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JORGE MAURICIO DE SOUZA ROCHA

ECLESIOLOGIA EM BONHOEFFER
Uma analise reflexiva, histórica e teológica sobre as perspectivas
eclesiológicas de Dietrich Bonhoeffer em Sanctorum Communio e no
Discipulado

SERRA
2018
JORGE MAURICIO DE SOUZA ROCHA

ECLESIOLOGIA EM BONHOEFFER
Uma analise reflexiva, histórica e teológica sobre as perspectivas
eclesiológicas de Dietrich Bonhoeffer em Sanctorum Communio e no
Discipulado

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao


Centro de Ensino Superior FABRA, como requisito
parcial para conclusão da graduação em Teologia.

Orientador: Prof. Gladson Pereira da Cunha.

SERRA
2018
ECLESIOLOGIA EM BONHOEFFER
Uma analise reflexiva, histórica e teológica sobre as perspectivas
eclesiológicas de Dietrich Bonhoeffer em Sactorium Commnunio e no
Discipulado
.

RESUMO

A Igreja brasileira tem enfrentado atualmente uma verdadeira crise


existencial, visivelmente fragmentada, teologicamente rasa, desnutrida
espiritualmente, por banalizar a fé, tem silenciado sua voz profética, e seu
posicionamento diante dos reais dilemas da nossa sociedade tem sido irrelevante. O
presente artigo propõe uma análise reflexiva sobre a Eclesiologia, sobretudo, a luz
das perspectivas eclesiológicas de Dietrich Bonhoeffer, que tanto por meio sua
respeitada produção acadêmica, quanto pela profundidade de sua impressionante
biografia, tem muito a dizer quanto ao verdadeiro proposito da Igreja, diante de
Deus, da comunidade local, e da sociedade como um todo.
PALAVRAS-CHAVES
Cristianismo. Bonhoeffer. Eclesiologia. Cristologia. Biografia.

ABSTRACT

The Brazilian Church has faced a veritable existential crisis, visibly


fragmented, theologically shallow, spiritually undernourished, by banalizing faith, has
silenced its prophetic voice, and its positioning in the face of the real dilemmas of our
society has been irrelevant. The present article proposes a reflexive analysis on
Ecclesiology, especially in the light of the ecclesiological perspectives of Dietrich
Bonhoeffer, who through both his respected academic production and the depth of
his impressive biography has much to say about the true purpose of the Church,
before God, the local community, and society as a whole.
KEYWORDS
Christianity. Bonhoeffer. Ecclesiology. Christology. Biography

.
INTRODUÇÃO

Poucos pensadores produziram teologia com tão ampla interação entre a vida
prática e a reflexão como Dietrich Bonhoeffer, teólogo alemão, pastor luterano que
foi executado pelo regime Nazista no fim da 2ª guerra mundial. Suas reflexões sobre
a Igreja de Cristo ocuparam de forma intensa e fascinante, a maior parte de sua
produção teológica. Nesse artigo discorreremos sobre a Eclesiologia (subdivisão da
teologia sistemática, que trata da natureza, função e missão da igreja), e sobre as
reflexões eclesiológicas de Bonhoeffer, que seja por seu engajamento pessoal, ou
por sua brilhante capacidade acadêmica, tem muito a dizer a Igreja contemporânea,
que vem enfrentando o desgaste de um tempo onde imperam o relativismo, o
pragmatismo, e a crise dos absolutos oriundos de uma sociedade pós-moderna, e a
forma como ela se apresenta em nossa realidade e cultura.

Para isso, preliminarmente, observaremos o conceito de eclesiologia, de


forma breve e sucinta, trataremos de forma geral sobre as abordagens a respeito
desse vasto campo da teologia cristã que observa o dogma da Igreja, bem como
algumas variantes, contexto histórico e direções. Posteriormente trataremos sobre
os principais aspectos da vida e da obra de Bonhoeffer, passo importante para
compreendermos o contexto em que sua eclesiologia foi elaborada e desenvolvida,
tanto no campo teórico, sobretudo, na vida prática.

Por fim, analisaremos mais especificamente algumas de suas reflexões


eclesiológicas, bem como sua visão do que significa na prática o ser Igreja. Para tal,
nosso foco será três de suas principais obras, das quais Bonhoeffer disserta sobre a
Igreja, iniciando por sua tese de doutorado intitulada “Sanctorum Communio, uma
investigação dogmática sobre a sociologia da Igreja” apresentada aos seus 21 anos,
perante a Faculdade de Teologia da Universidade de Berlim, em que o mesmo
recebeu o conceito máximo, o livro Nachfolge, traduzido para o português sob o
titulo de Discipulado escrito em 1937 e Vida em Comunhão publicada em 1938. Para
Bonhoeffer, a Igreja é Cristo presente fisicamente na terra, através da pregação da
palavra e dos sacramentos, e se manifesta inicialmente pelo chamado ao
seguimento.
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1 O QUE É ECLESIOLOGIA?
Inicialmente, é importante mencionar que a Igreja Cristã contemporânea,
assim como em outros períodos de transição na história, vem enfrentando grandes
desafios enquanto um organismo vivo e institucional. Portadora de uma mensagem
atemporal, edificada sobre uma afirmação tão solida, que foi capaz de atravessar os
séculos, proferida pelo apostolo Pedro, “Simão Pedro respondeu: "O Senhor é o
Cristo, o Filho do Deus vivo!”“.(Mt 16:16) e sobretudo, nas palavras do próprio Cristo,
“e sobre esta pedra, edificarei minha igreja” (Mt 16.18), mas que traz consigo um
peso cultural e filosófico de uma instituição que sobrevive a quase 2000 anos de
história, atravessando os períodos mais diversos e conturbados da humanidade,
transformando e sendo transformada, adquirindo características peculiares quer seja
assimilando e absorvendo, ou influenciando e direcionando a cultura ao seu redor.

Levando em consideração as características dos tempos em que vivemos


hoje, por muitos pensadores contemporâneos, compreendido como a “pós-
modernidade”, entendemos que o tema da religião, outrora descartado pelo
pensamento ocidental influenciado pelos pressupostos humanistas seculares,
característicos do pensamento iluminista e racionalista da modernidade, agora,
retornam ao debate acadêmico e popular como destaca o teólogo e pesquisador
Michael W. Goheen;

Uma das contribuições positivas dada pela pós-modernidade à cultura


ocidental tem sido a de levar o tema da religião de volta ao debate
acadêmico sério. Vários pensadores pós-modernistas tem tratado de temas
religiosos em seus escritos. Agora temas como perdão e oração estão
presentes na programação de conferencias acadêmicas conceituadas, o
que teria sido impensável apenas vinte anos atrás. (GOHEEN, 2016 p.170)

Não obstante, esse mesmo destaque, haja vista, o relativismo e a rejeição


das “verdades absolutas” característicos do pós-modernismo, têm gerado grande
necessidade e urgência de uma teologia verdadeiramente bíblica, que corresponda
de forma positiva e objetiva aos anseios do homem contemporâneo, que em busca
da sua própria “verdade particular”, vem se distanciando cada vez mais da fé nas
crenças que formaram as bases da nossa sociedade como a conhecemos hoje,
conforme Goheen evidencia, mesmo a razão não sendo mais o centro, ainda
prevalece o desejo de autonomia e emancipação do pensamento humano;

[...] devemos saudar esses desdobramentos, mas também precisamos


observar que o tipo de “religião” expresso por esses pensadores está muito
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longe de qualquer coisa parecida com a crença cristã ortodoxa. Os pós-


modernistas podem ter abandonado a confiança na razão, mas isso não
significa que abandonaram um desejo idólatra de autonomia humana. Nem
reabilitaram a confiança na tradição e no Deus vivo – pelo contrário. [...]
(GOHEEN 2016 p.170)

Nesse contexto, a compreensão real do que significa “Ser Igreja” é tão


importante para nós, enquanto estudantes da teologia cristã, tanto quanto para cada
cristão, membro de qualquer uma das diversas denominações cristãs, seja católica,
evangélica, tradicional ou carismática, histórica ou emergente. Para isso, a
importância do desenvolvimento de uma eclesiologia bíblica, contextualizada,
consciente, consistente e responsável, construída sobre uma ortodoxia comum, bem
como respaldada por uma ortopraxia, uma prática motivada por uma teologia
verdadeiramente cristã, como aponta o teólogo Alister McGrath;

A eclesiologia é aquela área da teologia que busca fornecer uma explicação


teórica para uma instituição que passou por muita mudança e evolução ao
longo dos séculos e que se estabeleceu em um contexto social e político
também variável. Assim, estudar as diversas perspectivas cristãs sobre a
igreja significa adquirir uma noção sobre a maneira como as instituições
adaptam-se às mudanças com a finalidade de sobreviver [...] (MCGRATH,
2005 p.543)

Eclesiologia é uma subdivisão da teologia sistemática, e trata da natureza,


função e missão da igreja. A tentativa de definir o “logos” da igreja e propõe que, a
exemplo de outras realidades, a igreja possui uma natureza intrínseca ou mesmo
uma essência que pode ser definida pela investigação sistemática. O termo pode ser
definido como o estudo acerca da doutrina da Igreja.

A expressão Igreja vem da palavra grega “ekklēsia” que por vezes tem sido
traduzido como aqueles que foram “chamados para fora” como indica R.C.Sproul;

Ekklēsia é outra palavra grega traduzida por “igreja”. A palavra ekklēsia é


formada do prefixo ek, que significa “fora de” ou “procedente de”, e de uma
forma do verbo kalēo, que significa “chamar”. Portanto, ekklēsia significa “os
chamados para fora”. (SPROUL, 2017, p 371)

Entretanto, em um sentido mais profundo, e analisando o contexto de como


essa mesma palavra “ekklēsia” era utilizada nos tempos bíblicos, por exemplo, como
os tradutores da septuaginta (tradução em grego do texto hebreu do Antigo
Testamento, feita para uso da comunidade de judeus do Egito no final do século III e
no II a.C., que teria sido realizada por 72 tradutores), o termo “assembleia” seria
mais apropriado, logo a Ekklesia de Deus, seria a assembleia, o ajuntamento ou a
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“comunidade de todos os cristãos de todos os tempos” como define o teólogo Wayne


Grudem,

A igreja é a comunidade de todos os cristãos de todos os tempos. Essa


definição compreende que a igreja é feita de todos os verdadeiramente
salvos. Paulo afirma: “Cristo amou a igreja e entregou-se a si mesmo por
ela” (Ef 5.25). Aqui o termo “a igreja” é usado para referir-se a todos aqueles
pelos quais Cristo morreu para redimir, todos os salvos pela morte de Cristo.
Isso, porém, inclui todos os verdadeiros cristãos de todos os tempos, tanto
os salvos do Novo como os do Antigo Testamento (GRUDEM, 2012, p.715)

Para Grudem, o conceito da Igreja, ou sua abrangência já se fazia presente,


ainda que de forma primeva, entre o povo Hebreu no Antigo Testamento; e a
tradução da palavra hebraica “qãhal”, para o grego “ekklêsiazõ”, “convocar uma
assembleia” pelos tradutores da septuaginta já indicavam tal abrangência;

Mas esse processo pelo qual Cristo edifica a igreja é apenas uma
continuação do modelo estabelecido por Deus no Antigo Testamento, por
meio do qual ele chamou a povo para si mesmo para ser uma assembleia
em adoração diante dele. Quando Moisés diz ao povo que o Senhor havia-
lhe dito: “Reúne este povo, e os farei ouvir as minhas palavras, a fim de que
aprenda a temer-me todos os dias que na terra viver...” (Dt 4.10), a
septuaginta traduz a palavra “reúne” (heb. qãhal) pelo termo grego
ekklêsiazõ, “convocar uma assembléia”, verbo cognato do substantivo do
Novo Testamento ekklêsia, “igreja”. Portanto, não é surpreendente que os
autores do Novo Testamento possam falar do povo de Israel do Antigo
Testamento como uma “igreja” (ekklêsia) no deserto” (At 7.38 - tradução do
autor) (GRUDEM, 2012, p.715).

Contudo, a eclesiologia não foi um dos temas mais explorados pelos


primeiros cristãos, como Alister McGrath nos aponta em sua obra, Teologia
sistemática, histórica e filosófica;

A eclesiologia não foi uma questão de grande importância para a igreja


primitiva. A igreja oriental não demonstrou ter consciência da importância
potencial dessa questão. A maior parte dos escritores gregos patrísticos dos
cinco primeiros séculos contentavam-se em descrever a igreja pelo uso de
imagens reconhecidamente inspiradas nas Escrituras, sem maiores
questionamentos. (MCGRATH, 2005, p.543)

MacGrath ainda sinaliza que foram as “controvérsias teológicas” que forçaram


as primeiras reflexões teológicas sobre a natureza da Igreja como, por exemplo, a
“controvérsia donatista” que foi a primeira a concentrar-se na questão da doutrina da
igreja, e nas questões a ela relacionadas, como a forma de atuação dos
sacramentos. Os donatistas eram exigentes, e insistiam que a Igreja não devia
perdoar nem receber pecadores, e que os sacramentos, administrados pelos
traditores (cristãos que negaram sua fé durante a perseguição de Diocleciano em
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303-305 d.C. e que mais tarde foram perdoados e readmitidos na Igreja) eram
ilegítimos.

Os donatistas acreditavam que todo o sistema de sacramentos da igreja


católica havia se corrompido. Como os sacramentos poderiam ser
validamente ministrados por pessoas que haviam se corrompido dessa
maneira? Portanto, era necessário substituir os traditores por pessoas que
haviam se mantido firmes na fé, mesmo sob perseguição. Também era
preciso batizar e ordenar novamente todos os que haviam sido batizados e
ordenados pelos traditores. Isso levou à inevitável formação de uma facção
separatista na igreja africana [...] (MCGRATH, 2005 p.546)

Então quando Agostinho (354 a 430 D.C) se torna Bispo de Hipona,


desenvolve o argumento eclesiológico, com a intenção de contrapor o donatismo,
faz uma distinção entre a “igreja visível e a igreja invisível.” Para Agostinho, a igreja
é um corpo misto, formada de uma combinação de trigo e joio, e, embora seja
chamada para seguir a pureza, Cristo fez advertências contra a disciplina
extremamente zelosa que, ao tentar remover o joio, poderia causar dano ao trigo (Mt
13:24-30). Essa visão “agostiniana” acerca da Igreja tem influenciado a eclesiologia
de forma geral no decorrer da história. Quanto às diferenças entre a Igreja visível e a
Igreja invisível, McGrath diz:

Em primeiro lugar, Agostinho destacou a natureza pecadora dos cristãos. A


igreja não pretendia ser uma comunidade de santos, mas um “corpo misto”
(cor- puspermixtum) de santos e pecadores. Ele encontra essa imagem em
duas parábolas bíblicas: a parábola da rede que pega muitos peixes, e a
parábola do joio e do trigo. Esta última parábola (Mt 13.24-31) assume
especial importância e precisa ser discutida [...] Para Agostinho essa
parábola refere-se à igreja no mundo. Ela deve esperar encontrar em seu
meio tanto santos quanto pecadores. Tentar fazer uma separação neste
mundo é algo prematuro e inadequado. Essa separação acontecerá no
tempo de Deus, no final da história [...] Portanto, em que sentido a igreja é
santa? Para Agostinho, a santidade em questão não está relacionada aos
membros da igreja, mas a Cristo. A igreja não pode ser uma congregação
de santos neste mundo, pois seus membros estão contaminados pelo
pecado original. No entanto, a igreja é santificada por Cristo, que a torna
santa — uma santidade que será aperfeiçoada e finalmente concretizada no
juízo final. (MCGRATH, 2005 p.546,547)

Diante de muitas outras controvérsias, e do surgimento de vários movimentos


sectários, os “pais primitivos” da Igreja, como foram chamados, desenvolveram suas
percepções teológicas com ênfase a combater o sectarismo bem como evitar as
cismas que por certo, enfraqueceriam a instituição. A Igreja se desenvolveu cada
vez mais através de uma estrutura Episcopal onde os bispos eram considerados, e
se intitulavam sucessores diretos dos apóstolos, conferindo aos mesmos um caráter
sacerdotal, gerando assim uma ideia de que não poderia haver salvação fora da
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Igreja romana, sendo assim, os pressupostos de Agostinho, de que a Igreja era o


corpo misto de Cristo, bem como a ideia de continuidade e autoridade apostólica
concedida aos bispos, outorgaram a Igreja, a noção de Catolicidade, única
depositaria da Graça divina e a total identificação da Igreja Romana como única
representante do Reino de Deus, como destaca o teólogo Louis Berkhof;

Agostinho não foi totalmente coerente em sua concepção da igreja. Foi sua
luta com os donatistas que o compeliu a refletir mais profundamente sobre a
natureza da igreja. De um lado, ele se mostra o predestinacionista que
concebe a igreja como a companhia dos eleitos, a communio sanctorum,
que têm o Espírito de Deus, e, portanto, são caracterizados pelo amor
verdadeiro. O importante é ser membro vivo da igreja assim concebida, e
não apenas pertencer a ela num sentido meramente externo. Mas de outro
lado, ele é o homem de igreja, que adere à idéia da igreja defendida por
Cipriano, ao menos em seus aspectos gerais. A igreja verdadeira é a igreja
católica, na qual a autoridade apostólica tem continuidade mediante a
sucessão episcopal. É depositária da graça divina, que ela distribui por meio
dos sacramentos. Esta igreja é, de fato, um corpo misto, no qual têm lugar
membros bons e maus. Em seu debate com os donatistas, porém,
Agostinho admitia que aqueles e estes não estavam na igreja no mesmo
sentido. Ele preparou também o caminho para a identificação católica
romana da igreja com o reino de Deus. (BERKHOF, 2001, p.553)

Seguindo as bases dessa tradição, a eclesiologia não sofreu grandes


alterações no decorrer da Idade Média, apenas um desenvolvimento da ideia de
Igreja como a detentora da autoridade do Reino de Deus sobre a terra, nesse
sentido a figura do Papa, recebia cada vez mais autoridade e poder absoluto,
chegando ao ponto do seu poder estar acima de reis e governantes dos Estados
oficialmente Cristãos.

Com a expansão do Cristianismo vieram tempos difíceis, pois quanto mais a


Igreja crescia e avançava, em território e poder, consequentemente ela era
secularizada, porém, como o próprio Bonhoeffer evidencia, algo de puro, ou pelo
menos a tentativa da manutenção da fé fora conduzida graças ao movimento
monástico, que com o aval da Igreja, se desenvolvia a margem da secularização da
Igreja Romana;

Com a expansão do cristianismo e o crescimento da secularização da


Igreja, a consciência da graça preciosa foi se perdendo. O mundo estava
cristianizado, e a graça tornou-se propriedade de um mundo cristão. Com
isso, tornou-se barata. A Igreja Romana, no entanto, preservou um resto
dessa primeira consciência. Foi de fundamental importância a vida
monástica não se ter separado da Igreja e esta ter tido a sabedoria de
tolerar o monasticismo (BONHOEFFER, 2016, p.22)
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Entretanto esse mesmo movimento, conforme Bonhoeffer contribuiu ainda


mais para a própria secularização da Igreja, pois a separava de sua missão e
presença no mundo, favorecendo assim, características do “dualismo” entre o
sagrado e o profano que a acompanhou ao longo dos séculos;

Mas, porque tolerou esse protesto e impediu a ruptura definitiva, a Igreja


relativizou o barateamento da graça e, na verdade, por meio dele até
mesmo ganhou a legitimação de sua própria vida mundana; pois, nesse
momento, a vida monástica tornava-se comportamento especial de natureza
individual, ao qual a massa popular não poderia ser submetida.[...] Assim,
sempre que se desferiam novos ataques à secularização da Igreja, podia-se
apontar para o caminho da vida monástica, ainda no seio da Igreja, ao lado
da qual se podia legitimar[...]Desse modo, recorrer à compreensão que a
Igreja primitiva tinha da graça preciosa, ideia que se preservava no
monasticismo da Igreja Romana, por fim serviu, paradoxalmente, como
justificação definitiva para a secularização da Igreja.(BONHOEFFER, 2016,
p.23).

Contudo, parece que o “cisma” da Igreja, que Santo Agostinho tanto temeu e
combateu, com sua eclesiologia da Igreja como um corpo misto, o “communio
sanctorum” indivisível, veio a se configurar, de forma inevitável, séculos depois
através da Reforma Protestante.

O Século XVI foi marcado, aparentemente, assim como no período patrístico,


por diversas controvérsias teológicas, sobretudo, das que abalavam a “unidade da
Igreja”, entretanto, diferentemente dos “pais da Igreja” essa fora uma inquietação
que a Igreja de então não conseguiu equacionar. As tensões que questionavam a
autoridade exclusiva de Roma, não foram movimentos isolados no seio da Igreja, e
já estava acontecendo, de certa forma, em meio a um movimento humanista
“renovador” do pensamento do clero, contudo, fora através das decisões e atitudes
de um monge alemão chamado Martinho Lutero, um dos precursores do movimento
que transformaria de forma contundente a eclesiologia, o movimento da Reforma
Protestante.

A partir da Reforma, o conceito de Cipriano de Cartágo, do “Extra ecclesiam


nulla salus” ( do latim, fora da igreja não há salvação) teve que ser redefinido,
sobretudo, por aqueles que institucionalmente se desligavam da Igreja Católica
Romana,

A Reforma do século XVI também testemunhou uma grande controvérsia


em torno deste tema. Como era possível, perguntavam-se os críticos da
Reforma, que os reformadores rompessem com a igreja estabelecida de
uma forma que fosse legítima e formassem suas próprias igrejas? Esta
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atitude não correspondia à violação da unidade da igreja?[...] Como já


vimos, a resposta tradicional dos reformadores a esta crítica era alegar que
a igreja medieval havia tornado-se corrupta a tal ponto que a Reforma
tornara-se inevitável.[...]Se uma reforma interna não fosse possível, a
separação e a formação de uma igreja reformada, fora da esfera de
influência da igreja católica medieval, seria necessária. (MACGRATH, 2005,
p.563)

As diversas denominações, bem como suas mais distintas narrativas,


desencadeadas pelo movimento da Reforma, iniciando pela Igreja que se separa de
Roma sob a visão Luterana, transformam a Eclesiologia em Eclesiologias e assim,
varias interpretações surgem acerca do que significa “ser Igreja”, bem como seus
dogmas e sacramentos. Por conseguinte, independentes da autoridade de Roma, as
Igrejas reformadas iniciam um processo que marca definitivamente a eclesiologia.
Posteriormente a Igreja Católica Romana, ainda sob a premissa do “extra ecclesiam
nulla salus”, passa a interpretar as igrejas protestantes como hereges, pagãos e
separados da promessa, ao mesmo tempo em que os protestantes alegavam que a
Igreja Católica havia corrompido a verdade e deixado o posto de única representante
do Reino de Deus como vimos no texto de MacGrath acima.

Essa postura acompanhou a eclesiologia católica ao longo de todo período da


modernidade, sendo debatida apenas no Concilio do Vaticano II já no século XX
quando as Igrejas protestantes vieram a ser reconhecidas como os “irmãos
separados”, como salienta MacGrath;

Uma abordagem imperialista que declara a existência de uma única igreja


empírica - isto é, observável - que mereça ser conhecida e tratada como a
verdadeira igreja. De acordo com esta ótica, todas as demais são
fraudulentas, ou, na melhor das hipóteses, um arremedo de igreja. Esta era
a posição defendida pela Igreja Católica Romana antes do Concilio Vaticano
II (1962-1965), quando a igreja católica reconheceu as demais igrejas
cristãs como irmãos e irmãs “separados” em Cristo. (MACGRATH, 2005,
p.563)

Sobre a Eclesiologia Católica Romana, vale ressaltar que essa visão mais
ecumênica da Igreja, fica registrada como uma tentativa de reaproximação dos
protestantes, no documento “CONSTITUIÇÃO DOGMÁTICA LUMEN GENTIUM
SOBRE A IGREJA”, disponível no site do Vaticano, como pode observar no trecho a
seguir:

A Igreja vê-se ainda unida, por muitos títulos, com os baptizados que têm o
nome de cristãos, embora não professem integralmente a fé ou não
guardem a unidade de comunhão com o sucessor de Pedro (28). Muitos há,
com efeito, que têm e prezam a Sagrada Escritura como norma de fé e de
vida, manifestam sincero zelo religioso, crêem de coração em Deus Pai
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onipotente e em Cristo, Filho de Deus Salvador (29), são marcados pelo


Baptismo que os une a Cristo e reconhecem e recebem mesmo outros
sacramentos nas suas próprias igrejas ou comunidades eclesiásticas.
(LUMMEN GENTIUM cap.II, 15)

Apesar de todas as tentativas de unidade da Igreja Cristã, dos movimentos


ecumênicos que até mesmo o próprio Bonhoeffer prefigurou, sonhando com a união
dos Cristãos de todas as raças e povos, através da pessoa de Cristo, (como
veremos no próximo tópico), a Eclesiologia enfrenta questões peculiares de nosso
tempo, e como salientamos no inicio desse tópico, uma das maiores narrativas
concorrentes da Eclesiologia tem sido a questão do pluralismo. De acordo com
Sproul (2014, p.09) “Pluralismo é uma filosofia que permite uma ampla diversidade
de pontos de vista e doutrinas coexistirem dentro de um único corpo”.
Consequentemente, surgem tantas discordâncias doutrinárias dentro das igrejas, e
paralelamente, uma tentativa de manter a paz e a unidade ao mesmo tempo em que
acomodam as diferentes cosmovisões. Essa tentativa de acomodar os pontos de
vista conflitantes tem gerado igrejas doutrinariamente fracas, e a perca da força de
sua mensagem como nos indica R.C.Sproul,

Conforme a igreja se torna mais pluralista, o número de pontos de vista


contraditórios tolerados aumenta. Por sua vez, a unidade estrutural e
organizacional se torna a principal preocupação. As pessoas lutam para
manter a unidade da igreja visível a todo custo. No entanto, sempre há um
preço a ser pago por isso, e, historicamente, o preço tem sido a pureza
confessional das igrejas. (SPROUL, 2014, p.09)

E hoje? Como é possível a Igreja do século XXI reagir a tudo isso?


Provavelmente ela se encontre mais fragmentada que em qualquer período da
história, consequentemente, debilitada doutrinariamente e temos observado essa
crise em meio a pergunta: “o que é a Igreja afinal de contas? ”

Dietrich Bonhoeffer é considerado um dos teólogos mais importantes da


primeira metade do século XX. Sua eclesiologia é profunda, prática e experiencial,
produzida em meio a uma vida dedicada a Igreja de Cristo, e provada em um dos
períodos mais difíceis da história da humanidade, nesse sentido sua teologia tem
muito a nos ensinar. Sobre seus argumentos teológicos, abordaremos mais
especificamente no tópico, “a Eclesiologia de Dietrich Bonhoeffer”, segue um resumo
de sua vida e obras.
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2 DIETRICH BONHOEFFER, VIDA E OBRA.


Nascido em 04 de fevereiro de 1906 na cidade de Breslau, Alemanha, Dietrich
foi o sexto dos oito filhos de Karl Bonhoeffer e Paula Bonhoeffer. Sendo seus
irmãos: Karl Friedrich, Walter, Klaus, Ursula, Christine, Sabine (gêmea de
Bonhoeffer, nascendo apenas quatro minutos depois) e Susane.

Seu pai foi um renomado neurocirurgião, e posteriormente, titular da cadeira


de psiquiatria e neurologia da universidade e diretor do hospital para doenças
nervosas em Berlim. Karl era um homem sóbrio, com autoridade marcante. Uma
pessoa responsável, íntegra, confiável, sempre equilibrado; que possuindo todos
esses atributos, reivindicava o mesmo de seus filhos. Sua mãe, Paula, vinha de
família culta e artística. Filha de um teólogo e de uma condessa que possuía dom
para a música. Paula formou-se professora, surpreendendo seus familiares. Mas
após seu casamento, grande parte do que aprendera no Colégio foi aplicado na
educação de seus filhos até os oito anos, devido sua desconfiança nos métodos
utilizados pelo ensino alemão. Mesmo depois que seus filhos atingiam idade
suficiente para ir à escola Paula continuava com as instruções religiosas.
(METAXAS, 2011, p.18-20)

Sua família vinha de uma linhagem repleta de glórias. Pela ascendência de


seus pais, o histórico familiar se destaca e por três séculos, os Bonhoeffer estiveram
entre as principais famílias de Schwäbisch Hall.

As árvores genealógicas de Karl e Paula Bonhoeffer são tão carregadas de


realizações valorosas que alguém talvez suspeitasse que as gerações
futuras pudessem se sentir de algum modo pressionadas com aquilo tudo.
Mas a profusão de maravilhas legada por tal herança parece ter sido uma
bênção tão grande que, a cada criança nascida, buscava-se não apenas
rivalizar com os gigantes do passado, mas também superá-los, ir além
deles. (METAXAS, 2011, p.16).

A família de Bonhoeffer, mesmo que indiretamente, era influenciada pelas


tradições do pietismo através do Herrnhut, sobretudo, sua mãe, Paula, e talvez dela,
tenha herdado uma espiritualidade ativa e piedosa, o próprio Dietrich, ao longo de
toda a sua vida utilizou os “Lemas diários” dos Morávios em suas devoções
particulares. Logo praticavam a sua religiosidade muito mais no ambiente familiar,
em casa, do que nos templos.

Fundada por Zinzendorf no século XVIII, Herrnhut dava prosseguimento à


tradição pietista da Irmandade Morávia [...] Zinzendorf usava o termo ‘fé
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viva’, o qual contratava desfavoravelmente com o nominalismo em vigor da


maçante ortodoxia protestante. Para ele, a fé era menos a respeito de um
ascendimento intelectual as doutrinas e mais um encontro pessoal e
transformador com Deus. Os Herrnhütter, portanto, enfatizavam a leitura
bíblica e a devoção no lar”. (METAXAS, 2011, p. 20)

No ano de 1914, deu-se inicio a Primeira Guerra Mundial e apesar dos


Bonhoeffer gozarem de certo conforto financeiro, nenhuma família, mesmo as mais
abastadas saíram imunes aos pesares do conflito. Em 1917, os dois irmãos mais
velhos de Dietrich (Karl Friedrich e Walter) foram convocados para o front de
batalha, e em 23 de abril Walter foi atingido por estilhaços de uma granada, o que o
levou a morte. Apesar das circunstancias adversas, Bonhoeffer ainda mantinha seu
lado extrovertido, mas também demostrava um lado sério. Após a perda de seu
irmão Walter e encarando as possibilidades da Alemanha perder a guerra, esse lado
sério ficou mais evidente, sendo nessa época que Bonhoeffer começou a considerar
a ideia de fazer teologia.

Entretanto, ele só se sentiria pronto para anunciar a sua família a decisão de


se tornar um Teólogo, no ano de 1920, nessa época com quatorze anos de idade, e
consequentemente, enfrentou o descredito e o menosprezo dos seus irmãos e
amigos, pois a vocação pastoral e a teologia não eram vistos com bons olhos pela
elite acadêmica de então, mas Bonhoeffer estava determinado, e parece que mesmo
sem ter a total dimensão do que faria, Deus já o preparava para algo maior, como
nos mostra Metaxas nos diálogos que Dietrich teve com seus irmãos;

Num debate sobre a escolha de Dietrich pela teologia, Klaus deteve-se no


problema da igreja em si, chamando-a de “pobre, débil, chata, instituição
pequeno-burguesa”. “Neste caso”, disse Dietrich, “eu terei de reformá-la”!
[...] Seu irmão Karl-Friedrich foi quem menos se agradou com a decisão de
Dietrich. Karl já se havia destacado como um brilhante cientista. Para ele,
Dietrich virava as costas para a realidade cientificamente concreta e fugia
para a névoa da metafísica. Em um de seus argumentos sobre o assunto,
Dietrich disse: “Dass ess einen Gott gibt, dafür lass ich mir den Kofp
abschlagen”, que significa algo como “É certo que existe um Deus, e por
essa certeza deixaria até mesmo cortar minha cabeça”. (METAXAS, 2011,
p.49)

Mesmo diante do preconceito, Bonhoeffer seguiu com seus estudos, primeiro


em Tubingen, dando continuidade em Berlim, contudo em 1924, na época com 18
anos, uma viagem de férias a Roma marcaria de forma significativa a sua visão
sobre a Igreja, o jovem Dietrich ficou fascinado com a beleza, a arte e a cultura da
cidade, sobretudo com a religiosidade que lhe encantou devido à diversidade, o que
provavelmente desencadeou seus anseios ecumênicos sobre a Igreja de Cristo;
16

A universalidade da igreja estava ilustrada de uma maneira


maravilhosamente eficaz. Membros brancos, negros e amarelos das ordens
religiosas — todos de vestes sacerdotais, unidos sob a igreja. Pareceu-me o
ideal verdadeiro. Dietrich Bonhoeffer (METAXAS 2011, p.61)

Pensar na Igreja que não esteja limitada a uma nação ou raça, ao contrario do
que sempre orientou, de certa forma a educação religiosa que recebeu, fez com que
sua mente e visão se alongassem acerca da questão: Afinal de contas, o que é a
Igreja? Nesse proposito, ao retornar a Alemanha, Bonhoeffer deu continuidade aos
seus estudos na Faculdade de Teologia da Universidade de Berlim. Dentre os
professores que mais o influenciaram estava; Adolf von Harnack, Karl Holl, Reinhold
Seeberg e Adolf Deissman, todos participantes da teologia liberal. Mas, o teólogo
que Bonhoeffer mais reverenciou e admirou, foi seu mentor e amigo; Karl Barth,
responsável pela oposição à teologia liberal e pelo surgimento da neo-ortodoxia.
Barth era suíço de nascimento e foi talvez o mais importante teólogo do século XX;
para muitos, o maior dos últimos quinhentos anos, como ressalta Metaxas;

Seu tratado inovador de 1922, A epístola aos Romanos, caiu como uma
bomba inteligente na torre de marfim de estudiosos como Adolf von
Harnack, que se apoiavam severamente na fortaleza expugnável do método
histórico-crítico e que se escandalizaram com a abordagem bíblica de Barth,
denominada neo-ortodoxia, que afirmava a ideia, particularmente
controversa nos círculos teológicos alemães, da real existência de Deus, e
que toda teologia e estudo bíblico devem ser sustentados por esse
pressuposto básico. Barth foi a principal figura a desafiar e anular a
influência da abordagem histórico-crítica alemã difundida na Universidade
de Berlim por Schleiermacher — e promovida pela atual eminência parda,
Harnack. Barth ressaltou a transcendência de Deus, descrevendo-o como
“totalmente outro” e, portanto, desconhecido por completo pelo homem,
exceto por meio da revelação. (2011 p.72)

Por se recusar a jurar fidelidade a Hitler, Barth seria expulso da Alemanha em


1934 e se tornaria o principal autor da Declaração de Barmen, na qual a Igreja
Confessante alardeava sua rejeição à tentativa nazista de trazer a filosofia do
Partido para dentro da igreja alemã.

Dietrich tomou sua decisão: escreveria, afinal, sua tese de doutorado aos 21
anos de idade, sob a orientação de Seeberg, mas optara por um tema dogmático. O
tema, aliás, seria fruto daquele quebra-cabeça intrigante iniciado em Roma, ou seja,
O que é a igreja? Intitulou o texto de Sanctorum Communio: Uma investigação
Dogmática dentro da Sociologia da Igreja. Bonhoeffer definiria a igreja não como
uma entidade histórica ou uma instituição, mas “Cristo existindo como comunidade
eclesial”. Um debute deslumbrante. (2011, p.76), sua tese obteve a avaliação
17

summa cum laude (com máximo louvor) reconhecimento por obter a máxima
qualificação possível em uma titulação universitária, e o próprio Karl Barth a celebrou
com um “milagre teológico”.

Como ainda não tinha idade para ser ordenado, ele aceitou ser pastor
assistente em uma comunidade em Barcelona, Espanha coincidindo com a época da
“grande depressão” ele pode experimentar atender uma comunidade em extrema
pobreza e necessidade. Em um célebre sermão, ele lembrou ao seu povo que “Deus
caminha entre nós em forma humana, falando a nós naqueles que cruzam nosso
caminho, sejam eles estranhos, mendigos, doentes, ou mesmo naqueles mais perto
de nós em nosso dia a dia, tornando-se a ordem de Cristo em nossa fé nele”. (2011,
p.96)

De volta à Berlim, Bonhoeffer voltou sua atenção para sua “segunda


dissertação” – exigida para conseguir uma designação na universidade. Publicada
em 1931 com o título: Act and Being (Ser e agir) onde cruza analises filosóficas e
teológicas a respeito dos conceitos eclesiológicos que vem desenvolvendo e parece
que dessas analises ele já demonstra um conflito interno entre seu magnifico status
acadêmico e o perturbador chamado de Cristo para o verdadeiro discipulado.

Entre 1930 a 1931, Bonhoeffer visita à América e ao se deparar com a


realidade das Igrejas em Nova York, a principio, apreensivo quanto ao Seminário de
Teologia União, julgando que ele fosse tão permeado de humanismo liberal que
tivesse perdido suas amarras teológicas. Mas com o passar do tempo, cursos com
Reinhold Niebuhr e longas conversas com seu amigo mais próximo, o americano
Paul Lehmann, trouxeram a Bonhoeffer, grande sensibilidade aos problemas sociais
da América. Esse choque com a realidade, sobretudo com a segregação racial vai
lapidando a teologia e a visão de reino em sua eclesiologia.

Bonhoeffer retorna a Alemanha em 1931, com apenas 25 anos, mas já com


status de grande teólogo, entretanto, se depara com a ascensão do Nazismo, o que
fez com que sua promissora carreira acadêmica e eclesiástica fosse modificada
dramaticamente. No verão de 1933, Bonhoeffer se opõem firmemente ao “parágrafo
ariano”, lei proposta pelo partido nacional socialista, que promovia a segregação dos
“não-arianos”, que posteriormente levou uma parte da Igreja a aderir e dar origem ao
termo Teuto-Cristãos, a ideia etnocentrista de que Cristo veio ao mundo para cada
18

nação especifica e não para todas as nações, na verdade esse “Paragrafo Ariano”
foi usado como uma estratégia para afastar os judeus das Igrejas alemães;

O que está em jogo não é de modo algum questionar se os membros das


congregações alemãs ainda podem tolerar a comunhão da igreja com os
judeus. O que está em jogo é a incumbência da pregação cristã em dizer:
aqui está a igreja, onde judeus e alemães estão juntos sob a Palavra de
Deus; aí está a prova se uma igreja ainda é a igreja ou não. Dietrich
Bonhoeffer (2011, p.165)

Em maio de 1934, nasceu à chamada Igreja Confessante, por obra de uma


minoria interna da Igreja Evangélica Alemã, que adotou a Declaração de Barmen em
oposição ao nazismo e as doutrinas teuto-cristãs. Em abril de 1935, Bonhoeffer
voltou para a Alemanha a fim de dirigir, em Finkenwalde, um seminário clandestino
para a formação de pastores para a Igreja Confessante, a qual sofria pressões
crescentes por parte da Gestapo, que culminaram em agosto de 1937, no decreto de
Himmler, no qual declarou ilegais as atividades de formação de candidatos a
pastores para a Igreja Confessante. Nesse período Bonhoeffer escreve uma de suas
mais emblemáticas obras, o livro Nachfolge, traduzido para o português sob o titulo
de Discipulado, e posteriormente Vida em Comunhão, onde registra suas
experiências em comunidade com os alunos do seminário.

Em setembro, o seminário de Finkenwalde foi fechado pelos agentes


Gestapo. Nos dois anos seguintes, Bonhoeffer continuou a lecionar na
clandestinidade, entretanto, em janeiro de 1938, a Gestapo o baniu de Berlim e, em
seguida, proibiu-o de falar em público.

Em 1939, Bonhoeffer aproximou-se de um grupo que conspirava contra Hitler,


do qual participava, seu cunhado, o advogado Hans von Dohnanyi, o almirante
Wilhelm Canaris, e o general Hans Oster. Bonhoeffer foi um relevante elo entre o
movimento ecumênico internacional e a conspiração alemã contra o partido nacional
socialista. Participou de diversas atividades na qual ajudou a retirar judeus da
Alemanha, contudo, ao ser descoberto, foi preso em 1943, durante o período que
passou na prisão, os últimos dois anos de sua vida, escreveu diversas cartas,
principalmente ao seu amigo Eberhard Bethge que junto com a sua obra inacabada
Ética, foram publicadas postumamente.

Depois de uma tentativa fracassada de um atentado contra o próprio Hitler,


pela resistência, conhecido como “Operação Valquiria” no dia 20 de julho de 1944,
19

Bonhoeffer foi transferido para a prisão de Berlim, depois para o campo de


concentração de Buchenwald e, por fim, para o de Flossenbürg, onde foi enforcado
junto com outros conspiradores.

Na manhã daquele dia, entre cinco e seis horas, os prisioneiros, entre eles o
almirante Canaris, general Oster, general Thomas e Reichgeritsrat Sack,
foram retirados das celas, e os veredictos da corte marcial foram lidos. Pela
porta semiaberta, numa das cabanas, avistei o pastor Bonhoeffer, antes de
tirar o uniforme da prisão, ajoelhado no chão, orando fervorosamente a seu
Deus. Fiquei deveras comovido pelo modo com que esse amável homem
orava, tão devoto e tão confiante de que Deus ouvia sua oração. No local da
execução, ele realizou outra oração curta e depois subiu os degraus até a
forca, com coragem e compostura. A morte dele foi verificada após poucos
segundos. Nos quase cinquenta anos que trabalhei como médico,
raramente vi um homem morrer tão inteiramente submisso à vontade de
Deus. (METAXAS, 2011, p.572)

À distância, soavam os canhões do exército norte-americano do general


George Patton. Três semanas depois Hitler cometeria suicídio e, em sete de maio de
1944, a guerra na Europa estaria terminada.

No decorrer de sua vida, Bonhoeffer publicou, em 1930, Sanctorum


Communio; em 1931, Ato e ser, em 1937, Discipulado; em 1938, A vida comunhão.
As cartas e as anotações escritas durante sua prisão e enviadas ao seu amigo
Eberhard Bethge, foram publicados por ele postumamente em 1951, junto com
algumas cartas para os pais e algumas poesias, sob o título de Resistência e
submissão. E as obras que, segundo o autor, deviam constituir a sua maior
contribuição: Ética (1949); Tentação (1953); O mundo na maior de idade (1955-
1966).

3 A ECLESIOLOGIA DE DIETRICH BONHOEFFER.


Ao analisar a sua biografia e o conteúdo de sua produção teológica, podemos
perceber que toda a eclesiologia de Dietrich Bonhoeffer foi produzida como uma
reação ao contexto que experimentara; em cada período de sua breve, porém,
intensa vida. Para Bonhoeffer, a Igreja é sempre compreendida, desde suas
primeiras percepções e produções teológicas como, a comunhão dos santos, o lugar
onde a revelação se corporifica, bem como a representação de Cristo no mundo, de
maneira que ao dissertar sobre a Igreja, evidentemente, em Bonhoeffer, sempre se
está tratando também de um tema cristológico. Assim sendo, o pensamento
eclesiológico de Bonhoeffer, pode ser caracterizado, sobretudo como, cristocêntrico,
20

diaconal e ecumênico, como veremos em algumas de suas obras. Veremos isso em


duas de suas obras:

3.1 Sanctorum Communio


Em 1927, Bonhoeffer, com 21 anos, defende sua tese de doutorado, com o
título; Sanctorum Communio. Eine dogmatische Untersuchung zur Soziologie der
Kirche “Sanctorum Communio: Uma Investigação Dogmática sobre a Sociologia da
Igreja”. Nesta obra, a filosofia social e a sociologia são postas a serviço da
dogmática, lançando mão do idealismo lógico de Hegel, do pensamento dialogal (a
“relação eu-tu”), fazendo referências a Troeltsch, sobretudo, ao pensamento
teológico de Barth, Bonhoeffer tenta chegar à compreensão sistemática da estrutura
da comunhão da Igreja Cristã. E Igreja, como “Communio Sanctorum”, é
simplesmente, a presença de Cristo no mundo, é o Cristo existindo como
comunidade; é o próprio Cristo presente como comunidade.

Desta forma, Bonhoeffer defende que a visão neotestamentária de Igreja,


possui dois diferentes conceitos, o “hierosolimita” e o “paulino”. Segundo Bonhoeffer,
o conceito hierosolimita (relativo à Igreja de Jerusalém) é o arquétipo do conceito
católico de Igreja, haja vista a centralidade na figura do Papa como sucessor
apostólico, já o conceito paulino, seria o arquétipo da Igreja Luterana. Aquele é
judeu-cristão; este é gentio-cristão.

Na primeira igreja, houve desde o inicio, uma verdadeira hierarquia, uma


ordem estabelecida por Deus, um direito eclesiástico divino, uma igreja
como instituição, pela qual os indivíduos são acolhidos. Um grupo bem
determinado, o dos “apóstolos”, isto é Tiago e os Doze, possui uma primazia
divina permanente, que não poderá ser igualada por ninguém, e, por essa
razão, compete-lhe a liderança. Esse conceito de Igreja foi superado por
Paulo a partira de sua compreensão do evangelho (BONHOEFFER, 2017,
p.111)

Bonhoeffer também sinaliza para a forma que Paulo pensa a respeito do


termo Igreja. Para ele a [ ekklesia ] é o que representa a tradução da LXX
para [qahal], e que em Paulo também é [edah] o que também foi traduzido por
 [synagogue] (BONHOEFFER, 2017, p.111), os judeus mantem o conceito
da que originalmente significava assembleia, ou que não se diferencia de
“comunidade popular”, e aplicam o termo a sinagoga, mas como um grupo fechado,
exclusivo aos judeus. Entretanto na língua grega, a expressão tem um sentido mais
próximo de “assembleia politica”. Contudo, a comunidade Cristã, a “Ekklésia” ou a
21

Igreja, extrapola todas as fronteiras nacionais e politicas; ela é universal e ainda


assim, “um povo”, ao lado de pagãos e judeus, ela é o “terceiro gênero” e para que
os gregos pudessem compreendê-la, Paulo fala da ekklesia toú
theoú = assembleia de Deus] (BONHOEFFER, 2017, p.111). Paulo aponta para a
Ekklesia como uma comunidade global, ou universal, mas também como uma
comunidade cristã local.

Em Bonhoeffer, a Ekkelsia, enquanto comunidade global, só é real na


comunidade individual. Como uma fundação de Deus na Terra, e através da Igreja,
Cristo se faz presente no mundo, entretanto, através do espirito Santo, Cristo se faz
presente no individuo que lhe obedece ao chamado, esse é o sentido da Igreja, a
atuação de Cristo, sobre a Igreja, governando a Igreja, mas também
simultaneamente, “sendo” a Igreja, através de Seu corpo. Cristo na Igreja é a nova
humanidade, (1 Co 15:45-47) o novo Adão.

Outra interessante distinção que Bonhoeffer também faz, acerca da Igreja, é


entre a atuação de Cristo e a do Espirito Santo na Igreja, segundo ele, o Espirito
Santo atua por intermédio dos indivíduos, os conduzindo para dentro da Igreja, ou
seja, para “dentro” de Cristo, que por sua vez atua sobre a comunidade, sobre o
corpo como um todo;

A posição de Cristo em relação à igreja é basicamente dupla; ele é o


Criador de toda a vida que repousa nele, o construtor da igreja, mas está
também todo o tempo realmente presente em sua igreja, pois a igreja é seu
corpo, ele a domina como a cabeça domina o corpo. Porém o corpo é
governado pelo Espírito Santo (1Co 12.13; Ef 2.18; 4.4), sendo que o
Espírito de Cristo e o Espírito Santo devem ser nitidamente diferenciados
por não serem idênticos no modo de atuação, o que Cristo é para a
comunidade toda o Espírito Santo é para os indivíduos. Ele tange os
indivíduos na direção de Cristo, traz Cristo até eles (Rm 8.14; Ef 2.22),
promove a comunhão entre eles (2Co 13.13; Fp 2.1), Isto é, sua atividade
se estende a vida social das pessoas e serve-se de sua inserção social e de
suas vontades sociais, ao passo que o espírito de Cristo está voltado para o
modo histórico da vida humana global (BONHOEFFER, 2017, p.112).

Desse modo, já em sua primeira obra, Bonhoeffer demonstra suas convicções


a respeito da Igreja de Cristo, e nos apresenta uma eclesiologia com características
ecumênicas, enxergando a Igreja como Comunidade, sendo assim, percebemos que
para Bonhoeffer, os cismas, as tantas divisões que a Igreja Cristã sofrera, bem como
o exclusivismo de algumas instituições, o etnocentrismo e as diferenças teológicas
não poderiam ser motivos de mais fragmentação, pois a Igreja em sua tese é “Cristo
22

existindo em comunidade”, e como estaria Cristo dividido(1Co 1.13)? Como bem nos
deixa claro em sua obra;

Na comunidade, Cristo age como se estivesse em seu instrumento. Nela,


ele está presente; como o espirito santo está presente no individuo, Cristo
se torna presente na comunidade dos santos. Quando levada a sério, a
ideia do corpo significa que essa “imagem” quer equiparar Cristo e a
comunidade, como o próprio Paulo faz claramente (1Co 12.12; 6.15); pois
estou onde está o meu corpo. Assim Paulo pode perguntar no caso de uma
cisão da comunidade: meméristai hó Xristós?= estaria
Cristo dividido?] (1Co 1.13). Partindo da convicção de que o próprio Cristo é
a comunidade, chega-se a ideia de uma vida orgânica na comunidade
segundo a vontade de Cristo extraída da imagem do organismo físico.
Todavia é mais do que evidente que tanto uma quanto a outra colidem com
a realidade da pecaminosidade e esperam por uma reflexão sistemática
mais profunda. Assim cristo é a presença real apenas na comunidade. A
comunidade está nele e ele na comunidade (1Co 1.30; 30.16; 2Co 6.16;
13.15; Cl 3.9; 2.17) e “estar em Cristo” significa o mesmo que “estar em
comunidade”. (BONHOEFFER, 2017, p.113)

Bonhoeffer concluiu que a Sanctorum Communio provém da firmeza e da


convicção de Jesus Cristo, não como uma personalidade que lançou o ideal com o
qual foi possível formar a comunidade dos santos, mas em que Nele mesmo já se
encontrava a presença da igreja, pois em Cristo a humanidade é incorporada
realmente na comunidade com Deus. A Igreja é instituída e realizada por Jesus
Cristo, como Sanctorum Communio, ela é sujeito; é Cristo existindo como ekklésia,
como comunidade dos santos.

3.2 Discipulado
A partir da primavera de 1935, Bonhoeffer é enviado como regente do
Seminário de Pregação de Finkenwalde. Ali, pode desenvolver seu conceito de
Igreja, não apenas de forma teórica, como já havia feito na fase mais acadêmica de
sua vida, mas, sobretudo na pratica, visto que a esse tempo, já havia se envolvido
na luta contra o Nacional socialismo. O resultado desse período foi uma de suas
obras mais populares e emblemáticas, o livro Nachfolge, (traduzido no Brasil como
Discipulado). A principio o Discipulado surge como um curso ministrado em 1936 na
universidade de Berlim (ultimo antes de ter sua licença de professor caçada), e
posteriormente publicado em 1937.

Em Discipulado, Bonhoeffer nos aponta para uma eclesiologia da Igreja como


in statu confessionais (igreja confessante) e a caracteriza como “Igreja seguidora”.
No seguimento, ou discipulado, está a essência do ser cristão, e o seguimento só
23

pode ser realizado na “Vida em Comunhão” Isso quer dizer que a Igreja,
fundamenta-se na fé e na obediência a Jesus, pois, somente a fé e a obediência
possibilitam o seguimento.

O conceito de situação em que a fé se torna possível nada mais é que a


paráfrase da circunstância em que os dois enunciados seguintes não só têm
validade, como são igualmente verdadeiros: Só o que crê é obediente, e Só
o obediente é que crê (BONHOEFFER, 2016, p.38)

Bonhoeffer apresenta a resposta para as seguintes questões: O que é ser um


Discípulo de Cristo, e qual é o custo disso? É nos apresentado o conceito de “graça
barata e graça preciosa”, e seguindo a lógica e a essência de sua eclesiologia em
que nos afirma que a Igreja é o próprio Cristo existindo no mundo, e, sobretudo na
comunidade dos santos, Bonhoeffer faz na verdade uma forte critica a teologia
liberal que, de uma forma abrangente, já predominava nas Igrejas de seu pais,
inclusive, vários alunos do seminário de Finkenwalde, que ele fora direcionado a
lecionar, já chegavam totalmente acéticos, desconsiderando até mesmo os pilares
da fé Cristã, pois a “graça barata” é aquela que não necessita de arrependimento,
essa “graça barata” aceita o pecador e o pecado, não diferencia a Igreja de uma
mera convenção social, nesse ponto Bonhoeffer diz;

A graça barata é graça como doutrina, como princípio, como sistema; é


perdão dos pecados como algo já dado por certo; é o amor de Deus como
conceito cristão de Deus. Quem aceita o amor de Deus já está perdoado de
seus pecados. A Igreja que segue esse tipo de doutrina da graça se vê
automaticamente beneficiada por ela. [...] A graça barata, em vez de
justificar o pecador, justifica o pecado. Desse modo, resolve tudo sozinha,
nada precisa mudar e tudo pode permanecer como antes. “Nossos esforços
são vãos.” O mundo continua mundo, e nós continuamos pecadores,
“mesmo na vida mais piedosa” (BONHOEFFER,2016, p.19]

Para Bonhoeffer, é evidente que o chamado ao seguimento, não pode ser


barateado, a Igreja é Cristo, é Cristo existindo, e dessa forma, quando o homem é
chamado ao discipulado, é chamado para dentro da Igreja, ou seja, chamado para
dentro de Cristo, de forma que é preciso uma nova vida, e se o seguimento requer
uma nova vida, logo, custou a vida, a Vida do próprio Cristo, que se doou por sua
igreja, esse é o custo do discipulado, é por isso que a graça é preciosa, pois na
eclesiologia de Bonhoeffer, ela é a encarnação do próprio Deus;

A graça preciosa é o tesouro oculto no campo, pelo qual o ser humano


vende feliz tudo que possui; é a pérola preciosa, pela qual o mercador
oferece todos os seus bens; é o domínio do reino de Cristo, pelo qual o ser
humano arranca o olho que o faz tropeçar; é o chamado de Jesus Cristo,
pelo qual o discípulo deixa suas redes para trás e o segue. A graça preciosa
24

é o evangelho que sempre se deve procurar, a dádiva que se deve pedir, a


porta à qual se tem de bater. Essa graça é preciosa porque chama ao
discipulado; é graça porque chama ao discipulado de Jesus Cristo; é
preciosa por custar a vida ao ser humano; é graça pois só assim dá vida ao
ser humano; é preciosa porque condena o pecado; é graça porque justifica,
perdoa o pecador. É preciosa, sobretudo porque foi preciosa para Deus,
porque lhe custou a vida de seu Filho — “Porque fostes comprados por
preço” (1Co 6.20) — e, portanto, não pode ser barato para nós o que custou
caro para Deus. É graça, sobretudo, porque Deus não considerou que seu
próprio Filho custasse caro demais para pagar por nossa vida, e assim o
deu por nós. A graça preciosa é a Encarnação de Deus
(BONHOEFFER,2016, p.20,21)

Outro aspecto importante da eclesiologia bonhoefferiana, é a sua ênfase na


presença viva de Cristo, na palavra e nos sacramentos, e estes proclamados pela
Igreja. Bonhoeffer tinha a convicção de que o Cristo de hoje, vivo e ressurreto,
exercendo seu ministério por meio da sua Igreja, é tão ou mais evidente do que o
Cristo em carne, em seus três anos de ministério terreno;

Ele continua presente entre nós, corporalmente e em sua Palavra. Se


quisermos ouvir seu chamado ao discipulado, temos de ouvi-lo onde ele se
encontra. O chamado de Jesus Cristo se faz ouvir na Igreja por meio de sua
Palavra e sacramento. A pregação e os sacramentos da Igreja são o lugar
da presença de Jesus Cristo. Quem quiser ouvir o chamado de Jesus ao
discipulado não precisa de uma revelação pessoal. Ouça a pregação e
receba o sacramento! Ouça o evangelho do Senhor crucificado e ressurreto!
É na Igreja que ele está presente por inteiro, o mesmo Jesus que convivia
com os discípulos. Ali está o Cristo glorificado, vivo e vitorioso. E só ele
pode chamar ao discipulado (BONHOEFFER, 2016, p. 179,180).

Como Corpo de Cristo, a Igreja é a continuação da presença física de Cristo


que por meio da palavra, exerce o chamado para o seguimento a cada discípulo,
assim como fez com os apóstolos, a força do chamado é o que garante o
posicionamento do discípulo, mas é através do Batismo que o mesmo sofre uma
ruptura com o mundo, é arrancado do mundo e introduzido através da paixão e
glorificação de Cristo para dentro da Igreja, para “dentro” de Cristo;

O batismo não é oferta do ser humano, mas oferta de Jesus Cristo. Ele se
fundamenta totalmente na vontade de Jesus Cristo conforme expressa em
seu chamado. Batismo quer dizer ser batizado; é ter de sofrer o chamado de
Cristo. No batismo, o ser humano torna-se propriedade de Cristo. [...]
Daquele momento em diante, passa a pertencer a Cristo. É arrancado do
poder do mundo e torna-se propriedade de Cristo. O batismo, portanto,
significa rompimento. Cristo intervém no domínio de Satanás, põe a mão
sobre os seus e cria sua Igreja. Passado e presente são separados. As
coisas antigas passaram, e tudo se tornou novo (BONHOEFFER, 2016, p.
184,185).

O seguimento iniciado pelo batismo exerce influencia total sobre o novo


cristão, que passa a se relacionar apenas com Cristo, e através desse
25

relacionamento, todas as afeições são redirecionadas e redefinidas. Bonhoeffer


entende que só Cristo é o mediador entre Deus e os homens, (1 Timóteo 2:3-6), mas
amplia esse conceito ao enfatizar que Cristo agora é Mediador entre o discípulo e o
mundo, todas as formas de relacionamentos da pessoa que foi batizada para “dentro
de Cristo” são profundamente transformados, de sorte que o Cristão só conhece a
Cristo agora, e através de Cristo, passa a conhecer todas as coisas;

No batismo, o rompimento é realizado em minha vida. Sou privado das


relações diretas com o mundo, porque Cristo, o Mediador e Senhor, se
interpõem entre mim e o mundo. Quem é batizado já não pertence ao
mundo, já não serve ao mundo, já não lhe é subordinado. Agora ele
pertence somente a Cristo e se relaciona com o mundo apenas por meio de
Cristo (BONHOEFFER, 2016, p.184,185).

Palavra e sacramento (batismo e ceia), de acordo com Bonhoeffer; (2016,


p.204) “No batismo, recebemos a dádiva de sermos membros do corpo; na Ceia, a
comunhão (koinonia) corporal com o corpo do Senhor e, em consequência disso, a
comunhão corporal com os membros desse corpo”. Esses são os alicerces da
“Sanctorum Communio”, a eclesiologia de Bonhoeffer é evidentemente cristológica e
se manifesta na presença de Cristo na Igreja e essa, através da presença de Cristo
no mundo, a partir da comunhão, iniciada pela palavra, confirmada pelo batismo e
vivenciada através da ceia do Senhor, a Igreja passa então a obter as características
fundamentais para retornar ao mundo e manifestar a presença de Cristo novamente
através da pregação conforme Bonhoeffer;

O batismo e a Ceia pertencem exclusivamente à Igreja do corpo de Cristo. A


Palavra dirige-se a todos, a crentes e descrentes. Os sacramentos
pertencem somente à Igreja. Assim, a Igreja cristã é, no sentido verdadeiro,
Igreja do batismo e da Ceia e, somente a partir daí, Igreja da pregação.
Evidenciou-se que a Igreja de Jesus Cristo reivindica espaço de pregação
no mundo. O corpo de Cristo é visível na Igreja que se une em torno da
Palavra e dos sacramentos (BONHOEFFER, 2016, p. 204).

Essa Igreja que vive a vida de Cristo em todo o tempo, é enviada de volta ao
mundo, testemunhando a todo instante, a Igreja de Jesus é “confessante”, sendo
assim, Bonhoeffer compreende em sua teologia, que toda a vida da Igreja acontece
no lugar que ela deve estar, no caso, o discípulo é participante do corpo de Cristo, e
deve sê-lo em qualquer lugar onde se faz presente, resgatando e restaurando a
cultura vigente, as interações, toda forma de pensar e agir de volta aos originais
propósitos do Criador. Contudo Bonhoeffer também entende a necessidade de um
lugar físico, um lugar para a prática e a organização do culto, onde a palavra e os
26

sacramentos são ministrados, também enfatiza a importância da comunhão diária,


do viver em comum dos que foram chamados ao seguimento;

Com isso, torna-se bem evidente o espaço da pregação e da ordem da


Igreja em sua necessidade estabelecida por Deus. A pergunta agora é se,
dessa maneira, já temos uma definição da forma visível da Igreja do corpo
de Cristo ou se ela ainda reivindica outros espaços no mundo. A resposta
do Novo Testamento não deixa qualquer dúvida: a Igreja não só precisa de
lugar para seu culto e organização, mas também para a vivência diária de
seus membros. Nosso tema, portanto, passa a ser agora o espaço de vida
da Igreja visível (BONHOEFFER, 2016, p. 206).

Quanto à necessidade de comunhão, Bonhoeffer traz a tona, a nossa


humanidade, desfazendo uma suposta “superioridade espiritual”, o engano que uma
religiosidade baseada em falsa piedade pode gerar, ou seja, a ideia de que não
precisamos uns dos outros, a pretensa ilusão de que alguém pode ser um cristão
sozinho ou independente; esse conceito, ele desenvolve em uma de suas mais
simples e fascinantes obras, o livro Vida em Comunhão, escrito logo após o
seminário clandestino em Finkenwalde ser descoberto e ter seu funcionamento
proibido pela Gestapo, e o encerramento dramático e abrupto daqueles mais de dois
anos em que Bonhoeffer pode vivenciar momentos de intensa comunhão diária com
os 22 seminaristas que preparava para pastorear a Igreja Confessante, em oposição
a Igreja estatal Alemã, que nessa época, já havia se rendido ao regime Nazista,
Bonhoeffer registra em seus momentos de solidão e angustia, a saudade da
comunhão, a falta do convívio, do partilhar, das orações, deixando evidente que a
Igreja é o lugar comum, de pessoas de reais, de seres humanos, que foram criados
para viver a unidade,

Não é vergonha o crente ter saudade da companhia de outros cristãos,


como se isso fosse sinal de viver ainda por demais na carne. O ser humano
é criado na carne, na carne apareceu o Filho de Deus na terra por amor a
nós, na carne foi ressuscitado, na carne o crente recebe Cristo no
Sacramento, e a ressureição dos mortos levará a comunhão perfeita das
criaturas espirito-carnais de Deus. Através da presença física do irmão, o
crente louva o Criador, Reconciliador e Salvador, Deus Pai, Filho e Espirito
Santo (BONHOEFFER, 1997, p.11).

Aqui, Bonhoeffer nos apresenta uma eclesiologia que desafia a frieza e


muitas vezes o individualismo de nosso tempo, enfatizando que a presença do irmão
Cristão é tão importante, pois segundo suas próprias palavras são “um gracioso sinal
físico da presença do Deus Triúno”. (1997, p.11), e na solidão, visitante e visitado
podem reconhecer um no outro o Cristo presente na carne, recebem e se encontram
como se com o Senhor se encontrassem, a comunhão, conforme Bonhoeffer é uma
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das graciosas bênçãos de Deus a sua Igreja, e para ele, essa verdade é tão
profunda que chega ao ponto de dizer que “o Cristo proclamado na boca do irmão, é
mais forte e evidente do que o Cristo guardado em nossos corações”, e por isso a
comunhão é tão necessária, e uma das principais características de sua eclesiologia;

Deus quis que procurássemos e achássemos sua Palavra viva no


testemunho de irmãos, na boca de uma pessoa. Por isso o cristão precisa
do cristão que lhe diga a Palavra de Deus, e necessita dele
constantemente, quando a incerteza e o desanimo o acediam, pois não
poderá ajudar a si mesmo sem burlar a verdade [...] O Cristo no próprio
coração é mais fraco do que o Cristo na palavra do irmão; aquele é incerto,
este é certo (BONHOEFFER, 1997, p.13, 14).

A experiência da Comunhão Cristã, conforme Bonhoeffer (1997, p,75-78),


também se faz presente no serviço, que ele apresenta em três características; ouvir
o irmão, se colocar a sua disposição e dar suporte em suas cargas e sofrimentos (Gl
6.2).

Na comunidade dos Santos, também se faz evidente a pratica da confissão e


do perdão, e assim, como já temos evidenciado, em Bonhoeffer, a graça é preciosa
demais para ser mal administrada, ao discípulo compete entender que suas falhas
foram perdoadas, primeiramente por Cristo, e que por esse motivo, não pode reter o
perdão ao irmão que se arrepende e confessa;

A comunhão dos santos não é a comunhão “ideal” de pessoas perfeitas e


sem pecado. Não é a comunhão dos puros que já não dão ao pecador a
oportunidade de se arrepender. Ao contrário, é a comunhão que se mostra
digna do evangelho do perdão proclamando verdadeiramente o perdão de
Deus, que nada tem a ver com perdão autoministrado; é a comunhão dos
que de fato experimentaram a graça preciosa de Deus e que andam de
modo digno do evangelho, não desperdiçando nem descartando essa graça
(BONHOEFFER, 2016, p.237).

Os sacramentos são pilares factuais da presença e da unidade da Igreja com


o Cristo vivo; logo a Ceia do Senhor ocupa uma importante função em sua
eclesiologia. Ao praticar a confissão mutua e a declaração de perdão, a comunidade
estará preparada para celebrar a Ceia do Senhor. Dessa forma, a alegria em Cristo
na comunidade é completa, as vidas em comunhão dos cristãos sob a palavra
alcançam seu alvo por meio do sacramento;

Como podemos participar verdadeiramente desse corpo de Cristo que fez


tudo por nós? Pois de uma coisa temos certeza: não existe comunhão com
Jesus Cristo que não seja a comunhão em seu corpo, no qual somos
recebidos, no qual está nossa salvação. Tornamo-nos participantes da
comunhão do corpo de Cristo por meio dos dois sacramentos do corpo de
Cristo, o batismo e a Ceia do Senhor (BONHOEFFER, 2016 p.193).
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Por fim, o chamado ao seguimento, a entrada por intermédio do batismo, a


comunhão e o serviço, a pratica da confissão e do mutuo perdão, a presença de
Cristo na Ceia do Senhor, são características de Cristo vivendo por meio do seu
corpo, dessa forma, a Igreja de Cristo, a Sanctorum Communio é a própria imagem
de Cristo, e por isso, Bonhoeffer enfatiza de forma veemente que a mesma deve
“andar como Cristo andou”;

[...] porque somos feitos à imagem de Cristo, iguais a Cristo devemos ser.
Porque já carregamos a imagem de Cristo, só Cristo pode ser o modelo que
temos de seguir. Porque ele mesmo vive sua verdadeira vida em nós,
podemos “andar assim como ele andou” (1Jo 2.6), fazer como ele fez (Jo
13.15), amar como ele amou (Ef 5.2; Jo 13.34; 15.12), perdoar como ele
perdoou (Cl 3.13), ter “o mesmo sentimento que houve também em Jesus
Cristo” (Fp 2.5), imitar os exemplos que ele nos deixou, dar a vida pelos
irmãos como ele deu a vida por nós (1Jo 3.16). (2016, p.254).

Para Bonhoeffer, só podemos ser como Cristo, porque Cristo foi como nós,
porque fomos conformados à sua imagem. Agora que nos tornamos imagem de
Cristo, podemos viver de acordo com seu exemplo;

Aqui de fato obras são praticadas, aqui, na simplicidade do discipulado, a


vida igual à de Cristo é vivida. Aqui ocorre a obediência simples à Palavra.
Sobre a minha própria vida, sobre a minha nova imagem, não recai mais
nenhum olhar. Eu a perderia no mesmo momento em que a desejasse ver.
Ela é apenas o espelho para a imagem de Jesus Cristo, na qual fixo meu
olhar. O discípulo vê apenas aquele a quem segue. (2016, p.254)

A Igreja, no discipulado, carrega a imagem do Cristo encarnado, crucificado e


ressurreto, que foi feito imagem de Deus, dele pode-se finalmente dizer que foi
chamado para ser “imitador de Deus”. O discípulo de Jesus é o imitador de Deus.
“Sede, pois, imitadores de Deus, como filhos amados” (Ef 5.1).

A Igreja para Bonhoeffer se manifesta na força do chamado ao seguimento e


no poder da Comunhão dos Santos que em Cristo são chamados ao discipulado
radical, a serem verdadeiramente “sal da terra e luz do mundo” (Mt 5.13-16). Sua
eclesiologia é profundamente prática, sua vida e a sua morte respaldaram o
conteúdo de sua produção teológica que infelizmente fora tão precocemente
interrompida.

“E, por causa disso, sofro e estou preso como um criminoso. Mas a palavra
de Deus não está presa. Portanto, estou disposto a suportar qualquer coisa
se isso trouxer salvação e glória eterna em Cristo Jesus para os que foram
escolhidos. Esta é uma afirmação digna de confiança: "Se morrermos com
ele, também com ele viveremos. Se perseverarmos, com ele reinaremos. Se
o negarmos, ele nos negará. Se formos infiéis, Ele permanecerá fiel, pois
não pode negar a si mesmo" (2 Tm2.9-13).
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CONSIDERAÇÕES FINAIS.

O desenvolvimento do presente artigo possibilitou uma análise importante


sobre a Igreja de Cristo, as abordagens históricas, bem como os caminhos
percorridos através dos tempos, sob um víeis eclesiológico, nos permitiram observar,
que mesmo entre erros e acertos, a Igreja Cristã tem atravessado os séculos e
porque não dizer, influenciado e moldado positivamente a cultura das nações
ocidentais, bem como seus valores éticos e morais, sobretudo, por meio da
pregação do evangelho de Jesus Cristo. Entretanto essa mesma Igreja, enquanto
instituição humana tem sofrido principalmente em nossos dias com os males da pós-
modernidade, fragmentada e muitas vezes dividida, enfraquecida pelo pluralismo de
ideias e convicções, pelo pragmatismo, pelo hedonismo, e mesmo que em crescente
popularidade em solo brasileiro, até de certa forma, gozando o status da “Cultura
Pop”, tem se transformado em uma instituição inchada, extremamente
antropocêntrica, doutrinariamente fraca e sem vigor.

Sobre esse prisma, a teologia prática e profunda de Dietrich Bonhoeffer,


experimentada em uma das épocas mais obscuras da história da humanidade,
doutrinariamente ortodoxa e piedosa, mas extremamente humana, mesmo tendo
sido formulada em uma época em que o Liberalismo Teológico eclodia na mente e
na pena de renomados pensadores, tem muito a nos ensinar, sua eclesiologia
profundamente comprometida com as escrituras, sua visão abrangente do que é “ser
Igreja”, pode em muito contribuir para resgatar em nosso tempo, as bases de uma
Igreja forte, que não se divida entre tantas doutrinas e praticas, e que não se venda
nem adultere a sua mensagem, para se amoldar aos padrões distorcidos dos dias
atuais (graça barata).

Que o legado teológico que Dietrich Bonhoeffer nos deixou, sua eclesiologia
que de forma resumida foi apresentada nesse artigo, sobretudo, sua postura integra
ao longo de toda a sua vida e, principalmente, diante da morte, possa nos ser tão útil
para o estudo acadêmico quanto para a práxis da Igreja Brasileira, que as
convicções que alicerçaram a vida de Bonhoeffer venham contribuir para a unidade
da Igreja, e na forma como os verdadeiros discípulos de Cristo, interagem com a
sociedade contemporânea. Pois sem tais pressupostos, a Igreja corre sempre o risco
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de assumir qualquer forma, de se aculturar sem nunca conseguir ser o ambiente


criado pela obediência que possibilita a vida pela fé em Cristo.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS

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BÍBLIA SAGRADA: Nova Versão Transformadora: letra grande. 1ª Edição. São
Paulo. Mundo Cristão. 2016.
BONHOEFFER, Dietrich. A comunhão dos santos: uma investigação dogmática
sobre a sociologia da Igreja. 1ª Edição. São Leopoldo/RS. Editora Sinodal; EST.
2017.
______, Dietrich. Discipulado. 1ª Edição. São Paulo. Mundo Cristão. 2016
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1997.
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http://www.vatican.va/archive/hist_councils/ii_vatican_council/documents/vat-
ii_const_19641121_lumen-gentium_po.html
GOHEEN, Michael W. Introdução a Cosmovisão Cristã: Vivendo na intersecção
entre a visão bíblica e a contemporânea. 1ª Edição. São Paulo. Vida Nova. 2016.
GRUDEM, Wayne A. Teologia Sistemática / Wayne Grudem. 2ª Edição. São Paulo:
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MCGRATH, Alister E. Teologia Sistemática, histórica e filosófica. Uma introdução à
teologia cristã. 1ª Edição. São Paulo: Sheed Publicações, 2005.
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dos Campos, SP: Editora Fiel. 2014.
______, R.C. Somos todos teólogos: uma introdução à teologia sistemática. 1ª
Edição. São José dos Campos, SP: Editora Fiel, 2017.

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