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Caderno

Revista de Cultura do
Diário Oficial do Espírito Santo
Ano VI - n.º 33 • Vitória-ES • Maio de 2016 • Bimestral

Por trás das

cortinas
A trajetória de luta do teatro capixaba para
continuar a criar público e para garantir
espaço para quem produz arte no Estado.
Foto: Divulgação/Diego Sá

Páginas 3 a 9
Editorial

A cena do Espírito Santo


res e diretores capixabas, para
tentar entender o que incentiva
Foto: Divulgação/Huemerson Leal

e o que impede o teatro capixa-


ba de progredir, de conquistar
mais público e de garantir espaço
para quem atua no meio. Ato-
res, produtores e diretores, como
Luiz Tadeu Teixeira, Marcelo
Ferreira, Margareth Galvão e
Elenice Moreira, além do próprio
Duílio Cid, falam sobre o teatro
produzido no Espírito Santo.
A visão sobre a obra de
José Carlos Oliveira, cronis-
ta capixaba que morreu há 30
anos, mas que deixou marcas
entre seus leitores, com textos
publicados em jornais de circu-
lação nacional, como o Jornal
do Brasil, nos seus melhores
tempos, também faz parte do
A peça “O Outro”, produção da Folgazões Cia. de Artes Cênicas Caderno D de maio. Um artigo
assinado pelo escritor Pedro

O
s encantos, as dificul- Duílio Henrique Kuster Cid, J. Nunes fala um pouco dessa
dades e a trajetória do que resultou na dissertação história.
teatro produzido no de mestrado em História, na O uso de projetos culturais
Espírito Santo são o mote prin- Ufes, e, finalmente, no livro no apoio a terapia de pacientes
cipal desta edição do Caderno “Revolução dos Caranguejos do HEAC, como o Cineclube
D. A maior efervescência da – o Teatro no Espírito Santo Lanterna Mágica, e a gestão
produção local, que coincide durante a Ditadura Militar”, compartilhada do Patrimônio
exatamente com o período da recentemente lançado. Cultural, também compõem esta
Ditadura Militar, é a inquieta- O estudo de Cid nos fez edição.
ção do ator, professor e escritor ampliar a discussão, ouvir ato- Boa leitura! n

Caderno
Revista de Cultura do
DIO
MIRIAN SCÁRDUA
Diretora-presidente
Coordenação de produção
Sérgio Egito e Stephanie Oliveira

Diário Oficial do Espírito Santo Edição, redação e revisão


SÉRGIO RICARDO DE OLIVEIRA EGITO Companhia de Comunicação
Diretor de Produção e Comercialização
Projeto gráfico e editoração
GOVERNO DO ESTADO Comunicação Impressa
PAULO CÉSAR HARTUNG GOMES GETÚLIO DARCY CURTY PIRES
Governador Diretor Administrativo-financeiro Jornalista responsável
Cláudio Rocha
CÉSAR ROBERTO COLNAGO
Vice-Governador SECULT Impressão
JOÃO GUALBERTO M. VASCONCELOS Gráfica do DIO
DAYSE MARIA OSLEGHER LEMOS Secretário de Estado da Cultura
Secretária de Gestão e Recursos Humanos

Este Caderno pode ser acessado no site www.dio.es.gov.br

2 Caderno maio de 2016


Teatro

Histórias, problemas e conquistas


Artistas lutam pela carreira e falam da
trajetória do teatro capixaba

A
constatação do livro “Re- Santo (FCES) e, depois da extin-
volução dos Caranguejos ção da FCES, do Departamento
– o Teatro no Espírito Estadual de Cultura (DEC), que
Santo durante a Ditadura Mili- tinham políticas definidas para
tar”, de Duílio Henrique Kuster o teatro por quem conhecia bem
Cid, de que o segmento teve um o meio e suas necessidades.
dos seus períodos de maior efer- A reforma do Carlos Gomes
vescência no Estado nos tempos ganhou força durante a passagem
duros da Ditadura Militar pode da peça “Liberdade, liberdade”,
surpreender muita gente, mas que tinha o ator Paulo Autran à
não chega a impressionar um frente do elenco. As péssimas
dos precursores do teatro nessas condições do local obrigaram o
terras, o ator, diretor e jornalista grupo a limpar canto por canto,
Luiz Tadeu Teixeira. poltrona por poltrona. A peça
Mais do que a criativida- foi apresentada e ao final o ator
de ou a inquietação dos artistas chamou a atenção da plateia para
nesses momentos de crise, que a situação do teatro e cobrou
poderiam motivar quem produzia dos estudantes capixabas uma
teatro por aqui, a coincidência, postura de defesa daquele bem
na visão de Teixeira e reforçada público.
por Cid, que é também histo- A situação, conforme Cid,
riador e ator, tem uma relação gerou constrangimento para o
Foto: Divulgação/Juçara Batista

clara com as políticas adotadas então governador intervencio-


no período. Não sem nenhuma nista Christiano Dias Lopes,
intenção, como esclarece o es- que estava vendo a peça e que
critor, que aponta as iniciativas prometeu, logo depois, restau-
de governo com base na neces- rar o teatro. O Carlos Gomes
sidade de evitar uma produção foi construído em 1927 e, na
cultural mais próxima do que década de 1951, constituiu-se
os militares adoravam chamar mais como uma sala de cinema Marcelo Ferreira, na peça “Crash”, é um dos
artistas que mais produz no ES
de ameaça comunista. do que como um espaço para
A mais relevante dessas abrigar espetáculos teatrais. Um
medidas de incentivo ao teatro movimento liderado por atores produções locais sempre foi di-
no Estado talvez tenha sido a locais conseguiu devolver o es- fícil. Nos anos de 1970, os gru-
grande reforma e reinaugura- paço à sua finalidade original, pos não se sustentavam e quem
ção do Teatro Carlos Gomes, em 1967, época da passagem queria se profissionalizar ia para
entregue à sociedade capixaba de Autran pelo Estado. o Rio de Janeiro ou para São
em dezembro de 1970. No seu Luiz Tadeu Teixeira lembra Paulo, com raríssimas exceções.
lastro, outras ações importantes que apesar dos incentivos do “Isso motivava uma dispersão,
foram adotadas, como a criação Estado após a reinauguração do uma falta de continuidade.”
da Fundação Cultural do Espírito Carlos Gomes, o mercado para “Naquela época (antes dos >>

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Teatro

Os obstáculos ao
artista local
Apesar da falta de dinheiro
e de um certo preconceito que
se tem com a produção artística
desenvolvida fora dos principais
eixos do país, o diretor, ator,
dançarino, coreógrafo e profes-
sor Marcelo Ferreira, que come-
çou a aparecer na cena capixaba
na década de 1980, destaca que
as pessoas continuam a produzir
teatro de qualidade no Estado.

Foto: Divulgação/Juçara Batista


Essa trajetória, de uma pro-
dução mais vigorosa nos anos
de 1970, não foi interrompida,
apenas oscilou, como acredita
Ferreira. “Passado a Ditadura,
tivemos boas produções durante
Marcelo Ferreira em cena da peça “Crash” as décadas de 1980 e de 1990,
com a estreia do Festival Vitória-
-Brasil de Dança e a continui-
“Nos anos de 1970, os grupos dade dos Festivais de Teatro de
não se sustentavam e quem São Mateus e de Guaçuí.” Para
o multiartista, essa variação é
queria se profissionalizar comum, como ocorre na Bolsa de
Valores, na economia em geral
ia para o Rio de Janeiro Ou para São e em outros segmentos. “Mas,
Paulo, com raríssimas exceções” nós, artistas, sempre mantivemos
acessa a chama.”
incentivos do Estado), havia me- meados dos anos de 1970, hou- A experiência de Marce-
nos grupos, um ou dois no má- ve uma proliferação de grupos, lo Ferreira é um bom exemplo
ximo. Quem queria fazer teatro alguns melhores preparados que dessa força dos artistas locais.
a sério se juntava. As peças de outros. “Na época em que havia De meados da década de 1980
sucesso ficavam várias sema- um ou dois, era mais fácil para até 2000, ele teve uma grande
nas em cartaz, fazendo sessões o público saber que era teatro parceria, como bailarino e pro-
diárias, no Teatro Geração (Ma- produzido com qualidade. Mas dutor da Cia Neo-Iaô de Dança,
gestic), na Escola Técnica, no as principais figuras foram para com outro multiartista capixaba,
teatro da AEI, com espetáculos outros centros ou passaram a Magno Godoy, que morreu em
como “Arena Conta Zumbi”, se dedicar a outras atividades 2008. Em 2003, lançou o Grupo
“Vitória de Setembro a Setem- com maior chance de realização Teatro Urgente. Com ou sem
brino”, “Mordaça”. Não havia profissional. Essa fragmentação crise, Ferreira realiza pelo menos
secretarias de Cultura, leis tipo prejudicou a produção e o nú- um trabalho cênico por ano.
Rubem Braga. Tudo era pro- mero de espetáculos de resulta- Este ano, o criador do Te-
duzido com recursos próprios do aquém do esperado criou no atro Urgente dirige a Ópera
dos grupos ou com um eventual público a ideia de que o ‘teatro Cavalleria Rusticana, com o
apoio do serviço de turismo da capixaba’ era de baixo nível”, coro Sinfônico da Faculdade
Prefeitura de Vitória. A partir de explica Teixeira. de Música do Espírito Santo

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Foto: Divulgação/Diego Sá
e acomodam ao mesmo tempo.
Sabe-se de ‘tudo’, mas desloca-
-se pouco para conferir ao vivo,
condição básica para existir o
teatro... Certo que não temos
o costume de ir ao teatro com
frequência, ou quase nunca, mas
também não temos educação,
nem em casa, nem na escola.
Aliás, sequer temos saneamento
O Grupo Folgazões apresentou a peça
“O Pastelão e a Torta” no Festival de São João Del Rey (MG)
básico e comida. E a velha indús-
tria cultural insiste em lançar a
(Fames), e estreia, em julho, a de Almeida (jornalista, crítico moda burra do momento. Diante
peça “Plugged, ensaio sobre dias de cinema, cineasta e escritor, desse quadro, o teatro continua
felizes”, encenação a partir de que morreu em 1995) para ir tendo seu valor e sendo realizado
texto de Samuel Beckett, com a ao cinema. Ele, vez por outra, diariamente por vários grupos
atriz Ivny Matos. aventurava-se como crítico de significativos no Estado. Mas,
Para Luiz Tadeu Teixeira, teatro também. Um profissional claro, faltam teatros, política de
no entanto, ainda falta mais apu- assim nos faz muita falta.” temporada para grupos profissio-
ro profissional ao teatro produzi- “Não temos crítica na im- nais, manutenção e ampliação
do no Espírito Santo. “É preciso prensa local. No Brasil, também dos festivais”, justifica Marcelo
romper com o conceito de fazer são raros os críticos/pensado- Ferreira.
como der, típico do amadorismo res, estudiosos que se dedicam Para ele, o que impede o
no pior sentido – bom é fazer a apreciar o teatro. Há muito teatro de prosperar no Estado é o
por amor e fazer bem feito. tempo deixamos de ter chama- mesmo que impede o ser humano
Há uma deficiência crônica na das nas emissoras de televisão, de prosperar sob o poder do ca-
preparação de quem se dedi- com raras exceções de parce- pital. Mas o multiartista acha que
ca à atividade.” Ele cita, por rias. As redes sociais dominam apesar da precariedade instalada >>
exemplo, a ausência da função
do produtor exclusivo, alguém
que trabalha com o objetivo de
viabilizar um empreendimento,
compatibilizando qualidade com
capacidade de comercialização
desse produto.

O poder da crítica
Alguns dos obstáculos ao
desenvolvimento ou acelera-
mento da produção de teatro
local, segundo a atriz e diretora
Margareth Galvão, começa pela
falta de uma análise crítica do
Foto: Divulgação/Victor Zorzal

teatro. O seu questionamento


é compartilhado por Marcelo
Ferreira e Luiz Tadeu Teixeira.
“Não há mais crítico de teatro
aqui. A crítica estimula o públi-
co. Lembro-me que o público
esperava as críticas de Amylton Peça Pailhaços, da Folgazões Cia. de Artes Cênicas

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Teatro

em todos os setores, o teatro e a sível viver só como atriz. “Eu há como viver só de bilhete-
dança ainda prosperam, “já que misturo tudo, a atriz, a profes- ria”, confirma Cid. Os grupos
é da crise que vive o artista, um sora, para poder viver de forma locais, mesmo quando aprovam
inconformado por excelência”. absurdamente modesta.” projetos em leis de incentivo,
Margareth, que é de São O exemplo da atriz é segui- como a Rouanet, ainda acabam
Paulo, radicada no Espírito San- do pelo ator e historiador Duílio patinando na hora de conseguir
to, vê um outro fator importante Henrique Kuster Cid, um dos “vender” o patrocínio.
que atrapalha o desenvolvimento membros do Grupo Folgazões
artístico local, que ela comparti- Cia. de Artes Cênica e autor do

[
lha como um sentimento comum livro “Revolução dos Caran- Margareth
a muitas pessoas que vêm de guejos – o Teatro no Espírito Galvão
fora do Estado, que seria um Santo durante a Ditadura Mi-
certo complexo de inferioridade litar”. Mesmo com uma ativi- É atriz, diretora, drama-
do capixaba. Ela reclama, por dade frequente, especialmente turga e professora de Teatro,
exemplo, do valor que se dá aos considerando o mercado local, nasceu e viveu 29 anos em
espetáculos que vêm de fora, Cid disse que todos do seu grupo São Paulo. Estudou teatro na
Fundação das Artes de São
quando eles são de baixa quali- precisam recorrer a outras ocu-
Caetano do Sul, em São Pau-
dade e superestimados. “O cara pações. Quem mais se aproxima
lo, na década de 1970, tendo
vai a algumas coisas horríveis, dessa sobrevivência, hoje, acaba
professores como Eugenio
que vêm de fora, e não paga R$ derivando para o conceito de Kusnet e Jonas Bloch. Radi-
10,00, R$ 20,00 para ver um teatro-empresa, que atua, tam- cada em Vitória, formou-se
trabalho bem legal aqui.” bém, por encomenda, fazendo, em Artes Visuais pela Ufes.
por exemplo, peças com conte- Ganhou três prêmios: Sated,
Trabalhadores da arte údo relacionado à necessidade como melhor atriz; Marlim
Para o artista local acomo- de um patrocinador ou de uma Azul, como destaque no
dado, Margareth manda recado: organização. cinema capixaba e como
“Dei aula 16 anos na Fafi. A arte Essa realidade não é uma diretora; e melhor espetá-
não cai do céu. Não tem essa exclusividade local. Até gru- culo de Rua no Festival de
história de talento, de genialida- pos considerados entre os mais São Mateus e no Festival de
de. Somos, hoje, trabalhadores bem-sucedidos do país, como o Juiz de Fora. Atualmente dá
da arte. Como artista, é preciso Galpão, de Minas Gerais, acaba cursos de interpretação para
estudar muito, trabalhar duro”. precisando das leis de incenti- câmera de cinema e vídeo,
Apesar do longo período de tea- vo ou de patrocínios diretos de prepara cantores líricos e
tro, Margareth diz que é impos- empresa para sobreviver. “Não elenco de filmes.

Luiz Tadeu Teixeira [


Iniciou sua carreira no teatro no Espírito Santo, em 1970, com o musical “Ensaio Geral” e a montagem
de “Mordaça”, de Edward Albee e Allen Ginsberg. Entre 1971 e 1974, estudou comunicação e teatro no
Rio de Janeiro e em São Paulo, além de trabalhar como contratado da Companhia de Paulo Autran nos
espetáculos “O Homem de La Mancha”, musical dirigido por Flávio Rangel, e “Coriolano”, de William
Shakespeare, com direção de Celso Nunes. De volta a Vitória, atuou, dirigiu e acumulou as funções em
“Antígona”, “Terror e Misérias do III Reich”, “O Caso Rosemberg”, “O Monta-Cargas”, “O Santo Inquérito”,
“Quando as Máquinas Param”, “Queima de Arquivo”, “Um Forte Cheiro a Maçã”, ”Pinóquio, o Musical” e
“O Inspetor Geral”. Em 1981, ganhou o prêmio de melhor ator em um festival de teatro nacional realizado
no Paraná, com a peça “Terror e Miséria do III Reich”, de Bertolt Brecht, dirigida por Renato Saudino. Em
2012, dirigiu o espetáculo “As Inesperadas Aventuras de Robinson Crusoé”. No cinema, atuou nos lon-
gas-metragens “Vagas Para Moças de Fino Trato”, “Lamarca” e “Fica Comigo” e dirigiu os curtas “Ponto e
Vírgula”, “O Ciclo da Paixão” e “Graçanaã”. Como jornalista, editou os cadernos de cultura dos jornais A
Gazeta e A Tribuna, de Vitória.

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Foto: Arquivo pessoal
Nos tempos da
Ditadura
O autor do livro “Revolução
dos Caranguejos – o Teatro no
Espírito Santo durante a Ditadura
Militar”, Duílio Henrique Kuster
Cid passou por um duro processo
para concluir sua obra, lançada
este ano, fruto da sua dissertação
de mestrado em História. Sem
Luiz Tadeu Teixeira e Paulo Autran em um ensaio de
“Coriolano”, de Shakespeare, em São Paulo, 1974
muitos registros sobre o seg-
mento, ele recorreu a pesquisas

[
no Arquivo Público, no Grupo
Marcelo Ferreira de Teatro da Barra, no Instituto
Jones dos Santos Neves, nos do-
Iniciou a carreira no teatro na década de 1980. Entre 1986 a 2000, cumentos oficiais da FCES, do
foi produtor e bailarino da Cia. Neo-Iaô de Dança, em parceria com
DEC e da Funarte, bem como nos
Magno Godoy. Em 2003, criou a Cia. de Teatro Urgente, que tem no
jornais locais mais influentes na
seu repertório os espetáculos “Back to Beckett”, apesentada naquele
época.
ano; “Godot” (deu a Marcelo e ao Teatro Urgente os prêmios de me-
lhor espetáculo, diretor e ator do Festival Nacional de Teatro de São
Entrevistas com atores e
Mateus), em 2005; “Nosferatu”, apresentado em Vitória, São Paulo e
autores teatrais capixabas como
Rio de Janeiro, na temporada de 2006; “Metropolis” (deu a Marcelo
Luiz Tadeu Teixeira, Renato Sau-
o Prêmio Klaus Viana de Dança Funarte/Minc), encenada no Rio de dino, Paulo De Paula, Sebastião
Janeiro, em São Paulo e em Vitória (durante o Festival Nacional de Xoxô, José Augusto Loureiro
Teatro de Vitória), em 2007; “Fahrenheit 451” (que ganhou o prêmio e Rômulo Musiello ajudaram a
de Trilha Original no Festival Nacional de Teatro de Guaçuí), em 2008; fechar a história. Entre as poucas
“Via Sacra”, um vídeo-dança, apresentado em Tiwanaku, La Paz, na obras que encontrou, a “História
Bolívia, em 2009; “Playbeckett”, em 2011; “Mefisto”, apresentado em do Teatro Capixaba, 395 anos”,
2012, no Espírito Santo e dentro do Projeto ES em Cena, em Salvador, do psicólogo Oscar Gama (ele
São Luís, Curitiba, Belo Horizonte e Rio de Janeiro, em 2013 e 2014; vai de José de Anchieta até 1980,
“Ópera Pobre”, em 2013, que também passou pelo projeto Circulação quando o livro foi publicado) é
Cultural por seis cidades do Espírito Santo; e “Crash, ensaio sobre a a mais relevante, embora tenha
falência”, em 2015. Além da carreira no teatro, é jornalista e professor um perfil mais descritivo.
e está cursando o mestrado em Artes, na Ufes. Duílio Kuster Cid explica
que o seu objetivo foi estudar as
políticas públicas de incentivo ao
teatro no Estado nesse período.
Foto: Arquivo pessoal

Em função disso, chegou a três


Luiz Tadeu Teixeira, etapas distintas: de 64 a 69, que
como Geppeto, em chama de ausência de qualquer
Pinochio, no teatro
política; de 70 a 77, com muitas
João Caetano, no
Rio de Janeiro
ações e marcada pela a criação da
FCES; e de 77 a 80, com redução
de incentivos e de extinção da
FCES e criação do DCE.
No primeiro período, pro-
duziu-se pouco no Estado. Cinco
peças foram apresentadas no Au-
ditório do hoje Instituto Federal >>

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Foto: Divulgação/Huemerson Leal
lão. O produtor Antônio Alaerte
“visitou” várias vezes a Polícia
Federal para se explicar.
No final de 1970, um teatro
Carlos Gomes reformado dava
um novo impulso ao teatro local
e ampliava o intercâmbio com
os maiores grupos de teatro do
país. Grandes peças passaram
pelo o Estado naquela época – a
“O Outro” é mais uma produção do Folgazões Cia. de Artes Cênicas política priorizava o intercâmbio
com os grandes autores, atores e
do Espírito Santo (Ifes). No fi- e tradicional, e de garantir a segu- grupos de teatro dos principais
nal dos anos de 1960 e início de rança nacional e de que a cultura centros de produção cultural do
1970, os ventos começaram a estaria protegida contra a ameaça país, como Rio de Janeiro e São
mudar, com mais investimento de contaminação comunista. Paulo. Mas o incentivo ao teatro
em políticas públicas. Destacava- No Espírito Santo, depois pela FCES não parou por aí.
-se, na época, o Grupo Geração, da peça “Liberdade, liberdade”, Algumas dessas ações foram
comandado por Toninho Neves com Paulo Autran, o governador a premiação de autores locais,
e Milson Henriques. intervencionista Christiano Dias que podiam, se selecionados,
As duas primeiras peças Lopes é associado à recuperação montar seus próprios espetácu-
do Geração, no entanto, foram do Teatro Carlos Gomes e por los, e a realização do I Festival
censuradas: “Zé da Silva em estabelecer uma política cultural, de Teatro Amador, de 1971,
confidência agora” e “Acorda em função da criação da Funda- organizado por Milson Henri-
meu gigante, acorda que estão ção Cultural do Espírito Santo ques, que previa ainda cursos
levando seu ouro embora”. O (FCES), como explica o escritor. de orientação dramática, para
grupo chegou a criar um teatro a formação dos artistas locais.
de Arena, no refeitório do Hotel Censura Nesse curso, formou-se o Grupo
Majestic, que depois abrigou o A Ditadura Militar, que pa- de Teatro Amador Carlos Gomes.
Colégio Brasileiro de Vitória. recia mais preocupada com os Henriques foi o primeiro diretor,
Milson Henriques ainda teria, principais centros econômicos convidado por Marien Calixte,
um pouco depois, a peça “Vitó- e políticos do país, também foi que era o responsável pela área
ria, de Setembro a Setembrino” vigilante no Estado. Um marco de teatro da FCES. Outra me-
censurada. da censura federal e da reação dida relevante da Fundação foi
Outros grupos desta época dos artistas locais, no início financiar a formação de artistas
foram o Equipe, liderado por Pau- da década de 1970, foi a peça locais, que recebiam bolsa para
lo Torre, que viria a se tornar o “Ensaio Geral”, com texto de estudar nos grandes centros.
diretor de jornalismo do jornal A Milson Henriques, que também Um dos motivos para a im-
Gazeta a partir do final dos anos atuou como ator ao lado de Luiz plantação de uma política que,
de 1970 e que morreu em 1995, e Tadeu Teixeira e Amylton de de fato, incentivou o desenvol-
o Praça Oito, liderado por Gérson Almeida, dirigidos por Rubinho vimento do teatro local, tem re-
Von Randow. Gomes, como registra o livro lação também com as pessoas
Duílio desenvolveu a tese de “Revolução dos Caranguejos”. que comandaram esse processo
que as políticas culturais nacio- Mesmo proibida pouco antes da nas entidades públicas respon-
nais ganharam um nível de es- data prevista para sua estreia, sáveis pela cultura. Luiz Tadeu
truturação com a Ditadura como a peça foi apresentada, apenas Teixeira, por exemplo, foi coor-
nunca existiu, mas com objetivos com música e expressão corporal. denador de Teatro da Fundação,
específicos de fazer parte de uma Durante a primeira exibição, que atendendo um convite de Marien
política de integração nacional, a seria única, os atores destruíram Calixte, em 1978.
partir de uma concepção mestiça o cenário construído em pape- “Na FCES, que virou DEC

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e depois Secretaria de Estado dier, pelo qual “todo o sistema Geração, Ludovico Pavoni, Mo-
da Cultura, trabalhei para que de poder é dispositivo destinado vimento, Vianinha-Aquários,
o teatro e o cinema do Estado a produzir efeitos, entre os quais União de Montanha, Universal,
pudessem avançar, procurando os que se comparam às ilusões Taguar, Ponto de Partida e Re-
criar condições para que os reali- criadas pelas ilusões do teatro. nascença, além de outros em
zadores tivessem como produzir. Tais ilusões objetivam criar a fase de registro, como O Grupo,
Lançamos os primeiros editais de imagem de um governante que Arteatro e Clio.
incentivo à produção... Criamos os corresponde aos anseios dos go- O nome da obra de Cid é o
Concursos de Dramaturgia Adulto vernados”, citação contida no título da peça escrita e dirigida
e Infantil e o Circuito de Oficinas livro de Cid. por Antônio Carlos (Toninho)
no interior”, justifica Teixeira. Toda essa política “avança- Neves, junto ao grupo Geração,
No tempo de duração da da” da FCES começa a declinar em 1979. A montagem é consi-
FCES, foram criados outros es- em 1977, com a redução de re- derada um marco do amadureci-
paços para apresentações teatrais, passe de recursos para a entidade. mento do teatro capixaba e remete
como o Teatro Estúdio, no edi- Isso, em um momento que os a uma metáfora que sintetiza as
fício das Fundações, ao lado da grupos teatrais locais começa- políticas desenvolvidas para a
Assembleia Legislativa do Espí- vam a colher os frutos da polí- arte no Espírito Santo durante a
rito Santo, na Cidade Alta, e que tica anterior. Outros dois fatos, Ditadura Militar. “Se até 1977
depois abrigou a TVE, e o Circo na visão de Cid, impulsionam aconteceu uma revolução na for-
da Cultura, que era itinerante. o movimento teatral no Estado ma do Estado relacionar-se com
na década de 1970: as mostras a atividade, após esse ano, assim
Teatrocracia de teatro da Ufes e a criação da como o crustáceo, esse proces-
Para tentar explicar os in- Federação Capixaba de Teatro so não foi para frente e, o que é
vestimentos nesta época no Es- Amador (Fecata). pior, retrocedeu num momento
pírito Santo, que tinha sua FCES Em 1978, para se ter ideia em que o teatro capixaba prin-
dirigida por artistas, alguns de- do que acontecia no Estado, esta- cipiava alcançar uma dimensão
les, inclusive, que tiveram obras vam registrados na Fecata vários considerável. Esse descompasso
censuradas pela Ditadura Militar, grupos, como Sucata, Itinerante, talvez explique os rumos tomados
o autor recorre ao conceito de Terra, Estrada, Expressão Nossa na área nas décadas seguintes”,
teatrocracia, de George Balan- de Cada Dia, Teatro da Barra, opina Duílio.

Doze anos de Festival de Vitória


Uma das ações atuais de incentivo Para Elenice, o Festival tem uma tem grupos, atores e diretores excelen-
ao segmento é o Festival Nacional de relação forte com a retomada do mo- tes, mas ainda há muito preconceito.
Teatro de Vitória, que este ano chega vimento teatral do Espírito Santo. “Ele “Se a peça é de fora, com atores de
a sua 12.ª edição. A realização é da foi fundamental para retomada dos novela, as casas lotam, independente
Ratimbum Produções, com parceria grupos locais. A participação de grupos da qualidade do espetáculo.”
da Prefeitura Municipal de Vitória. nacionais e até internacionais ampliam Para ajudar no impulso ao teatro
A programação ainda não está o intercâmbio necessário para que o e ao profissional local, a Ratimbum
fechada, mas, em princípio, o Festival Estado continue avançando.” Produções oferece, durante o Festival,
deve ser realizado em outubro. Elenice Apesar disso tudo, Elenice admite cursos, oficinas e outros eventos que
Moreira, uma das mentoras do even- que o público capixaba ainda resiste ajudam na formação desses profissio-
to, lembra que desde a sua criação, o muito ao espetáculo local. Ela acha nais. São oficinas de técnicos, produ-
Festival trouxe aos palcos da cidade que a ausência de espaços apropriados tores, organização, atores, diretores.
espetáculos dirigidos por diretores para a apresentação teatral compromete A edição deste ano, prevista para
como Eugenio Barba, Antunes Filho, muito o desenvolvimento do segmento. outubro, ainda carece de parcerias.
Antônio Abujamra, Gerald Thomas, “O que nos sobra é o Carlos Gomes. “Neste momento, nossa maior preocu-
Fernando Arrabal, Bia Lessa, Amir Outros espaços exigem um aluguel pação é fazer com que este ciclo que
Haddad, Aderbal Freire Filho e João muito alto para a realidade local.” chega aos 12 anos, mantenha-se. Vamos
Caderno maio de 2016 9
das Neves. Ela acredita que o Espírito Santo fazer a 12ª edição, tenho certeza.” n
Foto: Divulgação Secult/Rodrigo Queiroz
Artigo
Patrimônio de São Pedro de Itabapoana

A importância da gestão
compartilhada do Patrimônio Cultural

N
o Brasil, o reconheci- “A Gerência No Espírito Santo, a pro-
mento da necessidade teção do Patrimônio Cultural
de proteção do patrimô- de Memória e tem por base legal a Lei nº
nio histórico e artístico teve seu Patrimônio 2.947, de 16 de dezembro de
embrião nos anos 1920, época 1974, inspirada nos moldes do
em que o grupo conhecido por da Secult ES, Decreto-lei nº 25/1937 e que
“Caravana Paulista”, compos- é regulamentada pelo Decre-
to, entre outros, por Mário de intensificou to 626-N/1975. Na prática, em
Andrade, Oswald de Andrade, a presença nos relação ao decreto-lei é feita
Tarsila do Amaral, D. Olívia uma transposição da estrutura
Guedes Penteado, Paulo Prado, sítios, com o do Sphan para o Conselho Es-
partiu em viagem ao interior objetivo de se tadual de Cultura, praticamente
de Minas Gerais, na certeza de repetindo os mesmos preceitos
que a construção de uma arte e aproximar das da legislação federal.
uma cultura nacional passava, A Constituição Federal
necessariamente, pelo resgate gestões municipais de 1988 expande o conceito de
do passado como referência. e da população” patrimônio cultural, de modo
A partir das discussões con- a abarcar os bens de natureza
duzidas por Mário de Andrade to jurídico do tombamento no material e imaterial, nos quais
sobre a necessidade da criação Brasil como forma de proteção se incluem: as formas de expres-
de um órgão federal que pudesse do patrimônio cultural, e que são; os modos de criar, fazer e
zelar pelo patrimônio histórico e também criou o Serviço do Pa- viver; as criações científicas,
artístico nacional, é que foi pro- trimônio Histórico e Artístico artísticas e tecnológicas; as
mulgado o Decreto-Lei nº 25 de Nacional (Sphan), atual Insti- obras, objetos, documentos,
30 de novembro de 1937, marco tuto do Patrimônio Histórico e edificações e demais espaços
legal que instituiu o instrumen- Artístico Nacional (Iphan). destinados às manifestações

10 Caderno maio de 2016


artístico-culturais; os conjun- A participação da popu- sobre diretrizes para interven-
tos urbanos e sítios de valor lação na proteção do patrimô- ções nos espaços públicos, lotes
histórico, paisagístico, artístico, nio cultural pode ocorrer por e edificações.
arqueológico, paleontológico, diferentes maneiras, dentre as Essas resoluções buscam
ecológico e científico. quais: por meio da participação complementar aspectos não
O texto constitucional nos conselhos de cultura e nos esclarecidos pelas resoluções
inova ao introduzir o conceito organismos que decidem sobre de tombamento, pela lei nº
da responsabilidade compar- quais bens devem ser preserva- 2.947/1974 e ao mesmo tem-
tilhada da proteção dos bens dos; por meio da utilização de po, incorporam conceitos con-
que constituem esse patrimônio mecanismos legais, tais como temporâneos relacionados à
cultural, em consonância com o a ação popular para coibir os preservação de bens culturais,
pensamento democrático e que atos que ponham em riscos os refletindo a respeito de aspectos
encontra eco no pensamento de valores de importância cultural fundamentais para a preserva-
Marina Waisman, arquiteta ar- definidos pela coletividade; e ção das relações estabelecidas
gentina, defensora do ideário de pela observação dos critérios entre as edificações, as áreas
que a preservação do patrimônio definidos na legislação antes livres, as áreas verdes, preven-
está diretamente relacionada de intervir nos bens protegidos do também a necessidade de
ao grau de cultura cívica dos e em seus entornos. se preservar o traçado urbano
cidadãos e dos gestores públi- Além de bens tombados iso- existente, o arruamento e suas
cos. Para Waisman, em outras ladamente, atualmente, existem características de pavimenta-
palavras, as cidades que apre- cinco sítios tombados em nível ção, as áreas verdes, praças
sentam maior harmonia entre estadual no Espírito Santo: Por- públicas e encostas, de modo
as diferentes linguagens arqui- to de São Mateus (1976), Santa a preservar a relação que as
tetônicas que se sucederam em Leopoldina (1982), São Pedro edificações estabeleceram com o
diferentes momentos históricos, do Itabapoana, em Mimoso do entorno ambiental, paisagístico
formando um conjunto coeso, Sul (1987), Muqui (2012) e Ita- e cultural dos sítios.
são exatamente as cidades (po- pina, em Colatina (2013). Para Nos últimos anos, a Ge-
pulação e gestores públicos) que cada um destes sítios existem rência de Memória e Patrimô-
desde cedo definiram códigos regras, estabelecidas por meio nio da Secult ES intensificou
e aceitaram regras para essa de resoluções do Conselho Esta- a presença nos sítios, com o
coexistência. dual de Cultura, e que dispõem objetivo de se aproximar das
gestões municipais e da po-
pulação. As visitas regulares
têm por objetivo prestar es-
clarecimentos aos moradores
sobre como intervir de maneira
correta no sítio, fiscalizar a
regularidade das intervenções
em curso e aprimorar a ges-
tão compartilhada dos sítios,
envolvendo o poder público
Foto: Divulgação Secult/Rodrigo Queiroz

municipal e o Ministério Pú-


blico Estadual. n
Rodrigo Zotelli Queiroz
Mestre em Arquitetura e
Urbanismo pela Universidade
Federal do Espírito Santo
Especialista em Políticas Públicas
e Gestão Governamental / GMP /
Patrimônio de São Pedro de Itabapoana Secult ES

Caderno maio de 2016 11


Projeto cultural

Lanterna para a mente


Cineclube vira terapia lúdica de apoio
a pacientes de hospital estadual

O
apoio lúdico à te-
rapia dos pacien- Luz e arte
tes do Hospital
Estadual de Atenção Clíni-
A longa experiência Clínica (HEAC)?
ca (HEAC), antigo Adauto de Marcos Valério no mo- Sim. Os equipamentos
Botelho, e do seu vizinho vimento cineclubista o de projeção permanecerão
Centro de Atenção Psicos- credenciou para a realiza- nas instalações do HEAC.
social (Caps) Moxuara, em ção do Cineclube Lanterna A ideia é que as atividades
Cariacica, é o objetivo do Mágica. Ele está encantado permaneçam, com a oficina
Cineclube Lanterna Má- com o trabalho, acredita na final de formação cineclu-
função social e terapêuti- bista, que será realizada
gica, do cineasta e cine-
ca do que vem ajudando nas últimas três semanas
clubista Marcos Valério. a construir no HEAC e no do projeto, incluindo a Moxuara, assim como uma
A iniciativa faz parte do Caps Moxuara e se apressa a capacitação de formata- ferramenta possível para
projeto “Cultura na Saúde dizer que sua função, neste ção de projetos, visando, os terapeutas e psicólogos
Mental”, um trabalho que caso, é de oficineiro, o que principalmente, os editais envolvidos.
reúne as secretarias de Es- garante um contato muito da Secretaria de Estado da
tado da Cultura (Secult) e próximo com o paciente. Cultura (Secult). Que filmes foram exibidos
Valério fala da sua experiên- até agora? Que atividades
a da Saúde (Sesa).
cia no projeto e da impor- Qual é a proposta central são propostas após a exibi-
O lançamento oficial tância do audiovisual como do projeto? ção dos filmes e qual a re-
foi no dia 1.º de março, elemento de socialização Exibir filmes, realizar ceptividade dos pacientes?
na sede do hospital, com a de pacientes, terapeutas e debates e conversas sobre É uma lista muito longa
exibição do filme “Melodi- psicólogos envolvidos. conteúdos dos filmes e pro- de filmes, mas é uma mes-
ário”, de Marcos Valério. cedimentos dos cineastas cla de filmes de animação,
A previsão é de, com o Ci- O C ine cl ube Lanterna em seus filmes, assim como documentários e ficção, a
Mágica existe desde de- exercitar a prática audio- maioria curtametragens,
neclube, realizar semanal-
zembro e o convênio se visual, com exercícios de com uma cesta de autores
mente a exibição de filmes, encerra em agosto. Após câmera e corpo, animações, e produções capixabas. A
além de fornecer oficinas este prazo, serão doados pinturas e, iniciando agora seleção leva em conta os
de formação e debates. equipamentos adquiridos em maio, um ensaio de TV, exercícios. Assim, em al-
Uma sala de projeção pelo projeto para o Hos- utilizando a sua dinâmica guns momentos, os filmes
foi preparada para abrigar pital Estadual de Atenção para exercícios de texto e exibidos demonstram mais
expressão de voz e corpo, elementos sensórios e per-
assim como a produção ceptivos, com tempos lon-
de imagens-síntese. Além gos ou ritmos demarcados
disso, apostamos no au- com elementos gráficos
diovisual como ativador de e campos de cor; outros
sensorialidades, de percep- exploram e questionam
ções e expressões, e como a necessidade de objeti-
um elemento que se soma vidades nas narrativas (o
ao processo de terapia ao non-sense); outros trazem
qual estão inseridos os pa- questões conceituais, como
cientes do HEAC e do Caps o cinema direto, questões

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Fotos: Divulgação
Os pacientes participam das
sessões de cinema e fazem
exposta ao público, como exercícios da linguagem
o que já pode ser visto na cinematográfica
página do facebook do pro-
jeto (https://www.facebook. a todas as atividades que
com/cineclubelanternama- serão desenvolvidas, além
gicaheac/).
As reações são diver-
da exibição dos filmes. O
sas, de acordo com o estado secretário de Estado da
emocional ou condição te- Cultura, João Gualberto,
rapêutica do paciente. Mas, explica que a expectativa
no geral, a participação é é contribuir para o desen-
ligadas a temáticas, como cas de corpos, animações ativa e os dias do projeto, as volvimento das capacida-
mulher, trabalho e meio- stop-motion com pessoas terças e sextas, já entraram des artísticas, sensíveis e
-ambiente; outros, ainda, e objetos, desenhos e pin- para o cotidiano do hospital
são para o entretenimento. turas (estas em processo de e do Caps, e são aguardados
cognitivas dos pacientes,
Há documentários como o finalização) e massinhas. A e curtidos com entusiasmo. além de capacitar o corpo
“Rio de Mulheres”, que traz maior parte dos exercícios técnico de funcionários,
o universo de uma comu- é para circulação apenas Há projetos desenvolvidos estimulando diálogos entre
nidade quilombola dirigida entre o grupo, em função em paralelo? o cinema e a psicanálise.
por mulheres, cujos mari- das garantias de privacida- Lá no HEAC e Caps não, “Queremos valorizar a arte
dos estão na colheita da de dos pacientes, mas uma pelo menos sob minha res- como agente terapêutico
cana alhures ou as irrealida- parte dos trabalhos será ponsabilidade.
des do mundo de cada um
e fomentar a produção ar-
em “De Amor e Bactérias”, tística do Espírito Santo”,
da capixaba Virgínia Jor-
ge. Há ainda as animações
Marcos Valério [ disse o secretário.
Para o diretor do
e mágicas dos desenhos É cineclubista, formado e mestrando em Artes Visuais na HEAC, Renato Viana, o
de Fernando Diniz, antigo Universidade Federal do Espírito Santo. Ele coordenou projeto garante o direito
paciente do Hospital Pe- o Cineclube Universitário, entre 1985 e 1992. Logo de- do paciente de partici-
dro II, no Rio de janeiro, até pois, fundou e coordenou o Cineclube Metrópolis, seu
as invenções de Norman
par da comunidade. “De
sucessor. Tempos depois, criou o Cine-Teatro Garoto,
McLaren. em Vila Velha, e, mais recente, em 2010, criou o atual
acordo com a Declaração
As atividades deriva- formato de programação do Cine Jardins, de onde Universal dos Direitos Hu-
das das sessões dividem-se saiu dois anos depois. Realizou documentários sobre manos, todo ser humano
entre conversas e impres- a cultura popular, como “Pedras Pretas”, sobre a festa tem o direito de participar
sões sobre o conteúdo dos de São Sebastião, em Itaúnas; “Vida de Congo”, sobre livremente da vida cultural
filmes, sobre como se faz o cotidiano da comunidade de Santiago, na Serra, em da comunidade, de usufruir
cinema, sobre as próprias torno da banda de congo e a festa de São Benedito;
atividades a serem feitas a
das artes e de participar
“Melodiário”, um ensaio sobre a obra do compositor
partir dos filmes. Fizemos Jaceguay Lins; e o longa “filmeBalão”, sobre o ambiente
do progresso científico e
oficinas de contação de universitário e o grupo Balão Mágico, na década de de seus benefícios.” Ele
histórias para a câmera (os 1980 na Ufes, entre outros trabalhos. acredita que o projeto tem
autoretratos), as metoními- um grande potencial tera-
pêutico. n

Caderno maio de 2016 13


Crônica

José Carlos Oliveira entre nós


Pedro J. Nunes*

N
a noite de 13 de abril que faz a lucidez e o delírio da viu o mundo pela primeira vez,
de 2016, em que se prosa de José Carlos Oliveira, “nu, com vermes, com perebas
completaram 30 anos nascido entre nós, falecido en- e com fome”, como narrado
do falecimento de José Carlos tre nós, mas com um hiato em em seu romance-confissão “O
Oliveira, a Biblioteca Pública que, em terra estranha à de sua pavão desiludido”, aliás jus-
do Espírito Santo fez uma justa origem, construiu uma repu- tamente considerado por Luiz
homenagem a esse grande es- tação literária extraordinária Guilherme Santos Neves como
critor capixaba. Reunidos em que talvez não alcançasse na “o primeiro grande romance da
torno do evento intitulado “A aldeia original. literatura brasileira”.
crônica brasileira de José Car- José Carlos Oliveira nas- José Carlos Oliveira con-
los Oliveira - 30 anos depois”, ceu entre nós, ali no Morro do tinuaria a residir no Centro de
compuseram a mesa José Irmo São Francisco, na Cidade Alta. Vitória parte de sua meninice,
Gonring, Regina Egito e Rei- Para quem não está entre nós, vivida no perímetro da Praça
naldo Santos Neves, expositores a Cidade Alta é um dos bairros Costa Pereira numa época em
ligados ao homenageado por de Vitória, no Espírito Santo, que a cidade era um arremedo
reconhecimento e fascínio de localizado na região dentro dos do que chegou a ser, antes de
sua poderosa produção literá- limites daquilo que se conven- mudar-se com a família para
ria ou por laço de parentesco, cionou chamar Centro Histó- Jucutuquara, onde passaria
como é o caso de Regina Egito, rico de Vitória, pois que nessa seus últimos dias de adoles-
sobrinha em primeiro grau e circunscrição nasceu a cidade cência e juventude. O escritor
herdeira dos direitos de sua em seus cambiantes primeiros Ivan Borgo o conheceu nessa
obra. passos. Se estivesse vivo, em época, e dele traça um retrato
As efemérides são incô- agosto comemoraríamos com admirado, quase paternal, “um
modas, mas eventualmente ele, certamente em grande fes- menino vivaz, interessado, in-
esse receio é injusto. É o caso ta, seus 82 anos de idade, já que quieto, perscrutador, pediu-me
aqui, caso de lembrar um es- ele nasceu nesse mês, no dia 18, logo emprestados alguns livros
critor com um texto poderoso, no ano de 1934. O Morro do do Jorge Amado e foi pegá-los
um homem que viveu para a São Francisco é esse lugar de afobado no dia seguinte àquele
literatura, um leitor dedicado, suas tristes lembranças, “roído em que o conheci”, um menino
um observador atento de seu de mato bravo e pontilhado de que, já na cidade longínqua, lhe
tempo. Caso de lembrar a falta bananeiras e mamoeiros”, onde escreveria, como se escreve a
um tutor literário, “descobri
Balzac!”.
“É indispensável ler Mas – ai, triste cidade que
desmerece os seus! –, José Car-
José Carlos Oliveira. Para los Oliveira não caberia nesse
perímetro original. Incômodo
que usufruamos de sua lucidez, e brilhante, atrevido e pers-
de sua perspicácia, de sua picaz, características que lhe
arranjaram o dom de rebelde
grandeza literária...” precoce, daí reduzido a mera-

14 Caderno maio de 2016


mente precoce, com seu tom de tre os seus, para estar em casa.
ironia e despeito, melhor lhe E arremata: “José Carlos Oli-
fora ao destino tomar o navio e veira queria cinco anos, cinco
amanhecer na cidade estranha, anos apenas, para realizar seus
o Rio de Janeiro do início dos últimos projetos literários. Não
anos 1950, onde reencontrou teve tempo. “No dia 13 de abril
sua velha circunstância, a fome de 1986, cerca de seis meses de
e a precariedade, aliada à soli- sua permanência entre nós, e
dão, mas onde se firmou como há 30 anos, falecia José Carlos
um dos maiores nomes da lite- Oliveira, deixando como último
ratura nacional, escrevendo por item de seu valioso espólio, e
décadas as crônicas publicadas fruto de seu projeto de escritor
pelo Jornal do Brasil, entre residente, o notável volume de O evento “A crônica
outros diários, dedicando-se contos “Bravos companheiros brasileira de José Car-
também à prosa de ficção de e fantasmas”. los Oliveira - 30 anos
grande valor. Decorridos 30 anos de sua depois” contou ainda
Na segunda metade de morte, e sacudida a poeira des- com a exibição do
1985, para a realização do se tempo capaz de corroer as documentário “José
primeiro projeto de escritor pedras, ouvimos de José Irmo Carlos Oliveira entre
residente em terras capixabas, Gonring, pesquisador da obra nós”, de Pedro J. Nu-
ei-lo de volta entre nós. Com- do autor: “É preciso ler José nes (foto), escritor re-
balido, fundamente abatido, vai Carlos Oliveira”. Arrematamos sidente da Biblioteca
residir num hotel na Praia de com essa recomendação, e com Pública do Espírito
Camburi, onde escreve como ela fundamos esse manifesto: é Santo. O vídeo en-
sempre escreveu, ávido como indispensável ler José Carlos contra-se publicado
quem vive e vive bem e quer Oliveira. Para que usufruamos no site Tertúlia (www.
viver, a despeito da condição de sua lucidez, de sua perspi- tertuliacapixaba.com.
física, e de onde sai para a cácia, de sua grandeza lite- br), bem como, agre-
Universidade Federal do Es- rária, do desconforto de suas gado à edição dos de-
pírito Santo, outra ponta de revelações mais íntimas que, poimentos dessa noite
seu projeto, para a realização nesse indescritível mistério que memorável, disponível
de oficina literária e escrita de é viver, são as nossas próprias em DVD que se encon-
um ousado romance coletivo. revelações – que, talvez por isso tra no Setor Multimídia
Vingou a oficina, e rendeu seus mesmo, incomodem tanto –, e, da BPES à disposição
frutos, como atestam vários dos finalmente, para que façamos da comunidade.
participantes desses encontros justiça a um dos maiores nomes
na Ufes, mas gorou o romance. de nossas letras. n
“Ele retornou para a realização
desse projeto”, diz Reinaldo Pedro J. Nunes, escritor residente voluntário da BPES,
(*)

Santos Neves, “mas certamente é autor dos romances “Aninhanha” e “Menino” e dos volumes de contos
também retornou para estar en- “Vilarejo e outras histórias” e “A última noite”, entre outros

Caderno maio de 2016 15


Imagem Capixaba

CONVENTO DA PENHA, EM VILA VELHA I Foto: Renato Vicentini

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