros. Ficam incluídos
nesta definição viadutos, passagens superiores e passagens inferiores.
PONTILHÃO: Ponte, inclusive apoios, com vão livre igual ou inferior a seis metros.
BUEIRO: Estrutura de drenagem, construída sob a rodovia, atravessando todo o corpo estradal.
Em geral as Obras de Arte Correntes seguem projetos padronizados, como por exemplo os bueiros
celulares padronizados pelo DNIT [2], reproduzido na figura I.1.
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I.2 - PROJETO E CONSTRUÇÃO
No projeto de uma estrutura de ponte são envolvidas diversas áreas da engenharia, conforme
resumido na Figura I.2, em geral atendidas por empresas especializadas em setores afins.
I.3.1 - ESTRADAS
A construção de uma ponte decorre basicamente da necessidade de se transpor um determinado
obstáculo, por diversos objetivos, destacando-se comércio, expansão territorial e guerras. A reincidência de
desafios estimula o aprimoramento das técnicas de construção, o conhecimento dos materiais e o
desenvolvimento de ferramentas e equipamentos.
Embora a construção de pontes tenha ocorrido desde os primórdios da humanidade, pode-se
observar que apenas as civilizações com rede de estradas dominaram e sistematizaram de fato o processo.
Na civilização ocidental, destacam-se os romanos, considerados os primeiros construtores de estradas e
pontes em grande escala. No império romano as estradas chegaram a totalizar aproximadamente 400.000
km, percorrendo basicamente a Europa, Oriente Próximo e norte da África, como ilustrado na Figura I.5.
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I.3.2 – SISTEMAS ESTRUTURAIS
Para se superar um determinado obstáculo, desde a antiguidade o Homem, inspirado na natureza,
utiliza basicamente um dos sistemas estruturais fundamentais ilustrados na Figura I.6. Importante observar
que as condições de apoio nos sistemas em arco e pênsil devem ser indeslocáveis.
Pode-se considerar que o console com escora inclinada (“mão francesa”) e a estrutura estaiada são
evoluções do sistema em balanço, conforme ilustrado na Figura I.8.
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I.3.2.1 – BIAPOIADO
O sistema de viga biapoiada é talvez o mais intuitivo, sendo observado em todas as civilizações
antigas tais como na Mesopotâmia, Egito, Grécia e nas Américas (Astecas, Maias e Incas). Neste sistema,
as construções em pedra ficam limitadas a alguns poucos metros de vão, devido à relativamente baixa
resistência à flexão. Um exemplo de ponte antiga em placa de pedra apoiada é Tarr Step (Figura I.10), na
Inglaterra, cuja construção é considerada pré-histórica.
Figura I.10 – Ponte pré-histórica Tarr Step em placas de pedras apoiadas [3].
A solução em viga biapoiada em pedra pode ser encontrada recorrentemente em construções antigas
nas Américas (Figura I.11.a) e Egito (Figura I.11.b), assim como nos templos gregos e romanos.
Figura I.11 (a) Construção Inca em Machu Picchu [4], (b) templo de Karnak no Egito [5].
Na verdade, as pontes antigas baseadas no sistema de viga apoiada eram, quase em sua totalidade,
executadas em madeira e assim não resistiram aos séculos. Exemplo célebre é a ponte de Júlio César sobre
o rio Reno, ilustrada nas Figuras I.12.
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I.3.2.2 – BALANÇO
As pontes em balanço são construídas a partir das extremidades engastada, formando consoles
independentes que se unem no centro do vão. A ponte de Eleutherna (Figura I.13), é um raro exemplo em
pedra, construída anteriormente ao período romano na ilha de Creta (Grécia).
Nos templos maias, pode-se observar que a solução em balanço é bem caracterizada (Figura I.14.a).
O sistema em balanço é também denominado falso arco ou “corbel arch” (arco em consoles ou arco
misulado), em virtude da forma semelhante ao arco, observado por exemplo em antigas construções na
Índia (Figura I.14.b).
Figura I.14 (a) Construção maia [10], (b) antiga construção na Índia [11].
Assim como no caso da viga biapoiada, as antigas soluções estruturais de pontes em balanço também
eram em sua maioria construídas em madeira e assim não resistiram ao tempo. Um exemplo típico da região
do Himalaia é ilustrado na Figura I.15.
Figura I.15 - Ponte baseada no sistema de viga em balanço, construída em madeira [12].
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I.3.2.3 – ARCO
Embora a construção dos primeiros arcos se atribua aos etruscos, sua aplicação em pontes só se deu
sistematicamente, no Ocidente, a partir da civilização Romana. Em outras civilizações, tais como na Grécia,
o arco era utilizado só em vãos enterrados, na forma de galerias para esgotamento de águas [18].
No arco, o material é solicitado exclusivamente à compressão, praticamente uniforme em toda a
seção transversal. Com o melhor aproveitamento do material, a solução em arco permite vãos bem maiores
do que a viga.
Diversas pontes romanas em arco podem ainda ser encontradas íntegras em várias partes da Europa.
Uma destas notáveis obras é a ponte Juliano (Figura I.16.a), no sul da França, construída há mais de dois
mil anos e que só foi retirada de uso no ano de 2005.
No Oriente o arco também era conhecido pela civilização chinesa desde a antiguidade. Exemplo
ainda em uso é a ponte de Zhaozhou (Figura I.16.b), construída por volta do ano 600, em arco abatido com
aduelas em pedra com chavetas em aço.
Figura I.16 - Ponte em arco de pedra (a) Ponte Juliano na França [13] (b) Ponte Zhaozhou na China [14].
Figura I.17 Superfícies de contato (a) radiais nos arcos [15] (b) paralelas nas vigas em balanço [16].
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Entre arco e o balanço a técnica construtiva também se diferencia bastante. No sistema em balanço,
os consoles são posicionados gradualmente a partir dos extremos, sendo o conjunto estável durante todo o
processo construtivo, mesmo sem escoramento. Já no arco, as aduelas são ajustadas sobre escoramento e
somente após o posicionamento da pedra de fecho o conjunto adquire estabilidade. As ilustrações da Figura
I.18 esclarecem.
I.3.2.4 – PÊNSIL
O sistema pênsil ou de cabo suspenso é uma solução intuitiva, presente em todas as civilizações
antigas. A ponte pênsil pode vencer vãos bem mais extensos que os arcos, porém é bastante flexível e tende
a apresentar oscilação lateral com a passagem das cargas ou mesmo sob ação do vento.
O sistema original pênsil, com o estrado côncavo (Figura 19.a), evoluiu naturalmente para o
tabuleiro retificado, suspenso em cabo pênsil (Figura 19.b).
No passado, com os cabos em fibras naturais, as pontes ficavam limitadas à travessia de humanos
ou no máximo animais. Na prática, as pontes baseadas no sistema pênsil só puderam ganhar capacidade de
carga representativa após o advento do aço na forma de correntes e cabos.
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I.3.3 - MATERIAIS
A evolução dos materiais de construção é fundamental para se compreender o aperfeiçoamento dos
sistemas estruturais. Os principais materiais utilizados podem ser agrupados como a seguir.
Materiais com resistência à compressão bem maior do que à tração:
Pedra, na forma bruta ou lapidada até a forma de blocos regulares;
Tijolos cerâmicos, desde os mais simples blocos de argila cozidos ao Sol;
Concreto, desde suas formas mais simples empregadas pelos Maias e Romanos;
Materiais com resistência à compressão semelhante à tração:
Madeira, podendo se considerar o bambu como um tipo de madeira;
Aço, cujo uso como material de construção só se acentuou após a revolução industrial.
Em função das proporções de suas formas geométricas, existem ainda os elementos com resistência
preponderante à tração, tais como as cordas e correntes, existentes desde a antiguidade, atualmente
substituídos pelos modernos cabos de aço ou cordoalhas de protensão.
No passado, algumas civilizações conheciam o princípio do concreto, destacando-se a civilização
romana, que utilizou o “opus caementicium” por vários séculos com pozzolana (cinzas vulcânicas),
conforme descrito por Vitruvius (século I a.C.). Entretanto o concreto apresentava as mesmas limitações da
pedra, não permitindo vencer grandes vãos. Exceção impressionante é o Panteão de Roma (Figura I.21)
cujo domo, com 43m de diâmetro interno, permanece como o maior vão livre em concreto não armado.
Ainda que o aço fosse conhecido há milhares de anos, sua produção antes da revolução industrial
era praticamente artesanal, sendo o material destinado à manufatura de pequenos objetos. A aplicação
estrutural do aço se limitava basicamente a barras isoladas, correntes, suportes de apoio e pregos. Esta
limitação só foi vencida a partir do século XVIII, com o avanço da siderurgia, ramo da metalurgia dedicada
ao aço. A construção da ponte de Coalbrookdale (Inglaterra) em 1779, denominada “Iron Bridge” (Figura
I.22), é considerada o marco inicial das estruturas metálicas modernas.
Produtos
pouco Ferros fundidos
utilizados Ferros fundidos pouco utilizados
↓ mais utilizados ↓
↓
Teor de
Carbono
0 1% 2% 3% 4% 5% 6%
AÇO FERRO FUNDIDO (FoFo)
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I.3.3.2 - CONCRETO ARMADO
Para maior aprofundamento no tema indica-se o artigo do professor Augusto Carlos de Vasconcelos
“Alguns Aspectos Curiosos da História do Concreto”, publicado na Revista da Sociedade Brasileira de
História da Ciência, número 3 (1989), disponível na página do professor Eduardo Thomaz
(http://aquarius.ime.eb.br/~webde2/prof/ethomaz/), juntamente com outros trabalhos. Pode-se ainda
destacar a publicação “Histoire du Béton – naissance et développement, de 1818 à nos jours”, disponível
em http://www.infociments.fr/.
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I.3.3.3 - CONCRETO PROTENDIDO
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