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RESENHAS 275

A reação de Causey é http://dx.doi.org/10.1590/1678-49442018v24n1p275

animadora: desenhar é aceitar DAS, Veena. 2015. Affliction:


riscos; é gerar experiências health, disease, poverty. New
memoráveis e revolucionárias; é York: Fordham University Press.
pressupor que o pesquisador “não 256 pp.
sabe o que não sabe”. As imagens
são notas, documentos de campo Raphael Bispo
que se dão a ver. Não é preciso Mestre e Doutor em Antropologia Social
se desculpar, mas sim aprender pelo Museu Nacional/ Universidade Federal
com os diálogos, as reações e do Rio de Janeiro (UFRJ), Professor Adjunto
as interpretações. Todo desenho do Programa de Pós-Graduação em
etnográfico vale a pena, desde que Ciências Sociais (PPGCSO)/ Universidade
Federal de Juiz de Fora/MG, Brasil.
seja uma criação ética, moral e
intelectualmente responsável. Sob
este aspecto, é tocante o caso de “Eu mencionei a você minhas
uma entrevista feita pelo etnógrafo notas altas, não é mesmo? Mas
com um veterano de guerra, viúvo, eu não pude mostrar como eu fui
cuja fama social era a de arrogante bem na escola para a mamãe”
e orgulhoso. Desse encontro, (:78). A declaração em tom de
que reverte suas expectativas, o lamento é de Mukesh, 8 anos
autor não faz registros gráficos ou de idade, dita à antropóloga
textuais. Olha nos olhos, exercita Veena Das quando retornava à
sua visão periférica na penumbra, casa da criança na periferia de
aceita a memorização e o silêncio Nova Delhi e recebe a notícia da
como parte da experiência. Nem morte por tuberculose da mãe dele,
tudo, afinal, pode (ou deve) ser Meena. Esta e outras tocantes falas
registrado. compõem a narrativa de Affliction
Nos capítulos finais, Causey – a mais recente etnografia dessa
se pergunta como ultrapassar as influente pesquisadora indiana –
superfícies, como trazer à tona cujos desconcertantes sentimentos
as estr uturas e as motivações que provoca nos leitores são aqui
que animam pessoas, coisas e impossíveis de serem reavivados em
animais. Suas respostas em textos toda a sua intensidade. Isto porque
e imagens são de uma rara beleza: Das aprofunda neste trabalho a
revelam-se mais como perguntas proposta que tem marcado sua
do que soluções; são imperfeitas trajetória intelectual ao dedicar-se
e tentativas; são portas que se mais uma vez ao estudo das formas
abrem para dar sentido ao mundo – com que as pessoas resistem e
possibilidades dentro do impossível recuperam suas vidas que, por
projeto etnográfico. alguma razão, são devastadas pela
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dor, observando os movimentos que tensões sociais, como, por exemplo,


elas executam entre os diversos as doenças que nos acometem
l i m i a r e s d e s u a s ex i s t ê n c i a s com frequência. São aspectos da
justamente através da convivência existência um tanto escondidos
com os sofreres que corroem seus que vêm à tona e reorientam nossas
cotidianos. Dessa vez, a autora relações. Pequenas suspeitas,
privilegia em Affliction a trajetória traições e injúrias podem adquirir
de saúde e doença de moradores de uma maior escala e envenenar
variadas regiões pobres da Índia, uma vida, mas geram também
analisando a maneira como eles pequenos atos de amabilidades e
(re)habitam seus mundos marcados benevolências que tornam possível
pela precariedade do serviço de algum sobreviver.
atendimento médico. Segundo Das, as dores
Entretanto, mesmo diante dos “quase eventos” são ainda
dessa continuidade teórica, Das mais difíceis de serem captadas
acrescenta uma outra perspectiva etnograficamente por conta de
na multifacetada maneira como a suas fugacidades ao que parece
dimensão rotineira do sofrimento paradoxais: um sofrimento que
merece destaque em seus escritos. é assimilado em um contexto de
Em Critical Events (1995) e Life normalidade e, ao mesmo tempo,
and Words (2007) demonstrou como não é plenamente absorvido pelas
é possível habitar um cotidiano pessoas, deixando nelas marcas
repleto de memórias de violências e um senso de que algo não está
do passado através das linguagens muito bem. “Aflição” é a palavra que
do testemunho, do luto e do sonda suas notas de campo e que
silêncio. Tal proposta conecta-se à melhor expressa sentimentalidades
ideia de compreender a expressão que não chamam a atenção por
do sofrer provocada por grandes serem catastróficas ou sublimes,
“eventos críticos”, como a Partição mas que nos tiram por um momento
da Índia ou o assassinato de Indira a capacidade de nos engajarmos em
Gandhi. Porém, em Affliction, a nossas vidas. A aflição, portanto,
autora quer refletir sobre um estilo não é para a autora apenas
de sofrimento que poderíamos uma “teologia do sofrimento”, é
afirmar ser ainda mais habitual, também uma “política econômica
por se alicerçar na banalidade do do cotidiano” (:25), uma vez que
que ela nomeia de “quase eventos” realçar os desesperos e as misérias
(:12), modos como o dia a dia pode que o estar aflito provoca não
ser revirado de uma maneira não significa deixar de lado a energia
abrupta por acontecimentos que encontrada pelas pessoas para
estão longe de gerar rupturas ou reverter infortúnios.
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A imaginativa e sensitiva em trabalhos anteriores. Vivemos


narrativa etnográfica de Das deixa a morte dos outros queridos ao
mais uma vez sua marca na obra. fazermos dela algo que também é
Vários capítulos dedicam-se a nosso, reconfigurada em torno de
esmiuçar os itinerários terapêuticos mágoas e pesares, mas também de
de indianos em busca da cura ações dignificantes de recuperação
de seus males, concentrando-se existencial. Isto é particularmente
nas histórias de vida que existem relevante quando Das acompanha
por detrás do encontro dessas as reverberações das doenças na
pessoas com alguma doença. A vida das crianças no capítulo 3,
etnografia, ao privilegiar o enfoque talvez o mais “aflitivo” de todo o
em algumas poucas trajetórias, nos livro. Como elas aprendem a (re)
permite perceber em detalhes como fazer seus mundos e a lidar com a
estar adoentado revela muito das vida num contexto de precariedade
redes de relações sociais tecidas e privação, em que a morte de
em torno dessa situação, além da um vizinho ou parente é algo
circulação de afetos e das condições recorrente? As crianças defrontam-
específicas de atendimento precário, se a todo instante com uma rotina
resultado da pobreza urbana que que é misteriosa para elas, um
marca a dinâmica terapêutica “país estranho” (:69), nos termos
presente em inúmeras periferias de Wittgenstein, filósofo cujas
do mundo. Torna-se impossível reflexões são centrais na obra de
não nos sensibilizarmos quando Das. Porém, em suas “cenas de
acompanhamos o périplo de Meena instrução” (:61), elas não são uma
por variados centros médicos de mera adaptação a essas condições,
Nova Delhi, diagnosticada com muito menos seres autônomos
tuberculose e inúmeras vezes e autossuficientes que teorias
considerada “curada” pelos médicos. contemporâneas buscam corroborar.
No desespero que a acometia nos Das explora como a morte de uma
períodos de fortes dores, podemos mãe muito amada deforma a vida de
verificar também sua esperança e um filho. Acompanhamos Mukesh
movimentos de resistência em busca aprendendo a lidar com um mundo
de um bem viver mesmo diante não estável e essencialmente
das más condições do atendimento incoerente, construindo e
médico público. formulando um futuro para si em
Para a autora, a morte torna-se torno dos preceitos e ideais de sua
um parasita no corpo de quem fica, mãe falecida, fazendo-se agente
imagem-metáfora que muito faz diante de um futuro vislumbrado
lembrar o importante conceito de sempre por lembranças-parasitas
“conhecimento venenoso” presente que povoam sua memória.
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As trajetórias de doença mais significativas para seus entes


também nos dizem que o abandono familiares quando estes se veem às
e o “deixar morrer ” acontecem voltas com obrigações de cuidado e
numa imbricada trama que vai da carinho para com eles.
negligência do Estado à da própria Além dos “pacientes” e dos
família do doente. E quando alguém familiares, os agentes de saúde
tido como “louco” demanda a também merecem atenção na
atenção de outros, mas não consegue etnografia. A autora busca romper
obter o interesse necessário com a ideia de que existem dois
que lhe permita reconstruir sua sistemas de práticas de cura:
trajetória? Analisando casos ligados médicos que agem seguindo
a diagnósticos de doenças mentais, preceitos da biomedicina ocidental
Das traça o fracasso e a fragilidade e curandeiros que resgatam
das políticas de famílias que são tradições milenares indianas.
incapazes de absorver os efeitos A observação diária demonstra
de certos “sintomas” no dia a dia. que ambas as ações compõem
Neste tipo específico de infortúnio, os conhecimentos de todos os
a autora quer demonstrar que não responsáveis pela saúde nas áreas
se trata de uma mera “perda do pobres da Índia. O mesmo agente
self” ou de “identidade” por parte que faz uso de um antibiótico em
do doente. O que se perde é um um paciente também poderá utilizar
modo de se estar no mundo, por um tridente de Shiva e mantras
isso a descrição de um caso de em outra pessoa. Se os pacientes
“loucura” é muitas vezes o relato constantemente experimentam os
do conjunto de relações fraturadas limites da normalidade diante de
de uma pessoa, seus (des)afetos e uma doença, médicos e curandeiros
(des)encontros com os outros. Assim, também passam por esse tipo de
cabe ressaltar aqui que não se trata situação quando certos males são
de defender a “construção cultural” indecifráveis aos seus olhos. Logo,
da doença mental, demonstrando longe de ser uma mera relação
ser ela mero reflexo das resistências de troca de serviços terapêuticos,
de um indivíduo a uma sociedade e uma intricada rede relacional se
às suas regras. Das observou muitos configura entre quem sofre e quem
sofrimentos e violências em torno cura. Ao mesmo tempo, Das amplia
desses diagnósticos para desacreditar as fronteiras dessa articulação
dos efeitos e da “ realidade” quando demonstra as conexões
deles na vida das famílias. Foram existentes entre as decisões de cura
inúmeras e sucessivas histórias de e cuidado tanto com as tecnologias
exclusão em que as palavras de capazes de estender a vida das
certas pessoas passaram a não ser pessoas quanto com as ingerências
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de espíritos de “outro mundo”. As a banalidade da vida, resumindo


aflições diárias, portanto, conectam sua tarefa no mundo a meramente
humanos a diversas modalidades viver, não no sentido de apenas
de seres, sejam eles divinos ou sobreviver, mas no de aprender
maquínicos. A vida e a doença a se engajar na vida novamente
não são uma simples relação entre durante e depois dos sofrimentos
humanos. enfrentados.
Assim, diante de tudo o que
foi aqui exposto, Affliction poderia
ser considerada uma importante
contribuição para uma antropologia
da saúde e da doença. E realmente
a obra atende a este requisito. No
entanto, pensando de forma mais
ampla, o trabalho transcende a essa
abordagem ao contribuir também
para um refinado exercício de
consolidação de uma antropologia
das emoções que desde meados dos
anos 1970 ganha espaço no cenário
norte-americano. A essa tradição, a
autora não apenas avança sobre a
proposta de análise “micropolítica”
das sentimentalidades que pioneiras
como Lila Abu-Lughod e Catherine
Lutz souberam tão bem tecer através
de suas teorias. Das vai além,
construindo dentro desse campo
uma marca própria ao trazer, por
meio de sensíveis etnografias,
um minucioso acompanhamento
das nem sempre fáceis condições
existenciais da vida humana. A
autora é uma arguta etnógrafa
das “subjetividades precárias” ou
em “condições de precariedade” –
conceituaríamos assim sua trajetória
inspirados em Judith Bulter –
personalidades que agem com o
intuito de garantir seus cotidianos,

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