Curso de Direito
RESENDE
2018.1
ARUANAN RUBINELLI FONSECA ARRUDA
Resende
Campus Resende
2018.
Quando você chegou, minha vida mudou. Não podia
imaginar o tamanho deste amor.
Agradeço inicialmente aos meus pais, que nada me deixaram faltar e que me
prepararam moralmente para vida. Agradeço, em especial, a minha mãe por todo
carinho e dedicação à mim, àquela que com seu amor sem limites abdica de si, para se
dedicar aos filhos sem nunca esperar nada em troca. Meu amor pela senhora é
inestimável.
Aos professores, sem exceção, que com dignidade exercem a profissão mais
nobre de todas, e, com muita paciência e sabedoria, auxiliaram sobremaneira a
conclusão de mais esta etapa da vida.
RESUMO
O presente trabalho de conclusão de curso visa questionar e informar sobre o foro por
prerrogativa de função, trivialmente denominado por foro privilegiado, desenhando suas
nuances no cenário jurídico de maneira a reduzir a controvérsia existente na doutrina
quanto a sua constitucionalidade, dando foco, aos aspectos que o caracterizam, bem
como sua função e importância. O tema tem destaque corriqueiro no âmbito jurídico,
entretanto corriqueiramente gera contraposição entre os estudiosos da matéria. O
conteúdo articulado é relevante e busca alertar os juristas à importância de seu
delineamento, desta forma, teremos a real compreensão do instituto em discussão, que
muitas vezes é rechaçado e criticado como um privilégio subjetivo de determinada
classe.
SUMÁRIO
LISTA DE TABELAS
LISTA DE ABREVIATURAS
1. INTRODUÇÃO
exceção da Ação Popular, o que contraria outra distorção sobre o foro especial – a de
que sua finalidade se limita à natureza penal 1.
Esta visão é fruto de um cenário fruto em que boa parte dos detentores de tais
prerrogativas estão sujeitos a ações penais, o que vem lotando as serventias de
tribunais superiores, causando excessiva demora e, consequentemente, sensação de
impunidade urgindo daí, as criticas ao instituto.
Em recente decisão, o Ministro Luís Roberto Barroso, no bojo do julgamento da
Ação Penal 937, suscitou uma tese restritiva (ressalta-se: Não extintiva), haja vista que,
nas palavras do ministro, submeter-se a julgamento perante o supremo tornou-se
sinônimo de impunidade.
Destaca-se, que, no referido julgado o STF restringiu substancialmente o alcance
do foro por prerrogativa de função na esfera federal, acolhendo a tese apresentada pelo
ministro.
O Julgado, todavia, não afasta a pertinência do trabalho, eis que, não obstante a
repercussão geral, o acordão, repisa-se, apenas restringiu o instituo, não o expurgando
do ordenamento jurídico pátrio.
Deste modo, será possível chegar à conclusão de sua importância e o risco de
sua extinção, pois se trata de verdadeira materialização do princípio da igualdade, o
que por muitas vezes não é assim reconhecida.
Desenha-se na atualidade a distorção do instituto do foro por prerrogativa de
função, que deve ser estudado pormenorizadamente desde seu surgimento até os dias
atuais. Vale destacar que a finalidade do instituto pousa na efetiva materialização dos
princípios constitucionais da igualdade e da segurança jurídica, motivo pelo qual as
críticas que o circundam são perigosas a toda sociedade.
Trata-se, portanto, de pesquisa bibliográfica e jurisprudencial, acerca dos
institutos jurídicos e sociais que ensejam a existência do foro por prerrogativa de
função, concluindo ao fim, pela sua compatibilidade no sistema jurídico-constitucional
brasileiro.
1
O Artigos 102, I, alínea d, Art.105, I, alíneas b e c e Art.125 §1º da Constituição da República Brasileira,
estabelece hipóteses de foro privilegiado para julgamento dos remédios constitucionais.
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2
(BRASIL. Constituição (1824) Constituição Política do Império do Brazil. Rio de Janeiro, 1824.
Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao24.htm>.Acesso em
24 fev. 2018.)
3
(Constituição (1891) Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil. Rio de Janeiro, 1891.
Disponível em <://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao91.htm>. Acesso em 24
fev. 2018.).
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113, nº 25, rezava: "Não haverá foro privilegiado nem Tribunais de exceções; admitindo,
porém, Juízos especiais em razão da essência das causas” 4.
O tema não foi abarcado pela constituição de 1937, mas voltou ao destaque em
1946. Quando o art. 141, § 26, deixava clara a proibição do foro, tribunais e juízos da
seguinte forma: "não haverá foro privilegiado nem juízos e tribunais de exceção" 5.
Após trinta anos, a Constituição militar seguiu na mesma linha da anterior. O
artigo 150, § 15, dispõe que “A lei assegurará aos acusados ampla defesa, com os
recursos a ela inerentes. Não haverá foro privilegiado nem Tribunais de exceção.“ 6.
Na promulgação da constituição de 1988, a Assembleia Nacional Constituinte
seguiu com a proibição de Tribunais e juízos de exceção em seu artigo5º, inciso
XXXVII, mas abriu algumas possibilidades de foro privilegiado. Diz que não haverá juízo
ou tribunal de exceção, ao mesmo tempo em que estabelece quem terá direito ao foro
privilegiado.
Podemos perceber, então, que desde a proclamação da República foi instituído o
foro privilegiado, sendo modificado a cada nova constituição, mas sempre mantido de
alguma forma.
Há de se observar que, inicialmente, o foro privilegiado se dava devido à
natureza da causa, e não da função.
Em 1891, o foro privilegiado alcançava o presidente da republica, a ser julgado
pelo Senado nos crimes de responsabilidade e pelo STF nos crimes comuns, sendo
dever da Câmara dos Deputados declarar a acusação procedente ou não.
Outrossim, a competência especial se estendia aos Ministros de Estado, a serem
processados e julgados pelo STF nos crimes de responsabilidade e crimes comuns, e
pela autoridade competente para julgar o Presidente da República, caso houvesse
4
BRASIL.(Constituição (1934) Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil. Rio de Janeiro,
1934. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao34.htm>.
Acesso em 24 fev. 2018.)
5
(Constituição (1946) Constituição dos Estados Unidos do Brasil. Rio de Janeiro, 1946. Disponível em
< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao46.htm>. Acesso em 24 fev.
2018).
5
(Constituição (1967) Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, 1967. Disponível em <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao67.htm>. Acesso em 24 fev. 2018.)
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conexão entre eles. Era também competência originária e privativa do STF processar e
julgar os crimes de responsabilidade e crimes comuns de Ministros Diplomáticos.
Em 1934, a nova constituição estabeleceu que fosse criado um Tribunal Especial
para realizar o julgamento dos crimes de responsabilidade do Presidente da República,
eximindo o Senado desta tarefa. Já os crimes comuns do Presidente, dos Ministros da
Corte Suprema, seriam processados e julgados pela Corte Suprema, assim como os
crimes de responsabilidade e crimes comuns do Procurador-Geral da República, Juízes
dos Tribunais Federais e das Cortes de Apelação dos Estados, do Distrito Federal e dos
Territórios, Ministros do Tribunal de Contas, Ministros de Estado, Ministros Diplomáticos
e Embaixadores.
Foi criado, em 1937, o Conselho Federal, formado por dez membros que
deveriam ser nomeados pelo Presidente da República e por representantes dos
estados da federação. Esse Conselho era competente para processar e julgar os
crimes de responsabilidade do Presidente e dos Ministros do Supremo Tribunal Federal.
Os Ministros de Estado teriam seus crimes comuns e de responsabilidade julgados pelo
STF e, em caso de conexão com o Presidente da República, seriam julgados pela
autoridade competente para tal.
O Supremo Tribunal Federal também era responsável por processar e julgar
seus próprios Ministros e os Ministros de Estado.
A Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 1946 foi promulgada em um
contexto histórico muito peculiar. Sobre ele Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino (2017)
afirmaram que com o término da Segunda Guerra Mundial e o fim do Estado Novo,
ocorre a redemocratização do Brasil. Depois de grande turbulência no quadro político
interno ocorre a queda de Getúlio Vargas e, finalmente, a instalação de uma
Assembleia Constituinte, em dois de fevereiro de 1946. Em 18 de setembro de 1946 foi
promulgada a Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, elaborada com
base nas Constituições de 1891 e de 1934. Segundo o Prof. José Afonso da Silva
(2004), embora essa "volta ao passado" tenha sido um erro, e a Constituição de 1946
não tenha conseguido realizar-se plenamente, ela cumpriu sua tarefa de
redemocratização e proporcionou condições para o desenvolvimento do País, durante
as duas décadas de sua vigência.
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serviços” 7, enquanto que os privilégios reais são concedidos “não às pessoas, embora
redundem também em proveito delas, e sim às coisas que estão relacionadas com tais
pessoas, como os cargos, empregos, dignidade, invenções, descobertas, etc.” 8.
Desta forma, o autor afirma que os privilégios pessoais são inconstitucionais e
devem ser evitados a todo custo em um estado democrático de direito, mas os
privilégios reais, se justificados pela existência de interesse público nesse sentido, são
justos e necessários, apesar de ser preciso manter-se vigilante a fim de evitar eventuais
abusos.
Em contrapartida, José Frederico Marques (1980) nos assegura que tal situação
não se aproxima, de forma alguma, da ideia de privilégio. Segundo ele, a prerrogativa
de função se estabelece diante da necessidade apresentada em razão dos cargos e
funções exercidos por determinada pessoa, e não em favor do indivíduo específico.
Trata-se, portanto, de uma garantia que visa assegurar a independência e
imparcialidade da justiça, protegendo, dessa forma, o interesse geral.
Essa afirmativa tem base na ideia de que os agentes políticos estariam mais
seguros sendo julgados por magistrados mais experientes, e se legitima perante o
princípio da razoabilidade, peça fundamental da estrutura do regime democrático.
Júlio Fabbrini Mirabete (2005) defende que, observada a impossibilidade de
serem estabelecidas preferências pela lei, não se trata de privilégio, mas sim da
necessidade de garantir a dignidade das funções públicas, independente daqueles que
as exercem. Sendo desta feita, o princípio em destaque não está sendo violado, pois os
princípios da ordem e da subordinação estão resguardados, e protegendo o processo e
o julgamento de eventuais pressões e influências que os órgãos jurisdicionais
pudessem vir a sofrer daqueles que estão sendo julgados.
7
(BUENO, José Antônio Pimenta. Direito público brasileiro e análise da Constituição do Império. Brasília:
Senado Federal, 1978)
8
( , José Antônio Pimenta. Direito público brasileiro e análise da Constituição do Império. Brasília:
Senado Federal, 1978).
16
9
(MELLO, Celso Antônio Bandeira. Conteúdo jurídico do conceito da igualdade. 3. ed. São Paulo:
Malheiros, 1999)
10
(Inquérito n° 687, Tribunal Pleno, Rel. Min. Sydney Sanches, j. 25.08.1999, unânime, RTJ, 179/912).
11
( n° 687, Tribunal Pleno, Rel. Min. Sydney Sanches, j. 25.08.1999, unânime, RTJ, 179/912)
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Da mesma maneira, o ex-ministro Carlos Velloso (1999), afirma que o foro por
prerrogativa de função caracteriza um privilégio que não se coaduna com os princípios
republicanos e democráticos. O princípio da igualdade é inerente à República e ao
regime democrático. Tanto é verdade, que o princípio isonômico é destacado na
Constituição: Vejamos o exemplo, artigo 5°, caput, artigo 5°, I, artigo 150, inciso II,
artigo 151, inciso II, artigo 7°, incisos XXX, XXXI, XXXII, XXXIV, artigo 3°,inciso III,
artigo 43, artigo 170, inciso VII.”
Nessa linha de pensamento, o referido posicionamento não é de comum
consenso. Fernando da Costa Tourinho Filho (2005), esclarece que, após a cessação
do cargo, o referido foro privilegiado continua sendo direito do sujeito que anteriormente
ocupava o cargo.
Podem-se localizar posicionamentos que aceitam à permanência da
competência especial para os ex-ocupantes de funções e cargos públicos tanto na
doutrina quanto na jurisprudência de nossos tribunais. A temática, referente ao
julgamento de um ex-ministro de estado, foi declarada pelo então Ministro Relator,
Victor Nunes (1962) que: “A referida correção, sinceridade e independência moral com
que a lei deseja que sejam plenamente exercidas as funções públicas ficaria
desestabilizada, se o sujeito pudesse recear que, cessado o cargo, seria julgado, não
pelo Tribunal que tenha jurisdição especial para julgá-lo no exercício da função que
anteriormente realizava, e sim, por outros que poderiam não ter o mesmo grau de
imparcialidade.” 12.
12
(Rcl n° 473, Tribunal Pleno, Rel. Min. Victor Nunes, j. 31.01.1962, unânime, RTJ, 22/47)
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13
Termo utilizado para referir-se a um bloco formado por partidos políticos no congresso nacional, ainda
que pertencente a ideologias diferentes, com o intuito de formar maioria e, assim, aprovar pautas de seu
interesse.
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Municípios e
membros do
Ministério
Público da
União que
atuam
perante
Tribunais.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
observada a sua apresentação como garantia de justo julgamento, e não como artifício
de diferenciação entre os cidadãos.
Para terminar, por vez, essa dúvida generalizada pode ser usado o próprio
conceito de isonomia como argumento. Pois, tratar igualmente os iguais e
desigualmente os desiguais, na medida de suas desigualdades significa observar as
características que nos torna diferentes, para dessa maneira remediar os problemas
que são gerados dessa desigualdade da forma como for necessário.
Os ocupantes de cargos e funções públicos, membros conhecidos da sociedade,
se destacam dos cidadãos comuns no que tange a sua imagem, seus atos e suas
obrigações. Isso porque, possuem o que denominamos de à "vida pública", assim torna
impossível tentar igualar aos cidadãos comuns tanto no que se refere aos atos da vida
cotidiana, quanto em relação aos crimes cometidos, sejam eles comuns ou de
responsabilidade.
Basta uma rápida análise no cenário político atual para inferir que reinam os
interesses particulares acima dos públicos, afastando-se a imparcialidade, requisito que
deve ser inerente a todo gestor público. Mesmo assim os mais diversos artifícios são
usados para promover a proteção e manutenção dos benefícios adquiridos, fugindo da
boa-fé e a probidade esperada daquele que é instituído para julgar outrem.
Por considerar que as instâncias superiores menos propensas a tais
manipulações e jogos do poder é que foi conferida a elas a competência de processar e
julgar ocupantes de cargo público, os quais já foram enumerados anteriormente. Assim
sendo, resta inferir que o foro por prerrogativa de função foi e ainda é necessário no
nosso ordenamento jurídico como garantia da aplicação e do cumprimento das leis a
todos imposta.
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REFERÊNCIAS
DOS SANTOS, Miguel Ângelo Alves. Imunidades Jurídicas. 1ª ed. Editora Juarez De
Oliveira.
<http://www.senado.leg.br/publicacoes/GeneseConstituicao/pdf/genese-cf-1988-
1.pdf>
MARQUES, José Frederico. Tratado de direito penal. São Paulo: Saraiva, 1980. v. 1.
MIRABETE, Júlio Fabbrini. Processo penal. 17. ed. São Paulo: Atlas, 2005.
SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 23. ed., ver. e atual.,
São Paulo: Malheiros Editores, 2004.
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. 27. ed. São Paulo: Saraiva,
2005. v. 2.
Rcl n° 473, Tribunal Pleno, Rel. Min. Victor Nunes, j. 31.01.1962, unânime, RTJ,
22/47.
Inq n° 687, Tribunal Pleno, Rel. Min. Sydney Sanches, j. 25.08.1999, unânime, RTJ,
179/912.