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DADOS INTERNACIONAL DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP)

(CÂMARA BRASILEIRA DO LIVRO, SP BRASIL)

CAVALCANTI. TITO R. DE A.
JUNG / TITO R. DE A. CAVALCANTI . - SÃO PAULO : PUBLIFOLHA,
2007. - (FOLHA EXPLICA)
BIBLIOGRAFIA.

ISBN 978-85-7402-838-5

1. JUNG, CARL GUSTAV, 1875-1961 2. PSICOLOGIA JUNGUIANA 3.


SUMÁRIO
PSICANÁLISE I. TÍTULO.
07-7836CDD-150.1954 INTRODUÇÃO 7
ÍNDICES PARA CATÁLOGO SISTEMÁTICO: 1. PRIMÓRDIOS 13
1. JUNG, CARL GUSTAV: PSICOLOGIA ANALÍTICA 150.1954
2. PSICOLOGIA JUNGUIANA 150.1954 2. CONCEITOS PRINCIPAIS 21
3. RAÍZES, ALQUIMIA, INDIVIDUAÇÃO 51
4. DESDOBRAMENTOS 63
CRONOLOGIA 71
BIBLIOGRAFIA 79
são colocadas com freqüência nas estantes de auto-
ajuda. Ainda hoje é considerado místico, confuso,
simpatizante do nazismo e bígamo. Quanto de verdade
existe nessas afirmações?
Jung acreditava que toda teoria é produto da
equação pessoal de seu criador; portanto, sabia dos
INTRODUÇÃO limites de seus escritos. Ele afirmava que tanto Freud
quanto Alfred Adler (1870-1937) haviam descrito fatos
que correspondiam ao dinamismo psíquico de muitas
pessoas. Da mesma maneira, Jung acreditava que
existem aqueles que possuem outra psicologia, similar
à sua. Em suas palavras: "Chego a considerar minha
contribuição como minha própria confissão subjetiva. E
a minha psicologia que está nisso, meu preconceito
que me leva a ver os fatos da minha própria maneira.
O nome desta coleção, "Folha Explica", é uma
Mas espero que Freud e Adler façam o mesmo, e
variante de "Freud explica". Não se sabe quem criou
confessem que suas idéias representam pontos de vista
essa expressão, que demonstra o reconhecimento que
subjetivos. Desde que admitamos nosso preconceito
a humanidade tem pelo vienense Sigmund Freud (1856-
estaremos realmente contribuindo para uma psicologia
1939). Mas este livro vai tratar de um autor que tem
objetiva".1
sido visto como o lado B da psicologia das profundezas
A obra de Jung pode ser vista como um esforço
criada por Freud.
de resgate e tradução. Na tentativa de compreender
Dentre os primeiros exploradores do
seu mundo interno, e o de seus pacientes, ele procurou
inconsciente, o suíço Carl Gustav Jung (1875-1961) é
resgatar o universo simbólico humano que
certamente um dos mais contraditórios. Por um breve
habitualmente se encontra sob o poder das religiões,
período - de 1906 a 1913, aproximadamente —
dos místicos ou das filosofias orientais. A partir dessa
procurou aliar forças com Freud, de quem depois se
pesquisa, criou um corpo teórico que traduz esse
separou para seguir seu próprio caminho. Jung criaria
conhecimento para a linguagem ocidental. Além disso,
uma escola de pensamento que tem sido ampliada e
no fim de sua vida, debruçou-se também sobre a física,
praticada por muitos, ao redor do mundo.
a fim de encontrar respostas relativas aos fenômenos
No entanto, sob certo ponto de vista, ele é um
que observou nas manifestações do inconsciente.
marginal. No Brasil, sua inserção nas universidades
existe, mas é pequena em relação às outras escolas de
1
psicologia. Nas livrarias, as obras de seus seguidores C.G.Jung, Obras Completas, vol. XVIII/I. Pctrópolis: Vozes, 2000,
parágrafo 275.
Na segunda metade do século 20, cresceu o Ele sempre se considerou um cientista empírico, ou
interesse do Ocidente pelo Oriente. Médicos acupun- seja, aquele que constrói hipóteses científicas a partir
turistas estão em todas as capitais, existem franquias da descrição de realidades observadas.3 Os fenômenos
de cursos de ioga e várias escolas de meditação. Ao religiosos são realidades psíquicas e é nesse sentido
mesmo tempo, as religiões e o interesse pela mística que são trabalhados por Jung: seu interesse é pela
ressurgiram com força inesperada. O fundamentalismo experiência individual em relação aos fenômenos
religioso, por sua vez, mostra diariamente seu poder psíquicos — dentre os quais os fenômenos religiosos.
em diferentes religiões. Os livros de Paulo Coelho Jung afirmou que os fenômenos psíquicos
exploram temas místicos e vendem como água. A sempre tiveram a atenção do homem, e entendia suas
leitura da obra de Jung permite uma compreensão idéias não como um novo início na compreensão do
dessas mudanças inesperadas de rumo do interesse inconsciente, mas sim como uma continuidade em
coletivo; trabalha a hipótese de que o Ocidente chegou relação ao trabalho realizado por muitas gerações,
a um ponto no qual é necessária a retomada da vida embora ele utilizasse o pensamento científico. Essa
interior, preocupação que sempre foi mais elaborada perspectiva faz com que suas idéias sejam
pelo Oriente. freqüentemente confundidas com idéias gnósticas ou
Seu interesse pelas religiões também é fruto alquímicas, as quais ele cita em seus trabalhos, como
dessa preocupação, e nosso autor define religião como se fosse um continuador e não um estudioso delas.
"consideração e observação cuidadosas de certos Some-se a isso a falta de linearidade em seu
fatores dinâmicos concebidos como 'potências': pensamento, que se reflete em seus escritos, o que faz
espíritos, demônios, deuses, leis, idéias, ideais ou com que aqueles que procuram um sistema e uma
qualquer outra definição dada pelo homem a tais
fatores".2 Desconsiderar essas potências, segundo Jung,
3
torna-se cada vez mais difícil para o homem moderno, Quando Jung se autodenomina empírico, seria melhor que ele dissesse
fenomenólogo. Seu 'empiricismo' se refere ao exame de fenômenos
pois elas podem gerar não apenas patologias psíquicas, percebidos pela experiência individual e coletiva, mais do que aos
mas também convulsões sociais. resultados quantificáveis e passíveis de testes de repetição dos 'dados
Mas é preciso prestar muita atenção a um ponto que inegáveis' característicos das ciências experimentais. O método de Jung
leva em consideração a participação do observador no evento e assume
gera confusão:Jung nunca se refere à adesão a alguma que fatores pessoais contribuem de modo significativo para o acúmulo de
religião específica como necessária e nem defende conhecimento. Um tal empirismo não espera confirmar o resultado de
algum tipo de atividade mística. Pretende, inclusive, experiências repetidas. Não é, no sentido rigoroso, experimental. [...] O
método de Jung deveria chamar-se empírico somente no sentido
escrever para o homem cujo inconsciente não é mais fenomenológico e subjetivo, consistente com suas categorias de
contido pelas igrejas tradicionais ou por uma tradição. percepção neokantianas", escreve Ann Conrad Lammers, em In C.od's
Shadow (Nova York: Paulist Press, 1994), p. 117.Ver também Eloísa
2
Penna, Um Estudo Sobre o Método de bivesligaeào do Psique no Obra de
C.G. Jung. Obras Completos, vol. XI/1. Petrópolis: Vozes. 1978, C. G.Jutig (dissertação de mestrado em Psicologia Clínica. PUC/SP,
par. 8. 2003).
ordem em seus textos fiquem um tanto perdidos.4
Afirma "sempre considerar as coisas novamente e de
outro ângulo. Meu pensamento é, por assim dizer,
circular. Esse é o método que combina comigo. É, de
certo modo, um novo tipo de reflexão peripatética".5
Esse estilo reflete o propósito, em sua obra, de
valorizar o inconsciente — o que não significa de forma
nenhuma desvalorizar a consciência. O diálogo entre as
duas instâncias é o fundamental.
Jung foi um escritor prolífico; sua obra completa
é composta por 18 volumes. Vários de seus seminários
também têm sido editados, pouco a pouco, o que vem
ampliando a gama de assuntos abarcados por ele. Seria
temerário sintetizar uma obra com tantos rostos em
poucas páginas, e a intenção aqui é simplesmente
despertar a curiosidade do leitor pela obra de Jung.
Nos dois próximos capítulos são apresentados seus
conceitos principais. Em seguida, suas reflexões sobre
a cultura e, por último, os desdobramentos de sua
obra, elaborados por alguns de seus seguidores.

4
Deirdre Bair.Jung, Uma Biografia, vol. 2. São Paulo: Globo,
2006, p. 236.
5
Sonu Shanmdasani. Juug and the Making of Modern Psycology.
Cambridge Universicy Press. 2003, p. 16.
vivesse em outra época.6 Essa vivência o mergulhava
em um humor depressivo. Some-se a isso o poder que
tinha de se observar mesmo em situações de extrema
intensidade emocional. Uma vez foi acusado de plágio
em uma redação escolar e, no auge da fúria, sentiu
1. PRIMÓRDIOS como se uma porta isolante o separasse de um
ambiente ruidoso, capacitando-o a raciocinar
friamente sobre a situação. Pôde ver a incapacidade
do professor em rever sua percepção, e reconhecer a
sua própria responsabilidade na construção do mal-
entendido.7
A dinâmica do inconsciente8 se impôs a Jung
desde a infância. Em suas memórias narra o primeiro
sonho de que guardou lembrança:9 tinha por volta de
O interesse de Jung pela interioridade humana o três ou quatro anos de idade. Passeando por uma
acompanhou desde pequeno. Ele nasceu em 1875, em campina perto de sua casa encontra uma cova. Dentro
Kesswil, pequena localidade da Suíça alemã. Seu pai dela há uma escada. Desce e encontra, no
era pastor da Igreja Reformada Suíça, atormentado subterrâneo, sobre um trono magnífico, um grande
pelo que o próprio Jung definiu como falta de fé. A cilindro de carne com um olho único fitando o teto.
mãe carregava outros tormentos; ficou internada Imobilizado pela angústia, ouve a voz da mãe que diz:
algumas vezes quando Jung era pequeno, e sempre "Sim, olhe-o bem, isto é o devorador de homens!".
conversava com o filho, e com quem mais quisesse Aos 12 anos teve uma visão na qual Deus,
ouvir, sobre os espíritos que a visitavam durante a sentado em um trono no céu, defecava sobre a
noite. Algumas vezes dizia coisas que pareciam não vir
6
dela, como se outra personalidade mais poderosa C.G.Jung, Memórias, Sonhos, Reflexões. Rio de Janeiro: Nova Fronteira.
assumisse o comando de sua pessoa. Jung percebeu 1992, p. 51. 7 Idem, p, 68.
7
Idem, p. 68.
esse fenômeno na mãe, e também em si mesmo. 8
Jung define o inconsciente como uma função psíquica independente,
Porém, em sua personalidade que denominou anterior e oposta a consciência (Obras Completas, vol. XVIII/2, par.
"número 1", reconhecia-se como um menino normal, 1224), Existe, portanto, uma equiparação em termos de importância
entre a consciência e o inconsciente, ou mesmo uma importância
menos inteligente do que a média, porém esforçado. relativamente maior do inconsciente, pois ele é a fonte da consciência.
Por outro lado, em sua personalidade "número 2", Se usarmos a linguagem que empregava na época de sua adolescência, a
sentia-se distante do mundo dos homens e próximo dos consciência corresponde à personalidade número 1 e o inconsciente à sua
personalidade número 2.
fenômenos da natureza, como se fosse um velho que 9
C.G.Jung, Memórias, Sonhos, Reflexões. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
1992, p. 25.
Catedral de Basiléia. Essas imagens, principalmente a por ela influenciavam suas falas mediúnicas, o que
última, nada fáceis de serem assimiladas por uma inviabilizava a credibilidade de seus relatos.
criança, foram por ele entendidas, na época, como Em 1900, começa a trabalhar no Hospital
manifestações da divindade — unia forma de Psiquiátrico Burghõlzli, em Zurique, que era um centro
experienciar a divindade diferente daquela pregada importante dirigido por Eugen Bleuler10 (1857-1939).
por seu pai. Toda uma série de questionamentos Lá, debatiam-se todas as novas teorias no campo da
religiosos se seguiu, e o jovem Jung percebeu, aos psicologia, inclusive as idéias e os escritos de Freud.
poucos, que o pai carregava uma religião seca e Jung, nessa época, inicia um período de estudos
inoperante, na qual não existia a fé em um deus vivo. científicos com o método de associações de palavras,
Durante toda sua adolescência as discussões que será definido no próximo capítulo. Envolve-se
sobre religião com o pai foram constantes. Aos 16 anos profundamente com os pacientes psicóticos, e em 1906
a personalidade número 1 começou a preponderar, e escreve um texto sobre a demência precoce, como era
Jung se envolveu com a cultura e a cidade que o então chamada a esquizofrenia. A correspondência
cercavam. Quando chegou a hora de escolher uma com Freud se inicia até se encontrarem pessoalmente
carreira optou pela medicina, uma vitória da em 1907.
personalidade número 1, ligada às ciências naturais e à Em 1903 casa-se com Emma Rauschenbach, de família
vida prática. Seu pai conseguiu-lhe uma bolsa de bastante rica, e a partir dessa época não tem mais
estudos, já que a situação econômica da família era preocupações financeiras. Mas, como cedo
precária. Quando terminou o primeiro ano o pai reconheceu, sua inclinação para a poligamia tornou sua
faleceu, provavelmente de câncer. Nessa ocasião, a vida afetiva tumultuada, foco de falatórios e
mãe, com a voz de sua personalidade número 2, disse- sofrimentos.
lhe que então o caminho estava livre para ele. Como vimos, as experiências de Jung com a
Durante o curso de medicina, Jung participou de religiosidade do pai, o espiritismo da mãe e sua
uma fraternidade de estudantes suíços de diversas personalidade número 2, fizeram com que o invisível
universidades, chamada Zofingia. Podem-se desde cedo se tornasse uma questão para ele. Nessa
reconhecer, nesses primeiros textos, formulações procura de respostas, participava de sessões espíritas
iniciais de conceitos que Jung trabalharia durante toda ao mesmo tempo em que lia vários filósofos. Alguns
a vida. Nesse mesmo período, participou de sessões desses pensadores já exploravam o conceito de
espíritas com sua prima de 16 anos, que era médium. inconsciente, como Carus (1789-1869) e Schelling
Escreveu a dissertação de conclusão do curso de (1775-1854), representantes do romantismo alemão,
medicina sobre essa prima, mas sob um ponto de vista bem como Von Hartmann (1842-1906), herdeiro da
científico; concluiu que situações emocionais vividas
10
Eugen Bleuler, psiquiatra suíço, introduziu em 3911 o termo
"esquizofrenia" no lugar de dementia praecox até então utilizado.
tradição romântica, todos autores freqüentemente lidar com os outros complexos e, nesse movimento,
citados em suas obras. Junto a Kant (1724-1804), ampliar o território da consciência. Porém, a ação do
Nietzsche (1844-1900) e Jacob Burckhardt (1818-97), ego pode não se exercer ou ser violentamente
constituem a base de seu pensamento. Quando distorcida por outros complexos. Jung percebeu que,
começou a trabalhar no hospital psiquiátrico já devido a esse fato, muitos de seus pacientes psicóticos
carregava consigo uma respeitável bagagem cultural. mal se expressavam verbalmente, e somente
descreviam imagens ou sensações vagas. Jung valorizou
então esse tipo de encadeamento que chamou de
COMPLEXOS pensamento não dirigido, em oposição ao pensamento
lógico, dirigido, da consciência.
Nos primeiros anos de Burghölzli, Jung se Buscando o sentido das imagens, desenvolveu
envolveu com o teste de associações de palavras: uma posteriormente o método de amplificação dos
série de palavras-estímulo, ditas pelo experimentador, conteúdos do inconsciente, que procura fazer
devia ser respondida pelo paciente, com o primeiro correlações entre os sonhos e fantasias de pacientes e
termo que lhe viesse à cabeça. Esse teste já vinha o conteúdo de mitos ou contos de fadas. A procura é
sendo trabalhado por médicos como Wundt (1832-1920) por novos caminhos de desenvolvimento que, em
e Ziehen (1862-1950), tendo este último percebido que princípio, estão cristalizados nessas manifestações
o tempo de reação da pessoa à palavra-estímulo era coletivas. Jung contrapôs a amplificação dos conteúdos
maior quando um ponto difícil da vida do paciente era do inconsciente ao método redutivo de busca por uma
tocado. causa primeira. Para se relacionar com o inconsciente,
Na época, o termo "complexo"já era usado, mas postulava ser preciso o uso desses dois métodos, sob
Jung aprimorou o conceito depois de aplicar esse teste pena de perdermos a riqueza da produção do
em vários pacientes, principalmente psicóticos. inconsciente.
Percebeu, analisando os dados do teste, que havia um
sentido nos delírios desses doentes, até então
incompreensíveis. A partir disso, compreendeu que são FREUD
os complexos que influenciam a vida do indivíduo e
determinam seu comportamento. Jung havia lido a Interpretação dos Sonhos em
Complexos são aglomerados de idéias e afetos 1900, mas essa primeira leitura não lhe causou maior
em torno de um tema, e funcionam como se fossem impressão. Leu novamente em 1903 e passou a discutir
uma personalidade interior. O complexo mais as idéias de Freud com seus colegas no Burghõlzli. A
carregado energeticamente é o complexo do ego, partir desse momento, a história da descoberta do
ponto central da consciência; ele terá de reconhecer e inconsciente passa pelas disputas e intrigas que
acompanham freqüentemente os seres humanos, conseguiram, até o fim de suas vidas, reconsiderar seus
quando se unem em torno de um ideal. O fato de a pontos de vista.
genialidade ser a marca de muitos dos iniciadores da
exploração do inconsciente profundo não impediu que
ocorressem brigas e separações, influenciadas,
também, por motivos que pouco tinham a ver com
questões teóricas, embora essas, sem dúvida,
existissem.
Zurique era um centro importante no mundo
psiquiátrico na primeira década do século 20, e era de
extremo valor para Freud o fato de sua teoria ser
estudada ali. Some-se a isso a importância que ele
dava ao fato de Jung não ser judeu, o que livrava a
psicanálise de ser considerada uma ciência judaica.
Freud e Jung tinham muito a conversar; a
admiração era mútua. Seu primeiro encontro, em
1907, na casa de Freud, em Viena, durou 13 horas.
Foram muitos os encontros e a troca de cartas, mas os
dois nunca concordaram em relação à teoria do
inconsciente. Se acompanharmos a correspondência
entre eles, percebe-se que Freud fazia questão de uma
fidelidade estrita aos ditames de sua teoria. Jung, por
algum tempo, tentou se convencer das idéias de Freud,
mas depois desistiu. E Freud compreendeu esse
movimento de Jung como a tentativa de um filho
querer matar o pai para tomar seu lugar. Jung, de sua
parte, sentiu como se Freud tentasse impor uma
maneira de pensar monolítica, inquestionável.11 Não

teve. mais tarde, com os nazistas serviram apenas para marcar,


11
Dentre todas as acusações, a pecha ele junguiano' continua a com o selo final da desaprovação, um homem que os discípulos de
ser. provavelmente, a mais devastadora entre os descendentes Freud tinham aprendido a detestar. Seguindo a orientação de
intelectuais de Freud.Toda subcultnra tem seus vilões, e Jung; é Freud. Jung continua, até hoje. rejeitado, tido como 'místico' e
tinia figura particularmente odiosa, devido, em parte, às enormes tão pouco científico quanto o socialista Adler." Paul Roazen,
esperanças que Freud nele havia depositado. Os contatos que Freud e seus Discípulos. São Paulo: Cultrix. 1978. p. 259.
Os auxiliares informam ao capitão sobre os movimentos
dos tripulantes do porão e sobre aquilo que se passa
nos outros navios. A tripulação que trabalha no porão
tem, apesar de ficar encerrada abaixo da superfície,
uma percepção profunda dos movimentos atmosféricos
e das correntes marítimas, ou seja, daquilo que é
comum a todos os navios.
Fiquemos com essa imagem, que nos servirá de
CONCEITOS PRINCIPAIS auxílio na compreensão dos conceitos idealizados por
Jung.

ENERGIA PSÍQUICA

Construiremos uma imagem que nos


acompanhará na difícil tarefa de explicação dos Retornando à desavença entre Freud e Jung, o
conceitos de Jung. Todos se lembram dos carrinhos de que objetivamente determinou a separação final dos
trombada dos parques de diversões, com aquele dois foi o conceito de libido expresso por Jung no livro
suspensório único que se encosta ao teto, de onde vem Psicologia do Inconsciente. Esse livro veio à tona em
a energia que alimenta o carrinho. Inicialmente, 1912 e foi revisto pelo próprio Jung em 1947, que
mudaremos o teto em oceano e, ao mesmo tempo, mudou seu nome para Símbolos de Transformação.12
inverteremos o carro. Transformaremos esse carro Jung sempre relutou em aceitar a concepção sexual da
invertido em um convés de navio. O suspensório será libido. Para entendermos essa questão, não podemos
compactado e formará o porão do navio. deixar de nos remeter ao estado de ambas as teorias
O capitão não gosta muito de sair do na época, e também ao fato de Jung ter trabalhado
tombadilho. Pode até andar pelo convés, mas o porão principalmente com psicoses, enquanto Freud explorou
do navio com certeza não o atrai. Ele tem a função de mais o terreno das neuroses. Freud definia libido como
dirigir e cuidar do navio, além de se comunicar com os energia sexual, e Jung concordava com essa idéia em
outros navios; um navio solitário é praticamente relação às neuroses. Porém, nas psicoses, nas quais
impossível, em geral fazem parte de uma frota. ocorre a substituição da adaptação à realidade exterior
O capitão é geralmente ajudado por três de um por um mundo interno feito de fantasias, Jung
total de oito auxiliares, os outros ficam pelo convés ou afirmava que a concepção de libido sexual era
descem para o porão e ficam praticamente esquecidos. 12
Obras Completas, vol.V Petrópolis: Vozes, 1986.
restrita.13 Jung identificou então libido com energia encaminhamento da tensão psíquica — o futuro —
psíquica, tomando um ponto de vista quantitativo. também são consideradas.
Outra grande diferença se relaciona ao Se pensarmos em nossa imagem, Jung chama a
movimento da energia psíquica. Freud, segundo Jung, atenção primordialmente para aquilo que atinge todos
reduzia os sintomas a causas iniciais que, uma vez os navios: os mitos seriam as correntes marítimas, os
assimiladas, finalizariam o trabalho a ser feito pelo ventos, marés, tudo o que é compartilhado e, por
analista. Jung postulava que esse era apenas uma assim dizer, move os navios.
parte do trabalho, pois a energia psíquica também se O rompimento final veio em 1913. Nos anos
movimenta com uma finalidade,14 seja uma tentativa seguintes Jung se sentiu ameaçado pelo inconsciente;
de cura ou o reequilíbrio de forças, possibilidade que percebia-se vulnerável às invasões emocionais que, por
explorava com o método de amplificação. seu contato com os pacientes psicóticos, sabia bem
O primeiro passo na construção dessa técnica foi onde poderiam levá-lo. Acredita que a psique cria a
dado quando relacionou a fantasia de um paciente realidade e "a única expressão que posso usar para essa
psicótico com um mito antigo. Concluiu que o atividade é fantasia [...] a fantasia, portanto, parece-
conhecimento do mito facilitaria a compreensão da me a expressão mais clara da atividade específica da
vivência do paciente, ao permitir a identificação das psique".15 Pode-se dizer que ele foi fiel à sua
possibilidades de desdobramento da situação concepção, ao resolver se expor totalmente às
patológica. O método de amplificação, portanto, fantasias que o assediavam e seguir o pensamento não
implica que o olhar terapêutico deixe de privilegiar dirigido. Mas tomou o cuidado de manter seus laços
somente o passado. As muitas possibilidades de com a realidade bem firmes.
Nessa época, já morava e trabalhava em uma
13
Como afirma Amnéris Maroni, Jung se refere a Freud como confortável casa à beira do Lago de Zurique. Respeitou
pansexualista, o que não é correto. Freud sempre contrapôs à cuidadosamente os horários de trabalho e as relações
libido inicialmente as pulsões do ego, e após 1923, a pulsão de familiares, mas reservou uma parte do dia para fazer
morte. Ver A. Maroni, Jung: lndividuação e Coletividade. São construções de pedras na beira do lago, seguindo suas
Paulo: Editora Moderna, 1999, p. 25.
14 fantasias internas. Passava suas impressões para um
"Quando se trata de explicar um fato psicológico, é preciso não
esquecer que todo fenômeno psicológico deve ser abordado sob caderno que ficou conhecido como Livro Vermelho, no
um duplo ponto de vista, ou seja, do ponto de vista da qual também desenhava. Mergulhou naquilo que
causalidade e do ponto de vista da finalidade. É de propósito que Ellemberger16 chamou de "doença criativa". Nessa fase,
falo de finalidade, para evitar toda a confusão com o conceito de definiu seus conceitos principais e delineou seu
ideologia. Por finalidade, pretendo simplesmente designar a
tensão psicológica imanente dirigida a um objetivo futuro”.
15
C.G.Jung, Obras Completas, vol.VIII/2. Petrópolis: Vozes, 1984, Obras Completas, vol. VIII/2. Petrópolis: Vozes, 1984, par. 78.
16
par.456. H. F Ellemberger, El Descubrimiento del Inconsciente. Madrid:
Editorial Credos, 1976.
método de exploração do inconsciente, e também de indivíduo. Psicologicamente, a Eros, que, por assim
terapia. O método consiste em abrir espaço para que dizer, rege a extroversão, se opõe o poder, regente da
surja um diálogo entre a consciência e os complexos introversão. No livro, Jung faz um levantamento
constelados. Em nossa imagem, o complexo do ego é o cuidadoso de outros pensadores que se debruçaram
capitão que dirige o navio, mas toda a tripulação -os sobre essa mesma questão, desde a filosofia antiga até
vários complexos que compõem o inconsciente - seus contemporâneos.
precisa ter voz. Além da orientação da energia psíquica,
introvertida e extrovertida, Jung descreveu quatro
TIPOS PSICOLÓGICOS funções da consciência. Essas funções determinariam a
maneira pela qual os estímulos internos e externos são
O primeiro livro de fôlego escrito por Jung após percebidos e trabalhados pela consciência: o
sua doença criativa foi Tipos Psicológicos,17 editado em pensamento, que apreende significados; o sentimento,
1921. Nele, Jung explora a psicologia da consciência e que confere diferentes valores às experiências; a
o tema da direção da energia psíquica. Desnecessário sensação, que é a apreensão por meio dos sentidos; e,
dizer que, em nossa imagem, trata-se da relação entre por fim, a intuição, que capta possibilidades futuras e
o capitão e seus diferentes auxiliares, cada qual com o "clima" de um ambiente.
talentos para captar detalhes diferentes da navegação O pensamento e o sentimento são racionais; é
e da estrutura do próprio navio, assim como do possível construir um discurso articulado a partir do
comportamento dos outros navios. que captam. A sensação e a intuição são irracionais,
Escrever esse livro também foi, para Jung, uma percepções momentâneas.Temos então oito tipos
maneira de lidar com as diferenças entre as teorias de psicológicos, pois cada uma das quatro funções da
Freud e Adler. O primeiro representa o ponto de vista consciência pode ter a orientação extrovertida ou
extrovertido: a orientação da energia psíquica é para introvertida, perfazendo o total de oito funções.
com o mundo dos objetos e acontecimentos exteriores, As duas funções racionais se opõem; se uma se
aos quais ela se liga e dos quais depende. Adler desenvolve, a outra tende a ficar manca, como a mão
representa o ponto de vista introvertido: a orientação direita para o canhoto. O mesmo se dá com as funções
da energia psíquica é em direção aos objetos internos, irracionais. O que ocorre é que uma das funções se
ou fatores subjetivos, que determinam então o desenvolve e serve como a principal forma de
comportamento. adaptação do indivíduo. Duas outras ajudam como
Essas duas categorias devem ser empregadas funções auxiliares e a quarta fica pouco desenvolvida e
como adjetivos em relação às funções da consciência próxima ao inconsciente. Quando o indivíduo vive uma
que veremos a seguir, e ambas existem dentro de cada situação em que precise dessa função, vê-se em apuros
— ou põe os outros em apuros.
17
Obras Completas, vol.VI. Petrópolis: Vozes, 1991.
Por exemplo, se uma decisão ética tiver de ser conflito com ele. Mas é freqüente o capitão perceber
tomada por uma pessoa com a função sentimento que existem outras vozes de comando em seu barco.
inferior, valores importantes serão desconsiderados. Como foi dito, o capitão não gosta de andar no convés
Essa decisão poderá ser justificada pela função e muito menos de descer ao porão. Ele gosta da cabine
pensamento por meio de racionalizações, que podem de comando, com os botões que aprendeu a manipular
ser bem formuladas, e mascarar a falência de valores. na escola, e muitas vezes nem se dá conta de que faz
Outro exemplo: aquele que tem a sensação inferior vai parte de um navio, o qual tem um porão com
ter, provavelmente, mais dificuldade em perceber e tripulantes, e que está no mar, ao sabor dos ventos e
descrever a realidade que o cerca; vive com a cabeça das correntes. Por outro lado, acidentes acontecem. E
nas nuvens. também nossos navios formam esquadras e os capitães
Trabalhar com as funções da consciência, que aprendem a pilotar com aqueles mais experientes -que
também podem ser chamadas processos cognitivos, é nem sempre são bons professores. Com a idade, às
treinar o ego a mudar de ponto de vista. O primeiro vezes, cresce o seu interesse pelo porão do navio.
passo é o reconhecimento, pelo indivíduo, de qual Em ambos os casos, o capitão percebe a
função usa com mais freqüência; a seguir, a aceitação tripulação e sua capacidade de determinar ordens que
de outras maneiras de funcionamento, em si mesmo e entram em conflito com seus desejos (neurose) e, no
nos outros. As funções auxiliares e, mais ainda, a extremo, ordens que ignoram totalmente sua presença
função inferior, são como línguas que precisam ser (psicose). O diálogo entre o capitão e as pessoas do
constantemente treinadas, pois caem em desuso com porão é difícil, pois a tripulação fala de um modo
facilidade, já que não se tem muita habilidade com obscuro, se expressa por imagens. Emprega essa
elas. O destro não vai escrever bem com a mão linguagem por ter uma relação próxima com os
esquerda. Também é fundamental assinalar que essa movimentos marítimos, como se fosse a representante
teorizaçâo não pode ser usada como etiquetas que se desses movimentos junto aos outros integrantes do
colam nos indivíduos. Pode-se dizer somente que as navio.
pessoas têm mais características de um ou outro tipo Retomando o pensamento conceituai de Jung, a
psicológico. linguagem do inconsciente é imagética: trata-se do
pensamento não dirigido, em contraposição ao discurso
SÍMBOLOS da consciência, que usa a linguagem verbal do
pensamento dirigido. O inconsciente se expressa por
O navio de nossa imagem é deveras estranho, meio de símbolos, que, por sua vez, exprimem da
pois pode singrar mares por muito tempo, sem que o melhor maneira possível algo que é relativamente
capitão tome contato com a tripulação no porão; essa, desconhecido para a consciência.
por sua vez, pode fazer seu trabalho sem entrar em
O símbolo é o mecanismo psicológico que canaliza a afetivamente com os outros e com o mistério que
energia psíquica. Estabelece uma diferença de cerca a existência. São os arquétipos do inconsciente
potencial, que permite que a energia psíquica seja coletivo: formas vazias, matrizes intangíveis, virtuais,
atraída para caminhos diferentes daquele até então da consciência; formas instintivas de imaginar.19
trilhado. É como a construção de uma usina em uma A energia psíquica que se expressa por um
queda d'água. O símbolo tem "um grande número de arquétipo é sempre dupla, o arquétipo contém os
variantes análogas, e quanto mais variantes tem ao seu aspectos positivos e negativos de um determinado
dispor, mais completa e rica será a imagem que tema. O arquétipo materno, por exemplo, refere-se
projeta de seu objeto".18O ego precisa se debruçar por um lado à mãe acolhedora e nutridora, por outro a
sobre o símbolo e permitir que seus conteúdos seu oposto, a mãe que rejeita e mata. Ambos os pólos
fertilizem a consciência, sem querer impor a ele um devem ser acolhidos pela consciência como
significado único. Se isso for feito, o conteúdo do possibilidades de comportamento humano, para que
símbolo fica reduzido e, portanto, sua força não haja perigo de uma posição consciente unilateral.
transformadora diminuirá. O símbolo transforma-se em Se isso ocorrer, o comportamento não integrado à
um sinal, como, por exemplo, uma placa de trânsito consciência continuará a atuar a partir do
com seu significado umco. M.as a riqueza simbólica e, inconsciente, o que provavelmente acarretará um
justamente, o grande número de analogias possíveis, o conflito neurótico. A capacidade de a consciência
que faz com que o símbolo seja um combustível conviver com os opostos inerentes à estrutura
potente para a reflexão do ego, desde que seja aceita arquetípica da psique seria indicativa de saúde
a irracionalidade que também o compõe. psíquica.

ARQUÉTIPOS
19
Sempre deparo de novo com o mal-entendido de que os arquétipos são
Falamos acima dos movimentos marítimos, do determinados quanto ao seu conteúdo, ou melhor, são uma espécie de
vento, das diferentes marés. Eles influenciam 'idéias' inconscientes. Por isso devemos ressaltar mais uma vez que os
igualmente todos os navios. Se imaginarmos que esses arquétipos são determinados apenas quanto à forma e não quanto ao
conteúdo, e no primeiro caso, de um modo muito limitado. Uma imagem
fenômenos naturais têm certa regularidade, é possível primordial só pode ser determinada quanto ao seu conteúdo no caso de
tentar usá-los como auxiliares de navegação. Na tornar-se consciente e, portanto, preenchida com o material da
conceituação junguiana, esses movimentos marítimos experiência consciente. Sua forma, por outro lado, como já expliquei
antes, poderia ser comparada ao sistema axial de um cristal, que pré-
eqüivaleriam a temas recorrentes na experiência da forma, de certo modo, sua estrutura no líquido-mãe, apesar de ele
humanidade, tais como receber e dar cuidados próprio não possuir uma existência material." Obras Completas, vol. IX/1.
maternos, impor e se adequar a limites, relacionar-se Petrópolis: Vozes, 2003, par. 155.

18
Obras Completas, vol.V. Petrópolis Vozes, 1986, par. 180.
Os arquétipos formam o inconsciente coletivo.20 Voltando à metáfora do navio, a tripulação é
Jung afirma que a criança ao nascer já traz in potentia dividida de acordo com os fenômenos marítimos que
a capacidade de atualizar esses arquétipos de acordo conhece, cada tripulante podendo conhecer questões
com suas vivências no mundo das relações. Ocorre uma referentes a mais de um fenômeno marítimo. Os
interação entre a disposição arquetípica interior da tripulantes formam uma camada intermediária entre o
criança e o seu contato com o mundo externo. A partir capitão e o oceano e suas características. Um exemplo
dessa interação, vão se compondo os complexos, que, conceitual: o complexo paterno - um de nossos
por sua vez, integram aquilo que se chama tripulantes — se formará, por um lado, a partir da
inconsciente pessoal. presença de uma das inúmeras imagens contidas no
A divisão entre um inconsciente pessoal e outro arquétipo paterno — um de nossos fenômenos
coletivo é principalmente didática. Grosso modo, o atmosféricos —, imagens essas que representam os
inconsciente pessoal está relacionado com as questões possíveis comportamentos paternos humanos. Por
específicas da vida do indivíduo. Forma-se no embate outro lado, na relação com o pai externo, essa imagem
entre as necessidades coletivas do ser humano, paterna interior vai ser modificada ou reafirmada, de
representadas pelos arquétipos, e as necessidades do acordo com a personalidade desse pai. Essa
mundo externo, representadas pelas relações da estruturação da alma ajuda a compreender por que
criança. Os símbolos dos sonhos referentes a essa dois irmãos podem experienciar o mesmo pai de forma
camada do inconsciente, geralmente, têm um caráter diferente; são realidades internas diversas, e isso
próximo aos acontecimentos do dia-a-dia. Já os determinará uma diferente imago paterna em cada
símbolos que se referem ao inconsciente coletivo, que um. Jung define imago como a lente interna com a
emergem na medida em que as situações vividas por qual lemos determinada realidade. Nossa observação
um indivíduo nunca são completamente únicas, têm de alguém terá sempre o viés decorrente da
um caráter estranho: monstros mitológicos, naves constituição particular de nossa alma.
espaciais etc. Se transpusermos essa visão do indivíduo para as
culturas, as diferenças se expressam nos vários deuses
masculinos, nos diferentes pais dos contos de fada e
20
"O inconsciente coletivo é tudo menos um sistema pessoal encapsulado. assim por diante. Em cada cultura, algumas dessas
é objetividade ampla como o mundo e aberta ao mundo. Eu sou o objeto imagens paternas se sobressaem em detrimento de
de todos os sujeitos, numa total inversão de minha consciência habitual, outras, que ficam dormentes. Pode-se dizer que cada
em que sempre sou sujeito que tem objetos. Lá estou eu na mais direta
ligacào com o mundo, de forma que facilmente esqueço quem sou na cultura vai criar leis (complexo paterno) que a ajudem
realidade. 'Perdido em si-mesmo' É uma boa expressão para caracterizar a se adaptar à realidade específica com a qual se
esse estado. Este si-mesmo, porém, é o mundo, ou melhor, um mundo, se
uma consciência pudesse vê-lo. Por isso, devemos saber quem somos."
confrontam. As leis de uma sociedade complexa serão
Obras Completas, vol. IX/1. Petrópolis: Vozes, 2003.
diferentes daquelas de uma tribo indígena, por Jung fala da amplidão do arquétipo
exemplo. O mesmo ocorre com os outros arquétipos. exemplificando com os extremos do espectro da luz;
O ego tem de lidar com o mundo externo e o eles são inacessíveis ao olho humano e, portanto,
mundo interno. Se não conseguir se adaptar ao mundo segundo sua metáfora, à consciência. Ele se refere a
externo ou aos conteúdos do inconsciente, surge a uma profundidade à qual deu o nome de inconsciente
patologia. A dificuldade em geral é que o ego, em sua psicóide. Nesse nível, os mundos psicológico e
arrogância, muitas vezes não considera os símbolos que fisiológico se tocam, ou melhor, a matéria e o espírito
surgem do inconsciente, por meio de sonhos ou ainda não se separaram. O conceito de sincronicidade,
fantasias espontâneas.Jung acredita que a cultura que será visto no próximo capítulo, liga-se a essa idéia.
ocidental esqueceu a importância da linguagem Jung identifica e descreve cinco instintos.23
simbólica. Desaprendeu a ler os símbolos, e não Primeiro, a fome, como instinto de autoconservação.
valoriza a fantasia. O Ocidente perdeu contato com o Em seguida a sexualidade, como instinto da
movimento das marés, das correntes, dos ventos, e conservação da espécie. Em terceiro lugar está o
isso equivale ao afastamento dos instintos, pois na impulso à ação, que compreende a tendência a viajar,
teoria junguiana é impossível separar o conceito de o amor á mudança, o lúdico. O quarto é o instinto
arquétipo do conceito de instinto. reflexivo: é uma interrupção da carga de excitação que
Numa primeira definição, Jung afirma que os percorre o arco reflexo e que sofre o processo de
arquétipos são a imagem dos instintos. Numa outra, psiquificação; ou seja, um desvio que rebate a
argumenta que o arquétipo tem um pólo espiritual e excitação para a psique, antes que essa excitação se
outro biológico, que corresponderiam aos extremos descarregue no inundo exterior. Em vez de uma reação
ultravioleta e infravermelho do espectro da luz. O pólo instintiva surge uma série de estados ou conteúdos,
biológico são os instintos, estímulos a determinados que determinam a capacidade humana de refletir
comportamentos que têm, como característica, a sobre o que vivência: "A reflexão é o instinto cultural
compulsividade.21 O instinto ancora-se no biológico e é par excellence, e sua força se revela na maneira como
extrapsíquico. Mas ao encontrar uma estrutura psíquica a cultura se afirma em face da natureza".24 A excitação
complexa, tal como ocorre no homem, torna-se um se transforma em imagens, conteúdos psíquicos que
instinto psicológico, determinando o pólo espiritual
que corresponde à forma visual dos instintos. O servem como modelos para todas as entidades no remo humano. As
conceito de arquétipo é, portanto, um conceito categorias apriorísticas da percepção de Kant c os protótipos de
psicossomático.22 Schopenhauer também são conceitos precursores. Ver A. Samuels, B.
Shorter, B. Plaut. Dicionário Critico de Análise Junguiana. Rio de Janeiro:
Imago. 1986, p. 39.
23
21
Obras Completas, vol. VIII/2. Petrópolis: Vozes, 1984,par. 234. Obras Completa. vol.Vlll/2. Petrópolis, Vozes, 1984, par. 237-245.
22 24
Segundo Samuels.Shorter e Plaut, o conceito de arquétipo de Jung está Idem, par. 243.
na tradição das idéias platônicas, presentes nas mentes dos deuses, e que
podem ser verbalizados, ou podem aparecer na forma para que a situação se mostre, ao sonhador, de
de pensamento abstrato, obras de arte, maneira diferente. Essa é a razão da importância dos
comportamentos éticos ou conquistas científicas. Por sonhos para o processo terapêutico: a atitude
último está a força criativa, que Jung afirma ser de consciente do paciente é questionada, retificada,
natureza semelhante à do instinto.25 ampliada, a partir dos símbolos produzidos por sua
própria interioridade. Retomando nossa metáfora, a
tripulação reage às ordens do capitão, mostrando
SONHOS dados que ele não enxerga, dado seu posicionamento
dentro do navio.
Jung foi um grande estudioso dos sonhos, que Compreender os sonhos como compensações da
fazem parte essencial de sua terapia. Afirma que neles situação consciente não satisfez Jung. Essa é uma
se expressa o modo como o inconsciente assimila característica sua: reconhecer a impossibilidade de
aquilo que vivemos e, ao mesmo tempo, reage a essas conhecer o funcionamento da psique de maneira
experiências. Nas palavras de Jung, "os sonhos [...] satisfatória. Pode-se somente construir hipóteses que
comportam-se como compensações da situação da terão uma validade relativa, pois o inconsciente
consciência em determinado momento".26 sempre poderá mostrar um novo rosto. Jung chega a
Essa definição chama a atenção para a afirmar que devemos construir uma nova teoria para
necessidade de se conhecer a situação consciente do cada paciente.
sonhador. Os símbolos oníricos não vagam no nada,27 Dentro desse espírito, Jung descreve outras duas
referem-se a uma situação específica. Se a possibilidades de compreensão dos sonhos. A primeira
consciência, ao analisar determinada situação, constrói é a função prospectiva. Se alguém se afasta muito da
julgamentos rígidos ou unilaterais, ou então deixa de norma, ou seja, do comportamento médio esperado
lado aspectos importantes em relação a alguma idéia, para determinada cultura, o inconsciente ganha
os símbolos dos sonhos vão trazer os dados que faltam importância, e traça possibilidades de desenvolvimento
futuro em relação ao caminho tomado pela
25
Idem, par. 245. consciência. Como o inconsciente tem acesso a um
26
Idem. par. 487. material amplo, composto por percepções,
27 pensamentos e sentimentos subliminares, não se deve
Não se conhecem os arquétipos, mas sim as imagens que
produzem, que são chamadas imagens arquetípicas. Essas desprezar a direção apontada pelo inconsciente, mas
imagens, embora traduzam verdades universais, são símbolos que lhe dar a mesma importância que se dá às conclusões
fazem sentido na cultura em que se inserem. Por exemplo.Jimg da consciência. Isso não significa que a direção
analisa os discos voadores como um símbolo de nossa época que
expressa a totalidade. Em outras épocas ou outra cultura, essa apontada pelo inconsciente esteja sempre correta,
mesma totalidade poderia ser expressa por outro símbolo. senão teríamos um oráculo infalível, ou uma profecia,
o que facilitaria muito nossa vida. Infelizmente, a
função prospectiva propõe uma direção que pode ou A consciência tem limites. Por mais que possa ser
não concordar com o curso dos acontecimentos, ou ampliada, sempre haverá uma zona de fronteira para
mesmo concordar em alguns detalhes e em outros não. além da qual a dinâmica do inconsciente se impõe. O
O sonho não pode ser visto como um guia infalível. arquétipo da sombra tematiza esse lugar: o
Outra possibilidade descrita por Jung é o sonho desconhecido que nos acompanha. O complexo da
telepático. Em sua experiência, ele afirma que é difícil sombra pode se compor tanto de conteúdos que nunca
encontrar a importância dos acontecimentos estiveram na consciência como daqueles que foram
telepáticos que aparecem nos sonhos. Qual a reprimidos por estarem em desacordo com a
importância de sonhar com a chegada de uma carta identidade construída pelo ego.
que realmente chega, mas cujo conteúdo não traz Em nossa imagem, o capitão acolhe alguns membros da
maior interesse? Jung não aceita a idéia do puro acaso tripulação no convés, mas gostaria que só viessem os
e nem de algum tipo de explicação sobrenatural. tranqüilos. Os que geram problemas vão para a prisão,
Afirma que a explicação está além do saber no porão do navio. Os muito diferentes ficam
acadêmico. Seu interesse por esse tipo de fenômeno é perambulando junto com os auxiliares não convocados
a raiz do conceito de sincronicidade, que veremos no pelo capitão, também no porão. Nem é preciso dizer
próximo capítulo. que sempre que esses membros da tripulação
O sonho é um fenômeno natural, não esconde puderem, vão tentar perturbar o capitão e seu
nada. Nele, estão símbolos que procuram comando.
contrabalançar atitudes muito extremadas, ou a falta Conceitualmente, a sombra sempre se apresenta
de atitudes da consciência. Jung entende a psique inicialmente no outro. Seus conteúdos, assim corno
como um sistema fechado, que procura se equilibrar. todos os conteúdos do inconsciente, tendem a se
Voltando à nossa metáfora, as correntes marítimas não projetar e a ser percebidos no comportamento e ações
se preocupam com o capitão e seus dilemas, o que dos outros. Enxergamos primeiro no exterior aquilo que
aumenta a importância da tripulação. Se essa não for odiamos e desconhecemos em nós.Tendemos a não
ouvida -ou, pior, se for trancafiada no porão -, pode se reconhecer esses conteúdos como nossos e,
amotinar. A atitude do capitão é fundamental. O defensivamente, os valoramos negativamente. Nas
diálogo entre ele e a tripulação é que ajuda a travessia palavras de Jung, sombra é "aquilo que ele (a pessoa)
ser feita da melhor maneira. Os sonhos, ao lado das não queria ser".28
fantasias e da imaginação, são as maneiras que a Quanto mais conteúdos forem reprimidos, mais energia
tripulação utiliza para se comunicar com o capitão. psíquica fica no inconsciente, minando a força do ego.
Este fica frágil, atribui um poder excessivo às pessoas;
SOMBRA
28
Obras Completas, vol. XVI/2, Petrópolis: Vozes, 1987, par. 470.
e as atividades que precisa realizar passam a ser Vimos que Jung considera a psique um sistema
penosas. O ego fica paralisado, invadido pelo medo. Ou fechado, que procura se equilibrar. A energia psíquica,
então fica agressivo, e procura destruir nos outros portanto, está sempre em movimento, procurando
aquilo que considera negativo em si, mas não manter o equilíbrio entre o consciente e o
reconhece como próprio (e com o que, inconsciente, o dia e a noite, o universo da razão e o
conseqüentemente, não lida). As relações com o outro do sonho. A volta à mãe diz respeito ao incesto que,
ficam sobrecarregadas. É o onipresente mal que, em tal como compreendido por Jung, é um chamado
sua dimensão arquetípica, gera as distâncias entre as natural. Nunca é demais dizer que todo esse processo
pessoas. As distâncias geram incompreensões, que deve ser vivido simbolicamente.
podem desembocar em guerras ou em um esforço extra Além desse movimento, a energia psíquica, ao
de aproximação. O mai pode também se apresentar em encontrar um obstáculo, tende também a regredir em
situações de extrema carência, impostas por uma direção à infância e à mãe. Em ambos os casos,
maternagem deficiente, um pai ausente ou agressivo, constela-se o arquétipo do herói, que é o responsável
amores infelizes ou por situações coletivas de extrema pela retirada da consciência do útero materno. Em
necessidade, tais como acidentes ou desastres alguns mitos essa saída inclui a morte da mãe, em
naturais. outros é o filho que morre ou se emascula. São
A primeira tarefa de uma análise junguiana é diferentes resoluções do embate da consciência e do
trabalhar a sombra: separar o que é responsabilidade inconsciente.
própria daquela do outro, e questionar as ilusões a No primeiro caso, pode-se perceber a repressão
respeito de si mesmo. Começar a árdua tarefa de se do inconsciente, um desfecho perigoso para a vida ul-
tornar um adulto humano. terior do indivíduo. Isso acontece porque o
inconsciente, simbolizado pela mãe, aparece, para o
A MAE ego, como uma ameaça para sua capacidade de
autonomia e exercício da consciência. Matando-a, o
A presença do invisível, do inconsciente, sempre ego se afasta do inconsciente e passa a olhar o mundo
acompanhou Jung. Pode-se dizer que o primeiro de forma unilateral, apenas com a razão, afastando-se
símbolo desse poder do invisível é ligado ao arquétipo do universo simbólico. Édipo é o paradigma dessa saída
da mãe. Nossa vivência inicial é muito ligada a ela; e na leitura de Jung, e nossa civilização vive as
percorremos um longo caminho até ganhar alguma conseqüências da ação edípica no intelectualismo
autonomia. Periodicamente, precisamos voltar à mãe, excessivo.
ou seja. ao inconsciente, para um processo de O tabu do incesto procura impedir o mergulho
renovação. permanente do ego no inconsciente. Outros símbolos
maternos surgem, menos aprisionadores, colocando a
energia psíquica novamente em movimento tão íntimo?30 Como alguém, com essa intensidade de
progressivo. A mãe passa de mãe carnal a mãe sofrimento, pode enfrentar um adolescente complexo,
espiritual. O indivíduo se separa do rebanho e torna-se arrogante, e inseguro como foi Jung?
consciente de sua unicidade e, portanto, de sua Em tal situação, o pai tende a se tornar uma
solidão e de sua vindoura morte.29 Esse processo é figura distante, e é difícil humanizar a relação pai-
cheio de perigos, pois se o ego não consegue lidar com filho. Humanizar uma relação significa trazer à
os aspectos negativos da mãe, pode ficar preso no consciência os dois pólos de um complexo; seria fazer
inconsciente, no reino da imaginação e do mito, que com que o amor e o ódio não se mantivessem
tende, então, a se misturar com a realidade. separados, e sim mesclados em uma série de
Em nossa imagem, é como se o capitão ficasse sentimentos e idéias que preencha o potencial
prisioneiro no porão. Não existe ninguém no convés humano, e tornem o corpo psíquico mais vibrante. E
que responda pelo barco, tripulantes surgem e tomam como se, ao invés de só existir o branco e o preto,
decisões contraditórias, sem consideração uns pelos surgisse toda a paleta de cores. Isso vale para todos os
outros. O navio está à deriva. Essa é a derrota mais complexos.
temida que o capitão pode temer. O horror de que isso O complexo paterno funciona, entre outras
aconteça restringe seus movimentos. Muitas vezes, o coisas, como tentativa de impedir a regressão da
medo enrijece os braços que poderiam guiar o barco no energia psíquica. Sua função é mostrar um dinamismo
sentido de fazer com que sua rota colaborasse com ligado à racionalidade e à lógica. Um de seus símbolos
aquela dos outros navios. O desespero o leva a abal- é o sol, que discerne, explica, racionaliza,
roar e ser abalroado, tornando uma navegação que intelectualiza. Está ligado ao logos em oposição ao
deveria ser surpreendente e alegre, em algo cheio de mythos, que se refere ao arquétipo materno.31 As
sofrimentos e imprevistos desagradáveis. conquistas científicas e tecnológicas de nossa cultura
se devem ao exercício do complexo paterno, que
O PAI precisa se ater aos fatos, e funcionar com eficiência no
mundo profano.
Como já vimos, Jung teve um pai torturado por
dúvidas em relação à fé. Para um homem religioso,
isso é uma catástrofe. O que significa ser um pastor 30
Duas obras de arte transmitem a catástrofe que significa a
que não é mais capaz de acreditar naquilo que tem de perda de fé para um homem da igreja. São elas: John Updike, Na
transmitir? O que faz um nadador profissional que, Pureza das Lírios. São Paulo: Companhia das Letras, 1997.
para o próprio espanto, sente que se afoga por não Principalmente a primeira parte, "Clarence". E um filme de
lngmar Bergman, Luz de Inverno. São Paulo: Versátil Home Vídeo.
reconhecer o elemento que, até pouco tempo, lhe era 31
Karen Armstrong, Em Nome de Deus. O Fundamentalismo no
Judaísmo, no Cristianismo e no Islamismo. São Paulo: Companhia
29
Obras Completas vol.V. Petrópolis: Vozes, 1986, par. 415. das Letras, 2001, pp. 14-15.
O mythos, que simbolicamente se refere ao o fizesse.32 Sempre que surgia o assunto, Jung adoecia.
complexo materno, dirige-se ao eterno e ao universal, Com o tempo, Emma se adaptou ao marido, mantendo
seus relatos têm um efeito sobre nossa experiência e uma relação insólita, mas que parece ter sido
comportamento. Em uma sociedade, o mythos satisfatória para os dois.
proporciona um contexto que dá sentido ao cotidiano. Ele vivia cercado de mulheres, conhecidas como
E óbvio que a parceria dessas duas instâncias seria a Jungfrauen ("as mulheres de Jung") ou "as Valquírias"
situação ideal, mas não é o que se observa. Cria-se ou "as onze mil virgens", que assistiam às suas aulas na
uma hierarquia entre razão e mito, como se a razão universidade. Muitas dessas mulheres não eram,
fosse dar conta de tudo e o mito se tornasse obviamente, só admiradoras. A ligação amorosa mais
desnecessário. importante foi com Toni Wolff, com quem manteve
Mas não se deve cair no extremo oposto, ou uma longa relação.33 Viajava com Emma ou Toni, e
seja, uma supervalorização do mythos, um perigo que muitas vezes ambas o acompanhavam.
assombra a psicologia junguiana. O pai nos ensina a Com essa intensa vida amorosa, Jung começou a
enfrentar o mundo sem ilusões, e a suportar limites. Os perceber a existência em si de uma voz feminina, que
instrumentos de navegação, a sabedoria no timão, as interferia em seus pensamentos. Era uma voz interior,
baías nas quais não se deve entrar, são atributos a lhe dizer que o que ele fazia era arte. A partir da
indispensáveis. Sem eles se anda em círculos. Mas, a elaboração dessa vivência, definiu o que chamou de
dificuldade de colaboração entre logos e mythos nos arquétipo da sizígia (conjunção) anima-ani-mus. No
encaminha para o próximo arquétipo. homem, segundo Jung, aparece como uma mulher, em

ANIMA – ANIMUS / PERSONA 32


Deirdre Bair. Jung: uma Biografia, vol.I [São Paulo: Globo,
2006, p. 413.
O que nos fascina? Como lidar com o fascínio? 33
Antes de Toni Wolf, outra mulher, além de Emma teve uma
Em geral, a fascinação está ligada às relações relação significativa com Jung: Sabina Spielrein, filha de ricos
amorosas. Em suas memórias, Jung escreve que sempre judeus russos, que, aos 18 anos, em 1904, tornou-se paciente de
guardou uma desconfiança quanto ao amor. Ligava esse Jung. Foi uma análise longa. Jung se envolveu afetivamente com
Sabina e após o final conturbado da análise, ela se aproximou
sentimento às ausências repetidas de sua mãe em sua também de Freud. Mais tarde tornou-se psicanalista e foi pata a
infância. Independente da causa, sua vida amorosa foi Rússia. O papel que ela desempenhou, tanto em relação á
sempre conturbada. Manteve-se casado a vida inteira amizade entre ambos quanto em relação ás idéias teóricas que
com Emma Rauschenbach que, por sua vez, não se então estavam sendo gestadas. foi relevante. Ver John Kerr, Um
separou por acreditar que Jung desmoronaria se assim Método Muito Perigoso, Jung, Freud e Sabina Spielrein: a História
Ignorada dos Primeiros Anos da Psicanálise. Rio de Janeiro:
Imago, 1997. Também foi feito um filme sobre ela. dirigido por
Roberto Faenza, Jornada da Alma. DVD Paris Filmes, 2003.
sonhos, ou na imaginação, e carrega características Sempre que se lê sobre esse conceito é
femininas. Na mulher ocorre o oposto. importante considerar que o espírito da época
Jung define esse arquétipo como "a fonte das determina muito do que é reconhecido como masculino
projeções".Já vimos que a sombra se compõe de tudo e feminino. Jung usa muito a dicotomia masculino-
aquilo que ainda não foi trazido à consciência, e do feminino para falar desse arquétipo. O problema que
que é reprimido. Vimos também que seus conteúdos surge é que aquilo que é considerado masculino ou
tendem a se projetar nos outros. O arquétipo da anima feminino muda muito em culturas diferentes, ou
e do animus engloba o da sombra, pois representa mesmo dentro de uma só cultura. Na maioria das
justamente essa tendência a projetar o desconhecido. vezes, Jung define o animus associado ao logos e a
Se projetarmos algo que nos pertence ficamos presos, anima associada a Eros, como se o homem tivesse
profundamente comprometidos com a pessoa ou com a sempre uma consciência-logos e a mulher uma
idéia que recebe nossa projeção. Essa ligação, por consciência-Eros. Com as mudanças culturais pelas
meio da projeção de algo próprio, ainda desconhecido, quais passamos em relação a esse tema, fica claro que
é o que define o arquétipo da sizígia. o importante é a reflexão sobre as projeções, que
Por serem desconhecidos, e carregarem muito podem assumir uma imagem contra-sexual, mas não
do mistério daquilo que ultrapassa o poder de necessariamente. O próprio Jung afirma essa
compreensão da consciência, esses conteúdos muitas realidade:
vezes possuem uma força peculiar. Jung usa o conceito "Na projeção, a anima sempre assume uma forma
de "numinoso", desenvolvido pelo teólogo Rudolf Otto feminina, com determinadas características. Esta
(1869-1937),34 para caracterizá-los. O numinoso refere- constatação empírica não significa, no entanto, que o
se à obscura profundidade emocional, fascinante e arquétipo em si seja constituído da mesma forma. A
aterrorizadora, que é acessível ao sentimento, mas não sizígia masculino-feminino é apenas um dos possíveis
à conceituação lógica. pares de opostos, mas na prática é um dos mais
O que se projeta não se projeta a esmo. Aquele importantes e freqüentes. Ela tem muitas relações com
que recebe a projeção é adequado para isso, tem outros pares (de opostos) que não apresentam
também algo daquele conteúdo. Pode-se dizer que diferenças sexuais, podendo, pois, ser colocados numa
sempre existe o cabide certo para pendurarmos nosso categoria sexual apenas de um modo forçado."35
casaco. Trabalhar o arquétipo da anima-animus é o Portanto, todas as descrições de problemas ou
que permite a construção de uma relação cada vez possessões de animus e anima que lemos em Jung
mais verdadeira com o outro, aceitando quem esse devem considerar o momento cultural em que foram
outro realmente é, e não impondo ao outro a nossa escritas.
verdade, ou, melhor dizendo, nossas projeções.
34 35
Rudolf Otto, O Sagrado. Lisboa: Edições 70, 1992. Obras Completas.vol. IX/1. Petrópolis: Vozes, 2003, par. 142.
O arquétipo da sizígia anima-animus nos liga ao
outro, ao desconhecido. Mas como nos apresentamos a O que se pode dizer acerca do inconsciente
esse outro? Somos incapazes de nos revelar por inteiro; coletivo? Por um lado é conservador, pois representa a
mantemos algumas características que nos ajudam a tradição, em todas as suas nuances. Ao mesmo tempo
compor nosso papel social. Somos médicos, psicólogos, é como se fosse um enorme computador, que contém
advogados. Vestimo-nos dentro de um estilo. Temos informações praticamente infinitas, as quais podem,
objetos que nos identificam em um grupo. Esse recorte eventualmente, abrir possibilidades inesperadas para a
de nós mesmos que mostramos à sociedade é uma consciência. Para isso se dar, a consciência tem de
necessidade arquetípica, e compõe o arquétipo da abrir espaço para o inconsciente.
persona, nome que surge a partir da máscara usada Como vimos, a psique, para Jung, é um sistema
pelos gregos em seu teatro. fechado, que tende a se auto-regular. Por meio de
Se não a tivermos, ficamos desadaptados símbolos, o inconsciente oferece as compensações
socialmente. Mas, se ela se tornar rígida, ocorre uma necessárias. Mas o pensamento dirigido de nossa
"identificação com a persona": são aquelas pessoas que cultura tende a desvalorizar o mythos; e a
se definem pelo cargo ou profissão que ocupam, como compensação, que seria um processo natural, não
se isso bastasse para defini-los. Possuem uma funciona. Após retomar a importância da atenção aos
interioridade vazia, uma identidade frágil. Não símbolos, a consciência precisa conviver com as novas
conseguem sair de si mesmas, pois bloqueiam o possibilidades que eles trazem, o que torna possível o
movimento de projeção-conscientização administrado início da função transcendente. Jung a define como
pelo arquétipo da sizígia anima-animus. Todas as aquela que permite a colaboração entre conteúdos
relações que tentam construir com o mundo exterior conscientes e inconscientes.36
sofrem com isso. Esse é um trabalho sem fim, para a vida inteira. Jung o
Retomando: a energia psíquica na concepção de nomeou "processo de individuação". Os embates da
Jung é um conceito que deve ser compreendido como consciência com o inconsciente constróem uma
um quantum. Essa energia se determina percepção cada vez mais afinada, que recolhe na
qualitativamente na medida em que tramita pelos consciência, na medida do possível, os opostos
complexos da psique. Sua manifestação, portanto, relativos aos complexos. Isso muda a hierarquia entre o
revela sempre os dois pólos do complexo, como foi complexo do ego, que até então era o centro da
visto acima. Na prática, a energia psíquica é dual. A consciência, e os outros complexos, que serão
procura de um equilíbrio entre dois opostos nos leva ao reconhecidos como instâncias decisórias, ao lado do
arquétipo central. ego. Jung afirma que o arquétipo do si-mesmo é
aquele que tem uma função organizadora da totalidade
SI-MESMO
36
Obras Completas, vol VIII/2. Petrópolis: Vozes, 1984, par. 167.
consciente-inconsciente.37 Isso equivale a dizer que esse conceito, há um questionamento das religiões,
ocorre uma ordem na natureza, perceptível ao homem pois ele implicitamente afirma a relatividade de todas
quando ele se afasta da luz intensa da consciência e as religiões e, paradoxalmente, as reconhece como
enxerga a relatividade do ponto de vista consciente. fatores fundamentais do equilíbrio psíquico humano. As
Mas o que significa realmente essa vivência? Em nossa religiões, na leitura junguiana, se ocuparam por muito
imagem, o capitão abandonou a ilusão de quanto tempo do diálogo entre o consciente e o inconsciente.
depende dele a navegação. Reconhece as correntes Sua teoria permite que as revelações religiosas sejam
marítimas e os ventos, e procura se aliar aos consideradas registros simbólicos da dinâmica do
tripulantes para tomar as decisões, que são produto de inconsciente, da mesma forma que os contos de fadas
tudo o que se relaciona ao barco e à navegação. Como ou histórias folclóricas. Mas, com essa leitura, Jung
poderia ser chamado esse outro poder decisório? Trata- desagradou a religiosos e ateus, pois relativiza ambas
se de um princípio indefinível, pois ultrapassaria a as posições.
capacidade de descrição da consciência. Jung criou essa concepção da psique durante sua
"Intelectualmente", diz Jung, "ele não passa de doença criativa, nos anos 10 do século 20. Em seguida,
um conceito psicológico, de uma construção que serve procurou encontrar, na história e em outras culturas,
para exprimir uma essência incognoscível que não idéias que referendassem as suas. Serão o assunto do
podemos dominar desde que por definição ela próximo capítulo.
transcende nossa capacidade de compreensão. O si-
mesmo também pode ser chamado 'o deus em nós'. Os
primórdios de toda nossa vida psíquica parecem estar
inextrincavelmente enraizados nesse ponto e as metas
mais altas e derradeiras parecem dirigir-se para ele.
Tal paradoxo é inevitável, assim como sempre que
tentamos definir o que ultrapassa os limites de nossa
compreensão.38
Esse conceito provoca muita celeuma, pois Jung
diz que existem muitas imagens que correspondem a
esse arquétipo e são todas imagens de Deus. Inerente a

37
Um símbolo do si-mesmo muito estudado por Jung é a Mandala,
que indicaria um centro psíquico que não é igual ao Eu
consciente. Obras Completas, vol. XII. Petrópolis: Vozes. 1991.
par. 122-26.
38
Obras Completas, vol. VII/2. Petrópolis: Vozes, 1979, par. 399.
Por outro lado, nessa mesma época, começou a
olhar para o exterior. Entre 1919 e 1925 deu palestras
em diferentes países da Europa; como turista foi duas
vezes à África e duas vezes aos Estados Unidos. Lá, foi
ao Novo México visitar os índios pueblo. Conta em suas
memórias40 que nessas viagens conseguiu olhar para a
RAÍZES, ALQUIMIA, INDIVIDUAÇÃO Europa de fora. Pela primeira vez estava em um lugar
sem os preconceitos cristãos, com uma diferente
tradição histórica, e isso lhe permitiu lançar outro
olhar em relação à cultura européia. Despregou-se da
noção de tempo ocidental, vivenciando um tempo
circular, sem a premência do progresso. Ouviu o chefe
dos índios pueblo lhe dizer que o homem branco é
louco, pois pensa com a cabeça e não com o coração.
Depois de entrar em confronto com o Percebeu a outra face da civilização ocidental, a ave
inconsciente e delinear seus conceitos psicológicos, de rapina dos escudos heráldicos europeus em ação.
Jung sentiu necessidade de "apoiar em terra firme Um homem, apoiado em sua lança, visto pela janela do
[suas] fantasias e os conteúdos do inconsciente".39 trem, desencadeou em Jung uma reflexão sobre como
Comprou um terreno na margem superior do Lago de seria o desenrolar do mundo, sem que a consciência
Zurique e iniciou a construção daquela que ficou humana criasse o significado. Concluiu que essa
conhecida como a Torre de Bollingen. O início das capacidade humana o torna um segundo criador no
obras se deu em 1923; até 1955 Jung adicionaria novas processo do ser.41
estruturas, sempre com o intuito de representar na Jung queria encontrar as raízes históricas das
pedra aspectos de suas vivências. Retirava-se para lá e experiências interiores que percebia em si próprio e
levava uma vida simples; cortava a lenha de que em seus pacientes. Entre 1918 e 1926 retomou o
necessitava, plantava e colhia, imerso em sua estudo sobre os gnósticos que, segundo seu
interioridade. Com a construção em Bollingen, Jung entendimento, haviam encontrado, a seu modo, o
concretizou um espaço para sua personalidade número mundo do inconsciente.42 Mas sentia que faltava um
2.
40
Idem, p. 212-52.
41
Idem, p. 224.
39 42
C.G.Jung, Memórias, Sonhos e Reflexões. Rio de Janeiro: Nova Jung escreveu cm 1916 os Septem Sermones ad Mortuos, texto
Fronteira, 1992, p. 196. de caráter gnóstico, nunca divulgado oficialmente durante sua
vida. Embora o tenha considerado um pecado de juventude,
degrau entre as concepções gnósticas e suas próprias A alquimia acompanha o cristianismo
concepções psicológicas. A alquimia revelou-se a ponte compensando suas lacunas, principalmente em relação
que faltava. à maneira de lidar com os contrários. O cristianismo,
Em 1928 Richard Wilhelm lhe deu um livro sobre segundo Jung, se desenvolveu em detrimento do
alquimia chinesa, O Segredo da Flor de Ouro. A partir homem interior.44 Deu muita ênfase à imitação de
de seu encontro com essa obra, estudou por dez anos Cristo e isso levou a uma preponderância do homem
textos alquímicos. Percebeu que os alquimistas exterior, com um comportamento de aparência, muitas
falavam a linguagem simbólica, o que os aproximava vezes deixando o homem interior sem se desenvolver,
de suas próprias concepções. Com a alquimia, perdido na sombra. Já que Cristo foi identificado com
compreendeu o inconsciente como "um processo, e que o Bem, o Mal, além de ser responsabilidade do homem,
as relações do ego com os conteúdos do inconsciente tem de ser reprimido, e não compreendido como parte
desencadeiam um desenvolvimento ou uma verdadeira integrante do ser humano. A sombra fica maior, e
metamorfose da psique. Nos casos individuais é cresce a tensão entre o bem e o mal, entre os
possível seguir este processo através dos sonhos e contrários.
fantasias. No mundo coletivo, tal processo se encontra E claro que a intenção da imitatio Christi não
inscrito nos diferentes sistemas religiosos e na era a de uma simples imitação, mas sim da realização,
transformação de seus símbolos".43 Através do estudo em cada um, do exemplo dado por Cristo. Porém, o
das evoluções individuais e coletivas, e pela desenvolvimento do símbolo de Cristo não se deu dessa
compreensão da simbologia alquimista, chegou ao maneira; e a alma ficou na escuridão, subvalorizada. O
conceito básico de toda a sua psicologia: o "processo que pode ter facilitado esse desenvolvimento é a
de individuação". atitude extrovertida do ocidental, que tende a
compreender tudo ao nível do objeto, Cristo inclusive.
ALQUIMIA E CRISTIANISMO Isso enfraquece o entendimento de Cristo como aquele
que está presente no interior de cada um. Para Jung, o
Jung encontrou na história do homem o degrau oriental está ligado ao homem interior, e vê o exterior,
de que sentia falta. Os alquimistas procuravam o ouro - seu próprio ego e individualidade, como uma ilusão
não o ouro vulgar, mas aquele que representava a passageira.
totalidade, a reunião da consciência com o Mas a alma faz ligações, como vimos, com aquilo
inconsciente, aquele ponto definido por Jung como si- que está inconsciente. No caso, com os processos
mesmo. naturais que ocorrem na interioridade do homem e que
foram deixados de lado pelo cristianismo. É nesse
permitiu "pelo amor à honestidade", que fosse publicado junto a
44
suas memórias. Ver Memórias, Sonhos e Reflexões, pp. 332-41. Obras Completas, vol. XII. Petrópolis: Vozes, 1991, par. 12.
43
Idem, p. 184.
ponto que entra a alquimia, na visão de Jung, que seria verdadeiro e o outro não? Não há como responder
assim descreve o trabalho dos alquimistas: a essa pergunta a não ser procurando outro ponto de
"O trabalho deles com a matéria representava, vista que relativize a questão. E essa é a proposta
sem dúvidas, um esforço sério de penetrar a natureza ousada de Jung em relação às religiões: a partir do
das transformações químicas; mas, ao mesmo tempo, arquétipo do si-mesmo, surgem imagens do divino.
era também - e em uma proporção muitas vezes A psicologia junguiana não afirma a existência
dominante - a reprodução de um processo psíquico, de um Ser criador com determinadas características.
que se desenrolava paralelamente e que podia ser mais Muitos críticos de Jung afirmam que, em sua
facilmente projetado na química desconhecida da psicologia, ele propõe um deus interior. Essa idéia
matéria por ser um fenômeno inconsciente da pode ser inferida de uma leitura apressada de seus
natureza, tanto quanto a transformação misteriosa da escritos. Jung preocupa-se com a realidade simbólica,
matéria. E o problema descrito acima do processo de com os mitos; o divino pode ser vivenciado tanto na
se desdobrar da personalidade chamado processo de interioridade quanto em objetos externos ao homem:
individuação, que se exprime na simbólica "O mito é, essencialmente, o produto de um arquétipo
alquímica."45 inconsciente e é, portanto, um símbolo que pede
Porém, com as mudanças que ocorreram na interpretação psicológica. Para o homem primitivo
civilização ocidental a partir do Renascimento, o lado qualquer objeto, por exemplo, uma lata velha que foi
simbólico da alquimia perde forças e a química ganha jogada fora, pode subitamente assumir a importância
espaço. E com isso prevaleceu a tendência cristã de de um fetiche. O efeito não é, obviamente, inerente à
uni-lateralidade espiritual, em detrimento do lata, mas é um produto psíquico".47
instintivo.46
Jung procura a objetividade científica quando ARQUÉTIPOS E SOCIEDADE
explora a psique. As religiões são alvo de seu olhar
inquiridor, pois seus símbolos, como foi visto acima, Esse olho afinado com a dimensão arquetípica
espelham o processo de individuação coletivo. O não o ajudou a detectar a serpente que saía do ovo.
problema é que a religião se sente invadida com esse Em 1933, na Alemanha nazista, Jung assumiu a
olhar objetivo. Mas como responder à pergunta sobre presidência da Sociedade Médica Geral Internacional
qual deus é verdadeiro? Jeová? Alá? Xangô? Por que um de Psicoterapia, cargo que manteve até 1939. O
caráter internacional da Sociedade, reforçado por
45
Jung, permitiu que vários participantes,
Idem, par. 40. principalmente judeus, se mantivessem como
46
Para compreender melhor a visào que Jung tem do cristianismo
é interessante ler: "Resposta a Jó", em Obras Completas, vol. membros, ao contrário dos desejos nazistas.
XI/4. Petrópolis: Vozes, 1979. E, na seqüência, "Aion", Obras
47
Completas, vol. IX/2. Petrópolis: Vozes, 1982. Obras Completas, vol. X/4. Petrópolis: Vozes, 1991; par. 625.
Jung também se tornou editor da Zentralblatt PSICOLOGIA E FÍSICA
für Psychotherapie, revista publicada na Alemanha. No
final de 1933, foram publicados no mesmo exemplar Vimos no capítulo anterior que Jung definiu um
um artigo de cunho abertamente nazista e um artigo inconsciente coletivo, camada profunda e inacessível à
de Jung, "O Estado da Psicoterapia Hoje". Fiel a seu consciência. Inferimos sua existência a partir de
olhar arquetípico, Jung trabalhou nesse texto, e em imagens que se referem ás experiências comuns a toda
outros desse período, a suposição de que existem a humanidade. Foram usadas as imagens do oceano e
diferenças psicológicas entre as diversas "raças" e suas correntes, dos fenômenos atmosféricos e seus
''nações". Hitler, um Wotan48 redivivo, seria a movimentos, para nos ajudar a compreender esse
compensação para o complexo de inferioridade conceito. Mas a metáfora é pobre para expressar a
alemão. São observações que nunca poderiam ser complexidade desse campo, que Jung chamou
expressas dessa maneira, nessa época, jung psicóide.
negligenciava os fatores econômicos, históricos, sociais Nele, não haveria distinção entre psique e
e políticos em suas análises sobre a Alemanha, matéria. Jung retomou o conceito de unus mundus,52
transformando-a unicamente em uma entidade ou mundo unitário, para dar conta desse fenômeno. É
psicológica, a ser compreendida psicologicamente.49 uma área na qual as leis do tempo, espaço e
Quando a guerra terminou, Jung foi alvo de causalidade não são obedecidas e todos os estratos da
reportagens críticas e ataques diretos.50 Com o passar existência estão interligados. Experiências
do tempo, reflexões mais interessantes têm sido feitas relacionadas a esse campo seriam as coincidências
sobre suas posições.51 A complexidade do tema significativas, eventos que acontecem em tempos
permite que surjam nuances de sua teoria, e ajuda a diferentes, mas que guardam uma relação
desidealizar o mestre suíço, passo necessário para que significativa, como, por exemplo, falarmos de uma
se leia com objetividade seus escritos. pessoa que não vemos há muito tempo e ela aparecer
na nossa frente inesperadamente. Jung chamou
sincronicidade essa maneira não causal de conexão.
48
Wotan é o deus principal da mitologia nórdica. Seus atributos Essa parte de sua teoria é derivada da alquimia e de
são muitos. Por um lado refere-se à poesia e a inspiração, por sua amizade com o físico austríaco Wolfgang Pauli53
outro lado refere-se à fúria, a loucura e à guerra. (1900-58).
49
Andrew Samuels, "National Socialism, National Psychology,
and Analyrtical Psychology". In: A. Maindenbaum e S. Martim
(eds.). Lingering Shadows. Junguians, Freudians, and anti- 52
Obras Completas, vol. XI V/2. Petrópolis: Vozes, 1990, par.
Semitism. Londres: Shambala. 1991, p.189. .325-27.
50 53
Deirdre Bair, Jung: uma biografia. vol. 2. São Paulo: Globo, Os interesses amplos de Jung reverberaram em Olga Fröbe-
2006. cap. 33. Kapteyn, que sempre quis fazer de sua casa, próxima de Ascona,
51
Ver A. Maindenbaum e S. Martim (eds.), op. Cit. Suíça, um ponto de encontro entre o Oriente e o Ocidente. Desde
O CONCEITO CENTRAL culturais, patrióticos, ou qualquer coisa que possa ser
vista como regra moral universal; desenvolve uma
O processo de individuação é o conceito central ética própria, que pode ser contrária à moral vigente.
na teoria junguiana.54 Jung vê o inconsciente como Por exemplo, uma mulher muçulmana que vive em um
uma potência que procura expressão. Retomando nossa ambiente fundamentalista pode querer exercer seu
imagem pela última vez, pode-se dizer que o capitão, pensamento e pode desenvolver valores próprios
uma vez em processo, reconhece que as correntes quanto ao vestir-se ou ao comportar-se socialmente.
submarinas, assim como os ventos, o dirigem para um Esse abandono das regras coletivas tem um
ponto determinado, ainda desconhecido. Sua preço. Algo precisa ser dado em troca, e é nesse lugar
tripulação, que, como vimos, percebe os movimentos que Jung afirma a importância do indivíduo.55 Só ele
atmosféricos e do mar, lhe transmitirá as coordenadas, cria novos valores, só ele destrói valores caducos que
na medida do possível. Portanto, ele não pode escolher são aceitos por todos. Qualquer transformação social
a rota que quiser; até pode, mas perderá muito da não se sustenta sem indivíduos criativos que mostrem
ajuda da tripulação. Precisará se esforçar para aquilo que, sendo óbvio, se oculta.
construir uma rota de acordo com as orientações que A individuação não se confunde com
vêm de dentro do barco, e com suas observações dos individualismo,56 pois o processo não acontece se o
movimentos exteriores. Nessa jornada, seu barco pode indivíduo se isola. Ao mesmo tempo em que a pessoa
se afastar do restante da frota; e pode mesmo se opor
ao caminho da maioria dos barcos; pode ser agredido
55
por isso, ou mesmo agredir — os perigos não têm fim. A individuação retira a pessoa da conformidade pessoal e, com
Para Jung, o inconsciente é um "outro" que se isso, da coletividade. Essa é a culpa que o individualizado deixa
para o mundo e que precisa tentar resgatar. Em lugar de si mesmo
apresenta no decorrer da vida. Reconhecer e dar a precisa pagar um resgate, isto é, precisa apresentar valores que
palavra a esse outro é individuar-se. Nesse processo, sejam um equivalente de sua ausência na esfera coletiva e
questões éticas e morais terão de ser enfrentadas, pessoal. Sem esta produção de valores a individuação definitiva é
pois, ao entrar no processo, a pessoa deixa de se imoral e, mais do que isso, é suicida. Quem não souber produzir
submeter obrigatoriamente aos ditames sociais, valores deve sacrificar-se conscientemente ao espírito da
conformidade coletiva." Obrai Completai, vol. XVIII/2. Petrópolis:
Vozes, 2000, par. 1095.
56
Individualismo significa acentuar e dar ênfase deliberada a
1933. Jung participou das Conferências Eranos, organizadas por supostas peculiaridades, em oposição a considerações e
ela, e suas idéias tornaram-se o foco dos encontros. Muitos obrigações coletivas. A individuação, no entanto, significa
convidados deram palestras, dentre eles Mircea Eliade, Karl precisamente a realização melhor e mais completa das qualidades
Kerényi e Gerhard Scholem. coletivas do ser humano; é a consideração adequada e não o
54
Peter Hoinans, Jung in Context. Chicago: The Universiry of esquecimento das peculiaridades individuais, o fator
Chicago Press, 1995, p.24. determinante de um melhor rendimento social." Obras Completas,
vol.VII/2. Petrópolis: Vozes, 1979, par. 267.
se percebe única, também percebe, graças a seus
aspectos coletivos, que aquilo que acontece com
qualquer ser humano reverbera em si própria.

LADOB

No início deste livro, Jung foi definido como o


lado B da psicologia profunda. Explicando melhor: o
lado B é aquele que, embora não tendo o apelo
imediato do lado A, guarda outra beleza, que se
mostra mais devagar. As vezes, devido a uma maior
complexidade, que demanda mais tempo para ser
apreciada. Às vezes, para usar uma analogia musical, a
instrumentação ou a voz do cantor (no lado A) nos
atrapalha; mas outra versão pode despertar a simpatia
que a versão original não mereceu. (Às vezes, também,
não é demais dizer, o lado B é só uma música
qualquer, para completar o disco).
Se o leitor que nunca leu Jung tiver a
curiosidade de saber em qual dessas categorias ele se
inscreve, um bom começo é a leitura de Memórias,
Sonhos e Reflexões. Na seqüência, o volume VII/1,
Psicologia do Inconsciente e o volume VII/2, O Eu e o
Inconsciente, das Obras Completas. Ou então,
"Fundamentos de Psicologia Analítica", que faz parte
do volume XVIII/1. A biografia de Deirdre Bair é uma
ótima leitura complementar, pois consegue manter a
medida certa de empatia por Jung.
Nada substitui o contato direto com a obra de
um autor. Também é verdade que alguns pensamentos
do mestre ficam mais claros depois de trabalhados por
outros, que refletiram sobre suas idéias. E o que
veremos no próximo capítulo.
Jung quase não escreveu sobre as primeiras
fases da criança. A escola de desenvolvimento procura
aplicar suas idéias à infância. Dois autores
significativos dessa escola são o alemão Eric Neumann
(1905-60) e o inglês Michael Fordham (1905-95).
Neumann descreve as etapas do desenvolvimento do
DESDOBRAMENTOS bebê no livro A Criança.58 Fiel à idéia de que a
filogênese repete a ontogênese, escreveu também uma
História da Origem da Consciência.59 Sua obra, de
grande erudição, merece ser lida, embora Neumann
tenha sido criticado por projetar verdades míticas
sobre a história do homem.
Um dos críticos de Neumann foi Michael
A curiosidade de Jung fez com que ele se Fordham, que afirmava que as teorizações do analista
interessasse por inúmeros aspectos da alma. As alemão não eram ancoradas na observação e na prática
sementes que lançou deram frutos nos escritos de clínica com crianças. Fordham, amigo de Winnicott60
muitos autores. Alguns deles serão citados a seguir, (1896-1971), construiu várias pontes entre seu
para que se tenha ao menos uma idéia dos pensamento, que nunca deixou de ser fiel à concepção
desdobramentos da obra do mestre suíço. de psique junguiana, e a psicanálise. É criticado por
O analista inglês Andrew Samuels chama de "pós- alguns junguianos justamente por essa característica
junguianos" todos os autores que continuaram a refletir de suas idéias. Defende o uso do divã61 na análise
sobre as idéias de Jung. Ele publicou, em 1985, um junguiana; e percebe-se a forte presença de Melanie
livro no qual descreve três escolas: a clássica, a de
58
desenvolvimento e a arquetípica.57 Concebeu essa Eric Neumann. A Criança. São Paulo: Cultrix, 1991.
59
classificação de acordo com a ênfase dada por cada História da Origem da Consciência. São Paulo: Cultrix, 1995.
60
escola a aspectos clínicos e teóricos. Apesar das Donald Winnicott, psicanalista inglês, escreveu uma resenha de
limitações inerentes às classificações, elas são úteis Memórias, Sonhos e Reflexões que vale a pena ser lida. Winnicott
como uma primeira organização do panorama faz uma interpretação muito rica dos fatos vivenciais narrados por
Jung, e chega a uma interessante conclusão sobre o significado,
junguiano. para Jung, do livro de memórias. "Resenha de Memories, Dreams,
Reflections, 1964". Em: C. Winnicott, R. Shepherd.M. Davis
(orgs.), Explorações Psicanalíticas D. W. Witwieott. Porto Alegre:
Artmed, 1994.
57 61
Andrew Samuels. Jung e os Pós-Junguianos. Rio de Janeiro: Michael Fordham, Junguian Psychotherapy, a Study in
Imago, 1989. Analytical Psyehology. London: John Wiley & Sons, 1978, p. 65.
Klein62 (1882-1960) em suas teorizações. Tem uma dessa sua capacidade está no livro Anatomia da
abordagem eminentemente clínica, e vários dos Psique65 no qual explora a alquimia de modo palatável,
conceitos que criou são produto de seu trabalho com mesmo para os que não são estudiosos de Jung. Outros
crianças. Só há um de seus livros traduzido em de seus livros infelizmente não estão traduzidos.66
português, A Criança Como Indivíduo.63 James Hillman, um americano que estudou em
Marie-Louise von Franz (1915-98), representante Zurique, é o representante primeiro da escola
da escola clássica, tinha apenas 18 anos quando arquetípica. A principal característica de seu
conheceu Jung. Nessa época, ele começava a se pensamento é a ênfase no politeísmo da psique.
interessar por alquimia. Marie Louise tinha uma cultura Hillman acredita que Jung, com o conceito de si-
e inteligência fora do normal; tornou-se uma mesmo, facilita uma visão monoteísta da psique, fruto
pesquisadora dedicada do assunto e interlocutora de de sua formação cultural. Aprofundando uma
Jung, tomando o lugar que até então tinha sido afirmação do próprio Jung, segundo a qual "os deuses
ocupado por Toni Wolff (a companheira não oficial de viraram doenças",67 procura explorar os dinamismos
Jung). Dona de grande memória, falava em público psíquicos correspondentes a cada deus. Em decorrência
com facilidade, e a maioria de seus livros são disso, muitas "verdades" convivem na alma humana.
transcrições de seminários que dava no Instituto Jung Hillman explora uma vertente pós-moderna do
em Zurique. Dedicou-se, dentre outros temas, à pensamento de Jung. Sua psicologia procura construir
interpretação dos contos de fada. Manipula os uma perspectiva, um modo de ver os fenômenos que é
conceitos junguianos com competência, entremeando-
os com mitos de vários países, tornando a teoria plena 65
Edward F. Edinger, Anatomia da Psique, o Simbolismo
de vida. Muitos de seus livros foram traduzidos para o Alquímico na Psicoterapia. São Paulo: Cultrix, 1990. Outra autora
português. Escreveu ainda uma biografia de Jung que que fez um trabalho semelhante com a alquimia foi Marie-Louise
é, ao mesmo tempo, uma ótima introdução a seu von Franz, Alquimia, Introdução ao Simbolismo e à Psicologia. São
pensamento.64 Paulo: Cultrix, 1991.
66
Edinger trabalha o texto de Jung, Mysterium Coniunctionis, no
Edward Edinger (1922-98) pertence também à
livro: The Mysterium Lectures. Toronto: Inner City Books, 1995.
escola clássica. Psiquiatra americano, ele consegue Faz o mesmo com um livro de Jung, Aion, em The Aion Lectures.
esclarecer, em seus livros, aspectos densos da teoria Toronto: Inner City Books, 1996.
junguiana, sem trair as idéias originais. Um exemplo 67
"[...] Abandonamos, no entanto, apenas os espectros verbais,
não os fatos psíquicos responsáveis pelo nascimento dos deuses.
62 Ainda estamos tão possuídos pelos conteúdos psíquicos
Melanie Klein, psicanalista austríaca, foi uma das pioneiras no
autônomos, como se estes fossem deuses. Atualmente eles são
tratamento psicanalítico de crianças. chamados: fobias, obsessões, e assim por diante; numa palavra,
63
A Criança Como Indivíduo. São Paulo: Cultrix, 2001. sintomas neuróticos. Os deuses tornaram-se doenças."
64
Marie-Louise von Franz, C.G.Jung. Seu Mito em Nossa Época. "Comentário Sobre o Segredo da Flor de Ouro", em: Obra
São Paulo: Cultrix, 1992. Completa, vol. XIII. Petrópolis: Vozes, 2003, par. 54.
chamado de "fazer alma". Também explora o Estado Novo, Nise assumiu o setor de terapia
reconhecimento da alma no mundo (anima mundi), ocupacional do Hospital Pedro II, no Engenho de
principalmente nas cidades,68 compreendidas como o Dentro, Rio de Janeiro. Organizou exposições de
lugar na terra em que a imaginação é realizada. pinturas dos pacientes internos em 1947 e 1949, que
Outro autor que tem ganhado importância mais chamaram a atenção de críticos de arte. Em 1954 leu
recentemente é o alemão Wolfgang Giegerich. Em seus Psicologia e Alquimia; e em 1955 se iniciaram as
escritos retoma Hegel e propõe uma leitura dialética atividades do que viria a se tornar o Grupo de Estudos
radical dos mitos. Enquanto Hillman propõe que a alma C. G. Jung.Já em 1954 enviou a Jung algumas pinturas
deva ser imaginada e não definida, já que é uma de pacientes, e em 1957 estava em Zurique com a
metáfora e um campo de experiências,69 Giegerich exposição "A Esquizofrenia em Imagens". O próprio
afirma que a alma é vida lógica, pensamento.70 Jung lhe aconselhou a estudar mitologia, passo
Provocador, afirma que a psicologia junguiana corre o fundamental para ajudá-la a compreender as imagens
risco de se tornar um agente tranqüilizador de mentes, que tanto a fascinavam.
perdendo seu aspecto subversivo, ao se propor Pethó Sándor (1916-1992), médico ginecologista
somente a ligar mitos a comportamentos humanos. É a húngaro, chegou ao Brasil em 1949. Desenvolveu uma
ameaça do que chama "psicologia pop". Seus livros não técnica corporal chamada "calatonia", embasada
estão traduzidos para o português.71 teoricamente no pensamento junguiano. Seu nome
está ligado à PUC de São Paulo, onde foi professor na
BRASIL década de 1970, influenciando muitos alunos a
estudarem as obras de Jung.
O primeiro nome que surge ao se pensar a teoria Leon Bonaventure, belga, chegou ao Brasil em
de Jung no Brasil é o da médica alagoana Nise da 1967. Membro da Sociedade Internacional de Psicologia
Silveira (1905-99).72 Após ser presa pela ditadura do Analítica (IAAP), com sede em Zurique, começou a
trabalhar como analista em São Paulo. Coordenou em
1975 as comemorações do centenário do nascimento
68
James Hillman, Psicologia Arquetípica. São Paulo: Cultrix, de Jung e liderou um grupo de estudos.
1992, p. 93. Após a visita de analistas junguianos
69
Idem.p. 14. estrangeiros, e algumas desavenças internas, a
70
Wolfgang Giegerich, The Souls Logical Life. Frankfurt: Peter primeira sociedade junguiana se organizou em 1978, ao
Lang GmbH, 1999, p.9.
71 redor de Carlos Byington, médico carioca, que também
Artigos que fazem parte de uma polêmica qtie teve tom James
Hillman estão traduzidos em www.rubedo.psc.br fez a formação em Zurique. Hoje existem duas
72
Uma exposição da psicologia analítica no Brasil encontra-se em:
Arnaldo A. da Motta. Psicologia Analítica no Brasil; Contribuições programa de estudos Pós-Graduados em Psicologia Social,
Para a Sua História. Dissertação de Mestrado apresentada ao PUG/SP. 2005.
sociedades ligadas à Sociedade Internacional de
Psicologia Analítica: a Sociedade Brasileira de
Psicologia Analítica (SBPA) e a Associação Junguiana
Brasileira (AJB), além de inúmeros grupos em vários
estados brasileiros.73

73
Na página www.forumjunguiano.com.br, no link "grupos e
instituições", encontra-se extensa lista de grupos e instituições
junguianas no Brasil.
a Psicologia e a Patologia dos Fenômenos Ditos
Ocultos".

1902/1903 — Estuda com Pierre Janet, na Salpêtrière.

1903 — Casa-se com Emma Rauschenbach, com quem


teve quatro filhas e um filho.
CRONOLOGIA 1904/1905 — Organiza o laboratório de psicologia
experimental. Publica a primeira parte dos "Estudos
com Associação de Palavras".

1905 — Professor de Psiquiatria na Faculdade de


Medicina de Zurique. Continua como professor até
1875 — Dia 26 de julho nasce Carl Gustav Jung, em 1913. Chefe de clínica no Burghõlzli.
Kesswil, Cantão de Thurgau, Suíça. Filho do pastor
Johann Paul Achilles Jung (1842-1896) e de Emile 1906 - Início da correspondência Freud-Jung.
Preiswerk (1848-1923).
1907 — Publica "Psicologia da Demência Precoce".
1879 — Mudança da família para Klein-Hunigen, perto Primeiro encontro com Freud em Viena. Primeiro
de Basiléia, cidade na qual Jung freqüenta o ginásio. Congresso Internacional de Psiquiatria e Neurologia em
Berlim. Jung apresenta "A Teoria Freudiana da
1884 - Nascimento de sua única irmã, Gertrude. Histeria".

1895/1900- Estuda medicina na Universidade da 1908 — Primeiro Congresso Internacional de


Basiléia. Em 1896 falece seu pai. Psicanálise em Salzburg.

1900 — Torna-se assistente de Eugen Bleuler, que era 1909 - Viaja aos Estados Unidos com Freud,
médico-chefe do Burghölzli, Hospital Psiquiátrico de ambos convidados pela Universidade Clark,
Zurique. Massachusetts. Redator-chefe do Jahrbuch für
Psychoanalytische und Psychopathologische
1902 — Tese de doutoramento em medicina: "Sobre Forschungen, fundado por Freud e Bleuler.
1910 - Segundo Congresso Internacional de 1918/1926 - Estuda o Gnosticismo.
Psicanálise. Fundação da Associação Psicanalítica
Internacional,Jung é presidente até 1913. 1919 — Escreve "Instinto e Inconsciente".

1911 - Terceiro Congresso Internacional de Psicanálise 1920 — Viagem à Algéria e à Tunísia.


em Weimar. Escreve a primeira parte de
"Metamorfoses e Símbolos da Libido". Conhece Toni 1921 — Escreve Tipos Psicológicos.
Wolff. "Sobre a Doutrina dos Complexos".
1924 — Visita aos índios Pueblo, Novo México, Estados
1912 - Profere nove conferências na Universidade Unidos.
Fordham em Nova Iorque: "Tentativa de Apresentação
da Teoria Psicanalítica". Envia a Freud a segunda parte 1925/1926 — Expedição ao Quênia.Visita aos Elgo-nyi,
de "Metamorfoses e Símbolos da Libido". Em dezembro, no monte Elgon.
ruptura das relações pessoais com Freud.
1928— Escreve: O Eu e o Inconsciente e A Energia
1913 - Quarto Congresso Internacional de Psicanálise Psíquica. Richard Wilhelm envia a Jung um manuscrito
em Munique. Jung dá à sua psicologia o nome de de um tratado alquimista taoísta, "O Segredo da Flor
psicologia analítica. Em outubro, demite-se do cargo de Ouro".
de redator-chefe da Jahrbuch. Demite-se de seu posto
na Universidade de Zurique. 1929 - Escreve: "Comentário ao Segredo da Flor de
Ouro".
1914 — Deixa a presidência da Associação
Psicanalítica Internacional. 1930 - Assume a vice-presidência da Sociedade Mé-
dica Geral Internacional para Psicoterapia, cujo
1912/1919— Confronto com seu próprio inconsciente. presidente é E. Kretschmer. Primeiro encontro entre
Jung e W. Pauli.
1916 - Escreve "Sete Sermões aos Mortos" (incluído em
Memórias, Sonhos e Reflexões), "A Função 1932 - Recebe o prêmio de literatura da cidade de Zu-
Transcendente" e "Aspectos Gerais da Psicologia dos rique. Início da correspondência com W Pauli.
Sonhos".
1933 — Primeira conferência Eranos de Jung em
1917 — Escreve Psicologia do Inconsciente. Ascona, Suíça: "Estudo Empírico do Processo de
Individuação". Viagem ao Egito e Palestina.
1933/1939 -Torna-se presidente da Sociedade Médica 1957 — Começo da redação de Memórias, Sonhos e
Geral Internacional de Psicoterapia e editor do Reflexões com Aniela Jaffé. Entrevista televisionada
Zentralblatt für Psychotherapie und ihre Grenzgebiete. com John Freedman, para a BBC de Londres.

1934 — Começa o estudo sistemático de alquimia. 1958 — Escreve Um Mito Moderno.

1935 - Conferência no Instituto Tavistock em Londres: 1961 — Termina, dez dias antes de morrer, o "Ensaio
"Fundamentos de Psicologia Analítica". de Exploração do Inconsciente", para o Homem e Seus
Símbolos. Falece a 6 de junho em sua casa, em
1936 — Doutor Honoris Causa em Harvard. Escreve o Küsnacht.
ensaio "Wotan".

1937 - Conferência sobre psicologia e religião na


Universidade de Yale, EUA. Psicologia e Religião.

1938 - Viagem à índia, a convite do governo britânico.

1944 — Escreve Psicologia e Alquimia.

1946 - Escreve os ensaios "Sobre a Natureza da Psique",


"Psicologia da Transferência" e "Psicologia e Educação".

1948 - Inauguração do Instituto C. G.Jung em Zurique.

1951 - Escreve Aion.

1952 - Escreve Sincronicidade. Revisão de


"Metamorfoses e Símbolos da Libido", republicado como
Símbolos de Transformação. Escreve Resposta a Jó.

1955 — Falece Emma Jung.

1955/1956 - Escreve Mysteríum Conunctionis.


BIBLIOGRAFIA XV — O Espírito na Arte e na Ciência
XVI/1 — A Prática da Psicoterapia
OBRAS COMPLETAS DE C.G.JUNG (Editora Vozes) XVI/2 - Ab-Reação, Análise dos Sonhos,
Transferência
I - Estudos Psiquiátricos XVII — O Desenvolvimento da Personalidade
II — Estudos Experimentais XVIII/1 — A Vida Simbólica
III — Psicogênese das Doenças Mentais XVIII/2 - A Vida Simbólica
IV - Freud e a Psicanálise
V — Símbolos de Transformação OUTROS TÍTULOS DE JUNG EM PORTUGUÊS:
VI - Tipos Psicológicos
VII/1 - Psicologia do Inconsciente William McGuire e R. F. C. Hull (orgs.), G G.Jung:
VII/2 — O Eu e o Inconsciente Entrevistas e Encontros. São Paulo: Cultrix, 1982.
VIII/1— A Energia Psíquica
VIII/2— A Natureza da Psique C. G.Jung, Memórias, Sonhos, Reflexões. Rio de
IX/1 — Os Arquétipos e o Inconsciente Janeiro: Nova Fronteira, 1992.
Coletivo
IX/2 — Aion — Estudos Sobre o Simbolismo C. G.Jung. "Aproximação ao Inconsciente" em: C. G.
do Si-Mesmo Jung (org.), O Homem e Seus Símbolos. Rio de Janeiro:
X/l — Presente e Futuro Nova Fronteira, 2005.
X/2 — Aspectos do Drama Contemporâneo
X/3 — Civilização em Transição TÍTULOS NÂO DISPONÍVEIS EM PORTUGUÊS:
X/4 - Um Mito Moderno
XI/1 - Psicologia e Religião The Zofingia Lectures. London: Routledge & Kegan
XI/2 — Interpretação Psicológica do Dogma Paul, 1983.
da Trindade
XI/3 - O Símbolo da Transformação na Missa Vision Seminars. Dallas: Spring Publications, 1983.
XI/4 — Resposta a Jó
XI/5 - Psicologia e Religião Oriental Seminars on Dream Analysis. New Jersey: Princeton
X/XI - Escritos Diversos University Press, 1984.
XII — Psicologia e Alquimia
XIII — Estudos Alquímicos Nietzsche's Zarathustra. Notes of the Seminar Given in
XIV/1 - Mysterium Coniunctionis 1934-1939. New Jersey: Princeton University Press,
XIV/2 - Mysterium Coniunctionis 1988.
Zilda M. R Gorresio, Os Pressupostos Míticos de C. G.
Jung's Seminars on Nietzsche's Zarathustra. Abridged. Jung na Leitura do Destino: Moíra. São Paulo:
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Analytical Psychology. Notes of the Seminar Given in Peter Homans, Jung in Context: Modernity and the
1925. New Jersey: Princeton University Press, 1989. Making of a Psychology. Chicago: The University of
Chicago Press, 1995.
Psychology of Kundalini Yoga. Notes of the Seminar
Given in 1932. London: Routledge & Kegan Paul, 1996. Bárbara Hannah, Jung, Vida e Obra: Uma Memória
Biográfica. Porto Alegre: Artmed, 2003.
Children's Dreams. Notes from the Seminars Given in
1936-1940 by C. G.Jung. New Jersey: Princeton Thomas Kirsch, The Jungians: a Comparative and
University Press, no prelo (previsto para 2008). Historical Perspective. Londres: Routledge, 2000.

SOBRE JUNG Polly Young-Eisendrath e Terence Dawson (orgs.),


Manual Cambridge Para Estudos Junguianos. Porto
Deirdre Bair, Jung: Uma Biografia. São Paulo: Globo, Alegre: Artmed, 2002.
2006. Gustavo Barcellos,jM«£. São Paulo, Ática, 1991.
Ann Conrad Lammers, In God's Shadow. The
J. J. Clarke, Em Busca de Jung. São Paulo: Ediouro, Collaboration of Victor White and C. G. Jung. New
1993. Frieda Fordham, Introdução à Psicologia de Jung. York: Paulist Press, 1994.
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Marie-Louise von Franz, C.G.Jung, Seu Mito em Nossa Contribuições Para a Sua História. Dissertação de
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Luiz Paulo Grinberg, Jung, O Homem Criativo. São
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Sonu Shamdasam, Jung and the Making of Modern
______________, Figuras da Imaginação. São Paulo: Psychology: The Dream of a Science. Cambridge:
Summus Cambridge University Press, 2003.
Editorial, 2001.
Glauco Ulson, O Método Junguiano. São Paulo: Atica,
______________, Jung, Individuação e Coletividade. 1988.
São Paulo: Moderna, 1999.
DVD
Marilyn Nagy, Questões Filosóficas na Psicologia de C.
G.Jung. Petrópolis: Vozes, 2003. Matter of Hearts. USA 1986. Documentário dirigido por
Mark Whitney. Várias entrevistas com pessoas que
Renos Papadoulos (ed.), The Handbook of jungian conheceram pessoalmente Jung. Contém imagens de
Psychology. Londres: Routledge, 2006. arquivo de Jung.

Eloísa M. Damasco Penna, Um Estudo Sobre o Método SITES


de Investigação da Psique na Obra de C. G. Jung.
Dissertação de Mestrado, Programa de Psicologia a) Brasileiros
Clínica, PUC/SP, 2003.
www.sbpa.org.br - página da Sociedade Brasileira de
Paul Roazen, Freud e Seus Discípulos. São Paulo: Psicologia Analítica. Filiada à Sociedade Internacional
Cultrix, 1978. Nise da Silveira JK«& Vida e Obra. Rio de de Psicologia Analítica (IAAP), promove a formação de
Janeiro: Paz e Terra, 1978. analistas e cursos abertos. Uma vez por ano organiza o
MOITARA, encontro multidisciplinar, em Campos de
Andrew Samuels, Jung e os Pós-Junguianos. Rio de Jordão.
Janeiro: Imago, 1989.
www.ajb.org.br - página da Associação Junguiana
A. Samuels, B. Shorter, B. Plaut, Dicionário Crítico de Brasileira. Filiada à Sociedade Internacional de
Análise Junguiana. Rio de Janeiro: Imago, 1986. Psicologia Analítica (IAAP), promove a formação de
analistas. Uma vez por ano, em uma cidade diferente
Daryl Sharp, Léxico Junguiano. São Paulo: Cultrix, do Brasil, organiza um congresso internacional.
1993.
www.rubedo.psc.br — página que promove a Psicologia
Analítica, com ênfase na Psicologia Arquetípica.
Organiza um curso de pós-graduação em teoria e www.sedes.org.br - cursos de expansão em psicologia
terapia junguiana junto à Universidade Estácio de Sá, junguiana, promovidos pelo Instituto Sedes Sapientiae
Rio de Janeiro. Informações: www.estacio.br (SP).

www.himma.psc.br - página que procura uma www.facis-ibehe.com.br — Faculdade de Ciências da


interlocução com o pensamento pós-junguiano, a Saúde, São Paulo. Especialização em Psicologia
psicanálise, a literatura e as artes numa atitude ética e Junguiana.
imaginativa frente ao texto de C. G.Jung.
b) Internacionais
www.museuimagensdoinconsciente.org.br — página do
Museu de Imagens do Inconsciente, fundado por Nise www.cgjungpage.org — página que contém grande
da Silveira. número de artigos e resenhas.

www.symbolon.com.br - página paranaense que www.iaap.org — página da associação Internacional de


procura ser um elo de ligação entre os que estudam a Psicologia Analítica.
Psicologia Analítica.
www.alchemywebsite.com — página de alquimia com
www.forumjunguiano.com.br — página que pretende grande número de textos e imagens.
promover debates sobre Psicologia Analítica e fazer um www.jcf.org — página sobre mitologia, da Joseph
levantamento de pessoas, grupos e instituições ligadas Campbell Foundation.
à Psicologia Analítica.

www.bibliografiajunguiana.googlepages.com — página
que divulga livros de psicologia analítica publicados no
Brasil.

www.pucsp.br — Pontifícia Universidade Católica de


São Paulo. Pós-graduação stricto senso em psicologia
clínica. Núcleo de pesquisa, estudos junguianos.

www.cogeae.pucsp.br — pós-graduação lato sensu.


Abordagem junguiana: leitura da realidade e
metodologia do trabalho.
Esta obra foi digitalizada e revisada pelo grupo Digital
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o benefício de sua leitura àqueles que não podem comprá-
la ou àqueles que necessitam de meios eletrônicos para ler.
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