Gêneros textuais:
- Há muitos gêneros textuais; vamos focar nos principais e naqueles mais cobrados no ENEM.
Artigo de opinião / Carta / E-mail / Convite / Charge / Texto publicitário / Redação / Meme / Post
(facebook) / Cinematográfica / Histórias em quadrinho / Entrevista / Receita / Jornalístico /
Crônica / Conto / Romance (narrativa) / Poesia / Teatro
Crônica:
- Texto narrativo curto.
- Produzidos para jornais e revistas.
- Linguagem simples e coloquial. Oralidade.
- Tratam de acontecimentos corriqueiros, cotidianos, mas que tornam-se universais.
- Como se o autor estivesse conversando no café da manhã com o leitor.
- Visão pessoal subjetiva do cronista.
- Pode tratar de qualquer tema: político, econômico, amoroso, familiar, esporta, arte, ciência.
- Explora o humor, ironia.
- Possui personagens comuns: um amigo, namorado.
E a medicina, hein? - Antônio Prata
TÔ PREOCUPADO: não sei mais bater papinho. Por "papinho" entendo essa conversa
amena que puxamos com colegas de trabalho diante da máquina de café, essas palavras
inócuas que trocamos com conhecidos em festas e lançamentos de livros, na fila do
cinema ou no corredor do supermercado. Admito, sem falsa modéstia, que já fui um ás do
papinho. Até outro dia, era capaz de fazer hábeis trocadilhos com o título do filme em
cartaz ou do livro autografado; descolava, rapidamente, uma piada com cebolas, sabão em
pó ou qualquer que fosse o produto na gôndola do mercado; numa roda, ia de Leonardo
da Vinci a Leandro e Leonardo, sem jamais ficar chato ou deixar a peteca cair. De uns
tempos pra cá, contudo, algo mudou: paro diante de um conhecido, digo "oi, e aí, tudo
certo?", e, quando o papinho deveria brotar, as palavras somem da minha boca, como se
sugadas por um aspirador de pó. Aconteceu pela primeira vez faz uns três meses. Entrei
num restaurante e dei de cara com um escritor, a quem conheço por alto, mas cuja obra
muito admiro. Parei diante do sujeito, o cumprimentei e, quando abri a boca para dizer
qualquer bobagem, senti o vazio fungando em meu cangote. O escritor me olhava,
esperando alguma palavra -afinal, quem chega é o responsável pela introdução do
papinho-, mas minha mente era uma folha em branco. Assustado, agindo por reflexo,
tomei uma atitude que ainda não consigo compreender, mesmo já passadas tantas
semanas. Dei um soquinho no peito do literato e disse: "Bom apetite!". Que tipo de ser
humano, em sã consciência, dá um soquinho no peito de outro e diz "bom apetite!"?! O
Ronald McDonald talvez aja assim com uma criança, numa propaganda do McDia Feliz,
mas não uma pessoa de verdade -muito menos conversando com um grande escritor.
Arrasado, sentei numa mesa escondida, atrás de uma coluna, e fui roer o meu remorso.
Mal sabia eu que era só o começo de minha paralisia social. Dias depois, numa festa,
encontrei um ex-colega da escola, hoje oftalmologista. Nos cumprimentamos, um segundo
se passou, dois, três e, então, do fundo de minha estupidez, perguntei: "E a medicina,
hein?". Céus, como ele poderia responder a tamanha cretinice? Faria um discurso
começando com Hipócrates e terminando na última edição da "Scientific American"?
Tentaria, quem sabe, uma abordagem filosófica, dizendo que a medicina é a mais inútil de
todas as estratégias humanas para driblar a morte? Meu ex-colega, contudo, resolveu se
vingar na mesma chave, disse apenas "vai indo, vai indo... E você, escrevendo muito?". De
lá pra cá, por medo de cair novamente num desses bueiros sociais, estou praticando uma
espécie de chavão preventivo, que consiste em dar oi e engatar imediatamente num
papinho sobre o tempo. Sei que é uma estratégia burra, quase como matar-se por medo
da morte, mas antes abrigar-me no morno lugar comum da meteorologia do que,
debatendo-me para escapar do abismo do silêncio, terminar dando soquinhos no peito de
alguém ou perguntando por aí: "E a medicina, hein?", "E o direito cível, hein?", "E a
mecânica dos fluidos, hein?".
Deus me livre.
Toró - Antônio Prata